ANAIS TRABALHOS COMPLETOS Eixo Cultura Material-V.1
ANAIS TRABALHOS COMPLETOS Eixo Cultura Material-V.1
ANAIS TRABALHOS COMPLETOS Eixo Cultura Material-V.1
ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
EIXO 1
CULTURA MATERIAL
ESCOLAR
ANAIS
ANAIS
DE
DE
TRABALHOS
RESUMO
COMPLETOS
V. 1
ISSN 2358-3959
V.1
ANAIS DE RESUMOOrganizadoras
Elizabeth Figueiredo de Sá
Marijâne Silveira da Silva
Thalita Pavani de Castro
Organizadoras:
Elizabeth Figueiredo Sá
Marijâne Silveira da Silva
Thalita Pavani de Castro
ISSN: 2358-3959
CDU 37(063)
APOIO:
REALIZAÇÃO:
ISSN 2358-3959
ANAIS DE
TRABALHOS
COMPLETOS
EIXO
CULTURA MATERIAL
ESCOLAR
V.1
ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
ISSN 2358-3959
SUMÁRIO
CULTURA MATERIAL ESCOLAR
A DIMENSÃO ESTÉTICA DAS ESCOLAS DO IMPERADOR NA POLÍTICA DE MELHORAMENTOS DA
CIDADE DO RIO DE JANEIRO NO ÚLTIMO QUARTEL DO SÉCULO XIX...................................... 3
LUCIANA DE ALMEIDA SILVEIRA
A DISCIPLINA DE DESENHO NO COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ:
RELAÇÕES ENTRE MATERIALIDADE E CURRÍCULO (1943 A 1949)........................................ 15
CERES LUEHRING MEDEIROS
AS ESCOLAS DO QUILOMBO DE MATA CAVALO: LEGITIMAÇÃO HISTÓRICA E RESISTÊNCIA CULTURAL.32
CRISTIANE CAROLINA DE ALMEIDA SOARES – UFMT
“AOS LEITORES”: O PREFÁCIO DO LIVRO ESCOLAR DE MÚSICA DE ANTONIO RAYOL............ 43
KATHIA SALOMÃO
CÉSAR AUGUSTO CASTRO
COLEÇÃO “O MUNDO DA CRIANÇA”: MATERIALIDADE E CIRCULAÇÃO................................. 55
JULIANA CALIXTO BARTSCH
GIZELE DE SOUZA
DISCURSOS E SENTIDOS QUE CIRCULAM: DICCIONÁRIO UNIVERSAL DE EDUCAÇÃO E ENSINO
COMO SUPORTE DE IDEIAS PEDAGÓGICAS (ANOS FINAIS DO SÉCULO XIX).......................... 69
ANA PAULA DE SOUZA KINCHESCKI
LUIZA PINHEIRO FERBER
VERA LUCIA GASPAR DA SILVA
IMPRESSOS DAS ASSOCIAÇÕES DE PROFESSORES POLONESES PARA AS ESCOLAS ÉTNICAS NO BRASIL:
INVENTÁRIO E CARACTERIZAÇÃO....................................................................................................... 83
CLÁUDIA SEVERO
AMANDA BACKES KAUER
MATERIAIS DE ESCRITURAÇÃO ESCOLAR NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX:
UM MUNDO MATERIAL DO FAZER DOCENTE....................................................................... 96
FRANCIELE F. FRANÇA
GIZELE DE SOUZA
“OBJETOS INDISPENSÁVEIS PARA O ENSINO”: MOBILIÁRIO ESCOLAR CATARINENSE E A
CIRCULAÇÃO DE IDEIAS PEDAGÓGICAS (1851-1889)....................................................... 108
GUSTAVO RUGONI DE SOUSA
O LABORATÓRIO DE FÍSICA E QUÍMICA DA ESCOLA NORMAL DE SÃO PAULO NO FINAL DO
SÉCULO XIX................................................................................................................ 118
MATHEUS LUIZ DE SOUZA CÉFALO
PROJETO ARAUCÁRIA: PRÁTICAS E MATERIALIDADES NARRADAS NOS CADERNOS DE
PROFESSORAS DA DÉCADA DE 1980.............................................................................. 131
ALESSANDRA GIACOMITI
ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
ISSN 2358-3959
1 Parte da historiografia oficial, como o Guia das Escolas do Imperador, publicado pela Prefeitura da Cidade do Rio de Ja-
neiro, e autores como Costa (2012) não consideram a Escola Mista da Imperial Fazenda de Santa Cruz como parte das cha-
madas Escolas do Imperador. Localizada na freguesia rural de Santa Cruz, a escola foi fundada em 1885, sendo custeada
pelo D. Pedro II, com ensino profissionalizante destinado aos filhos dos funcionários da Casa Imperial. Inserida no projeto
civilizatório e projetada por Paula Freitas, a escola atendia aos dispositivos higienistas, visando garantir a adequação dos
espaços de aprendizagem, a salubridade e o acesso à escolarização. Dotado de uma arquitetura monumental o prédio se
destaca na região rural, onde funciona atualmente o Batalhão Escola de Engenharia.
2 São eles: Escola de São Sebastião na Freguesia de Sant›Anna; Escola da Freguesia de São José; Escola da Freguesia de São
Francisco Xavier do Engenho Velho; Escola da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Gávea; Escola da Freguesia de
Nossa Senhora da Glória; Escola de São Cristóvão; Escola da Freguesia de Santa Rita; Escola da Freguesia de Sant›Anna e
Escola Mista da Imperial Fazenda de Santa Cruz.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 10
3 Bethencourt da Silva estudou na Academia Imperial de Belas Artes e foi aluno de Grandjean de Montigny, cujos referen-
ciais arquitetônicos europeus influenciaram diretamente a sua obra. Assumiu o cargo de arquiteto da Câmara Municipal
de 1851 a 1859, sendo responsável por inúmeras obras na cidade, fundou a Sociedade Propagadora das Belas Artes em
1856 e o Liceu de Artes e Ofícios em 1858 (SOBRAL FILHA, 2015).
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 11
2001). Como Schueler, Rizzini e Marques (2015, p. 151) afirmam: “a proposta é inserir
a escola e o processo de escolarização na dimensão da cidade como espaço social
e histórico, por meio da ocupação dos espaços pelas escolas e das escolas pelos
sujeitos: meninos, meninas, homens e mulheres, alunos, professores e professoras”.
Considerações Finais
Pensar nas culturas urbanas e escolares requer considerar novas estéticas do
olhar a cidade em construção a partir da tríade medicina, educação e engenharia.
A organização de um plano geral de melhoramentos da cidade em 1874, para
alargamento e retificação das ruas, visava facilitar o acesso e a circulação na cidade,
aproximando e disciplinando pessoas, informações e lugares, cujos recursos de
análise incluíram a implementação dos sistemas de transporte, a eliminação de
barreiras sociais e físicas e os sistemas de comunicação. Refletindo sobre os projetos
das Escolas do Imperador, localizadas em áreas de fácil acessibilidade em virtude
da disponibilidade de transportes públicos, vias pavimentadas de acesso e espaços
públicos ajardinados, pode-se pensar em um sentido de complementaridade entre
os dois projetos e de estreitamento entre as culturas urbanas e escolares no período.
Recorrendo a Viñao Frago e Escolano (2001), afirma-se que os “palácios escolares”
se destacam pela arquitetura monumental, entendida aqui como um canal de
mediação pedagógica, identidade, expressividade, representatividade, enfim, um
programa de alto potencial educador. Acredita-se que a dimensão estética do prédio
escolar dialogava bem com a arquitetura institucional que o governo imperial atribuía
às instituições públicas, contribuindo para fortalecer as redes de sociabilidade
diante de um possível projeto de escolarização do social, cujas intencionalidades
são sinalizadas a partir dos esforços direcionados para a implantação das Escolas do
Imperador.
Nessa perspectiva, o projeto de expansão da escolarização, com destaque para as
Escolas do Imperador, estaria diretamente relacionado ao projeto de urbanização da
cidade imperial, com destaque para o Plano de Melhoramento da Cidade em 1874.
Perscrutando o processo de escolarização do social, por meio de um conjunto de
dispositivos de poder-saber de natureza educacional, científica e assistencialista,
sob a perspectiva de Foucault (2017), foi possível indiciar a articulação entre as
pretensas melhorias na qualidade do espaço urbano e as necessidades de organizar,
harmonizar e disciplinar os espaços e tempos citadinos no último quartel do século
XIX. Enfim, entrelaçando as culturas escolares e urbanas no período, foi lançado um
convite ao leitor para reflexão acerca da emergência de um olhar estético civilizatório
a partir das Escolas do Imperador no último quartel do século XIX.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 13
Referências Bibliográficas
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LAN-RIO/ZAHAR, 1988.
ABREU JUNIOR, L. de M. Apontamentos para uma metodologia em cultura material escolar.
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(46) jan./abr., 2005, p.145-166.
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dade do Rio de Janeiro entre 1850-1889. Dissertação (Mestrado em História), UNIRIO, Rio
de Janeiro, 2010.
ANDREATTA, V. Cidades quadradas, paraísos circulares: os planos urbanísticos do Rio de
Janeiro no século XIX. Rio de Janeiro: Mauad X, 2006.
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Império. R.J., 1870-1874. Disponível em: <http://www.crl.edu/brazil/ministerial/imperio>.
Acessado em: 10 out. 2019.
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FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 5. ed., 2017.
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Rio de Janeiro: EdUERJ, 2004.
GONDRA, José G. e SCHUELER, Alessandra F. M. de. Educação, poder e sociedade no Impé-
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GUIA DAS ESCOLAS DO IMPERADOR. PCRJ, SME, Centro de Referência da Educação Pública,
2005.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 14
ISSN 2358-3959
A DISCIPLINA DE DESENHO NO
COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ:
RELAÇÕES ENTRE MATERIALIDADE
E CURRÍCULO (1943 A 1949)
Ceres Luehring Medeiros – UFPR
1 A disciplina de Desenho será grafada com letra maiúscula e o desenho como expressão, ou melhor, manifestação de pen-
samento ou sentimento por meio gráfico, com letra minúscula.
2 Para esclarecimento, a instituição teve cinco denominações: Liceu de Curitiba (1846-1875); Instituto Para-
naense (1876-1891); Ginásio Paranaense (1892-1941); Colégio Paranaense (1942) e Colégio Estadual do Paraná
(1943-atual).
3 Termo que atualmente não é mais utilizado. O ensino secundário de maneira geral é o período da vida escolar
que está entre o ensino primário e o superior. “Considerando o percurso legal do ensino secundário no Brasil,
destaca-se como um de seus primeiros marcos a transformação do Seminário de São Joaquim, antigo Semi-
nário dos Órfãos de São Pedro, em um “[...] collegio de instrucção secundária, com a denominação de Collegio
de Pedro II [...]” (BRASIL, 1837), fato ocorrido em 2 de dezembro de 1837. ” (PESSANHA; BRITO, 2014, p. 238).
4 Capanema foi designado pelo presidente Getúlio Vargas para dirigir o Ministério da Educação e Saúde. Nomeado em julho
de 1934, permaneceria no cargo até o fim do Estado Novo, em outubro de 1945.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 17
referência da educação secundária no Paraná, até porque a educação era vista como
um dos alicerces do desenvolvimento.
Manoel Ribas5, queria fazer da construção de um novo prédio para o CEP uma das
obras mais notáveis de sua administração. Não foram poucas as notícias de jornais
e artigos no próprio Jornal dos estudantes do CEP louvando esta construção, que era
uma reinvindicação antiga.
Tem sido desvelado o carinho com que o Sr. Manoel Ribas procura
satisfazer as necessidades do velho Colégio Paranaense. Na sua política
de disseminação intensiva do ensino em nosso Estado são sem conta os
atos em favor do Colégio Estadual do Paraná e o maior de todos os seus
atos neste sentido é indiscutivelmente aquela que vem de se efetivar
com a construção de uma nova sede para o colégio. [...]. Realização que
é, por assim dizer, um prêmio as gloriosas conquistas e ao passado de
glórias de uma casa de ensino que está visceralmente ligada à evolução
social; cultural e política do Paraná. (Jornal. Colégio Estadual do Paraná,
out. 1943).
Straube destaca em que a pedra fundamental foi lançada “no dia 19 de abril
de 1943, data natalícia do presidente Getúlio Vargas”. (STRAUBE, 1993, p. 97). Data
simbólica, que exaltava a relação do Colégio e do próprio Governo Estadual com o
Estado Novo.
O terreno de 43.137,63m2, situado à Av. João Gualberto, abrigaria um prédio
realmente grandioso com salas de 54 m2 e uma estrutura esportiva com ginásio de
esportes, piscina e arquibancadas, “a mais perfeita instalação no gênero, não só
do Paraná, como de todo o sul do país” (O NOVO..., Jornal do Colégio Estadual do
Paraná, junho 1945). A construção demorou seis anos para ser concluída, pois havia
dificuldades financeiras, falta de mão de obra especializada e escassez de materiais
de construção (CASTRO, 2010, p. 249).
A construção de uma nova sede para o Colégio era fundamental para manter a
imagem de ensino de qualidade desta tradicional instituição de ensino secundário.
A Reforma Capanema foi propulsora de importantes mudanças na estrutura do
CEP. No que se refere ao ensino de Desenho, este foi dividido em modalidades. No
ano de 1945, foi publicada a Portaria Ministerial n.º 555, que expediu os programas
de Desenho dando as respectivas instruções. Na referida Portaria Ministerial estavam
indicadas as modalidades de Desenho nas séries do curso ginasial (BRASIL, 1945):
5 Manuel Ribas foi interventor de 1932 a 1935 e de 1937 a 1945 e governador do Estado do Paraná de 1935 a
1937.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 18
CURSO GINASIAL
Modalidades 1.a série 2.a série 3.a série 4.a série
Desenho do Natural X X X X
Desenho Decorativo X X X X
Desenho Geométrico X X
Desenho Geométrico e Projetivo X
CURSO CIENTÍFICO
Desenho do Natural X X X
Desenho Geométrico e Projetivo X X X
Desenho Decorativo X X
Desenho Convencional X X
Desenho Técnico X
A) Desenho do natural
Unidade I
Desenho do natural pela perspectiva de observação.
O mecanismo do globo ocular e o fenômeno da visão.
As deformações aparentes produzidas pelo fenômeno da visão.
A perspectiva como resultante do mecanismo da visão.
Ponto de vista, campo de visão distinta e quadro.
Exercícios de observação e medidas de planos de frente situados a distâncias variáveis para exemplificar o que se con-
sidera distância principal, isto é, a distância do espectador ao quadro e, como consequência, o que se deve considerar
ponto de vista.
FONTE: (BRASIL,1945).
11. Traçado dos triângulos quanto aos ângulos e à natureza dos lados; Linhas de circunferência e circunferência –
circunferências secantes.
12. Traçado dos ângulos quanto à abertura e sentido das aberturas dos lados; Quadriláteros ângulos.
13. Traçado das circunferências e suas linhas; Os três grupos das linhas; Circunferências tangentes.
B) Desenho geométrico
Unidade I
· Traçado das linhas retas, segmentos retilíneos e semi-retas.
· Posições das retas: absolutas e relativas.
· Uso da régua T e traçado das paralelas.
· Uso dos esquadros e traçado das paralelas.
· Uso dos esquadros e traçado das perpendiculares.
· Uso do duplo ou triplo decímetro.
Unidade II
· Traçado das linhas curvas: círculo e arcos de círculo.
· Diâmetro, raio e semi-círculo.
· Uso do transferidor.
· Medidas dos arcos de círculo. Grau e grado.
Unidade III
· Ângulos, leitura, medida a traçados.
· Vértice e lados do ângulo.
· Medida dos ângulos.
· Grandeza dos ângulos agudo, obtuso e reto.
· Traçado do ângulo com o transferidor e com o compasso.
· Traçado dos ângulos adjacentes, complementares e suplementares.
· Soma e subtração de ângulos.
· Divisão de ângulos em partes iguais. Traçado da bissetriz dos ângulos de vértice accessível ou não.
Unidade IV
· Traçado das perpendiculares e paralelas e suas aplicações: o) com o transferidor; b) com os esquadros de 45.°;
c) com os esquadros de 60.°; d) com compasso e esquadros; e) pela translação.
· Aplicações: ordenadas e abcissas. Redes ortogonais para ampliações e reduções.
Unidade V
· Polígonos. Linha poligonal, lados, classificação.
· Triângulo: construção e caracterização dos triângulos equilátero, isósceles e escaleno.
· Traçado de triângulos.
· Quadriláteros: construção e caracterização.
· Traçado do quadrado, do retângulo, do losango, do paralelogramo e do trapézio.
· Traçado das diagonais, mediatrizes e bissetrizes dos ângulos. Polígono de mais de quatro lados.
· Traçado dos polígonos pela inscrição no círculo.
· Ângulos centrais. Construção e caracterização.
· Traçado dos polígonos regulares conhecendo-se o lado.
· Aplicações: figuras semelhantes: Divisões de segmentos retilíneos em partes iguais e proporcionais.
FONTE: (BRASIL,1945).
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 25
Apesar de na 1.ª prova da 1.ª série ginasial haverem muitos conteúdos, segundo
o Programa federal, percebe-se que há uma organização dos conteúdos de Desenho
Geométrico no CEP diferente do referido programa, conforme tabela a seguir. Tem-se
a impressão que os conteúdos de Desenho Geométrico no CEP são mais complexos
dos que os exigidos no programa federal.
3. Desenho de sólidos.
4. Traçado dos triângulos quanto aos ângulos e à natureza dos lados; Linhas de circunferência e circunferência –
circunferências secantes.
5. Traçado dos ângulos quanto à abertura e sentido das aberturas dos lados; Quadriláteros ângulos.
6. Traçado das circunferências e suas linhas; os três grupos das linhas; Circunferências tangentes.
C) Desenho decorativo
Unidade I
· Motivo padrão e orientação. Composição decorativa e sua finalidade.
· Os elementos.
Unidade II
· Sistemas ornamentais.
· Diagrama.
Unidade III
· Emprego das cores em contraste e em harmonia, sob a orientação do professor.
FONTE: (BRASIL,1945).
Ressalta-se que o que é solicitado para a 1.ª prova da 1.ª série do Ginasial no CEP
é bem mais aprofundado que o programa federal estabelece. Na verdade, nesta
primeira prova, está todo o conteúdo do ano, de forma geral, conforme tabela.
QUADRO VIII – CURSOS GINASIAL E COLEGIAL. RELATÓRIO DOS MESES DE ABRIL, MAIO E
JUNHO DE 1947. LISTA DE PONTOS PARA A 1ª PROVA GRÁFICA DE DESENHO DA 1ª SÉRIE,
DO CURSO GINASIAL
5. Entrelaçado mixtilíneo.
1.ª Série
Revisão das principais construções geométricas. Origem e traçado comparativo das cônicas; tangentes. Traçado
das espirais; tangentes. Teoria elementar das projeções. Artifício fundamental das projeções ortogonais. Épura. Re-
presentação projetiva do ponto nos quatro diedros. Classificação das retas do ponto de vista projetivo. Represen-
tação projetiva das retas no primeiro diedro. Traços de retas. Classificação dos planos do ponto de vista projetivo.
Representação projetiva dos planos no primeiro diedro. Verdadeira grandeza de um segmento de reta. Mudança de
planos, rebatimentos e rotações. Cópia de vasos de cerâmica, com representação sucinta das sombras.
FONTE: (BRASIL,1945).
Isso se reflete na lista de pontos 1.ª prova gráfica da 1.ª série do Científico em que
são propostos para prova conteúdos de Desenho Geométrico e Convencional.
10. Traçados dos planos auxiliares de projeções e suas respectivas épuras; traçado gráfico do arco abatido
de 3 centros.
Referências
BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2004.
BRASIL. Decreto-Lei n. 4.244, de 9 de abril de 1942. Lei Orgânica do Ensino Secundário.
Diário Oficial da União - Seção 1 - 10/4/1942, Página 5798 (Publicação Original).
_____. Decreto-Lei n. 4.245, de 9 de abril de 1942. Disposições transitórias para a execução
da lei orgânica do ensino secundário. Diário Oficial da União - Seção 1 - 10/4/1942, Página
5798 (Publicação Original).
_____. Portaria n. 170 de 11 de julho de 1942. Expede os programas das disciplinas do Curso
Ginasial do Ensino Secundário. Diário Oficial de 11 de julho de 1942.
_____. Ministério da Educação e Saúde Pública. Portaria Ministerial n.º 555 de 14 de no-
vembro de 1945. Expede programas de Desenho e respectivas instruções metodológicas e
determina sua execução no curso ginasial do ensino secundário. Diário Oficial da União. Rio
de Janeiro, ano LXXXIV, n.º 263, 22.11.1945, p.17.766-69.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 30
ISSN 2358-3959
Objetivos
Compreender as escolas enquanto espaços de legitimação histórica e resistência
cultural da comunidade quilombola de Mata Cavalo.
Periodização
O presente trabalho trata-se de algumas das dimensões retiradas de pesquisas
que possibilitaram a escrita da dissertação de mestrado, intitulada de “Educação
ambiental na comunidade quilombola de Mata Cavalo: diálogos da arte, cultura e
natureza”, onde o processo investigativo iniciou-se no ano de 2016, concluindo esses
estudos na defesa, que aconteceu em março de 2018, junto ao GPEA-UFMT (Grupo
pesquisador em Educação ambiental, comunicação e arte). Este grupo pesquisador,
há mais de 16 anos, realiza diálogos fecundos junto a essa comunidade, por meio de
pesquisa, extensão e articulação de projetos em educação ambiental.
Ainda que essa pesquisa tenha constituído um retrato temporário desta
comunidade, foi possível dialogar e pesquisar acerca dos mais evidentes aspectos
que envolvem as manifestações culturais, sob o lume da educação ambiental popular.
Sendo assim, os mapeamentos realizados, possivelmente não conseguiram abranger
a totalidade desse quilombo, contudo, permitiram o debate acerca da necessidade de
preservar os hábitos de um povo ancestral, que anseia por visibilidade e legitimação
de seus direitos, bem como a importância da escola enquanto espaço de transmissão
de saberes e articulação política.
Naquela ocasião, a comunidade quilombola de Mata Cavalo foi pesquisada,
desenhada, mapeada (SILVA, 2011) e interpretada por meio da arte-educação-
ambiental (QUADROS, 2011), em busca de fortalecer a relação entre a cultura e a
natureza, de um povo que produz suas táticas de resistência frente a um processo
historicamente excludente, e permanece resistindo, desde os tempos da escravidão,
até os dias atuais. As políticas públicas e os interesses individualistas dos fazendeiros
da região, acabam por sobrepor e cercear os direitos dos moradores originais desse
território (SOARES, 2018).
Foram mapeadas quatro dimensões que estabelecem fecundos diálogos entre
a cultura e a natureza quilombola: os marcos históricos, as expressões artísticas, as
comidas típicas e as festas, como uma das formas de evidenciar as particularidades
desse povo, e suas multiplicidades culturais. Desta forma, buscamos enfatizar os
aspectos que se relacionam com o levantamento epistemológico que constituiu a
referida pesquisa de mestrado, bem como o mapeamento dos marcos históricos,
os quais evidenciaram as formas de resistência desta comunidade, legitimadas em
todos os cantos do quilombo pelos vestígios do tempo da escravidão, e sobretudo
sob a forma de manifestações artísticas e culturais (SOARES, 2018).
Nos espaços escolarizados, finalmente surgiram oportunidades de estudo aos
negros quilombolas, os quais foram historicamente discriminados e marginalizados.
Esses locais tornam-se, sobretudo, terrenos férteis para florescerem as articulações
políticas em defesa dos direitos a esse território ancestral, sob a forma de escolas.
As manifestações da educação popular ainda permanecem por todos os espaços.
Conforme Brandão (1984; 2002) a transmissão de conhecimentos entre as gerações
possibilita a preservação cultural.
Fontes
Para consubstanciar a presente pesquisa, utilizamos livros, dissertações de
mestrado, teses de doutorado, artigos científicos e cartilhas. Foi também estudado
um laudo antropológico da Comunidade Quilombola de Mata Cavalo (BARROS,
2007), onde consta o processo histórico de constituição desse território, o qual está
inserido nas proximidades do município de Nossa Senhora do Livramento, no estado
de Mato Grosso. Atualmente, a referida comunidade encontra-se dividida em seis
associações (figura 01):
Mata Cavalo de Cima, Mata Cavalo de Baixo, Ponte da Estiva, Capim Verde, Mutuca
e Aguassú.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 34
Metodologia
Em conformidade com as fontes de pesquisa supracitadas, constituímo-nos de um
arcabouço metodológico que proporcionou, inicialmente, uma pesquisa bibliográfica
pertinente à temática escolhida. Para orientar os passos investigativos, privilegiamos
o Mapa Social (SILVA, 2011) sendo a metodologia que nos permitiu o mapeamento de
quatro dimensões que entrelaçam a cultura e a natureza de Mata Cavalo: os marcos
históricos, as expressões artísticas, as comidas típicas e as festas. Estes mapeamentos
nos possibilitaram o reconhecimento de uma infinidade de aspectos culturais, bem
como os prejuízos socioambientais que interferem diretamente nos modos de vida
da comunidade (SOARES, 2017), e a demarcação e identificação das escolas por áreas
quilombolas, que são o foco do presente estudo.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 36
Resultados alcançados
Por meio dos estudos, diálogos e vivências em Mata Cavalo, foi possível perceber os
espaços de resistência da comunidade com uma grande importância na organização
e articulação política, onde outras educações também foram constituídas (SENRA,
2009). Desta forma, dirigimos um olhar diferenciado a algumas das escolas,
construídas ao longo dos mais de 140 anos de constituição dessa comunidade
quilombola, enquanto legitimadoras do direito à educação, mas que em muitos
momentos, também sofreu o racismo, de outrora até os dias atuais, cujo permanece
impregnado na região, em um processo excludente (SOARES, 2018).
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 37
(SENRA, 2009). Nesse espaço, apesar da mudança da escola para outro endereço,
ainda prevaleceu a resistência cultural, por meio das reuniões da associação dos
moradores e dos artesãos, para a troca de conhecimentos, resistindo com essas
práticas até os dias atuais. Esse espaço foi desativado para o ensino escolarizado,
contudo, permanece sediando as reuniões da associação Mutuca, uma das seis que
formam esta comunidade, sendo ainda o local de produção de atividades culturais
(festas, feiras, reuniões) e da economia solidária (artesanatos, doces e outros).
Atualmente, a Escola Estadual Tereza Conceição de Arruda é o único espaço de
ensino escolarizado, onde os mais importantes eventos políticos e sociais acontecem.
É local de festas, reuniões da associação de moradores, feiras culturais e eventos
escolares e acadêmicos. Fundada no ano de 2012, recebeu esse nome em homenagem
a uma das mais importantes lideranças no contexto escolar da comunidade. Tereza
foi uma das primeiras professoras quilombolas a atuarem nas escolas locais, tendo
iniciado suas atividades ainda muito jovem, dando aulas no quintal de sua casa, em
princípio, sem nenhuma remuneração (ABREU, 2019). Conforme afirma Manfrinate
(2001), ela foi fundamental na luta pela afirmação de gênero, identidade, conquista
da territorialidade e valorização da cultura quilombola. Infelizmente, faleceu antes
da inauguração da escola, mas deixou seu legado, onde seus familiares estudaram e
trabalharam no passado, e permanecem resistindo (SOARES, 2018).
Nos diálogos estabelecidos acerca da construção coletiva e partilhada dentro
e fora dos espaços escolares, possibilitados nos encontros, por meio da educação
popular (BRANDÃO 1984), consideramos de valor inestimável a manutenção dos
saberes e fazeres desta comunidade. Nesse sentido, sopesamos importante relatar
alguns dos aspectos da cultura popular, os quais foram identificados e mapeados,
conforme as autonarrativas originadas durante os muitos momentos, em especial na
oficina de mapeamento social da cultura quilombola de Mata Cavalo.
Os mapas sociais da cultura quilombola, elaborados e inspirados nas narrativas
da comunidade, enfatizam a importância da conservação e da manutenção cultural.
No mapa dos marcos históricos (figura 2), há que se observar uma infinidade de
vestígios materiais dos tempos árduos da escravidão, sendo um dos aspectos
mais lembrados e considerados por seu imenso valor histórico, pois evidenciam as
dolorosas recordações do sofrimento nos locais de tortura, trabalho forçado, e as
piores condições de sobrevivência.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 39
Figura 02 – Mapa Social da Cultura Quilombola de Mata Cavalo – Mato Grosso, 2017.
Referências
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ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
ISSN 2358-3959
Introdução
Os livros escolares de música são amplamente divulgados e utilizados no
ensino dessa arte no Brasil, tendo predominado, do período colonial até o início
da República, e principalmente no Império, a literatura europeia, em especial a
portuguesa e a francesa. No entanto, os músicos brasileiros já divulgavam seus
trabalhos, e juntamente com as publicações dos estrangeiros compunham o cenário
do ensino musical no país. Nesse contexto, foi produzido em 1902 um compendio
intitulado Noções de musica: extrahidas dos melhores auctores, por Antonio dos Reis
Rayol, renomado músico do Maranhão que exercia atividades educacionais tanto
em aulas particulares quanto em escolas de São Luís. Seu livro foi elaborado com o
objetivo de atender às necessidades dos seus alunos da Escola Normal e da Escola
de Música no Maranhão, abordando em seus conteúdos temas teóricos, como a
grafia tradicional, que auxiliavam na execução e interpretação musical. Exemplares
desse livro encontram-se no Acervo de Obras Raras da Biblioteca Pública Benedito
Leite e no Acervo da Academia Maranhense de Letras.
Bittencourt (2008, p. 190) afirma que as mudanças ocorridas durante o século
XIX transformaram o livro escolar em uma ferramenta que não poderia faltar nas
aulas, e as melhoras alcançadas na sua fabricação, o aumento do consumo pelos
alunos e uma formação dos professores, ainda precária, “fizeram do livro didático
um dos símbolos da cultura escolar, um depositário do saber a ser ensinado”.
Esses impressos da cultura material escolar são formados, em geral, de texto –
que contém os conteúdos específicos da disciplina em questão, e de paratexto -
composto por vários elementos, como a capa, o prefácio, as notas de rodapé, o
apêndice, trazendo diversas informações a respeito da obra e do contexto em que
ela se insere. Nos livros escolares esses elementos podem informar a maneira como
os mesmos deveriam ser utilizados em sala de aula, os conteúdos, as concepções
filosóficas e pedagógicas do autor e do contexto ao qual faz parte. Quando constrói
os paratextos, em especial o prefácio, o escritor tem a oportunidade de ter um
Delineando os paratextos
Paratexto, termo originário dos estudos de Genette (2018, p. 9), crítico e teórico
da literatura, é composto de diversos elementos que, segundo esse autor, servem de
reforço e acompanhamento ao texto de uma obra, tendo a função de apresenta-lo
“no sentido habitual do verbo, mas também em seu sentido mais forte: [...] torná-
lo presente, [...] garantir sua presença no mundo, sua “recepção” e seu consumo,
sob a forma, pelo menos hoje, de um livro”. Os elementos paratextuais são divididos
por Genette (2018) em peritextos, aqueles internos ao impresso circundando o
texto, como a folha de rosto, a instância prefacial, a dedicatória, e em epitextos, os
que são externos como as conversas e as entrevistas sobre a obra. O autor utiliza
o termo instância prefacial em vez de prefácio, pois esse tem uma lista longa “[...]
de parassinônimos [...]: introdução, prefácio, nota, notícia, aviso, apresentação,
exame, preâmbulo, advertência, prelúdio, discurso preliminar, exórdio, proêmio [...]”
(GENETTE, 2018, p. 145).
Antes de analisarmos a instancia prefacial de Noções de musica faremos uma
breve apresentação dos outros paratextos que compõe essa obra. A capa do livro,
que seria o primeiro na lista desses elementos, nesse caso específico não existe,
pois os exemplares encontrados não possuem a capa original que possivelmente
foi extraviada. Em seguida aparecem as folhas de guarda, sendo uma em branco e
a outra com uma vinheta, um desenho em forma estilizada semelhante a uma hera
ou uma videira que pode ter ligação com o assunto tratado no texto. Na folha de
rosto temos o título e o subtítulo do livro, além do nome do autor e sua identificação
profissional, e no final da página as informações tipográficas com o local e a data
da impressão. Intitulando sua obra de Noções de musica, o autor traz ao leitor de
forma curta e concisa qual a proposta do seu livro, dando a entender que pretende
abordar conhecimentos de música de maneira básica, pois “há títulos literais,
que designam, sem rodeio e sem alusão, o tema ou o objeto central da obra [...]”
(GENETTE, 2018, p. 78).
O subtítulo Extrahidas dos melhores auctores esclarece que Rayol se baseou
em outros autores da área para elaborar seu material, e ao incluir que seu
embasamento teórico foi com “os melhores auctores”, conforme seu juízo de
valor, provavelmente queria que se aumentasse a credibilidade quanto à sua obra.
Chegando ao lugar do nome do autor na folha de rosto, encontramos a abreviação
de Antonio dos Reis Rayol para Antonio Rayol. Maranhense, nascido na década de
1860, era tenor lírico, compositor, regente e violinista, e uma figura influente no
meio artístico, cultural e educacional do Maranhão. Rayol atuou como docente nas
instituições maranhenses, Casa dos Educandos e Artífices, Liceu e Escola Normal,
e ocupou o cargo de diretor da Aula Noturna de Música e da Escola de Música. Em
outros estados foi professor da Escola de Música da Bahia e da Academia Livre de
Música no Rio de Janeiro. Ganhou uma bolsa de estudos para a Itália, e em sua
estada na Europa, compôs e regeu, dentre outras obras musicais, a Missa Solene,
que se tornou a mais famosa de sua carreira. Portanto, seu nome era reconhecido,
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 46
7 Rayol foi diretor da Aula Noturna de Música em São Luís no ano de 1900, uma instituição pública com poucos recursos
frente ao que ele almejava por isso fez esse pedido ao governador. A Aula Noturna foi precursora da Escola de Música. Para
mais esclarecimentos a respeito da história dessas duas instituições ver Salomão (2016).
8 Maiores informações sobre a Escola Normal encontram-se em Castellanos (2010) e Motta e Nunes (2008).
9 Prática de entoar as notas na altura e na duração escritas na grafia musical.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 47
Rayol também utilizou nessa parte do seu texto prefacial figuras mitológicas
ligadas à música, como Orfeu, cuja voz e lira encantavam rochedos, árvores e
animais, e Anphion, que ao edificar a muralha de Thebas movia com o som de sua
lira as pedras até o seu lugar na construção (PHILIP, 2008; BULFINCH, 2001), porque
acreditava que o homem civilizado, acostumado a ouvir música, corria o risco de
tornar-se indiferente aos efeitos da melodia e da harmonia, surgindo então, como
artifício indutivo, alegorias mitológicas engrandecendo o poder dessa arte, bem
como sua capacidade divinal de despertar sensibilidade até mesmo no “selvagem”.
Visualiza-se novamente um Rayol de postura romântica ao acreditar na música
como uma oportunidade de elevação dos sentimentos nos seres humanos. Conforme
Gomes (2004), não se deve buscar esse fato, nesse caso do poder da música, como
uma verdade a ser comprovada, mas como algo que o autor vê, sente e defende.
“Um exercício de liberdade”, como cita Henrique (2009, p. 59), ou um discurso da
sociedade? No primeiro capítulo de Noções de musica, o autor emite mais uma
opinião sobre o efeito da música junto às pessoas, seu efeito civilizatório:
10 Essas duas tendências tinham com seus principais representantes Hanslick, denominado de formalista e defensor da
música absoluta, e Wagner na estética do sentimento (FONTERRADA, 2005).
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 49
Não é só o homem civilisado que ella domina por seus efeitos admiráveis;
ate o proprio selvagem para quem a sciência e as outras artes não teem
encantos, sente-se animado por ella – a musica adoça-lhe os costumes
e modifica os seus mais bárbaros instinctos. [...] hoje é [...] empregada
como um poderoso meio de moralidade na educação da mocidade
(RAYOL, 1902, p. 11, 14).
Considerações finais
Na historiografia consultada sobre o assunto pôde-se observar que a maioria
dos prefaciadores, autorais ou alógrafos, se preocupavam mais em falar sobre o
autor, sobre a obra, sobre o diferencial do livro em meio ao seu contexto, sobre
como os professores deveriam usá-lo. Genette (2018, p. 186) ressalta que há o
interesse de informar “sobre a maneira pela qual o autor quer ser lido”. O que Rayol
priorizou para informar aos seus leitores? Em sua instancia prefacial ele escreveu
um discurso: apresentando sua motivação pessoal para publicar um livro e os
anseios quanto aos alunos de aproveitarem essa obra; defendendo a relevância
da música; discorrendo a respeito dos efeitos que essa arte exerce sobre o homem
e de como seu ensino pode colaborar para a organização moral dos homens;
ressaltando a necessidade de que os alunos não executassem a música de forma
mecânica, somente racional, mas com expressividade para que a interpretação
musical se fizesse estimar junto ao público.
Em meio a esse discurso mais intelectual também reconheceu as limitações de
sua obra, em especial por dificuldades tipográficas, e a necessidade de ter buscado
embasamento teórico em outros autores. Em meio a uma diversidade de assuntos
existentes no meio musical, Rayol expôs as suas concepções, e ao selecionar o que
lhe agradava defendendo essa escolha, acreditamos que deixou ao mesmo tempo
uma imagem de si. Uma imagem que representa um músico e professor adepto
do período romântico, com postura modesta ao expor a necessidade de apoiar-se
no trabalho de outros teóricos, mas ao mesmo tempo posicionando-se de forma
crítica ao defender suas convicções musicais e sociais.
Baseados nos estudos de Chartier (1990, p. 127), para o qual “não existe
nenhum texto fora do suporte que o dá a ler” e não há entendimento de qualquer
texto que seja “que não dependa das formas através dos quais ele chega ao seu
leitor”, analisamos neste trabalho a materialidade de “Aos Leitores”, observando
a forma e a estrutura do texto, assim como os dispositivos que o permitiram se
dar a ler. Para esse autor, existem “[...] dois tipos de dispositivo: os que decorrem
do estabelecimento do texto, das estratégias de escrita, das intenções do ‘autor’
[...]”, que nos permitiram entender as concepções salientadas por Rayol, e “os
dispositivos que resultam da passagem a livro ou impresso, produzidos pela
decisão editorial ou pelo trabalho da oficina [...]”, ou seja, no caso de Rayol as
características tipográficas do objeto, como o uso de letras grandes e de poucos
parágrafos por página facilitando assim a leitura, embora o seu livro tivesse sido
elaborado para alunos em nível profissionalizante.
Ainda nos apoiamos em Chartier (1990) ao tratarmos das práticas dos sujeitos
e das múltiplas relações existentes considerando para tanto o conceito de
apropriação, uma vez que esse realça “[...] a maneira contrastante como os grupos
ou indivíduos fazem uso dos motivos ou das formas que partilham com os outros”
(NUNES E CARVALHO, 2005, p. 49, 53). Rayol (1902, p. 8) explicitou em seu prefácio
que se sentiria feliz se os conteúdos de seu livro, produzissem em seus alunos
“as mesmas sensações” que nele haviam sido produzidas. Nessa “declaração de
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 52
intenção” do autor, termo denominado por Genette (2018) como uma função do
prefácio, Rayol deixa implícito o discurso que fez sobre a relevância da música
para os sentimentos do homem, desejando que seus discípulos disso também se
apropriassem. Como realmente efetivou-se essa apropriação em seus leitores?
Evidenciou-se aqui o que de sua imagem Rayol, por meio de suas concepções,
pode projetar para fora do seu livro e o que de fora dele, como sujeito do seu
tempo, ele pode projetar para dentro desse impresso. Chartier (2014, p. 256, 257)
chama a atenção para a necessidade de se trabalhar com os materiais paratextuais
observando as múltiplas relações que os ligam, tanto “dentro do livro” quanto
“entre livros”, colocando-se “mais ênfase nas relações do que em taxonomias, e mais
em contextualizações dinâmicas do que em tabelas de classificação”, respeitando
a “historicidade própria” de cada material. Como se deu a apropriação de Rayol
quanto aos textos prefaciais e aos conteúdos musicais presentes nas obras dos
autores em que se baseou teoricamente? Essas indagações permanecem ao final
deste trabalho, sugerindo continuação da pesquisa.
A relevância de Rayol no cenário musical, principalmente no maranhense,
percebida na memória resguardada desse músico e professor, por meio de suas
composições ainda hoje executadas, dos registros de sua vida profissional, social
e pessoal na imprensa de seu tempo, do seu livro, em especial seu prefácio,
colaboraram e colaboram até hoje para a construção de sua legitimidade, um
sujeito do seu tempo e da atualidade. Conforme Gomes (2004, p.13), na cultura
da sociedade individualista “importa aos indivíduos [modernos] sobreviver na
memória dos outros, pois a vida individual tem valor e autonomia em relação ao
todo”. Dessa forma, uma das contribuições desta pesquisa é ampliar e aprofundar
os estudos sobre a história da educação, e nesse caso, notadamente as pesquisas
sobre cultura material relacionada à música e seu ensino.
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XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 54
ISSN 2358-3959
RESUMO
O presente estudo, em andamento, se propõe a examinar dimensões acerca da
materialidade e circulação da Coleção “O Mundo da Criança”, publicada em 1934
na cidade de Chicago, com o título de “Childcraft”. A partir de 1954, a coleção ganha
proporções internacionais sendo publicada além do inglês, em espanhol, italiano
e português. Traduzida e adaptada, a coleção é publicada em sua versão brasileira
pela Editora Delta em 1959, no Rio de Janeiro. A publicação brasileira tem estrutura
semelhante a original, é impressa em capa dura vermelha, com ilustrações coloridas
impressas sobre o couro vermelho na capa. O papel e tamanho dos livros também
se assemelham às edições norte-americanas, porém o conteúdo sofreu adaptações
e traduções em relação ao original. Diante do exposto, a proposta aqui firmada é
de trabalhar a Coleção “O Mundo da Criança” como fonte e objeto, realizar em um
primeiro momento uma breve análise partindo da materialidade da forma e conteúdo
dos livros, bem como acerca da perspectiva de circulação da obra. Em função
dos objetivos indicados anteriormente, este trabalho tem como fontes empíricas
os próprios volumes da Coleção “O Mundo da Criança” a fim de discutir aspectos
acerca da sua materialidade, bem como algumas matérias e anúncios de jornais,
no intuito de localizar e analisar dimensões e estratégias de publicação e circulação
da coleção. Como aporte teórico, o conceito de representação de Roger Chartier
(1988) é de extrema relevância para a análise das proposições acerca da infância e
de sua materialidade. O trabalho também se apoia nas contribuições de Michel de
1 Possui graduação em Artes Visuais pela Universidade Federal do Paraná e em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Ca-
tólica do Paraná. Pós-graduada em Psicopedagogia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Atualmente é aluna
de Mestrado em História e Historiografia da Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal do Paraná. – julianacalixtob@yahoo.com.br
2 Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal do Paraná. Mestre e Doutora em Educação pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, tendo seus estudos fundados na linha de História, Política, Sociedade, com Estágio
de Doutoramento Bolsa Sanduíche/Capes em História da Infância na Università Degli Studi di Pavia. Pós-Doutora pela
Università degli Studi di Firenze, com bolsa Sênior/CAPES. Atualmente atua como professora na Universidade Federal do
Paraná no setor de educação e pós graduação. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em História da Educa-
ção, História da Infância e Educação Infantil. – gizelesouza@uol.com.br
Certeau (1982) sobre o ofício da história e da escrita do historiador, bem como outras
referências acerca da produção sobre cultura material e sobre impressos.
Palavras-chave: Coleção “O Mundo da Criança”, materialidade, circulação
1. INTRODUÇÃO
Este artigo apresenta discussões acerca da materialidade e circulação da
Coleção “O Mundo da Criança”, publicada em 1934 na cidade de Chicago, com o
título de “Childcraft”. Sendo fonte e objeto de análise deste trabalho, a Coleção,
trata-se de uma enciclopédia3 infantil de quinze volumes, publicada por diferentes
editoras, sofrendo alterações em relação à materialidade e conteúdo diante de cada
publicação. Segundo as fontes consultadas até o momento, a referida Coleção teve
suas primeiras edições internacionais nos anos de 1949 e 1954, sendo impressa, além
do inglês, em línguas como o português, espanhol e italiano.
A coleção aqui em destaque chega ao Brasil em 1959, publicada pela Editora
Delta com o título de “O Mundo da Criança”. Com estrutura semelhante a original,
o conjunto de livros é impresso em quinze volumes em capa dura vermelha, com
ilustrações coloridas impressas sobre o couro vermelho na capa, conforme Figura 1.
3 De acordo com o Dicionário Latino-Português (1953), entende-se por enciclopédia um agregado de todas as ciências.
Sendo assim, a Coleção “O Mundo da Criança” era considerada uma enciclopédia infantil, por trazer informações para
crianças, pais e professores, abordando diferentes áreas do conhecimento, tais como: literatura, ciência, história, geogra-
fia, arte e música.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 57
Chartier (2001), portanto considera que a história da literatura e crítica literária deve
ser feita não apenas por meio da leitura do texto, como também sua materialidade
e contexto. De acordo com Agustin Escolano Benito (2018, p. 109), a relação entre
materialidade e contexto faz parte da busca dos historiadores. Conforme Benito
(2018) ao utilizar fontes pertencentes à cultura material, os historiadores se atentam
às relações entre os objetos produzidos, seu contexto de produção e uso.
Este trabalho também se apoia nas contribuições de Michel de Certeau sobre o
ofício da história e da escrita do historiador. Conforme Certeau (1982) “Toda pesquisa
histórica e historiográfica se articula com um lugar de produção sócio-econômico,
político e cultural” (CERTEAU, 1982, p. 56). Neste sentido, a perspectiva teórica de
‘lugar’ também nos auxilia na compreensão do “lócus” no qual a coleção é publicada
e as condições desta publicação em termos de táticas e estratégias.
Por conseguinte, com o fim de alcançar os objetivos aqui mencionados, este artigo
está organizado de maneira em que em um primeiro momento irá discutir a origem e
circulação da coleção “O Mundo da Criança”. Posteriormente serão apresentadas as
condições estruturais, materiais e estéticas do conjunto de livros.
4 May Hill Arbuthnot foi uma professora, editora, crítica e consultora em educação. Tendo seus estudos voltados à educa-
ção infantil, apresentava debates a respeito do jardim de infância e ensino por meio da literatura. Arbuthnot também foi
reconhecida por seu trabalho voltado à formação educacional para pais, sendo convidada a participar de conferências na
Casa Branca a respeito da infância (MCQUEEN, 2015).
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Fonte: MC QUEEN, Sharon A Permanent and Significant contribution the life of My Hill Arbuthnot, Association for
Library Service to Children, summer 2015
Contando com mais de três mil participantes e sendo transmitida para a população
via rádio, a conferência discutiu um projeto de modernidade, visando a infância por
meio de um olhar científico e de circulação de ideias (RODRIGUES, 2015, p.161-168).
Interessante salientar que na conferência realizada em 1930, havia sido convidada
a editora da coleção de livros “The Child’s Tressury”, que embasou a criação da
coleção de “O Mundo da Criança”. De acordo com Mc Queen (2015), o convite chegou
a May Hill como forma de reconhecimento de seu trabalho realizado a respeito da
infância, principalmente voltada à formação de pais.
Joyce de Fátima Morais (2019), afirma em seus estudos que as Conferências
realizadas na Casa Branca a respeito da infância, aconteciam de dez em dez anos,
levantando debates sobre o bem-estar e desenvolvimento infantil. Essas reuniões
contaram com a participação de representantes de diversas regiões do mundo, que
depositavam na infância a perspectiva de um futuro melhor. Ainda de acordo com
Morais (2019), a coleção de livros “Childcraft” tratava-se de uma resposta a todos
esses conceitos debatidos a respeito da infância.
Em 1950, portanto, realizou-se uma nova conferência na Casa Branca com o
propósito de se discutir a saúde e futuro da infância. Os debates estavam centralizados
na criação de uma personalidade sadia para as crianças, trazendo a família como
peça fundamental para essa construção. Essa convenção contou com integrantes de
todo o mundo e com a presença de 500 adolescentes. (O MUNDO DA CRIANÇA, vol.
15, p 159-163)
Se atentando aos objetivos estipulados pelo congresso norte-americano, após
a conferência sobre a infância em 1950, a coleção “Childcraft” é reformulada em
1954 trazendo sugestões de leitura para crianças e pais em prol da construção de
uma personalidade sadia. Tendo estrutura semelhante às primeiras edições, a
reformulação mantém o número de exemplares em capa alaranjada, com ilustrações
em branco, azul e preto. Suas principais mudanças são em relação ao conteúdo.
Os títulos são modificados e as ilustrações ganham maior intensidade nas cores. O
décimo e décimo primeiro volume, são maiores, por tratarem de assuntos destinados
à Arte.
Analisando o volume três da coleção “Chidcraft” de 1935, comparando com a
versão de 1954, percebe-se que as mudanças já iniciam na edição do livro, visto que
foram impressos por editoras diferentes. O título sofre modificações; àquele que
antes era nomeado de “Story of life and lands”, passa a ser chamado de “Folk and
Fairy Tales”.
A reformulação ocorrida acarretou na publicação em proporções internacionais,
sendo publicada além do inglês, em línguas como português, espanhol e italiano.
A versão em português chega ao Brasil em 1959, pela Editora Delta, também
responsável por publicações de outras enciclopédias. Recebendo o título de “O
Mundo da Criança”, é divulgada por meio de anúncios e propagandas de jornais e
revistas.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 61
Fonte: Imagem da versão norte-americana disponível online na Biblioteca do congresso Norte Americano e fotografias da
versão brasileira de acervo pessoal da autora
outros foram colocados por fazerem parte da cultura brasileira. Ao fazer uma análise
dos nomes dos autores que participaram de “O Mundo da Criança”, percebemos que
ela é composta por autores estrangeiros em sua maioria. Porém, também há uma
participação de escritores brasileiros, como é o caso de Olavo Bilac, Casimiro de
Abreu, Castro Alves, Euclides da Cunha, entre outros nomes.
Tratam-se de quinze livros de aproximadamente 25 cm x 18 cm, em capa dura
vermelha, em sua maioria com duzentas a trezentas páginas. Divididos em capítulos,
cada volume possui uma temática central como poemas, contos infantis, história do
Brasil e do mundo, ciência, artes visuais, música e desenvolvimento infantil. Dentro
de cada tema central, são discutidos diferentes assuntos, que vão se repetindo no
decorrer dos outros volumes.
ORGANIZAÇÃO
FAIXA-ETÁRIA TEMAS ABORDADOS ORGANIZAÇÃO TEXTUAL
ESTÉTICA
FONTE- Quadro elaborado pela autora a partir do quadro explicativo do Volume 15 da coleção “O Mundo da Criança”
Diante do Quadro 2 é possível inferir que a coleção era destinada à crianças de três
a doze anos. Às mais pequenas eram sugeridas leituras com textos menores e mais
lúdicos, com um número maior de ilustrações. Já às crianças maiores eram propostas
leituras mais densas, com vocabulário amplo e variado. É possível identificar também
que o espaçamento do corpo do texto se torna mais reduzido com o avançar dos
volumes, tendo nos livros finais disposição textual em colunas. Tal estratégia pode
ter sido realizada pelos editores, a fim de dinamizar melhor o espaço da folha de
acordo com os textos que a cada livro tornavam-se maiores.
Referente às imagens, a coleção constitui-se por ilustrações coloridas e
monocromáticas, que dialogam com o texto, ocupando espaço significativo nas
páginas do livro. Em relação a estrutura da versão de 1959 e ao uso das ilustrações no
decorrer dos volumes da coleção, percebe-se que até o sexto livro, há um predomínio
das ilustrações. A partir do sétimo, no entanto, começam a serem utilizadas também
fotografias para articular com os textos. Essa escolha pode estar relacionada à divisão
etária realizada, que previa um número mais baixo de ilustrações acompanhando os
textos para crianças de idade mais elevada.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 65
Volume 1 141 -
Volume 2 143 -
Volume 3 150 -
Volume 4 170 -
Volume 5 150 -
Volume 6 142 -
Volume 7 25 295
Volume 8 261 98
Volume 10 1 234
Volume 11 89 87
Volume 12 54 191
Volume 13 85 209
Volume 14 31 106
Volume 15 56 88
3.CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como resultado é possível inferir que as novas percepções a respeito da infância
a partir do final do século XIX e início do século XX, foram propulsoras de eventos
e publicações que promovessem representações de infância e criança vistas como
futuro e progresso da nação. Uma das publicações que sofreu modificações devido
aos novos olhares e percepções a respeito da infância foi a coleção “O Mundo da
Criança”.
Ao estudar a trajetória da coleção desde sua primeira edição norte-americana
até suas publicações em âmbito internacional, percebe-se que não se trata de uma
publicação neutra. É perceptível os ideais e representações de modelos de infância e
criança ,em busca de uma construção de uma personalidade fundada na educação
pela família. A própria reformulação dos livros após a Convenção da Casa Branca a
respeito da infância em 1950, é uma afirmativa dessa intencionalidade dos criadores
e idealizadores de “O Mundo da Criança”. Nos próprios volumes é afirmado que a
escolha dos conteúdos foi um resultado dos objetivos estipulados pelo congresso
norte-americano, após a conferência à respeito da infância da Casa Branca em 1950.
Consequentemente, a organização dos textos e imagens tem a finalidade de
transmitir valores que contribuam para a formação de uma personalidade, que
de acordo com os ideais estabelecidos pelo evento de 1950, eram ideais para a
infância. Por meio da análise dessa organização são identificadas representações de
uma infância ideal, fundada por meio da construção da personalidade. É visível a
importância da materialidade para entender os processos e representações, sejam
eles de infância, educação ou família.
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FONTES
Coleções:
CAVANAH. F., MOORE. N. E., WEIB. R.C. O mundo da Criança. Rio de Janeiro: Delta, 1949. 15 v.
Childcraft: Story of life and lands. Chicago: W.F. Quarrie & Company, 1935. Vol.3
OSBORN. Ernest G. Childcraft: Folk and Fairy Tales. Chicago: Field Interprises, 1949. Vol. 3.
Disponível em < https://archive.org/details/childcraftfolkfa03fiel>Acesso em 06 de janeiro
de 2020.
HILL. May The Child’s Tressury: The fundation Library. Chicago: Quarrie Corporation, 1923.
Disponível em < https://archive.org/details/childstreasury00hill/page/n185 > Acesso em 06
de janeiro de 2020
Jornais e revistas
Alterosa. O mundo da Criança. Minas Gerais, ed. 00347, novembro de 1961. p. 66.
Association for Library Service to Children, MCQUEEN, Sharon A Permanent and Significant
contribution the life of My Hill Arbuthnot, summer 2015 . Disponível em <https://www.jour-
nals.ala.org/index.php/cal/article/view/5694/7075> Acesso em 13 de janeiro de 2020.
Correio do Paraná. Mundo da criança desapareceu acusado funcionário do expresso,
ed.00386, 01 de setembro de 1960, p.12
O Dia. Clube Curitibano. Curitiba, ed.11725, 30 de abril de 961.
Realidade. O gosto pela leitura começa muito antes de a criança aprender a ler. A você, que
acha importante despertar no seu filho o gôsto pelos bons livros, vamos falar sobre “O Mun-
do da Criança”, ed. 0006, setembro de 1966, p. 9
Dicionários:
JUNIOR. José Cretella, CINTRA. Geraldo de Ulhôa Dicionário Latino-Português. 3ª edição.
São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1953.
REFERÊNCIAS
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posições Universias. SILVA. Vera Lúcia Gaspar da, SOUZA. Gizele de, CASTRO. César Augus-
to. Cultura Material Escolar em Perspectiva Histórica: Escritas e Possibilidades. Vitória:
EDUFES, 2018. p. 93-118.
BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. Tradução Vera Maria Xavier dos San-
tos. Bauru, SP: EDUSC, 2004.
CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Tradução de Maria de Lourdes Menezes, revisão
de Arno Vogel. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1982.
CHARTIER. Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Trad.Maria Manue-
la Galhardo. Lisboa: Difusão Editorial, 1988.
______Cultura escrita, literatura e história: conversas de Roger Chartier com Carlos Aguirre
Anaya, Jesús Anaya Rosique, Daniel Goldin e Antônio Saborit. Porto Alegre: ARTMED, 2001.
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LUCA, Tania Regina de. Leitura, Projetos e Revistas do Brasil 1916-1944. São Paulo: Editora
UNESP, 2011.
MORAIS. Joyce de Fátima. O Mundo da Criança: prescrições para os bons modos do infante
(1954 - 1959). Dissertação (Mestrado em Educação), Centro de Ciências Humanas, Letras e
Artes, Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2019.
RAGAZZINI, Dario. Para quem e o que testemunham as fontes da História da Educação? Ed-
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Curitiba, Editora da UFPR, nr.18, 2001, p.13-28. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.
php?pid=S0104-40602001000200003&script=sci_abstract&tlng=pt
RODRIGUES, Ana Júlia Lucht. ”Getting te world out”: congressos internacionais e a conferên-
cia da casa branca de proteção à criança de 1930. Franciele Ferreira; SILVA, Carolina Ribeiro
Cardoso de; SACRAMENTO, Cristina Carla. História da Educação, Infância e Cultura Materi-
al: os estudos produzidos pelos grupos de pesquisa da UDESC, UFPR, Unicamp. Florianóp-
olis: UDESC, 2015, p. 161 - 170. Disponível em <https://issuu.com/coloquio2015-ufprudescu-
nicamp/docs/ebook_historia_da_educacao_infanci> Acesso em dezembro de 2019.
ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
ISSN 2358-3959
no que diz respeito a sua composição material e a relação desta com os processos
de inovação tecnológica” (GASPAR DA SILVA, 2017, p. 14), além de colaborar com
a construção de entendimentos sobre a história da escola primária. Para tanto, a
delimitação temporal dos estudos concentra-se entre os anos finais do século XIX e
início do século XX.
A proposta acompanha reflexões inscritas em trabalhos de António Nóvoa e
Jürgen Schriewer, com especial destaque aqui para as registradas no livro A difusão
mundial da escola (Lisboa: Educa e Autores, 2010). Conforme advogam estes autores,
a circulação de ideias pedagógicas está relacionada à difusão mundial de um modelo
de escola, que se irradia de diferentes formas e sofre adaptações regionais e locais,
atendendo a diferentes interesses e projetos sócio-políticos. Entre as formas de
difusão está a imprensa pedagógica, com seus livros, revistas, dicionários e outros
modos de circulação impressa. Como inicialmente anunciado, neste trabalho nos
dedicamos ao estudo de conteúdos extraídos de um dicionário de educação de
grande circulação, percebendo este como um dispositivo propagador de conteúdos
e conceitos.
Entendemos que os Dicionários de educação não podem ser estudados por si só,
é preciso levar em consideração o contexto histórico e social em que estão inseridos
e os personagens que os utilizaram, para assim, tentar entender o papel deste objeto
em determinados espaços, bem como seus usos por diferentes sujeitos. Contudo,
nem sempre é possível recompor esta “rota”, mas a presença destes em acervos e
em bibliotecas pedagógicas atestam certa participação na construção de discursos e
projetos de escolarização.
Considerando essas características, a metodologia de pesquisa utilizada consistiu,
primeiramente, na identificação de dicionários pedagógicos6 com “participação” na
composição de discursos que apoiam os projetos de escolarização nos anos finais
de século XIX e anos iniciais do século XX, bem como, a localização de diferentes
edições7. Inicialmente esse movimento foi realizado em bases de dados online de
Bibliotecas e, posteriormente, em incursões em sebos para localizar as fontes em sua
versão impressa. Deste rastreamento foram localizados em formato digital: a versão
em francês e os volumes 1 e 2 da versão do ano de 1873, de Portugal. Os três volumes
do ano de 1886 foram encontrados e adquiridos em versão impressa.
Essa etapa do trabalho, somada a leitura de bibliografias que auxiliem na
compreensão sobre esse formato de fonte, confirmaram a circulação desses
impressos pela presença em acervos de Bibliotecas de diferentes países, como França,
Canadá, Portugal e Brasil. Thabatha Aline Trevisan e Bárbara Cortella Pereira (2013),
no trabalho intitulado Leituras recomendadas para as Escolas Normais no Brasil e na
6 A localização dos Dicionários Pedagógicos foi realizada por Ana Paula de Souza Kinchescki para a elaboração da pesquisa
de doutorado em andamento, intitulada provisoriamente de Instrumentos e acessórios de escrita: registros da constru-
ção de uma ‘necessidade universal” na escolarização da infância (Segunda metade do século XIX), orientada pela Profes-
sora Dra. Vera Lucia Gaspar da Silva (PPGE/UDESC).
7 Como exemplos, pode-se citar os dois volumes do Diccionaire de Pédagogie et d’Instruction Primaire, organizados por
Ferdinand Buisson e publicados em 1887 e 1888, assim como a versão revista e ampliada, publicada em 1911. Além destes
dicionários, também destacamos o Diccionario de Educacion y métodos de enseñanza, escrito por Mariano Carderera e
publicado em quatro tomos, respectivamente nos anos 1854, 1855, 1856 e 1858.
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8 Apesar de a publicação indicar que os verbetes foram escritos por Émile M. Campagne, com a colaboração de outros
autores, não há no decorrer de nenhuma das versões do dicionário (tanto na francesa quanto nas duas traduções portu-
guesas) a indicação dos responsáveis pela escrita de cada uma das definições. Sendo assim, neste trabalho optamos por
referenciar o autor Émile Mathieu Campagne ao citarmos algum trecho disponível na obra.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 72
[...] além da utilidade geral que tem para todos os que quizerem instruir-
se, por constituir uma verdadeira encyclopedia, onde são expostos, com
a maior clareza, todos os ramos do saber humano, vem sobretudo
prestar um valioso auxilio aos paes e professores, na importantissima
obra da educação das novas gerações, e tem, por isso, já o seu lugar
marcado nas bibliothecas escolares, cuja importancia deve ter sido
justamente apreciada pelas illustradas juntas de parochia (CAMPAGNE,
1886a, p. VI).
Ajustamos nossas lentes para os verbetes que entendemos que trazem elementos
que ajudam a compreender uma espécie de base estruturante do ensino primário.
Conforme já mencionado, destacamos aqueles que auxiliam no aprofundamento
de questões como argumentos de defesa da escolarização da infância e sua
obrigatoriedade, assim como o material recomendado para o tipo de escola ali
anunciada. Neste intento foi possível notar, nas versões de língua portuguesa,
mudanças significativas em dois verbetes específicos que tratam sobre a educação.
Na primeira versão, de 1873, não há desdobramentos nos termos instrucção
e escola, os quais são abordados em apenas um verbete, de forma mais geral.
Já no exemplar do ano de 1886 percebe-se que há especificações para os dois
vocábulos como, por exemplo, instrucção, que aparece de forma mais detalhada
como instrucção primária e instrucção pública. No caso da palavra escola, que antes
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 74
aparecia somente no plural, nesta outra versão é subdividida em: escóla, escólas,
escolas abecedarias, escólas primarias, entre outras. Estes termos, os conceitos que
portam e os desdobramentos apresentados na segunda versão são indicativos da
organização (ou reorganização) de um aparato de escolarização que vai se tornando
mais complexo, com desdobramentos nas tipologias que remetem a alterações no
formato das escolas e nos níveis de escolarização.
Mais do que exaltar o papel da escola, de forma geral, este dicionário coloca em
um lugar de destaque a instrução primária, anunciada como “a pedra angular da
instruccção publica”. Uma hipótese levantada por nós diante dos dados localizados
na pesquisa é a de que a Lei de 2 de maio de 1878, tenha influenciado para o reforço
do entendimento em torno da importância da instrução primária para a sociedade
portuguesa. Segundo o autor, esse nível de ensino
simbolizariam a força e a presença do Estado (ou dos Estados), aqui vemos uma
espécie de culto à simplicidade. Porém, considera-se importante destacar que,
a simplicidade defendida não retira destas construções o ideal de singularidade
que os edifícios escolares precisariam ter em relação às demais construções. Em
documentos que circularam em diferentes países na época em que o dicionário foi
publicado, é recorrente encontrar prescrições que ordenariam a elaboração das
plantas, o planejamento e a ocupação dos espaços.
Agustín Escolano Benito (2000), um dos especialistas na temática, analisa que, por
meio dos estudos sobre a cultura material escolar, passa-se a entender a arquitetura
como um elemento cultural e pedagógico, que carrega consigo um caráter simbólico,
fundamental de ser investigado para a construção de uma história da educação e das
práticas e instituições escolares. Segundo este autor (2000, p. 191) “El edificio-escuela
ha sido a estos efectos, desde que se definió como materialidad especializada, una
construcción diferenciada de los contenedores exclusivamente prácticos”. Ainda
na esteira da reflexão proposta por Escolano Benito os edifícios que abrigam as
escolas são espaços que têm a capacidade de ensinar, mesmo que de uma maneira
“silenciosa”.
A materialidade, em sua perspectiva, também carrega discursos e intenções. Dessa
forma, a estrutura de um edifício localizado nas cidades é pensada de forma diferente
daquele construído nos campos, por exemplo, mas sua fachada deve denotar tratar-
se de uma instituição de ensino. Retomando uma passagem do verbete Architectutra
escolar destacamos a “recomendação” de que, “[...] nas cidades convém evitar as
fachadas frias, monotonas e uniformes; e nos campos é bom circumdar a casa da
escola de plantas, de flôres, cujas côres se casem tambem com as das telhas e das
paredes” (CAMPAGNE, 1886a, p. 157).
Rosa Fátima de Souza (2005) é uma autora que também ressalta a importância
de considerar os silêncios da arquitetura e do espaço escolar como elementos
que educam. A pesquisadora chama atenção para a complexidade que envolve as
pesquisas que tratam da temática e para a importância de um olhar cuidadoso para
as fontes e para aspectos que, apesar de parecerem óbvios, escondem nuances
que podem se tornar fundamentais para a construção de narrativas históricas.
Destacamos aqui uma passagem de suas reflexões:
Para além da arquitetura, outros verbetes que tratam de aspectos que ajudam a
compor uma espécie de base material da escola foram localizados nas páginas do
Dicionário Universal de Educação e Ensino. No processo de pesquisa fizemos uma
busca a partir da leitura dos verbetes das duas versões publicadas em Portugal
(1873 e 1886) com o intuito de verificar se os termos eram os mesmos ou se
haveria algum acréscimo ou supressão. Nesse percurso nos deparamos com duas
questões: a primeira foi a que a versão de 1873 não continha tantos verbetes ligados
à materialidade escolar, apenas foram localizados quatro (mappas, estylo, imagens
nas escolas e cartas geographicas), já a segunda foi a de encontrar, na versão de
1886, uma quantidade maior do que a esperada por nós de verbetes que podem ser
traduzidos como expressão de uma materialidade escolar.
Por esta razão, optamos por elaborar uma sistematização que retratasse as
informações localizadas. A ideia inicial foi a de produzir um quadro reunindo os
dados encontrados nas duas versões, mas diante da desigualdade no número
de verbetes, definimos por não colocar aqueles disponíveis na primeira edição
(1873). Importante ressaltar que os artefatos sinalizados em negrito neste quadro
são aqueles que aparecem de forma repetida na edição de 1873. Para permitir que
o leitor consiga visualizar melhor quais verbetes foram selecionados e onde estão
localizados, chegamos no resultado do quadro abaixo:
Bussola
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Cadernos
Cartas geográficas
Casa escolar
Compendium
Contador
Escada métrica
Esquadro
Estylo
10 Foram dois os projetos, ambos coordenados por Rosa Fátima de Souza, desenvolvidos sequencialmente e com apoio
financeiro do CNPq. O primeiro, iniciado em 2007, recebeu como título “Por uma teoria e uma história da escola primária
no Brasil: investigações comparadas sobre a escola graduada (1870 – 1950). Para se ter uma ideia geral do projeto reco-
menda-se a leitura do livro “Por uma Teoria e uma História da Escola Primária no Brasil: Investigações comparadas sobre
a escola graduada (1870 - 1930)”, organizado por Rosa Fátima de Souza Chaloba, Vera Lucia Gaspar da Silva e Elizabeth
Figueiredo de Sá (Cuiabá - MT: EduFMT, 2013). O segundo intitulado “História da Escola Primária no Brasil: investigação
em perspectiva comparada em âmbito nacional (1930 – 1961)” também contou com um GT dedicado à cultura material
escolar.
11 Parte dos trabalhos desse Grupo pode ser conhecida com a leitura do livro “Cultura Material Escolar: a escola e seus arte-
fatos (MA, SP, PR, SC e RS, 1870-1925)”, organizado por Cesar Augusto Castro (São Luís - Maranhão: EDFMA - Café & Lápis;
1ª edição em 2011 e 2ª edição em 2013).
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 79
Quadro 2, apresentado abaixo, permitem observar que dos vinte e três verbetes,
treze foram classificados em materiais visuais, sonoros e táteis para o ensino.
MATERIAIS VISUAIS,
UTENSÍLIOS DA LIVROS E REVISTAS
MOBÍLIA SONOROS E TÁTEIS PARA O PRÉDIOS ESCOLARES
ESCRITA ESCOLARES
ENSINO
Penas Material
Estylo Syllabador
Museu escolar
Bussola
Cartas geográficas
Compendium
Contador
Escada métrica
Esquadro
Kuhlmann Junior (2001) considera que esses espaços eram reconhecidos como
pertinentes para desenvolver políticas diplomáticas, para auxiliar no crescimento
do mercado e no desenvolvimento moral dos países, assim como para a formulação
de novas metodologias educacionais. Desse modo, a partir dos investimentos aqui
realizados, é possível identificar que os Dicionários Pedagógicos contribuíram para a
circulação de ideais e materialidades que também estavam presentes nesses eventos.
Considerações finais
Para a elaboração deste trabalho levamos em consideração, inicialmente, nosso
interesse em ampliar compreensões acerca da propagação de discursos pedagógicos
na segunda metade do século XIX. Este tema foi escolhido devido sua relevância, não
só para o grupo de pesquisa em que as autoras estão inseridas, mas também para
o campo da História e Historiografia da Educação. No intuito de colaborar com a
organização de um quadro que auxilie no entendimento sobre a institucionalização
da escola e seu processo de inovação pedagógica e composição material, definimos
como principal fonte de pesquisa duas traduções portuguesas do Diccionario
Universal de Educação e Ensino (1873 e 1886), publicado originalmente na França,
por Émile Mathieu Campagne (1872).
Ao realizarmos a leitura dos verbetes disponíveis na referida fonte, intentou-se
analisar como o cenário da educação primária é apresentado pelos autores nas
diferentes versões investigadas. Chegou-se à conclusão que a versão de 1886 abarca
a instrução pública e primária de uma maneira mais detalhada: com um número
consideravelmente maior de páginas, de uma versão para outra foi possível identificar
inclusive uma mudança estrutural na forma em que são apresentados os verbetes, a
versão anteriormente citada passa a ter três volumes.
Um fato que chamou muito a nossa atenção foi o aparecimento de verbetes
associados à materialidade escolar na última versão do Dicionário, pois até então
muitos eram inexistentes tanto na versão francesa quanto na primeira tradução
publicada em Portugal. Essas questões, juntamente com outras informações presentes
neste texto, são alguns dos indícios que corroboram com nossa hipótese de que a
Lei de 2 de maio de 1878 e a circulação de ideias pedagógicas tenham influenciado
nas alterações e prescrições do Dicionário. Com a produção deste trabalho foi
possível perceber, para além das questões aqui apresentadas, que impressos
como os Dicionários Pedagógicos auxiliaram na propagação de ideias pedagógicas
e colaboraram, em certa medida, para os debates em torno da necessidade de se
escolarizar a infância de forma compulsória, realçando a materialidade que deveria
fazer parte desse projeto.
Referências
CAMPAGNE, Émile Mathieu. Diccionario Universal de Educação e Ensino. Trasladado ao
Portugues por Camillo Castello Branco e ampliado pelo traductor nos artigos deficientes em
assumptos relativos a Portugal. Porto: Livraria Internacional de Ernesto Chardron. Braga:
Livraria Internacional de Eugenio Chardron. Vol. 1, 1873a.
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ISSN 2358-3959
Introdução
A Sociedade Polônia, instituição jurídica da sociedade civil, localizada no quarto
distrito do município de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, é uma associação
centenária da imigração polonesa que possui acervo histórico, bibliográfico e
arquivístico, contemplando cerca de 9000 objetos de diversas materialidades. São
vestígios e memórias de um processo migratório pouco evidenciado na historiografia
brasileira, que reitera as contribuições culturais e práticas das imigrações alemã e
italiana para a formação histórico-cultural do sul do país, em detrimento de outras
etnias que participaram deste processo – aqui, em especial, a etnia polonesa.
Objetivando a visibilidade deste grupo étnico de imigrantes e a salvaguarda de seu
patrimônio histórico-cultural, que abrange o período do século XIX ao XXI, bem como
a promoção de pesquisas científicas sobre a imigração polonesa, suas características
étnicas religiosas, mantidas pelas congregações religiosas que atuavam nos estados
do Sul do Brasil, sendo as principais a Missão de São Vicente de Paulo, Irmãs de
Caridade de São Vicente de Paula e Irmãs da Sagrada Família; e, por fim, as escolas
subvencionadas que surgem na segunda década do século XX, quando os professores
são pagos pelos governos municipais ou estaduais devido à presença do ensino de
língua portuguesa em seu currículo.
No início da formação desse sistema de ensino étnico polonês, as aulas
nas escolas comunitárias eram de noções elementares da língua polonesa,
matemática e ensino religioso, sendo subsidiadas pela utilização de textos bíblicos
e histórias de santos. Em decorrência de sua consolidação, desenvolvimento
e constituição de novas instituições escolares, as temáticas das aulas foram
ampliadas para o ensino do português como língua estrangeira, história do
Brasil, história e literatura polonesa, ciências, desenho, caligrafia e ginástica.
Relevante destacar que essas instituições escolares presentes nos estados do
sul e sudeste brasileiro, eram geralmente de ensino primário, do primeiro ao
quarto ano, e foram poucas iniciativas de escolas étnicas polonesas de ensino
secundário. Os materiais didáticos utilizados pelos professores e estudantes
destas instituições escolares eram escassos até a década de 1920, quando o
sistema de educação étnico receberá novos subsídios do governo polonês e de
associações de professores poloneses fundadas em Curitiba, fundamentais para
a qualificação dos professores e organização e publicação de obras didáticas no
Brasil. A exceção desta conjuntura estavam apenas às escolas étnicas religiosas
que, desde sua fundação, já contavam com materiais específicos para o ensino
importados de países como Estados Unidos e Polônia. Outro aspecto relevante
acerca do processo de ensino étnico polonês é que as aulas eram, em sua maioria,
ministradas por professores homens.
O número de escolas étnicas polonesas aumentará exponencialmente durante as
primeiras décadas do século XX, chegando a existir 346 escolas em funcionamento
nos estados de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do sul em 1937, conforme
apontado por Luporini (2011, p. 187), momento em que estas instituições começam
a ser fechadas devido ao Decreto de Nacionalização de Ensino do presidente Getúlio
Vargas.
Considerações Finais
Foram expressivas as contribuições para a educação das agremiações de
professores, inicialmente a Kultura e a Oswiata e após alguns anos a CZP - União
Central dos Poloneses no Brasil. Dentre suas ações está a inauguração de escolas,
oferta de bibliotecas itinerantes, formação de professores, produção de diversos
impressos. A partir de 1938, a expressividade dessas associações foi silenciada devido
à vigência do Decreto de Nacionalização do Ensino de Getúlio Vargas, reduzindo tais
iniciativas de forma drástica.
Até o momento foram identificadas informações sobre essas agremiações
educativas em diferentes títulos de almanaques em polonês impressos no Brasil,
nos próprios documentos impressos por essas duas instituições, em relatórios de
imigração e em documentos consulares. Muitos desses documentos não constam
como empiria das pesquisas empreendidas.
Considerando o levantamento geral da existência de mais de 9 mil exemplares
de documentos impressos no acervo da Sociedade Polônia, a pesquisa não esgotou
todos os documentos impressos por estas agremiações de professores, o que
demonstra as potencialidades do acervo. Este estudo demonstra a diversidade e
importância dos indícios nas documentações das associações de professores para
a história da educação, tais como o currículo escolar, a questão didática, o ensino
bilíngue, a seriação e sobre a necessidade de aprender o português para vida
cotidiana no Brasil.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 95
Referências
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ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
ISSN 2358-3959
Após ter assumido seu lugar na escola do núcleo Zacharias em 1888, a professora
Rosa Nogueira enviou uma comunicação ao Inspetor Geral solicitando que lhe fosse
providenciado os livros de matrículas e de termos de visita, já que sua antecessora não
havia lhe entregado os antigos (NOGUEIRA, Rosa. 1888, AP. 830, p. 100).
Já em dezembro de 1879, a professora Maria Julia da Costa Gomes, da escola
feminina de Antonina, preparava seu relatório referente ao exercício do ano findo
para enviar ao Inspetor Geral, por intermédio do inspetor paroquial. No primeiro
parágrafo do relatório, Maria Julia escrevia estar cumprindo um dever estatuído pelo
Regulamento de 1876, o qual afirmava fazer sem “aquela aptidão que um tão magno
assunto requer” (GOMES, Maria Julia da Costa, 1879, AP. 578, p. 32).
Durante a segunda metade do século XIX, no Império brasileiro, exercer o magistério
primário implicava, afora ensinar, organizar e administrar o funcionamento de uma
escola. Um período demarcado, não só pelo processo de constituição da instrução
pública primária, mas também, por uma escola que se configurava no espaço de uma
sala, em que todos os alunos, distribuídos e organizados em classes, ocupavam o
mesmo ambiente e um único professor era responsável não só por dirigir e organizá-
la, como também limpar, equipar e manter. Tarefa que para ser cumprida pelo
professor, necessitava de distintos materiais.
Na busca por indícios de práticas docentes atreladas à materialidade escolar
nesse período, observa-se a existência de um mundo material da educação primária
e, ao analisar as fontes disponíveis, percebe-se que algumas especificidades
caracterizaram relações singulares entre os professores e esse universo material,
14 Manual - Elementos de Pedagogia: para servirem de guia aos candidatos ao magistério primário coordenado por José
Maria da Graça Affreixo e Henrique Freire. 4ª edição, Lisboa, Livraria Ferreira, Lisboa e Cia., 1875, p. 24.
15 - Dicionário da Língua Brasileira por Luiz Maria da Silva Pinto. Ouro Preto: Typographia de Silva, 1832. Aulete Digital: http://
www.aulete.com.br.
16 Foram consultados os verbetes “Escrituração” e “Escriturar” por serem complementares.
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Diana Vidal (2008) atenta para o fato de que a prática estatística é essencialmente
uma prática escriturística.
17 Veiga (2005) toma por referência as obras “A escrita da História” (1982) e “A invenção do cotidiano” (1999).
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lente que olhamos para a relação dos professores com os materiais de escrituração,
na compreensão de que, mesmo configurando-se como um dever, esta é entremeada
pela apropriação que os professores fazem (fizeram) das normas.
(...)
22 O relatório do Inspetor Geral também era acrescido das informações que obtinha das visitas que realizava pelas escolas
da província.
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23 Embora o autor não trate da escrita de relatórios, Tardif (2012) aborda a transmissão oral do saber produzido pelo profes-
sor em sua prática cotidiana aos seus colegas.
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24 Ainda que sejam poucos os mapas de frequência que fazem parte do conjunto de fontes tratadas neste tra-
balho, foram encontrados muitos documentos de professores comunicando o envio do mapa em “anexo” (ao
comunicado).
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de ser uma obrigação um tanto excessiva; por outro lado, ter acesso ao conteúdo do
seu “exame” poderia propiciar momentos de autoavaliação ou ainda ser um recurso
de validação de competências. Como instrumento de autoavaliação: ter em mãos o
termo de visita poderia fazer com que o professor repensasse a sua prática naquilo
que o inspetor indicasse como um mau procedimento ou mesmo que observasse seu
modo de ensinar pelos olhos de outrem (no caso o inspetor) fazendo com que revisse,
reiterasse, repensasse e retomasse práticas com a intenção de aprimorar-se a partir
de outra perspectiva. Entretanto, cumprir essa tarefa dava a chance do professor
de contestar o que achasse ser inadequado ou qualquer inverdade nas palavras
do inspetor. Os termos de visita se tornavam nesse caso, mais do que documentos
que tinham por intuito prover os inspetores de ensino de registros de informações
sobre a instrução, um dispositivo a ser usado pelo professor a seu favor quando fosse
conveniente/necessário (FRANÇA, 2014). Nessas situações, documento de verificação
tem seu sentido ampliado para documento de comprovação que, sob posse dos
professores, servia como termo de seguro (independente do seu conteúdo).
Algumas considerações...
Ao voltar a lente para esses documentos de escrituração pelos olhos dos
professores, podemos perceber que esse conjunto materializa e instrumentaliza um
ordenamento docente a partir de uma racionalização da escola.
Além disso, torna visível um modo de administração e organização da escola
primária que parte dos deveres docentes essencialmente burocráticos e disciplinares,
mas que se mostram pedagógicos na medida em que constroem e aprimoram o
ofício e a prática docente. Portanto, é possível afirmar que este modo característico
desses professores se trata, de mesma forma, de uma organização material, pessoal
e pedagógica, e que este fazer junto desta materialidade possibilita que estes
professores revejam a sua prática, a sua escola, o seu fazer e o ensino (de uma forma
geral), dando sentido ao seu saber (e fazer) e à sua condição como professor. Demarca-
se ainda a importância dos relatórios no exercício docente; produzi-los permitia
aos professores, não só expor suas insatisfações, seus progressos, ou se mostrarem
como bons cumpridores do papel que lhes foi designado (mesmo que timidamente),
assumir um lugar institucional e mediato como “especialista” do ensino.
Ademais, ao compreender que esses objetos tão singulares e diversos podem
revelar e ajudar a entender dos dizeres e fazeres da escola (PERES; SOUZA, 2011)
modos de fazer característicos do ofício docente executados pelos professores
primários oitocentistas, pode-se afirmar que esses objetos foram ressignificados na
e por uma arte de ensinar, tornando-se artefatos, e que a partir disso construíram
sentidos de uma prática docente na legitimação de saberes e consolidação de fazeres
constituindo uma tradição do ofício (ESCOLANO BENITO, 2017). Assim, interpreta-
se que a cultura material escolar é constitutiva do ofício docente por compreender
que, neste caso, ela funciona como um veículo de análise e produção de uma cultura
escolar por parte dos professores
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Fontes:
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COSTA, Antonio Ferreira. 1861, AP. 141, p. 03-07. DEAP-PR
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LOBO, Honório Décio da C. 1866, AP. 244, p. 140-146. DEAP-PR
NOGUEIRA, Rosa. 1888, AP. 830, p. 100. DEAP-PR
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mentação Paranaense no período de 1854 a 1889 (CDPR). Brasília: INEP, 2004, p. 178.
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Maria Elisabeth Blanck; MARTIN, Sonia Dorotea (org.). Coleção de Documentos da Educação
Brasileira. Coletânea da Documentação Paranaense no período de 1854 a 1889 (CDPR).
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Brasileira. Coletânea da Documentação Paranaense no período de 1854 a 1889 (CDPR).
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In: MIGUEL, Maria Elisabeth Blanck; MARTIN, Sonia Dorotea (org.). Coleção de Documentos
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República: Curitiba, 1929.
PARANÁ. Regulamento do ensino popular de 24 de agosto de 1892. In: Actos e Leis de
1890,1891 e 1892. Typografia da República: Curitiba, 1929.
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século XIX. Revista Brasileira de Educação, nº 17, p. 41-67, maio/agosto de 2008.
ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
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Este trabalho possui como objetivo central refletir sobre o mobiliário escolar
idealizado e construído para ser utilizado em escolas públicas primárias na Província
de Santa Catharina (Brasil) entre as décadas de 1851 a 188926. Pautado pela noção de
cultura material escolar e a partir de uma perspectiva histórica, compreende-se os
móveis idealizados para escolas públicas primárias como mercadorias (re)inventadas
pela modernidade educativa, imbricadas em um processo de circulação de saberes
legitimados, principalmente, a partir do século XIX.
Os dados localizados no decorrer do percurso de pesquisa têm permitido identificar
relações entre móveis presentes em escolas catarinenses e objetos anunciados em
manuais pedagógicos e em Exposições Universais, referenciados nesses espaços
como ideais para a escolarização da infância. A partir da análise de solicitações de
artefatos escolares, realizadas por professores para a Diretoria de Instrucção Pública
e de escritos publicados em jornais e relatórios, vem sendo possível a localização de
indícios que permitem refletir sobre o envolvimento da Província de Santa Catharina
no processo de circulação internacional de ideias pedagógicas. Compreende-se que
o movimento realizado não era apenas o de apropriação de modelos considerados
referenciais, mas também de contribuição, com envio de exemplares de suas
produções a eventos internacionais e estabelecimento de estratégias que visavam
o provimento material de escolas da província a partir de preceitos pedagógicos e
higiênicos.
Apesar de uma realidade material considerada “precária economicamente” em
falas registradas por governantes do período, os ideais de escola de Santa Catharina
sustentavam-se em discursos que entendiam como indispensável a presença de
26 As reflexões aqui desenvolvidas resultam de pesquisas e análises realizadas para a produção de tese de Dou-
torado, intitulada “A (re)invenção do mobiliário escolar: entre saberes pedagógicos, higienistas e econômicos
(1851-1889)”, defendida no ano de 2019, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do
Estado de Santa Catarina (PPGE/UDESC). Este trabalho, por sua vez, vincula-se ao projeto de pesquisa “Ob-
jetos para Consumo da Escola: O que dizem as Exposições Universais, os Museus Pedagógicos e as Leis da
Obrigatoriedade Escolar” (UDESC/CNPq/FAPESC)”, coordenado por Vera Lúcia Gaspar da Silva.
29 Tradução livre: “todos aquellos objetos, de uso corriente en la escuela, que sin formar parte del edificio ni haber sido
adscritos a él en el momento de la construcción, no son tampoco utilizables como medios de instrucción o de enseñanza”
(LABOR, 1936, p. 2133).
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Nesse sentido, a autora chama a atenção para a existência de uma batalha nada
silenciosa durante os Oitocentos em torno da modernização escolar, a partir de
defesas da inserção de objetos que estivessem de acordo com uma modernidade
pedagógica e higiênica anunciada, a qual serviu como uma espécie de guia para a
idealização dos móveis escolares e contribuiu para o fortalecimento de ideias que
vinculavam a eficiência pedagógica à presença e utilização de uma materialidade
escolar que satisfizesse exigências anunciadas em Exposições, relatórios e catálogos
idealizados por fábricas especializadas no mercado escolar. Produções do campo da
História da Educação, como as de Martin Lawn (2005), Juri Meda (2015) e Moysés
Kuhlmann Júnior (2001), fornecem indicativos de que as novas tecnologias e
adaptações no mobiliário pensado para estar presente nas escolas passaram a
expressar, ainda que indiretamente, uma das facetas da modernidade, uma vez que
projetos de artefatos como carteiras, mesas e escrivaninhas apresentavam o que
existia de “mais moderno” e se apoiavam em ideais da ciência e da racionalidade,
indicadas como as bases dessa sociedade.
Reflexões nesta direção também dão suporte às análises realizadas por Wiara Rosa
Rios Alcântara (2014) em sua tese de doutorado, que, ao tratar especificamente do perfil
do mobiliário exposto em exposições universais, apresenta dados acerca de diversas
carteiras escolares que receberam um conjunto de investimentos de educadores,
médicos e industriais, com o intuito de adequar seu design e suas tecnologias aos
preceitos modernos de ensino. Levando essas questões em consideração, a autora
indica em seu trabalho que a carteira escolar pode ser considerada uma lente para
o campo da História Econômica, uma vez que esse mobiliário permite identificar
relações existentes entre uma indústria escolar nascente e a escola como um mercado
consumidor atraente.
Compreende-se aqui que não apenas a carteira, mas também a cadeira, a
escrivaninha, o quadro-negro e todo o mobiliário pensado para a escola moderna do
final dos anos do Oitocentos podem funcionar como lentes que auxiliem a melhor
compreender os movimentos de racionalização que os Estados tiveram que passar
para instituir as escolas de massa. Nesse contexto, destaca-se o papel das leis de
obrigatoriedade escolar, que contribuem para alçar a escola como um mercado
atraente, uma vez que ao institucionalizarem a presença obrigatória das crianças
nesse espaço, “forçam” o Estado a se adequar burocrática e economicamente,
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Um olhar mais atento para essas dimensões possibilita fazer reflexões acerca de
elementos que dizem respeito ao cotidiano da sala de aula. O modelo reivindicado é
uma mesa grande, rígida e considerada pesada, muito semelhante aos exemplares
encontrados na França no mesmo período e criticados por Ferdinand Buisson no
Relatório da Exposição Universal de Viena, de 1873, por não atenderem aos preceitos
médicos e pedagógicos modernos. No entanto, também foram localizados, em outros
documentos30, projetos de mesas-bancos construídas para escolas catarinenses que
guardavam uma profunda semelhança com os modelos apresentados por Jean
Baptiste Daligault em seu manual, publicado em 1851 na França, e posteriormente
traduzido para o português por Francisco de Paulo Marques de Carvalho.
Escola feminina de 1ª Letras da Freguesia da Santís- Escola pública masculina de 1ª Letras da Freguesia
sima Trindade de Sant’Anna do Merim
Para uso da professora 1 Livro em branco de papel pautado
1 Livro de 100 folhas, pautado para matrícula 8 Iris clássicas
1 Livro de 5 folhas, pautado para termos 12 Expositores portugueses
1 Par de tinteiro de chumbo 6 Cathecismos de Montpellier
1 Campainha de metal branco 12 Traslados
1 Canivete de aparar prumas 10 Lousas e lápis
1 Régua grande 6 Escrivaninhas
Mesa de 6 palmos de comprimento e 4 de largura com
1 6 Bancos
gavetas
1 Cadeira 1 Par de tinteiros
Para uso dos alunos em geral 1 Mesa
Escrivaninhas de 18 palmos de comprimento e 1,5 de
4 1 Cadeira
largura com 6 tinteiros
4 Bancos para as mesmas Alugar-se caza
Para uso dos alumnos pobres
12 Gramáticas de Coruja 8ª Edição
12 Aritiméticas do mesmo texto Professor interino Joaquim Teixeira Couto
12 Cathecismos de Montpellier 12 de novembro de 1860
12 Cartilhas de Doutrina Christã por Pimentel
12 Lousas meas
12 Syllabarios de letra de não lithographados
12 Syllabarios de letra Italica e Romana impressas
12 Réguas Pequenas
Diretor Antonio de Souza Fagundes – diretor das escolas
de instrução primaria.
18 de janeiro de 1855
Fonte: Ofícios Expedidos da Instrução Pública de Santa Catarina (1855-1860). Elaborado pelo autor.
30 Ofícios Expedidos da Instrução Pública de Santa Catarina. Disponível em: Arquivo Público do Estado de Santa Catarina (Apesc).
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29 fev. 2020.
ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
ISSN 2358-3959
INTRODUÇÃO
O presente texto trata da apresentação de um recorte de uma pesquisa de
mestrado que pretende uma intersecção entre a história das ciências e a história da
educação por meio da compreensão sobre a formação dos professores para o ensino
das ciências na Escola Normal de São Paulo no final do século XIX e início do século
XX, sob orientação da Profª Drª Katya Mitsuko Zuquim Braghini.
Objetiva-se nesta comunicação discutir a importância do laboratório de Física
e Química da Escola Normal de São Paulo para a constituição e funcionamento da
cátedra específica para o ensino dessas disciplinas, apresentando quais eram os
tipos de objetos científicos adquiridos para o ensino de física e química, bem como
os conteúdos que poderiam ser ensinados por meio das práticas empíricas dadas
pelo manuseio desses objetos.
No aspecto metodológico, privilegia-se o estudo da cultura material escolar
por meio da análise dos instrumentos e aparelhos científicos remanescentes do
laboratório da Escola Normal, presentes no Acervo Histórico da Caetano de Campos
(antiga Escola Normal de São Paulo), situado no Centro de Referências em Educação
Mario Covas. Além disso, considera-se as fontes documentais escritas como as
notícias do jornal A província de São Paulo (1882; 1883), o relatório do diretor da
Escola Normal de São Paulo (1885) e os relatos de viagem do historiador e geógrafo
Alfredo Moreira Pinto (1900). Ainda, recorre-se a revisão de literatura que trata sobre
cultura material escolar e história do ensino das ciências, fazendo referência às obras
de Braghini (2019), Meloni e Granato (2014), Viñao Frago (2012), Escolano Benito
(2010) e Souza (2007).
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Uma das peculiaridades do ensino de física e química, em relação as demais
disciplinas que compõem um currículo escolar, é o papel da experimentação e da
prática nas aulas, por meio do manuseio de instrumentos científicos, o que demanda
a aquisição de materiais propícios às atividades práticas.
Segundo Meloni e Granato (2014, p. 2), “o processo de aquisição de objetos
de educação em ciências pelas escolas brasileiras iniciou-se no século XIX [...]”,
sobretudo, em um período em que “a educação prática das ciências foi valorizada”,
por meio do “método intuitivo na segunda metade do século XIX”. Nesse aspecto,
“a renovação pedagógica pressuposta pelo método intuitivo na virada do Século XX
dependia de uma grande lista de materiais, apresentando as expectativas, crenças,
interesses em tais modernizações [...]” (SOUZA, 2007, p. 171 apud BRAGHINI, 2019, p.
5476).
Segundo Rozante (2013), o método intuitivo foi tornado símbolo da renovação
educacional republicana e, portanto, o principal meio de se formar o cidadão
republicano civilizado por meio da educação dos sentidos. Para Munakata (2017, p.
91), as lições de coisas “conhecidas também como ‘método intuitivo’, constituem
proposta pedagógica que preconiza o contato direto do educando com o mundo,
pela observação, experimentação e manipulação, em vez de conhecê-lo pela leitura
dos livros”.
Com efeito, considerando a obra de Meloni e Granato (2014, p. 3), o presente
trabalho trata os aparelhos e instrumentos científicos do laboratório de física e
química da Escola Normal de São Paulo como “objetos de educação em ciências”,
haja vista que “além de materiais que podem contribuir para a construção da
identidade de uma comunidade, os objetos da educação em ciências podem ser
fontes para uma aproximação com as práticas pedagógicas do passado” (MELONI E
GRANATO, 2014, p. 9). Há de se considerar, ainda, que “por si só, o objeto já contém
uma carga de representações. A concretude do objeto já apresenta os sinais do que
se pretende transmitir, seja do ponto de vista do conhecimento formal, seja relativo
a uma determinação concepção de mundo” (MELONI, 2010, p. 136).
Contudo, observa-se que “los objetos no hablan por sí solos. Además, su mera
descripción o enumeración no nos lleva más allá de las crónicas, cronologías o anales
en relación con los acontecimientos.” (VIÑAO FRAGO, 2012, p. 11), ou seja, o estudo de
objetos não diz respeito a análises superficiais e meramente descritivas dos mesmos,
mas considera que “su interés no deriva de su condición de objetos o relatos, sino de
los sentidos, significados, conexiones y relaciones que el historiador establece entre
ellos y sus contextos de producción, recepción, apropiación e interpretación” (VIÑAO
FRAGO, 2012, p. 11), o que implica em um estudo mais aprofundado sobre a cultura
material escolar.
Segundo Braghini (2019, p. 5482), “a ‘cultura material escolar’ engloba os
itens produzidos e utilizados em uma instituição escolar, em diferentes suportes
informacionais, fragmentos do passado que possibilitam a construção de uma
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 120
narrativa histórica”. Para Escolano Benito (2010, p. 14), a cultura material escolar
é um registro da cultura empírica, que “puede ser valorada como es el exponente
visible, y tras su lectura el efecto interpretado, de los signos y de los significados que
exhiben los llamados objetos-huella”, tratando os objetos como fontes intuitivas.
Nesta segunda fase, o currículo da Escola Normal foi ampliado para quatro
cátedras, contudo, apesar de todo o avanço testemunhado em São Paulo, disciplinas
da área de ciências da natureza ainda eram inexistentes no currículo da Escola
Normal de São Paulo. Em 1878, sem verbas previstas para o orçamento da escola, a
instituição foi novamente fechada.
ANO CADEIRAS/PROFESSORES
31 Esse professor francês nasceu em Nice, em 1855. Se diplomou em medicina pela Faculdade de Medicina de Bruxelas,
na Bélgica. Prestou exame de suficiência na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e, após sua aprovação, em 1879,
passou a clinicar em São Paulo. Em 1880, foi nomeado professor da Escola Normal de São Paulo, ocupando a cátedra
recém-criada de Francês, Física e Química. Em 1882, em substituição ao Dr. Mamede de Freitas, Paulo Bourroul assumiu a
direção da Escola Normal de São Paulo (DIAS, 2013).
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 124
Paulo Bourroul foi o lente da 5ª cadeira entre os anos de 1880 e 1884, sendo o
responsável pela constituição da cátedra na Escola Normal. Segundo Dias (2013), em
1882, o docente assumiu a direção da Escola Normal de São Paulo, acumulando o
cargo junto a regência da cadeira de Francês, Física e Química. A autora assevera que:
32 O estudo dessas obras resultou em uma comunicação intitulada “Paulo Bourroul e o ensino das ciências na Escola Normal
de São Paulo no final do século XIX”, apresentada no 30° Simpósio Nacional de História (2019), organizado pela Associação
Nacional de História, em Recife (PE, Brasil), e está disponível nos anais do evento em questão.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 125
A respeito dos conteúdos ministrados por meio dos objetos adquiridos, o relatório
do então diretor da Escola Normal de São Paulo, de 20 de novembro de 1885 apresenta
que:
Figura 1: Instalações do laboratório: gabinete de Física da Escola Normal de São Paulo (1940)
Figura 2: Instalações do laboratório: gabinete de química da Escola Normal de São Paulo (1940)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dado o exposto, constatou-se que a Escola Normal de São Paulo recebeu um
importante destaque na instrução pública durante o século XIX, momento em que
o acesso à Educação estava atrelado ao interesse do poder público em expandir o
ensino primário e, para tanto, era necessário formar professores. No entanto, apesar
do desenvolvimento econômico, social e político que São Paulo testemunhou nesse
período, observa-se que o ensino de Física e Química era inexistente no currículo da
Escola Normal de São Paulo durante as suas duas primeiras fases de funcionamento.
Uma cátedra específica para o ensino dessas disciplinas foi constituída apenas em
1880, na dita terceira fase, diante do imaginário republicano de que a valorização das
ciências estava alinhada ao progresso e a modernidade, características fundamentais
para equivaler o Brasil ao “mundo civilizado”.
A organização inicial da cadeira de Física e Química foi resultado da atuação do
doutor Paulo Bourroul, primeiro lente dessa cátedra que, posteriormente, se tornou
diretor da Escola e Normal e foi o responsável pela aquisição de um laboratório de
física e química trazido da França, conferindo ao ensino da instituição uma feição
prática e experimental, alinhada ao método intuitivo que, de acordo com a mesma
lei que preconizava a abertura dessa cadeira, tornava a lição de coisas o método
oficial de formação de professores do estado.
Constatou-se que os aparelhos e instrumentos científicos se fizeram
imprescindíveis para o ensino de física e química na Escola Normal de São Paulo,
sobretudo, atendendo aos pressupostos do método intuitivo. Esses instrumentos
dizem respeito à cultura material escolar da Escola Normal, uma vez que tratados
como objetos de educação em ciências, denotam que a valorização do ensino das
ciências, sobretudo a constituição de uma cátedra específica para as disciplinas
de física e química e a aquisição de objetos específicos para elas, foi pertinente ao
interesse paulista de modernização presente no final do século XIX, ressaltando o
papel da instrução pública no atendimento ao espírito da época.
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XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 129
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ANAIS DE
TRABALHOS COMPLETOS
ISSN 2358-3959
Resumo
A cultura escolar como possibilidade de investigação na História da Educação,
permitiu a inserção de temas, objetos e fontes que por muito tempo foram
desconsiderados nos escritos da História. Neste cenário, a intenção deste texto é se
aproximar do cotidiano de professores e crianças, por meio de registros estampados
em dois cadernos de profissionais que atuavam na década de 1980, na pré-escola
curitibana e entrar nas instituições por caminhos antes não trilhados, descortinando
tensões, resistências e cumplicidades a partir dos fazeres e das práticas pensadas
e projetadas para as crianças pequenas no período. Utilizar estes materiais como
fonte histórica, permitiu o contato com as práticas escolares, com o currículo,
com os discursos, com a organização do trabalho pedagógico e as concepções dos
professores nos fazeres diário. São memórias de uma educação idealizada para
as crianças, escritos que longe de uma neutralidade passiva, são balizados por
desenvolvimento de táticas e as artes do fazer (Certeau 1984) do cotidiano, onde
o professor fabrica modos alternativos de exercer à docência. Inúmeros são os
registros e possibilidades de pesquisas registradas na memória dos cadernos. Abre-
se um leque de investigações, que até o momento permitiram compreender, que as
orientações do Guia Curricular do Projeto Araucária não eram as únicas propostas
descritas e projetadas nos cadernos, o que demonstrava a arte de fazer dos docentes
no período.
Palavras-chave: Projeto Araucária; cultura escolar; cadernos de planejamento.
Introdução
O caderno de planejamento dos professores é considerado um objeto da
cultura escolar e um vestígio valioso para o historiador se aproximar do cotidiano
de professores e crianças e entrar nas instituições. Este trabalho, fruto da pesquisa
de Mestrado em Educação, da UFPR, Linha de Pesquisa História e Historiografia
da Educação, tem como objetivo principal, investigar a partir de dois cadernos de
docentes que lecionavam em turmas de pré-escola na década de 1980, na prefeitura
de Curitiba, o cotidiano de professores e crianças, por meio de seus registros.
Encontrar os escritos de um professor sobre as atividades planejadas, só não é
mais difícil do que se deparar com o relato da criança sobre o cotidiano vivido na
escola. Muitas vezes, estes documentos só são descobertos porque um dia, foram
esquecidos. De acordo com Mignot e Cunha (2003), “são vestígios recantos desativados
das escolas e gavetas esquecidas de muitos armários de professores e professoras
que guardam registros do cotidiano escolar” (MIGNOT e CUNHA, 2003, p. 9). Materiais
que nesta investigação, são destacados como reveladores de potencialidades,
dificuldades, práticas e sonhos que denunciam o “espetacular da sala de aula”. Estes
cadernos fontes desta pesquisa, organizados com capricho e zelo, foram encontrados
em meio ao Acervo de documentos do Projeto Araucária, são vestígios que revelam
atividades e observações que foram desenvolvidas no período em que este projeto,
em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), Fundação Bernard Van
leer, da Holanda e prefeitura de Curitiba passaram a direcionar ações e propostas
para o atendimento ao pré-escolar na capital paranaense. Vale a pena salientar, que
este projeto teve duas fases de atuação em parceria ao município de Curitiba, de
1985 a 1988 (construção e implantação de uma proposta pedagógica para o trabalho
com crianças de 04 a 06 anos, em duas escolas municipais da Prefeitura de Curitiba
e de 1989 a 1992 ( quando direcionou suas ações para o trabalho junto às creches
municipais, atuando concomitantemente com o desenvolvimento de cursos de
aperfeiçoamento para as diferentes categorias profissionais que trabalhavam com a
Educação Infantil em Curitiba).
Nesse percurso, as narrativas evidenciadas nos cadernos, permitem uma reflexão
sobre as ações que direcionavam a organização do cotidiano nas turmas de pré-
escola, atendidas pelo Projeto. Estes cadernos podem ser entendidos como objetos
culturais que contribuem para a compreensão das representações dos processos
educacionais, com os métodos e apropriações teóricas. Roger Chartier (1990, p. 230)
pontua que “os materiais que transmitem as práticas e os pensamentos das pessoas
comuns são sempre formas e temas mistos e combinatórios [...]”, em face disso, não
interessa apenas identificar o que se escreve e quem escreve, mas entender como se
diz, como se representa, e que combinações realiza em suas práticas.
Por sua capa, os dois cadernos já delimitam que são do Projeto Araucária e se
referem a atividades diárias a pré-escola, deste projeto em específico.
Observam-se nestes diários, as propostas que eram pensadas para estas turmas de
pré-escola, neles vislumbra-se uma representação do que os adultos projetavam como
importante para as crianças nessa fase escolar. Estes registros não estão descolados
de um debate e discussões nacionais, que entendiam esta fase de escolarização,
como preparatória para aquisições de habilidades consideradas como fundamentais
para alfabetização e ingresso no 1º Grau. De acordo com Kramer e Abramovay (1986):
Grande parte - senão a maioria - dos professores vincula, basicamente, o início da
alfabetização ao treinamento da coordenação motora e da discriminação visual e
auditiva. (KRAMER E ABRAMOVAY, 1986, p.172).
Assim, atividades de coordenação motora, treino de habilidades, entre outras
estavam presentes nas anotações das docentes, que demonstravam articular tais
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 134
dada pela indicação de 1979 para a antecipação do ensino de 1º grau - antes dos sete
anos (Indicação 8/79) e vista no ano seguinte como o elemento que promoveria a
equiparação da criança pobre com a criança de camadas privilegiadas (Parecer792/80).
Sobre estes pareceres e indicações, destinados à educação pré-escolar, é possível
identificar que se baseavam em uma literatura referente à educação compensatória.
Como Didonet (1992) descreve,
FESTAS ESCOLARES
CAD 1 CAD 2
Vislumbra-se que datas de homenagem ao Dia das Mães e a Festa Junina também
foi destaque nestes cadernos. De acordo com as análises de Bencosta e Pereira
(2006) as comemorações inseridas no calendário escolar, sob a supervisão dos
professores, dispunham os alunos a teatralizarem “em diferentes momentos do ano
escolar representações festivas de cunho religioso, popular e aqueles sugeridos pela
própria escola”. (BENCOSTA, 2006, p. 3858). Nesse caso, a partir dos registros destes
cadernos em especifico, a Páscoa e o Dia do Índio, foram pano de fundo para tais
dramatizações, sendo que as crianças foram para casa, pintadas e caracterizadas de
acordo com a festividade.
Como se pode perceber através das imagens acima, a professora, para celebrar
cada data comemorativa, propôs algumas atividades pedagógicas. Assim, para
comemorar a Páscoa, a música, dramatização e o desenho para pintar fizeram parte
dos trabalhos. Vale destacar, que no primeiro exemplo, temos o Dia do Índio, que
comemorado no dia 19 de abril teve as suas atividades relatadas no diário do dia
18/04. Nesse caso, parece provável que a data de comemoração dessa festividade
cairia no sábado, sendo adiantada a sua celebração.
A persistência de atividades pautadas nas festas escolares é encontrada ao longo
dos registros nos diários, conforme imagem abaixo
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 139
FESTAS ESCOLARES
A descrição das atividades de Festa Junina aparece no dia 18/06 e vai até 27/06.
Em praticamente todos os momentos a professora foi articulando as atividades
ancoradas no tema: confecção de bandeirinhas, conversas, música típica. Enfim,
uma “concentração de afetos e emoções em torno de um assunto que é celebrado
e comemorado”, como afirma Bencosta e Pereira(2006) ao caracterizar as festas
escolares “enquanto produções do seu cotidiano, como uma ação, um tempo e um
lugar determinado” (BENCOSTA, 2006, p. 3858). Destaca-se que recorrente no diário
encontra-se a palavra “ensaio”, provavelmente para a apresentação para os pais e
comunidade.
Relacionando-se ainda às festas escolares, embora não constando nos registros
dos diários, mas por meio de fotografias deixadas dentro dos cadernos, visualizou-
se que a celebração do Dia das Crianças, também fez parte deste cotidiano. A seguir,
duas fotos que memoram esse dia.
XII COLUBHE - ANAIS DE TRABALHOS COMPLETOS - V. 1 • 140
Atrás das duas imagens consta a seguinte frase: “Dia da Criança 1986”. Na primeira
fotografia, percebe-se um adulto, possivelmente a professora, confeccionando
brinquedos de sucata que aparecem também na segunda imagem, agora nas mãos
das crianças que os utilizavam para brincar. O espaço escolhido, como se pode
perceber, é o da sala de aula, com carteiras e cartazes ao fundo. Na primeira fotografia,
observa-se na organização da sala a presença de cartazes do tempo, ajudante do
dia, figuras geométricas e chamadas, compondo este espaço. Com relação ao que
menciona a chamada, visualiza-se, que nos dois diários essa prática aparece de
forma recorrente, quase todos os dias.
A comemoração do Dia das Crianças no Brasil sucedeu-se “pela publicação
do decreto lei n. 4867 de 05 de novembro de 1924, que oficializou o dia de sua
comemoração para 12 de outubro de cada ano” (BENCOSTA e PEREIRA, 2006, p.
3862). Os indícios da demarcação dessa data, de acordo com Kuhlmann Jr. (1998)
podem ter sido em respeito às decisões realizadas nos trabalhos do 3º Congresso
Americano da Criança, realizado em conjunto com o 1º Congresso Brasileiro de
Proteção à Infância138, que sugeriram o dia do Descobrimento da América como
data para comemorar também o Dia da Criança.
(BENCOSTA, 2006) Isso indica que esse ano não teria sido o primeiro de comemorações,
conforme diz o autor.
Cotejando estes primeiros contextos de comemorações do Dia da Criança com
as imagens das fotos, verifica-se que a organização da professora foi atrativa para as
crianças, com brinquedos de sucata e bexigas, pois as crianças estão aparentemente
felizes neste espaço. Bencosta (2006) aponta para as modificações que ocorreram
na dinâmica desta festa sinalizando que “com o passar dos anos as programações
assumiram configurações mais atraentes para as próprias crianças, apesar da
insistência do formato organizacional da mente adulta para a festa“. (BENCOSTA,
2006, p. 3863).
Retornando às análises dos diários, percebe-se ainda que os dois cadernos
trazem uma rotina pautada pela demarcação do tempo, cronometrando o ritmo
de cada atividade. Com relação ao tempo e a sua representação nos espaços de
educação, ViñaoFrago (2000) esclarece que “a configuração, distribuição e usos do
espaço e do tempo são elementos não neutros nem marginais, mas, ao contrário,
substanciais e determinantes.” (VIÑAO FRAGO, 2000, p. 109). Neste sentido, observa-
se que o planejamento obedecia a uma sequência determinada de ações controladas
e obrigatórias, constituindo a forma e a metodologia de ensino destas professoras.
Nota-se ainda nos diários que as prescrições das atividades estão no passado,
descritas após as ações, como no exemplo acima “mostrei os blocos e as crianças
desenhavam de acordo com a figura e a cor”. A apresentação das ações no passado
é uma constante: “cantamos”; “conversamos”; “confeccionaram”; completaram”;
“desenharam”, “mostrei”, são exemplos de alguns dos verbos utilizados.
Na busca por indícios, percebemos que este caderno ― bastante esmerado,
ilustrado com figuras coladas ou desenhadas em cada página e uso de canetas
coloridas ― é datado da metade do ano de 1986 e foi construído após as atividades
terem sido realizadas, o que apresenta ao mesmo tempo o conteúdo e a aplicação
das propostas. Os diários revelam de forma mais contundente o que possivelmente
aconteceu nas duas turmas de pré-escola do Projeto Araucária, que analisadas
no cotejamento entre as prescrições do Guia Curricular e os registros dos diários,
demonstram um espaço entre o prescrito e o que possivelmente tenha sido realizado
no trabalho com a criança de 4 a 6 anos, desse contexto em específico.
Considerações Finais
Dessa maneira, os cadernos aqui pesquisados, foram considerados vestígios
que revelaram os fazeres e as práticas cotidianas por dentro da instituição escolar e
permitiram se aproximar de indicativos sobre as propostas pensadas para a criança
em idade pré-escolar na década de 1980, na cidade de Curitiba.
Os registros materializados nesses documentos, são valiosos para pensar as
práticas cotidianas vivenciadas nas turmas em idade pré-escolar, bem como ajudam
a perceber os modos como os professores articulavam ações prescritas pelo Projeto,
com discursos e maneiras de pensar a ação docente para a educação pré-escolar.
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TRABALHOS
COMPLETOS
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