Peter Zumthor - Poiesis
Peter Zumthor - Poiesis
Peter Zumthor - Poiesis
POIESIS
PETER ZUMTHOR
POIESIS
Área de concentração
Projeto de Arquitetura: Teoria e Métodos
Orientadora
Profª Drª Marta Vieira Bogéa
São Paulo
2019
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial
deste trabalho, por qualquer meio convencional
ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa,
com a condição de que se cite a fonte.
Email de contato
luis.tavares@usp.br
Aprovado em
Banca Examinadora
Julgamento Assinatura
Julgamento Assinatura
Julgamento Assinatura
agradecimentoS
À FAU-USP e à CAPES pela estrutura e apoio à pesquisa.
À Marta Bogéa pela cuidadosa orientação e sempre generosa
disposição em ajudar.
À Helena Ayoub e ao Luis Antônio Jorge pelos precisos comentários
no exame de qualificação que conduziram a pesquisa para essa estrutura.
Ao Kunsthaus Bregenz pelo material disponibilizado e informações prestadas.
À Hannah Uesugi e ao Pedro Botton pelo grande companheirismo
em dar forma a esse desenho.
À Julia Paccola pelo tratamento atencioso dado às fotografias.
Ao Alexandre Gaiser por descobrir o Stülpschalung entre suas traduções.
Ao Philip Ursprung e à Irina Davidovici pela troca enriquecedora
de opiniões.
À Marina Canhadas, à Marina Acayaba e ao Ricardo Gusmão
por dividirem o processo de pesquisa.
À Marcela Lino por conduzir a visita ao Atelier Zumthor.
À Marina Cechi pelas trocas e entrevista concedida.
À Clara Werneck, companheira de tema de pesquisa,
pelas conversas e trocas de material.
Ao Marinho Velloso pela amizade e por transpor
as questões desta pesquisa ao Arquipélago.
À Jihana Nassif pelo apoio desde o início até a conclusão desta arquitetura.
À minha família, José, Vera e João. Núcleo duro da beleza.
Palavras chave:
Peter Zumthor; Arquitetura suíço-alemã contemporânea; Projeto; Poiesis
abstract
This research analyzes the architectural work of the contemporary Swiss
architect Peter Zumthor, located after 1985, in the construction of his crea-
tive field, that is, in the recognition of the factors that influence his own de-
sign procedures, in order to contribute to the deepening understand of his
questions. In this sense, his biographical formation related to a craftsman’s
environment and his professional experience focused on the historical pa-
trimony, concomitant with the factors of the swiss architectural context of
the period, are related, mainly, to the influence of the theories of Aldo Ros-
si, Minimalist art and artist Joseph Beuys. Some common design strategies
of the generation of swiss architects from this context are emphasized in or-
der to recognize Zumthor among a generational debate. His design metho-
dology is approached focusing on the production of physical models in his
studio. The research on his poiesis is contemplated by means of the direct
analysis of his projects, from the report of the visit to the buildings until the
selection of a group of projects debated with greater emphasis. Technique
and Place, two fundamental questions for the architect, are addressed in
the analysis of the projects Sogn Benedetg Chapel (Switzerland, 1985–88),
Atelier Zumthor (Switzerland, 1985–86), Shelter for Roman Archaeological
Ruins (Switzerland, 1985–86), Bregenz Art Museum (Austria, 1989–97) and
Bruder Klaus Field Chapel (Germany, 2000–07).
Keywords:
Peter Zumthor; Contemporary swiss-german architecture; Project; Poiesis
sumário
0 Introdução 31
1 Peter Zumthor 37
1.1 Biografia – formação pessoal 38
1.2 Geração suíça e Aldo Rossi – contexto formativo 54
1.2.1 Manifestações projetuais 66
1.2.1.1 A concisão formal
e expressividade material 67
1.2.1.2 A lógica de plantas
não hierárquicas 76
1.2.1.3 A adaptação volumétrica
ao entorno 84
1.3 Atelier Zumthor 88
4 Conclusão 307
Bibliografia 314
Lista de imagens 320
0 Introdução
Este trabalho busca contribuir para o reconhecimento do campo criativo
do arquiteto suíço Peter Zumthor, ou seja, organizar algumas de suas bases
de pensamento projetual que se manifestam em sua obra pós 1985. Com
isso, esperamos criar um caminho de compreensão e análise de seus proje-
tos a partir do entendimento de sua poiesis.
Para tanto, organiza-se em três capítulos. No primeiro: descreve o ar-
quiteto quanto à sua formação biográfica, o contexto formativo de sua ge-
ração suíça, e o seu modo particular de projetar através de modelos físicos.
No segundo capítulo a pesquisa desloca-se para as próprias obras, anali-
sadas pelo autor desta pesquisa diante de sua viagem até elas. No terceiro
bloco, é definido um grupo, dentre os projetos visitados, para uma análise
mais aprofundada, os quais amparam as questões da obra de Zumthor.
Metodologicamente, o primeiro capítulo visa a apresentar o persona-
gem, entendendo quais parâmetros antecedem seu ato criativo ou embasam
suas decisões projetuais. A sua peculiar formação inicial como marceneiro,
em um ambiente familiar artesão, seguida da formação acadêmica de orien-
tações modernas em Basel e a sua primeira fase profissional atuando por dez
anos (1968–79) como analista de morfologias das vilas suíças para o Depar-
tamento de Patrimônio Histórico são fundamentais para seu entendimento.
Ao mesmo tempo, a pesquisa busca não isolar Zumthor dos debates
conceituais que o cercavam nesse mesmo período, década de 70, em que
a arquitetura suíça passava por uma transição para além dos paradigmas
modernos. Nesse momento, é importante reconhecer o papel de Aldo
Rossi como catalisador de um viés contextual que influenciou toda essa ge-
ração de arquitetos com sua atividade docente na ETH-Zurique.
33
Do mesmo modo, os debates artísticos provindos do Minimalismo ser-
viram à forma da arquitetura desse grupo diante da busca por uma respos-
ta essencial que resistisse ao excesso de imagens difusas e indeterminações
de seu tempo, sobretudo no final dos anos 80 e década de 90.
Nesse momento, a pesquisa elenca algumas manifestações projetuais
dessa geração, buscando reconhecer Zumthor nessa discussão: a concisão
formal e expressividade material; a lógica de plantas não hierárquicas; e a
adaptação volumétrica ao entorno.
Para o desenvolvimento dessas questões desse contexto histórico suíço
do período, recorre-se, principalmente aos autores: Irina Davidovici (DAVI-
DOVICI, 2018), Martin Steinmann (STEINMANN, 2001) e Françoise Arnold
(ARNOLD, 2013).
Como seria o processo de trabalho de Zumthor no desenvolvimento
de seus projetos? O capítulo “Atelier Zumthor” busca reconhecer o papel
central dos modelos físicos como verificadores das questões de projeto do
arquiteto. Os modelos levados para a Bienal de Veneza de 2018 pela parti-
cipação do Atelier Zumthor, Dreams and Promisses: models of Atelier Peter
Zumthor, são registrados pelo autor desta pesquisa e utilizados como parâ-
metros de análise.
O segundo capítulo da pesquisa corresponde a um relato em primeira
pessoa da viagem feita pelo autor desta pesquisa, em abril de 2016, a dez
obras do arquiteto, na Suíça, Áustria e Alemanha. A experiência da visi-
ta às obras propiciou uma análise direta dos procedimentos de projeto de
Zumthor, como fonte primária de pesquisa da dissertação. Especialmente
no caso de sua obra, que se dedica também aos aspectos relacionais corpo-
-arquitetura, a experiência de vivenciar os próprios edifícios torna-se im-
prescindível para o entendimento das questões do arquiteto. As obras estão
abordadas nesse capítulo segundo um método comum de investigação, ou
seja, um percurso analítico que demonstra: a sua inserção na paisagem, o
detalhe do acesso à edificação e, finalmente, seu interior.
No terceiro e último capítulo foi feito um elenco de um grupo das
obras visitadas que explicita questões mais amplas na interpretação dos
projetos de Zumthor. A Capela Sogn Benedetg (Suíça, 1985–88), o Atelier
Zumthor (Suíça, 1985–86) e o Abrigo para as Ruínas Arqueológicas Roma-
nas (Suíça, 1985–86) são analisados em conjunto, demonstrando como
Zumthor reinterpreta o uso da madeira local nos seus primeiros projetos e
34
sua relação com a obra mais recente. O Museu de Arte de Bregenz (Áustria,
1989–97) é utilizado para mostrar como se dá a utilização do vidro para o
arquiteto durante a década de 90, quando esse material repercutiu na ar-
quitetura global sobre os temas da superfície e sua potência como velamen-
to dos edifícios. A Capela de Campo Bruder Klaus (Alemanha, 2000–07),
por fim, a obra mais recente analisada, usufrui de questões do âmbito cons-
trutivo de Zumthor, onde o concreto é explorado de modo a expor seus
processos construtivos.
Dessa forma, esperamos que a pesquisa possa ampliar a compreensão
das virtudes de Zumthor diante de sua formação, seu contexto, e, funda-
mentalmente, suas obras.
A título de guia de leitura, estabelecemos que, na ocorrência de col-
chetes ([ ]) na legenda numérica, as imagens reproduzidas são do autor
desta pesquisa; as demais imagens estão devidamente creditadas no tér-
mino da dissertação.
35
1 Peter Zumthor
1.1 Biografia
formação pessoal
Peter Zumthor mantém uma prática e uma maneira de enxergar a arquite-
tura alicerçada na sua formação e histórico-profissional que engendraram
à sua arquitetura características singulares dentro do contexto arquitetôni-
co-cultural suíço-alemão da década de 80, período em que inicia seu pró-
prio Atelier, marcado pelas rediscussões da agenda Moderna.
Zumthor nasceu em 1943, em Oberwil, Suíça, onde trabalhou inicialmen-
te como marceneiro na oficina de seu pai. Estudou interior design, design e
arquitetura na School of Arts and Crafts, em Basel, e no Pratt Institute, em
Nova Iorque, na década de 60. Trabalhou dez anos no Departamento de Pa-
trimônio Histórico do cantão de Graubünden, na Suíça alemã, antes de abrir
seu próprio Atelier, em 1979, na cidade de Haldenstein, no mesmo cantão.
Desde então, produziu cerca de 130 projetos, dos quais cerca de 35 cons-
truídos 1. Por conta de sua produção, recebeu, dentre outros, o Prêmio Mies 1 Dado retirado da
publicação Peter
Van der Rohe de Arquitetura Europeia, em 1998; o japonês Praemium Impe- Zumthor 1985–2013
riale, em 2008; o Prêmio Pritzker em 2009; e a Royal Gold Medal do Royal Buildings and Projects:
DURISCH, Thomas (ed.);
Institute of British Architects em 2012. ZUMTHOR, Peter. Peter
O preâmbulo de sua formação arquitetônica correspondente aos cinco Zumthor 1985–2013
Buildings and Projects.
anos trabalhando como ajudante de seu pai, como marceneiro [joinery] são Zurique: Scheidegger
fundamentais, tanto para a incorporação de uma lógica construtiva ligada & Spiess, 2014.
ao fazer em seus posteriores projetos, como pela própria rediscussão da
prática arquitetônica suíça na década de 80, quando Zumthor desenvolve
sua arquitetura inicial fazendo uso da madeira.
A questão cultural do uso da madeira nesse período na Suíça está atre-
lada à própria definição da dicotomia artesão-arquiteto, sendo Zumthor
um dos personagens centrais no rompimento da ideia nostálgica associada
39
aos artesãos, justamente pelo próprio reconhecimento de sua atuação ini-
cial como marceneiro.
A retomada do uso da madeira na Suíça nesse período, para além dos
parâmetros modernos ensaiados na década de 30, quando sua aplicação
apenas envolvia um certo endereçamento do material à forma estilística
dominante, propiciou um ambiente mais profícuo aos arquitetos. Ver figuras 1 a 4.
Irina Davidovici 2 descreve esse contexto de “abordagem intelectual” 2 Arquiteta e ensaísta
Irina Davidovici,
ante ao uso da madeira e o papel “não sentimental” de Zumthor diante da professora de história
visão artesã associada a ele nesse debate pela sua formação inicial: e teoria de arquitetura
na Universidade de
Kingston, resultado de
O interesse suíço na construção de madeira não se baseia apenas em suas sua tese de doutorado
pela Universidade de
vantagens práticas ou ambientais. Pelo contrário, tem sido o resultado de Cambridge, a qual foi
uma abordagem intelectual, vendo a madeira como sensível ao contexto vencedora do Prêmio
Outstanding PhD Thesis
e capaz de despertar associações históricas. Essas associações operam em concedido pelo RIBA,
um nível tipológico e abstrato, evitando a imitação nostálgica das formas em 2009.DAVIDOVICI,
IRINA. Forms of
vernaculares. (DAVIDOVICI, 2018, p.105) Practice: German
Swiss Architecture
1980–2000. Zurique:
Embora posteriormente tenha se tornado arquiteto, a presença de GTA Publishers, 2012.
Zumthor nos debates promovidos pela principal revista suíça, Archithe-
se 3, reforçam as mesmas características relacionadas aos seus primeiros 3 Ver a entrevista com
o editor da revista,
anos como marceneiro para romper ou redefinir as relações possíveis en- Martin Steinmann em:
tre os artesãos e arquitetos naquele momento: STEINMANN, Martin;
ALDER Michael; HERZOG,
Jacques; De MEURON,
A atitude de Zumthor sinalizou um rompimento entre a percepção do Pierre, ZUMTHOR,
Peter. Bauen mit
arquiteto do artesão moderno e sua própria condição. Historicamente, holz/ Propos sur Le
invocações do nomeado “artesão” levantaram suspeitas desde os debates bois. Em Archithese
5. Schweiz: Archithese
sobre artes industriais do Werkbund, antes da Primeira Guerra Mundial. Verlagsgesellschaft
No contexto suíço, o apelo ao artesanato foi associado ao Landistil e à pro- mbH,1985. p.2–15.
paganda da autodefesa espiritual no final dos anos 30 e 40. Especialmente
após as revisões de identidade nacional dos anos 60, a imagem das mãos
enrugadas segurando formões permaneceu extremamente problemática.
O surgimento de Zumthor no estágio profissional suíço reafirmou o de-
bate de uma maneira nova e não sentimental. (DAVIDOVICI, 2018, p.106)
40
Emil Roth.
Albergue juvenil,
1 Fällanden, 1937.
nostálgica de quem atua a partir de trabalhos manuais. A importância em
abordar esses cinco anos iniciais na oficina de seu pai como parte de sua
formação consiste na educação de uma mentalidade artesã, como afirma o
historiador austríaco Friedrich Achleitner:
42
Meilli & Peter.
School for Wood
Technology,
2 Biel, 1990–93.
Burkhalter + Sumi.
Estação Florestal,
3 Turbenhal 1991–93.
Peter Zumthor.
Casa Gugalun,
4 Versam, 1990–94.
indagação inicial permanece em Zumthor até os tempos recentes, por exem-
plo, ao ser entrevistado pela revista Dear Magazine, na ocasião de sua expo-
sição autobiográfica Dear to Me 4, no final de 2017, ele menciona que gostaria 4 Dear to Me foi
uma exposição
de ser chamado de “arquiteto ou construtor [Baumeister]” (KUNSMANN; BUR- autobiográfica
KOFF, 2017), dada a ênfase no “fazer”, no “saber construir as coisas”. feita pelo arquiteto
ocupando todo o seu
Também é possível ter clareza dessa ênfase construtiva como éthos do projeto do Museu de
pensamento arquitetônico de Zumthor quando ele descreve uma memória Arte de Bregenz, na
ocasião festiva de seus
da época em que trabalhava como marceneiro, aos 18 anos de idade: 20 anos de existência,
entre 16/09/2017 e
07/ 01/ 2018. Estava
Com 18 anos, quando o meu tempo de aprendizagem como marcenei- centrada em conversas
ro estava praticamente no fim, desenhei e fiz os meus primeiros móveis. semanais entre
Zumthor e artistas
Normalmente construíamos os móveis na oficina, cuja forma e constru- literários e músicos
ção eram determinados pelo mestre ou pelos clientes. Mas eu não gosta- selecionados por ele.
va. Também não gostava da madeira que utilizávamos para as melhores
peças: a nogueira. Para os meus móveis escolhi o freixo claro e trabalhei
as peças singulares de maneira que ficavam bem de todos os lados; atrás
e à frente eram feitas com o mesmo cuidado e com o mesmo material.
Não me importei com o costume dos marceneiros de executar as par-
tes de trás dos móveis de forma mais barata e menos trabalhada, porque
normalmente essas não se veem. Finalmente podia arredondar muito
pouco as arestas dos móveis sem ser corrigido. De maneira leve e rápida
passei a lixa sobre as arestas dos corpos de madeira acabados de mon-
tar, para os libertar do fio cortante incômodo e preservar a elegância das
linhas finas. […] Coloquei a porta do pequeno armário na moldura de
frente com juntas mínimas, mas alinhada de tal modo que se fechava
sem resistência, apenas com um suave atrito que emitia um barulho de ar
5 Escolas técnicas
quase imperceptível. (ZUMTHOR, 2009, p.48) dessa região de
consagração da
experiência prática;
No segundo momento de sua formação, abrangida pela esfera acadêmi- compreendia também
ca, Zumthor estuda interior design, design e arquitetura na School of Arts Alemanha e Áustria.
Ver o capítulo The
and Crafts, em Basel, e no Pratt Institute, em Nova Iorque, na década de 60. Background of Practice
Em termos contextuais suíços desse período, a escola de Basel era de em: DAVIDOVICI,
Irina. Forms of
formação alinhada com os princípios da arquitetura moderna, fora do Practice: German
Cantão suíço-alemão, onde a ETH-Zurique (Instituto Federal de Tecnologia Swiss Architecture
1980–2000. 2ª edição
de Zurique), que tinha sua orientação pedagógica mais ligada às Fachho- ampliada. Zurique:
chschule 5, mantinha sua atenção à construção em módulos técnicos. GTA Publishers, 2018.
44
Apesar de ter estudado arquitetura diante de um ambiente moderno,
Zumthor não chega a desenvolver sua arquitetura propriamente nesses
princípios, tendo sido mais influenciado, como se observa em suas pri-
meiras obras, pelas discussões nomeadas “pós-modernas”, introduzidas Ver figuras 7 a 12.
na década seguinte. Ainda assim, é possível identificar alguns vínculos
modernos em suas obras, como a abstração geométrica dos volumes ar-
quitetônicos, a independência da estrutura e em módulos autônomos de
circulação.
Mais importante que a formação moderna em Basel, como dado da for-
mação de Zumthor, são os seus dez anos iniciais como arquiteto do Depar-
tamento de Patrimônio Histórico do cantão de Graubünden, de 1968 até
1979, quando abriu seu próprio Atelier.
Zumthor era responsável por analisar e publicar estudos da morfologia
construtiva das vilas históricas da região. Como esperado, isso se tornou
um componente fundamental em sua obra futura, agregando conhecimen-
tos culturais técnicos, assim como a valorização de uma via histórica, que
serão atualizados, como arcabouço projetual.
Em entrevista para Hans Ulrich Obrist and Julia Peyton-Jones 6, em 6 Peter Zumthor in
Conversation with
2011, Zumthor avalia essa experiência, que, inicialmente, não era conside- Hans Ulrich Obrist
rada por ele e nem pela classe de arquitetos da época uma “busca pessoal”, and Julia Peyton-
Jones. Disponível
mas uma atividade remunerada na qual ele estaria fazendo algo por que em https://www.
simplesmente tinha apresso: serpentinegalleries.
org/files/downloads/
Zumthor_0.pdf
Bem, novamente, foi um acidente. Voltei de Nova York e visitei um ami- Acessado em
06/01/2019.
go lá em cima [Norte]. Eu estava procurando trabalho, e havia um cara
no Escritório de Preservação onde ninguém queria trabalhar porque os
arquitetos não estão interessados nesse tipo de coisa. Mas tudo bem para
mim: eu amo essa área e achei que seria como férias trabalhar lá. Fiquei
feliz que eles me deram um cheque de pagamento no final do mês, mas
realmente foi um período de férias, olhando para todas essas casas boni-
tas o tempo todo – e alguém me pagou por isso! O que eu aprendi foi o
mistério da arquitetura vernacular. (ZUMTHOR, 2011)
45
exemplo, como o tipo das casas de cada lugar variava de acordo com os
modelos de agricultura:
Então eu olhei para isso e o que eu aprendi foi que você não pode real-
mente identificar o que eles constroem de todas as maneiras até às suas
origens. Eu pensei que deveria haver uma relação entre o clima ou o
meio ambiente e os materiais que eles usam. Mas às vezes não há madei-
ra no ambiente local e ainda usam madeira, e às vezes há muita madeira
e eles não a usam. Então eu pensei que deveria ter a ver com a maneira
como eles trabalham: a economia da agricultura, o tipo de agricultura,
mas novamente você chega a um certo ponto e, de repente, você não en-
tende mais nada. Eu estava ficando louco tentando entender. Finalmen-
te, eu estava lendo um livro quase esquecido, mas brilhante, de Richard
Weiss, Hauser und Landschaften der Sweiz, que pesquisara essas casas.
Esse campo de pesquisa estava completamente fora de moda, para es-
tudar essas antigas casas rurais. Então eu li isso e em um ponto ele sim-
plesmente diz “a morfologia das aldeias reflete a vida e o trabalho das
pessoas que vivem nelas” e lá estava, em uma frase. Reflete o sentimento,
reflete a maneira como trabalham e vivem; aí você tem tudo. Então foi o
que eu aprendi. (ZUMTHOR, 2011)
46
7
Peter Zumthor.
Café Demont,
5 6 Vella, 1970.
8 9
Peter Zumthor.
Casa Dierauer,
Haldenstein, 1975.
10 11
12
Peter Zumthor.
Remodelação da
torre medieval Casti,
Lumbrein, 1970.
Eu cresci em um ambiente artesão. Meu pai era um carpinteiro extraor-
dinário e me transmitiu a ideia de que se pode fazer tudo o que é espe-
cialmente interessante e ainda não atingir ninguém. Então começamos a
refletir de verdade. Há uma desconfiança no fazer. Comecei com a for-
mação profissional, depois a escola de artes e ofícios, design de mobi-
liário, seguindo de desenho urbano e industrial no Instituto Americano
Pratt e mais tarde me dediquei dez anos ao estudo da estrutura urbana de
núcleos históricos, história da arte, construção e assentamentos, isso me
parece ser uma formação perfeita. Desejaria que todo estudante pudesse
formar-se tão amplamente. (ZUMTHOR, 2001, p.20).
48
Contradição em Arquitetura, do americano Robert Venturi, e A Arquitetura
da Cidade, de Rossi; e a de 1972: Aprendendo com Las Vegas, de Venturi,
Denise Scott Brown e Steven Izenour.
No campo das artes visuais, o Minimalismo e a arte matérica de Joseph
Beuys, serviram como amparos formais nesse momento de redefinição da
arquitetura.
Dessa maneira, constituíram-se as referências formativas do arquiteto
no que diz respeito a seu próprio entendimento do fazer construtivo, alicer-
çado em sua origem no campo artesão, como marceneiro, e do fazer con-
ceitual, diante de sua formação acadêmica e profissional, trabalhando dez
anos com patrimônio histórico no mesmo momento de revisão teórica da
arquitetura suíça, impulsionada pelos estúdios de Aldo Rossi na ETH e a
expressividade artística minimalista.
Esse processo de formação indireta, ligada ao contexto rossiano e artís-
tico será desenvolvido no capítulo a seguir, pois relaciona-se com toda essa
geração de arquitetos suíços.
49
Formação pessoal
Publicação de estudos
de morfologia de aldeias;
1988 • Professor visitante no Southern California Institute of Architecture (SCI-ARC), Los Angeles, EUA.
• Primeira exposição individual de projetos: Partituren und Bilder – 1985–1988. Lucerna, Suíça.
1998 • Prêmio europeu Mies Van der Rohe pelo Museu de Artes de Bregenz.
1983 •
“ANALOGUE ARCHITEKTUR STUDIO”
FABIO REINHART + MIROSLAV SIK
Alunos:
Valerio Olgiati
Andrea Deplazes
Valentin Bearths
Christian Kerez
Quintus Miller
Paola Maranta
Conradin Clavuot
1991 •
13
Reprodução do
documentário Peter
Zumthor at Work, 2012.
1.2 GERAÇÃO SUÍÇA E ALDO ROSSI
CONTEXTO FORMATIVO
A Suíça ingressou nas questões da revisão do funcionalismo moderno, atra-
vés de um grupo de arquitetos da região italiana de Ticino, mais orientados
segundo as ideias do Racionalismo Italiano, nomeadamente Bruno Rei-
chlin, Fabio Reinhart, Dolf Shcnebli, Luigi Snozzi, Mario Campi e Everaldo
Consolascio, que facilitaram a o ingresso de Rossi na ETH 9. 9 Ver DAVIDOVICI,
IRINA. Forms of
Esse mesmo grupo de arquitetos estava, nesse momento, iniciando uma Practice: German
certa reinterpretação regional sulista das classificações tipológicas do Ra- Swiss Architecture
1980–2000. 2ª edição
cionalismo italiano, modelo que ganhou grande repercussão, especialmen- ampliada. Zurique: GTA
te na suíça-alemã. Em 1974, Martin Steinmann e Thomas Boga organizam Publishers, 2018, p.59.
a Tendenzen – Neuere Architektur im Tessin, exposição sobre a obra desses
arquitetos na própria ETH, trazendo essa referência conceitual para a re-
gião. Irina Davidovici descreve o impacto dessa exposição: Ver figuras 14 a 16.
55
A presença de Aldo Rossi na ETH aparece descrita em toda a biblio-
grafia consultada (LUCAN, 2001; L’HYPOTHÈSE, 2012; DAVIDOVICI, 2018;
ZUMTHOR, 2018) como um “fato maior”, de grande atração dos estudantes
e da crítica, sendo de central relevância na reorganização pedagógica e
limites da arquitetura daquele período de transição. Seu status carismático
o colocava em posição “quase mítica” na cena arquitetônica suíça, como
aponta Davidovici.
Seu primeiro estúdio se deu entre 1972 e 74, com os assistentes Bruno
Reichlin, Fabio Reinhart, e estava fundamentado nas teorias de seu livro
Arquitetura da Cidade (66), nomeado “Typological Studio”.
O discurso de Rossi serviu de método racional para a compreensão das
características regionais, mas também inferiu, naquele momento, certo dis-
tanciamento do enfrentamento da realidade subjetiva. Nesse sentido, ofe-
recia uma disciplina hermética.
Bruno Reichlin e Martin Steinmann objetivam essa discussão em dois
importantes números da revista Architese, nº 13 (1975) e nº 19 (1976), abor- Ver figuras 17 e 18.
dando o tema do Realismo na arquitetura, seu caráter possível mas experi-
mental, sensual e menos racional.
O segundo momento de Rossi na ETH ocorreu entre 1977–78, em um
estúdio colaborativo entre Bernard Hoesli e Paul Hofer, quando abordou
exatamente a questão da subjetividade na arquitetura, ou seja: posicionou
a experiência pessoal, a percepção e associações da memória como cam-
po de desenvolvimento do projeto arquitetônico. Esse estúdio consistiu no
preâmbulo de sua Autobiografia Científica, publicada em 1981.
No campo prático, essa mudança metodológica no entendimento da
História é de fundamental impacto na produção suíça daquele momento,
pois transcende o sentimento nostálgico de seu enfrentamento, tendo cria-
do subsequentes influências entre parte dos arquitetos. Zumthor e Herzog
& de Meuron (os últimos alunos diretos de Rossi do Typological Studio)
são dois exemplos de alguns dos que foram provocados por esse modo de
entender as possibilidades da arquitetura.
Zumthor, sete anos mais velho que Jacques Herzog e Pierre de Meuron,
apesar de não ter tido aula direta com Rossi, cita esse movimento teórico
como contribuinte de sua base formativa para, na sequência, abrir seu pró-
prio Atelier, em 1979, um ano depois da fundação do Herzog & de Meuron:
56
Luigi Snozzi.
Habitação coletiva,
14 Celerina, 1973.
15
Luigi Snozzi.
Gymnasium,
Monte Carasso, 1979.
16
Aurelio Galfetti.
Kindergarten,
Riva San Vitale, 1964.
A partir do final dos anos setenta para a metade dos anos oitenta, […] jo-
vens arquitetos na Suíça de língua alemã foram apanhados por algo que
me afetou também e para o qual eu gradualmente me senti pertencente.
Eu conheci arquitetos não só em casa, mas em Vorarlberg, Viena, e Tici-
no. Nós falamos sobre a qualidade visual da arquitetura, sua sensualidade,
sua fisicalidade, a sua capacidade para criar atmosfera. Aldo Rossi, que
estava ensinando em Zurique, na época, abriu meus olhos para a história
da arquitetura e da arquitetura da minha memória biográfica. A revista
Archithese fundada por Stanilaus von Moos endereçou questões como a
monotonia, realismo na arquitetura, e Aprendendo com Las Vegas. […]
Minha busca pessoal tinha começado. (ZUMTHOR, 2014, p.9)
58
17 18
Architheses 13 e 19.
Verlag Arthur Nigli,
Teufen, 1975–76.
Era muito importante para mim, porque eu fiz os meus estudos na
escola de arte de Basel, como parte de uma educação clássica modernis-
ta onde a história não existia. Fazer coisas novas, sempre o maior, foi a
principal qualidade reconhecida. Nós não poderíamos falar sobre nossos
sentimentos. Devíamos sempre nos expressar como arquitetos e ser toma-
dores de decisão, que justificam todos os tipos de coisas, ao que a decisão
certa seria tomada em acordo com o seu ser interior. Lembro-me de uma
observação que Aldo Rossi tinha feito a um jovem arquiteto que se prepa-
rou para sua formatura. Ele tinha olhado para o projeto, que incluía uma
grande fenêtre en longeur que todo mundo estava fazendo no momento.
Então ele perguntou ao jovem o seu lugar de origem na Suíça e disse que
sua arquitetura devia aprender com este lugar em vez de tentar se parecer
com ele. Esse conceito de memória do lugar foi uma verdadeira introdu-
ção à obra de arquitectura. (ZUMTHOR em ARNOLD, 2013, p.50)
Jacques Herzog, por sua vez, recorda da didática de Rossi, voltada mui-
tas vezes ao entendimento da imagem de beleza, na liberdade da busca por
uma arquitetura atraente:
60
Os ensinamentos de Rossi se perpetuaram, ainda, na ETH, mesmo após
a sua ausência: entre 1983 e 1991, Fabio Reinhart e Mirolslav Sik coman-
daram o estúdio Analogue Architektur, fundamentalmente amparado pelo
ensaio subjetivo Cidade Análoga 11, de Rossi. Diante da descrição de Davi- 11 Ver Capítulo 7:
museus minimalistas
dovici do funcionamento do estúdio, é possível estabelecer repercussões na em FOSTER, Hall.
própria produção do Atelier de Zumthor, naquele período, que tinha den- O complexo arte-
arquitetura. São Paulo:
tre seus colaboradores alunos do estúdio, Valentin Bearths, por exemplo: Cosac Naify, 2015.
Sik montou o estúdio, que logo se tornou uma escola dentro da escola,
como sistema de aprendizado auto-suficiente, com os alunos mais jovens
ajudando os mais velhos enquanto aprendiam as técnicas de representa-
ção características do estúdio. Ideias arquitetônicas foram transmitidas
através de desenhos de grande perspectiva, concebidos primordialmente
em termos de imagem e atmosferas. Em vez de representações arquite-
tônicas idealizadas como plantas e cortes, apresentadas como configura-
ções geométricas no espaço em branco do papel, os alunos foram enco-
rajados a representar o projeto em seu contexto. (DAVIDOVICI, 2018, p.71) Ver figuras 19 e 20.
61
A chamada Arte Povera, grupo de artistas italianos que se dissolvera
em 1970, rediscutiu os signos expressos pelos próprios materiais, essencial-
mente, pela associação contrastante entre diferentes materialidades.
Joseph Beuys é um artista que, de certa maneira, usufrui do legado da
Arte Povera e é referenciado por Zumthor em 1988, em uma conferência
realizada no Southern California Institute12: 12 O título original da
conferência é “a way of
looking at things” e fora
Os trabalhos de Joseph Beuys e de alguns artistas do grupo da Arte Pove- publicado em inglês,
dez anos depois de seu
ra têm para mim algo de revelador. O que me impressiona nessas obras ocorrido no periódico
de arte é o emprego preciso e sensual do material. japonês monográfico
A+U special edition,
Este parece estar enraizado num saber antigo do uso dos materiais fevereiro 1998. Tóquio:
pelo homem, que revela, em simultâneo, a sua verdadeira natureza para A+U Publishing, 1998,
p.6–25. Posteriormente,
além do culturalmente transmitido. em 2006, a publicação
No meu trabalho tento empregar os materiais de uma maneira seme- Architektur Denken
reuniu uma série
lhante. Penso que estes, no contexto de um objeto arquitetônico, podem de conferências do
assumir qualidades poéticas. Para tal efeito é necessário criar no próprio arquiteto em um único
título, incluindo a
objeto uma coerência de forma e sentido; uma vez que os materiais em si mencionada. Em 2009,
não são poéticos. (ZUMTHOR, 2009, p.9) a mesma publicação
foi traduzida para
o português, pela
Bruno Reichlin, por sua vez, condiciona o interesse dessa geração de ar- editora Gustavo Gili,
sob o título de Pensar
quitetos pelas artes, especialmente a Minimalista, como uma translação do a Arquitectura e a
discurso imagético ensejado por Rossi, para uma condição mais próxima conferência para “Uma
intuição das Coisas”:
da cultura Suíça: ZUMTHOR, Peter.
Pensar a Arquitectura.
Barcelona: Gustavo
Aldo Rossi é culpado dessa grande ambição de produzir arte com arqui- Gili, 2009, p.8.
tetura. Agora se tornou uma doença. Mas houve uma interessante inver-
são de pensamento: os jovens arquitetos suíços afastaram-se rapidamente
de Aldo Rossi e do pós-modernismo que envolvia inspiração histórica e
dos temas formais da história, porque era necessária uma grande cultura
histórica… não é de modo algum a tradição do nosso país, especialmen-
te em comparação com a Itália, que obviamente tem uma forte cultura
literária e que leva arquitetos a representar um mundo como é descrito
em romances. Muitos arquitetos, dentre os ex-alunos do Aldo Rossi, es-
tavam bastante interessados na arte contemporânea, que, na época, era
muito minimalista. O Minimalismo permitiu coletar e mostrar outras
figuras, outras imagens, mais próximas da tradição suíça. Aqui aprende-
62
19
20
Ilustração do período.
Peter Zumthor.
Rindermarkt
apartment building,
Zurich, 1988.
mos desenhos muito simplificados, às vezes geometrias abstratas muito
expressivas, sua cor, seu equilíbrio formal. É o que os professores e os
pedagogos fazem. O interessante é que os suíços também falam sobre
imagens, como é o caso de Herzog & de Meuron, mas é sobre imagens
pessoais e não imagens de sua cultura figurativa. Porque a ideia de usar
sua cultura figurativa envolveria afastar-se do individualismo e do culto
da auto-adoração, típico do artista suíço. (L’HYPOTHÈSE, 2012, min. 58)
64
21 Donald Judd
Untitled,
1972.
66
1.2.1.1 A concisão formal e expressividade material
Citados como parte na “New Simpicity” 14 suíça, o grupo concentra grande 14 Abordagem formal
relacionada com a
parte de sua obra em projetos com reduções formais para volumes conci- simplicidade observada
sos, prismáticos, onde há um deslocamento para o tema da superfície ma- com recorrência
cunhou esse título à
terial e da própria ideia de presença, atmosfera, do edifício em seu contexto: produção suíça desse
período, embora
não caracterize um
Na suíça, “New Simplicity” está longe de ser um objetivo. Realmente, é o movimento teórico
resultado lógico de outros objetivos conceituais. Nem é uma prioridade, próprio. Ver capítulo
“New Simplicity”, em
mas é o resultado de um processo de redução que faz os materiais e as LUCAN, Jacques;
formas brilharem e ressoarem. Menos é realmente mais aqui – o pro- RAFFAELE, Colette;
NICOLIER, Guy; MIVELAZ,
cesso de redução não é sinônimo de abnegação induzida pela escassez; Philippe; STEINMANN,
ele incorpora um esforço para a sensualidade. (ALLENSPACH, 1999 apud Martin. Matiére
d’art: architecture
LUCAN, 2001, p.142) contemporaine em
Suisse/ A matter of
art: contemporary
Os projetos abdicam de colagens ou de figurativizações, termos e solu- architecture in
ções de projeto tão utilizados no período no contexto global, concentran- Switzerland. Berlin:
Birkhauser, 2001.
do-se menos na ideia de figura e mais na ideia da forma: são artefatos geo-
métricos abstratos, silenciosos, concêntricos. Ver figuras 24 a 27.
Davidovici faz, ainda, uma extensão do sentido da concisão formal des-
ses projetos, muito coerente com a obra de Zumthor, que é a da aderên-
cia de uma interpretação simbólica da própria presença física dos projetos
como corpos autônomos na paisagem:
Embora seja essa uma operação arquitetônica comum a esse grupo nes- Ver figuras 28 a 31.
se período, ela se perpetua em Zumthor, mesmo recentemente; outros ar-
quitetos desse grupo, ao contrário, como Herzog & de Meuron, experimen-
67
taram outros modelos formais ao longo da carreira, flertando muitas vezes
com a cultura de mercado.
A segunda estratégia diz respeito à expressão matérica desses corpos
geométricos abstratos. As suas superfícies, com suas técnicas construtivas
diversas, ganham importância projetual de maneira que impõem “vibra-
ções” ao volume: a decisão pela materialidade do projeto é fundamental
para a justa definição de seu caráter e da própria experiência física sensorial. Ver figuras 32 a 39.
Cada arquiteto vai explorar sua própria interpretação da relação entre
matéria, contexto e volume arquitetônico, pois não há, como se observa
nos projetos, uma igualdade, decisão comum por materiais. Tampouco en-
tre as próprias obras dos arquitetos há regra individual que consagre sua
produção associada a um único material. Nesse sentido, essa característica
consiste mais em uma ação projetual comum, que vai absorver distintas
expressões matéricas, de acordo com cada contexto: um tema de projeto.
Davidovici observa, levando em conta o comentário de Steinmann, a
mudança que esse grupo de arquitetos engendrou com essa operação:
68
os nossos sentimentos. A magia do real é para mim essa “alquimia” da
transformação de substâncias reais em emoções, esse momento especial
de apropriação ou assimilação emocional da matéria, da substância e da
forma no espaço arquitetônico. (ZUMTHOR, 2009, p.85)
69
24
Gigon Guyer.
Signal Box,
Zurique, 1996.
25
Peter Markli.
La Congiunta,
Giornico, 1989.
26
27
Morger & Degelo.
Transformadores
elétricos da CfF,
Suíça, 1996–2014.
28
Peter Zumthor.
Abrigo ruínas
arqueológicas romanas,
Chur, 1985–86.
[29]
Peter Zumthor.
Capela Bruder Klaus,
Mechernich, 2007.
[30]
Peter Zumthor.
Capela Sogn Benedetg,
Sumvitg, 1985–88.
31
34 35
38 39
[…] baseie-se em uma planta lógica que serve como uma constelação de
contrastes e oposições, de analogias e relações homotéticas, de equilíbrio
e tensão, engendrando assim múltiplas associações sem que nenhuma
das partes individuais perca sua integridade ou relativa autonomia.
O descrito acima é especialmente relevante quando são feitas adições
a conjuntos que requerem uma abordagem sensível, como uma aldeia
no Graubünden com casas que são agrupadas e independentes. (LUCAN,
2001, p.126)
76
tetos, conseguimos fazer. […] Nessa piscina tentamos levar as unidades
espaciais a um ponto em que funcionam por si só. Tentamos, não sei se
conseguimos, mas não me parece que esteja mal. Espaços – aqui estou,
eles começam a reter-me espacialmente, não estou de passagem. Estou
bem aqui, mas neste momento ao virar a esquina, ou noutro ponto qual-
quer, há algo que desperta minha atenção, a luz que entra de uma certa
maneira, e eu passo descontraidamente. Tenho de dizer que isso é um
dos meus maiores prazeres: não ser conduzido, mas sim deambular – drif-
ting. (ZUMTHOR, 2009, p.44)
Esse modelo de planta em constelação fora desenvolvido pela primeira Ver figuras 41 a 57.
vez por Gigon & Guyer no Museu de Kirchner (1989–92), onde também
se desenvolve uma diferenciação material entre os interiores das salas de
exposição e os espaços de articulação, demarcando ainda mais essa alter-
nância de espaços.
Zumthor faz uso dessa configuração logo na sequência cronológica,
com suas Termas de Vals (1990–94), mas, como observa-se, mantém essa
temática ao longo de sua obra, até em sua fase mais recente.
Já o modelo de planta sem corredor, mas com ligação direta entre seus Ver figuras 58 a 61.
espaços, tem como um de seus edifícios iniciais mais emblemáticos a Casa
Tavole, de Herzog & de Meuron (1982–88). Pela análise das obras de Zum-
thor, pode-se aferir que há uma maior constância de edifícios com o pri-
meiro modelo de plantas (constelações), mas as plantas de corredor são
também abordadas no edifício anexo do Museu de Bregenz (1990–95) e na
Casa Gugalun (1990–94), por exemplo.
Em geral, nesse tipo de configuração espacial, é atribuída às divisórias
entre ambientes a função estrutural da edificação, sendo associados, com
frequência, os sistemas de circulação vertical a essas empenas.
77
40
42
43
41 44
[47]
51
48
49 52
Peter Zumthor.
Museu de artes Peter Zumthor.
de Kolumba, Swiss Sound Box,
Colônia, 1998–2003. Expo Hanover, 2000.
55
53
56
57
58
54 59
84
64 65
66
67
Peter Zumthor.
Los Angeles County
Museum of Art (LACMA),
Los Angeles, 2017.
68
Peter Zumthor.
Ampliação da
Fundação Beyeler,
Basel, 2017.
1.3 ATELIER ZUMTHOR
Ainda sobre a construção identitária de Zumthor, é preciso reconhecer
como são os processos de desenvolvimento e pesquisa de seus projetos: seu
método de trabalho em seu Atelier, pois seu modo de projetar é também
uma expressão de suas características em si.
Especificamente, os modelos físicos possuem um papel fundamental Ver figuras 69 a 71.
no processo de trabalho de Zumthor: são os artefatos usados para verifica-
ção e ajuste das várias camadas dos projetos, cada um deles construídos de
acordo com o que se almeja verificar.
Essa ênfase dada à construção de modelos pela necessária confrontação
das ideias subjetivas em objetos físicos pode sinalizar sua intrínseca menta-
lidade artesã, dada sua origem como marceneiro, e, nesse sentido, o recoloca 15 O Atelier Zumthor
divide-se em três
como um artífice, pensando através de seus objetos no fazer arquitetônico. edifícios vizinhos no
Seus modelos físicos não são, diante disso, obras necessariamente em vilarejo de Haldenstein
construídos ao longo
madeira, com acabamento primoroso; ao contrário, são instrumentos de tra- da história do escritório.
balho e pesquisa realizados de forma distante da abstração, acolhendo as O primeiro em 1986,
compartilhado com
reais materialidades de cada projeto, suas texturas, seus modos de construir. sua própria casa; o
A sua importância está refletida na própria organização espacial do segundo em 2005,
que passou a ser sua
mais recente edifício do Atelier Zumthor 15, por exemplo, que tem em todo atual casa e ampliação
seu pavimento térreo, comunicado diretamente com a rua, uma oficina de do Atelier; o terceiro,
inaugurado em
modelos. Com o mesmo tratamento dado pelos artesãos do vilarejo, que 2016, passou a ser a
têm no térreo de suas edificações seus ofícios conectados diretamente com ampliação de maior
escala, um edifício
a rua, os modelos de Zumthor estão expostos à maneira de uma vitrine. de três andares e um
Dentro da dinâmica do Atelier, todos iniciam seu dia de trabalho passando subsolo dedicado
unicamente ao Atelier.
necessariamente pelos modelos para subir até os postos de trabalho nos
andares superiores. Ver figuras 72 e 73.
89
Da mesma maneira, pode-se observar a importância dos modelos físi-
cos para o arquiteto quando reiteradamente os tem exposto em exposições
e bienais, endereçando a eles o sentido de obra do Atelier, abdicando de de-
senhos e outras formas de representação. São exemplos disso as exposições:
Architectural Models By Peter Zumthor, ocorrida em 2012 no Museu de Ar-
tes de Bregenz; a Bienalle de Veneza de 2016, quando apresentou um mo-
delo de grandes proporções do seu projeto para o LACMA; e a Bienalle de
Veneza de 2018, quando expôs 20 modelos de diferentes projetos selecio-
nados na nomeada Dreams and Promisses: models of Atelier Peter Zumthor.
Quanto à dinâmica do Atelier, a feitura dos modelos artesanais não im-
puta um caráter arcaico ou nostálgico à produção de sua arquitetura, mas
uma forma de “resistência” à utilização de computadores que, segundo
Zumthor, diminui a percepção de escala dos projetos, como afirmara em
entrevista para Jeanette Kunsmann e Stephan Burkoff em 2017:
90
69
70
71
72 73
Atelier Zumthor,
oficina de modelos.
jeto. Esse arquiteto passa o desenho para o computador, além de olhar
e organizar outras informações como o programa etc. Mas sempre em
constante conversa com o Peter sobre cada coisa. Depois, em algum mo-
mento, chega a hora de fazer exercícios em maquete. De diversas dimen-
sões, com diferentes objetivos. É muito importante que esteja claro pra
quem está coordenando ou trabalhando na maquete que saiba o objetivo
dela. Às vezes atmosférica, geralmente em maior escala com a materiali-
dade imaginada etc., às vezes mais simples volumétrica para observar a
relação com o entorno. Acho que a partir daí o processo é sempre uma
troca entre o desenho e a maquete. Não é linear de acordo com isso, ao
meu ver. Vai e volta sempre, dependendo do tipo de coisa que se deseja
verificar ou mostrar. (CECCHI, 2018. Depoimento ao autor)
92
Depois se trabalha em cima disso, mais maquetes, ele faz detalhes, de
como você vai abrir a porta, como vai ser a luz que vai entrar nesse lugar,
etc. Tudo é estudado com as maquetes, as cores, onde a luz vai entrar em
tal momento. Ele tem maquetes para ver a orientação do sol, em que país
em que cidade do mundo está o projeto. Ele faz toda a reconstrução do
movimento do sol para saber onde vai entrar e quanta luz ele quer que
entre. Tudo isso ele não faz eletronicamente, que hoje em dia é fácil, você
só coloca no SketchUp e faz automaticamente, mas não, ele faz tudo isso
fisicamente, em maquetes reais. (CABRAL appud WERNECK, 2017, p.63)
93
Esses mesmos modelos são usualmente utilizados em fotomontagens
editadas com paisagens difusas incluídas no fundo da imagem, árvores em
movimento, luz etérea, que reforçam seu aspecto metafísico. Ver figuras 76 e 77.
O segundo campo diz respeito às ambiências dos espaços interiores:
esse tipo de modelo opera com a verificação da luz, texturas, cores do
material real pretendido para o projeto. Em geral esses modelos acom-
panham pedestais de aço que os elevam até a altura dos olhos, sendo co-
mum encontrar portinholas que se abrem liberando determinadas vistas
para o seu interior.
Zumthor condiciona esse tipo de modelo à grande escala, pois há a ne- Ver figura 79.
cessidade corpórea de que o modelo informe a “magia do real” 19 que, nesse 19 Em referência ao
capítulo de mesmo
sentido, permite que se “vivencie” o modelo, com espaço suficiente para nome em ZUMTHOR,
entrar com a cabeça. Peter. Atmosferas,
Entornos Arquitetônicos
A grande escala também permite verificar outros componentes de pro- – As coisas que me
jeto, como a luz por exemplo. Zumthor, em 2015, durante o evento AME- rodeiam. Barcelona:
Gustavo Gili, 2009, p.19.
RICAnodelsud, menciona que especificamente a escala 1:10 é a adequada
para a correta verificação da luz sobre uma imagem apresentada de um
modelo da capela Bruder Klaus: Ver figura 80.
94
[74]
Modelo em cera de
Peter Zumthor. Pern
State Art Gallery, 2012.
[75]
Modelo em cera
de Peter Zumthor.
Mountain Hotel
Braunwald, 2014.
76
Fotomontagem
a partir de modelo.
Peter Zumthor.
Summer Restaurant.
Insel Ufnau, 2003–11
77
Fotomontagem a
partir de modelo.
Peter Zumthor.
Steilneset Memorial.
Vardo, 2007–2011.
Didática proposta
78 por Zumthor em seu
estúdio na Accademia
di architettura, em
Mendrisio, 1996:
Make it typical!
A small atlas
of architectural
atmosphere
100
79
81
Modelos construtivos
do Museu Mine
Zinc Allmannajuvet.
Noruega, 2003–2016.
80
Modelo de espaço
interior da Capela
Bruder Klaus.
Alemanha, 2001–2007.
[82]
Hotel Braunwald,
Suíça, projeto.
Modelo de leitura
analógica do lugar.
1:500 – construído
em 2014.
Isopor, areia,
cera, lã de aço.
[84]
[85]
Modelo de estudo de
um espaço interno.
Notar que, por esse
uso, o modelo não
segue a volumetria
externa do projeto.
Suporte metálico o
eleva até a altura
dos olhos.
1:20 – construído
em 2014.
Concreto celular,
pigmentos, água.
[87]
Hotel no Deserto
do Atacama,
[86] Chile, projeto.
Modelo de estudo
aproximado da
edificação de grandes
proporções.
1:100 – construído
em 2010.
[88]
Hotel no Deserto
do Atacama,
Chile, projeto.
1:20 – construído
em 2009.
Styrofoam, gesso,
pigmento.
Museu Zinc Mine
Allmannajuvet,
Noruega, obra
construída em 2016.
Modelo de leitura
analógica do lugar:
paisagem rochosa
lida pela textura
mineral do carvão.
Árvores e arames
metálicos retorcidos.
1:100 – construído
em 2014.
Styrofoam,
carvão, argila.
[89]
[90]
[91]
Capela Bruder Klaus,
Alemanha, obra
construída 2005.
1:10 – construído
em 2007.
Styrofoam,
areia, bambu
[94]
[93] [95]
Modelo de estudo
do espaço interior
da capela. Nota-se
que pela escala e
feitura atinge-se uma
proximidade muito
grande com o projeto
real construído. Como
o objetivo do modelo
é construir esse molde
do espaço interior
da capela, ele não
avança em representar
a forma externa.
1:10 – construído
em 2007.
Argila branca.
[96]
Modelo de leitura do
lugar: sua idealização
é arenosa, desértica,
embora a situação
real seja de um
verde parque. Essa
transformação
consagra a imagem
original da paisagem
americana como [97]
construção mental
de Zumthor.
1:500 – construído
em 2013.
Concreto pigmentado,
betume.
Casa privada, projeto.
Modelo de leitura do
lugar: edificações
representadas
geometricamente
precisas, laminares
em uma paisagem
“macia”, arenosa, com
a água representada
em cera.
1:500 – construído
em 2014.
Cartão em fibra
de madeira, areia,
cera, cartão.
[98]
[99]
Galeria de arte em
Berlim, Alemanha, [100]
projeto.
Modelo do edifício
construído inteiramente
em blocos de
mármore branco
maciços simplesmente
apoiados entre si:
apresenta grande
apuro construtivo,
feita inteiramente com
um único material,
como uma escultura.
1:50 – construído
em 2003.
Mármore.
Abrigo protetivo para
o Palácio Hisham,
Palestina, projeto.
[101]
Modelo do edifício em
1:20 para observação
da incidência de luz
nos mosaicos do piso
das ruínas do palácio.
Embaixo da intervenção
em madeira há uma
tampa redonda que
se abre, permitindo
que alguém entre por
debaixo para observar
o posicionamento
das madeiras.
1:20 – construído
em 2010.
Concreto, areia,
gesso, madeira.
[102]
Restaurante de verão,
Suíça, projeto.
Modelo de leitura do
lugar, uma pequena
ilha lacustre na [103]
Suíça. Zumthor
realiza novamente
uma maquete inteira
no mesmo material,
no caso a cera.
1:50 – construído
em 2005.
Cera.
[104] [105]
Modelo de estudo
dos espaços internos
a partir da lógica do
projeto, ou seja, placas
de pedra que estão
apoiadas conformando
blocos articuladores
dos espaços. O fato de
Zumthor tê-lo realizado
com o mesmo granito
local será especificado
na obra demonstra a
verificação precisa a
que o modelo permite.
1:50 – construído
em 1992.
Modelo de leitura do
lugar dos edifícios
da ampliação da
Fundação, que
possui edifícios
remanescentes em
seu entorno. Zumthor
divide a materialidade
de sua intervenção: o
primeiro volume novo
assume o mesmo
concreto celular dos
edifícios existentes,
mesclando-se, e o
[107]
segundo ganha uma
pequena cobertura de
aço negro. O mesmo
aço representa a
cobertura do edifício
museológico de Renzo
Piano, existente
na fundação.
1:250 – construído
em 2016.
Concreto celular,
pigmento, fio de aço.
[108]
Modelo de estudo
de espaço interior:
uma caixa com
muitas perfurações
e portinholas em
pontos estratégicos na
altura dos olhos para
observar o interior. O
vértice do projeto está
incompleto para livre
observação de um
ângulo importante. O
modelo tem sinais de
[109]
uso para verificações:
suas peças frontais
são unidas por
alfinetes, permitindo a
substituição simples.
1:50 – construído
em 2005.
Styrofoam, gesso,
pintura.
[110]
2 Relato de viagem
Este capítulo expõe, em primeira pessoa, a viagem do autor às obras de
Zumthor, realizada em abril de 2016 e encarada aqui como método de pes-
quisa e reconhecimento de questões intrínsecas dos trabalhos do arquiteto,
somente possível a partir da experiência em cada uma delas.
Antes, porém, retrocedo a 2015, ocasião em que defini qual seria o
momento ideal para visitar as obras de Zumthor. Naquele ano, participei
do evento AMERICAnodelsud e presenciei uma palestra proferida pelo ar-
quiteto. Enquanto Zumthor fazia sua exposição, uma tela ao fundo pro-
jetava, numa apresentação randômica, alguns trechos de suas falas: “The
sound of my house; Memory is Life itself; My early images: Stem Cells; My
secret muses; Herkunft – Where I come from; Architecture of my childhood;
We all come from a house; Object and body; Charged Voids; Always say I –
valuable sentimentality; The Power of the images inside my head; My body
knows more than my brain can think of in a fragmento f a second; Make
it typical than it becomes special; Good ideas don’t die; Passion, intensity,
condensation: atmosphere; An April morning in the 50ties”. Ao final, Zum-
thor exaltou a qualidade da luz de abril em sua região como uma imagem
forte em seu pensamento arquitetônico. Decidi, então, que faria a visita
em suas obras em abril do ano seguinte, em busca da luz de “uma manhã
em abril dos anos 50”.
Assim, definida a data, visitei dez de suas obras, todas construídas após
1985 – recorte desta dissertação – entre Suíça, Áustria e Alemanha, incluin-
do seu próprio atelier, em Haldestein, recém-ampliado (o Atelier Zumthor
se divide em três projetos vizinhos construídos ao longo do crescimento do
escritório nesse vilarejo, no Cantão alemão da Suíça, ao lado de Chur).
121
Muitos dos projetos de Zumthor estão nessa região do Cantão suíço de
Graubünden, onde ele vive e atua desde 1968, período em que trabalhou no
Departamento de Patrimônio Histórico da região.
Meu roteiro incluiu Bregenz, cidade austríaca, para visitar o projeto do
Museu de Artes; e Colônia, na Alemanha, onde está o Museu de Artes de
Kolumba e, nas proximidades, a capela de campo Bruder Klaus.
Feitas as visitas, somente dois anos mais tarde, entretanto, em 2018, es-
crevi os relatos em um processo de anamnese, chamando a atenção para
temas amadurecidos durante esse período e que se constituíram em uma
forma de experiência interpretativa complementada com a pesquisa icono-
gráfica existente das obras. Dessa maneira, foi possível editar, conforme a
memória e os registros pessoais, com distanciamento crítico, a própria ex-
periência da viagem em um sistema comum de análise dos projetos, isto é:
122
111 Abrigo para as ruínas 112 Capela de campo
arqueológicas romanas. Bruder Klaus.
Chur, 1985–86. Wachendorf, 2001–07.
124
Projetos apresentados
em ordem de visitação:
4 Atelier Zumthor.
Haldenstein, Suíça,
6 1986/2005/2016.
ÁUSTRIA
5
4 5 Termas de Vals.
3
1 Vals, Suíça, 1996.
SUÍÇA 2
FRANÇA
6 Museu de Artes
de Bregenz.Bregenz,
Áustria, 1997.
ITÁLIA
7 Museu de Arte de
Kolumba. Colônia,
Alemanha, 2007.
100 km
2.1 Abrigo para as Ruínas
Arqueológicas Romanas.
Chur, Suíça, 1986
118
planta N
120
corte 5 m
Chur, 11 de abril de 2016
130
[121]
[122]
Passado o centro histórico, atravessei o rio da cidade por uma ponte e
cheguei, então, a um lugar com edificações horizontais recentes, periféri-
cas, mas também dispersas em um tecido urbano disforme e orgânico.
Afinal, onde estavam as ruínas romanas?
Cheguei a perguntar para moradores locais, mas não sabiam sequer da
sua existência.
Depois de procurar muito, encontrei o Abrigo em uma rua asfaltada, ao
fundo de edificações banais, sem relevância arquitetônica ou histórica. Ao
lado, havia o estacionamento de um edifício residencial com depósitos dos
moradores colados no último volume prismático de madeira do projeto –
muito distante da imagem consagrada pelas fotografias das publicações que
sugerem um edifício inserido na paisagem natural.
Havia, no entanto, ao redor da obra, um único casarão em madeira,
nitidamente histórico, cujas janelas tinham grossas venezianas de ma-
deira, bastante semelhantes ao fechamento externo do Abrigo. Esse fato
introduz na observação da obra um vínculo com a questão local-cultu-
ral suíça.
132
[123]
[124]
125
tínuos no perímetro desse tubo. Essa materialidade não é informada por
desenhos do projeto anteriormente analisados.
A maçaneta escolhida é uma barra de aço do comprimento da largura
da palma da mão, centralizada no eixo da ferragem. Para girá-la, empu-
nha-se com o eixo entre os dedos da mão e gira-se no sentido horário até a
pequena barra de aço assumir a posição vertical: a imagem é de uma maça-
neta de cunho mecanicista, como quem abre um armário técnico.
Ao abrir a porta, o eixo claro da intervenção é definido pela passarela
metálica treliçada na mesma cota do acesso: o tubo prolonga-se visualmen-
te para o interior, atravessando os três volumes de madeira sob diferentes
nuances de luz natural. É possível acender, se necessário, a iluminação, pe-
los botões industriais ao lado direito da porta.
2.1.3 O interior
Ao encerrar seu edifício, Zumthor o faz com uma pele comum de lâminas
de madeira maciça posicionadas de forma inclinada e na horizontal, encai-
xadas por sobreposição uma a uma em uma subestrutura vertical de ma-
deira, também maciça. Esses painéis de marcenaria manufaturados são an-
corados, a cada módulo, por elementos metálicos, a uma grade interna de
pilares e vigas de madeira industrial laminada colada. O conjunto apoia-se
em uma base de concreto que corre paralela por fora das antigas paredes de
pedra remanescentes da construção romana.
Entre as antigas paredes romanas e a nova pele de madeira, há uma fai-
xa em tecido negro esticado que enfatiza a distância entre os dois tempos,
dando contraste às baixas ruínas remanescentes.
Não há transparência entre interior e exterior. Ao contrário, o ar e os
sons da cidade correm livres entre os dois tempos, e as lamelas vibram no
interior com a passagem do sol, as sombras das árvores do entorno surgem
desenhadas na fachada interna conforme a passagem do sol.
Lembrei imediatamente do aspecto diafragmático dessa pele de vene-
zianas que envolvem as ruínas apontado por Zumthor em seu memorial de
projeto: “Dentro do prédio, os sons da cidade penetram na estrutura das pa-
redes em lamelas. Fechado no espaço histórico, percebem-se os sons da cidade
do século XX, a posição do sol e o sopro do vento” (ZUMTHOR, 1998, p.28.).
134
[126]
136
[130]
[131]
[132]
[134]
[133]
[135]
[136]
2.2 E difício de Apartamentos
para Idosos. Chur, Suíça, 1993
137
N
140
corte 2 m
Chur, 13 de abril de 2016
146
[141]
A implantação do volume é retilínea, ocupando o espaço restante trian-
gular livre pós ocupação do terreno pelo centro de cuidados, paralela a um
de seus dois edifícios.
O volume é orientado no sentido norte–sul. Acessos e varanda de uso
coletivo voltados para leste, onde está o espaço ajardinado de articulação
entre todos os edifícios do conjunto e os usos de convívio, como um café
no térreo do edifício imediatamente à frente; para oeste estão todos os
apartamentos, resguardados e abertos para a vista do vale até o rio Reno.
148
[142]
[143]
[144]
[145]
[146] [147]
[148]
[149]
2.2.3 O interior
154
[150]
2.3 Capela Sogn Benedetg
Sumvitg, Suíça, 1985–88
151
planta
153 154
cortes 2 m
Sumvitg, 12 de abril de 2016
Desde Chur, Sumvitg está a duas horas de trem no sentido oeste em dire-
ção ao centro da Suíça e é a menor das cidades que visitei que abriga uma
obra de Zumthor. Na verdade, corresponde a uma vila com umas 30 casas
aglomeradas em um ponto montanhoso, acompanhadas de outras esparsas
na encosta. A igreja é a obra mais distante de Chur, mas ainda pertence ao
Cantão Alemão de Graubünden.
O trem me deixou na estação de Sumvitg-Cumpadials, naturalmente
na parte mais plana possível: o vale. Para chegar à capela, tive que as-
sumir um estado de peregrinação e caminhar por uma hora por uma
estrada local, em subida constante até chegar à cota da vila, três quilô-
metros depois.
160
[155]
pela nova construção de Zumthor, depois de ter vencido um concurso com
arquitetos locais em novembro de 1985.
A antiga igreja, de 1522, de acordo com o memorial do projeto de Zum-
thor , fora destruída por uma avalanche em 1984, mas, apesar disso, encon-
tra-se com sua forma ainda reconhecível: um altar de planta arqueada en-
caixado na topografia sugeriu-me certa conexão com o projeto vencedor de
Zumthor.
De fato, essa impressão inicial confirmou-se posteriormente na leitu-
ra da publicação sobre a capela da Fundaziun Ecclesiastica Capplutta Sogn
Benedetg, de Daniel Schonbachler, quando é descrito o processo de escolha
do projeto vencedor do concurso:
162
[156]
157 158
[159]
[160]
[161]
bém em madeira, a escada de concreto de acesso, e, do lado oposto, uma
pequena fonte de água formada a partir de um único tronco com a incisão
1991, quando foi inserida na obra.
Assim como no Edifício de Apartamentos para Idosos, em Chur, a fonte é
um elemento de projeto, que atua criando um elo simbólico com os ocupan-
tes. Na vila de Sumvitg, encontrei outra fonte análoga ao lado de uma casa.
Com a capela na minha frente, rodeei-a para compreender o projeto.
As pequenas plaquetas de madeira que revestem toda a face externa são
vibrantes e emocionam. Não são de desenho sofisticado, pelo contrário,
tudo é muito direto e simples, mas de uma delicadeza ímpar, pois são as
mesmas plaquetas que estão ali embaixo em muitas casas da vila, usadas
diretamente, em uma forma curva que acompanha o movimento do sol e,
portanto, a madeira envelhece diferente, tornando complexos os diferen-
tes matizes de cores do envelhecimento natural. A face sul estava cinza e,
à medida que caminhei até a porta, face norte, a madeira ganhou um tom
vermelho alaranjado.
Subi um pouco mais alto no caminho, para ver a capela por cima. É re-
velador, para sua implantação, a dimensão territorial do lugar. O volume da
capela está orientado para o extenso vale a leste, ponto de nascimento do
sol, exatamente em seu eixo visual. A posição da capela e sua forma alonga-
da no sentido do vale sugerem uma tensão entre o pequeno edifício e toda
geografia da região.
A entrada é pela face norte – mais colorida, ou menos queimada pelo sol da
face sul – em uma espécie de adendo ao volume unitário, conformando um
“tubo” de acesso na mesma materialidade da capela seguido de uma peque-
na escada em concreto monolítica que se apoia no terreno natural.
Essa estratégia de acesso em forma de “tubo” geometricamente autôno-
mo em relação ao corpo principal obedece à lógica formal encontrada no
Abrigo para Ruínas Arqueológicas Romanas. Aqui, no entanto, material-
mente, as mesmas plaquetas de madeira envolvem externamente a entrada,
seguindo a vocação de pele da superfície, pois internamente a superfície é
revestida de tábuas de madeira lisa.
166
[162]
[163]
[164]
A imagem industrial do volume central de acesso e circulação do pro-
jeto da intervenção nas ruínas, visitado anteriormente em Chur, aqui opera
em outro contexto: cada detalhe construtivo denota um ambiente de traba-
lho artesão.
A escada, em concreto aparente, é um corpo solto do tubo de aces-
so, por uma pequena fresta entre as partes. Faz a primeira transição. Seus
corrimãos são em ferro sem acabamento de pintura, levemente alaranjados
pela oxidação, chumbados diretamente no concreto.
Ao final dos cinco degraus, no patamar diante da porta, um pequeno
elemento também engastado no concreto chamou minha atenção: uma pe-
quena trave de ferro que lembrei também ter visto em uma fotografia de
Zumthor na porta de sua casa. Um pequeno elemento, mas com toda a
construção do personagem em si: desenho pragmático, para limpar as bo-
tas de terra e neve antes de entrar.
A porta em si é um elemento de desenho maior, refinada marcenaria em
réguas estreitas verticais. A maçaneta novamente me colocou diante de um
artesão, seu desenho elegante em ferro comprido ondulado, provavelmente
feito unicamente para essa capela, torna a alavanca de abertura algo leve.
Avançando depois da porta, entrei por inteiro no tubo de acesso de bai-
xa altura em madeira. É possível ver o interior da capela ao fundo, após
os montantes verticais de madeira da estrutura no perímetro do volume
principal, que estão no meio da passagem. O piso da passagem é em tábuas
espaçadas, como um deck, indicando o preâmbulo entre exterior e interior.
Sua cota está um degrau abaixo do piso do interior da capela.
Subi até a cota do piso da capela, em madeira com paginação concêntri-
ca, avançando por entre os montantes.
2.3.3 O interior
168
166
[167]
[165]
170
[171]
[172]
[173]
[174]
2.4 Atelier Zumthor
Haldenstein, Suíça, 1986/2005/2016
175
N
implantação
177
2016
1986 178
179
176
[180]
A estrutura independente das fachadas são um grid ortogonal em ma-
deira, fechados por grandes panos de vidro que, em perspectiva, refletem a
horizonte verde.
Em sua frente, a lateral cega em madeira do primeiro atelier, construído
em 1986, se relaciona diretamente com o casario local. O acesso ao atelier
de madeira dá-se por uma pequena ruela perpendicular à rua principal por
onde cheguei.
De frente a esse acesso está a casa de Zumthor, que também inclui parte
de se atelier: um volume baixo e alongado, que se relaciona com a pequena
rua e protege um pátio interno ajardinado e o volume de dois andares no
lado aposto.
Os três projetos estão implantados diretamente em seus lotes, de
modo continuo às outras casas de Haldenstein, com ligação direta com a
rua, sem divisões.
Nesse pequeno núcleo funciona uma espécie de polo arquitetônico,
inusitado nesse contexto silencioso e residencial. Muitas bicicletas apoiadas
e jovens cruzando entre os três edifícios dão vida à Haldenstein.
A implantação dos três edifícios em três lotes próximos conota o am-
biente de desenvolvimento disperso e espontâneo da cidadela a que fazem
parte, acrescidos com o tempo de expansão do atelier, mas cada um com
sua materialidade própria.
O acesso aos três ateliers dá-se diretamente para a via em sua frente, sem
recuos, com exceção do edifício mais novo que esta em uma cota mais alta
pela terreno natural, então é preciso subir uma pequena escada em pedra
até um platô com pedriscos.
Desse lugar, é possível ver com transparência todo interior no piso tér-
reo no qual há uma oficina de modelos sendo utilizada. A porta é o único
elemento de madeira, opaca, distinguindo-se na fachada das vitrines que
permitem ver os trabalhos do Atelier. Ela está associada à uma marquise
paralela a edificação feita por uma peça maciça de madeira laminada cola-
da coberta por uma placa de telha ondulada metálica. O piso de pedriscos
do platô é interrompido sutilmente dando lugar a um pavimento de pedras
178
[181]
[182]
pequenas da mesma cor, planas e quadradas, assentadas ortogonalmente,
conduzindo a transição até o interior.
No Atelier de madeira ocorre uma situação menos franca, pois o volu-
me na esquina está todo recluso envolto em ripas de madeira. A interrup-
ção para o acesso ocorre no volume protuberante da porta de acesso: um
tubo de aço preto, semelhante ao acesso do Abrigo para as Ruínas Arqueo-
lógicas Romanas visitado anteriormente, solto do chão. Suas dimensões
conferem à porta de entrada, em madeira e faceada pelo fim do volume
protuberante, com uma maçaneta esférica metálica polida. Para entrar no
Atelier há esse momento de suspensão dado pelo primeiro paço dentro do
tubo de acesso. Ao lado, a campainha, outro volume que parte da fachada
de ripas de madeira: uma chapa de aço não tratado retangular com um bo-
tão e as inscrições Atelier Zumthor gravadas no metal, um objeto de clara
exposição do caráter artesão do arquiteto.
Para passar pela porta tive que esperar minha amiga que me acompa-
nhava primeiro, pois o tamanho do acesso define a passagem individual.
Logo depois do tubo, uma cortina circular preta e couro protege a passa-
gem do vento. O piso continua no mesmo aço escuro do tubo de passagem
até as escadas que levam aos três níveis.
No Atelier de 2005 e atual casa de Zumthor, à frente, em concreto, uma
pequena marquise resultante do prolongamento da laje de cobertura faz a
transição de entrada, que ocorre como uma redução do volume. A porta de
acesso está recuada da face externa do volume e é em metal acetinado, com
a mesma maçaneta esférica polida. Não pude entrar pela porta por razões
de privacidade, mas pude atravessar a marquise que também ampara o
acesso ao pátio interno da casa: um jardim expressivo com muitos tipos de
vegetação, semelhante ao proposto para o Pavilhão da Serpentine Gallery.
De perto, o concreto era macio ao toque, com as marcas do tecido colocado
nas fôrmas que Zumthor menciona em seu memorial.
No chão, ao lado da parede alongada de concreto, a mesma chapa de
aço vista na Capela Sogn Benedetg para raspar os sapatos antes de entrar.
180
[183]
[184]
[185]
[186]
[187]
[188]
2.4.3 O interior
184
[189] [190]
[191]
2.5 Termas de Vals
Vals, Suíça, 1990–96
192
70 m
N
planta
196
corte 5 m
Vals, 13 de abril de 2016
192
[197]
[198]
2.5.1 I nserção na paisagem – implantação
194
[199]
rada do projeto. Não há ligação visível com os edifícios hoteleiros ao redor
desse espaço gramado, a não ser o acesso subterrâneo.
Em frente do platô, a montanha rochosa e as casas tradicionais de pe-
dra, para as quais o edifício monolítico se abre, na fachada frontal.
Terminando o giro, cheguei até a área da piscina externa, que opera no
edifício como uma “escavação” subtraída do monolito original, prismático.
Há a possibilidade de leitura de uma reproposta programática à antiga pisci-
na termal ao ar livre existente no complexo nos anos 30, inserindo no proje-
to um componente cultural do uso do espaço, descrito por Zumthor: “desde
meados de 1930, sua clientela, que diminuía anualmente, tinha a oportunida-
de de banhar-se em uma pequena piscina ao ar livre cheia com águas termais
que se tornavam vermelhas à exposição ao ar”.(ZUMTHOR, 1998, p.138).
Em relação à implantação, a posição da piscina externa encontra-se vol-
tada para o sul, recebendo a maior quantidade de sol ao longo do dia. Além
dessa questão técnica, talvez mais importante seja a relação atingida com
esse posicionamento. Quando se está na piscina e em sua área avarandada
ao redor, há um enquadramento visual em direção ao centro histórico da
cidade, cerca de 400 metros de distância dali, constituindo uma verdadeira
“janela ao ar livre”, mirante, para esse contexto.
196
[200] [201]
[202]
[203]
[205]
[204]
[206]
lizam de acordo com seus locais e usos, seja pela relação com o puxador,
que varia de uma barra alongada vertical a uma pequena esfera metálica do
tamanho de um pulso, seja pela própria matéria.
Destaco aqui a porta de acesso ao volume fechado das duchas relacio-
nado com a piscina externa, única em vidro azul, pois me pareceu notável
a possibilidade do uso do material, tão preciso na obra do arquiteto, como
em si elemento de transição.
O mesmo vidro azul que pontua as claraboias quadradas do espaço de
banho central interno do projeto aqui atua como material ponte da luz en-
tre dentro e fora da sala escura, de maneira que a porta se revela um espe-
lho vítreo, brilhante de fora e, a partir do um momento de sua abertura,
torna-se filtro de luz azul.
2.5.3 O interior
200
[207]
[208]
2.6 Museu de Artes de Bregenz
Bregenz, Áustria, 1997
209
corte 5 m
Bregenz, 14 de abril de 2016
206
[213]
[214]
menores e há diversos restaurantes com mesas espalhadas pelo extenso cal-
çadão, livre de carros.
A segunda visão do Museu está relacionada com essa segunda infor-
mação espacial, pois, para esse contexto, há um pequeno pavilhão em
concreto negro retangular, opaco, de três andares somente, transversal ao
calçadão, para assim liberar sua frente para a existência de uma pequena
praça com uma fonte entre o anteriormente descrito edifício de vidro e o
segundo edifício menor.
A implantação do projeto e sua escala formal articulam as duas situa-
ções urbanas nas quais ele se insere. Confirma-se o discurso presente no
memorial descritivo do projeto em que Zumthor exalta a influência do lago
Constança na materialização do edifício, o reconhecimento de sua geogra-
fia e características cromático-luminosas:
208
[216]
215
[217]
[218]
que excede os vidros passa a fazer parte ativamente da fachada do edifício,
com sua rigorosa modulação, enfatizando a constituição desse envelopa-
mento do edifício por componentes únicos em repetição – placas de vidro
apoiadas – assim como seu processo construtivo.
O pequeno edifício contempla um café em seu térreo, relacionando-se
diretamente com a praça conformada pelos dois edifícios, além de uma sala
de reuniões e o acesso para os dois andares superiores administrativos. Em
concreto negro, possui módulos verticais de caixilho piso a teto de mesma
largura deslizantes pela face exterior dos vedos.
Dessa pequena praça, onde está a porta de acesso ao espaço expositivo,
é possível ver apenas o vulto das escadas subindo em diagonal por meio da
pele contínua de vidro do volume prismático envelopado. As suas arestas
são luminescentes, pois a luz passa através.
As placas de vidro repetidas interrompem-se apenas em três momen-
tos: na passagem de acesso principal, relacionada com a praça; no acesso ao
elevador monta-cargas, relacionado à face lateral, onde há um espaço pos-
sível de carga e descarga; e na porta da saída de emergência, na face oposta
à porta de entrada, voltada para a avenida costeira ao lago Constança.
Essa matriz de acessos no térreo imprime a organização espacial e es-
trutural pelos pavimentos do edifício, conformando uma zona expositiva
livre central envolta pelos três núcleos verticais em concreto.
212
[219] [220]
221 222
[224]
[225]
[226]
Os puxadores transmitem a função pública do edifício, desenhados em
barras redondas de aço inoxidável de comprimento alongado. De meia al-
tura das portas até o chão, sugerem que não há propriamente uma altura de
empunhadura individualizada, mas sim suporte para diferentes estaturas.
2.6.3 O interior
216
[227]
[228]
Em todos os pormenores da edificação é possível identificar a exatidão do
desenho e a definição justa dos materiais.
O piso é alterado para o concreto polito cinza claro, alterando a lumi-
nosidade espacial do pavimento térreo.
Ao fim da escada, o primeiro andar com espaço expositivo é um pro-
longamento material do espaço de circulação vertical.
O plano superior formado pelo forro em luminoso em vidro ganha a
escala total da planta. Novamente, como nas fachadas externas, o rigor da
modulação e a elucidação dos elementos de suporte das placas de vidro:
todas as placas iguais quadradas e coordenadas com o espaço, apoiadas por
gravidade em quatro suportes retangulares metálicos que imprimem ritmo
pela repetição.
A luz interna oscila de acordo com a passagem do sol. Cada um dos
andares expositivos, conforme se ascende o edifício, tem sua própria quan-
tidade de luz.
A presença de dispositivos que exercem luz natural, zenital, nos proje-
tos de Zumthor, é uma constância em sua obra, desde o Abrigo das Ruínas
Arqueológicas Romanas. Em Bregenz, porém, a operação atinge outro grau
de sofisticação técnica e controle, uma vez que a penetração de luz não é
direta, através de alguma perfuração ou claraboia, mas todo o projeto en-
seja entorno desse tema ao transferir a luz incidente nas fachadas para os
forros dos andares expositivos.
O sistema expositivo consiste em pregar os quadros ou painéis direta-
mente nas empenas de concreto liso e, quando finalizada a exposição, há
um retrabalho de massear o furo com graute e alisar a parede de modo que,
de perto, percebe-se toda a série de furos já feitos na história do museu.
218
[229]
[230]
[231]
2.7 Museu de Arte de Kolumba
Colônia, Alemanha, 2007
232
234
plantas N
235
corte 5 m
Colônia, 15 de abril de 2016
A cidade de Colônia situa-se às margens do rio Reno, que nasce nas pro-
ximidades de Chur, onde Zumthor reside na Suíça, e segue até o norte da
Europa, atravessando a Alemanha. A presença do rio e da grande Cate-
dral gótica de Colônia são protagonistas na paisagem urbana. A estação de
trem principal está ligada à Catedral em uma grande praça central onde
ocorrem manifestações culturais. Meu trajeto até o Museu de Kolumba se
iniciou nessa praça de frente às duas torres da igreja. De lá, parte uma rua
pedonal de comércio principal, acompanhando o sentido do rio. Dobrei à
direita, me distanciando do rio por três quadras, até encontrar Kolumba. A
visão é do museu em uma esquina urbana, destacando-se por sua volume-
tria maciça na base e volumes de diferentes alturas na porção mais alta. Os
tijolos espaçados formam faixas e as grandes janelas com caixilharia apoia-
da por fora das paredes dinamizam o volume. Não há visão do interior, isso
se aplica mesmo no acesso do edifício, onde o único trecho de vidro no
térreo dá para uma parede recuada, uma antecâmara.
226
[236] [237]
2.7.2 Acesso à edificação – transição
228
[238]
[239]
[240]
[241]
2.7.3 O interior
232
[242] [243]
[244] [245]
Uma segunda sala especial chamou minha atenção. Toda folhada em
madeira, sua entrada se assemelha a um armário embutido em madeira
avermelhada, conectado diretamente ao espaço de circulação e distinguin-
do-se de seu espaço cimentício cinza amarelado. Dentro dela o pé direito
se eleva e todas as faces das paredes e teto são folheados com madeira, com
exceção do plano oposto à porta, que é uma grande caixilho de vidro com
uma cortina leve e translúcida. É o espaço de leitura do Museu, com uma
pequena biblioteca. As poltronas em couro marrom. É o espaço de maior
acalento do Museu.
A madeira utilizada no Museu é de grande sofisticação em forma, encai-
xes e detalhes, com execução manual, transparecem o ímpeto de Zumthor
pelo universo artesão, utilizado mesmo em um museu de grande escala.
Segui até o grande espaço central de piso em concreto polido brilhan-
te cinza claro rodeado por pequenas passagens abertas correspondentes às
salas expositivas. Assim como a sala de leitura, seus pés direitos são mais
altos que esses espaços de articulação enfatizando a transição entre os dois.
Nelas a iluminação natural vem por janelas na porção mais superior. A pas-
sagem entre o espaço central e essas salas de exposição está também enfati-
zada por uma pequena diferença do nível do piso, o que gera uma aparente
autonomia de seus volumes.
Entre os volumes, as grandes janelas geram uma gradação de luz pelo
piso brilhante. Ao me aproximar da última, pela sequência da ordem do
percurso, ocorre o enquadramento visual direto das duas torres da Cate-
dral da cidade, centro histórico de Colônia.
234
[246] [248]
[247] [249]
2.8 Capela Bruder Klaus
Wachendorf, Alemanha, 2007
250
planta
252 253
cortes 1 m
Wachendorf, 17 de abril de 2016
A Capela de Campo Bruder Klaus era o projeto que guardava maior expec-
tativa de visitação pela singeleza de sua escala acompanhada da potência de
seu particular sistema construtivo e espacialidade interna.
A localização da pequena capela está a 60 quilômetros a sudoeste de
Colônia, cidade onde me hospedei, na zona rural próximo à cidadela de
Mechernich e, da menor ainda, Wachendorf.
Como ela se situa em um local sem acesso direto por transporte, decidi
alugar uma bicicleta e pegar um trem até Mechernich e, de lá, chegar até ela
pedalando.
Considerei esse o método de deslocamento mais acertado para apreen-
der a implantação do projeto: a paisagem, o lugar, sua topografia e vistas,
seus caminhos.
Ao desembarcar na pequena Mechernich, perdi o sinal do celular e o
GPS (anteriormente à viagem, havia feito um mapa georeferenciado com
todos os projetos de Zumthor, a princípio meu único meio de encontrar
Bruder Klaus).
Na estação de trem, havia um grande mapa fixo da região e consegui
encontrar sinalizado “Bruder Klaus field Chapel”. Meu caminho de 40 mi-
nutos de bicicleta foi uma tentativa de lembrança desse mapa, apenas tendo
uma direção em mente que deveria seguir.
No caminho, a paisagem se compõe de vastos campos plantados em
planos inclinados, galpões de madeira junto a estrada, por vezes de asfalto,
por vezes de terra.
240
[254]
2.8.1 I nserção na paisagem – implantação
242
[255]
256
257
[258]
[259] [260]
[261] [262]
[263] [264]
[265] [266]
2.8.2 Acesso à edificação – transição
246
[267]
[273] [274]
[275] [276]
[277] [278]
2.8.3 O interior
250
[279] [280]
[281] [282]
[283]
3 POIESIS
TÉCNICA E LUGAR
A sala de estar de madeira é uma tradição venerável na casa alpina.
As paredes de pedra para a cozinha (Rhaeto-romansh, cha-de-feu
= casa do fogo) e paredes de vigas sobrepostas para a sala de estar
são suas características mais salientes. Quatro paredes de vigas
colocadas uma em cima da outra fazem a sala. O comprimento
das paredes e, consequentemente, o tamanho da sala dependem
do comprimento dos troncos de árvores disponíveis. Essa restrição
gera a escala de intimidade. Na nossa região, essas blockhouses são
chamadas Strickbauten, literalmente, casas entrelaçadas [knitted
houses]. A expressão é impregnada com o processo construtivo de unir
coisas em conjunto, de “entrelaçar” as vigas para fazer um todo.20
No intuito de estender a análise sobre a poiesis dos projetos do arquiteto, as 20 Zumthor, sobre o
processo construtivo
gêneses de suas ideias e seu raciocínio projetual, recorre-se, como objetos tradicional em madeira
guia de estudo, aos seguintes projetos construídos: Capela Sogn Benedetg das casas da região
dos Alpes suíços, ao
(Suíça, 1985–88), Atelier Zumthor (Suíça, 1985–86), Abrigo para as Ruínas justificar seu projeto
Arqueológicas Romanas (Suíça, 1985–86), como um grupo único, o Museu das Casas de Leis
(2006–09), Suíça na
de Arte de Bregenz (Áustria, 1989–97) e a Capela de Campo Bruder Klaus ocasião da premiação
(Alemanha, 2000–07). do Spirit of Nature
Wood Architecture
Técnica e lugar, dois temas fundamentais no desenvolvimento de projeto Award 2006.
de Zumthor, são aqui demonstrados diante de três cenários distintos para
que assim se possam estabelecer parâmetros analíticos mais complexos so-
bre a obra do arquiteto: os projetos destacados permitem uma triangulação
21 Os três projetos
entre diferentes períodos da obra do arquiteto, materiais utilizados (madei- foram apresentados
ra, vidro e concreto) e programas de uso distintos recorrentes (intervenção em um conjunto
único na primeira
em patrimônio histórico, espaço museológico e espaço religioso). exposição individual
A Capela Sogn Benedetg, o Atelier Zumthor e o Abrigo para as Ruínas do arquiteto entre 2 e
23 de outubro de 1988,
Arqueológicas Romanas estão tratados como um conjunto único, são três em Lucerne: Partituren
projetos construídos em madeira, no mesmo período, na mesma região und Bilder. Arbeiten
aus dem Atelier Peter
e usufruem de temas correlatos. Constituem as primeiras obras nas quais Zumthor, Haldenstein
Zumthor reconhece seu ponto de partida21 para os projetos que serão de- [Pontuações e fotos.
Obras do estúdio Peter
senvolvidos nos anos seguintes, após 1985. Zumthor, Haldenstein],
O Museu de Arte de Bregenz exemplifica como Zumthor atua diante com as fotografias
de Hans Danuser. O
de uma obra de escala icônica de um museu fora de seu país, na cidade catálogo homônimo
austríaca de Bregenz, e, sobretudo, como ele utiliza o vidro como material da exposição marca a
primeira monografia
único na conformação de uma “pele” ao edifício, tema recorrente na arqui- publicada dos
tetura do período em que foi construído, década de 90. projetos de Zumthor.
255
Por fim, a Capela de Campo Bruder Klaus, obra mais recente, faz re-
conhecer como Zumthor atua diante da paisagem natural e retoma temas
construtivos inerentes à sua obra, conforme a relação de sua concretagem e
sistema de fôrmas.
256
3.1 A CAPELA SOGN BENEDETG,
O ATELIER ZUMTHOR E O ABRIGO PARA
AS RUÍNAS ARQUEOLÓGICA S ROMANAS
As três obras situam-se no cantão de Graubünden: a Capela Sogn Benedetg
em Sumvitg, o Atelier em Haldenstein e o Abrigo em Chur, ou seja, estão
em maior ou menor medida relacionadas com uma paisagem campestre,
onde predominam casas e galpões rurais em madeira. Zumthor estava já
há seis anos atuando em seu próprio estúdio, depois de abri-lo em 1979,
após o período profissional de dez anos no Departamento de Patrimônio
estudando as vilas dessa mesma região. Quais seriam, então, as questões
desenvolvidas por Zumthor nesses projetos embrionários de sua obra?
A leitura da implantação desses projetos revela um dado recorrente para
a análise dos procedimentos de Zumthor quanto à presença da construção
no lugar em que se situam. Com exceção da Capela, implantada poucos
metros acima da cota das casas do vilarejo em uma posição de leve relevân-
cia, os outros dois são pragmáticos, uma vez que o Atelier ocupa a esquina
do lote em que reside, junto à rua, e o Abrigo circunscreve precisamente as
antigas ruínas existentes. Portanto, estão em posição de continuidade com
a paisagem, ou seja, estão naturalmente contidos nela, sem se destacarem
como fatos excepcionais.
Esse modo de pontuar seus edifícios em contextos específicos está des-
crito por Zumthor como um sentimento de “paisagens completadas”, quando
a presença de um edifício novo deve conviver serenamente com o existente:
259
nam como parte integrante do seu espaço envolvente […].
(ZUMTHOR, 2009, p.17)
Cada nova obra intervém numa certa situação histórica. Para a qualidade
dessa intervenção é crucial que se consiga equipar o novo com caracte-
rísticas que entrem numa relação de tensão significativa com o existente.
Para o novo poder encontrar o seu lugar, precisa primeiro de nos esti-
mular para ver o existente de uma nova maneira. (ZUMTHOR, 2009, p.17)
260
[284]
Atelier Zumthor
(1985–86)
[285]
Abrigo para as
ruínas arqueológicas
romanas (1985-86)
[286]
Capela Sogn
Benedetg (1985–88)
No caso do Abrigo, que é um projeto de intervenção em patrimônio
histórico, esse discurso é mais explícito, pois, como explica Zumthor, seu
projeto seguiu a cubagem da antiga casa romana, mas de maneira abstrata,
introduzindo um elemento reconhecível de madeira na “paisagem da cida-
de de hoje”.
Essa tensão da determinação da forma dos edifícios, ou objetos no es-
paço, entre a continuidade por abstração ao contexto e a qualificação de
um elemento novo é um embate arquitetônico suíço a que Zumthor per-
tence. Davidovici descreve, como exemplo, o projeto da Casa Azul (Blue
House) de Herzog & de Meuron, que formalmente é um arquétipo abstrato
da casa camponesa com duas águas, mas, como é nomeada, recebe uma
pintura de um tom de azul absolutamente externo ao local em que está:
262
287
[288]
Peter Zumthor.
Capela Sogn Benedetg,
Sumvitg, 1985–88.
Nesse primeiro conjunto de projetos de 1985, observa-se a predominância
no uso da madeira, ligada, sobretudo, ao contexto campestre suíço do can-
tão de Graubünden, onde localizam-se. No entanto, essa relação estabelecida
com a paisagem não impõe um franco mimetismo ao usualmente construído
nessa região, mas o toma como ponto de partida da técnica a ser desenvolvi-
da nos projetos, ou seja, não há aqui o uso nostálgico da matéria local, mas
uma vontade de exercê-la a seu modo, expondo sua técnica construtiva.
No caso do Abrigo, por exemplo, o princípio construtivo de entrelaça-
mento dos troncos de madeira típico das construções alpinas é evitado por
Zumthor, o que reforça, nesse caso, a pureza volumétrica dada às arestas Ver figuras 289 a 294.
bem definidas, e um sinal de contemporaneidade ao projeto, diferentemen-
te de outros arquitetos contemporâneos da região, como Gion Camina-
da 22, que adota procedimentos de projetos mais mantenedores das técni- 22 Gion A. Caminada
é arquiteto nascido
cas locais em seus projetos. em 1957, em Vrin.
Zumthor realiza esse gesto de reinterpretação das técnicas locais à sua Sua formação tem
pontos comuns com
maneira em diversas outras obras posteriores, nas casas de Leis (Suíça, a de Zumthor: filho
2006–09) e Luzi (1997–2001), por exemplo, temos um procedimento de de fazendeiros locais,
trabalhou como
projeto oposto ao do Abrigo, ou seja, ao invés de anular o encontro entre- carpinteiro antes de
laçado tradicional dos cantos das edificações, ele o prolonga até criar ou- estudar na escola de
artes aplicadas de
tra expressão construtiva própria. Da mesma maneira, no projeto da Casa Kunstgewerbeschule
Gugalun (Suíça, 1992–94), quando ele faz uma ampliação de uma casa tra- de Zurique e
arquitetura na ETH.
dicional, realiza a nova construção em pranchas de madeira sobrepostas,
alternando-as nas posições horizontal e vertical, em evidente releitura da
simples sobreposição de troncos da antiga casa. Ver figuras 295 a 300.
Nos memoriais dos projetos de 85, é possível observar esse sentido de
apropriação do uso da madeira. Zumthor, sobre o projeto de seu Atelier,
diz que:
264
Entrelaçamentos
tradicionais das casas
alpinas suíças.
289 290
Entrelaçamentos
de projetos de
Gion Caminada
291 292
[293] [294]
266
295
296
Casa Gugalun,
Versam, 1992–94.
298
Casa Luzi,
297 Jenaz, 1997–2001.
300
Casa Leis,
299 Vals, 2006–09.
do arquiteto. Philip Ursprung 24, em entrevista concedida ao autor, revela 24 Philip Ursprung
nasceu em 1963 em
essa operação analítica em que Zumthor expõe analogamente as latências Baltimore, EUA. Desde
do lugar: 2011 é professor de
História da Arte e
Arquitetura no Institute
Por “latência” quero dizer questões que não são óbvias, mas parcialmente for the History and
Theory of Architecture
reprimidas, esquecidas ou negligenciadas. Como um psicanalista que re- (GTA) da ETH-Zurique.
vela questões subconscientes ou memórias reprimidas, Zumthor dá, por
meio da arquitetura, acesso a processos históricos que foram esquecidos
ou reprimidos. A capela está respeitando o histórico dado, o caminho,
sim, e portanto o tempo em que a agricultura estava dominando e as pes-
soas se deslocavam a pé, não em estradas pavimentadas. (Nessa parte dos
Alpes até a década de 1950). Mas a capela não é nostálgica e não se im-
porta muito com a tradição de construção “local”. Tal tradição exigiria
uma capela construída de pedra, não de madeira. A construção de ma-
deira está mais próxima do ambiente atual do que do passado, refere-se
ao que coexiste – a floresta próxima, os estábulos – do que o que preexis-
te. A capela não quer ser um clichê do passado. Sua torre sineira parece
um poste de eletricidade ou um poste de teleférico. É muito contemporâ-
neo ou “presente”. Ajuda-nos a ver que reprimimos nosso próprio tempo
presente. (URSPRUNG, 2018. Depoimento ao autor)
268
Há nessa fala uma valorização do aspecto do envelhecimento do mate-
rial e da visibilidade da habilidade construtiva na obra executada. Isso pode
refletir sua mentalidade artesã descrita anteriormente em seu processo de
formação. Como objetos de estudo comum, verifica-se que na Capela Sogn
Benedetg, no Atelier Zumthor e no Abrigo das ruínas romanas, o arquiteto
envolve seus volumes com uma pele externa independente formada pela
soma de pequenos componentes iguais de madeira replicados, dos quais
transmitem o trabalho manual. Ver figuras 301 a 305.
No caso da Capela, as plaquetas de madeira instaladas sobrepostas; do
Atelier, as finas réguas de madeira espaçadas entre si; e, no Abrigo, as lâmi-
nas de madeira inclinadas percorrem toda a superfície externa dos volu-
mes, adaptando-se à modulação.
Tem-se, então, após os procedimentos de implantar seus edifícios em
continuidade com a paisagem, a tensão calculada entre leitura e releitura
das técnicas locais, a própria expressão construtiva da lógica artesã uma
virtude experimental de projeto.
Desse processo de envolver os edifícios com pequenas partes somadas,
observam-se dois fenômenos: o da aparente seriação industrial; e a franca
exibição do trabalho humano, virtuoso, para construir tal objeto.
A historiadora Irina Davidovici, ao analisar a “práxis” da produção ar-
quitetônica da Suíça alemã, diz especificamente sobre o projeto do Abrigo
para as ruínas romanas:
269
301
302 303
Abrigo para as
ruínas arqueológicas Capela Sogn
romanas (1985–86) Benedetg (1985–88)
304
305
Atelier Zumthor
(1985–86)
delicadeza de suas partes e o próprio gesto de envolver como um todo o vo-
lume arquitetônico, essa superfície envoltória é desassociada da estrutura,
que ocorre como um grid interno visualmente destacado.
A estrutura do Abrigo consiste em uma malha interna retangular de
madeira laminada colada com juntas metálicas e cabos de aço tensores; a
da capela, em pilares retangulares perimetrais de madeira laminada cola-
da repetidos com mesmo espaçamento, apoiando o sistema externo de fe-
chamento por pinos metálicos: estão, mais do que informando com clareza
a sustentação do edifício, atuando na espacialidade interna pela cadência
própria e participação no ritmo da luz que atravessa as peles exteriores.
Essa característica construtiva no uso da madeira será retomada em
uma família de projetos posteriores, oscilando a posição da malha estru-
tural em interna ou externa. Tanto no Abrigo para as ruínas arqueológicas
romanas (1985–86) como na Capela Sogn Benedetg (1985–88), a estrutura,
interna, libera a face externa para uma relação de proximidade com a pai-
sagem circundante das duas pequenas cidades suíças. Nos projetos recentes
dos pavilhões do Museu da mina de zinco de Almannajuvet (2003–2017) e
no Memorial Steilneset (2007–2011), ambos situados em sítios naturais no-
ruegueses, há a inversão da grade estrutural de madeira para a face externa,
dando autonomia aos volumes que encerram os interiores.
Nesses lugares, a estrutura proposta por Zumthor atua ela mesma como
elemento comunicativo de interpretação analógica do contexto. Os pavi- Ver figuras 306 a 313.
lhões do Museu da antiga mina de zinco desativada denotam a imagem das
estruturas típicas do universo da mineração antigas. No caso do Memorial
Steilneset, dedicado às vítimas acusadas de bruxaria no século XVII, a re-
petição dos pórticos de madeira, formados pela união de barras finas, está
correlata com as estruturas locais da pequena ilha de pescadores utilizada
tradicionalmente para secar peixe. Ver figuras 314 e 315.
Sobre o Memorial, Zumthor o apresenta primeiro descrevendo o lugar
em que se situa antes de descrever o projeto em si, a partir da observação de
que a pequena vila estava deixando sua atividade pesqueira e, portando, essa
cultura estava deixando de ser revelada: “Vardo já foi uma atraente vila de
pescadores. Hoje restam apenas alguns barcos no porto interno, e os longos
suportes de madeira na paisagem, antes usadas para secar peixes, estão cain-
do aos pedaços. Muitas das casas estão vazias”. (ZUMTHOR, 2014, 4 v., p.171)
Diante desse grupo de projetos em madeira, pode-se concluir que Zum-
272
[306]
[307]
Peter Zumthor.
Abrigo para as
Ruínas Arqueológicas
Romanas,
Chur, 1985–86.
[308]
309
Peter Zumthor.
Capela Sogn Benedetg,
Sumvitg, 1985–88.
310
311
Peter Zumthor.
Memorial Steilneset,
Vardo, 2007–11.
312
313
Peter Zumthor.
Museu da mina de
zinco de Almannajuvet
Sauda, 2003–17.
thor raciocina segundo um contexto dado, analisando sua história ou téc-
nicas cotidianas locais, em um procedimento de projeto de reinterpretação
das circunstâncias, sem mimetizar suas obras com os fatos construídos de
determinada paisagem, mas fazendo com que elas contribuam na revelação
ou no diálogo de culturas latentes: “Como arquiteto, estou interessado na
história que é armazenada e acumulada em paisagens, lugares e coisas. As
coisas que posso ver e sentir na paisagem são físicas e reais, não importa
o quão mudas, ocultas e misteriosas elas possam parecer à primeira vista”.
(ZUMTHOR, 2018, p.18)
274
314
315
3.2 MUSEU DE ARTES DE BREGENZ
O Museu de Artes de Bregenz transparece as operações projetuais de Zum-
thor em um edifício de grande escala com uma demanda, dada pelos pro-
motores, por “onipresença” na cidade austríaca de Bregenz. Tendo realiza-
do suas primeiras obras referenciais em madeira, todas em pequena escala
e em consonância com seu contexto familiar suíço, como seria a leitura
desse projeto de um museu para Zumthor? Além disso, a ênfase técnica
dada aos espaços expográficos de um museu condiciona o arquiteto a um
engenhoso processo arquitetônico de como fazer a luz natural penetrar em
seu edifício, concluindo em questões próprias de seu pensamento.
O projeto é resultado de um concurso realizado em 1989, conduzido
pelo governo do Estado Federativo de Vorarlberg, cuja capital, Bregenz, ca-
recia de um espaço para a arte contemporânea. A proposta de Zumthor
foi a vencedora dentre 72 inscritos, avaliados em janeiro de 1990 pelo júri
composto por: Adolf Krischanitz, Herbert Karrer, Kurt Burtsher, Heinz
Wagner, Friedrich Achleitner, Jacques Herzog (Herzog & de Meuron),
Guntram Lins, Peter Baum e Christoph Bertsch.
Segundo o júri, “com a construção da galeria nacional de Voralberg, as
margens do lago de Bregenz experimentarão um novo destaque urbano,
que vai de acordo com o desejo de muitos anos por um espaço artístico de
Vorarlberg” (WETTBERWERBE ARCHITEKTUR JOURNAL,1990, p.45), ou seja,
havia clareza na posição de destaque que o museu deveria ter em relação à
cidade e sua importância para com todo o Estado de Voralberg.
Na própria apresentação exigida pelo concurso, havia uma comum
perspectiva do projeto que os participantes deveriam realizar para a avalia-
ção coletiva: tal imagem consagrava o novo museu visto desde o lago à sua
277
frente, Constança, em uma observação não próxima do projeto e sua arti-
culação urbana imediata, mas da sua imagem de museu diante da paisagem
da cidade. Ver figuras 316 a 319.
Na ata do júri, a volumetria autônoma do projeto proposto por Zum-
thor o qualificou positivamente dentre os demais participantes:
278
316
317
Imagens enviadas ao
318 concurso em 1989.
319
Imagem atual do
modelo físico de 1989
de acesso, mas também a favor de uma solução que otimizasse em termos
de planejamento urbano. (ACHLEITNER, 1999, p.51)
280
das obras de arte”; além disso, causariam uma “redução óptica do espaço
para uma altura de 3 metros”. Ver figura 320.
A planta quadrada do Museu e o volume da edificação virtualmente cú-
bico gerado da proposta final construída já estavam presentes nessa pro-
posta inicial, mas de modo distinto: assim como usual, Zumthor desvin-
cula a estrutura das fachadas. Uma fileira paralela interna de pilares e um
único core rígido com a circulação e elevador autônomo, que liberam um
espaço central, é uma disposição que há muito se refere aos paradigmas
Modernos, indicando a ausência de referências locais.
O processo de projeto do museu durou de 1990 a 1995. Nesse perío-
do, passou por diversas revisões. No segundo estudo, de meados de 1992,
Zumthor altera o sistema da fachada, reduzindo a quantidade de “planos
rebatedores” de luz indireta para um por pavimento. Além dessa alteração
quantitativa, ele redesenha os próprios planos, antes opacos, propondo ale-
tas que direcionariam a luz até a parte alta das salas expositivas.
Com isso, Zumthor sinaliza um processo de redução formal do proje-
to inicial, aproximando-se cada vez mais de um volume prismático. De-
monstra, ainda, um aperfeiçoamento técnico do sistema de venezianas
como filtro empregado anteriormente, por exemplo, no projeto do Abrigo
das Ruínas Arqueológicas Romanas, ainda que a pesquisa não tenha obti-
do informações quanto à materialidade dessas aletas. As venezianas dessa
proposta mudam sua inclinação de acordo com o ângulo solar, expondo
uma investigação projetual mais relacionada com um perfil tecnológico
que Zumthor logo abandonaria. Ver figuras 323 a 330.
Além disso, nessa versão, o museu deixa de ser elevado da cota de nível
e passa a estar encaixado nela, com um meio nível subterrâneo e o piso de
acesso com pouca diferença de altura da cota externa, mas ainda acessado
por uma pequena escada. Na versão final, o museu é colocado em nível
com a cota externa, com o acesso principal voltado para a cidade e não
mais para o lago de Constança.
O grande momento do processo desse projeto, que contribui na descri-
ção da poiesis do arquiteto, ocorre na última versão, quando ele substitui a
pele externa filtrante, que fora inicialmente em plaquetas de madeira, de-
pois, em venezianas, por placas de vidro translúcido.
Zumthor realiza uma aproximação material com o contexto não mais
pela reinterpretação pura das técnicas latentes na paisagem local, mas apro-
281
320 Imagens enviadas ao
concurso em 1989.
Projeto construído
em 1997
321 322
Proposta apresentada
no concurso, em 1989.
323 324
327
Proposta revisada,
aprox. 1992.
325 326
[330]
328
Projeto construído
329 em 1997.
pria-se das propriedades físicas da matéria, o vidro translúcido levemente
esverdeado, para aderir na paisagem.
Diante do lago de proporções regionais de Constança, Zumthor impõe,
ao seu projeto, as mesmas cores, aspectos luminosos, brilho, reflexão de
suas águas brandas que o vidro é capaz de expressar. “Ele absorve a luz do
céu, a névoa do lago, reflete a luz e a cor e dá uma indicação de sua vida in-
terior de acordo com o ângulo de visão, a luz do dia e o tempo” (ZUMTHOR, Ver figura 331.
2002, p.174).
Esse mesmo procedimento de projeto de aderência físico-cromática ao
entorno pela definição do material da superfície externa do edifício pode
ser também observado, como um segundo exemplo de um museu fora de
seu país, em sua obra do Museu de Artes Kolumba (Alemanha, 1997-2007).
Zumthor, ao visitar o local das ruínas da antiga igreja romana sobre onde
ergueria um museu de arte sacra identifica nos tijolos cerâmicos a justa ma-
terialidade capaz de aderir o novo volume ao espaço circundante. Mas não
simplesmente tijolos cerâmicos, Zumthor estuda com o fabricante as diver-
sas possibilidades cromáticas dos seus tipos de tijolos, levando-os ao próprio
local para identificar as cores precisas do entorno. Esse processo de pesqui-
sa cromática está gravado no documentário “Peter Zumthor: Der Eigensinn
Des SchöNen” [A Obstinação da Beleza] 26, dirigido por Ursula Böhm. 26 Ver PETER ZUMTHOR:
DER EIGENSINN DES
Na Áustria, essa resposta pelo vidro também traduz a lógica de pensa- SCHÖNEN [A OBSTINAÇÃO
mento do arquiteto pela sua proposta técnica. Zumthor realiza uma pele DA BELEZA]. Direção:
Ursula Böhm.
externa dupla, que conforma um colchão climático translúcido, indepen- Stuttgart. SWR, 2000,
dente da estrutura de concreto principal, com um vazio interno de 90 cen- 58min. Som. Cor.
tímetros, de modo que as lajes e circulações internas aparecem esfumeadas Ver figura 332.
nas fachadas.
Esse modelo de edificação em peles duplas translúcidas, vidros, foi de-
senvolvido com alguma frequência durante o debate arquitetônico da déca-
da de 90, quando houve uma reconsideração dos valores de transparência
do material vidro, para sua utilização como substância material do vela-
mento externo dos edifícios. Terrence Riley, em sua exposição Light Cons-
truction 27, de 1995, no Moma, conduz esse debate elencando um grupo de 27 Ver RILEY, Terrence.
Light Construction.
projetos daquela década que contemplam essa construção de uma “seção Nova Iorque: The
dentro de uma seção”, com “véus” externos seguidos de ambientes internos. Museum of Modern
Art, 1995.
Riley agrupa o Museu de Bregenz com a proposta apresentada por David
Chipperfield para a ampliação do Neues Museum (Alemanha, 1994) e do
284
331
projeto da Igreja Ortodoxa Grega (Suíça, 1989) de Herzog & de Meuron.
Apesar de estar em diálogo com a circunstância arquitetônica interna- Ver figuras 333 a 335.
cional, a proposta da dupla pele de vidro de Zumthor se estabeleceria nos
mesmos parâmetros?
Assim, Zumthor passa a aplicar sobre o vidro suas próprias lógicas téc-
nicas, usufruindo naturalmente de seu passado artesão para “re-inventar”
um sistema de pele dupla durante a década de 90.
286
332
PETER ZUMTHOR: DER
EIGENSINN DES SCHÖNEN
[A OBSTINAÇÃO DA
BELEZA]. Direção: Ursula
Böhm. Stuttgart. SWR,
2000, 58min. Som. Cor.
E foi para o vidro que procuramos um magistral, embora comum, modo
de uso. Sem criar essa linguagem afetada, mas decodificando os princí-
pios simples. Ficou claro para nós que você não pode fazer buracos no
vidro se você tratá-lo com sinceridade, que você sempre vê todos os seus
topos, que não deve ser estressado ou pressionado. Com essa intenção
vem a inventividade. (ZUMTHOR, 2004, p.92)
288
334
David Chipperfield.
Proposta para
o concurso da
Extensão Neues
Museum Bregenz,
335 Berlim,1994.
A obra do Museu durou dois anos, sendo finalizada em 1997. Em 1998, o
projeto foi premiado com o Mies Van der Rohe Award como melhor projeto Ver figuras 336 e 337.
de arquitetura europeu daquele ano.
290
[336]
[337]
3.3 BRUDER KLAUS
A capela de concreto isolada na paisagem campal de Wachendorf, Alema-
nha, é oportuna para o reconhecimento de duas questões inerentes à obra
de Zumthor: uma vez distante de referências arquitetônicas do perímetro
habitado, como ele realiza uma obra de arquitetura em contato único com
a paisagem natural; e, diante dessa obra, qual a relevância de seu processo
construtivo em si.
O projeto da Capela de Bruder Klaus (dedicada à Niklaus Von Flue) se
inicia em 2001 a convite dos fazendeiros locais, no mesmo período em que
Zumthor estava projetando o Museu de Artes de Kolumba, em Colônia,
maior centro urbano próximo.
O tema de um espaço meditativo implantado em uma paisagem cam-
pestre vasta havia sido desenvolvido como raciocínio em outro projeto
não construído, também na Alemanha, dois anos antes, entre 1998 e 1999.
O chamado “Poetic Landscape”, em Bad Salzuflen; quando Zumthor de-
senvolvera pequenos edifícios, ou “casas” em suas palavras, dedicados aos
poemas feitos por poetas convidados a escreverem especificamente sobre
determinados lugares de uma propriedade agrícola.
A dupla prerrogativa paisagem-poesia foi responsável por estruturar
uma pesquisa de base do projeto posterior da Capela Bruder Klaus, pois
articula arquitetura com paisagem; e arquitetura com uma interioridade
meditativa, corpórea: “O projeto “Poetic Landscape” abriu novos espaços
para mim, novos espaços para pensar sobre a conexão da arquitetura com a
paisagem e a criação de edifícios que servem menos a um propósito prático
que a uma necessidade espiritual”. (ZUMTHOR, 2014, 3 v., p.11)
Esse projeto é apresentado por Zumthor em ambos memoriais, Poetic
293
Landscape e Bruder Klaus, como um estágio inicial que se concretizou pos-
teriormente na obra construída da Capela, finalizada em 2007. Fato que se
comprova quando se analisam as fotografias dos modelos físicos de implan-
tação de ambos projetos: Zumthor representa de maneira semelhante a paisa-
gem e a arquitetura como um plano de massas, ou seja os edifícios prismáti-
cos estão inseridos em volumes orgânicos de vegetação espraiada no campo.
A relação por oposição entre cada um dos monólitos retilíneos, corres- Ver figuras 338 a 340.
pondentes às casas dos poemas e à capela Bruder Klaus, e os planos contí-
nuos, vastos, dos campos com espaços conformados por massas orgânicas
de vegetação gera um sentido de tensão concêntrica aos edifícios, reforçan-
do sua presença.
Zumthor utiliza dos mesmos argumentos nos memoriais desses proje-
tos, ou seja, de que as intervenções seriam capazes de impor ao lugar uma
certa energia organizadora, assumindo o protagonismo para si. Seja no do
Poetic Landscape: “Queríamos intensificar a aura desses lugares por meio
de intervenção arquitetônica focada. Em sua totalidade, esperamos que es-
sas intervenções gerem um campo de energia de grande alcance na paisa-
gem” (ZUMTHOR, 2014, 3 v., p.11), como no da capela:
294
338 339
Modelos de estudo,
Poetic Landscape.
Atelier Zumthor,
1998–99.
340
Modelo de estudo,
Capela Bruder Klaus.
Atelier Zumthor,
2001–05
arquitetônicas ocas, criadas para capturar a mudança da intensidade da luz
do dia e para promover novas experiências de um lugar para outro” (ZUM-
THOR, 2014, 3 v., p.11), de modo a construírem tal inerioridade meditativa,
introspectiva desejada.
Não foi possível obter a informação na bibliografia consultada de qual
seria a materialidade exata dos edifícios dedicados ao Poetic Landscape, no
entanto, na Capela, a interioridade vazia do volume vertical está relacio-
nada explicitamente com seu processo construtivo, realizado em concreto
prensado em camadas.
A proposta arquitetônica de Zumthor, executada entre 2005 e 2007,
consiste na materialização de uma sequência construtiva: a construção das
fôrmas, a concretagem e a carbonização das primeiras para a sua desfôrma.
Para as fôrmas do espaço interno, foram usados 112 troncos roliços de
árvores cortadas de um bosque local. Os troncos foram posicionados lado
a lado definindo os limites do espaço interno em planta. Cada tronco foi
então apoiado em seu par no lado oposto, formando uma “barraca de ma-
deira enorme” (ZUMTHOR, 2014, 3 v., p.121), nas palavras de Zumthor. Ver figuras 341 a 343.
A seguir, instaurou-se uma rotina de concretagem: durante 24 dias a
estrutura fora preenchida com uma camada diária de 50 centímetros de
concreto prensado, até atingir 12 metros. O concreto foi feito como uma
massa espessa, de alta granulometria, constituída de cascalho de rio, ci-
mento branco, água e areia amarelo-avermelhada 28. A cada dia a mistura 28 Segundo artigo
no portal virtual
era refeita, o que resultou em variações sensíveis de cor e textura entre ca- do periódico
madas. Na superfície externa, as fôrmas eram planas e; na superfície inter- espanhol Tectonica.
Disponível em <http://
na, o concreto foi moldado envolvendo os troncos da “barraca”. tectonicablog.com/
No fim dos 24 dias, com o volume de 12 metros erguido, os fazendei- docs/Zumthor.pdf>
ros iniciaram um processo de queima dos troncos internos que durou três
semanas, até a finalização de sua carbonização e desfôrma facilitada: “Os
troncos das árvores se encolheram no fogo fumegante, que escureceu as
paredes com fuligem. Quando o fogo finalmente se apagou, os troncos de
árvores queimados foram removidos, deixando para trás sua marca e o
cheiro prolongado de fumaça”. (ZUMTHOR, 2014, 3 v., p.122)
Portanto, vemos a madeira, tão utilizada na obra do arquiteto, tanto em
estrutura como envelopamento sendo empregada materialmente no inte- Ver figuras 344 a 346.
rior da Capela para conferir sua textura, veios, específicos ao concreto, im-
pregnando-o com seu odor carbonizado. A operação é um processo físico
296
341
[342] 343
e químico, natural, baseado em gestos simples de execução, de acordo com Ver figura 347.
um ambiente rural onde se situa.
Além do apreço pelo uso e expressão dos materiais, que permeia toda
obra do arquiteto, de que maneira essa sequência construtiva poderia con-
tribuir para o entendimento do pensamento arquitetônico de Zumthor?
Nesse caso, a descrição das etapas da obra está visivelmente consagrada no
corpo construído.
As etapas de concretagem diárias estão explícitas na diferença de co-
res e marcas a cada 50 centímetros. Os troncos de madeira carboniza-
dos são visíveis pela subtração na massa interna do concreto. A porta, no
início do desenvolvimento da “barraca” dos troncos apoiados, assume,
consequentemente, a forma de um triângulo. Essa orientação da arquite-
tura através de simples processos, que permanecem na obra como gestos,
constitui uma característica no arquiteto. Martin Steinmann complemen-
ta nesse sentido:
298
344
345
[346]
300
347
Peter Zumthor.
Museu Artes Kolumba,
Alemanha, 1998–07
[348] [349]
351
Peter Zumthor.
Casa Chivelstone,
Inglaterra, 2008–18.
350
Peter Zumthor.
Museu LACMA,
Estados Unidos,
352 imagem de 2017.
Casa dos Mosaicos.
Atelier Zumthor,
Palestina 2006–10.
[353] [354]
355
356
304
[357]
[358]
4 Conclusão
A análise da obra do arquiteto Peter Zumthor reconhece sua formação pes-
soal e o contexto arquitetônico do qual ele foi contemporâneo como cir-
cunstanciais em seu modo de pensar a arquitetura. Apesar de esses fatores
terem propiciado um ambiente conceitual cercado de referências, Zumthor
não se constitui restrito a um determinado grupo, sendo um amálgama de
muitas questões, concluindo-se em um estado criativo próprio: sua poiesis.
Mais do que apoiar-se formalmente em paradigmas da arquitetura de
seu tempo, sobretudo uma linguagem dita pós-moderna, que, na Suíça,
usufruiu de referências do Minimalismo, e em sua formação inicial como
um artesão, Zumthor adota esses legados como amparos metodológicos
para sua obra, ou seja, como uma visão de mundo.
Ter nascido em uma família de artesãos e trabalhado formalmente como
marceneiro com seu pai lhe imputou precisão, franqueza e o trato “real” com
os materiais, pelo seu trabalho manual. Essa habilidade construída acerca da
madeira repercute-se em sua arquitetura, mesmo com outros materiais. Em
sua prática, a construção ou técnica construtiva empregada na obra está in-
ter-relacionada com a espacialidade própria do projeto construído.
A comunhão entre seus dez anos profissionais no Departamento de Pa-
trimônio Histórico do cantão de Graubünden e a mudança que o discurso
de Aldo Rossi gerou na arquitetura suíça do final dos anos 70, a partir de
sua atividade docente na EHT-Zurique, é um fato importante no reconheci-
mento das características de projetar de Zumthor.
Essa união faz com que Zumthor atente-se de maneira analítica à histó-
29 Ver entrevista
ria de cada lugar, buscando, como afirma Ursprung 29, as latências de cada concedida ao
um deles como um estímulo inicial para seus projetos. Não com a intenção autor na p.272.
309
de reproduzir os tipos arquitetônicos existentes, mas sim de interpretar a
ideia do típico, algo que ajusta suas obras de acordo com cada circunstância.
Nesse sentido, a contribuição de Rossi para a poiesis de Zumthor se dá
no âmbito metodológico dessa análise inicial sobre os lugares dos projetos:
310
ceu a importância da implantação, da mediação entre exterior e interior e
da dependência de uma interioridade reclusa na conformação de um voca-
bulário arquitetônico de Zumthor.
Diante das obras visitadas, do elenco de três análises distintas visan-
do a reconhecer Zumthor atuando sobre contextos distintos, em fases da
obra distintas e, principalmente, manipulando materiais diferentes, seja a
madeira, o vidro ou o concreto, podemos concluir que a mesma poética
orienta o desenvolvimento de seus projetos. Reinterpretar, aderir, empilhar
são ações projetuais que se complementam, como uma lógica maior que
encontrará seus significados em cada novo projeto.
As plaquetas de madeira que envolvem a capela Sogn Benedetg, de 1988,
estão analogicamente convertidas em vidro no Museu de Artes de Bregenz,
de 1997, e têm sua transformação física, que gera na sua forma curva uma
escala de cores de madeiras queimadas pelo sol, na carbonização dos tron-
cos das fôrmas da capela Bruder Klaus, de 2007.
Nesse mesmo período, enquanto a disciplina arquitetônica adaptou-se
às regras do capital financeiro, perdendo, muitas vezes sua condição tec-
tônica para operar em virtualidades e indistinções do mundo globalizado,
Zumthor, apesar das grandes titulações, manteve seu Atelier na pequena
vila suíça de Haldenstein, com novecentos habitantes.
Penso que a arquitetura, hoje em dia, deve recordar das suas tarefas e
possibilidades genuínas. A arquitetura não é nenhum veículo ou símbolo
de coisas que não fazem parte da natureza. Numa sociedade que celebra
o insignificante, a arquitetura pode opor resistência, contrariar o desgaste
de formas e significados e falar sua própria linguagem.
A linguagem da arquitetura não é, a meu ver, nenhuma questão de
estilo arquitetônico. Cada edifício é construído com um determinado ob-
jetivo, num determinado lugar e para uma determinada sociedade. Às
questões que resultam desses fatos simples tento responder com as mi-
nhas obras do modo mais preciso e crítico que consigo. Num tempo em
que a cultura da criação se encontra estagnada e a beleza é arbitrária,
aposto no efeito elucidativo desse trabalho. (ZUMTHOR, 2009, p.27)
311
359
bibliografia
A+U: Architecture and Urbanism Fevereiro 1998 Edição especial,
Peter Zumthor. Tóquio, A+U Publishers, 1998.
ARNOLD, Françoise. L’hypothèse Aldo Rossi. Entretiens Tires du Film.
Paris: Les Productions Du Effa. Paris, 2013.
ACHLEITNER, Friedrich. The Conditioning of Perception. Em: Peter
Zumthor- Kunsthaus Bregenz (Werkdokumente / Kunsthaus Bregenz,
Archiv Kunst Architektur). Berlim: Hatje Cantz Publishers, 1999. p.50–55.
ARQUITECTURA VIVA 198.10/2017. Artesanía: seis obras, três continentes.
Madrid, Arquitectura Viva SL, 2017.
BERTELOOT, Mathieu; PATTEEUW, Véronique. Form/Formless – Peter
Zumthor’s Models. Em: OASE nº 91 – Building Atmosphere. Roterdã:
NAI010 Publishers, 2013. p.83–91.
BAUMAN, Zygmunt. Retrotopia. Tradução de Renato Aguiar.
Rio de Janeiro, Zahar, 2018.
BIAGI, Marco. “Poetica concretezza: progetto dell’architetto Peter Zumthor”.
Em: VilleGiardini nº 375. Milão: Visibilia, 2001. p.4–15
BOURRIAUD, Nicolas. Pós-produção: como a arte reprograma o mundo
contemporâneo. São Paulo: Martins, 2009.
BÖHME, Gernot. “Atmosphere as mindful physical presence in space”.
Em: OASE nº 91 – Building Atmosphere. Roterdã: NAI010 Publishers,
2013. p.21–32.
—. Architektur und Atmosphäre 2006. Munique: Fink Wilhelm
GmbH, 2006.
—. “Encountering Atmospheres – A reflection on the concept of
atmosphere in the work of Juhani Pallasmaa and Peter Zumthor.”
315
Em: OASE nº 91 – Building Atmosphere. Roterdã: NAI010 Publishers,
2013. p.93–100.
DUDA, Thomas P. Between structure and dressing: Zumthor, Herzog
& de Meuron and the concept of dressing. Dissertação de mestrado.
Londres: Architectural Association, 1998.
DURISCH, Thomas (Ed.); ZUMTHOR, Peter. Peter Zumthor 1985–2013
Buildings and Projects. Zurique: Scheidegger & Spiess, 2014.
DAVIDOVICI, Irina. Forms of Practice: German Swiss Architecture
1980–2000. 2ª ed. ampliada. Zurique: GTA Publishers, 2018.
FOSTER, Hall. O complexo arte-arquitetura. São Paulo: Cosac Naify, 2015.
FRAMPTON, Kenneth. Labour, Work and Architecture – Collected Essays
on Architecture and Design. Londres: Phaidon, 2002.
FRIEDRICH Achleitner. Questioning the modern movement.
Em: A+U: Architecture and Urbanism February 1998 extra edition,
Peter Zumthor. Tóquio, A+U publishers, 1998. p.208.
LUCAN, Jacques; RAFFAELE, Colette; NICOLIER, Guy; MIVELAZ, Philippe;
STEINMANN, Martin. Matiére d’art: architecture contemporaine em
Suisse/ A matter of art: contemporary architecture in Switzerland.
Berlin: Birkhauser, 2001.
HAVIK, Klaske; TIELENS, Gus. Concentrated Confidence – A Visit to Peter
Zumthor. Em: OASE n0 91– Building Atmosphere. Roterdã: NAI010
Publishers, 2013. p.59–82.
HEIDEGGER, Martin. Construir, habitar, pensar. Em: Ensaios e
conferências. Tradução Márcia Sá Cavalcante Schuback. 2ª edição.
Petrópolis: Vozes, 2002.
—. Ser e tempo. Tradução de Fausto Castilho. 15ª edição.
Petrópolis: Vozes, 2005.
KÖB, Edelbert (Ed). Peter Zumthor-Kunsthaus Bregenz (Werkdokumente
/ Kunsthaus Bregenz, Archiv Kunst Architektur). Berlim: Hatje Cantz
Publishers, 1999.
KUNSMANN, Jeanette; BURKOFF, Stephan. Dear to me: Peter Zumthor. 2017.
Disponível em: <https://www.dear-magazin.de/interviews/
Peter-Zumthor_-Dear-to-Me_18067117.html>
L’HYPOTHÈSE Aldo Rossi. Direção: Françoise Arnold. Les Productions
Du Effa. Paris, 2012. 80 min. Som, Cor, Formato: 1 DVD.
MEIER, Marco. Peter Zumthor: Architektur der Gelassenheit. Em: Du: die
316
Zeitschrift der Kultur n°52 – Pendenzen: neuere Architektur in der
deutschen Schweiz, 1992. p.44–53.
MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da Percepção. Tradução de
Carlos Alberto Ribeiro de Moura. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
NASCIMENTO, Myrna de Arruda. Arquiteturas do pensamento. Dissertação
de Doutorado em Arquitetura e Urbanismo. São Paulo: FAUUSP, 2002.
NORBERG-SCHULZ, Christian. O fenômeno do lugar. Em: Uma nova
agenda para a arquitetura –Antologia Teórica 1965–1995. São Paulo:
Cosac Naify, 2006.
NOTES FROM A DAY IN THE LIFE OF AN ARCHITECT, Peter Zumthor
at Work. Direção: Win Wenders. Neue Road Movies: Berlim, 2012.
10min. Som, cor. Formato HD Digital.
O’BRIEN, Sophie (Ed). Peter Zumthor. Hortus Conclusus. Serpentine
Gallery Pavilion 2011. Londres: Koening Books, 2011.
PETER ZUMTHOR: DER EIGENSINN DES SCHÖNEN [A OBSTINAÇÃO DA
BELEZA]. Direção: Ursula Böhm. Stuttgart. SWR, 2000, 58min. Som.
Cor.
RILEY, Terrence. Light Construction. Nova Iorque: The Museum of Modern
Art, 1995.
ROSSI, Aldo. Uma arquitetura analógica. Em: Uma nova agenda para a
arquitetura –Antologia Teórica 1965–1995. São Paulo: Ed. Cosac Naify,
2006. p.379.
ROWE, Colin; SLUTZKY, Robert. Transparency: literal and phenomenal. Em:
Perspecta nº 8 (p.45–54). New Haven: The Yale Architectural Journal, 1963.
SACK, Manfred. Peter Zumthor: three concepts: Thermal bath, Vals; Art
Museum, Bregenz; International Exhibition and Documentation Centre,
Berlin. Basel: Birkhauser, 1997
SENNETT, Richard. O Artífice. 2ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2009.
SIMMEL, Georg. A Filosofia Da Paisagem. Em: Política e Trabalho nº 12,
1996. p.15–24.
SCHONBACHLER, Daniel. Saint Benedict Chapel (Caplutta Sogn Benedeteg)
– Architecture and Symbolism: Thoughts and images. Sumvitg:
Cussegl da Funaziun Caplutta Sogn Benedetg, 2013.
SCHAUB, Christoph. Place, Function and Form – The Architecture
of Gion A. Caminada and Peter Zumthor (1996, 24 mins).
Em: Films on Architecture. Zurique: Scheidegger & Spiess, 2014.
317
STEC, Barbara. Conversazioni con Peter Zumthor. Em: Casabella vol.68
no719. Milão: Mondadori, 2004. p.6–17, 90–95.
STEINMANN, Martin. Téchne on the work of Peter Zumthor.
Em: Domus nº 710. Milão: Editoriale Domus Spa, 1989. p.44–53.
STEINMANN, Martin. The presence of things. Commentes on recent
architecture in northern switzerland. Em: Construction Intention Detail.
Five projects from Five swiss architects. Artemis: Zirique, 1994. p.8–25.
STEINMANN, Martin; ALDER Michael; HERZOG, Jacques; De MEURON,
Pierre, ZUMTHOR, Peter. Bauen mit holz/ Propos sur Le bois. Em
Archithese 5. Schweiz: Archithese Verlagsgesellschaft mbH,1985. p.2–15.
SPIER, Steven. Place, authorship and the concrete: three conversations with
Peter Zumthor. Em: ARQ: Architectural Research Quarterly vol. 5 nº 1.
Cambridge: Cambridge University Press, 2001. p.15–36
ZUMTHOR, Peter. Atmosferas, Entornos Arquitetônicos – As coisas que me
rodeiam. Barcelona: Gustavo Gili, 2009.
—. A Way of Looking at Things. Em: Peter Zumthor – A+U Edição
especial, fevereiro 1998. Tóquio: A+U Publishing, 1998. p.6–25.
—. Ich baue aus der Erfahrung der Welt [Eu construo a partir da
experiência do mundo]. Em: Detail, vol.41 nº 1, p.20–27, 2001.
—. Make it Typical! A small atlas of architectural atmosphere.
Mendrisio: Atelier Zumthor e Accademia di Architettura, 2005.
—. Partituren und Bilder: architektonische Arbeiten aus dem Atelier
Peter Zumthor, 1985–1988. Lucerna: Architekturgalerie Luzern, 1988.
—. Pensar a Arquitectura. Barcelona: Gustavo Gili, 2009.
—. Peter Zumthor Works: Buildings and Projects, 1979–1997. Basel:
Birkhauser, 1999.
—. Recent projects. Em A+U nº 8 (383) agosto de 2002. Tóquio: A+U
Publishing, 2002. p.82–91
—. Spirit of Nature Wood Architecture Award 2006. Tampere:
Rakennustieto Oy, 2006.
—. Swiss sound box: a handbook for the pavilion of the Swiss
Confederation at Expo 2000 in Hanover. Basel: Birkhauser, 2000
—. Thermal Bath at Vals. London: Architectural Association, 1996.
—; FRETTON, Tony; DIENER, Roger. Das Haus. Zurique:
Architekturvorträge der ETH Zuürich, 2010.
—; OBRIST, Hans Ulrich; PEYTON-JONES, Julia. Peter Zumthor
318
in Conversation with Hans Ulrich Obrist and Julia Peyton-Jones.
Disponível em <https://www.serpentinegalleries.org/files/downloads/
Zumthor_0.pdf>
—; HUBER, Dorothee. Neues Bauen im alpinen Kontext. Unsere
Kunstdenkmäler: Mitteilungsblatt für die Mitglieder der Gesellschaft
für Schweizerische Kunstgeschichte = Nos monuments d’art et
d’histoire: bulletin destiné aux membres de la Société d’Histoire de
l’Art en Suisse = I nostri monumenti storici: bollettino per i membri
della Società di Storia dell’Arte in Svizzera. V. 35, 1984.
—; LENDING, Mari. A Feeling of History. Zurique: Scheidegger &
Spiess, 2018.
WERNECK Clara. A Arquitetura de Resistência de Peter Zumthor:
Fenomenologia, Lugar e Experiência. 2017. Iniciação Científica PIBIC CNPq
– Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.
WETTBERWERBE ARCHITEKTURJOURNAL. Viena: Verlag Holzhausen
GmbH, fev./mar. 1990.
319
Lista de imagens
Os cadernos do início e fim da dissertação são de fotografias do autor.
321
31 Pavilhão Serpentine. Fotografia de Martín Fernández de Cór-
dova.
32 Atelier Zumthor. Fotografia de Helene Binet.
34 Centro Seminários. Fotografia de Jurg Spaar.
35 Yellow House. Fotografia de Irina Davidovici.
37 Signal Box. Fotografia de Heinrich Helfenstein
38 Atelier Bardill. Fotografia disponível em <http://www.tectoni-
cablog.com/docs/Bardill.pdf>
39 Frei Atelier. Fotografia de Margherita Spluttini.
40 Museu Kirchner. Fotografia de Irina Davidovici.
42 Termas de Vals. Fotografia de Helene Binet.
50 e 355 Swiss Sound Box. Fotografia de Roland Halbe.
53 Perez Art Museum. Fotografia de Oriol Tarridas.
69 Zumthor. Fotografia de neues stadttor isny.
70 Zumthor. Disponível em <http://zumthor.tumblr.com>
71 Zumthor. Fotografia de Donata Wenders.
72 e 73 Atelier Zumthor. Fotografia de Kuster Frey.
79 Modelo Casa dos Mosaicos. Fotografia de Ima Alsammarae.
80 e 340 Modelo Bruder Klaus. Atelier Zumthor, disponível em ZUM-
THOR, 2009, p.24.
81 Modelo Museu Mine Allmannajuvet. Atelier Zumthor, dispo-
nível em ZUMTHOR, 2014, 4 v., p.8.
125 Casario tradicional. Imagem obtida no Google street view, ju-
lho de 2014.
157 Capela Sogn Benedetg de 1522. Fotografia disponível em
SCHONBACHLER, 2013, p.3.
158 Capela destruída pela avalanche em 9/10/1984. Fotografia dis-
ponível em SCHONBACHLER, 2013, p.3.
166 Zumthor em sua casa. Fotografia de Dominik Gigler.
215 Modelo de estudo. Atelier Zumthor, disponível em ZUMTHOR,
2014, 1 v., p.134.
256 Modelo de estudo. Atelier Zumthor, disponível em ZUMTHOR,
2014, 3 v., p.110.
257 Modelo de estudo. Atelier Zumthor, fotografia de Pep Romero
Garces.
322
287 Blue House. Disponível em <https://www.herzogdemeuron.com/
index/projects/complete-works/001-025/005-blue-house.html>
289 a 292 Detalhes encontros madeira. Disponível em <http://construction-
culture.blogspot.com/2009/07/vrin-and-gion-caminada.html>
295 Casa Gugalun. Fotografia de Henry Pierre Schultz.
296 Casa Gugalun. Fotografia de Helene Binet.
297 Casa Luzi. Fotografia de Peter Otoole.
299 Casa Leis. Fotografia de Ralph Feiner.
301 Abrigo para ruínas arqueológicas romanas. Atelier Zumthor,
disponível em ZUMTHOR, 2014, 1 v., p.40.
302 Capela Sogn Benedetg. Atelier Zumthor, disponível em ZUM-
THOR, 2014, 1 v., p.58.
303 Capela Sogn Benedetg. Atelier Zumthor, disponível em A+U,
1998, p.55.
304 Atelier Zumthor. Atelier Zumthor, disponível em ZUMTHOR,
2014, 1 v., p.16.
305 Atelier Zumthor. Atelier Zumthor, disponível em ZUMTHOR,
2014, 1 v., p.31.
309 Capela Sogn Benedetg. Atelier Zumthor, disponível em ZUM-
THOR, 2014, 1 v., p.56.
310 Memorial Steilneset. Disponível em <https://www.nasjonaletu-
ristveger.no/en/routes/varanger?attraction=Steilneset>
311 Memorial Steilneset. Atelier Zumthor, disponível em ZUM-
THOR, 2014, 4 v., p.179.
312 Museu de mina de zinco. Fotografia de Per Berntsen.
313 Museu de mina de zinco. Atelier Zumthor, disponível em ZUM-
THOR, 2014, 4 v., p.86.
314 Memorial Steilneset. Fotografia de Lindy Atkin.
315 Memorial Steilneset. Fotografia de Helene Binet.
316 a 318 Imagens da proposta enviada ao concurso para o Museu de
Bregenz. Atelier Zumthor, disponível em WETTBERWERBE AR-
CHITEKTURJOURNAL, 1990, p.48.
319 Modelo físico de 1989. Imagem concedida pelo Kunsthaus
Bregenz.
320 Imagens da proposta enviada ao concurso para o Museu de
323
Bregenz. Atelier Zumthor, disponível em WETTBERWERBE AR-
CHITEKTURJOURNAL, 1990, p.49.
323 Modelo físico de 1989. Imagem concedida pelo Kunsthaus Bregenz.
325 Modelo físico do segundo estudo aprox. 1992. Imagem conce-
dida pelo Kunsthaus Bregenz.
326 e 327 Segundo estudo aprox. 1992. Disponível em MEIER, 1992. p.46.
328 Modelo físico do projeto construído. Fotografia de Moshimoshiii.
329 Museu de Bregenz. Atelier Zumthor, disponível em ZUMTHOR,
2014, 1 v., p.142.
331 Fotografia do museu na cidade. Disponível em KUNSTHAUS;
KÖB; ARCHIV KUNST ARCHITEKTUR, 1997, p.17.
334 Igreja ortodoxa grega. Herzog & de Meuron, disponível em
<https://www.herzogdemeuron.com/index/projects/complete-
-works/051-075/057-greek-orthodox-church/image.html>
335 Proposta David Chipperfield. Disponível em RILEY, 1995, p.29.
338 Modelos estudo Poetic Landscape. Atelier Zumthor, disponível
em ZUMTHOR, 2014, 3 v., p.17.
339 Modelos estudo Poetic Landscape. Atelier Zumthor, disponível
em ZUMTHOR, 2014, 3 v., p.18.
341 e 343 Obra Capela Bruder Klaus. Disponível em <http://tectonica-
blog.com/docs/Zumthor.pdf>
344 Cortes do programa exibido pela SWR. Disponível em <https://
www.youtube.com/watch?v=mKdmQSngTUo&t=184s>
347 Imagem interna da Capela Bruder Klaus ainda com os troncos
no concreto. Disponível em ZUMTHOR, 2014, 3 v., p.123.
350 Casa em Chivelstone. Fotografia de Jack Hobhouse.
351 Casa em Chivelstone. Fotografia de John Pawson
352 Imagem eletrônica versão do Museu LACMA. Atelier Zum-
thor, disponível em <https://afasiaarchzine.com/2017/10/pe-
ter-zumthor-51/>
356 Detalhe do Pavilhão EXPO. Disponível em <http://imguramx.
pw/Peter-Zumthor-Swiss-Sound-Box-Swiss-Pavilion-Expo-
-2000-Arch.html>
359 Porta de acesso à casa atelier de Zumthor. Fotografia de
Laura Padgett.
324