ANAIS - DE - RESUMOS-Final COLUBHE 2020
ANAIS - DE - RESUMOS-Final COLUBHE 2020
ANAIS - DE - RESUMOS-Final COLUBHE 2020
DE
RESUMOS
ISSN 2358-3959
ANAIS
ANAIS
DE
RESUMO
RESUMOS
ISSN 2358-3959
ANAIS DE RESUMO
Organizadoras
Elizabeth Figueiredo de Sá
Marijâne Silveira da Silva
Thalita Pavani de Castro
Organizadoras:
Elizabeth Figueiredo Sá
Marijâne Silveira da Silva
Thalita Pavani de Castro
FICHA CATALOGRÁFICA
Dados Internacionais para Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecária: Elizabete Luciano/CRB1-2103
Anais de Resumos do XII Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação (COLUBHE)
[recurso eletrônico]. Organizadoras: Elizabeth Figueiredo de Sá, Marijâne Silveira da Silva e
Thalita Pavani de Castro. – Dados eletrônicos. Cuiabá-MT: Laercio Miranda Comunicação,
2021.
APOIO:
REALIZAÇÃO:
ISSN 2358-3959
SUMÁRIO
E PENSAMENTO EDUCACIONAL:
ENTRE BRASIL E PORTUGAL
Coordenadora: Carlota Boto
Eixo Temático: Historiografia, fontes e instituições de guarda
Ementa
Em tempos de mundialização das referências culturais, os estudos comparados inevitavelmente
avançam. Cada vez mais, verifica-se a existência de redes internacionais de pesquisas coletivas, de
modo que o uso da rede mundial de computadores possibilite o intercâmbio, a partilha e o confronto
de referências teóricas e mesmo fontes documentais. Os trabalhos a serem aqui apresentados
inscrevem-se nessa tendência de transdisciplinaridade, por um lado; e de transnacionalização, por
outro. São temáticas concernentes, quer ao estudo da situação portuguesa, quer à investigação
da realidade brasileira, mediante a clivagem da história e também através do filtro da pedagogia.
Por ser assim, os temas aqui investigados, expressos em documentações variadas – compostas por
relatórios de Presidentes de Província, por manuais escolares e livros sobre a política da educação,
pelo relato de experiências de formação docente e pelo escrutínio do pensamento pedagógico -,
têm como finalidade o estabelecimento de fronteiras e interações entre os dois países, seja pelo
reconhecimento de similitudes, seja pela demarcação das diferenças. Nesse sentido, são práticas,
são ideias, são culturas, são matérias, são currículos que se imbricam e se distendem, tendo por
resultado o estabelecimento tanto de confluências quanto de deslocamentos. Relatórios de
Presidentes de Província, versando sobre a temática da instrução pública no Maranhão do século
XIX; o projeto pedagógico de Castilho para o ensino da leitura e da escrita, também no XIX, a partir
das representações que, acerca do tema, estavam colocadas em Portugal e no Brasil; o estudo
comparado da Escola Nova no Brasil e em Portugal, no princípio do século XX, por meio do diálogo
entre a produção de Lourenço Filho e de Faria de Vasconcelos; a formação de educadoras da infância
em Portugal a partir das memórias das alunas de um instituto de formação do magistério – esses
são os objetos de estudo das diferentes comunicações que integram essa proposta de mesa de
comunicações coordenadas. Ao lado dos resultados dos trabalhos, os integrantes da mesa procurarão
vistoriar as perspectivas mediante as quais cada uma das pesquisas ora apresentadas dialogou com
a realidade do Brasil e com a realidade de Portugal. Buscou-se e buscar-se-á utilizar o momento da
apresentação, não apenas como a consolidação de um projeto já concluído, mas, sobretudo, como
o desenvolvimento de um trabalho em curso, a ser ainda aprofundado, mediante o fortalecimento
dos vértices do intercâmbio e da partilha cultural. Além disso, cabe reconhecer que, se a disposição
de um sistema de ensino codifica normas de agir para a estrutura da rede escolar, há aspectos, no
domínio da escola, que extrapolam as prescrições normativas dos programas oficiais e das diretrizes
que contam como ou o quê se deverá ensinar. É possível dizer que nem tudo que a escola faz estava
previsto que ela fizesse. A escola não poderá ser avaliada sem que se mergulhe na lógica inscrita em
sua vida cotidiana. Em certa medida, é isso que todas as comunicações aqui propostas pretendem
fazer: mergulhar na vida cotidiana de projetos escolares.
Com a criação desse método de ensino da leitura e com obras como Felicidade pela instrução,
Castilho buscou romper com um ensino por ele denominado velho e criou uma escola metódica, na
qual, em sua fala, a imobilidade, a punição, o enfado, cansaço, espera e demora não lograriam espaço.
A reforma proposta por Castilho evocava um princípio de felicidade pela via da instrução e de
ofícios como a agricultura e ia além de uma reforma pacífica. Ao vislumbrar uma sociedade mais
unida e civilizada, agregou ao ideal de razão e entendimento, advindo da Modernidade, seus projetos
para a instrução e agricultura. O projeto de felicidade pela liberdade em Castilho passava pelas
reformas pacíficas, criando mais ao final da sua vida o ideal de razão e entendimento pelo caminho
da instrução e agricultura sendo, para ele, o caminho para uma mudança social.
Sua proposta de liberdade e felicidade esboçava-se em um projeto de sociedade e de escola
regulada; a felicidade estaria em adequar-se aos ritmos que as palmas e os cantos de seu método
de ensino de leitura impetravam no espaço escolar e aos ritmos das máquinas a vapor que a
modernização da indústria e agricultura esboçava.
Na trajetória pedagógica e política de Castilho é possível analisar as disposições discursivas
propostas em seu projeto reformista, assim como observar o conjunto de estratégias de disputa de
poder ali presentes diante da mobilização das noções do novo e do tradicional. Ao vislumbrar uma
mudança social e política de forma pacífica, sem revolta e sem violência, o poeta português defendia
o liberalismo em sua face mais conservadora.
O projeto de instrução popular de Castilho característico dos homens das luzes do século XIX
tinha a consciência de difundir com o processo de alfabetização, os “germes de uma piedade
esclarecida” (CHARTIER & HÉBRARD, 1995, p.117) e perpassava um empenho laborioso e incessante
de aperfeiçoar a instrução através das tentativas de oficializar seu método de ensino de leitura, sendo
tais atividades imprescindíveis, em sua visão, para o desenvolvimento da cruzada da civilização.
António Feliciano de Castilho vislumbrava pela via da eleição do agricultor e do suposto
investimento financeiro no campo da agricultura instruir e formar novos cidadãos hábeis tanto na
leitura, escrita e no ofício permeado pelo saber científico a ser compartilhado nos novos espaços
instrucionais que necessitavam ser construídos. Sua utopia de regeneração social pela modernização
da agricultura e da instrução angariou para si inúmeros adeptos e não menos opositores.
Dessa forma, a saga do poeta português António Feliciano de Castilho foi ressoando em espaços
para além do raio de sua ação na ilha de São Miguel, alcançando todo Portugal e, em um contexto de
internacionalização dos debates pedagógicos, adentrando em solo brasileiro.
Boto e Albuquerque (2018) registraram uma ação pontual da vinda do poeta e educador português
António Feliciano de Castilho (1800-1875) para apresentação de seu método na Corte brasileira.
O curso dado por Castilho passou por momentos de rejeição explícita, implicando inclusive o
cancelamento do mesmo curso; o que suscitou inúmeras discussões.
O método de ensino desenvolvido por Castilho no momento de sua permanência na Ilha de S.
Miguel assumiu um caráter transnacional e, dentre vários outros que circularam nas províncias
brasileiras em meados do século XIX, apresentava-se como uma proposta de escola moderna,
caracterizada por sua função modeladora, racionalizadora, normativa e reguladora da cultura
letrada. Seu método de ensino foi enunciado no prólogo da obra Método Castilho para o ensino
rapido e aprasivel do ler impresso, manuscrito, e numeração e do escrever (1853) como patrimônio
geral e não privilégio, não sendo, portanto, tido “nem como virtude nem mercê, e sim como justiça
e pagamento da dívida. Subtrair, sonegar, aos espíritos o seu sol, dificultá-lo, encobri-lo e mesmo
vendê-lo é falsear a lei divina; é profanar a obra prima do Criador” (CASTILHO, 1853, n.p).
A saga do português António Feliciano de Castilho no campo da instrução pública brasileira
engendrou sua proposta de ensino de leitura e escrita à do ensino do ofício da agricultura. Dessa
forma, a partir do estudo da vida e obra de António Feliciano de Castilho, serão apresentados
inúmeros sujeitos, ideiais e impressos que circularam no campo da instrução pública primária tanto
em Portugal quanto no Império brasileiro, demarcando inúmeras presenças e posicionamentos.
Essa comunicação possibilitará compreender um campo repleto de articulações, estudos, matrizes,
ideias, impressos, debates, rupturas, apropriações, resistências, em um olhar historiográfico para
além das carências e silenciamentos.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 10
Referências
BOTO C.; ALBUQUERQUE S. L. (2018). Entre idas e vindas: vicissitudes do método Castilho no Brasil
do século XIX. Revista de História da Educação, v. 22, p. 16-37.
CASTILHO, A. F. (1853) Método Castilho para o ensino rapido e aprasivel do ler impresso, manuscrito, e
numeração e do escrever. Consultado em Dezembro, 2012, em: <http://sigarra.up.pt/up/web_base.
gera_pagina?p_pagina=1001565>.
______. Felicidade pela instrução. Lisboa: Tipografia da Academia Real das Ciências, 1854.
CASTILHO, Julio de. Memórias de Castilho. O Instituto: jornal científico e literário. Coimbra: Imprensa
da Universidade, Vol. 40, 1892/1893.
CHARTIER, Anne-Marie; HÉBRARD, Jean. Discursos sobre a leitura (1880-1980). SP: Editora Ática, 1995.
ISSN 2358-3959
A FORMAÇÃO DE EDUCADORAS DE
INFÂNCIA EM PORTUGAL (1954-1977):
UM OLHAR A PARTIR DAS MEMÓRIAS DE ALUNAS
DO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO INFANTIL
Apesar de se ter assistido, nas últimas décadas, a um interesse crescente pela história da
educação de infância, os estudos acerca desta temática têm-se centrado na análise do processo
de desenvolvimento e expansão deste nível educativo (e.g. Gomes, 1977), nas transformações
nas políticas de educação de infância (e.g. Cardona, 1997; Vilarinho, 2000) ou na emergência
e desenvolvimento do grupo profissional dos educadores de infância (e.g. Cardona, 2008) ou
ainda na história de instituições ou modelos pedagógicos específicos. Pouca atenção tem sido
dada, em Portugal, à história da formação de educadoras de infância, tema sobre o qual incide
este trabalho. Mais concretamente, é nosso objetivo contribuir para um maior conhecimento da
história da formação de educadoras de infância, em Portugal, no período compreendido entre
1954 e 1977.
A opção pelo ano de 1954 como limite temporal inferior deve-se ao facto corresponder ao
ano em que são criadas as duas primeiras escolas destinadas exclusivamente à formação de
educadoras de infância no nosso país- a Escola de Educadoras de Infância, criada por Maria Ulrich
e o Instituto de Educação Infantil, fundado por Maria Teresa Andrade dos Santos – localizadas
em Lisboa. A tal não será alheio o facto de esta ser também a década em que se começa a assistir
a um aumento na procura deste nível de ensino, fruto, em parte, da transformação na forma
como a educação infância é encarada - entre os anos letivos 1950-51 e 1959-60, o número de
instituições quase que duplica (passa de 94, em 1950-51, para 177, em 1959-60), assistindo-se a
um aumento ainda mais surpreendente no número de crianças que as frequentam, que passa
de 1954 para 6126 (Gomes, 1977).
Uma visão predominantemente assistencialista da educação de infância, concebida
para o acolhimento de crianças de classes sociais mais desfavorecidas durante o período
de trabalho das mães, e que predominou durante as primeiras décadas do Estado Novo, é
progressivamente substituída pela sua conceção como instituições destinadas à educação das
crianças, e cuja frequência, por se tratar de uma educação coletiva, assegurada por profissionais
especializadas, conscientes das necessidades educativas desta faixa etária, seria vantajosa para
o desenvolvimento social e intelectual das crianças, designadamente na sua preparação para
as exigências próprias da entrada no nível educativo seguinte, a escola primária. O público-
alvo deixa de se restringir às crianças oriundas das classes mais desfavorecidas, e assiste-se,
gradualmente, à defesa da sua universalização.
a ênfase na importância dos aspetos éticos e estéticos; o caráter inovador dos métodos e
das práticas pedagógicas utilizadas na formação das educadoras de infância, salientado por
todas as entrevistas, designadamente a utilização de métodos mais interativos, que apelavam
para o desenvolvimento da sua capacidade crítica, aspeto essencial na construção de uma
profissional reflexiva, que se interrogasse constantemente sobre a adequação das suas práticas;
a preocupação constante não só com a formação e o desenvolvimento profissional, mas também
com o desenvolvimento pessoal das futuras educadoras de infância.
Referências
CARDONA, Maria João. Para a história da educação de infância em Portugal: O discurso oficial
(1834-1990). Porto: Porto Editora, 1997.
CARDONA, Maria João. Contributos para a história dos profissionais de educação de infância em
Portugal. Interações, n. 4, v. 9, pp. 4-31, 2008.
As ideias que nortearam a institucionalização de escolas para a classe popular no Brasil são as
expressões dos novos rumos que foram sendo tomados e que perpassaram pela construção
ideológica de um novo ideal de homem e sociedade. Acerca disso, as mudanças ocorridas no século
XVIII, principalmente na Europa, alteraram os rumos da educação no Brasil no século seguinte.
Novos projetos sociais, políticos e econômicos foram elaborados em decorrência de tais mudanças
e o advento do Império brasileiro se configurou como momento primordial e privilegiado, como um
verdadeiro laboratório em que se pode observar a ligação entre as ideias que fundamentaram a
institucionalização de escolas primárias públicas e os fundamentos da sociedade pois, a educação
passa a ser encarada, a partir de então, como um dos elementos-chave na modelagem de uma nova
sociedade, a ponto de a instrução da população ser vista por alguns como uma espécie de panaceia
para quase todos os males de que a sociedade padecia. Por isso, nosso objetivo é compreender
como se chegou ao “direito” à escolarização da massa popular no Brasil, evidenciando como
historicamente adquirimos o direito à instrução pública, visto que a modernização que a sociedade
desse século sofreu colocou na educação a crença de que esta seria a chave para todos os problemas
fundamentais do país. Essa modernização da sociedade brasileira era uma exigência de fato, fruto
do estágio atingido no processo de mudança da base da sociedade exportadora brasileira, que de
rural-agrícola passa para urbano comercial. É interessante ressaltar que tanto os grupos internos
(parte da camada dominante e média) como externos (burguesia, que evoluiu de mercantil para
concorrencial) estão interessados nela. Foi uma adaptação necessária entre regiões hegemônicas e
periféricas que integram o sistema capitalista na fase industrial e concorrencial à época. A delimitação
temporal dessa investigação vai do momento em que o Marques de Pombal expulsa a Companhia de
Jesus das terras brasileiras (1759), perpassando pelo momento da Independência do Brasil (1822)
até 1850, marco cronológico do fim da primeira metade do século XIX. Partimos da afirmação de que
a pesquisa histórica é sustentada pelo tripé: as teorias da história, as fontes e a interpretação,
portanto, privilegiamos os estudos de Carlota Boto (2017); Clarice Nunes (1989); Carlos Monarcha
(2016); César Augusto Castro (2009, 2011) e Peter Burke (2010) que são pesquisadores da história e
História da Educação para sustentar as análises. E, recorremos à pesquisa documental, detendo-nos
na análise e na seleção dos relatórios de governo dos presidentes da província do Maranhão. Estes
relatórios são documentos que compreendem textos descritivos sobre a atuação e ideias dos
presidentes nas diversas áreas da administração pública, atendendo a uma determinação
constitucional. Cabe ressaltar que apesar dessas fontes serem peças políticas são reveladoras do
fazer da política educacional no interior das províncias do Brasil ao longo do século XIX, principalmente
por realizarem um balanço administrativo anualmente por parte do respectivo presidente e, ainda,
suscitar o debate e a tomada de posição acerca das realizações e das proposições do executivo
provincial. Quanto a metodologia aplicada, elegemos os pressupostos da Nova História para o
desenvolvimento desse trabalho, pois graças à contribuição dos historiadores dos Annales, tanto o
conteúdo como a concepção de documentos e de objetos de pesquisa se ampliaram e se
enriqueceram, nos permitindo olhar para o passado e trazer para o tempo presente o que antes não
era visto e não fora escrito oficialmente. A nova história nos propiciou investigar os acontecimentos
históricos da experiência humana e evidenciar os fatos educacionais ainda não analisados, o que
nos faz inferir que o debate acerca da ‘nova história’ situa-se, pois, como uma necessária interlocução
metodológica; diálogo este cujo objeto remete-se ao repertório da escrita historiográfica e às
estratégias de sua produção” (BOTO, 1994). É relevante frisar que esta pesquisa toma como proposta
de investigação a leitura, a interpretação e a análise dos relatórios de governo no movimento que
forma um tripé: teoria, fontes e interpretação (Nunes,1989), consideradas mais significativas para a
escola primária com fins de serem compreendidas em sua complexidade, levando em conta as forças
políticas, educativas e sociais que as compõem. Essa complexidade exige muita atenção às fontes
eleitas, aos modos de interpretações, aos procedimentos metodológicos e à escrita que assinala
relações diferentes. Assim, com base nesta perspectiva, a pesquisa documental aproxima-se da
pesquisa bibliográfica. O elemento diferenciador está na natureza das fontes: a pesquisa bibliográfica
comparada remete para as contribuições de diferentes autores sobre o tema, citados anteriormente,
atentando para as fontes secundárias, enquanto a pesquisa documental recorre a materiais que
ainda não receberam tratamento analítico, ou seja, as fontes primárias. Nossas análises apontam
que a educação escolar é abordada no início do século XIX baseada em discursos ideológicos
fundamentados pelo liberalismo econômico “instruir o povo” era a ordem, já que se precisava de
mão de obra preparada, escolarizada – uma vez que no Brasil acontecia a passagem de uma
sociedade exportadora-rural-agrícola para uma exportadora-urbana-comercial que precisava atingir
as exigências dos interesses externos. A instituição do Império se concebe como momento crucial e
privilegiado, pois a conquista da autonomia política, ou seja, o surgimento da nação brasileira,
impunha exigências à organização educacional e percebemos que a sociedade brasileira, de base
escravocrata, trabalhou a oferta e ampliação ou “popularização” da escola elementar. Quando
pensamos na construção da escola pública no Brasil, frequentemente nos reportamos às ações dos
republicanos, todavia sabemos que, na história da educação brasileira, o ensino público foi
engendrado em meados do século XVIII, por meio da ação do marquês de Pombal, muito antes do
advento da República. Tratou-se, portanto, de uma política de Estado que veio pelo alto e que
prescindiu de qualquer revolução social para se instituir. Alto de um déspota esclarecido e, com a
instituição das aulas régias, vinha também uma nova concepção de nacionalidade. No entanto, é
comum, nesse sentido, vincularmos, por vezes, as razões da criação da escola de Estado ao imaginário
do republicanismo. Entretanto, desde o século XVII, vinham-se operando na Europa várias
modificações no campo religioso, político e filosófico, o que posteriormente mudaria o curso da
educação no Brasil. Essas modificações atingiram seu apogeu no século XVIII, sob a influência da
Revolução Científica do século anterior. Carlota Boto (2017) caracteriza o século XVIII como intérprete
da ciência, da infância e da escola e, neste ponto, a autora ratifica a existência das influências desse
pensamento sobre a instrução pública em Portugal e posteriormente no Brasil, revelando que a
nova concepção de ciência que o século XVIII traz a lume já estava posta em Portugal desde meados
do século. Verifica-se também que tal definição de conhecimento estabelece confluência com o
lugar diferenciado a ser ocupado pela ação estatal. Era necessário para os iluministas portugueses,
rediscutir o lugar público do Estado na conformação do Reino. Chegadas essas transformações em
Portugal e consequentemente no Brasil, tão necessárias para o grande território dominado pela
Coroa portuguesa, elas se intensificaram, principalmente a partir de 1750, por meio das iniciativas
do primeiro ministro do rei D. José I, o marquês de Pombal, o qual, influenciado pelo pensamento
iluminista de seu tempo, percebeu, a respeito da educação que Um Estado que não controla a licença
para ensinar ou que não é capaz de averiguar a legitimidade dos que agem em nome da medicina é
um estado fadado ao fracasso, do ponto de vista das políticas públicas. Os iluministas portugueses
perceberam isso; e essa talvez tenha sido a grande marca da presença Pombalina em todo território
Luso. É com a expulsão dos jesuítas que se inicia o projeto de modernização português pelo marquês
de Pombal. Com a expulsão dos jesuítas das terras pertencentes à Coroa portuguesa, o novo sistema
que se inaugurou no Brasil foi o que se denominou de aulas régias, pagas pelos cofres da Coroa.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 16
Referências
BOTO, Carlota. Instrução pública e projeto civilizador: o século XVII como interprete da ciência, da
infância e da escola. São Paulo: Editora Unesp, 2017.
BURKE, Peter. A escola dos annales 1929 – 1989: a revolução francesa da historiografia. Tradução:
Nilo Odalia. – 2. Ed. – São Paulo: Editora da Unesp, 2010.
CASTRO, César Augusto. A ação da inspetoria geral de instrução pública no Maranhão Império:
1841 -1889. In. VI Congresso Brasileiro de História da Educação, Vitória-ES, 2011.
MONARCHA, Carlos. A instrução pública nas vozes dos portadores de futuros (Brasil – séculos XIX e
XX), Uberlândia: EDUFU, 2016.
NUNES, Clarice. Pesquisa histórica: um desafio. Caderno ANPED. Rio de Janeiro, nº 2, 1989.
ISSN 2358-3959
Carlota Boto
A presente comunicação tem por objetivo analisar comparativamente a produção teórica de dois
expoentes do movimento da Escola Nova, um português e um brasileiro, respectivamente António
de Sena Faria de Vasconcelos e Manuel Bergström Lourenço Filho, com a finalidade que verificar o
projeto de escola republicana que cada um deles perfilhava. Do ponto de vista teórico-conceitual,
a perspectiva analítica ancora-se no paradigma da História das Mentalidades, a partir da hipótese
segundo a qual as ideias defendidas por ambos os autores expressavam convicções partilhadas
pelos teóricos da época acerca do fenômeno educativo. Metodologicamente, a pesquisa deverá
proceder mediante a recolha e classificação de livros e artigos dos dois educadores, fontes que
serão vistoriadas e analisadas em consonância com as hipóteses teórico-conceituais que norteiam a
investigação. A construção do trabalho pretende efetuar uma revisão do estado da arte sobre ambos
os autores, mas propõe-se a acrescentar algo em relação àquilo que já foi escrito, por buscar percorrer
a internalidade das obras em correlação com o espírito de seu tempo e com o debate que existia
internacionalmente sobre a produção e circulação das ideias pedagógicas. Por fim, pretende-se
mapear a maneira pela qual foram estabelecidas fronteiras culturais e imbricamentos de propostas,
que aproximavam, mais do que afastavam, os modos de compreender o fenômeno educativo.
Pensar a História da Educação no século XX, em Portugal como no Brasil, requer que se atente
para o tema da Educação Nova ou da Escola Ativa. Como a escola moderna fez uma autocrítica e
passou a meditar sobre sua própria transformação? Esse é o eixo do problema, quando se busca
verificar o que se passava nas escolas e quais eram suas possibilidades de mudança. O primeiro
elemento a ser considerado foi o avanço ocorrido em áreas correlatas, sobretudo os progressos no
campo da Biologia, da Antropologia, da Sociologia e da Psicologia. A questão colocada naquele
princípio do século XX era a seguinte: por que as crianças que vão para a escola lá não aprendem?
Era necessário mudar a escola; era necessário repensar os métodos de ensino. Passa-se a recusar,
desde então, o que passará a ser qualificado como modelo de ensino tradicional. Era como se os
educadores do período tivessem duas tarefas: a de contribuir para a irradiação das oportunidades
escolares e a de fazer a crítica aos modelos e métodos então adotados pela escola tradicional.
O desafio, para que se compreenda o movimento da Escola Nova em países como Portugal e
Brasil, é o seguinte: como projetar uma escolarização pautada pela liberdade e pelo interesse
da criança, sendo, ao mesmo tempo, necessário dotá-la de instrumentais teóricos e conceituais
imprescindíveis para o domínio da norma culta da língua e do acervo cultural de conhecimentos
acumulados? Ou seja: como conciliar conteúdos e matérias sólidas de ensino com métodos
atraentes, que respeitem o desenvolvimento biopsicológico do educando?
Ambos os autores – Faria de Vasconcelos em Portugal e Lourenço Filho no Brasil – dialogam
implicitamente com as concepções possíveis de democratização do ensino. Essa expressão pode ser
compreendida, em uma primeira acepção, como a disponibilização da escola para todos, ou seja,
como a extensão das oportunidades escolares, o que permitiria a configuração de uma sociedade
mais bem distribuída, mais democrática. Por outro lado, democratização de ensino é também a
criação do artefato da democracia na engrenagem pedagógica. Isso supõe colocar a democracia
na sala de aula, transformar a aula em exercício de democracia, de maneira a que, ao vivenciar a
liberdade, as crianças possam aprender a viver e a conviver em liberdade. Tanto em uma perspectiva
como na outra, Faria de Vasconcelos e Lourenço Filho dialogaram com o ideário democrático na
educação. É necessário estudar seus trabalhos e suas intervenções públicas, com o objetivo de
verificar até onde se estendia, em cada um, o compromisso democrático; quais eram as fronteiras e
linhas de passagem que estavam dadas nas respectivas concepções de escola democrática.
António de Sena Faria de Vasconcelos (1880-1939) é um educador português que tem sido
caracterizado pela literatura pedagógica como um líder do movimento da Escola Nova em
Portugal e internacionalmente. Ele destacou-se por sua atuação junto à cadeira de Psicologia e
Pedagogia da Universidade Nova de Bruxelas e também porque criou uma escola experimental
em Bierges-les-Wavre. Sua atuação nessa escola seria descrita no livro Uma escola nova na
Bélgica, publicado em 1915. Depois da Primeira Grande Guerra, Faria de Vasconcelos se dirigirá
para Genebra, passando a integrar a equipe que compunha, na época, o Instituto Jean-Jacques
Rousseau. Ali, ele travaria contato com Claparède, Ferrière e Bovet. Foi um dos fundadores, em
Portugal, do grupo Seara Nova. Em Lisboa, não apenas dará aulas na Faculdade de Letras, como
funda o Instituto de Orientação Profissional, voltado para aplicação de práticas psico-pedagógicas
no âmbito da orientação escolar. Faria de Vasconcelos defende a tese do self-government, pelo
qual as próprias crianças elegeriam seus líderes, e onde a escola efetivamente se tornaria uma
miniatura de sociedade pautada pela democracia direta.
Manuel Bergström Lourenço Filho (1897-1970) nasceu em 10 de março de 1897, na vila
de Porto Ferreira no Estado de São Paulo. Fez os estudos primários em Santa Rita do Passa
Quatro, cursou o ginásio de Campinas, mas não terminou o curso. Em 1912, matriculou-se
na Escola Normal Primária de Pirassununga. Em 1914, recebeu o diploma de normalista. Em
1915, trabalhou como professor primário em Porto Ferreira, mas já em 1916, muda-se para São
Paulo, com o intuito de cursar a Escola Normal da Praça da República. Lourenço Filho conclui
seus estudos no curso normal em 1917 e em 1918 matricula-se na Faculdade de Medicina
de São Paulo, curso que ele interromperia algum tempo depois. Nessa época, Lourenço
Filho escrevia no Jornal do Commercio e na Revista do Brasil, onde trabalharia com Monteiro
Lobato. Em 1919, passou a escrever também no jornal O Estado de S. Paulo. Desde 1917
ele integraria o núcleo da recém-fundada Liga Nacionalista de São Paulo, da qual participa
também o diretor do mesmo jornal, Julio de Mesquita Filho. Em 1921, Lourenço Filho passou
a lecionar Psicologia e Pedagogia na Escola Normal de Piracicaba. Em 1922, Lourenço Filho
seria nomeado Diretor-Geral da Instrução Pública do Ceará, com a finalidade de reformar o
ensino naquele estado. Esteve em Fortaleza até 1923, encarregando-se da administração do
sistema de ensino, mas também ensinando na Escola Normal de Fortaleza. Sua reforma do
ensino no Ceará foi bastante importante na época. Em 1924, ele reassumiria suas aulas na
Escola Normal de Piracicaba. Lourenço Filho integra a geração de educadores do Brasil que
compôs o grupo dos chamados Pioneiros da Escola Nova. Nesse sentido, defendeu uma escola
pública, gratuita, laica, obrigatória, única e universal, para ambos os sexos. Lourenço Filho
é um intelectual que procurou superar a tradição ensaística que marcava os escritos sobre
educação no Brasil daquele período, adotando um padrão científico e acadêmico de redação
da matéria educativa. Pretendia dispor a pedagogia a partir de critérios de cientificidade; e,
para tanto, atrelava seus estudos tanto ao repertório da sociologia quanto da psicologia.
A finalidade da pesquisa aqui empreendida é o reconhecimento dos paralelos que aproximam
e distanciam o ideário pedagógico produzido pelo conjunto da obra de Faria de Vasconcelos,
em relação àquele que produzirá Lourenço Filho. Sendo assim, supomos uma intersecção e
uma fronteira entre as ideias – pontos em que elas se tangenciam e também pontos nos quais
elas se distanciam. Acreditamos que, por meio do estudo desses dois intelectuais exemplares
do que de melhor o movimento da Escola Nova produziu em Portugal e no Brasil, será possível
compreender as maneiras pelas quais as ideias pedagógicas foram produzidas, apropriadas,
reproduzidas e se faziam circular naquele específico período histórico. Colocar, nesse sentido,
em articulação as ideias da Escola Nova elaboradas nos dois países de língua portuguesa
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 19
Referências
CATROGA, Fernando. O republicanismo em Portugal: da formação ao 5 de outubro de 1910. Coimbra:
Faculdade de Letras, 1991.
FARIA DE VASCONCELOS. Obras completas (1915-1920). Tomo II. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 2000.
LOURENÇO FILHO, M. B. Introdução ao Estudo da Escola Nova. 7ªed. São Paulo: Melhoramentos, s/d (b).
Ementa
A Comunicação Coordenada apresenta como desafio penar a circulação de artefatos escolares
entre Brasil e Portugal da segunda metade do século XIX às primeiras décadas do XX. Para tanto,
elege três artefatos: as sebentas acadêmicas, anotações estudantis de sala de aula produzidas no
âmbito do ensino superior-universitário; os livros da Biblioteca do Podo e das Escolas, publicados por
David Corazzi; e materiais para uso nas aulas, para secretaria e para o funcionamento geral da Escola
Normal Caetano de Campos fornecidos pela Casa Lebre, Mello & Comp. A primeira comunicação é de
autoria de Margarida Felgueiras e Marcia Cruz e problematiza práticas de estudo no âmbito do ensino
superior-universitário e a produção de artefatos delas decorrentes. É parte de uma pesquisa mais
ampla que questiona: o que de fato sabemos sobre como os estudantes estudam? Que mecanismos
e estratégias foram historicamente utilizados? Quais as mutações sofridas nas práticas das anotações
de sala de aula no interior da universidade? A segunda comunicação, de autoria de Diana Vidal,
pretende explorar as estratégias de comercialização mobilizadas entre 1881 e 1889 para impressos
e, em particular, aqueles dedicados à escola e às classes populares, bem como a circulação destes
artefatos culturais entre Brasil e Portugal. Para tanto, toma a editora David Corazzi como mote. Ao
escopo da análise se associa ainda uma apresentação de exemplares da coleção Biblioteca do Povo
e das Escolas, de modo a caracterizar estes impressos, compreendendo os aspectos materiais como
parte integrante do empreendimento comercial. Já a terceira e última comunicação, da lavra de
Wiara Alcântara, objetiva discutir, sob uma perspectiva histórica, as relações entre escola e mercado
no processo de institucionalização da escola pública paulista. Usando as lentes da História da
Educação, da História Econômica e da Cultura material, o interesse reside em pensar como a escola
também movimenta o mercado local. Parte do caso da comercialização de artefatos escolares de
uma casa comercial portuguesa, a Casa Lebre, Mello & Comp. para a Escola Normal Caetano de
Campos, ambas em São Paulo, entre 1893 e 1895.
Palavras-chave: Sebenta. Formação Jurídica. Cultura Acadêmica. Cultura material Escolar. Práticas
de escrita ordinária.
1 margafel@fpce.up.pt ou reduf.proj@gmail.com
2 marciacruz@fpce.up.pt ou marciacruz.refuf.murcapt@gmail.com
ficassem com borrões gordurosos, que concediam uma aparência visualmente inadequada. O nome
sebenta também é associado às características de usos do artefato, uma vez que estas, na maioria dos
casos, apresentavam-se com uma aparência de sujidade, com o papel muito encardido, devido à
utilização contínua, por grande período de tempo, pelos diversos estudantes que se sucediam ano a ano.
Nesse sentido este estudo busca realizar aproximações da prática das anotações em sala de aula em
Portugal, com aquelas existentes no Brasil. Para tanto, estabelece como centralidade o estudo da
formação jurídica e, para a realização do exercício de aproximação elege em Portugal, a Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbra, por ter sido a primeira de sua natureza a ser fundada em Portugal,
em 1210, por D. Dinis. O Studium Generali, assim se designava a Universidade, obteve autorização de
funcionamento por meio da Bula Papal “Scientiae thesaurus mirabilis”. A Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra, ao longo de sua história e práticas de formação jurídica incorporou e consolidou
a produção e o uso de sebentas. No Brasil, a opção investigativa recaiu sobre a Faculdade Livre de
Sciências Jurídicas e Sociaes do Rio de Janeiro, fundada em 1891 que, juntamente com a Faculdade Livre
de Direito do Rio de Janeiro deu origem, em 1920, a hoje denominada Faculdade Nacional de Direito da
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Quanto à primeira instituição jurídica mencionada cabe ressaltar
a significativa publicação de anotações de sala de aula, com a mesma finalidade atribuída pelos
estudantes em Portugal sem contudo se apresentar como a mesma denominação ou seguir o mesmo
processo editorial. Além disso a Faculdade Livre de Sciências Jurídicas e Sociaes do Rio de Janeiro só foi
fundada após mais de meio século da instituição dos Cursos Jurídicos brasileiros, ocorrida em 1827 em
São Paulo e em Olinda – Pernambuco, instituições pelas quais circularam muitos estudantes brasileiros e
portugueses que estudaram na Faculdade de Direito de da Universidade de Coimbra. O objetivo deste
trabalho é apresentar e descrever a prática das anotações de sala de aula nessas duas instituições e nelas
os agentes envolvidos, a materialidade dos artefatos e a rede de sociabilidades constituída. Do ponto de
vista teórico partimos do pressuposto de que a prática e os artefatos no âmbito das instituições sob
estudo integram a denominada “Cultura Acadêmica” (CRUZ, 2014), composta por “ritos, símbolos e
práticas” específicas do ensino superior-universitário, na perspectiva simbólica e material, marcada pela
pluralidade que, na presente investigação, guarda ligação com aspectos da cultura escolar (VIDAL, 2009)
assim como, com as práticas ordinárias de escrita (LAHIRE, 2002) que a partir da perspectiva da cultura
material escolar, consubstancia-se em forma de objetos e artefatos “que possuem um pouco da nossa
alma, pois estruturam a nossas vidas e estão impregnados de significações e afectos, que nos constituem
como pessoas” (FELGUEIRAS, 2010, p. 31). Desse modo interessou-nos entender inicialmente como essa
prática circulou entre Portugal e o Brasil e, em um segundo momento, como era vivenciada na Faculdade
Livre de Sciências Jurídicas e Sociaes do Rio de Janeiro. Com vistas a proceder à investigação proposta,
nossa opção, do ponto de vista metodológico, foi a utilização do Paradigma Indiciário (Ginszburg, 1989),
considerando que a historiografia tradicional relegou a um segundo plano os estudos que tratam das
atividades estudantis, principalmente quando dizem respeito a aspectos folclorizados das tradições
acadêmicas, como é o caso das sebentas, que ocupam um estatuto de menor dignidade acadêmica.
Nesse sentido, Ginzburg assim se expressa “[...] Se a realidade é opaca, existem zonas privilegiadas –
sinais, indícios – que permitem decifrá-la. [...]”, tornando-se necessário, assim, “[...] examinar os
pormenores mais negligenciáveis [...]” (GINZBURG, 1989, p. 177). O Paradigma Indiciário foi aplicado a
um diversificado conjunto de fontes: bibliográficas (livros e relatos memorialísticos), documentais
(regulamentos do Curso de Direito), periódicas (jornais e revistas), iconográficas (imagens). Também
utilizamos a história oral, por meio de entrevistas a ex-estudantes da década de 1950 e 1960 em Portugal,
que, apesar de estar fora da datação do estudo envidado, permitiu que tivéssemos uma dimensão da
relação dos estudantes com a prática e com o artefato e seu uso. Realizamos o cotejamento entre essas
diversas fontes. O marco temporal definido para o estudo, as duas primeiras décadas do século XX,
sinaliza que o recorte contempla períodos comuns de vivência do republicanismo no Brasil e em Portugal.
O processo editorial das sebentas atuou como um divisor temporal, pois contemplou, nos dois países, o
uso da mesma tecnologia: a litografia e a tipografia. Por fim, foi verificado quanto à prática, quais os
agentes envolvidos e a materialidade dos artefatos, que continham as referidas anotações. Os resultados
obtidos a partir da aproximação realizada permitem afirmar a necessidade do historiador da Educação
procurar alternativas investigativas nas práticas do cotidiano do ensino superior e dos objetos que lhes
são afetos, identificando e resignificando tais práticas, inclusive para que possam ser explicadas e
compreendidas. Sinalizamos que as anotações estudantis de sala de aula são um tema fértil a merecer
maior e mais aprofundada atenção dos historiadores da Educação, em face das diversas conexões que a
prática possibilita, a exemplo da cultura acadêmica, da cultura material acadêmica, dentre outras. A
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 23
migração da prática das anotações de sala de aula para outros níveis de ensino como o secundário ou os
cursos técnicos e artísticos, tem dificultado a percepção de sua importância como objeto de estudo e
patrimônio educativo.
Referências
CRUZ, Marcia Terezinha J. O. Ritos, Símbolos e Práticas Formativas: a Faculdade de Direito de Sergipe
e sua cultura acadêmica. São Cristóvão-Sergipe: UFS, 2014 (Tese de Doutoramento em Educação).
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In: FELGUEIRAS, M. L.; VIEIRA, C. E. (Eds.). Cultura Escolar, Migrações e Cidadania. Porto: Sociedade
Portuguesa de Ciências da Educação, 2010. p. 17-32.
GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. Tradução Federico Carotti. 2. ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
LAHIRE, Bermnard. Homem Plural. Os determinantes da ação. Petrópolis: Editora Vozes, 2002.
VIDAL, Diana Gonçalves. No interior da sala de aula: ensaio sobre culturas e práticas escolares. In:
Curriculo sem fronteiras. V. 9, nº 1, pp 25-11, JAN/JUN 2009.
ISSN 2358-3959
Este trabalho objetiva discutir, sob uma perspectiva histórica, as relações entre escola e mercado
no processo de institucionalização da escola pública paulista. Há trabalhos significativos na área da
História da Educação que já se debruçaram sobre a emergência de um comércio internacional de
objetos escolares, a partir da segunda metade do século XIX (Vidal, 2007; Alcântara, 2014; 2018;
Meda, 2017). Aqui, usando as lentes da História da Educação, da História Econômica e da Cultura
material, o interesse reside em pensar como a escola também movimenta o mercado local. Para
tanto, será tomado o caso da comercialização de artefatos escolares de uma casa comercial
portuguesa, a Casa Lebre, Mello & Comp. para a Escola Normal Caetano de Campos, ambas em São
Paulo. Entre 1893 e 1895, a Casa Lebre é uma importante fornecedora, não apenas de materiais para
uso nas aulas, mas também artigos para festas, para secretaria e para o funcionamento geral daquela
instituição. São usadas como fontes ofícios produzidos pela Secretaria da Escola Normal de São
Paulo ou pelo Thesouro do Estado de São Paulo, notas de compra fornecidas pela Casa Lebre,
anúncios e propagandas de jornais sobre as atividades comerciais da Casa Lebre. O procedimento
metodológico consiste em confrontar tais fontes buscando compreender o comércio de artefatos
entre uma casa comercial portuguesa e uma escola de formação de professores, na cidade de São
Paulo. A Casa Lebre foi fundada em 1858, como uma loja de ferragens, pelos irmãos João Lopes
Lebre e Joaquim Lopes Lebre. Este último, além de um importante comerciante português, foi um
dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Beneficência de São Paulo, recebeu o título de barão e
depois conde de São Joaquim e deu nome a duas ruas na cidade de São Paulo, a rua Conde de São
Joaquim e a rua São Joaquim. Inicialmente, a empresa chamou-se Casa Lebre & Irmão, mas, segundo
Barbuy (2006), em 1880 foi associada aos Mello. A loja estava situava, na Esquina da Rua Direita com
a Rua XV de Novembro, em uma região de modernos comércios no centro da cidade de São Paulo,
conhecida como Triângulo. De acordo com Barbuy (2006), o estabelecimento experimentou uma
notável prosperidade, ampliação, modernização e refinamento das mercadorias, passando a vender
artigos variados e a ter marcas próprias de ferragens. As lojas de ferragens foram “um ramo que
tendeu a manter-se nas mãos de luso-brasileiros [...] em 1857, eram dezessete casas desse gênero,
todas em mãos de portugueses ou brasileiros, espalhadas no Triângulo” (Barbuy, 2006, p.153). A
autora ainda ressalta que a Casa Lebre desenvolveu o comércio de drogaria, perfumaria e brinquedos
importados, dos principais fabricantes da Europa e móveis austríacos Thonet. Tais informações,
levantadas por Barbuy (2006), a partir de anúncios de jornais, podem ser vistas também nas notas de
compra fornecidas pela empresa. Nas notas de compra fornecidas pela loja à escola constam
informações sobre o ramo do comércio e as mercadorias fornecidas. Destaca-se como uma loja de
ferragens, mas vende também “miudezas de armarinho, drogas, tintas, kerozene, chá, ceras e couro,
completo e variadíssimo sortimento de perfumarias finas e artigos de ferro batido” (APESP, Série
Manuscritos. Secretaria do Interior. Escola Normal.Ano 1892. Caixa 530). No ofício de n. 111, da
Secretaria da Escola Normal de São Paulo, o diretor informa ao Secretario de Estado dos Negócios do
Interior a realização de uma despesa extraordinária, feita com a exposição escolar, no valor de
708$200 contos de réis. A quantia deveria ser paga a Lebre, Mello e Comp. pelo fornecimento de um
conjunto variado de artigos como fitas de cor, fechadura com campainha, toalhas papel de seda,
metros de tecidos diversos, grama, arame, dentre outros. Esse ofício chama a atenção porque, de
um lado, faz menção a uma possível exposição escolar realizada pela Escola Normal, no ano de 1895.
De outro, evidencia como a escola passou a depender cada vez mais do comércio local, não apenas
para o fornecimento de materiais didáticos, mas de um conjunto de outros artefatos necessários ao
seu funcionamento. No ano de 1895, no ofício número 94 da Secretaria da Escola Normal de São
Paulo, o diretor da instituição solicita ao Thesouro do Estado o pagamento de 682$220 contos de réis
em favor de Lebre, Mello & Comp. pela aquisição de material de ensino para as aulas de trabalhos
manuais e de economia doméstica, na seção feminina. A relação das mercadorias vendidas,
constante na nota de compra, permite saber mais sobre os materiais usadas nessas aulas de
trabalhos manuais e economia doméstica, na seção feminina da Escola Normal. Em 31 de agosto de
1895 foram fornecidos, dentre outras mercadorias, 6,25m de casimira; 12 papéis de agulha; 2,72m de
linho branco; 1,20m de cambraia de linho; 1 mão papel de seda; 1,5m de algodão em rama; 70cm de
veludo; 95cm de cetim; 1m de cetim; 10m de froco; 9m de froco; 3m de fita; 30,65m de cordão de
seda; 1 carretel de arame liso. Essas notas de compra fornecidas pelas empresas são fontes férteis
para a compreensão dos processos econômicos, sociais e culturais que envolveram a
institucionalização e a expansão da escola pública. Elas dão ciência de uma materialidade muito
variada exigida para o funcionamento desta nova escola, que é a escola moderna. Sinalizam,
também, dilemas da relação entre o público e o privado que vão emergir juntamente com a escola
de massa e obrigatória. Apontam a relevância de investirmos mais na constituição de uma História
Econômica da escola e da escolarização, entendida no cruzamento e no confronto de uma diversidade
de fontes, mas também de diferentes áreas do conhecimento, como defende Kula Witold (1977).
Para este autor, na análise do objeto, o historiador econômico pode se valer das contribuições de
outras disciplinas históricas, como a história política, a história da cultura material, do direito e dos
movimentos sociais. Assim, falar de uma história econômica da escola significa dar destaque aos
aspectos econômicos que impõem limites e possiblidades à expansão da Instrução Pública, sem
dissociá-los das questões legais, sociais, culturais e políticas. Isso porque, de acordo com Witold
(1977), não existe o fato econômico apartado de outros fatores. “Os fatos econômicos frequentemente
acham-se imbricados com fatos políticos, sociais, culturais, institucionais, ou mesmo ligados às
mentalidades” (Witold, 1977, p.26). Desse ponto de vista, há uma questão social e cultural que
permite compreender a forte imigração para São Paulo, no século XIX. No caso, um novo tipo de
imigração de portugueses para o Brasil. Há questões e interesses comerciais, econômicas e também
educacionais na relação entre escola e mercado. Sem dúvidas, tais questões são separadas para fins
didáticos e de recorte de investigação, mas todas encontram-se devidamente imbricadas na tessitura
do social e na própria escola. A Casa Lebre é uma casa de comércio; a Escola Normal, uma casa do
saber. A relação comercial entre estes dois estabelecimentos é apenas uma, dentre várias, que
evidenciam um comércio intenso da escola não apenas com as grandes empresas que dominavam
o mercado internacional de mobiliário e materiais escolares, mas de grandes e pequenas empresas
locais capazes de fornecer itens mais básicos, como tecidos, fechaduras, arames, agulhas, papel,
tinta, dentre outros. Essa discussão contribui, também, para ampliar a noção do que significa afirmar
que a escola é um fenômeno urbano. Se de um lado, o crescimento das cidades e da população
urbana vai demandar a expansão da rede de escolas, a ampliação da oferta de vagas; de outro, a
escola é também um fenômeno urbano porque, para o seu funcionamento, vai demandar um
conjunto de serviços tipicamente urbanos, como meios de transporte para locomoção de alunos,
professores e funcionários, serviços de água, esgoto e luz elétrica, e um comércio local com condições
de suprir suas necessidades mais imediatas e corriqueiras, como aqui se pode perceber.
ISSN 2358-3959
3 Esta comunicação faz parte das pesquisas realizadas pelo Projeto Temático “Saberes e práticas em fronteiras: por
uma história transnacional da educação (1810-...), processo FAPESP nr. 2018/26699-4, e no âmbito da Bolsa Produ-
tividade em Pesquisa, concedida pelo CNPq.
literatura de colportage, estudada por Roger Chartier (2002, p. 165 e seg.), para a França no século XVII.
De modo similar a esta, destinava-se ao consumo das classes populares, o que implicava na escolha de
textos, autores, bem como de estratégias de distribuição e venda.
De fato, sua circulação no território nacional foi intensa. Giselle Venâncio (Idem, p. 5), ao
estudar a trajetória do livreiro cearense Gualter Rodrigues da Silva, informa que em 1892, em seu
inventário, constavam “38 títulos da coleção Biblioteca do Povo e das Escolas, num total de 1415
exemplares presentes na livraria cearense”. Uma breve busca na Hemeroteca Digital da Biblioteca
Nacional localiza menções à Biblioteca em jornais do Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco, Bahia,
Maranhão, Santa Catarina e Paraíba. São notícias de distribuição de volumes, como remessas aos
diretores do Club Literário e Recreativo pelo diário O norte, da Paraíba, em 1882; doações a escolas,
como a realizada por Anastácio Silveira de Souza para o Lyceu de Artes e Offícios, pel’ O despertador,
de Santa Catarina, em 1883; ou anúncios de livrarias, como a Ramos d’Almeida e Cia, pelo Diário do
Maranhão, em 1884.
As datas das edições dos diários indiciam, ainda, a rapidez com que os exemplares da Biblioteca
foram dispersados geograficamente. Confirmam o diagnóstico de inovação e ousadia empresarial no
planejamento e produção de suas edições atribuído a David Corazzi por Telmo Verdelho e João Paulo
Silvestre (2011, p. 43). Dentre as estratégias mobilizadas pelo editor, estavam “técnicas publicitárias”
pioneiras, como destacam Irene Vaquinhas e Isabel Nobre Vargues ( p. 72) , ao referirem-se ao sistema
que implementou de brindes e prêmios sorteados por meio de loterias para cativar seus leitores.
A extensa rede de distribuição de livros não se restringia ao Brasil. De acordo com Manoela
Domingos (1985, p. 66), a editora possuía 217 correspondentes, abrangendo a China e países
da Europa e África. A esses correspondentes, considerados como “(...) todas as pessoas que se
responsabilizem por um certo número de assinaturas de cuja distribuição se encarreguem e dêem a
esta Casa garantia de sua boa vontade, honradez e zelo” (Catálogo de 1884 Apud DOMINGOS, Idem,
ibidem), a editora oferecia uma comissão de vendas de 15%.
No Almanak Administrativa, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro, a partir de 1884, a remissão
a David Corazzi é substituída por José de Mello que, mantendo o endereço comercial da rua da
Quitanda, nr 40, apresentava-se como gerente no Brasil da antiga casa editora David Corazzi
(Empreza Horas Românticas de Lisboa). No ano seguinte, acrescentou a informação de que era
agente exclusivo da Companhia das Águas Gazozas e Medicinais das pedras salgadas de Villa Pouca
de Aguiar, Portugal. Ainda na edição de 9 de janeiro de 1889 do Diário do Commercio (RJ), José de
Mello aparecia como gerente da editora David Corazzi, ofertando prêmios ao curso noturno gratuito
para o sexo feminino, anexo ao Collégio Pedro II, entregues ao professor Cony.
Portanto, entre 1882, quando Corazzi se instalou no Rio de Janeiro e 1888, quando vendeu a
editora, o empreendimento comercial passou por alterações. Inicialmente, José de Mello assumiu as
tarefas antes realizadas por David Corazzi. Na sequência, Mello acumulou mais uma representação,
seguindo o caminho dos muitos agentes comerciais de empresas estrangeiras radicados no Rio de
Janeiro, como, dentre outros, Louis Conseil, Etienne Collet e Charles Vautelet (ALCANTARA, 2018).
Conseil, por exemplo, além de representar casas francesas dedicadas ao comércio escolar como a
Maison Deyrolle, era fornecedor de vinhos provenientes de Bordeaux.
O expediente evidencia que os ramos do comercio ainda não estavam especializados. Analisando
os inventários de dois livreiros de Fortaleza, Alexandrina de Oliveira – esposa de Joaquim José de
Oliveira – e Gualter Silva, datados respetivamente de 1870 e 1892, Giselle Venâncio (2005, p. 3)
encontrou na lista de produtos postos à venda em suas livrarias, mercadorias como “Água Balsâmica
para dentes de montonac”, “Água de toilette phenicado do Dr. Lamaire”, “Ácido carbosótico”, “Pílulas
de Santa Maria”, “Pomada Rondesicus”, “Sabão de Alcatrão”, “Pomada Mágica” e “Pós Dentifrícios”.
Explorar as estratégias de comercialização mobilizadas no período para impressos e, em particular,
aqueles dedicados à escola e às classes populares, bem como a circulação destes artefatos culturais
entre Brasil e Portugal, são os objetivos da presente comunicação. Para tanto, tomaremos a editora
David Corazzi como mote. Ao escopo da análise se associa ainda uma apresentação de exemplares
da coleção Biblioteca do Povo e das Escolas, de modo a caracterizar estes impressos, compreendendo
os aspectos materiais como parte integrante do empreendimento comercial.
Nesse tocante, não se pode elidir do estudo que a publicação visava a vulgarização dos
“conhecimentos humanos”, destinando-se a prover de instrução aos “que não sabem por lhes
fallecerem recursos com que aprendam”, como clamava Xavier da Cunha, diretor da coleção entre
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 28
1881 e 1894, no prólogo editado em 1883 (CUNHA, 1883). Tal pretensão, por certo, incidia também na
definição do formato dos exemplares e dos meios utilizados para distribuição e propaganda.
Referências
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econômico administrativa. Rivista di storia dell’educazione, 1/2018, pp. 343-361.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL/ Rio de Janeiro:
Bertrand do Brasil, 2002.
COLLICHIO, Terezinha Alves. Primeira Exposição Pedagógica realizada no Rio de Janeiro em 1883
e um importante Congresso da Instrução cancelado. Resultados de uma pesquisa. Cadernos de
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CUNHA, Xavier da. Quatro páginas de prólogo, in Biblioteca do Povo e das Escolas, Sexta série. Lisboa:
David Corazzi editor, Empreza Horas Românticas, 1883.
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VERDELHO, Telmo & SILVESTRE, João Paulo. Lexicografia bilingue: A tradição dicionarística
português–línguas modernas. Lisboa: Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, 2011.
ISSN 2358-3959
INSTITUIÇÕES EDUCATIVAS DE
SESSÃO COORDENADA
Ementa
A Comunicação Coordenada que ora apresentamos tem como objetivo analisar a história de
instituições educativas de Portugal e Brasil em diferentes níveis do ensino, entre as décadas de 1940 e
1970. Além disso, os estudos convergem no perscruto das memórias, das práticas e culturas escolares
valendo-se da perspectiva teórica da história cultural e do uso metodológico da análise documental
histórica e da história oral. Com o intuito de aprofundar a discussão teórico-metodológica sobre as
instituições educativas, nos propomos a analisar as potencialidades da compreensão do espaço e
tempo em que as práticas de escolarização se desenvolvem nos diferentes contextos e o modo como
se engendram aos moldes de organização da escola moderna, sobretudo aquela instituída no final
do século XIX. Desse modo, a abordagem à existência e percurso da Escola do Magistério Primário
de Coimbra, entre 1942 e 1974, contempla os espaços, o diretor, os professores e as professoras, o
corpo discente, o currículo e as práticas educativas, os rituais escolares e as publicações, periódica
e pedagógico-didáticas; analise do processo histórico de constituição da história de instituições
escolares, os processos e práticas de escolarização do ensino primário desenvolvidos em um
município do Vale do Rio dos Sinos, Campo Bom, na primeira metade do século XX; analise de
como as políticas públicas em educação influenciavam nas práticas que se desenvolviam no âmbito
escolar de uma instituição polivalente de Osório/RS, na década de 1970, bem como da forma como
compreendiam a formação técnica em nível de 1.º grau e sua relação com as disciplinas da base
comum; analise de como as relações políticas regionais interferiram nas questões administrativas
da UEMT/UFMS desde a criação da Faculdade de Farmácia e Odontologia em 1962 até efetiva
federalização em 1979. Investigar a história de uma instituição educativa representa conhecer e
significar os sentidos, os ritos e as normas que os diferentes sujeitos estabelecem nas mais distintas
relações que estabelecem, bem como, que a instituição constrói na realidade em que está inserida.
Nesse sentido, a mesa analisa a história de uma instituição formadora de professores primários
em Portugal; o processo de constituição de três grupos escolares de ensino primário elementar; a
institucionalização de uma escola polivalente e de uma instituição de ensino superior sob viés da
pesquisa histórica documental com aportes teóricos em Chartier (1990), Escolano Benito e Viñao
Frago (2001), bem como Bourdieu (1989) reforçando o caráter cultural e social destacado em cada
investigação. Embora a pesquisa em história das instituições educacionais constitui-se em campo
muito abrangente da História da Educação a história das instituições escolares se apresenta como um
campo em projeção de múltiplas possibilidades de estudos considerando suas formas organizativas
e pedagógicas, tanto em espaços urbanos quanto rurais.
o ensino graduado, ou seja, os grupos escolares públicos estaduais de Campo Bom, a saber: Escola
Ildefonso Pinto, Escola 4 Colônias e Escola João Blos, inicialmente identificada como João Pessoa.
Campo Bom é um município da região metropolitana, distante cerca de 50 quilômetros de Porto
Alegre (capital do Estado). É uma cidade que se destaca pelas ciclovias, suas festas populares e pelo
pioneirismo na exportação de calçado, sendo a principal fonte econômica da região. Além disso,
emancipou-se em 31 de janeiro de 1959. E em 1960, realizou-se a 1ª. Feira de Amostras de Produtos
Industrializados do Vale dos Sinos, que originou a FENAC (Feira Nacional do Calçado). Em uma
tentativa de reativar os primórdios desta 1ª. Feira, em 2006 surge a Festa do Sapato que se encontra
na sua 7ª. edição em 2018.
A perspectiva teórica é a da história cultural, por considerar na análise dos processos de escolarização
aspectos da cultura, os sentidos e significados evidenciados em documentos. A história cultural é nossa
perspectiva teórico-metodológica de trabalho, considerando que ao investigar os processos e práticas
de escolarização por este viés amplia-se a leitura dos signos, dos sentidos, das tradições e convenções
estabelecidas pelos grupos sociais na tessitura de suas identidades de pertencimento.
O estudo vale-se de acervos públicos e privados, acessando em arquivos: ofícios, cartas, mensagens,
livros atas, legislações, fotografias, entre outros. A institucionalização do ensino primário por meio do
ensino graduado implica compreender os impactos da implantação deste tipo de instituição como
processo de contribuição para formação de saberes, práticas que contextualizados possibilitam
inferir sobre as permanências e (des)continuidades da escola moderna na contemporaneidade.
Trata-se de um estudo com análise documental. Portanto, o entendimento é de que o que torna
um documento relevante é a análise que se faz dele, não o documento em si. São as perguntas
que o pesquisador elabora e as lentes que utiliza para analisar teórico e epistemologicamente
que possibilitam recompor cenários vividos a partir de vestígios e dos instrumentos escolhidos
pelo investigador. Nesse sentido, como argumenta Ragazzini (2001), o corpus documental implica
reconhecer, atribuir, distinguir, selecionar e interpretar o que se escolhe analisar.
A escolarização é aqui entendida a partir de Faria Filho (2011), como um fenômeno educativo, que
possibilita refletir sobre as políticas estabelecidas, os modos de constituição e organização dos saberes
e práticas escolares desenvolvidos em um determinado espaço e tempo. Como referido anteriormente,
a investigação orienta-se pelos pressupostos da História Cultural, portanto os procedimentos teóricos
e metodológicos estão fundamentados ainda em Vinão Frago e Escolano Benito (2001), Chartier (1990),
entre outros, auxiliam na articulação entre história, práticas e contexto sócio histórico.
No Rio Grande do Sul, a colonização europeia desde o século XIX – alemães e italianos –, bem como
a presença castelhana colaborou para que a dificuldade de compreensão da língua portuguesa se
disseminasse nas vilas e no interior das comunidades. Em Campo Bom os imigrantes alemães instituíram
as escolas comunitárias em diferentes localidades e, além do ensino doméstico, realizado pelos familiares.
Há documentos que evidenciam a presença de aulas públicas em Campo Bom desde 1853, como
o documento, do professor “Frederico Michaelsen”, Brummer, que exerceu o magistério público
em Campo Bom, no período de oito meses no final de 1853. Em 1895, a cadeira de Campo Bom foi
transformada em Aula mista, pela reorganização número 147, de 14 de março de 1898, e passou a
ser a 16ª escola pública de 1ª entrância mista do município de São Leopoldo. Entre o final do século
XIX e primeiras décadas do século XX identificamos em ofícios e relatórios da intendência municipal
os professores: Júlio Wortmann, Olimpia Guedes F. Menezes e Anna Francisca de Carvalho Kunnech,
foram os primeiros professores e em Sapiranga a professora Amália Gomes Pereira, Henrique
Kietzmann, Ottília Christmann, Amália Ada Diefenthaeler, Maria Lydia dos Santos, Glória Velho
Weiss, Analia de Oliveira e Silva, Antonio Anschau, Gustavo Foerster, Carmen Rocca Beltrão e Eliza F.
da Silva, Luiza Knieling, irmã da professora Ida Gulhermina Knieling de Souza, que será a primeira
diretora do primeiro Grupo Escolar de Campo Bom.
Cabe considerar que o modelo dos Grupos escolares influenciou concomitantemente na
concepção arquitetônica da escola, bem como na composição material da escola, adotando outro
tipo de mobília escolar e vasto material didático. Mesmo que de modo ainda indiciário, identifica-
se que as condições físicas nem sempre eram critérios para uso da nomenclatura dos grupos, que
por vezes, se assemelharam nesta região, as aulas reunidas e/ou mantinham organização de ensino
ainda próxima das escolas multisseriadas.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 32
Referências
ARAUJO, José Carlos S.; SOUZA, Rosa Fátima de; PINTO, Rubia-Mar Nunes (Orgs.). Escola primária na
Primeira República (1889-1930): subsídios para uma história comparada. Araraquara, SP: Junqueira
& Marin, 2012, p. 100-150.
CHARTIER, Roger. A história cultural entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990.
FARIA FILHO, Luciano Mendes de. Processo de escolarização no Brasil: algumas considerações e
perspectivas de pesquisa. In: Menezes, Maria Cristina. Educação, memória, história: possibilidades,
leituras. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2011, p. 541-544.
FERRI, Luis Fernando. Ensino de história e consciência histórica. Implicações didáticas de uma
discussão contemporânea. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2011.
GRAZZIOTIN, Luciane Sgarbi Santos; ALMEIDA, Dóris Bittencourt (Org.). Colégios Elementares e
Grupos Escolares no Rio Grande do Sul: Memórias e cultura escolar – Séculos XIX e XX. São Leopoldo:
Oikos, 2016.
RAGAZZINI, Dario. Para quem e o que testemunham as fontes da História da Educação? Educar,
18(2), dez. 2001, p. 13-28.
VIÑAO FRAGO, Antonio; ESCOLANO, Augustín. Currículo, espaço e subjetividade: arquitetura como
programa. 2. ed., Rio de Janeiro: DP&A, 2001.
ISSN 2358-3959
Este trabalho é resultado de uma pesquisa sobre a história da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul, federalizada em 1979, e a sócio gênese de sua criação ainda como Universidade Estadual de
Mato Grosso em 1969. No entanto, precisa-se voltar mais um pouco nos arquivos da Instituição até
1962, quando foi criada a Faculdade de Farmácia e Odontologia em Campo Grande, a partir da qual
se originou a Universidade Estadual de Mato Grosso. Além dessa faculdade é preciso considerar a
criação, em 1967, do Instituto Superior de Pedagogia, em Corumbá e do Instituto de Ciências Humanas
e Letras, em Três Lagoas, que podem ser considerados o embrião da Universidade Estadual de Mato
Grosso e, posteriormente, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Efetivamente, foi criada
a Universidade Estadual de Mato Grosso pela Lei Estadual nº 2.947, em 16 de setembro de 1969,
com a sede em Campo Grande, incorporando também o Instituto Superior Pedagógico de Corumbá
e o Centro de Ciências Humanas e Letras de Três Lagoas. No início da década de 1970, o governo
de Mato Grosso ampliou a educação superior no Sul do estado criando os Centros Pedagógicos de
Aquidauana e Dourados. E, posteriormente, criou, em 1976, o Centro Pedagógico de Rondonópolis.
Todos esses Centros constituíram a Universidade Estadual de Mato Grosso. Com a divisão do Estado
de Mato Grosso, foi concretizada a federalização da instituição, pela Lei Federal nº 6.674, de 5 de
julho de 1979, que “autoriza o Poder Executivo a instituir a Fundação Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul, em obediência ao disposto no art. 39 da Lei Complementar nº 31, de 11 de outubro de
1977”. Com a federalização, o Campus de Rondonópolis passou a incorporar a Universidade Federal
de Mato Grosso, que tinha sede em Cuiabá.
Para compreender como foi sendo constituída a história da UFMS analisa-se como as relações
políticas regionais interferiram nas questões administrativas da UEMT/UFMS desde a criação da
Faculdade de Farmácia e Odontologia em 1962 até efetiva federalização em 1979. Nesse contexto,
é importante analisar os processos de escolhas de gestores da UEMT/UFMS e suas as relações
político-partidárias com governadores, deputados, senadores de Mato Grosso/Mato Grosso do Sul
e, inclusive do presidente da República. É imprescindível conectar a história da UFMS com a história
política de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul porque nem sempre se pode considerar a vinculação
da instituição com a política local como algo positivo, pois em alguns momentos essas relações
políticas entravaram o desenvolvimento da universidade em alguns municípios e priorizaram-na
em outros devido à influência de políticos da região. Essa proximidade da Universidade Estadual de
Mato Grosso com o governo Estadual e com os políticos locais influenciou até mesmo a contratação
de técnicos e professores em decorrência das relações de parentesco e/ou político-partidárias.
Somente depois da federalização se iniciaram os concursos públicos, no entanto essas relações
ainda eram muito fortes, e nem sempre o concurso garantiu a escolha da pessoa mais qualificada
para o cargo. A federalização trouxe ganhos para os funcionários, que foram sendo inseridos na
carreira federal. Porém, em tempos de ditadura civil-militar, também houve perseguições políticas
dentro da universidade, inclusive com a demissão de professores vinculados a partidos de oposição
Referências
BACELLAR, Carlos. Fontes documentais: Uso e mau uso dos arquivos. PINSKY, Carla Bassanezi (org.).
Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2005.
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J. C. S.; GATTI JUNIOR, D.. Novos temas em história da educação brasileira: instituições escolares e
educação na imprensa. Campinas, SP: Autores
CHARTIER, Roger. A história cultural. Entre práticas e representações. Lisboa: Difusão Editorial, 1988.
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Educação. SBHE. Campinas: Editora Autores Associados. Jan./jun. 2001, n.1
OLIVEIRA, J., & FARIA FILHO, L. (2019). Educação e modernização: a UFMG na trajetória de um projeto
modernizante (1968-1974). Revista Contemporânea de Educação, 14(29), 193-207.
REMOND, René (org). Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003. VIDAL, Diana;
ABDALA, Raquel. A fotografia como fonte para História da Educação: questões teórico-metodológicas
para pesquisa. IN: Revista do Centro de Educação. UFSM. Vol. 30, n.2, 2005.
ISSN 2358-3959
destacar que as entrevistas foram realizadas a partir da aplicação de questionário, pois se trata
de uma entrevista semiestruturada, a qual conta com determinadas perguntas previamente
organizadas, mas abre espaço para acréscimos de elementos que os sujeitos julgarem relevantes
abordar. As mesmas foram gravadas para, na sequência, serem degravadas e/ou transcritas.
Posteriormente serão analisadas as falas dos 4 sujeitos estudados e destacando o que fora
mencionado e que se refere ao contexto estudado neste trabalho.
Cabe destacar que, como mencionado anteriormente, antes da realização das entrevistas,
fora definido um breve roteiro de perguntas, buscando antes das entrevistas traçar um contexto
lógico das questões que serão aplicadas aos sujeitos selecionados, buscando mapear os fatos
históricos contextualizados naquele momento e relacionar com a fala dos sujeitos. Quanto ao
questionário, este tem o objetivo melhor proporcionar o estudo do conteúdo das falas captadas
nas entrevistas, proporcionando que melhor se mapeie o conteúdo à que esta pesquisa se
propõe. Além disso, procura-se perceber como educação e trabalho eram entendidos pelo
corpo docente, notadamente a partir da concepção de formação profissional em nível de 1.º
grau. É preciso que se destaque que para esta pesquisa em especial, que se registre que para
selecionar os sujeitos que seriam posteriormente estudados, os sujeitos entrevistados foram
identificados e localizados a partir de um periódico pedagógico produzido por docentes
da instituição, denominada Revista Polivisão. A partir da análise e organização dos textos
publicados, promoveu-se a identificação dos autores, bem como o traçado de relação dos
mesmos com a escola e com a docência. Quanto à seleção dos sujeitos entrevistados é preciso
que se destaque que tal periódico constitui-se em relevante documento para o estudo da
história da educação osoriense. Ainda que não seja o objeto deste estudo, foi base importante
para a definição dos entrevistados. Entre os mesmos, encontram-se pessoas que atuaram tanto
na docência das disciplinas técnicas, como na gestão e na supervisão escolar. Tendo em vista a
intrínseca relação entre a referida rede e o Regime Militar, pretende-se, ainda, compreender se a
forma como as práticas educacionais ocorriam eram pautadas pelas diretrizes educacionais ou
se havia a confluência de outras teorias pedagógicas. No que se refere à bibliografia usada como
base nos estudos, este trabalho se ampara em autores como FERREIRA (1996), ALBERTI (2005)
quando abordado sobre História Oral. Ainda na bibliografia, faz uso de autores como SHIROMA
(2011), Araújo (2010) e Souza e Lima (2016) no que se refere à Política Pública de Educação e às
Escolas Polivalentes.
No caso deste estudo é fundamental destacar que concomitante aos desejos políticos do
momento, o país elaborou uma Política Pública de Educação voltada à satisfazer os interesses que
corroborassem com o exercício do tratado MEC-USAID. Desta feita é fundamental destacar que
corroborando com o tratado MEC-USAID, a política pública de educação deste período, buscava
especialmente que o ensino fosse focado especialmente em um conteúdo tecnicista, ou seja, buscava
centrar o conhecimento dos alunos em um ensino que privilegiava as disciplinas técnicas, visto que
buscava mão de obra técnica para a entrada imediata no mercado de trabalho e não primava pela
formação de conhecimentos nas áreas das ciências humanas. É preciso ainda que se destaque, que
é através de políticas públicas de educação que o Estado tem sua ação através da elaboração legal e
de manejo orçamentário às ações que se referem à educação à população, assim, se percebe que as
atividades dentro das escolas estão intimamente direcionadas pelas políticas públicas de educação
elaboradas pelo Estado, o que não seria diferente nesta pesquisa em questão, em que através de
convenio com outro país buscava oferecer a parte da população brasileira uma educação tecnicista.
Entretanto, as práticas que se levaram a cabo no âmbito da instituição estudada, nem sempre
estiveram em consonância com os anseios do regime vigente. Essa investigação viabiliza entender
como os pequenos (por desconhecidos, mas grandes pelo seu papel de ação transformadora no
cotidiano escolar) refletem, ressignificam e levam ao dia a dia da escola em uma pequena cidade
do litoral norte gaúcho, as concepções de ensino integrado e de formação humana integral. É mister
destacar, que após transcritas as entrevistas e feitas a respectivas analises dos material, emergem
nas falas dos sujeitos entrevistados conteúdos que mostravam justamente um movimento que
apesar das orientações das políticas públicas de educação do momento à que se propõe este recorte
temporal, se opõe à estas imposições vinda de cima para baixo resultado do tratado MEC-USAID, ou
seja, percebe-se que a circulação de determinado pensamento educacional, através da formação
pedagógica a partir de autores como Paulo Freire, atuou no sentido de transformar as práticas de
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 38
tais docentes e de pensar e instituição educacional como um espaço de mudança social. Aliado ao
acesso a determinados teóricos, cujo os conteúdos de suas obras contribuíram diretamente para a
conscientização da atual condição de trabalho e o papel social não só dos professores, mas também
para os movimentos sociais, notadamente a organização dos professores enquanto profissionais da
educação que detém direitos, e que tem um papel fundamental na formação e construção de uma
sociedade mais democrática, culminando com as greves do magistério, as quais corroboraram para
a compreensão do magistério como classe.
Referências
ALBERTI, Verena. Manual de História Oral. Rio de Janeiro: FGV, 2005.
ARAÚJO, José Alfredo de. A USAID, o regime militar e a implantação das escolas polivalentes no
Brasil. Revista de Epistemologia y Ciencias Humanas, Rosário - Argentina, n. 2, 11p., 2010.
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Ed. FGV, 1998.
SHIROMA, E. O.; MORAES, M. C. M. de; EVANGELISTA, O. Política Educacional. 3. ed. Rio de Janeiro:
DP&A, 2004.
SOUZA, S., & LIMA, G. Escolas Polivalentes na Ditadura Civil-Militar: Marco no Modelo de Ensino
Profissionalizante ou Instrumentos de Propaganda do Regime? O Processo de Implantação do
Polivalente de Ituiutaba- Mg (1974-1985). Educação & Formação, 1(2), 2016, p. 72-88. doi: http://
dx.doi.org/10.25053/edufor.v1i2.1892.
ISSN 2358-3959
Luís Mota
António Gomes Ferreira
Carla Vilhena
Pretende-se concretizar uma síntese, de cariz histórico, de uma instituição educativa portuguesa,
de âmbito regional – Coimbra –, criada com o propósito de realizar a formação de professores do
ensino primário, numa análise centrada num período específico do seu funcionamento, cerca de
três décadas, durante a vigência do Estado Novo. A preocupação monográfica encaminhou-nos para
uma definição prévia de categorias, a contemplar no plano analítico, contanto que os vestígios, ou
se se preferir, as fontes disponíveis, assim o permitissem. Neste sentido, a abordagem à existência
e percurso da Escola do Magistério Primário de Coimbra, entre 1942 e 1974, contempla os espaços,
o diretor, os professores e as professoras, o corpo discente, o currículo e as práticas educativas, os
rituais escolares e as publicações, periódica e pedagógico-didáticas. O presente texto constitui um
recorte de um estudo mais vasto dedicado às instituições de ensino normal primário público, em
Coimbra (Mota e Ferreira, 2012).
A existência de instituições de ensino normal que articulam a transmissão de conhecimentos,
de técnicas, de normas e de valores específicos da profissão com a produção desse mesmo corpo
autónomo de saberes pedagógicos, radica na conjugação de fatores ao longo do processo histórico,
como a questão do problema do método no campo da didática, em pleno século XVII, com a
emergência e afirmação das preocupações estatais, em finais de setecentos e na centúria seguinte,
com os problemas do ensino, a par, em dado momento, da afirmação profissional e social dos
mestres de ler, escrever e contar, num contexto de crescente procura social da educação caucionada
pelas transformações socioeconómicas.
Os primeiros esforços de institucionalização do ensino normal, em Portugal, remontam a meados
da segunda década de oitocentos e surgiram associados à tentativa de difusão do método de ensino
mútuo, contudo foi na produção legislativa de Rodrigo da Fonseca Magalhães, em 1835, que se
intentou criar uma rede escolar de ensino normal primário, tendo sido prevista a existência de uma
escola normal de instrução primária para o sexo masculino, em cada capital de distrito. A despeito
desta e de outras iniciativas, só em 1862, quase trinta anos depois, seria instalada, no palácio dos
marqueses de Abrantes, em Marvila, a primeira escola normal para o sexo masculino. Coimbra, a
par de outras localidades, nomeadamente, por força da instabilidade política, das dificuldades
orçamentais e da falta de recursos humanos capacitados, viu a criação de uma escola normal primária
ser adiada até ao século XX. Novo século e novo diploma legal (Decreto n.º 8, 1901) corporizam a
instalação, na Lusa Atenas, de uma escola normal destinada ao sexo masculino, bem como outra
para o sexo feminino. Não obstante, os quarenta anos seguintes trouxeram hesitações, vicissitudes
e controvérsias ao desenvolvimento do ensino normal em Portugal, das quais a escola de Coimbra
não só não se eximiu, como esteve no epicentro dos acontecimentos que, em 1936, conduziriam o
Estado Novo a suspender as matrículas do 1º ano, nas escolas do magistério que entretanto tinham
sido criadas pelo governo de Ditadura Nacional para substituir as republicanas escolas normais
primárias. Foi tão só em 1942 que o Estado Novo inscreveu, definitivamente, o modelo escolar
como o mais conveniente para a formação de professores do ensino primário. A reabertura, naquela
data, das novéis escolas do magistério primário, de entre elas, a de Coimbra, consagra-as como
estabelecimentos de ensino oficial, confiando-lhes a tarefa de ministrar, aos alunos, “a cultura e
a prática pedagógica” (Portugal, 1942, p. 1140) e conferindo-lhes a preparação necessária para o
desempenho da função de professor do ensino primário, tarefa que a Escola do Magistério Primário
de Coimbra desempenharia, apesar das transformações políticas que modificaram a fácies do país,
especialmente entre 1974 e 1977, até 1989, ano da sua extinção, cedendo o espaço à Escola Superior
de Educação que atualmente integra o Instituto Politécnico da conhecida cidade dos estudantes.
O devir histórico, aqui enunciado em síntese – e.g., inquérito à escola e suspensão das matrículas
do 1º ano (1935 e 1936) ou o ano da sua extinção (1989) –, e as suas motivações, resultam, em larga
medida, de idiossincrasias da Escola que, a par das motivações, a singularizam entre as demais. A
diferenciação em relação a outras instituições educativas portuguesas tem por base, desde logo,
os seus destinatários, seja pela idade cronológica – só podiam ser admitidos portugueses entre os
dezasseis e os vinte oito anos de idade –, pelo sexo ou pelas origens, geográficas ou socioeconómicas.
Indicadores que encerravam, só por si, um elevado grau de variação na composição do corpo discente,
conferindo um potencial de diferenciação face às restantes escolas do magistério primário. O esforço
inicial de homogeneização, patente na exigência do diploma do 2º ciclo liceal (ou equivalente) e nos
exames de admissão – escritos e orais – a português, matemática e geografia-história, não obliterou
a presença de culturas e valores distintos que, independentemente da maior ou menor proximidade
em relação à cultura escolar oficial, contribuíram para uma adequação do projeto pedagógico de
cada escola, em geral, e da Escola do Magistério Primário de Coimbra, em particular.
Do já enunciado destaque-se o reconhecimento da diversidade existente entre as instituições
educativas (Sanfelice, 2006), mais ou menos percuciente, nomeadamente, também entre as escolas
do magistério primário, instituições de formação que transmitem a cultura escolar, mas produzem,
de igual modo, culturas, dimensão que lhes confere uma “identidade histórica” (Magalhães, 2004,
p. 125). A Escola do Magistério Primário de Coimbra, enquanto instituição educativa, constitui uma
realidade dentro de outra realidade, enquadrada à escala nacional e internacional, por uma norma
política e por uma estrutura educativa, fazendo com que o seu espaço de atualização identitária
(Magalhães, 2004) emerja na relação dialética entre a agência (liberdade e autonomia dos atores) e a
estrutura (traduzida num certo normativismo burocrático), espaço para “infidelidades normativas”
(Lima, 1998, p. 176), caldeada pelas mudanças de contexto – e.g., económico, político, social – que
conduzem a alterações, mais ou menos de circunstância, oferecendo um conjunto de oportunidades
que, por si só, constituíram campo para o desenvolvimento de particularidades resultantes das
vicissitudes históricas experienciadas pela Escola.
Interpretação que concilia uma aproximação às relações que a Escola estabeleceu com o contexto
geográfico e sociocultural em que se encontra inserida, bem com a interpelação da sua realidade interna,
enquanto “instituição, organização e comunidade” (Magalhães, 2004, p. 123) marcada pelas suas próprias
condições materiais e simbólicas de existência – e.g., racionalidade pedagógica, autossuficiência de
recursos. Nesta perspetiva analisam-se os espaços e os edifícios, as áreas de organização, a estrutura
sociocultural, bem como as identidades cultural e educacional. Convocamos e resgatamos todas as
fontes (disponíveis), seja no domínio do arquivo, da memória ou da museologia (Magalhães, 2004). A
partir da triangulação de dados delineamos o modelo pedagógico da EMPC e salientamos dimensões
de mudança e permanência, bem como de rutura (e conformidade) entre a norma e as práticas sociais.
Em termos de sintomia, a leitura resultante da análise da evolução dos espaços e edifícios, e
de cada um per si, ilustraram quanto as condições materiais de existência subordinam a nossa
perspetiva da educação, bem como toda e qualquer experiência educativa. Padronizada pelo
sistema de ensino em que se encontrava enquadrada, inscrita num tempo com condições materiais e
simbólicas dadas – e.g., políticas, culturais ou socioeconómicas –, nem por isso deixaram de medrar,
resultantes da gestão e vivência de uma experienciação de um destino traçado, singularidades
identitárias. Em contraponto a uma norma tantas vezes tomada como cerceadora da ação, a sua
ausência esteve longe de promover e potenciar a intervenção, nomeadamente, dos professores –
e.g., a alteração dos planos de estudo e a ausência de publicação de novos programas, em 1960. O
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 41
Referências
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On-line, Campinas, número especial, p. 20-27, ago. 2006.
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e Psicologia/Universidade do Minho, 1998.
ISSN 2358-3959
Ementa
Esta proposta propõe-se a compartilhar estudos e pesquisas sobre a formação e a profissão
docente em perspectiva histórico-educacional, estando compreendidos a Revista do Ensino, um
periódico mineiro, os cursos de Pedagogia no Brasil, as instituições escolares destinadas ao magistério
primário em Portugal e as escolas normais no Brasil. A presente proposta situa-se no âmbito do eixo,
Formação Docente, e tem como problematização central a seguinte indagação: é possível situar a
formação do professor como um continuum sem enveredar pela concepção de que sua história seja
repetitiva? Tais preocupações têm como fontes primárias a imprensa pedagógica, mensagens dos
presidentes de estado (Brasil), legislação educacional, poemas, discursos pedagógicos, testemunhos
orais (entrevistas), dados estatísticos etc. Em termos de periodização, e em ordem cronológica, as
quatro propostas envolvem pouco mais de um século e meio: a formação do professor no Brasil
inicia-se em 1835, pela modalidade denominada por escola normal, e se extingue em 1971; em
1925, em Minas Gerais, cria-se a Revista do Ensino – uma estratégia para a formação de professores
primários – um órgão da Diretoria do Ensino daquele estado, cuja proposta tem por objeto a ética
docente expressa pela mesma entre 1925 e 1940; ao final dos anos de 1930, criam-se no Brasil
cursos de Pedagogia, cujo objeto abarca sua trajetória entre 1939 e 1990; cronologicamente, a
última proposta tem por objeto a formação de professores do ensino primário em Portugal durante
a crise revolucionária entre 1974 e 1976. Quanto ao método, sumariamente as propostas se baseiam
em pesquisa documental e bibliográfica, e visam concorrer para a construção historiográfica da
educação brasileira e portuguesa, ao abranger diferentes tempos históricos e diferentes espaços
geográficos, o que possibilita um caráter comparatista dos mesmos. Embora a periodização seja
disforme, mas abrangente, as temáticas estarão atentas à dimensão universal que o objeto permite,
sem suprimir suas singularidades nacionais, posto que envolvem Portugal e Brasil, bem como suas
singularidades no que dizem respeito à abrangência da periodização contemplada. Em termos de
resultados, pode-se propor que a formação do professor seja um clamor que não cessa, desde as
primeiras centelhas no âmbito da modernidade, em particular desde o século XVI. Tal clamor não
tem um caráter repetitivo porque os contextos e as respostas aos mesmos são diferenciados.
Referências
ALMEIDA, M. Z. C. M. de. Curso de Pedagogia: um protagonista em busca da sua identidade. Cadernos
da Educação, Goiânia, GO, nº 03, 1995.
ARAUJO, José Carlos Souza; FREITAS, Anamaria Gonçalves Bueno de; LOPES, Antônio de Pádua de
(orgs.). As Escolas Normais no Brasil: do Império à República. Campinas: Editora Alínea, 2008, p.
321-340.
BICCAS, Maurilane de Souza. O impresso como estratégia de formação: Revista do Ensino de Minas
Gerais (1925-1940). Belo Horizonte, MG: Argvmentvm, 2008.
Em um país cuja população analfabeta chegava a mais de 80%, encontrar professores era
tarefa árdua. Assim, as províncias tenderam a criar escolas normais a fim de formar docentes,
isto é, adotaram a estratégia de nações da Europa. A formação normalista se iniciou no país em
1835, mas só se estabilizou, em parte, após 1870, para permanecer como alternativa de formação
docente; não sem contestações do governo da província do Rio de Janeiro, que mandou fechar
a Escola Normal de Niterói, em 1849. A criação de escolas normais seguiu um ritmo de urgência,
advindo talvez do fracasso das tentativas pioneiras de formar professores para o nível elementar.
Como método, adotaram o mútuo — prescrição da lei de 1827 (artigo 4º). Uma vez criadas as
escolas normais, outro problema se impôs: a insuficiência. Insuficiência de escolas, de candidatos
à preparação para docência em escolas primárias, de programa de estudo, de preparo na prática.
Assim, foi preciso reformar a escola Normal, de modo que a reforma feita em São Paulo, em 1890,
definiu um padrão de organização e funcionamento; isto é, definiu uma escola Normal-modelo
para cidades paulistas e de outros estados (destes partiram, rumo a Paulo, muitos educadores a
fim conhecer o modelo). A reforma teve duas vertentes: ampliar conteúdos curriculares e focar na
prática. Até 1900, a tendência a reformas se arrefeceria para que se iniciasse a era dos institutos
de educação como espaços de cultivo da formação docente. Biccas (2002; 2008) tem argumentado
que o impresso pedagógico em Minas Gerias foi atribuído como estratégia de formação docente
no período 1925–40. Não por acaso, a Revista do Ensino, fundada e interrompida em 1892, voltou
a circular no estado a partir de 1925. Por causa da Segunda Guerra Mundial, a publicação cessou
em 1940, para voltar irregularmente de 1946 a 1971, quando foi extinta de vez, após 239 edições.
Com efeito, este estudo parte das constatações de Biccas para propor um aprofundamento de seus
postulados sobre prescrições morais e disciplinares para professoras primárias com uma análise
das leituras sugeridas e prescrições de comportamento social e conduta em sala de aula. Assim,
o estudo especula sobre a ação da Revista de Ensino como formadora tendo em vista as formas,
os conteúdos e as intenções dos textos tidos como formadores no referido período, que marca a
retomada de sua publicação e de uma nova paralisação. O estudo parte deste questionamento:
nas “boas” intenções dos articulistas que escreviam para a Revista do Ensino, como seriam a ética
profissional da professora e sua missão educacional como docente primária segundo a publicação?
Tentar delinear respostas a essa indagação exigiu compreender analiticamente discursos presentes
em textos voltados especificamente a professoras do Primário, pois aí se expuseram estratégias de
formação das docentes. A fonte de pesquisa foi a própria revista, ou seja, foram textos de conteúdo
pedagógico, mensagens sobre instrução pública e sua importância, poemas, letras de música, leis
e outros gêneros textuais de onde se derivam normas a professoras do Primário. As fontes foram
Luís Mota
António Gomes Ferreira
Carla Vilhena
Portugal, abril de 1974. Na madrugada do dia 25 eclodia um movimento militar, liderado por
oficiais subalternos (capitães), autónomo e equidistante de quaisquer correntes políticas e sociais,
com o objetivo de democratizar o Estado e a sociedade portuguesas. Aparentemente, num primeiro
momento, parecia ser consensual a preocupação, para todos – e.g., membros do I governo provisório,
militares, certos setores da sociedade civil –, a célere institucionalização de um regime democrático.
Permaneceu a ambiguidade do entendimento sobre o conceito de democracia (ou regime
democrático) e a verdade é que até 25 de novembro de 1975, durante mais de ano e meio, a sociedade
portuguesa experimentou um tempo de transição onde a questão do regime esteve em aberto, o
então designado Processo Revolucionário em Curso (PREC). O Estado constituiu, durante esse
período, uma plataforma de lutas sociais e políticas que determinaram a sua paralisia administrativa.
Com os acontecimentos de 11 de março de 1975, acelerou-se o processo revolucionário e assistiu-se
à progressiva estatização da economia com a nacionalização da banca, dos seguros e das principais
empresas industriais, de transportes e de comunicações. No período subsequente, até novembro,
consagraram-se as chamadas conquistas da revolução tendo, paralelamente às nacionalizações,
ocorrido a reforma agrária e o controlo operário nas empresas. Contudo, a neutralização do poder
capitalista não se traduziu, ainda assim, na afirmação do poder popular, assistindo-se, ao invés, a
uma dualidade de impotências e à génese de um “Estado dual” (Santos, 1998), por via da estratégia
mobilizada para articular o Estado com o movimento social popular. Apesar dos esforços e tentativas
de hegemonização por parte dos partidos políticos, o movimento social conseguiu, ainda assim,
conservar espaços de autonomia e não se confundiu (ou fundiu) com as forças políticas.
CURSO DE PEDAGOGIA:
HISTÓRIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM
ESTADOS DO CENTRO-OESTE DO BRASIL (1939-1990)
A comunicação aqui apresentada tem como objeto de estudo o Curso de Pedagogia no Brasil.
Para tanto, este trabalho busca analisar a partir dos projetos de formação de professores no
período de 1939 a 1990, o Curso de Pedagogia. Nesta perspectiva, o trabalho aqui proposto
pautou-se pelos objetivos: compartilhar estudos e pesquisas sobre a formação de professores-
docentes, suas políticas, práticas educativas e memórias que abordam os percursos de formação
e profissionalização docente; contribuir para a construção da história e historiografia da
educação brasileira e do Centro-Oeste do Brasil. O recorte temporal aponta para a data de
criação do curso de Pedagogia pelo Decreto Decreto-Lei no. 1.190, de 04.04.1939. A década de
1990 contempla o período em que o Curso de Pedagogia passa pelas reformulações mais
recentes cuja centralidade tem lhe conferido a identidade como professor-docente da educação
básica além de outras funções pedagógicas na escola e fora dela. Recorreu-se ao referencial
teórico-metodológico da História Cultural, em estudos e análises de documentos, entrevistas e
a literatura historiográfica sobre o tema, buscando articulação dialética entre as fontes, a
produção teórica e o contexto histórico. Os resultados apontaram que, com a criação da
Associação Brasileira de Educação, (1924) a formação de professores configurava-se em dois
movimentos que ora se contrapunham, ora se identificavam: de um lado, as “tentativas de
instalação das chamadas escolas normais superiores, nos moldes da instituição francesa ou dos
teacher’s college norte-americanos” e de outro, a defesa das verdadeiras universidades no País
voltadas para a pesquisa e “os estudos desinteressados” em oposição ao caráter profissionalizante
que marcou a tendência dos cursos superiores no Brasil. A questão da identidade dos cursos de
formação de professores, principalmente o de Pedagogia, bem como o papel das faculdades de
educação têm polarizado as discussões entre os educadores brasileiros há mais de meio século.
O documento intitulado “Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova”, publicado em 1932, expressa
essa preocupação ao enfatizar a necessidade de formação universitária para todos os professores
dos diferentes graus de ensino: “A tradição das hierarquias docentes (...) (mestre, professor e
catedrático) é inteiramente contrária ao princípio da unidade da função educacional”, sugerindo
inclusive a “incorporação dos estudos do magistério às universidades”. Foi essa polarização que
permeou os debates em torno dos projetos da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade
do Distrito Federal (UDF), na década de 1930, no bojo das quais foram criadas as Faculdades de
Filosofia, Ciências Humanas e Letras, que incorporaram à estrutura dessas universidades o
Instituto de Educação, na cidade de São Paulo e a Escola de Educação, na cidade do Rio de
Janeiro( então Distrito Federal), respectivamente. Embora ambos os projetos tivessem à sua
frente dois dos ilustres escolanovistas: Fernando de Azevedo (USP) e Anísio Teixeira (UDF)
evidenciam-se diferenças significativas na concepção educacional entre ambos os projetos,
conforme assinala Fávero: “A função do Instituto (...) é apenas de fornecer o curso de formação
pedagógica para os candidatos ao magistério secundário (USP). (...) Já no caso da UDF, a Escola
de Educação tem como objetivos não só prover a formação do magistério (...) como também
concorrer como centro de documentação e pesquisa para a formação de uma Cultura Pedagógica
Nacional”. Em que pese as divergências, havia também pontos comuns entre ambos os projetos,
entre eles, era o de “formar na Universidade as elites que com base na autoridade do saber que
iriam orientar a Nação” proposta ou intencionalidade desencadeou, segundo as análises da
mesma autora, reações contrárias que contribuíram para que o governo do Presidente Getúlio
Vargas, num contexto de ditadura e repressão ideológica tomasse para si as rédeas desses
projetos políticos da formação dessas elites e impusessem (MENDONÇA, 1994, p.37-40). Essa e
sua tutela e intervenção sobre a Universidade. Assim é que em 1939, “na voragem do Estado
Novo, a UDF foi extinta sumariamente” e incorporada à recém-criada Universidade do Brasil e
Faculdade Nacional de Filosofia. Como orientação político-pedagógica instituiu por meio de
normativas do Conselho Federal de Educação, o chamado “padrão federal” que definia o
currículo básico para todos os demais cursos de Licenciatura do País. O Curso de Pedagogia
sofrerá então a sua primeira das três regulamentações, pelas quais passou a nível nacional em
1939, 1962 e 1969. Assim, pelo “padrão federal” os cursos de formação de professores ou das
licenciaturas, entre eles, o de Pedagogia, passaram a ter duração de quatro anos, ou seja, três
anos de bacharelado “ao qual acrescentava mais um ano do chamado “curso de Didática”, cujo
currículo por sua vez era composto de seis disciplinas (Didática Geral, Didática Especial,
Psicologia Educacional, Administração Escolar, Fundamentos Biológicos da Educação e
Fundamentos Sociológicos da Educação), obrigatórias a todos os cursos de Licenciatura em
qualquer área, inclusive no de pedagógica, constituindo-se, então, o que passou a denominar-
se de “esquema 3 + 1” . Esse modelo será mantido por mais de 20 anos. A Reforma Universitária
de 1968 (RU-68, Lei 5.540/68) trouxe alterações significativas para o sistema de ensino superior
brasileiro. Uma delas foi o surgimento das faculdades de educação (FE) e dos institutos básicos,
em substituição às faculdades de Filosofia, Ciências Humanas e Letras, que respondiam pela
formação do bacharel -licenciado por meio do conhecido “esquema três mais um”(CHAVES,
1981, p 47- 50). O curso de Pedagogia, vinculado à FE, passará a formar os “especialistas em
educação”(administrador escolar, orientador educacional , dentre outras). Contudo, na década
de 1970, no bojo das reformas institucionais que ocorreram orientadas pelos paradigmas norte-
americanos (acordos MEC/USAID), o sistema educacional brasileiro passa por uma reestruturação
completa em todos os níveis e graus de ensino. Em relação às universidades, foram extintas as
Faculdades de Filosofia e criados os institutos básicos, responsáveis pelos cursos de bacharelado
e as Faculdades de Educação, pela formação pedagógica. Foi também introduzido o regime de
créditos de periodicidade semestral em substituição ao regime seriado/anual, entre outras
modificações estruturais. Em Goiás, a FE/UFG em 1984 estimulada pelos debates nacionais
ocorridos na década de 1980 redefiniu o eixo curricular do Curso de Pedagogia, que passa a
formar o professor para escola básica ao invés dos especialistas. Ex-alunos (hoje, professores na
FE), desse currículo revelaram que “a maioria dos professores concorda que o eixo fundamental
do curso, ou seja, a formação de professores para a escola básica, deve ser mantido, como
também a concepção da docência ampliada”. No caso de Mato Grosso do Sul, ainda que os
cursos de Pedagogia oferecidos pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, em seus
diferentes campi, em Corumbá, Três Lagoas, Dourados tivessem adotado um currículo mínimo
estabelecido pela Resolução 002/1969 do Conselho Federal de Educação, cada curso possuía
uma estrutura própria, com diferentes habilitações e cargas horárias, foi possível observar que
foi apenas o Curso de Pedagogia, oferecido em Campo Grande que já iniciou com as habilitações
de licenciatura para o Magistério da Pré-escola e séries iniciais do 1º grau, no período de 7
semestres, assim o curso visava à formação do professor para a escola básica. Mesmo assim,
oferecia aos alunos que frequentassem e concluíssem o 8 semestre, a habilitação em Supervisor
Escolar, conforme assinala Vargas (2007). Entretanto, esse Curso de Pedagogia começou e
permaneceu com a mesma estrutura até o ano de 1983, quando é autorizado seu funcionamento
pelo Parecer MEC de nº 375/1983, com isso, o plano de curso aprovado, retirou a habilitação em
Supervisão Escolar que havia sido prevista anteriormente. Assim, no ano de 1984 entrou em
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 49
vigor uma nova estrutura curricular aprovada pela Resolução UFMS de nº 57/1983, que revogava
as anteriores e fazia a integralização das habilitações, que passava a denominar-se Magistério
da Pré-escola á 4 º Série do 1º Grau. Essa estrutura curricular aprovada permaneceu em
funcionamento até o ano de 1990, quando foi revogada pela Resolução UFMS de nº 045/1990.
Em linhas gerais, pode-se concluir que a historiografia da educação brasileira aponta que a
questão de formação de professores para as séries iniciais da escola básica a nível superior, é,
não só urgente, mas de grande relevância social em países em que a infância e a juventude estão
totalmente excluídas dos benefícios educacionais, seja pela ineficiência dos sistemas de ensino,
seja pela negligência dos governos, seja pelas próprias condições materiais e culturais desses
segmentos sociais.
ISSN 2358-3959
E é desse período que o Brasil é tributário: a formação do professor inicia-se em Niterói em 1835.
A título de estruturar uma periodização, propõe-se que o movimento das escolas normais no Brasil
possa ser compreendido por intermédio de três etapas: 1°. – 1835 a 1920; 2°. – 1921 a 1945; e 3°. –
1946 a 1971. Em relação ao primeiro período (1835-1920), encontra-se o da emergência das várias
escolas normais do país, até a disseminação dos grupos escolares no Brasil, desde o final do século
XIX. Conforme Oliveira (2003), em 1874 haviam 10 escolas normais, mas dentre elas não se contavam
duas do período de 1847 (ARAUJO; FREITAS; LOPES, 2008). “A falta de escolas normais em 10
províncias pode atribuir-se numas à exiguidade dos seus recursos, noutras à incúria dos seus
legisladores: em nenhuma a defeito da ideia, pois nunca a experimentaram” (OLIVEIRA, 2003, p.
213). Conclusivamente à sua argumentação, sustentava: “Se as escolas [normais] se destinavam a
ensinar, deviam primeiro aprender. Ora, se não aprenderam, se se fundaram e dirigiram a esmo, era
natural que não pudessem arcar com os defeitos da organização [...]. Fundemos, pois escolas
normais como elas devem ser [...]” (OLIVEIRA, 2003, p. 214). O Brasil foi republicanizado ao final do
século XIX, em 15/11/1889, porém o Manifesto Republicano de 03/12/1870 é lacônico a respeito da
educação e do ensino, nem mesmo em termos de projeto. Todavia, com a República brasileira,
adviria a política educacional preocupada com a escola primária graduada e seriada, através dos
grupos escolares e das escolas-modelo, capitaneada inicialmente por São Paulo em 1893, mas
disseminada em todos os estados por volta de 1920. Ao desdobramento desse movimento a favor da
escola primária graduada, e contra as altas taxas de analfabetismo (em 1920, 65% da população com
mais de 15 anos), encontra-se o segundo período, cuja demarcação ficaria entre 1921 e 1945, adstrito
ao movimento de expansão quantitativa e de interiorização dos grupos escolares, quando e em
correlação com estes a ampliação do número de escolas normais torna-se muito significativa.
Saliente-se particularmente que o número de grupos escolares instalados nos estados de São Paulo,
Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte em 1922 somavam 76,5% em relação ao restante
do país. Em termos estatísticos, em 1920, São Paulo tinha 11 escolas normais públicas, sendo 03 na
capital e 08 no interior. Em 1925, registra a Mensagem do Presidente de Estado que 1.705 é o número
de candidatos ao magistério nas dez escolas normais públicas, e os concluintes são em número de
239. Por outro lado, 194 era o número de grupos escolares em 1922. No mesmo ano, em Minas Gerais,
171 eram os grupos escolares. As escolas normais mineiras em 1920 somavam 38, sendo duas
oficiais, e 36 equiparadas. Além disso, em 1926, havia, entre officiaes e equiparadas, 55 escolas
normaes, e em 1930, 66. O número de alunos normalistas, em 1926, atingia 2.197, porém em 1930
ascendia a 10.177 alunos. Embora as informações sejam de natureza diversificada, é possível através
das Mensagens dos respectivos Presidentes de Estado do ano de 1930, ou mesmo anteriormente,
reunir alguns registros estatísticos parciais com relação aos grupos escolares e ao número de escolas
normais: Mato Grosso (11 são os grupos escolares instalados, e conta com 2 escolas normais
públicas); Paraná (51 grupos escolares com 4 escolas normais públicas); Rio de Janeiro (65 grupos
escolares e 2 escolas-modelos, e com uma escola normal pública e 5 equiparadas); Rio Grande do
Norte (21 grupos escolares com 2 escolas normais públicas); Santa Catarina (25 grupos escolares
com 3 escolas normais públicas); no Maranhão (3 escolas normais públicas em 1929); e em
Pernambuco, 8 escolas normais públicas em 1928 (cf. www.crl.edu/brazil/provincial a propósito das
referidas mensagens de tais estados). No interior do terceiro período, desde o ano de 1946 - ano da
Lei Orgânica do Ensino Normal - a 1971 – ano de extinção das escolas normais - têm-se alguns
fenômenos correlatos desde os anos de 1940: êxodo rural associado ao processo a favor da
concentração urbana, ampliação quantitativa e paulatina dos grupos escolares e, por consequência,
o crescimento do ensino secundário desde 1945. Além disso, institucionalizam-se os cursos de
licenciatura desde os anos de 1930, o que significou sua expansão e interiorização entre os anos de
1940 de 1960, através das faculdades de filosofia, ciências e letras, o que promoveu contribuições à
profissionalização do professor, mas a conviver com a significação da escola normal, uma vez que o
crescimento de grupos escolares esteve associado ao crescimento demográfico urbano (em 1920,
84% da população brasileira habitavam a zona rural; em 1940, a população rural era de 68,8% em
relação à urbana; a população brasileira rural em 1960 somava 55%. Desde então, a vida urbana
começa a corroer o tecido rural, ganhando centralidade. Em relação à qualificação para o magistério
primário em 1940, segundo Werebe (1970), 60% eram normalistas; porém, em 1957, dezessete anos
depois, 53%. As escolas normais somavam 540 em todo o território nacional em 1949 (ROMANELLI,
1978, p. 163). Entretanto, também em 1957, as regiões sul e sudeste detinham 87,57% dentre as
normalistas de todo o país, e o número de não-normalistas atingia a casa dos 46,8% (ibidem, p. 162).
A reforma de 1971, por intermédio da Lei 5.692, estabelece que o exercício do magistério seja pautado
em termos de formação em grau superior (Art. 30, letras b e c; cf. também os 29 e 77), o que implicava
na criação das Habilitações Específicas para o Exercício do Magistério. O Parecer do CFE n° 346/72
registra tal movimento: o planejar a formação do magistério no Brasil foi a uma guerra em curso,
associando seu treinamento à prática mesma no ensino, um treinamento em serviço ou mesmo em
batalha. Apontava, em relação aos cursos normais, que “[...] formavam professores para o ensino
primário, [e] não levavam suficientemente em conta que, além de concorrerem para a cultura geral
e a formação do professorado, deveriam ter caráter profissionalizante” (MEC, 1972). As finalidades
sociais das escolas normais foram diversas conforme a periodização aqui sugerida. E em relação ao
movimento histórico nacional, foram amoldadas por este: vinculadas inicialmente às escolas de
primeiras letras (a denominação republicana as trata como isoladas), associaram-nas em seguida à
escola graduada e seriada, assistiram e compartilharam da expansão da concentração urbana, e
vieram a se modificar paulatinamente com a profissionalização docente em nível superior desde a
segunda metade dos anos de 1930. A democratização do acesso a cursos de licenciatura estabeleceu
as escolas normais num patamar diferenciado até a reforma pela Lei 5.692/71, quando uma inflexão,
em vista dos processos sócio-escolares, urbanos e capitalistas, re-situam as instituições escolares de
um modo geral, pela extinção dos grupos escolares e da escola secundária, além da extinção das
escolas normais. Entre a profissão de normalista que se teve e se exerceu no decorrer dos séculos XIX
e XX, a profissionalização docente manifestou diferentes formas em relação à sociedade a que serviu,
bem como a diferentes finalidades sociais; enfrentou conjunturas diversas em relação ao modo de
produzir a existência, eminentemente rural antes, porém paulatinamente urbana posteriormente. O
ensino normal se prestou à notabilidade, à distinção, à insígnia. Certamente, o prestígio, a admiração,
o respeito, a distinção e o valor sócio-cultural da normalista não podem ser compreendidos, em
particular, sem a disseminação da escola primária pelas vias da expansão e da interiorização. Se a
normalista já gozou de alto prestígio, ele esteve associado ao papel social da mulher para além da
vida doméstica no decorrer de um período de transição que viu feminizar o magistério desde o final
do século XIX. O samba-canção gravado por Nelson Gonçalves, intitulado Normalista, de 1949,
inspirado em caso real, merece destaque de parte de sua letra: inicia-se a primeira estrofe por vestida
de azul e branco, afirma a normalista como um brotinho em flor, na segunda estrofe; e na terceira -
Mas a normalista linda/Não pode se casar ainda/Só depois de se formar. Para além da metáfora,
expressa pelo brotinho em flor, atente-se para a referência ao uniforme e à passagem pela escola
normal como uma transição para o casamento.
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CIVILIDADE E ESCOLARIZAÇÃO
Coordenador: Tony Honorato
Eixo temático: Sujeitos e processos escolares e não escolares
Ementa
A história da educação no Brasil e em Portugal tem investigado as mudanças nos costumes
dos grupos sociais e os processos de escolarização formaram e indicaram modelos esperados e
impostos aos indivíduos no intuito de uma formação civilizada para os contextos públicos e privados.
Destacamos uma história da educação entre os séculos XVI e XX, como lugar da constituição de um
novo indivíduo para atender o ideário civilizatório pautados em códigos de etiqueta específicos e
que difundiam ideais de progresso, de valores religiosos e de infância enfatizando o predomínio
da racionalidade, a difusão da escola e a propagação da ciência como preceito. Esta comunicação
coordenada é um esforço de investigação buscando os processos em realidades brasileira (São Paulo,
Paraná e Mato Grosso do Sul) e em realidade portuguesa, assim como os modos de concretização do
ideário civilizador de escolarização na formação do cidadão/homem civilizado. Pretende-se discutir
a história da escolarização e a história dos costumes considerando os aportes teóricos de Norbert
Elias e interlocutores. As fontes que compõem as pesquisas consideram manuais de civilidade
(século XVI), imprensa do século XIX, regimentos escolares, livros de imposição de penas, impressos
pedagógicos, dispositivos legais e entrevistas produzidas a partir da História Oral. O primeiro trabalho
discute “O catecismo romano de 1566: educação cristã e manual religioso de civilidade”, analisando
como o catecismo e seus manuais de civilidade, no contexto do Concílio de Trento, foram usados em
instituições da ordem católica frente aos novos desafios dos movimentos reformadores. O segundo
trabalho “Educação protestante: olhares sobre experiências brasileira e portuguesa na transição
do século XIX”, discute dois modelos educacionais protestantes transplantados de outras matrizes
culturais, dando destaque para seus propósitos republicanos e civilizatórios ou mais amplamente de
um modelo societal, mas que em função das singularidades regionais (no caso do Brasil) ou nacionais
(no caso de Portugal) foram configurando estratégias de criação e disseminação de um modelo que
se pode conotar como de educação popular, em que as estratégias de alfabetização, escolarização
e de democratização cultural se fizeram presentes em diferentes setores sociais. O terceiro trabalho
“Escolarização dos costumes: formando professores, disseminado civilidades”, aborda uma história
dos costumes escolares praticados na formação de professores no Estado de São Paulo em nome
do dito bom comportamento no final do século XIX e início do XX. E o último trabalho “Educação e
etiqueta de civilidade na formação das crianças da escola SEI/Serviço de Educação integral”, parte
da premissa eliasiana de que a criança como ente funcional necessita se relacionar cada vez mais
com um maior número de pessoas e grupos para além da família, para então compreender o SEI
como um lugar de ‘agendas civilizatórias’. Assim no avançar na interpretação do processo civilizador
permitirá compreender normas, costumes e a formação de indivíduos escolares, interpretando os
códigos de civilidade, a escola de períodos históricos e informando um conjunto de práticas e valores
que compõe a imagem do indivíduo em civilização no tensionamento com específicas instituições.
EDUCAÇÃO PROTESTANTE:
OLHARES SOBRE EXPERIÊNCIAS BRASILEIRA E
PORTUGUESA NA TRANSIÇÃO DO SÉCULO XIX
dentre outras fontes, nas páginas do jornal local Gazeta de Piracicaba, nas duas últimas décadas
do século XIX e a primeira década do XX. A intenção é observar e descrever os sinais e as marcas
distintivas e características do comportamento social das educandas do Piracicabano, que
circulam nas páginas do jornal, ao mesmo tempo que promovem a difunsão de uma nova cultura
escolar. No caso português tentaremos ensaiar uma visão de conjunto sobre o modelo de
educação popular, tendo como princípio reitor que a proposta educacional dos protestantes
portugueses foi essencialmente estruturante de uma cultura protestante capaz de potenciar uma
ética e uma identidade diferentes daquelas que a matriz política e cultural católica inculcava.
Porventura, esta singularidade portuguesa possa ser captada justamente pelas potencialidades
que os dispositivos criados pelos protestantes originaram em termos de reconfiguração das
dinâmicas (e trajectórias) sociais. O modelo de educação popular pressupõe cinco dimensões
indelevelmente conectadas, a saber: i) dimensão educativa (científica, religiosa, cultural e social);
ii) dimensão associativa (com propósitos também de educação de adultos, formação profissional
e educação religiosa); iii) dimensão de formação teológica; iv) dimensão assistencial e filantrópica;
e v) dimensão de temperança/regeneração. Situa-se a consolidação do modelo, iniciado em
meados do século XIX, nos anos 20 do século XX, através das suas múltiplas materializações –
quer sejam as escolas primárias ou as dominicais ou o escotismo; quer pela formação de Uniões
Cristãs da Mocidade, de Ligas de Esforço Cristão, ou iniciativas de carácter cultural; quer pela
criação de Seminários; quer por iniciativas de indelével projeção filantrópica (Grupos, Sociedades
ou Dispensários de Beneficência, Orfanatos e Asilos-Berço); quer (e para finalizar) pela
disseminação de Ligas (Dominical, Antitabagista e Antialcoólica, Cruz Branca) ou a indiscutível
participação na Cruz Vermelha, na Sociedade Protectora dos Animais), na Liga da Bondade, na
Sociedade Anti Esclavagista, entre outras – com expressão nos periódicos, em folhetos e numa
literatura (ficcional e moralizante), que em simultâneo circulava, e que constituem o nosso
suporte documental. A escola (entendida como lugar de alfabetização e de escolarização, mas
também como lugar de sociabilidade) foi primaz na disseminação do modelo societal almejado
pelos protestantes portugueses. É neste contexto de concepções liberais e pragmáticas vivenciadas
nos dois países que se pode perceber mudanças sociais e educacionais, a partir de um processo
civilizador, que se estabelece por meio da educação dos modos e do controle dos comportamentos
individuais pela instituição-escola. Nos aproximaremos nesta análise a partir dos conceitos de
psicogênese e sociogênese desenvolvidos por Norbert Elias em sua relação com a educação.
Conceitos estes compreendidos em sua dinâmica no interior dos processos históricos com as
transformações percebidas tanto na estrutura da personalidade dos indivíduos como no interior
das estruturas das sociedades. Embora para Elias este processo é mais facilmente observado em
uma escala de longa duração, acreditamos que em menor escala, também seja possível perceber
mudanças no comportamento imposto e esperado socialmente e que aos poucos vão sendo
internalizados pelos indivíduos a partir de sua relação com novos valores oriundos de outras
sociedades vistas como modelos a serem seguidos. As mudanças sociais ao serem internalizadas
e absorvidas na psique dos indivíduos se transformam em comportamentos sociais aceitáveis
permitindo a inserção dos indivíduos e grupos sociais. Associaremos ainda, como um potencial
denominador comum, que a capacidade manifesta de materialização de projetos societários,
como recursos importantes para a ação e a interação social, construiu uma tripla história: a do
agente, a do mundo e a das categorias da reflexividade, logo da transformação social (SCAFF,
2011,SEWELL JR., 2005). Mas é também a história de um modelo de organização que vai
respondendo às realidades políticas, sociais e culturais, evidenciando um paradigma de cultura
cívica – ancorado num habitus (ou capital social) – como matriz da inovação social (SEWELL JR,
2005, p. 139), em que os atores sociais se vão assumindo como agentes de mudança. Em linhas
gerais, a proposta do presente pesquisa é a de investigar como as normas e valores do discurso
educacional das sociedades protestantes geraram condutas que foram aos poucos internalizadas,
aprimoradas e ampliadas à medida em que os processos relacionais foram se transformando ao
longo do processo histórico, estabelecendo novas redes de interdependências construídas nos
diferentes campos de relação, permitindo assim observar o modo como as novas configurações
do campo social flexionam as rígidas bases das fronteiras entre o indivíduo e a sociedade. As
distintas temporalidades e as particularidades espaciais – como ainda o estado em que se
encontram os estudos sobre o protestantismo em ambos os países – ditam uma certa prudência,
para o caso português, em termos de conclusões, ou seja de uma visão mais global, sobre a
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 55
questão educativa, mas pode autorizar, desde já, que apesar de estudos de caso (monografias,
instituições ou biografias), que uma outra história emergiu no campo de uma historiografia
pautada por hegemônicas e canônicas problemáticas, que supriam outras possibilidades de fazer
história, capaz, em suma, de construir o tempo (glosando uma expressão de Pierre Bourdieu).
Referências
ELIAS, Norbert. O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1993. 2v.
OLSON, David R.. L’école entre institution et pédagogie: repensar la reforme. Paris: Retz, 2003.
SCAFF, Lawrence A.. Max Weber in America. Princeton: Princeton University Press, 2011.
SEWELL JR., W. H.. Logics of History, Social Theory and Social Transformation. Chicago: The
University of Chicago Press, 2005.
ISSN 2358-3959
Durante os anos de 1545 a 1563 ocorreu, no seio da Igreja Romana, o chamado Concílio de
Trento, reuniões dos seus líderes com objetivo de avaliar a sua conduta institucional e implementar
mudanças. Desde o século anterior, em várias partes da Europa, havia denúncias de mal
comportamento do clero e das igrejas locais e, no início do século XVI, especialmente a partir das
denúncias de Martinho Lutero, pessoas da alta cúpula romana, dentre ela o papa Paulo III, decidiram
por realizar um concílio que, fundamentalmente, trouxesse a unidade perdida com os movimentos
reformadores. Durante três períodos (1545-1548, 1551-1552 e 1562-1563) cardeais, bispos e teólogos
discutiram e elaboraram um documento final contendo as decisões de um dos mais importantes
concílios da história da Igreja. Dentre as várias deliberações, uma foi a publicação de um livro onde
estivesse a doutrina católica explicada de forma clara e breve: o CATECHISMVS, Ex Decreto Concilii
Tridentini, ad Parochos Pii Quinti Pont. Max. Iussu editusad, editionem Romae A. D. MDLXVI publici iuris
factam accuratissime expressus, que aqui vai ser referenciado como Catecismo Romano. O Catecismo
é analisado por nós como um manual de civilidade para os católicos, à medida em que, dentre outras
finalidades, se queria resgatar um tipo de comportamento que fosse condizente com os princípios
cristãos. A teoria que embasa tal pesquisa é a dos processos civilizadores produzida por Norbert
Elias. O objetivo desta comunicação, que é parte de uma pesquisa mais ampla, é mostrar que o
Catecismo foi pensado para, também, fomentar um tipo de comportamento mais adequado do
cristão frente aos novos desafios a partir dos movimentos reformadores. A metodologia consiste
na análise documental tanto do Catecismo Romano quando das decisões do próprio Concílio de
Trento como um todo. A fonte principal utilizada é um fac-símile da edição portuguesa de 1590.
Originalmente o Catecismo foi redigido em 1566 a mando do papa Pio V. A periodização da pesquisa é
de 1545, quando se deu o início do Concílio de Trento, e 1590, quando se deu a publicação da edição
portuguesa. Esta comunicação trata mais especificamente de apresentar a análise do documento em
si, mas a pesquisa objetiva verificar qual o alcance, no século XVI, do Catecismo em terras da América
Portuguesa. É importante que se avalie a condução da Igreja no período pela atuação dos seus
mandantes no que se refere às causas e consequências do Concílio de Trento, pois aquelas reuniões
se configuraram, acima de tudo, em um Concílio dos bispos, como afirma Mullett (1985). A reforma
da Igreja deveria começar pelas dioceses, ou seja, pelos bispos, na medida em que muitas causas
do estado de lassidão e corrupção moral em que se encontrava a Igreja localizavam-se na esfera
da ação dos prelados, fossem nas paróquias, na atuação dos padres etc., e muitas das resoluções
tinham seu âmbito de aplicação prática igualmente na esfera administrativa das dioceses, como, por
exemplo, a criação de seminários para preparar melhor os futuros padres. Ressalte-se, ainda, que
no Código de Direito Canônico, mesmo hoje em dia, não há qualquer instância de ação pastoral e
decisão no sentido jurídico entre a Cúria Romana e as dioceses, por isso a importância das dioceses
e, consequentemente, dos bispos, os quais, na hierarquia católica, só estão abaixo do Papa
Nesse sentido, Mullett afirma que os “bispos foram agentes indispensáveis da Contra-Reforma”
(1985, p. 17). O “coração pulsante” do Concílio de Trento foi, continua Mullett, a reforma sistemática
dos bispados, paróquia por paróquia, implicando a inspeção dos padres, o estabelecimento de escolas
que a Igreja fomentasse uma mudança de comportamento dos católicos tanto no ambiente da igreja
como, e especialmente, na família e na sociedade.
Referências
CATECISMO ROMANO. Nova Versão Portuguesa Baseada na edição autentica de 1566. Por Frei
Leopoldo Pires Martins, O. F. M. Serviço de Animação Eucarístico Mariano: Anápolis – Goiás – Brasil.
ISSN 2358-3959
Parte-se da seguinte pergunta geral: como os estudantes se tornariam educados para viver
em uma figuração chamada escola que se institucionaliza para formar, a partir de saberes e
práticas sistematizados, homens educados para viverem em sociedade? A pesquisa trata-se de
uma história da escolarização dos costumes em nome do dito bom comportamento do estudante
desejado para viver em sociedade. O desenvolvimento dos modos de costumes implicou,
segundo Norbert Elias (1994), na instituição de específicos controle e autocontrole dos
sentimentos emocionais, para isso houve um preço social qualificador de uma ideia de homem
moderado. Assim busca-se nesta comunicação apresentar e analisar comportamentos
considerados (in)disciplinado do estudante em civilização escolar no final do século XIX e início
do XX. O problema histórico colocado é o de que o indivíduo em fase escolar nem sempre se
comportou da maneira que o processo de institucionalização escolar desejou como um sinal de
civilidade. Por conseguinte, tensionamentos entre estudantes e professores, estudantes e
pessoal do administrativo escolar, passam a ser frequentes exigindo, por um lado, medidas de
controle dos comportamentos e, por outro lado, a sóciodinâmica também demandou práticas
de extravasamento de emoções promotoras de sentimentos de satisfação e liberdade em
contraposição aos clausuramentos. Para Veiga (2011), pode se falar de um processo escolarizador
que implicou nas mudanças tanto das estruturas psíquicas quanto das estruturas sociais,
mudanças que foram sendo produzidas de forma (inter)geracional em uma perspectiva de longo
prazo. Assim como os estudantes careceram adquirir diferentes comportamentos, a figuração
escolar também careceu, interdependentemente com os estudantes e outros, mudar os sentidos
de sua estrutura social. As nossas análises voltam-se para as experiências de escolares
denominadas de indisciplinas vivenciadas entre o final do século XIX e a primeira década do
século XX, considerando a escolarização dos costumes no estado de São Paulo, particularmente
na cidade de Piracicaba, numa escola de formação de professores: Escola Complementar de
Piracicaba (1897-1911). Isto é, a indisciplina daqueles em formação de professores que
gerenciariam a indisciplina dos futuros alunos. Como corpus documental têm-se regimentos
escolares e livros de imposição de penas (famoso “livro negro”). Adotar esta fonte é também
reconhecer a existência de um limite em sua natureza. O livro é composto por registros
manuscritos de controle da administração escolar. Desse modo, torna-se relevante ressaltar
que os registros de imposição de penas se apresentam de acordo a escrituração realizada pelas
pessoas responsáveis pela manutenção da ordem e da organização do cotidiano escolar,
particularmente, pelo diretor. Essa escola foi instituída, dentre tantas razões e interesses, com
o objetivo de formar professores para assegurar o desenvolvimento do ensino primário, que
com a instauração da Primeira República foi considerado um caminho eficiente para sanar a
ignorância do povo para culminar na ordem e no progresso da nação. Considera a Escola
Complementar de Piracicaba uma ação no contexto do projeto do governo republicano paulista
do final do século XIX e início do XX, porque ela nasceu sob o signo das políticas da Reforma de
Instrução conhecida como “Caetano de Campos” 1892/1893. Os constructos de Norbert Elias
(1993; 1994) colaboram como matrizes interpretativas. Assim, para pensar essa história da
escolarização dos costumes também faz se mister analisar os comportamentos denominados
como ‘ilegais’, ‘desordeiros’ e ‘inconvenientes’ no cotidiano escolar. Está a falar da indisciplina
do aluno! Como resultado de pesquisa, apresentaremos a seguir comportamentos considerados
indisciplinados na formação de professores. Na Escola Complementar de Piracicaba/SP houve
uma representação de que o futuro professor deveria ser disciplinador dos valores vigentes, já
que seria um exemplo de disciplina para seus alunos no futuro. Esperava-se a incorporação de
um comportamento professoral, entendido como a formação de um padrão de autocontrole
altamente regulado e diferenciado no que diz respeito ao próprio comportamento. Este tipo de
autolimitação seria lentamente condicionado e incorporado nos/pelos futuros professores. No
primeiro ano de funcionamento da Escola Complementar encontram-se dezenove (19) registros
de indisciplina no livro de imposição de penas, em uma configuração constituída por sessenta
(60) alunos. O volume de registros aponta para comportamentos nos quais os alunos feriram o
poder da organização administrativa e pedagógica da instituição. Perscrutando o livro ‘negro’
identifica-se como comportamento julgado indisciplinado: lutas corporais, desrespeito ao
professor, imoralidade higiênica e mobilização contra a organização pedagógica e administrativa
da escola. O desrespeito, a ofensa e a desobediência aos professores eram os comportamentos
indisciplinados com maior número de registros no livro. O desrespeito ao professor sugere uma
espécie de recusa por parte dos alunos ao novo sujeito educado e futuro educador. Desobedecer
ao professor representava agredir a ‘alma’ de um dos personagens, ou conforme Souza (1998),
de um dos apóstolos da civilização, incumbido em consolidar os ideais, os costumes e as
representações da ‘boa’ sociedade brasileira do final do século XIX. Na Primeira República, o
professor recebeu o papel central de responsável pela educação escolarizada dos filhos da
sociedade republicana, de reformador do ensino público e de detentor de uma nobre missão
cívica e patriótica. Era pelo professor que se conseguiria transmitir e construir comportamentos
disciplinados dos cidadãos em idade escolar. O professor como autoridade e como representante
social, não poderia ser ofendido, desobedecido e desrespeitado, muito menos em um curso de
formação profissional de docentes que buscava a instituição do comportamento professoral. O
poder da organização administrativa e pedagógica também era afrontado pelos alunos.
Estimular previamente os colegas para não realizarem um exercício solicitado pelo professor,
faltar coletivamente, ocupar-se durante a aula com trabalhos diversos da lição explicada, vaiar
o professor por não concordar com a nota atribuída no seu boletim e não declarar ao diretor
arrependimento de suas condutas, foram comportamentos avaliados como indisciplina pelos
administradores dos costumes escolares. Um outro comportamento denominado de indisciplina
emerge na preocupação da escola em coibir os vícios imorais em nome da saúde do corpo social.
Usar qualquer espécie de fumo no interior da escola era um ato de indisciplina passível de pena.
Houve por parte da instituição escolar investimento sobre o ‘corpo sadio’. Esta orientação
recebeu influência dos valores e hábitos fortemente veiculados pela ciência médica do final do
século XIX. As concepções de saúde propagadas pelo movimento médico higienista também
colaboraram com a construção e ordenação da racionalidade escolar, intrinsecamente amparada
pela racionalidade republicana brasileira. Para os republicanos, a escola, como representante
legal do estado, detinha o poder de proliferar a moralidade higiênica, aliás, esse foi um dos
discursos incorporados por pedagogos e estadistas brasileiros no final do século XIX e início do
XX, tais como Rui Barbosa e Fernando de Azevedo. No cotidiano da Escola Complementar as
lutas corporais entre os alunos também eram intituladas como indisciplinas. O livro de imposição
de penas não apresenta os motivos dos confrontos/conflitos, apenas menciona o nome dos
envolvidos e os lugares (recreio, fila e proximidades da escola) nos quais ocorriam as agressões
corpóreas deixando marcas físicas e simbólicas dos costumes escolares. Fica evidenciado que a
escola também compõe um lugar no qual as relações de interdependências entre os indivíduos
podem gerar confrontos/disputas, agressões e possibilidades de extravasamento das tensões
emocionais repudiadas na sociedade moderna, a violência física. Por fim, considera-se que ao
analisar os registros de indisciplina no livro ‘negro’ da Escola Complementar de Piracicaba/SP,
o desafio passou a ser como compreender os açoitamentos da ‘alma/consciência’ do aluno. As
transformações dos costumes escolares podem ser uma forma de se estudar o novo modo de
vida do final do século XIX e início do XX. Entende-se que num estágio do processo escolarizador,
típico da transição do século XIX para o XX na realidade brasileira, houve um crescente movimento
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 61
Referências
ELIAS, Norbert. O processo civilizador: formação do estado e civilização. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
1993.
ELIAS, Norbert. O processo civilizador: uma história dos costumes. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994.
SOUZA, Rosa de Fátima. Templos de civilização: implantação da escola primária graduada no Estado
de São Paulo (1890-1910). São Paulo: Fundação Editora UNESP, 1998.
e da proliferação das instituições educativas desde a infância. Neste trabalho, vamos tratar de uma
instituição educativa que foi criada para atender especialmente crianças de 2 a 6 anos se configurando
inicialmente como uma escola de Pré-escola, no período de sua criação 1980, atualmente a
nomenclatura é Educação infantil. Na sua fundação os objetivos explícitos eram a formação da criança
pequena no município de Dourados, sul de Mato Grosso do Sul. Entretanto, a referida escola hoje
atende crianças até o final do Ensino Fundamental (14 anos) formando uma geração de indivíduos há
aproximadamente quatro décadas, tornou-se uma referência na escolarização geracional desta
localidade. Nosso foco será a Educação Infantil na Escola Serviço de Educação Integral/SEI abarcando
uma periodização desde sua criação qual seja 1980-2019, considerando que este fragmento faz parte
de uma pesquisa mais ampliada que trata a instituição a partir de quatro décadas de atuação. Nosso
objetivo nessa pesquisa sobre a escola é tratar de modo eliasiano quais as concepções de educação,
civilidade e formação destinada à indivíduos entre dois e quatro anos, expressas entre as diversas
atividades e práticas pedagógicas, ou as chamadas “agendas civilizatórias” (BOTO, 2016) que
acontecem na escola desde festas, corais, bandas, teatro, dança, viagens, celebrações de datas
comemorativas, feiras pedagógicas etc. Neste trabalho destacaremos em especial uma atividade
destinada as crianças maternais de dois e três anos que seria um curso chamado FBM Fiscal das Boas
Maneiras, no qual as crianças exercitam e aprendem modos de civilidade, etiqueta social e
comportamentos esperados pelo grupo. Trabalharemos com uma metodologia que se utiliza do
cruzamento de fontes e registros provenientes dos acervos escolares, e produção de documento a
partir da metodologia da História Oral, com entrevistas a docentes e membros da comunidade escolar.
Temos uma documentação da escola disponibilizada nos arquivos escolares como: Ata de criação da
instituição, regulamentos, o programa do curso, certificados emitidos aos futuros fiscais das boas
maneiras, planejamento de professores, no qual consideramos a riqueza e a disponibilidade dos
acervos escolares que temos acesso. Além desta, estamos produzindo uma documentação, para este
trabalho contaremos com uma entrevista de uma professora do maternal, que lecionou durante toda
a sua carreira (vinte e cinco anos) com as crianças pequenas e acompanhou esse curso FBM. Importante
destacar que esta atividade é parte de uma proposta lúdica da Escola Serviço de Educação Integral,
mas com intencionalidade pedagógica e prevê ensinar e exercitar modos, comportamentos sociais da
boa convivência e normas de etiqueta como a utilização de cumprimentos, as palavras amenas, os
pedidos de desculpa, levando as crianças a se expressarem com palavras como: “com licença, obrigada,
me desculpa, por favor”, entre outras. Buscamos na experiência desse curso de FBM perceber a
educação da civilidade social nestes contextos de escolarização institucional, no qual os modos da boa
civilidade são valorizados, abordando comportamentos específicos para o convívio entre as crianças
do maternal e os adultos da escola (os/as docentes). Nossa ênfase recai na análise das normas e
prescrições que regulam e os conceitos trabalhados nesta prática, e de que modo, elas também se
constituem em instrumentos de controle e autocontrole da educação destes meninos e meninas da
escola. Analisaremos a partir do processo civilizador de Norbert Elias como as etiquetas, regras e
padrões de civilidade ainda são preservados e ou ensinados às crianças. Considerando a programação
em uma instituição educacional, nos questionamos se tais conhecimentos não deveriam ser destinados
ao espaço doméstico ou adquiridos no âmbito familiar, no qual as pessoas comumente se referem a
tais modos e etiquetas como se uma “boa educação viesse do berço” referindo-se à educação familiar.
Tentaremos compreender no âmbito dessa instituição as motivações para seguir com uma atividade
que a princípio não seria de responsabilidade institucional, percebendo assim como a escola, a
comunidade e as próprias crianças lidam com essa prática ou esse curso, ou se para elas ele só
representaria mais uma brincadeira. Concluindo conjecturamos que a escola e as experiências vividas
com /o professor/a da nossa infância posteriormente poderá ser lembrada pelos modos como
atribuímos sentido e significado. Tais experiências compõem a história da nossa educação na infância
determinada pelas relações sociais específicas que estabelecemos. Portanto, se todos os seres
humanos trazem consigo, pelo modo como se constituem individual e coletivamente, as marcas da
educação recebida na infância, é possível pensar com Elias (2001) que tais experiências estão intrínsecas
a própria constituição do indivíduo e ao longo da vida tais marcas reverberam as origens da formação
recebida nos primeiros anos, assim aprender modos e boas maneiras de civilidade social podem ser
marcas para estas crianças no período de convivência no espaço da escola, e possivelmente elas vão
carregar para a vida lembrando que, embora a etiqueta seja algo de difícil aprendizado, só a partir dela
conseguimos nos relacionar e conviver socialmente com nossos pares e nos grupos que fazemos parte.
RESUMOS DAS
COMUNICAÇÕES
INDIVIDUAIS
EIXO
CULTURA MATERIAL
ESCOLAR
ISSN 2358-3959
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de uma nação moderna. Portanto, é preciso pensar o processo de remodelação urbana atrelado a
uma remodelação social da cidade.
Em outras palavras, o projeto de expansão da escolarização, com destaque para as Escolas do
Imperador, estaria diretamente relacionado ao projeto de urbanização da cidade do Rio de Janeiro.
Perscrutando o processo de escolarização do social, por meio de um conjunto de dispositivos de
poder-saber de natureza educacional, científica e assistencialista, sob a perspectiva de Foucault
(2017), foi possível indiciar a articulação entre as pretensas melhorias na qualidade do espaço
urbano e as necessidades de organizar, harmonizar e disciplinar os espaços e tempos citadinos no
último quartel do século XIX, com destaque para as Escolas do Imperador. Enfim, entrelaçando as
culturas escolares e urbanas no período, foi lançado um convite ao leitor para reflexão acerca da
emergência de um olhar estético civilizatório a partir das Escolas do Imperador no último quartel do
século XIX.
Referências
ABREU JUNIOR, L. de M. Apontamentos para uma metodologia em cultura material escolar.
Proposições - Revista quadrimestral da Faculdade de Educação da UNICAMP, vol. 16, n.1. (46) jan./
abr., 2005, p.145-166.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 5. ed., 2017.
VEIGA, C. G. Educação estética para o povo. In: LOPES, E. M. T.; FARIA FILHO, L. M.; VEIGA, C. G. 500
Anos de Educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 3ª ed., 2003, p.135-150.
VINCENT, G.; LAHIRE, B. e THIN, D. Sobre a história e a teoria da forma escolar. Educação em Revista.
Belo Horizonte: UFMG, n.33, jun. 2001, p.7-47.
ISSN 2358-3959
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Palavras-chave: História das disciplinas escolares. Ensino de Desenho. Colégio Estadual do Paraná.
Este trabalho propõe a análise da disciplina de Desenho no Colégio Estadual do Paraná, Brasil,
entre 1943 e 1949. Esta instituição de ensino secundário foi criada com o nome de Liceu de Curitiba,
em 1846, passando a se chamar Ginásio Paranaense em 1892 e depois, Colégio Estadual do Paraná
em 1943. Durante muitos anos, e pode-se dizer de certa forma que ainda hoje, foi a instituição
representativa do ensino secundário público no Paraná. Localizado, desde 1950, em importante
edifício na região do Alto da Glória em Curitiba, ocupou durante 45 anos outro prédio imponente na
região central da capital paranaense. A pesquisa insere-se no campo da história das disciplinas
escolares, e está vinculada à linha de pesquisa História e Historiografia da Educação do Programa de
Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná. O recorte temporal inicial se refere
à alteração do nome deste Colégio na conjuntura da Reforma Capanema, ocasionando também
mudanças no currículo e nos programas educacionais do Desenho no ensino secundário e o recorte
final à mudança para um novo prédio escolar em 1950. O trabalho analisa a oficialização do ensino
de Desenho no currículo brasileiro do ensino secundário por meio dos programas e instruções
pedagógicas da Reforma de Gustavo Capanema em um contexto de padronização, de centralização
das ações educacionais e de sua inserção na instituição escolar, especialmente no Colégio Estadual
do Paraná. Sendo assim, a disciplina de Desenho aparece delineada com conteúdos mínimos a
serem aplicados e forma de avaliação estabelecida. Percebe-se que as definições de Desenho são
múltiplas: pensamento, comunicação, percepção, prática, linguagem. Entende-se assim por
Desenho não apenas a técnica ou o produto final, mas tudo que envolve seu fazer, como instrumentos,
suportes, a forma de ensinar, o simbólico, o imagético, a linguagem, interagindo com sujeitos que o
realizam, apreciam ou criticam. A história da disciplina de Desenho traz a busca sistemática da
prática de desenhar, tendo como premissa a rigidez do traço e a imitação das formas. Assim, por
meio de linhas, traços e formas é possível ver o mundo. O diálogo e as reflexões estabelecidas neste
trabalho foram realizados com base em fontes de diversas tipologias, provenientes de diversos
arquivos da capital paranaense. São documentos originários do poder público (programas da
disciplina, discursos ministeriais, leis, decretos, instruções), documentos administrativos e
pedagógicos escolares (planos de estudos, livros de faltas, grades curriculares, relatórios dos
inspetores, atas da Congregação, relatórios de finanças e patrimônio, pontos de prova, regimentos
internos), jornais, jornal dos estudantes do Colégio Estadual do Paraná e fotografias. No que se refere
ao ensino do Desenho, é necessário pesquisar o currículo e a estrutura da disciplina; suas finalidades,
os conteúdos, os métodos de ensino-aprendizagem; o sistema de avaliação; os planejamentos; o
material didático utilizado; as produções de material e os recursos didáticos; os programas; os
exercícios; os pontos de provas; a formação dos professores; os objetos escolares (sólidos
geométricos, esquadros, transferidor, pranchetas, cabeças de gesso, modelos, relevos, bustos); os
desenhos e as pinturas; e os livros didáticos utilizados. É essencial valorizar as fontes provenientes
do cotidiano escolar e não apenas as da legislação educacional e dos programas de ensino. Como
também será feita uma análise de fotografias e imagens, pode-se refletir que elas são parte da
compreensão da cultura escolar. Todo o tratamento ou cuidado que o historiador deve ter ao analisar
um documento escrito deve ser dado, da mesma forma, às fontes imagéticas. Fotografias e desenhos
podem trazer elementos de como os objetos da cultura material escolar foram introduzidos nas
escolas e indicar como os sujeitos se apropriaram deles no cotidiano escolar. Porém, é preciso
advertir que as imagens podem produzir representações oficiais dos sujeitos, dos espaços e das
práticas escolares. Entre os acervos consultados está o Centro de Memória e o Arquivo Geral do
Colégio Estadual do Paraná e o Arquivo Público do Estado do Paraná. O referido Colégio, atualmente,
é tombado pelo patrimônio histórico, e é um local privilegiado para a investigação sobre a História
da Educação. Primeiro, por sua trajetória histórica desde a sua criação. Segundo, porque seu espaço
físico e seu percurso histórico permitiram a guarda e preservação de significativo acervo documental,
que possibilita pesquisas em História da Educação. Tais documentos registram e constituem a
cultura material escolar, específica da instituição, profundamente relacionada, de forma dialética,
com a sociedade e a cultura com as quais se relaciona de forma mais ampla. Ou seja, são testemunhos
da vida institucional, da sua cultura e memória, com as particularidades da escola que os produziu.
Sendo assim, o trabalho trata da cultura material escolar, ou seja, o conjunto de objetos que circulam
no ambiente escolar, mediados pela relação pedagógica e pelas relações sociais, portanto a cultura
material envolve os seres humanos, as matérias-primas, as técnicas, e o consumo. Pode-se pensar,
então, nas relações entre professores, alunos e a comunidade escolar com a cultura material escolar,
da qual fazem parte os objetos escolares de Desenho. No contexto estudado, qualidade de ensino
significava, também, aquisição de artefatos escolares. Ao travar contato com os objetos escolares,
estabelece-se uma relação entre o pedagógico e o material, especificamente numa disciplina que
está inserida nesse Colégio modelo do secundário no Paraná. Como referenciais teóricos, a pesquisa
dialoga com autores como Julia e Chervel, que tratam da história das disciplinas escolares. Como
defende Chervel, a escola produz uma cultura específica, singular, que emerge do próprio
funcionamento escolar, e cujos efeitos se estendem sobre a sociedade. As disciplinas escolares se
formam no interior de uma cultura escolar. Desta forma, busca-se investigar a cultura escolar que
envolve o ensino de Desenho no contexto de um Colégio secundário modelar como o Colégio
Estadual do Paraná. Também, toma-se como referenciais teóricos Forquin, Viñao Frago e Escolano
Benito, que discutem questões acerca do currículo, dos saberes escolares e da cultura escolar, além
de autores que tratam da cultura material escolar. O ensino do Desenho foi prescrito em programas
definidos por Leis e Portarias, transposto para o meio escolar, no caso o Colégio Estadual do Paraná,
por meio de programas e projetos fiscalizados e inspecionados e pelos materiais e livros didáticos,
que constituem a materialidade da disciplina. Chama-se atenção para o estudo dos livros didáticos
de Desenho, objetos da cultura material escolar e fontes importantes nesta investigação para que se
saiba como os programas oficiais foram interpretados e materializados. Eles auxiliam também no
sentido de saber como cada autor de livro concebeu e didatizou o conhecimento e se posicionou
frente às leis, à concepção de escola e ao espaço educacional. Também os instrumentos de desenho
e modelos para desenhar são importante material a ser analisado, pois é possível pensar na didática
do ensino de desenho com base neles. Na história da disciplina de Desenho, percebe-se que ela tem
suas próprias normas, ao mesmo tempo em que serviu para disciplinar a mão e o corpo, aspecto que
vem ao encontro das ideias de Chervel quando trata da construção dos saberes escolares. Pensar a
história do ensino de Desenho é mais que pensar sobre as práticas, as técnicas ou os procedimentos
artísticos do desenho em si. É pensar como ele se insere no espaço escolar como disciplina,
oficializada pelas leis, com programas e conteúdos específicos, e como isso se relaciona com a
transmissão dos saberes ou com sua assimilação por meio de procedimentos, conteúdos, normas e
materiais. Estabelece-se, assim, relações com os conteúdos do Desenho no âmbito de um Colégio
modelo do ensino secundário do Paraná em diálogo com o campo educacional em outros locais e
contextos. Na análise da disciplina de Desenho no Colégio Estadual do Paraná compreende-se o
quanto era importante documentar o patrimônio material desta instituição de ensino, como espaços
arquitetônicos, mobiliário, laboratórios, equipamentos e objetos. Era por meio do patrimônio
material que o Colégio demonstrava sua qualidade de ensino, sua adequação ao currículo e aos
programas educacionais federais, em específico da disciplina de Desenho. Assim, os espaços e os
artefatos materiais da disciplina de Desenho no Colégio Estadual do Paraná estão vinculados a
concepções pedagógicas, a saberes e práticas, ao ofício docente e a toda uma relação simbólica com
estes objetos no contexto de uma organização escolar.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 70
Referências
CASTRO, C. A. (org.) Cultura material escolar: a escola e seus artefatos (MA, SP, PR, SC e RS, 1870-
1925). São Luís: EDUFMA: Café & Lápis, 2011.
CHERVEL, A. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria e
Educação, Porto Alegre, n. 2, p. 177-229, 1990.
TABORDA, M.A.O.; RANZI, S.M.F. História das disciplinas escolares no Brasil: contribuições para o
debate. Bragança Paulista, SP: EDUSF, 2003.
“AOS LEITORES”:
O PREFÁCIO DO LIVRO ESCOLAR DE
MÚSICA DE ANTONIO RAYOL
Kathia Salomão
Cesar Augusto Castro
Os livros escolares de música são amplamente divulgados e utilizados no ensino dessa arte
no Brasil, tendo predominado, do período colonial até o início da República, e principalmente
no Império, a literatura europeia, em especial a portuguesa e a francesa. No entanto, os músicos
brasileiros já divulgavam seus trabalhos, e juntamente com as publicações dos estrangeiros
compunham o cenário do ensino musical no país. Nesse contexto, foi produzido em 1902 um
compendio intitulado Noções de musica: extrahidas dos melhores auctores, por Antonio dos Reis
Rayol, renomado músico do Maranhão que exercia atividades educacionais tanto em aulas
particulares quanto em escolas de São Luís. Nascido nessa capital na década de 1860, tornou-se
um cantor lírico, compositor, regente e violinista. Rayol atuou como docente nas seguintes
instituições maranhenses: Casa dos Educandos e Artífices, Liceu e Escola Normal. Ainda ocupou
o cargo de diretor da Aula Noturna de Música e da Escola de Música. Em outros estados foi
professor da Escola de Música da Bahia e da Academia Livre de Música no Rio de Janeiro. Seu
livro foi elaborado com o objetivo de atender às necessidades dos seus alunos da Escola Normal
e da Escola de Música no Maranhão, abordando em seus conteúdos temas teóricos, como a
grafia tradicional, que auxiliavam na execução e interpretação musical. Exemplares desse livro
encontram-se no Acervo de Obras Raras da Biblioteca Pública Benedito Leite e no Acervo da
Academia Maranhense de Letras. Os impressos em geral são formados de texto e paratexto,
sendo esse último composto por vários elementos, como a capa, o prefácio, as notas de rodapé,
o apêndice, trazendo diversas informações a respeito da obra e do contexto em que ela se insere.
No caso de livros escolares esses elementos podem informar a maneira como os mesmos
deveriam ser utilizados em sala de aula, os conteúdos, as concepções filosóficas e pedagógicas
do autor e do meio ao qual faz parte. Quando constrói os paratextos, em especial o prefácio, o
escritor tem a oportunidade de ter um espaço só seu, defendendo suas ideias que foram
desenvolvidas dentro de um processo histórico. Assim, aprofundar os estudos a respeito dos
elementos paratextuais em busca de entender esse “mundo periférico” e ao mesmo tempo
imerso no texto, tornou-se relevante. Dessa forma, esta pesquisa visa analisar o prefácio de
Noções de musica compreendendo-o como um espaço em que a imagem de Rayol e as suas
concepções a respeito da música e seu ensino são evidenciadas. Utilizamos neste trabalho a
pesquisa bibliográfica, com embasamento teórico em autores, como Genette (2018) para
entender a análise de paratextos, Fonterrada (2005) e Andrade (2013) para discorrer sobre o
contexto musical e social do período, e Chartier (1990, 2014) para o estudo da história do objeto
na sua materialidade, das práticas dos sujeitos e das múltiplas relações existentes, e a pesquisa
documental, cujas fontes são os relatórios das Mensagens dos Governadores e a imprensa
periódica. A escolha desse livro em especial como fonte e objeto de estudo, delimitando ele
próprio o tempo (décadas iniciais da Primeira República) e o espaço dessa pesquisa, e de seu
Referências
Andrade, Clarissa Lapolla Bomfim. A Gazeta Musical: positivismo e missão civilizadora nos primeiros
anos da República no Brasil. São Paulo: Editora Unesp, 2013.
Chartier, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. 2. ed. Tradução Maria Manuela
Galhardo. Lisboa: DIFEL, 1990.
______. A mão do autor e a mente do editor. Tradução George Schlesinger. São Paulo: Editora
Unesp, 2014.
Fonterrada, Marisa Trench de Oliveira. De tramas e fios: um ensaio sobre música e educação. São
Paulo: Editora Unesp, 2005.
Genette, Gérard. Paratextos editoriais. 2. ed. Tradução Álvaro Faleiros. Cotia, SP: Ateliêr Editorial,
2018.
ISSN 2358-3959
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Maria Stephanou
cujas temáticas centrais não contemplam uma palavra a ser associada. Os abecedários ilustrados
contemplaram uma variedade de temáticas foram versáteis para articular palavras a letras iniciais.
Além dos abecedários de preceitos cristãos, ou de virtudes e boas condutas, ou alfabetos de figuras
históricas ou de geografia, além daqueles que foram impressos como abecedários enciclopédicos,
cujas imagens alternam-se de objetos a profissões, de soldados a embarcações, de virtudes do
bom aluno ou da criança bem educada a instrumentos musicais, de brinquedos a utensílios de
cozinha etc,. Destacam-se, ainda, aqueles que contemplam imagens e palavras associadas à história
natural, com predomínio de animais, em sua variedade ou exclusivamente de pássaros ou peixes,
além daqueles que elegem as plantas, flores, árvores, representantes da diversidade da flora. Uma
pedagogia da imagem progressivamente passa a caracterizar o gênero impresso abc, em duas
direções: a) da sequencia das letras do alfabeto e suas diferentes formas de grafia até aqueles que
b) da impressão em preto e branco adquirem a impressão em cores vivazes, ritmo e movimento,
cenários contrastantes, novas técnicas de mise en pagedas letras, sílabas e palavras, em associações
por vezes engraçadas ou insólitas com as ilustrações. A nova invenção visual inundou as páginas dos
abecedários de ilustrações e os editores intentavam nutrir o imaginário infantil, além de assegurar
o aprendizado da leitura. Como afirma Marie-Pierre Litaudon - Bonnardot (2014), os abecedários
não se limitaram a transmitir um saber linguístico, mas passaram a produzir, e ao mesmo tempo a
exprimir, uma cultura da infância. Nesta comunicação apresentamos um inventário de abcs do século
XIX, bem como sua caracterização quanto às edições-editores, quanto aos dispositivos tipográficos,
quanto às temáticas ilustradoras e geradoras de palavras, a presença ou não de letras adornadas, de
sílabas, de frases, de textos de leitura, entre outros aspectos contrastivos. Por exemplo, a sequência
do alfabeto, rigorosamente observada, nem sempre significa a repartição em páginas segundo cada
letra, podendo aparecer agrupadas em conjuntos ou distribuídas segundo quantidades eleitas pelo
autor ou pelo editor: duas a duas, três a três, quatro a quatro, seis a seis. Isso ocorre igualmente
com as imagens: uma somente por página acompanhando a letra, a silaba e a palavra, as vezes uma
frase, ou um conjunto de imagens reunidas após diversas letras, suas sílabas e palavras. Ou seja,
por vezes, as letras, sílabas, palavras e frases aludiam a imagens que não eram impressas na mesma
página, mas conforme os recursos tipográficos eram apresentados em pranchas, agrupadas, em
páginas ao lado dos textos ou em páginas ao final. Em alguns abecedários, a página inteira parece ter
sido elaborada e decorada a partir de um universo representacional associado à letra, com diversas
ilustrações cujos nomes/letras iniciais são evocadoras do seu uso da letra, ricamente compostas e
caprichosamente desenhadas, apesar de algumas contorções árduas e sugestivas a que o artista ou
o autor, talvez o editor, obrigavam as crianças a compreender ou memorizar. Discutimos o quanto
observamos a existência de indícios da circulação de imagens e modelos editoriais, pistas quanto
a adaptações, reinvenções e adequações às especificidades de cada idioma. Embora as imagens
e suas narrativas se façam cada vez mais presentes nesses impressos do século XIX, sobretudo
na passagem para o século XX e neste crescentemente, longe de um a ruptura com sua história e
forma secular, apontamos a persistência de atributos e composições que caracterizam uma certa
identidade do gênero abc, cada vez mais ligado à instituição escolar e ao uso pelas famílias que
intentavam assegurar o progresso escolar dos filhos. Outro movimento de caracterização do
conjunto de abecedários examinados volta-se à associação dos abecedários aos métodos de ensino
da leitura e da escrita: método sintético, soletração, silabação, método analítico, etc.
Em outros estudos (SOUZA e STEPHANOU, 2016, 2015, 2013) apresentamos uma espécie de
circuito variado da presença dos abecedários, ora como apoio ou instrumento de ensino, ora como
modo de organização segundo a sequência alfabética para a disposição de um conjunto variado
de conteúdos. Em outro recorte em que analisamos parte distinta do corpus de abecedários que
vimos reunindo (STEPHANOU E SOUZA, 2018) também em relação aos impressos abc do século XIX
que nesta comunicação elegemos para uma análise mais imersiva, não podemos afirmar que tenha
havido uma importação integral de modelos e conteúdos impressos da França traduzidos para o
Brasil, reproduzindo uma perspectiva eurocêntrica, ou uma transferência direta, o que seria um
reducionismo ingênuo. Podemos presumir que os abecedários examinados, seja por suas temáticas,
seja pelas palavras escolhidas, ou ainda, pelos atributos gráficos e suas visualidades, tenham sido
objeto de apropriações, adaptações, ora das imagens com textos inteiramente recriados, ora das
capas reinventadas, ou de imagens transpostas para outras letras, atendendo às especificidades das
palavras evocadoras em cada idioma.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Objetivos
Compreender as escolas do quilombo de Mata Cavalo enquanto espaços de legitimação histórica
e resistência cultural da comunidade de Mata Cavalo.
Periodização
O presente trabalho trata-se de algumas das dimensões retiradas de uma pesquisa de mestrado,
iniciada em março do ano de 2016, que possibilitou a elaboração de uma dissertação defendida em
março de 2018. Na ocasião, a comunidade quilombola de Mata Cavalo foi pesquisada, desenhada,
mapeada (SILVA, 2011) e interpretada por meio da arte-educação-ambiental (QUADROS, 2011), em
busca de fortalecer a relação entre a cultura e a natureza de um povo que produz suas táticas de
resistência frente a um processo excludente, que permanece desde os tempos da escravidão até os
dias atuais, nos quais as políticas públicas e os interesses individualistas dos fazendeiros da região,
acabam por cercear os direitos dos moradores originais deste território (SOARES, 2018).
Fontes
Para consubstanciar a presente pesquisa, utilizamos livros, artigos científicos, cartilhas e um
Laudo Antropológico da Comunidade Quilombola de Mata Cavalo, onde consta o processo histórico
de constituição deste território, inserido nas proximidades do município de Nossa Senhora do
Livramento, no estado de Mato Grosso.
Nossa principal fonte de informações foi a referida dissertação de mestrado, da qual retiramos
um recorte temático para a presente pesquisa. Outras dissertações e teses foram utilizadas, sendo
muitas delas, resultantes de pesquisas em Mata Cavalo e outros quilombos. Neste sentido, as
narrativas dos moradores da comunidade, legitimados pela metodologia utilizada, acerca dos
espaços escolarizados, são nossas maiores fontes para a elaboração dos mapas sociais da cultura
quilombola e, mais especificamente, a demarcação, identificação e reconhecimento das escolas
quilombolas como importantes marcos de legitimação histórica e resistência cultural. Frente a este
processo excludente sofrido pelos quilombolas de Mata Cavalo, buscamos perspectivas de estudos
que se consubstanciam na educação ambiental, percebendo que os prejuízos socioambientais
atingem, com maior prejuízo, pessoas em situação de vulnerabilidade socioambiental (SILVA, 2011).
Metodologia
Em conformidade com as fontes de pesquisa supracitadas, constituímo-nos de um arcabouço
metodológico que proporcionou, inicialmente, uma pesquisa bibliográfica pertinente à temática
escolhida. Para orientar os passos investigativos, privilegiamos o Mapa Social (SILVA, 2011) sendo
a metodologia que nos permitiu o mapeamento de quatro dimensões que entrelaçam a cultura e a
natureza de Mata Cavalo: os marcos históricos, as expressões artísticas, as comidas típicas e as festas.
Estes grandes mapeamentos nos possibilitaram o reconhecimento de uma infinidade de aspectos
culturais e prejuízos socioambientais que interferem diretamente nos modos de vida da comunidade
(SOARES, 2017), bem como a demarcação e identificação das escolas por áreas quilombolas, que
são o foco do presente estudo.
Optamos pela elaboração dos mapas pictóricos (FIORI; ALMEIDA, 2005), que dispensaram o rigor
cartográfico, para proporcionar o entendimento da comunidade, independente de faixa etária ou nível
de escolaridade. O processo de criação, por meio de desenhos, utilizou imagens pictóricas sugeridas
pelos quilombolas. A oficina de mapeamento social aconteceu no único espaço escolarizado: a
Escola Estadual Quilombola Tereza Conceição de Arruda, e contou com a presença de quase 80
pessoas da comunidade, sendo conduzida por membros do grupo pesquisador, no qual fazem parte
a autora desta pesquisa, e suas respectivas orientadoras de mestrado. Foram também realizadas
entrevistas na escola e nas residências dos quilombolas, e sob o lume da inspiração Sociopoética
(PETIT, 2002), as pesquisadoras puderam promover a valorização das particularidades e saberes
quilombolas, sensibilizando, por meio dos diálogos e vivências, a igualdade dos saberes populares
e científicos, utilizando a arte e a cultura como sensibilizadoras do processo de aprendizagem, tanto
da comunidade, quanto do grupo pesquisador.
Ao sistematizar os marcos históricos e culturais mapeados na pesquisa, pudemos também
identificar os espaços escolarizados que foram se constituindo e resistindo ao longo do tempo, em
Mata Cavalo, elaborando gráficos e ilustrações, possibilitando a valorização dos aspectos culturais e
ambientais da comunidade.
Resultados alcançados
Por meio dos estudos, diálogos e vivências em Mata Cavalo, foi possível perceber os espaços
de resistência da comunidade com uma grande importância na organização e articulação política,
onde outras também educações foram constituídas (SENRA, 2029). Desta forma, dirigimos um
olhar diferenciado a algumas das escolas que foram construídas ao longo dos mais de 140 anos
de constituição desta comunidade quilombola, enquanto legitimadoras do direito à educação, mas
que em muitos momentos, também sofreram com o racismo, que deixou sua herança até os dias
atuais, pois ainda permanece impregnado na cultura da região (SOARES, 2018).
Conforme os relatos dos membros da comunidade, a primeira escola foi fundada em 1944, para
atender a solicitações de uma das lideranças locais, em busca de ensino escolarizado para seus
filhos. Em meio a tantos obstáculos para a construção deste espaço, houve ainda muitos embates e
impedimento do acesso à educação para as crianças negras e quilombolas. A discriminação racial
fazia parte do cotidiano dos estudantes, que em muitos momentos eram impedidos de acessar a
escola, por conta de sua origem negra.
Já em 1893, relata-se a construção da Escola Afonso de Campos Maciel, que recebeu o nome de
um fazendeiro da região. Contava com precária infraestrutura, e a maioria das professoras vinham
de Nossa Senhora do Livramento. Na falta de funcionários, elas acumulavam múltiplas funções, e
em muitos momentos, organizavam a limpeza, o material e o lanche escolar para as crianças, com
seus recursos financeiros.
No ano de 1996, foi fundada a Escola Estadual São Benedito, no mesmo período em que ocorreu a
diáspora de muitos quilombolas que haviam sido expulsos por fazendeiros, de seu território de origem.
Neste espaço de estrutura simples, com telhado coberto de palha, foi também o local de importantes
articulações políticas (SENRA, 2009), se constituído como um dos mais importantes espaços de
resistência de Mata Cavalo, fortalecendo também o ensino escolarizado quilombola (SILVA, 2011).
Já em 2002, a Escola Rosa Domingas deu continuidade à resistência do ensino escolarizado: foi
denominada em homenagem a uma importante liderança quilombola, que, junto a seus familiares
e comunidade, resistiu a violentas e inúmeros ataques e ameaças de fazendeiros, que queria tomar
suas terras (SENRA, 2009). Neste espaço, apesar da mudança da escola para outro endereço, ainda
prevaleceu a resistência cultural, por meio da reunião da associação dos moradores e dos artesãos,
para a troca de conhecimentos, resistindo com estas práticas até os dias atuais.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 78
Atualmente, a Escola Estadual Tereza Conceição de Arruda é o único espaço de ensino escolarizado,
onde as mais importantes articulações políticas e sociais acontecem. É local de festas, de reuniões
da associação de moradores, de feiras culturais e eventos escolares e acadêmicos. Fundada no
ano de 2012, recebeu o nome em homenagem a uma das mais importantes lideranças no contexto
do ensino escolarizado da comunidade. Tereza foi uma das primeiras professoras quilombolas
a atuarem nas escolas locais, tendo iniciado suas atividades ainda muito jovem, dando aulas no
quintal de sua casa, a princípio sem nenhuma remuneração. Conforme afirma Manfrinate (2001),
ela foi fundamental na luta pela afirmação de gênero, identidade, conquista da territorialidade e
valorização da cultura quilombola. Infelizmente, faleceu antes da inauguração da escola, mas deixou
seu legado, onde seus familiares estudaram e trabalharam no passado, e permanecem resistindo.
Em meio às dimensões da educação ambiental, temos percebido como inevitáveis as perdas
culturais, intrinsecamente ligadas à degradação local, com a contaminação de mercúrio nos rios,
proveniente dos garimpos, o desmatamento causado pelo crescimento do agronegócio, a extinção
espécies vegetais e animais, fundamentais para o equilíbrio ecossistêmico da região, e dentre outros
prejuízos socioambientais, Mata Cavalo ainda enfrenta o processo excludente das políticas públicas,
que tenta negar direitos para evitar a permanência dos quilombolas em seu território ancestral
(MOREIRA, 2017).
Contudo, por onde as escolas de Mata Cavalo se constituíram, pudemos perceber a resistência da
comunidade em legitimar seus aspectos culturais por meio da utilização de elementos da natureza
na constituição material das imagens tradicionais quilombolas pintadas nos pátios e nas salas de
aula, na presença do artesanato tradicional, e sobretudo, nos hábitos deste povo, que insiste em
lutar pela permanência em seu território ancestral, se reunindo para resistir com suas reivindicações
políticas, suas festas, danças, saberes e sabores.
Referências
BARROS, Edir Pina de. Laudo Pericial Histórico-antropológico. Mato Grosso: Justiça Federal, 2007.
SATO, Michèle. Projeto Redes de Pesquisa em Mato Grosso – 2016, da Rede de Educação Ambiental
e Justiça Climática (REAJA). UFMT-PPGE, GPEA.
SILVA, Regina. Do invisível ao visível: o mapeamento dos grupos sociais do estado de Mato Grosso
– Brasil. 2011. 221 f. Tese (Doutorado em Ciências) – Programa de Pós-graduação em Ecologia e
Recursos Naturais, Universidade Federal de São Carlos. São Carlos: 2011.
faz uma breve divulgação. De acordo com o anúncio, os livros contavam com histórias próprias da
infância, passadas de geração em geração, bem como curiosidades e músicas infantis. A publicação
ainda enfatiza a atenção da editora ao publicar um volume com sugestões e conselhos para pais.
Dentre as publicações encontradas nos jornais e revistas da década de 1960, foram os anúncios
no jornal O Dia, em abril de 1961, que divulgavam a coleção por meio de exposições e sorteios
realizados, no Clube Curitibano, situado na cidade de Curitiba, Paraná. De acordo com o texto do
jornal os sócios e familiares do clube estavam convidados a participar de uma exposição de livros
que aconteceria no hall de entrada, na qual seriam disponibilizadas informações sobre o concurso
Congraçamento Inter Clubes, cujo prêmio para vencedores seria a Coleção O Mundo da Criança. Em
1960, na sessão de crimes do jornal Correio do Paraná, é noticiado um roubo que aconteceu na
cidade de Curitiba, por meio da manchete: O mundo da criança desapareceu: acusado funcionário do
expresso. O incidente teria contado com o roubo da coleção, que de acordo com o dono dos livros,
foi comprada por um agente da estação rodoviária, custando Cr$ 250,00. Por meio dessas fontes
é possível obter indícios acerca dos valores cobrados pelo conjunto de livros O mundo da Criança,
bem como a forma em que a circulação e aquisição poderiam ser feitas à época. Em função dos
objetivos indicados anteriormente, este trabalho tem como fontes empíricas os próprios volumes
da Coleção O Mundo da Criança a fim de discutir aspectos acerca da sua materialidade, bem como
algumas matérias e anúncios de jornais no intuito de localizar e analisar dimensões e estratégias
de publicação e circulação da coleção. Como aporte teórico, o conceito de representação de Roger
Chartier (1988) é de extrema relevância para a análise das proposições acerca da infância e de sua
materialidade. O autor entende as representações como percepções sociais produzidas por grupos
de indivíduos, com determinado posicionamento político, social ou escolar, e nesta direção esta
reflexão nos auxilia na investigação e compreensão acerca da atuação de determinados grupos e
sujeitos envolvidos no processo de tradução, publicação e comercialização da Coleção o Mundo
da Criança no Brasil. Como este estudo é de natureza historiográfica, o trabalho com as fontes faz-
se fundamental. Ragazzini (2001) aborda o conceito de fonte como vestígios e testemunhos do
passado, que permitem uma verificação dos acontecimentos, por meio de perguntas realizadas
pelo pesquisador. Nesse sentido, elas são tratadas pelo autor, como “layers” ou camadas, que ao
serem analisadas vão estabelecendo relações com o contexto, com os acontecimentos, com a sua
conservação e a relação leitor-intérprete. O trabalho também se apoia nas contribuições de Michel
de Certeau sobre o ofício da história e da escrita do historiador. Neste sentido, a perspectiva teórica
de ‘lugar’ também nos auxilia na compreensão do lócus no qual a coleção é publicada e as condições
desta publicação em termos de táticas e estratégias. Outras referências também se fazem presentes,
algumas delas acerca da produção sobre cultura material e sobre impressos.
Referências
CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Tradução de Maria de Lourdes Menezes, revisão de Arno
Vogel. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2012.
MORAIS. Joyce de Fátima. O Mundo da Criança: prescrições para os bons modos do infante
(1954 - 1959). Dissertação (Mestrado em Educação), Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes,
Universidade Estadual de Maringá. Maringá, 2019.
LUCA, Tania Regina de. Leitura, Projetos e Revistas do Brasil 1916-1944. São Paulo: Editora UNESP,
2011.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 81
Fontes
CAVANAH. F., MOORE. N. E., WEIB. R.C. O mundo da Criança. Rio de Janeiro: Delta, 1949. 15 v.
O gosto pela leitura começa muito antes de a criança aprender a ler. A você, que acha importante
despertar no seu filho o gôsto pelos bons livros, vamos falar sobre “O Mundo da Criança”, Realidade,
ed. 0006, setembro de 1966, p. 9
O mundo da Criança. Alterosa. Minas Gerais, ed. 00347, novembro de 1961. p. 66.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Esta comunicação propõe apresentar uma análise do patrimônio e da cultura material escolar
produzidos pelo Colégio Sagrado Coração de Jesus, das Irmãs Dominicanas de Monteils, em Porto
Nacional. A presença da educação dominicana-anastasiana, de origem francesa, marcou de maneira
significativa esta cidade e toda a região do antigo norte de Goiás, atualmente estado do Tocantins.
A Congregação das Irmãs Dominicanas de Nossa Senhora do Rosário de Monteils, fundada por Madre
Anastasie em 1850, na pequenina cidade de Bor, sul da França, com objetivos de trabalhar em prol das
crianças, dos jovens e dos idosos dedicando-se à educação e à saúde, abrindo escolas e mantendo
asilos e hospitais, expandiu seu trabalho para além do Atlântico, ainda no final do século XIX.
No Brasil, em comunhão com os projetos reformadores dos bispos da diocese de Goiás,
em especial Dom Claudio José Gonçalves Ponce de Leão, as religiosas dominicanas francesas
constituíram entre os anos de 1883 e 1910 uma rede de educação confessional católica em lugares
distantes dos grandes centros. No intuito de implantar colégios, especialmente para atender as
meninas das elites locais e regionais, mas também para preencher a lacuna deixada pelo poder
público no quesito educacional e para fortalecer a missão religiosa evangelizadora-catequética
da congregação, as Irmãs Dominicanas de Monteil chegaram ao Brasil em 1883 e fundaram neste
mesmo ano, em Uberaba-MG, o Colégio Nossa Senhora das Dores, em 1885, na cidade de Goiás-
GO, o Colégio Sant’Ana; em 1902, na nascente Conceição do Araguaia-PA instalaram o Colégio Santa
Rosa de Lima; em 1904, na cidade ribeirinha de Porto Nacional-GO/TO edificaram o Colégio Sagrado
Coração de Jesus e em 1910, na cidade de Formosa-GO criaram o Colégio São José.
Ao longo do século XX, as Dominicanas-Anastasianas fundaram outras instituições escolares em
diversos estados brasileiros como São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Brasília e Rio Grande do Sul.
Num movimento de expansão e contração, algumas destas instituições se consolidaram e outras
arrefeceram, por questões diversas, encerrando suas atividades educativas.
Entre os colégios da rede dominicana-anastasiana no Brasil, o Colégio Sagrado Coração de Jesus
de Porto Nacional resistiu às intempéries, crises e dilemas de sua trajetória. Desta forma, a relevância
deste trabalho se estabelece ao considerar o legado da Educação Dominicana-Anastasiana como
“uma complexidade espaço-temporal, pedagógica, organizacional, em que se relacionam elementos
materiais e humanos” (MAGALHÃES, 1999, p.21) para a sociedade portuense e do Tocantins.
Justifica-se este trabalho tendo em vista às questões do valioso patrimônio educativo enfatizando a
conjuntura arquitetônica do Colégio Sagrado Coração de Jesus e a cultura material escolar (SOUZA, 2007)
produzida pela educação confessional católica dominicana-anastasiana em tempos e espaços diferentes.
Estes tempos e espaços configuram a problematização central da proposta desta comunicação.
Eles referem-se às duas sedes que ocupou o Colégio Sagrado Coração de Jesus em Porto Nacional
e que continuam edificadas. A primeira casa onde iniciou a instituição escolar, em 1904, cedida por
um coronel portuense da época, foi demolida. De tal modo, entre 1906 a 1954, o colégio funcionou
em seu primeiro prédio próprio, construído pelos frades dominicanos - exímios construtores –, pelas
religiosas e pela população local, contando com as tecnologias do início do século XX. Este espaço
comportou a educação interna de meninas, o curso normal - único em toda região - e o início do
externato para rapazes até a década de 1954. Este prédio foi edificado próximo à Igreja Matriz e ao
Convento dos Padres Dominicanos, em meio às residências das famílias mais abastadas da cidade.
Atualmente, o prédio pertence a COMSAÙDE, organização não-governamental que tem atividades
vinculadas a educação, saúde e promoção humana. Ele compõe o centro histórico de Porto Nacional
e foi tombado em 2008 como patrimônio histórico pelo Instituto do Patrimônio Histórico Artístico
Nacional (IPHAN).
O segundo e atual prédio do Colégio Sagrado Coração de Jesus foi edificado no início da década
de 1950 e inaugurado em 1954. Em funcionamento até os dias atuais, conta com uma arquitetura
moderna, ousada e imponente. “A obra das irmãs dominicanas está fortemente presente na
memória coletiva portuense” (BARROS, 2008, p. 73) e revela referências identitárias da comunidade
local e do carisma educacional dominicano-anastasiano.
Com o aporte teórico das proposições das pesquisas em cultura escolar, como categoria de
análise, embasados nas produções de JULIA (2001), CIAVATTA (2009), FORQUIM (1993) e outros, no
campo de investigação da História da Educação, o trabalho aqui proposto insere-se nos projetos
de pesquisa do Diretório/Grupo de Pesquisa “Educação, História, Memória e Culturas em diferentes
espaços sociais/HISTEDBR” do Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade
Católica de Goiás e no projeto de pesquisa de doutorado em desenvolvimento intitulado “Educação
Dominicana-Anastasiana no antigo norte de Goiás: o Instituto Nossa Senhora de Lourdes de
Arraias-TO”.
Os caminhos para a elaboração deste trabalho, que resulta de uma pesquisa histórica, com
enfoque qualitativo, tem como procedimento metodológico um corpus escrito, fruto de revisão
bibliográfica sobre as temáticas de cultura material escolar e patrimônio escolar e um corpus
documental que resultará das fontes encontradas nos diversos arquivos em que a pesquisa
acontecerá. Na perspectiva dos subsídios teóricos e metodológicos da História Cultural, que
alargou as possibilidades de pesquisa em História da Educação (CARDOSO, 2011), tendo em vista
a pluralidade das possibilidades de investigação e de fontes de pesquisa, na busca de “decifrar o
passado” (PESAVENTO, 2008), a partir dos olhares múltiplos sobre os aspectos da cultura escolar, é
que esta comunicação se fundamenta e analisa os elementos da cultura material e do patrimônio
escolar dominicano-anastasiano.
Desta forma, além da apresentação e análise do patrimônio expresso nos monumentos elencados,
o trabalho relacionará alguns objetos escolares catalogados como expressões da cultura material
escolar do Colégio Sagrado Coração de Jesus, como o primeiro piano adquirido pela instituição,
vindo da França nos anos de 1920 e que possibilitou o ensino de música pelas religiosas francesas às
alunas da instituição.
Quanto as fontes, além dos livros de registros e documentos diversos como relatórios, notas e/ou
recibos de compras e fotografias do acervo do Colégio Sagrado Coração de Jesus e dos documentos
encontrados no arquivo da Congregação de Monteils no Brasil, diversos objetos escolares disponíveis
no memorial das Irmãs Dominicanas em Uberaba-MG, nos depósitos do Colégio, no museu histórico
de Porto Nacional e nos acervos particulares de ex-professores e ex-alunos da instituição dominicana-
anastasiana contribuirão para que sejam arrolados elementos desta cultura material escolar, tendo
em vista que os objetos escolares são artifícios tecnológicos produzidos socialmente e que carregam
marcas do seu tempo.
Como artefatos que compõe a escola, a percepção destes objetos podem auxiliar a identificação
de projetos educativos desenvolvidos pela instituição ao longo do tempo. De acordo com Escolano
Benito (2012) a noção de cultura material escolar tem sido uma ferramenta essencial por permitir
avançar na problematização dos múltiplos significados que os objetos podem possuir no cotidiano
escolar, seus diferentes usos e desusos e as diversas relações estabelecidas desde sua idealização,
fabricação, comercialização e uso nas atividades escolares.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 84
Referências
ESCOLANO BENITO, Agustín. Las materialidades de la escuela (a modo de prefacio). In: GASPAR da
SILVA, Vera Lucia; PETRY, Marilia Gabriela (Orgs.) Objetos da Escola: espaços e lugares de constituição
de uma cultura material escolar (Santa Catarina – Séculos XIX e XX). Florianópolis: Insular, 2012. p.
11-18.
SOUZA, Rosa Fátima de. História da cultura material escolar: um balanço inicial. In: BENCOSTA,
Marcus Levy (Org.). Culturas escolares, saberes e práticas educativas: itinerários históricos. São
Paulo: Cortez, 2007.
MAGALHÃES J.P. de. Breve apontamento para a história das instituições educativas. In: J.L. SANFELICE;
D.SAVIANI e J.C. LOMBARDI (orgs.), História da Educação: perspectivas para um intercâmbio
internacional, Campinas, Autores Associados, 1999.
O presente trabalho tem como objetivo principal identificar e analisar como o cenário da
educação primária é apresentado no Diccionário Universal de Educação e Ensino, escrito por
Émile Mathieu Campagne (França, 1872) e traduzido para o português por Camilo Castelo Branco
(Portugal, 1873), destacando argumentos de defesa da escolarização da infância e o provimento
material recomendado para a escola ali anunciada. Intenta-se compreender de maneira mais
aprofundada elementos relacionados à instrução primária, buscando contribuir com os debates
da área e ampliar as possibilidades de se pensar diferentes discursos e sentidos que circulavam em
distintos países nos anos finais do século XIX. Compartilhamos como interesse comum no grupo de
pesquisa ao qual estamos vinculadas e outros parceiros, o de analisar e explicar processos pelos
quais ideias pedagógicas se movimentam e maneiras de percebê-las a partir da materialidade
escolar e suas prescrições.
A proposta acompanha reflexões inscritas em trabalhos de António Nóvoa e Jürgen Schriwer,
com especial destaque aqui para as registradas no livro A difusão mundial da escola (Lisboa:
Educa e Autores, 2010). Conforme advogam estes autores, a circulação de ideias pedagógicas está
relacionada à difusão mundial de um modelo de escola, que se irradiará de diferentes formas e
sofrerá adaptações regionais e locais, atendendo a diversos interesses e projetos sócio-políticos.
Entre as formas de difusão está a imprensa pedagógica, com seus livros, revistas, dicionários e outros
modos de circulação impressa de ideias pedagógicas e propostas para escolarização da infância.
Como inicialmente anunciado, neste trabalho nos dedicamos ao estudo de conteúdos extraídos de
um dicionário de educação de grande circulação, entendendo-o como um dispositivo propagador
de conteúdos e conceitos pedagógicos.
Entendemos que os Dicionários de educação não podem ser estudados por si só, é preciso levar
em consideração o contexto histórico e social em que estão inseridos e os personagens que os
utilizaram, para assim, tentar entender o papel deste objeto em determinados espaços, bem como
seus usos por diferentes sujeitos. Contudo, nem sempre é possível recompor esta “rota” mas, a
presença destes em acervos, bibliotecas pedagógicas e em bibliotecas de educadores atestam certa
participação na construção de discursos e projetos de escolarização.
Para este estudo optamos por adotar como fonte o “Diccionário Universal de Educação e Ensino:
útil à mocidade de ambos os sexos, às mães de família, aos professores, aos directores e directoras de
collegios e aos alumnos que se preparam para exame”. Este impresso (por nós compreendido como
documento) teve sua primeira edição publicada na França, sob a responsabilidade de Émile Mathieu
Campagne no ano de 1872. No ano seguinte, passa a circular em Portugal uma tradução e versão
estendida feita por Camilo Castelo Branco e seus colaboradores, organizada em dois volumes. A
promulgação da Carta de Lei da Direcção Geral de Instrução Pública, datada de 2 de maio de 1878,
que traz entre seus objetivos normatizar o ensino obrigatório, as matrículas e a frequência no ensino
primário, foi entendida por Castelo Branco como uma necessidade para a elaboração e lançamento
de nova versão no ano de 1886, estendida e ilustrada, desta vez, organizada em três volumes
(CASTELO BRANCO, 1886).
Ao confrontarmos diferentes edições e versões, foi possível observar que há alterações; da versão
francesa de 1872 para a primeira publicada em Portugal sob a responsabilidade de Castelo Branco
há inclusão de assuntos específicos do cenário português e subtração de alguns conteúdos. As duas
versões portuguesas – a primeira publicada em 1873 e a segunda em 1886 - também são diferentes
entre si, e chamou nossa atenção a inclusão de muitos verbetes relacionados à educação após a
promulgação da Lei da Direcção Geral de Instrução Pública de 1878, anteriormente citada, por essa
razão, nossos olhares estarão concentrados principalmente nessas duas versões. Uma de nossas
hipóteses é que tais mudanças acompanhem, além das prescrições estabelecidas em Lei, discursos
pedagógicos em circulação, o que coloca dicionários deste tipo como importantes instrumentos de
circulação de princípios de renovação pedagógica.
Entendemos, com base em tese intitulada Representações e apropriações docentes do método
intuitivo na educação paulista da primeira república (1890-1920), escrita por Oscar Teixeira Junior
(2011), que os dicionários pedagógicos tinham como objetivo tornar comum e possibilitar o acesso
de conceitos científicos a todos os letrados. Trata-se de obras normalmente produzidas a partir
da reunião de especialistas de diversas áreas, proporcionando assim, a construção de um caráter
considerado eclético em seus escritos. Deste modo, tanto a reunião de sujeitos - em geral ocupantes
de lugares de poder e capacidade de difusão - quanto o fato de ser publicado em um dicionário
atribui a este tipo de publicação uma força modelar significativa, no sentido de se fazer presente em
discursos, publicações e projetos de escolarização.
Considerando essas características, a metodologia de pesquisa utilizada consistiu, primeiramente,
na identificação de dicionários pedagógicos com “participação” na composição de discursos que
apoiam os projetos de escolarização nos anos finais de século XIX e anos iniciais do século XX, bem
como, a localização de diferentes edições. Inicialmente esse movimento foi realizado em bases de
dados online de Bibliotecas e, posteriormente, em incursões em sebos para localizar os documentos
em sua versão impressa. Deste rastreamento foram localizados em formato digital: a versão em
francês e os volumes 1 e 2 da edição do ano de 1873, de Portugal. Os três volumes do ano de 1886
foram encontrados e adquiridos em versão impressa, fazendo parte do acervo pessoal das autoras.
Essa etapa do trabalho, somada a leitura de bibliografias que auxiliem na compreensão sobre
esse formato de fonte, confirmaram a circulação desses impressos pela presença em acervos de
Bibliotecas de diferentes países, como França, Canadá, Portugal e Brasil. Thabatha Aline Trevisan
e Bárbara Cortella Pereira (2013), no trabalho intitulado Leituras recomendadas para as Escolas
Normais no Brasil e na França (século XIX): transferências culturais e de modelos pedagógicos, relatam
sobre a recomendação deste Dicionário, inclusive, como leitura necessária aos professores em
formação pela Escola Normal de São Paulo no século XIX.
Após a localização dos impressos, iniciou-se um contato mais direto com o conteúdo destas fontes
com o intuito de nos familiarizarmos com os termos ali tratados. Em seguida, ordenamos os documentos
e selecionamos os verbetes que avaliamos estarem articulados a projetos de escolarização, destacando
aqueles que auxiliam no aprofundamento de questões como: argumentos de defesa da escolarização
da infância e sua obrigatoriedade e o provimento material recomendado para a escola ali anunciada,
destacando os artefatos relacionados a leitura e escrita. Neste percurso foram destacados verbetes
que tratam de escola, educação, instrução primária, método de ensino, mobília escolar, entre outros.
Para as análises, foram estabelecidas categorias com o objetivo de facilitar as buscas, a sistematização
dos dados e permitir reflexões mais aprofundadas sobre os verbetes selecionados.
Para a construção das reflexões aqui presentes, somadas às categorias, foi importante
aprofundar a compreensão sobre alguns aspectos no tocante a fonte principal como, por exemplo,
o que representou o Dicionário de Educação e Ensino no período em que foi publicado? Qual a
credibilidade que este dicionário possuía? Quais eram as posições sociais e cargos ocupados por
aqueles que assinavam como seus autores e tradutores?
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 87
Em suas primeiras páginas, o Volume 1 da edição portuguesa de 1886, apresenta uma nota dos
editores explicando o objetivo deste dicionário, caracterizado como um livro de extrema importância
seja para a formação de professores, seja como auxiliar na prática docente. Com elementos deste
tipo, busca-se construir uma ideia de que é um livro essencial para a melhoria do ensino e para o
estímulo da prática de pesquisa e construção de saberes, tanto por parte dos professores quanto
dos estudantes. Em suas palavras, os autores entendem que o dicionário,
[...] além da utilidade geral que tem para todos os que quizerem instruir-se, por constituir uma
verdadeira encyclopedia, onde são expostos, com a maior clareza, todos os ramos do saber humano,
vem sobretudo prestar um valioso auxilio aos paes e professores, na importantissima obra da
educação das novas gerações, e tem, por isso, já o seu lugar marcado nas bibliothecas escolares,
cuja importancia deve ter sido justamente apreciada pelas illustradas juntas de parochia[1]
(EDITORES, Lisboa, 1886, p. VI).
Ao observar que os autores atribuíam ao Dicionário significativa importância para o cenário
educacional da época, foi possível notar, nas versões de língua portuguesa mudanças significativas
em dois verbetes específicos que tratam sobre a educação. Na primeira edição, de 1873, não há
desdobramentos nos termos instrucção e escola, os quais são abordados em apenas um verbete,
de forma mais geral. Já na edição do ano de 1886 percebe-se que há especificações para os dois
vocábulos como, por exemplo, instrucção, que aparece de forma mais detalhada como instrucção
primária e instrucção pública. No caso da palavra escola, que antes aparecia somente no plural,
nesta outra versão é subdividida em: escóla, escólas, escolas abecedarias, escólas primarias, entre
outras. Essas questões, são alguns dos indícios que corroboram com nossa hipótese de que a Lei
de 2 de maio de 1878 e a circulação de ideias pedagógicas tenham influenciado nas alterações e
prescrições do Dicionário.
Cláudia Severo
Amanda Backes Kauer
A Sociedade Polônia, localizada no quarto distrito do município de Porto Alegre, capital do Rio
Grande do Sul, possui um acervo histórico, bibliográfico e arquivístico, abrangendo o período do
século XIX ao XXI, com potencial para pesquisas nos mais variados campos de saber, principalmente
se relacionadas às temáticas da imigração polonesa no sul do Brasil. Compreendendo a potencialidade
dos vestígios de história e memória localizados neste espaço, desde 2017 são empreendidos esforços
de pesquisadoras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para a identificação,
arrolamento, elaboração de quadros descritivos e conservação preventiva do acervo inexplorado e
guardado por esta sociedade civil. Objetivando a criação e implementação de um Centro de Memória
da imigração polonesa no Brasil, em junho de 2018 foi oficializado um Termo de Cooperação
Científico-Cultural entre UFRGS e Sociedade Polônia, evidenciando a importância das ações
desenvolvidas para a comunidade acadêmica e externa, para que a lacuna acerca da imigração
polonesa no Brasil possa ser preenchida através de estudos minuciosos realizados com os diversos
documentos existentes na Sociedade Polônia. Estimamos que, atualmente, integram o acervo cerca
de 8000 obras em suporte papel sobre distintas temáticas: história da polônia, economia, política,
filosofia, educação, história contemporânea, literatura, arte, dentre outras. É interessante destacar
que esse expressivo conjunto de impressos foi reunido a partir de doações de diversas instituições,
havendo também aquelas de acervos pessoais, e este movimento permanece ocorrendo e permite
enriquecer e incentivar o trabalho realizado nesta instituição. Ao iniciarmos as pesquisas com os
documentos existentes na Sociedade Polônia, uma das atenções se voltou para a identificação,
caracterização e inventário de todos aqueles que contivessem informações sobre as escolas étnicas
polonesas ou se referissem ao tema Educação mais amplamente, fosse História da Educação na
Polônia ou seus manuais didáticos, ou ainda manuais escolares publicados em língua polonesa ou
português. A expressividade das iniciativas escolares dos imigrantes é atestada por dados fornecidos
por diversas fontes. Em 1938, quando do Decreto de Nacionalização do Ensino de Getúlio Vargas,
conforme indica Malikoski (2018) estavam organizadas 128 escolas étnicas polonesas no sul do
Brasil, abrangendo 4560 alunos e 114 professores. Neste sentido, essa pesquisa se inscreve no campo
da História da Educação, fundamentada na História Cultural e História da Cultura Escrita, sendo
Roger Chartier um dos principais referenciais teóricos. Os movimentos de arrolamento e identificação
dos impressos possibilitaram o reconhecimento de expressivo número de impressos atinentes às
buscas acerca de Educação e escolas étnicas, apontando para a diversidade de tipologias
documentais presentes no acervo. Visando a organização desses impressos através de um léxico de
domínio dos pesquisadores do campo da História da Educação, optou-se por adotar a classificação
por gêneros utilizada pelo LIVRES, Banco de Dados de Livros Escolares Brasileiros da Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo (USP). Dentre os descritores, comparecem: livro do professor,
manual didático, cartilha de alfabetização da língua polonesa, livros de consulta, literatura infantil e
juvenil e imprensa pedagógica. Face à variedade de características e conteúdos dos impressos, foi
elaborado um inventário em quadro descritivo contendo informações acerca do ano de edição, país
de impressão, editora, número de páginas, dimensões, estado de conservação da obra, presença de
carimbos de bibliotecas ou acervos, marcas de uso. Até o momento foram repertoriadas mais de 500
obras, que abrangem o período 1882-2010 e que contemplam diferentes temáticas, como o processo
de ensino dos imigrantes poloneses no sul do Brasil no início do século XX, suas práticas de leitura e
organizações culturais.Salienta-se a presença de cerca de 25 documentos impressos no Brasil em
língua polonesa ou bilíngue e, dentre estes, há 10 obras de relevância para a pesquisa sobre as
escolas étnicas polono-brasileiras, por tratarem-se de publicações de associações de professores
poloneses. Segundo Silva (2019), as associações culturais dos imigrantes poloneses podem ser
caracterizadas como uma de suas primeiras formas de sociabilidade no Brasil, sendo estas
relacionadas à etnicidade. Eram associações culturais, recreativas e religiosas que, objetivando a
solução de questões locais das colônias, organizavam-se a partir da iniciativa dos próprios imigrantes.
A educação das crianças polonesas foi um dos aspectos de relevância para essas associações, sendo
as Escolas-Sociedades a solução encontrada. Além do catecismo, ensino de aritmética e língua
portuguesa, essas escolas realizavam o ensino da língua polonesa – que pode ser compreendida
como uma das formas de reafirmação da identidade étnica –, em algumas, havia ainda a produção
de suas próprias cartilhas e material escolar. A organização dessas sociedades foi um processo
ininterrupto nos séculos XIX e XX, que aglutinou os imigrantes de acordo com suas crenças ideológicas
e religiosas, havendo dentre essas as associações de professores poloneses que se voltavam para as
formações destes sujeitos durante os períodos de recesso escolar. Com a criação da Polônia
independente em 1918 e o estabelecimento de relações diplomáticas em 1920 com o Brasil,
consolidou-se o movimento educacional em torno da Aliança central: “Kultura”, associação de
escolas não religiosas e, em seguida, da associação de professores “Oswiata”, reunindo as escolas
polonesas religiosas. A Kultura, fundada em Curitiba em 1920, representou uma Federação das
Associações Educacionais Polonesas. Dentre seus objetivos constava a organização do ensino,
centralizando escolas e sociedades para formar uma organização mais ampla; melhorar o processo
de ensino étnico através da organização de bibliotecas fixas e itinerantes; o fornecimento de livros
didáticos e manuais, a construção de novas escolas e a formação de professores. A Kultura
caracterizava-se por um ativismo social, laico e de cunho progressista, não considerando a
importância de preceitos religiosos. Gerou desta forma, uma série de divergências ideológicas que
culminou na fundação em 1922, pela Congregação dos Padres Vicentinos e outras lideranças
religiosas, a União das Escolas Católicas Polonesas, denominada “Oswiata”. Esta, continha os
mesmos objetivos da Kultura, mas aliado ao fundamento religioso. Outro indício que podemos
apontar são as anotações do Cônsul polonês Kazimierz Głuchowski, de quando esteve no Brasil em
1922, publicadas em 1927, que relatam que a raridade ou inexistência de lugares que não possuíam
uma sociedade com finalidades escolares. Essas sociedades estavam filiadas à Kultura ou à Oświata,
fundadas posteriormente à Primeira Guerra Mundial em Curitiba. A maior parte das escolas estava
filiada à associação Kultura, com 22 escolas, enquanto a Oświata possuía apenas 06 escolas filiadas.
Cabe também ressaltar que, segundo Luporini (2011), em decorrência da Primeira Guerra Mundial,
serenou a rivalidade entre as agremiações em prol de unificar as entidades para a fundação de novas
escolas étnicas em locais distantes. O material didático foi aperfeiçoado pelas agremiações, assim
como as condições do trabalho docente, proporcionando um desenvolvimento da cultura escolar
nas localidades carentes de tais iniciativas. A expressividade desses movimentos se mantém até que
em 1938 por força do Decreto de Nacionalização, ocorreu o fechamento de mais de 355 sociedades
polonesas e a proibição de publicações que não fossem em língua vernácula. Após 22 anos de
funcionamento, somando esforços na condução dos processos de organização étnica, as entidades
encerraram suas atividades. Embora houvesse esforços de adequação dessas atividades ao processo
político vigente, a falta de interesse dos membros somado a pressão política perfez o desfecho. O
movimento da Nacionalização pôs fim a maioria dos processos de organização étnicas e de imprensa
pedagógica em língua estrangeira. Contudo, ainda é possível localizar algumas dessas publicações
em acervos no sul do Brasil, no caso do acervo histórico da Sociedade Polônia, foram encontrados
os seguintes títulos (traduções livres) publicados por estas associações ao longo das décadas de
1920-1930: Krótka Gramatyka Polska i Ćwiczenia Językowe (Pequena Gramática da Língua Polonesa
e Exercícios de Linguagem), edições de 1924 e 1936, totalizando 04 exemplares; e Gramatyka Języka
Portugalskiego i Cwiczeniami dla Szkół i Samokow (Gramática da Língua Portuguesa com Exercícios
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 90
para escola e alunos autodidatas), 02 exemplares de 1931, ambas de autoria do Pe. José Joaquim
Góral; e Klucz do Cwiczen i Zadan (Exercícios e tarefas da gramática do português), impressa em
1932, todas publicações da Oświata. Quanto às publicações da Kultura, foram arrolados 03
exemplares da revista mensal Kultura, ano de 1933, edições de março, abril e junho. Os movimentos
de caracterização e arrolamento dos documentos impressos que integram o acervo da Sociedade
Polônia são fundamentais enquanto documentação de gestão de acervo, mas representam,
principalmente, vestígios inéditos que não foram utilizados em pesquisas já empreendidas no Brasil
acerca da temática escolas étnicas polonesas.
Referências
CHARTIER, Roger. A história cultural entre práticas e representações. Trad.
Maria Manuela Galhardo. Lisboa: Difusão Editorial, 1988.
GLUCHOWSKI, Kazimierzr. Os poloneses no Brasil. Porto Alegre: Rodycz & Ordakowski, 2005.
MALIKOSKI, Adriano. Escolas étnicas polonesas no Rio Grande do Sul. Caxias do Sul: EDUCS, 2018.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Durante a segunda metade do século XIX, no Império brasileiro, exercer o magistério primário
implicava, afora ensinar, organizar e administrar o funcionamento de uma escola; isso porque
este foi um período em que o ensino primário - a instrução pública - passava por um processo
de constituição, além de ser demarcado por uma escola primária que se configurava no espaço
de uma sala, em que todos os alunos frequentes, distribuídos e organizados em classes,
ocupavam o mesmo ambiente e um único professor era responsável não só por dirigir e organizá-
la, como também limpar, equipar e manter. Para cumprir essa tarefa, ao professor, eram
necessários distintos materiais, os quais, ora foram diretamente determinados em alguns dos
regulamentos publicados, ora, em outros, foram definidas orientações sobre os procedimentos
para o cumprimento de tal incumbência. Este trabalho tem o intuito de analisar e evidenciar
estes “distintos materiais”, um conjunto material específico da e para a escola que se configurou
junto de modos de fazer docente produzidos no período aqui em estudo e conformaram um
repertório de saberes dos professores primários - os materiais de escrituração. Para tanto, por
meio das histórias que contam os professores sobre determinados artefatos, objetiva-se
destacar qual o sentido atribuído a estes na prática docente, pois compreende-se que é (também)
no manuseio dos objetos que os professores traduzem seus saberes fazendo uso do seu acervo
empírico (ESCOLANO BENITO, 2017). Diante disso, interpreta-se que a cultura material escolar é,
portanto, constitutiva do ofício docente por entender que, neste caso, ela funciona como um
veículo de análise e produção de uma cultura escolar por parte dos professores. Logo, opera-se
com os conceitos de cultura escolar e cultura material escolar, para exemplificar algumas
experiências que foram vividas pelos professores primários no dialogismo entre a sua prática e
a dimensão material da escola e que fazeres e saberes foram produzidos nesta interação. Na
busca por indícios de práticas docentes atreladas à materialidade escolar, observa-se um mundo
material da educação primária e, ao analisar as fontes disponíveis, percebe-se que algumas
especificidades caracterizaram relações singulares entre os professores e esse universo material,
as quais configuraram tanto um mundo material específico da escola (objetos associados à
prática de ensino - os materiais “essenciais ao ensino” - cadernos, livros, manuais, lápis, penas,
lousas, papel, entre outros), como um mundo material específico do fazer docente (concernente
à pratica docente que se ocupa da organização da escola e do exercício do magistério). Para este
estudo a lente se aproxima do conjunto material relacionado à prática docente que se ocupa da
organização da escola e do ofício docente - uma categoria distinta de material que foi solicitado,
mencionado ou especificado nas comunicações dos sujeitos da escola oitocentista denominados
como livros de matrícula, livros de termos de visita, mapas escolares e relatórios, categorizados
como materiais de escrituração. Materiais inseridos no fazer diário dos professores de primeiras
letras, que despontam principalmente como documentos burocráticos, mas que podem ser
Referências
ESCOLANO BENITO, Agustín. A escola como cultura: Experiência, memória, arqueologia. Campinas,
SP: Ed. Alínea, 2017.
LAWN, Martin; GROSVENOR, Ian. When in doubt, preserve: exploring the traces of teaching and
material culture in English schools. In: History of Education, 30-2, p. 117, 2001.
Este trabalho possui como objetivo central refletir sobre o mobiliário escolar idealizado e
construído para ser utilizado em escolas públicas primárias na Província de Santa Catharina (Brasil)
entre as décadas de 1851 a 1889. As reflexões aqui desenvolvidas vinculam-se às pesquisas e
análises realizadas para a produção de tese de Doutorado, defendida no ano de 2019. Pautado pela
noção de cultura material escolar e a partir de uma perspectiva histórica, os móveis idealizados para
escolas públicas primárias são compreendidos como mercadorias (re)inventadas pela modernidade
educativa e que estão imbricadas em um processo de circulação de saberes legitimados,
principalmente, a partir do século XIX.
Para refletir acerca da circulação de ideias e de relações em torno do mobiliário escolar, as
incursões no Arquivo Público do Estado de Santa Catarina e as buscas na Hemeroteca Digital
Catarinense foram fundamentais, pois o estudo de fontes como anúncios e notas presentes
em jornais publicados em diferentes cidades catarinenses, ofícios expedidos pela Diretoria de
Instrução Pública, assim como “fallas” de Presidentes da Província permitiu identificar tempos
e modos próprios de constituir a instrução primária em Santa Catharina. A análise desses
documentos possibilitou a localização de argumentos em torno da defesa da construção de uma
escola pública que deveria estar articulada aos “referenciais” e ideais modernos provenientes de
nações consideradas “mais avançadas”.
Por meio do estudo sobre o mobiliário escolar oitocentista pôde-se perceber que adaptações
e soluções para os objetos da escola foram consideradas temas caros à escolarização moderna
que se desenhava a partir do século XIX, uma vez que foram identificadas reivindicações que
versavam acerca da necessidade de adaptar os móveis escolares a preceitos higiênicos. Nesse
período, nota-se uma circulação de discursos provenientes de diferentes países (Brasil, Estados
Unidos, França e Portugal) que se assemelham ao considerar o mobiliário como peça central
para uma vida saudável, deixando de entende-lo apenas como um item de apoio às práticas
escolares, mas alvo de questionamentos e merecedor de maiores investimentos por parte de
médicos e educadores.
A leitura do livro organizado por António Nóvoa e Jürgen Schriewer (2000) foi importante para
compreender o modelo escolar que ganha força no decorrer do século XIX e que passa a circular e
ser apropriado, em distintos países e regiões. Nessa obra, autores como John Meyer, Martin Lawn,
Denice Barbara Catani, entre outros, procuram problematizar como uma determinada organização
escolar com profundas semelhanças no currículo, na formação docente, na pedagogia e nas
políticas prescritas foi difundida e alçada como referência educacional no período. Esses trabalhos
estão vinculados a investigadores, universidades e projetos de pesquisa de diferentes países. Os
investimentos colaborativos permitiram a identificação de um conjunto de evidências que indiciam
sobre uma difusão mundial de um modelo escolar em nível internacional diretamente articulado
com a pedagogia moderna, a formação dos sistemas nacionais de ensino, a consolidação dos
Estados e um desenvolvimento industrial.
Conforme destacado por Heloisa Helena Pimenta Rocha (2010), as adequações nos espaços
escolares, seja com relação à sua arquitetura, seja com relação ao mobiliário, tinham como base uma
matriz médica, bastante difundida por meio de congressos, impressos e organizações de inspeções
em escolas. Essa difusão, todavia, não ocorreu de forma isolada, mas sincronizada com um conjunto
de ideias que vinham ganhando força em nível internacional, sendo identificadas em documentos
provenientes de diversos países europeus, da América Latina e dos Estados Unidos da América.
A partir das pesquisas da autora, foi possível perceber que o Brasil também esteve inserido
nesse processo e que, além de incorporar ideias, produziu discursos e elaborou estratégias de ações
articuladas com a defesa da adaptação de escolas e artefatos aos preceitos médicos:
Dessa forma, o que se viu foi um conjunto de inserções no ambiente escolar que buscavam criar
uma “consciência sanitária” em alunos e professores, com vistas à propagação de hábitos higiênicos
preventivos. A educação era entendida como um espaço fundamental e apropriado para a difusão
desses saberes, inclusive com recomendações registradas em periódicos[1] e documentos oficiais,
dentre os quais se podem citar os relatórios dos presidentes da Província de Santa Catharina, as
legislações provinciais e os regimentos internos de grupos escolares catarinenses[2], nos quais a
higiene aparece como um elemento curricular e uma prática a ser observada. Assim como Heloisa
Pimenta Rocha observou em suas pesquisas, os vestígios localizados por esta investigação, indicam
que “a confluência entre a Medicina, a Higiene e a educação escolar mostrou-se inevitável” (ROCHA,
2010, p. 160).
Nesse sentido, a obrigatoriedade escolar pode ser compreendida como um dos elementos
fundamentais no processo de expansão e institucionalização das escolas com vistas a formar e a
proteger a infância e, assim, garantir o desenvolvimento da nação. Articuladas a essa perspectiva,
Vera Lucia Gaspar da Silva & Gizele de Souza (2018) indicam que as leis de obrigatoriedade escolar,
relacionadas ao desenvolvimento industrial, contribuem para o fortalecimento da escola como
um nicho de mercado atraente para a ampliação de relações capitalistas, uma vez que, para a
institucionalização da escola moderna, foram elaboradas normas e projetos relativos a um conjunto
de tecnologias condizentes com os preceitos higiênicos e sanitaristas defendidos como ideais no
período oitocentista.
A partir das investigações realizadas, identifica-se que a Província de Santa Catharina também estava
envolvida no processo de circulação internacional de ideias pedagógicas, não apenas se apropriando
de modelos considerados referenciais, mas também contribuindo com esse movimento enviando
exemplares de suas produções a eventos internacionais e estabelecendo estratégias que visavam
o provimento material das escolas da província a partir de preceitos pedagógicos. Apesar de uma
realidade material considerada “precária economicamente”, os ideias de escola de Santa Catharina
pautavam-se em discursos que entendiam como indispensável a presença de aparatos considerados
modernos e higiênicos, os quais poderiam contribuir para a formação dos cidadãos catarinenses.
Diante dos dados foi possível identificar não apenas utensílios e móveis que eram solicitados para
a Diretoria de Instrução Pública, mas também perceber tensões existentes entre discursos presentes
em ofícios que expressam respostas para as solicitações de compra de artefatos para as escolas,
enviadas por diretores e professores. De acordo com o disposto nos documentos analisados, dentre
as dificuldades alegadas por parte do Estado estavam as condições financeiras, que impediriam a
aquisição de grande parte dos objetos requisitados pelos docentes. Diante da situação, apenas os
artefatos considerados indispensáveis para o serviço público da instrução e que fossem produzidos
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 96
por pequenas marcenarias e oficinas artesanais poderiam ser adquiridos, pois assim os custos
seriam reduzidos.
Com relação à materialidade, apesar da defesa de sua necessidade aparecer em discursos, quando
as fontes trazem dados sobre o provimento das instituições descortina-se um cenário que indica
uma realidade diferente ao ser comparada ao ideal defendido. No entanto, mesmo em um contexto
organizado por uma ideia de “mínimo necessário”, chama a atenção nos discursos de presidentes da
província a preocupação em anunciar o desejo de equipar as escolas primárias com materialidades
que estivessem próximas a indicações referenciadas pela modernidade educativa em construção no
período, localizadas em documentos como catálogos de móveis escolares, manuais pedagógicos e
relatórios de Exposições Universais.
Desse modo, localizaram-se pontos em comum que corroboram com as análises em torno da
existência de uma circulação internacional de ideias pedagógicas, tais quais a defesa do investimento
em formação docente, a definição de um método de ensino, bem como uma infraestrutura e materiais
adequados ao processo de ensino e aprendizagem, referenciados pela modernidade educativa
oitocentista. Nesse sentido, a pesquisa sobre a (re)invenção do mobiliário escolar, ao estudar o
contexto catarinense, pôde identificar que, embora as ideias em torno dos móveis tenham sido
apropriadas de diferentes formas, essas mantiveram elementos relativos a aspectos pedagógicos,
higienistas e econômicos que circularam internacionalmente.
Referências
GASPAR DA SILVA Vera Lucia; SOUZA Gizele de. Objetos de utilidade prática para o ensino elementar:
museus pedagógicos e escolares em debate. In: ______; ______; CASTRO, César Augusto (Orgs.).
Cultura material escolar em perspectiva histórica: escritas e possibilidades. Vitória: EDUFES, 2018.
p. 119-142.
NÓVOA, Antonio.; SCHRIEWER, Jürgen. A difusão mundial da escola: Alunos, Professores, Currículo,
Pedagogia. Lisboa: Educa, 2000.
ROCHA, Heloísa Helena Pimenta. Cultura escolar e práticas de higienização da infância na escola
primária paulista. In: VIDAL, Diana Gonçalves; SCHWARTZ, Cleonara Maria (Orgs.). Histórias das
culturas escolares no Brasil. v. 1, Vitória; EDUFES, 2010. p.157-194.
[1] Anúncios e artigos localizados em jornais catarinenses publicados no período oitocentista, indiciam sobre discur-
sos que abordavam a importância da higiene e da instrução pública para o desenvolvimento da província.
[2] SANTA CATARINA. Regimento Interno para os Grupos Escolares (Decreto n. 588, de 22 de abril de 1911) e SANTA
CATARINA. Regimento Interno dos Grupos Escolares do Estado de Santa Catharina. Aprovado e mandado observar
pelo Decreto n° 795, de 2 de maio de 1914 (ambos localizados no Arquivo Público do Estado de Santa Catarina).
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Palavras-chave: Educação do campo; Ensino de Língua Portuguesa; Girassol: saberes e fazeres do campo.
O PNLD Campo destinou-se às escolas públicas rurais com até 100 alunos do 1º ao 5º ano do
ensino fundamental e visava disponibilizar coleções que foram elaboradas com diferentes e
específicas metodologias voltadas para a realidade do campo, com conteúdos curriculares que
acolhessem os saberes das comunidades rurais, valorizando a identidade dos alunos que nelas
vivem e, principalmente, evitando a estigmatização de estereótipos da comunidade do campo. O
PNLD Campo também tinha como propósito considerar as especificidades do campo em relação
também ao contexto político, ambiental, econômico, de raça e etnia, levando em conta uma
concepção pedagógica própria da educação do campo e a necessidade da elaboração de materiais
didáticos que atendessem todas essas demandas.
A partir do edital de convocação de inscrição de obras didáticas para avaliação e da publicação
do Guia de Livros Didáticos do PNLD Campo, verificou-se que de um total de 18 coleções inscritas,
apenas duas foram aprovadas para serem distribuídas nas escolas a partir de 2013: Coleção Girassol:
Saberes e Fazeres do Campo e Coleção Projeto Buriti Multidisciplinar. A Coleção Girassol: Saberes
e Fazeres do Campo foi a mais adotada em 2013, por 83,82% dos municípios brasileiros, com uma
tiragem de 3.814.664 exemplares. A coleção. Projeto Buriti multidisciplinar teve tiragem de 735.939
exemplares e foi adotada em cerca de 16% dos municípios com escolas do campo. Esses dados
indicam a expressividade da coleção Girassol no que compete à uma política didática em escolas
do campo, sobretudo considerando que historicamente o livro didático configura-se como principal
recurso didático em escolas tipicamente rurais ou do campo.
A coleção Girassol foi escrita por Isabella Carpaneda, Angiolina Bragança, José Roberto Bonjorno,
Regina Azenha e Tania Gusmão é composta por 9 (nove) volumes, sendo a composição seriada e
multidisciplinar por área. Para o 1º ano apresenta um volume e, para os demais, dois volumes,
assim distribuídos: 1º ano: Letramento e Alfabetização e Alfabetização Matemática; 2º ano e 3º ano:
Letramento e Alfabetização, Geografia e História; Alfabetização Matemática e Ciências; 4º ano e 5º
ano: Língua Portuguesa, Geografia e História; Matemática e Ciências.
No que concerne à organização do ensino da língua portuguesa, os volumes da coleção estruturam-
se em unidades subdivididas em capítulos, contendo seções que correspondem aos eixos de ensino.
São essas seções: “Leitura”, “De olho na escrita”, “Traçando letras”, “Produção”, “Estudo da Língua”,
“Hora da História”, “Texto puxa texto” e “Estudo do texto”. A coleção, mesmo organizada por área de
conhecimento, busca estabelecer trabalho interdisciplinar mediante articulação entre os conteúdos
das diferentes disciplinas escolares.
Na coleção foi adotada a perspectiva do ensino da língua portuguesa centrada na concepção de
gêneros textuais como instrumentos para as atividades de leitura e escrita.
Tendo em vista os aspectos apresentados, a análise dos resultados possibilita compreender
que, com enfoque nos aspectos do ensino da língua portuguesa, verifiquei que quanto à frequência
ocorrida de gêneros textuais no Livro Didático ficou evidenciado o seguinte: cartaz (2), cantigas (7),
instruções de jogos (1), trava-línguas (2), parlendas (2), texto informativo (5), fábula (2), contos (2),
poemas (5), bilhete (1), receita (1), advinhas (1), símbolos e placas (1), artigo (1), reportagem (1),
convite (1), entrevista (1) e que são por meio desses gêneros que os desdobramentos quanto ao
sistema de escrita alfabética, a prática de produção de textos, a prática da oralidade numa perspectiva
de viabilizar a alfabetização e o letramento dos educandos. Pude observar que o LD vários gêneros
textuais, aparecendo sobretudo as cantigas. Porém, utiliza-se em sua maioria, a mesma maneira
para propor as atividades, e com isso deixa evidenciado a incorporação de contribuições que possa
auxiliar no ensino de língua portuguesa centrados nas concepções de letramento e de gênero. Quando
se propõe atividades relacionadas à oralidade percebe-se que alguns gêneros vêm desprovidos de
noções conceituais, além de metodologias que venham amplamente explorar a conversação, o
debate, o seminário o que caracterizaria um trabalho efetivo tomando como base a oralidade. Em se
tratando do processo de aquisição do sistema de escrita alfabética, é possível observar que as autoras
trabalharam, principalmente, com o método sintético. Percebi, por exemplo, que do ponto de vista
da perspectiva da fonética e da fonologia, em sua maioria, as atividades propostas, contemplam a
consciência fonológica, no nível de rimas, aliterações e pares mínimos. As autoras não apresentaram
uma sequência alfabética ordenada e nem explicaram ao professor, em seus momentos dialógicos,
a escolha da ordem de apresentação. Não há menção sobre a distinção entre vogais orais e nasais
ou sobre a presença de consoantes nasais em posição de coda silábica. Não encontrei possíveis
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 99
pontes para a produção oral, através, por exemplo, de processos fonológicos recorrentes na fala das
crianças, que poderiam sugerir a reflexão sobre as diferenças entre a fala e a escrita.
Portanto, vale ressaltar que as atividades propostas no livro se coadunam em parte com o que
é requerido nas avaliações nacionais e com as orientações pelos documentos e apenas algumas
atividades dão subsídios a um trabalho voltado ao ensino da língua portuguesa levando em
consideração a valorização e reconhecimento das especificidades dos povos do campo.
Bittencourt, C. Livros Didáticos: entre textos e imagens. In: O Saber Histórico na Sala de aula. São
Paulo: Contexto, 1997.
Choppin, Alain. História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte. In: Educação e
Pesquisa. São Paulo, 2004.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Palavras-chave: Escola Normal de São Paulo. Cultura material escolar. História do ensino das
ciências.
O presente trabalho apresenta um recorte de pesquisa de mestrado que pretende uma discussão
sobre a história do ensino das ciências no estado de São Paulo. Durante a década de 1880, a sociedade
paulista testemunhou a ascensão de tendências modernizadoras e republicanas. Nesse período,
a Escola Normal de São Paulo se tornou o principal centro de ensino paulista, sendo responsável
pela formação dos futuros professores do estado. No intuito de se alinhar às tendências da época, a
Escola Normal foi, no plano educativo, uma das responsáveis pela institucionalização das ciências
no Brasil, sobretudo, pela reforma do ensino prevista pela Lei nº 130, de 25 de abril de 1880, que
preconizava uma reorganização curricular na Escola Normal, introduzindo as disciplinas de física e
química no currículo por meio da criação da 5ª cadeira de francez e de noções de physica e chimica. O
primeiro lente dessa cátedra foi o médico Paulo Bourroul que, em 1882, tornou-se também diretor
dessa instituição. De acordo com o jornal A província de São Paulo, de 07 de novembro de 1882, esse
professor foi incumbido, pelo presidente da província, de “comprar aparelhos necessários ao ensino
de chimica e physica [...]”. Observa-se que a aquisição de materiais para o ensino das disciplinas
científicas não partiu apenas do professor em questão, mas, também, do presidente da província,
conforme relatado ao jornal A província de São Paulo, em 08 de março de 1883: “[...] logo depois da
minha nomeação, e na primeira entrevista que tive com s. exc. falando-me das reformas urgentes
na Escola, S. exc. Chamou minha atenção sobre a necessidade de o mais breve, organizar o ensino
prático dessas matérias”, o que evidencia o alinhamento de interesses entre o poder público e a
Escola Normal de São Paulo.
Objetiva-se, portanto, discutir a importância do laboratório de física e química para a constituição
e funcionamento da cátedra, apresentando quais eram os tipos de objetos científicos adquiridos
para o ensino de física e química, bem como os conteúdos que poderiam ser ensinados por meio
das práticas empíricas dadas pelo manuseio desses objetos. No aspecto metodológico, privilegia-se
o estudo da cultura material escolar por meio da análise dos instrumentos e aparelhos científicos
remanescentes do laboratório da Escola Normal, presentes no Acervo Histórico da Caetano de
Campos (antiga Escola Normal de São Paulo), situado no Centro de Referências em Educação Mario
Covas, bem como a análise dos objetos destinados ao ensino de física presentes no acervo do
Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo. Além disso, considera-se as fontes
documentais escritas como as notícias do jornal A província de São Paulo (1882; 1883), o relatório do
diretor da Escola Normal de São Paulo (1885) e os relatos de viagem do historiador e geógrafo Alfredo
Moreira Pinto (1900). Recorre-se a revisão de literatura que trata sobre cultura material escolar e
história do ensino das ciências, fazendo referência às obras de Braghini (2019), Meloni e Granato
(2014), Viñao Frago (2012), Escolano Benito (2010) e Souza (2007).
Segundo Meloni e Granato (2014, p. 2), “o processo de aquisição de objetos de educação em
ciências pelas escolas brasileiras iniciou-se no século XIX [...]”, sobretudo, em um período em que “a
educação prática das ciências foi valorizada”, por meio do “método intuitivo na segunda metade do
século XIX”. Nesse aspecto, “a renovação pedagógica pressuposta pelo método intuitivo na virada
Referências
BRAGHINI, Katya M. Z. Conhecimento que passa pelas Mãos. A Trajetória de Trabalho e Pesquisa do
Núcleo de Estudos Escolas e seus Objetos (NEO). In: Anais Eletrônicos do X Congresso Brasileiro de
História da Educação, 2019, Belém. História da Educação: Democracia e Diversidade Cultural. Belém
- PA: Congresso Brasileiro de História da Educação - SBHE, 2019. v. 1. p. 5473-5483.
ESCOLANO BENITO, Agustín. Patrimonio material de la escuela e historia cultural. Revista Linhas,
Florianópolis, v. 11, n. 02, p. 13–28, jul./dez. 2010. Disponível em:
SOUZA, Rosa Fátima. História da Cultura Material Escolar: um balanço inicial. In: BENCOSTTA, Marcus
Levy. Culturas escolares, saberes e práticas educativas. Itinerários Históricos. São Paulo: Cortez
Editora, 2007.
PROJETO ARAUCÁRIA:
PRÁTICAS E MATERIALIDADES NARRADAS NOS
CADERNOS DE PROFESSORAS DA DÉCADA DE 1980
Alessandra Giacomiti
cadernos, nos deparamos com desenhos das araucárias, árvore símbolo do estado do Paraná,
também conhecida como pinheiro-do-paraná. A escolha por essa ilustração, que representa a
nomenclatura do projeto e o símbolo do estado onde foi implementado, é reveladora de uma
representação do lugar de onde estas professoras falam, conforme sugere Certeau (2002). Por sua
capa, os dois cadernos já delimitam que são do Projeto Araucária e se referem a atividades diárias a
pré-escola, deste projeto em específico. Além disso, as prescrições dos cadernos destas professoras
trazem uma representação do que os adultos projetavam como importante para as crianças em
idade pré-escolar. Estes registros não estão descolados de um debate e discussões nacionais, que
entendiam esta fase de escolarização como preparatória para aquisições de habilidades consideradas
como fundamentais para alfabetização e ingresso no 1º Grau. De acordo com Kramer e Abramovay
(1986): Grande parte - senão a maioria - dos professores vincula, basicamente, o início da alfabetização
ao treinamento da coordenação motora e da discriminação visual e auditiva. (KRAMER E ABRAMOVAY,
1986, p.172). Tal discussão, que acompanhava o pensamento de teóricos, pesquisadores entre
outros são encontrados nas linhas dos cadernos das professoras e são considerados vestígios, sobre
a escolarização da criança pequena, ancorados em exercícios de coordenação motora (cópia,
recorte, colagem, pintura em figuras prontas), as professoras se articulavam a proposições de um
contexto nacional. Tal escolarização pode estar em consonância com o que se esperava do contexto
histórico no qual estava implantada, com a preocupação nos 70 e 80 pautadas na prevenção do
fracasso escolar ao qual as crianças das camadas sociais mais pobres estariam fadadas. Observa-se,
nestes diários, que permaneciam na rotina destas pré-escolas atividades de coordenação motora, o
que não fazia parte da proposta do Projeto Araucária, que vinha com uma proposição mais ativa de
ensino (atividades estruturadas, pequenos grupos, jogos livres). As professoras não chegam a
romper com a proposta do Projeto Araucária, mas usam de táticas para subverter as regras e criar a
sua própria rotina em sala de aula, outro indício de que existe um posicionamento das professoras
diante das prescrições do Projeto. No entanto, a professora de um dos cadernos, faz uma aproximação,
em alguns momentos, do planejamento com a organização da proposta do Guia Curricular do
projeto. Outro ponto interessante registrado nestes diários, refere-se as festas escolares. As festas
comemoradas e registradas nos diários possibilitam uma aproximação com alguns momentos
festivos que as professoras construíram e fizeram parte da prática inserida no calendário escolar. As
festas comemoradas e registradas nos diários possibilitam uma aproximação com alguns momentos
festivos que as professoras construíram e fizeram parte da prática inserida no calendário escolar. A
persistência de atividades pautadas nas festas escolares é encontrada ao longo dos registros nos
diários. Assim, a homenagem ao Dia das Mães e a Festa Junina também foram destaque nestes
cadernos. De acordo com as análises de Bencosta e Pereira (2006) as comemorações inseridas no
calendário escolar, sob a supervisão dos professores, dispunham os alunos a teatralizarem “em
diferentes momentos do ano escolar representações festivas de cunho religioso, popular e aqueles
sugeridos pela própria escola”. (BENCOSTA, 2006, p. 3858). Nesse caso, a partir dos registros destes
cadernos em especifico a Páscoa e o Dia do Índio foram pano de fundo para tais dramatizações,
sendo que as crianças foram para casa pintadas e caracterizadas de acordo com a festividade. Outro
ponto registrado nos diários, e que merece destaque, refere-se ao registro de queixa sobre a falta de
material. Com relação a essa questão, embora Kuhlmann Jr. (2007) esteja se referindo à virada do
século XIX, início do XX, visualiza-se que a falta de materiais ou propostas baratas de ensino,
encontram permanência na pré-escola inserida no Projeto Araucária. A economia de material, a qual
a proposta do Projeto Araucária apontava, confundia-se também com a falta dele, denominando o
que Kuhlmannn Jr. (2007) mencionou acima. São tantos registros e possibilidades de pesquisa
estampadas na memória dos cadernos, abre-se um leque de investigações, que até o momento
permitiram compreender, que as orientações do Guia Curricular do Projeto Araucária não eram as
únicas propostas descritas nos cadernos, o que demonstrava a arte de fazer dos docentes. Dessa
maneira, os cadernos aqui pesquisados, foram considerados vestígios que permitiram olhar os
fazeres e as práticas cotidianas por dentro da instituição escolar, a partir das lentes e entendimentos
dos docentes sobre sua prática. Para ancorar a discussão de cultura escolar, são utilizados os
conceitos dos autores Antonio Viñao Frago (1998), Dominique Julia (2001) e André Chervel (1990).
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O tema desta comunicação são os cadernos escolares de História do primeiro segmento do ensino
de 1º. Grau no município do Rio de Janeiro, no período entre os anos de 1975 e 1980. Com a análise
de cadernos escolares objetiva-se identificar as características o ensino de História, neste segmento
da educação após a organização da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, que ocor-
reu depois do processo de fusão do Estado da Guanabara ao Estado do Rio de Janeiro. A presença da
História nos currículos dos anos iniciais possibilita que os discentes desenvolvam uma visão crítica
da sociedade em que vivem. Por meio de ações pedagógicas que envolvam as relações entre passa-
do e presente, que promovam a partir da apresentação da diversidade de contextos, os exercícios
da narrativa, da análise, da reflexão e da comparação, é possível formar cidadãos que respeitem as
diferentes de formas de ser e de viver. A História é uma disciplina fundamental para a construção da
identidade dos alunos, sendo este um processo que deve ser iniciado nos primeiros anos de esco-
larização. A trajetória do ensino de História mostra que o seu conteúdo sempre esteve presente nos
currículos dos anos iniciais da escolarização. Segundo Prost (2014), na França, a História se tornou
obrigatória no século XIX na escola primária, com objetivo de desenvolver o patriotismo e partilhar
esses sentimentos. Para tal, utilizava como recurso pedagógico imagens, narrativas, biografia e len-
das. Em geral, envolviam conceitos como cidadania, e a conscientização sobre os direitos políticos,
com o propósito de estimular sentimentos que contribuíssem para a construção do ideário da nação
entre as crianças. Durante o Império ainda que os programas não fossem os mesmos para todas as
províncias, já era possível identificar a narração de feitos considerados heróicos, como base dos
conteúdos desenvolvidos nas classes escolares. Com o advento da República, houve o aumento da
escolarização. Com isso, a História ensinada nas salas de aula passou a ter como objetivos principais
o despertar do nacionalismo, a transmissão das tradições nacionais e a homogeneização da cultura
histórica. As práticas docentes se baseavam na memorização e no estímulo ao culto dos heróis na-
cionais. Estes eram os conteúdos que seriam fundamentais para a aprovação dos alunos nos exames
de admissão aos cursos ginasiais. Na década de 1950, se fortaleceram na escola primária as propos-
tas curriculares com base no formato dos Estudos Sociais em um formato que integrava os ensinos
de História e Geografia. Nesta perspectiva, a fundamentação psicológica era essencial, sendo que a
abstração das noções temporais deveria ser suplantada, a partir de trabalhos que tivessem como
referência realidades mais próximas dos alunos, a saber o bairro, a comunidade ou o município.
Eram os estudos do meio. Permaneciam, no entanto, o culto às datas cívicas e aos grandes heróis na-
cionais. A Lei n° 5692/71 transformou as disciplinas de História e Geografia em Estudos Sociais. Para
atender às demandas criadas pela lei, foram elaboradas propostas curriculares que afastavam o en-
sino de História de sua ciência de referência. Fonseca (2006) ressalta que os programas de ensino
de História das quatro séries iniciais formulados na década de 1970 valorizavam o culto aos sujeitos
históricos e a glorificação de suas ações. Neste período era muito comum a escola adotar um cader-
no especial para pesquisa sobre datas cívicas, onde os alunos escreviam textos e faziam ilustrações
contemplativas aos heróis nacionais. Enquanto nas séries finais do ensino de 1º. Grau e no 2º. Grau
havia a resistência à implantação da disciplina de Estudos Sociais, com a mobilização dos professores
por mudanças, a formação fragilizada dos professores de 1ª. a 4 série em cursos profissionalizantes
colaborava para a imposição de conteúdos e metodologias. Os cadernos são fontes importantes para
a pesquisa sobre as práticas. Neste suporte de escrita os alunos registram as atividades: textos, exercí-
cios, pesquisas e ilustrações. O estudo dos cadernos dimensiona características do diálogo estabeleci-
do entre docentes e discentes por meio das correções, anotações, elogios e críticas escritas. A análise
de historiografia da educação demonstra que os cadernos escolares já foram utilizados como fonte
para o desenvolvimento de pesquisas com diferentes temáticas como a infância, a escola, a família.
Foram utilizados para a percepção de formas aculturação escrita; como veículos transmissores de va-
lores e atitudes ou modo de doutrinação ideológica e política, bem como meio para o estudo do cur-
rículo e das diferentes disciplinas e atividades escolares, para compreender a distribuição do tempo,
os tipos de exercícios, aspectos materiais, sua iconografia, e estudos de dimensão histórica. No que se
refere a implantação de reformas e inovações pedagógicas, as pesquisas indicam os cadernos como
um recurso importante para a identificação de defasagens ou distâncias existentes entre as propostas
teóricas, as leis e as práticas docentes e discentes, além de proporcionar um olhar privilegiados aos
processos de hibridação, adaptação, acomodação, rechaço ou aceitação que costumam acompanhar
às reformas educativas. O caderno escolar pode nos dar indícios sobre o peso da produção escrita nas
práticas docentes, a sequência dos conteúdos, a rotina escolar, e se as atividades foram realizadas den-
tro ou fora do espaço escolar. O conteúdo desde artefato escolar deve ser problematizado enquanto
portador de uma prática discursiva. Assim este pode ser visto como um conjunto de signos que se arti-
culam e entrelaçam de modo particular como práticas discursivas. A prática discursiva escolar possui
especificidades com os enunciados que se repetem, com a forma de organização e com o destaque
de palavras. Os cadernos têm a função de produzir saber escolar, à medida que sua utilização segue
regras próprias determinadas por professores, como por exemplo, a organização das folhas, o espaço
entre as linhas, a cor da caneta que se escreve e o uso das margens. Os desenhos, mapas e colagens
são aspectos que o distinguem dos usos deste suporte de escrita por outras instituições. A escola pro-
duz um discurso próprio. Utilizando como fonte cadernos escolares utilizados entre os anos de 1975 e
1980 organizados em um acervo pessoal, pretende-se analisar o conteúdo dos textos, as ilustrações e
os exercícios, com o objetivo de identificar a proposta pedagógica do ensino de história do município
do Rio de Janeiro. Ao final dos anos 1970, a mobilização dos professores e o processo de redemocra-
tização do país levaram a mudanças e influenciaram a reformulação de propostas curriculares mu-
nicipais. Houve o retorno da História e da Geografia como disciplinas autônomas e a elaboração de
propostas curriculares que se referenciavam nos novos paradigmas do conhecimento histórico e, nas
inovações das ciências da educação. Destaco que neste período a proposta pedagógica carioca estava
sendo reformulada, uma vez que o Estado da Guanabara havia sido extinto. Neste sentido, o caderno é
representativo, pois é o espaço onde história local pode ser contemplada, por meio da escrita copiada
ou mimeografada, ilustrações e pesquisas. Este trabalho pretende contribuir para ampliar, aprofundar
e difundir o conhecimento da área sobre a história do ensino de História nos anos iniciais do ensino
fundamental carioca de modo a subsidiar os debates sobre o papel da escola na educação histórica
entre professores, diretores e pesquisadores.
Referências
ABUD, Kátia. O ensino de História nos anos iniciais: como se pensa, como se faz. Antíteses, v. 5, n. 10,
p. 555-565, jul./dez. 2012 BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de história: fundamentos e
métodos. 3ª. Ed. São Paulo: Cortez, 2009.
CERRI, Luís Fernando. Uma proposta de mapa do tempo para artesãos do mapa do tempo: História
do ensino de História e didática da História. In: MONTEIRO, Ana Maria; GASPARELLO, Arlette
Medeiros; MAGALHÃES, Marcelo Souza (org). Ensino de História: sujeitos, saberes e práticas. Rio de
Janeiro: Mauad X, FAPERJ, 2007. ESCOLANO, A. e VIÑAO Frago, A. Currículo, espaço e subjetividade.
A arquitetura como programa. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2001 .
VINÃO FRAGO, Antonio. Os cadernos escolares como fonte histórica: aspectos metodológicos e
historiográficos. In: MIGNOT, Ana Chrystina Venâncio (org.). Cadernos à vista: escola, memória e
cultura escrita. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2008.
RESUMOS DAS
COMUNICAÇÕES
INDIVIDUAIS
EIXO
ENSINO DE HISTÓRIA
DA EDUCAÇÃO
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este trabalho tem como objeto o Ensino e a Pesquisa em História da Educação no Pará e como
principal objetivo explanar de que maneira se originou o debate acerca do ensino e da pesquisa em
História da Educação no Estado do Pará. Como fonte primária utilizamos o relatório do “I Seminário
de História da Educação: Ensino e Pesquisa” realizado no ano de 1996 na Universidade Federal do
Pará. O documento contém informações acerca dos objetivos do evento, inquietações que levaram à
sua realização, conteúdos que eram abordados na disciplina em diferentes instituições e um resumo
dos debates ocorridos. De acordo com o relatório o evento contou com a participação de professores,
pesquisadores e alunos de graduação em Pedagogia vinculados à História da Educação.
Cabe ressaltar que não existem registros de eventos anteriores no estado do Pará que buscassem
discutir a História da Educação, de tal forma que o seminário se constituiu em uma iniciativa pioneira
e como o primeiro espaço de debate que objetivou a construção de uma síntese crítica acerca
do ensino e também da pesquisa no campo da História da Educação, bem como visou fomentar
discussões a respeito das metodologias adotadas para o ensino da disciplina nos cursos de formação
de professores na Universidade Federal do Pará (UFPA), na Universidade do Estado do Pará (UEPA) e
na Universidade da Amazônia (UNAMA) e na Secretaria de Estado de Educação (SEDUC).
Para realizarmos a interpretação dos dados coletados utilizamos a técnica da análise de conteúdo
que, de acordo com Bardin (2011) se constitui em
Como se trata de um estudo situado no campo da história das disciplinas, utilizamos como
referencial teórico Andre Chervel, devido a importância que o mesmo atribui aos conteúdos do ensino
destacando a necessidade de compreender a amplitude e a noção de disciplina, é preciso reconhecer
Entendemos que a disciplina História da Educação possui cultura, regras e normas próprias
configurando-se como uma “entidade concreta” conforme nos ensina Chervel (1990) e que está
inserida em um ordenamento acadêmico sendo, portanto “instituída por meio do desenvolvimento
histórico do campo acadêmico-universitário e escolar e pelas ações de seus agentes em sua própria
existência e constituição” (RODRIGUES, 2011, p. 146).
Levando em consideração esse aspecto buscamos apresentar ao longo do texto como se deu
a constituição histórica desse campo no Brasil até tornar-se disciplina nos cursos de formação de
professores e como se apresentara na UFPA, UEPA, UNAMA e no curso de formação para o magistério
da SEDUC identificando similitudes e diferenças entre as instituições.
Para elaborar um histórico da disciplina História da Educação no Brasil, de acordo com Vidal e
Faria Filho (2003), é necessário considerar três vertentes que a influenciaram como disciplina, quais
sejam, a tradição historiográfica do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB), as escolas de
formação para o magistério e a produção acadêmica entre os anos de 1940 a 1970.
A primeira vertente de Escrita Ligada ao IHGB buscou constituir uma história da educação que valorava
os feitos do regime imperial no campo da instrução pública, fazendo uso de documentos oficiais.
A segunda vertente trata do momento em que a disciplina História da Educação foi incorporada
ao currículo da Escola Normal do Rio de Janeiro em 1928 e fazia parte das medidas de reorganização
do curso de formação do magistério promovidas por Fernando de Azevedo, que buscava introduzir
os princípios da escola ativa posteriormente Escola Nova no ensino primário. Júlio Afrânio Peixoto
foi um dos primeiros professores da disciplina no Rio de Janeiro e também o autor do primeiro
manual didático de História da Educação Brasileira publicado em 1933 denominado “Noções de
história da educação”.
Segundo Faria e Vidal (2003) citando Clarice Nunes, o texto de Peixoto inaugurou uma regra de escrita
dos manuais de História da Educação que passaram a “deixar de lado a pesquisa em fontes primárias
e eleger a compilação comentada como forma de trabalho” o que atribuía a história da educação a
missão de explicar os problemas do presente pelos destaques dos fatos do passado. Estabelecendo
uma divisão entre o antes e o depois da Escola Nova que irá se apresentar em diversas obras como a de
Fernando de Azevedo. Os autores destacam também que Tito Lívio Ferreira com o manual intitulado
“História da Educação Lusobrasileira” era um dos únicos manuais escolares que se filiava à tradição
historiográfica do IHGB buscando desvendar o processo e gênese da educação brasileira
A História da Educação surge ligada à filosofia da educação e por vezes integrada em uma única
disciplina nas escolas de formação do magistério, integração que foi fortalecida pela reforma de 1932
e pela criação do curso de Pedagogia na Faculdade Nacional de Filosofia em 1939 e principalmente
pela Lei Orgânica para o ensino normal de 1946, que determinou a união de História e Filosofia da
Educação em uma disciplina única. Essa visão de que as duas eram integradas, segundo de Vidal e
Faria Filho (2003, p. 51), acabou promovendo o “afastamento da escrita da história da educação da
prática dos arquivos, estimulando as interpretações que pretendiam conferir-lhe uma importância
moral” atribuindo-lhe um caráter de disciplina formadora fazendo com que a história permanecesse
como repetição e comentário.
De acordo com Almeida Sá (2006) o curso de Pedagogia foi criado no final dos anos 30, sendo
regulamentado pelo Decreto-Lei nº 1.190, de 4 de abril de 1939, que estruturou a Faculdade Nacional
de Filosofia da Universidade do Brasil com uma organização curricular que separava o bacharelado
da licenciatura, o que, nas palavras de Cury (1996), causava a separação entre conteúdos e métodos
e entre teoria e prática, componentes relevantes do processo pedagógico.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 110
O curso surgiu tendo como uma de suas finalidades preparar para o magistério os docentes do
ensino secundário e normal, bem como os interessados ao exercício de atividades técnicas. Segundo
SILVA (1999)
No início foram criadas quatro seções, secção de filosofia, secção de ciências, secção de letras
e secção de pedagogia, entre as quais se distribuíam os cursos regulares de Filosofia, Matemática,
Química, Física, História Natural, Geografia, História, Ciências Sociais, Letras, Pedagogia e Didática.
(SILVA, 1999, p. 33).
A organização pedagógica do curso, de acordo com Favaro (2011) derivou-se da Escola Normal e
apresentava em seu currículo, entre outras disciplinas, a História da Educação. No entanto, segundo
Saviani (2007), nesse momento, a disciplina não alcançou o merecido destaque, ficando em segundo
plano. Nóvoa (1996) também nos informa que
Esse autor ressalta que o estudo histórico visa a analisar os vestígios deixados em um espaço-
tempo, em um momento histórico, cabendo à educação atender a determinados objetivos que
correspondam a visões de homem e de mundo. Dessa forma, as relações entre os fatos do passado
e do presente são “indícios a partir dos quais o historiador interpreta o passado” (ABBUD, 2008, p.6).
A partir dessas reflexões foi possível desenvolver nossa análise e perceber que a concepção
positivista e pragmática da História da Educação que considera a mesma como um possibilidade
de conhecer o passado para não repeti-lo no presente permaneceu por muito tempo no campo
acadêmico, inclusive nos documentos analisados, que ordenavam a disciplina de forma cronológica,
abarcando temas desde a antiguidade clássica até os temas mais recentes naquele momento,
tratavam de diversas temáticas enfatizando em determinados períodos as ideias pedagógicas e em
outros os principais educadores, sendo por vezes demarcadas por um pano de fundo constituído
pela história política e legislativa. Desse modo, consideramos que o I Seminário de História da
Educação: ensino e pesquisa, cumpriu um papel importante no desenvolvimento do campo no
estado do Pará, visto que, a partir de sua realização, surgiram propostas que buscaram mudar os
paradigmas vigentes.
Referências
CHERVEL, André. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria e
Educação, nº 2, p. 77-229, Porto Alegre, 1990.
FARIA FILHO, L.M.; VIDAL, D. História da Educação no Brasil: a constituição histórica do campo (1880-
1970). Revista Brasileira de História, São Paulo, v.23, n.45, p.37-70. 2003. Disponível em: http://www.
scielo.br/pdf/rbh/v23n45/16520.pdf.
Camilla V. C. P. De Oliveira
Cesar Augusto Castro
O texto busca explorar a imprensa periódica paraense na Belém republicana (1938) como objeto/
fonte de pesquisa, visto que a República é considerada um período que transmuda e estabelece
novos padrões morais e intelectuais na educação brasileira, pois nela instauraram-se novas
ideologias no âmbito social, bem como a democratização da educação escolar no Brasil. Nas
últimas décadas, pesquisadores da história da educação, discutem a imprensa periódica
educacional, como “fonte privilegiada de estudo; jornais, boletins, revistas, magazines; feitas por
professores para professores, feita para alunos por seus pares ou professores, feita pelo Estado ou
outras instituições como sindicatos, partido, associações e igreja” (BARROS, 2002, P. 173). A revista
Terra Imatura (1938) – também conhecida como “Revista do Estudante” é fonte de análise do
debate/embate ideológico em busca da pesquisa em história da educação, no intuito de discutir e
compreender a educação pública, entre as ações dos atores educativos, e respectivamente as
normas e práticas de uma época específica. O referido impresso, foi pensado e organizado por um
grupo de intelectuais orgânicos/homogêneos, que se destinaram a orientar o seio social, em
especial a mocidade paraense sobre a realidade política vigente e seus reflexos no âmbito
educacional paraense. Notou-se um importante diálogo entre o papel do historiador da educação
ao utilizar periódicos nas produções científicas educacionais, e os conceitos de Antonio Gramsci
(1988) ao evidenciar a imprensa como propagadora do poder hegemônico/ideológico no setor
cultural societário, então, esse texto tem por finalidade investigar os discursos da revista Terra
Imatura (1938) sob perspectiva gramsciana, as quais revelam diversas vozes culturais capazes de
construir mentalidades plurais diante dos homens. Dito isso, crê-se na escrita como produto da
cultura, visto que se torna a materialização da prática linguística da fala/ação humana. No periódico,
buscou-se: compreender a imprensa periódica educacional como fonte/objeto para história da
educação; analisar as vozes dos intelectuais orgânicos no contexto educacional republicano
paraense. Ao observar a imprensa como suporte de poder, é necessário perceber que nela se institui
um espaço privilegiado das relações sociais e das ações de intelectuais, que por sua vez, destinam
suas preocupações na defesa de seus interesses de classe para qual operam, possibilitando
conhecer as realidades sobre várias ramificações societárias. A imprensa periódica não é neutra
sob os aspectos políticos, econômicos e sociais, como exprime a concepção de Bastos (2002, p. 155-
152) ao dizer que são “dispositivos privilegiados para forjar o sujeito/cidadão é a imprensa,
portadora e produtora de significações”, assim, Gramsci (2001, p. 67) afirma que “a arte da imprensa
revolucionou todo o mundo cultural, dando à memória um subsídio de valor inestimável e
permitindo uma extensão inaudita da atividade educacional”. Sabe-se que a imprensa de grande
circulação como destaca Gramsci desvela o domínio de verdade fidedigna sob os homens, no
sentido de educar e convencer por meio do campo linguístico cultural. Na República, a civilidade,
moralidade, o higienismo, patriotismo entre outros padrões de modernidade eram produzidos e
aperfeiçoados por meio do discurso e da prática, porém as desigualdades se alocavam em diversos
eixos da sociedade, e a problemática tenciona-se a partir das circulações de ideia republicanas,
uma vez que promoviam uma concepção de verdade universal. Logo, a teoria gramsciana conduz
a compreensão da imprensa/periódico como meio de comunicação de massa/mecanismo de
pressão, que são instrumentos de manipulação de fluxo ideológico, os quais são pensados por
intelectuais, e muitas vezes controladas pelo Estado (Aparelho ideológico) Burguês, que mantém
a hegemonia a favor da classe dominante no poder. Assim, tudo que é proposto nas entrelinhas
dos impressos é pensado por um ideário homogêneo, articulado “pelo modo como são redigidas,
pelo tipo de leitor com as finalidades educativas que querem atingir” (GRAMSCI apud COUTINHO,
2002, p. 200-201). Foram coletados na Biblioteca Arthur Viana em Belém do Pará dois exemplares
n.02 v.1 e n.05 v.1 da revista Terra Imatura (1938), que foram selecionados alguns texto para estudo.
Metodologicamente, utilizou-se a polissemia dos discursos e os embates ideológicos,
fundamentados às contribuições e conceitos indissolúveis da corrente filosófica de Antonio
Gramsci, no sentido de compreender o contexto cultural, educacional, político das lutas de classe
e ordem social em seus polos dominantes, bem como a sociedade civil na discussão da hegemonia,
que se instala na ação política-ideológica entre as classes sociais antagônicas, em relação aos
seus projetos sociais e suas ideologias, que para Gramsci (1987, p.16), ideologia é “uma concepção
de mundo que se manifesta implicitamente na arte, no direito, na atividade econômica, em todas
as manifestações da vida individual e coletiva”, e no entendimento de Chaves (1996, p. 33) “não
existe uma só ideologia, mas ideologias (dominante e dominada), uma vez que a hegemonia
garante uma direção, em prol do convencimento aos sujeitos que estabelece o consenso perante a
sociedade. Gramsci (2002, p.129) descreve que “a imprensa é a parte mais dinâmica dessa estrutura
ideológica” da classe dominante em sua frente “teórica ou ideológica”, a qual se vale da
materialidade desse suporte e seus discursos para sua manutenção, ou seja, o setor editorial engloba
os jornais políticos, revistas de todos os tipos, científicas, literárias, filosóficas entre outros,
possuem um programa explícito e implícito que alimentam e apoiam uma determinada corrente
ideológica (GRAMSCI, 2002, p. 78). Nesse contexto, pode-se expor como exemplo de suporte
ideológico, a revista/fonte, era um mensário independente, dos estudantes do Pará, direcionada
ao discurso no debate de Letras, Artes e Ciências, que estava sob direção de Cléo Macambira Braga,
nas primeiras páginas da revista é compreensivo ler um protesto em prol do direito de igualdade
e mudanças: “é preciso que os estudantes da Amazônia, cerrando fileiras ao nosso lado [...],
mostrem que a sua vontade de vitória deve crescer, subir, ir a luz, para tornar-se uma realidade
brasileira” (IMATURA, 1938, p. s/n). Chaves (1996, p. 46) cita os pensamentos de Gramsci ao dizer
que “o intelectual orgânico revolucionário deve construir um saber que supere o saber dominante.
Para isso, deve atuar de diferentes formas: ideológica, política, econômica e cultural, pois estão
num mesmo nível e todas têm a mesma importância”. A revista aclara uma sociedade insatisfeita
com a invisibilidade social. Então, onde estavam a “Ordem e Progresso” que era o ideário de
civilidade que se manifestou na república brasileira? A materialidade do periódico segundo seus
enunciados “representava a vontade de lutar; Terra Imatura é a peleja, por um Brasil mais nosso,
por uma Amazônia mais ajudada” (IMATURA, 1938, p. 3). Que Amazônia imatura era essa que
parecia não existir a si mesma? Filhos de uma terra imatura, imaturos seriam? Na análise, é notório
um discurso voltado para um consenso crítico sob a realidade social heterogênea. Ressalta-se que
a mocidade unida a eles e ativa para lutar, “todos” formariam um grupo/intelectual homogêneo/
orgânico com os mesmos objetivos. Chaves (1996, p. 46) ao citar Gramsci diz que “o intelectual
orgânico revolucionário deve construir um saber que supere o saber dominante. Para isso, deve
atuar de diferentes formas: ideológica, política, econômica e cultural, pois estão num mesmo nível
e todas têm a mesma importância”. Então, era necessário não silenciar e formar argumentos
incessantes em relação ao que se desejava. Um discurso organizado para persuadir opiniões/
mentalidades acerca das concepções de educação antidemocrática, fadada ao governo excludente,
ao qual “refere-se ao autoritarismo do Estado brasileiro e denunciar os crimes das ditaduras do
mundo todo”. No campo educacional, havia a luta constante pela legalidade da democracia para
ergue um país “O estudante do Pará [não deveria] ficar parado como um fraco, um fraco quiéto
como um vencido pelas descrenças do meio o estudante pobre tem duas barreiras contra si: a sua
pobreza e a carestia dos livros e das taxas escolares” (IMATURA,138). Os estudantes e professores
pertenciam ao coletivo de intelectuais orgânicos, que para Gramsci “não existe atividade humana
da qual se possa excluir toda intervenção intelectual, não se pode separar o homo faber do homo
sapiens”,ou seja, “todo homem, fora da sua profissão desenvolve uma atividade intelectual,
podendo ser um filósofo, um artista, um homem de gosto, participa de uma concepção de mundo”
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 113
(GRAMSCI, 1988, p 7-8). O intelectual orgânico, está vinculado a uma classe social, no engajamento
do ato reflexivo, da construção teórica e Práxis. Portanto, entende-se que a revista foi uma das
maneiras que o coletivo de intelectuais paraenses lutaram contra a voz do Estado Burguês,
utilizando o discurso como prática militante revolucionária para mudança social.
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Massangana, 2010.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Gislene Prim
O presente trabalho tem como temática a trajetória da disciplina História da Educação no curso de
Pedagogia da FAED (Centro de Ciências Humanas e da Educação), na UDESC (Universidade do Estado
de Santa Catarina), desde a criação do Curso em 1963 até 2013, quando houve a implantação da última
reformulação curricular. O principal objetivo é compreender o papel e o significado da disciplina
História da Educação diante das alterações curriculares, as permanências e mudanças desta disciplina
neste curso. A pesquisa pretende compreender a trajetória da disciplina História da Educação do curso
de Pedagogia da FAED/UDESC para ampliar os conhecimentos sobre a história da educação catarinense
e sobre a formação dos professores. Os objetivos específicos são: a) identificar as mudanças e
permanências em relação às ementas, aos conteúdos, à metodologia e às referências bibliográficas no
ensino da disciplina História da Educação, b) conhecer a relação entre a disciplina História da Educação
e a formação de professores no curso de Pedagogia da FAED/UDESC entre 1963 e 2013. A pesquisa
realizada com o recorte de um período de 50 anos permite a análise de um maior número de fontes e
contextualizações, o que possibilita um melhor entendimento do processo de constituição de uma
disciplina. Conhecer a constituição, a organização e as finalidades de uma disciplina e refletir o que,
como e para quem ensinar, aspectos essenciais do pensar educativo em diferentes períodos. É
imprescindível olhar com atenção os momentos de conflito e de ruptura no percurso da história da
educação catarinense e brasileira. É necessária uma reflexão sobre a trajetória da disciplina, olhando
para o desenvolvimento do currículo, da disciplina, dos conteúdos estudados. Procuraremos dar
visibilidade ao percurso histórico do curso e da disciplina em específico, como forma de destacar sua
pertinência, sua valorização no currículo e no processo de formação de professores, visto que ela é um
importante elemento curricular. As análises são feitas com base em fontes documentais, as quais
foram pesquisadas nos arquivos da FAED e no Conselho Superior da UDESC. As fontes são
essencialmente os Planos de Ensino da Disciplina, Matrizes Curriculares do Curso, Processos de
Alteração Curricular e também a legislação educacional para formação de professores nos âmbitos
nacional, estadual e institucional. Diante das informações coletadas nas fontes documentais, foram
identificadas onze alterações curriculares no período (1963-2013), dentre elas propõe-se analisar três.
Tal escolha se deve ao fato de terem sido essas as que envolveram mudanças na trajetória da disciplina
História da Educação, sendo elas: em 1985, por meio do Processo 942/85 e da Resolução 016/85 –
Consepe; em 2002, com o Processo 687/02 e a Resolução 021/2003 – Consepe; e 2011, com o Processo
6561/2009, seguido da Resolução 055/2011 – Consuni. Sendo assim, pretende-se conhecer a trajetória
da disciplina História da Educação para compreender aspectos da história da formação de professores
no curso de Pedagogia da FAED/UDESC. Na análise da documentação pesquisada, percebe-se que as
disciplinas curriculares se filiam ao momento histórico do país e do estado. As inúmeras reformulações
curriculares caracterizam o desafio da formação de professores e a necessidade de avanços teóricos e
metodológicos na área da educação – no curso de Pedagogia. A disciplina História da Educação é o
campo de investigação, desde sua ementa, seus conteúdos, suas referências bibliográficas e sua
organização, num processo de reconhecimento de como se deu sua trajetória nos currículos do curso
e quais as contribuições/reflexões que promove na formação de professores. Ao analisar a educação
brasileira e catarinense por meio da História da Educação percebemos que ela se constitui e se modifica
com as pessoas, com os lugares que elas ocupam como produtoras da história. Metodologicamente, o
presente estudo classifica-se de acordo com a abordagem qualitativa, por se tratar de uma metodologia
que considera a atividade humana e a educação em seus aspectos subjetivos e interativos, em que há
um interesse do pesquisador pela interpretação e descrição da situação pesquisada. Como método de
investigação, propõe-se a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental, tendo em vista o uso de
documentos como fonte principal para análise. Para, assim, perceber as singularidades próprias dos
atores educacionais que contribuíram para esta construção, para reconhecer continuidades e
descontinuidades neste processo da trajetória histórica da disciplina História da Educação no curso de
Pedagogia. Para tanto, esta pesquisa apoiar-se-á, principalmente, nos estudos de Antônio Nóvoa
(1999), Carlos Monarcha (2007), Maria das Dores Daros (1999; 2002; 2005), entre outros que, como estes
citados, tratam de aspectos fundamentais da história da educação brasileira e catarinense e da história
da profissão docente. Além do suporte teórico de autores que serão fundamentais para o
desenvolvimento da pesquisa, tais como André Chervel (1990), Dominique Juliá (2002), Décio Gatti
Junior (2008) e Maria do Carmo Martins (2007, 2014) para as investigações pertinentes à história das
disciplinas escolares. As discussões são organizadas em três momentos no texto, no primeiro: “Os
primeiros passos para formação de professores: a Escola Normal” em que se iniciam as reflexões e
ações sobre a formação de professores, seguidas das reflexões sobre o curso de Pedagogia, com a
análise da trajetória da disciplina História da Educação nos currículos. Diante dessa reflexão, propõe-
se recompor, ainda que superficialmente, os primeiros passos para formação de professores, desde a
Escola Normal ao curso de Pedagogia, mais especificamente a Escola Normal Catharinense e o Curso
de Pedagogia da FAED/UDESC, objeto deste estudo. Podemos considerar que a disciplina História da
Educação é considerada no currículo como introdutória a outros estudos da área da educação. Caberia
a ela fornecer uma base contextual da origem das questões educacionais. Por isso, ela é acompanhada,
por exemplo, da Filosofia e da Sociologia da Educação desde os currículos do curso de formação de
professores na Escola Normal e no Curso de Pedagogia, compondo a área do conhecimento considerada
Fundamentos da Educação. No segundo: “Uma caminhada pela história da educação catarinense: o
curso de Pedagogia da FAED/UDESC e a disciplina História da Educação” onde é realizada uma
contextualização histórica, social, econômica e educacional do estado de Santa Catarina, com a criação
da FAED, e a trajetória da disciplina História da Educação no curso de Pedagogia a partir das alterações
curriculares a serem analisadas no período estudado. No terceiro (em construção), “O Ensino de
História da Educação: idas e vindas nos ‘modos de operar’ a disciplina” serão destacados os temas,
autores e as metodologias no ensino da disciplina História da Educação identificados nos Planos de
Ensino do período estudado. Entende-se que este trabalho contribui para as reflexões deste Centro de
Ensino e também dialoga com outras instituições de ensino superior de formação de professores. Há
que se considerar a importância e o espaço que a disciplina História da Educação ocupa nos currículos
dos cursos de formação de professores desde a sua implantação, pois, as discussões propostas em sala
de aula têm o objetivo da formação de sujeitos atuantes na sociedade. Não há uma única História da
Educação, mas diferentes leituras, experiências educativas, espaços, tempos e atores que construíram
e constroem a história diariamente. Para realizar um estudo em História da Educação a partir da
reflexão sobre a trajetória da disciplina História da Educação no curso de Pedagogia da UDESC, faz-se
necessário remeter-se a algumas contextualizações históricas e educacionais para melhor compreensão
da temática. Pensando assim, necessário destacar que a história da formação docente no Brasil é
repleta de conflitos entre os envolvidos nesse processo, sendo eles os políticos, os intelectuais da
educação e os professores. Pois toda mudança nas formas de pensar e agir na educação estão atreladas
ao momento histórico, social e político vivido. Consideramos que a História e consequentemente a
História da Educação não é linear, progressiva, mas repleta de retrocessos, contradições e
descontinuidades. O estudo de uma disciplina curricular contribui para compreender o papel dos
contextos sociais, políticos, econômicos e culturais, na forma de definir que conhecimentos devem
estar presentes no curso de formação de professores. No decorrer da pesquisa procurar-se-á
compreender o significado e a importância dessa disciplina no curso de formação de professores para
compreensão dos diferentes contextos em que atua, suas influências e sua interligações com a
educação. Percebemos que as disciplinas constituem um grupo de saberes, e o seu lugar no currículo
é objeto de questionamentos, disputas e pesquisas na área de História da Educação e do Currículo.
Buscar compreender essas questões é um grande desafio.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Elisângela Batista
João Carlos Da Silva
O presente estudo tem como objetivo discutir o ensino de História no viés da pedagogia
histórico-crítica como alternativa necessária para a democratização do ensino e emancipação
humana, no município de Toledo. Podemos observar através das reformas e propostas educacionais
que o ensino de História fundamentado no materialismo histórico-dialético, não é basilar para o
Estado ideologicamente concatenado com o neoliberalismo. Prevalece na escola pública da
atualidade uma educação voltada para o trabalho negando acesso a todos os conhecimentos, isto
é, o patrimônio cultural e científico da humanidade. Torna-se necessário compreendermos no
contexto da história da educação do Brasil, identificando como o ensino de História foi inserido
nesse processo de organização social do capitalismo, quais caminhos têm percorrido e qual
deveria ser sua verdadeira finalidade. Consideramos a possibilidade de um ensino de história na
perspectiva da pedagogia Histórico-Crítica (PHC) no sentido de uma educação emancipadora
capaz de romper com a lógica do capital a qual a escola está inserida. Entendemos a PHC não
apenas como uma teoria, mas também como um movimento que se expressa na perspectiva da
mudança na qual a classe trabalhadora se aproprie do conhecimento científico, patrimônio da
humanidade, produzido pelos homens, como superação de uma educação burguesa. A partir de
2006 os fundamentos teóricos norteadores dos conteúdos curriculares, foram direcionados, para
o materialismo histórico-dialético, defendendo uma formação crítica e a emancipação humana
por meio da aquisição do conhecimento. Iniciado seu desbravamento em 1946, após a indústria
madeireira e Colonizadora Rio Paraná S/A- MARIPÁ, juntamente com uma companhia imobiliária
inglesa, adquirirem a gleba de terras fazenda Britânia, funda-se em 14 de dezembro de 1951 o
município de Toledo. No Oeste do Paraná, com a implantação da Usina Hidrelétrica Itaipu, recursos
financeiros foram destinados para a Educação. Organismos internacionais demonstravam
interesse no desenvolvimento educacional, para suprir a demanda industrial que ali se estabelecia.
A partir deste pressuposto foi criado o projeto Especial Multinacional de Educação Brasil – Uruguai
– MEC/OEA, este por sua vez, foi uma proposta da Organização dos Estados Americanos – OEA. O
ensino de História norteou-se pelas diretrizes da Lei 5.692/71 consolidando medidas que já vinham
sendo adotadas durante os anos de 1960, institucionalizando algumas experiências já realizadas
e estabelecendo ações em consonância com o projeto de educação mais amplo do estado
brasileiro. (FONSECA, 2009). Desde os anos de 1970, o ensino de História nos anos iniciais do
fundamental do município de Toledo, tinha como auxílio didático fundamentos e materiais de
apoio que vinham das esferas estaduais. Segundo dados levantados junto aos professores da
rede, os conteúdos eram referentes a História nacional, e que havia uma apostila elaborada em
1979, para a 3ª série do primeiro grau a qual foi utilizada até 1984. A partir desta data, membros do
Referências
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2015.
CHAUI, Marilena. Brasil: Mito fundador e sociedade autoritária. São Paulo: Fundação Perseu Abramo,
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ROMANELLI, Otaiza de Oliveira. História da Educação no Brasil (1930/1970). Petrópolis, RJ: Editora
Vozes, 1985.
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Autores Associados, 2002.
ISSN 2358-3959
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O estudo faz uma análise sobre o ensino e a história da educação da criança do final do século
XV e início do XVI, que a nosso ver está relacionado com a visão atual sobre o Ensino de História
da Educação, no que se refere entendermos o passado como referência para algumas reflexões do
presente. O objetivo principal do trabalho é o de compreender a preocupação, tratada por Erasmo
de Roterdã (1466-1536), sobre a educação da criança como essencial para a formação do homem do
futuro.
Por tratar-se de um estudo do passado e as preocupações com as questões sociais do respectivo
período, nos fundamentamos na História Social e no conceito de longa duração. Abordaremos o
homem no seu devido tempo e espaço, analisando que sem entendermos algumas das preocupações
que foram pertinentes de debates e de reflexões no passado, não conseguiremos tratar das exigências
atuais com fundamentos necessários para entendê-las como essenciais para a formação humana.
A relação principal que faremos entre passado e presente é a de analisar a educação social como
necessidade de qualquer momento, porém, compreende-la como prioridade criada e estabelecida
para atender o seu respectivo tempo. Quando nos referimos a educação e ao ensino da criança entre
o final do século XV e começo do XVI, estamos entendendo que Erasmo se refere às necessidades
vigentes da sua época, mas que, ao analisarmos alguns pontos tratados por ele, verificamos que
as mesmas preocupações perpassam a história, sejam elas: o conhecimento, a honestidade, o bom
comportamento, as boas ações, as relações familiares, o bem comum dentre outras.
Pensar o passado como possível estudo para reflexão da nossa época, pode parecer uma forma de
anacronismo, entretanto, nos pautamos em Marc Bloch (1886-1944) quando analisa o passado como
uma ciência e afirma que “Toda ciência, com efeito, é, a cada uma de suas etapas, constantemente
atravessada por tendências divergentes, que não são possíveis de dirimir sem uma espécie de aposta
sobre o futuro”. (p.45).
Desse modo, estudar e ensinar sobre a História da Educação nos possibilita compreender as
diferentes instâncias que a permeiam , tendo a possibilidade de analisa-las (História e Educação)
interligadas e, também, correlacionadas com a re/organização da sociedade.
Erasmo, em sua obra De Pueris, fez o que poderíamos chamar hoje de ‘manual pedagógico’.
Ele ensina como educar a criança desde o seu nascimento. A obra nos remete a várias reflexões
sobre a preocupação do autor com a formação da criança, contudo, favorece o entendimento de
que os ensinamentos não eram específicos à criança, mas sim, aos pais para educarem seus filhos.
Provavelmente, o autor considerava inadequada a educação que as crianças recebiam, quando
pensada para atender as prioridades da sua época.
As mudanças educacionais ficam claras quando Erasmo se remete a ‘educação na fase do
aleitamento’. Ele não titubeia em afirmar aos pais que não se deve perder tempo para dar uma boa
educação à criança. Não é possível esperar que ela cresça e desfrute de alguns ‘vícios’ familiares
e sociais, haja vista que, ainda na fase da amamentação já é possível iniciar os primeiros passos
de instrução.
Segundo ele, o alimento deveria ser para o físico e para a mente. As amas amamentavam e os
pedagogos instruíam, de forma simultânea “[...] condividas, por igual, os cuidados entre as amas e
o preceptor de sorte que aquelas lhe fortificam o pequeno corpo com o melhor dos sucos enquanto
este zela pela mente, subministrando ensinamentos salutares e honestos”. (p.02).
Erasmo ensinava aos pais o dever de trabalhar com o desenvolvimento total do filho, corpo
e mente, visto que, a preocupação maior era dar o alimento e criar uma criança saudável e forte
fisicamente. Quanto à mente, apesar de historicamente ser uma questão abordada, Erasmo levanta
pontos mais específicos. Para ele, o desenvolvimento da mente precisava ser iniciado com a criança
ainda no berço, entendendo que o corpo e a mente tinham a mesma necessidade de força (alimento)
para sobreviverem.
O autor critica os pais que tratavam os filhos como incapazes de aprendizado, dando a eles:
mimos, carícias e cuidados pela fragilidade da idade, considerando que o ensino fosse como um
‘veneno’ para a criança. Por meio desses aspectos observados nas famílias do seu período, Erasmo
ressalta que, se as crianças continuassem sendo tratadas da forma como os pais estavam fazendo, a
sociedade futura seria repleta de homens incapazes de discernimento e de atitudes indignas do bem
comum “A mãe natureza aparelhou, com mais recursos, os animais desprovidos de fala para suas
funções genuínas. Não admira, então, ter a divina Providência entregue ao único ser racional, dentre
os viventes, a maior parcela de sua natureza à educação?” (cap.10. p.03).
A pauta de discussão da obra é a educação. O autor considera inadmissível o desprezo pela
instrução, asseverando que os homens cuidam dos animais e os adestram para a caça desde filhotes,
sem remorso de os educarem muito novos. Quanto aos filhos, que foram providos de razão e que
deveriam ser desenvolvidos muito cedo, são ‘poupados’ desses cuidados como se fossem castigos
para a criança (cap. 12, p.03). Erasmo atrelava a responsabilidade da educação pelas vias da família
e pela do preceptor como necessárias para o desenvolvimento intelectual. Para ele o começo de
uma boa educação era pelos familiares e pelas pessoas que conviviam com a criança, ensinando os
devidos comportamentos condizentes para a boa educação da época.
Sem fazermos comparações entre períodos históricos, mas analisando, conforme já mencionado
anteriormente, que algumas questões perpassam historicamente, Alexis Leontiev (1903-1979),
séculos depois de Erasmo, revela que as preocupações referentes ao desenvolvimento do psiquismo
na criança, independe de época. De acordo com ele, a criança se divide em dois ‘círculos’ “[...] O
primeiro compreende os seus íntimos: a mãe, o pai ou aqueles que ocupam o seu lugar junto da
criança” (p. 306). Para esse autor, o primeiro círculo é a base da educação da criança e o segundo,
que o autor diz ser o ‘círculo mais largo’ “[...] é constituído por todas as outras pessoas; as relações
da criança são mediatizadas pelas relações estabelecidas no primeiro círculo, menor, quer a criança
seja ou não educada na sua família” (p.306).
Leontiev considera que a criança ao adentrar no segundo círculo ela se modifica, aprende novas
coisas e se relaciona com outras pessoas, “Mas psicologicamente, a atividade da criança permanece,
nos seus traços principais a mesma que antes” (p.306). Portanto, família e escola têm uma relação de
responsabilidade que interagem. São responsabilidades distintas, mas essenciais para a formação
integra do futuro adulto.
Retomando Erasmo, vemos que algumas questões educacionais, trabalhadas no livro De Pueris,
transcorreram séculos e, provavelmente, continuarão sendo motivos de grandes debates. Tratar
sobre a base educacional da criança e apresentar a família como o alicerce para o início da sua
formação humana, é uma forma de compreender as relações inter-relacionadas entre o privado e o
social, visto que, a falta da educação moral/ética e do desenvolvimento do conhecimento culminam
nas relações econômicas, políticas, religiosas e outras, “Diriam, então, que os filhos de príncipes
estão fora das regras do jogo. Ora essa! Que ouço eu!? Por ventura cada um não tem o próprio filho
em conta de coisa tão preciosa tal como nascido de rei? (cap.03, p.20), o autor continua sua análise
asseverando que a educação é para ricos e para pobres [...] para os apaziguados pela fortuna a
filosofia também é uma ajuda valiosa na administração dos próprios bens” (cap. 03, p.20).
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 124
Referências
BLOCH, Marc. Introdução à História. Coleção saber. Publicações Europa-América, 1967.
EIXO
HISTORIOGRAFIA,
FONTES E
INSTITUIÇÕES DE
GUARDA
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este trabalho tem como objetivo apresentar e analisar, descrevendo sua estrutura, partes
e conteúdo, a documentação produzida pela Comissão Especial de Inquérito (CEI) instaurada
na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo em 11 de outubro de 1968, para apurar “as
responsabilidades do conflito” ocorrido entre os estudantes da Universidade Presbiteriana
Mackenzie e da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, conhecido
como “Batalha da Maria Antônia”. Pretende mostrar, especialmente, o caráter da documentação
e as possibilidades de seu estudo para a história do movimento estudantil, em geral, e a atuação
do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), em particular. O conflito ocorreu nos dias 2 e 3 de
outubro de 1968, na rua Maria Antônia, no centro da cidade de São Paulo/SP, rua que separava
as duas instituições de ensino. O inquérito produzido pela CEI possui 392 (trezentas e noventa e
duas) páginas e está encadernado em um volume único, arquivado junto ao Acervo Histórico da
Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo e registrado sob o nº. 7955/68.
Para esta pesquisa, documento é “todo texto escrito, manuscrito ou impresso, registrado em
papel” (CELLARD, 2008, p. 297). Além disso, pensa-se o documento como uma construção, “produto
da sociedade que o fabricou segundo suas relações de forças que aí detinham poder” (LE GOFF,
2003. p. 536). Enquanto construção, é fundamental que se entenda a sua forma de constituição e seu
contexto (CELLARD, 2008, p. 299), especialmente a conjuntura política e social em que foi produzido,
destacando-se que se trata de documento produzido por deputados, dentro de uma Assembleia
Legislativa, durante a Ditadura Civil-Militar brasileira (1964-1985). Além disso, é necessário captar
as práticas dos autores envolvidos, tanto no que se refere aos participantes da Comissão Especial
de Inquérito, parlamentares e depoentes, quanto aos destinatários daquele documento, bem como
sua autenticidade, natureza e sua “lógica interna” (CELLARD, 2008, p. 302). Quanto à relevância de
se analisar a estrutura das fontes, parte-se dos pressupostos de Bloch, para quem os documentos,
“mesmo os aparentemente mais claros e mais complacentes, não falam senão quando sabemos
interrogá-los” (BLOCH, 2001, p. 79).
Em 1968, a conjuntura nacional era de uma mobilização estudantil crescente e os ânimos se
acirravam entre movimento estudantil e regime militar, com uma crescente tensão e uma escalada
repressiva que culminou com o Ato Institucional nº 5, editado em 13 de dezembro de 1968, durante
o governo do general Artur da Costa e Silva. O conflito da Maria Antônia mereceu atenção de
parlamentares da Assembleia Legislativa de São Paulo. Por um lado, viu-se a violência no conflito e o
seu desfecho, com a morte de um estudante; por outro, a atuação do Comando de Caça aos Comunistas
(CCC), cujos membros eram, em grande medida, alunos da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Conforme depoimentos, o conflito se iniciou por conta de um pedágio que os alunos da Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras realizavam para angariar fundos para participarem de um Congresso
da União Nacional dos Estudantes (UNE), o que gerou um ataque por parte de alguns estudantes da
Universidade oponente. A partir daí, foram dois dias de intensa luta entre os estudantes, com uso
de bombas e armas. O então Deputado Fernando Perrone, parlamentar extremamente combativo,
denuncia, em uma fala na Assembleia Legislativa, uma posição, por parte do governo paulista,
que ia além da omissão, citando o apoio da polícia aos estudantes da Universidade Presbiteriana
Mackenzie. No dia seguinte ao término do conflito, foi pedida, por meio do Requerimento nº 962 de
1968, a instauração da Comissão Especial de Inquérito, tendo sido aprovada em 11 de outubro, por
meio do Ato nº 32 de 1968, pelo então presidente da Assembleia Legislativa, o sr. Deputado Nelson
Pereira. Neste ato, foram designados para compor a CEI, os Srs. Deputados Waldir Helu, Domingos
Aldrovandi, Antônio Leite Carvalhaes, Salvador Julianelli, Agnaldo de Carvalho Júnior, Valério Giuli,
Fernando Perrone e Raul Schwinden. Seguiu-se daí os atos de convocação para eleição da Presidência
e Vice-Presidência da CEI; depois a juntada de documentos, requerimentos e convocações, com o
objetivo de viabilizar uma visita da CEI ao local do conflito. Houve a designação de um fotógrafo
para acompanhar a Comissão Especial de Inquérito, portanto, há uma série de fotografias dos
locais em que o conflito ocorreu, evidenciando a extensão dos danos provocados e a violência
que foi empreendida pelos estudantes e por agentes do Estado. Vestígios apontam para pichações
mencionando grupos como o Comando de Caça aos Comunistas (CCC), que é mencionado na fala
de alguns parlamentares e do estudante que foi ouvido em depoimento. A documentação produzida
pela CEI mostra a ausência de solicitação ou de realização de perícia no local, a fim de se produzir
outras provas que pudessem elucidar a demanda. A maior parte do inquérito refere-se ao registro
das reuniões realizadas pela Comissão Especial de Inquérito, que contou com o depoimento de um
aluno e professores de ambas as universidades envolvidas, em que se discutem as motivações do
conflito, histórico das animosidades entre os estudantes e a participação de diversos agentes no
ocorrido. Destaca-se o depoimento da então Reitora da Universidade Presbiteriana Mackenzie, a Sra.
Esther de Figueiredo Ferraz, pelo longo e detalhado testemunho que presta a respeito do ocorrido e
o depoimento do estudante Lauro Pacheco Ferraz, aluno da mesma instituição e único estudante a
depor, como convidado de um dos parlamentares. Destaca-se este depoimento especialmente por
conta das interrupções sofridas, por parte do Presidente da Comissão Especial de Inquérito e da
menção aos estudantes que faziam parte do Comando de Caça aos Comunistas (CCC).
Nos depoimentos, discute-se questões tais como a existência dos excedentes e o auxílio aos
parlamentares para destinação de verbas para a construção da Cidade Universitária e o pagamento
de mensalidades no ensino superior público. Há também registros de conflitos entre parlamentares,
por conta, na maioria das vezes, de perguntas e falas realizadas pelos deputados durante as reuniões
da CEI, mostrando as disputas de narrativas políticas quanto às ocorrências na rua Maria Antônia.
Na documentação, uma série de marcas a canetas, aparentemente decorrentes da correção pelos
taquígrafos no momento do registro, não tendo havido tempo hábil para a emissão dos documentos
finais. Evidencia-se, ainda, que a CEI não foi finalizada, tendo a última reunião sido realizada pela
Comissão Especial de Inquérito em 5 de dezembro de 1968, não constando na documentação seu
encerramento o que, supõe-se, pelas informações obtidas junto ao Acervo Histórico da Assembleia
Legislativa, teria ocorrido por conta do clima repressivo no país, já que se estava às vésperas da
decretação do Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro de 1968, o que acarretou, em janeiro de
1969, o fechamento da Assembleia Legislativa e a cassação de 24 (vinte e quatro) parlamentares,
dentro eles, o Sr. Deputado Raul Schwinden, então Vice-Presidente da CEI e o Sr. Deputado Fernando
Perrone. Destaca-se, por fim, que a Comissão Especial de Inquérito foi o único movimento estatal
destinado a investigar, ainda que sem valor penal algum, um conflito bastante violento entre
estudantes, envolvendo morte e destruição de patrimônio público.
Referências
BLOCH, M. Apologia da história ou o ofício do historiador. Tradução de André Telles. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2001.
CELLARD, A. A análise documental. In: POUPART, J. et al. (Orgs.). A pesquisa qualitativa: enfoques
epistemológicos e metodológicos. Tradução de Ana Cristina Nasser. Petrópolis: Vozes, 2008. p.
295-315.
LE GOFF, J. História e memória. Tradução de Bernardo Leitão... [et al.]. 5° ed. Campinas, SP: Editora
da UNICAMP, 2003.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 128
Fonte
SÃO PAULO (Estado). Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Comissão Especial de
Inquérito para apurar as responsabilidades do conflito havido entre os alunos da Faculdade de
Filosofia Ciências e Letras da Universidade de São Paulo e os alunos da Universidade Mackenzie,
nos dias 2 e 3-10-68. Registro Geral nº. 7955/68. Raul Schwinden e outros. São Paulo, SP: Assembleia
Legislativa do Estado de São Paulo, 1968. 392 p.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Inserida no domínio da História Intelectual, esta pesquisa teve como objetivo realizar o
mapeamento da escrita sobre a temática educacional produzida pela elite cultural potiguar e
publicada na Revista Pedagogium da Associação de Professores do Rio Grande do Norte no período
de 1921 a 1927. O recorte temporal estudado no trabalho, situado nas primeiras décadas do século
XX, é compreendido como um momento de inovações e construção dos valores nacionais atrelados
ao surgimento e consolidação do novo regime, a República. Assim, neste trabalho buscamos
identificar os principais intelectuais que escreveram artigos publicados na Revista da Associação,
bem como assinalar a sua participação na elaboração do impresso pedagógico, situando estes
sujeitos no contexto da sociedade potiguar. Desse modo, buscamos responder os seguintes
questionamentos em nosso estudo: quem eram os sujeitos que escreviam sobre a educação potiguar
na Revista da Associação de Professores? e o que eles escreviam sobre a temática em seu impresso
pedagógico? Nosso aporte teórico é composto, sobretudo, pelas contribuições dos historiadores
franceses Jean-François Sirinelli (1998, 2003), que apresenta os conceitos de intelectuais, elite
cultural e sociabilidade; Roger Chartier (1996, 2009), a partir de sua compreensão acerca da prática,
representação, circulação e apropriação; e Michel de Certeau (1982), que nos auxilia a compreender
a tríade formada pelo lugar de fala, a prática e a escrita dos intelectuais. Colabora também para a
realização da pesquisa o conceito de instituição, abordado sob a perspectiva do historiador da
educação Justino Magalhães. Na Primeira República, identificamos no Rio Grande do Norte, a criação
de instituições científicas e culturais, entre as quais destacamos o Instituto Histórico e Geográfico do
Rio Grande do Norte, fundado em 1902, a Liga de Ensino, fundada em 1911 e a própria Associação de
Professores, fundada em 4 de dezembro de 1920, sob o título de Associação de Professores do Rio
Grande do Norte. A data da fundação corresponde às comemorações pelo aniversário de dez anos
da primeira turma de docentes formada pela Escola Normal de Natal. Seu principal intuito era
fortalecer o movimento de profissionalização da educação, bem como fundar escolas públicas e
leigas por todo o estado a fim de reduzir as elevadas taxas de analfabetismo. Para a sua criação, a
Associação de Professores contou com o apoio das principais autoridades políticas e educacionais
potiguares. Entre as quais destacamos, o governador do Estado Antônio José de Melo e Souza, o
Diretor Geral de Instrução Pública Manoel Gomes de Medeiros Dantas e o Diretor da Escola Normal
de Natal Nestor dos Santos Lima. Além destes, estavam presentes na cerimônia de fundação da
Associação, realizada no salão nobre do Palácio do Governo, Severino Bezerra, Chiquita Câmara,
Ecila Cortez e Luciano Garcia, Luís Antônio, Amphilóquio Câmara, Luís Soares e Ivo Filho, entre
outros (PEDAGOGIUM, 1921). A primeira direção da instituição foi formada por Amphilóquio Carlos
Soares da Câmara como presidente; Francisco Gonzaga Galvão, como vice; Julia Alves Barbosa,
primeira secretária; Oscar Wanderley, segundo secretário e Stella Ferreira Gonçalves como adjunta;
Luiz Soares d´Araújo como orador e Djanira Leite, vice-oradora; Francisco Ivo Cavalcanti como
tesoureiro e Luis Antônio dos Santos Lima como seu adjunto; Braz Caldas como bibliotecário e Anna
da Silva Araújo, adjunta. Desde a sua criação, a Associação tinha como objetivo a publicação de um
impresso pedagógico que pudesse contribuir com a formação e defesa do magistério público e
privado atuante tanto na capital, quando no interior do Estado. Com esse intuito, foi publicado o
primeiro número da Revista intitulada Pedagogium no ano de 1921, sob a direção de Nestor dos
Santos Lima. De acordo com Ribeiro (2003), a Revista foi publicada até o ano de 1953, passando por
três fases distintas, com períodos de interrupção. Quanto as temáticas, ressaltamos que estas
versavam principalmente sobre aspectos formativos, com o objetivo de fornecer ensinamentos
práticos sobre conteúdos dos programas disciplinares. É possível encontrar na Revista também
reflexões sobre a História da Educação Potiguar, sobre experiências educacionais de outros Estados
e Países, seções de caráter informativo relativas as ações administrativas e textos sobre a organização
do ensino potiguar, entre outras temáticas. O corpus documental do estudo é formado assim pelas
publicações da Revista Pedagogium que tivemos acesso e que correspondem ao período de 1921 a
1927. Foram analisadas o total de vinte revistas que estão disponíveis no Repositório de História e
Memória da Educação (RHISME/UFRN). Consideramos as fontes como construções históricas e
sociais, perpassadas por interesses e relações de poder, uma vez que nos pautamos em Le Goff
(1990, p. 545) que, ao considerar o documento enquanto monumento, considera que “o documento
não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é um produto da sociedade que o fabricou
segundo as relações de forças que aí detinham o poder”. Assim, essa concepção revela que as
publicações da Revista Pedagogium não se realizam de forma neutra, mas sim como resultado de
escolhas e interesses daqueles que a produziram. Destacamos que a Pedagogium se revela como um
lócus privilegiado para analisarmos a circulação de ideias educacionais do período e igualmente se
apresenta como um espaço de sociabilidade. Nesse sentido, enfatizamos a criação de uma rede de
sociabilidades em torno da instituição e das questões educacionais do estado. A Pedagogium
enquanto espaço de sociabilidades, possibilitava aos intelectuais apresentar seus pensamentos e
fazer circular suas ideias e aquelas em que acreditavam. Como integrantes dessa elite cultural
vinculada a Revista a Associação, encontramos, entre outros nomes, sujeitos como Nestor dos
Santos Lima, seu irmão Luiz Antônio dos Santos Lima, Manoel Gomes de Medeiros Dantas,
Amphilóquio Câmara e Luiz Correia Soares de Araújo. Estes intelectuais potiguares são compreendidos
como membros de uma elite criadora e mediadora cultural conforme apreendemos com SIRINELLI
(1998). Faziam parte de um grupo pequeno e coeso que apresentava semelhanças em suas trajetórias
intelectuais e, sobretudo, em suas concepções ideológicas. Em sua maioria, formados em Direito ou
Medicina no Recife, ocupavam cargos de destaque na política e na sociedade norte-rio-grandense,
desde professores e gestores escolares a políticos. Em geral, eram atuantes nas decisões públicas,
escreviam, pensavam, defendiam e aplicavam modelos de educação. Transitavam em mais de uma
instituição científica, fazendo com que seus discursos também circulassem entre os membros desses
grupos, na esfera política e entre a população letrada do estado. Nessa perspectiva, constatamos
que a rede de sociabilidades construída por estes intelectuais, possibilitou e fomentou a criação e a
circulação de um discurso sobre a educação no Rio Grande do Norte da Primeira República que
orientou as ações políticas e administrativas no campo educacional potiguar. Esse discurso
influenciava na elaboração das legislações específicas com a criação de modalidades de ensino,
com leis, decretos e regimentos escolares. Além disto, a análise das escritas reproduzidas nas páginas
da revista da Associação de Professores nos possibilita uma compreensão acerca do passado
educacional do nosso estado. Permite-nos também perceber as relações entre aquilo que era escrito,
a vida, os posicionamentos políticos dos intelectuais e os cargos por eles ocupados, percebendo que
o passado como criação imagético-discursiva perpassa as palavras, mas também as vivências e
subjetividades de cada sujeito estudado. Assim, a construção da rede de sociabilidades e do discurso
educacional não se dá de maneira naturalizada, mas sim orientada por questões filosóficas, políticas
e econômicas. Através dos artigos publicados na Pedagogium, identificamos também o alinhamento
ideológico entre as ações governamentais do estado com relação à educação e a nova política
republicana, com relação ao trabalho, ao civismo, a moral, a higiene e a patriotismo, assim como
informações sobre o número de instituições escolares do estado, de profissionais da educação, de
analfabetos e as tendências pedagógicas que circulavam no Rio Grande do Norte. Por fim, ressaltamos
que a realização deste trabalho contribui para o fomento do campo da História da Educação Potiguar,
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 131
pelo conhecimento produzido acerca do nosso passado educacional e das articulações entre ideias
pedagógicas, modelos de educação e a elite cultural atuante nas primeiras décadas do século XX.
Referências
CERTEAU, M. A Escrita da História. Tradução de Maria de Lourdes Menezes. Rio de Janeiro, Forense
Universitária, 1982.
CHARTIER, R A história cultural entre práticas e representações. Tradução de Maria Manuela Galhardo.
Rio de Janeiro, Lisboa Difel 1990.
SIRINELLI, Jean-François. As elites culturais. In: RIOUX, Jean Pierre; SIRINELLI, Jean-François. Para
uma história cultural. Lisboa: Editorial Estampa. p.259-279. 1998.
SIRINELLI, J F Os intelectuais. In: REMOND, R. (Org.) Por uma história política. Rio de Janeiro Fundação
Getúlio Vargas, 2003 p 231 269.
ISSN 2358-3959
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educativa da cidade de Cuiabá, no sentido de percebê-la enquanto espaço cultural e educativo foi
necessário o referencial de autores que tratam sobre a temática, tais como: Pesavento (2008, 2007,
2004, 1999, 1995), Cedro (2009), Miranda e Siman (2013) e Medeiros Neta (2011). Também, foram
utilizados como fontes documentais, os relatórios do interventor Júlio Müller ao Presidente da
República, periódicos, fotografias e obras memorialistas em busca documental realizada no Arquivo
Público do Estado de Mato Grosso, no Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional e
na Casa Barão de Melgaço. As leituras do referencial que deu suporte à pesquisa permitiram perceber
que a produção acadêmica relativa aos estudos da cidade é bastante abrangente, devido à sua
natureza interdisciplinar. Segundo Barros (2012), nos períodos anteriores, por não haver métodos
apropriados fundamentados em teorias capazes de explicar a cidade e o fenômeno urbano em todas
as suas dimensões possíveis, que lhes garantissem uma sistematização investigativa, representava
uma desmotivação para transformar a cidade em um campo específico do saber, preocupado em
entender a especificidade do viver urbano. O século XX se caracterizou pelo “século da urbanização”,
quando se verifica que a maior parte da população mundial passou a habitar nos centros urbanos,
devido, entre muitos fatores, ao deslocamento dos sujeitos que se dedicavam às atividades agrícolas
para a cidade, até então um ambiente exótico, que passa a ser percebido como um lugar atrativo, de
novas possibilidades. Este fato contribuiu para que, então, nesse século, se tenha assistido a uma
grande eclosão de interesses na diversidade dos campos do saber em estudar este desafiador
enigma e esta vasta trama de complexidade que é a cidade. O mosaico que compõe o espaço urbano
está impregnado de subjetividades de diferentes tempos. Torna-se possível a visibilidade dessas
subjetividades quando, ao observar a cidade, percebe-se que elas se revelam no significado de suas
ruas, avenidas, na arquitetura de suas edificações e de seus monumentos, no conjunto de uma
paisagem exclusiva, personalizada por sua história. É a partir da modernidade que a cidade se torna
o grande cenário dos acontecimentos, despertando o interesse, enquanto objeto de estudo, das
várias áreas do conhecimento. A cidade não se reduz apenas em um local de aglomeração e de
produção, portanto, seus estudos não se limitam a meros processos econômicos e sociais, consiste
também, e acima de tudo, em considerá-la, nela mesma, um problema e um objeto de reflexão,
tendo como perspectiva as representações que se constroem nela e sobre ela, o que implica em
“resgatar discursos e imagens de representação da cidade sobre espaços, atores e práticas sociais”
(PESAVENTO, 2008, p. 78). Para compreender a dimensão educativa da cidade adotou-se a perspectiva
da Nova História Cultural (NHC). Para o historiador Roger Chartier (2002, p. 16), “A história cultural
tem por principal objecto identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma
determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler”. Nesse sentido, a NHC não se
constitui em uma História do Pensamento ou Intelectual, e nem tem como objetivo o estudo de
ideias e nomes mais expressivos, mas sim, uma nova forma da História interpretar a cultura. Portanto,
a cultura considerada ao olhar do historiador não se limita apenas à compreensão da realidade a
partir do olhar da elite intelectual. Abrange também os demais grupos sociais, anteriormente
ignorados, em suas diversas formas de expressão. Nesse sentido, “[...] a tarefa do historiador seria
captar a pluralidade dos sentidos e resgatar a construção de significados que preside o que se
chamaria ‘a representação do mundo’. Mais do que isto, tomamos por pressuposto que a história é,
ela própria, representação de algo que teria ocorrido um dia”. (PESAVENTO, 1995, p. 280). Como
resultado das análises foi possível perceber que Mato Grosso, o projeto de modernização das cidades
brasileiras e a inclusão de Cuiabá à onda desenvolvimentista encampada pelo Estado seria necessário
a formação de um novo perfil de cidadão: educado, trabalhador, ordeiro, saudável, católico, amante
da pátria e da família. Ao forjar a construção do Brasil novo, era necessário, também, reconfigurar
sua gente interiorana para tornar produtivos os “espaços vazios”. O regime do Estado Novo lançou
mão de todos os recursos que pudesse ter papel efetivo a esse fim. A escola, os meios de comunicação,
as artes e, também, a racionalização dos espaços urbanos enquanto estratégia para a reeducação da
população. A administração pública por meio da interventoria de Júlio Müller associou esforços da
esfera estadual e federal para dinamizar esse processo em Cuiabá, pressupondo a condução da
população aos princípios nacionalistas do Estado Novo, assim como a substituição de velhos hábitos
por comportamentos considerados civilizados e modernos. A modernização dos equipamentos da
imprensa oficial, a inauguração da rádio A Voz do Oeste e o do cinema, garantiria a difusão dos
princípios ideológicos da política estodonovista assim como também, disciplinaria a população às
novas práticas culturais e a novos hábitos de higiene e saúde. A construção do Colégio Estadual tinha
como intenção à inclusão de Cuiabá à política nacional de educação e a equiparação a um modelo
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 134
de escola já praticado nos centros urbanos brasileiros. Pode-se considerar, então, que o projeto de
modernização da cidade de Cuiabá, elaborado a partir dos princípios do urbanismo moderno, foi
acompanhado de intenções educativas disciplinadoras, destinadas à formação de uma nova cultura
que orientasse para hábitos e costumes que deveriam ser assimilados pela população citadina e que
expressassem o sentido de desenvolvimento daquela administração pública enquanto expressão de
progresso.
Referências
MEDEIROS NETA, O. M. de. Cidade, sociabilidade e educabilidade: Príncipe, Rio Grande do Norte.
Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2011.
A década de 1940 trouxe uma efervescência educacional e política na esteira do Estado Novo
(1937 – 1945). A atuação do Ministério da Educação e Saúde Pública durante a gestão do Ministro
Gustavo Capanema (1934 – 1945) trouxe à educação, um protagonismo vivenciado através de seus
projetos que buscavam alinhar a sociedade brasileira às concepções político-ideológicas do novo
estado brasileiro pretendido pelo regime de Getúlio Vargas. Como relevância na formação do cidadão
que deveria compor o novo estado brasileiro, as atenções do ministério Capanema voltaram-se para
o ensino secundário, nível no qual, seriam formadas as elites dirigentes da sociedade. Sendo assim,
uma série de ações foram firmadas no sentido de compor uma educação que respondesse aos ideais
do Estado Novo.
O trabalho aqui proposto tem como objetivo a análise de duas dessas ações, a Universidade do Ar
e a Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD). A primeira, tratou-se de um programa radiofônico,
transmitido pela Rádio Nacional (1941 – 1944), com objetivo de levar formação pedagógica adequada
aos professores atuantes no ensino secundário de todo o país. Esta foi a primeira iniciativa de
formação de professores não presencial que se tem registro no Brasil. A Universidade do Ar teve
como objetivo, oferecer ao docente secundarista a formação adequada para sua atuação, com
conteúdo metodológico e certificado concedido ao professor que cumprisse o trabalho final de cada
disciplina cursada. A certificação era equivalente ao diploma oferecido pela Faculdade Nacional
de Filosofia, instituição de formação docente em nível superior, exigida pela reforma do ensino
secundário promovida por Capanema em 1942.
A segunda ação a que nos debruçamos nesse artigo é a Comissão Nacional do Livro Didático –
criada pelo decreto nº1.006 de 30 de dezembro de 1938 e institucionalizada em 1940, permanecendo
até a década de 1960. A comissão teve como função principal, a avaliação dos livros didáticos para
serem adotados nas escolas de todo o país. Através de apreciações, seus membros emitiam pareceres
favoráveis ou contra, levando em conta o momento político, as adequações com a concepção de
formação do cidadão para o novo Brasil. A escolha dos profissionais para integrarem a comissão foi
feita pelo próprio ministro Capanema, levando em conta alguns critérios como: a disponibilidade dos
profissionais e as instituições em que atuavam, o que demonstra a intenção do ministro Capanema
em compor a comissão com pessoas comprometidas como o ideal educacional em voga.
O recorte temporal de nosso estudo (1941 e 1944) leva em conta o período de transmissão do
programa Universidade do Ar, uma vez que a Comissão Nacional do Livro Didático deu continuidade
aos seus trabalhos até o ano de 1969. Atentamos para o fato de que a inauguração do programa
radiofônico se deu um ano antes da implementação da lei orgânica do ensino secundário. Essa
reforma proposta por Capanema em 1942 consolidava o que já havia sido posto em 1931, na reforma
Francisco Campos, a formação em nível superior para os professores secundaristas. Nesse sentido,
a instauração da Universidade do Ar pelo Ministério da Educação vem confirmar a intenção de
preparação profissional docente, nas perspectivas da concepção de educação do regime. Na esteira
da educação secundária como espaço de formação das novas elites dirigentes sociais, foi preciso que
o material didático de uso nesse contexto, apresentasse afinidades com os preceitos educacionais
estonovistas. Assim, entra em funcionamento a CNLD, em 1940, tornando a primeira metade dessa
década, o período de mobilização do Ministério da Educação em torno do ensino secundário.
A análise dos dados aqui investigados, parte dos jornais publicados à época. Periódicos como os
jornais A Batalha, A Noite e a revista A Ordem nos permitem observar a composição da Universidade
do Ar, bem como da Comissão Nacional do Livro Didático. Além disso, as fontes tratadas nesse
artigo, nos colocam diante de artigos publicados por professores envolvidos nos dois projetos,
trazendo-nos as representações e apropriações que esses sujeitos fizeram do designo a eles dado,
na responsabilidade de contribuírem para a formação secundarista na concepção do Estado Novo.
Desse modo, as redes estabelecidas entre eles tornaram-se essenciais para a percepção dos espaços
ocupados por esses educadores no Ministério da Educação.
Como base exploratória de nossa pesquisa, nos auxilia na compreensão do papel intelectual
vivenciado no Brasil até o Estado Novo, a visão de Velloso (2012). Já na análise dos textos publicados
nos periódicos – notícias e artigo – tomamos como referência as concepções de apropriações
e representações, definidas por Chartier (1988). Como relação às redes estabelecidas entre os
professores atuantes na Universidade do Ar identificados também como integrantes da Comissão
Nacional do Livro Didático, orientamo-nos pelas redes de sociabilidades propostas por Sirinelli
(2003).
Partindo do que nos afirma Velloso (2012, p.150), a percepção do intelectual que se tinha até
o Estado Novo, era do intelectual na “torre de marfim”. Nesse contexto, esses atores sociais não
assumiam, em muitos casos, um lugar crítico dos conflitos e debates presentes na sociedade. “A
metáfora da “torre de marfim” é incessantemente reproduzida como símbolo da alienação política
em que viviam as nossas elites culturais”. No entanto, segundo a autora, o novo regime convidou
intelectuais à “arena política” - através do posicionamento desses sujeitos nos ministérios,
principalmente no Ministério de Educação e Saúde Pública. Desse modo, esses sujeitos foram
convocados a assumirem posições, ocuparem espaços que viabilizassem a profusão dos ideais do
Estado Novo.
Para análise dos textos publicados nos periódicos que nos servem as fontes, tomamos como
base Chartier (1988, p. 26), ao elucidar que “a apropriação tem por objetivo uma história social das
interpretações, remetidas para as suas determinações fundamentais (que são sociais, institucionais,
culturais) e inscritas nas práticas específicas que as produzem”. A partir das matérias publicadas
nos periódicos, buscamos, então, identificar as apropriações feitas pelos sujeitos escolhidos para
ocuparem a Universidade do Ar e a CNLD, os discursos desses professores nos levam a perceber as
representações que esses fizeram dos projetos perante a sociedade.
A respeito das redes de sociabilidades, as fontes nos ajudam a remontar o elenco de professores
atuantes em ambos projetos. Nesse sentido, Sirinelli (2003, p. 248) aponta para o fato de que, “Todo
grupo de intelectuais organiza-se também em torno de uma sensibilidade ideológica ou cultural
comum e de afinidades mais difusas, mas igualmente determinantes, que fundam uma vontade e
um gosto de conviver. São estruturas de sociabilidade difíceis de apreender, mas que o historiador
não pode ignorar, subestimar”. Diante dessa afirmação, os professores atuantes nos projetos do
Ministério da Educação de uma forma geral, aparecem de forma recorrente. Aqui, em nossa análise, os
sujeitos envolvidos na Universidade do Ar são também identificados, em grande parte, na Comissão
Nacional do livro Didático, o que nos remete à “sensibilidade ideológica ou cultural comum e de
afinidades”, proposta por Sirinelli (2003). Essas “sensibilidades” uniriam sujeitos em torno de um
objetivo, ainda que suas afinidades fossem difusas, ou seja, mesmo que fosse por posicionamentos
distintos, pensar em favor de uma causa, uniu esses homens de pensamento.
Com base na análise das fontes, os resultados alcançados dão conta de uma percepção em
relação aos projetos aqui analisados como parte integrante de ações que colocaram a formação no
ensino secundário como um espaço de difusão dos ideias pretendidos pelo Estado Novo. A pesquisa
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 137
sobre as relações dos professores da Universidade do Ar nos levou à análise de suas redes de
sociabilidades. Como uma agulha a tecer os fios, observamos que em meio aos projetos do Ministério
da Educação, a Comissão Nacional do Livro didático representou um lugar de encontro entre vários
professores atuantes também na Universidade do Ar. Explorando os trabalhos desenvolvidos
por esses professores na CNLD, observamos que esses educadores partilhavam de pensamentos
consoantes. Esse movimento nos levou a perceber que o ministro Capanema contava com uma rede
de profissionais, intelectuais, os quais influenciavam de forma direta o ensino e as concepções de
educação no país.
Referências
CHARTIER, Roger. A História Cultural. Entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1988
LEYENDECKER, Niely Natalino de Freitas. Universidade do Ar: nas ondas do rádio se formam os
professores secundaristas do Brasil (1941 – 1944). Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade
do Estado do Rio de Janeiro, Faculdade de Formação de Professores, 2019.
SIRINELLI, Jean- François. Os Intelectuais. In: REMOND, René. Por uma História Política. Rio de
Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 2003.
O Arraial de Barretos, no noroeste do Estado de São Paulo, começou com a chegada de duas
famílias migrantes, provenientes de Minas Gerais, os Barreto e os Marques, em torno de 1830. O
Arraial se constituía num aglomerado de palhoças, cobertas de sapé ou de capim, ao redor da
fazenda Fortaleza. A data oficial de início é 25 de agosto de 1854, dia da doação de terras à Capela
do Divino Espírito Santo de Barretos, pela família dos Barreto, sob a jurisdição do município paulista
de Jaboticabal. No dia 16 de abril de 1874, esta capela foi elevada à condição de freguesia (Rocha,
1954). Isto permitiu a Barretos participar de eleições para vereador, e não depender da freguesia de
Jaboticabal. Em 1877, chegava o primeiro padre para cuidar da paróquia, o italiano Henrique Sassi,
que abriu um livro de casamentos, um de óbitos e um de batizados (Menezes, 1985). Os imigrantes
italianos chegaram a Barretos a partir de 1885, vindo diretamente da Itália ou de Ribeirão Preto,
onde residiram, temporariamente, trabalhando na lavoura de café. Mas, somente em 1895, ocorreu
a grande imigração italiana para Barretos, em sua maioria proveniente do Vêneto. Na bibliografia
aparece certo desprezo referente à população do incipiente arraial, como de despreparada, “tudo
na base do faz de conta”, composta por indígenas e caboclos, além de alusão ao negro escravizado
e aos livres. O memorialista barretense, Ruy Menezes, descreveu a “paisagem humana de Barretos”
do fim do século XIX e início do XX como de “uma caboclada dominante de cor morena, pálida,
olhos oblíquos, lembrando suas origens indígenas, miúda, de barbinha rala e nem sempre bem
vestida” e “o que existia ainda era incipiente, tudo na base do faz de conta. Pois, foi quando se deu
no Brasil a imigração italiana” (Menezes, 1985). Houve um aumento populacional nesta região,
composta pelos municípios cafeeiros de Ribeirão Preto, Franca e São José do Rio Preto, São Carlos,
Bebedouro e Araraquara (Faleiros, 2007): “a imigração italiana ganha dimensões consideráveis até
transformar-se em fenômeno de massa entre 1887 e 1902, contribuindo, de modo decisivo, para o
aumento demográfico do país” (Trento, 1989). O grande número de italianos que imigraram para
Barretos, em um curto período, é significativo. Rotellini (1906, p. 720 e 755), na obra II Brasile e gli
Italiani, publicado em 1906, atesta que Barretos contava com 5.884 habitantes. Deste total, 2.000
eram italianos. No mesmo ano da grande imigração para Barretos, os italianos criaram, no dia 22
de junho de 1895, a Società Italiana di Mutuo Soccorso Unione e Fratellanza, que foi importante
para o município (Menezes, 1985). Esta Società tinha por finalidade, conforme o artigo 2º de seu
estatuto, “o mutuo soccorro e a instrução, com o fim de conseguir para si, a moralidade e para os
socios que a compoem o maior desenvolvimento possível do bem-estar moral e material, oferecendo
divertimentos lícitos aos sócios e famílias juntando assim o util ao agradavel”. O primeiro professor
de Barretos foi o português Antônio Alexandre Ferreira. Nesses primeiros tempos, constatou-se a
presença de uma escola, no ano de 1868, identificada graças a um registro em Ata da Câmara Municipal
de Jaboticabal, porque o Arraial de Barretos pertencia à Freguesia de Jaboticabal (Freitas, 1978;
Capalbo, 1978). Conforme a bibliografia, o primeiro professor primário de Barretos foi o português
Antonio Alexandre Ferreira. Depois lecionaram as primeiras letras no arraial Narciso José de Lima,
Francisco Sales, João Crisóstomo de Souza, Antônio Fernandes Pinheiro, Pinto Machado, Eliseu
Guardanapo Papudo. Mais tarde abriram escolas o Chico Boticário, o Chico Manteiga, o Candinho
Mestre (Candido Caetano Ferreira de Souza), o Escobar, o Sales, Eliseu e Bonifácio, José Carlos, filho
de José Rufino Messias (Rocha, 1954). Antes dessa escola houve outras, a do Salese (italiano), a do
Antônio Pinheiro (Rocha, 1954). Os professores eram persistentes e, mesmo assim, não conseguiam
atender a toda a população, que muitas vezes sequer queria estudar: “a população compunha-se
em sua quase totalidade, de analfabetos ou semianalfabetos nas escolas locais” (Rocha, 1954).
No dia 24 de março de 1885, o senhor Moraes Barros apresentou a Emenda nº 22, na 24ª Sessão
Ordinária da Assembleia Provincial, solicitando a criação de “duas escolas primárias, uma do sexo
masculino, outra do sexo feminino na nova Villa de Barretos” e Anna Candida de Brito foi nomeada a
primeira professora pública para reger a cadeira da Vila de Barretos. Ela foi admitida pela Inspetoria
Pública Geral aos exames de concurso das cadeiras de primeiras letras, no dia 7 de março de 1885
(Jornal Correio Paulistano - 26/09/1885). Por volta do ano de 1903, foi fundado o Colégio Lacerda,
pelo capitão Ernesto Lacerda, destinado à instrução primária e secundária, somente para meninos,
nas modalidades de externato e internato, com ensino da língua italiana. Antes de quaisquer outras
construções, a Colônia Italiana se preocupou em ter um espaço na imprensa, uma escola e construir
uma sede. Desde o início, os italianos organizaram a construção de uma escola, na zona urbana
de Barretos, que era mantida pela Societá Italiana di Mutuo Soccorso Unione e Fratellanza. Assim
mantiveram a língua, o ensino da escrita, a alfabetização na língua materna, a definição de uma
bandeira, de um hino e de diplomas e o sentimento de pertencimento, de compartilhamento de
costumes e cultura, formando uma identidade italiana em terras barretenses. As associações de
socorro mútuo foram instituídas na maioria dos antigos núcleos coloniais paulistas, e também criaram
escolas elementares que funcionavam em suas sedes. A maior parte dessas escolas era privada, com
frequência somente masculina e ensinavam os conteúdos em língua italiana (Mimesse, 2015). O ano
de 1904 marca o desenvolvimento da escola italiana em Barretos, com o trabalho pedagógico do
italiano Enrico Spaletra, como professor titular. A abertura desta escola fora necessidade de educar,
formalmente, os italianos e estava conforme determinava o artigo 2º de seus Estatutos: “a Sociedade
tem por fim [...] a instrução [...]”. Esta escola atendia as crianças italianas de ambos os sexos. Em
1906, já contava com 32 crianças matriculadas (Rotellini 1906). O artigo tem como fonte bibliográfica
as pesquisas publicadas em livros e em jornais barretenses, objetivando apresentar a imigração
italiana e a história da educação no município de Barretos, entre os anos de 1900 e 1909. A História
Cultural é o referencial deste artigo, nos seus campos história da educação e história da imigração
italiana, sob a metodologia da análise documental histórica.
Referências
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ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Para compreendermos o nosso tempo precisamos estudar o passado, pois nossa constituição
identitária passa pela compreensão do que fomos e somos, toda a obra humana é História, as vitórias,
as derrotas, as memórias e os gestos, todos os atos e as experiências vivenciadas pelos sujeitos históricos
podem reconstruir uma parte da História. História, em seu sentido etimológico, é uma terminologia
grega e significa “pesquisa”. Configura uma ciência que investiga as ações dos indivíduos e dos/nos
grupos humanos no tempo e no espaço por meio da análise de trajetórias, eventos e processos que
ocorreram no passado. O pressuposto de sua natureza epistemológica encontra validação no grande
acervo teórico e metodológico disponível na literatura cientifica mundial até a atualidade. A História é
uma área que se utiliza de fontes arquivísticas, assim, instituições de memória e arquivos são
fundamentais no processo de pesquisa dentro desta área. O Arquivo Público pode ser caracterizado
como um repositório de memória que possibilita a reconstrução da História, os documentos nele
guardados são produzidos pela sociedade segundo as relações de força dos sujeitos históricos que
detinham o poder. Essas instituições arquivísticas possuem a função de recolher, preservar e conservar
esses materiais, além de compartilhar essas informações com a comunidade. O conceito de arquivo,
segundo o Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística (2005) se caracteriza de quatro formas
distintas: conjunto de documentos de uma entidade coletiva ou pública, de uma pessoa ou família,
produzidos ou acumulados; instituição que possui a finalidade de custódia, processamento técnico,
conservação e o acesso a esses documentos históricos; instalações que funcionam arquivos e móvel
com a função de guarda de documentos. Nas instituições de Arquivo Público pode-se encontrar uma
variedade de fontes documentais, fotos, papéis, enfim, um imenso acervo que ajuda a História a
entender o passado para compreender o presente. Os Arquivos possuem uma grande função na
sociedade, quanto mais nossa sociedade vai se desenvolvendo, maior é a quantidade de atividades
desenvolvidas e diversas, ou seja, maior são os atos registrados da humanidade, assim, é significativo o
tanto de obra humana que pode ajudar na reconstrução da História por meio da conservação destes
documentos. O artigo trata-se da instituição - Arquivo Público de Mato Grosso, criado no ano de 1896, no
Governo de Antônio Correa da Costa e, o acervo foi organizado inicialmente por Estevão de Mendonça,
que reconhecia a devida importância da guarda dos documentos e da instituição para a sociedade
mato-grossense. Conforme o site oficial do Arquivo Público de Mato Grosso, no primeiro momento para
a organização do acervo foram confeccionadas as latas de folhas de flandres, nelas depositando os
documentos classificados por ano. Em 1931, o Dr. Artur Antunes Maciel, Interventor Federal em Mato
Grosso, instituiu o Decreto n° 113, anexando o Arquivo à Biblioteca Pública, passando a denominar-se
Biblioteca e Arquivo Público, vinculada à Secretaria de Educação, Cultura e Saúde. Dessa forma, o
Arquivo Público do estado de Mato Grosso pode ser considerado como uma das instituições culturais
mais antigas do estado. Ao longo dos anos, até o início da década de 1970 diversos nomes estiveram à
frente da direção do Arquivo Público de Mato Grosso, tais como: Gervásio Leite, Nilo Póvoas e Vera
Iolanda Randazzo, entre outros. No ano de 1972, no governo de José Manuel Fontanilhas Fragelli o
Arquivo Público passou a ser vinculado à Secretaria de Estado de Administração sendo designado como
Departamento de Documentação e Arquivo. Em 1979 novamente foi alterada a sua nomenclatura para
Arquivo Público de Mato Grosso e em 2002 para Superintendência de Arquivo Público. Durante a
trajetória da instituição ocorreram mudanças na localização do espaço e, isso acarretou no extravio de
documentos, no armazenamento e manuseio inadequado dos mesmos. Atualmente tem como missão:
promover a gestão e o recolhimento dos documentos permanentes, de valor histórico, produzidos pelo
Poder Executivo Estadual, preservar e facilitar o acesso aos documentos sob sua guarda e elaborar,
acompanhar e implementar a política estadual de arquivos e de protocolos. Logo, o acesso ao Arquivo é
público, qualquer pessoa que tiver interesse pode visitar a instituição e realizar o manuseio adequado
dos documentos, utilizando das ferramentas disponibilizadas pelos servidores. O Arquivo Público tem
realizado uma política de gestão de preservação e tratamento técnico adequado do patrimônio
documental do estado, por isso atua na conservação, descrição e catalogação desses documentos,
contando como uma biblioteca e uma hemeroteca. Este Arquivo tem sido parceiro do Grupo de Pesquisa
História da Educação e Memória – GEM/UFMT, desde o ano de sua fundação em 1993. A partir de então
o Grupo tem desenvolvido dissertações, teses e demais pesquisas acadêmicas com os recortes do
período do Brasil Colônia; Império; República, com ênfase na História da Educação regional. Entre os
anos de 1995 a 2003, sob a orientação dos professores (as) Elizabeth Madureira Siqueira e Nicanor
Palhares Sá, foi realizado pelos membros e bolsistas do GEM o levantamento da documentação de
alguns acervos públicos e privados, e também, foi realizado a transcrição, digitalização e resenha desses
documentos que foram localizados. Neste sentido, o artigo tem como objetivo destacar o Arquivo
Público de Mato Grosso enquanto uma importante instituição arquivística contendo fontes identificadas
como: documentais, microfilmados e fotográficos, tendo como foco as fontes da história da educação.
Haja vista que esses documentos apontam os elementos que são primordiais no processo de
reconstrução da história. Para este trabalho nos propomos a enfatizar o aspecto histórico da instituição,
sem necessariamente especificar um período, de modo a dar maior visibilidade a dimensão do banco
de dados existentes e o que ele possibilita no campo da pesquisa a construção de novos objetos,
permitindo estudos de inúmeras temáticas, tais como: instituições escolares, alunos, professores,
cultura escolar, materialidade escolar, entre outros. Essas temáticas podem ser analisadas a partir de
recortes temporais diversos, que abrangem desde o período colonial, passando pelo Império e pela
República. As fontes utilizadas no presente artigo tratam de informações contidas no próprio site do
Arquivo, das fontes documentais impressas, manuscritas e narrativas, como também, recorreu-se a
pesquisa produzida por alunas do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal
do Mato Grosso, no ano de 2016, com a finalidade inicial de desenvolver as dissertações e teses, e,
posteriormente, ampliou-se com a catalogação de todos os documentos mapeados sobre a instrução
pública organizados em caixas e latas, algumas identificadas como “Instrução Pública”, outras como
“Educação” e ainda como “Caixas Avulsas”, entre os anos de 1930 a 1950, para alimentar o banco de
dados do acervo do GEM. Este artigo parte de uma pesquisa qualitativa e quantitativa e segue com
reflexões na perspectiva da história cultural (CHARTIER, 1990), dando ênfase a função cultural e social
do Arquivo e seu papel de manter viva a história de Mato Grosso, utilizando as pistas e os indícios
(GINZBURG, 1986) deixados pelos seus protagonistas. Os procedimentos teórico-metodológicos
utilizados neste artigo parte do princípio da operação historiográfica (CERTEAU, 2002), que consiste no
exercício de localizar, selecionar e analisar os dados. De modo geral, procura-se aqui destacar a
importância do Arquivo Público de Mato Grosso como uma instituição arquivística e como fonte de
pesquisa e de preservação do patrimônio documental da esfera da administração pública. Por meio dos
resultados apresentados, concluiu-se que a necessidade de organização dos Arquivos Públicos e o valor
administrativo e histórico de seu acervo documental, devem ser de fundamental importância para o
cotidiano dessa instituição e de todas as instituições arquivísticas, bem como, dar valor ao trabalho das
pessoas envolvidas e dos/das pesquisadores/as que utilizam os documentos para pesquisas que
contribuem com a construção da memória histórica, das identidades e da cultura escolar que forma os
cidadãos e configura a sociedade. Portanto, este trabalho buscou elucidar sobre a importância e a
trajetória do Arquivo Público do estado de Mato Grosso para as pesquisas no âmbito da história da
educação, visto que os acervos disponíveis nos desvelam um universo documental bastante variado
que tem instigado por anos os/as pesquisadores/as mato-grossenses e brasileiros. Por isso, se faz
necessário enfatizar essa instituição, pois ela contribui para reconstruir a história e refletir sobre o
direcionamento dos aspectos educacionais até os dias atuais.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A INTERLOCUÇÃO DE ACERVOS NA
PESQUISA HISTORIOGRÁFICA
Joseane Cruz Monks
Vania Grim Thies
O presente trabalho tem por objetivo descrever as principais fontes utilizadas na pesquisa de
dissertação de Mestrado[1], já concluída, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação
(PPGE), da Faculdade de Educação (FaE), da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Estas fontes
integram os diferentes acervos do centro de memória e pesquisa História da Alfabetização, Leitura,
Escrita e dos Livros Escolares (Hisales)[2] e foram problematizadas e analisadas de forma a constituir
a interlocução dos dados na produção da referida pesquisa.
O Hisales tem como missão garantir a salvaguarda dos variados artefatos que constituem/
constituíram o âmbito do espaço escolar atuando, neste sentido, como guardião da memória e
da história da intituição escolar, das práticas pedagógicas, do ensino, da leitura, da escrita, das
professoras/professores e das crianças. E, atualmente, integra seis acervos principais: 1) cadernos de
alunos; 2) cadernos de planejamento (diários de classe); 3) livros para o ensino da leitura e da escrita; 4)
livros didáticos produzidos no Rio Grande Sul; 5) materiais didáticos pedagógicos e 6) escritas pessoais
e familiares. Outros materiais complementares também são salvaguardados pelo centro, como por
exemplo, revistas educacionais, revistas literárias, manuais pedagógicos entre outros.
Dentre os acervos do Hisales, selecionou-se as principiais fontes para a construção empírica da
pesquisa de dissertação. Para tal utilizou-se o acervo de cadernos de alunos, o acervo de revistas
(Revistas do Ensino e Revista do Globo), o acervo de manuais pedagógicos e o acervo dos livros
para o ensino da leitura e da escrita. Esses artefatos compreendem a periodização que perpassa
todas as décadas do século XX, e correspondem especificamente: os cadernos de alunos (1968-
2008), as Revistas do Ensino (1951-1978), as revistas do Globo (1950-1960) e os manuais pedagógicos
(1905 - 1991), acervo dos livros para o ensino da leitura e da escrita (1950-2000)[3] o alargamento da
periodização se justifica pela intenção de realizar a contextualização da pesquisa e a compreensão
ampla do fenômeno investigado (meios de produção e reprodução de folhinhas de atividades em
cadernos de alunos).
Ao descrever as fontes da pesquisa maior, será evidenciado como se operou com as potencialidades
dos materiais, exemplificando a proposta de interlocução dos acervos na perspectiva historiográfica
(De Certeau, 2000). A possibilidade de articular os diferentes artefatos garantiu à pesquisa elementos
fundamentais para a compreensão do fenômeno da produção e reprodução das folhinhas[4] no
cenário escolar gaúcho, a partir dos cadernos de alunos no período de 1968-2008.
A pesquisa, ambientada no campo da cultura material escolar interligou este campo com
o da História da Educação, privilegiando neste sentido, a sistematização dos dados por meio da
interlocução dos artefatos que compõem os diferentes acervos, e, que de alguma maneira se
correlacionavam com o contexto escolar. Como aporte teórico do campo da cultura material
escolar os autores Felgueiras (2015) e Escolano Benito (2017) deram subsídio a pesquisa e às
problematizações. Sobre cadernos de alunos, autores como Hébrard (2001), Mignot (2008) entre
outros, foram o aporte teórico.
Referências
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Janeiro: Forense Universitária, 2002.
FELGUEIRAS, Margarida Louro. Para uma fundamentação da cultura material das práticas educativas.
In: FIGUEREDO DE SÁ, Elisabeth. SIMÕES, Regina Helena Silva e. GONÇALVES NETO, Wenceslau.
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HÉBRARD, Jean. Por uma bibliografia material das escritas ordinárias: o espaço gráfico do caderno
escolar (França – séculos XIX-XX). In: Revista Brasileira de História da Educação. Campinas, n. 1, p.
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MIGNOT, Ana Chrystina V. (Org.) Cadernos à vista: Escola, memória e cultura escrita. Rio de Janeiro:
edUERJ, 2008.
[1] A pesquisa intitulada “Do artesanal ao digital: uma genealogia dos meios de produção e reprodução de folhinhas
de atividades em cadernos de alunos”.
[2] O Hisales - História da Alfabetização, Leitura, Escrita e dos Livros Escolares - é um centro de memória e de pesquisa
vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Faculdade de Educação (FaE) da Universidade
Federal de Pelotas (UFPel).Tem como um dos objetivos principais a constituição de acervos para a manutenção
da história e da memória da escolarização elementar. Para maiores informações acesse https://wp.ufpel.edu.br/
hisales/.
[3] A periodização exemplificada corresponde aos materiais utilizados na pesquisa, pois os acervos têm periodizações
mais amplas.
[4] Recursos didático-pedagógicos produzidos pelas professoras para subsidiar a prática pedagógica.
ISSN 2358-3959
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Este trabalho é resultado de uma pesquisa realizada para a dissertação de mestrado em Educação,
da Universidade Federal de Goiás, situado na história da educação, na perspectiva da história
cultural. Tem por finalidade evidenciar o lugar ocupado pelas Ciências Naturais na legislação, no
final do século XIX, período de transição do Império para a República, em um cenário em que havia
o crescimento da produção de livros de leitura no Brasil. Desse modo, os livros necessitavam ser
aprovados pelo Conselho de Instrução Pública para circularem em ambientes escolares. Foram
escolhidas duas fontes principais para este trabalho, o Decreto nº 7.247 de 1879, de autoria do
Ministro do Império Carlos Leôncio de Carvalho, e o Parecer da Reforma do Ensino Primário, proposto
pela Comissão de Instrução Pública, publicado em 1883, composta, além do deputado e jurista Ruy
Barbosa, que a presidia, por Thomaz do Bonfim Espinola e Ulysses Machado Pereira Vianna, com
a finalidade de realizar um estudo aprofundado do referido Decreto. Assim, buscamos evidenciar
as Ciências Naturais nas duas fontes mencionadas, tendo em vista que o conhecimento científico
teve grande destaque a partir da segunda metade do século nos livros produzidos, uma vez que
as fontes propunham a introdução do ensino científico como essência da Instrução Primária, além
da inserção das Lições de Coisas, também conhecida como método intuitivo, e era baseada no
ensino por meio das coisas, partindo do particular para o geral, daquilo que se conhece para então
iniciar o desconhecido, educando assim a vista e o ouvido. De modo semelhante a um investigador,
procuramos pistas nas fontes referenciais, a fim de auxiliar na compreensão do lugar ocupado pelas
Ciências Naturais nos livros de leitura, principalmente dos livros de autoria de Felisberto de Carvalho.
Assim, para compreender a organização da área que propomos investigar nos livros escolhidos,
as Ciências Naturais, faz-se necessário investigar o que antecedia, ou o que vigorava, na legislação,
pois o livro escolar, desde este período deveria estar nos conformes das leis escolares, inclusive para
ser aprovado e poder circular nos ambientes escolares.
A primeira normatização abordada é o Decreto nº 7.247, de 19 de abril de 1879, de autoria
do Ministro do Império, Carlos Leôncio de Carvalho, que também ficou conhecida na história da
educação como Decreto Leôncio de Carvalho. A mesma legislação propôs a reforma do ensino
primário e secundário na Corte e do ensino superior em todo o Império.
Estabeleceu-se uma Comissão para realizar estudos sobre a reforma proposta por Leôncio de
Carvalho que resultou em dois pareceres e suas respectivas propostas de projeto substitutivo para
reforma da Instrução Pública, tendo como relator Ruy Barbosa, este documento é conhecido como
os Pareceres de Ruy Barbosa (1882 e 1883). Entretanto, parece-nos justo referenciar a Comissão de
Instrução Pública composta com a finalidade de realizar um estudo aprofundado do Decreto (1879)
proposto pelo então Ministro do Império, Carlos Leôncio de Carvalho. Os Pareceres/Projetos são
conhecidos na história da educação como Pareceres de Ruy Barbosa, no entanto, utilizaremos neste
trabalho a referência Barbosa, Espinola, Vianna, uma vez que a referida comissão foi composta,
além do deputado e jurista Ruy Barbosa, que a presidia, por Thomaz do Bonfim Espinola e Ulysses
Machado Pereira Vianna, pois os três fazem jus à autoria.
São estes documentos as referências para identificarmos o formato dado ao ensino de
Ciências Naturais, pois esses serviram como base para a elaboração de livros escolares do
período. O Decreto nº 7.247/1879, ato administrativo do Ministro do Império, estabeleceu a
execução imediata dos regulamentos que não envolviam aumento de despesas e, necessitava
de aprovação do Poder Legislativo.
Em contrapartida, foi criada a Comissão de Instrução Pública (1883) encarregada pela
apreciação deste decreto proposto por Leôncio de Carvalho. A Comissão realizou um detalhado
levantamento sobre a situação educacional de países como a Inglaterra, Estados Unidos, França,
e diversos outros, a fim de comparar à realidade brasileira. Deste modo, foram submetidos à
apreciação da Câmara dos Deputados os pareceres e os projetos substitutivos referentes ao ensino
primário, ensino secundário e superior.
A expressão ‘instrucção popular’ se referia, neste momento histórico, a proposta de alargar, ou
tornar exequível, a instrução primária, tema que atravessa a segunda metade do século XIX nos
discursos e propostas do Império. A aula primária teria que ser um espaço que não se limitasse
aos rudimentos da leitura e da escrita, tampouco se limitasse aos ensinamentos religiosos, mas
sim o ensino científico devidamente inserido na chamada ‘renovação fundamental dos méthodos’.
Popularizar a instrução, desta forma, era aumentar o número de escolas primárias e não democratizar
o ensino fora da escola.
Neste trabalho propõe-se a seguinte organização subdividida em quatro partes: a primeira
trata sobre o decreto (1879) proposto por Carlos Leôncio de Carvalho, então Ministro do Império; a
segunda aborda o Parecer da Comissão de Instrução Pública (1883) que propôs a Reforma do Ensino
Primário; a terceira versa sobre os Rudimentos das Ciências Físicas e Naturais enfatizadas no parecer
e projeto substitutivo; e, por fim, a quarta e última parte apresenta os destaques às Ciências Naturais
no projeto substitutivo proposto pela Comissão.
Na primeira destaca Carlos Leôncio de Carvalho que ao assumir a pasta do Ministério do Império
empenhou-se na proposta de reforma eleitoral aliando às questões educacionais, já que uma das
propostas seria o fim do voto dos analfabetos, conforme registrou Castanha (2013). O desenvolvimento
da Instrução Pública significaria avanço, por isso era necessário o aumento do número de escolas,
fato que, entretanto, acarretaria em aumento das despesas. Para Leôncio de Carvalho, as despesas
impactariam o governo, mas os resultados estavam comprovados estatisticamente por estudos
que a educação diminuiria consideravelmente, segundo Castanha (2013, p. 212), “[...] o número de
indigentes, dos enfermos e dos criminosos, aquilo que o Estado despende com escolas poupa em
maior escala com asilos, hospitais e cadeias”.
Na segunda parte apresenta o Parecer e Projeto da Comissão de Instrução Pública, em
quadros organizados por meio de informações oficiais (As informações oficiais fazem referências
aos Relatórios do Ministério do Império de 1854, 1870, 1872, 1874, 1878, 1880 e Relatório do
Inspector Geral da Instrucção Primária e Secundária do Municipio Neutro em 1858.). Seguindo
a premissa dos documentos da época, somada ao espírito polêmico e questionador de Ruy
Barbosa, o parecer faz críticas em relação à quantidade de escolas primárias do Império com
base nos estudos realizados em Relatórios do Ministério do Império, uma vez que apresentam
quantitativo de escolas que, segundo o Parecer, não condizem com a realidade. A Comissão
faz uma minuciosa análise dos quadros, na mesma perspectiva segue apresentando dados e
tecendo críticas ao número de escolas, aumento das matrículas de alunos, inferioridade da
instrução brasileira em comparação a outros países e, principalmente, as estatísticas brasileiras
oficiais deste período.
Na terceira parte refere-se ao Rudimentos das Ciências Físicas e Naturais enfatizadas no parecer
e projeto substitutivo, observamos que as Ciências Naturais ocupam desde o princípio um lugar
relevante na educação, uma vez que é enfatizada a importância do conhecimento científico
no desenvolvimento de habilidades intelectuais nas crianças, conforme relata a Comissão de
Instrução Pública (1883) “[...] da curiosidade nasce a atenção; da attenção a percepção e a memoria
inteligente[...]”. Segundo os estudos da Comissão de Instrução Pública (1883, p. 179), em um período
de quinze anos foram instituídas pelo menos cinco comissões na Inglaterra para investigar a respeito
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 148
da “[...] sciencia como instrumento do ensino commum [...]” e que despertava ‘grandioso interesse’
na sociedade europeia, em especial a inglesa.
Na quarta e última parte abordamos os destaques às Ciências Naturais no projeto substitutivo
proposto pela Comissão de Instrução Pública. Ao longo do projeto a comissão apresenta o
detalhamento do programa do Curso da Escola Primária Elementar, e dentre outras disciplinas
compreende as Ciências Naturais. Desse modo, observamos que, desde a escola elementar, as CN
são enfatizadas como fundamentais para o desenvolvimento do conhecimento científico na criança,
uma vez que estimula, por exemplo, o estudo de botânica por meio das plantas, ou seja, a Comissão
propõe que o ensino se inicie pela observação da realidade, daquilo que é concreto.
Assim, para Burke (2005, p. 10) os historiadores culturais têm em comum “[...] a preocupação
com o simbólico e suas interpretações. Símbolos, conscientes ou não, podem ser encontrados em
todos os lugares, da arte à vida cotidiana, mas a abordagem do passado em termos de simbolismo
é apenas uma entre outras”, por isso, além de compreender os significados presentes nos livros,
buscamos também confrontar a legislação educacional vigente no período, utilizando como fonte o
Decreto (1879) e os Pareceres da Comissão de Instrução Pública.
ISSN 2358-3959
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O presente trabalho subsidia pesquisa de doutorado em andamento que tem por objetivo
identificar e analisar as formas, estratégias de escrita e representações presentes no formato
editorial da revista A Violeta nos textos das autoras Mary e Arinapi para educar suas leitoras, no
período em que a revista circulou, entre os de 1916 a 1950. A escolha de analisar a revista A Violeta
se deu por ela ser o primeiro periódico voltado para mulheres e escrito por elas e que tinha como
finalidade “cultivar as letras femininas e patrícias”, segundo Nadaf (1993), em meio a uma capital
considerada atrasada e pouco respeitada por seus cronistas, viajantes, por aqueles que passavam
por aqui. Ora, certamente por isso, as associadas do Grêmio Júlia Lopes ansiavam, por meio dos
aportes textuais mensais da revista, o “engrandecimento da moral da nossa extremecida terra” (A
Violeta, 1933, p.3). E, no início do século que traria a revista A Violeta o Brasil ainda estava sob os
ecos da Belle Époque, um estilo cultural que se estabelecia por aqui e ditava moda. Nesse período
visualizavam-se as lutas para se ter uma cidade limpa, higiênica, higienizada no caminho para a
modernidade. O modelo de referência dessa modernidade, de civilização, da intelectualidade, de
centro cultural era Paris. Paris era, para o Brasil, o centro irradiador de tudo isso e influenciava
sobremaneira a cultura nacional. Os ideais republicanos poderiam ser sentidos especialmente em
sua capital, o Rio de Janeiro e ela seria concebida, respiraria e exportaria um modelo de
modernidade. Ela seria o seu símbolo. As mudanças urbanas implicavam uma nova cidade, na
tentativa de romper com o passado monárquico e colonial. Needell mostra que “[...] não há como
negar a ocorrência de mudanças no período, mas a persistência de estruturas duradouras,
adaptadas a circunstâncias instáveis, talvez seja o dado mais importante” (NEEDELL, P. 42,
1993). Isso demonstra que apesar dos investimentos realizados no Brasil, com ideais de
transformação para uma civilização moderna, o retrato era duplo, sendo uma, a permanência com
elementos desse passado colonial e, outra, as tentativas do estabelecimento do novo período
desejado. Voltando o olhar para Cuiabá, ela a partir dos cronistas, viajantes e aventureiros que por
aqui passavam era uma cidade “cercada, fechada, sitiada” e era assim considerada, também, por
estar geograficamente localizada distante dos grandes centros que se formavam no país e, ainda
por estar no “limite da ‘nação’ brasileira”, nos limites da civilização. Uma cidade afastada das
riquezas culturais e intelectuais que só esses grandes centros irradiavam, nos relatos desses
cronistas. Era necessário então abandonar as velhas narrativas e roteirizar uma nova Cuiabá com
novos traços, novas cores e novos textos. Era necessário resgatar velhas histórias e para além
delas, suas bases heroicas do passado do povo mato-grossense pautadas em dois mitos
importantes à essa construção, que eram os exploradores argutos e desbravadores das terras
realizando entradas e bandeiras motivados, os bandeirantes, pela busca de riquezas minerais. A
capital “teria surgido como o ‘eldorado’ brasileiro onde o ouro brotava do chão sem o menor
esforço” (MACIEL, 1993, p. 91). E como parte desse plano de reconstrução de um passado vigoroso
era preciso colocar Cuiabá nos trilhos da modernidade, ancorada em um “sentimento de unidade
e pela sua (re) afirmação como símbolo maior das tradições mato-grossenses”, a nacionalidade. E
o período de circulação da revista foi o recorte temporal adotado na investigação maior. Para isso,
este texto nasceu com o objetivo de estabelecer uma cartografia, com vistas a realizar um balanço
das produções bibliográficas, teses, dissertações e artigos científicos, em torno da imprensa como
fonte para a História da Educação, a partir do projeto de formação que a revista A Violeta se
configurava e para demonstrar como esse campo transcende as fronteiras escolares e pode
ampliar seu olhar através de diversos objetos e utilizando diferentes fontes. É importante ressaltar
que durante o processo de construção do projeto de pesquisa pensei ser importante conhecer o
interesse de outros pesquisadores que tiveram A Violeta como foco, de modo a sondar a relevância
de minha tese, de antemão na compreensão de que investigar essa revista torna possível ter
acesso a uma história intelectual e de produção escrita da mulher cuiabana. Também, que ela
contribui com a imprensa periódica tendo em vista a interlocução entre o campo da História da
Educação e sua produção historiográfica e as discussões teóricas propiciadas pelas concepções
da História Cultural. Na perspectiva desse campo teórico, sua abrangência, a pluralidade de
objetos, fontes e associação de métodos de investigação é que se reflete sobre a educação como
um fenômeno social que transcende a relação consigo e com o outro, através do tempo e do
espaço. Portanto, é possível pensa-la, não restrita a uma instituição escolar, a um espaço formal
sem deixar de reconhecer o papel fundamental que como instituição social cumpre a escola. A
pesquisa maior, também, traz consigo a oportunidade de dar visibilidade à produção literária
cuiabana, como também tenta recuperar os modos como as mulheres que escreviam para a revista
A Violeta se inseriam e propiciavam uma vida cultural a suas leitoras. Além disso, por meio das
representações de educação para mulheres, por meio de um impresso feminino, é possível
compreender como Arinapi e Mary pensavam a educação para suas leitoras no período em que ela
circulou, a partir das notícias, crônicas, dos textos literários, informes escritos por elas e ali
veiculados. e, assim, algumas perguntas rondaram esse iniciar. Este exercício permitiu, também,
constatar as possíveis lacunas investigativas sobre um objeto cultural, de produção autoral
feminina. Trago, então, algumas dessas perguntas com a finalidade de fazer o leitor conhecer o
meu percurso, meu interesse nessa construção e por delinear o mapeamento bibliográfico que
realizei. São elas, especialmente: A Violeta, sendo um impresso tão importante para Cuiabá e
tendo marcado historicamente sua passagem em seu período de circulação, quais foram as
pesquisas realizadas sobre ela? Ela foi objeto ou fonte de pesquisa? As investigações realizadas
orbitavam em quais temas? As pesquisas foram desenvolvidas em quais programas? E,
especialmente, quais eram os objetivos das pesquisas encontradas? A propósito devo pontuar
um desafio encontrado ao realizar o mapeamento. A ausência de uma catalogação precisa, um
Thesaurus de Imprensa Periódica, ou mesmo a indexação de títulos referentes a ela, no Thesaurus
Brasileiro da Educação, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(INEP) foi um fator que dificultou a ampliação da busca. Desse modo, procurei utilizar algumas
palavras-chave e descritores sugeridos pelo meu olhar na análise da revista, do que eu já busco
nela e, especialmente a partir do nome da minha fonte. Hora optei por abrir a busca articulando
entre imprensa e educação e hora procurando realizar uma articulação mais precisa que incluísse,
também os fundamentos teóricos das pesquisas, procurando as aproximações e afastamentos a
partir deles. Outro elemento importante foi o recorte temporal e os argumentos utilizados pelos
pesquisadores para essa adoção. Interessei-me, especialmente por aquelas que investigaram A
Violeta em todo o seu período de circulação. Esta pesquisa foi realizada tendo como fontes, de
seleção e coleta de dados bibliográficos, a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações –
BDTD, que integra sistemas de busca de produções de instituições de ensino e pesquisa brasileiras,
o Banco de Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, que oferece
consulta aos resumos dos trabalhos defendidos nos diversos programas de pós-graduação do
país. Ainda, utilizou-se da biblioteca eletrônica Scientific Electronic Library Online – SCIELO, em
que se dispõe de uma larga coleção de artigos científicos e periódicos indexados. A princípio, a
maior preocupação que norteou as buscas pelas produções refere-se ao fato de que a imagem do
feminino é construída a partir da autoria. Investigou-se pesquisas com discussões acerca dos
dispositivos de disseminação e proliferação de estigmatização da mulher como estratégia utilizada
pelo periódico, A Violeta no propósito de conduzir a construção de um perfil para a dona de casa e
que se configuraria como um instrumento de fala, de mecanismos de estabelecimento de ideias
dominantes durante ao seu período de circulação. O recorte de análise foi estabelecido desde o
ano de 1990 até 2019 como período de abrangência.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 151
Referências
CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Estud. av. [online]. 1991, vol.5, n.11 [cited 2019-
07-03], pp.173-191. Disponível em : <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
40141991000100010&lng=en&nrm=iso>. ISSN 0103-4014. http://dx.doi.org/10.1590/
S0103-40141991000100010.
______. A história cultural entre práticas e representações. Trad. de Maria Manuela Galhardo.
Lisboa: Difusão Editora, 1988, 244 p.
GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais. Morfologia e história. São Paulo: Companhia das Letras,
1989.
______. O fio e os rastros: verdadeiro, falso, fictício. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
ISSN 2358-3959
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No Brasil dos anos 1930, entre aqueles que assinaram o Manifesto dos Educadores da Escola
Nova (1932) e os que ficaram de fora, poucos não se alinharam às fileiras do Estado Novo (1937-
1945). Nesse momento, propostas e projetos para educação foram pensados, articulados e
discutidos pelos setores responsáveis por construí-los e executá-los. Fora dos locais normatizados
como educacionais indivíduos também se dispuseram a apresentaram propostas, pareceres e
discursos sobre a situação educacional e intelectual do país, sendo muitos destes debates
publicados em jornais e revistas. Entendendo a ação pedagógica como algo a ser executado
também fora dos muros escolares, não será difícil confirmar a imprensa como um dos dispositivos
privilegiados para forjar o sujeito/cidadão. Assim nos questionamos como o tema educação
aparece na imprensa da capital federal no período Varguista? Trabalharemos a imprensa como
objeto e fonte de pesquisa, em que é possível conhecer o que homens e mulheres escreviam o que
liam e como vivenciavam os espaços sociais em determinada época e lugar. Neste trabalho
questionamos o uso de fontes impressas não educacionais como importantes mecanismos de
referência e proposição de formas de se pensar e fazer a História da Educação brasileira. Em meio
ao grosso volume de possíveis fontes a serem trabalhadas neste recorte elencamos para tal
proposta a revista Vida Doméstica e o Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, pelo grande número
de tiragem de cada um, ampla circulação nacional e longevidade destes impressos na história
brasileira. Neles é possível perceber diversas representações em torno da instrução no campo do
ensino bem como maneiras de ser e viver, qualificando as mesmas como fontes para pesquisas em
torno da história da educação brasileira entre os anos de 1930 e 1945. A revista Vida Doméstica, foi
fundada em 1920 pelo empresário Jesus Gonçalves Fidalgo e teve sua circulação mensal até 1962,
com tiragem de mais de 50.000 exemplares por mês. Possuía em torno de 200 páginas e atuou em
um período da expansão capitalista no Brasil e do avanço da cultura de massas e buscou, no
interior de suas publicações, tornar legítimos alguns comportamentos femininos. Analisando suas
páginas, encontramos inúmeras representações do feminino e da educação de mulheres, sendo
importante considerá-las como personagens, peças fundamentais na assimilação dos anos 1930 e
seguintes. Vida Doméstica consolidou um público feminino fiel em todo Brasil e, por ter uma
circulação nacional, é uma importante fonte que nos permite analisar as formas de significação
dos gêneros. O recorte cronológico compreende alguns anos que antecedem o sufrágio feminino
no Brasil e avança para os anos do Estado Novo, quando vamos nos deparar com mudanças
significativas na organização social e na posição da mulher frente à família, à sociedade e ao
mercado de trabalho. Todas as revistas estão disponíveis na rede internacional de computadores
– web - com destaque para a Hemeroteca Virtual no sítio da Biblioteca Nacional. O Jornal do
Commercio, carioca, foi fundado em 1° de outubro de 1827 por Pierre René François Plancher de
La Noé. Mantendo em seu título a grafia original, foi um dos mais antigos órgãos de imprensa da
América Latina, encerrando sua versão impressa e digital em 29/04/2016. Sob o comando de Felix
Pacheco 1923-1935 e depois com Elmano Cardim na direção da instituição até 1957, o jornal era
editado em oito colunas, com 272 linhas em cada uma e em corpo 7, seu editorial, com mais de 10
páginas – dependendo do dia chegavam a 20, como aos domingos - e suas páginas eram próximas
dos governos e políticos, mostrando apoio, em geral, a cada presidente, governador ou prefeito
governistas, o que configurava um caráter conservador do Jornal do Commercio. Entretanto,
sisudo no cenário sensacionalista da imprensa dos anos 20 e 30, fugindo ao apelo das fotografias
sangrentas e das manchetes provocativas, o jornal era cercado por uma aura de confiabilidade,
lido pela elite da capital. Era formado e formava o pensamento dos homens que davam sustento
econômico e intelectual à nova república. Na história da educação, o uso da imprensa como fonte
e objeto de pesquisa, principalmente os jornais e revistas, relaciona-se com sua especificidade
como veículo de circulação de ideias que representavam e ainda podem representar um
determinado interesse, sendo este dependente do meio de vida dos homens e mulheres do
período que circula. Por isso, ainda que tenha proximidade com ficcionalidades, é preciso admitir
que pesasse sobre a imprensa a expectativa de ser referencial ao real, da mesma forma como
opera, por exemplo, a historiografia, ao produzir narrações de passado. Assim, como informa
Marialva Barbosa (2007) é preciso entender os jornais e revistas operando sob o regime da
novidade, em que transformam os acontecimentos cotidianos em ações supostamente de ruptura,
como se tivessem fortes conseqüências. Por outro lado, a imprensa também é palco de
manifestações coletivas, onde são veiculados debates, discussões e polêmicas da época que se
propõe pesquisar, da maneira como apresenta Carlos Vieira (2007, p.13) quando sugere que “[...]
vislumbramos, em ampla medida, a complexidade dos conflitos e das experiências sociais”. A
palavra escrita pode em qualquer tempo e lugar ser utilizada na construção de interpretações
históricas, “em outras palavras são incomensuráveis as possibilidades de reconhecimento e de
problematização do passado por meio das páginas da imprensa” (VIEIRA, 2007, p. 13). Tanto a
imprensa periódica que não é voltada diretamente aos temas educacionais, como a imprensa
diária e popular, pode ser trabalhada enquanto fontes importantes para a história enquanto
testemunho de métodos e concepções pedagógicas e educacionais de um determinado período.
Estas fontes possibilitam aos historiadores da educação análises ricas a respeito dos discursos
educacionais, revelando-nos, ainda, em que medida eles eram recebidos e debatidos na esfera
pública, ou seja, qual era a sua ressonância no contexto social (CARVALHO; ARAÚJO; GONÇALVES
NETO, 2002, p. 72). Os impressos serão aqui tratados como resultantes das apropriações em que
os indivíduos constroem seu cotidiano, incutidas no repertório do indivíduo e/do grupo – que
podem ser plurais – a qual ele participa. Existe uma permanente interrogação sobre a possibilidade
de ir do discurso ao fato, o que obriga a pôr em causa a idéia da fonte enquanto testemunho de
uma realidade, de múltiplos sentidos, donde a dupla tendência para analisar a realidade por meio
das suas representações e para considerar as representações como realidade de múltiplos
sentidos. Por outro lado, para Chartier (1990, p. 45) constata-se a existência de práticas sociais que
não poderão ser reduzidas a representações, pois revestem uma lógica autônoma. Resolver esta
tensão implica tornar operatória a noção de leitura e o conjunto de formas de apropriação, as
quais permitem pensar simultaneamente a relação de conhecimento, em particular, os
procedimentos com as fontes, e o conjunto dos atos de relação, comprometedores de práticas e
de representações. Portanto, as representações serão definidas pelos grupos que as forjam e
postas como “dominantes” de uma maneira de ver o mundo, de classificá-lo, dividi-lo e delimitá-
lo. A interlocução com as proposições de Roger Chartier, no campo da história cultural, teria
marcado fortemente a renovação dos nossos estudos histórico-educacionais. São as práticas
articuladas que constroem historicamente as figuras que permeiam as categorias intelectuais de
produção/compreensão que organizam a apreensão do mundo social como categorias
fundamentais de percepção e de apreciação do real. As representações não são discursos neutros,
na realidade produzem estratégias e práticas que tendem estabelecer uma autoridade, uma
deferência, e mesmo a legitimar escolhas. Estava em curso naquele contexto de produção,
circulação e apropriação da Revista Vida Doméstica e do Jornal do Commercio, um processo de
especialização da atividade intelectual. Não por acaso tal processo coincidia com movimentos
paralelos e conectados entre si: o fortalecimento do campo de conhecimento das ciências sociais
e humanas; o surgimento das universidades brasileiras – o próprio Fernando de Azevedo à frente
da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, inaugurada em 1934; a
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 154
emancipação feminina iniciada pelo sufrágio e a modernização do Estado brasileiro, dando origem
à institucionalização de inúmeras atividades educacionais e culturais.
Referências
CARVALHO; C.H; ARAÚJO; J.C; NETO, W.G. Discutindo a história da educação; a imprensa enquanto
objeto de análise histórica (Uberlândia-MG, 1930-1950). In: ARAÚJO, José Carlos & GATTI JUNIOR,
Décio (Orgs.). Novos temas em história da educação brasileira: instituições escolares e educação
na imprensa. Campinas, SP: Autores Associados, 2002.
BARBOSA, Marialva. História Cultural da Imprensa (1900-2000). Rio de Janeiro: Mauad X, 2007.
CHARTIER, Roger. História Cultural: entre práticas e representações. 2 ed. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 1990.
VIEIRA, Carlos Eduardo. Jornal diário como fonte e como tema para a pesquisa em História da
Educação: um estudo da relação entre imprensa, intelectuais e modernidade nos anos de 1920.
In: TABORDA DE OLIVEIRA, Marcus Aurélio (Org.). Cinco estudos em História e Historiografia da
Educação. Belo Horizonte: Autêntica: 2007.
ISSN 2358-3959
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[1] Não conseguimos encontrar de quando se trata esse documento, que pertence a sua 8ª edição, porém temos, em seu
prefácio da 4ª edição, datada de 1919.
[2] Tradução livre da autora do texto.
[3] “Side by side with language study is the study of mathematics in the schools, claiming the second place in impor-
tance of all studies” (REPORT..., 1895, p. 52).
ISSN 2358-3959
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Introdução
O presente estudo teve como objetivo realizar um mapeamento acerca da produção
historiográfica que tem como recorte temático o ensino secundário paranaense, especificamente
os trabalhos que tiveram como recorte temporal o período compreendido entre 1942 e 1961.
Com o intuito de contribuir para o (re)conhecimento da produção acadêmica que investigou
tais período e temática, foram realizadas buscas sistematizadas e analíticas do que vem
sendo produzido nos diversos programas de pós-graduação em âmbito nacional, elegendo
como fontes privilegiadas as teses e dissertações disponíveis na Biblioteca Digital de Teses e
Dissertações (BDTD) e o Banco de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (BTD/CAPES). É importante destacar que a escolha das bases de dados
da BDTD e do BTD/CAPES teve como fatores preponderantes o acesso gratuito, o fato de estarem
disponíveis em meio eletrônico e por comportarem um vasto acervo da produção acadêmica de
diferentes instituições de ensino superior.
A metodologia utilizada foi a Revisão Sistemática Integrativa de Literatura, a qual tem como
pressuposto a organização da pesquisa em seis etapas a serem seguidas, a saber: 1. Identificação
do tema e seleção da questão de pesquisa; 2. Estabelecimento de critérios de inclusão e exclusão;
3. Identificação dos estudos pré-selecionados e selecionados; 4. Categorização dos estudos
selecionados; 5. Análise e interpretação dos resultados; 6. Apresentação da revisão e síntese do
conhecimento (BOTELHO, CUNHA, MACEDO, 2011).
Os descritores utilizados foram organizados da seguinte maneira: a localidade (Paraná,
paranaense, Curitiba, curitibano); o grau de ensino (secundário, médio, normal, comercial, técnico,
profissional, agrícola, industrial); o local de oferta e seus sufixos (escola, colégio, ginásio, ginasial,
colegial); assim como o recorte temporal (1942-1961). Os critérios de inclusão adotados foram:
1. Teses e dissertações produzidas em programas de pós-graduação nacional; 2. Intervalos de
publicação: 1990 e 2019; 3. Publicações que tangenciem o ensino secundário paranaense e seus
termos afins a partir da década de 1940 até a primeira metade dos anos 1960. Foram excluídos
estudos que abordassem o ensino secundário de outros estados, estudos duplicados e não escritos
em língua portuguesa.
Quanto à fase de seleção preliminar, todos os documentos passaram pela criteriosa análise
dos pesquisadores, seguindo os critérios de inclusão anteriormente descritos. Após isso, foram
efetuadas as leituras dos títulos, resumos e palavras-chaves dos trabalhos identificados, cabendo,
quando necessária, a análise das conclusões/considerações finais. Os mesmos critérios aplicados na
fase de seleção preliminar também foram executados na fase final de seleção, essa que se baseou na
releitura dos títulos, resumos e palavras-chaves, assim como na análise dos sumários, introduções e
quando necessário conclusões dos estudos.
Na fase de análise e interpretação dos resultados, foi elaborado pelos revisores um instrumento
de condução de pesquisa que serviu para a tabulação dos dados coletados e realização de uma
apreciação qualitativa e crítica dos estudos incluídos. Destarte que essa apreciação foi fruto de uma
adaptação da técnica de análise temática de conteúdo, aportada teoricamente nas contribuições de
Bardin (2011). Nesse momento, por meio da leitura e releitura das produções, buscou-se identificar
aspectos relevantes que se repetiam ou se destacavam, assim como comparar as semelhanças e as
diferenças entre os mesmos a fim de realizar uma posterior categorização.
Resultados e discussões
A identificação dos trabalhos pré-selecionados decorreu inicialmente da aplicação dos
descritores nas bases de dados anteriormente descritas, sendo obtidos neste levantamento 1.027
teses e dissertações. Após a tabulação destes dados no instrumento de pesquisa, foram aferidos
os títulos, resumos e palavras-chave, sendo apenas selecionados aqueles que correspondessem a
todos os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos - o que gerou a seleção de 44 estudos na fase
de seleção preliminar. Já na fase de seleção final, foram excluídos 4 trabalhos por não contemplarem
ao escopo definido. A partir dos dados gerados pelo instrumento de condução da pesquisa, foi
observado que dentre os 40 estudos incluídos, 28 estavam indexados no BTD, sendo 19 dissertações
de mestrado e 9 teses de doutorado. Por sua vez, os 12 restantes estavam indexados no BDTD, dos
quais 10 são dissertações e 2 teses.
Quanto às categorias de análise procedentes dos delineamentos traçados pelos autores em
seus estudos e identificadas pelos revisores na etapa de interpretação e análise dos dados, foram
obtidas as seguintes temáticas e percentuais correspondentes: 1. História das instituições escolares
(13 dissertações e 7 teses); 2. Formação de professores (8 dissertações); 3. Disciplinas escolares (6
dissertações e 1 tese) e 4. Arquitetura escolar (2 dissertações e 1 tese). Além disso, foram alocadas
em uma categoria extra, denominada de outros temas, 2 teses. A seguir, tendo em vista os limites
deste texto, são apresentadas algumas análises das categorias acima descritas.
Formação de Professores
Na categoria “Formação de professores”, percebeu-se a pertinência de análise conjunta de 10
estudos, os quais mobilizaram especificamente o grau de ensino normal. Todos estes trabalhos se
caracterizam por serem dissertações de mestrado com foco em instituições escolares singulares
e regionais, produzidas por mulheres em programas de pós-graduação em Educação no estado
do Paraná. No decorrer da análise desta categoria, foi possível perceber que para além da análise
da cultura escolar das instituições estudadas, foram também consideradas as possíveis relações
entre seus surgimentos e desenvolvimento para com as políticas públicas educacionais nacionais,
estaduais e as demandas sociais de suas localidades.
Disciplinas Escolares
Importantes contribuições foram localizadas na categoria “Disciplinas Escolares”, no que diz
respeito à ampliação do conhecimento produzido acerca do grau de ensino secundário no estado do
Paraná. De modo que do total de 7 estudos organizados nessa categoria, 5 foram classificados como
instituições de ensino público atrelados a este grau de oferta de ensino; 1 identificado como uma
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 160
Arquitetura Escolar
Nesta categoria foram localizados três trabalhos, os quais focalizaram seus esforços na história
das instituições educacionais, em especial aquela história que trata no uso e nas atribuições dadas
aos tempos e aos espaços escolares pelos diferentes sujeitos que as compuseram. Os trabalhos
alocados nessa categoria discutiram e contribuíram para compreensão, não apenas no que diz
respeito à construção (ou não) de prédios escolares, como também na caracterização de seus
objetos de estudos (arquitetura escolar e espaços escolares) como elementos históricos que sofrem
influências das transformações regionais, macrorregionais e, sobretudo, pelos discursos políticos
educacionais do período.
Considerações Finais
O desenvolvimento da presente revisão possibilitou uma síntese crítica do atual cenário de
produção acadêmica com vistas ao ensino secundário paranaense no recorte compreendido
entre 1942 e 1961. As teses e dissertações analisadas nesta revisão certamente contribuíram para
a construção da memória relativa ao ensino secundário paranaense, isto perspectivado a partir
de diferentes interpretações, localidades, instituições e respondendo a múltiplas e significantes
problemáticas.
Referências
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.
BOTELHO, Louise Lira; CUNHA, Cristiano Castro de Almeida; MACEDO, Marcelo. O método da revisão
integrativa nos estudos organizacionais. Gestão e Sociedade: Belo Horizonte, v.5, n. 11, p. 121-136,
2011.
NUNES, Clarice. O “velho” e “bom” ensino secundário: momentos decisivos. Rev. Bras. Educação,
Rio de Janeiro, n. 14, p. 35-60, Ago. 2000.
ISSN 2358-3959
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A temática em torno da obra e do sujeito Primitivo Moacyr é cara às nossas pesquisas e projetos há
um tempo considerável. Dando prosseguimento às investigações em torno deste importante autor da
História da Educação nossa proposta para este trabalho é reconhecer quais as semelhanças e diferenças
na escrita de Primitivo Moacyr e dos historiadores filiados ao IHGB no recorte temporal das décadas de
1930 e início dos anos 1940. Para tal selecionamos duas obras de Moacyr: A Instrução e o Império:
Subsídios para História da Educação no Brasil 1823-1853 publicado em 1936 e A Instrução e a República:
Reforma Benjamim Constant 1890-1892 publicado em 1941 e ainda a Revista do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro como fontes para a pesquisa. Compete-nos primeiramente apresentar Primitivo
Moacyr. Nascido em Salvador na Bahia no ano de 1867, foi órfão de pai e alfabetizado em asilo. Seu
primeiro cargo empregatício, que se tem conhecimento, foi de professor de primeiras letras em Lençóis
(BA). A convite de Inocêncio Góis de Calmon, então Presidente de Pernambuco, Moacyr mudou-se para
Recife para ocupar a função de inspetor do Liceu desta cidade. Suas boas relações sociais o levaram
para o Rio de Janeiro, onde se estabeleceu, casou-se e formou-se em direito pela Faculdade Livre de
Direito em 1894. Chegou a investir em um escritório de advocacia junto a Josino de Araújo e Carlos
Peixoto, mas optou por seguir carreira pública, função exercida até aposentadoria. Em 1895 Moacyr
ingressou na Câmara dos Deputados como redator de debates parlamentares. Quando este cargo se
extinguiu, Moacyr passou a ocupar o cargo de redator dos documentos parlamentares até se aposentar
em 1933. Para além deste emprego, Moacyr foi inspetor de exames de segunda época de institutos
particulares de ensino secundário em 1929; atuou como Promotor dos Feitos da Saúde Pública entre
1905 e 1911; e ainda escreveu crônicas para o Jornal da Commércio sobre instrução pública no Império
e início da República que se tornaram referências para escrita de seus livros. Sua primeira produção em
formato de livro foi impressa pela tipografia do Jornal do Commércio em 1916 - O Ensino Público no
Congresso Nacional. Breve Notícia. As demais produções de Moacyr foram empreendidas, primeiro
pela Companhia Editora Nacional entre 1936 e 1940. São livros pertencentes à Coleção Brasiliana
coordenada naquele período por Fernando de Azevedo: três volumes de A instrução e o Império:
subsídios para a história da educação no Brasil, outros três volumes sobre A instrução e as províncias e
ainda dois volumes sobre A instrução pública no Estado de São Paulo. Sobre o período republicano,
Moacyr publicou sete volumes de A Instrução e a República entre 1941 e 1942 pela Imprensa Nacional
sob os auspícios do Inep (Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos) dirigido por Lourenço Filho. O
autor ainda apresentou dois artigos em congressos promovidos pelo IHGB: o primeiro em 1940, no III
Congresso Sul-rio-grandense de História e Geografia em Porto Alegre com o seguinte artigo O ensino
comum e as primeiras tentativas de sua nacionalização na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul
(1835-1889); e, em 1942, no III Congresso de História Nacional no Rio de Janeiro, com o artigo A instrução
primária e secundária no município da Corte na Regência e Maioridade. Diante destas quinze obras
produzidas por Moacyr selecionamos os livros inaugurais das coleções sobre instrução no Império e
República. Esta escolha se justifica pelo fato de abordarem em seu conteúdo desde a instrução primária
ao ensino superior em nível nacional, o que permite um entendimento mais geral da visão do autor
sobre a instrução no Brasil. E ainda se justifica pela composição destes livros que são os únicos de suas
coletâneas com bibliografia de referência e um capítulo preliminar em que Moacyr antecede o conteúdo
do livro, o que para nós demonstra sua preocupação com a narrativa histórica. Quanto à opção por
trabalhar com a Revista do IHGB se dá pelo fato de ser uma produção com parâmetro de escrita
legitimado na década de 1930 e com autorias de artigos e livros variados entre os associados do
Instituto, possibilitando uma pesquisa fundamentada quanto a compreensão da escrita histórica
daquele tempo. A Revista do Instituto teve sua edição inaugural em 1839, um ano após a fundação do
IHGB e ainda circula hoje com regularidade. Suas edições das décadas de 1930 a 1940, de acordo com
nossa pesquisa, seguiram certo padrão de escrita das produções inaugurais, com artigos de interesse
e articulação política, sobre expoentes pátrios e suas biografias e as atas das sessões ocorridas no
Instituto. De acordo com Ângela de Castro Gomes (2009) as concepções de história e as escolhas
narrativas que começaram a surgir no início do século XX apareceram por meio das mudanças políticas
e sociais ocorridas na instituição da República e no distanciamento que se pretendia estabelecer com
o passado escravista e o regime imperial. Nesse momento prevaleceu uma ênfase voltada à civilização
e ao progresso adequados aos moldes da modernidade. E a produção de história no Brasil, como de
Pedro Lessa (2015), inclinou-se a pensar na cientificidade da disciplina, uma exigência do “novo tempo”
que se arquitetava. Para esse autor, a História tinha um papel de subsidiar as demais ciências sociais
como a Sociologia, sendo uma base fundamental para suas induções científicas. Manuel de Oliveira
Lima (2015), outro historiador de destaque do período, já demonstrava preocupação com a construção
narrativa da história do Brasil, interessando-o estabelecer uma integração do passado imperial ao que
se edificava enquanto nação em seu tempo. Oliveira Lima, ao se reportar sobre a Revista do IHGB,
argumentava que sobressaíam mais os documentos do que ensaios em suas edições, fato que Primitivo
Moacyr também resguarda em suas obras. Após cumprir a pesquisa até o momento sustentada por
uma metodologia bibliográfica, temos algumas considerações e resultados. O que aproxima a produção
de Primitivo Moacyr aos historiadores contemporâneos do IHGB é primeiro sua participação em dois
congressos distintos promovidos pelo Instituto, demonstrando certo reconhecimento por parte dos
organizadores ao convidá-lo para tais eventos e ainda corrobora para afirmar que Moacyr não era
alheio ao que ocorria no interior da Instituição. Outro ponto que consideramos de proximidade está
relacionado à preocupação com a divulgação dos documentos oficiais, objetivo pautado nos estatutos
do Instituto e permanente nos conteúdos das Revistas consultadas. A centralidade do Estado, os
grandes eventos e personagens históricos como temas principais dos conteúdos dos livros de Moacyr
e da Revista do IHGB é certamente o ponto chave da pesquisa. O que encontramos como distanciamento
está associado às referências ampliadas dos autores do IHGB consultados, como no texto de Pedro
Lessa, que já apresenta reconhecer e debater autores europeus daquele período, além da trajetória da
história que narra em seu livro e das questões sobre o que é a história, a sua cientificidade e função
dentre as ciências sociais. Apesar deste fato, a maior parte do conteúdo encontrado nas Revistas
selecionadas não são de discussões conceituais e teóricas, mas sim biografias, discursos de posse,
cópias de edições de livros e as assembleias do Instituto. Segundo Ângela de Castro Gomes (2009), o
perfil do historiador no início do século XX encontrava-se em aberto. Os sócios do IHGB apresentavam
formações distintas como médicos, advogados, engenheiros, o que amplia as visões e discussões
históricas. Os espaços acadêmicos ainda escassos na década de 1930 contribuem certamente para a
permanência desse perfil heterogêneo. Nos dois livros fontes desta pesquisa, Moacyr não traz questões
conceituais, nem aborda sobre a escrita da História. Sua narrativa é construída pelo recorte de
determinados trechos acompanhados de pequenos comentários ou o resumo dos fatos, sem formular
questionamentos mais elaborados sobre aquele proceder histórico, mas sim alguma opinião de
maneira mais direta e rasa. Consideramos, portanto, diante da obra produzida sobre a educação
brasileira, que Primitivo Moacyr demonstrou o interesse por produzir e publicizar história, mesmo que
não se reconhecesse como historiador. Segundo Venâncio Filho: “Não pretendeu, entretanto, ser
historiador. Certo se quisesse, poderia ter sido. Conscientemente, preferiu realizar o trabalho humilde,
paciente e probo do desbravador, jungindo a cópia e ao resumo” (1943, p.97). Sua produção bibliográfica
está sustentada em uma pesquisa arquivística detalhada, preocupada em relatar uma verdade histórica
assim como se escrevia ainda a história tradicional (Peter Burke, 2011) naquele período, baseada nos
documentos oficiais, pautada numa visão de cima, centrada nos grandes homens e seus feitos e escrita
de maneira objetiva. Apesar de não ser filiado ao IHGB, Primitivo Moacyr apresenta uma escrita muito
mais próxima do que distanciada do que era legitimado pelo Instituto, tornando-o um pesquisador de
seu tempo.
ISSN 2358-3959
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da pesquisa qualitativa. Apesar de considerar a história oral como uma metodologia favorável e
eficiente para a realização de uma pesquisa e para a reconstrução da história, a princípio é importante
destacar que, desde as décadas iniciais do século XX, diversos sociólogos e antropólogos norte-
americanos fizeram uso de relatos orais em suas investigações. Mesmo no Brasil, a utilização de
relatos orais em pesquisas acadêmicas remonta aos anos de 1950, nas Ciências Sociais. Contudo, foi
apenas no contexto da Nova História que as fontes orais fizeram sua reentrada no campo desta
disciplina, embora ainda continuem a enfrentar resistências. Thompson (2002, p. 311) assume que
“continua em aberto a oportunidade para se desenvolver um novo método adequado à história
oral”. Tal perspectiva afasta-se da ideia de que, o documento não é apenas papel, mas a própria
realidade. Há uma tradição empírica documental na história e mesmo nas Ciências Sociais em geral
– uma confiança abusiva em seus dados, mas hoje o ressurgimento da história oral mostra que dados
verbais podem ser suficientes para dar conta de objetos e problemáticas científicas não “apesar” de
sua subjetividade, mas por conta dela, a subjetividade própria do ser humano, dos seus modos de
viver, estar juntos e compartilhar lembranças, histórias e narrativas. Em face do debate sobre a
história oral, Meihy (1996) evidencia que a entrevista tem seu valor em si, não apenas retratam uma
totalidade. Os trabalhos em história oral podem apreender experiências de pessoas que falam sobre
aspectos de suas vidas, mas os recursos tecnológicos utilizados na captação das entrevistas não
devem suprir os contatos diretos com seus entrevistados. A entrevista em história oral é sempre um
processo dialógico, o que demanda pelo menos duas pessoas, que se completam, a saber: o
entrevistador e o entrevistado e o resultado do encontro gravado é a entrevista. A gravação produzida
implica na construção de um texto escrito, tonando-se uma fonte oral (documento), podendo
preencher lacunas de outros documentos na pesquisa. Meihy (1996) considera que as entrevistas
colhidas não devem ser substituídas por falta de escassez de fontes documentais, mas estas devem
dialogar com outras fontes utilizadas na pesquisa. Ao realizar uma pesquisa pelo viés da história
oral, inicialmente é importante definir se as fontes orais serão utilizadas no projeto como referência,
como técnica, como método ou como uma disciplina independente. Como referência, as fontes são
“minúcias”, não há preocupação sobre sua produção e uso. Se utilizadas como técnica, as fontes
orais, seriam utilizadas de maneira associada às documentações escritas e iconográficas. A história
oral, inserida na pesquisa como método, utiliza as fontes orais como eixo central de observação,
salientando metodologicamente todos os critérios desde o recolhimento da entrevista, seu
tratamento, transcrição e análise. Como último critério, as fontes orais utilizadas como uma disciplina
independente, entendida como uma disciplina nova, não é aceita como um recurso multidisciplinar
(MEIHY, 1996). Em se tratando de fontes orais, as narrativas são uma produção do pesquisador que,
após a transcrição das entrevistas, organiza-as em função de seu interesse de pesquisa. Certamente,
a produção de fontes orais passa pela recolha de informações junto a testemunhas e, para isso,
fazemos uso de técnicas pertencentes ao universo metodológico da história oral. O planejamento de
um trabalho de história oral, deve considerar a questão da memória, seus significados, as relações
existentes entre o que está sendo rememorado e os sentimentos e/ou valores externalizados nas
entrevistas, assim é possível compreender que nem sempre o ato de rememorar é uma ação saudável
e positiva para o sujeito, pois pode trazer dores e sofrimentos. Destacamos a ideia de Paul Thompson,
quando salienta que a fonte oral permite-nos desafiar a subjetividade da percepção humana,
despregar as camadas de memória, abrindo as fossas de suas sombras, indo em busca da verdade
encobrida (1992), dessa maneira é preciso fazê-la de maneira crítica e responsável, em relação aos
significados que há por trás das memórias particulares dos sujeitos envolvidos nas entrevistas, para
que assim possamos contruir o conhecimento histórico na perspectiva da narrativa, permitindo,
assim, uma descrição das representações dos sujeitos que viveram a História ou, de alguma forma,
com ela tiveram contato. Já para Alberti (1996), ao se incorporar certos conhecimentos sobre
potencialidades da memória humana, é importante observar a constituição de memórias, do qual
não é o processo cognitivo de rememoração e esquecimento, e sim a transformação daquela ação
em objeto de estudo e análise, entendida pela autora como um processo factual pela história oral,
no sentido de se investigar a memória lá onde ela não é apenas significado mas também
acontecimento, ação. Ao se pensar e planejar a realização de entrevistas é necessário refletir sobre
os procedimentos que norteiam sua utilização, como por exemplo, a rememoração de memórias e a
maneira como os sujeitos entrevistados “lembram” de suas histórias. No entanto, a maneira como
cada um dos sujeitos entrevistados irá (re)lembrar de suas vivências, será diversa uma da outra, uma
vez que cada indivíduo tem as suas percepções acerca de determinado assunto, vivências e trajetórias
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 165
de vida. O que fará com que cada pessoa evoque suas memórias e experiências de maneira também
diversificada. De todo modo, a utilização de entrevistas em pesquisas em história oral, devem levar
em consideração a questão da rememoração e evocação da memória a fim de uma melhor análise
dos dados e sua utilização na pesquisa. Por fim, vale ressaltar a relevância da história oral nas
pesquisas, configurada como metodologia e como um importante instrumento para se conhecer
histórias de vida e/ou instituições e coletar novos dados para a pesquisa que poderiam não estar
contemplados em fontes documentais escritas. Objetivamos, aqui, apresentar uma reflexão sobre o
uso das entrevistas na história oral, de forma a contribuir para um planejamento mais consistente
por parte do pesquisador que se utilizará dessa metodologia. Deve ficar claro que ao trabalhar com
fontes orais, como qualquer outra fonte, não estaremos mais buscando alcançar e apresentar o
passado como verdade absoluta. Também não será o foco de nossas preocupações a confiabilidade
de tais fontes.
ISSN 2358-3959
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O ensino de 2º grau foi promulgado pela Lei nº 5.692 de 11 de agosto de 1971 e se caracterizou
pela fusão de todos os ramos do 2° ciclo (o ensino normal, o ensino técnico industrial, o ensino
técnico comercial e o ensino agrotécnico). As escolas de ensino médio passariam, obrigatoriamente,
a fornecer cursos profissionais. A Lei nº 5.692/71 teve em vista vários objetivos, contudo podemos
elencar, aqui, os dois mais relevantes. O primeiro se deu de maneira explícita: formar mão de obra
qualificada para atuar no mercado de trabalho, suprindo a alta demanda das indústrias brasileiras,
devido o milagre econômico. Já o segundo, aparece implicitamente, pois com o caráter da
terminalidade também se objetivava conter a entrada dos alunos nas universidades. Neste sentido,
este trabalho se insere no domínio da nova história política e tem como intuito analisar de que
maneira as estatísticas do ensino de 2º grau são tratadas e/ou relatadas nas Mensagens Presidenciais
ao Congresso Nacional entre os anos de 1971 a 1985. Este recorte temporal se justifica devido a Lei
supracitada ter sido criada no ano de 1971, bem como em 1985 se teve o fim do regime militar no
Brasil. Dessa forma, partimos das seguintes questões: como estão relatados os dados estatísticos do
ensino de 2º grau nas Mensagens Presidenciais ao Congresso Nacional entre os anos de 1971 a 1985?
Essas estatísticas vinham acompanhadas de alguma análise ou justificativas? Ou ainda, se percebe
algum tipo de relevância dada a esses dados estatísticos nas mensagens presidenciais? As fontes
mencionadas acima estão disponíveis no site da Universidade de Chicago denominado: Center for
Research Libraries Global Resources Network. As Mensagens Presidenciais ao Congresso Nacional
são anuais, se divide em tópicos e se organizam, de maneira geral, da seguinte forma: Introdução;
Política Econômico-financeira; Política Social; Política externa; Justiça; e Forças Armadas. Dentro
desses temas maiores, existem outros subtemas, como é o caso de Educação e Cultura, item que
será analisado neste trabalho, inserido no tópico denominado Política Social. Constatamos que
existem mudanças em relação aos tópicos principais entre os anos analisados, contudo, as temáticas
tratadas nos documentos não sofrem modificações, são as mesmas. No que concerne às estatísticas
educacionais, este é um campo ainda pouco estudado no âmbito da educação e mais especificamente
da história da educação e quando demarcamos o domínio da educação profissional este tipo de
investigação se torna mais escassa, fazendo com que esta análise seja ainda mais relevante. Portanto,
compreendemos que as estatísticas são um campo da ciência das quais se utilizam vários outros,
como é o caso da educação, econômico ou o campo político, o que torna de extrema necessidade
que se estude e se compreenda a utilização desses dados para as tomadas de decisões que dão
rumo às nações e no caso em análise, de maneira mais específica, ao âmbito educacional. É
significativo entender, que essa ciência denominada estatística, é utilizada para embasar e justificar
mudanças, estratégias dos grupos políticos que estão no poder. O aporte teórico que fundamenta
essa investigação é composto por Serge Berstein (1998) com o conceito de cultura política,
compreendendo que esta é uma espécie de código formalizado no seio de um partido e difundido
em uma tradição política, sendo a cultura política um corpo vivo em constante evolução. Para o
autor, a cultura política é constituída por um conjunto de componentes que mantêm relação estreita
entre si, o que permite se definir uma identidade do indivíduo. Outro autor que nos auxilia na
compreensão da dimensão da história política, numa perspectiva da nova história política é René
Rémond (2003) ao considerar que o político é o espaço de gestão da sociedade global, ele conduz
outras atividades e regulamenta seu exercício. As decisões da esfera política podem criar novas
conjunturas que abrem campo para outras atividades de todo tipo, e isso ocorre porque ela se
vincula a outros domínios da vida coletiva. Apesar de o autor considerar essa conjuntura, ele coloca
que nem tudo é político, constatando “[...] que o político é o ponto para onde conflui a maioria das
atividades e que recapitula os outros componentes do conjunto social.” (RÉMOND, 2003, p. 447). No
que concerne à estatística, partimos do pressuposto, conforme explica Jean-Louis Besson (1995),
que elas não podem ser tratadas como realidade ou como verdadeiras ou falsas, devendo ser
percebida como um conhecimento relativo, logo, é possível entender que seus dados não são
neutros. Ainda sobre a discussão dos conceitos fundantes para este trabalho citamos Rusen (2015),
pois este autor entende que o método histórico é a regulação do processo cognitivo e faz com que os
procedimentos sejam reconstruíveis, controláveis e criticáveis. Ao utilizarmos o método histórico
compreendemos que ele guia a pesquisa por meio de regras que caracteriza o conhecimento
histórico enquanto ciência. Em conjunto com o método histórico, também será utilizado o método
denominado história serial que tem por objetivo, de acordo com Barros (2004), o uso de fontes que
demonstram uma certa homogeneidade ao mesmo tempo em que possibilita quantificar ou serializar
informações, na tentativa de detectar regularidades nos documentos analisados. Ao iniciarmos a
análise das fontes, inferimos, de maneira geral, nas primeiras apreciações que à medida que os anos
foram passando, as informações trazidas nas Mensagens Presidenciais ao Congresso Nacional foram
sendo aprofundadas nos documentos. Logo, ao averiguar cada um das fontes supracitadas, se
constatou um aumento das informações, assim como, um cuidado em detalhar os subtemas em
cada tópico. No que concerne ao subitem Educação e Cultura os documentos deixam claros o
discurso que as mudanças na área de educação e cultura são um compromisso do governo para o
desenvolvimento social e cultural da nação brasileira e tratam sobre a democratização do ensino
como fator importante para o crescimento da nação. Outro elemento constatado é o fato de haver
um maior número de informações sobre o ensino superior e as estratégias governamentais para esse
nível. Os documentos também dão grande atenção aos temas analfabetismo e população pré-
escolar, trazendo dados sobre a expansão de matrículas e escolas, aquisição e reforma de ambientes,
bem como a aquisição de material didático para o ensino de 1º grau. Outro aspecto que chama a
atenção é que ao tratar sobre cultura, os documentos corriqueiramente fazem menção à educação
física como sendo um fator de grande importância. No que concerne ao ensino de 2° e suas
estatísticas, objeto de estudo deste trabalho, traz informações sobre temáticas como: projetos de
capacitação de recursos humanos por meio de programas como o Aperfeiçoamento de Pessoal para
a Formação Profissional (CENAFOR) e o Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Médio (PREMEM)
que em 1979 atingiram um total de 4.626 docentes e 382 especialistas; os documentos também
versam constantemente sobre número de matrículas; bolsas de trabalho; aquisição de equipamentos
para os estabelecimentos de ensino. É interessante constatar que as Mensagens Presidenciais ao
Congresso Nacional não trazem uma homogeneidade na forma de apresentar os dados, pois em
determinados momentos trabalham com números, inclusive apresentando o montante gasto ao
longo do ano, em outros casos, apenas relatam de maneira mais superficial as ações produzidas,
não trazendo nenhum número ou dados estatísticos acerca do que efetivamente feito no decorrer do
ano. Essa inferência é constata em especial na educação de 1º e 2º graus, visto que ao tratarem do
ensino superior os documentos trazem mais elementos sobre as ações que foram executadas. Outro
elemento relevante de se observar é que nos primeiros anos da década de 1970, sempre que as
mensagens tratavam do ensino de 2º grau também abordavam o ensino de 1º grau, o que impossibilita,
por exemplo, saber quanto foi o valor total dos recursos investidos em cada um desses graus de
ensino. Notamos também, em algumas fontes, comparações entre os anos anteriores para se
justificar ações, ou aumento de matrículas que foi acontecendo ao longo dos anos, isso demonstra
uma certa preocupação na utilização dos números para demonstrar o desenvolvimento das ações
na área de educação. As apreciações aqui expostas demonstram a necessidade de se analisar os
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Referências
BARROS, José D’Assunção. O campo da história: especialidades e abordagens. Rio de Janeiro: Vozes,
2004.
BERSTEIN, Serge. A cultura política. In: RIOUX, Jean-Pierre; SIRINELLI, Jean-François. Para uma
história cultural. Lisboa: Editorial Estampa, 1998. p. 349-363.
RÉMOND, René. Por uma história política. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003.
RUSEN, Jorn. Teoria da História: uma teoria da história como ciência. Curitiba: Editora UFPR, 2015.
ISSN 2358-3959
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A Escola Doméstica de Nossa Senhora do Amparo foi fundada em 22 de janeiro de 1871 pelo seu
idealizador, padre Siqueira, que tinha como premissa atender meninas órfãs e desvalidas. Foi em
Petrópolis a cidade que padre Siqueira escolheu para iniciar sua obra, possivelmente porque já sabia
daquelas terras e que a Corte ali se instalava, com isso, seria mais fácil chegar ao Imperador para
pedir ajuda para os seus ideais de educação. Padre Siqueira realiza, no período em que esteve em
Petrópolis, várias viagens, procurando novos conhecimentos, visitando escolas públicas e
particulares, falando aos ricos de seus planos. Sempre tivera vontade de cuidar de menores
abandonadas e educá-las em sua formação. Seu sonho era que essas menores se tornassem
mulheres capazes de assumir seu papel na história. Educar as meninas desvalidas para que
pudessem, no futuro, viver honestamente de seu trabalho, quer como boas mães de famílias, quer
como empregadas domésticas, quer como representantes do magistério, seja em casa ou nas
escolas. A troca de missivas, prática bastante comum da época, também era realizada pelo padre
Siqueira. Para se comunicar com a família Imperial, escreve uma carta ao Imperador Dom Pedro II,
solicitando apoio para construção e a autorização de funcionamento de sua escola. Entre uma
correspondência e outra, padre Siqueira envia e recebe várias outras cartas que possivelmente
dialogam a fim de obter ajuda para a construção de sua escola. Entre tantas missivas trocadas, padre
Siqueira se comunica com vários benfeitores e outros sacerdotes para auxílio de sua obra. No centro
histórico da cidade serrana do Rio de Janeiro, Petrópolis, margeando um dos rios principais da
cidade, encontra-se atualmente a Escola Doméstica de Nossa Senhora do Amparo de fachada
imponente, bem cuidada e que ocupa grande parte da extensão do quarteirão. As paredes rosadas
da importante construção da Escola Doméstica de Nossa Senhora do Amparo guardam, também, as
marcas deste mesmo passado, tendo em vista sua existência desde a época da família imperial na
cidade. O imperador, Dom Pedro II, foi apresentado à Escola pelo fundador da instituição: o padre
Siqueira. Essa escola mantém também a guarda destas cartas trocadas entre o padre Siqueira e seus
correspondentes em sua Sala-Museu, localizada no interior dela. Na Sala-Museu organizadas em
vitrines encontram-se os ego-documentos, itinerários de viagens, cartas enviadas e recebidas pelo
padre Siqueira, assim como alguns documentos da Escola Doméstica de Nossa Senhora do Amparo.
Alguns manuscritos também fazem parte do acervo organizado nas vitrines, entre eles: o Opúsculo
sobre a educação, documento que padre Siqueira explica ao Imperador Dom Pedro II seu programa
de Educação e deixa claro sobre o cuidado com as meninas desvalidas. Este documento está exposto
como um dos primeiros a serem vistos. Trata-se de um acervo que guarda além das cartas trocadas
outros documentos museológicos, que incluiu diversas categorias documentais: desde cartas,
cadernetas, anotações pessoais, objetos, listas de despesas, até a arquitetura traçada pelo próprio
protagonista, artífice da construção a partir de sua idealização. Entre vários documentos deixados
pelo fundador, neste trabalho, as cartas serão eleitas como objeto de estudo. O presente estudo tem
como objetivo analisar, por meio das missivas trocadas entre o padre Siqueira e seus correspondentes,
quais foram suas motivações, suas perspectivas, suas aspirações e, também, suas angústias, suas
tristezas e seus insucessos para a realização dessa obra voltada à educação feminina. As cartas
trazem em si, o conhecimento de um passado – distante ou não – que permite vislumbrar um fato
ocorrido. A carta é uma maneira de apresentar ao correspondente o decorrer da vida cotidiana. Por
meio da correspondência, o indivíduo acaba por criar uma literatura de si próprio e essa literatura
objetiva transpor os limites da linguagem, pois se trata de reinventar e de ultrapassar os limites do
que somos. A reflexão acerca da escrita da carta, do tipo de letra e sobre a mensagem que ela quer
passar, precisa ser extraída com rigor científico, pois qualquer lapso pode levar à perda de
informações precisas, pois, mesmo quando se perde em expressão gestual e interativa, a carta ganha
em sua capacidade de autonomia e espaçamento. Ao eleger cartas como fonte, o historiador/
pesquisador precisa realizar perguntas para sua fonte “carta” e estabelecer um diálogo interdiscursivo
e perceber que o que está escrito na carta não são somente as palavras e a mensagem, mas sim um
lugar privilegiado de emoções, acontecimentos, sentimentos e temporalidade e quais fatos
subjetivamente marcantes estão inseridos naquele contexto. Tentar compreender a biografia
individual, narrada em forma de cartas, abre para o pesquisador várias possibilidades para entender
as intercessões entre as evoluções estruturais e as trajetórias individuais, colocando-as sob dilemas
humanos e sociais. A escrita autobiográfica pode ser considerada como uma escrita histórica capaz
de remeter a aspectos incontornáveis da experiência humana. Em um plano mais específico,
investigar o padre Siqueira no seu tempo e na sua contemporaneidade, analisando as ideias que o
moveram na realização de sua obra; evidenciar as pessoas que o ajudaram, por meio de sua memória
documental localizada na Sala-Museu; analisar o que o moveu a criar essa fundação; identificar
aqueles com os quais ele se correspondia. Os procedimentos metodológicos remetem a uma
pesquisa qualitativa, essencialmente documental, que tem como fonte principal as cartas localizadas
no acervo museológico guardadas. A Escola Doméstica de Nossa Senhora do Amparo nos deixou não
apenas um legado da própria cultura escolar, mas também pistas de um passado intrigante, por
meio do acervo localizado no interior da escola, cheio de perplexidades de como essa obra foi
idealizada, executada e finalizada e, ainda, quais foram os desafios no caminho de sua construção.
Em meio a tantos objetos disponíveis na Sala-Museu, é necessária uma imersão na tentativa de
buscar os sinais de uma vida e de uma obra deixados pelo registro histórico escrito, e tentar trazer a
mensagem o mais próximo daquilo que ela representa. Todo documento histórico traz pedaços da
realidade histórica e não a realidade histórica num todo. Como referencial teórico-bibliográfico,
tomaram-se os escritos de Heymann (2012) para entendimento da Sala-Museu e arquivo. Bahktin
(1992), que para ele, a carta, com suas várias formas, faz parte dos gêneros discursivos e é tão rica e
diversa quanto as possibilidades da atividade humana são inesgotáveis. Cunha e Mignot (2002), que
relatam que ao iluminar estes papéis “ordinários”, pode-se pensar na importância de uma “memória
de papeis” para o reconhecimento de diferentes práticas, costumes, rituais, ações e sociabilidade.
Castilho e Blass (2015), que destacam que a escrita epistolar serve para quebrar os muros do silêncio,
levantar pontes de papel e propiciar conversas a distância. Também irão nortear a análise e estudo
das cartas; Vasconcelos (2015) e Cunha (2015) direcionaram o trabalho e enfatizando que as cartas
trocas trazem as narrativas da escrita de si e do outro, portanto, são consideradas ego-documento.
Assim, o presente trabalho evidencia a construção de uma obra dedicada à educação da pobreza,
especialmente a mais desvalida, a do sexo feminino. O estudo é finalizado com a apresentação das
ideias trocadas e compartilhadas e das expectativas que ele tinha sobre a realização de sua obra,
identificando as suas perspectivas em termos de uma escola para meninas e com a descrição das
suas ideias acerca da educação feminina. O recorte temporal da pesquisa, se dará no período de
1868 até 1880 data em que o padre Siqueira esteve à frente de sua obra. Debruçar sobre as cartas e
analisar a caligrafia escorreita do padre Siqueira, leva a visualizá-lo com os dedos sujos no tinteiro,
preocupado com o futuro das meninas que abrigava, traçando, nos seus escritos, as ideias para o
formato de educação feminina que buscava. A imersão em sua história possibilitará um universo de
possibilidades obtidos por olhares atentos aos mínimos detalhes de cada carta analisada.
ISSN 2358-3959
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localizada na capital paulista, cuja missão, desta vez, não consistia na habitual prática das preceptoras
de ensinar língua estrangeira e piano aos filhos, mas contratada para ensinar o filho adolescente
Carlos a amar. O idílio, como Mário de Andrade também a chamou foi publicada no final da República
Velha, num contexto em que o Brasil vasto contava com uma população maciçamente analfabeta,
tanto nas áreas rurais quanto urbanas, quando emerge em São Paulo uma burguesa industrial,
descontente com a política voltada para exportação do café, numa ocasião de expressivo aumento
da quantidade de imigrantes, principalmente italianos. Amar verbo intransitivo, demonstra uma
conjugação difícil já que, pela subversão do ato educativo, apresenta-se uma lição de amar, mas um
amar programado, ensinado, superficial na medida que o verbo pede, mas não recebe complemento,
tornando-o sem rumo e passageiro, sob a crença de que tal sentimento comporta poder-se amar
simplesmente, sem prender-se ao objeto do amor. Apenas uma iniciação amorosa para o filho,
encomendada pelo patriarca senhor Souza Costa, sem compartilhar sua real intenção com a
matriarca dona Laura, submissa, quieta e completamente sujeita às decisões do marido, enquanto
modo de agir tão comum naquela época. A família Souza Costa simbolizava a nova burguesia
paulistana, os novos-ricos: uma burguesia industrial urbana. De fato, a presença de preceptoras
estrangeiras era prática comum, para o ensino de piano, alemão, francês e etiqueta requintada de
comportamento social, sendo que no idílio vê-se que a Elza, ou Fräulein ministrava tais conhecimentos
ao adolescente Carlos e às irmãs menores Maria Luísa, com doze anos, Laurita com sete e Aldinha
com cinco anos, como maneira de ocultar a real empreitada naquela mansão de Higienópolis. Nessa
perspectiva, o centro do debate passa sobretudo pela questão patrimonial, já que o jovem Carlos
poderia se imiscuir com mulheres pobres e, apaixonando-se “por uma qualquer” levaria a risco a
fortuna da família em razão da possibilidade de, ao mesmo tempo, trazer para sua família alguém
sem posses impedindo-o que se relacionasse com “moças de família”, também abastadas,
perpetuando-se o poder e domínio. O que não se quer é a redução ou diluição do patrimônio dos
Souza Costa por conta de uma aventura de adolescente com instintos à flor da pele. Entretanto,
porque uma preceptora alemã e não uma de cá? A hipótese que se constrói está relacionada à
intenção da família valer-se dos serviços de Fräulein para dar um lustro civilizatório na prática da
iniciação sexual do jovem rapaz. Amar verbo intransitivo traz a dicotomia sentimento, paixão em
contraponto com razão, como mecanismo de solução prática para resolver problema da vida que se
apresenta. O caráter nacional do alemão contrasta com a mesmice dos brasileiros, vagarentos, que
não sabem aritmética e não somam coisa nenhuma. Aliás, só servem para serem empregados – e da
esfera pública –, ao passo que num olhar de superioridade Fräulein se considera pertencer a uma
raça mais forte afirmando que tanto os índios, os negros quanto portugueses são de raça inferior,
mas era obrigada a fugir de sua terra em razão da fome, falta de oportunidades, de modo que nem o
amor é transitível nem seus sonhos. É, pois, um romance, sob a égide das ideias modernistas em que
Mário foi protagonista para internalizar em terra tupiniquim as vanguardas europeias para suprimir
sentimentalismo piegas, para tornar o texto literário mais objetivo, ao mesmo tempo crítico. Não
bastasse, na perspectiva do cubismo assimilado por Mário, percebe-se uma fuga do formato de
escrita aparentemente certinho/organizado. Parece, contudo, haver também forte influência do
futurismo, marcado pela irreverencia do autor que, em várias passagens, dialoga com os personagens,
apresenta trechos em outras línguas, numa engrenagem de texto fluido e veloz. Quanto ao método
empregado, trata-se da análise crítica de vestígios do passado, sintetizados no conceito de operação
historiográfica (CERTEAU, 1982). Dada a natureza da fonte literária, esta passa a ser analisada em
cotejo com outras fontes para a construção da narrativa histórica que comporta dimensões subjetivas,
imaginárias tão importantes como fatos de natureza política. Assim, o papel do historiador não se
limita à crítica estética interna da obra Amar Verbo Intransitivo, mas todos os aspectos necessários à
compreensão dos comportamentos individuais e coletivos. Em linhas conclusivas, ainda que
parciais, infere-se que Mário retratou em sua obra o fenômeno das famílias aristocratas brasileiras
que buscavam professoras que expressassem condutas irretocáveis em função da forte preocupação
com a conduta moral daquelas que fossem as preceptoras dos filhos e ainda, que tivessem gostos e
práticas requintadas ao costume europeu. Ao mesmo tempo, subverteu tais ideias ao retratar
Fräulein como uma educadora sexual das elites paulistanas, como uma mulher triste e frustrada
consigo mesma e com o mundo ao redor.
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Thiago Andreuci
Janaína Maria De Souza
Este trabalho, fruto de uma pesquisa de mestrado em andamento, tem como objetivo compreender
fatores que demonstrem a posição da Igreja Católica no debate acerca da liberdade de ensino
público-privado presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1961. Serão analisadas as
estratégias discursivas da Igreja utilizadas pelo que denominavam “boa imprensa” no recorte de
1959 até 1964, enquadrando movimentações prévias à promulgação da Lei e os ecos desta até o
golpe civil-militar. O tratamento dos dados fez-se pela análise histórica e de conteúdo utilizando
como fonte o jornal impresso “O Arquidiocesano” de periodicidade semanal, disponível para
consulta no Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana e a LDB de 1961, disponível online no
site da Câmara Legislativa Federal. Ao encontro dos interesses da Igreja, o desenrolar da morosa Lei
de Diretrizes e Bases da Educação era um elemento que merecia atenção e divulgação favorável em
artigos específicos. Igreja e política se misturavam na mesma proporção que a própria política se
relacionava à educação, criando um triângulo de intenções. A campanha pela elaboração da
legislação nacional que ordenaria os caminhos da educação estampou manchetes dos mais variados
periódicos do país, incluindo o jornal O Arquidiocesano. Em 29 de junho de 1959 fora publicada a
primeira edição do jornal O Arquidiocesano, órgão oficial da Arquidiocese de Mariana, abrindo
portas para a Igreja católica aliar preceitos morais, cívicos, éticos e educacionais através de novos
meios de comunicação, indicando, assim, à sociedade marianense os caminhos justos à fé católica.
A cidade de Mariana é ponto vital e estratégico para o estudo da formação de Minas colonial. Às
margens do Ribeirão do Carmo, a chamada cidade histórica dos dias atuais surgiu de forma pioneira
como fruto das muitas expedições paulistas que eclodiram no final do século XVII em busca dos
aluviões auríferos, achados que tornaram famoso o Vale do Tripuí, futuro berço da vizinha Ouro
Preto. Vila de Nossa Senhora de Ribeirão do Carmo foi elevada a cidade em abril de 1745 chamando-
se Mariana por homenagem à rainha D. Maria Ana d’Áustria. Tornou-se sede do bispado de Minas
com a chegada de D. Manoel da Cruz à cidade em 1748 e em 1750 viu erguer-se o Seminário da Boa
Morte, que cumpria a nobre missão de ser instrumento do acesso ao ensino superior por uma parcela
da população, além de revitalizar o controle moralizador da Igreja na região. Desta maneira, a Igreja
Católica intensificou sua influência em Mariana e concomitantemente passou a participar de forma
ativa no crescimento da cidade. Buscar compreender a influência católica na sociedade de Mariana
é aquiescer à relevância da sede da primeira capital e bispado do estado de Minas e, por consequência,
à potencialidade do estudo capaz de revelar particularidades significantes na história da educação
brasileira. Diante de tais aspectos, de que maneira o periódico da arquidiocese de uma cidade
historicamente católica divulgava e trabalhava as problemáticas envolvendo a educação, em um
contexto amplo, que seria deferida às famílias cristãs? O Arquidiocesano tinha a função de educar
seus fiéis, seja dentro dos motes religiosos ou fora deles. Em comunhão, o profano e o sagrado
partilhavam as páginas de tal forma que o fiel católico poderia adquirir na leitura do periódico
conhecimentos que contemplavam o corpo e também a alma. As fontes são produções humanas e
registros das relações entre os homens e um dado momento histórico (TOLEDO & JÚNIOR, 2012),
neste caso, as páginas do jornal revelam a relação entre uma instituição secular a própria sociedade
que a rodeia. A boa imprensa, católica, apostava nos jornais como um método moderno e eficaz de
propagação daquilo que consideravam ser o bem aos assuntos religiosos, ademais, as páginas do
jornal extrapolavam o corriqueiro e adentravam também em assuntos políticos, deixando claro o
viés do periódico e contrariando a premissa de criação veiculada na razão do jornal. O envolvimento
de instituições religiosas com a educação, escolar e não escolar, é um assunto muito explorado na
História da Educação. Desde os jesuítas, passando pelos atributos cristão necessários aos professores
no Império, até o ensino religioso nas escolas no século XX, a religião cristã caminha junto à educação
com olhos severos e atentos a quaisquer mudanças na sua força diante do imaginário educacional.
O Arquidiocesano debruçou-se de forma considerável acerca de assuntos educacionais, como
atestam Fernanda Aparecida Oliveira Rodrigues Silva e Rosana Areal de Carvalho (2018), veiculando
artigos que citavam o Conselho Municipal de Educação, a Campanha Nacional dos Educandários
Gratuitos, o Fundo Nacional do Ensino Médio, bolsas de estudos, a educação religiosa das crianças,
preocupação com analfabetismo, compromisso das escolas particulares em conceder matrículas
gratuitas, e em mais de uma oportunidade participou, à sua maneira, dos debates em volta da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação. O processo de consolidação da Igreja Católica no Brasil foi,
categoricamente, pautado por características políticas e não tardou para que o Arquidiocesano
fizesse sua primeira referência, contrária, ao comunismo na edição número 4 e de lá citando
esporadicamente alguns assuntos até que o projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação viesse
à tona na edição 25. O discurso do jornal se pauta sob a bandeira da liberdade de ensino, uma
igualdade entre Escola Pública e Particular em que o estudante fosse livre para escolher entre as
duas ofertas de educação. Ademais, seguindo o preceito do Direito Natural do Cristão, há de se
garantir oportunidades iguais a todos e o Estado deveria assumir o papel de provedor dos recursos
necessários. A soma desses fatores culminaria num regime verdadeiramente democrático da
educação, dispare das iniciativas comunistas, antipatrióticas e anticatólicas. Roque Spencer Maciel
de Barros (1960), nos faz refletir sobre o conceito de liberdade de ensino não como uma permissão e
legitimação de escolas particulares patrocinadas com dinheiro público, mas sim como liberdade de
se ensinar e aprender. Uma escola democrática seria aquela onde, independentemente da crença ou
classe social, todos tivessem acesso à educação. Assim, questionamos: qual dos espaços escolares
iria se comprometer a acolher o estudante independente de sua religião ou poder aquisitivo e,
consequentemente, deveria receber suprimentos do Estado? Com periodicidade semanal, atingindo
cidades e distritos com sua tiragem de 6000 exemplares, O Arquidiocesano transfigurava sua retórica
espiritual em influência política, tornando parte de sua agenda um espaço de propaganda do que a
Igreja Católica considerava legítimo dentro do debate público-privado. O jornal utilizava da estratégia
direta de idealizar o crítico da LDB como um inimigo antagonista aos bons costumes cristãos e
familiares. O comunista, o antipatriota, anticatólico, o vermelho, o laico e totalitário, todos esses
personagens constituem uma amálgama do que deveria ser combatido pelos leitores do periódico.
No recorte apresentado, da fundação do jornal em 1959 até o golpe civil-militar de 1964, a LDB
estampara cinco artigos em sua maioria de tamanhos consideráveis, com discursos diretos e
claramente ideológicos, mostrando a razão deste jornal, expondo de forma clara a posição do órgão
oficial da Arquidiocese de Mariana acerca do debate sobre a liberdade de ensino brasileira. Debruçar-
se sobre periódicos regionais de diferentes épocas nos transporta como espectadores privilegiados
das motivações características tanto dos que produziam o impresso, como daqueles que consumiam
suas páginas. No que tange à História da Educação, a utilização da imprensa como fonte possui uma
eficácia já atestada e uma potencialidade capaz de incitar novas perguntas e hipóteses. Através das
páginas do O Arquidiocesano, da “boa imprensa”, podemos imergir no contexto educacional do
período pela ótica do âmago social, e nesse viés pode-se buscar compreender de forma mais apurada
conceitos e ações pertinentes à educação, avaliando seus desdobramentos no tocante à verdadeira
disputa entre os defensores das instituições públicas ou particulares. A problemática que envolve a
dicotomia da educação público-privada é densa e constantemente absorve novas particularidades.
As intenções deste trabalho se pautam em ilustrar este debate a partir da ótica religiosa de um
periódico regional em um determinado espaço de tempo, buscando contribuir com futuras pesquisas
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 175
que abordem o tema. Diante da concepção de que a imprensa enriquece o olhar do pesquisador em
História da Educação e proporciona-lhe documentos com um prisma de interpretações, o periódico
“O Arquidiocesano” nos apresenta elementos sobre a educação (escolar e não escolar) da primeira
cidade e capital de Minas Gerais durante mais de três décadas. De riqueza equivalente aos resultados
já obtidos por autores que o estudaram, tem-se a potencialidade que o tal periódico expõe sobre o
horizonte dos estudos tocantes à História da Educação, inclusive, sobre o debate entre o ensino
público-privado.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este trabalho tem por objetivo apresentar os procedimentos e questões associados à elaboração
de um guia preliminar de arquivos públicos do Estado de São Paulo que possuem documentação
acerca da expansão da estrutura física da rede de ensino secundário do estado de São Paulo nas
décadas de 1940 a 1960, sobretudo associados a setores responsáveis por obras e serviços públicos
escolares. Trata-se, portanto, da primeira etapa de uma pesquisa que visa entender como ocorreu
o processo de expansão da rede e quais parâmetros arquitetônicos foram adotados nas escolas
secundárias no estado de São Paulo. Para o mapeamento e elaboração do guia de fontes, foi
considerado os termos arquivísticos contidos em Bellotto (1996) e APESP (2018).
Face a especificidade do tema proposto, a revisão elaborada por Bencostta (2019) foi utilizada
como referência para compreensão de diferentes tendências no estudo da arquitetura escolar. Com
relação a história do ensino secundário no Estado de São Paulo, foi considerado o estudo de Souza e
Diniz (2016). Informações que compõem a história institucional da Secretaria de Educação no Estado
de São Paulo e dos órgãos da administração pública responsáveis pelo processo de construção
das escolas executadas por meio de convênios firmados entre Município e Estado, também foram
considerados, no intuito de realizar buscas assertivas nos bancos de dados dos arquivos mapeados,
portanto, os principais descritores utilizados em todos os sistemas e plataformas de busca foram:
“arquitetura escolar”, “ensino secundário”, “convênio escolar”, “construção de escolas”, “PAGE”,
“FECE” e “IPESP”.
Considerando o recorte temático proposto para este mapeamento e a bibliografia de referência, a
busca por arquivos e acervos públicos e privados foi organizada em três eixos: 1°: arquivos estaduais
e municipais que possuem fundos que contemplam a educação pública e especificamente o
ensino secundário; 2°: arquivos e acervos voltados para execução de obras e serviços que possuem
documentos relativos à expansão física da rede e arquitetura das escolas de ensino secundário e
3°: acervos digitais que contêm Projetos de Lei, Leis e Decretos que determinam a edificação de
escolas secundárias. No âmbito do primeiro eixo, os arquivos identificados foram: Arquivo do Estado
de São Paulo, Arquivo Histórico Municipal, Acervo do Centro de Memória Mario Covas, Arquivo
Intermediário da Prefeitura de São Paulo e o Centro de Memória de Educação da USP. Quanto dos
arquivos que tratam de obras, serviços e arquitetura escolar: Fundação de Desenvolvimento Escolar
– FDE, Acervo do Departamento de Edificação da Prefeitura – EDIF, Acervo da Companhia Paulista de
Obras e Serviços, Acervo da biblioteca da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e o Instituto
de Arquitetos do Brasil – IABsp. Os acervos digitais voltados para as normativas e legislações da
educação foram: Assembleia Legislativa e Câmara Municipal de São Paulo.
No Arquivo Público do Estado de São Paulo, no Centro de Acervo Permanente, é possível encontrar
o fundo da educação composto por documentações produzidas entre 1886 e 1963. Os documentos
não foram organizados e nem avaliados antes do seu recolhimento, portanto, permaneceram na
ordem em que foram recolhidos. Os principais conjuntos foram identificados e para o mapeamento,
somente o conjunto “obras e serviços” foi considerado. O conjunto compreende 100 caixas e
deste total, 50 versam sobre o recorte temporal deste mapeamento, entretanto, os documentos
identificados por “criação de escola” ou “construção escolar” estão relacionados, em sua maioria,
aos projetos de lei que podem ser acessados digitalmente no site da Assembleia Legislativa ou da
Câmara Municipal. No Centro de Acervo Administrativo do Arquivo do Estado, encontra-se extensa
documentação do fundo de educação, em especial das décadas de 1940 a 1970, entretanto, estão
em processo de avaliação documental. São 29 (vinte e nove) mil caixas, com aproximadamente 100
pastas. Apesar do acervo não estar aberto ao público, foi autorizado a análise documental dos itens
que já foram avaliados e que estão sendo organizados temporariamente em três categorias: guarda
permanente, atividade fim e eliminação. Na guarda permanente, a maioria dos documentos refere-
se aos projetos de lei emitidos pela ALESP. A quantidade de documentos que está sendo separada
na função de atividade fim, em comparação com a guarda permanente é maior, e os principais
assuntos identificados são: mapa de movimentos, levantamento estatísticos acerca do auxilio
fornecido pelo Estado para as despesas de transporte de alunos e parcerias com empresas privadas.
Os respectivos documentos evidenciam a função especifica da Secretaria de Educação nas décadas
de 1940 a 1970. Quanto do Arquivo Histórico Municipal, o acervo concentra-se em documentos
relacionados à comemoração do IV Centenário da cidade de São Paulo. Referente às escolas, os
documentos identificados, principalmente no setor cartográfico e na mapoteca, referem-se às
plantas arquitetônicas de grupos escolares, colégios e escolas técnicas consideradas emblemáticas
durante o período da década de 1950. O Centro de Memória da Faculdade de Educação da USP
conta com documentos que retratam a realidade do ensino secundário nas décadas de 1950 e 1960,
principalmente com relação aos dados estatísticos de matrícula e expansão da rede. O principal
fundo mantido pelo Centro de Memória é do Instituto Caetano de Campos.
Com relação aos acervos digitais da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal, é possível
localizar todas as leis que regulamentaram o processo de criação e construção de escolas e, no
tocante ao Convênio Escolar, as leis que estabeleceram a parceria entre Município e Estado, e
instituíram as responsabilidades de cada ente governamental na oferta e garantia de ensino.
Os funcionários do EDIF, órgão municipal de construção de obras, em todos os contatos,
informaram desconhecer qualquer documento referente ao processo de construções escolares de
ensino secundário na década de 1940 a 1960, principalmente obras executadas pelo Convênio Escolar,
repassando a responsabilidade da guarda documental para a FDE. O contato com a Fundação de
Desenvolvimento Escolar é realizado, somente, pelo Sistema de Informação ao Cidadão – SIC. Após
várias solicitações, os funcionários informaram que os documentos que tratam da construção de
escolas secundárias, foram obtidas com a Companhia de Obras Públicas, portanto, os documentos
contidos na FDE não são considerados fontes primárias e a relação das escolas inventariadas pelo
Fundo de Desenvolvimento Escolar pode ser obtida por meio da leitura do livro “Arquitetura Escolar
Paulista – Décadas de 1950 e 1960”. Isto posto, considerando as informações deste livro, existem
pelo menos 85 documentos técnicos de arquitetura referente as escolas secundárias edificadas nas
décadas de 1950/60. O acervo da CPOS encontra-se em processo de transição para o Arquivo do Estado,
portanto, não está acessível aos consulentes, entretanto, a partir de uma listagem disponibilizada
pelo Centro Administrativo do Arquivo do Estado de São Paulo, foi possível identificar a variedade
de documentos que tratam diretamente da execução das obras escolares. Deste modo, quando
disponibilizado, se constituirá em fontes para o entendimento de como ocorreram os processos de
execução de obras escolares, desde os custos públicos, até alterações e cancelamento de obras,
contratações de escritórios de arquitetura, dentre outros documentos.
O Instituto de Arquitetos do Brasil do departamento de São Paulo, disponibiliza 399 boletins
digitalizados que datam de 1946 a 2009 que tratam de diversos assuntos, incluindo temas da
arquitetura paulista em voga nas décadas de 1940 a 1960. Demais documentos estão em processo
de catalogação e tem previsão de abertura para consulta pública em 2020. Por fim, a FAU apresenta
3 revistas de arquitetura e 1 revista de engenharia criadas entre as décadas de 1930 e com término
aproximado na década de 1970, que trazem em algumas edições a proposta da arquitetura escolar
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 178
que foi pensada pelo Convênio Escolar, pelo Fundo Estadual de Construções Escolares e pelo
Instituto de Previdência de São Paulo, sendo os dois últimos, referenciados ao Plano de Ação do
Governo Estadual de 1959.
Destarte, os resultados parciais demonstram que os dados e informações referentes ao processo
de expansão do ensino secundário são dispersos, reforçando a necessidade da disponibilização de
um guia que facilite a pesquisa acerca da temática. Essa dispersão também está associada ao fato de
que os recursos utilizados na década de 1940 a 1960 para a construção de novas unidades escolares
são descontínuos e de origem diversa. Parte deles, ainda em processo de mapeamento, é oriunda do
Instituto de Previdência Social para o Fundo Estadual de Construções Escolares – FECE, apresentando
indícios de desvio de recursos garantidores da previdência pública em prol da educação.
Bibliografia
APESP. Plano de classificação e tabela de temporalidade de documentos da administração pública do
Estado de São Paulo: atividades-meio. – 2. ed., revista e ampliada. – São Paulo: Arquivo Público do
Estado, 2018.
BELLOTO, Heloisa Liberalli & CAMARGO, Ana Maria de Almeida (coord.) Dicionário de Terminologia
Arquivística. São Paulo, AAB-SP/SEC, 1996.
SOUZA, Rosa Fátima de; DINIZ, Carlos Alberto. A articulação entre estado e município na expansão
do ensino secundário no estado de São Paulo (1930-1947). Entre o ginásio de elite e o colégio popular:
estudos sobre o ensino secundário no Brasil (1931-1961), Uberlândia, EDUF, 2014.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Palavras-chave: Estado da arte. Congresso Brasileiro de História da Educação. Escola Normal Rural.
O objetivo deste texto caracteriza-se em discutir acerca dos resultados obtidos em uma
investigação de caráter quali-quantitativa e análise bibliográfica na perspectiva do delineamento de
uma parte do estado da arte a partir de 7 trabalhos apresentados nas edições do Congresso Brasileiro
de História da Educação (CBHE) entre os anos de 2008 a 2017, acerca da Educação Rural, com enfoque
em “Escola Normal Rural”. Os anos de 1938 e 1960 foram marcados pelos índices elevados de
analfabetismo e baixa escolarização por parte da população brasileira, sobretudo nas áreas rurais.
Nesta conjuntura, apoiada ao movimento denominado “Ruralismo Pedagógico”, idealizado pelo
intelectual Sud Menucci, fortaleceram-se as propostas para a criação de Escolas Normais Rurais,
objetivando-se a formação de professores primários rurais (ou normalistas). Com vistas para fixar o
homem no campo e conter o crescente êxodo rural, o currículo das Escolas Normais Rurais
estruturavam-se, em linhas gerais, no ensino da Higiene rural, Sociologia rural, Educação rural e
atividades rurais. (FERREIRA, 2017; SILVA; COSTA, 2018). Tendo em vista o necessário mapeamento
historiográfico acerca das produções sobre as Escolas Normais Rurais, nos propomos em delinear os
estudos acerca da temática, publicados nos anais dos CBHE. A escolha do referido evento científico,
deve-se ao reconhecimento de que o mesmo desde ano de 2000 estabelece intercâmbios entre os
pesquisadores de História da Educação, do Brasil, contando também com a colaboração de
pesquisadores estrangeiros. Contribuíram para as discussões dos resultados desta investigação, os
estudos de Damasceno e Beserra (2004): levantamento bibliográfico, mapeando uma parte do
estado da arte sobre os estudos de educação rural no Brasil, nas décadas de 1980 a 1990, levantando
uma discussão dos estudos mais recorrentes, a organização regional destas produções, as tendências
atuais e as temáticas ainda não suficientemente exploradas. Pinho (2008): levantamento bibliográfico
a partir de 31 trabalhos na temática “história da educação rural” apresentados em alguns dos
maiores congressos de história da educação da América Latina (2001 a 2007). Ao tomar conhecimento
desta pesquisa, surgiu o interesse em atualizá-la e ir além dos seus itens de análise, mas com enfoque
no CBHE (2008 a 2017). Ávila (2018) localizou 15 teses, 50 dissertações, 8 artigos, 1 dossiê e 1 e-book
ao realizar um levantamento bibliográfico das produções existentes entre os anos de 2002 a 2016
acerca da educação rural na perspectiva histórica. Silva e Costa (2018) dedicaram-se em apresentar
o estado da arte sobre a historiografia das Escolas Normais Regionais Rurais no Brasil, através do
levantamento de 36 dissertações e 10 teses – Dissertações e Teses (DTs), localizadas na Biblioteca
Digital de Teses e Dissertações (BDTD) entre 2002 a 2017. Tendo em vista a aproximação dos nossos
objetos de estudo e a similaridade com o recorte temporal, a partir da investigação realizada por
Silva e Costa (2018) discutiremos nossos resultados, propondo tecer uma comparação entre o
esboço de uma parte do estado da arte em DTs e o que mapeamos a partir dos anais do CBHE sobre
Escolas Normais Rurais. De acordo com Ferreira (2002), as pesquisas denominadas “estado da arte”
objetivam-se em mapear e discutir o que está sendo produzido acerca de um determinado tema,
buscando responder “quando”, “onde” e “quem” produz tais trabalhos, apontando avanços, lacunas
e abrindo caminhos para futuras pesquisas. Para Nunes e Carvalho (2005), levantar discussões a
partir de trabalhos anteriormente produzidos é fundamental para a renovação da prática da pesquisa
histórica. Por compreender que o estado da arte se caracteriza pelo mapeamento de produções
(teses, dissertações, livros, periódicos, anais de eventos) acerca de uma determinada temática,
foram utilizados os seguintes questionamentos: a) quais as fontes utilizadas pelos pesquisadores? b)
quais as universidades e em quais regiões desenvolvem-se mais pesquisas sobre o tema? c) quais
regiões do Brasil precisam que as pesquisas sejam mais exploradas? d) quais os autores que mais
publicaram artigos sobre a temática? e) quais os referenciais teóricos mais citados? Entre os anos de
2008 a 2017, foram publicados 4.148 trabalhos nos CBHE. Destes, apenas 82 dedicam-se aos estudos
sobre a Educação Rural, o que corresponde a 1,97% do total de produções. No que diz respeito à
quantidade de trabalhos publicados sobre Escola Normal Rural, localizamos 7 produções: 1 em
2008, 1 em 2011, 1 em 2015 e 4 em 2017, demonstrando um aumento significativo no CBHE de 2017,
com relação as edições anteriores do mesmo congresso. Silva e Costa (2018), notaram um crescimento
quanto às DTs produzidas a partir de 2008, comparado aos anos precedentes, que não ultrapassavam
o total de 2 DTs. Quanto à distribuição geográfica dos trabalhos publicados nos anais do CBHE, 3
trabalhos foram produzidos no Nordeste, 3 no Centro-Oeste e 1 trabalho no Sul. Os grupos de
pesquisa demonstraram-se em importantes espaços para discussão e aproximação entre
pesquisadores, com o objetivo de realizar investigações e publicações de resultados por meio de
diversos meios para divulgação da pesquisa científica. Em uma pesquisa realizada através do
Diretório de Grupos de Pesquisa do CNpq localizamos 25 grupos, onde estes, possuem, pelo menos,
em suas linhas de pesquisa a Educação Rural, distribuídos nas regiões Norte, Nordeste, Centro-
oeste, Sudeste e Sul do Brasil. A UFMT conta com dois grupos que possuem, pelo menos, em suas
linhas de pesquisas o estudo acerca da Educação Rural: História da Educação e Memória (GEM) e o
Grupo de Pesquisa e Estudos em História da Educação, Instituições e Gênero (GPHEG). E a Unesp
também conta com dois grupos que possui, pelo menos, em suas linhas de pesquisa, o estudo acerca
da Educação Rural: Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Cultura e Instituições Educacionais (GEPCIE)
e Grupo de Pesquisa em Ensino, Cultura e Ideologia na Educação Básica da Zona Urbana e Rural
(GEPERU). As universidades que têm maior incidência de trabalhos publicados são: UFMT e a UECE.
Quanto aos autores: foi possível realizar uma análise mais aprofundada quanto à trajetória de
pesquisa dos autores dos textos encontrados. Acessando o currículo Lattes de cada um, destacamos:
Antonio Germano Magalhães Júnior: possui mais de 20 publicações acerca da temática e Sarah
Bezerra Luna Varela: sua dissertação trata sobre uma Escola Normal Rural. Apesar de não retornarem
ao CBHE nas edições posteriores, com publicações acerca da Escola Normal Rural, através de seus
currículos, foi possível compreender que outros meios como: projetos de iniciação científica,
publicações em periódicos e em capítulos de livros, configuram-se também, em espaços férteis para
divulgação da pesquisa científica. Através do mapeamento realizado por Silva e Costa (2018) é
possível observar uma certa disparidade no que se diz respeito à quantidade de trabalhos publicados
nos CBHE, e as 36 dissertações e 10 teses defendidas entre 2002 e 2017. Dos autores localizados a
partir do estudo anteriormente citado, apenas um pesquisador dedicou-se em publicar os resultados
de sua investigação no CBHE. Não temos o intuito de afirmar que o referido congresso constitui-se
no único espaço para divulgação dos resultados de uma pesquisa. Mas o que podemos perceber é
que muitos defendem suas DTs, mas poucos preocupam-se em divulgar o conhecimento produzido
no campo científico. Quanto às fontes utilizadas é predominante o uso de fontes documentais. E no
que se diz respeito aos referenciais teóricos, 6 fundamentam-se na perspectiva da Nova História
Cultural e 1 no campo marxista. Através de trabalhos sobre análise bibliográfica ou levantamento de
produções existentes na área desejada, é possível nortear o pesquisador, de forma mais simplificada
na busca por textos referentes ao seu objeto de estudo. Deste modo, as pesquisas que se dedicam
em realizar o mapeamento de uma determinada temática, estão incumbidas a abrir caminhos para
atualizações, preenchimento de lacunas ou novas investigações. A temática “Escola Normal Rural”
demonstrou- se em uma das lacunas a serem preenchidas por parte dos pesquisadores que
investigam a Educação Rural, pois esta, encontra-se inserida em um campo de investigação
minimamente visível. Haja vista que esta pesquisa apresentou os resultados de um mapeamento
realizado a partir dos trabalhos publicados nos anais do CBHE para futuras investigações sugerimos:
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 181
um mapeamento estado da arte a partir dos trabalhos sobre Educação Rural em periódicos
qualificados e livros.
Referências
ÁVILA, Virgínia Pereira da Silva de. Educação rural em perspectiva histórica. Pensar a Educação em
Revista, v.4, n.2, p. 1-21, jul./set. 2018. Disponível em: http://pensaraeducacaoemrevista.com.br/wp-
content/uploads/sites/4/2018/07/EDUCA%C3%87%C3%83O-RURAL-EM-PERSPECTIVA-
HIST%C3%93RICA.pdf>. Acesso em: 16 mar. 2019.
FERREIRA, Nilce Vieira Campos. A Escola Normal Rural Brasileira nos anos de 1938 – 1963. In:
CONGRESSO BRASILEIRO DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO, 9... 2017, João Pessoa, Anais..., João Pessoa,
2017, 13 p. Disponível em: https://drive.google.com/drive/folders/1Y-aJeoZ0VJjSAZolAd0JKKtVFijBV
Vgr>. Acesso em: 20 jul. 2019.
PINHO, Larissa Assis. A pesquisa sobre Educação Rural em Congressos de História da Educação
(2000-2007). In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO, 5... 2008, Aracaju. Anais...
Aracaju, 2008. 15 p.
SILVA, Tiago Rodrigues da; COSTA, Odaleia Alves da. Historiografia das escolas normais regionais
rurais do Brasil: estado da arte. Revista eletrônica Documento Monumento. vol. 24. n. 1, dez. 2018,
p. 45-66.
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ISSN 2358-3959
A pesquisa aqui apresentada a problemática de trabalho a partir das fontes documentais para a
área da história da educação. Pretendeu-se desta forma analisar duas fontes de pesquisa documentais
sendo: os documentos oficiais dos mais diversos encontrados nos arquivos públicos municipais
assim como as entrevistas que se tornam documentos após serem gravadas e transcritas. Estes
documentos foram organizados e analisados e compuseram as fontes de uma pesquisa acadêmica
de doutorado já concluída. E nos fizeram compreender a importância da preservação e a necessidade
de que se tenha um banco de informações e de fontes onde as pesquisas já realizadas destinem o
material coletado para que novos pesquisadores possam utilizá-los se necessário, compondo um
lugar de preservação e guarda de documentos históricos da região pesquisada. Diante disso, surge a
iniciativa de se constituir um Centro de Documentação regional em uma universidade pública neste
município e também através da parceria com a prefeitura municipal desta cidade, organizar e
coordenar a manutenção do arquivo municipal da educação do município. Faz-se necessário
esclarecer que outros materiais, além das referidas fontes, poderão compor o acervo documental do
Centro de Documentação regional, no entanto está pesquisa de doutoramento e com mais uma
pesquisa de mestrado defendidas por meio do mesmo projeto de pesquisa e sob a mesma orientação
possibilitaram iniciar um trabalho de busca e levantamento sobre a história da educação da região.
As referências teóricas que embasaram esta análise focaram na ideia de preservação da memória e
da história e na escrita da história , assim como o uso e o cuidados com as fontes, para isso utilizamos
como referências as obras de Le Goff (1990), quando aborda a questão da história por meio da
memória e a história monumento, de Certeau (2002) quando explica os modos de se escrever a
História; Burke (1992), quando analisa as questões referentes a escrita da história; Bacellar (2005)
por apresentar as questões sobre o acesso e arquivo documental, Alberti (2005) quando indica a
relação entre a entrevista como um documento. Nessa perspectiva metodológica o trabalho com as
fontes documentais e orais através da entrevista possibilitaram a análise da trajetória da pesquisa.
Consideramos que os enigmas encontrados pelo pesquisador são por ele considerados como as
pistas e os indícios para a construção de sua análise e assim possibilitam que seu trabalho seja
extremamente gratificante. No entanto, cabe ao pesquisador, que se tenha um foco bem apurado do
que deve considerar como material importante para a coleta de fontes documentais, afim de que
não se corra o risco que durante o andamento da pesquisa se escolha diversos rumos que nem
sempre foram propostos no início do estudo. A partir da seleção documental exige-se uma atenção
e organização do material trabalhado no sentido de perceber como esses documentos podem
compor o cenário e a trajetória histórica. Para tanto, os documentos históricos, devem ser
questionados a todo momento para que na análise da documentação oficial possamos verificar os
interesses presentes no documento, indicando quem o produziu e, quais as intenções de quem o fez,
como também as intenções de quem o preservou. Também devemos questionar a memória, quando
ouvimos os relatos dos entrevistados precisamos compreender que cada indivíduo lembra o que
considerou ser mais relevante e mais marcante na sua relação com o ato de lembrar. Diante disso,
compreendemos que os acontecimentos históricos precisam ser questionados para que possam ser
verificados com o olhar do pesquisador que o investiga. E também indicar quais são os caminhos e
lugares de guarda. Tais ações nos possibilitam verificar e analisar na perspectiva de diversos ângulos
o objeto colocado como centro da investigação, evitando-se engamos. A variedade de fontes de
pesquisa permite ao pesquisador da história da educação compreender que existe a dificuldade de
localizar as fontes, no entanto de uma forma outra podemos compor o cenário pesquisado, de
maneira que uma fonte pode contribuir com a outra, no entanto, cabe problematizar que uma fonte
não deve e nem pode substituir a lacuna deixada pela outra fonte, mas as aproximações e o
entrelaçamentos entre as diferentes fontes possibilitam um olhar mais apurado para o todo
pesquisado. De forma que a prática de pesquisar indica uma série de variantes e de determinantes
no trajeto da pesquisa. O pesquisador ao não encontrar acesso a todos os documentos deve
direcionar-se a outros tipos de documentos e fontes que contribuam para a reconstituição da
pesquisa. Tal busca por esses indícios faz parte da importante tarefa do pesquisador em história da
educação, no entanto é preciso perceber que a verdade detectada em um determinado acontecimento
nunca será a realidade concreta, mas será uma reinterpretação do que aconteceu. Não podemos
esquecer que a pesquisa é apenas uma leitura do passado e por mais detalhada que seja o
levantamento documental e a análise dos documentos é sempre um olhar do presente sobre o
vivido. As fontes documentais são entendidas como os documentos, registros, marcas e vestígios
deixados por indivíduos, por grupos, pelas sociedades e pela natureza que representam ou
expressam uma determinada forma de ser da matéria, seja natural, humana ou social em um
processo de contradição e transformação. Para tanto, a proposta de criação de um Centro de
Documentação regional objetiva promover reflexões acerca da preservação e ordenação de fontes
para a história da educação na região e construir uma proposta de estruturação do acervo no espaço
de uma universidade pública. Como também propiciar reflexões teóricas e metodológicas sobre a
constituição de acervos físicos, fortalecendo vínculos entre a universidade e a comunidade em seu
entorno, valorizando a memória escolar da região e estabelecendo parcerias entre outras instituições
de pesquisa, principalmente na área de educação e da história regional. Contribuindo para a
produção de uma história da educação local e regional, subsidiando pesquisas correlatas. O que
pretendemos é contribuir a partir da criação do Centro de Documentação regional, no espaço da
universidade pública brasileira, como um lugar que possibilite multiplicar os espaços de preservação
documental, em que a comunidade interna e externa tenha acesso aos mesmos. Outra possibilidade
é aproximar o pesquisador do seu meio privilegiado de investigação, a fonte. Possibilitando a
ampliação do ofício do pesquisador em educação e a aproximação de áreas como a história, a
arquivologia e a biblioteconomia. E diante disso, possibilitar ao estudante em educação e de outras
áreas que tenham o contato prático com a noção de memória, registro e fonte fazendo com que a
história da educação se materializa nas evidências encontradas a partir dos vestígios da ação
humana. A partir deste trabalho pretendemos iniciar uma ação de preservação da memória e da
história de modo que consigamos conservar as lembranças do passado para que esqueçamos de
nós mesmos, afinal o passado faz parte do nosso presente e nos possibilita olhar para o futuro.
Compreendendo que os acervos dos arquivos das prefeituras, escolas, bibliotecas e acervos pessoais
muitas vezes retratam o que a sociedade desejava que ficasse perpetuado para as próximas gerações.
Verificamos a possibilidade de se escrever a história da educação partindo das mais variadas fontes
documentais e a divulgação e organização dos acervos documentais indicam a possibilidade de
uma documentação disponível compondo um cenário social determinado. O trabalho de criação e
implantação do Centro de Documentação regional é um trabalho de garimpo e exige paciência e
muitos anos de dedicação e de estudos contudo compreendemos que os documentos sempre serão
uma representação do que foi e os acontecimentos que a documentação indica sempre deverão ser
questionados e esmiuçados e analisados pelo pesquisador, verificando quais foram os caminhos
trilhados, objetivando perceber as entrelinhas, as minudências mais negligenciadas,
independentemente de quais forem as fontes de pesquisa possíveis. Ao mesmo tempo, que a
trajetória pessoal e de um grupo social indicam elementos que compõe o cenário para um
pesquisador, as evidências indicam um contexto maior vivenciado em âmbito local, regional e
nacional, contribuindo assim para a história da educação brasileira em suas especificidades.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este texto apresenta resultados parciais da pesquisa de mestrado em Educação e tem como
objetivo compreender o pioneirismo de Fúlvia Rosemberg e o debate sobre as relações raciais e
suas questões étnico-raciais numa relação adulto-criança, um campo de estudos também pioneiro
na literatura infantil dos anos 70, problematizando o pioneirismo e a análise de representação na
literatura infanto-juvenil, a contribuição de seu trabalho para a idealização da infância, seu percurso
histórico e as análises produzidas em decorrência do livro; a discussão das lacunas e possíveis
diversidades nos resultados da pesquisa e divulgação do livro, estas possibilidades serão discutidas
tendo em vista os sentidos e criticas à produção, e a contribuição do estudo para educação. O final
dos anos 1970, e o transcorrer dos anos 1980 foram importantes para a análise do discurso e suas
interferências na sociedade brasileira, nessa onda de estudos após seu retorno ao Brasil, depois da
conclusão de seu doutorado na França, Fúlvia montou uma equipe para trabalhar na área que mais
lhe interessava no momento: a crítica da literatura infantil. Feminista, chegava com uma bagagem
intelectual ainda pouco conhecida entre nós, com os primeiros ecos das políticas da diferença, que
aqui mal arranhavam as denúncias das desigualdades sociais. Uma das primeiras pesquisadoras
brasileiras a trabalhar sobre representações da família nos livros infantis e o racismo nos livros
didáticos, havia já evidenciado em sua tese realizada na França e desde então tornada uma obra
clássica sobre este tema tanto na França quanto no Brasil. Nesse período a pesquisadora e sua
equipe fazem um questionamento sobre o conceito de Literatura infanto-Juvenil, o que é como
eram produzidos e comercializados os livros indicados para esta categoria, como os personagens,
as subjetividades e apresentação. Em 1985, Fúlvia Rosemberg apresenta um resumo deste material
em um livro intitulado “Literatura Infantil e Ideologia” colocando em discussão a especificidade
da literatura Infantil sua diagramação e qualidade, a linguagem (Textual e Visual), particularidades
não observadas naquele momento; como também o diálogo e o lugar da criança e do adulto como
produtores de um mesmo conhecimento. O resultado é uma obra sobre a abordagem histórica e
metodológica centrada nas questões de ideologia: relação adulto-criança, literatura infanto-juvenil
e análise de conteúdo. Inicialmente a construção de instrumentos toma como linha de trabalho a
reflexão crítica, sendo ela a preocupação subsidiária sobre o conteúdo dos livros e a contribuição
para a compreensão do ser criança, o uso da literatura infantil e seu conteúdo social, elementos
presentes na relação de dominação adulto-criança que, nesse processo de análise consistiu em
categorizar a percepção do leitor na bipolarização dominador-dominado, questionando assim o
discurso proferido para a criança na relação de poder. Nossa pesquisa ressalta o lugar e importância
de Fúlvia Rosemberg e o pioneirismo na produção intelectual na análise da produção de livros
infanto-juvenil no Brasil nas décadas até a década de 70 e as identificações das ideologias presentes
na produção. Entendidas as questões apresentadas por Rosemberg como fonte primária categoriza-
se a pertinência entre: A relação adulto-criança, a literatura infantil e ideologia, para estabelecer
instrumentos de coletas e análises de dados. Construímos um conjunto amostral classificatório
amplo de unidades de informação e com base nesse material, identificamos o seguinte problema:
o que caracteriza o abandono da pesquisa em literatura infantil depois da produção do livro por
Fúlvia Rosemberg? Quais os descaminhos? Como foram entendidas as críticas? Qual a repercussão
e contribuição dos resultados para constituição da literatura infantil?, como também o diálogo
e o lugar da criança e do adulto como produtores de um mesmo conhecimento. Como proposta
básica a contribuir com o significado da literatura a pesquisa documental possibilita a utilização
dos procedimentos de análise de fontes documentais; e de leitura de bibliografia especializada com
abordagem histórica sobre literatura infantil e a relação adulto crianças e as ideologias tais como:
questões étnicos-raciais, as categorias sociais, as editoras e o público leitor infantil e o momento
histórico-educacional, a busca por conhecer as razões e intenções para a realização de seu trabalho,
e a iniciativa da pesquisadora junto à Fundação Carlos Chagas - FCC, sendo este material coletado
diretamente nos arquivos da fundação, uma parte levantada no acervo pessoal da autora, em
propriedade da família e outra na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-PUC. A continuidade
é a historiografia do momento social e político vivido no Brasil no decorrer da realização do trabalho
da pesquisadora. Outras fontes estão sendo analisadas como apoio para nossa intenção de
pesquisa, em jornais e periódicos sobre a extensão deste material e seu uso nos diversos campos do
conhecimento como teses e dissertações e editoras.
Para o desenvolvimento optamos pela pesquisa documental, com a utilização dos procedimentos
de: Localização, dos materiais que deram início a pesquisa, os estudos com livros na década de
40 uma análise de Dante Moreira Leite (1950) sobre livros de leitura para escolares; na década
de 50 estudos sobre livros escolares (Bazzanela(1957) e Hollanda(1956) e na década de 1970 a
publicação de livros de recreação de Schreiber(1975); Recuperação dos documentos iniciais seus
pressupostos políticos e teóricos para entender o interesse de pesquisa motivos que levaram a
Fundação Carlos Chagas a realização material originário e o convite da pesquisadora e sua equipe
para realizar o trabalho de síntese e análise da literatura infantil produzida na época; Reunião de
material para aprofundar a perspectiva histórica que direta, ou indiretamente do tema no campo
da educação; Seleção dos resultados das pesquisas dos anos 1980 e 1990, Ordenação leitura de
bibliografia especializada com abordagem histórica e a produção literária neste momento histórico-
educacional; Análise de fontes documentais sobre literatura infantil e a relação adulto crianças e
as ideologias, o processo de análise de conteúdo organizando as partes do discurso buscando as
categorias e unidades de análise e contexto, a objetividade da coleta e a categorização como artefato
metodológico tais como: questões étnicos-raciais nas formas de interpretação para os elementos
discursivos da história focalizada e o contexto de representação estabelecendo um diálogo e
aprofundando o teórico, as categorias sociais precisa determinar o lugar social determinado pela
temática, organizando o conteúdo afim de permitir visualizar processo histórico e os espaços de
resistência, as editoras verificando o que caracterizou a quantidade de publicações no período, as
renovações da literatura e como se consolidou o fator dinamizador quanto a época da produção e o
período histórico em nosso estudo; e o público leitor infantil verificar as posturas tradicionais frente
a uma infância do ser educável e domesticável, que centra o poder do adulto na desigualdade de
conhecimento queremos indicar a literatura infantil em quanto momento do produto de modelos e
a vivencia e assimilação . A continuidade da pesquisa amplia a busca conhecer as razões e intenções
da dualidade igual-desigual dos seus discursos, as representações do trabalho, e a iniciativa da
pesquisadora junto à Fundação Carlos Chagas - FCC, continuidade de análise das fontes documentais
do material coletado nos arquivos da fundação, e no acervo pessoal da autora; outras fontes estão
sendo analisadas como apoio para a pesquisa, em jornais como “O Estado de São Paulo” e “Folha de
São Paulo”, Boletins da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil –FNLIJ seus números 61-62-63,
e periódicos sobre a extensão deste material e seu uso nos diversos campos do conhecimento como
teses e dissertações e editoras.
Referências
AZEVEDO, Fernando. A literatura infantil numa perspectiva sociológica. Sociologia – (Escola de
sociologia e Política) Vol. XIV, n.1, mar; 1952.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Trad. Maria M. Galhardo. Rio
de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 186
MOURA, Clóvis. Dialética radical do Brasil Negro, (277-326). 2ª.ed. São Paulo: Fundação Maurício, 2014.
MUNANGA, Kabenquele. Negritude: Usos e sentidos. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009.
ROSEMBERG, Fúlvia. Análise dos modelos Culturais na Literatura Infanto-Juvenil Brasileira n.1-9,
São Paulo: FCC Fundação Carlos Chagas, 1980.
THOMPSON, John B. Ideologia e Cultura Moderna: Teoria social crítica na era dos meios de
comunicação de massa. Petrópolis: Vozes, 2009.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente trabalho busca conhecer e aprofundar sobre a vida e as obras do autor do “Resumo
de História do Brasil”, Henrique Luís Niemeyer Bellegarde, as principais edições foram publicadas
entre 1831 e 1834. Os resumos tinham como intuito auxiliar os jovens compatriotas do Brasil a
compreender sobre a História da nação recém independente, e abordavam desde detalhes sobre a
vida e a cultura das populações indígenas que habitavam o território antes da conquista portuguesa,
passando pelas fases da colonização, pelos processos contestadores, pela vinda da família real, pelo
processo de independência política do nosso país e finalizando com detalhes sobre o governo de
Dom Pedro I e com a abdicação deste. O autor em questão nasceu em Lisboa, em outubro de 1802,
veio para o Brasil com sua família no ano de 1808, na nau do então príncipe regente, no mesmo
momento da vinda da família real portuguesa para o nosso país. No Brasil, o autor estudou desde
cedo na Academia Real Militar do Rio de Janeiro, onde passou cerca de uma década, o que possibilita
identificar que sua formação escolar esteve intimamente ligada a uma instituição militar, de origens
portuguesas, e observar seu crescimento hierárquico dentro de uma instituição militar de suma
importância no recorte histórico em questão. O início da segunda década do período oitocentista
ficou marcado pelo envio, em nome do governo português, para Moçambique, como capitão-general
na então colônia portuguesa.
Henrique Bellegarde regressou ao Brasil para servir ao Corpo de Engenheiros, no ano de 1822, e
fez parte do movimento que culminaria na emancipação política do nosso país em relação a Portugal.
O engenheiro e militar contribuiu e auxiliou na projeção de edificações na capital do Império,
construções estas que tinham como objetivo evitar uma possível invasão portuguesa na capital
do Império. Apesar de uma ausência de estudos e pesquisas que busquem analisar a participação
do jovem do processo de independência do nosso país, após retornar para o Brasil, o jovem foi
agraciado com um auxílio do governo imperial para estudar no continente europeu, no ano de 1825,
especificamente foi enviado para Paris, na França. No continente europeu, o autor luso brasileiro
estudou na Escola Real de Pontes e Calçadas, e permaneceu na França por aproximadamente três
anos, retornando de lá graduado bacharel em Letras, com uma carta de engenheiro geógrafo, e foi
um aluno frequente do curso de pontes e calçadas. Diante de seu regresso, no ano de 1828, recebeu
a patente de Major do governo imperial, patente esta que tinha demasiada importância social
no período em questão. Foi neste mesmo momento que o autor foi agraciado com a medalha de
Cavaleiro da Imperial Ordem da Rosa, sendo esta uma honorífica brasileira. Neste momento após o
regresso, casou-se com Maria Luísa Adelaide de Vitória Soares, com quem teve dois filhos: Guilherme
Cândido Bellegarde e Maria Henriqueta Niemeyer Bellegarde.
O interesse pela vida do autor luso brasileiro surgiu a partir do fato de que seus resumos foram
adotados no Imperial Colégio de Pedro II, já nos anos 40 do século XIX, como manual para estudos
sobre a História do Brasil. O colégio em questão era uma importante instituição de educação no
período imperial, vista como uma instituição modelo para as demais, servindo como modelo desde
os materiais utilizados até os currículos, por exemplo, e sendo possível um maior aprofundamento
sobre esta instituição através da leitura de Vera Lúcia de Queirós Andrade, em conjunto com as leituras
de Arlette Gasparello e Circe Bittencourt, que aprofundaram sobre os manuais e livros autorizados
para uso ao longo da história do colégio. Desta forma, o primeiro livro de História do Brasil utilizado
no colégio, foi também utilizado em outras instituições no período imperial, principalmente na
capital do governo imperial, mas também em outras províncias. Um ponto importante que cabe
aqui levar em consideração é que a aprovação do resumo como manual no colégio, ocorreu num
momento posterior a morte do autor.
O engenheiro veio a óbito antes de ver seu livro sendo utilizado no colégio, falecendo em 21 de
janeiro de 1839, deixando seus dois filhos. No que diz respeito aos seus descendentes, foi possível
encontrar informações sobre Guilherme, que ocupou cargos dentro do governo imperial. Além
do filho, o irmão Pedro Bellegarde e seu tio Conrado Niemeyer ocuparam cargos importantes no
governo, o que evidencia a participação da família no processo de consolidação do Estado Nacional.
Após sua morte, os resumos permaneceram circulando, e além de circulando, foi possível identificar
uma quarta e uma quinta edição do resumo, publicados entre 1855 e 1860, com modificações
pertinentes, mas que traziam como autor Henrique. Essas novas edições possibilitam justificar a
pertinência e importância em compreender a vida do autor aqui proposta, pois suas ideias circularam
por um período indeterminado, apesar de não terem permanecido como manuais no colégio, visto
que nos anos 50 em uma das reformas do currículo o colégio adotou o Compêndio de História do
Brasil, de Abreu e Lima.
Para aprofundar sobre a vida do autor, foi necessário pesquisar mais detalhes no setor de
manuscritos da Biblioteca Nacional, onde foi possível localizar documentos e bilhetes do autor,
como forma de buscar enriquecer o trabalho em questão. Muitos dos bilhetes e documentos
encontrados neste setor possibilitaram identificar as relações e os cargos ocupados no período
imperial do nosso país. Foi possível identificar seus avanços hierárquicos dentro do governo, bem
como suas reivindicações para que pudesse realizar suas obras e construções. Foi necessário acessar
documentos sobre o colégio e até mesmo de professores do período, para que estes auxiliassem
desbravar sobre a adoção dos resumos como manuais didáticos, em qual período o resumo foi
utilizado como manual didático, e sobre seu uso em outros colégios no período em questão. Como
forma de descobrir mais detalhes sobre a família, desde suas origens no continente europeu, até
seus descendentes no período imperial, sendo possível identificar outros membros da mesma
família que ocuparam cargos demasiadamente importantes, como por exemplo seu irmão, seu tio
e seu filho.
A pesquisa sobre a vida e as obras do autor luso brasileiro, exigiu conciliar técnicas tradicionais,
como a ida a arquivos de manuscritos para que fosse possível encontrar documentos pessoais que
ajudassem a reconstituir a história e as posições ocupadas na sociedade oitocentista, em conjunto
com práticas que exigiram um conhecimento de programas digitais que preservam e reconstituem
árvores genealógicas de famílias que possuem importância nas sociedades, no caso a família
Niemeyer, que era por parte de mãe, deixou um legado na história da arquitetura e engenharia
nacional, o que possibilitou encontrar mais detalhes sobre. As delimitações e noções utilizadas para
nortear sobre como e o que pesquisar sobre o autor em questão, são embasadas nas ideias de Jean
Sirinelli, dialogando com noções da História Intelectual, afim de compreender como a formação e
as redes de sociabilidade do engenheiro militar contribuíram para o seu processo de escrita dos
resumos. As noções de Sirinelli possibilitaram identificar o autor dos resumos como um intelectual
dentro do seu contexto, por conta de suas ocupações e funções na sociedade imperial, esse fator nos
levou a buscar sempre mais detalhes e informações sobre a vida nas mais distintas esferas.
Dentre os resultados alcançados até então com a pesquisa, que partiu de estudos realizados
durante o desenvolvimento de uma iniciação científica e atualmente com a produção da dissertação,
foi compreender sobre a vida do engenheiro militar, que se aventurou na escrita dos resumos de
História do Brasil, idealizados e utilizados como manuais didáticos numa importante instituição de
educação, foi possível identificar como sua formação esteve sempre ligada as instituições militares,
e reconhecer sua efetiva participação tanto no governo português como no governo do império
brasileiro. Além destes pontos importantes, foi possível identificar como sua família sempre esteve
presente no governo imperial, ou seja, os membros das famílias Niemeyer e Bellegarde foram
pessoas ativas no processo de consolidação do estado nacional brasileiro. Henrique teve interesse,
de certa forma, em participar do movimento de emancipação política do nosso país, mesmo sendo
um luso brasileiro e estando em cargo numa outra colônia portuguesa, regressou ao Brasil e neste
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 189
Jardins de infância, creches e escolas maternais, fizeram parte do modelo de conjunto das
instituições em uma sociedade civilizada. A concepção de assistência científica, formulada no
início do século XX, em consonância com as propostas das instituições de educação popular
difundidas internacionalmente, já previa que o atendimento da pobreza não precisaria de grandes
investimentos. A educação assistencialista promovia uma pedagogia da submissão, que pretendia
preparar os pobres para aceitar a exploração social. O Estado não deveria gerir diretamente as
instituições, repassando os recursos para entidades. Depois de sangrarem por muitos anos as
verbas educacionais, as propostas do regime militar queriam atender as crianças de forma barata.
Classes anexas nas escolas primárias, instituições que deixassem de lado critérios de qualidade
“sofisticados” dos países desenvolvidos, “distantes da realidade brasileira”. Tratava-se de evitar que
os pobres morressem de fome, ou que vivessem em promiscuidade, assim como o seu ingresso na
vida marginal (KUHLMANN, 2010, p.11)
Para Kuhlmann (2010), o fator da escolarização se explicaria em relação aos outros fatos sociais,
sendo envolvidos pela demografia infantil, o trabalho feminino, as transformações familiares, as
novas representações sociais das infâncias, etc. Pensar em uma perspectiva da sociologia centrada
na escola das crianças pequenas não nos distancia do pensamento sociológico global da pequena
infância, nem das especificidades dos outros campos da sociologia, ou seja, a sociologia da escola
maternal estaria situada no campo mais amplo de uma sociologia da pequena infância, que tem por
objetivo analisar as condições de ações específicas orientadas em direção à criança.
Pensemos na proposição de que as instituições e espaços para infância precisariam transitar da
concepção de direito da família e o das mães, para o direito de acesso e qualidade ao bem-estar
integral da criança pequena, problematizando, claro, se seria possível dissociar esses dois direitos,
passando assim para compreensão de que as instituições são direitos constituídos socialmente. Nesse
campo, as discussões frente ao qual, o real papel da Educação Infantil passava por um momento de
orientação assistencialista, como função não pedagógica nos âmbitos políticos e administrativos.
Sendo assim, os cuidados com a alimentação, higiene e saúde passaram a ser práticas vistas como
ameaça as instituições que desejavam se legitimar como espaço escolar.
Redirecionando a lente para o percurso da educação pré-escolar no município de São Paulo, em
1937 com a implementação do Estado Novo, por Getúlio Vargas, São Paulo apresenta um cenário
fértil, em clima de efervescência política e marcas significativas da Semana de Arte Moderna de 22 ,
Mário de Andrade, um dos participantes ativos do movimento, foi nomeado em 1935, pelo prefeito
Fábio Prado, como responsável pelo recém criado Departamento de Cultura, instalando assim, os
primeiros Parques Infantis
Oportunamente, segundo Marc Bloc “[...] aquilo que o texto expressamente nos diz, deixou de ser
objetivo preferido de nossa atenção. [...] o maior interesse deveria ser o que texto nos dá a entender,
sem ter intenção de fazê-lo” (1965, p.59). Para Le Goff, “ [...] o documento não é qualquer coisa que
fica por conta do passado, é um produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças
que ai detinham o poder. Só a análise do documento enquanto monumento permite à memória
coletiva recuperá-lo e ao historiador usá-lo cientificamente, isto é, com pleno conhecimento de
causa” (1984,p.536), ou seja, o documento é produzido e fabricado socialmente, sendo legitimado e
eleito por quem detém o poder. Tais considerações reformam a fragilidade do documento analisado,
consideramos que o emissor não possui neutralidade.
Portanto, os vestígios que revelados no discurso presente no artigo publicado na revista de
celebração de 50 anos da educação pré - escolar do município de São Paulo, sugere esta educação
pobre pensada para pobres, nos provocando a investigar, quais conquistas foram consolidadas após
esta promessa sem jeito de futuro? Passados os 50 anos, a rede municipal trilhou mais 30 anos e no
presente, como estão olhando para a educação pública que não deve ser opção, mas sim escolha.
Referências
Bloch, Marc. Introdução à história. (trad.) Lisboa, Publicações Europa-América, 1965. p 59.
CHARTIER, Roger. O mundo como representação. In: Estudos Avançados, Rio de Janeiro, n.11(5),
1991.
GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. – São Paulo: Cia. das letras, 1989.
KISHIMOTO, T. M. Recuperando a história da Educação Infantil em São Paulo. In São Paulo. Escola
Municipal:50 anos de pré-escola municipal. SME. Ano 18, n 13, p.6-10,1985.
MORTATTI, Maria do Rosário Longo. Notas sobre linguagem, texto e pesquisa histórica em educação.
História da Educação, Pelotas/RS, p. 69-77, 1999.
MORTATTI, M. R. L.. O livro de Alzira. Educação. Santa Maria, v. 38, n. 1, p. 55-74, jan./abr. 2013.
PANIZZOLO, Claudia. Notas sobre a história das creches de São Paulo. Magistério. Secretaria
Municipal de Educação. – São Paulo: SME / COPED, 2017.
SÃO PAULO. ESCOLA MUNICIPAL. 50 anos de pré-escola municipal. v18, nº 13, 1985.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Introdução
Esse trabalho visa apresentar, analisar e discutir as possibilidades, desafios e vulnerabilidades
de fontes históricas de pesquisas aplicadas em uma abordagem da história da Educação Especial
brasileira, a partir de resultados parciais de duas pesquisas desenvolvidas em mestrados acadêmicos.
A primeira foi defendida em 2018, sob o título “O Educandário para Cegos São José Operário:
cultura escolar e políticas educacionais - Campos/RJ – décadas de 1960 e 1970” (CARDOSO, 2018),
no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Políticas Sociais da Universidade Estadual do Norte
Fluminense Darcy Ribeiro (Campos/RJ), na linha de pesquisa “Educação, Cultura, Política e Cidadania”
e no âmbito do grupo de pesquisa CNPq Educação, Sociedade e Região. Entre outras contribuições,
destaca-se por identificar e analisar as linhas de ação e o funcionamento da Campanha Nacional
de Educação de Cegos, além de tratar de questões pontuais sobre o Centro Nacional de Educação
Especial (CENESP).
A segunda foi defendida em 2019, no Programa de Pós-Graduação em Educação, Contextos
Contemporâneos e Demandas Populares, na área de concentração em Educação, da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (Nova Iguaçu/RJ), sob o título “O Centro Nacional de Educação
Especial e o atendimento aos “excepcionais”: antecedentes, atores e ações institucionais (1950-
1979)”- (BATISTA, 2019), e no âmbito do Grupo de Pesquisa Observatório de Educação Especial e
Inclusão Educacional (ObEE). Destaca-se pela análise minuciosa sobre a criação do CENESP e as
ações realizadas por este órgão no período em que foi presidido por Sarah Couto César (1973-1979).
O ponto de encontro desses estudos são as políticas de Educação Especial durante as décadas de
1960 e 1970, em um contexto marcado pela ampliação das políticas educacionais para as pessoas
com deficiência por meio da assistência técnico-financeira do Estado às secretarias de educação e
às instituições especializadas. Trata-se, portanto, de um período de institucionalização em âmbito
federal das políticas de Educação Especial brasileira, por meio das Campanhas Nacionais e da
criação do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP). Por isso, esse período define o recorte
temporal deste trabalho.
O que desperta o interesse deste trabalho são as fontes históricas selecionadas para o
desenvolvimento dessas pesquisas que variaram entre entrevistas orais, documentos oficiais,
imprensa jornalística da época, fotografias e legislação. Destacamos as três primeiras. A riqueza
dessas fontes levaram a trazê-las aqui como centro da discussão sobre suas possibilidades, desafios
e vulnerabilidades, a partir dessas experiências investigativas.
As investigações contribuem para a valorização e ampliação do conhecimento e da historiografia
da educação, sobretudo, da Educação Especial brasileira, tradicionalmente pouco estudada pela
comunidade científica.
Aspectos metodológicos
Buscou-se superar o historicismo e a narrativa dominante da história oficial, com fundamento na
renovação historiográfica sob a influência do Movimento dos Annales e da Nova História, movimento
que proporcionou para a historiografia da educação significativa influência, no “alargamento
objectual, com novas temáticas, novos públicos e novos olhares”; [...], na “revalorização da memória,
representações e vivências, com recuperação das marcas do passado e abertura a diversas fontes de
informação” (MAGALHÃES, 1998, p. 54).
As pesquisas valorizaram um público novo para a historiografia da educação, as pessoas com
deficiência, se for considerado que, tradicionalmente, a Educação Especial não tem tido notoriedade
na trajetória da historiografia da educação brasileira.
O trabalho do historiador está intimamente relacionado com as fontes a serem verificadas, que
devem ser delimitadas de acordo com as perguntas feitas ao objeto de estudo. As fontes trazem a
marca de um tempo, de um lugar, de estratégias de agregação de valores, conceitos e normas de
ajustamento, tramas de jogos de poder, de rituais, de ruptura de grupo sociais organizados.
“A história da educação incorporou processos de cientificidade, designadamente a comparação,
a conexão, a triangulação, o cruzamento de fontes, a reconceptualização” (ALVES, PINTASSILGO,
20016, p. 35).
Batista (2019) priorizou os pressupostos da história oral para a ordenação das ações a serem
realizadas no desenvolvimento da pesquisa, pois, “possibilita o registro de reminiscências das
memórias individuais; a reinterpretação do passado”, sendo um meio de descobrir documentos
escritos e fotografias que, de outro modo, não teriam sido localizados” (THOMPSON, 1992, p. 25).
Enquanto Cardoso (2018) privilegiou a técnica da triangulação das fontes, confrontando os dados
encontrados (MAGALHÃES, 2017).
Os documentos oficiais trouxeram significativa contribuição para as pesquisas, principalmente
os publicados pelo Ministério da Educação e Cultura. Julia (2001, p. 19) afirma que “os textos
normativos devem sempre nos reenviar às práticas”.
Nesse sentido, ressalta-se que é necessário analisar criticamente os documentos oficiais em
um “contínuo processo de interpretação: de onde vem o documento? Quem o produziu? Quando
foi feito? Como foi conservado? Haveria razões, conscientes ou inconscientes, para que o autor
deformasse as informações?” (FERREIRA, FRANCO, 2013, p. 79); tendo em vista que o documento
pode ser compreendido como uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época,
da sociedade que o produziram, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a
viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo silêncio (LE
GOFF, 1990).
Segundo as autoras, a imprensa jornalística mostrou-se muito rica, ao propiciar por meio das
matérias, a compreensão dos contextos social e político do período da pesquisa (NÓVOA, 2002;
XAVIER, DIAS, 2005; XAVIER, MAGALDI, 2008). O acesso a essas informações contribuiu para a
visualização do processo de construção social das políticas para a educação de pessoas público
alvo da Educação Especial, e da influência de atores sociais envolvidos na rede de sociabilidade.
Nas palavras de Nóvoa (2002, p. 30), “é difícil encontrar um outro corpus documental que traduza
com tanta riqueza os debates, os anseios, as desilusões e as utopias que têm marcado o projeto
educativo nos últimos dois séculos”.
A guarda dos documentos analisados encontra-se em acervos públicos e privados, físicos ou
digitais (CASTRO, 2017), como no caso da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.
Resultados e desafios
A utilização dos diversos tipos de fontes históricas, por meio da técnica da triangulação das fontes
permitiu, principalmente, o alargamento do conhecimento e a análise da formação das primeiras
políticas de Educação Especial brasileira. A abertura a diversas fontes possibilitou uma maior solidez
dos resultados.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 195
Referências
BATISTA, G. F. O Centro Nacional de Educação Especial e o atendimento aos “excepcionais”:
antecedentes, atores e ações institucionais (1950-1979). Dissertação de Mestrado (Mestrado em
Educação). Universidade Rural do Rio de Janeiro, 2019.
CARDOSO, F. L. de M. O Educandário para Cegos São José Operário: Políticas Educacionais e Cultura
Escolar – Campos/RJ (décadas de 1960 e 1970). Dissertação de Mestrado (Mestrado em Políticas
Sociais). Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, 2018.
PINSKY, C. B.; LUCA, T. R (orgs.). O Historiador e suas fontes. 1ª ed. São Paulo: Contexto, 2012
THOMPSON, P. A voz do passado – História Oral. Tradução Lólio Lourenço de Oliveira. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1992.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Esse artigo tem como objetivo tecer algumas reflexões sobre relação entre História e a
Literatura para discutir os processos de construção da narrativa histórica a partir da concepção de
“verossimilhança” presente na escrita historiadora e “efeito do real” contido na escrita literária. Para
exemplificar essa discussão será analisado o livro “As Memórias do Livro: Manuscrito de Sarajevo”,
de autoria de Geraldine Brooks, para destacar a utilização que a literatura faz de fatos históricos
para criar seu enredo/trama. Esse processo analítico irá decodificar os processos de “apropriação
da operação historiadora” por parte da literatura a fim de estabelecer efeitos de veracidade da
narrativa elaborada por esse romance histórico/policial. Tais artifícios narrativos acabam por falsear
a compreensão do leitor, pois, ao lançar pequenos vestígios do real em sua trama literária, se
constrói o engodo como forma de capturar o leitor. Nesse ponto, se estabelece o desafio da escrita
da história que deve utilizar-se dos mecanismos narrativos da literatura sem estabelecer o engodo
como mecanismo de conquista do seu leitor. A escrita da História encaminha-se para uma narrativa a
“beira da falésia”. Pois, o debate sobre os limites e desafios da escrita em História a partir das noções
de Operação Historiográfica e de Paradigma Indiciário e das apropriações dessas concepções pela
literatura é de suma importância para o desenvolvimento da História da Cultura Escrita.
Assim, entende-se que a história como área científica, se preocupa com representação do real, a
verossimilhança; já literatura, sendo uma forma de expressão artística, alguns vezes, possuidora de
historicidade pode vir a ser utilizada pelo historiador para a produção do conhecimento histórico,
entretanto, trabalha com o ficcional. A literatura utiliza-se de mecanismo narrativos que usam os
efeitos narrativos científicos para produzir efeitos de real. Os estudos do imaginário abriram uma
janela para as formas de ver, sentir e expressar o real dos tempos e a literatura pode vir, segundo
Sandra Pesavento (2006), a servir como um indício historiográfico, não devido a seus personagens
terem existido ou não, mas com relação à vida, a sintonia fina que muitos deles acabam ter com a
época em que procuraram retratar. Ao situar a narrativa literária no tempo, o historiador passa a dar
sentido aos efeitos e direcionados ao leitor, que foi projetado como expectativa por quem escreveu.
Cabe ao historiador problematizar a especificidade do campo literário, limitando os espaços de sua
atuação, demonstrando o que faz parte da literatura e o que faz parte da história, pois a literatura utiliza-
se de subterfúgios para atrair o leitor, independentemente o texto pode falsear o real ou manipular a
fim de criar um efeito o real no seu texto através de pista e vestígios ofertados ao leitor. Para Chartier
(2015), a uma linha tênue entre a história e a ficção. Segundo ele, “a ficção é “um discurso que ‘informa’
do real, mas não pretende representá-lo nem abonar-se nele”, enquanto, a história pretende dar uma
representação adequada da realidade que foi e já não é, tal construção se pela exposição dos caminhos,
decisões e escolhas realizadas pelo historiador. Nesse sentido, o real é ao mesmo tempo o objeto e o
fiador do discurso da história. Contudo, muitas razões escondem e falseiam essa distinção. A primeira
está ligada as exposição das evidências que são a força das representações do passado propostas pela
literatura. (CHARTIER, 2015, p.24-25). As Memórias do Livro: Manuscrito de Sarajevo é um romance que
conta a odisseia da chamada “Hagadá de Sarajevo”, o mais conhecido dos manuscritos judeus. Relata,
desde sua confecção, lugares e pessoas por onde passou, até chegar às mãos da restauradora de livros,
a personagem Hanna. A autora se apropria de vários fatos historiográficos para narrar seu romance.
Proponho verificar em seu enredo, os principais pontos que refletem a veracidade histórica trazida por
ela. Esse livro mostra-se rico em detalhes, que, o leitor consegue emergir na trama da história e em certos
momentos duvidar do verídico e do ficcional. Para tal análise, utilizaremos como principais referências
os seguintes autores e obras que abordam a temática de escrita da história e da narrativa literária: Roger
Chartier, A história ou a leitura do tempo (2015) e Os desafios da escrita (2002); Michel De Certeau, A Escrita
da História (1982); Sandra Jatahy Pesavento, História e Literatura: uma velha-nova história (2006); Carlo
Ginzburg, O fio e os rastros: verdadeiro, falso, fictício (2007). Sabemos que a literatura há muito tempo
vem se utilizando de fatos históricos para a narrativa de seus livros ficcionais. Citamos como exemplo o
escritor Miguel de Cervantes que se utiliza de vários aparatos e detalhamentos em muitas passagens de
seu livro Dom Quixote para tornar o enredo mais atrativo e real, como expõe Roger Chartier “Ao entrar
na oficina, Dom Quixote vê “toda aquella máquina que en las emprentas grandes se muestra”. Cervantes
introduz o leitor na divisão e na multiplicidade de tarefas que caracterizam o processo de impressão: Dom
Quixote “vio tirar en una parte, corregir en outra, componer en esta, enmendar en aquella.” Os verbos
espanhóis usados por Cervantes designam as diferentes operações feitas por diversos operários: tirar
para o impressor, “corregir” para os revisores de provas, “componer” e “enmendar” para os tipógrafos.”
(CHARTIER, 2002, PG. 35). O processo tipográfico narrado por Cervantes é o que ocorria nas tipografias.
O escritor se apropria das técnicas para tornar mais próximo do real sua narrativa. Em outras passagens
de seu livro podemos observar descrições que fazem com que a narrativa se torne mais próxima da
representação que o autor quer atingir daquela época e daqueles fatos. Geraldine Brooks faz o mesmo ao
escrever seu livro. Por meio de pequenos vestígios a personagem Hanna, reconstrói a memória do livro.
Para se imaginar viajando junto com a personagem, a autora usa inclusive do subterfúgio do mapa, o qual
encontra-se na primeira página no livro, para que o leitor possa acompanhar todo o trajeto percorrido por
ele. Além disso, em várias passagens a personagem descreve a forma como ocorre todo o processo de
restauração de um livro, citando ferramentas específicas, procedimentos especializados, o que faz com
o que o leitor acredite que a pessoa que escreve realmente entende de todo esse processo. Sobre isso,
Chartier pontua que outra razão com “que faz vacilar a distinção entre história e ficção reside no fato de
que a literatura se apodera não só do passado, mas também dos documentos e das técnicas encarregados
de manifestar a condição de conhecimento da disciplina histórica.” (2015, p. 27). O Historiador, diferente
de um escritor ficcional, necessita reunir dados, selecionar documentos, estabelecer conexões e
cruzamentos. É ele quem elabora a trama e procura oferecer uma visão mais aproximada do real
acontecido. Já para um escritor literário, este, mesmo utilizando-se de fatos históricos, não é fidedigno ao
acontecimento, pois cria personagens e enredos para inserir-se nesses acontecimentos. Para Pesavento,
“ a história é diferente, é narrativa organizada dos fatos acontecidos, logo, não é fingimento ou engodo,
delírio ou fantasia.” (PESAVENTO, 2006, p. 06). A escrita da história é uma trama, uma intriga. Segundo
Michel de Certeau, “A escrita da história é o estudo da escrita como prática histórica.” (CERTEAU, 1982, p.
09). Na ficção é possível jogar com as palavras. Na historiografia, necessitamos de maior precisão.
Para Chartier (2007), hoje é mais difícil distinguir a ficção da história. Isso se deve, especialmente,
as representações do passado propostas pela literatura, que mesmo não sendo fidedigna à ordem
cronológica ou de acontecimentos, moldam representações do passado. Geraldine Brooks, traça
um itinerário em seu livro, fazendo com que os capítulos, embora pareçam independentes, ficam
interligados. Essa técnica é utilizada por Carlo Ginzburg (2007), em seu livro O fio e os rastros:
Verdadeiro, Falso Fictício, onde ele, logo no início do livro descreve de que maneira vai unir os
capítulos que se seguem, por meio de rastros históricos e histórias verdadeiras. Ginzburg (2007),
procura também distinguir a narração histórica da narração ficcional, pontuando que a histórica
possui cientificidade, a representação da realidade, já a ficcional, não tem a obrigação dessa
representação. Para ele, a narrativa histórica assimilaria a narrativa ficcional. A discussão, enfim,
mostrará as reflexões que estão sendo discutidas na atualidade sobre a questão história e literatura,
e as preocupações que os historiadores possuem em torno desse tema. A literatura, por vezes,
concede ao historiador, subterfúgios, pois, apesar de não se fidedigna aos acontecimentos, de
criar personagens fictícios, ela narra ambientes e situações cotidianas da época em que se propõe
escrever. Obviamente, que o historiador deve saber aproveitar, destacando o que podemos aproveitar
dela para estudo histórico. A História, não pode se isolar das demais áreas do conhecimento, deve
conversar com elas, para que assim, o trabalho do historiador seja mais completo. Não só a literatura,
mas a filosofia, sociologia, artes podem vir a contribuir. No entanto há de se ter determinados
cuidados ao se trabalhar, especialmente, com a ficção, para deixar claro o limite e as diferenciações
que existem entre as duas. Há muitas críticas e discussões a respeito. Somos uma ciência, prezamos
pela veracidade, trabalhos com a verossimilhança, mas não podemos nos isolar.
ISSN 2358-3959
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HISTORIOGRAFIA DA EDUCAÇÃO NO
ENSINO DE GRADUAÇÃO:
A PRODUÇÃO DO CURSO DE PEDAGOGIA
DA UFPA (2014 - 2018)
Resumo
A temática da História da Educação ao ser abordada nas produções acadêmicas e em obras
literárias permite ao leitor uma compreensão mais clara dos processos históricos de conformação
e desenvolvimento dos processos educativos, tais como são conhecidos nos dias de hoje. Por
entendermos a importância de tratar a História da Educação nas produções acadêmicas desde o
início do percurso acadêmico é que optamos por analisar as produções desenvolvidas em um dos
níveis iniciais deste percurso, ou seja, no ensino de graduação. De acordo com Saviani (2008): “a
construção da memória histórica da educação brasileira pode ser abordada a partir de três vetores: a
preservação da memória; o ensino de história da educação; a produção historiográfica propriamente
dita.” (p. 153). Esse trabalho irá investigar a produção historiográfica.
Dada a importância da pesquisa neste campo da educação, o presente artigo tem como escopo
elaborar uma cartografia das produções em História da Educação no Curso de Licenciatura em
Pedagogia da Universidade Federal do Pará (UFPA) no campus de Belém para, assim, termos uma
visão do alcance da temática entre os estudantes de graduação do citado curso. Para tanto, temos
como objetivo analisar o conteúdo dessas produções tendo como principais fontes os Trabalhos
de Conclusão de Curso (TCC) entre os anos de 2014 e 2018, período escolhido em razão da última
mudança curricular do curso, realizada no ano de 2010.
Para a realização desta tarefa optamos por dividi-la em três etapas; a primeira consistiu no
levantamento dos TCCs produzidos neste período, informação coletada junto à biblioteca do Instituto
de Ciências da Educação (ICED), Unidade Acadêmica à qual o curso de Pedagogia está subordinado.
A segunda etapa se dedicou a categorizar os TCCs de acordo com as temáticas abordadas; para
tanto, usamos como referências as áreas e subáreas de conhecimento definidas pelo Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em especial aquelas vinculadas à
área da Educação, inserida na grande área “Ciências Humanas”.
Em terceiro lugar, após sua categorização, identificamos os trabalhos relacionados à pesquisa
em História da Educação e passamos a examiná-los de forma mais detalhada, com o intuito de
identificar seu objeto e problemática, buscando construir uma visão geral acerca da produção no
campo da história da educação no referido curso de graduação.
Para o desenvolvimento de nosso estudo optamos por adotar a pesquisa que se denomina
“estado da arte” ou “estado do conhecimento” que, segundo Ferreira (2002) tem o desafio de:
mapear e de discutir uma certa produção acadêmica em diferentes campos do conhecimento,
tentando responder que aspectos e dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes
épocas e lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas certas dissertações de
mestrado, teses de doutorado, publicações em periódicos e comunicações em anais de congressos
e de seminários. (FERREIRA, 2002, p. 257)
Por outro lado, uma das dificuldades apontadas por Ferreira (2002) e reforçada por Romanowski
e Ens (2006) refere-se aos títulos dos trabalhos pesquisados, pois muitos deles não deixam claro
o que abordam no estudo, fazendo com que seja necessária a leitura do resumo. No entanto, as
dificuldades permanecem devido à má elaboração de alguns deles, visto que alguns resumos não
apresentam elementos fundamentais integrantes de um trabalho acadêmico, como por exemplo,
o tipo de pesquisa feita e até mesmo o objetivo do trabalho. Além disso, as palavras-chave muitas
vezes não fazem referência à essência da pesquisa. Por isso, a pesquisa denominada “estado da
arte” requer do pesquisador, tempo e empenho para poder realizá-lo.
Resultados
Como resultado parcial desta pesquisa apresentamos no Quadro 1 as temáticas dos Trabalhos
de Conclusão de Curso defendidos entre 2014 e 2018, distribuídos de acordo com as especialidades
definidas pelo CNPQ, em termos de quantidade e porcentagem de todos os TCCs defendidos no
curso, o que resulta em um total de 504 (quinhentos e quatro) trabalhos.
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Como podemos perceber no quadro 1, a temática mais frequente entre os TCCs defendidos é a de
“Educação Pré-Escolar” com 14,40 % do total de trabalhos, seguida da temática “Educação Especial”
com 12,40 %, indicando uma alta produção em comparação com as demais temáticas. Além destas,
outras temáticas aparecem com um alto índice de abordagem, como por exemplo, “Métodos e
Técnicas de Ensino” e “Política Educacional”, cada uma com 9,60% e 8,20%, respectivamente. Atrás
delas, as abordagens mais frequentes são “Currículos Específicos para Níveis e Tipos de Educação”
com 5,80% e “Avaliação de Sistemas, Instituições, Planos e Programas Educacionais” com 5,40%,
revelando uma média produções sobre tais temáticas. Observa-se também, o baixo índice de
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 201
Referências
BRANDÃO, Zaia; BAETA, Anna Maria Bianchini; ROCHA, Any Dutra Coelho. Evasão e repetência no
Brasil: a escola em questão. 2. ed. Rio de Janeiro, RJ: Dois Pontos, 1986.
SAVIANI, Dermeval. História da história da educação no Brasil: um balanço prévio e necessário. Eccos
Revista Científica, v. 10, n. Esp, p. 147-167, 2008.
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pesquisadores interessados tenham contato com um resumo do que está sendo produzido na
literatura sobre o uso de impressos escolares em pesquisas acadêmicas no campo da História da
Educação, no estado de Mato Grosso do Sul.
Referências
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. 4 ed. rev. e actual. Lisboa, PT: Edições 70, 2009.
BIOLCHINI, Jorge et al. Sytematic review in software engineering. Technical report, RT–ES 679/05.
System Engineering and Computer Science Dept. Rio de Janeiro: COOPE/UFRJ, 2005. Disponível em:
https://www.cos.ufrj.br/uploadfile/es67905.pdf. Acesso em 29 set. 2019.
CORDEIRO, Alexander Magno et al. Revisão sistemática: uma revisão narrativa. Revista do Colégio
Brasileiro de Cirurgiões, Rio de Janeiro, v. 34, n. 6, p. 428-431, Dec. 2007. Disponível em: http://www.
scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-69912007000600012&lng=en&nrm=iso. Acesso
em: 17 out. 2019.
GONÇALVES, Helena de Abreu; NASCIMENTO, Marilene Batista da Cruz; NASCIMENTO, Kathia Cilene
Santos. Revisão sistemática e metanálise: níveis de evidência e aplicabilidade científica. Revista
Eletrônica Debates em Educação Científica e Tecnológica. Vitória, v. 5, n. 3, p. 193-211, nov. 2015.
Disponível em: https://proceedings.ciaiq.org/index.php/ciaiq2015/article/view/281/277. Acesso em
20 out. 2019.
KITCHENHAM, Barbára. Procedures for performing systematic reviews. Join Technical report, Keele,
Staffs, ST5 5BG, UK, TR/SE-0401, Keele University and NICTA, jul. 2004. Disponível em: http://www.inf.
ufsc.br/~aldo.vw/kitchenham.pdf. Acesso em: 28 set. 2019.
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Neste sentido, optou-se pela realização desta pesquisa no estado de Rondônia, cujo recorte
temporal tem como baliza a criação do Território Federal do Guaporé em 1943, a criação do
Departamento de Educação através do Decreto Territorial n. 13, de 10 de abril de 1944 e a
transformação do Território em Estado em 22 de dezembro de 1981. E a imprensa é concebida como
uma fonte de relevante valor cultural para a educação do estado rondoniense e para a História da
Educação.
Sendo assim, propõe-se analisar, pela ótica dos jornais impressos o que a imprensa rondoniense
noticiou acerca das crianças, da infância e seus direitos à educação escolar durante as décadas de
quarenta a oitenta do século XX? Quais os lugares e os espaços de sociabilidade eram frequentados
pelas crianças? Quais as representações de escolarização da infância foram materializadas na
imprensa rondoniense e em quais os jornais apareceram com mais frequência?
A pesquisa com os jornais rondonienses foi feita por meio dos “rastros recuperados por intermédio
de uma poeira de acontecimentos minúsculos” (REVEL, 1998, p.31), seguindo a abordagem micro
histórica que se propõe a “enriquecer a análise do social tornando suas variáveis mais numerosas,
mais complexas e também mais móveis” (p.23).
Como bem define Revel, o papel do historiador consiste em trabalhar com aquilo que efetivamente
aconteceu, por intermédio das fontes, perceber as alternativas e as incertezas pelas quais os atores
sociais do passado se defrontaram. Enquanto os micros historiadores tem clareza de que cada ator
histórico participa de maneira próxima ou distante, de processos (contextos), de dimensões e de
níveis variáveis, do mais local ao mais global.
Chartier (2009 p.54) também tratou da redução de escala de análise afirmando que “referência a
uma ou outra depende do que o historiador deseja ver” apoiado em Ricoeur, assevera que em cada
escala podemos ver coisas que não são vistas em outra. Uma história global pela qual pode reconhecer
nas “situações mais locais as interdependências que as ligam ao longe, sem que necessariamente os
atores tenham clara percepção disso” (p.57). O autor apresenta a ideia de “glocal” que se refere “aos
processos pelos quais são apropriados as referências partilhadas, os modelos impostos, os textos
e os bens que circulam mundialmente, para fazer sentido em um tempo e em um lugar concreto”
(p.57).
Tendo como parâmetro o “jogo de escala” apresentado em Revel (1998) articulando o local com o
global, discutir-se-á as relações entre ensino primário/escolarização da infância e imprensa, infância
e criança e direito a educação escolarizável, na perspectiva de que “variar a objetiva não significa
apenas aumentar (ou diminuir) o tamanho do objeto no visor, significa modificar sua forma e sua
trama” (p.20)
Os aspectos teórico/metodológicos pautaram-se na História Cultural, centrada em pesquisa
documental e bibliográfica, desenvolvida por meio da utilização de procedimentos de localização,
reunião, seleção e ordenação de notícias veiculadas nos jornais rondonienses.
Para tanto, adotou-se os jornais “Alto Madeira”, O Guaporé e a Tribuna, editados em Porto Velho e
que circulavam em todo o estado de Rondônia no período delimitado. Os jornais foram localizados
nos acervos do Museu da Memória de Rondônia (MERO), situado na capital e na Hemeroteca Digital
da Biblioteca Nacional (BN Digital).
A pesquisa com os jornais rondonienses foi feita por meio dos “rastros recuperados por intermédio
de uma poeira de acontecimentos minúsculos” (REVEL, 1998, p.31), seguindo a abordagem micro
histórica que se propõe a “enriquecer a análise do social tornando suas variáveis mais numerosas,
mais complexas e também mais móveis” (p.23).
A metodologia adotada consistiu em localizar as publicações sobre a temática no referido jornal.
Para tanto se fez uso das palavras-chave: “criança”, “infância” e “escola primária”. Após a identificação
das ocorrências foi feita a seleção que obedeceu aos critérios de conteúdo. Sendo assim, fez parte do
repertório todas as noticias do jornal, espalhadas nos diferentes espaços. A classificação, seleção e
organização das notícias foram articuladas com o contexto histórico social, político e econômico local
e nacional. A organização da documentação coletada, reunidas num único documento, tabuladas e
ordenadas por meio de quadros, gráficos e figuras contribuíram para a análise documental de forma
interpretativa.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 207
Com os resultados foi possível mapear as notícias veiculadas nos jornais rondonienses,
especificamente as relacionadas às crianças, à infância e os direitos à educação escolarizada. As
notícias localizadas registram momentos cívicos dos alunos das mais diferentes instituições, prédios
escolares, professores, alunos, salas de aula, materiais didático pedagógicos, espaços destinados
para as escolas, entre outras que retratam as situações vivenciadas pela infância rondoniense e
pelas crianças da época no processo de escolarização. Os dados revelam aspectos da sociedade não
identificados nas fontes oficiais escritas, o ideário que permeava o período e contribui para a escrita
de uma história da escolarização destinada as crianças neste estado da região amazônica. Pesquisar
a escolarização da infância pela ótica da imprensa permitiu descortinar características singulares do
campo educacional, mostrando as relações estabelecidas por seres humanos numa determinada
época, tanto no âmbito nacional, como ainda no regional e local.
Referências
ARIÈS, Phillipe. História Social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC,1981.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL. RJ: Bertrand,
1990.
KUHLMANN JR, Moisés. Infância e Educação Infantil na abordagem histórica. Porto Alegre:
Mediação, 2011.
LIMA, A. M. de. Achegas para a história da Educação no Estado de Rondônia. Secretaria Municipal de
Educação e Cultura. Porto Velho: Gráfica da Prefeitura, 1987.
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Construída a partir da perspectiva da História Cultural, esta pesquisa está circunscrita ao campo
da História da Educação e inserida no domínio da História dos Intelectuais. Tendo como ponto de
partida a imbricação entre os campos político, intelectual e educacional, este trabalho tem como
objetivo investigar a relação dos intelectuais da educação potiguar com o Instituto Histórico e
Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN) a partir dos artigos que publicaram na revista deste
Instituto durante as primeiras décadas do século XX. O recorte de nosso estudo que compreende o
que convencionou-se chamar como República Velha ou Primeira República, apresenta-se como um
momento de contradições tanto no âmbito nacional quanto no Rio Grande do Norte. Evidencia-se
que ao passo que no campo político, a organização tinha como base o fenômeno do coronelismo,
também se buscava alinhar aos valores nacionais em construção, expressos pelos signos da
modernidade urbana e pela a consolidação dos símbolos nacionais. A política estadual era dominada
por oligarquias sustentadas pela atividade agropecuária. A grande movimentação em torno da
sucessão no cargo de governador do estado, denota as disputas políticas entre grupos oligárquicos
de orientações opostas (SPINELLI, 2010). Trazem a luz também as relações híbridas existentes entre
o caráter público e os interesses particulares, uma vez que os sujeitos ocupantes de cargos públicos
e administrativos eram sempre indicados pelos membros da elite política. Nesse contexto, o campo
educacional era também produto das articulações existentes no campo político e o discurso pela
modernidade educacional se evidencia durante o período estudado, pois a Primeira República é o
momento em que a preocupação com a civilidade se torna mais latente, de modo que a educação
era o caminho para se construir cidadãos polidos e adequados para o novo modelo de sociedade
proposta pela República. Se fazia necessário instruir as crianças do presente para consolidar os
valores cívicos e democráticos no futuro. Do mesmo modo, era também necessário higienizar os
corpos e as cidades, promovendo campanhas de vacinação, asseio e cuidados pessoais, assim como
realizar reformas urbanas, sanear esgotos e embelezar as cidades. Estas ideias e práticas políticas e
administrativas eram articulados à perspectiva higienista que se configura enquanto um discurso
circulante na Europa do século XIX e que se fortaleceu e se materializou no Brasil com o projeto
republicano, sobretudo no final do século XIX e início do XX. O higienismo fornecia as bases científicas,
pautadas especialmente no evolucionismo de Herbert Spencer, para se pensar a formação integral
do homem. Esse modelo educacional deveria atingir as diversas áreas, desde o psíquico ao moral e
o físico, orientando a construção de currículos escolares com disciplinas de cuidados com o corpo e
puericultura (MENEZES, 2015). Na esteira desses movimentos de higienização e modernidade, nota-
se a valorização da ciência, com o surgimento de várias instituições culturais e sociedades científicas
por todo o Brasil. É nesse contexto que percebemos a disseminação, por diversos estados brasileiros,
dos correspondentes do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) fundado em 1838. No
cenário potiguar, verificamos a fundação do IHGRN se deu em 29 de março de 1902, no salão da
Biblioteca Estadual, que funcionava no antigo prédio do Atheneu Norte-Rio-Grandense (LIMA, 1982,
p. 11). O IHGRN foi criado com o objetivo de salvaguardar a memória do estado, através da coleta,
organização e guarda de documentos, incentivar a pesquisa e produzir a história oficial do estado.
Estiveram presentes em sua cerimônia de inauguração o então governador Alberto Frederico de
Albuquerque Maranhão, Francisco Pinto de Abreu, Manoel Dantas, Henrique Castriciano, Antônio de
Souza e Augusto Tavares de Lyra, entre outros. A primeira diretoria do Instituto foi formada pelo
desembargador Olympio Manoel dos Santos Vital, como presidente; Alberto Maranhão, como vice-
presidente; Pinto de Abreu, como 1º secretário; Luís Fernandes, como 2º secretário; o desembargador
Francisco de Salles Meira e Sá, como orador; e Veríssimo de Toledo, como tesoureiro (REVISTA DO
IHGRN, 1903). Além destes, outros intelectuais fizeram parte da instituição, como, por exemplo, Eloy
Castriciano de Souza, Luís da Câmara Cascudo, Tarcísio Medeiros e Nestor dos Santos Lima.
Identificamos que diversos intelectuais que fizeram parte do Instituto como sócios também
circulavam em outros espaços e atuaram no campo educacional a exemplo de Nestor dos Santos
Lima que construiu uma trajetória associada sobretudo a educação primária e normal do Estado e
que foi admitido como sócio do IHGRN em 1910, se tornou presidente do Instituto em 1927 e eleito
primeiro presidente perpétuo em 1953. Da mesma forma, percebemos que os intelectuais que
compunham esta instituição, legitimavam sua atuação no campo por meio dela e pela escrita nas
publicações de sua revista. Estes sujeitos são, portanto, considerados como membros de uma elite
criadora e mediadora cultural (SIRINELLI, 1998). Seus ideais acerca da educação potiguar e de outros
assuntos de interesse público, circulavam em diversos jornais e periódicos do período, assim como
na Revista do IHGRN. Esta revista começou a circular no ano de 1903 e é publicada até os dias atuais.
Tomamos esta publicação como fonte para perceber o entrelaçamento dessa teia de intelectuais,
que escrevem sobre diversas temáticas relativas sobretudo a história, a memória, a conformação
geográfica do estado e a educação. Para a análise das fontes, foi utilizado o método historiográfico
da heurística e da hermenêutica, realizando a crítica interna e externa dos documentos, bem como
a análise do discurso, para compreender as orientações políticas e ideológicas destes sujeitos que
compunham a rede. Para auxiliar na compreensão do objeto aqui estudado, nos pautamos nos
conceitos de intelectual e sociabilidades propostos por de Jean François Sirinelli (1998, 2003); no
tripé lugar de fala, prática e escrita, explicitado por Michel de Certeau (1982); e as noções de campo
e habitus, exploradas por Pierre Bourdieu (1996, 1998). É nossa intenção, portanto, demonstrar que
estes intelectuais da educação se inserem no campo a partir da constituição de uma rede de
sociabilidades e que a sua escrita não se dá de maneira naturalizada ou descontextualizada. É antes
um reflexo de suas vivências e experiências. Destaca-se também a compreensão de que a construção
dessa rede de sociabilidades a partir do IHGRN e da publicação do seu periódico, possibilitou a
legitimação deste grupo de intelectuais envolvidos nas temáticas educacionais e que, dessa forma,
também contribuíram para a criação de um campo para se debater a educação pública potiguar. Nas
páginas da Revista do IHGRN, podemos ler artigos sobre as mais diversas temáticas referentes à
história do Rio Grande do Norte, biografias de potiguares importantes, questões de tratados e limites
estaduais, disputas fronteiriças, necrológios e narrativas historiográficas. Durante o período
estudado, nota-se a orientação dos ideais positivistas na produção historiográfica, em que ganhava
protagonismo a documentação escrita, sobretudo a oficial, considerada como portadora da verdade
histórica, perseguida como um elemento a garantir veracidade e cientificidade às pesquisas. É
notório o esforço realizado para coletar e preservar os documentos. Alguns intelectuais que
identificamos como autores de artigos publicados na Revista são até hoje considerados como
bibliografia clássica para o estudo da História do Rio Grande do Norte, como por exemplo Tavares de
Lyra, Tarcísio Medeiros e Câmara Cascudo. De tal modo, os intelectuais membros do IHGRN,
utilizavam sua Revista como um veículo de comunicação para defender e disseminar seus
pensamentos acerca da educação e de outras questões. Faziam, portanto, dessa publicação e do
próprio Instituto Histórico, um espaço de sociabilidade, onde discutiam e apresentavam suas ideias
e concepções. Compreendemos que o pertencimento a este grupo de intelectuais e a esta instituição
cultural possibilitou a criação de uma identidade de grupo, partilhada através do habitus (BOURDIEU,
1996). A prática desses intelectuais no IHGRN e sua escrita na Revista são orientadas pelo lugar de
fala de cada um, atendendo aos seus interesses e subjetividades (CERTEAU, 1982). Ressaltamos
igualmente que a escrita de intelectuais sobre intelectuais na Revista, explicita a seleção daqueles
que eram considerados importantes para história e a política do estado, delimitando também o
espaço de atuação deste grupo e consolidando um campo de discussão e atuação sobre e na
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 210
educação potiguar. Sendo assim, nota-se que estudar a atuação dos intelectuais da educação e as
redes de sociabilidades que constroem no Rio Grande do Norte da Primeira República por meio do
IHGRN e sua Revista é também compreender as suas relações políticas, sociais e ideológicas, bem
como as suas concepções educacionais, o que nos conduz a produção do conhecimento acerca da
História da Educação do nosso estado.
Referências
BOURDIEU, Pierre. As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário. São. Paulo: Companhia
das Letras, 1996.
CERTEAU, Michel de. A Operação Historiográfica. In: ____. A Escrita da História. Rio de Janeiro:
Forense-Universitária, 1982.
SIRINELLI, Jean-François. As elites culturais. In: RIOUX, Jean Pierre; SIRINELLI, Jean-François. Para
uma história cultural. Lisboa: Editorial Estampa. p.259-279. 1998.
SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais in: RÉMOND, René. Por uma história política: Rio de Janeiro:
Ed. UFRJ/Ed. FGV, 1996.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Durante a primeira metade do século XX Primitivo Moacyr produziu uma vasta obra tendo
como objeto de investimento intelectual a educação e a instrução. Sabemos que desde a
Proclamação da República no Brasil à escola foi imposta a missão de promover o progresso e o
desenvolvimento do país e de construir o cidadão republicano, dentre outros elementos que
compõem a edificação de um país moderno. Se a educação fora lócus importante para a
disseminação e efetivação de um modelo de Estado nas décadas de 1930 e 1940, o autor deve
ser destacado tanto pela obra que produziu quanto por ser sujeito atuante na construção da
história educacional brasileira. Questionamo-nos por que, dentre tantos possíveis temas,
Primitivo Moacyr estudou e escreveu sobre a instrução brasileira. Baiano de Salvador, nascido
em 1867 e falecido no Rio de Janeiro em 1942, Moacyr teve seus primeiros contatos com a
instrução pública como professor de primeiras letras em Lençóis, no interior da Bahia. Em
seguida, transferindo-se para Pernambuco, trabalhou no Liceu da capital. Em 1894 diplomou-se
em Direito pela Faculdade Livre do Rio de Janeiro e, em 1898, em Ciências Sociais pela mesma
instituição. Trabalhou na Comissão de Redação da Câmara dos Deputados Federais, entre 1895
e 1932, ora por indicação da Comissão de Polícia da Mesa Diretora da Casa Legislativa, ora por
concursos. Entre 1904 e 1911, ocupou o cargo de Promotor dos Feitos da Saúde Pública. As
publicações de seus livros iniciaram com o volume O Ensino Público no Congresso Nacional:
breve notícia, publicado pela tipografia do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, em 1916.
Posteriormente, entre os anos de 1936 e 1942, foram publicadas A Instrução e o Império e A
Instrução e as Províncias, ambas com três volumes, e A Instrução Pública no Estado de São Paulo:
1ª década Republicana 1890-1893 com dois volumes, sob a égide de Fernando de Azevedo e da
Companhia Editora Nacional, na Coleção Brasiliana; e A Instrução e a República, com sete
volumes, editados pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos - INEP e publicados pela
Imprensa Oficial entre os anos de 1940 e 1944. Estes livros reúnem um extenso conjunto de
documentos oficiais tais como legislações e regulamentos; relatórios de presidentes de província
e de diretores da instrução pública; e referências bibliográficas contemporâneas abrangendo
desde o período do Império até as primeiras décadas republicanas. Pode-se observar a
preocupação do autor com o trabalho de cunho histórico na apresentação dos antecedentes
dos temas abordados em cada livro. Para o período republicano o autor abordou seis reformas
educacionais e o ensino secundário nos segmentos profissionais técnico-industrial, comercial e
ensino agronômico. Sua obra não se resume aos livros. Esteve presente com suas produções
intelectuais em dois eventos de história, como é o caso do texto O ensino comum e as primeiras
tentativas de sua nacionalização na província de S. Pedro de Rio G. do Sul (1835-1889), apresentado
no III Congresso Sul-Riograndense de História e Geografia, em Porto Alegre. Este trabalho foi
editado, na íntegra, no Jornal do Commercio de 17 novembro de 1940. Outro evento foi o III
Congresso de História Nacional em 1942, no Rio de Janeiro, com o artigo A instrução primária e
secundária no município da Corte na Regência e Maioridade. Além disso publicou, em 1939, o
artigo A instrução rural e o Império na Revista do Professor (SP), edição 022, organizada por Sud
Mennucci. Nos jornais encontramos, entre 1915 e 1942, inúmeros artigos no O Estado de S. Paulo
(SP) e, principalmente, no Jornal do Commercio (RJ). Fundado em 1° de outubro de 1827, por
Pierre René François Plancher de La Noé, o Jornal do Commercio foi um dos mais longevos
órgãos de imprensa da América Latina encerrando sua versão impressa e digital em 29 de abril
de 2016. O conteúdo editorial e noticioso era próximo aos governos e políticos, mostrando
apoio, em geral, a cada presidente, governador ou prefeito, expondo o caráter conservador com
o qual é conhecido. Entretanto, sisudo no cenário sensacionalista da imprensa dos anos de 1920
e 1930, fugia ao apelo das fotografias sangrentas e das manchetes provocativas, o que cercava
suas páginas de uma aura de confiabilidade e muito a gosto da elite brasileira. Era formado e
formava o pensamento dos homens que davam sustento econômico e intelectual à nova
república (BARBOSA, 2007). Recordando a afirmativa de Fernando de Azevedo, “O jornal agita e
propaga, o livro penetra e fixa.”, algo se confirma. A presença da obra de Moacyr no Jornal
precede a publicação dos seus livros. Os artigos de Primitivo Moacyr publicados no Jornal do
Commercio ficaram, mais do que esquecidos, desconhecidos. Numa primeira entrada junto ao
acervo do Jornal do Commercio, disponibilizado no site da Hemeroteca da Biblioteca Nacional,
utilizando Primitivo Moacyr como palavra-chave de busca nos periódicos digitalizados pela
instituição, no recorte de sua trajetória de vida, de 1867 a 1942, encontramos 1651 ocorrências
sendo 199 textos de sua autoria presentes apenas nas páginas do Jornal do Commercio. Estes
artigos foram publicados, primeiramente, no ano de 1915 em duas séries - a primeira com 4
artigos, sobre a intervenção nos estados e a segunda, com 15 artigos, sobre o ensino público no
congresso nacional. Depois, somente em 1929 Moacyr voltou a ter seus textos publicados na
imprensa. Neste ano, encontramos 16 artigos sobre a instrução no período republicano, de 1917
a 1929. Em 1930, ainda sob o mesmo tema, identificamos 41 textos no Jornal do Commercio
indicando que seus estudos avolumavam-se. Novo hiato no ano de 1931 até o retorno das
publicações em meados do ano de 1932. Sob o tema da instrução no Império encontramos 71
artigos publicados até 1935 e 02 sobre o ensino profissional em 1933. De novembro de 1935 a
1942 foram 50 textos publicados nas páginas daquele periódico versando sobre a instrução no
Império e na República, bem como artigos informando sobre a bibliografia educacional e a
cultura no estado novo. Ao observar os títulos dos artigos dos jornais e dos capítulos presentes
nas obras publicadas pela Coleção Brasiliana e pelo INEP, sendo que dos dezesseis livros de
Moacyr publicados, quinze foram no período entre 1936 e 1942, percebemos que existem
estreitas correspondências entre eles e que a hipótese da antecedência dos artigos dos jornais
aos livros necessita de luz investigativa. Para o presente trabalho problematizamos a produção
da obra moacyrniana à luz da modernização do espaço público expresso no deslocamento feito
por Primitivo Moacyr entre os artigos veiculados no periodismo nacional, em especial no Jornal
do Commercio, e a publicação de livros no espaço das coleções de editoras comerciais e oficiais.
Entendendo a obra enquanto um conjunto que não é uniforme e muito menos linear, é possível
perceber um modus operandi de produzir a escrita sobre a instrução pública desenvolvido pelo
intelectual. Este trabalho trata os impressos enquanto fonte para a História da Educação de tal
maneira que os documentos, enquanto representações, como nos informa Roger Chartier
(1990), produzem sentidos que são apropriados de diferentes formas, no vai-e-vem do jogo
social. Os impressos são compreendidos como resultantes das apropriações nas quais os
indivíduos constróem seu cotidiano, incutidas no repertório do indivíduo e/do grupo – que
podem ser no plural – do qual ele participa. Por outro lado, a imprensa também é palco de
manifestações coletivas, onde são veiculados debates, discussões e polêmicas da época que se
propõe pesquisar, bem como “[...] vislumbramos, em ampla medida, a complexidade dos
conflitos e das experiências sociais” (VIEIRA, 2007, p. 13). A palavra escrita pode, em qualquer
tempo e lugar, ser utilizada na construção de interpretações históricas, “em outras palavras são
incomensuráveis as possibilidades de reconhecimento e de problematização do passado por
meio das páginas da imprensa” (VIEIRA 2007, p. 13). Estas fontes possibilitam aos historiadores
da educação análises ricas a respeito dos discursos educacionais, revelando-nos, ainda, em que
medida eles eram recebidos e debatidos na esfera pública, ou seja, qual era a sua ressonância
no contexto social. Afirmamos que estava em curso, naquele contexto de produção e circulação
dos escritos, um processo de especialização da atividade intelectual de Primitivo Moacyr. Nosso
objeto se insere na interface da história cultural, política e da educação brasileira, tendo a
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 213
história dos intelectuais como centro analítico, utilizando da maneira como tem sido proposta
por autores como Jean-François Sirinelli. Com Maria Rita Toledo (2001) e outros extraímos o
debate acerca do espaço público no âmbito editorial, em especial a organização das coleções
como estratégia comercial que, para além dos lucros, atraía um maior público leitor. O caminho
feito por Primitivo Moacyr do jornal ao livro evidencia como ele produziu de acordo com as
condições de seu tempo e das ambições e necessidades individuais; um ator social, que
perpassou os campos da história, da política e da educação, tanto em seus dias como funcionário
público, quanto no seu tempo com os documentos. A publicação da obra moacyrniana pela
Companhia Editora Nacional, pelo INEP e pelo Jornal do Commercio (RJ) deixaram a marca
intelectual histórica do autor no cenário brasileiro e da história da educação brasileira.
ISSN 2358-3959
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MANUAL DIDÁTICO:
O ENSINO PRÁTICO DE ARITMÉTICA - CONTINUIDADES
E DESCONTINUIDADE ENTRE O ESTADO REPUBLICANO
E AS ESCOLAS COMUNITÁRIAS TEUTO-BRASILEIRAS
Realço neste artigo as múltiplas aplicabilidades dos manuais didáticos usados nas escolas
comunitárias teuto-brasileiras. Destaco as funções ideológicas e culturais, que se apresentam
essencialmente como a mais antiga das histórias das mentalidades nos processos de aculturação
republicana. Os manuais didáticos impressos pela editora Verlag Rotermund & Co. estabeleceram
sua identidade à medida que se dirigiam a um leitor-modelo dotado de uma singularidade que o
distinguia do leitor republicano. A fonte primária desta pesquisa será o primeiro manual didático
“O ensino prático de Aritmética” com 65 páginas, editado pela Verlag Rotermund & Co. em 1924.
O proprietário foi Rotermund, um pastor luterano que editava grande parte das publicações da
igreja reformada do sul do país, no século XIX. Atualmente este manual didático pertence ao Museu
Histórico e Antropológico da Região do Contestado localizado na cidade de Caçador – Santa Catarina.
Por vezes, os editores empregaram neste manual didático as operações elementares, o sistema
monetário, as unidades de medida e geometria aliados as curiosidades bíblicas com o propósito de
manter as crianças inseridas na prática moral e religiosa, promovendo reflexões sobre atitudes de um
bom cristão. Os textos usados na composição dos manuais era destinados ao público de imigração
identidade teuto-brasileira e faziam uso de expressões simples com conteúdos direcionados aos
supostos interesses das crianças, quase sempre era adotavam personagens associados ao universo
infantil e à imaginação das crianças, aliados aos ensinamentos bíblicos transcritos e interpretados
de acordo com os princípios morais protestantes, visando modelar comportamentos dos pequenos
leitores e seus familiares. O manual didático prático de Aritmética ou manual de aritmética do cristão
associou de forma lúdica histórias de cunho moral e religioso com conhecimentos exatos moldando
modelos esperados de ser criança e de viver a infância. O movimento Cristão da Restauração,
composta por católicos e evangélicos, reagiram, e o meio comum desta reação foi inserção dos
princípios religiosos como referência maior para a organização político-social e cultural, através
dos livros didáticos. Nesse sentido, as formações discursivas não apenas buscavam modelar um
olhar sobre a infância, mas, sobretudo, informar as práticas relativas ao cuidado e à socialização
das crianças, normatizando seu processo de inserção social. Esse reconhecimento de normalização
social da infância também se manifesta no Brasil, ainda que posteriormente.
Os ideais dos republicanos espelhavam-se nos princípios da Revolução Francesa e buscavam
“[...] construir um homem novo, remodelando o cotidiano através de uma memória” (PERROT,
1999, p. 93). Dado isso a importância atribuída às relações entre o Estado e a sociedade civil, entre o
público e o privado, entre o coletivo e o individual. No prefácio da obra é indicado que seu método
de ensino harmonizava aos “novos tempos”, indicando a hegemonia do pensamento econômico
no século XIX, por outro lado, o pensamento político tornava-se marcado pela preocupação com a
delimitação de fronteiras e com a organização dos interesses privados, atribuindo, assim, relevância
à família, que passa a ser vista como célula de base e instância reguladora. Em 1920 a escola pública
é apresentada como uma opção para o colono pobre, e apesar dos problemas de aprendizagem
causados pelos desentendimentos linguísticos entre os alunos e seus professores brasileiros, por
outro lado, quando a nacionalização começou, existiam no Brasil aproximadamente 1.500 escolas
teuto-brasileiras, boa parte delas administradas por ordens religiosas católicas e pelas comunidades
evangélicas luteranas (Dalbey 1970; Kreutz 1994). Delineia-se neste artigo a cultura escolar teuto-
brasileira como um conjunto de finalidades escolares que estabeleciam conhecimentos e ensinava
condutas na medida que guiavam as decisões dos sistemas de ensino. Assim como as culturas,
as práticas educativas escolares devem ser percebidas em seus contextos ideológicos, políticos e
religiosos, pois estão necessariamente ligados aos interesses e relações de força de certos grupos.
Isto nos leva a investigar a presença da ideologia cultural no manual didático editado pela Verlag
Rotermund. A metodologia a ser utilizada nesta pesquisa configura-se como histórica e bibliográfica
baseada em autores como: Kreutz (1994), Bitencourt (1993), Munakata (1997), que destacam a
história inicial do livro didático no Brasil. Sob esta perspectiva o pesquisador historiador não
é aquele que se limita a produzir documentos textuais em uma nova linguagem. Nessa revisão
historiográfica da educação será desenvolvida uma produção constante do presente com o passado,
e o resultado desse diálogo consistirá na transformação de objetos naturais em cultura, Certeau
(1982). Na pesquisa historiográfica posposta terá por objetivo a tarefa de convocar o passado que
já não está em um discurso presente, objetivando revelar em riqueza as particularidades da fonte
primária e em persuadir o leitor em um processo de validação dos resultados obtidos. Sob o olhar
de Chartier (1990), pode-se dizer que a imprensa pedagógica, foi longamente usado como veículo de
continuidade e descontinuidade para circulação de ideias que traduziram valores e comportamentos
morais que se desejava ensinar sobre a ideologia religiosa, entre Estado Republicano e as escolas
comunitárias teuto-brasileiras. Conforme sugerido por Valente (2007), há uma infinidade de
materiais impressos que em conjunto com os manuais didáticos permitem a composição do quadro
da educação prática de matemática e aritmética em tempos das escolas teuto-brasileiras. No início
os professores de conteúdos de matemática moderavam apenas a formação teórica, detinham
as competências a ensinar, mas, a notória ausência dos saberes práticos da docência gerava um
distanciamento entre os traquejos didáticos pedagógicos e os saberes para a prática do ensino
pelo método Lancasteriano. Entre os saberes matemáticos preconizados incluiriam a aritmética
até proporções; aplicações de aritmética ao comércio, noções gerais de geometria teórica e prática
e suas aplicações ao desenho linear e agrimensura. Conforme Monarcha (2009, p. 16), “As vozes
dos sujeitos da época pedem para serem ouvidas e meditadas […]”. O ensinar e o aprender, assim
como quaisquer outras atividades humanas, necessitam de um espaço e tempo determinados para
acontecer. Iniciamos elegendo uma época – A Nova República –, um lugar – áreas coloniais da região
sul – uma instituição – Escolas teuto-brasileiras – como focos de investigação. Mas que lugar era
esse à época? Devido as funções políticas e administrativas, seu crescimento econômico deu-se ao
fato de o Estado estabelecer-se com as regiões coloniais alemãs e italianas em um forte fluxo de
comercialização (Fortes, 2004). A demarcação temporal de 1889 a 1924 não deve ser entendida com
rigidez, uma vez que os antecedentes editoriais e uso dos manuais didáticos pelas Escola teuto-
brasileira precisam ser considerados em um processo lento que envolveu mais de trinta de anos.
Exaltaremos as vozes do passado, daqueles que ajudaram a entendermos melhor essa história.
Desta forma, a ação do pesquisador historiador consiste em efetuar um trabalho sobre estas vozes
para construir os fatos. Portanto, um fato não é outra coisa senão o resultado de uma elaboração,
de um raciocínio, a partir das marcas do passado. A conclusão compor-se-á em enfatizar que o livro
didático “O ensino prático de Aritmética” não foi um simples espelho. Ele foi usado como dinâmica
de interações comunitárias com objetivo claro: a defesa da religião cristã contra o liberalismo, e,
posteriormente, contra o Estado, que postulava o ensino público e laico.
Referências
ARAÚJO, J. C. S. Republicanismo e escola primária nas mensagens dos presidentes de estado de
Minas Gerais (1891-1930). In: ARAÚJO, José Carlos Souza; SOUZA, Rosa Fátima de; PINTO, Rubia-
Mar Nunes (orgs.). Escola primária na primeira república (1889-1930): subsídios para uma história
comparada. Araraquara: Junqueira & Marin, 2012.
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KREUTZ, L.; LUCHESE, T. Â. Grupos étnicos, pluralidade cultural e políticas públicas na história da
educação no Rio Grande do Sul. In: Revista Brasileira de História de Educação, n. 11, n. 1, pp. 179 -
206, 2011. https://doi.org/10.4025/rbhe.v17n3.934
MAURO, S. Uma história da matemática escolar desenvolvida por comunidades de origem alemã
no Rio Grande do Sul no final do século XIX e início do século XX. 2005. 257 f. Tese (Doutorado em
Educação Matemática) – Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2005.
Este trabalho apresenta uma revisão sistemática que objetivou identificar e analisar como as
produções científicas da área de Educação têm mobilizado a perspectiva teórica e metodológica do
sociólogo Pierre Bourdieu em pesquisas de biografia, trajetória e história de vida de professores e as
contribuições para o campo da História da Educação. O interesse pela pesquisa se deu por meio da
realização de dois estudos em andamento, as trajetórias biográficas de professores, Oliva Enciso e
Luiz Alexandre de Oliveira, no campo histórico-educacional de Campo Grande em Mato Grosso do
Sul. Na última década a abordagem biográfica ganhou novos olhares em investigações da História
da Educação. Pesquisadores têm realizados estudos sobre intelectuais da educação e outros
personagens que atuaram na educação, discutindo não somente as ideias pedagógicas desses
sujeitos, mas os processos de formação intelectual, as redes de sociabilidade, as viagens formativas,
estratégias de legitimação, entre outros temas. Além de utilizarem novas fontes, como
correspondências, reportagens e artigos publicados na imprensa, autobiografias, acervos pessoais,
dentre outros. A fim de apreenderem por meio de uma história individual as similitudes e diferenças
com a história coletiva Galvão e Lopes (2010). Montagner (2007) traz à luz os procedimentos possíveis
dentro da abordagem biográfica bourdieusiana, em que o agente social é colocado como o “centro
e a chave” das análises nas ciências sociais, numa relação entre a História e a Sociologia. Para o
autor, Bourdieu esclarece a impossibilidade de que a história de vida, biografia e trajetória consiga
dar uma sequência cronológica e lógica dos acontecimentos e ocorrências da vida de uma pessoa,
mas pelo objetivo proposto alcançam um sentido coerente às ações humanas. “Do ponto de vista de
Bourdieu, é impossível dar sentido a um todo que escapa ao próprio sujeito, histórico, determinado
socialmente, imerso em um universo social fora de nossos controles”. Bourdieu (1996ª) define a
noção de trajetória como “uma série de posições sucessivamente ocupadas por um mesmo agente
(ou um mesmo grupo), em um espaço ele próprio em devir e submetido a transformações
incessantes”. E alerta, que na apreensão de uma trajetória, está deve ser compreendida na
singularidade do agente no percurso do espaço social pelas disposições do habitus e nas posições
ocupadas no campo. Enfim, a trajetória é compreendida como o resultado de um sistema de traços
pertinentes, de uma biografia individual, ou de grupo, ou seja, a objetivação das relações entre os
agentes e as forças presentes no campo. Para identificar e analisar a dimensão que a teoria
bourdieusiana tem alcançado, na articulação entre campo teórico e campo histórico-educacional,
explorou uma revisão sistemática de produções científicas. A fim de na apreciação do estado de
das discussões de Pierre Bourdieu iniciadas no texto “A ilusão biográfica”, na ampliação do campo
biográfico como um espaço de desenvolvimento do campo histórico e educacional. As pesquisas
realizadas de abordagem biográfica, fundamentadas nos referencial teórico têm contribuído para
elucidar a compreensão no campo da História da Educação em diferentes objetos, pois o autor
define uma perspectiva e um raciocínio próprio para análise. A revisão sistemática levou ao estado
de conhecimento, possibilitou uma visão ampla e atualizada do movimento da pesquisa de
abordagem biográfica no Brasil. Bem como, permitiu o contato com as discussões acerca dos objetos
de estudos das investigações das teses de doutoramento em andamento. A partir das leituras dos
conceitos de biografia e trajetória, entendemos a trajetória como a delimitação submergida em uma
história de vida, uma tentativa de apreender as ações dos agentes em determinados espaços sociais.
Referências
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: Razões práticas: Sobre a teoria da ação. Trad. Marisa
Corrêa. 9. ed. Campinas/SP: Papirus, 1996a, p. 74-82.
BOURDIEU, Pierre. As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário. Tradução Maria Lucia
Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 1996b.
BOURDIEU, Pierre. Coisas ditas. Tradução Cássia R. da Silveira et all.. São Paulo: Brasiliense, 2004.
GALVÃO, A. M. de O.; LOPES, E. M. T. Território plural: a pesquisa em história da educação. São Paulo,
SP: Ática, 2010.
MONTAGNER, Miguel Ângelo Trajetórias e biografias: notas para uma análise bourdieusiana.
Sociologias, Porto Alegre, ano 9, nº 17, jan./jun. 2007, p. 240-264.
ISSN 2358-3959
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A leitura como prática criadora (CHARTIER, 2002) e não como um simples consumo de
letras, símbolos, ideias; a leitura como atividade produtora de sentidos singulares e não como
estratégia de transferência de sentidos alheios. A leitura como sobrevoo autônomo e não como
caminhar definido. Estas compreensões sobre a leitura reconhecem o leitor como um sujeito
que viaja, seguindo a metáfora utilizada por Certeau (2001), por campos de outros, fazendo-os
próprios, através de suas caças furtivas. Os campos são instituídos pelo livro, pelas suas ordens:
“[...] a ordem de sua decifração, a ordem no interior da qual ele deve ser compreendido ou,
ainda, a ordem desejada pela autoridade que o encomendou ou permitiu a sua
publicação” (CHARTIER, 1994, p. 8). As ordens do livro estão inscritas através de seus protocolos
de leitura, ou seja, pela delimitação de uma leitura autorizada. Ainda que no campo instituído
pelo livro sejam autorizados os destinos de viagens, os leitores atravessam-lhe traçando seus
próprios trajetos, segundo seus próprios desejos, formas de viajar e maneiras de perceber o
campo. Compreendem-se os protocolos de leitura como aqueles dispositivos que pretendem
controlar a recepção, instaurar os destinos de viagens; eles são as estratégias que o escritor e
editor utilizam para definir uma única e legitima maneira de entender o discurso escrito;
encontram-se estabelecidos a partir de duas vias, uma puramente textual, que inscreve no texto:
“as convenções, sociais ou literárias, que permitirão a sua sinalização, classificação, e
compreensão, empregando toda uma panóplia de técnicas, narrativas ou poéticas, que, como
uma maquinaria, deverão produzir efeitos obrigatórios, garantindo uma boa leitura” (CHARTIER,
2001, p. 97) e uma segunda via de instauração através das formas tipográficas. O presente
texto tem por objetivo discutir como os protocolos de leitura possibilitam enxergar as
representações de mulher forjadas em uma revista feminina, cuja circulação se deu na primeira
metade do século XX, no Brasil, a partir dos vestígios implícitos e explícitos que estão ali
impressos. A revista Jornal das Moças foi uma revista carioca que tinha como objetivo “Levar ao
lar das famílias patrícias, além da graça e do bom humor que empolgam, da música e canto que
embalam, dos brincos e contos infantis que deleitam, da moda que agrada, do romance que
desfaz as visões tristes da existência, da nota mundana que satisfaz a curiosidade insofrida, os
conhecimentos úteis que instruem [...]”. Esse objetivo tinha por finalidade cativar suas “patrícias”,
elevando seus espíritos de mulheres encantadoras, termo bastante usado para caracterizar a
mulher prestimosa, cujo comportamento é calcado nos mais altos valores morais, levando-a,
conduzindo-a a seguir irretocavelmente em seu caminho de personagem, além de encantadora,
impoluta. Para tanto, centrou-se a reflexão nos estudos de Chartier (1990), que além de definir
os protocolos de leitura como mecanismos que ditam a interpretação correta, permite
compreende-los como delineadores de uma leitora ideal para esse texto. O conceito de
Representações utilizado no presente trabalho está sustentado dentro da perspectiva da História
Cultural, a partir de Roger Chartier (2002). O principal objeto da História Cultural, segundo o
autor, é “identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade
social é construída, pensada, dada a ler” (p. 16-17). Por sua parte, as Representações constituem-
se como “matrizes de práticas construtoras do mundo social”, que visam, portanto, regular a
prática, sempre atuando no terreno das lutas de representações, em um processo entre a
imposição e a definição submissa ou resistente que cada comunidade produz de si mesma
(CHARTIER, 1991). Nos estudos da semiótica da interpretação, Umberto Eco propõe o conceito
de leitor-modelo. Esse conceito está inserido nas análises de obras literárias, de textos narrativos,
no entanto, o utilizamos aqui por entender que subsidia a análise do suporte escolhido. Eco nos
coloca que “um texto é emitido para alguém que o atualize – embora não se espere (ou não se
queira) que esse alguém exista concreta e empiricamente” (1986, p. 37). Assim sendo, entende-
se que ao produzir um anúncio, um texto em um suporte, o autor e os demais participantes do
projeto editorial de um suporte constroem um leitor, o idealizam, o almejam e, para isso, criam-
se dispositivos internos que auxiliam o leitor a percorrer o caminho para a mais correta
compreensão do que é dado a ler. Esse leitor participa cooperativamente na “máquina
preguiçosa” que é o texto produzido pela autoria, sem a presença do leitor, inicialmente. Esse
texto nasce e permanece envolto de lacunas a serem preenchidas por esse leitor, pois “que
problema seria se um texto tivesse de dizer tudo que o receptor deve compreender – não
terminaria nunca” (ECO, 1986, p. 09). Esse autor postula dois conceitos, sendo o de leitor-
modelo e o de leitor-empírico como participes ativos na mente do autor e como sujeitos
preponderantes no imenso tecido com suas tramas e urdiduras envoltos em signos, entrelaçados,
entremeados que aguardam o leitor no seu coser dos espaços soltos, das lacunas dessa trama. O
leitor empírico é posto na interação textual como aquele que o lê de variadas formas e o
interpreta, também de variadas formas, pois, para isso, traz consigo seus desejos, seus
sentimentos, suas expectativas e os projeta sua interpretação, o consumo do bem material, o
entendimento do que é veiculado por seus parâmetros absolutamente sensoriais e subjetivos. Já
o leitor-modelo de Eco é aquele leitor previsto, desejado, uma estratégia textual que se desenha
para que se tenha uma leitura “correta” ou “autorizada” do texto, como diz Chartier, é “uma
espécie de tipo ideal que o texto não só prevê como colaborador, mas ainda procura criar” (Eco,
1986, p.15). A partir da compreensão desse conceitos que dão base a esta investigação,
representações e leitor-modelo, apresentados em associação a um quadro teórico-metodológico
de análise através dos protocolos de leitura e reconhecendo a revista feminina impressa como
objeto histórico, foi realizada a análise da fonte, Jornal das Moças, buscando entender essa
mulher, identificando o perfil da mulher ideal no semanário carioca, procedendo a investigação,
ainda, a partir das categorias indumentária, temas autorizados para a mulher e estética feminina,
inicialmente. O artigo aponta a fonte, a partir dos vestígios, rastros, sinais encontrados, como
um espaço fértil para a perpetuação do estereótipo de mulher como a rainha do lar e aquela que
conduz a criação dos filhos da nação. A sexualidade da mulher é o foco, nas construções de um
ideário feminino, de um constructo feminino e tem sido a marca de sua identidade e todo o
discurso veiculado nas diferentes mídias, em diferentes épocas, trazem consigo diferentes
representações de mulher que vão desde a sua castidade inviolada, de sua fragilidade até a
visão de mulher promíscua, a depender do ideal de vida procurado por essa mulher, perpetuando
uma visão discriminatória. Mulher livre, mulher na rua, mulher pública inspira promiscuidade,
nesse sentido. Esses discursos consolidados na imprensa feminina da primeira metade do
século XX, por exemplo, constitui-se como dispositivo de produção e propagação de mitos
baseados em modelos entranhados na sociedade androcêntrica em que ela circulava e o
estabelecimento de mitos da época para reforçar o retrato ideológico do nacionalismo, do
patriotismo, do aprimoramento da raça, da nação ideal desejada pelo Estado na época, através
de personalidades que faziam parte do imaginário feminino do período. Nesse sentido, entende-
se que a dominação, a supremacia masculina está tão inculcada no inconsciente coletivo que
não enxergam-se as estruturas históricas masculinas que vem sendo apregoadas, por exemplo,
no discurso veiculado no conteúdo textual de revistas femininas. Verificou-se, também, que a
identidade feminina, forjada nos diversos suportes inseridos na imprensa feminina e, no caso, a
Jornal das Moças, foi construída socialmente a partir do outro, do homem, do masculino, tendo
como base este e reforçando a supremacia masculina, já inculcada no inconsciente coletivo e
apregoada no discurso veiculado no conteúdo textual e imagético das revistas femininas.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 222
Referências
CERTEAU, Michel De. A invenção do cotidiano: artes do fazer. 4ª ed., tradução de Epharain Ferreira
Alves. Petrópolis, RJ: Forense Universitária, 1994.
CHARTIER, Roger. A história cultural entre práticas e representações. Trad. Maria Manuela Galhardo.
Lisboa: Difusão Editorial, 1988. 244 p. (Col. “Memória e Sociedade”, coord. p/Francisco Belhencourt
e Diogo Ramada Curto, v. 1).
_____. (Org.) Práticas de leitura. 2. ed. São Paulo: Estação Liberdade, 2002.
_____. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV e XVIII.
Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1994.
ECO, Umberto. Lector in Fabula, a cooperação interpretativa nos textos narrativos.Trad. Attílio
Cancian. São Paulo: Editora Perspectiva, 1986.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Esta pesquisa privilegia o acervo de Obras Raras do Sistema de Bibliotecas da Universidade São
Francisco (USF) como fonte de pesquisa para a história da educação. Tem como objetivo de rastrear
a memória e a identidade dos Franciscanos da Ordem dos Frades Menores (OFM), Província da
Imaculada Conceição do Brasil, ali presentes a partir da leitura da composição do acervo; assim
como fomentar a linha de pesquisa Rastros: patrimônio cultural franciscano e educação, visa também
identificar o patrimônio cultural franciscano bibliográfico e disseminar suas potencialidades para
pesquisas acadêmicas. Esta pesquisa partiu de algumas reflexões e questões norteadoras, tais
como: qual a importância do acervo de Obras Raras do Sistema de Bibliotecas da Universidade São
Francisco à história da educação? De que modo acervos desse teor deixam de ser apenas fonte de
reflexão do historiador para se tornarem também elementos de prova das pesquisas desenvolvidas?
Considerando que nesta pesquisa o recorte temporal das Obras Raras investigadas abrange desde a
colonização do Brasil, período também conhecido como Brasil Colônia ou Brasil colonial, séculos
XVI até XIX. A pesquisa identificou que o acervo de Obras Raras do Sistema de Bibliotecas da
Universidade São Francisco reúne publicações relevantes à memória das políticas públicas de nosso
país e à história da educação brasileira desde 1520. Considera-se que temáticas privilegiadas por tal
acervo estão intrinsecamente ligadas constituindo-se, mutuamente, num processo de ampla
circulação de ideias, garantida pela imprensa que resultou tanto na ampliação da publicação de
obras quanto na formação e ampliação de bibliotecas. Com as vantagens que a disseminação do
conhecimento e a emergência da indústria editorial trouxeram, surge também uma nova
preocupação, a de preservar e conservar o acervo bibliográfico para gerações futuras, tomando o
cuidado para que estas tenham acesso a um material de qualidade, similar ao seu original (BURKE,
2003). Considera-se também que a memória, onde cresce a história e, por sua vez a alimenta, procura
salvar o passado para servir tanto o presente e como ao futuro (LE GOFF, 2003). Esta é uma pesquisa
de cunho exploratório, pois a prospecção e a garimpagem no acervo permitiu a localização das obras
raras que compõem a Biblioteca em diferentes áreas do conhecimento. Foram localizadas pelo
empenho arqueológico delineando a cartografia de um acervo inestimável, mapeando suas
descobertas e achados, rastreando o que se tornara insondável. De acordo com Souza (2012, p. 50-
51), no acervo da biblioteca de Obras Raras da USF “[...] há um exemplar cuja capa é de couro de
animal. O livro intitula-se O livro das Conformidades, ao qual o autor Bartolomeu de Pisa dedicou
mais de quinze anos de sua vida para escrevê-lo, e parece ter sido lido apenas superficialmente pela
maioria dos autores que dele falaram. Partindo da ideia de que a vida de Francisco fora um
seguimento perfeito da vida de Jesus, Bartolomeu de Pisa, quis reunir, sem perder nenhum, todos
os traços da vida do Poverello, espalhadas nas diferentes legendas conhecidas de seu tempo. Ao
estudar os fragmentos que o autor conservou, vê-se, de imediato, que essa coleção pertencia à
tendência dos zelantes da pobreza. O documento mais antigo do acervo de Obras Raras da USF data
de 1520 é oriundo de conventos franciscanos. Entre os catalogados e disponíveis há ainda: Na área
de filosofia publicada em 1520: DUNS SCOTUS, John. Subtilitatis epidicticon. Pavia: Jacob
Paucidrapius Burgofranco; Biografia de São Francisco: BOAVENTURA. Códice leienda maíor;
Franciscanismo, capuchinos, publicado em 1590: BARTHOLOMEUS. Liber aureus inscriptus liber
conformitatum vitae beati, ac seraphici patrics Francisci ad vitam iesu christi domini nostri: nunc denuò
in lucem editus, atqs infinitis propemodum mendis correctus à reuerendo, ac doctissimo P. F. Ieremia
Pucchio Utinensi sodali franciscano. Bononiae: Apud Alexandrum Benatium; Introdução à Bíblia de
1566: CARTHUSIA, Dionysii. Enarrationes piae ac eruditae in quinque mosaicae legis libros hoc est,
Genesim, Exodum, Leviticum, Numeros, Deuteronomium. Coloniae: Apud Lavedes Ioannis; O Evangelho
segundo Paulo publicado em 1556: D. Ioannis Chrysostomi archiepiscopi constantinopolitani
enarrationes, partim antehac, partim nunc primum traduetae & aeditae, in D. Pauli Epistolas: Galatas,
Ephesios, Philippenses, Colossenses, Thessalonicenses II; Livro de meditações e escritos contemplativos
de 1548: INÁCIO. Exercitiorum spiritualium: editio princeps qualis in lucem prodiit. Romae: B. Herder;
Coletas de orações publicadas em 1531: CARTHUSIA, Dionysii. Insigne commentariorum opus, in
psalmos omnes Davidicos: quos ipse multiplici sensu, quantum fieri potuit, nempe Literali, Allegorico,
Tropologico, & Anagogico (id quod nemo hactenus praestitit) non nisi. Coloniae: Petrum Quentell.”,
entre outros. A distinção entre obras raras e preciosas repousa no caso de as primeiras serem
definidas em virtude da escassez de volumes com características idênticas, enquanto as segundas
são identificadas nem tanto em razão de sua antiguidade ou número de exemplares disponíveis
mas, principalmente, das ilustrações, das anotações que contenha, do material empregado em sua
confecção e de aspectos relativos ou subjetivos considerados pelo profissional responsável pela
seleção, pois a explosão bibliográfica ocorre a partir de 1448, com a imprensa de Gutenberg, que
teve relevância intelectual e histórica. Apurou-se que os critérios que orientaram a formação do
acervo da Biblioteca de Obras Raras foram os seguintes: relatos de viajantes estrangeiros dos séculos
XVIII e XIX; obras dos séculos XVI a XIX; edições em diferentes suportes, personalizadas e numeradas;
obras esgotadas e desaparecidas; edições fac-similares; as primeiras edições de autores clássicos de
diferentes áreas do conhecimento e edições censuradas. Observa-se em tal acervo a exteriorização
das lembranças individuais e sociais, ali onde documentos, imagens e objetos ascendem à função
de depositários de memória. Entre passado e presente as materialidades transitam, principalmente,
os que atuam no âmbito da gestão informacional, história, instituições de guarda e memória de
instituições. Campo permeado, algumas vezes, pelas disputas de poderes e na dimensão dos
embates que definirão o que será lembrado, como será lembrado, e também com aquilo que, não
sendo lembrado, será esquecido (GAGNEBIN, 2006). Burke (2003) ressalta a importância de voltar o
olhar e estudar as formas materiais dos livros, os detalhes sutis de tipografia e diagramação,
argumentando que elementos não-verbais, entre eles a própria disposição do espaço, são portadores
de significado. Um dos resultados desta pesquisa foi a identificação dos livros que deram origem ao
acervo de Obras Raras do Sistema de Bibliotecas da Universidade São Francisco pertencem às
diferentes áreas do conhecimento, chegaram em quantidade variada e se encontram em estados
distintos de conservação. As obras foram recebidas e acolhidas como parte das memórias das casas
franciscanas no Brasil e, ao mesmo tempo, acrescentaram mais dados sobre a história de uma
biblioteca franciscana. A delicadeza e a fragilidade das obras raras são admiráveis, desde a presente
preocupação em salvar, organizar e conservar a herança cultural escrita, em meio a desestruturação
material que marcou um período da história, acabaram por fazer dos livros um objeto de dimensões
às vezes excessivamente imponentes, acentuando um caráter sacral e misterioso, posto que
privilegiavam-se os aspectos visuais – solenidade e grandeza do formato – relativamente aos
aspectos gráficos. Esta biblioteca de Obras Raras é considerada um repositório do patrimônio
intelectual e cultural que permite uma relação dinâmica entre conhecimento e pensamento − um
espaço configurado como lugar de memória (NORA, 1993). Outro fator importante, na constituição
de uma biblioteca, refere-se às questões técnicas da seleção e da classificação do acervo o que
proporcionou a inserção da USF no Plano Nacional de Recuperação de Obras Raras (PLANOR) da
Biblioteca Nacional no Brasil, pois este plano que tem como objetivos identificar e recuperar obras
raras existentes, não só na Biblioteca Nacional (BN), como em outras instituições e acervos
bibliográficos do país, bem como divulgar informações sobre bibliotecas e instituições curadoras de
acervos raros e especiais em todo o Brasil. Le Goff (2003. p. 535-536) afirma que “[...] o documento
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 225
não é qualquer coisa que fica por conta do passado, é um produto da sociedade que o fabricou
segundo as relações de forças que aí detinham o poder.”. Por fim, as instituições de guarda permite
pensar e refletir numa circulação e produção de saberes a partir do conhecimento preservado.
Referências
BURKE, Peter. Uma história social do conhecimento: de Gutenberg a Diderot. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editora, 2003.
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006.
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História, São Paulo:
PUC, n.10, p. 07-28, dez.1993.
Terezinha Oliveira
Maria Teresa Santos
Resumo
O objetivo desta comunicação é refletir sobre a recepção da disputa entre os mestres mendicantes
e mestres seculares do século XIII pela historiografia brasileira do século XX. Elegemos como
fontes para o estudo os trabalhos de Falbel (1974), Ullmann (2000) e De Boni (2003). Esses autores
dedicaram-se ao estudo desta disputa para recuperar as origens da Universidade de Paris com o
intuito de compreender os fundamentos políticos e culturais da principal instituição de ensino
superior brasileira. Para analisá-los nos pautaremos na perspectiva teórica da história social, a
qual nos permite considerar estes autores como intelectuais que compreenderam essa instituição
educativa sob seus múltiplos aspectos. Ao refletir sobre estes escritos pretendemos, também,
recuperar a memória dessa instituição e considerar historicamente como ela foi encarada em outro
tempo que não o nosso.
Resumo expandido
Um dos maiores conflitos entre mestres seculares e mestres regulares na Universidade de Paris no
século XIII foi um embate travado nas décadas de 1250 e 1260. Este embate ocorreu principalmente
em virtude das disputas pelas cadeiras de teologia, na qual os regulares conquistam mais cadeiras
e, com isso, os seculares se sentem prejudicados. Os participantes desta disputa escreveram textos
para defenderem as suas posições e, principalmente, o direito de serem mestres na Universidade. As
disputas entre eles marcaram a história das origens da universidade de Paris e continuam atraindo a
atenção de intelectuais dos séculos XX e XXI.
Esta exposição analisará a recepção dessa disputa entre os intelectuais brasileiros no século XX.
Traremos, assim, um conjunto de autores que a analisaram com o intento de recuperar a memória
das origens da Universidade de Paris entre estudiosos brasileiros.
O primeiro autor que trazemos para o debate é Falbel, um historiador. No artigo ‘De Reductione
Atrium ad Theologiea de São Boaventura’, Falbel analisa o conflito entre os seculares e os
mendicantes quando da indicação de Boaventura de Bagnoregio para a cadeira de teologia na
Universidade de Paris.
Segundo Falbel, em 1248, o mestre franciscano Boaventura recebeu a licença para ensinar, mas
a dificuldade estava em ser aceito na Universidade de Paris junto aos doutores seculares. Uma das
principais razões para não ser aceito seria pelo fato de que ele não poderia fazer o juramento de
fidelidade à universidade como os mestres seculares faziam, pois, como mestre franciscano, já teria
feito o juramento à Ordem Franciscana.
A questão de pertencer a duas instituições foi fortemente combatida por Guilherme de Santo
Amor no Breve Tratado sobre os perigos do novíssimo tempo. Na verdade, o que estava posto nesta
questão do juramento é uma das principais característica da corporação, pois o juramento de
fidelidade era condição de conservação de um ofício e os mestres seculares entendiam que a função
de ensinar era um oficium. Um aspecto importante sobre a questão da fidelidade é que era uma das
ligações essenciais que salvaguardava as relações feudo-vassálicas. Assim, ainda que a Universidade
se apresentasse como uma instituição jovem, ela tinha em suas regras os valores das práticas sociais
anteriores. Por isso, o Mestre deveria ter um só ‘senhor’, representado simbolicamente por seu
estatuto.
Esses aspectos da querela abordados por Falbel também foram examinados pelos dois outros
autores que elegemos.
De Boni (2003), um filósofo, apresenta o debate entre os mestres seculares e os mendicantes
apontando para aspectos que são essenciais: a questão da pobreza, da corporação e do
posicionamento das autoridades à época em relação ao embate. Ele destaca que nos séculos XII
e XIII a pobreza deixou de ser miséria social para se converter em imitação de Cristo, tornando-se
virtude. Criou-se em torno da pobreza um ideal de comportamento que aproximava os homens de
Cristo. Esse ideal que associa pobreza à virtude e ao filho de Deus, portanto, um modelo de homem
que representaria o ‘bem’, é a principal característica dos mendicantes que disputavam o espaço do
ensino na Universidade com os mestres seculares.
A ideia de uma forma linear de entendimento de pobreza não se coaduna com os diferentes
tempos do medievo ocidental. No período carolíngio, pobreza era uma condição ‘natural’ do ser
social em virtude das condições materiais de produção da vida (OLIVEIRA, 2012). Entre os séculos
XI e XII, ela esteve associada aos ‘camponeses errantes’ sem trabalho ou àqueles sem um ‘lugar
social’, como os filhos bastardos da nobreza ou filhos terceiros, quartos da nobreza ou da realeza que
estavam distantes da linhagem de sucessão e sem direito ao morgado. No século XIII, ela se torna
uma atitude mental proveniente de uma eleição consciente daquele que considera a pobreza um
caminho para a virtude, uma escolha ‘quase’ santa, pois é similar à escolha do filho de Deus.
De Boni destaca que, dentre as inúmeras razões para os embates, três aspectos foram os principais.
O primeiro deles é que os frades não faziam o juramento de fidelidade a Universidade. O segundo
é que eles não cobravam prebendas por suas aulas e, com isso, retiravam alunos dos doutores da
corporação e, por fim, o terceiro aspecto é que muitos dos melhores alunos tornavam-se frades,
prejudicando a formação de novos doutores para a universidade.
Assim, as razões para o conflito entre os mestres seculares e os frades mendicantes eram
evidentes. ‘O novo’ expresso pelos últimos punha em xeque o poder e as bases de subsistência
dos mestres seculares, uma vez que atraíam muitos alunos e não aceitavam subordinarem-se às
regras da Universidade. Analisada situação séculos após a sua eclosão, é possível presumir que não
seria possível a existência harmoniosa entre as duas correntes de mestres universitários. O embate
era inevitável por colocarem frente a frente duas visões distintas de mundo. Os seculares estavam
alinhados à forma medieval de ser e os mendicantes, ainda que ‘filhos’ do medievo, associavam-se
às cidades, a um princípio de vida que hoje chamaríamos de ‘cosmopolita’.
Prosseguindo a análise sobre o grupo de intelectuais brasileiros que refletiram sobre a querela da
década de 1250, trazemos Ullmann (2000), historiador e filósofo. Na História da Universidade, dedica
um capítulo para analisar a questão dos conflitos universitários na Idade Média e salienta com ênfase
as primeiras disputas entre os mestres seculares e mendicantes, ou seja, a controvérsia entre 1229
a 1231, quando os mendicantes continuam a dar aulas em seus monastérios, enquanto os mestres
seculares e estudantes estavam em greve. Trata-se, em linhas gerais, do grande conflito da década de
1270 que culminou com a condenação das 219 sentenças. No que diz respeito ao embate da década
de 1250, ele é um tanto tímido ao enfatizar que o conflito foi mapeado pela questão da pobreza e
pelo embate entre os seculares e os mendicantes para a ocupação de espaços na Universidade e na
sociedade.
A questão é apresentada por Ullmann no âmbito da disputa por espaço, além do problema da
pobreza. De todo modo, observamos que o autor destaca a década como muito conflituosa. Para
o autor é possível perceber que uma das grandes razões do conflito era, de fato, o lugar que os
mendicantes estavam ocupando não só na universidade, bem como na sociedade. À medida em que
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 228
os frades ganhavam espaços sociais, os seculares perdiam pelo fato de que ambos ocupariam os
mesmos “lugares”, quais sejam, a universidade e os fiéis cristãos.
Todavia, não se trata somente do que hoje poderíamos definir como disputa do campo, mas
do embate entre duas concepções distintas de entendimento de conhecimento, de mundo e,
especialmente, do que seja homem, assim, expressão das mudanças que estavam ocorrendo no
Ocidente e que marcaram para sempre a história da universidade. Sob este aspecto, Ullmann não
deixa de reconhecer a relevância dos mendicantes para o desenvolvimento de um novo olhar para a
ciência. O autor apresenta as obras que os mestres mendicantes escreveram, considerando-as como
clássicas, já que permaneceram no tempo, a exemplo das Sumas de Teologia e Contra os Gentios de
Tomás de Aquino. Isto só para indicar um exemplo.
Ao apresentarmos as posições desses três autores explicitaremos a permanência desse embate
universitário na historiografia brasileira bem como consideramos relevante retomar o acontecimento
e as análises desses intelectuais para conservar/construir hoje, no século XXI, a memória das origens
da Universidade de Paris no âmbito da história da educação.
Referências
DE BONI, L. A. O debate sobre a pobreza como problema político nos séculos XIII e XIV. In: DE BONI,
L. A. De Abelardo a Lutero. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003, p. 215 - 254
FALBEL, N. “De Reductione Atrium ad Theologiea” de São Boaventura. Revista de História, v. XLVII,
São Paulo, p. 5-84, 1974.
ULMANN, R. ULLLMAN, A. R. Disputas pelas Cátedras de Teologia. In: A universidade Medieval. Porto
Alegre: EDIPUCRS, 2000, p. 219-235.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente trabalho apresenta objetos e sujeitos da Química, que foram desvendados durante
visitas à Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho (ESMAVC), originária do primeiro Liceu
Feminino Português, criado em 1906, em Lisboa, para a pesquisa de pós-doutorado em museologia
e patrimônio no MAST/ UNIRIO, entre outubro e novembro de 2015. Com essa pesquisa, buscou-se
salvaguardar o patrimônio cultural da Química e da Dietética existente no Centro de Memória da
Escola Técnica Estadual (Etec) Carlos de Campos, originária da primeira Escola Profissional Feminina
da capital, criada em 1911, em São Paulo. Em 2017, publicou-se um catálogo produzido a partir
dessa pesquisa na Reserva Técnica Visitável de Alimentação e Nutrição, referente à arquitetura
escolar, aos artefatos e às suas possibilidades de musealização, nesse lugar de memória e da história
da educação no campo da alimentação e nutrição. Nos acervos dos laboratórios de Física e Química
e da Biblioteca da ESMAVC, com apoio da coordenação e de professores, foi possível ter acesso a
equipamentos, catálogos de fornecedores, cadernos de alunas e compêndios produzidos por
professores, que possibilitaram compreender e relacionar os objetos encontrados sobre as práticas
escolares e pedagógicas dessa escola secundária, entre as décadas de 1920 a 1970. Quanto aos
sujeitos relacionados a essa cultura material, descobriu-se Rômulo de Carvalho (1906-1997),
licenciado em Ciências Físico-Química pela Universidade do Porto em 1931, e que ingressou como
professor no Liceu de Camões em 1934, tornando-se diretor do Laboratório de Química neste liceu
entre 1938 e 1948, tendo passado por diversos liceus até aposentar-se em 1974. Esse professor e
cientista produziu uma vasta obra na sua área de Ciências Físico-Químicas, estimulando a divulgação
científica. Dentre estas, inclui-se a História do Ensino em Portugal. Outras obras localizadas nessa
escola, foram as de Alice Bravo Torres Maia Magalhães (1914 - 1989), que foi aluna e professora neste
liceu, produzindo compêndios de Físico-Química. Durante as visitas aos laboratórios de Física e de
Química da ESMAVC, reconhecendo-se objetos semelhantes aos empregados nas práticas escolares
pelos professores do Instituto Profissional Feminino da capital, denominação da atual Etec Carlos de
Campos, entre 1933 e 1945. Nesse instituto, a química foi incluída no currículo do curso de Educação
Doméstica para formação de professoras da educação profissional, em 1934, quando era diretor
Horácio Augusto da Silveira. A primeira professora de química, nesse instituto, foi Celina de Moraes
Passos (1899-1974), normalista formada pela Escola Normal de Artes e Ofícios, que ingressou como
preparadora de Chimica Alimentar em 1935; e no ano seguinte, foi contratada como professora de
“economia doméstica e química”. A professora Celina de Moraes Passos publicou, em 1938, o livro
“Noções sobre Química Alimentar” com o prefácio do médico Francisco Pompêo do Amaral (1907-
1990). Nessa época, esses dois profissionais escreviam matérias jornalísticas sobre educação e
saúde no campo da alimentação e nutrição, em jornais paulistas. Nesse prefácio, Pompêo do Amaral
discorreu sobre uma nova classe de profissionais, que eram as dietistas, criada pelo médico Pedro
Escudero na Argentina, em 1934, e neste destacou o papel dos médicos nos estudos sobre a
alimentação racional, e das dietistas como auxiliares do médico na orientação da dieta alimentar,
exaltando o esforço de Celina de Moraes Passos, ele conclama a direção das escolas profissionais a
lançar em nosso país, os primeiros cursos de dietistas. Em janeiro de 1939, a convite do Secretário da
Educação e da Saúde Pública, Francisco Pompêo do Amaral assumiu o cargo de médico-chefe da
Superintendência do Ensino Profissional, que nessa época, ocupava parte das instalações do
Instituto Profissional Feminino, e, criou o primeiro curso no campo da alimentação e nutrição no
Busca-se com esse ensaio qualitativo de cunho bibliográfico, registrar os primeiros contatos com
um arquivo. Tendo como objetivo principal verificar a existência de documentos nos arquivos
públicos e privados do município de Vilhena/RO localizada na região norte do Brasil, que aponte
vestígios da participação dos padres Salesianos e das Mestras Pias Filippini na educação do município
em tela nos anos de (1960-1980). Adentrando no lócus da pesquisa a região norte do Brasil, mais
especificamente o município de Vilhena foi alvo de inúmeras migrações nos anos de 1960 e 1970 com
o intuito de potencializar a região com espaços voltados para a agricultura e pecuária. O processo
migratório foi estimulado com a abertura do que antes era uma “picada” a BR-029 (atual- BR-364),
que ligaria a região norte as demais localidades do Brasil. As propagandas midiáticas e a criação de
órgãos responsáveis pelas divisões das terras contribuíram também para a vinda de famílias
principalmente da região sul brasileira. Os migrantes depararam-se com uma realidade não
mencionada nas publicidades, Vilhena, se tratava de um espaço ainda em desenvolvimento e
envolvia negligências em diversos setores públicos, principalmente na educação nosso alvo de
pesquisa. Os espaços educacionais de Vilhena são marcados por lutas e reivindicações da sociedade.
E é nesses vieses de lutas e reivindicações, que no ano de 1960 resultou-se a criação da primeira
instituição escolar, tendo como registro o Decreto nº353 de 10 de agosto de 1960. Por esse motivo a
delimitação temporal, que se estende até 1980, período que corresponde aos reflexos históricos
também da ditadura militar. Uma vez, que os militares estavam fortemente inseridos nos espaços
políticos e públicos da região. Sem professores com qualificação na docência, a escola era um lugar
de fabricação. Os religiosos estavam diretamente ligados ao ensino nas escolas públicas e na
formação dos professores que se constituíam na profissão. Cabe assim, problematizar sobre como
foi a investida dos religiosos na educação de Vilhena/RO no período de (1960-1980)? Os trabalhos de
Farge (2019); Bloch (2001); Certeau (2012) são visitados, procurando organizar uma concepção de
similitude e diferenças na organização das ideias e construção dessa pesquisa. Os vestígios
encontrados nos arquivos a princípio foram satisfatórios, encontramos uma gama de documentos
que são primordiais para leituras de um passado que foi presente. Registrar os primeiros contatos
com os arquivos, surgiu da experiência de estudos realizados no Instituto de Estudos Brasileiros
(IEB), tendo como coordenadora a Professora Drª. Diana Gonçalves Vidal e o Professor Drº. José
Cláudio Sooma Silva. A organização das fontes e os cuidados foram minuciosamente tratados e
praticados em estudo e em visitas ao arquivo do IEB. A formação inicial foi de extrema relevância
para a organização desse ensaio e manuseio das fontes investigadas. A falta de organização e
estrutura dos arquivos surpreende, pois revela que mesmo com o descaso, ainda existem vestígios
em meio ao abandono dos papéis antigos. Os arquivos são invisíveis para grupos não pesquisadores,
porém, chamam a atenção dos historiadores/ pesquisadores por conter muitas histórias cotidianas
refutadas mas, vividas por sujeitos e/ou personagens simples que não ocuparam lugares de prestígio
na sociedade dominante. O não visto, nos arquivos também provocam atravessamentos e a possível
elaboração de uma contra história oficial. Ainda, que realizada uma análise preliminar percebemos
a participação dos Padres Salesianos e das Mestras Pias Filippini na educação de Vilhena. A leitura
das fontes nos permitiram perceber que estamos lidando com uma sociedade marcada pela
diversidade cultural que se (re)inventava com o que lhes era oferecido para (re)organizar uma nova
sociedade que se formava em meio às dificuldades. O Livro Tombo da Igreja Católica, foi uma fonte
pertinente e desafiadora por apresentar a escrita e a percepção de um sujeito que estava inserido no
contexto social do período e que tinha uma visão de mundo voltada para sua crença e formação de
ser. Ao mesmo tempo deixará vestígios da organização de espaços que nos propomos a investigar.
Eis, o desafio do historiador. Buscamos ter cuidado ao nos aproximar dessa fonte de pesquisa
olhando para a organização e participação desses religiosos na constituição da educação a partir das
narrações que os inseriam nas atividades. A partir, das leituras das fontes encontradas nos arquivos
pudemos perceber que a inserção dos religiosos na educação acontece muito antes da
institucionalização da escola. Os ensinamentos aconteciam em espaços não formais e desvinculados
de instituições educativas. Percebemos também, um ensino técnico organizado para as mulheres na
costura de confecções. Os grupos eram divididos em, quem tinha conhecimento dos números e
sabiam ler ficavam responsáveis com os cortes, medidas e riscos das peças a serem confeccionadas
e ainda o registro das encomendas e clientes se houvesse. Aquelas que não dominavam a leitura ou
escrita ficavam na parte manual em costurar as peças. Apesar, de não conhecerem de maneira formal
os números e as letras as mulheres (re)inventavam modos de leitura que permitia manusear as peças
no momento da costura. Os valores das produções confeccionadas vendidas no processo de
aprendizagem eram custeadas para as compras de novos materiais. A missão salesiana se estendia
aos campos também, na catequização dos indígenas que ainda restaram da devastada colonização.
Esses recebiam preparações religiosas para servir nas celebrações religiosas e na continuação e
propagação da fé cristã no restante das comunidades indígenas. Os trabalhos dos missionários
salesianos aumentaram devia a migração da região, e em apelo escreveram uma carta missionária
pedindo reforço as Irmãs Mestras Pias Filippini. As irmãs Mestras Pias tinham como missão a
educação dos jovens e da assistência social. Um grupo de irmãs estavam atuando na Argentina e
devido a guerra tinham a intenção de migrar para outro país. Assim, o pedido de ajuda dos salesianos
chega a cede localizada na Itália e a madre superiora autoriza a vinda das irmãs Mestras Pias que
estavam na Argentina para o município de Vilhena. As aulas de ensino religioso na escola Wilson
Camargo, foram deixadas pelos salesianos e as irmãs Mestras Pias passaram a ministrar. As
celebrações e cursos também foram divididos e as irmãs ficavam com a responsabilidade de
catequizar as meninas para a ordem religiosa. Aqueles que tivessem aptidão a missão eram enviadas
para a ordem religiosa, preparação e instrução. No ano de 1979 as irmãs Mestras Pias inauguram
uma escola particular denominada de Escola Santa Lúcia Filippini, no município de Vilhena com um
ensino destinado a educação primária. O ensino era destinado as crianças de famílias com rendas
superiores que conseguiam custear o processo de formação dos filhos. As aulas eram ministradas
pelas próprias irmãs e em horários opostos atendiam o ensino religioso das escolas públicas. As
formações pedagógicas das religiosas eram ordenadas pelas irmãs Mestras Pias da Itália, passado
primeiramente ao grupo religioso da escola Santa Lúcia Filippini de São Paulo, e por fim, esse grupo
era responsável em transmitir a formação para as irmãs dos municípios interioranos. Essa pesquisa
ainda tem muitos aspectos a serem discutidos, pois, como acontecia um ensino com culturas tão
diferentes? Como o ensino foi sendo constituídos no interior das salas de aula? Qual o modelo de
criança-aluno que queriam formar? Os arquivos ainda têm muito a nos revelar quando questionado
e entendido como uma fonte de conteúdo culturais sujeito a interpretações. Todas essas (re)leituras
do passado nos permitiram aproximar da História da Educação do município de Vilhena. Por isso, o
trabalho do historiador deve ser de um farejador, buscar nos vestígios e nas brechas uma possibilidade
de visualizar as histórias escondidas nos raros documentos esquecidos nos arquivos. Coletar os
documentos oficiais, requer toda uma preparação e principalmente ética na maneira de produzir a
história que precisa ser criticada, problematizada e analisada em diversas situações. As fontes nos
dizem muitas coisas quando interrogadas. Contudo, obtivemos uma aproximação dos arquivos
como fonte de pesquisa, e notamos que a educação de Vilhena foi consolidada com a participação
social da comunidade e de uma intensa influência religiosa. Eram pessoas comuns, com culturas e
objetivos distintos mais que fabricaram um modelo de escola no município. Por mais, vantajosa ou
não que fosse a participação dos sujeitos envolvidos podemos notar que foi de relevância para as
necessidades de organização do momento. Não estamos negando os destemperos, o que queremos
dizer é que a sociedade se organizou e reorganizou com os instrumentos que lhes eram oferecidos
no cotidiano vivido.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Eliane Küster
Este artigo trata dos cadernos escolares como fontes documentais, no âmbito da história cultural,
tendo como objeto os cadernos de uma aluna inserida no contexto da EJA - Educação de Jovens e
Adultos, em sua relação com a escola e com os conteúdos.
É sabido que os cadernos escolares constituem “relevante artefato material da escola
contemporânea, cujo estudo se mostra uma excelente fonte de pesquisa” (OLIVEIRA, 2008, p.
129). Nesse sentido, é compreendido que cada caderno tem o jeito de cada um de nós, de suas
preferências e da forma como se tratavam essas preferências, acrescentando que “cada um colocava
no seu [caderno], além do que era solicitado, copiado, criado, uma maneira peculiar de traduzir o
existente” (GRINSPUN, 2008, p. 261).
Nem tudo, porém, fica registrado nos cadernos. Viñao-Frago (2008) afirma que os cadernos
“silenciam, não dizem nada sobre as intervenções orais ou gestuais do professor e dos alunos, sobre
seu peso e o modo como ocorrem e se manifestam, sobre o ambiente ou clima da sala de aula”
(VIÑAO-FRAGO, 2008, p. 25). Ir em busca dessas intervenções e do ambiente em que ocorreram
justifica a realização deste estudo sobre os cadernos escolares. Como observa Oliveira (2008), nessa
seara, os sujeitos da escola são também considerados:
No caso dos cadernos escolares, os sujeitos a serem conhecidos pelo estudo são, prioritariamente,
os alunos a quem eles pertenciam, mas não só. O estudo deixa entrever alguns dos demais sujeitos
da escola – como professores, suas práticas e, portanto, suas afiliações pedagógicas –, os conteúdos
escolares e a metodologia em ação, as adesões epistemológicas e metodológicas da instituição e
mesmo as regras gerais da política educacional atual (OLIVEIRA, 2008, p. 130).
Perante o exposto, foi apresentada a questão problema: O que os cadernos escolares de uma
aluna da terceira idade apresentaram no contexto das práticas e pautas escolares, sociais e culturais,
quando ela frequentou uma classe de EJA - Educação de Jovens e Adultos, em uma escola da Rede
Municipal de Ensino de Curitiba, no período de 2003 a 2004?
O objetivo geral do estudo foi, desta forma, investigar o que os cadernos escolares de uma aluna
da terceira idade apresentaram no contexto das práticas e pautas escolares, sociais e culturais, à
época em que ela frequentou uma classe de EJA - Educação de Jovens e Adultos, em uma escola
da Rede Municipal de Ensino de Curitiba, no período de 2003 a 2004. Como objetivos específicos,
estabeleceu-se: considerar os cadernos escolares como fontes de pesquisa; apresentar a EJA como
uma oportunidade de aprendizagem; e verificar nos cadernos escolares de uma aluna da EJA, seus
diferentes usos e seus possíveis significados.
O estudo possibilitou que fossem “acionadas estratégias múltiplas de pesquisa” (RIBEIRO, 2003,
p. 287), entre elas, a pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental e a pesquisa de campo.
O aporte teórico do trabalho está relacionado à história cultural (CHARTIER, 1990), sendo que os
autores fundantes da pesquisa foram: Oliveira (2008), Grinspun (2008), Viñao-Frago (2008), Razzini
(2008) e Julia (2001).
Referências
ALBERTI, Verena. Histórias dentro da História. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes históricas.
São Paulo: Contexto, 2014, p. 155-202.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2010.
GRINSPUN, Mírian Paura Sabrosa Zippin. Velhos cadernos, novas emoções. In: MIGNOT, Ana Chrystina
Venancio (Org.). Cadernos à vista: escola, memória e cultura escrita. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2008,
p. 257-265.
JULIA, Dominique. A cultura escolar como objeto histórico. Revista Brasileira de História da
Educação. Campinas, n. 1, jan./jun. 2001, p. 9-43. Disponível em: Acesso em: 12 abr. 2017.
OLIVEIRA, Inês Barbosa de. Aprendendo com os cadernos escolares: sujeitos, subjetividades e
práticas sociais cotidianas da escola. In: MIGNOT, Ana Chrystina Venancio (Org.). Cadernos à vista:
escola, memória e cultura escrita. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2008, p. 130-142.
VIEIRA, Alboni Marisa Dudeque Pianovski. A história cultural e as fontes de pesquisa. Revista
HISTEDBR On-line. Campinas, nº 61, p. 367-378, mar. 2015. Disponível em: https://periodicos.sbu.
unicamp.br/ojs/index.php/histedbr/ article/view/8640533/8092. Acesso em: 08 mai. 2017.
se não se realizarem as intermediações maiores com processos sociais. Nesse sentido esse autor
propõe a utilização da categoria cultura escolar como um conceito teórico que permite
metodologicamente instrumentalizar a pesquisa no sentido de articular “as dimensões espaço-
temporais do fenômeno educativo escolar, os conhecimentos, as sensibilidades e os valores a serem
transmitidos e a materialidade e os métodos escolares” (FARIA FILHO, 2007, p.195). Em relação às
fontes, essa investigação foi iniciada a partir do acervo fotográfico da escola. As imagens fotográficas
são entendidas como objetos culturais que renascem na memória dos personagens e consistem em
fontes documentais de práticas culturais desenvolvidas na escola. Le Goff (2013) considera a fotografia
por meio de duas vertentes: uma na qual a imagem/documento tem relação com alguma materialidade
e representação da realidade; outra em que a imagem-monumento representa um símbolo estabelecido
no passado a ser lembrado no futuro. No caso em questão, foram encontradas imagens que representam
essas duas grandes categorias que agora serão refinadas de acordo com as especificidades do contexto
histórico em que foram produzidas. Embora, as imagens fotográficas sejam fontes de pesquisas que se
encontram “em um campo ainda em construção e aberto a novas indagações” (MOLINA, 2015, p.464),
Bencosta (2011, p. 400) considera que essas fontes “consistem em testemunho e representação da
escola primária em determinada época, pois revelam a um só tempo o modo de ser, mas também o de
se conceber a escola”. Assim, a fotografia se torna uma importante fonte para a aproximação da escola
no passado, mas precisa ser interpretada em cruzamento com outras fontes – normativas, pedagógicas,
orais etc – que colaborem para a compreensão dos nexos entre escola e sociedade em cada período.
Nesse sentido, os resultados que serão apresentados nessa comunicação se referem à análise inicial
das imagens, mas, na continuidade do projeto, serão considerados também os dados obtidos pela
análise dos documentos escritos do arquivo escolar e pelas entrevistas. Os resultados preliminares
apontam que o acervo da Escola Estadual Raul Saddi possui aproximadamente 973 fotografias soltas
ou armazenadas em livros, álbuns e pastas referentes ao período de 1982 a 2006, mas ainda há
possibilidade de encontrar imagens mais antigas a esse período nos periódicos da cidade e mais
recentes nos acervos pessoais dos agentes escolares. Diante do potencial explicativo das fotografias
aliado a necessidade de organização do acervo por temas que facilitem o acesso estão sendo
desenvolvidos procedimentos metodológicos com vistas a preservar esse acervo. As imagens
fotográficas foram agrupadas em três categorias: os protagonistas (docentes, discentes e visitantes); as
atividades prescritas no currículo oficial, tanto na sala de aula como nas práticas esportivas; as
atividades planejadas no âmbito da escola, tais como festas, cerimônias de formatura, desfiles cívicos,
ações de conscientização ambiental, atividades que promoviam um estilo de vida saudável ou a
inclusão. Observa-se que as fotografias do acervo se encontram em bom estado de conversação, mas,
não seguem uma normatização arquivística, embora alguns procedimentos de identificação tenham
sido realizados como, por exemplo, a indicação das datas de registros, a descrição de alguns elementos
dos eventos - conteúdo e contexto -, procedimento apontado como necessário em Paixão (2012).
Espera-se que as entrevistas esclareçam muitas situações que foram registradas, uma vez que há
funcionários muito antigos e ex-alunos que hoje são professores e que participaram ativamente da
vida escolar. Ainda não foram localizados registros fotográficos das duas décadas da fundação da
escola (anos de 1960 e 1970), bem como dois últimos quinze anos que provavelmente foram registradas
com câmeras de celulares particulares de professores e agentes escolares. As lacunas encontradas no
acervo fotográfico trazem prejuízos para a história da escola e apontam para a urgência em adotar
controles e normas para salvaguardar a memória e o patrimônio escolar. Embora nas últimas décadas
as práticas de preservação tenham se ampliado em consonância com a tendência internacional,
abrangendo as dimensões de bens material e imaterial da sua coletividade englobando aspectos
simbólicos da sociedade em que está inserida, a preservação do patrimônio educativo, no Brasil, ainda
se ressente da ausência de políticas públicas e práticas escolares que impeçam a contínua destruição
de importantes registros do cotidiano das instituições escolares. As análises iniciais indicam que as
fotografias das aulas de educação física da década de 1980 evidenciam uma cultura escolar voltada
para um modelo esportivo competitivo, traçado pelos governos militares pós 1964, que visava
direcionar a atenção dos jovens para as disputas esportivas e afastá-los das discussões políticas. Nesse
sentido as imagens sugerem que os professores atuavam no sentido de valorizar as práticas esportivas
e selecionar os melhores para representar a escola, de acordo com a tendência observada na época
(DAÓLIO,1995). As imagens da década de noventa indicam que a escola realizava atividades de inclusão,
em sintonia com o que foi definido na Declaração de Salamanca (1994), que norteou as políticas e a
legislação para Educação Especial em vigor no Brasil.
ISSN 2358-3959
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Referências
FÁVERO, Osmar. Uma Pedagogia da Participação Popular: Análise da prática pedagógica do MEB -
Movimento de educação de Base, 1961-1966. Campinas: Autores Associados, 2006.
POLLAK, Michael. Memória, Esquecimento e Silêncio. Revista de Estudos Históricos, Rio de Janeiro,
v. 2, n.3, p. 3-15, 1989.
SOUSA, Avanete Pereira. Fontes Documentais para o Estudo do Poder Local e do Cotidiano na Bahia
Colonial. In. CASIMIRO, Ana Palmira Bittencourt S; LOMBARDI, José Claudinei; MAGALHÃES, Lívia
Diana Rocha (Org). A Pesquisa e a Preservação de Arquivos e Fontes para a Educação, Cultura e
Memória. Campinas/SP: Alínea, 2009.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Maria Stephanou
O acervo documental guardado pela Sociedade Polônia, entidade da sociedade civil criada em
fins do século XIX na capital do Rio Grande do Sul, cidade de Porto Alegre, é composto por mais de
oito mil obras em suporte papel, bem como por um acervo tridimensional diverso (são diversas as
materialidades guardadas pela instituição: quadros, medalhas de participação em guerras, moedas,
troféus de diversas competições esportivas, flâmulas, uniformes, indumentária, dentre outros
objetos que são parte importante da história da instituição e da imigração polonesa no Brasil). Essa
diversidade e volume possibilitam configurar o acervo da Sociedade Polônia como um patrimônio
ímpar. Nesse acervo escondem-se tesouros a descobrir e valorar. Quase inédito sob muitos aspectos,
foi curiosamente conservado a partir da fusão/reunião de diferentes tipologias de impressos, de
distintos tempos e de diversas instituições e procedências, como da Polônia para o Brasil; de outros
países ou do interior para Porto Alegre, de pequenas bibliotecas particulares que foram incorporadas
ou de acervos de procedência desconhecida. Diferentes temáticas de pesquisa, olhares atentos,
mãos zelosas, pensamentos inquiridores, exercícios de compreensão do idioma, sacudiram
documentos adormecidos e, assim, movimentaram as pistas e os vestígios das experiências do
passado, que se fazem presentes/presenteadas aos pesquisadores... Aos poucos, como historiadoras
e museólogas, começamos a identificar raridades! O que é raro? Aquilo que é pouco comum, pouco
frequente ou pouco abundante. Ou ainda, precioso, inédito, quase perdido, esquecido, escasso,
antigo, excepcional, frágil, efêmero, tantos sentidos a expressar! Uma convicção vem mobilizando
a equipe de pesquisa desde 2014: a Sociedade Polônia guarda uma rica e diversa documentação da
história da imigração e da cultura polonesa, da história da leitura, da história da educação étnica,
da cidade, de bibliotecas e acervos, histórias a registrar e documentos inusitadamente reunidos sob
sua guarda. Nessa perspectiva, a comunicação objetiva apresentar os processos epistemológicos,
metodológicos e técnicos que fundamentam as práticas de pesquisa (história da educação, história
da leitura, história da imprensa em língua estrangeira) e a atuação de equipe da UFRGS no fomento
à constituição de um centro de memória junto à Sociedade Polônia, centro que venha a assegurar
a preservação do referido patrimônio e o acesso e publicização a pesquisadores e interessados. Em
2018, sob um Termo de Cooperação Científico-Cultural firmado entre a Universidade Federal do Rio
Grande do Sul e a Sociedade Polônia, foram deflagradas ações de inventário, tratamento técnico,
organização e análise de documentos históricos, alguns em estado muito precário de conservação
e em risco de perda iminente e, consequentemente, de apagamento de parte da história e memória
coletiva, sobretudo da história brasileira. Indagações acerca do atributo de “raridade” das obras
desse acervo, sobretudo em suporte papel e na forma de livros, foram listados critérios que
orientam as reflexões e ações da equipe envolvida, em especial critérios sobre as especificidades
e preciosidades documentais com as quais nos passou-se a trabalhar. Dentre os critérios, foram
listados elementos que permitem identificar preciosidades ou raridades, e todas as conotações a elas
atribuídas, face a determinados impressos ou conjuntos de obras do acervo, a saber: raridade pela
antiguidade; raridade pela excepcionalidade da edição; raridade segundo critérios de conservação
(material frágil que mesmo assim tenha resistido ao tempo); raridade em relação a um contexto
nacional/país (impressos no Brasil em idioma polonês); raridade por suas relações com um evento
excepcional (premiações; eventos especiais); raridade porque efêmero desde sua impressão (por
exemplo, um só número publicado de um impresso que se apresentou como periódico); raridade
em relação ao próprio acervo (livros em idioma polonês, impressos na França, há mais de 100 anos,
guardados em acervo do sul do Brasil); raridade no âmbito do campo literário; raridade das edições:
em polonês, obras clássicas da literatura nacional brasileira (ex: Viriato Corrêa - A Balaiada, edição
em polonês); raridade das edições – uma determinada coleção editorial completa; finalmente,
raridade do próprio suporte (técnicas de reprodução, ou ilustração, ou encadernação) não mais
em uso; raridade pela origem: uma determinada tipografia, ou editora, ou instituição de grande
relevância ou extinta. A partir de 2019, como decorrência dessa explicitação, elencou-se como
prioridade de tratamento técnico, inventário e pesquisa o conjunto documental de obras impressas
no século XIX que integra o referido acervo e representado por cerca de 320 volumes. Passados de
impressores, de livreiros, de leitores e suas histórias de leitura, passados de bibliotecas e acervos,
de agremiações e escolas, majoritariamente das comunidades polonesas no Brasil apresentaram-se
como possibilidades de estudo e pesquisa. Duas atenções, em especial, concentram os olhares e
fazeres: uma, aquela que concerne à divulgação e socialização a pesquisadores e público interessado
das obras raras através da elaboração de um guia comentado, em articulação à segunda atenção
que consiste na análise de indícios das práticas de leitura e usos das obras inventariadas, tais como
carimbos, variadas marcas de leitura, marginálias, guardados entre as páginas, encadernações,
dedicatórias, dentre outros. Autores da história cultural são inspiradores das atenções à história da
leitura e autores da Museologia embasam as ações de tratamento técnico das obras. É significativo
ressaltar que como parte substantiva da cadeia operatória da Museologia, existem as ações de
salvaguarda da cultura material, as quais englobam a documentação, a pesquisa e a conservação
preventiva das diferentes materialidades. Nesta coleção do século XIX, em específico, destaca-se a
importância dos procedimentos de conservação preventiva, afinal, a composição material dessas
obras (a pré-disposição congênita do suporte papel), seu tempo de existência e diferentes usos e
percursos, fazem com que seja necessário prestar uma atenção especial a cada um dos artefatos.
Vale ressaltar que o compromisso dessas ações é manter a integridade das obras e eliminar e/ou
estacionar os fatores de degradação que estão agindo sobre os documentos, sem esquecer que
nenhum procedimento é final, mas que todo procedimento de conservação preventiva é crucial
para a efetiva preservação do acervo. Desse modo, concomitante ao processo de arrolamento, foi
realizado um diagnóstico de conservação das obras, identificando os agentes de deterioração e seu
estado de conservação. Após esse movimento individual e atento da documentação, bem como da
análise, cada obra foi higienizada, acondicionada observando-se o uso de invólucros adequados e
armazenada em local adequado para sua preservação. O objetivo de todas essas ações é justamente
tornar acessível esse patrimônio, possibilitando sua comunicação de diferentes formas, tanto por
meio de pesquisas e publicações, como também através de exposições e ações educativo-culturais. A
comunicação enfatizará a relevância de reflexões teórico-metodológicas acerca dos procedimentos
e decisões descritos, em especial com vistas a fomentar a organização de outros acervos inusitados,
que preservem e se tornem acessíveis aos pesquisadores do campo da História da Educação,
em particular, e reverberem na produção de problemas de pesquisa acerca de temáticas pouco
exploradas no campo, como vêm se mostrando o caso da imprensa étnica e das escolas étnicas
polonesas.
Por fim, o excepcional significado da parceria estabelecida entre a UFRGS e a Sociedade Polônia
e o trabalho que intersecciona os campos da História da Educação e da Museologia reside em três
aspectos principais: a) a necessidade e importância de valorização e preservação do rico e raro acervo
histórico da Sociedade Polônia, que resta ainda quase desconhecido, acrescidos da necessidade
de fomentar o interesse a novas pesquisas como modo efetivo de assegurar sua sobrevivência
como acervo documental; b) os exemplos instigantes à pesquisa oferecidos pelas aproximações
sucessivas a determinados arranjos e conjuntos documentais já empreendidos pela equipe de
pesquisadores e bolsistas, o que reforça a necessidade de promover maior visibilidade e atribuição
de valor simbólico, histórico e cultural à documentação preservada; e, por fim, c) as possibilidades
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 243
Referências
CHARTIER, Roger (org.). Práticas de Leitura. São Paulo: Estação Liberdade, 2000.
DARNTON, Robert. A questão dos livros: passado, presente e futuro. São Paulo: Cia das Letras, 2010.
ECO, Umberto. A memória vegetal e outros escritos sobre bibliofilia. Rio de Janeiro: Record, 2010.
FRONER, Yacy-Ara; SOUZA, Luiz Antônio Cruz. Reconhecimento de materiais que compõem acervos.
Belo Horizonte: LACICOR/EBA/UFMG, 2008 (Tópicos em conservação preventiva: 4).
TEIXEIRA, Lia Canola; GHINZONI, Vanilde Rohling. Conservação preventiva de acervos. Florianópolis:
FCC, 2012.
ISSN 2358-3959
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A década de 1940 foi palco para a difusão de projetos educacionais que angariavam desenvolver
uma nova nação que crescia tendo como cenário político, o Estado Novo (1937-1945). Esse período
histórico de grandes transformações sociais no Brasil, teve na educação o espaço profícuo para a
promoção no novo clima político trazido pelo regime estabelecido por Getúlio Vargas a partir de
1937. De acordo com Capelato (2012, p. 123), “nas representações do Estado Novo, a ênfase no novo
era constante: o novo regime prometia criar o homem novo, a sociedade nova e o país novo”. Era a
oposição entre o antigo e o novo, entre o atrasado e o moderno. Tinha-se nesses ideais, a concepção
de um futuro promissor para a nação e para o cidadão.
A difusão dos ideais estadonovistas sustentava-se em um tripé básico, repressão, política e
propaganda. Nesse contexto, o rádio e a educação estabeleceram papéis relevantes na consolidação
da nova fase política junto ao povo. A presença do governo na sociedade através das ondas
radiofônicas estabeleceu um parâmetro de cumprimento de alcance ao cidadão, de forma mais
abrangente possível, vislumbrada pelos ideais getulistas.
Diante desse cenário, o presente trabalho tem como objetivo, pensar a questão do novo em ações
educativas promovidas pelo Ministério da Educação e Saúde Pública no Estado Novo (1937 – 1945).
Nesse sentido, nossos olhares voltam-se para dois movimentos relevantes desenvolvidos nesse
período. Em primeiro lugar, nossas lentes são ajustadas para atuação do Serviço de Radiodifusão
Educativa, serviço instituído pelo presidente Getúlio Vargas, pelo decreto (nº 378/ 1937), com o
objetivo de promover a irradiação de programas educativos. Posteriormente, nos debruçamos
sobre o programa Hora da Juventude Brasileira, atração radiofônica destinada aos sujeitos do
ensino secundário, entre os anos de 1940 e 1944, pensando nas relações entre o antigo e o moderno,
o velho e o novo.
O Serviço de Radiodifusão Educativa foi uma organização governamental criado pelo decreto
de lei número 378 de 1937. Este decreto tratava da nova organização do Ministério da Educação e
Saúde Pública, que em seu artigo 50 regulamentou o Serviço e sua finalidade de promover e irradiar
programas educativos. Porém seu projeto fundador foi idealizado anos antes, por Roquette-Pinto
em 1923 quando criou a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro (1923-1936). Essa foi uma rádio criada
sem fins lucrativos e governamentais para ser educativa. Sendo criada por Roquette-Pinto, Henrique
Morize, Amoroso Costa, Venâncio Filho, entre outros, na Sociedade Brasileira de Ciências (1916), a
Rádio Sociedade buscou ser um instrumento de comunicação e conhecimento para a construção da
nação. A rádio se mantinha pelos seus sócios efetivos e membros associados com uma programação
educativa, com aulas de ciências, Física, Português, Italiano, Frânces, História Natural e palestras
seriados. Quando a Rádio Sociedade se viu ameaçada por dificuldades financeiras, Roquette-Pinto e
os demais associados decidiram doar a Rádio Sociedade para o Ministério da Educação e Saúde, sob
a condição de mantê-la como rádio educativa sem fins comerciais e partidários.
Após o aceite, o Ministro Gustavo Capanema regulamentou a antiga estação da Rádio Sociedade
como o Serviço de Radiodifusão Educativa em 1937 e sua estação; PRA-2. No entanto, o Serviço
passou por muitas dificuldades até colocar em prática as atividades educativas. A sua organização
ficou prejudicada pela falta de direção, profissionais técnicos e equipamentos necessários. Tais
problemas foram intensificados pela disputa entre os ministérios da Educação (ministro Gustavo
Capanema) e Justiça (ministro Francisco Campos) em torno da gestão do Serviço. Segundo Oliveira
(2001), havia um direcionamento para a divulgação da política por meio da propaganda, com a
criação dos departamentos: oficial de propaganda (1931), Departamento Nacional de Propaganda
e Difusão Cultural (1934) e o Departamento de Imprensa e Propaganda (1939). As disputas em torno
do Serviço de Radiodifusão Educativa duraram até 1943 quando Gustavo Capanema conseguiu que
o Ministério da Educação e Saúde organizasse o Serviço, e com isso a posse de Fernando Tude de
Souza para a direção. A gestão de Tude de Souza (1943-1951), foi marcada pelo desenvolvimento
da Rádio Ministério da Educação, com a extensão das suas transmissões, equipamentos e materiais
avançados, ampliação da programação.
O programa Hora da Juventude Brasileira foi um programa radiofônico, transmitido pela Rádio
Nacional, entre os anos de 1940 e 1944. Dividido em três vertentes específicas. Teve como público-
alvo, em sua etapa inicial, os estudantes do ensino secundário, a família desses alunos e, por fim,
os professores que lecionavam nesse nível de ensino. Idealizado por Lúcia Magalhães, diretora da
Divisão de Ensino Secundário do Ministério da Educação e Gilberto de Andrade, diretor da Rádio
Nacional, teve como função, irradiar palestras e informações referentes à condução do ensino
secundário praticados nos ginásios do Brasil, além de levar formação pedagógica específica aos
professores secundaristas nas disciplinas em que atuavam.
O programa ia ao ar todas as quintas-feiras, entre os anos de 1940 a 1944. Como forma de atrair
a audiência do público pretendido, eram feitos sorteios mensais de prêmios. Para participação nos
sorteios, os estudantes deveriam enviar respostas às perguntas feitas no ar. A faceta objetivada pelo
Hora da Juventude Brasileira, foi o de elevar o potencial de formação dos alunos secundaristas,
transmitindo ao maior número de jovens, pais e professores os ideais do projeto de organização da
juventude elaborado por Gustavo Capanema.
O recorte temporal estabelecido para nosso estudo, compreende o período entre a criação do
SRE, em 1937, que ocorreu no mesmo ano de implantação do Estado-Novo, e 1945, ano em que tem
fim o programa radiofônico voltado à formação da juventude no país, momento que marca também
o final do regime Getulista. Da criação do SRE, passando pela atuação do serviço na programação
educativa do rádio, até a proposta de formação docente pelo rádio – terceira fase do programa
Hora da Juventude Brasileira – a concepção do “novo” foi amplamente divulgada pelos projetos
educativos do Ministério da Educação através do rádio.
Como forma de análise sobre o uso pedagógico do rádio, auxilia-nos a concepção estabelecida
pela dicotomia, “velho x novo” (Le Goff, 1990). Para o autor o novo assume a ideia de começo ou
nascimento, “mais do que uma ruptura com o passado, ‘novo’ significa esquecimento, uma ausência
de passado” (1990, p. 173). Assim, o Estado Novo rompia com o velho regime e instaurava uma
nova era, o marco do começo de uma nação que nascia com a reorganização do Estado quanto a
formação do seu povo. Desta forma o novo rompia com o velho que precisava ser esquecido: miséria,
analfabetismo, doenças e endemias que assolavam o povo marcado pelas desigualdades sociais.
As fontes desse trabalho compreendem uma seleção de matérias publicadas no jornal A Noite
à época a respeito do SRE e do programa Hora da Juventude Brasileira. A análise dessas fontes
nos levou a compreendermos, baseados em Chartier (1198), as apropriações e representações
estabelecidas a respeito da implementação do SRE e do programa Hora da Juventude Brasileira.
Segundo o autor, “a apropriação tem por objetivo uma história social das interpretações, remetidas
para as suas determinações fundamentais (que são sociais, institucionais, culturais) e inscritas
nas práticas específicas que as produzem.” Nesse sentido, buscamos identificar as apropriações
realizadas pela concepção do novo na atuação do SRE e no programa radiofônico aqui analisados.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 246
Assim, a análise das fontes a respeito do programa A Hora da Juventude Brasileira e a atuação do
Serviço de Radiodifusão Educativa nos fornece a percepção de que a concepção do novo percorria
entre o programa e o Serviço. Na medida que ambos buscavam reconstruir a identidade nacional a
partir de uma educação pelo rádio. Tais ações visavam diminuir as distâncias entre o velho homem
marcado pelo atraso e o novo homem pelo qual viria o progresso. A apropriação e representação
identificadas, nas matérias, nos levou a observar que ao Ministério da Educação era fundamental
alcançar a sociedade de forma abrangente através do rádio. Para isso, alcançar o alunado, sua família
e os professores que lidavam diariamente com a formação na escola, era o objetivo buscado pelo
Ministério da Educação, para um ensino que preparasse o cidadão pretendido para o Estado Novo.
Referências
CAPELATO, Maria Helena. O Estado Novo: o que trouxe de novo? In: O tempo do nacional-estadismo:
do início da década de 1930 ao apogeu do Estado Novo. FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de
Almeida Neves (org). 5ª ed. Rio de Janeiro, ABDR, 2012.
CHARTIER, Roger. A História Cultural. Entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1988
OLIVEIRA, Lucia Lippi. O intelectual do DIP: Lourival Fontes e o Estado Novo. In: r, Helena (Org.).
Constelação Capanema: intelectuais e política. Rio de Janeiro: FGV, 2001.
ISSN 2358-3959
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Resumo
Esta pesquisa busca responder a problemática central: como o processo de alfabetização vem
se construindo historicamente no município de Canápolis-MG, durante o período de 1933 a 1971? A
mesma se constituiu de recortes de uma investigação desenvolvida no Programa de Mestrado em
Educação da Universidade de Uberaba- UNIUBE, intitulada “História e Memória da Alfabetização
em Canápolis: revisitando as cartilhas utilizadas no período de 1933-1971”. A pesquisa trouxe em
suas intenções o objetivo de investigar o processo histórico da alfabetização no período delimitado,
apoiando-se em fontes primárias (cartilhas de alfabetização) e secundárias (os documentos
encontrados no Arquivo Público Municipal de Canápolis, dentre eles, livros de atas de reuniões
pedagógicas das escolas de Canápolis, leis e decretos municipais, cadernos de planejamento de
professores, livro de posse de professores, diários de classe, regulamento de ensino, periódicos e
documentos similares.O recorte cronológico inicial se justifica por ser o momento em que foi criada a
primeira escola primária no município pesquisado, assim como por ser um período em que o ideário
pedagógico renovador ganha força em nosso país. A pesquisa se estende a 1971, ano de reforma
da LDB-5.692/71, que instituiu mudanças expressivas na educação brasileira, reformando o ensino
de 1º e 2º graus. O estudo procurou também mapear as cartilhas mais utilizadas no município no
período delimitado, onde foram localizados três exemplares: Cartilha da Infância, O Livro de Lili e As
Mais Belas Histórias – Os Três Porquinhos. Após o mapeamento das cartilhas procuramos cotejar as
concepções teórico-metodológica existentes nestas. Para tanto, optou-se pela pesquisa bibliográfica
e documental, com abordagem qualitativa apoiando-se no referencial teórico-metodológico do
materialismo histórico-dialético, visto que o mesmo proporciona entender a conjuntura do objeto,
possibilitando sua visão contextual. A investigação se constituiu teoricamente a partir dos aportes
de Frade e Maciel (2006), Maciel (2000), Mortatti (1999, 2000 e 2006), Romanelli (2012), Santos (2001),
Saviani (2008), Soares (2000) e outros.
Introdução
A cartilha enquanto recurso material para o processo de ensino e leitura foi considerada relevante
em nosso país, tornando-se essencial instrumento ao fenômeno de alfabetização, vindo a conquista
seu espaço ampliado no meio escolar ao longo dos séculos XIX e XX.
Podemos verificar que as cartilhas, por mais que tenham alterado seus métodos, bem como
realizado modificações externas e gráfico-didáticas durante todo processo histórico, procurando
aprimorar e atualizar vários de seus aspectos, e de suas particularidades, especialmente no
que tange à concepção de alfabetização, permaneceu inalterada sua condição de indispensável
faz orientações em prol da educação naquele estabelecimento de ensino, e ressalta “ 3º- Método
Global para o 1º ano eliminando a cartilha e adotando “O Livro da Lilí” e ainda continua “4º- Centro
de Interesse – Cartaz, Jogos, desenhos, afim de melhorar o aprendisado” (LIVRO ATA, 08/08/1960:28).
A referência para o processo de alfabetização canapolina concentrava-se no método global. Nos
reportamos a Maciel (2001), que esclarece: “O Método Global de Contos tem como principal
característica iniciar o processo de alfabetização por textos com sentido completo, por um todo, isto
é, por frases ligadas pelo sentido, formando um enredo, constituindo uma unidade de leitura [...]
(MACIEL, 2001, p.121)
A concretização e aplicação do Método Global em Canápolis é evidenciada na IV reunião oficial
do corpo docente do município, em 21 de março de 1964, onde lê-se: “3º) Foi nos aconselhado
também: a) Que determinadas classes do Grupo sofram uma pequena modificação, sendo que as
duas normalistas regentes no Grupo, ocupe uma a 1ª série para a aplicação do método Global” (ATA
de 21/03/1964:13, grifo do autor.).
Outra característica marcante do Método Global é confirmada nas práticas de alfabetização
canapolina, “As provas de Leitura Oral de (1º ano) seriam antes do dia 30” (LIVRO ATA, 22/11/1966:47,
grifo do autor).
Esse período de estudo no município pesquisado foi marcado pela utilização do Método
Global para o processo de alfabetização, assim como pela utilização das cartilhas e/ou pré-livros
de alfabetização - Livro da Lili e As Mais Belas Histórias - Três Porquinhos que evidenciam em
suas estruturas a base metodológica do Método Global, partindo do todo – texto, para as partes
– sentenças.
Considerações Finais
Dentre os principais resultados obtidos, visualizamos que o contexto histórico da alfabetização
canapolina foi marcado pela presença de dois métodos de alfabetização, o método sintético e o
método analítico. O primeiro período representado pelas décadas de 30 e 40 foi marcado pelo
método sintético de alfabetização com o uso da Cartilha da Infância e o segundo período, décadas
de 50, 60 e 70 foi definido pela presença do método analítico/global, que estabelece como base
metodológica o todo para as partes, representado pelas cartilhas - Livro da Lili e As Mais Belas
Histórias - Três Porquinhos.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Ao analisar a história da cidade de Maracaju, em Mato Grosso do Sul, notou-se que a primeira
escola teve papel na consolidação de tal região como município, quando ainda não havia sido
feita a divisão do estado de Mato Grosso. Desta maneira, tendo como alvo a história de criação e
funcionamento da atual Escola Municipal João Pedro Fernandes, questionamos como uma escola,
durante a formação de uma cidade, constrói-se como agente histórico. Tomou-se como recorte
temporal o período de 1921 a 1961, que abrange o ano de sua inauguração, passando por relevantes
momentos da escola, até a data em que tal instituição passou a operar como escola urbana.
Como a pesquisa encontra-se em andamento, o presente trabalho tem como objetivo apresentar
os procedimentos metodológicos de localização, acesso e seleção das fontes, dialogando sobre a
produção da pesquisa em história da educação. Além disso, pretende-se destacar uma discussão
metodológica sobre as fontes levantadas para análise. A pesquisa não foi concluída, todavia, há
elementos suficientes para essa discussão.
A escola, situada mais precisamente na Rua Dracena, número 2211, na cidade de Maracaju,
foi inaugurada em 1927, recebeu como primeiro nome “Associação Incentivadora da Instrução
de Maracaju” com o objetivo de atender aos filhos dos poucos moradores da região da cidade já
fundada. Em 1930, devido à expansão da cidade, a escola passou a chamar-se “Escolas Reunidas
de Maracaju” considerando sua configuração. Em outras palavras, a instituição estudada reuniu
outras escolas da região em uma única. No mesmo ano, mudou de nome para “Escolas Reunidas
João Pedro Fernandes”, em homenagem ao primeiro prefeito e também um dos pioneiros na cidade.
Dezesseis anos depois, passou a se chamar “Grupo Escolar João Fernandes”. Em 1974, com a divisão
do estado de Mato Grosso, recebeu o nome de “Escola Estadual de 1° Grau João Fernandes”. Alguns
anos depois, mais precisamente em julho 1991, foi chamada de “Escola Estadual de 1° e 2° Graus
João Pedro Fernandes” e, em novembro do mesmo ano, de “Escola Estadual de 1° Grau João Pedro
Fernandes”. Dois anos depois, em 1993, chamou-se “Escola Municipal de Pré-Escolar e 1° Grau João
P. Fernandes”. A última alteração no nome da escola fora feita em 1998, quando passou a se chamar
“Escola Municipal João Pedro Fernandes”, atendendo ao público do Ensino Fundamental I e II.
Considerando que “em história, tudo começa com o gesto de separar, de reunir, de transformar em
‘documentos’ certos objetos distribuídos de outra maneira” (CERTEAU, 1982), viu-se a necessidade
de tomar os objetos de análise (fotografias, registros, relatos orais e itens que se enquadram no
conceito de cultura material escolar de Chartier) e dar uma nova significação para eles. A partir
de Certeau, sabe-se que é necessário produzir e isolar tudo o que for analisado para, assim, dar a
ele outro significado. Ainda nessa perspectiva, Ana Chrystina Venancio Mignot (2003) notabiliza a
relevância de revisitar esses materiais ao afirmar que, para os historiadores da educação tal ato
“Significa iluminar a escrita ordinária, refletindo sobre a importância dos professores e da escola
na vida de cada um e de todos”. Sendo assim, pensa-se que a história de tal instituição transpassa a
barreira física e adentra a significância do que foi escrito em tais materiais.
Referências
CERTEAU, Michel de. A Escrita da história/Michel de Certeau.Tradução de Maria de Lourdes Menezes;
Revisão Técnica [de] Arno Vogel. – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1982.
LUCHESE, Terciane Ângela. Modos de fazer história da educação: Pensando a operação historiográfica
em temas regionais.Hist. Educ. (online). Porto Alegre, v. 18, n. 43, 2014
MIGNOT, Ana Chrystina Venancio. Papeis guardados. Rio de Janeiro, RJ: UERJ, Rede Sirius, 2003.
PIZZANI, Lucianaet al.A arte da pesquisa bibliográfica na busca do conhecimento.Rev. Dig. Bibl. Ci.
Inf., Campinas, v.10, n.1, p.53-66, jul./dez. 2012
YIN. R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3 ed., Porto Alegre: Bookman, 2005.
ISSN 2358-3959
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O tema norteador desta comunicação é a imprensa como fonte de pesquisa e sua importância
no processo de compreensão dos fenômenos educativos de tempos e espaços específicos, uma
vez que esta é marcada por significações e concepções dos editores, autores e demais entes
político e acadêmicos. Temos por objetivo discorrer acerca da Revista A Escola como fonte de
pesquisa em história da educação. Para tanto enfatizamos as temáticas e justificativas elencadas
em dissertações e teses acadêmicas que tomam a referida Revista como fonte de pesquisa. Assim
sendo, voltamos nossos olhares de modo especifico para as seguintes produções: Dissertação de
mestrado intitulada “Inquietações modernas: discurso educacional e civilizacional no periódico A
Escola (1906-1910)”, defendida em 2007, pela autora Caroline Baron Marach; Tese de doutorado
com o título “A Expressão do liberalismo na Revista A Escola (1906-1910) no Paraná”, defendida em
2014, por Claudia Maria Petchak Zanlorenzi; e a dissertação “Ensinar a ser cidadão: as abordagens
dos docentes do Paraná na Revista A Escola”, defendida por Marcia Ferreira Pinto Bogoni, no ano de
2018. A finalidade é compreender como as referidas produções acadêmicas se pautaram nas
publicações da Revista A Escola para compreender as temáticas selecionadas pelos autores. Assim
enfatizaremos a justificativa dos autores para fundamentar nossa hipótese de que a Revista A
Escola tem especificidades que contribui para o conhecimento e compreensão de elementos
relacionados à organização na educação paranaense no início do século XX. A metodologia
adotada está pautada na perspectiva da História Cultural, na qual Chartier (1991) considera que a
análise da história das representações compostas nos textos escritos resulta em uma melhor
compreensão acerca dos indivíduos envolvidos com tal produção que circula em lugares
específicos. Desse modo, a análise se pautou na leitura e identificação da Revista A Escola nas
páginas das produções de três trabalhos aqui já nomeados. Dentre outras possibilidades de fonte,
escolhemos estes trabalhos, pois a referida Revista também é fonte de nossa dissertação em
andamento no curso de Mestrado em Educação, assim consideramos que a revisão bibliográfica,
no caso em questão, contribui para a relação entre fonte e sua pertinência para a compreensão de
elementos pontuais da história da educação, sobretudo paranaense. Sobre a Revista A Escola,
esta foi elaborada e publicada em Curitiba- PR no período entre 1906 e 1910, está disponível no
arquivo público da Biblioteca Pública do Estado, situada em Curitiba. Seu objetivo era “não só
preencher uma lacuna mais ainda lidar sincera e descabeladamente em pró do progredimento da
instrução publica do nosso futuroso Estado e da classe que a dirige, em labuta quotidiana e
profícua. Fazer o mestre, dotar a escola de um pessoal aparelhado para os prélios edificantes e
gloriosos da inteligência, - Eis felizmente a preocupação quase unanime dos paranaenses, maximé
do proeminente depositário do poder publico local” (A ESCOLA, 1906, ANNO I, NUM.1, p. 1). A
Revista foi criada pelo Grêmio dos Professores Públicos do Paraná, seu público alvo eram
professores que atuavam durante o período de disseminação da própria Revista. Partimos da
premissa de que a Revista é uma imprensa pedagógica e enquanto tal podemos atribuí-la como
fonte. Desse modo, as discussões tecidas nessa pesquisa estão fundamentadas nas concepções
de autores que conceituam e discorrem sobre a imprensa pedagógica, entre eles: Catani (1996),
Bastos (2002), Rodrigues e Biccas (2015), Nóvoa (2002), Catani e Sousa (1994). Esses autores
concordam que a imprensa tem estreita relação com seu contexto de criação e esta especificidade
Referências
A ESCOLA: Revista do Grêmio dos Professores Públicos do Estado da Paraná. 1906-1910. Curitiba:
Acervo Biblioteca Pública do Paraná: divisão estadual.
Este trabalho tem o objetivo apresentar textos do Jornal Aurora Fluminense, que tratavam da
questão educacional, entre os anos de 1827 a 1831, principalmente a partir da análise dos escritos por
Evaristo Ferreira da Veiga e Barros (1799-1837). Percebe-se uma intencionalidade educativa
desenvolvida no percurso das discussões, e, ainda, uma tentativa de implementação de medidas
legais para a efetivação desse processo. Evaristo Veiga atuou como forte liderança no grupo político
denominado Moderado e seus projetos foram importantes para a consolidação se pensar a
nacionalidade brasileira. Nos textos Evaristo da Veiga manifesta o movimento político do Brasil,
marcado pelo confronto produzido entre o vocabulário político, as linguagens regionais e suas
referências intelectuais de origem, entre os anos de 1831-1834. Como teve participação efetiva no
movimento de sete de abril de 1831, aos poucos se transformou em uma das principais lideranças no
chamado grupo político liberal moderado, em particular, após a Abdicação de D. Pedro I. Sua
participação também foi atuante na Sociedade Defensora da Liberdade e da Independência Nacional
com funções de secretário perpétuo. Teve grande influência na aprovação do Ato Adicional em 1834.
Ainda se faz importante ressaltar a sua interferência no processo de eleição de Diogo Antônio Feijó em
1835, como regente único. Esta ação está delimitada em momentos que antecedem o Período
Regencial, no pós-independência e posteriormente até 1837. Durante o Primeiro Reinado houve fases
diferenciadas na política, conforme os interesses de agentes que estavam presentes no direcionamento
do poder político, econômico e entre outras instancias do corpo social. Após o início das atividades
parlamentares em 1826 ocorreu uma retomada da participação da imprensa e das associações. Já a
partir de 1827 como uma forma de reação contra a expansão dos espaços públicos e houve um
aumentam os volumes de condecorações realizados por D. Pedro I. Na demarcação temporal definida
nas décadas finais de 1820 e início da década de 1830 se verificou que o aparato legal constituído
pode ser considerado como um instrumento inicial do processo de formação da sociedade brasileira
do século XIX. Esse processo teve engajamento de políticos de grupos conservadores ou mais liberais
preocupados em desenvolver uma ideia, mesmo que ainda incipiente, de pertencimento, ou seja, a
busca de uma identidade nacional. Concomitante a esses encaminhamentos no campo social uma
das características marcantes dos discursos jornalísticos foi a necessidade de disseminação da
instrução elementar, o ler, escrever e contar condicionada para a população livre. Os jornais do
período reclamavam a necessidade de ter a liberdade de escrever e de formar a opinião daqueles que
tinham acesso aos seus escritos. Isso demonstra também como a instrução pública ganhou
importância após ocorrida a independência, com a pretensão de trazer certa organização para o
Estado que se formava. Observasse nos jornais do período a tentativa dos redatores de trazer trechos
de livros de obras iluministas, caracterizando-as com a sua interpretação. No Jornal Aurora Fluminense
se observa que principais acontecimentos políticos foram vivenciados por Evaristo da Veiga e lhe
deram uma concepção ampla sobre a liberdade de expressão e de seus limites. Os livros escolhidos e
disseminados por meio de empréstimos na livraria, de Evaristo da Veiga tratavam em seus conteúdos
de autores que, em particular escreveram sobre a Revolução Francesa e Americana. Havia necessidade
de criar novas referência e valores culturais da política diferenciados para aquele momento. Desse
modo, os princípios estruturais das divisões políticas eram expressos na tripartição de soberanias no
início do século XIX, a soberania do rei, a soberania do povo e soberania da nação. Nesse processo a
compreensão conceitual de soberania deveria ultrapassar os limites do poder decisório do campo
político, mas ser compreendido no limite das relações de poder estabelecidas entre governo, forças
políticas e sociais e a resultante das tensões existentes nesse processo. Ao observar os textos que tem
como foco principal defender a necessidade de instrução a intencionalidade de entende-lo com
vínculos estabelecidos no corpo social. Nesse sentido, sua função se distinguia das de outras
categorias que compunham a sociedade, ou seja, eram entendidos como intelectuais, como os
homens que tinham o poder de pensar sobre o cotidiano que conviviam e de encaminhar processos
de organização social. Entre estes processos de organização social estava a necessidade da instrução
pública como elemento originário de uma reflexão sobre o cálculo de sua utilidade, de modo a
expressar o compromisso em cumprir uma agenda de modernização ao agir prudentemente modo a
dar prioridade a obtenção de resultados determinados. Tanto Evaristo da Veiga como outros homens
de sua rede de sociabilidades tinham em seu modo de pensar encaminhamentos para organização
política, social, econômica e educacional a partir da referência de países europeus, apesar das
condições econômicas e desenvolvimento totalmente diferenciadas. Verificava-se que o país ficava
muito longe de alcançar o desenvolvimento de países europeus, porém posicionam medidas, entre
elas a educação como possibilidade de mudança das condições materiais e imateriais da nação que
se constituía. Por meio de uma pesquisa bibliográfica e documental busca-se analisar a história da
constituição do pensamento educacional no período que antecede o período regencial, a partir da
visão do Jornal Aurora Fluminense. A educação resulta de complexas relações sociais presentes nas
relações humanas por essa razão não é possível compreende-la por si só. Para a análise da manifestação
do pensamento educacional, na imprensa, investigamos os conflitos sociais e a luta no campo político
do seu tempo, pois as primeiras fases do estudo foi de historicizar a fonte periódica selecionada.
Nesse processo metodológico o objetivo foi buscar e “restituir” ao passado a dimensão contextual,
para dar possibilidade de compreensão das condições do cenário socioeconômico, bem como seus
aspectos culturais que sedimentaram o pensamento de Evaristo da Veiga seja atingida. Tanto nas
ações políticas, como na ação Jornalística Evaristo da Veiga procurava delinear uma linha condutiva
que levasse seus leitores e redes de sociabilidades a adquirirem uma opinião, entendida por ele como
crível, em torno dos acontecimentos ocorridos. A linha tênue dos movimentos separatistas estava
presente em regiões extremamente importante para o país. Formar uma “opinião pública” tornou-se
uma estratégia ao se considerar o poder das palavras, ou seja, o poderoso instrumento de combate
que se transforma ao agir no modo de pensar dos homens. Essa expressão desempenhou papel de
destaque na constituição dos espaços públicos. Sua ação principal foi de dar as sociedades ocidentais
uma nova legitimidade por meio da escrita, em especial, a partir de meados do século XVIII. Ou seja,
a compreensão de que o nascimento da opinião foi um processo pelo qual se desenvolveu uma
consciência política, no âmbito da esfera pública. E a instrução entra nesse jogo como uma
possibilidade de influenciar nos costumes e entendimentos que se tinha na organização social como
processo civilizador. Outro ponto considerado nesse trabalho é sobre a agitação característica do
período regencial nos pequenos jornais que foram de extrema importância para a conformação do
ambiente político, social, cultural, educacional e outros mais. O jornalismo tinha como característica
ser ideológico, militante e panfletário, com interesse de marcar posição no intuito de mobilizar os
leitores para as diferentes causas que surgiam. Para Nelson Werneck Sodré (1945, p. 147) a imprensa
era considerada uns dos principais instrumentos na luta política e seus redatores comportavam-se
muitas vezes como verdadeiros agitadores. De acordo com Dolhnikoff (2005, 23) a construção do
Estado Nacional na primeira metade do século XIX foi marcada pelo debate entre diferentes projetos
que refletiam a diversidade de interesses e de concepções da elite dirigente. Dolhnikoff (2005, p.17)
houve a conformação de um pacto federativo quando D. Pedro I tomou como melhor decisão a de
abdicar do poder. Essa decisão acabou por promover a inclusão de elites provinciais na construção
do Estado-Nação. As principais fontes para realização do estudo foram o Jornal Aurora Fluminense
nas edições que tratam da instrução pública entre os anos de 1827 a 1831; MOREL, Marco. As
transformações dos espaços públicos: imprensa, atores políticos e sociabilidades na cidade imperial
(1820-1840). São Paulo, Hucitec, 2005; BASILE, Marcello Otávio Neri de Campos. O Império em
construção: Projetos de Brasil e ação política na Corte Regencial. Tese de Doutorado em História
Social. Programa de Pós-graduação em História, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2004.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
cadernos não são neutros, e não devem ser analisados apenas como reflexos de atividades escolares.
Desse modo, o texto está organizado em três tópicos principais: a importância da relação família-
escola no “desenvolvimento” da criança; os cadernos escolares como fonte de pesquisa; a relação
família-escola a partir dos cadernos escolares. O aporte teórico fundamenta-se em autores temáticos
que tratam do tema família-escola, cadernos escolares e história da educação, entre outros. Como
procedimento metodológico inicial foi realizada a pesquisa bibliográfica, com objetivo de mapear a
produção sobre a temática, disponível em bancos de dados digitais. Trata-se de estudo de cunho
qualitativo e de caráter documental, permite a investigação da problemática a partir do estudo dos
documentos que foram produzidos durante determinado tempo, espaço e grupo social. No caso, os
cadernos escolares produzidos por alunos, professores e que são vistos e analisados como
documentos. Contudo, os estudos utilizando esse material como fonte e/ou objeto de pesquisa é
algo recente, pois até a “década de 1980 os cadernos permanecem esquecidos” (VIÑAO, 2008, p. 16).
Diferente dos livros didáticos, eles são vistos como de pouco importância, sendo na maioria das
vezes descartados, jogados no lixo; motivo pelo qual existe dificuldade de encontrá-los e os poucos
que são guardados, fazem parte de arquivos particulares de famílias dos alunos e de docentes, que
por motivos diversos, os mantiveram guardados. Para o corpus documental desta pesquisa, foram
utilizados três cadernos de alunos, sendo ambos de recados ou bilhetes, mas com datas e níveis
escolares diferentes compreendendo o ano de 2002 a 2014, e o nível da Educação Infantil, sendo: um
do Jardim I (2003), de um Centro Integrado de Educação Infantil (CIEI); um do Jardim III (2002), de
uma Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental (EMEIF) e um do Berçário I (2014),
de uma Creche Municipal de Educação Infantil (CMEI). Com base na referência de genealogia de
Foucault (1996; 2008) no que se refere ao surgimento das instituições, é que se discutirá neste texto
de que forma os registros escritos nos cadernos tanto por parte da escola como da família, podem
ser compreendidos como discursos e exercício de poder. A busca pelas fontes continua, pois estas
farão parte de outra pesquisa maior, no entanto, percebe-se a riqueza das fontes já cedidas e o
quanto vão contribuir para a historiografia da educação, pois trazem em sua materialidade, não
somente indícios de troca de informações entre família e escola, mas possibilitam a busca por outros
objetos de estudo que compõem a história da educação, dando abertura para novas pesquisas. A
escolha por esses três cadernos foi feita a partir do critério “caderno de recado”, e que são em número
reduzido. Após selecioná-los, passamos a leitura exploratória, na qual foi possível observar em sua
materialidade não somente os conteúdos externos e internos, mas também o formato dos mesmos,
tamanho, tipo de capas, organização interna e externa, entre outras características. Os resultados
até o momento apontam que a partir da leitura exploratória dos cadernos, foi possível evidenciar
que a troca de informações entre as instituições escola e família, por meio dos cadernos de recados
acontece mais pelo envio de comunicados por parte da escola, aspecto que confirma a assertiva de
que as instituições escolares fazem tentativas de envolver as famílias nas atividades educativas dos
seus filhos, educandos. Esses recados são de diversas naturezas: convites à eventos festivos,
palestras, bem como solicitações de materiais para realização das atividades em sala de aula etc.
Desse modo, esses cadernos consultados apresentam dados sobre a história recente da relação
entre essas duas instituições, indicando que a mesma acontece, ano após ano, de forma mecanizada
e repetitiva, quase sempre com os mesmos objetivos: os de informar as famílias sobre as datas e
horários de festas, eventos, reuniões e outras atividades. Mas há outras formas de comunicação, por
meio dos cadernos de atividades do próprio aluno, cujos registros convocam pais de crianças, cujo
desempenho é considerado aquém dos objetivos previstos nas disciplinas e para cada ano da
escolarização, a se envolverem e se explicarem acerca do desempenho escolar de seus filhos, mas
também de controle das famílias, que se “omitem”. De todo modo, evidencia-se que os cadernos são
meios de comunicação escrita entre família e escola. Por outro lado, é preciso estar atento as
interpretações que se faz dos cadernos como fonte de pesquisa, principalmente quando o objeto de
análise está para além do espaço-tempo e das atividades escolares, como é o caso da relação
família-escola.
Referências
FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Tradução Luiz Felipe Baeta Neves. 7.ed. Rio de Janeiro:
Forense Universitária. 2008.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 260
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. Tradução Laura Fraga de Almeida Sampaio. 21. ed. São
Paulo: Edições Loyola, 1996.
primária de pesquisa: alcances e limites teóricos e metodológicos para sua abordagem. In: MIGNOT,
Ana Chrystina Venancio (Org.). Cadernos à vista: escola, memória e cultura escrita. Rio de Janeiro:
Eduerj, 2008, p. 35 – 48.
KRAMER, Sônia (Org.). Com a pré-escola nas mãos. Uma alternativa curricular para a educação
infantil. 14. ed. São Paulo: Ática, 2002.
O arquivo Grão Pará guarda muitos documentos sobre a família Imperial brasileira. Em seu acervo
estão cartas, documentos, egodocumentos, fotografias e diários. Dentre os arquivos existentes, está
o Pedro Orleans e Bragança (POB), doado ao Museu Imperial em Petrópolis, em 1948, por d. Pedro
Gastão de Orleans e Bragança. Este arquivo pertence ao mesmo fundo do Arquivo Grão-Pará e
atualmente, parte do acervo que pertence à família Imperial está cedido, em comodato, ao Museu
Imperial em Petrópolis e parte continua sob a guarda da família. Desses documentos, expressivo
conteúdo diz respeito a educação das princesas imperiais brasileiras sob o olhar de seus mestres e
de sua preceptora principal. Luiza Margarida Portugal de Barros, a condessa de Barral, foi a preceptora
principal das herdeiras do trono do Brasil, Isabel e Leopoldina, no período de 1856 a 1864. Sempre
atenta e extremamente rigorosa, a condessa passa a escolher mestres para conduzirem as disciplinas
que seriam estudadas e a cuidar também do comportamento das meninas incluindo os hábitos da
toalete. Em seus estudos sobre educação doméstica, Vasconcelos (2005) afirma que o preceptor era
aquele que exercia a prática educativa no espaço doméstico, ou seja, na casa, e que não havia um
estatuto formal para a educação doméstica. As cartas e documentos pesquisados evidenciam alguns
nomes de mestres que, sob a supervisão da condessa, contribuíram para a educação de Isabel e
Leopoldina. Alguns autores famosos, outros, músicos em ascensão, outro, pintor de destaque, cada
qual contribuindo na estratégia pedagógica planejada pela condessa para que as futuras herdeiras
do trono tivessem uma formação sólida e culturalmente prestigiada. Além dos mestres, a condessa
aproveitava toda a ocasião em que a família Imperial fosse visitada por celebridades da época, para
que as mesmas dessem “lições” às princesas. O presente estudo tem como objeto a análise dos
cadernos, estudos e planos de aula das princesas brasileiras, buscando apresentar/analisar/
recompor aspectos da condução educacional dirigida pela condessa. Inicialmente, o estudo abordou
as concepções de educação para as princesas que a condessa demonstrava em suas cartas, planos
de aula e estudos, revelando o pensamento da aristocracia brasileira, durante a segunda metade do
século XIX. Em um plano mais específico, apresenta-se a forma como a preceptora desenvolvia as
práticas de educação doméstica, em especial, os caminhos como conduzia o que considerava
adequado para a educação de suas pupilas, crianças nobres, futuras herdeiras do trono brasileiro. A
partir daí, centra-se, nos estudos e planos de aula da condessa de Barral, atentando-se para o fato de
que, além da formação cultural que as avalizaria como chefes de estado, havia uma preocupação
singular voltada para um comportamento exemplar como mulher, boa esposa, boa gestora, boa
mãe. Essa onipresença e esse controle absoluto de tudo o que se passava na vida das meninas eram
cuidadosamente observados pela condessa, mesmo quando se tratava, apenas, de um final de
semana longe das princesas. Atenta-se para os itinerários pedagógicos da preceptora, no que diz
respeito ao dia a dia da educação das princesas, observando-se que algumas dessas práticas já eram
usadas pelas mestras que se diziam discípulas de Rousseau, que consistiam em levar o aluno a se
arrepender de sua falta diante da constatação do mal que havia causado. As aulas e estudos
planejados pela Condessa estabeleciam um rígido cronograma, cujos horários eram de segunda a
sábado, começando das 7h da manhã às 9h30min da noite, com pausas apenas para receber as
visitas agendadas e aprovadas pela preceptora e pelos Imperadores, além das refeições e recreios.
No inverno, os horários de algumas aulas sofriam pequenas alterações e eram ministradas na parte
da manhã. As meninas eram avaliadas continuamente e as notas eram dadas em francês. Outro
aspecto que emerge na condução da educação das princesas pela condessa é o desvelo com o
capricho, a limpeza e a organização, que pode ser notada na exigência de que os escritos não
contivessem rasuras e borrões. Tal proibição requeria extremo cuidado ao lidar com a pena e o
tinteiro, tendo em vista que a perícia de levar a tinta sem pingar até o papel era algo que a preceptora
exigia das princesas. Por fim, trata-se das relações da condessa de Barral com as princesas Isabel e
Leopoldina no decorrer das suas atividades de preceptoria e o que tal prática desencadeou no
relacionamento delas ao final dos estudos, em 1864. Para tanto, utiliza-se como amparo teórico o
conceito de representações de Roger Chartier, que afirma a capacidade crítica diante da história,
cujas possibilidades de leitura são vistas como “construções interpretativas” daquilo que se quer
“validar ou rejeitar”; em diálogo com Paul Ricoeur, que entende as representações como um “objeto”
e como uma “operação” singular, permitindo o retorno ao fato que se quer evidenciar, sem que o
mesmo esteja alijado de outras representações diferenciadas. Dessa forma, o objetivo é analisar os
documentos e egodocumentos referentes aos estudos produzidos pelas princesas e pela própria
condessa, colocados em diálogo com autores que enfocam temática semelhante, segundo Cerqueira
e Argon (2019) Felismino (2018), Monge (2018), Lopes (2018), Aguiar (2017), Vasconcelos (2005). Entre
os documentos abordados como fontes, destacam-se os cadernos e planos de estudos das princesas
Isabel e Leopoldina que se encontram no arquivo Grão Pará do Museu Imperial em Petrópolis, através
dos quais torna-se possível intentar pelos temas e organização, as representações e itinerários sobre
o ideal de formação almejado para a educação das herdeiras presuntivas do trono brasileiro bem
como pelas famílias das elites oitocentistas, em relação à nacionalidade, capacidades, referências,
experiência, conduta moral, nas últimas décadas do século XIX. A metodologia remete aos
procedimentos relativos a uma pesquisa histórica e essencialmente documental, na qual as fontes
elencadas são interrogadas de diversas maneiras, a fim de exprimirem aquilo que era considerado
apropriado para a formação educacional e cultural das princesas, guardadas as peculiaridades de
cada contexto. Conclui-se, pelos conteúdos abordados nos cadernos e planos de estudos, que Isabel
e Leopoldina tiveram uma formação abrangente que posteriormente foi consolidada com viagens,
outras leituras e pelo interesse pelas questões ligadas ao desenvolvimento da educação no país,
especialmente a educação pública. Embora não houvesse um estatuto que regesse o ofício da
preceptoria, ela estava regulada por meio das representações construídas e legitimadas pelos
usuários desses serviços, com códigos que se referiam desde a conduta moral esperada das mestras
que habitavam as casas de seus alunos e alunas, até os conhecimentos exigidos para o exercício da
profissão, fazendo com que a valoração desses serviços estivesse invariavelmente vinculada ao
domínio de determinados saberes, habilidades, referências de empregos anteriores, e, como um
aspecto bastante apreciado, a nacionalidade oriunda de determinados países da Europa. Com maior
influência na formação das princesas do que os próprios pais, Imperadores, ocupados em suas
funções cerimoniais, a condessa moldou muitos aspectos da personalidade das meninas, não a sua
semelhança, mas tomando como modelo aquilo que ela acreditava ser a exímia educação para
mulheres pretensas soberanas de uma nação. Para isso, não mediu esforços, seja na contratação dos
melhores professores disponíveis no Império, seja nas lições morais cotidianas que impregnavam a
atmosfera dos Paços. Auxiliada por mulheres que não faziam sombra a sua liderança, ela cercou-se
das servidoras em quem confiava e que não discutiam ou sequer refletiam sobre sua maneira de
conduzir a educação das princesas, obedecendo-a em todas as determinações. Esse contexto
permitiu que, como nenhuma outra preceptora da família Imperial e até mesmo incomparável diante
de muitas pares europeias, Barral pudesse consolidar sua participação na formação da herdeira do
trono do Brasil e de sua irmã, estendendo sua atuação ao campo político, tendo em vista a imensa
credibilidade que possuía com o Imperador. As orientações da condessa sempre estiveram voltadas
para uma cultura sólida e de destaque, com um maciço investimento na formação e preparo para o
desempenho da futura função de imperatriz do Brasil que, certamente, uma das duas exerceria.
ISSN 2358-3959
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Resumo
Este trabalho apresenta parte dos resultados de uma pesquisa de doutoramento desenvolvida
no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, que
teve como objetivo investigar a implementação do ensino secundário nas cidades de Belo Horizonte
(Minas Gerais) e Campo Grande – no recorte temporal deste estudo, a cidade localizava-se ao sul
de Mato Grosso, a partir de 1977, com a divisão deste estado, a cidade passou a ser capital de Mato
Grosso do Sul. Mais especificamente, o foco da investigação recaiu sobre dois ginásios públicos de
ensino secundário, o Ginásio Mineiro e o Ginásio Campograndense, os primeiros implementados
em cada uma das duas cidades. Adotou-se uma perspectiva histórico-comparada, tomando como
fonte e objeto produções acadêmicas (teses e dissertações) produzidas nos programas de pós-
graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul/UFMS e da Universidade
Federal de Minas Gerais/UFMG. Neste texto, especificamente, problematizamos a produção de uma
historiografia sobre o ensino secundário a partir das dissertações e teses constituídas em expressões
singulares de “práticas figuradas” daqueles que as produziram e das relações que estabeleceram
no interior da comunidade epistêmica de pertencimento. Neste sentido, indicamos que os autores
destas produções acadêmicas determinaram a constituição de um discurso historiográfico sobre
o ensino secundário nestas duas cidades que cristalizou determinadas interpretações sobre esse
processo histórico.
Apresentação
Neste texto apresentamos a hipótese de que nas teses e dissertações analisadas a produção de
um discurso historiográfico sobre o ensino secundário estava relacionada às práticas figuradas que
os pesquisadores-produtores estabeleceram no interior dos grupos a que pertenciam, a partir de
três argumentações: 1) a produção do conhecimento nos programas de pós-graduação em Educação
da UFMS e UFMG, entendida como estratégias para delimitar o pertencimento a uma comunidade
acadêmica e como figurações sociais determinadas e determinantes da ação dos indivíduos
pertencentes a essa comunidade; 2) a construção de um discurso historiográfico relacionado ao
conjunto de estratégias e figurações que os indivíduos, membros de grupos de pesquisas específicos,
adotaram, individual ou coletivamente, como forma de estabelecer as relações e determinar a sua
posição no interior deste grupo e; 3) a adoção e apropriação de uma historiografia já consolidada,
que impôs um sentido interpretativo específico ao ensino secundário, entendida como tática dos
autores das produções acadêmicas analisadas como forma de demarcar seu pertencimento a este
grupo.
Partindo dos conceitos de figuração de Norbert Elias e de táticas e estratégias de Michel de
Certeau, constituímos o que denominamos de “práticas figuradas” – elemento conceitual que nos
auxiliou a investigar, comparativamente, o processo de implementação do ensino secundário nas
duas cidades.
De início, reconhecemos, em acordo com Elias (2006), que as figurações são elementos
constitutivos das relações sociais entre os indivíduos que se caracterizam pela sua flexibilidade,
permitindo a formação de diferentes e variadas modalidades associativas transitórias entre os
indivíduos, conforme seus interesses estéticos, ações, ocupações espaciais, laços familiares e
vínculos profissionais, entre tantos outros.
Ao mesmo tempo, as táticas e estratégias propostas por Certeau (1998) nos possibilitaram
registrar a dimensão de que havia, na produção das teses e dissertações, um jogo social que
impôs uma relação de forças entre seus agentes produtores. Relação essa expressada nas práticas
figuradas estabelecidas como forças desiguais de poder, formadas a partir das posições distintas
que os pesquisadores (polarizados, talvez, na condição de orientadores e orientandos) ocupavam
no campo social em que estabeleceu suas configurações.
Tomadas como objeto, as produções acadêmicas foram abordadas como práticas figuradas
daqueles que as produziram. Para tanto, consideramos o espaço acadêmico como um território de
disputas, em que se desenvolveram relações assimétricas de poder.
Neste espaço, os indivíduos configuraram-se de forma relacional para constituírem-se como forças
táticas ou estratégicas na busca por ocupar posições privilegiadas de poder e de reconhecimento
no contexto mais amplo do espaço acadêmico. Enquanto prática figurada de seus produtores, as
produções acadêmicas foram entendidas como táticas de ocupação de um espaço e que, em função
das figurações que se constituíram no interior do espaço acadêmico, acabou por determinar a
produção/apropriação de uma historiografia sobre o ensino secundário.
Para entender estas práticas figuradas foi preciso reconhecer as relações entre conhecimento
e poder, ou melhor, as relações de poder presentes na produção do conhecimento, entendidas
enquanto figurações que os indivíduos desenvolvem, bem como as diferentes táticas e estratégias
adotadas como forma de participação nestas figurações.
Pressupostos teóricos
Para Elias (2001) existem diferentes formas de poder, entre eles está o conhecimento. As relações
de interdependência criam diferentes níveis de poder e exigem dos indivíduos a adoção de variados
recursos e meios para elevar, ou manter, sua condição de poder. Neste contexto, as práticas figuradas
criam um intrincado conjunto de elementos que favorecem a manutenção de um equilíbrio de
poder. Este equilíbrio, contudo, se mantém em constante estado de tensão, devido às pressões que
as estratégias e/ou táticas que cada indivíduo adota exerce sobre os demais indivíduos.
A sociologia de Norbert Elias entende o conhecimento como um produto histórico, ligado a
características objetivas e subjetivas, e originado a partir de um conjunto de inter-relações sociais
(RIBEIRO, 2010, p.118). Para esta autora, a produção do conhecimento em Elias é abordada como
um processo composto por vários outros processos que se entrecruzam (RIBEIRO, 2010). Assim,
partindo deste argumento, entendemos as produções acadêmicas analisadas enquanto objeto. Não
tomamos o conhecimento por elas produzido, mas buscamos identificar como este conhecimento
foi produzido, ou mais especificamente, as práticas figuradas desenvolvidas para a produção deste
conhecimento.
Neste sentido, abordamos as produções acadêmicas a partir do conceito de operação
historiográfica (CERTEAU, 2010), para identificarmos os indícios destas práticas figuradas na
constituição de uma historiografia sobre o ensino secundário.
Enquanto operações historiográficas, as produções acadêmicas se vinculam a um lugar social,
prescindem de uma prática técnico-metodológica de seleção e abordagem das fontes e produzem
um discurso sobre/para seus objetos de investigação. Ao analisarmos as formas como as teses e
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dissertações articularam estes três aspectos, encontramos indícios que nos permitiram identificar
alguns elementos das práticas figuradas por elas desenvolvidas.
Referenciar o pertencimento a um grupo de estudos e pesquisas, a uma linha de pesquisa dentro
do programa de pós-graduação, bem como a inserção no programa de pós-graduação da própria
instituição, são formas que as produções acadêmicas adotaram para situar o seu lugar social, e nesta
condição, como tática para a ocupação de um lugar, um espaço que ainda não é seu.
A definição e seleção do corpus documental foi entendida como ligada a este lugar social, que
imputava aos produtores das teses e dissertações uma agenda de investigações, temáticas e objetos,
que de certa forma delimitavam a escolha das fontes. Neste sentido, pudemos identificar, entre as
produções acadêmicas analisadas, uma similaridade das fontes adotadas para o estudo de seus
objetos.
Na produção de um discurso sobre o ensino secundário, as produções acadêmicas adotaram
como tática a incorporação das interpretações de uma historiografia já consolidada sobre esta
temática, referenciando-a por meio de citações, uma forma de entendimento do ensino secundário
cristalizada e, por elas, pouco problematizada.
Notas finais
Com a análise das produções acadêmicas, a partir da identificação dos elementos constitutivos
de uma operação historiográfica, pudemos identificar um conjunto de indícios que nos permitiram
entendê-las como práticas figuradas, pois seus produtores incorporam como tática em suas
figurações um sentido interpretativo para o ensino secundário em que a produção de um discurso
estava condicionada pela vinculação a uma historiografia já consolidada, pela busca de ocupação
de um lugar social ao qual ainda buscavam pertencer e pela adoção de um corpus documental
circunscrito e delimitado por este espaço social.
Ao identificarmos as produções acadêmicas como práticas figuradas, nos aproximamos de um
conjunto de pistas que nos trouxe a possibilidade de indicar de que forma produziu-se, a partir
destas produções, um sentido interpretativo para o ensino secundário nas cidades de Belo Horizonte
e Campo Grande.
Estas pistas apontaram na direção da produção de um discurso historiográfico sobre o ensino
secundário, ao mesmo tempo que nos permitiu indicar alguns elementos que, comparativamente,
constituíram a possibilidade da escrita de uma outra historiografia sobre as singularidades do
processo de implementação do ensino secundário nestas duas cidades.
Bibliografia
CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Trad. Ephraim Ferreira Alves. 3ª ed.
Petrópolis: Editora Vozes, 1998.
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ELIAS, Norbert. Escritos & ensaios. 1-Estado, processo, opinião pública. Organização e apresentação:
Frederico Neiburg e Leopoldo Waizbort. Tradução textos em inglês: Sérgio Benevides; textos em
alemão: Antonio Carlos dos Santos; textos em holandês: João Carlos Pijnappel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2006.
RIBEIRO, Luci Silva. Processo e figuração:um estudo sobre a sociologia de Norbert Elias. Tese
(Doutorado em Sociologia), Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, UNICAMP:Campinas, 2010.
ISSN 2358-3959
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Manoel Bomfim (1868-1932) foi um intelectual brasileiro (escritor, médico, professor e político)
engajado em sua autenticidade: era um intérprete e um observador do país, em especial, da
transformação urbana, social, política e econômica que se desenvolveram a partir início do século
XX. Suas críticas em torno dos atenuantes problemas sociais e educacionais existentes no Brasil
também se voltaram para a América Latina, especialmente a partir de sua obra A América Latina: males
de origem (1905). A obra, escrita na França, demonstra toda a preocupação do autor em relação à
formação social brasileira de uma perspectiva diferenciada: do continente europeu enxergou o Brasil
e a América Latina com outra silhueta, como se esta distância acentuasse o seu olhar em relação às
suas proximidades latinas. Em seu ponto de vista, os latino-americanos, como os brasileiros, sofriam
o que denominou “parasitismo social” em relação às nações ibéricas, estabelecendo uma relação de
submissão entre classes dominadas e dominantes. Nesta obra, seu contradiscurso foi evidenciado
ao ir de encontro à teoria do branqueamento e das etnias inferiores do povo brasileiro, afirmando
que a questão do atraso não era um problema racial, mas social e que apenas a educação seria capaz
de curar os atrasos sofridos pelo Brasil e as demais nações latinas. Consideramos esta obra como o
ato inaugural do pensamento intelectual de Bomfim e permanecerá em seus escritos posteriores,
até 1932 quando viria a falecer.
Este estudo, ainda em andamento, pretende compreender como a ação e o discurso deste
intelectual foi se estruturando em contextos históricos de intensos debates sobre a educação, a
identidade nacional e o progresso, marcando o seu pensamento e suas tomadas de posição no
âmbito da interpretação de nação, mas também da relação existente entre o Brasil e a América
Latina. A partir do recorte proposto pela seleção de seus escritos (1905-1932) e amparado pelo
movimento metodológico da análise micro-histórica (Ginzburg, 1987; Revel, 1998), seguiremos as
pistas dos desdobramentos do pensamento de Manoel Bomfim, seguindo a trilha derridiana da
desconstrução, acerca das suas reflexões sobre as questões educacionais brasileiras, mas oscilante
e marcada pela diferença e subversão em relação a sua contemporaneidade.
Sendo assim, buscaremos nos escritos: A América Latina: males de origem (1905); Através do Brasil
(1910); Lições de Pedagogia (1915); Noções de Psicologia (1916), Pensar e Dizer (1923); Método dos
Testes (1924); O Brasil na América (1929); O Brasil na história (1930); O Brasil nação (1931) e Cultura
e educação do povo brasileiro (1931) os matizes que fermentam e conectam as ideias do autor e
também o seu engajamento com as possibilidades que configuram um sujeito, um intelectual e
um projeto para o Brasil no campo da história da educação que se mostra contracorrente. Neste
estudo, nosso objetivo é estabelecer a relação dialética entre a produção escrita de Manoel Bomfim
com a educação, mas também com questões que envolvem a interpretação e a formação de nação,
a ideia de progresso e moderno tanto no âmbito nacional, quanto latino-americano.
Para isto é preciso situar algumas questões e seus respectivos referenciais. Primeiramente, a ideia
de intelectual que parte do engajamento, conforme Sirinelli (2006), e se amplia para a função social que
estes sujeitos se caracterizavam a partir de suas redes de sociabilidade (Sirinelli, 2003), espaços sociais
e tomadas de posição, estabelecendo uma representatividade cultural, tendo a produção escrita como
uma ação simbólica (Chartier, 1990; Gomes e Hansen, 2016). Para isto, o contradiscurso (Foucault,
2007) se apresenta como fundamental para o estudo de Manoel Bomfim, especialmente pelo caráter
contracorrente em que o autor e a sua obra se coloca às questões debatidas pela intelectualidade
naquele contexto histórico, da virada do século, marada pela Primeira República (1889-1930). Seu
contradiscurso envolvendo: a raça e mestiçagem, o atraso e o progresso e a educação se deslocava
do hegemônico da época, do embranqueamento e da eugenia. Para Bomfim, o atraso brasileiro não
era uma questão de mestiçagem ou miscigenação, mas de educação, que seria a “cura para os males
brasileiros”, conforme afirma em sua noção de parasitismo em América Latina: males de origem (1905).
Desse modo, entendemos o contradiscurso, a partir de Foucault (2007), como essa contraposição
ao discurso científico da época, tendo em seu discurso e produção intelectual (Bakthin, 1997) uma
autonomia possível e desviante. Desse modo, definimos o recorte de 1905 até 1932 por demarcar o
seu posicionamento contracorrente, em A América Latina: males de origem (1905) e a sua última obra
Cultura e educação do povo brasileiro (1931), antes do seu falecimento em 1932.
A interpretação da relação entre progresso e educação se estabelece nas obras do autor também
se mostra como uma consequência da sua circularidade intelectual (Ginzburg,) em espaços sociais
e políticos, especificamente urbanos, marcados pela Belle Époque tropical (1898-1914), conforme
Needell (1993), instituições (Pedagogium, Liga Brasileira de Higiene Mental e Associação Brasileira
de Educação) e suas respectivas redes de sociabilidade (Sirinelli, 2003). Desse modo, ao interpretar
a modernidade e o progresso, Bomfim é crítico em à relação dependente do Brasil às ideias ibéricas,
e aponta especialmente em sua trilogia sobre o Brasil: O Brasil na América (1929); O Brasil na
história (1930); O Brasil nação (1931), questões que envolvem a América Latina, a ideia de nação, a
interpretação do Brasil, e também da brasilidade. Podemos dizer que a sua preocupação inicial de
definir a nação, se desenvolve em suas últimas obras, para interpretar a nação, a partir da cultura.
Esta cultura só seria possível, a partir de esforços, especialmente políticos, com a educação. Sendo
assim, é possível estabelecer a partir de sua produção escrita tanto um discurso convergente ao
ideário escolanovista, como uma preocupação em pensar a educação como fundamental para o
progresso e desenvolvimento da identidade nacional.
Referências
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1920.
______. Pensar e Dizer: estudo do símbolo no pensamento e na linguagem. Rio de Janeiro: Casa
Electros, 1923.
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______. Lições de pedagogia: teoria e prática da educação. 3. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves,
1926.
______. O método dos testes: com aplicações à linguagem do ensino primário. Rio de Janeiro:
Francisco Alves, 1928.
______. O Brasil na América: caracterização da formação brasileira. Rio de Janeiro: Francisco Alves,
1929.
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______. O Brasil Nação: realidade da soberania brasileira. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1931.
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______.; BILAC, Olavo. Através do Brasil. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1910.
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RESUMOS DAS
COMUNICAÇÕES
INDIVIDUAIS
EIXO
IDEIAS PEDAGÓGICAS,
CURRÍCULO, PRÁTICAS
EDUCATIVAS
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A proposta que será apresentada objetiva a análise dos discursos especializados sobre as
relações entre a infância e a cultura escolar letrada sob a perspectiva de Michel Foucault. Mais
precisamente, buscou-se examinar os discursos sobre a idade mais adequada para o início do
processo de alfabetização, tendo em vista que a questão tornou-se alvo de renovado interesse
desde a ampliação do ensino fundamental para nove anos, antecipando a entrada das crianças de
seis anos nessa etapa da escolaridade - a medida gerou uma série de discussões pedagógicas
acerca das consequências dessa mudança para as crianças, que anteriormente frequentavam a
educação infantil e passaram a frequentar o ensino fundamental. A análise incidiu os anos de 1997
a 2015, adotou-se como fonte os documentos oficiais relativos ao currículo da educação infantil e
os relativos à ampliação do ensino fundamental para nove anos, considerou-se também como
material de análise o texto da Lei nº 11.274, 6 de fevereiro de 2006, dispondo sobre a duração de 9
(nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de
idade. Foram examinados ainda artigos da Revista Nova Escola no período de 2003 a 2015 sobre, e
artigos da série especial intitulada “Educação Infantil” da Revista Educação, publicada em 4
fascículos entre os anos de 2009 e 2011. À luz de Michel Foucault a propósito das formações
discursivas, procurou-se fazer uma caracterização dos discursos, por meio da descrição de seus
enunciados mais recorrentes, das relações que se estabelecem entre eles e que produzem os
efeitos de “evidência” e de “verdade” acerca do modo como se pode/deve alfabetizar na educação
infantil e nos primeiros anos do ensino fundamental. Verificou-se que esses efeitos se relacionam
à associação entre a “idade certa” para alfabetizar e a “natureza” do desenvolvimento infantil e ao
“respeito” pela infância e que tais associações produzem simultaneamente a valorização de toda
a ação pedagógica que leve em conta a natureza da criança e o respeito à infância, como a
desqualificação de qualquer intervenção que não tenha origem na compreensão dessa natureza e
no respeito às motivações infantis. Evidenciou-se o temor de que a antecipação do ensino da
leitura e da escrita para as crianças de seis anos que cursam o primeiro ano ou ainda para as mais
novas, por meio de atividades preparatórias, realizadas desde a educação infantil, possam
prejudicar as crianças, ao coibir a espontaneidade infantil, que deveria ser a marca dessa etapa do
desenvolvimento da criança. Constatou-se que a procura pela idade certa para a alfabetização das
crianças na educação infantil ou daquelas que, após a implementação da Lei nº 11.274, de 06 de
fevereiro de 2010, ingressam aos seis anos no ensino fundamental, vincula-se a outros temas que
caracterizam os discursos sobre a educação infantil ao longo do tempo, dentre os quais a
importância da brincadeira e do jogo para o desenvolvimento das crianças nessa etapa da
escolaridade. Relaciona-se ainda à discussão sobre como se relacionam nessa fase o educar e o
cuidar, em suma, ao modo como se estabelecem os objetivos da escola e à maneira como se define
o trabalho dos professores na educação infantil. Pode-se dizer que os discursos veiculados nos
documentos oficiais e nos textos das revistas delineiam duas culturas escolares distintas ao referir-
se à educação infantil e ao ensino fundamental. Na primeira etapa, a escola é descrita como um
Referências
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de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo
sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos
6 (seis) anos de idade. 2006. Disponível em: https://www.planalto.gov.br Acesso em 09 jul. 2013.
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http://revistaeducacao.uol.com.br/textos/0/entenda-por-que-o-letramento-precocepode-ser-
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REVISTA NOVA ESCOLA. Site da Revista Nova Escola, São Paulo. Disponível em: <http://revistaescola.
abril.com.br/ensino-fundamental9-anos/>.
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A sociedade moderna tem em sua história registros diversos de ações coletivas que movidas por
interesses comuns despertaram nos indivíduos a necessidade ou vontade de promover o
desenvolvimento do seu meio social através de práticas associativas. A prática associativa servia como
instrumento democrático capaz de desenvolver o espírito de cooperação nos diferentes espaços sociais.
Nas interpretações de Alex de Tocqueville (2000; 2005), o associativismo ancorado em princípios
democráticos, nos quais a liberdade e participação social são colunas basilares na construção e
consolidação da sociedade moderna, configurou-se como uma ação coletiva motivada por um
sentimento de defesa ao bem comum e combate ao individualismo. Nos anos oitocentistas, as
associações, fossem literárias, esportivas ou ecológicas, reuniam um grupo de jovens de interesses
comuns que desenvolviam atividades que requeriam organização, disciplina, cooperação e colaboração,
o que as tornavam como um lócus de aprendizagem e de convívio social. Por meio delas assegurava um
tipo de prática educativa que aprimorava e dialogava com a educação escolar e familiar. O associativismo
estudantil dotado de peculiaridades e autonomia faz parte de uma cultura escolar presente nas mais
diversas instituições de ensino do cenário educacional brasileiro e chama a atenção por sua significância
na construção da identidade dos alunos que dele fizeram parte. As razões para a presença marcante
desse tipo de associativismo na realidade da educação das sociedades democráticas são plurais, mas
percebe-se que a comunhão com os interesses ditados pela democracia é uma característica peculiar a
ele. Desse modo, a presente pesquisa tem como objetivo apresentar a Sociedade O Porvir e a Sociedade
Grêmio Tobias Barreto, duas associações estudantis fundadas nos anos oitocentistas pelos alunos do
Atheneu Sergipense, instituição pública do Ensino Secundário do estado de Sergipe/Brasil. A produção
deste texto seguiu o caminho teórico-metodológico da pesquisa histórica e dialoga com os conceitos de
Associativismo e Arte de se associar, ambos defendidos por Alex de Tocqueville (2000; 2005), e tomou
como principais fontes os jornais estudantis, órgãos oficiais das associações e o livro “Crônicas da
Passagem do Século”, cujo autoria é Edilberto Campos, sócio fundador da Sociedade Grêmio Tobias
Barreto. O teórico Tocqueville compreende o fenômeno do associativismo como um mecanismo de
combater ao individualismo nas sociedades democráticas, constituído a partir de um modelo de
associações ou sociedades livres em que os indivíduos reúnem-se de forma voluntária e motivados por
identificarem-se com os objetivos presentes. Tocqueville identificou na sociedade dos Estados Unidos
oitocentista esse modelo de associativismo, também conhecido como associativismo voluntário, o qual
consiste na “adesão pública que certo número de indivíduos dá a determinadas doutrinas e no
compromisso que contraem de contribuir de uma certa maneira para fazê-lo prevalecer” (Tocqueville,
2005, p. 220)”. Neste sentido, as associações confiavam ao indivíduo o direito de se reunir e se unir em
torno de um interesse comum, por meio delas se estabelecem a socialização e a sociabilidade em prol
de um projeto coletivo. As interpretações tocquevilleanas sobre esse fenômeno auxiliaram-me na
investigação de associações estudantis como fruto da ação de indivíduos que promovem práticas
legítimas de socialização e estabelecem relações sociais comuns aos espaços democráticos. A inquirição
das práticas estudantis de socialização na educação brasileira, sobretudo no Atheneu Sergipense,
instituição de ensino secundário do estado de Sergipe criada em 1870, resultou na identificação de um
conjunto de associações estudantis criadas e dirigidas por alunos ao longo da história daquela
instituição de ensino. Concretizando-se assim como uma arte de se associar, que segundo Tocqueville
(2000) é um costume criado a partir de uma necessidade que os indivíduos sentem de se reunirem em
torno de uma associação. A arte de se associar se faz necessária dentro do processo de civilização dos
homens, pois por meio das associações a igualdade de condições se desenvolve e se fortalece, e no caso
dos costumes dos alunos do Atheneu Sergipense que de se unirem por meio das suas associações revela
que a criação de agremiações estudantis deu-se movidas por interesses comuns e necessidades do
desenvolvimento de práticas culturais. Dentre do universo das associações estudantis do Atheneu
Sergipense, localizei a Sociedade O Porvir, criada por alunos do Atheneu Sergipense em 1872, é a
associação estudantil mais antiga da qual se tem registro na história da educação de Sergipe e que a sua
criação deu-se, influenciada pela prática de associativismo e as produções de jornais pelos estudantes
das faculdades do império brasileiro. A criação de uma associação tendo como fim específico reunir
estudantes interessados em desenvolver o espírito de colaboração, a autonomia e a produção de um
jornal que veiculava suas opiniões, concepções políticas e sociais e capacidades científicas e literárias,
demonstra que os alunos, de forma consciente, acreditavam no papel especial que um jornal exerce
mediante a um projeto de agregação de interesses comuns. Outro registro da presença do associativismo
estudantil em Sergipe durante o século XIX foi a Sociedade Grêmio Tobias Barreto. Preservada nas
memórias de um dos seus sócios, Edilberto Campos, que imortalizou a sua existência no seu livro
Crônicas da Passagem do Século, essa agremiação retratou cenas do cotidiano dos jovens alunos do
Atheneu Sergipense, que em meio às suas necessidades sociais e culturais associaram-se visando
desenvolver seus conhecimentos, assim como a oratória, compartilhar leituras e desenvolver o espírito
de solidariedade, cooperação e responsabilidade. A Sociedade Grêmio Tobias Barreto fundada em 1898
pelos alunos do Atheneu Sergipense tinha como principal finalidade ministrar aulas noturnas gratuitas
para quem quisesse, especialmente para os adultos atrasados desejando recuperar o tempo perdido, e
realizar reuniões literárias, as quais foram denominadas como reuniões de cúpulas (Campos, 1965). A
finalidade de ministrar aulas para adultos coloca esta associação estudantil dentro do conjunto das
“forças educativas” instituídas no Brasil oitocentos. Segundo os estudos de Gondra e Shueler (2008), a
criação de associações com finalidades educativas se deu em um momento em que a educação foi
pensada no plural, como também as forças educativas foram plurais para atender o projeto de
construção da nação que acabava de nascer. A família, igreja e governo compartilharam o mesmo
projeto de educação e conviveram com diversas iniciativas oriundas de diferentes indivíduos e grupos
sociais que, também, contribuíram de forma crucial. Estas iniciativas revelaram a participação efetiva
da sociedade civil que em prol de difundir a civilização entre as camadas mais amplas da população,
implementou múltiplos espaços e redes de sociabilidade. No interior desses espaços de sociabilidade,
diferentes atores sociais com formação intelectual e atuação profissional diversas interagiam. Práticas
como produção de jornais, defesas de teses, leituras e recitações de poemas, estudos e atividades
literárias, aulas de reforço e organização de eventos cívicos eram comuns nas rotinas da Sociedade O
Porvir e da Sociedade Grêmio Tobias Barreto. A investigação dessas associações revelou que o
associativismo estudantil do Atheneu Sergipense desenvolveu-se com o apoio de professores e diretores
da instituição de ensino e atendeu a valores sociais, culturais e educativos. Os alunos do Atheneu
Sergipense sócios dessas associações conviveram com normas disciplinares, proibições, suspensões,
expulsões, sanções, prêmios, desenvolveram capacidades intelectuais, compartilharam interesses e
experiências, exercitaram a autonomia e souberam combater o sentimento do individualismo perante
os interesses comuns. Esse tipo de associativismo discente apresentou-se como uma prática cultural e
educativa comum no ambiente das instituições das diversas modalidades de ensino brasileiro. O
Atheneu Sergipense no final dos anos oitocentistas e na primeira metade do século XX mostrou traços
de um cotidiano permeado de práticas discentes que, em meio às regras de comportamentos e condutas
a inculcar, uniram-se em torno de associações estudantis que primavam pelo desenvolvimento literário
e cultural dos jovens alunos dos estudos secundários. A identificação das associações estudantis,
fundadas pelos alunos do Atheneu Sergipense, situou esta “Casa de Educação Literária” no bojo da
discussão sobre o associativismo no cenário educacional brasileiro. A constatação da presença dessas
associações permitiu declarar a assertiva de que no interior do Atheneu Sergipense a arte de se associar
fez parte da sua cultura escolar desde os seus primeiros anos de atividades. Os alunos que delas fizeram
parte estabeleceram regras de convivência, códigos de condutas, executaram planos de atividades e
desenvolveram práticas educativas e culturais em meio ao exercício da sua autonomia.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A DRAMATURGIA DE ROSVITA DE
GANDERSHEIM E O MARTÍRIO COMO PROJETO
DE EDUCAÇÃO PARA O SÉCULO X
Essa comunicação tem por objetivo refletir sobre o martírio como proposta educacional de Rosvita
de Gandersheim (935-1002) e a sua contribuição para o desenvolvimento social do século X. Buscando
compreender os princípios pedagógicos apresentados pela monja, estudamos uma de suas peças tea-
trais, o que nos permitiu observar a singularidade de sua obra. Caracterizada como pesquisa bibliográ-
fica e documental, para a realização deste estudo, analisou-se a atuação educativa desta personagem
por meio de sua peça teatral intitulada Sabedoria (sapientia). Dentre os autores que fundamentaram
este estudo destacam-se: Lauand (1986), Paz (2000), López (2003) e Bovolim (2005). Além disso, recor-
remos ao estudo e análise da peça por meio de investigações em livros, artigos e demais fontes impres-
sas ou disponíveis na internet. As leituras, reflexões e considerações foram desenvolvidas por meio de
pressupostos teóricos da História Social.
A peça Sabedoria (Sapientia), de Rosvita de Gandersheim (935-1002), fonte do nosso estudo nesta
exposição, retrata o período do Imperador Adriano (76-138), nela conta a história de uma mãe cha-
mada Sabedoria, e suas três filhas, mortas pelo Imperador Dioclecio, pois se negaram a adorar ou-
tros Deuses. Ao analisar a peça, observamos que as filhas recebem o nome das virtudes teologais:
Fé, Esperança e Caridade. Cada uma delas têm a seguinte idade: Fé (12 anos), Esperança (10 anos) e
Caridade (8 anos).
Na trama, conforme observa Lauand (1986), a monja desenvolve um texto curto para a interpreta-
ção da criança mais nova (Caridade - 8 anos), composto assim por dezesseis falas. A criança de 10 anos
(Esperança), tem vinte falas e a criança mais velha (Fé – 12 anos), tem vinte e quatro falas. Interessante
observar que além das falas serem proporcionais à idade, a quantidade de falas, nada mais é do que a
multiplicação pelo dobro de cada virtude teologal.
Assim, supomos que Rosvita, ao escrever a peça, o fez propositalmente para demonstrar o seu do-
mínio da matemática, fato que será evidenciado ao longo da peça, no momento em que ela apresenta
um problema aritmético. A autora aborda a disciplina do quadrivium, demonstrando a inteligência da
mulher ao elaborar um problema matemático, por meio da idade das filhas, enfatizando o seu pensa-
mento escolástico. No enredo, Fé, Esperança e Caridade são torturadas até a morte diante de sua mãe
Sabedoria. Após 40 dias, Sabedoria faz uma oração junto ao sepulcro de suas filhas e se despede da
vida terrena, enviando seu espírito aos céus. A monja via no martírio uma forma de educar as jovens de
seu mosteiro para que renunciassem ao pecado e viessem a ter bons hábitos.
Ao refletirmos sobre a construção histórica do projeto educacional e sua importante função
para uma dada sociedade, observamos que em períodos distintos, sempre existiu um projeto
de educação que regeu aquela sociedade. Cada período histórico é marcado por um modelo de
educação que carrega a característica de sua época, pois os projetos foram desenvolvidos para
atender as necessidades de um tempo específico. Para compreendermos a relevância da proposta
educacional de Rosvita de Gandersheim e a sua influência no desenvolvimento social do século
X, consideramos fundamental recorrer a História Social, pois conforme aponta Bloch (2001, p. 54)
“[...] por trás dos escritos aparentemente mais insípidos e as instituições aparentemente mais
desligadas daqueles que as criaram, são os homens que a história quer capturar [...]”, portanto, para
compreender o homem e suas relações sociais, deve-se considerar a sociedade como um todo e não
limitar-se apenas a um fato isolado.
No período medieval (século V ao XV), a instituição escolar surge com caráter diferente dos
modelos de educação que se apresentaram anteriormente. Na Grécia antiga, por exemplo, as
pessoas preocupavam-se com o físico, tinham como princípio formar o guerreiro. No período
medieval, por seu turno, preocupam-se com a alma, com a formação do cristão, o ensino, em suma,
era fundamentado na religião.
No século VI, quando surgem as escolas monásticas, o projeto de educação era formar o cristão e
propagar os valores morais e religiosos. Essas características perpassaram os séculos e influenciaram
os homens medievais, bem como o projeto pedagógico de Rosvita de Gandersheim.
De linhagem nobre, pois pertencia a dinastia Otoniana, Rosvita de Gandersheim (935-1002)
viveu no século X, no mosteiro de ordem beneditina localizado em Gandersheim, região que hoje
conhecemos por ser a Alemanha. Foi nele que a dramaturga escreveu suas peças. Segundo Lauand
(1986), suas peças apresentavam mulheres cultas, esclarecidas, bem humoradas e de simplicidade
encantadora, um contraste para o século X.
Considerada uma intelectual para a época, suas contribuições para a propagação da educação
cristã e a recuperação de valores morais que estavam em crise, foram significativas. Por meio de
sua obra, reestabeleceu-se a composição teatral no Ocidente, aponta Lauand (1986), demonstrando
assim sua relevância para a história da dramaturgia.
Grandes foram os desafios superados por Rosvita, pois conforme indica Lauand (1986, p. 30), “[...]
desde os primeiros séculos, os espetáculos em geral e o teatro em particular, eram vistos por muitos
cristãos com desconfiança [...]”. No entanto, apesar de toda oposição, foi por meio desta arte que
Rosvita encontrou a oportunidade para expressar sua fé e defender os seus valores. A monja utiliza
o teatro e o martírio como um método para educar as suas jovens.
Em 852 foi fundado o mosteiro de Gandersheim, conforme aponta López (2003), o local era
considerado centro cultural da época, pois nele se concentravam grandes obras tanto de cunho
cristão, quanto seculares. O espaço reservado para o conhecimento foi fundamental para a
propagação do saber no período medieval.
Segundo Paz (2000), no mosteiro Rosvita escreveu pelo menos três livros, sendo um composto por
oito poemas, outro composto por seis peças teatrais e um terceiro livro composto por dois épicos.
O autor a considera como uma das personagens mais brilhantes do século X. Naquele período, não
era comum mulheres teatrólogas, por isso ela ficou conhecida como sendo a primeira dramaturga
do teatro medieval (PAZ, 2000).
Para compor suas peças, a monja recorreu a leitura não só das sagradas escrituras, mas também
a escritos de Agostinho (354 – 430), Tertuliano (160 – 220), além dos autores pagãos Terêncio (185
a.C – 159 a.C) e Plauto (254 a.C – 184 a.C), elaborando, a partir do pensamento deles, a cristianização
de suas peças.
Rosvita de Gandersheim almejava formar o cristão, de modo a alcançar uma mudança mental
e comportamental. Para alcançar esse fim, era necessário estabelecer um projeto pedagógico para
orientar as noviças e monjas do mosteiro e estas, por sua vez, fariam mudanças nos respectivos
espaços sociais que ocupariam. Logo, seus dramas expressam as atrocidades que os homens são
capazes de cometer por não terem sabedoria.
Mediante este drama, Rosvita expressa a força, a fé e a sabedoria da mulher medieval,
demonstrando que diante das diversidades, a figura feminina se manteve firme no seu propósito e
não negou sua fé alcançando, por meio do martírio, a recompensa divina. Apesar do teor religioso, a
“[...] voz forte da abadia de Gandersheim [...]” como indica Lauand (1986, p. 31), a monja buscou, por
meio do martírio, conscientizar inclusive as crianças de que os homens não serão misericordiosos
com elas e que, por falta de conhecimento, os humanos são capazes de cometer atos muito
agressivos.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 277
Ao apresentarmos uma das peças escrita por Rosvita pretendemos destacar a relevância
de sua obra para a história da educação, analisando o teatro e o martírio como uma ideia
pedagógica adotada pela monja para formar as mulheres do século X, preparando-as para o
futuro e para a vida em sociedade.
Referências
BLOCH, M. Apologia da história ou o ofício de historiador. Trad. André Telles. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2001.
Esse trabalho aborda a relação entre deficiência e inclusão convergindo como tema central a
felicidade, aqui compreendida também como uma estratégia de fomento à aprendizagem e
permanência dos estudantes nas instituições de ensino. Entende-se que os estudantes deficientes
demandam uma formação inclusiva oferecida nos cursos técnicos e tecnológicos de instituição
pública federal no DF, tendo uma organização curricular necessária a partir do eixo da realização
pessoal, antes mesmo da consolidação da aprendizagem dos componentes conceituais e legitimados
historicamente por diretrizes curriculares nacionais. Considerando como premissa de que a
aprendizagem envolve não somente os aspectos cognitivos, mas ainda os sociais e emocionais, esse
artigo busca compreender o desenvolvimento adquirido, através da potencialização dos talentos,
do fortalecimento da autoestima, da autonomia, da busca pela felicidade pessoal e do investimento
na colaboração como ferramentas de aprendizagem. Felicidade, nesse trabalho, se ancora em
Aristóteles (2005), que previa sua origem na divindade, se constituindo uma atividade similar à
virtude, considerando a felicidade como missão de todo indivíduo de qualquer cultura e de qualquer
era. Na perspectiva aristotélica, a felicidade é algo perfeito, autossuficiente, que só os sábios têm
propensão a alcançar. Desde a Idade Média (séc. V a XI), as práticas de segregação foram uma
indicação de que, para a sociedade, o deficiente era considerado um ser sem valor no mercado
produtivo, um peso para as famílias no atendimento às suas limitações e um ônus para os serviços
públicos de saúde. Essas práticas de segregação persistem até hoje, mesmo que de forma velada; no
passado as pessoas com deficiência (PcDs) eram confinadas, isoladas do convívio, numa nítida
discriminação prognosticada como irreversível e quase contagiante. Algumas culturas, além do
abandono, escravizavam ou até eliminavam seus deficientes. Com o passar do tempo, Direitos foram
conquistados e, mais especificamente no Brasil, a imposição legal da entrada de estudantes com
deficiência no ambiente educacional proporcionou o início do processo de integração entre
membros da comunidade escolar e as Pessoas com Deficiência. No entanto, somente a integração
do indivíduo no ambiente educacional é insuficiente para que se alcance um efetivo processo de
inclusão, pois além da construção de estratégias de escolarização que potencializem seus talentos,
fortaleçam a autoestima, a autonomia, a felicidade pessoal, é missão das instituições de ensino
técnico e tecnológico, a formação profissional das pessoas com deficiência, garantindo a certificação
e, consequente, inserção no mercado de trabalho. Dessa forma, a justiça social se instala, por meio
do acesso aos bens culturais e exercício cidadão do trabalho. Há que se romper com essa estigmação,
principalmente ao se evidenciar o papel das escolas enquanto centros de formação cidadã e de
desenvolvimento, encaminhando os indivíduos para a inserção no mercado de trabalho, de forma
que possam garantir, com dignidade, a sua sobrevivência. As instituições de ensino devem se
constituir como um espaço determinante para o enriquecimento da formação humana. A felicidade,
o bem estar e a realização pessoal podem contribuir para a formação de indivíduos protagonistas da
representados, principalmente, por Siger de Brabante e Boécio de Dácia, a fim de questionar a tese
do monopsiquismo defendida por esses intelectuais e assumir uma outra perspectiva em relação ao
De Anima de Aristóteles – obra em torno da qual acontece o debate sobre o intelecto. Na segunda,
o teólogo dominicano se dirige aos estudantes da Faculdade de Teologia para fornecer a eles uma
síntese do conteúdo que precisavam conhecer, ordenado da maneira como julgava mais conveniente
para aprendê-lo.
A Suma Contra os Gentios, por seu turno, destina-se a outro propósito, isto é, à formação dos
frades dominicanos que trabalhavam com a pregação e com a conversão, particularmente na região
da península ibérica. Encomendada por outro dominicano, o frade Raimundo de Penaforte, a Suma
Contra os Gentios é uma obra de caráter apologético e, por isso, tem o objetivo de defender e explicar
a doutrina cristã, ao mesmo em que procura refutar doutrinas que, no julgamento dos pensadores
cristãos, estariam equivocadas. Com o objetivo de fornecer aos frades a densidade teórica necessária
para o trabalho a que se destinavam, Tomás de Aquino desenvolve uma obra sistemática e complexa,
articulando as referências das Sagradas Escrituras com as autoridades da Filosofia, particularmente
Aristóteles, procurando, portanto, estabelecer uma síntese escolástica capaz de formar e informar os
frades a respeito do pensamento cristão.
Para os limites desta comunicação, destacamos as reflexões do autor sobre o intelecto e as
criaturas intelectuais, presentes no Livro II, mais especificamente os capítulos que têm como tema
central o intelecto – capítulos 46 ao 101. Um primeiro dado que julgamos relevante sobre esse
trecho da Suma Contra os Gentios é a coerência de Tomás de Aquino em relação ao texto d’A Unidade
do Intelecto e à Suma Teológica. Essa coerência, inclusive, não é novidade para a historiografia, já
que muitos historiadores que se dedicaram ao estudo de suas obras demonstraram que o teólogo
dominicano é considerado como o principal pensador da Escolástica medieval, justamente, pela
força e profundidade de sua doutrina e pelo rigor teórico-metodológico – algo que se atribui não
só ao conhecimento dos escritos cristãos e dos autores pagãos, mas também à capacidade de ser
coerente e sistematicamente meticuloso. Assim, embora a fonte principal deste estudo seja a Suma
Contra os Gentios, consideramos relevante recorrer às outras obras do teólogo dominicano que,
eventualmente, possam contribuir para a compreensão da fonte principal.
Como observaremos, a Suma Contra os Gentios é uma obra teológica que ganha importância
política, como grande parte das obras dessa natureza produzidas no Ocidente medieval do século XIII,
pois relaciona-se com o processo de expansão externa da Cristandade (cf. LE GOFF, 2005). Com efeito,
o modo como Tomás de Aquino concebe o intelecto está relacionado a uma determinada concepção
de homem e de sociedade, diferente daquela com as quais seus adversários concordavam. Do nosso
ponto de vista, há razões para acreditar que Tomás de Aquino tenha tomado as posições que tomou,
em favor da existência de um intelecto individual e único para cada alma humana, considerando os
rumos que a Cristandade estava trilhando em sua época. Concordar com as teses averroístas ou com
as de outros pensadores, cristãos ou não-cristãos, sobre o intelecto significava concordar, também,
com uma série de conceitos no campo da moral que não condiziam com os valores cristãos. Um
exemplo é o do livre-arbítrio.
O tema do livre-arbítrio é discutido por Tomás de Aquino em diversas obras. Se o ser dotado de
livre-arbítrio é capaz de ‘ser causa de si mesmo’; se para ‘ser causa de si mesmo’ esse mesmo ser
precisa formular um juízo livre; e se, para isso, deve recorre ao conhecimento intelectual; quem,
de fato, seria ‘causa de si mesmo’ se a causa do conhecimento intelectual estivesse fora ‘de si
mesmo’? Quer dizer, se o homem não fosse dotado de um intelecto individual e próprio, mas apenas
participasse de um intelecto único externo a ele, não seria livre do modo como o conceito de livre-
arbítrio sugere.
Entendemos que essa situação gerava discussões importantes no campo da moral para a
cristandade do século XIII, como as que envolvem a responsabilização do pecador pelo pecado
que cometeu. Como poderíamos compreender a ação individual – que pode ser virtuosa ou não,
a depender das escolhas feitas e da ambiência social e cultural na qual é praticada – a partir da
ideia de um intelecto separado, impessoal, que nos dotaria das formas inteligíveis, instrumentos
necessários para a eleição e a deliberação?
Além disso, ressaltamos que esses debates se desenvolvem em contextos que consideramos
pedagógicos. O teólogo dominicano se posiciona a respeito desses temas em obras escritas ou para
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 283
Referências
BLOCH, M. Apologia da história, ou, O ofício de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.
TOMÁS DE AQUINO. Suma contra os Gentios. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia São Lourenço
de Brindes: Sulinas; Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul, 1990. vol. 1.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
No final dos anos 1990, em Portugal, registaram-se alterações significativas na política educativa,
sob a orientação dos Departamentos da Educação Básica (DEB) e do Ensino Secundário do Ministério
da Educação. Ana Benavente, Secretária de Estado da Educação, e Paulo Abrantes, diretor do DEB,
foram os rostos mais visíveis de uma nova política que fez da inovação a sua palavra de ordem e
centrou os esforços na mudança, nas escolas como locus da gestão curricular e na melhoria das
práticas pedagógicas. Nas palavras de Ana Benavente, esse “processo que vai ao núcleo duro do
ensino e da aprendizagem e que mexe nas práticas mais enraizadas que, como sabemos, não
dependem de uma decisão” (Entrevista ao Jornal Público, 27-12-1998).
Este estudo pretende revisitar, refletir e compreender o significado deste processo no sistema
educativo português e nas dinâmicas de inovação, com base na análise de textos legais, relatórios
nacionais, documentos e relatórios de escolas participantes no projeto, testemunhos de pessoas
envolvidas e literatura científica sobre o tema.
Esta nova fase, que marca o início de um processo de inovação a partir de 1997, é antecedida pelo
Projeto de Revisão Participada sobre os Currículos do Ensino Básico, promovido pelo Ministério da
Educação e que realiza uma verdadeira radiografia à educação básica, em 1996/97, pretendendo
encontrar soluções para o fracasso da reforma curricular de 1989, que se respaldava na Lei de Bases
do Sistema Educativo de 1986. No relatório deste projeto, reconhece-se que o currículo escolar
continuava organizado por disciplinas escolares e centrado nos seus programas, registando-se
uma elevada carga horária letiva dos alunos e faltando a articulação entre os três ciclos do ensino
básico e com o ensino secundário. Como salientaram vários autores na década de 90, a discussão
gerada por este Projeto evidenciou que o currículo nacional base, enquanto quadro de referência
fundamentador, articulador e orientador que garantia a todos os portugueses o direito a receber
uma educação de qualidade, apresentava muitos problemas na sua conceção e fundamentação. Os
documentos produzidos no âmbito desta revisão sobre os currículos apresentaram os pontos críticos
identificados no sistema educativo, considerados pelas escolas que participaram neste processo
como os mais problemáticos e que deveriam ser objeto de revisão/reestruturação curricular. Esta
situação expressava o resultado de um conjunto de tradições de escolarização que se tinham
mantido vivas no sistema educativo português, assistindo-se a sucessivas reformas estruturais que
foram realizadas para responder à premência de garantir o acesso universal e de reduzir o insucesso
e o abandono escolares.
Os novos caminhos que se delineavam em Portugal, na segunda metade dos anos 90,
acompanhavam a agenda internacional. Os debates educativos desenvolviam-se então num contexto
histórico de mudanças sociais e culturais profundas, onde se afirmava a sociedade do conhecimento
e da globalização e se consolidava um paradigma central para a educação e o desenvolvimento
das pessoas e da sociedade, designado por formação ao longo da vida. Neste contexto, Portugal
retoma algumas das orientações internacionais em matéria educativa, nomeadamente as que
foram definidas pela UNESCO, enquadrando-as num debate alargado sobre a Educação Básica e
o seu papel na formação das crianças e jovens portugueses, que devia consagrar os princípios de
aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver em comum e aprender a ser. Colocavam-se
assim novos desafios à escola, que se queria para todos, e aos professores, no sentido de promover
políticas de inclusão de populações de diversa matriz social e cultural.
Face a estes desafios, o Ministério da Educação respondeu, primeiro, com a Revisão Participada
sobre os Currículos do Ensino Básico, que permitiu identificar os problemas do sistema educativo.
Depois, delineou-se o Projeto “Gestão Flexível do Currículo” (GFC) que desempenhou um papel central
nas modificações do sistema educativo. As grandes finalidades que se colocavam neste projeto eram
“promover uma mudança gradual nas práticas de gestão curricular nas escolas do ensino básico;
(...) melhorar a eficácia da resposta educativa aos problemas surgidos da diversidade dos contextos
escolares; fazer face à falta de domínio de competências elementares por parte de muitos alunos à
saída da escolaridade obrigatória” (Despacho n.º 9590/99). Afirmava-se uma conceção de currículo
como projeto e como processo e assente na sua gestão flexível, entendida como a “possibilidade
de cada escola organizar e gerir autonomamente o processo de ensino/aprendizagem, tomando
como referência os saberes e as competências nucleares a desenvolver pelos alunos no final de
cada ciclo e no final da escolaridade básica, adequando-o às necessidades diferenciadas de cada
contexto escolar” (idem). Neste sentido, preconizavam-se mudanças na organização, orientação e
gestão das escolas, o envolvimento da comunidade educativa em projetos conjuntos de natureza
educativa e cultural, visando a qualidade e pertinência das aprendizagens dos alunos, que deviam
ser significativas e se passavam a organizar fundamentalmente na perspetiva do desenvolvimento
das suas competências. Esta conceção de currículo pressupunha a autonomia e capacidade de
decisão dos professores em matéria curricular, apelando ao seu desenvolvimento profissional e ao
envolvimento em estruturas de trabalho colegial.
A “Gestão Flexível do Currículo” (GFC) foi um projeto nacional, implementado a partir do ano
letivo de 1997/98 e que nos 4 anos seguintes envolveu 184 escolas. Tendo dimensão nacional,
colocava a sua centralidade no trabalho desenvolvido pelas (e nas) escolas, colocando-lhes desafios
completamente novos.
Paralelamente foram constituídas equipas de apoio, coordenados pelas instituições do ensino
superior, que acompanharam e apoiaram as escolas, seguindo planos formativos que se adequaram
às diferentes realidades. O Ministério da Educação e estas equipas promoveram ainda a produção
de documentos teóricos e materiais de apoio para os professores, assim como um amplo debate
entre os docentes envolvidos e com os parceiros que asseguravam a assessoria interna e externa
às escolas. No âmbito deste Projeto, muitas das escolas e professores experimentaram, definiram,
redefiniram e planificaram estratégias de gestão curricular para adaptar o currículo nacional aos
contextos reais em que cada instituição funcionava e que fossem também adequados ao perfil
dos seus alunos. O currículo assumia assim uma dimensão fortemente local e que se traduziu em
instrumentos poderosos para o trabalho escolar, como os Projetos Curriculares de Escola e de Turma.
O relatório sobre este projeto, coordenado por Luísa Alonso, faz uma análise profunda e crítica
da GFC e chama a atenção para o facto de pela “primeira vez na história da educação escolar em
Portugal” se registar “a intenção de produzir mudanças estruturais de fundo que põem em causa
o núcleo duro das invariantes organizacionais da escola, apontando para um novo paradigma de
currículo, de profissionalidade docente, do papel do aluno e da própria escola.” (2001: 5). Os autores
sublinham principalmente o “novo paradigma de inovação/mudança” que a GFC representava, pois
estava alicerçada “numa concepção cultural e política, que considera a escola (ou agrupamento
de escolas) como contexto ecológico para a emergência da mudança, com base em processos de
pesquisa, de reflexão, de decisão e de avaliação participada e negociada, a ser construída de forma
evolutiva e dinâmica” (2001: 5). Como sublinham os autores, a mudança impunha-se então como
uma centralidade inadiável e exigia a todos a capacidade de aprender a lidar com ela. Neste sentido,
apontavam-se novas e imprescindíveis atitudes, como a compreensão, a colaboração e a procura de
valores que se configurassem com sentido e oferecessem uma orientação para a mudança, face à
nova situação internacional. O Projeto GFC foi essa resposta, surgindo pela primeira vez em Portugal
a clara opção por uma reforma pensada como mudança e inovação, que colocava no interior da
escola (e em relação com o seu exterior) a concretização desse processo inovador, cujo motor
eram as pessoas que habitavam essa mesma escola. Por seu lado, a relação de dependência que
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 286
caracterizava a situação das escolas face à administração desloca-se para uma nova perspetiva,
centrada no diálogo e na construção de consensos possíveis, num jogo de comunicação e de diálogos
de cima para baixo e de baixo para cima (top-down, bottom-up).
Esta experiência culminou com a reorganização curricular do ensino básico (Decreto Lei n.º 6/2001)
e a adoção estratégica da noção de “currículo nacional”, centrado na definição de competências
gerais e num sistema de avaliação dos alunos. As escolas tinham a responsabilidade de organizar
a gestão flexível do currículo, isto é, de “organizar e gerir autonomamente o processo de ensino/
aprendizagem, tomando como referência os saberes e as competências nucleares a desenvolver
pelos alunos no final de cada ciclo e no final da escolaridade básica, adequando-o às necessidades
diferenciadas de cada contexto escolar e podendo contemplar a introdução no currículo de
componentes locais e regionais”. A escola passou a ser o território e o contexto do desenvolvimento
curricular, centrado no currículo nacional e nos projetos de escola.
Referências
Alonso, M. L. G. (coord.); Peralta, H.; Alaiz, V. (2001). Parecer sobre o Projecto de Gestão Flexível do
Currículo.
repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/20821/1/Parecer+GFC_2001.pdf
Ministério da Educação (2001). Gestão flexível do currículo: escolas partilham experiências. & .(2002).
Gestão flexível do currículo. Reflexões de formadores e investigadores.
Este estudo é fruto de uma dissertação de mestrado de 2015 e, objetiva discutir a história do
curso de Pedagogia no Brasil sob a perspectiva de narrativas oficiais de reformas. Os antecedentes
históricos relativos à criação do curso de Pedagogia se construíram com a política nacional para a
educação no Brasil, organizadas progressivamente com a implantação do Ministério da Educação e
Saúde Pública, em 1930, e com a criação do Conselho Nacional de Educação, em 1931. Naquele
período, o país passava por processo de modernização, isso colocou a educação como um serviço
público importante instrumento para a legitimação de uma nova hegemonia. Nesse movimento de
definição de um modelo nacional de educação, outras contra narrativas entre educadores católicos
e laicos se intensificaram. As reivindicações dos católicos lhes renderam a introdução do ensino
religioso nas escolas públicas no bojo da Reforma Francisco Campos em 1931. Em resposta, os
defensores da escola laica lançaram, em 1932, o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, na
qual propunha a reestruturação do sistema educacional visando atender à industrialização
emergente e crescente a um projeto de uma educação, pública, laica e democrática. O curso foi
criado em 1939 pelo Decreto-Lei nº. 1.190, no âmbito da Faculdade Nacional de Filosofia, tendo
como contexto o governo de Getúlio Vargas, sob a égide da Reforma Francisco Campos. Tratava-se
de uma ruptura social de caráter violento, antecedida por propostas que foram se legitimando na
década de 1930, defendidas principalmente por Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo. O então
curso formava o bacharel para atuar na estrutura burocrática dos sistemas de ensino e o licenciado
para o exercício da docência no ensino secundário e, particularmente, no curso normal. Essa
separação entre bacharelado e licenciatura caracterizou uma organização curricular seriada,
denominada de esquema 3+1(BRZEZINSKI, 1996), pois o bacharelado (três anos) se constituía em
pré-requisito à obtenção do diploma de licenciado (um ano). Em 1946, houve uma tentativa de
substituir o criticado esquema 3+1 por meio da obrigatoriedade de quatro anos de formação em
Faculdades de Filosofia, tanto para o bacharel quanto para o licenciado (BRASIL, DECRETO LEI nº.
9.092 de 1946). Apesar disso, os diplomas continuavam separados, destinando-se o de bacharel aos
que escolhessem somente as disciplinas optativas do quarto ano, e o de licenciado a quem optasse
pelo esquema total de inclusão da formação pedagógica. Com a aprovação em âmbito nacional do
Decreto-Lei n. 8.530, de 2 de janeiro de 1946, conhecido como Lei Orgânica do Ensino Normal. O
ensino normal, ramo de ensino do segundo grau, incluía a modalidades do ensino normal: o curso
de regentes de ensino articulado com o curso primário, o curso de formação geral de professores
primários, com o curso ginasial. A próxima regulamentação do curso de Pedagogia ocorreu com a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 4.024, de 1961. Essa legislação, segundo Scheibe e
Durli (2011), reflete o pensamento pedagógico produzido nas décadas de 1940 a 1950 bem como o
seu contexto social e político. Politicamente, o período de 1945-1964 foi caracterizado por ampla
mobilização das forças democráticas e liberais com o autoritário Estado Novo, paralisado pelo Golpe
Militar, que reprimiu qualquer mobilização popular que pretendesse ampliar os limites de uma
democracia ainda restrita. Essa legislação foi sendo seguida de outros aparatos legais, a saber, do
Parecer CFE 251/1962 Parecer CFE 251/1962 e da Resolução CFE Nº. 62, que indicavam as disciplinas
que deveriam compor o currículo mínimo do curso de Pedagogia na qual passou a ter quatro anos,
sendo três dedicados à base comum, que compreendia sete disciplinas (Psicologia da Educação,
Sociologia Geral e da Educação, História da Educação, Filosofia da Educação e Administração
Escolar) e mais um ano, dedicado ao estudo da didática e da prática de ensino, tornadas obrigatórias,
bem como de duas disciplinas optativas escolhidas em um rol de 12; Parecer CFE 12/1967 que tratou
da formação de professores para as disciplinas específicas do ensino médio técnico; Parecer CFE
252/1969 Resolução CFE nº. 2/1969 que promoveu uma nova reorganização do curso, agora com a
extinção da distinção entre bacharelado e licenciatura, bem como a definição de conteúdos mínimos
e a duração do curso de Pedagogia. Além disso, o Parecer CFE 252/1969 deu poder ao Conselho
Federal de Educação (CFE) e às instituições de Ensino Superior autonomia para a criação de novas
habilitações e ainda ofereceu algumas possibilidades a serem desenvolvidas na graduação e na pós-
graduação. Para vários autores este aparato legal estava contraditório na medida pois, determinava
que as especialidades pedagógicas dar-se-iam na parte diversificada do curso, mesmo tendo ciência
de que estas especialidades deveriam ocorrer na pós-graduação e não na graduação. Contudo, a
explicação que os relatores do Parecer em questão deram para tal fato é a de que, em decorrência
das demandas do mercado de trabalho, não haveria tempo para esperar que as pessoas se formassem
em tal grau, logo, estas formações passariam a ocorrer dentro do próprio curso de Pedagogia. A
vigência do Parecer CFE nº. 252/69 e da Resolução CFE nº. 2/69 perdurou até a aprovação da vigente
Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) 9.394/1996 que garantiu a existência do curso de
Pedagogia e de seu campo. Contudo, a LDB provocou debates sobre em torno de contra narrativas
que defendiam a criação dos Institutos Superiores de Educação (ISE). O que ocorreu no Decreto nº
3.554/2000 ao definir o Curso Normal Superior como espaço preferencial para a formação dos
professores para a educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, e, de outro, preserva
essa função ao curso de Pedagogia (Art.62 da LDB nº 9.394/96), tendo como consequência dois
espaços distintos com a mesma atribuição acadêmica. Nesse sentido, temos duas narrativas em
destaque que tentam definir qual o lócus de formação do Pedagogo, de um lado narrativas que
defendem uma formação subsidiada pela articulação ensino-pesquisa e, tendo a universidade
como o único local dessa possibilidade e outra contra narrativa que luta por uma formação aligeirada
e mercadológica pelos IES privadas. Após intensos debates tivemos a instituição das Diretrizes
Curriculares Nacionais para o curso de Graduação em Pedagogia (DCN) que representa a última
reformulação específica para o curso (PARECER CNE/CN nº. 05/2005 e RESOLUÇÃO CNE/CP nº.
1/2006). O grande destaque das DCN é o sentido ampliado da docência ao articular a ideia de trabalho
docente a ser desenvolvido em espaços escolares e não escolares. Além disso, foram acrescidas 400
horas ao curso, totalizando 3.200h, distribuídas entre atividades formativas, estágio supervisionado
e atividades teóricas e prática. As DCN representam avanços no que diz respeito às discussões e
valorização das minorias excluídas e a defesa dos seus direitos básicos. No contexto das DCN
identificamos quatro narrativas: 1. a defesa do curso de Pedagogia bacharelado; 2. a defesa do curso
de Licenciatura em Pedagogia com base na docência; 3. a defesa do curso de Normal e 4. a defesa da
Pedagogia Empresarial, em que se advoga a formação do pedagogo para atuar em instituições
educativas não escolares. No ano de 2015 o curso de Pedagogia sofre nova regulamentação com a
Resolução nº 2/2015 que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível
superior em cursos de licenciaturas, inclusive a Pedagogia. Essa resolução mantém a carga horária
mínima do curso, contudo, altera sua distribuição com um aumento de 100h para o estágio
supervisionado e a inclusão de 400 horas para a denominada atividades prática. Esse posicionamento
visa atender narrativas que apregoam a suposta necessidade de que o aluno deva o quanto antes
adentrar seu ‘futuro’ ambiente de trabalho, buscando com isso articular teoria-prática. Nesses
pressupostos, apreendemos que o curso de Pedagogia ao longo de sua história foi se constituindo
de contra narrativas, dentre estas a de reformas oficiais que tentam definir o curso de Pedagogia, seu
perfil profissional e para qual sociedade. A narrativa de que a reforma é indicativa de mudanças,
inclusive estruturais, para avanços na educação, é legitimada na defesa das reformas educacionais
implementadas no Brasil a partir da década de 1990, sendo então, aclamadas como solucionadoras
das mazelas centenárias do sistema de ensino público (OLIVEIRA, 2011). A narrativa da reforma é
nutrida de motivações de crise de crescimento dos sistemas escolares universalizados, de pressão
pela eficiência na utilização dos recursos. Nessa direção, segundo Moreira (2000) as reformas
curriculares no Brasil pouco contribuem para romper com a concepção da racionalidade técnica,
principalmente nos cursos de formação de professores. Por essa via, compreendemos que as
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 289
reformas não são necessariamente promotora de avanços para o curso de Pedagogia, representam
sim narrativas imersas num campo de disputas de grupos específicos imbricados em condições
sociopolíticas em busca de legitimação de concepções de homem, de sociedade, de educação, de
currículo e de formação de professores.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
RESUMO
Este artigo apresenta uma releitura sobre os pensamentos de José Martí como fonte histórica e
sua influência para educação na América Latina. Martí é um homem de impressionante atualidade,
suas idéias permitem que temas contemporâneos assumam contornos mais claros que podem ser
facilmente modificados em instrumentos de nossa reflexão. As considerações de Martí consistem
em uma pedagogia radical, fortemente fundamentada na realidade social e cultural na qual se
realiza, mas também compromissada com a modificação dessa realidade. A metodologia baseou-
se na pesquisa bibliográfica e análise de documentos. O objetivo central do estudo é a análise das
contribuições pedagógicas do intelectual José Martí na elaboração de propostas de políticas públicas
educacionais voltadas para a Educação inovadora, crítica, política e de qualidade que valoriza as
potencialidades e as possibilidades da América Latina.
Introdução
A América Latina dispõe de uma esplêndida tradição pedagógica, sendo parcela da melhor
prática e teoria pedagógica global, entretanto sua importância e transcendência nem sempre são
conhecidas e valorizadas. Conforme Streck (2007), em momentos de crise é preciso retornar às fontes.
Assim buscamos nos pensamentos de José Martí elementos que colaborem com o reconhecimento
de nossa tradição pedagógica.
José Martí foi o intelectual mais público e paradigmático da América Latina no século XIX, nele
encontramos uma expressão muito lúcida do que deveria ser a educação na América Latina e traços
de uma pedagogia latino-americana. “Foi um letrado, mas não um intelectual orgânico do poder”
(RAMOS, 2008, p. 83).
Martí procurou transformar o modo de ser e atuação do intelectual no contexto latino-americano,
recomenda que o intelectual latino-americano busque o “saber da terra”, pois nossa identidade
deve estar alicerçada no mais profundo de nossa natureza; sugere na explanação na obra Nuestra
América que considera como cultura a natureza latino-americana. Martí busca os elementos naturais,
autóctones, específicos da realidade.
Dialogar com José Martí na qualidade de educador e articulador político, evidenciando sua
concepção de educação, poderá revelar outros espaços além da escola de concepção transformadora
para o desenvolvimento de potencialidades possibilitando ao sujeito ser responsável por sua
história.
O presente estudo tem como objetivo central a análise das contribuições pedagógicas do
intelectual José Martí na elaboração de propostas de políticas públicas educacionais voltadas
para a Educação inovadora, crítica, política e de qualidade que valoriza as potencialidades e as
possibilidades da América Latina.
Metodologia
O material empírico utilizado na pesquisa foi elaborado a partir de uma revisão de literatura sobre
a concepção do intelectual José Martí. A prática de pesquisa pautou-se na pesquisa bibliográfica e
análise documental, a partir das leituras e/ou releituras, facilitou chegar ao conhecimento que se
pretendia.
Conclusão
As considerações de Martí consistem em uma pedagogia radical, fortemente fundamentada na
realidade social e cultural na qual se realiza, mas também compromissada com a modificação dessa
realidade. Não pode existir uma pedagogia para a liberdade sem que ela própria seja libertada de
preceitos que a envolvem em esquemas rígidos. Em Martí encontramos o resgate e reafirmação de
uma educação para a identidade nacional e regional, sem distinção de raça ou sexo.
Referências
FERNANDES, Florestan. A atualidade de José Martí. In: KOLLING, E. José Martí: vida e obra. São
Paulo: Centro de Estudos Martianos, 1995. p. 32-33.
MARTI, José. La Habana: obras completas. La Habana: Centro de Etudios Martianos; Karisma Digital,
2001. (Edição Eletrônica)
RAMOS, Júlio. Desencontros da Modernidade na América Latina: literatura e política no século XIX.
Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.
STRECK, Danilo Romeu. José Martí e a Educação Popular: um retorno às fontes. In: 30º REUNIÃO da
Anped, 2007. Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/30ra/trabalhos/trabalho_gt06.htm.
Acesso em: dez.2007.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Objetivos
A pesquisa procura, inicialmente, compreender como se deu a circulação das ideias pedagógicas
libertárias em território brasileiro, identificando quais destas ideias passaram a fazer parte das
práticas pedagógicas da Escola Moderna N.1 de São Paulo. Ao retomar as bases do pensamento
libertário e da pedagogia libertária, particularmente as ideias de Joseph-Pierre Proudhon, Mikhail
Bakunin, Piotr Kropotkin, Paul Robin, Sébastien Faure e Francisco Ferrer y Guardia, será possível
compreender o papel atribuído à Educação pelos libertários e, mais especificamente, as questões
que envolveram a criação e o funcionamento da Escola Moderna N.1. O objeto principal são as
práticas pedagógicas desenvolvidas na Escola Moderna N.1 – as principais referências externas e
suas apropriações realizadas pelos educadores da instituição.
Periodização
Os marcos inicial (1912) e final (1919) correspondem aos anos de funcionamento da Escola
Moderna N.1. Contudo, haverá a necessidade de extrapolar esta periodização pois será preciso
um recuo cronológico de forma a compreender as bases da pedagogia libertária e os esforços para
viabilizar a escola, mas também avançar a fim de identificar suas contribuições e legados para a
educação, bem como as ações educativas dos militantes anarquistas nos anos seguintes.
Metodologia e fontes
Os autores elencados para compor o referencial teórico-metodológico transitavam entre a
história, a antropologia e a sociologia, também possuindo uma preocupação comum com as
práticas. Apropriação[1], de Roger Chartier (2002), e autonomia-heteronomia[2], de Pierre Bourdieu
(2004) –, são os principais conceitos que servirão de ferramentas analíticas para a compreensão do
objeto de estudo.
A fim de compreender os elementos expostos acima serão analisados, entre outros documentos,
os seguintes periódicos:
1. A Lanterna (1910 a 1916) – importante ferramenta de propaganda e conscientização da causa
libertária, contendo inúmeros artigos sobre política, sociedade, crítica anticlerical e educação.
Publicou artigos sobre o educador Francisco Ferrer y Guardia, sobre o processo para implementação
da Escola Moderna N.1, e realizava a divulgação dos cursos oferecidos por esta instituição.
2. Gazeta do Povo (1910) – periódico católico e conservador, publicou duras críticas à maçonaria,
ao espiritismo e, particularmente, ao pensamento pedagógico libertário de Francisco Ferrer y
Guardia.
3. O Início (1915 e 1916) – publicou algumas das práticas pedagógicas desenvolvidas na Escola
Moderna N.1 (especialmente atividades de alunos), bem como eventos e outros elementos da rotina
da instituição.
4. Boletim da Escola Moderna (1918 e 1919) – publicou artigos de cunho informativo/propaganda
e divulgou cursos oferecidos pela Escola Moderna N.1, assim como eventos.
A documentação oficial (Legislação de ensino, Anuário do Ensino do Estado de São Paulo, livros
de visitas de inspetores de ensino, livros de matrículas, livros de chamada e livros de inventários
referentes a escolas da região do Belenzinho) e o acervo bibliográfico da Escola de Comércio Saldanha
Marinho são importantes fontes para compreender e problematizar as questões que envolveram a
criação, funcionamento e fechamento da Escola Moderna N.1.
Considerações finais
A pesquisa em curso procura analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas na Escola Moderna
N.1, buscando destacar as soluções próprias encontradas pelos seus educadores diante das
limitações financeiras/técnicas, do contexto, das motivações e das possibilidades de ação, bem
como das lutas travadas entre a Escola Moderna N.1 e os setores sociais e políticos contrários ao seu
modelo de ensino, culminando no fechamento da escola. Ao realizar a revisão bibliográfica, além de
rever e trazer à tona outros documentos que versam sobre os discursos e as práticas pedagógicas
libertárias, a pesquisa busca contribuir para os estudos da pedagogia libertária, das práticas
pedagógicas antiautoritárias e da História da Educação no Brasil.
Referências
BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São
Paulo: Editora UNESP, 2004.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Tradução de Maria M. Galhardo.
Lisboa: DIFEL, 2002.
CORRÊA, Felipe. Bandeira Negra : Rediscutindo o Anarquismo. Curitiba: Editora Prismas, 2015.
GALLO, Silvio. Pedagogia libertária: anarquistas, anarquismos e educação. São Paulo: Imaginário;
Manaus: Editora da Universidade Federal do Amazonas, 2007.
LUIZETTO, Flávio Venâncio. Presença do Anarquismo no Brasil: um estudo dos episódios literário e
educacional – 1900/1920. São Carlos: UFSCar, tese de doutorado, 1984.
[1] entendida como uma relação dialética estabelecida entre o autor/obra e seus públicos/leitores, a leitura torna-se
uma atividade que permite interpretações e extrapolações, novas formas, sentidos e usos são pensados e material-
izados em práticos para além daquilo pensado originalmente pelo autor
[2] conceitos trabalhados na perspectiva da produção do conhecimento científico, porém serão trazidos para o campo
da Educação e das instituições escolares. Autonomia se refere à capacidade que agentes, instituições e campo têm
de refratar, retraduzindo sob uma forma específica as pressões e as demandas externas. Heteronomia, por sua vez,
se refere às determinações externas que buscam intervir sob agentes, instituições e campo de forma a garantir seus
interesses.
[4] Método de ensino baseado na razão e na ciência. Entendido como indutivo-intuitivo, demonstrativo e objetivo,
fundamenta-se na pesquisa e na observação, em oposição ao ensino estatal e confessional onde os tabus e
imposições religiosas e sociais impediam o desenvolvimento intelectual e o conhecimento de determinados temas
e conteúdos.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Resumo
As transformações do mundo contemporâneo influenciam diretamente em aspectos básicos da
nossa vida em sociedade, e neste texto, citaremos como essas mudanças têm afetado a educação
e o processo de ensino, além da relação entre o aluno e o professor e o uso crescente de novas
tecnologias, no âmbito da educação superior e profissional, tendo em vista o crescente surgimento
de novos recursos tecnológicos e novas metodologias de ensino. A reflexão sobre como qualificamos
e educamos nossos alunos e os colocamos no mercado de trabalho torna-se necessária, se temos
como anseio possibilitarmos mudanças nas relações sociais que permitam a construção de
consciências individuais e coletivas. As interações sociais são fundamentais para a aprendizagem do
aluno, por isso, no método construtivista a cultura a qual o indivíduo pertence influencia no processo
de aprendizagem, fato desvantajoso para o professor, que encontra mais dificuldades para controlar
a aula, além de que no método construtivista cada aluno tem um ritmo de aprendizagem. Com o
uso das metodologias ativas o professor faz com que os alunos vivenciem situações inesperadas
que exigem que eles reflitam, busquem e avaliem informações para solucioná-las e apresentá-las.
Nesse contexto, o professor atua como orientador ou facilitador nos grupos de trabalho ou estudo,
interagindo mais intensamente com os alunos do que quando interagiria em aulas puramente
expositivas. Na relação entre esses sujeitos, o aluno exerce o papel de protagonista ao interagir nas
aulas e possibilitar, por meio de suas ações, a reconstrução de seu conhecimento. Dentro do processo
de aprendizagem, é importante que o aluno compreenda a relevância de obter conhecimento
contextualizado com sua vida, para sua formação profissional e para atuar em sociedade, fazendo
com que esteja mais bem preparado para as exigências do mercado, de pessoas capazes de criar e
produzir, de pessoas independentes e pró-ativas.
O presente trabalho tem como objetivo identificar, por meio de análises teóricas, métodos de
ensino diferentes dos tradicionais, além de apresentar pontos fortes do uso das metodologias ativas
e fragilidades do ensino tradicional, com a intenção de demonstrar que a maneira como instituições
e docentes tratam o processo de ensino-aprendizagem pode influenciar na atuação profissional
dos alunos. O surgimento de novas tecnologias influencia na atividade pedagógica de todos os
níveis, portanto, cria-se novas concepções de conhecimento, de alunos, professor, instituição e
composição curricular, seja na educação básica, superior, tecnológica, técnica ou profissionalizante.
Focamos na relação entre professor e aluno, bem como o papel de cada um dentro do processo
de ensino-aprendizagem, além das formas de avaliar o aluno conforme as mudanças decorrentes
da aplicação de metodologias ativas. É importante destacar que não se trata de desmerecer os
métodos tradicionais, mas complementar, aprimorar, diversifiar e facilitar o processo educativo
para que os alunos tornem-se profissionais preparados para a realidade do mercado de trabalho,
bem como para o exercício da cidadania. O papel do professor é de mediador e não se resume
apenas em repassar informações sobre o conteúdo aos alunos nas aulas, também é papel do
professor instigar inquietações nos alunos, despertar curiosidades para que busquem responder
aos seus questionamentos, e ampliar seu conhecimento sobre diversos assuntos. Desta forma, o
aluno também é responsável pelo seu aprendizado, pois responde às suas dúvidas pesquisando,
problematizando e comprendendo conteúdos pelos quais tem interesse.
Saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria
produção ou a sua construção. Quando entro em uma sala de aula devo estar sendo um ser aberto
a indagações, à curiosidade, às perguntas dos alunos, a suas inibições; um ser crítico e inquiridor,
inquieto em face da tarefa que tenho – a de ensinar e não a de transferir conhecimento. (FREIRE,
2002, p. 21).
Trata-se de uma pesquisa de revisão bibliográfica de abordagem qualitativa com base em
autores como DEWEY, FREIRE, MASSETO, MORAN e REZENDE. Justifica-se pelo fato de que durante
a graduação ou formação tecnológica, ou seja, no decorrer do curso, o aluno é preparado para as
práticas profissionais e para a vivência em sociedade, de maneira ética. No processo de ensino-
aprendizagem deve ocorrer uma mediação de conhecimentos e experiências entre os envolvidos,
respeitando o contexto em que o aluno está inserido, transformando e ampliando o conhecimento
de mundo deste.
Espaço e ambiente para se planejar em conjunto o curso a ser realizado, negociar as atividades,
discutir interesses; ponto de encontro para leituras, exposições, debates, momentos de síntese,
diálogos e descobertas. Tempo para identificação das necessidades, expectativas e interesses
dos participantes, para traçar objetivos a serem alcançados, definir e realizar um processo de
acompanhamento e de feedback do processo de aprendizagem (MASETTO, 2014).
O trabalho em grupo faz com que o aluno interaja e coopere com os outros integrantes, portanto
estimula e treina o discente para o trabalho em equipe, situação encontrada no mercado de
trabalho. Após o trabalho em grupo, o professor utiliza, principalmente, como método de avaliação,
o seminário, que também é uma metodologia ativa, e corresponde a exposição da pesquisa, das
opiniões e conclusões obtidas pelo grupo. Barbosa e Moura (2013) afirmam que, conforme a ciência
cognitiva, uma aprendizagem efetiva vai além do que simplesmente ouvir, por isso, faz-se necessário
a aplicação de atividades que levem o aluno a pensar sobre o que está fazendo, portanto:
Para se envolver ativamente no processo de aprendizagem, o aluno deve ler, escrever, perguntar,
discutir ou estar ocupado em resolver problemas e desenvolver projetos. Além disso, o aluno deve
realizar tarefas mentais de alto nível, como análise, síntese e avaliação (BARBOSA; MOURA, 2013, p.
8)
A aprendizagem duradoura e sólida é construída pelo próprio aluno dentro seus métodos de
aprendizagem, pois esses métodos exige mais empenho do aluno para formação de conceitos e
compreensão de conteúdos e informações. Afirmações propaladas por Freire (2002) ressaltam a
necessidade de o docente assimilar os princípios que norteiam a atividade do professor em direção
à autonomia.
Conclui-se nesse trabalho que a complementação da aprendizagem tradicional por meio dos
recursos oferecidos por metodologias ativas, ou a própria aplicação das mesmas como um todo, na
instituição de ensino favorece um ambiente educacional em que o aluno também é responsável pelo
seu processo educativo. Participando ativamente desse processo, tendo como responsabilidade
principal o interesse em aprender e a disposição para aprender conteúdos na prática. Morán
(2015) sugere a integração das atividades da sala de aula com as digitais e das presenciais com
as virtuais. Nesse aspecto, o professor precisa se comunicar face a face com os alunos, e também
digitalmente, com o uso de tecnologias móveis, equilibrando a interação com todos e com cada um.
As metodologias ativas nos permitem acreditar que os alunos saem da escola ou se formam nos
cursos preparados para atuação profissional e com as habilidades necessárias que o mercado de
trabalho exige, pois foram apresentados a situações de aprendizagem significativas e realistas para
suas vidas.
A possibilidade de interatividade; as possibilidades que o computador tem de simular aspectos da
realidade; a possibilidade que as novas tecnologias de comunicação, acopladas com a informática,
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 298
Referências
BARBOSA, Eduardo Fernandes; MOURA, Dácio Guimarães de. Metodologias Ativas de Aprendizagem
na Educação Profissional E Tecnológica. Boletim Técnico Senac, Rio de Janeiro, v. 39, n.2, p.48-67,
maio/ago. 2013. Disponível em: http://www.bts.senac.br/index.php/bts/article/view/349. Acesso em:
Set 2019.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia saberes necessários à prática educativa. 25. ed. São Paulo:
Editora Paz e Terra S/A, 2002.
MORÁN, José. Mudando a Educação com Metodologias Ativas. Coleção Mídias Contemporâneas.
Convergências Midiáticas, Educação e Cidadania: aproximações jovens. Ponta Grossa-MG, v.2, 2015.
Disponível em: http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2013/12/mudando_moran.pdf.
Acesso em: Set 2019.
Introdução
“Quem não aprendesse com as Irmãs Militão, não aprenderia com mais ninguém...” Eis a frase
que ecoa nas falas de muitos moradores do município de Senhor do Bonfim, no interior da Bahia,
quando se trata da história da educação local. Movida por essas memórias e comentários sobre duas
professoras leigas, o presente texto constitui um recorte de uma pesquisa de doutorado sobre
histórias de vida e trajetórias de professoras negras na segunda metade do século XX em Senhor do
Bonfim-Bahia. Aqui especificamente trataremos de duas professoras, conhecidas como Irmãs Militão
e individual, carinhosa e popularmente conhecidas por Tia Lourdes e Tia Di, as quais são sujeitos de
pesquisa por atenderem aos critérios estabelecidos pela pesquisadora, dentre eles ser professora
negra considerando o histórico de escravidão no Brasil e ter atuado na segunda metade do século XX
em Senhor do Bonfim-BA, cidade onde ocorreu também a formação profissional da pesquisadora.
Além disso, as professoras já falecidas, mantém-se vivas nas memórias de moradores e ex-alunos
por motivos que vão desde a rígida disciplina e castigos físicos, ao amor, compromisso e respeito
presentes no processo de ensino-aprendizagem em geral. As professoras sujeitos de pesquisa desse
estudo, chamadas carinhosamente por Tia Lourdes e Tia Di, eram irmãs, negras, leigas e residiam
em Senhor do Bonfim com alguns familiares. Solteiras, durante parte da vida adulta, transformaram
a própria residência em uma escola nomeada Escola Santa Teresinha, a qual até o presente momento
não localizamos documentação oficial, e que era conhecida por todos como Escola das Militão,
sobrenome das professoras. Segundo as fontes analisadas até o momento, consta que a escola
funcionou de 1975 até 1985 e se tornou famosa por ter como característica principal a rigidez e
disciplina severa com os alunos, entre outras especificidades ligadas às histórias de vida das
professoras, conforme descreveremos no desenvolvimento do texto final. Objetivos: Temos como
objetivo geral analisar as práticas pedagógicas de duas professoras leigas, assim como a
representatividade destas até os dias atuais na memória dos ex-alunos, conhecidos e moradores
contemporâneos. Como objetivos específicos elencamos os seguintes: descrever a metodologia
utilizada pelas Irmãs Militão no processo de ensino-aprendizagem; identificar as práticas pedagógicas
utilizadas e a relação com as experiências cotidianas das professoras; e ainda, compreender as
situações que despertavam os sentimentos e ações de rigidez, medo, amor e respeito na relação
professor/aluno tão presentes nos comentários de ex-alunos, vizinhos das professoras e conhecidos
contemporâneos. Fontes: Diante da não localização de documentos oficiais até o momento e
dificuldades de acesso em alguns locais a exemplo de um memorial existente em uma escola
particular da cidade e que segundo informações possui fotografias e objetos pertencentes às
professoras estudadas, optamos por analisar para esse trabalho duas postagens sobre as professoras
na rede social Facebook, por considerar segundo Lima; Jaques; Ávila( 2015), que a rede social
constitui um espaço de narrativas biográficas e autobiográficas uma vez que tanto o dono do perfil
quanto os indivíduos que escrevem os comentários exercem a escrita de si e ao mesmo tempo sobre
o outro. Além disso, de acordo com Santos (2017, p. 3), “os acervos pessoais virtuais se apresentam,
assim como os cadernos e diários pessoais, como recursos no intento de guardar-se, perenizar-se e
dar-se a ver na posteridade”. Metodologia: A partir de postagens feitas por dois perfis do Facebook,
cujas iniciais são RA e MGP, sobre a atuação e importância das professoras Militão na educação e
cultura de Senhor do Bonfim, observamos e analisamos os comentários feitos por ex-alunos, ex-
vizinhos e conhecidos das professoras, buscando identificar marcas da cultura escolar da época, os
rituais praticados diariamente e em datas comemorativas, a prioridade dos conteúdos ensinados, a
metodologia utilizada, os recursos didáticos e como se dava a avaliação, além das práticas
disciplinares. Essas últimas, segundo os comentários analisados, eram rígidas e explicitamente
demonstradas através de castigos físicos com o uso da palmatória e conhecimento e consentimento
dos familiares dos alunos. Até o dia 30 de setembro de 2019, o perfil de RA tinha 22(vinte e dois)
comentários e 76(setenta e seis) compartilhamentos, enquanto que no perfil de MGP constavam 152
(cento e cinquenta e dois) comentários e 228 ( duzentos e vinte e oito) compartilhamentos. As duas
postagens encontradas e analisadas têm como titulação “Irmãs Militão, professoras leigas, disciplina
rígida com castigos físicos, “ a lição “ no bireau, a sabatina da taboada c/ palmatória com furinho no
meio e a pedra da “licença”(MGP) e “professoras irmãs Militão, de Senhor do Bonfim...Lembradíssimas
pela “palmatória nossa de cada dia”(RA). Cada postagem é composta pela parte escrita pelo autor
de cada perfil, duas fotografias das professoras e os respectivos comentários de cada postagem, cuja
autoria varia de ex-alunos, vizinhos, conhecidos, familiares de ex-alunos e pessoas da atualidade
que emitem opinião e/ou reproduzem histórias contadas por outros contemporâneos das professoras
pesquisadas. Com essas fontes foi possível analisar a prática pedagógica das professoras, identificar
as diversas atividades que elas desenvolviam no campo religioso e cultural, como por exemplo o
caruru de Cosme e Damião, as novenas de Santo Antônio, auxiliar mulheres em trabalho de parto,
etc., e a influência dessas atividades no desenvolvimento do respeito e prestígio como educadoras,
assim como as possíveis explicações para a presença de sentimentos como amor e ódio, medo e
respeito e outros tantos demonstrados das mais diversas formas nos comentários analisados. As
análises foram feitas a partir do embasamento teórico em autores como Nóvoa (2013), Josso (2010),
Agustín( 2017) e Tardif (2012), entre outros que discutem prática docente, experiências de vida,
cultura escolar e formação docente, buscando compreender os significados das práticas dessas
professoras. Resultados: Sobre os resultados alcançados com esse estudo podemos destacar vários,
que inclusive vão além dos objetivos inicialmente estabelecidos. Dessa forma, é relevante mencionar
o grande número de indícios sobre tantas outras memórias ligadas à educação local e regional que
despertam a curiosidade do leitor, sobretudo pesquisadores e historiadores, podendo gerar outras
pesquisas na área da história da Educação. Além disso, foi possível verificar o papel assumido pela
rede social Facebook como espaço memorialístico através dos diversos elos que se estabelecem de
forma rápida e com um grande número de usuários permitindo a composição de histórias como as
das professoras irmãs Militão e outras afins, contribuindo para a pesquisa de doutorado e outras que
podem ser desenvolvidas em outro momento e/ou por outros pesquisadores. Sobre o objeto de
pesquisa específico desse estudo foi possível descobrir e analisar informações, acontecimentos e
práticas da vida cotidiana e profissional das professoras estudadas que justificam o fato delas
continuarem tão vivas na memória da população, servindo inclusive de referência como educadoras
para as séries iniciais, apesar de não terem em sua trajetória a formação especifica para o magistério.
Da mesma forma que identificamos sujeitos que consideram as antigas práticas efetivadas pelas
professoras como traumáticas, devido ao uso de castigos físicos, mas se recordam com saudades de
outros ensinamentos no âmbito cultural desenvolvidos pelas Irmãs Militão que precisam ser
lembrados e valorizados. Por fim, percebemos com esse estudo, o quão se faz necessário, nós
pesquisadores da educação nos debruçarmos cada vez mais sobre como se constitui o ofício de
ensinar, suas causas, formas e consequências, dando a devida importância à formação e atuação do
professor e a relação com as suas histórias de vida, já que segundo Nóvoa ( 2013, p. 17), “ é impossível
separar o eu profissional do eu pessoal”. Percebemos ainda a importância de adentrarmos sobre a
história da educação local, estabelecendo relações com a regional e nacional e dando visibilidade a
história contada de baixo, conforme nomeia o historiador Thompson, que é aquela construída e
contada por indivíduos comuns, pertencentes às classes consideradas subalternas, que não
aparecem na história oficial mas que constituem sujeitos sociais, atores dos acontecimentos
passados que são de extrema necessidade para a compreensão e transformação da realidade. As
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 301
professoras Irmãs Militão, Tia Lourdes e Tia Di, com as diversas funções que assumiram ao longo da
vida, como educadoras, merendeiras, benzedeiras, parteiras e tantas outras experiências vivenciadas,
sem dúvida, contribuíram com a educação e a cultura do Município de Senhor do Bonfim, no Sertão
do estado da Bahia e fazem parte da Historiografia e História da Educação local.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Em Portugal, o ensino da Filosofia tem sido contínuo desde a Idade Média, instalando-se nas
escolas de ordens monacais e nas universidades. Tal continuidade histórica é a sua característica
distintiva pois a presença institucional da Filosofia, quer como curso quer como disciplina de um
curso, não tem sido uniforme nem tem estado isenta de polémicas. Ao longo do tempo ordenou-se a
distintas finalidades formativas e seguiu diferentes correntes de pensamento, por isso os programas,
as metodologias e os objetivos não têm sido poupados a mudanças substantivas que cedem a
pressões ideológicas, seja por preservação da tradição seja por abertura à modernidade (Boavida e
Schippling, 2008). O recém movimento contra a dispensa escolar da Filosofia (ou presença residual)
exemplifica a sua vulnerabilidade a interesses económicos e tem-se esforçado por a defender
como exercício singular do pensamento crítico e sistemático, indispensável à sustentabilidade da
democracia e valoração do bem comum (Nussbaum, 2010). Em Portugal, professores do ensino
universitário e do secundário confluíram na sua defesa pública em encontros académicos, em
artigos (Moura, 1988; Ferreira, 2015) e livros (Manso, 2017), e têm repensado as suas condições de
ensino. Em face deste movimento importa identificar os marcos histórico e político-legislativo do
ensino da Filosofia em Portugal, construindo um quadro que lhes dê evidencia.
Ora com apoio metodológico na análise crítica de documentos legislativos e textos selecionados
no arquivo da Secretária-Geral do Ministério da Educação (Lisboa), pretende-se alcançar uma
visão sintética do percurso histórico da presença do ensino da filosofia. Não se trata de analisar
conteúdos de programas de filosofia (Henriques, 2001) mas de identificar as ideias pedagógicas e
fazer o reconhecimento da instalação da Filosofia nos diversos níveis de ensino, incluindo a escola
de 1.º ciclo e a pré-primária, facto recente. Esta possibilidade de abordagem, que exige o fôlego
investigativo de uma equipa, enquadra-se num projeto iniciar e que assenta no traçado de um
percurso capaz de mostrar como o ensino da Filosofia se tem configurado e reconfigurado no embate
com polémicas e poderes. Dentro do limite investigativo mencionado, a estrutura do texto apoia-se
em três pontos, correspondentes a três níveis de ensino. No ensino superior a periodização fixada
vai desde a fundação dos Estudos Gerais (1288) até ao 25 de abril de 1974. No ensino secundário
considera-se o período entre a criação do Real Colégio das Artes (1542) e, também, o 25 de abril de
1974. No ensino primário e pré-primário, o mais recente e curto dos períodos, toma-se o ano 1988
e trava-se no ano 2010. Aduzem-se as razões para esta demarcação temporal: em relação ao ensino
superior e secundário, dois longos percursos, a data de 25 de abril de 1974 representa o início de um
período de profundas reformas (fundação de novas universidades, criação de cursos de formação
de professores, de mestrado e doutoramento, bem como adesão do processo de Bolonha) e de
profusão legislativa pelo que merece um tratamento que extrapola o espaço do texto; em relação ao
ensino primário e pré-primário, regista-se o ano de introdução de Filosofia para Crianças nos planos
de estudo de instituições privadas e fixa-se o ano 2010 por ser significativo em termos de atividade
docente. Exclui-se o ensino monacal, reservado para outra fase de estudo.
Alinhavam-se agora datas e introduzem-se alguns dados para dar a compreender o alinhamento
e o estado da investigação.
Referências bibliográficas:
ALBUQUERQUE, L. Ensino liceal. In: SERRÃO, J. (Org.). Dicionário de História de Portugal. Porto:
Livraria Figueirinhas, 1985, pp. 389-392.
CARVALHO, J. Obra completa I Filosofia e História da Filosofia. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
1981.
Prestes a completar seu primeiro centenário de independência o Brasil passava por intenso
projeto modernizador, no qual buscava se reinventar a partir de reformas urbanas, uma latente
efervescência cultural e intelectual, valorização de práticas esportivas e crescente industrialização.
Este período também apresentou uma intensa mobilização intelectual, marcada pela disputava de
projetos que buscavam definir um perfil para a nação que ainda não havia se consolidado enquanto
república. Este tensionamento em meio à construção de uma identidade nacional via reestruturação
do projeto republicano, mobilizou intelectuais, jornalistas, juristas, diplomatas, políticos, entre
outros, a ocuparem os espaços públicos para questionar e propor mudanças de ordem política e
social.
A construção de um Brasil moderno, pautado pela reinterpretação do passado, diagnóstico do
presente e projeção do futuro, ocupava a centralidade dos debates e disputas pela conquista da
legitimidade por meio de projetos que buscavam definir um Brasil moderno. Parte destes projetos
passaria pela educação, assim como pela necessidade de repensar a cultura e a sociedade.
A década de 1920 localiza-se imediatamente após a I Guerra Mundial (1914-1919), e foi marcada
por tensionamentos em meio à construção de uma identidade nacional a partir da reestruturação
do projeto republicano, que mobilizou intelectuais, jornalistas, juristas, diplomatas, políticos, entre
outros, que ocuparam os espaços públicos para questionar e propor mudanças de ordem política e
social.
Este período concentrou, ainda, parte dos debates educacionais do início da República e
resultou em reformas de ensino em vários estados e no Distrito Federal. Estas reformas partiam do
entendimento de que as escolas deveriam compartilhar o ideário republicano, contribuindo para a
efetivação da modernização dos hábitos e da vida em sociedade, por meio da universalização do
ensino. Para tanto, as reformas de ensino dos primeiros anos da república instituíram, em várias
localidades do Brasil, os grupos escolares como modelo educacional que deveria substituir as
escolas isoladas.
Neste contexto, seriam comemorados os centenários da Independência do Brasil (1922) e da Lei
de 15 de Outubro de 1827 (1927). Ambas as comemorações foram marcadas pela rememoração do
passado por meio da imprensa, institutos históricos e intelectuais do período, o que sugere uma
análise a partir dos “lugares de memória”, de acordo com Pierre Nora, que utiliza essa categoria
entendendo que estes são espaços nos quais a ritualização se faz necessária para acessar uma
memória.
Diante do exposto, o objetivo deste trabalho é examinar como os periódicos da década de 1920
foram utilizados para as disputas pelos sentidos produzidos para a educação em Minas Gerais
nas celebrações do centenário da Independência do Brasil (1822-1922)., por meio da atuação dos
intelectuais.
Para tanto, considero os repertórios mobilizados nos discursos dos intelectuais, ressaltando a
importância de compreender as comemorações do centenário da Independência como efeméride
que corrobora para a projeção destes indivíduos. Interessa saber, portanto, de que forma os
periódicos foram utilizados para a realização de embates políticos entre intelectuais durantes os
preparativos para as comemorações deste centenário e quais foram seus objetivos. O recorte
temporal utilizado nesta pesquisa é marcado pelas comemorações do centenário da Independência
do Brasil (1822/1922) em Minas Gerais, contemplando fontes de toda a década de 10 e primeiros
anos da década de 20.
Por um lado, a realização desta pesquisa busca ampliar o quadro de estudos sobre essa temática,
por outro, enfatiza o papel fundamental da educação para a construção da nação brasileira.
Interessa, portanto, analisar como se dava o jogo político, as articulações e as tensões entre seus
atores, buscando compreender como os repertórios eram mobilizados e disputados.
O cenário destas disputas é Minas Gerais, cuja sociedade foi conformada a partir dos ideais
republicanos, o acesso ao ensino deveria ser ampliado e as escolas deveriam aderir à modernização
proposta pela intelectualidade.
Em Minas, os principais periódicos utilizados para a difusão de artigos, notícias e agenda do
Centenário da Independência foram o Diário de Minas, Minas Geraes e O Pharol, sendo os dois
primeiros de Belo Horizonte e o último de Juiz de Fora. Além destes, vários jornais do interior se
ocuparam de noticiar sobre as comemorações, tanto na fase preparatória e após sua realização,
quanto por meio de análises sobre o significado da rememoração da data naquele momento político.
Tais jornais contribuíram, assim, para expor parte das disputas pelos sentidos da comemoração,
que levavam em conta o projeto de Brasil defendido e empreendido pelo Estado naquele momento,
assim como por intelectuais de diversos grupos políticos.
Para a compreensão do problema aqui posto, a análise documental foi realizada de maneira que
fosse possível operar com conceitos como: modernidade, intelectuais e repertório, com o cuidado
de não operar as fontes como testemunhos de uma verdade ou retratos fiéis do ocorrido.
Para operar com o conceito de modernidade, são utilizadas as reflexões de Jacques Le Goff
(1997) sobre os conceitos de moderno, modernidade, modernização e modernismo. Para melhor
compreender os discursos sobre modernidade e modernização, tem sido fundamental compreender
a movimentação intelectual do período, entendendo os intelectuais como a categoria responsável
por trazer à luz os debates sobre as comemorações dos centenários da Independência. Destaca-se
o fato de ser o espaço público o locus para debates e disputas pelos sentidos da educação que eram
promovidos por entes personagens. Diante disso, é necessário considerar o momento da construção
desses diálogos, debates e disputas. Para tanto, compreender o contexto em que se inseriam é
primordial, o que traz ao debate a noção de contextualismo linguístico, definida por Skinner.
Ao lidar com a ideia de que os intelectuais se organizam por meio de grupos sociais, devemos
considerar que tais agrupamentos ocorrem devido a afinidades. Diante disso, o conceito de
repertório, para Ângela Alonso (2003), contribui para estre trabalho à medida em que o compreende
como sendo “o conjunto de recursos intelectuais disponível numa dada sociedade em certo tempo.
É composto de padrões analíticos; noções; argumentos; conceitos; teorias; esquemas explicativos;
formas estilísticas; figuras de linguagem; metáforas.”
Para o desenvolvimento da pesquisa utilizo periódicos mineiros, publicações nacionais sobre
os centenários aqui contemplados, assim como, documentação relativa aos preparativos das
comemorações, como atas de comissões e mensagens dos Presidentes do Estado. A escolha por este
tipo de fonte se dá pela necessidade de investigar os escritos produzidos no âmbito das instituições
e eventos nos quais os responsáveis, não apenas pelas comemorações, como pelos sentidos que a
elas eram designados, estavam inseridos, colocando essa produção em diálogo permanente com as
pesquisas que investigam este período.
Neste sentido, foram investigados textos publicados no jornal Minas Geraes; Diário de Minas e
Estado de Minas e O Pharol, por serem jornais de ampla circulação e que dialogavam com um
público maior. Além destes, jornais publicados em cidades mineiras, que tratam da comemoração
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 307
Este artigo tem como temática as reformas educacionais. A pesquisa situa-se no campo da
história e historiografia da educação por investigar a reforma de César Prieto Martinez, intelectual
paulista que em comissão exerceu o cargo de inspetor da instrução pública no estado do Paraná
entre 1920-1924.
O trabalho corrobora os esforços empreendidos pelos integrantes do Grupo de Estudos e
Pesquisas em História da Educação, Intelectuais e Instituições Escolares.
Nosso objeto de estudo é a reforma educacional levada a termo pelo inspetor e as principais
fontes utilizadas são os relatórios do inspetor e referências historiográficas que versam sobre o
recorte em destaque.
Questionamos: Que relações podemos tecer entre as medidas de reforma de César Prieto Martinez
e o pensamento taylorista? Com base nesta indagação temos o objetivo de analisar as relações e a
presença dos Princípios da Organização Científica do Trabalho – OCT de Frederick Winslow Taylor,
publicado pela primeira vez em 1911, nas proposições racionalizadoras de Martinez. A partir deste
objetivo destacamos três objetivos específicos: compreender o contexto de desenvolvimento das
ideias do capital-industrial – com especial enfoque no pensamento taylorista – na sociedade da
década de 1920; apresentar sua presença no pensamento educacional reformista paranaense; e
destacar algumas medidas que apontam para uma relação entre o taylorismo e as propostas de
reforma efetuadas por Martinez no Paraná.
A metodologia utilizada é de pesquisa bibliográfica e documental. Tendo como aporte teórico a
bibliografia sobre o materialismo histórico pode-se afirmar que os relatórios pesquisados referentes
a instrução pública deste período apresentam a pretensão do inspetor de que a escola se organizasse
segundo a lógica do trabalho industrial.
Com a modernização dos processos produtivos ocorridos em virtude do desenvolvimento do
capital, vê-se no início do século XX a circulação das ideias de Taylor – pela apresentação de leis
que garantiam uma maior eficiência na produção – em diversas áreas da sociedade e, inclusive na
educação.
Pelas características do taylorismo a escola assume um modelo semelhante ao do sistema fabril,
baseado no uso de princípios científicos para melhorar a produtividade, na fragmentação das ações,
controle de tempo, inspeção, prêmios, entre outros. Os princípios da reforma paranaense da década
de 1920 evidenciados nos relatórios de Martinez expressam estas peculiaridades.
O contexto educacional deste período é caracterizado por Saviani (2013) como de diversas
reformas em todo o Brasil. Carvalho (1989) as sinaliza como uma tentativa de resolver o problema
da dívida republicana que impedia o progresso: abrasileirar os brasileiros e nacionalizar o imigrante,
Nas duas últimas décadas, a imprensa tem se tornado uma das fontes de pesquisa comumente
utilizadas pelos pesquisadores em História da Educação, em razão de ser considerada como um
espaço vasto em informações sobre diversas temáticas, tais como: a instrução pública, a política,
romance, guerra, vendas e compras, dentre outros. Por meio destas, os gêneros discursivos se
apresentavam para transmitir as informações aos leitores. Dentre eles, havia o anúncio. A sua
presença nos jornais remete à circulação da vida diária, revelando-se como parte integrante da vida
social, como trocas, vendas de objetos, trabalhos, recompensas, auxílios.
Delimitamos como objeto de pesquisa a circulação de livros sobre Instrução e Educação nos
jornais de maior circulação na Paraíba durante o Império. Para tanto, a questão central desta
investigação é: quais os livros sobre Instrução e Educação que circularam na imprensa na província
da Paraíba durante o Império? A partir de tal questionamento desdobram-se outros: Como a
imprensa divulgava os livros no século XIX? Quais eram as estratégias discursivas? Quais os livros/
autores mais recorrentes nos anúncios dos jornais da época? Havia a participação de leitores na
imprensa? Se havia, como eles participavam?
Nessa perspectiva, o gênero anúncio, no século XIX, especificamente no período imperial,
representou um dos modos de manifestar os saberes propagados pela sociedade, entre eles os
que envolviam as questões sociais, econômicas e educacionais, nos quais podemos vislumbrar as
várias maneiras de expressão em uma dada época. Com efeito, diante do gradual consumismo que
atingia a sociedade oitocentista, os anúncios ultrapassavam o caráter informativo, adequando-se a
um modelo persuasivo, cuja descrição e argumentação tornavam-se aspectos determinantes para
assegurar a atenção do público. Nesse intento, percebemos o ingresso deste gênero nos jornais
paraibanos do Império, no sentido de reconstruir e dar visibilidade para o cotidiano de contextos
específicos, conforme aponta Freyre (1979), a respeito do uso desse suporte: Quem tiver a pachorra
de folhear a coleção de um dos nossos diários dos princípios do século XIX – que exige um extremo
cuidado, porque o papel muitas vezes se desmancha de podre ou de velho nos dedos do pesquisador
menos cauteloso -, quem tiver essa pachorra e esse cuidado, há de acabar concluindo como o
diplomata português: mais do que nos livros de história e nos romances, a história do Brasil do
século XIX está nos anúncios dos jornais (FREYRE, 1979). Freyre anuncia, inicialmente, a importância
dada aos jornais do século XIX como um suporte que deve ser manuseado com atenção, devido
à sua longa jornada de existência, acrescendo que, inevitavelmente, ele reproduz, nas respectivas
páginas, a história do nosso país. Contudo, pelo fato de o jornal ser um espaço público e detentor de
alguns gêneros discursivos, Freyre imputa aos anúncios a responsabilidade de propagar essa mesma
história, reverberando a posição e a contribuição que esse gênero proporciona aos pesquisadores.
Nesta perspectiva, temos o anúncio, gênero discurso em que se divulgava e se propagava
objetos e serviços, tais como livros, aulas, casas, escravos, sítios, roupas e etc. “Os anúncios,
portanto, começavam a conquistar um espaço na relação cotidiana das pessoas, nos negócios e nas
leituras” (NEVES, 2009, p. 63). Assim, os livros, em seus múltiplos tipos, tamanhos e abordagens,
eram anunciados nos jornais do século XIX em duas vertentes: levando em conta o grande
público, oferecendo leituras para todos os perfis; especificando o público-alvo a partir dos objetos
selecionados para divulgação. As especificidades de anúncio variavam de acordo com o tipo de livro
a ser divulgado. Por seu conteúdo e forma, os anúncios de jornais remetiam para um público leitor
menos especializado do que aquele dos catálogos de livreiros. Ainda que a tendência dos jornais
fosse descrever a utilidade das obras anunciadas, consideradas adequadas a determinados tipos de
leitor, como juristas, confessores, religiosos, cirurgiões, entre outros, era o universo dos catálogos
que fornecia livros a um público mais aprimorado.
As estratégias discursivas do anúncio para apresentar, vender ou trocar os livros eram variadas.
Um exemplo são os livreiros do século XIX que utilizavam os espaços pagos nos jornais para divulgar
seus produtos e aumentar o lucro nas vendas. As formas de divulgar tinham caráter informativo,
sobre as novidades recém lançadas em prelos do Brasil e do exterior, e algumas apresentavam até
uma espécie de crítica literária sobre as obras. Nestas formas, verificam-se as estratégias de venda
e as formas de produção e apresentação dos anúncios, atentando para quais impressos recebiam
mais destaques e de que maneira estes eram oferecidos aos futuros compradores. Dessa forma, é
apresentada ao pesquisador uma possibilidade de compreender maneiras em que foram elaborados
os anúncios nos jornais do século XIX, considerando a relação com a conjuntura histórica do período;
e as várias formas de circulação e aquisição da leitura.
Nesta pesquisa que ora desenvolvemos, temos como objetivo analisar a circulação de livros
sobre Instrução e Educação na imprensa paraibana durante o Império, buscando também identificar
e classificar títulos e autores e outros aspectos que envolvem os livros e os impressos na imprensa
paraibana do século XIX, na perspectiva da compreensão da história do livro a partir do processo de
produção, circulação e apropriação, bem como da circulação de ideias na imprensa.
A pesquisa sobre livros e imprensa constitui-se em caminhos variados da pesquisa histórica para
uma abordagem das práticas culturais e educacionais de uma sociedade em dado período histórico.
Assim, a história do livro e dos impressos e a história da leitura podem dar-se na direção à investigação
da representação das mensagens transmitidas pela palavra escrita. Na busca de dar visibilidade aos
livros, impressos e possíveis leitores, este estudo não trata tão-somente de levantamento de dados
quantitativos, mas sim de analisar o contexto da circulação das obras identificadas nos jornais da
província da Paraíba, embora se reconheça a importância da descrição dos dados.
Tomando o corpus nos jornais da Paraíba, mais especificamente no periódico O Publicador
(1864-1885), por ser considerado de maior circulação disponível na internet e por ser diário, o qual
se encontra disponível nos sites da Hemeroteca e do Jornais e Folhetins Literários da Paraíba no
Século XIX. Ao investigar os livros neste periódico buscamos arrolar os títulos, classificar as obras
e estabelecer textos. Também foi possível conhecer as estratégias anunciativas, de modo que foi
identificado n’O Publicador os anúncios e outras estratégias discursivas (avisos, notícias...) a fim de
saber a relação entre o livro e o leitor. Para isso, fez-se necessário relacionar o texto e o contexto do
jornal, considerando que o conteúdo neste suporte não se constitui em um objeto único e isolado.
Para tanto, este estudo primou, sobretudo, pela busca minuciosa de dados, que permitiu
reconstituir a história do livro e da leitura na Paraíba no Império por meio do preço de livros,
livreiros, lugares de vendas, tipografias, bibliotecas, leitores e etc. Tais aspectos nos possibilitou
expandir horizontes de abordagem e de ressaltar o quanto o livro, no sentido mais amplo, serve
como documento fundamental para estudos históricos.
Referências
ARAÚJO, Camila A. SENA, Fabiana. Os professores nos anúncios do jornal O Publicador (1864-1885)
da Paraíba. Revista Tempos e Espaços em Educação, São Cristóvão, Sergipe, Brasil, v. 10, n. 22, p.
93-104, mai./ago. 2017.
FREYRE, Gilberto. O escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX. São Paulo: Global,
2012.
NEVES, Lúcia M. B. P. Dos “avisos” de jornais às resenhas como espaços de consagração (1808-1836).
In: NEVES, Lúcia M. B. P. (Org.) Livros e impressos: retratos do Setecentos e do Oitocentos. Rio de
Janeiro: EdUERJ, 2009.
Introdução
As festas escolares constituem um dos elementos da cultura escolar nas instituições escolares,
são tradições que intentam rememorar datas históricas, homenagear personagens e reafirmar ideais
de ensino, de sociedade e de projeto político. As intencionalidades dessas práticas são muitas vezes
ditadas por quem as produziu, com a possibilidade que seus usos nas práticas cotidiana sejam
mantidos ou modificados pelos indivíduos que atuam no ambiente escolar. De acordo com Hobsbawn
(1984), estas tradições são invenções que pretendem inculcar valores e normas de comportamentos,
utilizando para tal, o procedimento da repetição promovendo uma continuidade com o passado.
Situamos neste trabalho, as festas escolares que tem o intuito de celebrar as datas religiosas
no contexto da cultura escolar, que compreendemos de acordo com os estudos do autor Julia
Dominique (2001) como
Entende-se por cultura escolar então, o conjunto de normas e práticas que são determinadas por
relações que não podem ser analisadas isoladamente, sem que se considere a “análise precisa das
relações conflituosas ou pacíficas que ela mantém, a cada período de sua história, com o conjunto
das culturas que lhe são contemporâneas: cultura religiosa, cultura política ou cultura popular.”
(JULIA, 2001b p.10).
O presente texto propõe investigar especificamente as festas escolares cuja motivação sejam as
datas que historicamente representam manifestações religiosas como a Páscoa e o Natal, a fonte
principal escolhida para esta pesquisa é uma Coletânea Didática produzida em fevereiro do ano de
1970, pelo setor de material didático da Divisão de Educação e Assistência e Recreio da cidade de
São Paulo, este material visava orientar as práticas pedagógicas dos Parques Infantis e era produzido
periodicamente muitas vezes incluindo sugestões das próprias educadoras dos Parques.
Contextualização
Os Parques Infantis foram criados em 1935, pelo escritor Mário de Andrade podem ser considerados
como a origem da rede de educação infantil paulistana compreendendo a faixa etária de três a seis
anos (Faria, 1999). Os primeiros Parques Infantis foram construídos nos bairros operários Lapa,
Ipiranga e Mooca e visavam proporcionar atividades educacionais e culturais as crianças com foco
na valorização da cultura nacional.
Uma das maneiras de garantir que as festas aconteceriam neste espaço encontram-se em um
dos itens do Regimento Escolar do Parque Infantil, orientações quanto a obrigatoriedade de os
funcionários participarem de “reuniões na chefia, festivais e outras realizações fora do parque” nas
quais observamos uma primeira normativa sobre a realização das festas naquele espaço, ainda
de acordo com o Ato de criação dos Parques Infantis no art. 58, do Capítulo III (Dos Divertimentos
Públicos) do Título IV (Da Divisão de Educação e Recreio) do Ato 861, estipulava:
Outro estudioso da cultura escolar, o autor André Chervel (1990) chama a atenção para a maneira
como a escola é produtora de uma cultura específica e singular que irá influenciar diretamente a
vivência desse indivíduo na sociedade. Afirma que o sistema “forma não somente os indivíduos,
mas também uma cultura que vem por sua vez penetrar, moldar, modificar a cultura da sociedade
global”. (CHERVEL, 1990a, p. 184).
Apresentando a escola como produtora de uma cultura específica e singular que irá influenciar
diretamente a vivência desse indivíduo na sociedade e ao pensar sobre o papel e as finalidades das
instituições, define que “a educação dada e recebida nos estabelecimentos escolares é, à imagem
das finalidades correspondentes, um conjunto complexo que não se reduz aos ensinamentos
explícitos e programados” (CHERVEL, 1990b, p.188).
Dessa maneira, podemos dizer que as festas escolares são um acontecimento frequentemente
anual, que não se estabelece sem reminiscência, sem a repetição do passado. (Ozouf, 1976). As festas
compõem a estrutura da cultura escolar e são pensadas para determinadas finalidades, de modo
que sua construção está subordinada a fatores externos que intentam disseminar valores e ideias.
Em pesquisa realizada junto ao acervo da Memória Documental da Secretaria Municipal de
Educação (SME) da cidade de São Paulo, é possível identificar inúmeros documentos que constroem
a trajetória dos Parques Infantis numa perspectiva histórica, trazendo informações sobre sua
organização, funcionamento, e também documentos que orientam as práticas pedagógicas nas
instituições servindo como uma espécie de guia para os educadores, alguns desses documentos
denominados como “apostilas”, eram ainda utilizados em formações com os profissionais que
atuavam nos parques no período de 1960 à 1970.
Um desses documentos, trata-se de uma coletânea didática produzida em fevereiro de 1970 com
150 páginas pela Seção Técnico Educacional/Setor de Material didático. Numa análise preliminar, é
possível perceber no decorrer do material que predominantemente as unidades tratam das datas
comemorativas na escola como aporte para a realização das propostas com as crianças, no que se
destacam a Páscoa, Natal e outras comemorações de natureza cívica. As orientações aos educadores
contam com explicações direcionadas aos profissionais sobre como trabalhar as temáticas, sugestões
de atividades para ilustração, recorte, canções temáticas, roteiro para dramatizações e histórias em
geral.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 316
O procedimento de pesquisa utilizado para análise das informações encontradas nesta coletânea
será o de análise da configuração textual, que permite enfocar os diversos aspectos constitutivos de
um texto, considerando que este
Compreendendo as instituições escolares como espaço onde se constrói uma cultura singular e
específica através de suas práticas educativas, o objetivo deste estudo é então compreender a quais
símbolos religiosos estas festas remetiam na época da publicação da coletânea, relacionando-os
com o conceito de cultura escolar retomado a partir de André Chervel (1990) e de Julia Dominique
(2001), uma vez que ao ser direcionado aos educadores dos Parques Infantis, esse material orientava
práticas e concepções pedagógicas.
Este material voltado a formação, indica em várias passagens sua intenção em valorizar as
festividades que tem como aporte comemorar as datas da páscoa e natal, trazem consigo uma
representação ideológica dominante ligada apenas a uma religião, sendo ela a Católica Apostólica
Romana. Vincula-se ainda a estas práticas educativas a disseminação de valores cristãos as crianças
de teor moral e religioso, a reafirmação de valores cristãos e a maneira como estes são vinculados
a virtudes, a ser uma boa pessoa, a ter um bom comportamento, tornando-se também através da
memória, modos de regulação do comportamento dos indivíduos perante a sociedade.
Referências
CHERVEL, A. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria &
Educação, Porto Alegre, n. 2, p. 177-229, 1990.
FARIA, Ana Lúcia Goulart de. A contribuição dos parques infantis de Mário de Andrade para a construção
de uma pedagogia da educação infantil. Educação & Sociedade, ano XX, nº 69, Dezembro/99.
HOBSBAWM, Eric A invenção das tradições. São Paulo: Paz e Terra, 1984.
JULIA, Dominique. A Cultura Escolar como Objeto Histórico. Revista Brasileira de História da
Educação, n.1, jan./jun., p.9-43, 2001.
MORTATTI, Maria do Rosário. Notas sobre linguagem, texto e pesquisa histórica em educação. In:
História da Educação. Pelotas, v. 6, p. 69-77, out. 1999.
OZOUF, Mona. A festa: sob a Revolução Francesa. In: LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre. História: novos
objetos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, p. 216-232.
ISSN 2358-3959
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alunos-aprendizes, suas normas acadêmicas e administrativas, o perfil do aluno que espera formar,
utilizando como modelo para análise a Escola SENAI Roberto Mange.
Localizamos também a tese de doutorado sob o título “A engenharia pedagógica: taylorismo
e racionalização no pensamento de Roberto Mange” de autoria de Augusto Zanetti (2001). A
pesquisa evidencia o conceito de trabalho e educação na concepção de Roberto Mange a partir da
racionalização e a produção taylorista.
Já o trabalho de Eraldo Leme Batista (2013) evidencia outro espaço de atuação e fala de Roberto
Mange, uma vez que estuda a concepção de educação profissional, defendida e divulgada pela
revista do IDORT (1931-1942). E com isso, a importância dos Intelectuais orgânicos da burguesia,
com ênfase à Roberto Mange, principal ideólogo dos estudos e propostas para a educação de um
trabalhador dócil, disciplinado e adaptável ao projeto societário burguês.
A partir da revisão de literatura ora delineada sobre a atuação de Roberto Mange, percebe-se a
relevância da pesquisa sobre a história dos intelectuais e engenheiros-educadores na estruturação
da rede de ensino industrial nas primeiras décadas do século XX. Desse modo, o estudo se propõe a
desvelar a relação entre o trabalho e a educação presente nos seus discursos e práticas educativas.
Assim, este trabalho trata-se de uma pesquisa no campo da história da educação profissional, a
qual utiliza-se o referencial teórico do materialismo histórico, bem como o referencial metodológico
referente à biografia histórica e ao método Indiciário (Ginzburg, 1986), uma vez que permite ao
pesquisador a análise dos fatos a partir dos indícios e pistas para compreensão dos fenômenos mais
gerais. Assim, busca-se a interpretação histórica na qual o passado se reveste do caráter histórico.
A partir disso, buscamos os indícios por meio das fontes históricas em disponíveis na Biblioteca
Nacional do Brasil, na qual localizamos periódicos como as revistas IDORT (1930 a 1955), Revista
Senai (1948-1949), Anuário Roberto Mange (1955-1961); acervo digital do Arquivo Edgard Leuenroth
na Unicamp onde encontramos “De homens e Máquinas” (Acervo pessoal de Roberto Mange:
inventário analítico) e a Politécnica São Paulo.
Nessa perspectiva, buscamos nesta pesquisa as evidências do racionalismo da concepção de
Roberto Mange envolto ao projeto dos agentes do ensino industrial em prol da constituição desse
campo no Brasil. Com isso, analisa-se a atuação do engenheiro-educador para contribuição nessa
constituição a partir da relação trabalho e educação (SAVIANI, 2000; 2007).
Nesse sentido, as concepções estabelecidas para essa pesquisa serão analisadas por meio de
uma abordagem de caráter bibliográfico e documental, com predominância de tratamento dos
dados através da interpretação histórica, a partir das categorias: intelectual (SIRINELLI, 1996; 1998),
sociabilidades (AGULHON, 1977), cultura política (BERSTEIN, 1998), trabalho-educação (CIAVATTA,
2019) e lugar, prática e escrita (CERTEAU, 2002).
A rede de sociabilidades de intelectuais e engenheiros-educadores difundiram a rede de agentes
em torno da organização racional do trabalho para o ensino industrial brasileiro em meados do séc.
XX. Nesse contexto, com o advento da industrialização, o projeto republicano avançava no país em
busca para a formação de instituições especializadas no ensino industrial. Assim, compreende-se as
práticas históricas enquanto práticas sociais.
Desse modo, a partir dessa compreensão, evidencia-se que o campo da história dos intelectuais
“tornou-se assim, em poucos anos, um campo histórico autônomo que, longe de se fechar sobre
si mesmo, é um campo aberto, situado no cruzamento das histórias política, social e cultura”
(SIRINELLI, 1999, p. 232).
Como resultados, evidencia-se que o suíço Roberto Mange vem ao Brasil à convite de Paulo Souza
para fazer parte da Escola Politécnica de São Paulo, visto que este era o berço dos industrialistas do
país. Este espaço traduziu-se no ambiente para a difusão de suas ideias por meio de conferências,
publicações, visitas técnicas e a prática docente.
Com isso, o engenheiro-educador revela-se enquanto um agente do ensino industrial, por meio
de seus espaços de fala e práticas no campo industrial, advindas de suas experiências americanas
e europeias. Dessa forma, difundia-se a formação para o trabalho com vistas à qualificação de
técnicos e trabalhadores em prol da produtividade do setor industrial. Sobre essa perspectiva,
compreende-se que “trabalho e educação são atividades especificamente humanas. Isso significa
que, rigorosamente falando, apenas o ser humano trabalha e educa” (SAVIANI, 2007, p. 152).
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 319
Mais tarde, Gustavo Capanema, ministro da educação convidou Roberto Mange para assumir a
direção do SENAI, cargo no qual assumiu as suas atividades durante as décadas de 40 e 50, haja vista
as experiências enquanto professor de Engenharia Mecânica na escola Politécnica de São Paulo,
bem como enquanto diretor do Instituto de Organização Racional do Trabalho (IDORT) no decorrer
dos anos 30. Nestes espaços, ele desenvolveu vários métodos para a formação e preparação dos
aprendizes às indústrias. À exemplo das publicações em torno dessas temáticas disseminadas pelo
IDORT, localiza-se os artigos intitulados “Preparação do fator humano para a indústria” e “Escolas
profissionais junto às indústrias” (ZANATA, 1991).
Nesse sentido, a concepção de ensino baseava-se na fusão da formação técnica (racionalidade)
e a educação integral dos sujeitos. O engenheiro-educador Roberto Mange realizou visitas técnicas
em países no exterior com o intuito de expandir os modelos e técnicas para a seleção e formação de
mão-de-obra, visto que esta era uma prática dos agentes do ensino industrial no Brasil neste período.
Desse modo, buscava também a formação e a seleção de pessoal para as ferrovias, bem como
defendia o método sequencial para a construção da eficiência e a disciplina dos jovens aprendizes.
Na publicação “De Homens e máquinas” (1991), evidencia-se uma carta do Ministro Capanema
no qual o mesmo eleva elogios ao trabalho de Roberto Mange no tocante ao desempenho quanto
ao contato com a Suíça sobre técnicos para a formação do ensino profissional no Brasil. Com isso,
destacou-se na tarefa de trazer ao país a modernização para a produtividade industrial.
Nesse intento, explorava-se a psicologia industrial por meio da abordagem da psicotécnica, na
qual a escolarização do trabalho industrial caracterizou a industrialização da escola. Dessa forma,
delineia-se em sua concepção uma pedagogia do trabalho voltada à preparação do fator humano
para a indústria.
Roberto Mange compreendia que a técnica não significa um valor absoluto ou até mesmo
indiferente às questões do espírito e das individualidades humanas, uma vez que acreditava na
formação crítica do sujeito, visto que o conhecimento só se renova a partir dessa criticidade. Assim,
evidencia-se Mange envolto à rede de agente de intelectuais, engenheiro-educadores em prol da
estruturação do campo industrial no Brasil, uma vez que estava preocupado com a formação de
trabalhadores mediante a relação educação e trabalho.
ISSN 2358-3959
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Este trabalho tem por objetivo analisar as propostas curriculares para o ensino de química para
a educação secundária do estado de São Paulo entre o final do período conhecido como “Regime
Militar” e o início da redemocratização, verificando os temas, os conteúdos, as sugestões de
práticas e as relações com o contexto social do período. A escola moderna se caracteriza por ser
um espaço de poder dentro da sociedade, no qual grupos ou classes antagônicas disputam não
apenas o direito à educação e das políticas educacionais, mas também da organização da escola, do
que deve ser ensinado e das práticas que devem ser adotadas pelos professores. Nesse sentido, o
presente trabalho se apoia nas concepções de Goodson (1997, p.17) de que “o currículo escolar é um
artefato social concebido para realizar determinados objetivos humanos específicos” e, portanto,
possibilitam a análise das disputas entre os grupos sociais. Diante disso, o currículo escrito é um
campo rico em informações já que “é o testemunho público e visível das racionalidades escolhidas e
da retórica legitimada das práticas escolares” (GOODSON, 1997, p. 20). Sendo assim, o currículo não
é apenas uma simples distribuição de conteúdos, mas se constitui, na realidade, em um conjunto
específico de ênfases e omissões. As análises apresentadas nessa comunicação se concentraram no
período de 1977 a 1988 devido aos programas de ensino de química de 1977, orientados sob a lei
5.692/71 que definia que o ensino secundário teria como proposta a formação profissionalizante para
as indústrias estrangeiras (HILSDORF, 2015), e de 1988 estavam sob a lei 7.044/82 que alterou alguns
artigos da lei 5.692/71 retirando o foco na formação profissionalizante. Nesse período a educação
era vista como um fator impulsionador da economia, pois, segundo Dermeval Saviani (2010), há um
aumento significativo nas publicações com relação a esse tema.
Para a pedagogia tecnicista, a escola e a organização dos conteúdos deviam ser feitas de forma
semelhante a um processo industrial já que nessa proposta a “educação será concebida como
um subsistema cujo funcionamento eficaz é essencial ao equilíbrio do sistema social de que faz
parte” (SAVIANI, 2010, p. 383). Diferentemente do método tradicional, centrado no professor, ou
da pedagogia nova que professor e aluno decidem sobre a utilização de determinados meios, a
proposta tecnicista valoriza o processo, assim como sua finalidade passa a ser a de aprender a fazer.
Além das ideias pedagógicas relacionadas à pedagogia tecnicista, outras concepções sobre
o trabalho pedagógico relacionado ao ensino das ciências começaram a ser discutidas. Nos anos
1980, a educação passou a ser vista como uma prática social tendo relações com os sistemas
políticos e econômicos e o ensino de ciências deveria contribuir para a transformação da
sociedade (NASCIMENTO; FERNANDES; MENDONÇA, 2010). Nesse contexto se justifica a análise das
permanências e das transformações do currículo e os possíveis nexos com a conjuntura social.
Como metodologia da pesquisa foi utilizada a análise qualitativa dos documentos que
apresentam as propostas curriculares de Química para o estado de São Paulo. Entende-se como
documentos “quaisquer materiais escritos que possam ser usados como fonte de informações sobre
o comportamento humano” (PHILLIPS, 1974, p. 187) e perante essa gama de opções se incluem como
fontes documentais “desde leis e regulamentos, normas, pareceres, cartas, memorandos, diários
pessoais, autobiografias, jornais, revistas, discursos, roteiros de programas de rádio e televisão até
livros, estatísticas e arquivos escolares”. (LUDKE; ANDRÉ, 2013, p.45). Foram analisados os programas
de química, mais especificamente, publicações oficiais da Secretaria do Estado de Educação e da
Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (SEE-SP/CENP). Os programas de 1977, 1978, 1979
e 1982 publicados após a lei 5.692/71 e o programa de 1986, 1988 após a lei 7.044/82. As proposições
curriculares foram analisadas buscando as permanências e suas modificações.
Vale ressaltar que nas publicações, além dos conteúdos conceituais, contém atividades para
alunos, orientações para prática do currículo e manuais de segurança em laboratório. Contudo, a
análise consistiu nas relações entre os conteúdos dos anos analisados com o propósito de identificar
a ocorrência ou não de variações; as atividades sugeridas, tais como experimentos, leituras e saídas
de campo e as ideias pedagógicas presentes nas propostas curriculares.
Os resultados da análise do currículo obtidos até o momento indicam que o documento
publicado em 1977 apresenta nesse momento um caráter de ensino para a formação profissional.
Para tanto estão presentes sugestões de atividades experimentais que ficam a cargo do professor
executar de acordo com a avaliação, tanto da capacidade cognitiva dos alunos com relação ao
conteúdo conceitual a ser ministrado, quanto da disponibilidade de recursos para a execução das
práticas experimentais. Apesar desta proposta curricular estar no âmbito da lei 5.692/71– que visa
a formação profissionalizante – a sugestão de realizar atividades experimentais para desenvolver o
hábito de investigação no aluno traz uma aproximação bastante grande com o discurso das práticas
pedagógicas relacionadas ao ensino pela descoberta e não ao ensino tecnicista - já que para isso o
foco deve estar sobre os processos - como era de se esperar.
Em 1978, com a publicação dos subsídios para a implementação das propostas curriculares
de química para o segundo grau, os princípios orientadores presentes no programa de ensino
não se alteram com relação ao que se propõe com relação ao método experimental, já que nessa
proposta todas as atividades são experimentais. As orientações pedagógicas com relação à prática
experimental ganham força, com isso é dada maior explicação ao que se pretende com o ensino
experimental. Algumas justificativas presentes nas orientações aos professores indicam a utilização
das atividades experimentais não apenas para a formação profissionalizante, mas para desenvolver
o raciocínio dos estudantes. Além disso, a experimentação, segundo o documento, faz com que os
alunos compreendam de fato os fenômenos estudados, não apenas memorizando as definições.
Após a promulgação da Lei 7.044/82, há uma mudança nos objetivos do ensino de 2º grau,
principalmente em relação à questão do trabalho. A visão de que as atividades experimentais são
fundamentais para o ensino de química é ampliada a partir do programa publicado em 1986.
Nessa lei a finalidade da escola não é mais a formação profissionalizante, mas a formação para
o mercado de trabalho, de forma mais ampla. Conjuntamente com a alteração das finalidades
propostas pela 7.044/82, a proposta para a disciplina de química também sofre alterações nos
princípios orientadores, ou seja, passa a conter “a experimentação como um dos momentos de
reelaboração do conhecimento; o tratamento do conhecimento científico sob uma perspectiva
histórica e; a análise crítica da aplicação do conhecimento químico na sociedade.” (SÃO PAULO,
1988, p.10).
Com relação aos temas e conteúdos presentes para a segunda e terceira série do ensino
secundário, as propostas curriculares orientadas pela lei 5.692/71 contém os seguintes temas:
extração de petróleo e hulha, metais e seus compostos na natureza e até um tópico denominado
“materiais – análise, obtenção e propriedades” (São Paulo, 1979, p.19). E, após a promulgação da lei
7.044/82 e com a modificação das propostas curriculares, os temas também sofrem alteração com
a introdução dos seguintes temas: a água na natureza, transformações químicas e na terceira série
majoritariamente o estudo dos compostos de carbono. A alteração nos conteúdos e o aparecimento
de temas como o estudo do carbono indicam a relação existente entre a sociedade e a educação.
Uma análise mais ampla mostra que os programas referentes à segunda e à terceira séries,
principalmente do período de 1978 a 1982, apresentam características bastante marcantes do ensino
tecnicista com etapas bem marcadas, as atividades experimentais focando nos métodos de execução
e nos procedimentos para chegar aos resultados . Com isso, professores e alunos perdem espaço
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 322
AS TRANSFORMAÇÕES NO CURRÍCULO DE
UMA ESCOLA SECUNDÁRIA NO BRASIL (1968-
2008): UM ESTUDO SÓCIO-HISTÓRICO
O objetivo deste trabalho é efetuar uma análise historiográfica do currículo escolar do ensino
secundário no Brasil, através da Unidade Escolar Francisco Vitorino d’ Assunção (UEFVA), instituição
de ensino localizada na cidade de Timon, Maranhão, Brasil, no período de 1968 a 2008. O processo
de reconstituição histórica tem como base, sobretudo, os estudos de Ivor Goodson (2018) em história
do currículo e das disciplinas escolares. No âmbito brasileiro, tomamos Souza (2008) é nosso como
principal alicerce da história e organização do trabalho e currículo escolar no século XX. A periodização
do estudo é decorrente da história e memória da instituição escolar. A UEFVA foi fundada em 1968,
na época como Ginásio ofertando o ensino secundário ginasial. Encerra-se em 2008, como Ensino
Fundamental, em virtude da periodização das fontes usadas no estudo. Os 40 anos propostos na
investigação são justificados pela história e memória da escola que teve suas atividades iniciadas
atendendo aos interesses da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961.
Em seguida, pela Reforma de Ensino da Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971 que realizou alterações
curriculares profundas impostas pela Ditadura Militar (1964-1985). No final do século XX, após a
redemocratização do país veio a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 determinando novas
Diretrizes Nacionais da Educação ao estabelecer mudanças e estabilidades no currículo do Ensino
Fundamental. Nesse contexto, ficamos inquietos com alguns questionamentos: Como foi a
organização curricular diante das flutuações sociopolíticas entre 1968 e 2008? Quais as disciplinas
escolares foram criadas para atender os interesses socais e políticos no período? A pesquisa
apresenta um caráter qualitativo, bibliográfico e documental. Para isso, os cerificados de conclusão
do curso e históricos escolares são entendidos nas visões de documento/monumento apresentadas
por Le Goff (2013). São produtos da sociedade, da época em que foram produzidos, carregando
sentidos e representações da organização do currículo entre os anos de 1968 e 2008. Nas
compreensões do currículo escolar como uma construção social, percebemos as alterações na
organização curricular da escola, desde sua fundação como Ginásio Bandeirante em 1968. No final
da década de 1960 a escola apresentava a seguinte currículo: Língua Portuguesa, Matemática,
História, Geografia, Ciências, Ed. Moral e Cívica (EMC), Ed. Física, Ed. Artística e Técnicas Agrícolas;
entre 1973 e 1978: Português, Matemática, História do Brasil, História Geral, Geografia do Brasil,
Geografia Geral, Ciências, EMC, Técnicas Agrícolas, Técnicas Comerciais, Programa de Saúde,
Organização Social e Política do Brasil (OSPB), Inglês, Ed. Artística e Ed. Religiosa; no final da década
de 1990: Português, Matemática, História, Geografia, Ciências, Religião, Inglês, Ed. Artística, Programa
de Saúde, OSPB e Desenho; e no início do século XXI: Português, Matemática, História, Geografia,
Ciências, Religião, Inglês, Artes, Ed. Física e Ética e Cidadania. De 1968 a 2011 o Brasil no âmbito
educacional passou pela implantação de duas LDB e uma reforma da educação básica em 1971. A
LDB 4.024/1961 procurou estabelecer um currículo formal no curso ginasial através de disciplinas de
caráter propedêutico e com orientações para o trabalho. Em 1971 com a reforma educacional da
Ditadura Militar pela Lei Federal Lei n. 5.692/1971 estabeleceu no ensino de 1º grau um currículo com
disciplinas escolares para uma sondagem de aptidões e iniciação para o trabalho. Daí uma ênfase
nas disciplinas técnicas de âmbito profissionalizante que marcaram a história da UEFVA na década
de 1970, tais como Técnicas Agrícolas e Comerciais. A reformulação curricular promovida pela
Ditadura Militar configura-se como um exemplo claro dos jogos políticos, de poder e controle como
fatores externos na construção do currículo. Nesse caso, o currículo do Ginásio Bandeirante tinha
por função social não apenas a escolarização dos jovens na cultura geral, mas a gama de disciplinas
de EMC, OSPB, Ed. Religiosa e Técnicas Comerciais, Agrícolas representavam as finalidades políticas,
sociais e ideológicas da Ditadura Militar na sociedade por meio das instituições escolares. Nas
Técnicas Agrícolas, disciplina escolar de maior legitimação e representação na sociedade timonense,
os alunos aprendiam todo o processo agrícola, desde a preparação do solo até a colheita dos
alimentos. A introdução das disciplinas profissionalizantes no currículo do Ginásio Bandeirante
desde a sua fundação em 1968 é fruto da inserção do tecnicismo no ensino secundário, realizado
com apoio dos 12 acordos firmados entre o MEC e Agency for International Development (USAID) dos
Estados Unidos da América (EUA), denominados historicamente de acordo MEC-USAID entre 1966 e
1968. As mudanças curriculares advindas do acordo MEC-USAID também são um exemplo que um
país subdesenvolvido busca “exemplos” para copiarem as suas instituições de ensino e currículos
oficiais, dos pais mais desenvolvidos, pelas pressões de agências internacionais de desenvolvimento,
como também por aspirações para o progresso e modernidade (FORQUIM, 1996). No currículo
escolar da UEFVA entre 1968 e 1978 havia também as disciplinas de EMC e OSPB. Ambas estabelecidas
pela Ditadura Militar como um instrumento político e pedagógico de seu projeto de pais nas
instituições escolares. A EMC foi estabelecida de forma obrigatória pelo Decreto-Lei nº 869, de 12 de
Setembro de 1969 através do Ministério da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar.
Por isso, as finalidades de uma disciplina escolar são de diferentes ordens, que podem variar desde
as religiosas, sociais, políticas e outras que podem ser de natureza para a socialização dos sujeitos
para uma aprendizagem ideológica, disciplina social e comportamentos (CHERVEL, 1990). A
organização curricular da UEFVA na década de 1990 é fruto dos embates políticos e sociais que
disputaram o currículo da educação básica na medida em que há criações, manutenções e extinções
de disciplinas escolares. Ao longo do início dos anos 2000, gradativamente as disciplinas de EMC e
OSPB foram “desmilitarizadas” e conteúdos incorporadas nas disciplinas de História e Geografia.
Por isso, no currículo da UEFVA entre 2005 e 2008 não apresenta EMC e OSPB. Na reestruturação do
currículo da educação básica, a LDB 9394/96 estabeleceu uma organização curricular para as escolas
em três dimensões: cultura geral, cientifica e cidadania (SOUZA, 2009). A lei foi formulada após o
Regime Militar sendo que o país vivia momentos de aberturas políticas, reorganização dos pilares
democráticos e liberdades dos movimentos sociais. A palavra de ordem no cenário político e
educacional era cidadania. Com essa tendência as disciplinas escolares foram se estruturando, ao
passo que o Estado determinava as políticas curriculares, como os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN), publicados em 1999, para finalidades de promover a partir de seus conteúdos curriculares a
cidadania nos alunos com meios de compreensão do papel do homem na sociedade, meio ambiente
e política. A introdução desse novo cenário na cultura escolar fez emergir na primeira década do
século XXI a disciplina escolar Ética e Cidadania como podemos verificar no currículo da UEFVA entre
2005 e 2008. Podemos compreender, então, o currículo da UEFVA não como algo fixo, estático e
imutável, mas dinâmico, social, histórico com continuidades e rupturas na medida em que as há
mudanças nas conjunturas e estruturas políticas e educacionais do país. Logo, a construção da
história do currículo escolar perpassa também a história da sociedade (GOODSON, 2018). Para, além
disso, as disciplinas escolares Português, Matemática, História, Geografia, Ciências, dentre outras
com estabilidades na organização curricular da UEFVA desde sua fundação em 1968 também passam
por processos de mudanças no interior da cultura escolar de cada disciplina. O trabalho permitiu
uma visão panorâmica, um sobrevoo na história do currículo escolar do Brasil no período de 1968 a
2008 com olhares voltados para uma escola localizada em Timon, Maranhão. A partir das fontes
bibliográficas e documentais da UEFVA foi possível perceber o quanto o currículo escolar é fruto de
uma construção social perante os contextos políticos, culturais e sociais de determinados períodos.
Contudo, compreendemos que o assunto não está esgotado, ainda há possibilidades de maiores
estudos e aprofundamentos da história do currículo e das disciplinas escolares ofertadas na
educação básica, na história da UEFVA. Como por exemplo, análises das diferenças entre o currículo
prescrito e o praticado pelo corpo docente. Até que ponto as diretrizes curriculares nacionais ao
longo da história da UEFVA produziram a cultura escolar das disciplinas escolares no interior da
escola? Essa é apenas uma de tantas perguntas que ainda carece de respostas e estudos.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 325
Referências
CHERVEL, André. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria &
Educação, v. 2, p. 177-229, 1990.
GOODSON, Ivor Frederick. Currículo: teoria e história. 15. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2018.
LE GOFF, Jacques. História e memória. Tradução Bernardo Leitão, et al. 7. ed. Campinas: Editora da
Unicamp, 2013.
SOUZA, Rosa Fátima de. História da organização do trabalho escolar e do currículo no século XX:
ensino primário e secundário no Brasil. São Paulo: Cortez, 2008.
ISSN 2358-3959
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O presente trabalho tem por objetivo compreender o relatório feito por Gildásio Amado sobre
as viagens pedagógicas que ele fez à França e à Inglaterra com o intuito de conhecer e estudar
experiências renovadoras no ensino secundário. Para tanto, a fonte primária do mesmo é o relatório
de viagem escrito por ele e publicado, em 1955, sob o título “Relatório de viagem do professor
Gildásio Amado sobre as reformas na educação da França e da Inglaterra” (AMADO, 1955). O autor
desse relatório era formado em medicina e professor do Colégio Pedro II e do ensino superior, mas,
a partir de 1956, passou a ser o titular da Diretoria do Ensino Secundário (DES) do Ministério da
Educação, quando teve um papel decisivo na instituição das classes secundárias experimentais,
que renovaram o ensino secundário brasileiro. Ocupou outros cargos administrativos de relevo no
campo da educação nacional como presidente da Comissão Nacional do Livro Didático (1947-1955)
e, a partir de 1968, como integrante da equipe de planejamento do ensino médio da Diretoria do
Ensino Secundário. No entanto, as viagens pedagógicas de Gildásio Amado à França e à Inglaterra
foram realizadas quando ele era professor do Colégio Pedro II e a publicação do relatório sobre as
mesmas foi enviado ao Ministro da Educação em janeiro de 1954 e publicado na prestigiada Revista
Brasileira de Estudos Educacionais (RBEP).
O relatório elaborado por Gildásio Amado é considerado uma representação dos sistemas de
ensino francês e inglês, em particular o ensino secundário, que deve ser analisado à luz dos jogos de
poder do seu autor. Na perspectiva historiográfica de Chartier (2002) que se adota neste trabalho, os
textos são representações do passado, que devem ser entendidos a partir dos limites e dos interesses
dos seus autores. Ao entender que o movimento pedagógico renovador da época investia em divulgar
e dar publicidade aos seus ideais, recorre-se ao entendimento de Carvalho (2007) que concebe o
ato de viajar e dar visibilidade aos relatos de viagens como ações indissociáveis para se alcançar a
propagação de ideais, estabelecer aproximações, divulgar iniciativas, ganhar novos membros e, por
fim, fortalecer interesses específicos. Ademais, Gildásio Amado e considerado um mediador cultural
que teve uma atuação muito ativa nos anos de 1950. As práticas de mediação cultural ocorrem com
atores diversos que possuem grande importância pela presença e papéis estratégicos na cultura
e na política de uma sociedade e, por isso, constituem redes de sociabilidade que estão ligadas a
interesses de grupos sociais aos quais pertencem (GOMES e HANSEN, 2016).
As ações de Gildásio Amado revelavam a sua busca do que era inovador na Europa no pós-guerra
no campo da educação e, em particular, no secundário. Por isso seu relatório das suas viagens
pedagógicas à França e à Inglaterra apresentam representações sobre o Plano Langevin-Wallon e as
classes nouvelles do sistema de ensino francês e o Education Act do sistema Inglaterra. No seu relato
da sua viagem pedagógica à França, Gildásio Amado, dá mais importância à Comissão Langevin-
Wallon, apesar de considerá-la bem conhecida no Brasil, do que ao ensaio pedagógico das classes
nouvelles. No entanto, deve-se considerar que, por meio da falta de aplicação do Plano Langevin-
Wallon, Amado analisa impasses do ensino secundário francês, constatando que o sistema tem
uma estrutura centralizada e burocrática, formada por várias instâncias e conselhos e conclui que
a base legal do ensino francês permanece o mesmo de antes da Segunda Guerra. Mas ele ressalta
que há inovação colocada em prática por professores e diretores, que introduziram métodos
conferindo ativismo aos alunos, especialmente nas classes nouvelles, bem sintetizadas por ele com
o devido destaque para o seu ineditismo. Essa experiência inovadora tinha como propósito otimizar
a atuação da orientação escolar, bem como proporcionar aos professores melhores condições
de trabalho pedagógico, afinado com o timbre da cultura moderna que emergia no pós-guerra e
nas necessidades sociais que surgiam, servindo inclusive ao Brasil pelo olhar de Amado, já que as
classes nouvelles são apropriadas pela experiência renovadora da educação secundária brasileira na
maioria das escolas públicas. O educador brasileiro relata também que a formação dos professores
das classes nouvelles era voluntária e feita no Centro Internacional de Estudos Pedagógicos (CIEP),
localizado em Sèvres, onde ele também assistiu aulas para sentir o espírito da nova pedagogia e
que o CIEP também acolheu vários educadores estrangeiros que buscavam aggioanamento nas suas
práticas educativas, inclusive professores brasileiros.
Em relação a viagem pedagógica à Inglaterra, o foco de Gildásio Amado recai no Education Act de
1944, sendo que dá relevo aos seus pontos principais: o fato de a Inglaterra já ter atingido o aumento
da obrigatoriedade do ensino e a importância da à formação moral e cívica e como isso pode ser
alcançado pelas atividades extracurriculares, a valorização do ensino técnico colocado no mesmo
patamar do humanístico ao possibilitar a transição entre os tipos de ensino e a importância das
aptidões individuais coordenadas pela orientação educacional para que isso fosse concretizado. E
quando analisa os três tipos de ensino secundário inglês, o ensino moderno é que ganha a maior
relevância justamente por se destinar a maioria dos estudantes e compreender várias modalidades
que abarcavam as diversas aptidões. Afinal, um dos critérios que tem grande relevância para
Gildásio Amado de forma explícita em seu relatório sobre ambos os países é o desenvolvimento
integral do aluno – físico, emocional, espiritual e intelectual. Assim, ele elogia os meios que tornam
esse desenvolver integral possível: a escola em período integral, número reduzido de alunos, o valor
dado aos trabalhos manuais, as atividades extracurriculares e a educação física, que acontece mais
fortemente na educação inglesa. E, a partir disso, ele critica a limitação brasileira ao focar apenas no
desenvolvimento intelectual e ao fato de cada período do dia dedicar-se a uma turma diferente, ou
seja, um ensino não integral. O que se colocou para Amado como indispensável para o sucesso da
Education Act foi a flexibilização e liberdade dada às escolas e professores para desenvolverem seus
currículos, horários, espaços e a responsabilização do Ministério da Educação inglês na garantia de
excelentes instalações e na formação de professores, assim como possuía um excelente e qualificado
serviço com as inspetorias educacionais, já que os professores eram uma grande demanda no
período pós-guerra. Além da formação dada pelos colégios, que equivale ao magistério no Brasil,
e pelas universidades que seria uma formação mais extensa, foram criados cursos de formação
emergencial.
Por fim, analisando o relatório das viagens pedagógicas de Gildásio Amado na França e na
Inglaterra, em meados da década de 1950, pode-se concluir que o educador brasileiro direcionou
suas observações tanto para as questões administrativas como para os modelos educacionais e que
algumas dessas ideias já circulavam no campo educacional brasileiro. Assim, ele conseguiu encontrar
respaldo nos sistemas de ensino da França e da Inglaterra para as questões que lhe inquietavam
no contexto educacional do Brasil como a rigidez burocrática, a dualidade do ensino técnico e
humanístico e o aumento da demanda pelo ensino secundário. Por isso, as bandeiras levantadas pelo
educador eram as da educação gratuita e de qualidade para todos e a flexibilização das escolas para
que estas pudessem trabalhar a partir das aptidões dos alunos. As visitas pedagógicas de Gildásio
Amado e o seu relatório sobre as mesmas, portanto, contribuíram para alinhavar a renovação do
ensino secundário no Brasil.
Referências
AMADO, Gildásio. Relatório do Prof. Gildásio Amado sobre as reformas da educação na França e
Inglaterra. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Rio de Janeiro, v.24, n.60, 159-197, out./dez.,
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XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 328
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Paulo: Cortez, 2007.
BARRETO, Raylane Andreza Dias Navarro. THOMAZ, Alice Ângela. Práticas Reformistas na Educação
Brasileira: a contribuição dos irmãos Gildásio e Gilson Amado. Revista HISTEDBR Online, n. 46, p.
264-277, jun. 2012.
CHARTIER, Roger. À beira da falésia: a História entre certezas e inquietude. Porto Alegre: Editora da
Universidade/UFRGS, 2020.
GOMES, Ângela de Castro; HANSEN, Patrícia Santos (Orgs.). Intelectuais mediadores: práticas
culturais e ação política. 1 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.
ISSN 2358-3959
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onde conduziu experiências que são relatadas no livro Une Ecole Nouvelle en Belgique, publicado
em 1915. Manuel Bergström Lourenço Filho foi um dos signatários do Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova, publicado em 1932, e assumiu a direção do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Nacionais em 1938. Estes são apenas fragmentos de tramas muito mais complexas representadas
pelas trajetórias profissionais prolíficas desses sujeitos.
No presente trabalho, exploramos como as trajetórias desses educadores, por meio de seus
deslocamentos geográficos/institucionais/temáticos, se cruzam em diferentes momentos e os
tornam parte de uma mesma rede internacional. Para tanto, a NEF atua como fio condutor e elemento
aglutinador para explorar tais conexões. O recorte temporal se concentra entre os anos 1910 e 1950,
período de grande atividade desses atores.
No que diz respeito às fontes, nos baseamos principalmente em documentação que compõe a
coleção da World Education Fellowship (nome adotado pela NEF em 1966) sob a guarda do arquivo
do Institute of Education da University College London, explorando correspondências, anais dos
congressos internacionais da NEF e as revistas associadas como a The New Era e a Pour l’Ere Nouvelle.
Nesses documentos, buscamos vestígios de Nieto Caballero, Julio Larrea, Faria de Vasconcelos e
Lourenço Filho. Aliada a essa documentação também cotejamos dados levantados na Hemeroteca
Digital da Biblioteca Nacional do Brasil, documentos da Associação Brasileira de Educação (ABE)
e amostras de revistas pedagógicas sul-americanas como a Nueva Era do Equador (editada por
Julio Larrea), La Obra e seu suplemento Nueva Era da Argentina (editados por J. Rezzano), ambas
aprovadas pela NEF como revistas associadas, e a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Além
das referidas fontes, fazemos amplo uso de bibliografia relacionada à produção intelectual e a
aspectos biográficos dos quatro educadores.
É possível perceber as intersecções nas trajetórias desses educadores em diferentes momentos,
lugares e formas. Por meio dos congressos internacionais ou em missões de estudo na Europa,
Estados Unidos e na América do Sul, os frequentes deslocamentos geográficos favoreceram as
interlocuções entre esses atores. Mas não apenas por meio da circulação de sujeitos foram feitas
essas redes. O intercâmbio também ocorria por meio das revistas pedagógicas. Esses vários formatos
de circulação (sujeitos/objetos/ideias) se somam e potencializam a constituição das redes.
As intersecções nem sempre se dão a partir dos encontros entre esses atores, mas também a
partir de itinerários comuns. Desta forma, também ganham relevância na análise a passagem por ou
troca de correspondência com instituições/organizações como o Instituto Jean-Jacques Rousseau e
o Bureau International d’Education, ambos na Suíça, ou o Teachers College da Columbia University,
nos Estados Unidos, e as missões governamentais ou cargos públicos que exerceram em seus países
ou a convite de outros governos.
Entre as idas e vindas por diferentes países e instituições, apreendemos a presença de Nieto
Caballero no Rio de Janeiro em 1925 e suas interlocuções com a ABE, e correspondências trocadas
com Larrea com a mesma organização nos anos 1930. Em 1945, em viagem por países da América do
Sul ministrando palestras, Larrea passa dois meses no Brasil e mantém contato com Lourenço Filho.
Este, por sua vez, faz várias viagens pela América do Sul e seu livro Introdução ao Estudo da Escola
Nova é traduzido para o espanhol. Vasconcelos viaja pela América Latina na segunda metade dos
anos 1910, incluindo em seu itinerário Cuba e Bolívia.
A partir das referidas fontes e buscando determinar de que forma esses educadores se conectam,
seguimos os traços deixados a partir dos quais vamos reconstituindo uma trama maior de conexões
internacionais. A exemplo do que Ginzburg e Poni (1989) chamam de “fio do nome”, reconstituímos as
trajetórias desses educadores em busca de intersecções de suas vidas. Os autores denominam este
método de “onomástico” e não o classificam como um procedimento novo. Como exemplo citam os
registros das paróquias rurais, nos quais ao lado do nome está o da casa agrícola e o da propriedade
cultivada. Nem sempre o historiador encontrará todos os dados que procura, no entanto, poderá
achar dados seriais “com os quais é possível reconstruir o entrelaçado de diversas conjunturas”
(GINZBURG; PONI, 1989, p. 174). Segundo os autores “As linhas que convergem para o nome e que
dele partem, compondo uma espécie de teia de malha fina, dão ao observador a imagem gráfica do
tecido social em que o indivíduo está inserido” (GINZBURG; PONI, 1989, p. 175).
As intersecções das trajetórias e os elementos que os aproximam e os colocam como partes
da mesma rede se dão em diferentes momentos e de formas diversas. Como alerta Fuchs (2007)
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 331
sobre as redes, essas conexões são frequentemente assimetricamente recíprocas, o que implica que
variam de intensidade, densidade e duração.
Estar atentos às redes que os indivíduos tecem é uma forma de perceber a amplificação que o
movimento escolanovista teve em diversos países, e apreendê-lo como um evento complexo, mas
dotado de peculiaridades, que se compôs em diferentes experiências resguardando as reflexões
que apontavam para uma educação nova, divulgadas, sobretudo, pela NEF. Nosso objetivo pauta-se
em compreender como Agustín Nieto Caballero, Julio C. Larrea, António Sena Faria de Vasconcelos
e Manoel Bergström Lourenço Filho teceram essas redes, produzindo e reproduzindo saberes que
buscaram transformar o modo como a escola educava.
Referências
BRASTER, S.; ANDRES, M. M. P. La escuela nueva en imágenes: fotografía y propaganda en The New
Era (1920-1939). Historia y Memoria de la Educación, v. 8, p. 97-145, 2018.
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VIDAL, D. G.; RABELO, R. S. A criação de Institutos de Educação no Brasil como parte de uma história
conectada da formação de professores. Cadernos de História da Educação, v. 18, n. 1, 2019.
ISSN 2358-3959
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educacionais de uma pequena cidade nos subúrbios de Chicago, os quais lhe deram carta branca
para experimentar suas próprias concepções pedagógicas. Em vez de aplicar seus métodos em uma
classe, Washburne pôde fazer das escolas públicas de Winnetka um laboratório educativo. No decorrer
de dez anos, ele conseguiu fazer de seu método uma experiência de reconhecimento internacional,
citada por pedagogos renomados e pelos principais jornais da época, tornando-se como Francis
Parker ou John Dewey, uma das figuras principais da educação progressiva estadunidense (GARDET,
2018). E isso se deu, principalmente, por suas viagens e participação em associações nacionais,
lhe permitindo uma ampliação de sua atuação profissional. Sobretudo quando professores,
representantes das escolas de Winnetka, passaram a fazer parte, a partir de 1925, do programa de
quase todos os congressos internacionais realizados pela New Education Fellowship (NEF), também
conhecida como Ligue Internationale Pour L’Education Nouvelle, importante organização criada
com o objetivo de promover a educação nova e desenvolver uma expansiva rede internacional de
colaboradores para difusão de seus ideais (RABELO, 2016). Os membros da NEF incluíam alguns dos
educadores mais importantes das décadas de 1920 e 1930, dentre eles: Dewey, Montessori, Decroly,
Ferrière (CLEWS, 2009). Por meio de suas publicações e de suas conferências internacionais, a NEF fez
circular “teorias, modelos, objetos e pessoas relacionados às pautas da Educação Nova, alcançando
lugares diferentes e agregando novos pesquisadores e entusiastas” (VIDAL; RABELO; p. 211, 2019).
Ao se filiar a essa organização, Washburne construiu sua rede internacional de conexões, trocando
afinidades científicas experimentais. A fim de melhor compreender a circulação internacional de
suas ideias pareceu-nos essencial um estudo das revistas Pour l’ére nouvelle e The New Era, ambas
periódicos fundadores da NEF, e principalmente pela ampla representatividade desses periódicos
em escala internacional. Essas revistas funcionaram como uma espécie de ponto de encontro de
ideias, aberta a todos que trabalhassem com a renovação educacional, nos moldes defendidos
pela NEF. Tratava-se de um espaço privilegiado de publicação destinado tanto aos educadores que
desejassem compartilhar suas experiências, quanto aos cientistas para apresentarem o progresso
de suas pesquisas, construindo assim, um repertório comum e partilhado de saberes experimentais
e teóricos. Considerando que “a transferência de um campo nacional para outro se faz por meio
de uma série de operações sociais”, que envolvem seleção, marcação e leitura (BOURDIEU, 2002)
interessou-nos saber: quem traduz as ideias de Washburne? O que se traduz de suas ideias? Com
que intenção? No processo de recepção de suas ideias que (re)interpretação lhes são dadas? Na
análise da documentação evidencia-se que as redes de sociabilidade tiveram importância ímpar
na circulação e apropriação do ensino individualizado de aritmética. Ao explorar essas redes pôde-
se restabelecer as conexões internacionais e intercontinentais que estavam desligadas e melhor
compreender como ocorreu a ampla circulação das experiências desenvolvidas e testadas em
Winnetka, que circularam para além de suas fronteiras, em um “espaço não fixado, criado por meio
de comunicações e viagens” (LAWN, 2014, p. 141). Em síntese, as publicações em periódicos oficiais
da NEF e as viagens internacionais de Washburne facilitaram a circulação de suas experiências para
além das fronteiras estadunidenses, por meio de revistas afiliadas que funcionaram como porta-
vozes da renovação pedagógica.
Referências
BOURDIEU, Pierre. As condições sociais da circulação internacional de ideias. Enfoques: Revista
eletrônica, Rio de Janeiro, v. 1, n. 01, p. IV – XV, 2002. Disponível em < http://www.enfoques.ifcs.ufrj.br/
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Disponível em <https://doi.org/10.1080/00309230701248271> Acesso em 15 set. 2019
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professor primário no Brasil (1920 – 1960). 285f. Tese (Doutorado em Educação). Universidade de
São Paulo: São Paulo, 2016.
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VIDAL, D. G.; RABELO, R. S. A criação de Institutos de Educação no Brasil como parte de uma história
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de Geografia, entre os anos de 1930 a 1970. Para tanto, usa-se como referencial teórico trabalhos
que, sob a ótica a ciência da história, procuram compreender a história da organização do trabalho
didático: ALVES (2015); ALVES e CENTENO (2009); BRITO (2012), dentre outros.
A metodologia adotada tem caráter qualitativo, a partir de pesquisa bibliográfica e documental,
envolvendo os seguintes procedimentos: 1) revisão de literatura, na qual buscou-se aporte teórico
em livros, artigos, dissertações, teses e outras fontes secundárias que abordem a temática; 2)
exame e descrição do compêndio “Geografia humana do Brasil” (AZEVEDO, 1950), evidenciando a
função desse instrumento no trabalho didático, para Azevedo, por um lado; por outro, procura-se
compreender como se articulam os conteúdos ali arrolados. Para tal, toma-se particularmente a
temática referente à questão ambiental, inserida no paradigma que relaciona terra/homem.
A comunicação está dividida em duas partes. Na primeira são apresentadas reflexões teórico-
metodológicas sobre a categoria compêndios, considerando que os mesmos, como referido
anteriormente, foram uma das mais importantes modalidades de textos escolares utilizadas no
ensino secundário, principalmente até a primeira metade do século XX. Nessa direção, é preciso
considerar as principais categorias que norteiam essa comunicação, a saber: trabalho, trabalho
didático, organização do trabalho didático, instrumentos do trabalho didático, compêndio. A segunda
parte descreve as condições de produção e o conteúdo da obra analisada, a partir do exame do
tema escolhido, buscando identificar quais as relações desse conteúdo com as teorias geográficas
presentes no momento histórico em destaque, e quais as propostas do autor para a utilização de
seus compêndios.
Com a análise do material foi possível constatar que a obra ainda apresenta as principais
características de um compêndio, a saber: conteúdo rigoroso, embora já apresentado de forma
sintética; utilização criteriosa e cuidadosa de ilustrações, em que pese não se tratar, ainda, de um
texto escolar ilustrado (as ilustrações serviam apenas para reforço do texto principal). Destaca-
se que as fotografias inseridas na obra foram produzidas pelo próprio autor, durante às diversas
excursões que realizou pelo Brasil. A estrutura do compêndio “Geografia humana do Brasil” está
organizada em três partes: a) Bases físicas; b) Fatores humanos; c) Fatores econômicos, e essa
organização confirma a influência da Geografia francesa e do possibilismo no pensamento do autor.
Nesse modelo de estrutura, o estudo geográfico é dividido em quadros, em que aos aspectos físicos
vão se sobrepondo os aspectos humanos e econômicos. Ao final de cada quadro apresenta-se
uma conclusão, que pode ser um conjunto de cartas que procuram demonstrar a relação entre os
elementos humanos e naturais; ou podem ser leituras de fim de capítulo, com trechos escritos pelo
próprio autor da obra ou por outros autores. Essas leituras de fim de capítulo se caracterizavam por
serem textos muito bem selecionados, pois deviam relacionar-se que está sendo tratado. Na obra
em questão, foram utilizadas leituras de fim de capítulo.
Esse compêndio ainda apresenta alentado número de páginas, o que o distancia da concepção
comeniana de manual didático. Pensados a partir da divisão do trabalho, os manuais didáticos,
criados por Comenius com o surgimento da Escola Moderna, foram criados com a finalidade de
garantir a transmissão do conhecimento, dadas as condições materiais da época (ALVES, 2015). Para
Comenius, o manual didático deveria apresentar conteúdos simplificados e resumidos, tratando
apenas das coisas necessárias e omitindo as que não têm importância, o que não é observado na
obra de Aroldo de Azevedo. A obra analisada apresenta um conjunto qualificado de conteúdo, que
para a época foi considerado modelo no que se refere a adequação ao Programa Oficial, rigoroso
critério metodológico e precisão de linguagem didática.
Além disso, a formação do autor no âmbito da Geografia francesa justifica sua trajetória e confirma
a valorização que Aroldo de Azevedo dava ao trabalho de campo. De acordo com o autor, por meio
das aulas de campo, os geógrafos poderiam ter uma melhor visão do espaço e a partir dessa prática,
compreender a trama das relações sociais que se estabelecem em determinado recorte espacial. Em
função disso, Aroldo de Azevedo foi o pioneiro nos estudos atualmente denominados de Geografia
Histórica ou Geografia Retrospectiva, que propõe a discussão rigorosa da relação do homem com
o meio, sendo este último considerado como elemento fundamental para compreensão da gênese
dos lugares.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 337
Referências
ALVES, G. L. Textos escolares no Brasil: clássicos, compêndios e manuais didáticos. Campinas, SP:
Autores Associados, 2015.
ALVES, G. L.; CENTENO, C.V. A produção de manuais didáticos de história do Brasil: remontando ao
século XIX e início do século XX. Revista Brasileira de Educação, v. 14, n. 42, p. 460-487, set./dez. 2009.
AZEVEDO, A. Geografia Humana do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1950.
CONTI, B. J. Aroldo de Azevedo. Boletim Paulista de Geografia, n. 50, p. 31-35, 1976. Disponível em:
<http://www.agb.org.br/publicacoes/index.php/boletim-paulista/article/view/1120>. Acesso em: 14
abr. 2019.
ISSN 2358-3959
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CONSTRUTIVISMO EM ALFABETIZAÇÃO
NO CURRÍCULO DA REDE MUNICIPAL DE
ENSINO DE SÃO PAULO (1985-1996)
Los sistemas de Escrituras en el desarollo del niño, resultado de suas pesquisas, no qual propõem
uma “revolução conceitual” no campo da alfabetização, deslocando o eixo da discussão desse
campo, antes centrado nos métodos de ensino, para os pressupostos em torno da aprendizagem da
leitura e da escrita, sobretudo pela criança.
No ano de 1985, Los sistemas de Escrituras en el desarollo del niño foi traduzido e publicado no
Brasil sob o título Psicogênese da língua escrita, tornando-se referência para as reformulações dos
currículos escolares das redes estaduais e municipais de diferentes localidades, até ser adotado
como referência em política de amplitude Federal, em 1996, com a publicação dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN). Isso não significa, porém, que o contato com a obra de Ferreiro e
Teberosky no Brasil tenha se dado exclusivamente em Língua Portuguesa. Textos de sua autoria,
em língua espanhola, já circulavam anteriormente no país pelos meios acadêmicos Desde então,
ainda que sofrendo alterações decorrentes de adaptações, processos de apropriação e articulações
com outras teorias, o construtivismo em alfabetização tornou-se a principal referência em políticas
públicas voltadas ao ensino inicial de leitura e escrita, configurando-se como teoria hegemônica na
organização dos currículos de alfabetização.
Inicialmente, quando se verificam os primeiros aspectos do construtivismo em documentos da
rede municipal de ensino de São Paulo, isso se dá em coexistência com algumas recomendações
concernentes aos métodos de alfabetização (analítico e sintético), como se verifica em Programa
de 1º Grau – 1ª à 4ª série (1985), programa de ensino fruto de um redirecionamento curricular
proposto pela equipe que compunha a SME durante a gestão do prefeito Mário Covas (1983-1985).
O tensionamento entre as “novas bases teóricas” e a permanência dos métodos de alfabetização)
pode ser entendido também como um movimento de ecletismo teórico e metodológico, que tinha
como objetivo uma ação conciliadora entre método e os novos entendimentos que estavam sendo
adotados com relação aos pressupostos teóricos de base construtivista.
No ano de 1985 Jânio Quadros foi eleito prefeito de São Paulo e passou a dirigir a prefeitura
a partir de 1986, com um mandato vigente até 1988. Em decorrência desse fato, os quadros,
nomenclaturas e estrutura de SME são profundamente modificados. Entre diferentes mudanças,
as equipes da recém-renomeada Secretaria Municipal de Educação e do Bem-Estar Social (SME-
BES) passaram a propor novas bases curriculares para o município. A partir da publicação dos
documentos Repensando a prática de alfabetização (1986) e Orientação para classes de 2ª série -
língua portuguesa (1986), Propostas alternativas de alfabetização (destaque: Emília Ferreiro) (1987)
e Alfabetização - os primeiros dias de aula na 1ª série do 1º grau (1988) observa-se a ampliação do
referencial construtivista e piagetiano nas reorientações curriculares da rede municipal de São
Paulo, de modo que alguns aspectos do interacionismo linguístico também coexistam. Esse processo
mostra um modo específico de inserção do construtivismo em alfabetização na perspectiva de
Ferreiro e Teberosky na rede, que se centra no investimento de alguns pontos específicos dessa
teoria, como as hipóteses infantis sobre a escrita alfabética.
Desde os documentos produzidos durante a gestão de Mário Covas (1983-1985) o interacionismo
linguístico aparece como prescrição para o ensino de Língua Portuguesa, sobretudo com relação
à leitura, à produção de texto e análise linguística. Esse referencial teórico aparece de modo
convergente com o construtivismo em alfabetização desde então, mas ganha força na rede no início
da década de 1990, sobretudo com a mudança de equipes em função de nova administração pública,
gestão da prefeita Luiza Erundina (1989-1992), que é marcada por professores e pesquisadores
ligados diretamente às proposições interacionistas linguísticas, como é possível perceber a partir
da publicação de Critérios de avaliação das primeiras séries (1989), Cadernos de formação: 01-
grupos de formação - uma revisão da educação do educador - série grupos de formação (1990) e
Movimento de reorientação curricular: documento 1 – português – visão da área (1992). Os últimos
documentos curriculares de Língua Portuguesa propostos ao final da gestão da prefeita Luiza
Erundina (1992), integrantes do denominado Movimento de Reorientação Curricular, trazem uma
ideia mais naturalizada do construtivismo em alfabetização, sobretudo pelo trabalho dos grupos de
formação de professores, coordenadores pedagógicos e diretores de escola realizados em 1989 e
1990, de sorte que os últimos documentos enfocam aspectos do interacionismo linguístico de forma
mais aprofundada.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 340
O que se verifica também é que, no período estudado (1985-1996), os sujeitos envolvidos com
as reorientações curriculares do município de São Paulo guardavam estreita relação com a rede
estadual de ensino.
A análise parcial desses documentos, portanto, tem possibilitado compreender que, por meio
de um movimento gradativo de adoção dessa teoria, se consideram os processos de formação
continuada de professores e currículos escritos, como mecanismos/estratégias de convencimento
quanto ao referencial teórico construtivista em alfabetização nos currículos de Língua Portuguesa
no município de São Paulo.
CHERVEL, André. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria &
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SÃO PAULO (Município). Propostas alternativas de alfabetização (destaque: Emília Ferreiro). *A1.1/20,
1987.
em apenas alguns deles. A significativa variação do número de incidências das categorias nas
dissertações não impediu que elas funcionassem como ponto de articulação entre os trabalhos, de
forma a possibilitar uma análise comparativa, identificando as diferentes tendências e as
representações recorrentes. As representações identificadas foram assim agrupadas: curso de
pedagogia; currículo de pedagogia; habilitações; estágio; pós-graduação e universidade; educação
e sistema educacional; profissionais da educação; curso superior de educação; faculdade de
educação; tecnicismo e educação tecnicista. Além das unidades de análise, foram também
identificadas unidades de contexto, que segundo Moraes (1999), são indispensáveis para a
compreensão das representações firmadas. Como as pesquisas, apesar de abordarem temas
correlatos, têm configurações muito distintas, a análise não esteve voltada aos resultados ou
conclusões de cada pesquisa. Como referencial teórico fundamental, a análise contou com Pierre
Bourdieu (2004) para quem o campo científico é um espaço dinâmico de forças e de disputas, e
Roger Chartier (1990) que define representações como práticas sociais fundadas em categorias
compartilhadas que permitem compreender, classificar e atuar sobre o real. A análise das
representações possibilitou identificar pontos de interseção, conexão e oposição que demonstram a
posição dos trabalhos e de seus autores no campo científico. Constatou-se que na UFPR, no período
de 1977 a 1983, havia uma intersecção entre os estudos que vinham sendo realizados sobre o
conceito de currículo e suas aplicações, e os estudos realizados sobre o Curso de Pedagogia. Havia
uma mistura de papéis e de processos institucionais e científicos que possibilitavam estas áreas de
intersecção. Como um grupo de professores que havia ingressado no Curso de Mestrado, optou por
investigar o seu próprio contexto de trabalho e, desta forma, estudar um processo em que estavam
diretamente implicados e que era de natureza curricular, o estudo científico e as propostas
institucionais coexistiam e dialogavam. Os trabalhos defendidos em 1980 e 1983, por sua vez,
apresentam pontos de conexão e de divergência, o que permite inferir que havia um debate
institucional sobre a formação dos especialistas no Curso de Pedagogia. Em um contexto político
ainda ditatorial, apesar dos processos de distensão e abertura, percebe-se que as relações
institucionais estavam marcadas pela imposição de modelos, o que dificultava o posicionamento
divergente ou de oposição. No entanto, no campo científico era possível afirmar o posicionamento
divergente, o que fazia com que as dissertações pudessem ser utilizadas como recursos táticos para
o questionamento do trabalho realizado no Setor de Educação, muitas vezes pelo próprio autor do
trabalho, o que demonstrava que o campo, ainda que de implantação recente, possuía algum grau
de autonomia. Em 1988, vê-se que os novos parâmetros constitucionais para o Ensino Superior
influenciavam a produção científica, trazendo novas questões para o debate. Na década de 90 os
dois trabalhos que trazem à tona a discussão sobre o Curso de Pedagogia representam novamente
uma situação de oposição. Seguindo linhas epistemológicas diferentes, tem-se um trabalho
declaradamente conservador enquanto o outro propõe uma mudança de paradigma para a formação
e atuação dos pedagogos. Para além das lutas entre as diferentes representações constituídas e
defendidas, é possível verificar a dinâmica de oposições e conexões em quatro aspectos constitutivos
dos trabalhos realizados: metodologia, conceitos, posicionamento político e propostas. Percebe-se,
ao final desta reflexão, que as representações sobre o currículo e o Curso de Pedagogia podem ser
utilizadas como um meio para compreender o enredamento entre o contexto de atuação profissional
e a produção discente que houve na UFPR no período compreendido entre os anos de 1977 a 1997,
e em especial nos anos de 1980 e 1983, quando se concentraram as defesas dos trabalhos das
primeiras turmas matriculadas no PPGE, que pelo momento histórico vivenciado, parecem ter sido
influenciadas pelo Movimento Nacional de Reformulação dos Cursos de Formação dos Profissionais
da Educação. A análise das intersecções entre o posicionamento de diferentes grupos que coexistiam
em um mesmo campo científico e as relações de convergência e de oposição entre as diversas
representações, demonstrou que é necessário, para se visualizar os diferentes posicionamentos
políticos e epistemológicos, recorrer a algumas representações correlatas, uma vez que havia um
consenso estabelecido sobre a inadequação do currículo e do Curso de Pedagogia. Sendo assim, o
posicionamento sobre questões como as diferentes habilitações, o estágio, a pós-graduação e a
universidade, a educação e o sistema educacional, os profissionais da educação, o projeto do Curso
Superior de Educação, a Faculdade de Educação, o tecnicismo e educação tecnicista são fundamentais
para inferir nuances às representações de ordem mais geral, e estabelecer relações mais sutis entre
os sujeitos que forjavam e movimentavam estas representações na direção dos efeitos pretendidos.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 343
Referências
BARDIN, Lawrence. Análise de Conteúdo. Trad. Luis Antero Reto, Augusto Pinheiro. São Paulo:
Edições 70, 2011.
BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. Texto
revisto pelo autor com a colaboração de Patrick Champagne e Etienne Landais; tradução Denice
Barbara Catani. São Paulo: Editora UNESP, 2004.
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Trad. Maria Manuela
Galhardo. Rio de Janeiro/Lisboa: Bertrand Brasil/DIFEL, 1990.
MORAES, Roque. Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, v. 22, n. 37, p. 7-32, 1999.
O presente artigo tem como objetivo central analisar as formas pelas quais a educação com o
corpo foi sendo introduzidos nas instituições educacionais no Brasil, na primeira república, em
especial nas escolas normais. A metodologia utilizada para a realização do trabalho foi a pesquisa
bibliográfica e documental. Para realizar as discussões aqui propostas, utilizaram-se como aporte
teórico, os seguintes autores: Monarcha Carvalho (1998 /2000), Nery (2008), Silva (2019), Rodrigues
(2019), Ozelin (2010) e outros. Nos anos iniciais do século XX, houve um avanço de doenças
infectocontagiosas, que ocorreram pelo aumento populacional nos centros urbanos. Dessa forma,
as escolas primárias passam a se preocupar com aspectos higienistas para controlar doenças e evitar
suas proliferações, portanto, políticas sanitárias passam a surgir com esse fim. Ações governamentais
entram em vigor para que melhorias nas instalações e aspectos gerais de convívio passem a ser
tomados, desde higiene fisiológica, passando pela moral e chegando à limpeza sanitária. Para tais
fins, a construção de um indivíduo que passasse a refletir sob esses âmbitos, traria uma capacidade
à longo prazo de propagação pessoal e comunitária de condutas que contribuíssem positivamente à
sociedade no geral. Vale ressaltar também, a busca por homens mais fortes e civilizados, que
trouxessem concepções melhoradas e mais desenvolvidas sobre um homem que nascia com a nova
República, e que precisava fortalecer sua identidade para que ocorressem mecanismos de se
estruturar uma nova população. Pensando em como eram as condições das escolas e as formas de
suas organizações, manuais passam a ser desenvolvidos para nortear as condutas dos professores,
e uma inspeção escolar sanitária passa a acontecer. Todas essas normas, eram definidas por médicos
que treinavam os professores e diziam as maneiras como deveriam agir e passar as informações e
regras que passariam a fazer parte da estrutura social. “Um bom ensino de higiene, ministrado nas
escolas primárias e secundárias, seria talvez o melhor meio de difundir diretamente pelas famílias os
conhecimentos de profilaxia contra doenças contagiosas e de regras práticas e úteis de boa higiene”
(SACADURA, 1906, p. 11). As recomendações referem-se principalmente a prevenção das doenças,
objetivo que se tornou obsessão da medicina depois das descobertas de Pasteur e Koch. Dentro
desse contexto, outro elemento importante retrata a preocupação com o corpo que vai sendo
disseminado no século XX, as escolas de formação de professores, denominadas escolas normais. As
discussões frente ao tema é notório nesse período e além das escolas primárias, secundárias e dos
professores que atuavam, era necessário formar a consciência, daqueles que ainda estavam em seu
processo de formação, os então futuros professores, para tanto, dentro de algumas revistas criadas
por alunos das escolas normais, também vê-se a efervescência por um cuidado com o corpo, uma
vez que esse estava diretamente relacionado com os princípios da primeira república, ou seja, uma
sociedade moderna. Para a elaboração deste texto, foram utilizadas como fontes principais, as
escritas por alunos das escolas normais, a saber: o periódico Excelsior! (1911-1916) e a Revista O
ESTUDO (1922-1931), elemento que delineia e justifica o recorte temporal da presente análise, que foi
e pautada no que meados do século XX propõem quando se trata de sociedade, como mencionado
no presente texto e que ainda. Para tanto, o texto aqui proposto analisa quais artigos estavam
presentes nessas revistas e quais deles apontam para um cuidado com o corpo. E ainda sobre o
contexto republicano, pode relatar que no início da primeira república, o Brasil vinha passando por
uma série de modificações no se que remente as ordens sociais, econômicas e políticas, entretanto,
os fatos mencionados aqui não são unidades isoladas, torna-se parte uma história, ao qual vem sido
construída no império e transpassado para a primeira república. A sociedade brasileira, ainda que
com suas peculiaridades em casa região, através das ações transformadoras direcionava-se para a
modernidade e as escolas normais no país, vem dando suporte no que se remete a essa ordem. E são
dentro dessas instituições educacionais, aos quais aparecem os impressos educacionais escritos
por alunos e também alguns por professores. Entretanto, o que se destaca na presente análise é a
presença de conteúdos que estavam sendo trabalhados pelos professores das escolas normais,
nesse momento denominado como lentes, ganhado espaço em uma revista escrita por alunos e
alunas das escolas normais. Apresentando indícios de que os conteúdos ensinados pelos lentes,
estavam sendo adquiridos pelos alunos (futuros professores) e também estavam circulando nas
instituições de ensino, uma vez que os alunos publicam conteúdos que estão presentes em
documentos normativos como os currículos escolas e em impressos escritos por professores,
aproximando- nos do que estava acontecendo naquele momento, ao que se remente conhecimento,
circulação de saberes e principalmente a processos higienistas que tomava conta da sociedade da
época. Ao tomar como fonte revistas de regiões distintas, sendo uma do estado de São Paulo e outra
do Rio Grande do Sul, pode-se compreender qual era a visão de corpo, higienização que os alunos
(futuros professores) das escolas normais estavam tomando para si, no momento. Torna-se
importante ressaltar que uma série de modificações ocorreram no processo império e república,
ainda que aqui toma-se como base apenas a república tudo ocorreu por um processo, e dentro
dessas modificações, as questões cívicas também rumina nas escolas, nos discursos e
sociedade. Sobre a revista da escola normal de São Carlos a Excelsior! Silva (2019), aponta: “[...] é
possível notar a importância dessa revista, uma vez que ela nasceu juntamente com a Escola Normal
de São Carlos e com o objetivo de estreitar o vínculo entre a comunidade escolar e a comunidade
externa.”, ou seja, é possível perceber que assim como a revista foi criada em 1911, a escola normal
de São Carlos também foi, essa que por sua vez, tinha no momento grande influência política. A
revista era organizada por alunos e alunas da escola normal de São Carlos e distribuída gratuitamente,
mas esse não eram os únicos agentes que escreviam nelas, além de que o processo de seleção e
revisão da revista ficava sob os cuidados dos professores, como indica Nery (2008), mas a revista
recebe atenção também pelo fato de ser criada antes mesmo da revista dos professores da escola
normal de São Carlos. É possível observar que nesse momento no Brasil, ocorre um investimento
alto no que se remente a formação higienistas. Criou -se em 1918 o instituo de hygiene, que segundo
Ozelin (2010) “O Instituto de Hygiene teve atuação importante na elaboração de estratégias que
tinham como objetivo divulgar hábitos de higiene no ambiente escolar por meio da formação
profissional dos professores primários e de agentes de saúde pública, além da produção de impressos
destinados às crianças das escolas primárias e seus professores.”, além disso, a autora menciona
diversos cursos, palestras com esse tema que ocorrem, em especial direcionado aos professores no
estado de São Paulo. Nota-se assim, uma estratégia política para disseminar os cuidados com o
corpo. Em 1912, nota-se nos currículos uma matéria denominada História Natural, Anatomia,
Pyscologia e noções de higiene e em 1920 os currículos recebem uma reestruturação recebendo a
matéria de higiene. Os impressos dessa escola, escritos por alunos também apresentam questões de
hygiene. Sobre essa questão de cuidado com o corpo e a revista os autores, Hayashi; Hayashi, Arce,
Chiari e Menochelli (2011, p. 234) apontam que “ Periódicos educacionais que privilegiavam em suas
páginas artigos sobre educação moral, civismo e higiene e eram publicados pela própria Escola
Normal também compunham o acervo da biblioteca, entre eles a Revista da Escola Normal de São
Carlos (1916- 1923) e o Raio Verde (1917- 1918). O acervo ainda acolhia os periódicos Excelsior! (1911-
1916). O Estudo (1917), O Sorriso (1929), [...].Ou seja, a busca em disseminar conteúdos de cuidados
e higienização com o corpo vai ganhando espaço nas escolas normais do país e além disso, a busca
por uma sociedade moderna leva a ações que promovam tal cuidado. Encontra-se na revista O
Estudo, assuntos retratando a higiene e sua prática, como um texto intitulado “Sentidos-Hygiene
dos orgaos e dos sentidos – sentido da visão – importância da visão – cultura da visão”, nesse texto
retrata os sentidos dos orgãos, e a necessidade de bons costumes de higiene, classificando sugestões
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 346
de cada parte do corpo. Os métodos utilizados para ministrar os referidos conteúdos da revista
estavam pautados na experimentação e entendimento. Nesse sentido são destacados aqui os
conteúdos encontrados referentes à formação de professores: fisiologia humana, higiene, higiene
escolar e ginástica. Nesse sentido, Machado e Schelbauer (2008) destacam que os conteúdos das
escolas que deveriam não só fornecer o que formariam o espírito de professor, através de uma
elevada cultura, como também era fundamental que existissem conteúdos que tivessem como
finalidade disciplinar suas qualidades educadoras e moralizadoras. Assim sendo, na revista O Estudo
encontram-se texto de alunos e futuros professores com temas de higiene; higiene e saúde pública;
higiene mental na escola; higiene e educação no ensino supletivo; e plano de higiene para grupos
escolares, para com isso realizar o desenvolvimento integral do aluno, baseado nas “diretrizes da
Educação funcional” da época aqui estudada.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O trabalho aborda a história do ensino da leitura e da escrita no Espírito Santo, Brasil, no período
de 1946 a 1960. Para isso, analisa modelos desse ensino que circularam por meio de cartilhas
escolares, prescritas e/ou utilizadas na escola primária, no período de vigência da Lei Orgânica
do Ensino Primário (Decreto-Lei n. 8529/1946) e investiga sentidos das ilustrações da natureza,
materializadas nas cartilhas, em relação aos textos escritos para o ensino da leitura e da escrita.
Utiliza como fontes principais cartilhas e legislações federais e estaduais relacionadas à organização
do ensino primário. Teórica e metodologicamente o trabalho se ancora em princípios da História
Cultural, principalmente, nas reflexões de Roger Chartier (1996). As normatizações escolares e as
cartilhas registram a memória escolar de seu momento histórico, pois são compreendidas como
fontes depositárias de representações acerca de modelos de ensino da leitura e da escrita tidos
como adequados para ensinar as crianças a ler e a escrever, além de nos oferecer pistas de ideias
pedagógicas e didáticas, orientações metodológicas e políticas educacionais que foram privilegiadas
no espaçotempo delimitado.
O trabalho de Campos (2008) mostra que o método global (palavração, sentenciação e/ou
historieta) foi utilizado nas escolas primárias capixabas, a partir do uso de diferentes cartilhas, a
saber: Cartilha Moderna (método da palavração), Cartilha Sodré (método da sentenciação), Cartilha
de Bitu (método da sentenciação), Lalau, Lili e o Lôbo (método da historieta) e O livro de Lili (método
da historieta). O diálogo com as fontes documentais mostrou que, no período pesquisado, apesar de
as cartilhas demonstrarem aparentes diferenças nos modos de propor o trabalho com o ensino da
língua portuguesa, a análise comparativa permitiu inferir que a concepção de linguagem ancorava-
se na abordagem associacionista que reduz a linguagem e a sua apropriação ao nível sensorial e
fisicamente observável.
Assim sendo, ambos os autores reconheciam a linguagem como um sistema fechado em que
os elementos constitutivos não dependiam um do outro, ou seja, a gramática e a semântica eram
constituintes independentes, logo a forma precedia o significado que se apresenta com um sentido
unívoco e isolado da “[...] totalidade do fenômeno lingüístico e do conteúdo sócio-histórico-
cultural” (GONTIJO, 2002, p. 6). Dessa forma, os alunos se apropriavam da linguagem por meio da
pura imitação que requeria capacidade de associação mecânica, passiva e repetitiva. Esse modelo
de ensino nos remeteu a considerar que a aprendizagem da língua se operacionalizava, na escrita,
pela capacidade de codificar os sons da fala, transformando-os em sinais gráficos e, na leitura, pela
capacidade do indivíduo de reconhecer a letra e seu respectivo som. Assim, o aluno só conseguia
ler com compreensão quando tivesse possuído o domínio mecânico da decodificação do sistema
alfabético de escrita.
Podemos observar, com o estudo de Braggio (2005), os vários aspectos que caracterizam esse
modelo de ensino da leitura e da escrita para a prática em sala de aula: o controle da aprendizagem;
a decisão, por parte do professor, de quando e como o aluno deve aprender; a apresentação
de sentenças descontextualizadas para a criança; a ênfase nas questões gramaticais e não na
semântica; a concretização da leitura, para a criança, só pode ocorrer da esquerda para a direita; a
necessidade de pré-requisitos para aprender a ler (coordenação motora, discriminação perceptivo-
visual, lateralidade, espaço etc.); a interação verbal e visual entre aluno/aluno e aluno/professor é
cerceada.
Desse modo, compreendemos que o modelo de ensino da leitura e da escrita, fundamentado na
visão associacionista, instaura e legitima procedimentos sistematizadores e universais que impedem
as crianças de se tornarem sujeitos de seu próprio discurso e de se apropriarem da língua como
mais um instrumento para a tomada de consciência da realidade. Logo, esse modelo de ensino que
circulou nas escolas primárias capixabas, no período de 1946 a 1960, serviu de poderoso instrumento
nas mãos daqueles que detinham o poder econômico e político, pois tinha como finalidade “[...]
anestesiar a consciência do[s] indivíduo[s], tornando-os leitores passivos, acríticos, mantenedores
do status quo [...]” (BRAGGIO, 2005, p. 3).
Cabe destacar que apesar das aparentes distinções nos modos de ensinar a leitura e a escrita, os
textos materializados nas cartilhas permaneceram com uma linguagem extremamente limitada, as
lições com a mesma sequência, repetição de palavras idênticas e falta de significação das palavras
escritas. Essa permanência era devido ao fato de que os autores das cartilhas continuavam acreditando
que esse modelo de trabalho com a língua portuguesa ajudava os alunos na aprendizagem, pois
esta era concebida como um processo de imitação e associação entre objetos. De modo geral, o
método global propunha que o ponto de partida para o ensino da língua portuguesa fosse com as
unidades maiores da língua para, sequencialmente, decompô-las em unidades menores; porém
o modelo de ensino dependia do que se considerava como unidades maiores da língua. Alguns
compreendiam que era a palavra; outros entendiam que era a sentença e, assim, construíram
o método da sentenciação que inicia o ensino com sentenças inteiras para depois dividi-las em
palavras e, finalmente, em sílabas e letras. Houve ainda aqueles que acreditavam que a unidade
maior da língua era a historieta. Esses, por sua vez, formularam o método da historieta, que começa
com a leitura de histórias, completando-se com a sequência anteriormente descrita.
Autores, como Yolanda Betim Paes Leme de Kruel (Cartilha Moderna), compreendiam que a
unidade maior era a palavra. Ao ressaltar que o princípio basilar do ensino se constituía na palavra,
é possível entender, de acordo com Braggio (2005), que a palavra era tida como tendo relação
direta com o seu referente, uma vez que o aluno aprendia a representação da palavra por meio da
associação entre a emissão sonora e a imagem do objeto. Por sua vez, a imagem era tida como
motivadora para a aprendizagem das palavras.
Outros autores, como Benedicta Stahl Sodré (Cartilha Sodré) e Rafael Grisi (Lalau, Lili e o Lôbo),
entendiam que era a sentença e, assim, usavam o método da sentenciação que inicia o ensino com
sentenças inteiras para depois dividi-las em palavras, sílabas e, finalmente, analisar os valores
fonéticos das letras. A Cartilha Sodré, por exemplo, em sua primeira lição apresenta uma gravura que
representa um animal, com a finalidade de ilustrar, especificamente, a ação descrita na sentença que
vem a seguir: “A pata nada”. Uma sentença com sintaxe simples, o que dar a ler traços de postulados
de teorias behavioristas que enfatizavam que a aprendizagem deveria iniciar-se do mais simples
para o mais complexo. Posteriormente, destaca as palavras-chave da frase e a sílaba tônica de cada
uma delas, enfatizando, assim, as sílabas “pa” e “na”. A sílaba “pa” aparece destacada no centro da
página em uma outra palavra que não pertence a sentença (papa), indicando a preocupação em
repetir enfaticamente o fonema que deveria ser fixado pela criança. Vale destacar que a imagem
de outros animais também são apresentadas para a aprendizagem de determinadas sentenças,
palavras, sílabas e letras. Os animais representados são domésticos ou rurais, trazendo pistas de
valorização da natureza e exaltação da vida no campo para o cidadão que estava sendo formado
naquele período.
Houve ainda aqueles autores que acreditavam que a unidade maior da língua era a historieta.
Partindo dessa compreensão, Anita Fonseca (O Livro de Lili) e Ariosto Espinheiro (Infância Brasileira)
fizeram uso do método da historieta, que começa com a leitura de histórias, completando-as com
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 349
Referências
BRAGGIO, S. L. B. Leitura e alfabetização: da concepção mecanicista à sociopsicolinguística. Porto
Alegre: Artes Médicas, 2005.
CAMPOS, D. A alfabetização no Espírito Santo na década de 1950. 2008. 265 f. Dissertação (Mestrado
em Educação) – Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2008.
Resumo
O presente artigo apresenta práticas pedagógicas articuladas de valorização e produção de
uma nova interpretação sobre a educação e a convivência no campo com mudanças de atitude
e paradigmas para o desenvolvimento sustentável. O objetivo deste estudo foi avaliar a proposta
pedagógica da Escola Classe Córrego do Meio, visando promover de forma prática o aprendizado
de agroecologia, de agroextrativismo, e de educação ambiental através do desenvolvimento de
uma metodologia transdisciplinar. Concluimos que o processo educativo do campo necessita estar
vinculado à sustentabilidade e que a escola deve ser a responsável pela aplicabilidade de ações que
sensibilizem o sujeito do campo para uma postura de preservação da natureza.
Introdução
A Escola Classe Córrego do Meio é uma escola do campo, localizada em Planaltina-DF, atende
nas modalidades educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental, além de ofertar aulas de
Educação em Tempo Integral no contra turno. Em todas as suas ações a Escola Classe Córrego do
Meio promove o sentimento de pertencimento, diminuindo através da sensibilização os problemas
sociais e ambientais existentes na comunidade.
De acordo com as argumentações Freire (1980), a Educação do Campo está fundamentada
em uma proposta pedagógica dialeticamente desenvolvida para construção de um novo habitus
cultural, ético, político e social que pretende uma transformação biófila, relacionada às interrogações
próprias à sua materialidade.
É imprescindível que a escola do campo tenha uma educação específica para o campo,
estabelecendo vínculo com as comunidades e povos do campo, “... pois um dos objetivos da
educação popular é contribuir para criar condições do povo ser sujeito do processo de produção do
conhecimento e de sua própria vida” (MOLINA, 2006, p. 12).
De acordo com Caldart (2011), o povo tem direito de ser educado no lugar onde vive, através de
uma educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada a sua cultura e as
suas necessidades humanas e sociais. A Escola Classe Córrego do Meio pretende produzir uma nova
interpretação sobre a educação e a convivência no campo, reconhecendo o meio e o ser que nele
se integre e estabelecendo instrumentos para que a comunidade escolar se aproprie desse espaço
auxiliando em sua preservação.
O objetivo deste estudo foi avaliar a proposta pedagógica da Escola Classe Córrego do Meio,
visando promover de forma prática o aprendizado de agroecologia, de agroextrativismo, e de
educação ambiental através do desenvolvimento de uma metodologia transdisciplinar, a fim
de promover mudanças de atitude e paradigmas para o desenvolvimento sustentável por meio
do planejamento de ações articuladas para aquisição de conhecimento e valorização dos fatores
culturais e históricos vinculados a vegetação nativa do Bioma Cerrado.
Metodologia
A pesquisa esta fundamentada na metodologia de estudo do meio e na percepção de que os
agentes atuam como mecanismo de aprendizagem. Recorremos às pesquisas de Gadotti, que ao
recorrer a Pedagogia da Terra e a Ecopedagogia, associa educação e sustentabilidade promovendo
uma pedagogia biófila, proporcionando o respeito a todas as formas de vida como alternativa de
promoção da aprendizagem a partir da vida cotidiana. De acordo com o educador Gadotti (2009, p.
75), o pressuposto da sustentabilidade é “o sonho de bem viver, o equilíbrio dinâmico com o outro e
com o meio ambiente, a harmonia entre os diferentes”.
A metodologia busca o sentido topofílico, idealizado por Yi Fu Tuan, de formação de um elo
afetivo entre o homem e o meio físico, entre os diversos sujeitos que formam o universo escolar, não
somente na percepção aluno ou professor, mas de todas as pessoas que vivenciam a escola.
Conclusão
Entende-se que uma educação libertadora vai muito além das práticas repetitivas de sala de aula,
é associada à vida, ao trabalho e às experiências. Uma educação para a vida possibilita aos alunos se
reconhecerem como sujeitos críticos e atuantes em sua realidade, com capacidade de transformar
seu meio social a partir de sua prática.
O processo educativo do campo necessita estar vinculado à sustentabilidade. Compreendemos a
Educação do Campo não como fim em si mesma, mas, se inscrevendo no rol de disputas dos modelos
educativos que podem colaborar na construção de um projeto educacional como perspectiva para
uma organização transformadora da sociedade. Neste contexto, a escola Classe Córrego do Meio
através de suas práticas pedagógicas contribui para que o sujeito do campo seja protagonista de
ações que possam acarretar um desenvolvimento sustentável para a região em que está inserido.
Referências
CALDART, Roseli Salete. Por uma Educação do campo: traços de uma identidade em construção.
In: ARROYO, Miguel Gonzalez; CALDART, Roseli Salete; MOLINA, Mônica Castagna (Org.). Por uma
Educação do Campo. 5. ed. Petropólis, RJ: Vozes, 2011.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1996.
______. Pedagogia do oprimido. 17. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
GADOTTI, Moacir. Educar para a sustentabilidade. Instituto Paulo Freire, São Paulo, 2009.
______. Pedagogia da Terra: Ecopedagogia e educação sustentável. CLACSO, Buenos Aires, 2001.
Disponível :<http://www.saber.ula.ve/mundouniversitario/archivospdfs/num10_julio2004/moicer_
gadotti_pedagogia_terra.pdf>. Acesso em: 11 jun. 2019.
MOLINA, Mônica Castagna. Educação do campo e pesquisa: questões para reflexão. In: MOLINA,
M. (Org.). Educação do campo e pesquisa: questões para reflexão. Brasília: Ministério do
Desenvolvimento Agrário, 2006.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Claudino Gilz
Cleonice Aparecida De Souza
A presente pesquisa tem como objeto as ideias pedagógicas, o currículo e as práticas educativas
implementadas pelos Franciscanos em Petrópolis no segmento da então instrução primária, ofertada
pela Escola Gratuita São José no período de 1897-1922. Trata-se aqui dos Franciscanos da Província
da Imaculada Conceição do Brasil, instaurada pelo então Papa Clemente X em 15 de julho de 1675
por meio da Bula Pastoralis Officii. Após duzentos e vinte e dois anos, os Franciscanos desta mesma
Província fundam, em Petrópolis – RJ, uma escola contígua à Igreja do Sagrado Coração de Jesus,
cuja oferta de ensino primário foi inicialmente gratuita para alunos pobres, oriundos de famílias de
colonos alemães pobres e de famílias de ex-escravos recém libertos na época pela extinção da
escravatura no Brasil. Alinhados às orientações da Igreja Católica, os Franciscanos fundadores da
Escola Gratuita São José compreendiam-na, antes de tudo, assim como a Capela em que atuavam
como evangelizadores, como instituição nucleadora da comunidade. A delimitação do período de
1897 a 1922 se deve, em si, a três razões, a saber: a primeira diz respeito ao curso histórico a abranger
os primeiros 25 anos da Escola Gratuita São José, fundada pelos Franciscanos; a segunda está
associada ao tempo em que se deu a edição e publicação do Primeiro Livro de Leitura, a edição e
publicação do Segundo Livro de Leitura, a edição e publicação do Terceiro Livro de Leitura e a edição
e publicação do Quarto Livro de Leitura na tipografia desta Escola (hoje Editora Vozes), considerando
que, no período, os livros escolares que “[...] saíam dos prelos do país eram, na maior parte, de
inspiração materialista ou, pelo menos, agnosticista.” (PIMENTEL, 1951, p. 8); a terceira dessas razões
faz jus às diversas tratativas privilegiadas pelos Franciscanos para disseminar – tanto nas salas de
aula da Escola Gratuita São José como em muitas outras escolas do Brasil que vieram a adotar os
Livros de Leitura editados e postos em circulação pela tipografia desta Escola – não só uma proposta
curricular, mas também um ideário educacional alinhado às orientações da Igreja Católica no
período. A compreensão a respeito do modo como os livros escolares possibilitam apontam –
enquanto objetos de pesquisa sobre as ideias pedagógicas, o currículo e as práticas educativas –
para diversos aspectos de uma determinada circunscrição histórica, cultural e escolar, em si, não se
basta. Menos oportuno ainda é menosprezar o quanto os livros escolares se apresentam como obras
de diversos conteúdos educacionais propostos por políticas educacionais do regime governamental
da época em são editados e postos em circulação. O tema desta pesquisa atenta para possíveis
tensões entre as prerrogativas educacionais católicas (LEÃO XIII, 1878) disseminadas pelos
Franciscanos e as proposições educacionais dos liberais, positivistas e republicanos, defensores de
uma educação laica. Privilegia o tema, com as fontes primárias afins, os já mencionados Livros de
Leitura na conexão com o contexto sociocultural da época, em busca de hipóteses, premissas e
conceitos que tornam possível flagrar não só o ideário pedagógico, a prática curricular de uma
escola como espaço dado à história de vida de professores e alunos, à a disposição das disciplinas
para cada ano letivo, à socialização de saberes, a rotinas e à produção-circulação-reprodução
cultural. Entende-se que “[...] uma cultura é também um conjunto de diferentes recursos, em que há
sempre uma troca entre o escrito e o oral, o dominante e o subordinado, a aldeia e a metrópole; é
uma arena de elementos conflitivos, que [...] assume a forma de um ‘sistema’.” (THOMPSON, 1998, p.
17). Tornam possível também entrever o espaço escolar como uma instância de conflitos de
interesses, de resistências, de alternâncias de curiosidades e expectativas, de embates ideológicos,
de tensões instituídas normas de controle da disciplina comportamental, de punição aos infratores,
entre outros aspectos. Tendo em vista que as fontes viabilizam o acesso às tecituras de compreensão
de um fato, as fontes “[...] resultam da ação histórica do homem e, mesmo que não tenham sido
produzidas com a intencionalidade [...], acabam testemunhando o mundo dos homens em suas
relações com outros homens e com o mundo circundante, a natureza [...].” (LOMBARDI, 2004, p. 155).
O objetivo desta pesquisa visa rastrear – com base nos Livros de Leitura, na história da leitura e nas
formas históricas de produção e disseminação dos livros escolares, final do século XIX e primeiras
décadas do século XX – elementos relacionados tanto às ideias pedagógicas, ao currículo como às
práticas educativas dos Franciscanos no segmento da então instrução primária ofertada na Escola
Gratuita São José. Considerando que “[...] a leitura de um livro é ato contraditório e estudar seu uso
é fundamental para o historiador compreender a dimensão desse objeto cultural” (BITTENCOURT,
1993, p. 5), o escopo metodológico da pesquisa sobre as ideias pedagógicas, o currículo e as práticas
educativas mobilizadas pelos Franciscanos na Escola Gratuita São José para alunos do segmento da
então da instrução primária entre 1897 e 1922 decorre da análise dos Livros de Leitura editados na
tipografia e utilizados em sala de aula por professores e alunos dessa escola. Análise esta que deixa
entrever não só para a especificidade acadêmica e confessional das ideias pedagógicas, currículo e
práticas educativas articuladas pelos Franciscanos, como também um modo de presença desses
religiosos no âmbito da instrução primária do Brasil tensionado por embates, resistências, lutas e
até por silenciamentos impetrados por liberais, positivistas e republicanos a fomentar, no período, o
ensino laico nas escolas do Brasil. Em face à pesquisa sobre as ideias pedagógicas, o currículo e as
práticas educativas implementadas pelos Franciscanos em Petrópolis na Escola Gratuita São José,
alguns dos primeiros resultados flagram a compreensão de determinadas situações do processo de
modernização do Brasil em curso, final do século XIX e início do século XX, em que a educação era,
nos discursos dos agentes da cúpula do regime republicano, um dos meios mais promissores para se
alcançar tal intendo. Em um segundo momento da investigação, os resultados encampam o
alinhamento dos conteúdos abordados nas salas de aula da Escola Gratuita São José à identidade
confessional católica e franciscana da própria escola, balizada principalmente pelas seguintes Cartas
Encíclicas publicadas pelo então Papa Leão XIII: a Carta Encícli ca Inscrutabili Dei Consilio, de 21 de
abril de 1878; a Carta Encíclica Quod Apostolici Muneris – socialismo, comunismo e niilismo, de 28 de
dezembro de 1878; a Carta Ci Siamo Grandemente – em favor do matrimônio cristão, de 1 de junho
de 1879; a Carta Encíclica Arcanum Divinae Sapientie, de 10 de fevereiro de 1880; a Carta Encíclica
Libertas, de 20 de junho de 1888; a Carta Encíclica Sapientiae Christiane, de 10 de janeiro de 1890; a
Carta Encíclica Rerum Novarum, de 15 de maio de 1891. Alinhamento este tensionado pelo embate
travado pela Igreja Católica no período com aqueles que estavam a propor a laicidade da educação,
a disseminar visões de mundo distintas da Igreja Católica por meio do o racionalismo, do socialismo,
do comunismo, do anarquismo, da maçonaria e do niilismo. Em um terceiro e último momento, os
resultados expõem o predomínio de algumas temáticas inerentes às ideias pedagógicas, ao currículo
e às práticas educativas latentes nos Livros de Leitura da Escola Gratuita São José, tais como: o
conhecimento de Deus a enfatizar a compreensão do Ser Divino como o criador de todos os seres a
rivalizar com os propositores do socialismo, do comunismo, do niilismo e do liberalismo que estavam
a idealizar a constituição de nações e estados modernos, destituída de valores religiosos; o lugar e o
valor da família constituída pela união sacramental e indissolúvel na formação dos alunos e futuros
cidadãos a contrapelo das proposições dos positivistas e liberais à formação de núcleos familiares
baseados somente em um contrato jurídico-social encampado pelo Estado, passível a qualquer
momento de dissolução pela possibilidade de divórcio dos cônjuges; a proposição de uma escola
imbuída da finalidade de proporcionar ao seus alunos uma consistente e ampla instrução primária
atrelada à formação religiosa travando, a seu modo, um embate como que diário com o Estado
defensor de ideias pedagógicas, currículos e práticas educacionais civilizatórias de cunho laico e,
por sua vez, desconfessionalizadas.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 355
Referências
BITTENCOURT, C. M. F. Livro didático e produção do conhecimento histórico: uma história do
saber escolar. 374 f. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação,
Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de
São Paulo, 1993.
LEÃO XIII. Carta Encíclica Inscrutabili Dei Consilio – início do pontificado, 21 de abril de 1878. In:
DOCUMENTOS DE LEÃO XIII (1878-1903). Tradução de Honório Dalbosco e Lourenço Costa. São
Paulo: Paulus, 2005. p. 13-23.
Palavras-chave: Educação democrática. Alquimia das disciplinas. Estudos Sociais / Ensino do Meio.
alquimia está inscrita, então, nesses sistemas de pensamento que operam na fabricação dos sujeitos
da escola. Para Thomas Popkewitz, essa é uma proposição teórica e também metodológica, uma vez
que nos auxilia na proposição de caminhos para ‘historicizar’ os objetos do presente, procurando
entender como estes recebem plausibilidade, por meio de diferentes práticas históricas, entrando
no ‘verdadeiro’.
No contexto brasileiro, a disciplina escolar Estudos Sociais recebeu notoriedade e foi implementada
em âmbito nacional e de forma mais ampla durante a ditadura militar, mais especificamente a partir
do Parecer no 895/71, que efetivou as Licenciaturas Curtas de 1o grau, dentre as quais constava a que
formava para o ensino desse componente curricular. Os Estudos Sociais já eram, entretanto, uma
realidade para o ensino primário desde meados de 1930, quando o Departamento de Educação do
Distrito Federal publicou o ‘Programa de Ciências Sociais’, no qual era mencionada a disciplina para
os cinco primeiros anos da escola elementar. Essa disciplina escolar é também encontrada, na mesma
época, no currículo da Escola de Professores do Instituto de Educação, que habilitava para a docência
no curso primário. Podemos dizer, então, que os Estudos Sociais emergem no Brasil no contexto da
Escola Nova, sendo defendido por autores como Carlos Delgado de Carvalho e Anísio Teixeira, que
estudaram com John Dewey nos Estados Unidos no início do século passado. Em 1934, por exemplo,
no Programa de Ciências Sociais do Departamento de Educação do Distrito Federal, chefiado por
Anísio Teixeira, Carlos Delgado de Carvalho enuncia uma proposta para o ensino da disciplina
escolar Estudos Sociais: o envolvimento da escola com a vida social, criticando contundentemente o
distanciamento entre a escola e a sociedade e entendendo que uma democracia moderna não podia
desinteressar-se da vida social e do ambiente em que se encontrava. Tal proposta se alinhava com o
ideário de John Dewey de uma aprendizagem a partir das experiências vividas no convívio social, o
que demandaria uma guinada metodológica para o ensino. Afinal, se o ensino de Estudos Sociais era
pautado nas vivências práticas dos alunos, a separação por matérias escolares não poderia existir, o
que reforçava a integração curricular. Desde então, o Programa de Ciências Sociais teve sucessivas
edições até o ano de 1955. Quando examinamos os enunciados que marcaram a trajetória dos
Estudos Sociais nas escolas brasileiras, percebemos uma regularidade em torno da elaboração de
uma sociedade harmônica e equilibrada, sem divergências e conflitos, resultante da contribuição
igualitária dos indivíduos. Entre as décadas de 1940 e 1960, por exemplo, essa disciplina escolar foi
uma das mediadoras na concretização desse projeto social; entretanto, isto não ocorreu de imediato
e nem ganhou a totalidade da escola e da sociedade civil. Outro discurso emerge na década de 1970,
durante a Ditadura Militar.
No contexto angolano, como já mencionado, a disciplina escolar Estudo do Meio emerge no
âmbito de reformas educativas que se seguiram ao processo de democratização do país. A legislação
promulgada em 2001 enuncia significativas modificações no sistema educacional, dentre as quais se
destacam: ampliação da formação básica de oito para nove anos; novas divisões dos níveis de ensino;
criação de outras disciplinas escolares; reformulação dos conteúdos curriculares; transformação do
sistema de avaliação. Iniciada em caráter experimental em 2004 com os estudantes que ingressaram
pela primeira vez no ensino pré-primário, a reforma foi paulatinamente se expandindo até abarcar
todo o sistema em 2011. A disciplina escolar Estudo do Meio emergiu no ensino primário, então, em
meio a outras novidades, tais como a Educação Moral e Cívica, a Educação Visual e Plástica, a Educação
Musical e a Educação Laboral. O Estudo do Meio passou a ser ministrado nos primeiros quatro
anos de escolaridade para estudantes entre seis e dez anos de idade, em substituição à disciplina
escolar Ciências da Natureza, com o objetivo de “iniciar a criança no conhecimento sistematizado
do ambiente que a rodeia”, desenvolvendo nos estudantes “as capacidades de observação e
relacionamento e favorecer a sua integração social” (INIDE, 2007). Ele foi apresentado como um
componente curricular para o qual concorrem conceitos de várias áreas científicas: a Antropologia; a
Biologia e, em particular, a Ecologia; a Etnologia; a Geografia; a História; a Psicologia. Ele foi também
enunciado como articulando aspectos que têm a ver com a Moral e o Civismo, com vistas a contribuir
para a compreensão progressiva das inter-relações entre a natureza e a sociedade (INIDE, 2007). A
integração curricular foi sendo reforçada, então, de modo a que pudesse desenvolver, de forma mais
adequada do que no formato disciplinar tradicional, “alguns processos simples de reconhecimento
da realidade envolvente (observar, descrever, formular problemas, avançar possíveis respostas,
ensaiar, verificar) assumindo uma atitude de permanente pesquisa e experimentação” (INIDE, 2007).
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 358
Referências
FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2015.
POPKEWITZ, T. S. Cosmopolitanism and the age of school reform: science, education, and making
society by making the child. London: Routledge, 2007.
ISSN 2358-3959
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HISTÓRIA DA ALFABETIZAÇÃO NO
MUNICÍPIO DE NAVIRAÍ/MS: MEMÓRIAS E
TRAJETÓRIAS DOCENTES (1973 a 2005)
durante sua trajetória de escolarização na infância; analisar as concepções, os modos e como os/as
professores/as alfabetizadores/as entendem método de alfabetização; compreender se existem
relações entre as práticas de alfabetização da trajetória escolar dos sujeitos e suas opções com o seu
trabalho pedagógico. A história oral é percebida como uma possibilidade de valorização das pessoas
nas pesquisas, uma metodologia que permite aos indivíduos se expressarem e documentar aspectos
históricos que não foram registrados (SARAT, 1999). Trata-se de uma metodologia que se constitui de
fontes para o estudo da história e que consiste em gravar entrevistas com indivíduos que participaram
ou testemunharam acontecimentos do passado e do presente (ALBERTI, 2005). Trabalhar com
história oral não significa escrever uma história definitiva, mas com a voz dos sujeitos produzir uma
história cujo registro está em suas memórias, seus relatos e podem não sacramentar certezas, mas
diminuir o campo das incertezas.
ISSN 2358-3959
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conhecimento e poder, entendendo-as como produtoras de quem somos e daquilo que podemos
(ou não) saber. Consideramos as formas de poder além das institucionalizadas, em especial, as que
apostam na positividade do mesmo como constituidor de normas e produtor de efeitos para além
de uma visão dualística baseada em oposições dicotômicas do tipo dominadores versus dominados.
Aqui, diferentemente, como sistematiza Thamy Pogrebinschi (2004), a ideia é assumir uma noção
de poder multidirecional, para além das regras de direito e não localizado em grupos específicos,
sendo percebido como acúmulo de saberes e não como ideologia. Nessa perspectiva, é importante
destacar que a noção de subjetividade com a qual operamos está voltada para a esfera do discurso,
a qual legitima algumas formas de ação em detrimento de outras, construindo ‘regimes de verdade’.
Procuramos, assim, pesquisar a construção de subjetividades a partir de uma abordagem discursiva,
operando sobre os ditos, a superfície dos textos, descrevendo os enunciados a partir de acúmulos
e exterioridades, ao invés de percebê-los a partir de um fundamento transcendental e/ou lógica
interna.
Com tais noções de poder e discurso, concebemos os currículos como construções históricas
que produzem os conhecimentos e os sujeitos da educação, definindo as normas e os padrões
que validam aquilo que conta como ‘verdade’ para o ensino e a formação de professores. Nesse
contexto, buscamos entender como certos tipos de professores vão se constituindo como
profissionais ‘bons’ e ‘adequados’ para a atuação em pré-vestibulares sociais, em meio a padrões
de ‘normalidade’ que vieram se constituindo como característicos desse universo escolar em
contraste com a educação nomeadamente entendida como regular. Para isso, tomamos tanto os
depoimentos de professores negros e egressos de pré-vestibulares sociais quanto os documentos
curriculares sobre/para o tema e por eles produzidos como superfícies textuais que, no presente,
articulam as experiências passadas com as expectativas de futuro, em um movimento que produz,
alquimicamente, as ‘verdades’ da docência nesse universo educacional específico. Na construção
e análise desse arquivo de pesquisa, lançamos um olhar cauteloso sobre ambos os tipos de fontes,
entendendo-as como constituidoras daquilo que definimos como a realidade dos pré-vestibulares
sociais e dos sujeitos que neles habitam. Ema uma espécie de triangulação dessas fontes, buscamos
não produzir oposições e dicotomias entre as ações humanas e as estruturas sociais mais amplas,
supervalorizando ora a força das limitações estruturais, ora o poder individual de emancipação dos
sujeitos; aqui, diferentemente, o movimento é o de pensar como o discurso estrutura e define, na
contingência, aquilo que conta como realidade. Nesse movimento, assumimos que a luta política e a
agência dos professores negros e egressos de pré-vestibulares sociais é produzida discursivamente,
em meio às relações entre conhecimento e poder.
Nesse contexto, Ferreira et al (2014, p. 9) produzem a seguinte elaboração, da qual me útil a
reflexão essencial: “É em meio a esse sistema que nos definimos como bons e maus professores
[…] tomando decisões sobre o que e como ensinar em meio a discursos que nos constituem e
nos posicionam no mundo” (grifos dos autores). Trata-se, aqui, de analisar as relações entre essas
decisões, posições e os discursos constituintes que as encejam, no contexto dos pré-vestibulares
sociais. Mais especificamente, nas relações currículo, prática docente e discursos. Nisto, também é
pertinente a percepção do como categorias administrativas operam – nestes níveis relacionados –
no nível da subjetividade pessoal, como nos autoriza e pensar Thomaz Popkewitz.
Na análise, vimos percebendo como esses sujeitos se tornam professores em meio a constituição
de inúmeros pares binários, os quais delimitam fronteiras entre o que somos/podemos ser e o que não
somos/podemos ser, assim do que podemos/devemos (ou não) saber, no âmbito de aspectos como:
os conhecimentos mais ou menos pertinentes a esse público-alvo; as capacidades e habilidades de
aprendizagem em meio a critérios de padronização e normalidade que produzem o ‘bom’ ensino e
os ‘bons’ estudantes em meio à constituição dos ‘outros’; as histórias desses sujeitos professores
como capazes de aglutinar características adequadas ao entendimento dessa realidade e do que
deve ser feito nela versus experiências e formações consideradas inadequadas para a atuação
nos pré-vestibulares sociais, ainda que produtoras das normas e padrões do ensino dito regular.
Nesse contexto, professores negros e com trajetórias escolares igualmente ‘alternativas’ produzem
currículos que se movimentam entre o ingresso na universidade e as experiências cotidianas,
entre o sucesso e o fracasso escolar, entre expectativas de futuro geradas pelo estudo e a rotina
do presente ligada ao mundo do trabalho. Argumentamos que essa produção curricular, ao contar
com as experiências visceral desses sujeitos negros em pré-vestibulares sociais, é potencializadora
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 364
Referências
POGREBINSCHI, T. Foucault, para além do poder disciplinar e do biopoder. Lua Nova [online], 2004.
Esta comunicação tem como objetivo dar visibilidade ao projeto de intervenção desenvolvido
com o propósito de destacar a importância de criar condições através das/nas práticas pedagógicas
para que os estudantes tenham contato com textos literários, seja em prosa ou em verso, da
literatura produzida em Mato Grosso, contribuindo para a formação de leitores e para a construção
da identidade literária mato-grossense. Conforme Cândido (2011), a Literatura é uma necessidade
e um direito humano e é uma “[...] possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas [...]”
(p.177), porque “[...] a função da Literatura está ligada à complexidade de sua natureza [...]”
(ibidem, p. 178). Nesse sentido, ler Mato Grosso é garantir ao aluno o direito de conhecer sua
própria história, compreendida aqui como constituição dos sujeitos mato-grossenses, ou seja,
ao propor as leituras literárias produzidas em Mato Grosso, tivemos como propósito levá-los ao
contato e ao prazer de conhecer a literatura de Mato Grosso e se reconhecerem em Mato Grosso.
Desta forma, neste trabalho, “Ler Mato Grosso: Uma proposta de leitura do texto literário”, ao
considerar a importância da literatura na vida de cada ser humano, propusemos como objetivo,
através de um projeto de intervenção interdisciplinar com alunos dos 9º A,B,C e D do Ensino
Fundamental da Escola Estadual “Alcebíades Calháo”, do município de Cuiabá – MT, para além de
dar oportunidade aos alunos de conhecerem as produções de autores regionais, desnaturalizar a
concepção de que a literatura está num lugar inacessível. O trabalho reflete uma ação integradora
entre escritores e artistas regionais, suas obras e os estudantes, buscando o incentivo à leitura,
de forma a explorar e evidenciar as obras de escritores regionais como Aclyse de Matos, Maria C.
de Aguiar Campos, Caio Bertoni, Marília Beatriz de F. Leite, Eduardo M. L. Mahon, Sebastião C. G.
Carvalho e Wender C. C. Nascimento, e também de artistas plásticos ( telas, grafites) da cidade.
Como metodologia, partimos das leituras, rodas de conversa, discussões e análises, em sala de
aula, de diversas obras dos autores mencionados, e a partir daí foram desenvolvidas atividades
como palestras, oficinas, bate-papo com os escritores, organização da biblioteca, visita à Academia
Mato-grossense de Letras, pintura dos muros da escola, noite de autógrafos, concertos musicais e
exposição dos trabalhos à comunidade. Como questões basilares que direcionaram nosso trabalho,
procuramos investigar quem são os sujeitos para os quais se propôs o desenvolvimento do referido
projeto; que condições de produção de leitura são constitutivas nesses sujeitos; quais construções
históricas e sociais a respeito da literatura atravessam esses sujeitos no que diz respeito aos sentidos
constituídos, literatura canônica, desconhecimento da própria arte literária mato-grossense. Como
preconiza Marta Cocco, nosso propósito é que “as obras regionais ocupem o merecido espaço por
méritos qualitativos e que não destituam o espaço de outras obras importantes, canonizadas ou
não, de outras literaturas” (COCCO, 2009, p.57). Desta forma, almejamos que a literatura de Mato
Grosso, juntamente às demais literaturas, ganhe espaço nas escolas públicas, visto que todas são
importantes para o letramento literário. Nessa direção, nossa proposta ao contemplar a literatura
regional aplicada a uma perspectiva de letramento literário através de leituras e análises de obras
que compõem a literatura mato-grossense, é criar a possibilidade de abrir os olhos a um mundo de
manifestações artísticas tão próximas e, ao mesmo tempo, tão distantes dos leitores que transitam
pela escola, pois desconhecemos a nossa própria arte literária. Ler é um direito social. E a literatura
também. Ela nos humaniza, como nos alerta Antônio Candido (2011). “A literatura confirma e nega,
propõe e denuncia, apoia e combate, fornecendo a possibilidade de vivermos dialeticamente os
problemas. ” (idem, p. 175). Os resultados obtidos superaram nossas expectativas, considerando
que todas as ações desenvolvidas foram feitas com base em parcerias, doações e participação
de muitos colaboradores, atravessando os muros da escola, indo muito além do que planejamos
inicialmente. Tudo isso, sem nenhum recurso financeiro. Como resultado, a partir desse trabalho,
interdisciplinar, constatamos uma melhora substancial na prática da leitura dos sujeitos-alunos
envolvidos e maior envolvimento destes com a leitura literária, bem como a melhora no trabalho em
equipe ao envolver os profissionais de outras áreas como artes, geografia e história. Promoveu-se
a desconstrução do cânone nacional como única possibilidade de conhecer o outro e se humanizar
ao trazermos a literatura mato-grossense para compor as aulas de leituras literárias. Além disso
o convívio e a parceria com os escritores aproximaram a Academia Mato-grossense de Letras e a
comunidade escolar, ocasionando maior conhecimento e envolvimento com a literatura produzida
em Mato Grosso. Através das parcerias com os autores e proprietários de editoras localizadas em
nossa cidade ampliamos o acervo da biblioteca através de doações. O projeto nos permitiu refletir
sobre o ensino de literatura como caráter humanizador e social, pois somos seres multiformes, e
também perceber avanços significativos no letramento literário dos estudantes, construindo um
percurso de leitura habitual e prazeroso, além de propiciar a identificação e valorização da cultura
local. Para além da ampliação do repertório linguístico, interpretativo, conceitual, reflexivo e crítico,
concebemos com a literatura regional leva aos alunos a ideia de que o meio em que vive também é
importante e valorizado socialmente. O conceito construído de que apenas o que “vem de fora” pode
ser reconhecido e estudado em sala de aula deixa de ser verdade absoluta, quando esses alunos
passam a conhecer obras de grande qualidade produzidas em sua região. Dessa forma, não constitui
um problema o educando/leitor orgulhar-se do local onde vive, das coisas da sua terra. Pelo contrário,
é importante porque afirma o seu valor. [...] O problema apenas surge quando o orgulho passa a ser
índice de uma suposta superioridade diante do outro e de uma ingênua compreensão de cultura, o
que deve ser e pode ser evitado. (COCCO, p. 58-59). Então, numa relação de alteridade, constituiu-
se este trabalho como parte de uma dinâmica para a desconstrução daquilo que, ideologicamente,
se construiu como cânone literário. A proposta é trazer a produção literária de Mato Grosso para
compor a história de leituras em que os alunos se reconheçam como parte da história criadora
da arte literária. O contato com autores conterrâneos e contemporâneos faz da proximidade a
construção de novas leituras e novos leitores, além de despertar o gosto pela leitura. Segundo Cocco
(2009), não podemos privar esse cidadão da reflexão, do pensamento crítico acerca da realidade
do seu entorno, o que é possível por meio de obras cujos temas incidem sobre o local (não apenas
como espaço geográfico, mas, sobretudo, local como espaço de reflexão sobre a vivência de seres
da natureza, inclusive os humanos, considerados em sua historicidade. Conhecer a história de sua
região, por intermédio da literatura regional, permite ao aluno conhecer, consequentemente, a sua
história. O sentimento de pertencimento torna-se muito mais intenso, pois passa a sentir, entender,
comover-se, revoltar-se, mesmo de forma “subconsciente e inconsciente”, como afirma Candido (
2011). A proposta é trazer a produção literária de Mato Grosso para compor a história de leituras
em que os alunos se reconheçam como parte da história criadora da arte literária. O contato com
autores conterrâneos e contemporâneos faz da proximidade a construção de novas leituras e novos
leitores, além de despertar o gosto pela leitura.
Referências
EAGLETON, Terry. Teoria da Literatura – Uma Introdução. Tradução: Waltensir Dutra. 6ª ed. – São
Paulo: Martins Fontes, 2006.
CAMPOS, Maria Cristina de Aguiar. O Falar Cuiabano. Cuiabá: Editora Carlini & Caniato, 2014.
CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 3ª ed., revista e ampliada. São Paulo: Duas Cidades, 1995.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 367
GARCIA, Edson Gabriel. A leitura no meio do caminho. IN: Prazer em ler: Um roteiro prático-poético
para introduzir qualquer um e quem quiser nas artes e artimanhas das gostosices da leitura. Vol.
1. São Paulo: Instituto C&A e CENPEC, 2006, p. 18.
COCCO, Marta Helena. O lugar da literatura regional no ensino. Revista Ecos. n. 8, dez, 2009,p. 55-60.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Raissa Pinheiro
Palavras-chave: Educação Física escolar e militares. Educação Física e Estado Novo. Revista de
educação física.
Nesta comunicação, apresentaremos alguns dados preliminares de uma investigação que ainda
está em andamento e trata da associação entre militares e educadores para implantação da educação
física escolar na década de 1930 no Brasil. A Educação Física aparecerá, nas primeiras décadas do
século XX, no Brasil, vinculada aos ideais eugênicos de regeneração e embranquecimento da raça,
pois acreditava-se que a partir de exercícios físicos, o povo brasileiro miscigenado se reconstituiria
transformando também sua moral (Priore, 2011). Desde o final dos anos 1920, a discussão ganha
espaço na Associação Brasileira de Educação - ABE, que na época era um importante lugar de
discussões(Linhales, 2009) em direção à Educação Física Escolar e, na década de 1930, essa
perspectiva se intensifica também pelo que vinha acontecendo no cenário político. Getúlio Vargas,
então Presidente da República anuncia, em novembro de 1930, um “programa de reconstrução
nacional” e os militares contribuem, exercendo uma função fundamental na construção de uma
“doutrina” para a Educação Física que fosse de encontro aos ideais de reconstrução desse programa
nacional (Castellani Filho,1988). Em abril de 1932, o Regulamento de Educação Física é aprovado
e passa a ser adotado em todas as unidades do exército, inclusive no Centro Militar de Educação
Física. Em outubro de 1933, o Centro Militar é transformado em Escola de Educação Física do
Exército (EsEFEx), tendo como principal objetivo ensinar o método de educação física que acabava
de ser aprovado (Regulamento de Educação Física), bem como promover e orientar sua aplicação,
preparando e formando instrutores para fins não militares, portanto na preparação dos futuros
professores que iriam atuar nas escolas, na disciplina de Educação Física Escolar. Essa orientação
será concretizada no decreto nº 24.794 14 de julho de 1934 e prevê um acordo entre o Ministério
da Guerra e o Ministério da Educação para a contratação de militares formados em educação física
como professores dessa disciplina nos estabelecimentos oficiais e fiscalizados. Na Constituição de
1937, o artigo 131 estabelece a obrigatoriedade da Educação Física em todas as escolas da nação e
a Instituição militar, em conjunto com a Instituição escolar, assume um papel decisivo na formação
do “novo” cidadão brasileiro, pois a formação seria dada pela Escola de Educação Física do exército
aos professores e a atuação deles seria fiscalizada por uma Inspetoria composta por militares
(Horta, 2012). Assim, o objetivo geral dessa pesquisa é o de investigar como se deu esse consórcio
entre educadores e militares na construção de um projeto nacional de educação física escolar e no
programa de reconstrução nacional e quais as razões que demandaram determinada organização
da prática escolar da Educação Física. A principal fonte de pesquisa é a Revista de Educação Física
do Exército (REFE), criada em maio de 1932, pela Escola de Educação Física do Exército (EsEFEx), com
periodicidade variável, ora bimestral, ora mensal ou ainda semestral e veiculada até os dias de hoje,
com diversas sessões com orientações de práticas corporais, exercícios dirigidos para os professores,
eventos esportivos entre outros temas. O recorte temporal desse estudo começa em 1932, ano de
início da Revista de Educação Física do Exército (REFE) e o término da pesquisa será em 1939 quando
houve uma interrupção nas publicações por conta do início da segunda guerra mundial. A Revista de
Educação Física do Exército (REFE) é dividida em várias seções e nos interessam os artigos publicados
cujo temas são relacionados a Educação Física escolar, que entre 1932 e 1939 somaram 80 artigos
publicados. Os artigos que nos aprofundaremos serão os artigos que discutem os seguintes temas:
“relatos sobre experiências com a educação física nas escolas”, “notícias sobre a educação física
nos estados brasileiros”, “legislação sobre educação física escolar” e “lições de educação física,
dramatizações e ginástica historiada” que estão publicados em diversas seções pela revista. A revista
atuava como veículo oficial da Escola de Educação Física do Exército (EsEFEx) e entre os objetivos
estava o de divulgar a “causa da Educação Física”, em especial o Regulamento da Educação Física,
documento criado pelo exército brasileiro com normas para a implantação da educação Física a
partir da Missão Francesa, que se estabeleceu em meio a conflitos entre os militares formados pela
missão alemã e os militares formados pela missão francesa, sendo que os militares formados na
missão alemã, conhecidos como jovens turcos que ficaram a frente do Centro Militar até o início de
1929, adotando após esse período o método francês através do Regulamento da Educação Física. De
acordo com Castro (1997), o método francês era considerado, na época, o melhor método levando-se
em consideração as características fisiológicas brasileiras e assim as iniciativas de institucionalização
da educação física dentro do próprio exército e da escola foram consagradas. No período estudado,
circulavam na Revista de Educação Física do Exército (REFE) mensagens de interesse governamental,
propagando os objetivos das forças armadas no campo da Educação Física, educação e formação da
identidade nacional, sendo as seções que mais nos interessam na revista a “Unidade de doutrina”
e “lições de educação física”, em que damos prioridade aos artigos que abordam a Educação Física
aplicada às escolas, assim poderemos compreender como os militares influenciaram as decisões e
sobre de que maneira a Educação Física e a Educação deveria ser orientada nas escolas. A Revista
de Educação Física do Exército (REFE) contou, na época, com autores como Inácio de Freitas Rolim,
militar, e educadores como Fernando de Azevedo, Fernando de Magalhães e Lourenço Filho, que
escreviam artigos na Revista e também participavam dos debates da ABE, nos indicando possível
ligação entre esses pensadores e os militares na construção dessa disciplina. Para a seleção dos
artigos que interessam para os objetivos da pesquisa, estamos identificando, todos os textos que
tratam da educação Física como campo de saber implantado nas Instituições escolares através
dos exercícios físicos, ginástica, jogos e práticas corporais que ensinavam disciplina e ordem,
dos quais seriam os objetivos desse programa de formação de um novo homem à partir dessas
práticas físicas. Na análise desses artigos, temos nos apoiado em Chartier (1998) para identificar
as representações que circulam nos discursos dos autores em relação ao papel da Educação Física
escolar na construção do “homem novo” e em Chervel (1990) e Viñao (2008) para identificar possíveis
conflitos e convergências sobre qual a Educação Física deveria ser a escolar, a praticada na escola. Em
uma análise preliminar dos textos dos anos de 1932 e 1933, já é possível compreender a importância
que as escolas tinham para os militares, já que essa instituição seria o caminho encontrado para
disseminar o método de educação física que de fato construiria um homem novo para a sociedade
que estava se constituindo, pois trazia elementos fundamentais como ordem e disciplina para esse
processo. Os textos lidos até aqui, preliminarmente, apontam para o resultado desse consórcio entre
educadores e militares em que a Educação Física Escolar, na década de 1930, foi implantada não
como disciplina autônoma, apesar do desejo dos militares de mantê-la sobre sua responsabilidade
e cuidado único, mas integrada ao processo educativo geral. A Educação Física escolar fará parte da
educação integral aplicada nas escolas pelo Brasil a partir desse período até os dias de hoje.
Referências
CASTRO, Celso. In corpore sano-os militares e a introdução da educação física no Brasil.
Antropolítica, Niterói, Rj, nº 2, p. 61-78, 1º se. 1997.
HORTA, José Silvério Baía. O hino, o sermão e a ordem do dia; regime autoritário e a educação no
Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ, 2012.
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PRIORE, Mary Del; AMANTINO, Márcia. História do corpo no Brasil. São Paulo: Editora Unesp, 2011.
VIÑAO, Antonio. História das Disciplinas Escolares. Revista Brasileira de História da Educação. N. 18,
p.174-216, 2008.
ISSN 2358-3959
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Norbert Elias (1994), ao estudar o Processo Civilizatório, isto é, a modificação dos hábitos e
costumes que alteraram o comportamento do homem europeu, aponta-nos para a estruturação de
um jogo normativo que seleciona os indivíduos considerados aptos para frequentar a nova sociedade
que se pretendia construir no século XIX.
Em A sociedade de Corte (2001), o referido autor descreve as normas referentes ao cerimonial e
à etiqueta. Nessa obra, Elias demonstra que os rituais de convívio social, desenvolvidos pela corte
francesa, refletem na estruturação social, denotando status e submissão entre aqueles que dominam/
não dominam as práticas preconizadas. Portanto, era necessário que o sujeito que pretendesse
participar da nova sociedade desenvolvesse habilidades que se conformassem à posição social que
deveria ocupar.
Nesse sentido, uma obra perdura no tempo, na medida em que circula e é reinterpretada por
um conjunto de leitores que a ressignificam e passam a denotar sua posição social no contexto em
que se inserem. O livro de Prevost, produzido no século XVIII, na França Iluminista, ganhou novos
significados quando chegou à corte portuguesa e circulou na sociedade brasileira.
Diante desse aspecto, surge a necessidade de fazer um estudo sobre a apreensão dessa obra no
contexto português e brasileiro. Não obstante, a compreensão do ideal de civilidade nos remete ao
pensamento que foi incorporado pela elite brasileira, ávida de espelhar o comportamento europeu,
fato que parece ter tido grande influência na construção de propostas para a Instrução Pública na
Província da Parahyba do Norte.
Essa representação não é apenas um componente de uma mentalidade de época, mas a forma
como o sujeito do século XIX pretendia ser reconhecido no Brasil, como ele se compreendia e como
queria ser compreendido no complexo processo da constituição da nação brasileira. De acordo com
Barros (2004, p. 87),
A pesquisa foi dedicada à leitura do livro de Prevost e ao levantamento dos relatórios da Província
da Parahyba do Norte. Quanto à obra analisada, tivemos o cuidado de buscar o texto original,
publicado em 1777, a fim de compreender o plano da obra. Além disso, verificamos as versões que
circularam em Portugal, em língua portuguesa, e constatamos que sua tradução foi adaptada.
Quanto aos relatórios de Província, fiz um levantamento da criação da Instrução Pública da
Parahyba, pontuando seus principais objetivos. Destaco que a criação do Lyceu Parahybano
antecedeu a organização da Instrução Pública e os desafios de organizar o ensino secundário
erigiu as bases para a organização do ensino na Província, fato elucidado por Ferronato (2012). O
confronto do discurso dos Presidentes de Província com a análise da obra me fez perceber que há
uma correlação direta entre os princípios defendidos por Prevost e as falas dos administradores
da Parahyba, especialmente no que tange à preocupação com a formação moral da mocidade.
Entendemos que essa pesquisa ajuda na compreensão de como a instrução pública da Paraíba foi
concebida e implementada num período em que o Império do Brasil fazia esforços para se consolidar
como uma nação civilizada.
[1] Escolhi utilizar a palavra “Instrucção” com a grafia contida nos Relatórios de Província.
ISSN 2358-3959
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Este trabalho, fruto de uma dissertação de mestrado, buscou investigar se e como a Lei 5.692/71,
um marco importante na educação no período de ditadura civil-militar, impactou as discussões a
respeito do ensino de gramática na disciplina de Língua Portuguesa. Com o advento da legislação
em questão, o ensino de Língua Portuguesa começou a passar por transformações em seus
pressupostos teóricos e metodológicos para adequar-se a um momento em que, além das mudanças
na educação, as mídias, com a novidade da televisão em cores, lançavam novas perspectivas em
relação à comunicação. Para Razzini (2000), foi a partir desse momento que no ensino de português
trocou-se o falar e escrever “corretamente” dos textos literários antológicos, por textos de diferentes
estilos que transmitissem a comunicação e a compreensão da “Cultura brasileira”. Nessa perspectiva,
a Língua, considerada instrumento maior de comunicação, seria um suporte no auxílio de ensinar o
aluno a melhor falar, ler, estudar, sentir, apreciar e escrever. Determinava-se, a partir disso, que o
aluno deveria ser um eficiente emissor e receptor de mensagens através da utilização de códigos
verbais e não-verbais. O que combinava com um momento de mudanças nas mídias visuais e
gráficas, ou seja, um mundo que passava a se apresentar com mais cores e possibilidades
comunicativas diante dos alunos (BELMIRO, 2000). Em relação ao ensino da gramática propriamente,
segundo o Parecer do CFE nº 853/71, a aprendizagem deveria ser feita a partir de atividades em que
o idioma pudesse “surgir” diante do aluno, sob a forma natural de comportamento. Sendo assim, o
estudante deveria ter contato com língua a partir dessas situações cotidianas para, por fim, chegar
às sistematizações gramaticais e poder compreendê-las em sua essência. A partir da promulgação
da lei 5.692/71, e dos pareceres a ela relacionados, revistas pedagógicas publicadas por órgãos
oficiais como o Ministério da Educação e Cultura (MEC), o Conselho Federal da Educação (CFE) e pelo
Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), que circularam durante o período em território
nacional, passaram a orientar professores e profissionais da educação a respeito da implementação
da legislação e sobre a adequação necessária para o ensino de diferentes disciplinas, como por
exemplo, a de Língua Portuguesa. Para identificar, então, as principais discussões a respeito do
ensino de gramática na disciplina de Língua Portuguesa, que na época passou a ser nomeada como
Comunicação e Expressão, utilizou-se como fontes principais os pareceres oficiais e textos
educacionais publicados nas revistas Educação, publicada pelo MEC, Documenta, publicada pelo
CFE, e por fim Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP), divulgada INEP. Através da análise
desses documentos, buscou-se compreender como os profissionais da educação que publicavam
nesses materiais abordaram e contextualizaram o ensino de Língua Portuguesa, conforme a Lei
5.692/71 e os pareceres a ela relacionados, a partir das revistas pedagógicas ora mencionadas.
Sendo assim, alguns conceitos foram importantes para a realização dessa investigação, entre eles os
de representação e apropriação, discutidos pelo historiador Roger Chartier (1990), e o de tradição
seletiva, proposto por Raymond Williams (2003). Foi possível notar que a Lei 5.692/71 trouxe
importantes discussões para a disciplina de Língua Portuguesa, pois além de alterar sua nomenclatura
e objetivos, incitou diferentes discussões e posicionamentos em relação à gramática e seu ensino.
Devido às discussões dos aspectos comunicativos um interessante debate linguístico passou a
ganhar espaço nas revistas pedagógicas ora mencionadas, que tinham o objetivo de orientar o
profissional do meio educacional durante o período de implementação da Lei em questão. Para o
linguista e professor Silvio Elia (1976), em artigo publicado na revista Educação, o recorrente discurso
da comunicação teria afetado significativamente o ensino de Língua Portuguesa. Isso porque, os
conceitos da comunicação tinham a intenção de colocar o professor ao nível do aluno, e buscava
usar a linguagem que o educando trazia de seu cotidiano no ambiente escolar. Muito da confusão da
norma culta acontecia, conforme o autor, por costumeiramente a relacionarem com a norma
literária, devido à influência da literatura clássica e estrangeira na nossa própria história. Entretanto,
o correto seria, em sua opinião, que o aluno desenvolvesse, ao longo do seu período escolar, a prática
de diferenciar a língua culta da literária, e aprimorar sua língua materna a partir da leitura e do
estudo das normas gramaticais. Por outro viés, o texto Flávia da Silveira Lobo (1977), professora de
literatura brasileira na época, publicado em 1977 na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, traz
um discurso diferente do anterior. O artigo intitulado Língua Portuguesa: afinal que língua é essa?,
discute as questões da linguagem formal e informal, e aborda as mudanças naturais que ocorrem
em um idioma de acordo com o tempo e o meio em que se desenvolvem. Em sua concepção, pelo
fato de a escola acostumar os alunos de que a língua parte de uma gramática e de suas regras, a ideia
de que idiomas evoluem conforme o uso acabam passando despercebida por esses falantes. Para
Lobo, a cobrança exagerada da gramática sem levar em consideração as mudanças da língua e os
contextos de uso, assim como o contato do aluno com literatura somente em linguagem formal,
poderiam deixar a criança que está em processo de aprendizagem desconfortável com seu próprio
idioma. Por meio da leitura de tais artigos é possível concluir que uma mesma legislação incitou
diferentes discursos. Apesar da valorização aos aspectos comunicativos no ensino de Língua
Portuguesa a partir da Lei 5.692/71, o meio educacional se apropriou de diferentes formas das
questões levantadas pela legislação, uma vez que alguns dos discursos presentes nas revistas
pedagógicas analisadas defendiam manter um ensino tradicional da disciplina, ou seja, com ênfase
à gramática, enquanto outros propunham inovações, apoiando-se, essencialmente, em Teorias da
Comunicação. Dessa forma, pode-se compreender essa defesa pelo ensino “belo” e “correto” da
língua conforme a acepção de “tradição seletiva” discutida por Raymond Williams (2003, p. 60),
observando esse processo de permanência, transformação e de tentativas de amenização da
gramática no ensino de Português. Para Williams, “o que sobrevive não é determinado por seu
próprio tempo, mas pelos tempos posteriores, que gradativamente compõem uma tradição” (p. 59).
Nesse aspecto, se considerarmos a argumentação do autor, o estudo da gramática mantinha-se
presente nas orientações da época devido aos valores de cada época que o preservou. Isso porque,
por muito tempo o ensino de Português se baseou no estudo da gramática e na leitura de antologias
que privilegiassem autores portugueses e a linguagem clássica, desenvolvendo nos alunos a
concepção da escrita e da fala “correta” (SOARES, 2002). São notórias, portanto, algumas diferenças
de opiniões e concepções do meio educacional no processo de apropriação da Lei 5.692/71 e os
pareceres a ela relacionados. Apesar da defesa por tradição de um lado, e a necessidade de inovação
por outro, as principais orientações a respeito do ensino de Língua Portuguesa propõem, de forma
geral, a comunicação com o objetivo de desenvolver no aluno as capacidades de expressar-se de
forma clara e correta. Esse ensino não necessitaria ser puramente gramatical, e sim valorizar as mais
variadas formas de se explorar a leitura e a comunicação. Sendo assim, observa-se que a proposta
do ensino de gramática deveria ser precedida também do desenvolvimento da leitura e escrita de
diferentes gêneros, verbais e não-verbais, o que demonstra, de certa forma, que os dois lados da
discussão – “elegância” e “correção” na escrita/fala versus linguagem informal – estavam pouco a
pouco se aproximando, afinal, a inserção do conceito de comunicação nas orientações do período
poderia demonstrar um novo olhar para a relação da gramática com o ensino e o desenvolvimento
da Língua Portuguesa. Deve-se considerar, igualmente, as diferentes posições e formações desses
profissionais, pois essa dicotomia pode partir de professores que vinham já de uma tradição de
ensino e que poderiam não ter interesse em mudá-la; e por aqueles que, ou acabavam de ingressar
na educação e encontravam esses novos discursos, ou aqueles que buscavam atualizar seus métodos
de ensino. Em linhas gerais, as orientações pedagógicas do período mantêm um discurso equilibrado,
em que a gramática continua fiel escudeira do ensino de Língua e ganha, de acordo com a legislação
do período, somente outra posição, a de complemento final no processo de desenvolvimento eficaz
da comunicação e da expressão dos alunos.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente estudo visa abordar o problema do Ensino Religioso nos embates durante a elaboração
da primeira Lei de Diretrizes e Bases da educação brasileira, mediante seus processos de constituição
motivados por interesses diversos. Estes consequentes embates ocorreram entre os que eram
favoráveis à sua execução, os intelectuais denominados “católicos” e os grupos que defendiam uma
educação laica, liberal e democrática, denominados “liberais”, oriundos de tendências distintas,
mas que se unem no momento do debate e oposição à proposta anterior.
Ao abordarmos este problema, identificamos interesses econômicos e políticos diversos, opiniões,
discussões e tendências no que se refere à própria realidade e a necessidade dos educandos de
um sistema educacional que fosse realmente consistente, forte e transformador. Consideramos
este tema das discussões acerca da elaboração da primeira Lei de Diretrizes e Bases da educação
brasileira (LDB 4024/61) um assunto delicado e complexo, mas ao mesmo tempo, pertinente e de
interesse para a compreensão da história da própria educação brasileira, fazendo-se necessário um
aprofundamento adequado sobre ele, a fim de contribuirmos para o esclarecimento em torno da
presença do fenômeno religioso, do discurso sobre Deus e da experiência cultural-religiosa de um
povo, pois marca desde as origens a educação brasileira.
Deste modo, nosso intento assenta-se na observação dos vínculos existentes entre educação e
doutrina religiosa e em que medida os embates ocorridos e as consequentes reformas promovidas,
sobretudo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira de 1961 deram conta de abarcar a
problemática apontada.
Nesta primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei 4.024/61, em seu artigo
97, encontraremos o dispositivo com determinação para que a disciplina de Ensino Religioso seja
oferecida nos horários normais das escolas, ou seja, é validado o ensino da religião dentro dos
currículos comuns escolares, embora com matrícula facultativa e sem qualquer ônus para o Estado.
E é exatamente neste período histórico de grande valor, momento capital de nossa evolução
histórica moderna, encarado sob o ponto de vista pedagógico, que se assenta o nosso recorte
temporal e epistemológico, para observarmos os constantes e calorosos debates ocorridos na defesa
de uma reforma educacional por grupos distintos, cada um com suas razões e ideologias próprias.
Desta maneira, nos propomos analisar, de forma objetiva, as balizas que foram, no decorrer da
história da educação, aplicadas no âmbito do chamado Ensino Religioso, enquanto disciplina nos
currículos educacionais brasileiros. De modo que, ficarão evidentes quais as bases teóricas, legais e
metodológicas compõem a história do referido componente pedagógico, buscando assim, averiguar
os momentos em que o enfoque se rendeu a uma abordagem meramente catequética, doutrinal,
proselitista, tendenciosa e/ou dependente nos campos teológicos, ou não.
Mas além disso, observar a defesa que fará o grupo católico que acabava por privilegiar uma
educação um tanto quanto privatista, conservadora e tradicional. Por outro lado, identificar a união
entre três grupos para defender a oferta de uma educação pública, gratuita e laica. São eles: liberais-
idealistas, representados pelo Jornal O Estado de São Paulo; os liberais pragmatistas, representados
pelos educadores pioneiros do Movimento da Escola Nova e os liberais de tendências socialistas,
representados pelo Professor Florestan Fernandes, já presente na Universidade de São Paulo (USP).
De modo que os problemas decorrentes deste debate educacional implicam na própria legislação
que seria posteriormente promulgada, com a finalidade de chancelar os conteúdos oferecidos aos
estudantes brasileiros, interessando-nos, assim, buscar compreender qual foi o caminho trilhado
para se chegar ao que enfim, fora aprovado, suas influências, possíveis dependências além das
finalidades com as quais o processo foi sendo implementado.
Por esta razão, considerando a necessidade natural que a sociedade sempre teve de estabelecer
princípios para a sua própria organização, a fim de bem orientar os seus cidadãos acerca de
seus direitos e deveres, além de determinadas outras normas e balizas necessárias para o bom
funcionamento do coletivo, queremos analisar as diversas discussões que nortearam as legislações
que basearam o próprio Ensino Religioso brasileiro até o período específico, por nós apontado, mas
sobretudo, com enfoque na clara disputa por um campo científico, aí presente.
Para tanto, buscaremos compreender como se deu essa verdadeira disputa por espaço e,
consequentemente, por poder, posto que o campo é lugar de embate constante, com regras explícitas
e uso de linguagem específica, ou não. Lutas pela hegemonia e pela legitimidade do campo, por
meio de manifestações, publicações, pareceres, apoios e declarações de políticos, intelectuais,
pronunciamentos, etc, que pretendemos analisar.
O Ensino Religioso está presente nos currículos educacionais do Brasil há certo tempo e sempre
com discussões a seu respeito, sobretudo no que se refere aos problemas epistemológicos inerentes
a ele, devido à necessidade de um maior esclarecimento para uma consequente aplicação a contento,
respeitando tradições religiosas e culturais presentes em nosso país. Deste modo, identificamos a
necessidade de se estudar os calorosos embates que ocorreram acerca da referida disciplina, no
momento que antecede a promulgação de nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases, a lei 4024 de
1961, dez anos depois reformada pela Lei 5692 de 1971.
Consideramos ser este um tema complexo e atual para as discussões acerca da Educação
brasileira, levando em conta a mudança ocorrida recentemente com a Base Nacional Comum
Curricular, depois de tanta discussão e polêmicas, na qual o Ensino Religioso, conforme orienta
a Lei de Diretrizes e Bases, continua sendo disciplina obrigatória nas Escolas Públicas, porém,
permanecendo facultativo ao aluno, cursá-la ou não, ou seja, a matrícula poderá ser optativa aos
alunos do ensino fundamental. Entre as competências para esse ensino estão a convivência com a
diversidade de identidades, crenças, pensamentos, convicções, modos de ser e viver.
No dia 27 de setembro de 2017, o STF (Superior Tribunal Federal) decidiu que o Ensino Religioso
em escolas públicas pode ter caráter confessional, ou seja, as aulas podem ter como guia os
ensinamentos de uma religião específica, levantando assim, mais uma vez, um grande debate sobre
a legitimidade da decisão estabelecida, bem como sua aplicação, forma e prazo de implementação
nas unidades escolares.
Com placar apertado, quase que empatado (seis votos a cinco), os Ministros do STF decidiram
de maneira a não considerar a laicidade do Estado Brasileiro de Direito, julgando uma ação de
inconstitucionalidade movida pela Procuradoria-Geral da República, que defendia que as aulas
da referida disciplina deveriam oferecer uma visão geral sobre as diferentes tradições religiosas,
modificando inclusive, a lei que até então estava em vigor e assim orientava os currículos brasileiros.
O Conselho Nacional de Educação ainda deverá decidir se o Ensino Religioso terá tratamento
como área do conhecimento ou como componente curricular da área de Ciências Humanas, no
Ensino Fundamental. De modo que a discussão continua e isto nos interessa frontalmente, pois
está exatamente dentro do que temos estudado e assim poderemos analisar os desdobramentos e
deliberações da referida discussão.
Além das questões supra apresentadas, identificamos também um número consideravelmente
pequeno de estudos sobre o assunto, o que nos interpela ainda mais a nos propormos para oferecer
também a nossa contribuição para a evolução do debate e da reflexão acerca dos temas em questão.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 378
A proposta desta comunicação é analisar o Método Intuitivo como um dos temas mais publicados
pelos docentes na Revista do Ensino alagoana. O referido periódico pedagógico era vinculado ao
Pedagogium Alagoano criado para oferecer aos professores os meios de instrução profissional que
poderiam necessitar, com os melhores métodos ou material de ensino, tal ação impulsionaria o
melhoramento da instrução, sua primeira edição foi em 15 de maio de 1891. Publicada nos dias
1 e 15 de cada mês, a redação do periódico era composta por alguns intelectuais como, Francisco
Domingues da Silva, Ignacio Joaquim da Cunha Costa e Joaquim Ignacio Loureiro, por exemplo.
Os artigos escritos na revista eram de autoria dos professores públicos da capital, ela durou dois
anos sob o título Revista do Ensino, depois volta em 1927 com uma mudança no título, ao invés
de usar “do Ensino”, vinha como Revista de Ensino. Ela seguia as revistas a nível nacional desde
a primeira de 1883 no Rio de Janeiro. Alagoas não podia ficar atrás, visto que a partir do Decreto
n. 7.247, de 19.04.1879, o Poder Executivo “Institui a reforma primaria e secundaria no município
da Corte e o superior em todo império”, com isto o Método Intuitivo passou a ser considerado um
avanço educacional, pois já bastante visto na Europa, e como o Brasil estava passando por uma
transição de Império para Republica nada melhor que trazer o método educativo que estava
relacionado com o que se tinha de mais moderno em termos de ensino . Machado e Silva (2014,
p. 200), interpretam que quando Benjamin Constant criou o decreto nº. 981, em 08 de novembro
1890 (BRASIL, 1890), e por ter sido o primeiro diretor da Escola Normal da Corte em 1880, via como
sua responsabilidade instituir uma reforma da instrução pública no Brasil. A partir desse decreto o
método do ensino intuitivo passou a fazer parte das discussões para buscar a melhoria da educação.
O decreto pretendia universalizar o ensino público, e o método iria ser um aliado na formação dos
professores. As autoras Remer e Stentzler (2009, p. 6339) diz que o método intuitivo foi firmado nas
ideias de Pestalozzi e Fröebel, trazendo uma abordagem indutiva, na qual o ensino deveria partir do
particular para o geral, do conhecido para o desconhecido. Este método já era conhecido em outras
cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, pois Rui Barbosa traduziu o livro escrito por Norman Allison
Calkins intitulado “Primary object lessons”, publicado no Brasil em 1886 com o título de “Primeiras
Lições de Coisas” tornando-se um manual para orientar os professores, tanto nas escolas normais e
primarias no final do século XIX e início do século XX. Portanto, a partir de então recomendava-se
que as províncias teriam que aderir o método do Ensino Intuitivo, porque era adotado e usado nos
países como Alemanha, na Suécia, na França, na Bélgica, Itália e nos Estados Unidos, e assim o Brasil
pretendia seguir o que estava de mais atual na época. O método intuitivo requeria dos professores
mais intelectualidade, portanto um aprimoramento do saber, segundo (RENER e STENTZLER
2009, p. 6341). Contudo, para que os professores adquirissem intelectualidade, necessitariam de
materiais pedagógicos para a formação docente. Benjamin Constant em 1890 cria o Pedagogium,
que foi um museu pedagógico, no Rio de Janeiro, que entra como instrumento de veiculação de seu
projeto a Revista Pedagógica também do estado fluminense em 1890, então a mesma revista que
circulava nas grandes capitais da época São Paulo e Rio de Janeiro, que chegou em Alagoas com
o mesmo discurso dando ênfase a formação inicial e continuada dos professores, e constituindo
elementos para instaurar uma pedagogia republicana em todo território brasileiro. Ao analisar a
Revista do Ensino alagoana percebemos que por elas não eram bem vistas na área da história da
educação nacional de acordo com Regina Luca (2015, P. 111) diz que a partir da “década de 1970 era
relativamente pequeno o número de trabalhos que se valia de jornais e revistas como fonte periódica
para o conhecimento da história no Brasil, mas reconhecendo a importância de tais impressos.
Entendendo a importância dos periódicos na história da educação, trago a Revista do Ensino para
essa comunicação, pois nela há diversos artigos que abordam o Método Intuitivo. Ao analisar a
Revista do Ensino de 1891-1892, termos o apoio de Catani (1996) que diz, é ser possível partir de
um estudo de determinados periódicos educacionais e toma-los como núcleos informativos, para
tratar de questões de ensino observando os conjuntos de prescrições e recomendações sobre as
formas ideais de como se realizava o trabalho docente. Portanto, o periódico alagoano que seguia os
padrões dos Estados brasileiro, com a ajuda do Pedagogium que o intuito de padronizar a educação
pública alagoana através de seus docentes, visando o Método Intuitivo que estava em ascensão no
momento, o Estado deveria se igualar a nação brasileira quanto a educação, obedecendo o Decreto nº
981, para que a educação pública alagoana fosse bem vista pelos atuais responsáveis pela educação
brasileira. Em Alagoas foi decretado pelo primeiro governador republicano a proposta do diretor da
instrução pública no oficio n. 77, de 14 de fevereiro do corrente ano que o ensino público, através
de seus mestres e métodos passariam ser unificados nas aulas primárias, de acordo com a Revista
do Ensino (1891, p. 01). No periódico alagoano o Methodo Intuitivo ou Lecções de Cousas, é abordado
nas áreas de conhecimento como: português, ciências físicas e naturais. O primeiro artigo da revista
que trata sobre o Ensino Intuitivo – Prelecção dada a crianças, I – Corpos Brutos ou inorgânicos, I –
Corpos Vivos ou Orgânicos nele é abordado os seres não vivos (REVISTA DO ENSINO, 1891, p. 37-
39) como mármore, madeira, ouro e a água, seres vivos como: plantas, humano e animais, mas
sempre com exemplos concretos para que as crianças não fiquem fazendo conjecturas, a Revista
do Ensino número 3 seguindo até ao número 4, vai dando continuidade ao assunto. A professora
Laura Diegues, traz um artigo intitulado “Illutres Collegas: Designada para apresentar n’esta sessão
um trabalho sobre Lições de Cousas,hoje tão em uso nos paizes os mais civilisados,[...]”.(REVISTA DO
ENSINO, 1891, p. 82-86). Além da professora deixar claro o propósito do artigo, ela traz nele como os
professores deveriam apresentar o ensino do substantivo próprio e comum, através de um diálogo
com as crianças, trazendo os nomes das cidades como substantivo próprio, e os objetos da sala
como substantivo comum. Além desses já mencionados encontramos outros dois ligados às ciências
da natureza e física, nos exemplares número 6 e 7 do corrente ano ambos artigos localizados na
da Secção Pedagogica – Dissertação sobre Licções de Cousas, tanto pela professora Eulalia Eloysa
Castro Bahia como Maria Amelia da Conceição. No resultado, proposto a partir da análise da revista
entendemos que o Pedagogium estava realizando seu papel, pois o diretor da Instrução Publica
Diegues Junior fez uma visita a escola do sexo feminino do Pedagogium e ficou satisfeito de como as
aulas dirigidas pelas professoras Angelica Pita, Eulalia Bahia e outras, mas ele cita Angelica Pita que
traz licções de cousas para explicar o corpo humano. (PATRIA, 1892). As docentes estariam seguindo
a revista alagoana que trazia as instruções necessárias no seu primeiro exemplar. Gondra (1997) diz
que toda essa preocupação com a formação ou profissionalização docente, na verdade não passava
de uma propaganda republicana para se mostrar vitorioso com a queda da monarquia, tudo que
estava ligado ao velho, necessitava de uma reformulação através do seu novo regime ideário, em
diversos os setores da sociedade tais como: econômico, político e o educacional, dentre outros.Com
isso acreditamos que os docentes estavam alcançando a inlectualidade necessária para transmitir o
Método Intuitivo nas escolas primarias de Alagoas.
Referências
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campo educacional. Revista Educação e Filosofia, 10(20) p. 115-130, jul/dez. 1996.
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XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 381
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Bassanezi (Org.). Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2015. p. 111-1533.
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ISSN 2358-3959
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Escrever sobre o Programa de Ensino Integral é sempre desafiador, principalmente quando se está
envolvido diretamente com o cotidiano de uma escola inserida no Programa. Entendo que fazer uma
leitura critica é um caminho possível. Assim, o objetivo desse artigo é possibilitar uma multiplicidade
de discussões acerca do tema e elencar algumas possibilidades de tentar entender porque os
obstáculos e os acertos devem ser observados com atenção. No dia 11 de setembro de 2019 o Governo
de São Paulo publicou no Diário Oficial do Estado a resolução nº 44, que garantia, a expansão do
Programa Ensino Integral (PEI). Como Professor Coordenador de Área de Humanas (PCA/Humanas)
e Professor de História de uma Unidade Escolar que desde 2016 atua no Programa de Ensino Integral,
no Ensino Fundamental II, algumas questões se colocam como hipóteses a serem investigadas,
como por exemplo, na prática o que justifica tal expansão? Como, no interior da escola, o principal
objetivo do Programa de Ensino integral que é: formar jovens autônomos solidários e competentes se
desenvolve? Quais são os obstáculos e quais os êxitos? Quanto as Premissas: Protagonismo Juvenil,
Formação Continuada, Corresponsabilidade, Excelência em Gestão e Replicabilidade[2], de que
maneira, no cotidiano escolar, essas premissas proporcionam trocas de experiências que permite
a, equipe escolar, aprender aprimorando a sua prática pedagógica a serviço de uma educação de
qualidade? Essas são questões chaves para entendermos a aplicabilidade do Programa de Ensino
Integral, no dia a dia da Escola. É necessário pontuar que de acordo com o próprio governo paulista,
divulgado pelo Jornal Folha de São Paulo, os alunos matriculados no Programa de Ensino integral,
no ano de 2018, do Ensino Médio tiveram uma pontuação 60% maior que as demais modalidades de
ensino, segundo o IDESP (Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo)[3]. Em
nenhum momento, o governador apresentou os números para o Ensino Fundamental II, no Estado
de São Paulo. A Resolução SE-52, de 2-10-2014, que dispõe sobre a organização e o funcionamento,
das escolas estaduais, do Programa Ensino Integral, de que trata a Lei Complementar 1.164, de 4 de
janeiro de 2012[4], estabelece as diretrizes para a implementação do Programa de Ensino Integral no
Estado de São Paulo, quando pontua que, “a importância da expansão do Programa Ensino Integral
que, iniciado no ensino médio, estendeu-se também ao ensino fundamental – anos iniciais e anos
finais, com implantação gradativa nas escolas da rede estadual”[5]. Em toda a resolução o governo não
indica quais mudanças estruturais fará no prédio escolar para adaptá-lo ao Programa, quando esse
item deveria ser o principal, ou seja, não há um critério para que a escola possa aderir ao Programa.
A segunda questão, versa sobre o objetivo do Programa de Ensino Integral que é o desenvolvimento
da formação de jovens autônomos solidários e competentes. Três são as disciplinas, que na
organização de uma escola do Programa, se colocam como importantes no desenvolvimento dos
adolescentes. São as disciplinas, Eletivas, Projeto de Vida e Protagonismo Juvenil. Alem dessas, existe
uma que, não se aplica enquanto disciplina, mas é muito bem aproveitada na escola, a Tutoria. No
documento orientador do Programa de Ensino Integral[6], a disciplina eletiva, é uma proposta da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no seu artigo 26, como parte diversificada, das diretrizes
dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio. Ainda, segundo o documento orientador,
as Disciplinas Eletivas[7] deveriam promover “o enriquecimento, a ampliação e a diversificação
de conteúdos dentro do currículo do Ensino Integral”. As disciplinas eletivas ocupariam “um lugar
central no que tange à diversificação das experiências escolares, oferecendo um espaço privilegiado
para a experimentação, a interdisciplinaridade e o aprofundamento dos estudos”[8]. Essa disciplina
é oferecida semestralmente e deveriam participar, de sua elaboração, ao menos dois professores,
de preferência de áreas do conhecimento distintas, com tema que deveriam atender as demandas
dos alunos em relação aos seus Projetos de Vida e, no Ensino Fundamental, os alunos podem ser
agrupados entre 6º e 7º anos e 8º e 9º anos. Em muitas ocasiões, o principio do estudante eleger
sua disciplina eletiva acaba não se concretizando, pois não existe número de vagas suficientes para
serem oferecidas, além disso, no caso do Ensino Fundamental II, os estudantes não tem a maturidade
de fazer escolhas. Dessa forma, os alunos acabam não participando da construção do seu próprio
currículo, como proposto pelo Programa de Ensino Integral. Outra disciplina que norteia o Programa
de Ensino Integral é o Projeto de Vida[9], que se constitui em um meio para motivar os estudantes
a fazerem bom uso dessas oportunidades educativas. No Programa os docentes devem “apoiar o
projeto de vida de seus alunos e garantir a qualidade dessas ações. No entanto, cabe também aos
alunos a corresponsabilidade no seu desenvolvimento, já que são os interessados diretos”[10]. De
acordo com o documento orientador os jovens deveriam participar “ativamente do processo ensino
e de sua aprendizagem”. E a função da escola é oferecer possibilidades para que os jovens atinjam
esse objetivo final, ou seja, seu projeto de vida e a realização dos seus sonhos. A terceira disciplina
diversificada importante para o desenvolvimento do adolescente é o Protagonismo Juvenil[11], que
“é um processo no qual o jovem é simultaneamente sujeito e objeto das ações no desenvolvimento
de suas próprias potencialidades”.[12] Para que esse tipo de orientação e desenvolvimento ocorra,
seria necessário, que o ambiente escolar fosse “cuidadosamente pensado de modo permitir ao
educando conquistar a autoconfiança, autodeterminação, autoestima, autonomia, capacidade
de planejamento, altruísmo, perseverança”[13], que seriam elementos fundamentais para o
desenvolvimento de “suas habilidades e competências na conquista de sua identidade pessoal e
social”[14]. Mas, na prática e, tendo como referência a escola de Ensino Fundamental II, em que atuo,
isso ocorre de maneira muito superficial. Mais uma vez, destacando a imaturidade dos estudantes,
mas também o despreparo dos professores, que não são capacitados para tal empreitada, uma vez
que os cursos de formação, quando são oferecidos pela Secretaria do Estado da Educação, estão
distante da realidade do cotidiano escolar. Enfim, devemos responder uma última questão, não mais
importante, sobre o cotidiano escolar de uma escola inserida no Programa de Ensino Integral. De
que maneira as premissas proporcionam trocas de experiências para que a equipe escolar aprimore
a sua prática pedagógica? A formação do educador deveria ser abordada sob duas perspectivas: a
primeira busca o aperfeiçoamento da formação do educador nas bases, nos conceitos e nas práticas
do Programa Ensino Integral; a segunda dedica-se à formação do educador no âmbito do Currículo.
Portanto, trata-se de fortalecer a formação docente no que se refere aos conteúdos do Currículo
(Base Nacional Comum e Parte Diversificada) trabalhados na sua prática profissional[15].
[1] http://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/secretaria-da-educacao-publica-resolucao-sobre-expansao-do-
programa-ensino-integral/. Em 31/10/2019.
[2] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf. Em 31/10/2019.
[3] https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2019/10/doria-promete-ampliar-ensino-integral-mas-reduz-ver-
ba-de-programa.shtml. Em 31/10/2019.
[4] http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/52_14.HTM?Time=10/07/2017+13:07:47. Em 31/10/2019.
[5] Idem.
[6] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
[7] Artigo 11, § 2º - Nos Anos Finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, a avaliação dos componentes curric-
ulares da Parte Diversificada, incluídas as Atividades Complementares, processar-se-á especificamente na seguin-
te conformidade: 1 – nas Disciplinas Eletivas, de duração e avaliação semestrais: com nota atribuída mediante a
aplicação de critérios de participação e envolvimento do aluno (desenvolvimento de atividades e pontualidade
em sua entrega), bem como de assiduidade, de mudança de atitude, de domínio de conteúdo e uso prático dos
quatro pilares da educação, devendo se utilizar diferentes instrumentos de avaliação, tais como: ficha para registro
do desempenho do aluno, portfólios, observação rotineira pelo professor e uso de agenda, entre outros. Resolução
SE-52, de 2-10-2014.
[8] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
[9] Artigo 11 – Os componentes curriculares da Parte Diversificada, excetuada a Língua Estrangeira Moderna, nas
matrizes do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, serão avaliados na conformidade do que estabelece a
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 384
presente resolução, observando-se que as notas atribuídas, quando for o caso, não interferirão na definição da
situação final do desempenho escolar do aluno, em termos de promoção/retenção. § 2º - Nos Anos Finais do Ensino
Fundamental e no Ensino Médio, a avaliação dos componentes curriculares da Parte Diversificada, incluídas as
Atividades Complementares, processar-se-á especificamente na seguinte conformidade: 5 – no Projeto de Vida, do
Ensino Médio, e no Projeto de Vida: Valores para a Vida Cidadã e Protagonismo Juvenil, dos Anos Finais do Ensino
Fundamental: mediante parecer descritivo a ser elaborado ao final de cada semestre, versando sobre atitudes e
ações do aluno que forem observadas, tendo como base a obtenção das competências relativas aos quatro pilares
da educação. Resolução SE-52, de 2-10-2014.
[10] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
[11] Artigo 3º, II - nos Anos Finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio – além dos eixos de que tratam as alíneas
“a”, “b” e “c” do inciso anterior, com observância também aos eixos estruturais a seguir relacionados: b) Protagonis-
mo Juvenil – processo pedagógico em que o aluno é estimulado a atuar, criativa, construtiva e solidariamente, na
solução de problemas reais, que se vivenciem na escola, na comunidade e/ou na vida social. Resolução SE-52, de
2-10-2014.
[12] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
[13] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
[14] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
[15] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
[16] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
[17] https://www.educacao.sp.gov.br/a2sitebox/arquivos/documentos/342.pdf
ISSN 2358-3959
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mencionar o Decreto-lei n.º 5.607, de 22 de julho de 1943, o qual “dispõe sobre a organização de
Serviços de Ensino e Orientação Profissional nas Estradas de Ferro Administradas pela União, e dá
outras providências”, instituído pelo então presidente Getúlio Vargas. Com essa legislação é que se
regulamenta, portanto, o “ensino profissional ferroviário que, na prática, já vinha há muito tempo
sendo patrocinado dentro das concessionárias das ferrovias” (BATISTA, 2009, p.8). Estabeleceu-se
com isso a criação “em cada uma das Estradas de Ferro Administradas pela União, um Serviço de
Ensino e Orientação Profissional (S. E. O. P.) que funcionará[ia] de acôrdo com o presente decreto-
lei e com a legislação complementar que for expedida” (BRASIL, 1943). Ademais, observa-se que
nesse decreto-lei a S.E.O.P teria “por finalidade estudar, organizar e aplicar processos destinados a
formar, orientar ou aperfeiçoar o pessoal técnico e administrativo da respectiva estrada” (BRASIL,
1943). Ou seja, a promulgação desse decreto-lei flerta com um dos itens inscritos no quadro de
enunciados dos quais a RVPSC deveria promover, a saber: “a formação do pessoal necessário aos
serviços, por meio de seleção adequada e instrução profissional, como tambem o aperfeiçoamento
técnico e funcional dos empregados” (BRASIL, 1942a). Falar da instauração da Escola Profissional
Ferroviária Cel. Durival Britto e Silva em Curitiba, passa por considerar o contexto político e
econômico no qual o Brasil se encontrava na década de 1940, quando se exigia uma “redefinição
da política de importação de pessoal técnico qualificado”, dado que “a guerra estava funcionando
como mecanismo de contenção da exportação de mão de obra dos países europeu para o Brasil”
(ROMANELLI, 2014, p.159). Os desdobramentos do Decreto-lei que trata do Ensino Industrial revelam,
portanto, a preocupação do governo em engajar as indústrias na formação de seus trabalhadores,
como bem analisa Romanelli (2014), principalmente porque, segundo examina a própria autora,
o sistema de ensino estatal estava impossibilitado de oferecer educação profissional adequada.
Apesar deste estudo ter procurado responder algumas questões quanto as finalidades do projeto
educacional imbuído na Escola Profissional Ferroviária Coronel Durival Britto e Silva em Curitiba,
parece fundamental o seu aprofundamento apoiado em outras fontes, uma vez que este trabalho
limitou-se ao exame das legislações encontradas da década de1940 e da escassa bibliografia em
relação ao ensino profissional ferroviário. Objetivos. Este trabalho se destina a análise de um
conjunto de normas, que permitiram, em linhas gerais, a instalação da Escola Profissional Durival
Britto e Silva, em Curitiba, no Paraná, na década de 1940. O presente trabalho traz à baila o debate
a respeito do ensino industrial, cuja expressão guardava uma determinada concepção de formação
da força de trabalho no país, conforme analisa Machado (2012). Também constitui objetivo desse
estudo levantar algumas reflexões sobre o projeto educacional pretendido para as ferrovias, em
especial, na cidade de Curitiba. Metodologia. Propõe-se uma pesquisa bibliográfica e documental,
apoiada em análise da legislação do período de 1940, correspondente ao inicio das atividades da
escola profissional ferroviária, objeto deste estudo. Resultados. A Escola Profissional Ferroviária em
Curitiba, possibilitou a profissionalização e atuação de um conjunto de trabalhadores nas ferrovias
ao mesmo tempo em que ofereceu um ensino de preparo geral, onde estes trabalhadores tinham
acesso a matemática e língua portuguesa.
Referências
BATISTA, Maristela Iurk. O Estado Novo e as novas perspectivas no processo educacional brasileiro:
os reflexos na expansão do ensino ferroviário (1937-1945), 2009. Disponível em: http://www.histedbr.
fe.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario6/Escolas,+Cursos+e+Programas++Especiais/
Estado+Novo....doc. Acesso em: 21 out. de 2019.
BATISTA, Sueli Soares dos Santos; CARVALHO, Maria Lúcia Mendes de. Estudo sobre os cursos
ferroviários nos anos de 1940 a 1960 a partir das revistas ferroviárias. Educação em Revista. Belo
Horizonte. V.31. n.03. p.143-167, julho-setembro, 2015. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/
edur/v31n3/1982-6621-edur-31-03-00143.pdf. Acesso em: 22 nov. de 2019.
BRASIL. Decreto-lei nº 4.073, de 30 de janeiro de 1942. Lei orgânica do ensino industrial. Rio de Janeiro
(RJ). 1942b. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-
4073-30-janeiro-1942-414503-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em: 24 out. de 2019.
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BRASIL. Decreto-lei nº 5.607, de 22 de junho de 1943. Dispõe sobre a organização de Serviços de Ensino
e Orientação Profissional nas Estradas de Ferro Administradas pela União, e dá outras providências.
Rio de Janeiro (RJ). Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/
decreto-lei-5607-22-junho-1943-415719-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em: 23 out. de 2019.
MACHADO, Maria Lúcia Büher. Formação profissional e modernização no Brasil (1930-1960): uma
análise à luz das reflexões teórico-metodológicas de Lucie Tanguy. Educ. Soc., Campinas, v. 33, n.
118, p. 97-114, jan.-mar. 2012 Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v33n118/v33n118a07.pdf.
Acesso em: 20 nov. de 2019.
PETUDA, Rosângela Maria Silva. Experiências ferroviárias na cidade de Ponta Grossa (PR) (1955-
1997). História e Perspectivas, Uberlândia (51): 185-217, jul./dez. 2014. Disponível em: http://www.
seer.ufu.br/index.php/historiaperspectivas/article/view/28892. Acesso em: 4 out. de 2019.
ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da Educação no Brasil. 40. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
[1] O Estado Novo constituiu-se, no Brasil, um regime político entre o período de 1937 a 1946.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Reisla Silva
Joaquim Pintassilgo
Esta comunicação tem por objetivo compreender que elementos do “Método Decroly” circularam
por meio do periódico de educação Português Revista Escolar e da Revista de Ensino do Estado de
Minas Gerais-Brasil. Jean Ovide Decroly (1871- 1932) nasceu na Bélgica e formou- se em medicina
pela Universidade de Gante em 1896. Entre os anos de 1896 e 1897 fez internato médico em neurologia
m Berlim e na Universidade de Salpêtrière em Paris, onde esteve por intermédio de um concurso de
bolsas. Em 1901 foi convidado pela sociedade de medicina belga a chefiar um pequeno centro de
estudos para observação e tratamento de crianças ‘anormais’. O convite foi aceito com uma ressalva:
que este centro funcionasse na própria casa de Decroly e que estas crianças convivessem com seus
três filhos. Nasce então o “Instituto de ensino especial –Laboratório pedagógico Dr. Decroly”. No ano
de 1907 Decroly criou a escola de Ermitage para a educação regular. A partir deste momento os seus
trabalhos transcendem o campo médico inclinando-se para o campo da aprendizagem infantil
(Dubreucq,2010). A escola fundada por Decroly funciona atualmente com o seu nome e faz parte da
FESLI (Federation of Free Subsidized Establishments), Federação de Estabelecimentos Livres não
Subsidiados de Bruxelas. Possui mil alunos com idades entre três e dezoito anos. No que diz respeito
ao “Método Decroly”, alguns mistérios o circundam, um deles é a inexistência de fatos que comprovem
a sistematização feita pelo próprio autor. Nesse sentido, buscamos compreendê-lo a partir das
organizações feitas por seus colaboradores, entre eles Amelie Hamaïde (1956), sua mais próxima
colaboradora, a primeira a redigir o livro denominado La Méthode Decroly em 1922. A partir de 1923
o referido livro recebeu inúmeras traduções: para o inglês (1923), castelhano (1924), polaco (1926),
turco (1927), japonês (1931), alemão, eslovaco, sueco, português e romeno. Considera-se portanto,
como “Método Decroly”, um conjunto de procedimentos vinculados ao autor, no âmbito dos métodos
ativos e da Educação Nova, onde assumem um papel de grande relevância, tendo como eixos
estruturantes, os centros de interesses infantis, a função da globalização (ou das ideias associadas)
e os jogos educativos. Utilizamos esta definição prévia para melhor captar as representações
emergentes das fontes analisadas e não incorrer no comum equívoco de vincular o “método” apenas
ao programa dos Centros de Interesses Infantis. As fontes escolhidas para este estudo foram artigos
elaborados por educadores e inspetores de ensino em dois periódicos educacionais, um Português
e outro Brasileiro. O primeiro deles é a Revista Escolar, que foi veiculada mensalmente entre janeiro
de 1921 e dezembro de 1935. Os seus locais de edição foram em Vila Franca de Xira, Santarém e, por
último, Lisboa. Embora não fosse uma revista da Imprensa Oficial, os seus principais diretores e
responsáveis foram Inspetores de Ensino, nomeadamente: Albano Ramalho, Heitor Passos e
Joaquim Tomás. O objetivo desde periódico foi contribuir com a formação de professores, fomentar
a discussão sobre os problemas nacionais da educação, além se servir como veículo de publicação
de artigos doutrinais do regime político Português, assim como, entrevistas pedagógicas, notas
científicas, notas didáticas, dentre outros assuntos (Nóvoa, 1993). Entre os diversos conteúdos da
revista destaca-se a sessão que apresenta e discute ideias pedagógicas de grandes educadores,
entre eles o belga Jean Ovide Decroly. O segundo periódico de educação analisado é a Revista de
Ensino, que foi uma publicação da Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, e nasceu por meio da
Lei nº 41, de 3 de agosto de 1892. Após publicar três exemplares a revista foi desativada, voltando a
funcionar a partir do Decreto nº 6.665 de agosto de 1924, tendo o seu primeiro número sido publicado
em 8 de março de 1925. A partir desse decreto, foi determinado que a Diretoria de Instrução Pública
se responsabilizaria pela publicação mensal da revista, cujo objetivo era orientar, estimular e
informar os colaboradores do ensino e outros que porventura se interessassem pelos assuntos
educacionais. Este periódico foi o mais expressivo para a história da educação mineira, tanto por sua
permanência de cinco décadas, quanto pela sua ação de destaque no processo de formação dos
professores e de reconfiguração do campo educacional do Estado. (Rodrigues e Bicas,2015). Entre os
anos da Reforma do Ensino Primário (1928-1929), foi criada na revista uma seção intitulada “Centro
Pedagógico Decroly” cujo objetivo era orientar os professores com pouca ou nenhuma experiência
com este referencial teórico-metodológico. (Rodrigues e Bicas,2015). A revista teve sua produção
interrompida durante cinco anos por razões da Segunda Guerra Mundial, voltando a circular em
1946, sendo extinta 25 anos mais tarde, em 1971. Devido a longevidade de ambos os periódicos, bem
como a quantidade de material coletado, os artigos escolhidos para a análise foram aqueles que
apresentaram os elementos estruturantes do “Método Decroly”, tal qual mencionamos. O texto
desta comunicação foi configurado em três partes: a primeira realiza uma breve contextualização da
figura do educador Belga Jean Ovide Decroly e os elementos estruturantes de seu “método”; a
segunda parte discorre sobre as circunstâncias históricas e educacionais de circulação das revistas,
assim como o perfil dos autores dos artigos analisados; a terceira e última parte versa sobre as
representações construídas sobre o “método”, além de evidenciar que elementos do “Método
Decroly” estes periódicos fizeram circular e quais as suas proximidades e distanciamentos em termos
de apropriação. As questões que nos impulsionaram a este estudo foram: que representações foram
elaboradas a partir do autores dos artigos da Revista Escolar e da Revista de Ensino acerca do “Método
Decroly”? Que elementos do “método” quiseram apresentar aos professores e aspirantes à profissão?
Para responder a estes questionamentos, encontramos suporte nos conceitos de Representação e
Apropriação propostos pela História Cultural, sob a perspectiva de Chartier (2002). Tais conceitos
ajudaram-nos a compreender que o “Método Decroly” foi recebido no contexto das práticas culturais
pelos diversos autores dos textos e interpretado de acordo com as condicionantes do seu meio. Tudo
isso com objetivo de orientar as práticas docentes, tendo como ponto de referência a política
educacional vigente em ambos os países. Dessa forma, as representações e apropriações realizadas
pelos indivíduos e grupos produziram discursos isentos de neutralidade, capazes de produzir
estratégias e táticas impondo, de certa forma, um projeto reformador de escolhas e condutas para os
docentes e aspirantes da profissão. Em ambos os países o “método” chegou no momento em que as
pedagogias estrangeiras demonstravam ser a salvação para os problemas educacionais, por isso,
evocadas junto aos ideais da Escola Nova, indicariam o caminho certo para o progresso educacional.
No entanto, no caso da Revista de Ensino, o periódico é um instrumento Oficial de veiculação das
ideias e políticas educacionais, por isso, ao desvela-lo, percebemos que as estratégias para aplicação
do “método” estão muito mais voltadas para uniformização do referido método no Estado do que
para a compreensão profunda acerca do mesmo. Esta afirmação nos leva a pressupor que o método
tenha sido representado de forma estratificada, ocasionando a apropriação parcelar por parte do
professorado mineiro. Na Revista escolar, percebemos um aspecto mais formativo, isso porque a
revista não apresenta objetivos institucionais. Não desconsideramos portanto, o aspecto formador
e prescritivo das lições apresentadas nas páginas do periódico por seus autores, que em sua maioria
foram Inspetores de Ensino em Portugal. Na Revista Escolar o “método” é destacado mais vezes para
o ensino da leitura e função da globalização; na Revista de Ensino, por seu turno, os centros de
interesse são mais realçados, ficando no leitor a dúvida se este seria o único elemento estruturante
do “Método Decroly”.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 390
Referências
Chartier, R. (2002). História Cultural: entre práticas e representações. (2ª ed.). Lisboa: Difel.
Dubreucq, F., & Mafra, J. (Orgs.) (2010). Jean Ovide Decroly. Recife: Editora Massangana.
Nóvoa, A. (Dir.) (1993). A imprensa de educação e ensino. Repertório análitico (séculos XIX - XX). Lisboa:
Instituto de Inovação Educacional.
Rodrigues, E., & Biccas, M.S (2015). Imprensa pedagógica e o fazer historiográfico: o caso da Revista
do Ensino (1929 – 1930). Acta Scientiarum,37(2),115-130.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente texto adota como princípio uma discussão acerca da importância do processo de
Letramento no contexto escolar, tendo como aliada a Literatura Oral em exercícios desenvolvidos na
prática de contação de histórias, que visam a formação do aluno-leitor-sujeito-social. Dessa forma,
tomamos como objetivo principal refletir sobre o conceito de leitor na atualidade e a necessidade de
articular tal conceito ao seu papel no contexto sociocultural. Para tanto, trazemos como proposta
metodológica compartilhar experiências de oficinas de contação de histórias, ofertadas em cursos
de formação continuada (2012-2017), na cidade de Dourados-MS, a professores e demais sujeitos
ligados direto ou indiretamente ao contexto escolar. Segundo Freire (1990), o ato de ler “[...] não se
esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita, mas que se alonga na
inteligência do mundo [...]” (FREIRE, 1990, p. 11. grifo nosso). Ao comungar dessa perspectiva
freiriana, podemos entender que o exercício de ler exige uma interação do texto (escrito ou oral) com
a pessoa que o recebe. É a partir do conhecimento de mundo do sujeito receptor, da sua bagagem de
vivências e experiências, que ele será capaz de construir sentidos para o texto. Como se pode
observar, o texto não é uma obra acabada no ato da sua produção, mas sim, exige a participação do
seu receptor para que o sentido seja construído – por isso a necessidade de trabalhar com a ideia de
sentidos múltiplos. A interpretação de um texto está atrelada a outros fatores externos ao texto, tais
como o espaço e o tempo em que ele é recebido, nos quais estão imbricados por discursos políticos
e ideológicos que interferem na percepção do sujeito-receptor. Dessa forma, há de se pontuar que a
leitura é também, ao lado disso, uma prática social. Ela é uma ação cultural construída ao longo da
história de uma dada sociedade. Dito isso, entende-se que, consequentemente, ela é “[...] um ato de
posicionamento político diante do mundo [...]” (BRITTO, 2001, p. 84), o que implica em dizer que não
se trata de um discurso neutro, ou de uma verdade absoluta, mas, pelo contrário, é um discurso que
carrega em si construções de verdades, ou ainda, representações de mundo. Para o nosso texto, cabe
essa discussão de Britto (2001) à medida que compreendemos a Literatura Oral enquanto uma
manifestação cultural de cunho estético com intenções, construções e representações de mundo
feitas a partir da ótica de um determinado grupo social. Sendo essa singularidade discursiva
responsável por definir uma identidade sociocultural a essa sociedade. Permitir que o aluno-leitor
compreenda isso é possibilitar a ele adquirir ferramentas para que construa a sua própria identidade
e para que ele tenha condições de fluir por diferentes textos de forma emancipada. É exatamente
essa perspectiva da leitura enquanto prática social, enquanto competência para o uso de práticas
complexas e diversificadas da linguagem (oral ou escrita) no seu cotidiano que chamamos de
letramento. Na fala de Catitu Tayassu (2011), ao problematizar a relação entre alfabetização e
letramento enquanto condições indispensáveis (e não somente!) para o processo de inclusão
sociocultural, a autora procura definir o letramento da seguinte forma: “[...] quando nos referimos
aos usos complexos, diversificados, cumulativos e qualificados da leitura e da escrita, por meio de
práticas sociais que envolvem a linguagem oral e a competência com a linguagem escrita a isso,
então, chamamos letramento” (TAYASSU, 2011, p. 26). Assim, ao se pensar no letramento se exige
uma postura diferenciada do educador, isto é, este deve se atentar para as mudanças de cunho
sociais, culturais, econômicas e tecnológicas as quais o aluno-sujeito-social esteja inserido, de forma
a visar uma maior diversificação do uso da leitura e da escrita para que o aluno tenha contato.
Acreditamos nessa forma de contribuir para que o aluno tenha condição de entrar em contato e, por
conseguinte, consolidar habilidades, ou ainda, “[...] competências e experiências cumulativas em
favor de um rico capital cultural e linguístico [...]” (TAYASSU, 2011, p. 29. grifo da autora). Nesse
sentido, discutir o letramento em sala de aula é também tocar no assunto acerca da necessidade de
uma formação contínua de professores, no seu papel de pesquisador e, em especial, de leitor –
dentro das complexidades aqui colocadas, é claro. É a partir de então que conseguiremos avançar
na formação de alunos-sujeitos-sociais com competência para lidar, da melhor forma possível, com
as diferentes linguagens e tecnologias presentes em seu cotidiano. Aceito isso, compreendemos a
importância dos cursos de formação continuada oferecidos aos professores do ensino básico, em
parceria com as instituições de ensino superior da cidade de Dourados-MS. Nesse estudo de caso
das oficinas de contação de histórias ofertadas por nós, procuramos estabelecer um espaço de
trocas de conhecimentos com os professores, com vistas de socializarmos acerca da necessidade
dele se colocar como mediador e pesquisador desse processo de busca pelas mais diversas fontes
orais, diversas técnicas e metodologias passíveis de serem aplicadas em sala de aula. O desafio
colocado aos professores era de pelas práticas de narração se tornar um contador de histórias das
salas de aulas. O professor que conta histórias é um intérprete, o qual é responsável por manifestar
o conteúdo do texto literário orais em sua performance. Leva-se em conta que nessa prática, o grupo
de ouvintes, principalmente alunos das séries iniciais, não são sujeitos passivos e silenciosos. Ao
contrário disso, os ouvintes participam por meio das interferências, no diálogo com o contador e em
suas reações auditivas e afetivas. São eles que determinam a natureza e a intensidade do prazer,
enquanto giram as histórias na roda que é articulada por seus ouvintes e o professor-contador de
histórias. A memória, meio natural de conservação da tradição oral, é um recurso do narrador. Ela é
fundamental para a performance. O texto literário oral narrado por meio da performance se
desenvolve no espaço da escola, mas escapa a esse espaço e tempo. Isto porque, a memória traz,
junto a essa que está sendo contada, outras narrativas, de modo a promover um ambiente polifônico,
composto por um mundo de vozes pertencentes ao “hoje” e também ao “ontem”, que ressoam entre
o passado e o presente das histórias da nossa sociedade, da nossa cultura e dos costumes que são
passados de uma geração a outra. Esse faz de conta imprime intensidade às distintas vivências e às
sensações do jogo narrativo. Neste ponto é que se encontra a importância de contar histórias na
escola, como prática de reconstrução da esfera do rito, tendo por finalidade estabelecer um
conhecimento acerca das experiências e saberes comum à identidade histórico-cultural dos alunos-
sujeitos-sociais, a partir do seu reconhecimento como pertencente a um grupo e detentor de uma
identidade. Isto se torna ainda mais significativo uma vez levado em conta a história e a cultura do
povo pantaneiro sul-mato-grossense, formado em grande parte por homens “matutos” e por
indígenas, contadores de histórias das lendas sobre seres míticos que habitam as nossas matas.
Entre os resultados obtidos dessas experiências com oficinas de contação de histórias, destacamos
o sentimento, quase que unânime, de desconforto inicial expresso pelos professores quando
submetidos aos exercícios que envolvem a prática de contação. Todavia, este sentimento
rapidamente se dissipava à medida que a preocupação com a técnica – entendida por nossos
ouvintes inicialmente como algo único e engessado, um produto pronto a ser assimilado – era
superada por um processo de empatia com a própria dinâmica encontrada na narrativa da história.
Nossos interlocutores eram levados a fazer um exercício de rememoração, a partir do reconte de
histórias que remetiam a um fato passado, narrado no seio familiar ou no contexto da sua formação
escolar. Assim, o lúdico e as memórias se ligavam numa teia de intertextualidades. Nesse sentido,
esta prática que promulga o letramento em sala de aula, coloca-se como uma valiosa ferramenta
para que se configure o autoconhecimento do aluno, enquanto indivíduo e enquanto forma de
evidenciar e valorizar o seu pertencimento a um contexto sociocultural.
Referências
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
terra: 1996 (Coleção leitura).
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 393
BRITTO, Luiz Percival Leme. Leitura e Política. In: EVANGELISTA, Aracy Alves Martins; BRANDÃO,
Helian Maria Pina; MACHADO, Maria Zélia Versiani (Orgs.). A escolarização da leitura literária. O jogo
do Livro Infantil e Juvenil. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. p. 77-91.
TAYASSU, Catitu. Alfabetização e Letramento: condições de inclusão social (?). In: GONÇALVES,
Adair Vieira; PINHEIRO, Alexandra Santos (Orgs.). Nas trilhas do letramento: entre teoria, prática e
formação docente. Campinas, SP: Mercado de Letras; Dourados, MS: Editora da Universidade Federal
da Grande Dourados, 2011.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
OS IMPRESSOS NA FORMAÇÃO DE
PROFESSORES EM SÃO PAULO 1916 – 1923
instalação na província do Rio de Janeiro, sendo organizada pela Lei n° 10, de 1835, no entanto, sua
instalação só ocorreu posteriormente em 1840. Após essa criação, surgiram outras escolas normais,
que foram permeando o Brasil, entretanto com suas especificidades; que poderiam trazer suas
inúmeras características divergentes por estarem em localidades e até condições opostas,
constituindo uma forma não igualitária sobre como deve ser uma escola. As escolas normais
brasileiras passaram por um período de avanços e retrocessos até que pudessem se consolidar na
primeira república, dentre muitas destas inúmeras mudanças, podemos dar destaque as
reorganizações das relações de trabalho do regime do trabalho escravo para o trabalho livre e a
utilização da mão de obra dos imigrantes que aqui chegavam, um avanço nos setores de prestações
de serviços diversos e a indústria, urbanização, aparecimento de uma classe média e de um
proletariado que ascendia da zona rural para a urbana; assim, a sociedade seguia para um
delineamento moderno, dessa maneira, no estado de São Paulo a primeira escola normal a ser
instaurada foi a escola normal de São Paulo/SP, ao qual não escapou desse processo de aberturas e
fechamentos. Sobre esse período da escola normal de São Paulo, segundo Dias (2008), [...]” criada
em 1846, teve seu primeiro fechamento decretado em 1867; reaberta em 1875, novamente foi
fechada em 1878; após sua reinauguração em 1880, não interrompeu mais suas atividades,
continuando República a dentro.” Em 1910, com as ações reformadoras de Oscar Thompson, são
difundidas escolas normais pelo interior do estado de São Paulo. Essas escolas tinham como
metodologia o uso do método intuitivo, onde ensinar estava relacionado com a imitação e a
observação, oferecendo uma formação de caráter prático aos futuros educadores, para tanto é
criada a primeira escola modelo. Importante destacar que esse método passou a fazer parte do
currículo oficial com à conhecida Reforma Caetano de Campos (1890), sendo assim, o método
intuitivo tomou corpo nas reformas republicanas paulistas e se tornou a base para a organização das
escolas primárias. Posteriormente a reforma e com a finalidade de estabelecer o método de ensino,
as escolas normais buscou-se por profissionais qualificados, especializados no método intuitivo. A
Reforma da Escola Normalista liderada por Caetano de Campos, segundo Teixeira (2012, p. 98),
“possibilitou a utilização de novos métodos de ensino e a formação de professores normalistas para
a expansão da rede pública estadual”, envolvendo o enriquecimento dos conteúdos curriculares e a
ênfase na prática que trazia em sua essência um caráter enriquecedor de cunho nacionalista, cívico
e que repercutia em uma perspectiva de interesses em construção de uma nova nação que pudesse
trazer todas as características que se emergiam nesse período. Na tentativa em difundir esse novo
modelo de formação docente e os conteúdos de ensino a serem transpassados aos alunos (futuros
professores) das escolas de formação de professores, denominadas escolas normais, utilizou- se de
dispositivos que pudessem consolidar esse feito, entre eles, os currículos, bibliotecas escolares e o
elemento primordial analisado no presente texto, que trazem maiores condições e visibilidades
sobre como essas condutas educacionais foram estruturadas os impressos educacionais idealizado
e escritos por professores de tais escolas, torna-se significativo um adendo, de que também existiam
revistas empreendidas por alunos/futuros professores das escolas normais, elucidando os caminhos
e contribuições que essas mudanças puderam ocasionar na profissão docente e também, seus
reflexos sobre os ensinos propagados em tais transformações. No presente texto buscou -se
compreender quais saberes estavam sendo disseminados pelos professores das escolas normais, na
busca em formar professores e se o cerne dos saberes era prático ou teórico, além, de pautar quais
eram as periodizações de tais conteúdos, tendo uma perspectiva que os únicos meios em que essas
trocas de informações chegavam eram por meio desses conteúdos publicados. Compreender os
caminhos percorridos pelas as escolas de formação de professores, os sujeitos que contribuíram
para a construção das revistas Como aporte teórico, a composição segue a linha histórico cultural e
contou com as contribuições de autores como Carvalho (2000/ 2011); Dias (2008); Honorato (2013);
Inoue (2015); Nery (2009); Nóvoa (1992); Ozelin (2010); Oliveira (2018); Tanuri (1973/1976); Teive
(2008); Souza (2006); Silva (2019) e etc. Os impressos educacionais são ferramentas necessárias
nesse momento, no que se remete a formação de professores no Brasil e da sociedade moderna que
se constituía, tonar-se importante destacar que os impressos educacionais não são os únicos
elementos para tal formação, porém é um contribuinte na construção do pensamento e propagação
de informações para professores das escolas Normais. A metodologia utilizada para a realização do
trabalho foi à pesquisa bibliográfica e documental.
ISSN 2358-3959
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Para compreender a ação pedagógica e o currículo escolar do século XIX é necessário considerar
os livros didáticos e de leituras. As fontes do século XIX evidenciam que no início do período imperial
a disponibilidade de livros era restrita, porém a partir da década de 1840, as publicações de livros,
jornais e periódicos tiveram um grande impulso. Tais livros e outros materiais começaram a entrar
na escola de forma desordenada, oferecendo perigo à ordem estabelecida, visto que muitos
deles difundiam ideias liberais, anárquicas e até revolucionárias. Cientes do perigo emergente, as
autoridades passaram a introduzir na legislação educacional diversas restrições ao uso dos livros
escolares.
No presente texto procuro explicitar os critérios estabelecidos para o uso de livros didáticos e
de leitura nas escolas primárias do período imperial brasileiro, mais especificamente entre 1850
e 1889. O objetivo central é demonstrar os mecanismos utilizados pelo Estado para controlar a
entrada dos livros nas escolas, estabelecendo relações entre os conteúdos transmitidos e os valores
e princípios da sociedade e de Estado imperial. Em outras palavras: relacionar o currículo escolar
com a construção do Estado Nacional.
Nesse sentido, tomei como fontes de análise a legislação educacional produzida pela Corte e as
províncias do Rio de Janeiro, Mato Grosso e Paraná, bem como leis, contratos, decretos, relatórios
de presidentes de províncias, de inspetores de instrução pública, de comissões de inspeção, de
autores do século XIX e de historiadores da educação. A partir do cruzamento das fontes foi possível
compreender as medidas e ações que expressam a interferência direta do Estado no controle do que
se ensinava e de lia nas escolas primárias do século XIX.
Os manuais didáticos fazem parte do processo educativo há muitos séculos, porém, a sua inserção
de forma mais intensa se deu a partir da difusão dos ideais de educação de João Amós Comenius.
Na obra Didática Magna, Comenius fundamentou sua proposta de difusão da instrução através do
uso racional, metódico e cotidiano dos livros didáticos. Segundo ele: “Os livros, pois, deverão ser
redigidos para todas as escolas segundo os nossos princípios de facilidade, solidez e brevidade,
contendo tudo o que for necessário e de modo completo, sólido e preciso, de tal modo que possam
ser uma imagem veracíssima do universo (que deverá ser pintado nas mentes dos alunos). Acima
de tudo, desejo e solicito que os assuntos sejam expostos em linguagem familiar e comum, para
permitir que os alunos entendam tudo espontaneamente, mesmo sem mestre” (COMENIUS, 2002,
p. 217). Comenius lançou suas ideias e pôs em práticas, ainda na primeira metade do século XVII,
todavia elas penetraram de forma intensa no interior das escolas, somente no século XIX, período no
qual, o Estado passou a investir e assumir, de forma plena o controle da instrução pública.
No caso do Brasil, a ação estatal se intensificou após a independência e, de forma mais efetiva a
partir de 1850. Fato semelhante se deu com a oferta e produção de livros e outros materiais impressos,
visto que até 1850, a circulação era restrita, aumentando intensamente no período posterior. O
primeiro regulamento, a impor restrições ao uso dos livros nas escolas, foi o de 14 de dezembro de
1849, da Província do Rio de Janeiro. Segundo o artigo 62, “só podem usar nas escolas de livros que
tenham sido autorizados pelo presidente da província, ouvido o inspetor geral” (PROVÍNCIA do RJ.
Regulamento de 1849, p. 591). Além de controlar o uso dos livros o governo estimulou os professores
e outros intelectuais a escrever ou traduzir livros. Diante disso, muitas pessoas empenharam-se
naquela tarefa, pois os relatórios dos inspetores, seguidamente se referem aos livros que foram
submetidos a análise do conselho, ou do inspetor, sendo que muitos deles foram reprovadas ou
sugeridas adaptações.
O inspetor de instrução pública da Corte, Eusébio de Queiroz, no seu relatório de 1857, evidenciou
que no processo de institucionalização da reforma Coutto Ferraz, de 1854, a questão da revisão e
seleção dos livros escolares teve uma importância significativa. Assim ele argumentou: “Dentre
os compêndios admitidos nas escolas convinha extirpar algumas proposições, por serem umas
pouco ortodoxas, outras contrárias aos princípios, de nosso sistema governativo, e outras inexatas
quanto à matéria do ensino, ou enunciados sem a clareza necessária à inteligência dos alunos. As
comissões encarregadas dessas revisões acabam de dar seus pareceres, indicando as correções a
que se deve atender nas edições subsequentes dos compêndios a que se referem. (MUNICÍPIO da
Corte. Relatório do Inspetor de Instrução de 1857, p. 6). Isso valia, inclusive para os professores das
escolas particulares, que só poderiam adotar “compêndios e métodos que não forem expressamente
proibidos”. (BRASIL. Decreto 1331-A de 1854, p. 65).
A reforma da instrução pública de 1854, na Corte constitui-se em modelo para as demais
províncias do Império. No que se refere ao controle dos livros escolares não foi diferente, pois, os
regulamentos de instrução pública aprovados posteriormente, nas províncias analisadas, também
instituíram dispositivos, que limitavam o uso dos livros e compêndios, somente aos autorizados pelo
presidente, inspetor ou conselho de instrução. No decorrer dos anos, vários livros foram autorizados
e, muitos deles, comprados pelo Estado, tanto na Corte, como nas províncias para serem distribuídos
aos alunos das escolas públicas.
Em relação aos livros e compêndios escolares, pode-se afirmar, que já havia uma espécie
de programa do livro didático instituído no século XIX. Além de comprar grande quantidade de
exemplares de um mesmo autor, o Estado também celebrava contratos com autores renomados
para escrever determinadas obras objetivando suprir carências da instrução pública.
Segundo o inspetor da Corte, Antonio Herculano de Souza Bandeira, no seu relatório de 1884, os
livros fornecidos pelo Governo eram “guardados na escola, e apenas utilizados durante os exercícios”.
Nesse sentido, recomendava aos professores para que não exigisse dos “alunos a compra de livros,
pois o Governo está disposto a fornecer os necessários”, mas o problema era que já havia uma grande
quantidade de livros autorizados. Para tanto, propôs uma regulamentação e classificação dos
livros já autorizados junto ao Conselho de Instrução, antes de comprar novos exemplares. Depois
de discutido no Conselho, o projeto foi encaminhado ao ministro e se transformou no decreto n.
9.397, aprovado em março de 1885. A nova lei contemplou todas as sugestões, constituindo-se num
documento claro e objetivo, que possibilitava uma intervenção dura do governo para implementar
uma política de compra e distribuição de livros.
As tentativas de inovação nos métodos de ensino, as preocupações com o processo disciplinar, as
constantes interferências e investimentos do Estado em livros didáticos, visando dar-lhe um caráter
mais prático e utilitário para difundir a educação, demonstram que um conjunto significativo de
professores, de autoridades, de intelectuais, entre outros, preocupavam-se com a qualidade da
educação. Negar ou ignorar, tais iniciativas é minimizar o processo histórico, ou seja, é negar a ação
de inúmeros indivíduos, que dedicaram boa parte de suas vidas para criar as bases da educação
nacional.
A legislação instituída nas províncias e na Corte, complementada pelas posições e discursos
das autoridades permitem concluir que a interferência direta do Estado na escolha e no uso dos
compêndios escolares e livros de leitura também fez parte da lógica de construção da ordem,
centralização e hierarquização da sociedade imperial. E, dessa forma, também deve ser considerado
como um componente central do controle do currículo da escola primária no século XIX.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 398
Referências
BRASIL. Decreto n. 1331-A de 17 de fevereiro de 1854. Aprova o Regulamento para a reforma do ensino
primário e secundário do Município da Corte. Coleção das Leis do Império do Brasil de 1854 – Tomo
XVII. Parte II. Rio de Janeiro: Tipografia Nacional, 1854.
COMENIUS, João Amós. Didática Magna. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
Durante as décadas de 1930 e 1940 o Brasil, sob o governo de Getúlio Vargas, é empreendido por
uma política centralizadora tendo como projeto a nacionalização do país. As reformas educacionais
tiveram grande intensidade na reconfiguração dos espaços escolares. A intenção deste trabalho é
problematizar as praticas curriculares empreendidas numa escola secundária, privada, voltada para
meninos, ligada a Ordem dos Frades Menores, localizada em Lages, no planalto serrano catarinense
- o Ginásio Diocesano. Tendo em vista ser Santa Catarina um Estado eminentemente de imigração
européia verificou-se uma intensificação da vigilância da inspetoria escolar para que o currículo
nacionalizado fosse efetivado nessa escola. A presente análise busca perceber algumas das
estratégias de apropriação por parte do corpo dirigente e docente dessa escola dirigida por uma
congregação de origem alemã que tem a necessidade de maior afirmação do civismo e patriotismo
no seu cotidiano escolar. Desta forma, o presente trabalho tem como foco analisar como as
“disciplinas-saber” foram apropriadas pelo corpo docente – formado, sobretudo, pelos freis
franciscanos – e apresentadas aos educandos do Ginásio Diocesano. Como os agentes desse
estabelecimento desenvolveram os saberes escolares e de que forma esse conhecimento foi ajustado
pelo estilo pedagógico da instituição? O que se pretende, portanto, é analisar o recorte do saber
selecionado e (re)significado pela instituição escolar e as práticas relacionadas a produção de seus
sentidos e sensibilidades. Para isso, como bem lembra André Chervel (1990), a história de uma
disciplina escolar pode ser captada em seus múltiplos determinantes, especialmente no que tange
às finalidades, aos conteúdos e aos resultados esperados e obtidos do processo de escolarização. O
corpo dirigente do Ginásio Diocesano tinha um projeto escolar que previa a instrução, bem como a
educação de seus alunos. No entanto, se diferenciava das outras escolas lageanas por imbricar nesse
projeto um processo educacional que tinha por intuito tornar o estudante um agente social que usa
a escola como espaço para adquirir habilidades, sensibilidades e disposições apropriadas para a
projeção em uma determinada participação na sociedade – de serem os futuros dirigentes. Com a
educação efetivada no internato e semi-externato, seu projeto pedagógico não objetivava apenas
transmitir um saber, mas tinha como promessa a garantia de uma “formação global” que recaía num
conjunto de processos sobre as dimensões pessoais do aluno. Assim, a escolarização dos freis
franciscanos estava calçada na união entre a instrução e a formação moral dos “futuros varões” da
região serrana a fim de que estivessem preparados para um projeto de futuro ligado a escolarização
das elites regionais. Esse aspecto nos permite compreender que as instituições escolares trabalham
no sentido de construir um estilo pedagógico em consonância com os anseios daqueles a quem ela
vai receber, o que nos ajuda a vislumbrar como as “disciplinas-saber” ministradas no Diocesano
foram apropriadas pelo seu corpo dirigente e apresentadas para os estudantes no intuito de
atenderem a demandas pré-estabelecidas. Na análise dos saberes escolares podemos buscar um
esboço daquilo que projetavam para a construção destas disposições. O currículo e o estilo
pedagógico adotado podem ajudar a problematizar alguns caracteres desta educação distinta
colocada em prática nas salas e dependências da escola franciscana. Nesse contexto, os ginásios
equiparados de ensino secundário deveriam seguir a estrutura curricular mínima proposta pelo
Ministério da Educação e Saúde Pública através orientação de Reforma Francisco Campos (1931). No
entanto, isso não impedia que cada estabelecimento, sob um “filtro”, se apropriasse e modificasse
esse currículo. Assim, como escola ligada a uma ordem religiosa, o conhecimento sobre o mundo era
de forma cuidadosa projetado para a naturalização da moral católica, bem como do projeto de
nacionalismo já em voga por conta das políticas públicas do Estado Novo. O Diocesano, ao que
indicam os relatórios construídos pelo inspetor do ensino secundário, desenvolveu suas práticas à
luz dos princípios da renovação pedagógica sem renunciar àqueles que norteavam e afirmavam
uma educação católica. Neste cenário, a presente pesquisa procura esboçar alguns desdobramentos
de um projeto “conservador” na forma por naturalizar um habitus moral católico na circulação dos
saberes escolares – nas palavras de Pierre Bourdieu (1998), capital escolar. Vemos nos relatos do
inspetor alguns casos dos métodos adotados pelos professores quando do ministério de suas aulas,
mas não temos como objetivo constatar a efetividade desses relatos e sim perceber a relação deste
discurso com o projeto escolar que os franciscanos queriam evidenciar. A educação Diocesana
calçada nos preceitos morais do catolicismo teve que se apropriar do cenário da nacionalização
brasileira para legitimar sua imagem da escola perante a sociedade serrana e a Inspetoria Geral do
Ensino Secundário (que garantia sua equiparação e funcionamento). Nesse âmbito, as presenças
constantes da “Pátria” juntamente com “Igreja” formavam um conjunto indissociável na formação
do homem distinto. A construção do conhecimento escolar, que tinha por objetivo tanto instruir
como educar, era pautada em dois elementos tidos pelo corpo dirigente da escola como essenciais:
ser católico e patriota. Atravessado por esse ideal quando se analisa o currículo escolar de uma
instituição deve-se ter cuidado para perceber as intenções que existem e permeiam seu conjunto.
Buscar os prescritos para o projeto formador das disposições do alunado é um desafio. Ivor Goodson,
nesse caminho, afirma que o currículo deve ser visto não apenas como a expressão ou o reflexo de
interesses sociais determinados, mas também como produtor de identidades e subjetividades
sociais. O currículo não apenas representa, ele faz. É preciso reconhecer que a inclusão ou a exclusão
de saberes no currículo têm conexões com a inclusão ou a exclusão na sociedade (GOODSON, 1995).
Nesse sentido, a proximidade entre religiosidade e patriotismo fez parte desse processo, que tinha
os programas alinhados entre os governos estadual e federal em conjunto com a Igreja católica.
Permeadas por esse contexto, as atividades curriculares do Diocesano envolvidas no ensino de
Religião, História, Canto Orfeônico e Língua Portuguesa eram as disciplinas onde mais desveladamente
encontramos indícios dessa aproximação e que por isso ganharão destaque na análise deste trabalho
tendo por base os Relatórios da Inspetoria do Ensino Secundário e jornais de circulação regional. Das
suas análises é possível perceber que uma “perfeição moral e intelectual” deveria ser fruto do
trabalho de construção de um habitus católico que garantiria à Igreja a sua manutenção e
permanência, o que se intensifica porque neste espaço de formação para a distinção estavam
agrupados os filhos de parte das elites serranas. Estava a Igreja católica preocupada em inculcar em
seus alunos valores que avaliava adequados para conter a ordem das transformações pelas quais
passava a sociedade brasileira. Nesse meio, os jovens eram projetados a enfrentarem aqueles que
julgavam “ameaçadores ao mundo moderno” por significarem rupturas com a ordem estabelecida,
concorrentes espirituais como o protestantismo e o espiritismo, assim como concorrentes sociais
como os anarquistas e comunistas (KULESCA, 2004). A formação desenvolvida no Ginásio Diocesano
pautava-se na idealização de armar moralmente o futuro herdeiro. Em um projeto de distinção, o
acúmulo de saberes e habilidades estava imbricado em estratégias que visavam habituar os alunos,
através das atividades curriculares, a um saber escolar tratado como conhecimento único, natural e
ideal. Esta construção de verdade, “deduzida” através dos relatórios e impressos, estava muito
atrelada à forma como as atividades escolares eram desenvolvidas. O aprendizado ali adquirido
procurava não deixar espaços para a criticidade desse mundo construído pela moral católica. Assim,
a educação de distinção, sob a perspectiva da “educação global”, ao mesmo tempo em que preparava
os futuros herdeiros para a resistência ao mundo moderno a partir do lançamento das bases de uma
pedagogia “conservadora” mas racionalmente instrumentalizada, legitimava a transmissão das
posições sociais pelo “bom desempenho” do currículo, também naturalizando que, ao término do
curso ginasial, teriam conquistado essa posição social.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 401
Referências
BAIA HORTA, J. S. O hino, sermão e a ordem do dia: Regime autoritário e a educação no Brasil (1930
– 1945). São Paulo: Autores Associados, 1994.
BOURDIEU, P. Os três estados do capital cultural [1979]. Tradução de Magali de Castro. In: NOGUEIRA,
M. A.; CATANI, A. M. (org.). Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998.
CHERVEL, A. Historia das disciplinas escolares: Reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria &
educação, Porto Alegre, nº02, 1990, pp.177-229.
KULESZA, W. A. A cultura escolar católica no Brasil moderno. Educação UNISINOS, São Leopoldo,
vol. 08, nº14, jan/jun, 2004, pp. 189-204.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Resumo
Este trabalho surgiu através de pesquisas, análises e leituras acerca das práticas dos professores
na perspectiva intergeracional com o objetivo de compreender as práticas educativas de professores
dentro da perspectivado trabalho com as pessoas velhas. Portanto, o caminho da aprendizagem ao
longo da vida requer muito do fazer pedagógico quanto ao alunado que se encontra na velhice. A
respectiva trabalho tem o intuito de evidenciar através da pesquisa bibliográfica, constatando
hipóteses oriundas das Práticas de Professores na Perspectiva da Educação Intergeracional,
abordando a disparidade de geração e cultural entre professores e alunos velhos que estudam. Os
primeiros movimentos sobre as práticas intergeracionais surgiram nos Estados Unidos, na década
de 1960, com programas que pretendiam juntar pessoas com mais idade com as crianças do jardim
de infância, de forma a promover a inclusão social de pessoas em situação de pobreza, violência e
consumo de substâncias. Na Europa, foi na década de 1990 e na Inglaterra que surgiram as primeiras
iniciativas destinadas a promover a participação social das pessoas com mais idade, em iniciativas
de voluntariado. Foi a partir dessa década que a política europeia começou a ter em consideração
este tema, configurando-se três eventos importantes: o Ano Europeu para as Pessoas Idosas e
a Solidariedade entre Gerações, em 1993; o Ano Internacional das Pessoas Idosas, em 1999; e o
Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre Gerações, em 2012. Esta agenda
contemplou uma grande variedade de programas intergeracionais, atividades, práticas e iniciativas
que decorreram por toda a Europa e França. O processo ensino e aprendizagem para os cidadãos
mais velhos contribuem para modificar a ideia preconceituosa da incapacidade apenas pela idade,
bem como ajuda a incluir e reinseri-los no trabalho e na comunicação intergeracional. A metodologia
utilizada foi uma abordagem quantitativa, adotando a categoria de pesquisa bibliográfica, buscamos
a várias fontes de pesquisa, como: artigos, sites, bibliotecas virtuais e livros sobre a temática da
prática de professores no contexto da educação intergeracional. E para a fundamentação teórica
buscamos ARANHA (2007), YUNES (2012), NERI e CACHIONI (1999). SILVA e DAMIANI (2005), TARDIF
(2008), dentre outros pesquisadores que trabalham o tema em estudo.
Como resultado do prolongamento da vida, o fenômeno da família tem sido acompanhado por uma
prorrogação de duas e três gerações a quatro ou cinco gerações. Não é incomum hoje em dia que os
pais de 40 a 50 anos tenham alguns de seus pais de 60 a 70 anos e os avôs de 80 a 90 anos. É possível
que duas ou até três dessas gerações estejam no que se define como “fases de envelhecimento da
vida”. O envelhecimento, portanto, não é apenas um fenômeno individual ou social, mas também está
relacionado com os aspectos cronológicos, biológicos, psicológicos e culturais, o que caracteriza que
um indivíduo é ou não velho. Nosso estudo não trata de tais fenômenos, mesmo reconhecendo sua
relevância para reconhecimento de que um indivíduo se encontra na velhice. Atualmente, há um maior
número de crianças que conhecem seus avôs quando estes ainda estão vivos, e convivem com eles por
um longo tempo. Portanto, um número maior de pessoas de um século atrás pode manter as relações
entre avós e netos. O ensino-aprendizagem é um fator extremamente relevante, no que tange as práticas
e condução dos trabalhos com o público em estudo. O envelhecimento tornou-se objeto de estudo
de diversas áreas do conhecimento, dentre elas o ensino e aprendizagem, cada vez mais as pessoas
velhas vem praticando várias atividades que antes eram tidas como “atividades para jovens”, o que
aumentou bastante às relações intergeracionais entre os grupo familiar e social, no que tange a procura
por voltar aos estudos não é diferente, os velhos com mais frequência tem procurado retomar seus
estudos. O aprendizado para o idoso é fundamental para a continuidade da sua autonomia, interação
e para realizar suas escolhas em sintonia com o mundo. Há uma grande necessidade do preparo dos
professores para atuarem nas turmas de pessoas velhas nos diferentes espaços educativos, alicerçada
no respeito as diferenças e na valorização do outro. Tendo em vista que hoje uma grande maioria dos
novos paradigmas sobre as pessoas velhas traz consigo os seguintes rótulos como: sujeitos que são
“descartáveis”, “frágeis”, sem “validade” é ainda patente pejorativas que é atribuídos a essa categoria,
vez que a sociedade é marcada pela presença de várias gerações. O envelhecimento é um processo
biológico que se caracteriza pela passagem do tempo, variando de acordo com as características
de cada um, o seu estilo de vida e as suas condições socioeconômicas e de saúde. É uma etapa de
maturidade, sabedoria e experiência de vida, mas, por outro lado, é o período em que para muitos
se revelam maiores momentos de solidão, de baixa autoestima, muitos tendem a ter depressão e
agravamento de problemas de saúde. Estamos em um momento em que predominam duas ideias
opostas em relação ao envelhecimento: uma se refere à pessoa que envelhece como foco de saber,
conhecimento e experiência, que organiza a sua vida de acordo com as suas preferências e expectativas;
a outra relata a pessoa de forma mais negativa, sendo caracterizada como vulnerável, física, mental
e socialmente. A realização de atividades intergeracionais apresenta muitos benefícios a ambas as
gerações que a praticam. Os alunos velhos usufruem de uma ajuda indispensável praticada pelos mais
novos, ao passo que estes se conscientizam das dificuldades sentidas pelos com mais idade, fornecem
apoio reconfigurando a forma como encaram o envelhecimento. Desta forma, coloca-se a tônica nos
pontos fortes em vez de nos atributos negativos das pessoas. NÉRI (2005) complementa ainda, que a
educação intergeracional parte de uma grande necessidade em relação à educação voltada para os
velhos, sabendo transmitir de forma acolhedora como desenvolver um trabalho educativo em espaços
diversos na sociedade, de grande intergeracionismo. Neste sentido, é importante analisar e ressaltar
o fazer pedagógico em torno do trabalho para com os velhos, ou seja, a prática considerada pode ser
como os afazeres de conduzir, ouvir, trocar compartilhar experiências. Por conseguinte, nesta categoria
os coparticipantes, apresentam de forma individual os diferentes caminhos na busca de conhecimento
e saberes com o intuito de atuar de forma eficaz com os alunos velhos. Neste sentido, pensar práticas de
professores a partir da sua formação inicial e continuada na perspectiva intergeracional é ajuizar dia após
dia, para promover a aceitação, autoestima e o desempenho da prática com êxito referente ao público
dantes mencionado. Entendemos que o profissional tem um vasto compromisso com a aceitação de
uma variedade de público, inclusive ao mencionado. A reflexão sobre a importância da prática, o modo
de agir dos professores, sua maneira de relacionar-se com os alunos velhos, os objetivos do trabalho,
a maneira de trabalhar faz a diferença tanto na vida desses alunos quanto para o profissional que terá
grande aprendizado. Com base em leituras elencadas percebe-se que a ausência de conhecimento
e experiência por parte dos profissionais acerca do convívio intergeracional tem dificultado todos os
envolvidos. Contudo o professor, durante a sua formação e na sua prática cotidiana vai determinando
“certificações” sobre sua forma de agir, que se colocam de acordo com as experiências e vivências que
são os subsídios necessários para efetivar os fazeres adequando para com os velhos, assim como os
saberes adquiridos. Percebeu-se que o movimento discursivo das concepções da prática docente se
constitui pelos discursos que se aproximam das perspectivas de uma formação sólida e reflexiva. Faz-se
necessário a fusão da teoria e prática para uma aproximação do que objetivamos para o sucesso nesse
desafio que se dá no intergeracional no campo da aprendizagem. Outros discursos convergem com
essa concepção, na medida em que tomam a prática como elemento de reflexão, tanto na formação
inicial como no aprendizado contínuo. Dessa maneira, identificamos que esses discursos tendem a se
aproximar da abordagem do Professor Reflexivo. Também foi identificada real situação da concepção
dos fazeres docentes como intervenção entre sujeitos, práticas e saberes.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Resumo
Este trabalho tem o objetivo de identificar e analisar as práticas educativas destinadas a infância no
livro Lições de Pedagogia, de Maria Lacerda de Moura, publicado em 1925, de modo a compreender a
sua trajetória educacional e o contexto em que ela pensou e escreveu a obra. O trabalho de pesquisa
se justifica pelo fato que ser incipiente a produção de trabalhos sobre práticas educativas na área
da história da educação, sobretudo sobre as práticas científicas desempenhadas pelo professor no
início do século XX. A metodologia parte do levantamento bibliográfico, em seguida, a busca por
fontes históricas, primárias e secundárias, assim como a consulta à historiografia que trata sobre
a temática “infância”, “formação de professores” e as “práticas educativas” ao longo da história da
educação brasileira. Os resultados apontam que Lições de Pedagogia, revela a importância, para
Maria Lacerda de Moura, de a pedagogia ser fazer cientifica, fato comum para o contexto positivista
da época. E nota-se a preocupação da educadora com a formação de professoras, ao direcionar
práticas e teorias que pudessem auxiliá-los no processo educativo, já que, segundo ela, os acessos
a essas informações eram escassos, já que não existia um acervo bibliográfico direcionado a elas.
Introdução
Diferentes práticas educativas e didáticas, vêm sendo desenvolvidas no contexto escolar
durante a história da educação brasileira. Neste trabalho, optamos pela utilização do termo práticas
educativas, por compreender que tais práticas presentes na obra Lições de Pedagogia extrapolam
o ambiente escolar chegando a uma conjuntura mais ampla, considerando também a situação
social das mulheres. Conforme Agostini (2018), o termo “práticas educativas” compreende além
das atividades propriamente escolares. É um estudo de práticas conduzidas por agentes exteriores
se relacionando com um contexto histórico maior que considera a política e a cultura. Para tal
compreensão é importante entender os processos, que à envolvem ou seja, as práticas e experiências
vivenciadas dentro de uma cultura escolar. Segundo Faria Filho (2003), a noção de cultura escolar é
entendida como:
[...] a forma como em uma situação histórica concreta e particular são articulados e representadas,
pelos sujeitos escolares, as dimensões espaço-temporais do fenômeno educativo escolar, os
conhecimentos, as sensibilidades e os valores a serem transmitidos, a materialidade e os métodos
escolares (FARIA FILHO, 2003, p.85).
Neste trabalho, busca-se identificar e analisar as práticas educativas e a didática direcionadas
pela educadora mineira, Maria Lacerda de Moura, em seu livro Lições de Pedagogia. Para esse fim,
se fez necessário compreender a sua trajetória educacional e verificar de que modo contribuiu para
a escrita de seu livro. Também, identificar o contexto no qual ela viveu, pensou e escreveu Lições
Algumas considerações
A obra Lições de Pedagogia, possui caráter pedagógico possibilitando diversas reflexões no
campo da história da educação. Que são raros os registros de práticas de professores no início do
século XX. É possível compreender como se pensava a educação da infância e como ela era proposta
para ser realizada na prática. Com caráter de escola moderna, Maria Lacerda de Moura pensava em
uma educação com liberdade, autonomia e principalmente o reconhecimento do ser individual
assim como são discutidas nos cursos de formação de professores nos dias atuais, distantes ainda
de uma prática efetiva.
Ao realizar o levantamento bibliográfico, foi possível identificar as lacunas existentes no que
foi produzido sobre a obra Lições de Pedagogia, ou seja, a pouca investigação que se tem sobre as
informações contidas no livro.
As categorias elencadas: práticas da professora cientista e práticas da professora mediadora, por
mais que se tornam objetos de análise em sua singularidade, se entrecruzam e dialogam na escrita
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 406
da obra. Isso faz com que tomemos essas categorias somente como chaves de leitura e não como
nichos de informações isoladas.
Tanto nas práticas das professoras cientistas quanto nas práticas da professora mediadora, a
presença do positivismo e dos ideais da escola nova se mostram bem claros na escrita da educadora.
Isso pode ter relação com o seu pensamento libertário, pelo qual se destacou como feminista e
primeira líder anarquista na época
Como grande parte do público que estava formando nas escolas normais naquela época era
composta por mulheres, Maria Lacerda de Moura se voltou para a educação mais consciente desse
público, chamando atenção para o seu papel como professoras e futuras mães. Pela escrita do seu
livro, a autora acreditava que por meio da educação das pelas mulheres, seria possível alterar para
melhor a formação de toda a sociedade.
Referências
AGOSTINI, Juliana. Práticas Educativas do Ginásio Santo Antônio (São João del-Rei, 1909-1945).
Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade Federal de São João del-Rei, São João del-Rei,
2018.
FARIA FILHO, Luciano Mendes. O processo de escolarização em Minas Gerais: questões teórico-
metodológicas perspectivas de análise. In: VEIGA, Cynthia et all. Historiografia e História da
Educação no Brasil. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2003.
GUIMARÃES, Paula Cristina David. Maria Lacerda de Moura e o “ estudo cientifico da criança
patrícia” em Minas Gerais (1908-1925). Tese (Doutorado em Educação). Universidade Federal de
Minas Gerais: Faculdade de Educação. Belo Horizonte, 2016.
LEITE, Miriam Lifchtz Moreira. Outra Face do Feminismo: Maria Lacerda de Moura. São Paulo: Ática,
1984.
ISSN 2358-3959
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Este estudo particulariza a Escola Normal Primária em Lisboa (Portugal) e Natal (no Rio Grande
do Norte, Brasil), entre os fins do século XIX e primeiras décadas do século XX. O intuito é analisar a
disciplina Pedagogia, componente do Programa de Ensino da instituição em destaque. Fundamentado
teórica e metodologicamente na História Cultural, definida por Chartier (1990), através da conjunção
da história dos objetos na sua materialidade, das práticas nas suas diferenças e das configurações,
dos dispositivos nas suas variações. Enquanto fontes, delimitam-se os livros, por ordem de
edição: Elementos de Pedagogia (1870), Compêndio de Pedagogia (1873), Notas de Pedagogia
Filosófica (1890) e Princípios de Pedagogia (1891-1893). São analisados, também, em relação aos
temas pedagógicos os periódicos como a Revista Escolar (1925-1926) e a Revista Pedagogium (1921-
1925). Além disso, analisamos Diários de Classe e a Coluna Pedagogia do jornal A República – publicada
durante os meses de julho a setembro de 1911 – e escrita por Nestor dos Santos Lima, professor e
diretor da Escola Normal de Natal. Pedagogia era a disciplina em torno da qual se deviam articular
os diferentes saberes na Escola Normal Primária, e passou a ser considerada como representando,
ao mesmo tempo, a especificidade do curso de formação de professores. Os discursos pedagógicos
transformados em saberes especializados que vieram construir o campo dos saberes pedagógicos
considerados necessários à prática docente, passaram a ser organizados sob a forma de compêndios
ou manuais de pedagogia, servindo como suporte material a ser lido na formação docente e nos
concursos, assumindo um papel fundamental na preparação para o exercício do magistério primário.
Os manuais constituíram “instrumentos de difusão de uma cultura profissional do magistério”,
veículo do discurso pedagógico e de mobilização de referenciais internacionais
complexos. Ressaltamos que o núcleo pedagógico da formação do normalista era composto por
conhecimentos provenientes das matérias pedagogia, didática, metodologia e prática de ensino.
Essas são áreas que responderam às interrogações postas pelo magistério, cujo desenvolvimento
esteve profundamente relacionado com a construção da docência como profissão. O estudo desse
aspecto nos leva à afirmação de que os manuais de ensino eram utilizados por alunos da Escola
Normal Primária no estudo das questões concernentes ao ofício de ensinar, especialmente, das
matérias específicas. Enquanto um dos resultados das iniciativas que corporificam a escola e um
lugar de elaboração de conhecimentos sobre essa instituição e suas práticas, os manuais pedagógicos
permitem examinar aspectos importantes da constituição da cultura escolar. Eram vias de circulação
de conhecimentos pedagógicos que apresentavam ideias aos normalistas. Os manuais colaboraram
para a construção e difusão das instituições de ensino e das formas pelas quais elas foram concebidas,
em um momento em que ocorria a expansão mundial da escola, processo relativamente homogêneo
que simultaneamente assumiu contornos específicos em espaços determinados. Um aspecto a ser
destacado na análise dos manuais que difundiam os saberes escolares, utilizados em fins dos
oitocentos e nas duas primeiras décadas do século XX, diz respeito às descrições, às prescrições e
aos modos de fazer. Os manuais são muito reveladores do que constitui o duplo movimento
contraditório da disseminação dos conhecimentos elaborados no seio de uma disciplina. Os
conceitos difundidos eram noções simples e utilizáveis. Os livros dos normalistas constituíram-se
como a gramática do magistério, cujo objeto era o objeto de ensino. Eles tinham como tema geral a
educação e seus aspectos pedagógicos, psicológicos, didáticos e metodológicos. Elementos de
pedagogia tinha por objetivo orientar os candidatos ao magistério primário. Foi compilada pelos
professores José Maria da Graça Afreixo e Henrique Freire – diplomado pela Escola Normal de Lisboa
–, os quais atuavam nas Escolas Centrais. Esse manual teve como colaborador o professor José
Antônio Simões Raposo, professor de pedagogia e metodologia da Escola Normal do sexo feminino,
em Lisboa. O livro apresenta conceitos para educação, sobre a qual considera os aspectos de sua
divisão: física, moral e intelectual. Já a pedagogia era compreendida enquanto o conjunto dos
princípios que presidem a educação das crianças, e das leis que sobre esses prin- cípios se formam.
Além disso, a didática como a combinação dos princípios e leis que todo professor deve conhecer
para conseguir a instrução dos seus alunos e define a metodologia como responsável pela
enumeração dos diversos modos, métodos e processos empregados nos vários ramos de ensino.
O Compêndio de pedagogia, de Antônio Francisco Moreira de Sá, estava em conformidade com os
programas para os exames de professores e também tinha por finalidade servir aos estudos dos
candidatos que desejavam ingressar nas escolas normais. O autor era professor público vitalício das
Escolas Primárias de Lisboa e Cavaleiro da Ordem de Cristo, o que influenciou as ideias por ele
veiculadas. Definiu pedagogia como o conhecimento de princípios que presidem a educação dos
meninos, ou meninas, e os meios de os empregar, dividindo-a em teórica ou didática e prática ou
metodológica. A didática era entendida como o conhecimento que todo o professor deve ter das leis
e princípios para obter a boa instrução dos seus discípulos, como também acerca da metodologia,
sobre a qual afirmava ser o conhecimento concernente aos modos e métodos empregados no mister
de ensinar. Em Notas de pedagogia filosófica, José de Sousa afirmava se dá por compensado, se
conseguisse despertar a atenção e o gosto pelos estudos pedagógicos, tão necessários e
indispensáveis quanto são ignorados e esquecidos. Pretendia apresentar as bases científicas da
pedagogia moderna, claramente influenciado pelos ideais positivistas e por Herbert Spencer. José
Augusto Coelho, por seu turno, em Princípios de pedagogia, concebia os princípios de pedagogia em
conformidade com os preceitos postulados Herbert Spencer. no que diz respeito à inteligência
humana, as duas maneiras fundamentais de se tornar possuidor de uma verdade qualquer se davam
de forma “passiva e subserviente, a recebe quando lhe é imposta pela autoridade dos outros,
fixando-a tal como lhe foi apresentada; ou, ativa e independente, se eleva até à concepção dessa
verdade, graças aos esforços do seu próprio mecanismo mental. Para Nestor dos Santos Lima, na
Coluna Pedagogia, a disciplina consistia na apresentação das teorias de educação, na indicação dos
fins e descrição dos métodos e processos, ou seja, os temas em reflexão estavam relacionados com
a metodologia do ensino. Os manuais e, de modo específico, os artigos sobre pedagogia, evidenciam
de modo recorrente citações de pedagogos, filósofos, sociólogos, psicólogos, biólogos e outros
cientistas que definiram as funções docentes, os papéis dos alunos e os métodos de ensino. Ao
mesmo tempo, a análise dos manuais e impressos evidencia a própria história das ciências que
fundamentaram a formação do magistério no período em estudo. Se a pedagogia era o elemento
definidor dessa formação, ao longo do século XIX, nas primeiras décadas do novecentos, a psicologia
e a pedologia se constituíram enquanto elementos aglutinadores das principais reflexões dos
docentes. Em fins da década de 1920, as Escolas Normais Primárias de Lisboa e de Natal estavam em
efetivo funcionamento. O Curso Normal exibia um caráter de formação profissional – ao pautar-se
em elementos peculiares das Ciências da Educação. A formação oferecida aos professores tornou-se
cada vez mais especializada e legitimou a profissionalização do magistério primário. As Escolas
Normais Primárias, em suas respectivas configurações, produziram por meio de seus agentes
educativos práticas imbuídas do modelo pedagógico vigente que preconizava a introdução dos
princípios da Pedagogia Moderna. Instaladas em continentes distintos as instituições partilhavam
projetos e discursos que se entrelaçavam, evidenciando uma completa sintonia e circulação do
pensamento pedagógico. A reciprocidade de ideias e práticas pode ser observada nos discursos de
intelectuais, professores, dirigentes de instrução pública, mas, sobretudo, em livros escolares,
regulamentos e periódicos. A cultura escolar em suas dimensões empírica, prática ou material é
produzida cotidianamente pelos docentes. Seja nos aspectos políticos ou normativos, os quais
correspondem as regras que governam o funcionamento das escolas, seja no caráter científico ou
pedagógico, elaborado para explicar ou propor modos de trabalho tipicamente escolares, a exemplo
dos saberes veiculados pelos manuais e periódicos.
ISSN 2358-3959
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qualidade que a sociedade necessitava. Segundo Beisiegel (2005), as iniciativas estatais se voltaram
a solucionar o problema da educação pública em seus aspectos quantitativos, sem operar com a
premência necessária em sua dimensão qualitativa, aprofundando ainda mais os problemas
educacionais por expandir a oferta de vagas em instituições inadequadas sem as condições
fundamentais para o seu funcionamento. As distorções que conduziram o crescimento da rede
pública de ensino acabaram por secundarizar os elementos fundamentais intrínsecos a educação,
refletindo uma divergência entre os valores proclamados e a sua efetivação. Os estudos, discussões
e críticas dirigidas à educação escolar, em todos os seus níveis, demonstram que a mesma se
constituiu em contínuo percurso de crise. Nesta perspectiva, compreender a sua trajetória torna-se
iminente na tentativa de buscar alternativas para os desafios que compõem a realidade escolar,
superando questões fenomênicas que acabam se tornando o centro das discussões e impedem o
avanço para uma análise crítica (SAVIANI 2002). Na configuração da atual sociedade, tanto no âmbito
formal quanto informal, a escola assumiu, aos poucos, papel de destaque, ainda que numa
compreensão caótica da sua atribuição, compreende-se sua importância na constituição do
indivíduo e na formação das novas gerações. No interior desse amplo e intenso campo, compreender
o movimento das ideias pedagógicas não se limita a uma abstração, mas consiste em conhecer o
desenvolvimento da educação em seus aspectos teóricos e seus corolários na realidade concreta. É
necessário perceber as teorias pedagógicas se originaram em tempos e contextos condicionados a
questões políticas, sociais e econômicas, que em consequência, vão configurando as concepções de
homem, de sociedade e consequentemente, delineando diferentes princípios, atributos funcionais
e objetivos à escola. Em diferentes perspectivas e propostas, as concepções pedagógicas se
constituem com o intuito de responder as necessidades que se apresentam concretamente no
cotidiano. Independente de dispor dos subsídios suficientes para dar conta da realidade, seu teor se
define sob a reflexão e o estabelecimento de perspectivas e práticas que orientam o processo de
aprendizagem e formação dos indivíduos. Saviani (2013a) destaca que o adjetivo pedagógico se
refere especificamente a questões metodológicas, orientando o ato educativo, portanto, a pedagogia
se configura em uma teoria elaborada em razão das práticas escolares. Considera a escola pública
como espaço imprescindível para a formação humana, sobretudo aqueles excluídos, o professor
como intelectual e a socialização e apropriação do conhecimento científico sistematizado como
núcleo da formação humana, numa perspectiva crítica da sociedade. Em um cenário marcado pelo
conservadorismo e obscurantismo a PHC, tem se colocado como instrumento de resistência diária
do professor. O que no senso comum dos educadores pode ser compreendido como uma mera
questão teórica tem efeitos corolários na prática pedagógica e na formação dos indivíduos. Em seu
âmago, o que se verifica é uma prática educativa voltada para a perspectiva de adaptação e
manutenção do status quo da sociedade, ou na possível superação da mesma. Gadotti (1999) destaca
que a história das ideias não segue a lógica das novas descobertas científicas que acabam por tornar
as antigas obsoletas. Ou seja, as ideias filosófico-educacionais não passam por um aperfeiçoamento
continuo e ascendente fazendo com que as reflexões antigas percam sua validade para serem
substituídas por visões entendidas como modernas. As tentativas de organização, descrição e
classificação das tendências pedagógicas, oferecem elementos para os professores identificarem os
pressupostos teórico-metodológicos que estão implícitos em práticas, que na maioria das vezes são
incorporadas ao cotidiano, pois, se tornaram senso comum no ambiente escolar. É fundamental ao
professor, ter ciência de que seu trabalho tem um sentido mais amplo do que o fenômeno que ocorre
dentro da sala de aula. Nessa perspectiva, busca-se evidenciar a dimensão política da educação e
sua mediação no ceio das práticas sociais. O papel da educação se insere no domínio deste vir a ser
da sociedade. Para responder as demandas que se apresentam atualmente, as necessidades do
aluno que integra a escola pública brasileira é vital exceder a estratégia ideológica liberal que
predomina no âmbito educacional, no qual os antagonismos políticos, filosóficos, teóricos e
metodológicos são minimizados a simples recursos discursivos, justificando atuações pedagógicas
pragmáticas, fragmentadas e acríticas, anulando as possibilidades de enfrentamento dos problemas
educacionais. A PHC se configura como uma proposta de qualidade assentada na condição recíproca
que existe entre a prática social e a prática educativa. Instrumentalizando os professores, esta teoria
contribui para a compreensão da educação em sua totalidade, orientando o trabalho docente em
direção à superação dos conceitos de qualidade disseminados pelas tendências pedagógicas
burguesas, efetivando uma educação que tem como padrão de qualidade a formação humana
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 411
Referências
BEISIEGEL, Celso de Rui. A qualidade de ensino na escola pública. Brasília: Liber Livro Editora, 2006.
GADOTTI, Moacir. História das ideias pedagógicas. 8 ed. - São Paulo: Ática, 1999.
SAVIANI, Dermeval. Do senso comum a consciência filosófica. 14ª ed. – Campinas, SP: Autores
Associados, 2002.
SAVIANI, Dermeval. História das ideias pedagógicas no Brasil. 4ªed – Campinas, SP: Autores
Associados, 2013a.
A Coleção Resumo Didático foi publicada pela Companhia Melhoramentos entre 1918 e 1932.
Esta coleção configurou-se com um projeto editorial, vinculado aos princípios da Escola Nova, de
renovação do ensino de história, no Brasil, a partir das histórias regionais. Para tal empreendimento
foram arregimentados expoentes da historiografia nacional e/ou regional. Nesse sentido, a presente
comunicação pretende compreender a associação dos princípios escolanovistas e o ensino de
história assim como a historiografia de então engaja-se nesse projeto.
As três primeiras décadas do século XX se configuraram como um momento de intensas
discussões sobre os destinos do Brasil. Intelectuais, de matizes diferentes, questionavam o modelo
socioeconômico e político vigente no país. A República recém instaurada era questionada por não
desenvolver ações de (re)conhecimento e valorização da cultura brasileira. No âmbito educacional,
às vésperas das comemorações do primeiro centenário da independência do país, identificava-se
um quadro estarrecedor. Mais de 80% da população era analfabeta. Além da crítica à ausência de
uma rede escolar que atendesse a população questionava-se os métodos e práticas pedagógicas.
Influenciados por filósofos e pedagogos norte-americanos e europeus, um grupo de intelectuais
propõe a reestruturação da rede escolar e de seus métodos seguindo os princípios da Escola Ativa
também chamada de Escola Nova. Os estudos existentes sobre o movimento priorizam as Reformas
Educacionais, promovidas nas gestões dos Departamentos da Instrução Pública, ou a identificação
das novas propostas metodológicas para a instrução primária e para a formação de professores.
Pouco se discute as interações entre tais propostas e os saberes curriculares, especialmente no
campo do ensino de história. A coleção Resumo Didático, editada pela Companhia Melhoramentos
de São Paulo, entre 1918 e 1932, conforma uma proposta inovadora para o campo do ensino de
história por propor que esta disciplina fosse ensinada a partir das histórias estaduais. Ideia inspirada
no princípio da experiência próxima, concreta e significativa dos educandos. Para a concretização
desse projeto foram convidados historiadores consagrados regional ou nacionalmente. Nesse
sentido, essa coleção permite a reflexão sobre a relação entre os cânones da escrita da história e as
inovações propositivas do escolanovismo. Para o desenvolvimento desta pesquisa foram analisados
os doze livros editados pela Companhia Melhoramentos e os relatórios de gestão dos presidentes de
estado, assim como coleções de leis estaduais, para compreender os princípios legais que nortearam
a implementação das propostas escolanovistas e as recepções destas ideias nos diversos locais.
Não é de hoje que a educação brasileira está na pauta do dia. Crônicos são os problemas no que
se refere à estrutura das escolas, a baixa remuneração dos professores, aos métodos e técnicas de
ensino, as relações entre a escola e a comunidade, entre outros. É este quadro que leva profissionais
de diversos matizes a refletir e propor ações que transformem essa realidade. A par da demanda social
por melhorias na educação, os campos disciplinares vêm investindo em uma reflexão diagnóstica
sobre o ensino nas escolas e sobre alternativas para sua melhoria. Nos últimos 30 anos, por exemplo,
a área do Ensino de História vem ocupando um lugar crescente entre as discussões dos historiadores,
com a configuração de seminários específicos e linhas ou programas de pós-graduação dedicados
ao tema. A articulação com as teorias pedagógicas e com a teoria da história vem configurando a
área de Ensino de História como uma área de fronteira e adensando as discussões aí promovidas. A
reflexão sobre o papel da história na escola e sobre a renovação de sua didática não é algo exclusivo
de nosso tempo e vem se configurando como um instigante problema para os estudiosos. A história
do ensino de história é um capítulo importante da história da história, ou da historiografia, pois
nos permite pensar aspectos da configuração desse campo disciplinar e dos usos do passado na
conformação da consciência histórica ao longo da história.
As primeiras iniciativas de modernização da esfera educacional no Brasil Republicano remetem
ao movimento das reformas da instrução pública promovidas em diferentes estados do país.
Ao analisar esse conjunto de reformas em estudo clássico, Jorge Nagle faz referência à chamada
“política dos estados” responsável pela aglutinação das forças estaduais na sustentação do governo
federal, e, no plano da educação, pela adoção de um conjunto de medidas coordenadas no sentido
da organização dos sistemas escolares estaduais, expressando a força política das lideranças de
determinadas unidades federadas. O movimento das reformas da instrução pública ocorrido nos
estados brasileiros ao longo da Primeira República expressa com clareza a liderança exercida pelo
grupo paulista na condução da política nacional o que, no âmbito da educação, verificou-se com a
repercussão alcançada pelo modelo de reforma educacional implementado no estado de São Paulo,
em 1920.
A Companhia Melhoramentos de São Paulo (Weiszflog Irmãos Incorporada) publicou, entre
1918 e 1932, uma série de livros escolares intitulada “Resumo Didactico”. Cada título dedicava-se à
história de um estado brasileiro e a sua leitura era proposta aos alunos das Escolas Normais e aos
professores das escolas primárias. A publicação de livros didáticos é diretamente proporcional à rede
escolar estabelecida no país. Uma boa parte dos compêndios e manuais didáticos durante o século
XIX era importada, seja em língua estrangeira, seja em português impresso fora do país. Francisco
Alves foi o primeiro editor brasileiro a fazer da produção escolar o principal filão de seu negócio.
Até então, o mercado escolar era muito incipiente para justificar a concentração das atenções de
um editor. Entre a Proclamação da República, em 1889, e o fim da Primeira Guerra Mundial, em
1918, a matrícula na escola primária quintuplicou, saindo de 250 mil para um milhão duzentos e
cinquenta mil estudantes. A Companhia Melhoramentos foi constituída, em 1890, com a finalidade
de produzir papel. Em 1920, que se funde com a Weiszflog Irmãos, que já vinha atuando desde
1909 com materiais didáticos. A série Biblioteca Infantil, iniciada em 1915, foi um grande sucesso
editorial. Logo em seguida, a editora produziu obras de História, através do bom relacionamento
de J. Alves Dias com os reconhecidos autores dessa área: Rocha Pombo, Oliveira Lima e Affonso
d’Escragnolle Taunay. A produção didática do consórcio se eleva de 51 mil, em 1916, para 344 mil
exemplares, em 1922. Nos anos 1920, a Companhia Melhoramentos de São Paulo consolidou-se nos
meios educacionais paulistas. Além das cartilhas e de obras para as variadas disciplinas específicas,
a editora passa a publicar, a partir de 1921, a Revista Nacional, com artigos escritos por algumas
lideranças do movimento renovador da escola e da educação no Brasil: Lourenço Filho, Fernando de
Azevedo, Carneiro Leão, entre outros. A estratégia de comercialização dos livros escolares, em um
mercado em expansão, levou a Editora a criar uma publicação anual com o objetivo de divulgar as suas
obras. Reabertura das aulas: livros didáticos e material escolar circulou entre professores e diretores
de escolas em São Paulo, Rio de Janeiro e Recife. Analisar as estratégias editoriais é um aspecto
importante na análise das obras específicas. Isso vale especialmente se estamos considerando livros
didáticos cuja penetração no mercado depende, em grande medida, dessas mesmas estratégias. A
editora, e suas práticas, constitui um dos lugares de produção do conhecimento histórico escolar.
Os prefácios dos livros de Pedro Calmon, Lucas Boiteaux e Rocha Pombo, da coleção Resumo
Didactico, apontam para tópicos recorrentes no debate da historiografia e do pensamento social
brasileiro, especialmente as relações entre a “pequena pátria” e a “grande pátria”. Esses autores
explicitam que a região/estado e a nação são entidades complementares. Não por outra razão,
harmonia, amor e instinto são palavras chaves para ligar os conceitos polares torrão/pátria,
estado/União, Bahia [Santa Catarina/ São Paulo]/ Brasil. Rocha Pombo desenvolve um continuum
entre família, comuna, Estado [e Nação]. Rocha Pombo, Max Fleiuss, Pedro Calmon, Clodomiro
de Vasconcelos, Lúcio José dos Santos, Lucas Boiteux, Craveiro Costa, Cruz Filho, Teodoro Braga,
Mário de Mello, Doca Sousa, autores dos livros da série Resumo Didático, foram historiadores do seu
tempo. Eram filiados ao respectivo Instituto Histórico e Geográfico de seu estado e, uma parte deles,
ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB). Os Institutos, desde a criação do IHGB, em 1838,
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 414
e dos respectivos estaduais, ao longo do século XIX e início do século XX, eram os principais locais
de debate sobre a produção historiográfica no país. Construía-se assim um lugar para a história
regional no campo educacional e no campo historiográfico.
ISSN 2358-3959
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O presente trabalho visa analisar as ideias do pensador baiano Rui Barbosa de Oliveira (1849-
1923) para a Educação Profissional no Brasil durante a última década do Império. Nosso intuito é
compreender como este intelectual construiu uma representação sobre a Educação Profissional que
seria necessária para o Brasil do final do século XIX e início do século XX, a partir do contexto histórico,
do seu lugar de fala e sua rede de sociabilidade, bem como através da circulação das ideias vigentes
nacional e internacionalmente nesse período. Assim, buscamos contribuir para o campo da Educação
Profissional, campo de produção de conhecimento que acreditamos precisar da compreensão da
história e da política educacional para avançar e consolidar sua produção científica. Com efeito, os
trabalhos na esfera da Educação Profissional possuem temáticas bem variadas, tendo as obras de
cunho historiográfico uma parcela ainda relativamente pequena dentre tais temas. Em nosso artigo,
iniciamos apresentando o contexto da Educação Profissional, outrora denominado Ensino Industrial
no final do Brasil Império e início do período Republicano a partir de relevantes trabalhos
historiográficos, iniciando com Fonseca (1961) e discorrendo para outros mais atuais. Esta pesquisa
está inserida na interface da abordagem teórica dos campos historiográficos da História Cultural e
da História dos Intelectuais. Entendemos que o mundo é dado a ler como representação através das
práticas. Tais práticas se estabelecem diante das apropriações, enquanto usos e interpretações, das
leituras das representações do mundo inscritas nas próprias práticas que as produzem. Nesse ciclo
surgem os conceitos basilares da História Cultural: representações, circulação das ideias, práticas e
apropriações. Os conceitos de representação e prática; apropriação e circulação, próprios da História
Cultural, bem como os da História dos Intelectuais, como lugar de fala e rede de sociabilidade, são
fundamentais em nosso trabalho. De fato, compreendemos que para analisar a obra Barbosiana
exige-se o entendimento de que ela é produção de um intelectual em sua rede de sociabilidade. Para
tanto, utilizamos a obra de Sirinelli (2003) e consideramos uma noção socialmente ampla do conceito
de intelectual, mas com uma atuação específica enquanto sujeito político no processo histórico, isto
é, um sujeito cultural engajado em uma luta política e com uma função social. Esse sujeito, ainda
segundo a compreensão de Sirinelli (2003), estabelece relações interpessoais com outros intelectuais
que possuem uma mesma sensibilidade ideológica ou cultural e, portanto, estão, em maior ou
menor grau, engajados na mesma luta política. Além disso, tais relações instauram-se também
diante da vontade de conviverem em um mesmo ambiente ou relacionarem-se de modo contínuo;
assim se formam as redes de sociabilidade que precisam ser postas em relevo para melhor
compreensão das origens e circulação das ideias. Também dialogamos com o domínio da História
das Disciplinas Escolares e a compreensão de Chervel (1990) de que os conteúdos de uma disciplina
são impostos à escola pela sociedade em sua cultura, mas que a própria instituição os reconfigura,
daí sendo importante analisarmos como categorias a gênese, a função e a funcionalidade da
disciplina, também são compreensões fundamentais ao nosso estudo. Isso porque percebemos
neste trabalho a relevância dada por Rui Barbosa ao ensino de Desenho para a Educação Profissional
brasileira, construindo acerca desta disciplina uma representação clara de sua intrínseca finalidade
para o desenvolvimento da nação. Essa representação é, ao nosso ver, o contributo mais vigoroso do
autor para o que posteriormente seguiu-se no campo da história da educação profissional, já no
período republicano. A disciplina escolar Desenho figura como parte da formação do ensino primário
da educação brasileira desde 1879, com a reforma de Leôncio de Carvalho, para a qual o legislador
Rui Barbosa é escolhido em vista de emitir um parecer. Ao buscarmos compreender o papel desta
disciplina para o ensino profissional em documentos educacionais do final do século XIX e início do
século XX no Brasil, nos deparamos com o “Parecer da Reforma do Ensino Primário e Várias Instituições
Complementares da Instrução Pública” de Rui Barbosa, em que vemos uma defesa enfática do papel
do Desenho para o ensino de ofícios em vista do desenvolvimento da nação. A partir de então, no
âmbito da educação profissional, tal disciplina, que não aparecia nas primeiras tentativas do Estado
de constituir uma proposta para o Brasil, surgirá com o Decreto de criação das Escolas de Aprendizes
Artífices (EEA) no governo de Nilo Peçanha, em 1909. Neste interstício de três décadas, inúmeros
debates originados em grande parte da difusão das ideias de Rui Barbosa em união com outros
debates educacionais e legislativos, vão consolidando a representação construída por Barbosa
sobre a importância do Desenho para a profissionalização da população e levam a sua consolidação
com a lei-decreto de criação das Escolas de Aprendizes Artífices. Utilizando o método histórico como
descrito em Rüsen (2015), constituído dos procedimentos de heurística, crítica e interpretação,
estabelecemos, na etapa heurística, como pergunta histórica que nos guia no presente trabalho:
quais os principais elementos, dentre suas ideias educacionais, Rui Barbosa expressa para a
Educação Profissional brasileira na virada do século XIX para o XX? O método histórico determina as
regras do pensamento histórico como processo de pesquisa que o capacitam a fundamentar
cientificamente a historiografia. Dessa forma, o método histórico nos auxilia a fundamentar o
processo cognitivo e reflexivo particular de maneira a torná-lo reconstituível e criticável. Assim, na
etapa da crítica, ao buscarmos analisar a qualidade da informação e das fontes para responder
nosso questionamento estabelecemos como principais fontes do trabalho o Parecer do polímata
baiano nas suas obras completas (BARBOSA, 1946); o discurso “O desenho e a arte Industrial”
realizado por Rui Barbosa no Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro no ano de 1882, bem como,
em menor grau a obra traduzida pelo intelectual Rui Barbosa “Primeiras Lições de Coisas – Manual de
Ensino Elementar para o Uso de Paes e Professores”, de Norman Calkins, pois nesse trabalho de
tradução aparecem indícios das influências de ideias traçadas pelo legislador. Por fim, realizamos a
interpretação delimitando contextos sociais e históricos importantes, relações interpessoais de
Barbosa enquanto intelectual e seu lugar de fala, e fragmentos dos documentos que expressam com
precisão as ideias centrais do gênio barbosiano sobre a nossa temática. O período do recorte
temporal é determinado pela publicação da Reforma Leôncio de Carvalho que levará Barbosa à
elaboração de seus famosos pareceres, nos quais ele compila suas ideias sobre educação em geral e
em particular sobre a educação profissional. Terminamos com a publicação da lei de criação das
Escolas de Aprendizes e Artífices pois observamos nessa lei a consolidação da ideia de uma educação
profissional sistematicamente regulada pelo Estado em vista do seu desenvolvimento econômico e
social, bandeira enfatizada por Rui Barbosa, bem como com a estruturação de seus pensamentos
sobre organização e administração educativa, filosofia e política da educação profissional e
metodologia de ensino que se firma especialmente na disciplina escolar Desenho. A partir de uma
análise de documentos e trabalhos sobre as Escolas de Aprendizes e Artífices e tomando como foco
a disciplina Desenho, percebemos que as ideias de Rui Barbosa, em particular as sobre o Desenho,
foram apropriadas pelas Escolas de Aprendizes Artífices por meio de força da lei e das ações de
gestão que premiavam os bons trabalhos de desenho e de ofício, reforçando a relevância do Desenho
para a formação de artífices. Nossos resultados também apontam indícios da influência das ideias
em circulação internacional nas obras de Rui Barbosa e, a partir dele na educação profissional
brasileira.
Referências Bibliográficas
BARBOSA, Rui. Reforma do Ensino Primário e Várias Instituições Complementares da Instrução
Pública. Obras Completas de Rui Barbosa. Vol. X. 1883, Tomo II. Rio de Janeiro, RJ: Ministério da
Educação e Saúde, 1946.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 417
CHERVEL, André. História das Disciplinas Escolares: Reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria
& Educação, V. 2, p. 177 – 229, 1990.
FONSECA, Celso Suckow da. História do ensino industrial no Brasil. V. 1. Rio de Janeiro, RJ: Escola
Técnica Nacional, 1961.
RÜSEN, Jörn. Teoria da História: uma teoria da História como ciência. Trad.: Estevão C. de Resende
Martins. Curitiba, PR: Editora da UFPR, 2015.
SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René (Ed). Por uma história política. 2ª Ed.
Rio de Janeiro, RJ: Editora FGV, 2003.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Resumo
Para sociedade, a sexualidade sempre foi um “tabu”, um tema complexo, de difícil discussão,
principalmente, quando está relacionado à criança. Pois, causa receio, vergonha, sem contar a falta
de informação e a insegurança que permeiam o assunto, dificultando o diálogo necessário. Por isso
falar sobre sexualidade não é nada fácil, para os pais e muito menos para os (as) professores (as),
pois este tema, sempre foi alvo de tabus, crenças e preconceitos. No entanto, a manifestação da
sexualidade está cada dia mais precoce, pois, a mídia, as tecnologias, as músicas estão expondo
seus conteúdos, cada vez mais de forma erotizada. Isso acaba influenciando tanto no comportamento
das crianças, quanto na ideia que elas têm sobre si e o outro. Neste sentido, para entender sobre
sexualidade infantil, é necessário inicialmente compreender que a uma diferença entre “sexo” e
“sexualidade”. Enquanto o Sexo é entendido a partir do biológico, remetendo-se a ideia de gênero,
feminino e masculino, a sexualidade vai além das partes do corpo, constituindo-se como uma
característica que está estabelecida e está presente na cultura e história do homem. Neste
pressuposto, Figueiró (2006) frisa que “sexualidade é uma energia que leva o bebê a construir a
primeira forma de conhecimento: distinguir seu corpo do dos outros. É a energia que leva o ser
humano a movimentar-se e interagir com o meio ambiente, impulsionando suas ações na direção da
satisfação das necessidades básicas e do premente desejo por prazer” (FIGUEIRÓ, 2006, p. 44).
Portanto, sexualidade não é sexo e sim tudo aquilo que está relacionado ao processo de conhecimento
e experimentação do próprio corpo. Quando falamos de crianças, não estamos falando de curiosidade
e nem de malícia. Por que a malícia está no olhar estereotipado e erotizado dos adultos. A criança,
pelo contrário tem curiosidade em relação ao mundo, às coisas e a si próprio. Ela percebe que tem
um corpo e possui delimitações concretas que constroem o seu ser. Sendo assim, é esperado que se
conheça e experimente seus limites através de suas vivências. Para Nunes e Silva (2006, p. 73) “A
sexualidade transcende à consideração meramente biológica, centrada na reprodução e nas
capacidades instintivas”. Pois a sexualidade é uma dimensão humana essencial, e é necessário que
seja entendida na totalidade dos seus sentidos, como tema e área de conhecimento. Pois a
curiosidade, as diferenças que as crianças percebem em seu próprio corpo, no corpo do outro e a
descoberta das carícias, fizeram do assunto um tabu, algo que “não é conversa para crianças”
contribuindo para aguçar ainda mais a imaginação das crianças. E nos dias atuais, a manifestação da
sexualidade faz parte do cotidiano das escolas. E cada vez mais os (as) professores (as) se deparam
com situações em que a sexualidade das crianças está evidente. São situações rotineiras no
desenvolvimento infantil, porém, ainda é um assunto complexo nas escolas, mas que faz parte do
cotidiano da sala de aula e precisa ser encarado pelos professores. Desta forma, durante o exercício
de sua função, os professores que atuam na Educação Infantil, tem enfrentado um grande desafio: A
manifestação da sexualidade. Torna-se um desafio, devido à ausência de debates e diálogos, sobre
o tema na maioria dos currículos e durante a formação de professores. Além disso, a família que
deveria ser responsável por dialogar sobre a sexualidade com seus filhos, não se sente preparada o
suficiente para abordar o assunto não propiciando uma abertura para a conversa em casa. Sendo
assim, os pais transferem para escola mais essa responsabilidade. Desta forma, é de extrema
relevância, compreender que a criança possui sexualidade e entender o verdadeiro significado do
termo. Para melhor entendimento, é necessário definição e reflexões sobre o termo “sexualidade”,
para que pais, professores e a quem mais interessarem, possa lidar com a temática de forma
adequada. Portanto, considera-se essencial entender que a sexualidade está presente na vida de
cada indivíduo desde o nascimento até a sua morte. Por isso, Figueiró (2006), frisa que é importante
estar atento, quanto à manifestação da sexualidade dos alunos no espaço escolar. Pois a sexualidade
é uma das demandas que mais têm apresentado dificuldades, problemas e desafios aos professores,
no cotidiano da sala de aula. A manifestação da sexualidade dos estudantes no espaço escolar, esta
de modo geral, aguçada, tendo em vista o modo em que a sociedade atual e também os meios de
comunicações, estão abordando a temática. Neste sentido, buscou-se, através da pesquisa de cunho
bibliográfico, compreender como a manifestação da sexualidade infantil é vista na escola
contemporânea, por meio dos seguintes objetivos: conhecer contribuições para o processo de
formação de professores, sobre sexualidade Infantil, bem como explicar a necessidade de diálogos,
sobre sexualidade infantil na escola contemporânea. No desenvolvimento, está descrito o referencial
teórico que subsidiou a presente pesquisa, o qual apresenta o conceito do termo sexualidade, a
contribuição de teorias de aprendizagem e desenvolvimento humano sobre a sexualidade, em
especial a descrição das fases do desenvolvimento psicossexual da criança de acordo com a teoria
de Freud, o papel do educador e apontamentos sobre a importância da formação de professores no
que concerne a esta temática. Também estão descritos os resultados e as discussões. No qual, é o
momento da análise de como a manifestação da sexualidade infantil é vista na escola contemporânea.
E nas considerações finais, evidenciou que a temática sexualidade, é um assunto complexo e de
difícil conceituação. No entanto, entendeu-se que a sexualidade perpassa a questão reprodutiva e
de acordo com os teóricos citados no decorrer do trabalho, tais como: FIGUEIRÓ (2006), FOUCAULT
(1988), FREUD (1905), OLIVEIRA (2011), NUNES, C.; SILVA (2006), a sexualidade pode ser considerada,
manifestação natural do indivíduo em relação a seu corpo, que se manifesta através do relacionamento
consigo mesma e com os outros. No entanto, atualmente, à manifestação da sexualidade em sala de
aula, tem sido uma situação rotineira nas escolas de educação infantil. Porém, ainda há muito receio
no que concerne a este assunto. Percebe-se que ainda, há muitas barreiras e tabus, quando se fala
em sexualidade, principalmente a infantil. Portanto, ao considerar a temática sexualidade de
extrema relevância, e por fazer parte de todo um contexto social, a sexualidade passa a ser para o
estudante, essencial não só para sua formação como ser pensante e ético, mas também para o seu
exercício da cidadania. A sexualidade faz parte da construção do individuo, tornando-se necessário
a abordagem do tema desde a educação infantil. Pois não se pode mais admitir professores, com
conduta preconceituosa e completamente alheia ao conhecimento e competências necessárias para
essa abordagem. Neste sentido, é necessário ter como base, teóricos que discutem a temática
sexualidade, para compreender as melhores formas de abordar e trabalhar com este assunto na
educação infantil, ainda há muito que ser feito, pois os tabus que envolvem a sexualidade estão
enraizados em todos e para agir com as crianças adequadamente é preciso que os professores
tenham a sua sexualidade bem resolvida, só assim esses tabus serão superados. Diante deste
pressuposto, os professores necessitam rever sua formação moral e profissional, tornando-se
imprescindível que adquiram maior informação, cursos de formação, tanto a inicial quanto a
continuada. A ausência de informação sobre sexualidade é um grande problema. Pois Freud (1905)
afirmou em seus estudos a existência de uma sexualidade infantil e apesar desta afirmação, há
indivíduos que se recusam a acreditar na existência desta sexualidade, agindo com descaso ou de
forma inadequada diante de algumas situações referentes à temática. Ou seja, as pessoas que não
aceitam a existência desta sexualidade, dificultam e ate impedem as crianças de manifestarem seus
impulsos. No entanto, considera-se também, que a realidade em que a criança vive, está diretamente
ligado a seu comportamento e a manifestação da sexualidade. Portanto, esta pesquisa traz uma
contribuição teórica aos professores e uma base para se repensar a formação e a prática educativa
quando relacionada à sexualidade infantil e poderá servir como base para estudos futuros.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 420
Referências
FIGUEIRÓ, Mary Neide Damico. Formação de educadores sexuais: adiar não é mais possível.
Londrina: Eduel, 2006.
NUNES, C.; SILVA, E. A educação sexual da criança: subsídios teóricos e propostas práticas para uma
abordagem da sexualidade para além da transversalidade. Campinas: Autores Associados, 2006.
não se pode fazer palavra escrita elementarmente, senão dividindo-se elementarmente; dividiu-se
sem custo em sílabas; subdividiu-se das sílabas ainda em elementos” (CASTILHO 1999b, p. 114).
Fundamentados na definição do método de leitura de Braslavsky (1971), pode-se situar António
Castilho na defesa do método fonético, justamente por partir da palavra falada para a decomposição
desta em elementos e, dessa forma, reivindicar a primazia da linguagem falada da aprendizagem
da leitura, partindo do que se “ouve e fala” para chegar ao que se “escreve e vê”. A leitura auricular
consistia na decomposição e síntese do objeto de leitura: a palavra falada, sendo para Boto uma
“biforme repetição do mesmo processo” (BOTO, 2012, p. 57).
Braslavsky (1971) apresentou a sensibilidade de Martha Salotti com o drama da criança na
passagem da voz viva da linguagem falada à letra morta aconselhando redobrar o olfato, o sabor,
a cor da palavra falada que oferece à criança riso e festa, companhia e refúgio. Era a defesa por não
tornarem “surdas” as crianças que ouviam, partindo assim do riso e festa da palavra falada como
início do processo de ensino da leitura.
Em tal leitura é criticado o excesso de estímulo ao contexto visual na alfabetização, em detrimento
dos outros sentidos. Essa seria uma defesa, em outras palavras, pelos princípios ancorados no
método fônico. A defesa pelo ouvido pensante elaborada por Schafer (1991) foi sensivelmente
defendida pelo poeta cego português no século XIX.
Se na pauta das discussões no atual cenário político estão as questões da alfabetização centradas
entre marchas sintética ou analítica, é necessário problematizar acerca da importância do ato de
ler para a emancipação do sujeito e, para tanto, discute-se com Jacotot a importância do Ensino
Universal na área da Música para a formação de leitores autônomos e criativos.
Os embates entre os defensores de Castilho e Jacotot em solo imperial brasileiro no século XIX
resultaram de diferentes concepções filosóficas referentes ao ensino da língua materna. Jacotot e
seu princípio do ensino do todo relacionável encontrou resistências em uma espécie de redes de
saberes filosóficos que fundamentaram os métodos para o ensino de leitura nos séculos XIX e XX. O
ensino Universal proposto por Jacotot evocava a liberdade criativa do “todo” no ensino da língua
materna a partir, inclusive, do ensino de música.
Jacotot partia do princípio da totalidade de um texto no início do processo de alfabetização,
rumo à matriz de um método global. Jacotot foi considerado por vários pedagogos como o criador
do método analítico para o ensino da leitura através de seu Ensino Universal apresentado na obra
Língua materna, publicada em 1822.
Observa-se que esse embate imperial, embora aparentemente bem esclarecido nas ideias
pedagógicas republicanas, necessita ser problematizado nas práticas de nossas atuais escolas,
questionando a ambivalência no ensino da leitura e escrita a partir do anúncio de um modo analítico
que se reproduz no campo das “partes” da marcha sintética e graduada. A necessidade latente no
campo do debate metodológico para o ensino da leitura e da escrita na atualidade remete-se ao
desafio da partida do todo da leitura do mundo à leitura da palavra.
Após a caminhada na linha tênue da classificação das matrizes desses métodos que circularam,
observa-se que os embates apresentados no Brasil oitocentista resistiram ao tempo adentrando
em nossa atualidade. Se o perigo iminente das “associações” causa estranheza nos dias atuais,
torna-se necessário parafrasear Braslavsky (1971, p. 58), pois “se certas teorias associacionistas
envelheceram, os processos de associação não são por isso menos fundamentais” (BRASLAVSKY,
1971, p. 58); a capacidade de relacionar a gama de informações que são acessadas com o
conhecimento previamente construído por um indivíduo ativo no processo conduz a um processo
analítico global de ensino.
Corroborando Magda Soares (2017), observa-se que a “velha” discussão não fora vencida.
Historicamente, nota-se um silenciamento e um reducionismo do debate sobre os métodos
de alfabetização, legando-os ao campo das querelas das marchas pedagógicas e mascarando
o todo social, o que pode levar a uma ortodoxia da escola conduzida por vias espontaneístas. A
partir da ótica de uma pergunta — Alfabetização: em busca de um método? —, a autora responde
destemidamente sobre a necessidade de estarmos sim em busca de um método, defendendo um
debate na conceituação de método, para além de “camisa de força”, ortodoxo, tradicional.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 423
Referências
ALBUQUERQUE, Suzana Lopes de. Métodos de ensino de leitura no Império brasileiro: António
Feliciano de Castilho e Joseph Jacotot. 2019. 240f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de
Educação. Universidade de São Paulo, USP, 2019.
BOTO, Carlota. A escola primária como rito de passagem: ler, escrever, contar e se comportar.
Imprensa da Universidade de Coimbra, 2012.
BRASLAVSKY, Berta P. de. Problemas e métodos no ensino da leitura. São Paulo: Melhoramentos e
Editora da USP, 1971. Agostinho Minicucci (Trad.). Prof. Lourenço Filho (Prefácio).
SCHAFER, R. Murray. O ouvido pensante. Tradução e Marisa Trench e O. Fonterrada, Magda R. Gomes
da Silva, Maria Lúcia Pascoal. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1991.
[1] Enquanto “a alfabetização é entendida como o processo de aquisição e apropriação do sistema da escrita, alfabéti-
co e ortográfico, o letramento é o desenvolvimento de habilidades de uso da leitura e da escrita nas práticas sociais
que envolvem a língua escrita, e de atitudes positivas em relação a essas práticas {...]” (SOARES, 2017, p.47).
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Um estudo comparativo entre diversos diplomas legais, emanados pelo Ministério da Educação
português entre 1986 e 2019, permite compreender de que modo a estrutura curricular tem vindo a
ser alterada, que ideias pedagógicas e práticas educativas têm sido veiculadas.
Ao longo destes trinta e três anos é possível analisar quer as sugestões feitas, quer as diretrizes
promulgadas, utilizando para tal tabelas comparativas, a partir de duas entradas, a sequência
cronológica por um lado, e os temas mais recorrentes, por outro.
O ano de 1986 é aquele de onde se parte, por ter sido neste ano, em 14 de outubro, que foi
publicada a Lei de Bases do Sistema Educativo. Os últimos anos foram igualmente analisados, porque
surgiu legislação abundante que convém observar: a 6 de julho de 2018 foi publicado o Decreto-
Lei 55/2018 sobre o desenvolvimento do currículo, a operacionalização do perfil de competências,
a concretização da autonomia e flexibilidade na gestão curricular das escolas e, em 4 de julho de
2019, surgiu o Despacho 6147, que definiu linhas orientadoras que as escolas devem adotar para
organizar propostas de trabalho, relacionadas com intercâmbios com outras escolas, visitas de
estudo, cooperação entre instituições e outras atividades lúdico-formativas.
O que está em causa neste trabalho é a análise da perspetiva oficial, perceber de que modo se
foi promovendo “o desenvolvimento de competências de pesquisa, avaliação, reflexão, mobilização
crítica e autónoma de informação, com vista à resolução de problemas e ao reforço da sua autoestima
e bem-estar” (al. III do texto introdutório do Decreto-Lei 55/2018, de 6 de julho) e, também, a forma
como se foi perspetivando a dinamização de trabalho interdisciplinar e diferentes ofertas educativas
e formativas.
Percebe-se que, independentemente das alterações políticas que ocorreram em sucessivas
legislaturas houve um caminho que foi, de uma maneira geral, consistente, sobretudo desde 1989,
com o Decreto-Lei 43/89, de 3 de fevereiro, que já visava a “flexibilidade do calendário escolar” e um
regime jurídico que consignava a autonomia das escolas. Essas preocupações tiveram continuidade
em 1998, quando se afirmava que “a autonomia das escolas e a descentralização constituem aspetos
fundamentais de uma nova organização da educação, com o objetivo de concretizar na vida da escola
a democratização, a igualdade de oportunidades e a qualidade do serviço público de educação”
(Decreto-Lei 115-A/98, de 4 de maio). Certo é que atualmente permanecem estas diretrizes, tendo
em conta legislação que foi produzida em 2017 e em 2018, sobre a forma mais adequada de pôr em
prática uma autonomia que há muito se vem tentando.
Independentemente de governos mais à direita ou mais à esquerda do espetro político, tem
havido igualmente uma preocupação em retirar ao manual escolar a primazia enquanto recurso
educativo, com a justificação de que isso pode contribuir para estimular outras formas de trabalho na
sala de aula, e têm persistido as tentativas para alterar a configuração dos horários dos professores,
com o intuito de que possam articular-se, reservando tempos comuns para colaborar em projetos
de interesse para a escola.
Na verdade, é percetível uma preocupação generalizada pelos diferentes Ministérios da Educação
em implementar práticas educativas que pudessem e possam vir a alterar métodos mais centrados
no professor, essencialmente expositivos e pouco cooperativos. Apesar desta tendência, houve
momentos em que se inverteu a lógica seguida de continuidade, como foi o caso da interrupção do
que estava consignado no documento Currículo Nacional do Ensino Básico – Competências Essenciais,
divulgado em 2001. Com efeito, no ano de 2011, o Despacho 17169/2011, de 23 de dezembro, referia
explicitamente que não se justificava continuar a utilizar aquele documento, atendendo a uma
conceção de ensino que valorizava então sobretudo o conhecimento, independentemente da sua
aplicabilidade prática.
Analisar as sugestões feitas e as diretrizes promulgadas ao longo destes mais de trinta anos,
permite compreender, de forma bastante clara, que atualmente reemergiu a noção de competência,
não só referida no tal documento de 2001, Competências Essenciais, como em diversos autores (veja-
se, por exemplo, Perrenoud, 2001), ressurgindo, portanto, como “um conceito de caráter integrador
e mobilizador de um conjunto vasto de conhecimentos” (Roldão, 2004: 19).
Em simultâneo, é possível constatar também que Portugal tem tentado acompanhar as diretrizes
da atual União Europeia, adesão que efetivou a partir de janeiro de 1986, e que além disso são
constantemente relembrados, em muitos documentos curriculares, os desafios colocados à
globalização, à democracia e à educação, abordados em relatórios da UNESCO produzidos desde
aquela década.
Verifica-se também que do ponto de vista legal tem havido em Portugal diversas tentativas para
abandonar uma abordagem dos programas fragmentada em objetivos mais ou menos estanques
e, igualmente, para implementar práticas mais integradas, integradoras e flexíveis, que devem
ser avaliadas através da principal modalidade de avaliação tal como está consignada, a avaliação
formativa. Por sua vez, o Conselho da Europa tem chamado a atenção para os princípios e linhas
orientadoras daquilo que deve ser um ensino de qualidade para o século XXI, e Portugal tem
participado com grupos de trabalho próprios, chamando a colaborar por vezes as associações de
professores.
Na verdade, a insistência em promulgar legislação que reforce a autonomia das escolas, que
atribua uma percentagem relevante do tempo letivo para outro tipo de práticas educativas,
cooperativas, baseadas na resolução de problemas e no trabalho de projeto, é sintomática de que
tem sido muito difícil concretizar esses objetivos. Isso explica talvez os inúmeros diplomas que
apresentam justificações para uma reorganização dos currículos do ensino básico e secundário,
sobre o que se pretende com a autonomia das escolas e a flexibilidade dos horários.
Fica claro que essas intenções não têm tido as repercussões desejadas e que permanecem as
dificuldades em reorganizar os espaços educativos, em alterar a “cultura organizacional da escola”,
já analisada nos anos noventa por António Nóvoa. Por outro lado, parece evidente que subsistem
dificuldades em alterar as práticas de trabalho entre os professores e entre os professores e os
alunos (ver Beane, 2016).
É preciso pois reaprender através de projectos concretos, centrados na resolução de problemas
pertinentes para aquela escola e para aqueles alunos, colocando interrogações, perplexidades,
dialogando. Se há muito tempo que isto vai sendo referido (lembremo-nos do que se dizia da Área de
Projeto em 2001 e em 2004), já nas Orientações da Direção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento
Curricular, de 9 de agosto de 2006, se afirmava que as principais competências a desenvolver e a
avaliar seriam, entre outras, a recolha, análise, seleção de informação, a resolução de problemas,
a tomada de decisões adequadas e devidamente justificadas, a capacidade de comunicar os
resultados de múltiplas formas e com suportes diversificados, articulando diferentes saberes teóricos
e práticos. Tudo isto se interligava com as competências de trabalhar em grupo, de colaborar, de
responsabilizar-se com o cumprimento de tarefas atribuídas.
E, na verdade, são também estas competências, entre outras, que vemos plasmadas no documento
Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, homologado pelo Despacho 6478/2017, de 26
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 426
Referências
BEANE, J. A. (2016). Curriculum integration: designing the core of democratic education. New York:
Teachers College Press.
MARTINS, G. O. (coord.) (2017). Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória. s.l. [Lisboa]:
Ministério da Educação/Direção-Geral da Educação [homologado pelo Despacho n.º 6478/2017, 26
de julho]
PERRENOUD, P. (2001). Porquê construir competências a partir da escola? Porto: Edições ASA.
Roldão, M.C. (2004). Gestão do Currículo e Avaliação de Competências – as questões dos professores,
2ª edição. Lisboa: Editorial Presença.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Introdução
Após o surgimento das avaliações externas, diversos estados e municípios têm procurado
desenvolver sistemas de avaliação que seguem o modelo adotado pelas avaliações externas de
âmbito nacional como o SAEB e a Prova Brasil, buscando implantar instrumentos próprios para
investigar o nível de aprendizagem dos alunos de sua rede, criar métodos para se saírem “bem” nas
avaliações provas e, por consequência, alcançarem altas notas nessas provas.
Em Mato Grosso do Sul (doravante MS), as avaliações em larga escala realizadas nas escolas
públicas estaduais, recebem o nome de SAEMS - Sistema de avaliação da rede pública de MS,
criado em 2003, tem por objetivo avaliar a rede estadual de Ensino, com relação às habilidades e
competências desenvolvidas em Língua Portuguesa - Leitura/Produção de texto e Matemática.
Esse sistema de avaliação tem por finalidade aferir e acompanhar a “qualidade” do ensino das
escolas estaduais de MS, refletir sobre os direcionamentos dos recursos, além de fornecer informações
periódicas e comparáveis sobre o desempenho dos estudantes, as quais poderão fornecer subsídios
para os gestores escolares implantar políticas pedagógicas de aprimoramento do ensino, ou seja,
detectar os problemas no ensino, visando sempre a tirar melhores notas nesse Sistema de Avaliação.
A diferença básica entre as avaliações externas nacionais, com exceção do ENEM (que é aplicado
ao ensino médio), é que o SAEB e a Prova Brasil verificam somente habilidade de leitura. Enquanto
que a avaliação do SAEMS verifica habilidades de leitura e escrita.
Quando falamos em avaliação, precisamos definir claramente o que se pretende avaliar, em
qualquer tipo de avaliação, pois é necessário que estejam claros os objetivos e as concepções que
a fundamentam. No que diz respeito às avaliações externas como o SAEB, Prova Brasil (âmbito
Federal) ou SAEMS (esfera estadual) deveriam tomar como pressuposto de que a leitura e a escrita
são processos que se constroem nas práticas sociais.
Beth Marcuschi (2006) afirma que na prática não é bem assim, pois as avaliações externas SAEB
e ENEM têm foco na leitura, mas nestas avaliações a leitura é compreendida como simples atividade
de extração de informações contidas na superfície textual, pois o “SAEB e o ENEM demonstram
preocupação de avaliar o que o aluno foi capaz de aprender em sala de aula, sem se voltar mais
especificamente para as práticas de leitura em sua dimensão social”. Essa autora ainda relata que
[...] a leitura está associada à compreensão, entendida enquanto processo de construção de
sentidos, uma complexa relação entre conhecimentos pessoais no confronto com conhecimentos
textuais. Portanto ler é compreender, e compreender é um processo. Ao reagir a um texto, o leitor
produz sentido [...]. (MARCUSCHI, 2006, p.64).
Neste sentido, ler envolve habilidades que vão desde a decodificação, compreensão, chegando
ao posicionamento crítico diante do textos de diferentes gêneros, tipos e finalidades.
Para tanto, de acordo com os estudiosos citados, entendemos que ler e escrever são processos
contínuos. As ações desse processo, não se esgotam nas séries iniciais, são ações que perduram por
toda vida, em conjunto a todos os profissionais envolvidos no processo ensino/aprendizagem.
É importante destacar, também, a referência que é feita à suposta imparcialidade do processo
avaliativo, pelo fato de ele utilizar técnicas objetivas, sobre esta questão Beth Marcuschi afirma:
O fato de o SAEB e Enem trabalharem apenas com itens de múltipla escolha, impede que sejam
solicitadas dos alunos justificativas para suas respostas. Essas permitiriam uma compreensão
melhor sobre como o aluno avalia e analisa as propostas defendidas pelo texto na relação com suas
experiências de vida e com as dimensões éticas e estéticas do conhecimento. (MARCUSCHI, 2006,
p.81).
Essa afirmação vale, também, para o SAEMS, pois a avaliação externa de MS segue a mesma
estrutura apresentada pelo SAEB e Prova Brasil, com questões fechadas, as quais não exigem
justificativas para suas respostas, não defendem suas ideias, seus conhecimentos de mundo em
relação ao tema apresentado em cada questão. Diante do exposto, Geraldi (2010) relata que na
escola “lê-se um texto para responder perguntas, enfim lê-se um texto para cumprir uma ordem”.
No entanto, destacamos uma diferença da Prova Brasil e do SAEB, com relação ao SAEMS, pois
a avaliação externa de MS exige a produção de texto assim como no ENEM. Mas interrogamos se as
questões fechadas exigidas no SAEMS comprovam se o aluno é ou não leitor, já que não expressa
sua opinião por meio de respostas dissertativas, não expressa seu olhar sobre o texto lido, porque
somente assinala respostas já existentes.
E ainda temos o trabalho com a oralidade, que também é deixado de lado, sendo que é exigido
no currículo do Ensino Médio, e podemos afirmar que não há indícios de cobrança deste quesito nas
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 429
avaliações externas tanto nacionais quanto estaduais, o que Beth Marcuschi (2006) afirma acontecer
devido à natureza do exame.
No entanto, entendemos que uma avaliação sofre influência dos valores, das visões de mundo
e da percepção que os avaliadores possuem da realidade e das interferências dos governos. Além
disso, é importante levar em conta que os dados e as percepções sobre a realidade não conseguem
captá-la em sua totalidade. Eles são aproximações dessa realidade. Para Horta Neto,
É importante salientar que, mesmo tendo seus limites, a avaliação é capaz de fornecer informações
para a tomada de decisões para a implantação de políticas públicas e, nesse sentido, é muito melhor
do que um voo cego, no qual não existem dados em que os formuladores de políticas possam se
embasar. (HORTA NETO, 2010, p.12)
Paro (1998) considera que a educação é um processo que se prolonga por toda a vida da pessoa
e, portanto, não pode ter sua qualidade avaliada em um dado momento a partir de índices de
reprovação e aprovação ou por avaliações externas.
Nesse sentido, mensurar a qualidade da educação a partir de indicadores é um tema polêmico,
pois para o autor, o produto da escola é o aluno educado, e esse produto deve ter especificações
rigorosas quanto à qualidade que dele se deve exigir.
De acordo com as afirmações de Paro (1998), argumentamos sobre a necessidade de que todos
aqueles que estejam envolvidos no processo educacional, como dirigentes, professores, pais e
alunos, tenham a sua disposição dados a partir dos quais seja possível estabelecer juízos de valor
sobre a qualidade da educação.
Paro (1998) afirma que sem a existência desses dados, ficaria prejudicado um acordo mínimo
sobre como atuar para aprimorar esse processo, dificultando, assim, a discussão que venha a
contribuir para a formulação de políticas públicas adequadas.
No entanto, existe o desafio de construir a ligação entre a avaliação e a sala de aula para que estes
exames não fiquem apenas com a função de traçar diagnósticos e possam de fato contribuir para
uma mudança no sistema educacional, e consequentemente, na metodologia abordada em sala de
aula.
ISSN 2358-3959
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A escola pública vem sendo constantemente atacada em seu âmago, numa era de interesses
privados que alardeiam cada vez mais catástrofes, como o desfecho final de um espaço estratégico
de formação de valores para uma sociedade democrática e humanizada. Desconhece-se, entretanto
fazeres e saberes em cenários escolares constituídos por esforços que se assemelham à lenda de
Sísifo, personagem da mitologia grega que recebeu a árdua tarefa de empurrar uma pedra até o
cume de uma montanha e, no entanto, sempre que a pedra estava prestes a chegar ao seu objetivo,
rolava montanha abaixo e tudo tinha que recomeçar. A metáfora se insere nas dificuldades por
que passam as instituições escolares que se constituem enquanto convergência de fatores sociais,
políticos, econômicos e culturais, que nela se instalam, enquanto espaço vivo de diversidades e
desigualdades.
Um espaço rico de alteridades, em que “[...] se torna impossível pensar a subjetividade sem o
outro, já que o outro nos arranca permanentemente de nós mesmos.”. (ROLNIK, 1994, p.161). Âmbito
em que as identidades se hibridizam a partir da heterogeneidade de suas culturas e ponto latente
de convergência para o qual se dirige a maior parcela da sociedade brasileira, a escola pública , por
meio de seus atores, busca incansavelmente encontrar soluções em suas próprias tempestades.
Este trabalho visa contribuir com essa discussão, trazendo uma pesquisa que se propôs analisar
se a prática pedagógica denominada Projeto Convulsivo Sinódico (PCS) interferiu na identidade
da Escola Carlos Augusto de Camargo, em Piedade. A instituição, localizada em Piedade, pequeno
município de economia agrária do estado de São Paulo atende atualmente, em sua maior parte,
alunos de áreas periféricas e em menor quantidade, alunos do centro de Piedade, nas modalidades
do ensino fundamental, ensino médio (período da manhã e tarde) e EJA – (Educação de Jovens e
Adultos) nível fundamental e médio e alunos do ensino médio (período noturno). A comunidade
atendida é formada de filhos de proletários e da pequena burguesia urbana, sendo que muitos deles,
especialmente os alunos maiores de 21 anos surgem do exército industrial de reserva, parcialmente
absorvido pelo capital urbano rural.
A pesquisa se deu pela análise dos planos de direção/gestão, em recortes sobre o PCS, uma caixa
de fotografias e registros no blog da Escola. O Projeto iniciou em 1993 e está sendo vivenciado até hoje.
Registra-se o espaço temporal delimitado para a investigação : 1993 – 2019. As análises da pesquisa
foram iluminadas pelas concepções de Roger Chartier (2002, p.17) na dimensão da história cultural,
que “tem por principal objeto identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma
determinada realidade social é construída, pensada e dada a ler”; de Justino Pereira de Magalhães
(2004, p.97) para quem os fenômenos educativos, dentre eles as ações teóricas e práticas, devem ser
observados nas acepções, dimensões e fundamentos, por meio da materialidade, representação e
apropriação (MAGALHÃES, 2004, p.97-99) e de Viñao Frago para quem a cultura escolar sedimenta-
se em sua continuidade, persistência no tempo e relativa autonomia que permite gerar produtos
específicos. (VIÑAO, 2002,p.59.)
De nome bizarro, o PCS foi engendrado coletivamente entre os professores que lá estavam, em
1993, orquestrados pela então coordenadora pedagógica Prof.ª Maria Lúcia de Amorim Soares. À
maneira da poesia Dadá, as palavras foram extraídas aleatoriamente de um dicionário escolhendo-
se as que melhor expressavam as representações daquele momento. Expressões que traziam as
tramas das relações e interações sociais instaladas antes do momento sinódico, metaforicamente
visto como equilíbrio. Tramas realizadas num campo de forças que embutia concepções de
representações, sentidos e significados sobre o papel da escola e de seus atores na sociedade. Nesse
campo de forças considerou-se a mudança anual do quadro de professores e alunos, permitindo
novas formas de pensar e de agir.
Assim o Projeto continuou se modificando constantemente. Numa metáfora visual - areia que
penetra nas pedras sedimentadas pelos sistemas de educação, legislações e normas a serem
cumpridas, que tornam a escola, conforme informam Soares e Nogueira (2012, p.139), um “espaço de
mesmice, repetição do senso comum”, situação em que “o habitual é o mais difícil de ver com olhar
de estranhamento, que permite romper com as cristalizações nos modos de ver, através do acesso
a vivências estéticas e seus significados.”. Areia que penetra entre pedras, exercitando, na dimensão
de Munhoz e Zanela, apud Soares e Nogueira (2012,126) a relação estética “uma das formas mais
antigas da relação do homem com o mundo, antecedendo o direito, a política, a filosofia e a ciência”.
Na prática, o PCS se inicia com a busca de um tema gerador. As ideias se originam do próprio
movimento de professores e alunos, de suas ansiedades e acontecimentos. Aos poucos vão nascendo
em conversas informais, nas brechas do tempo/espaço e determinações pedagógico/administrativas.
Essas ideias vão sendo tecidas e absorvidas, até eclodirem na reunião de planejamento, que ocorre
no início do ano, momento em que se estabelece um consenso sobre a temática que perpassa o
conteúdo das disciplinas da grade curricular, como um tema transversal (Projeto Convulsivo), até
finalizar em materializações artísticas do processo (Projeto Sinódico). A temática vem, em geral
acompanhada de um clássico literário, que permite refletir sobre ser humano em fragilidades/
potencialidades na sociedade em que se vive, exercitando assim o olhar para o outro.
O PCS se instalava/instala num exercício criativo, que na esteira de buscar forças para vivenciar os
desafios do mundo contemporâneo, experiencia práticas conduzidas a apreciar e interpretar melhor
o que é visto e ouvido. Relações intrínsecas à educação, enquanto processo de subjetivação, em
sentido evolutivo, que compreende uma atividade humana e de relação do sujeito consigo próprio,
com os outros e com a realidade circundante. (MAGALHÃES, 2004, p.54)
A prática foi implementada na época em que a Escola havia se transformado em Escola Padrão,
um projeto do governo do Estado de São Paulo, com a finalidade recuperar a qualidade, modernizar
a escola pública, preparar o aluno para o acesso aos níveis elevados de compreensão e intervenção
na realidade e utilizar novas tecnologias educacionais. A Escola Padrão oferecia autonomia
pedagógica, administrativa e liberdade de propor projetos especiais relacionados ao ensino-
aprendizagem, capacitação e relações com a comunidade. A conexão constitui-se num terreno
fértil para uma revolução invisível, que buscava a identidade da Escola “Carlos Augusto” e de seus
atores. As diretrizes e metas do PCS traziam possibilidades de vivenciar, com maior pertencimento, o
espaço escolar e intensificar relações de identidade. Suas diretrizes: praticar a comunidade para ser
feliz; refinar a qualidade educacional extirpando a ganga impura; impulsar a leitura no instante pós
– moderno e pelear pela cidadania e democracia competentes. Suas metas: dar forma corpórea à
busca da felicidade; inculcar a produtividade qualitativa do corpo docente, discente e administrativo;
embriagar-se na paixão de conhecer e viver o mundo contemporâneo e peludiar pelos direitos e
frondejar deveres. Com diretrizes e metas não convencionais, o PCS sempre causou e ainda hoje
causa estranhamento junto aos órgãos aos quais a escola está atrelada. As resistências internas
instaladas nas mudanças anuais de alunos e professores, dentro da instituição, com formações e
conceitos diferenciados sobre o papel da instituição, bem como a constante adequação às normas
e regulamentos da Secretaria da Educação do Estado caracterizaram o PCS como um processo em
constante devir, em formas diferenciadas de ser. Porém sua existência se materializou em 23 edições
anuais, num movimento sempre instituinte dentro da Escola “Carlos Augusto”, sendo que a sua 23ª
encontra-se em andamento, em 2019.
Os resultados preliminares apontaram que o PCS se integrou à cultura escolar da instituição,
através de sua repetição, embora em formatos que se diferenciaram de sua gênese, abrindo-se em
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 432
novas conexões e ramificações que permitem abrir espaços para seus atores e ideias sempre em
transformações por meio de ações e experiências.
Uma prática que devolve a esses mesmos atores o papel de protagonistas no âmbito da instituição
e que ao vivenciar a dimensão invisível da alteridade, constituem e são constituídos de novas
identidades, em permanentes mutações.
Referências
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. 2ª ed. Lisboa: Difusão Editorial,
2002.
MAGALHÃES, Justino Pereira de. Tecendo nexos: história das instituições educativas. Bragança
Paulista: Editora Universitária São Francisco. 2004.
SOARES e NOGUEIRA. E.J. Educação estética: alguns princípios orientadores para práticas pedagógicas
emancipatórias no cotidiano escolar. In: Pulsações e questões contemporâneas. RevistAleph. UFF.
Rio de Janeiro, nº 18, Ano VI, 2012, p. 126-141. Disponível em http://revistaleph.uff.br/index.php/
REVISTALEPH/article/viewFile/39/34. Acesso em 23.07.2017
Max Alves
A canção — que é uma manifestação musical numa concomitância entre música, que são sons
em ritmos combinados de maneira melódico-harmônica, e uma letra a ser executada também de
forma melódico-harmônica intrinsecamente ligada à música — é defendida por diversos autores
no campo do ensino e da pesquisa em História como um documento importante para se notar a
sociedade em que ela foi realizada. Marcos Napolitano (2002), em seu livro “História & Música” — no
qual se dedica a falar da canção como documento não só na pesquisa, mas também no ensino de
História —, ressaltou que ela, a canção, é um importante veículo de nossas utopias e anseios sociais,
que atravessou o século vinte estando intrinsecamente ligada à sociedade brasileira. Anteriormente,
José Geraldo Vinci de Moraes (2000) ainda endossava esta ideia falando sobre como ela pode nos
fazer enxergar setores tradicionalmente esquecidos da sociedade pela historiografia de cunho
positivista.
À canção como documento, existe uma defesa de Miriam Hermeto (2012) em seu livro “A canção
popular brasileira e o ensino de História: palavras, sons e tantos sentidos”, em que a autora discorreu
sobre o documento como sendo toda e qualquer produção humana, já que elas informam sobre
o modo de vida e a inserção social de quem as produziu. Desta forma a canção parece, para estes
autores, como um documento repleto de informações.
Apesar de ela existir há muito tempo, é certo, foi só a partir da década de 1980 que o debate
sobre a canção a ser utilizada como documento pela História ganhou efervescência no Brasil. Não
significa, evidentemente, que ela não poderia ter sido encarada como tal anteriormente, mas é que
foi a partir daquela década que debates no campo de Historiografia e da Educação puderam fazer
de tal contexto propício, de maneira mais explícita, à inserção de tal documento na pesquisa e no
ensino de História. Isto se explica, em partes, por dois movimentos: o fim do nosso mais recente
período ditatorial e influência da Nova História.
No campo político, o Brasil atravessou, da década de 1980, um intenso período de debate acerca
da reconfiguração de uma então sociedade sob regime ditatorial para uma sociedade em processo
de redemocratização. Novas demandas eram postas e discutidas. Podemos notá-las no nosso
texto constitucional, que é um reflexo daquelas discussões. Nele, para a Educação, por exemplo,
foram previstas liberdade de ensino, pesquisa, pensamento e de divulgação do saber e a presença,
sobretudo, da valorização da diversidade, ou seja, buscou-se garantir aspectos que haviam sido
suprimidos nos anos anteriores. Desta forma, pode-se notar que na Educação o determinismo
positivista perdia espaço. Aquele debate de reconfiguração também da Educação foi mais bem
reafirmando a partir da lei complementar nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996, a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional.
Já no que se refere à Nova História, esta seria a influência da Escola dos Annales sobre o modo
como pensar e escrever a História, que se deu de maneira mais incisiva no Brasil e no mundo a
partir da década de 1970. Difícil de ser definida, segundo Peter Burke (2011) em seu livro “A escrita
da História: novas perspectivas”, ela é está associada à historiografia da revista Annales: économies,
societés, civilisations e tem em Lucien Febvre, Marc Bloch e Fernand Braudel seus grandes expoentes.
Seria ela, num esforço de definição, uma corrente historiográfica que caminha em oposição ao
positivismo. Enquanto ele é, por exemplo, historicizante e defende o uso de documentos escritos
e/ou oficiais como credenciais de uma verdade, a Nova História não vê a possibilidade da ausência
do historiador ao narrar a História e prega uma diversidade documental para a análise do homem
no tempo. Então, naquele contexto político e social no qual o Brasil passava pela década de 1980,
a Nova História tinha um campo fértil no qual render frutos e um deles foi a ampliação da noção de
documento.
Aquele contexto, então, serviu para o nascimento da efervescência do debate e nos anos
seguintes, até os dias de hoje, inclusive, estes debates não se encerram. Vendo a Educação como
algo que nunca está acabado, o aprimoramento no trato de documentos tidos como alternativos
sempre é discuto diante de suas particularidades, já que muitos historiadores podem alegar maior
familiaridade com o documento escrito.
Diante deste campo, um projeto de pesquisa de mestrado — apresentado e acolhido pelo
Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco — foi elaborado
para que pudéssemos discutir sobre a prática educativa do professor de História na opção pelo uso
da canção em sala de aula. Nossa intenção é buscar evidenciar o contato do professor de História
com esta metodologia ao longo de sua formação inicial e/ou continuada em serviço e também como
ele enxerga os apontamentos acadêmicos a partir de sua prática, dentre outras questões. Foi, então,
necessária uma pesquisa do Estado do Conhecimento para pudermos situar nossa pesquisa do
debate acadêmico que vinha sendo construído ao longo das últimas décadas, notar perspectivas
que poderíamos nos apoiar ou divergir, notar também tendência metodológicas, conceituais e quais
os principais programas de pós-graduação que vêm debatendo a temática no Brasil.
A partir dessa atual pesquisa foi possível notar os autores mais tradicionais na temática, que
construíram seus argumentos nas décadas anteriores e se tornaram referências importantes para
aqueles que desejam estudar mais sobre a canção como um documento na pesquisa e no ensino de
História.
Desta forma, o nosso objetivo aqui é apresentar um estudo do tipo Estado do Conhecimento
acerca da canção como documento a ser utilizado na prática educativa de História. O nosso foco
temporal é o decênio 2010-2019, que foi escolhido para que pudéssemos notar o que de mais recente
vem sendo discutido na área, quais os autores anteriores a este período que são recorrentemente
citados como amparo teórico dessas pesquisas, mostrando as tendências que foram construídas ao
longo das últimas décadas e como estas tendências vêm se transformando.
Em nossa metodologia buscamos por teses e dissertações no repositório institucional da UFPE, na
Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e nas plataformas ligadas à Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES): Portal de Periódicos Capes/MEC, no
repositório do portal eduCapes e no Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES. Três descritores
foram escolhidos, utilizados individualmente e combinados: “Música no Ensino de História”, “Canção
no Ensino de História” e “Novas linguagens no Ensino de História”. A escolha destes descritores se
deu, respectivamente, por “música” ser um termo mais abrangente que “canção” e muitas vezes
preferido em relação a ele; por “canção” se constituir em um dos principais conceitos de nossa
pesquisa; e finalmente por ela, a canção, estar inserida dentro do grupo que costumamos chamar
de “novas linguagens” —mesmo não sendo tão novas assim — na pesquisa e no ensino de História.
Conseguimos notar, a partir dessa pesquisa, uma concentração de trabalhos a cerca dessa
temática nos programas de pós-graduação das regiões Sul e Sudeste. O número maior de programas
de pós-graduação nessas regiões, em comparação as outras três regiões do país, pode ser uma
explicação para esta incidência. A região Sul, por sua vez, apresentou mais da metade dos trabalhos
levantados e o estado do Paraná, mais da metade dos trabalhos da região Sul.
Falando sobre música/canção na aula de História e/ou na prática docente de professores de
História; música/canção no livro didático de História; e revisões bibliográficas sobre a canção
e o Ensino de História, apenas cinco dos trabalhos levantados coincidem no objeto (prática do
professor de História com a canção como documento). Dos cinco, quatro tiveram suas atividades
explicitamente orientadas e/ou sugeridas pelos pesquisadores e um trabalho independeu do arbítrio
do pesquisador para a existência da prática, mas ela foi pensada, pela professora da pesquisa, para
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Referências
HERMETO, Miriam. Canção popular brasileira e o ensino de História: palavras, sons e tantos
sentidos. Belo Horizonte: Autêntica, 2012.
MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento histórico. Revista
Brasileira de História, São Paulo, vol. 20, n. 39, p. 203-221. 2000.
NAPOLITANO, Marcos. História & Música: história cultural da música popular. Belo Horizonte:
Autêntica, 2002.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
convencimento político por meio da argumentação favorável às repúblicas mundiais e a crítica severa
ao sistema monárquico. Os intelectuais republicanos que se manifestavam pela imprensa, por sua
vez, contribuíram para a construção de um projeto de sociedade, perpassando pelos diversos serviços
públicos necessário aos progresso de um Estado e, por consequência, abarcando a instrução pública
primária, como afirmado antes, tendo-a na posição de maior princípio republicano, justamente pela
potencial capacidade de produção de um povo ordeiro e engajado com os objetivos agora traçados.
A Proclamação, contudo, apesar do fetiche republicano, não transformou radicalmente a estrutura
social e a modelagem política, apoiada na exaltação de personagens e símbolos e no discurso
positivista de evolução, como uma esperada alteração natural do Estado, simplesmente pela
modificação do regime. Observou-se após o evento, que transformações profundas nas atividades
do Estado não seriam automáticas e que ampliou ainda mais a luta política e ideológica nos
bastidores do poder. Salientamos, por último, que, apesar do movimento nacional pela educação
popular, cada estado da federação teve participação diferenciada no processo de implementação da
instrução primária, o que gerou a necessidade de estudos regionais, a exemplo do Paraná, nosso
local de pesquisa.
RESUMOS DAS
COMUNICAÇÕES
INDIVIDUAIS
EIXO
INSTITUIÇÕES
EDUCATIVAS
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Ariclê Vechia
Seguindo as diretrizes da política nacional, logo depois de emancipada de São Paulo, em 1853, a
Província do Paraná passou a estimular a entrada de imigrantes europeus, principalmente alemães.
Curitiba, em meados do século XIX, como capital da recém-criada Província, passou a oferecer
inúmeras chances econômicas atraindo, levas sucessivas de imigrantes, principalmente alemães.
A maioria desses imigrantes que chegou ao Brasil depois de 1850, era de religião protestante. Na
realidade, seguiam as doutrinas de Lutero e se autodenominavam evangélicos. Vindos de uma
sociedade em que a Igreja Evangélica e o Estado estavam associados, passaram a viver em um meio
onde o catolicismo era a religião oficial; as outras religiões eram apenas toleradas e o imigrante
protestante era considerado um “cidadão” de segunda categoria. Para esses imigrantes , era de suma
importância a criação de um espaço destinado à escolarização de seus filhos que preservasse os
traços culturais básicos da terra de origem, em especial, a língua alemã e os princípios morais
segundo a religião evangélica. Esta comunicação tem como objeto de estudo, o processo de criação
e transformação da Escola Alemã de Curitiba no período de 1867 a 1889. Seus principais objetivos
são: apresentar o processo de fundação da Escola Alemã; analisar as suas finalidades em diferentes
períodos, bem como as facetas da organização escolar e suas práticas educativas. Teórica e
metodologicamente o estudo insere-se na História das Instituições Escolares, tendo como matriz a
História Cultural. Está embasado em fontes documentais tais como: Ofícios e Requerimentos
trocados entre a Comunidade Evangélica, a Direção da Escola e os Inspetores da Instrução Pública,
Leis e Decretos que regulamentavam a educação na Província do Paraná e a Escola Alemã, a imprensa
periódica, os planos de estudo, os livros didáticos, enfim, toda e qualquer documentação relacionada
com esta instituição escolar no período de 1867 a 1889. Os imigrantes alemães depois de estarem
estabelecidos na região, começaram a reconstruir as instituições sociais que lhe dariam o suporte
para manter sua identidade étnica em um meio diverso. Em 1866, a comunidade fundou a Deutsche
Evangelische Kircken Germainde, que seria liderada por um pastor. Portadores de uma cultura
letrada, logo a seguir, procuraram criar um local que atendesse, de forma adequada, a educação de
seus filhos. No mesmo ano, o Pastor Gaertner solicitou licença para ensinar as primeiras letras em
língua alemã para crianças “alemãs”. Esta licença lhe foi concedida e a Escola Alemã
Evangélica começou a funcionar em janeiro de 1867. Porém, logo a seguir a Inspetoria da Instrução
Pública ordenou que a escola fosse fechada sob a alegação de não cumprir as normas estabelecidas
pelo governo. Ocorreram vários embates entre a Comunidade Evangélica e a Inspetoria da Instrução
Publica. Havia conflito entre as ideias religiosas e educacionais nutridas pelos alemães protestantes
e pelos brasileiros: o ensino em língua estrangeira, ensino de religião não oficial e coeducação dos
sexos. Em virtude dos preceitos da religião protestante tanto meninos quanto meninas deveriam ser
alfabetizados para fazerem a confirmados na fé e exercer o direito do livre exame da Bíblia. Portanto,
a escola tinha por finalidade ensinar a ler e escrever em alemão a meninos e meninas e formá-los
segundo os princípios da religião Evangélica. A Escola Alemã Evangélica de instrução primária
começou a funcionar ainda em 1867 em língua alemã e debaixo dos preceitos evangélicos, reunindo
meninos e meninas, crianças alemãs e filhos de imigrantes já nascidos no Brasil. O protestantismo
germânico caracterizava-se pela fusão de elementos religiosos com outros que, no transcorrer do
tempo, adquiriram significado sagrado, como é o caso da língua alemã. Mediante o seu uso é que
Lutero tornou acessível ao povo o conhecimento da Bíblia. Lançou, também, os alicerces do
Neuhochdeutsche – o alemão moderno, portanto, a “gênese da nova língua e da religião tornou-se
uma coisa só”. A religião protestante previa que os membros da comunidade fossem alfabetizados;
sem esse requisito, seria quase impossível praticar a religião: cantar os hinos, estudar o catecismo,
ler a Bíblia para ser confirmado na fé. Por isso, a alfabetização deveria ocorrer em língua
alemã. Devido à divergências internas a comunidade, em fins de 1868 a escola foi fechada. Porém,
no início da década de 1870, a guerra franco –prussiana e diversos outros fatores contribuíram para
despertar o sentimento de identidade étnica nacional da população de língua alemã em
Curitiba. Neste contexto de incremento do “nacionalismo alemão”, a comunidade da Igreja
Evangélica e a Escola da Comunidade, que haviam sido extintas, foram reativadas pela atuação do
representante do Conselho Eclesiástico da Prússia que havia recebido a incumbência de formar
novas igrejas e escolas no Brasil. Cumprindo sua missão, em 1872, conseguiu reunir e pacificar a
comunidade evangélica que havia se desagregado e reabrir a Escola da Comunidade Alemã que
tinha sido fechada. A partir de então, os alunos da Deutsche Schule aprendiam a ler, escrever e a
contar em língua alemã. A gramática estudada era a da língua alemã. A religião cristã era ensinada
segundo os preceitos evangélicos. Porém, os elementos, língua e religião, agora estavam
intrinsecamente unidos a um outro: a Germanidade . A Escola da Comunidade Alemã passou a ser
regida por nova finalidade: a preservação da religião e do Deutschtum. Deutschtum ou Germanidade
engloba a língua, a cultura, o Geist (espírito) alemão, a lealdade à Alemanha, enfim, todo o que está
relacionado a ela, mas como nação e não como Estado. O alto nível de ensino da escola atraíram,
como alunos, os filhos de parte da comunidade alemã católica e até mesmo de alguns brasileiros.
Em 1879, a escola tornou-se Escola Mista de Religião Evangélica e Católica. A formação das crianças
e dos jovens já não tinha um direcionamento único. A formação dos alunos tornou-se algo ambíguo
uma vez que o ensino da religião não era realizado meramente por meio de uma disciplina, mas era
uma concepção de educação segundo os princípios e valores de cada religião. Atendendo o critério
de ensinar também a religião católica, a escola passou, em 1882, a ser subsidiada pelo governo
Provincial e ganhou mais prestígio. O segmento católico da escola passou então, a exigir que a escola
fosse desvinculada da Igreja, o que aconteceu em 1884. A escola, sob a denominação Deutsche
Schule (Escola Alemã), agora deveria se identificar com toda a comunidade alemã radicada em
Curitiba. Sob esta nova orientação, a Escola Alemã adotou como filosofia: incentivar, de forma
explícita, a preservação dos valores da cultura alemã – o Deutschtum, mas agora já com uma
conotação política, com marcas de militarismo e de um nacionalismo de Estado. Doravante, o
ensino ministrado traduziria essa filosofia de forma marcante. o enfoque dado aos conhecimentos
continuou visando a manutenção do “espírito alemão” com implicações políticas. Assim, a língua
alemã e sua gramática, a aritmética, a geografia, os hinários, o catecismo eram ensinados sob a ótica
das ideias educacionais germânicas. O ensino da gramática alemã, por exemplo, integrava diferentes
conteúdos e era realizado, principalmente, através de contos que ressaltavam os valores da cultura
alemã e através do uso de textos que versavam sobre o modo de vida alemão, sua história e sua
geografia. Mas a maior evidencia das finalidades perseguidas pela escola verificava-se nas práticas
educativas que refletiam a intenção de preservar o ‘espirito alemão’ agora exaltando o caráter militar
e politico. Por ocasião dos festejos comemorativos da desvinculação da Escola da Igreja, ocorreram
vários desfiles, ao estilo militar, pelas ruas da cidade, acompanhados de Bandas de Música e canções
que estimulavam o ‘espirito alemão”. A Escola Alemã, no período de 1885 a 1887, ficou marcada por
crises internas e revelava ambiguidades nas suas finalidades. Esta comunidade heterogênea, agora
com poder nas mãos, fez com que divergências latentes viessem à tona e outras tantas fossem
criadas. Apesar de todos os estremecimentos internos, de muitos pais terem retirado seus filhos da
Escola, a mesma continuava funcionando com pleno êxito. Porém, eles começavam a tomar
consciência da necessidade de educar as crianças para se tornarem cidadãos brasileiros. Neste
sentido, novamente a escola foi destacada como um elemento de preservação do ‘espirito alemão’,
mas era necessário também cultivar elementos representativos da Pátria adotiva ou da nova Pátria,
pois muitas crianças e jovens, à época, já haviam nascido no Brasil e um dia formariam um só povo,
o povo brasileiro. A escola agora, de um lado, visava a manutenção do Deutschtum com vinculação
política, de outro, buscava cultivar elementos representativos da ‘pátria brasileira’, começava a se
forjada a identidade teuto-brasileira.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente artigo faz parte de uma pesquisa mais ampla de doutorado pelo Programa de Pós-
graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (PPGED/UFRN) a respeito
dos grupos escolares do Estado potiguar. Está inserido na temática da História da Educação, de forma
específica nos estudos sobre instituições educacionais, pois aborda a pesquisa acerca dos grupos
escolares. Seu objeto de estudo é a análise das práticas e representações existentes entre os órgãos
estaduais e as figuras responsáveis ligadas a educação, bem como a relação desses com o Grupo
Escolar Barão de Mipibu. Tem por objetivo analisar as práticas da Secretaria de Educação do Rio
Grande do Norte sobre o Grupo Escolar Barão de Mipibu, como também as representações criadas
sobre a atuação das autoridades da área durante o período de 1957 a 1971. O recorte temporal inicia-
se no ano de 1957, a escolha dessa data ocorreu por ser o ano da criação da Secretaria de Educação
do Estado sob a direção de Tarcísio Vasconcelos Maia, por força da Lei nº 2.225, de 9 de dezembro de
1957, passando o órgão a se chamar Secretaria de Educação e Cultura do Rio Grande do Norte (SEC-
RN). O término da pesquisa ocorre em 1971, pois é nesse ano que marca o fim dos grupos escolares
no Brasil, através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 5.692/71, a qual extinguiu os grupos
escolares, substituindo-os pelas escolas de ensino de Primeiro Grau, que unificou o ensino básico,
passando a ser de oito anos. O recorte espacial é o Grupo Escolar Barão de Mipibu, que está localizado
no município de São José de Mipibu, na região agreste do Rio Grande do Norte, distante da capital
Natal cerca de 40 km. O Grupo Escolar Barão de Mipibu é uma escola centenária, tendo sido fundada
ainda no final Império, em 1880, como Casa de Instrução Pública e passando a ser um grupo escolar
no início da República pelo Decreto nº 204 de agosto de 1909, inserido na política estadual da criação
dos grupos escolares, revelando assim a sua relevância para os estudos locais e nacionais, pois foi
uma das primeiras escolas graduadas a serem criadas no estado – sendo a primeira fora da capital
– e que desde o seu início apresentou forte atuação dos órgãos estaduais sobre si. A escolha por tal
pesquisa ocorreu a partir dos estudos de Cruz (2018), em que, a partir do conhecimento e análise
das documentações encontradas no arquivo da escola, que revelaram as relações entre o Estado,
através da Secretaria de Educação, e o Grupo Escolar Barão de Mipibu. Os documentos que serviram
de fontes para a pesquisa foram: os Livros de entradas e saídas de correspondências do Grupo Escolar
Barão de Mipibu, através dessa documentação foi possível identificar a comunicação entre a escola
e a Secretaria, observar as ordens oferecidas pelas autoridades e os conflitos nas realizações ou
o cumprimento das mesmas, como também as necessidades do grupo escolar no seu ordinário,
revelando a submissão do Grupo à secretaria; os Termos de visita e inspeção do Grupo Escolar Barão
de Mipibu, os quais expressavam as anotações sobre a fiscalização que abarcava a inspeção técnica,
da estrutura física e higiene do Grupo como também de ordem pedagógica, além disso, revelava as
práticas realizadas no Grupo pela Secretaria de Educação do Rio Grande do Norte como políticas
implantadas pelo órgão; a Legislação Educacional do Rio Grande do Norte das décadas de 1950 a
1970, documentação que possibilitou compreender as leis que foram criadas no período, bem como
comparar a existência da lei e as práticas realizadas pela Secretaria de Educação no grupo escolar
Barão de Mipibu como meio de aplicação; o livro de uma memorialista do Grupo, intitulado Grupo
Escolar Barão de Mipibu: orgulho mipibuense (2009) de Maria Lúcia Amaral. O artigo possui relevância
para os estudos da História da Educação, pois possibilita o conhecimento dos mecanismos e das
práticas realizadas pelos meios de fiscalização dos grupos escolares no Rio Grande do Norte,
apresentando as relações existentes entre o ambiente escolar e os órgãos de fiscalização do Estado;
além de contribuir para a compreensão e construção da história educacional local e nacional. O
referencial teórico-metodológico está inserido no campo historiográfico da História Cultural.
Escolheu-se realizar a pesquisa através do viés cultural e tem como principais expoentes que orientam
o trabalho, os historiadores franceses Roger Chartier com sua obra A História Cultura: entre práticas
e representações (Chartier, 2002) e Dominique Julia, com seu artigo A cultura Escolar como objeto
histórico (Julia, 2001). O primeiro contribui com as noções de ‘prática’ e ‘representação’, ou seja, ao
pensar as ações da secretaria de educação sobre o Grupo Escolar Barão de Mipibu, através de suas
práticas, bem como das representações criadas acerca desse órgão de fiscalização e dos sujeitos que
o compunham. O segundo, traz as contribuições acerca do conceito de Cultura Escolar, ao entender
a mesma como um conjunto de normas e condutas, como também um conjunto de práticas. Tais
estudos sobre práticas escolares contribui para o voltar-se ao funcionamento interno das escolas,
bem como é no âmbito das práticas que se é possível compreender as modificações ao longo do
tempo. Observa-se a importância da Cultura escolar, por analisar as práticas existentes dentro do
ambiente escolar e as fontes utilizadas nesse trabalho possibilitam uma análise das relações Escola
e Estado a partir de um olhar interno, o do Grupo. Outros autores se destacaram na pesquisa sobre
a temática, a saber: José Carlos Libâneo, Concepções e práticas de organização e gestão da escola:
considerações introdutórias para um exame crítico da discussão atual no Brasil (Libâneo, 2007), que
traz em seus escritos a análise das práticas de organização e gestão da escola durante o Regime Civil
Militar; e a autora Daniela Vieira com sua dissertação intitulada As mudanças na educação do RN nos
idos de 1950 e 1960: a prática de Lia Campos (Vieira, 2005), no qual estuda as ações do governo do
Estado do Rio Grande do Norte, através da Secretaria de Educação e Cultura, na implantação das
orientações pedagógicas e das inspeções educacionais, analisando a atuação de personalidades
nessa ações. Ao realizar a pesquisa, foi possível compreender que a fiscalização escolar do período em
análise passou por modificações. Ao se observar as práticas realizadas pela Secretaria de Educação,
no final da década de 1950 e início de 1960 com meados de 1960 e início de 1970, percebe-se que
ocorreram mudanças na atuação e nas representações acerca do órgão e das figuras pertencentes
ao mesmo, ocorre uma transição de uma inspeção mais pedagógica para práticas fiscalizadoras
mais técnicas, influenciadas pela Pedagogia Tecnicista que foi implantada durante o Regime civil
militar. Isso revelava a preocupação com o cumprimento das ações direcionadas pelo CEPE (Centro
de Estudos e Pesquisas Educacionais) do Rio Grande do Norte, apresentando-se em suas práticas
fiscalizadoras abordagem tecnicista, bem como tais práticas eram reflexo das representações
atribuídas a educação e a função dos supervisores escolares na época, que era voltada para a
concepção de uma educação funcional, mercadológica, comportamental e produtiva.
Referências
CRUZ, Paula Lorena Cavalcante Albano da. Da suntuosidade à funcionalidade: Grupo Escolar Barão
de Mipibu (1909-1971). Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal, RN:
2018.
JULIA, Dominique. A cultura Escolar como objeto histórico. Revista Brasileira de História de
Educação. n. 1, jan./jun. 2001. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/37742506.pdf
Acesso em: 20 jul 2018.
VIEIRA, Daniela Fonsêca. As mudanças na educação do RN nos idos de 1950 e 1960: a prática de Lia
Campos. 2005. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
Natal: 2005.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 444
VIDAL, Diana Gonçalves ; FARIA FILHO, Luciano Mendes. História da educação no Brasil: a constituição
histórica do campo (1880-1970). Revista Brasileira de História. [online]. 2003, vol.23, n.45, pp.37-70. ISSN
0102. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010201882003000100003&script=sci_
abstract&tlng=pt Acesso em: 15 mai 2018.
ISSN 2358-3959
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Já é consenso afirmar na historiografia da história da educação brasileira que nas duas primeiras
décadas republicanas, o município de Piracicaba destaca-se entre os mais representativos do estado
de São Paulo em matéria de educação, em um contexto em que o ideal de instrução se fortalece
orientado por concepções de mundo que buscam definir novas condutas e hábitos em um discurso
que articula “escolarização e civilização” (FARIA FILHO, 2003). Apelidada de “Ateneu Paulista” pelo
intelectual italiano Roberto Capri, e mais tarde de “a cidade das escolas” pelo professor e literato
piracicabano Thales Castanho de Andrade, pioneiro na história do ensino rural no país, Piracicaba
conviveu nos primeiros anos da República com índices de escolarização dos mais expressivos no
estado de São Paulo. A presente comunicação insere-se em um projeto de pesquisa de maior
abrangência, em fase de desenvolvimento, que investiga as estratégias de expansão escolar utilizadas
pela municipalidade e analisa as representações sociais sobre esta expansão nas duas primeiras
décadas do governo republicano brasileiro (1890-1910). Faz parte do escopo da pesquisa reunir e
trabalhar com um número considerável de informações e analisar os processos que deram origem à
estruturação e expansão educacional no município de Piracicaba, privilegiando a abordagem em
uma perspectiva meso-analítica que vê na articulação das dimensões macroestruturais e nos
domínios micro contextuais a possibilidade de compreensão dos processos investigados. A
periodização que baliza a pesquisa tem como marco inicial as principais reformas educativas
realizadas no estado de São Paulo no quadro social de um novo regime político gerador do modelo
escolar paulista, e estende-se até o final da década de 1910. O objetivo primordial do trabalho aqui
apresentado é mapear, analisar e dar a conhecer como se organiza, funciona e se expande o ensino
privado dentro do recorte espacial e temporal proposto pela pesquisa maior. Para isto, levamos em
consideração todos os modelos de oferta escolar, mesmo aqueles de pouca duração, disponíveis
nos documentos e fontes locais, pois é neste contexto que se dá a inserção e a presença no município
de uma rede de agentes políticos, religiosos e representes da sociedade civil que levaram adiante, o
que podemos caracterizar de um projeto de escolarização em Piracicaba que se destaca tanto pelos
aspectos quantitativos como qualitativos. Como já divulgado em estudos anteriores, este projeto
civilizatório tem início no final da década de 1870 com o empenho dos irmãos Prudente e Manoel de
Moraes Barros, eminentes advogados e políticos locais que utilizando-se de suas posições e recursos
individuais e de grupo contribuíram para a instalação de uma escola protestante norte-americana
em Piracicaba, a exemplo do Colégio Internacional, fundado pelos missionários presbiterianos
George Nash Morton e Edward Lane em 1873, na cidade de Campinas. Entretanto, apesar da
existência do Colégio Piracicabano, fundado em 1881 pelos missionários metodistas; do
empreendimento reativo para a construção do Colégio (católico) Nossa Senhora da Assumpção,
iniciado em 1883 e finalizado em 1893, sob o comando da irmandade de São José de Chamberry; e
de algumas poucas iniciativas de particulares, Piracicaba ainda padecia sob o desinteresse da
municipalidade pela instrução pública e as poucas e más instaladas escolas exibiam um baixo nível
de assistência, situação peculiar a maioria de outros municípios da província nesse mesmo período.
Referências
CAMPOS, Edson N.; CURY, Maria Z. Fontes primárias: saberes em movimento. Rev. Fac. Edu., São
Paulo, v. 23, n. ½, 1997, p. 303-313.
OLSON, David R. L’école entre institution et pédagogie: repensar la reforme. Paris: Retz, 2003.
ISSN 2358-3959
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O presente texto tem como proposta apresentar uma narrativa histórica acerca da Escola de
Aprendizes Artífices de Alagoas, no período compreendido entre 1909 a 1930. A periodização temporal
delimitada justifica-se pelo ano de criação da escola, por intermédio do Decreto-Lei nº 7.566 de 23
de setembro de 1909, até o ano de 1930, quando deixou de estar vinculada ao Ministério da
Agricultura, Indústria e Comércio, passando para a jurisdição do recém criado Ministério da Educação
e Saúde Pública. No estudo consideraremos como fonte central para a análise as fotografias da
instituição que registram a ação dos sujeitos da escola, em específico, os alunos artífices que
mobilizaram as suas experiências discentes nos espaços da escola. Vale ressaltar que a leitura visual
das fotografias foram realizadas concomitante a interpretação das fontes de outra natureza como, os
relatórios oficiais e a legislação, por exemplo. Ou seja, consideramos que a fotografia analisada de
forma isolada poderia ofuscar ou limitar os resultados do estudo, por isto é que realizamos o
cotejamento de diversas tipologias de documentação. Posto isto, os objetivos são: 1) analisar o
papel da instituição na formação profissional dos meninos pobres; 2) identificar a partir dos indícios
a identidade dos alunos; 3) analisar algumas práticas escolares prescritas aos alunos e 4)
problematizar a condição socioeconômica desses meninos em conflito com a cultura escolar da
instituição. As fontes selecionadas para a construção da narrativa são os relatórios dos diretores da
escola, os relatórios do antigo Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, os periódicos, a
legislação e as fotografias. No tratamento metodológico dessas fontes, as fotografias foram
concebidas como portadoras de indícios do cotidiano da escola e os sujeitos que nela frequentaram.
Foram as lentes delas, que como janelas para o passado forneceram dados que os documentos
textuais não revelam quando indagados. Contudo, Kossoy (2001) adverte que na sua análise é
importante considerar o seu processo de construção, isto porque este tipo de artefato cultural é
criado e construído. Sendo assim, o episódio registrado pelas lentes do fotógrafo não corresponderia
necessariamente à realidade histórica, mas a uma aparência. Assim, as fotografias da instituição não
foram tomadas tal como a cena registrada, mas antes partimos do pressuposto de que as imagens
congeladas poderiam ser também cenas montadas. Um outro procedimento que analisamos foi
quanto a técnica empregada na produção. Vidal e Abdala (2005), ao discutirem os aspectos teórico-
metodológicos do uso deste tipo de fonte na História da Educação, dizem com base em Kossoy
(2001) que a análise técnica consiste num conhecimento histórico sobre a época em que a fotografia
foi produzida. Logo, é necessário estudar o contexto alagoano na Primeira República. Se tratando
das “fontes oficiais”, mais especificamente os relatórios dos diretores da escola e os relatórios dos
ministros da pasta de Agricultura, Indústria e Comércio, o nosso exercício foi o de examiná-las sem
submetermos a elas, ou seja, não as tomar como portadoras da verdade, mas considerando o lugar
social que os dirigentes da instituição ocupavam e que, portanto, pode ter condicionado os seus
discursos nos relatórios. Assim, como bem assevera Toledo e Junior (2012), não existem documentos
neutros. Logo, na análise nos guiamos pelas seguintes indagações: sob quais condições aqueles
documentos foram produzidos? Com que propósito? Por quem? E para quem? Foram estas perguntas
propositais que possibilitaram uma leitura deste tipo de documentação a contrapelo, pois conforme
orienta Benjamin (1994), a tarefa do historiador é escovar a história a contrapelo. No grupo da
“legislação” há procedências distintas como, por exemplo, os decretos, regulamentos, diários
oficiais da União e dos Estados, as Constituições e até aquelas que não são legislações como os
documentos de acordos, tratados, convênios de órgãos que influenciam a produção de políticas
educacionais (SANFELICE, 2004). Na pesquisa utilizamos os documentos que pertencem diretamente
a legislação. Luciano Mendes de Faria Filho (2005, p. 251) ao discutir as contribuições do historiador
inglês Edward P. Thompson para a História da Educação brasileira, nos alerta “para uma distinção
necessária entre dois momentos fundamentais: o momento da produção e o momento da realização
da lei”. Sendo assim, é preciso considerar que o tempo da lei não é o tempo de sua efetivação. E no
caso deste estudo os decretos outorgados estiveram em permanente confronto com as condições
materiais da instituição. Apresentado a metodologia, os resultados obtidos com a análise dos dados
foi o de que a Escola de Aprendizes Artífices de Alagoas foi criada em decorrência da promulgação do
Decreto-Lei nº 7. 566, de 23 de setembro de 1909, assinado pelo presidente da República, na época,
Nilo Peçanha. O decreto estabelecia a criação de 19 Escolas de Aprendizes Artífices nas capitais dos
Estados. Contudo, a instituição alagoana só foi instalada quatro meses depois de sua criação, em 21
de janeiro de 1910. Nos dizeres do historiador da educação Élcio de Gusmão Verçosa (1997), a escola
de aprendizes foi a semente do ensino técnico-industrial em Alagoas. Após a promulgação do decreto
de sua criação o segundo passo foi em direção a instalação. A escolha do local de acomodação da
escola pode ser visto como um processo lento por ocasião de não ter havido um prédio em boas
condições de infraestrutura que abrigasse a nova instituição. Segundo o seu primeiro diretor, o
engenheiro Miguel Guedes Nogueira no relatório de 1910, assim que recebeu as ordens e instruções
do ministro Pedro de Toledo para instalar a escola no Estado, registrou que os três prédios oferecidos
pelo governo estadual se encontravam em deplorável estágio de conservação. Diante disto, os
trabalhos de reforma estenderam-se num período de meados de dezembro de 1909 a junho de 1910,
portanto, aproximadamente seis meses. Mesmo durante a reforma dos prédios, a escola foi
inaugurada em 21 de janeiro de 1910, na capital Maceió. A legislação prescrevia quais eram os
critérios para a admissão dos alunos nos cursos primário, de desenho e nas oficinas. Tais critérios
baseavam-se na condição social, faixa etária e estrutura física do corpo. No regulamento registra-se
que poderiam ser somente admitidos à matrícula meninos entre 10 a 13 anos de idade e desde que
não fossem portadores de nenhuma moléstia contagiosa que pudesse ser transmitida aos demais
artífices. Tal proibição justificava-se porque ser portador de uma doença transmissível traria riscos
de contaminação dos demais aprendizes e disseminação da moléstia. Logo, percebe-se que a
formação profissional era o núcleo da instituição, tendo como escopo formar operários dentro de
uma escola profissional em que desde a mais tenra idade se constituiria o trabalhador nacional
(GOMES, 2003, p. 63). Além disto, era necessário comprovar oficialmente a condição de pobreza do
candidato: “Art. 6º – Serão admitidos os individuos que o requererem dentro do prazo marcado para
a matricula e que possuirem os seguintes requisitos, preferidos os desfavorecidos da fortuna”
(BRASIL, Decreto-lei nº 7.566, de 23 de setembro de 1909, s/p ). Neste caso específico, embora a
pobreza fosse um estado em que nenhum indivíduo quisesse se encontrar, para os candidatos, seria
um dos meios que garantiria a oportunidade de aprender um ofício. Assim, ser pobre era uma
questão sine qua non, senão a principal para a admissão na escola. Conforme a legislação, o diretor
Guedes Nogueira organizou o curso primário em elementar e complementar. No programa de ensino
identifica-se que o nível elementar, assim como o complementar durava cada qual 2 anos (1º ano e
2º ano), sendo que no 1º ano o aluno cursava a 1º e 2º série, bem como no 2º ano a 1º e 2º série,
somando 4 anos de curso primário. Essa divisão, segundo ele, justificava-se por ser uma estratégia
pedagógica que poderia possibilitar a inserção dos menores analfabetos no universo das letras
(nível elementar), bem como aprimorar aos que já eram letrados, porém com limites (nível
complementar). Conforme a legislação federal a escola de Alagoas poderia instalar em suas
dependências até o número de 5 oficinas de caráter manual e/ou mecânico. O critério utilizado para
defini-las seria o de considerar as demandas de produção local. As oficinas instaladas foram as de:
Sapataria; Marcenaria; Serralheria; Carpintaria e Funilaria. Nisto percebe-se que a Escola de
Aprendizes de Alagoas foi criada a fim de também atender a economia local. O certo é que a partir da
iconografia da instituição é possível chegar à conclusão de que os meninos artífices recebiam as
aulas nas oficinas como prescrevia a legislação. Contudo, uma questão que ganha força é saber se
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 450
após aprenderem o tirocínio eles encontrariam trabalho na cidade. Ao me direcionar aos jornais da
década de 1910, não conseguimos rastrear notícias de crianças que trabalhavam no comércio e/ou
na indústria e o que dificultou ainda mais pelo fato de haver poucos jornais desse período.
Referências
CUNHA, Luiz Antônio. O ensino industrial-manufatureiro no Brasil. Revista Brasileira de Educação.
São Paulo, n. 14, p. 89-107, mai-ago/2000.
VERÇOSA, Elcio de Gusmão. Cultura e Educação nas Alagoas: história, histórias. 4 ed. Maceió:
EDUFAL, 1997.
ISSN 2358-3959
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O objetivo desta pesquisa é compreender a gênese e a função social da instituição escolar para
moças no sul de Minas Gerais. O recorte temporal escolhido corresponde entre os anos de 1927, data
de criação da escola até o ano de 1946 que se registrou a última turma do Curso Normal de Economia
Doméstica devido a Reforma no Ensino Normal que ocorreu neste período. A pesquisa converge com
o eixo temático Instituições Educacionais. As fontes de estudo incluem mensagens de governadores
estaduais, discursos, legislação educacional, anuário de ensino e a imprensa. A análise dessas fontes
seguiu o referencial teórico na inter-relação de ensino profissional, com exclusão, pobreza e
juventude. O procedimento metodológico procurou analisar dialeticamente as articulações local,
estadual e nacional a respeito do ensino profissional doméstico. Como fundamentações teóricas
estão pesquisas relacionadas à História da Educação, Educação Feminina e Ensino Profissional,
produzidas por pesquisadores, tais como: RIBEIRO, ARAÚO e SILVA (2017), RIBEIRO (2017),
GONÇALVES (2012), RODRIGUES (2007). A pesquisa apresentada dirige-se para a seguinte questão:
Qual a missão social da Escola Doméstica de Brazópolis e as influências do currículo na formação
das alunas? A premissa é que esse ensino se alinhou a uma classe social alta, porém com vagas
custeadas pelo município e Estado para alunas menos afortunadas — que desenvolveram
tardiamente um ofício, pois as obrigações no lar se impunham e as oportunidades profissionais se
destinavam a priori ao trabalhador masculino. O estudo faz parte de um projeto de pesquisa mais
amplo: “Educação, pobreza, política e marginalização: formação da força de trabalho na nova capital
de Minas Gerais”, 1909–27, aprovado pela FAPEMIG e CNPq, agências brasileiras de fomento à
pesquisa acadêmica. Os achados e as constatações da pesquisa apontam que a Escola Doméstica de
Brazópolis constituiu-se de um currículo cultural e social amplo que tenha proporcionado uma
formação importante para a mulher Brazopolense. Sendo uma das primeiras escolas profissionais
domésticas femininas no Estado de Minas Gerais, como mostra em matéria jornalística divulgada em
jornal impresso, disponível na Hemeroteca Digital Brasileira, A Noite (RJ), publicado em 8 de março
de 1928, p.4 destacando que “entre os estabelecimentos que honram o espírito de iniciativa e a
orientação pedagógica do Estado, destaca-se a Escola Doméstica Modelar de Brazópolis, a primeira
que se creou em Minas Geraes”. A Escola Doméstica de Brazópolis foi criada em Minas Gerais a partir
da iniciativa do ex Presidente da República, de 1914 a 1918, Wenceslau Braz, e sob patrocínio da
Sociedade Protetora da Instrução (de Brazópolis, MG), na pretensão de aperfeiçoamento da mulher
para o lar, afirmado na revista Acaiaca (1952, p.54) que devido às iniciativas da escola ali formavam
“uma legião de boas donas de casa que formará outras legiões que hão de reformar a sociedade de
amanhã”. Assim como outras instituições destinadas ao ensino profissional doméstico feminino
durante a Primeira República, a educação feminina era voltada principalmente para aprimoramento
das funções dentro do lar. Em 13 de maio de 1927 teve inicio as aulas sob a direção das Irmãs da
Providência, tendo como primeira diretora a Irmã Maria Otávia. De 1932 a 1942 a escola foi dirigida
pela senhorita Idalina de Oliveira Castro, e sua irmã, Gina de Oliveira de Castro, como secretária.
Idalina e Gina estudaram na Bélgica, Idalina diplomada na Escola Doméstica de Laeken (REVISTA
ACAICA, 1952, p. 53), e Gina diplomada pela Escola Agricola-Domestica oficializada de Wavre-Notre
Dame, no “país que se tem distinguido no que respeita á educação feminina” (Brazopolis - Orgão
Oficial dos Poderes Municipais. Redator-gerente: Santos Lima. Publica-se aos domingos. Ano 10.º.
Brazopolis MG. 23 de julho de 1933, numero 479 . p. 2). Tiveram grande influência para anexar à
escola o ensino Normal, e em reconhecimento do alto valor do instituto brazopolense, o sr. Secretario
da Educação declarou instituir a fiscalização preliminar da Escola para fins de equiparação, “afim de
que ela, alem de sua finalidade, que não se alterará, seja tambem Normal”, como declarou
textualmente á Sociedade Protetora da Instrução e publicado em nota no jornal Brazopolis - Orgão
Oficial dos Poderes Municipais (Redator-gerente: Santos Lima. Publica-se aos domingos. Ano 10.º.
Brazopolis MG. 13 de agosto de 1933, numero 482, p. 1). Há variações na denominação da escola nos
jornais, ora encontra-se Escola Doméstica de Brazopolis, ora Escola Doméstica Nossa Senhora
Aparecida, Escola Normal de Economia Doméstica Nossa Senhora d’Apparecida. Em 1927 foi
inaugurada nomeada Escola de Economia Doméstica Nossa Senhora Aparecida, em 1932 começa a
oferecer o curso Normal mudando sua nomenclatura para Escola Normal de Economia Doméstica
Nossa Senhora Aparecida até 1947, quando passa a se chamar Escola Normal Nossa Senhora
Aparecida. O currículo da instituição foi pensado a partir dos currículos europeus, importados da
Bélgica precisamente (Revista ACAICA, 1952, p. 53). O modelo educacional feminino europeu
fundamentava-se na ideia da educação da mulher como possibilidade de mudança social a partir do
lar, dessarte, “a Europa vinha enfatizando uma educação generalizada da população, tendo a mulher
como transmissora da cultura e dos valores de um modelo social, passando a ter o papel de preparar
o homem moderno” (TAVARES; STMATTO, 2018, p. 4). No currículo também contatavam com aulas
de Religião e Moral, Português, Francês, Aritmética, Geometria, História Pátria, Geografia, Ciências,
Desenho, Canto e Psicologia, de acordo com Caderno de Actas de Exames e Promoção, registros de
1930 a 1936, disponíveis no arquivo da Escola Estadual Wenceslau Braz (acesso em abril de 2019). A
grade curricular abarcava desde as competências para ensino de tarefas domésticas à matérias
técnicas destinadas para aprimoramento moral e religioso das alunas. Em 1952 a instituição concluía
seus 25 anos de funcionamento e a Revista Acaica (1952) publicou uma matéria sobre a instituição
informando o total de 4.550 matrículas realizadas durante esse tempo, sendo cobrado a 61% das
alunas o valor da anuidade integral, 4,3% com anuidade reduzida, e 33% gratuitas. Do total de
matrículas de alunas que não pagavam anuidade, 61% eram oferecidas pela escola, 5,8% exigidas
pelo Estado e 32,9% foram custeadas pela prefeitura municipal de Brazópolis, percebendo-se assim
que a instituição era privada e subsidiada também pelo Poder Público. A escola apesar do forte
preceito religioso e conservador conseguiu modificar um paradigma social, pressupõe-se ainda que
as mulheres não ocupavam cargos no mercado de trabalho, estando sua atuação atrelada às tarefas
domésticas e posteriormente tomando espaços sociais conseguindo visibilidade social e
empregabilidade como foi possível analisar a partir do Caderno de Atas de Reunião (datado de 1939
a 1965), no quadro de funcionários da escola encontra-se nomes de ex-alunas formadas na instituição
que posteriormente trabalharam na escola como professoras e secretárias. Os resultados da pesquisa
apontam que a Escola Doméstica de Brazopolis abrangia em seu currículo importantes competências
para ensino de tarefas domésticas e matérias técnicas destinadas para aprimoramento moral e
religioso das alunas. Em 1933 a instituição passou a oferecer também curso para habilitá-las para o
exercício do magistério nas escolas de primeiro grau, e como função social visava a formação integral
das moças tendo um olhar constante voltado para a sociedade, preparando-a para o exercício
profissional, sendo professora e boa dona de casa. As moças aprendiam a vivenciar as situações de
aprendizagem pelo convívio em grupo indispensável para a vida em sociedade e na família. No
Decreto n.º 11533 de 14 de setembro de 1934, a Escola de Economia Doméstica N. S. Aparecida foi
reconhecida como de primeiro grau, sendo equiparada às outras escolas Normais do Estado. O Curso
Normal de Economia Doméstica perdurou até 1946, quando houve uma grande reforma no ensino
Normal no país. Percebe-se a modificação da estrutura curricular na linha temporal de funcionamento
da escola, com a inclusão de matérias científicas e a possibilidade de formá-las para no curso de
Magistério, abrindo espaços para emancipação econômica e abertura no mercado de trabalho.
Enfatizamos a importância desta instituição para a formação social e profissional das alunas no
município e região de Brazópolis, visto que ocorriam matrículas de alunas de diversas cidades na
instituição devido sua notoriedade.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 453
Referências
GONÇALVES, Irlen Antônio. A República e os seus projetos de educação profissional: escolarização
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Programa de Pós Graduação de Educação da Universidade Federal de Uberaba, 2017. 197p. (Relatório
de pesquisa)
RIBEIRO, Betânia de Oliveira Laterza; ARAUJO, José Carlos Souza; SILVA, Elizabeth Farias. Ensino
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Antonella Carvalhode (Org.). Campo de saberes da História da Educação no Brasil. 1. ed. Ponta
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RODRIGUES, Andréa Gabriel F. Educar para o lar, educar para a vida: cultura escolar e modernidade
educacional na Escola Doméstica de Natal (1914 – 1945). 2007. 306 f. Tese (Doutorado em Educação)
– Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2007.
ISSN 2358-3959
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consolidação da religião luterana na Serra dos Tapes, representadas por três vertentes luteranas: a
Igreja Luterana Independente, Igreja do Sínodo Riograndense (atual IECLB) e a Igreja do Sinodo de
Missouri (atual IELB).
Por se tratar da abordagem dos ritos culturais dos pomeranos, cabe serem discutidos esses
quatro rituais, que são o batismo, a confirmação, o casamento e a morte.
O primeiro rito da vida dos indivíduos é o batismo, que acontece após o nascimento da criança,
onde a criança passa a ser vista como ser pertencente ao universo da igreja.
De acordo com Maltzahn (2011, p.65), “a vida social é dividida em ciclos, então se o batismo é a
transição do nascimento para a integração na estrutura social, o próximo passo, a confirmação, é a
transição da infância para a idade adulta”.
A confirmação é um dos ritos de passagem da cultura pomerana característica da religião
luterana. É um ritual semelhante à Crisma da religião católica, praticada por jovens entre 12 e 14
anos (MALACARNE, 2017). A confirmação é um ritual com forte ligação com a escolarização dos
descendentes de pomeranos, pois a idade da confirmação coincidia, muitas vezes, com o período
de término dos estudos.
Outro rito de passagem dentro do contexto pomerano é o casamento, que para Bahia (2011) é
um momento de ruptura e transformação, marcando o fim dos bailes, do tempo de namoro, e de
separação de família e amigos, onde duas pessoas de famílias diferentes se integram e passam a ter
laços permanentes. No período estudado, era quase impossível acontecer separação entre os casais.
E por fim a morte é o ritual de ruptura do contexto social. O ritual que carrega mais simbolismo e
superstição seja no sepultamento ou nas crenças após morte ou na edificação dos cemitérios.
Para a realização deste trabalho, foram feitos as consultas às fontes documentais e as entrevistas
com algumas pessoas que foram alunos dessas três escolas. Mas para contextualização das propostas
são apresentadas algumas análises preliminares, com base nas seguintes fontes documentais:
Documentos da Escola 1: Livro de sta (1941 – 1986), estatuto redigido em alemão gótico (1923),
livro de registros de batismo (escrito em língua alemã – 1913), livro de assinatura/presença de
reuniões (1945), livro de assinatura/presença de reuniões (1950), estatuto de Criação – registrado
em cartório (1923), e caderno de registros do professor referente aos atos cívicos (década de 1950).
Documentos da Escola 2: Livro de chamada (outubro/1948 à dezembro/1956), livro de ata
de abertura e encerramento do ano letivo (sem data), livro de chamada da escola (julho/1940 à
maio/1945), livro de chamada da (junho/1945 à maio/1952), livro de frequência escolar (março/1960
à outubro/1963), livro de atas cívicas (março/1969 à Setembro/1981), livro de atas cívicas
(setembro/1943 à setembro/1948), livro de frequência escolar sem nome de alunos (junho/1939
à agosto/1943), livro de frequência escolar diária (abril/1956 à outubro/1956), livro de frequência
escolar diária (abril/1946 à dezembro/1950), livro de frequência escolar diária (abril/1946 à
novembro/1959), ata de batismos, confirmações, casamentos e sepultamentos (1939 – 1970), livro
de matrícula escolar (1939 – 1949), lista de bolsistas da escola (1969 – 1977), e ata de batismos,
confirmações, casamentos e sepultamentos (1942 – 1970).
Documentos da Escola 3: livro de batismo e confirmações (1882 – sem data de término), livro de
atas da escola (1957 – 1974), livro de inspeção (1957 – 1959), livro de posse e desligamento, e linha
do tempo da comunidade religiosa (1882 – 1918).
As fontes são apresentas para que o leitor se familiarize com os documentos que serão trabalhados.
Ao analisar esses documentos constatou-se que muitas crianças evadiam a escola após serem
confirmadas, e que muitas delas precisavam frequentar a escola para serem consequentemente
confirmadas, e que após casarem as pessoas não mantinham vinculo com a escolarização, mas
somente coma instituição religiosa.
Nas narrativas os interlocutores falam sobre a importância dos ritos de passagem, especialmente
da confirmação, onde falam sobre os detalhes da confirmação, e afirmam que após serem
confirmados, não frequentavam mais a escola, pois deveriam ajudar suas famílias no trabalho
camponês, visto que o público dessas escolas abrangia especialmente os filhos de colonos de
descendência pomerana.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 456
Pode-se perceber que a religião perpassa toda a vida dos indivíduos, mas que a escolarização
é restrita às crianças até o período do rito confirmatório. Pois nos documentos se percebe uma
nítida ligação entre escola e igreja, sendo, desta forma, instituições coexistentes, além disso, nas
narrativas é percebido um discurso de importância destinada à igreja, sendo a principal instituição
de formação cidadã para esses descendentes de pomeranos. Pois como destaca Rambo (2002, p.66),
“a igreja protestante começou por implantar comunidades solidamente estruturadas em torno de
suas igrejas, suas escolas, seus cemitérios e demais aparelhos comunitários”. O que remete, que se
as estruturas de igrejas e escolas estão unidas, suas práticas religiosas e ritualistas se entrelaçam
em relações, que refletem na comunidade e nos alunos que frequentavam essas escolas, tornando a
igreja também uma instituição educativa.
Referências
BAHIA, Joana. O tiro da Bruxa: identidade, magia e religião na imigração alemã. Rio de Janeiro:
Garamond, 2011.
MALTZAHN, Gislaine Maria. Família, ritual e ciclos de vida: Estudo Etnográfico sobre narrativas
pomeranas em Pelotas (RS). 2011. 151 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Instituto de
Sociologia e Política. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Universidade Federal de
Pelotas, Pelotas, 2011.
RAMBO, A. B. A igreja dos imigrantes. In: DREHER, Martin (org.) 500 anos de Brasil e a Igreja na
América Meridional. Est. Edições: Porto Alegre, 2002.
STEYER, Walter. Os imigrantes alemães no Rio grande do Sul e o Luteranismo: a fundação da Igreja
Evangélica Luterana do Brasil e o confronto com o Sínodo Rio-Grandense, 1900-1904. Porto Alegre:
Singulart, 1999.
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Este resumo apresenta os resultados parciais da pesquisa em andamento, cujo objeto é a história
de criação do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, campus de Campo
Grande, integra o grupo de pesquisa “Sociedade História e Educação - GEPSE/HISTEDBR-MS, da
Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul”, vinculado à Linha de Pesquisa “História, Políticas e
Educação¨, do Programa de Pós-graduação em Educação mestrado e doutorado da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul. Este trabalho objetiva investigar a criação e consolidação dos cursos
de Pedagogia na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, no período 1970-1996, ou seja, do
início da criação do estado até a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996. O
Ensino Superior no estado de Mato Grosso do Sul é ministrado por instituição pública e privada sen-
do a principal instituição pública a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Os procedimentos
metodológicos compreendem a investigação bibliográfica e documental. Foram selecionados para
fundamentação da pesquisa os seguintes autores: Kullok (2000), Freitas (2002), Maciel; Neto, (2004),
Silva (2006) e Gatti (2011). Durante a coleta de dados foram consultadas e sistematizadas fontes ins-
titucionais dos anos de 1970 e 1980, adentramos aos centros de documentação do estado de Mato
Grosso do Sul em busca de documentos do período que apresentassem dados sobre o curso. Arquivo
Público Estadual de Mato Grosso do Sul, Arquivo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e
Arquivo da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Optou-se como
referência metodológica pelo enfoque do materialismo histórico dialético, por considerá-lo mais
apropriado e que mais contribui para o desenvolvimento de pesquisas neste campo de investigação.
Desta forma, discutimos inicialmente os aspectos históricos e legais que organizaram o curso de
Pedagogia no Brasil e finaliza com a caracterização história do curso de Pedagogia na Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul. O curso de Pedagogia no Brasil no decorrer de sua história enfrentou
inúmeras modificações curriculares as quais interferiram e direcionaram a sua estrutura, bem como
a identidade dos profissionais da educação. O mesmo foi criado mediante o Decreto-lei nº 9 1.190,
de 04/04/1939 que organizou a Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil, apresentando na
sua estrutura quatro eixos fundamentais Filosofia, Ciências, Letras e Pedagogia, bem como uma se-
ção direcionada ao curso de didática. No Decreto-lei nº 9 1.190/1939, no artigo 19, estabelece a du-
ração de três anos para o curso e as disciplinas que deveriam ser cursadas na primeira, segunda e
terceira série da formação do pedagogo, apresenta na Secção XI, a estrutura curricular para o curso
de pedagogia. A compreensão histórica que impulsionou a mudança na organização do Estado bra-
sileiro como consequências das demandas da produção capitalista, alterou as políticas de formação
de professores desenvolvidas nas últimas décadas, suscitando desdobramentos de natureza políti-
ca, econômica e social. Este fenômeno desencadeou investigações e discussões entre os
Referências
FREITAS, Helena Costa Lopes de. Formação de professores no Brasil: 10 anos de embate entre
projetos de formação. Educação e Sociedade, Campinas, v. 23, nº 80 (Número Especial), 2002.
Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v23n80/12928.pdf> Acesso em: 20 set 2019.
GATTI, Bernardete Angelina. Políticas docentes no Brasil: um estado da arte. Brasília: UNESCO, 2011.
MACIEL, Lizete; NETO, Alexandre (Orgs.). Formação de professores: passado, presente e futuro. São
Paulo: Cortez, 2004.
SILVA, Carmem Silvia Bissolli da. Curso de pedagogia no Brasil: história e identidade. Campinas:
Autores associados, 2006.
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A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA FORMAÇÃO DE
PROFESSORES EM MINAS GERAIS E A CRIAÇÃO DA
ESCOLA NORMAL DE DIAMANTINA, 1878 A 1905
sua influência sobre Diamantina. Destaca-se, nesse estudo, os autores Araújo (2008), Faria Filho
(2000), Tanuri (2000), Villela (2000; 2008), Gouveia (2000), entre outros. Para segunda etapa, foi feita
a consulta nos acervos do Arquivo Público Mineiro, a Biblioteca Antônio Torres e o Center for Research
Libraries (CRL). No primeiro arquivo, as ações podem ser divididas em duas fases: a primeira, junto
aos Anais da Assembleia Legislativa Provincial, de 1876 a 1889, e os Anais da Câmara dos Deputados
e Senadores, entre 1889 a 1906, em que foram localizados os debates em torno da formação de
professores e da instrução pública em Minas Gerais bem como os processos de criação, instalação e
suspensão da Escola Normal de Diamantina. A segunda fase, por sua vez, foram localizadas
documentos junto ao Fundo da Instrução Pública relacionados diretamente instituição educativa
destinada a formação de professores em Diamantina que, até o presente momento, conta com
aproximadamente 2.700 documentos, sendo divididas em atas, provas, solicitações de matrículas,
documento de professores, pareceres, entre outros, entendidos como fundamentais para
compreensão da dinâmica dentro dessa instituição educativa. Por sua vez, na Biblioteca Antônio
Torres, as fontes localizadas e selecionadas são oriundas de treze jornais, veiculados em Diamantina
entre os anos de 1831 a 1913 e totalizam 184 matérias que foram publicadas nos jornais: Sete de
Setembro, 17º Districto, A Diamantina, A Ideia Nova, Cidade de Diamantina, Echo do Serro, Estrela
Polar, O Aprendiz, O Itambé, O Jequitinhonha, O Municipio, O Normalista e o Norte. Por fim, no CRL
foram encontradas mensagens, relatórios e falas de Presidente de Província e do Estado, entre os
anos de 1850 a 1906, que tratavam especificamente da instrução pública, formação de professores,
Escolas Normais e instrução primária. Nesse arquivo, contabiliza-se a utilização de treze falas, trinta
relatórios e sete mensagens que perfazem todo o período de funcionamento da Escola Normal de
Diamantina, entre 1878 a 1905. Diante das fontes e do referencial teórico que fundamentou as
análises, pode-se apontar como resultado parcial da pesquisa que a formação de professores em
Minas Gerais, durante o século XIX e início do XX, apresentou-se como um dos caminhos possíveis
para desenvolvimento da sociedade mineira rumo ao progresso e a modernidade. Tal compreensão,
está no bojo da discussão sobre a instrução pública, de modo geral, e a instrução primária, em
particular, uma vez que para o governo mineiro o mal desempenho do ensino primário se daria por
consequência do mal desempenho e preparo dos próprios professores. Esse problema, portanto, só
seria sanado, conforme apontam os Relatórios de Presidente de Província, com a criação de
estabelecimentos de ensino específicos para a formação de professores que pudessem formar
adequadamente candidatos ao magistério primários. Nesse cenário, é possível perceber que o mote
“A escola é o mestre” perpassou nos discursos proferidos pelos Presidentes de Províncias entre as
décadas de 1850 a 1870 adentrando até os primeiros anos da República, evidenciando assim o
problema quanto a formação de professores em Minas Gerais e sua reverberação no ensino primário.
Logo, após um movimento macro na educação nacional no final da década de 1860, na qual verifica-
se o retorno de instituições educativas destinada exclusivamente a formação de professores, em
Minas Gerais tal agitação seria inaugurada pelo reestabelecimento da Escola Normal ouro-pretana
pela Lei nº. 1.769, de 04 de abril de 1871, responsável também pela criação de uma Escola Normal na
cidade de Campanha. Em um período de dez anos, entre 1878 a 1888, foram criadas mais sete escolas
destinadas a formação de professores, incluindo a Escola Normal de Diamantina que se tornou
referência no seu ramo de serviço público no norte mineiro. As análises da pesquisa indicam que
essas escolas foram instaladas nas cidades que se caracterizavam pela pujança econômica, cultural,
política e comercial apresentando também certa movimentação urbana e um contingente
populacional significativo. Desse modo, compreende-se que as Escolas Normais mineiras foram
fundamentais para estabelecer processos educativos em suas regiões, pois além de formar
professores primários, eram palco para realização de concursos para provimento de cargos nas
escolas primárias, espaços de socialização, disputas políticas e de poder. Com o advento da República
em 1889, haveria mais alguns investimentos por parte do governo mineiro no que tange a formação
de professores. Além da existência das nove Escolas Normais espalhadas nas Minas, seriam criadas
mais seis instituições educativas para a formação de professores, reconhecidas pelo poder público
estadual. Diante das fontes consultadas, é possível afirmar que a crença do governo mineiro de que
haveria uma relação direta entre o ensino primário e o ensino normal, ou seja, entre a instrução
primária e a formação de professores, atravessaria a República. Embora houvesse mudado o caráter
da educação nesse período, os professores primários ainda eram compreendidos como o caminho
para o sucesso ou fracasso da instrução pública de modo geral. Entretanto, a crise financeira
instaurada em Minas Gerais associada ao alto custo desses estabelecimentos de ensino levaria o
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 462
governo decretar a suspensão de todas as Escolas Normais existentes no Estado, o que a primeira
vista, prejudicaria a promoção da instrução primária. Porém, essa pesquisa apresenta a hipótese de
que a suspensão das Escolas Normais, incluindo da cidade de Diamantina, favoreceria a formação
de professores pela via privada, uma vez que o ensino normal promovido por essas instituições seria
reconhecido pelo Estado mineiro, dando um caráter moderno pela relação entre público e privado.
Referências
ARAÚJO, José Carlos de Souza. A Gênese da Escola Normal de Uberlândia, MG: o contexto estadual e
a independência cultural em 1926. In: ARAUJO, José Carlos de Souza; FREITAS, Anamaria Gonçalves
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FARIA FILHO, Luciano Mendes. Instrução elementar no século XIX. In: LOPES, Eliane Marte Teixeira;
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TANURI, Leonor Maria. História da Formação de Professores. Revista Brasileira de Educação, nº. 14,
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VILELLA, Heloísa de Oliveira Santos. O mestre-escola e a professora. In: LOPES, Eliane Marte Teixeira;
FARIA FILHO, Luciano Mendes; VEIGA, Cynthia Greive (Org.). 500 anos de Educação no Brasil. Belo
Horizonte: Autêntica, 2000, p. 95 – 134.
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Aspecto da cultura escolar da Escola, os eventos promovidos no seu interior não estão dissociados
das representações da Instituição, dos alunos, dos dirigentes, dos professores, dos funcionários, da
população local e da sociedade como um todo. A escolha das comemorações, muitas vezes, esteve
relacionada ao projeto político e social vigente, como ocorreu a concentração da Juventude Escolar
do Vale do Paraíba.
Os alunos participaram de outras atividades além das aulas, onde prevaleceram a ordem e
disciplina, requisitos de ordem pedagógica e política, e se constituíram em elementos simbólicos
que elevaram o valor da Escola e deram crédito à Instituição.
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Anderson Szeuczuk
Joao Carlos Da Silva
Este trabalho tem como objetivo discutir a interiorização do ensino superior público no Estado do
Paraná em correspondência com o processo de transformação social. O estudo sobre a história do
ensino superior é fundamental para reconstrução da memória local. Consideramos a universidade
enquanto espaço de conflitos de interesses, cujo estudo é fundamental para compreensão do
meio social e político que está inserida. No âmbito do ensino público, a partir de uma organização
constituída pelo Estado, por meio de políticas públicas específicas fica evidente o desinteresse no
cenário atual do investimento em políticas públicas educacionais. A universidade historicamente
esteve relacionada ao desenvolvimento econômico, político e social. No Brasil a universidade desde
seu projeto inicial, contou com peculiaridades em cada período de sua existência como concepções
ideológicas específicas, destinação de recursos e prevalência entre público e privado. As políticas
públicas do governo federal possibilitaram a ascensão do ensino superior privado, que por vários
meios, obteve apoio governamental para seus interesses, como incentivos fiscais e gratuidade
mediante políticas de bolsas de estudo oferecidas pelo poder público. Um dos elementos para
compressão da presença do ensino privado em paralelo público é a questão da legislação de cada
período que legitimou a presença deste setor em uma área prioritária para sociedade. Atualmente,
o Estado do Paraná conta com sete intuições públicas Estaduais, a Universidade Estadual de Ponta
Grossa (UEPG) de 1969, Universidade Estadual de Londrina (UEL) de 1970, a Universidade Estadual de
Maringá (UEM) de 1970, Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) de 1987, Universidade
Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO) de 1990, Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP)
de 2006 e a Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR) de 2001. Essas universidades foram criadas
a partir da incorporação de instituições isoladas em torno de um órgão da administração central,
muitas localizadas em regiões com pouca densidade populacional. No momento em que o Estado
investe em políticas públicas específicas para uma modalidade educacional acaba enfatizando os
interesses políticos das lideranças naquele momento, podemos analisar as políticas educacionais
em um contexto onde a educação é considerada uma mercadoria a atender aos interesses do
capital. No entanto, quando o governo não investe adequadamente na educação pública, acaba
não atendendo a demanda necessária, favorecendo indiretamente o setor privado que percebe o
caminho para sua hegemonia. Sobre a história do ensino superior no Estado do Paraná, identificamos
a existência de estudos isolados sobre as instituições, algumas pesquisas sobre o surgimento destes
estabelecimentos, outras direcionadas à análise da conjuntura política local ou estadual. Além de
uma revisão bibliográfica sobre a temática, tendo como principais referências Freitag (1979), Sheen,
(1986), Dourado (1997), Saviani (2001), Cunha (2007). A formação de cada universidade é marcada
pelas características da época em que se desenvolveu, os interesses da sociedade, a situação
econômica, e também as questões religiosas e políticas envolvidas em sua formação. Isso justifica a
importância do estudo e análise das instituições de ensino superior (IES), a fim de compreendermos
a relação entre Estado e sociedade. Em nossa análise dispomos de fontes primárias arquivadas no
Centro de Documentação e Memória da UNICENTRO (CEDOC), e uma vasta legislação educacional
Referências
CUNHA, Luis Antônio. A universidade temporã: o ensino superior da colônia à Era Vargas. 3ª ed. São
Paulo: UNESP, 2007.
FREITAG, Barbara. Escola, Estado e Sociedade. 3ed. São Paulo: Cortez e Moraes, 1979.
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da história de uma Universidade Pública: o caso da Universidade Estadual de Maringá. Maringá:
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SAVIANI. Derval. Instituições de Memória e organizações de Acervos. In: SILVA. João Carlos da Silva.
(Org).. História da Educação: Arquivos, Instituições escolares e memória histórica. Campinas, Alinea,
2013. p. 13-31.
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para as instituições responsáveis pela de educação dos seus sujeitos imigrantes, distribuídos no país
de maneira a construir a cultura identitária na sociedade de acolhimento.
No processo da mobilização, percebe-se as colônias representadas por associações, que
cumpriram o importante papel de órgão aglutinador da comunidade, principalmente, entre 1936 e
1956, isto é, até o marco de fundação da Federación de Asociaciones Japonesas del Paraguay. Elas
passaram duas décadas fomentando relações políticas em busca da uma melhor socialização dos
imigrantes e da resolução de conflitos em seu campo de atuação, tanto na comunidade interna
quanto na sociedade paraguaia. Assim, como as colônias, as associações possuíam entre as suas
funções “recriar aqui uma sociedade, uma comunidade rural aos moldes do Japão (um mini-Japão),
para poder viver em espaço estrangeiro” (MORIWAKI, 2008, p. 38). As práticas sociais e culturais ao
longo da trajetória das associações japonesas propõem um modelo de organização social e circulação
dos sujeitos imigrantes internamente em sua comunidade, como também em outros espaços da
sociedade paraguaia. Nesse modelo de organização foram criadas instituições educativas singulares
em suas práticas sociais e representações culturais, com o objetivo de estimular os estudos da língua
de garantir a formação identitária dos descendentes. Durante a pesquisa encontramos os registros
de dez associações japonesas distribuídas pelo país, das quais selecionamos quatro que possuem
instituições educativas e relações de integração com a presença de estudantes nipo-brasileiros nas
instituições nipo-paraguaias: 1)Escuela Japonesa de Pedro Juan Caballero, localizada na capital do
departamento de Amambay, constitui uma conurbação internacional com a cidade brasileira de
Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul; 2) Escuela Japonesa de Capitán Bado, localizada no departamento
de Amambay noroeste, região que faz divisa com o Brasil; 3) Escuela Japonesa de Ciudad del’Este,
localizada na capital do Alto Paraná; e, por fim, a 4) Escuela Japonesa de La Colmeña, localizada no
departamento de Paraguari, na região do Alto Paraná.
As associações japonesas como mantenedoras dessas instituições e responsáveis pela da formação
educativa do grupo e da constituição de sua cultura identitária, articularam práticas inspiradas
nas experiências de uma determinada situação histórica, como por exemplo, a peculiaridade
da imigração e a organização pelo modelo de colônias administrativas, as quais promoviam um
espaço destinado a ser a “escola de japonês”. Tal pressuposto direciona a reflexão sobre a trajetória
das referidas instituições educativas, por meio da problematização das práticas culturais acerca
da “escola de japonês” e dos professores como agentes sociais do ensino da língua e da cultura.
Conforme, Certeau (1982, p. 16) convém assinalar que a historiografia “Não se interessa por uma
“verdade” escondida que seria necessário encontrar; ela constituiu símbolo pela própria relação
entre um espaço novo, recortado no tempo e um modus operandi que fabricam ‘cenários’”. Assim,
o cotidiano escolar assume a necessidade de aprofundamento e reflexão acerca de seus aspectos
internos, as práticas e as representações das formas de ensino e a problematização do ambiente
educativo. Convém mencionar que as instituições educativas faziam parte do projeto de educação e
de vida do imigrante, e com elas se concretizava a formação identitária, por meio dos departamentos
escolares mantidos pelas associações japonesas. Importante ressaltar que no âmbito da educação
se constituíam as relações políticas e sociais que implicaram na expansão gradativa da presença
japonesa em instituições educativas em distintas colônias na sociedade paraguaia. A educação dos
descendentes incluía não só práticas da cultura japonesa, mas, também, a marca da consciência
étnica de ser filho de imigrante, justamente configurando a noção étnica. Esse grupo, porém, tinha
no professor a figura de um sujeito na situação das múltiplas identidades, que ao mesmo tempo era
o responsável pela representação da sua coletividade. Outro fator importante para a educação na
comunidade, as próprias companhias de emigração junto ao governo inseriam nas bases estruturais
da colônia um espaço físico para o ensino com a presença de uma escola. Como testemunha
Kasamatsu (2011b, p. 144-145): “La educación en el idioma japonés, que era la prioridade para
las autoridades y padres, se há desarrollado dentro de una estricta disciplina por los profesores
venidos desde el Japón y más algunos de formación local”. Mediante tais indícios, observa-se que
a escolarização teve início, paralelamente à organização de suas vidas na colônia, como iniciativa
para a expansão das instituições educativas dentro da comunidade japonesa e mais tarde se faz
presente na sociedade. A interlocução com estudos sobre a escolarização japonesa promove novas
perspectivas para o aprofundamento do conhecimento histórico acerca das especificidades do
processo focalizado, revelando nas representações de suas instituições e nas práticas culturais
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 471
vivenciadas, algumas estratégias adotadas pelas famílias de imigrantes na educação dos seus
descendentes na sociedade de acolhimento.
Referências
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Roger Chartier com Carlos Aguirre, Jesús Anaya Rosique, Daniel Goldin e Antonio Saborit. Porto
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Memorial da América Latina, 2011.
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A ideia de uma Constituição Política não é uma novidade para a Europa do fim do século XVIII.
Porém a novidade é a mudança da soberania que passa do rei para a nação, tornando-se o mote
revolucionário liberal desse período que construiu o mundo ocidental contemporâneo. A soberania
da nação refletirá os desejos das elites locais por meio das constituições políticas que surgirão
no rastro revolucionário. Porém, para se fazer representar as elites locais criaram essa novidade
institucional que é a Província. A Província, garantiria a representatividade regional diante de um
governo central e buscaria pela educação, a formação e a consolidação de uma identidade regional.
Província e Educação seriam, pois, um dos reflexos da modernidade institucional criado pelas
revoluções do século XIX.
O Projeto O Império das Minas Gerais: relações entre política, poder, educação e cultura na
administração dos negócios da província (1834-1889) visa analisar as relações que se estabeleceram
entre a província de Minas Gerais e o Governo Central de modo a compreender os possíveis
impactos da composição e da atuação do segundo escalão da burocracia imperial – a presidência
– na administração dos negócios da Província, em especial, no âmbito das ações voltadas para a
educação no período de 1834 a 1889. Mas, para um melhor entendimento do papel do presidente,
foi-nos preciso entender o que é a Província, considerada uma novidade institucional na medida
em que tal ideia revelava, apenas e até o final do século XVIII, um pedaço de terra, uma região que
mantinha uma relação de total subserviência ao poder central – do nobre local para o rei – sendo
objeto de desejo, conquista, troca e paga ao vencedor dos espólios de guerra.
A partir do século XIX, as províncias se impõem ao poder central reafirmando suas identidades, suas
necessidades e seus desejos locais de maneira a se manterem unidas ao centro, porém se satisfeitas
suas condições. Uma dessas condições é a possibilidade de educar “seus filhos” reafirmando a ideia
de uma pátria local que deveria se sobrepor – em último caso – à ideia de uma pátria centralizada e
centralizadora. A resposta do poder central foi buscar uma etapa da educação – a educação média
e superior - que reafirmasse o compromisso central com as províncias buscando educar homens
que construíssem leis que favorecessem os dois lados: a formação do amor à pátria e a defesa da
província nas primeiras letras e, por outro lado, a construção de uma legislação centralizada que
respeitasse o sentimento e a necessidade locais. Ou seja, a Província se apresenta como uma
instituição educadora com um projeto local, ora em oposição ora em apoio ao poder central.
Objetivos
Por tudo o que dissemos acima, nossa comunicação apresenta parte dessa pesquisa e tem como
objetivo conhecer a ideia de Província na transição do século XVIII e XIX e como essa ideia mobilizaria,
a nosso ver, um novo projeto educacional no Brasil Imperial. O que buscamos conhecer é o processo
de transição no Brasil de uma situação de Capitania, objeto de conquista, exploração e troca para
uma situação de Província – uma exigência política liberal – objeto de soberania, deliberação e
protagonismo da população local. Buscamos ainda demonstrar como essa mudança nas relações
políticas e institucionais engendrou um modelo de escola de massas que, infelizmente, não foi bem
realizado no Brasil, mesmo ficando a cargo das províncias e, mais tarde, dos estados.
Periodização
O período que desenvolvemos essa pesquisa vai de 1812 até 1834 – da Constituição de Cádiz à
criação das Assembleias provinciais no Brasil. A Constituição de Cádiz de 1812 tornou-se um marco
na medida em que insere na Península Ibérica, por meio dos liberais espanhóis, a nova concepção
de província em oposição à ideia de capitania. Por outro lado, o limite que escolhemos é o ano de
1834, período em que se consolida a ideia de província no Brasil com o Ato Adicional e a criação das
Assembleias provinciais. É nesse momento que há uma “federalização” do ensino de primeiras letras
no Brasil passando a educação.
Fontes
Para essa pesquisa usamos os jornais publicados no Brasil a partir de 1808, mas, principalmente
o Correio Brasiliense, fonte privilegiada para o entendimento da evolução da ideia de província.
A imprensa periódica, apesar de à época haver pouca originalidade e muita reprodução, é
demonstrativa da vulgarização e espalhamento de uma ideia. Ali vimos como os periodistas debatiam
e buscavam influenciar a opinião pública sobre uma ideia que tomavam partido. Assim, a nova ideia
de província – resultante das revoluções liberais – foi ganhando espaço e divulgação por meio da
imprensa periódica, fazendo e ganhando adeptos tornando-se uma causa.
Outra fonte consultada é a Constituição de Cádiz de 1812, fonte inspiradora de outras constituições
na América luso-espanhola, nos seus capítulos sobre a organização da província e da educação.
Usamos também suas interpretações à época buscando conhecer os debates em torno dessa ideia
na transição da capitania à província.
Metodologia
O referencial teórico no qual nos apoiamos são as teorias sobre o constitucionalismo ibérico
do professor Antônio Manoel Hespanha, quando nos propõe os problemas enfrentados pelos
Liberalismo na condução das construções institucionais da província e do estado-nação naquela
península – que vão influenciar fortemente o Brasil no seu nascimento enquanto Estado.
O referencial metodológico utilizado por nós é o de Reinhart Koselleck na pretensão de
entendermos a historicidade dos conceitos – província e educação – bem como o alinhamento da
linguagem em torno de um projeto de nação. Usamos, ainda, as metodologias e propostas contidas
no projeto Iberconceptos que “tiene como principal objetivo estudiar desde una perspectiva
comparada y transnacional algunos de los más importantes conceptos, lenguajes y metáforas
políticas que circularon en el mundo iberoamericano a lo largo de los últimos siglos”, conforme
consta de seu sítio.
Resultados
As influências das constituições francesas e, principalmente, da Constituição de Cádiz (1812)
trouxe à América uma nova sensação em termos de política e uma mudança radical na forma de
representação da velha Capitania – antes subjugada e tratada com manu militari -, objeto de conquista
e espoliação para a ideia de Província, resultado do encontro, da deliberação em assembleias.
No caso do brasileiro, a ideia chegou no início do século XIX, como consequência direta da
Revolução Liberal do Porto, em 1820. Porém a discussão seria anterior a essa data, na medida em
que as possessões espanholas na América colonial discutiriam e se organizariam como províncias
do Império espanhol. No processo de implantação no Brasil após a independência, a elite brasileira
asseguraria o antigo território da capitania colonial e suas relações locais de poder. Em troca
ofereceriam apoio a um governo centralizado e forte que, avaliavam, naquele momento se fazia
necessário. Com o Ato Adicional e a criação das Assembleias provinciais, a elite definiu claramente
o seu lugar no espectro político imperial. Indicaria ao imperador os possíveis nomes para exercer
o cargo de presidente da província, em geral ligado ao partido no poder, e ocupando as vice-
presidências por meio do processo eleitoral local reforçando assim o seu poder.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 474
Resultado desse arranjo, a educação como maior investimento do Estado imperial, foi delegada
à província. Foi retirado do município para centralizar na capital as decisões sobre a criação e
fechamento das aulas públicas, da contratação e demissão de professores e professoras, da
assistência aos estudantes como o fornecimento dos materiais necessários aos seus estudos. Isso
levou as províncias a criarem e recriarem ao longo do século XIX modelos pedagógicos. Em Minas
Gerais inicia-se com o Método Lancasteriano abandonado logo depois em todo o Império. O que vai
definir novo modelo é o olhar para fora, no caso a França com o seu modelo de educação republicano
e as experiências das Escolas normais. A Escola Normal de Ouro Preto, criada pela lei nº. 13/1835,
deveria atualizar os métodos de ensino olhando para as nações civilizadas.
Assim, o projeto de educação liberal no Brasil ainda não logrou o seu êxito na construção de
uma nação baseada nas ideias iluministas que orientaram o Liberalismo materializados na ideia e na
prática da Província como estrutura local.
Referências
As principais referências que usamos é o dicionário organizado por João Feres Júnior, Léxico
da História dos conceitos políticos do Brasil publicado em Belo Horizonte pela EdUFMG/Humanitas
em 2014 que ao dar continuidade às propostas teórico-metodológicas de Reinhart Koselleck,
juntamente com o sítio do Proyecto Iberconceptos, do qual o Léxico é adaptado; Reinhart Koselleck
aparece em nossas leituras, na busca das ferramentas necessárias para a apropriação dos conceitos
e de seus usos, com Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos, publicado no
Rio de Janeiro pela Contraponto-Ed. PUC-Rio em 2006; De Antônio Manuel Hespanha nossa leitura
se concentra em Pequenas repúblicas, grandes estados: problemas de organização política entre
Antigo Regime e Liberalismo publicado em Lisboa, POR pela Imprensa da Universidade de Coimbra
em 2005 busca entender essa passagem das monarquias ibéricas absolutistas ao estado liberal
constitucional, atentando para a indicação de que um dos principais problemas a ser resolvido
nessa passagem era o da Educação.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente trabalho tem como objetivo abordar as ações da congregação das Filhas de Sant’Ana
na educação para meninas desvalidas em Belém do Pará no período de 1925-1930. Sabemos que as
congregações religiosas tiveram importante papel na educação da infância desvalida e na formação
de meninas para a sociedade brasileira, especialmente por ser uma das primeiras congregações a
dispor de práticas de assistência, proteção e educação para as meninas pobres na capital do Pará. As
ações de abrigamento eram executadas com base no princípio da caridade e amparo aos desvalidos
da sorte, prática amplamente difundida pela Igreja que realizava esta tarefa a partir da parceria com
o Estado para manutenção de instituições de recolhimento que estavam sob os cuidados das
congregações religiosas. As atividades das congregações desenvolvidas junto às crianças têm
registros desde a época colonial com os Jesuítas. A prática catequizadora e educativa destas
congregações religiosas serviu de parâmetro para a formação educativa de crianças pobres, órfãs e
abandonadas. Nessa lógica de atendimento às meninas, as congregações religiosas dedicaram suas
ações no cuidar, instruir e educar das meninas pobres e órfãs, além de resguardá-las dos perigos que
a população feminina estava a passar no século XIX e XX. Assim, era comum o recolhimento de
mulheres por muito tempo nestas instituições ao ponto de muitas chegavam a optar por uma vida
religiosa de clausura. Estas instituições tinham a função de assistência e proteção às meninas órfãs,
no sentido de assegurar o lugar da mulher no do casamento e da dedicação ao lar e a família. Para
alcançar tal intenção, a educação ofertada às meninas nas instituições se concentrava no ensino das
prendas do lar como corte, costura, pintura, cozinha entre outras habilidades femininas que
geralmente eram ensinadas pelas freiras das congregações religiosas as quais eram as mais indicadas
para instruir as educandas na formação para o lar. Nesse sentido, o trabalho educativo das
congregações religiosas nos asilos, recolhimentos e colégios para meninas se consolidou no século
XIX quando o movimento imigratório destes grupos religiosos para o Brasil se acentuou, como
também possibilitou a chegada de novas congregações no país.O presente cenário propiciou à Igreja
católica cimentar sua posição no campo da educação dos segmentos mais desfavorecidos da
população brasileira, especificamente no que se refere à instrução da infância pobre a qual era tida
como mais propensa a se corromper pelos valores provindos da modernidade manifestados nos
anos finais do século XIX e eram observados com cautela pelos religiosos em virtude pois, também
tinham a função de instruir a população naquela nova conjuntura social sem perder de vista a
manutenção dos códigos tradicionais.Toda esta cautela em relação à preservação dos valores frente
a modernidade por parte das congregações era mais evidente na educação de meninas, pois elas
deveriam ser mulheres honradas e respeitadas. As instituições de recolhimento educativas femininas
sob a organização das congregações religiosas asseguravam uma educação adequada para formação
de mulheres preparadas para atender às exigências de uma sociedade paraense que desejava um
perfil feminino para atender à elite local.Nessa perspectiva, adentrando ao século XX, a premissa de
educação feminina se manteve sob a égide do papel da mulher em receber educação para constituir
a futura família, porém com o advento da República, foi acrescido ao ensino das educandas
internadas nas instituições educativas práticas educativas que enalteciam a pátria, entre as quais
destaca-se o respeito à Pátria e as festas cívicas.Diante do exposto, o Estado do Pará, particularmente
a capital paraense, não estava apartado de toda esta conjuntura, igualmente como no contexto
nacional, o Pará recebeu congregações religiosas as quais produziram no referido Estado uma
política de assistência e educação das crianças originada desde o século XIX e perdurou até o século
seguinte e, que se somaram aos trabalhos no âmbito educativo dos demais grupos religiosos
presentes por todo território nacional.Na realidade da capital paraense, foram criadas instituições
educativas dirigidas por várias congregações religiosas para educar meninas pobres, desvalidas,
como também meninas de famílias de melhores condições financeiras, as chamadas pensionistas. É
importante lembrar que esta congregação estendeu suas ações educativas para o século XX em
outras instituições que igualmente se ocuparam em atender às meninas da cidade de Belém. Dessa
maneira, o presente trabalho apresenta os primeiros resultados da investigação a respeito da
congregação das Filhas de Sant’Ana e suas atividades no campo da Educação do Pará nos séculos
XIX e XX. A referenciada pesquisa visa analisar a relevância do trabalho educativo da congregação
das Filhas de Sant’Ana na educação de meninas pobres e pensionistas nas instituições educativas na
capital paraense entre os anos de 1925 a 1930. Consoante ao que a história nos revela, as congregações
religiosas, particularmente as femininas, representaram importante papel no processo educativo de
meninas e na formação de mulheres para serem mães de família e respeitosas esposas. Nessa
direção, o objetivo deste estudo é apresentar o trabalho educativo das religiosas da congregação
das Filhas de Sant’Ana desenvolvido junto as meninas pobres e pensionistas educadas nas
instituições educativas dentro de uma lógica formativa feminina praticada em todo o Brasil no
período investigado que,intencionava educá-las nas conhecidas habilidades femininas como
costura, bordado, pintura entre outras que constituíram as educandas em futuras mães de família
que ao mesmo tempo valorizavam a pátria. Nesse sentido, o referido estudo tem como objetivos
específicos: (1) apresentar a gênese e os princípios educativos da congregação; (2) evidenciar a obra
educativa para meninas da população da cidade de Belém as quais eram organizadas dentro das
instituições de acordo com sua condição social: meninas pobres e pensionistas. A escolha do período
histórico da investigação (1925 a 1930) se deve em razão da representatividade deste período para a
História da Educação e para a história da Igreja Católica no Brasil. A primeira justificativa deve-se ao
fato de que nas duas últimas décadas da primeira República, a educação feminina começou a se
modificar proporcionando as alunas formação profissional, especificamente o magistério, o qual era
destacado pelo ideário da época como uma função essencialmente feminina, haja vista que a
educação era entendida como um ato de cuidado e zelo pelo outro, sendo que tal característica era
atribuída à mulher que desde o século XIX era vista como a guardiã do lar e educadora dos filhos
sendo responsável pelo cultivo dos valores morais e religiosos; a segunda justificativa refere-se à
questão de que no período deste estudo a Igreja católica vivenciou o que a história denomina como
processo de reconstrução do catolicismo no Brasil o qual ocorreu entre a década de 1920 e 1930.
Esse processo de restauração permitiu à Igreja reconquistar seu espaço no âmbito do Estado,
sobretudo no que diz respeito às atividades na esfera da educação possibilitando o aumento do
quantitativo de congregações religiosas presentes no ensino primário, secundário e nas
universidades. Assim, metodologicamente esta pesquisa se caracteriza como documental e as fontes
que constituem o “corpus” deste estudos e tratam do jornal católico A Palavra que veiculava notícias
a respeito das instituições educativas dirigidas por congregações religiosas, entre as quais está a
congregação investigada, desse modo esta pesquisa se ocupou em analisar um conjunto de notícias
veiculadas por este mesmo jornal no período de 1925 e 1930. Além desta fonte também utilizamos o
relatório de atividades do ano de 1930 do Instituto Gentil Bittencourt; também utilizamos as
mensagens dos governadores do Estado durante o período investigado os quais davam ciência ao
poder legislativo da situação das instituições educativas no Estado. Os referenciais teóricos que
fundamentam a análise documental são: Azzi (1977); Rizzini e Rizzini (2004); Almeida (2014); Leonardi
(2016) entre outros. Os resultados revelaram que esta congregação teve considerável importância
na educação das meninas da cidade de Belém, suas ações educativas contribuíram para a
manutenção da formação feminina em voga no período investigado evidenciando ainda o papel da
mulher e ao mesmo tempo procurando promover práticas de valorização da pátria.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 477
Referências
ALMEIDA, Jane Soares de. Mulheres na Educação: missão, vocação e destino? In: SAVIANI, D. et al. O
Legado Educacional do século XX no Brasil. 3ª Ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2014.
AZZI, Riolando. O início da Restauração Católica no Brasil: 1920-1930. Síntese, Belo Horizonte (MG),
v. IV, n. 10, 1977.
RIZZINI, Irene; RIZZINI, Irma. A institucionalização de crianças no Brasil, percurso histórico e desafios
do presente. Rio de Janeiro: Ed. PUC, 2004.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Palavras-chave: Arquivo histórico escolar. Levantamento. Escola Estadual João dos Santos.
Pesquisas realizadas no ramo da História da Educação carecem de fontes, mas, na maioria das
vezes o pesquisador se depara com dificuldades para encontra-las, o que gera um trabalho custoso
e muito minucioso. Assim, uma investigação dentro de uma instituição escolar fornece para o
pesquisador a possibilidade de encontrar peças fundamentais para a construção de novas pesquisas.
Desse modo, a presente pesquisa tem o objetivo de identificar e catalogar o arquivo histórico
escolar da Escola Estadual João dos Santos que foi inaugurada em 1908, descrevendo e analisando
os documentos que possui, sua localização e suas condições de preservação e de guarda. Para isso,
a metodologia escolhida se desenvolve por meio dos seguintes eixos: 1) levantamento da produção
bibliográfica sobre arquivos escolares, seus usos e processo de preservação, conteúdo que ainda é
muito carente no ramo acadêmico já que só foi possível achar quatro estudos referentes à temática;
2) busca e catalogação dos arquivos e sua documentação na Escola Estadual João dos Santos, que
ocorreu por intermédio de uma etiqueta tendo código (número do documento), nome do autor que
o escreveu e a data de cada documento manuseado, levando em consideração, portanto, o que
Felgueiras (2005) comenta que “inventariar é o primeiro e decisivo passo para se conhecer, divulgar
e estudar esse patrimônio” (FELGUEIRAS, 2005, p. 101); 3) identificação do contexto de produção da
documentação existente, registrando suas especificidades, autoria e objetivos; 4) criação de banco
de dados e lançamento das informações coletadas na pesquisa, tal banco de dados tinha as seguintes
abas: código, tipo de documento, data, autor, número de páginas, condições de preservação,
palavras-chave, local de guarda e observações relevantes, e 5) disponibilização dos dados para a
consulta pública, por meio de publicações, principalmente, de pesquisadores que tenham interesse
na história da educação da cidade de São João del-Rei.
Este trabalho se justifica tanto pela inexistência de informações sobre a documentação histórica
educacional da cidade, quanto pela importância de manter a preservação da memória escolar em
diferentes tempos históricos. Fatos como descartes de documentos ou falta de local específico para
guarda-los, precariedade das acomodações escolares, grande número de documentos burocráticos
que a escola produz decorrente da demanda do Sistema Escolar, demasiada exigência que funcionários
e gestores escolares estão sujeitos, a falta de parcerias para a conservação dos documentos, ilustram
as más condições de preservação e guarda dos documentos de um arquivo histórico que é a atual
realidade brasileira. Outro quesito importante a ser considerado é a possibilidade de apagamento
da memória escolar da Escola Estadual João dos Santos se os documentos não sejam revelados,
registrados e conservados, uma vez que há carência de políticas públicas para essa condição.
Essa pesquisa é de caráter quantitativa, já que como discursa Zanella (2011) é por meio de uma
pesquisa quantitativa que há a possibilidade de medir e quantificar resultados de determinada
investigação, assim, levando em consideração o levantamento e o banco de dados foram possíveis
fazer o recorte da pesquisa que é algo de suma importância. No caso dessa pesquisa a relação de
tempo foi tão larga (1897-2003), porque se sucedeu a partir da observação do documento mais
antigo (um livro) e do documento mais recente (uma ata) a ser levantado e catalogado.
A escola que é feita a pesquisa foi fundada pelo Dr. João Baptista dos Santos, o qual tinha o título
de Visconde de Ibituruna por causa de suas bem feitorias realizadas em São João del-Rei e região,
na casa número 8 da Prainha e tinha como desejo perpetuar o nome do seu falecido pai que era um
português e se chamava João dos Santos, no dia 20 de abril de 1881. Com a morte do Visconde de
Ibituruna, a escola se fecha, e assim, em 26 de julho de 1908, é instalado na cidade, o Grupo Escolar
de São João del-Rei, situado à rua da Prata, atual Pe. José Maria Xavier, nº15 . No ano de 1918, a
escola se transfere para seu prédio próprio, na Av. Eduardo Magalhães, onde funciona até hoje.
Nessa mesma época, foi proposta a mudança do nome da escola e após consulta popular, venceu o
nome do Dr. João Batista dos Santos, o Visconde de Ibituruna, em virtude de ter sido ele, o precursor
na fundação e manutenção de um estabelecimento de ensino na cidade, passando a ser chamado
por “Grupo Escolar João dos Santos” e posteriormente, “Escola Estadual João dos Santos”.
Durante a pesquisa aconteceu um fato muito marcante: a interdição de algumas salas da
referida escola, pelo Corpo de Bombeiros, decorrente de trincas nas paredes e vazamentos em
calhas, Houve, portanto, um remanejamento de salas o que sucedeu no deslocamento de uma
parte dos documentos que estavam na Sala Arquivo para uma sala interditada, confirmando assim,
o que todo material bibliográfico sobre a temática traz: ainda há um descaso muito grande com
os documentos antigos que são armazenados nas escolas que pode ser ocasionada pela falta de
informação sobre a importância desses documentos para a construção do caráter educativo da
cidade e do país.
Na instituição de ensino, local da pesquisa, foi possível mapear, em primeira análise, três locais
de guarda de arquivos: A Secretaria Escolar que acomodava a maioria das atas manipuladas; a
Sala de Direção que dispunha de livros, a Sala Arquivo que hospedava algumas atas de promoção,
diários de classes, pastas de alunos e de professores, livros de frequência diária, livros de inventário,
comunicados da Secretaria Escolar, livros, dentre outros. Posteriormente, com a interdição de
salas, como já foi mencionado, ocasionou no quarto local de guarda, que é a Sala Interditada que
acondicionava livros de literatura que outrora se encontrava na Sala Arquivo.
Com este cenário, e com o auxílio de EPI’s (Equipamentos de Proteção Individual) como, por
exemplo, luvas, óculos e máscara, foi possível manusear com destreza, cada documento encontrado,
observando cada dado necessário para a alimentação do banco de dados e para o preenchimento
da etiqueta que seria colada na parte inferior e direita de cada arquivo.
Os resultados apontam para, pelo menos, nove tipos de documentos encontrados no arquivo
histórico escolar da Escola Estadual João dos Santos, nos seus 285 documentos catalogados, são eles:
(1) Registro de Frequência Diária o que pode facilitar ao criar uma trajetória dos alunos matriculados
na escola em determinado período de tempo; (2) Livro de Ocorrências que ajuda a entender as
mudanças que os atores da Educação passaram; (3) Registro de Atividades de Professores que
relatam as atividades fora de sala de aula que as professoras propuseram para as crianças; (4) Livros
que eram usados para pesquisas dos conteúdos ministrados em sala de aula ou para leitura ou uso
propriamente dito em sala de aula; (5) Controle de Merenda/Relatório Semana da Alimentação/Caixa
Escolar que possibilita assimilar como essas práticas eram adotadas pela escola para as crianças
menos favorecidas; (6) Livro de Inventário oportuniza a compreensão dos materiais, mobiliários e
afins que eram utilizados pela escola; (7) Comunicados da Secretaria Escolar que geram indagações
sobre a postura do Sistema Escolar perante algumas situações; (8) Atas que promovem o registro
fiel do que aconteceu em reuniões o que propicia a um olhar detalhado para esses momentos e (9)
Folhas de Pagamentos que contempla uma parte burocrática da gestão escolar.
Enfim, é notório que as escolas possuem instalações precárias para a guarda de seu arquivo
histórico escolar, bem como possuem carência de parcerias para a conservação desses documentos
e de políticas públicas que viabilizem tal conservação, o que pode acarretar ao apagamento dessa
história escolar, causando lacunas na História da Educação da cidade, do estado e, consequentemente,
do país. O referencial teórico adotado parte do diálogo com autores como VENDRAMETRO, MORAES,
ZAIA (2005) e MOGARRO (2005) que dizem que o arquivo histórico ajuda na construção da memória
escolar e da identidade histórica da escola. São com eles que se tem conhecimento e compreensão
da cultura material escolar revelando, consequentemente, as práticas que aconteciam e as relações
entre os atores da Educação em tal instituição e em determinada época.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 480
Referências
FELGUEIRAS, M. L. Materialidade da cultura escolar. A importância da museologia na conservação/
comunicação da herança educativa. Pro-Posições. v.16, n.1,p.87-102, jan./abr. 2005.
MORAES, Silvia V.M.; ZAIA, Iomar B.; VENDRAMENTO, Maria C. Arquivos Escolares e pesquisa histórica:
fontes para o estudo da educação Brasileira. Pró Posições. v. 16, n. 1(46), jan/abr. 2005, p. 117-144.
Referências
FELGUEIRAS, Margarida Louro. Materialidade da cultura escolar. A importância da museologia na
conservação/comunicação da herança educativa. Pro-Posições, v. 16, n. 1, p. 87-102, jan./abr. 2005
MORAES, Sylvia V. M.; ZAIA, Iomar B.; VENDRAMETRO, Maria C. Arquivos Escolares e pesquisa histórica:
fontes para o estudo da educação brasileira. Pró-Posições. V. 16, n. 1 (46), jan./abr. 2005, p. 117- 144.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este trabalho é parte do projeto que investiga como as instituições fundadas ao longo dos 60
anos da Colônia Pinhal – São Miguel Arcanjo/SP contribuiu para manter as tradições japonesas e ao
mesmo tempo para a integração dos seus membros na sociedade local. A Colônia Pinhal foi fundada
em 1962, período que Cardoso (1995) apresenta como o terceiro período da imigração japonesa para
o Brasil, tendo como característica a vinda dos imigrantes para se estabelecer no Brasil e não mais
para fazer fortuna e retornar para o Japão. As primeiras famílias que formaram a Colônia Pinhal,
vieram da Provincia de Funkui, com o apoio da JICA (Japan International Cooperation Agency) uma
instituição pertencente ao governo japonês que subsidiou a vinda dos imigrantes e comprou as
terras onde foi instalada a colônia. A Colônia Pinhal fica a 170 km de São Paulo, na zona rural de São
Miguel Arcanjo, entre as cidade de Pilar do Sul e São Miguel Arcanjo. De acordo com a Revista 50º
Aniversário Comemorativo da Colônia Pinhal, inicialmente chegaram três famílias, nós anos seguinte
em torno de 54 famílias. Um ano após a chegada das primeiras famílias, foi fundado a Associação
Japonesa. Associação Japonesa com apoio da Cooperativa Sul Brasil e da JICA (Japan International
Cooperation Agency), em maio de 1964, deu inicio das aulas da “Escola Brasileira” (primária), e em
outubro de mesmo ano inicio das atividades da Escola Japonesa. Segundo Demartine (1995), a
preocupação dos japoneses em educar seus filhos no Brasil foi influenciada por dois fatores:
primeiro, valorização da educação no começo do século XX no Japão na Era Meiji; segundo, o alto
grau de escolaridade dos nipônicos em relação a outras levas de imigrantes, sendo superados
apenas pelos alemães. Essa preocupação pode ser constatada entre os japoneses e seus descendentes
na Colônia Pinhal, por meio das iniciativa de organizar associações e escolas. Desta forma este
trabalho aborda as iniciativas de educação formal da Colônia Pinhal analisando o processo de
criação e funcionamento da Escola Mista da Colônia Pinhal, atual Escola Estadual Masanori Karazawa
, e a Escola de Língua Japonesa, inquerindo em que contexto socioeconômico as escolas foram
criadas, a função de cada escola quem eram seus professores, como eram suas práticas pedagógicas;
o papel da JICA na fundação e funcionamento das escolas, qual clientela as escolas atendiam no
período referente a 1964, ano da fundação de ambas as escolas , a 2002, ano que ocorreu o processo
de municipalização. A periodização 1964 a 2002, permite analisar o processo de implementação,
suas práticas, mudanças de edifícios, passagem para administração pública estadual da escola
primária, ampliação da escola japonesa para escola modelo e por fim o processo de ampliação da
escola oferecendo o segundo ciclo do ensino fundamental e a municipalização do primeiro ciclo.
Consideramos a análise documental de acordo com Le Goff (1900) que o documento não apenas
escrito, mas também ilustrado, transmitido pelo som, imagem ou de qualquer outra maneira, dando
um sentido mais amplo ao documento em uma perspectiva de análise que pensa em suas práticas
como produção social, rompendo com a idéia de prova isolada. Foram utilizados documento
escritos, iconográficos e orais. É importante enfatizar que os documentos da Escola Modelo de
Língua Japonesa da Colônia Pinhal estão escritos em japonês. Dentre as fontes utilizadas destacamos:
Livro de visita dos inspectores escolares; Livro de matrícula de alunos; Prontuários de alunos;
Escrituração da JICA; Discursos dos presidentes da JICA na entrega dos prédios das escolas; Discurso
do consu do Japão em visita a Colônia Pinhal, Livros didáticos; Coleção de correspondência escolar;
Resvista Escolar Cruzeiro do Sul; Planejamento escolar anual e semanal; Material didático, legislação,
Revista do 50º Aniversário Comemorativa da Colônia Pinhal, recortes de jornais, fotografias e
depoimentos de professores, funcionários, alunos e moradores locais. As fotografias foram utilizadas
como fontes e também foram entrelaçadas com as fontes orais. A maior dificuldade com os relatos
orais, assim como algumas fontes escritas foi que muitos moradores das Colônia Pinhal falam
português com muita dificuldade ou só falam japonês. Procuramos nortear os depoimentos dividido
nas seguintes partes: História da família - trajetória do Japão para o Brasil, trajetória no Brasil até
chegar a Pilar do Sul; Cotidiano na Colônia Pinhal - dificuldades, vantagens, rotina, convívio com os
antigos moradores de São Miguel Arcanjo; Escolas – práticas escolares, festas, atividades cívicas,
professores, interação com os demais alunos, regras disciplinares, brincadeiras e rotina escolar. A
análise evidenciou as escolas foram fundadas logo no inicio do processo de imigração com o apoio
da JICA(Japan International Cooperation Agency) com objetivo que moradores conseguisse manter
as tradições japonesas, perpetuando entre os seus descentes, mas ao mesmo tempo aprendessem
a língua Portuguesa, os costumes para poder viver no Brasil e para o crescimento socio-economico
da colônia. A JICA, além de comprar as terras onde é a Colônia Pinhal, subsidiou a vinda dos primeiros
imigrantes japoneses, a construção de estradas, do prédio do Kaikan, instalação de energia eletrica
e o prédio de ambas escolas. Inicialmente foi construído um prédio para atender as Escola Mista da
Colônia Pinhal e no período noturno era utilizado pela Escola Japonesa. No período pesquisado a
Escola primaria recebeu vários nomes: Escola Mista da Colônia Pinhal, Escola Emergêncial da Colônia
Pinhal, Escola Municipal Mista da Colônia Pinhal, Escola Estadual de Primeiro Grau da Colônia Pinhal
e Escola de Primeiro Grau Masanori Karazawa e por fim Escola Estadual Masanori Karazawa, esta
escola foi criada pela associação japonesa, juntamente com a JICA com apoio do municipio que
enviou a primeira professora a Lume Yamazoe, mas logo no primeiro ano de funcionamento ela foi
oficializada como escola municipal. Na primeira década de funcionamento 98% dos alunos atendidos
era japoneses e descendentes, esse número foi caindo chegado no final do período investigado
apenas 20% dos alunos eram japoneses ou descentes. Até o inicio da década de 90 do século XX
havia uma grande preocupação com o ensino da “lingua patria” oral e escrita, eram constantes as
orientações sobre o uso das cartilhas, pranchas, da importância do ditado, dos exercícios diário
envolvendo a linguagem oral e escrita considerando que a escola estava situado em um “núcleo de
imigrantes”, aos poucos essas orientações foram diminuindo e começou as orientações para
realização de projetos que resgatasse a origem do bairro, conhecimentos sobre o Japão com visitas
ao bairro da Liberdade e Museu do Imigrante. A Escola Japonesa iniciou suas atividades no mesmo
prédio da Escola primária, nos primeiros anos atendia principalmente jovens e adultos, ensinando a
língua escrita em japonês e em alguns momentos a língua portuguesa também. Seu principal papel
nos primeiros anos era manter os rituais, tradições e festas japonesasa professora Lume também
lecionava nesta escola. Com o aumento de crianças em idade escolar, ela também começa atender
no contra turno da escola primária em um prédio próprio. Em 1997, a Escola Japonesa da Colônia
Pinhal foi escolhida pela JICA para se tornar escola modelo da região sudoeste do interior do Estado
de São Paulo e passa ser denominada Escola Modelo de Língua Japonesa da Colônia Pinhal.
Tornando- se escola modelo a JICA construiu um novo prédio seguindo os padrões das escolas
primárias no Japão, subsidiou a vinda de professores do Japão. A escola recebe desde de então um
professor japonês, vindo do Japão, para morar e trabalhar por três anos, no fim deste período ele
retorna ao Japão e outro professor é enviado, a escola também possui outros professores locais. Seu
lema desde de 1997 é “Ser Forte, Corajoso e ter grandes idéias”, com objetivo de “educar os alunos
que conservem a tradição dos imigrantes japoneses através do estudo da língua japonesa,
desenvolver a compreensão das diferenças culturais, desenvolver o conhecimento e imaginação
fértil e ter o corpo e a alma forte e saudável” . Para atingir esses objetivos atende crianças a partir de
3 anos, com aulas diárias, de língua japonesa, origami, caligrafia, oratória e redação, desenho,
atividades físicas e música. Utiliza o material didático das escolas primária do Japão e do Centro
Brasileiro de Língua. Os rituais e festas foram considerados práticas fundamentais para atingir os
objetivos da escola. Rituais cotidianos de comportamento e os rituais festivos. Ambas as escolas
tiveram papel fundamental na permanência dos imigrantes japoneses no Brasil e no crescimento da
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 486
Colônia Pinhal, possibilitando a aprendizagem essencial para os recém chegados viverem em terras
brasileiras e aprendizagem das tradições do pais de origem dos antepassados das novas gerações da
Colônia Pinhal
Referências
CARDOSO, Ruth C. L. Estrutura familiar e mobilidade social: estudo dos japoneses no Estado de São
Paulo. São Paulo: Primus Comunicação, 1995.
DEMARTINI, Zeila de Brito. Relatos orais de famílias de imigrantes japoneses: elementos para a
história da educação brasileira. Educação & Sociedade, ano 21, nº 72, p.42, ago. 2000.
Na virada do século XX, a cidade de São Paulo passou por grandes transformações urbanas. O
crescimento demográfico e a intensificação do processo de industrialização podem ser
compreendidos como fatores importantes na constituição de São Paulo como metrópole. A
cidade crescia, migrantes e imigrantes chegavam em busca de oportunidades ou melhores
condições de vida. Esse crescimento também promoveu visível quadro de desigualdade social.
Um breve histórico desse atendimento frente às demandas nacionais revela que a necessidade
de se atender crianças pequenas em ambientes não familiares constituiu-se pela forte presença
da pobreza, da marginalidade social, da criança nascida de união considerada ilegítima ou da
situação da criança abandonada. No Brasil, a proteção inicial à criança desamparada foi realizada
pelo Estado e pela Igreja até aproximadamente metade do século XIX. A atuação de ambos
ocorreu no controle legal, jurídico e por meio dos apoios financeiros esporádicos. Com um
desempenho mais direto estava à sociedade civil, que “compadeceu-se e preocupou-se” com a
sorte da criança desvalida e sem família (MARCÍLIO, 1998, p. 132). A compreensão dessas
mudanças e suas implicações nas propostas das instituições de atendimento à criança de 0 a 6
anos na cidade de São Paulo, no período de 1935 a 1950 é o que justifica a escolha pelo tema
dessa pesquisa. Tem-se por objetivo compreender as razões que demandaram determinadas
propostas/decisões das autoridades públicas sobre a organização das instituições de atendimento,
por meio de revisão bibliográfica sobre o contexto histórico em que ocorreu esse serviço,
destacando os fatores nele intervenientes, especialmente no que se refere às propostas
elaboradas no município, compreendendo o período da criação do Parque Infantil em 1935 até as
primeiras creches ligadas ao poder público municipal, que datam da década de 1950, cuja origem
estava no estabelecimento dos primeiros convênios entre a Prefeitura Municipal de São Paulo e
entidades beneficentes. Como procedimentos metodológicos foram analisados documentos
legais e normativos, referentes ao período, disponibilizados no portal da Secretaria Municipal de
Educação da Prefeitura de São Paulo: Acervo da Memória Técnica Documental e no portal da
Fundação Carlos Chagas: Acervo da História da Educação e da Infância. Foram utilizados como
fontes os documentos históricos elaborados pelos órgãos administrativos vinculados às
instituições de atendimento à criança nesse período e o ordenamento legal de atendimento à
criança de zero a seis anos. Nesta pesquisa, utilizou-se para análise as categorias: creches,
currículo, cuidar e educar, que foram emergindo ao longo da pesquisa, na medida em que as
fontes eram levantadas, coletadas e selecionadas. Os resultados parciais da pesquisa indicam a
organização de instituições de diferentes estruturas e formas de manutenção, que podem ser
discutidas quanto às condições para o desenvolvimento infantil que defendem. Espera-se assim
, contribuir com um estudo que vise aperfeiçoar a ação da creche como instituição onde as
crianças, vivem, convivem, exploram e crescem, adquirindo assim elementos para participar da
vida em uma sociedade complexa. Essa análise possibilitou o esclarecimento das consequências
para a qualidade das instituições, no sentido de verificar quais foram as ações da Prefeitura do
Município de São Paulo para não cumprir o princípio legal de incorporar as creches ao sistema
educacional, intensificando o lançamento dos chamados programas alternativos de atendimento.
As formas alternativas de atendimento deram-se por meio do aluguel de imóveis, auxílio
financeiro a entidades sociais para construção dos equipamentos, fornecimento de materiais
para construção para entidades sociais, mutirão, cessão, em comodato, de área municipal, bem
como investigar as propostas de atendimento das crianças das camadas populares e como esse
atendimento foi concebido, investigando se ao se propor a criação de instituições destinadas as
camadas populares com menos recursos, pensou-se em uma educação pobre para os pobres.
Isto significa compreender em qual sentido as propostas e programas de atendimento a criança,
fizeram uso do termo Assistencialismo. Assim, caberá a análise de como o termo assistencialismo
foi concebido nas propostas e programas, se com o sentido de favor, contrapondo-se a direito,
colocando aquele que é assistido em posição de dependência e débito em relação ao que assiste
ou com o sentido de direito. Para Kuhlmann Jr. (2015) as concepções vigentes de educação, fazem
pensar que existe uma concepção superior de atendimento das crianças pequenas, afastam da
reflexão de que essas instituições “carregam em suas estruturas a destinação a uma parcela
social, a pobreza, que já representa uma concepção educacional” (p. 166). Kuhlmann Jr. (2000, p.
8), observa que “embora as creches e pré-escolas para os pobres tenham ficado alocadas à parte
dos órgãos educacionais, as suas inter-relações se impuseram”. Surgem para as crianças pobres,
filhas de mães de boa conduta, que trabalham fora e recebem até dois salários mínimos, as
creches, casulos, berçários em empresas privadas, o prezinho, escolas maternais, creches
domiciliares, creches comunitárias entre outras denominações, as quais não eram geridas
diretamente pelo Estado, que teria por função repassar recursos para as entidades. Essa análise
demonstra a organização de instituições de diferentes estruturas e formas de manutenção em
seu trabalho junto às crianças, ou seja, diferentes propostas de atendimento traçadas quanto às
crianças atendidas: pobres e filhos dos operários atendidos de acordo com a emergência de suas
necessidades e filhos da elite social, atendimento nas instituições com ênfase pedagógica, por
exemplo, no Jardim da Infância Caetano de Campos, anexo à Escola Normal do Estado consolidou-
se na cidade de São Paulo, sobretudo para garantir o modelo ideal ao cultivo da infância paulista.
Essa análise demonstra a organização de instituições de diferentes estruturas e formas de
manutenção em seu trabalho junto às crianças, ou seja, diferentes propostas de atendimento
traçadas quanto às crianças atendidas: pobres e filhos dos operários atendidos de acordo com a
emergência de suas necessidades e filhos da elite social, atendimento nas instituições com ênfase
pedagógica, por exemplo, no Jardim da Infância Caetano de Campos, anexo à Escola Normal do
Estado consolidou-se na cidade de São Paulo, sobretudo para garantir o modelo ideal ao cultivo
da infância paulista. Essa análise demonstra a organização de instituições de diferentes estruturas
e formas de manutenção em seu trabalho junto às crianças, ou seja, diferentes propostas de
atendimento traçadas quanto às crianças atendidas: pobres e filhos dos operários atendidos de
acordo com a emergência de suas necessidades e filhos da elite social, atendimento nas
instituições com ênfase pedagógica, por exemplo, no Jardim da Infância Caetano de Campos,
anexo à Escola Normal do Estado consolidou-se na cidade de São Paulo, sobretudo para garantir
o modelo ideal ao cultivo da infância paulista. Essa análise demonstra a organização de
instituições de diferentes estruturas e formas de manutenção em seu trabalho junto às crianças,
ou seja, diferentes propostas de atendimento traçadas quanto às crianças atendidas: pobres e
filhos dos operários atendidos de acordo com a emergência de suas necessidades e filhos da elite
social, atendimento nas instituições com ênfase pedagógica, por exemplo, no Jardim da Infância
Caetano de Campos, anexo à Escola Normal do Estado consolidou-se na cidade de São Paulo,
sobretudo para garantir o modelo ideal ao cultivo da infância paulista. Essa análise demonstra a
organização de instituições de diferentes estruturas e formas de manutenção em seu trabalho
junto às crianças, ou seja, diferentes propostas de atendimento traçadas quanto às crianças
atendidas: pobres e filhos dos operários atendidos de acordo com a emergência de suas
necessidades e filhos da elite social, atendimento nas instituições com ênfase pedagógica, por
exemplo, no Jardim da Infância Caetano de Campos, anexo à Escola Normal do Estado consolidou-
se na cidade de São Paulo, sobretudo para garantir o modelo ideal ao cultivo da infância paulista.
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Referências
MARCÍLIO, M. L. História Social da Criança Abandonada. São Paulo, SP: Hucitec, 1998.
KUHLMANN JR., M. Histórias da educação infantil brasileira. Revista Brasileira de Educação. Fundação
Carlos Chagas, São Paulo, n. 14, p. 5-19, mai/ago 2000.
__________________. Infância e Educação infantil uma abordagem histórica. 7.ª ed. Porto Alegre:
Editora Mediação, 2015. 192 p.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Introdução
Ao estudarmos os primeiros currículos voltados para a atividade de policiamento implementados
no Brasil, foram encontrados diversos sinais de que a ideia de Polícia Militar no Brasil surgiu na cidade
do Rio de Janeiro, no período republicano, a partir da transformação do Corpo Militar de Polícia
da Corte em polícia militarizada e, posteriormente, em Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF),
consagrando as características de uma corporação policial subordinação ao Exército. Um processo
que implicou a criação de um curso próprio para a formação de oficiais da PMDF com currículos
voltados para a atividade de policiamento, o que marcaria a criação de uma escola militarizada para
a formação de dirigentes de uma organização policial.
A temática do ensino militar passa a ser relevante no âmbito luso-brasileiro a partir do ano de 2011,
quando foi publicado o livro Militares e educação em Portugal e no Brasil (ALVES e NEPOMUCENO,
2011). Essa obra é o resultado de um esforço investigativo que envolveu pesquisadores brasileiros e
portugueses como Claudia Alves, Maria Nepomuceno de Araújo, Joaquim Pintassilgo, Márcio Couto
Henrique, Amarilio Ferreira Neto, Omar Schneider, Beatriz Rietmann da Costa e Cunha, Manuela
Teodoro, Maria Teresa Santos Cunha e Laura Nogueira Oliveira. Nessa coletânea, encontramos
trabalhos que enfocam a atuação dos militares na educação, tanto civil quanto militar, nos séculos
XIX e XX. Os textos trabalham com questões relativas à cultura escolar, à profissão docente, às
instituições escolares e aos projetos políticos de escolarização, tanto no Brasil quanto em Portugal.
Uma das ferramentas utilizadas nesses trabalhos foi a de analisar a atuação dos militares como
professores, dirigentes, difusores de projetos e modelos educativos, em suma, como intelectuais da
educação.
Tema
Trabalhando dentro do eixo temático relacionado com o estudo das Instituições Educativas,
o presente trabalho tem por tema o estudo sobre o processo de transformação da antiga Divisão
Militar da Guarda Real de Polícia, fundada em 1809, em PMDF, força reserva e auxiliar do Exército, no
ano de 1920, por meio da criação de uma escola específica de formação de oficiais, independente
das escolas de formação de oficiais do Exército Brasileiro: o curso p
Objetivos
O objetivo geral da pesquisa proposta é o de avançar nos estudos na área de História da Educação,
em especial, na história das instituições escolares, com ênfase no processo de reformulação de
currículos e história das disciplinas escolares, avaliando as imbricações com outras linhas de
pesquisa.
A pesquisa objetivará, ainda, demonstrar as relações entre a história da educação e a história das
instituições militares e policiais, comprovando, dessa forma, a tese de que diversos pressupostos
teóricos e metodológicos da História da Educação podem ser aplicados à análise histórica das
instituições militares e policiais.
Âmbito cronológico
Quanto ao recorte temporal, recorro às ponderações de Braudel (1965) para poder utilizar da
longue durée. Por tratar-se de um estudo que versa sobre a análise histórica de currículos, o que pode
ser enquadrado dentro do “imenso domínio cultural” (BRAUDEL, 1965, p. 269), foi necessária certa
busca das origens dos currículos e seus criadores. Por isso, o recorte temporal engloba a fundação
da Divisão Militar da Guarda Real de Polícia da Corte do Rio de Janeiro, em 1809, e a promulgação do
regulamento de 1920 que criou o curso profissionalizante da PMDF.
Metodologia
Usando a teoria elaborada por Thompson (1981), o estudo proposto considera a história com um
processo, que deve ser comprovado pelos indícios empíricos, ou seja, pelas fontes. Além disso, nesse
processo, os sujeitos históricos agem segundo suas intenções, influenciados por fatores contextuais,
como os de ordem econômica e social, mas também segundo suas orientações ideológicas e
pessoais. Embasados por esse referencial, os procedimentos metodológicos de investigação e
análise propostos utilizarão a ideia de que os conceitos e as evidências devem “conversar” entre si,
por meio de comparações que busquem comprovar a aplicabilidade de determinado conceito em
determinado quadro empírico.
Os documentos foram analisados utilizando-se da contextualização; da análise dos critérios e dos
vieses; do cruzamento de fontes; da comparação das informações; da aproximação de documentos;
do estabelecimento de constâncias, da identificação de mudanças e permanências. O principal
referencial para este tipo de análise foi o de Bacellar (2011), o qual definiu que
Para a análise da evolução histórica das disciplinas relacionadas com a atividade policial nos
currículos recorremos à teoria da história das disciplinas escolares proposta por Chervel (1990). Tal
apreciação parte da ideia de que as disciplinas escolares têm objetivos próprios, independentes
dos objetivos acadêmicos. Não foram encontradas comprovações de que as disciplinas ligadas
às atividades policiais possam ter sido desenvolvidas em algum tipo de instituição superior de
pesquisa. Pelo contrário, há indicações que tais conhecimentos são fruto de um embate político,
por isso constarem de regulamentos, mas também da prática cotidiana da atividade policial e da
disseminação desses conhecimentos de outras instituições, inclusive de outros países, como no
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 492
caso das instruções das caixas de aviso e do uso de apitos, cujas origens remontam a polícia de
Londres do século XIX.
Fontes
A principal fonte de dados foram os regulamentos da PMDF, entre 1809 e 1920. Foi dado destaque
aos regulamentos das primeiras décadas do século XX, e como essas normas serviram de base para as
propostas de criação de um corpo de conhecimentos policiais no Brasil. Para tanto, foram analisadas
fontes como os alvarás régios, cartas de lei e decretos do século XIX, que disciplinam as organizações
policiais da Corte; e decretos e leis que regulavam o funcionamento da polícia do Distrito Federal
no início do século XX. Também foram averiguados jornais como O Brazil Militar; os relatórios dos
ministros da Justiça e da Guerra; obras memorialistas do período, itinerários de militares envolvidos
com a criação da PMDF; entre outras.
Conclusões
Ao estudamos um pouco da história da PMDF verificamos que uma das primeiras características
dessa instituição foi a de que ela sempre esteve relacionada com a atividade de policiamento, talvez
até pelo caráter mais urbano da cidade do Rio de Janeiro do século XIX. Por outro lado, também
sempre teve certa ligação com o Exército. No que tange à história das disciplinas relacionadas com a
atividade policial, devemos ressaltar que o regulamento de 1858 do Corpo Policial da Corte já previa
que o chefe de Polícia deveria organizar as instruções policiais da corporação. Nos regulamentos
seguintes, percebemos a gradativa ampliação da instrução policial, passando pelo regulamento de
1889 com as prescrições para o serviço de ronda, a criação da Escola de Recrutas em 1893, o uso de
apitos em 1901, instruções sobre o uso de caixas de aviso em 1905, a criação da Escola Policial em
1911, e o regulamento da PMDF de 1920 que criou o curso profissionalizante na PMDF.
Referências
ALVES, C.; NEPOMUCENO, M. A. (orgs.). Militares e educação em Portugal e no Brasil. Rio de Janeiro:
Quartet, 2011.
BACELLAR, C. Uso e mau uso dos arquivos. In: PINSKY, C. B. Fontes históricas. 3ª. ed. São Paulo:
Contexto, 2011. p. 23-80.
BRAUDEL, F. História e Ciências Sociais: a longa duração. Revista de História, São Paulo, v. 30, n. 62, p.
261-294, jun. 1965. ISSN 2316-9141. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/revhistoria/article/
view/123422/119736>. Acesso em: 17 nov. 2019.
CHERVEL, A. História das disciplinas escolares: Reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria &
Educação, n. 2, p. 177-229, 1990.
AS PRÁTICAS CÍVICO-PATRIÓTICAS NA
ESCOLA BRASILEIRA: HISTÓRIA E MEMÓRIA
DO GYMNÁSIO MINEIRO DE UBERLÂNDIA,
EM MINAS GERAIS, BRASIL (1930-1950)
(ABE) que foi fundada no início da década de 1920 orbitava um conjunto de intelectuais brasileiros
que ficariam conhecidos como pioneiros da educação nova, entre os quais Anísio Teixeira, Lourenço
Filho e Fernando de Azevedo, sendo que eles buscavam influenciar a ação do Estado, o que fizeram,
destacadamente, em 1932, por meio da divulgação do importante “Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova”. Todavia, os intelectuais católicos não silenciaram e buscaram manter a relevância
da Igreja junto à sociedade brasileira, o que fizeram por meio de um movimento conhecido como
reação católica que ganhou forma, não somente, por meio da estruturação de revistas tais como “A
Ordem”, de 1921, e de centros de formação tais como o “Centro Dom Vital”, de 1922, mas também,
na manutenção de instituições escolares. No que se refere às instituições escolares destacam-se as
escolas normais, nas quais se formavam as futuras professoras primárias, com ampla atuação em
escolas confessionais, estatais e da sociedade civil. A partir da década de 1940, os católicos passaram
também a criar e manter instituições universitárias em importantes cidades brasileiras, focadas na
oferta de cursos que formassem professores para o ensino ginasial e secundário. Nessa direção,
durante a primeira metade do Século XX, no Estado brasileiro de Minas Gerais, em especial na região
do Triângulo Mineiro, da qual a cidade de Uberlândia faz parte, existiam instituições escolares que
eram mantidas por diferentes instâncias promotoras do ensino: confissões religiosas, sociedade
civil e Estado. Estas instituições escolares colocavam em ação uma série de práticas que evocam o
civismo e o patriotismo valorizando a dimensão laica do Estado mas, comumente, também
participavam ativamente de manifestações de cunho religioso, em especial católico, aproximando-
se dos arranjos institucionais próprios da articulação do poder entre o Estado e a Igreja no Brasil.
Deste modo, é perceptível a movimentação da Igreja Católica nesta região de Minas Geais, por meio
da manutenção de paroquias e de colégios. Algumas congregações religiosas instaladas na região
mantinham os últimos e, em muitos casos, também escolas normais. No que diz respeito as cidades
de Uberaba e Uberlândia destaca-se ainda o movimento da Igreja Católica a fim do provimento do
ensino superior, sobretudo, por meio de cursos destinados à formação de professores, como
estratégia preventiva em relação a propagação de ideias liberais e comunistas. Em termos de
resultados, percebeu-se que no Brasil, o período compreendido entre as décadas de 1930 e de 1950
foi marcado pela centralização da vida social no Estado, o que levou a existência do nomeado Estado
Novo, entre 1937 e 1945. Todavia, este papel predominante do Estado não se fez sem a colaboração
de importantes instituições sociais, entre as quais a Igreja Católica, o que pode ser visto, a título de
exemplo, na introdução do ensino religioso nas escolas públicas estatais, inicialmente, em Minas
Gerais e depois em todo território nacional. Esta aliança parece evidenciar a predominância de um
liberalismo mais preocupado com a manutenção da ordem social do que com a garantia de direitos
individuais, bem como de um progresso conduzido pelo Estado do que pela iniciativa particular no
âmbito da sociedade. A liberdade de ensino assegurou a existência de diversas instâncias que
promoveram o ensino na época, sociedade civil, Igreja e Estado, todavia, obedientes às decisões
sobre o que ensinar e que valores disseminar oriundos das determinações estatais. Este conjunto de
fatores permite compreender a forma como a ampliação das possibilidades de escolarização
estiveram envolvidas com os processos de urbanização e de modernização das cidades e do país,
unindo ideais cívicos, patrióticos e católicos. O esforço da Igreja Católica em manter Escolas Normais
e de criar Faculdades relacionadas à formação de professores evidencia uma estratégia que foi
exitosa de manutenção nas escolas públicas estatais de formação inicial do viés ideológico católico.
Deste modo, é compreensível que nas comemorações cívico-patrióticas realizadas entre as décadas
de 1930 e de 1950, em especial, na mais importante delas que é o Sete de Setembro, data em que se
comemora a Independência do Brasil, os alunos das escolas públicas estatais tenham colaborado de
modo reiterado com as alunas das escolas católicas da cidade, o que se fez nos ensaios e nos
momentos dos desfiles cívico-patrióticos pelas ruas da cidade. As evidências encontradas nesta
pesquisa deixam claro que as escolas da cidade de Uberlândia comportavam de modo reiterado e
consistente uma dimensão formativa de caráter cívico e patriótico, em colaboração com o catolicismo,
para além das funções de aquisição de conhecimentos e de preparação para o trabalho. De fato, na
memória dos sujeitos que habitavam a instituição escolar no período coberto pela investigação, os
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 495
Referências fundamentais
BENCOSTTA, M.L.A. Desfiles patrióticos: memória e cultura cívica dos grupos escolares de Curitiba
(1903-1971). In: VIDAL, D.G. (Org.). Grupos Escolares: cultura escolar primária e escolarização na
infância no Brasil (1893-1971). Campinas/SP: Mercado das Letras. 2006.
CANDIDO, R.M. Culturas da Escola: as festas nas escolas públicas paulistas (1889-1930).
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Referências
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XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 498
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SOUZA, Rosa Fátima de. Templos de civilização. A implantação da escola primária graduada no
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Campinas: Mercado das Letras, 2006.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A pesquisa teve como objetivo central refletir acerca das ações assistenciais e educativas prestadas
aos meninos e meninas pertencentes à infância pobre e abandonada na Primeira República. Sendo o
enfoque de nossas pesquisas, escolhemos para este trabalho identificar as semelhanças e diferenças
nas ações e nas trajetórias institucionais do Asilo de Santa Leopoldina, criado em 1854, na cidade
de Niterói e do Asilo Infantil de Nossa Senhora da Pompeia, criado em 1917, na cidade do Rio de
Janeiro, para atuarem na proteção à infância desvalida.
Os asilos eram administrados, respectivamente, pela Irmandade de São Vicente de Paulo, criada
em 1854 e sediada em Niterói, e o Patronato de Menores Abandonados, criado em 1907, e sediado
na cidade do Rio de Janeiro. No que tange aos cuidados e à educação dos asilados e das asiladas, os
dois asilos firmaram contratos com congregações religiosas que administravam o governo interno
dos asilos. No caso do Asilo de Santa Leopoldina, instituição que abrigava somente meninas, o
contrato foi firmado com as irmãs Filhas de Caridade de São Vicente de Paulo. O Asilo Infantil de
Nossa Senhora da Pompeia, no entanto, abrigava crianças de ambos os sexos e era gerido pelas
irmãs de Sant’Ana.
O Patronato de Menores Abandonados foi criado em 1906, porém sua inauguração oficial, com
seus estatutos aprovados, realizou-se no dia 05 de julho de 1908. Destinado a acolher e formar para
o trabalho menores pobres e abandonados, o Patronato de Menores Abandonados nasceu como
parte de uma ação concebida por filantropos. Instituição privada, sobrevivia de doações, eventos
beneficentes e subvenções do Estado. Em relação ao Asilo Infantil de Nossa Senhora de Pompéia, foi
criado em 29 de junho de 1917 e ficava localizado à Rua Zeferino, 169, no bairro do Méier, Rio de
Janeiro. Quando inaugurado seu diretor era o padre Nino Minella, presidente Romana Moniz Foster
Vidal e vice-presidente Custódia de Oliveira Marques. Tinha por objetivo educar menores do sexo
feminino, com idade de dois a oito anos, cujos pais estivessem cumprindo sentença
A Irmandade de São Vicente de Paulo foi criada em 1854 pela Presidência da Província do Rio
de Janeiro, foi constituída inicialmente por filantropos católicos da sociedade civil, integrada pela
elite do império, senadores imperiais, militares e empresários, como o Barão de Mauá. Recebia
subvenções do Governo Provincial, no entanto, a maior parte dos seus recursos provinha de doações
dos irmãos da instituição. O Asilo de Santa Leopoldina, também criado em 1854, tinha como
objetivo educar e abrigar a infância desvalida da província fluminense, possuiu uma longa trajetória
atendendo meninas órfãs e pobres de 1854 até meados da década de 1980.
Como recorte temporal definimos o período entre os anos de 1917 a 1927. A justificativa do
período se dá pela criação em 1917 do Asilo Infantil de Nossa Senhora da Pompeia e 1927 pela
publicação do Código de Menores, marco legal na proteção à infância.
De acordo com Camara (2014, p.75) “o Rio de Janeiro, no início do século XX, configurava-se como
cenário de transformações urbanísticas e sanitárias que se refletiam na formulação de propostas
públicas e privadas assentes no ideal de modernidade, de civilização e de progresso”.
Outra discussão neste período é a ideia de criar uma relação de brasilidade na sociedade brasileira
que já vinha sendo debatida desde a Abolição da Escravatura (1888) e da Proclamação da República
(1889) em que a intenção de construir um sentimento de pertencimento patriótico na população era
visto como algo urgente. Em meio às discussões do que seria o Brasil e o brasileiro, pensar a infância
como o futuro que ainda estava por vir e que poderia ser moldado de forma a se tornarem cidadãos
fiéis e úteis à pátria, eram uma das prioridades dos intelectuais envolvidos e preocupados com a
criança
Fica evidente, pelas reportagens do jornal O Fluminense, a preocupação com a infância que
perambulava pelas ruas da cidade. Uma infância maltrapilha, pedinte, abandonada e explorada que
não condizia em nada com a imagem do progresso que se esperava. A recém instalada república
trazia os mesmos problemas do império e era preciso resolvê-los para alcançar a modernidade que
se pretendia com o novo país, agora republicano.
Nesse sentido, as instituições asilares, os orfanatos e internatos eram uma alternativa para prestar
assistência, regenerar e salvar essa infância que estava em perigo, mas que se não fosse retirada das
ruas, poderia vir a se tornar perigosa para a sociedade. Assim, a preocupação não era somente com
a criança, mas com o perigo futuro que ela poderia representar se não fosse salva.
Em relação à metodologia, temos como referência o contexto social e político da Primeira
República. Neste sentido, buscamos identificar e analisar as regras, as práticas educativas, e
as concepções acerca da educação ofertadas nas instituições de controle à infância desvalida.
Analisando a trajetória institucional dos dois asilos, entendendo-os dentro da categoria analítica
de instituição total (GOFFMAN, 2015) e buscando identificar as estratégias institucionais e as táticas
dos sujeitos no confronto da rigidez institucional (CERTEAU, 2014, p.94) e a rede de sociabilidades
(SIRINELLI, 2003), que circundavam os dois asilos e possuíam poder decisório sobre a vida das
crianças em situação de clausura.
A pesquisa é de cunho histórico-documental e possui como fontes os relatórios administrativos,
os documentos de solicitação e/ou determinação de ingresso dos meninos e meninas, e as
reportagens sobre os eventos e rotinas pedagógicas publicadas nos periódicos que circulavam no
período sobre os dois asilos. Tendo em vista o exposto, através de perguntas às fontes, objetivou-se
analisar a trajetória das duas instituições dentro do contexto social e político em que a civilidade,
o progresso, a eugenia e o discurso médico-higienista se faziam presentes nas ações de controle da
infância desvalida.
Nos dois casos foram constituídas associações de damas de caridade que auxiliavam na
organização de eventos e outras estratégias de arrecadação de donativos a fim de financiar as ações
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 501
assistenciais: a Associação das Damas de Caridade de São Vicente de Paulo, no caso da Irmandade
de São Vicente de Paulo; e, a Associação Damas de Santa Cecília, vinculada ao Patronato de Menores
Abandonados.
As senhoras da alta sociedade fluminense estavam sempre presentes nos eventos, nas reuniões
e na maioria das atividades em prol das instituições assistenciais e faziam parte de uma rede de
sociabilidades onde, segundo afirma Camara (2017, p. 201), “caridade, filantropia e assistência
constituíam-se como faces de um discurso que, objetivando atenuar à situação de precariedade da
população pobre, assumiu força junto aos setores mais abastados da sociedade”.
Algumas delas, à exemplo de Adelina Lopes Vieira, que estava presente na reunião de inauguração
do Patronato de Menores Abandonados em 1907, também fazia parte da Associação das Damas de
Assistência à Infância. E Firmina Augusta de Castro Carreira, presidente da Associação das Damas da
Caridade de São Vicente de Paulo. Nessa direção, era comum o envolvimento da elite fluminense nas
atividades pela causa da infância pobre e abandonada.
Compondo uma malha assistencial criada no Rio de Janeiro, as duas instituições em tela tinham
o objetivo de prestar assistência e educação a criança pobre e desvalida através do trabalho, no caso
do Patronato, e da fé, no Asilo de Santa Leopoldina. Ambas buscavam garantir o enaltecimento da
pátria e a suposta integração dos indesejáveis à sociedade. Intervir na infância desvalida através do
trabalho e da fé era uma forma de caridade, salvação e engrandecimento do país.
Referências
CAMARA, Sônia. A arte de educar e prevenir crianças: as Conferências de Higiene Infantil do Instituto
de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro (1901-1907). In: Pesquisa(s) em História da
Educação e da Infância: conexões entre ciência e história. CAMARA, Sônia (ORG.) – Rio de Janeiro:
Quartet: Faperj, 2014.
CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. 22° ed. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René (Org.). Por uma História Política. Rio de
Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2003.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Esta proposta de comunicação analisa a trajetória do colégio particular Atheneu Alagoano para o
sexo feminino nos periódicos da província. A instituição foi fundada no dia 02 de julho de 1883 pela
professora e literata Maria Lucia de Almeida Romariz, tendo sido fechado provavelmente no ano
1877. A fundadora tinha projetos para a ascensão feminina, pois além do colégio, fundou revistas
específicas para o público feminino, seus escritos circularam até em Portugal. A intenção do Atheneu
era elevar o nível de instrução intelectual das mulheres, ao ponto de leva-las aos cursos superiores
do Império. Este é o diferencial deste colégio, pois buscava não somente o ensinar a ler, escrever e
contar, fato já contemplado mesmo que insatisfatoriamente, nas escolas de primeiras letras e nos
cursos normais do país, mas sim dar a possibilidade de mulheres serem aceitas nas faculdades do
Império. Além de matricular estudantes que podiam pagar por seus estudos, a instituição de Maria
Lúcia aceitava meninas desvalidas dando a elas instrução e a possibilidade de aprender prendas
domésticas para que tivessem com que se sustentar. Por esses motivos o estudo acerca dessa
instituição é relevante, pois trata de uma escola especializada em fornecer instrução primária e
secundária para as mulheres no final do império, uma vez que no país normalmente a elas era
ministrado o ensino primário e o normal, em escolas de primeiras letras específicas para o sexo
feminino ou em cursos normais anexos aos liceus. A abordagem teórico – metodológica é baseada
na análise das publicações nos periódicos, especialmente nos jornais O Orbe, Gutemberg e O Liberal.
Para Cézar Toledo e Riomar Skanlinski Junior os periódicos “[...] são uma rica fonte de informações
para pesquisas em História da Educação”. (TOLEDO; SKANLINSK JUNIOR, 2012, p.256). Para Tania
Luca (2006) são peças documentais importantes, pois não são, como se pensava anteriormente, um
conjunto de informações distorcidas ou um quadro parcial do cotidiano, mas sim uma fonte da qual
apreendemos traços da cultura da época. As pesquisas historiográficas em torno da educação
feminina surgiram a partir da década de 1970 através dos movimentos feministas. As mulheres se
perceberam como sujeitos históricos, passando a ser “[...] tanto objetos de estudo como
pesquisadoras”. (ALMEIDA, 1998, p.45). Jane Almeida (1998) afirma que os pressupostos teórico-
metodológicos para o estudo da educação feminina devem ser ancorados nas pesquisas pautadas
nos conceitos da Nova História, pois deve-se levar em conta as histórias de mulheres invisíveis, seu
cotidiano e, em certo ponto, sua resistência a uma sociedade masculinizada. Não é objetivo desta
comunicação tratar especificamente sobre questões do gênero, contudo é necessário que as
entendamos, porque Maria Lucia expressava um interesse de elevar o nível de formação escolar da
mulher; e também para compreendermos como era a educação delas no Império. Nesta época a
educação feminina passou a ter alguma visibilidade através da Lei de 15 de outubro de 1827, em que
no Art. 11 e 12 é disposto que fossem criadas escolas de primeiras letras para as meninas e que
contratassem mestras. Esta Lei impulsionou a criação das escolas de formação docente na Corte e
em outras províncias, inicialmente para formar professores do sexo masculino, porém a procura
dessa formação pelos homens era reduzida. Para Leonor Tanuri tal fato se deu por causa dos baixos
salários que os professores, formados pelos cursos normais, recebiam. Por isso optavam pelos
cursos secundários que lhes dava possibilidade de realizar os exames preparatórios e concorrer a
um curso superior. A partir de 1870 houve um aumento significativo das mulheres matriculadas nos
cursos normais em todas as províncias, ancoradas no conceito de que a educação infantil deveria ser
dada pelo público feminino, pois seria uma extensão da maternidade (TANURI 2000, p.66). Elas
desempenhavam o papel educacional de forma mais econômica, pois sem a formação adequada
não conseguiriam ser aprovadas nos concursos, tendo que ser contratadas com salários mais baixos
(BRASIL, 1831). De acordo com Blake (1882) a fundadora do Atheneu Alagoano Maria Lucia de Almeida
Romariz nasceu em Palmeiras dos Índios (AL), no dia 16 de abril de 1863. As informações acerca dos
seus estudos estão divergentes, tendo como possibilidade o ensino secundário do Liceu Provincial
Alagoano ou o curso normal anexo a esta instituição. Ela desejava estudar em uma das faculdades
do país, porém não conseguiu a aprovação para entrar no curso superior, fato que a deixou frustrada
com a educação que era ministrada sobretudo às mulheres. Era casada com o professor de francês e
poeta Antonio de Almeida Romariz, morto aos trinta e três anos, ficando Maria Lucia de apenas vinte
anos desprovida de sustento. Este acontecimento aliado à frustação com sua própria educação,
foram decisivos para a fundação do Atheneu Alagoano para o sexo feminino. Ela tinha um projeto de
formação para o feminino, que seguia do Atheneu, dois periódicos: A Revista Alagoana (1887) e o
Almanak Litterario Alagoano das Senhoras (1888) e depois como professora de português do Colégio
Sacramento já na República. Embora a fundação destas revistas tenham sido após o fechamento da
instituição, tal informação nos auxilia na compreensão da intelectualidade da fundadora e diretora
do Atheneu e quebra alguns paradigmas sobre a educação feminina no final do Império. Os jornais O
Orbe e Gutemberg diante da situação difícil de Maria Lucia, publicavam em suas páginas, os estatutos,
propagandas e elogios ao novo estabelecimento educacional e à fundadora. Nessas publicações os
jornais exaltaram o heroísmo e bravura de alguém que acabara de perder o esposo e mesmo diante
de todo sofrimento do luto tirou forças, para desempenhar tão importante papel. O Estatuto do
Atheneu Alagoano foi publicado na íntegra na primeira página do Jornal O Orbe no dia 01 de julho de
1883, através dele, conseguimos analisar a instituição e ter uma ideia do que propunha. Logo nos
primeiros artigos é visto a missão e o objetivo do colégio: ser uma instituição particular de educação
doméstica, social e instrução primária e secundária, para o sexo feminino. O objetivo era trazer o
aperfeiçoamento moral e intelectual da mulher alagoana, no intuito de eleva-la ao nível do progresso
do século. No Império, além do Atheneu Alagoano, temos notícias de outros três colégios particulares,
com disciplinas muito semelhantes ao ensino secundário, exclusivos para o sexo feminino, dos quais
provavelmente Maria Lucia tenha se inspirado para criar a sua instituição: Collegio Oito de Janeiro,
criado por Aristhea Maria de Araujo Jorge (SANTOSa, 2018, p. 121,122.); Collegio Nossa Senhora da
Conceição, criado por Afra Pereira Branco; e Collegio de Sant’Anna, dirigido por Anna Candida Cutrim
Moenda. (SANTOSb, 2016, p. 72,78). Não há informações que atestem se era ou não objetivo desses
colégios dar formação às mulheres para que ingressassem nos cursos superiores do Império, tal
como era no Atheneu. A instituição de Maria Lucia era composta por internato, externato e semi-
internato, neste local seriam ensinados as ciências, o gosto pelo estudo das Belas Artes e das prendas,
para auxilia-las a conquistar ascensão intelectual e profissional. A fundadora idealizou uma escola
que tivesse o mesmo tipo de ensino secundário que os homens tinham, para que as moças formadas
por sua instituição pudessem alcançar a formação superior. A instituição possuía matérias do curso
normal para quem pretendesse seguir carreira docente e o curso secundário para as interessadas
nos exames preparatórios das faculdades de medicina e direito do Império. O currículo era composto
no primário por todas as disciplinas do Curso Normal do Liceu Provincial acrescentando Música
Vocal, Piano e Dança; e no secundário por todas as disciplinas ministradas também no Liceu
Provincial Alagoano e no Atheneu Sergipense. A instituição de Maria Lucia fechou provavelmente em
1887, pois nos primeiros meses daquele ano ainda encontramos notícias no jornal O Orbe sobre o
Atheneu, referindo-se aos exames de dezembro de 1886. A data exata e as causas do fechamento não
foram localizadas. Recuperamos alguns nomes de estudantes que realizaram os exames da
instituição nos anos em que permaneceu aberto, dentre elas, Anna Alves Vieira Sampaio, irmã mais
nova da fundadora, que conseguiu ingressar na Faculdade de Direito do Recife em 1888, tendo se
formado em 1893. Ela foi a primeira mulher alagoana formada em um curso superior. Mesmo diante
do funcionamento efêmero desse colégio, ele foi relevante para a época, pois ofereceu um ensino de
qualidade para as mulheres, visando não somente uma profissão pautada no magistério feminino
das escolas de primeiras letras, mas na possibilidade de ascensão financeira em carreiras até então
ocupadas pelos homens.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 504
Referências
ALMEIDA, Jane. Mulher e Educação: Paixão pelo possível. São Paulo: Unesp, 1998
LUCA, Tania. História dos, nos e por meio dos periódicos. In. PINSKY, Carla. (org). Fontes Históricas.
2. Ed. São Paulo: Contexto, 2010.
TANURI, Maria. História da Formação de Professores. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro,
n. 14, p. 61-88, maio – agosto, 2000.
TOLEDO, Cézar; SKANLINSK JUNIOR, Oriomar. A Imprensa Periódica como fonte para a História da
Educação: Teoria e Método. Revista HISTEDBR, Campinas, n. 48. p. 255-268, dezembro, 2012.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este estudo é resultado de uma pesquisa que busca investigar o percurso histórico da
implantação e implementação da Escola Comunitária Casa Familiar Rural de Conceição do Araguaia
no Pará (CFR), como símbolo de resistência e defesa pelos direitos dos povos que vivem no e do
campo, no contexto político do estado liberal brasileiro. Os movimentos sociais do campo, têm
provocado muitos tensionamentos em torno da luta pela educação do campo, e nesta perspectiva,
a criação da CFR se soma a essa luta.
As CFR têm por objetivo dar oportunidades aos filhos dos agricultores a formação escolar,
agregando um currículo com conhecimentos científicos e práticos, contextualizados com as atividades
desenvolvidas no campo e mediados pela Pedagogia da Alternância. Muitos são os desafios para
implementar essa prática que propõe uma alternativa para além do modelo pedagógico das escolas
tradicionais como política pública de educação do campo, conquistada pelos movimentos sociais e
legitimadas por lei.
Com a metodologia, História Oral Temática e abordagem qualitativa, foram entrevistados 03 (três)
sujeitos envolvidos no processo de implantação e implementação da CFR, para apreender, por meio
das suas narrativas, os processos de continuidades e rupturas presentes desde a sua implantação,
em 2004, como também a trajetória de lutas para sua implementação até os dias atuais. Como aporte
teórico, dialoga-se com diversos autores entre os quais Barroso (2005), sobre liberalismo, Estado e
educação; Gimonet (2007), Estevam (2003), sobre educação do campo e Casas Familiares Rurais;
Alberti (2005), sobre História Oral Temática e outros. Consultou-se os marcos legais, como as LDB
4024/61, 5692/71, 9394/96, Parecer CEB/MEC 36/2001 e o Projeto Político Pedagógico da CFR (2009).
Desta forma, este estudo buscou “dar vozes” aos que foram protagonistas no processo de
implantação e implementação da CFR, observando que a escolha dos entrevistados, foram “guiadas
pelos objetivos da pesquisa”, conforme orientações de Alberti (2005), sendo que a mesma autora
assevera que os estes devem estar “entre àqueles que participaram, viveram, presenciaram ou
se inteiraram de ocorrências ou situações ligadas ao tema e que possam fornecer depoimentos
significativos” (ALBERTI, 2005, p. 31-32).
As entrevistas foram livremente concedidas às pesquisadoras, nas quais se obteve narrativas
dos sujeitos no que se refere à resistência e à “desistência”, sendo posteriormente, apresentadas
considerações acerca da temática em questão.
As CFR, no Brasil, seguem o modelo orientado pela experiência francesa da Maison Familiare
Rurale – MFR, ao mesmo tempo em que são escolas, oferecem também o espaço de moradia, onde
estudantes aprendem não apenas conteúdos voltados à formação científica e formal, mas também,
uma formação de caráter geral e profissional para a sua vida prática, contextualizados com as suas
necessidades como sujeito do campo (ESTEVAM, 2003).
O movimento da criação das CFR, que enfrenta desafios, uma vez que a experiência propõe a
alternativa de um modelo pedagógico distinto das escolas tradicionais, especialmente, em relação
ao currículo, ao tempo escola e tempo comunidade.
A alternância propõe “ uma outra maneira de aprender, de se formar, associando teoria e prática,
ação e reflexão, o empreender e o aprender dentro de um mesmo processo” (GIMONET, 2007, p.28).
O mesmo autor afirma ainda que mais do que uma escola do campo ou uma escola agrícola, este
tipo de escola visa “formar os agricultores e contribuir para o desenvolvimento do país. A primeira
CFR do Estado do Pará foi fundada no município de Medicilândia, com uma turma de 25 alunos.
Convém destacar que, o estado do Pará possui extensão territorial de 1.247.954,666 km², sendo
a segunda maior unidade federativa do Brasil. Nessa vasta extensão ocorrem com frequência
conflitos agrários, uma vez que o meio rural paraense é monopólio de grandes grupos capitalistas,
prevalecendo o latifúndio e o agronegócio em detrimento da agricultura familiar.
De acordo com os dados do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação do Campo da Amazônia
(GEPERUAZ), mais de 100 mil escolas foram fechadas no Brasil no período de 2000 a 2015. Somente
no estado do Pará foram 5.355 mil escolas do campo fechadas, sendo 4.411 escolas no campo e 944
unidades educacionais na cidade.
Esses dados refletem o encolhimento das políticas públicas para a população que vive no e do
campo, e que, a educação não é pensada pela lógica dos trabalhadores que vivem do trabalho da
terra, da agricultura familiar e da pesca.
A principal ideia é que o processo de fechamento das escolas não pode ser visto apenas como
uma questão educacional. Faz-se extremamente necessário ler este fenômeno do fechamento das
escolas do campo a partir da relação entre os elementos de sua tríade estruturante, ou seja: o campo,
a educação e a política pública (MOLINA, 2015, p. 386).
É neste cenário político que a CFR em Conceição do Araguaia/PA busca consolidar-se enquanto
instituição preocupada em ofertar uma educação diferenciada para a população que vive no e do
campo, pois uma escola que vai além da escolarização formal cumpre o seu papel social, norteada
por princípios apontados por Barroso (2005):
(...) que seja sábia para educar (permitindo a emancipação pelo saber), recta para integrar as
crianças e os jovens na vida social (por meio da partilha de uma cultura comum) e justa (participando
na função social de distribuição de competências (BARROSO, 2005, p. 745).
Em 2004, na localidade onde foi implantada a CFR de Conceição do Araguaia/PA possuia um
grande número de assentamentos de reforma agrária, antes existiam áreas de colonização. De modo
que, a população residente no local enfrenta vários problemas para permanecer na terra, entre as
quais as dificuldades de acessar serviços básicos como saúde, estradas, habitação e educação.
O processo de implantação da CFR em Conceição do Araguaia/PA foi marcada pelo envolvimento
de vários sujeitos e instituições, no entanto, muitas histórias e memórias foram registradas em
documentos, mas deixam suas marcas na vida e na memória daqueles que estão construindo
diariamente esta história e sempre que têm oportunidade de narrarem as suas memórias e reviverem
o passado, expressando a relevância da escola para a vida dos campesinos e a sua participação
consciente na consolidação desta experiência.
Conforme nos relatou a entrevistada Silva (2016), ex-diretora e atual coordenadora pedagógica
da CFR, a criação da Casa foi especial “porque surgiu a partir da necessidade que a gente tinha na
região, da gente lidar com a condição do jovem no campo e com a dificuldade de acesso à escola”.
Mediante os testemunhos dos sujeitos pesquisados e de consultas no Projeto Político Pedagógico
da CFR Ensino Médio (2009), constatou-se que o currículo trabalhado na escola, com ênfase em
agroecologia, tem influenciado positivamente nas novas formas de produção e na agricultura
familiar, ampliando a capacidade para outras culturas, envolvendo diretamente os conhecimentos
apreendidos na escola e a aumentando a capacidade de produção destes pequenos agricultores da
região.
Esta experiência dá sentido aos conceitos ensinados, a partir de situações de vida dos estudantes,
e se tornam situações de aprendizagem na qual a produção dos saberes é mais relevante do que o
recebimento das informações prontas.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 507
Para Gimonet (1999, p.4) “a experiência no mesmo tempo como suporte de formação, caixa de
saberes, funil educativo e como ponto de partida do processo de aprender”, refletindo para uma
educação para a autonomização e não para a alienação.
Conforme consta no projeto Político Pedagógico da CFR (2009) a dinâmica da Alternância é
que integra, estudante e família, no mesmo processo formativo, pois, esse modelo metodológico
propicia, por meio das vivências familiares, uma proposta educativa integrada com as experiências
vividas no ambiente escolar, inserindo a família como parte integrante do processo formativo do
estudante.
A formação voltada para a vida, humaniza o estudante sem ignorar a importância do
aprofundamento intelectual e dos saberes científicos trabalhados na CFR, levando-o a assumir o
papel de protagonista na construção do seu conhecimento, uma vez que:
As expectativas expressadas nos relatos obtidos por meio das entrevistas, embora oriundas de
sujeitos que tiveram diferentes atuações em relação à experiência de implantação da CFR, convergem
para o mesmo ponto, no sentido de que, a escola do campo precisa ser construída mediante olhar
dos sujeitos do campo, desde a concepção do papel social da escola até a concepção pedagógica,
não se limitando a espaços físicos, mas possibilitando uma escola para a vida onde o estudante
encontre na formação a possibilidade de sua emancipação social.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este trabalho se insere nas pesquisas sobre a história da formação de professores no Brasil e, mais
especificamente, na história da formação de professores de Mato Grosso do Sul. Nesta perspectiva, o
presente trabalho visa analisar a história do Curso de Magistério do Centro Específico de Formação
e Aperfeiçoamento do Magistério (CEFAM), buscando compreender o processo de instalação e
funcionamento desse Curso no município de Naviraí/MS, no período de 1994 a 2000. A delimitação
temporal está associada a dois momentos na história do curso de magistério e na política educacional
do período, o ano inicial de 1994, por marcar a criação desse Centro Específico de Formação e
Aperfeiçoamento do Magistério junto à Escola Estadual de Pré-Escolar, 1 º e 2 º Graus Juracy Alves
Cardoso, em Naviraí/MS. Embora a Resolução de Autorização de funcionamento do Curso de 2 º Grau
– Lei 7.044/82, no CEFAM – Juracy Alves Cardoso tenha ocorrido somente por meio da Resolução
da Secretaria de Estado de Educação (SED), n. 11.70 de 11 de março de 1997. Assim, no período de
criação e autorização de funcionamento do CEFAM, em Naviraí, a legislação vigente era a Lei 7044/82
que constituiu uma emenda da Reforma de Lei 5.692/71, mas que não afetou a Habilitação ao
Magistério. Já o ano de 2000 por corresponder ao período de fechamento desse Centro de formação
de professores no município, devido à Deliberação do Conselho Estadual de Educação/Mato Grosso
do Sul (CEE/MS) n. 5803, de 09 de junho de 2000. Certamente, este fechamento do CEFAM, no ano
de 2000 esteve relacionado à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96, que entrou
em vigor a partir de 1997 e determinou que a formação de professores da Educação Infantil e das
séries iniciais do Ensino Fundamental fosse realizada em nível superior. As fontes que embasam
essa pesquisa são constituídas por atas, diários, pastas, listas de matrículas, decretos, resoluções,
fotografias, jornais, documento síntese da avaliação dos CEFAMs, cadernos, trabalhos escolares,
avaliações. Essas fontes foram coletadas no Arquivo da Escola Juracy Alves Cardoso, na Secretaria
Estadual da Educação de Mato Grosso do Sul e nos arquivos pessoais de antigos professores e de
ex-alunos do CEFAM de Naviraí. Além dessas fontes, foi necessário recorrer às fontes orais, por meio
de entrevistas com antigos professores e ex-alunos do CEFAM. Essas entrevistas foram realizadas
por meio de um roteiro de questões semiestruturadas, que foi elaborado de acordo com os objetivos
desta pesquisa. As entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas para análise e uso
na pesquisa. Todos os entrevistados assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE), concedendo os direitos de utilizar os dados das entrevistas na pesquisa. Essas entrevistas
possibilitaram por meio das memórias dos antigos professores e ex-alunos do CEFAM, levantar
dados sobre a instalação dessa instituição no município de Naviraí, bem como conhecer aspectos
importantes que marcaram o funcionamento desse Centro de formação de professores. Conforme
registra Le Goff (1996), a memória como propriedade de conservar certas informações, remete-
nos a um conjunto de funções psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar impressões ou
informações passadas, ou que ele representa como passadas. Essas fontes foram analisadas à luz
dos pressupostos da Nova História Cultural, com base em autores como Chartier (1990), Burke
(2005). Além disso, foi necessário recorrer aos trabalhos ligados à história de Mato Grosso do Sul,
história da educação, história da formação de professores, ao currículo, entre outras. Os resultados
apontaram que, em Mato Grosso do Sul, os CEFAMs teve início apenas a partir do ano de 1987, devido
a um movimento de consolidação e expansão desses Centros pelo Brasil. Desse modo, é importante
compreender que esses Centros em Mato Grosso do Sul não fizeram parte dos primeiros instalados
em nosso país, ainda no início da década de 1980, conforme assinala Tanuri (2000). O Projeto CEFAM
teve seu início no ano de 1989, em Mato Grosso do Sul, na Escola Estadual de Primeiro e Segundo
Graus Joaquim Murtinho, na capital Campo Grande, por meio da Deliberação nº 1.774 de 10/12/1987.
A aprovação do primeiro CEFAM de Mato Grosso do Sul foi mediante a Deliberação CEE/MS Nº 2. 233,
de 07 de julho de 1989. Contudo, a instalação de novos CEFAMs, em Mato Grosso do Sul, ocorreu
somente nos anos de 1990, com a implantação desses Centros nos municípios de Aquidauana,
Corumbá, Coxim, Jardim, Naviraí, Paranaíba, Ponta Porã e Três Lagoas. No caso do município de
Naviraí, a instalação do CEFAM ocorreu em 1992, entretanto a autorização de funcionamento
somente aconteceu no ano de 1997. Mesmo assim, as suas atividades iniciaram em 1994, com
a transição do Curso de Magistério da Escola Estadual de Pré-Escolar, 1º e 2º Graus Juracy Alves
Cardoso para esse Centro de formação. Essa transição também promoveu mudanças no horário de
funcionamento do Curso de Magistério, que com o CEFAM passou a ser ofertado em período diurno,
pois até 1993, com a Habilitação Específica para o Magistério de 1º Grau, esse Curso funcionava
apenas no período noturno. Desse modo, o Curso de Magistério do CEFAM de Naviraí funcionava em
período diurno, atendendo alunos provenientes de diferentes classes sociais, sobretudo, originária
do ensino público de 1 º grau, com aula no período vespertino com duração de quatro anos, no
entanto, em dois dias da semana, os alunos tinham aula em período integral. O interesse do CEFAM
era formar professores atuantes desde a pré-escola até a 4 ª série do 1 º grau. Neste sentido, era
importante garantir não só as aulas teóricas, mas também que os estágios fossem realizados com
muita responsabilidade, integrando a prática com a formação teórica que os professores recebiam
no Curso de Magistério do CEFAM. Desse modo, os alunos durante as aulas recebiam orientações
de estudo com o intuito de permitir uma reflexão acerca da sua atuação tanto no estágio como no
curso. Assim, os alunos poderiam relacionar a teoria das disciplinas com a prática, inclusive quando
as escolas de Naviraí precisavam de professores substitutos, os diretores chamavam os alunos do
CEFAM, apesar de não ser uma atividade remunerada, isso contava como horas complementares.
Entretanto, esse projeto de formação a nível médio que a Lei 5.692/71 admitiu, foi por algum tempo
a base de formação de muitos profissionais da educação, exercendo suas funções de formação de
professores que se habilitarão para atuar na Pré-Escola e nas quatro primeiras séries do 1º grau.
Contudo, esse programa de formação de professores foi perdendo sua força e sendo substituído
pelo sistema educacional, que agora formaria os seus professores em cursos de graduação com
Licenciatura Plena, conforme registram Siquelli e Alves (2016). Em Naviraí, o CEFAM foi desativado,
mais precisamente, no ano de 2000, conforme já mencionado anteriormente, devido à implantação
da LDB 9.394/96. Embora o CEFAM tenha tido um rápido funcionamento, foi possível constatar que
esse Centro deixou marcas importantes na história da formação dos professores deste município,
e também na história da formação de professores de Mato Grosso do Sul, uma vez que, conseguiu
formar professores do município de Naviraí e da região, por meio de uma formação que visava
articular a parte teórica dos conteúdos com a parte prática, proporcionando a eles uma formação
em período integral, a fim de oferecer condições para que o aluno ampliasse gradativamente seu
conhecimento, diferenciando assim, essa formação docente dos outros cursos de Magistério.
Referências
BURKE, Peter. O que é história cultural? Rio de Janeiro: Zahar, 2005.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil. Lisboa: Difel, 1990.
SIQUELLI, Sonia Aparecida.; ALVES Mirian Aparecida Beltrão. CEFAM Paulista: Contribuições da
Historiografia e Fontes Históricas na Formação de Professores. Argumentos Pró-Educação, Pouso
Alegre, v. 1, nº 2, p. 273 – 297, mai. - ago., 2016, p. 273-297
TANURI, Leonor Maria. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, São
Paulo, n. 14, p. 61-88, maio/ago. 2000.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Analisar a criação da escola étnica Deutsche Schule (1862) pela Sociedade Alemã de Beneficência
(Deutscher Hilfsverein) a partir dos esforços da Igreja Alemã para instruir os filhos de migrantes de
língua germânica radicados na sede política do Império brasileiro é o objetivo deste artigo. A pesquisa
parte pressuposto que a identidade étnica é construída na crença subjetiva de uma origem comum
em uma situação pluriétnica específica (POUTIGNAT & STREIFF-FENART,1998) e que o estudo da
etnicidade pressupõe avaliar as atuações das diferentes formas de expressá-la. A historiografia tem
aprofundado o estudo sobre a etnicidade da migração alemã ao Brasil com ênfase nos estados do
sul e seus núcleos de colonização. No entanto, a História da etnicidade dos germânicos que vieram
para a cidade do Rio de Janeiro, sede do poder imperial, tem sido uma lacuna a ser preenchida. Lenz
(2002, 2003) e Seyferth (2000) ao estudarem a migração alemã para a cidade concluíram que, desde
1808, com o translado da Corte portuguesa para o Brasil o número de migrantes germânicos na sede
política imperial aumentou. Não eram apenas os germânicos abastados que desejavam vir para a
sede da Corte que o porto do Rio de Janeiro recebia. Ali chegavam, também, os trabalhadores das
indústrias germânicas instaladas no Rio de Janeiro e também, aqueles esperançosos por um pedaço
de terra cultivável no espaço territorial brasileiro ou os que, pobres e ingênuos, tinham sido logrados
por especuladores europeus que os fizeram ali aportar. Estes migrantes eram oriundos de vários
Estados nacionais que, naquele momento ainda se ligavam em união aduaneira. Foram eles que
promoveram sua etnicidade na sede imperial brasileira através da língua, dos costumes e da religião
comum, de confessionalidades diferentes, forjando uma ascendência comum já que não havia, até
1870, uma nação que os caracterizasse em uma identidade coletiva. Neste sentido, a etnicidade
desta “comunidade imaginada” (ANDERSON, 2008) de hanseatas, suíços, austríacos, alemães e
tantos outros povos constantes do Deutscher Bund, sempre esteve centrada no interior da
representação cultural produzindo sentidos na cultura “germânica” simbólica que os unia. Estes
homens migrantes cujas necessidades foram atendidas na cidade do Rio de Janeiro, apenas, e tão
somente, por seus patrícios, fossem eles homens comuns, homens de negócio, profissionais liberais
ou diplomatas, eram oriundos de espaços geográfico diferentes, mas todos de língua germânica.
Muitos deles aqui chegaram com necessidades de recursos que lhes prouvesse a subsistência, a
educação para os filhos que traziam e teriam na nova terra e, também, de oportunidades para exercer
sua religiosidade protestante. Os germânicos no Rio de Janeiro viviam sua etnicidade de modo bem
diferente daqueles imigrantes que foram para o sul, como Koseritz, daí seu espanto e certa
insatisfação com o que observava em sua visita à Corte. Na sede do poder imperial estes imigrantes
mantiveram seu pertencimento à terra natal, preservando o idioma nacional, a religião e sua cultura
através da reunião em associações (vereine). É da iniciativa destes homens, em busca de raízes da
terra natal, representantes da etnicidade germânica em solo carioca, e de sua representação cultural,
que nasce a Escola Alemã. A forma como este grupo se agrega na cidade do Rio de Janeiro reflete,
culturalmente, a região natal de que provinham, marcando as associações (vereines) que aqui
reproduzem. Destas associações surgiu esta escola alemã para os migrantes pobres de língua
germânica, que buscava, através das tradições comuns, preservar a etnicidade, no novo espaço
geográfico que ocupava. A História desta instituição educativa germânica foi um dos reflexos visíveis,
mas esquecidos, de uma cidade que, no século XIX, crescia numérica e estruturalmente com a
chegada de muitos não nacionais embalada na modernidade europeia e permeada pela exclusão e
segmentação de origem e religião de seus habitantes, à cultura local. Ali, onde se estabeleciam, os
germânicos comungavam relações de interdependência, complementaridade e simbiose com as
diferentes etnicidades e com a cultura local. O Rio de Janeiro que recebia o migrante germânico, e
muitos outros de nacionalidades diferenciadas (portugueses, italianos, espanhóis, sírios, libaneses,
armênios, etc.), desde a abertura dos portos, ampliava o mercado consumidor dos produtos
europeus na terra carioca, ao mesmo tempo em que diferenciava os não nacionais dos habitantes
locais pela língua, costumes, tradições e religião.. A terra carioca passa a ser, pela interação inevitável
de etnias, uma Babel tropical habitada por aqueles que fugiam das guerras religiosas e das mudanças
econômicas europeias e outros que tinham economias e tinham medo de aplicá-las onde nasceram.
Desse modo, em solo desconhecido, o migrante germânico pobre, e também o abastado, buscavam
seus iguais em etnicidade para sobreviver e trabalhar, apesar da dificuldade do entendimento da
língua local, do novo habitat estrangeiro. Os migrantes germânicos que vieram para o Rio de Janeiro
mantiveram seu pertencimento à terra natal preservando o idioma nacional, a religião e a cultura
através da reunião em associações recreativas, como a Sociedade Germania (Gesellschaft Germania)
e religiosas, como a Igreja Alemã (Deutsche Kirche). Deste modo estabeleceram uma organização
social própria validada por signos culturais diferenciados. (POUTIGNAT & STREIFF-FENART, 1998). As
associações refletiam a moderna cultura alemã, desde o século anterior, e previam um agrupamento
livre, de caráter voluntário e onde a posição social era, de certo modo, irrelevante. Ainda que estas
agremiações germânicas buscassem atender às necessidades espirituais e pecuniárias mais urgentes
dos novos migrantes que achegavam pelo uso da mesma língua, havia a necessidade, também, de
prover a educação das muitas crianças que traziam, ou aqui eram concebidas, mantendo a etnicidade
do grupo. De início a Igreja Alemã intercedeu para obter vagas em escolas particulares para algumas
das crianças, mas os esforços empreendidos não tinham como atingir a precisão de todos. Por outro
lado, raríssimas eram as escolas particulares de alemães para atender todos, e as públicas, instaladas
em casas-escolas em sua maioria, não tinham como atender satisfatoriamente àqueles que não
falassem português, o que era, exatamente, o caso destes pequenos migrantes. Em 1843, a Igreja
Alemã do Rio de Janeiro se uniu à Igreja Evangélica Prussiana (IEP) que, daí pra a frente passa a
dirigi-la e mantê-la, seja enviando pastores, seja financeiramente, pagando um professor para
ministrar aulas na escola da Igreja, para germânicos do sexo masculino. Em 1861, a Sociedade de
Beneficência propôs, em Assembleia Geral realizada em 18 de agosto do mesmo ano, criar uma
escola laica, a Deutsche Schule (Escola Alemã). Por 72 votos a favor, e alguns contra, dos membros da
Sociedade de Beneficência Alemã, a escola foi criada. Importante ressaltar que a escola que criavam
naquele momento não visava atender aos associados, que usavam em sua maior parte, a educação
doméstica, com professores contratados, mas àqueles que, por falta de recursos, não podiam
usufruir de escolas elementares. A Escola Alemã, designada nos documentos “Escola da Sociedade
de Beneficência Alemã”, nasce do interesse da Igreja Alemã de promover a educação dos jovens
imigrantes germânicos pobres que, por não conhecerem a língua portuguesa, não tinham como
matricularem-se nas casas-escolas existentes na cidade, a partir dos esforços hercúleos mas
insuficientes da Igreja Alemão. A escola elementar para ambos os sexos, estabelecida pela Sociedade
de Beneficência Alemã, começa a funcionar em um prédio alugado, bem próximo à Igreja Alemã, à
Rua dos Inválidos, em 1º de setembro de 1862. Tinha matriculados na instituição os 32 alunos que
vieram da escola da Igreja. Em 1863, a Inspetoria Geral de Instrução Primária do Município da Corte,
chefiada pelo Inspetor Geral Eusébio de Queirós Coutinho Matoso da Câmara, por Aviso de 7 de
novembro de 1862, habilitou Frederico José de Hangen (Fredrich von Hagen), natural da Prússia,
nascido em 12 de fevereiro de 1827, autoriza a escola e o aceita, “para dirigir a Escola Elementar
estabelecida pela Sociedade de Beneficência Alemã, considerando as matérias constantes do
respectivo, exceto canto, desenho e ginástica”. Contava, além do Diretor, com duas professoras, a
Sra. Doefler e sua filha que assumiram a regência das três séries do Ensino Primário. No ano seguinte
a instituição passa a contar, em seu quadro funcional, com o pastor Carl Wagner, que assume a
disciplina de Religião. Com o aumento do número de alunos matriculados, há necessidade de mais
espaço para as atividades educacionais, e a escola muda seu endereço para a Rua do Arcos nº 21,
ainda em prédio alugado, após a tentativa frustrada de auxílio financeiro por parte da Igreja Alemã,
já dirigida, então, por Berlim e não mais pela Prússia. A pesquisa identifica a etnicidade germânica
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 513
no Rio de Janeiro como consequência dos processos identitários que permitiram a criação da
Deutsche Schule., amparada nos estudos de Barth (1966), Bobbio (1992), Hall (1997) e Poutignat-
Streif-Fenard (1998), dentre outros teóricos e toma por fontes relatos de memorialistas alemães
(SCHLICHTHORST, 2000 e KOSERITZ, 1980); relatórios do Ministro de Império do período pesquisado
e documentos do acervo institucional do Colégio Cruzeiro, antes da 1ª Guerra designado Deutsche
Schule.
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arquétipo de universidade, mas sim, buscar evitar a reprodução dos modelos tradicionais. A
Universidade de Brasília (UnB), criada por Darcy Ribeiro, foi concebida a partir da ideia original de
Anísio Teixeira, quando esboçou a UDF em 1935. Nesse sentido, foi concebida como um projeto
nacional, levando em conta valores característicos da cultura brasileira. Essa é a Universidade
necessária de Darcy Ribeiro. O conceito nasceu do desejo de asseverar ao país um caminho seguro
em busca de sua autonomia. A instituição nasceu para enfrentar e criar soluções para os problemas
nacionais através da formação cidadã dos estudantes, da capacitação de profissionais especialistas
e para contribuir cultural e academicamente para a construção da nova capital. A concepção da
universidade manteve-se muito distante da estrutura da tradicional universidade brasileira, e foi
construída assentando-se nas áreas de saber e pelos diferentes campos de conhecimento. As
sociedades são formadas por instituições que, em contrapartida, a formam e a fazem existir da forma
específica pela qual o fazem; assim, as sociedades são como sistemas de sentido, dos quais, em
muitos contextos, como o nosso, a universidade é parte essencialmente integrante. Mas, instituição
socialmente construída, a universidade pública não é apenas a criação de um período histórico, mas
apresenta-se como permanente recriação, em cada contexto específico, dos sentidos que
inicialmente a fizeram ser. Conquanto a concepção de Universidade seja fruto de seu tempo, e assim
deva ser compreendida - como um conceito histórico - constata-se que cada um desses pensadores
refletiu e contribuiu para a compreensão que hoje se encerra sobre o seu conceito. A Universidade,
que atualmente se apresenta no Brasil, aproxima-se daquela propugnada por Ortega Y Gasset, em
sua preocupação em atender à sociedade na formação de quadros profissionais e de Humboldt
quando focaliza a pesquisa científica. No campo da formação profissional, especificamente em se
tratando de formação para o magistério, a preparação de professores na Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro (UFRRJ) é ainda muito embrionária. Os primeiros cursos de Licenciatura da UFRRJ
nasceram em 1963 da necessidade de atender a um público relacionado ao mundo rural, que buscava
alternativas para a profissionalização de algumas atividades do campo. A Licenciatura em Ciências
Agrícolas e a Economia Doméstica vieram cumprir tal objetivo. As duas licenciaturas nasceram de
um quadro social que em nada favorecia a presença feminina nas instituições de ensino superior. O
curso da Economia Doméstica buscava a formação de jovens de sexo feminino para atuarem no
ambiente doméstico das propriedades rurais, acompanhando a atuação do agrônomo e do
veterinário, no campo do trabalho rural, em outras palavras, demarcando o papel da mulher na
sociedade rural da época. Logo, os cursos de Licenciatura em Ciências Agrícolas e Economia
Doméstica complementavam a vocação rural assumida pela instituição, e foram criados quando a
universidade ainda se encontrava subordinada ao Ministério da Agricultura. As primeiras licenciaturas
criadas estavam voltadas para formação de professores, sobretudo, no ensino médio. Esse era o
caso dos cursos de Química e Biologia, cuja formação atendia, preferencialmente ao ensino médio.
E, sobre as licenciaturas de Economia Doméstica e de Licenciatura em Ciências Agrícolas, tais cursos
se restringiam, sobretudo, às escolas técnicas cujo quantitativo ainda era muito reduzido no território
fluminense, e, especialmente na região em que se localiza a universidade, praticamente inexistiam.
A criação da maioria dos cursos de licenciaturas para atuar no ensino fundamental e na educação
infantil é muito recente. As últimas licenciaturas foram criadas pelo Programa de Reestruturação das
Universidades Federais quando nasceram vinte oito cursos de graduação, com predominância para
os cursos das áreas de Humanas e de Saúde. Por fim, o estudo insere-se no campo da História da
Educação, mais especificamente na temática das Instituições Educativas. Trata-se de uma pesquisa
qualitativa e descritiva, pois objetiva analisar o sentido da universidade no Brasil, em especial, a
Universidade Rural, e as características de criação dos cursos de licenciatura da UFRRJ, estabelecendo
relações com a história da instituição além de cotejar com os projetos de universidade que foram
conjecturados ao longo da constituição da nação. Para atingir tal propósito, foram utilizados como
procedimentos técnicos a pesquisa bibliográfica, elaborada a partir de livros, artigos e periódicos,
pesquisa documental, concentrada na leitura de documentos oficiais, como Atas do Conselho
Universitário e do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão e o exame de outras fontes primárias
como processos, atas de reuniões departamentais e ofícios, além dos dispositivos legais estruturantes
das universidades no Brasil. O período focalizado na investigação abrange desde as primeiras
licenciaturas surgidas nos primeiros anos da década de 1960, até a política mais recente que criou o
REUNI, no atual milênio, durante o governo Lula.
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Referências Bibliográficas:
CHARLE, C., VERGER, J. História das Universidades. SP: UNESP, 1996.
NOSELLA, Paolo & BUFFA, Ester. Instituições Escolares- por que e como pesquisar. Campinas: Ed.
Alínea, 2009.
ORTEGA Y GASSET. Missão da Universidade In: SANCHÉZ, Juan Escámez. Ortega Y Gasset. Recife:
Fundação Joaquim Nabuco/Ed. Massangana, 2010.
Este texto incide sobre um tema menos esclarecido na História da Educação em Portugal – o
estatuto educacional da freguesia no contexto da oferta escolar. É um estudo de micro-história,
porventura mesmo de “pequena história”, mas que se torna representativo de um ciclo histórico, de
universalização escolar em Portugal, no final do século XIX. Busca-se uma “história a partir da base”
e que pelos aspectos envolvidos e pelas repercussões se torna significativo. A freguesia constituía,
no período delimitado, a instância geográfica, administrativa e social de alfabetização escolar. O
funcionamento de uma unidade escolar e muito particularmente a construção de um edifício de
raiz constituíam fator de identidade local. Mas o plano escolar e o poder de decisão e representação
junto das autoridades regionais e das autoridades centrais, era prerrogativa do município. Cabia,
no entanto, às juntas de freguesia, para o enfrentamento de suas demandas referentes às unidades
escolares, a oferta do terreno e contribuir para a edificação e manutenção da escola. Neste processo,
foi determinante a congregação de apoios locais e apoios estatais, nos planos financeiro e logístico
para a consecução da oferta da escola e, ainda assim, à custa de muito esforço e determinação
por parte dos poderes paroquiais. É deste processo que o caso aqui abordado dá nota a título de
exemplo.
O trabalho fundamenta-se em documentos coligidos no Arquivo Municipal de Ovar e na Junta de
Freguesia de São Vicente de Pereira, como livros de atas, correspondências, fotografias e imprensa
(CÂMARA; JUNTA). Procurou recuperar o processo de construção do prédio de uma escola para o sexo
masculino, iniciado em 1888, como resultado do esforço do “brasileiro” (imigrante português que
enriqueceu no Brasil e retornou para sua terra natal) João Rodrigues de Oliveira Santos, abastado
industrial daquela Freguesia que, para esse fim, consegue doação do terreno e substancial quantia,
de seus próprios recursos e de outros que angariou com amigos portugueses que viviam no território
brasileiro. A oferta foi feita à Junta da Freguesia no mesmo ano em que foi inaugurada a escola para o
sexo feminino, também nessa freguesia e por doação do mesmo João Rodrigues de Oliveira Santos,
que arcara com os custos de construção e mobiliário desse edifício. Diferentemente do processo da
escola feminina, que se arrastou por 14 anos, numa contenda que envolvia disputas entre grupos
do poder local (GONÇALVES NETO & MAGALHÃES, 2009), o que não aconteceu no presente caso, que
sofreu percalços apenas de ordem burocrática, o prédio da escola masculina teve sua construção
mais acelerada, sendo inaugurado já no início de 1892, após pouco mais de 3 anos de construção.
No bojo das discussões que ocorrem em Portugal e na Europa no século XIX, envolvendo a luta pela
generalização da instrução pública, destaca-se a presença da iniciativa privada, estimulada e, mesmo,
conclamada pelas autoridades governamentais, construindo escolas e outros melhoramentos para
a sociedade (hospitais, orfanatos, etc) ou contribuindo com fundos para a consecução de obras sob
a responsabilidade do Estado (MAGALHÃES, 2010; CANDEIAS, 2004). Na freguesia de São de Vicente
de Pereira, município de Ovar, localizado na região Centro de Portugal, isso pode ser observado na
figura de João Rodrigues de Oliveira Santos, que fizera fortuna no Brasil (Maranhão) e retornara ao
seu rincão de origem, onde era naquela época proprietário de uma moderna fábrica de chapéus,
pretendendo a ele estender benefícios dos quais era carente, como instrução, hospitais, estradas,
etc (SANTOS, 2007). Fosse por filantropia, pelo sentimento de responsabilidade para com sua terra
natal ou pela busca de reconhecimento social, de respeitabilidade que o dinheiro unicamente não
podia assegurar, o certo é que esses personagens, notadamente os “brasileiros”, marcaram parte
das terras portuguesas, tanto em termos materiais, com palacetes e adereços arquitetônicos, como
imateriais, ao contribuir para os avanços da instrução e da cultura.
A documentação, principalmente os livros de atas da Junta de Freguesia de São Vicente de Pereira
e da Câmara Municipal de Ovar, bem como os dois jornais de Ovar (O Ovarense e O Povo d’Ovar), nos
permite acompanhar a Junta de Freguesia de São Vicente de Pereira no difícil processo de criação,
construção e implementação de uma escola numa pequena e pobre comunidade periférica de
Portugal. Note-se que a escola para meninos na freguesia já existia, mas eram constantes os registros
nas atas da Junta de reclamações dos professores referentes às precárias condições do edifício onde
funcionava a escola. A Junta, por sua vez, responde ser impossível encontrar na localidade prédio
em melhores condições para ser alugado, o que remetia à necessidade do enfrentamento do desafio
da construção de um prédio próprio para esse fim.
Num contexto marcado por divisões políticas entre dois grupos que se enfrentavam por meio
do debate público, das urnas, pelos jornais e, inclusive, pelo uso da violência nas ruas, a Junta de
Freguesia luta contra os entraves burocráticos que não lhe permitem obter a celeridade necessária
para melhor atender às necessidades da instrução local. Da mesma forma, dado o quadro de
pobreza da população e, consequentemente, da arrecadação dos fundos para sua manutenção ou
necessários para algum investimento, a freguesia esforça-se ao máximo para bem aplicar os recursos
recebidos em doação, fundamentais para a construção da escola para os meninos. Por conta disso,
estabelece diálogo constante com a Câmara Municipal de Ovar, da qual dependia para a aprovação
de todos os passos referentes à obra da escola. Promove rigorosa licitação para a obra, com edital
meticuloso, publicado na imprensa de Ovar, conseguindo 5 propostas de arrematação e, ao final,
um preço significativamente inferior ao que estava orçada originalmente a construção da escola.
Por meio do apoio do deputado que representava o município no Governo, consegue a aprovação de
importante auxílio estatal para as obras, correspondente à metade do valor originalmente estipulado
e, com isso, acaba por assegurar por meio desse subsídio, mais da metade dos recursos necessários
para a edificação. Fiscaliza atentamente a construção, procurando conseguir junto ao Governo
Civil de Aveiro que as vistorias necessárias para a liberação do subsídio estatal ocorram no menor
tempo possível, evitando maiores atrasos na finalização da escola. Vende parte de seu patrimônio,
os chamados terrenos baldios, para conseguir os recursos faltantes, iniciativa, no entanto, que será
bloqueada pelo Tribunal Administrativo de Aveiro, que não reconhece na Junta de Freguesia poder
suficiente para efetuar a alienação desses terrenos, mesmo com o aval da Câmara Municipal de Ovar.
Esse contratempo fará com que a Junta de Freguesia, mesmo com o início do funcionamento da
escola, reste com uma dívida para com o arrematante da construção da escola, reconhecida nas atas
da Junta, de 144 mil réis (equivalentes a pouco mais do que o salário anual de um professor primário
à época), que a documentação não permite identificar quando foi finalmente quitada. Apesar de
todos os percalços, a Junta de Freguesia verá seus esforços coroados em 1892 com a edificação da
escola e sua entrada em funcionamento.
Foi possível, dessa forma, perceber, uma parte da complexidade do processo de escolarização
que se pretendia no final do século XIX em Portugal. As disputas nas freguesias e nos municípios
eram intensas dificultando a geração de uma pauta comum ou suprapartidária, mesmo em assuntos
que poderiam ser considerados desta dimensão, como o ensino primário. Remete-se, ainda, à
necessidade de se aprofundar os estudos em torno da esfera municipal, tanto para compreensão,
no nível micro, de uma discussão que se espraia no macro, como para se apreender o movimento
que se desenrola no interior do país e no espaço dos municípios em torno de questões relevantes
para os avanços da nação ou da comunidade, como o caso da educação.
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Muitas são as lições, ainda, que podemos tirar desse estudo, mas todas confluem para a constatação
do atraso instrucional de Portugal no final do século XIX, em relação aos demais países europeus,
e para a urgência com que esse problema deveria ter sido enfrentado – o que não ocorreu. Apesar
de todos os esforços do Estado, dos municípios, das paróquias e dos privados, Portugal adentrará o
século XX com índices de analfabetismo alarmantes para os padrões europeus e ainda levará várias
décadas para, finalmente, conseguir disponibilizar uma instrução de massas à sua população.
Referências
CÂMARA Municipal de Ovar. Livro de Actas 32, 12/02/1887-14/07/1890; Livro de Actas 33, 21/07/1890-
17/07/1893. Arquivo Municipal de Ovar.
CANDEIAS, António (Dir.). Alfabetização e escola em Portugal nos séculos XIX e XX: os censos e as
estatísticas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004.
GONÇALVES NETO, Wenceslau; MAGALHÃES, Justino. Ação privada e poder público na luta pela
instrução: Portugal na segunda metade do século XIX. RBHE, 20, 2009, p.15-39.
MAGALHÃES, Justino. Da cadeira ao banco: escola e modernização (séculos XVIII-XX). Lisboa: EDUCA,
2010.
SANTOS, Guilherme G.O. As crónicas de João Rodrigues de Oliveira Santos e a fábrica de chapéus,
em São Vicente de Pereira. Dunas – Temas & Perspectivas, VII (7), 2007, p.3-18.
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a isso, a constituição imperial brasileira, de 1824, rezava em seu artigo 5º que “a religião católica
apostólica romana continuará a ser a religião do Império”. Todas as “outras religiões serão permitidas
com seu culto doméstico e particular, em casas para isso destinadas, sem forma exterior de Templo”
(Constituição Brasileira de 1824, Artigo 5º) permitindo que os cultos e a evangelização protestantes
se disseminassem no país. A chegada e implantação do protestantismo no Brasil foi lenta e tardia,
oficializou-se ao final do século XIX com a chegada dos luteranos, anglicanos, presbiterianos,
congregacionalistas, batistas e outros, os quais buscaram propagar suas ideias religiosas e suas
doutrinas fazendo oposição ao catolicismo. A primeira escola confessional protestante implantada
no Brasil foi uma instituição escolar presbiteriana na década de 1870 e em 1881 nasceu a primeira
escola metodista. Conforme Garrido (2005, p. 19), “a chegada dos protestantes no Brasil irá dar um
novo fôlego na questão educacional brasileira”. Com sua ética valorizando o ensino, o protestantismo
influenciará diretamente na reestruturação da escola no Brasil. Por serem consideradas [as religiões]
da palavra, as doutrinas reformadas oferecem o acesso à escrita. Na visão de Marcondes e Seehaber
(2004) dois tipos de protestantismo aconteceram no Brasil: o de imigração que nasce com os grupos
e as famílias que vieram da Europa e dos Estados Unidos com o intuito de se fixar no país, reconstruir
suas vidas e preservarem a cultura e fé sendo a escola fundamental para isso. Sendo o outro, o
protestantismo de missão, o qual tinha os mesmos objetivos das missões católicas, evangelizar e
conquistar o maior número de adeptos à sua denominação religiosa. As frentes missionárias
protestantes tinham na abertura de escolas o melhor meio para disseminação da doutrina e
conquista de novos fiéis. Concomitante a chegada, a implantação e disseminação dos protestantes
no Brasil e a abertura de escolas dirigidas por eles, a Igreja Católica intensificou o processo de
romanização do Brasil. Uma das estratégias do episcopado brasileiro foi trazer para o Brasil
congregações religiosas europeias, femininas e masculinas, para cuidar da evangelização e da
educação dos cristãos católicos. Os representantes da Igreja Católica afirmavam que a finalidade
das escolas confessionais era formar cristãos. Diante de tais mudanças na sociedade, a Igreja e os
colégios religiosos se viram obrigados a alterarem, mesmo que sutilmente, seus discursos e suas
atividades dando maior abertura à “modernização”, tentando pregar seus valores de forma mais
livre. Dessa maneira, salesianos (as), dominicanos(as), rogacionistas, agostianianos(as), vicentinas,
redentoristas, entre outras congregações se estabeleceram em vários lugares do Brasil com a
finalidade de trabalhar com a educação. Para tanto, com a intenção de contribuir para o campo de
estudos da História da Educação Protestante e Católica no Brasil, essa comunicação objetiva
apresentar, em uma conjuntura sincrônica, aspectos educacionais, como ponto de convergência e
divergência, das propostas confessionais de ensino dessas instituições educativas, dialogando entre
duas pesquisas em desenvolvimento no Programa de Pós Graduação em Educação da Pontifica
Universidade Católica de Goiás, linha de pesquisa Educação, Sociedade e Cultura e vinculada ao
grupo de pesquisa “Educação, História, Memória e Culturas em diferentes espaços sociais/HISTEDBR”.
A primeira pesquisa, se propõe a investigar a obra missionária instituída pelos missionários norte-
americanos presbiterianos, na cidade de Rio Verde- Goiás, culminando com a implantação de uma
Escola de Enfermagem, anexa ao Hospital Evangélico de Rio verde, um espaço destinado a formar
enfermeiras com qualidades éticas e morais, tendo como elementos formadores os princípios da
tríade do ideário protestante: educação, religião e saúde, produzindo novas atitudes profissionais
nas enfermeiras formadas nesta instituição educativa. Tem por objetivo analisar as estratégias de
implantação e as revelações construídas entre a Escola de Enfermagem Cruzeiro do Sul e os
missionários presbiterianos, na cidade de Rio Verde. Foi necessário um recorte temporal, assim, o
período de análise inicia-se em 1937, foi nesse ano que ocorreu sua fundação em Rio Verde. Momento
também em que tomou força no Brasil a política getulista da Marcha para o Oeste, com o intento de
ocupar o estado de Goiás, denominado como um “espaço vazio” que deveria ser “preenchido”, com
uma nova proposta colonizadora e de inovação para o progresso do Brasil. Essa investigação encerra-
se na década de 1970, momento em que é possível perceber uma certa efervescência política no
campo da saúde, onde o curso de enfermagem vivencia uma reformulação. O segundo trabalho
investigativo, analisa a educação dominicana-anastasiana no antigo norte de Goiás a partir do
Instituto Nossa Senhora de Lourdes da cidade de Arraias, estado do Tocantins. Tem como objetivo
compreender a trajetória do Instituto Nossa Senhora de Lourdes na cidade de Arraias, no antigo
norte de Goiás, na perspectiva da memória e da história desta instituição, no período de 1958 (sua
fundação) à 1982 (encerramento de suas atividades) e inserção social na comunidade local e regional.
O caminho metodológico escolhido para a construção desse texto parte do pressuposto da Nova
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 522
História Cultural. Como metodologia, optou-se pela pesquisa qualitativa, de cunho documental,
ancorada na análise de fontes que delineiam todo esse percurso. Por meio dessas fontes pesquisadas
foi possível perceber uma grande influência do ensino particular nessas regiões dos estados de Goiás
e do Tocantins, salientando que a formação das famílias de melhores condições financeiras esteve
em grande parte nas mãos de instituições de ensino particulares, católicas e protestantes. As
investigações realizadas até então, apontaram diversas particularidades desse processo educacional
de ambas confissões religiosas e revelam sua contribuição para a educação brasileira. Entretanto, no
que diz respeito à História da Educação brasileira, o quadro da realidade educacional protestante
permanece, em muitos aspectos, desconhecida, ainda se tem muito a fazer. O principal objetivo da
educação das escolas confessionais, tanto para católicos como para protestantes, era a formação de
cristãos. Essa tensão entre as religiões fez com que a escolas se tornassem cada vez mais presentes
na sociedade.
ISSN 2358-3959
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O presente estudo tem por finalidade mostrar através de investigação científica, a implantação e
o desenvolvimento da Instrução Primária no Amazonas Imperial, a partir da instalação da Província
autônoma em 1850. O marco temporal é o período de 1850 a 1889 com o término do Império através
da Proclamação da República do Brasil. Entre as várias alternativas possíveis para fundamentar e
consubstanciar texto, optamos por dar continuidade as nossas reflexões e análise que fazem uso das
fontes primárias, como as mensagens, as falas e os relatórios dos presidentes das províncias e dos
diretores gerais da Instrução Pública da Província do Amazonas.
A historiografia regional referencia que apesar da criação da Provincial acontecer em 5 de
setembro de 1850 é somente em 1852 que foi efetivamente instalada com a nomeação do Sr. João
Batista de Figueiredo Tenreiro Aranha para a presidência, feita pelo Imperador. As fontes por nós
consultadas, registram que a conquista da autonomia administrativa dessa imensa província
foi comprovadamente positiva em termos educacionais. A partir da sua instalação assistiu-se
numericamente um crescimento gradativo da escola de instrução primária na Província, apesar das
dificuldades naturais típicas da região norte do Império. Dentre as dificuldades naturais destacamos
os inúmeros e densos rios que formam a bacia hidrográfica da Amazônica, da imensa floresta
tropical, mas é ainda de assinalar, a falta de pessoas qualificadas e possuidores de compromisso
com a escolarização das crianças e jovens e de uma grande boa vontade de socializar os saberes
escolares primários nos mais distantes recôncavos da Província. Apesar dessas variáveis impeditivas,
a escola primária foi gradativamente, ano após ano, sendo construída, implantada e consolidada no
Amazonas Imperial.
No estudo, fazemos uso dos aportes teóricos e metodológicos da História da Educação como
um dos domínios da ciência histórica, da Nova História, que ocupa em investigar, não só narrativas
consideradas dominantes, mas também, as representações dos fenômenos, da valorização dos
vários documentos pedagógicos educativos[1] como fonte de análise. A investigação, perspectiva
uma releitura da história da educação, haja vista o processo de transformação pelo qual passou
e tem passo a historiografia sobre a Instrução Primária no Brasil, na segunda metade do século
XIX. As novas aberturas, no campo da História da Educação, contribuem para avançar e alargar o
conhecimento em novas direções, reconhecendo que essas novas direções não esgotam o processo
histórico, pelo contrário, remetem a indagações, saberes, problematizações que nos conduzem
a caminho e outros olhares recheados de conhecimento científico sobre a existência da escola
primária no vasto território do Amazonas provincial.
Após a Independência do Brasil em 1822, D. Pedro I, imperador do Brasil, sanciona a Lei de 15 de
outubro de 1827, determinando a criação de Escolas de Primeiras Letras em todas as cidades, vilas e
lugares mais populosos do Império. Dentre outros aspectos, a Lei traz no seu escopo a substituição do
“velho” mestre régio de então, pelo professor primário, que faz uso de plano de ensino previamente
Referências
RIZZINI, Irma (2006). Educação na Amazônia Imperial: crianças índias nos internatos para formação
de artífices. In SAMPAIO, Patrícia Melo e ETHAL, Regina de Carvalho (orgs). Rastro da Memória:
história e trajetórias das populações indígenas na Amazônia. Manaus: EDUA.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 525
Fontes:
Mensagem, (1852) com Relatório do Vice Presidente de Província do Amazonas. Pará: Typ. De Santos
& Filhos.
Relatório apresentado pelo Presidente da Província do Pará, sobre o estado em que se encontrava a
Província do Amazonas (1852). Apresentando após a tomada de posse do 1º Presidente do Amazonas.
Manaus: Typ. de M. da S. Ramos.
[1] O sentido dado à expressão “documento pedagógico educativo” aqui por nós no estudo,
diz respeito aos artefatos pedagógicos como: regimentos, regulamentos, mapas, livros, cartilhas,
manuais pedagógicos, quadros, carteiras, bancos, cadeiras, mesas etc., produzidos pelo homem
para atender às necessidades modernas e racionais do campo da pedagogia escolar.
[2] Nas primeiras décadas do Império brasileiro, o espaço geográfico que compreende hoje quase
toda a Região Norte do Brasil pertencia a Província do Grão-Pará com sede em Belém. Em 5 de
setembro de 1850, por carta Imperial, D Pedro II cria a Província do Amazonas, desmembrando-a
da Província do Pará. Em 1º de janeiro de 1852, João Baptista de Figueiredo Tenreiro Aranha,
nomeado pelo então imperador, instala e dá início à administração da nova Província do Império, a
do Amazonas, Cidade da Barra, que depois foi denominada de Manaus.
[3] Segundo o Relatório apresentado pelo presidente da Província do Pará acerca do estado em
que se encontrava a Província do Amazonas, depois da instalação desta e da tomada de posse o
primeiro presidente Sr. João Baptista de Figueiredo Tenreiro Aranha. (1852, p. 38).
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Formar artistas não é uma tarefa fácil. Em um país, como o Brasil, onde a qualidade do ensino
básico e fundamental, ainda parece não ter uma solução satisfatória e sustentável, este tipo de
formação poderia ser considerado desnecessário. Ao assumir uma escola de dança do Estado como
objeto de pesquisa relacionada às Instituições Escolares pretendeu-se abrir caminhos para o olhar
à outras instituições de artes, desconhecidas e/ou desvalorizadas pelo público acadêmico e pela
sociedade. A Escola de Dança do Teatro Guaíra, enquanto Instituição Escolar foi a primeira no Paraná
que oferecia o ensino de ballet gratuito com a preocupação em formar bailarinos profissionais. Esta
escola completou 60 anos em 2016. É uma instituição escolar específica da área da dança clássica
(em sua origem). Muitos saberes e práticas analisados por pesquisadores de instituições escolares
fazem parte desta escola e estão presentes em suas práticas pedagógicas como, por exemplo: as
disciplinas, os níveis escolares, o número de alunos e o de professores, entre outros. Há relações
com o espaço, com o ensino, com os projetos pedagógicos específicos, além de terem disciplinas
diferenciadas; sem esquecer as celebrações anuais que são os espetáculos que a escola desenvolve
todos os anos com todos os seus estudantes. A formação existe, incluindo os aspectos de ônus e
bônus de uma instituição escolar de ensino elementar, fundamental ou superior. Conformações,
transformações e deformações são visíveis como em seus processos de ensino e aprendizagem.
Entretanto, não cabe julgar esta instituição, mas analisá-la no contexto sócio-político-cultural pelo
que fez e faz pelos profissionais da área da dança em Curitiba, independentemente, de suas vitórias
ou fracassos. O objetivo desta pesquisa consiste em investigar a trajetória histórica da Escola de
Dança do Teatro Guaíra, denominada, anteriormente, Curso de Danças Clássicas, no período entre
1956 a 1961. Para compreender a história da Escola de Dança do Teatro Guaíra foi necessário voltar
no tempo, conhecer aspectos e possíveis origens do ensino da dança em Curitiba, antes da criação
desta instituição, além de conhecer as singularidades do ballet clássico, seu surgimento e sua
história, assim como os conteúdos específicos desta formação. A metodologia tratou da busca, coleta
e análise de fontes através da interdisciplinaridade, “interação que se estabelece entre disciplinas”
(BARROS, 2012, p.104). As fontes coletadas foram analisadas através da linguagem do ensino da
dança (MARQUES, 1999) e da História da Educação (NOSELLA; BUFFA, 2008, 2013) no seu contexto
social, político, econômico e cultural para melhor compreensão da instituição escolar escolhida.
Tanto a Historiografia da Dança quanto o estudo baseado em Instituições Escolares são áreas
relativamente novas de pesquisa, especialmente, tratando-se da primeira. Segundo SILVA (2012), há
uma fragilidade no campo de pesquisa em Historiografia da Dança não só por ser um campo novo de
pesquisa, mas por apresentar acúmulos de relatos e trajetórias artísticas sem se “comprometer com
a complexidade histórica e social que permeia os ambientes, os processos e os produtos artísticos da
Dança” (SILVA, 2012, p.111). Para tentar compreender alguns destes processos relacionados à Escola
de Dança do Teatro Guaíra foram pesquisadas fontes que partem de periódicos locais encontrados
no Setor de Memória da própria escola. Alguns recortes de jornais encontravam-se sem identificação
de data e nome do periódico sendo, algumas vezes, descartados. Contudo, aqueles encontrados
no Arquivo Público do Paraná tinham a finalidade de analisar os fatos nos respectivos contextos
tentando aproximar-se da metodologia de pesquisa das Instituições Escolares com o intuito de
valorizar a historiografia da dança. Com relação às fontes, abre-se um parêntese importante. Muitas
fontes, referentes à Escola de Dança do Teatro Guaíra não foram encontradas, especialmente aquelas
que tratavam dos períodos anteriores à década de 1970. Este fato sugere algumas hipóteses: 1) o
incêndio do Teatro Guaíra (1970) pode ter incinerado alguns documentos; 2) A Escola de Dança do
Teatro Guaíra mudou de espaço por mais de três vezes e alguns documentos podem ter se extraviado
ou ter sido dado como perdidos; 3) a burocracia para pesquisar dentro do arquivo do Teatro Guaíra,
alocado no Arquivo Público do Estado que necessitava, obrigatoriamente, do acompanhamento
de um funcionário do Teatro; 4) os espaços que a Escola ocupou por décadas foram divididos com
outras escolas e cursos, fato que pode ter misturado os documentos; 5) o receio por parte de alguns
entrevistados em revelar certas práticas da escola e mostrar documentos; 6) a vigilância, enquanto a
pesquisadora estava no processo de coleta de fontes, e os poucos horários fornecidos para a pesquisa
dentro da Memória da Escola. Todas estas hipóteses e situações dificultaram o acesso às fontes,
relacionadas à Escola de Dança do Teatro Guaíra. Mesmo assim, foi possível acessar uma quantidade
significativa de fontes que permitiu dar vida ao texto e, de acordo com Julia (2001) “o historiador
sabe fazer flechas com qualquer madeira” (JULIA, 2001, p.17). Vale ressaltar que as fontes da área da
dança diferenciam-se dos outros objetos de pesquisa, considerando que estes objetos não podem
ser reproduzidos como em outros campos do saber. Este tipo de fonte artística (a dança, o teatro e a
música) se esvai logo que é consumido, fruído. São objetos efêmeros, na área das artes que merecem
uma atenção metodológica própria, embora seja uma discussão para um próximo texto. Pode-se
dizer, portanto, que a dança é como uma vela que “consome a si mesmo no próprio ato de criar a
luz” (BERTHOLD, 2006, p.16). Este texto pretende mostrar os percalços que os primeiros diretores e
primeiros professores no final dos anos 1950 e início dos anos 1960 enfrentaram. A promessa que
demorou a ser cumprida, de construção de um teatro para a cidade de Curitiba comprometia o ensino
devido ao espaço precário. O Teatro Guaíra foi fruto de um projeto que envolvia as comemorações
do Centenário do Paraná, no ano de 1953. Estas celebrações consistiam, entre outras coisas construir
uma biblioteca (Biblioteca Pública do Paraná), um teatro (Teatro Guaíra) e um Centro Cívico para
a capital do Estado. Contudo, a construção do teatro demorou mais do que fora programada por
inúmeras dificuldades, entre elas, um incêndio. Porém, o pequeno auditório, Salvador de Ferrante,
conhecido pelos curitibanos como Guairinha tinha sido inaugurado, em 1954 e este seria, desde 1956
a primeira casa a abrigar a Escola de Dança do Teatro Guaíra. A Lei de número 2382, de 10 de maio de
1955 cria o Teatro Guaíra, “entidade autônoma, diretamente subordinada ao Governador do Estado”
(DIÁRIO OFICIAL DO PARANÁ, 1956, n.59) afirma que o mesmo era destinado ao incentivo das belas
artes e deveria proporcionar espetáculos para o público. Porém, os espetáculos da escola estavam
longe de acontecer considerando que manter alunas em um curso que não era muito conhecido,
por ser novo era um desafio constante. Manter diretores e professores também era uma dificuldade
devido às negociações com o Governo do Estado. Para as considerações finais é possível afirmar a
necessidade em registrar a trajetória histórica da primeira escola de dança do Estado. Além disso,
percebe-se que mesmo enfrentando dificuldades, os primeiros profissionais que por ali passaram
conseguiram manter e dar continuidade à escola. Até hoje, a Escola de Dança do Teatro Guaíra
continua formando bailarinos e oferece, desde 2012, três cursos distintos, sendo: Curso Livre, Curso
de Formação do Artista Bailarino e Curso Técnico em Dança.
Referências
ESCOLA DE DANÇA DO TEATRO GUAÍRA. Setor de Memória da Escola de Dança do Teatro Guaíra.
Curitiba, 2014.
GEMAEL, Rosirene. Escola de Dança do Teatro Guaíra: um registro. Curitiba: Secretaria do Estado da
Cultura, Centro Cultural Teatro Guaíra, 2007.
MARQUES, Isabel A. Ensino de Dança Hoje: Textos e Contextos. São Paulo: Cortez, 1999.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 528
NOSELLA, Paolo; BUFFA, Ester. Instituições Escolares: por que e como pesquisar. Campinas, SP:
Editora Alínea, 2013.
_____________. Instituições Escolares: por que e como pesquisar. In: VECHIA, Ariclê; SANTOS,
Ademir Valdir dos. (Orgs.). Cultura escolar e história das práticas pedagógicas. Curitiba: UTP, 2008.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A educação rural, em âmbito nacional, foi temática de discussões dos administradores políticos
do país e dos intelectuais desde o início do século XX intensificando no período de 1930 – 1945. Dois
grupos se formaram na defesa da escola rural brasileira com posições antagônicas no que se referem
aos objetivos e finalidades dessa escola.
De um lado estavam os ruralistas que defendiam a melhoria das condições da vida campesina,
de maneira que o homem do meio rural não sentisse necessidade de abandonar a terra. Esse grupo
criticava o modelo de escola que estava inserido na zona rural brasileira, cosiderava-o ineficiente,
pois estava apegado à cultura urbana, funcionando como propaganda da vida citadina, convidando
o camponês a abandonar a sua vida no campo.
De outro lado estavam os intelectuais escolanovistas, que embora concordassem com a necessária
integração da população rural a um projeto nacional de sociedade via escola e, consequentemente,
a necessária fixação do homem no campo, acreditavam e saíram em defesa de uma escola comum,
com currículo comum a todos.
A presente comunicação, resultado de pesquisa de doutorado pelo Programa de Pós-Graduação
em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, visa apresentar e discutir a expansão,
localização e distribuição da escola primária rural no município de Poconé, Mato Grosso, no período
de 1930-1945. Para a tessitura desta comunicação, respaldou-se no referencial teórico metodológico
da história das instituições escolares conforme Magalhães (2004) e Sanfelice (2007; 2008). Para
subsidiar a análise utilizou-se o conceito de representações de Roger Chartier (1990), compreendido
como as maneiras que um dado grupo vê/compreende o mundo social. Esse conceito possibilita
compreender as relações entre os discursos e as práticas, ou seja, as formas pelas quais os sujeitos
envolvidos interpretaram e construíram a educação mato-grossense no espaço rural.
A metodologia, de abordagem histórica, deu ênfase à localização, reunião, seleção e análise
de fontes documentais compostas por leis, decretos, regulamentos, mensagens presidenciais à
Assembleia Legislativa, mensagens dos interventores, relatórios dos diretores da Instrução pública
e dos inspetores escolares, localizados na Base de Dados do Grupo de Pesquisa em História da
Educação e Memória (GEM), no Arquivo Público de Mato Grosso (APMT) e no Núcleo de Documentação
e Informação Histórica Regional (NDHIR-UFMT).
No período em questão, a zona rural de Mato Grosso era composta por uma diversidade de
ruralidades que, em razão da sua localização, do seu ambiente físico e sua organização, construíram
culturas e práticas cotidianas plurais e singulares. Essas ruralidades, de certa forma, influenciaram
a organização do ensino rural primário mato-grossense, seja pela instalação, ou seja, pela não
instalação das instituições escolares nas diversas localidades espalhadas pela extensa zona rural do
estado, especialmente as práticas cotidianas escolares.
A escola rural, nesse cenário do estado, era a que tinha maior alcance para as crianças mato-
grossenses em idade escolar. Embates e lutas de representações, em âmbito nacional, aconteceram
em torno do ensino rural entre os ruralistas e os escolanovistas, sendo que Mato Grosso apropriou-se
expandir essas escolas no município, assim como para equipá-las e fiscalizá-las, dando indícios da
sua importância para os representantes do governo.
As escolas rurais poconeanas estiveram em movimento pela região pantaneira, fechava-se uma
escola em determinada povoação e abria-se em outra ou, ainda, em outro momento reabria-se
naquela mesma localidade, seja por definição da instrução pública amparada pelo aspecto legal,
seja por questões geográficas, ou seja pelo clientelismo político. Entre instalar/desativar escolas, no
município pantaneiro, entraram em cena as lutas de representações sobre a educação rural travadas
no cenário educacional.
ISSN 2358-3959
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Este local logo ficou pequeno e mudou-se de forma definitiva para um prédio próprio que contava
com algumas estruturas especiais para as crianças como: quadra, ginásio, castelinho, campo,
parede mágica, fazendinha, tanques de areia, piscinas, capelinha, dentre outros. A implantação
do SEI trouxe algumas mudanças na visão educacional até então praticada na cidade tais como: o
resgate de festas da formatura, encerramento do ano letivo, coral, noitada, diada, tardada, chá das
mães, café com os pais, etc. Além de projetos como SEI saber, conheSEImento, SEI ler, culinária, dia
maluco, semana do conto, jardinagem, bandinha, fiscal de boas maneiras, excursões e etc. Exposto
isto, realizamos uma reflexão teórica a partir das leituras de temas como: Instituição, Formação de
Professores, Memória e História Oral e, posteriormente, nas visitas ao SEI encontrou-se algumas
fontes documentais que foram disponibilizadas pela instituição tais como: autorização para
funcionamento, atas, pastas de estágios, livro de matrículas, proposta curricular, planos de aula
de professores/as, além de um grande acervo fotográfico que nos possibilitará contar esta história
dentre outros. E para fazer uso destas fontes teremos como metodologia, a análise documental e a
história oral no qual já foram realizadas as entrevistas com os fundadores dona Ezir e Sr. Gutierre,
e por seguinte, pretende-se conhecer os relatos de professores/as e alunos/as da época do curso
do magistério objeto do nosso estudo. Já que por sua vez, trabalhar com a história oral torna-se
possibilidade de valorizar as vozes de pessoas, trajetórias de vida, memórias, biografias, histórias e,
ainda, dar respostas aos nossos questionamentos (SARAT; SANTOS 2010). Temos deste modo, alguns
resultados pertinentes quanto a escola. Seu público alvo são pais de alunos de classe média baixa,
pertencentes a diferentes setores trabalhistas, no entanto com condições financeiras que permitem
ou que priorizam o investimento em educação a partir do pagamento à escola. Ao analisarmos
os registros das matrículas da escola, encontramos profissões relacionadas as famílias como,
por exemplo: motoristas, vendedores/as, pedreiros, lavradores/as, professores/as, funcionários
públicos, pequenos/as empresários/as, artesãos, militares, religiosos/as entre outras. A escola SEI
tem um alto nível de aprovação e reconhecimento na comunidade, já que não utiliza nenhum recurso
de marketing e propagandas e mesmo assim, a tendência ao aumento está sempre ocorrendo a cada
ano; além de ser totalmente autossustentável considerando a administração geral e financeira da
mesma que são todos da família Gutierre; a escola mantém um acesso e permanência dos alunos
em torno de uma década e conta também com a presença de alunos das cidades vizinhas; o quadro
docente e administrativo tem pouca rotatividade e alguns deles estão na escola há mais 20 anos
de trabalho e de algum modo estes se constituem em fontes vivas de experiências na instituição; a
escola investe no relacionamento familiar envolvendo pais e professores/as no acompanhamento
e participação em todas as atividades, especialmente nas celebrações sendo uma das tradições da
instituição. Portanto, a partir destes aspectos sobre a instituição é possível perceber que o SEI é um
espaço educativo de cunho tradicional na cidade de Dourados, que desde o início busca pensar em
experiências que contemplem uma formação total dos alunos. Assim, pensando em um curso de
magistério neste espaço institucional e imerso nestas características apresentadas, faz –se possível
levantar algumas reflexões e consequentemente algumas respostas iniciais. Ofertar um curso que
habilita professores/as ao ensino para a classe média/alta? Pagar para atuar como professor/a? Por
que ofertar um curso de formação de professores/as? Como aconteciam as formações? Dentre outras
indagações que se tornam possíveis. Tem-se então como hipóteses que o curso tenha sido ofertado
para agregar serviços, e formar professores/as que seriam ideais a partir dos conhecimentos e práticas
adquiridos para atuarem na escola SEI. E o seu termino, a partir dos documentos, fica visível que não
houve clientela satisfatória para dar sequência e no período encerrado cujo ano de 1998 já se estava
iniciando a regularização nos cursos de formação tendo em consideração a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional – LDB 9394/1996. Acredita-se que este estudo é importante já que a referida
instituição esteve presente na formação de várias gerações e sua história contribuiu com novas
perspectivas de investigação da educação local e regional. Pois compreendemos a história tal como
aponta Luchese (2014) como um processo que em suas multiplicidades, descontinuidades, brechas
e atravessamentos constitui os momentos do passado-presente. A História como narrativa, como
trama do passado, como fios que se intersectam na construção do passado, permeado por práticas
e representações. E é com o interesse de conhecer estas práticas que pretendemos elucidar alguns
aspectos da história desta formação de professores/as no período do curso do magistério ofertado
pela Escola Sei em Dourados - MS, apresentando o processo histórico desta instituição educativa e a
sua trajetória no campo da história da educação.
ISSN 2358-3959
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Essa pesquisa teve como objetivo abordar o funcionamento das escolas multisseriadas em
atividade no município de Iguape. Visou compreender as diferenças desta forma escolar da que
ocorre na zona urbana, assim como a importância destas instituições para a comunidade rural.
Apesar de ter focado um local específico, foi possível compreender através do estudo a diferença
que há entre a educação rural e urbana, diante de um contexto histórico que abrange os setores
político, econômico, social e cultural. Esse tipo de escola existe desde o final do século XIX e início do
século XX. Nesse ambiente, os alunos de diferentes séries podem permanecer de forma concomitante
com o mesmo docente. Essa modalidade escolar continua em funcionamento na atualidade,
apresentando em sua estrutura semelhanças significativas com a forma em que funcionava nos
séculos anteriores. O estudo sobre essa forma de educação fez-se necessário uma vez que, diante do
processo de modernização pelo qual vem passando a educação, e de políticas que promovem
subsídios a esse setor, essas instituições brasileiras localizadas em pontos de difícil acesso, centradas
na zona rural, parecem, em primeiro momento, não participar de tais considerações, funcionando
muitas vezes em condições precárias, tanto no que diz respeito à estrutura física quanto pedagógica.
Há controvérsia entre estudiosos da educação sobre essa modalidade escolar, pois enquanto uns
apoiam, outros criticam essas pequenas instituições por atenderem alunos de várias séries de
maneira simultânea, na mesma sala, com o mesmo professor o qual se desdobra em ensinar
conteúdos distintos para crianças de idades e nível de escolaridade diferentes. As críticas
fundamentam-se principalmente no argumento de que os alunos dessas escolas apresentam
comprometimento da aprendizagem evidenciado principalmente no momento em que buscam
continuar seus estudos nas instituições urbanas. Tal posicionamento incita à questão: o que se
entende e de que forma ocorre esse “comprometimento”? Diante dessa realidade, há preocupação
de um estudo sobre esse ambiente escolar distinto das escolas urbanas do município, além de
compreender a importância destas escolas para as comunidades as quais pertencem. Também foi
relevante considerar se existe preocupação do trabalhador rural em manter essas instituições em
funcionamento em suas comunidades. Iguape foi a cidade escolhida como universo de análise
diante de sua riqueza histórica e das diversidades político-econômicas, tal como sócio-culturais,
uma vez que está situada em uma das regiões consideradas mais carentes do Estado de São Paulo:
o Vale do Ribeira. Apesar desse fato, poucas pesquisas relativas ao assunto têm sido efetuadas
especificamente quando o tema é voltado a Iguape. Por isso, para se compreender a realidade
dessas, algumas considerações foram necessárias, como o conhecimento das características do
referido município que motivaram e ainda estimulam a existência destas salas em funcionamento, a
se considerar que o reconhecimento dos fatores que fundamentam a vivência de uma cidade é
importante para que se compreenda a estrutura e a organização dos setores nela inseridos, uma vez
que estes respondem às exigências especiais e são pontos conflitantes entre as classes formadas por
diferentes níveis econômicos. A Educação não pode se desvencilhar desse processo. Iguape foi
contemplada com um dos primeiros grupos escolares fundados no Estado de São Paulo: o Grupo
Escolar de Iguape, atualmente, Escola Municipal Vaz Caminha que, inicialmente, teve a função de
agrupar as escolas isoladas da região em um só espaço. Essa instituição está totalmente vinculada
ao crescimento econômico pelo qual passou a cidade do início do século XX, assim como a fixação
do sistema capitalista mediante a agricultura. Logo, justificou-se acompanhar o desenvolvimento de
Iguape como um todo. Diante dessa perspectiva econômica, situa-se o trabalhador agrícola, principal
usuário das escolas multisseriadas situadas na zona rural deste município. Portanto, também
careceu que se efetuasse uma relação dessas pequenas instituições com os fenômenos sociais,
políticos, econômicos, ambientais e culturais que as permeiam. As dificuldades encontradas para
obtenção de fontes que pudessem dar melhor esclarecimento sobre essas escolas apareceram
justamente pelo fato de situarem-se em meio rural, relativamente distantes da zona urbana e, por
isso, pouco contempladas. Por esse motivo, a pesquisa abrangeu um período de 28 anos, ou seja, de
1980 a 2008, o que foi possível, não apenas através de fontes primárias, mas também por relatos e
entrevistas com alunos e pessoas que estiveram ou ainda estão envolvidas com esse contexto, ter
uma visão mais esclarecedora desse tipo de escola em tal região. Apesar dessa restrição de tempo,
não se pôde ignorar a existência dessas instituições em períodos anteriores, pois fazem parte da
identidade do homem ribeirinho, das comunidades quilombolas ou indígenas que habitam o local e
que, muitas vezes são apresentadas como alegorias culturais que marcam as variações linguísticas,
as atividades artesanais e outros aspectos que definem a cultura, geralmente valorizados pelo
turismo que busca originalidade. Mas o homem do campo ainda que marginalizado pela urbanização,
é responsável pela constituição da história local. As escolas multisseriadas, objeto principal desta
pesquisa, não aconteceriam se as comunidades situadas no interior do município não existissem.
Esse povo não é mero espectador, mas protagonista da sociedade à qual pertence. Através da história
da cidade, da análise dessas instituições não só foi possível compreender sua organização, mas o
reconhecimento dos habitantes da zona rural na luta pelo exercício de sua cidadania, principalmente
quando estes recorrem à Educação como força que impulsiona seus descendentes para condições
mais dignas de vida e igualitárias diante da sociedade urbana. Outro aspecto relevante para a
compreensão da educação nas salas unidocentes está no entendimento de como se configuram,
como surgiram e ainda se desenvolvem, pois, diante da legislação e dos parâmetros que definem o
funcionamento dessas escolas, é possível visualizar os fatores integrados na educação do homem
trabalhador campesino. Diante da estrutura física, da proposta pedagógica e das ações que
interferem no processo ensino-aprendizagem, pôde-se esclarecer as distinções que ocorrem em um
mesmo setor público de quando este atua no meio urbano e quando se faz no meio rural. As
considerações sobre a importância social dessas escolas como formas de expansão da educação
para os habitantes das zonas mais distantes do centro urbano, assim como suas funções como meio
de integração da comunidade mediante possíveis eventos efetuados nesses locais também são
relevantes para que se possam traçar conclusões sobre os motivos que levam essas salas unidocentes
a funcionar. A possibilidade das crianças residentes distantes do centro urbano poderem estudar
dentro de sua comunidade e a relação desse vínculo como estímulo de permanência desses
estudantes em seu ambiente são essenciais para a valorização das regiões agrícolas e do homem
pertencente a essas localidades. Portanto, essa educação transmitida na zona rural tem papel
fundamental no que se refere ao êxodo. Uma vez entendida a relevância do estudo sobre as condições
da educação escolar existentes em localidades afastadas e a escassa pesquisa abordam sobre
escolas isoladas o referencial teórico contou principalmente com os estudos de Iguape feitos por
Ernesto G. Young (1903), Roberto Fortes (2000) e Roberto G. Collaço (1989), o que foi de grande valia
para o esclarecimento dos aspectos históricos que constituíram a cidade. Rosa Fátima de Souza
(1988-1998) e Luciano M. Faria Filho (2000) também foram referências para se compreender sobre o
conceito de escolas isoladas. Logo, esta pesquisa foi norteada principalmente pelas fontes literárias
citadas, assim como pelas dissertações e artigos científicos sobre instituições rurais e unidocentes
no Brasil. Através da legislação e da colaboração da Secretaria Estadual de Educação de São Paulo,
e dos membros da Secretaria Municipal de Educação de Iguape, foi possível ter uma perspectiva
mais próxima da realidade organizacional e funcional das escolas multisseriadas na atualidade.
Diante da escassez de recursos que pudessem fornecer maior números de dados sobre o
funcionamento dessas escolas na região iguapense, especificamente no período anterior à
construção das instalações atuais, como procedimento metodológico, recorreu-se à memória da
comunidade, através de depoimentos de antigos moradores e docentes que conviveram nesse
contexto educacional de difícil acesso tanto em épocas mais remotas quanto no presente.
ISSN 2358-3959
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O presente trabalho é resultado parcial de pesquisas desenvolvidas pela autora em seu processo
de doutoramento, vinculado ao Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro (UNIRIO/RJ). Essa análise tem como objetivo discutir os projetos e embates políticos
envolvendo a escolarização de ingênuos e crianças pobres na cidade do Rio de Janeiro, então Corte
do Império brasileiro, vista como um mecanismo de ordenamento e redenção nacional. A intenção
é investigar se houve um processo de inserção social dos ingênuos, para além de sua condição
jurídica, ou seja, é debater se o preceito legal tornou-se uma prática efetiva, com oferta de instrução
e educação aos filhos livres de mães escravas, tanto por parte do Estado quanto de particulares.
Privilegiam-se, nesse momento, os anos de 1871 e 1888, por se tratar de um período fundamental
na efetivação de medidas e práticas envolvendo a escolarização dos ingênuos, amparados pela Lei
Rio Branco, a chamada Lei do Ventre Livre (1871), bem como a promulgação da Lei Áurea (1888), que
determinou o fim da utilização da mão de obra escrava no Brasil. Utilizam-se como fontes de pesquisa
alguns periódicos que circularam na cidade do Rio de Janeiro, no período abordado, assim como os
Anais do Senado Federal, que representam a “memória oficial” das temáticas aqui discutidas. Sobre
as fontes será empreendida uma análise qualitativa acerca dos projetos e práticas de letramento
referentes às crianças pobres da cidade, dentre as quais se incluem libertos e ingênuos. Entre os
jornais contemplados destacam-se: Gazeta da Tarde, Diário de Notícias, Gazeta Nacional e Jornal do
Commercio.
Ao levar em consideração as relações estabelecidas entre educação, cidadania e liberdade,
interessa-me discutir os projetos políticos e as reformas educacionais implementadas nesse período,
enquanto uma política de Estado visando à escolarização da população. Meu objetivo é acompanhar
os discursos – inclusivos ou não – voltados para a questão da educação dos ingênuos, de modo
específico, e das crianças pobres, de maneira geral, num recorte temporal que abarca os últimos
anos do Império brasileiro.
A presença de escravos e libertos nas escolas oitocentistas não constitui novidade para a
historiografia contemporânea. Pesquisas recentes muito têm contribuído para a problematização
das diferentes formas de inclusão/exclusão desses segmentos sociais no aprendizado das letras. As
pesquisas nessa área têm demonstrado que os mecanismos de exclusão de escravos, na prática,
ocupavam um terreno bastante fluido e ambíguo. O que a historiografia sobre o tema revela é
que, no moroso processo das leis educacionais e dos sistemas de efetivação da instrução pública
provinciais, o direito à instrução primária gratuita foi sendo paulatinamente estabelecido no decorrer
do século XIX. E, embora a autonomia legislativa outorgada pelo Ato Adicional de 1834, em matéria
de instrução primária e secundária, via de regra, tenha excluído os escravos do direito de frequentar
as escolas públicas, tal acesso, mesmo que minoritariamente, foi conquistado em algumas regiões
do Império (GONDRA; SCHUELER, 2008).
Iniciativas voltadas para a instrução e educação de escravos e libertos acompanharam um
debate intenso, que envolveu diferentes setores da sociedade, no qual a escola assumia um lugar
gratuidade do ensino adensavam os embates acerca do papel do Estado como garantidor de tais
meios, ou seja, de que houvesse escolas elementares para oferecer à população os conhecimentos
necessários ao desenvolvimento do país. Ao lado da instrução estava a educação. Além dos
conhecimentos “práticos” de leitura e escrita havia os valores morais. Nesse caso, não bastava
instruir, era preciso educar a população seja na Corte ou nas demais províncias do Império.
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Em investigação sobre as instituições escolares, Nosella e Buffa (2013, p.13) apontam que
estudos sobre o tema “[...] desenvolveram-se, sobretudo, a partir dos anos 90, entretanto, de forma
esporádica, surgiu antes disso.” Os autores recuperam por meio de uma retrospectiva sobre os
estudos históricos da educação no Brasil e classificam a produção existente sobre a temática em
três momentos distintos: 1) situado entre as décadas de 1950-1960; 2) nas décadas de 1970 e 1980
e; 3) iniciado na década de 1990. No tocante aos estudos atuais na área concluem: “Atualmente,
os estudos de instituições escolares representam um tema de pesquisa significativo entre os
educadores, particularmente no âmbito da história da educação. Tais estudos [...] privilegiam a
instituição escolar considerada em sua materialidade e em seus vários aspectos.” (NOSELLA; BUFFA,
2013, p. 17).
Neste sentido, esta comunicação visa divulgar dados de uma investigação cujos olhares
voltaram-se para resgatar aspectos pertinentes a materialidade das instituições escolares da cidade
de Porto Velho criadas entre os anos de 1914 a 1943 para atender a população infantil da época, em
seus vários aspectos. Essas instituições são concebidas também enquanto sínteses das múltiplas
determinações de variadas instâncias: política, econômica, religiosa, cultural, moral e ideológica,
que se interagem dialeticamente, resultando daí sua identidade (SANFELICE, 2007, p. 77).
A cidade de Porto Velho está localizada na região Norte do Brasil, fundada às margens do Rio
Madeira. Inicialmente, foi criada como povoado em 1907 pela empresa Madeira-Mamoré e elevada
à categoria de Município em 2 de outubro de 1914, por meio da Lei nº 757, sancionada por Jonathas
de Freitas Pedrosa, governador do Estado do Amazonas. O município esteve vinculado a este estado
até 1943, quando ocorre um desmembramento de terras deste com partes do estado de Mato Grosso
originando assim o Território Federal do Guaporé, do qual passou a ser Porto Velho a capital. Durante
todo este período foram criadas em Porto Velho 17 unidades escolares.
Sendo assim, foram estes dois fatores que influenciaram na delimitação do recorte para
o desenvolvimento da pesquisa. Para tanto se recorreu aos periódicos disponibilizados pela
Hemeroteca da Biblioteca Nacional e nos acervos do Museu Palácio da Memória Rondoniense
(MERO), bem como aos escritos de memorialistas, mensagens dos governadores e relatórios de
intendentes da época que foram analisados à luz da História Cultural (CHARTIER, 1990). Fez-se uso
da abordagem historiográfica enquanto metodologia na medida em que se empregou a recolha
e tratamento diferenciado de diversos tipos de informação que culminou na síntese crítica e na
construção de uma história das instituições educativas, corroborando assim com o que aponta
Magalhães (2004, p.71):
De acordo com Magalhães (2004) existem vários tipos de instituições educacionais, sendo assim,
nesta pesquisa o foco será direcionado para as instituições do tipo escolar voltadas para a formação
educacional das crianças. Na gênese da cidade de Porto Velho, quando buscamos por dados
referentes às crianças constatamos que eram “poucas” ou “inexistentes” e as poucas que se viam
pela cidade tinham uma vida curta, pois eram ceifadas pelas moléstias. Em relatório produzido por
Oswaldo Gonçalves Cruz no ano de 1910, quando esteve em missão na região, o sanitarista estampou
suas impressões sobre as crianças, assim relatando: “a população infantil não existe e as poucas
crianças que se vêm têm vida por tempo muito curto. Não se conhecem entre os habitantes de Santo
Antônio pessoas nascidas no local: essas morrem todas.” (CRUZ, 1910, p.11-12). Especificamente,
sobre as crianças com as quais teve contato na cidade de Porto Velho assim externou: “[...] A região
está de tal modo infectada que sua população “não tem noção de que seja o estado hígido”, e para
ela a condição “de ser enfermo” constitui a normalidade. As crianças – as poucas que existem –
inquiridas sobre o estado de saúde respondem simplesmente “não tenho moléstia, só tenho baço”.”
(CRUZ, 1910, p.45).
Apesar de serem consideradas poucas ou quase inexistentes como expresso na opinião do
sanitarista, as crianças necessitavam de instrução e educação que fossem ofertadas em instituições
escolares voltadas para sua formação. Sendo assim, os primeiros dados relativos à criação de uma
instituição escolar para atender a infância ocorre em 1917, na modalidade mista que começou a
funcionar em um salão do prédio da Associação Instructiva Recreativa e Beneficente de Porto
Velho que sob a incumbência do município contou com uma média de 44 crianças matriculadas
na época. Uma escola pública mista estadual vai ser instalada na cidade em 1918, sendo nomeada
pelo governador do Estado do Amazonas Alcantara Bacellar, para exercer efetivamente a cadeira
de professora, a normalista Alice Borges. Paralelo às instituições escolares públicas na modalidade
isolada urbana, funcionavam também em Porto Velho algumas escolas particulares (como os
colégios administrados pela ordem religiosa dos Salesianos e outros oriundos de pessoas físicas) e
escolas rurais.
Um recenseamento oficial da população infantil de Porto Velho (de zero a 12 anos) foi realizado
no ano de 1925 no intuito de se conhecer o número exato de crianças existentes na cidade em idade
escolar. A partir disto passou a ser incorporada nos discursos do Interventor estadual a defesa pela
obrigatoriedade do ensino, adotando como exemplo o que já acontecia em São Paulo e Minas
Gerais. Os dados apontavam também que somente duas escolas públicas existentes na cidade eram
insuficientes para atender a demanda e com a mobilização da imprensa e de homens influentes em
vários setores da cidade, a modalidade graduada foi implementada no ano de 1925 com a criação
do Grupo Escolar Barão de Solimões pelo interventor do Amazonas, Alfredo Sá, sob a condição de o
município oferecer o prédio para instalação desta instituição escolar.
Na imprensa local foi possível localizar vários debates sobre esta modalidade que geraram lutas
de representações (CHARTIER, 1990) no interior dos vários segmentos, tendo início desde o projeto
à publicação de uma legislação municipal via Lei nº 75, de 25 de março de 1919 (JORNAL ALTO
MADEIRA, edição n. 00194, p. 5), que autorizava o superintendente municipal a reservar uma área de
terreno do patrimônio municipal para a construção do prédio para abrigar essa instituição escolar. O
Grupo passou a funcionar em prédio provisório no pavilhão da Sociedade Beneficente Portuguesa,
situada à Rua Duque de Caxias, feito de madeira, com cerca de balaústra.
Apesar dos debates na imprensa e dos esforços, o Grupo Escolar Barão de Solimões funcionou por
mais de quinze anos em outros prédios provisórios alugados até que no dia 01 de agosto de 1940 foi
instalado em sede definitiva, num edifício construído e mobiliado pela diretoria da Estrada de Ferro
Madeira Mamoré. Para tal instalação foi solenizada com uma festa escolar promovida pela Inspetoria
Regional do Ensino e noticiada pelo Jornal Alto Madeira. Assim como aconteceu em outros cantos
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Brasil, a instalação dessa instituição realizada num “suntuoso” edifício para atender as crianças
da cidade de Porto Velho fundaram aquilo que Diana Vidal (2005) denomina de “representação de
ensino primário” disseminando valores, normas (sociais e educacionais) e concebido como símbolo/
sinônimo de progresso e status para uma parcela da sociedade. Durante o período delimitado
constatou-se que em diferentes tempos e espaços se constituíram diferentes projetos de instituições
escolares na cidade de Porto Velho, que com suas singularidades e diferenças impactaram na vida
das crianças de maneiras variadas.
Referências
CHARTIER. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL. RJ: Bertrand, 1990.
CRUZ, Oswaldo Gonçalves. Considerações geraes sobre as condições sanitarias do Rio Madeira. Rio
de Janeiro: Papelaria Americana, 1910. Acervo Casa de Oswaldo Cruz: obras raras.
MAGALHÃES, Justino Pereira de. Tecendo Nexos: história das instituições educativas. Bragança
Paulista/SP. Editora Universitária São Francisco. 2004. Disponível em: http://hdl.handle.
net/10451/5924. Acesso em 13/10/2019.
NOSELLA, Paolo; BUFFA, Ester. Instituições escolares: porque e como pesquisar. Campinas: Editora
Alinea, 2013.
SANFELICE, José Luíz. História das Instituições Escolares. In: NASCIMENTO, Maria Isabel Moura
Nascimento et al. Instituições Escolares no Brasil. Conceito e reconstrução histórica. Campinas, SP:
Autores Associados: HISTEDBR; Sorocaba, SP: Uniso; Ponta Grossa, PR: UEPG, 2007. Cap. 5, p. 75-93.
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Uma instituição escolar “projeta-se para dentro de um grupo social. Produz memórias ou
imaginários. Mobiliza ou desmobiliza grupos de pessoas e famílias (...) é muito mais do que um
prédio que agrupa sujeitos para trabalharem, ensinarem, aprenderem e etc” (SANFELICE, 2006, p.
25). As instituições educativas guardam memórias e se constituem em espaços nos quais se tecem
parte da memória social de uma determinada cidade. E marcam de certa forma, a trajetória de vida
daqueles/as que as frequentaram. Não são autônomas, desconectadas da realidade social, cultural
e educacional da realidade que as produziram. Compõem a tessitura das cidades e carregam seus
traços. Se mantem guardadas nas memórias de alunos e ex-alunos, que um dia transitaram por seus
corredores. As instituições educativas, assim como os sujeitos que por elas transitam, são possuidoras
de uma memória assentada nas tradições orais que são transmitidas pelas gerações que se sucedem
e contemplam uma cultura escolar marcada por práticas cotidianas vividas no espaço escolar.
Quantas memórias guarda uma instituição de ensino? Quais as “marcas” que seus ex-alunos e alunas
carregam? Nesse sentido, o objetivo desse artigo é adentrar nos corredores do Colégio Imaculada
Conceição em Cáceres/MT a partir dos olhares de ex-estudantes dessa centenária instituição
educativa. Para tanto, utilizamos como fonte para a escrita desse artigo, relatos de memórias de
moradores dessa cidade, foram analisadas oito entrevistas de ex-alunos e alunas, que narraram
sobre os “tempos” de colégio entre as décadas de 1930 e 1950. Cáceres-MT, uma cidade do século
XVIII, possui duas instituições escolares centenárias. O Grupo Escolar Esperidião Marques, fundado
em 1912, instituição de ensino público e a outra, que será analisada a partir de seus ex-alunos e
alunas, é o Colégio Imaculada Conceição, o CIC, como é mais conhecido. Instituição de ensino
privado, foi fundada em 1907 pelas Irmãs da Congregação de Nossa Senhora da Imaculada Conceição
de Castres, foi ainda, a primeira instituição de ensino particular que atendia crianças do sexo
feminino na cidade. Entendemos as instituições educativas também enquanto “lugares de memória”
(NORA, 1993), em que “a memória é vida, sempre guardada pelos grupos vivos e em seu nome, ela
está em evolução permanente, aberta à dialética da lembrança e do esquecimento, inconsciente de
suas deformações sucessivas, suscetível de longas latências e súbitas revitalizações” (NORA, 1993, p.
3). O Colégio Imaculada Conceição foi durante muito tempo (e ainda é) uma instituição voltada à
formação de crianças das camadas elitizadas da cidade de Cáceres-MT, e buscava se destacar naquilo
que se tinha de mais moderno no processo educacional. A fundação do Colégio Imaculada Conceição
se deu aos dias três (03) de fevereiro de 1907, o advento foi muito comemorado pelos moradores de
Cáceres. Sua fundação marca a presença religiosa na educação cacerense, especialmente feminina.
No entanto, as raízes dessa instituição remontam ao ano 1836 quando a Madre Emilie de Villeneuve
fundou ao Sul da França a Congregação das Irmãs de Nossa Senhora da Imaculada Conceição de
Castres, ou Irmãs Azuis, como também ficaram conhecidas no Brasil. As Irmãs Azuis se notabilizaram
pelos seus trabalhos missionários, aos poucos a Congregação espalhou-se por muitos países, até
que em 1904 a convite do arcebispo de Cuiabá, Carlos Luís d’Amour, aportam-se nessa cidade seis
irmãs para assumirem a administração do Asilo Santa Rita. Ainda no início do século XX, as Irmãs
Azuis são chamadas a irem mais longe, a avançarem por caminhos novos e desconhecidos, atendendo
ao pedido dos Padres Franciscanos da Terceira Ordem Regular de São Francisco (TOR), juntamente
com a vontade de continuarem a missão de Emilie, fundadora da congregação, quatro irmãs lançam-
se pelo rio Paraguai com destino a São Luiz de Cáceres e em 1º de janeiro de 1907, após seis dias de
viagem chegam a esta cidade. Os motivos que possivelmente influenciaram as irmãs a se
estabelecerem em Cáceres/MT foram o surto de febre amarela, varíola e a peste bubônica que nesse
momento assolavam a região, assim como também a pobreza existente no lugar. No que diz respeito
ao colégio fundado por elas, não demorou para que a instituição ganhasse reconhecimento pela
qualidade do ensino que oferecia, conforme consta nas documentações e nas entrevistas, bem como
pelo caráter rígido das disciplinas impostas pelas irmãs responsáveis pelo colégio ao corpo discente
da escola. O colégio foi a primeira instituição de ensino particular voltada ao atendimento do público
feminino. É importante assinalar que meninos e meninas só ocuparão o mesmo espaço de
aprendizagem, a partir de 1989, no período anterior, embora houvessem meninos matriculados,
estes não ocupavam os mesmos espaços. Havia espaços destinados a meninas e outros para
meninos. O colégio em questão buscava promover uma educação pautada na valorização dos
princípios da fé cristã, aspecto comum nas instituições escolares fundadas e/ou mantidas por ordens
religiosas, comumente católicas, nesse caso, as Irmãs Azuis. O colégio está localizado desde a sua
fundação próxima à igreja Matriz, a Praça Barão do Rio Branco e o Rio Paraguai, área central da
cidade, esse local se constituía em um emaranhado de relações socioculturais em decorrência dos
mais diversos transeuntes e inúmeras relações sociais tecidas nesses espaços. As narrativas orais de
ex-estudantes foram fundamentais para compreender os significados do Colégio Imaculada
Conceição para a cidade de Cáceres. Desse modo, defende-se a relevância das narrativas orais como
fontes, visto que os relatos dos habitantes que vivenciaram a dinâmica da cidade de Cáceres revelam
“tempos” e “espaços” que se tornam conhecidos através do trabalho de rememoração. Daí a
importância dos relatos de memória, pois as expressões, o valor simbólico que alguns espaços
adquirem na memória coletiva da cidade, não são possíveis de serem percebidos em documentos
escritos. A memória torna-se importante categoria nas análises, enquanto campo de lutas, tensões
sociais e formas de dominação e legitimação de poder, uma vez que tem sido as circunstâncias quem
definiu, ao longo do tempo histórico, quais memórias e quais histórias deveriam ser consideradas
plausíveis. As narrativas orais possibilitam compreender os diferentes sentidos e significados que a
escola adquire na vida dos sujeitos. As narrativas dos ex-estudantes apontaram para uma série de
elementos presentes no cotidiano escolar do Colégio Imaculada Conceição em Cáceres/MT que até
a década de 1950, quando se tem a fundação de outra instituição primária de cunho particular, a
saber, o Instituto Santa Maria, se configurará como a principal responsável pela formação intelectual
das elites cacerense e consequentemente, ponto de partida para o ensino secundário. As narrativas
das(os) ex-estudantes reconstruíram e ressignificaram o passado, possibilitando conhecer e
compreender o espaço escolar e as significações destes para aquelas(es) que os compõem,
especialmente as(os) alunas(os), que no interior desse contexto, constituem o elemento fundamental
para as dinâmicas que se estabelecem nesses espaços. Admiração, respeito, temor, carinho, são
sentimentos que se misturam, e ao mesmo tempo eternizam sujeitos que há muito tempo já se
foram. Muito além de se perceber a presente instituição escolar em sua dimensão física, as narrativas
possibilitaram notar o outro lado, a versão/concepção do universo escolar aos olhos daquelas(es)
que geralmente são vistas(os) como espectadoras(es), e que na realidade constituem o centro/causa
da existência dessas instituições, ou seja, as crianças, adolescentes e jovens, que ao longo da história
foram silenciados, deixados no anonimato, especialmente as mulheres. Essas, assim como se pode
perceber, foram as que menos tiveram acesso ao benefício que segundo a lei, figura como direito de
todos, a saber, a educação. Desta maneira, a memória é importante categoria, enquanto campo de
lutas e tensões sociais e formas de dominação e legitimação de poder, “uma vez que tem sido o
poder estabelecido quem definiu, ao longo do tempo histórico, quais memórias e quais histórias
deveriam ser consideradas certas” (FENELON et al 2004, p.8). Com isto, propõe-se uma reflexão
sobre as lutas em torno da produção e silenciamentos de certas memórias e da cristalização de
outras, analisando o Colégio Imaculada Conceição, a partir dos olhares de ex-estudantes, o pensando
também como “lugar de memória”.
ISSN 2358-3959
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sua família. Portanto, as revistas, ao contrário dos relatórios não traziam as informações de forma
objetiva, mas sim com toda a profundidade que fosse necessária para atingir seus leitores. Em
relação às práticas pedagógicas evidenciadas nas Revistas Criança Excepcional, é notório o quanto
tal fonte agrega mais informações se comparadas aos Relatórios da Diretoria. Nas revistas, são
apresentadas temáticas como O jogo Livre como instrumento de diagnóstico infantil (1970), bem
como outras que já eram tratadas nos relatórios, mas que ganham uma nova roupagem nessa fonte,
como as questões relacionadas à educação sexual (1971), artística e de habilitação e reabilitação
vocacional (1975). O enfoque nas classes de treinamento intensivo (1974) também é marcante
nesses documentos.
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OS CURSOS DE FORMAÇÃO/ESPECIALIZAÇÃO
DE PROFESSORES NO ENSINO DO DEFICIENTE
AUDITIVO, NO BRASIL E EM PORTUGAL (1950-1980)
Somente na década de 1980 a concepção pedagógica começou a ser esboçada nos cursos de
formação do IAACF, em Portugal, no contexto reclamado pela integração.
O estudo da história comparada foi perspectivado, nestes termos, a partir das contribuições de
António Nóvoa (1995), que adotou a abordagem teórica do sistema mundial, alicerçada no sistema
de crenças da pós-modernidade, que coloca em xeque a ideia amplamente disseminada a respeito
da autonomia das sociedades nacionais e de suas histórias. Em um pensamento para além deste
aforismo, António Nóvoa chama a atenção para a emergência da operação da reconstrução histórica
que envolve “processos de difusão cultural ou análises globais das interdependências trans-
nacionais (NÓVOA, 1995, p. 18).
Deste modo, esta investigação, de cunho qualitativo, tratou da compreensão de uma realidade
idiográfica, complexa, vivida social, histórica e institucionalmente pelos sujeitos encarnados, ou
seja, por “homens reais, concretos, com interesses, valores também reais, concretos” (VIEIRA et
al., 1998 , p. 9). Esses sujeitos agiam em arranjos com seus semelhantes, em situações de conflitos,
resistências (veladas ou não) ou acomodações em uma instituição escolar.
A pesquisa foi realizada no Instituto Nacional de Educação de Surdos, no Brasil, onde se
encontram o Espaço Memória que conta com a Biblioteca Ana Rímoli de Faria Dória, um rico acervo
iconográfico e documental; o Arquivo Corrente da instituição assim como o seu Arquivo Permanente.
Em Portugal, as instituições investigadas foram o Instituto Jacob Rodrigues Pereira, pertencente à
Casa Pia de Lisboa e seu acervo foi encontrado no Centro de Documentação e Arquivo Histórico da
Casa Piano e no Instituto António Aurélio da Costa Ferreira, integrado em 1988 à Escola Superior de
Educação de Lisboa (ESELx).
As fontes consultadas nas instituições referidas foram, predominantemente: textos legislativos,
regulamentos, grades curriculares, planos de estudo, ordens de serviço, anuários, atas, relatórios e
dossiês dos gestores, registros de associações de professores e artigos de periódicos como revistas
organizadas por gestores e docentes, entre outros.
Com relação às fontes orais, foram entrevistadas cinco ex-normalistas, tendo cada uma delas
se formado em anos diferentes no Curso Normal do INES e, posteriormente, trabalhado como
professoras efetivas no colégio de aplicação da instituição, assim como nos seus Cursos de
Especialização no ensino do deficiente auditivo até início dos anos 1980. Também foi entrevistada
uma professora do Curso Normal do INES.
Em Portugal, foram entrevistadas três professoras que fizeram cursos de especialização nas
décadas de 1950, 1960 e 1980 no Instituto Jacob Rodrigues Pereira e no Instituto António Aurélio da
Costa Ferreira.
Estas entrevistas foram realizadas à luz da metodologia da História Oral, entendendo esta
como uma corrente historiográfica que enfatiza “[...] fenômenos e eventos que permitem, através
da oralidade, oferecer interpretações qualitativas de processos histórico-sociais” (LOZANO, 2006,
p.16), contribuindo, assim, para a compreensão dos fenômenos educacionais a partir de suas
interpretações da realidade social.
No transcurso da pesquisa foram identificados três modelos de formação que foram adotados no
percurso formativo das três instituições escolares/instituições de formação que se desenvolveram
de forma combinada ou com a predominância de um deles, dependendo da instituição escolar
formadora.
Assim, foi constatado um modelo que tendeu, prioritariamente, para uma concepção redutora
e normativa do ensino, em que o futuro professor de surdos ao articular os vários saberes
indispensáveis ao ofício docente foi se constituindo como um professor “executor” dos preceitos do
curso, em que também as experiências dos professores mais antigos foram assumindo importância
na prática pedagógica das gerações mais novas, modelo este encontrado, predominantemente, no
Curso Normal do Instituto Nacional de Educação de Surdos e nos cursos de especialização oferecidos
pelo Instituto Jacob Rodrigues Pereira.
Outro modelo encontrado foi o que se ocupou da transmissão dos conhecimentos oriundos
das ciências de base, sendo este modelo acadêmico mesclado ao modelo em que incentivou
as investigações científicas que (re)desenharam o perfil do professor de deficientes auditivos,
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encontrados, de uma forma geral, nos cursos promovidos pelo IAACF em resposta à demanda pela
integração dos alunos deficientes à rede regular de ensino.
A pesquisa apontou que a identidade histórica da instituição escolar passou pela compreensão
do tipo de socialização docente que foi realizada pelo percurso formativo do futuro professor e
a efetivada ao longo do exercício do seu ofício, além dos marcos institucionais e seus modos de
regulação.
Esses elementos operacionalizados através das interações entre os agentes escolares acabaram
por disseminar saberes, crenças e valores que apresentaram traços de homogeneidade entre
instituições escolares e de formação como o INES e o IJRP, dando a ver a circularidade de modelos e
concepções de educação de surdos que consolidou programas institucionais distintos que, contudo,
foram baseados na visão clínica da surdez, preponderante em relação aos aspectos pedagógicos
entre os anos 1950 a 1980.
Referências
Dubet, F. (2006). El declive de la instituición-professores, sujeitos e indivíduos ante la reforma del
Estado. Tradução de Luciano Padilla, Barcelona, Espanha: Gedisa editorial.
Lozano, J. E. A. (2006). Prática e estilos de pesquisa na história oral contemporânea. In Ferreira, M.;
Amado, J. (Orgs.). Usos e abusos da história oral. 8 ed., Rio de Janeiro: Ed. FGV.
Nóvoa, A. (1995). Modelos de análise em educação comparada: o campo e a carta. Tradução de Ana
Isabel Madeira do artigo publicado na revista Les Sciences de l’éducation pourl’ère nouvelle, n. 2-3,
pp. 9-61.
Vieira, M. P. A.; Peixoto, M. R. C.; Khoury, M. A. (1998). A Pesquisa em História. 4. ed. São Paulo: Ática.
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escolas, era necessário passar por um rigoroso exame de admissão (1931-1971), dessa forma,
candidatos de diferentes classes sociais ingressaram no ensino secundário, sem precisar custear
pelos estudos. A pesquisa se fundamenta no histórico do materialismo dialético, parte do
pressuposto que a história é um processo contínuo de transformação e que é necessário
entender a relação entre singular e totalidade. Assim, o estudo das instituições escolares
considera as contradições existentes, os condicionamentos históricos, políticos, sociais e
culturais presente no ensino secundário do Brasil, no contexto da sociedade capitalista. Como
procedimentos metodológicos foram analisados os documentos legais de âmbito nacional, pois
o governo federal que legislava a respeito do ensino secundário, tais como: Decreto nº 8.659
(1911), que decentralizou o ensino, os considerando corporações autônomas (ensino superior e
fundamental); Decreto nº 11.530 (1915), alterou as modificações feitas por Rivadávia Corrêa,
oficializou o ensino e estabeleceu a interferência do Estado na educação e mantiveram os seis
institutos de instrução secundária e superior; Decreto nº 16.782 (1925), O ensino secundário era
de seis anos e não era obrigatório; A Reforma de Francisco Campos (1931), nessa reforma,
introduziu-se o exame de admissão, que era uma prova que as crianças faziam para saber se
estavam aptos ao ingresso no ensino secundário ou não, assim sendo, a entrada de crianças
oriundas da classe trabalhadora ficou mais difícil. O exame era obrigatório de 1931 a 1971 e a
admissão para a educação superior se dava apenas para aqueles que concluíssem o ensino
secundário; Lei Orgânica do ensino Secundário (1942), promovida por Capanema, Ministro da
Educação de Vargas, o ensino dividido em dois ciclos, o primeiro com quatro anos, denominado
ginásio, e o segundo com duração de três anos, chamado de colégio, nesse último era dividido
em clássico e científico; Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1961), a educação era
dever da família e caberia ao Estado fornecer recursos indispensáveis, se a família faltasse.
Observa-se que a educação era direito a todos, porém, não constava questão da gratuidade a
todas as etapas. O ensino secundário continuou dividido em ginasial com duração de quatro
anos e colegial com duração mínima de três anos. As legislações nos mostram que o ensino
secundário era de interesse da União, mas que também não era para todos, muito menos
obrigatório, assim sendo, o ensino secundário era para a classe dirigente. Logo, o estado não se
preocupou com a criação desse tipo de escola. Para tentar amenizar a situação educacional da
classe trabalhadora, eles destinavam recursos financeiros para escolas privadas em troca de
bolsas de estudos para alunos pobres. O governo federal legislou a respeito do ensino secundário,
porém, não obrigava a criação de escolas para suprir a demanda, e o que cada estado/município
tinha que fazer, ou dar recursos para a implantação de escolas privadas destinadas a esse fim.
Dessa forma, o ensino secundário foi considerado elitista, a classe trabalhadora não tinha
condições de pagar por esse tipo de estudos, além disso, a população estava mais na área rural,
e as escolas de ensino secundário quando existiam, se encontrava em sua maioria na área
urbana. Existia no período de Vargas um embate entre aqueles defensores da escola pública,
pois para eles, os recursos públicos só poderiam financiar a educação mantida pelo Estado,
além disso, o estado deveria fiscalizar a manutenção de escolas privadas. Já para os privatistas,
o financiamento deveria ser ampliado para todas as escolas, sendo elas estatais ou não, dessa
forma, o ensino seria livre, pois para seus defensores a função seria da família na escolaridade
de seus filhos. No período da década de 1930, o conflito público e privado era principalmente a
questão religiosa, representantes do setor religioso privado queriam que as escolas públicas
fossem obrigadas a ofertar o ensino religioso. Na década de 1950 intensifica as discussões sobre
o destino da verba pública da educação, pois representantes do setor privado achavam-se no
direito de ter uma parte da verba pública. Essas relações se dão na sociedade capitalista, no
momento em que ocorreu um crescente aumento da população urbana, além disso, com a
industrialização, houve a necessidade de criarem novas escolas, porém, não existiam escolas
para todos, dessa forma, o espaço para a iniciativa privada para a criação de escolas ficou aberto.
Os resultados mostram que a legislação não estabeleceu sua obrigatoriedade, e em consequência,
a implantação dos primeiros colégios secundários no município foi assumida pelo setor privado.
A primeira escola secundária privada se instalou em 1917, e a primeira escola pública em 1939.
O município deu recursos financeiros, e matérias às instituições privadas em troca de bolsas
para alunos pobres. O ingresso às escolas públicas e privadas era mediante um exame de
admissão, que era excludente, dessa forma, tornava-se mais difícil para a classe trabalhadora
frequentar o ensino secundário, que passou a ser considerado elitista, para a classe dominante.
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Referências
BRITEZ, A. E. Memória e História: a educação secundária em Campo Grande sob a ótica de seus
agentes sociais (1920-1960). In: Jacira Helena do Valle Pereira Assis; Alice Felisberto da Silva (Org.).
Memórias do ensino secundário no sul de Mato Grosso no século XX. 1ed. Campo Grande, MS. Ed.
Oeste, 2015, v.1. p. 125-150.
BRITO, S. H. A. de. A educação no projeto nacionalista do primeiro governo Vargas (1930-1945). In:
HISTEDBR. Navegando na história da educação brasileira. Campinas: 2006. Disponível em: http://
www.histedbr.fe.unicamp.br/navegando/artigos_frames/artigo_101.html.
BUFFA, E. O público e o privado como categoria de análise da educação. In: José Claudinei Lombardi;
Mara Regina M. Jacomelli; Tânia Mara T. da Silva (Org.). O público e o privado na história da educação
brasileira: concepções e práticas educativas. 1 ed. Campinas: Autores Associados, 2005, v. 1, p. 41-58.
ISSN 2358-3959
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O presente trabalho tem como objetivo investigar a escola primária paraense no período da
Primeira República a partir do estudo sobre o surgimento do Grupo Escolar Benjamin Constant.
Tendo como pressuposto fundamental compreender o surgimento dos grupos escolares dentro do
contexto histórico da política educacional da época.
Portanto, esta pesquisa tem como objeto a trajetória histórica do Grupo Escola Benjamin
Constant no contexto da institucionalização da educação pública no período da Primeira República.
Neste sentido, o lapso temporal compreende a década de 1920, mais especificamente o ano de
1922 a 1927. Essa limitação de tempo ocorreu pelas fontes encontradas, pois mesmo o grupo sendo
fundado em 1901, não encontramos documentos desta época, o que conseguimos encontrar foram
relatórios administrativos do segundo decênio do século XX.
Para esta pesquisa optou-se por realizar uma pesquisa bibliográfica e documental. Com relação
à pesquisa bibliográfica, utilizamos como suporte histórico autores como Saviani (2005; 2006; 2008),
Nagle (2001), Souza (1998; 2006), Faria Filho (2000), entre outros autores para caracterizar uma
revisão da literatura ou uma revisão bibliográfica, que segundo Lima e Mioto (2007), é requisito de
qualquer pesquisa.
Com o intuito de atender os objetivos propostos também se fez necessário uma pesquisa
bibliográfica, que segundo Oliveira (2007) é o estudo e a análise de documentos de domínio científico
tais como livros, periódicos, enciclopédias, ensaios críticos, dicionários e artigos científicos, com a
finalidade de proporcionar ao pesquisador o contato direto com obras, artigos ou documentos que
tratem do tema em estudo.
Com relação à pesquisa documental, a mesma pode ser confundida com a bibliográfica, mas há
diferenciações no que se referem aos instrumentos utilizados, como aponta Oliveira (2007), pois na
pesquisa documental os documentos não recebem nenhum tratamento científico, como é o caso
dos relatórios, reportagens de jornais, revistas, cartas, filmes, gravações, fotografias, entre outras
matérias de divulgação.
Neste viés, realizamos buscas em sites de publicações acadêmicas e na plataforma da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES. Além de buscas eletrônicas
realizamos pesquisas no setor de obras raras da Biblioteca Pública Arthur Vianna, localizada no
Centro Cultural Tancredo Neves - CENTUR e no Arquivo Público do Estado do Pará - APEP, nesses
locais tivemos acesso as mensagens dos governadores paraenses da década de 1920, além de
decretos, regulamentos escolares, jornais e revistas da época.
No contexto educacional a história tem um papel relevante para compreendermos melhor o
atual cenário da educação brasileira. Saviani (2002) aponta no sentido de que é a própria dinâmica
social que acaba por criar contradições, as quais apresentam como consequências novas formas de
produções do homem. Sendo assim, para que haja esta compreensão faz-se necessária a apropriação
do contexto histórico para problematizar a realidade vivenciada, tendo por base a investigação do
passado para se discutir os processos sociais vividos no presente, contribuindo com isso para a
formação de pessoas com uma visão mais ampla do mundo.
Neste sentido, destacamos o século XIX, que segundo Souza (2006) foi um período marcado pelo
discurso do movimento de escolarização em massa, momento em que houve uma propagação da
ideia de escola pública para todas as classes sociais. Com isso, se previa o avanço do país em sintonia
com o desenvolvimento social e econômico.
No entanto, para que se alcançasse esta meta seria necessária a organização dos currículos do
ensino de forma a racionalizá-los e padronizá-los com o objetivo de atender um maior número de
analfabetos. Já que antes do período Republicano, isto é, no Império, a educação era voltada apenas
para as classes mais elitizadas.
O final do século XIX se insere na historiografia brasileira como sendo o início da consolidação
da educação pública, marcado por muitas alterações na história do Brasil, como pela Proclamação
da República, com a transição do antigo regime presente no país para uma nova conjuntura
administrativa, gerando transformações nas questões políticas, sociais, econômicas e educacionais.
Esta transição de governo propiciou a defesa da instrução como elemento de integração do
povo como uma nação, favorecendo a necessidade de produção de uma nova escola, organizada de
acordo com os interesses do projeto educacional da nova ordem que se implantava.
No período republicano a educação popular tinha o papel de formar cidadãos, os quais
possibilitariam a consolidação do regime, como também promover o desenvolvimento social e
econômico. Estas características podem ser visualizadas conforme Souza (1998) revela em seus
estudos, na medida em que:
A escola primária republicana instalou ritos, espetáculos e celebrações, em nenhuma outra época,
a escola primária, no Brasil, mostrara-se tão francamente como expressão de um regime político.
De fato, ela passou a celebrar a liturgia política da República; além de divulgar a ação republicana,
corporificou os símbolos, os valores e a pedagogia moral e cívica que lhe era própria. (SOUZA, 1998,
p. 124).
A República nasceu pautada na firmação de valores fundamentais para o indivíduo, almejando a
formação de cidadãos e para isso ser possível era necessária uma educação mais abrangente, pois
ela se tornaria o mais forte instrumento para a consolidação do regime republicano.
Para tanto, sendo imprescindível a organização de uma nova escola organizada de acordo com
os interesses do projeto educacional da nova ordem que se implantava. Nesse sentido, fazia-se
primordial uma formação integral do povo tanto moral quanto intelectual que segundo Souza (1998,
p. 27) necessitava de “um amplo projeto civilizador que foi gestado nessa época e nele a educação
popular foi ressaltada como uma necessidade política e social”.
Neste cenário surge a instituição dos Grupos Escolares, que segundo Saviani (2005) constitui-se
uma grande inovação:
[...] criados para reunir em um só prédio de quatro a dez escolas, compreendidos no raio da
obrigatoriedade escolar. Anteriormente a essa organização as escolas primárias, eram chamadas
também de primeiras letras, essas classes denominadas de escolas isoladas ou avulsas e unidocentes.
(SAVIANI, 2005, P. 24).
Portanto, em meados do século XX, há o surgimento dos grupos escolares, os quais segundo Faria
Filho (2000) ganham destaque, pois naquele momento a escola é marcada pela centralidade, por ser
um local específico e adequado para uma educação que agora também é especializada.
No cenário paraense o primeiro grupo escolar, segundo França (2013), foi criado em 1899 no
interior do Estado, já na capital o primeiro grupo foi criado em 7 de janeiro de 1901 com o nome de José
Veríssimo. Alguns meses depois em 12 de agosto surgiu o 2º Grupo da Capital, que posteriormente
foi chamado de Grupo Escolar Benjamin Constant.
Com a pesquisa nos foi possível encontrar alguns achados a respeito do Grupo Benjamin Constant,
poucos foram sobre a primeira década de sua criação, a grande maioria dos documentos achados
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 555
e os mais relevantes foram datados do segundo decênio. As principais fontes primárias foram os
relatórios administrativos da diretora Aurelia de Seixas Franco, que administrou o grupo durantes os
anos de 1922 a 1927. Nestes relatórios constavam um pouco do cotidiano do ambiente escolar, como
frequência de alunos e funcionários, divisão de turmas por professores, organização do espaço,
eventos, condição estrutural do prédio, além de muitas passagens que exaltavam a República e o
patriotismo.
Por meio desses documentos nos foi possível identificar a situação vivenciada pela instrução
pública da época a partir dos relatos da diretora, como também comparar essas informações com as
contidas nas mensagens dos governadores da época, que apontavam em seus discursos a intensa
crise financeira vivenciada pelo estado do Pará com o fim do apogeu da economia gomífera, situação
que influenciou diretamente em diversos segmentos da sociedade, principalmente no setor da
educação, o qual sofre com cortes de verbas, falta de pagamento dos docentes e um sucateamento
da estrutura predial e de materiais pedagógicos dos grupos escolares existentes no estado do Pará.
Referências Fundamentais
FARIA FILHO, Luciano M. dos pardieiros aos palácios: cultura escolar e urbana em Belo Horizonte na
Primeira República. Passo Fundo: UPF, 2000.
NAGLE, Jorge. Educação e Sociedade na Primeira República. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.
SAVIANI, Dermeval et al. O legado educacional do século XX no Brasil. Campinas: Autores Associados,
2004.
SOUZA, Rosa Fátima de. Templos de civilização: a implantação da escola primária graduada no
Estado de São Paulo: (1890-1910). São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Gisele Belusso
Os municípios constituem esferas de ação na disseminação da educação, pois não tendo a quem
repassar suas responsabilidades por vezes assumiram tarefas que não eram suas ou criaram
maneiras de resolver questões locais. A presente comunicação pretende apresentar o conjunto de
instituições escolares primárias administradas pelo poder público municipal de Farroupilha/RS. A
pesquisa insere-se no campo da História da Educação à luz da categoria historiográfica município
pedagógico cunhada por Justino Pereira de Magalhães, na primeira metade do século XX. Ela tem
sido utilizada como uma categoria em formação e assim compreendida provisoriamente por
Gonçalves Neto (2015, p.33) como “[...]como uma entidade político-administrativa presente no
Brasil, possibilitada na segunda metade do século XIX [...]”, assim justificada pela presença de
legislação descentralizada a qual compulsa aos municípios a regulamentação local. No entanto, ao
analisar as ações municipais, em especial na década de 1930 e 1940, em Farroupilha/RS, um
município do Rio Grande do Sul, percebe-se que apesar da implementação dos Grupos Escolares,
sob responsabilidade do Estado e de um período de centralização na Educação, a grande parte dos
estudantes do ensino primário continuam frequentando a escola pública municipal. Assim, foi o
município que seguiu administrando a maior parte das iniciativas de escolarização, além de ser ele
que organizou a implementação dos Grupos Escolares, a mediação com as comunidades por
solicitação de escolas, dentre outras questões. Assim, compreende-se que a categoria historiográfica
município pedagógico pode ser utilizada para analisar os espaços de autonomia, mediação e
coparticipação dos municípios na primeira metade do século XX. O que se torna possibilidade ao
deslocar o foco das ações das Câmaras Municipais para as ações da equipe administrativa no período
do Estado Novo, em especial pelos investimentos realizados pelas administrações municipais. Nesta
perspectiva, são os pressupostos teórico-metodológicos da História Cultural que pautam a análise,
tendo como categoria de análise o município pedagógico, valendo-se da análise documental
enquanto metodologia. Os documentos mobilizados para a análise proposta são as fotografias de
prédios escolares, plantas arquitetônicas, históricos de instituições escolares, correspondências
emitidas e recebidas da Prefeitura Municipal de Farroupilha e periódicos em circulação na Região
Colonial Italiana. Ao emancipar-se politicamente o município de Farroupilha assume uma série de
escolas que já estavam em funcionamento e antes pertenciam aos municípios de Caxias, Bento
Gonçalves e Montenegro. Assim, a municipalidade manteve em funcionamento essas escolas e abriu
mais onze instituições escolares nos primeiros dez meses da administração totalizando assim 42
escolas municipais de ensino primário no ano de 1935. Ainda quanto ao número de aulas em
funcionamento, em outra publicação O Almanaque Ilustrado(1939, p. 39) a informação sobre o
mesmo ano diverge “atualmente a Prefeitura mantêm em franco funcionamento e com matrícula
bastante apreciável 45 aulas[...]”, ou seja, dentro de um mesmo ano da administração o número de
aulas municipais modificou-se indicando que a abertura e fechamento de aulas fez parte da rotina
da administração pública no período. Os fechamentos de escolas no ano de 1939 têm relação com a
criação dos grupos escolares. Pois as aulas de número 26, situada na Sardenha Velha, regida pela
professora Lidia Schulke e número 17, localizada na Vila Jansen, regida pela professora Maria Troian
por estarem a menos de 2.500 metros de um Grupo Escolar, foram extintas, conforme orientação
expedida por circular da Secretaria da Educação do Estado (FARROUPILHA, Ato 185, 1939). No ano
anterior, 1938, a aula número 42, localizada no Travessão Trentino, São João, foi extinta pela baixa
frequência, entretanto caso houvesse a matrícula de “alunos filhos de contribuintes neste município,
alcancem o número mínimo de 25” a aula seria reaberta no ano de 1939. (FARROUPILHA, Ato 147,
1938). Em 1939 são reabertas duas aulas a primeira na linha República e a segunda na linha Alencastro
sob a justificativa de terem cessado os motivos que haviam determinado seu fechamento
(FARROUPILHA, Ato 174, 1939). Portanto os motivos para abertura e fechamentos de aulas foram
também motivados pela infrequência e pela instalação de grupos escolares estaduais no munícipio.
Em 1940, conforme divulgação do Jornal A Época, 1940[1] em Farroupilha havia 41 aulas municipais,
6 estaduais e 4 particulares. O número das instituições é um dado a ser relativizado, pois as análises
até então permitem afirmar que a abertura e fechamento de aulas era um processo em constante
movimento por diversos motivos, dentre eles: a falta de professor, os prédios escolares em condições
precárias, a abertura dos grupos escolares e aulas isoladas, etc. As instituições, em sua grande
maioria localizavam-se nas áreas rurais, em prédios improvisados ou construídos pelas próprias
comunidades em terrenos doados para sediar a escola. À exemplo, apresento a manifestação quanto
a estrutura física expedida pelos membros da comissão da escola municipal de São Marcos, de 14 de
março de 1935, em que alegam “que o prédio onde funciona dita escola é propriedade particular,
como o respectivo terreno também.” Diante disso negociam a doação à Prefeitura Municipal, caso
ela assuma o 600$000 da dívida restante que era de 3:700$000 que se refere a construção do mesmo.
O que apresenta um processo muito comum no município a doação de terrenos para as escolas no
interior e a construção do prédio escolar pela comunidade com recursos próprios. Por vezes, essas
construções, na década de 40, já estavam em condições precárias como a da comunidade da Linha
Boêmios, em 1940, A “casa onde a escola está instalada é pequena, antiga e está desmoronando.
Com 40 alunos e o número aumentando a comunidade vai construir uma nova casa e pede orientações
para prefeitura.” O que denota que as comunidades sentem-se responsáveis pelos prédios escolares
e assim pede orientações quando da necessidade de adequar as condições para atender os alunos
da comunidade. Ainda é preciso considerar que garantir o prédio escolar significava manter a escola
aberta no local, o que se percebe a seguir. Na comunidade da Linha Machadinho foi realizado um
acordo entre o poder público e a comunidade. Em correspondência da comunidade, em 2 de
fevereiro de 1937, os moradores “reclamam da distância da escola, [a] mais próxima em “Sardenha
Velha” [fica a] (três km). Pedem uma aula que ficaria localizada na casa de Pedro A. Silvestrin, naquele
distrito.” Ainda indicam a professora Theresa Silvestrin para dirigir a escola, a ser nomeada. A
informação do subprefeito Modesto Picolli aponta de que deveriam os moradores construir a casa e
o poder público então “daria” a professora no ano seguinte. Outras correspondências denotam que
a comunidade não disponibilizar o prédio para a escola acaba por justificar a negativa de abertura de
novas instituições escolares como a da comunidade da Turma 18, do 3º distrito, em 6 de abril de
1937, em que “pedem a criação de uma aula. Sugerem como professor João Luiz Primaz, que regeu
aula criada pelo município de Montenegro no ano 1926”. No verso da correspondência existe uma
observação escrita pelo subprefeito, Modesto Picoli, de que não há prédio em condições para ser
instalada a escola, o que nos permite compreender que as solicitações das comunidades eram
realizadas na prefeitura e quem verificava as se havia prédio em condições era o subprefeito. E não
ter um prédio em condições tinha como consequência a negativa da solicitação da comunidade,
mesmo que existindo a necessidade e alunos a espera daquele atendimento. Consta em anexo a esta
correspondência uma lista com o nome dos 28 alunos que frequentariam a escola, com filiação,
idade, cor, sexo, localidade e observações. Diante da listagem é possível auferir que diversas crianças
eram irmãos da mesma família com idades entre 7 e 13 anos, com cinquenta por cento do público
feminino, todos residentes na localidade de Turma 18. O cotidiano era organizado com um único
agrupamento de alunos de diferentes adiantamentos ou séries, com um professor, ou melhor
professora, pois em sua maioria eram mulheres.
[1] Jornal A Época, Caxias, 1 de setembro de 1940, ano II, n. 95, p. 11. Disponível em:<http://memoria.bn.br/DocRead-
er/097209/443>. Acesso em: 18 jun. 2018.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 558
Referências
GONÇALVES NETO, Wenceslau. Repensando a história da educação brasileira na Primeira República:
o município pedagógico como categoria de análise. In: NETO, Wenceslau Gonçalves Neto; CARVALHO,
Carlos Henrique de. (Org). Ação Municipal e Educação na Primeira República no Brasil. Belo
Horizonte: Mazza Edições, 2015.
MAGALHÃES, Justino Pereira de. Do Portugal das Luzes ao Portugal Democrático: Atlas-Repertório
dos Municípios na Educação. Lisboa: Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, 2014a.
(Estudos e ensaios). Disponível em:< http://repositorio.ul.pt/handle/10451/18286>. Acesso: 05 de
jun.2018.
Documentos acessados
Almanaque ilustrado, 1939.
Correspondência dos membros da comissão da Escola Municipal de São Marcos para Prefeitura
Municipal de Farroupilha, em 14 de março de 1935.
Esta pesquisa é sobre a relação museu e escola na cidade de Tiradentes e visa a compreender
como a instituição museal articula suas práticas com a comunidade e, assim discutir sobre a noção
de patrimônio.
Após realizar estágio em um museu, considerando a importância histórica de Minas Gerais, nos
ensinamentos adquiridos na graduação e pós-graduação, decidi tentar o mestrado com o objetivo
de aperfeiçoar meus conhecimentos, contribuir com reflexões para a temática educação em museus,
priorizando nosso patrimônio, ressaltando nossa comunidade em busca de uma pesquisa científica
que privilegie nossa região.A intenção é refletir sobre nosso patrimônio material e imaterial. A
importância de nos compreendermos como parte de contextos histórico e reconhecer que é preciso
preservá-lo, uma vez que nossa cultura está em constante movimento.
A partir da tríade relação museu-escola-comunidade, penso em como minha inquietação como
pesquisadora me impulsionou a refletir sobre esse contexto. Em uma noite de “Recital do Órgão de
Tubos” oferecido gratuitamente pelo Museu Regional de São João del-Rei, no ano de 2011, observei
um senhorzinho no passeio em frente à porta, apreciando o recital. Fui até ele e o convidei para
entrar, mas ele, muito envergonhado, me disse que estava saindo do trabalho, estava sujo e que
aquele lugar não era para ele. Insisti, mas não obtive êxito. A situação me causou incômodo. Por que
não era lugar para ele? Era um evento gratuito. A partir dessa experiência, vários questionamentos
começaram a surgir: Quantas pessoas mais pensam da mesma maneira? Por que essas pessoas não
se sentem pertencentes a esses espaços que também são públicos? Como democratizar os espaços
de cultura para a população local? Como promover ou facilitar esse acesso? E os alunos, nesse
contexto, como se apropriam destes espaços? As escolas e os museus facilitam esse acesso?
Nessa pesquisa, ainda em fase inicial, busco compreender como se efetivam os laços entre
a escola e o museu, como os alunos se apropriam dos bens patrimoniais culturais da cidade,
como as instituições culturais promovem o acesso para a comunidade mais carente (econômica e
culturalmente), como os alunos percebem o patrimônio da cidade, como sensibilizar e dialogar com
o museu, com a escola.
Partindo do pressuposto de que um sujeito, quando se sente pertencente a determinado lugar,
cria vínculos afetivos, sensibiliza os que estão mais próximos e assim pode colaborar com esse
local para preservá-lo e, dessa forma, pode manter viva a história, a memória desse lugar. O saber
local, a memória coletiva, criam condições para a construção e interpretação de sentidos ao viver,
conforme Meneses (2013). Para grande parte da população local, as visitas escolares são, geralmente,
a primeira e única possibilidade de ir a um museu. Assim, a relação entre escola e museu pode
facilitar a ampliação do público dos museus e, ao mesmo tempo, favorecer a preservação do nosso
patrimônio.
Considerando essas ideias, a pesquisa de mestrado tem sido desenvolvida a partir de um estudo
de caso, realizado no Museu Casa de Padre Toledo e nas três escolas da rede pública da cidade de
Tiradentes (MG). O Museu Casa de Padre Toledo ainda não foi objeto de estudo de pesquisadores
e é uma instituição que guarda uma parte importante da história de Minas Gerais, do Brasil. O
casarão que se tornou museu, com seus forros pintados, é um exemplar único da arquitetura civil
colonial e o circuito expográfico oferece informações sobre a Inconfidência, a povoação da antiga
Vila e o cotidiano das Minas, a partir de acervo diverso. Assim, a pesquisa poderá acompanhar de
perto os desafios que uma instituição de guarda da memória encontra, estando inserida em uma
cidade que é patrimônio histórico tombado pelo Iphan e com um forte turismo, mergulhado no que
se pode denominar de “indústria cultural” (CHOAY, 2006). A escola e o museu são instituições que
unidas favorecem o aprendizado do aluno, podem ter um aspecto importante em sua formação, na
construção de experiências, conforme Larrosa (2015). Os sujeitos têm o direito de se apropriar da
sua cidade, preservar sua história, cultura e costumes, identidade e memória.
No presente estágio da pesquisa, foi realizada uma revisão bibliográfica com o objetivo de se
perceber como o tema relação museu-escola-comunidade vem sendo trabalhado nos últimos
dez anos. O interesse é o de analisar publicações que versam sobre museu e escola, pensando
na articulação com as comunidades nas quais os museus se encontram. Muitos dos trabalhos
encontrados se referem a patrimônio como bem material nas áreas como arquitetura, políticas
públicas, arqueologia, ensino de História no ensino fundamental e médio e gestão de patrimônios.
Sobre “museu” foram encontradas sobretudo referências a museus de ciências, referindo-se às
áreas biológicas e geográficas. Portanto, museus de história tem sido pouco estudados, o que leva a
identificar uma lacuna no campo em questão.
A respeito do Padre Toledo não foi encontrado um trabalho de pesquisa sequer, apenas algumas
menções a ele e sua atuação como articulador na Inconfidência Mineira. Quanto ao Museu Casa
de Padre Toledo, há somente um livro, que registra o processo de restauração pelo qual o museu
passou, concluído em 2012. Tais constatações revelam a necessidade de se estudar este museu,
especialmente neste momento, em que, como dito, o museu está reestruturando sua expografia
e seu setor educativo. As escolas podem e deveriam contribuir, atuar e trabalhar com a educação
patrimonial. Considero que a instituição escolar deveria se propor à formação do cidadão de
forma integrada. Em alguns casos, a escola não possui autonomia para desenvolver projetos que
possam contribuir para o aprendizado das noções de tempo histórico, identidade social e memória
individual e coletiva. Muitos professores ficam limitados à imposição de um currículo que não
expressa as necessidades dos alunos, ficando as ações docentes restritas às salas de aulas. Também
há que se considerar que a escola, muitas das vezes, ainda reproduz a cultura dominante e as
estruturas de dominação entre as classes sociais. Em certos aspectos, a escola ainda é reprodutora
das desigualdades sociais, conforme Bourdieu (2007). E as classes populares, de modo geral, não
se veem como frequentadoras de instituições culturais, dificultando, assim, práticas que poderiam
fazer com que a sociedade fosse menos desigual culturalmente. Apesar disso, a partir de Freire
(1987), podemos priorizar a dialética, considerando alternativas na escola e a possibilidade de que
sempre ocorrem avanços, pois somos seres em movimento e nossa práxis demonstra essa constante
movimentação.
A escola poderia valorizar a cidade da qual faz parte, conhecer os alunos que a frequentam,
valorizar a identidade e a história local. Diante disso, considero que Tiradentes ainda tem muito
que se preocupar com a formação dos alunos para além do que é realizado no sistema escolar, uma
vez que há outras instituições educativas que também podem fazer parte do cotidiano cultural dos
estudante, como os museus e centros de culturas, além do próprio centro antigo da cidade.
O objetivo dessa pesquisa é compreender como um museu histórico, mantido por uma
universidade pública, em uma cidade antiga e extremamente turística, se relaciona com as escolas
da cidade de Tiradentes e, ao mesmo tempo, como as escolas se relacionam com o referido museu.
A partir daí, refletir sobre as políticas que norteiam as atividades dos museus e os atuais cortes
orçamentários na área da cultura, pesquisar a história do Museu Casa de Padre Toledo, compreender
a inserção desse museu na cidade de Tiradentes, pesquisar sobre pertencimento, identidade e
memória.
Por se tratar de um estudo de caso, nesta pesquisa tem sido utilizadas diversas abordagens para
o levantamento dos dados a serem analisados, como a análise documental, observação, observação
participante, entrevista semi-estruturada, questionários.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 561
Os resultados preliminares nos mostram que o Museu está ressignificando seu setor educativo,
seu circuito expográfico. Busca reformular suas atividades para priorizar o atendimento e se
inserir na comunidade. Os alunos das escolas locais possuem maior acesso aos bens culturais da
cidade através de ações educativas organizadas em parceria entre museu e escola. A universidade
pública, no caso a UFMG, busca facilitar esse diálogo. A maioria dos alunos não se apropria dos
bens patrimoniais, não participa da maioria dos festivais oferecidos no decorrer do ano na cidade,
vivendo suas experiências culturais fora do centro antigo de Tiradentes.
Referências
BOURDIEU, Pierre; DARBEL, Alan. O Amor pela Arte: os museus de arte na Europa e seu público. São
Paulo: Edusp/Zouk, 2007.
CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: UNESP, 2006.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido, 17ª. ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987.
LAROSSA, Jorge. Tremores: escritos sobre experiência. Belo Horizonte: Autêntica, 2015. Coleção:
Experiência e Sentido.
MENESES, José Newton Coelho. A vivência e a musealização da vida. In: XXVII Simpósio Nacional de
História e diálogo social. 2013. Natal RN. Disponível em http://www.snh2013.anpuh.org/resources/
anais/27/1364752618_ARQUIVO_ANPUH_Natal_Texto.pdf (último acesso em 20 de novembro de
2019).
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este artigo tem como proposta discutir o papel da Universidade do Estado do Amazonas, tendo
como foco a interiorização e formação de professores pelo Parfor na Universidade do Estado do
Amazonas, no período de 2009 a 2019. O recorte histórico selecionado tem como perspectiva o
período de inicio dos cursos e sua consolidação até o ano de 2019. O Plano Nacional de Professores
para Educação Básica (PARFOR) foi instituído, segundo Gatti (2011) como uma política nacional para
a formação de profissionais para o magistério da Educação Básica em parceria com as Secretaria de
Educação dos Estados e municípios e as IPES para ministrar cursos a nível superio. Com a aprovação
da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional em 1996, essas mudanças passaram a ser uma
necessidade urgente, uma exigência na vida profissional dos docentes, como garantia para assegurar
a finalidade da educação, o pleno desenvolvimento dos educandos, o preparo para o exercício da
cidadania, assim como, a qualificação para o trabalho, conforme o dispositivo previsto no art. 61 e
62. Nessa perspectiva, o decreto de n.6.755, de 29 de janeiro de 2009, institucionalizou a Política
Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica sob a atuação da
Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior – CAPES, com a responsabilidade de
fomentar a formação inicial e continuada de professores para a educação básica. Dentre os princípios
e finalidades do PARFOR, em seu art.2º, destacamos: a) a extensão da formação docente em todas as
etapas da educação básica; b) a formação ampla do profissional da educação, baseada em princípios
político e social de construção de uma sociedade democrática; c) o pacto federativo na viabilização
política e administrativa de promover a articulação entre o Ministério da Educação, as instituições
formadoras, sistemas e redes de ensino; d) a garantia de padrão de qualidade na oferta dos cursos
pelas instituições formadoras; e) a articulação teoria e prática no processo de formação docente e o
domínio de conhecimentos científicos e pedagógicos embasados na pesquisa, ensino e extensão.
Diante do exposto, a finalidade da política nacional consiste em ampliar o campo da formação
docente, no sentido de promover a equalização nacional da formação inicial e continuada na
perspectiva de reduzir as desigualdades sociais, através da educação. Com isso, no art. 11 do decreto
de n.7.755/2009, no inciso III, pontua que a oferta emergencial dos cursos de licenciaturas ou
programas especiais, contemplam docentes em exercício, com pelo menos três anos na rede pública
da educação básica. Por fim destinado aos graduados não licenciados, professores que atuam fora
de sua formação, professores com nível de ensino médio e projetos e programas de apoio à formação
continuada. Dessa forma a expansão do programa se consolida a partir de 2009 nos diversos estados
e municípios do Brasil. O gerenciamento pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES) desde 2009 tem como suporte, um sistema de rede denominado Plataforma Freire.
Dessa forma, a formação docente no Amazonas envolve fundamentalmente, a particularidade do
lugar, em seus aspectos geográficos, políticos e culturais que envoltos na dinâmica da diversidade e
da alteridade docente, considerando os aspectos globais e locais que emergem e singularizam a
prática de formação e de institucionalização. O Parfor, de fato, tem sido um programa audacioso e
impactante no universo amazônico, pelos desafios e complexidade de realização, e dar sentido aos
Palavras-chave: História da Educação em Mato Grosso. História das Instituições Escolares. Grupo
Escolar Visconde de Taunay.
O presente texto tem como objetivo compreender o percurso histórico do Grupo Escolar Visconde
de Taunay desde seu início em 1938 até o último registro em Diário Oficial de Mato Grosso em 1973 e
sua importância para a cidade de Guia Lopes da Laguna. Trata-se de uma pesquisa qualitativa inédita
e visa contribuir para a História da Educação e das Instituições Escolares do Mato Grosso e do Mato
Grosso do Sul. Objetiva-se compreender a importância dessa instituição para a constituição da
cidade de Guia Lopes da Laguna respondendo a questões como: qual o percurso histórico da criação
dessa instituição escolar até o último registro oficial que foi possível encontrar dela?; qual a
contribuição socioeducativa dessa escola para a cidade de Guia Lopes da Laguna?; essa escola
formava a elite local? Para contribuir na contextualização dos diferentes momentos que permearam
sua história, serão abordados aspectos políticos e históricos que contribuíram para o desenvolvimento
da região Sul de Mato Grosso após a Guerra do Paraguai, bem como os movimentos que foram
preponderantes para o início do Povoado de Guia Lopes até se constituir como cidade de Guia Lopes
da Laguna, em 1953. Por meio de análise da história do sul de Mato Grosso e da região de Guia Lopes
da Laguna, é possível constatar que, situado em um território fronteiriço estratégico, após a Guerra
do Paraguai se tornou uma região na qual houve a formação de uma elite agrária com o
desenvolvimento de latifúndios pecuaristas, que necessitava de investimentos econômicos para o
escoamento de suas produções. Esses investimentos na região ocorreram devido a ações
governamentais, principalmente as relacionadas à Marcha para o Oeste, a qual visava o
desenvolvimento e interligação do interior do país às demais regiões brasileiras. Para além das
questões econômicas, a expansão do ensino era também considerada como um dos objetivos da
Marcha para o Oeste, já que em lugares longínquos a difusão educacional ocorria mais lentamente
do que nos grandes centros. Quando os militares acamparam à margem esquerda do Rio Miranda
em 1937 na fazenda Jardim com a 1ª Companhia do 4º Batalhão de Sapadores, trouxeram as famílias
dos oficiais que a esta servia e dos operacionais da CER-3 (Comissão de Estradas de Rodagem). Nessa
localidade, se instalaram e durante as festividades da fundação do Povoado de Guia Lopes um
documento foi escrito solicitando a Getúlio Vargas a abertura de uma escola na localidade. Assim,
em 1938, foi criada a primeira instituição escolar no Povoado de Guia Lopes vinculado à cidade de
Nioaque-MT, ofertando o ensino primário a quarenta e cinco crianças de ambos os sexos. Inicialmente
nomeada como Escola Visconde Taunay, é oficialmente citada como Escola Rural Mista do Povoado
de Guia Lopes. Essa escola atendeu aos filhos de fazendeiros da região, da população local e dos
oficiais vinculados ao 6º Batalhão de Engenharia e se estruturou ao lado da Igreja São José. Em 1939,
ainda pertencente à cidade de Nioaque, recebeu oficialmente o nome de Escola Rural Mixta do
Povoado de Guia Lopes, sendo pertencente às Escolas Reunidas de Nioaque. No entanto, segundo
fontes secundárias, a escola continuava a ser identificada como Escola Visconde de Taunay pelos
moradores locais. As contradições nas informações localizadas com relação ao nome da Escola são
tratadas como dados importantes, já que foram essenciais para o desenvolvimento da pesquisa e
para a busca por documentos oficiais que contribuíssem na reconstrução do percurso histórico
dessa instituição escolar. Consideram-se como importantes para compreender a história dessa
escola, algumas particularidades no atendimento aos alunos, o ensino, o nome dos primeiros
professores, as dificuldades relacionadas ao mobiliário, a estrutura física da escola, bem como a
realidade das escolas da região de Nioaque quanto ao número de alunos e à necessidade de
ampliação do número de vagas. Baseados na Organização do Ensino Primário e Normal do Instituto
Nacional de Estudos Pedagógicos de 1942, e devido ao aumento do número de alunos e à expansão
do atendimento, em 1948, a escola se tornou Escolas Reunidas Visconde de Taunay. Sendo assim,
houve a necessidade de contratação de novos professores para melhorar o atendimento educacional.
A esse respeito, vale destacar que professores que não eram facilmente encontrados na região,
sendo necessário recorrer a normalistas de outras localidades ou a professores considerados leigos.
O Livro de Termo de Posse e Compromisso da Escola Visconde de Taunay evidencia as diversas
nomeações realizadas de 1950 a 1957 nas Escolas Reunidas Visconde de Taunay, bem como registros
e documentação educacional das demais escolas da cidade no final dos anos 50. Do ano de 1958 até
o final de 1959 houve um aumento de 60% do número de alunos, o que é considerado significativo.
Esse aumento fez com que em 1960 que a instituição fosse elevada a Grupo Escolar Visconde de
Taunay. Durante o período de 1938 a 1960, a instituição escolar passou por diversas adequações
quanto à sua estrutura física, no entanto permaneceu instalada ao lado da igreja São José, utilizando
além das suas salas de aula, o salão paroquial. Tornou-se uma referência educacional na cidade e,
fazendo uso de espaços conjuntos à igreja, contribuiu não somente para a manutenção da elite local,
mas também foi considerada pelos moradores como meio pelo qual aqueles que ali estudavam
ascenderiam socialmente. Vale destacar que no início dos anos 60, a escola também utilizava como
parte das dependências para o ensino um espaço cedido do prédio da prefeitura. O Grupo Escolar
Visconde de Taunay que acompanhou o desenvolvimento da cidade, era reconhecido por sua
qualidade e rigidez no ensino, bem como pela centralidade física de suas instalações. Em meados
dos anos 60, a escola precisou se adequar às necessidades educacionais da época e se instalou
fisicamente em um novo prédio, também na região central da cidade, que concomitantemente,
abarcava o Ginásio Guia Lopes. A partir de então, foram passíveis de diferenciação por meio do nível
de ensino oferecido e do período no qual os alunos estudavam (diurno ou noturno). No entanto,
para a comunidade local, começa a haver uma indissocialidade entre ambas as escolas até que em
1973 é encontrado o último registro daquela que foi a primeira instituição escolar de Guia Lopes da
Laguna, o Grupo Escolar Visconde de Taunay. Para fundamentar parte da história dessa escola em
seus diferentes tempos históricos foram utilizadas fontes primárias do Arquivo Público do Estado do
Mato Grosso e da IOMAT (Imprensa Oficial do Estado de Mato Grosso), bem como documentos de
domínio público (leis e regulamentações nacionais) e documentos do acervo da Escola Estadual
Salomé de Melo Rocha, atual responsável pelo arquivamento dos mesmos. Foram utilizadas também
fontes secundárias como entrevistas e o site do memorialista Dalmolin (2015 e 2018), que retrata
parte da história e da memória da cidade. No entanto, as informações obtidas no site do memorialista
são confrontadas com os dados obtidos nas fontes primárias. A influência da memória nessa
construção se dá a partir das contribuições de Pierre Nora (1993), quando esse pesquisador enfatiza
que a memória se tornou passível de ser estudada como um objeto que visa alargar a memória
coletiva, isso porque o Grupo Escolar Visconde de Taunay é parte da história local e do processo
constitutivo da cidade de Guia Lopes da Laguna. Por se tratar de um período extenso, que perpassa
mudanças intensas em nível nacional na Educação brasileira, fez-se necessário compreender as
diferentes tessituras políticas, bem como contextualizar as leis educacionais que entraram em vigor
durante esse período. Para fundamentação sobre o contexto histórico e as influências políticas na
propagação e organização do ensino primário e da educação no Brasil que envolveram os períodos
abordados (1938 a 1973), foram utilizados Saviani (2013), Ghiraldelli (2001) e Romanelli (1997). Esses,
dentre outros autores, analisam o percurso histórico e educacional brasileiro enfatizando a dualidade
existente nos diferentes períodos da educação brasileira e retratando o caminho percorrido no país
para a propagação do ensino. Petitat (1994) é utilizado como referencial teórico metodológico, pois
utiliza-se as mesmas categorias cunhadas por esse autor, quais sejam as categorias espaço (físico e
de poder), tempo e conteúdo enfatizando a formação da elite. A pesquisa realizada evidencia que o
percurso histórico do Grupo Escolar Visconde de Taunay, independente da nomenclatura utilizada,
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 566
contribuiu para a formação da elite local e acompanhou o crescimento do Povoado de Guia Lopes
até a criação da cidade de Guia Lopes da Laguna, colaborando socialmente por meio do ensino,
pois, além de atender os filhos da elite econômica, atendia também os estudantes de outras classes
sociais, sendo considerado como formador da elite cultural da cidade de Guia Lopes da Laguna.
Referências
NORA, Pierre. Entre Memória e História: a problemática dos lugares. Tradução: Yara Aun Khoury.
Projeto História. Revista do Programa de Estudos Pós - Graduados de História. PUC, São Paulo, n.
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SAVIANI, Dermeval. História das ideias pedagógicas no Brasil. 4. ed. Campinas, SP: Autores
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funcionamento ficara em torno de (9,8%), o que significou baixa superação quanto às dificuldades
metodológicas do estudo autônomo e quanto às promessas do ensino supletivo.
Referências
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Acesso em: fev. 2019.
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MONACO, Rosa Maria Garcia. Centro de Estudos Supletivos de Niterói: uma proposta de educação
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Professores, UERJ, São Gonçalo, 2017. 141p.
ISSN 2358-3959
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que ofereciam esta modalidade de ensino, além, do fato da instituição ter sido estadualizada neste
ano (1975).
Metodologia: A fim de atender ao propósito do presente estudo foi realizado levantamento
documental e bibliográfico, que servem de base para a realização de uma pesquisa que pode ser
caracterizada como um estudo de caso com uma base historiográfica e educacional, fundamentada
numa abordagem qualitativa. Para tanto será utilizado como recurso de pesquisa as fontes
documentais primárias, associadas aos periódicos de impressa encontrados, já que o estudo sobre
a escolarização pela imprensa possui um importante papel para a compreensão de processos
educacionais existentes em uma determinada época e localidade, permitindo assim a busca de
novas formas de se conhecer a educação pela utilização de outras fontes de informação. Sobre o uso
de jornais como fontes Le Goff afirma que o documento, “não é qualquer coisa que fica por conta do
passado, é um produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de força que aí detinham o
poder. Só a análise do documento enquanto monumento permite à memória coletiva recuperá-lo e
ao historiador usá-lo cientificamente”. (LE GOFF 2003, p. 535)
Vale também enfatizar que as páginas de um jornal revelam as particularidades das instituições
educacionais e também representam um material que possuí aspectos culturais, sociais, políticos
e econômicos, bem como formatação, redação, direção e os sujeitos dos quais compõem à equipe
do jornal. Para tanto, é preciso se considerar alguns fatores como “a história do periódico, o
posicionamento político dos dirigentes, donos, ou chefe de redação” (GRAZZIONTINI 2006, p.4). Posto
isto, percebe-se que cada fonte é singular e exige um conhecimento acerca de suas peculiaridades.
Inicialmente, os documentos foram fotografados, lidos, selecionados e analisados. Posteriormente,
foi realizada uma revisão de literatura com a finalidade de aprofundamento da temática.
Fontes: Como já apontado, o presente trabalho terá como base as fontes primárias encontradas
na Câmara e Prefeitura de Cajuri, como atas, resoluções, portarias, decretos e leis e os documentos
localizados no acervo deste educandário, que funciona até hoje, com o nome de Escola Estadual
Capitão Arnaldo Dias de Andrade, como as atas de fundação da escola, de reuniões, relatórios anuais,
de exames de admissão, de matrícula, de termos de visitas escolares, de termos de promoção, de
autorização para lecionar e de correspondências oficiais para a Arquidiocese de Mariana, visto que,
aparentemente, a origem deste estabelecimento está relacionada com a paróquia religiosa local.
Já as fontes secundárias locais foram identificadas nas páginas dos jornais A Cidade (1962-1967)
e Folha de Viçosa (1963-1973), além de livros produzidos por memorialistas locais que tratam da
história do município de Cajuri e de suas instituições, valores, etc.
Resultado: Com base no estudo inicial realizado constata-se que o Ginásio Santo Antônio foi
reconhecido pela portaria n º 309, de 21 de março de 1962, publicado no Diário Oficial União do dia
10 de maio de 1962, para continuar seu funcionamento na cidade de Cajuri, Minas Gerais, tendo sido
fundado como uma instituição particular no ano de 1961, pelo padre Oswaldo Renato Cunha. A partir
do ano de 1964 o referido ginásio passou a ser mantido pela Associação Presidente Kennedy, um
órgão de execução da paróquia de Santo Antônio de Cajuri destinado a manter cursos secundários,
teóricos e práticos voltados ao ensino de corte e costura, escolas para crianças, escola doméstica
para instrução e educação de moças, curso de alfabetização de adultos e supletivos.
Embora tenha sido uma iniciativa de cunho particular, o Ginásio também foi criado com o
intuito de oportunizar o acesso popular ao ensino ginasial por parte da população cajuriense, com
uma considerável oferta de bolsas para os alunos menos favorecidos economicamente. Segundo
documentos do acervo do educandário, para o ingresso na instituição era realizado o exame de
admissão à primeira série ginasial, pautado nos termos da Lei Orgânica do ensino secundário,
decreto nº4244, de 9 de abril de 1942 e nº 8347, de 10 de dezembro de 1945, com a realização de
provas nas disciplinas de Português, Matemática, Geografia e História do Brasil.
A análise de alguns documentos como o regimento interno do Ginásio, registro de matrícula
e aproveitamento, permite verificar que o estabelecimento ofereceu no período em estudo, os
conteúdos de português, matemática, história, geografia, inglês, francês, latim, desenho, educação
religiosa, educação moral e cívica, educação física e ciências.
Ademais, é válido ressaltar que o corpo docente deste educandário, era escolhido pelo pároco
responsável, o padre Oswaldo Renato Cunha, que dirigiu o estabelecimento durante 1961 e 1975, cujo
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 572
critério de seleção prezava por professores de moral exemplar que fossem católicos praticantes, e de
preferência, egressos de cursos oferecidos pela Escola Normal Nossa Senhora do Carmo, localizada
na cidade de Viçosa. Além disso, eram estimulados a realizar cursos de aperfeiçoamento durante as
férias em entidades educadoras relacionadas, preferencialmente, com a igreja católica.
Tomando por base os dados e informações analisados, percebe-se que o Ginásio Santo Antônio
oportunizou o acesso ao ensino ginasial, não só para a elite cajuriense, mas também para contingentes
da população que até então não tinham acesso ao ensino ginasial, oportunidade esta que será mais
ampliada, com a incorporação deste estabelecimento à rede estadual de ensino público, em 1975,
com o nome de Escola Estadual Capitão Arnaldo Dias de Andrade.
Referências
BRASIL. Portaria nº 309, de 10 de maio de 1962. Diário Oficial da União, Brasília, DF.
CELLARD, André. A análise documental. In: POUPART, Jean et al. A pesquisa qualitativa: enfoques
epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 295-316.
LE GOFF, J. História e Memória. Tradução de Bernardo Leitão et al. 5 ed. Campinas, SP: Editora da
UNICAMP, 2003.
GRAZZIONTIN, Francine. Imprensa: considerações para seu uso como fonte histórica. Semina:
Cadernos dos Pós-graduandos do Programa de Pós-Graduação em História, Universidade de Passo
Fundo, V.4(1), p.1-7,2006.
Com a busca de estudos que considerassem a cultura escolar, houve a realização de pesquisas
com novas temáticas, inclusive a história das instituições que como menciona Diniz (2012), é uma
vertente da história cultural por possibilitar a reflexão do cotidiano de um espaço educativo, além
de possibilitar a relação desse cotidiano com a sociedade. Burke (2005), conceitua história cultural
e o fazer dos historiadores que trabalham nessa perspectiva, o autor menciona que o “[...] terreno
comum dos historiadores culturais pode ser descrito como a preocupação com o símbolo e suas
interpretações. ” (BURKE, 2005, p. 10). Diante disso, estudar na perspectiva da história cultural,
as instituições que em determinado momento educaram pessoas, torna-se necessário para a
compreensão de diversos aspectos, inclusive os relacionados ao cotidiano e as vivências dos
sujeitos da instituição. A partir disso, considerando a história cultural, os objetivos do estudo cujos
resultados estão apresentados neste texto, consistiram em localizar pesquisas sobre instituições
realizadas com abordagem histórica, especificamente pesquisas sobre os Institutos de Educação
(IE) que funcionaram no estado de São Paulo, analisando-as a partir do mencionado por Magalhães
(2004). Para isso, realizou-se pesquisa bibliográfica com abordagem histórica sobre a temática,
consultando bases de dados com as palavras-chave “Instituto de Educação”. As consultas foram
realizadas nos seguintes locais: banco de teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES), base de dados da Universidade Estadual Paulista (UNESP) “Catálogo Athena”,
coleção de periódicos científicos brasileiros da biblioteca eletrônica Scientific Electronic Library
Online (SCIELO), banco de dados da Universidade de São Paulo (USP), base de dados da biblioteca
da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e o acervo da Biblioteca da Universidade Federal
de São Carlos (UFSCar), todos disponíveis on-line. Destacam-se que os Institutos de Educação,
tiveram a expansão para o interior do estado de São Paulo na década de 1960, funcionando no
estado de São Paulo de 1933 a 1975. Tinham como eixo central a formação dos professores e para
isso, atendiam do Jardim de Infância (atual Educação Infantil) até cursos de formação continuada
de professores. A partir dos procedimentos metodológicos mencionados, selecionaram os textos de
Reis (2015), Bontempi Júnior (2011), Tofoli (2003), Evangelista (1997, 2002), Pinheiro (2000), Camargo
(1997, 2000) e Nadai (1994). A maioria dos estudos estudaram o IE da capital, tendo como fonte
principal o jornal, também tiveram como procedimento metodológico a utilização da história oral,
de periódicos, de legislações, de fontes localizadas nas instituições e fontes arquivadas com pessoas
que foram membros da instituição, como ex-professores e ex-alunos. Magalhães (2004), traz reflexões
teóricas sobre as instituições educativas, além de trazer sugestões relacionadas à metodologia de
pesquisa nesse campo, tendo como objetivo tecer nexos sobre a história das instituições educativas
de maneira epistêmica, substantiva, metodológica e considerando a investigação. Destacam-se que
não houve a utilização de todas as fontes mencionadas em todas as pesquisas citadas, o que seria
importante para considerar a totalidade da instituição educativa, pois como menciona Magalhães
(2004) considerar a instituição educativa como totalidade, juntamente com a historiografia da escola/
escolarização, colabora com a construção da instituição educativa como objeto epistêmico. Para
Ainda sobre as interpretações das fontes o autor menciona que para interpretá-las, deve-se ter a
Referências
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São Paulo. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 41, n. 142, jan./abr. 2011. Disponível em: http://www.
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BURKE, Peter. O que é história cultural? Trad. Sérgio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, Ed.
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MAGALHÃES, Justino Pereira de. Tecendo nexos: história das instituições educativas. Bragança
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PINHEIRO, Ana Regina. A imprensa escolar e o estudo das práticas pedagógicas: o jornal ’Nosso Esforço’
e o contexto escolar do curso primário do Instituto de Educação (1936 a 1939). 2000. 126 f. Dissertação
(Mestrado em Educação)-Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2000.
REIS, Viviane Cássia Teixeira. A história da Didática no Instituto de Educação Leônidas do Amaral
Vieira – Santa Cruz do Rio Pardo (1953-1975). 2015. 219 f. Dissertação (Mestrado em Educação)–
Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2015.
Resumo
Na perspectiva da educação comparada, o presente estudo aborda as políticas de assistência e
educação à infância em Portugal e Pará, tomando o caso de dois estabelecimentos educativos que
objetivavam recolher, instruir e educar meninas desvalidas e órfãs: a primeira a Casa Pia de Évora
(1834-1928), situada na cidade de Évora, ao Sul de Portugal, idealizada pelo intendente Geral da
Polícia, Diogo Inácio Pina Manique; e a segunda o Orfelinato Antonio Lemos (1897-1911), situada no
Pará, ao Norte do Brasil, idealizado pelo intendente Municipal de Belém, Antônio José de Lemos. As
dinâmicas políticas e sociais da pobreza e da assistência em Portugal e no Pará se encontram em
tempos diferentes, mas seus reflexos vão aparecer com o objetivo de abrigar, instruir e educar
meninas desvalidas. No século XIX e início do XX, tanto em Portugal como no Pará acentuaram a
laicaização da assistência, tendência verificada desde o Liberalismo. Sem dúvida, a capacidade
criativa dos governos sugeria uma enorme riqueza da ação do Estado. O esforço de proteção à
infância desvalida passou a canalizar para obras assistenciais laicas, valorizando a educação e,
principalmente, a formação feminina para o trabalho. Neste sentido, a criação dessas instituições
em espaços diferentes se assemelham nas ações e propósitos educativos. Para tal questionamos:
Em que aspectos as duas instituições se assemelham e se distanciam na prática de proteção,
educação e instrução e suas repercussões na educação feminina? Utilizamos como fontes estatutos,
fichas das recolhidas e relatórios. Entrecruzamos as fontes a partir dos fundamentos teóricos e
metodológicos da educação comparada na intenção de identificar ações, procedimentos e discursos
que circularam de Portugal para o Pará na construção de políticas de criação de instituições para
meninas desvalidas. Propomos ainda destacar o funcionamento, educação e o quotidiano destas
instituições, atendendo, entre outros aspectos, às vertentes sociais e educacionais que se aproxima
e se distanciam. Como fundamentação teórica nos apropriamos de Abreu (2014; 2013), Pimenta
(2012), Gameiro (2000) e Bezerra Neto (1994). Pina Manique foi o idealizador do modelo da Casa Pia
que tinha o objetivo de amparar aos órfãos. A Casa Pia de Évora teve um papel importante no
abrigamento, sustento, educação e instrução de meninas na zona do Alentejo. A carreira política de
Pina Manique, inicia no ano de 1762, quando foi nomeado por Marquês de Pombal a exercer o cargo
de Juiz do Crime no bairro do Castelo de S. Jorge, em Lisboa. A atuação de Pina Manique atingiu
respeito da população quando articulou os recursos da intendência com os da Casa Pia por meio de
vários projetos que tentavam diminuir consideravelmente os problemas da miséria e da saúde da
população portuguesa, sobretudo de meninas desvalidas. Enfim, seu projeto para sociedade
portuguesa era de um país próspero, saudável, educado, informado, trabalhador e menos propicio
ao vício e à imoralidade. A criação da Casa Pia de Évora tinha como objetivo estabelecer modelos de
ação educativa para formar meninas úteis para a sociedade da zona rural do Alentejo. Na capital do
Pará, Antônio Lemos que foi intendente entre 1897 e 1911, criou o Orfelinato Antonio Lemos. Durante
quase quatorze anos como intendente Municipal de Belém foi o principal responsável pela busca da
modernidade e de um modelo civilizador. Em razão da ascensão da burguesia extrativista da
borracha, esse projeto de modernização, por meio de medidas de urbanização sanitarista, contribuía
para que, de um lado, Belém se tornasse uma cidade salubre e atraente para o estrangeiro; e de
outro, atendia aos anseios da elite paraense que deseja viver em um lugar civilizado. Entretanto,
para atingir tal modernidade e civilidade era preciso a população apresentar comportamentos,
hábitos e costumes refinados, compatíveis com um país desenvolvido. Houve então uma política de
fiscalização com a atuação de agentes municipais na educação da população tanto que se estabeleceu
a criação de “instituições civilizadoras” para abrigar meninas desvalidas. Esse ideário de civilidade e
de um sentimento humanitário levou Lemos a idealizar o Orfelinato como o intuito de abrigar,
instruir e educar meninas. Para a inauguração da instituição foi necessária uma mobilização para
obter fundos financeiros que seriam depositados na conta da “Associação Protectora dos Órphãos”,
na qual objetivava construir uma instituição que daria às órfãs “casa, mesa, luz, vestuário, instrução
primária, ensinando-se aos do sexo feminino toda sorte de costura, chá, prendas de agulha, e
serviços domésticos”. Tudo leva a crer que como dedicado gestor, o intendente Lemos acreditava
que a instituição favorecia às meninas desvalidas e órfãs, pois estariam livres dos males do abandono
e principalmente do perigo das ruas. Era recorrente na capital do Pará meninas em situação de
abandono e orfandade serem defloradas em razão das condições de vulnerabilidade que elas se
encontravam. O Orfelinato passou a ter credibilidade e prestígio não somente perante à população
abastada, mas também desfavorecida que via na instituição uma maneira de livrar as meninas
desafortunadas, amparadas por uma política de formação feminina adequada. Em razão da procura
pelo Orfelinato, Antônio Lemos propõe transformar em “Instituto Técnico Profissionalizante”, para
trabalhos agrícolas. Tal formação promovia nas órfãs, além de uma formação feminina para serem
“boas mães e esposas amorosas”, o aprendizado de um “ofício”. Em ambas as instituições, as meninas
ali recolhidas eram amparadas da miséria e se tornavam mulheres úteis à sociedade, pois o ideário
ideológico era transformar meninas em mulheres com valores morais para serem “mães de família”
e “senhoras do lar”. Embora em lugares e contextos diferentes, ambas as instituições se assemelham
em aspectos políticos, educacionais e sociais na formação feminina. A propagação do ideário
civilizatório tanto em Portugal quanto no Pará, no século XIX e início do XX, era de educar e formar
mulheres pobres para serem úteis às elites locais. As mulheres restavam três destinos: o casamento
e os filhos, um lugar como criada ou a prostituição. Em Portugal, o projeto da Casa Pia de Évora para
meninas tenha o objetivo de afastá-las de percursos desviantes, e para tal recebiam instrução
primária, alimentação e vestuário. O cotidiano das educandas era de uma rígida disciplina e vigiadas
no sentido de salvaguardar a honra e a dignidade. A instituição se preocupava com o destino das
educandas, pois muitas regressavam frequentemente a Casa Pia em razão de não encontrarem
trabalho doméstico nem o casamento. O mais vasto mercado de trabalho para mulher na região do
Alentejo se concentrava no emprego de cridas que serviam para mulheres entre os 15 aos 25 anos. A
educação que recebiam visava o aproveitamento das meninas para serem boas criadas, por isso a
elite local composta por lavradores, proprietários, comerciantes, professores, membros do clero,
militares e administradores da Casa Pia, requeriam uma empregada educada dentro da instituição
com a obrigação de a alimentarem, vestirem, calçarem e darem cama, roupa lavada, médico e
botica. Embora parecesse uma ação humanitária das elites locais, por ser uma forma de assistência,
muitas retornavam à instituição por serem maltratadas. No caso do Pará, a proposta de uma
educação feminina, de certa maneira comungavam com os mesmos anseios vistos nas camadas
hegemônicas da sociedade portuguesa. No Orfelinato existia crescente necessidade de recolher,
instruir e educar as meninas desvalidas e órfãs de forma, de um lado, educá-las com comportamentos
morais, e de outro lado, prepará-la para o casamento, para serem damas de companhia ou criadas.
Denominadas de “filhas de criação”, as meninas do Orfelinato eram adotadas para cumprir tarefas
domésticas. Havia ainda a procura delas para atender o comércio local abastecido pela crescente
comercialização da borracha. Portanto, conhecidas como meninas bem preparadas em prendas do
lar, elas eram contratadas a fim de produzirem roupas, bordados e enxovais para noivas e batizados.
A formação das educandas do Orfelinato baseava-se também na educação para a música, canto
orfeônico, aulas de línguas e religião. Enfim, os resultados indicam que ambas as instituições foram
arquitetadas sob a égide da civilidade, difundida pelos ideais iluministas que procuravam educar as
meninas desvalidas para ocupar seu papel de mãe, esposa dedicada e para o trabalho doméstico.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 578
Sem dúvida, o estado e a burguesia tanto em Portugal como no Pará acabavam contribuindo para
uma modernização conservadora e a exploração do trabalho das meninas desvalidas da Casa Pia de
Évora e do Orfelinato Antonio Lemos, respectivamente.
Referências
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Pará, Belém, 1994.
GAMEIRO, Maria Isabel (2000), Recolher, Educar e Instruir – A Casa Pia de Évora. UNLFCSH, Lisboa,
2000.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Palavras-chave: História da Educação. Formação de professores normalistas. Escola Normal Heitor Lira.
A análise das práticas do cotidiano permite adentrar no processo histórico de uma instituição
educativa. Revelam a organização e funcionamento passando pela materialidade, apropriação e
representação do momento histórico vivido. Este trabalho tem como objetivo representar as práticas
educativas que aconteceram em uma instituição no período de implantação e implementação das
propostas de atendimento para a creche. A Escola Paulistinha de Educação foi a primeira Creche
Universitária Federal brasileira. Criada no ano de 1971 para atendimento dos filhos de duas
funcionárias que trabalhavam na Escola Paulista de Enfermagem- EPE. Uma das mães era professora
do curso de Enfermagem e a outra chefe do departamento de recursos humanos, ambos cargos de
nível superior. Associado a outras questões econômicas a levavam ao pertencimento as camadas
médias da sociedade na época. Motivadas pelas leis trabalhistas as mães reivindicaram, junto à
diretoria da Escola, o direito de levar seus filhos ao local de trabalho, pois não tinham com quem
deixá-los. Após muitas discussões e conflitos a solicitação foi atendida e deu origem a creche. Por
mais de uma década a instituição foi chamada de Comunidade Infantil, nome escolhido pelas mães.
Elas acreditavam que o termo creche não refletia a intensão de acolhimento e qualidade que queriam
ofertar aos seus filhos. Na década de 1970 o termo creche era considerado pejorativo e análogo a
falta de qualidade de atendimento e ainda, instituição destinada aos filhos das mães trabalhadoras
das camadas baixas. Na década de 1990 recebeu o nome de Paulistinha, devido à grande influência
da Escola Paulista de Medicina que era sua mantenedora. Inicialmente o atendimento se deu em
uma sala adaptada dentro da Escola Paulista de Enfermagem e foi mantido durante certo tempo
com recursos próprios das mães, incluindo aquisição de mobiliários, alimentação, contratação de
funcionárias e rotina diária. Tudo era acompanhado pelo setor de Enfermagem Pediátrica. Após
cerca de dois anos da criação, a EPE assumiu a responsabilidade dos cuidados das crianças e então,
foi elaborado um projeto institucional sob os cuidados de Marianna Augusto- Professora da
Enfermagem Pediátrica. O período investigado consiste do ano de 1971, ano em que foi criada, até o
final da década de 1980, período em que foram criados dois manuais para organização da creche
que regiam o atendimento. Nesse estudo foram utilizados como fontes: registros iconográficos,
entrevistas e manuais. A distância temporal e a escassez de fontes escritas remeteram à necessidade
da utilização da memória como fonte no auxílio da reconstrução de um passado vivido. Os registros
iconográficos foram cedidos pelos participantes da pesquisa ao passo que as entrevistas eram
coletadas. As imagens ajudaram a compor um cenário para compreensão do tempo vivido,
articulados às narrativas formaram um compósito de informações que apresentaram formas de
representação do cotidiano nas relações construídas. Aqui serão utilizadas entrevistas das
fundadoras da creche, de mães e ex-alunos, que compartilharam suas memórias para a escrita desse
trabalho e lançamento de novas narrativas. Na década de 1970 as normas para organização e
funcionamento das instituições para cuidado das crianças pequenas ainda eram determinadas pelo
Departamento Nacional da Criança-DNCr. No entanto, Marianna Augusto, estudiosa e especialista
em puericultura, com outras Enfermeiras da EPE, especializadas em Pediatria e Puericultura,
elaborou o Manual Comunidade Infantil Creche (1979 e 1985) com o objetivo de orientação,
organização e funcionamento das creches para atendimento às exigências da pediatria da época,
afim de oferecer a melhor assistência à criança. Esta obra foi pautada nos referenciais do DNCr
-Creches Organização e Funcionamento, Leis trabalhistas, orientações do Departamento de
Segurança e Higiene do Trabalho e nos princípios dos cuidados de puericultura, visto que o
atendimento da criança pequena não era vinculado a órgãos da educação. O primeiro volume do
Manual Comunidade Infantil Creche, foi publicado em 1979, e refletia as ações que aconteciam na
creche durante aquela mesma década. Foi organizado em nove capítulos com informações relevantes
para a organização das creches como: orientação e cuidados, localização, construção, equipamento
e materiais, administração, contratação e seleção de pessoal, rotinas diárias, cuidados com a saúde,
higiene do ambiente, orientações para a família, sugestões para assistência à criança nos seus
primeiros anos de vida, planta-modelo ideal para uma Creche. O manual era um documento
modelizador que propunha ações para o preparo da criança para atuação na sociedade. O documento
apresentava uma estrutura que contemplava os anseios da comunidade acadêmica da Escola
Paulista de Enfermagem, visto que, esse referencial foi utilizado para organização de outras creches
que faziam parte dos projetos filantrópicos dessa Escola. Diante dessa aceitação em 1985 foi
publicada a 2ª edição do Manual Comunidade Infantil-Creche. Essa edição foi elaborada em 15
capítulos que ampliaram as discussões contidas no primeiro volume, como: educação para os
valores essenciais da vida humana, direitos da criança, importância do Departamento Nacional de
Segurança e Higiene do Trabalho, normas para organização de Regimento interno, modelos de fichas
para inscrição, matrícula, questões de saúde e questionários socias. Ainda apresentava uma parte
sobre a composição do leite materno e a importância da amamentação dos bebês. Questão relevante
para época já que na década anterior a representação social apontava para a substituição do
aleitamento materno pelo leite industrializado. Os documentos expressavam as necessidades de
funcionamento de uma creche, e em análise juntamente com outras fontes foi possível observar a
importância desse manual que refletiram nas ações do cotidiano na instituição investigada que
serão apontadas ao longo do texto. Foram utilizadas três categorias para análise das fontes: a
primeira foi Instituição Educativa. De acordo com Magalhães (1998, 2004) a história das instituições
escolares e das práticas educativas revela importante linha de ação, de construção social e cultural,
como parte de relação complexa que se integram dialeticamente passando pela materialidade,
apropriação e representação na produção de uma sociedade. Como materialidade compreende-se
os fazeres pedagógicos, a organização e funcionamento, condições materiais-espaços e estrutura-
arquitetura, as ações em processo e desenvolvimento, regulamentos e normas de funcionamento,
aspectos que revelam a significação da participação dos sujeitos no projeto educacional. Entende-
se apropriação às aprendizagens construídas de acordo com o modelo pedagógico idealizado que
constituem a identidade dos sujeitos e da instituição. As representações são as formas de organização
e relacionamentos, promovendo fatores de diferenciação das identidades, formadas nas relações
estabelecidas em um contexto complexo e multifacetado, apropriando-se das estruturas de dada
instituição, desenvolvendo a identidade histórica. Como segunda categoria foi utilizada a
Representação de Lugar, Certeau (2014) apresenta as práticas cotidianas, saberes e lugares de fala,
como indissociáveis de uma instituição. O autor distingue lugar e espaço nas relações de coexistência.
Lugares são comuns e não estabelecem familiaridade, não definem identidade, é uma configuração
espacial que a priori não pressupõe vínculo, é inerte, implica ordem. O espaço não indica nenhuma
estabilidade, dá vida ao lugar pelas ações dos sujeitos. As práticas cotidianas se operam no espaço,
que com as especificidades constroem e estruturam histórias distintas associadas a um movimento
e transformação. Como terceira categoria foi utilizada a Memória sob as perspectivas de Halbwachs
(2006) e Bosi (1994), que as apresentam como construções a partir de um contexto vivido e que
expressam questões identitárias, contraditórias e morais a partir de quadros sociais revelados
durante as narrativas. Para Halbwachs (2006) o coletivo é o ponto de partida para a análise das
memórias e esquecimentos. Segundo o autor a memória é considerada individual e única, mas as
rememorações são desenvolvidas a partir de combinações complexas de quadros sociais
estabelecidos de acordo com as relações. Bosi (1994) assegura que por meio das entrevistas é
possível vencer a distância e voltar a contar as aventuras e representações, algumas vezes motivadas
por objetos guardados que estavam esquecidos, que ao ser relembrados voltam a florescer na
memória. O tratamento das fontes propiciou o entendimento da composição de uma história que
não se pode afirmar como verdadeira e única, mas sim como recortes de representações, cheia de
contradições, valores morais, uma história não linear, no entanto, formada por um compósito de
elementos que se complementaram durante as análises. Como resultados são mostradas as práticas
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 583
ocorridas nessa instituição que apontam para concepções pedagógicas que privilegiaram os valores
morais da época, os cuidados com a saúde e as práticas preparatórias e escolarizantes.
Referências
BOSI, E. Memória e sociedade: lembrança dos velhos. 3. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
CERTEAU, M. A invenção do cotidiano: 1. Artes de fazer. Tradução de Ephraim Ferreira Alves. 22. ed.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
HALBWACHS, M. A Memória Coletiva. Tradução Beatriz Sidou. São Paulo: Centauro, 2006.
MAGALHÃES, J. Tecendo Nexos: História das Instituições Educativas. Bragança Paulista - SP: Ed.
Universitária São Francisco, 2004.
ISSN 2358-3959
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região, contribuindo, desta forma, para a ampliação do conhecimento da história das instituições
educativas brasileiras.
Essa investigação permitiu-nos perceber, dada a dificuldade de localização das diferentes fontes
documentais, a importância da reconstituição da sua trajetória, não apenas ao nível material,
mas também em termos pedagógicos. Serviu para que pudéssemos revelar o aporte documental
produzido pela Instituição, assim como esboçar os seus momentos iniciais. Permitiu-nos ainda
concluir que conseguimos, não apenas dar maior visibilidade ao Seminário Episcopal da Conceição,
cuja história, importância e relevância carecia de maior divulgação, considerando o importante papel
que desempenhou, enquanto instituição educacional de maior vulto na Província de Mato Grosso
em meados do século XIX, mas também, dar o nosso contributo no sentido de localizar, organizar
e sistematizar grande parte dos documentos relacionados com o Seminário e, dessa forma, tornar
possível a sua disponibilização ao público.
Referências bibliográficas
ALVES, G. L. O Pensamento Burguês no Seminário de Olinda (1800-1836). São Paulo: Humanidades,
1993.
MAGALHÃES, J. P. Tecendo Nexos: história das instituições educativas. Bragança Paulista: Editora
Universitária São Francisco / CDAPH, 2004.
Introdução
A pesquisa versa sobre os vestígios da criação da Escola Normal Oficial do Brasil no século XIX e o
Instituto de Educação Clélia Nanci na cidade de São Gonçalo – Rio de Janeiro em meados do Século
XIX. O objetivo principal é rememorar a história das duas instituições localizadas nas cidades de
Niterói e São Gonçalo, considerando a historicidade dos tempos da gênese de cada instituição, for-
talecendo a relevância da Escola Normal a formação de professores no Brasil e a trajetória das insti-
tuições escolares de formação de professores ethos (MARTINS, 1996) da cultura pedagógica no país.
O ethos da cultura pedagógica inserida nas Escolas Normais ou Institutos de Educação, resulta
do encontro da teoria com a prática, da subjetividade com a objetividade, sendo a escola local
privilegiado para que estas múltiplas facetas transpareçam.
Algumas questões são investigadas: em que contextos sócio-político-cultural foram instauradas
estas duas Escolas Normais? Quais propósitos elas deviam servir? Quais as aproximações e diferenças
entre as duas Instituições? Que contribuições hoje estas instituições nos apontam?
Metodologia
A abordagem da micro-história possibilita diversos “caminhos e incertezas no percurso da
pesquisa” (REVEL, 1998). Por sua vez, nesta abordagem os processos sociais e históricos sejam
Considerações finais
A criação da Escola Normal, em ambos contextos, ocorreu por momentos de forte idealização da
educação, caracterizados por uma crença ilimitada no poder civilizatório da instrução. A mentalidade
era que a causa do atraso e da criminalidade no país residia na falta de instrução do povo. Assim
esperavam, através da formação de professores, derramar as “luzes” sobre a população, tanto no
século XIX e XX.
A Escola Normal como um ethos educativo atravessou o ontem e o hoje, e vem nos desafiando
a re(pensar) a formação do professor primário, já que as experiências formativas existem desde a
época do Império”. No entanto, que legado temos da trajetória histórica dos Institutos de Educação
em questão para o “passado presente” da educação brasileira?
Referências
GINZBURG, Carlo. Mitos, Emblemas e Sinais. São Paulo: Cia das Letras, 1989.
Jornal “O SÃO GONÇALO”: impressos publicados nos anos de 1959-1966. São Gonçalo, RJ.
MARTINS, Ângela Maria Souza. Dos Anos Dourados aos Anos de Zinco: análise histórico/cultural da
formação do educador no Instituto de Educação do Rio de Janeiro, 1996.
REVEL, Jacques; Jogos de Escalas: a experiência da microanálise. Rio de Janeiro: Editora Fundação
Getúlio Vargas, 1998.
TAVARES, Maria Tereza Goudard. Percursos e movimentos: dez anos do Vozes da Educação em
São Gonçalo. In: ARAUJO, Mairce (orgs). Vozes da Educação: memórias, histórias e formação de
professores. Petrópolis: DP et Alii, 2007.
VILLELA, Heloísa de Oliveira Santos. A Primeira Escola Normal do Brasil: uma contribuição à história
da formação de professor. 1990. 286 f. 1990. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade
Federal Fluminense, Niterói - RJ, 1990.
XAVIER, Libânia Nacif. História da educação e história local. In: MENDONÇA, Ana Waleska Campos
Pollo.; ALVES, Claudia.; GONDRA, José Gonçalves.; XAVIER, Libânia Nacif.; BONATO, Nailda Marinho
da Costa (orgs). História da Educação: desafios teóricos e empíricos. Niterói: Editora da Universidade
Federal Fluminense, 2009.
______. Lugares de memória da educação e da escola no Brasil. In: ARAUJO, Mairce (orgs). Vozes da
Educação: memórias, histórias e formação de professores. Petrópolis: DP et Alii, 2007
ISSN 2358-3959
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período pesquisado. O Centro Cívico da EAFUR foi criado conforme a legislação vigente e chamava-
se Centro Cívico Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon e tinha como objetivo “proporcionar ao
educando a formação de caráter, tendo por base Deus, amar a Pátria e suas tradições, ação intensa e
permanente em prol do Brasil” (PLANO DE TRABALHO DO CENTRO CÍVICO MAL. CÂNDIDO MARIANO
DA SILVA RONDON, 1981). Segundo este documento as atividades promovidas foram: palestras
sobre alimentação e direitos humanos, jogos, jornal mural, organização de lazer para crianças
filhos dos funcionários, explanação de símbolos nacionais, conferência sobre os grandes vultos
republicanos no Brasil, festas folclóricas, horas cívicas (hasteamento de bandeira) e participação
nas festas de na cidade Urutaí. Mesmo sendo um espaço de atuação para os alunos o Centro Cívico
era acompanhado por uma professora, nomeada pelo diretor, e responsável por elaborar o plano
de trabalho e coordenar todas as atividades em parceria com a cooperativa escolar. As atividades
desenvolvidas vinham ao encontro da determinação da legislação vigente.
Os Centros Cívicos deverão: a) considerar o civismo, nos três aspectos fundamentais: caráter, com
base na moral, tendo como fonte Deus nos termos do Preâmbulo da Constituição do Brasil; amor à
Pátria e às suas tradições, com capacidade de renúncia; ação intensa e permanente em benefício do
Brasil; b) projetar-se sobre as atividades de classe e extraclasse (...); c) elaborar o Código de Honra
do Aluno, nos níveis primário e médio, e o Código de Honra do Universitário, no nível superior; d)
Empregar modernos processos didáticos de comunicação e explorar o desejo natural do educando
de realizar novas experiências (DECRETO Nº 68.065 de 1971, Art. 32).
No ano de 1985, período de redemocratização, permitiu-se a criação de grêmios estudantis
por meio da Lei nº 7.398/1985 que no Art. 1º dizia: “Aos estudantes dos estabelecimentos de
ensino de 1º e 2º graus fica assegurada a organização de Estudantes como entidades autônomas
representativas dos interesses dos estudantes secundaristas com finalidades educacionais,
culturais, cívicas esportivas e sociais”. A novidade desta regulamentação foi o fato que a constituição
do Grêmio Estudantil significou a volta dos alunos como sujeitos de suas lutas políticas, tornando-
se protagonistas e com a possibilidade de romper como o controle instituído na legislação anterior.
Embora já fosse possível a criação de um espaço de atuação estudantil independente, na EAFUR,
ainda persistia o controle das ações estudantis nos moldes do Centro Cívico. Mas o contexto
de abertura política e redemocratização, e talvez a presença do aluno de apelido Tupanamaro,
promoveu e incentivou a organização de movimentos de luta dos discentes por seus anseios
dentro EAFUR. Segundo o depoimento do próprio Tupanamaro, o anseio era participar da gestão
da Escola com direito a uma ampla e livre participação nas tomadas de decisão; e a pichação foi
uma forma de expressar sua insatisfação com a maneira de escolha da direção da EAFUR. Naquele
momento, como era de costume, o diretor da instituição foi indicado por instâncias superiores,
de maneira indireta, sem a participação dos alunos. O desfecho do fato ocorrido indica que uma
gestão autocrática considerava a a participação política dos alunos um entrave aos seus interesses.
Os alunos, membros da EAFUR como pessoas em formação e como trabalhadores, conviviam com
a política institucional implementada e desenvolvida no interior da mesma. Viñao Frago (2006)
chama essa política interna de micropolítica. Para Benito Escolano “a análise da cultura escolar, no
âmbito dessas proposições, leva a destacar que nem tudo se aprende racionalmente, sendo muitos
elementos da cultura educativa internalizados pelo pertencimento a uma comunidade, isto é, pela
mimese e imersão nela” (ESCOLANO, 2017, p.154).
Referências
BRASIL, Decreto-Lei nº 68.065, de 14 de janeiro de 1971. Disponível em: <http://www2.camara.leg.
br/legin/fed/decret/1970-1979/decreto-68065-14-janeiro-1971-4099 91-publicacaooriginal-1-pe.
html>. Acesso em: 24 out. 2019.
ESCOLANO, Agustín. A Escola como Cultura: experiência, memória e arqueologia. Campinas, SP:
Editora Alínea, 2017. Tradução de: Heloísa Helena Pimenta Rocha e Vera Lucia Gaspar da Silva.
FERACCHI, Marialice M. O estudante e a transformação da sociedade brasileira. São Paulo: Cia Editora
Nacional, 1977.
IF GOIANO. Plano de Trabalho do Centro Cívico Mal. Cândido Mariano da Silva Rondon. Acervo IF
Goiano Câmpus - Urutaí, 1981.
ISSA, Silvia Aparecida Caixeta. ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE URUTAÍ (1978-1986): a formação
de mão de obra agrícola no Sudeste Goiano. 2018. 197 f. Tese (Doutorado). - Universidade Federal de
Uberlândia, Programa de Pós-Graduação em Educação.
MAGALHÃES, Justino Pereira de. Tecendo Nexos: histórias das instituições educativas. Bragança
Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2004.
VIÑAO FRAGO, Antonio. Sistemas educativos, culturas escolares y reformas. 2 ed. Madrid Espanha:
Editora Morata, 2006.
ISSN 2358-3959
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Este trabalho se insere nos estudos sobre a história da educação, com recorte nas investigações
sobre a história da educação para os povos indígenas. Nessa perspectiva, tem por objetivo analisar
o processo de criação e consolidação das escolas indígenas instaladas na primeira metade do século
XX na Reserva Indígena de Dourados (RID), no sul de Mato Grosso, a saber: a “escola da missão”
(Escola Primária General Rondon), e a “escola do Posto”, (Escola Francisco Ibiapina), assim como,
investigar como era o ensino nestas instituições no período. O recorte temporal está associado a
dois momentos na História da Educação direcionada aos indígenas; o inicial (1928), pela criação
da Missão Evangélica Caiuá; e o final (1957), é quando o grupo de pesquisadores missionários do
Summer Institute of Linguistcs (SIL), instituição com sede nos Estados Unidos, iniciou os estudos
do ensino bilíngue no Brasil, em especial com os indígenas Kaiowá. O ensino da língua materna foi
utilizado para melhores resultados da alfabetização dos indígenas na língua portuguesa, para que
pudessem estar preparados para as leituras dos textos bíblicos, logo, a sua integração a sociedade
não indígena. Conforme Faustino, “o objetivo do SIL era codificar as línguas nativas e ensiná-las
nas escolas, promovendo a integração à sociedade nacional por meio da conversão dos índios
ao protestantismo” (2009, p.16). Já o recorte geográfico, é delimitado pela localização da “escola
da missão” (Escola Primária General Rondon), da “escola do Posto” (Escola Francisco Ibiapina) e
da Missão Evangélica Caiuá. Para a análise proposta neste texto, foi necessário recorrer a uma
bibliografia ligada à educação indígena, à história da educação, à história de Mato Grosso e, mais
especificamente, à história de Dourados e região. Neste estudo, foram, também, privilegiados
como fontes de pesquisa, os documentos do Posto Indígena Francisco Horta e da Missão Evangélica
Caiuá (MEC), como: relatórios e atas de reunião do Posto Indígena Francisco Horta, relatórios de
frequência escolar e notas dos alunos indígenas, relatórios de atendimento e consumo de gêneros
alimentícios e de higiene nas escolas, relatórios do quantitativo populacional da Reserva, relatórios
sobre os serviços realizados na Missão, relatórios emitidos pelas escolas, relatórios escritos pelas
professoras, provas e conteúdos trabalhados. Fontes essas encontradas nos arquivos do Museu
do Índio do Rio de Janeiro e no Centro de Documentação Regional (CDR) da Universidade Federal
da Grande Dourados. No que diz respeito a delimitação espacial, cumpre esclarecer que a Reserva
Indígena de Dourados, foi criada no ano de 1917 pelo Decreto nº 404 de 3 de setembro, com uma
área de 3.539 hectares, sendo povoada pelas etnias Guarani, Kaiowá e Terena. (LOURENÇO, 2007).
Na Reserva, após alguns anos, em 1928, foi fundada a Missão Evangélica Caiuá, mantendo contatos
principalmente com os indígenas das etnias Guarani e Kaiowá, e, posteriormente, com os Terena. Os
fundadores da Missão foram os missionários americanos, reverendo Alberto Sidney Maxwell e sua
esposa Sra. Mabel Davis Maxwell. Compuseram também a primeira equipe missionária o agrônomo
Dr. José da Silva e sua esposa Guilhermina da Silva (professora); o médico membro da Igreja
Metodista Nelson de Araújo; o professor e dentista Esthon Marques membro da Igreja Presbiteriana
Independente, que de modo assistencialista atendia aos indígenas de forma espiritual, educacional,
médica e hospitalar. A educação escolar teve início na Reserva entre os anos de 1929 e 1930, por
meio da alfabetização de adultos via a cristianização, por intermédio de cultos e aulas dominicais.
Os missionários buscaram então via estratégias escolares, evangelizar, “civilizar” e integrar os
Guarani, Kaiowá e também os Terena a sociedade nacional brasileira. Nessa localidade, pode-se
dizer que os indígenas foram o principal motivador, ou melhor, “atrativo” para o estabelecimento
desses missionários nessa região. Mesmo que o interesse inicial dos missionários fosse unicamente
a catequese indígena, não deixaram de manter contato com a população não indígena local. Desse
modo, a atuação protestante em Dourados pode ser estudada sob duas perspectivas, uma vez que
a ação missionária entre a população dita urbana deu-se de maneira diferente da exercida entre os
indígenas. Romanelli (2014) aponta que no Brasil, nesse período, ainda de Primeira República (1889-
1930), as estratégias de escolarização mantiveram os valores das camadas dominantes que por
interesses particulares, organizaram uma forma de ensino fragmentada e totalitária, que continuava
a excluir os indivíduos que não pertenciam às elites dominantes por meio de um ensino que tinha em
suas práticas o monopólio cultural. No que se refere a história das instituições escolares, Magalhães
(1996) esclarece que foi somente nas últimas décadas que, na história da educação, a abordagem
dos processos de formação e de evolução das instituições educativas constituiu um domínio do
conhecimento historiográfico em renovação. De acordo com o autor, essa renovação tem operado
uma profunda alteração metodológica, uma vez que essa história passou a ser “construída da (s)
memória (s) para o arquivo e do arquivo para a memória, intentando uma síntese multidimensional
que traduza um itinerário pedagógico, uma identidade histórica, uma realidade em evolução, um
projeto pedagógico” (MAGALHÃES, 1998, p. 61). Há de se considerar aqui que, a influência da Nova
História Cultural no campo de estudo da História da Educação, possibilitou que pesquisadores desta
área passassem a se dedicar a outra proposta de estudo, isto é, uma proposta voltada a um pluralismo
epistemológico e temático, capaz de privilegiar a investigação de objetos singulares, incluindo
a história das instituições escolares, a história das disciplinas escolares, a história do currículo, a
história da formação e da profissão docente. No entendimento de Carvalho (2007, p. 116), “as questões
lançadas pela chamada Nova História Cultural redesenharam as fronteiras e redefiniram os métodos
e objetos da história da educação no Brasil”. Neste estudo, foi possível constatar que as escolas
indígenas investigadas estiveram ligadas a Missão Caiuá, que tinha confissão protestante e buscava
“civilizar”, integrar e evangelizar as etnias indígenas por meio de estratégias escolares e religiosas
que priorizaram um ensino que negava e desvalorizava a cultura indígena, impondo uma cultura
não indígena como única e desenvolvida. A educação escolar desenvolvida pelo SPI e pela Missão
Caiuá, realizou um trabalho de assimilação e integração dos indígenas ao ideal de nacionalidade
defendido pelos missionários, consequência de todo um processo aristocrático pelo qual passou a
educação, pois as práticas educativas estavam imbricadas a um lugar, a culturas diversas, a políticas
sociais e econômicas, a práticas religiosas, a línguas diferentes, que convergem em ensinamentos
que são aceitos, negados, e/ou assimilados por aqueles que recebem. No entanto, os indígenas,
diante da política de “civilização”, evangelização e integração do projeto de nacionalidade dos não
indígenas, souberam a seu modo étnico e cultural, negar, assimilar e/ou participar das estratégias
de escolarização utilizadas, afirmando a sua identidade, que sofreram transformações com as
relações que foram sendo estabelecidas. Deste modo, os contatos mantidos entre os indígenas e
os missionários, provocaram mudanças culturais no modo de viver das etnias da Reserva. Portanto,
negando, assimilando e/ou participando das práticas de ensino e de trabalho impostas pela Missão
Caiuá, os indígenas foram afirmando sua identidade étnica e cultural. Essa afirmação ocorreu com
as transformações culturais vivenciadas pelos indígenas, por intermédio das relações mantidas com
os não indígenas, e as etnias diversas.
Referências
CARVALHO, Marta Maria Chagas de. Manuais de pedagogia, materialidade do impresso e circulação
de modelos pedagógicos no Brasil. Revista Colombiana de Educación, nº 52, enero-junio, 2007,
p.114-135, Bogotá/Colombia.
MAGALHÃES, Justino Pereira de. Um apontamento metodológico sobre a história das instituições
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culturas escolares, profissão docente. São Paulo: Escrituras Editora, 1998.
ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da educação no Brasil. 40. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
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Com o regime republicano, instaurado no final do século XIX, novos rumos foram traçados para
a história do Brasil e da educação brasileira, com o desejo de romper com a cultura arraigada do
período colonial e imperial. Nesse processo, a educação, concebida como simbologia do progresso
e da modernização da Nação, passou a ser vista como instrumento de formação do cidadão
republicano, de manutenção e sobrevivência do novo Regime.
A primeira República foi o tempo não apenas de reorganizar o ensino, mas sobretudo, de
reinventar, conforme Faria Filho (2000), a escola primária brasileira para atender aos anseios e
aos ideais republicanos. Para Souza (2008), no início do século XX, em diferentes regiões do país,
surgem políticos, intelectuais e reformadores comprometidos com o grande empreendimento de
modernizar e disseminar a educação pública com vistas à superação do atraso advindo do período
imperial e como elemento de constituição da nacionalidade.
O símbolo da modernização era a escola graduada, mais eficiente para o projeto republicano
de homogeneizar a cultura e a política da sociedade. Os grupos escolares foram uma modalidade
de ensino adotada em vários Estados do país e pelo próprio Mato Grosso. Com eles, estabeleceu-
se uma nova forma de organização distanciando das características da então escola unidocente:
suntuosos e modernos prédios destinados às escolas, em lugar das salas multisseriadas, com um
mesmo professor ensinando tudo a todos (alunos de várias idades em uma mesma sala de aula),
passou-se a ter tempos escolares ritmados nas disciplinas escolares, divisão das turmas em função
do seu adiantamento e professores normalistas.
A presente comunicação tem como objetivo compreender a criação e a implantação do Grupo
Escolar Caetano de Albuquerque, no município de Poconé- MT, e a sua trajetória no período de 1912
– 1971. O referido município está localizado no pantanal mato-grossense, a 100 km, em linha reta
da capital, Cuiabá. Para Assis e Silva (2018), o município, como o próprio estado de Mato Grosso,
compreendia uma grande extensão territorial, com pouca e dispersa população, contabilizando
nos anos iniciais de 1900 entre 4.000 a 5.000 habitantes, distribuída, essencialmente, pelas áreas
rurais. Oriundo das extrações do ouro, após o declínio do mineral, desenvolveu-se outra atividade
econômica no município, a criação de animais, aproveitando-se das suas características naturais.
O pantanal mato-grossense é caracterizado por duas estações bem definidas: o período da seca e o
período das águas. Essas estações ritmavam o movimento da população poconeana, assim como o
fluxo das crianças nas escolas; na seca, as famílias que tinham propriedades no pantanal seguiam
para as fazendas e, no segundo período, com as inundações, as famílias voltavam para a cidade.
Reduzir a escala como propôs Revel (1998) e investigar a trajetória do Grupo Escolar Caetano de
Albuquerque, no município de Poconé, possibilita ao historiador enriquecer o real, investigando o
particular e o individual, dando relevo para as invisibilidades locais. Nessa ótica, a história é uma
prática social, compreendida não como verdades absolutas, mas ligada aos desvios das regras
desejadas e impostas por determinados agentes históricos ou grupos sociais, em conformidade com
os pressupostos da História Cultural, Chartier (1990) e Certeau (2002).
A criação do grupo escolar na cidade pantaneira, nas representações do articulista, tinha a missão
de modernizar e aprimorar a educação da juventude poconeana. A instauração do estabelecimento de
ensino representava sinônimo de prosperidade e de modernização para a instrução e para o próprio
município. Nas mensagens dos Presidentes de Estado, embora sejam reconhecidas as dificuldades
de Mato Grosso para criação, aparelhamento e manutenção dos grupos escolares, são recorrentes,
na ótica dos administradores, as representações de que a escola graduada trouxe modernidade para
a instrução pública compatíveis com os anseios do novo regime republicano, deixando em evidência
a superioridade desta em relação às escolas unidocente.
Nos relatórios dos diretores é recorrente o apontamento das dificuldades para o funcionamento
dos grupos escolares dentro dos parâmetros estabelecidos pela lei. No caso específico de Poconé, a
referida instituição nem sempre funcionou com o número de matrículas exigido pelos Regulamentos
de 1910 e 1927, além de ser instalado em casa alugada, sem estar adequada aos requisitos
estabelecidos pela lei. Na falta de materiais pedagógicos, como carteiras individuais, compatíveis
com a organização da escola graduada, as características da escola unidocente se arrastaram para a
prática cotidiana do grupo. No entanto, não há como negar a relevância do grupo escolar Caetano de
Albuquerque para a escolarização de uma parcela significativa da infância poconeana.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Introdução
Trata-se da comunicação dos resultados da pesquisa desenvolvida no mestrado, no âmbito do
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia. Corresponde
a uma investigação no campo dos estudos da História da Educação no Brasil. Em linhas gerais,
versa sobre o processo de organização da instrução pública nos anos iniciais da República no
Brasil, focalizando especificamente o município de Uberaba. Objetiva demonstrar de que modo a
municipalidade participava deste processo.
Quanto ao corpus documental, foram priorizadas as seguintes fontes históricas: Atas da Câmara
Municipal e Relatórios de Inspeção do Ensino. Quanto ao recorte temporal (1895-1917), por opção
metodológica, não se tratou de estabelecer uma delimitação política e/ou econômica. Sua definição
se deu pelas próprias fontes históricas: o ano de 1895, corresponde à data do primeiro Relatório de
Inspeção, assim como o ano de 1917 faz referência à data do último relatório a que tivemos acesso.
O período pesquisado compreende os anos iniciais do Período Republicano (1895 a 1917). Leva
em consideração a ambiência histórica de transformações sociais e materiais que antecedem à
Proclamação, bem como os anos posteriores à implantação do regime. (COSTA 2007). Cenário em
que se configura uma realidade educacional específica, na qual se observam traços de permanência
de um antigo padrão de escolarização, frente a uma nova forma de organização da instrução pública
que se institui.
Fundamentação teórica
Na transição do Império para a República, além das transformações políticas, econômicas e
sociais, a educação escolar passou por modificações e ocupou lugar de destaque. Com implantação
da República, não somente é alterado o regime político do país, como adota-se uma nova forma de
organização do Estado, pautada no federalismo. Conservando-se uma tendência descentralizadora
que tem suas origens ligadas ao Império, particularmente, no Ato Adicional de 1834, a mudança
de sistema político se dá de maneira específica, conformando o que podemos denominar de um
“federalismo à brasileira”. Questão que reverbera não somente no âmbito político-administrativo,
como também no que se refere à educação. (FERREIRA; CARVALHO; GONÇALVES NETO, 2016).
A descentralização promovida pelo regime republicano terá influência na realidade educacional
do período. A República tinha a crença no poder regenerador da educação. Mediante a difusão da
instrução seria possível remodelar a ordem social e consolidar a República. (CARVALHO & CARVALHO,
2012). Contudo, mesmo a educação sendo concebida como via para o progresso e consolidação do
novo regime, o estado republicano não dará forma a uma organização centralizada e unificada para
instrução pública. A descentralização político-administrativa, implicou também em descentralização
educacional. Esta questão é fundamental à compreensão da realidade educacional nos primeiros
anos republicanos, pois foi nesse contexto de descentralização que permitiu aos estados e
municípios, formas próprias de organização da instrução pública. Boa parte das responsabilidades
e dos encargos referentes à instrução primária, ficava a cargo das Câmaras Municipais. Em Minas
Gerais as Câmaras desenvolveram uma autonomia relativa, no que concerne aos aspectos ligados
à deliberação sobre a instrução primária. Nesse contexto, a realidade municipal acena como lócus
privilegiado do esforço de organização da instrução pública e o estudo dessa instância adquire
relevância para a história da educação. (GONÇALVES NETO; CARVALHO, 2015).
Essa relativa autonomia e/ou responsabilização do poder municipal em matéria de instrução
primária pode ser interpretada mediante a categoria de análise do “município pedagógico”, que
concebe o município não somente como entidade político-administrativa, mas também como um
território pedagógico. Faz referência à possibilidade e capacidade do poder local de organizar e
definir princípios próprios para a instrução municipal, num determinado contexto educacional de
descentralização que permitia a sua manifestação. (MAGALHÃES, 2015).
Resultados e discussão
No período pesquisado, o município Uberaba acenava com centralidade no âmbito da região
atualmente denominada Triângulo Mineiro. A cidade experimentou um significativo desenvolvimento
econômico-social: o traçado urbano se ampliou, cresceu a população local, avulta-se o contingente
de pessoas vivendo na área urbana, além dos avanços materiais e melhoramentos urbanos.
Visando adequar o município aos anseios republicanos de civilidade e progresso, os dirigentes
locais atuaram propondo e executando medidas que tinham por desígnio racionalizar a cidade e a
sociedade uberabense. A Câmara Municipal tomou iniciativas no sentido de ordenar o espaço urbano
e conformar os hábitos dos cidadãos, com a proposição de leis de ordenamento, implantação de
melhoramentos urbanos e a reforma no Código de Posturas.
Nesse sentido, teremos em Uberaba um processo de organização da instrução pública e de difusão
da escolarização. Perspectiva confirmada pela existência de um bom número de unidades escolares
no município e índices de analfabetismo abaixo das médias apresentadas pelo restante do país. O
número de escolas criadas é representativo do valor atribuído à educação pelos dirigentes locais.
No período pesquisado foram criadas 14 escolas rurais e 10 escolas urbanas, totalizando 24 escolas
criadas pelo poder municipal. Além disso as autoridades locais promoveram variadas ações de
fomento e organização da instrução: criando escolas, contratando professores, responsabilizando-
se pelo financiamento da instrução pública e propondo leis para organização do ensino municipal.
Dentre os pontos de destaque desta ação educativa da Câmara Municipal, elencamos alguns de
maior relevância: a existência de Comissões temáticas dedicadas à instrução pública; a constituição
de Conselhos Escolares no munícipio e nos distritos; e a criação de uma inspetoria municipal de
ensino municipal. Além disso, chamam atenção os dados referentes ao financiamento da instrução,
que indicam uma tendência de crescimento dos gastos municipais com a educação escolar.
Elementos que apontam para uma preocupação da municipalidade sobre a questão da instrução.
De modo que, aos menos nestes primeiros anos republicanos, podemos atribuir à Uberaba a
categoria de “município pedagógico”. Ocorreu uma mobilização educativa: um envolvimento do
município com os assuntos relativos à instrução, com uma correspondente expansão e organização
da escolarização municipal.
Mediante a análise dos Relatórios de Inspeção, foi possível ir além do prescrito nas proposições
legislativas, no sentido de confrontá-las com as condições materiais de existência das escolas
municipais. Os relatórios confirmam a importância da municipalidade na promoção da instrução
pública. Os relatos de inspetores destacam um bom número de escolas mantidas pela Câmara
Municipal, sendo estas inclusive em maior número que as escolas mantidas pelo estado.
Demonstrando uma ação complementar do município na oferta de instrução, colaborando com o
governo estadual no atendimento da crescente demanda por educação, sobretudo nas áreas rurais.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 601
Considerações finais
Numa ambiência de descentralização político-administrativa e de responsabilização da
instância local, o município de Uberaba ao início da República irá se constituir enquanto “município
pedagógico”, organizando a instrução pública em seus domínios. Nesse sentido, podemos dizer que
estamos tratando em que muitas ações foram propostas e/ou concretizadas pela Câmara a fim de
promover a escolarização.
Contudo, este processo carece ser relativizado. A municipalidade atuou na organização da
educação, mas deu forma a uma instrução pública ainda sem organicidade. Faltava-lhe uma
regulamentação mais bem definida e melhores condições materiais de existência. Em nossa
perspectiva, a tônica da organização da instrução pública municipal em Uberaba, corresponde
a um processo ainda problemático, no qual o município, ao mesmo tempo em que se propunha
racionalizado e civilizado, também tinha a sua realidade educacional marcada por contradições, e
conservava deficiências que contrariavam o discurso de modernização.
Acreditamos que, ao final da presente investigação, é possível ter uma melhor compreensão
acerca da realidade educacional dos primeiros anos do período republicano no Brasil, sobretudo
no que refere às ações educativas empreendidas a nível local. De modo que devemos, ao mesmo
tempo, reconhecer a importância da iniciativa local no processo de organização da instrução pública
e, também, identificar os limites e os problemas que conformaram esta ação educativa.
Referências
CARVALHO, Luciana Beatriz de Oliveira Bar de & CARVALHO, Carlos Henrique de. O lugar da educação
na modernidade luso-brasileira no fim do Século XIX e início do XX. Campinas, SP: Alínea, 2012.
COSTA, Emília Viotti. Da Monarquia à República: momentos decisivos. 8. ed., rev. e ampl. São Paulo:
UNESP, 2007.
GONÇALVES NETO, Wenceslau & CARVALHO, Carlos Henrique de. (Orgs.) Ação Municipal e Educação
na Primeira República no Brasil. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2015.
MAGALHÃES, Justino. O município liberal e a decisão política. In: GONÇALVES NETO, W; CARVALHO,
C. H. de. (Orgs.) Ação Municipal e Educação na Primeira República no Brasil. Belo Horizonte: Mazza
Edições, 2015.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Resumo
Duas influências educacionais são identificadas no movimento operário no início do século XX, a
do pedagogo espanhol Francisco Ferrer com as escolas modernas e o modelo socialista russo após
a Revolução de 1917. Com base nessas duas influências, o trabalho objetiva identificar e analisar a
criação e as finalidades das Universidades Populares na primeira metade do século XX em três estados:
Rio de Janeiro, Paraná e São Paulo. Outros estados também tiveram experiências com universidades
populares, porém, neste momento, serão destacados apenas três exemplos que mostram esforços
para criação de cursos superiores ao movimento operário na primeira metade do século XX.
Enfatiza-se, com esta pesquisa, a luta da classe operária e seus aliados na construção do próprio
modelo educacional de ensino superior, bem como as dificuldades encontradas nos três estados para
o funcionamento dessas instituições que, mesmo com existências efêmeras, tiveram um projeto e
uma finalidade para funcionarem.
O trabalho está situado no âmbito da História Cultural, com base em Chartier (1990), o qual
apresenta uma proposta de como as práticas e as representações constituem-se, partindo do princípio
de que podemos apreender do passado por meio das representações feitas anteriormente, as quais,
na maioria das vezes, são formuladas pelos grupos sociais, neste caso, os operários e os defensores
da educação popular. As fontes são bibliografias e documentais (Jornais).
A primeira universidade popular criada neste recorte temporal foi a do Rio de Janeiro, em 1904,
de inspiração anarquista, conhecida como Universidade Popular de Ensino Livre. A universidade
foi criada nos moldes de educação preconizados por Francisco Ferrer[1] e tinha como objetivo a
“instrução superior e a educação social do proletariado”, conforme aponta Ghiraldelli Júnior (1987, p.
161), com base no jornal O Amigo do Povo de 2 de abril de 1904, porém ela foi fechada no mesmo ano
fortes repressões.
Dentre os ideais libertários, estava a defesa das escolas autônomas e autogeridas, a educação
integral e o ensino nacionalista, defendidas pelo pedagogo espanhol Ferrer. As ideias anarquistas
predominaram até a Revolução Socialista Russa que, posteriormente, tornou-se referência no
movimento operário. De acordo com Rago (1985), as manifestações do movimento operário foram
motivos de repressão, inclusive a educação, visto que, após a revolução russa, iniciativas educacionais
libertárias, como as escolas modernas de São Paulo foram fechadas por forte repressão estatal.
Após a revolução russa surgem novas inspirações educacionais no movimento operário,
despertando novos anseios em defesa da educação popular pelo país. Saviani (2011, p. 182) reforça
que essas duas correntes pedagógicas, influenciaram o movimento operário. Afirma ainda que os
“[...] vários partidos operários, partidos socialistas, centros socialistas, assumiram a defesa do ensino
popular gratuito, laico e técnico-profissional”, despertando a partir daí o surgimento das escolas
operárias e também bibliotecas populares.
No Paraná, um dos primeiros indícios sobre a criação de uma Universidade Popular, em Curitiba
no ano de 1931, foi a informação coletada no livro de Wachowicz (2006) “Universidade do Mate:
história da UFPR.”. O autor cita que após a Revolução de 1930 surgiu em Curitiba um movimento
educacional de orientação esquerdista que “pretendeu” instalar uma universidade popular.
Aprofundando a informação, constatou-se na reportagem do jornal Diário da Tarde[2], que foi
criada uma Universidade Popular em Curitiba no ano de 1931. O artigo, escrito por Sérgio Duarte,
ressalta a necessidade de uma universidade aos proletários e o entusiasmo dos mesmos pela
sua criação. A universidade foi criada pela União Operária do Paraná e tinha dois objetivos, um
revolucionário e outro educativo. Sua finalidade seria “[...] o melhoramento immediato da vida do
proletário e a formação da consciência revolucionária.”[3]
Em outra reportagem do jornal Diário da Tarde[4], encontramos mais detalhes sobre os postulados
da universidade: 1) Cultura ao alcance de todos; 2) Escola Una; 3) Cátedra livre; 4) Abolição do
ensino dogmático e livresco; 5) Participação livre; 6) Participação do corpo discente na direção da
universidade e 7) Extensão universitária. A finalidade era desenvolver na classe operária as aptidões
físicas, morais e intelectuais. Porém, segundo Wachowicz (2006), ela foi fechada por suposta ligação
com o partido comunista.
Em São Paulo, no Jornal “Diário Nacional”[5], do dia 18 de janeiro de 1931, p. 5, é publicada
uma reportagem sobre o interesse de um grupo de intelectuais, artistas, cientistas e educadores,
fundarem uma sociedade, intitulada “Associação Brasileira de Cultura” (A. B. C.), para “difusão de
ensinamentos e cultura geral das massas e desenvolvimento do gosto artístico entre as camadas
populares”. Já no dia 25 de julho, no mesmo ano e jornal, é publicado um discurso do secretário
geral da A.B.C, Manuel do Carmo, pronunciado no Rotary Clube de São Paulo, sobre o tema: “A A.B.C
e o seu programa cultural”, revela que a ideia principal da associação era criar uma Universidade
Popular, porém, revela que a ideia não era nova, pois “[...] a Associação pega o facho de luz que outros
já empunharam e vae leval-o adiante, procurando iluminar o caminho em pról da comunidade”.
Ainda no mesmo ano, no dia 25 de agosto o jornal publica uma reportagem com o título:
“Matrícula na Universidade Popular”, que segue informando que a Associação Brasileira de Cultura
acaba de abrir as inscrições para os cursos da universidade, “visando difundir a cultura entre as
classes menos favorecidas e que encontram dificuldades para a continuação de seus estudos.” Para
matrícula, a associação cobrava o pagamento de uma taxa de mil réis, que dava ao estudante o
direito de frequentar os vários cursos da universidade.
Outra experiência em São Paulo, conforme mostra o Jornal de Notícias[6], foi a Universidade Popular
Presidente Roosevelt, destinada aos que quisessem aperfeiçoar a instrução com cursos inteiramente
gratuitos, contribuindo para elevação cultural das camadas menos favorecidas. Hermínio Sacchetta
(1909-1982)[7] proferiu uma aula sobre o Trotskismo no curso de Doutrinas Políticas em 1946. Na
aula ele abordou sobre a doutrina trotskista e o conceito de “revolução permanente”, defendida pela
corrente. O autor revela ainda, que a universidade era de iniciativa particular e tinha como objetivo
contribuir para a elevação do nível cultural do povo.
Conforme o regulamento do Curso Popular de Doutrinas Políticas, da Universidade Popular
Presidente Roosevelt, encontrado no Arquivo Público de São Paulo, informa que nunca houve
uma preocupação com o preparo político da população, por este motivo a necessidade do curso.
O regulamento deixa claro não tem “cor política” nem religiosa, sendo o único comprometimento
com a cultura do povo em geral. Porém, conforme a aula proferida por Hermínio Sacchetta, ela foi
destinada ao público operário.
Com base nos apontamentos dos três estados é possível depreender das fontes que nos projetos
de implantação das universidades, ambos tinham o mesmo objetivo, o de elevar culturalmente a
classe popular/operária por meio de cursos de fácil acesso, contrapondo ao modelo de universidades
tradicionais e elitistas do período. São exemplos que mostram a história e a luta da educação popular
no Brasil.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 604
Referências
GHIRALDELLI JR., Paulo. Educação e movimento operário. São Paulo: Cortez, 1987.
RAGO, Margareth. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.
SACCHETTA, Hermínio. O caldeirão das bruxas e outros escritos políticos. Campinas: Pontes/
Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1992.
SAVIANI, D. História das ideias pedagógicas no Brasil. 3. ed. Campinas: Autores Associados, 2011.
[1] Francisco Ferrer foi um educador libertário espanhol do século XIX, criador da Escola Moderna. Defendia uma edu-
cação humana e igualitária. Conforme Ghiraldelli Júnior (1987, p. 114), “Ferrer entendia a co-educação enquanto
fórmula capaz de abrigar uma mesma sala de aula, na mesma escola, crianças de classes sociais diferentes. Para
Ferrer, uma escola exclusiva para uma ou outra classe social teria, forçosamente, que optar por incutir nas crianças
os sentimentos de ódio, próprios dos adultos, ódio resultante da luta de classes, o que só serviria para atrapalhar
a educação infantil”.
[2] DIÁRIO DA TARDE. Curitiba, 16 de outubro de 1931.
[3] DIÁRIO DA TARDE. Curitiba, 7 de setembro de 1931.
[4] DIÁRIO DA TARDE. Curitiba, 9 de setembro de 1931.
[5] DIÁRIO NACIONAL. São Paulo, 18 de janeiro de 1931.
[6] JORNAL DE NOTÍCIAS. São Paulo, 05 de maio de 1946.
[7] Jornalista de militante do Partido Comunista.
ISSN 2358-3959
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Céu Basto 4
Margarida Louro Felgueiras 5
Resumo
No século XIX e início do século XX o cenário de vida da população portuguesa pautava-se por
um conjunto de problemas, entre eles a precaridade em que viviam as famílias, que segundo Faria
de Vasconcelos, “a desorganização da família põe em perigo a própria existência da sociedade”
(VASCONCELOS, 1905, p. 25). Impunha-se a urgência de trabalhar no sentido de a modificar e
organizar, através de políticas sociais e novas formas de assistência. As zonas rurais e semirrurais
caracterizavam-se, por situações de enorme pobreza, mais sentida em famílias numerosas, que
levou ao “abandono, a marginalização, a exploração, a mendicidade de crianças e jovens ou
situações trágicas.” (VASCONCELOS, 1905, p.29). Este quadro social despoletou a necessidade de se
criarem instituições que respondessem à necessidade de educar e reeducar a infância e juventude
marginalizada, impondo um conjunto de regras que se faziam cumprir através de mecanismos de
poder. A preocupação com a marginalidade infantil, com a pobreza da população e com a falta de
respostas sociais face ao problema e, ainda, a inquietação que este quadro social constituía para
a sociedade, levou a que as elites se organizassem no sentido de apoiar este grupo social. A ideia
de caridade avulsa foi atualizada pela de ação organizada, que procurou retirar da rua as crianças
pobres, tornando-as úteis socialmente. A educação e assistência foram vistas como os meios para
essa transformação social (FELGUEIRAS, 2008, 2018); (FERNANDES, 2006). O concelho de Penafiel,
desde século XIX, destacou-se por ser o único do distrito do Porto, que em articulação com a capital
do distrito, se mobilizou no sentido de garantir a assistência e educação da infância marginalizada e
pobre do próprio concelho e dos concelhos contíguos. As misericórdias sempre assumiram um papel
significativo na história da beneficência e assistência aos mais desfavorecidos. Na segunda metade
do século XIX os legados à Misericórdia de Penafiel aumentaram significativamente, atingindo mais
de meia centena de registos e é nestes registos que se inclui o legado de José António Leal, por
testamento, para a fundação do Asilo de meninas pobres, que viria a ser fundado no ano de 1893. O
Asilo António José Leal manteve o seu funcionamento até à década de setenta do século XX, altura
em que encerrou. Tratou-se de uma instituição privada, tutelada pela Santa Casa da Misericórdia
de Penafiel, que tinha como missão acolher e educar meninas pobres do concelho, embora tivesse
acolhido meninas de outras regiões do país. O Internato Margarida Alves Magalhães foi fundado
em 1925, a partir do legado do benemérito José Augusto Alves de Magalhães e o seu encerramento
ocorreu no início da década de sessenta do século XX. Nas primeiras décadas de funcionamento da
instituição esta foi tutelada pela Junta Geral do Distrito do Porto e a partir de 1935 pela Santa Casa
da Misericórdia de Penafiel. O Internato tinha como missão acolher e educar meninas pobres do
distrito do Porto, embora, à semelhança do Asilo, acolheu meninas de outras regiões do norte do
país. O Asilo António José Leal e o Internato Margarida Alves Magalhães integram um conjunto de
instituições, que surgiram na cidade de Penafiel, a partir da segunda metade do século XIX.
Este trabalho tem como objetivo conhecer a fundação e a história do Asilo António José Leal e
do Internato Margarida Alves Magalhães e, simultaneamente, compreender, através de uma análise
comparada, o papel que tiveram estas duas instituições em prol da assistência e educação da
infância feminina pobre.
O recorte temporal situa-se entre 1926 e 1961, respetivamente o término da República, pelas
alterações que introduz no funcionamento do Asilo António José Leal e o ano de encerramento do
Internato Margarida Alves Magalhães.
As fontes selecionadas para este trabalho dizem respeito à documentação de arquivo que
encontramos sobre as duas instituições, nomeadamente os livros de atas das sessões da Comissão
Administrativa e da Assembleia de Irmãos da Santa Casa da Misericórdia de Penafiel; livros de
registo de entrada de meninas; livros de registos de matrículas no ensino primário; documentos
relacionados com a atividade económica das duas instituições; relatórios anuais da atividade da
Santa Casa da Misericórdia de Penafiel e outros documentos. Estas fontes foram cruzadas com
publicações da imprensa local e os relatórios da Comissão Municipal de Assistência, produzidos
anualmente, a partir de 1949.
O trabalho insere-se na história social da educação e a abordagem metodológica é de natureza
quantitativa, qualitativa e comparada. Quantitativa, pois recolhemos alguns dados seriais que
permitem uma visão da população atendida no período de tempo estudado; e interpretativa,
pois quer os dados tratados segundo uma estatística descritiva, quer outros de natureza mais
episódica, recolhidos na imprensa, necessitam de ser interpretados e explicados; comparada
porque pretendemos compreender o que é comum e o que diferencia, numa abordagem que vise
compreender a mesma problemática, nas diferentes instituições, no mesmo espaço-tempo social.
Neste seguimento pensamos que a leitura dos aspetos comuns e das diferenças entre as duas
instituições em estudo irá fornecer informações relevantes que conduzirão à construção de um
novo saber. Segundo Nóvoa e Catani esta abordagem “exige a problematização da própria noção de
comparação e um exercício crítico que permita criar categorias férteis na apreensão das peculiaridades
dos processos de apropriação dos saberes e da invenção das práticas no campo educacional” (2000,
p.1). Para António Gomes Ferreira (2008) a comparação em educação é complexa e múltipla e leva
a tenhamos em consideração a relação existente entre o contexto histórico, social, económico,
político e cultural. O autor encontra-se na mesma linha de pensamento de Nóvoa e Catani ao referir
que a educação comparada “gera uma dinâmica de raciocínio que obriga a identificar semelhanças
e diferenças entre dois ou mais factos, fenómenos ou processos educativos e a interpretá-las”
(FERREIRA, 2008, p.125). Para este autor a educação comparada visa “compreender a dinâmica dos
sistemas educacionais ou de aspetos com eles relacionados por via da comparação” (2008, p.125).
Como resultados apontamos o aprofundamento do conhecimento acerca das duas instituições
de assistência e acolhimento da infância marginalizada na cidade de Penafiel. Constitui mais um
contributo para a compreensão de formas de educação para crianças necessitadas, em regime de
internato, tido durante muito tempo como o modelo de formação (Felgueiras, 2018). Em particular
para as meninas, que deviam ser afastadas da vida social e preparadas para a vida no lar. No caso das
meninas pobres o seu destino social seria a vida como empregadas domésticas ou para trabalhos no
campo ou artesanais, como costura ou bordados.
Referências
FELGUEIRAS, Louro Felgueiras - Do Modelo de Internato ao Internato Modelo. Educação, Norma e
Ensino na Misericórdia do Porto (1900-2012). In Amorim, Inês (Cord.) Sob o Manto da Misericórdia.
Volume IV. Porto: Santa Casa da Misericórdia do Porto e Grupo Almedina,2018, (pp. 268-303).
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 607
FELGUEIRAS, Margarida Louro - Para uma História Social do Professorado Primário em Portugal no
Século XX. Uma nova família: o Instituto do Professorado Primário Oficial Português. Porto: Campo
das Letras Editores, 2008.
NÓVOA, António e CATANI, Denise B. - Estudos comparados sobre a escola: Portugal e Brasil (séculos
XIX e XX). Texto apresentado no I Congresso Brasileiro de História da Educação, Rio de Janeiro,
novembro de 2000.
VASCONCELOS, Faria de - Uma escola nova na Bélgica. Neuchâtel: Delachaux & Niestlé, 1915.
ISSN 2358-3959
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No Paraguai, o Decreto do Poder Executivo nº 10.175, de 22 de março de 1965 criou sete Centros
Regionais de Educação, dentre eles o Centro Regional de Educación – CRE de Pedro Juan Caballero,
responsável pela educação básica, ensino médio, cursos profissionalizantes, e especialmente, pela
formação de professores na região fronteiriça. O CRE foi criado em Pedro Juan Caballero apenas em
1976, e em 10 de abril de 1985, por meio da Resolução Nº 754, o Ministério da Educação e Cultura
modificou seu nome para Centro Regional de Educação “Dr. Raul Peña”, o qual é considerado a maior
instituição pública da cidade.
A história das duas instituições apresentaram particularidades em relação à estrutura física,
pedagógica e didática, entretanto, ao serem analisadas diante de algumas práticas educativas e no
contexto da história da educação, principalmente em um período em que ambos os países lidavam
com o regime militar, apresentaram várias aproximações, aspectos que ficaram muito mais evidentes
diante da possível articulação entre as diversas fontes pesquisadas e a relação entre a história das
instituições e a história da educação.
Torna-se relevante destacar também que a busca por pesquisas sobre a historiografia destas
instituições e sobre a história da educação na fronteira entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero
evidenciou um campo ainda incipiente, o que reforça o compromisso e significado social, cultural
e histórico de possibilitar a escrita da história das instituições educativas, pois nesta rede de
interdependência entre indivíduos, instituições, fontes e acontecimentos a história pode ser
registrada, narrada, rememorada e eternizada.
Referências
BEZERRA, Artur D’amico. A ESCOLA NORMAL DE PONTA PORÃ, SUL DE MATO GROSSO (1959-1974).
CAMPO GRANDE/MS, 2015. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul, UFMS, 2015.
ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador: uma história dos costumes. Tradução de Ruy Jungmann. Rio
de Janeiro: Zahar, 1994.
MAGALHÃES, Justino Pereira de. Tecendo nexos: história das instituições educativas. Bragança
Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2004.
SANFELICE, José Luís. História das instituições escolares e gestores educacionais. Revista
HISTEDBR. Campinas, n. especial, p. 20–27, ago. 2006 - ISSN: 1676-2584 20.
RESUMOS DAS
COMUNICAÇÕES
INDIVIDUAIS
EIXO
POLÍTICAS
EDUCATIVAS
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Este artigo faz parte de uma pesquisa de pós-doutoramento com o objetivo de contribuir para
o debate sobre a privatização do ensino brasileiro. Para isso focaliza os encontros educacionais
organizados pelo Instituto de Pesquisa e Estudo Sociais (IPÊS), respectivamente no ano de 1964 e
1968 procurando desvendar a concepção educacional de seus dirigentes.
A articulação do IPÊS enquanto instituto, segundo Paulo Ayres Filho, empresário ligado ao
ramo farmacêutico e um de seus fundadores, se iniciou em outubro de 1960 e se manteve atuante
até o início dos anos 70. Sua desmobilização aconteceu pelas divergências internas e pelo fato
de integrantes do instituto assumirem cargos dentro dos governos militares. O instituto foi uma
associação com objetivos claros de combater movimentos de esquerda e organizar empresários, de
diversos setores, para atuarem diretamente nos rumos da sociedade brasileira formulando reformas
sociais para alcançarem seus objetivos.
Oficialmente, o IPÊS em seu panfleto intitulado em o “O que é o IPÊS” declara que sua fundação
foi em agosto de 1961, nele expressa seus objetivos mais amplos e afirma que o movimento surge
inspirado na ata da Aliança para o progresso e na Encíclica Mater et Magistra do papa João XXIII. O
IPÊS era composto por sessões regionais, sendo duas sessões de maior destaque: a de São Paulo e
da Guanabara. Até 27 de maio de 1964 esse instituto possuía uma estrutura conjunta, e, segundo a
ata da comissão orientadora e da comissão diretora do IPÊS São Paulo, a partir desse ano ocorre
uma modificação administrativa, tornando as sessões independentes, essa alteração aconteceu
por problemas administrativos que segundo esses dirigentes deveriam ser resolvidos localmente.
Porém, afirmavam que a colaboração entre as sessões do IPÊS deveria ser intensificada.
Temos que ressaltar que o IPÊS foi um dos articuladores do golpe civil-militar brasileiro de 1964,
sendo seus integrantes sujeitos que representavam empresas nacionais, internacionais, profissionais
liberais e membros do exército.
Os eventos educacionais do IPÊS, foco central desse trabalho, tinham o objetivo de reunir
especialistas em torno de temáticas que consideravam essenciais e, assim, colaborar com as
reformas educacionais propostas durante o governo militar. O primeiro simpósio ocorreu no ano
de 1964, no mês de novembro, oito meses após o golpe civil-militar. O segundo, intitulado como
fórum “A educação que nos convém” ocorreu no ano de 1968, entre outubro e novembro, em meio
as discussões sobre a reforma universitária e a instauração do Ato Institucional n. 5.
A articulação desses sujeitos no meio educacional, sua atuação em defesa do livre mercado, do
desenvolvimento econômico, nos fez entendê-los como intelectuais que possuíam uma concepção
de sociedade e buscavam defendê-la, garantindo com isso seus interesses e fortalecendo sua classe.
Para o entendimento sobre a função e a formação do intelectual nos valeremos de referências
como Gramsci (1978; 2011) e Bobbio (1997). Gramsci afirmava que qualquer grupo social cria para
si camadas de intelectuais que lhes dão homogeneidade e consciência da própria função no campo
social, político e econômico.
Os sujeitos que fazem parte de nossa investigação têm um papel dirigente (intelectual), não
apenas especificamente em relação à sua função técnica, mas também como organizadores da
sociedade (organizadores da cultura) com suas múltiplas relações vividas, criando, assim, condições
favoráveis para a expansão de sua própria classe. São nas relações sociais que a consciência do ser
humano é formada. Essas relações são traduzidas em experiências que serão incorporadas à sua
cultura.
Esses dirigentes que se organizavam no IPÊS são intelectuais, e sua função era de convencimento
e harmonização para favorecer o setor privado. Cabe ressaltar que usamos essa noção de intelectual
não baseado na dicotomia trabalho manual versus trabalho intelectual (pensar), mas sim na função
do sujeito na sociedade. Um operário que tem uma função política sindical pode ser considerado um
intelectual, assim como um empresário ligado às suas respectivas associações e sindicatos. O papel
intelectual desses sujeitos nos leva a evidenciar que esse grupo organizado buscava a hegemonia
de seus interesses perante a sociedade brasileira e para isso, necessitavam criar o consenso em um
grupo com diversas diferenças internas.
E nesse sentido que tomamos como referência a noção de hegemonia de Williams (2011).
Williams destaca que Gramsci atuou de maneira a mudar a caracterização dessa noção, o que antes
era entendido apenas como um conceito de dominação entre Estados passa a ser visto como uma
combinação de forças políticas, sociais e culturais. Sendo assim, a hegemonia não tem o mesmo
significado de domínio ou dominação. Ela passa a ser um “sistema vivido de significados e valores
– constitutivo e constituidor” segundo o qual os grupos presentes na sociedade civil, e nesse caso,
na iniciativa privada, passam por um processo de construção com suas práticas e vivências no que
tange à sociedade que almejam. A hegemonia passa a ser um processo dinâmico e não estático.
Os sujeitos que fazem essa história não são mecanizados no sentido de atuarem de forma linear.
Assim, a construção da hegemonia passa a ser um processo histórico em constante movimento com
contradições e consensos em torno, no caso, de um mesmo setor educacional. Como afirmamos
anteriormente, a hegemonia é o conjunto de significados e valores, um processo histórico, que faz
parte da realidade dos sujeitos que vivem em determinadas condições sociais e culturais e não pode
ser entendida como uma mera manipulação.
Nesse sentido, essa análise recai nos processos que levam à cultura dominante, pois se articula
com o processo social real. Esses dirigentes e empresários, não buscavam simplesmente o lucro
para sua atividade, apesar dessa preocupação estar presente, buscavam também uma maneira de
organizar a sociedade em prol de seus interesses, ou seja, detinham uma concepção social.
Esses dirigentes (intelectuais) construíram espaços de consenso para aturarem de maneira
coesa na sociedade durante o período da ditadura civil-militar brasileira. Esses espaços se davam
muitas vezes em encontros e congressos sobre diversas temáticas, porém a destacada por nós se
refere a educação brasileira. Esses sujeitos ligados ao setor privado entendiam a educação como
um dos setores de maior importância da sociedade, inclusive para o seu próprio desenvolvimento.
Ao falarmos de hegemonia, falamos de processo histórico vivido e construído em nosso cotidiano,
algo real e não isolado. Se esse processo fosse analisado como algo simplesmente estrutural onde
uma classe domina a outra, a complexidade da sociedade em que vivemos não seria retratada e
ficaríamos apenas no campo das ideias. A construção da hegemonia vai muito além da questão de
imposição pela força ou econômica, ela determina uma cultura que se torna dominante a partir de
significados e valores selecionados.
Levando-se em consideração o contexto e o momento histórico abordados, devemos ficar
atentos aos pequenos rituais do cotidiano de determinados grupos que eram feitos para fortalecer
essa hegemonia do setor privado. Como a intenção desse trabalho é buscar nos sujeitos (e em seus
grupos) suas contradições e consensos, seus interesses comuns em torno da educação privada,
levando em conta que a consciência de classe e a sua homogeneidade se constroem a partir dessas
relações que, ao se traduzirem em experiências comuns, formam a classe social, não poderíamos
entender as noções apresentadas até aqui como conceitos fechados e isolados.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 614
O processo histórico acontece na medida em que as ações e relações desses sujeitos geram
mudanças em seus receptivos meios. O diálogo com as evidências fará com que esse processo
histórico, o processo de construção da hegemonia do setor privado se torne a preocupação central
dentro deste trabalho. Porém, para chegarmos aos processos precisamos analisar vidas e escolhas
individuais, ou seja, os dirigentes e empresários, apoiadores presentes no IPÊS.
As principais fontes dessa pesquisa foram encontradas no Arquivo Nacional na cidade do Rio de
Janeiro, e no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC),
na mesma cidade. Esses documentos detalhavam as atividades e intenções dos sujeitos presentes
nesse instituto em relação a educação e a sociedade brasileira de uma maneira geral. Esse artigo,
como dissemos anteriormente, focaliza os documentos específicos sobre os simpósios educacionais
do IPÊS e podemos afirmar que os dirigentes desse instituto tinham uma visão voltada para uma
sociedade pautada no livre mercado, com certas peculiaridades, onde a principal função da educação
seria levar para o desenvolvimento econômico, sendo influenciados pelas ideias de Theodore W.
Schultz, professor da Universidade de Chicago e criador da teoria do capital humano, beneficiando
assim setores empresariais com a educação.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Esta pesquisa analisa a participação do estado do Amazonas nas discussões sobre os rumos da
educação brasileira após 1930. A análise destaca dois eventos significativos, ambos acontecidos em
1935: a) o propósito do governo federal em elaborar o Plano Nacional de Educação (PNE); b) a VII
Conferência Nacional de Educação (CNE), promovida pela Associação Brasileira de Educação (ABE)
no Rio de Janeiro. A metodologia é assentada em dois eixos: a) Um breve diagnóstico da educação
do Amazonas nas primeiras décadas do século XX; b) O quadro educacional do estado no contexto
político brasileiro da época. O recorte temporal considerado vai do início do século XX até meados
da década de 1930. Há poucas referências sobre a participação amazonense nas discussões
educacionais travadas em âmbito nacional, principalmente durante a década de 1930. Outrossim, a
pesquisa é parte de um estudo mais amplo sobre a institucionalização da educação escolar no
estado de Rondônia, cuja capital, Porto Velho, era parte do estado do Amazonas até o ano de 1943,
quando foi criado o Território Federal do Guaporé. A pesquisa é de caráter documental e bibliográfica.
Como fontes documentais, recorremos a mensagens dos governadores do Amazonas à Assembleia
Legislativa, bem como a órgãos de imprensa da época, tais como: Jornal do Commercio, de Manaus;
Alto Madeira, de Porto Velho; Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro. A pesquisa bibliográfica foi
realizada a partir de autores como Azevedo (1944), Chagas (1980), Freitas e Biccas (2009) e Saviani
(2018), com o fim de caracterizar o quadro da educação brasileira no período analisado. O
desenvolvimento da análise apresenta a seguinte ordem: 1) o diagnóstico da educação amazonense
nas primeiras décadas do século XX; 2) a caracterização do cenário brasileiro no mesmo período; 3)
a participação do Amazonas na elaboração do Plano Nacional de Educação; 4) a participação do
estado na VII Conferência Nacional de Educação. Quanto ao primeiro ponto, diagnóstico da educação
amazonense, eis alguns exemplos ilustrativos: a) em 1917, na recém-fundada cidade de Porto Velho,
denunciava-se que a instrução primária se resumia a uma única escola; b) a fundação, em 1925, do
primeiro grupo escolar portovelhense (o Grupo Escolar Barão do Solimões) se mostrou mais
motivada por interesses partidários (a eleição de candidatos do Partido Republicano do Amazonas)
do que fruto de uma política educacional do estado, uma vez que, apesar da inauguração solene, a
sede definitiva da escola somente foi concluída quinze anos depois, em 1940, pela empresa Estrada
de Ferro Madeira Mamoré (EFMM); c) escolas privadas, inclusive algumas dirigidas pela Igreja
Católica, eram subvencionadas pelo poder público; d) ao mesmo tempo em que apoiava as
instituições privadas, a Intendência Municipal de Porto Velho sancionava a Lei número 87, de 18 de
março de 1920, promovendo o fechamento de escolas públicas para cortar despesas devido, dentre
outras razões, à queda de preço da goma elástica, principal produto de exportação da região; e)
mensagem de 1937 do governador do Amazonas à Assembleia Legislativa alertava que seriam
necessárias mais 911 escolas para atender a 81% de crianças em idade escolar que estavam sem
estudar, o que exigiria uma despesa adicional equivalente à metade das rendas do estado, o que
somente poderia ser atendido com o apoio financeiro da União. Quanto ao segundo ponto da
análise, ou seja, o cenário da educação brasileira no mesmo período, a leitura de Azevedo (1944),
Chagas (1980), Freitas e Bicas (2009) e Saviani (2011) traz algumas informações relevantes que
permitem articular o contexto local com o cenário brasileiro: a) o regime educacional descentralizado,
originário da época imperial, foi aprofundado durante a República Velha, o que fez a educação
fundamental ser responsabilidade dos poderes locais; b) os gastos dos estados com a instrução
pública decresceram em relação aos valores verificados durante o Império; c) somente com a
Constituição Federal de 1934 a União passou a definir diretrizes educacionais e prestar auxílio aos
estados; d) em 1920, a porcentagem de analfabetos ultrapassava 60% da população brasileira; e) em
todo o país era realizado um intenso debate sobre os rumos da educação, chegando a caracterizar
uma acirrada disputa entre renovadores escolanovistas e conservadores, em sua maioria católicos,
pela hegemonia no campo educacional. A participação amazonense na elaboração do Plano
Nacional de Educação, merece destaque: a) a solicitação enviada diretamente pelo então presidente
Getúlio Vargas por meio de telegramas endereçados ao governador do estado, Álvaro Maia, em 15 de
julho de 1935 e 23 de janeiro de 1936: b) nesses telegramas, o governo federal solicitava sugestões ao
plano, ou mesmo um anteprojeto, e o preenchimento de um questionário elaborado pelo Ministério
da Educação e Saúde Pública; c) em 6 de abril de 1936, o governador do estado reportou ao presidente
Getúlio Vargas que o questionário fora levado ao conhecimento de todo o magistério estadual e que
a Diretoria de Ensino Público estava empenhada no cumprimento das solicitações do Ministério. d)
foi elaborado um minucioso relatório a respeito dos estabelecimentos de ensino e demais serviços
de educação no estado, contemplando, dentre outros tópicos, o ensino superior, os grupos escolares,
o Ginásio Amazonense Pedro II, a Escola Normal, a Escola de Aprendizes Artífices; d) nesse relatório,
é interessante ressaltar preocupações com a formação de professores (currículo moderno, especial
cuidado na formação de professores rurais), com o ensino religioso (em atendimento à Lei número
32 de 30 de dezembro de 1935, reconhecendo a autoridade do Bispo Diocesano de Manaus e de
outros líderes religiosos dos credos que não atentassem contra as leis do país) e com a estatística
educacional (cumprindo o Convênio Estatístico firmado durante a IV Conferência Nacional de
Educação de 1931, visando à escrituração e controle das atividades educacionais). Finalmente, o
último ponto da análise, a participação do Amazonas na VII Conferência Nacional de Educação: a) a
comissão amazonense foi presidida pelo diretor de instrução do estado, Arthur Cezar Ferreira Reis;
b) destacou-se a participação da professora Emília de Carvalho Antony com a palestra intitulada “O
problema econômico e o problema do ensino, as Escolas de Emergência no Amazonas”; c) essas
denominadas “Escolas de Emergência”, de caráter móvel, foram criadas por lei estadual de 1931 com
o objetivo de alfabetizar as crianças do interior do estado, cujas famílias se deslocavam em função
da atividade extrativista; d) tratou-se, sem dúvida, de uma rara oportunidade para expor as
peculiaridades do estado mais longínquo da União, com sua grande extensão territorial e dificuldades
de transporte; e) foi, também, ocasião de mostrar ao país a importância dada pelo estado à educação,
com a aplicação, em 1932, de 24,67% da receita orçamentária (um dos maiores percentuais entre os
estados brasileiros, superior ao quantum fixado na Constituição Federal), a obrigatoriedade, fixada
na Constituição Estadual, das escolas públicas oferecerem exercícios ginásticos, o comprometimento
com a criação de escolas normais rurais, as subvenções aos institutos de ensino profissional, nos
níveis técnico, científico e superior. f) por fim, a professora Emília de Carvalho Antony não poupou
críticas ao governo federal, de quem o Amazonas continuava a ter apenas risonhas promessas, tendo
tudo realizado no campo da educação com suas próprias forças. Como resultados alcançados nesta
pesquisa, entendemos, em primeiro lugar, que o estado do Amazonas, nas primeiras décadas do
século XX, convivia com os mesmos problemas que atingiam ao conjunto da educação brasileira. Ao
mesmo tempo, por força de um modelo educacional descentralizado e carente do apoio federal, o
estado se viu forçado a buscar soluções adequadas às suas peculiaridades geográficas, econômicas
e sociais, o que pode ser atestado, por exemplo, na criação das Escolas de Emergência. Por último,
em um momento da história educacional brasileira caracterizado por disputas ideológicas entre
reformadores e conservadores, a VII Conferência Nacional de Educação foi oportunidade de inserção
do estado nos debates ora travados. Entretanto, essa participação se caracterizou pela apresentação
de medidas práticas para solução dos problemas locais e pela crítica à atuação do governo federal
no campo da educação.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 617
Referências
ALTO MADEIRA. Porto Velho: Empresa Jornalística Alto Madeira. 1917-2017.
_______. Exposição ao exmo. sr. dr. Getúlio Vargas, d.d. presidente da República, por Alvaro Maia,
interventor federal. 1938.
AZEVEDO, Fernando. A cultura brasileira: introdução ao estudo da cultura no Brasil. São Paulo: Cia.
Ed. Nacional; IBGE, 1944.
SAVIANI, Dermeval. História das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas: Autores Associados, 2018.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O objetivo do trabalho foi o de analisar como a disciplina Educação Física (EF), dirigida ao Ensino
Médio (EM), comparece no discurso oficial da última reforma educacional, inscrita na Medida
Provisória (MP) nº 746/2016 (BRASIL, 2016) convertida na Lei nº 13.415/2017 (BRASIL, 2017), utilizando
a análise da produção acadêmico-científica disponível em bancos de dados digitais. O recorte
temporal adotado foi o período de 2016 a 2019, justificado pela aprovação das legislações que a
regulamentaram e pelas recentes produções que a analisam. Essa legislação modificou os aspectos
garantidos pela reforma educacional dos anos 1990, intervindo também na disciplina Educação
Física Escolar (EFE). Em 1996 deu-se a aprovação e publicação da segunda Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDBEN), Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996), que também marcou um momento
histórico importante para a EFE, quando esta deixou de ser entendida apenas como “aptidão física”
ou atividades de recreação e passou a ser um componente curricular. Utilizamos como metodologia
a pesquisa bibliográfica realizada em três bibliotecas digitais: a Biblioteca Digital de Teses e
Dissertações (BDTD), o repositório da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), e o banco
de dados da Scientific Electronic Library Online (SciELO). Para as buscas foram definidos dois
Descritores (D): D1- Lei nº 13.415/2017 and “Educação Física” e D2 - Reforma educacional and
“Educação Física”. Para auxiliar nas buscas foi utilizado como recurso, o recorte temporal de 2016 a
2019 e também no “assunto” o termo “educação física”. O levantamento bibliográfico permitiu a
construção de um mapa. Posteriormente foram realizadas as leituras dos trabalhos encontrados
para a seleção das produções, que serviram de fonte para o estudo, resultando na construção de
quadros. Como referencial teórico recorremos a conceitos inscritos na perspectiva foucaultiana e a
autores que abordam a Educação Física Escolar. Em sentido amplo, as teses, dissertações, leis,
regulamentos foram considerados fontes documentais para a pesquisa; e inscrevem-se em diferentes
discursos, como o oficial e o científico, entendendo que “o discurso é uma representação cultural
construída pela realidade” (FOUCAULT, 2008, p. 82). Na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a
disciplina EFE está definida como componente curricular da Área de Linguagens e suas Tecnologias.
Justifica-se na área das práticas sociais e na construção do ser humano; afirmando que nas práticas
o acesso ao conhecimento se efetiva. Porém, no processo escolar em questão é essencial relacionar
temas enfatizados ao conhecimento da realidade social, “não só proporcionar ao aluno o vivenciar,
apreciar, e valorizar estes benefícios vindos da cultura relacionada ao movimento humano, mas
também a questionar, perceber e compreender os sentidos e significados destas manifestações
corporais na sociedade em que vive” (DIAS, 2013, p. 278). O que deixa de evidenciar os desafios da
disciplina EFE, enquanto componente curricular no Ensino Médio e as implicações pedagógicas,
pois a “Reforma vem na proposta de uma nova roupagem de formação profissionalizante que
mantém a população distante de uma formação superior crítica” (SOARES, 2017, p.157). Acarretando
em uma desvalorização da mesma, refletindo na possibilidade de exclusão de algumas disciplinas
escolares, como a Educação Física. Nesta perspectiva, buscamos ampliar o diálogo com Chervel
(1990), para compreender o processo histórico de “disciplina” em sua constituição escolar e social
no campo científico. O pensador aborda o funcionamento da disciplina na escola como princípio de
investigação e dedicação da história cultural num conjunto de disciplinas escolares: “O sistema
escolar é detentor de um poder criativo insuficientemente valorizado, que desempenha um papel
duplo, não apenas de formar indivíduos, mas também no desenvolvimento que molda e modifica a
cultura da sociedade” (CHERVEL, 1990, p. 184). Ainda, em diálogo com Foucault (1996, p. 30) podemos
definir a disciplina como um “domínio de objetos, conjunto de métodos, um corpus de proposições
consideradas verdadeiras, jogo de regras e de definições, de técnicas e de instrumentos: tudo isso
constitui uma espécie de sistema anônimo à disposição de quem quer ou pode servir-se dele sem
que seus sentidos ou sua validade estejam ligados a quem sucedeu ser seu inventor”. Sobre o
contexto histórico da disciplina EFE, Martins (2016) evidencia ser uma área marcada pela
disciplinarização dos corpos, um exercício ligado a “disciplina do corpo”. Mas não se trata somente
dessa disciplina, pois a instituição escolar também tem sido considerada um “dispositivo
disciplinador”, mas que, em contrapartida, é também um espaço social que exerce contra poderes.
Os resultados da pesquisa bibliográfica feita nas bibliotecas digitais, apontam preocupações dos
pesquisadores sobre a disciplina e sobre a última reforma educacional. O Descritor D1- “Lei
13415/2017” e D2- “Reforma educacional” apresentou-se em diversas áreas da educação, porém ao
fazer a relação com o termo and “Educação Física” observou-se a rarefação no resultados de
trabalhos. Com base nas buscas, a BDTD resultou um total de 38 produções encontradas, e
selecionadas 19. No repositório da UFGD foi encontrado 13 e selecionado 4. Na SciELO dos 30
trabalhos encontrados foram selecionadas apenas 10 produções. O total selecionado nas plataformas
foi de 33 trabalhos. Com a realização da leitura dos trabalhos, foi observada a preocupação dos
estudiosos com a valorização dos profissionais da educação e as políticas governamentais, que não
promovem a continuidade de programas educacionais, devido às trocas de mandatos em curtos
períodos de tempo. Porém, dentre os estudos selecionados nas buscas dos repositórios Universitários
foi possível localizar pesquisas, como a dissertação de Hilário (2019) que analisa as reformas dos
anos 1990 e de 2017, abordando a história da relação educação-trabalho, como enunciado, inscrita
no Ensino Médio. A análise do referido enunciado presente nas duas reformas é apontado como
parte da maquinaria de governos neoliberais e tem atuado na regulação de subjetividades alinhadas
a essa racionalidade que caracteriza a sociedade brasileira contemporânea desde o século passado
e acirrando-se nos anos 1990. Conforme conceitos do referencial foucaultiano, o trabalho descreve
e analisa os discursos legais sobre o Ensino Médio. Os resultados da análise sinalizaram a existência
de uma rede discursiva em torno da escolarização juvenil, na qual são produzidas subjetividades
jovens úteis à manutenção do modo capitalista e neoliberal de governo da população em curso no
país. Outro trabalho que está dirigido à reforma educacional é a dissertação de Soares (2017), que
analisou a MP, considerando-a uma “contrarreforma” frente às conquistas alcançadas com as
políticas educacionais em curso a partir dos anos 1990, e também para a disciplina de EF. Os
resultados obtidos apontam uma ampla reflexão sobre as implicações da reforma analisada, e que
refere-se a uma desestruturação da docência e sua terceirização por meio de convênios, no
oferecimento de parte do currículo escolar. Outro tema relevante encontra-se na tese de Beltran
(2019), que buscou examinar o processo da atual reforma educacional. O que norteou a pesquisa do
autor foi à seguinte problemática: “quais os elementos motivadores e condicionantes da atual
reforma do ensino médio e quais os fundamentos da proposta de formação do novo ensino médio?”.
O autor recorreu ao materialismo histórico dialético para análise, e seguiu os procedimentos
metodológicos por meio da revisão bibliográfica, levantando dados sobre o EM e analisando as
seguintes legislações: Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio (DCNEM) e da BNCC. Outras
pesquisas mapeadas evidenciam as preocupações dos pesquisadores dessa temática apontando,
em espacial, para as consequências negativas que tal reforma pode implicar para a formação dos
adolescentes/jovens matriculados no EM, bem como para as práticas pedagógicas de professores da
disciplina de EF, pois sua oferta tornando-se optativa, tende a ser colocada em plano secundário,
“desqualificada”, no currículo escolar do Ensino Médio.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 620
Referências
CHERVEL, André. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Rev.
Teoria e Educação, n. 2, 1990. p. 177-229.
DIAS, Diogo Inácio; CORREIA, Walter Roberto. A Educação Física no ensino médio como objeto de
estudo da produção acadêmico-científica nos periódicos nacionais. Rev. Bras. Educ. Física e Esporte.
São Paulo, v. 27, n. 2, p. 277-87, Abr-Jun 2013.
FOUCAULT, Michel. Arqueologia do saber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves. 7. ed. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2007.
FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. 3. ed. Trad. Salma
Tannus Muchail. São Paulo: Martins Fontes, 1985.
ISSN 2358-3959
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Durante a ditadura civil-militar (1964-1985), ocorrida no Brasil, diferentes grupos sociais foram
afetados, direta ou indiretamente, por medidas provenientes desse regime político. Baseado na
Ideologia da Segurança Nacional e Desenvolvimento, instituiu-se no país uma nova política que
visava reformar o setor educacional. O potencial industrial do Brasil passou a ser enaltecido, além
do dever de cada cidadão em contribuir com esse progresso. Neste sentido, a educação brasileira
passou a ser concebida sob um viés tecnicista, com vistas a instrumentalizar o processo educativo
para que se tornasse proveitoso à expansão econômica (GOMES, 2010, p. 52). Os estudantes e as
instituições educacionais, passaram a ser um dos focos da atenção do governo. Para tanto, foi
decretada a Lei 5.692/71, responsável, dentre outras coisas, pela reformulação curricular e a criação
de novas disciplinas, com o intuito de promover uma nova interpretação da realidade nacional.
Assim sendo, tornou-se obrigatório o ensino de Estudos Sociais para o 1º grau (1ª a 8ª série) a qual
englobou os conteúdos de Geografia e História, gerando com isso a descaracterização dos currículos
dessas disciplinas. “A ideia era atender os interesses ideológicos dos setores que controlavam a
esfera política do que propriamente o desenvolvimento das ciências humanas” (GERMINARI; HORN,
2006, p. 29). Considerando esse contexto, o objetivo deste trabalho foi de analisar de que forma a
legislação e normatização oficial educacional promoveu a instituição, organização e promoção do
ensino de Estudos Sociais na rede municipal de Curitiba, para o ensino de 1º grau, entre os anos que
se estende de 1971 (quando a Lei 5.692 foi decretada) a 1985 (ano em que o regime ditatorial chegou
ao fim).
Por muito tempo prevaleceu na historiografia da educação a escola vinculada unicamente
à história dos regimes políticos. Isto impossibilitava a apreensão das dinâmicas diferenciadas de
poder presentes entre os grupos sociais, limitando o entendimento da história do cultura escolar.
Contudo, em 1990, no Brasil, a atenção começou a ser voltada para novos objetos e outros problemas
promovendo, desta forma, uma renovação de temas ou escolhas de novos temas referentes
à Educação, com base nos pressupostos da História Cultural (FONSECA, 2003, p. 60). Sob esta
perspectiva, o objetivo deste trabalho, mencionado anteriormente, foi pensando e problematizado,
com o intuito de intuito de dar visibilidade às relações que se estabelecem entre o indivíduo e a
sociedade na tentativa de “identificar os modos como, em diferentes lugares e momentos, uma
determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler” (CHARTIER, 1990, p. 16-17). As
concepções de Roger Chartier acerca da História Cultural e os seus conceitos de representação e
apropriação, foi de suma importância para esta pesquisa. Para esse autor, todas as manifestações
humanas configuram-se em representações que são criadas para atribuir sentido ao mundo social.
As representações, por sua vez, são determinadas pelos interesses de grupo que as forjam. Portanto,
para cada caso, é necessário relacionar os discursos proferidos com a posição de quem os utiliza.
A representações inserem-se “em um campo de concorrências e de competições cujos desafios se
enunciam em termos de poder e de dominação” (CHARTIER, 1990, p.17), ou seja, produzem “lutas de
representações”. Essas lutas, por sua vez, geram inúmeras apropriações, as quais consistem “no que
os indivíduos fazem com o que recebem, e que é uma forma de invenção, de criação e de produção
desde o momento em que se apoderam dos textos ou dos objetos recebidos. Desta maneira, o conceito
de apropriação pode misturar o controle e a invenção, pode articular a imposição de um sentido
e a produção de novos sentidos” (CHARTIER, 2001, p. 67). Em suma, as apropriações modelam e
geram novas representações, de acordo com os interesses sociais, com as imposições e resistências
políticas, além das motivações e as necessidades que se confrontam no mundo humano. Esses
conceitos, discutidos e problematizados no contexto de sua utilização e no decorrer deste trabalho,
possibilitou analisar de que forma a instituição, organização e promoção dos Estudos Sociais na
rede municipal de ensino, de Curitiba, se constituíram e foram representadas pelos grupos sociais,
direta ou indiretamente, envolvidos no processo.
Para a concretização deste trabalho foram utilizadas fontes escritas como a legislação e
normatização oficial educacional e documentos encontrados no arquivo público municipal de
Curitiba: plano curricular municipal para o ensino de Estudos Sociais, planos de aula e relatórios de
atividades referentes a esta disciplina, testes unificados.
Com base nos pressupostos da História Cultural, a legislação e normatização oficial educacional
foram compreendidas como fontes que possibilitam apreender desde a política educacional do
período até as práticas de sala de aula, por darem visibilidade às “[...] relações sociais mais amplas nas
quais estão inseridas e as quais elas contribuem para produzir” (FARIA FILHO, 1998, p. 99). Faria Filho
(1998), propõe tratar a legislação educacional como fonte. O autor entende que é pela experiência
que os sujeitos se constituem. Neste sentido, o processo de escolarização e as culturas escolares
são o resultado das experiências dos próprios sujeitos, dos sentidos que produzem e compartilham.
Assim sendo, a legislação educacional no Brasil é produzida, em geral, para criar costumes e culturas
a partir deles, além da possibilidade de ser considerada como expressão ideológica das camadas
dominantes na sociedade dependente. A Lei 5.692, pensada sob essa perspectiva, por exemplo,
apresenta um discurso imbuído de ideologia, uma vez que profere a intencionalidade e as ideias
do governo civil-militar, que buscava a adesão da população aos seus princípios. Porém, a mesma
legislação não pode ser pensada apenas por esse enfoque, já que isso oculta o processo dinâmico
que abre “[...] mais uma possibilidade de interrelacionar, no campo educativo, várias dimensões
do fazer pedagógico, às quais, atravessadas pela legislação, vão desde a política educacional até
as práticas da sala de aula” (FARIA FILHO, 1998, p.99). Portanto, para esse autor, é fundamental
que a análise da lei ocorra em função de três dimensões: de ordenamento jurídico, de linguagem
e de prática social, ampliando o processo analítico. A partir de então, a lei pode ser vista como
prática ordenadora e instituidora, voltada para as relações sociais, levando em consideração os
sujeitos envolvidos na produção da legislação (FARIA FILHO, 1998, p.106), além de contribuir para
o “[...] controle e formalização de outras (ou novas) práticas” (FARIA FILHO, 1998, p.108). Sob esta
perspectiva, ao analisar a Lei 5.692 foi preciso atentar ao contexto de sua produção e realização,
considerar as pessoas que o produziram e sua intencionalidade, bem como, investigar as práticas
procedentes do mesmo.
Além das fontes escritas, foram utilizadas a memória e a fonte oral. Vale lembrar que quando
se utiliza a oralidade como fonte é necessário considerar as especificidades inerentes a ela, já que
a memória possui um caráter seletivo. Portanto, é preciso tentar identificar como a memória se
modifica e varia ao longo do tempo e de acordo com o lugar (BURKE, 1992).
O entrecruzamento da fonte oral com as outras fontes foi de suma importância, pois propiciou
diferentes problematizações que surgiam à medida em que essa pesquisa foi sendo desenvolvida.
A análise dos discursos de diferentes grupos sociais possibilitou esclarecer os porquês de certas
interpretações e como as representações são exteriorizadas.
Referências
BURKE, Peter. A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo,
1992.
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990.
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GOMES, Maximilian da Rocha. Formação inicial de professores: um estudo de caso das práticas
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GERMINARI, Geyso Dongley; HORN, Geraldo Balduíno Horn. O Ensino de História e seu Currículo:
teoria e método. Petrópolis-RJ: Vozes, 2006.
ISSN 2358-3959
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pela documentação se deu principalmente pelos arquivos da câmara municipal pelas leis, atas da
sessões, relatórios e projetos; na secretaria de governo pelas leis e decretos-lei, e pelos documentos
complementares dos arquivos da Secretaria Municipal de Educação, além de outras instituições
da cidade como secretaria Estadual de Educação, Arquivo Público Municipal, Biblioteca Pública e
o Instituto Estadual de Educação. Ao selecionar informações nos arquivos, as análises apresentaram-
se no intuito de verificar se era possível legitimar as ações políticas administrativas do poder público
municipal constituídas como educativas e em favor e defesa da instrução. Uma tarefa complexa e
que nos convidou a pensar que para ler a cidade e seu passado, refletimos sobre a reconfiguração
temporal discutida por Pesavento (2007, p. 16), «a própria natureza das fontes se amplia, em leque,
oferecendo ao historiador possibilidades cada vez maiores de abordagem».
A análise da realidade local caminhou em diálogo a estudos de um conjunto da legislação nacional
e estadual bem como de autores que compusessem um diálogo sobre a força da legislação como
Cury (2000), sobre a educação no contexto de uma cidade em construção, Veiga ( 1994) e das relações
do sujeito com o espaço e o tempo, Pesavento (1995). Além destes, consideramos observar os
estudos de autores e pesquisadores da realidade londrinense e que trouxeram elementos históricos,
econômicos, administrativos, geográficos e políticos acerca da cidade de Londrina. O exercício do
pesquisador, segundo Certeau, é compreendido nestas ações de localização, seleção, análise das
fontes e da transformação dos fatos encontrados em documentos para a escrita da história, desta
história.
As possibilidades de discussão localizadas na documentação foram abrangentes e pudemos
organizar nossa pesquisa nos seguintes temas: a educação para além da escola; a educação cultural
para os sujeitos e a Biblioteca Municipal; o professorado; as instituições escolares e os planos,
programas e propostas para o ensino. Por uma síntese do que tivemos acesso na documentação que
catalogamos e analisamos, destacamos que das 606 leis elaboradas pelo município de 1934 a 1960,
170 se referiam à educação. Dentre estas, nos deparamos com um cenário educacional numa cidade
em crescimento que acompanhava dentro de suas limitações às demandas federais naquele período
histórico. Elas envolviam tópicos como: criação de escolas, regulações, subvenções, contratações
entre outros. Pudemos perceber como foram aplicados nesta localidade os planos e propostas para
o ensino nacional, porém geridos pela administração local.
Como desfecho, apresentamos a trama social e política envolvida na promoção da instrução
também atentos ao processo sócio-cultural presente no seu ethos urbano. Quando abordamos a
educação além da escola observamos que a intenção de trazer cultura ao povo londrinense estava
presente nas ações ligadas à biblioteca e nas ações culturais como um todo. Tornar Londrina civilizada,
dar condições de conhecimento aos sujeitos também dava a ela um status de progresso e de um
lugar favorável ao crescimento do indivíduo e de todo seu entorno econômico e social. Esse intento
se fazia presente nos discursos políticos e por todas as deliberações. O processo regulamentador
educou os seus sujeitos de alguma forma e esse movimento conduziu a transformação da cidade,
do município e de sua evolução ao longo dos anos. A escola e o ensino que passam por este espaço,
acontecem também para contribuir com um sistema mais amplo e que envolve as condições sociais
dos indivíduos inseridos num contexto econômico de sociedade e de nação.
Por fim verificamos quais eram as condição que em que se davam as ações regulatórias
voltadas à escolarização na cidade. O município de Londrina agiu num tempo e espaço e exerceu
a validação dos ideais pedagógicos para a nação brasileira olhando para os londrinenses e para a
realidade predominantemente rural das suas escolas neste período. Os documentos nos permitiram
narrar fragmentos do ambiente formal escolarizador que são as instituições escolares do período,
noções de sua estrutura e funcionamento que classificamos em alguns tópicos discorridos como: o
professorado, sua formação, condições de trabalho, orientações pedagógicas; os planos e programas
escolares e algumas especificidades do currículo bem como sobre as propostas para o ensino local.
Compreendemos por este estudo que Londrina apresentou um cenário evolutivo no que diz
respeito à escola e à educação. Os agentes locais promoveram a aplicação do ideário nacional
nesta localidade. A política municipal mesmo em estruturação física não deixou de lado a escola
no movimento do desenvolvimento estrutural da cidade. Foi notada a participação de muitos
agentes e que muitas vezes com uma capacitação não especializada, muito comum para o período,
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 626
promoveram muitas das instituições e fomentaram evoluções para a formação junto ao fenômeno
desenvolvimentista, que educou seus sujeitos dentro ou fora da escola.
Referências
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incertezas de ontem, desafios de hoje.FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito
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tentativa de interpretação In. DUARTE,Regina Horta; FARIA FILHO. Luciano Mendes; et al (Org.).
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oitocentista. Belo Horizonte: Autêntica,1998. p. 89-125.
MAGALHÃES, Justino Pereira de. O município liberal e a decisão política. Coleção Pensar a Educação.
Série estudos históricos - Ação Municipal e Educação na Primeira República no Brasil. Belo Horizonte:
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ISSN 2358-3959
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Palavras-chave: Política Educacional. Péricles Madureira de Pinho. Brasil, MEC, anos 1950 a 1960.
Pesquisas, ou seja, as duas publicações divulgavam as mesmas notícias. Neste aspecto, o projeto
editorial institucional deixou transparecer o acionamento de três estratégias: 1. a estratégia de
legitimação pela duplicação de possibilidades de afirmar a importância da instituição e consagrar a
memória e as ideias do grupo que a comandou, mesmo que para isto tenha lançado mão de matrizes
teóricas estrangeiras no que se referiu à Educação e sua relação com a pesquisa e com o campo das
Ciências Sociais. 2. uma estratégia de articulação por ocupar os espaços de debate – quaisquer que
fossem – pela via dos impressos, congressos, intercâmbios e via os corredores e os bastidores da
política nacional. 3. a estratégia de intervenção como corolário das estratégias anteriores numa
perspectiva de reformar os sistemas estaduais e municipais não só no que concerne à estruturação
dos marcos regulatórios ou refinamento do aparelho de gestão, mas também na proposição de
manuais escolares e livros especificamente para docentes que objetivaram inculcar a possibilidade
da construção de currículos escolares exemplares. Desta forma, uma rede em ação amparada num
projeto político-pedagógico que teve nos impressos a sustentação necessária para a sua consecução
ou, ao menos a sua divulgação, das intenções almejadas: a legitimação do Centro Brasileiro de
Pesquisas Educacionais; a legitimação de determinadas maneiras de pensar e fazer livros didáticos,
manuais escolares e livros de estudo para os docentes como forma de intervenção exemplar nas
práticas curriculares e nas práticas dos professores visando ao alcance da compreensão e modificação
do mundo rural sob as lentes do mundo urbano num processo de articulação entre Educação e
Sociedade via a realização de pesquisas, inquéritos e levantamentos realizados por educadores,
sociólogos e antropólogos ligados ao CBPE. Ou seja, a natureza complexa e ambiciosa deste projeto
e a sua realização, ao menos em parte, mostram a relevância do intelectual mediador Péricles
Madureira de pinho em toda esta jornada. Vale acrescentar que o CBPE estava vinculado ao Instituto
Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) também sob a direção de Anísio Teixeira. Neste sentido, a
intensa ligação do CBPE com o INEP possibilitou o trânsito de Péricles Madureira de Pinho pelas
duas instituições e uma efetiva participação nas decisões referentes aos seus rumos institucionais. A
partir de 1962, foi indicado para o Conselho Federal de Educação (CFE) sem se desligar da gestão do
CBPE. Em 1964, com o advento do golpe civil-militar, Anísio Teixeira foi afastado de todos os cargos
públicos. Atendendo um pedido de Teixeira, Pinho permaneceu à frente do CBPE. Uma das primeiras
medidas do governo militar foi a supressão dos Centros Regionais de Pesquisa Educacional, o
diferencial do CBPE na sua busca de compreender o nacional pelo regional. Assim, não causa
estranheza que a instituição tenha sobrevivido até 1977. Explicitada a importância de Pinho no
campo educacional nos anos 1950 e 1960, algumas indagações se apresentam: Por que houve o
esquecimento do intelectual que teve uma participação relevante nos debates educacionais do
período em tela? A formação em Direito teria levado o intelectual a ser considerado um outsider? A
figura emblemática de Anísio Teixeira à frente do INEP, do CBPE e da Campanha de Aperfeiçoamento
de Pessoal de nível Superior (CAPES) poderia ter ofuscado as contribuições de Pinho?
Questionamentos a serem respondidos no texto completo a ser apresentado no evento. Cabe
esclarecer que a metodologia utilizada na consecução deste trabalho repousa na pesquisa de caráter
documental e histórico, especialmente no que concerne à História Política que entende o intelectual
como ‘ator do político’, do ator que apresenta ‘um engajamento na vida da cidade’ e dos seus projetos
e que também pode ser a testemunha ou a consciência destes movimentos no que refere à assinatura
de manifestos e abaixo-assinados, criação de revistas e demais ações que se estendam a outros
campos sociais. Assim, foram fundamentais a confrontação entre memórias, entrevistas, acervos,
correspondências, relatórios institucionais e impressos pedagógicos na perspectiva de apreender a
rede que deu a sustentação para a permanência dos referido ator no âmbito da burocracia estatal.
Péricles Madureira de Pinho nasceu na Bahia em 1908 e faleceu no Rio de Janeiro em 1978. Em 1960,
registrou em seu livro ‘São assim os baianos” a seguinte impressão “Nascidos ou não na Bahia,
baianos são os que ali vivendo com ela se identificam constituindo expressões de sua multiplicidade
de espírito Ainda sem atentar para a generalização do homem do Sul – todo nortista é baiano – há
entre os ‘baianos da Bahia’ (como os chamava Afrânio Peixoto) tipos e atitudes variados, antagônicos
até. A caricatura do extrovertido e bem falante, sempre utilizada para focalizá-los, não se ajusta a um
meio que apresenta gente diversa, desde a silenciosa e reticente, incluindo a refletida e discreta, até
à palavrosa e retumbante, misturada na mais expressiva das comunidades do País.” Entendemos
que, para além do espírito, torna-se necessário retirar do esquecimento s contribuições deste
intelectual para a educação pública no Brasil.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 629
Referências fundamentais
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Boletim Mensal do Centro Brasileiro de Pesquisas
Educacionais. Rio de Janeiro: CBPE/INEP/MEC, 1957 a 1964.
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Anísio Teixeira: pensamento e ação. Rio de Janeiro: Ed. Civilização Brasileira, 1960a, p. 167-190.
PINHO, Péricles Madureira de. São assim os baianos. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura,
1960b.
SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, Réne (org.). Por uma história política. 2. ed.
Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p. 231-270.
ISSN 2358-3959
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O livro didático é o material escolar e/ou fonte de consulta mais utilizado por professores e alunos
dentro ou fora da sala de aula. Enquanto produto possui vinculações simbióticas com a escola,
as quais o tornam artefato que povoa grande parte das memórias da população brasileira, como
principal obra de disseminação de saberes e, por conseguinte, de referência educacional. Logo, é
um produto cultural de pertinente significação ao assentamento dos saberes enquanto disciplinas
escolares, das noções de verdades históricas e das ideias memoriais, já que possui funções
instrumentais, ideológicas e culturais, que perpassam desde os métodos de aprendizagem, até as
questões políticas de construção e manutenção de identidades.
Os formatos didáticos a que estamos familiarizados hoje, são resultados de um amplo processo
gestado ao menos desde meados do XIX, quando da formação e consolidação dos Estados nacionais
e da franca disseminação das redes escolares por que passou o nascente Estado-nação brasileiro,
pós-independência. Na ocasião, ideários sobre o ensino, disciplinas escolares, bem como noções
de educação, ensino, história e produção didática foram edificados os quais fizeram com que as
editorações escolares assumissem papel central na escolarização. Porquanto, as novas textualidades
acionadas nos livros escolares corroboraram à fundação de um ideário histórico, marcado pela
valorização do olhar na relação com a aprendizagem, que passou, na referida temporalidade,
a acionar a linguagem icnográfica em espaços relevantes no lócus das edições didáticas, como
complementos harmônicos ao texto verbal e construtoras de um senso de verdade histórica.
Em um momento inicial, o tratamento às imagens nas edições escolares foi estritamente voltado
à função de complemento e validação visuais à textualidade verbal, com inserções em preto e
branco, em menores proporções no comparativo iconografia/texto e sem quaisquer indicações
de informações precisas para sua problematização e uso como documento histórico. Contudo,
com o tempo, essa correlação sofreu alterações, pelo advento de novas discussões no âmago da
historiografia, da educação, das teorias da imagem e na interseção das três áreas, a datar do fim do
século XX. No cenário, a dinâmica potencializadora das imagens como textos e documentos passou
por grandes debates na definição de diretrizes à educação atual, em que importantes orientações
e programas evidenciaram sua proficuidade no texto didático, como é o caso dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN’s), no fim da década de 1990, e os editais mais elaborados do Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD), que são marcas de nossa época.
Destarte, este trabalho busca compreender a imagem nos livros didáticos para além de teores
ilustrativos, já que observa como o signo, juntamente com o impresso escolar, sedimentam espaços
de memória a partir da associação dada entre imagem, (con)texto e livro didático. Para tanto,
considera discutir a iconografia que expõe as populações indígenas em representações que foram
confeccionados em circunstâncias históricas diferentes das quais as utilizam no presente. De modo
especial, as imagens compiladas em obras didáticas que buscam referenciais imagéticos nas coleções
de relatos ilustrados das viagens de Theodore De Bry e de Hans Staden ao Brasil, no século XVI.
Mediante os processos curatoriais e a apropriação são destacadas as muitas etapas de uma tradição
seletiva delineada de modo específico pela indústria cultural, a qual propõe uma ótica de leitura
e compõe memórias visuais sobre os povos nativos, diante a proposição de uma sensibilidade de
leitura que articula a figuração do indígena como o outro na editoração didática.
Assim, esta pesquisa compreende o uso e apropriação de algumas imagens nas editorações
didáticas como espectros de manutenção de alteridades, já que as permanências nas edições
escolares de dadas construções imagéticas sobre os povos nativos do Brasil, são lidas aqui como
resultados de interesses e hierarquias de uma indústria característica. Ainda, interpreta como tais
imagens fundamentam estratégias de conservação de memórias, já que, quando apenas expostas
com teor de ilustrações, assumem acepções de senso comum que tomam a denotação de verdade
e/ou tradução ocular do ocorrido, sem abrir espaço para o debate de como são representações
carregadas de intencionalidade e resultados de seu tempo. A fim de promover o pensar sobre o
estigma e o estereótipo, a alteridade e a desigualdade que as imagens promovem sobre as parcelas
escolarizadas, parto de questionamentos que se dão em torno do processo de apropriação imagético
nos processos de elaboração do livro didático e como tais encontram remodelações nas últimas
décadas diante de políticas educativas voltadas ao livro didático e o ensino de história
Para composição do conjunto de imagens, busco aquelas produzidas pelos viajantes dos
quinhentos, encontradas nos quatro volumes da coleção “História, Sociedade e Cidadania”, de
Alfredo Boulos Júnior, editorada pela Editora FTD, e nos exemplares do “Projeto Araribá História”,
publicado pela Editora Moderna. Ambas coleções que lideram a lista dos manuais mais distribuídos
aos anos finais do Ensino Fundamental no período verificado, com um montante de aproximados 5
milhões de volumes, segundo números do Fundo para o Desenvolvimento da Educação (FDE), sobre
o Programa.
A quantidade de livros das coleções distribuídas no país é potente à discussão das questões de
memória histórica e/ou visual e de concepções arraigadas em nosso meio sociocultural, uma vez que
as pinturas impressas nos volumes atingem uma parcela considerável da população escolar brasileira,
suas famílias e comunidades. Pelo uso prioritário das edições, é possível que compreendamos como
se dão as relações de aceitação no segmento escolar, social e educativo deste tipo de proposta
curatorial de imagens/textos sobre os indígenas brasileiros. A temporalidade pensada compreende
a marca de uma década pós-promulgação do dispositivo legal número 11.645 de 10 de março de
2008, que altera à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), incluindo no currículo
oficial o ensino da história e culturas indígenas. Por tal motivo, este texto considera o edital que é
vigente no momento que rememora uma década da instauração de tal medida, o PNLD 2017, para
compreender como se dão as apresentações nativas nos impressos didáticos e problematiza-las
ante ao processo de incorporação de imagens ao contexto educacional pós-lei.
As obras de Theodore de Bry e Hans Staden, integradas às referidas edições são analisadas pelo
método histórico-semiótico da professora Ana Maria Mauad, no qual as imagens, simultaneamente,
possuem o teor de documento e monumento e, como toda a fonte histórica, emanam noções
formadas no âmago da cultural, em um tempo e em dados trabalhos sociais que envolvem a
produção sígnica. A motivação a uso de tal imperativo interpretativo converge que a formulação de
ambos os viajantes dos quinhentos não foram construídas com intuitos educacionais. Pelo contrário,
evocaram imaginário, noções próprias de seu tempo e interesses diversos, que são entendidos
durante a concepção de uma coleção escolar em uso séculos após suas execuções. Todavia, foram
agregadas aos livros frente processos característicos de tradições seletivas que buscam retratar uma
face dos indígenas, seus costumes de modo a compor discursos sacralizados de alteridades.
Outrossim, entre a chegada europeia ao Brasil, os primeiros contatos entre europeus e nativos,
as expressões oriundas daquele momento e o século XXI, há um grande espaço de tempo. Logo,
também entre a produção das gravuras de Staden ou de Bry e a sua impressão em milhões de
livros escolares. Não obstante, quando as pranchas com retratos ilustrados preenchem as páginas
dos volumes usados no país, com escassas indicações para além de suas pequenas legendas, são
evidenciados os modos como a construção da alteridade indígena se dá no impresso didático. Isso
pois, mediante a ausência desses povos em períodos históricos além da chegada portuguesa e
da colonização, entendemos como as representações sobre esses povos reiteram as propostas de
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 632
tratamentos que os indígenas, usualmente, recebem no meio textual do livro, mesmo após algumas
medidas afirmativas de valorização no âmbito das políticas públicas educativas.
Afinal, uma década pós-lei 11.645/2008, a valorização dos nativos, suas tradições, culturas e
histórias nos livros brasileiros ainda são resultados de processos curatoriais específicos e envoltos pela
lógica editorial mercadológica, que seguem condicionando tais sujeitos às óticas da alteridade pelo
esmaecimento, exotismo e alheamento que as imagens quinhentas a que nos referimos, bem como
outras que representam essa parcela, edificaram. Sobretudo, quando tais introduções imagéticas
são usadas em recortes, sem receber tratamentos adequados e deslocadas temporalmente,
movimentos que pouco contribuem para debates problematizadores que reconsiderem os povos
nativos e suas memórias, perpetuando e reverberando, assim, noções arraigadas, hierarquizadas
e de senso comum que embasam memórias visuais que condicionam o indígena como o outro
atrasado do passado brasileiro.
À vista disso, os textos – visuais ou escritos -, são produtos representativos das relações políticas
imbricadas no contexto histórico de que fazem parte. Quando são incorporados ao impresso escolar
passam a ser vislumbrados como espectros povoadores da memória coletiva, atuantes na validação
de imaginários e, portanto, inseridos no processo de concepção histórica. O livro, nesse sentido,
passa a ser um representante da realidade esperada ou escolhida para se perenizar discursivamente,
gerando noções modeladas aos interesses e prerrogativas de determinados setores e momentos.
Assim, acionar as construções estéticas do XVI nos livros didáticos de história atende às significações
que se esperou e espera rememorar dos indígenas: aquelas atreladas ao passado, ao atraso e ao
exotismo.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
APRENDIZAGEM E DESEMPENHO:
FACES DE UMA MESMA MOEDA? UMA
RETROSPECTIVA DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS
NO BRASIL (ANOS 1960 A 1990)
Referências
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2007.
ISSN 2358-3959
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Este trabalho tem como objeto as iniciativas do poder público municipal em Campo Grande/MT,
em relação ao ensino médio, particularmente referentes ao seu primeiro ciclo, o ensino ginasial,
no período compreendido entre os anos 1963 a 1971. Como já discutido a partir dos trabalhos
produzidos pela historiografia regional (PESSANHA, 2016), este foi um momento histórico de forte
expansão deste grau de ensino, seja pela indução resultante da reestruturação e reorganização do
ensino secundário, por meio sobretudo da reforma Capanema (1942) e da materialização da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1961); seja pela ação de governos estaduais e municipais,
atuando de forma direta, na implantação de escolas, e/ou na atribuição de verbas e contratação
de professores, para a subvenção de escolas privadas. Assim, os marcos temporais desse trabalho
referem-se ao ano de criação do primeiro ginásio mantido pelo governo municipal, em 1963, o “
[...] Ginásio Municipal Prof. Arlindo Lima [que] foi criado pela Lei n. 851, de 25 de outubro de 1963,
publicada no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso” (ESCOLA MUNICIPAL PROFESSOR ARLINDO
LIMA, 2012), tendo sido ainda aprovado o Regimento Interno desse mesmo Ginásio por meio do
Decreto n. 1.746, de 26 de outubro de 1963, assinado pelo Prefeito Municipal e publicado no jornal O
Matogrossense; e o ano de 1971, quando entrou em vigor a Lei 5.692, que criou as escolas de 1° grau,
resultantes da fusão do ensino primário e primeiro ciclo do ensino médio, o curso ginasial.
Nessa direção, o objetivo geral do trabalho é analisar a atuação do governo municipal entre 1963
e 1971, no que se refere ao ensino ginasial, uma vez que, no momento histórico em questão, além
do Ginásio Municipal Arlindo Lima, foram criadas outras cinco instituições escolares congêneres,
a saber: o Ginásio Comercial Bernardo Franco Baís; o Ginásio Professor Henrique Cyrilo Corrêa; o
Ginásio Padre José Valentim; o Ginásio João Nepomuceno e o Ginásio Comercial Dona Neta (CAMPO
GRANDE, 1971). Como objetivos específicos, visa-se evidenciar os determinantes que levaram
o município a atuar nessa direção em relação ao ensino médio, uma vez que, até 1963, a maioria
dos estabelecimentos de ensino que ofertavam o curso ginasial eram privados – segundo dados
disponíveis para 1959, funcionavam cinco escolas privadas em Campo Grande que possuíam o
ginásio – e uma escola pública, estadual. Assim, em 12 anos, o governo municipal colaborou para
dobrar o número de estabelecimentos com curso ginasial, que passou de 6 em 1959, para 12 em
1971. Outros elementos a serem analisados referem-se aos locais escolhidos pela Prefeitura para o
funcionamento desses estabelecimentos, bem como o fato de que duas dessas escolas ofereciam o
ensino comercial.
Quanto às fontes mobilizadas para o trabalho, cite-se a produção bibliográfica já existente sobre
o ensino secundário no Brasil e no Sul de Mato Grosso em particular, nesse momento histórico; além
das fontes documentais encontradas em distintos acervos físicos e digitais, contendo os documentos
produzidos pelo poder público municipal (legislação, relatórios, álbuns gráficos, jornais etc),
presentes em sítios como o da Câmara Municipal de Campo Grande e o Arquivo Histórico de Campo
Grande (ARCA); os documentos relativos aos dados estatísticos, em especial aqueles produzidos
Referências
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CAMPO GRANDE. Prefeitura Municipal de Campo Grande. Aspecto da Cidade Morena: 71. In: Campo
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XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 638
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camara.ms.gov.br/legislacao-municipal. Acesso em: 25 mar. 2019.
O presente artigo tem por objetivo apresentar por meio das Políticas Educacionais para o Ensino
Superior de que forma os estudantes com deficiências têm garantido o acesso e permanência nesta
etapa da educação. O artigo apresenta o contexto das políticas educacionais do ensino superior tem
sido produzidas. Para a compreensão do estudo será tomado o Ciclo de Política como epistemetodologia
de análise. Em seu texto o artigo apresenta as produções acadêmicas, em nível de tese, realizadas nos
programas de pós-graduação. O artigo é parte integrante da pesquisa, em andamento, de doutorado
pertencente a linha Política, Gestão e História da Educação e ao grupo de pesquisa Políticas de
formação e trabalho docente na educação básica (GEFRORT), coordenado pela Professora Dra. Celeida
Maria Costa de Souza e Silva, ambos do programa de pós-graduação – Mestrado e Doutorado em
Educação da Universidade Católica Dom Bosco (PPGE/UCDB). Para a compreensão da temática é
necessário apropriar-se do conhecimento referente ao processo histórico das Políticas Educacionais
Brasileiras para o Ensino Superior. Neste contexto Dourado (2009), apresenta, a reflexão sobre as
políticas educacionais que nos remete à compreensão dos complexos processos de sua regulação e
regulamentação, bem como da relação entre a proposição e a materialização das ações e programas
direcionados aos sistemas educativos. A análise de indicadores educacionais e seus desdobramentos
torna-se, assim, referência fundamental na identificação dos limites e desafios para a concretização de
políticas educacionais. As Políticas Educacionais para o Ensino Superior denotam-se como resultantes
da influência dos contextos históricos da sociedade. O contexto histórico é importante para a
compreensão das influências internacionais, nacionais e locais presentes na produção das políticas
educacionais. Para tratar da temática pretende-se apresentar como as políticas educacionais do ensino
superior foram constituídas tendo como recorte temporal o período de 1988-2018. A delimitação
temporal se dá pela promulgação da Constituição de 1988, o marco final aponta o contexto dos efeitos
apresentados pelo Programa Incluir. O Programa de Acessibilidade na Educação Superior (Incluir)
propõe ações que garantem o acesso pleno de pessoas com deficiência às instituições federais de
ensino superior (Ifes). Outro conceito a ser apreendido neste artigo é referente aos estudantes com
deficiências. Entende-se como estudantes com deficiências todos os estudantes pertencentes ao
público alvo da educação especial, conforme a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva (2008), considera-se como público alvo da Educação Especial na perspectiva da
Educação Inclusiva, estudantes com deficiência (intelectual, física, auditiva, visual e múltipla),
transtorno global do desenvolvimento (TGD) e altas habilidades. Neste contexto educacional é
relevante compreender que a Educação Especial é uma modalidade de ensino que visa promover o
desenvolvimento das potencialidades de pessoas com deficiências, condutas típicas ou altas
habilidades, e que abrange os diferentes níveis e graus do sistema de ensino. Ou seja, uma modalidade
de ensino para pessoas com deficiência ou altas habilidades. Convém mencionar, ainda que, a
educação inclusiva refere-se ao processo educativo que deve ser entendido como um processo social,
onde todos os estudantes com deficiências e de distúrbios de aprendizagem têm o direito à
escolarização. Ou seja, uma modalidade de ensino para todos. A apreensão destes conceitos permite
que se tenha maior propriedade das políticas educacionais referentes a estes estudantes no ensino
superior. Conforme Kassar e Meletti (2013), o processo pedagógico precisa ser concebido como a
dimensão de máxima importância nas experiências educacionais, secundarizando-se outros, como os
advindos das áreas médica e psicológica, de forma a situar no docente e sob a sua responsabilidade o
poder de planejar e implementar as ações de ensino, mesmo quando precisar ser apoiado. Cada
estudante merece ser olhado como uma pessoa que é constituída por múltiplos elementos e uma
história própria; para quem o como fazer ou o que fazer para ensiná-lo não depende de uma receita
pedagógica anterior, definida pela deficiência e pelo grau de sua gravidade. No percurso de um
processo de inclusão, considera-se que os processos são complexos, envolvem inúmeras relações
institucionais e pessoais que criam um mundo suscetível ao surgimento de conflitos, tensões e
desacertos que requerem reflexão, discernimento e disposição dos participantes para que sigam
tentando. Assim sendo, entende-se que o processo de escolarização não se vincula somente a educação
básica, mas também, ao ensino superior oportunizando aos estudantes com deficiências o acesso, a
permanência e todo desenvolvimento das atividades de ensino, a pesquisa e a extensão dentro das
IES. O presente artigo para contemplar com o objetivo proposto baseia-se em análise documental e
bibliográfica. A análise documental acontecerá mediante a fonte de dados e de documentos nacionais,
bem como da produção bibliográfica onde será apresentado o contexto legal do direito à educação dos
estudantes com deficiência no nível superior e as teses de doutorado publicadas nos bancos de dados
da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e no Banco de Teses e Dissertações da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). O estudo tomará como
abordagem metodológica o Ciclo de Política de Stephen Ball (1994) para a compreensão da produção
dos textos legais referentes a temática. Para o modelo analítico proposto por Ball, as noções de
influência, produção de texto, prática, resultado e estratégia são centrais. Principalmente por meio
delas classificou aquilo que entendeu serem as facetas da análise das políticas educacionais. O
presente artigo realizará a apreensão de dois contextos: o contexto da influência e o contexto da
produção do texto. Conforme Mainardes (2006), esse contexto é importante por ser o momento em que
diferentes grupos discutem em torno dos objetivos das políticas e é quando esses grupos “disputam
para influenciar a definição das finalidades sociais da educação e do que significa ser educado. É
possível perceber que o contexto de influência é o espaço no qual os grupos hegemônicos, com seus
distintos objetivos, agem. Quando as políticas são elaboradas, diferentes grupos discutem e articulam-
se em torno de suas finalidades no que diz respeito à educação, fazendo com que determinada política
seja um acordo possível sobre os variados e muitas vezes contraditórios interesses desses grupos.
Além disso, nesse contexto também há a influência de organismos internacionais e de temas globais
nas políticas nacionais. O outro contexto, o da produção do texto refere-se ao espaço em que as
políticas são traduzidas para discursos e, geralmente, passam a estar melhor articuladas com a
linguagem do interesse público em geral. Neste contexto é possível observar a existência de interesses
dos grupos hegemônicos, que influenciam as políticas, e dos interesses da população, por meio da
conexão com os elementos que permeiam o senso comum. Assim sendo, utilizar o Ciclo de Políticas
para a apreensão da produção das políticas educacionais do ensino superior que atendem aos
estudantes com deficiências permite compreender que esta produção de textos resulta de ações de
grupos que disputam interesses em políticas que favoreçam a estrutura e o domínio hegemônico. As
disputas acontecem mediante os interesses contidos nas ações firmadas por cada grupo em disputa
evidenciando as características destes mediante a sociedade. O estudo elaborado permitiu considerar
que as mudanças ocorridas na sociedade e que as políticas educacionais devem acompanhar esta
mudança com o intuito de atualizar-se e atender as demandas da sociedade. Esta mudança na
sociedade leva em consideração que as políticas educacionais para o ensino superior, as quais
garantem o acesso e permanência dos estudantes com deficiências nesta etapa de ensino, se
apresentam em processo de produção mediante a materialização da legislação mostrando as
influências nesta produção do texto. A materialização acontece mediante a elaboração e produção de
políticas institucionais que buscam atender no âmbito pedagógico os estudantes oportunizando todo
desenvolvimento das atividades de ensino, a pesquisa e a extensão dentro das Instituições de Ensino
Superior. Nessa conjuntura, é notável que as políticas educacionais para o ensino superior carecem de
aprofundamento nas investigações acadêmicas referente a temática proporcionando maior interesse
em promover a efetivação na elaboração de políticas educacionais que atendam às necessidades dos
estudantes com deficiências quanto ao aceso e permanência no ensino superior.
ISSN 2358-3959
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Resumo
Este artigo é resultado de estudo realizado na Disciplina de Seminário de Aprofundamento:
Histórias e pòlíticas da Educação no Curso de Doutorado da PUC/PR. Tem como objetivo realizar
um comparativo entre as leis brasileiras relacionadas ao ensino superior e a materialização destas
em uma faculdade estadual do Litoral do Paraná, hoje universidade estadual, e também no curso de
matemática na mesma instituição. Realizou-se pesquisa bibliográfica e documental, com relação às
leis do sistema educacional brasileiro, comparando com documentos que fazem parte do acervo da
Faculdade, documentos tais como: atas da congregação e relatórios da Universidade. No trabalho
evidencia-se que houve a materialização de partes das leis educacionais em vigor na Universidade
em estudo.
cooptação dos estudantes, opositores ao autoritarismo, pelo Estado, intressado no seu controle por
mecanismos cooperativos.” (Cunha, 1980, p.205), porém ela vem a se caracterizar com orientações
democráticas e ajuda a elaborar uma nova política educacional.
Na FAFIPAR, também ocorre o movimento estudantil, que se consolida, nos anos 1960, com a
criação do Diretório Acadêmico da Faculdade. Nessa época, houve a deflagração de uma greve pelos
estudantes do Estado, a qual obteve a adesão dos acadêmicos da FAFIPAR. Essa greve foi uma das
lutas iniciadas 1960 contra uma estrutura precária e antidemocrática das universidades brasileiras.
Em 1º de junho de 1962 estudantes deflagram a “greve do 1/3”. A denominação foi escolhida
por expressar o alvo mais imediato do movimento: participação na gestão da universidade e nos
conselhos de educação que supervisionavam sua política. A greve estende-se por 3 meses e atinge a
maior parte das 40 universidades existentes no Brasil na época. (APUFPR, 2010, p. 4)
A participação dos estudantes na gestão universitária estava prevista na Lei de Diretrizes de Bases
da Educação Nacional de 1961, no Art. 78, que tratava sobre o corpo discente e que afirmava “[...] terá
representação, com direito a voto, nos conselhos universitários, nas congregações, e nos conselhos
departamentais das universidades e escolas superiores isoladas, na forma dos estatutos das referidas
entidades.”(BRASIL, 1961)
Analisando a greve dos estudantes, sob a luz da Cultura Escolar (JULIA, 2001), enquanto objeto
histórico, percebe-se que por mais que estivesse na lei, ela não havia sido implantada e nem
regulamentada e necessitava de um aval do Conselho Universitário e dessa forma surge, por parte
dos estudantes, uma radicalização em forma de luta por esse direito. Assim, foi necessária uma luta
estudantil na FAFIPAR para que viesse a garantir um direito que já estava previsto em Lei. Conforme
ata do dia 03/07/1962, a Congregação por unanimidade, concedeu representação do corpo discente
nos órgãos deliberativos como estava prevista no Art. 78 da LDB e também conforme o Regimento
Interno da mesma.
Com relação ao curso de matemática, após três anos de sua criação, aparece nas atas dos anos
1963, que a Congregação começa a discussões sobre o Curriculo Mínimo. Este estava previsto na
LDB 4.024/61 no “Art. 70. O currículo mínimo e a duração dos cursos que habilitem à obtenção
de diploma capaz de assegurar privilégios para o exercício da profissão liberal serão fixados pelo
Conselho Federal de Educação.” (BRASIL, 1961).
Assim, foi aprovado o Parecer 295/1962 que entre outras atribuições fixava o currículo mínimo
para o curso de Licenciatura em Matemática com 2200 horas e também “O Parecer CFE 292/62, de
14/11/62, que estabeleceu a carga horária das matérias de formação pedagógica a qual deveria ser
acrescida aos que quisessem ir além do bacharelado.” (BRASIL, 2001).
Na FAFIPAR, as questões do currículo mínimo estão presentes desde a ata de 16 de dezembro de
1963, porém na ata de 28 de maio de 1964 esses currículos são melhor discutidos, sendo que nessa
reunião, o Senhor Diretor pede para que os departamentos se reúnam para discussão dos currículos.
Pelos documentos, entende-se que já existia por parte da FAFIPAR, uma preocupação em seguir o
Parecer sobre o currículo mínimo. Pelas pesquisas realizadas nos documentos[2] com relação às
disciplinas que compunham o currículo mínimo, existia certa liberdade do professor com relação a
seu trabalho.
Esta liberdade é um fato presente nas histórias das disciplinas escolares em que o professor tem
uma determinada liberdade “[...] a escola não é o lugar da rotina e da coação e o professor não é o
agente de uma didática que lhe seria imposta de fora (JULIA, 2001, p.33), ou seja, por mais que exista
uma inspeção, sempre o professor tem um certo grau de liberdade para atuar de acordo com suas
convicções.
Como o recorte histórico, para este estudo, foi fixado entre os anos de 1956 a 1965, entende-
se que muito do que estava previsto na Lei Nacional para as Universidades (Decreto 19.851/61) foi
aplicada também á Faculdade Estadual, que por mais que fosse uma faculdade isolada no Litoral
Paranaense, estava sujeita ao que ocorria no momento político, econômico e educacional do país.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 643
Referências
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3rd ed. São Paulo: Editora da Unesp, 2007, 308p. Disponível em: <https://books.google.com.br/>.
Acesso em: 19 de mai. 2018.
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educação, n. 1, jan./jun. 2001.
Ocumentos analisados
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em <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-19851-11-abril-1931-505837-
publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em 09 de out. 2017.
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Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4024.htm>. Acesso em: 13 jun. 2017.
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que estabelece a duração e carga horária dos cursos de formação de professores da educação
básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. Disponível em: <http://portal.
mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/028.pdf>. Acesso em 25 de out. 2017.
FACULDADE ESTADUAL DE FILOSOFIA E LETRAS DE PARANAGUÁ (FAFIPAR). Livro Ata, número 1. p.01-
110, anos 1960 a 1965.
[1] Instituição pública de ensino superior, situada no Litoral do Estado do Paraná, mantida pelo governo estadual, com
sede na cidade de Paranaguá, atualmente UNESPAR.
[2] Na LDB 4.024/61 e Parecer 295/1962
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Referências
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A pesquisa aqui apresentada teve como objetivo elaborar uma análise dos princípios que
fundamentaram a concepção de educação professada pelo Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova de 1932 e suas conexões com aspectos do pensamento liberal. A pesquisa focaliza a
caracterização geral do contexto social, e por decorrência, explicita a forma em que foram gestadas
as condições sociais que culminam no despontar do grande movimento de renovação relativo aos
padrões de escolarização, que por sua vez, se configura na publicação do Manifesto dos Pioneiros de
1932. Quando partimos do pressuposto que visa ao entendimento de uma determinada concepção
de educação, ou seja, para compreender a função que é atribuída à educação escolarizada
historicamente não se deve prescindir da dimensão social, uma vez que, a estrutura da sociedade e
suas respectivas transformações exercem influência neste processo, e vice-versa. Do clima de
ebulição social consubstanciado na década de 1920 decorre a insurgência, no campo educacional,
das forças do movimento renovador impulsionado pelos ventos modernizantes do processo de
industrialização e urbanização. Tal contexto caracteriza-se por um processo de transição do modelo
social que ainda busca consolidar suas bases como destaca Nagle (2001, p. 21) “de tipo colonial,
induzido, para outro, autônomo, constitui essa década a fase de instalação do capitalismo no Brasil,
e, portanto, se define como período intermediário entre o sistema agrário-comercial e o urbano-
industrial, os dois grandes ciclos da vida econômica brasileira”. Integra esse momento um grande
esforço para alterar as bases do poder e a função do Estado, principalmente no campo educacional.
Constata-se a preocupação com a democratização do ensino, enfim está na pauta do debate a
“educação do povo” com a finalidade explícita de arregimentar forças no sentido de consolidar a
nação brasileira e o regime político imanente à novel Federação, fazendo emergir um sentimento de
pertencimento à pátria. Profundas alterações nos setores sociais quer sejam de ordem política quer
sejam de ordem econômica e social marcam o início do século XX. Frente às contingências tratava-se
de Republicanizar a República, ou seja, batalhar pela consolidação dos velhos e prementes ideais
proclamados desde o advento do novo modelo político instalado em 1889. Este contexto marcado
por profundas mudanças estruturais desencadeia a emersão do “entusiasmo pela educação e o
otimismo pedagógico”, uma vez que a educação passa a ser concebida como o problema vital do
qual dependeria o progresso do país. Verifica-se que tal corrente de pensamento constituiu a mais
expressiva bandeira de luta hasteada na década de 1920. A questão educacional se sobrepõe em
grau de importância ante os demais problemas sejam de natureza política, econômica ou social,
vista como a única alternativa que possibilitaria a resolução destes. A instrução torna-se cada vez
mais laureada no sentido de atuar em sentido oposto (destruir) à velha formação social considerada
resultado da incultura e ignorância. Diante desta breve exposição, a luta ideológica que vem na
esteira do período que se estende dos anos de 1910 aos 1920 encontra espaço propício para se
fortalecer com os reformadores e, por conseguinte, o processo de viabilização de um novo paradigma
educacional culmina no lançamento do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932 destinado
“ao povo e ao governo” elaborado por Fernando de Azevedo e assinado por 26 intelectuais. O
documento, por sua vez, sintetiza os princípios necessários a tão premente renovação educacional
ao conferir uma direção mais objetiva ao campo educacional, ganhando terreno e respaldo no plano
das medidas políticas adotadas pelo Presidente Getúlio Vargas a partir de 1930, principalmente, a
promulgação da Constituição de 1934. Tomando como pressupostos os condicionantes histórico-
sociais que norteiam a educação neste momento, buscou-se a intencionalidade de identificar para
além da aparência dos discursos presentes nas ideologias de caráter nacionalistas encetadas no
Brasil e as nuanças do ideal de educação e sua relação com o pensamento liberal. Ante a análise
empreendida, os resultados revelam que as mudanças ocorridas no mundo do trabalho (início do
processo de industrialização pautado pelo capital em seu segundo ciclo monopólico) demandam
uma espécie de reestruturação no âmbito educacional. Para a realização desta pesquisa e de suas
análises teve-se como princípio uma perspectiva pautada na compreensão materialista histórica, a
partir da qual não se pode abstrair as múltiplas determinações impostas pelo conjunto das relações
sociais e econômicas do período sobre as concepções que nortearam a elaboração do Manifesto de
1932, detre as quais se destacaram a ascendente introdução num movimento de industrialização e
urbanização e, consequentemente, um crescente discurso sobre a importância e necessidade de
formação de um novo homem, capaz de atender ao modelo de cidadania advinda do modo de vida
democrático e industrial. Ao partir da consideração de tais aspectos, a análise buscou demonstrar a
origem do teor político e expectativas depositadas na educação como elemento propulsor do
desenvolvimento nacional. Por tratar-se de uma pesquisa bibliográfica teve como fonte primária o
texto do Manifesto de 1932,, e como secundárias os textos de comentaristas do pensamento
escolanovista e sobre o movimento da Escola Nova no Brasil (AZEVEDO, 1958; VIDAL, 2003; SAVIANI,
2004). Os resultados da pesquisa apontam que, apesar das preocupações democráticas da concepção
liberal em educação, a ênfase da educação defendida pelo movimento de renovação estava no
atendimento das necessidades socioeconômicas do processo de industrialização nos anos 1930.
Nesse sentido convém destacar que a publicação do Manifesto se configurou na culminância do
processo de reforma educacional, pois a partir deste momento traçou-se uma direção mais objetiva
para o plano de reconstrução no âmbito educacional cuja preocupação maior era refutar o sistema
tradicional de educação considerado obsoleto. A concepção de educação apregoada no documento
possui estreita relação com os princípios liberais, principalmente àqueles vinculados a ampliação da
liberdade e igualdade, ou seja, em princípios democráticos. Outro aspecto que ganha destaque é a
questão da exacerbação do indivíduo. Assim, a educação concebida como um direito de todos
conforme defendida pelos Pioneiros de 1932, na prática teve outra conotação, uma vez que não
atendeu a demanda em razão das precárias condições de vida da maior parcela da população que
implicou em inúmeras dificuldades de permanência na escola. A educação fundamentada em
princípios de igualdade como reação à educação privilégio ou seleção, preconizada em todas as
instâncias no Manifesto dos Pioneiros traduziu-se em contradições ao passo foi considerada como
instrumento determinante da elevação das “aptidões naturais” do indivíduo e, consequentemente,
“selecionando os mais capazes” para exercer “influência efetiva na sociedade”, inclusive, interferir
na “consciência social” de modo a transformá-la. Nesse sentido, as desigualdades passam por uma
nova dimensão legitimadora, o que incorreu na segregação social. Apesar da educação pautada em
tais pressupostos refletir as incoerências de um momento marcado por indefinições, a escola foi se
firmando como importante instituição social gracas a esse legado de concepções Para fins de
sistematização o texto foi dividido em três partes. A primeira parte traz uma breve análise da
sociedade ao realizar a definição dos setores sociais, bem como das ideologias deles resultantes. A
segunda parte enuncia as bases e os princípios que produzem o movimento de renovação
educacional, traçando a sua configuração geral. A terceira parte estabelece a relação da concepção
de educação apregoada pelos reformadores sintetizada no Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova de 1932 e o pensamento liberal, destacando-se, no entanto, as contradições impregnadas no
documento e dando os encaminhamentos para as considerações finais.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 649
Referências
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VIDAL, Diana Gonçalves. Escola Nova e processo educativo. In: LOPES, Eliane Marta, FIGUEIREDO,
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ed., 2003
ISSN 2358-3959
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Carolina Martin
de Piracicaba no que diz respeito à expansão escolar no período estudado e a ligação do legislativo
e executivo municipal com o estadual. Para tanto, estabeleceu-se um diálogo entre Norbert Elias
(1994) que trata as relações de poder de forma mais ampla e os teóricos Milton Santos (2006) e Henri
Lefebvre (2000), os quais abordam a temática em âmbito local. Os resultados demonstram que na
década de 1880 o quadro da educação em Piracicaba seguia o movimento educacional do país, com
políticos que não demonstravam, no geral, preocupação para com a educação pública e sim, com o
processo de urbanização. A edilidade respondia às prerrogativas ditadas pelo governo provincial, a
iniciativa privada completava parte da demanda não atendida do ensino público e a população, na
maior parte dos casos, não se envolvia no desenvolvimento da educação local. Se considerar a
fidedignidade da informação de que no início da década havia aproximadamente 1.000 crianças e
jovens em idade escolar e que a população do município se expandiu no decorrer dessa década,
verifica-se que o quadro educacional de Piracicaba não se desenvolveu o suficiente para suprir a
demanda. A média de instituições de ensino nos anos 1880 a 1889 foi de 23. Observa-se que até 1885
a maioria das instituições de ensino do município eram privadas, no ano de 1886 havia o mesmo
número de estabelecimentos públicos e privados e a partir de 1887 ocorreu um movimento que
levou ao aumento das escolas públicas e diminuição das privadas. O panorama da educação em
Piracicaba se alterou no primeiro decênio republicano, diante da comparação com municípios
vizinhos de maior protagonismo tinha considerável número populacional e conquistava serviços
estaduais, como a implantação de diferentes tipos de instituições educacionais, que eram disputadas
por localidades de todo o estado de São Paulo. A edilidade, ao contrário do que ocorreu na década
anterior, passou a se dedicar mais às questões educacionais, apesar dos assuntos urbanísticos ainda
serem seu principal foco. Os camaristas atuaram para conseguir mais instituições de ensino estaduais
em seu território, como as consideradas emblemáticas no estado de São Paulo à época, contudo
continuaram a atuar frente as crescentes demandas impostas pelo governo estadual. Outro ponto
de destaque foi a criação de leis municipais e a criação de uma escola noturna por parte dos
vereadores. A extensão das preocupações da câmara municipal foi dimensionada nas sessões,
ações, leis e gastos, os quais integram o conjunto geral de expansão em diferentes modalidades e
níveis de ensino. O comportamento dos camaristas pode ser entendido como uma racionalidade de
uma elite esclarecida em busca de um ideal, como exemplo está o caso das instituições estaduais de
ensino, pois quando conseguem uma logo passam a agir para conseguir outra, num processo
contínuo. E essas iniciativas contaram com o apoio e aprovação de parte da sociedade que passaram
a participar dos eventos e exames finais dessas instituições escolares consideradas emblemáticas
na época, principalmente o Grupo Escolar. A quantidade geral de escolas se expandiu no meio
urbano, principalmente, devido à inciativa privada, mas nos bairros afastados da cidade a carência
ainda era um fato. Os dados indicam que nas questões educacionais ainda havia muito o que fazer,
pois mesmo diante de algumas conquistas, aproximadamente um terço (1/3) da população em
idade escolar não era atendida e, no geral, a taxa de analfabetismo ainda era alta. Além disso, a
educação particular atendia o dobro de alunos em relação à instrução pública. Em relação à
quantidade de instituições de ensino no município de Piracicaba, esta praticamente duplicou, o que
se considera ser uma soma relevante, mesmo que como exposto acima ainda não seja capaz de
atender toda a demanda. A primeira década do século XX foi o período de maior transformação no
panorama educacional de Piracicaba, a edilidade passou a atender uma quantidade maior de
prerrogativas do governo estadual, principalmente no tocante à fiscalização da educação em seu
território e do aumento de estabelecimentos estaduais. Os camaristas adotaram outro
comportamento no que diz respeito à criação de uma rede própria de escolas com a implantação de
15 estabelecimentos, provimento por concurso, estabelecimento de programa de ensino e subvenção
a instituições beneficentes. A população que até então pouco se envolvia com as questões
educacionais locais passou a colaborar com auxílio pecuniário às escolas públicas e beneficentes, a
frequentar exames e doar prêmios para estas e participar de festas e solenidades tanto de escolas
públicas como privadas. E a iniciativa privada continuou seu processo de expansão ao oferecer
diferentes modalidades de ensino para distintos públicos alvo. A quantidade de instituições de
ensino entre 1900 e 1910 duplicou em relação à década anterior, a área rural até então negligenciada
ganhou escolas públicas e privadas, todo esse desenvolvimento rendeu ao município a alcunha de
‘Athenas Paulista’. Assim, diante dessas colocações considera-se que o processo crescente de
desenvolvimento da educação em Piracicaba de 1880 a 1910 levou essa localidade a adquirir as
características pertinentes à categoria historiográfica Município Pedagógico, quando apesar de estar
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 652
sob tutela do estado e ter que arcar com numerosas prerrogativas, passa a ter uma identidade
própria educacional, a qual irrompeu da ação conjunta entre políticos, habitantes, elites e inciativa
privada.
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Éditions Anthropos, 2000.
SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4 ed. São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo, 2006. (Coleção Milton Santos; 1)
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Educação, em número de 5, convocadas pela Organização dos Estados Americanos (OEA) constituindo
reuniões de Ministros da Educação, foram realizadas no Panamá (1943), em Lima (1956), em Punta
del Este (1961), em Santiago (1962) e Bogotá (1963). Levadas a termo no contexto da criação da
Aliança para o Progresso, essas conferências interamericanas diferenciaram-se das Conferências
Internacionais pelo nível de institucionalização implicada nas intenções de cumprimento das
recomendações convencionadas e nos instrumentos adotados como resoluções, acordos e convênios
assinados pelas autoridades políticas envolvidas. Essas conferências podem ser consideradas uma
das expressões da política de intervenção dos Estados Unidos na América Latina caracterizadas pelo
envolvimento de ministros da educação e pelo estabelecimento de acordos internacionais com
vistas a modificar a situação da educação nos países participantes. O recorte temporal do estudo
abrange a primeira Conferência Internacional de Instrução Pública realizada em 1934 e a última
Conferência Interamericana de Educação, realizada em Bogotá, em 1963. Como fontes de pesquisa
foram utilizados os documentos produzidos nessas conferências consultados no site da Biblioteca
Digital da Unesco (https://unesdoc.unesco.org/). A investigação fundamenta-se na história
transnacional que busca ampliar as narrativas nacionais colocando em questão os contatos entre
atores sociais, instituições, sociedades e culturas. Dessa maneira, as situações nacionais são
problematizadas em termos de influências entrecruzadas pressupondo que fronteiras, espaço e
tempo não são fixos, mas se relacionam e se transformam por meio dos contatos (Tyrrell, 2007;
Fuchs, 2014). O estudo vale-se, também, dos aportes metodológicos da história do currículo
fundamentada em Ivor Goodson e Stephen Ball. A análise das fontes evidenciam que a problemática
do ensino secundário ganhou mais destaque nas Conferências Internacionais na década de 1950 e
no início dos anos 60 do século XX. As primeiras recomendações para essa modalidade de ensino
assinalavam a sua progressiva expansão e a necessidade de aliar cultura geral com formação prática.
Ressalta-se também, recomendações para a formação especializada dos professores, renovação
didática das diversas disciplinas e o acesso das mulheres à educação. Na Conferência de 1960, a
recomendação n° 50 versou sobre a elaboração e expedição dos programas do ensino secundário
colocando em relevo a necessidade de mudanças curriculares dada a generalização do ensino
secundário em muitos países. A indicação mais precisa foi a dupla tendência no sentido de intensificar
a iniciação ao trabalho e os conhecimentos de ordem prática e profissional no secundário e,
simultaneamente, ampliar conhecimentos de cultura geral nas escolas técnicas e profissionais de
nível médio. No que diz respeito às Conferências Interamericanas de Educação, a declaração de
Santiago do Chile sobre o ensino médio reiterou as tendências em debate, isto é, a renovação do
secundário pela integração entre formação geral e estudos especializados voltados para a orientação
para o trabalho. Embora a Conferência tenha assinalado a finalidade da educação média a formação
da personalidade integral do educando, a discussão de fundo residia nas necessidades de formação
de mão-de-obra para o mercado de trabalho mais diferenciado e com novas exigências
técnicas. Pretendia-se uniformizar a estrutura do ensino médio em todos os países adotando dois
ciclos: o primeiro, denominado básico, de cultura geral, deveria proporcionar ensino comum
enquanto o segundo ciclo, voltado para a especialização, deveria diferenciar-se em ramos distintos.
Outro aspecto importante nas conferências interamericanas foi a ênfase dada ao tema da educação
para o desenvolvimento econômico e social da América Latina ressaltando a renovação do ensino
secundário em relação ao currículo e aos métodos de ensino como política educacional de
fundamental relevância. Não por acaso, o ensino técnico e profissional foi considerado de alta
prioridade pela influência direta no desenvolvimento econômico dos países. Em sintonia com as
novas demandas do capitalismo, as indicações dos organismos internacionais passaram a enaltecer
os desafios da ciência e da tecnologia e a imprescindibilidade da educação para o trabalho. A defesa
da democratização do ensino secundário significou também a renúncia da formação dos jovens com
base na cultura geral desinteressada. O desenvolvimento econômico e social tornou-se a tônica das
recomendações gerais favorecendo um léxico comum transnacional sobre a generalização e a
renovação do ensino secundário. Muitos desses sentidos comuns podem ser encontrados nas
propostas de renovação do ensino médio em circulação no Brasil nas décadas de 1950 e 1960.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 655
Referências
BALL, S.; MAGUIRE, M; BRAUN, A. Como as escolas fazem as políticas. Atuação em escolas secundárias.
Ponta Grossa: Editora UEPG, 2016.
FUCHS, Eckhardt, “History of education beyond the Nation? Trends in Historical and Educational
Scholarship”, In: BAGCHI, Barnita, FUCHS, Eckhardt and ROUSMANIERE, Kate (ed), Connecting
histories of education. Transnational and cross-cultural exchances in (post) colonial education. New
York/Oxford, Berghahn Books, 2014.
POPKEWITZ, T.S. Transnational as comparative history: (un)thinking differences in the self and
the others. In FUCHS, E. ; VERA, E. R. The concept os the transnational in the history of education.
Palgrave/Macmillan, 2017.
STRUCK, Bernhard, FERRIS, Kate & REVEL, Jacques, Introduction: Space and Scale. In: Transnational
History, The International History Review, 33:4, 573- 584, 2011.
EDUCAÇÃO E CONSERVADORISMO:
O PROJETO ILUMINISTA DE BERNARDO
PEREIRA DE VASCONCELOS (1795-1850)
Objetivo
Essa é comunicação da nossa pesquisa de Doutorado que faz parte de um projeto maior que não
é aqui explicitado por questões de anonimato, mas que visa discutir os intelectuais e o pensamento
educacional brasileiro. Assim, essa é a comunicação de uma pesquisa em andamento cujo objetivo
é o de apresentar o projeto educacional de Bernardo Pereira de Vasconcelos para o Império do Brasil
entendendo o mesmo como partícipe dessa intelectualidade brasileira do século XIX que vive essa
contradição: modernizar e conservar. Ou seja, ao mesmo tempo que constrói as instituições mais
modernas que o mundo ocidental conheceria para um recém-inaugurado Estado deveria construir-
lhe também os meios de conservação política da elite que o fez. Dessa forma, apresentar a nossa
compreensão sobre o pensamento ilustrado no Brasil do Primeiro Reinado (1822-1831), tomando
como referência e ponto de partida o discurso de Bernardo Pereira de Vasconcelos (1795-1850)
explicitado na Carta aos Senhores Eleitores da Província de Minas Gerais, de 1828, objeto de nossa
análise. Esse documento, é uma fonte privilegiada para entendermos a contribuição da experiência
liberal na construção de um repertório político de forma a perceber as influências do Iluminismo
europeu no discurso educacional e na prática política de Bernardo Vasconcelos, inaugurador do
conservadorismo político no Brasil. Ali, Bernardo Vasconcelos presta contas de seu primeiro mandato
e apresenta-se candidato à reeleição à Assembleia Geral.
Periodização
Assim, o nosso período é o das regências no Brasil. O processo de emancipação do Brasil em 1822,
a Abdicação de D. Pedro I ao trono em 1831 e o período regencial no Brasil (1831-1840), acabaram
por gerar uma situação de pequenas guerras civis, uma vez que os interesses das elites locais não
se compatibilizavam na construção do Estado imperial. Liberais Conservadores, Liberais Moderados
e Liberais Exaltados se digladiavam no espaço instituído da Assembleia Nacional e em pequenos e
provincianos teatros de guerra, política e física. Para além da Assembleia Nacional, onde o sistema
eleitoral não permitia a entrada daqueles que não pertenciam à classe senhorial, a disputa se dava
nas ruas, praças e matas naquilo que Ilmar Rohllof de Mattos (1987) chamou de lutas da rua e lutas
da casa. Deixando de lado, neste momento, as lutas da rua, a disputa política pelo Estado imperial
era também a luta intestina da classe senhorial pelo modelo a ser adotado e, assim, construindo e
construindo-se tentando fazer do seu projeto de classe o projeto nacional. Um projeto liberal, porém,
em sua maior parte conservador, em contraposição ao que consideravam a anarquia provocada pela
ideia democrática de federalismo e repartição do poder, o que representava um espaço público e
uma soberania um pouco mais ampliados. Para isso, o recurso ao modelo parlamentar inglês e o
voto censitário foram adotados.
Fontes
A nossa fonte privilegiada e principal documento é a Carta aos Senhores Eleitores da Província
de Minas Gerais, escrita em 1828, tornada aqui um objeto de nossa análise, dentre outras fontes, é
parte de nosso projeto de doutoramento. Ali, Bernardo Vasconcelos presta contas de seu primeiro
mandato e apresenta-se candidato à reeleição à Assembleia Geral. Além do principal documento
exposto acima, objeto central no qual desenvolvemos nossa análise, trabalharemos com outras
fontes produzidas no período, tais como o Diário do Conselho Geral da Província de Minas Gerais, os
jornais O Universal e o Sete de Abril, fontes privilegiadas tanto para compreendermos o contexto de
ação quanto o pensamento político de Bernardo Vasconcelos.
Referencial metodológico
Para tanto apoiamo-nos no referencial metodológico de Reinhart Koselleck, em Futuro Passado,
na busca das ferramentas necessárias para a apropriação dos conceitos e de seus usos. Passamos
por Jean-François Sirinelli e Norberto Bobbio na tentativa de entender a ação do intelectual. Assim
chegarmos em Quentin Skinner, com a sua obra Visões da Política, e de Hans Ulrich Gumbrecht com
As funções da retórica parlamentar na Revolução Francesa tentando compreender e reconstruir, em
parte, a maneira de discursar e agir nos espaços públicos refazendo uma genealogia dos principais
conceitos iluministas, dentre eles o liberalismo e a educação, que penetraram o século XIX brasileiro.
Nossa pesquisa busca mecanismos e razões para entendermos a construção da busca do consenso e
a virada linguística que organiza o Estado imperial e os brasileiros. Além de Skinner e Gumbrecht são
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referências fundamentais para o nosso entendimento Lyn Hunt e a invenção dos direitos, Carlota
Boto e o conceito de homem novo, além de Condorcet.
Resultados
Ainda provisórios, nessa etapa, percebemos que o projeto dos inconfidentes mineiros de 1789-
1792, visto e entendido como um projeto iluminista de longo prazo da elite mineira, manteve sua
continuidade no discurso e nas ações de Bernardo Vasconcelos demonstrando que, a despeito
da modernidade constitucional, a Ilustração também inspirou e justificou o caráter conservador
e centralizador do Estado e a permanência desse pensamento nas instituições educacionais do
Império brasileiro.
Referências
Uma consagrada biografia de Bernardo Pereira de Vasconcelos ainda é a de Otávio Tarquinio de
Souza. Trata-se do volume III da História dos Fundadores do Império do Brasil – Bernardo Pereira
de Vasconcelos, volume 210, reeditada em Brasília pelo Conselho Editorial do Senado Federal em
2015; ainda para o entendimento do período é fundamental a leitura de O tempo Saquarema de
Ilmar Rohloff de Mattos, publicado em São Paulo pela Hucitec em 1987; quem deve ser lido também
é Christian Edward Cyril Lynch com sua obra Da monarquia à oligarquia : história institucional e
pensamento político brasileiro (1822-1930), publicado em São Paulo pela Alameda em 2014; a ideia
de um homem novo preconizado pelo Iluminismo e a Revolução Francesa está em Carlota Boto com
A escola do homem novo: entre o Iluminismo e a Revolução Francesa publicado em São Paulo pela
UNESP em 1996; e, por fim, para não prolongarmos uma lista que é imensa não podemos deixar
de citar Hans Ulrich Gumbrecht com As funções da retórica parlamentar na Revolução Francesa que
desenvolverá seus estudos buscando entender como se constrói o consenso político e a identidade
política por meio da linguagem, aí incluída a educação.
[1] Como na definição de Ângela de Castro Gomes e Patrícia Hansen (2016), “[...] intelectuais que atuam, exclusiva-
mente ou paralelamente, realizando outras atividades como mediadores culturais (GOMES; HANSEN, 2016, p. 4)” e,
no caso de Bernardo Pereira de Vasconcelos, quase um curador do pensamento político europeu pinçado e exposto
nas páginas dos jornais que editou.
ISSN 2358-3959
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lema Ordem e Progresso, e considerando um ideal de trabalho nacional que fosse capaz de tornar a
população nacional saudável, disciplinada e produtiva. Tratava-se de regenerar o brasileiro.
Cabe assinalar que os operários na cidade de São Paulo no início do século XX eram, em sua
maioria, imigrantes. A partir das suas manifestações reivindicatórias no início do processo de
industrialização do Brasil, o trabalhador imigrante deixou de ser o modelo ideal de trabalhador, ao
mesmo tempo em que persistia a ideia do negro como propenso à vadiagem bem como a imagem
do brasileiro comum como improdutivo, vadio, doente, apático e degenerado.
Outro aspecto a se considerar seria o da transição entre uma economia essencialmente agrícola e
dependente do trabalho escravo para uma fase industrial com operários livres. Segundo os intelectuais
e políticos à época, não seria possível concretizar a República sem a adequada organização do
trabalho em um país marcado pela ausência de preocupação com o analfabetismo de letras e
ofícios. Para corrigir essa situação seria necessário que a população pobre tivesse possibilidade de
educação profissional e que os negros emancipados fossem alcançados por alguma instrução.
Assim, se considerava que a condição desse contingente da população constituiria o principal
fator de atraso à marcha para o progresso. Lemas como “Progredir ou desaparecer” e “Vitalizar pela
educação e pela higiene” demonstram o pensamento dos entusiastas pela educação.
A escola era então proclamada como a instituição capaz de colocar o país nos trilhos da nova
ordem social e econômica e viabilizar a consolidação de um caráter nacional no Brasil. Nesse
contexto, a educação profissional se configura como um instrumento para qualificar a mão-de-obra,
disciplinar o trabalhador e nacionalizar o operariado.
A escola técnico-profissional em seu nível elementar passou a ter relevância como um ensino
prático, necessário à vida do país e como requisito para o desenvolvimento urbano-industrial. Mas
também parecia ser essa modalidade de ensino convocada a responder aos novos desafios postos
pela urbanização, ou seja, incidir pedagogicamente sobre a questão social. Assim se inclui no debate
educacional uma crítica à cultura literária e livresca como padrão de ensino e em contraposição a
defesa profissionalização da escola primária.
Numa sociedade marcada pela desigualdade social e por forte exclusão, a oferta da escolarização
reproduziu também a distância entre a formação dos quadros dirigentes da sociedade e a formação
do povo. O ensino técnico, em que pese a importância que lhe fora conferido nas discussões e mesmo
considerando a implantação da rede de Escolas de Aprendizes Artífices, mantinha características a
ele atribuídas desde o período imperial. No contexto de reformas, no ano de 1920 o governo federal,
por meio do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, nomeou uma Comissão liderada
pelo engenheiro João Lüderitz para avaliar e remodelar o Ensino Profissional Técnico. Os estudos
da Comissão, a partir da inspeção em várias escolas, subsidiaram a organização de um Projeto
de regulamento do ensino profissional técnico, que sugeria reestruturação especialmente para o
currículo, posto que a ausência de um currículo pré-estabelecido representava um dos problemas para
o funcionamento das escolas. Segundo o relatório, os diretores das escolas profissionais raramente
eram profissionais ou tinham a experiência necessária para compreender o que seria necessário
numa indústria para propor a organização das oficinas, assim como havia excessiva liberdade para
mestres igualmente mal preparados. As condições físicas e materiais das escolas também foram
alvo de observação. Os regulamentos estabelecidos até então eram considerados demasiadamente
brandos tendo em vista que a definição do que se deveria estudar ficava absolutamente a cargo dos
diretores.
O relatório da já citada comissão influenciou parte significativa da Portaria de 13 de novembro
de 1926, aprovada pelo Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, denominado Consolidação
dos dispositivos concernentes às Escolas de Aprendizes Artífices, e a partir do qual houve uma
regulação para tais cursos, especialmente no que tange ao currículo, inclusive com seriação. A partir
de então foi estabelecido um currículo padrão para as oficinas das Escolas de Aprendizes Artífices
estabelecendo condições de promover maior controle sobre a aprendizagem profissional. Parte da
carga horária era agora destinada à prática profissional.
O estágio de industrialização em São Paulo induziu ainda a natureza dos cursos que deveriam
ser oferecidos. A escola paulista oferecia cursos de tornearia, de mecânica e eletricidade ao lado de
oficinas mais artesanais como é o caso de carpintaria e artes.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 661
No caso do Estado de São Paulo o perfil dos estudantes das Escolas de Aprendizes Artífices
também parece ter um viés peculiar, por se constituir de filhos de operários e outros profissionais
urbanos, incluindo estrangeiros, os quais adquiriam nos cursos novos valores e novas concepções
de trabalho.
Portanto podemos afirmar que a formação profissional desses jovens fez parte do processo de
socialização da força de trabalho pelo capital.
Para a construção desse estudo de caráter qualitativo, recorreu-se a fontes diversas, tais como
legislação de implantação e funcionamento das Escolas de Aprendizes Artífices e suas alterações,
Portarias e Regulamentos, Relatórios do Ministério de Agricultura, Indústria e Comércio, da Secretaria
do Interior e Anuários. Utilizamos além da pesquisa documental a pesquisa bibliográfica. Tomamos
como principais aportes teóricos os pesquisadores Acácia Zeneida Kuenzer, Carmen Sylvia Vidigal
Moraes, Jorge Nagle, Luis Antonio Cunha e Marta Maria Chagas de Carvalho.
ISSN 2358-3959
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O objetivo deste trabalho foi perceber como as ideias de eficiência, eficácia e racionalização com
vistas à formação do cidadão útil circularam e foram representadas, principalmente no contexto da
educação para o trabalho, em períodos distintos da educação brasileira, situando-se, principalmente
durante o final do século XIX e o século XX, trazendo com mais relevo, propostas educativas do
estado do Paraná. Almejou-se, perceber semelhanças e diferenças no emprego desses termos por
meio de alguns textos sobre políticas educacionais implantadas no Brasil, fazendo principalmente
um paralelo com a lei nº 5692/71, que carrega o título de ter sido uma lei tecnicista.
Para tanto, alguns textos foram selecionados para esta discussão de autores como: de Decca
(1984); Oliveira (2003); Oganauskas (2015); Ribeiro(1986) e Cunha(2005). Por fim, algumas fontes
como discursos governamentais do período referente à promulgação da lei nº 5692/71, foram
cotejadas para discutir a questão da circulação de ideias referentes à formação do trabalhador útil.
As fontes utilizadas no trabalho, foram discursos governamentais, periódicos, legislação
educacional e entrevistas com professores que vivenciaram o período da articulação da lei nº 5692/71
nos sistemas de ensino no estado do Paraná. Além disso, utilizou-se o conceito de representação
de Chartier (2002) na análise desses materiais. A metodologia utilizada para o desenvolvimento do
trabalho envolveu pesquisa bibliográfica, com base nos textos, documentos e fontes já mencionadas.
Com relação ao tema de pesquisa proposto, percebeu-se que a ideia do ser humano útil e
principalmente do tempo útil contém uma história bem mais longínqua do que talvez algumas
pessoas supõem. Parte de um senso comum, quando se estuda em História da Educação divisões
por vezes rígidas de concepções pedagógicas, como se uma terminasse e automaticamente outra
começasse sendo que as permanências e mudanças são muito mais recorrentes que as rupturas,
principalmente se tratando da formação humana. Ideias vão e vem numa circulação entre diferentes
tempos históricos, se adaptando é claro para cada contexto onde são representadas, elucidadas e
propostas.
O autor Edgar de Decca (1984), em o Nascimento das Fábricas traz discussões bastante pertinentes
sobre o olhar de forma diferenciada para a própria palavra trabalho, que ao longo do tempo, passa
a ter um sentido mais positivo, pois antes era associada a algo penoso e doloroso, sendo que a
partir do século XVI, passou da “mais humilde e desprezada posição ao nível mais elevado e a mais
valorizada das atividades humanas, quando Locke descobriu que o trabalho era a fonte de toda a
propriedade” (DE DECCA,1984,p.8).
Além disso, outro aspecto interessante trabalhado por De Decca (1984) é a percepção, trazendo
o autor Marglin, de que a reunião dos trabalhadores nas fábricas, a partir de determinado momento
histórico, não foi devido ao avanço das técnicas de produção, mas sim com o intuito de controle
social, dos ritmos, tempos, saberes dessas pessoas. Ou seja,
Essas ideias são recorrentes em vários contextos e discursos governamentais, por vezes até
naturalizadas, mas percebe-se que suas raízes têm relações com a própria forma de se organizar o
mundo do trabalho a partir do sistema de fábricas.
No contexto brasileiro, especificamente, há uma tendência, também advinda de senso comum,
que quando se menciona industrialização e formação para o trabalho, muitas pessoas associam
com o período da Era Vargas em diante, mas a preocupação com essas questões e muitas iniciativas
para sua configuração vem de tempos anteriores.
Ribeiro (1986) ao tratar da experiência do liceu de Artes e ofícios de São Paulo, coloca que as
configurações dos cursos ofertados datam de 1873, sendo que em 1895 a escola passa por uma ampla
reforma e o trabalho prático passa a ser o núcleo da formação oferecida, alterando os programas dos
cursos ofertados até então. Havia uma “ preocupação com a formação do operário completo que
caminhava ao lado com a produção do artefato perfeito” (RIBEIRO,1986, p.46).
Aliás, esse se tornou um grande traço dos liceus: a preocupação que os alunos acompanhassem e
conhecessem o processo integral da produção. Durante o tempo de vigência do liceu houve ofertas de
cursos de arte em madeira, desenho, mecânica, modelagem, arquitetura, carpintaria, eletricidade,
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 664
dependendo da demanda da sociedade em cada contexto, sendo esse um aspecto observado pelo
liceu. Com o tempo, porém, a instituição também enfrentou as questões de divisão e subdivisão do
trabalho que foram se acentuando, “a forma impessoal da máquina imprimirá sua marca também
aqui. E as exigências em termos de qualificação sofrerão profundas alterações” (RIBEIRO, 1986, p.70).
Nesse sentido, já no início do século XX percebe-se essas diferentes concepções e dicotomias no
processo de trabalho. Sendo importante também salientar que a divisão entre trabalho intelectual e
manual, com a valorização do primeiro e inferiorização do segundo, também é um processo histórico.
Implicitamente, talvez, esse seja um elemento importante na defesa de um trabalho integral feita
por grande parte dos mestres do liceu e também em outros contextos. Uma hipótese é que ao se
pensar no conhecimento integral e sistêmico do objeto de trabalho, o trabalhador ainda possui o
controle de sua produção, não seria uma concepção fragmentada associada ao sistema de fábricas,
partindo do entendimento de Decca, por exemplo.
Em relação à Lei nº 5.692/71, que foi um dos principais marcos legais na educação durante o
período de ditadura civil-militar, onde os cursos profissionalizantes existentes no ginásio foram
extintos e o ensino de 1° grau, portanto, não ofereceria formação profissional, enquanto o 2° grau
todo foi estruturado como profissionalizante, também trouxe a circularidade das ideias de eficácia,
racionalidade, eficiência e utilidade, não só em seu texto, mas nas justificativas para sua implantação
dadas por diferentes agentes do estado. Como afirma Newton Sucupira, representante do CFE junto
à Secretaria – Geral do MEC, nas diretrizes para a elaboração do Plano Setorial de Educação 1975/79
Portanto, nas justificativas apresentadas sobre a Reforma, a preocupação com o homem produtivo
e com um ensino mais articulado e integral, que o tornasse útil às necessidades da sociedade da
época ganhava destaque.
Como resultado oriundo dessa pesquisa nota-se que as ideias de eficiência, eficácia, racionalidade,
fazem parte de uma concepção de controle social no mundo do trabalho, que circularam em
diferentes contextos e períodos que por vezes se aproximam e por vezes se distanciam, pois essas
representações do mundo social “são sempre determinadas pelos interesses de grupo que as
forjam”(CHARTIER, 2002, p.17). Porém, é importante perceber que para além das diferenças, muitas
ideias e representações na formação para o trabalho permaneceram, com justificativas, contradições
e críticas muito semelhantes ao longo da história da educação brasileira.
Referências
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2002.
CUNHA, L.A. O ensino profissional na irradiação do industrialismo. São Paulo: Editora Unesp, 2005.
OLIVEIRA, M.R.P.de. Formas cidadãos úteis: os patronatos agrícolas e a infância pobre na Primeira
República. Bragança Paulista: Edusf, 2003.
ISSN 2358-3959
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Os Relatórios dos Presidentes das Províncias eram documentos oficiais, produzido pelo
presidente da Província, como homonimamente indicado, e apresentado na Câmara local, como
forma de balanço das ações tomadas, dos problemas da região e das perspectivas sobre os diversos
assuntos de interesse público, as demais autoridades. Neste sentido, este tipo de fonte garante
sinais, emblemas e indícios dos imaginários, das crenças e dos investimentos realizados. Assim, na
fala do presidente da Província de Minas Gerais, em 1843, Francisco José de Souza Soares D’Andréa,
retrata que o ensino secundário era voltado unicamente para os homens de classes elevadas que
não fariam trabalhos manuais e para quem, deveriam ocupar os postos da academia. As mulheres
não deveriam concorrer nos círculos mais elevados da sociedade, segundo ele. Assim, temos uma
pista das representações sociais sobre o público-alvo do ensino secundário, bem como a tônica de
sua organização que perdura até os anos de 70, do século XX, que marcará o início do processo de
massificação do ensino. A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) nº. 5692 de 1971, representa um marco para
as políticas públicas educacionais, modificando as estruturas e as finalidades dos segmentos de
ensino. O segundo grau torna-se profissionalizante e o ensino fundamental passa a ter
obrigatoriamente oito anos. A categoria trabalho fundamenta as proposições da LDB de 71, marcando
uma oposição ao par humanístico e científico. Assim, a profissionalização ascende frente ao ensino
propedêutico, tendo o 1º e 2º graus direcionados para a qualificação para o trabalho. Neste sentido,
Cury e colaboradores (1982) afirmam que a organização do trabalho impacta os próprios sentidos do
mesmo, bem como os sistemas educacionais e seus objetivos. Quando se pensa o ensino secundário,
desde os seus primórdios, os embates entre um ensino humanístico e científico são presentes. Souza
(2009) retrata que durante todo o Império houve uma preponderância do ensino humanístico,
representado por um currículo que valorizava as línguas clássicas e que começa ser questionado no
século XX. Em tais embates, a autora dispõe que com a sobrevalorização de uma educação científica,
todas as humanidades são contestadas. Assim, o presente trabalho se inscreve na temática da
história do ensino secundário em Minas Gerais, desde o início das organizações dos empreendimentos
de instrução pública mineira até aos ideais reformistas da República (1818-1890). Primeiramente,
após fazer breve explanação, focar-se nas nomenclaturas que demonstram as finalidades do ensino
secundário, os debates, os sujeitos, os espaços e as organizações arroladas para este tipo de estudo.
As fontes que constituíram este trabalho são de natureza oficiosa, a partir dos Relatórios de
Presidentes de Província, de fundo jurídico, com as legislações do período e dados da imprensa.
Ambos acervos documentais estão disponíveis no Arquivo Público Mineiro (APM). Nesse sentido,
objetiva-se refletir sobre as aulas avulsas, os liceus públicos e as finalidades do ensino secundário.
Com as Reformas Pombalinas, em 1759, que entre outros pontos, fechou colégios Jesuítas. Assim,
em Portugal, a partir de concursos públicos para o provimento de cargos de professores, abriram-se
aulas avulsas de Filosofia, de Retórica e de Gramáticas Grega, Latina e Hebraica. No contexto do
Império, segundo Hilsdorf (2002), em 1772, existiam 44 aulas régias, divididas em Primeiras Letras,
Gramáticas e Filosofia. As reformas Pombalinas, vislumbravam uma nova organização do ensino,
refletindo sobre as metodologias e as práticas dos professores, entretanto, como aponta Villalta
(1997) a realidade estava separada por uma falésia das proposições teóricas, uma vez que a
orientação religiosa persistia e o ensino era calcado na repetição. De acordo com as fontes utilizadas,
o ano de 1818 foi o primeiro que se teve registro oficial de aulas avulsas na província mineira. As
denominações variam entre Instrução Intermédia e a posteriori Instrução Secundária. O ano de 1831
também é marcado pela criação de cadeiras de Gramática, especialmente a Francesa, que integrou
as outras disciplinas oferecidas, ambas registradas em livros que ocupavam do registro dos
professores. Lages (2019) oferece um panorama das localidades que receberam as cadeiras de aulas
avulsas e destaca que em função da Lei de 1860, apenas as aulas de Latim e de Francês são mantidas.
Mas, a mesma autora identifica que muitas aulas voltam a ser avulsas, em função das dificuldades
de algumas instituições se manterem. Assim, três momentos são destacados dentro da organização
do ensino secundário. O primeiro, em 1831, trata das ações, na forma do Decreto daquele ano, de
expansão da instrução. Então, cabe ressaltar que existe uma relação entre as leis imperiais e
provinciais, principalmente no que faz referência aos decretos que sinalizavam a abertura de novos
colégios de ensino secundário. Portanto, existe uma confluência entre as legislações e os papeis do
Conselho da Província, para a instrução pública. O segundo momento é marcado pelo Decreto
número 60, em 1837, com os estabelecimentos de aulas do ensino secundário. Já a última dimensão
é marcada pelo aumento da abertura das aulas de Gramática Francesa e pela abertura de instituições
particulares. Neste sentido, a partir dos anos 40 do século XIX, é recorrente discursos contra as aulas
avulsas, sendo o ano de 1860 carregado de marcas legais para o corte de cadeiras das aulas avulsas.
Existia também um descompasso entre o planejamento das ações de abertura e de fechamento das
classes, que não eram tão paralelas frente ao investimento básico para a sua realização. Tanto, que
nas análises, é recorrente nos discursos oficiosos a dificuldade de financiamento. Para além disso, a
dificuldade e a falta de professores também são relatadas. Sobre esse último aspecto, a instalação
dos poucos docentes nas comunidades, muitas das vezes sofria reveses no início, na sua permanência,
criando turmas sem professores ou com vários pedidos de transferência de localidade. Em resposta
a tal situação, criou-se mecanismos para a manutenção da permanência dos professores na
comunidade. A organização das matérias também são foram pensadas para que o exercício dos
professores visasse a permanência e demarcasse um papel social da instrução e dos seus
destinatários. Assim, uma das principais modificações necessárias na lógica das aulas avulsas foi a
adaptação a um tempo escolar, o que impactou também as práticas dos professores. Neste sentido,
a Lei número 13, de 1835, fora uma primeira marca do governo provincial em regular as aulas, suas
quantidades e sua duração, no ensino secundário. Na mesma direção, regulamentos foram realizados
para que os professores seguissem as normas de periodicidade, de aplicação de provas e regulação
geral das atividades letivas. Logo, tal contexto de falta de professores e poucas normativas sobre as
aulas avulsas, fez com que o governo provincial remanejasse várias turmas para uma só cadeira, por
exemplo. Assim, um professor, quando aprovado em concurso, poderia assumir mais de uma
cadeira. Outra particularidade era que apesar das delimitações do ano letivo, com o seu início e o
seu fim, bem como o tempo da aula, não se tinha uma definição clara sobre os limites das entradas
dos estudantes nas aulas avulsas. Esta questão, fora marcada por alguns professores em reclamações
registradas nas fontes pesquisadas. O que entende-se de consenso sobre os alunos, é que permanecia
a indefinição de sua entrada, sendo que a frequência iria até se sentirem aptos para a realização dos
exames finais. Em 1837, com a Lei número 60, definisse a divisão entre instrução primária e instrução
secundária, entendendo que os graus de ensino seriam dependentes, portanto o avanço dependia
da conclusão do nível anterior. Portanto, partindo de uma lógica da criação da lei e da proibição,
entende-se que os alunos poderiam matricular antes, sem nenhuma comprovação prévia da
conclusão dos ciclos do ensino primário. Cabe destacar que essas alterações se referem a instrução
pública e que as instituições particulares seguiam estatutos próprios. Logo, sobre as aulas avulsas,
pode-se considerar que houve grande interseção entre as variadas instâncias e repercussão nas
mudanças da organização, com foco no ensino secundário. Assim, o trabalho também se refere a um
lastro de preocupação do tempo presente, nas reformas do ensino médio, itinerários formativos e a
educação dos jovens.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Esse estudo é parte de uma pesquisa que tem como objetivo analisar as ações do Ministério da
Agricultura, Indústria e Comércio para a expansão das escolas profissionais, agrícolas, industriais e
comerciais, no período de 1909 a 1929. Em 1909, o ministério, criado pelo decreto 1.606 de 29 de
dezembro de 1906, foi reorganizado e instalado através do decreto 7.501 de 12 de agosto de 1909, o
Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas passou a ser o Ministério da Agricultura, Indústria e
Comércio. No ano de 1929 o ministério foi novamente reorganizado e desmembrado em dois
ministérios distintos, Ministério da Agricultura e Ministério da Indústria e Comércio. Desse modo,
esse trabalho, especificamente, tem como objetivo analisar a Escola Normal de Artes e Ofícios
Wenceslau Braz como parte dessas ações para o desenvolvimento do ensino profissional dentro do
recorte temporal da pesquisa citada anteriormente. Tendo em vista as dificuldades para a organização
do ensino envolvendo principalmente a necessidade de um corpo docente qualificado para as
Escolas de Aprendizes Artífices, o Ministério incorporou ao quadro de instituições de sua
responsabilidade a Escola Normal de Artes e Ofícios Wenceslau Braz, criada pela Prefeitura Municipal
do Distrito Federal em 1917. Logo depois de sua inauguração, essa escola foi transferida para a
jurisdição do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio com intuito de formar professores e
mestres para as Escolas de Aprendizes Artífices e também para outras escolas (BRASIL, 1918).
Localizada no prédio do antigo palácio do Duque de Saxe, a escola oferecia cursos de formação para
mestres e professores do gênero masculino e feminino. Ela fez parte de um conjunto de ações com o
objetivo de reorganizar as Escolas de Aprendizes Artífices. O seu ensino deveria integrar a teoria e
prática, de forma que os profissionais lá formados reproduzissem essa prática nas Escolas de
Aprendizes Artífices. Nessa perspectiva, esse estudo se insere na dimensão da história política
segundo Rémond (2003) e Barros (2005). De acordo com Barros (2005), com a história política à
medida que analisamos as relações provenientes do poder atribuído ao Estado pela força da lei,
podemos perceber essa força como mecanismo de controle e determinante do todo social. Para
Rémond (2003, p. 444) “Praticamente não há setor ou atividade que, em algum momento da história,
não tenha tido uma relação com o político”, e isso não seria diferente com a educação. Diante disso,
é preciso que analisemos os interesses, as motivações e as disputas que envolvem o desenvolvimento
da atividade política sobre a educação. Assim como a influência das ideologias e das decisões
políticas como determinantes no campo da educação, a história política é importante para a
compreensão do todo social. “A política é lugar de gestão do social e econômico”. A política é tratada
a partir da sua função de determinação do contexto e dos reflexos de sua prática (RÉMOND, 2003).
Inseridos no domínio da História da Educação Profissional, fazemos uso da concepção de “trabalho-
educação”, trazido por Ciavatta (2019) como uma unidade epistemológica que comporta a relação
entre o trabalho e a educação. Pensar essa concepção é pensar os dois conceitos, trabalho e
educação, como parte de uma realidade social. Para a autora, nessa concepção podemos, ao analisar
a história da educação profissional, pensar as relações de produção, as transformações do mundo
do trabalho, as políticas educacionais e a formação dos trabalhadores (CIAVATTA, 2019). Além dessas
áreas, um ponto importante para construção dessa análise é perceber o “trabalho como princípio
educativo e o princípio educativo do trabalho” , mas também a formação para o trabalho como
“meio de alienação e sujeição dos trabalhadores” (CIAVATTA, 2019, p. 146). Metodologicamente,
adotamos um caminho que partiu do mapeamento, categorização e análise das fontes, os relatórios
do Ministério apresentados anualmente no período supracitado, além das legislações concernentes
ao objeto de estudo. Também realizamos um levantamento bibliográfico sobre o tema, trazendo
alguns estudos que se aproximam do nosso pelo recorte temporal e temática para contribuir com as
discussões aqui apresentadas. Nessa construção, buscamos responder aos seguintes
questionamentos: Qual a importância da Escola Normal de Artes e Ofícios Wenceslau Braz para o
desenvolvimento do ensino profissional no Brasil no século XX? Qual o objetivo do Ministério da
Agricultura, Indústria e Comércio para com essa escola? Como ocorreu o desenvolvimento dessa
escola enquanto esteve subordinada a esse Ministério? Os relatórios do Ministério da Agricultura,
Indústria e Comércio de 1909 a 1929 se constituíram enquanto fontes à pesquisa documental. Os
relatórios eram apresentados ao fim de cada ano pelo ministro em exercício ao presidente da
República. Neles os ministros descreviam todas as atividades do ministério naquele ano, as ações
desenvolvidas e seus desdobramentos, as dificuldades enfrentadas, os desafios superados, o
acompanhamento dos estados, a movimentação contábil e também os instrumentos legais mais
importantes como leis, decretos e recrutamentos que interferiram nas ações realizadas naquele ano
até a data de apresentação do relatório. Ao todo foram analisados dezenove relatórios, pois os
documentos referentes aos anos de 1915 e 1921 não estavam disponíveis. A pesquisa foi realizada no
acervo digital do Center for Research Libraries, da Universidade de Chicago, na coleção Brazilian
Governments Documents, na sub-coleção de relatórios ministeriais, na seção do Ministério da
Agricultura. Metodologicamente adotamos a concepção de análise documental de Arostegui (2006).
Para Arostegui (2006), o trabalho das fontes não se resume a extração de informações, portanto é
necessário realizar a crítica das fontes, questioná-las. Nesse sentido, percebemos os relatórios como
fontes “para a história”, ou seja, não foram criados com essa intencionalidade mas servem a esse
propósito. E essa análise não é um trabalho mecânico, carece de uma preparação teórica e
metodológica. Além disso, a adequação das fontes está diretamente ligada aos objetivos da pesquisa.
Além disso, nos baseamos no método indiciário de Ginzburg (1989). De conformidade com Ginzburg
(1989), o procedimento metodológico do indiciarismo transferiu para o interior das pesquisas as
tensões entre narração e documentação, já que a análise dos indícios é construída a partir da
investigação das convergências e divergências, das inferências de causas não documentadas ou
comprovadas por meio dos efeitos. Como já dito anteriormente, a Escola Normal de Artes e Ofícios
Wenceslau Braz fazia parte de um conjunto de ações para transformar e reorganizar as Escolas de
Aprendizes Artífices concretizadas pelo Serviço de Remodelação do Ensino Profissional. O objetivo
dessa medida era o de qualificar os professores e mestres que atuariam nas Escolas de Aprendizes
Artífices. Essa escola se configurava como escola mista, recebia alunos do gênero masculino e
feminino. Nos anos estudados manteve uma média de duzentos alunos por ano, divididos em cerca
de oito turmas. Para o ingresso na escola, os candidatos passavam por uma prova de admissão, com
os conteúdos do ensino primário como português, desenho e aritmética. O percentual de alunas
sempre superou o de alunos, por isso, em 1928, foi atribuída uma nota mínima nesse exame para as
mulheres. Algumas aulas eram comuns a ambos os gêneros, como português, educação cívica,
desenho, francês, pedagogia, contabilidade, matemática, geografia e história. Mas as oficinas de
trabalhos manuais eram divididas por gênero, para o masculino os trabalhos com metais e madeira
e para o público feminino as oficinas de trabalhos domésticos e cerâmica. Além dessas aulas, os
alunos também tinham aula de educação física e recebiam alimentação adequada de acordo com
padrões higienistas. A primeira turma de professores formou-se no ano de 1924, apadrinhados pelo
presidente que deu nome a escola, Wenceslau Braz. A escola recebeu um novo regimento em 30 de
agosto de 1926. Em 1928, o ministro da Agricultura, Indústria e Comércio ressaltou os resultados
satisfatórios do trabalho desenvolvido na escola. Dessa forma, concluímos que a Escola Normal de
Artes e Ofícios Wenceslau Braz se configura como um importante objeto de estudo para o campo da
História da Educação Profissional, a medida que podemos resgatar a sua contribuição para o
desenvolvimento do ensino profissional no período em estudo.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Introdução
Temos como objetivo deste trabalho apresentar um breve levantamento da legislação educacional,
com um recorte para o Brasil Colônia (1500-1822), que forneça subsídios para o entendimento
histórico da estruturação da Formação de Professores no Brasil e a construção do ideário social do
(des)prestígio da profissão docente.
Essa é uma investigação de caráter histórico, onde utilizamos Análise documental e Bibliográfica
com abordagem qualitativa. Na análise documental utilizamos como fontes primárias de informação
as Cartas Jesuíticas reunidas e posteriormente publicadas (LEITE, 1956-1960 e NÓBREGA, 1931)
e toda a Legislação Educacional referente ao período Brasil Colonial que pode ser encontrada
digitalizada na íntegra no sítio do Parlamento Português (PORTUGAL, 2010).
Período Jesuítico
Os primórdios da educação no Brasil envolve a obra dos Jesuítas nos primeiros anos da recém-
descoberta colônia de Portugal. Marcado pela pedagogia jesuítica a educação estava vinculava-se as
questões da colonização e da catequese. Os jesuítas vieram ao Brasil a pedido da coroa portuguesa a
fim de doutrinar os índios e promover sua integração na sociedade e economia da colônia.
Assim os primeiro jesuítas enviados ao novo mundo saíram de Portugal, acompanhando a armada
do primeiro Governador-Geral do Brasil Tomé de Sousa, em 01/02/1549 e chegam ao Brasil em
29/03/1549. O padre jesuíta Manoel da Nóbrega, membro da Companhia de Jesus chefiava o grupo
composto pelos padres Leonardo Nunes, João de Aspicuelta Navarro, Antonio Pires e os irmãos
religiosos Diogo Jácome e Vicente Rodrigues. Ainda em 1949 o irmão Vicente Rodrigues, também
conhecido como Vicente Rijo, já ensinava doutrina aos meninos e tinha escola de ler e escrever
na Povoação do Pereira (posteriormente Vila Velha). Conforme primeira carta do padre Manuel
da Nóbrega enviada em abril de 1549 à Portugal depois de sua chagada ao Brasil ao padre Simão
Rodrigues de Azevedo: “O Irmão Vicente Rijo ensina a doutrina aos meninos cada dia e também
tem eschola de ler e escrever; parece-me bom modo este para trazer os Índios desta terra, os quaes
têm grandes desejos de aprender e, perguntados si querem, mostram grandes desejos” (NOBREGA,
1931).
Desta forma, Vicente Rodrigues (1528-1600) pode ser considerado o primeiro professor do Brasil,
o pioneiro mais antigo da educação nacional, ou seja, o primeiro docente português a lecionar aulas
de “ler e escrever” em terras brasileiras, uma vez que processos de ensino-aprendizagem eram
evidentemente desenvolvidas pelos povos indígenas anteriormente a chegada dos portugueses
à Terra de Palmares. Assim, nosso primeiro professor era um jovem sem formação específica que
movido talvez pela necessidade, frente à situação, pôs-se em ação!
Nos anos seguintes foram fundadas as primeiras escolas de instrução elementar existentes no
Brasil: Bahia (1550), São Vicente (1553) e Espírito Santo (1551), posteriormente São Paulo (1554), no
entanto os missionários não estavam preparados para as funções que deles se esperava, incluindo
a do magistério. Os primeiros anos das missões jesuítas, Período Heroico (1549-1570), tinha como
foco a catequização dos povos indígenas e na construção das primeiras escolas e igrejas do brasil.
A coroa portuguesa por meio do Alvará de 07/11/1564 concedeu permanentemente recursos para
as ações missionárias e manutenção dos colégios jesuítas estabelecendo o padrão de redizima.
Posteriormente, tais benefícios foram estendidos para outros colégios onde destacamos o Alvará de
15/01/1565 para o Colégio de São Vicente, o Alvará de 11/02/1568 para o Collegio do Rio de Janeiro
e em 1576 o Alvará para a Collégio de Olinda.
No segundo período jesuíta no Brasil, Período de Organização e Consolidação (1570-1759)
as ações estava centrada principalmente na formação intelectual da elite e na preparação para o
ingresso em cursos superiores das universidades portuguesas, assim a criação de colégios assumiu
uma importância maior que a da atividade missionária.
Período Pombalino
O Período Pombalino (1759-1808) promoveu uma ruptura no sistema de ensino brasileiro, até
então centrado na vertente religiosa. O Marquês de Pombal (1699-1782) promoveu uma reforma
educacional que promoveu uma descentralização da educação jesuíta passando o controle para a
Coroa Portuguesa, essa reforma culminou na expulsão dos Jesuítas.
Marcos na Legislação Educacional no Período Pombalino:
Lei 28/06/1759, proibição dos Livros dos padres da Companhia de Jesus e do seu Método.
Lei de 3/09/1759, Lei dada para a proscrição, desnaturalização e expulsão dos regulares da
Companhia de Jesus, nestes reinos e seus domínios.
Alvará de 28/06/1759, dá início a Reforma dos Estudos Menores e extinguiu as escolas jesuítas.
Propõe a Criação das aulas régias de gramática latina, retórica e grego, entretanto até 1765 não
houve nomeação de nenhum professor.
Edital 28/07/1759, trata da Criação do cargo de diretor de Estudos.
Lei de 11/01/1760, amplia a Lei dos Estudos Gerais.
Estatutos, 07/03/1761, Cria os Estatutos do Collegio Real dos Nobres.
Lei de 05/04/1768, criação da Real Mesa Censória: responsável pela secularização do controle da
circulação de livros.
Alvará de 04/06/1771, extinção do cargo de diretor dos estudos, essas competências foram
transferidas para Real Mesa Censória.
Lei de 06/11/1772, cria as aulas régias de leitura, escrita e cálculo, além das cadeiras de filosofia.
Alvará de 06/11/1772 regulamenta os exames aos quais os professores deveriam se submeter
para ingressar na carreira docente. Até essa data nenhuma legislação tratou especificamente da
Formação Docente, o que evidencia que no Brasil a preocupação em selecionar os professores
antecedeu a preocupação com a sua formação (TANURI, 2000).
Entre 1759 e 1771, os mestres eram pagos pelas Câmaras Municipais e possuíam autorização
para cobrar contribuições dos pais dos alunos. Os problemas com a falta de pagamentos levavam à
grande oscilação nos ordenados, o que gerava insatisfação por parte dos professores. Criado pela lei
de 10/11/1772, o subsídio literário foi uma arrecadação destinada para o pagamento de mestres e
professores das escolas menores públicas de todos os reinos e territórios de Portugal incidia sobre o
vinho, a aguardente, o vinagre e outros produtos comercializados no Reino e domínios.
As aulas Régias eram compostas basicamente por aulas avulsas e sem articulação e Ausência
de Currículo. Apenas em 28/06/1774 as Aulas Régias iniciaram. A primeira foi no Rio de Janeiro,
ministrada pelo professor Régio Francisco Rodrigues Xavier Prates.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 671
Período Joanino
Período Joanino (1808-1822) assinalado pela vinda da família real para o Brasil em 22/01/1808
devido à invasão francesa a Portugal.
Legislação Educacional para esse período:
Decreto de 17/01/1809, prescreve como hão de ser providas as cadeiras de ensino público, indica
regras para a nomeação de um magistrado para a fiscalização.
21/02/1821, cria o cargo de inspetor dos estabelecimentos literários e científicos do Reino o
responsável pela promoção da instrução pública no Brasil.
Decreto de 30/06/1821, Permite a qualquer cidadão o ensino e abertura de escola de primeiras
letras independente de exame ou licença.
Primeiros Cursos de Ensino Superior no Brasil: Lei de 04/12/1810, cria a Escola Politécnica da
Academia Real Militar da Corte; Decreto de 23/02/1808, instituiu uma cadeira de Ciência Econômica;
Decreto de 12/10/1820, organizou a Real Academia de Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura
Civil, depois convertida em Academia das Artes.
Decreto de 3 de julho de 1820, Concede a “João Batista de Queiroz uma pensão annual, para ir
á Inglaterra aprender o systema Lencasterianno”. O método Lancaster, ensino mútuo ou monitorial
consistia em uma organização onde monitores acompanhavam as atividades pedagógicas de um
pequeno grupo. Foi assim que surgiram no Brasil as primeiras experiências com a questão do estágio,
“essa foi realmente a primeira forma de preparação de professores, forma exclusivamente prática,
sem qualquer base teórica” (TANURI, 2000, p.63).
Decisão de 13/03/1821, comunica a retirada de Sua Majestade para Portugal.
Algumas Considerações
Pensar a Formação Docente requer analisar diversas dimensões que perpassam e se entremeiam
tanto na ação docente, quanto nas normativas legais ou nas representações sociais que envolvem o
processo ensino aprendizagem.
Pensamos que a partir do entendimento do caminho histórico indicado pela legislação para a
educação em nosso país podemos levantar alguns importantes indicativos também sobre a formação
do docente que se construiu e se constrói sob certa relação de simbiose com as políticas públicas
para a educação. Apresentamos alguns dos principais marcos legais para a educação no Brasil no
período colonial, antes mesmo de qualquer legislação específica para a formação de professores.
Desta forma pudemos perceber que os caminhos legais para a educação pública surgiu já em segundo
plano, dado à demora em se estabelecer instituições públicas de ensino ou regulamentações para a
profissão docente. Consideramos que esse trabalho contribui para área de pesquisa em História da
Educação tanto por fazer um levantamento dos documentos que abordam a educação no período
colonial brasileiro, como também por trazer uma análise que relaciona tal legislação como com a
ação e com a Formação Docente.
Referências
LOPES, Eliana Marta Teixeira, FARIA FILHO, Luciano Mendes VEIGA, Cynthia Greive. (orgs.). 500 anos
de educação no Brasil. 2a ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. 606 p.
LEITE, Serafim. Monumenta Brasiliae, Roma: Monumenta Historica Societati Iesu, 1956-1960. 4v.
NÓBREGA, Manuel da. Cartas do Brasil: 1549 - 1560. Rio de Janeiro, RJ: Oficina Industrial Gráfica.
1931. 258p
PORTUGAL, Legislação Régia. Parlamento Português, 2010. Disponível em: <http://legislacaoregia.
parlamento.pt>. Acesso em: 20/11/2019.
TANURI, Leonor Maria. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, n.14,
2000, pp. 61-88.
ISSN 2358-3959
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e Estatística (IBGE), além de publicações da imprensa periódica local, por meio do jornal Gazeta de
Viçosa, cujos exemplares localizados até o momento, demonstram que o mesmo circulou no ano de
1938, passando a atuar como órgão oficial do município, preocupando-se em divulgar apenas atos
políticos, favoráveis à ideologia dominante do período, sendo, portanto, um espaço para enaltecer
o regime dominante nos governos nacional, estadual e municipal. A pluralidade de fontes, exigiu
da pesquisa uma seleção de documentos em busca de mapear o processo de escolarização na
região de Viçosa ao longo do período proposto. Enquanto isso, os livros dos poderes municipais,
apresentam intenções ou ações capazes de reconstituir parcialmente aspectos de uma organização
administrativa, tendo como foco, políticas voltadas aos estabelecimentos de ensino. Como forma de
contemplar esse discurso oficial, priorizou-se a análise de leis e decretos municipais, como condição
para compreender o processo de criação e desenvolvimento de escolas na região de Viçosa, assim
como identificar possíveis avanços ou rupturas do processo de escolarização, enquanto as atas do
poder legislativo, apresentam vestígios ou intenções referentes as posições políticas dos vereadores
a respeito dos rumos da educação municipal. Já as Revistas de Estatística e Educação de Minas Gerais
compostas por edições publicadas a cada decênio, entre 1920 e 1950, constituem-se em importantes
fontes para este estudo histórico, por conterem informações oficiais e diversas, referentes a um
contexto social, econômico, cultural e político dos municípios brasileiros.
Metodologia: Com o intuito de averiguar o processo de expansão das unidades escolares,
principalmente de nível primário, no município de Viçosa, entre 1938 a 1946, optou-se pela realização
de uma pesquisa de caráter histórico documental, pautada pelas análises de Jacques Le Goff (2003),
Lombardi (2003), e Sá-Silva (2009), com o intuito de construir uma abordagem consistente sobre
as fontes utilizadas do período delimitado no estudo. Nesse sentido, compreende-se que não são
todas as ações históricas que ficaram registradas para a posteridade, onde as vivências sociais
que, apesar de terem existido, não foram de alguma forma documentadas, não podendo assim,
serem recuperadas e contadas. Deste modo, cabe aos pesquisadores checar a veracidade das
fontes, devendo indagar as intencionalidades e motivações dos autores enquanto a produção do
documento, assim como questionar a seleção e manutenção do mesmo.
Já a revisão de literatura nos auxilia a tratar dos efeitos das políticas autoritárias nacionais em um
contexto local, e suas implicações no setor educacional durante o Estado Novo, que trouxe consigo,
mudanças estruturais na sociedade por meio da instauração de um modelo desenvolvimentista
fundamentado na industrialização, compreendendo que por este movimento, a educação começa a
sofrer alterações, em resposta às novas necessidades que surgiam, ambicionando uma capacitada
mão de obra para o exercício de novas funções que se abriam no mercado de trabalho. Eventualmente,
iremos identificar ações do poder público local, com intenções de proporcionar a classe popular um
maior acesso à educação mediante abertura de escolas de nível primário.
Resultado: Diante deste cenário, identificou-se a presença quase exclusiva de escolas isoladas
de nível primário, rurais, mistas, constituídas por um ou mais grupos de alunos, de idades variadas,
sob a responsabilidade de um docente, lecionando em sua maioria, em localidades afastadas do
centro urbano ou distrital. Segundo Viega (2011), para criar esse tipo de instituição em determinada
localidade, era preciso que uma professora, com ou sem titulação, ou um grupo de moradores
oriundos do local solicitasse aos órgãos competentes, a implantação de uma cadeira de instrução
primária. O poder público local, além de conceder a cadeira, assumia o encargo de prover o salário do
professor nomeado e fiscalizar o funcionamento da escola. A prefeitura também arcava com o aluguel
do espaço escolar, fornecendo móveis e materiais didáticos. Este era a principal responsabilidade do
município com o ensino, visto que o ensino ginasial e médio era apenas oferecido por instituições
particulares, o que impedia a continuidade de estudo para a maioria da população do município.
E tomando por base o desmembramento territorial ocorrido no município no final do ano de
1938, verificamos que houve a extinção de 8 cadeiras de instrução pública pertencentes aos distritos
emancipados, e a exoneração de 8 docentes, reduzindo o quadro escolar municipal de 19 para 11
escolas de nível primário. Esse impacto não alterou apenas o número de cadeiras registradas no
município, tendo também efeitos nas receitas públicas, onde o governo local passou a recolher
menos impostos até 1943, e consequentemente, investiu menos 25%, na instrução primária. Não
obstante, observamos que, entre 1939 e 1943, houve um crescimento de 100% de escolas públicas
criadas no município e em seus distritos, saltando de 11 para 22 unidades existentes, contando
com mais 11 instituições até o final de 1946, o que representou um crescimento de 200%, entre
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 674
1939 e 1946. Tal ampliação no número de escolas, se justifica pela gradativa melhora nos valores
arrecadados pela caixa escolar, que expandiu entre 1939 a 1946, cerca de 116%, demonstrando que
apesar do momento de repressão política, visualizado nas páginas do periódico local, a educação
primária no município de Viçosa, durante o período do Estado Novo, teve um desenvolvimento
quantitativo importante.
Referências
LE GOFF, J. Documento/Monumento. In: LE GOFF, Jacques. História e Memória. Trad. Irene Ferreira,
Bernardo Leitão e Suzana Borges. 5. ed. Campinas: Ed. UNICAMP, 2003.
SÁ-SILVA, J. R.; ALMEIDA, Cristóvão Domingos, GUINDANI, Joel Felipe. Pesquisa documental: pistas
teóricas e metodológicas. Rev. Bras. de História & Ciências Sociais. n. I, p. 1-15, jul., 2009.
à História das Instituições Escolares do Ensino Secundário de Minas Gerais, pode ajudar no
entendimento das práticas escolares colocadas em ação no período em referência na presente
pesquisa.
Referências fundamentais
LAGES, R.C.L. História do ensino secundário em Minas Gerais: percursos, rubricas, finalidades. In:
LOPES, E.M.T.; CHAMON, C.S. (Orgs.); CARVALHO, C.H.; FARIA FILHO, L.M. (Coord. Col.). História da
Educação em Minas Gerais (v.2, Império). Uberlândia/MG: Edufu, 2019. p.177-202.
MOURÃO, P.K.C. O ensino em Minas Gerais no tempo da República (1889-1930). Belo Horizonte:
CRPE. 1962.
SILVA, G.B. A Educação Secundária: perspectiva histórica e teoria. São Paulo, Editora Nacional. 1969.
SOUZA, R.F. O ensino secundário em Minas Gerais no período republicano: o secular desafio da
democratização. In: GONÇALVES NETO, W.; CARVALHO, C.H. (Org); CARVALHO, C.H.; FARIA FILHO,
L.M. (Coord. Col.). História da Educação em Minas Gerais. (v.3, República). Uberlândia/MG: Edufu,
2019. p.353-381.
VECHIA, A.; CAVAZOTTI, M.A. A Escola Secundária. Modelos e Planos (Brasil, Séculos XIX e XX). São
Paulo: Annablume. 2003.
ISSN 2358-3959
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Este trabalho busca discutir políticas públicas para o ensino secundário na Bahia, o ensino
humanístico e sua expansão durante o período demeados dos anos de 1940 até 1961. Esta é uma das
questões que faz parte de uma pesquisa nacional, com pesquisadores de diversos estados brasileiros,
ENSINO SECUNDÁRIO NO BRASIL EM PERSPECTIVA HISTÓRICA E COMPARADA (1942-1961).
Coordenada pela professora Eurize Caldas Pessanha e Financiada pelo CNPQ. O Ensino Secundário
baiano tem seu inicio com a sua implantação no ano de 1836, após o Ato Adicional de 1834, que
autorizou que as Assembleias Provinciais pudessem legislar sobre a educação primária e secundária.
Constava de reunir as chamadas aulas maiores em um único prédio, não compondo um curso
propriamente. O objetivo inicial declarado era de preparar uma camada intermediária da população
para o trabalho na burocracia do Estado, meio a um processo de formação do Estado Brasileiro
muito conturbado do ponto de vista político, econômico e social durante o período regencial.. Em
relação ao Liceu Provincial, a legislação respondia, a princípio, uma iniciativa das elites, de acordo
com as necessidades de formação de uma camada intermediária da sociedade pronta para atender
as exigências urbanas. Apesar de seus objetivos iniciais, O Liceu Provincial Baiano tem uma
composição propedêutica, com base nas humanidades, com uma estrutura composta de 13 cadeiras:
Gramatica Filosófica, Latim, Frances, Inglês, Grego, Geografia e História (que compunham uma só
disciplina), Aritmética, Geometria e Desenho e Pintura, Musica, além de incorporar o museu de
História Natural. Estas aulas avulsas existiam tanto na Capital, como também eram distribuídas em
outras cidades como Santo Amaro, Cachoeira, Nazaré, Valença, Ilhéus, Caravelas Itaparica, Rio de
Contas, Itapicuru, Vila da Barra, Caetité, Cayru, Inhambupe, Maragogipe, Jaguaribe, vila Nova, Porto
Seguro, Jacobina. Porém, tais aulas ocorriam sem nenhuma orientação geral, seja quanto ao
conteúdo, método ou extensão e intensidade de programas. O ensino secundário segue
desorganizado até 1895, com a Lei 117 que modifica a estrutura do ensino, em uma espécie de Lei
Orgânica do ensino baiano. Por ocasião da edição da referida Lei, a instituição de ensino secundário
passou a ser chamado de Ginásio da Bahia. O período inicial republicano, caracterizado por uma
série de reformas educacionais, incluindo o ensino secundário, repercute na educação baiana e no
seu Ginásio da Bahia, que por uma reivindicação antiga, passa a ser equiparado ao Colégio Pedro II
do Rio De Janeiro, dando possibilidade para a elite baiana que lá estudava, ingressar nos cursos de
Direito e Medicina e, os egressos do Ginásio da Bahia , passaram a ter privilégios em certos ramos de
atividade, compondo uma elite importante na composição do quadro da intelectualidade baiana.
Porém, a elitização como caracterização importante do período, leva também a uma ampliação de
escolas particulares, que de maneira geral tem características, na sua maioria de escolas
confessionais. O Ginásio da Bahia continuou sendo a única instituição oficial de ensino secundário
durante os anos 1920, assim como continuará como única instituição pública de ensino secundário
por mais algum tempo. Em 1925, com a Reforma da Instrução, por ocasião da primeira passagem de
Anísio Teixeira na Secretaria da Educação baiana, apesar das mudanças promovidas no ensino
básico, o ensino secundário foi mantido na única instituição pública, no Ginásio da Bahia. Os anos
de 1930 indicam mudanças para o ensino secundário no país, repercutindo nos diversos estados,
como no Ginásio da Bahia, com a Reforma de Francisco Campos em 1931 , com o objetivo de
transformar o ensino secundário, buscando superar a característica exclusivamente propedêutica a
fim de contemplar uma função educativa, moral e intelectual do jovem. Durante o Estado Novo, com
as características autoritárias, próprias da ideologia fascista, o Secretário da Educação da Bahia,
Isaias Alves, devido a grande necessidade provocada pela demanda desta modalidade de ensino,
decide por ampliação das matrículas no ginásio da Bahia, que por falta de espaço passou a funcionar
em três turnos. São ampliadas as matrículas em vários turnos, sem, porém, pensar em aumentar o
número de estabelecimentos públicos para o ensino secundário. Desta forma o ensino secundário
público continua somente no Ginásio da Bahia em Salvador, além das nas escolas particulares. Neste
sentido, como escolas particulares temos: o curso secundário em apenas um estabelecimento nos
municípios de Jacobina, Itabuna, Senhor do Bonfim, Cachoeira, Barra, Alagoinhas, Feira de Santana,
Santo Amaro e Caetité. Os municípios de Ilhéus e Nazaré possuíam cada um deles dois
estabelecimentos de ensino secundário particulares. Após a Reforma Capanema de 1942, o único
colégio público de ensino secundário na Bahia passou a denominar-se Colégio da Bahia, ministrando
o curso em dois ciclos, conforme o determinado pela Lei Orgânica: o ginasial com duração de quatro
anos e, o segundo – curso clássico e científico, com duração de três anos cada. A legislação
determinou, ainda, que os estabelecimentos de ensino secundário fossem de dois tipos, o ginásio e
o colégio e não podiam adotar outra denominação. De tal forma que o Art. 6º da referida Lei dispunha:
“Os estabelecimentos de ensino secundário não poderão adotar outra denominação que não a de
ginásio ou de colégio”. E no artigo 7º: “Ginásio e Colégio são denominações vedadas a estabelecimentos
de ensino. não destinados a dar ensino secundário.” O ensino secundário baiano permanece
somente em um único estabelecimento em Salvador até 1947 quando é desdobrado em mais três
ginásios públicos na capital: na Liberdade, o Colégio Duque de Caxias; em Nazaré, o colégio Severino
Vieira; em Itapagipe o Ginásio João Florêncio. Este texto tem como objetivo apresentar o ensino
secundário na Bahia como característico de estudos das humanidades, discutindo suas implicações
na formação da juventude letrada baiana, da implantação do Liceu Provincial em 1836 no século
XIX até meados do século XX. Pretende-se, ainda, demonstrar o seu funcionamento em um único
estabelecimento até 1947, período em que se pode classificar como sendo mais democrático, com
governador Otávio Mangabeira eleito livremente, quando é desdobrado em outros estabelecimentos.
Registra-se que foi exatamente a partir da administração de Anísio Teixeira na Secretaria de Educação
que podemos constatar um processo de expansão do ensino secundário na Bahia. A partir dos anos
1950, mais precisamente 1953, durante o governo de Getúlio Vargas no país e sob o governo estadual
de Regis Pacheco, tem início na Bahia a atuação da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade
– CNEC. Este foi um período de grande expansão das escolas cenecistas no país. Na Bahia representou
a inclusão de escolas secundárias no interior do estado, com a pretensa argumentação de serem
gratuitas, mas que, porém terminam por representar um privilegio às escolas particulares. Por outro
lado terminam por indicar uma expansão para cidades do interior baiano que não possuíam
possibilidade de continuidade após a conclusão dos estudos primários. Além deste fato, tais escolas
tinham ampla aceitação pela comunidade local, seja da população em geral como também das
autoridades públicas. Para realização da pesquisa da qual resulta este trabalho, utilizamos das
fontes disponíveis no Arquivo Público da Bahia - APBA e Instituto Geográfico e Histórico da Bahia –
IGHBa e Biblioteca Pública da Bahia – BPBa e Arquivo Municipal de Salvador .Foram consultadas as
Mensagens de Governadores, Relatórios de Secretários da Educação , Leis , Decretos e Atos do
Governo do Estado da Bahia., além disso, materiais de dois Jornais de maior tiragem no Estado :
Jornal A Tarde e Diário de Notícias, os dois jornais de maior circulação no estado da Bahia na
época. Também consultamos dissertação de mestrado e artigos sobre a temática. O Ensino
secundário humanista e propedêutico foi proposto a partir da inspiração francesa, das reformas
daquele país que inspiraram o Brasil na criação deste ensino que levariam sua juventude para a
preparação necessária ao nível superior, definiram em seus currículos disciplinas de cunho humanista
a fim de propor aos seus alunos um saber diferenciado dos outros tipos de ensino como o comercial
e o normal.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 680
Referências
BOAVENTURA, E. M. “Anísio Teixeira e a autonomia da educação baiana”. In: Revista da Bahia.
Salvador, v.32, n.31, jul. p.70-83, 2000.
FARIAS, Gelásio de Abreu. MENEZES, Francisco da Conceição. Memória Histórica do Ensino Secundário
Official na Bahia durante o primeiro século 1837 -1937
JESUS, Andeia Reis de. Colégio Estual da Polícia Militar – Primeiros Tempos : formando brasileiros e
soldados ( 1957- 1972 ). Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação – FACED/UFBA . Salvador.
2011
LIMA, Débora Kelman de (2008). Educação pública e secundarista em Salvador: o Ginásio da Bahia,
1895-1942. In: LUZ, José Augusto; SILVA, José Carlos (Org.). História da educação na Bahia. Salvador:
Arcádia. p. 197-231
Nas últimas três décadas do século XIX cresce na província de Minas Gerais a preocupação com a
criação de escolas técnicas, do tipo de artes e ofícios, direcionadas as camadas populares. Até então,
a escola do tipo elementar, inserida em um contexto de extrema desigualdade e fragilidade nos
acessos e nas permanências, não se ocupava em ensinar ofícios mecânicos, mas sim, os
conhecimentos básicos relativos a escrever, ler e calcular. O mesmo quadro ocorria para as
instituições de ensino secundário. Elas preparavam uma pequena parte da elite que as frequentava
para o ensino superior fora do país. Logo, os colégios e liceus secundários não ofertavam ensino
técnico, visto sua finalidade e seus destinatários. Até meados do século XIX, não existia uma
sistematização, uma organização dos conhecimentos e das instituições para a formação profissional.
Ela acontecia no decorrer do próprio trabalho, nos espaços os quais aconteciam de maneira informal,
hereditária ou imposta aos órfãos. Logo, as crianças e os jovens viam e reproduziam os processos de
realização de determinado ofício, até que elas dominassem aquela habilidade. Neste sentido, as
denominadas artes úteis que referiam aos ofícios mecânicos, até aos meados do século XIX, não
figuravam entre os objetivos das escolas. Cabe destacar que ações pontuais ocorreram em outras
províncias sobre o ensino profissional, como por exemplo, as criações das Casas de Educandos
Artífices, que entre 1840 e 1856, foram instaladas em dez localidades. Fonseca (1962) aponta que
desde o início do século XIX, com a subida de D. João VI ao poder, em função das demandas do
exército, as escolas com ofícios específicos foram planejadas para algumas províncias. O mesmo
autor salienta que uma escola destinada aos indígenas, a partir do Decreto Imperial de 1832, também
ofertaria um ensino técnico. Entretanto, nenhuma das duas últimas ações foram de fato instaladas.
Nas últimas décadas do século XIX, as famílias dos mestres e donas das oficinas passaram a coexistir
com uma instrução mais sistematizada e oficial desses saberes. Assim, começaram as primeiras
ações direcionadas ao ensino industrial e manufatureiro. Iglésias (1958) retrata que o modelo de
escola agrícola não foi bem sucedido em Minas, sendo o Instituto Agronômico de Itabira, que
funcionou por 18 anos, uma exceção dessa lógica. De toda forma, as ações em prol do ensino
industrial foram irregulares, entretanto marcaram o início das escolas das classes técnicas destinadas
as camadas populares e pensadas pelos dirigentes. Nos anos 1870 e 1880, o Instituto de Menores
Artífices e o Liceu de Artes e Ofícios, ambos instalados em 1880, provenientes de leis anteriores,
foram instalados em Montes Claros e em Serro, respectivamente. Em 1886, outra iniciativa foi o Liceu
de Artes e Ofícios de Ouro Preto. Cabe ressaltar que a partir da Lei número 3.608 de 1880, um possível
Liceu de Artes e Ofícios de Minas Gerais, pode ter funcionado, fruto de uma iniciativa privada, na
cidade de São João del-Rei. Tal ação é entendida como particular, uma vez que não se encontra
normativas e registros nos fundos e documentos oficiais. Nesta direção, com uma pesquisa do tipo
documental, que tem em seu corpus textos legais e jurídicos, os relatórios e as correspondências dos
presidentes da província mineira, localizadas nos seções do Arquivo Público Mineiro (APM). Essas
fontes, em suas natureza e opção de escolha, correspondem de forma coesa o anseio de responder
acerca das representações e imaginários que as elites políticas e mandatárias tinham sobre a escola,
os sujeitos, o ensino técnico, a organização dos espaços e o papel do Estado naquela sociedade. Até
a primeira metade do século XIX, em termos de instrução, o governo da província mineira se
preocupou mais com a distribuição das escolas primárias, em função do foco dado aos professores,
suas formações e suas práticas. Esses aspectos, bem como os materiais, os processos de ensino e de
O presente artigo mostra como a Prefeitura Municipal de Curitiba organizou o seu atendimento
para bebês de 0 a 3 anos em creches públicas curitibanas entre 1977 e 2003. As fontes utilizadas para
esse estudo foram: legislação, planos e relatórios de governos; cadernos elaborados pelas instâncias
administrativas da Prefeitura, apostilas elaboradas pelos técnicos das diferentes instâncias da
administração pública, entrevistas e fotografias. Ainda houve o uso de notícias de jornais publicadas
no período de estudo. O presente artigo abarca o período entre 1977 e 2003. Os objetivos desse artigo
são apresentar a história das políticas educacionais direcionadas à crianças pequenas na cidade de
Curitiba. Identificar as propostas para o atendimento de bebês de 0 a 3 anos em instituições públicas -
as creches. Neste artigo revela-se o modelo de atendimento realizado nas creches curitibanas, assim
como os sujeitos sociais envolvidos nesse processo.A rede de creches curitibanas foi inaugurada em
1977 e estava vinculada à esfera da Assistência Social na Prefeitura Municipal de Curitiba, e somente
no ano de 2003 passou a figurar na Secretaria Municipal da Educação. As creches em Curitiba
organizaram o atendimento às crianças por faixa etária: 0 a 3 anos – Berçário e Maternal, 3 a 5 anos
– Maternal II e Jardim I e 5 anos e 6 meses a 6 anos e 11 meses – Jardim II. Esse atendimento mesmo
estando sob a guarda da assistência social , guardava proposições e orientações pedagógicas para
uma ação educativa na creche. A análise metodológica do tema mobilizou a investigação não
exclusivamente no âmbito da história da atuação político-administrativa frente ao setor de creches
(como se fosse uma relação unidimensional de implementação da política à prática educativa), mas
se pôs como tarefa examinar como se constituiu o atendimento nas creches públicas do município
de Curitiba, no período delineado, com o propósito de analisar o lugar, no sentido certeauniano, que
a atuação, as propostas, os sujeitos, as instituições assumiram na configuração histórica das creches
em Curitiba: suas representações e suas práticas.Considerando essa perspectiva de lugar, podemos
afirmar que a creche nasceu para o atendimento de crianças carentes em núcleos de favela, assim
como para suas famílias que viviam em situação de pobreza e em moradias comprometidas. A
intenção da Prefeitura era de que a família pudesse dar continuidade ao trabalho realizado nas
creches para que houvesse a melhoria da condição das famílias também. Toda a construção, a
elaboração e a proposição das atividades nas creches era realizado por uma equipe multidisciplinar:
pedagogos, psicólogos, nutricionistas, assistentes sociais, fonoaudiólogos e professores. Esses
profissionais realizavam acompanhamento periódico dos profissionais que atuavam diretamente
com as crianças nas creches públicas - as babás. Para a faixa etária entre 0 a 3 anos, a Prefeitura
Municipal de Curitiba organizou o trabalho ao longo do período estudado (1977 e 2003) com três
possibilidades principais de atividades: estimulação essencial, massagem e literatura. As equipes
multidisciplinares (pedagogos, psicólogos, nutricionistas, fonoaudiólogos e assistentes sociais) das
instâncias administrativas que planejavam esse atendimento, organizaram propostas de trabalhos
pedagógicos a serem realizados nas creches públicas da cidade e ensinavam aos profissionais das
creches para que esses executassem com as crianças. Entre os anos de 1977 e 2003, várias atividades
foram planejadas, muito focadas em princípios da psicologia, da medicina e enfermagem. Essa
opção teórica era recorrente no plano nacional: outros estados e municípios também pautaram sua
ação com os bebês nessas áreas. Em Curitiba, que oferecia o atendimento para bebês a partir de
quatro meses de idade, por onze horas diárias, as propostas indicadas eram para além dos cuidados
com higiene, sono e alimentação, primando por uma concepção desenvolvimentista dos bebês.
No caso curitibano a busca por autores da área da psicologia e medicina, indicavam a estimulação
essencial, a psicomotricidade e a massagem para que essas figurassem como constituintes de uma
história da educação infantil realizada em creches públicas por profissionais leigos, que recebiam
formação ao mesmo tempo em que atendiam as crianças. A equipe multidisciplinar realizava
formação em serviço aos profissionais e os mesmos organizavam a rotina dos bebês a partir das
orientações recebidas.Esses profissionais que eram contratados ou concursados para atuarem nas
creches, realizavam cursos oferecidos pela PMC, com o intuito de aprimorar sua ação nas Unidades.
Importante destacar que nesse período as creches não estavam vinculadas administrativamente a
Secretaria da Educação, no entanto, ainda assim apresentavam propostas educativas. Evidente que
essas propostas foram marcadas pelo momento histórico no qual foram organizadas, mas embora
apresentassem vínculos com as questões da assistência, apresentavam cunho educativo.Nesse
sentido percebe-se que havia uma sintonia entre as orientações que eram dadas nacionalmente
e as opções que a administração municipal fazia para organizar o atendimento às crianças de 0 a
6 anos, o que reforça a ideia de circulação e apropriação de ideias acerca do atendimento infantil.
Assim, os conceitos de representação e apropriação (Chartier, 1991), compõem o repertório para a
compreensão de como houve a apropriação destas leituras na rede de creches de Curitiba e também
compreender as ações dos sujeitos envolvidos neste processo.
Os documentos orientadores de uma proposta pedagógica para as creches de Curitiba foram
sendo aprimorados, tanto do ponto de vista do conteúdo, quando da forma e das parcerias para
a produção dos mesmos. O atendimento oferecido na creche que pretendia a educação de toda a
família baseava-se numa avaliação de que as famílias não teriam condições adequadas de educar
aquelas crianças. Dessa maneira, a criança estando na creche, poderia ser uma extensão da proposta
educativa em sua família. Dessa maneira a função da creche iria para além dos muros da instituição
e pretendia atingir a todos os componentes da família numa perspectiva de compensação de
carências, estabelecendo que tanto as crianças quanto as mulheres e os pobres seriam sujeitos
incompletos e tuteláveis no que diz respeito à higiene, alimentação e ao aspecto sociocultural.
Esta perspectiva da creche com a função social de educar famílias, crianças e comunidade
circulava numa esfera nacional. A partir da pesquisa realizada foi possível concluir que houve nesse
período estudado a presença de um trabalho educativo planejado para o atendimento aos bebês
em creches curitibanas. Constata-se que houve proposta intencional para o atendimento, mesmo as
creches não fazendo parte da Secretaria da Educação. As propostas são marcadas pelos momentos
históricos nacionais e apresentam o mesmo repertório teórico dado pelos documentos nacionais
acerca do atendimento institucional de bebês e para, além disso, traz possibilidades diferenciadas
no atendimento como por exemplo, as ações de massagem. Evidente que não se pode afirmar que
todas essas ações ocorriam em todas as salas de berçário, mas pode-se afirmar que havia propostas
e elas foram registradas, inclusive por meio de fotografias, o que revela que essas informações
circulavam nas Creches e eram amplamente divulgadas. Os profissionais organizavam rotinas fixas,
nas quais ao longo do dia, propunham diferentes momentos para os bebês: para além das questões
de cuidado, higiene e alimentação, havia propostas de massagem, estimulação e literatura. Dessa
maneira, se pode afirmar que ainda que as creches estivessem vinculadas à assistência social,
apresentavam projeto educativo para o atendimento às crianças, assim como a prefeitura realizava
formação em serviço dos profissionais que atuavam nas creches.
Referências
CERISARA, A. B. O referencial curricular nacional para a educação infantil no contexto das reformas.
Educação e Sociedade. vol. 23, nº 80 p. 326-345. 2002.
CERTEAU, M. de. A invenção do cotidiano. Vol. 1. 20ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013b.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 685
CHARTIER, R. O mundo como representação. Estudos Avançados, n. 11(5), São Paulo, jan./abr. 1991,
p. 173-191.
Dilce Schueroff
Vera Lucia Gaspar Da Silva
Palavras chaves:
O objetivo desse trabalho é analisar dispositivos criados pela lei da obrigatoriedade, os quais
foram importantes para a consolidação do modelo escolar implementado em Santa Catarina no
século XIX. Compreender o modo como a escolarização foi sendo implementada desde o Oitocentos
é importante porque nos fornece pistas para entender a constituição do nosso atual sistema de
ensino.
Com o intuito de compreender a gênese da consolidação do modelo escolar através da escola
obrigatória, na província de Santa Catarina, lugar de análise nesse trabalho, são utilizadas as
seguintes fontes: legislação educacional, censo escolar, ofícios expedidos pela Diretoria da Instrução
Pública, relatórios da Diretoria da Instrução Pública e Relatórios de Presidente de Província.
Dentre as fontes utilizadas para a análise, destacam-se aquelas que aprovaram em Santa Catarina
a escola obrigatória: a Lei n. 699 do ano de 1874 (SANTA CATHARINA, Lei n. 699, 1874) e o Regulamento
para execução da Lei nº 1.144 de 1886 e da Lei nº 1.187 de 1887 (SANTA CATHARINA, 1888). Na lei que
aprovou a escolarização obrigatória (Lei n. 699 do ano de 1874), foram prescritos a faixa etária para
meninos e meninas; a responsabilidade aos pais, tutores ou preceptores; punições àqueles que não
cumprissem a lei; e um mecanismo de fiscalização para garantir o cumprimento das prescrições
legislativas. Outro documento importante que ajuda na compreensão das ações criadas pelo estado
para promover a expansão da escolarização é o Regulamento para execução da Lei nº 1.144 de 1886
e da Lei nº 1.187 de 1887 (SANTA CATHARINA, 1888). Este regulamento foi organizado em cinco
capítulos: o primeiro trata da obrigação do ensino, o segundo do recenseamento escolar, o terceiro
do processo de penas e dos recursos, o quarto dos auxílios escolares e o quinto das disposições
gerais. A análise desses documentos é importante porque as ideias neles apresentadas foram
reproduzidas e apropriadas em legislações posteriores.
A obrigatoriedade escolar em Santa Catarina é citada em diferentes produções, ainda que poucos
estudos a tenham tomado como objeto. Vera Lucia Gaspar da Silva e Ione Ribeiro Valle (2013)
produziram um dos poucos estudos sócio-históricos dedicados ao tema tecendo reflexões sobre a
obrigatoriedade escolar utilizando como fonte principal a legislação do ensino. Todavia ainda há
aspectos a explorar no que tange ao debate por conta da “diversidade que congrega e contrasta” e
pela “constatação que o conceito da obrigatoriedade escolar é móvel, constantemente atualizado e
ressignificado socialmente” (VIDAL; SÁ; GASPAR da SILVA; p. 10, 2013). Com base nestes indicativos,
no presente trabalho, além da legislação são utilizadas fontes que oferecem pistas sobre os usos dos
dispositivos legislativos, buscando-se perceber se na prática corroboram ou não com o prescrito da
lei. Considera-se aqui que o cruzamento de fontes oferece dados que permitem construir um quadro
que observa um conjunto mais ampliado de aspectos.
Outra fonte central nesse trabalho é o recenseamento escolar. No decorrer do século XIX a
estatística se tornou uma ferramenta necessária para governar. O pesquisador português António
Candeias (2005) diz que a arquitetura, a implementação e a estabilização da escola fazem parte de
um tempo longo de transformações que viu a consolidação de uma “ciência do Governo”, que é a
estatística; sem ela, não seriam possíveis formas modernas de gestão. Essa “ciência de Governo”
se consolida, segundo Foucault (2008), a partir do século XIX, período que marca as mudanças na
maneira de governar e no qual a estatística tornou-se um saber extremamente necessário para os
Estados.
Ao longo do século XIX a estatística escolar era produzida por meio de mapas de matrícula e
frequência, porém, no ano de 1888 entrou em cena outra forma de produzi-la: o censo escolar. O
censo tinha por objetivo identificar as crianças em idade escolar, e a partir desse reconhecimento,
organizar ações necessárias para garantir que estas recebessem instrução, fosse na escola pública,
na particular ou em casa. Assim inserido na máquina estatal, o censo escolar servia como apoio no
cumprimento dos dispositivos relacionados a obrigatoriedade do ensino, ou seja, um instrumento
para auxiliar no governo da escolarização da infância, inclusive com previsão de auxílio às crianças
pobres.
Na perspectiva de análise aqui adotada, os dispositivos legislativos são lidos como estratégias
para implementar a escolarização à população infantil. O conceito de estratégia é trazido de Michel
de Certeau que a concebe como “o cálculo (ou manipulação) das relações de forças que se torna
possível a partir do momento em que o sujeito de querer e poder (uma empresa, um exército, uma
cidade, uma instituição científica) pode ser isolado” (CERTEAU, 2007, p. 99). A estratégia é uma
ordem imposta pelo mais forte para controlar os espaços, se traduz em poder de controle; quanto
mais forte o poder, menor a mobilização dos sujeitos para produzir táticas que burlam as forças
de controle (CERTEAU, 2007). Portanto, neste trabalho, os dispositivos legislativos são lidos como
poder de controle, entendendo que quanto mais fortes e organizadas fossem as formas de controle,
mais eficácia teriam, ou seja, maior seria o número de crianças instruídas. As formas de controle
são representadas pela organização do serviço de inspeção, a aplicação de multa aos pais que não
oferecessem instrução a criança, o censo escolar, e o auxílio escolar às crianças reconhecidamente
pobres.
A pesquisa nos documentos consultados mostrou três questões consideradas relevantes, as
quais ajudaram a consolidar um modelo de escola que se generalizou pela obrigatoriedade: 1-quais
crianças eram obrigadas a receber instrução e quais não eram; 2- qual era o papel da família e qual
era o papel do Estado em relação a oferta da instrução às crianças; 3- qual a importância que o
Estado atribuía à estatística escolar no século XIX.
Em relação ao primeiro item, a lei da obrigatoriedade determinava que as crianças que moravam
nas cidades e nas vilas eram obrigadas a receber instrução. Contudo, os meninos que residiam
a até dois quilômetros, e as meninas até um quilômetro de distância da cidade ou vila não eram
enquadrados neste contingente. Além das crianças que moravam a certa distância das vilas e
cidades, também não eram obrigadas a frequentar a escola aquelas que tivessem impossibilidade
física ou mental. No caso destas últimas, a exclusão do sistema regular de ensino permaneceu até o
ano de 2008 quando foi criada pelo Ministério da Educação a Política Nacional de Educação Especial
na Perspectiva da Educação Inclusiva. Esta iniciativa visou construir políticas públicas promotoras
de uma educação de qualidade para todos os alunos, dentre elas, destaca-se a inclusão de crianças
com deficiência no sistema regular de ensino.
Outra questão que ficou evidente nos documentos está relacionada ao dever da família a ao
dever do Estado. O Estado exercia o papel de regulador, gerenciando a obrigatoriedade com a
criação de formas de controle - inspeção, estatística, punições, multas – que responsabilizavam os
pais, tutores ou preceptores pela instrução das crianças. Por longo tempo “[...] ao direito de educar
por parte do Estado correspondeu a obrigatoriedade escolar como imposição ao indivíduo. Só muito
recentemente, ao direito à educação, por parte do indivíduo, correspondeu a obrigatoriedade de
oferecer educação, por parte do Estado” (BAIA HORTA, 1983, p. 2 apud GASPAR da SILVA; VALLE,
2013, p. 303). Se por um lado o Estado criou dispositivos de controle e impôs a obrigatoriedade, por
outro, apesar do intento para oferecer auxílios escolares aos alunos pobres, faltavam escolas, e as
que existiam, de acordo com os documentos consultados, funcionavam em condições precárias:
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 688
ambientes que não atendiam aos preceitos higiênicos e faltavam materiais necessários para o ensino
da leitura e escrita.
Em relação ao terceiro item, dedicado a discussão sobre a importância que o Estado atribuía à
estatística escolar no século XIX, as fontes consultadas indicam que era uma ferramenta importante
porque fornecia elementos para a composição de um quadro mais preciso sobre da Instrução
Primária e servia de base para o cumprimento da lei da obrigatoriedade. No contexto histórico se
observa, durante o período monárquico, certa evolução no controle sobre a produção de estatística:
maior fiscalização da produção de mapas e criação do censo escolar em 1888. O censo escolar criado
no período monárquico foi extinto no oitavo ano da república (1897), sob a alegação de pouca
eficácia e falta de recursos para realizá-lo. A partir do oitavo ano da república até meados de 1915, a
produção de estatística escolar é bastante escassa.
Considerando o período aqui estudado, qual seja, os anos finais do século XIX, as análises até
aqui empreendidas indicam que as estratégias adotadas pelo estado para escolarizar a população
em idade escolar tiveram pouca eficácia. Contudo, tais estratégias foram fundamentais para a
consolidação da escolarização que, apenas muito recentemente culminou como direito subjetivo e
dever do Estado e da família, inclusive aos que apresentam alguma deficiência física ou intelectual.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A formação do professor leigo foi alvo de diferentes ações desenvolvidas no intuito de suprir a
escola primária, especialmente a escola rural, de pessoal docente com formação específica para o
exercício da docência. Podemos remeter a gênese do interesse em uma formação específica para o
exercício da docência a criação da Escola Normal em 1864. No entanto, nos restringiremos no presente
trabalho ao período compreendido entre os anos de 1950, quando os exames de suficiência são
estabelecidos, até a década de 1970, destacando-se nessa o pedagógico parcelado. Assim, objetivamos
compreender as ações desenvolvidas visando a formação do professor leigo procurando perceber
seus intuitos formativos, seus efeitos na composição do corpo docente e relacionando-o com a
expansão da rede escolar primária e a profissão docente. Para tanto foram utilizadas dados estatísticos
do IBGE; Diário Oficial do Estado, fontes hemerográficas, livros sobre cidades do Piauí, mensagens
governamentais, legislação dentre outras. Utilizamos o cruzamento das fontes, objetivando melhor
compreender a temática analisada. Trabalhamos com os conceitos de profissão docente e sua
história como pensado por Nóvoa (1991) e de configuração, como formulado por Norbert Elias (1991).
Além desses autores, utilizamos Rodrigues (1985) e Santana (2011), dentre outros. Por professor leigo
entende-se aqueles que exercem a profissão docente sem possuir a habilitação legal para o exercício
da docência, embora, como afirma Tesser (1993) seja impróprio o uso do termo leigo aplicado a um
docente que tem anos de atuação na profissão e, portanto, não vive um alheamento em relação a ela.
A experiência constituindo-se em um elemento do processo do fazer-se professor desse docente.
Assim seria mais adequado falar-se em professores não titulados para nomear esses sujeitos presentes
na docência e na escolas. É procurando analisar as ações que visaram a escolarização desse docente
que o presente trabalho se desenvolve. A década de 1950 foi um período em que se fez presente no
Piauí ações, em sintonia com a perspectiva desenvolvimentista do período, ações em diferentes áreas
de atuação do estado (estradas, escolas, energia, dentre outras) (MEDEIROS, 1996). Nesse período há
uma alteração no processo de urbanização do Piauí e o estado passou a inserir-se nacionalmente de
modo diverso da forma como ocorria sua inserção anteriormente. Essa urbanização gerou uma maior
procura por escolarização, embora, segundo Bandeira (1983) não houvesse altera o sistema produtivo
do estado. O caminhão e o rádio aparecem como símbolos, como afirma Castelo Branco (1970), das
transformações por que passava o estado. Façanha (1998) destaca como relevantes a rede de estradas
de rodagem e a melhoria nas comunicações e a Barragem da Boa Esperança, dentre outros aspectos.
Contudo, para Nunes e Abreu (1995) essas ações não produziram o efeito esperado. Nesse período
houve um acréscimo no número de municípios existentes no Piauí que passou de 86 à 114. Desenhava-
se no período um quadro educacional caracterizado como vivendo uma crise, marcada por falta de
fiscalização e assistência as escolas, atraso no salário dos docentes, falta de material e mobiliário
escolar (PIAUÌ, 1952). Em 1954 era criada a secretaria de estado de educação e saúde, dando uma
nova organização a estrutura educacional do estado. Viagens de formação era utilizadas no processo
de transformação da escola e de busca por inovação, tendo professores do Piauí realizados cursos no
Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife e diversas outras localidades do Brasil. O estado procurava
incorporar a ação das escolas ideias educacionais através da realização de cursos no período de
férias, com concessão de bolsas para a frequência aos mesmos. A construção de prédios escolares
para escolas rurais, resultado de convênios estabelecido pelo governo do estado, na década de 1940,
com o Ministério da Educação e Saúde colocava-se como uma ação de transformação da escola no
meio rural. No convênio de 1949 estava previsto a construção de sessenta prédios escolares rurais
(PIAUÍ, 1950). Contudo, mesmo considerando esses desejos de mudança, percebe-se uma
continuidade no que diz respeito ás modalidade de escolas oferecidas. Na década de 1950 havia o
predomínio das escolas isoladas como modalidade de escola na oferta escolar, em 1951 o Piauí
mantinha 891 escolas isoladas (PIAUÌ, 1952). O perfil docente indicava o predomínio de professores
leigos. Dados apresentados na mensagem governamental de 1952 apontavam a existência de 656
professores diplomados e de 994 professores leigos, sendo esse número coincidente com a atuação
no espaço urbano e rural (PIAUÍ, 1952). Assim, no professorado estadual havia a predominância de
leigos em sua composição, situados estes na zona rural. Em 1960, o governador Francisco das Chagas
Caldas Rodrigues, em sua mensagem à Assembleia Legislativa, apontava a dificuldade de prover as
escolas rurais com os regentes de ensino, ou seja, professores com nível ginasial, sendo necessário
contratar os professores de letras, que eram professores leigos. A solução pensada para a seleção
desses docentes foi a aplicação de uma prova de habilitação, não sendo possível a utilização da
formação específica como critério (PIAUÍ,1960). Em 1959 haviam 762 professores normalistas e 1361
não normalistas atuando nas escolas primárias mantidas pelo estado, municípios e particulares no
Piauí. Destes a maior concentração encontrava-se nas escolas mantidas pelos municípios (PIAUÌ,
1960). Em 1967, era explicitada na mensagem governamental o interesse em limitar a presença do
professor leigo nas escolas, sendo enfatizada a não contratação de professores com esse perfil e a
presença dos professores leigos existentes em curso de formação. Essa decisão estava calcada na
ideia de que um ponto vulnerável da ação educativa estava na dificuldade de contratação de pessoal
docente qualificado para o exercício da função. Em 1966 havia 1466 professores normalistas e 2840
professoras leigas (PIAUÍ, 1967). A realização de treinamentos e cursos de formação de emergência
foram as saídas apresentadas para a constituição de um corpo docente com formação para o exercício
da docência. Nos anos de 1950 já podia-se perceber uma crescente crítica em relação ao valor dos
salários pagos aos docentes, destacando-se a exiguidade dos mesmos em relação aos preços dos
produtos. Isso tornava a carreira pouco atrativa. Os professores leigos permanecem incorporados aos
quadros da docência oficial pela previsão de sua presença na organização do quadro docente. Desse
modo, pela classificação dos docentes presentes na legislação percebe-se a incorporação do docente
leigo no quadro oficial. Em 1960 os docentes eram agrupados nas seguintes categorias: professores
primários (diplomados pela escola normal de grau colegial), regentes de ensino (portador de
certificado de curso normal regional ou curso ginasial), professores de letras (não diplomados),
professores auxiliares portador de certificado de curso de emergência). Além desses, havia os
zeladores, inspetores de alunos, auxiliares de disciplina e professores de educação física. Como
podemos perceber, os docentes leigos encontravam um lugar na classificação dos docentes do
estado, sendo incorporados ao aparato educacional. Contudo, a inadequação da formação ou falta
dela continuavam sendo apontadas nos discursos oficiais como empecilhos para a inovação
educacional do estado. Em 1968, o governador Helvidio Nunes de Barros, anunciava em sua mensagem
à assembleia legislativa a participação de 139 professores leigos em curso de treinamento (PIAUÌ,
1968), indicando ser essa política adotada nesse momento pelo estado para a formação desse
docente. Assim, em 1968, no centro de treinamento de Campo Maior, foi realizado curso de
treinamento para professores leigos, em regime de internato, tendo participado dele 319 docentes de
67 municípios. Foi realizado, dentro dessa política de treinamento, em convênio com algumas
prefeituras cursos para professores municipais, em sua maioria leigos (PIAUÌ, 1969). Em 1971, a ênfase
era dada ao treinamento do professor leigo rural, considerando as transformações realizadas na
organização da escola. Assim diferentes ações foram sendo efetivadas ao longo do período. Segundo
Gondim(1982) o Programa de aperfeiçoamento do magistério primário (PAMP) foi realizado no Piauí,
no que diz respeito a formação do professor que tinha o curso primário incompleto, em quatro etapas,
sendo executado no período de 1965 a 1970; o pedagógico parcelado foi implantado em 1972 e o
Logos I, implantado em 1973, e o Logos II, em 1976. No que pese essas ações, no final do período
analisado ainda vamos encontrar professores leigos atuando nas escolas de primeiro grau,
especialmente as rurais, sendo responsáveis pela oferta de escolas a população piauiense.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Atualmente o movimento migratório se constitui como uma grande problemática social, isto
porque mesmo não sendo recente a cultura de deslocamento no mundo as contradições que
permeiam o trânsito de pessoas trazem à tona não somente questões econômicas, ambientais e
políticas, mas sobretudo éticas, uma vez que carrega em seu bojo o racismo e a xenofobia. Dos
desdobramentos das políticas adotadas, seja nacional ou internacional, é observável a normalidade
com que alguns estados destitui os migrantes de sua moralidade, mantendo-os intencionalmente
em situação de vulnerabilidade e atendidos com escassas políticas públicas com resquícios de
direitos humanos (PATARRA, 2006). Neste quadro, menos ainda pode-se dizer das políticas educativas
que contemple as especificidades de grupos não hegemônicos, mesmo sendo estes mesmo
receptores de políticas racistas e xenofóbicas. Num contexto de estado de liquidez do mundo, das
relações, da segurança e imersos em uma cultura de consumo, as sociedades exigem novos contornos
e projetos de futuro. Para alguns intelectuais, estamos vivendo num tempo líquido que, contrário a
uma modernidade sólida, antigas estruturas de Estado tornam-se e solúveis e insuficientes, e estão
deixando aos poucos de existirem. Nesta perspectiva, tanto a política como o poder não adquirem
as mesmas características e funcionalidades que fundamentaram no passado. Separados neste
tempo ou época fluída e líquida, o poder adquiriu proporções globais e sua atuação descontrolada
das ações políticas torna-se ineficaz (BAUMAN, 2007). .Deste descontrole político e, consequente
emancipação dos poderes, um clima de desconfiança e incerteza se tornou preeminente e
amplamente presente. Nas relações humanas, as mudanças tornaram-se percebíveis pela fragilidade
e inconstâncias com que se apresentam na sociedade o individualismo e a competitividade, regadas
de habilidades e competências promissoras, resultando na fragmentação de social, apartando a
coletividade das suas histórias pessoas (BAUMAN, 2007). Em meio a este quadro de incerteza,
descontrole e principalmente insegurança, tonar-se oportuno pensar quais táticas deverão ser
utilizadas a fim que se possa sobreviver ao mundo de liquidez? Neste contexto, este ensaio se propõe
a refletir sobre políticas educativas e públicas para migrantes alicerçadas na historiografia
brasileira. Tal reflexão é oriunda de uma pesquisa de doutorado em andamento, “Centro de Pastoral
para migrantes - CPM: num mundo em crise entre Justiça Climática e Colapso Climático”, cujo tema
migração se justifica pelo entendimento de que esta abordagem é relevante no âmbito do debate
sobre políticas públicas que possam atender de modo eficiente e digno aos migrantes residentes em
Cuiabá, Mato Grosso. Das questões adjacentes desta pesquisa, pensamos nas políticas educativas
para os migrantes climáticos, por nós entendido como pessoas que migram em decorrência de
desastres ambientais climáticos. Nos dias atuais, pesquisadores de diversas áreas do conhecimento
tem apresentado o imenso desafio posto aos seres vivos em razão da queima global e do colapso
climático. Já sabemos que as alterações climáticas decorrem também de ações antrópicas (NOBRE,
2010) e, neste sentido, optamos por responsabilizar os protagonistas dos desastres ambientais,
fazendo uso do conceito de colapso climático com propósito de marcar a responsabilização de seus
efeitos na sobrevivência da vida em todo o planeta aos agentes causadores do caos vigente. Estudos
seu Ethos, sua natureza alicerçada na sustentabilidade planetária. Esperamos que a reflexão exposta
neste trabalho consista em esforços que antevejam possibilidades em favor da promoção de políticas
educativas e públicas que não somente contribuam para o fortalecimento das redes de solidariedade
que atuam junto a estes grupos que se encontram em situação de vulnerabilidade, mas que
advenham novas formas e perspectivas educacionais coerentes com a realidade social do
Brasil. Diante do quadro apresentado e sendo ainda incipientes os debates acerca da complexidade
do fenômeno migratório, pensamos que a promoção de direitos humanos e políticas educativa e
públicas, via legislação especifica para migrantes, devem afigurar-se como pauta de discussão nos
centros deliberativos.
Referências
BACHELARD. Gaston. A psicanálise do fogo. 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
NOBRE, Carlos A; SAMPAIO Gilvan; SALAZAR, Luis. Mudanças Climáticas e Amazônia. In: Cienc. Cult.
vol.59 no.3 São Paulo July/Sept. 2007. Disponível em: Salazar://cienciaecultura.bvs.br/pdf/cic/
v59n3/a12v59n3.pdf. Acesso em: 26/04/2018.
PACÍFICO, Andrea Pacheco; GAUDÊNCIO, Marina Ribeiro Barboza. A proteção dos deslocados
ambientais no regime internacional dos refugiados. REMHU - Rev. Interdiscip. Mobil. Hum .,
Brasília, Ano XXII, n. 43, p. 133-148, jul./dez. 2014. Disponível em: file:///C:/Users/rober/Desktop/
DOUTORADO/artigos+migração/PACIFICO+E+GAUDENCIO.pdf. Acesso: 29/03/2019.
PATARRA, Neide Lopes. Migrações internacionais de e para o Brasil contemporâneo: volumes, fluxos,
significados e políticas. In: São Paulo Perspec.vol.19 no.3.São Paulo July/Sept. 2005. Disponível
em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-88392005000300002. Acesso:
14/02/2019.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Esta pesquisa tem como temática as Políticas Públicas para Crianças com Deficiências no período
de 1927 à 1946 e como objetivo principal identificar as instituições educativas criadas para a
educação da infância com deficiência no estado de Mato Grosso, trazendo o contexto das políticas
públicas no período da Era Vagas. Neste sentido, foi possível conhecer a forma como essas crianças
receberam uma educação que não era a escolar. Alguns anos depois, após a regulamentação de
1946 passou-se a pensar numa educação voltada para pessoas com deficiência e em atividades que
proporcionassem uma educação para as mesmas dentro de um ambiente educacional. Também foi
relevante compreender a história da educação de crianças com deficiência e a importância de
registrar quais as instituições que foram criadas para acolher as mesmas no estado do Mato Grosso,
bem como as regulamentações e políticas públicas que eram voltadas para elas durante o período
de 1927 a 1946 no estado. Considero isto relevante haja vista que, ao se pensar nas políticas existentes
hoje, foi preciso percorrer marcos na história sobre educação para deficientes, desde os governos do
Brasil Império aos dias atuais para que se avançasse em leis que pudessem contribuir para
escolarização das crianças com deficiências. Por mais que não seja o ideal, mas acredita-se na
compreensão de que a partir de tais fatos é que foi possível o surgimento das primeiras políticas
públicas para a infância com deficiência. Diante disso, utilizou-se como forma metodológica a
Operação Historiográfica, de Michel de Certeau (1999) por considerar que as práticas científicas
estão interligadas à escrita, na operação histórica, tendo como referência também a combinação de
um lugar social, observando as particularidades desse lugar de fala. Portanto, está ligado a lugares
sociais, cultura e particularidades. Segundo o autor “a história é a arte de encenação que compreende
a relação entre o lugar do discurso, os procedimentos de análise e a construção de um texto. Portanto,
a combinação de um lugar social, de práticas científicas e de uma escrita” (CERTEAU, 1999 p.65).
Também se utilizou a metodologia de Roger Chartier (1990), no que diz respeito de que a leitura e os
gestos para a compreensão das variantes da história, daquilo que se ficou como marco histórico, ou
seja, o sujeito precisa apropriar-se daquilo que está lendo, fazer uso do que está escrito, sendo fiel a
tal texto, não se sobrepondo ao que está presente nos fatores que existem na prática de determinada
leitura. A apropriação baseada nos conceitos onde se percebeu sua preocupação com a construção
de um texto bem embasado e estruturado, bem como a importância de sentir o que o texto
verdadeiramente quer transmitir ao leitor. Para este autor “Contar títulos e edições, no entanto, não
basta: é preciso também detectar os gestos que eles recomendam ou estigmatizam.” (CHARTIER,
2003, p. 172). A pesquisa foi inserida na abordagem qualitativa com a intenção de conhecer e analisar
quais foram as instituições privadas e as políticas públicas educacionais para a infância das crianças
com deficiências. Segundo Minayo (2007, p. 21), a pesquisa qualitativa nas ciências sociais se ocupa
da “dimensão da realidade que não pode ser quantificada”. Este trabalho está embasado ainda na
vertente da História Cultural e cujas fontes foram localizadas, levantadas, recuperadas, selecionadas
e organizadas para posterior análise, sendo elas: jornais, leis, decretos, mensagens, relatórios de
interventores – encontradas nas Secretarias de Estado de Educação do Mato Grosso e no Arquivo
Público, em Cuiabá/MT, bem como no banco de dados do IBGE. Para os resultados foi possível
evidenciar que as instituições educativas e as políticas públicas criadas para atendimento da infância
com deficiência, bem como visibilizou a importância das atividades que foram desenvolvidas para
acolhimento educativo dessas crianças com deficiências no Mato Grosso. Foi muito importante
pensar sobre a História da Educação e neste caso a educação para crianças com deficiência, como se
deu tais movimentos naquele período, bem como foram desmistificados vários termos usados para
classificar as pessoas com alguma deficiência física ou intelectual e quais políticas públicas voltadas
para este público. Percebeu-se a necessidade ao fazer a análise, numa perspectiva histórico-cultural
no sentido de que se conheceu e desta forma, foi possível dar visibilidade de como essas crianças
viveram e sobreviveram diante de uma precarização do sistema público de saúde e educação no
estado no Mato Grosso. Os lugares que essas crianças com deficiência viviam não as favoreciam para
se desenvolverem intelectualmente e educacionalmente, as instituições serviram apenas como
escape para a resolução momentânea de um problema social de educação no Mato Grosso e no
Brasil, mas que de fato não conseguiu efetivamente resolver o problema de escolarização da infância
com deficiência. Conhece-se um pouco de como era a trajetórias das instituições públicas voltadas
para a educação da infância com deficiência e como a sociedade abordava as políticas públicas em
um cenário político ditatorial. No Brasil, o atendimento às pessoas com deficiência teve início na
época do Império, com a criação de duas instituições: o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em
1854, atual Instituto Benjamin Constant – IBC, e o Instituto dos Surdos Mudo, em 1857, hoje
denominado Instituto Nacional da Educação dos Surdos – INES, ambos localizados no estado do Rio
de Janeiro. No início do século XX foi fundado o Instituto Pestalozzi (1926), instituição especializada
no atendimento às pessoas com deficiência mental e em 1954, é fundada a primeira Associação de
Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE, e em 1945, é criado o primeiro atendimento educacional
especializado às pessoas com superdotação na Sociedade Pestalozzi (BRASIL, 2007). As pessoas com
deficiência eram vistas como “retardados”, “doentes” e “incapazes”, sempre em situação de
desvantagem, sendo alvos de caridade popular e da assistência social. Não eram percebidos como
sujeitos de direitos sociais, entre os quais se inclui também a educação (BRASIL, 2002). Moreira
(2007) define que educação é um processo de construção coletiva, em que deve ser contínua, ou
seja, não deve ser interrompida, almejando desenvolver por completo todas as etapas de
conhecimento educacional das crianças e que o ambiente educacional se torna um lugar de
privilégio, no sentido de que neste local é possível descobrir um mundo intelectual, valores e atitudes
que são aprendidos e também um local onde se aprender os direitos e deveres e tornar-se um
cidadão. Ao se deparar com os estudos já na História da Educação percebe-se que a trajetória da
história da educação deve ser compreendida em seus marcos e acontecimentos para além do seu
tempo histórico, nas palavras de Roger Chartier (1999) que “ao criarem representações, os indivíduos
descrevem a realidade tal como pensam que ela é ou como gostariam que fossem”. Os textos que
foram analisados apontaram pistas de como se iniciaram a criação das instituições para fazer
atendimento as pessoas com deficiência, que ao longo dos tempos se institucionalizou e
regulamentou o ensino formal escolar para as crianças com deficiências. Os textos mostraram
indícios de como foram construídas as primeiras políticas públicas e a relevância de pensar isso
hoje, considerando que existe um número considerável de crianças com deficiências. O foco do
atendimento dessas instituições era visivelmente os deficientes das classes menos favorecidas
tendo em vista amparar os deficientes pobres desprovidos de qualquer tipo de assistência. Dados
oficiais da época mostraram a fundação das duas instituições em âmbito nacional citadas acima,
nesse contexto, percebeu-se que a referida temática, propôs uma discussão indispensável para a
educação de nosso país no que diz respeito a uma educação para pessoas com deficiência, o que
antes era chamado de educação para os excepcionais, a mesma também era desenvolvida de forma
segregada, onde não tinha, com isso a busca na compreensão de como se deu a educação da infância
com deficiência no período de 1927 a 1946 se percebeu que as instituições que faziam atendimento
à esse público não buscavam de fato, escolarizar, mas fazer um atendimento para que eles pudessem
de alguma forma, continuar na sociedade, mas não inclusos.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Com os objetivos de contribuir para as discussões sobre a história das políticas de formação de
leitores nas escolas da rede municipal de São Paulo e problematizar de que modo essas políticas
se associam a determinadas concepções de Educação a partir da segunda metade do século XX,
apresentam-se, neste texto, resultados parciais de pesquisa de Mestrado em Educação, cujo
enfoque centra-se nos mecanismos de composição dos acervos de obras literárias para escolas de 1º
Grau da rede municipal de São Paulo mediante análise de documentos referentes ao projeto piloto
Programa Escola-Biblioteca, iniciado em 1972, que deu origem ao programa Espaço e Sala de Leitura,
em vigência nessa rede por mais de quatro décadas.
Por meio de abordagem histórica, centrada em pesquisa documental e bibliográfica, desenvolvida
a partir da utilização dos procedimentos de localização, recuperação, reunião, seleção e ordenação
de fontes documentais e leitura de bibliografia especializada sobre o tema, reuniu-se referências de
diferentes tipos de textos relacionados à formação de leitores na prefeitura de São Paulo, tais como:
programas de ensino; portarias, leis; decretos, entre outros.
Os resultados apresentados neste texto referem-se à análise de material utilizado para o
desenvolvimento das atividades de leitura e utilização de acervo do Programa Escola-Biblioteca, a
saber: as fichas de leitura dirigida, no período de implementação do programa (1972-1981).
A análise do conjunto de aspectos inter-relacionados, constitutivos da configuração textual das
fichas de leitura do Programa Escola-Biblioteca da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo foi
desenvolvida considerando os dados presentes em fichas disponibilizadas pelo arquivo da Memória
Técnica Documental de São Paulo e documentos orientadores - que indicam as formas de aplicação
desse material e quais objetivos esperados – todos relacionados ao avanço das práticas de leitura
pelos alunos e formação de leitores. Foi realizada análise deste material – Fichas de direção de leitura
- por meio do conceito de configuração textual.
Nas décadas de 1970 e 1980, período de implementação do Programa, o Brasil estava sob o
governo de um regime civil-militar, o país possuía altos índices de analfabetismo e escolas com pouca
estrutura. No que tange às condições de produção da leitura na escola neste contexto, como em
qualquer sistema totalitário, os mecanismos de censura estavam presentes por meio de uma série
de normas restritivas e limitantes para o encaminhamento do ensino e a leitura, parte fundamental
do ensino, também sofria as consequências decorrentes das investidas autoritárias da censura.
O Programa Escola-Biblioteca teve início em 1972 no município de São Paulo em caráter
experimental, o projeto-piloto se deu por meio de parcerias entre escolas municipais e bibliotecas
públicas com o objetivo de enfrentar o descaso dos jovens pelos livros e o desuso de ler para recreação
roteiro engessado de leitura, pela fragmentação da obra lida ou pela sensibilização em relação a
aspectos para os quais se pretendia chamar a atenção, o estudante, movido pela necessidade (e
obrigatoriedade) de preencher as fichas, era condicionado a realizar a leitura literária em ambiente
escolar sem espaço para discordância ou opiniões distintas. Observa-se, portanto, concepção
de leitura centrada na instrumentalização, repetição e memorização, de modo coerente com a
perspectiva da Teoria da Comunicação, que estabelece parâmetro explicativo, portanto também de
ensino, na compreensão técnica da mensagem transmitida pelo autor ao seu receptor, mediante o
uso de um canal e código específico, situando num referente.
Nesse sentido, tomando a análise das práticas de leitura dirigida por fichas como base, as ações
desenvolvidas na ocasião da implementação do Programa Escola – Biblioteca indicam sua sintonia
com a perspectiva da racionalidade técnica instituída no país especialmente após a promulgação
da Lei 5.692 de 1971, durante o regime ditatorial militar, quando também a Teoria da Comunicação
passou a dar base para formulação de novos currículos para o ensino da língua portuguesa. Por
fim, os documentos aqui analisados, ao possibilitar reflexões acerca do ensino e aprendizagem de
leitura no período em que foram adotados, associadamente o contexto histórico de controle rígido
por parte do regime ditatorial miliar, também fornecem pistas acerca de procedimentos de controle
de formação, sobretudo de sujeitos leitores, por parte das políticas de escolarização da Secretaria
Municipal de Educação de São Paulo.
MORTATTI, Maria do Rosário Longo. Os sentidos da alfabetização: São Paulo 1876/1994. São Paulo:
UNESP; Brasília: COMPED, 2000
SÃO PAULO (SP). Históricos/ programa escola biblioteca/ sala de leitura/ bibliotecas. Coletânea de
documentos que enfoca o programa escola- biblioteca desenvolvido pelo setor de atividades escola-
biblioteca da SME/SP: objetivos, programações escolas participantes, progressos e dificuldades,
legislação, atividades. Memória Técnica Documental de São Paulo, *H1.1/16
águas entre o que existia e o que se tornou o ensino secundário brasileiro, pois permitiu uma atuação
descentralizada do MEC com os profissionais secundaristas e as próprias escolas secundárias. A
pesquisa analisa, deste modo, a trajetória profissional daqueles intelectuais durante o período em
que estiveram à frente das ações do MEC em relação ao ensino secundário na DES, em especial, à
CADES, procurando dar visibilidade às suas estratégias de atuação sob o mote da renovação
pedagógica desta etapa de escolarização. O professor Armando Hildebrand consta como chefe de
seção técnica do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), no corpo editorial da Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP), nos anos de 1940; é citado como o mentor da CADES no
ano de 1953, na DES permanece como diretor até o ano de 1956, assume a iniciativa de importantes
e grandes projetos educacionais no interior das décadas mencionadas com passagens em outros
órgãos, comissões e diretorias. Em seu lugar, no ano de 1956, assume a direção da DES o médico e
professor de química Gildásio Amado, ex-docente e diretor do externato do Colégio Pedro II no Rio
de Janeiro, lhe é atribuído o feito da expansão da CADES no país; viajou à Europa para conhecer dos
formatos do ensino secundário em países como Alemanha, Inglaterra e França, mobilizou
intensamente a reformulação curricular do ginásio do ensino secundário em sua atuação técnico-
pedagógica na DES, e mesmo depois da extinção desta diretoria contribuiu para a reforma do ensino
de segundo grau prevista na Lei 5696 de agosto de 1971, para a qual é mencionado como membro do
grupo de trabalho da implantação da reforma. O próximo diretor, Lauro de Oliveira Lima, bacharel
em Direito e Filosofia, Inspetor do Ensino Secundário na inspetoria do estado do Ceará, assume
brevemente a DES no ano de 1963, embora tenha sido sua passagem por curto período (de agosto de
1963 a abril de 1964) o interstício e o cenário político no qual se movimenta é particularmente
relevante: as propostas reformadoras de João Goulart na presidência da República provocam as
forças reativas da sociedade civil e dos agentes militares que representavam o coorte dessas forças
reativas; no Ministério da Educação e Cultura o então ministro Paulo de Tarso publica algumas
portarias levadas a termo pelo professor Lauro de Oliveira, das quais os ginásios e colégios
particulares vão se ressentir; a instabilidade política advinda com o golpe militar no ano de 1964 se
desdobra sobre o ministro e o diretor da DES, custando-lhes os postos nestas funções. Reassume
Gildásio Amado a Diretoria do Ensino Secundário em seguida até a aproximação do ano de 1970,
quando, com a Reforma Administrativa do MEC, as diretorias são extintas neste ministério. As fontes
analisadas são textos jornalísticos do período, disponíveis na Hemeroteca Digital da Biblioteca
Nacional, em particular, a subseção denominada Diário Escolar: educação e cultura, jornal
universitário, do periódico Diário de Notícias, do Rio de Janeiro. A escolha da fonte jornalística não é
aleatória; distante da revolução informacional provocada nos anos 2000 pela rede mundial de
computadores, os jornais foram a principal plataforma de comunicação pública por séculos no país,
antes mesmo da Primeira República. Localizar num jornal diário criado (naquela que foi a Capital
Federal desde a chegada da família real) por Orlando Dantas, Nóbrega da Cunha e Figueiredo
Pimentel em 1930, com tendências expressamente anti-getulistas, esta subseção dedicada
exclusivamente ao campo da educação é um exercício relevante de recomposição de fontes na
História e Sociologia da Educação cuja diversidade de discursos e agenciamentos contribuem para
a compreensão da rede de sentidos que encobre um dado recorte histórico e demonstra a importância
política-social-cultural da educação como um campo de disputas por conhecimento e poder sobre
a condução dos destinos das jovens e dos jovens alcançados pela etapa de formação escolar
estudada por esta pesquisa. A abordagem metodológica é orientada pela análise documental e de
conteúdo mediadas pela historiografia correspondente à delimitação temporal selecionada, como a
correlação com outros documentos vinculados à Diretoria do Ensino Secundário e seus diretores. O
estudo das fontes desta pesquisa foi realizado com fundamento na urdidura do termo intelectuais
por Ângela de Castro Gomes, Sergio Miceli e Carlos Eduardo Vieira; os estudos em História da
Educação sobre o ensino secundário-médio de Norberto Dallabrida e Luiz Antônio Cunha. O termo e
os indivíduos tomados aqui por intelectuais surgem como unidade polissêmica, especialmente
quando se fala dos lugares e mídias: “são homens da produção de conhecimentos e comunicação de
ideias, direta ou indiretamente vinculados à intervenção político-social... atores estratégicos nas
áreas da cultura e da política que se entrelaçam, não sem tensões, mas com distinções” (GOMES;
HANSEN, 2002, p. 10). Unidade polissêmica que “desliza pelos sentidos”, na reflexão de Carlos
Eduardo Vieira (2008; 2015), de forma mais distinta nas posições de mediador dos conflitos sociais,
organizador da cultura e produtor de capital simbólico; caracterizando, assim, os intelectuais do
campo educacional como integrantes do campo imbuídos de um sentimento de missão que
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 701
Palavras-chave: Ensino secundário. Educação pública e privada no RS. História da educação no RS.
Este trabalho faz parte de um estudo maior sobre o ensino secundário no Rio Grande do Sul entre
as décadas de 1930 a 1960. Esse é um período em que no Brasil se constatam alterações significativas
no ensino secundário (compreendido aqui como a etapa média de escolarização, posterior ao ensino
primário e que antecede o superior), resultantes da necessidade de sua expansão e modernização.
É quando os defensores da educação pública e privada disputam interesses que se refletem na
constituição da legislação educacional: a Reforma Francisco Campos (1931), a Lei Orgânica do
Ensino Secundário (1942) e a LDBEN (Lei 4024/1961). É importante ressaltar que a implantação e
propagação deste nível de ensino representaram (e ainda representam) um desafio político a ser
enfrentado nas instâncias federal, estadual e municipal. Esses fatos refletiram em novos contextos
de escolarização, que envolviam diretamente interesses regionais e locais dos poderes públicos e
confessionais, especialmente das municipalidades e da Igreja Católica.
Busco aqui enfocar o espaço geográfico conhecido como região sul do estado, destacando os dois
mais importantes municípios - Pelotas e Rio Grande - que pertenciam à Diocese de Pelotas. Nesse
sentido, pretendo preencher uma lacuna a respeito do conhecimento histórico sobre o ensino
secundário Rio Grande do Sul, que apresenta muitas singularidades em relação aos outros estados
brasileiros, entre as décadas de 1930 a 1960. Firmada em pressupostos teórico-metodológicos da
História Cultural, com a leitura de Peter Burke, Michael De Certeau, Jacques Le Goff, Roger Chartier,
Viñao Frago, Domenique Julia, Sandra Pesavento, dentre outros, objetivo trazer o ensino secundário
como um produto cultural resultante de uma intencionalidade do Estado, cotejando aspectos
ligados à educação pública e privada, à cultura escolar e urbana e atuação do governo estadual e
municipalidades. Para tanto, analiso referenciais bibliográficos sobre a temática, e dou destaque
aqui aos relatórios dos governos estaduais e municipais, bem como ao jornal da Diocese de Pelotas
“A Palavra” que circulou de 1912 a 1959. Também subsidio minhas análises em jornais locais, boletins
informativos, almanaques e revistas que possibilitaram uma aproximação dos discursos emitidos na
época em relação a um projeto de sociedade e um produto cultural (o ensino secundário) almejado
pelos defensores do ensino público e privado.
No Brasil, o regime republicano consagrou constitucionalmente a separação entre a Igreja e o
Estado e a laicização do ensino. No entanto, várias foram as estratégias dos governos estaduais,
durante a Primeira República (1889-1930), de vincularem a sua atuação aos interesses da Igreja
Católica, especialmente no que dizia respeito à educação, e aqui no caso específico, do ensino
secundário e superior. No Rio Grande do Sul, sob os sucessivos governos do Partido Republicano
Rio-grandense, que era guiado pela égide do Positivismo, foram privilegiados os interesses das
escolas confessionais junto ao ensino secundário. O estado limitava-se a buscar a expansão do
ensino elementar (primário) público e laico e a contribuir para a consolidação de uma verdadeira
rede confessional de ensino secundário.
Em Pelotas e Rio Grande, acompanhando uma tendência organizacional do catolicismo no
país, nas duas primeiras décadas da instalação da diocese, houve uma maior preocupação com as
articulação muito interessante das “forças vivas” destes dois municípios que resultará na criação
de três universidades: a Universidade Católica de Pelotas, a Universidade Federal de Pelotas e a
Fundação Universidade de Rio Grande (também federal).
Referências
AMARAL, Giana L. O municipalismo, a educação e o desenvolvimento local: Pelotas, RS, Brasil –
primeiras décadas do século XX. Anais do Encontro Internacional: Os municípios na modernização
educacional e cultural. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2014. v. 1. p. 65-75.
BURKE, Peter. O que é história cultural? 2ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2008.
PESSANHA, Eurize; ASSIS Wanderlice; SILVA, Stella. A história do ensino secundário: o caminho para
as fontes. Roteiro, Joaçaba, v. 42, n. 2, p. 311-330, maio./ago. 2017
TAMBARA, E. C.; QUADROS, C. de; BASTOS, M. H. C. A educação (1930-80). In: GERTZ, R. BOEIRA, N.
e GOLIN, T. (orgs). República. Da revolução de 1930 à ditadura militar (1930-1985).Vol. 4. Passo
Fundo: Méritos, 2007. p. 315-333.
ISSN 2358-3959
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O tema desta comunicação são os desafios enfrentados por diretores de instituições de escolares
municipais e privadas ao longo do processo de expansão do ensino secundário no Distrito Federal, entre
os anos de 1932 e 1950. A cidade do Rio de Janeiro se construiu institucionalmente, desde a sua fundação,
como um espaço de articulação nacional. Inicialmente, derivou o seu dinamismo econômico-social do
fato de ser o principal porto brasileiro e centro militar e, posteriormente, de ser a capital da República e
centro cultural, político e econômico do país – como sede do poder federal, centro financeiro nacional e
sede de empresas públicas e privadas atuantes no território brasileiro, até 1960, com a transferência da
capital federal para Brasília. A condição política diferenciada não assegurou aos seus cidadãos o acesso
ao ensino secundário. Ainda que a partir de 1930 tenha se intensificado a procura por esse nível de ensino,
até o final dos anos 1940 havia poucos colégios públicos no Distrito Federal. Entre os anos 1930 e 1950, é
possível identificar dois movimentos de expansão deste segmento: o crescimento das escolas privadas e a
criação das Escolas Técnicas Secundárias. De acordo com o anuário estatístico de 1950, a cidade do Rio de
Janeiro dispunha de 231 estabelecimentos de ensino secundário, dos quais 185 eram privados e 31 eram
municipais. Nomeado Diretor Geral da Instrução Pública em 1931, Anísio Teixeira propôs que a Prefeitura
assumisse a tarefa de oferecer o ensino secundário, até então responsabilidade do governo federal, que
mantinha o Colégio Pedro II e da iniciativa privada responsável por ginásios laicos e religiosos. Para Anísio
Teixeira o modelo implementado pela Reforma Francisco Campos mantinha o dualismo das escolas
primária e profissional para o povo, e a secundária e superior para a elite. A proposta das Escolas Téchnicas
Secundárias articulava o ensino secundário ao profissional, rompendo com o que Anísio considerava uma
discriminação social e pedagógica. O curso oferecido por estas novas instituições seria dividido em dois
ciclos que integravam o currículo propedêutico ao profissional: o primeiro básico extensivo a todos os alunos
a partir dos 11 anos com duração de dois anos, e o segundo que era composto por um curso secundário
equiparado ao do Colégio Pedro II, de acordo com a legislação federal, e as modalidades técnicas, a saber,
comercial e industrial. Entre 1931 e 1934 foram inauguradas 11 Escolas Técnicas Secundárias e o número
de matrículas aumentou de 2310 para 5026. Em 1937, houve alteração na proposta das Escolas Technicas
Secundárias. Após o afastamento de Anísio Teixeira em 1935, as críticas a este modelo de escolarização
secundária do Distrito Federal se intensificaram: o alto custo, a dificuldade para recrutar professores
qualificados para o ensino profissional e o baixo nível intelectual dos alunos. O decreto 5922 – A de 27 de
fevereiro de 1937 estabeleceu que todas as escolas passassem a oferecer o curso secundário de forma
intensiva com duração de três anos, separadamente do curso profissionalizante que poderia ser cursado
nos dois ou três anos seguintes, dependendo da especialidade. Nos anos 1940, apesar de manterem a
nomenclatura, as escolas téchnicas secundárias foram se caracterizando cada vez mais pela dualidade
combatida por Anísio Teixeira. O Coronel Pio Borges, Secretário de Educação e Cultura do Distrito Federal,
entre 1939 e 1942, durante o governo do Prefeito Henrique Dodsworth, determinou que as matrículas
dos alunos das escolas téchnicas secundárias fossem interrompidas no ano de 1941: a razão provém que
as escolas da prefeitura não devem destinar-se a fornecer alumnos para as escolas superiores, mas sim
preparar technicos em várias profissões de ordem prática. Desta forma, o curso secundário ministrado
em escolas do Distrito Federal deveria ter mais disciplinas práticas e menos teoria. A resustência dos
diretores destas escolas foi fundamental para evitar que fossem fechadas. A articulação dos responsáveis
pela direção escolar com os pais e os alunos, que organizaram campanhas e manifestações, assegurou a
continuidade do funcionamento desses estabelecimentos, que eram tão importantes para a população
que residia longe do centro da cidade e não tinham condições financeiras para pagar as mensalidades de
colégios particulares. Outro exercício de expansão do ensino secundário no Distrito Federal ocorreu com
o aumento do número de instituições de ensino privadas, que passaram a constituir a maior parte dos
estabelecimentos. O processo de implementação da Reforma Francisco Campos, a partir da implantação
dos Decretos n. 19.890 de 18 de abril de 1931 e 21.241 de 4 de abril de 1932, trouxe grandes desafios
aos diretores de colégio particulares da cidade do Rio de Janeiro. A seriação do currículo, a exigência
do registro profissional dos professores, a frequência obrigatória dos alunos às aulas, a implantação de
um regime de avaliação discente e a estruturação do sistema de inspeção federal demandavam uma
adaptação à nova organização do sistema escolar. A Reforma Francisco Campos ainda foi alterada pela
Lei Orgânica do Ensino Secundário de 1942 (Reforma Capanema) que definiu o ciclo ginasial, de quatro
anos, e o ciclo colegial, de três anos. O Ministério da Educação e Saúde Pública implementou o serviço da
inspeção aos estabelecimentos de ensino secundário, subordinado ao Departamento Nacional de Ensino,
dirigido por Lúcia Magalhães, que passou a operacionalizar a fiscalização nesse nível de escolarização
no território nacional. Os estabelecimentos de ensino secundário tiveram liberdade para se estabelecer,
mas passaram a ser submetidos à “inspeção preliminar”, por um prazo não inferior a dois anos, e,
posteriormente, à “inspeção permanente ou equiparação”. Os diretores de escolas enfrentaram desafios
para conquistar a condição de equiparação. Nos anúncios de estabelecimentos de ensino publicados em
periódicos, é possível identificar que sempre constava a palavra equiparado em destaque, dando indícios
de que essa condição era importante e transmitia confiabilidade aos pais que estavam escolhendo
uma escola para os filhos. Entre as dificuldades enfrentadas pelos diretores estavam a contratação de
professores que possuíssem registro, a adaptação dos prédios escolares e o controle da frequência
dos alunos, que muitas vezes acometidos por doenças não conseguiam atingir o percentual mínimo
de frequência. Nesse sentido, é importante destacar a função mediadora de Lúcia Magalhães junto aos
diretores. Em periódicos há várias publicações sobre sua participação em solenidades, festas de formatura,
inaugurações de prédios escolares, que demonstram sua proximidade do cotidiano destas instituições .
Também é possível encontrar em jornais, colunas sobre educação debates e respostas às dúvidas de pais,
professores e diretores sobre a nova legislação. Utilizando como fonte anuários estatísticos, periódicos
e relatórios serão analisados os discursos de diretores de instituições particulares e públicas, a saber as
Escolas Téchnicas Secundárias com o objetivo de identificar os desafios enfrentados ao longo do processo
de expansão do ensino secundário carioca. Os estudos sobre a história do ensino secundário carioca são
de grande importância. As discrepâncias presentes nas unidades da rede estadual de ensino do Rio de
Janeiro perpassam pela existência por um longo período de duas redes escolares autônomas no estado:
o Distrito Federal e o Estado do Rio. Estas redes de ensino se encontram em situações de dificuldade
quanto a preservação de suas memórias, uma vez que muitos documentos foram perdidos no processo
de fusão. Este estudo pretende contribuir para novos olhares para história do ensino secundário da cidade
do Rio de Janeiro, de forma que fossem iluminadas as especificidades quanto às políticas públicas,o
cotidiano escolar, os formatos de ensino e os desafios que foram enfrentados em sua expansão.
ABREU, Jayme. O sistema educacional fluminense: uma tentativa de interpretação e crítica. Rio de
Janeiro: MEC/Inep/CBPE/Cileme, 1955. (Série V, Publicação n. 6).
NUNES, Clarice. O «velho» e «bom» ensino secundário: momentos decisivos. Rev. Bras. Educ. [online].
2000, n.14 [cited 2019-11-27], pp.35-60. Available from: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S1413-24782000000200004&lng=en&nrm=iso>. ISSN 1413-2478.
SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena Maria Bousquet; COSTA, Vanda Maria Ribeiro. Tempos de
Capanema. São Paulo: Paz e Terra; Fundação Getúlio Vargas, 2000.
SILVA, Geraldo Bastos. A educação secundária: perspectiva histórica e teoria. São Paulo: Cia Editora
Nacional, 1969 (Atualidades Pedagógicas, vol. 94).
RESUMOS DAS
COMUNICAÇÕES
INDIVIDUAIS
EIXO
PROFISSÃO
DOCENTE
ISSN 2358-3959
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A história da profissão docente no Brasil, desde o final do século XIX, com o processo de
feminização do magistério, é marcada pela presença predominante de mulheres atuando como
professoras nas escolas (LOURO, 2000). No Sul de Mato Grosso, precisamente nas áreas marcadas
pela colonização recente, desencadeada pela Campanha “Marcha para o Oeste” – ou seja, ação
política do governo de Getúlio Vargas durante o Estado Novo (1937-1945) que visou o incentivo ao
povoamento da região oeste brasileira (OLIVEIRA, 2008), também se encontram registros acerca da
presença maciça de mulheres que atuaram como professoras nas escolas primárias. Nesta
perspectiva, o presente trabalho emerge com o objetivo de analisar a atuação das professoras no Sul
de Mato Grosso e, de forma mais específica, nas áreas de abrangência do Núcleo Colonial de
Dourados, situado no município de Dourados, no período de 1955 a 1974. Para tanto, busca-se
examinar o ingresso dessas professoras nas escolas pertencentes a esse Núcleo, assim como,
investigar a formação dessas professoras, além de analisar o trabalho desenvolvido por elas nas
escolas e nas comunidades onde estavam inseridas. A delimitação temporal considerou aspectos
relevantes para a compreensão da participação feminina no processo de escolarização dessa
localidade no Sul de Mato Grosso, bem como da política educacional brasileira. O ano de 1955
corresponde a um período de grande crescimento no número de escolas primárias rurais no
município de Dourados, principalmente de instalação dessas escolas nas áreas situadas no Núcleo
Colonial, o que acabou por demandar uma necessidade maior de professoras para atuar como
docentes. É oportuno explicar que a Campanha “Marcha para o Oeste”, ocorrida no Sul de Mato
Grosso, promoveu a criação da Colônia Nacional Agrícola de Dourados (CAND). A referida Colônia foi
criada pelo Decreto-Lei n.º 5.941, de 28 de outubro de 1943 e, no entanto, a sua real implantação
ocorreu somente em 20 de julho de 1948, quando o governo federal, por meio do Decreto-Lei n.º 87,
demarcou os seus limites com a reserva de uma área não inferior a 300 mil hectares, o que constituiu
o Núcleo Colonial de Dourados (PONCIANO, 2006). O ano de 1974 sinaliza um período de mudanças
nas condições de funcionamento das escolas primárias situadas nas áreas de abrangência do antigo
Núcleo Colonial de Dourados, com o processo de municipalização dessas instituições escolares e
também devido à implantação de cursos de magistério rural, em uma parceria entre o Estado de
Mato Grosso e o citado município, para formar os professores leigos que atuavam em Dourados e no
seu entorno. Ainda cabe lembrar que o ano de 1974 está marcado pela vigência da Reforma da Lei de
n.º 5.692/71, que reestruturou o ensino e a formação de professores no Brasil. Esta Reforma determinou
que professores/as deveriam ter uma formação inicial de nível médio e, por conseguinte, também
passou a exigir esta formação para os respectivos professores que estivessem em exercício no
magistério. As fontes que embasam a pesquisa são constituídas por Relatórios e Mensagens de
Governadores do Estado de Mato Grosso, Relatórios de Secretários de Estado, dados censitários,
legislação, fotografias, documentação das Colonizadoras, entre outras. Recorreu-se, ainda, às fontes
orais, realizando-se entrevistas com as professoras mulheres que atuaram nas áreas do antigo
Núcleo Colonial de Dourados, por meio de um roteiro com perguntas semiestruturadas e com o uso
Referências
CHARTIER, Roger. A história Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1988.
LOURO, Guacira Lopes. As mulheres na sala de aula. In: DEL PRIORE, Mary. História das Mulheres no
Brasil. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2000.
OLIVEIRA, Benícia Costa de. A política de colonização do Estado Novo em Mato Grosso (1937-1945).
1999.
PONCIANO, Nilton Paulo. Religião, Cidade: o papel da Igreja Católica no processo de organização
sócio-espacial de Fátima do Sul/MS (1943 – 1965). Tese (Doutorado em História) - Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Assis, SP, 2006.
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Este estudo investiga a atuação de professores/as nas escolas isoladas do Espírito Santo no
contexto da reforma do ensino promovida por Carlos Alberto Gomes Cardim (1908-1909). Para
tanto, utiliza como fonte principal o jornal Diário da Manhã, que publicava atos oficiais da Secretaria
de Instrução do Espírito Santo, notícias, reportagens e notas acerca da educação, relatórios de
governo e trabalhos historiográficos sobre a educação no Espírito Santo O mapeamento, a seleção e
análise das fontes basearam-se em teorizações da micro-história, especialmente a partir do método
indiciário (Ginzburg, 2002). Nesse processo, destacam-se a busca por indícios, pistas e sinais, a
leitura dos textos a contrapelo e a exploração do hors-texte.
Investigar o exercício da docência no cenário republicano implicou compreender a emergência
dos grupos escolares, a decorrente reorganização da instrução primária e, principalmente, as
relações de força envolvidas no processo de diferenciação entre “grupos escolares” e “escolas
isoladas”. Mais do que denominações distintas, a classificação de grupos escolares, escolas isoladas
e escolas reunidas significou diferentes modos de ensino, programas escolares, condições salariais,
infraestrutura, tempo de duração do curso primário, dentre outros elementos da escolarização.
Destaca-se ainda que os dois termos surgem intrinsecamente associados por relações de
oposição e concorrência. Embora ambos sejam criações republicanas, se o grupo escolar simbolizava
a modernização educacional e a difusão do ideário deste regime, a escola isolada, por outro lado,
não denominava um novo modelo, mas uma condição nova para um tipo de escola primária secular
(SOUZA, 2016).
Com a instauração da República, os discursos sobre a necessidade de expansão da oferta de
ensino, que vinham se intensificando desde a década de 1830, associam-se à visão da instrução
pública como chave para o desenvolvimento da nação. Na esteira desse processo, os grupos escolares
passam a ser vistos como a solução mais correta e racional para executar a missão educacional,
ocupando um papel de destaque nos discursos governamentais, nas políticas públicas e no ideário
em circulação na imprensa.
O primeiro grupo escolar capixaba foi criado em 1908, como a pedra de toque da reforma
empreendida pelo paulista Gomes Cardim, que integrava o programa de modernização do Estado
proposto pelo governo Jerônimo Monteiro. Como principais focos dessa reforma, destacamos
a formação de professores, a normatização da docência e a organização sistemática das escolas
(SIMÕES; SALIM, 2012).
Nesse contexto, o grupo escolar foi entendido como o signo do futuro, expressão do moderno e
da civilização. Por oposição, a escola isolada se tornou sinônimo de atraso, remetendo à tradição
imperial que se buscava superar. O pressuposto era de que as escolas isoladas seriam substituídas
progressivamente pelos grupos escolares. Os entraves na difusão das escolas graduadas, no entanto,
não permitiram que essa expectativa fosse cumprida.
Esta comunicação tem como foco a História da Educação no Brasil referente a formação
de orientadores educacionais durante a Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino
Secundário (1957-1965). Os objetivos propostos são: verificar a legislação relacionada à Orientação
Educacional (OE) antes e durante a Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário
(CADES); conhecer os periódicos e autores que publicavam, por meio da CADES, sobre a OE; e
investigar as representações e estratégias presentes na campanha que estavam ligadas à formação
de orientadores educacionais.
O conceito de representações tem como base as análises de Chartier (1998) ao entender que as
representações estão em campos de concorrência onde ocorrem as relações de poder e dominação.
Como estratégias, entendemos que são “ações que, graças ao postulado de um lugar de poder (a
propriedade de um próprio), elaboram lugares teóricos (sistemas e discursos totalizantes), capazes
de articular um conjunto de lugares físicos onde as forças se distribuem” (CERTEAU, 1994, p. 102).
Desta feita, compreendemos a CADES como um lugar de poder que elaborava e/ou fazia circular
ideias sobre a OE por meio de legislações, revistas, simpósios, cadernos, etc. e que alcançavam
lugares físicos (escola e sociedade) distribuindo suas “forças”. Para realizar a pesquisa foi feito
um levantamento da legislação do período, bem como dos periódicos publicados pelo MEC, mais
especificamente os que estavam ligados à CADES.
A Orientação Educacional (OE) chegou ao Brasil no início do século XX, sob forte influência da
educação e da psicologia norte-americana. Sua primeira aparição legal se deu com a Lei Orgânica
do Ensino Industrial de 1942, seguida da Lei Orgânica do Ensino Secundário (1942), Lei Orgânica do
Ensino Comercial (1943) e a Lei Orgânica do Ensino Agrícola (1946). No ano de 1952 foi publicado
o primeiro Manual de Trabalho dos Orientadores Nacionais, que tinha por função conceituar as
modalidades da OE. Nesse período foram realizados simpósios, seminários, conferências e reuniões
sob a supervisão da diretoria da CADES. A Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961 (Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional – LDB) veio para fixar normas com relação à formação do orientador
educacional de nível médio e primário. Como se percebeu a falta de orientadores educacionais
habilitados para o exercício da profissão, o Conselho Federal de Educação publicou em 1962 o parecer
nº 79 que indicava para a existência de exames de suficiência que beneficiaria a formação e o registro
de orientadores educacionais. Outras legislações foram a portaria nº 137 (06/06/1962) e o parecer
nº374 (Conselho Federal de Educação) que determinavam, respectivamente, medidas emergenciais
(prova de suficiência) e fixação de currículo mínimo para o Curso de Orientação Educacional.
Finalizando o recorte temporal encontramos a portaria nº 159 (14/06/1965), determinando que os
Cursos de Orientação Educacional em nível superior deveriam ter a duração média anual de 810
horas. Ressaltamos que a legislação não é vista sob uma esfera meramente política. Ao analisar
fontes oficiais estamos entrando num emaranhado de relações (sociais, econômicas, educativas)
onde há duas dimensões: uma de caráter político e histórico e outra ligada aos sujeitos que realizam
as intervenções sociais (FARIA FILHO, 1998).
Neste mesmo período em que surgia dispositivos legais sobre a OE, a CADES foi criada pela
Diretoria do Ensino Secundário pelo decreto nº 34.638 de 17 de novembro de 1953, durante o governo
de Getúlio Vargas. Sua criação está ligada ao processo de modernização e industrialização que o
Brasil vivenciou na década de 1950 (com a mudança de uma sociedade rural para a urbana houve
uma alteração na demanda e nas características da escola urbana). Naquele momento a maioria dos
professores de ensino secundário da escola brasileira eram leigos, ou seja, não possuíam formação
acadêmica nas Faculdades de Filosofia, Letras e Artes. A Campanha teve um papel importante na
formação de profissionais da época ao realizar cursos para professores, simpósios, encontros,
concursos, jornadas, entre outras ações, além de publicar um vasto material que daria suporte para
a formação e ampliação do conhecimento dos docentes.
No caso da OE a Campanha possuía a função de “incentivar a criação e o desenvolvimento de
serviços de orientação educacional nas escolas de ensino secundário” (BRASIL, 1953). As atividades
realizadas pela CADES podem ser vistas como uma tentativa de formar um novo modelo de
professor e consequentemente de aluno (que era o cidadão brasileiro que estava se ajustando às
necessidades que do novo contexto brasileiro mais urbano e industrializado do pós-guerra). Entre
essas publicações, selecionamos duas: A Revista Escola Secundária e os Cadernos de Orientação
Educacional (COE) produzidas pela CADES. A Revista Escola Secundária, tinha o objetivo de orientar
professores de diferentes áreas em aspectos legais, didáticos e curriculares. Apresentava-se como
uma revista feita por professores para os professores. Ela trouxe em todos os seus 19 números
publicados, uma seção específica sobre a Orientação Educacional, na qual haviam de um até quatro
artigos assinados por diversos professores. Já os Cadernos de Orientação Educacional formaram
um conjunto de 25 números publicados de pequenos folhetos que possuíam de 10 até 43 páginas,
nos quais eram registrados trechos de simpósios, encontros, cursos, leis, experiências, palestras ou
artigos referentes à Orientação Educacional. As duas fontes possuem semelhanças no conteúdo e
em alguns casos podemos verificar que os mesmos autores ou circulavam nos dois periódicos.
Em linhas gerais, os assuntos giravam em torno da definição de conceitos da Orientação
Educacional; a legislação; a relação do orientador educacional com a família e o aluno adolescente;
a influência da psicologia e do catolicismo; e citavam alguns exemplos como os advindos da
experiência francesa e da norte-americana. A Revista Ensino Secundário e o COE foram utilizados
como uma estratégia de formação de orientadores educacionais e apresentavam uma grande
variedade de autores, por isso, pode ocorrer que entre um texto, e outro, haja lutas de representação,
mas de forma mais ampla, o interesse geral era de definir conceitos e posicionamentos da OE, já que
o Brasil iniciava a implantação dessa função nas escolas.
Sobre os autores analisados verificamos que 58% eram mulheres e 42% eram de homens. Entre
eles havia 73% de professores denominados civis e um grupo de 26% de professores religiosos
(padre, dom, bispo, madre, irmão). Diferenciar a origem desses autores não significa definir o estilo
de escrita deles, pois em diferentes momentos podemos encontrar artigos escritos por religiosos que
procuravam dar um tom científico sobre a OE, bem como artigos escritos por professores civis que
possuíam um cunho religioso fervoroso (principalmente católico) o que indicava interesses e táticas
para alcançar os objetivos. Como o campo de atuação dos orientadores educacionais ainda estava se
formando o grupo de professores que possuíam experiência na área era escasso e estes circulavam
com frequência nos eventos, formações e publicações sobre o tema. Alguns realizaram viagens aos
Estados Unidos e à França onde entraram em contato com ideias e experiências de diferentes tipos
de serviços de Orientação Educacional. A Revista Escola Secundária e os COE demonstram que esses
autores eram provenientes de lugares como: Centro de Aperfeiçoamento e Pesquisas da Petrobrás
(3%), Diretoria do Ensino Secundário (6%), Secretarias e Inspetoria de Educação em geral (11%),
Colégio de Aplicação da Faculdade Nacional de Filosofia e da Universidade de São Paulo (11%),
Instituto de Educação do Distrito Federal (14%), Faculdades em geral (17%), PUC (RJ, SP, GO e RS)
(19%), e Colégios e Institutos em geral (19%).
Entre as orientações dadas por estes autores em eventos e textos há uma ênfase na tentativa de
ajustamento do aluno adolescente ao sistema educacional, escolha profissional e posicionamento
social. Também há uma preocupação com o apoio da família e a necessidade dos pais estarem
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preparados para educarem seus filhos. Em vários artigos percebemos um diálogo supostamente
harmonioso entre a Psicologia e a religião. Entendemos que os eventos e as publicações da CADES
proporcionaram a formação, a discussão e o entendimento sobre o que significava a Orientação
Educacional na escola secundária brasileira e tinha como um dos seus objetivos suprir uma
necessidade apresentada naquele momento. Os resultados dessa pesquisa ainda são parciais e
fazem parte do resultado inicial de escrita da tese de doutorado que está sendo desenvolvida na
linha de pesquisa História e Historiografia da Educação, no setor de Educação da Universidade
Federal do Paraná.
Referências
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Difusão do Ensino Secundário. Diário Oficial da União - Seção 1 - 20/11/1953, Página 19912.
CERTEAU, M. A invenção do cotidiano. Vol. 1: Artes de fazer. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 1994.
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. Lisboa: DIFEL; Rio de Janeiro:
Bertrand do Brasil, 1998.
FARIA FILHO, L. M. A Legislação escolar como fonte para a história da educação: uma tentativa de
interpretação. In: FARIA FILHO, L. M. (Org.) Educação, modernidade e civilização. Belo Horizonte:
Autêntica, 1998, p. 89-125.
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Os participantes desta pesquisa foram cinco professores da UFT que participaram do processo
de implantação do Curso de Licenciatura de Educação do Campo, nos Campi de Arraias (PIMENTA;
SANTANA; MESSIAS, 2015) e Tocantinópolis (OLIVEIRA; ALMEIDA, 2015) e intentou-se apreender dos
seus relatos, os percursos e desafios encontrados na materialização dessa política pública, assim,
como a concepção que possuem sobre a Educação do Campo e os itinerários formativos constituídos
no Curso.
Portanto, o desafio de implantar o curso de LEdoC na UFT coube a dois campi: Arraias e
Tocantinópolis. Estes foram criados a partir da iniciativa de um coletivo de educadores que, em
resposta ao Edital Chamada Pública 02/SECADI, de 03/08/2012, se propuseram a formular os Projetos
Políticos Pedagógicos do Curso. Depois de muitos debates, reuniões, crenças e descrenças dos seus
elaboradores, o trabalho culminou nos documentos que analisou-se a medida que se efetivavam
sua execução.
A LEdoC da UFT foi uma experiência salutar, mas que enfrentou óbices, a exemplo do que ocorreu
em outras instituições públicas, permeada de conflitos e tensões face à proposição de um novo
modelo de curso, que difere em concepção e formato daqueles que tradicionalmente são ofertados
nas universidades brasileiras.
Nesta perspectiva, Molina e Sá (2011) afirmam que cabe à universidade o desafio de repensar seu
fazer pedagógico, ainda que não represente uma total mudança de paradigma. A oferta de cursos de
nível superior direcionados aos povos do campo representa um reforço às contradições coexistentes
dentro da universidade.
Os sujeitos da pesquisa, narraram a realidade vivenciada, revelaram toda a trama de sua história
de vida, pessoal e profissional, e que, por vezes, se constituíram em um amálgama da sua própria
existência. Neste caso, foi pautada por ideais e comprometimentos na construção de um novo
projeto de desenvolvimento que perpassou pela formação de professores para uma Licenciatura
específica em Educação do Campo.
A LEdoC pressupôs um trabalho coletivo, e na percepção dos entrevistados, os desafios só
foram superados à medida que os sujeitos que a defendiam, concebiam o campo como local de
possibilidades e de vivência.
Pimenta (2015, CAMPUS ARRAIAS) menciona que a LEdoC está em fase de institucionalização
e argumenta que ainda não existe, a nível nacional, uma diretriz para a sua operacionalização.
Ressalta que “às vezes, aquilo que do ponto de vista pessoal, da militância, achamos o melhor, não
se enquadra nos padrões daquilo que o MEC entende ser o melhor. E aí sim, nós temos uma tensão,
mas temos uma nova fase dessa trajetória”.
Oliveira (2015, CAMPUS TOCANTINÓPOLIS) destacou as resistências encontradas na comunidade
para implantação da LEdoC. Desvelou as dificuldades de romper com o que está posto na realidade
educacional brasileira, e que repercutiu no meio acadêmico, a “valorização” de cursos considerados
importantes pelo mercado. Desta forma, propor um curso que visava a formação de educadores do
campo, não representava os interesses dos grupos dominantes, ocasionando os conflitos descritos
pelos professores.”.
Na opinião de Messias (2015, CAMPUS ARRAIAS), precisa-se “aprender muito, dentro da
universidade, não vir com muita coisa pronta. Este é um desafio muito grande essa questão da
aprendizagem, do conviver com as diferenças”.
No entendimento de Santana (2015, CAMPUS ARRAIAS), “somos sujeitos limitados, não
conseguimos dar conta de tudo, mas estamos tentando fazer o possível. O impossível ainda estamos
tentando construir”.
Almeida (2015, CAMPUS TOCANTINÓPOLIS) relata que todo o processo de implantação da
LEdoC foi marcado por enfretamentos e oposições ao curso dentro da própria universidade e,
ultrapassando seus muros, ganhou uma dimensão inimaginável. As tensões e conflitos configuram
uma possibilidade quase inevitável quando se trata de reivindicar políticas públicas que instituem
os direitos sociais, no caso, assegurar o direito à educação da população que tem o campo como
meio de existência, produção e vida. Para discutir e tratar das diversas identidades da população
que vive no e do campo, em todas as suas dimensões, considera ser necessário “reorganizar práticas
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educativas para os sujeitos diversos, mas isso nós vamos construindo devagar, sem querer reinventar
a roda, não vamos fazer isso da noite para o dia. É um processo. E eu acredito imensamente nele [...]”.
Por meio dos testemunhos orais dos protagonistas da pesquisa, observamos que a LEdoC da
UFT, dos Campi de Arraias e Tocantinópolis, tiveram percursos diferentes em sua materialização
(antagonismos e ocorrências), que emergiram da própria realidade a que pertencem. Percebe-se que
a história narrada por quem dela participou e ajudou a construir, dá um novo sentido à Educação do
Campo, tendo em vista a oportunidade de formação profissional dos educadores.
Outro ponto para reflexão diz respeito à forma como a LEdoC da UFT concebe a alternância.
Observamos que os entrevistados possuem clareza da concepção de alternância que pretendem, e
nos dois campi pesquisados são elaboradas estratégias de acordo com as concepções e possibilidades
de cada um, que visam a articulação dos Tempo-Universidade e Tempo-Comunidade, na inter-
relação entre os diversos saberes que compõem o conhecimento científico e as matrizes culturais
dos povos do campo.
Destacamos a existência de conflitos quanto aos encaminhamentos da alternância. Entretanto,
estes fazem parte do processo, na medida em que se exigem novas posturas, novas demandas frente
à organização do trabalho pedagógico, dos professores que vão praticá-la e que cuja formação
tradicional dificulta a sua plena efetivação. Identificamos, ainda, as dificuldades de ordem estrutural,
no acolhimento aos estudantes, no período em que acontece o Tempo-Universidade, e de logística,
no acompanhamento dos professores nas atividades desenvolvidas no Tempo-Comunidade.
A utilização da história oral nos conduziu para o centro das histórias dos sujeitos e da construção
desta nova proposta de formação de professores, vinculada à educação do campo. Mesmo os
mais céticos dentro da academia, não permanecem indiferentes à dinâmica dessa proposta
político-pedagógica.
ISSN 2358-3959
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A Liga do Magistério Catarinense teve sua formação noticiada nas páginas dos jornais A República
e O Estado de Santa Catarina em dezembro de 1924. Nessa ocasião, sua presidência coube à
professora Maura de Senna Pereira, tendo como vice Martha Tavares Alves. A primeira e segunda
secretária foram, respectivamente, Antonieta de Barros e Maria Gonzaga. Por fim, coube à Délia Régis
a tesouraria da associação e à Beatriz de Souza Brito o encargo de oradora. Uma nova configuração
da diretoria foi empossada em janeiro de 1927: Iracema Aducci substituiu Maura Pereira na
presidência que, por sua vez, passou a ser a 1ª oradora, acompanhada de Oswaldina Medeiros. Maria
Gonzaga escalonou a vice-presidência. Maria do Espírito Santo e Julieta Torres foram designadas 1ª
e 2ª secretária, respectivamente. Ida Simone e Iracema Vilela Carreirão foram, por fim, convocadas
na condição de bibliotecárias. A agremiação apresentava como objetivos o auxílio pecuniário aos
colegas que o requisitassem, bem como a possibilidade de organização e união do professorado
local.
A despeito do anunciado destaque das integrantes da diretoria, tal qual anunciado também
nas páginas dos jornais locais, a Liga do Magistério Catarinense não teve uma atuação longeva. Já
em 1928 ela dá sinais de desgaste devido ao pouco engajamento da categoria e ao insignificante
envolvimento dos colegas, conforme depoimentos das integrantes. No mês de agosto do ano
seguinte, seu desmonte é tristemente anunciado em manchetes do jornal O Estado. Em que pese sua
irrisória sobrevida e seu restrito alcance no interior da categoria docente, interessou apreender as
manobras de um grupo específico de professoras que se mobilizar em prol do que consideraram ser
possíveis melhoras nas condições de trabalho. Importa, portanto, o rastreamento das táticas desse
grupo específico de docentes e seu entendimento como parte de uma movimentação funcional
específica no interior de uma carreira que progressivamente se aparelhava.
Sendo assim, este trabalho objetiva rastrear as práticas operacionalizadas pelas professoras
catarinenses junto à Liga do Magistério Catarinense na década de 1920. Para tanto, tomou como
fontes os jornais da época, bem como escritos de algumas de suas integrantes veiculados na
imprensa e no meio literário. Foram também acessadas as atas e publicações disparadas em torno
da realização da Conferência Estadual do Ensino Primário, já que esse evento foi também um
importante ponto de articulação do grupo. Por fim, foram também fontes dessa pesquisa partes
da documentação administrativa exarada e recebida pela Diretoria Geral da Instrução Pública no
período de vigência da Liga, acessadas após visita ao Arquivo Público do Estado de Santa Catarina.
Interessou entender as práticas das docentes como operações (CERTEAU, 2009) lançadas para
demandar o que consideravam pontos pungentes para a melhora da sua condição de trabalho.
Dentre eles, destacam-se a reivindicação por isonomia salarial e para concessão da autorização para
contrair casamento para professoras dos Grupos Escolares (OTTO, 2008).
Também por essa via, levou-se em conta a categorização das práticas endossada por Michel
de Certeau, que as divide entre táticas e estratégias. Essas categorias são propostas por Certeau
(2009, p. 91 - 108), que as endossa para o entendimento das práticas cotidianas. As estratégias são
entendidas como aquelas exaradas a partir de um local próprio. Trata-se, pois, de um lugar de gestão
imbuído de uma autoridade. As segundas, por sua vez são encampadas em meio a um território
alheio. Tratam-se, pois, das furtividades e inventividades. As práticas das professoras vinculadas à
Liga foram entendidas como táticas em meio a uma carreira que progressivamente se aparelhava e
se vinculada a uma via burocrática de organização do mando.
Esse trabalho levou em consideração estudos já publicados acerca da história da profissão
docente. Destacam-se os escritos de Demartini e Antunes (1994) e Antônio Nóvoa (1997). Das
primeiras destaca as considerações acerca da masculinização da carreira docente e da abordagem
generificada da progressão funcional professoral. Do segundo, é cara a noção de funcionarização do
professorado. Ela foi aqui tomada para entendimento da incorporação da docência como parte de
um funcionarismo que progressivamente se aparelhava. Cabe também, nesse caso, realçar a ligação
dessa funcionarização docente à organização da Diretoria Geral da Instrução Pública como polo de
gerenciamento burocrático da instrução.
Cabe, ainda levando em conta a atuação de um grupo de professoras em meio a uma carreira
burocrática que se mostrou predominantemente ocupada por homens, operacionalizar gênero
como categoria de análise. Ela é válida não somente para constatar a pouca presença feminina na
carreira burocrática de gerenciamento da instrução catarinense no período abordado, mas para
rastrear as táticas e operações das docentes, localizando-as. Em outras palavras, atentar para a
constituição histórica da profissão docente considerando a categoria gênero envolve tensionar a
ocupação feminina das salas de aula e masculina da carreira burocrática.
A metodologia de análise empregada levou em conta as considerações de Michel de Certeau ao
apresentar a Escrita da História (CERTEAU, 2002). Nessa toada, interessou a composição de uma
série documental para circunscrição do objeto, objetivando assim rastrear as práticas operadas
pelos sujeitos políticos. Foi assim possível assinalar os desvios das práticas rastreadas nos
documentos organizados em série. Essa operação historiográfica, encampada na organização de
uma série documental para circunscrição do objeto de pesquisa enunciado, permitiu perceber o
comum e o contínuo das rotinas na administração da instrução e no gerenciamento do pessoal com
ela envolvido. Foi dessa continuidade que o grupo de professoras que se fizeram ver na Liga do
Magistério se descolou. Ou seja: em um momento de progressiva funcionarização do professorado
e de uma verticalização masculinizada da carreira, esse grupo de docentes se distinguiu pelas
demandas encampadas e pela forma de atuação. Vale, a esse respeito, ressaltar que em Santa
Catarina, naquele período, era comum a presença de mulheres na somente qualidade de docentes
no chão da escola. As progressões funcionais, conforme a documentação acessada, não foram
escalonadas por mulheres na época.
É apresentado como resultado o mapeamento das demandas e operações desse grupo de
professoras, que permite rastrear algumas das inventividades em meio a uma carreira que
progressivamente se aparelhava. São, portanto, entendidas como táticas as operações alinhavadas
em meio a uma estrutura burocrática pouco permeável a suas reivindicações. Apresenta, a título
de considerações finais, constatação a respeito da especificidade da atuação de professoras nesse
contexto específico, já que para as mesmas a via de crescimento burocrático na carreira mostrou-
se pouco receptiva. Elas, pois, burlaram a pouca inserção burocrática organizando suas práticas
em outros polos. Esses polos, contudo, não se encerraram em si. Suas articulações no campo da
conferência e da imprensa catapultaram demandas que chegaram ao Congresso catarinense,
cotejando a inserção no ambiente legislativo visando à alteração de leis que não as apraziam.
Uma vez tendo suas demandas visibilizadas nas discussões dos congressistas, dois foram os
efeitos conseguidos: o primeiro foi a divulgação de seus ideais e a conquista de alguns defensores,
sobretudo na imprensa. O segundo, porém, foi a resistência – deliberada ou não – da maioria dos
ocupantes do Congresso catarinense. Foi, porém, através dessas táticas furtivas que as professoras
se mobilizaram em torno de demandas que lhes eram urgentes. Essas, imediatamente, geraram
resistências e pouco frutificaram de imediato. Porém, mais que medir o sucesso ou insucesso dessas
mobilizações, cabe rastrear esses movimentos e apontar seus sujeitos políticos.
Referências
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CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1.artes de fazer. 15ª ed. Petrópolis: Vozes, 2009.
CERTEAU, Michel de. A operação historiográfica. In: A escrita da história. Tradução de Maria de Lourdes
Lemos Britto de Menezes; Revisão de Arno Vogel. 2ª. ed. Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária,
2002. Pág. 65 – 110.
CERTEAU, Michel de. Teoria e método no estudo das práticas cotidianas. In: SZMRECSANYI, Maria
Ivone (org). Cotidiano, cultura popular e planejamento urbano (Anais do Encontro). São Paulo: FAU/
USP, 1985, p. 3 – 19.
DEMARTINI, Zeila de Brito Fabri; ANTUNES, Fátima Ferreira. Magistério primário: profissão feminina,
carreira masculina. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, número 86, pág. 5 – 14. Agosto de 1993.
NÓVOA, Antonio. Formação de professores e profissão docente. In.: Os professores e sua formação.
Lisboa: Dom Quixote, 1997, ág. 13 – 33.
como forma de sustentar a crença na recompensa simbólica em primeiro lugar, para reivindicar em
seguida, de forma hesitante, a recompensa financeira pelo trabalho.
O CPP como associação de professores primários, utiliza na Revista do Professor, por vezes um
discurso emocional como forma de representação de um coletivo, do que eles pretendiam expor
como a classe do professorado paulista. Destarte, as representações são vistas como fruto de
representações coletivas e individuais. As representações individuais produzem representações
coletivas, no entanto ao mesmo tempo em que está a representação coletiva é constituída por uma
fusão, ela também resulta em uma nova representação, como podemos observar na leitura dos
artigos publicados no periódico da associação.
Mesmo quando as representações sobre a profissão docente estavam alinhadas com as
campanhas salariais do CPP, como aconteceu de forma mais intensa entre 1958 e o início da década
de 1960, com a alta da inflação e a perda de poder aquisitivo dos professores, estas fazem uso
(mesmo que contraditoriamente) de uma representação de professor que pode cumprir com a sua
missão, mesmo sem as condições adequadas de trabalho. Por conseguinte, ao mesmo tempo em que
se exalta a capacidade do professor de superar as adversidades encontradas no local de trabalho,
se advoga pela melhoria dos salários para uma prática pedagógica mais eficiente. De acordo com
Vicentini (2002) o movimento da categoria docente em torno das campanhas salariais gerou um
grande impacto nas representações do professorado. Pelo fato das greves e passeatas como prática
reivindicatória, serem consideradas incompatíveis com a profissão docente, estas campanhas
acabavam por reforçar as representações de professor primário que serviam tanto para justificar o
trabalho do professor como algo que tinha predominantemente uma recompensa simbólica, quanto
uma forma de representar a coletividade da categoria diante das injustiças da carreira do magistério.
Por ser o centro do ofício dos professores, a prática pedagógica foi amplamente representada
pelos artigos do CPP. Em forma de recomendações, análises dos “novos e modernos métodos de
ensino”, e até mesmo por meio das descrições realizadas nas homenagens aos velhos mestres, estas
representações sobre as práticas estavam na maioria das vezes interligadas com as representações
sobre as dimensões emocionais. Desta forma, são listadas não somente as representações de
emoções relacionadas à prática de ensino, como: alegria, amor, esperança e afeição, mas também
representações que definem o que seria o bom professor: abnegação e amor. A presença das
emoções na prática pedagógica não é apenas justificada como uma forma de estabelecer um
vínculo entre o professor e o aluno para o aprimoramento do processo de ensino, mas também
como uma finalidade em si. O exemplo do professor primário deveria indicar o amor como prática.
Sem referências ao que seria uma educação moderna ou aos padrões de prática colocados pela
cientificidade educacional, a maioria dos textos encontrados na revista descrevem livremente
qualidades morais e emocionais tidas como necessárias ao bom professor. Como forma de embasar
as representações exemplificadas, os artigos da Revista do Professor buscavam argumentar sobre a
prática dos professores com base na própria experiência que os autores possuíam com o cotidiano
escolar ou, como Tardif (2000) indica, nos saberes da experiência do trabalho docente, ou seja, um
saber constituído na história de vida do professor (pessoal e profissional).
Deste modo, podemos observar como a recompensa simbólica da profissão docente estava
presente em muitos dos artigos. A descrição do afeto pelos alunos e o amor pela docência, era
colocada não só como característica necessária à docência, como também necessária para a
representação destes professores como categoria profissional. O Dia do professor, como ritual de
celebração da categoria docente, é marcante no que se refere à construção das representações do
professor primário, pois, os textos produzidos em razão dessa comemoração, descrevem qualidades
tidas como adequadas ao docente, colocando em evidência valores, práticas e emoções valorizadas
pelo conjunto da categoria.
O estudo das publicações da Revista do Professor, permitiu a compreensão de como as dimensões
emoções estavam atreladas à representação do habitus (na definição de Bourdieu, 1996) professoral,
ou seja, aos dispositivos de apreciação e percepção do mundo dos professores, que, por sua vez,
utilizavam as emoções como forma de representar uma recompensa simbólica pela profissão. A
análise das fontes possibilitou ainda o estudo das dimensões emocionais como composição da
illusio (BOURDIEU, 1996), isto é, como uma das formas de representar o valor e o significado do
magistério para os professores.
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Portanto, as emoções no trabalho dos professores primários possuem múltiplos aspectos. Além
de estarem presentes de forma permanente no trabalho de ensino, na interação com os alunos, com
o ambiente e a comunidade escolar e do entorno escolar, agindo como resposta às mais diversas
situações que os professores experienciam no trabalho educativo, as emoções também estão
presentes na produção de representações sobre o trabalho do professor, tanto aquelas produzidas
por eles como por outros agentes do campo educacional. Desta maneira, as representações das
emoções no trabalho docente recebem interferências de várias ordens: o que é considerado como
adequado ao ambiente de ensino, quais as expectativas de trabalho e qual a realidade encontrada,
qual prática é considerada legítima na área etc. Considerando a pesquisa realizada neste trabalho,
vemos a complexidade formada entorno das representações destas emoções: as tensões provocadas
pelas disputas de representações sobre o trabalho, carreira, formação e prática do professor primário,
em um contexto de mudanças no campo educacional.
ISSN 2358-3959
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Entre 1930 e 1937, as iniciativas do governo do Espírito Santo para a área da educação incluíram
a criação da Revista de Educação (RE), que circulou de 1934 a 1937, e de uma biblioteca pedagógica
destinada aos professores (LAUFF, 2007), a realização do Primeiro Congresso de Aperfeiçoamento
Pedagógico (CAP), que reuniu professores de todas as escolas públicas capixabas na cidade de Alegre,
em 1935 (LAUFF, SIMÕES, 2019). No contexto das políticas educacionais instituídas pelo capitão
João Punaro Bley, interventor designado pelo governo Getúlio Vargas em seguida à revolução de
1930, para governar o estado capixaba, este estudo analisa constituição da RE como dispositivo para
a formação de professores no exercício do magistério local, focalizando o encontro produzido entre
o CAP e a RE, a partir da publicação dos Anais do congresso nos números 17, 18 e 19 da revista, em
1935. Concebida pelo Serviço de Cooperação e Extensão Cultural (SCEC) do Departamento de Ensino
Público do Espírito Santo para difundir processos e métodos da pedagogia moderna, compreende-
se que a RE tenha atuado como “caixa de utensílios” (CARVALHO, 2001), que projetava “[...] fornecer
bons moldes [...]” (CARVALHO, 2001, p. 143) para as práticas dos professores que atuavam em
instituições escolares capixabas.
De 1934 a 1937, a RE sobreviveu a seis mandatários da pasta responsável pela educação no
Espírito Santo. Por outro lado, o professor e jornalista Claudionor Ribeiro, chefe SCEC e editor
do impresso, gerenciou sem interrupção o projeto da revista que dispunha artigos de abertura,
artigos de fundo e variadas seções avulsas. Embora o projeto inicial previsse a circulação mensal
do periódico, observou-se tal periodicidade somente de abril de 1934 a outubro de 1935. Dos 31
números publicados, quatro não estavam disponíveis para pesquisa: 4, 5, 20 e 21. Nos 27 números
analisados, além do texto editorial assinado por Ribeiro, o corpo principal, exibindo artigos de
fundo, compunha-se de textos produzidos por professores, inspetores técnicos de ensino, diretores
escolares, médicos, funcionários públicos e políticos. Os artigos publicados abordavam os seguintes
temas: Didática, Educação Física, Educação Rural, Escolas, Estatística Escolar, História, Linguística,
Material Didático, Práticas Auxiliares ao Ensino, Psicologia, Política Educacional, Pedagogia, Saúde,
SCEC e variedades. A publicação do periódico revelou-se irregular: seis exemplares em 1934 e 1935;
três edições em 1936 e duas em 1937. Os exemplares às vezes incluíam mais de um número. Por
exemplo, a edição do Primeiro Congresso de Aperfeiçoamento Pedagógico correspondia aos números
17, 18, 19 (1935) (sem considerar as edições de novembro e dezembro desse ano, que correspondiam
aos números 20 e 21, não encontradas). Variações observadas com relação ao projeto editorial e à
irregularidade da publicação ao longo do tempo sugerem momentos de estabilidade (janeiro de
1934 a maio de 1935), intermitência (junho de 1935 a dezembro de 1936) e de retração (1937) no
processo de produção da RE. Nos dois primeiros momentos, as prescrições de práticas pedagógicas
(traduzidas como Didática) prevalecem no conjunto dos artigos (de abertura e de fundo) analisados
quantitativamente, possivelmente porque entre os autores predominavam inspetores técnicos de
ensino. No terceiro, decresce o espaço ocupado por esse tema. Nos dois momentos iniciais, também
se destacam temas relacionados à política educacional, neles incluídos textos de divulgação de
feitos governamentais. Na terceira fase a Educação Rural ganha espaço, indiciando os esforços
de interiorização do ensino que caracterizaram o período. Foco deste estudo, observa-se que a
edição referente ao CAP compõe o momento de destaque das prescrições didático-pedagógicas
direcionadas aos docentes em serviço. Especificamente, a Didática ocupa 48% dos artigos da RE,
enquanto 10% dos artigos abordam tematizam a Pedagogia. De 29 artigos, 9 intitulam-se Planos
de Aulas, sendo que cada professor/autor apresentou mais de um planejamento, com o objetivo de
modelar práticas de ensino escolar segundo preceitos da pedagogia moderna. Também os artigos
“O ensino da geografia na escola primária”, “O ensino das sciencias physicas e naturaes na escola
primaria”, “O desenho applicado ás diversas disciplinas”, “O ensino da geografia” e “Qualidades do
professor” endereçavam-se à orientação prática de professores. Com relação ao tema Pedagogia,
publicaram-se os seguintes textos: “Educação pelo interesse”, “Como educar” e “ Os primeiros
ensaios da formação moral e intellectual”. “Discurso” e “Em prol do ensino” tratam de assuntos
considerados variedades. Os artigos “Estatística escolar” e “Escripturação escolar e estatística”,
como os títulos indicam, esclarecem medidas estatísticas e orientam os professores quanto a
lançamentos de matrícula, frequência, registro de notas e aproveitamento dos alunos. Com relação
à Saúde, aparecem “A educação sanitária e o futuro do Brasil” e “O professor e a profilaxia da
lepra”. Sobre Escolas, “Denominações e construções de escolas” e “O que faltou dizer no Congresso
Pedagógico” (em que o organizador do CAP, João Ribas da Costa, chama atenção para a organização
e limpeza das salas de aula pelos professores). Sobre Educação física escolar, “Ligeira apreciação
sobre a educação physica da criança”. “Evolução da música” propõe uma abordagem histórica desse
tema. Provenientes de apresentações realizadas por professores e técnicos durante o Congresso de
Aperfeiçoamento Pedagógico, os artigos analisados convergem para a formação didático-pedagógica
do magistério capixaba, quer seja por meio de orientações prescritivas sobre questões educacionais,
ou a elas relacionadas, quer seja pela modelização de métodos e práticas de ensino. Segundo o
organizador do CAP (COSTA, 1935), o professor que não aproveitara as preleções especializadas e
aulas padrão do CAP seria comparável a uma peça com tinta velha na qual o polimento “delicado”
das orientações pedagógicas não surtiram efeito. Nesses casos, acreditava que somente “[...]
lixa e sóda caustica [...]” (COSTA, 1938, p. 60) poderiam remover “[...] velhos restos de tintas [...]”
e “[...] profundas oxidações [...]” (p. 60). Neste estudo, a leitura tanto dos textos editoriais da RE
como dos artigos redigidos por professores e técnicos educacionais, possibilitaram a indiciarização
(GINZBURG, 1989) de usos da RE como dispositivo para a formação de professores em serviço,
tendo em vista o projeto de expansão e qualificação do ensino no Espírito Santo, de acordo com
as diretrizes emanadas do Ministério da Educação e Saúde no período investigado. Especialmente
em 1935, os três números dedicados aos anais do CAP evidenciam a execução de um programa
eminentemente técnico, que limitava a formação docente à observação e à execução de práticas
“eficientes e produtivas”, em contraposição a teorizações “inúteis”. Os textos analisados, dentre os
quais se encontram vários planos de aula, deixam ver modos de utilização da RE como dispositivo
de formação de professores em serviço, na medida em que, a partir do ambiente controlado do
CAP, possibilitam o registro, a articulação e a amplificação das “vozes autorizadas” de professores
e técnicos convidados que, durante o congresso, alinharam o tom da formação docente em serviço
às diretrizes traçadas para o aperfeiçoamento do magistério capixaba. Estrategicamente, tratava-se
de fazer chegar aos professores das escolas em todo o Espírito Santo um pacote de orientações que
pode ser assim resumido: a) redução da pedagogia moderna à atualização de métodos e técnicas
de ensino; b) oposição da racionalidade técnico-científica a compreensões teóricas, políticas e
sociais da educação; c) formação em serviço baseada na observação e na modelização de métodos
e técnicas de ensino; d) utilização competente de recursos didáticos em sala de aula. Conclui-se que,
no contexto capixaba, fatores como o predomínio da economia agrícola, a carência de professores
e a insuficiência de meios para expandir a escolarização, estendendo-a às regiões interioranas,
conferiram à utilização da RE como dispositivo para a formação de professores, antes de tudo um
caráter utilitário que se estende aos textos pedagógicos, essencialmente voltados para a orientação
da prática de ensino.
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Referências
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leitura. In: VIDAL, Diana Gonçalves; HILSDORF, Maria Lúcia Spedo (orgs.). Brasil 500 anos: tópicas em
história da educação. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, p. 137-167.
COSTA, João Ribas da. O que faltou dizer no Congresso Pedagógico. Revista de Educação, Vitória,
anno 2, n. 17-18-19, p. 60-64, ago.-set.-out. 1935.
GINZBURG, Carlo. Mitos, emblemas, sinais: Morfologia e história. Tradução Federico Carotti. São
Paulo:Companhia das Letras, 1989.
LAUFF, Rafaelle F. Útil e Agradável: A Revista de Educação (1934-1937) – Remodelização das práticas
de ensino e divulgação da política reformista educacional de João Punaro Bley no Espírito Santo.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação: História, Política,
Sociedade. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007.
LAUFF, Rafaelle Flaiman; SIMÕES, Regina Helena Silva. Flutuações da galera, (im)perfeições da
pedagogia e outros mapas de navegação: a formação em serviço de professores no Espírito Santo
(1930-1935). Revista Brasileira de História da Educação, v. 19, p. 86, 2019
ISSN 2358-3959
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se aproximarão dos termos empregados para expressar as virtudes dominantes, pois a atividade
pedagógica é, na universidade, frequentemente vista como inferior. Nesse sentido, seria impossível
relacionar a ela, pela qualidade do trabalho que exerce, as virtudes dominantes observadas.
Nas avaliações que enfatizaram as qualidades médicas, percebemos o uso das apreciações que
buscaram, sobretudo, valorizar as habilidades médico-cirúrgicas. Contudo, há diferentes maneiras de
se referir às qualificações apresentadas, aquelas que enfatizam o desenvolvimento correto da técnica
demonstrando seu domínio (“habilidade e destreza”), aquelas que aludem a um conhecimento de
ordem um pouco diversa para o qual se exigem habilidade e o profundo conhecimento da literatura
médica (“teve erudição nas condutas diagnósticas e terapêuticas”) e, finalmente, aquelas que se
apresentam envoltas pela “elegância” no desenvolvimento do procedimento (“procedimento
realizado de forma elegante”) sugerindo que, mesmo quando se está avaliando as habilidades
que são eminentemente cultivadas, os atributos que se referem às virtudes dominantes, médias
e inferiores incidem sobre a percepção dos avaliadores fazendo com que se avalie mais do que a
simples competência para a execução da técnica.
Considerações finais
É relativamente comum ouvirmos que a USP é uma instituição elitista que reproduz em seu interior
as desigualdades sociais que ocorrem fora dela consagrando aqueles que têm mais condições para
isso. Entretanto, essas considerações não bastam para compreendermos as formas pelas quais essa
reprodução se opera, sendo necessário que entendamos como. Ao investigarmos os concursos de
contratação docente tivemos a oportunidade de compreender uma das formas de reprodução que
consagra certos habitus mais próximos aos valores e aos padrões de excelência universitários. Tomar
os pareceres elaborados pelas bancas nos permitiu identificar características do juízo professoral
que foi elaborado tendo por base valores apresentados por meio de um léxico específico que buscou
explicitar os pontos fortes e fracos daqueles que concorreram às vagas como docentes da instituição.
Referências
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas linguísticas: o que falar quer dizer? 2ª ed. São Paulo:
EDUSP, 1996.
_________.A economia das trocas simbólicas. 7°edição. São Paulo: Perspectiva, 2013.
JULIA, Dominique. A cultura escolar como objeto histórico. In: Revista Brasileira de História da
Educação, n°1, jan/jul 2001.
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Introdução
Este trabalho apresenta a tentativa de (re)construção da história, praticamente desconhecida, da
educadora sanjoanense Alexina Pinto, educadora mineira que atuou na Escola Normal de São João
del- Rei entre os anos de 1893 e 1896.
O quase desconhecimento de sua atuação pode estar relacionado, em parte, à falta de fontes que
possam esclarecer sobre a sua trajetória e atuação, mas, também, pode se relacionar ao contexto
em que viveu, marcado pelo domínio social masculino e apagamento das personagens femininas
que, apesar de ocuparem um espaço de destaque, não tiveram suas ações transformadas em
monumentos (LE GOFF, 1996).
Esta pesquisa trabalha a primeira hipótese levantada: a escassez de fontes sobre Alexina Pinto.
Assim, seu objetivo principal foi o de identificar o maior número possível de fontes que possam
esclarecer sobre a atuação e trajetória de Alexina Pinto. Durante o processo de identificação das
fontes, tornamos em perguntas os objetivos específicos: Quais as fontes existentes e disponíveis e
que possam esclarecer sobre Alexina Pinto e suas ações? Onde elas estão? De que tipo são? Quando
foram produzidas? Por quem?; Essas perguntas movimentaram o processo de levantamento de
fontes para posterior catalogação das informações contidas em cada uma delas.
Algumas considerações
O trabalho apresentado teve como objetivo a tentativa de uma (re)construção da história ainda
pouco conhecida da educadora Alexina Pinto. Por meio dos procedimentos metodológicos adotados,
foi possível perceber a pouca produção sobre o tema e as várias lacunas existentes, sobretudo no
campo da Educação. Essa lacuna pode ser justificada, também, pela carência de fontes sobre a
educadora e, consequentemente, sobre suas ações e trajetórias na educação.
Longe de promover o encerrar desta lacuna, a presente pesquisa pôde contribuir com o campo
ao catalogar as fontes que foram encontradas e disponibilizá-las em um banco de dados. A ideia é
que, a partir dessa catalogação de informações, outras pesquisas possam surgir e contribuir para a
(re)construção da história da educadora Alexina Pinto.
Referências
BICCAS, Maurilane de Souza. O Impresso como Estratégia de Formação: revista de Minas Gerais
(1925-1940). Belo Horizonte, Argumenton, 2008.
CELLARD, André. Análise documental. In: POUPART, Jean et al. A pesquisa qualitativa: enfoques
epistemológicos e metodológicos.Petrópolis: Vozes, 2008.
O percurso acadêmico de Ana Waleska Pollo Campos Mendonça (1946-2017) será abordado neste
trabalho, em razão de suas contribuições para o campo da História da Educação no estado do Rio de
Janeiro e no Brasil.
As fontes consultadas e analisadas foram a sua produção acadêmica, a saber, artigos, livros
e capítulos publicados, programas e ementas dos cursos por ela elaborados e ministrados,
documentos encontrados no Núcleo de Memória da PUC-Rio, atas de reuniões do seu Grupo de
Pesquisa e, a principal delas, uma entrevista que Mendonça concedeu a Tânia Dauster, na PUC-Rio,
transcrita por Ana Beatriz Lavagnino para o “Projeto Fundadores” – a construção da memória da
Pós-Graduação em Educação da PUC-Rio. A metodologia utilizada, portanto, concilia a história oral
e análise documental.
A análise dessas fontes documentais revela elementos da formação de Mendonça, sua carreira
profissional e o tempo de atuação na PUC-Rio, os cargos ocupados, disciplinas lecionadas, as
sociedades científicas nas quais atuou, seus achados de pesquisa, a concepção de história de
educação que defendia, dentre outros aspectos marcantes da construção de sua trajetória.
Compreendemos que refletir sobre a atuação de Mendonça como historiadora da educação e
que teve sua trajetória marcada por engajamentos educacionais é um exercício que implica o
mapeamento das redes pelas quais circulou. Trata-se, portanto, de uma temática que ocupa um
lugar de destaque na historiografia da educação brasileira há algum tempo.
O trabalho está dividido em 6 partes. Na primeira tratamos de sua entrada na universidade e das
primeiras experiências profissionais. Na segunda, de sua experiência no mestrado e dos primeiros
anos de docência no ensino superior. A terceira parte remete para os tempos de redemocratização do
país, quando Mendonça deu os primeiros passos na pesquisa, descobriu novas formas de militância
e cursou o doutorado. Na quarta parte enfatizamos a conciliação vivenciada por Mendonça entre
ensino, pesquisa e administração. A quinta parte remete para os últimos anos de atuação acadêmica,
partindo da experiência de pós-doutoramento, realizada em Portugal. Concluímos com algumas
inquietações deixadas pela historiadora da educação.
Ressaltamos que esta análise resultou numa visão particular e, portanto, parcial da trajetória
de Mendonça e, ainda que colabore com a historiografia, na medida em que proporcione um olhar
a mais sobre sua trajetória e sobre sua concepção de história da educação num dado contexto
histórico. Investigar os esforços feitos em prol da Educação no Brasil, nos diversos períodos e por
intelectuais e professores como Mendonça, pode se configurar em contribuição relevante para o
campo da história da educação, em especial para a história da profissão docente.
Em 1964, Ana Waleska Mendonça ingressou na Universidade Católica, no curso de graduação
em Pedagogia, oferecido pela antiga Faculdade de Filosofia. Formou-se em 1967 e no ano seguinte
iniciou o curso de Mestrado em Educação, na área de Planejamento Educacional, na PUC-Rio.
Referências
BRANDAO, Z.; MENDONÇA, A. W. P. C.. Uma tradição esquecida: Porque não lemos Anísio Teixeira? 2ª
edição revista.. 2. ed. Rio de Janeiro: Forma & Ação, 2008. v. 1. 250p.
MENDONÇA, A. W. P. C.. Anísio Teixeira e a Universidade de Educação. 1ª. ed. Rio de Janeiro: EDUERJ,
2002. 185p.
MENDONÇA, A. W. P. C.. Reconstruindo uma Trajetória. In: José Gondra; José Cláudio Sooma Silva.
(Org.). História da Educação na América Latina: ensinar e escrever. 1ed.Rio de Janeiro: EdUERJ, 2011,
v. 1, p. 39-53.
MENDONÇA, A. W. P. C.; XAVIER, L. N.. Por uma política de formação do magistério nacional: o INEP/
MEC dos anos 1950/1960. 1. ed. Brasília: INEP/MEC, 2008. 260p.
SOARES, J.C., Xavier, L.. Contribuições de Ana Waleska Mendonça para a pesquisa em História da
Educação. Revista Contemporânea de Educação, 2019.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Para este trabalho busca-se apresentar a trajetória profissional do professor Apelles Porto Alegre,
nascido na cidade de Rio Grande/RS em vinte e quatro de outubro de 1850 e morreu na cidade de
Porto Alegre/RS em seis de julho de 1917. Filho de Antônio José Gomes Porto Alegre e Delfina da
Costa Campelo, o casal teve quatro filhos, além de Apelles que era o caçula, Apolinário, Lucio e
Aquilles.
A família Porto Alegre mudou-se para a capital do Rio Grande do Sul após o falecimento do
pai, Antônio José, nesta cidade todos construíram suas vidas. Os irmãos Porto Alegre, como eram
conhecidos, estiveram sempre envolvidos com à educação, a cultura e à política do estado, atuando
como professores, escritores, poetas, jornalistas, além de criarem colégios e participarem de jornais
e associações como o Parthenon Litterário, e o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do
Sul. Conforme Alvaro Pôrto Alegre (1954, p.7) Apolinário deixou um manuscrito relatando: “À minha
família cabe a glória de ter sido a inspiradora da reação atual em favor da liberdade. Fomos os mestres
da mocidade rio-grandense. Filhos de farrapos, não interrompemos jamais a evolução tradicional”.
Existia um orgulho mútuo e uma consciência de que o envolvimento com a cultura e a educação do
Estado deixaria marcas na história.
Para a construção metodológica deste trabalho, cabe destacar as contribuições de Cellard (2010)
para utilização da análise documental. Inicialmente encontrou-se um conjunto substancial de
documentos particulares, do qual é possível entender onde atuava e as principais ideias do professor
Apelles, que viveu na metade século XIX, estando fortemente influenciado pelas ideias abolicionistas
e republicanas. Além desse conjunto de documentos particulares, a pesquisa se estendeu para
acervos públicos e privados da cidade de Porto Alegre como Instituto Histórico e Geográfico do Rio
Grande do Sul, o Museu da Comunicação Hipólito José da Costa, o Arquivo Histórico do Rio Grande
do Sul, o Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul, a Biblioteca Pública do Estado do Rio
Grande do Sul, entre outros.
De acordo com Cellard (2010), o documento escrito é uma fonte preciosa que o historiador pode
utilizar, seja no passado ou no presente e em muitos casos é a única ferramenta a ser utilizada.
O acervo do professor Apelles conta com 152 documentos o que permitiu realizar um agrupamento
formando séries, segundo nossos critérios podem ser descritas do seguinte modo: correspondências,
recibos, boletins, telegramas, textos, poemas, cartões de visita, documentos e anotações.
Estes documentos datam de 1855 a 1934, porém, trinta e quatro não possuem datação.
Considerando, que o professor Apelles Porto Alegre faleceu em 1917, estas fontes são relacionadas a
seus familiares e serão analisadas por sua relevância para a história da educação.
contribuiu de forma permanente com a disseminação do ideário positivista que apregoava o fim do
império e a implantação de um regime presidencialista. Ideias que eram ministradas nos espaços
escolares, e nos diversos impressos nos quais colaborava.
Referências
ARRIADA, Eduardo. A Educação Secundária na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul: a
desoficialização do ensino público. Jundiaí: Paco Editorial, 2011.
GOMES, Angela Maria de Castro e HANSEN, Patricia Santos. Intelectuais Mediadores: práticas
culturais e ação política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.
PÔRTO ALEGRE, Alvaro. Apolinário Pôrto Alegre. Pôrto Alegre: Editora Thurmann, 1954.
ISSN 2358-3959
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Resumo
Passados 130 anos da Proclamação da República, que tem dentre os seus valores a tolerância e a
solidariedade e cuja concretização requer como prioridade uma educação democrática e inclusiva,
apresento este trabalho, que faz parte da tese do meu doutorado em educação, iniciado em 2019,
na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Seu tema é a produção docente de Ariano Suassuna,
homem das Letras, que destacou-se no magistério como professor universitário, na UFPE, e como
secretário de educação e cultura, fazendo uso das políticas educativas para realizar diversos projetos
culturais, como o Movimento Armorial. Inspirado pelas leituras de Euclides da Cunha, Machado
de Assis e Dostoiévski, Suassuna não aceitou a segregação cultural das elites imposta às classes
populares, para manter a continuidade de sua dominação hegemônica, enfocando a questão do
intelectual orgânico de Gramsci. Inferindo que a base da cultura erudita vinha das nossas tradições
ibéricas, reinterpretadas através de cinco séculos, por indígenas, negros e mestiços, amálgama que
deu origem à cultura popular, Suassuna procurou fazer uma fusão de dois países: O “Brasil oficial”
e o “Brasil real”. Desse modo, este texto configura-se como uma reflexão sobre a sua contribuição
à Educação brasileira, ao enfocar a relevância social de sua produção docente, dentro e fora do
locus tradicional da sala de aula.
Introdução
Este trabalho configura-se como a história e a análise da produção docente de Ariano Vilar
Suassuna, sua preocupação com a construção do conhecimento e da identidade do povo brasileiro, e
da preservação de sua memória cultural. Não obstante ter nascido no seio de uma família tradicional,
política e abastada, parte do que Machado de Assis chamou de “Brasil oficial”, Suassuna, para
quem a cultura era a sede da alma e da honra de uma nação, optou por entender e trabalhar para
um outro país, o “Brasil real”, dos pobres e desvalidos. Esta pesquisa pretende, na intercessão do
rigor científico e da relevância social, investigar a sua experiência individual como docente, que se
expandiu por décadas, para diversas redes de sociabilidade.
Suassuna elaborou a sua literatura e docência, com o popular e o erudito sempre se imbricando,
tendo o Movimento Armorial como a concretização dessa fusão. Exemplo disso foi a interação da
orquestra sinfônica com os cantadores, uma iniciativa de oferecer ao povo a cultura erudita e mostrar
ao erudito o valor do popular. Como educador, era essa a percepção e intenção de Suassuna: formar
cidadãos críticos, que valorizassem a sua cultura e a sua identidade.
Para o professor Suassuna (como apreciava ser chamado), o povo tinha que ter acesso à educação
e à cultura porque o “Brasil real” merecia uma educação ideal. Educação que deveria ser levada aos
sertões, às periferias e às favelas, como um projeto pautado na construção do conhecimento e da
valorização da memória cultural.
Objetivos
O objetivo do presente estudo é investigar, analisar e registrar, nos anais da História da Educação,
o valor de Ariano Suassuna, não apenas como literato, mas percebê-lo pelo viés da defesa e da
prática de ações e políticas educacionais e culturais. É ainda compreender a contribuição de sua
docência para a Educação brasileira, identificando elementos biográficos que o levaram à carreira
de professor, sua verdadeira vocação, segundo todos os que conviveram com ele.
Esta pesquisa pretende apresentá-lo como pensador e agente de práticas pedagógicas e projetos
culturais, como professor da UFPE e secretário de educação e cultura, aplicando a Literatura às
Ciências sociais, mostrando aos educandos que o conhecimento adquirido era o grande propulsor
da transformação da vida em sociedade.
Metodologia
O discurso acadêmico precisa dialogar com outros discursos e dessa maneira, tendo como foco
a produção docente de Ariano Suassuna, este trabalho será um diálogo entre Educação, Literatura e
História. A análise está sendo realizada a partir de referenciais teóricos que fundamentarão categorias
de análise como escola, educação, ensino, memória, identidade, história, literatura e cultura.
É também desenvolvido a partir de pesquisas realizadas no Arquivo da UFPE e entrevistas com
familiares, colegas de docência e ex-alunos, uma vez que a escrita de um trabalho de pesquisa requer
muito mais do que um olhar minucioso a documentos e fontes bibliográficas que fundamentam o
tema escolhido e a sua problemática. Para a tessitura desse trabalho, documentos e diálogos com
outros pesquisadores e teóricos não seriam suficientes. Foi preciso ouvir o outro, melhor dizendo,
outros, que através das entrevistas compartilharam suas memórias individuais, coletivas, históricas,
afetivas e assim, também autobiográficas sobre convivências e interações com o professor Ariano
Suassuna.
Resultados alcançados
Foram, neste primeiro ano, realizadas leituras de teóricos sobre as categorias de análise citadas
na metodologia, bem como de textos de Ariano Suassuna, empreendidas pesquisas no arquivo
geral da universidade onde ele trabalhou por mais de três décadas e ainda entrevistas com
familiares e companheiros de trabalho, durante uma viagem que fiz a Recife. A tese será dividida em
três capítulos: biografia, prática educativa e projeto de “uma educação ideal” para o “Brasil real”. O
primeiro capítulo já está sendo desenvolvido.
Em sua obra A Educação na Cidade, o professor Paulo Freire afirma que “Ninguém começa a ser
educador numa terça-feira às quatro da tarde”, porque segundo ele, a pessoa se faz e se forma como
educador. E isso é, ao longo da existência, um processo permanente de reflexão e prática. Segundo
relatos de familiares, Suassuna descobriu sua vocação ainda na infância, em Taperoá, quando fazia
o primário e era o monitor da turma. Assim, quando o professor Emídio precisava ausentar-se,
o menino Ariano assumia a classe. Era o sertão da Paraíba, em tempos de seca muito intensa e
de extrema desigualdade social.
Formado em direito, não encontrou na advocacia a sua realização profissional, e em 1956,
finalmente ingressou, paralelo ao seu processo de escrita, naquela que seria sua verdadeira a
vocação, o magistério, tornando-se o professor Ariano Suassuna, na Universidade Federal de
Pernambuco ( UFPE)
Entretanto, de acordo com o professor Carlos Newton Júnior, da UFPE, numa prestação de contas
mais ampla, teríamos que também considerar, além das aulas e orientações do professor Suassuna,
a sua produção no campo do ensaio – artigos, estudos, capítulos de livros e prefácios, que o próprio
Suassuna considerava como extensão natural do seu trabalho docente.
Mesmo fora da sala de aula, durante seus mandatos como secretário de governo e após a
aposentadoria em 1989, manteria o enfoque da valorização do ensino, tornando sua prática
educativa itinerante, ao percorrer as periferias, favelas e sertões brasileiros, levando cultura.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 743
Em 1970, surgia o Movimento Armorial, cujo objetivo era criar uma arte erudita a partir dos
elementos da cultura popular do Nordeste, e abrangia muitas formas de expressões artísticas, como
música, dança, literatura, tapeçaria, artes plásticas, teatro, cinema e arquitetura. Enquanto secretário
de cultura de Pernambuco, na década de 1990, elaborou e coordenou as aulas-espetáculo, eventos
organizados com muitos elementos icnográficos e musicais da estética armorial, que continuaram
até o fim de sua vida.
Ainda enquanto secretário de cultura do Estado, no governo de Miguel Arraes, surgiria o projeto
“A Onça malhada, a Favela e o Arraial, com o qual Suassuna e sua equipe de artistas percorriam
as periferias brasileiras e o sertão, convidando o povo simples do “Brasil real” para assistir aos
espetáculos de música, dança e teatro. A onça era na realidade uma metáfora do povo brasileiro,
mestiço em sua etnia e por conseguinte, em sua cultura.
Conclusões
A palavra-chave da produção literária e docente de Suassuna é “resiliência”, nomenclatura tão
pertinente à realidade das práticas educativas das escolas públicas de nosso país, onde os seus atores
sociais (professores e alunos), de norte a sul do Brasil, diariamente retornam às unidades escolares,
imbuídos pela “pedagogia da esperança”, que fortalece os seus sonhos, transformando-os em
projetos, práticas e realizações, apesar das situações de desigualdade do contexto sociopolítico.
A grande relevância de décadas de sala de aula e dos projetos culturais de Ariano Suassuna foi
a compreensão do “Brasil real” pelo “Brasil oficial”. Seria impossível valorizar o Brasil sem valorizar
seu povo do sertão, das periferias e das favelas, sem oferecer-lhes uma educação e uma cultura de
qualidade. É preciso que a democracia seja republicana e a república seja democrática, para que
possamos de fato abrir os braços e fazermos um país. O professor Ariano Suassuna foi um sujeito
social, que interligou o universo das letras com o da docência, pelo viés do comprometimento da
arte e o povo. O seu legado, fundamentado e posto em prática a serviço da educação e da cultura, é
portanto de grande relevância para a história da Educação brasileira.
Referências
CUNHA, Euclides da. Os Sertões. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001.
VICTOR, Adriana. Ariano Suassuna: um perfil biográfico/ Adriana Victor, Juliana Lins. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editora, 2007.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Marina Matiello
Terciane Angela Luchese
O estudo é desenvolvido com o objetivo de analisar como se constituiu a docência nas escolas
carlista-scalabriniana no Rio Grande do Sul, no período de 1915 a 1948. Para tal, busca-se investigar
indícios acerca da seleção e formação de professores, no percurso histórico de implantação de
instituições escolares scalabrinianas no Rio Grande do Sul. Utilizam-se pressupostos teórico-
metodológicos da história cultural e da história da educação, com o emprego da história oral e da
análise documental histórica. Como principais referenciais da abordagem da história cultural,
utilizou-se Certeau (2015); Burke (1992, 2008, 2011), Le Goff (1994), Chartier (2014, 2016), Veyne
(2014) e Pesavento (2008). O recorte temporal foi delimitado de 1915, ano de inserção da Congregação
na Região Colonial Italiana (RCI) — RS, até 1948, quando iniciaram as obras educacionais no Sul do
estado do RS, em Santa Vitória do Palmar, o que produz uma nova configuração para a organização
da congregação no estado gaúcho. O percurso da pesquisa é marcado pela busca de documentos e
da contribuição de sujeitos para compreender a constituição e a organização da congregação e da
educação carlista-scalabriniana. A história das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo –
Scalabrinianas está relacionada à Pia Sociedade dos Missionários de São Carlos, fundada por Dom
Giovanni Battista Scalabrini, que recebeu o título de “Apóstolo dos Migrantes”. A congregação
feminina emergiu com o auxílio do cofundador Pe. José Marchetti, que, após presenciar a situação
de um órfão lactante e de seu pai (viúvo), teve a ideia de fundar, em São Paulo, um orfanato para os
filhos de migrantes, especialmente italianos. Com a convicção de que as Irmãs completariam a obra
dos missionários, Scalabrini fundou a Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo
– Scalabrinianas. Para atender à urgência da situação dos órfãos e abandonados do orfanato,
Marchetti solicitou ajuda à própria irmã, Assunta Marchetti, que se tornou cofundadora da
congregação. A Congregação, fundada no dia 25 de outubro de 1895, visava atender às necessidades
de catequese, educação e saúde dos imigrantes italianos. (CONGREGAÇÃO DAS IRMÃS MISSIONÁRIAS
DE SÃO CARLOS BORROMEO, 1995). A presença das Irmãs Carlistas — Scalabrinianas no Rio Grande
do Sul deu-se a partir de 1915, com a missão de dirigir uma escola no Município de Bento Gonçalves,
na Região de Colonização Italiana (RCI). A primeira obra no Rio Grande do Sul, uma escola católica e
italiana, foi denominada, primeiramente, de Colégio São Carlos. Depois se transferiu para outro
prédio, recebendo a denominação de Colégio Nossa Senhora Medianeira. No período proposto para
o estudo foram inauguradas 14 escolas no estado, pertencentes a Província Imaculada Conceição,
fundada em 1927, nas seguintes localidades: Bento Gonçalves (1915); Farroupilha (1917); Guaporé
(1917); Nova Bréscia (1919); Nova Milano/Farroupilha (1924); Anta Gorda (1931); Roca Sales (1931);
Muçum (1933); Caxias do Sul (2 unidades, 1936 e 1946); Caravaggio/Farroupilha (1937); Paraí (1943);
Casca (1948) e, no mesmo ano, em Santa Vitória do Palmar, expandindo, assim, para além da RCI. Ao
pensar sobre os tempos, espaços, sujeitos, conhecimentos e as práticas escolares, em específico
neste estudo, sobre a educação preconizada pela Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos
Borromeo – Scalabrinianas, é inevitável refletir acerca da docência nas escolas da Congregação das
Irmãs Missionárias Carlistas — Scalabrinianas. No Rio Grande do Sul, recorte espacial proposto, as
primeiras professoras eram Irmãs. No entanto, as religiosas, em alguns momentos e para disciplinas
específicas, necessitaram do auxílio de religiosos, mais especificamente, de padres de leigos. Não se
tem o intuito de apresentar um dossiê sobre quem eram esses professores, mas apresentar alguns
ensaios sobre o tema. No início da história das escolas da congregação, as Irmãs Carlistas —
Scalabrinianas poderiam se tornar professoras tão logo tivessem o conhecimento necessário para o
nível de ensino a que lecionariam. Em 1945, o Regulamento Interno do Colégio São Carlos, indicavam
as normas para os professores, dentre as quais estar em sala de aula pelo menos 5 minutos antes de
sua aula; ministrar as aulas de acordo com os horários estipulados pela diretora; zelar pela disciplina
nas aulas e para a disciplina geral do colégio, além de cooperar com a diretora. Sobre a disciplina,
destaca-se, no art. 18º, que, dentre as proibições, era vedado ao professor “servir-se da cátedra para
pregar doutrinas contrárias aos interesses nacionais, ou para insuflar nos alunos, clara ou
disfarçadamente, atitudes de indisciplinalidade ou agitação”. Assim, se entende que os professores
deveriam obedecer às normas do colégio, que estavam, por sua vez, amparadas em normatizações
e exigências nacionais. Reforça-se, assim, que as religiosas se adaptaram ao movimento de
nacionalização do País, sendo possível, por isso e por outros motivos, é claro, permanecerem nas
suas atividades educacionais. Com isso, quer-se dizer que, ao mesmo tempo que as escolas carlistas-
scalabrinianas se distinguiam de outras, por serem de uma congregação católica italiana, ou
reconhecida como italiana, também se assemelhavam às escolas da época, pelo fato de atenderem
à legislação vigente. Para atender à legislação de 1946, os professores tinham a Carteira de
Identificação, que os habilitava à docência de disciplinas no Ensino Secundário. O Decreto-Lei 8.777,
de 22 de janeiro de 1946, do Ministério da Educação e Saúde, dispunha sobre o registro definitivo dos
professores de Ensino Secundário. Entende-se, a partir disso, que com o diploma ou a prova, era
possível a habilitação para disciplinas do Curso Secundário, o que justifica os professores terem
atuado em várias disciplinas, incluindo, as de áreas diferentes. Antes disso, as prerrogativas pareciam
ser outras, lembrando que as religiosas já possuíam status de saber e que, por terem aprendido os
conteúdos enquanto eram estudantes, muitas vezes, já eram consideradas aptas à docência. Os
indícios encontrados permitem crer que a escolarização promovida por elas estava relacionada à
instrução, com o objetivo de criar condições para que os alunos recebessem os conhecimentos
básicos, trabalhados inicial e especialmente em Cursos Primários e, depois, estendendo-se para os
Cursos Secundários. Havia simplicidade nos fazeres das Irmãs missionárias e uma valorização da
transmissão de conteúdos e da memorização. Alguns saberes eram valorizados, incluindo-se os
trabalhos manuais e a música. Nos colégios carlistas — scalabrinianos, estavam presentes o canto,
através do coral; o ensino de piano; e o teatro, com encenações públicas para demonstrar à
comunidade os resultados da educação preconizada pelas escolas. As freiras disciplinavam,
ensinavam aos alunos, especialmente às alunas internas, os cuidados com a limpeza e a organização
dos espaços. A instrução e os trabalhos manuais eram destinados às meninas, com o objetivo de,
além de instruir, ensinar as alunas a se comportarem, ou seja, era importante ler, escrever, calcular,
mas também se comportar adequadamente. As Irmãs carlistas — scalabrinianas foram afirmando
sua presença e técnica, na área da educação, através de construções sólidas em áreas centrais de
Municípios. Também estiveram presentes no interior do Município de Farroupilha, para dar
atendimento às demandas das comunidades de migrantes italianos. Pode-se afirmar que, em
Farroupilha, Bento Gonçalves e Guaporé, as escolas carlistas-scalabrinianas possuíam os maiores
prédios da cidade, em áreas centrais, denotando imponência e empoderamento. Os colégios eram
referência não só pela arquitetura, mas também pela educação religiosa, moral e disciplinadora,
oferecida pela Congregação das Irmãs Missionárias de São Carlos Borromeo — Scalabrinianas. Em
Caxias do Sul, o prédio, no período estudado, não era tão imponente como o de outras congregações,
que se estabeleceram no Município anteriormente. Conclui-se que as principais marcas da educação
carlista-scalabriniana, eram a instrução e a religiosidade. Essa educação prezava pela disciplina,
pela organização e pela ordenação do espaço. As Irmãs carlistas — scalabrinianas queriam ser
reconhecidas por essas marcas, pois eram aspectos valorizados pela comunidade. A educação tinha
como principal referência o próprio fundador, era constituída na prática e estava voltada à
catolicidade, à etnicidade e à escolarização. A etnicidade representava uma marca importante da
congregação, com a qual se produzia uma identificação com os imigrantes e seus descentes; a
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 746
escolarização era entendida como instrução de fundamentos básicos de leitura, escrita e cálculo; e
o catolicismo aparecia nas práticas cotidianas e nas celebrações das escolas da congregação.
Referências
CONGREGAÇÃO DAS IRMÃS MISSIONÁRIAS DE SÃO CARLOS BORROMEO – SCALABRINIANAS.
Centenário mscs: celebrando o Centenário de Fundação da Congregação das Irmãs Missionárias de
São Carlos Borromeo – Scalabrinianas (1895-1995). São Paulo: Loyola, 1995.
FRANCESCONI, M. Inizi della Congregazione Scalabriniana: il primo dopo guerra (1919-1940). Roma:
Centro Studi Emigrazione, 1975. v. 5.
SIGNOR, L. M. Irmãs Missionárias de São Carlos Scalabrinianas: 1895-1935. Brasília: CSEM, 2005. v.
1. (Série Memórias, 1).
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente artigo tem como objetivo analisar as representações sobre a educação escolar
veiculados nos Programas de Ensino Primário de Mato Grosso no período de 1961 a 1966. A definição
do recorte temporal para este estudo se justificava pela atuação do governo estadual na reorganização
do ensino primário, a partir de diversas intervenções destinadas a alterar as condições do ensino
ministrado nas escolas primárias mato-grossenses. Sendo assim, foi no governo de Fernando Corrêa
da Costa (1961-1966) que ocorreu a criação dos referidos programas escolares, quando o
Departamento de Educação e Cultura, vinculado à Secretaria de Educação, Cultura e Saúde
estabeleceu as diretrizes curriculares para cada matéria, as orientações metodológicas gerais, e as
obrigações e deveres aos professores e alunos dos grupos escolares, escolas reunidas, escolas
isoladas e rurais, mistas do estado. As ingerências do governo de Mato Grosso na configuração do
ensino primário foram realizadas diante do contexto voltado para a implantação de modificações na
educação nacional, que tinha o objetivo de melhorar o nível do rendimento das escolas brasileiras.
Dessa forma, este trabalho procura compreender como as questões educacionais foram
representadas nos referidos programas, que estavam destinados a orientar a atividade dos
professores nas escolas primárias. O subsídio teórico escolhido para este estudo foi o conceito de
representações elaborado por Roger Chartier (1990), que é compreendido como delimitações,
classificações e divisões que indivíduos e grupos organizam sobre si mesmos ou sobre algum aspecto
do mundo social. As exclusões e classificações colaboram para a constituição de formas de percepção
e de apreensão do real, propiciando um entendimento de qual visão deveria prevalecer no campo
educacional, pois são discursos que buscam se tornar hegemônicos na sociedade pela qual são
apresentados, bem como também procuram manter ou provocar o surgimento de novas práticas.
Nesta circunstância, analisar as representações sobre a educação escolar advinda de um documento
oficial do Estado, voltado aos professores primários, significa apreender os seus interesses relativos
à organização escolar, os conteúdos a serem ministrados nas escolas, as percepções sobre qual perfil
de professores estava sendo exposto, assim como as maneiras como as práticas pedagógicas
difundidas faziam parte de um enredo representacional do governo estadual, relativo a criação de
uma nova reestruturação do ensino que deveria ser oferecido aos alunos do curso primário, já que
as visões do social não são de formar alguns discursos neutros (CHARTIER, 1990). Além disso, a
abordagem de Antônio Nóvoa (1995) também foi definida como suporte para a escrita deste texto,
ao entender que o processo de profissionalização docente ocorre por meio das relações construídas
entre o Estado e os professores. Deste modo, a compreensão da profissionalização da docência no
estado decorre das interações estabelecidas historicamente entre os professores e o Estado. Essas
interações possibilitaram a composição de novas formas do exercício da atividade docente enquanto
profissão, pois, segundo Nóvoa (1995), o Estado exerce a organização do magistério, desde a
definição das modalidades de ensino, a criação das escolas, os conhecimentos que deveriam ser
pela gestão estadual. Assim, o referido programa visava oferecer um suporte aos professores
primários em suas atividades escolares, a partir de uma base de orientações pedagógicas voltadas
para a definição dos conhecimentos a serem ensinados e as metodologias a serem empregadas no
exercício do magistério. As análises indicaram que os diversos discursos difundidos nos programas
escolares procuravam referendar que o avanço do ensino primário ocorreria por meio da inserção de
conhecimentos e técnicas de ensino modernas, bem como enfatizava a atuação do Estado na
realização das modificações no ensino estadual.
Referência
ALCÂNTARA, Hermes Rodrigues de. Três anos de progresso educacional e sanitário. Cuiabá,
Secretaria de Educação, Cultura e Saúde, 1964.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990.
MARCÍLIO, Humberto. História do ensino em Mato Grosso. Cuiabá: Secretaria de Educação, Cultura
e Saúde, 1963.
NÓVOA, Antônio. (Coord.) Os professores e sua formação. 2ª. ed. Lisboa/Portugal: Publicações Dom
Quixote, 1995.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
ASSOCIAÇÃO DO PROFESSORADO
CATARINENSE: ENTRE A TUTELA DO ESTADO
E A EMANCIPAÇÃO DO PROFESSORADO
XIX, como é o caso da Imperial Sociedade Amantes da Instrução, fundada em 1834, que procurava
disseminar a instrução elementar. Objetivo semelhante era pretendido pelo Grêmio dos Professores
Públicos Primários da Corte, criado em 1880, que buscava acompanhar o desenvolvimento da
ciência pedagógica (LEMOS, 2011).
A Associação do Professorado Catarinense tinha como finalidade auxiliar a condição moral e
intelectual do professorado da província de Santa Catarina e prover as garantias de seus direitos
pessoais e interesses gerais da classe. Para tanto, poderia fazer uso de diferentes estratégias, tais
como organizar sessões para discutir assuntos concernentes à instrução pública e ao professorado,
em particular, e trocar correspondências com sociedades nacionais e estrangeiras dedicadas à causa
da instrução. Deveria, ainda, criar uma biblioteca pedagógica e publicar uma revista pedagógica
mensal. Estava prevista, também, a realização de concursos nos quais seriam conferidos prêmios
aos melhores trabalhos pedagógicos da província e a criação de uma caixa beneficente para auxílios.
A associação era administrada por um conselho eleito anualmente e constituído de presidente,
vice-presidente, primeiro e segundo secretários, tesoureiro, orador e um procurador para auxiliar
o tesoureiro. Sua manutenção era feita por meio das mensalidades dos sócios efetivos; pelo
pagamento da joia quando do ingresso do sócio efetivo e por doações. Com a arrecadação, a
associação mantinha um fundo na Caixa Econômica. Segundo o estatuto, os rendimentos deveriam
ser utilizados na compra de livros para a biblioteca, em prêmios que a associação desejasse conferir
e na concessão de auxílio aos sócios.
Destaca-se que tais finalidades são semelhantes àquelas apontadas por Catani (2003) ao
investigar a Associação Beneficente do Professorado Paulista. Criada em vinte e sete de janeiro de
1901, tal associação possuía como objetivo reunir e/ou prover os membros do magistério público
do Estado de São Paulo. A associação paulista também oferecia serviços de saúde e assistência em
caso de doenças ou invalidez do sócio e aos órfãos e às viúvas, assessoria jurídica e uma biblioteca
especializada. Mantinha, do mesmo modo, uma caixa de empréstimos e se propunha a realizar
conferências pedagógicas. A Revista do Ensino – periódico da associação do professorado paulista –
foi publicada entre 1902 e 1918, e contou com subvenção do poder estatal em diferentes momentos.
A revista da Associação do Professorado Catarinense intitulada Professor foi lançada no dia 25 de
agosto de 1889, cerca de um ano após a criação da associação, com distribuição gratuita a todos os
seus membros. Professor era formada de quatro páginas e foi composta, gratuitamente, nas aulas de
Tipografia do Liceu de Artes e Ofícios pelos estudantes Álvaro Guimarães e Pompeo Theodoro Dias,
sob a direção do professor Geraldo Ferreira Braga. Assinam como comissão redatora do impresso,
logo na primeira página, os médicos Luiz Augusto Crespo e Paula Guimarães e o professor Fausto
Werner.
Para Catani (2003), além de propagar os ideais defendidos por uma associação, uma revista
pedagógica contribui no processo de organização do campo educacional, pois é “fruto de um
projeto que, ao pretender congregar e defender os professores, quer contribuir para a delimitação e
o reconhecimento da especificidade profissional do trabalho da categoria” (p. 60).
A Associação do Professorado Catarinense contava, na data da publicação da sua revista, com 76
membros efetivos e onze professores que manifestaram interesse de virar sócios, mas não efetuaram
o pagamento da joia e das mensalidades. Em junho de 1889, o fundo social mantido pela associação
totalizava 869$203. Sua biblioteca estava sediada no Liceu de Artes e Ofícios localizado em de Nossa
Senhora de Desterro e podia ser frequentada no período noturno pelos sócios. Localizou-se indícios
da composição da biblioteca, como a doação realizada pelo professor do Liceu de Artes e Ofícios
Alfredo Toledo. Foram doados os seguintes livros: Traité des Devoirs, de Cícero, Werther, de Goethe,
Les Joyenses Commères de Windsor, de Shakespeare, Sul la Destruction des Jésuites em France,
de D’Alembert. Ao que parece, manter a biblioteca teria função estratégica de manter o fluxo de
interessados pela associação e de difundir conhecimentos, mas também, poderia auxiliar na difusão
de um projeto político-educacional específico.
Conforme o estudo de Leuchtenberger (2009), as associações profissionais no final do século XIX
e início do XX desempenhavam, além das funções de amparo financeiro, no caso da concessão de
auxílios assistenciais, importante papel social. Destaca-se que tal função atualmente é abarcada
pelo sistema de seguridade social, notadamente, a previdência e a assistência social.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 752
Este trabalho é fruto parcial da pesquisa de doutorado intitulada “EURIDES PEREIRA DE SOUZA: a
singularidade de ser professora no ensino rural de Uberlândia - MG, 1966 – 1997”. Tem como objeto
de estudo a história de vida, formação e as práticas educativas da professora alfabetizadora Eurides
Pereira de Souza. Dessa forma, nosso objetivo central consistiu em investigar a trajetória de vida de
uma professora primária no Ensino Rural de Uberlândia no período de 1966 a 1997, enfocando suas
práticas educativas desenvolvidas principalmente em escolas rurais do município de Uberlândia –
Minas Gerais.
O recorte temporal se justifica por abordar o tempo de docência da professora pesquisada.
Como metodologia, optamos pela História Oral, por meio de entrevistas realizadas com a professora
Eurides. Dessa forma, as narrativas são nossas fontes primárias, complementadas por fontes
iconográficas, e com a documentação disponibilizada na Seção de Recursos Humanos da Prefeitura
Municipal de Uberlândia e na Fundação Helena Antipoff.
Utilizamos para este trabalho autores que estudam os saberes docentes como Tardif (2002) e
Nóvoa (1992; 2005) e Ciclo Profissional Docente, com os destaques de Huberman (2000).
Defendemos a tese de que as práticas educativas da mediadora cultural e professora Eurides
Pereira de Souza promoveram o acesso das comunidades escolares rurais a saberes educativo-
culturais, extrapolando os muros escolares.
Neste trabalho em especial, evidenciamos a trajetória burocrática-pedagógica analisando as
entrevistas e o material encontrado na pasta funcional da professora pesquisada, na Prefeitura
Municipal de Uberlândia.
O encontro da sua pasta funcional nos possibilitou traçar parte de sua trajetória profissional,
numa perspectiva mais burocrática. Pudemos, assim, verificar a omissão proposital ou não nas
narrativas de Eurides, da quantidade de pedidos de contagem de tempo, da dificuldade em obter
direitos como os quinquênios e, principalmente, de se aposentar somente com um cargo, tendo
trabalhado todo o tempo com dobra de período.
As políticas públicas da Secretaria Municipal de Educação de Uberlândia e do Instituto de
Previdência Municipal de Uberlândia - IPREMU não reconheceram o tempo dobrado dispensado
pela professora na Educação Municipal, alegando a sua não contribuição previdenciária para o cargo
em dobra.
Nesse sentido, buscamos autores que discorressem sobre o assunto em pauta. Segundo
Godtsfriedt (2015), vários pesquisadores têm se debruçado a estudar os ciclos de vida profissional,
por serem importantes fontes de informações sobre a prática profissional docente. Nesta pesquisa
utilizamos os documentos da pasta funcional e as narrativas, não para estudar as práticas, mas
revelar o ciclo profissional e a carreira de uma História de Vida – considerando que vida e profissão
se atrelam durante o exercício profissional.
- Entrada na carreira – Exploração – Descoberta (1-3 anos de carreira): Huberman (2000) classifica
esta fase como sobrevivência, descoberta e exploração. A sobrevivência se dá entremeio ao choque
com o real (confronto inicial com a complexidade profissional), envolvendo as preocupações consigo
mesmo, os desencontros entre os ideais e as realidades e o enfrentamento de outras dificuldades
do contexto escolar. Já a descoberta traduz o entusiasmo do início de carreira, as experimentações
e a exaltação pela responsabilidade assumida, por constituir parte de um corpo profissional. Soma-
se a esses aspectos a exploração, que pode ser fácil ou problemática, sendo limitada, portanto, por
questões de ordem institucional.
Nessa fase, Eurides passa por duas condições extremas: a primeira, por ter vivido o seu pior ano
(primeiro ano de magistério):
Como eu disse, o primeiro ano como professora foi o pior ano da minha vida nas escolas rurais,
porque não tinha assistência de nada, apoio de nada, conforto de nada, vezes nada. Contando
que eu não tinha experiência, então, se eles me colocaram lá nessa situação, teriam que dar uma
assistência maior. (SOUZA, 2018, p. 254).
E a segunda, por ter conseguido passar no concurso e ser nomeada na escola recém-construída:
Escola Municipal Saudade.
Fiquei entre os dez primeiros lugares. Pra quem era atrasada, era um “trem” do outro mundo.
O Renato deu a chance de nós trabalharmos dentro da prefeitura. Ele falou que as dez primeiras
colocadas, se quisesse vir procurar o serviço dentro da Secretaria de Educação, podia ir. E eu já tinha
invocado tanto com as escolas rurais, que eu não quis ir. [...]. Era iniciante e já tinha gostado. Falei:
“Não, eu vou ficar é nas escolas rurais”. (SOUZA, 2018, p. 247).
- Fase de estabilização (4-6 anos): essa fase caracteriza-se como o estágio de consolidação
pedagógica, de sentimento de competência crescente e segurança. Ocorre o comprometimento
com a carreira docente e aumenta a preocupação com os objetivos didáticos. Considera-se, ainda,
como a fase de libertação ou emancipação, em que se acentua o grau de liberdade profissional
(HUBERMAN, 2000).
No momento de estabilização, Eurides continua atuando na Escola Municipal Saudade, com
turmas multisseriadas.
[As crianças] já entrava na primeira série, sem o menino saber nada. O menino entrava sem base.
Aí, ‘cê tinha que ficar dando a base pro menino ali, junto com a primeira série. Você tinha que fazer
os dois trabalhos com a sala. O curso que eu fiz para o concurso me ajudou muito. (SOUZA, 2018, p.
247).
da sala de aula, seja por um desencanto causado por fracassos em suas experiências ou por
reformas estruturais. O professor faz um exame do que será feito de sua vida frente aos objetivos e
ideais estabelecidos inicialmente; reflete tanto sobre continuar no mesmo percurso, como sobre as
incertezas de uma possível mudança (HUBERMAN, 2000).
Eurides experimenta essa fase de diversificação quando, na segunda gestão do prefeito Renato
de Freitas (1973 a 1977), a secretária de Educação, Corália, convida-a para trabalhar no setor do
lanche:
Teve uma época que eu fui trabalhar no setor do lanche porque lá era dos três governos: estadual,
federal, municipal. Por esses todos que eram mantido esse lugar, então, todos tinham que colaborar
para organização do lugar. Então a Prefeitura me cedeu pra ir ser a supervisora do lanche. Uma
supervisora pro lanche municipal e tinha outra que era supervisora estadual. (SOUZA, 2018, p. 249).
No Brasil, entre os anos de 1933 a 1940, Erico Veríssimo escreveu romances cuja personagem
principal e recorrente era a professora-leitora Clarissa. O primeiro romance sobre a jovem Clarissa
foi escrito, segundo o próprio autor, em quinze tardes de sábado e uma boa dúzia de domingos,
feriados e dias santos, demonstrando como seu início de carreira foi conturbado, mesclando suas
atividades na Livraria e Editora do Globo e sua dedicação às histórias narradas em seus livros.
Realizar esse estudo acerca das representações de professoras nos livros de Erico Veríssimo implica
considerar o processo de criação literária e a trajetória do escritor, que nasceu na cidade de Cruz
Alta, Rio Grande do Sul. Por motivos familiares, que levaram à ruina sua família, o jovem Veríssimo
não pôde finalizar os estudos em um renomado colégio da capital do Estado, Porto Alegre. Anos
mais tarde, em 1930, ao retornar a capital em uma tentativa de mudar de vida, após uma tentativa
de se estabilizar na cidade natal, o jovem começa a trabalhar na Livraria e Editora do Globo, casa
editora que publicaria todos os seus livros. Lá, o escritor experimentou todas as etapas da produção,
desempenhando funções de escritor, editor, redator e tradutor.
Em prefácio presente na reedição do romance, Veríssimo descreveu como construiu a personagem
Clarissa, que seria uma menina vestida com seu uniforme de normalista, com treze anos, se muito.
Seu andar seria uma dança, seu rosto deveria se parecer com uma fruta madura, e seus olhos escuros
deveriam revelar a manhã de primavera, com os jacarandás floridos da velha praça da Igreja Matriz
de Porto Alegre. Assim surgiu a personagem da menina e jovem professora.
O nome da personagem também foi explicado pelo escritor, que afirmou em seu livro de memórias
Solo de Clarineta, volume I, no prefácio da edição de 1978, que a história que escrevia com seus
tons claros merecia uma personagem cujo nome irradiasse esse frescor. Primeiro pensou em Clara,
nome logo rejeitado. O nome Clarice também foi repelido; finalmente pensou em Clarissa, nome que
depois daria a sua própria filha.
Clarissa foi também o primeiro romance de Erico Verissimo, publicado em novembro de 1933
pela Livraria e Editora do Globo, trata das descobertas da jovem Clarissa Albuquerque, de treze para
quartorze anos de idade, que se preparava para a profissão docente, saindo de sua cidade natal
no interior do Rio Grande do Sul rumo à capital do Estado, Porto Alegre, para estudar na Escola
Normal. A era jovem definida como uma jovem morena, com olhos pretos, bem escuros, e levemente
oblíquos. O rosto oval e o cabelo repartido no meio e muito lambido completavam a fisionomia da
normalista.
Uma vez na cidade, Clarissa hospedou-se na pensão da tia Zina, local que poderia ser definido
como um microcosmo da sociedade porto-alegrense da época, considerando a diversidade de
moradores do local.
Como os outros três livros narram a vida da jovem após concluir os estudos na Escola Normal, se
faz necessário uma breve explicação dos acontecimentos narrados: no livro Música ao longe (1935),
a jovem Clarissa, já formada, retornou a sua cidade natal, Jacarecanga, para lecionar. Lá, se deparou
com uma nova realidade, sua família, os Albuquerque, estava falida e desestruturada após a morte
de seu pai, assassinado a mando do prefeito do município. Em meio aos problemas de sua família
e a transferência para um grupo escolar longe de sua cidade natal, a jovem ainda tenta lidar com os
sentimentos por seu primo Vasco Bruno, seu amor dos tempos de criança. A história narrada em Um
lugar ao sol (1936) conta o retorno de Clarissa para Porto Alegre com sua mãe e primo para tentar
reestruturar a vida, se afastando da cidade onde seu pai fora assassinado. Saga, por sua vez, foi
publicado em 1940, e conta a história de Vasco Bruno, primo de Clarissa, que ao retornar da guerra
se casa com a jovem professora e se muda para uma casa no interior, onde pretende encontrar a
paz. Assim, se no primeiro livro, Clarissa é a menina que se prepara para lecionar, nos romances
Música ao longe, Um lugar ao sol, e Saga, a personagem, já uma jovem adulta, desenvolve o ofício
de professora.
Veríssimo escreveu os quatro livros em que a personagem aparece - Clarissa (1933), Música ao
Longe (1935), Um lugar ao Sol (1936) e Saga (1940) -, em um espaço de 8 anos, em uma época em
que a taxa de analfabetismo em Porto Alegre era muito alta, atingindo grande parte da população,
o que nos faz pensar: se Veríssimo se inspirava na sociedade porto-alegrense par escrever as
histórias, porque concordamos que a escrita literária é uma prática humana e uma das fontes mais
significativas para a compreensão das relações sociais, quem eram os leitores desses romances
proibidos? E, quais leitores eram representados neles?
Nas histórias sobre a menina Clarissa, são indicadas, de forma reflexiva, as leituras realizadas,
primeiro, pela normalista, que se atrevia a ler livros proibidos pela tia, de forma escondida. Um bom
exemplo é o livro A que morreu de amor..., romance que segundo sua tia, como não era livro do
colégio, iria prejudicar a cabeça de uma menina que estudava, e via a escola como uma “obrigação”,
quase uma “prisão”; e, depois, pela professora, que escrevia um diário, um registro íntimo em
que revelava suas práticas de leitura e escrita, revelando também sua relação com os alunos, as
exigências do colégio onde trabalhava, a configuração e disposição de elementos no espaço escolar,
entre outras características de sua vida e profissão. A jovem professora não podia acreditar que a
vida era tão diferente daquelas narradas em livros.
Considerando esses dados, é possível realizar reflexões sobre o que era permitido ou não ser lido
por uma menina e uma jovem na cidade de Porto Alegre naqueles dias. Ao se apropriar dos romances
lidos de forma escondida, a menina fazia comparações entre a literatura e a vida, evidenciando a
leitura literária como meio de representações de si própria.
Considerando os limites deste estudo, foram definidos dois livros para uma análise mais
aprofundada, são eles: Clarissa (1933) e Música ao Longe (1935); o primeiro por narrar a juventude
e anos de estudo da menina na Escola Normal, o segundo por narrar as primeiras experiências da
professora logo após a conclusão do curso normal. Dessa forma, foi realizada a leitura dos dois
livros e posterior fichamento, destacando os trechos mais pertinentes para este estudo. Análises
preliminares sobre as representações da personagem Clarissa, com descrições das práticas escolares
da jovem normalista e das práticas docentes da jovem professora recém titulada, indicam o perfil de
uma professora leitora, escritora e questionadora do universo escolar e de seu próprio trabalho. Fato
curioso é que a protagonista reflete sobre sua prática docente escrevendo seu diário
A Literatura é aqui compreendida como fonte para pesquisas em História da Educação, também
na perspectiva de Chartier (2009), em que as representações do passado propostas por ela são
fundamentais. Uma aproximação ao campo da História Cultural é possível por considerar que a
mesma propõe espaços de trabalho entre textos e leituras, com a finalidade de compreender as
práticas, que constroem o mundo como representação, que, por sua vez, é aqui compreendida como
um instrumento que faz ver um objeto ausente por meio de sua substituição por uma imagem, de
acordo com Roger Chartier (1990), para quem representações pressupõem reconhecer uma maneira
própria de grupos sociais estarem no mundo.
Um estudo desses romances poderá auxiliar na compreensão das imagens representadas em
torno da figura de normalista e de professora, já que a escrita literária é uma prática humana, situada
em um contexto com formas, modos e estruturas próprias. A investigação apresentada possibilitou
relacionar as duas obras do escritor Erico Veríssimo selecionadas para este estudo com as pesquisas
de autores como Chartier (1990), com trabalhos sobre o conceito de representação, fundamental
para identificar as imagens de professoras presentes nos livros de Veríssimo, Darnton (1992, 1998),
com seus estudos sobre livros proibidos e recomendáveis, uma vez que a menina Clarissa não podia
ler qualquer livro, segundo sua tia, e Michèle Petit (2008, 2009, 2013, 2019), que argumenta que a
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 758
Eliana De Oliveira
Já o uso dos termos mandonismo e clientelismo, também empregados nesta comunicação se deram
a partir do diálogo com o estudo desenvolvido por José Murilo de Carvalho (1999) onde o autor
buscou esclarecer conceitos e teorias em torno das categorias. Para Carvalho (1999) o mandonismo
“refere-se a estruturas oligárquicas e personalizadas de poder” (CARVALHO, 1999, p.133). O
mandonismo perpassa toda a história política do país e exerce significativa influencia na formação
da cidadania. Já as relações clientelísticas, segundo o autor “dispensam a presença do coronel, pois
ela se dá entre o governo, ou políticos e setores pobres da população”. (CARVALHO, 1999, p.134-135).
Para uma melhor compreensão das relações entre os sujeitos envolvidos com a educação escolar,
a análise se fundamentará por meio das contribuições teóricas desenvolvidas pelo sociólogo alemão
Norbert Elias e pelo historiador inglês Edward Palmer Thompson. Destaca-se que, na concepção de
Elias (1993), desde o início de suas vidas os indivíduos existem em interdependência uns dos outros,
e, quanto mais complexo o meio social, e as funções que os sujeitos desempenham na sociedade,
maiores também serão as relações de interdependência. Os conceitos elaborados pelo autor nos
permitem aprofundar na análise das dinâmicas sociais, que ligam os sujeitos uns aos outros e os
tornam interdependentes, problematizando assim as múltiplas relações presentes no processo de
produção da docência como função pública.
Já os estudos desenvolvidos pelo historiador inglês Edward P. Thompson (1981), contribuem na
problematização das tensões e conflitos formadores das dinâmicas sociais e da própria constituição
dos sujeitos históricos. Neste sentido, os conceitos do “fazer-se” da classe trabalhadora e de
experiência são importantes para pensarmos as ações do professorado mineiro como resultado
de um longo aprendizado, construído e compartilhado pelos docentes, no cotidiano das relações
escolares ou extraescolares.
Para Thompson (1981), o ser humano é sujeito de seu próprio fazer-se. Ou seja, é através das
dinâmicas relacionais e das mudanças que surgem nessas relações que os indivíduos se constituem,
constroem e reconstroem suas ações e pensamentos. O autor compreende que homens e mulheres
vivem experiências reais que possibilitam mudanças em sua consciência social. Segundo o autor:
A experiência surge espontaneamente no ser social, mas não surge sem pensamento. Surge
porque homens e mulheres (e não apenas filósofos) são racionais, e refletem sobre o que acontece
a eles e ao seu mundo. [...]. O que queremos dizer é que ocorrem mudanças no ser social que dão
origem à experiência modificada: e essa experiência é determinante, no sentido de que exerce
pressões sobre a consciência social existente, propõe novas questões e proporciona grande parte
do material sobre o qual se desenvolvem os exercícios intelectuais mais elaborados. (THOMPSON,
1981, p. 16).
Diante do exposto, duas questões se apresentam como centrais para o desenvolvimento deste
estudo: como se deu a interferência dos políticos locais, no cotidiano das escolas públicas primárias?
Dada a significativa presença da política coronelística, seja no âmbito da pratica, seja na organização
do trabalho, de que modo a profissão foi caracterizada pelo próprio fazer-se docente?
Para a reflexão destas questões estão sendo investigadas diferentes fontes documentais. Como
parto da premissa de que, pensar o professor como funcionário público, implica em refletir sobre o
impacto da intervenção estatal no comportamento político dos docentes, o estudo realizado aborda
as regulamentações sobre nomeações, exonerações, transferências, direitos, deveres, penalidades
para a configuração da carreira docente. Sendo assim, o estudo analisa as principais legislações do
ensino, criadas entre 1891 e 1918.
Outra fonte, utilizada neste estudo, se refere aos anais da Câmara dos Deputados e do Senado
Mineiro, produzidos no contexto pesquisado. Neste tipo de fonte é possível encontrar discussões
realizadas durante o processo de elaboração das reformas do ensino empreendidas em Minas Gerais.
Recorri também às mensagens dos presidentes de Estado, que abordam a situação política econômica
de Minas Gerais, bem como os aspectos relacionados à escola. A intenção foi compreender as ações
dos governantes e suas limitações, bem como a relação entre política e educação no contexto.
Para investigar os problemas vivenciados no cotidiano escolar e social, está sendo explorado o
rico acervo de códices da Secretaria do Interior, localizados no Arquivo Público Mineiro, na seção de
Guia e fundos referentes a instrução pública. Neste acervo encontram-se documentos de natureza
bastante variada tais como cartas de professores e diretores dos grupos escolares, relatórios de
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 761
inspetores sobre funcionamento das escolas primarias, ofícios trocados entre professores, gestores,
presidente do Estado e famílias relativos aos mais variados assuntos, portarias, etc. Ressalto que
tal documentação possibilita um melhor entendimento sobre o cotidiano do trabalho, no que se
refere a efetivação dos direitos e deveres do professorado bem como os conflitos entre professores,
inspetores, famílias e chefes políticos locais.
A intenção foi a de compreender a natureza dos conflitos, bem como as implicações para docentes
no que diz respeito ao trabalho e a sua organização como categoria. A problematização das fontes
indicaram que as novas regulamentações sobre o trabalho docente não se fizeram sem tensões,
havendo ocorrência de conflitos entre professores e autoridades políticas, ao mesmo passo em que
alguns professores também se beneficiavam das ações dos mandatários locais. Ou seja, as ações dos
chefes políticos locais, tiveram muita influência na forma como os professores se relacionavam com
os agentes envolvidos no processo de escolarização, com a população local, bem como no processo
de organização docente.
Referências
CARVALHO, José Murilo de. Mandonismo, Coronelismo, Clientelismo: Uma Discussão Conceitual. In:
CARVALHO, José Murilo de. Pontos e bordados: escritos e história e política. Belo Horizonte: Editora
UFMG, 1999, 1ª ed.
ELIAS, Norbert. O processo civilizador, volume 1: formação do estado e civilização. Tradução Ruy
Jungmann. Rio de Janeiro: Zahar, 1993.
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. 3
ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
VISCARDI. Cláudia Maria Ribeiro. Minas de dentro para fora: a política interna mineira no contexto da
Primeira República. Locus: Revista de História. V. 5, n.2. 1999, p.89-99.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente estudo tem o objetivo de contribuir com a compreensão sobre a recente história do
campo da formação de professores da educação superior no Brasil sob a perspectiva do
Desenvolvimento Profissional Docente (DPD). Para isso, buscamos estabelecer diálogo entre as
temáticas e as dimensões do desenvolvimento profissional recorrentes publicadas em revistas
científicas que buscam rigor epistemológico sobre esse campo do conhecimento. Essas interlocuções
apontam para a necessidade da compreensão e apropriação das recentes mudanças na sociedade,
que exigem uma perspectiva de ressignificação na concepção de formação de professores, das
práticas formativas e das relações de trabalho. O campo do DPD, entendido como uma concepção de
formação de professores de forma contínua, é caracterizado por um complexo conjunto de
dimensões. A origem dos estudos nessa perspectiva teórica remonta aos anos 1990. No entanto, no
Brasil somente na última década tem se ampliado investigações nessa perspectiva. Com efeito, os
estudos brasileiros tratam de temas e dimensões diversas do DPD, por vezes carecendo de maior
diálogo com a epistemologia que trata de contextos mais amplos, relacionando-os a conceitos mais
profundos e historicamente localizados. Os conceitos de DPD foram caracterizados por mudanças
nas últimas décadas, como escreve Fernandes Cruz (2015) e outros autores com os quais debatemos
neste texto. Mudanças essas necessárias diante das novas tecnologias, das novas configurações das
diversidades, das diferenças e das novas relações de tempo e de espaço característicos dos dias
atuais. No que se refere aos aspectos metodológicos, realizamos o fichamento de 17 artigos
científicos que tratam do DPD na educação superior no Brasil. Os artigos, publicados nos últimos
cinco anos (2014 a 2018), foram selecionadas por meio da base de dados da Scientific Electronic
Library Online (SciElo) e no Google Acadêmico (Google Scholar), encontrados pelos descritores
Desenvolvimento Profissional Docente e Educação superior. Delimitamos esse período buscando
conhecer os estudos mais recentes e, por ser o período de maior concentração no número de
publicações. Nos propomos a sistematizar as principais dimensões e temáticas presentes nessas
discussões, para em seguida identificar a relação desses estudos com a epistemologia consolidada
que trata sobre a temática. Buscamos, ainda, dialogar com experiências dos nossos projetos sobre
desenvolvimento profissional na educação superior, considerando as mudanças históricas nos
conceitos a partir das transformações da sociedade. As análises foram realizadas buscando o diálogo
entre essas fontes, obras completas e artigos científicos de autores que tratam do DPD sob a
perspectiva conceitual e histórica, como Marcelo Garcia (1999), Day (1999), Fernandes Cruz (2015) e
outros. Essa experiência nos levou à necessidade de expandir nossos estudos para novas temáticas,
como, por exemplo, os processos de identificação no âmbito dos estudos culturais e a importância
da educação intercultural no novo contexto. Dentre os temas tratados nos artigos destacamos: a
motor que dá partida a essas pesquisas, destacando a importância da narrativa desses profissionais
para a construção de novos conhecimentos. Esses resultados vêm sendo obtidos paulatinamente
por intermédio dos estudos no âmbito do Grupo de Pesquisa do qual fazemos parte e nos projetos e
parcerias nacionais e internacionais que estamos realizando no âmbito do nosso Programa de Pós-
Graduação. Destaca-se a necessidade de pensar em novos estudos que permitam o aprofundamento
teórico relacionado à realidade do Desenvolvimento Profissional Docente (DPD) na educação
superior brasileira, considerando as diferenças culturais e as circunstâncias regionais próprias do
País.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
de ensino secundário oficiais, equiparados ou sob inspeção preliminar. (BRASIL, 1931). Se, até então, o
corpo docente dos liceus era formado por pessoas da comunidade como advogados, médicos,
militares, religiosos, bacharéis ou autodidatas, conhecidos por sua “cultura”, a partir de 1931, só
deveriam poder lecionar os que tivessem obtido aquele registro. Como forma de aproveitar aqueles
que já estavam lecionando, o art 69 institui o registro provisório aos que o requerem, dentro de seis
meses a contar da data da publicação deste decreto. (BRASIL, 1931) Na sequência, os artigos 70 e 72
definiam os limites dessa provisoriedade pois havia a determinação de que, depois de criada a
Faculdade de Educação, Ciências e Letras, (...) para obter a inscrição definitiva, será exigida
habilitação perante comissão daquela faculdade, não só em Pedagogia como nas disciplinas relativas
à inscrição. (BRASIL, 1931). Ficou também determinado que, dois anos depois de diplomados os
primeiros licenciados da Faculdade de Educação Ciências e Letras, será condição necessária, para a
inscrição no Registo de Professores a exibição de diploma conferido pela mesma Faculdade. (BRASIL,
1931). O Ministério da Educação, no período investigado, emitiu uma quantidade significativa de
decretos, leis, portarias e outros diplomas legais para uniformizar conhecimentos e comportamentos
tanto para formação quanto para o exercício do magistério no ensino secundário em todo o país. A
obediência a esses dispositivos era fiscalizada pelo sistema de inspeção, criado em 1931 e
aperfeiçoado com a Lei Orgânica do Ensino Secundário de 1942. Os documentos oficiais deixam
evidentes as intenções do governo de formar um quadro qualificado de professores para atuarem no
ensino secundário. A princípio, duas medidas se destacam: a proposta aos professores em exercício
de se registrarem como docentes do ensino secundário e a criação da Faculdade de Educação,
Ciências e Letras. A primeira medida, servia como uma autorização de exercício de profissão, de
certa maneira, uma licença provisória para o exercício da função, até que o professor completasse o
curso superior. Entretanto, para as regiões mais distantes, onde ainda não havia faculdades de
formação de professores, houve pouca alteração na formação dos quadros desses profissionais.
Uma década depois, outra medida foi adotada para transformar esses “professores leigos” em
profissionais. Trata-se da criação da Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário
(C.A.D.E.S.) decreto 34 638 de 17 de novembro de 1953, à qual caberia promover, por todos os meios
a seu alcance, as medidas necessárias à elevação do nível e à difusão do ensino secundário no país.
(BRASIL, 1953). Entre as várias medidas que deveriam ser tomadas para que a C.A.D.E.S. pudesse
alcançar seus objetivos, aparecem em primeiro lugar: promover a realização de cursos e estágios de
especialização e aperfeiçoamento para professores, técnicos e administradores dos estabelecimentos
de ensino secundário; e conceder e incentivar a concessão de bolsas de estudo a professores secundários
a fim de realizarem cursos e estágios de especialização e aperfeiçoamento promovidos por outras
entidades, no país ou no estrangeiro. (BRASIL, 1953). Tendo os dispositivos legais sobre professores
do ensino secundário como base, constituem objetivos do presente artigo: descrever a formação e
aperfeiçoamento dos professores dos estabelecimentos de ensino secundário na parte sul do estado
de Mato Grosso do Sul que, desde 1977, forma o atual estado de Mato Grosso do Sul, e analisar mais
especificamente o perfil dos professores de línguas estrangeiras modernas do ensino secundário
nessa região e no período de vigência da Lei Orgânica do ensino secundário. A utilização desse
recorte disciplinar se justifica porque o ensino das disciplinas de línguas estrangeiras passou por
muitas transformações no período entre a Lei Orgânica do Ensino Secundário e a Lei de Diretrizes e
Bases de 1961. A primeira, por sua concepção humanista, delegou às línguas nacional e estrangeiras
modernas um papel relevante e reforçou no currículo nacional a presença do latim, do francês, do
inglês e do espanhol e a segunda, por descentralizar as línguas estrangeiras modernas do currículo
tornando-as parte do núcleo de disciplinas optativas. Como fontes para alcançar esses objetivos
foram selecionadas teses e dissertações que contivessem informações sobre professores do ensino
secundário na região e período mencionados, mesmo quando o tema professor não fosse o objeto
da pesquisa. A análise das teses e dissertações confirmou que os professores de línguas estrangeiras
na região e no período estudados podem se caracterizar como “professores leigos”, uma vez que nos
quadros e tabelas extraídos da documentação escolar, professores de francês, por exemplo, eram
médicos, funcionários aposentados, normalistas, ou com curso científico. A região Sul de Mato
Grosso só instalou uma Faculdade de Filosofia em 1961, razão pela qual continuavam a lecionar os
profissionais liberais que se dispunham a trabalhar nas disciplinas com as quais tinham alguma
afinidade. Esse foi também o motivo pelo qual recebeu os cursos e os exames de suficiência para
registro dos professores da C.A.D.E.S. de 1957 a 1960. Destaca-se a inscrição de candidatos às
disciplinas de Português, Francês, Latim e Inglês. Conclui-se, portanto, que a proposta de
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 767
Referências
ALVES, Claudia. Estudos secundários no Brasil nos séculos XIX e XX. In: PESSANHA, Eurize Caldas;
GATTI JÚNIOR, Décio (Org.). Tempo de cidade, lugar de escola: história, ensino e cultura escolar em
“escolas exemplares”. Uberlândia: EDUFU, 2012. p. 87-116.
MIRANDA, Bruna Camila Both. A Cades e um novo modelo de professor Secundário nas décadas de
1950 e 1960. Tese de Doutorado. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP,
Brasil.2019.
Esta comunicação insere-se nas pesquisas sobre a história da formação e da profissão docente.
Nesta perspectiva, a presente comunicação busca analisar a formação dos(as) professores(as) e o
trabalho docente realizado por eles(as), nas áreas de colonização recente situadas no Sul de Mato
Grosso, mais precisamente, nas localidades marcadas pela campanha da “Marcha para o Oeste” de
Getúlio Vargas, no município de Dourados, no período de 1948 a 1974. O recorte temporal justifica-se
em 1948 por sinalizar o ano de instalação da Colônia Nacional Agrícola de Dourados (CAND),
desencadeada pela Campanha da “Marcha para o Oeste” de Getúlio Vargas. Embora essa Colônia
tenha sido criada em 1943, a sua instalação definitiva somente ocorreu em 1948. Já o ano de 1974
sinaliza um período de mudanças nas escolas situadas nessas localidades pertencentes às áreas de
colonização por meio da CAND, que deixaram de pertencer ao governo de Mato Grosso e se tornaram
instituições escolares municipais, o que acabou influenciando diretamente na formação e no
trabalho docente dos(as) professores(as) dessas escolas situadas no meio rural, tendo entre as
exigências à habilitação em magistério para atuar de 1. ª a 4. ª séries do 1 grau. Isso também esteve
relacionado às orientações da Reforma de Lei, a de n. 5692/71, que determinava a obrigatoriedade
da formação em nível mínimo de 2º grau aos professores que atuavam até o 4º Ano do ensino de 1º
Grau (antigo primário e atual anos iniciais do ensino fundamental), exigindo que muitos docentes
que quisessem manter sua atuação em sala de aula retornassem à escola para fazer a complementação
da sua formação. Para o desenvolvimento deste trabalho, foi preciso recorrer às fontes documentais
e orais, entre elas, as Mensagens de Governadores do Estado de Mato Grosso, Livro Perfil do Município
de Dourados, Relatórios de Atividade Mensal da Supervisão Regional de Educação à Diretoria
Regional de Ensino, Listas das Escolas Rurais em funcionamento e das Escolas Rurais Desativadas no
Município de Dourados; Legislações, Processo de contratação dos(as) professores(as),
fotografias. Essas fontes foram localizadas no Centro de Documentação Regional da Universidade
Federal da Grande Dourados, no Museu Municipal de Dourados, na Secretaria Municipal de Educação
de Dourados, Arquivo Público de Mato Grosso e nos arquivos pessoais dos antigos professores. As
fontes orais foram constituídas por entrevistas realizadas com antigos(as) professores(as) de escolas
rurais da localidade. Essas entrevistas foram realizadas mediante a um roteiro com questões
semiestruturadas e gravadas em áudio, para posteriormente, serem transcritas e analisadas.
Todos(as) os(as) entrevistados(as) assinaram um o Termo de Consentimento Livre Esclarecido
(TCLE), concedendo o direito dos dados na pesquisa. Mesmo com a assinatura do TCLE por parte
dos(as) entrevistados(as), optou-se por utilizar nomes fictícios dos(as) professores(as) entrevistados
(as), para preservar a privacidade deles (as). As entrevistas possibilitaram compreender por meio
das memórias elementos importantes sobre a formação e o trabalho docente exercido nesta
localidade do Sul de Mato Grosso, pelos(as) professores (as) entrevistados(as). Como afirma Le Goff
(1990), a memória seja individual ou coletiva, é um componente fundamental daquilo que
costumamos chamar de identidade, sendo sua busca uma ação essencial da sociedade e indivíduos
atualmente. Essas fontes foram analisadas com base nos pressupostos da Nova História Cultural, em
autores como Chartier (1990) e Burke (2008), pois esse campo ampliou as possibilidades de
pesquisas, ao permitir incorporar nas investigações históricas novos temas, objetos e fontes de
estudo. Acrescenta-se a esses pressupostos também as referências ligadas à história e historiografia
da educação, história da formação e da profissão docente, história do ensino rural e história de Mato
Grosso. Os resultados apontaram que as transformações ocorridas devido ao progresso motivado
pela colonização recente, também teve um papel significativo na área da educação, pois, antes do
processo de colonização à educação crescia lentamente em Dourados. No início, ela acontecia nas
fazendas da região e/ou nas próprias casas dos professores e alunos, somente na década de 1930 é
que se registra, na cidade, a criação de escolas na área urbana. Nesse contexto, foi somente após a
instalação de fato da CAND em 1948, que a educação no município de Dourados passou por um
processo de crescimento e consequentemente expansão com a criação de escolas tanto no meio
urbano quanto no meio rural. Os (as) professores(as) que atuaram nas escolas rurais dessas
localidades ingressaram na sua maioria, na condição de docentes leigos, tendo no período, na
maioria das vezes, a formação apenas no curso primário (completo ou incompleto) ou no curso
ginasial (completo ou incompleto). No entanto, não se pode deixar de registrar aqui, que apesar de
não ser uma característica comum da profissão docente nesta localidade, foi possível localizar no
período pesquisado, que teve professores(as) que ingressaram nas escolas rurais com o diploma do
Curso Normal. Geralmente, a contratação desses (as) professores(as) ocorria por designação dos
pais, familiares ou até mesmo por indicação de pessoas da população local, pois, os moços e moças
que se tornavam docentes na localidade eram aqueles que possuíam um pouco mais de escolaridade
do que os outros moradores. Na maioria das vezes, esses moços e moças tornaram-se professores(as)
nas escolas primárias rurais dessas localidades, ainda muito jovens, até mesmo sem atingirem a
idade de 18 anos. Como não havia muitos recursos financeiros, algumas das escolas que esses(as)
professores(as) iniciaram na profissão docente, eram criadas pela iniciativa do estado de Mato
Grosso, pela subvenção financeira federal da CAND, e, ainda, pela iniciativa das próprias famílias que
residiam na localidade. Embora as escolas subvencionadas pelo governo federal apresentassem
melhores condições de infraestrutura física, quase todas as escolas da localidade sofriam com a falta
de recursos para dotá-las com os móveis e utensílios imprescindíveis ao desenvolvimento das
atividades de ensino, uma vez que, havia carência de carteiras, lousa, livros, cadernos, lápis,
borracha, sanitários, filtros de água, iluminação. Assim, constatou-se que esses(as) professores(as)
passaram por muitas dificuldades nessas escolas, dificuldades essas que se estendiam desde as
condições físicas dos estabelecimentos até de materiais didáticos e pedagógicos para o trabalho
docente cotidiano em sala de aula. Houve casos até de professores(as) que iniciaram nas escolas
rurais da localidade e foram despedidos meses depois pela falta de experiência para ensinar. Apesar
dessas circunstâncias que marcaram o cotidiano das escolas e o trabalho desses(as) professores(as)
que exerceram a profissão nesta localidade, um dado chamou atenção foi o fato dos(as) docentes se
esforçarem ao máximo para ministrarem boas aulas, buscando recursos e orientações pedagógicas
para trabalhar de forma diferenciada com os seus alunos, por meio de atividades e experiências
práticas no dia a dia. A partir dessas iniciativas surgiram, por exemplo, trabalhos ligados ao ensino
de Matemática por meio do uso de sucatas, que resultou posteriormente na criação em uma das
escolas rurais, de um laboratório de sucatas para experiências práticas no ensino, onde os alunos
podiam desenvolver atividades e experimentos a partir dos conteúdos trabalhados em sala de aula,
conforme relatado em entrevista pelo professor Monteiro (2019), que mesmo diante de todas as
dificuldades e desafios procurava refletir sobre suas práticas em sala de aula, com o intuito de
melhorar o seu trabalho docente. Mesmo com um número pequeno de professores(as) habilitados(as)
pela Escola Normal, pois a maioria dos(as) docentes da localidade era leigo, eles acabaram por
exercer um papel importante no processo de criação e funcionamento das escolas primárias nessas
áreas, bem como contribuíram para o processo de escolarização das crianças e até mesmo dos
adultos, que precisavam ser alfabetizados com cursos ministrados no período noturno, nas próprias
escolas para adultos analfabetos. Além disso, foi possível constatar que esses(as) professores(as)
exerceram nessas escolas atividades para além da docência, pois, eram eles(as) que cuidavam da
merenda, da limpeza e até mesmo de toda documentação escolar. Assim, pode-se concluir que as
histórias e memórias da formação e do trabalho docente em áreas de colonização recente no Sul de
Mato Grosso, como aquelas situadas na abrangência da CAND, dentro do Núcleo Colonial de
Dourados, pertencente ao município de Dourados foram marcadas pela presença e atuação do(a)
professor(a) leigo(a) nas escolas primárias rurais, bem como por professores que exerceram um
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 770
trabalho para além das atividades docentes, sobretudo, por ser também responsáveis por outras
tarefas nas escolas, tarefas essas que extrapolavam o fazer docente de sala de aula.
Referências
BURKE, P. O que é História Cultural? 2ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora. 2008.
CHARTIER, R. A História cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
Lisboa: Difel, 1990.
MONTEIRO. [junho 2019]. Entrevista concedida a pesquisadora. Fátima do Sul – MS, 2019.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
passado, com base nos aspectos existentes pelas concepções gregas a respeito de memória e
lembranças. Le Goff (1984-2003), acerca do conceito de documento/monumento, pois para ele, “o
documento é monumento, resulta do esforço das sociedades históricas para impor ao futuro
determinada imagem de si própria. O documento é produto da sociedade, que o fabricou segundo
as relações de forças que nela detinham o poder. [...]” e Duarte (2004), nas questões sobre entrevistas
semiestruturadas, pois como o mesmo afirma, “entrevistas são fundamentais quando se precisa/
deseja mapear práticas crenças, valores e sistemas classificatórios de universos sociais específicos,
mais ou menos bem delimitados, em que os conflitos e contradições não estejam claramente
explicitados”. Nesse estudo, na perspectiva metodológica, utilizaram-se as ideias sobre as análises
documentais conforme Le Goff (1984-2003) para quem “o documento é resultado de uma montagem,
consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziu e também das
épocas sucessivas durante as quais continuou a existir”. A pesquisa documental ocorreu por meio da
procura de fontes do arquivo pessoal da docente e no arquivo institucional da direção do CCE, os
quais permitiram rememorar determinados aspectos vivenciados pela docente na universidade. A
argumentação do percurso metodológico realizou-se por meio de duas etapas principais da pesquisa
documental, quais sejam: a coleta de documentos e, posteriormente, a análise dessas fontes
documentais com o intuito de coletar dados para versar sobre os vestígios presentes nessas
informações, a fim de fundamentar as questões desenvolvidas no transcorrer do texto. Nessas visitas
ao arquivo pessoal da docente, foi reunido corpus documental com as seguintes fontes: Atos da
Reitoria, declarações da direção do CCE, Portarias da Reitoria, contratos de trabalho, requerimentos,
diplomas, certificados, históricos de notas, declarações sobre cursos de formação, declarações
sobre disciplinas lecionadas, declarações de participações em eventos científicos, editorial de
revista, artigos em revistas científicas, ofícios da universidade, cartão de mensagem, dissertação de
mestrado em educação, entre outros. Na busca de fontes documentais no arquivo da direção do
CCE, foram localizadas: Atas das reuniões do Conselho Departamental do CCE, de 1976 a 1983; Atas
das reuniões do Conselho Departamental do CCE, de 1991 a 1993, quando Conceição Carvalho foi
Diretora do CCE e Presidente do Conselho; Regimento Interno do CCE, sendo uma versão baseada no
primeiro, que vigorou nas décadas de 1980 e 1990; cinco exemplares da Revista Educação e
Compromisso, pertencente ao CCE e criada à época em que a docente foi Diretora do Centro; e
normatizações internas. A realização de entrevistas semiestruturadas com participantes que
presenciaram a atuação profissional de Conceição Carvalho fez-se necessária, tendo em vista a
necessidade de averiguar informações oriundas das reminiscências e memórias desses entrevistados,
de modo que estas levassem ao alcance de respostas relacionadas à problemática discutida nesse
estudo. Nesse contexto, como ferramenta metodológica, foram efetuadas as entrevistas
semiestruturadas a partir de roteiros elaborados para os professores. Por meio das histórias narradas,
foi possível reconstruir determinadas situações vivenciadas pela docente em suas passagens na
universidade. Os colaboradores da pesquisa foram professores e funcionários companheiros de
trabalho do mesmo departamento da docente. Foram entrevistados, mediante escolha prévia, os
seguintes participantes: quatro ex-professores do DMTE; uma professora que foi amiga de trabalho,
mas pertencia a outro departamento; e um ex-funcionário, que foi auxiliar de Conceição. Visando a
responder ao questionamento central desse estudo, pode-se atribuir três constatações, conforme
segue: a primeira é a de que Conceição Carvalho foi docente da instituição durante mais de vinte
anos, desenvolveu trabalho no âmbito educativo e deixou marcas na conjuntura do DMTE, como a
construção de um departamento democrático e com influência sobre diversos cursos de licenciaturas
oferecidos na UFPI. Além da concretização de redes de sociabilidades duradouras entre os docentes
do departamento, buscou qualificação profissional por meio de realização de cursos de
aperfeiçoamento e mestrado, aventurando-se fora do Piauí, na Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS). A segunda é que a docente, enquanto gestora, pontuou questões democráticas e
garantiu um legado para a universidade, por meio de suas atuações na promoção e concretização do
sonho do Curso de Mestrado em Educação da UFPI, onde fomentou a criação da Revista Educação e
Compromisso e participou da concepção do primeiro volume do periódico científico do mestrado, a
Revista Linguagens, Educação e Sociedade. A terceira é que a professora foi produtora intelectual e
procurava voltar seu olhar científico de pesquisadora para a própria instituição onde atuava,
estimulando e desenvolvendo pesquisas e estudos que, de alguma forma, contribuíram para as
questões vivenciadas no cotidiano universitário e podem ser fontes importantes, pois mostram
dados sobre determinadas problemáticas voltadas para a UFPI. Diante disso, Conceição Carvalho,
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 773
como docente, gestora e intelectual desenvolveu seu papel de educadora e formadora, tendo a UFPI
como lugar ideal para que isso se concretizasse. Todos os vestígios evidenciados nesse estudo são
um pequeno passo na promoção de pesquisas que envolvam a atuação de profissionais da educação
e intelectuais que atuarão na UFPI. Por meio desse trabalho apreendeu-se que a trajetória da docente
acompanhou avanços quanto a aspectos acadêmicos, da estrutura física e da circularidade dos
saberes pedagógicos produzidos na UFPI. Outrossim, denotou-se a relevância das articulações e
relações pessoais estabelecidas pela docente, suas redes de sociabilidades no DMTE, e as
mobilizações junto às esferas superiores administrativas da instituição. Cabe, ainda, evidenciar o
envolvimento direto de sua produção intelectual com a atuação e participação efetiva nas atividades
de extensão, com cunho social, e ensino em nível de graduação.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A pesquisa apresentada neste trabalho dedica-se à análise de livros, livros escolares e manuais
escolares que constituem a literatura pedagógica para subsidiar os processos de formação de
professores no Estado, entre o período de 1940 a 1990. A partir dessa perspectiva, levando-se em
conta à escrita, a produção e distribuição de livros para a formação de professores, esse estudo
incide sobre os professores, autores de livros, que interviram direta e indiretamente nas políticas,
nos projetos e nas práticas de formação de professores no Estado do Paraná, sendo eles: Erasmo
Pilotto (1910-1992), Eny Caldeira (1912-2002) e Pórcia Guimarães (1917-2005); ao passo que as suas
trajetórias oferecem condições para pensar os contextos pedagógico e político dos programas de
formação de professores em curso ao longo do século XX, no Paraná. Ressalta-se que os livros, livros
escolares e manuais escolares, tornaram-se indispensáveis para a formação docente, principalmente
porque os seus conteúdos tornaram-se específicos para cada fase de aprendizagem, sendo por
exemplo, cartilha nos processos de alfabetização e manual quando da profissionalização adulta
(LAJOLO; ZILBERMAN, 1996). Destarte, na medida em que passam a se configurar como bem de
consumo, a partir da segunda metade do século XIX, os livros voltados para a formação docente,
tornaram-se os textos impressos de maior circulação no Brasil. Neste cenário, os livros se destinavam
prioritariamente aos professores, devendo assegurar o domínio de conteúdos básicos a serem
transmitidos. Apenas décadas mais tarde é que o livro passou a ser consumido também por
estudantes. Ainda assim, nas primeiras décadas do século XX, o destinatário privilegiado do livro e
manual escolar continuaria a ser o professor. Logo, a história dos livros voltados a formação docente,
em conjunto com outros artefatos como quadro-negro, caderno escolar, livros ata, entre outros,
compõem uma diversidade material que marca uma nova forma do fazer escolar e um novo olhar
para a história da escola. Estes artefatos fazem parte da cultura material escolar, que passou a ser
objeto de estudos da História da Educação, nos últimos anos, devido a sua interlocução com a Nova
História Cultural e, respectivamente, da preocupação de historiadores em preservar estas obras
enquanto fontes de pesquisa e memória educacional. Isto posto, na história dos processos de
formação de professores, os livros representam importantes instrumentos para auxiliar os currículos
e programas de formação, como também, as disciplinas escolares na tarefa de instruir os futuros
professores em relação a saberes, conhecimentos, atitudes e valores. Nada se tornou mais
significativo, que a criação e organização de uma vasta literatura pedagógica, para ocupar os espaços
de formação docente. Com relação à formação de professores no Paraná, esta se valorizou no final
do século XIX, por ocasião da estruturação da instrução no Estado. Dentre as diversas reestruturações
da Instrução Pública, no final do século XIX, a reforma do ensino no estado de São Paulo, em 1890,
inspirou os dirigentes da educação paranaense para iniciativas renovadoras. A partir dos anos de
1920, as escolas de formação de professores experimentaram um processo de expansão com a
criação do Instituto de Educação do Paraná, em Curitiba (1924), que passou a contar com uma escola
de aplicação anexa; o Instituto de Educação de Paranaguá (1926), que atendia o litoral paranaense;
e o Instituto de Educação de Ponta Grossa (1927), na região dos Campos Gerais. Logo, entre a década
de vinte ao final da década de quarenta do século XX, o movimento reformista se ampliou e dentre
os episódios mais significativos estão: as reformas do ensino público e, particularmente da Escola
Normal, promovidas por Prieto Martinez e Lysímaco Ferreira da Costa; o processo de implantação da
Faculdade de Filosofia Ciências e Letras (1938) na capital, que instituiu a formação de professores
em nível superior; o Movimento pela Escola Nova, que promoveu Raul Gomes, como signatário do
célebre Manifesto dos Pioneiros (1932), e Erasmo Pilotto que, na condição de liderança do movimento
renovador, assumiu entre 1949 e 1951 a Secretaria da Educação e Cultura do Estado. Entre os anos
1950 e 1980 essas tendências foram mantidas, seja pela ação dos intelectuais do período anterior ou
pela emergência de novos atores. Entre estes destacam-se, no plano propriamente pedagógico, Eny
Caldeira e Pórcia Guimarães. Em comum entre esses personagens, de diferentes gerações, filiações
ideológicas e pedagógicas, estava o desejo de modernizar o país e o Estado a partir por meio de
investimentos em educação e, particularmente, na formação do magistério paranaense. De modo
especial, Erasmo Pilotto, Eny Caldeira e Pórcia Guimarães, considerados professores-autores das
obras pesquisadas, são a prova que o conhecimento produzido em seus livros nunca ficou obsoleto,
podendo ser utilizado pelas gerações futuras da mesma maneira em que foi aplicado a época de sua
produção. Sobre a questão da autoria, durante muito tempo, diferentes autores de livros haviam
sido colocados de lado, pois pensava-se que a produção de sentido de um livro era proveniente
apenas de um sistema de signos ligados as narrativas do texto ou a sua forma impressa (CHARTIER,
1999). Basicamente, essas abordagens proclamavam o desaparecimento do autor e,
consequentemente, a história do livro tornava-se uma história sem autor, sem leitor. Contudo,
quando se compreende a importância da autoria, ou seja, a condição de professores-autores, é
porque se percebeu que a esses intelectuais foi outorgado o poder de serem divulgadores ou
intermediários entre o conhecimento científico e o conhecimento a ser transmitido aos futuros
professores. Nesta chave de análise, cumpre destacar que a trajetória dos autores pesquisados é
marcada por sua relação com a formação docente. Eny Caldeira se formou na segunda turma de
Pedagogia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), estudou um período na Europa, onde foi
aluna de Maria Montessori e Jean Piaget, atuou como professora normalista e como diretora do
Instituto de Educação do Paraná entre 1952 e 1955 e foi também pesquisadora do Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP); Erasmo Pilotto se formou normalista em
1927, foi um dos principais articuladores da Escola Nova do Paraná, criou os Cursos Normais
Regionais no interior do Estado e os Programas Experimentais durante sua gestão de Secretário,
atuou como jornalista, publicando crônicas e também foi crítico de arte e durante sua trajetória de
vida quis promover a junção do campo educacional e artístico paranaense; Pórcia Guimarães Alves
obteve o grau de pedagoga aos 23 anos pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da UFPR, local
onde trabalhou anos mais tarde como docente na disciplina de Psicologia Educacional, foi atuante
na prática de atendimento diferenciado à crianças portadoras de necessidades especiais. Portanto,
a relevância desse estudo envolve, em sentido amplo, a história dos livros, destinados a subsidiar a
formação de professores. E, em sentido stricto, a importância da criação, difusão e permanência dos
livros nos espaços destinados à formação de professores no Paraná que testemunham as
peculiaridades de uma literatura pedagógica que sustentou os processos de formação. O objetivo
principal, incide na pesquisa, catalogação e análise de diferentes obras, escritas por esses
professores-autores que compõem uma literatura pedagógica desenvolvida como instrumentos da
prática e do discurso pedagógico. O recorte temporal se justifica, porque os livros pesquisados, dos
autores em questão, começam a ser editados e divulgados a partir de 1940, como a obra
“Reorganização do Ensino Secundário” (1949) de Erasmo Pilotto; finalizando no período de 1990,
com a obra “Memória da Psicologia do Paraná (1997) de Pórcia Guimarães. Mediante estes aspectos,
busca-se nesta literatura sua relação com o social, ou seja, um conjunto de posicionamentos
elaborados que visam orientar, condensar e simbolizar aquilo que se acreditava ser certo ou errado
sobre a educação, e que se destinava à formação do professorado. Buscou-se na literatura pedagógica
produzida por estes professores paranaenses a sua extensão, ou seja, os sentidos pedagógicos que
os atravessam. Nesta direção, em termos metodológicos, pensa-se os livros produzidos, por meio da
análise das características materiais (análise da materialidade) e textuais (análise narrativa).
Fundamentalmente, procurou-se operar com questões de análise narrativa – de natureza
epistemológica e didática –, associadas às características técnicas, visuais, físicas dos livros.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 776
Optou-se por uma confluência de análise a fim de romper com categorias de pesquisa estanques,
descritas por Choppin (2004), que ora concebem o livro (escolar) apenas como um documento
histórico, analisando seus conteúdos, ora negligenciam seu conteúdo, o considerando apenas como
um produto fabricado, comercializado e distribuído – objetos materiais. Destarte, os livros destinados
à formação de professores são artefatos importantes porque possuem conteúdos repletos de
representações e valores predominantes em um determinado período e contexto, tornando-se
anunciadores de marcas culturais que vinculam concepções pedagógicas, saberes e dimensões
simbólicas. Conclui-se que os livros destinados a formação docente, proporcionam compreender
uma rede de significados produzidos em relação à sociedade paranaense, à época e à educação. São
obras que contribuem para a memória educacional existente na cultura da formação docente
paranaense.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Esta pesquisa é um estudo de História da Educação, que tem como objetivo analisar a formação
de professores do Curso Normal Pedagógico ao Curso de Pedagogia, na cidade de Imperatriz – MA,
entre 1969 e 1978. O recorte temporal adotado se refere ao ano de criação da Escola Normal
Pedagógica, em que passou a ofertar o Curso Normal Pedagógico, em 1969 e o recorte final, em
1978, ano da criação do Curso de Pedagogia, ofertado pela Universidade Federal do Maranhão,
Campus II (UFMA), na cidade de Imperatriz, como cursos de formação de professores para a docência
no ensino primário, que correspondia ao nível de 1ª à 4ª séries, tanto na esfera pública, quanto
privada, que se encontrava em expansão, à época. O objeto de estudo desta pesquisa é uma
construção histórica dos cursos de formação de professores em Imperatriz. As inquietações que nos
levaram à esta pesquisa foi por constatarmos um vazio historiográfico na História da Educação
Maranhense e Imperatrizense, acerca da formação de professores entre os anos de 1969 e 1978.
Chegamos até a pensar na inexistência de possibilidades para a realização da pesquisa, tendo em
vista que não havia nenhuma informação que nos levasse ao arquivo da instituição que ofertou,
inicialmente, o Curso Normal Pedagógico. Porém, com as buscas, conseguimos encontra-lo e, ao nos
depararmos com o ambiente em que as fontes documentais estão alojadas, nos deparamos também
com a possibilidade de realização desta pesquisa, para uma construção história dos cursos de
formação de professores em análise. Surge, então, a seguinte questão-problema: Quais as
características do processo de formação de professores a partir do Curso Normal Pedagógico ao
Curso de Pedagogia na cidade de Imperatriz – MA, entre 1969 e 1978? No momento em que os
poderes públicos, ao longo dos anos, formularam leis e decretos com os moldes dos cursos de
formação docente para o exercício do magistério, a classe do professorado passou a ter status
profissional e, por meio de um direito social, também, passaram a obter a licença como mandato
formal para o exercício da profissão. Inicialmente, o ensino primário foi o nível de ensino pioneiro a
se organizar, com o objetivo e responsabilidade pela educação das futuras gerações. Partindo dessa
premissa, o Estado se tornou o responsável pela regulamentação e fiscalização da escolarização
infantil. Assim, aumenta a necessidade de cursos de formação de professores para a docência no
ensino primário. O percurso construído na formação de professores no país não pode ser visto de
forma linear, nem homogênea, pois, sempre esteve pautado em inúmeros conflitos, disputas e
entraves, tanto interna como externamente. Os professores, no exercício da docência, constituem-
se como produto e produtores dentro do processo “plural” de escolarização. Essa pluralidade está
pautada na diversidade de implementação de modelos, tanto de escolarização primária quanto de
formação de professores, em que cada Estado da Federação disponibilizava, à época. Os debates
acerca da formação de professores para o ensino primário, intensificaram-se a partir da revitalização
das Escolas Normais, com surgimento dos CEFAMs, com a reestruturação do currículo das Escolas
Normais e dos cursos de Pedagogia, novos cursos de formação docente, em nível superior e com
produções acadêmicas sobre o assunto. Podemos apontar as modalidades de formação docente
que foram se constituindo no decorrer dos anos. Inicialmente eram os mestres-adjuntos,
posteriormente, as Escolas Normais em dois níveis, o ginasial e o colegial, seguindo pela Habilitação
Específica para o Magistério (HEM), coexistindo paralelamente por muito tempo ao Curso de
Pedagogia, sendo estas modalidades formadoras de professores para o ensino primário. Para o
ensino secundário, foram implementados os cursos de Licenciaturas, nos quais eram ensinados os
modos de ensinar aos alunos, as disciplinas específicas de cada área. No Estado do Maranhão, a
expansão da formação de professores aconteceu de forma paulatina, devido às descontinuidades
políticas e administrativas na capital, São Luís, refletindo tal falta de compromisso tanto com as
implementações de políticas públicas educacionais consistentes, quanto à guarda dos documentos
que possam fundamentar as pesquisas relacionadas à formação de professores no Estado. No início
da década de 1960, o Estado do Maranhão contabilizava um alto índice de analfabetismo, quase 70%
da população e a quantidade de escolas primárias era superior à de escolas secundárias, sendo o
ensino primário eleito pelo Governador Newton Bello como parte central do sistema educacional. O
Governador priorizava mais o ensino primário que outros níveis de escolarização, no entanto,
percebia a necessidade de professores para atuarem no ensino primário e enfatiza que no ensino
Normal repousa toda a estrutura do primário, então, formula o Plano Trienal (1961-1963). O
diagnóstico do Plano Trienal, apresentado pelo governo, apontou que havia maior número de cursos
de formação de professores em nível de 1º ciclo, ginasial (13 cidades), que formava regentes do
ensino primário, do que em nível de 2º ciclo, colegial (4 cidades), que formava professores do ensino
primário. Para melhor compreensão do processo de organização da estrutura educacional, definido
pela LDB nº 4.024/1961, podemos esclarecer as divisões dos níveis de ensino em ensino primário; 1º
ciclo - ginasial: secundário/médio, normal, agrícola, comercial, industrial e orientado para o trabalho;
2º ciclo - colegial: secundário, normal, agrícola, comercial, industrial e outros. A meta governamental
era formar 4.500 professores normalistas entre 1961 e 1965. Entre os anos de 1968 e 1971 foram
implantados 92 ginásios nos municípios do interior do Estado, expandindo o ensino secundário. Em
quantidade numérica, os chamados Ginásios Bandeirantes superaram os da rede privada. Como os
poderes públicos ainda não haviam superado a expansão dos cursos de formação de professores
por todo o Estado, como se encontrava a situação da cidade de Imperatriz, em meados da década de
1960, em relação aos níveis de ensino primário e normal, tendo em vista a dificuldade de tráfego, por
falta de estradas, da capital à cidade de Imperatriz e vice-versa? É em meio a esse cenário que
situamos o objeto desta pesquisa. O início da década de 1960, a cidade passou a ter uma redefinição
em seu perfil sócio-econômico, passando por mutações e ampliações urbanas, por meio de ações do
Governo Federal, constituindo-se em uma população heterogênea. A inexistência de estradas que
ligassem Imperatriz às demais cidades do Maranhão e do Nordeste, exceto, uma estrada carroçável
que ligava Imperatriz a Grajaú, aberta em 1952, por onde recebeu migrantes do Ceará e de outras
cidades do Maranhão, a cidade praticamente não mantinha contato com a capital, São Luís. Por esse
motivo, suas relações comerciais eram feitas, principalmente, com os Estados de Goiás e Pará, por
meio do rio Tocantins. Com a construção de uma das rodovias federais mais importantes do país,
que faz ligação de Brasília-DF à Belém-Pa (BR 010), o crescimento populacional se tornou mais
intenso. Para dar continuidade à pesquisa, ainda foram elaborados os seguintes objetivos específicos:
Investigar os aspectos que influenciaram no processo de formação de professores na cidade de
Imperatriz a partir dos cursos formadores; Analisar as modificações ocorridas por força das leis, nas
nomenclaturas dos cursos de formação de professores, entre o Normal Pedagógico e Pedagogia;
Compreender os traços da cultura escolar da formação de professores em análise, por meio dos
vestígios. O percurso metodológico é pelo enfoque historiográfico, que, como já foi explicitado
anteriormente, existem lacunas consideráveis por falta de fontes historiográficas deixadas ao longo
do tempo, dificultando as pesquisas em História da Educação do Maranhão, principalmente, em
História da Educação de Imperatriz, relacionadas às instituições escolares, à formação de professores,
ao ensino primário, etc, todavia, há possibilidades de ampliação da pesquisa em curso, pois, com a
Revista dos Annales, o historiador pode se apropriar de novas abordagens de pesquisa e, ancorado à
Nova História Cultural, sendo esta, propulsora na desconstrução das fontes oficiais como verdades
absolutas e confiáveis, ampliando e democratizando a noção de documento histórico. A abordagem
é histórica, através de pesquisas bibliográficas e análise documental dos vestígios como, currículo,
atas de resultados finais, fotografias, leis, decretos, resoluções, entre outros. A pesquisa está
embasada nas seguintes categorias e autores: Cultura Escolar – Julia (2001); Formação de
Professores – Tanuri (2000); História Cultural – Burke (2012); História da Educação de Imperatriz –
Cruz (2012); Instituições Escolares – Gatti Jr e Pessanha (2005), entre outros. Por fim, acreditamos
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 779
que esta pesquisa, através da construção histórica dos cursos de formação de professores na cidade
de Imperatriz, do Normal Pedagógico ao de Pedagogia, entre 1969 e 1978, possa contribuir para a
ampliação dos estudos da História da Educação Maranhense e Imperatrizense.
ISSN 2358-3959
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Os anos que se seguiram após a proclamação da República foram marcados por inúmeras
mudanças, dentre as quais a transformação urbanística e a moralização da sociedade brasileira. Da
mesma forma que em boa parte do mundo ocidental, espaços como hospitais, escolas e prisões
brasileiras começam a sofrer remodelações radicais, com base numa proposta de limpeza e
novidades calcadas em métodos científicos e na crença de que o país estava passando por uma
etapa de desenvolvimento material e do progresso social.
A modernização da sociedade brasileira torna-se o ponto central dos discursos tanto de políticos
quanto da elite econômica e intelectual da nação, que buscam promover uma mudança na antiga
estrutura até então marcada por um modelo agrário-exportador. O objetivo é a consolidação de uma
sociedade urbano-comercial, a efetivação de um modelo modernizante de sociedade acompanhado
de uma nova ideia de cidadania e do ideal de uma “pátria nova”.
Este modelo de crescimento implica na formulação de um novo conceito, o de “multidão”.
O número de pessoas cresce nos centros urbanos, ocupando as ruas e instalando a sensação de
isolamento e de solidão. Na tentativa de diminuir esse processo, os urbanistas difundem reformas
nas estruturas das cidades, onde mecanismos de divertimento são edificados, tais como a construção
de parques urbanos e públicos. Tal como nas grandes capitais europeias e da América do Norte,
cidades como o Rio de Janeiro passam a ter novos recursos utilizados afim de dirimir a rude rotina
de trabalho dos operários, que veem nesses locais espaços para seu parco divertimento.
As mudanças também atingem a arcaica organização escolar, marcada até então pela sua
pequenez e restrição aos mais favorecidos. Segundo os críticos de época, as suas falhas e deficiências
levaram a maioria da população a viver num estado total abandono educacional.
Na tentativa de disciplinar, educar e sanar os males da população pobre dos grandes centros
urbanos brasileiros é iniciada uma mobilização entre o poder público – Estado – e os intelectuais.
A ciência europeia é transformada no marco definidor das sociedades civilizadas, trazendo consigo
visões racistas, onde os brancos deveriam ocupar o primeiro lugar no desenvolvimento humano e os
negros os cargos inferiores. Este ideário construído na Belle Époque está muito longe de ser inocente,
sobretudo numa sociedade com um passado escravocrata e marcada pelo preconceito racial.
Frente a esse contexto é implementado um projeto de embranquecimento baseado num modelo
étnico brasileiro no qual primava a ideia de civilizar o individuo, a partir da disciplina do corpo.
Hábitos de higiene, uma aparência estética do corpo, disciplina para o trabalho e um modelo de
educação seriam pontos centrais para a construção de uma “nova” sociedade brasileira. M. Foucault
(1979) nos aponta que durante o processo de industrialização, urbanização e de organização da
população são pensadas técnicas disciplinares que definidoras dos corpos individuais e suas formas
O IPFOF é o exemplo clássico de práticas de educacionais que espelham a forma como o Estado
buscou ordenar a sociedade, distribuindo o exercício de funções e o lugar a ser ocupado no mundo
do trabalho pelas camadas pobres da população. Assim sendo, desde a aluna até ao corpo docente
cabe a todos uma hierarquia que contribuirá para o ideal de modernidade projetado naquele
momento. A presente comunicação pretende analisar a forma pela qual este processa é forjado no
cotidiano escolar e na relação docente-aluno, através das suas práticas escolares e da disposição
hierárquica do corpo docente.
Referências
FOUCAULT, M. Microfísica do poder. São Paulo: Graal, 1979.
LOPES, Eliane M. T.; FARIA FILHO, Luciano M. de; VEIGA, Cynthia G. 500 anos de Educação no Brasil.
Belo Horizonte: Autêntica, 2011.
LOURO, Guacira Lopes. “Uma leitura da história da educação sob a perspectiva do gênero”. In: Projeto
História. São Paulo, 11 nov, 1994.
ISSN 2358-3959
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A presente comunicação tem como temática a identidade profissional das mulheres responsáveis
por promover a educação primária rural na cidade de Apucarana-PR. O estudo sobre a identidade
profissional das professoras rurais objetiva compreender as condições de formação e atuação no
magistério rural no período compreendido entre as décadas de 40 a 90 do século XX, com ênfase
na trajetória profissional como elemento para a pesquisa em História das Instituições Escolares e
da Profissão Docente. O problema de investigação incidiu sobre os aspectos de gênero, a partir do
processo de feminização do magistério rural.
A pesquisa também analisa o processo de construção de identidade profissional das professoras
que trabalharam no magistério rural municipal, em consonância com a tendência de feminização
do magistério, apontada pela historiografia da educação, em nível nacional. A configuração sobre
como se deu a formação e atuação destas mestras rurais tem relação com o processo de constituição
ideológica presente nos programas, documentos escolares, fotos e registros de carreira docente.
Como percurso metodológico, adoram-se as pesquisas bibliográfica e documental que buscam,
a partir dos pressupostos de investigação acerca das instituições escolares e da formação de seus
mestres, elucidar as representações escolares de determinada comunidade, as especificidades dos
indivíduos que as compõem, que as faz em seu tempo, seu espaço e sua subjetividade.
Neste aspecto, objetiva-se conhecer o passado e, ao mesmo tempo, dialogar com o presente, a
partir de narrativas que possam (re)constituir significados de uma história vivida.
[...] Por um lado a possibilidade de aceder ao discurso do outro, problema do historiador: o que
se pode apreender do discurso do ausente? Como interpretar os documentos ligados a uma morte
intransponível, quer dizer, a um outro período, e a uma experiência “inefável”, sempre abordada
pelo lado de onde é julgada a partir do exterior? Por outro lado, a alteração da linguagem através de
uma “possessão” objeto próprio deste exposto (CERTEAU, 1982, p.218).
A partir dos estudos da História Cultural e da revisão acerca dos contributos da historiografia
da educação brasileira sobre o tema, realizamos as análises acerca do processo de feminização do
magistério rural apucaranense. Para tanto, contribuíram com as análises os estudos de Schelbauer
(2014), Nóvoa (1992), Almeida (2001) Hervatini (2011) e Faria (2017).
As fontes documentais que subsidiaram a pesquisa na formação de professores em Apucarana-
PR foram localizadas nos acervos da Autarquia Municipal de Educação, do Núcleo Regional de
Educação e de duas instituições escolares apucaranenses: Colégio Estadual Santos Dumont e Colégio
Estadual Nilo Cairo. Dentre as fontes documentais impressas e manuscritas utilizadas para o estudo,
podemos citar as atas, os quadros de disciplinas que compunham os programas, bem como suas
ementas, ofícios e relatórios, fichas de acompanhamento individual dos alunos, boletins, históricos
escolares, livros de chamada e fontes iconográficas.
O recorte temporal inicia-se em 1940, década da constituição das primeiras escolas rurais e
instalação da primeira Escola Normal Regional em Apucarana, tal acontecimento representa uma
forma de suprir as necessidades na formação de docentes para a região em expansão. O marco final
do estudo situa-se em 1990, marcado pela cessação da maior parte destas instituições situadas na
área rural.
No presente estudo foram elencados 30 professores e professoras que lecionaram, a partir dos
anos de 1930, em escolas primárias rurais e escolas municipais rurais em Apucarana e escolas
primárias municipais que funcionavam em espaços urbanos do município. O registro possibilita
quantificar o gênero, as características físicas, o estado civil, a formação, as datas de nomeação e
admissão, os salários que recebiam das escolas onde trabalharam e as funções que exerceram.
Podemos destacar o número expressivo de mulheres que lecionaram em escolas primárias em
Apucarana-PR. Dos 30 professores que atuavam no magistério rural, 24 eram mulheres, ou seja, 80%
do quadro era composto pelo gênero feminino.
Outra questão está relacionada à diferenciação das funções e salários desses professores. Com
base no livro ata de Registro da Vida Funcional dos professores e professoras das escolas primárias de
Apucarana, percebe-se que os professores construíram carreira atuando em funções de subdireção
nas escolas primárias, já as professoras, por sua vez, não recebiam a mesma promoção apesar do
grau de instrução entre eles e tempo de carreira serem relativamente iguais.
Contratado pela portaria 20/64 passa a exercer função de professor na Escola Barão do Rio Branco
de 10-2-1964 a 31-12-1964, com vencimentos de Cr$ 23.000 mensais. Foi efetivado pelo concurso
de professores municipais realizado em dezembro de 1964, a partir de 1º de janeiro de 1965, com
vencimentos de Cr$ 36.000 mensais. Foi nomeado em conformidade com a lei 80/63 e pelo decreto
33/63. Recebeu nomeação de prôfessor e passou a exercer o cargo de sub-diretor em São Domingos
(sede) na Escola Municipal Manoel Ribas em São Domingos (sede) (curso noturno), como contratado
recebendo Cr$ 23.000 mensais com referência ao período contratado. Em março de 1965 passou
a receber Cr$ 50.500 mensais. A partir de março de 1966 passou a receber Cr$ 65.500 mensais,
exercendo a função de professor na Escola Manuel Ribas e ao mesmo tempo exercendo o cargo de
contratado recebendo por este período Cr$ 29.300, pelo período noturno (AUTARQUIA MUNICIPAL
DE EDUCAÇÃO, 1952-1966).
Sobre a formação destes professores e professoras, destacamos entender a palavra formação
como algo amplo que se refere tanto à escolarização voltada ao magistério, quanto às experiências
docentes, portanto, frequentemente, tais profissionais não tinham uma formação específica, porém
utilizavam experiências pessoais para o trabalho escolar.
O estudo evidenciou, quanto à formação, que entre os 30 professores listados: 20% (6 - seis)
possuíam o curso primário; 3,3% (1 - um) iniciou o curso ginasial; 3,3% (1 - um) realizou o curso
ginasial completo; 16,66% (5 - cinco) haviam finalizado o curso normal ginasial; 13,33% (4 - quatro)
tiveram a formação concluída no curso normal regional; 23,33% (8 - oito) concluíram o curso normal
secundário, porém sem maiores especificações; 3,3% (1 - um) realizou licenciatura em pedagogia
e 13,33% (4 - quatro) professores sem informações quanto à formação. Pode-se constatar que a
escolarização dos professores e professoras era diversificada, mas a maioria formada pelos cursos
normal regional, normal ginasial e normal secundário.
Os problemas apresentados em relação às condições das instituições, assim como a ausência de
recursos humanos e materiais e a as diferenças salariais faziam com que os docentes, com constância
pedissem remoções para instituições em espaços urbanos.
Neste aspecto, ser professora em espaços rurais pode ser compreendido como uma função na qual
se enfrentava dificuldades marcadas pela ausência de recursos humanos e físicos, impossibilitando
muitas vezes o trabalho escolar. Ser professora da escola primária rural exprimia aquela que, além
de ser responsável pela instrução dos alunos, cumpria o que era tido como “papel da mulher”:
limpar, cozinhar, manter a escola em ordem, como o fazia em seu próprio lar.
A educação rural no município desenvolvida, sobretudo, pelas mestras rurais foi relevante para
a expansão do ensino primário na região e imprimiu marcas significativas da presença feminina no
magistério, contribuindo para marcar a representação histórica destas mulheres no magistério rural.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 785
Consideramos que a busca pelos sujeitos que participaram deste processo é essencial dar voz
àqueles que muitas vezes são silenciados e, portanto esquecidos, os/as estudantes, os/as docentes,
familiares, funcionários, mas, sobretudo, as mestras que empreenderam a tarefa de escolarizar a
infância no espaço rural.
Referências
ALMEIDA, Dóris Bittencourt. Vozes esquecidas em horizontes rurais: histórias de professores.
Porto Alegre: UFRGS, 2001. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-graduação em
Educação, 2001.
CERTEAU, Michel. A operação historiográfica. In A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
FARIA, Thais Bento. Paraná, Território de “Vocação Agrícola”?! Interiorização do Curso Normal
Regional (1946-1968). Tese (Doutorado em Educação) Universidade Estadual de Maringá, Maringá,
2017.
NÓVOA, António, coord. - “Os professores e a sua formação”. Lisboa: Dom Quixote, 1992. p. 13-33.
Localizado ao fundo do Recôncavo, as margens da Baía da Guanabara, com um porto que serviu
de grande importância para a economia da Província do Rio de Janeiro no período imperial, o Arraial
da Estrela elevou-se a município. No dia 20 de maio de 1846, criado pelo decreto de n° 397 da
Assembleia Provincial do Rio de Janeiro, o município recém criado contou com as seguintes
freguesias: Freguesia de Nossa Senhora da Piedade de Inhomirim (criada em 1868); Freguesia de
Nossa Senhora da Guia de Pacobaíba (criada em 1755); Freguesia de Nossa Senhora do Pilar (criada
em 1696), e o Curato de Petrópolis criado em 1843, pelo Imperador Dom Pedro II, ao emancipar-se,
Petrópolis deixou de fazer parte do município de Estrela no ano de 1857. O município de Estrela,
localizado em um território cercado por montanhas, pântanos e charcos, possuía o clima propício
para o plantio de mandioca, arroz, milho, cana de açúcar e algodão. As condições citadas acima,
proporcionaram também a produção de lenha, carvão, tijolo, farinha e aguardente, no município.
Situado às margens de pequenos rios navegáveis, que no período do império possibilitou o acesso e
o escoamento de produtos do porto da Corte do Rio de Janeiro até a Baía de Guanabara, alcançando
o Rio do Vale Paraíba (RJ), até a província de Minas Gerais. Extinto no ano de 1892, a área geográfica
onde se encontra o município de Estrela, atualmente pertence aos municípios de Duque de Caxias e
Magé, ambos localizados na Baixada Fluminense, região periférica da cidade do Rio de Janeiro.
Antes de ser elevado a município, a região onde encontrava-se o porto da Estrela, teve grandes
contribuições. Desde o período aurífero a região exerceu grandes papéis ao considerar as rotas
traçadas pelo Caminho Novo de Proença, na primeira metade do século XVIII. Para que um simples
povoado fosse elevado à condição de vila ou cidade, se fazia necessário a aquisição da importância
político - administrativa, de tal forma que houvesse interesse local ou por parte do governo central.
Segundo estudos de Mazola (2008), o Arraial de Estrela pode se tornar um município por pressões
realizadas pelos proprietários locais. Ao considerar os debates políticos em torno da construção do
município, buscamos compreender neste trabalho o papel da difusão da escolarização nesse
processo, com foco na formação e atuação dos docentes nomeados para ocupar as cadeiras das
escolas públicas na região. A análise se dá em conjunto com os impactos da instrução oferecida por
esses docentes, ao considerar as suas redes de sociabilidade, tensões com o governo, condições de
trabalho a partir da investigação do processo de escolarização da região no período de 1846 a 1889.
A análise aqui apresentada está pautada nas contribuições dos estudos acerca da história local e
regional, história da Baixada Fluminense, no conceito de jogos de escalas de Jacques Revel (1998),
nas contribuições de Faria Filho (2009) acerca do uso do “regional como unidade e como posição de
análise”, e no uso do conceito de “fio do nome” de Ginzburg; Poni (1991). Para a realização deste
trabalho, recorremos a um conjunto de fontes diversas, como a imprensa periódica, o Almanak
Laemmert, os relatórios dos Presidentes da Província do Rio de Janeiro, e documentos da instrução
pública, a fim de realizarmos o levantamento dos docentes atuantes e investigarmos as ações em
conjunto com as discussões em torno das políticas educacionais. Ao se tratar do processo de
escolarização no período do Império Brasileiro se faz necessário remeter à Lei Geral de Ensino de
15 de outubro de 1827. Em seu primeiro artigo fica explícita a necessidade da criação de escolas de
primeiras letras em cidades, vilas, e lugares mais populosos. Mais adiante percebemos a importância
e o impacto do decreto provincial de n. 1.470 de 1869 para a educação de meninas, que previa a
criação de escolas públicas femininas em todas as freguesias da província em que se julgasse
necessário. Com as modificações, leis e debates políticos na época, Estrela passou por diferentes
momentos até decair. No decorrer deste período o município pode contar com duas escolas na
década de 40, quatro escolas na década de 50, sete escolas na década de 60, dezesseis escolas na
década de 70, e doze escolas públicas criadas e providas na década de 80, distribuídas por suas
freguesias. Ao realizar o cruzamento de dados com as informações encontradas no Almanak
Laemmert: Administrativo, Mercantil e Industrial (1844 - 1889), com os Relatórios dos Presidentes da
Província do Rio de Janeiro, foi possível mapear durante o período de 1846 a 1889, mais de 80
professores atuantes na instrução do município, sendo aproximadamente 71 públicos - constando
nesse número os professores substitutos -, 5 particulares, 4 subvencionados e 4 nas Colônias
Orfanológicas. Destes professores identificamos que pelo menos que sete frequentaram a escola
normal. Cabe ressaltar que está análise não apresenta dados referente a Freguesia de Petrópolis,
justamente por ter ocorrido seu processo de emancipação. Na análise de dados foi possível encontrar
professores que posteriormente passaram a dar aulas em escolas mistas. O número considerável de
docentes no magistério da região durante o período, muito tem a ver com as condições em que se
encontrava o município e suas escolas. A rotatividade, o não custeio das escolas, a falta de pagamento
dos vencimentos, diz muito a respeito sobre a não permanência dos docentes em suas cadeiras e a
frequente busca dos mesmos por melhores condições de trabalho. Entre muitos outros docentes,
pode-se ressaltar as professoras Julieta de Sampaio Mayrink, Rosa Maria da Conceição Neves
Andrade, Amélia da Cunha Mourão, e Candida Olympia de Lima Viegas por nos dar indícios de como
eram as condições de trabalho e o posicionamento da Diretoria de Instrução, quanto aos seus
pedidos de licenças para tratar a saúde, remoções, pagamento dos vencimentos e custeio das
escolas. Cabe também destacar a professora vitalícia da escola de Estrela, Candida Olympia de Lima
Viegas, inscrita no Instituto Pedagógico no ano de 1876. Ao solicitar gratificação extraordinária de
200$ anuais, por contar mais de 20 anos de magistério, teve seu pedido negado pela Diretoria de
Instrução que não reconhecia que Candida Viegas havia completado 20 anos de efetivo exercício
para ter direito a gratificação. No caso de outra professora Anna Josephina Nery do Valle, com família
instalada na Freguesia de Nossa Senhora do Pilar, observamos o reconhecimento público ao receber
elogios por ter alunos “extremamente adiantados”. Já o professor Miguel Antonio de Araujo Dantas,
para além de ter sido professor público de instrução primária de 2° classe da escola estabelecida na
Freguesia de N. S. da Guia no município de Estrela, atuou no magistério em distintos locais da
Província do Rio de Janeiro, nos quais também desempenhou diferentes funções como de
subdelegado, além de ser eleitor. Nota-se que variados docentes do município carregam antes do
nome as patentes e títulos como “Major”,”Padre” e ”Bacharel”. Tais pertencimentos sociais,
econômicos e políticos poderiam produzir embates e tensões entre professores e autoridades. Nesse
sentido, torna-se importante trazer para a reflexão os sujeitos nomeados pelo governo para atuar na
fiscalização. No que diz respeito aos inspetores do município de 1851 a 1885 constatamos que
compuseram o quadro de Inspetores e membros do conselho de instrução primária 24 sujeitos,
como o Barão do Pilar, os capitães José Pinheiro de Siqueira e José Ferreira Panasco de Araújo que
também eram subdelegados em Estrela, o capitão Luiz Ignacio da Costa Valle que era juiz da
irmandade de N. S. do Pilar e quatro doutores. Como evidência de que os professores tiveram alguma
atuação conjunta, destacamos a manifestação de apreço de 13 professores de diferentes localidades
de Estrela, endereçada ao ex-inspetor municipal Joaquim Alves Machado, publicado no jornal Diário
do Rio de Janeiro (RJ) de 1876/; “Os abaixo assinados, membros do magistério público e particular,
subvencionado deste município, em extremo penhorados pela delicadeza e urbanidade com que V.
S. os tratou durante o tempo em que exerceu o importante cargo de inspetor municipal das escolas,
não podem, sem faltar á devida justiça, deixar de significar a V.S. o seu reconhecimento”. Assim
importa considerar as tensões e mediações entre o papel de fiscalização e as relações em jogo entre
o inspetor Joaquim Alves e os professores da região e como isso reverbera na estabilidade dos
docentes e no desejo de locomoção para outras regiões da Província. Soma-se a isso o problema da
insalubridade, os atrasos de pagamentos, o não custeio das escolas e a política de provimento das
escolas públicas primárias na Província do Rio de Janeiro que poderiam estar associadas às tensões
com o governo e o tratamento dispensado ao magistério na Província.
ISSN 2358-3959
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[1] Harry Amorin nasceu em 23 de maio de 1927 e faleceu 20 de agosto de 1988. Formou –se em Engenharia e foi o
primeiro governador do estado de Mato Grosso do Sul (de 1 de janeiro de 1979 a 12 de junho 1979), indicado pelo
então presidente Ernesto Geisel (1974-1979).
[2] Segundo Silva Filho (2008), em Mato Grosso do Sul muitas forças políticas lutavam para permanecer no poder.
[3] Após a divisão do estado, o CEUD se tornou Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e, em 2005, Univer-
sidade Federal da Grande Dourados (UFGD).
[4] Segundo o Decreto Nº 99.490, de 30 de agosto de 1990, as instituições de ensino Superior realizarão os concursos
vestibulares nos termos da lei, de seus estatutos e regimento. Esses, têm por objetivo a classificação dos candida-
tos para preenchimento de vagas de cursos ofertados pelas instituições.
[5] Algumas mulheres que foram selecionadas no processo de contratação já possuíam vínculo com a UEMS.
ISSN 2358-3959
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Esta pesquisa tem como objeto a trajetória pianística da Irmã Augusta Costa Marques. Descendente
de uma família tradicional mato-grossense, influente na política do estado de Mato Grosso em seu
período de vida. A atuação de sua família na política vem desde o Império e estendeu sua atuação no
período Republicano. No período imperialista, temos o Barão de Poconé, Manuel Nunes da Cunha, o
primeiro barão de Mato Grosso. Mais à frente sua neta se casará com um jovem tenente-coronel
descente da família Costa Marques, outra família tradicional do Estado, dessa união surgirão dois
políticos importantes à época, não apenas no cenário mato-grossense, mas também no cenário
nacional. Sua ligação a uma família de político reforça o conceito de Sirinelli – Genealogia de influências
– o que marcou uma geração antes, neste caso por várias gerações que a antecederam e vieram
reivindicando assim a imagem de fidelidade dos intelectuais no engajamento de toda uma vida política.
Esses percursos podem igualmente ser analisados através da evolução de um grupo de intelectuais
oriundos de uma matriz comum. (Sirinelli, 2003). É importante ressaltar esses dois políticos históricos,
pois os benefícios que ambos propuseram em sua época, ainda nos dias de hoje refletem as luzes do e
a intrepidez de uma época marcada por grande atraso de recursos nos estado. Manoel Esperidião Costa
Marques era o mais velho de doze irmãos, do qual o sétimo filho era o pai da nossa investigada, esse
político lutou e idealizou por um progresso no seu período de atuação política, foi um dos parlamentares
que a convite da princesa Isabel ajudou na elaboração da Lei Áurea, e participou da expedição para
mediação e demarcação de seringais no Rio Guaporé até a região da Vila Bela da Santíssima Trindade,
o segundo filho é Joaquim Augusto da Costa Marques, foi presidente do Estado Província de Mato
Grosso, o sexto presidente, foi o primeiro presidente a conseguir completar seu quatriênio de mandato,
em sua administração foram feitos vários avanços de modernidade para o estado, no campo da
educação foi o responsável pela criação da Biblioteca Pública do Estado, como a implantação de outros
grupos escolares na capital como no interior. Esses apontamentos não apenas reforçam a influência de
poder desses políticos, mas a gama de possibilidade que era dada aos seus descendentes, uma vez
oriundos de família elitistas, o acesso aos estudos era algo garantido, não sendo isto realidade para os
demais que os cercavam, digo as classes menos favorecidas. Ainda criança a jovem Augusta foi mandada
para o Asilo Santa Rita, escola de renome da época. O Asilo naquela época ocupa no campo católico
uma dúbia atuação, ao mesmo tempo em que era um orfanato para jovens desvalidas era um internato
para moças burguesas, que mandadas por seus pais, seriam educadas por religiosas, com isto, seriam
futuras mulheres preparadas para marcar presença nos bastidores da sociedade cuiabana ou em
funções que eram próprias do sexo feminino, como professora primária, enquanto aos homens, cabiam
as decisões e o direcionamento da sociedade. A história Cultural tem o seu foco no passado, assim
motivada na forma de ver, mas ao mesmo tempo de estar no mundo que modelaram sociedades e
indivíduos de uma época, e sob uma égide crítica possibilita uma releitura sobre fatos de uma realidade
que foi construída, abrindo espaços para procedimentos diferenciados, assim procurando identificar a
cultura, a forma de pensar de uma época por meio de suas representações e práticas. Foi no Asilo Santa
Rita que sob a orientação de irmã Alzira Bastos que Augusta Costa Marques passará pelo processo de
ensino-aprendizagem, no qual quando se tornar religiosa, vocação essa que a fará abandonar a
estrutura aristocrática da família e fluirá em suas atitudes e decisões através da caridade, exercerá o
papel de professora e pianista em Guiratinga, cenário central dessa pesquisa. Assim, este trabalho tem
por objetivo compreender a contribuição de irmã Augusta Costa Marques, professora leiga de piano,
para a educação musical em Guiratinga - MT (1980 – 2000). Esta pesquisa, bibliográfica e documental,
se propõe a atingir seu objetivo geral por meio da compreensão dos conceitos que dão suporte a ela no
viés da História Cultural e na História dos Intelectuais e se pautará nos estudos de Sirinelli (1998),
Chartier (1991), Revel (1998) e Ginzburg (1989), guiando o percurso investigativo a utilizar, da intuição
para, a partir da análise de dados particulares, insignificantes, negligenciáveis, marginais e
imperceptíveis sobre a vida dessa religiosa-educadora. Na época não foi cobrado uma formação
profissional no que tange ao curso técnico de piano, a sociedade em geral da época valorizava
integralmente uma mulher formada no magistério da Escola Normal, assim subtendia que tudo que
viesse de lá, já era o suficiente para lecionar qualquer coisa. Lecionar piano estava ligado ao mesmo
que alfabetizar uma mulher com formação a época, tinha o seu lugar cativo no espaço de trabalho
deste tipo de seguimento. O presente artigo enfatiza como uma professora leiga em piano conseguiu,
durante anos, lecionar piano se guiando por uma intuição musical, que ao mesmo tempo se entrelaçava
com as tendências musicais da Escola Nacional de Música e do Conservatório Brasileiro de Música,
ambos situados no Rio de Janeiro, de onde emanava o programa nacional de música. A necessidade do
pesquisador de ler nas entrelinhas dos documentos, e ter a consciência de que todo documento,
imagem ou objeto são produções humanas, portanto, representações da realidade (BURKE, 2005).
Distanciando do modelo dominante, mas ao mesmo tempo, tornar visível a sua base de investigação e
abordagem, onde a história dominante se mostrou incapaz de apreender tudo que se referia a
experiência social, onde amparado na micro-história, Revel irá dizer: “[...] Um dos efeitos da passagem
para a micro-história é transformar por exemplo, a natureza da informação e a relação que o historiador
mantem com ela. Assim se reconstrói o mundo exterior a partir de migalhas, informações que se recebe
a fim de transmitir”. (REVEL, 1998).Como fundamentação para a compreensão do papel do historiador
cultural e intelectual onde o mesmo deve ser voltar para o deciframento das fontes que lhe forem
exibidas. Ele é um decifrador que se vale de provas, indícios, intuição, ou seja é necessário examinar as
evidências mais negligenciáveis. Percebemos que tal apropriação de critérios educacionais serão
utilizados por toda a sua vida útil como professora, transformando as suas práticas como marcas do
seu ensinar, assim nos diz Chartier: “ [...] A apropriação, a nosso ver, visa numa história social dos usos
e das interpretações, referidas a suas determinações fundamentais e inscritas nas práticas específicas
que as produzem. (CHARTIER, 1988, p. 180). Carlo Ginzburg (1989) que através do novo método
epistemológico, o paradigma indiciário, mostra que o pesquisador deve com muita intuição, verdade e
sensibilidade, assim como um Sherlock Holmes nos indícios, Giovanni Morelli nos signos pictóricos e
Sigmund Freud nos sintomas, articulados em disciplinas diferentes, mas muitas vezes ligadas entre si
pelo empréstimo de métodos semelhantes, buscando decifrar enigmas que passaram despercebidos,
como “os nossos pequenos gestos inconscientes revelam o nosso caráter mais do que qualquer atitude
formal, cuidadosamente preparada por nós” (GINZBURG, 1989, p. 146). O desafio em escrever numa
página branca sob o olhar em decifrar as pisadas dessa religiosa no convento de Guiratinga - MT, fechada
no silêncio dos muros, apenas aparecendo em seus trabalhos sacerdotais e educacionais, dar voz a
essa religiosa não é tecer elogios, ou criar um pódio de venturas, mas a relevância que teve na sociedade
a qual prestou mais de 20 anos seus profundos ensinamentos, principalmente no que se refere a arte
pianística. Ressalta Ginzburg que na “Imensa página branca onde as pessoas que procuramos deixaram
escrito não só seus movimentos e seus passos mas também seus pensamentos secretos, as esperanças
e angústia que as agitavam” (GINZBURG, 1989, p. 170). É possível perceber que Irmã Augusta dentro da
sua vida religiosa dedicou-se a lecionar, mas especificamente o instrumento: piano. Guiada no
paradigma salesiano na constituição das Irmãs Salesianas, sua atuação sacerdotal terá seu ápice em
Guiratinga-MT, sua última cidade de trabalho missionário, onde durante duas décadas sob um prisma
de idealismo e intrepidez focado na metodologia das irmãs é aplicada a técnica pianística, com forte
influência do Conservatório Brasileiro de Música. Essa instituição se mostrou importante em seu
método sendo adotado no nivelamento das séries dos alunos. Irmã Augusta inovou em seu período de
atuação ao inserir meninos no aprendizado de piano, como também, possibilitou novas perspectivas
acerca do gosto pela música erudita nessa localidade.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
MEMÓRIAS DE PROFESSORAS:
DESVELANDO AS PRÁTICAS EDUCATIVAS DO
ENSINO PRIMÁRIO NO PARANÁ, 1930-1950
Ariclê Vechia
a professora tinha uma posição de destaque na sociedade, era respeitada pelos alunos e pelos pais
dos alunos; 2) ser professora normalista naquela época significava estar comprometida com a
educação das criança, com a formação do caráter dos alunos e com o ensinar-lhes os conhecimentos
que precisariam para enfrentar a vida, conforme expressão da época. Desmontaram sentir-se
honradas por terem sido professoras de alunos que depois se tornaram médicos, engenheiros,
profissionais liberais e políticos. Todas elas recordavam, com orgulho, o fato de terem cumprido com
seu “dever cívico” de terem realizado o estágio obrigatório em localidades do interior do Estado,
geralmente na zona rural. De fato, o Governo Paranaense via as professoras como mulheres
missionarias das letras e do civismo que “vão anunciar o evangelho da Pátria”. O Código de Educação
de 1938 redimensionou a ação educacional, fixou o estágio obrigatório no interior em dois anos, pois
a meta do governo era a de transformar as professoras em agentes de transformação social. A politica
adotada pelo governo Vargas, de modo especial durante o Estado Novo, via na escola o veiculo ideal
para atingir a almejada homogeneização ideológica e cultural. Em 1937 foi deflagrada a Campanha
de Nacionalização das escolas mantidas por imigrantes que sofreram intervenção do governo
visando repelir qualquer traço de nacionalismos da terra de origem. As professoras entrevistadas
destacavam, com orgulho, terem participado desta obra de homogeneização cultural junto aos
núcleos de imigrantes, não só como professoras, mas como Inspetoras de Ensino. Visando garantir
as metas estabelecidas para as escolas e professoras, quais sejam: ministrar conhecimentos uteis e
concretos visando uma vida laboriosa, incutir normas de boa conduta, respeito às Leis e às
instituições e autoridades brasileiras, o governo paranaense instituiu um rígido sistema de
fiscalização e controle das escolas – a Inspetoria de Ensino. Além de um grupo de inspetores
especialmente designados para esta tarefa, a Inspetoria Geral, contava com um exército de
professoras que eram designadas para cumprir este dever cívico. Em seus relatos, destacaram em
detalhes, como executavam suas tarefas como Inspetoras de Ensino: faziam visitas inesperadas nas
escolas para verificar se as outras professoras estavam seguindo as determinações legais quanto aos
conteúdos e métodos de ensino. Nas escolas dos núcleos de imigrantes, além dos itens anteriores,
verificavam o progresso ou não das crianças na aprendizagem da língua portuguesa e a aquisição
dos valores nacionais. Além disto, seguindo determinações legais, elas percorriam as escolas do
interior e aplicavam as provas previamente elaboradas pela Inspetoria de Ensino. Estas provas se
constituíam em mais um instrumento utilizado para a homogeneização ideológica e cultural. O que
as narrativas das entrevistadas nos revelam é que muito embora todas fossem de classe media,
portanto sem necessidade de econômica de trabalhar, todas se dispuseram a deixar suas casas, seus
familiares e foram para o meio rural fazer o estágio obrigatório com a tarefa de transmitir às crianças
daquele meio, a cultura, os hábitos de vida social urbana, os hábitos de higiene, normas de conduta
e amor à Pátria. Como eram todas jovens acabaram se casando com rapazes do interior e lá exerceram
o magistério até sua aposentadoria. Nas narrativas de todas as entrevistadas é dado destaque à sua
fidelidade aos ideais do governo, à retidão do seu caráter, a severidade no trato das questões
educacionais. Em suas falas as referências eram feitas usando os seguintes termos: “eu era durona,
eu era exigente, eu era uma tigra”. Na realidade estes aspectos eram mais importantes do que o
domínio do conjunto de conhecimentos a ensinar; a escola primária deveria cultivar a inteligência e
apurar o sentimento das crianças, pois a “união das faculdades as alma com as intelectuais formará
o homem futuro como exige a família, como exige a pátria”. Cabia à professora cuidar do coração
infantil, incutindo-lhe o sentimento moral, o sentimento do belo, o sentimento do infinito pela razão
e pela consciência, pois da cultura do espírito da mulher dependia a formação das crianças. Dessas
colocações depreende-se que a professora não precisava dominar conhecimentos vastos e profundos
das ciências humanas e das ciências biológicas e matemáticas para cumprir sua missão, o mais
importante era a justeza de seu caráter. Ao que parece a Escola Normal cumpriu seu papel de inculcar
nas futuras professoras, normas de boa conduta, autodisciplina, respeito ás leis, às autoridades e às
instituições nacionais. Estas virtudes serviriam de escudo com o qual deveria defender-se no meio
onde fosse lecionar. As memórias das professoras entrevistadas permitem reconstruir esses aspectos
da história da educação na capital do Paraná e em seus arredores. Seus relatos revelam que sua
formação e suas praticas refletem as políticas para o ensino primário e para a formação de professores
no Estado do Paraná na primeira metade do século XX.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 795
Referências
COSTA,L.F.Relatorio da Escola Normal Secundaria referentes às atividades de 1923/4.
CARVALHO, J.M. A Formação das Almas: o imaginário da Republica no Brasil: São Paulo: Cia das Letras,
1990.
MIGUEL, M.E.B. A Formação de Professor e a Organização Social do Trabalho. Curitiba: Editora UFPR,
1997.
O presente trabalho tem como objetivo principal descrever o processo de formação das professoras
leigas da zona rural por meio do LOGOS II em Duque Bacelar, no Estado do Maranhão na década de
1980. O projeto LOGOS II que foi uma iniciativa educacional a fim de habilitar e formar professores
leigos, a nível de 2º grau. Segundo Paz et al (1984) as unidades da federação atendidas pelo projeto
foram: Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Piauí, Paraná, Ceará, Maranhão, Minas Gerais, Rondônia,
Bahia, Rio de Janeiro, Paraíba, Rio Grande do Norte, Roraima, Pernambuco, Santa Catarina, Sergipe,
Amazonas e Acre. O projeto LOGOS II constituiu-se de uma iniciativa para formar professores leigos
em nível de 2º grau, buscando atender as exigências da Lei 5.692/1971. De acordo com Gondim: são
considerados professores leigos os que não tem habilitação adequada para o magistério, além disso,
em geral apresentam precário nível de formação geral, como primário incompleto, primário completo,
ginásio incompleto e no melhor dos casos ginásio completo (GONDIM,1982, p. 15). A pesquisa de
campo foi realizada em Duque Bacelar, um município brasileiro do estado do Maranhão fundado em
1 de janeiro de 1955. Localiza-se na microrregião de Coelho Neto, mesorregião do leste Maranhense.
O município tem cerca de 10 649 habitantes, população estimada de acordo com o censo de 2010 e
tem como municípios limítrofes: Coelho Neto, Chapadinha, Buriti e o estado do Piauí. A periodização
do trabalho justifica-se pelo fato de que em 1979 o projeto LOGOS II começou a ser implantado no
Estado do Maranhão e em 1985 foi executado no município de Duque Bacelar. Para a construção deste
trabalho nos fundamentamos em Alberti (1989) e Montenegro (1994) no que diz respeito à história
oral, em Pollack (1989) no que se refere à memória e em Tardif (2002) e Gatti (2010) e nos aspectos
inerentes à formação de professores. No que diz respeito aos aspectos metodológicos realizamos
pesquisa bibliográfica e também fez-se o uso da História Oral, através de entrevistas semiestruturadas.
A História Oral busca perceber e registrar os sujeitos que fazem parte da história oficial. De acordo
com Montenegro: a história trabalha e constrói uma representação de fatos distantes, ou mesmo onde
ou quando se encerra a possibilidade de encontrar testemunhas daquela lembrança. (MONTENEGRO,
1994, p.17). Primeiro elaboramos uma pesquisa bibliográfica sobre o projeto LOGOS II para assim
identificar os principais pesquisadores que desenvolveram trabalhos sobre a temática “formação de
professores” e “projeto LOGOS II” depois fizemos um levantamento na zona urbana e rural de Duque
Bacelar, buscando assim indicações de alguns nomes de alunos que teriam concluído o programa
investigado. Com os nomes indicados, foi feito um primeiro contato a fim de certificar-se sobre a
viabilidade da concessão das entrevistas. Em seguida, as entrevistas foram realizadas, transcritas e
analisadas. As mesmas abordam sobre o projeto LOGOS II, com sua contextualização na formação de
professores leigos seguindo assim a sequência de um roteiro prévio e organizadas em 4 categorias:
formação, práticas docentes, magistério rural e relação da professora com o meio rural. A primeira
entrevistada nesta pesquisa foi a professora Aracelia Bastos Almeida, que nasceu no povoado Bonfim
zona rural de Duque Bacelar, cursou o LOGOS II, posteriormente formou-se em Pedagogia. A segunda
Referências
GONDIM, M. A. D. R. O Projeto Logos II no Piauí: uma análise de programas para formação do professor
leigo de zona rural. Rio de Janeiro, PUC/RJ, 1982. 273p.
MONTENEGRO, A.T. História oral e Memória: a cultura popular revisitada. 3. ed. São Paulo: Contexto,
1994.
PAZ, M. J. M. et al. Projeto Logos II: Didática da Linguagem. CETEB, Brasília, DF, 1984.
POLACK, M. Memória e Identidade Social. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 5, n. 10, 1992, p. 200-212.
ISSN 2358-3959
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conceito de jogos de escalas de Jacques Revel (1998), para entender a articulação entre o local e o
global, também são acionados para nos ajudar a realizar uma análise dessas experiências voltada para
a história local. O município de Magé está situado em um território conhecido atualmente como Baixada
Fluminense, no Estado do Rio de Janeiro e desempenhou um papel importante para a ocupação
territorial da província. Pois possuía diversas estradas, rios e portos que serviam como escoadouros da
produção do interior para a Corte. Além do mais, essa região era produtora de mandioca, farinha, milho,
feijão e cana - de - açúcar (ALONSO, 2000). Em 1789, a freguesia de Magé foi elevada à categoria de Vila
e em 1857 elevada à categoria de Cidade graças ao seu desenvolvimento econômico. No período
estudado esta localidade estava subdividida nas seguintes freguesias: Nossa Senhora da Piedade, São
Nicolau do Suruí, Nossa Senhora da Ajuda de Guapimirim, Nossa Senhora Aparecida e Santo Antônio do
Paquequer (Teresópolis) e pelo curato de Sapucaia. Nos limites territoriais do referido município
encontramos a Fábrica de Tecidos de Santo Aleixo que nos relatórios dos presidentes da província é
apontada como um empreendimento promissor para a mesma. Assim como a fábrica, encontramos a
presença do Gabinete de Leitura Mageense que é mencionado frequentemente nas fontes citadas. A
população mageense era estimada em 24.119 pessoas, sendo 13.301 livres e 10.818 escravizados
segundo o Recenseamento do Brasil de 1872. Por meio deste censo, podemos analisar o quantitativo
populacional de cada freguesia, o número de analfabetos e alfabetizados, bem como saber o quantitativo
de crianças que frequentavam a escola. Nesse quesito, a freguesia de Nossa Senhora da Piedade era a
mais populosa do município e por conta disso e de acordo com a determinação legal, foi a primeira
localidade a registrar a presença de uma escola feminina. No relatório de 1840 temos a primeira menção
da criação da escola de meninas em Magé que foi ocupada pela professora e poetisa Luiza Augusta de
Menezes. Isso não significa que foram criadas escolas para meninas nas demais freguesias prontamente.
A situação da instrução feminina na província modificou-se com o Decreto 1.470 de 1869 que estabeleceu
que todas as freguesias deveriam contar com uma escola para meninas e uma para meninos. E a partir
disso, foram criadas escolas nas demais freguesias mageenses. Entre 1840 e 1889, encontramos a
existência de 28 professoras - sendo 22 professoras públicas, uma provisória, uma substituta e quatro
professoras particulares - atuando no município. Destas, até o momento atual, identificamos que ao
menos oito professoras frequentaram a Escola Normal. Criada pelo Decreto nº10 de 04 de abril de 1835,
a Escola Normal tinha o intuito de normalizar a atuação docente bem como contribuir para a formação
de professores com o objetivo de ampliar a oferta educacional da Província. As experiências dessas
“mulheres em sala de aula” que pretendemos analisar abordam a formação e perpassam as condições
de trabalho, redes e espaços de sociabilidade, religiosos, familiares e sociais. Por meio do cruzamento
dos dados da imprensa periódica com as demais fontes podemos analisar a atuação das docentes e
observar as relações sociais construídas nos locais onde exerceram a docência. Também podemos
verificar a rotatividade das professoras entre os municípios e/ou freguesias. Segundo Nascimento
(2011), a movimentação entre cadeiras era uma prática comum entre professoras e professores,
indicando assim a mobilidade espacial. Ademais, é recorrente o pedido de pagamento dos ordenados
o que pode nos indicar como eram as condições de trabalho em que as mesmas estavam submetidas.
Costumeiros também eram os pedidos de licença pelas professoras. Vidal (2010) salientou a importância
de que ao tomar o magistério como experiência, devemos contemplar as trajetórias individuais das
docentes. Porém sem afastar-se da observação das determinantes sociais e histórica. Ao seguir esta
premissa, neste trabalho salientaremos algumas experiências docentes entre as quais as das professoras
de duas freguesias: Nossa Senhora da Piedade e São Nicolau do Suruí. Dentre as docentes que atuaram
nessas localidades, destacamos a presença das seguintes professoras e as aparições sobre suas
trajetórias: Candida Francisca da Costa Lopes - professora e examinadora de escolas, requerimentos de
pagamentos e licenças, segunda vice diretora da sociedade para proteger a infância desvalida e irmã da
também professora de Magé, Isabel Francisca da Silva Medenilha; Joanna Rosa de Magalhães - Habilitada
pela Escola Normal, pedidos de licenças, de remoção da escola e pedidos de pagamento; Luiza Augusta
de Menezes - primeira professora de Magé, poetisa, agradecimentos em relação a sua atuação
profissional; Minervina Laura Moreira Guimarães - professora e poetisa, pedidos de pagamento de
gratificação e custeio da escola, dificuldades enfrentadas na sua atuação quando houve uma epidemia
de sarampo na região. Desta forma, com o cruzamento dos dados, podemos observar as relações sociais
que foram construídas no exercício docente, pedidos de licenças, remoções, os espaços de sociabilidade
bem como analisar o tempo de permanência das professoras no município. Ao utilizarmos a ideia de
docência como experiência coletiva, as vivências dessas professoras nos permite compreender melhor
o trabalho docente feminino e seus efeitos na escolarização de meninas em Magé no período do Império.
ISSN 2358-3959
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bem como amparada em fontes documentais e nas análises historiográficas sobre a temática. Neste
trabalho, objetivou-se trabalhar com a história oral temática, visto que a história oral temática torna
o questionário “peça fundamental para a aquisição dos detalhes procurados” (MEIHY, 1996, p. 41).
A metodologia da pesquisa foi desenvolvida a partir do trabalho com fontes orais, realizado por
meio de entrevistas semiestruturadas com dez professoras, com idades entre 72 a 85 anos, que
atuaram no magistério rural. As entrevistadas foram selecionadas com base nos seguintes critérios: o
ingresso no magistério entre as décadas de 1950 e 1980 e ter lecionado nas escolas isoladas rurais do
município de Maringá também neste período. Destas, duas residem no distrito de Floriano, uma no
distrito de Iguatemi e as demais na cidade de Maringá. A predominância de professoras no magistério
rural maringaense foi um dos aspectos de destaque neste estudo. De acordo com as entrevistadas
e com os registros localizados nas fontes documentais, a presença masculina no magistério rural
de Maringá era minoritária. O instrumento de investigação contou com questões semiestruturadas
divididas em seis grupos: 1. identificação; 2. formação; 3. magistério rural; 4. formação em serviço;
5. práticas docentes e 6. relação das professoras com o meio rural.
O trabalho também foi fundamentado em fontes documentais e bibliográficas, a partir de
uma revisão de literatura sobre a temática proposta e um levantamento, catalogação e análise de
documentos localizados nos acervos do Setor de Patrimônio Histórico de Maringá e das Secretarias
de Educação dos municípios de Maringá, Floresta, Ivatuba e Paiçandu, visto que esses três últimos
foram distritos de Maringá até o ano de 1961; bem como nos acervos escolares das Escolas Municipais
Fernão Dias, Ruy Alvino Alegreti, Dona Lázara Ribeiro Vilela, Machado de Assis e Vitor Beloti. Dentre
os principais documentos localizados podemos citar as atas, as fichas de professores, as plantas e as
fotografias das escolas primárias rurais.
Os resultados indicam que a criação da maioria das escolas rurais ocorreu na década de 1950 no
município de Maringá e em seus respectivos distritos. Este dado regional corrobora o que a pesquisa
sobre a história da educação tem evidenciado no tocante a expansão do ensino primário no Estado
do Paraná. De acordo com Schelbauer e Corrêa (2019, p. 82), uma das características da expansão
ao longo deste período é “a interiorização de unidades escolares que certamente acompanha o
processo do povoamento para o interior do Estado, seguindo a lógica da colonização, por meio da
distribuição de terras”.
Sobre o magistério rural, as professoras entrevistadas iniciavam suas carreiras como professoras
leigas, por meio de indicação política ou de pessoas influentes. Verificamos que, inicialmente, na
década de 1950, as professoras não recebiam formação em serviço nem orientações sobre o trabalho
pedagógico, cenário que teve modificações com a implementação da LDB nº 4.024/61, no que se
refere à orientação do trabalho pedagógico e com a LDB nº 5.692/71 no sentido da formação em
serviço.
Em suas narrativas, todas as professoras afirmaram ter estabelecido boa relação com os alunos,
pais e comunidade e não mencionando episódios de desavenças. De acordo com Le Goff (2012),
seja a propósito de lembrar ou de esquecer, o interesse, a afetividade, o desejo e a censura exercem
influência sobre a memória individual. As professoras relataram também que, naquela época, se
sentiam valorizadas pelo trabalho realizado, passagens estas rememoradas com bastante entusiasmo
envoltas a um sentimento saudosista em relação ao passado. De acordo com Bosi (1994, p. 480), “[...]
a memória vem acompanhada de uma valorização do trabalho evocado e de uma crítica, ou melhor,
de uma estranheza em faces a certos costumes atuais.”
Investigar as motivações destas professoras a ingressarem no magistério rural, bem como
compreender as particularidades e singularidades que entremeiam o trabalho e a vida destas
professoras, fez-nos perceber o que Nóvoa (2000) afirma ser impossível: separar o profissional do
pessoal, pois as escolhas e caminhos percorridos por estes professores influenciam, na sua maneira
de ser, o modo de ensinar e desvendam, na sua forma de ensinar, a sua maneira de ser. Sendo assim,
reconstituir por meio das narrativas das memórias das professoras rurais da época foi uma forma
de registrar a história a partir das lembranças daquelas que também fizeram parte desta história,
daquelas que compuseram a história da escola rural de Maringá.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 802
Referências
BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembranças do velho. 17ª ed. São Paulo: Companhia das Letras,
2012.
MEIHY, José Carlos Sebe B. Manual de História Oral. São Paulo: Edições Loyola, 1996.
SCHELBAUER, Analete Regina; CORRÊA, Rosa Lydia Teixeira. Povoar e escolarizar: história da expansão,
dos modelos e modalidades de escola Primária no Paraná. In: FURTADO, Alessandra Cristina;
SCHELBAUER, Analete Regina; CORRÊA, Rosa Lydia Teixeira (Orgs.). Itinerários e singularidades da
institucionalização e expansão da escola primária no Brasil (1930-1961). Maringá: Eduem, 2019.
ISSN 2358-3959
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Referências
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Fontes Históricas. 2.ed. São Paulo: Contexto, 2008. p. 23-79.
ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador - volume 2: Formação do Estado e Civilização. Rio de Janeiro:
Zahar, 1993.
ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador - volume 1: Uma História dos Costumes. 2 ed. Rio de Janeiro:
Zahar, 2011.
VEIGA, Cynthia Greive. Elaboração de hábitos civilizados na constituição das relações entre
professores e alunos. Revista Brasileira de História da Educação, n. 3, (21), p. 61-92, set-dez, 2009.
Disponível em: http://www.rbhe.sbhe.org.br/index.php/rbhe/article/view/62/70
ISSN 2358-3959
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Tomando como referência os estudos acerca das práticas escolares, esse estudo versa sobre os
dispositivos pedagógicos elaborados para atuação e formação de docentes primários na década de
1970 na instituição de ensino normal: Escola Normal Estadual de Campina Grande-PB (ENECG). A
centralidade desse estudo enfoca um período em que a modalidade do ensino normal brasileiro
apresentava decadência, sendo substituído em muitas outras cidades pela Habilitação Específica para
o Magistério, no entanto, na cidade de Campina Grande, a referida instituição, primeira escola para
formação de professores em caráter público, passa a ocupar seu prédio próprio, após dez anos
funcionando em outras escolas. Criada na década de 1960, sua constituição enredou um processo de
anos, por conta das divergências político partidárias do Estado paraibano e da cidade de Campina
Grande. Essa escola, como outras criadas no mesmo período atendiam o projeto de desenvolvimento
da nação por meio da educação, mas também no contexto campinense havia nesse período uma forte
propulsão à esfera industrial, uma vez que a cidade estava com a economia estagnada e a migração
aumentava contundentemente, ademais alguns periódicos diários do período estudado apontam a
criação desta instituição como um benefício para juventude feminina campinense, caracterizando-a
enquanto espaço predominantemente feminino, bem como uma estratégia para melhoria do ensino
primário. Portanto, a virtude de analisar as práticas escolares desenvolvidas na instituição em
consonância com o espaço escolar atenta para um dado encontrado em uma das fontes primárias
desse estudo, da qual argumenta a necessidade de existir um prédio específico para formação das
futuras professoras. Dessa forma, com o intuito de analisar as práticas escolares desenvolvidas na
Escola Normal Estadual de Campina Grande-PB na década de 1970, utilizaremos como fontes primárias
as fichas de matrículas das alunas, bem como o álbum de fotografias da escola, estas estão disponíveis
no arquivo João Agripino, pertencente à escola ora estudada. Essas fichas de matricula e álbum foram
fotografadas e armazenadas em meio digital para análise. Além das fichas propriamente ditas, o local
onde estas são armazenadas constitui um fragmento da vida escolar dessas alunas, uma vez que
nesses registros encontramos documentos, provas, bilhetes e outras informações pertinentes ao
percurso escolar das normalistas, bem como sua relação com o corpo administrativo. Corroboramos
então com o pensamento de Vidal (2006), que evidência a presença das práticas escolares “[...] no
amplo espectro dos espaços, tempos, objetos, mobiliário e equipamento escolar” (p.154). A ficha de
matrícula, em sua especificidade nos permite analisar as disciplinas estudadas nos três anos do curso
normal, além de identificar a forma de ingresso das alunas na escola. Para tanto, nesse momento, no
que concerne a atuação das alunas, nos ateremos ás disciplinas ministradas no período do curso
normal, bem como informações avulsas que constituíam o fazer docente (provas, trabalhos escolares
entre outros) e as atividades socioculturais apresentadas por meio das fotografias. Outro documento
que constituirá a análise é o discurso do diretor da instituição na década de 1970, essa fala foi preparada
e proclamada em virtude da inauguração do prédio da escola normal, que arraigou em sua solenidade
também a conclusão da turma do mesmo ano. Por meio desse documento podemos nos aproximar do
pensamento de Dominique Julia (1995), no que se refere a entender a cultura escolar sob a ótica das
práticas e normas escolares, para tanto essa análise é consubstanciada pela atuação do corpo
profissional “[...] chamados a obedecer a essas ordens e, portanto, a utilizar dispositivos pedagógicos
encarregados de facilitar sua aplicação” (p.11). Apesar de ser breve, destacamos a tonalidade acerca da
atitude do agir docente “[...] à medida em que a instituição se tornava um espaço de formação
privilegiado, tudo o que passava no seu interior ganhava importância” (LOURO, 1997, p.91). No discurso
podemos identificar alguns elementos que confirmam as hipóteses da instituição ter se mantido
estritamente feminina ao longo dos anos, sua configuração ainda como escola normal e a visibilidade
das professoras recém formadas para atuação com a infância. Cabe mencionar a ênfase com a educação
da criança, visto à necessidade de formar um sujeito preocupado com a pátria, para tanto, o professor
é um agente missionário afastado de suas paixões em prol do bem social. Tais argumentos se entrelaçam
com a requisição do prédio específico para formar as professoras, construindo uma visibilidade de
padrão arquitetônico propagado há muito nos discursos reformistas acerca da instauração das escolas
públicas. Evidenciamos uma vicissitude no discurso local, entendendo que o estudo proposto à
investigação das práticas escolares “[...] precisa levar em consideração seus usos, as preocupações
com a beleza, segurança, funcionalidade, ampliações, reformas, transferências de espaços e da
localização dos prédios e sua inserção no panorama local” (WERLE, 2004, p.24). Embora a escola seja
construída no século XX, sua institucionalização ainda carrega no discurso a grande imponência no
prédio escolar como fomentador das práticas, além das permanências ao apresentar e tornar visível
para a cidade à onerosidade da escola moderna. A fim de estabelecer ainda argumentos de analises,
acreditamos que situar a relação com as atividades que compunham o fazer docente no espaço formal
de educação (o prédio escolar), bem como as práticas desenvolvidas para a sociedade, tais como:
inauguração do prédio escolar ou desfile cívico, participação em solenidades citadinas, além das
práticas institucionalizadas como festividades de colação de grau e formatura, compõe a tessitura da
cultura escolar. Dessa forma, com o intuito de atender o objetivo proposto, o presente estudo estará
organizado da seguinte forma: breve recorte histórico acerca da criação da escola até ocupação do
prédio próprio; os arquivos consultados e documentos que auxiliaram a análise do contexto; seguido
das fichas de matrícula que apresentam as disciplinas curriculares enfatizadas para formação de
professoras, em conjunto com essa análise arguiremos sobre a atuação, interpretação e representação
das alunas normalistas conforme as outras fontes mencionadas, por fim apresentaremos a contribuição
dessa pesquisa. É notório destacar que quando tratamos da temática que envolve a formação docente
e as práticas que constituem essa formação, adentramos em um campo repleto de estudos e
significados, porém cada tempo histórico e cada instituição guarda suas nuances que compõem vez ou
outra, semelhanças, porém dificilmente acomete a mesma identidade, isto porque os sujeitos que
fizeram parte do período estudado atuavam conforme a sua realidade, ora porquanto o sujeito que
investiga e as fontes estudadas também são permeadas de singularidades, cabendo assim mencionar
que no caso das pesquisas documentais, a forma com qual se faz o trato da fonte, é possível identificar
possibilidades e achados distintos. Os estudos que enfatizam a formação de professores trazem uma
contribuição pertinente a educação e, no que concerne a pesquisa histórica, essa revela atitudes e
simbolismos que não foram construídos por mero acaso, mas por estratégias que compõem um
arcabouço analítico bem mais amplo do que o entendimento de um objeto. Cientes da amplitude a
qual nos propomos para análise de documentos chegamos a perspectiva do indiciarismo, onde o
interesse do pesquisador não constitui a criação ou reconto de uma história, mas a aproximação com
o fato ocorrido, por meio da junção e interpretação dos documentos. Por se tratar de uma temática da
qual infere a atividade docente, temos como pressuposto a utilização do conceito de representação em
Chartier (1991). Após catalogação das fontes, iremos apresentar os conceitos que tangem a atual
discussão, tomando como base as disciplinas ofertadas no período educativo em relação com as
atividades desenvolvidas e também com o contexto sociocultural difundido por meio das fotografias
escolares e pela fala de agentes administrativos. A discussão será composta pelos dados analisados
organizados em tabelas comparativas e com aparato teórico. É possível identificar que apesar do
descompasso da criação da instituição até o seu exercício no prédio próprio existem muitas lacunas
que mantém a relação de desacerto em relação com a conjuntura nacional. A escola desempenhou na
sociedade campinense um cenário de propulsão educacional, promovendo para moças da sociedade
o prestígio e a formação normalista.
ISSN 2358-3959
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reivindicação em massa por uma política salarial docente no plano mundial ocorreu em 1966 durante
a Conferência Especial Intergovernamental realizada pela Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Paris,
que produziu o documento Recomendação ao Estatuto dos Professores apontando a necessidade de
políticas de formação, progressão, melhoria das condições do trabalho, política salarial e
remuneração, como elementos essenciais para a regularização da carreira, bem como para a
produção social e profissional do professor. Houve um declínio na expectativa de desenvolvimento
da política salarial a partir da década de 1970, com o advento dos governos neoliberais, globalização
e restruturação produtiva, agravado pelo advento dos governos opressores da ditadura. Em
contrapartida teve importante interlocução com a perspectiva de universalização do ensino e o
crescimento do número de docentes nas redes, contribuindo para uma atividade política de cunho
corporativo e mais envolvida com as propostas de melhoria. Relatórios de organizações
multinacionais produziram um documento em 1990 - Declaração Mundial de Educação para Todos
– que mostravam que a baixa remuneração e a valorização do professor seriam pontos cruciais para
a melhoria do cenário educacional. Assim, apontaram a necessidade de estabelecer “alianças” entre
Estados e sociedade visando melhores condições de trabalho, sociais e pessoais para os
professores. As intensas greves na educação no Brasil entre 1970 e 1980 foram consequências do
arrocho salarial para os trabalhadores, e que se somaram aos demais movimentos da década de
1980 que reivindicavam democracia no país, acentuando a atuação dos profissionais em educação
no processo histórico-democrático. (LOURENÇO, 2011). Entende-se que é um direito do professor
um salário digno e condizente com sua função social, cabendo ao Estado subsidiar, acompanhar e
assegurar os deveres fundamentais constantes na Constituição Federal de 1988, que julgou valorizar
os profissionais da educação escolar, garantir os planos de carreira e a forma de ingresso, e
implementar o piso salarial nacional inerente à qualidade da educação. Questões que foram
reforçadas pela LDB/1996 que reafirmou a necessidade de aperfeiçoamento dos professores,
inclusive com licença remunerada e estabeleceu critérios de progressão na carreira a serem
desenvolvidos nas instâncias de governo e especifica as verbas e as despesas, sendo complementadas
pela Lei 9.424/1996 (FUNDEF) e pela EC nº 14/1996. O salário do professor, portanto, passou a
configurar nas políticas educacionais e, sua regulamentação a caminhar junto às políticas de
financiamento como medida para a manutenção e desenvolvimento do ensino. Para efeito desta
proposta, o salário de professor é o objeto estratégico e mobilizador que influencia e, ao mesmo
tempo, é influenciado pelo movimento do Estado capitalista ao longo da história, estando suscetível
às conveniências e condições das instâncias governamentais, que com suas especificidades,
contribuem para um cenário desigual. Observa-se que a Lei do Piso (2008) não tem força de lei como
deveria, que mesmo sendo compreendida como força equalizadora da política de valorização
docente, permanece sob o controle e vigilância pelo MEC (VEIRIA, 2010). O salário deve ser compatível
com a importância da função social do professor em qualquer momento da história, de maneira que
ofereça condições para o desenvolvimento formativo, intelectual e social desempenhando a
profissão com segurança e harmonia. Entretanto, assume o status de política introduzida de cima
para baixo, das políticas nacionais para os estados e municípios. Também se encontra num
movimento contraditório inerente ao modelo de Estado capitalista, pois embora situar-se no
universo das reivindicações seculares dos professores, parece vislumbrar-se no imediatismo das
políticas de governo, e não de Estado. A partir destas questões sobre salário docente, é possível
enxergar o tamanho desafio em superar um determinado modelo de política que, ao mesmo tempo
busca valorizar o professor e tende a atender as prerrogativas de um Estado protagonista de crise
estrutural e financeira. Desta maneira, a implementação de uma política salarial docente em
abrangência nacional se torna uma política estruturante, que se insere em um contexto conflituoso
e complexo, que coloca em disputa as condições do Estado capitalista e o trabalho professor, uma
vez em que o salário é um instrumento determinante das condições sociais e coadjuvante do
processo de melhoria das relações entre trabalho e educação. Assim, sempre ocorreu um movimento
permanente entre Estado e políticas de valorização docente que interagiu com as necessidades do
trabalhador nutridas pelo direito ao salário a altura da função social e, ao mesmo tempo, ao rigor
das contingências financeiras. Segundo Castel (2005, p. 495) o salário é uma condição histórica, pois
permanece em constante conflito na sociedade capitalista devido sua função bilateral (mercado e
trabalho), tanto na produção do trabalho como para a proteção social. É neste pêndulo entre trabalho
e proteção social que o Estado se estabelece como responsável pela condução e garantia desta
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 810
proteção, pela qual encontra-se o salário, por isso consiste em um importante instrumento definidor
da história. Desta maneira pretende-se discutir o salário docente ao longo da história podendo
contribuir para o entendimento da luta histórica do professor por salário justos e compatíveis com a
função social que exerce.
Referências
CASTANHA, André Paulo. Pedagogia da Moralidade: o Estado e a organização da
CASTEL, R. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Tradução de Iraci D. Poleti.
5ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.
LOURENÇO, Eliane. Salários e Greves: memórias dos professores da escola pública paulista
nas décadas de 1970 e 1980. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História (ANPUH), São Paulo, julho
de 2011. Disponível em: <http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/ 14/1300849800_
ARQUIVO_Elaine_Lourenco_Anpuh.pdf>. Acesso em: 10 out. 2019.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (MEC). Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932) e dos
Educadores (1959). Recife: Editora Massangana, Fundação Joaquim Nabuco/MEC, 2010. Coleção
Educadores. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me 4707. pdf>.
Acesso em: 20 maio 2018.
VIEIRA, Juçara Dutra. Dois Séculos de Atraso: Piso Salarial Nacional dos Educadores. 2 ed. Rev. Amp.
Brasília/DF: CNTE, LGE, 2010.
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por exemplo, como é o caso de Theophilo, aqui estudado. Nesse sentido é possível inferir que a
República e o seu movimento atrelado ao Iluminismo, de que a razão (que se manifesta através do
ensino da ciência, da instrução das novas gerações e de outros pressupostos) seria a nova luz para as
pessoas, se mostra contraditório, uma vez que essa razão se vale não só para instruir, mas também
para condenar, punir, padronizar (entendendo que cada termo tem um peso e um significado, e não
como sinônimos) os indivíduos. Os resultados parciais de tal pesquisa têm apontado que os
mecanismos estratégicos, pelo fato de deterem mais subsídios e recursos, sobressaem aos táticos;
em sentido weberiano (1982, 2015a, 2015b) há um apagamento das características pessoais e o
imperativo da impessoalidade, do apego às formalidades e do respeito e cumprimento da lei (o que
Max Weber chamará de dominação burocrática diante destas características, embora existam outras),
o que atesta o processo de uniformização, padronização e homogeneização dos professores. Como
este exemplo é apenas um, diante de outros processos encontrados, não se pode afirmar que havia
um movimento por parte do Estado em ataque aos professores das escolas do interior, sobretudo
das escolas isoladas, mas a situação de Theophilo se torna exemplar, justamente por elucidar como
se dava a atuação do poder público sobre os indivíduos. Outro resultado encontrado é que o Estado,
a fim de explicitar seus argumentos acusatórios, se respalda inclusive nos apontamentos do docente,
pois em dado momento do processo disciplinar Silva pede sua exoneração, isso não é visto com
bons olhos pela inspetoria, que o acusa de que se fosse um sujeito idôneo não faria tal solicitação,
isso demonstra que a interpretação das ações dos indivíduos perpassa o crivo dos superiores e que
isso pode atestar o que eles já estavam pré-indicando que o réu era. Nesse sentido, se quer pontuar
que o peso das ações estatais sobre a pessoa chegam ao ponto de que a mesma se negue a exercer
seu ofício e peça para deixar de cumprir sua função. Assim a dúvida que surge é: se o Estado desejava
punir o professor, por qual razão vê como algo depreciativo o mesmo pedir sua exoneração? O que
dá base para afirmar que o que os sujeitos possuidores de poder queriam era a padronização de
Theophilo aos padrões republicanos, condizentes a ideia de moral que detinham no período. Dessa
forma, a analise da peça processual propicia um entendimento de quais concepções de mundo eram
importantes para as figuras detentoras e aplicadoras da lei e no que eles vão se pautar na tentativa
de conformar o professor aos padrões que eles querem impor. A justificativa para tal pesquisa se dá
para aprofundamento de outras pesquisas já realizadas e na tentativa da construção de “uma
história vista de baixo”, atrelando-se aos estudos sobre o fazer e o ser docente, tentando compreender
os processos pelos quais essa profissão passou até ser o que é hoje. Importante salientar que tal
justificativa se encontra na História Cultural, que tem se detido nos últimos anos a olhar para figuras
singulares e tentando discerni-las na História da Educação que tradicionalmente encarava seus
objetos de estudo e análise “pelo alto” partindo do pressuposto legal e dando-o como fato
consumado. Pesquisas dessa envergadura servem para perceber as nuances dentre o prescrito e o
realizado (quando se pensa na legislação), mas não só isso, também servem para apresentar novos
caminhos a uma história que ainda está se estruturando e se firmando, para elucidar novas realidades
e novas formas de se compreender o passado e o que acontecia nesse período, num processo que
também dá subsídios (mas não só) no entendimento do presente. Nesta perspectiva outro objetivo
é dar espaço para novos estudos e também sustentar outros já realizados. Por fim, cabe assinalar
que esta pesquisa está em continuidade em um projeto maior, que visa analisar três tipos de
processos disciplinares contra professores paulistas: aqueles que faltam no trabalho; aqueles que
inculcam valores contrários a moral e aos bons costumes nos estudantes; e aquele que desrespeita
o superior hierárquico (seja diretor escolar, seja inspetor ou os representantes dos conselhos
municipais). A pesquisa está intitulada como: “Apagando as luzes: processos disciplinares contra
professores paulistas. Um olhar sobre as punições (1887 - 1896)”, dissertação que será apresentada
no Programa de Pós-Graduação em Educação, no eixo História da Educação, da Universidade Federal
de São Paulo (UNIFESP).
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Os resultados obtidos com esta pesquisa indicaram que, de fato, a passagem pela escola primária
rural era um elemento obrigatório para o início da carreira docente no estado de São Paulo. As
professoras deveriam permanecer no mínimo 1 ano nessas escolas, para depois se inscreverem
no concurso de remoção. Pela precariedade das escolas rurais e os obstáculos enfrentados, por
exemplo, a distância e o afastamento dos familiares, as professoras permaneciam o tempo suficiente
para se remover para as escolas urbanas. Algumas professoras entrevistadas narram que passavam a
semana nas escolas que lecionavam e retornavam para a família apenas no final de semana; Apenas
duas professoras iniciaram a carreira do magistério como leigas, dados levantados sobre o nível de
formação dos professores das escolas primárias no estado de São Paulo apontam que o número de
docentes leigos no estado era relativamente baixo. Das 13 professoras entrevistas, 11 concluíram o
curso normal ou a habilitação para o magistério e ao longo da carreira cursos de aperfeiçoamento,
especialização e a licenciatura em Pedagogia. O alto índice de professoras formadas estava
relacionado com o elevado número de estabelecimentos de formação de professores existentes
no estado de São Paulo. As professoras pouco relataram sobre cursos específicos para lecionarem
na zona rural, porém, ao analisar alguns estudos, podemos apontar que existiam no estado alguns
cursos de especialização e a Escola Normal Rural de 2º ciclo, que foi implementada no ano de 1956,
no município de Piracicaba. A Escola Normal Rural foi idealizada pelo movimento do ruralismo
pedagógico com o objetivo de formar professores com conhecimentos específicos para práticas
agrícolas e capazes de modificar a mentalidade do homem do campo; A forma de ingresso na
carreira dessas docentes variou entre as regiões pesquisadas, predominando o recrutamento
por concurso de títulos que foi instituído no estado de São Paulo com o Código de Educação de
1933 , sendo assim, as professoras deveriam fazer pontos para poder escolher uma escola na zona
rural ou urbana e se efetivar; Para realizarem os concursos de títulos, as professoras deveriam
ser normalistas diplomadas por escolas normais do Estado, ou por escolas normais equiparadas,
com idade mínima de 18 anos. Para classificar os candidatos, levava-se em conta: média geral de
psicologia e pedagogia, tempo de exercício como professor efetivo ou substituto e duração do curso
da escola onde se diplomaram; outra forma de ingressar na carreira era ser professoras substitutas,
que constituía em substituir as professoras regentes e formar pontos para, futuramente, conseguir
uma sala como docente. As professoras substitutas deveriam comparecer ao estabelecimento
de ensino 15 minutos antes do início das aulas, permanecendo na unidade escolar auxiliando as
professoras e o diretor e desempenhar todas as atribuições das professoras primárias, quando
necessário; ou por indicação de autoridades das cidades. Destacamos que no ano de 1962 uma nova
lei alterou alguns critérios para o ingresso na carreira do magistério primário, dando preferência de
escolha para as escolas rurais as professoras diplomadas pela Escola Normal Rural de Piracicaba
e transformando gradativamente o concurso de títulos por concurso de provas e títulos; o tempo
de exercício nas escolas rurais foi muito diferente nas três regiões. Na região de São José do Rio
Preto as professoras permaneceram no máximo 4 anos em escolas rurais, as professoras de Birigui,
região de Araçatuba, permaneceram em média 19 anos em escola rurais e as professoras de Rio
Claro, na região de Campinas, permaneceram em média 12 anos em escolas rurais, desse modo,
entendemos que algumas professoras criaram uma identidade como professoras rurais, lecionando
nessas escolas por mais de 5 anos, enquanto outras, não criaram essa identidade, se removendo
para a zona urbana logo que atingiam a pontuação suficiente para se transferir; a aposentadoria se
deu após anos de trabalho em escolas primárias e/ou em outros cargos do quadro do magistério.
Enfim, este trabalho detém-se na retomada de diferentes temporalidades da formação, ingresso
na carreira docente e tempo de exercício no magistério primário rural, considerando os diferentes
tempos de escola e dos sujeitos, buscando a partir desta premissa, ampliarmos nesta pesquisa
nossas perspectivas sobre a formação e profissionalização docente na zona rural no estado de São
Paulo e no Brasil, buscando relacionar a ideia de tempos dos sujeito com as suas subjetividades
na qual a estética nos inspira sobre a formação docente compreendendo-a como uma dimensão
da existência, a qual possibilita outras epistemologias sobre a formação, talvez podemos inferir
que se trata de uma formação concebida ao longo da vida. A conclusão reflete sobre a trajetória da
profissionalização docente no Estado de São Paulo como um desdobramento das relações mantidas
na organização social da profissão docente nacional.
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atividades culturais. Circulavam em espaços usualmente ocupados pela elite capixaba, como os
clubes, os bailes e as rodas da alta sociedade, muitas vezes tendo seus nomes vinculados aos de
seus pais e maridos.
A formação que essas professoras receberam também as apresenta como mulheres privilegiadas,
pois a maior parte delas estudou na Escola Normal D. Pedro II – a principal instituição destinada
à formação docente no Estado. Algumas atuavam ou atuariam, mais tarde, nessa instituição, a
exemplo de Maria das Dores Paoliello, que, sendo também cirurgiã dentista, chefiava o Serviço de
Assistência Dentária daquela Escola. Outras exerceram a docência ou foram membros de bancas de
concursos nessa instituição, como foi o caso das professoras Ilda Grijó, Custódia Gomes de Souza e
Rita Tosi Quintaes.
Pelo menos cinco professoras desse grupo realizariam, ainda, em 1931, o Curso de Emergência
oferecido pelo Departamento de Educação Física do Espírito Santo e, algumas delas, chegariam a
atuar como professoras de Educação Física.
Ao ocuparem número significativo das vagas do CSCP, essas professoras passaram a receber
uma formação especificamente voltada para os princípios e práticas da escola ativa. Por meio do
programa do curso, conduzido pelo educador paulista Deodato de Moraes, puderam acessar as mais
avançadas discussões sobre pedagogia científica e escola ativa nos moldes europeus e americanos.
Nesse processo, as professoras destacaram-se, também, na produção das teses finais requeridas
para a conclusão do curso. Durante o processo de apresentação dos trabalhos, que aconteceu em
meados de 1930, seus nomes figuraram com grande destaque nas páginas dos jornais capixabas,
em trabalhos que versavam sobre temáticas analisadas à luz do ideário escolanovista, tais como:
educação sanitária, educação física, museus e excursões escolares, brasilidade, higiene, escolas
rurais, escotismo, entre outros.
No jornal A Gazeta, as matérias sobre as defesas das teses do CSCP apareciam quase diariamente,
repletas de elogios aos cursistas, com destaque para as mulheres, como foi o caso da professora
Hilda Pessôa Prado, que apresentou um trabalho intitulado “Jogos e pateos de recreio”. Dizia o jornal
que “Occupando-se desse problema essencial que é a cultura physica na escola, o fez a autora com a
maior dedicação revelando conhecimentos e pratica que constituem a mais forte documentação da
these. Os debates decorreram com enthusiasmo fora do commum” (CURSO..., 1930, p. 6). O mesmo
aconteceu com os trabalhos de diversas outras professoras.
Outro destaque cabe aos espaços ocupados no meio educacional durante e após a conclusão do
curso. Diversas professoras atuaram em grupos escolares na capital ou no interior, como foi o caso
de Maria Amália Coutinho, que trabalhava no Grupo Escolar Gomes Cardim, onde eram empregados
os métodos da escola ativa. Maria Magdalena Pisa, por sua vez, exercia a docência no Grupo Escolar
Bernardino Monteiro, em Cachoeiro de Itapemirim, e seria responsável, mais tarde, por fundar outro
grupo escolar no mesmo município. No geral, os grupos escolares passaram a ser espaços para oferta
de alguma formação com base na escola ativa, destinada a professoras e professores que atuavam
em pequenas e precárias escolas isoladas rurais.
Após a realização do CSCP, boa parte dessas professoras seguiu carreira no meio educacional
capixaba. Maria Durvelina Calmon foi, em 1931, professora das Escolas Reunidas de Argolas, e Maria
Amália Coutinho atuou, em 1934, no Jardim de Infância Ernestina Pessoa, uma instituição destinada
à educação infantil, de grande relevância em Vitória e dirigida, por longos anos, por outra professora
que frequentou o CSCP: Ilda Pessoa Prado.
Outras professoras chegaram a ocupar cargos de diretoras dessas e de outras instituições, quais
sejam: Olavia Ramalho, diretora das Escolas Reunidas de Argolas; Rita Torres, que dirigiu o Grupo
Escolar Deocleciano de Oliveira, em Siqueira Campos; e Maria Magdalena Pisa, que, em 1933,
conduziu o Grupo Escolar de Guandú, em Cachoeiro de Itapemirim e, posteriormente, o Grupo de 2ª
classe Padre Anchieta, na capital Vitória.
Em meados dos anos 1930, encontramos algumas dessas professoras a figurarem como autoras
de artigos publicados na imprensa pedagógica. Duas delas – Rita Monteiro Torres e Custódia Gomes
de Souza – publicaram artigos na Revista de Educação do Espírito Santo, que circulou entre 1934
e 1937. Frutos de palestras proferidas no 1º Congresso de Aperfeiçoamento Pedagógico, os textos
indicam a permanência em seus discursos, dos conhecimentos acessados durante o CSCP. Custódia
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Gomes de Souza, que atuava no Curso de Adaptação à Escola Normal Pedro II, tratou do ensino de
ciências físicas e naturais e fazia menções diretas à Escola Nova e aos seus idealizadores, e o texto de
Rita Monteiro Torres, sobre o ensino geografia, mencionava a sua formação no CSCP.
Por fim, cabe registrar que diversas professoras que frequentaram o CSCP integraram o grupo
que fundou a Associação Espirito-Santense de Educação, filiada à Associação Brasileira de Educação
(ABE). Entre elas estavam: Custódia Gomes de Souza, Diva Neves, Hilda Pessoa Prado, Ilda Grijó,
Maria Amália Coutinho, Maria das Dores Paoliello, Maria Luiza Netto e Rita Tosi Quintaes.
Partindo da aproximação das professoras capixabas com o ideário de modernização da educação
pela via do CSCP, as fontes indicam que muitas delas foram engajadas e ocuparam significativos
espaços no meio educacional capixaba, tornando-se referências nos debates, o que nos leva a
refletir sobre as relações de força que envolviam o contexto da educação, em especial, no processo
de feminização do magistério, ao considerarmos o fato de que os cargos de direção e inspetoria, por
exemplo, costumavam ser ocupados por homens.
Consideramos ainda que, estudar a inserção das mulheres na cena educacional, bem como suas
permanências e ascensão a espaços de discussão e de liderança, contribui para compreendermos
não só a constituição do trabalho docente feminino capixaba, mas também os processos históricos
e sociais que contribuíram para a constituição do ensino público no Espírito Santo.
Referências
GINZBURG, Carlo. O fio e os rastros: verdadeiro, falso, fictício. São Paulo: Companhia das Letras,
2007.
GINZBURG, Carlo. Relações de força: história, retórica, prova. São Paulo: Companhia das Letras,
2002.
COSTA, Fernanda Maria Oliveira. Mulheres em cena na reforma educacional escolanovista do Espírito
Santo (1928-1930). Vitória: Ufes, 2018.
Lais Boveto
Terezinha Oliveira
de sua existência histórica. Tais referências se fazem necessárias para a prática produtiva, para a
política e mesmo para a prática cultural.” (SEVERINO 2007, p. 292).
Com isso, é importante ressaltar que a profissão docente está imbuída de elementos da
subjetividade, sem os quais tende a ser destituída de seus valores tradicionais e fundamentais.
Portanto, a potencialidade do uso da razão, bem como a formação integral do professor são
indissociáveis desses elementos e se vincula diretamente à capacidade e necessidade de produzir
a história e, com isso, de manter e desenvolver a herança de conhecimentos recebida das gerações
anteriores.
ISSN 2358-3959
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Luciane Hinterholz
Marilândes Mól Ribeiro de Melo
legislação que regula o Curso de Pedagogia no Brasil, a LDB e as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a formação de professores e documentos oficiais dos cursos de Pedagogia do IFC, portanto
para ampliar a construção do desenvolvimento da escrita deste objeto, o procedimento adotado
para o conhecimento do tema será a realização de um estado do conhecimento serão feitos
levantamentos de referências teóricas tais como, livros e artigos científicos dentre outros que
permitirá o acesso ao conhecimento do que já se tem estudado sobre o assunto abordado nessa
pesquisa, propondo uma análise das diversas posições acerca desse problema. Quanto aos objetivos
esta pesquisa é explicativa, pois visa identificar os fatores que determinam ou que contribuem para
a ocorrência dos fenômenos, estes, descritos e detalhados por meio das análises bibliográficas sobre
o tema. Igualmente também lançaremos mão de questionários, dos Projetos Políticos Pedagógicos
dos cursos, dos resultados dos formulários respondidos pelos egressos, no portal do Egresso do IFC.
Com isso, visamos aprofundar o conhecimento sobre esta realidade específica, sua razão e seus
porquês. Pesquisas de cunho explicativo envolvem procedimentos tais como a realização de
entrevistas com pessoas que podem contribuir de modo prático para o entendimento do problema
pesquisado e análise de estudos já realizados que contribuam para o entendimento do problema de
pesquisa (GIL, 2002). Nesse sentido, o instrumento e técnica que será acionado para a produção dos
dados será um questionário semiestruturado no qual os egressos responderão itens relacionados ao
lugar onde estão trabalhando, ao processo formativo, ao que compreendem por socialização
profissional, dentre outros aspectos relativos aos dados pessoais, carreira, experiência profissional.
O questionário terá questões abertas e fechadas, sendo estruturado com os itens: dados pessoais,
carreira, formação acadêmica e experiência profissional. Será também de cunho descritivo, pois
auxiliará no desenho do perfil dos egressos e dos acontecimentos e fenômenos da realidade dos
agentes, foco desse estudo. A análise do material empírico produzido, será fundamentada a partir de
categorias teóricas construídas por Pierre Bourdieu tais como habitus, violência simbólica e campo,
como principais dentre outras desse mesmo teórico que poderão ser acionadas. No que diz respeito
à abordagem, esta pesquisa será qualitativa. A abordagem qualitativa contribuirá para a descrição
dos fatos e fenômenos da realidade dos egressos dos cursos de pedagogia do IFC, por meio de
análise documental e dos questionários, salientando a importância das interpretações dos eventos,
captando o contexto em sua totalidade e enfatizando a subjetividade como meio de compreensão e
interpretação das experiências narradas por esses agentes de uma forma organizada. Esse tipo de
análise é fundamentado em conhecimentos teórico-empíricos que lhe conferem caráter cientifico.
Nesse sentido, este estudo terá aportes empíricos que serão produzidos por meio da aplicação do
questionário, os Projetos Políticos Pedagógicos dos cursos e dos questionários respondidos no
Portal do Egresso do IFC. Primamos também por identificar os fatores que condicionam ou que
contribuem para a ocorrência dos fenômenos, estando estes suficientemente descritos e detalhados.
No que diz respeito aos aspectos quantitativos, operará com itens relativos aos dados pessoais,
trajetória escolar e experiência pedagógica que serão quantificáveis e fundamentarão os dados
qualitativos. Esta pesquisa é dependente de informações transmitidas pelos egressos dos Cursos de
Pedagogia do IFC. No que diz respeito aos instrumentos de coleta e produção de dados o uso de
questionários, dos Projetos Políticos Pedagógicos e dos resultados dos formulários respondidos
pelos egressos do IFC fornecerão elementos para obtenção de dados tanto qualitativos, quanto
quantitativos para interpretação do objeto de pesquisa. Nesse sentido, estes instrumentos serão os
responsáveis por proporcionar os aportes empíricos que serão posteriormente interpretados.
Pretendemos no questionário fazer uso de questões estruturadas para a produção dos dados
numéricos. Já as questões semiestruturadas respondidas pelos egressos abordarão itens
relacionados ao lugar onde estão trabalhando, ao processo formativo, ao que compreendem por
socialização profissional, dentre outros aspectos que permitirão realizar a análise interpretativa do
objeto. Assim esperamos que ao analisar os processos formativos ofertados pelo IFC possamos
conhecer a inserção e a socialização profissional dos egressos desta instituição; conhecer se
efetivamente esses egressos foram inseridos no campo educacional. Objetivamos por parte desta
pesquisa, uma colaboração efetiva para a construção do campo da História da Educação catarinense
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Referências
ARAÚJO R.M.B.; NUNES C.M.F.; LUCINDO N.I. Um estudo com egressos do curso de pedagogia:
avaliando a formação inicial. Revista @mbienteeducação. São Paulo: Universidade Cidade de
São Paulo, v. 11, n. 2, p. 240-258 maio/ago. 2018. e-ISSN 1982-8632. Disponível em: https://doi.
org/10.26843/ae19828632v11n22018p241a59 (Acesso: 13/10/2019).
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998ª.
LUDKE, Menga. Sobre Socialização Profissional de Professores. Cad. Pesq., São Paulo, n.99, p.5-15,
Nov.1996.
Se se partir da constatação que João Guimarães Rosa explora em sua obra certo imaginário sobre
o professor; compete-nos perguntar - que imagens professorais seriam estas explicitadas na obra
Grande Sertão: Veredas? Dito isso, objetivou-se nesse texto discutir a figura do educador autodidata
a partir da categoria “professor leigo”, nos tempos da Primeira República brasileira: da “República
Velha”. Lembra-se que a modalidade política chamada República era recém-implantada no Brasil,
nasce exatamente no ano 1889, e ela demandava desde suas origens modernas, alguma relação
positiva da população com a cultura escrita; demais, as novas formas de trabalho urbano ligado
mundo da revolução industrial, com sua realidade maquinal, também se conectava ao universo da
ciência, que por sua vez se sustentava na cultura escrita, portanto, algo dependente de formas da
escolarização, de curricularização das vidas das populações. Logo, tais variáveis forçam as nações
ocidentais, entre elas o Brasil, a programar condições de instrução escolar no seio da sua população.
Ao que parece, Guimarães Rosa foi tocado pelo problema do fenômeno educacional da sua época,
fenômeno que apontava inesistência a precariedade de escolarização primária nos rincões de
territórios como o interior das Minas Gerais. A obra em tela já sinalizava para a percepção da
população sobre a necessidade do domínio da leitura e da escrita. Evidencia-se no Grande Sertão:
Veredas, de certa forma, o interesse das elites rurais pela escolarização e seu relevo no campo da
política, por isso as elites rurais passaram a perseguir o conhecimento escolar; isso, seguramente,
estaria ligado ao evento do bacharelismo, quando se tornou desejo comum das famílias rurais
abastadas terem um herdeiro doutor, ou seja, alguém portador de alta escolarização, de formação
superior. Há sinais no livro sobre as formas de escolarização adotadas pelas pessoas que não
possuíam nem escolas, nem professores em suas comunidades rurais, mas que possuíam condições
materiais para enviar um dos membros da prole para estudar na vila e/ou cidade mais próxima para
obter a tão importante instrução escolar. Sugere-se a existência de um mercado privado e informal
de obtenção dos saberes escrito. Preconiza-se sobre a raridade da existência dos profissionais da
educação. Insinua-se o que seria recursos didáticos necessários ao fazer escolar. Nessa época o
Brasil era, em termos demográficos, uma nação rural, embora a expectativa sobre a vida urbana,
vida nas cidades já ocupasse boa tarde da mentalidade nacional, pois como se sabe, ao longo do
século 20, o Brasil deixou de ser um mundo rural para tornar-se um universo urbano, com o êxodo
rural e formação das grandes periferias metropolitanas. Desde o alvorecer do século XX o debate
educacional refletia sobre o problema das cidades inchadas de pessoas analfabetas vindas de meios
rurais. Quanto aos caminhos para a produção deste trabalho: os dados empíricos foram coletados
da obra Grande Sertão: Veredas. Lia-se o livro para recolher passagens nas quais se percebia
significantes e significados como professor/a, escola, material de ensino, estudantes, relações de
ensino, analfatos, leitura, política, poder, estado. Nesta juntada, há um rico material relacionado ao
personagem central – “Riobaldo”, em que se notam traços do processo de escolarização rural no
sertão mineiro, nas primeiras décadas do século passado, com evidências sobre as realidades dos
estudantes, das escolas, das condições de ensino, e do professor, e a profissão docente. O personagem
narrador, ao discorrer sobre sua extensa e funda memória, descreve a vida de um menino órfão,
criado pelo padrinho, quem financiou seus ‘anos e meio’ de escola no “Curralinho”; e que se tornaria
um tipo de “intelectual jagunço”, se se pode dizer assim, pois era um dos poucos que sabia ler e
escrever no bando armado que habitava e perambulava como nômade nas regiões centro, oeste e
norte das Minas. A obra foi publicada em meados do século XX, e o autor certa vez chamou de
“autobiografia irracional”; o livro constrói uma fábula, supomos, a partir do contexto rural da
“República Velha”, no interior do Estado de Minas Gerais, no período histórico que precedeu a
conhecida “Era Vargas”. Ressalta-se que esses dados foram reunidos, e interpretados à luz da noção
de “professor leigo”, ou como denominados por Carlos Rodrigues Brandão, “professor rural”. Este,
por sua vez, era portador de algumas características como: não possuía formação profissional, mas
um astuto utilizador dos métodos nos quais foi alfabetizado valia-se das memórias de suas
professoras; atuava notadamente em escolas rurais; às vezes frequenta algum curso de
aperfeiçoamento; em alguns casos atuava em situações efêmeras na substituição de outro professor.
No que respeita a metodologia da investigação, utilizamos também a categoria ‘imaginário’, isto é –
“à forma pela qual um indivíduo ou um grupo vê determinada imagem, determinado elemento de
sua cultura ou sociedade.” Ou seja, como Rosa viu a professor, a escola de sua época. Adverte-se que
a implantação do imaginário republicano: produção da cidadania política – deu-se na passagem do
século XIX para o Sec. XX, bem como se aprofundaram nas primeiras três décadas desse século XX;
tal fato agita e intumesce o mercado de trabalho docente, pois como se sabe a alfabetização passa a
ser uma característica necessária da inclusão no sistema eleitoral, bem com para compor os cargos
eletivos e profissionais do estado; nota-se uma valorização da instrução escolar; tempo de elogio ao
ethos escolarizado. Um dos efeitos desse imaginário educacional que se instalou à época provocou,
não por acaso, a realização, em vários estados brasileiros, das “Reformas Educacionais”; estas,
interessadas na popularização da educação primária - grupos escolares, profissionalização docente;
as escolas normais foram uma entre outras medidas de difusão do saber escolar que se fizeram
presentes nos cálculos dos poderes públicos com vistas a produção em massa da razão escolar entre
os brasileiros. A esse respeito sugere-se analisar, entre outras, as obras de autores como: Fernando
de Azevedo, Carlos. Monarcha, Esther Buffa, Leonor Tanuri, Dermeval Saviani, Diana Vidal e, claro, o
famoso Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Em suma, sabe-se que os literatos, não raro, se
valem de evidências reais para inspirar ficções, o que poderia ser caso do professor rural roseano. Diz
a historiografia da educação que, desde o século XIX, tem se implementado por aqui políticas para
formar professores, isto é, profissionalizar os docentes conforme critérios técnicos e científicos.
Demais, a proposta mergulha no esforço de trabalhar a literatura como fonte histórica. Assim,
conforme Antonio Candido, o literato, mesmo na ficção, funciona como testemunho da historicidade
de sua época, logo, sua obra estaria em maior ou menor grau eivada de vestígios históricos. Assim,
muitos livros ficcionais a maneira do Grande Sertão: Veredas possui certas dimensões sociais
evidentes, cuja indicação pode fazer parte de qualquer estudo, histórico ou crítico, pois referências
a lugares, modas, usos; manifestações, atitudes de grupo ou de classe são traços a serem analisados.
Ainda, conforme Jean Starobinsk cabe ao investigador da história, perceber na obra de ficção os
sinais presentes de ecos externos ao texto, o que sugere que o escritor foi à realidade da qual o livro
nascera para fertilizar sua invenção. De modo parecido, Carlo Ginzburg alega que pela literatura o
historiador acessa pistas infinitesimais que permite penetrar em aspectos da realidade histórica
profundos, pelos sintomas e indícios manifestos na obra. A escolarização tornou-se uma estratégia
de modernização social, a partir do momento que o capitalismo industrial assumiu o lugar de
paradigma civilizacional no ocidente. Mas para isso era necessário criar um exército de profissionais
capazes de escolarizar segundo certos critérios preestabelecidos pelo Estado. Porém, as políticas de
formação docente no Brasil historicamente tem sido insuficientes, ineficientes, incapazes de oferecer
professores em quantidade e qualidade suficiente para abastecer a escolas pelo país, notadamente
as escolas rurais. Diante disso, os dirigentes dos sistemas de ensino recorrem a professores
‘desqualificados’, a saber: pessoas alfabetizadas, mas que não se formaram em cursos de formação
de professores; no caso descrito por Rosa, eram os cursos das escolas normais. Essa foi a maneira
escolhida para suprir as demandas por recursos humanos para educação escolar rural - transformar
pessoas alfabetizadas em professores leigos. Cabe dizer que também a população percebeu a
necessidade da alfabetização e, em muitos casos, ela buscou as primeiras letras por meio desses
leigos.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 826
Referências
AZEVEDO, F. de et al. Manifesto dos pioneiros da Educação Nova (1932) e dos educadores
(1959). Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, v. 122, 2010.
GINZBURG. Carlo. O fio e os rastros: verdadeiro, falso, fictício. São Paulo: Companhia das Letras,
2007.
MONARCHA, C. Escola Normal da Praça: o lado noturno das luzes. - Campinas: Editora da Unicamp,
1999.
TANURI, L. M. História da Formação de Professores. Revista Brasileira de Educação. São Paulo, nº.
14, p.61-87, mai./jun./jul./ago., 2000.
RESUMOS DAS
COMUNICAÇÕES
INDIVIDUAIS
EIXO
RELAÇÕES DE GÊNERO,
GERAÇÃO, ETNIA,
CLASSE SOCIAL
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Introdução
O livro enquanto objeto de pesquisa tem a sua importância devido ao lugar que ocupa numa
instituição escolar: o de ser um instrumento poderoso não apenas no que diz respeito à instrução
dos sujeitos, mas, também, no que concerne à educação moral. Quando se trata do ensino de leitura
e escrita nas turmas iniciais, cresce sua importância. Muitos alunos carregam em si, como um fator
identitário, marcas do livro didático com o qual foram alfabetizados e desenvolveram as habilidades
de leitura. As reflexões de historiadores que passaram a tomar o livro como objeto cultural, revelaram
que esse recurso didático não pode ser considerado neutro, com o único propósito de ensinar a
leitura e a escrita. Ele carrega diferentes práticas e representações da sociedade que o concebeu e
que se materializam nas páginas desse recurso didático. Na tentativa de desenvolver a identidade
tão cobiçada, sonhada por intelectuais desde os tempos do Império, os livros didáticos de maneira
geral, serviram de fundamento à construção da identidade nacional. Diversos autores republicanos
tinham como projeto de nação a alfabetização para desenvolver o patriotismo e a adesão às
instituições; além de ter o objetivo de inculcar conhecimentos bem definidos. Essa foi uma atribuição
da escola e a alfabetização se tornou muito mais do que um processo de ensino de leitura e escrita;
tornou-se também um locus de educação política e partilha de sentimentos comuns. Uma coleção
de livros didáticos denominada “As Mais Belas Histórias” circulou nas escolas públicas de Minas
Gerais a partir de 1954, ano de sua primeira publicação. Essa coleção foi escrita pela professora
mineira Lúcia Monteiro Casasanta. O conjunto é formado por um pré-livro e cinco livros de leitura. A
base metodológica da alfabetização do material é o método global de contos por isso é composto de
narrativas diversas. As histórias se movem entre o mundo lendário medieval, contos de fadas,
milagres religiosos, a epopeia carolíngia e façanhas de heróis gregos, romanos, figuras bíblicas e
personagens brasileiros. Elas educam os meninos apresentando lições sobre os atos desses heróis.
Os livros da coleção foram considerados adequados para o uso em sala de aula porque tiveram a
indicação formal de segmentos decisórios da Secretaria de Educação de Minas Gerais no período de
sua publicação. Outro fator relevante para a circulação desses impressos foi a existência de uma
rede de relações que apoiava a autora Lúcia Casasanta. O fato de ter circulado nas escolas de Minas
Gerais durante décadas, reforça a importância de se pesquisar as lições que a coleção carregava nas
suas páginas. A questão que mobiliza este trabalho é compreender quais representações veiculadas
que concorreriam para o aperfeiçoamento moral, intelectual e prático dos meninos contribuindo
para a formação de um herói. Objetivo: O objetivo deste trabalho é analisar as diversas lições
presentes nas páginas desse impresso, cujo conteúdo contém representações de um modelo ideal
de brasileiro. As qualidades do caráter escolhidas pela autora e que serviram de modelo foram
inspiradas em heróis porque esses seriam capazes de promover a paz, indispensável ao progresso
da nação. Periodização: Todo um contexto político e educacional foi propício para que a professora
mineira Lucia Casasanta elaborasse essa coleção de livros. A publicação da coleção pode ser
considerada um ato consolidador das teorias da escola nova em Minas Gerais, portanto uma
reverberação, ainda que tardia, da Reforma Educacional de Francisco Campos, ocorrida nos anos de
1920. O recorte inicial é o ano de 1954, data da publicação inicial da coleção “As Mais Belas Histórias”.
As fontes documentais encontradas revelam que esse material foi adquirido por escolas mineiras
desde 1954, data da primeira edição. A Coleção foi indicada por segmentos decisórios da Secretaria
de Educação do Estado de Minas Gerais (SEEMG), como sendo aquela que estava em consonância
com as teorias sobre alfabetização vigentes no período. Tratava-se do método global de contos,
conforme denominado pela própria autora, defendido como o melhor método para alfabetizar as
crianças mineiras. Pela mesma razão que garantiu sua circulação, o material perdeu sua força a
partir dos anos iniciais de 1970, quando uma nova metodologia de ensino de leitura e escrita; de
orientação sintética, foi implementada pela Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais
(SEEMG). Houve um relativo declínio na distribuição dos livros nas escolas mineiras a partir de 1976
com essa nova configuração. Esse ano determinou o recorte final da pesquisa. Tal fato foi considerado
nesta investigação, como resultante do enfraquecimento do contexto pedagógico que dava suporte
à distribuição desse material nas escolas mineiras. Fontes: As fontes são primárias com destaque
para a coleção “As Mais Belas Histórias” objeto e fonte desta pesquisa. Além dos livros da coleção em
ótimo estado de conservação, foram localizados outros documentos na Biblioteca Alaíde Lisboa, da
Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, (UFMG), num fundo arquivístico
denominado “Fundo Arquivístico Lúcia Casasanta”. Outras fontes utilizadas são registros diversos de
escolas mineiras em que a coleção foi utilizada. As fontes confirmam a circulação e uso das “Mais
Belas Histórias”. Metodologia: A proposta metodológica para analisar esses materiais de ensino é o
método crítico, buscando adquirir os sentidos velados de uma determinada sociedade que produziu
seu livro didático de alfabetização para suas crianças. Os procedimentos consistem em utilizar fichas
elaboradas para a coleta das categorias de análise do conteúdo das histórias e imagens, definidas a
partir dos objetivos. O propósito das fichas é a orientação da coleta dos dados com o objetivo de
recolher e registrar de maneira ordenada, os dados sobre as lições ensinadas que contêm informações
sobre a construção do mito do herói brasileiro. As histórias do material didático são ricamente
ilustradas. Resultados alcançados: O material apresenta lições imagéticas educativas em prosa e
verso, em que personagens encarnam modelos de heróis com características associadas unicamente
à figura masculina. Inexiste no material qualquer referência à possibilidade de tais características se
referirem também às figuras femininas. Dentre os diversos atributos se destacam a busca pela
estabilidade, a necessidade de autonomia, a autoconfiança e a competição. Essas representações
ficam evidentes tanto nas ilustrações quanto nas histórias que eram lidas, contadas e recontadas
pelas crianças e também pelas professoras; com a leitura se estendendo muitas vezes para os serões
domésticos das famílias. A principal conclusão da investigação é que os textos e as imagens de
personagens heroicos, mostrando comportamentos cujas ações denotam tais virtudes, fortaleceram
representações sobre um homem brasileiro cuja identidade deveria ser pautada nessas características
de herói. Essa identidade ensinada nos livros de alfabetização era desejada no caráter daqueles
responsáveis pela condução dos destinos do país rumo à modernidade. Esses brasileiros heróis
eram educados nas escolas porque teriam a missão futura e o dever, de promover a paz para que
houvesse progresso. A pesquisa sobre a construção do mito do herói na identidade nacional,
privilegiou a coleção “As Mais Belas Histórias”, porque ela se tornou uma referência quase obrigatória
das teorias escolanovistas nas escolas mineiras. Com novas configurações ensinou interpretações
do Brasil que eram discutidas entre intelectuais renomados. As lições ensinadas sobre o caráter de
um herói, em forma de narrativas e principalmente de imagens, se tornaram um marco de referência
para construção da identidade nacional, porque permaneceram vivas na memória daqueles que
foram alfabetizados com elas. Ao apresentar esses personagens, com características valorizadas
como sendo masculinas, reconhecia-se no passado, o substrato necessário para a formação do povo
brasileiro. Por meio dessas escolhas para a composição do material didático, a autora se manteve
fiel ao princípio de que, forjar uma nação de heróis, seria urgente e necessário e se daria pelo o
resultado do esforço pessoal e do talento individual. Autores: Os autores que fundamentam esta
investigação são Aumont (2002) sobre a imagem vinculada à organização simbólica da sociedade;
Bourdieu (2014) sobre a dominação masculina; Chartier (1991) e o conceito de representação;
Choppin (2009) sobre os livros escolares e Velloso (1993) que aborda a perspectiva épica do herói
brasileiro.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A Escola Normal de Ouro Preto foi criada através do artigo 7º da lei nº 13, no dia 28 de março
de 1835, sendo a primeira escola dessa natureza instituída em Minas Gerais, na então capital da
província, a cidade de Ouro Preto. Contudo, a referida instituição é marcada por períodos de
descontinuidades em suas atividades: estabelecida em 1840 – cinco anos após a sua criação legal –
foi fechada dois anos depois e reaberta em 1847, a partir da lei nº 311, de 8 de abril de 1846. No ano
de 1852 a Escola é novamente fechada, tornando às suas atividades somente em 1872. Foi com a lei
nº 1.769 de 1871 que a sua abertura se tornou definitiva no contexto do século XIX.
Dessa forma, no dia 18 de abril de 1872 é reinstalada a escola normal da então capital de Minas
Gerais, dando início, assim, à sua terceira e última fase de funcionamento no século XIX. Como
apontam Gouvêa e Rosa (2000), a partir deste momento, a instituição passa por um processo de
reorganização, de mudança nos métodos de ensino e de ampliação do currículo e do tempo de
duração do curso. Além disso, presencia-se a inserção da mulher no corpo discente da Escola, o que
não havia até então, uma vez que em suas duas primeiras fases, não foram localizados registros de
que ela recebeu estudantes do sexo feminino.
Contudo, a partir de sua terceira fase de funcionamento, observou-se, através da leitura dos
livros de matrícula da instituição referentes aos anos de 1877 até 1888 (Não foram encontrados
os livros referentes aos anos de 1872 até 1876), que o ingresso de estudantes do sexo feminino no
primeiro ano do curso normal é superior ao do sexo masculino em quase todos os anos analisados,
excetuando-se somente o ano de 1881. Ou seja, as décadas de 1870 e 1880 apresentam-se como
decisivas e centrais para a feminização do corpo discente da instituição.
Tendo em vista estes apontamentos, o estudo ora apresentado possui como objeto de análise
o corpo discente da Escola Normal de Ouro Preto no contexto das duas primeiras décadas de sua
terceira fase de funcionamento. Assim, se estabelece como finalidade principal do trabalho a análise
do processo de feminização do corpo de alunos da referida Escola, e como essa mudança influenciou
e impactou as normatizações, relações sociais, e os currículos da instituição, em um período em que
se presenciava, não só em Minas Gerais, mas também no restante do país, o início do processo de
feminização da formação e também da profissão de docente primário.
O presente trabalho baseia-se em estudos que discorrem acerca da história das mulheres, das
relações de gênero e da feminização do magistério no Brasil, sendo os principais deles: Perrot
(1988, 1995); Scott (1995); Louro (1994), entre outros. Como referencial metodológico, o estudo se
vale das pesquisas bibliográfica e documental. No que tange às fontes, utilizam-se as mais variadas
no universo do objeto analisado, tanto internas, ou seja, produzidas no interior da própria Escola
Normal de Ouro Preto (exames, correspondências, atas e registros de matrícula), quanto externas
(periódicos mineiros, legislação pertinente, currículos e relatórios dos presidentes da província de
Minas Gerais na Assembleia Legislativa Provincial).
Pela análise das fontes coletadas foi possível constatar que, desde o início de sua terceira fase
de funcionamento, no ano de 1872, na Escola Normal de Ouro Preto permitia-se a matrícula de
ambos os sexos. Entretanto, conforme o Regulamento nº 62, de 11 de abril de 1872, que regia as
escolas normais da província de Minas Gerais, as lições deveriam ser alternadas para cada um deles.
Porém, sete anos depois, a partir do Regulamento nº 84, de 21 de março de 1879, homens e mulheres
poderiam frequentar a Escola simultaneamente, mas, com as devidas divisões no interior das salas
de aula.
Ainda conforme os dados analisados, sobretudo a partir das consultas às listas de matrícula dos
alunos, foi possível constatar a superioridade no quantitativo feminino nas matrículas da instituição
entre 1877 e 1888, uma vez que em todos os anos observados, o ingresso no primeiro ano foi
majoritariamente feito por mulheres, com exceção somente do ano de 1881. No que diz respeito ao
segundo ano do curso, os homens só foram a maioria nos anos de 1877 e 1882. Já no terceiro ano,
os alunos do sexo masculino são ainda mais raros, sendo que entre 1884 e 1889, só dois homens se
matricularam nele.
Também de acordo com os dados analisados, foi possível notar a grande evasão escolar ao longo
do curso normal. As matrículas no segundo ano são bastante inferiores às do primeiro, e às do
terceiro ano menores ainda que as do segundo. Pode-se concluir, então, que muitos dos alunos que
ingressavam no curso, não chegavam a concluí-lo, ou demoravam mais tempo que o estipulado para
encerrá-lo. Também no que diz respeito à evasão escolar no curso normal de Ouro Preto presencia-se
uma diferenciação por gênero. Comparando os alunos matriculados nos primeiros e nos segundos
anos, por exemplo, percebe-se que cerca de 33% das mulheres seguiram no segundo ano do curso
após concluírem o primeiro. No que tange aos homens, por outro lado, a média de permanência é de
cerca de 18%, o que indica que a evasão masculina era maior que a feminina.
É possível concluir, ainda, que as mulheres chegavam ao último ano do curso em maior número,
e que também o terminavam em grande quantidade. Assim, observou-se que chegaram a se
matricular no último ano do curso normal, no período analisado, 67 mulheres e apenas 17 homens.
Desse contingente, o concluíram 69 alunos, sendo 55 do sexo feminino, e 14 do masculino.
A frequência cada vez maior de mulheres no corpo de alunos da Escola Normal de Ouro Preto
fez com que modificações fossem realizadas ao longo dos anos a fim de melhor adaptá-las. Neste
sentido, faz-se importante pontuar que, se em 1872, tanto as moças quanto os rapazes poderiam
ingressar na instituição com a idade mínima de 16 anos (Regulamento nº 62, de 11 de abril de 1872),
já em 1883 essa idade havia sido diminuída para ambos os sexos, mas, ainda mais para elas, que
agora poderiam frequentar a Escola a partir dos 12 anos, e eles dos 14 (Regulamento nº 100, de 19
de junho de 1883). É importante lembrar, que diferentemente dos alunos do sexo masculino (que
poderiam estudar no Liceu Mineiro ou no Liceu de Artes e Ofícios de Ouro Preto), para as meninas,
o ingresso no curso normal era uma das únicas vias possíveis e bem aceitas socialmente para a
continuidade dos seus estudos para além do ensino primário elementar nesse período.
Outro ponto a ser observado é a modificação curricular trazida pelo Regulamento nº 100, de 19
de junho de 1883. A partir dele, para as moças seria incluída mais uma disciplina, a de trabalhos
de agulha e bordados, que deveria ser realizada na escola prática do sexo feminino. Já no que diz
respeito às aulas de música, passava-se a haver algumas diferenciações entre os dois sexos, em que
meninas apreenderiam piano ou harmonium e os rapazes violino.
Dessa forma, é possível concluir que ao final da década de 1880 já se presenciava, claramente, a
consolidação do processo de feminização do corpo discente da Escola Normal de Ouro Preto, uma
vez que já são poucos os homens a frequentar e, sobretudo, a concluir o curso no instituto. Essa
feminização se faz ver também nas modificações das normas e dos currículos do curso normal ao
longo das décadas de 1870 e 1880. Todavia, faz-se relevante pontuar que os homens continuavam a
ser maioria absoluta no que diz respeito ao corpo docente da Escola Normal de Ouro Preto. Em todo
o período analisado, observou-se a presença de somente uma docente do sexo feminino entre os
professores que ministravam as suas aulas na instituição.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 832
Referências
GOUVÊA, Maria Cristina Soares.; ROSA, Walquíria Miranda. História da Escola Normal em Minas Gerais
(1835-1906). In. PEIXOTO, Anamaria Casasanta.; FARIA FILHO, Luciano Mendes de. (org.) Lições de
Minas – 70 anos de Secretaria da Educação. Secretaria de Estado da Educação do Estado de Minas
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PERROT, Michelle. Os excluídos da história: operários, mulheres e prisioneiros. Rio de Janeiro: Paz
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PERROT, Michelle. Escrever uma história das mulheres: relato de uma experiência. Cadernos Pagu,
Campinas, n. 4, 1995.
SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação & Realidade, Porto Alegre, V.
20. nº2, jul\dez., p. 71-99, 1995.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente texto apresenta resultados de pesquisa que tem como objeto de estudo a implantação
de creches na cidade de São Vicente. E, em especial o período de 1997 a 2004. Esta pesquisa teve
sua problemática levantada a partir da minha experiência acadêmica como aluna da rede pública
de ensino dessa mesma cidade, onde passei toda minha trajetória desde a Educação Infantil até o
Ensino Médio. Desta relação nasce o interesse sobre a historicidade da implantação de creches neste
período, na cidade brasileira de São Vicente, no estado de São Paulo, assim como sobre as propostas
e práticas pedagógicas existentes nesse período. 1990. A presente pesquisa envolve duas áreas de
conhecimento a história da implantação da creche na cidade de São Vicente e as políticas públicas
para este nível de escolaridade.
Nesta pesquisa, o centro está na investigação do cenário e as condições que constituíram o
processo de implementação das creches na cidade de São Vicente, buscando identificar entre elas
quais condições beneficiaram e quais dificultaram a implantação desse programa na cidade.
A etapa inicial dessa pesquisa constituiu-se na identificação das creches da cidade de São
Vicente que estão em funcionamento, sendo este dado obtido por meio de pesquisa via internet nos
endereços eletrônicos oficiais do município.
As instituições de educação da criança pequena estão em estreita relação com as questões que
dizem respeito à história da infância, da família, da população, da urbanização, do trabalho e das
relações de produção, etc., e, é claro, com a história das demais instituições educacionais. Para
Moysés Kuhlmann “não se trata apenas da Educação Infantil: a história da educação em geral precisa
levar em conta todo o período da infância, identificada aqui como condição da criança, com limites
etários amplos, subdivididos em fases de idade, para as quais se criaram instituições educacionais
específicas”.
A constituição das instituições de atendimento a criança pequena no Brasil para Moysés
Kuhlmann:
Há uma diversidade de opiniões sobre as causas e os temas que teriam influenciado a
constituição das instituições pré-escolares-creches, escolas maternais e jardins da infância.
(KUHLMANN, 1998, P. 77)
Com a organização da indústria, do comércio e do amplo processo de urbanização, o poder
público passa a ser cobrado quanto a implantação de órgãos que atendam esta parcela da
população, especialmente as creches, passam a ser reivindicadas pelas mães trabalhadoras, que
precisavam de um local para deixarem seus filhos durante a sua jornada de trabalho.
Em termos de políticas públicas educacionais para a educação infantil, o poder público
cambaleava, com algumas iniciativas, até a década de 1980, embora esse segmento educacional
existisse no Brasil há mais de um século. Os avanços nos programas de políticas públicas foram
certamente impulsionados pela reorganização geral da sociedade civil que provocava conquistas
no âmbito da legislação. A Constituição de 1988 foi marco na história da Educação Infantil no Brasil,
uma vez que reconheceu a educação de 0 a 6 anos como um direito da criança.
No processo de implantação destas creches na cidade de São Vicente percebe-se claramente que
a cidade não tinha condições de defender o sistema de ensino e organizar tal implantação, entretanto
o governo da época criou um sistema de formação de Ongs, que receberiam o repasse de recursos da
prefeitura para tocar as creches. Não demorou muito e abrir creche virou uma febre em São Vicente
em regime de colaboração, na forma de um apoio técnico e financeiro. Contudo, este processo foi
realizado sob a supervisão da prefeitura, da Secretaria de Educação e das implacáveis conselheiras
do Fundo Social de Solidariedade, que exigiram a implantação de um projeto pedagógico nas
unidades, que incluía uniformes, alfabetização, acompanhamento médico e disciplina
Esse contexto influenciou para aumentar o número de creches na cidade e, ainda auxiliou na
diminuição de encargos para prefeitura.
Por meio desta pesquisa, busco compreender quais eram as metas e os objetivos do programa
de creche implantado na cidade de São Vicente, para os diferentes públicos desse processo: mães,
filhos, vereadores, empresários, organizadores do programa e governo.
A creche para criança pequena no Brasil segundo Moysés Kuhlmann:
Não se pode considerar a creche como uma iniciativa independente das escolas maternais ou
jardins de infância, para as crianças de três ou quatro a seis anos, em sua vertente assistencialista,
pois as propostas de atendimento educacional à infância de zero a seis anos tratam em conjunto das
duas iniciativas, mesmo que apresentando instituições diferenciadas por idades e classes sociais.
(KUHLMANN, 1998, P. 78)
Com o referencial de política pública, analisarei o processo de implementação das
creches, situando-as no cenário histórico-político de seu período de consolidação, buscando
responder a problemática desta pesquisa: o porquê de Ongs e não creches da prefeitura.
Basicamente o processo de expansão das creches no Brasil ocorre a partir da década de 1970
para acolher e proteger as crianças cujas mães eram absorvidas pelo mercado de trabalho em franco
desenvolvimento industrial e comercial na época e não tinham condições de assumir os cuidados
com os filhos nesse período.
Porém, com a dificuldade que o Estado tinha em assumir as responsabilidades inerentes à criação
e manutenção desses espaços fez com que essas instituições acabassem discriminadas e ficassem
marcadas por um conceito errôneo de assistencialismo, conforme aponta Merisse (1997) “as
primeiras instituições voltadas ao atendimento da infância no Brasil tiveram seu início fortemente
marcado pela ideia de oferecer assistência e amparo aos necessitados”.
Essa situação se perdura por vários anos até a promulgação da Constituição Federal de 1988 que
veio para delinear um novo olhar para a criança e para reconhecer seu direito a ser atendida em
creches e pré-escolas públicas. Após a concessão dessa nova forma de reconhecer as instituições
de Educação Infantil, é possível observar que novas políticas educacionais começaram a ser
direcionadas para a Educação Infantil, concebendo o direito de todas as crianças a ter acesso a uma
educação de qualidade e que pudesse proporcionar um desenvolvimento integral, humano e social.
A Constituição de 1988 afirma o direito à educação em creches e pré-escolas a todos os filhos
de trabalhadores (homens e mulheres) urbanos e rurais (Art.7º, inciso XXV) como um direito à
assistência.
A década de 80 foi marcada, por grandes mobilizações em torno da criança e do adolescente
com significativa participação de amplos setores da sociedade civil organizada e também com a
presença de representantes de órgãos públicos e o apoio da UNICEF. A Constituição de 1988 é um
marco desta mudança de doutrina no modo de enxergar a criança, seguido do Estatuto da criança
e do adolescente, lançando os princípios de implementação de novas políticas para a infância.
(CRAIDY, 1994:21-22).
A expansão da creche na cidade de São Vicente, como instituição de cuidado da criança está
também associada, às transformações educacionais e sociais, como as mudanças nos modelos
familiares e as transformações no mundo do trabalho. Os pais necessitavam sair para trabalhar e
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 835
não tinham onde deixar seus filhos e nem podiam se ocupar totalmente da criança pequena. Com
estas transformações o poder público se viu obrigado a atender esta demanda da sociedade.
Como fontes para a realização da pesquisa tem se localizado documentos da Secretaria de
Educação do Município, matérias nos jornais A Tribuna de Santos e Jornal Vicentino, Decretos
Municipais localizados no acervo histórico da cidade de São Vicente. Pretende-se ainda realizar
entrevistas com dirigentes, professoras e ex-alunos, seguindo os protocolos da história oral. Com
o estudo das informações disponíveis nos documentos dos acervos citados e dos depoimentos
irei registrar, interpretar e compreender os acontecimentos que possibilitaram a implantação das
escolas de educação infantil no município dentro do contexto histórico-social, assim como as ideias
e práticas pedagógicas existentes nessas instituições.
As análises irão relacionar a implantação das creches no final da década de 90 até o ano de 2004
no município de São Vicente, com o processo de expansão dessas instituições em todo o país, que
culminou na sua inserção no capítulo da Educação da Carta Constitucional de 1988, considerando
as demandas da população, as políticas sociais e as propostas educacionais, identificando os
elementos comuns com esses processos mais amplos e os específicos às condições deste município.
Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. promulgada em 5 de
outubro de 1988.
________. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Câmara da Educação Básica.
Resolução nº022/98. Brasília, 1998.
KUHLMANN JR., M. Infância e Educação Infantil - uma abordagem histórica. Porto Alegre: Mediação,
1998; 7ª edição – 2015.
MERISSE, A. Origens das instituições de atendimento à criança pequena: o caso das creches. In:
Lugares da infância: reflexões sobre a história da criança na fábrica, na creche, no orfanato. São
Paulo: Arte &Ciências, 1997.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Ao tratar das fontes para a constituição de pesquisas em História da Educação muitos são os
desafios enfrentados. Nos estudos no interior da temática das relações étnico-raciais, os problemas
aumentam à medida que se observa escassez em materiais oficiais que tragam informações
sobre o negro, descoladas de sua condição de escravo ou de grupo social submetido a todo tipo
de discriminação e preconceito. As imprensas, especialmente os jornais da imprensa negra,
apresentam-se para este trabalho como fontes e objetos bastante profícuos para descortinamento
das condições do negro na sociedade paulistana no início do século XX, afastando esse grupo
social da representação apresentada anteriormente. Trabalhos como este permitem, também, a
reconstituição crítica do processo histórico de sucessivos suportes de comunicação. Neste sentido,
discutiremos neste trabalho as relações de pertencimento assumidas pela imprensa negra com a
chamada “grande imprensa” a partir de análise da estrutura e temática destes dos jornais .
A imprensa negra é tomada nesta pesquisa como objeto fértil na constituição de uma nova
imagem do negro, nas primeiras décadas do século XX. Ao abordar esta temática ela nos remete a
pensar como foi produzida e o papel das associações criadas no país, como uma estratégia, que pode
se configurar como uma perspectiva de escolarização do social: “uma imprensa que tem circulação
restrita e penetração limitada à comunidade a que se destina, irá exercer uma função social, política
e catártica durante sua trajetória, mudando de conotação ideológica com a passagem do tempo”.
(Moura, 2002, p. 6).
A variedade de títulos e subtítulos recorrentes nesta imprensa contrasta com o número reduzido
de números publicados de cada jornal ou revista, em função da escassez de recursos financeiros
de seus editores, condições políticas e históricas da época da publicação. Assim como os jornais
publicados no Brasil desde o século XIX, em sua grande maioria, tiveram vida efêmera e curta. Boa
parte deles ficava no primeiro número, não conseguindo sobreviver por um período relativamente
longo de tempo.
No primeiro período de publicação da imprensa negra, aproximadamente de 1915 -1923
(FERRARA, 1986), notamos uma incipiente conscientização étnica do negro com fortes referências
à aceitação do homem negro pela sociedade negra brasileira. O jornal “O Clarim da Alvorada”,
inaugura uma segunda fase (1924-1937) de debates promovidos pela imprensa negra, na qual
a produção “jornalística atinge o seu ápice, sem palavras atenuantes, de forma direta e objetiva”
(FERRARA, 1986). Procura fortalecer a união da população negra para a reivindicação de seus direitos
de participação na sociedade brasileira. No jornal “A Voz da Raça” (1933), o grupo negro desperta
para o sentimento patriótico, segundo o qual seria possível compreender seu valor. A última leva de
jornais da imprensa só começa a ser publicada após o fim do Estado Novo. A situação política geral
reflete-se nos jornais negros. Temos a propaganda política aberta e o apoio a candidaturas tanto de
negros quanto de brancos. As reivindicações permanecem as mesmas: apelos à união, valorização e
exaltação do negro.
Este período apresenta certo amadurecimento do negro com relação a sua posição na sociedade
dominante, tanto social quanto política e econômica, além de uma maior conscientização por meio da
qual os problemas do negro seriam resolvidos. As relações entre negros e brancos são apresentadas
“no nível de uma luta de classes, e são reivindicados direitos, participação e representação políticas
efetivas” (FERRARA, 1986).
Para melhor entender a importância da imprensa negra na constituição de identidades acerca do
negro no início do século XX, fez-se necessário a compreensão do contexto histórico e as razões que
levaram o grupo social dos negros a produzirem este cabedal de informações.
O início do século XX pode ser cunhado como um período no qual a sociedade brasileira enfrentava
dois grandes dilemas. Primeiro, a preocupação com a absorção das populações de cor às formas de
vida organizadas a partir de uma sociedade altamente competitiva. Segundo, existia a discussão
acerca do preconceito de cor, a constante associação entre cor e posição social ínfima, que favorecia
a exclusão do negro da condição de “gente” (FERNANDES, 2008). A vinculação do negro e do mulato
à escravidão, recentemente abolida, mostrava o quanto à sociedade brasileira do período construía-
se sobre falácias discursivas, ou seja, o discurso empreendido pelo recém-inaugurado regime
republicano só poderia ser constituído de forma verdadeira se houvesse uma busca por um melhor
posicionamento do negro na sociedade brasileira.
Durante o primeiro quinquênio do segundo quartel deste mesmo século se avolumaram de tal
modo a amargura e a insatisfação da ‘população de cor’, que brotaram, espontaneamente, vários
movimentos de tomada de consciência, de crítica e de repulsa ao duro destino a que se viam
relegados os homens de cor. O movimento que se organizava não possuía o caráter de uma revolução
contra a ordem social estabelecida; constituía-se mais em um protesto contra as debilidades mais
profundas do sistema de relações sociais presente nas injustiças cometidas neste contexto histórico.
Auxiliava o negro em um processo de libertação que o prendia à antiga condição de escravo ou de
liberto, que o submetia à “dominação racial tradicionalista”.
Organizações de protesto dos negros surgiram em diferentes regiões do país. Textos e
depoimentos de ex-militantes mostraram a existência de entidades de defesa da raça negra já no
início de nossa história republicana. Entretanto, devemos reconhecer que o poder de mobilização
dessas organizações teve, de fato, visibilidade nas capitais e nas grandes cidades brasileiras. Ao
contrário, do que já se escreveu sobre a convivência pacífica das raças no Brasil, as relações entre
elas eram, no cotidiano, marcadas por conflitos e tensões.
Essa tendência foi mantida praticamente ao longo de todo o século XX. Em momentos cruciais
da história republicana, podemos encontrar registros dos movimentos de protesto dos negros: o
mais emblemático foi o promovido pela Frente Negra Brasileira, em 1931, na cidade de São Paulo,
mobilizando em torno de 100.000 militantes (MOURA, 1983). A instituição possuía como órgão
de divulgação e propagação de seus ideais o jornal “A Voz da Raça”, além de manter instituições
educacionais com o intuito de alfabetizar a população negra.
Segundo Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (1998), essas organizações “se configuram como
instâncias educativas, na medida em que os sujeitos que participam delas as transformam em espaços
de educação política”. Já no início do século XX, o movimento criou suas próprias organizações,
conhecidas como entidades ou sociedades negras, cujo objetivo era aumentar sua capacidade de ação
na sociedade para combater a discriminação racial e criar mecanismos de valorização da raça negra.
Nesse sentido, os jornais da imprensa negra também foram fundamentais na disseminação da
importância da educação para o desenvolvimento da população negra. Tal perspectiva de pesquisa
procurou contribuir para os estudos, ainda lacunares, da imprensa negra paulista, tratando de dar-
lhe a visibilidade devida no interior da imprensa brasileira do início do século XX. Trabalhos anteriores
utilizaram os jornais da imprensa negra paulista como fonte de informações na configuração de um
panorama social, econômico e, em alguns casos,identitários dos negros paulistas. Esta tese deu
um passo além na perspectiva de utilização da imprensa negra, tomando-a também como objeto
de estudo, decifrando os entremeios e as dificuldades de sua construção. Penetrou-se em sua
organização tipográfica, nas premissas, na formação e atuação profissional de seus idealizadores,
buscando compreender a complexidade presente à escolha das temáticas tratadas, os contextos
históricos nos quais certas decisões eram tomadas, as soluções dadas a problemas financeiros que,
por muitas vezes, impediram a permanente circulação dos periódicos.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 838
Referências
FERRARA Miriam Nicolau. A imprensa negra paulista (1915-1963). São Paulo, 1981. Dissertação de
Mestrado em Antropologia FFLCH, USP.
FERNANDES, Florestan. A integração do negro à sociedade de classes. São Paulo: FFCL/USP, 1964.
GONÇALVES, Luiz Alberto; SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves. Movimento Negro e Educação. Revista
Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n.15, p. 134-158, jul/dez 2007.
MOURA, Clóvis. “A imprensa Negra em São Paulo”. IN: Imprensa Negra. Estudo Crítico de Clóvis
Moura. São Paulo: Imprensa Oficial. Sindicato dos Jornalistas no Estado de São Paulo, 2002.
ISSN 2358-3959
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No campo da História da Educação ainda são poucos os trabalhos que evidenciam a criança e a
infância como objetos de estudo. Dentre estes poucos, as fontes mais utilizadas são aquelas que
referenciam a assistência infantil e a vida escolar das crianças, diante principalmente de documentos
textuais e/ou fotografias que revelam a rotina e as práticas educacionais dentro da escola. Um dos
principais pesquisadores da Infância e um dos pioneiros a se debruçar sobre sua história foi o historiador
francês Philippe Ariès, com seu célebre livro História Social da Criança e da Família, cuja primeira edição
data de 1963. O trabalho de Ariès estuda a infância no contexto francês, tendo como documentos a
iconografia, vestimentas, lápides, fontes manuscritas etc. Segundo este historiador, na Idade Média, a
infância era desvalida de cuidados e proteção, uma vez que o sentimento de apego às crianças inexistia.
Ariès observa uma mudança de comportamento com relação às crianças ao longo da história,
identificando que a noção de infância vai se consolidar sobretudo na passagem do século XVII para o
XVIII. No cenário brasileiro, a historiadora Mary Del Priore ao organizar o livro História das crianças no
Brasil (1991), revela que é importante investigar a historicidade da infância e suas especificidades,
sobretudo porque, de maneira geral, pode-se afirmar que a História da Infância tem sido registrada por
médicos, professores, padres, legisladores e educadores. A partir dos relatos desses profissionais que se
tem notícias históricas sobre essa fase da vida, uma vez que os relatos das próprias crianças são fontes
raras em arquivos públicos e particulares. Tendo em vista as importantes referências sobre a Infância
supracitadas e a escassez de trabalhos contribuintes para a construção e colaboração para com a
História da Infância, esta pesquisa tem por cerne a infância, a qual se pretende analisar a partir de
fotografias realizadas por um fotógrafo amador de São João del Rei, Minas Gerais, que deixou o legado
de mais de cem fotos a sua família: o Sr. João da Costa. O arquivo fotográfico familiar em questão é
composto em sua totalidade por 192 fotografias. Desse montante, 67 não foram realizadas pelo Sr. João
da Costa. Essas fotos são, em sua maioria, retratos recebidos como lembranças de amigos, familiares e
afilhados. Há também fotografias tiradas em estúdios fotográficos e em excursões religiosas, todas com
a intenção de recordação e lembrança, de construção de uma memória familiar. Nessa subsérie,
encontra-se a fotografia mais antiga do acervo, datada de 1914. É importante destacar que algumas
fotografias que não são de autoria do Sr. João da Costa também serão utilizadas na pesquisa sobre a
infância que se pretende realizar com este trabalho por fazerem parte do contexto histórico e familiar
pesquisados. O Sr. João da Costa era neto de imigrantes italianos e o primogênito de onze irmãos, viveu
entre os anos de 1923-2012. Estudou apenas durante nove meses, tempo suficiente para aprender a ler,
escrever e fazer contas, ensinamentos mais relevantes para a época. Seus registros fotográficos
aconteceram entre os anos de 1964 e 1979, em sua quase totalidade na Colônia José Teodoro, zona rural
de São João del-Rei (Minas Gerais), onde nasceu e viveu grande parte da sua vida. Sua atuação como
fotógrafo amador só foi possível por ter sido contemplado em uma rifa com uma máquina fotográfica
do modelo Bieka MF-M20, fabricada entre as décadas de 1950 e 1960 pela empresa DF Vasconcelos, no
Brasil. O acervo fotográfico de sua autoria é composto por 125 fotografias, ganhando destaque as
imagens da infância, seja de seus filhos, sobrinhos e/ou crianças da Colônia José Teodoro (90 fotografias).
Há, nessas imagens, a presença de brinquedos, raros para a época, devido à condição financeira das
famílias fotografadas e ao cotidiano do brincar daquela época, em que os brinquedos industrializados
eram menos populares. Por esse motivo, o seu destaque nas fotografias era tão importante e significativo.
Em análise preliminar das fotografias que retratam brinquedos, observamos uma separação de gêneros
em que as meninas são fotografadas com bonecas e acessórios femininos, como bolsas, enquanto a
infância masculina é mostrada com carrinhos, bolas e com animais. Outro aspecto notório, rico de
significados para aquelas famílias, era o momento da Primeira Comunhão. Os trajes típicos, a postura
adequada, a religiosidade e o respeito saltam aos olhos nessas fotografias, dialogando com “a grande
festa religiosa da infância” descrita por Ariès (1981). Sr. João da Costa lançou seu olhar também para a
paisagem que o cercava e conseguiu abranger aspectos da Geografia local, bem como da lida diária
daquele lugar. Em seus registros (35 fotografias), vemos a criação de animais, plantações, casas,
construções, festas e paisagens. Essas fotografias também serão consideradas, buscando compreender
o contexto que cercava a família e as crianças fotografadas. Mas vale ressaltar que este trabalho tem
como foco estudar a infância retratada pelo fotógrafo amador Sr. João da Costa e suas especificidades.
Levando em conta a particularidade do material empírico legado pelo Sr. João da Costa que chegou aos
dias atuais e considerando as leituras feitas durante a graduação de Pedagogia, que mostram a
importância que a História da Infância tem tomado como tema dentro do campo da História da
Educação, é que inicialmente, nasceu a ideia dessa pesquisa como um Trabalho de Conclusão de Curso,
já finalizado em 2018. Visto o enorme e rico arquivo fotográfico e as privilegiadas fotografias da infância
deste fotógrafo amador, além de materiais e informações colhidas referentes à época estudada nas
fotografias, surgiu a necessidade e a oportunidade de explorar e aprofundar a pesquisa no Mestrado,
que se encontra em fase inicial. Como exemplo marcante, posso citar as práticas familiares que se
estenderam durante gerações e que marcaram a infância na família do Sr. João da Costa. Atualmente
essa pesquisa encontra-se em andamento e vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal de São João del Rei. Nascida no século XIX, inicialmente a fotografia produzida e
manipulada pelo homem, foi considerada insuficiente como fonte histórica sobretudo por fatores como
a subjetividade e manipulação do fotógrafo no ato do registro. Uma visão positivista de que se trata de
uma descrição do real, apenas transcreve o que o documento textual afirma, colocou a fotografia como
fonte secundária e subalterna, como representação simbólica e ilustrativa. Sua posição enquanto fonte
primária e principal nesta pesquisa direciona que a contribuição deste trabalho para a História da
Infância seja assinalar através das fotografias do Sr. João da Costa, o cotidiano e as características de
uma infância para além das instituições escolares, visto a quase inexistência de trabalhos semelhantes
pelo levantamento realizado até o presente momento. Os resultados preliminares obtidos com a revisão
bibliográfica revelam uma predominância de trabalhos realizados sobre o assistencialismo e a infância
institucionalizada, sobretudo por fontes textuais. As fotografias encontradas nesses trabalhos, em
quase totalidade dos casos, apontam para uma infância vista e estudada sobre essas duas diretrizes. Em
sua dissertação de mestrado, Frias (2017) realizou extenso levantamento sobre os temas mais recorrentes
com relação à infância para o campo da História da Educação. Frias (2017) observa que é crescente a
produção de trabalhos sobre a infância, embora sejam ainda escassos sobretudo pela dificuldade em
encontrar fontes. Reitero que entre os temas recorrentes sobre a infância encontrados por Frias há uma
grande maioria de trabalhos concentrados na assistência à infância e sua escolarização. Como fontes de
pesquisa principais utilizadas pelos historiadores, a autora aponta relatos, memórias, documentos
textuais, mas não descreve nenhum trabalho relacionado a fotografias da infância, o que revela a
existência de uma lacuna no que se refere aos trabalhos sobre História da Infância. Um levantamento de
dados realizado por Frias (2017) e atualizado na presente pesquisa aponta um importante déficit na
produção acadêmica das principais revistas no campo da História da Educação (Revista Brasileira de
Educação, Revista Brasileira de História da Educação e Revista Brasileira de História) no que diz respeito
à produção de trabalhos relativos à Infância, Infância e Educação e Infância e Fotografia. Após a
organização e leitura desses dados, foi possível perceber o quanto o estudo da temática “Infância” ainda
é pequena entre os pesquisadores da História da Educação, sobretudo em sua análise a partir de
documentos fotográficos. Nesta pesquisa, a metodologia utilizada será de análise historiográfica das
fotografias à luz de trabalhos que versam sobre História da Fotografia e sobre a História da Infância,
buscando compreender as imagens inseridas no contexto histórico no qual foram produzidas. Como
objetivo principal espera-se compreender as representações sobre a Infância na Colônia José Teodoro
nas décadas de 1960 e 1970 através da análise das fotografias de crianças produzidas pelo Sr. João da
Costa numa perspectiva historiográfica.
ISSN 2358-3959
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desenvolvimento do país. Assim, houve a necessidade de se preocupar com a escola rural para
tentar diminuir essa migração (SIMÕES; TORRES, 2011), portanto fixar o homem no campo com
suas famílias virou projeto de governo.
Na década de 1930, o manifesto dos pioneiros e todas as lutas em prol de mudanças significativas
na educação de modo geral, foi relevante para as escolas rurais, pois proporcionou abertura para
discussões sobre as especificidades dessa modalidade de ensino. Na Constituição de 1934, o artigo
156 apresentou à necessidade do governo da união, em reservar no mínimo, vinte por cento das cotas
destinadas a educação no respectivo orçamento anual (BRASIL, 1934). Com força de lei, tornou-se
um ato considerável, no entanto, isso, não foi suficiente para que a educação rural se efetivasse de
fato. Segundo Paiva (2003) o período de 1930 e 1945 apresentou debates significativos em relação ao
ensino técnico-profissional e a educação rural.
Na Constituição Federal de 1946, o intuito foi de responsabilizar a educação rural para as empresas
privadas, tal mudança gerou retrocesso para a educação nessas escolas. [...] III - as empresas
industriais, comerciais e agrícolas, em que trabalhem mais de cem pessoas, são obrigadas a manter
ensino primário gratuito para os seus servidores e os filhos destes; IV - as empresas indústrias e
comerciais são obrigadas a ministrar, em cooperação, aprendizagem aos seus trabalhadores
menores, pela forma que a lei estabelecer, respeitados os direitos dos professores [...] (BRASIL, 1946,
Art. 168).
Já a partir dos anos de 1980, com o grande enfoque dos movimentos sociais, retorna os
debates nacionais acerca da qualidade de vida do homem do campo (CANDAU, ANHORN, 2001).
Esse movimento de busca por maior reconhecimento se estende também a década de 1990, com
a implementação da Constituição Federal de 1988, na qual garante a educação como direito de
todos e dever do Estado, sem distinguir educação rural e urbana. A CF de 88 leva em consideração
as diferenças locais e regionais, proporcionado autonomia para que os estados pensem a melhor
forma de garantir a educação. Outro fator importante nos anos de 1990, foi a Lei n. 9.394/96 que
implementou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, essa levou em consideração as
especificidades das escolas rurais ao firmar no artigo 28 os seguintes termos: Art. 28. “Na oferta
de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações
necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente: I -
conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos
da zona rural; II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases
do ciclo agrícola e às condições climáticas; III - adequação à natureza do trabalho na zona rural
(grifo nosso). Parágrafo único. O fechamento de escolas do campo, indígenas e quilombolas será
precedido de manifestação do órgão normativo do respectivo sistema de ensino, que considerará a
justificativa apresentada pela Secretaria de Educação, a análise do diagnóstico do impacto da ação
e a manifestação da comunidade escolar” (Incluído pela Lei nº 12.960, de 2014) (BRASIL, 1996). A
partir da legislação percebe-se que a educação rural no Brasil passou por um processo de mudanças
significativas, isso pode ser observado mediante as legislações que foram criadas ao longo dos anos.
Portanto, iniciada no final do século XIX essa educação perdura até os dias atuais, lutando para
ofertar uma educação de qualidade e nos leva a presente pesquisa que busca realizar em sua base
teórica-metodológica a historia oral, dentro da abordagem qualitativa, buscando compreender a
infância das crianças do primário das escolas rurais do município de Naviraí/MS a partir da perspectiva
de docentes e gestores, sujeitos (secretários da educação, diretores e pessoas da comunidade local)
que atuaram entre os anos de 1970 a 1990 nas escolas rurais do município, assim, como relatos das
próprias crianças. Para tal, nossa opção metodológica é trabalhar com as memórias e as histórias
de vida destes participantes enquadrando-as como instrumento rico e promissor a ser explorado
na estruturação da presente proposta. Levantamos as fontes desse trabalho a partir de uma busca
nos arquivos e acervos das escolas rurais do município. Para selecionar os sujeitos colaboradores,
realizamos uma análise na Gerência Municipal de Educação (GEMED) a fim de identificar quem
foram as professoras, professores e os gestores do período (diretores, secretários e gerentes da
educação) em quais períodos atuaram. Além disso, levantamos documentos e registros compostos
por: relatórios, planejamentos de professores, fichas funcionais, planos de gestão, lista de alunos,
um arcabouço documental que permite utiliza-los a fima de compreender o período.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 843
O trabalho com a memória segundo Meihy (2005) permite trazer à tona questões de um
determinado tempo, recordações. “A presença do passado no presente imediato das pessoas é a
razão de ser da história oral. Nessa medida, a história oral não só oferece uma mudança no conceito
de história, mas, mais do que isso, garante sentido social a vida de depoentes e leitores, que passam
a entender a sequencia histórica e se sentir parte do contexto em que vivem”. (MEIHY, 2005, p.19)
Vidal (1999) acrescenta que ao se propor utilizar a história oral como perspectiva teórico-
metodológica, é relevante o alinhamento entre outros documentos que se apresentem coerentes
com o recorte temporal da pesquisa proposta.
As afirmações supracitadas indicam que a educação rural no Brasil, precisa ser investigada, ainda
há muitas lutas a serem travadas no cenário das políticas públicas voltadas para a educação do
campo, especialmente no que tange a educação das crianças do ensino rural primário. Analisar o
contexto da educação rural no presente município contribui de forma relevante para que possamos
de fato proporcionar uma educação de qualidade que leve em consideração as necessidades dos
sujeitos que vivem nesse espaço, e assim compreender os processos inseridos nesta modalidade de
educação.
ISSN 2358-3959
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Os indígenas Akwen Xerente, trazem uma particularidade quanto as crianças menores de cinco
anos, essas só falam na língua akwen até serem iniciadas na língua portuguesa por ocasião do seu
ingresso na fase escolar. Condição prevista na tradição oral dessa povo. Os Xerente da Aldeia Porteira,
na sua maioria, dominam com proficiência a língua portuguesa, somente os mais velhos falam com
certa dificuldade o português, são caracterizados como um povo bilíngue. Outra singularidade
dessa etnia, é que, mesmo na presença de não índio, eles se comunicam entre si fazendo uso da
língua materna. Os Xerente tinham como principal forma de alimentação a caça e a coleta, sendo
essas as condições básicas de alimentação do grupo. Mas devido ao impacto da obras realizadas no
Rio Tocantins, essa condição alimentar, principalmente no que concerne a pesca e a caça, principal
fonte de alimentação, reduziu-se significativamente. Diante desse cenário, os Xerente tiveram que
buscar outras formas de subsistência através de outras fontes de renda. E todas essas mudanças
impactaram com muita agressão na saúde do indigena Xerente, principalmente na saúde do ancião
indígena.
Estudos realizados pelo etnólogo Curt Nimuendajú (1942), apontam que a principal característica
do processo de convivência dos Xerente, traz como especificidade, a simplicidade conciliada ao meio
ambiente. Em face dessa harmonia com a natureza, Nimuendajú (1942), apresenta em seu estudo
que o Xerente tem um sistema sociocultural muito heterogêneo, organizado por um equilíbrio
dinâmico entre dois planos sociais, divididos entre os Doí e Wahirê, relacionado nessa ordem, Sol
e Lua, que são os ídolos criadores do povo Xerente. Esses sistemas expressam nessa pluralidade
cultural, complexos rituais como: grupos de nominação feminina e masculina das crianças, os mitos,
as pinturas corporais, as cerimônias e rituais, times esportivos, classes de idade, casamento, dentre
outras cerimônias, tudo organizado a partir de relações de parentesco. O processo de observação
e entrevistas ocorreu em duas visitações, entre os meses de outubro e novembro de 2019. Foram
entrevistados quatro anciãos da Aldeia Porteira Nrozawi, distribuídos em dois homens e duas
mulheres. A seleção da amostra observou a dois critérios: a) trabalhar com dados previamente
autorizados; b) trabalhar com velhos (homens e mulheres) com idade igual ou superior a 60 anos.
Após o estudo e análise dos resultados da pesquisa realizada na sociedade Akwen Xerente, constatou-
se que a velhice é uma fase da vida onde o indivíduo se torna experiente e sábio, com conhecimento
capaz de orientar a comunidade mais jovem a tomar decisões. Foi possível identificar também, que
os mais velhos são os agentes incentivadores e mobilizadores da preservação da cultura desse povo.
A análise das percepções das histórias que os anciãos da Aldeia Porteira Nrozawi trouxeram,
possibilitaram esclarecer o efeito que as mudanças sociais e culturais estabeleceram em suas vidas
e as consequências dessas transformações nos seus costumes. Nesse sentido, conclui-se que falar
com o ancião Xerente sobre o seu processo de envelhecimento, gerou certo pesar, justificado devido
às mudanças culturais e de saúde procedentes da vida moderna. A preservação dos costumes foi
mencionada como um processo em declínio, devido os jovens desfrutarem de vários aparatos
tecnológicos o que dificulta o interesse nos encontros para a tradição oral. Nos relatos de vida dos
anciãos entrevistados, a preservação da cultura foi considerada como ponto de maior importância
para salvaguardar a preservação desse grupo, em segundo lugar, eles mencionam a questão da
saúde no envelhecimento indígena. A cultura é o seu bem mais precioso. Esta pesquisa reforçou
a necessidade da informação para compreender as particularidades culturais desse povo, como
também se faz necessário postular um novo olhar sobre o velho na sociedade indígena, não por seu
papel junto ao grupo, mas pelas mudanças que os impactos ambientais, as mudanças aceleradas
na sociedade envolvente e a a expansão tecnológica afetam sobremaneira na cultura, nos hábitos e
saúde desses indivíduos. Apesar das interferências que a modernidade impõem à vida na sociedade
indígena, entende-se que os anciãos são os principais agentes cuidadores da memória cultural
dessa etnia e como tal, conclui-se que os Xerentes na velhice ocupam um lugar de destaque na sua
comunidade, pois continuam representando um importante papel.
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Editora Rona, 2012.
ISSN 2358-3959
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de Caarapó/MT, começou a estudar em 1961, com 10 anos de idade, na Escola Rural Mista da Colônia
Laranjal Café – Porã. Também compõe essa história o professor Luiz, hoje com 71 anos, teve sua
infância marcada pelo trabalho, fugia de casa para ir à escola, pedia aos adultos que lhe desse uma
cartilha, mas só pode frequentar uma escola aos 16 anos. O professor Venâncio estudou em
seminários católicos, gostava de estudar, mas não era compreendido pelos irmãos, que acreditavam
que o trabalho era mais importante. Os pais do professor Lídio foram migrantes. Saíram do interior
de São Paulo com a intenção de ir para o Paraná em busca de melhores condições de trabalho e
sustento para os seis filhos pequenos. Por motivos que ele não sabe explicar, acabaram chegando a
Dourados em 1956. Nessa época, o menino estava com seis anos de idade e ainda não tinha
frequentado escola. Depois de alguns anos de dificuldades, seu pai foi trabalhar em fazendas com
plantação de café e, aos 10 anos, Lídio era ajudante do pai na roça e da mãe nos cuidados com os
irmãos menores. A família resolveu mudar para Caarapó, município localizado no extremo sul de
Mato Grosso uno, e nas proximidades dessa nova fazenda havia uma escola. Surgia, então, a
oportunidade, tão esperada pelo menino, que tentava ler as cartilhas que o irmão mais velho trouxe
dos poucos anos que estudou em São Paulo. Outra lembrança, muito presente na narrativa do
professor Lídio sobre a época em que frequentava o ensino primário, é a dos castigos físicos
impingidos pelas professoras. O castigo físico, fez parte da educação de crianças. Na escola, o castigo
tinha duas funções de punição: reprimir o mau comportamento e combater a falta de aprendizagem.
Isso quer dizer que historicamente, o castigo já foi considerado um procedimento pedagógico
legítimo. Já na narrativa do professor, Luiz é marcante, a experiência do trabalho. Sabemos que
nossas concepções atuais questionam o trabalho da criança, porém a infância é mais que um período
biológico pelo qual todas as pessoas passam. É uma construção histórica e social determinada pela
organização da civilização. Assim, em muitos contextos sociais e econômicos, o trabalho infantil se
apresenta como alternativa para a família e para o sustento coletivo. Por sua vez, temos o professor
Venâncio, que vem de origem humilde e morou durante a infância com a família na cidade de Ribeirão
Claro, no norte do Paraná. A colonização da região norte do Paraná (de que também fazem parte as
cidades de Ribeirão Claro e de Maringá) se pautou na ideia de modernidade e a igreja católica
participou ativamente desse processo civilizador, especialmente considerando o movimento
migratório, pois as famílias atraídas, principalmente pelo desenvolvimento da cultura cafeeira. No
aspecto da formação escolar, uma das ações do primeiro bispo de Maringá, Dom Jaime Luiz Coelho,
foi a criação do Seminário Menor Diocesano, que, segundo o professor Venâncio, recebia crianças,
somente meninos, com vocação religiosa. A Igreja tem, em sua prática institucional e histórica,
buscou formar de meninos que, na grande maioria das vezes, acabavam vindos de populações
menos abastadas, foi nesse contexto Venâncio frequentou a escola. Com base nessas histórias da
infância, esta investigação possibilitou esclarecer trajetórias individuais e buscou contribuir para o
resultado da documentação produzida na escrita da história da educação regional de cidades do
interior do estado do Mato Grosso uno e, consequentemente, brasileira, caracterizada por um
compromisso com o processo de rememorar, com o qual a vida vai sendo revisitada pelo
indivíduo. Verificamos que estudar era um desejo para os professores que, desde muito pequenos,
precisavam trabalhar para ajudar na sobrevivência da família. Ir para a escola poderia significar uma
vida melhor e de possível rompimento com a pobreza e as condições adversas. Quando conseguiram
ir para a escola sentiram o sucesso e o fracasso, expressos na alegria de aprender a ler a cartilha e de
conseguir decorar a tabuada, mas também na tristeza de serem castigados por seus erros. Para esses
homens, nos guardados da infância está a superação de quem teve poucas oportunidades e
enfrentou a distância, a fome e a falta de condições adequadas ao estudo. Desta forma, os professores
Luiz, Venâncio e Lídio apresentam uma história coletiva que é também singular e universal, pois a
história de um grupo social é percebida de forma única por seus integrantes, o que lhes permite
vivências singulares. Ao mesmo tempo, essa trajetória individual possui elementos que se repetem
entre os componentes desse grupo. Assim, as vivências desses indivíduos compõem um contexto
maior, contexto que constitui parte da história de uma região.
ISSN 2358-3959
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Bianca Amorim
Este trabalho tem como objeto de estudo os jornais da chamada Imprensa Negra paulista, que
circularam na capital de São Paulo entre os anos 1889 e 1929. Estes periódicos, de publicação e
preservação bastante irregulares, retratam uma vida social rica destes sujeitos, mas também trazem
em suas páginas debates acerca do que é ser negro em São Paulo e no Brasil durante este período.
Nestes periódicos buscamos observar o papel atribuído à mulher negra tanto nas representações da
educação formal e sua importância dada pelos autores à escolarização como instrumento na busca
de igualdade racial e, também, a partir do conceito de experiência articulado por E. P. Thompson,
refletir sobre as formas como diferentes maneiras de ensinar e aprender também podem ocorrer
fora das escolas e de outros ambientes entendidos como espaços privilegiados para a transmissão
do conhecimento. E, nesta forma não-escolar de transmissão de conhecimento, compreender qual
o papel que os autores desta imprensa, em sua maioria homens, atribuem e idealizam para as
mulheres negras.
Durante este processo de pesquisa, dividimos nossa atenção entre as muitas séries de jornais
publicadas durante esse período, sendo elas: A Pátria (1889-1890), O Propugnador (1907), Menelik
(1915-1917), A Rua (1916), O Alfinete (1918-1921), O Bandeirante (1918-1919), A Liberdade (1919-
1920), O Xauter (1920), A Sentinella (1920), Kosmos (1922-1925), O Clarim d’Alvorada (1924-1929), Elite
(1924), Auriverde (1928), e O Progresso (1928-1929).
Estas séries guardam grande semelhança entre si, mas possuem linhas editoriais bastante
diferentes, embora em sua maioria circulassem em pelos espaços das mesmas sociedades recreativas
em diferentes momentos do recorte temporal. Algumas dessas folhas parecem ter conquistado mais
relevância para o público, já que sua publicação se estende ao longo dos anos, gerando séries com
números mais expressivos de exemplares e outras desaparecem nas primeiras edições. Contudo,
apenas podemos supor que o do fim das séries corresponda ao fim efetivo dos periódicos, já que há
enorme irregularidade na preservação das edições. Desta forma, os silêncios e grandes intervalos
temporais são uma peculiaridade que precisamos ter em mente ao pesquisar este material.
Os periódicos desta imprensa estão fortemente ligados à associações recreativas e à vida social
desses indivíduos, o que torna o comportamento em sociedade um dos grandes tópicos tratados
por esta imprensa, que busca corrigir os desvios dos padrões aceitáveis assim como estabelecer
exemplos a serem seguidos em público. Isso se dá principalmente em seções especialmente
voltadas para criticar os deslizes comportamentais cometidos nos salões e em público em pequenas
notas, ou através de colunas mais longas, geralmente escritas pelos editores das folhas, dedicadas
a uma questão comportamental específica. Através dessa relação de proximidade com a vida
social, os impressos também se tornam veículos destas sociedades recreativas para a publicização
de documentação produzida por estas, como balanços de caixa, chapas eleitas para diretoria, ou
expulsão e suspensão de membros. Além disso, realizam a divulgação de eventos futuros e ensaios.
Outra característica marcante dessas folhas é o espaço reservado para a publicação de produções
literárias, enviadas aos editores por seus leitores. As contribuições variam, sendo as mais comuns
sonetos e poemas, mas também encontramos contos de romance, descrições e mesmo um folhetim,
publicado ao longo de diversos números de um periódico. Menos frequente era a devolutiva das
contribuições, mas podemos encontrar em algumas folhas a resposta aos escritores sobre textos
ainda em análise; nesses espaços também encontramos notas chamando leitores e leitoras a darem
sua contribuição aos jornais, nos dando algumas informações sobre quem eram, afinal, esses
autores que contribuíram com esta imprensa.
A questão racial é tema de debate constante, seja sobre a existência de preconceito de raça, as
perspectivas para o futuro do negro brasileiro e, principalmente, a união e elevação da raça, esta
última, bandeira levantada por todos os jornais analisados. Neste denso debate, o discurso de não-
enfrentamento direto em questões de opressão racial é característica marcante dos periódicos
deste período: os editores defendiam sempre que deveriam conquistar a amizade e a simpatia dos
brancos, e não confrontá-los a respeito de comportamentos discriminatórios.
Parte expressiva desses periódicos se encontram disponíveis em hemerotecas digitais, facilitando
o acesso e trabalho de pesquisa,. Por outro lado, por questões de preservação do acervo, os
arquivos tendem a interditar o acesso aos documentos em papel, visando sua melhor preservação,
acarretando assim a perda de contato com a fonte em sua forma material. Esta restrição acarreta
algumas perdas de informações que poderiam ser acrescentadas pela forma física dos periódicos,
limitação que, embora não seja significativa precisa ser também considerada. Foram interrogados à
luz de questões pré definidas, que podem ser divididas em algumas categorias.
A primeira dessas categorias diz respeito aos aspectos físicos, produção e circulação , como
quantidade de páginas e diagramação; aspectos relacionados como precificação, seus editores
e, se possível encontrar a informação, quais tipografias os imprimem ao longo de seu período em
circulação. Outra categoria diz respeito às relações com as sociedades recreativas e outros periódicos
que circulavam nos mesmos espaços, levantando documentação produzida pelas sociedades e
divulgadas pelos jornais, e os jornais e sociedades mencionados. Por último, as questões referentes
às ações educativas adotadas e as representações da educação em relação com raça. A questão
de gênero não foi incluída nessas questões por não ter sido inicialmente os objetivos de nossas
interrogações. Contudo, sua forte presença nos fez revisitar as informações levantadas e perceber
que os jornais não só se voltavam aos debates da questão racial e da experiência do ser negro na
capital paulista no início da República, como essas questões se interligavam com outras, referentes
às expectativas relacionadas ao papel social da mulher nesse momento, nos obrigando a considerar
não apenas a categoria raça, mas também suas intersecções de gênero.
Os resultados obtidos até o momento têm nos apontado direções interessantes. A primeira delas
é que, embora alguns colegas tenham apontado para a ausência feminina das páginas da imprensa
negra até meados da década de 20, momento em que se considera que os jornais tenham se tornado
mais políticos e reivindicativo, há indícios de colaborações femininas em folhas anteriores, mesmo
que escassos. Também encontramos menções, por estas folhas, de mulheres estudantes normalistas,
indícios de que exerciam o cargo de professoras. Em alguns momentos, há a sobreposição de
mulheres normalistas e mulheres autoras. Contudo, estes dados ainda são raros em meio ao volume
de exemplares tratados.
É mais comum nos depararmos com normatizações sobre o comportamento feminino por parte
dos autores homens o que, em um primeiro momento parece apenas a reprodução dos ideais
dominantes. Porém, a partir de discussões levantadas por Paulina Alberto e Cláudia Pons Cardoso,
observamos que as questões de gênero levantadas nas páginas desta imprensa são mais complexas
do que o simples desejo de imitar o comportamento ideal dos brancos. Todavia, é preciso observar
que o machismo reproduzido pelos jornais, ao apregoar que o papel ideal feminino é em posição
de submissão se articula de maneira compensatória a mecanismos de opressão racial, ou seja, seu
objetivo é compensar aos olhos dos possíveis leitores brancos, os estereótipos sociais negativos
atribuídos aos negros. Estereótipos esses que não atingem apenas aos autores homens, mas
também às mulheres sobre quem escrevem, vigiando o comportamento e descrevendo maneiras
ideais de ser e agir.
Desta forma, ao buscarmos por mulheres nesta imprensa, encontramos poucos, mas interessantes
textos escritos por autoras femininas. Contudo, não podemos descartar a importância dos escritos
dos autores homens sobre as mulheres e as expectativas que lhes recaem nos papéis que lhes são
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 851
atribuídos. Ao tentarem educar as leitoras para comportamentos ideias, esses autores não estavam
apenas estavam reproduzindo o sistema de opressão no qual estavam inseridos: estavam buscando
subvertê-lo demonstrando serem capazes não só de aprender os valores comportamentais mais
estimados na sociedade, como também eram capazes de exibi-los de forma exemplar no exercício
de sua vida social, de maneira condizente com a opção pelo não confronto direto defendido pelas
linhas editoriais dos periódicos.
ISSN 2358-3959
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Referências
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LOPES, E. M. T.; GALVÃO, A. M. de O. [o que você precisa saber sobre...] História da educação. Rio de
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Esse estudo propõe uma discussão acerca do eixo Relações de Gênero, Geração, Etnia, Classe
Social, com base nos autores: Moysés Kuhlmann Jr (2000,2015), Carmem Silva Vidigal de Moraes
(2005), Sérgio César da Fonseca (2017) e Felipe Ziotti Narita (2017), mediante o estudo de algumas
obras que tratam da temática. Trata-se de analisar informações referentes a memória de duas
instituições do final do século XIX e no início do século XX no Estado de São Paulo que tiveram
destaques por ter em sua essência características assistencialistas e enfrentar as desigualdades que
permeavam naquele período. No regulamento apresentam como objetivo promover a educação
intelectual e profissional de meninos pobres e combater as desigualdades sociais, mediante as
propostas institucionais e qual a educação que permeava para as crianças. O Instituto Dona Anna
Rosa, inaugurado no final do século XIX, no ano de 1874, na cidade de São Paulo e o Instituto
Dona Escolástica Rosa, na cidade de Santos, cidade portuária e balneária no estado de São Paulo,
inaugurado no início do século XX em janeiro de 1908.
Ao tratar da história da educação infantil, Kuhlmann Jr (2015, p.69) considera que “as instituições
têm sido classificadas como educacionais ou não a partir da identificação de origens diferentes
das propostas. É um raciocínio que parte de um ponto de vista interno a cada uma delas e não as
situando dentro da história”. Ou seja, não é porque se constituíram como destinadas aos pobres,
com intenções assistenciais, que elas deixariam de ser educacionais: é característica das políticas
assistenciais desse período a proposição de instituições educativas, situadas à parte do sistema
de ensino. No caso da educação profissional de crianças pobres, a sua história é analisada como
caracterizando um dualismo educacional, que estabelece uma trajetória distinta daquela percorrida
pelas crianças que frequentavam a escola regular e que poderiam seguir a sua formação até o ensino
superior. No caso das instituições pesquisadas, cabe destacar que a sua criação não ocorreu através
de uma iniciativa estatal, mas particular, vinculada à dotação testamentária de dois indivíduos, Anna
Rosa de Araújo, em São Paulo, e João Octávio dos Santos, na cidade de Santos, SP. Esta característica
é um aspecto importante a ser considerado nas análises que serão realizadas.
Tratando-se do Instituto D. Anna Rosa, Sociedade Protetora da Infância Desvalida, Fonseca (2017)
pesquisou essa instituição e considera que deve-se em atendimento à herança de D. Anna Rosa
de Araújo, abrigando primeiramente 62 alunos, com aulas de leitura, escrita, gramática da língua
nacional, as quatro operações de aritmética, sistema métrico de pesos e medidas e noções muito
gerais de matérias úteis aos ofícios e artes. Como executor do testamento, Francisco Antônio de Souza
Queirós, o Barão de Souza Queirós. Com o nome da sua benfeitora é uma das primeiras instituições
de ensino profissional da cidade de São Paulo com o objetivo de enfrentar as desigualdades sociais
daquele período, criado para ser tanto orfanato quanto escola profissional, possível em razão do
dote legado por D. Anna Rosa. Possuía várias oficinas e projetava a instalação de outras. Até 1889,
ministrou ensino a 629 alunos. Mantinha oficinas de ferreiro e serralheiro, carpintaria e litografia,
cordas de algodão e sacos de papel, alfaiataria, sapataria, funilaria, carpintaria, pedreiros, pintores e
maquinistas. Os alunos encontravam boa colocação, quando saíam do Instituto. Entre seus internos
constavam órfãos e meninos com família que passariam pelos menos quatro anos na instituição,
conforme estipulado pelo regimento, tendo seus estudos e formação seguindo o programa escolar
e instrutivo do Instituto, que compreendiam conteúdo das disciplinas escolares, bem como o
encaminhamento dos internos para as oficinas.
Inaugurado em 1908, o Instituto Dona Escolástica Rosa, escola destinada à educação intelectual
e profissional de meninos pobres em Santos, cidade portuária e balneária no estado de São
Paulo, Brasil, em atendimento ao legado do testamento de João Octávio dos Santos, um próspero
comerciante, nascido em 1830 em Santos, filho do conselheiro João Otávio Nébias e da escrava
Escolástica Rosa, que recebeu do seu pai o apoio necessário nos estudos para adentrar ao mundo
dos negócios. Preocupado com o alto índice de orfandade na cidade de Santos, no final do século
XIX, João Octávio dos Santos resolveu planejar um instituto para atender a infância desvalida
daquela época, destinada a meninos pobres e órfãos, sem distinção de nacionalidade, em regime de
internato. João Octávio desejou que, no mesmo espaço, os meninos recebessem instrução escolar
e profissional necessárias para uma vida digna e igualdade social. Tinha como objetivo abrigar e
fornecer formação profissional ao menor carente, oferecendo instrução primária, religiosa e moral:
em princípios elementares das ciências que os habilitassem para exercerem artes e ofícios, em
uma época em que a assistência social se restringia ao alívio dos males, a educação começava a se
estabelecer e a atuação do poder público era pouco expressiva (CONCEIÇÃO, 1908).
O instituto Dona Escolástica Rosa foi construído seguindo rígidos critérios de higiene escolar e foi
projetado pelo arquiteto Ramos de Azevedo, que dirigiu escritório responsável pela construção de
vários monumentos republicanos no estado de São Paulo, assim como a Escola Normal, fundada em
1846, inicialmente frequentada apenas por alunos do sexo masculino como também o Instituto Dona
Anna Rosa. No primeiro regulamento do Instituto Dona Escolástica Rosa, de 1907, foram definidas
orientações sobre o perfil e atribuições dos docentes e funcionários e as normas pedagógicas, em
princípios elementares das ciências que os habilitassem para exercerem artes e ofícios. Dividido em
quatro séries: a primeira o ensino de leitura e caligrafia; a segunda o de leitura corrente, caligrafia
e primeiras noções de cálculo; a terceira de análise elementar, operações com números inteiros,
frações ordinárias e decimais; a quarta compreendia a análise gramatical e lógica, sistema métrico
decimal, proporções, noções gerais de geografia, geografia do Brasil, educação cívica e catecismo.
Os alunos residiam no Instituto e permaneciam por quatro anos, podendo esse período ser
expandido caso o aluno não conseguisse habilitar-se, tivesse boa conduta e manifestado vocação
escolar ou artística. O instituto Dona Escolástica Rosa manteve esses moldes no período de 1908 até
1933, quando foi feito um convênio com o governo do estado, que assumiu a escola com alterações
significativas na proposta pedagógica (CONCEIÇÃO, 1908). Enquanto o Instituto Dona Anna Rosa,
é até os dias atuais administrado pela quinta geração dos descendentes do fundador, oferecendo
atendimento totalmente gratuito, desde a creche até oficinas de iniciação profissional.
“Carmem Silva Vidigal de Moraes”, no artigo “Educação, formação profissional e certificação de
conhecimentos: considerações sobre uma política pública de certificação profissional”, apresenta
elementos para combater as desigualdades, para isso, examina a educação e a formação profissional
que constituem algumas das principais medidas destinadas. Em um primeiro momento, a relação
entre educação e trabalho, formação e emprego está longe de ser explicada por relações causais, de
ordem individual. Nessa perspectiva, tanto o acesso ao trabalho como o acesso à educação escolar e
à formação profissional constituem direitos sociais. A geração de emprego e a expansão qualitativa
e quantitativa da educação apresentam-se como exigências para a ampliação dos direitos de
cidadania, combate à desigualdade e como pressuposto à implantação e consolidação do processo
democrático (MORAES, P. 11).
Será realizado pesquisa bibliográfica em livros, dissertações, artigos e análise documental. Serão
considerados aspectos relacionados ao contexto histórico das instituições citadas e às desigualdades
e políticas sociais que permeavam o período da pesquisa - final do século XIX e início do século XX.
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Referências
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ISSN 2358-3959
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GÊNERO E RELIGIÃO:
O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DO
CONSERVADORISMO POLÍTICO NO BRASIL
O presente trabalho apresenta uma proposta de discussão face à contraofensiva advinda das
forças conservadoras e religiosas em decorrência dos estudos de gênero, que se desenvolveram
mediante a luta histórica dos movimentos feministas, a partir da década de 1970 e persiste até os
dias atuais.
Consiste em uma pesquisa documental, trabalhou-se com a revisão bibliográfica, documentos
oficiais, notícias e demais documentos divulgados pela imprensa e representantes da sociedade
civil.
Em decorrência dos estudos feministas introduzidos na década de 1970, o conceito de gênero
passou por uma reelaboração, pois entendeu-se naquele momento histórico que o termo deveria
ser ampliado para além do binário masculino e feminino, por não se demonstrar mais suficiente
para abranger a diversidade que despontava no meio social, principalmente após a IV Conferência
Mundial da Organização das Nações Unidas sobre a Mulher, realizada em setembro de 1995 em
Pequim na China.
Diante desta nova “perspectiva de gênero” a Igreja Católica apresentou uma contraofensiva, “com
vistas a reafirmar a doutrina católica e reiterar a naturalização da ordem social e moral” (JUNQUEIRA,
2018, p. 463), sendo que em 1998, na Conferência Episcopal do Peru, surge a primeira referência ao
termo “ideologia de gênero.
Conforme esse entendimento, os teóricos voltados a combater a então criada “ideologia de
gênero” passam a subverter conceitos essenciais desenvolvidos nas pesquisas voltadas aos estudos
de gênero, frutos de uma complexa discussão entre ativismo e academia, de forma a incitar uma
suposta aliança conspiratória dos estudiosos de gênero.
Para esta corrente doutrinária, gênero passa a ser enquadrado como uma nova ideologia
de esquerda, uma conspiração global, na qual elites corruptas estariam unidas com a finalidade
de eliminar a base da estrutura familiar e minar os princípios democráticos, objetivando a
implementação do Marxismo na sociedade através de revolução cultural.
Desta forma, a “ideologia de gênero” teve sua origem na igreja católica, protagonista naquele
momento histórico de um movimento reacionário diante das conquistas advindas da luta dos
movimentos feministas e liberais.
No Brasil, a religião católica sempre ocupou um espaço importante no cenário político desde a
sua colonização, devido a incumbência que lhe foi atribuída em difundir o cristianismo para as novas
terras. Durante um longo período o monopólio católico se consolidou na sociedade brasileira:
No caso brasileiro, as religiosidades cristãs nunca sofreram restrições em sua atuação em razão do
regime político do Estado. A Igreja Católica, e portanto, o cristianismo, foi historicamente favorecida
desde a chegada da coroa portuguesa em terras brasileiras [...] só quando se oficializou a separação
entre Igreja e Estado, em 1891, na carta magna republicana, que se pôs fim ao monopólio católico e
permitiu a liberdade religiosa para outros cultos (VENCATO; SILVA; ALVARENGA, 2018, p. 590)
Mesmo com a separação entre a Igreja e o Estado, os privilégios concedidos para a Igreja Católica
perduraram durante toda segunda metade do século XX, consolidando a presença do setor religioso
na esfera pública brasileira.
A partir da década de 1990, com a consequente redemocratização pós-ditadura militar, a
Igreja Católica adotou uma posição política mais conservadora, afastando-se da esquerda e se
aproximando dos evangélicos neopentecostais, enquanto os movimentos sociais feministas e LGBT
ganhavam força e se aproximaram do Estado, principalmente durante os governos liderados por
partidos de esquerda.
A partir dos primeiros anos da década de 2000 essa conjuntura toma forma, tendo em vista que,
enquanto os movimentos sociais passaram a contar com a presença do Estado, face à promulgação da
Constituição Federal de 1988, o que permitiu uma abertura para as pautas ligadas à gênero e direitos
da população LGBTQI+, a igreja católica consolidou uma política conservadora em sentido contrário,
firmando alianças esporádicas com políticos evangélicos que naquele momento ascendiam numa
articulação conservadora no cenário político brasileiro.
Devido ao conservadorismo crescente, o executivo Federal tomou para perto as demandas dos
movimentos ligados a sexualidade, dando visibilidade às pautas da sociedade civil, materializados
por meio dos movimentos sociais feministas e LGBTQI+. Esta visibilidade proporcionou um cenário
positivo na conquista de novos direitos alcançados através do Poder Judiciário.
A partir de 2011, o Supremo Tribunal Federal ratificou algumas conquistas advindas da luta
da sociedade civil e movimentos sociais que trabalham na defesa da diversidade, dentre elas
o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo no mesmo patamar do casamento
heterossexual (BRASIL, 2011), o que intensificou a contraofensiva dos atores religioso e sociais
daquele momento histórico, representados em maior parte pelo setor evangélico neopentecostal
que ganhava força no Executivo Federal.
Embora a decisão tenha representado uma conquista que refletiu a luta histórica dos movimentos
sociais e a consolidação de direitos humanos fundamentais, diante do longo trajeto de exclusão e
invisibilidade dos grupos socialmente marginalizados, ocorreu um movimento contrário do setor
conservador da sociedade, de forte cunho religioso e bastante organizado.
Religião e política, embora se apresentem em espaços distintos na vida social, passaram a se
relacionar, formando a base do discurso conservador. A religião que passou a pautar a agenda
política e trouxe em seu conteúdo diretrizes incapazes de questionamentos, por advirem de uma
fonte superior e mística.
Trata-se de um movimento que demonstrou a inserção da suposta “ideologia de gênero” na
agenda política conservadora, com forte tendência religiosa e com vistas a difundir por meio de
valores morais, uma contraditória proposta que tem como pano de fundo garantir os interesses
neoliberais do Estado Capitalista.
O termo atualmente se tornou o principal argumento do discurso religioso conservador, que
passou a utilizar o sintagma ideologia de gênero como principal argumento ideológico, mascarado
por uma política perversa e excludente, que utiliza de valores morais religiosos para segregar os que
não se enquadram na concepção tida como ideal, aqueles que não são interessantes para o sistema
capitalista na atualidade.
A atual conjuntura político-religiosa materializa-se em seu viés conservador mediante a
crescente atuação de religiosos na esfera política, advindos em sua maior parte do setor evangélico,
representantes de uma parcela da população que ascendeu demograficamente a partir da década
de 2000 e consolidou sua presença no Legislativo e Executivo federal.
Com a inserção dos evangélicos pentecostais no cenário político nacional, a partir dos anos
2000 e com a criação da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) em 2003, o sintagma “ideologia de
gênero” adentra no legislativo enquanto ideologia conservadora, e toma força principalmente após
as decisões liberais do Supremo Tribunal Federal em 2011 (BRASIL, 2011).
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 863
Referências
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Brasília: Supremo Tribunal Federal, 2011. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/
verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931. Acesso em 19 jul. 2019.
VENCATO, Anna Paula; SILVA, Rafaela Lacerda da; ALVARENGA, Rodrigo Lessa. A educação e o
presente instável: repercussões da categoria “ideologia de gênero” na construção do respeito às
diferenças. Psicologia Política. Vol. 18, n. 43, pp. 587-598. Set. – Dez. 2018.
ISSN 2358-3959
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“Uma criança logicamente é o futuro do país! Queira ou não, uma criança bem-educada vai ser uma
cidadã bem-educada”. (Giuseppe, entrevistado 2002). A epígrafe nos remete a ideia de que as crianças
no período da infância são concebidas como as perspectivas de formação e continuidade geracional em
todos os grupos humanos. Assim, nesse período da infância – em torno de 12 anos, segundo o Estatuto
da Criança e do Adolescente- elas deveriam aprender conhecimentos que as transformem em indivíduos
funcionais para o seu grupo social. Na perspectiva do nosso entrevistado as crianças são o futuro e a
responsabilidade tanto na educação como na formação das gerações que tem como dever apoiar e
apontar os modelos sociais mais adequados, para que ela siga e se torne essa cidadã bem-educada. Tal
perspectiva nos leva a refletir com Norbert Elias quando ele aponta que: “no curso de um processo
civilizador individual, o potencial é atualizado segundo a medida e o modelo de regulação dos afetos e
pulsões à maneira que a sociedade os desenvolveu e os prescreve. Assim, da criança “incivilizada” vai se
fazendo um adulto mais ou menos “civilizado”. Quanto mais complexa e diferenciada vai se tornando a
sociedade dos adultos, mais prolongado e complexo se torna o processo de transformação civilizatória
de cada indivíduo” (ELIAS, 2012, p 483). Deste modo, a maior dificuldade a ser desenvolvida nesse curto
período da infância seria fazer com que um indivíduo que vem ao mundo munido biologicamente de
recursos que lhe conferem ser parte da espécie humana e transformá-lo em um ser sociável, funcional,
um ser humano socialmente aceitável e capaz de conviver no grupo do qual ele faz parte, obedecendo
normas, prescrições, comportamentos e participando de processos e mudanças sociais e civilizadoras.
Tal formação se inicia desde que o indivíduo nasce ficando sujeito aos grupos sociais que o rodeia, à
princípio a família e, posteriormente as instituições, (escola, igreja, clube, agremiações, associações,
partidos etc.). Com as crianças algumas dessas instituições são fundamentais na composição da sua
formação como exemplo a escola. De qualquer modo, em ambos os espaços família ou escola, a
educação das crianças é marcada por relações de interdependência e poder entre elas e os adultos. No
âmbito da família os pais e na escola os/as docentes, serão os indivíduos que desenvolveram relações
de interdependência com as pessoas a sua volta e, também, manipularam o poder assegurado em
ambos os grupos nessa configuração. Deste modo, teoricamente poderíamos dizer que forjar um
comportamento civilizado nas crianças seria socialmente dever de pais no âmbito das relações privadas
e familiares e, dos professores/as no âmbito público escolar onde a obediência, a adequação às normas
e aos padrões impostos seria o resultado social esperado. No entanto, o processo é muito mais complexo
e demanda uma reflexão que nos permite a partir dos pressupostos eliasianos. Assim nosso objetivo
neste recorte, de uma pesquisa mais ampla, é explicitar de que modo se dão as relações de
interdependência e poder entre adultos e crianças considerando a partir das teorias de Elias, os modos
e os comportamentos nas relações de interdependência e poder estabelecida nos seus grupos de
convivência. Faremos a partir de um material empírico composto pela memória de um grupo de
entrevistados adultos/idosos que passaram pela infância e expressaram suas percepções sobre a
relação estabelecida com as crianças considerando três gerações. Investigamos primeiro a percepção
sobre a sua própria infância. Segundo a percepção sobre a infância de filhos e filhas. Terceiro a percepção
sobre a infância de netos e netas. Compusemos uma documentação representada, por entrevistas feitas
com pessoas na faixa etária de 50 a 90 anos que viveram a infância e foram pais, avós ao longo do século
Este estudo traz livros infantojuvenis de três escritoras, analisando a representação das babás
em cada um deles. Os livros possuem longevidade, sendo publicados desde o século XIX e XX que
continuam sendo difundidos até o século XXI. Os livros têm meninas e jovens como protagonistas e
trazem uma perspectiva da aristocracia sobre como estas personagens deveriam se portar, uma vez
que em todos os livros apresentados, elas se mostram rebeldes e travessas. As babás estão sempre
presentes em diferentes situações, orientando e cuidando para que estas meninas e jovens sigam
por um caminho estabelecido como adequado.
As escritoras dos livros são a Condessa de Ségur, da França, Louisa May Alcott, dos Estados
Unidos e Maria Clarice Marinho Villac, do Brasil. Cada uma destas mulheres teve a possibilidade de
desenvolver a escrita no país e no lugar social em que viveu. Suas boas relações entre familiares e
pessoas conhecidas garantiram que pudessem se dedicar à escrita e buscar maneiras de imprimir
seus livros. A Condessa de Ségur nasceu na Rússia de uma família aristocrática e se tornou escritora
na França, quando já era avó e dedicava cada novo livro a um de seus 19 netos. Louisa May Alcott,
de uma família burguesa com ares aristocrásticos, nasceu em Germantown, nos Estados Unidos, e
morou nas cidades de Boston e Concord, criando um patrimônio financeiro para sua família por meio
de seu trabalho. Maria Clarice Marinho Villac nasceu em Itu, no estado de São Paulo, de uma família
aristocrática patriarcal, contava os acontecimentos de sua infância aos seus filhos e sobrinhos, que
sugeriram transformar estes relatos em livros. Sendo todas as escritoras de famílias abastadas e de
com um grande círculo de relações, puderam trazer aspectos importantes para a formo de meninas
e jovens a partir de suas perspectivas e de sua classe social.
Cada uma das escritoras, de diferentes lugares, retratam os empregados e especialmente as
babás, que são pessoas incumbidas de cuidar das crianças no interior da residência. A perspectiva
das autoras é de quem observa estas pessoas de longe e as descrevem sem precisar vivenciar sua
rotina. De seu lugar privilegiado, as escritoras puderam retratar os empregados em diversos de seus
livros. Para este estudo serão analisados os livros[1] Les petites Filles modèles[2] (1858), da Condessa
de Ségur, Little women[3] (1868), de Lousa May Alcott e Clarita da pá virada (1939), de Maria Clarice
Marinho Villac.
Les petites Filles modèles era publicada pela editora Hachette em Paris e seu ilustrador foi Bertall.
Já o livro Little women foi produzido pela Roberts Brothers em Boston e foi ilustrado por May Alcott,
irmã de Louisa May Alcott. Clarita da pá virada, por sua vez, teve sua publicação pela editora Revista
dos Tribunais na cidade de São Paulo. Quem ilustrou foi o caricaturista Manuel Romano, conhecido
como Manolo. Além destas primeiras edições, estes livros foram largamente difundidos, sendo que
os livros estrangeiros tiveram traduções para várias línguas.
Com as suas boas relações, cada uma das escritoras conseguiu maneiras de publicar seus livros.
As indicações de parentes se mostrou fundamental para que pudessem chegar a um editor que se
dispusesse a conhecer seu trabalho e imprimir seus livros. Os livros trazem a configuração familiar e
como as babás são representadas.
Esta representação está calcada em como a aristocracia enxerga o empregado, no caso, a babá, o
que significa que esta pessoa deve ser mulher e que se mostre obediente perante seus patrões. Roger
Chartier, historiador cultural, indica como a representação está presente no cotidiano: “A relação de
representação é assim turvada pela fragilidade da imaginação, que faz com que se tome o engodo
pela verdade, que considera os sinais visíveis como índices seguros de uma realidade que não existe.
Assim desviada, a representação transforma-se em máquina de fabricar respeito e submissão, em
um instrumento que produz uma imposição interiorizada, necessária lá onde falta o possível recurso
à força bruta. “ (CHARTIER, 2002b, p. 75)
Por meio dos livros dedicados a crianças e jovens, as escritoras trazem como cada personagem
deve se portar, inclusive os empregados, que trabalham e vivem na casa para garantir o bem-estar
de todos. Além do mais, esta representação é construída a partir da visão de um determinado grupo,
no caso, a aristocracia, que por meio desta representação, mantém os status quo. Neste sentido “As
percepções do social não são de forma alguma neutras: produzem estratégias e práticas (sociais,
escolares, políticas) que tendem a impor uma autoridade à custa de outros, por ela menosprezados,
a legitimar um projecto reformador ou a justificar, para os próprios indivíduos, suas escolhas e
condutas.”(CHARTIER, 2002a, p. 17)
Tais representações ainda são desejáveis no século XXI e este é um dos motivos da sua longevidade.
Ao analisar os três livros, a representação apresentada por Roger Chartier será importante para
compreender a representação de cada uma das personagens e, especialmente, das babás.
Os livros
No livro Les petites filles modèles há a formação de famílias que se unem, com duas mães que
são viúvas e suas filhas. Camille e Madeleine são filhas de Mme de Fleurville e Marguerite de Mme
de Rosbourg. A elas se unem a menina órfã Sophie, cuja madrasta deixa aos cuidados de Mme de
Fleurville e a babá Élisa.
Em Little women há a família March, formada pela Mrs. March e suas filhas Margareth, Josephine,
Elisabeth e Amy e a babá Hannah. O pai, Mr. March, por estar trabalhando como capelão durante a
Guerra de Secessão, está distante da família.
Já em Clarita da pá virada, a família é ampla, em que crianças convivem com seus pais, avós
maternos, tios e muito empregados na fazenda de café. É o avô materno o dono de várias propriedades
e que organiza a rotina da fazenda, junto com sua esposa, avó de Clarita.
Neste estudo serão apresentadas três situações em casa um dos livros, nas quais as babás
ganham destaque quando se trata de cuidar das crianças em momentos de perigo e de saúde. Em
cada um dos livros as babás se preocupam e se dedicam para que a criança/ jovem se recupere.
Pouco se sabe sobre as vivências destas empregadas, sabe-se que vivem na casa e realizam vários
trabalhos, como cozinhar, cuidar do jardim com as crianças, passear com elas e levar a medicação
necessária quando estão enfermas. As babás não deixam de sofrer uma relação abusiva dos patrões,
pais das crianças. Em todas as narrativas os empregados não possuem família e vivem na casa dos
patrões, à disposição deles e se espera obediência e subserviência por parte das babás, quanto para
as crianças e jovens.
Os empregados marcam a condição de um determinado grupo social, compondo a representação
da família que conta com seus serviços, entre os quais estão os cuidados com os seus filhos. As
narrativas das três escritoras apresentam os empregados como membros da família que mantêm
um vínculo com as crianças e jovens. A formação da criança com outros membros que auxiliam na
orientação e no cuidado, mostra-se mais ampla do que se fosse realizada somente com a presença
dos pais. Nota-se que são as babás que asseguram bem-estar das crianças, estando presentes o
tempo todo em diversas situações.
Neste trabalho é importante lançar um novo olhar sobre estas empregadas e perceber em que
medida elas são presentes na vida das crianças e jovens que cuidam. Este olhar precisa ser crítico,
pois as escritoras viam as babás como uma empregada necessária para cuidar dos filhos e esta
relação acaba sendo bastante autoritária e, por vezes, abusiva. As famílias aristocráticas necessitam
de todas estas pessoas para garantir o bom andamento das atividades da casa e, assim, as babás
deixam de se dedicar à própria família para cuidar dos filhos dos outros. Este desprendimento de sua
família para assegurar um trabalho em outra casa é o que as babás e outros empregados realizam e
que deve ser melhor analisado nas narrativas destas três escritoras.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 868
A representação destas personagens dos livros precisa ser estudada e compreender em que medida
continua presente na atualidade, uma vez que a reimpressão destas obras aponta a necessidade de
garantir que estes símbolos permaneçam e se perpetuem, seja no que se refere a meninas e jovens
mais contidas e obedientes, seja pela submissão dos empregados e, especialmente, as babás.
Referências
ALCOTT, Louisa May. Little women: or Meg, Jo, Beth and Amy. Boston (EUA): Roberts Brothers, 1880,
Disponível em: <https://babel.hathitrust.org/cgi/pt?id=mdp.39015004168533;view=1up;seq=9>,
acessado em 12 de dezembro de 2015;
CHARTIER, Roger. “Capítulo IV: Textos, impressos, leituras”. In: A História cultural: entre práticas e
representações. Lisboa (Portugal): DIFEL, 2002a;
____________________. À beira da falésia: entre incertezas e inquietude. Porto Alegre (RS): Editora
Universidade. 2002b;
COMTESSE DE SÉGUR. Les petites filles modèles. Hachette, 1858, Disponível em: <http://gallica.bnf.
fr/ark:/12148/bpt6k6513581s>, acessado em 25 de novembro de 2015;
VIOLETA MARIA. (Maria Clarice Marinho Villac). Clarita da pá virada, São Paulo: “Revista dos
Tribunais”, 1939[4].
Este estudo tem a intenção de compreender a relevância dos contos populares para a formação das
crianças, considerando a importância das pesquisas de Luís da Câmara Cascudo para a valorização
desse gênero. Será analisada a trajetória do autor e alguns de seus livros, especialmente no que se
refere à literatura popular. Considera-se que os Contos Orais remetem à memória daqueles que
contam e dos seus ouvintes, os quais contribuem e participam desses momentos, colaborando para
a construção da afetividade e pertencimento cultural.
Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) pertencia a uma família tradicional de Rio Grande do Norte,
que tinha condições financeiras, como a maioria dos intelectuais do Brasil nascidos no século XIX.
Por viver nesse contexto, Cascudo foi inserido em situações que contribuíram para sua formação
Intelectual: educação de qualidade, contato com diversos livros, inclusive estrangeiros, professores
particulares mantidos pelo seu pai, Coronel da Guarda Nacional, Francisco Cascudo. (LIMA, 2008)
A produção intelectual de Câmara Cascudo iniciou-se em 1918, quando houve a sua primeira
publicação no Jornal A Imprensa - sendo seu pai o proprietário – em que ele faz uma crítica literária,
com o título: “Bric a Brac”. Em relação ao percurso de Câmara Cascudo, Lima (2008), relata:
A literatura seria, portanto, uma motivação inicial para a tarefa que Cascudo incumbira para si:
ser um homem das letras, o que, enfim, se concretiza através da decisão de abandonar a faculdade
de medicina para ingressar na faculdade de direito, dessa vez no Recife, saindo do Rio de Janeiro,
onde estava estudando havia três anos, pois abandonara a Faculdade da Bahia no primeiro ano para
se transferir para o Rio. Portanto, o ano de 1922 marca o retorno de Câmara Cascudo ao nordeste
brasileiro. (LIMA, 2008, p. 172)
Nesta época, Cascudo estava atento aos acontecimentos que ocorriam no Brasil, como a
“manifestação na semana da arte Moderna de 1922” (LIMA, 2008, p; 175). Cascudo, do Rio Grande do
Norte, acompanhava essas transformações e mantinha correspondência com outros intelectuais,
como Mário de Andrade.
Ao mesmo tempo, Câmara Cascudo era adepto ao movimento integralista, um partido que foi
fundado em 1930, tendo grande influência das práticas fascistas que ocorriam na Europa, após o
fim da primeira Guerra Mundial. O integralismo foi um movimento de extrema direita e conservador.
Lima (2008) considera que o envolvimento de Cascudo neste movimento não teria relação com o
interesse de sua pesquisa sobre os temas folclore e cultura popular brasileira, e acrescenta:
Da análise de suas obras, é possível defender a hipótese de que ocorreu exatamente o contrário:
foi o seu interesse pela cultura brasileira – os costumes, as lendas e tradições do Brasil, temas que
eram parte do discurso do integralismo – que o levou a se aproximar desse movimento, como, aliás,
ocorreu com muitos outros intelectuais que fizeram essa opção claramente pelo interesse cultural
que o integralismo despertava. (LIMA, 2008, 177)
Margarida de Souza Neves (2005, p.5), por outro lado, considera que, na leitura de suas obras é
possível “encontrar pistas da peculiar conjugação entre o desejo de ser moderno e o conservadorismo
levado às raias de um filo-fascismo que é próprio de uma linhagem de pensadores brasileiros”.
Considerado um dos maiores folcloristas do Brasil, Câmara Cascudo dedicou suas pesquisas
à cultura e o folclore brasileiro. Quando se pesquisa sobre esses temas, em bancos de teses e
dissertações, Cascudo é uma das principais referências, pois possibilita ao pesquisador por meio
das suas obras, compreender o contexto social brasileiro e a relevância da diversidade cultural por
meio dos contos populares.
Ao perceber este vasto campo sobre a literatura popular, é importante que se possa entender a
diferença que existe entre ela e a dita “literatura oficial”. A última obedece a ritos e padrões escolares,
pois é uma expressão de ações pensadas e repensadas por pessoas estudadas e intelectuais,
enquanto a primeira tem como ponto forte a espontaneidade do povo, que estão relacionadas a
regionalidade, tradições culturais, festas e crenças populares:
A literatura oral é como se não existisse. Ao lado daquele mundo de clássicos, românticos,
naturalistas, independentes, digladiando-se, discutindo, cientes da atenção fixa do auditório, outra
literatura, sem nome em sua antiguidade, viva e sonora, alimentada pelas fontes perpétuas da
imaginação, colaboradora da criação primitiva, com seus gêneros, espécies, finalidades, vibração e
movimento, continua, rumorosa e eterna, ignorada e teimosa, como rio na solidão, e cachoeira no
meio do mato. (CASCUDO, 1984, p.27).
É relevante destacar que a literatura oral e popular pode ser valorizada e considerada importante
na sociedade, pois estabelece relações direta com o povo, aquele que recita em voz alta em diferentes
lugares da cidade ou nas fazendas, possibilitando a criação de vínculos entre aquele que conta e
aquele que ouve as histórias, considerando a oralidade uma expressão poderosa.
Nesta pesquisa, por meio de uma perspectiva histórica, a intenção é analisar os escritos de Luís
da Câmara Cascudo, considerando a importância da literatura popular no Brasil e as suas relações
com a questão da identidade regional. Dentre as 192 obras, que abrangem a cultura popular, folclore
brasileiro, crenças populares e religiosas, antologias das comidas brasileiras, entre outros temas,
serão selecionadas três obras relacionadas à literatura popular: Lendas brasileiras (2011); Contos
tradicionais do Brasil (2001); e Literatura oral no Brasil (1984).
Lendas brasileiras foi publicado em sua primeira edição em 1945, Cascudo reuniu 21 lendas, sendo
organizado de acordo com a origem, trazendo referências das cinco regiões do Brasil, relatando as
lendas que perderam a sua origem com o tempo. Este livro objetiva compartilhar diferentes histórias
populares, de diversas culturas.
No livro, Contos Tradicionais do Brasil (2001), escrito por Cascudo, sendo publicado pela primeira
vez em 1946, demonstra preocupação com os contos orais brasileiros e decide recolher contos
regionais, a grande maioria de seu estado, buscando narrativas de pessoas populares que por meio
da memória, transmitiam histórias que sobreviveram à peneira do tempo. Neste livro, Cascudo reúne
100 contos populares, divididos em doze categorias: encantamento; exemplo; animais; facécias;
religiosos; etiológicos; demônio logrado; adivinhação; natureza denunciante; acumulativos; ciclo da
morte e tradição. Os contos possibilitam que os leitores se aproximem da cultura popular:
[...] pareceu lógico, porque esses cem contos estão vivos, trazidos de geração em geração, na
oralidade popular. Alguns, retirados de coleções impressas, com as precisas indicações bibliográficas,
pertencem fielmente à mesma estirpe (CASCUDO, 2001, p. 12-13)
Além dos contos recolhidos neste livro, Cascudo (2001), trazia mais informações e características
dos contos nas notas de rodapé, sobre local, as variantes do mesmo conto, influências de contos
europeus e dentre outras localidades, possibilitando ao leitor e ouvinte a compreensão e valorização
da cultura popular.
No livro, A Literatura oral no Brasil, diferente das outras duas obras que foram referidas
anteriormente, faz-se uma pesquisa minuciosa, com ideias e reflexões de Cascudo sobre a literatura
oral, fontes e o folclore brasileiro, em relação a esta obra, Cascudo (1984), relata:
“Literatura Oral” terminou-se em março de 1949 e foi impressa em junho de 1952. Texto vagaroso,
feito e refeito como renda de almofada, atendia ao plano de informação e não “exibição” da Cultura
Popular, para mim, é tradução verídica e única do britânico “Folk-lore”. (CASCUDO, 1984, p. 11)
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 871
Neste contexto, ao compreender que os três livros a serem analisados e relatados nesta pesquisa
foram publicados por Cascudo em 1945-1952, em sua primeira edição, a periodização desta pesquisa
focaliza especialmente esses sete anos em que Cascudo dedicou-se à Literatura popular.
Desenvolveremos pesquisas bibliográficas em livros escritos por Cascudo, livros sobre o autor,
periódicos, dissertações e teses, imagens iconográficas, análises de documentos disponibilizados
no LUDOVICUS - Instituto Câmara Cascudo -, para compreender e apresentar o histórico sobre a
literatura popular brasileira, a trajetória da literatura de cordel e as contribuições para a construção
da identidade e para a utilização em espaços escolares. Além de utilizar os estudos disponibilizados
no site “Memória Viva”.
Referências
CASCUDO, Luís Câmara Cascudo. Contos Tradicionais do Brasil. 10 ed. São Paulo: Global, 2001.
CASCUDO, Luís Câmara Cascudo. Literatura oral no Brasil. 3. ed. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo:
Ed. Da Universidade de São Paulo, 1984.
CASCUDO, Luís Câmara Cascudo. Lendas Brasileiras. 13 ed. São Paulo: Global, 2011.
LIMA, Matheus Silveira. Percurso intelectual de Luís da Câmara Cascudo: modernismo, folclore e
antropologia. Perspectivas, São Paulo, v. 34, p. 173 - 192, jul./dez., 2008.
NEVES, Margarida de Souza. Viajando o sertão: Luiz da Câmara Cascudo e o solo da tradição. In:
CHALOUB, S.; NEVES, M. S.; PEREIRA, L. A. M. (orgs.). História em cousas miúdas: capítulos de história
social da crônica no Brasil. Campinas, SP: Editora da Unicamp, p.239-264.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
MEMÓRIAS DE VELHOS:
MÚSICA E DANÇA NA UMA & UNITINS
Este trabalho objetiva mostrar as melhorias advindas da música e da dança para o velhos da
Universidade da Maturidade(UMA) – Campus/UFT e da UNITINS – Campus Araguatins. Cantar,
dançar significa muito para os velhos da Universidade da Maturidade e da Unitins. Proporcionar aos
velhos a possibilidade de experimentar, compreender as habilidades essenciais para a formação
profissional do velho.
Em função da melhoria da qualidade de vida que está relacionada a diversos fatores tais como:
controle de doenças crônicas através de exames periódicos e medicamentos adequados; consciência
da necessidade de alimentação balanceada atividade física constante, não ao álcool, ao fumo, noites
tranquilas de sono, relações interpessoais de qualidade, amizade, o dançar o cantar etc...
Através da dança os velhos tem adesão à prática de atividades físicas passando de sedentário
a ativo. Pois, além de ter benefícios psicológicos e sociais, melhora as capacidades físicas como: o
equilíbrio, flexibilidade e agilidade. Benefício físico mental e emocional.
São vários os benefícios da música para os velhos, dentre eles podemos citar, a liberação de
endorfina, substâncias que são liberadas pelo organismo, responsáveis pela felicidade e prazer.
Melhoram o humor e a ansiedade, fazendo o velho se sentir mais feliz, evitando assim a depressão.
A música diminui a dor, aumenta a socialização e estimula o cérebro trazendo alegrias ao tempo
presente.
A pesquisa foi fundamentada nas concepções de Simone de Beauvoir (1976), que contextualiza
a velhice, a inclusão social do idoso por meio de ações que permitam novas relações sociais e sua
inclusão na sociedade atual, podendo assim refletir sobre o lugar do idoso e a possibilidade de
entender-se como sujeito dos seus atos. O cantar e dançar empodera o velho.
Beauvoir (1976, p. 13) destaca que o primeiro texto que se tem conhecimento acerca do
envelhecimento data de 2.500 a. C. e foi escrito por um filósofo egípcio. Trata-se da decrepitude física
advinda da velhice. Aponta-se que, apesar das diferentes sociedades terem atribuído, ao longo dos
séculos, vários sentidos à velhice, o declínio orgânico é recorrente e aparece em vários momentos da
história da humanidade. Para a autora, nos relatos bíblicos, em que revelavam os princípios do povo
judeu (século IX), a velhice era retratada como uma benção, sendo os homens velhos aquela figura
que merecia respeito. Na Palestina, o homem mais velho poderia governar enquanto sua saúde era
boa. Hoje, a concepção de velhice é totalmente diferente.
A velhice não é um fato estático, é o resultado e o prolongamento de um processo. Em que consiste
este processo? Em outras palavras, o que é envelhecer? Esta ideia está ligada à ideia de mudança.
Mas, a vida do embrião, do recém-nascido da criança, é uma mudança contínua. Caberia concluir
daí, como fizeram alguns, que nossa existência é uma morte lenta? É evidente que não. Semelhante
paradoxo desconhece a verdade essencial da vida: ela é um sistema instável no qual se prende e se
reconquista o equilíbrio a cada instante; a inércia é que é o sinônimo da morte. A lei da vida é mudar
(BEAUVOIR, 1976, p. 17).
Realizou-se pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo para consecução deste trabalho. A
investigação de natureza qualitativa teve como preocupação o significado particular atribuído pelos
próprios protagonistas aos fatos investigados, a análise de valores e princípios, a classificação de
conceitos, o desvendamento de símbolos... a captação e a interpretação do sentido dos diferentes
conteúdo.
O prisma descritivo compreendeu o estudo para se obter uma melhor compreensão do
comportamento de diversos fatores e elementos que influenciam (...) o fenômeno objeto da
investigação (OLIVEIRA, 1997, p. 117). Este ângulo suscita a compreensão das transformações nos
planos sociais, culturais e emocionais dos indivíduos pesquisados.
Trabalhou-se o canto, as letras das músicas apresentadas e as variadas formas da dança
procurando trazer a memória dos participantes em qual momento aquela música ou dança foram
importantes na sua vida. O participante tem a oportunidade de contar a história vivenciada por meio
da música ou dança.
Para fazer as representações musicais os velhos escolhem os cantores que mais marcaram a sua
infância, juventude ou um momento que lhe marcou. Artistas como Raul seixas, Genival Lacerda, As
Frenéticas, Sidney Magal, Jane e Herondy, Ney Matogrosso, Alcione são os preferidos dos velhos.
Na UNITINS, após os ensaios com professores e acadêmicos responsáveis pelo projeto “A Melhoria
da Vida do Idoso Por meio da Música e Dança” no CRAS e no Centro de Convivência e Fortalecimento
de Vínculos-Araguatins, os velhos faziam apresentações juntamente com os acadêmicos e todo o
corpo docente da Universidade uma vez a cada mês.
Na UMA – UFT, após os ensaios foram realizadas apresentações para o público da Universidade da
Maturidade e participações em aberturas de eventos usando a música e a dança.
O velho está vivendo mais e sabe-se que qualidade de vida não está apenas relacionada a saúde
ou ausência de doença, mas está relacionada ao bem-estar. A música e a dança têm esse poder de
proporcionar bem-estar as pessoas além de uni - las tornando - os mais felizes, e consequentemente
inclusos na sociedade.
Segundo Oliveira e Teixeira (2010), a dança é uma prática corporal que proporciona ao velho uma
experiência física, emocional, lúdica, social e expressiva, melhorando a qualidade de vida, através
de um espaço de diversão e cultura e de integração social.
Com a música e dança percebe-se a possibilidade da integração, o envolvimento e a socialização,
propiciando o desenvolvimento da autoestima, memória, atenção e de laços afetivos com seus
pares.
Segundo Sáez (2002, p.104):
“Processos e procedimentos que se apoiam e se legitimam enfatizando a cooperação e interação
entre duas ou mais gerações, assegurando a partilha de experiências, conhecimentos, habilidades,
atitudes e valores, com o fim de aumentar os respectivos níveis de autoestima e autorrealização
pessoal. O objetivo é mudar e transformar-se na aprendizagem com o outro”.
Para os velhos, as ações desenvolvidas com a música e a dança, verbais, plásticas, corporais e de
memória, funcionam como novas possibilidades de experiências grupais que os levam a reflexão
sobre direitos, valores e suas relações com a comunidade. Os velhos têm autonomia para escolherem
as músicas, o tipo de dança e a coreografia para as apresentações.
Percebe - se que a pele enrugada e os fios de cabelos brancos são marcas que trazem o encanto
de uma história. Marcas de vivências de uma vida que merece toda a nossa atenção e respeito.
Procurou-se ouvir as histórias de cada velho, as marcas de suas vivências as suas dificuldades em se
expressar. Viu-se a melhoria a cada ensaio ou apresentação seja ao dançar, ao cantar ou até mesmo
em nos contar as suas lembranças que podem ser alegres, tristes ou somente de nostalgia. Quanto
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 874
as lembranças deixamos que o velho conte também a história vivida para se libertar daqueles
momentos ruins vivenciados.
Com a atividade de recuperação da memória por meio da música e dança, percebeu-se o quanto
é importante ouvir e deixar os velhos se expressarem. O projeto ainda está em desenvolvimento,
fazemos apresentações em aberturas de eventos, promovemos Sarau Cultural, Manhã de Talentos,
Tarde de Talentos, Pout Pourri com memórias, dentre outras atividades.
A arte de cantar e dançar resulta em um crescimento pessoal e vai além dos movimentos do
corpo, são também expandidas as funções cognitivas e emocionais. Nas apresentações percebeu-
se o entusiasmo e alegria dos velhos na música e na dança. Com estes elementos promoveu-se a
autonomia, a transformação e o bem estar dando ao velho a sensação de poder.
Referências
BEAUVOIR, Simone de. A velhice: a realidade incômoda. as relações com o mundo. v. 2. 1976.
LEAL, I. J.; HASS, A. N. O significado da dança na terceira idade. Revista Brasileira de Ciência do
Envelhecimento Humano. Passo fundo, RS 6471. Janeiro/junho, 2006.
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ISSN 2358-3959
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O presente trabalho tem por objetivo refletir acerca da Educação Sexual para a infância, de base
eugenista, na qual Renato Kehl (1889-1974) defendeu, propagou, e inclusive, projetou um programa
para ser disseminado nas escolas secundárias e normais. O tema esteve presente nas edições do
periódico Boletim de Eugenía (1929-1932), no Primeiro Congresso Brasileiro de Eugenia (1929) e em
alguns livros como um assunto constante entre os intelectuais que se articulavam numa rede de
sociabilidades (SIRINELLI, 2003). No bojo dessa discussão, instrução e controle dos sujeitos, cujo
propósito direcionava-se ao melhoramento da espécie humana. Interessa trazer concepções em
torno da Educação Sexual, pensando a noção de “criança eugenizada” (KEHL, 1929) para o projeto
de nação brasileira a ser construído pelos eugenistas.
Renato Kehl, foi médico, farmacêutico, escritor, marcado principalmente pela fundação da
Sociedade Eugênica de São Paulo, 1918, e do Boletim de Eugenía no Rio de Janeiro, 1929. Sendo
conhecido como um dos maiores divulgadores da eugenia no Brasil. A partir dos debates acerca da
raça, onde a mestiçagem emergiu como objeto de discussão para explicações do atraso brasileiro
em face ao progresso que se almejava para a nação, tendo como apoio os programas de higienização
e saneamento a partir do final do século XIX, a Eugenia difundiu-se. O termo “eugenía[1]”, eu: boa,
genus: geração (DEL CONT, 2008), foi criado no ano de 1883 por Francis Galton (1822-1911), cientista
britânico que ficou amplamente conhecido ao publicar seu ensaio sobre a hereditariedade humana
em 1865, com influência de Charles Darwin, seu primo (DEL CONT, 2008), em A origem das espécies.
Com a obra Hereditary genius, em 1869, consolidou a Eugenia, sendo esse texto considerado
fundador dessa ciência (SCHWARCZ, 1993).
O recorte temporal escolhido entre 1929 e 1932 vai de encontro ao período de duração do
periódico Boletim de Eugenía, no qual serviu como uma fonte importante para a disseminação
dos ideais debatidos entre os adeptos da “Higiene da Raça”. Entendemos as primeiras décadas do
século XX do Rio de Janeiro como um momento de discussão dos problemas sociais que assolavam
a população herdeira da escravidão (falta de saúde e assistência) e principalmente da construção
de uma nacionalidade brasileira, onde a infância esteve na centralidade. Forças médicas, jurídicas,
pedagógicas (CAMARA, 2010) protagonizaram debates, intervindo com ações que pudessem
transformar o cenário. Nesta direção, Camara (2010) salienta que a infância tornou-se objeto de
preocupação entre a intelectualidade, onde era preciso forjá-la, entendo-a como o futuro da nação.
Mas nas ações propostas de melhoramento racial e da criação de um “tipo ideal” eugênico, qual
infância Kehl tinha como preocupação?
Escolhemos como fonte para a realização do trabalho o periódico Boletim de Eugenía, que foi
publicado pela primeira vez em janeiro de 1929, filiado a Liga de Hygiene Mental. A sede tinha
localização na Rua Smith Vasconcellos, 63, Aguas Ferreas – Rio de Janeiro, tendo como diretor e
proprietário, Renato Kehl. De periodicidade mensal nos três primeiros anos, cujas edições de junho e
julho de 1929 foram publicados conjuntamente, foi nesta edição também que o Boletim incorporou-
se ao suplemento da revista médica Medicamenta[2]. No último ano de existência, 1932, tornou-se
uma revista trimestral.
O periódico era sistematizado por artigos, trabalhos, textos traduzidos, notas e anúncios divididos
em quatro páginas em seu primeiro ano (1929), sendo somente a edição de dezembro, deste ano,
com o volume de 12 páginas. Em 1930, as edições variaram entre 4, 6, 8 e 12 páginas; já em 1931,
no período de publicação de todo ano se manteve o número de 8 páginas. Em seu último ano de
circulação, em 1932, como revista trimestral, as páginas variaram entre 15 e 35.
Como metodologia, faremos a análise do periódico, onde já foi realizada a catalogação das
matérias publicadas, sendo assim tornou-se possível perceber o volume da temática. O periódico
nesse sentido, pode ser entendido como um veículo de condensamento das questões que deveriam
ser divulgadas a respeito do movimento eugênico, obviamente passando pelo crivo de Kehl. Capelato
(1998) atenta ao fato de que:
Ao eleger o Boletim como fonte, pensamos em trazer de fato a Educação sexual na visão de Renato
Kehl, essa ideia caminha na direção de Capelato (1998), percebendo a imprensa como manipuladora
de interesses. O próprio Kehl classificou a Eugenia em três: positiva, negativa e preventiva. a positiva:
“para augmento progressivo dos individuos de valor bio-social”; a negativa: “para reduzir o numero
dos elementos inferiores” e preventiva: “para evitar o aparecimento de individuos inferiores” [sic]
(ESTATUTOS DA SOCIEDADE EUGENICA DE SÃO PAULO, 1918). Apesar de ter constatado as vertentes
da Eugenia, o interesse neste trabalho terá como especificidade a perspectiva do intelectual.
Tendo como um dos métodos de controle e investigação da hereditariedade, Kehl lançou um
Inquérito sobre a Educação Sexual da Infância e da Mocidade no periódico, que deveria ser respondido
pelos leitores e enviados para a sua caixa-postal. Pelas perguntas, pela escrita e quando se reflete
sobre o grupo leitor do periódico, deslocamo-nos a pensar que Brasil era esse que a Eugenia de Kehl
almejava nas primeiras décadas do século XX.
As principais referências para o desenvolvimento do trabalho serão: Costa (1999) que traz a figura
do médico como um agente protagonista de intervenção social ainda no século XIX, mostrando
como a Higiene modificou a estrutura familiar brasileira. Camara (2010) que nos ajuda a pensar
sobre o Rio de Janeiro da década de 1920, trazendo o contexto urbano-social e a centralidade na
infância. Schwarcz (1993) e Del Cont (2008) com concepções sobre raça, abrem possibilidades para
a compreensão da Eugenia e seus fundamentos. Sirinelli (2003) em relação ao intelectual e suas
articulações entre múltiplos espaços no estabelecimento de redes de sociabilidades entre homens
e mulheres influentes. Esses autores são fundamentais, mas no decorrer do trabalho outros serão
acionados para a sustentação da escrita.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 877
Referências
CAMARA, Sônia. Sob a guarda da República: a infância menorizada no Rio de Janeiro da década de
1920. Rio de Janeiro: FAPERJ, 2010.
COSTA, Jurandir Freire. Ordem médica e norma familiar. Rio de Janeiro: Edições Graaal, 1999.
DEL CONT, Valdeir. Francis Galton: eugenia e hereditariedade. Sci. viga. São Paulo, v. 6, n. 2, p. 201-
218, junho de 2008. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-
31662008000200004&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 17 de novembro de 2019.
ESTATUTOS DA SOCIEDADE EUGENICA DE SÃO PAULO. Rio de Janeiro: Casa de Oswaldo Cruz/
Fiocruz, 1918.
KEHL, Renato. Questões de Raça. Rio de Janeiro: Boletim de Eugenía, junho-julho de 1929, p. 3
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças. Cientistas, instituições e questão racial no Brasil,
1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, 287p.
SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René. Por uma história política. 2. ed. Rio de
Janeiro: FGV, 2003.
[1] Pronunciada no Brasil com acento na letra “i”, diferente de como se pronunciava na Itália, eugénia. Segundo João
Ribeiro, em artigo publicado no Boletim da Eugenía (fevereiro de 1929), tanto a pronúncia quanto a escrita, deveri-
am se assemelhar aos fonemas das ciências como filosofia, psicologia, fisiologia.
[2] Na edição de junho-julho (nº 6- 7) de 1929, o Dr. Renato Kehl, trouxe na capa um texto sobre a incorporação do Bo-
letim à Revista Medicamenta. Convidado pelo colega Teophilo de Almeida, esta edição e as posteriores passaram a
ter abaixo do título: “separata da Medicamenta”.
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busca de emprego e melhoria de vida. A cidade de Cuiabá tem na sua população os descendentes
de indígenas de várias etnias, de africanas/os, de portugueses e de outros países, também
apresentam forte migração de pessoas de outros estados do nordeste e centro-oeste e, a partir
dos anos 1970, de pessoas do sul e sudeste do país que juntos formaram este mosaico de povos e
comunidades tradicionais e de grupos sociais em condição de vulnerabilidade em todo o Estado
(SILVA, 2014). Mato Grosso também é repleto de conflitos internos, principalmente pela posse da
terra, e mais recentemente pela posse da água. Nas vésperas dos 300 anos de fundação da capital,
em 2012 começam chegar os haitianos, após o terremoto e das graves crises internas por quais
vivem o Haiti. A paisagem da cidade passa a apresentar no centro pessoas jovens e adultas nas
ruas e bairros, com uma língua diferente e desconhecida, e notadamente muito educados. Chegaram
primeiro de ônibus, vindos do Estado do Acre, e mais recentemente de avião. A Educação Ambiental
envolvida nas temáticas de direitos humanos e aliadas à pesquisa com grupos sociais em situação
de vulnerabilidade, promove o seminário Fluxos Migratórios em Cuiabá em 2018, que discutem
políticas públicas para migrantes. É neste encontro que inicia os estudos desta pesquisa com a
imigração e entre agosto e setembro de 2019, ao entrevistar as mulheres haitianas, a História do
Haiti vem à tona com toda sua riqueza e sua proximidade conosco. Além de possuírem este
acontecimento único no mundo em que o povo se libertou da escravidão, trazem com elas o
legado de cultura negra nas Américas. São possuidoras de riqueza cultural, de valores e princípios
que procuram cultivar também no Brasil. Mostram uma originalidade de ser com uma língua
própria, criada por elas e eles para fugir do colonizador francês no seu país, conversando
abertamente entre si nas ruas de Cuiabá e nas suas igrejas evangélicas. Por terem tal herança
cultural e histórica da humanidade, encontraram o Brasil como um destino ainda a ser conhecido,
às vésperas da realização da Copa do Mundo de Futebol de 2014, com muita oferta de empregos
pelas obras e possibilidades de serviços a serem preparados e oferecidos para este evento mundial
e Cuiabá como uma das cidades-sede. Passado este momento da copa, os empregos das obras em
andamento foram se rareando, devido ao término do evento e a processos judiciais relativos ao
mal uso do dinheiro público. Independentes, as e os haitianas/os continuaram chegando, e ao
mesmo tempo também percorrem a América do Sul em busca de emprego e conforme a economia,
entram e saem do país. A instabilidade política e social do Haiti contribui com a continuidade da
migração. A entrevista desta pesquisa foi realizada individualmente com 15 haitianas que vivem
em Cuiabá, com perguntas semiestruturadas, buscando sua história e sua relação com meio
ambiente no Haiti e as mudanças climáticas. Como resultados parciais podemos mostrar que
afirmar orgulhosamente que é da natureza dos haitianas migrarem e este é o motivo de estarem
aqui. As mulheres com mais tempo em Cuiabá vieram de ônibus, e mais recentemente chegam de
avião, principalmente as mais jovens. Não mais estranham o calor da cidade, relatam sentir igual
ao do Haiti. Já possuem em sua maioria uma história de migração, vinda do meio rural para a
cidade no próprio país. Todos querem emprego, sua primeira motivação por melhoria, a maioria
quer estudar, principalmente as mais novas. Algumas não sentiram ou não estavam nas cidades
onde ocorreu o terremoto de 2010 no Haiti. Elas não ouviram falar sobre mudanças climáticas e
poucas relataram observação sobre alterações do clima no Haiti. As reflexões das respostas serão
realizadas à luz da fenomenologia de Bachelard (2008). O que podemos mostrar é que tais
respostas confirmam a hipótese de que grupos sociais vulneráveis, como as mulheres negras, não
estão sendo informadas ou formadas no tema, e ainda pela sua condição de migrante poderão
continuar a margem de qualquer ação mais urgente. Assim, esta pesquisa pode representar um
anúncio que uma ação humana relacionada por motivos climáticas, requer políticas públicas que
especifiquem este público, possibilitando fortalecê-los para que a sua condição de migrante e de
mulher não seja somente uma trágica consequência do colapso climático. Esperançamos que
esta pesquisa ajude apontar uma tecitura de políticas possibilite a Cuiabá potencializar sua
capacidade de acolher imigrantes e construir com elas e eles estruturas sociais que as/os atendam
e transformem a realidade também da própria cidade, uma vez que deverá se tornar muito mais
quente e seca nas próximas décadas. Conhecendo mais sobre as mulheres imigrantes haitianas
podemos assim também reconhecê-las no movimento por justiça climática, uma vez que sofrem
as consequências e não estão sendo informadas.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 880
Referências
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ISSN 2358-3959
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Trata-se de uma pesquisa no campo da História da Educação sobre aspectos da trajetória escolar
de Benedicto Galvão - criança negra, nascida na cidade de Itu , interior paulista, no ano de 1881, que
frequentou o Grupo Escolar Queiróz Telles, a Escola Normal de São Paulo – Curso Complementar
anexo – e a Faculdade de Direito de São Paulo (FDSP), trajeto efetuado entre o final do séc. XIX e
início do séc. XX que possibilitou a ele chegar à presidência da Ordem dos Advogados do Brasil,
seção São Paulo ( OAB/SP) em 1940, tornando-se o primeiro presidente negro dessa instituição. O
objetivo fundamental foi investigar quais as estratégias e táticas utilizadas por Benedicto Galvão,
por sua família e outros atores que possibilitaram o seu acesso e a permanência nessas importantes
instituições de ensino perfazendo essa trajetória notável para a época, tendo em vista que pela
vigência do regime escravista no Brasil durante mais de três séculos legou ao negro e a seus
descendentes o estigma da cor e a permanência de barreiras que impediam ou dificultavam o acesso
da população negra à escolarização. Como Benedicto Galvão, menino negro de origem paupérrima
conseguiu acessar e permanecer em instituições privilegiadas e de acesso restrito à população?
Quem seria esse aluno negro estudando na Escola Normal na virada do século XIX para o XX,
instituição privilegiada e reservada para poucos? Seria ele filho de alguma lavadeira ou ama de leite?
Seria um órfão, um filho legítimo ou natural? Seus pais teriam sido negros escravizados ou livres? Ou
ainda algum negro forro que houvesse acumulado riquezas? A quais táticas sua família recorreu para
auxiliar sua manutenção na Escola Normal, ou ainda quais estratégias foram usadas para o ingresso
na Faculdade de Direito em São Paulo do século XX? Utilizou-se os conceitos de estratégia e tática de
Michel de Certeau (2014) que apresenta a estratégia como um cálculo, ou uma manipulação “das
relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder
pode se isolar” e a partir dessa posição distanciada consegue manipular as circunstâncias. Por outro
lado, a tática é compreendida como “a ação calculada que é determinada pela ausência de um
próprio.” Nessa perspectiva, entre as estratégias de dominação e controle e as táticas de sobrevivência
e inserção, foi levantada a hipótese de que a chegada de Benedicto Galvão à cidade de São Paulo no
ano de 1899 para se profissionalizar na Escola Normal Complementar e depois ingressar na FDSP,
só foi possível com o favorecimento de alguém ou alguma organização. A partir dos estudos de
Bastides e Fernandes (2008) foi possível depreender que Benedicto Galvão seria um “infiltrado”, ou
seja, um beneficiado por apadrinhamento, muito comum à época. Quem seriam esses padrinhos
que o infiltrado nos lugares socialmente reservados para os privilegiados? Golombek sugeriu que
Benedicto Galvão foi aceito porque alguém o levou e alguém o aceitou e completa “por trás dessas
duas ações, deve haver muita história.” (GOLOMBEK, 2016). De quem seriam “essas mãos” que o
ajudaram? Algum cafeicultor, um barão, um clérigo, um profissional liberal, um republicano? Desse
modo, no intuito de (re) constituir essa “muita história”, ainda não revelada sobre Benedicto Galvão,
além do levantamento bibliográfico, foram percorridos os Arquivos Públicos do Estado de São Paulo,
da Escola Normal e da Faculdade de Direito de São Paulo, dentre outros e mobilizado outras fontes
como as revistas e jornais do século XIX da cidade de Itu e, ainda, o entrecruzamento de textos
literários produzidos no final do século XIX e nos anos iniciais do século XX. Com o cotejamento das
fontes evidenciou-se a ação do então, secretário do interior da Província de São Paulo, Alfredo Pujol,
advogado, político republicano e crítico literário que se responsabilizou por auxiliar Benedicto
Galvão com a moradia, o transporte, a alimentação e demais despesas necessárias para que ele
conseguisse concluir os estudos e iniciasse na carreira do magistério público e depois na jurídica. A
relevância em se reconstituir e analisar a trajetória de Benedicto Galvão à luz do conceito de Bourdieu
para trajetória, possibilita verificar as incongruências em relação à educação da população e em
especial da população negra naquele período, confirmando o que Cruz (2009) identificou nos
percursos dos dois professores negros universitários investigadas por ele, que o trajeto de Benedicto
Galvão pode ser incluída nas trajetórias desviantes em relação a trajetória modal efetuada pelo seu
grupo étnico-racial. Com relação ao recorte temporal - final do século XIX e primeiras décadas do XX
– (1881-1943) justifica-se por ser um momento de fundamental importância para a compreensão das
relações raciais no Brasil, juntamente com as reformas que impactaram a área educacional naquele
período: tendo em vista a criação dos Grupos Escolares, o auge da Escola Normal como modelo de
escola republicana, e a Faculdade de Direito de São Paulo que formava os futuros dirigentes do país.
Perante o exposto, este trabalho justifica-se pela quase ausência de estudos sobre alunos negros na
Escola Normal de São Paulo e na Faculdade de Direito de São Paulo e especificamente sobre suas
trajetórias de sucesso escolar e ascensão social como descendentes de escravizados, como já
observado que seriam “trajetórias desviantes em relação à trajetória modal efetuada pelo seu grupo
étnico-racial”. (CRUZ, 2009). Por isso, no intuito de tornar público outra versão da história educacional
dos negros, dando voz a esses sujeitos e evidenciando suas trajetórias de êxito e triunfo, à medida
que lhes foram dadas oportunidades de acessar para competir nos lugares determinados socialmente
apenas para não negros, esta pesquisa se insere. É na cidade de Itu, palco da primeira Convenção
Republicana (1873) e de implementações inovadoras na área educacional, os Grupos Escolares, que
o estudante mestiço Benedicto Galvão – conclui seus estudos primários e parte para a capital do
estado de São Paulo para ingressar na Escola Normal da Praça da República, a instituição portadora
do modelo educacional republicano para a formação dos professores naquele período. Após sua
profissionalização, chega a bacharel pela Faculdade de Direito de São Paulo entre o final do séc. XIX
e início do séc. XX, ou seja, mais um passo dado em direção ao cargo que ocuparia em 1940 - primeiro
presidente negro da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB/SP).Sendo a pesquisa de
natureza historiográfica, a metodologia adotada foi constituída da revisão bibliográfica, da análise
de prontuários e demais documentos escolares como o livro de matrículas, atas, dentre outros. Para
elucidar as questões propostas foram analisadas as fontes localizadas no: Arquivo Histórico do
Estado de São Paulo (AHESP); Arquivo da Faculdade de Direito de São Paulo; Arquivos Digitais de
Jornais e periódicos de São Paulo; Arquivo do Centro de Referência Mário Covas (CRE Mario Covas);
Arquivo Histórico da Escola Normal Caetano de Campos; Arquivo do Museu Republicano de Itu;
Arquivo de Documentos Raros da Universidade de São Paulo (USP) e Arquivos de bibliotecas e
universidades disponíveis on-line. Revista da Faculdade de Direito da USP; Revista Campo & Cidade
(Itu) e Jornais da Província de São Paulo do período; o Conjunto de Obras Raras da USP – Jornais de
Itu. A partir dessas fontes tencionou-se a reconstituição da trajetória escolar de Benedicto Galvão
para averiguar quais fatores propiciaram a “infiltração” e permanência desse estudante negro nesses
espaços de educação formal, possibilitando-o a chegar a exercer a função de Presidente da Ordem
dos Advogados do Brasil, seção São Paulo em 1940. Por fazer parte de uma pesquisa maior que
incursionou pelas três instituições escolares nas quais Benedicto Galvão frequentou e em aspectos
da vida profissional, tais como , sua atuação como docente no ensino público paulista e ainda como
advogado e conselheiro da OAB/SP, esta comunicação apresentará mais especificamente alguns
aspectos da trajetória de Benedicto Galvão na Escola Normal Complementar Anexa e, deste modo,
com objetivo de incorporar a trajetória de Benedicto Galvão, às narrativas que dão lugar às
experiências educacionais que envolvem a população negra como protagonista em “diferentes
momentos da história” esta pesquisa se insere.
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Este trabalho se refere à pesquisa sobre a história do Parque Infantil do Jardim Casqueiro e Vila
Bandeirantes, no município de Cubatão, São Paulo e das práticas pedagógicas ali implantadas,
no período de 1956 a 1966. Trata-se do primeiro Parque Infantil da cidade e as investigações
encontraram informações sobre histórias adormecidas, mas não esquecidas. Como referências
teóricas e metodológicas, utilizaram-se autores da história social e cultural, e da história da infância
e da educação infantil, como Le Goff, Ginzburg, Kuhlmann Jr., Meihy e Holanda, Pollack, E. P.
Thompson. Foi realizado o levantamento de bibliografia e de fontes documentais relacionadas à
história da cidade, a coleta de imagens e de depoimentos, por meio de história oral.
Ao longo das décadas de 1940 a 1960, houve uma significativa expansão dos parques infantis
por todo o país, especialmente no estado de São Paulo. Os parques eram instituições extraescolares
destinadas a crianças entre 4 e 12 anos de idade, que desenvolviam atividades culturais e de
educação física. A partir do final dos anos 50, foram se transformando, com a diminuição do limite
etário até os 6 anos de idade e a sua inserção nos sistemas educacionais como instituições pré-
escolares, adotando de forma generalizada a denominação de Escolas Municipais de Educação
Infantil. A comunicação apresenta aspectos da história de Cubatão, emancipada do município de
Santos no ano de 1949, e dos elementos que levaram a que a cidade, acompanhando a efervescência
dos parques e recantos infantis em todo o estado de São Paulo, inaugurasse o parque em 1956, já
com a característica de uma instituição pré-escolar. Situado no Bairro Jardim Casqueiro, local de
intenso crescimento populacional, o parque foi instalado de maneira improvisada em um barracão
para receber os pequenos alunos. Para os que vivenciaram este período, memórias se transformam
em relatos de emoção e saudosismo, canções são relembradas, cantadas e todas registradas em
partituras, por esta pesquisadora. Juntam-se a essas lembranças fotos, cadernos de atividades e
diplomas que exibem assinaturas de personalidades importantes do cenário cubatense.
O primeiro parque infantil de Cubatão que posteriormente mudou de local e de nome, não
deixou de existir na memória daqueles que vivenciaram sua história e que puderam contribuir na
reconstrução desta memória. Na história oral o recorte temporal situa-se entre 1960 a 1962.
Tecendo a história
Segundo Pinto (2005) entre 1900 e 1950, Cubatão era tipicamente rural. No final dos anos 40 a
comunidade de Cubatão se incomodava com a dependência política e administrativa de Santos e a
partir de 1948 essa ideia se materializou com a formação de uma comissão de moradores e o apoio
do deputado estadual Lincoln Feliciano, que era político influente na região. A primeira eleição
ocorreu em 9 de Abril de 1949, e tomaram posse o prefeito Armando Cunha e a primeira Câmara de
Vereadores do Município.
Após a emancipação do município de Cubatão, foi no ano de 1954 no mandato do Prefeito Doutor
Luís de Camargo da Fonseca e Silva que surge a primeira preocupação com a construção de parques
infantis através da Lei Ordinária nº 158 que em seu teor continha a autorização para a construção
dos primeiros Parques Infantis na cidade. A escola foi entregue em 09 de Abril de 1956 pelo Prefeito
Armando Cunha, que após o discurso de inauguração entregou a chave da escola.
A história oral teve como objetivo a busca por novos enfoques que desvelassem as possibilidades
históricas para além das publicações encontradas.
Com a identificação de dois ex-alunos da unidade, no intuito de coletar maiores informações, Tico
Barbosa e Marilda Canelas foram convidados à entrevista. Foi contatada também a professora Neide
Pinho, que trabalhou no Parque na década de 60. Nos depoimentos novos dados apareceram, Tico
Barbosa contribuiu com diploma, memória musical e o caderno de atividades, Marilda Canelas com
lembranças das brincadeiras que desenvolviam no Parque e Neide Pinho contribuiu com memória
musical e pedagógica.
O primeiro contato foi com Tico Barbosa Junior e a conversa durou aproximadamente 50
minutos. O segundo contato foi com a professora Neide Pinho Cardozo, e a entrevista durou cerca
de 40 minutos, onde ela contou sua experiência no Parque Infantil na década de 60 e quando atuou
no Departamento de Educação na Prefeitura de Cubatão. O terceiro contato foi com a supervisora
Marilda Canelas. A entrevista durou por volta de 25 minutos e ela explicou que tinha poucas
lembranças do parque.
Na analise foi possível observar, que apesar dos Parques Infantis terem um currículo mais livre
em relação à escola primária, eles não estavam totalmente soltos. (KUHLMANN, FERNANDES, 2014.
pg.701 e 702). Com a apresentação do caderno de atividades de Tico Barbosa, foi possível destacar as
atividades de coordenação motora, dobraduras, pintura à mão, atividades de música. Pelo caderno
pode-se observar que o currículo era norteado pelo calendário de comemorações, com atividades
de desenvolver a destreza motora como: pintar nos limites do desenho, colar pedaços de papel,
passa linhas.
As práticas curriculares do Parque Infantil Jardim Casqueiro e Vila Bandeirantes apresentam um
planejamento com temas específicos do calendário escolar comemorativo. No caderno aparecem
também os temas do dia das mães, dos pais, sete de setembro, primavera, semana da criança.
Outros temas como alimentação, esquema corporal, forma e cores, também estão presentes através
de pintura, recorte e colagem.
Um dos destaques da pesquisa foi a coleta das canções que eram realizadas no período. Tico
diz que o canto era prioritário no Parque Infantil, sempre eram estimulados a aprender hinos.
Trabalhavam principalmente com as datas festivas, festa junina, dia das crianças e dia do índio.
A música era importante na proposta curricular. Neide Pinho recorda que nas atividades diárias
tinha muita dança, cantigas infantis, histórias. Nas atividades com música elas criavam, faziam
instrumentos com tampinha de cerveja e fazia o coco serrando a casca da fruta. Contribuiu com duas
canções Brincadeira Musical e Primavera.
A Brincadeira Musical se refere a um trava língua e não tem significado, nem tradução. A cada
repetição, deveria se iniciar mais rápido. Segundo Neide as crianças adoravam cantar esta música. A
canção foge do perfil das temáticas, mas apresenta refinado trabalho de articulação de palavras. Ela
é alegre e cantada rapidamente, fica mais divertida. A Primavera é uma canção temática e fala da
alegria que a primavera promove ao chegar. Tem caráter lento e melodioso.
Visando o registro das canções esta pesquisadora, coletou , registrou através da confecção das
partituras e gravou as canções, disponibilizando-as através da pesquisa.
Conclusão
Foi possível constatar que o Parque funcionava com duas classes, uma no período da manhã e
outra no período da tarde e as atividades pedagógicas ofereciam desafios motores e preparativos
para a alfabetização. A música também aparecia com forte caráter cívico e de comemorações.
As crianças estudavam dois anos, sendo que no último ano eram iniciadas ao mundo das letras.
Funcionou como uma instituição pré-escolar, onde contemplava o desenvolvimento da criança e a
preparação para o primário.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 885
A escola funcionou por aproximadamente uma década, até a inauguração do novo prédio
para onde se transferiu. Na nova unidade, além da estrutura física mais próxima do modelo de
Parque Infantil, também teve a denominação alterada para Escola Municipal de Educação Infantil
Professora Almerinda Monteiro de Carvalho. À margem da memória oficial, e ofuscado na memória
da população, o parque ficou vivo nas lembranças de poucas pessoas.
A identidade de uma comunidade, de um povo ou de um país deve estar arraigada à sua memória
e apesar da história fluir, esta deverá preservar o autoconhecimento da coletividade, suas histórias e
representações. A forma como os documentos são tratados, como se fossem exclusivas da produção
interna da escola (ou propriedade), desconsiderando sua relevância política, econômica e social,
tem causado para prejuízos irreparáveis à memória histórica educacional.
Referências
CUNHA, Humberto Pereira da. Da Escola de Saúde a Parques Infantil: Santos (1931-1952) Dissertação
apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Católica de
Santos. Orientador: Profº. Dr. Moysés Kuhlmann Jr.
FRANCO, Jorge Martins. FRANCO, Maria do Rosário Lopes. Alguns Passos. Viena Gráfica & Editora.
2011
KUHLMANN Jr., M., Histórias da educação infantil brasileira, in Revista Brasileira de Educação, Mai/
Jun/Jul/Ago 2000 Nº 14 http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n14/n14a02.pdf
KUHLMANN Jr., M.; FERNANDES, F. S. Educação, cultura e infância no Parque Infantil paulistano
(1947-1957). Rev. Diálogo Educ., Curitiba, v. 14, n. 43, p. 693-716, set./dez. 2014. http://www.redalyc.
org/html/1891/189132834004/
MEIHY, J. Carlos Sebe Bom. HOLANDA, Fabíola. História Oral: como fazer, como pensar. 2. Edição.
São Paulo. Contexto, 2014.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A presente pesquisa surgiu a partir do interesse por um tipo Sociologia da Educação e suas
confluências com História da Educação. Nesse contexto, nos últimos anos, temos investido em um
eixo pouco explorado pelos estudiosos de trajetórias escolares, que é o eixo histórico. Vale ressaltar
que esse eixo histórico é entendido como as possibilidades de análises dos fenômenos sociais a
partir das relações de interdependências entre os sujeitos. Veiga (2005) aponta que a interpretação
da singularidade de um acontecimento, objeto da historiografia, demanda investigação e análise
da figuração social dos indivíduos, suas relações e redes de interdependência de modo a permitir a
compreensão de sua existência singular e a dinâmica de mudanças e rupturas.
Nesse caso, são as trajetórias escolares que delineiam as possibilidades de sucesso e fracasso
escolar, a escolaridade é tida como um trunfo para as famílias dos meios populares, pois é justamente
através dela que se pode observar ou não os efeitos de irradiação. Tomamos, aqui, efeito de irradiação
como as possibilidades de transmissão cultural, não linear, não necessariamente intencional, dos
benefícios simbólicos e materiais de uma escolarização longa, adquirida por um membro de uma
família proveniente dos meios populares aos filhos e netos, de forma duradoura. Isso foi explicitado
em uma pesquisa, ainda inédita, sobre o médico negro João Teixeira de Miranda (PORTES; LOPES,
2015).
Nessa perspectiva, foi reconstruída a trajetória de um “pardo”, como era denominado à época,
de nome José Rubino de Oliveira (PORTES; CRUZ, 2007). Dentre outras conclusões, demonstrou-se
que a trajetória de Rubino foi útil para mostrar qual o efeito de irradiação que uma trajetória como a
dele teria na sua família. Embora ainda não se saiba qual foi o destino social da família de Rubino, o
fato de ele ter concluído um curso superior refletiu imediatamente na escolaridade de seu filho José
Rubino de Oliveira Jr., que, de acordo com os registros dos arquivos da Faculdade de Direito de São
Paulo, deu entrada no curso jurídico com a idade de 17 anos em 1891.
Com isso, consideramos importante investigar mais sobre os efeitos de irradiação em diferentes
trajetórias escolares de sujeitos provenientes dos meios populares. Para tanto, a hipótese que
fundamentou o estudo proposto se apoiou em verificar as possibilidades de irradiação dos benefícios
de uma escolaridade longa, pois, ao observarmos o caso concreto de uma família, como mostrar-
se-á a seguir, o efeito de irradiação acontece, mas não se propaga de forma linear nem contínua
entre os membros dessa família na quarta geração. Então, é pertinente perguntar: o que ocorre na
quarta geração dessa família em termos escolares?
*As letras adotadas no esquema são as letras inicias dos nomes reais dos sujeitos.
**Fonte: Reconstrução da autora a partir de entrevistas e vivências junto a essa família, 2018.
Nessa configuração familiar, coexistem quatro gerações. A primeira geração mostra o casal V e
F, que eram trabalhadores urbanos e alfabetizados. Tiveram nove filhos. Noutro extremo, tem-se o
casal F e V, pequenos produtores rurais e analfabetos, reflexo do descaso educacional para com a
população que vivia no campo no período. Esse casal teve cinco filhos. A união entre o filho A do casal
V e F e a filha E do casal F e V gerou seis filhos. Esses seis filhos concluíram o ensino superior, quatro
na UFMG (E, H, F e M2) e dois na PUC-MG (M1 e M3). Temos, aqui, as mais diversas formações na área
de Ciências Humanas (História, Pedagogia, Direito, Geografia, Biblioteconomia e Administração)
pela ordem de exposição dos filhos da terceira geração no esquema.
A filha M1, de 62 anos, casou-se com J. Ele não tem curso superior, mas tem Ensino Médio
e é representante comercial. Esse casal teve dois filhos, L, 28 anos, que está cursando Processos
Gerenciais na UniBH, e R, 25 anos, que cursava Direito na UFMG.
Os sujeitos E e H não tiveram filhos.
O filho F, 56, casou-se com R, formada em Direito na PUC-MG. Esse casal teve dois filhos: J, de
19 anos, deu início ao curso de Direito na Puc-MG, neste ano. E a filha A, de 14 anos, cursa o Ensino
Médio de forma regular.
A filha M, 53, se casou com C, que cursou Direito, recentemente, mas deve a monografia. Esse
casal teve duas filhas, C, de 29 anos, que tem Ensino Médio completo, e B, de 22 anos, que começou
a cursar Direito na Faculdade de Minas Gerais (FAMIG).
Por fim, o filho M, 50, se casou com J, que tem Ensino Médio completo. Esse casal teve duas filhas:
L, de 15 anos, que está no 1º ano do Ensino Médio, e J, de 13 anos, que cursa o 8º ano do Ensino
Fundamental, ambas de forma regular.
A história das duas famílias entrevistadas, de M1 e M2, nos possibilitou investigar a hipótese
estabelecida, reafirmada nos objetivos de verificar a possibilidade de irradiação de um capital
escolar construído ao longo de uma geração e verificar por que ele não se propaga de forma linear
nem contínua pelos membros da família e parece se configurar como um trunfo perdido. Ademais,
permitiu ampliar o campo de conhecimento sobre as trajetórias escolares de sujeitos pertencentes
aos meios populares.
Como artifício metodológico utilizamos a entrevista genealógica, em profundidade, que
contemplou diferentes gerações. Foram essas entrevistas que ofereceram condições de ressignificar
os dados coletados.
A partir das entrevistas e das análises feitas podemos afirmar que a hipótese de estudo elaborada
se confirmou pelos dados apresentados, pois ficou explícito que as possibilidades de irradiação
dos benefícios de uma escolaridade longa acontecem, mas não se propagam de forma linear, nem
contínua entre os membros dessas famílias na quarta geração.
Nessas circunstâncias ressaltamos três circunstâncias que se associam na possibilidade de
entendimento do fenômeno por nós investigado. A primeira diz respeito à “relação com o saber”
conforme Charlot (2013). Observa-se nos jovens analisados que eles não conseguiram, em um tempo,
estabelecer uma relação de reconhecimento e de prazer com saber. A escola e o ato de estudar
pareceram a eles um fardo a ser carregado diuturnamente. Nessas circunstâncias, essa situação
parece anular os esforços de escolarização dos pais, inibindo todo o poder de um acompanhamento
e investimento efetuado pelos pais. A inserção de B em um “outro mundo” permite a ela efetuar
e retomar os estudos diante de uma relação prazerosa com o saber. O sucesso escolar parece ser
refém dessa circunstância.
Outra circunstância observada diz respeito às “contradições da herança”, nos dizeres de Bourdieu
(1997), visto que, no caso, parece-nos que esses jovens se negam a receber a herança cultural e
escolar a eles destinada.
Vejamos o caso de R, que efetua com sucesso até o sexto período do curso de Direito da UFMG,
um dos mais concorridos e prestigiados dessa Universidade. Não nos esqueçamos que R tem como
modelo socializador um tio, H, dada a sua proximidade com ele, que foi a um tempo promotor de
Justiça e, agora, procurador do estado de Minas Gerais. R se recusa terminantemente a continuar no
curso, “aquilo não era para mim”, procura, a todo custo, construir uma trajetória própria, mas árdua,
diferente daquela que a mãe professora sonhou e lutou, a fim de que ele, criando as condições
necessárias, para que ela se efetivasse.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 888
Por último, ressaltamos nessas famílias diferentes “modelos socializadores” à disposição dos
jovens como bem ressalta Lahire (1997). Nesse caso, o modelo fundado nas esperanças provenientes
da escola, defendido pelas mães M1 e M2, elas próprias trânsfugas que se distanciaram de suas
origens via escola, parece perder força para o modelo socializador dos pais, J e C, que executam as
suas atividades laborativas com mais liberdade naquilo que se refere às obrigações do mundo do
trabalho, construindo os seus horários e ganhando aquilo que produzem, mesmo sob o risco de uma
certa incerteza.
Referências
BOURDIEU, Pierre. As contradições da herança. Coord: Pierre Bourdieu. A miséria do mundo.
Petrópolis: Vozes, 1997. p. 587-593.
CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Porto Alegre: Artmed, 2013.
LAHIRE, Bernard. Sucesso escolar nos meios populares. As razões do improvável. São Paulo: Ática, 1997
PORTES, Écio Antônio; CRUZ, Ricardo Alexandre da. Trajetórias e estratégias sociais e escolares do
pardo José Rubino de Oliveira (1837-1891): da selaria em Sorocaba às arcadas jurídicas do Largo
de São Francisco, São Paulo. In: PEREIRA, Lúcia Helena Pena; OLIVEIRA, Wanderley Cardoso (Org.).
Práticas educativas – discursos e produção de saberes. Rio de Janeiro: E-papers, 2007. p. 147-169.
VEIGA, Cyntia Greive. Pensando com Elias as relações entre Sociologia e História de Educação. In:
FARIA FILHO, Luciano Mendes de (Org.). Pensadores sociais e história da educação. Belo Horizonte:
Autêntica, 2005. p. 139-166.
ISSN 2358-3959
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O presente texto pretende trazer alguns aspectos de uma pesquisa em andamento, que pretende
compreender as contribuições dos Cadernos de História Geral da África para a História da Educação.
Nesse sentido, foi muito importante pesquisar alguns aspectos do processo editorial da obra,
apreendendo-os por meio da perspectiva da nova história cultural, por um lado. E por outro, por meio
daquela que pretende defender as abordagens decolonialistas ou as epistemologias do sul. Nesse
sentido, o texto se organiza, primeiramente, apresentando aspectos históricos da constituição da
referida obra, para em seguida, problematizar esse processo à luz das ideias que a própria produção
historiográfica africana produziu.
O século XX viu surgir, sobretudo a partir da década de 1920, novos paradigmas historiográficos
propostos pela Escola dos Annales, que rompiam com perspectivas anteriores, sobretudo no que diz
respeito aos modelos positivistas. Um novo olhar sobre as fontes e uma reflexão sobre a construção do
próprio conhecimento histórico foram importantes para ampliar as pesquisas históricas em direção
a outros campos da vida humana, como o social e o cultural. Além disso, houve uma preocupação
maior em compreender, não apenas a “história dos grandes homens”, mas também os processos
históricos protagonizados por grupos e indivíduos historicamente marginalizados.
Ao mesmo tempo, a partir do final da década de 1940, influenciada pelas reflexões teórico-
metodológicas realizadas pelos Annales, a historiografia africana também se renovou. No entanto,
é preciso compreender que, apesar dessas influências, os historiadores africanos desenvolveram
categorias específicas de análise para investigar a história do continente, primando por uma ótica
autóctone. Desejavam, assim, romper com as perspectivas eurocêntricas que, em grande parte,
estigmatizavam o continente africano, considerando-o primitivo, a-histórico. Importante lembrar
que essas transformações historiográficas se desenvolviam concomitantemente aos processos de
independência das nações africanas, que libertavam-se do jugo europeu.
Nesse contexto nasceu a coleção intitulada “História Geral da África” (HGA), fonte histórica
analisada nesta pesquisa, construída ao longo da segunda metade do século XX, formada por oito
volumes extensos. Financiada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e
Cultura (UNESCO), a HGA contou com as contribuições de centenas de especialistas- historiadores,
arqueólogos, antropólogos, linguistas, africanos e não-africanos, e possuiu o intuito de constituir-se
na condição de uma obra de referência sobre o tema, produzindo e sistematizando um conhecimento
científico sobre a África. Assim, é necessário compreender a importância desta coleção para a
compreensão do africano como sujeito de sua própria história, contribuindo para uma espécie
tomada de consciência.
Uma relevante questão que se apresenta nesse debate é que se, por um lado os Annales
contribuíram para a renovação historiográfica africana, sobretudo a partir do final da década de
1940, por outro esta não teria acontecido se os intelectuais africanos não tivessem pensado a
essas análises com ampla bibliografia que aborda diferentes temas, tais como a construção da HGA,
teorias decoloniais, e a importância da descolonização do ensino na educação básica.
Diante do que foi exposto, compreendemos até o momento que a “História Geral da África”,
constitui-se como importante obra de referência sobre o continente africano. Nesse sentido, é
necessário compreender que, embora a renovação da historiografia africana e, mais precisamente,
a HGA, tenham sofrido influências da francesa Escola do Annales, desenvolveram uma base teórico-
metodológica específica para tratar sobre o tema.
Além disso, observamos que as traduções da “História Geral da África” para a língua portuguesa,
bem como a elaboração das “Sínteses”, a partir dos trabalhos de pesquisadores da UFSCAR,
são iniciativas importantes no sentido de fomentar a implementação da Lei 10.639/2003 e,
consequentemente, a descolonização do ensino. Tendo em vista a marginalização dos alunos
negros no sistema educacional brasileiro deve-se, em parte, à falta de identificação destes com
os conteúdos discutidos em sala de aula, a disseminação de um conhecimento científico sobre a
África, a partir da visão africana, tornam compreensíveis a complexidade e a importância históricas
do continente, bem como as contribuições das sociedades africanas e dos afro-brasileiros para a
formação da sociedade brasileira.
Referências
BARBOSA, Muryatan Santana. A África por ela mesma: a perspectiva africana na História Geral da
África (UNESCO). São Paulo, 2012 (Tese).
GOMES, Nilma Lino. Relações étnico-raciais, educação e descolonização dos currículos. Currículo
sem Fronteiras, v. 12, n. 1, jan/abr 2012. Disponível em: < http://www.acaoeducativa.org.br/fdh/wp-
content/uploads/2012/11/curr%C3%ADculo-e-rela%C3%A7%C3%B5es-raciais-nilma-lino-gomes.
pdf >. Acesso em 20 de outubro de 2019.
KI-ZERBO, Joseph (ed.). Metodologia e Pré-História da África. Brasília: UNESCO, 2010. Disponível
em: < http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/about-this-office/single-view/news/general_history_of_
africa_collection_in_portuguese_pdf_only/>. Acesso em 10 de julho de 2019.
SANTOS, Boaventura de Sousa; e MENESES, Maria Paula (orgs.). Epistemologias do Sul. Coimbra:
Edições Almedina, 2009.
SOARES, Felipe Paiva. Polifonia conceitual: a resistência na História Geral da África (UNESCO). Juiz
de Fora, 2014 (Dissertação).
ISSN 2358-3959
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resgate das origens das formas de opressão sobre esses grupos propiciou uma compreensão mais
ampla e profunda de que a garantia da liberdade e da igualdade depende de tratamento isonômico
das questões das diferenças.
Assim, as pesquisas sobre a história das populações africanas escravizadas nas Américas
ganharam grande impulso nos anos 1980, revelando um esforço por revelar aspectos desconhecidos
das diferentes experiências dos negros sob a violência da escravidão.
Ao mesmo tempo, os pesquisadores do campo da educação, área do conhecimento para a qual
a criança é sujeito constante, também lançaram-se ao resgate da história da educação escolar e
assistencial em busca das diversas experiências da infância que, agora, começava a ser conhecida.
Para além da história das instituições voltadas para o atendimento à infância e das ideias pedagógicas,
os historiadores da educação dedicaram-se à análise documental que permite conhecer as múltiplas
possibilidades de educação das crianças e adolescentes de nosso passado.
O objetivo do trabalho que ora apresentamos é conhecer, por meio dos discursos da elite
burocrática e intelectual da cidade de Santos, província de São Paulo, as tensões sociais e ideológicas
em torno do processo de extinção da escravidão no Brasil oitocentista, o projeto de nação de
emergia na fase de superação do regime monárquico e implantação da República e as práticas dos
escravizados na afirmação de suas identidades, subjetividades e sociabilidades.
No último quartel do século XIX, pelo porto de Santos, escoava a maior parte do café consumido no
mercado externo. A produção encontrou no interior da província de São Paulo condições favoráveis
e, em poucas décadas, linhas férreas interligavam as fazendas do oeste paulista ao porto de Santos.
Também nele aportavam os navios que traziam os imigrantes europeus que iriam desempenhar
importante papel na substituição da mão de obra escrava pela livre em fins daquele século. A
paisagem da cidade portuária sofreu profundas alterações graças à intensificação do movimento de
cargas e passageiros, ao crescimento dos negócios e ao aumento da população. Também o volume
de negros escravizados, oriundos de outras províncias brasileiras já que o tráfico negreiro havia sido
proibido em 1850, introduzidos na cidade aumentou consideravelmente. Junto com esse aumento,
os debates em torno do uso do trabalhador escravizado ganharam enorme importância nos meios
político e intelectual e, desde cedo, o alinhamento a causa abolicionista ficou evidente. Santos,
desde os anos 1860, era tida como a meca dos escravos fugidos das fazendas de café ao abrigar dois
grandes quilombos, o do Pai Felipe e o do Jabaquara. Além disso, ainda que não haja registro oficial
da abolição da escravidão no município em 1886, muitas são os exemplos de práticas abolicionistas
na cidade, o que, entretanto, não confirma a adesão entusiasmada, como querem alguns, à causa
emancipacionista.
Recorrendo aos Relatórios de Presidente de Província e aos jornais da cidade de Santos, entre
1871 e 1888, procuraremos explicitar e analisar as propostas e argumentos acerca do tratamento
destinado às crianças negras nascidas após a lei do Ventre Livre de modo a rastrear interesses,
intenções, motivações, relações com o que se propunha na província e no Império. Se a leitura e análise
dessa documentação permite identificar a postura das elite no que tange à educação das crianças
livres de mães escravizadas, nas margens e rodapés, nas entrelinhas, nos detalhes aparentemente
pequenos e insignificantes, como afirma Guinzburg, podemos perceber as apropriações que das
possibilidades abertas pela lei, fizeram os negros escravizados.
Estudos que tratam da mesma temática, como Portela (2016), aludem que os senhores de
escravos de São Paulo não entregaram os ingênuos à guarda do Estado, na medida em que o
trabalho escravizado era “o alicerce do desenvolvimento econômico de São Paulo”. Segundo a
autora, a dependência exclusiva do braço escravo na cafeicultura “justifica (ou pelo menos explica) a
resistência dos escravocratas paulistas em debater, propor e aplicar ações de caráter emancipatório”
(2016, p.11)
Todavia, podemos problematizar a exclusividade da perspectiva senhorial na decisão sobre
a preservação sob situação de cativeiro das crianças negras livres. Seguindo a trilha aberta por
historiadores sociais que indica que as vivências dos sujeitos resultam em ações de acomodação,
reivindicação e contestação, procurei identificar no pós-Ventre Livre, a luta dos escravizados pela
preservação da convivência mães-filhos, quando a lei permitia aos senhores separá-los e receber
uma indenização do Estado. São muitos os estudos sobre a escravidão no Brasil que apresentam
a incansável luta dos negros contra a instituição do cativeiro, sua capacidade de aproveitar as
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 894
brechas presentes no sistema para obter “vantagens e benefícios” para si, seus familiares e amigos.
Assim, é possível que os senhores não tenham liberado os filhos livres de suas escravas, menos pela
necessidade que deles tinham como trabalhadores, mas para não desrespeitar o costume de lhes
assegurar sua vida familiar.
Referências
CHALHOUB, Sidney. Visões da liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na Corte.
São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
PORTELA, Daniela Fagundes. Iniciativas de atendimento para crianças negras na Província de São
Paulo. Jundiaí: Paco Editorial, 2016.
ROMÃO, Jeruse. História da educação dos negros e outras histórias. Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade. Brasília, 2005.
SLENES, Robert. Na Senzala uma Flor: Esperanças na Formação da Família Escrava. Brasil Sudeste,
século XIX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
VEIGA, Cynthia Greive. Conflitos e tensões na produção da inclusão escolar de crianças pobres, negras
e mestiças, Brasil, século XIX. Educ. rev., Belo Horizonte, v. 26, n. 1, p. 263-286, Apr.2010. Disponível
em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-46982010000100013&lng=en&
nrm=iso>. Acesso em: 03. Nov.2019. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-46982010000100013.
ISSN 2358-3959
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A festa de comemoração do aniversário do Colégio, que acolhe este estudo, acontece no dia 22 de
março ou no final de semana próximo à data. Nessa festa, estudantes e seus familiares, profissionais
da escola, autoridades, ex-alunas e ex-alunos fazem-se presentes no pátio escolar. Os antigos
estudantes desfilam no Batalhão da Saudade, reintegram-se à banda, reencontram colegas, utilizam
as quadras para jogos e são aplaudidos pelos meninos e meninas que, atualmente, estudam na
escola. Há quem retorne pelas boas lembranças e pelo carinho pelo educandário, há os que fazem
deste momento um momento de (re)encontro com amigos. Há os que estavam de passagem e
resolveram conferir e existem aqueles que agendaram o compromisso.
O Batalhão da Saudade é fruto de uma das diversas características dessa escola, perceptíveis no
decorrer desse evento, o sentido de pertença: sentimento incentivado e constantemente alimentado
pela Instituição. Até o ano de 1995, esse Batalhão era composto apenas por homens. A partir do ano
de 1996, pouco a pouco, a presença de mulheres vem aumentando. Ainda são poucas em relação
ao efetivo que desfila, contudo, suas presenças não passam despercebidas: saltos, saias e, algumas
vezes, crianças de colo ou ainda no ventre fazem parte do conjunto que desfila.
O educandário, em questão, foi uma escola monoeducativa masculina até o ano de 1989, quando
ingressaram as primeiras meninas na qualidade de alunas. Esta comunicação é fruto de um estudo
que, entre outras interrogações, buscou responder se, ao longo de sua vivência na qualidade de
escola mista, este Colégio sofreu alterações significativas em sua cultura escolar e compreender
como estudantes - homens e mulheres em construção - percebem e resignificam as relações de
gênero no espaço escolar deste educandário.
Parte da investigação se constituiu na reflexão sobre o processo de inserção feminina discente
nessa escola, percebendo meninos e meninas como sujeitos datados historicamente, assim como
as relações entre eles. Percepção atenta, também, para as singularidades desses sujeitos e para as
características, distinções, práticas e simbolismos da referida instituição de ensino. Neste sentido, as
pequenas e ordinárias práticas cotidianas, resistências sutis, apropriações diferenciadas levaram a
inferir que “[...] o cotidiano se inventa com mil maneiras de caça não autorizada” (CERTEAU, 2000, p. 38)
e esta compreensão norteou o olhar pesquisador em relação à cultura escolar, permeou as reflexões
acerca das trajetórias escolares de colaboradores da pesquisa e esteve presente na observação de
diferentes masculinidades e feminilidades “forjadas por meio de atitudes de contraposição ou não
às regras e à autoridade escolar” (CARVALHO M., 2009, p. 119).
A instituição alvo do estudo é o Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA). Escola pertencente ao
conjunto de escolas de Educação Básica mantidas pelo Exército Brasileiro, localizada na cidade de
Porto Alegre, Estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Velho Casarão ou Velho Casarão da Várzea são
nomes carinhosos atribuídos a esse educandário rico em tradições e ritos; os quais, muitas vezes,
são frutos de releituras de acontecimentos ou costumes de épocas anteriores: criações recentes ou
inventadas com vestes de passado, de antigo, de tradição de longa data (HOBSBAWM, 1997).
A pesquisa é uma investigação de cunho qualitativo e busca orientação nos campos da Nova
História e da História Cultural. Está inserido nos domínios da História da Educação, transita
pela Nova História Militar, pela História das Mulheres e busca auxílio na produção da História
das Masculinidades, da História da Virilidade, da Sociologia da Infância e nos estudos sobre
juventude. A categoria gênero é auxílio para a compreensão de práticas escolares, ritos e
decisões institucionais em relação ao trato de meninos e meninas.
Homens e mulheres se constituem na relação com os outros homens e mulheres e este é
um processo constante e dialético. Esse colégio, ainda tão masculino, provoca-nos pensar nos
homens e mulheres de diferentes idades que nele vivenciam parte do seu tempo. “Ser homem/
ser mulher é uma construção simbólica que faz parte do regime de emergência dos discursos
que configuram sujeitos” (COLLING, 2004, p. 29). Os estudantes, contribuintes deste estudo,
pertencem à faixa etária de 10 a 19 anos e vivenciam um determinado contexto político, social,
cultural e histórico.
O recorte temporal é do ano de 1989 ao ano de 2013. O ano de 1989 é justificado por ser
o primeiro ano do referido educandário enquanto escola mista e o ano de 2013 por marcar o
término da investigação. O fio condutor escolhido foi tecido a partir de narrativas discentes
coletadas através de entrevistas semi-estruturadas e, também, de textos postados em blogs
ou redes sociais (Orkut e Facebook), grafados em cadernos ou em folhas avulsas ou, ainda,
impressos no periódico escolar denominado Hyloea. O trabalho com narrativas considera,
entre outros aspectos, que narrar constitui um processo de reconstrução e de resignificação
do vivido, que estas estão sempre inseridas em um contexto sócio-histórico (ABRAHÃO, 2004) e
são ações políticas. Para além das narrativas discentes, a investigação contou com entrevistas
concedidas por trabalhadores e trabalhadoras da escola e com uma diversidade considerável
de documentos, importante pela premissa da existência de vários discursos possíveis acerca de
acontecimentos, períodos ou situações vivenciadas.
Investigando estudos sobre juventude, parece existir um consenso entre os diferentes
campos de que esta fase da vida constitui um elo, uma transição entre a infância e a fase
adulta. Entretanto, apesar dos diversos estudos acerca da juventude, ou envolvendo jovens,
carecemos de uma maior reflexão sobre como desenvolver pesquisas com jovens: as técnicas de
pesquisa, em geral, são pensadas e utilizadas como se estivéssemos tratando de adultos mais
novos. Epistemologicamente é possível que estejamos, em relação aos jovens, em uma posição
semelhante àquela em relação às crianças: muito falamos sobre e pouco os entendemos como
figuras políticas (HENDRICK, 2005) e/ou alguém sobre muito corremos o risco de inventar
(GRAUE;WALSH, 2003).
Quando, no ano de 1988, foi decidido que meninas poderiam fazer os exames de admissão
para o ano letivo de 1989, o CMPA não alterou seu caráter e nem ideal de homem a ser formado.
Podemos inferir que não alterou também o ideal de mulher, pois, embora não houvesse alunas
na escola, já havia o par ideal para o homem desejado. A presença feminina no cotidiano da
escola, a partir de 1989, não alterou a alma matter deste educandário, mas, assim como no
seu período de colégio direcionado à educação apenas do sexo masculino, no tempo de escola
mista, o qual ainda é presente, jovens, agora de ambos os sexos, vivenciam este espaço e, nele,
imprimem suas marcas e não apenas aquelas que o educandário permite que sejam vincadas
em suas pedras ou afixadas em suas paredes. Ao longo do tempo, meninos e meninas inventam
o seu cotidiano, vivenciam e administram seus espaços de não poder, usam de suas astúcias,
resignificam, resistem ou burlam as práticas, leis e direcionamentos originárias do ‘lugar de
poder e de querer’ (CERTEAU, 2000). Entretanto, elas e eles também são cooptados por esta
mesma ordem a qual opõem resistências. O que nos contam?
Apesar da Instituição, em geral, silenciar sobre questões de gênero, os seus estudantes e
demais integrantes falam e fazem gênero mesmo sem terem esta consciência. O texto desta
comunicação, pela delimitação de espaço e tempo de exposição, privilegia as contribuições
de estudantes do CMPA nos anos de 2010 a 2013 e as categorias apresentação pessoal, mérito,
patronos e cartografia escolar. Podemos perceber que estes meninos e meninas percebem
relações e desigualdades de gênero (e não apenas) no espaço escolar e, além de perceber, lidam
com esta realidade, questionam, aderem, subvertem.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 897
Cronologicamente, essa série de oito álbuns compreende de 1895 a 1951. Os álbuns da Escola Caetano
de Campos podem ser divididos em dois grupos: profissionais e artesanais, confeccionados na própria
escola. Os profissionais são álbuns de formandos. Os artesanais foram compostos a partir de um
esforço de memória de comemorações, eventos e atividades pedagógicas realizadas na escola. Desse
modo, a figura da professora não aparece, pois o foco é outro. Assim, dos oito álbuns selecionados
sete são caracterizados como profissionais, e um é artesanal. Os dois primeiros, de 1895 e de 1908,
são institucionais. O de 1895 foi realizado um ano após a inauguração do novo prédio da escola,
construído na Praça da República em homenagem à sua proclamação. A literatura sobre a Escola
Caetano de Campos é ampla, devido à projeção que alcançou e à dimensão do seu acervo, englobando
a história da Instituição, das práticas escolares lá desenvolvidas e da formação docente. Do ponto de
vista institucional, a Escola Caetano de Campos representou a catalisação dos ideais republicanos e o
pioneirismo na formação docente em São Paulo. Tornou-se modelo de ensino paulista a partir do início
do Regime Republicano. Verifica-se que a Escola Caetano de Campos, que foi renomeada diversas
vezes ao longo de sua existência, é mencionada na maioria das obras e estudos sobre a Educação
paulista e sobre a formação docente no Brasil.
No álbum de 1895, o foco parece ter sido o prédio recém-construído, embora haja fotografias de
práticas escolares em sala de aula, de grupos de professores e diversas fotos de classe, compostas
pelos alunos e seus respectivos professores e professoras, as chamadas fotos de classe. Nesse álbum
há seis fotos de classe de alunos com suas respectivas professoras. As professoras são também
representadas em duas fotografias do corpo docente da escola. Já o álbum de 1908, com muitas
mais folhas, é composto também por fotografias que apresentam as dependências da escola, mas
o foco parece ter se direcionado para as práticas escolares, pois há diversas fotografias de aulas, em
sala de aula e em espaços externos da escola, de outras práticas, tais como roda e lanche, retratos do
corpo docente e fotos coletivas, separadamente, de alunos e de alunas. Por fim, há uma foto coletiva
composta por toda a comunidade escolar. Ao todo são quatorze fotografias nas quais aparecem
professoras.
Constatou-se que nas fotos de classe o posicionamento das professoras é o mesmo dos
professores homens nas demais fotografias das séries das quais as fotografias aqui analisadas fazem
parte: sentados, ao centro do grupo, num lugar de destaque para o qual o olhar do observador é
dirigido. Esse lugar portanto, não é aleatório, mas construído e pensado para ser o mais relevante,
onde deve estar o elemento mais importante do grupo: o professor ou a professora. Essa constatação
pode auxiliar na investigação acerca do lugar que o professor e a professora ocupavam na escola e
na sociedade.
Além da composição técnica e iconográfica das fotografias, outro aspecto considerado foi a da
representação da profissão docente feminina, objetivo deste estudo.
Perceberam-se alterações com relação aos contextos temporais, mas também as permanências
compositivas – são fotografias frontais, horizontais, simétricas. Além disso, fotografias de
identificação – as posições devem permitir a identificação de todos os presentes. São também
importantes suportes de memória para os retratados e para a própria escola.
Os outros álbuns da série selecionada para compor o corpus documental da pesquisa são seis
álbuns de professorandos, como eram denominados. São o que se caracteriza como álbuns de
formandos, e são dos seguintes anos: 1933, 1939, 1941, 1950 e 1951. São compostos de modo
profissional, e o último, de 1931, é um álbum fotográfico do Jardim de Infância, com composição
artesanal. Nos álbuns de formandos, as mulheres, professorandas, são representadas em retratos
individuais, e há também retratos individuais das professoras e dos professores das turmas,
com destaque para os que atuavam em cargos administrativos na direção da escola e para os
homenageados. Em 1939 e em 1941, a direção da escola era ocupada pela professora Carolina
Ribeiro, devidamente representada em um retrato individual no início dos álbuns.
No álbum do Jardim da Infância há apenas uma fotografia na qual uma professora é retratada.
Nessa fotografia, a professora aparece em ação, sentada ao piano e rodeada de crianças. Ao analisar
as demais fotografias componentes desse álbum, conclui-se que o seu foco tenha sido o de registrar
as práticas específicas do Jardim da Infância, dando centralidade à ação das crianças.
Embora haja fotografias de atividades escolares em sala de aula e em outros espaços escolares,
internos e externos, e também fotografias que registram os prédios escolares, a maior parte do
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 900
conjunto se concentra em duas temáticas que se destacam: as fotos de classe, que se caracterizam
como retratos coletivos, e os retratos individuais, de professorandas e de professoras.
Numa perspectiva social, os registros fotográficos revelam a conformação de uma cultura
escolar que guarda estreitas relações com a forma como a sociedade projeta e constrói imagens
de si mesma. Pela análise desses retratos foi possível concluir que a imagem da professora mulher
produzida no período estudado indica a conformação da profissão docente com a atuação feminina
e o lugar no qual a mulher foi colocada, pela confluência dos ditames sociais vigentes, da cultura
escolar e do lugar que ela alcançou, em virtude de sua prática profissional.
Referências
ABDALA, Rachel Duarte. Fotografias escolares: práticas do olhar e representações sociais nos álbuns
fotográficos da Escola Caetano de Campos (1895-1966). Tese de doutorado. Faculdade de Educação,
Universidade de São Paulo, 2013.
CARVALHO, Marta Maria Chagas de. A Escola e a República. São Paulo: Brasiliense, 1989 (Coleção
tudo é história, 127).
LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação: uma pesquisa pós-estruturalista. 16. ed.
Petrópolis-RJ: Vozes, 2014.
PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. Tradução de Angela M. S. Corrêa. 2. ed. São Paulo:
Contexto, 2017.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este texto tem por principais objetivos levantar uma discussão acerca das rupturas e permanências
na História dos Ciganos, partindo do geral, ou seja, das múltiplas narrativas sobre os ciganos da Índia
à Portugal, da Literatura à Bíblia, discutindo a validade das generalizações conceituais para estes
grupos de pessoas tão distintas entre si, procurando encontrar no grupo de ciganos Calon, moradores
de Santa Fé do Sul/SP, tais permanências e/ou rupturas. Com base na historiografia levantada
sobre os ciganos e as fontes coletadas nas escolas da cidade e relatos extraídos de entrevistas com
moradores e ciganos, procuramos demonstrar parte da história esquecida/camuflada deste grupo
e em especial, mostrar como as novas gerações tem se portado frente a cultura cigana (2008-2019).
Nesta pesquisa procuramos entender como os mitos em torno dos ciganos contribuíram para seu
nomadismo e as várias situações de intolerância que causaram os mais diversos tipos de violência,
para a partir destes, procurar entender algumas das atitudes dos alunos nas escolas santafessulenses
(dificuldade no aprendizado, comportamento violento, baixa frequência escolar e evasões); para
conseguir propor medidas que venham apoiar as escolas no processo educacional dos ciganos e
demais moradores da cidade que são diretamente influenciados pela presença destes.
De difícil definição, de generalizações impossíveis (FAZITO,2006); os ciganos têm sua origem
geralmente relacionada à Índia (TEIXEIRA,2008), lá, dentro do sistema de castas seriam adoradores
da deusa Cali (Kali), que era conhecida por beber o sangue dos vencidos nas guerras, em suas
representações, esta entidade tem vários braços, é azul, tem um colar feito de cabeças e um tipo
de cobertura da genitália feito de braços humanos. Os ciganos acampavam próximos à cemitérios/
crematórios pois seria o espaço destinado a casta que adorava Cali. O motivo de sua diáspora não
é sabido, da Índia chegaram nos balcãs e depois, no século XI um grupo chegou no Leste Europeu.
Outro grupo anteriormente, atuando como mercenário, participou da ocupação moura da Península
Ibérica, lá, criaram rotas comerciais e passaram a conviver com as demais populações.
Tudo indica que as rotas comerciais gerou vários elos de comércio e conflitos ( , sendo que,
entre os judeus, surge um novo mito relacionado aos ciganos; no Talmud e na Cabala, surge a
figura de Lilith; esta teria sido a primeira mulher criada por Deus, por não aceitar a submissão a
Adão teria dito o nome de Deus (impronunciável YHVH) três vezes como um ataque; por isso foi
expulsa do Paraíso vindo a se relacionar com anjos caídos (demônios) e posteriormente teria tido
relações com Adão e seus filhos. Outra versão aponta que a mesma era um demônio em formato
de cobra alada, e esta teria enganado Eva a comer o fruto proibido. Independente da origem desta
personagem, em ambas as vertentes, ela é mãe dos ciganos. Nos relatos judaicos ela é apresentada
bebendo sangue de mortos, matando recém-nascidos e viajantes para se alimentar de suas carnes
e sangue. O profeta Isaias, no capítulo 34, verso 14, profere uma maldição ao povo de Israel,
apontando que se estes não se voltassem ao Deus verdadeiro, Lilith e seus filhos (ciganos) fariam
morada no acampamento dos judeus).
De Israel surgem outros mitos/lendas relacionando os ciganos com o período de Cristo; são várias
as versões (ARISTICTH,1995): A. Foram ciganos ferreiros que fizeram os pregos da cruz de Cristo.
B. Foi um cigano que tirou o último prego da cruz de Cristo para liberar o corpo sem vida. C. Um
cigano teria negado asilo a Maria e José obrigando os mesmos a dormirem em um estábulo no
dia do nascimento de Cristo. Depois vem um segundo rol de lendas, estas relacionados a figura da
Santa Sara de Kali, padroeira dos ciganos canonizada pela Igreja Católica no século XII. Sobre Sara
levantamos as seguintes narrativas: A. Teria sido a parteira que auxiliou Maria no nascimento de
Cristo. B. Seria escrava de Maria e foi uma das mulheres que seguiram Cristo no seu “ministério”. C.
Seria filha de Cristo com Maria Madalena. Todas estas narrativas culminam em um desfecho similar,
com a perseguição dos cristãos, Sara e alguns discípulos teriam sido colocados em um barco sem
remos para morrerem nas correntezas, após Sara fazer uma oração temerosa Deus os conduziu até
o litoral da França e lá teriam sido resgatados por ciganos.
Os primeiros mitos forneceram argumentos para que os ciganos sofressem graves acusações
de canibalismo na Europa, em 1781, 141 ciganos foram assassinados; pois para os algozes, eram
vampiros e canibais pois suas deusas se alimentava de sangue e carne humana.
A Igreja Católica, no entanto, os perseguiu mais pelas práticas religiosas do que os mitos em
si (ANDRADE JÚNIOR,2013); a leitura de mãos, os casamentos fora da Igreja, as crianças ‘pagãs’, o
estilo de vida itinerante; tudo isto desafiava seus poderes. Várias foram as punições, de castigos à
punição de serem vendidos como escravos e várias foram as tentativas de contê-los, como as leis
que determinavam o tempo que poderiam ficar acampados nas vilas e cidades, a distância que
tinham que manter de propriedades.
Toda esta mística envolvendo os ciganos e o estilo de vida que contrariava o senso comum
católico foram reproduzidos por Vitor Hugo e Prosper Mérimée conforme o romantismo do século
XIX enxergava os ciganos, e principalmente as ciganas, relatadas como belas, atraentes e com
poderes místicos para encantar e enfeitiçar qualquer homem que teriam interesse; o primeiro
criou a personagem Esmeralda, protagonista de Notre-Dame de Paris, o segundo criou Carmem.
Enquanto a primeira entre as várias ‘opções’ para se relacionar acabou escolhendo o único que
era compromissado (adultério), a segunda, ao conquistar o nobre Don José, fez dele um fora da
lei. Conforme veremos, toda esta narrativa será reproduzida na literatura brasileira fomentando e
difundindo rótulos até os dias de hoje.
Como já mencionado anteriormente os ciganos teriam ido para a Península Ibérica e lá se
estabeleceram além do período da Reconquista; em Portugal, em algum momento do século XVI estes
passaram por perseguições devido a sua participação nas invasões mouras, com isto, vários foram
deportados para as colônias distantes de Portugal. O primeiro relato de ciganos sendo enviados para
o Brasil é de 1574, um tal João Torres e sua família teriam sido enviados para cá, no entanto, não é
possível saber se realmente chegaram ao Brasil, se desviaram para outra colônia ou se acabaram
ficando na Europa; o que é fato é que a partir do século XVII vários ciganos chegaram no Brasil e a
importância destes na história do país tem sido negligenciada por historiadores. Houveram diversas
solicitações das capitais dos estados para que a coroa não enviasse ciganos para a colônia, ao ponto
que da metrópole, várias foram as solicitações para que os grupos de ciganos fossem enviados aos
sertões, pois lá seriam uteis na luta contra os nativos e se ficassem nas cidades portuárias poderiam
representar riscos econômicos.
Em MG e no RJ são apontados vários registros de confrontos, na capital da metrópole, no
entanto os ciganos conseguiram ocupar cargos públicos e tiveram alguns personagens com certa
notoriedade. É ainda no Rio que os ciganos são representados na literatura como os originadores
da malandragem do brasileiro como analisa FERRARI(2006), apontando esta constatação na obra de
Antônio Candido, Dialética da Malandragem. Assim, quando os ciganos aparecem em uma história
são tratados de forma pejorativa.
Até o momento, podemos constatar que as narrativas em torno dos ciganos e seus mitos geradores
contribuem para que os ciganos que conseguem algum tipo de ascensão social se camuflem, ou
então que a biografia destes não mencione sua origem cigana. Por exemplo, nos livros de história
não consta que os presidentes Washington Luiz e Juscelino Kubistchek eram de origem cigana, assim
como Clarice Lispector ou Olavo Bilac; mas se buscar um dicionário eles ainda serão relacionados
com roubos e negócios escusos.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 903
Referências
ANDRADE JÚNIOR, L. Os ciganos e os processos de exclusão. Revista Brasileira de História. São Paulo,
v. 33, nº 66, p. 95-112- 2013
ARISTICTH, J. Verdade Sobre Nossas Tradições. Brasil, Editora Irradicação Cultural, 1995.
FERRARI, F. Ciganos Nacionais. São Paulo, USP. Acta Literaria Nº 32 (79-96), 2006
TEIXEIRA, R. C. História dos Ciganos no Brasil. Núcleo de Estudos Ciganos Recife – 2008
ISSN 2358-3959
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Este trabalho apresenta um mapeamento de teses e dissertações que tratam da história da educação
dos indígenas, capturadas no acervo da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior
(CAPES) e em sites das próprias instituições de ensino superior (com Mestrado e/ou Doutorado em
Educação e em História), num recorte de tempo de produção que vai dos anos de 2001 a 2016. Vale
esclarecer que adotamos a expressão “história da educação dos indígenas” com base na discussão do
movimento indígena brasileiro, que considera o termo “indígena” mais adequado por significar “aquele
que pertence ao lugar”, “originário”, “original do lugar”, na mesma acepção do pesquisador e escritor
Daniel Munduruku (2012), superando o termo “índio”, código imposto pelos europeus e apropriado pelo
movimento indígena na década de 1970, quando as lideranças perceberam que essa apropriação era
fundamental para sua afirmação étnica (evidentemente, no contexto atual o uso desse termo não faz
mais sentido). No Brasil, os trabalhos sobre as questões étnico-raciais no contexto educacional ganharam
relevo nos anos 1980-1990, no bojo da redemocratização do país e do debate internacional sobre a
relevância da universalização da educação e da valorização dos direitos humanos universais, entre os
quais destaca-se o respeito pela diversidade cultural e étnico-racial. No âmbito da História da Educação
Brasileira, as questões que envolvem a diversidade cultural têm permeado vários estudos de releitura
histórica das iniciativas educacionais de grupos étnicos ainda no século XIX, especialmente de imigrantes
europeus e de negros, com ênfase para sua resistência difusa nos variados contextos de escravidão, pós-
abolição e período republicano. No caso dos indígenas, catequese e educação, imbricadas com
resistências difusas, também têm sido pesquisadas nos contextos de colonização, escravidão, “civilização”
republicana e variadas tutelas ao longo do séc. XX e, na história mais recente, a trajetória de lutas,
sobretudo, pela demarcação de terras e pelo direito à educação. Em relação à presença dos indígenas na
História da Educação Brasileira, educadores e historiadores têm se dedicado ao estudo de instituições
educativas formais e não-formais (desde o período colonial até os dias de hoje) de e para indígenas,
presentes historicamente nos espaços de aldeamentos, colônias, comunidades indígenas, cidades etc.;
no entanto, são poucos os trabalhos inscritos propriamente na área da história da educação dos indígenas
se comparados aos estudos sobre a educação escolar indígena, a maioria realizada nas linhas de pesquisa
de didática, currículo, métodos de ensino, políticas educacionais, formação de professores conforme
inventariou Luís Donisete Benzi Grupioni (2003), que chegou à conclusão de que a temática educacional
no contexto indígena adquiriu importância acadêmica entre 1978 e 2002, compondo um campo de saber
interdisciplinar. Também autoras como Raimunda Maria Rodrigues Santos e Neide Vieira de Siqueira
(2009) mostraram o que foi elaborado, estudado e produzido no país sobre a educação indígena, entre
teses de doutorado e dissertações de mestrado, em diferentes instituições de ensino e programas de pós-
graduação. Elas fizeram uma ampliação do inventário de Grupioni, estendendo a investigação até o ano
de 2007 e exploraram questões como problemáticas mais recorrentes, métodos e tipos de pesquisa (mais
recentemente, Sheila Alves de Araújo (2014) faz uma análise das produções científicas sobre a criança
indígena no período de 2001 a 2012). Analisando esses estudos, observamos que todos eles demonstram
um esforço para mapear, sistematizar e analisar as produções acadêmicas relacionadas sobretudo à
O presente trabalho tem como objetivos apresentar como a educação formal é retratada no
Jornal Momento Feminino: o jornal para o seu lar, que foi criado em 1947 e possui exemplares
na Biblioteca Nacional do Brasil até o ano de 1956; e identificar as reivindicações por escolas
presentes no periódico supracitado. A escolha desse periódico se deve ao fato do mesmo
ter sido escrito e dirigido às mulheres, demonstrando como uma fonte impressa pode trazer
representações sobre o feminino de uma determinada época; neste jornal muitos foram os
assuntos tratados: lar, família, filhos, moda, política, economia, educação, além da publicação
de contos. Assim, o estudo desse periódico nos leva ao campo de estudo de gênero e história
das mulheres, mas também nos faz refletir sobre a história da educação, já que o mesmo trazia
uma ampla discussão sobre educação formal, a saber: a defesa de mais escolas e creches, além
das campanhas por alfabetização de adultos. Estas discussões trazidas pelo jornal Momento
Feminino não estavam descoladas dos debates das décadas de 1940 e 1950, anos em que a
luta pela educação pública estava vigente, relembrando, ainda, que a Constituição de 1946
trazia o viés de “Educação como Direito de Todos”. Logo, não trazemos outra história, e sim,
demonstramos que as mulheres estavam inseridas em sua época, e tiveram um papel importante
nas discussões vigentes, incluindo o debate sobre educação para todos, e mais especificamente,
neste impresso vemos a importância dada para educação para os mais pobres.
As informações supracitadas devem estar aliadas ao que Momento Feminino representava, pois
como já mencionado, o mesmo foi escrito por mulheres, e além disso tinha em sua direção Arcelina
Mochel, vereadora pelo Partido Comunista do Brasil (PCB) no ano de 1947, frisando, ainda, que o
jornal é considerado pela historiografia como um órgão não oficial do PCB à época. Assim, ao iden-
tificarmos as reivindicações por uma educação formal para os mais pobres, conseguimos, através
das fontes, compreender o que mulheres militantes e partidárias possuíam como bandeiras de
luta nos anos de 1940 e 1950. Outro fator importante a ser analisado é que por ser um jornal dire-
cionado ao feminino, o discurso predominante era que elas, as mulheres, tinham como principal
missão o ato de educar. Dessa forma, entendemos a importância dada aos debates educacionais
nessa imprensa feminina, já que essa era uma missão das mulheres: educar seus próprios filhos
e a sociedade como um todo. Obviamente, não podemos esquecer que nos anos de 1940, apenas
pessoas alfabetizadas votavam o que também justifica a intensa campanha e ações do Partido
Comunista do Brasil em favor da escola e da alfabetização de adultos.
Como metodologia para este trabalho iremos analisar o conteúdo do jornal, trazendo
reportagens que retratam as reivindicações por escola, além de análises sobre o sistema
educacional, sendo interessante notar que a maior parte desses textos eram escritos por Ligia
Maria Lessa Bastos, professora e vereadora em 1947 pela União Democrática Nacional (UDN).
Assim, também analisamos que mesmo sendo um jornal que tinha em sua direção um quadro
do Partido Comunista do Brasil, este impresso trazia outras mulheres para escrever em suas
páginas. Com Perrot (2015), podemos compreender as discussões travadas por este impresso
feminino, pois a instrução é uma das reivindicações mais antigas das mulheres, sendo esta
uma das principais condições para trazê-las à cena pública. Vale ressaltar, que muitas mulheres
sempre trabalharam, mas será através da instrução que parte das mulheres, ainda reclusas ao
privado, vem para ocupar os espaços públicos. Também, devemos assinalar que as questões
trazidas pelo jornal Momento Feminino, estavam em torno da educação primária, formação
de professores, infraestrutura de escolas, não sendo aberto espaço para discussão sobre a
Educação superior. Esse fato é interessante, pois demarca um campo de reivindicações dos
movimentos femininos à época, pois se o grupo de Bertha Lutz reunido na Federação Brasileira
pelo Progresso Feminino (FBPF), criou a União Universitária Feminina (UUF) como uma
associação para organizar mulheres que estavam no nível superior ou já tinham passado por
ele, temos as mulheres de Momento Feminino escrevendo nas páginas do jornal que: era óbvio
o direito à mulher a uma instrução superior, mas que muito havia de se fazer para que todos
tivessem acesso à educação primária. Essa apreciação pontua uma distinção, sem juízo de valor,
mas que coloca posições políticas e diferencia, a priori, os movimentos de mulheres à época.
Logo, partindo dessas análises iniciais vale entendermos como a história das mulheres pode
contribuir para a história da educação, tendo em vista que muitos dos debates sobre o feminino
recaem sobre a luta por instrução, e por trabalho, já que consideravam que as mulheres tinham
como vocação educar. Não distante disso, uma das principais escreventes sobre educação no
jornal Momento Feminino era uma professora (e também vereadora), que mesmo não sendo do
mesmo partido político da direção do impresso teve espaço para trazer reflexões, expor críticas
e propor sugestões.
Para analisarmos nossa fonte, estabeleceremos diálogos com diferentes autores, incluindo
referências que tratem sobre os debates educacionais à época e a importância da Constituição
de 1946, que mesmo trazendo à luz a concepção de “Educação como Direito de Todos”, essa
mesma Constituição ainda se mantinha excludente, quanto à gratuidade pra todos os níveis de
ensino. O que nos leva a compreender as reivindicações constantes no jornal Momento Feminino.
Ainda, será relevante os estudos sobre histórias das mulheres e gênero, pois o destaque dado à
escolarização e a missão de educar das mulheres, mesmo em um jornal do Partido Comunista do
Brasil, revela como a construção do feminino, transpassa posicionamentos políticos, podendo
ser ainda, uma forma de conquista, já que a instrução e o trabalho são as principais lutas das
mulheres. Não distante, pensarmos a história das mulheres, neste caso, será também pensarmos
a história da educação, tendo em vista que identificaremos através das fontes e das referências
bibliográficas as reivindicações e lutas travadas por educação formal e pública para todos, nas
décadas de 1940 e 1950.
Deste modo, ressaltamos a importância de pensarmos como a imprensa é uma fonte
significativa a História das Mulheres, em que se torna possível avançarmos nas “invisibilidades”
de sujeitos históricos, tendo em vista que a imprensa é dos um dos meios de atuação feminina,
desde o século XIX. Logo, todo documento, incluindo os impressos, são construções de um
determinado tempo histórico, de uma sociedade e cultura, e desta forma, ele deve ser analisado,
questionado e perguntado para que se obtenha análises de um determinado fato humano.
Portanto, podemos afirmar que utilizar Momento Feminino como fonte de pesquisa, nos faz
assinalar temas, linguagem, conteúdo, quem escreve e para qual público.
Por fim, vale ressaltar que a imprensa feminina e militante do Partido Comunista do Brasil
demonstra como a educação é também um campo de disputa política, já que a mesma perpassa
toda a sociedade. Logo, um jornal dirigido por uma integrante de um partido político, pode
trazer questões para pensarmos a escolarização das classes populares no Brasil, demonstrando
como a cultura política não está restrita a disputas nas eleições. Além de revelar que pessoas
de diferentes correntes políticas puderam estar presentes num projeto de impresso, que tinha
como foco a informação e educação de mulheres. Logo, o jornal Momento Feminino: o jornal
para seu lar se destaca por ser semelhante aos periódicos da época, trazendo em suas páginas
assuntos considerados femininos, como moda, culinária, literatura, mas também se diferencia ao
trazer discussões políticas, de economia, e principalmente por enfatizar a presença feminina na
construção da educação brasileira. Sendo assim, entendemos a importância dos estudos sobre
histórias das mulheres para compreendermos diferentes histórias, pois a presença feminina na
sociedade se deu de muitas formas, e através desses vestígios de memória, como a imprensa
feminina, podemos demonstrar os sujeitos que antes eram considerados invisíveis.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 908
Referências
FARIA, Lia. Os excluídos da ceia republicana – pelo direito à educação. In: MONTEIRO, Geraldo Tadeu
M.. Estado, Democracia e Direito no Brasil: trinta anos da Constituição Cidadã. Rio de Janeiro:
Gramma Editora, 2019.
LUCA, Tania Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY (org.). Fontes históricas.
São Paulo: Contexto, 2008.
PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. São Paulo: Contexto, 2015.
Referências documentais:
Momento feminino: um jornal para seu lar. Brasil. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1947 a 1956.
(hemeroteca digital)
RESUMOS DAS
COMUNICAÇÕES
INDIVIDUAIS
EIXO
SUJEITOS E
PROCESSOS
ESCOLARES E
NÃO ESCOLARES
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente trabalho é parte de uma pesquisa em andamento que versa sobre a atuação dos
inspetores escolares no processo de nacionalização das escolas paulistas sendo que a abordagem
aqui explicitada incide na análise de fragmentos do livro de Reunião[1] Pedagógicas, boletim nº
14 da Secretaria da Educação e da Saúde Pública da capital paulista e que apresenta os resumos
dos relatórios das vinte e uma delegacias regionais de ensino redigidos pelo Professor Plínio Paulo
Braga - Delegado Regional em comissão junto a diretoria de ensino.
Nesse compêndio do livro, observamos que uma das naturezas temáticas que constaram o
cronograma de organização dos encontros regionais das delegacias de ensino de São Paulo, obedece
ao decreto devidamente publicado no “Diário[2] oficial “de 16 de janeiro de” 1937, e que determina
como uma das temáticas para os encontros pedagógicos das autoridades de ensino o tema do
“cultivo da linguagem pátria” como um dos norteadores das discussões e das ações de intervenção
e de orientação técnica pedagógica a serem considerados no trabalho pedagógico com as escolas
primárias paulistas do ano em voga.
A temática da cultura da língua pátria foi tomada no ano de 1937 na cidade de São Paulo como
um dos direcionamentos das ações nas visitas de inspeção realizada pelos inspetores escolares e
como um princípio da atuação dos delegados de ensino bem como, em uma diretriz do investimento
técnico da orientação dos trabalhos pedagógicos realizados pelos diretores escolares em suas
respectivas escolas.
Na presente fonte, livro de Reunião[3] Pedagógicas, boletim nº 14 da Secretaria da Educação
e da Saúde Pública da capital paulista, observamos um forte apelo estabelecido nos discursos
impostos nas diferentes reuniões regionais realizadas entre as principais autoridades do ensino
público paulista no intuito de resguardar a expansão nacionalizadora nas escolas. “O Estado de S.
Paulo apresenta diversidades de aspectos, encarado sob o prisma das correntes imigratórias que o
procuram”. (trecho do relatório da delegacia da Capital - 1937).
É importante mencionar sobre uma possível e necessária qualificação precisa do que foi o
nacionalismo que nos parece explicito na análise desse compêndio fonte documental do setor
da educação Paulista, e isso nos permite dizer, em concordância com CORSI (2000, p.14), que o
projeto nacional permanece neste contexto como eixo abstrato, como ideal declarado por todos, daí
surgindo à necessidade de qualificar-se mais precisamente de que nacionalismo as esferas publicas
falavam e que propostas nacionalistas levou adiante em suas respectivas práticas politicas.
No cenário paulista, assistimos nesse período um crescente desenvolvimento econômico que
fortaleceu o fluxo imigratório na cidade em função da potencialização da economia pelo capital
industrial, dos quais podemos observar a mão de obra estrangeira configurando-se no cenário urbano.
Diante disso identificamos nas diferentes organizações escolares a presença marcante do público de
imigrantes alocados em diferentes zonas instituídas na extensão do estado e na configuração das
cidades. Vimos na análise desse documental o quão incisivas encadearam-se às ações presentes
nas práticas e discursos[4] dos diferentes sujeitos responsáveis pela representação pública e
política do ideal patriota frente a atuação com as instituições escolares de modo que observamos
o “esquadrinhamento” organizado de diferentes ações e atuações de inspeção pelas regionais de
ensino, bem como de intervenções de orientação técnica descritas nos relatórios do presente livro
oficial e desenvolvidas ao longo do ano como testificam os relatórios que apresentam o delineamento
racional e organizacional promovidos com os encontros regionais dos diferentes distritos de São
Paulo de modo a reverberar em ações sistemáticas de neutralização dos condicionantes culturais
presentes nas diferentes áreas tomadas pelos imigrantes de diferentes nacionalidades.
As descrições explicitadas nos relatórios dos inspetores apresentam grandes anseios e
preocupações com as manifestações culturais adversas às nacionais mantidas em determinadas
regiões pelos estrangeiros aqui alocados e dos quais inferem tratar de atitudes de obediência às leis
e elementos da pátria origem da população imigrante.
[...] “Embora solicitos e obedientes ás leis do paiz, os immigrantes não perdem de vista os interesses
de sua patria distante, a que procuram servir por todos os meios. Nas populações menos numerosas
mantêm elles escolas, onde tudo-methodos de ensino e programmas, material didactico, hymnos
patrioticos, - é puramente japonez”.
Referências
NÓVOA, A. História da educação: novos sentidos, velhos problemas. In: Magalhães, Justino P. (org.)
Fazer e ensinar história da educação. Braga, Universidade do Minho, p 35-54, 1998.
SAVIANI, D. História das Ideias Pedagógicas no Brasil. 5º edição -, Campinas, SP, Autores Asociados –
(coleção memória da educação). 2019.
FARGE, Arlette. O sabor do arquivo. Tradução Fátima Murad. São Paulo, Editora da Universidade de
São Paulo, 2009.
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XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 912
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[1] Fonte fornecida pela Memória Técnica Documental da PMSP, para a pesquisa em andamento como exigência ao
título de mestre pela UNIFESP.
[2] Jornal institucional dos atos, decretos e publicações dos órgãos públicos do Estado de São Paulo.
[3] Fonte fornecida pela Memória Técnica Documental da PMSP, para a pesquisa em andamento como exigência ao
título de mestre pela UNIFESP.
[4] O estabelecimento das nossas interações pela pesquisa com os discursos escritos nos diferentes relatórios apre-
sentados no documento em análise - Livro oficial de reunião Pedagógica boletim nº14 /1937 - Estado de São Paulo -
produzidos pelos inspetores escolares para a abordagem de suas respectivas atuações diretas com as organizações
escolares nos permitirá utilizar-se da metodologia da análise de discursos recomendada por Chartier (2002) “A in-
venção da escrita no mundo da oralidade, a aparição do códice no mundo dos rolos ou a difusão da imprensa no
mundo do manuscrito obrigaram a semelhantes, senão idênticas, reorganizações das práticas culturais” (Chartier,
2002a; 2003a).
ISSN 2358-3959
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Com as crescentes conquistas da educação inclusiva, seus debates têm se ampliado cada vez
mais nas discussões pedagógicas e reflexões metodológicas dentro e fora dos ambientes
escolares. Muitos intelectuais e instituições contribuíram para a implementação e consolidação
de políticas públicas e educacionais que atendam às subjetividades dos alunos com Necessidades
Educacionais Especiais (NEE). Diante deste contexto e a partir da perspectiva da História Cultural,
esta pesquisa está inserida no campo da História da Educação e circunscrita aos domínios da
História dos Intelectuais e das Instituições. Tendo como ponto de partida a construção entre os
campos político, intelectual e educacional, este trabalho tem como objetivo investigar a relação
da intelectual Dorina de Gouvêa Nowil e sua atuação para a criação de políticas públicas para
educação de cegos no Brasil através da Fundação Dorina Nowill para Cegos (FDNC). Dorina de
Gouvêa Nowill nasceu em 28 de maio de 1919, na cidade de São Paulo. Filha de Manuel Monteiro
de Gouvêa e Dolores Panelli, Dorina teve dois irmãos: Amélia, mais velha e Manuel, o caçula. Em
1927, ingressou no Externato Elvira Brandão, onde cursou do primário ao ginásio, formando-se
em 1935, em São Paulo. Vitimada por uma doença, sofreu infecção ocular que causou hemorragia
e cegueira, aos 17 anos de idade. Foi a primeira mulher com deficiência visual a formar-se
professora pela Escola Normal Caetano de Campos em 1945. Ao longo do curso, desenvolveu
com o apoio de colegas um método para promoção de educação de crianças cegas. O projeto
teve aprovação do Departamento de Educação do Estado de São Paulo, abrindo caminho para a
instalação do I Curso de Especialização de Educação de Cegos na América Latina. Em 1946, criou
a Fundação para o Livro do Cego no Brasil (FLCB). Atualmente situada em São Paulo, a Rua
Diogo de Faria, nº 558, Vila Clementino, sob o nome de Fundação Dorina Nowill para Cegos
(FDNC) atua há mais de 70 anos no atendimento ao deficiente visual, buscando em suas ações a
completa autonomia e integração social do deficiente à sociedade, oferecendo programas
gratuitos de reabilitação e produzindo materiais didáticos em braile, livros falados e mídias
digitais. Resultado de uma militância de sua fundadora, a professora Dorina Gouvêa Nowill, em
um exemplo de como a persistência é fator determinante para o sucesso e de que a limitação,
imposta pela falta de visão desde os 17 anos, não impediram que a intelectual levasse a frente
seu alvo na democratização e acesso aos processos formativos. A instituição não atua apenas
nas questões de cobertura das carências apresentadas pela educação formal, age diretamente
na inclusão do deficiente na sociedade tendo como eixo de sua frente de trabalho três pontos
de atuação: primeiro na produção e distribuição gratuita de material gráfico especial, tais como
livros em Braille para alunos da rede pública de ensino do Estado de São Paulo, manuais de
instruções, bulas de remédios, placas de sinalizações, entre outras. Segundo na produção de
material sonoro, como livros falados e digitais, revistas de circulação nacional e materiais para
treinamentos empresariais, feitos mediante solicitação. E terceiro, através de diversos cursos,
como no ensino da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), cursos específicos para introdução do
deficiente visual ao mercado de trabalho. Neste olhar, ao abordar a temática da educação
inclusiva, a compreendemos como um direito garantido por leis através de um processo sócio
histórico de conscientização e embates políticos em busca de reconhecimento. Vale ressaltar
que a perspectiva inclusiva que é abordada na pesquisa é vista por Romeu Sassaki (1997) como
de adaptação mútua entre sujeito com deficiência e sociedade na busca de um desenvolvimento
amplo em todos os aspectos de sua vida. Neste sentido, evidencia-se que não se trata de uma
modalidade de ensino exclusiva ou segregadora destinada às pessoas com deficiência e NEE.
Nota-se, portanto, que todo esse processo de construção e consolidação de políticas públicas
para cegos e demais sujeitos com NEE, se deu através de lutas e conquistas. A participação de
intelectuais no processo de conquista de direitos é comum nas sociedades, pelo fato de fazerem
parte de um grupo que atua socialmente e comporta-se como criador e mediador cultural
(SIRINELLI, 1998). De tal modo, enxergaremos Dorina como uma pensadora que direciona toda
a sua atuação política e educacional no sentido de promover a inclusão de pessoas com cegueira
à formação. Em sua atuação, uma postura de possibilitar a todos o acesso à educação de
qualidade. Dessa forma, nota-se que as discussões trazidas pela Nova História Cultural, que nos
permitem não apenas a inovação nos métodos e ampliação das fontes de pesquisa, mas também
novas interpretações, com abertura para diversos domínios, sendo, portanto, uma linha de
trabalho historiográfico que possibilita a pluralidade (BURKE, 2008). A partir dessa perspectiva,
é possível compreender o mundo como invenção, percebendo as diversas camadas de história
construídas ao longo do tempo por práticas e representações, ideias e mentalidades. Essa
abertura teórica reflete também em uma diversidade de estudos e fontes, possibilitando
diálogos entre concepções anteriormente distintas, como é o caso da história política. Para
melhor compreender a trajetória e a atuação de Dorina de Gouvêa Nowill, nos pautamos nas
deliberações do historiador francês Jean François Sirinelli (1996). As análises promovidas pelo
viés cultural da história, permitem o rompimento com leituras deterministas em que a sociedade
influencia e forja o intelectual ou, por outra via, o intelectual constitui-se de maneira a-histórica
e descontextualizada, exercendo ele influência direta sobre o meio. Cabe-nos nesse trabalho
perceber a dupla influência de uma instância sobre a outra, analisando as relações sujeito-
sociedade e sociedade-sujeito que orientam concepções políticas, discursos e ações. Para uma
melhor compreensão da figura de Dorina Nowill, foi trabalhado o conceito de intelectual
proposto Sirinelli, que entende esses sujeitos como membros de uma elite criadora e mediadora
cultural (SIRINELLI, 1998). De tal forma, a intelectual Dorina é vista nesse trabalho como uma
criadora e mediadora cultural. Uma intelectual capaz de captar os discursos que ocorriam sobre
a temática da inclusão educacional em nível internacional, aliar às suas experiências sociais e
traduzir isso em militância por direitos, pressão por debates e políticas públicas, projetos e
propostas inclusivas para a formação de cegos principalmente através da Fundação Dorina
Nowill para Cegos. Outro autor que nos auxilia na construção das análises é Michel de Certeau.
A partir de sua obra A Escrita da História (1982), podemos pontuar o tripé lugar de fala, prática e
escrita da intelectual estudada. De tal modo, buscamos apresentar a trajetória de Nowill,
relacionando sua vida pessoal à sua atuação pública em prol da criação e consolidação de
políticas públicas para as pessoas com NEE. Sua escrita também é contemplada a partir do
contato com sua autobiografia E eu venci assim mesmo (1996), operacionalizada por meio da
análise do discurso. Em nossa pesquisa, o discurso é visto a partir de uma perspectiva
foucaultiana, no qual ele é um elemento de primeira importância para a conquista e a legitimação
do poder. Temos, portanto que a garantia de direitos e a construção de um espaço para discussão
de práticas inclusivas na educação não se dá de maneira naturalizada, mas sim através da
atuação de sujeitos e instituições. Além do livro autobiográfico da intelectual, serão também
tomadas como fontes biografias e a legislação educacional voltada para alunos com NEE. As
mesmas são operacionalizadas pelo método historiográfico da heurística e da hermenêutica,
realizando a crítica interna e externa dos documentos, e relacionando-os aos seus contextos
sociais e políticos de produção. Buscamos, portanto, compreender a importância de Dorina de
Gouvêa Nowill para educação inclusiva no Brasil, sobretudo, para os cegos, bem como da
Fundação Dorina Nowill para Cegos. Trabalhos como este aqui construído, evidenciam a
necessidade de conhecer mais a fundo as relações entre sujeito e sociedade que implicam nas
articulações políticas, na criação e aplicação das leis e decretos educacionais e na atuação de
instituições para promoção de uma efetiva educação inclusiva em nosso país.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 915
Referências
BURKE, Peter. O que é História Cultural? Trad. Sergio Goes de Paula 2ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editora. 2008.
CERTEAU, Michel de. A Operação Historiográfica. In: ____. A Escrita da História. Rio de Janeiro:
Forense-Universitária, 1982.
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SIRINELLI, Jean-François. As elites culturais. In: RIOUX, Jean Pierre; SIRINELLI, Jean-François. Para
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SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais in: RÉMOND, René. Por uma história política: Rio de Janeiro:
Ed. UFRJ/Ed. FGV, 1996.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O trabalho em lume fez parte da minha dissertação de Mestrado (Silva, 2018) e tem como objetivo
analisar a atuação do médico Almir Madeira (1884-1972) no tocante a assistência à infância pobre
escolar, na cidade de Niterói, então capital do estado do Rio de Janeiro, a partir de uma das suas
ações neste campo, a instituição da Obra do Copo de Leite, na Escola Euzébio de Queiroz, no ano
de 1917. A instituição desta Obra configurou-se como mais uma ação do médico para combater a
mortalidade infantil e o analfabetismo na cidade.
Almir Madeira formou-se em Medicina, em 1909, pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro,
atuou primeiro como estagiário e depois como médico do Instituto de Proteção e Assistência à
Infância do Rio de Janeiro (IPAI) entre os anos de 1909 a 1914. O Instituto de Proteção e Assistência
à Infância fora criado pelo médico Moncorvo Filho em 1899 e tinha dentre seus objetivos prestar
assistência materno-infantil às mães e crianças pobres da capital da República. Desta forma, fazer
parte do corpo de estagiários e médicos do Instituto permitiu a Almir Madeira entrar em contato com
a geração de médicos e intelectuais reformistas (SIRINELLI, 2003) insertado nos debates em torno da
filantropia e do modelo racional de assistência médico infantil que via uma forma de não somente
tratar a doença, mas também de preveni-la.
Sendo assim, ao posicionarmos Almir Madeira pertencendo a uma geração de médicos e
intelectuais reformistas, assumimos a noção de geração defendida por Sirinelli (2003) na qual
determina um evento como marco fundador de uma geração. Defendemos que a mobilização em
torno da assistência à infância pobre fundamentada na racionalidade científica e na legitimação
do poder dos médicos tenha sido a o marco fundador para os médicos da geração de Almir Madeira
(Silva, 2018), De acordo com Sirinelli:
Estar inserido no contexto do Instituto de Proteção e Assistência à Infância e comungar das ideias
que lá eram defendidas permitiu que fosse confiada a Almir Madeira por Moncorvo Filho a fundação,
em 1914, do Instituto de Proteção e Assistência à Infância de Niterói (IPAIN), congênere do da capital
da República. Esta oportunidade possibilitou ao médico Almir Madeira se dedicar diretamente e
ampliar sua atuação nas causas da infância pobre de sua cidade. Embora o Instituto de Niterói tenha
sido fundado como congênere da capital federal, com regras, padrões e objetivos gerais próximos,
houve especificidades que marcaram sua individualidade e pontuaram suas distinções. No caso de
Niterói, o Instituto foi responsável pela distribuição do copo leite em escola pública da cidade, em
1917 (Silva, 2018), a Escola Euzébio de Queiroz.
Conforme Silva (2018) o discurso salvacionista via a infância como um “ser em devir” (SARMENTO,
2007, p.26), o “futuro da nação” e com a “missão de salvadora do mundo”. Se as crianças eram
consideradas o futuro de uma nação, eram delas que o país tinha que se preocupar fazendo
intervenções para prevenir as doenças que as assolavam e as levavam à morte ou à debilidade.
Nesta direção, “a educação realizada de formas diversas como a higiênica, religiosa, física, moral,
intelectual congraçava para a obtenção de uma sociedade representante de um país civilizado e de
uma nacionalidade em construção” (SILVA, 2018, p.75).
Desta forma, Almir Madeira projetava a escola como “lugar de regeneração física e mental” (Silva,
2018, p.114) e propagava a concepção de que a criança bem nutrida avançaria em seus estudos,
“não ficaria doente e teria mais aptidão para as atividades físicas” (Silva, 2018, p.114). Silva (2018)
afirma ainda que sendo assim, a alimentar as crianças corretamente era uma das soluções, junto
com outras para aumentar a frequência escolar e acabar com o analfabetismo. Além de protegê-las
da morte precoce, das doenças, da inaptidão, do raquitismo, da inércia e a prepará-las para o serem
futuros trabalhadores.
Baseando-se na ideia do pediatra argentino Genaro Sisto, que implementou nas escolas públicas
do seu país o Copo de Leite, o médico Almir Madeira seguiu a realização de Sisto e implementou
a mesma obra na cidade de Niterói. A Obra do Copo de Leite, conforme o médico, foi iniciada em
1917 e baseava-se na distribuição de um copo de leite para os alunos da Escola Euzébio de Queiroz
que encontravam-se subnutridos e eram matriculados no Instituto de Proteção e Assistência à
Infância de Niterói (MADEIRA, 1922 apud SILVA, 2018). Em sua palestra Obras de preservação escolar,
apresentada na Conferência inaugural do Curso de Férias da Escola Normal de Niterói, Almir Madeira
afirmou que o Copo de Leite era, “incontestavelmente um meio propício, embora tão simples,
para aumentar a frequência escolar, e que a outros aliados poderiam facilmente resolver o grave
problema nacional do analfabetismo” (Jornal do Commercio, 14/12/1923).
A Obra o Copo de Leite configurou-se como uma das ações de Almir Madeira como Diretor do
Instituto de Proteção e Assistência à Infância de Niterói (IPAIN) e só foi possível por haver filantropos
na instituição com capital suficiente para financiar a distribuição do leite na Escola Euzébio de
Queiroz. Acreditamos que através da rede de sociabilidades (SIRINELLI, 2003) construída por Almir
Madeira foi possível a Obra o Copo de Leite “Condessa de Nova Friburgo” alimentar 57 crianças entre
os anos de 1914 a 1918, segundo os dados informados no jornal O Berço (08/011919) e em 1920 haver
a distribuição de copos de leite para 236 crianças (O Jornal, 13/10/1928).
Para a realização deste trabalho analisamos as fontes documentais relativas aos trabalhos
apresentados por Almir Madeira como o apresentado no Primeiro Congresso Brasileiro de Proteção à
Infância, em 1922: Da instituição do Copo de Leite no Brasil e a palestra Obras de preservação escolar,
proferida na Conferência inaugural do Curso de Férias da Escola Normal de Niterói, em 1923.
Como resultado obtido através das fontes analisadas verificamos que Almir Madeira através
da implementação da Obra Copo de Leite pretendeu ampliar as ações preventivas às doenças em
relação ao corpo e a alimentação das crianças pobres da cidade de Niterói. Esta ação embora fosse
advinda do Instituto de Proteção e Assistência à Infância de Niterói tinha como objetivo alcançar um
maior número de crianças na cidade para além do espaço físico da Instituição.
Como fontes primárias pesquisamos em jornais O Jornal, Jornal do Commercio, O Berço. Nos
jornais realizamos pesquisas acerca da atuação do médico e suas ações, bem como informações
sobre o Instituto de Proteção e Assistência à Infância de Niterói e suas relações com médicos e outros
profissionais da sua geração.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 918
Referências
CAMARA, Sônia. Infância pobre e instituições assistenciais no Brasil republicano. In FARIA FILHO,
Luciano Mendes, ARAUJO, Vania Carvalho (Org.). História da Educação e Assistência a Infância no
Brasil. Vitória: EDUFES, 2011.
SARMENTO, Manuel Jacinto. VASCONCELLOS, Vera Maria Ramos. (Org.) Infância (in)visível.
Araraquara: Junqueira & Marin, 2007.
SILVA, Alessandra Moura da. Entre a assistência médica infantil e a regeneração da infância pobre
escolar: a atuação do médico Almir Madeira a partir do Instituto de Proteção e Assistência à
Infância de Niterói de 1914 a 1929. 2018. Dissertação (Mestrado) Programa de Pós-Graduação em
Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René (Org.). Por uma História Política. 2ª
edição – Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Fernando Ripe
A presente comunicação pretende desenvolver uma análise dos discursos relativos à boa
educação de sujeitos infantis que que foram enunciados em um manual pedagógico dedicado
ao “descanço dos Mestres, e utilidade dos Discipulos”. O interesse por sua análise, justifica-se na
medida em que, nos finais do século XVIII, a circulação de obras que direcionavam a aprendizagem
da leitura, da escrita e da contagem, mas principalmente na instrução dos princípios da religião e da
civilidade, ganhou centralidade na cultura impressa portuguesa.
Tomamos como principal fonte de análise a obra Nova escola de meninos. Na qual se propõem
hum methodo facil para ensinar a lêr, escrever, e contar, com huma breve direção para a educação
dos meninos. Ordenada para descanço dos Mestres, e utilidade dos Discipulos. Escrito pelo presbítero
secular Manoel Dias de Sousa (1753-1827), publicada em Coimbra no ano de 1784.
Apesar de Nova Escola de meninos ter tido uma única edição, é importante destacar que o
conjunto enunciativo mobilizado pelo autor é, semelhante aos manifestados em obras similares
que circularam na Europa neste mesmo período, decorrentes, sobretudo, das práticas partilhadas
socialmente e dos saberes científicos divulgados à época. Manoel de Sousa afirma reiteradas vezes
que seus aconselhamentos são advindos de sua experiência, bem como do seu conhecimento
adquirido pela leitura dos “grandes autores”.
Como revela o título da obra, a intenção do autor era oferecer aos Mestres e discípulos um
eficiente e simples método para a aprendizagem da leitura e escrita da língua portuguesa e das
operações elementares da aritmética.
Ao final de Nova escola de meninos, foi acrescido um capítulo intitulado Breve Direcção para a
educação dos meninos, ao qual apresentava um conjunto de direcionamentos “para a educação da
mocidade”, propondo que se utilizasse “o modo mais util de se portar com os meninos, de forma
que se intimidem com máo modo, ou pancadas como todos os dias succede; nem menos com hum
methodo demasiadamente brando que mais se lisonjéem, que ensine” (SOUSA, 1784, Dedicatória).
Tendo em vista, que que estes preceitos de regulação e punição, propagados a um determinado
público leitor, possuem a intenção de direcionar a conduta dos infantis masculinos, que propomos
como chave de leitura teórica o conceito de governamentalidade, de Michel Foucault (2006). Tal
categoria analítica nos possibilita a compreensão dos deslocamentos enunciativos operados pelo
religioso Manoel de Sousa a fim de produzir uma população infantil masculina guiada pela ética
religiosa-cristã e pela civilidade como modos específicos de vida.
Metodologicamente, estamos preocupados em analisar a estrutura do discurso mobilizado pelo
autor, compreendendo, para tanto, as construções/constituições que o mesmo empregou para o
sujeito infantil. Ao entendermos que este discurso de governamento está diretamente inserido e
influenciado pelo contexto político e social em que o seu autor está inserido, propomos a identificação
e análise dos possíveis mecanismos de poder e de saber discursivamente aconselhados para
administrar e supervisionar os infantis lusitanos do final do século XVIII. Nesse sentido, a intenção
é a de defender a tópica de que as regras para a boa educação de meninos postas pelo religioso
Manoel de Sousa se constituem como um conjunto de ações, de domínio do Estado, capazes de
gerenciar e governar uma população, neste caso os sujeitos infantis masculinos, capaz de atuar
numa sociedade moderna.
A partir de um empreendimento metodológico de análise e descrição da obra citada, indicando não
somente os enunciados imperativos, mais recorrentes, mas como estes funcionaram para a promoção
de determinados modos de ver e dizer a infância masculina por meio de prescrições e normativas que
indicavam valores ético-religiosos, conservação da saúde e adiantamento nos estudos.
Os imperativos ético-religiosos igualmente se propunham a educar os filhos nos bons costumes
cristãos, de modo que, a vigilância e a punição foram elementos estrategicamente enunciados. Nestes
casos, pais e mestres deveriam estar atentos para inibir toda inclinação por meio dos mecanismos
da repreensão e do castigo, a fim de inculcar nos meninos a subordinação e a obediência.
Por se tratar de uma narrativa produzida por um padre, é justificável que enunciados religiosos
fossem os elementos mais destacados para a imitação dos infantis. Ao longo de todo o manual
pedagógico Sousa não poupou oportunidades de manifestar seu apresso aos preceitos católicos
como forma de guiar a conduta dos meninos. Exemplo, quando o autor critica aqueles que ignoram
e denigrem os costumes cristãos, afirmando que a “ignorância tem sido sempre o manancial donde
brotão a corrupção dos costumes, as liberdades, e as superstições; e a experiência tem mostrado
que os ignorantes da Religião, e dos seus estudos, são os que se tem atrevido a quererem denegrir a
sua magestoza, e soberana face” (SOUSA, 1784, p. 189).
A educação foi percebida pelo autor como a ação de modelar uma criança, “desde o berço”, por
meios dos costumes civis e dos preceitos cristão-católicos, sobretudo, para evitar que o infantil se
inclinasse aos vícios. Nesse sentido, a educação deveria superar a ausência de razão, uma vez que
pretendia “suprir esta falta [ignorância] em que nascemos, e deve ensinar a domar as paixoens, antes
que chegue a idade de as temer” (SOUSA, 1784, p. 189). Destacou, ainda, a necessidade de “cultivar,
e formar a mocidade assim nas ciências, como nos costumes, e ensinar-lhe a cumprir as obrigaçoens
da vida civil, e Christã” (SOUSA, 1784, p. 190).
Ainda que a obra tenha sida objetivamente direcionada à educação de meninos, seus enunciados
também poderiam ser empregados ao ensino de meninas. O regime de educabilidade posto no século
XVIII europeu, certamente era normatizado pela figura de um educando ideal, seja uma criança,
masculina, de segmentos da aristocracia ou da burguesia e, principalmente no caso português,
fundamentada na religião católica. No entanto, é importante destacar, conforme Rogério Fernandes
(1994, p. 22), que os discursos pedagógicos direcionados às meninas, “pelo menos entre as classes
superiores”, deveria ter “duração assaz reduzida”. De acordo com o autor, esta redução da fase da
infância às meninas se justificava pela intenção de casá-las o quanto antes. “O casamento, por sua
vez, não tardava a transformar a menina em mãe”.
Em síntese, cumpre afirmar que o manual Nova Escola de meninos desempenhou importante
papel no processo discursivo de constituição de sujeitos masculinos nos finais do século XVIII
em Portugal. Primordialmente, ao alertar os pais e mestres sobre o combate dos pecados, Sousa
afirmou enfaticamente a necessidade de as crianças serem reguladas pelos “dictames da razão, e da
prudencia, e fundada nas maximas da virtude”, pois do contrário os pais poderiam causar “grandes
encargos da sua consciencia, e os graves damnos de seus filhos, e os prejuízos da sua caza, e da
Republica”. Por fim, Sousa advertiu que seria infrutuoso todo esforço e dedicação na educação dos
filhos sem o auxílio de uma consciência cristã, “todo o trabalho, e deligencia humana he frustrado,
se lhe falta a benção graciosa do Creador, a quem deve toda a virtude, e toda a ciência, a assim
devem primeiro que todo implorar o seu auxilio” (SOUSA, 1784, p. 200).
Cabe ainda destacar, que, assim como outros escritores portugueses do Setecentos, Sousa
firmou-se como um escritor tributário e compilador de muitas ideias da pedagogia de John Locke.
Notadamente a boa educação de um filho deveria ser guiada pela razão e, no caso de Sousa,
acrescida dos valores éticos-cristãos, portanto, fundada na obediência e na negação dos vícios que
poderiam conduzir os meninos aos pecados.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 921
Fonte
SOUSA, Manoel Dias de. Nova escola de meninos. Na qual se propõem hum methodo facil para
ensinar a lêr, escrever, e contar, com huma breve direção para a educação dos meninos. Ordenada
para descanço dos Mestres, e utilidade dos Discipulos. Coimbra: Na Real Officina da Universidade,
1784.
Referências
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ISSN 2358-3959
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Organizados com base territorial nos bairros, subúrbios, favelas e morros de diversas cidades
brasileiras, os Comitês Populares também se evolviam nos problemas das localidades como
reivindicações em torno de saúde, organização e orientação para implementação de Comitês,
proteção e ajuda aos lavradores locais, criação de serviço de entrega de correspondência a domicílio,
canalização de água potável, canalização de esgoto, melhorias no bairros; iluminação de ruas,
meio fio, calçamento etc. Para além das reivindicações imediatas, a outra finalidade dos Comitês
era interessar a população em questões da grande política, abandonando a ação isolada e voltada
estritamente para o local.
Se tratando da educação e da cultura, que foram as reivindicações que estavam no ceio das
preocupações dos Comitês Populares, várias atividades culturais e educacionais foram promovidas,
dentre as quais destacavam-se a atuação do poeta Francisco Solano Trindade na Baixada
Fluminense, em especial Duque de Caxias conforme pesquisa documental preliminar. De acordo
com suas possibilidades e limitações, os Comitês Populares Democráticos, desenvolveram teatro
amador, sessões de cinema, exposições, programa de calouros, bailes, concursos carnavalescos,
entre outras atividades. Porém o carro-chefe dessas atividades foi a campanha de alfabetização de
adultos. Os cursos de alfabetização se instalaram nas sedes dos Comitês ou, em grande parte, nos
cômodos, ou quintais cedidos pelos moradores. Voluntários ministravam as aulas. Solicitação de
doações de materiais foi uma constante na vida dos Comitês.
Uma figura pública negra que se destacou no Rio de Janeiro e também na Baixada Fluminense,
por meio dos Comitês Populares Democráticos, foi Francisco Solano Trindade. Poeta e residente fixo
do Rio de Janeiro, Solano constituiu o Comitê Democrático Afro Brasileiro em 1945. Em 1944 Solano
publicou um livro cujo título era ‘’Poemas de uma vida simples’’ e devido a um poema de seu livro
‘’Tem gente com fome’’, o poeta foi preso, e teve seu livro apreendido.
Por trás da iniciativa dos Comitês Populares Democráticos, não pode ser negligenciado o PCB,
que foi o partido político que esteve a frente da população brasileira em busca de uma vida mais
justa e digna as pessoas, que se diferenciava de outras ideologias políticas, não por ser melhor, mas
por promover e praticar a democracia interna e buscar mudar a realidade do país com integralidade.
Lutava pela classe operária, tinha uma função altamente educativa e patriótica, buscavam atuar
com lealdade em todas as organizações de classes, e nos Comitês Democráticos Populares, de
bairros e profissões, a fim de mostrar ao povo, que a democracia para ser conquistada, é organizada
a partir e por eles mesmo, usufruindo e defendendo os direitos que lhes são seus, como políticos
e econômicos na constante renovação e aproveitamento dos valores mais capazes de exercerem
cargos públicos. (Tribuna Popular, 13/06/1945, p.2)
O intercâmbio dos Comitês também era ação muito comum, onde havia envolvimento e
organização, o que nos mostra que seus trabalhos quando organizados, não acontecia de forma
individualizada, mas quando se uniam mesmo cada um sendo atuante em uma localidade, o
fortalecimento em prol do progresso brasileiro, tendia a ser maior. Uma busca pela União Nacional.
Em uma grande reunião do Comitê Democrático Progressista de Belford Roxo, diversos Comitês
tiveram a palavra, dentre eles os de Coelho da Rocha, Agostinho Porto, Vila Meriti, Coelho Neto, São
Mateus, Andrade de Araújo e Nova Iguassú. Assuntos de diversos interesses daquela localidade e do
povo em geral, foram debatidos. Falaram sobre o aumento das passagens nos trens de Rio D’Ouro e
da linha auxiliar e da deficiência dos transportes nos trens da Central, ônibus etc. (Tribuna Popular,
15/08/1945, p.5)
Apesar das deficiências e a limitação que eles enfrentavam pela estrutura político-econômico do
sistema dominante capitalista. Os movimentos de educação popular tiveram um significante papel
na formação política das camadas populares, corroborando para a conquista de espaços efetivos
de participação nas zonas periféricas da sociedade e o fortalecimento dos partidos políticos mais
identificados com os movimentos populares. Esses movimentos foram o ponto de partida, onde
poderia e deveria ser instaurado um processo educativo de elevação da consciência política das
massas, mas também um ambiente propício de construção de novas relações sociais, primeiramente
solidárias, e futuramente, socialistas. Frente a ausência de uma tradição de participação política
popular organizada no Brasil, a experiência de educação popular dos Comitês Populares
Democráticos na Baixada Fluminense, longe de ser inexpressiva, possui valor para história de
educação da sociedade da região. É um acontecimento pouco conhecido na história da educação
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 924
Referências
Lemme, Paschoal. Memórias de um Educador. Volume 4. 2 ed. Brasília: Inep, 2004.
PINHEIRO, Marcos Cesar de Oliveira. O PCB e os Comitês Populares Democráticos na cidade do Rio de
Janeiro (1945-1947). Rio de Janeiro: UFRJ/IFSC/Programa de Pós Graduação em História Comparada,
2007. (Dissertação de Mestrado)
SANTOS, Henrique Buy dos. Os Comitês Democráticos Populares na Baixada Fluminense (1945-
1947). Nova Iguaçu: UFRRJ/ Instituto Multidisciplinar/Departamento de História e Economia, 2011.
(Monografia de conclusão de curso).
BATISTA, Vitor da Silva. Educação Popular na Baixada Fluminense: a experiência dos Comitês
Populares Democráticos (1945-1947). In: Congresso Nacional de Educação, V. 2018, Recife –
Pernambuco: REALIZE, 2018.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este trabalho se insere no campo de pesquisa sobre História de Vida. Assim, toma-se como proposta
apresentar resultados parciais de uma pesquisa que se encontra em desenvolvimento acerca da
História de Vida de Dorcelina de Oliveira Folador. Trata-se, nesse sentido, de uma investigação que visa
(re)construir a História de Vida dessa mulher que foi professora, mas também ativista política e atuante
nas Artes, no período que vai de 1963 ao ano de 1999. A delimitação temporal aqui estabelecida, toma
como base, respectivamente, o ano de 1963, que corresponde a data de nascimento de Dorcelina
de Oliveira Folador, na cidade de Guaporema, interior do Paraná, Brasil; e finda na segunda metade
da década de 1990, mais precisamente, em 1999, quando Dorcelina tem sua vida interrompida, ao
ser vítima de disparos de arma de fogo, em sua casa, onde morava com duas filhas ainda crianças e
seu esposo na cidade de Novo Mundo, no interior de Mato Grosso do Sul, Brasil. Com vistas a se (re)
construir a História de Vida dessa mulher, adota-se uma metodologia qualitativa, baseada na coleta e
análise de fontes de fundo biográfico (manuscritos sobre sua rotina de vida, de reuniões, anotações
sobre escola, desenhos, fotografias), provenientes de um arquivo pessoal, conservado pela família de
Folador. Ao lado disso, também se procurou fazer um levantamento de materiais que servissem como
fontes, provenientes de Centros de Documentação, Arquivos Históricos e em Secretarias de Educação
do Estado de Mato Grosso do Sul, nos quais se buscou registros desta professora a fim de se obter pistas
acerca do seu percurso laboral como educadora. Além disso, recorreu-se às fontes orais, por meio de
entrevistas com parentes e pessoas que vivenciaram e conheceram Dorcelina de Oliveira Folador. Essas
entrevistas estão sendo coletadas por meio de um roteiro com questões semiestruturas e gravadas por
meio da técnica do gravador. Após a coleta, tais entrevistas passam por um processo de transcrição e,
por conseguinte, por um processo de análise. Cabe salientar que todos os entrevistados assinam um
Termo de Livre Consentimento e Esclarecimento (TECLE), de forma a conceder a presente pesquisa o
direito de usos dos dados coletados. O trabalho de análise das fontes aqui destacadas tomam como
base as discussões do sociólogo francês Pierre Bordieu (1997), sobre capital cultural, bem como,
busca-se estabelecer uma vinculação com as referências sobre história de vida, história de mulheres,
história da educação, história do Brasil e história de Mato Grosso do Sul. A pesquisa biográfica, a
qual se busca desenvolver aqui, toma como definição aquilo que é proposto por Delory-Momberger
(2016, p. 136), enquanto “[...] reflexão da inscrição do agir e do pensar humanos em figuras orientadas
e articuladas no tempo que organizam e constroem a experiência segundo a lógica de uma razão
narrativa [...]”, mas também, a exemplo do que nos fala Viñao (2000), uma narrativa que, por pertencer
a um determinado tempo e espaço, carrega em si as intenções daquele que a escreve, possibilitando
o resultado de sua escrita sobre si carregar omissões, bem como, recriações do fato rememorado. Os
resultados parciais desta pesquisa apontam que Dorcelina foi uma professora que desenvolveu um
trabalho singular nos campos da Educação, da Política e das Artes, na região de Mundo Novo – MS,
durante as décadas de 1980 e 1990. Nos diferentes campos nos quais atuou, a saber, educacional,
político e artístico, pode-se dizer que Dorcelina se utilizou das experiências cotidianas do contexto
religioso e social, bem como dos saberes institucionais adquiridos na sua formação educacional para
promover a diferença entre aqueles que a circundavam. Para uma melhor compreensão da história de
vida de Dorcelina, torna-se importante esclarecer aqui ainda que ela se mudou com apenas 11 anos
de idade, em 1974, com sua família para Mundo Novo, cidade que pertence ao atual Estado de Mato
Grosso do Sul e faz divisa com Paraná e com o Paraguai. A cidade de Mundo Novo, desde a chegada
da família de Dorcelina, nos anos de 1970, era marcada por conflitos entre acampados (sem-terras) e
os latifundiários da região, resultante da crise que assolou o país nessa época e obrigou trabalhadores
da terra, brasiguaios e indígenas expulsos de suas propriedades, a migrarem dos estados vizinhos
para a região mundonovense. Ainda jovem, junto com a família, passou a frequentar a comunidade
católica daquele lugar, no qual, a partir de 1980, veio a se tornar uma das líderes da Pastoral da
Juventude. Concomitante aos papéis que assumiu de liderança em campanhas comunitárias da igreja
católica, estava o seu trabalho na política. Ainda jovem, Dorcelina, ao tomar como experiência as suas
atividades direcionadas aos menos favorecidos, passou a ser correspondente do jornal do Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, em Mundo Novo, o Jornal dos Sem Terra, no qual relatava os
feitos do movimento, bem como, as perseguições que o grupo sofria. Já no ano de 1987, participou
da fundação do Partido dos Trabalhadores, na cidade onde morava. E, no ano seguinte, candidatou-
se a vereadora. No ano de 1996, foi eleita prefeita de Mundo Novo, de modo a passar a assumir o
cargo em janeiro do ano subsequente. Enquanto no papel de prefeita, Dorcelina trouxe importantes
modificações para a cidade, em especial, por assumir como postura um engajamento em projetos
que visavam à valorização de segmentos sociais que se encontravam à margem, a exemplo dos
pequenos trabalhadores rurais, das mulheres, das crianças e das pessoas com deficiência; tomando-
se como instrumento de materialização o Orçamento Participativo. Ainda durante a sua gestão frente
à Prefeitura de Novo Mundo, Dorcelina foi assinada, mais precisamente em 1999, conforme inquérito,
o motivo de sua morte foi resultado do mal estar que esta causou naqueles que não comungavam das
suas práticas políticas. De um modo geral, pode-se dizer que trabalho de levantamento de dados, bem
como a seleção e entrecruzamento de fontes acerca da história de vida da mulher, professora, política
e atuante nas artes, Dorcelina de Oliveira Folador, até então invisível aos olhos sociais do Estado no
qual atuou e do mundo acadêmico, em geral; torna-se importante tanto para a história das mulheres,
a história, história política e história da educação sul-mato-grossense à medida que se toma como
base de pesquisa aquilo que é discutido por Pierre Bourdieu (1997) sobre capital cultural. Em outras
palavras, tomando-se como base este sociólogo francês e, junto a isso, propondo-se uma imersão na
história econômica e política do Estado do Mato Grosso do Sul, para além daquilo que foi registrado
com base em preceitos da história tradicional; pretende-se compreender de que modo o volume e
a estrutura dos capitais conquistados por Dorcelina ao longo de sua vida influíram no seu trabalho
seja no campo educacional, político ou artístico. Assim como colocado por Araújo (2014), a história da
mulher no papel de docente e, incluiria aqui, no papel de política e nas artes, não pode ser pensada
de modo desvinculado do contexto mais amplo de constituição da mulher no espaço social. Dito isso,
no caso de Dorcelina, não se pode menosprezar o fato de se tratar da história de vida de uma mulher
que busca se firmar em espaços socialmente destinados a homens, e não somente isso, tratam-se de
homens que pertencem e defendem os interesses hegemônicos de uma elite e que, como no caso de
Folador, usam da força estatal para reprimir ações que os ameaçam.
Referências
ARAÚJO, Sônia Maria da Silva. História das mulheres, história de vida de professoras: elementos para
pensar a docência. Educ. rev. [online]. 2014, n.53, p.295-310.
BOURDIEU, P. Capital Cultural, Escuela y Espacio Social. México: Siglo Veinteuno, 1997.
VIÑAO, Antonio. Las Autobiografías, Memorias Y Diarios Como Fuente Histórico-Educativa: Tipología
Y Usos. Revista Teias. PROPED. UERJ. v. 1, n. 1 (2000)
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este estudo teve como objetivo geral, analisar as produções intelectuais da linha de pesquisa Saberes
Culturais e Educação na Amazônia, voltadas aos saberes e educação que ocorrem em espaços não
escolares. Em decorrência deste objetivo busquei analisar as concepções de saberes e de educação que
fundamentam as produções intelectuais da linha de pesquisa Saberes Culturais e Educação na Amazônia;
identificar o aporte metodológico que fundamentam estas produções; assinalar os tipos de saberes
mapeados em diversos espaços nas produções e, refletir historicamente sobre a construção da linha de
Pesquisa Saberes Culturais e Educação na Amazônia. O marco temporal definido para este estudo foi o
período de 2003-2015, por englobar a trajetória histórica do Programa de Pós-graduação em Educação
da Universidade do Estado do Pará (PPGED/UEPA), a partir de sua constituição em 2003, perpassando
pela formação da primeira a nona turma. Do ponto de vista metodológico tratou-se de um estudo
documental e bibliográfico, de abordagem qualitativa. Os procedimentos de produção de dados se
constituíram a partir de levantamento bibliográfica (LAKATOS; MARCONI, 1995) e, análise de um conjunto
de produções intelectuais do PPGED/UEPA e documental (BLOCH, 2001), por também direcionar estudo
à história da linha de pesquisa Saberes Culturais e Educação na Amazônia, do referido Programa de Pós-
graduação. Os documentos analisados na referida pesquisa constituíram-se em, Portaria de nº 191/2003
CCSE/UEPA; Parecer CNE/CES nº: 163/2005; Resoluções do CONSUN-UEPA de nº: 892/2003 e CONCEN-
UEPA de nº: 383/2003; Projeto de Pesquisa/NEP, Edital 06/2004 CCSE/UEPA; Edital do processo seletivo
do PPGED/UEPA, 2005; Proposta do Programa do PPGED/UEPA, 2015; Regimento do PPGED/UEPA, 2015.
Com intuito de obter dados históricos sobre o referido Programa de Pós-graduação, foram realizadas
entrevistas semiestruturada com três sujeitos, todas professoras que compunham o corpo docente do
PPGED/UEPA e que, participaram intensivamente junto ao processo de constituição deste Programa.
Procedi a análise dos dados com base na técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 2002), com intuito de
desenvolver leitura minuciosa das mensagens científicas contidas nos conteúdos que compunham as
produções analisadas. Esta pesquisa teve como fonte central de análise, as produções intelectuais
discentes. Neste sentido, no presente artigo, refino reflexão em torno dos tipos de saberes assinalados os
quais, encontram-se mapeados em diferentes espaços de educação nas produções analisadas. Ressalto,
que o Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade do Estado do Pará, desde sua
constituição a partir da recomendação pela CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior) no ano de 2005, é formado por duas linhas de pesquisa: a 1º Formação de Professores e
Práticas Pedagógicas, que dentre outros objetivos, desenvolve estudos no campo da formação inicial e
continuada de professores e a 2ª linha Saberes Culturais e Educação na Amazônia que, também investiga
temas educacionais como, saberes, representações, imaginário, conhecimento em relação às práticas
socioculturais e educativas, no contexto brasileiro e amazônico. Dessa forma, os estudos das duas linhas
contemplam pesquisas que refletem problemas educacionais voltados à realidade brasileira e
apresentam como especificidade reflexões em torno do universo socioeducacional da Amazônia, em
seus múltiplos ambientes educativos com um olhar para o desenvolvimento educacional da referida
região. Ao visar esses objetivos, o PPGED/UEPA vem se consolidando na pesquisa em educação na região
norte, há mais de dez anos através de investigações calcadas na diversidade de temas educacionais
voltados a compreensão da problemática educacional no ambiente escolar, assim como em outros
espaços sociais, no contexto cultural da Amazônia. Vale ressaltar, que as produções intelectuais discentes,
são entendidas segundo Targino (2010, p. 32), como um ‘manancial de conhecimentos consolidados em
determinada área ou especialidade’ isto é, como um conjunto de conhecimentos científicos produzidos
na academia que congregam pesquisas em torno de diferentes temáticas no interior de determinado
campo de conhecimento. Dito isto, as produções intelectuais analisadas constituem-se em um conjunto
de conhecimentos científicos que contribuem para pensar educação a partir da dimensão educativa da
cultura e neste sentido, desvelam estudos sobre processos educativos não escolares os quais, são tecidos
no contexto da vida social por estarem imbricados em inúmeras práticas socioculturais que mobilizam
um conjunto de saberes e evolvem distintas coletividades. Portanto, o meu interesse em estudar um
conjunto da produção intelectual do PPGED/UEPA, foi devido essas trazerem em seu bojo investigações
que desvelam processos educativos e saberes, junto ao cotidiano de sujeitos, grupos e coletividades
ocorridos em distintos espaços sociais da Amazônia, para além do espaço escolar, o que remete a
compreensão de que educação é um processo tecido por um conjunto de práticas socioculturais que se
fazem presentes na vida diária de homens e mulheres sendo assim, ao se desenvolver em contextos
culturalmente diversos, implica na concretude de educações, como indica Brandão, 2002, p. 7, ‘...
Ninguém escapa à educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos, todos
nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para
saber, para fazer, para ser ou conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação...’. Dito isto, ao se
desenvolver em diversos contextos e, sendo gestada nas relações interpessoais, a educação proporciona
aos indivíduos sentidos de educar no e para o percurso da vida, respondendo às demandas socioculturais
de seu tempo, tornando-os paulatinamente em seres aprendentes. Neste sentido, as produções
intelectuais analisadas sinalizam a ocorrência de educação que possui um contorno próprio por ser
específica a determinado meio educacional que, no entendimento de Trilla (2008, p. 29) é um “meio que,
em suma, abriga espaços e tempos nos quais se gera educação”. Sendo assim, o meio pode ser uma casa
de produção de farinha, uma aldeia indígena, uma escola de samba, um ritual religioso dentre outros,
onde o tempo para aprender e ensinar é forjado na ação educativa. Para o autor, esses meios educacionais
configuram tipos distintos de educação nas sociedades humanas, os quais se diferenciam pela
especificidade do processo educacional. Em se tratando das produções intelectuais analisadas, estas
revelam distintos espaços sociais onde ocorre educação como: estaleiro naval familiar; terreiro de Mina;
ritual de encomendação das almas dentre outros. A educação que se desenvolve em diferentes espaços
sociais e encontra-se difusa na sociedade por estar imbricada em práticas socioculturais, tende a
mobilizar um conjunto de saberes criados e recriados por sujeitos envolvidos no processo do aprender e
ensinar. Albuquerque (2015, p. 662-3), denomina esses saberes, de saberes culturais e os entende como
‘...Uma forma singular de inteligibilidade do real, fincada na cultura, com raízes na urdidura das relações
com os outros, com o qual determinados grupos reinventam criativamente o cotidiano...’. Os saberes
culturais, neste sentido, resultam das relações que indivíduos estabelecem com o meio natural em que
vivem e, calcados na cultura, fundamentam-se em outra racionalidade, onde predomina, por exemplo, a
habilidade, a criatividade, a percepção. Sendo assim, homens e mulheres em convívio social interpretam,
organizam e essignificam suas experiências ao longo do tempo que, atravessadas pelos saberes culturais,
lhes permitem compartilhar entendimentos sobre a realidade em que vive. É a partir desta perspectiva,
que cultura neste estudo é entendida como um sistema entrelaçado de símbolos, sentidos e significados
os quais, para Geertz (2008) são interpretáveis por serem constituídos e transmitidos historicamente.
Disto isto, percebo a cultura amazônica, formada de distintos modos de vida como, por exemplo, dos
ribeirinhas, dos quilombolas, dos povos originários os quais, ao atribuírem sentido às suas práticas
culturais em suas relações interpessoais, revelam um complexo conjunto de saberes que configuram
diferentes maneiras do aprender e ensinar. Dentre as conclusões, registro identificação de tipos de
saberes: Saberes Religiosos; Saberes da Produção; Saberes da Comercialização; Saberes Étnicos; Saberes
Poéticos-carnavalescos; Saberes Artísticos bem como, a diversidade de espaços de educação reveladas
nas produções intelectuais analisadas como: Grupo de Capoeira; Festa do Jacaré dos Assurini-Trocorá;
Práticas De uma Curadora; Festa do Sairé; Polo Joalheiro; Feira do Agricultor, Grupo de Dança Regional,
dentre outros. Constatei neste estudo, entre outros aspectos, há predominância destas pesquisas no
meio rural, com maior concentração na mesorregião do Nordeste Paraense.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Este trabalho tem como tema a renovação da pedagogia católica no Paraná. Seu interesse se volta
para o processo de constituição do campo intelectual católico, no contexto paranaense. Através da
atuação dos intelectuais católicos na área da educação a Igreja procurou resignificar o seu papel
social e político na sociedade paranaense. No Brasil, a liderança de Alceu Amoroso Lima (1893-1983),
levado à condição de presidente do Centro Dom Vital do Rio de Janeiro em 1928, foi decisiva para
fomentar um laicato militante nos ideais católicos. No Paraná, a liderança de Alceu Amoroso Lima
também foi importante. Desde a criação do Círculo de Estudos Bandeirantes, no ano de 1929, o
laicato católico paranaense organizou-se de modo institucional. Assim, a presente pesquisa busca
apresentar a participação de Alceu Amoroso Lima nesse processo de organização do laicato católico
paranaense. Para tanto, a correspondência dos intelectuais paranaenses com o presidente do Centro
Dom Vital do Rio de Janeiro foi analisada como fonte histórica.
O trabalho tem objetivos: identificar e analisar as características do modernismo católico na
atuação dos intelectuais no contexto paranaense das décadas de 1920 e 1930 e suas implicações
na educação. Analisar a participação de Alceu Amoroso Lima no processo de formação do campo
intelectual católico no Paraná. Identificar os principais interlocutores de Alceu Amoroso Lima no
campo do laicato católico paranaense. E apresentar e analisar a disputa ideológica pela hegemonia
no interior do campo intelectual católico no Paraná.
Para Gramsci (2007), a Ação Católica foi um movimento complexo que comporta a conjugação de
três elementos: católicos integristas, jesuítas e católicos modernistas. Sua análise será importante
aqui para compreendermos a atuação dos intelectuais católicos, especialmente de Alceu Amoroso
Lima, procurando situá-lo entre as diferentes nuances da configuração do campo católico. Entre
os intelectuais católicos cabe delimitar, portanto, suas linhas ideológicas, no inclusive no contexto
paranaense.
Os intelectuais católicos foram representantes do modernismo católico tal como foi definido por
Gramsci. Muitos estudiosos apropriam-se das ideias gramscianas no estudo sobre os intelectuais
(SAID, 2000), (VIEIRA, 2008) e (CAMPOS, 2010), mas poucos utilizam-se delas para o entendimento
da Ação Católica e do Catolicismo. Dentre estes últimos merecem destaque Pierucci (1978), Cury
(1984), Hoonaert (1986) e Portelli (1984). Os intelectuais católicos também estavam sintonizados
com a renovação educacional do movimento pela Escola Nova.
Para Fausto (2001, p. 18), é necessário lembrar as divergências entre os “pensadores católicos” e
os “nacionalistas autoritários”. Além disso, a corrente católica “possuía vários matizes”, que podem
ser representados em Jackson Figueiredo e Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde). Um ponto de
vista era comum entre os católicos: “a interpretação transcendental da história” e sua característica
espiritualista. Já os nacionalistas autoritários eram cientificistas, naturalistas e se aproximavam do
ecletismo. Jackson era um “tradicionalista” que idealizava um “modelo de sociedade medieval”.
Por sua vez, Alceu “um modernizador”, preocupado com o que “chamava de Idade Nova”, mais
tarde “convertido em um defensor da democracia”. Essas afirmações nos permitem compreender as
peculiaridades dos intelectuais católicos da época.
Os estudos teológicos da Igreja Católica, em 1879, passaram por um projeto de restauração. As
mudanças foram apresentadas sutilmente e tinham como norte dos estudos a filosofia tomista,
procurando restabelecer a harmonia entre a razão e a fé. O Papa Leão XIII, na encíclica Aeterni
Patris (1879), ordena aos católicos a retomada imediata do pensamento de Tomás de Aquino como
autoridade filosófica em que deveriam se inspirar, para aproximação de maneira gradual ao mundo
da ciência (Hanicz, 2003).
O projeto de restauração (ou romanização)[1] do catolicismo foi uma reação da Igreja à
modernidade. Os documentos Mirari Vos (1832), de Gregório XVI, Quanta Cura e o Syllabus Errorum
(1864), de Pio IX, já demonstravam a preocupação dos papas com o pensamento moderno presente
entre os católicos. Leão XIII procurou sanar essa situação obrigando a retomada do tomismo. Em sua
famosa encíclica Pascendi Dominici Gregis (1907), o Papa Pio X seguiu a mesma linha, procurando
combater o “modernismo católico”, isto é, a adoção de ideias modernas por parte dos católicos.
Para Pio X, o tomismo seria um dos “remédios” para combater o modernismo entre os católicos. No
entanto, cumpre salientar que a retomada do pensamento Tomás de Aquino será designada nesse
contexto de neotomismo.[2]
As pesquisas que tratam dessa temática educacional, isto é, da participação direta da Igreja no
campo educacional paranaense das décadas de 1920 e 1930, podem ser encontradas nas obras de
Campos (2008), Fressato (2003) e Hanicz (2006). Nesse sentido, é fundamental analisar o processo
de formação do grupo de leigos que estavam a serviço da igreja, assim como os principais conceitos
que demarcam a ação dos católicos sob esse projeto.
Na perspectiva teórico-metodológica a pesquisa orienta-se pela História Intelectual. Os autores
tomados como referências principais são Antonio Gramsci (a discussão sobre os intelectuais e a Igreja
Católica, a Ação Católica e o modernismo católico) e Pierre Bourdieu (as noções de posição social,
trajetória, capital cultural, campo intelectual e redes de sociabilidade). A orientação do trabalho
baseia-se em uma história-problema. Estabeleceremos um diálogo particular com a História, a
Sociologia e a Filosofia.
Entre os resultados alcançados na pesquisa estão: a investigação sobre a sociabilidade intelectual
de Alceu Amoroso Lima no Paraná e, respectivamente, seus projetos para o campo da educação.
Entre os intelectuais paranaenses que mantiveram importante comunicação epistolar com o líder
do laicato católico, encontrei: Bento Munhoz da Rocha Neto (1905-1973), Flávio Suplicy de Lacerda
(1903-1983) e Liguarú Espírito Santo (1900-1985).
É preciso mencionar que analisamos a correspondência passiva de Alceu Amoroso Lima, isto é,
as cartas recebidas por ele de intelectuais paranaenses. Além desses nomes importantes do laicato
católico paranaense, vinculados ao Círculo de Estudos Bandeirantes, outras personalidades de
relevo na sociedade da época também trocaram suas missivas com Amoroso Lima, entre eles, os dois
arcebispos de Curitiba: Dom João Francisco Braga (1868-1937) e Dom Ático Eusébio da Rocha (1882-
1950). Contudo, optamos por não investigar os clérigos, preferindo analisar apenas os membros do
laicato católico.
A preocupação com a questão da educação era central na reação católica iniciada nos anos de
1920. Como escreveu Flávio Suplicy de Lacerda, em 1932, Amoroso Lima era o “grande líder da reação
católica”. A sua atuação política, literária e intelectual teve dimensão nacional, incidindo também no
Estado do Paraná. Apesar de Curitiba não ter fundado uma sede para o Centro Dom Vital, como era
a vontade de Amoroso Lima, é correto afirmar que o Círculo de Estudos Bandeirantes, inaugurado
em 1929, foi uma entidade congênere a essa associação. Havia o culto à memória de Jackson de
Figueiredo e a preocupação com o estudo da obra de Farias Brito. Mas, além disso, buscava-se a
propagação do tomismo, por meio da divulgação da Suma Teológica, na tradução de Alexandre
Correia. As obras de Amoroso Lima e do padre Leonel Franca eram requisitadas e citadas pelos
membros do laicato católico paranaense. Com destaque maior para as publicações de Amoroso Lima,
que serviam para subsidiar o trabalho docente desenvolvido pelos intelectuais católicos no ensino
superior paranaense. O auge dessas boas relações foi a outorga do título de “sócio-correspondente
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 931
honorário” do Círculo de Estudos Bandeirantes a Alceu Amoroso Lima. Isso evidencia que houve
uma apropriação da obra de Amoroso Lima por parte do laicato católico paranaense.
O trabalho com a imprensa era outra característica marcante na atuação tanto de vitalistas
quanto de bandeirantes. A publicação em jornais e revistas era algo incentivado pelos intelectuais
católicos. Nesse sentido, Amoroso Lima foi convidado a publicar seus artigos no jornal Cruzeiro, do
Círculo de Estudos Bandeirantes. Esse convite foi realizado por Liguarú Espírito Santo, que também
mediou a colaboração de Bento Munhoz da Rocha Neto com a revista A Ordem, do Centro Dom Vital
do Rio de Janeiro. Assim, havia um intercâmbio constante de publicações. O estudo dos artigos de
Rocha Neto na revista A Ordem ainda é um trabalho a ser realizado. Da mesma forma, a investigação
sobre os textos de Amoroso Lima difundidos no jornal Cruzeiro.
Na correspondência, como instância da sociabilidade intelectual, é possível identificar as
nuances do trabalho desenvolvido no campo educacional por parte do Círculo de Estudos
Bandeirantes. Mais ainda, torna-se viável, mesmo que por meio de indícios, avaliar a participação
de Amoroso Lima nesse processo. É correto afirmar que, com base na análise da correspondência,
nota-se uma transição dos fundamentos filosóficos que norteiam a ação do laicato católico. Essa
transição consistia na passagem do espiritualismo e antirracionalismo de Farias Brito, representado
por Jackson de Figueiredo (herdeiro do ultramontanismo), para o neotomismo, que, via Jacques
Maritain, passou a ser divulgado por Amoroso Lima entre os intelectuais católicos. Esse foi um
processo lento e contraditório.
[1] Trata-se de um processo de reforma da Igreja, iniciado após a perda dos estados papais, ocorrido durante o pontif-
icado de Pio IX (1846-1878).
[2] O Papa Leão XIII (2005) pediu através da encíclica Aeterni Patris a “renovação da filosofia cristã tomista nas escolas
católicas” (p.71). Assim, o tomismo foi “renovado” no âmbito do catolicismo.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Durante as três primeiras décadas do século XX, Francisco Furtado Mendes Vianna produziu
uma grande variedade de obras didáticas, dentre elas a série “Leituras Infantis” composta por
sete obras que vão desde cartilhas para alfabetização até livros seriados para o ensino de leitura;
além de poemas, hinos, artigos educacionais e conferências. Além das produções, Francisco
Vianna foi também professor normalista paulista, inspetor escolar e superintendente de
educação elementar no Distrito Federal (Rio de Janeiro). Como forma de compreender o seu
percurso na historiografia da educação, o presente artigo visa reconstituir a vida educacional e
profissional do autor, entre os últimos anos século XIX e as primeiras décadas do século XX. Para
buscar uma melhor compreensão de sua formação intelectual, procura-se recuperar o ambiente
físico, social e cultural em que Vianna se movia, apresentando, assim, a sua formação, os seus
parceiros profissionais e eventos sociais quais esteve presente em sua trajetória de vida.
Considerando a representatividade de Francisco Vianna na educação, é necessário compreender
como e porque o autor escreveu as suas obras e quais foram as motivações para esses
escritos. Sendo assim, foi utilizado o conceito de “trajetória” proposto por Bourdieu (1996), que,
diferente da biografia, incide localizar as posições que esse indivíduo ocupa na sociedade e o
modo como o mesmo se desloca ou se mantém. Dessa forma, a análise visa apresentar as
permanências e os deslocamentos realizados por Francisco Furtado Mendes Vianna em sua
trajetória de vida, relacionando a sua posição social com as relações próximas. Compreender o
conceito de trajetória para reconstituir a vida do autor é entendê-lo, dessa forma, em um campo
de disputas com outros professores e autores de escritos educacionais, e que esses também
percorreram um caminho parecido para se constituírem dentro desse universo, com a consciência
de estarem dentro do jogo, aceitá-lo, reconhecer seus os alvos, seja de forma consciente ou não.
Em relação as obras didáticas (especialmente às séries de leitura) publicadas por tantos autores
- inclusive Vianna - no início do primeiro período republicano, constituem-se em objetos nobres
ou temas dignos de interesse, ou seja, possui uma valorização por definição ideológica,
constituída por grupos dominantes acerca do que pode ou não ser dito e valorizado. Para que
esses objetos (no caso os livros educacionais) sejam estimados hierarquicamente é necessário
investimentos intelectuais suficientes, sendo esses objetos apreciados por meio de legitimidade
e prestígio. Nesse jogo de disputa por prestígio e legitimidade, compreende-se o percurso de
Francisco Vianna na disputa por um espaço dentro da educação, considerando o momento e os
locais que exerceu a sua profissão. Sendo assim, os jornais e revistas periódicas educacionais
quais o autor Francisco Vianna foi mencionado foram utilizados para operar essa análise,
abarcando a sua produção de livros didáticos, sua atuação como professor, como inspetor
escolar; sua participação em eventos sociais e produção de concepções educacionais e políticas
por meio de palestras e publicações em revistas e jornais. Dessa forma, foram pesquisados os
jornais presentes no acervo da Biblioteca Nacional (BN) – Acervo Hemeroteca Digital Brasileira.
Foram utilizados os seguintes títulos publicados no Distrito Federal: A época (1880-1889/1910-
1919), A Lanterna (1870-1879), Jornal da Noite (1870-1889), A Manhã (1920-1959), A noite (1910-
1969), A Razão (1910-1929), Revista da Semana (1900-1959), Almanak-Henault (1900-1919),
Annaes da Assembléa Nacional Constituinte (1930-1939), Correio da Manhã (1900-1979), Diário
Carioca (1920-1969), Diário da Noite (1930-1979), Diário de Notícias (1860-1899/1930-1979),
Gazeta de Notícias (1870-1959), Jornal do Brasil (1860-1869/1890-2018), Jornal do Commercio
(1820-2018), O imparcial - diario illustrado do Rio de Janeiro (1910-1949), O imparcial (1920-
1929), O Jornal (1870-1879/1900-1979), O Malho (1900-1959), O Paiz (1860-1939); os publicados
em São Paulo foram: O Estado de São Paulo (1875-2018), Correio Paulistano (1850-1949),
Commercio de São Paulo (SP) e A Lanterna: Folha Anti-Clerical de Combate (1900-1919). Um total
de 150 ocorrências sobre suas atividades profissionais e pessoais foram localizadas entre os
anos de 1893 e 1935, tanto na cidade de São Paulo quanto no Distrito Federal (Rio de Janeiro).
Os jornais selecionados para a presente pesquisa foram publicados entre o fim do século XIX até
a metade do XX, período marcado por uma expansão de periódicos com diferentes posições
ideológicas, reflexo de um contexto marcado pelas mudanças políticas, no aumento populacional
e imigratório, além do desenvolvimento econômico que refletiram no consumo frenético de
informações e na necessidade de definir novos ideais sobre o novo cidadão republicano. Com a
relevância do jornal como ferramenta essencial para captar as diferentes mudanças que
ocorreram no início do século, acredita-se que o uso dos jornais é essencial para compreender
a posição social de Francisco Vianna e como as suas obras circularam durante o período. De tal
modo, foram coletados os jornais que possuíam referências ao autor (assuntos pessoais e
profissionais) como forma de situá-lo socialmente, mas também sobre as obras publicadas com
o seu nome. Como resultados obtidos, observou-se que foi num cenário político, econômico,
populacional e cultural marcado pela disputa entre os diversos grupos sobre os valores a serem
propagados na população e na defesa na educação como forma de mudança na sociedade que
Francisco Vianna cresceu. A nova demanda educativa necessitou de profissionais de diversas
áreas: arquitetos, médicos e sanitaristas, profissionais da área do Direito e da política, além de
educadores empenhados no conhecimento dos métodos de ensino, e na criação de materiais,
como por exemplo, os livros didáticos, pois, além das reformas instituídas no final do século XIX
e início do XX, os profissionais da educação realizavam palestras e conferências com o intuito de
inculcar modelos educativos. Ao reconstituir a vida pessoal e profissional de Francisco Furtado
Mendes Vianna identificou-se que o professor, autor e inspetor escolar era um homem do seu
tempo, formou-se em uma das instituições mais importantes da época (A Escola Normal de São
Paulo), atuou em instituições educacionais como professor e diretor (Escola Prudente de Moraes,
Grupo Escolar Dr. Cardoso de Almeida e Gymnasio de Campinas), ocupou cargos burocráticos e
de importância (Inspetor de Ensino e Superintendente Geral do Ensino Elementar e Particular
do Rio de Janeiro). Participou de eventos de caridade, criou uma instituição de apoio aos
professores, ofereceu conferências educacionais e ofertou cursos preparatórios, publicou
diversos escritos voltados para o campo qual disputava, dando visibilidade para os seus feitos e
sendo reconhecido, de certa forma, por seus contemporâneos. Também foi possível constatar
como a relação familiar com os tios o possibilitou a seguir a carreira da educação e na defesa do
ideal positivista comteano e proferi-los em seus escritos. Francisco Vianna apreende por meio
da vivência com o seu tio Godofredo José Furtado e pelo seu outro tio, Teixeira Mendes, a defesa
pelo ideal de comteano. Dessa forma, observa-se que as suas relações familiares (mesmo que
pequena por conta da perda dos pais de forma tão repentina) o possibilitou manter contatos
profissionais e pessoais tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro. No que diz respeito aos
vínculos sociais, principalmente a sua proximidade com a família Barreto por meio de René, foi
criado um terreno fértil para que Francisco Vianna fosse aprovado no concurso para a cadeira de
“História Natural” em um dos ginásios mais importantes do período, o de Campinas. Observa-se
que, além de ocupar a cadeira de professor, o autor substitui o diretor Arnaldo de Oliveira
Barreto por um curto espaço de tempo. Ao ocupar um cargo de tamanha importância com pouco
tempo de atuação na instituição e tempo de profissão, Francisco Vianna foi convidado para o
cargo de inspetor no Distrito Federal, sendo esse um dos mais cobiçados pelos professores.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 934
Referências
BOURDIEU. P. É possível um ato desinteressado? In: BOURDIEU. P. Razões Práticas: sobre a teoria da
ação. Campinas, São Paulo: Papirus, 10 ed., 1996, p.137-157.
CHARTIER, R. A História Cultural: entre práticas e representações. Tradução: Maria Manuela Galhardo.
2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990.
LUCA, T. R. de. A história dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, C. B. (org.). Fontes Históricas.
São Paulo: Contexto, 2005.
SIRINELLI, J-F. Os intelectuais. In: RÉMOND, R. (org). Por uma história política. UFRJ/FGV. Rio de
Janeiro, 1996.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente trabalho tem como objetivo investigar a rotina de estudos de trinta jovens do 3º
ano do Ensino Médio, na faixa etária de 16 à 19 anos de idade em uma comunidade periférica,
localizada no bairro Jardim Rádio Clube, do Distrito conhecido como Zona Noroeste da cidade de
Santos, que está situada na Região Metropolitana da Baixada Santista, litoral do estado de São
Paulo, sendo alguns oriundos do conjunto de palafitas conhecido como Dique da Vila Gilda e Vila
Telma, da mesma cidade, matriculados em uma escola estadual local. Esse conjunto de palafitas
forma a maior favela sobre manguezais do Brasil, com cerca de mais de 20 mil pessoas, distribuídas
em seis mil famílias, segundo dados do último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) de 2010. Essas famílias têm no seu convívio diário, além do lixo que é descartado
de forma irregular, a falta de água e esgoto e a alta das marés, que acaba invadindo seus barracos
improvisados. Outro fator que chama atenção é a violência decorrente do tráfico de drogas e que
somada a todos os outros aspectos já citados, compõe um cenário de vulnerabilidade social em
que esse grupo de alunos está inserido. Esse conjunto de favela se contrapõe ao restante da cidade
que tem o sexto melhor IDH-M do Brasil, medida composta por três indicadores: longevidade,
educação e renda; e também eleita a décima cidade melhor para se viver, tendo o maior porto de
carga da América Latina e também o maior jardim de orla do mundo. Com esse trabalho, busca-
se refletir acerca das práticas de estudos improvisados em um contexto de acesso limitado de
recursos didáticos disponíveis fora do ambiente escolar. A questão orientadora visa refletir não
apenas sobre as condições econômicas que limitam esse acesso, mas também sobre a não oferta
de espaços de formação cultural nessas comunidades. A proposta da presente pesquisa surgiu a
partir da elaboração e aplicação de um projeto de reforço intitulado Foco ENEM, desenvolvido pelos
sujeitos pesquisadores ao longo de 2019 e contava com a participação de professores voluntários
das disciplinas especificas: Matemática, Física, Biologia, Química, História, Sociologia, Filosofia,
Geografia, Língua Portuguesa, Língua inglesa e Espanhol, além de debates que contemplavam
assuntos relacionado à cultura jovem, como exemplo, o universo geek e o universo das redes
sociais. Como os citados pesquisadores são oriundos da escola pública e, assim, enfrentaram
dificuldades semelhantes ao do grupo que norteou este trabalho durante o processo de formação,
notou-se que as falas dos discentes vêm ao encontro dos debates propostos por Fanfani, Dubet e
Thompson, assim como evidenciam o que Buffa e Nosella tão bem abordam, ou seja, ainda que
a educação escolar seja um elemento formalmente presente, ela nem sempre cumpre seu papel.
O percurso metodológico norteador da realização desta pesquisa está assentado na prática de
observação e também na aplicação de formulários no Google Forms, além de visitas aos espaços
frequentados no cotidiano desses jovens e entrevistas não estruturadas, cujo referencial são os
estudos de José Carlos Sebe Bom Meihy (1991, 1996, 2005, 2006, 2013), Fanfani (2000), Dubet
(2003) e Thompson (2002). O projeto teve como base as demandas apresentadas pelos próprios
alunos, que com frequência se referiam às dificuldades de estudar, pois nem sempre a escola
lhes oferecia os recursos didáticos primordiais para o desenvolvimento do conhecimento e a
melhora do desempenho escolar. Também relatavam durante as aulas no período noturno que
a falta de acesso a espaços de cultura, cinemas, viagens, museus etc. constituía outro elemento
comprometedor da vida acadêmica e cultural, pois, segundo eles, a possibilidade de frequentar
esses lugares atua como mais um processo relevante na formação, considerando-se que a simples
presença em aulas ministradas em espaços tradicionais não basta para um bom desempenho
no ENEM ou vestibulares. Nesse sentido Fanfani (2000) faz o seguinte questionamento: “em que
medida o que se oferece corresponde às condições de vida, necessidades e expectativas das
novas gerações de latino-americanos?”. O mesmo autor ainda afirma que a massificação, ou
seja, a disponibilidade de vagas nas escolas, nem sempre corresponde à real necessidade dos
jovens. Conforme salienta o autor, os dados indicam que a escola para os adolescentes é uma
escola em expansão (FANFANI, 2000, p. 1) Mas o mesmo autor, afirma que: “em muitos casos,
este crescimento quantitativo não é acompanhado por um aumento proporcional em recursos
públicos investidos no setor. Muitas vezes, “teve-se que fazer mais com menos”. (FANFANI, 2000,
p. 1). Nesse sentido, a situação observada durante o desenvolvimento do projeto evidencia a
relação direta entre massificação e baixa na qualidade no ensino oferecido. Já para Dubet, em As
Desigualdades Multiplicadas “tal democratização é bastante segregativa, pois os filhos das classes
populares se encontram nos setores e formações menos valorizadas e menos úteis, enquanto os
filhos das categorias superiores adquirem uma espécie de monopólio das carreiras elitistas e
rentáveis” (DUBET, 2003, p. 8-9). Tal colocação se evidencia durante as entrevistas sobre o que
os jovens esperam nos estudos e quais universidades e carreiras pretendem seguir. A maioria
fala apenas em fazer cursos profissionalizantes; aqueles que almejam as universidades, nunca
citam universidades públicas, referem-se sempre a instituição particulares sem grande expressão;
outros levam em consideração o ensino à distância (EAD) devido sua condição econômica e
perceberem que a maioria dos cursos possuem uma mensalidade que está de acordo com o seu
alcance financeiro, já que a média salarial das famílias não ultrapassa um salário mínimo mensal.
Esta pesquisa ainda em andamento, com início no ano letivo do calendário oficial do estado de
São Paulo e com término no ano letivo em dezembro, tem evidenciado que, mesmo a escola
oferendo aulas regulares e professores preparados, tais elementos não têm sido suficientes para a
formação mais completa dos alunos, em se tratando de educação cultural. Outra evidência pôde
ser percebida na rotina escolar desses alunos foi a influência da violência nas suas rotinas, pois
de forma recorrente, tem-se a limitação da circulação de pessoas no bairro a partir de ordens
vindas por parte dos traficantes ou mesmo da polícia — conhecidas como “toques de recolher” —
já que os confrontos são rotineiros e com isso, a escola tem que ficar fechada. Outro agravante no
aprendizado desses alunos é a constante falta de professores, pois é com frequência haver aulas
vagas, seja porque o professor faltou ou porque entrou de licença e não houve preenchimento
da vaga, tudo isso, soma-se com a falta de recursos e equipamentos, tais como: banda larga
de qualidade, computadores ligados à rede, equipamentos de práticas de esportes, visitas
monitoradas a espaços culturais, etc., o que acentua as desigualdades entre os alunos oriundos
de áreas periféricas e aqueles pertencentes a classes sociais de poder aquisitivo muito mais
elevado. Mas cabe ressaltar, que tais jovens tem buscado alternativas para superar tais limitações
do sistema, pois alguns são integrantes do Centro de Aprendizagem e Mobilização Profissional e
Social (CAMPS), que tem como objetivo promover a inserção social, oferecendo curso de formação
profissional, assim como, a oportunidade do primeiro emprego, com remuneração de um salário
mínimo, auxilio doença, vale alimentação e transporte. Além da formação profissional, da chance
inserir-se no mercado de trabalho e a remuneração parece ser o objetivo principal para que esses
jovens participem do projeto, pois o bônus recebido é uma forma de complementar a renda
familiar.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 937
Referências
BUFFA, Ester; NOSELLA, Paolo. A educação negada: introdução ao estudo da educação brasileira
contemporânea. São Paulo: Cortez, 2001.
FANFANI, E. T. Culturas jovens e cultura escolar. In: SEMINÁRIO “ESCOLA JOVEM: UM NOVO OLHAR
SOBRE O ENSINO MÉDIO”. 2000, Brasília: MEC, 2000.
MEIHY, José Carlos Sebe B; HOLANDA, Fabíola. História Oral: como fazer, como pensar. 2. ed. São
Paulo: Contexto, 2013.
da Europa para ajudar na direção do Colégio Jacobina, foi Leão quem sugeriu que ao invés disso
mandasse Laura para estudar lá. Sua viagem foi no ano de 1925. Com a ida para estudar no Institut
Jean Jacques Rousseau, Laura estreitou laços com seus renomados professores, dentre eles Adolphe
Ferrière. Com isso, também se abriram portas para que a educadora fosse representar o país no
Congresso de Locarno, em 1927, na França.
Em estudo realizado por Mignot (2017), no ano de 1929 Laura e Ferrière trocaram cartas nas quais
a educadora assumira a responsabilidade de ajudá-lo na sua passagem pelo Brasil, decorrida da
viagem que empreenderia pela América do Sul no ano seguinte, 1930. Na carta resposta, de 9 de
janeiro de 1929, Ferrière fala dos passos que tem dado para possibilitar sua vinda ao Brasil e dá
destaque aos temas que pretende abordar, tais como: a escola ativa e os centros de interesse, por
exemplo.
A carta era um dos meios de encurtar distâncias entre pessoas que estavam longe fisicamente.
Naquele tempo, então, se constituía como uma prática cultural muito recorrente a fim de manter
contato entre a população. Pode ser pensada como uma prática que define códigos próprios que
viabilizam a comunicação (CAMARGO, 2011), que foi muito utilizada e ficou marcada, pelo seu
constante uso, durante muitas décadas.
Assim como muitos outros educadores faziam, os contatos estabelecidos por Ferrière, Leão e
Lacombe se constituíam em importantes trocas. O educador suíço se preocupou em anunciar os
feitos e efeitos do trabalho desenvolvido por Leão no Brasil; recebeu Lacombe como sua aluna
no Instituto, assim como apresentou-a para importantes nomes da Europa. Enquanto isso, os
educadores brasileiros também se ocupavam na realização de outros feitos que ajudariam Ferrière.
Carneiro Leão primeiro com o envio de Laura e depois com a tradução do Livro. E Laura, por sua vez,
tentou ajudar na chegada, estadia e viabilização financeira da passagem de Ferrière pelo Brasil (que
por conta dos conflitos políticos desencadeados pela Revolução de 30 não teve autorização para
desembarcar do navio ancorado no porto da cidade do Rio de Janeiro).
Nesse sentido, Gomes e Hansen (2016) falam da sociabilidade intelectual, que se constitui na
associação de grupos de intelectuais que atuam em determinada sociedade. Tal associação se dá
na forma de feitos, como os de Ferrière, Leão e Lacombe que culminam em importantes resultados,
neste caso no campo da educação. Podemos aqui considerar que as redes de sociabilidade também
se constituíram como um dos marcos realizados por Ferrière tanto nas viagens que fazia, ao se
encontrar com presidentes das repúblicas, diretores dos ensinos primário e secundário, reitores
de universidades, professores, dentre outros, quanto em outros momentos de sua carreira ao
estabelecer contatos e parcerias com educadores de todo o mundo. Alves (2012) considera as
sociabilidades os elos estabelecidos pelos intelectuais com lugares e pessoas.
Muitos são os motivos para se criarem as redes de sociabilidade. Segundo Sirinelli (2003) uma
sensibilidade cultural comum e afinidades difusas são os motivos que se organizam e formam
essas redes. No caso desses intelectuais, as articulações envolviam não só o reconhecimento de
seus respectivos trabalhos, mas também o prestígio que os alcançariam quando fossem cada vez
mais conhecidos e reconhecidos. Para Ferrière, era importante conseguir “chegar” à América; já para
Lacombe e Leão, ter seus nomes na cena internacional era um feito e tanto. Sendo assim, a tessitura
de contato era vantajosa para todas as partes, visto o reconhecimento que alcançaria seus nomes.
Adolphe Ferrière, Antonio Carneiro Leão e Laura Jacobina Lacombe eram educadores conhecidos
e reconhecidos no cenário nacional e internacional. Foram muito importantes para a educação
brasileira visto que seus ideais ultrapassavam os modelos que vinham sendo utilizados pelo sistema
educacional. As trocas estabelecidas trouxeram os resultados almejados por todas as partes, além
de que a circulação das ideias do educador pela educação brasileira ajudara a acelerar, expandir e
legitimar as concepções lançadas pela Escola Nova.
Referências
ALVES, Cláudia. Jean-François Sirinelli e o político como terreno da história cultural. In: LOPES, Eliane
M. T., FARIA FILHO, Luciano M. de. (Orgs.) Pensadores Sociais e História da Educação. Belo Horizonte:
Autêntica Editora. vol. 2. 2012;
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CAMARGO, Maria Rosa Rodrigues Martins. Cartas e Escrita. Práticas culturais, Linguagem e Tessitura
da Amizade.. 1. ed. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 2011. v. 1. 168p;
GOMES, Ângela de Castro; HANSEN, Patrícia Santos. Intelectuais Mediadores: Práticas culturais e
ação política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016. 489p;
SIRINELLI, Jean- François. Os intelectuais. In: REMOND, René (org.). Por uma história política. 2.ed.
Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, p 232-253, 2003.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Introdução
A História da Educação, embora nas últimas décadas esteja se fortalecendo e diversificando seus
temas e fontes, ainda se ocupa pouco do movimento estudantil como objeto de estudo (BITTAR,
Marisa; BITTAR, Mariluce, 2014), principalmente do movimento estudantil denominado secundarista,
do qual fazem parte alunos do ensino fundamental, médio e profissionalizante.
Com este trabalho, busca-se ampliar os estudos em torno do Movimento Estudantil, no campo
da História da Educação, portanto. Dito isso, propõe-se, nesta pesquisa, analisar, com apoio em
pesquisa bibliográfica e documental, as temáticas veiculadas nos congressos da União Municipal
dos Estudantes Secundaristas de São José dos Pinhais (UMES/SJP), nos anos de 2009, 2010 e 2015,
exprimidas nos crachás encontrados.
Os crachás utilizados nos congressos eram coloridos e dispunham de duas perfurações nas
extremidades de um dos lados, onde se poderia inserir algum tipo de cordão, a fim de possibilitar
portá-los ao redor do pescoço ou em outra parte do corpo. Foram encontrados três crachás, sendo
o crachá “A”, do segundo congresso, ocorrido em 28 de março de 2009, medindo cerca de 10,5x12,8
centímetros; o crachá “B”, do terceiro congresso, ocorrido em 20 de março de 2010, medindo cerca
de 10,5x14,8 centímetros; e o crachá “C”, do quinto congresso, ocorrido em 17 de outubro de 2015,
medindo cerca de 10,5x14,8 centímetros, também. Ademais, observou-se nos três crachás o logo da
entidade estudantil e de seus parceiros e apoiadores dos três congressos.
José dos Pinhais, como revelam os discursos contidos em ata, do presidente da comissão eleitoral
e demais componentes da mesa, no congresso de fundação da entidade, em 31 de março de 2007,
afirmando que “a construção de atividades estudantis, culturais e esportivas, como também a
construção de uma sociedade mais justa” (UMES/SJP, 2007), constituiriam a importância da UMES/
SJP.
Portanto, a União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São José dos Pinhais, com o
“objetivo de [...] servir de representação e sustentação dos estudantes perante ao município,
governos, comunidade e demais instâncias da sociedade civil organizada” (UMES/SJP, 2007),
originou-se mediante o casamento entre a disposição dos estudantes em construir uma “sociedade
mais justa” e as políticas de incentivo à formação de Grêmios Estudantis no interior das escolas
públicas estaduais, promovidas pelo então governador do período.
Essa política, característica do governo do Estado do Paraná, nos anos de 2003 a 2010, como
forma, acredita-se, de reconhecer a importância das organizações de alunos, haja vista que “direções
escolares agiam contra a formação dos grêmios, seja por temerem a sua força reivindicatória, seja
por não conseguirem compreender a sua importância”, segundo a mensagem do então Secretário da
Educação, destinada aos estudantes, diretores e professores, por meio da qual declarava, também,
querer um aluno “que haja, que viva”, situava-se dentro de uma conjuntura marcada pela “repulsa”
ao neoliberalismo e da inclusão de políticas sociais, analisadas, segundo Resende (2007), como de
“grande impacto social”.
No entanto, nesse período, particularmente a partir de 2007 até 2010, em que a UMES/SJP
realizou três dos seus cincos congressos, a política brasileira, mesmo tendo a frente um partido
considerado mais à esquerda do espectro político, caracterizou-se pela não alteração radical da
“política macroeconômica em vigor desde 1999. Em vez disso, introduziu uma série de iniciativas
novo-desenvolvimentistas paralelamente ao tripé neoliberal”, conforme analisa Saad Filho e Morais
(2018, p. 154). Essa justaposição, para estes autores, acabou introduzindo uma variante no sistema
de acumulação, “que pode ser camada de neoliberalismo desenvolvimentista”.
Considerações finais
Bloch (2001), considera que o historiador deve olhar para a história a fim de compreendê-la e não
de julgá-la. Analisar, por meio dos crachás, as temáticas manifestas nos congressos da UMES/SJP,
constitui-se parte do processo de compreender a história do movimento estudantil secundarista
brasileiro. Pode-se dizer, assim, que as temáticas expressas, “orgulho de ser estudante” e “verás que
um filho teu não foge a luta”, retratam o vivido e o experimentado pelos estudantes, suas decisões e
contradições, e, não menos importante, suas formas de olhar a si mesmos e a sociedade.
Referências
DAYRELL, Juarez. O jovem como sujeito social. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, v. 24,
n. 2, p. 40-52, 2003.
BLOCH, Marc. Apologia da história, ou, O ofício do historiador. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
BITTAR, Marisa; BITTAR, Mariluce. Os movimentos estudantis na História da Educação e a luta pela
democratização da universidade brasileira. EccoS – Rev. Cient., São Paulo, n. 34, p. 143-159, maio/
ago. 2014. 143.
SAAD FILHO, Alfredo; Morais, Lecio. Brasil: neoliberalismo versus democracia. São Paulo: Boitempo, 2018.
UMES/SJP. Colégio Estadual Costa Viana. Ata do congresso de fundação realizada no dia 31 de
março de 2007.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A Irmandade da Misericórdia, no Maranhão, como no resto do Brasil, foi uma das instituições
religiosas que assumiram a assistência aos desvalidos. Fundada em São Luís, em 1623, as
Misericórdias alargaram suas funções no Oitocentos com a construção de igrejas, hospitais e
cemitério a fim de estabelecerem seu patrimônio em terras maranhenses. Os presidentes da
província que atuavam na provedoria da Irmandade tentavam implementar uma intervenção
mais direta da Coroa Portuguesa nos assuntos relacionados à assistência em São Luís. Uma
suposta crise financeira caracterizou as práticas caritativas da Irmandade na segunda metade do
século XIX, o que motivou dar novos rumos aos serviços assistenciais na capital. Mesas
administrativas, formadas por representantes oficiais da província, da elite local e da Irmandade,
tentavam desviar da crise com recursos atrelados a promessas de salvação. Mas, os desvios das
verbas no âmbito institucional acarretando falta de recursos alteraram o caráter da assistência
aos desvalidos, da caridade para filantropia, com a participação da Província na manutenção dos
serviços da instituição. Além de auxílio médico e funeral, os serviços da Santa Casa incluíam o
recolhimento, o batismo e a educação de crianças enjeitadas por suas mães. Essa atuação junto
a infância foi importante para a época, já que a mortalidade infantil na cidade de São Luís
registrava altos índices, fruto do abandono que sofriam mediante impossibilidades das mães de
criá-los. Pergunta-se: Como a Santa Casa de Misericórdia garantia e mantinha os serviços de
assistência a essas crianças abandonadas? Este estudo tem como objetivo geral, analisar a
organização da Irmandade da Misericórdia na assistência a infância maranhense, em documentos
sobre finanças e estatísticas da instituição entre os anos 1850 e 1880. Para isso, será feita a análise
dos estudos da historiografia maranhense, que registraram a atuação da Irmandade no Maranhão
Imperial e a análise de documentos do Acervo do Arquivo Público do Estado do Maranhão,
referente as ações da Santa Casa na assistência as crianças, como os relatórios de província,
mapas estatísticos e ofícios da Santa Casa. A institucionalização das crianças é apontada por
Rizzini (2004) como uma proposta das Santas Casas de Misericórdia no Brasil para o
enclausuramento dos meninos e meninas, órfãos ou filhos de pais legítimos. “Além desse divisor
social, recorreu-se também ao divisor racial.” (p.27) Era necessário retirar da sociedade o
incomodo causado pelos moribundos e pecadores, que deveriam ocupar espaços distintos de
acordo com a hierarquia social da época: livres e escravos, homens e mulheres, ricos e pobres. A
Província do Maranhão, durante o século XIX, passava por uma reorganização de ordem
econômica, política e social devido à exportação do algodão, graças ao impulsionamento da
Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e Maranhão; a adesão do Maranhão a Independência
e as revoltas internas que surgiram após o grito no Ipiranga, como a Balaiada. (MEIRELES, 2015)
Esse cenário fez com que a província iniciasse o século com uma população escrava de origem
africana que superava o número da dos senhores brancos. O crescimento demográfico em meio
as miscigenações possibilitaram o aparecimento de problemas como o aborto e o abandono de
crianças nas ruas, nas portas das casas ou em instituições. Mulheres, da elite e mães-escravas,
que sofriam abusos, estupros e outras coerções masculinas, eram obrigadas a abandonar seus
filhos. “O controle sobre a conduta, a sexualidade, a religiosidade, a maternidade, representavam
uma forte vigilância sobre o corpo e a alma da mulher.” (ABRANTES, 2004, p. 151) Nesse cenário,
era preciso pensar os espaços públicos e as instituições que se responsabilizariam pela higiene e
pela moral desses sujeitos, excluídos sociais, expropriados de suas próprias vontades, confinados
e conformados para serem civilizados. (FOUCAULT, 2014) Assim, remete-se a pobreza que no
Maranhão sempre esteve associada ao descaso das políticas públicas. Pensar, portanto, na
família, na mulher, na criança, e de maneira interdisciplinar, relacionar pobreza ao tempo e aos
discursos que impregnam ações assistencialistas de amparo, de estanque de um problema
higiênico é motivar uma busca pelo real significado da institucionalização na história da
assistência à infância. As doações milionárias advindas da elite maranhense, interessada no
recolhimento das minorias, garantia a Irmandade a sua consolidação como instituição
mantenedora do poder local e garantiam o funcionamento dos espaços designados para a
assistência pública na capital da Província. Marques (1970, p. 482) retratou em sua obra, as
repartições e dependências adquiridas pelas Misericórdias para a realização de suas obras de
caridade: “secretaria e contadoria, tesouraria, procuradoria-geral, presos pobres, expostos,
hospital de caridade, hospital dos lázaros, igreja e cemitério.” Essa constituição demarca os
sujeitos assistidos, incluindo os bebês abandonados, que após recolhimento, eram conduzidos
aos cuidados do corpo e da alma, como alimentação, catequese e educação moral. A assistência
às crianças era sistematizada sobre a égide das Ordens Religiosas e se estruturava em instituições
com características de clausura, pois, para proteger e educar era necessário “o rigor dos castigos,
o submetimento às ordens, o distanciamento da autoridade” (VARELA; ALVAREZ-URIA, 1992, p.
07). Algumas instituições religiosas, portanto, incumbem-se pelos infantes sem valor apontados
por uma sociedade sem pecado, e, como a Irmandade da Misericórdia, territorializam o Poder
Eclesiástico. Na província do Maranhão, a Irmandade constrói o Hospital da Caridade, responsável
pelo atendimento da população, principalmente pobre, e que depois, se consolida como a Santa
Casa. Além do hospital, igrejas, como a de São José (principal padroeiro da Ordem e que deu
nome a muitas instituições de recolhimento infantil no Brasil) e o Cemitério da Misericórdia, são
construções representativas da expansão institucional da Irmandade na Cidade de São Luís. Com
a monumentalidade desses espaços, a sociedade rendia-se ao império religioso, que administrava
as mazelas sociais, isolando-as ou condicionando-as às normas civilizatórias. Na perspectiva,
portanto, de perceber a constituição e manutenção dessas instituições, a pesquisa documental
buscará na análise dos relatórios de Província, entre os anos de 1850 e 1880, os discursos e
atuações das mesas administrativas da Santa Casa na organização de suas finanças, despesas e
receitas, para a compra de materiais, mobiliários e reformas nos edifícios, igrejas e casas.
Também, possibilitar a identificação dos representantes sociais que formavam as mesas
administrativas e como eles influenciavam a manutenção dos espaços de assistência infantil.
Através das análises de Mapas Estatísticos de crianças órfãs e recolhidas, identificar-se-á os
encaminhamentos dados a elas, após tempo de permanência na instituição. Nas visitações ao
Arquivo Público do Estado do Maranhão, fez-se o levantamento de alguns Relatórios da Província
que revelam as reuniões das Mesas Administrativas da Santa Casa de Misericórdia, as quais o
Governo da Província tinha representação. São decisões sobre o funcionamento desses espaços,
receitas e mapas estatísticos contendo: nomes de crianças, entrada na instituição, entrega a
família para adoção ou para outra instituição educativa. Os Ofícios dos Mordomos da Santa Casa
de Misericórdia ao Presidente da Província (dos anos 1860-1880) que descreviam as condições de
abandono das crianças e os conflitos institucionais com as famílias legítimas para devolução da
criança ao lar reveladores de uma certa fragilidade institucional na definição desses
encaminhamentos. Esses documentos eram registrados nas situações de abandono das crianças
nas instituições de recolhimento mantidos pela irmandade, como a Casa dos Expostos, que fora
criada para essa finalidade. Com os resultados desse levantamento, pretende-se analisar a
atuação da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia do Maranhão na assistência aos desvalidos,
na administração dos recursos e na manutenção dos espaços institucionais, percebendo suas
constituições, os sujeitos que geriam os serviços e os encaminhamentos dados as crianças
abandonadas.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 946
Referências
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 2014.
MEIRELES, Mário Martins. História do Maranhão. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da DASP,
2015.
VARELA, Julia; ALVAREZ-URIA, Fernando. A Maquinaria Escolar. Teoria e educação, 6, 1992, p. 69-97.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O artigo em tela é fruto de uma pesquisa de doutorado que investiga a concessão de equiparações
de cursos normais, no estado Minas Gerais, à Escola Normal Modelo de Belo Horizonte. A pesquisa,
que está em andamento, pretende analisar essa prática de equiparação na cidade em Juiz de Fora,
cuja escola normal mantida pelo estado foi suprimida em 1907. Tal prática consistia em o estado
conceder a cursos particulares ou municipais, que seguissem os moldes da Escola Normal Modelo,
as regalias de diplomar os normalistas. Conforme Ferreira (2019), as escolas normais equiparadas
além de seguir o programa de ensino da escola normal da capital, eram submetidas à fiscalização
estatal.
Meu contato inicial com esse tema foi através das páginas do periódico Jornal do Commercio,
da cidade de Juiz de Fora, ainda enquanto bolsista de Iniciação Científica pela Universidade
Federal de Juiz de Fora. Durante a pesquisa, o nome de um sujeito social despertou-me a atenção:
José Rangel. Ele, que estava constantemente presente como articulista do periódico, foi professor
e diretor da Escola Normal de Juiz de Fora, meu objeto de estudo no Mestrado em Educação pela
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Na dissertação (FERREIRA, 2013), abordei sua defesa
em relação à importância de o estado não suprimir a instituição juiz-forana, tanto através de
representações e artigos no Jornal do Commercio e Correio de Minas, quanto de uma viagem à
Belo Horizonte, em 1905, para conversar com o Sr. Francisco Salles, então presidente do estado, e
seus secretários.
Além disso, tratei sobre a ausência de artigos e manifestações de José Rangel acerca da
supressão da Escola Normal de Juiz de Fora, tanto no Jornal do Commercio, quanto no Correio
de Minas, após a Reforma do Ensino Primário e Normal de 1906. Uma possível interpretação
esteve relacionada à sua indicação para diretor dos primeiros Grupos Escolares de Minas Gerais,
implantados no mesmo prédio e utilizando o mesmo mobiliário que a escola normal da cidade
(FERREIRA, 2013).
Ao retomar os estudos para o Doutorado em Educação, pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro, deparei-me novamente com algumas ações desse sujeito histórico, especialmente quanto
ao seu posicionamento acerca dos cursos normais particulares equiparados. Ora, se enquanto
professor e diretor da Escola Normal de Juiz de Fora defendeu sua importância para a formação
de professores na cidade, como se posicionou sobre essa formação, que passou a ser realizada
pelos equiparados particulares até 1928, ano em que foi criada a Escola Normal Oficial de Juiz de
Fora (OLIVEIRA, 2000)?
Pensando sobre essas questões, corroboro Lejeune, que aponta que “o ato do pesquisador
consiste em construir um objeto que seria, na verdade, apenas um dos objetos possíveis a serem
construídos. [...] assim, é preciso que ele tenha em mente que se escolhesse outro centro, os limites
se deslocariam” (LEJEUNE, 2008, p. 51). Desta feita, o objetivo do presente artigo foi tecer algumas
reflexões sobre José Rangel a partir de suas memórias, que foram escritas e publicadas por ele
no livro Como o tempo passa...: aspectos, fatos, figuras e costumes antigos e contemporâneos
(RANGEL, [1940]). Os esforços foram centrados em pensar a abordagem que ele fez sobre a Escola
Normal de Juiz de Fora, por ter tido uma relação direta como professor e diretor dessa instituição,
bem como problematizar sua percepção acerca da Reforma do Ensino Primário e Normal de 1906,
especialmente no tocante ao seu posicionamento (ou não) sobre a prática de equiparação de
cursos normais.
Para analisar essa escrita de si, foi importante não tomá-la como um “dado”, como um “resgate”
sobre o que “verdadeiramente aconteceu”. Tal escrita, como todo documento histórico, implicou
em subjetividade, em uma construção do eu, já que foi produzida por um sujeito social. Mas
“é justamente nesse espaço privado, que de forma alguma elimina o público, que avultam em
importância as práticas de uma escrita de si” (GOMES, 2004, p. 9). Em outras palavras, ao construir
suas memórias, José Rangel fala tanto sobre si quanto sobre outros sujeitos, ações e relações, que
de alguma forma influenciaram suas escolhas e o constituíram como sujeito social de seu tempo.
Desse modo, problematizou-se o sentido de seus movimentos, sobretudo o de deixar de ser
diretor da Escola Normal de Juiz de Fora para ser diretor dos primeiros Grupos Escolares de Minas,
como uma “relação objetiva entre o sentido e o valor, no momento considerado, dessas posições
num espaço orientado” (BOURDIEU, 2002, p. 190). Ou seja, a partir dos vestígios encontrados e dos
documentos mobilizados, pôde-se inferir que a relação com os governantes do estado foi utilizada
como forma não só de defesa daquela escola normal, mas, em determinado momento em que
essa defesa poderia ser “em vão”, como forma de manter sua “trajetória” de destaque frente à
instrução pública, mesmo que tivesse que dirigir outra instituição.
Essa “trajetória” é o “envelhecimento social”, que independe do “envelhecimento biológico”
(BOURDIEU, 2002). Para compreendê-la, foi necessário compreender o campo em que ela se
desenvolveu, assim como “o conjunto das relações objetivas que uniram o agente considerado –
pelo menos em certo número de estados pertinentes – ao conjunto dos outros agentes envolvidos
no mesmo campo e confrontados com o mesmo espaço dos possíveis” (BOURDIEU, 2002, p. 190).
Nesse sentido, e para tecer reflexões sobre a Escola Normal de Juiz de Fora, sua supressão e a
criação de cursos equiparados, foram analisadas as seções de seu livro de memórias que aborda
sua relação com os governantes da época, em especial com João Pinheiro e Carvalho Brito. O
primeiro, presidente do estado em 1906, implantou a Reforma que criou os Grupos Escolares; já
o segundo foi o Secretário dos Negócios Interiores de João Pinheiro, a quem José Rangel diz ter
conhecido mais de perto (RANGEL. [1940]).
Através de tal análise documental, percebeu-se que o campo em que essa “trajetória” se
desenvolveu foi um campo político, no qual o agente em questão tinha boas relações, conseguindo
permanecer em posições de destaque e comando de diferentes instituições púbicas de Juiz
de Fora. Por outro lado, essa boa relação pôde ser um indicativo de que, ainda que houvesse
discordâncias com as ações do governo, José Rangel não se manifestaria publicamente. O que
aconteceu quando falou sobre as escolas normais equiparadas, “sôbre cuja eficiencia não me
compete manifestar” (RANGEL, [1940], p. 226).
Pierre Nora aponta que a memória é “aberta à dialética da lembrança e do esquecimento,
inconsciente de suas deformações sucessivas, vulnerável a todos os usos e manipulações” (NORA,
1993, p. 9). Nesse sentido, não há como afirmar que José Rangel relatou em suas memórias tudo o
que “verdadeiramente aconteceu”, visto que, ainda que de forma inconsciente, pode ter lançado
luz sobre alguns aspectos de sua vida em detrimento de outros.
Do mesmo, o presente artigo abordou uma interpretação possível, construída através dos
registros de memória de um sujeito social, podendo abrir caminho para outras construções. O
que acredito não ter implicado na “reconstrução” de um passado, mas sim em uma interpretação,
“sempre problemática e incompleta do que não existe mais” (NORA, 1993, p. 9), mas que foi
possível para nesse momento e para essa tessitura argumentativa.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 949
Referências
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: AMADO, J. ; FERREIRA, M. de M. (Orgs.). Usos e abusos
da história oral. Trad. Glória Rodríguez, Luiz Alberto Monjardim, Maria Magalhães e Maria Carlota
Gomes. 5ª ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002, p. p. 183-191.
GOMES, Angela de Castro. Escrita de si, escrita da História: a título de prólogo. In: _____ (org.). Escrita
de Si, escrita da História. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2004, p. 7-24.
LEJEUNE, P. O pacto autobiográfico (bis). In: _____. O pacto autobiográfico. De Rousseau à Internet.
Belo Horizonte : Ed.UFMG, 2008, p. 48-69
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História. São Paulo:
PUC-SP. n. 10, 1993, p. 7-28.
RANGEL, José. Como o tempo passa...: aspectos, fatos, figuras e costumes antigos e contemporâneos.
Rio de Janeiro: A Encadernadora , [1940].
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
compreendemos que foi, com base na ação em contexto religioso que se deu a interlocução entre
esses dois educadores, em uma conjugação de pensamentos que se transformou em ação concreta
no interior do Movimento Graal. A própria Maria de Lourdes aponta esse sentido de proximidade
com Freire através do Cristianismo e, embora assumindo-se que em muitos momentos o próprio
Freire pode “não se reconhecer em algumas coisas” que fez, destaca a riqueza de seu encontro
com o pensamento freireano declarando que este funcionava para ela como a síntese de muito
do que vinha sendo discutido por grandes pensadores como Edgar Morin, Ivan Ilich, Martin Buber,
entre outros, na forma simples e óbvia das propostas que Paulo Freire apresentava. Em uma frase
apresentada por ela em um texto dedicado a Freire destaca “as ideias são qualquer coisa que nos
anima, nos transforma e que, de certa maneira, nos dá a esperança e o élan necessário para viver”.
Referências
CORDEIRO, C. J. Na demanda do Graal em Portalegre: O sentido educativo e social do Projecto
Promoção Humana e Evangelização desenvolvido na década de sessenta e setenta do século XX em
Portalegre. Dissertação de Mestrado, Instituto Politécnico de Portalegre - ESE, 2012.
Compreender a intenção dos artigos de Francisco Lins publicados no jornal O Paiz, em 1924,
é o objetivo central deste trabalho. Ao todo foram publicados dez artigos, como resultado da
experiência de viagem de Francisco Lins à Europa. Enviado pelo governo em 1911, regressou
apenas em 1917, a fim de conhecer o que havia de mais moderno em termos de educação. Esta
investigação se debruçou sobre tais escritos, o contexto de sua publicação, o suporte em que foram
veiculados e seu conteúdo. Busco com isso compreender as razões que levaram a divulgação
desses textos acontecer apenas em 1924, alguns anos após o retorno desse educador.
O professor, poeta e jornalista mineiro Francisco Lins (1866-1933), embora hoje seja
desconhecido, recebeu bastante destaque nas áreas em que atuou durante o final do século XIX e
início do século XX. No campo da educação, sua trajetória foi marcada pela viagem que realizou à
Europa, na qual estudou no Instituto Jean-Jacques Rousseau e conheceu institutos de educação
em diversos países.
A oportunidade da viagem à Europa surgiu logo após a intensa participação de Lins na campanha
presidencial de Hermes da Fonseca, em 1910. Por designação da secretaria de agricultura de Minas
Gerais foi encarregado de organizar e dirigir a representação do estado na Exposição Internacional
de Turim (1911). Nomeado pelo presidente do estado mineiro Coronel Bueno Brandão em outubro
de 1910, a partir de então Lins viajou a diversos municípios se preparando para a representação
na exposição. Prestes a partir em viagem, Lins recebeu mais uma missão. O então secretário do
interior de Minas Gerais, Delfim Moreira, o incumbiu de estudar os institutos de ensino primários e
profissionais da Itália, Bélgica, Suíça, França e Alemanha. Ciente das missões que tinha a cumprir e
acompanhado de sua esposa, embarcou no navio Halle, em maio de 1911. Além destas, entre 1912
e 1915, integrou a primeira turma dos cursos oferecidos pelo Instituto Jean-Jacques Rousseau,
sendo o único brasileiro entre os 22 alunos de diversas nacionalidades naquele que viria a ser um
centro de referência internacional que mais tarde atrairia muitos educadores. No Instituto, Lins
teve acesso ao que havia de mais novo quanto às ideias, aos métodos e aos modelos educativos.
Entre outubro e dezembro de 1924, o jornal O Paiz publicou uma série de dez artigos de Francisco
Lins. O objetivo desses textos, conforme o próprio educador afirma, era abordar os problemas
da educação e como eles foram resolvidos nos países do Velho Mundo. Lins garantiu ainda que
os escritos tiveram por base um grande número de notas feitas sobre o tempo que estudou os
institutos europeus e que estiveram guardados durante muito tempo. Os problemas da educação
nacional apontados, segundo ele, foram identificados a partir de sua experiência enquanto Reitor
do Gymnasio Mineiro de Barbacena e fiscal da instrução pública de Minas Gerais.
A justificativa apresentada por Lins para publicação de tais artigos apenas naquele momento
consiste no fato de ser aquele um momento oportuno, em que a União e os estados se ocupavam
com as reformas da educação pública. De fato, nesse período vários estados do país discutiam
reformas no ensino com base nas influências escolanovistas. Cabe destacar entre essas reformas
as que aconteceram nos estados do Ceará (1923), da Bahia (1925), de Minas Gerais (1927), do
Distrito Federal (1928) e de Pernambuco (1928).
Nesse contexto de reformas que a educação brasileira passava, as viagens foram tomadas
como estratégia para conhecimento dos modelos pedagógicos estrangeiros (MIGNOT e GONDRA,
2007, p. 8). Esse propósito fez com que elas fossem largamente estimuladas, o que possibilitou
a circulação de políticas e práticas pedagógicas estrangeiras inovadoras que inspiraram os
reformadores brasileiros. Escrever sobre a viagem também era uma prática comum nesse
contexto. Era uma maneira de completar a viagem, tendo em vista que a partir da publicação
das experiências compartilhavam os conhecimentos e reflexões sobre o que havia de novo na
educação estrangeira, além de ser um modo de legitimação dos educadores diante de seus
contemporâneos (CHAMON E FARIA FILHO, 2007, p. 56-57).
Neste trabalho, portanto, debruço-me sobre a escrita que Francisco Lins produziu sobre essa
sua viagem à Europa. Busco considerar o suporte em que esses artigos circularam, trabalho
conforme a perspectiva de Roger Chartier (1999) segundo a qual a compreensão de qualquer
texto depende da forma como chega ao leitor (CHARTIER, 1999, p. 17). Opero também com Luca
(2018) no que tange aos procedimentos para o trabalho com a imprensa periódica enquanto
fonte de pesquisa histórica.
O jornal O Paiz, no qual os artigos foram publicados, era um periódico diário de grande
circulação na cidade do Rio de Janeiro, entre 1884 e 1934. Em sua trajetória, teve a circulação
interrompida apenas uma vez, entre 1930 e 1932. Desde sua fundação, a história deste jornal
esteve relacionada à política (CASTILHO, 2013). Como diversos outros periódicos surgidos após
a abolição, defendia a causa republicana, além disso, vários jornalistas utilizaram sua escrita
para ascender a cargos políticos. Por longo período teve como diretor, e mais tarde proprietário,
o português João Lage, compreendido pela historiografia como a típica imagem do jornalista
corrupto, que recebia benefícios materiais em troca de posicionamento do jornal. Exercia,
assim, um jornalismo situacionista. E embora nunca tenha vivido uma situação financeira
plenamente favorável, foi durante a administração de Lages que a folha teve seu momento
de maior popularidade, alimentada pelas desavenças públicas com o concorrente Edmundo
Bittencourt, fundador do Correio da Manhã (CASTILHO, 2013, p. 7).
Durante o governo de Arthur Bernardes (1922-1926), o impresso teve sua credibilidade afetada
pelo apoio ao presidente, que exercia seu pleno poder sob estado de sítio. Diante da censura
aos jornais de oposição ao governo, O Paiz ficou isolado e, consequentemente, encontrava-se
enfraquecido. Sendo assim, no momento em que Francisco Lins publica seus escritos, o jornal
está ao lado do governo e por isso não é visto com bons olhos. Ao longo dos artigos, Lins tece
elogios ao trabalho que Arthur Bernardes vem realizando, isso sugere que os textos também
serviram de propaganda ao governo federal naquele período.
Nos artigos ao jornal O Paiz, Lins escreve sobre diversos institutos europeus, estabelece
comparações com a educação no Brasil e faz sugestões para a resolução dos problemas
educacionais brasileiros. Expõe suas impressões sobre a educação nacional, que julga como a
falta de moral, ordem e disciplina. E aponta soluções com base nos seus conhecimentos sobre
os institutos estrangeiros. Para Lins, era preciso uma educação nova, e para isso, entre outras
coisas, seria necessário formar bons professores, inclusive trazer alguns grandes nomes do
estrangeiro, pois segundo ele o valor do ensino estaria na qualidade dos educadores.
Concluo a partir da análise dos artigos que entre os possíveis interesses da publicação
estavam a divulgação das ideias, os modelos e os métodos pedagógicos estrangeiros que Lins
conheceu em sua viagem à Europa. Outros interesses envolviam a legitimação das reformas da
educação e do próprio educador no campo da educação. Além de servirem de propaganda para
governo de Arthur Bernardes.
Este estudo contribui para ampliação do debate a respeito da circulação internacional de
modelos educativos e acerca do período de reforma que a educação brasileira passou entre as
décadas de 1920 e 1930. Sua relevância também pode ser apontada no fato de tratar um sujeito
ainda pouco estudado na História da Educação e que foi aluno na primeira turma do Instituto
que influenciou as reformas educativas brasileiras nas décadas seguintes.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 955
Referências
CASTILHO, Marcio de Souza. “O amigo incondicional de todos os governos”: a trajetória de João Lage
em O Paiz nos primeiros anos da República. In: Anais do IX Encontro Nacional de História da Mídia.
Ouro Preto: Universidade Federal de Ouro Preto, 2013.
CHAMON, Carla Simone e FARIA FILHO, Luciano Mendes de. A educação como problema, a América
como destino: a experiência de Maria Guilhermina. In.: MIGNOT, Ana Chrystina Venancio e GONDRA
(Orgs). Viagens pedagógicas. São Paulo: Cortez, 2007, p. 39-64.
CHARTIER, Roger. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV
e XVIII. Brasília: EDUNB, 1999.
LUCA, Tânia Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.)
Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2018, p. 111- 153.
MIGNOT, Ana Chrystina Venancio e GONDRA (Orgs). Viagens de educadores e circulação de modelos
pedagógicos. In: Viagens pedagógicas. São Paulo: Cortez, 2007, p. 7-14.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O presente trabalho é parte de uma pesquisa de mestrado em educação, e tem como objetivo
analisar as ideias e os projetos educacionais pensados ou implementados por Diogo Velho
Cavalcanti de Albuquerque no Oitocentos Brasileiro e as suas redes de sociabilidades construídas
ao longo de sua atuação enquanto Deputado Provincial, Deputado Geral, Senador Vitalício pelo
Estado do Rio Grande do Norte, membro do conselho do estado e Promotor da Cidade de Areia,
Comissário Geral na Exposição Universal de Paris e editor, entre outros cargos por ele assumidos
ao longo de sua carreira iniciada como aluno do Lyceu Provincial da Parahyba do Norte. A
pesquisa de caráter histórico se insere no campo da História da Educação. Nessa perspectiva,
tentamos entender como esse personagem da história brasileira pensava o campo da instrução
no Brasil e como teria formado sua rede de sociabilidade que lhe permitiu acessar os mais altos
cargos do Império Brasileiro. A partir do estudo de sua trajetória pensamos ser possível entender
como se constituía o homem político no XIX. Para isso, foi preciso analisar sua trajetória
educacional e social, seu meio interno e transformador intelectual, assim como suas relações
sociais. Utilizamos como fontes principais os Relatórios de Presidentes de Província, mais
precisamente os Relatórios de Instrução Pública (1861/1862), Relatórios de Presidente da
Província do Piauí (1860), Ceará (1868) e Pernambuco (1871), Relatórios do Ministério das
Relações Exteriores (1872), da Agricultura (1869), da Justiça (1875), assim como, impressos
jornalísticos entre eles o Alva. Jornal literário de (1850) da Província da Paraíba do Norte. Para a
pesquisa traçamos a trajetória de vida de Diogo Velho, no sentido de entender sua formação e
sua atuação no que refere às questões relativas à instrução durante o período em que atuou
como Presidente nas Províncias de Pernambuco, Piauí e Ceará, e diretor de instrução pública na
Parayba do Norte. Enquanto metodologia, caracterizamos essa pesquisa como básica, quanto a
sua natureza; descritiva, quanto a sua fonte; documental, quanto à coleta de dados; qualitativa.
Para a análise das fontes partimos dos escritos de Jacques Le Goff (2003, p.537-538) que afirma
“O documento não é inócuo. É antes de mais nada, o resultado de uma montagem, consciente
ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziram, mas também das épocas
sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a
ser manipulado, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura, e o
testemunho, o ensinamento (para evocar a etimologia) que ele traz devem ser em primeiro lugar
analisados desmistificando-lhe o seu significado aparente. O documento é monumento. Resulta
do esforço das sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente –
determinada imagem de si própria.” No que se refere aos aportes teóricos nos baseamos nos
conceitos de representação de Roger Chartier (2002), e de formação do intelectual político de
Sirinelli (2003) (1998). Além desses aportes, também partimos dos estudos de: Ferronato (2014),
René Remónd (2003), Ângela Alonso (2002), José Murilo de Carvalho (2010), Ilmar Rohrloff
de Mattos (1987), Veiga (2008), entre outros. Esta pesquisa foi pensada no sentido de entender a
História da educação no Oitocentos inserida no processo de construção do estado Nacional. Ou
seja, a partir do estudo da trajetória de Diogo Velho tenta-se aqui entender que projetos estavam
em construção no âmbito da educação que se relacionassem à construção da identidade da
Nação e qual o papel da instrução neste processo. Por isso a importância do estudo deste
homem que frequentou o debate sobre a instrução no período. Diogo Velho nasceu no dia 9 de
novembro de 1829 na fazenda chaves, na cidade de Pilar, interior da então Parahyba do Norte.
Era filho, de Diogo Velho Cavalcanti de Albuquerque e Ângela Sofia Cavalcanti, casou-se com
Amélia Machado Coelho de Castro. Cursou o ensino primário com as aulas avulsas, naquele
momento aprendendo a ler, escrever e a contar. No ensino secundário frequentou o Lyceu
Provincial da Parahyba do Norte e posteriormente, adentrou, ao Curso de Direito, na Faculdade
de Olinda. Enquanto aluno do Curso de Direito a vida acadêmica permitiu-lhe aprimorar sua
intelectualidade, possibilitando-o adentra como redator do Jornal Literário Alva, na tipografia
de José Rodrigues da Costa. Também foi Patrono da Cadeira de n°13 da academia de Letras da
Parayba do Norte. Com efeito, Diogo Velho, elaborou um trabalho intitulado Notice generale sur
les principales lois promulgués au Brésil de 1891 a 1894, uma monografia apresentando um
resumo histórico dos primeiros anos do Brasil República. Além desse trabalho, Almeida (1997,
p.82) relatou a existência de outra obra com nome de “Extrait de l’ Annuaire de la législation
Comparée” ( Paris, 1896; 99 págs.in 4°). Entre os mais importantes títulos nobres existentes no
século XIX, Diogo Velho foi condecorado, em 1871, como Visconde de Cavalcante. Concluindo-se
sua vida pública política como membro do partido conservador. Dos resultados da pesquisa,
temos que em 1861, enquanto diretor de instrução pública da Província da Parayba do Norte,
Diogo Velho Cavalcanti d’ Albuquerque, discorreu em seu escrito um projeto de uma educação
nacional que chamamos na pesquisa de “Projeto de sistema nacional de instrução”. Esse projeto
estabelecia a ideia de uma educação nacional, ou seja, para ele a instrução pública deveria estar
diretamente atrelada a uma única legislação, que regeria toda instrução do império, assim não
permitindo que as províncias interferissem com suas regulamentações estabelecidas pelas
Assembleis Provinciais no andamento da instrução do povo brasileiro. Seu projeto situava uma
pasta ministerial única e exclusiva para administrar toda a instrução da nação. Esse Ministério
deveria ter como ponto central o objetivo de capacitar e direcionar o desenvolvimento da
educação/cultura e progresso do povo, de maneira que trouxesse maior benefício à população
brasileira. E todo projeto estaria subordinado a uma administração central, no qual estabelecia
sua organização administrativa ao governo central, assim, direcionando a instrução /educação
do povo brasileiros do século XIX para o bom andamento do progresso da nação, tal qual, para
o desenvolvimento intelectual do povo. O que estabelecia o curso do progresso da Nação, Diogo
velho, quando dirigente das Províncias mencionadas anteriormente, discorreu seus pensamentos
em torno da qualificação docente e a importância de estabelecer locais adequados tanto para
formar professores quanto para formar o alunado. Ainda pontuou a importância de qualificar
melhor os educandos e artificies. Quando Ministro da Agricultura, seu escrito traz informações
em torno da Escola Pátrias de Agricultura Fundada pela Companhia União e Indústria. Essa
instituição foi posta em prática em sua gestão enquanto Ministro da agricultura. Nessa
perspectiva, e diante da importância dos estudos voltadas para a história da educação brasileira
é preciso compreender como seguiu as discussões em tornos desses projetos educacionais,
pois, eram eles que poderiam ter mudado o rumo da educação brasileira do século XIX, e talvez
tiver estabelecido outros momentos e outras discussões em torno da educação do século XXI,
tendo em vista o movimento histórico, seus acontecimentos fatos e desenvolvimento social.
Assim e entre os aspectos relevantes, estão os acontecimentos políticos da época nas Províncias
e a ligação econômica que era estabelecida com a instrução pública. Pois, cada Província
apresentava uma economia distinta, direcionando a instrução pública a desenvolve-se a partir
da necessidade que cada Região apresentava. Contudo, a história é movimento, é a ação do
homem no seu tempo, essa ação que conduz as possíveis transformações sociais, políticas e
econômicas, que possibilita percorrer caminhos que alcance resultados significativos para a
historiografia em torno da história da educação.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 958
Referências
CARVALHO, José Murilo de. A construção da ordem: a elite imperial. Rio de Janeiro: Civilização
brasileira, 2008.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Tradução de MARIA, Manuela
Galhardo. 2° ed. Portugal: Difel, 2002. (memória e sociedade)
SIRINELLI, Jean- François. Os intelectuais. In: REMOND, René (org). Por uma nova história política.
Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2003.
MATTOS, Ilmar Rohloff de. O tempo Saquarema. São Paulo: HUCITEC; Brasília: INL, 1987.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A fronteira Oiapoque, atual ente federado do Amapá, historicamente se caracteriza como uma
região de refúgio para indígenas e quilombolas que buscavam territorialidades outras, longe do
escravismo e violência preconizados pelo pacto colonial. Não por coincidência, esta fronteira também
é conhecida por ser um dos últimos territórios contestados entre o Brasil e demais estados nacionais
limítrofes, só tendo sua anexação definitiva a república brasileira após a publicação do Laudo suíço,
em dezembro de 1900. Ocorre que a partir da definição fronteiriça, a região foi alvo de trabalhos de
reconhecimento e inspeção pelo Ministério da Guerra brasileiro, da qual o mais célebre se traduz
pela passagem da Comissão Rondon na região, em 1927. É sobretudo a partir do relatório expedido
pelo Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon – que acusou o “afrancesamento” dos índios da
região do Oiapoque naquele contexto (Rondon, 2019) – que os indígenas da região foram expostos
a um processo de escolarização compulsória, que iniciou-se duas décadas depois da passagem
da comissão, por volta de 1950. Efeméride que marca de forma definitiva a “invenção” da escola
estatal entre os “índios do Uaçá”, relegando ao esquecimento as experiências coloniais vivenciadas
de forma intermitente, com a pedagogia jesuítica de bases francesa e holandesa (Nimuendajú,
1926; Batista, 2019). Tratamos então nesse texto da “invenção” de uma tradição/cultura escolar
entre coletivos e pessoas indígenas da região de Oiapoque nos termos de Eric Hobsbawm, para
quem “[o] passado histórico no qual a nova tradição é inserida não precisa ser remoto” (2015, p.
08). Essa tradição escolar inaugurada dentre os quatro povos indígenas do Oiapoque, quando lida
a luz do advento da Educação Escolar Indígena específica, diferenciada e munida de pertinência
social exarada a partir da constituição federal brasileira e legislação análoga, escamoteia, em
alguma medida, os movimentos de resistência a implantação dessa escola, visto que os discursos
históricos “oficiais” tendem a tratar da chegada da escola como marco de civilidade, emancipação
e qualidade de vida as populações contempladas. É nesse sentido que o presente artigo toma a
análise os relatos e lembranças silenciadas de um passado do qual nos fala Michael Pollak (1989),
uma memória de velhos que aponta para a violência epistemológica e consequente resistência
a implantação da escola, protagonizada pelos homens memória (Le Goff, 2013), guardiões da
tradição que, aparentemente, desconfiaram da educação e escolarização ofertada e/ou imposta
pelos “brancos”; e ainda, do desdobramento histórico que demonstra a aceitação e o desejo de
escolarização por parte das jovens gerações de indígenas em momento posterior. Como apontamos,
três décadas após a emissão do laudo suíço, a equipe de Inspeção de Fronteiras comandada pelo
General Rondon concluiu ser necessário instalar um posto do Serviço de Proteção aos Índios (SPI)
e escolas nas aldeias da região de Oiapoque. A estratégia brasileira era de investir na garantia do
território pela nacionalização das populações indígenas, processo que ficou conhecido na região
como o “abrasileiramento” dos “índios e crioulos franceses” (Batista, 2019). De acordo com Antonella
Tassinari (2003), em 1934, as duas primeiras professoras foram enviadas para as aldeias de Espírito
Santo, no rio Curipi, e Santa Maria dos Galibis (atual Kumarumã) no rio Uaçá. Segundo as memórias
recolhidas por Tassinari, esses dois povos incorporaram as professoras a sua rede de parentesco, o
que teria resultado em uma relação sincrética e positiva com o advento da escola estatal. Essa primeira
organização escolar, bem como a contratação de respectivas professoras ficou a cargo do Serviço de
Proteção ao Índio (SPI), que realizou a política integracionista para o qual foi criado, interferindo
na produção econômica dos indígenas da região pela introdução de outras espécies de cultivos, ao
tempo em que introduzia as “professoras brancas”, os castigos físicos, e os trabalhos comunitários
como forma de punir quem se desviasse das normas criadas pelo próprio órgão (Arnaud, 1984). Não
obstante, a implantação da cultura escolar nacionalista entre os “índios do Oiapoque” não se deu
sem resistências, ora implícitas, ora explícitas. A exemplo, a tradição oral dos Palikur-Arukwayene,
habitantes do território, demostra que neste momento de chegada das professoras “brancas”, os
anciãos Palikur recusaram a implantação da escola em suas aldeias no rio Urukauá através de
distintas estratégias, por associarem o empreendimento à escravização de suas crianças pelos
brancos, talvez em observação ao caráter diário e repetitivo das rotinas escolares (Gomes, 2011).
Entre os Palikur-Arukwayene, a escolarização estatal só lograria êxito aproximadamente quarenta
anos após essa primeira tentativa, fruto da combinação dos trabalhos de missionários de orientação
protestante com agentes do estado brasileiro, alocados no Serviço de Proteção ao Índio (SPI), que
quebrariam, por meio de diferentes estratégias, a resistência dos capitaines (caciques) palikur. A
partir de Expedito Arnaud (1969), sabemos que em 1945 houve uma outra tentativa de instalação de
uma escola entre os Palikur, mas a direção do Posto do SPI entendeu por bem não contrariar a maior
parte dos velhos do grupo, que consideravam tal coisa (rotina escolar) uma forma de escravidão.
Sem poder alcançar se foi um ato proposital, é sabido que o inspetor do SPI decidiu respeitar a
vontade dos mais velhos, mas enviou um bakmini palikur (menino) para estudar fora, tratava-se de
Moisés Iaparrá. O envio de um menino órfão para estudar em Belém e no Rio de Janeiro mostrou-
se uma estratégia eficaz, uma vez que retornando aquele indígena escolarizado e fluente na língua
portuguesa, ele tornar-se-ia o principal interlocutor dos missionários do SIL, além de ser o primeiro
professor nativo contratado pelo estado brasileiro para alfabetizar adultos entre o seu povo.
De acordo com a pesquisa de Labontê (2015), dos anos de 1930 até 1970, as escolas nas aldeias
dos Galibi-Marworno (região do Kumarumã ) e dos Karipuna (região do médio Curipi no Espírito
Santo), ajudaram a mudar os costumes e o modo de ocupação territorial, contribuindo por fim para
o desuso da língua geral indígena e o monolinguismo em português. É sintomático o caso do povo
Karipuna, que atualmente tenta reaprender (na escola indígena) a língua Kheuól. Como aponta o
autor indígena, não parece ser coincidência a relação entre os anos de escolarização e “integração”
a cultura nacional e a supostamente baixa vitalidade das línguas indígenas na região.De acordo
com Gomes (2011, p. 11), vimos que entre as décadas de 1930, 1940 e 1950 ainda sob a égide do
SPI, começaram as primeiras tentativas de aproximação com os “índios franceses” da etnia Palikur,
com o objetivo de implantar escolas. Isso aconteceu em uma pequena aldeia chamada Sawahap,
localizada na montanha Ucupi para onde inicialmente foram mandadas duas professoras. Os relatos
dessa época dão conta de que os adultos palikur insurretos recusavam-se a “obedecer”, bem como a
reificar a autoridade das professoras frente aos alunos. Segundo o relato colhido por Gomes (2011),
a escola então imposta não combinava com o modo indígena de educar seus bakmini (crianças).
A partir de 1958 o órgão indigenista tenta nova implantação de uma unidade escolar na aldeia
Mawighi, distribuindo ferramentas e mudas de plantas frutíferas como forma de cooptar os pais dos
alunos, para que incentivassem seus filhos a frequência escolar. Experiência que cessou em 1964 por
aparente falta de professoras/es dispostos a empreitada.
Segundo o testemunho de Cícero da Cruz, chefe do Posto Indígena Palikur, de 1976 a 1978, a
escolarização dentre os Palikur retornaria de forma permanente a partir da atuação de professores do
MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), sendo que seu sucesso deveu-se principalmente
a contratação de Moisés Iaparrá como monitor indígena de aprendizagem (Labontê, 2015). Ainda
segundo o chefe de posto, as mudanças e a frequente falta de professores/as, além do suposto
“pouco interesse dos índios” em aprender o português, eram os principais problemas enfrentados
pela implantação da escola no rio Urukauá, naquele momento. A desconfiança dos velhos palikur
com relação a instituição escolar expressa nas referências antes mencionadas, encontram lastro na
história da educação escolar entre os Palikur-Arukwayene em grande parte do século XX (Tassinari,
2001). Mas as memórias dos velhos que tomaremos a análise, referenciam, contraditoriamente um
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 961
outro momento, nas últimas décadas do século XX, em que a escolarização passa a ser desejada.
Da formação do primeiro professor indígena, Moisés Iaparrá, até a formação do primeiro mestre
e doutorando em antropologia do povo Palikur, Adonias Guiome, o contato involuntário com a
escola brasileira por parte dos cognominados “índios franceses” guarda memórias de resistência,
negociação, aceitação e ressignificação que pouco aparecem nos discursos oficiais, via de regra
ufanistas, que como vimos apontando velam os conflitos e impactos causados pela “invenção” de
uma cultura escolar, em sociedades consideradas ágrafas.Não obstante as conquistas já auferidas, o
caminho a percorrer ainda é longo, visto que a desigualdade de acesso a serviços educacionais pelos
povos indígenas é diagnosticada pelo próprio órgão oficial de ensino brasileiro. Perpassando todas
estas histórias e memórias está o protagonismo indígena, em constante trabalho de ressignificar a
herança monolíngue, nacionalista e unicultural proporcionada pelo aparato escolar do estado.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
O trabalho apresenta resultados de pesquisa concluída cujo objetivo foi o de traçar um mapa do
Ensino Médio (EM) no estado de Mato Grosso do Sul (MS), conforme as produções acadêmico-
científicas. Neste trabalho o objetivo foi o de analisar dois dos enunciados que essa produção discute
e faz circular sobre o EM e a constituição de subjetividades jovens nele inseridas. Como fonte foi
utilizada a produção acadêmica (teses e dissertações) da Pós-Graduação em Educação (PPGEdu), de
três universidades do estado de Mato Grosso do Sul, uma gestada pelos salesianos, a Universidade
Católica Dom Bosco (UCDB), e duas públicas, a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS)
e a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Como recorte temporal adotou-se o período
de 1999 a 2018. No caso das teses foi incluído todo o período em que as mesmas encontram-se
disponíveis, isto é, de 2008 a 2018. Como informado, iniciamos o mapeamento das dissertações no
ano de 1999, contudo encontram-se disponíveis no repositório da UCDB, um total de 42 trabalhos
defendidos em anos anteriores, mas nenhum deles refere-se ao EM. A metodologia utilizada para a
primeira seleção dos trabalhos que incluíram o Ensino Médio foi realizada pela leitura dos títulos,
resumos e palavras-chave. O material foi acessado entre abril e agosto de 2019. Esclarecemos que os
limites observados na primeira etapa das buscas, em parte dos resumos, em termos de ausência de
informações necessárias sobre as pesquisas (como recorte temporal, fontes, metodologia), não
invalidaram totalmente seus usos. Considerando esses elementos e selecionadas as produções que
comporiam o mapa, foi realizada a leitura completa ou de partes específicas dos trabalhos que
tratam de temáticas referentes ao EM. Há ainda trabalhos defendidos que não possuem disponíveis
nos repositórios o resumo e o texto completo em PDF, mas que foram acessados em sites de buscas
online e incluídos no mapeamento. Considerando os critérios de seleção adotados os resultados
apontaram que das 934 dissertações e teses disponíveis nos repositórios consultados, 64 trabalhos
priorizam o EM nas reflexões. Após leitura, esses trabalhos selecionados foram organizados em áreas
ou temáticas; entre elas, três - Empregabilidade/orientação vocacional, Políticas educacionais/
gestão escolar e Ensino médio integrado ao técnico - dão ênfase e problematizam a relação educação-
trabalho, permitindo selecionar o enunciado “educação para a vida e para o trabalho”; a outra
temática, Ensino-aprendizagem e prática pedagógica, que possui a maior incidência de produções
sobre EM nos repositórios, colocou em circulação o segundo enunciado que nos dispusemos a
analisar: “é preciso adaptar o ensino às características do aluno”. Desse modo, para este texto, foram
priorizadas apenas parte das 64 produções selecionadas. Em diálogo com Foucault (2001) podemos
afirmar que o “enunciado” possibilita a aproximação de discursos de época, já que estes caracterizam-
se como um “conjunto de enunciados”. Concebemos o enunciado como uma mescla de signos
(palavras, frases, proposições), porém sua identificação não se resume a esses aspectos da
linguagem. O enunciado, tem uma modalidade própria de existência e deve ser identificado em um
regime complexo de instituições materiais; modalidade esta “que lhe permite estar em relação a um
domínio de objetos, prescrever uma posição definida a qualquer sujeito possível, estar situado entre
outras performances verbais, estar, enfim, dotado de uma materialidade repetível” (FOUCAULT,
2000, p. 124). O enunciado é histórico e tem sua identidade reconhecida na relação com outros
saberes e enunciados de época. O enunciado “educação para a vida e para o trabalho” compôs
discursos diversos sobre essa modalidade educacional. Nas produções da pós-graduação
selecionadas ele comparece, pois as viradas macropolíticas, os diferentes exercícios de governo do
outro, afetam a microfísica das instituições sociais, como a escola, e vice-versa. No tema “políticas
públicas/gestão escolar”, foram selecionados 9 trabalhos, destacamos alguns deles. Das pesquisas 4
analisam a chamada “Escola Guaicuru”, que em síntese foi uma reforma educacional realizada no
estado de MS, proposta no primeiro governo petista (1999-2002), e que vigorou parcialmente no
segundo mandato (2003-2006). Outros dois trabalhos analisam programas e parceria com instituições
privadas e denunciam a inserção da lógica de mercado, interferindo na gestão escolar. Como nesses
trabalhos, também consideramos ser possível identificar o enunciado em questão no discurso oficial
ou nas legislações, que evidencia a dicotomia educação-trabalho ou vida-trabalho nesse nível da
educação no país. Levando-se em conta o pouco espaço disponível neste texto, retomamos somente
algumas intervenções legais para exemplificar. Com a promulgação da Constituição Federal de 1988
(BRASIL, 1988), foi assegurada a obrigação do estado brasileiro para com essa etapa da escolarização.
Em decorrência, em 1996, promulga-se a segunda LDB, Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996), garantindo
espaço no texto legal, tanto para o EM, como etapa final da educação básica, como para a oferta de
educação profissional técnica. Reforma essa que também gerou críticas de analistas desse nível da
educação, como o texto de Kuenzer (2000), no qual afirma que “o ensino médio agora é para avida”,
fazendo a crítica a oferta de educação profissional sem uma sólida formação geral, mais uma vez,
não prevista com a separação entre EM e técnico. Essa é uma questão presente nos trabalhos de pós-
graduação selecionados sobre a denominação de “ensino médio integrado ao técnico”, que permitiu
materializar a integração prevista no Decreto nº 5.154/2004 (BRASIL, 2004) e na Lei nº 11.741/2008
(BRASIL, 2008); mas esses trabalhos evidenciam as limitações e dificuldades para o funcionamento
dessa modalidade educacional, mesmo nos Institutos Federais criados para esse fim, fazendo (re)
aparecer a luta de forças entre os conhecimentos de formação geral e o profissional. No tema
“empregabilidade/orientação vocacional” mais uma vez é a questão da relação educação-trabalho e
do mercado que se coloca em análise. Entre as preocupações destacamos a que analisa como o
discurso da empregabilidade afeta e produz a identidade dos jovens. Constata-se ainda que a
maioria dos alunos do EM da escola pública trabalha, enquanto os da escola privada estudada não.
O outro enunciado selecionado comparece em trabalhos da temática “Ensino-aprendizagem/prática
pedagógica”. Produções que analisam principalmente as metodologias e instrumentos utilizados
em diferentes disciplinas escolares (história, filosofia, biologia, matemática, e outras) e suas
implicações nas práticas pedagógicas. Entre os trabalhos mapeados identificamos alguns que
dialogam com a Teoria da Aprendizagem Significativa e com a abordagem Sócio-Histórica, usadas
como suportes para a realização de intervenções em sala de aula (pesquisa de campo) e/ou para a
análise dos resultados das pesquisas. O diálogo com essas teorias coloca em circulação o enunciado
que afirma que “é preciso adaptar o ensino às características do aluno”. Esses trabalhos não
problematizam esse enunciado, ao contrário, evidenciam sua produtividade na consecução de
aprendizagens “efetivas”. Com apoio de Lima (2017) podemos afirmar que esse enunciado, colocado
em circulação desde o início do século passado, tem nessas teorias psicológicas (e em outras) sua
atualização; a autora ressalta e problematiza, entre outros aspectos, a noção da “desigualdade das
inteligências” que elas preconizam. Em contraposição a esse enunciado, no mapa geral do EM,
comparecem trabalhos de políticas públicas, por exemplo, que também contribuiram para identifica-
lo. O trabalho de Obara (2009, p. 6) evidencia que no primeiro governo do Partido dos Trabalhadores
(PT) no MS (1999-2002) o currículo estava alicerçado “na concepção da Escola Única, ou seja, voltada
para a formação geral, articulada em três eixos: formação cultural, formação econômica e formação
política”. Segundo essa reforma o conhecimento a ser ensinado era a referência a ser valorizada.
Também na temática “currículo”, cujos trabalhos acentuam a centralidade do conhecimento
recusando que o ensino se adapte as necessidades dos alunos. Concluindo, partimos do princípio
que esses enunciados abordados neste texto, em circulação nas legislações, nas produções científicas
e nas escolas (e em outros saberes e instituições sociais), objetivam e afetam a ação e o modo de ser
dos envolvidos com a educação, pois contribuem para produzir os sujeitos e a realidade de que
tratam. Porém não é somente esse aspecto que se efetiva, já que os sujeitos não agem da mesma
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Referências
LIMA, Ana Laura Godinho. É preciso adaptar o ensino às características do aluno: análise histórica de
um enunciado. Cadernos de História de Educação, v. 16, n. 2, p. 311-333, mai. ago. 2017.
FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. 3. ed. Trad. Salma
Tannus Muchail. São Paulo: Martins Fontes, 1985.
Maysa Gomes
Eles vão por aí, papas, profetas, crentes e reveladores, orgulhosos cada
um do seu culto, o único que é a Verdade. Falai-lhes boamente, sem a
tenção de agredi-los, e eles se confessarão - por que só uma coisa é
impossível ao homem: enganar o seu semelhante, na fé. (João do Rio,
1906)
políticas, portanto, relações de poder, emergiu nas fontes como uma questão significativa. A disputa
de narrativas travada entre formas de governo, pobreza, educação, dentre outros temas, constituiu
uma complexa ciranda de proposições e ações que auxiliam no entendimento da história brasileira
e da história da educação, pois, neste contexto, a educação tornava-se uma peça indispensável na
realização de uma nação a ser educada em uma República recém inaugurada.
Na República, o catolicismo continuou como a principal religião dos brasileiros, dada a adesão da
maioria da população a este culto, e a igreja católica permaneceu no comando de uma ampla rede
de ensino secundário e de seminários, no entanto, deixou formalmente de ser a religião oficial do
Estado, em um momento da história do país, onde a maioria da população era analfabeta e o ensino
elementar titubeava ente reformas e insucessos.
A presença do catolicismo e outros cultos, bem como do analfabetismo, foi dimensionada
pelas estatísticas dos recenseamentos realizados em fins do século XIX. Estes censos indicaram as
características da população brasileira no período 1872 -1900, demonstrando o estado geral do país -
de um Império que chegava ao fim a uma República que pretendia transformar a nação em nome do
progresso. Não obstante as imprecisões apresentadas nos recenseamentos, os dados sobre religião
e analfabetismo, articulados com os debates e embates da fé, forneceram uma perspectiva histórica
mais abrangente da compreensão que buscamos com essa pesquisa.
Dentre os vários espaços em que figuraram, o conflito entre católicos e positivistas ganhou as
páginas da imprensa e os debates políticos em fins do século XIX e início do XX, principalmente,
com a proclamação da República, a adoção da laicidade do Estado e a decretação do fim do ensino
religioso nas escolas públicas. Observamos também que, tanto para o catolicismo quanto para o
positivismo, a educação se apresentava originariamente pela força das prédicas próprias às religiões,
bem como pelo ensino de conteúdos filosóficos e científicos, onde quer que eles se realizassem - nos
colégios ou nos templos.
Neste trabalho, objetivamos compreender melhor este contexto, tentando localizar a questão
educacional nos debates, nas publicações e na imprensa. A indagação para a qual buscamos
resposta neste estudo é: como a educação, seus objetivos e finalidades, emergiram nas publicações
e nos debates entre católicos e positivistas em fins do século XIX e início do XX? Nossa hipótese é de
que, embora sob o arcabouço da fé em debate, a educação foi um componente essencial tanto para
o positivismo quanto para o catolicismo, no sentido político e cultural.
Para o desenvolvimento da pesquisa, utilizamos fontes primárias e secundárias, a saber, os dados
dos recenseamentos realizados em 1872 e 1890, para a abordagem do dos cultos e do analfabetismo;
a obra As Religiões no Rio, uma série de reportagens feitas por João do Rio, coligidas e publicadas
em 1906; os princípios da Filosofia Primeira que se constituíram a base do ensino positivista; a
entrevista de Trajano Carneiro (1993) [1]; O Ensino Positivista, obra de Raimundo Teixeira Mendes.
Já para a abordagem do catolicismo, utilizamos as obras do Padre Júlio Maria, tais como, A Religião
– partes II e III, publicadas no Livro do Centenário v. 1; Apóstrofes; e as Conferências da Assunção,
realizadas no Rio de Janeiro. Abordamos também o capítulo III do segundo volume do Livro do
Centenário, intitulado Religiões Acatólicas e periódicos como O Apóstolo e A Gazeta de Noticias,
disponíveis na BNDigital, dentre outros documentos e publicações referentes à temática. Com
este conjunto de fontes primárias e secundárias, buscamos inquirir a educação no contexto destas
religiões, observando os elementos constantes da nossa hipótese.
A demarcação desse trabalho busca apreender, historicamente, elementos explicativos da
temática em estudo, configurando-se nos campos da sociedade, da política, da cultura, da religião e
da educação, como lugares da produção de humanidades historicamente construídas. Burke (2002),
entende a história em estreita relação com a teoria social, e assim sendo, no âmbito da história da
educação torna-se possível a abordagem dos contextos em sua pluralidade. Realiza-se, assim, a
conexão entre este estudo e a historiografia, considerando, como Magalhães (1999) que “a história
é assim um fator de informação e relativização e permite compreender, explicar e avaliar em que
medida as ideias pedagógicas e as práticas educacionais são fator-produto de uma construção
social.” (p.50).
Este estudo resulta, portanto, de pesquisa histórica, documental e bibliográfica, orientada pela
abertura de temáticas e diálogo entre fontes e com outros campos disciplinares, onde o lugar da
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 967
Referências
ASSOCIAÇÃO do Quarto Centenário. O Livro do Centenário (1500-1900). Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1900. (v. I e II)
BURKE, Peter. História e teoria social. São Paulo: UNESP, 2002. 275p.
COMTE, A. Catecismo Positivista. In: COMTE, A. Os pensadores. São Paulo: Ed. Abril Cultural, 1978c.
637p. Disponível em: <https://cesarmangolin.files.wordpress.com/2010/02/> Acesso em: 23 Jun.
2017
MARIA. Pe. Júlio. Conferências da Assunção. São Paulo: Ed. Santuário, 1988.
[1] Trajano Carneiro frequentou o curso oferecido pelos positivistas no Templo da Humanidade, no Rio de Janeiro.
ISSN 2358-3959
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A proposta deste artigo é analisar as discussões sobre a laicidade nas escolas, problematizando
a intervenção de um grupo protestante na aula de História da África. O objetivo geral é discutir o
proselitismo evangélico dos Gideões Internacionais, no Colégio Estadual Hilda Carneiro na cidade
de Feira de Santana-BA na turma do 7º ano B, no dia 18 de setembro de 2019. Os específicos são:
identificar se houve autorização por parte da direção escolar para à distribuição de Bíblias Sagradas
entre os estudantes, professores e demais funcionários; analisar a filiação religiosa dos docentes
do referido colégio; descrever como a presença evangélica foi utilizada como fonte para dialogar
sobre a intolerância religiosa por parte de alguns grupos evangélicos contra as religiões de matrizes
africanas; identificar os impactos sociais que são causados no ambiente escolar, caso a temática
religiosa seja discutida de forma apologética. A metodologia adotada neste artigo foi a de análise
e interpretação de dados com base nas fontes material e oral que foram estudadas nesta pesquisa.
As fontes oficiais como a Constituição Federal de 1988 e a Lei Federal 10.639/03, o depoimento oral,
realizado em entrevista, com a professora de História Mirleide Santana Lima Pinheiro. Também
serviu de fonte para este trabalho a Bíblia Sagrada distribuída para todos e todas presentes na escola
na data já supracitada. Em vigor no ordenamento jurídico brasileiro, durante o governo Lula, a Lei
Federal 10.639/03 alterou a Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 e foi implementada pela Lei Federal
11.645, de 10 março de 2008. Destacaremos nesta pesquisa, a Lei 10.639/03, pois, foi trabalhado
em sala de aula a temática Africana. A disciplina de Estágio II faz parte dos requisitos de práticas
educacionais do currículo de ensino superior da Universidade Estadual de Feira de Santana-UEFS,
no dia 18 de setembro de 2019, foram ministradas duas aulas com a temática Africana em atenção
a necessidade de dialogar sobre uma educação antirracista em tempos de tamanha segregação e
preconceito vivenciados nos últimos anos no Brasil.
De acordo com Munanga (2004), atualmente, existe a ideologia racista, mascarada de cultura,
cuja superioridade se camufla na estética, na religião, nas produções intelectuais, e isso pode ser
observado no privilégio das manifestações europeias comparadas as Afrodescendentes. “O racismo
é uma crença na existência das raças naturalmente hierarquizadas pela relação intrínseca entre o
físico e o moral, o físico e o intelecto, o físico e o cultural”. (MUNANGA, 2004, p. 07). Em sintonia
com a perspectiva de Munanga, Santana afirma que: “Os conceitos de negro, branco e mestiço não
significam a mesma coisa nos Estados Unidos, no Brasil, na África do Sul, na Inglaterra. Por isso o
conteúdo dessa palavra, é etno-semântico, política-ideológico e não biológica”. (SANTANA, 2006, p.
164).
A Lei Federal 10.630/03 é uma importante ferramenta jurídica para que os profissionais de
educação possam ter um aparato legal para aplicação de conteúdos relacionados a História da
África e cultura Afro-Brasileira, conhecer a História da África e dos Afrodescendentes em seu contexto
histórico e não a partir da visão eurocêntrica. Foi com este objetivo que na aula de Estágio II decidimos
trabalhar uma parte da História da África Pré-Colonial, no dia 18 de setembro de 2019, na turma do
7º ano turma B, no turno matutino do Colégio Estadual Hilda Carneiro. Nessa aula, trabalhamos
como alguns reinos Africanos, a exemplo de Gana, Mali e Songai, se formaram e foram responsáveis
por grandes relações econômicas com o ocidente e criaram e modelaram diversas culturas ao longo
da História da África.
O Colégio Estadual Hilda Carneiro está localizado na Rua D, s/nº do conjunto Feira V – Mangabeira
na cidade de Feira de Santana-BA. Foi autorizada pelo decreto 9691 e publicado no Diário Oficial em
04/12/1984. A estrutura do Colégio está organizada em dez salas de aulas, uma secretaria em que
são tratados os assuntos administrativos do Colégio, uma sala de professores, dois banheiros (um
masculino e outro feminino), 674 estudantes matriculados no ano letivo de 2019 e recebe estudantes
do 6º ano ao 3º do ensino médio. Também são destinadas turmas para a Educação de Jovens e
Adultos – EJA, matriculando estudantes entre 15 e 17 anos, chamados de Tempo Juvenil. As aulas
são ministradas nos turnos matutino e vespertino, o Colégio não tem sala de vídeo, laboratórios de
informática e ciências, não tem biblioteca nem recursos destinados para aulas práticas.
No decorrer da explicação sobre a História da África, tivemos a intervenção da professora de
História Mirleide Santana Lima Pinheiro, que disponibilizou seu horário para que eu pudesse
desenvolver minha aula, cedendo, nesse período de tempo, espaço para que um grupo Evangélico
distribuísse de forma gratuita Bíblias de vertente protestante.
De forma dinâmica, para que pudéssemos saber quem eram aquelas pessoas, interrompemos
a nossa aula para conhecê-las. Flavio e Gilberto se apresentaram como integrantes do grupo
protestante chamado “OS GIDEÕES”, eles tinham como objetivo distribuir aquele material para que
os estudantes “tivessem acesso a palavra de Jesus”. Diante do episódio ocorrido questionamos: a
escola realmente é laica? Fica a reflexão para nosso diálogo.
De acordo com o texto introdutório da Bíblia distribuída, os Gideões Internacionais é uma
associação de interesse proselitista presente em diversos países pelo mundo. “A finalidade da
Associação é tornar conhecido o Evangelho de Cristo em todo mundo, a fim de que todos cheguem
a conhecer o Senhor Jesus como Salvador pessoal” (BÍBLIA SAGRADA, 2011, s/p).
Levando em consideração a laicidade em instituições públicas, como a escola, e que os visitantes
tiveram permissão para distribuírem Bíblias nesse espaço, decidimos, de forma interativa, incluir
essas pessoas na aula de História da África. Os questionei sobre a intolerância religiosa contra as
Religiões de Matrizes Africanas aqui no Brasil, visto que estávamos numa aula sobre essa temática.
Sabemos que as religiões de Matrizes Africanas é um dos grupos religiosos que mais sofrem com a
intolerância, portanto, pedi que os visitantes dialogassem com a turma sobre essa questão.
Naquele momento, os visitantes contribuíram com a aula informando que, de acordo com seus
ensinamentos religiosos é importante respeitar o outro, e que o objetivo da distribuição de Bíblias
era converter as pessoas às doutrinas dos protestantes. Com o objetivo de registrar esta situação
em um texto cientifico, procurei um dos visitantes, o senhor Flávio e o convidei para uma entrevista,
porém, até a elaboração deste texto ele não estava disponível para ser entrevistado.
De acordo com a professora de História, Mirleide Santana, a escola já acolhe este grupo protestante
há pelo menos cinco anos. “Oh, o ambiente nós permitimos a entrada é ... de qualquer cidadão que
venha a desenvolver trabalho de informação, de conhecimento, né ... ou até mesmo de manifestar
o desejo de um, de uma expressão religiosa” (PINHEIRO, entrevistada concedida ao autor em 18 de
outubro de 2019).
Quando falamos em um Estado Laico, destacamos a não influencia religiosa nas políticas do
Estado, ou seja, o não-privilégio de uma religião sobre outra. Isso não significa que o Estado é ateu
ou agnóstico. O Estado Laico deve tratar os grupos sem crenças da mesma forma com que trata os
outros grupos religiosos.
A sala de aula é um ambiente formativo, sendo o espaço que pode abrigar uma diversidade muito
ampla de grupos com ou sem religião e culturas distintas, ela pode ser responsável pela mediação
de uma construção de sentimentos de respeito e alteridade, da mesma forma, caso ela não pratique
a laicidade prevista na Constituição Federal, ela pode representar um campo propicio para diversos
conflitos.
No Colégio Hilda Carneiro, a distribuição de Bíblias pelos Gideões Internacionais não condiz
com os princípios de igualdade da Constituição Federal, pois, eles exerceram uma manifestação
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 970
de sociabilidade, diferentes atores sociais com formação intelectual e atuação profissional diversas
interagiam reconhecendo as associações como espaços de sociabilidade, compreendo que no Brasil
das décadas finais dos anos oitocentistas e da primeira metade do século XX, elas, fossem literárias,
esportivas ou ecológicas, reuniam um grupo de jovens de interesses comuns que desenvolviam
atividades que requeriam organização, disciplina, cooperação e colaboração, o que as tornavam
como um lócus de aprendizagem e de convívio social. Tais atividades promoviam a sociabilidade e
asseguravam um tipo de prática educativa que aprimorava e dialogava com a educação escolar e
familiar. Dos inúmeros tipos de associações que existiam, o associativismo estudantil dotado de
peculiaridades e autonomia fez parte de uma cultura escolar presente no cenário educacional e da
juventude brasileira, e chama a atenção por sua significância na construção da identidade dos
alunos que dele fizeram parte. As razões para a presença marcante desse tipo de associativismo na
realidade da educação das sociedades democráticas são plurais, mas percebe-se que a comunhão
com os interesses ditados pela democracia é uma característica peculiar a ele. Apropriando-se das
reflexões e conceitos de Simmel (2006), a investigação dos espaços de sociabilidade dos estudantes
no estado de Sergipe resultou na identificação de um conjunto de associações estudantis criadas e
dirigidas por alunos ao longo da história da juventude sergipana. Essas associações, presentes no
universo dos espaços educativos e de formação, representaram as práticas estudantis, cujo
finalidades perpassaram pelo ideal de se socializar dentro das instituições de ensino ou fora delas. O
associativismo estudantil em Sergipe tem sua origem no século XIX, sendo a primeira associação
estudantil criada em 1872 pelos alunos do Atheneu Sergipense. E assim como ocorreu em São Paulo,
a primeira metade do século XX registrou a presença de diversas associações criadas pelos alunos do
ensino secundário, e atrelada a elas, estava a produção de impressos estudantis, exclusivamente
jornais. Durante a pesquisa foram catalogados 47 jornais produzidos pelos estudantes de várias
instituições de ensino sergipanas, que circularam com o apoio e o incentivo dos professores e da
direção das instituições, às quais os alunos estavam vinculados. Neles, os discentes compunham o
corpo editorial e veiculavam notícias que representavam o cenário social, político e educacional do
momento. Dos 47 jornais estudantis que circularam em Sergipe na primeira metade do século XX, 18
são órgãos oficiais das associações estudantis, 12 foram criados e produzidos pelos alunos do
Atheneu Sergipense, destes, 6 foram identificados como órgão oficial das associações estudantis
dessa instituição de ensino. Dentre as associações estudantis criadas em Sergipe na primeira metade
do século XX que desenvolviam formas de sociabilidade destaco aqui, as criadas pelos alunos do
Atheneu Sergipense, são elas: Grêmio Littero Sportivo do Pedro II, Grêmio Literário Pedro II, Centro
Cultural Alcebíades Paes, Grêmio Pré-Politécnico do Atheneu Sergipense e o Grêmio Literário
Clodomir Silva. Nessas associações, os alunos praticavam a sociabilidade através das reuniões
literárias, palestras, caravanas, excursões culturais, da produção de jornais, programas de rádio e
atividades esportivas, estas sendo atividade exclusivamente desenvolvidas pelo Grêmio Littero
Sportivo do Pedro II. Essas práticas revelam que as atividades das agremiações não estavam restritas
apenas ao interior das suas reuniões, extrapolavam os limites da instituição de ensino e davam
visibilidade e representação na sociedade sergipana. No interior daquelas associações, em meio a
uma série de atividades e obrigações, os sócios desenvolveram atividades como reuniões literárias,
palestras, caravanas, organização de eventos cívicos, excursões culturais, produção de jornais,
programas de rádio, aulas de reforço e atividades esportivas que se configuraram como formas de
sociabilidade e que contribuíram significativamente para o desenvolvimento intelectual e político
da juventude. A identificação de tais atividades permitiu definir as agremiações estudantis como
lócus legítimos de sociabilidade, uma vez que os pilares das finalidades delas estavam fincados nos
princípios de união e fortalecimento dos ideais de bem comum. As associações estudantis
constituíram-se, assim, como verdadeiros espaços de sociabilidades fundamentados em princípios
democráticos, cujas finalidades aguçavam o intelecto, o espírito de cooperação e responsabilidade.
O princípio fundamental de uma associação é unir um grupo de indivíduos na orbita dos interesses
e objetivos comuns, por meio da prática associativa, a juventude exercitou o convívio social,
combateu o individualismo e aprendeu práticas de organização, liderança, disciplina e autonomia.
Os jovens que delas faziam parte, conviviam em um ambiente que promovia cultura e espírito
democrático, instituía relações sociais, nas quais a interação estabelecia a sociabilidade, significante
no universo das práticas educativas e culturais.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
ESTRATÉGIAS DE MOVIMENTO:
UMA VIAGEM DE ADOLPHE FERRIÈRE NAS PÁGINAS
DA REVISTA POUR L’ÈRE NOUVELLE (1931)
Analisar o artigo escrito por Adolphe Ferrière, a respeito de sua viagem ao Chile, publicado na
revista Pour l’Ère Nouvelle, é o objetivo deste estudo. Com o intuito de divulgação e fortalecimento
do movimento da Escola Nova, patrocinado pela Ligue Internationale pour l’Éducation Nouvalle,
que o educador suíço Adolphe Ferrière parte rumo à América Latina, em 1930. Tal empreendimento
foi publicizado através de artigos na revista Pour l’Ère Nouvelle. Nesta investigação, interessa-nos
especificamente a sua passagem pelo Chile, que aconteceu entre junho e julho de 1930. Debruçamos-
nos, portanto, sobre o artigo que trata dessa experiência, a fim de apresentar as motivações e
impressões dessa viagem. Buscamos discorrer também sobre o impresso em que tornou público
seu relato, explorado sua materialidade e conteúdo.
Viajar era uma estratégia utilizada pelos educadores escolanovistas a fim de divulgar e expandir
o movimento que começava a ganhar reconhecimento pelo mundo. Nas suas travessias tinham
oportunidades de observar, experimentar e comparar as apropriações realizadas pelos países que
aderiam as ideias da Escola Nova. Nesse sentido, Adolphe Ferrière, um dos idealizadores e mais
importantes difusores desse movimento, tinha como uma de suas principais missões realizar
inúmeras viagens com o objetivo de apresentar uma educação que renovaria o homem e a sociedade
(MIGNOT E GONDRA, 2007).
Durante seis meses do ano de 1930, Ferrière empreendeu longa excursão pela América do Sul.
Nessa travessia, passou por sete países, sendo: Equador, Peru, Chile, Argentina, Paraguai, Uruguai e
Brasil. A viagem era uma demanda da Ligue Internacional pour L’Èducation Nouvelle do Chile, que por
meio de uma carta escrita pelo seu representante, no ano de 1928, pediu que alguém fosse enviado
para falar a respeito da nova educação. Nesse mesmo tempo, o Bureau International d’Éducation
de Genève Nouvelle – considerado o principal centro de referência da Escola Nova europeia que
contava com um acervo de materiais recolhidos em diversos países, tais quais mostravam as
diferentes maneiras que estes utilizavam para implantar o movimento em seus respectivos sistemas
educacionais – também declarava desejo de estreitar laços com a América Latina (FERRIÈRE, 1931,
p. 13 apud PERES, 2002, p. 3 e 4). Nessa combinação de circunstâncias, ficou acordado que Ferrière
representaria o órgão.
Ferrière permaneceu no Chile entre 18 de junho e 27 de julho de 1930. Conforme Blanco (2016, p.
442), o país passava por um comando autoritário e o campo educacional foi marcado por inúmeros
conflitos. Entre os anos de 1860 e 1920 houve consideráveis mudanças na educação chilena, em
especial os dois anos citados que foram marcados pela promulgação das Leis da Educação. A primeira
(de 1860) tentava romper com as altas taxas de analfabetismo, precariedade na estrutura escolar e
outros problemas educacionais. A segunda Lei (de 1920) tornava o ensino primário obrigatório. Essa
era uma tentativa de integrar os setores excluídos que começaram a dar início aos novos rumos que a
educação tomou, levando novas concepções pedagógicas a fim de reformular o sistema educacional
chileno. Com a presença de um governo autoritário na década de 1920, não obtiveram tanto êxito
e somente no início da seguinte que novos pensamentos e caminhos começaram a ser elaborados
para a melhoria da educação chilena, tendo sido a Associação Geral de Professores (AGP) a iniciar
as reformas e enxergar a necessidade de se conhecer os interesses políticos e educacionais deste
campo.
Assim como as viagens, os registros dessas experiências também consistiam em estratégia de
circulação de ideias (MIGNOT e GONDRA, 2007). Adolphe Ferrière escrevia suas experiências de
viagem em seu diário pessoal e nas páginas da revista Pour l’Ère Nouvelle, na qual era editor chefe.
Interessa a essa investigação, especificamente, as impressões e reflexões de Ferrière obtidas a partir
da viagem ao Chile e publicadas em forma de artigo na Pour l’Ère Nouvelle.
Para a análise desse material, trabalhamos conforme a perspectiva de Roger Chartier (1999, p. 17),
segundo a qual, a compreensão de qualquer texto depende da forma como chega ao leitor. Portanto,
buscamos entendê-lo muito além do conteúdo veiculado, mas apresentá-lo em sua materialidade e
localizar seu papel na divulgação dos ideários escolanovistas. Dialogamos assim também com Luca
(2018) que considera uma tarefa essencial nas pesquisas com fontes impressas identificar o local
ocupado pela publicação na história da imprensa.
A revista Pour l’Ère Nouvelle foi idealizada em 1921, na ocasião do congresso fundador da
Ligue International Pour l’Education Nouvelle, em Calais. Esse órgão ajudaria a institucionalizar o
movimento, tornar conhecidos os idealizadores e os ideais da Escola Nova. Existiam em três versões
linguísticas da revista: em língua alemã “Das Werdende Zeitalter”, em língua inglesa “The New Era” e
em língua francesa “Pour l’Ère nouvelle” - para assim conseguir alcançar um grande público leitor.
Para cada uma dessas havia um representante específico, Elisabeth Rotten, Beatrice Ensor e A. S.
Neill e Adolphe Ferrière.
A primeira edição da revista foi publicada em janeiro de 1922, sua periodicidade inicialmente era
trimestral. O número de assinantes passou de 75 para 700 entre os anos de 1924 a 1929 (MIGNOT E
GONDRA, 2007). De 1927 até 1937, suas edições passaram a ser de caráter mensal, todavia publicadas
ao longo de dez meses do ano (duas vezes por ano um número da revista publicava artigos referentes
a dois meses). No decorrer dos anos, a regularidade foi reduzida até a revista encerrar duas edições
no primeiro trimestre de 1940. Ainda houve uma nova tentativa de retomar os trabalhos entre 1946 e
1947, no entanto, apenas cinco números foram publicados. Todos os 156 exemplares desse impresso
encontram-se digitalizadas e disponíveis para consulta no site da Université de Caen Normandie.
Dentre os muitos artigos de assuntos variados publicados na Pour l’Ère nouvelle, encontram-se
as experiências de Adolphe Ferrière ao redor do mundo. Ferrière controlou sozinho a linha editorial
da revista até 1925, quando a administração passou para as mãos do Grupo Francês de Educação
Nova, mas o educador continuou extremamente atuante mesmo após essa mudança. Foi a partir
desse lugar editorial que ele ocupava que seus relatos de viagem foram publicados no periódico
(MIGNOT E GONDRA, 2007). Detemo-nos aqui à edição nº 64, de janeiro de 1931, no artigo intitulado
L’Education Nouvelle au Chili. O relato ganha destaque nesse número, ocupando as primeiras folhas,
logo após o editorial dessa publicação que possui um total 28 páginas.
Ao longo desse escrito de viagem de Ferrière, ele apresenta a educação chilena, destacando
mudanças e permanências no ensino, estabelece relações com os sistemas educacionais de
outros países e avalia as instituições que visitou. Demonstrou, em seu relato, ter apreciado muito a
educação o país, a ponto de considerar as instituições públicas que visitou como de primeira linha
e afirmou que não acreditava que elas tenham se apresentado assim apenas para que ele visse um
bom trabalho. Além disso, concluiu que o país era inovador e que acreditava que passos muito mais
significativos seriam dados após sua passagem e as conferências que realizou.
Todavia esses registros produzidos por Ferrière não podem ser trabalhados de modo
desinteressado, haja vista o próprio objetivo de consagração do movimento escolanovista intrínseco
na Pour l’Ère nouvelle desde sua criação. Levando em consideração que seu relato seria divulgado
internacionalmente a fim de promover o movimento, ele apresenta apenas um recorte de interesse
do educador suíço, estando longe de conter a total realidade educacional do Chile naquele momento.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 975
Desse modo, esta investigação permite compreender as estratégias lançadas pelos educadores
ligados a Escola Nova a fim de fazer circular suas ideias, entre as quais estão viagens de importantes
educadores e os registros dessas suas experiências. Mais do que pensar as impressões de viagem
de Ferrière em sua passagem pela América do Sul, a partir de um olhar apurado sobre o impresso
que as veiculou, consideramos que seus objetivos interferiram na própria produção do artigo de
Ferrière e, consequentemente, na elaboração de uma imagem de que a implementação das reformas
escolanovistas no continente americano teriam sido um sucesso. Portanto, a importância da análise
realizada neste estudo consiste em sua colaboração para a circulação internacional de ideias no
início do século XX e as problematizações dirigidas a um impresso ainda pouco estudado no Brasil.
Referências
CHARTIER, Roger. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV
e XVIII. Brasília: EDUNB, 1999.
LUCA, Tânia Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.)
Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2018, p. 111- 153.
MIGNOT, Ana Chrystina Venancio e GONDRA (Orgs). Viagens pedagógicas. São Paulo: Cortez, 2007.
PERES, Eliane. O diabo inventou a escola? A escola ativa na visão de Adolphe Ferrière. In: 25ª
Reunião Anual da ANPEd (Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação), 2002,
Caxambu. MG. Educação: manifestos, lutas e utopias. Rio de Janeiro: ANPED, 2002. Disponível
em: http://www.miniweb.com.br/educadores/teoria_educ/resenha_FERRI%C8RE.pdf. Acesso em
10/11/2019.
TORO BLANCO, Pablo Andrés. Misión Al finis terrae: Adolphe Ferrière y su viaje a Chile en 1930. In: Díaz,
José María Hernández. (Coord.). Influencias suizas em la educación española e iberoamericana.
Salamanca: Ediciones Universidad Salamanca, 2016, p. 441-45.
ISSN 2358-3959
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favorecer o contato público com clássicos da literatura mundial, tornava popular o que até o
momento se restringia a uma classe. Raul Lima ainda afirmava, em matéria ao Diário de Notícias: “o
número dos que gostam de ler e podem comprar é limitadíssimo! Os livros, concorde, são caríssimos”
(20 de agosto de 1950). Partindo desse pressuposto, é possível perceber os motivos que levavam à
caracterização de comunistas, aos simpatizantes com tal projeto, bem como aos defensores da
escola pública (SAVIANI, 2013). Entre estes, destacamos a atuação da professora Palmarina Maria
Mariá, por acreditarmos que esta auxilia a visualização regional desse fenômeno global. Na década
de 1950 a mestra já tinha carreira consolidada, tanto na docência, quanto no jornalismo. Havia
redigido críticas a condição precária das instituições de ensino e da educação dos municípios
interioranos, utilizando-se do jornalismo. Ora falando da cidade natal, ora relatando problemas do
estado e do país. Apenas no período citado, suas publicações no Jornal de Alagoas contam 57 títulos,
abordando temas como: a condição econômica da cidade natal, a conjuntura política do estado, a
precariedade das escolas públicas, as péssimas condições formativas da classe popular e a função
do ambiente letrado no processo de formação intelectual. Como mulher interiorana, a propagação
nacional e internacional dos seus escritos e projetos, bem como sua trajetória de vida, são
consideráveis negações a ideia ultrajante de feminino, visto que a este era reservado apenas o lar, as
prendas domésticas e o magistério primário (NICOLE e ALMEIDA, 2017). Em Alagoas as condições
eram mais limitadas, pois como afirmara: “Aqui dentro do país, Alagoas não é mais que u’a minúscula
parte da Federação que dá o saboroso sururu e as famosas “peixaradas” (SARMENTO, 1956). A
província era, segundo a mestra: “Tradição e nada mais” (idem), principalmente em localidade
interiorana. Por tal razão, muitos foram os conterrâneos que migraram para o Rio de Janeiro no auge
de suas carreiras: Rosália Sandoval, Graciliano Ramos, Jorge de Lima. Literatos que em tais tempos
viam Alagoas de fora. Provavelmente, como afirmara matéria do periódico Alagoas: Mensério
Ilustrado, de 1938: “emigração, forçada pela pobreza do meio”. Suas produções diziam mais do
Nordeste e do País, que necessariamente do estado de origem. Falando de Alagoas em Alagoas, as
críticas, anúncios e crônicas de Mariá apresentam riqueza de detalhes. Provavelmente inspirava-se
nas leituras que fazia corriqueiramente. A sua escrita, remete, em muitos momentos, a Tolstoi em
Guerra e Paz, autor identificado no acervo doméstico da professora. Este mostrara que em todos os
fatos existem verdades que somente podem ser compreendidas quando há menção a todos os
envolvidos. É, também, na citada concepção metodológica que fundamentamos o presente estudo.
Portanto, durante a escrita, “(...) as hipóteses, as dúvidas, as incertezas tornavam-se parte da
narração; a busca da verdade tornava-se parte da exposição da verdade obtida” (GINZBURG, 2007,
p. 265). Argumentamos que a capacidade de “organizar-se também em torno de uma sensibilidade
ideológica ou cultural comum e de afinidades mais difusas, mas igualmente determinantes”
(SIRINELLI, 2003, p. 248), com demais representantes da Intelligentsia épica, tornam a docente, na
ótica analítica inspiradora desta pesquisa, uma intelectual. Raras foram as alagoanas, oriundas do
interior do estado, que tiveram a oportunidade de ocupar a imprensa com a liberdade que ela
preservou a duras penas. Nesta pesquisa, constitui-se nossa principal fonte, o periódico Jornal de
Alagoas, pois, sua consolidação como meio de comunicação e lugar de socialização de ideias, o
torna rico instrumento para estudos historiográficos. Após consultas realizadas em acervos locais,
foram identificados documentos que favoreceram a formulação da seguinte indagação: Como a
implantação de Bibliotecas Públicas no interior de Alagoas buscou interferir na formação extraescolar
de tal província após a ditadura do Estado Novo? A escolha do jornal enquanto fonte identifica a
produção como parte da História Cultural, sobretudo por falar de uma personagem por tempo
invisibilizada, e por ancorar-se na ideia de que é preciso considerar a multiplicidade de fontes
existentes para conhecer sujeitos e histórias marginais, como é o caso das mulheres professoras,
cujas ações e trajetórias, muitas vezes, foram relegadas ao esquecimento. Deste modo, propomos
analisar três textos jornalísticos intitulados: Um Velho Tema: Brasiliano Sarmento (1953), Herança de
Primo Pobre (1954) e Jorge de Lima, um velho tema (1954), porque ao tratar da implantação da
Biblioteca Pública de uma cidade interiorana, possibilitam a percepção de como se deu tal processo
no interior de Alagoas, favorecendo a compreensão da interferência social de Maria Mariá, uma
professora secundária que apresentou em seus escritos rastros do ofício, ao defender projetos
favoráveis à formação extraescolar da classe subalterna. As bibliotecas serviram como bases
civilizatórias, mas não se pode negar que ao favorecer o contato público com clássicos da literatura
mundial, também exerceram o papel formador, pois nelas reside a possibilidade de contato com o
mundo letrado. Assim sendo, por meio desta pesquisa documental e histórica, buscamos demonstrar
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 978
a interferência de tal mestra no debate intelectual épico e na implantação de projetos para formação
de leitores, dimensão importante da história da educação de Alagoas, por muito tempo esquecida
entre os arquivos e depoimentos locais.
Referências
GINZBURG, C. O fio e os rastros: verdadeiro, falso, fictício. Tradução de Rosa Freire d’Aguiar e
Eduardo Brandão. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
SIRINELLI, J. F. Os intelectuais. In.: RÉMOND, R. Por uma história política. 2 ed. Rio de Janeiro: FGV,
2003.
SAVIANI, D. História das ideias pedagógicas no Brasil. 4 ed. São Paulo: Autores Associados, 2013.
MARTINS, Marcus Vinicius Rodrigues. Bibliotecas públicas e escolares nos discursos de Cecília
Meireles e Armanda Álvaro Alberto: acervos e práticas de leituras. Perspect. ciênc. inf., Belo
Horizonte, v. 19, n. spe, p. 227-241, Dec. 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1413-99362014000500017&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 27 de
Outubro, 2019.
ISSN 2358-3959
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O presente trabalho propõe uma investigação sobre a história da Educação no município de São
Bernardo do Campo, localizado na região metropolitana do estado de São Paulo. Interessa uma
análise de fragmentos de três documentos legais escritos no século XIX, ocasião da instituição da
primeira escola de primeiras letras. Os documentos estão citados na obra de Santos (1992) intitulada
Antecedentes Históricos do ABC Paulista: 1550-1892. Os dois primeiros documentos são escritos
pelo inspetor Francisco Martins Bonilha à Câmara de São Paulo, sendo o primeiro escrito em 1834
e o segundo em 1842. O terceiro se trata de um ofício encaminhado pelo Pe. Lustosa, professor de
primeiras letras na Freguesia de São Bernardo, em 13 de março de 1852, endereçado ao Inspetor
Geral da Instrução Pública da Província, Dr. Diogo de Mendonça Filho.
A primeira escola de primeiras letras de São Bernardo foi conhecida popularmente como “do
Padre Lustosa”, denominada a primeira escola pública do ABC. Tomás Inocêncio Lustosa, vigário
no município entre 1848 e 1892, é ordenado padre em 1828. Através de concurso, em 1830, assume
a cadeira de professor da escola criada na freguesia, atendendo a lei provincial que estabelecia a
criação de escolas em todas as vilas e principais localidades da província de São Paulo, três anos
após a criação da lei. Nesta ocasião Francisco Martins Bonilha exercia o cargo de inspetor de ensino
na Freguesia.
Ao analisar os documentos, cabe um olhar apurado aos discursos inacabados, assim como
os enunciados das respostas, explicações e a centralidade do poder. Dados e discursos foram
verificados e contrapostos, como, por exemplo: alunos matriculados e efetiva frequência, solicitação
de materiais pedagógicos e permanentes e condições arquitetônicas de funcionamento.
De acordo com Souza (1998) educação e moralidade andavam de mãos dadas, sendo diretamente
ligadas à formação do cidadão. A sociedade, que até o momento era vista como atrasada, passa
a vislumbrar a possibilidade de avanços através da educação. A autora, de forma muito clara,
contextualiza o crescimento econômico nas últimas décadas do século XIX, o qual deu origem a vários
debates no campo, político, intelectual e econômico. Havia muitas novidades, entre elas: a transição
para o trabalho livre, a construção de uma identidade nacional, a modernização da sociedade e o
progresso da nação, logo se fazia necessário pensar em um projeto civilizador que atingisse a todos.
Neste diapasão, a educação popular foi eleita como uma necessidade política e social.
É possível identificar no discurso de Bonilha esta visão, quando afirma em sua escrita no ano
de 1834 que: “Não obstante, a instrução primária tem recebido algum impulso, já não se vem tantas
assinaturas de cruz, como observei antigamente, e é bem natural que este pequeno adiantamento
produza a emulação e se vão desenvolvendo os germes da civilização, de que tanto necessitamos.”
Ainda neste documento o inspetor ressalta a questão social e econômica da população, afirmando
que os pais por vezes optavam pelo trabalho dos filhos para que a família pudesse se sustentar: “A
escola tem 20 alunos, todos filhos de pessoas pouco abastadas, pela maior parte lavradores, de que
resulta tirarem os filhos do aprendimento todas as vezes que os podem empregar em seu serviço.”
Outra queixa do inspetor se refere à quantidade de escolas no Freguesia: “Mas também é mui claro
que as primeiras letras não são bastantes para constituir o homem em estado de guiar-se a si mesmo
na sociedade e é portanto de esperar-se da sabedoria da Assembleia Provincial estabelecimentos
públicos de instrução elementar acomodados às diferentes posições dos indivíduos.”
O padre Lustosa também relata a dificuldade em garantir a frequência dos alunos, uma vez que
a distância seria um dificultador para o acesso e permanência das crianças, somando às questões
econômicas e necessidade de trabalho. Neste sentido o “padre-professor” realizou uma adaptação
de horário: “A primeira aula nos dias compridos começa às 8 horas e acaba às 10 e meia; de tarde,
entra às 2 e acaba às 4 e meia; nos dias outros, entra às 8,30 e acaba às 11; de tarde entra a 1 e 30 e
acaba às 4 para alguns alunos que moram mais longe tenham tempo de com dia chegarem às suas
casas.”
Através destes fragmentos verifica-se que, apesar da lei de 15 de outubro de 1827, que em seu
artigo 1.º dizia que em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos haveria escolas de primeiras
letras que fossem necessárias (Faria Filho, 2016), a mesma não garantiu que, de fato as escolas se
estabelecessem de forma efetiva. Se por um lado a legislação indicava a necessidade de escolas de
primeiras letras em todas as vilas, Silva (2004) fala da dissonância entre o estabelecimento da lei e a
sua aplicabilidade. Em suas palavras: “Nas demais cidades, menos cosmopolitas e populosas, não há
notícias de colégio, mas apenas de mestres que ofereciam seus préstimos às crianças, ou cobrando
uma mensalidade, ou mesmo gratuitamente, como ocorreu em algumas vilas da Capitania de São
Paulo.” (SILVA, 2004, p. 144).
Nota-se que existiam limites para a concretização deste desejo de escolarização, uma vez que
questões sociais, culturais, políticas e econômicas emergiam, considerando que se tratava de uma
mudança de paradigma o acesso de todos à escola. No ofício encaminhado pelo professor Lustosa,
em 13 de março de 1852, endereçado ao Inspetor Geral da Instrução Pública da Província, Dr. Diogo
de Mendonça Filho, estes limites são elucidados pelo padre, ao relatar: “Os traslados que os alunos
escrevem são impressos que vem à minha custa tenho mandado vir do Rio de Janeiro para eles
escreverem; [...]A muito poucos tenho ensinado Gramática Nacional porque os pais apenas os filhos
mal sabem ler e escrever e algumas contas, logo os tiram da aula. Muitas vezes sem que o professor
saiba. Por isso não posso ensinar gramática. [...]O catecismo que os alunos aprendem é o histórico de
Fleury, traduzido pelo Dr. Manoel Joaquim do Amaral Gurgel, cujos exemplares me foram remetidos
pelo Exmo. Governo há muitos anos. Por isso que se acham sujos e estragados; [...]A sala onde existe
a aula é a minha casa. Por ainda não estar acabada no todo, não moro nela. Contudo, a dita, sala,
apesar de ainda não estar forrada, é suficiente para os alunos.”
Evidenciam-se no relato de Lustosa fatos mencionados por Saviani (2015) em relação à parca
remuneração, ineficiência do método e falta de instalações físicas adequadas.
Curioso observar que em relação à disciplina não houve qualquer tipo de contestação por parte
do professor, ao afirmar: “As correções que costumo empregar são as físicas e morais.”.
De acordo com Saviani (2015) Lancaster era bastante rígido em relação à disciplina, conforme
anunciado na obra Sistema britânico de educação (1823), escrito pelo pedagogo inglês: “aqueles
que constrangiam fisicamente, não por machucar mas pelo fato de ter pregado no corpo a marca de
punição, ou que constrangiam moralmente”. (SAVIANI, 2015, p. 128)
Ao que se indica, o método lancasteriano na questão de castigos físicos e morais não foi contestado
ou, se sequer, houve qualquer tipo de queixa ou reivindicações por parte do professor Lustosa e a
orientação foi seguida a risca.
Desta forma, conclui-se que a “revolução no processo educacional necessária” atendia não
somente um olhar que visasse apenas a Educação enquanto fim, mas enquanto meio de se atingir
a consolidação de um ideal. Evidencia-se ainda que os discursos, quando de interesse mútuo entre
o sistema e o professor, não sofria críticas ou necessidade de alteração, em especial na prevalência
das relações de poder.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 981
Referências
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do Campo: SECE, 1992.
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M. H. C. (orgs). Histórias e memórias da educação no Brasil. Vol I – Séculos XVI-XVIII. Petrópolis:
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SOUZA, Rosa Fátima de. Templos de civilização: a implantação da escola primária graduada no
Estado de São Paulo: (1890-1910). São Paulo: Fundação Editora da Unesp, 1998.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Uma das devoções religiosas mais populares entre os negros – escravos e forros – foi o culto a São
Benedito. Sua festa católica, organizada pelas inúmeras irmandades do santo ou associadas a Nossa
Senhora do Rosário, espalhadas pelo Brasil e em diferentes datas, rendia também homenagens aos
ancestrais africanos, evidenciando o caráter sincrético dessas manifestações. A hagiografia do santo
negro coincide com as qualidades de Omulu/Obaluaiê. São Benedito é igualmente associado ao
orixá Ossaim ou ao inquice Lingongo, nome com que o santo negro foi reconhecido no Rio de Janeiro
pelos negros de origem banta. Verificamos também a associação entre São Benedito e Odú Obará,
em diversas regiões de Minas Gerais, em especial, nas cidades mineiras de Tiradentes, São João Del
Rei e Serro, conforme referências mais completas, a seguir.
O culto a São Benedito foi introduzido no Brasil a partir da primeira metade do século XVII. Pode
ser proveniente tanto de Portugal, quanto da África. Segundo Frei Apolinário da Conceição (1744),
no ano de 1609, já se tinha instituído no Mosteiro de S. Anna da Cidade de Lisboa uma Irmandade
de S. Benedito, informação que provavelmente foi colhida pelo frade franciscanos do livro de Baião
(1726) que, por primeiro, se dedicou a biografar o santo negro. Praticamente, todos os conventos
franciscanos de diversas províncias portuguesas tinham altares com a imagem de São Benedito, tal
a popularidade que adquiriu entre os lusos (CONCEIÇÃO, 1744).
Na África, como antes o fizeram na Europa, os dominicanos foram os responsáveis por introduzir a
devoção a Nossa Senhora do Rosário, antes mesmo do início do comércio de escravos com a América
portuguesa. Com a popularização da devoção ao Rosário de Nossa Senhora, a piedade originária
da espiritualidade dominicana, passa também a ser difundida por outras ordens religiosas. Os
franciscanos, como os jesuítas, difundiram, na África, e em outras partes, o culto a Nossa Senhora
do Rosário que, no entanto, foi associado à veneração de São Benedito. É perfeitamente possível,
portanto, que o culto a Nossa Senhora do Rosário e a São Benedito tenha chegado ao Brasil com
os próprios africanos trazidos à força da África (MELLO E SOUZA, 2002). O culto ao santo negro se
alastrou, havendo encontrado grande acolhida e popularidade em todo o Brasil.
As representações iconográficas de São Benedito têm origem no início do século XVII, na Europa.
No Brasil, a exemplo de outros santos, as primeiras imagens aqui produzidas seguem a tradição
e os cânones da arte sacra erudita europeia. Mas a partir do Setecentos a arte sacra brasileira se
despoja da erudição e foca sua intencionalidade no aspecto devocional, de fato, como imagem da
arte popular. Essa constatação torna incomum e bastante singular outros tipos de representação do
santo encontradas, até o momento, em Minas Gerais e que são objeto dessa pesquisa. Referimo-nos
a três imagens de São Benedito pertencentes a três igrejas mineiras e que portam nas mãos uma
abóbora, a saber: Igreja de Nossa Senhora do Rosário, construída pela Irmandade de Nossa Senhora
do Rosário dos Homens Pretos, templo mais antigo da cidade de Tiradentes (antiga Vila de São José
Del Rei), datado de 1708; Igreja de Nossa Senhora do Rosário, em São João Del Rei, construída pela
Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, havendo a primeira capela sagrada em
1719 (a atual edificação é uma reconstrução iniciada em 1751 e terminada poucos anos depois, no
mesmo local da primitiva edificação); e a Capela de Nossa Senhora do Rosário, do distrito de Milho
Verde, da cidade do Serro (Antiga Vila do Príncipe), presumivelmente construída no século XIX.
Beatriz Coelho (2002), em seu resumo dos atributos hagiográficos de escultores mineiros de São
Benedito, não faz referência alguma acerca do símbolo iconográfico da abóbora. Significa dizer que
que os artistas encarregados pelas irmandades e confrarias a compor as imagens de tendências
sincréticas criaram um gênero próprio, todavia aparentemente corrente numa mesma região
aurífera de Minas, e que, evidentemente, não seguia a iconologia oficial do catolicismo colonial.
Optaram por uma forma bem ao gosto da religiosidade popular assentada em memórias ancestrais
da mitologia africana.
O atributo da abóbora é uma elaboração artística que resulta de evidente sincretismo do
catolicismo popular sob a influência de elementos simbólicos e mágicos das religiões de matrizes
culturais africanas. A particularidade dessas imagens ganha relevância porque destoam do próprio
padrão usual da arte sacra mineira, tão profusa nas suas representações de São Benedito. Conexões
entre aspectos da biografia de São Benedito e o mito yorubano de Odú Obará foram analisadas a
partir de diversas narrativas. O símbolo da abóbora é a chave conectiva entre o hagiológio católico e
a mitologia africana sobre a qual se firma a cultura religiosa afro-brasileira.
Os casos particulares das imagens – utilizadas ao modo de fortes indícios que fundamentaram
as argumentações propostas – foram também analisados levando-se em consideração contextos
históricos e culturais mais amplos. Afinal, arte barroca foi pródiga em criar imagens com a
intencionalidade de educar os sentidos das gentes a serem civilizadas e cristianizadas. O ato de
conhecer produz prazer. Não há novidade entre a aproximação etimológica entre as palavras saber
e sabor que se originam dos vocábulos latinos sapere e sapore. Ora, compreender também é um
prazer. É por isso que uma das funções primordiais da imagem é a função pedagógica. A arte, em
especial, a arte sacra tem a intencionalidade de produzir a afetação dos sentidos e de modificar os
estados da alma. Uma imagem vale por mil palavras. Trata-se de uma sintaxe sem a representação
estritamente escrita. A textualidade do ícone e da imagem é universal. O texto imagético pode ser
decodificado por todos, independentemente do nível de domínio do código da linguagem escrita
ou de escolaridade do sujeito. No período colonial brasileiro, os condicionantes culturais vigentes
são, em larga medida, antiliterários. A marca mais forte da sociedade colonial é desenhada por uma
população majoritariamente desescolarizada, iletrada e, portanto, não leitora do texto escrito. O
domínio do alfabeto, reservado a poucos, serve como divisor de águas entre a cultura oficial e a
vida popular. O cotidiano colonial popular se organizou e se reproduziu sob o limiar da escrita. A
arte barroca e as imagens produzidas pelo catolicismo ampliaram as possibilidades leitoras dos que
viviam apartados da cultura ilustrada.
A prodigalidade estética da arte barroca, movida pela inspiração religiosa, mais que prestar um
tributo a Deus por sua própria glória, pretendeu servir ao colonizador de meio eficaz de aculturação.
O intento era conduzir as gentes nativas e aquelas aqui chegadas em direção à apreciação das
virtudes abstratas cristãs, buscando atraí-las, antes pelos sentidos materiais, especialmente através
da beleza das formas. No entanto, a arte sacra popular se serviu dos mesmos instrumentos para
imprimir uma “aculturação às avessas”, conforme a descreve Vainfas (2014). Transformou a cultura
do colonizador, ao amalgamá-la com elementos da cultura indígena e africana, num processo
de sincretização do catolicismo na sua expressão popular. Temos assim uma das características
fundamentais da religiosidade popular brasileira: o paralelismo sincrético, ou seja, para cada santo
da devoção católica, há um correspondente nos orixás.
Referências
BAIÃO, José Pereira. História das Prodigiosas Vidas dos Gloriosos Santos Antônio e Benedito, maior
honra e lustre da Gente Preta. Lisboa: Biblioteca Nacional de Portugal - Lisboa Occidental,1726.
COELHO, Beatriz. Devoção e arte: imaginária religiosa em Minas Gerais. São Paulo: Edusp, 2002.
CONCEIÇÃO, Fr. Apolinário da. Flor peregrina ou nova maravilha da graça descoberta na prodigiosa
vida do beato Benedicto de S. Philadelphio, religioso leigo da província reformada de Sicília, 1ª ed.
Lisboa: Oficina Pinheirense da Música e da sagrada religião de Malta, 1744.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 984
MELLO E SOUZA, M. Reis negros no Brasil escravista: história da festa de coração de Rei Congo. Belo
Horizonte: Ed. UFMG, 2002.
VAINFAS, Ronaldo. A tessitura dos sincretismos: mediadores e mesclas culturais. In: FRAGOSO, João;
GOUVÊA. Maria de Fátima. O Brasil Colonial: 1443-1580. Vol. 1, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2014. p. 357-388.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
Neste artigo tencionamos a presença da escritora carioca Júlia Lopes de Almeida (1862 – 1934),
romancista, contista, cronista e dramaturga (LOBO, 2006) e suas colaborações nas páginas da revista
A Violeta, fonte deste estudo, periódico feminino fundado, redigido e dirigido por mulheres da classe
média e elite cuiabanas, cuja finalidade principal era o cultivo das letras femininas e patrícias. (edição
1, 16/12/1916, p.1), no período que compreende os anos de 1918 e 1934.
Com sua primeira edição datada em 16 de dezembro de 1916, A Violeta circulou durante 34 anos
com periodicidade quinzenal – nas suas primeiras 32 edições (1916-1918), e mensal, nos anos que
seguem até sua ultima edição, em 31 de março de 1950, de acordo com o acervo consultado para
esta pesquisa – o acervo digital da Fundação Biblioteca Nacional. A este respeito, destacamos que
o acervo da revista encontra-se em outros núcleos, a saber: NDIHR – Núcleo de Documentação e
Informação Histórico Regional de Mato Grosso; APMT – Arquivo Público de Mato Grosso; BCBM –
Biblioteca Casa Barão de Melgaço e Casa Barão de Melgaço, onde estão disponíveis os acervos da
AMT – Academia Mato-grossense de Letras e IHGMT – Instituto Histórico Geográfico de Mato Grosso.
Dentre 158 edições presentes no acervo consultado, salientam-se os anos de 1925 a 1930 com a
maior incidência de exemplares disponíveis (50 no total) e o ano de 1918 com o menor número, 1
exemplar. No que tange a edição da revista, são 8 as tipografias responsáveis pela publicação da revista
no recorte temporal adotado para este trabalho: Typografia Livraria Globo (1918,1919,1921,1923);
Typografia A. Evangelista (1924); Typografia Modelo (1925); Typografia Emydgio Lima (1926); Escolas
Profissionais Salesianas (1927); Typografia Official (1929,1930,1933,1934); Typografia d´Norte (1931)
e Typografia d´O Momento (1932).
Para este estudo, buscamos a interação com os aspectos que circunscrevem a história cultural,
outrora desenvolvidos por Burke (2008) e Chartier (2002) no debate a respeito de práticas e
representações, especialmente no que tange a abordagem de fontes, já que, para evitarmos um
possível anacronismo, ao teorizar a fonte deste estudo – A Violeta -, há de se apurar dimensões
diversas de sua constituição e representação, tais como o contexto sócio – histórico a que pertence e
o público a que se dirige por exemplo, buscando o cruzamento de fontes, isto é, a cotejamento com
outros periódicos, leis, documentos, livros.
Celebrado como segundo periódico feminino e o primeiro feminista em Mato Grosso, A Violeta
recebe destaque, ainda, por ser o periódico feminino literário com maior tempo de atividade
ininterrupta no Brasil no período estudado. Contos, poesias, colunas sociais, crônicas, artigos de
opinião e notícias eram alguns dos conteúdos apresentados pela revista.
Fundado em 26 de novembro de 1916 por um grupo de mulheres letradas, professoras e
normalistas da sociedade cuiabana (NADAF, 1993), o Grêmio Literário Júlia Lopes se configura
como órgão responsável pela promoção do desenvolvimento intelectual da mulher mato-grossense.
Neste grupo de mulheres, destacam-se Maria Dimpina Lobo Duarte, professora e escritora, nome
responsável pela fundação do Grêmio e sua presidente, e Maria Ponce de Arruda Müller, professora,
escritora e diretora escolar. Ambas colaboraram como escritoras, atuando, em sua maioria, com o
recurso do pseudônimo, ferramenta comum entre as mulheres escritoras do século XIX e do início
do século XX.
as riquezas naturais do país, a língua como unidade nacional e a religião são algumas das temáticas
abordadas nas edições disponíveis para este estudo.
Ressaltando-se a imprensa periódica e seu caráter modelador de mentalidades, tencionamos,
por meio deste breve estudo, reflexão acerca das colaborações de Júlia Lopes de Almeida na revista
A Violeta (1916-1950), um produto do Grêmio Literário Júlia Lopes, criado em 1916, em homenagem
à escritora carioca e um dos primeiros periódicos femininos no estado de Cuiabá, criado, financiado
e produzido por mulheres.
Introdução
O presente trabalho tem por objetivo apresentar resultados parciais do segundo ano de
doutorado, envolvendo o estudo da História da Educação em Minas Gerais, tendo como fonte de
análise o periódico da Revista do Ensino, no período compreendido entre de 1927 a 1934. Nosso
propósito foi compreender as discussões em torno das questões relacionadas à formação docente
em Minas Gerais, onde as premissas escolanovistas são divulgadas pelos discursos proferidos pelo
intelectual Noraldino Lima, em sua participação em diversas solenidades, enquanto Secretário de
Educação e Saúde Pública do Estado, sendo que boa parcela deles foram reproduzidos em artigos na
Revista do Ensino, pois o impresso era divulgados aos professores nas escolas primarias e normais
como forma de divulgação das mudanças que estavam acontecendo no sistema educacional.
A delimitação do período, de 1927 a 1934, decorram em razão da fase das mudanças educacionais
pelas quais o Estado de Minas Gerais passava naquele momento, principalmente, com a Reforma
Francisco Campos 1927/28, que altera o ensino primário e normal nas gerais e adota os princípios
da Escola Nova como um novo método de ensino para as escolas primárias mineiras.
Justificativa
A partir de leituras e análises dos artigos da referida revista, publicados entre os anos de 1927
a 1934, percebemos que nas suas edições sempre haviam artigos destinados sobre as práticas dos
professores, dentro dos princípios da Escola Nova e, constantemente, já expressam uma preocupação
de como os professores das escolas primárias iriam ensinar e como ensinar.
Com isso tivemos o interesse de aprofundar os estudos sobre o intelectual Noraldino Lima, pois foi
influente na área da educação em Minas Gerais principalmente no período estabelecido pela pesquisa,
foi diretor do periódico e seus discursos divulgados enquanto Secretário de Educação e Saúde Pública
na revista os quais eram sempre voltados para prática do docente em sala de aula. No ano de 1927,
Noraldino Lima é nomeado diretor da Instrução Pública do Estado de Minas Gerais, no ano de 1930 com
a posse do presidente Olegário Maciel, Lima retorna como diretor da Imprensa Oficial e em março de
1931 o cargo da Secretária da Educação e Saúde Pública em Minas Gerais, enquanto esteve no cargo
de secretário participou como paraninfo de entregas de diplomas de Escola Normais em todo território
mineiro seus discursos, entre os anos de 1931 a 1934, compreendemos no seus discursos sempre
estavam presente a importância das novas professoras aplicarem o novo método da Escola Nova que
foram discutidos o longo de todo seu curso de normalistas. Neste período foram reunidos em um livro,“O
Metodologia
A partir de leituras de artigos, tanto da Revista do Ensino, quanto de dissertações sobre
a questão conflituosa e deficiente da formação dos professores, em Minas Gerais, tivemos o
interesse de aprofundar nossos estudos, a fim de caracterizar os problemas de cunho formativo
dos profissionais da educação, existentes no sistema educacional no período de sete anos, pois
foi um período de grandes mudanças educacionais no Estado de Minas Gerais. Através da Revista
do Ensino, pudemos perceber que ocorreram alguns congressos destinados à formação docente,
cursos de aperfeiçoamento, bem como, o surgimento dos grupos escolares. Como apoio, optamos
pela utilização dos discursos feitos pelo intelectual Noraldino Lima, como fonte também, devido
a sua importância no campo da educação em Minas Gerais e das reformas propostas nos anos de
1927 e 1928, pois foram criadas propostas que agrega a formação docente, como uma das ações
primordiais para o avanço da educação mineira.
Assim, em termos metodológicos, para o desenvolvimento deste estudo, selecionamos os
artigos da Revista de Ensino que abarcassem tanto a questão da formação dos professores, no
período delimitado, como também, as mudanças ocorridas no ensino com o advento da Escola
Nova, na preocupação de como os docentes deviam ensinar questionar os alunos. A partir de então,
confrontamos os dados coletados, com a Reforma Francisco Campos, em Minas Gerais, datada de
1927/28, considerando que a mesma foi responsável por determinar a inclusão de procedimentos
escolanovistas nos cursos normais. Os discursos do intelectual mineiro Noraldino Lima, salientavam a
importância dos professores na prática da sala de aula utilizarem os métodos escolonovistas e o
compromisso que os professores tinham com o estado para o desenvolvimento da sociedade.
Objetivos
O papel do intelectual Noraldino Lima como Secretário de Educação e Saúde Pública, a Revista
do Ensino enquanto disseminadora dos princípios da Escola Nova e a ação de Noraldino Lima
para a formação dos professores e seus discursos como paraninfos nas entregas de diplomas para
normalistas como meio de divulgação da Escola Nova.
(RESULTADOS PARCIAIS)
No final dos anos 20 e início dos anos 30 houve várias mudanças, no que diz respeito ao sistema
político, econômico e social tanto no país quanto no Estado de Minas Gerais. Em Minas Gerais nos
anos de 1929 tivemos um grande rompimento dentro de um dos partidos mais fortes do estado
que foi o Partido Republicano Mineiro, pois era preciso escolher um sucessor e prepará-lo para
assumir o cargo como governador do estado havia três grandes nomes que eram Arthur Bernandes,
Wenceslau Braz e Mello Vinna para suceder o então governador Antônio Carlos, pois todos já tinham
experiências nas questões políticas. Mas Antônio Carlos como atual governador do estado não queria
um candidato pronto e sim um que fosse preparado por ele e assim optou em escolher Olegário
Maciel.
A indicação que foi aceita pela comissão do partido, mas Mello Vianna que estava no comando do
Partido Republicano Mineiro e tinha como intuito de ser candidato ao cargo e não sendo escolhido
para a sucessão do governo mineiro, ele deixa o partido levando junto o então vice-presidente de
Minas Gerias e deputados o que acaba ocorrendo um rompimento no partido.
Assim, as eleições para presidente do estado em 1930 tiveram dois candidatos que foram
Olegário Maciel pelo Partido Republicano Mineiro e o Mello Vianna pelo Partido da Concentração
Conservadora.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 990
Referências
BICCAS, Maurilane de Souza. O impresso como estratégia de formação – Revista do Ensino de Minas
Gerais (1925-1940). Belo Horizonte, MG: Argvmentvm, 2008.
BARROS, Vanda Terezinha Medeiros de. A Renovação educacional sob as Bençãos Católicas: um
estudo sobre a aliança Estado/Igreja em Minas Gerais (anos 1920-1930). Dissertação de Mestrado.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.
VIERIA, Carlos Eduardo; JÚNIOR, Bruno Bonyempi; OSINSKI, Dulcce Regina Baggio. História
Intelectual e Educação: Imprensa e Esfera Pública.
VIERIA, Carlos Eduardo; JÚNIOR, Bruno Bonyempi; OSINSKI, Dulcce Regina Baggio. História
Intelectual e Educação: Reforma educacionais, estado e sociedade civil.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A presente comunicação tem como propósito apresentar uma reflexão sobre os discursos que
trataram da educação profissional, a partir da imprensa periódica, que circulou no estado de Minas
Gerais, no período de 1920 a 1930, quando ocorreu a tramitação, promulgação e repercussão do
Código de Menores de 1927. Especificamente, o foco recai sobre a forma de representação da
criança - vadia e delinquente – e da escola do trabalho como lugar de desvio. Os periódicos que
serão tomados como fontes são: “O Pharol”, “Jornal Queluz”, “Lar Catholico”, “A Família”, “Monitor
Mineiro”, “O tempo”, “Semana Religiosa”, “A Vanguarda”, “O patriota”, “O Democrata”, “Diário do
Comércio” e “Correio da Semana”. O acesso a essas fontes se dará por meio de consultas ao acervo
do Arquivo público Mineiro e da Hemeroteca Biblioteca Nacional digital. Enfatizamos que esta
proposta trata-se de uma abordagem histórica, que buscará uma aproximação entre a História da
Educação, a História do Direito e a História Política e Social. Notamos a relevância de se relacionar
as respectivas áreas, tomando em consideração a historiografia, especificamente o “Movimento
dos Annales” que influenciou os ramos especializados da História. Isto amparado na relação com a
História dos Discursos, em que se abre um novo leque de opções de abordagem e admite analisar
os discursos produzidos pela sociedade em um determinado momento histórico e compreender
se esses discursos trouxeram alguma consequência para a sociedade da época estudada. Os
discursos em seus fragmentos talvez não despertem a atenção de um leitor, não demonstrando ali
nenhum mistério a priori, mesmo que nesses discursos haja a presença de ideias e termos de áreas
diversas, como as da medicina, jurídica e política, não claramente concatenadas e, que por isso,
muitas vezes passando despercebidas a um primeiro olhar. Porém, basta colocar estes discursos
em seus lugares de fala para que rapidamente se desfaçam os enigmas, fazendo surgir em seu lugar
tensões e conflitos entre discursos de naturezas distintas. É analisar os discursos sob esse prisma
que pretendemos, nessa comunicação. Para isso, a análise e a narrativa discursiva se apoiarão nas
referências de Serge Berstein (1998), para quem a cultura política, como uma categoria de análise
histórica, permite compreender o discurso político como um vetor social, consistindo em mecanismo
de propagação de valores e ideais políticos, inseridos em um dado contexto. Da mesma forma, a
escola como um vetor para a propagação de uma determinada cultura política. Nesta celeuma, a
cultura política permite relacionar, pelo discurso, pelo argumentativo, as raízes e filiações dos
indivíduos, suas motivações e estabelecer um nexo entre estes. É por meio desses parâmetros que
se calça a proposta de compreender os discursos da imprensa e as nuances ali envolvidas, para
demonstrar que os discurso ali proferidos, carregados de representações, foram influenciados por
uma concepção de político que fundamentou as políticas públicas para a educação profissional.
Para a captação das representações contidas nos discursos, a referência será Roger Chartier
(2002), que tem chamado a atenção para as considerações acerca da noção de representação. Esse
autor tem proposto um lugar da pesquisa entre textos e leituras que “constroem o mundo como
representação” cujo objetivo é o de identificar como “em diferentes lugares e momentos uma
determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler” (CHARTIER, 2002, p.133). Assim,
seguiremos o protocolo que Chartier especifica em etapas, sendo estas: primeiro, a de compreender
as series de discursos na sua descontinuidade; segundo, desmontar os princípios da sua regularidade;
terceiro, identificar as suas racionalidades particulares, supondo, em nosso entender considerar os
condicionamentos e exigências que advém das próprias formas nas quais são dadas a ler. Sobre o
discurso, consoante aos ensinos de Orlandi (2009, p. 142), o discurso político conceitua-se como
portador e constituinte de representação da sociedade, de sujeitos, de estratégias, ou seja, de uma
determinada realidade social; é uma prática de linguagem que intervêm na relação do homem e sua
realidade natural e social, constituindo-o em sua história; é objeto sócio histórico dimensionado
no tempo e no espaço das práticas do humano; pronunciamento oral ou escrito elaborado com
uma série de significados que expressam a maneira de pensar e de agir de um indivíduo dirigindo-
se ao outro ou a um grupo de indivíduos, com o fim de intervir. Ademais, no que tange a escola
e a educação profissional, intenciona-se evidenciar pelos discursos e suas representações, como
estes eram considerados como vetores de desvio da vadiagem e da delinquência, apoiando-se no
exposto por Nogueira e Gonçalves (2015, p. 201-225) que ressaltam que a educação pública, desde
a proclamação da República, era vista como uma forma de incutir os valores republicanos na mente
dos indivíduos. Também, era considerada um dos fatores que conduziria ao progresso da nação
brasileira, formando pessoas para o mercado de trabalho. Nesse viés faz-se necessário descortinar,
pelo discurso que é seu “veículo”, as representações que foram lançadas sobre a criança, tratando-a
como passível de delinquente, vadia e, sobre a escola, sendo considerada como vetor de desvio da
delinquência e vadiagem, sendo engendrada na rigidez e na disciplina, durante as décadas de 1920
a 1930. Quanto a método, seguiremos os ensinamentos de Patrick Chauredeau (1996, p. 232) em
seu esforço para constituir uma estratégia de análise do discurso capaz de contemplar, de forma
integrada, as múltiplas dimensões envolvidas no ato de linguagem, como resultado de uma dupla
interação, do homem com o homem e do homem com o mundo. Para ele, o intercruzamento deste
movimento na produção de representações, resulta em práticas, pulsões, gestos que compõem
os textos discursivos que são integrados ao grupo social a que se destina de maneira natural,
“como uma evidência partilhada por todos”. Com ele, nossa atenção estará na proposição da
teoria linguística, que acentua o debate sobre a análise do discurso e nos convida a fazê-la através
de um modelo dinâmico, articulando as “dimensões psicossociológicas envolvidas num ato de
linguagem, especialmente, a identidade e os papeis sociais dos interlocutores, as relações sociais
que estão inseridos, os objetivos, as representações e as expectativa dos parceiros” (CHAUREDEAU,
1996, p. 5-43). O procedimento da análise será por meio da pesquisa documental, consistindo na
coleta de dados por meio das publicações da imprensa nacional com enfoque no estado de Minas
Gerais. O jornal será tomado como fonte, como documento histórico, hábil para a compreensão do
pensamento e ideal de determinada época. No colóquio com a imprensa será possível pensar como
essas reportagens produziram o locus da criança na sociedade, e a imagem da educação para o
trabalho e, bem assim, a representação que se tinha da escola, menor, delinquência, vadiagem e o
trabalho.
No levantamento realizado evidenciou-se, nos periódicos selecionados, que a criança é
representada por sua inocência, pela sua candura, pela sua pureza, que a todos seduz, atrai,
enternece e encanta. Significando esta constituinte de um espírito e coração ainda em formação.
Nesse contexto é imperioso o papel do Estado e sua intervenção direta no pátrio poder, diante da
indispensável necessidade da mantença de certos valores e a busca por objetivos específicos a
serem alcançados nessa sociedade em construção. Valores estes defesos a vadiagem e delinquência,
compreendidos como a vagabundagem e o desemprego, ou seja, posturas sociais que fogem ao
imperativo do Estado para o trabalho. A escola nessa conjuntura é considerada local de desvio da
vadiagem dos menores, destinada “a educação física, moral, profissional e literária”, o que corrobora
ipsis literis ao artigo nº 199 do Código de Menores, citado pela imprensa. Por isso que em diversas
publicações ressaltam-se quanto a necessidade de uma efetiva fiscalização quanto a matrícula e
frequência da criança da escola, sem a qual, estariam propensas ao crime e a perversidade.
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2009.
NOGUEIRA, Vera Lúcia; GONÇALVES, Irlen Antônio. As reformas do ensino público primário como
constituintes da política educacional do estado de Minas Gerais (1891- 1906). Educação em Foco,v.
18, p. 201-225, 2015.
ISSN 2358-3959
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Este trabalho faz parte de uma pesquisa de mestrado em processo de construção da dissertação,
portanto em andamento. Buscamos compreender os sentidos educacionais na cidade de Mariana,
na primeira metade do século XIX, a partir de análises dos núcleos familiares existentes naquele
período, utilizando como fontes as listas nominativas de 1831 e 1840. A história da educação em
Mariana, está vinculada a características que perpassam o contexto de formação da cidade. A
construção de um lugar está além dos limites espaciais, é inerente aos sujeitos, aos agentes que
contribuíram na constituição desse lugar. Neste sentido, a relação sujeito – lugar, produz um efeito
de construção do espaço, algo que vai além da casualidade, do espaço natural. Portanto, partimos
do contexto histórico da formação da cidade para compreendermos a educação.
A formação da cidade de Mariana, segue um projeto de colonização que esteve diretamente
relacionada a economia mineradora e a presença da Igreja Católica. A cidade originou-se como
povoado em 1696, nomeado Nossa Senhora do Carmo, em homenagem ao rio de mesmo nome.
A partir de então, iniciou-se um processo de ocupação, e a construção da capela da Conceição,
atribuiu à região a condição de arraial. Em 1701, o bispo do Rio de Janeiro elevou a capela à condição
de paróquia, aumentando o grau de importância da região. Todavia, a região passou por grandes
dificuldades, devido a escassez de produtos de subsistência e os acidentes geográficos ocasionados
por enchentes. Essas características levaram ao êxodo territorial em momentos distintos, e o
povoado voltou a ser habitado apenas em 1703.
Com o aumento populacional e fluxo de atividades no território, fez-se necessário maior controle
e organização do mesmo. Essa era uma demanda não apenas da metrópole portuguesa, mas
também dos próprios moradores, os “homens bons”, pessoas influentes que organizaram-se para a
formação da Câmara, um passo importante para a elevação do arraial a condição de Vila do Carmo,
em 1711. É interessante destacarmos como a atividade mineradora influenciou na morfologia da
cidade. Ao contrário de outras povoações, a atividade mineradora atribuiu a Mariana, um caráter
urbano, enquanto que os núcleos rurais foram surgindo em seu entorno, a partir da necessidade de
abastecimento do centro minerador. A diversificação das atividades econômicas, ocorreu a partir
do declínio da mineração, no final do século XVIII. A agricultura, pecuária, comércio, e atividades de
pequenos artesãos, foram exemplos de atividades que cresceram como forma de enfrentamento à
crise da mineração (FONSECA, 2015, p.2).
O estatuto de cidade ocorreu em 1745, após a instauração do Bispado, decretado por D. João V.
Deste modo, a Vila do Carmo passou a ser chamada de Mariana, em homenagem a D. Maria Anna
d’Áustria, esposa de D. João V. Entretanto, foi necessário estabelecer uma política de urbanização,
alinhada aos conceitos de modernização que circulavam em Portugal, portanto, engajado ao
pensamento ilustrado, que refletisse os ideais de uma “sociedade civilizada”. Deste modo, existiu
um “projeto” de controle social, político e econômico, engajado à Metrópole (FONSECA, 1998). Esse
projeto, esteve alinhado a inclusão do Bispado à Mariana, algo que conferiu bastante influência a
região que segundo Sônia Maria de Magalhães (2012), passou a exercer não apenas funções políticas
e administrativas, mas também religiosas e educacionais.
Segundo Foucault (1978), a existência do Estado moderno demanda formas de governamentalidade
que articulam-se com a “gestão da sociedade civil”, uma sociedade submetida a processos naturais
que a coloca em constante mobilidade. Neste sentido, foi necessário a construção de mecanismos
de segurança, ou mecanismos regulatórios capazes de garantir a gestão da população por parte do
Estado, com o intuito de manter a ordem social. Deste modo, o cenário de uma sociedade crescente
e com constante circulação de pessoas, exigiu o estabelecimento de medidas capazes de possibilitar
essa ordenação social, o que nos leva as nossas fontes: as listas nominativas. Essa perspectiva nos
possibilita atribuir um lugar às listas nominativas, como as de instrumentos de regulamentação
social ao contribuírem para gerar informações sobre a população, com o intuito de estabelecer uma
organização.
As listas nominativas são censos que trazem informações objetivas a respeito dos habitantes de
determinada região, como o nome, qualidade, condição, idade, estado civil e ocupação. Algumas
listas, como a de 1840, indicam se as pessoas sabiam ler. Esses dados são identificados por domicílios
ou fogos. Entendemos os domicílios sempre a partir do seu chefe. Identificamos e agrupamos os
domicílios em: domicílios simples, domicílios chefiados por mulheres e domicílios chefiados por
homens. As listas nominativas de Mariana de 1831 e 1840 podem ser encontradas no Arquivo Público
Mineiro em Belo Horizonte.
Após classificarmos os domicílios, pudemos identificar que do total de 596 fogos, 176 (29,5
%) eram domicílios simples, 273 (45,8%) domicílios chefiados por mulheres e 142 (23,8%) eram
chefiados por homens. Se analisarmos os dados separadamente, percebemos o valor expressivo de
domicílios chefiados por mulheres.
A lista nominativa de 1840 possui 2.037 habitantes, organizados em 418 domicílios. Identificamos
123 (29,5%) domicílios simples, 92 domicílios chefiados por homens (22%) e 201 (48,1%) domicílios
chefiados por mulheres. Destacamos que a lista nominativa de 1840, indica a “naturalidade” e
começam a aparecer classificações de nacionalidade como “brazileiro”.
Para este estudo, buscamos observar os domicílios em que há a presença de pessoas em situação
escolar, classificadas como “na escola”, “estudando”, “aprendendo a ler”, “estudante” ou “estudante
de gramática”. Essas duas últimas classificações indicam uma distinção no nível escolar, não estando
mais no nível de primeiras letras. Os termos relacionados ao ensino aparecem nas listas junto as
ocupações, a partir dessas informações pudemos identificar e quantificar essas pessoas na escola.
Em 1831, haviam 60 domicílios com pessoas em situação escolar, deste total, 21 dos domicílios
eram simples, 13 eram chefiados por homens e 26 chefiados por mulheres. Distribuídos nesses
domicílios, identificamos um total de 90 pessoas na escola, sendo que 65 estavam na escola
elementar e 25 eram estudantes. Em 1840, foram identificados 45 domicílios, aos quais 14 eram
domicílios simples, 17 eram chefiados por mulheres e 14 chefiados por homens. Contabilizamos um
total de 60 alunos, sendo 33 de primeiras letras, incluindo 5 aprendendo a ler, e 27 estudantes.
Buscamos identificar aqueles núcleos com crianças na escola em 1831, que também estavam
presentes na lista nominativa de 1840, com o intuito de analisar as possibilidades de mobilidade
social nesse período e perceber se houveram mudanças significativas na estrutura desses núcleos
familiares. Um processo equivalente foi realizado por Marcus Vinícius Fonseca (2015) ao estudar as
listas nominativas da população de Cachoeira do Campo, dos anos de 1831 e 1838. A contraposição
das documentações possibilitou levantar questões a respeito do papel que a experiência escolar
exercia sob aquela população. O trabalho realizado por Fonseca nos auxilia metodologicamente.
Partimos do mesmo princípio de análise da contraposição dos dados presentes nas listas de Mariana
dos anos de 1831 e 1840. Comparamos os domicílios com pessoas na escola, buscando compreender
os significados das possíveis mudanças e permanências que ocorreram no período de nove anos
que separam as listas nominativas, e se as experiências escolares interferiram nesses processos.
Reproduzimos os domicílios em “tabelas”, de forma a facilitar a visualização. Para analisá-los,
levamos em consideração a variação que os nomes poderiam sofrer. Outro critério importante foi a
idade, que por sua vez, ou permaneceu a mesma, ou alterou-se de forma expressiva. Conseguimos
identificar vinte e dois fogos. As análises preliminares desses domicílios, permiti-nos realizar algumas
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 996
considerações e também fazer indagações que acreditamos ser importantes para o andamento da
pesquisa. Nota-se que na lista nominativa de 1840, há perdas de algumas informações como por
exemplo a qualidade dos habitantes. Na maioria das vezes esses dados aparecem para diferenciar
os cativos dos livres, de modo que apenas a qualidade dos escravos é sinalizada. Observamos que
o termo “brazileiro” foi bastante utilizado na lista de 1840, não sendo encontrado no documento
de 1831. Há uma necessidade portanto, em compreendermos o significado social do uso dessa
terminologia.
A indicação de quem sabia ler em 1840, tornou-se um dado muito importante, pois contribuiu
para contabilizar os dados da população alfabetizada e nos permitiu levantar algumas questões
como: Quantos domicílios com pessoas em situação escolar possuíam chefes leitores? Qual era o
perfil desses leitores? Além disso, quantos desses domicílios eram chefiados por mulheres? Esses
dados influenciaram diretamente na necessidade de educar os seus tutelados?
A coleta dos dados a partir dos domicílios, também nos mostrou que em muitos casos o domínio
da idade não era algo muito presente. Esse fato nos leva a questionar se nos domicílios com pessoas
estudando havia maior precisão em relação a faixa etária. Também discutimos sobre as concepções
de família no século XIX, tendo em vista a considerável quantidade de mulheres chefes de domicílio
presentes na cidade de Mariana, contrapondo ao ideal de hegemonia patriarcal, já contestado em
outros trabalhos, mas ainda presente no senso comum.
ISSN 2358-3959
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O presente trabalho tem como objetivo compreender o Negro no Lyceu de Goyaz dentro do recorte
temporal da Primeira República. O Lyceu de Goyaz é uma instituição de Ensino Secundário criada em
1846 e que continuou oferecendo majoritariamente esse tipo de ensino, humanista e propedêutico até
1960, ano em que a política educacional brasileira modificou a estrutura de ensino para segundo grau.
Em relação ao objeto de estudo, o negro, já identificamos alguns aspectos de esquecimento na docu-
mentação da instituição, portanto, pautadas no conceito de esquecimento de Paul Ricouer faremos
uma análise dos documentos do período. Junto a esse conceito, acrescentamos o conceito de bran-
queamento como característica da sociedade no momento em estudo. Nesse sentido, pretende-se
analisar o conceito do negro da Primeira República a partir da historiografia brasileira e goiana, com-
preendendo nesse percurso os mecanismos organizacionais utilizados na instituição, balizado pelo
conceito de esquecimento, além de aspectos de permanência e conclusão de alunos negros do curso
secundário. O interesse em estudar a historicidade dos percursos trilhados pela população negra, sur-
giu de incômodos no processo de formação da minha identidade como mulher negra, provocando a
curiosidade em compreender as raízes dessa desigualdade racial que vem perdurando e influenciando
as relações sociais. Superadas as expectativas depositadas à minha classe social e racial, ingressei na
universidade, onde o processo de tomada de consciência de classe adquiridas no decorrer da trajetó-
ria acadêmica me levaram a certas inquietações, a principal, vem de encontro ao fato de estarmos
ainda imersos na conservação de preconceitos construídos historicamente advindos do período escra-
vocrata, em que a manifestação de um racismo estruturante, encontra-se presente no imaginário cole-
tivo e nas relações sociais. Tais relações, despertaram-me para necessidade em se refletir essa história
que foi por muito tempo ignorada, silenciada, esquecida e desvalorizada por construções sociais ad-
vindas da classificação de grupos, colocando o negro em posição inferior. Desde então, desenvolvi um
olhar sensível para a temática, percebendo a necessidade e importância desse estudo para desmistifi-
car as raízes profundas criadas no início da instrução brasileira. A historiografia brasileira demonstra
que a gênese social da população negra parte da escravidão, em consequência da exploração, trata-
mentos e direitos diferenciados. A instrução do negro inicia-se ou, deveria iniciar-se a partir da tímida
implementação do projeto de lei que antecede a abolição da escravidão, a Lei do ventre livre n. 2.040
de 28/11/1871, em que os filhos nascidos de pessoas escravizadas passavam a ter uma perspectiva de
liberdade ocupando uma posição jurídica diferente dos seus pais. Considerando a miscigenação da
constituição do povo brasileiro e as influências recebidas, vale ressaltar que essa divisão ocorreu de
diversas maneiras, por classe, idade, sexo e cor, cabendo ao negro o trabalho manual e a formação
para o trabalho. Com a Lei n. 3.353 de 13/05/1888 da abolição da escravidão, negros forma libertos e
renegados ao acaso. O processo de libertação da escravidão gerou impasses estruturantes na organi-
zação da educação brasileira. Nesse sentido, interessou-me saber como se perpetuou a educação do
negro um pouco mais adiante, observadas na Primeira República de 1889 a 1930 no Lyceu de Goiás que
nesse período foi a única instituição de ensino secundário público em Goiás. Dessa forma, chegamos à
seguinte questão: Sabendo que a população goiana foi formada pela miscigenação de povos, caracte-
rísticas da constituição do povo brasileiro, em que se destacam os nativos, os negros e os brancos, in-
dependente de qual classe social pertenciam e, que, o ensino secundário tinha como critério produzir
a elite goiana e não somente educar a elite econômica, previamente selecionada por pertencer a clas-
ses definidas como elitistas, é possível perceber que a instituição Lyceu de Goyaz recebeu alunos de
classes e cores diversas, portanto, a pergunta que norteia essa pesquisa é: Como o negro pode ser visto
no Lyceu de Goyaz na Primeira República, a partir da documentação interna dessa instituição? Optou-
se pela delimitação do início e fim da Primeira República, por compreender que o negro já possuía uma
condição social de liberto, diferente de sua condição anterior regimentada pela escravidão. Abrindo
vistas para possibilidades de compreensão da perpetuação de trajetórias educacionais e escolares dos
negros, guiados por uma nova perspectiva de liberdade apresentados no contexto político goiano e as
leis decretadas referentes ao Ensino Secundário. O Coronelismo era cenário político que continuou
predominando no período da Primeira República, o poder transitava nas mãos de poucos grupos fami-
liares pertencentes de uma elite econômica. O projeto de divisão social realizada na época deposita-
vam na educação as expectativas de mantê-la de forma que ao Lyceu de Goyaz se destinava a tarefa
formar a elite goiana, que não se restringia aos aspectos econômicos, mas principalmente intelectuais,
abrindo brechas para a possibilidade de se perceber a presença do negro na instituição mesmo que o
este não pertencesse a elite econômica. Nesse período pós- abolicionista percebe-se um novo movi-
mento que disseminava pelo país diversas Ideologias. Petrônio José Domingues identificou em sua
obra nuances da ideologia do Branqueamento de e como esta foi legitimada nas relações entre os ne-
gros na cidade de São Paulo nesse período, o que se comprova na obra de Gilberto Freire sobre as no-
vas imagens que são dadas aos negros nomeando-os e classificando-os de maneiras que amenizasse
o nome da sua cor preta, trazendo o fortalecimento do branqueamento nas constituições sociais. A
pesquisa orienta-se através da abordagem da História da Educação e toma por base o método históri-
co que compreende a realidade como uma construção social contínua, objetivando ainda, contribuir
para o acervo de estudos sobre história da educação, pautando-se além da pesquisa bibliográfica, na
pesquisa documental. Os documentos que serão analisados nessa pesquisa localizam-se no Arquivo
Público Estadual de Goiás, situado na Praça Pedro Ludovico Teixeira, no Museu das Bandeiras na
Cidade de Goiás e nos documentos internos do Lyceu de Goyaz no período de 1889 a 1930. Diante da
problemática sobre os rumos e (des)rumos da população negra na província de Goiás Le Goff abre
vistas à possibilidade de construção da historiografia educacional do negro por meio da investigação
da inexistência documental sobre o assunto, pois esse apagamento também indica uma história, con-
siderando ainda que, o fortalecimento da pesquisa precisa se dar de maneira cuidadosa e consciente
explorando as possibilidades tangíveis. Antônio Joaquim Severino afirma que não é o bastante ver, é
preciso olhar. Nesse sentido, pretende-se no desenvolvimento desse trabalho realizar uma análise crí-
tica das fontes, respeitando as produções historicamente construídas, todavia sob um olhar questio-
nador lendo nas entrelinhas e confrontando ideias cristalizadas. Esta pesquisa, ainda em andamento,
está em fase de coleta e análise de dados, buscando perceber se existme registros de informações ra-
ciais nas fichas de matricula dos alunos na tentativa de elucidar a compreensão sobre o lugar ou não-
-lugar do negro no Lyceu de Goyaz, ou seja, sobre como a instituição apresentou em sua documenta-
ção os conceitos de embranquecimento e de esquecimento do negro. Diante do percurso metodológico
pretendido, já se concretizaram algumas visitas aos arquivos. O primeiro deles foi o arquivo do Museu
das Bandeiras, localizado na Cidade de Goiás, local onde já funcionou como Casa de Câmara e Cadeia
sendo posteriormente adaptado para suas novas funções. A visita foi mediada por uma bibliotecária
responsável pelo arquivo, que disponibilizou documentos para serem fotografados que se referiam ao
Lyceu de Goiás, tais como livros de matrícula nas disciplinas de Português, Geografia, Francês, Música,
Aritmética e Latim do ano 1883-1893, de Português e Geometria de 1886-1904, Gramática Latina 1886-
1903, livros de matrícula de alunos do 1º ano de 1904-1907, alunos do 1º, 2º e 3º ano de 1918-1924,
Registros de Equiparação do Lyceu ao Colégio Pedro II de 1918, Memória Histórica de 1847-1908, Atas
de Instalação do Lyceu e Termos de Exames, Contratos e Concursos de 1906-1910, entre outros docu-
mentos que já estavam digitalizados. Na visita ao arquivo do Lyceu de Goyaz, percebeu-se que os do-
cumentos estão organizados e catalogados em ordem alfabética com o dossiê de 1540 alunos que já
estudaram no estabelecimento, cada pasta contém o histórico do aluno dentro da instituição e docu-
mentações de ficha de matrícula, recibos de pagamento, transferências, entre outros documentos que
não foram analisados ainda para se compreender do que se refere. A princípio foram fotografados 70
dossiês. Nesse sentindo, pretende-se após seleção, categorização e leitura reflexiva e sistematizada do
material selecionado, realizar a síntese do estudo proposto, a fim de acrescentar e trazer novas releitu-
ras sobre o assunto. Cristiane Maria Ribeiro aponta para a necessidade de pesquisas e a análises que
contemplem a temática da educação da população negra, pois a invisibilidade desse grupo racial,
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também, é resultado da escassez de bibliografias que abordem sua história. Diante desse fato, o pre-
sente projeto de pesquisa visa contribuir para o acervo de estudos sobre história educação, dando luz
a percepção da ocupação do negro no sistema de ensino, fortalecendo e valorizando o debate sobre a
população negra na sociedade brasileira. A pesquisa qualitativa buscará ainda contribuir para a des-
construção de princípios arraigados na cultura brasileira, sobretudo acarretada a educação do negro.
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(GÓMEZ, 2003, p. 226). Para ele, isso indica uma lacuna no trabalho historiográfico, que privilegia
a produção realizada pelos ocupantes de posições públicas ou de destaque na sociedade, mas
mantém na marginalidade as produções das camadas populares, que muito tem a dizer sobre
história da cultura escrita e o processo de desenvolvimento das sociedades. Além disso, registros
das pessoas comuns e pessoas das camadas populares “trazem à luz outras experiências, outras
visões, outras formas de compreender a realidade; Outras vidas, que, em conformidade com usos
oficiais, ajudam a democratizar a história. Com eles, a história é feita e a vida é feita” (GÓMEZ, 2003,
p. 248). Esta visão está alinhada ao esforço de Arlette Farge para pensar novos lugares para a história,
que possam ir além daquela produzida pela metodologia da historiografia tradicional. Farge (2011)
critica a historiografia tradicional afirmando que ela “reparou apenas nas grandes regularidades de
fenômenos coletivos” (FARGE, 2011, p. 83), deixando inauditas outras vozes quando apresentaram-
se dissonantes e ameaçadoras para “o rosto liso da construção histórica” (FARGE, 2011, p. 63).
Uma das principais formas de promover apagamento das vidas das mulheres e das pessoas das
camadas populares foi negando-lhe o acesso à alfabetização. Quando do processo de alfabetização,
longo e heterogêneo, as mulheres e as camadas populares foram as últimas a receber espaço,
condições e atenção para o ensino das letras. Ensino que permitiu primeiro o conhecimento
da leitura, e só depois, o poder da escrita. Nas sociedades de cultura grafocêntrica, a leitura e a
escrita são os requisitos para aprender tudo ou mais, são ferramentas essenciais para a autonomia
individual, para acessar outras informações e migrar de posição social. A partir da alfabetização,
os sujeitos ganham uma autonomia para produzir e incrementar a própria vida, fazer muito além
daquilo que foi ensinado. Apesar da desigualdade de condições de acesso à alfabetização, Gómez
afirma que as práticas de escrita ordinárias foram realizadas, no mínimo desde a Idade Média, não só
por pessoas da aristocracia, nobreza e clero, mas também por pessoas das camadas populares que,
por meio de seus registros, ocuparam um espaço de testemunho de suas histórias de vida. Este gesto
problematiza a historiografia tradicional, e convida a pensar sobre o fato de que “la memoria escrita
preservada es, sin duda, el mejor espejo de la estructura del poder y de los prejuicios establecidos
en cada época” (GÓMEZ, 2003, p. 245)
Visando combater à situação de “memoricídio” a que estão submetidas as produções das pessoas
comuns (GÓMEZ, 2003, p. 245), pesquiso as práticas de escrita ordinárias de mulheres negras e/ou
quilombolas. O corpus empírico da minha dissertação é composto por documentos eleitos por cinco
mulheres, nascidas entre as décadas de 1940 e 1970, na capital e interior do estado do Rio Grande
do Sul. Apresento-as aqui por pseudônimos: Joana, Liliane, Mariana, Natalina e Débora. Há uma
dinâmica peculiar da pesquisa que propicia às participantes um papel ativo de produção de suas
biografias, não só do passado como também no futuro, pois a materialidade confiada à pesquisa,
durante o período de maio de 2018 a maio de 2019, se apoia nas seleções que realizaram quanto ao
que mostrar e o que ocultar.
Defino aqui como práticas de escrita ordinárias as atividades cotidianas como bilhetes, caderno
de receitas, álbuns de família, livros de contas, diários pessoais, agendas, entre outros. Diferentes
fatores contribuem para que as práticas de escrita ordinárias, realizadas no cotidiano e sem objetivo
“fazer uma obra”, recebam status de “sem qualidade”, definição apresentada por Cunha (2007). Com
frequência, estes manuscritos são realizados sem expectativa de leitores imediatos, permitindo aos
e às escreventes confiar ao papel seus sentimentos, aflições e vivências. No exercício de registrar a
(re)flexão sobre os pensamentos, é possível produzir um espaço para ecoar histórias que nos narram
sobre nós mesmos.
Esta pesquisa propiciou pensar as relações das escreventes no processo heterogêneo da
alfabetização brasileiro. Apoiado no censo educacional, Alceu Ferraro (2002, p. 34) demonstra que o
percentual de analfabetos em 1950 era de 50,6% para a população brasileira com 15 anos ou mais;
em 1960, este percentual cai para 39%; em 1970, para 33,7%; em 1980, 25%, e sucessivamente nas
décadas seguintes, mas alcançando a marca de um dígito percentual apenas em 2012: 8,7%. Isso
permite refletir que enquanto um direito social, a educação para todos é bastante recente, e que
havia, até a década de 1970, uma parte significativa da população fora da escola. Por consequência,
sem alcançar a autonomia aferida a partir da alfabetização. Não de forma trivial, devido à condição
socioeconômica, as camadas populares – no Brasil, principalmente a população negra –, foram
excluídas no passado e também no presente, por meio da evasão escolar.
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Quanto ao suporte material da minha pesquisa, são: folhas pautadas avulsas; folhas sulfites
avulsas; agendas comerciais; agendas pessoais; cadernos brochuras pequenos; caderno espiralados
grandes e pequenos. Estes suportes falam do tempo em que foram comercializados e das relações
sócioeconômicas das escreventes.
No que tange às motivações das práticas de escrita: para Joana, o registro foi motivado pelo
pedido do neto, relaciona-se à preservação da memória de vivências da comunidade quilombola.
Para Liliane, Mariana e Natalina, as práticas de escrita estão relacionadas às leituras espirituais, onde
buscaram conforto para momentos de vida mais turbulentos. Mariana conservou a materialidade
mais antiga: um caderno de músicas de 1972, que testemunhou mudanças da escrevente desde
tenra idade. Os documentos de Débora relacionam-se diretamente à atividade laboral exercida por
mais tempo, cozinheira; destaca-se seu afeto pelo caderno de questionário, sobrevivente há 34anos.
Por fim, é possível afirmar que suas práticas de escrita são também desejos: de escuta, de
constrição sobre si mesmas, agradecimentos, preces. Espaços que configuram uma narração de si,
da história do grupo social e dos usos sobre a memória no tempo cotidiano.
Referências
CUNHA, Maria Teresa Santos. Do Baú ao Arquivo: Escritas de si, Escritas do Outro. UNESP – FCLAs –
CEDAP, v. 3, n.1, 2007.
FARGE, Arlette. Lugares para a História. Tradução Fernando Scheibe. Belo Horizonte: Editora
Autêntica, 2011.
FERRARO, Alceu. Analfabetismo e níveis de letramento no Brasil: o que dizem os censos? Educ. Soc.,
Campinas, vol. 23, n. 81, p. 21-47, 2002.
GÓMEZ, António Castillo. Das mãos ao arquivo. A propósito das escritas das pessoas comuns.
Florianópolis: PerCursos, v.4, nº1, julho de 2003.
Para Pullias e Young (1972) a arte de exercer o magistério está vinculada às preocupações básicas
do ser humano ao longo de sua dramática luta pela afirmação cultural, isto é, à “transmissão de
conhecimentos” e à constante renovação das fontes do humanismo criador que fazem parte de sua
sobrevivência. Assim a necessidade do conhecimento do ensino está, mais do que nunca, presente na
consciência de cada professor, sendo a arte de ensinar aliada a uma técnica ritual escolar própria de
cada um. O professor aborda seu trabalho com positivas e fortes crenças no alto potencial dos seres
humanos, numa causa considerada digna, muitas vezes esquecendo-se de si próprio. No entanto,
os valores educacionais, o propósito e a importância da educação, o significado do ensino como
trabalho de uma vida, a alegria e satisfação de um trabalho só podem ser realizados com arte. Para
esta comunicação escrevo sobre a normalista e professora Irene Lisboa. Uma jovem que integrou
o grupo de alunas do curso normal da Escola Normal Primária de Lisboa para o sexo feminino e
desempenhou um importante papel na vida escolar enquanto aluna e depois como professora,
um caminho trilhado dentro de um corpo de saberes especificos. O objetivo principal para essa
comunicação é conhecer a professora e escritora Irene Lisboa (1892-1958) quanto à sua formação e
produção de textos dissertativos em periódicos.
O texto apresentado é parte da tese de Doutorado Acadêmico em Educação desenvolvida junto
a Universidade Estadual Paulista (UNESP) campus de Marília/SP - Brasil e a Universidade de Lisboa,
que possui como tema as práticas presentes nas Escolas Normais de São Paulo e de Portugal. O
tema é abordado de uma perspectiva histórica, por meio da utilização de procedimentos de reunião,
seleção, organização e análise de fontes documentais (Mortatti, 2000) inserido num conjunto de
investigações que se preocupam com a História Cultural dos Saberes Pedagógicos, orientado pelas
premissas de Chartier (2000).
Ao se vasculhar os arquivos públicos de Lisboa, Coimbra, Porto, escola Decroly, Instituto J-Jaccques
Rouseau e Instituto Jean Piaget com acentuado cuidado epistemológico e documental coletou-se
fontes em vários suportes (textos, cartas, fotografias, bibliografias, documentais) na qual surgiram
pistas e vestígios Ginsburg (1989) que fizeram surgir uma narrativa sobre a busca pela formação e
atuação de Irene Lisboa.
Observa-se em alguns textos escritos por Irene Lisboa, publicados no jornal Educação Feminina
(1913) ainda aluna e nos artigos publicados já professora, como, por exemplo, no artigo “A escola
atraente” conceitos e princípios da educação nova, defendidos por Irene enquanto uma professora
artista. Artista na coragem de estudar, divulgar e refletir sobre as novas tendências da educação,
mesmo que para isso muitas vezes fosse necessário se ocultar por meio de um pseudónimo.
Irene do Céu Lisboa nasceu 25/12/1892 em Arruda dos Vinhos, vivendo sua infância com sua
madrinha na casa de Lisboa na Baixa Pombalina. Iniciou o curso de normalista em 1912 na Escola
Normal Primária de Lisboa, onde demonstrou liderança, dirigindo o primeiro jornal de alunas da
escola denominado Educação Feminina. Esse jornal quinzenal apresentava-se como Orgão das
Normalistas de Lisboa, concebido por mulheres cuja edição estava a cargo de Ilda Moreira, amiga e
companheira de Irene Lisboa, e de um pequeno grupo de colegas. O jornal abordava diversos temas
dentre os quais pode-se citar: as conferências pedagógicas, os problemas do ensino normal, da
orientação pedagógica e da aplicação de métodos de ensino; a escola e sua ligação com o meio e a
família, etc.
Irene Lisboa escrevia quase todo o jornal inserindo críticas ao ensino, aos professores e às alunas
e ainda abordava temas educativos e literários. O jornal Educação Feminina teve uma vida efêmera,
somente sete números e seis meses de existência sendo então proibido pelo Conselho Escolar da
Escola Normal, presidido pelo republicano José Tomás da Fonseca. Apesar desse episódio Irene
Lisboa prosseguiu seus estudos na Escola Normal Primária de Lisboa vindo a concluir o curso normal
primário em 3 de Julho de 1914, iniciando sua atividade de docência como professora substituta nas
escolas oficiais da cidade de Lisboa. Quando nomeada para a Escola do Beato Irene se defronta
com uma realidade de pobreza material e diversificada. Dessa forma a sua compreensão de escola,
criança e família são alargadas porque centra suas preocupações nos problemas socioeducativos.
Quando é convidada a assumir a Escola da Tapada como docente do ensino infantil prepara-se
estudando teorias de Montessori, Decroly e Felix Klein. Pois possui desejo de aperfeiçoamento, é
considerada uma autodidata. Essa necessidade de conhecimento leva a inscrever-se no curso de
especialização do ensino infantil da Escola Normal de Lisboa, e em Julho de 1923 conclui o curso.
Mais tarde Irene volta à Escola Normal de Lisboa na qualidade de professora de Pedagogia nos
cursos de formação inicial.
Parafraseando Pullias e Young (1972) apresento as múltiplas facetas de Irene Lisboa:
• A professora envolvida: Na sua procura pela qualidade no desempenho, habilidosa na condição
do ensino-aprendizado, quando se preocupa com seus alunos do ensino infantil e vai em busca
de estudar para poder ajudá-los em todos os sentidos se envolvendo inclusive com as questões
sociais.
• A professora investigadora: Uma professora com um poder criador enorme, uma capacidade
especial na qual sua energia criadora, que se expressava eficazmente, tinha a capacidade de
“fazer” dentro de um padrão satisfatório. Parece que quanto mais sabia, mais forte era o desejo
de saber mais, aprender, refletir. Constata-se isso no relatório das viagens de estudo dos bolseiros
quando esteve em Genebra no Instituto Jean Jacques Rousseau. Irene produz um relatório que
abrange vários assuntos.
• A professora criadora: Irene apresenta também o aspecto de uma atitude de professora criadora,
aquela que dá asas à liberdade, à imaginação. Uma relação criada entre ela e os alunos permite
essa capacidade criadora. Uma artista que se movimenta no palco da sala de aula com grande
desenvoltura dando a imagem da professora viva para seus estudantes.
• A professora artista: Aquela que é capaz de exercer a profissão com uma dose de arte. Arte
essa desenvolvida com a redação, seja ela cientifica ou literária. Para Leandro, “uma mulher
seriamente empenhada na sua arte, que reconhece que a sua poesia não tem as caracteristicas
da poesia feminina até então praticada” e ainda “sobre a arte, num trecho do seu livro Solidão,
expressa sua opinião exortando as mulheres a derrubar o preconceito de que há uma arte
feminina, a arte das mulheres, diferente da dos homens”. (LEANDRO, 1997, p. 238-239).
• A professora cosmopolita: Viveu diversas situações em diversos locais, viagens de estudo a Suiça,
Bruxelas e Paris, viveu intensamente a vida de professora em todos os seus sentidos, dentro de
suas opções politicas, sociais e humanísticas.
Para alguns autores a noção de artista relacionada a criatividade, a sensibilidade, a personalidade
própria de cada professor. Irene Lisboa uma “artista cientista”, seus textos versavam entre poemas e
textos dissertativos críticos para vários periódicos.
Os resultados deste estudo apontam que na época do curso normal, Irene Lisboa estava muita
atenta as novas propostas educacionais e que, havia muitos movimentos em Portugal divulgando
essas idéias, veja-se o prefácio do livro de Faria de Vasconcelos publicado por Ferrière, com os trinta
princípios da escola nova. Inserida nesse movimento, percebe-se pelos seus textos que nunca se
afastará deles. Assim Irene Lisboa pode ser considerada uma artista em todos os sentidos; na arte
de educar, na arte de ensinar em geral, e ensinar os pequeninos em particular, na arte de produzir
literatura, na arte de escrever hora a jornais e periódicos, na arte de estar presente na imprensa
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 1005
expresando suas ideias, sua forma de ver a educação e os problemas sociais. Mais ainda: uma
cientista e artista, pois ciência e arte são parceiras.
Irene Lisboa a normalista, a professora do ensino primário oficial, a professora de ensino infantil,
a inspectora de ensino infantil, a professora da Escola Normal Primária de Lisboa, a escritora
ficcionista. Para Fernandes, “uma resistente antifascista que nunca desertou do seu posto de
combate. (FERNANDES, 1979. p. 129).
Conclui-se que este estudo permite a compreensão de um importante momento da história da
formação de professores em Portugal e os seus desdobramentos na figura da aluna e professora,
Irene Lisboa.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
A presente comunicação versa sobre a análise da trajetória (DUBAR; 1998) profissional de Ernesto
de Faria Júnior, em especial, acerca de seu transitar na ou pela Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi)
da então Universidade do Brasil. O recorte temporal desse caminhar encontra-se circunscrito entre os
anos de 1939 e 1962. Tal fato justifica-se em razão do mesmo ter atuado na supracitada instituição, em
um primeiro momento, na condição de professor contratado, entre os anos de 1939 e 1946 (FÁVERO,
1989 e 2003), e, em sequência, na condição de Professor Catedrático entre 1946 (após concurso) e 1962,
por ocasião de seu falecimento nas dependências da Faculdade Nacional de Filosofia, após calorosa
discussão na Reunião de Congregação do dia 14 de março do ano acima mencionado, em defesa da
manutenção da disciplina escolar Latim (BERARDINELLI, 1996). Desta feita, consideramos pertinentes
para o desenvolvimento de tal proposta, a elaboração de considerações no que diz respeito aos estudos
sobre biografia ((BOURDIEU, 1996 & 2003; DELORY-MOMBERGER, 2012; LEVI, 1996; LEVILLAIN, 1988;
LORIGA, 1998 & 2011; MINOGT, 2018; SCHIMIDT, 2018), objeto de pesquisa de doutoramento em
desenvolvimento, no campo da História da Educação. Logo, acreditamos serem plausíveis a
conceituação no que se refere àquilo que denominamos como ato de biografar (MINOGT, 2018) sob o
olhar da historiografia e, do mesmo modo, deferências no que concerne a estudos que versam, de
natureza igual, à histórias de vida, autobiografias (BARBOSA, 2008) e autoetnobiografias (CALVA, 2019).
Nesse sentido, cumpre salientar que a partir da crise de paradigmas vigente no âmbito das ciências
sociais, temos identificado discussões no campo da História da Educação que contemplam novos
objetos antes confinados a áreas de outros espaços disciplinares, seja no que se refere ao aspecto
teórico seja sob o ponto de vista metodológico. Percebemos, então, que a busca por novos referenciais
teórico-metodológicos no interior da História da Educação tem possibilitado outras leituras, na medida
em que sugerem uma interpretação sobre os fenômenos escolares a partir da ação dos indivíduos ou
grupos de indivíduos que compõem esse mesmo universo social (FARIA FILHO et al., 2004). Chaves
(2014) sinaliza que nessa nova abordagem tem surgido investigações que giram em torno de trajetórias
sociais e a “a escola passa, então, a ser a grande fonte inspiradora dessa ‘nova’ História da Educação,
ao trazer à baila seu cotidiano, antes invisível e raramente considerado” (p. 103). Nesse sentido,
inferimos que um dos desdobramentos da crise desse modelo estrutural consistiu no alargamento do
ou no olhar do pesquisador no que se refere às experiências relativas, para exemplificar, à história do
cotidiano, da cultura popular e das mulheres. E, para além disso, pesquisas sobre trajetória de sujeitos,
docentes ou discentes no cenário escolar, conforme assinalam Peixoto & Passos (2005), têm sido
contumazes. Sob esse aspecto, destacamos as contribuições da micro - história (Ginzburg, 1987) como
também das escalas de observações de Revel (1996), em razão do compartilhamento de preocupações
e participações nas discussões historiográficas realizadas a partir da terceira geração dos Annales.
Nesse enquadramento destacamos, para efeito de contemplação de nosso objeto de comunicação, a
contribuição da micro -história visto que propiciou o alargamento das temáticas, o abandono da
história linear e o aumento das fronteiras, se assim podemos anunciar, sobre formas de tratamento,
abordagem e objetos de investigação como acima mencionados. A mudança de ou no olhar do
pesquisador demonstra, em certa medida, o modelo uno e em menor evidência ao passo que a
multiplicidade e a interdisciplinaridade se constituem de modo mais presente. Além do que
[1] De acordo com Revel, constitui-se em elemento que apresenta um norte para a pesquisa, ou seja, considerada, meta-
foricamente, uma bússola.
[2] Ernesto Faria Jr consta na relação de professores suplementares (externato) do Colégio Pedro II entre 1925 e 1926, de
acordo com o anexo 4 (p.257) da tese do Professor Jefferson Soares intitulada Dos Professores “Estranhos” Aos Cat-
edráticos: Aspectos da Construção da Identidade Profissional Docente no Colégio Pedro II (1925-1945), defendida em
março de 2014 no Departamento de Educação da PUC-Rio sob orientação da professora Ana Waleska Mendonça.
[3] A primeira Universidade do Distrito Federal (UDF) foi criada por iniciativa de Anísio Teixeira em 1935, sendo extinta
três anos depois. Em 1950 é criada outra com a mesma denominação que deu origem à Universidade do Estado da
Guanabara – UEG e atualmente UERJ.
ISSN 2358-3959
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Bellotto (2008) afirma que indiferentemente de qual seja o trabalho histórico que o pesquisador
se proponha a organizar, ele “[...] necessitará indubitavelmente do texto colocado ao seu alcance
pelo instrumento de pesquisa. Cabe ao seu elaborador aprender, condensar e, sem distorções,
apresentar todas as possibilidades de uso da aplicação da documentação por ele relacionada e
escrita.” (BELLOTTO, 2008, p. 137). Sendo assim, a recuperação, reunião, seleção e análise das
referências de obras escritas pela poetisa Presciliana Duarte de Almeida e sobre ela durante os anos
de 1889 a 2019 é fundamental, sobretudo para auxiliar pesquisas futuras.
Nesse sentido, a pesquisa teve como metodologia a pesquisa bibliográfica e documental por
meio de procedimentos de localização, seleção e organização das fontes documentais impressas e
manuscritas, como livros, jornais, revistas, cartas, e todo tipo de “documento” que a poetisa produziu
ou que a mencione e que encontrei disponíveis na Academia Paulista de Letras, na Hemeroteca da
Biblioteca Nacional Digital e em sites disponibilizados online, nos quais utilizei como palavra-chave
o nome da autora nos dois formatos que ela assinava: Presciliana Duarte de Almeida e Prisciliana
Duarte de Almeida.
Presciliana Duarte de Almeida nasceu em Pouso Alegre/ MG, no dia 03 de junho de 1867. Segundo
Coelho (1984), ela era de família de escritoras, sendo prima de Julia Lopes de Almeida (1862-1934) e
de Adelina Lopes Vieira (1850-1923); casou-se com o primo Silvio de Almeida (1867-1924); faleceu no
dia 13 de junho de 1944, com 77 anos, vítima de diabetes, e encontra-se enterrada no cemitério do
Araçá em São Paulo/ SP.
De acordo com Coelho (1991), a autora teve grande destaque em sua época, participando de
movimentos culturais, literários e educacionais, sendo considerada por Arroyo (1990) como uma
das percursoras da poesia para crianças, e ainda, para Arroyo (1990, p. 217), nela “[...] encontramos
as mais válidas vozes da poesia para crianças no Brasil. [...]”.
A escritora também foi fundadora e diretora da revista A Mensageira, considerada por vários
autores como a primeira revista com teor feminista do Brasil, e, além de fundar e dirigir por anos
A Mensageira, a poetisa teve publicados textos em várias outras revistas da época, como é o caso
de A Família, A estação, Revista Feminina e do Almanaque Garnier, entre outras; dentre suas várias
publicações, teve publicados cinco livros dentre eles, dois são especificamente para o público
infantil e para o professorado da época.
Além das publicações em revistas e livros, Presciliana Duarte de Almeida teve participação na
fundação da Academia Paulista de Letras, tendo como cadeira a de nº 8, cuja patrona foi Bárbara
Heliodora, figura importante da Inconfidência Mineira, com quem a poetisa mantinha laços
sanguíneos (até o momento, não foi possível conseguir confirmar qual o grau de parentesco de
Presciliana Duarte de Almeida com Barbara Heliodora, sendo que, alguns autores afirmam que
Presciliana Duarte de Almeida era bisneta de Barbara Heliodora e outros autores afirmam que
Presciliana Duarte de Almeida era tataraneta). A fundação da Academia Paulista de Letras aconteceu
em 27 de novembro de 1909, na cidade de São Paulo, onde a poetisa residia, sendo uma fundação
sem fins lucrativos e sem prazo determinado de duração que tem por objetivo geral a cultura da
literatura. Até o momento, foi possível localizar um total de 44 publicações da autora, divididas
em periódicos que circulavam à época (Almanaque Garnier, Revista A família, A Mensageira, A
estação e Revista feminina), cinco livros ( Rumorejos, Sombras, Páginas Infantis, O Livro das Aves:
Crestomathia em prosa e verso e Vetiver) e um hino ( da cidade de Jacutinga/MG). A produção mais
antiga de Presciliana Duarte de Almeida data do ano de 1889 no periódico A Família, com poema
intitulado “Silente” e sua última publicação em vida data do ano de 1939 sendo o livro de poesia
Vetiver.
Nas publicações sobre a poetisa, até o momento, foram encontradas 125 produções, porém,
grande maioria dessas publicações são repetições de informações básicas sobre a poetisa como ano
de nascimento e morte; e citações sem menção à fonte. Foram localizadas como publicações sobre
Presciliana Duarte de Almeida: quatro dissertações, quatro trabalhos de Conclusão de Curso (TCC),
dois trabalhos de Conclusão de Curso em especialização (TCC), um livro (obra póstuma), 19 citações
em livros, 29 artigos, 20 trabalhos publicados em anais de eventos, seis resumos publicados em
anais de eventos, dois resumos, uma resenha, cinco discursos, 24 menções em blogs ou site, uma
menção em blog ou site internacional, uma menção em rede social e seis menções ou citações em
periódicos. A produção mais antiga se encontra no livro da Academia Paulista de Letras (1912) e
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 1010
trata-se de citação em livro e a mais recente até o momento foi o Trabalho de Conclusão de Curso de
Pinto (2018) com o título: Um estudo sobre Presciliana Duarte de Almeida (1867-1944) e a Literatura
Infantil.
Ao organizar, e ainda estar buscando publicações de e sobre a poetisa Presciliana Duarte de
Almeida, foi observado, como já afirmado anteriormente neste resumo que existem muitas citações
sobre a poetisa, porém elas não trazem, em sua grande maioria, novas informações e apenas se
repetem. No caso das publicações de Presciliana Duarte de Almeida, foi observado até o momento
que foram muitas, entende-se então, que a poetisa, como afirma Coelho (1984), tinha um lugar de
destaque na época.
Com esse balanço e organização, que estou realizando das produções de e sobre Presciliana
Duarte de Almeida, tenho como objetivo organizar um Instrumento de Pesquisa que venha facilitar
e proporcionar pesquisas futuras.
Referências
ARROYO, Leonardo. Literatura Infantil Brasileira. São Paulo: Melhoramentos, 1988.
COELHO, Nelly Novaes. Dicionário Crítico da Literatura Infantil/Juvenil Brasileira. 1882 – 1982.
2.ed. São Paulo: Quírion, 1984.
_________. Precursores. In:____. Dicionário Crítico da Literatura Infantil Juvenil. 4.ed. São Paulo:
Ática., 1991.
MORTATTI, Maria do Rosário Longo. Notas sobre linguagem, texto e pesquisa histórica em educação.
História da Educação. Pelotas v. 3. n. 6 p.69-77.1999. Disponível em: <https://seer.ufrgs.br/asphe/
article/view/30258/pdf>. Acesso em: fev. 2017.
ISSN 2358-3959
ISSN 2358-3959
PROFESSORES VOLUNTÁRIOS DA
EDUCAÇÃO DE ADULTOS EM SANTOS:
ENTRE A EXPERIÊNCIA E A FORMAÇÃO INICIAL – 1970-1990
Este artigo procura discutir o recurso do voluntariado para suprir a demanda por docentes nas
salas de aula dos cursos de educação de adultos a partir do último terço do século XX na cidade de
Santos. Dentro das campanhas pela escolarização de jovens e adultos, a proposta de aproveitar
professores em formação para estarem voluntariamente a frente das classes de educação de adultos
surgiu como paliativo para resolver a falta de docentes para estas turmas. A prática apareceu nas
primeiras campanhas de alfabetização lideradas pelo governo federal, como a Campanha de
Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA), de 1947, e permaneceu até a extinção da Fundação
Educar, sucessora do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), em 1990, última tentativa de
política pública brasileira para a solução do analfabetismo entre jovens e adultos. Ao lado da
problematização da educação e experiência proposta por E. P. Thompson em “Educação e
experiência”, publicado no livro “Os românticos”, de 2002, cujo texto é resultado de uma conferência
proferida pelo historiador inglês em Leeds, em 1963, no qual a experiência de fora da universidade é
tida como complementar à educação proposta na academia, numa perspectiva de troca entre
professor e educando para ampliação do conhecimento de ambos, surge a complexidade de
compreender como professores em formação foram vistos como capacitados a ministrar aulas para
adultos na cidade de Santos, considerando as peculiaridades desta modalidade no que se refere ao
tempo de aprendizagem dos educandos, adequação dos materiais didáticos à realidade dos adultos,
processos de avaliação condizentes com o senso crítico já alcançado por este público, entre outros
pormenores. Nesse quesito, entende-se que os docentes em formação recorreram a táticas para
insubordinar, ainda que não conscientemente, a ordem imposta pelas políticas públicas, em um
movimento semelhante ao que foi detectado por Michel de Certeau e seu grupo de pesquisa em
“Invenção do cotidiano”, de 2002, quando do estudo das práticas cotidianas dos sujeitos pertencentes
à cultura popular em contraponto à cultura de massa. No dia a dia, os professores voluntários da
educação de adultos estiveram envolvidos em práticas que iam da adaptação do material didático
disponível à adequação do ritmo das aulas para que os educandos adultos pudessem acompanhar
e permanecer no curso, a despeito do que os dirigentes responsáveis pelas políticas públicas
entendessem ou direcionassem para o que os adultos não escolarizados deveriam aprender, isto é,
do tipo tático, os professores voluntários, cuja formação estava em andamento, produziam uma
bricolagem entre o que percebiam que funcionava e tinha resultados positivos em sala de aula de
alunos em escolarização tardia, o conhecimento recém-adquiridos nos cursos que frequentavam
como alunos da graduação e/ou do magistério que eram e a adaptação necessária para adequar a
aula a adultos. A fim de estabelecer um panorama de elaboração das políticas públicas e da medida
que recorria ao voluntariado para captar professores, este artigo fundamenta-se na literatura
produzida sobre as políticas públicas para a educação de adultos, como a de Vanilda Pereira Paiva,
em “Educação popular e educação de adultos”, de 1987, e Osmar Fávero e Marinaide Freitas, em “A
educação de jovens e adultos: um olhar sobre o passado e o presente”, de 2011, e nos documentos
que a cidade de Santos mantém em registro sobre as escolas que ofertaram cursos e turmas na
modalidade, disponíveis nos diplomas legais e imprensa oficial. O método de articulação dos
materiais de pesquisa provém do entendimento apresentado por E. P. Thompson, especialmente
nos capítulos VI “Os filósofos e a História” e VII “Intervalo: a lógica histórica”, partes integrantes do
livro “A miséria da teoria ou um planetário de erros: uma crítica ao pensamento de Althusser”, de
1981, no qual reforça a necessidade de interrogação das evidências históricas a fim de produzir uma
interpretação mais próxima do fato investigado, entendendo que “os fatos não podem falar enquanto
não tiverem sido interrogados” (p. 38), isto é, possibilitando novas compreensões a partir do diálogo
com as evidências. Para localizar a discussão deste artigo, é preciso compreender algumas das
bases socioeconômicas nas quais foram forjadas as propostas de formação de professores no Brasil
a partir da ideia apresentada nos cursos da Escola Normal e, posteriormente, no curso de magistério
e no curso superior de Pedagogia, assim como toda a preocupação e, consequentemente, o interesse
em formar professores e como formar estes profissionais, recorrendo-se a ideias e materiais que
foram elaborados fora do país, e a publicações posteriormente propostas pelos intelectuais da
educação brasileira que pudessem auxiliar os professores na constante capacitação que resultasse
em reversão do analfabetismo entre a população brasileiro. Delimitar a localização dos fatos
analisados é outra baliza necessária, mencionando brevemente a atuação do Liceu Feminino
Santista, na cidade de Santos, litoral do estado de São Paulo, como um dos espaços de formação
formal das docentes. Além disso, busca-se situar as políticas públicas em educação de adultos
realizadas em Santos que lançaram mão do voluntariado como parte da proposta executiva dessas
políticas e, por fim, conhecer, por meio de relatos, obtidos por meio de entrevista, de profissionais
que foram docentes voluntários para a educação de adultos, as táticas a que recorreram para superar
os desafios que o trabalho de escolarização de adultos ofereceu naquele período com aquelas
determinações. A especificação da cidade de Santos como local de estudos – e de onde são
selecionados os sujeitos entrevistados – remete ao contexto de rápida urbanização da cidade
motivada pela transformação socioeconômica herdada dos anos de intensa comercialização do café
no final do século XIX e início do século XX. A porta dos imigrantes que vieram ao Brasil para trabalhar
nas fazendas de café do interior do estado de São Paulo foi o porto santista. O movimento de chegada
de estrangeiros revelou a necessidade de abertura de turmas para a alfabetização dos trabalhadores
imigrantes, servindo como complementação para inserção deles na cultura e costumes brasileiros.
De um lado, a rede pública fez algum movimento a partir da oferta de cursos noturnos mantidos pela
prefeitura em seis escolas municipais juntamente com a adesão à política pública de combate ao
analfabetismo que marcaram com intensidade o cenário brasileiro a partir de 1947. De outro, a
congregação mariana manteve a escola noturna “Santo Inácio”, inaugurada em 1921, que recorreu
também ao voluntariado entre os seus “moços” congregados para dar aulas aos filhos dos
trabalhadores, inicialmente, e depois aos próprios trabalhadores, a partir de 1970. Entidade sindical
também contribuiu com salas de alfabetização de adultos, como a que foi mantida pela Sociedade
União Operária em Santos, desvelando o campo de disputa pela formação educacional e cultural do
enorme contingente que precisava da escola no ambiente intensamente urbano que se caracterizava
a cidade de Santos. Na esteira da discussão, destaque-se o valor do voluntariado para angariar
apoios entre a sociedade santista e convencer professores a fazer o trabalho para o qual ainda não
estavam prontos profissionalmente em troca de valores simbólicos de ajuda de custo e de relações
de trabalho que beiravam a precariedade e que apresentavam incerteza de continuidade pela
simples mudança de calendário letivo, assim como o entendimento de que o trabalho com pessoas
adultas que não frequentaram a escola quando na infância poderia ser feito de modo semelhante a
uma doação ou a uma assistência social, uma vez que esta população não tivera como frequentar a
escola anteriormente. Como resultados, este artigo traz o levantamento de informações sobre as
escolas que ofereceram curso noturno para adultos, com quantitativo de turmas e alunos, anúncios
convocatórios de adesão voluntária de professores à política pública de combate ao analfabetismo
que foi vigente a partir do último terço do século XX, entrevistas de docentes que forneceram detalhes
do modo como estes professores voluntários trabalhavam frente a estas turmas de educação de
adultos e a organização da contextualização história da cidade de Santos que podem tecer um
quadro abrangente, mas não definitivo, sobre as condições em que se deram a preferência por
professores em formação para ministrarem, de modo voluntário, aulas a adultos em escolarização
tardia.
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 1013
Referências
CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. Tradução por Ephraim Ferreira Alves.
8 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
FÁVERO, O.; FREITAS, M. A educação de adultos e jovens e adultos: um olhar sobre o passado e
o presente. Revista Inter Ação, v. 36, n. 2, p. 365-392, 28 dez. 2011. Disponível em <https://www.
revistas.ufg.br/interacao/article/view/16712>. Acesso em: 30 mar. 2019
PAIVA, Vanilda Pereira. Educação popular e educação de adultos. São Paulo: Edições Loyola, 1987.
______. Educação e Experiência. In: ______. Os românticos. Rio de Janeiro: Civilização brasileira,
2002.
ISSN 2358-3959
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A presente proposta se debruça sobre os debates acerca da instrução popular a partir da imprensa
operária no Rio de Janeiro nas primeiras décadas do século XX. A educação analisada para as
camadas populares passa, sob este curso histórico, a ser observada pela ótica dos próprios
trabalhadores. O trabalho propõe percorrer caminhos, em prol da educação, pensados e realizados
por trabalhadores, no sentido de tocar em temáticas que nos mostram as pluralidades existentes
nesse período que faz parte da história da educação no Brasil. Acreditamos que estes percursos
possam contribuir no sentido de ampliar as visões a respeito das agências dos múltiplos atores
sociais e nos permite perceber melhor a complexidade dos projetos e lutas sociais e políticas em
disputa em torno da educação popular. De acordo com Maciel (2016), observamos como a imprensa
operária se constituiu enquanto instrumento fomentador da cultura operária. A Federação Operária
do Estado do Rio de Janeiro, assim como outros movimentos de cunho associativo, aponta para o
valor coletivo nos objetivos de alcançar conquistas por direitos em torno das condições dos
trabalhadores e permite algumas observações. Refletimos sobre como os documentos construídos
por grupos de diferentes trabalhadores, por meio de atas, estatutos, bases de acordo, em geral
contemplam propostas pedagógicas defendidas por seus representantes, uma vez que expressam
seus anseios, expectativas frente às agendas a serem construídas. Segundo Barbosa (2007, p. 51),
para além de apresentarem a situação vivenciada como real, esses “construtores de mensagens”
externavam opiniões e juízo de valores sobre o acontecimento narrado. Ou seja, para além de
divulgadora dos acontecimentos a imprensa assumia o papel de formadora de valores sobre um
determinado grupo social. Sodré (1966, p. 352), destaca o pensamento de Gustavo Lacerda, jornalista
à época, que via o jornalismo operário não como profissão, mas como uma “escada para galgar
posições”, que sonhava com uma organização sindicalista, capaz de defender os interesses dos seus
associados. Com isso, objetivo central deste trabalho consiste em abordar propostas, debates e
projetos, em torno da instrução pensada pelos trabalhadores e intelectuais que se debruçavam
sobre a instrução destes grupos sociais. Refletimos a respeito da instrução como parte integrante
dos interesses e reivindicações nas agendas desses agentes históricos. Sob esta perspectiva, o jornal
é utilizado como fonte de informações sobre como trabalhadores entendiam a educação e um
instrumento de ação e coesão dos mesmos ao considerarmos as especificidades do jornalismo
desenvolvido pelos trabalhadores. Observamos que grupos defendiam uma educação em que
considerasse o aspecto intelectual associado ao trabalho. Por isso o valor por uma formação com
uma perspectiva integral, que valoriza a apreciação e leitura de diferentes obras, valorização pelas
artes com teatros, músicas. A concepção de educação estava articulada, para além da criação e
manutenção de escolas, à difusão e propagação de artes, instrumentos educativos fomentadores de
práticas culturais com potencial de promover uma formação reflexiva. Uma defesa pelo direito ao
acesso de todos no que tange ao desenvolvimento do ser humano em suas diversas aptidões. A
e objetivos da educação, são algumas das questões que movem esta investigação. O trabalho
desenvolvido por Batalha (2000) nos leva a refletir a função da imprensa operária como expressão
da cultura criada pelos trabalhadores. Periódicos de diferentes correntes políticas-ideológicas,
foram instrumentos de propagandas e debates que expressaram práticas de cultura dos múltiplos
trabalhadores e revelaram uma pluralidade de questões e perspectivas. Entendendo a imprensa
como um campo de luta, de militância e política, também ressaltamos a imprensa operária como
um instrumento pedagógico frente ao que se propunha no aspecto de dialogar e chegar ao alcance
das diferentes associações e grupos de trabalhadores. A imprensa representa mais do que resistência,
porque foi usada como formas de organização em busca de outras possibilidades por meio das
experiências e agências dos atores sociais pertencentes às camadas populares. A imprensa operária
possibilitou ampliar as lentes para análise da história de modo a reconhecer a pluralidade de sujeitos
e entidades envolvidos com a expansão do ensino primário e elementar, mas também, com o ensino
profissional e de ofícios, existente no bojo de tensões e disputas de projetos de educação no Rio de
Janeiro. Deste modo, acreditamos que existem possibilidades de ampliar as discussões, gerar
reflexões e debates, promovendo diálogo com outras narrativas, ao fazer outras formas de leitura da
história que contemplem as agências destes grupos sociais.
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RESISTÊNCIA E DESISTÊNCIA:
A ATUAÇÃO DE PAULO FREIRE COMO SECRETÁRIO
MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO (1989 - 1991)
Esta comunicação propõe-se a expor parte da pesquisa sobre a atuação de Paulo Freire como
secretário da educação do município de São Paulo, entre 1989 e 1991, na gestão da prefeita do
Partido dos Trabalhadores, Luíza Erundina. Investigou-se a experiência de Paulo Freire em seu
percurso como intelectual da educação, no empenho em verificar os obstáculos e contradições
enfrentados que culminaram com sua desistência antes do término da gestão municipal. Para
tal, considerou-se o conceito de intelectual orgânico ator do político de Gramsci (2001) que o
define como aquele que está não somente organizando ideias mas aplicando-as; além disso o
intelectual é capaz de uma elaboração ativa e crítica que propicia transformação da realidade.
Desta forma, o intelectual orgânico é aquele que elabora ideias, aplicando-as como instrumentos
de transformação. Sendo assim, considera-se a proposição de que Paulo Freire é intelectual
orgânico, dado que, produziu reflexões teóricas que moveram sua atuação política, participando
“das práticas culturais, sistematizando, sintetizando visões de mundo e organizando projetos
educativos” (GRAMSCI, 2001, p.53).
O conceito de experiência proposto por E. P. Thompson (1981) também configura elemento
importante para a compreensão da ação do intelectual no cargo de secretário da Educação no
município de São Paulo. O historiador inglês, em sua obra A miséria da teoria, propõem que o
historiador não se permita esquecer o conceito, ainda que se constitua de maneira imperfeita, já
que ele favorece uma narrativa que considera a materialidade das relações e não somente uma visão
de sistema, já que por experiência se compreende “uma resposta mental e emocional, seja de um
indivíduo ou de um grupo social, a muitos acontecimentos inter-relacionados ou a muitas repetições
do mesmo tipo de acontecimento” (THOMPSON, 1981, p. 15).
A metodologia de análise do intelectual pressupõe que se observe a “trajetória”, a “geração” e
a “rede de sociabilidade” do intelectual Paulo Freire. Tais conceitos estão presentes nos estudos
de Sirinelli (2003) que considera que o intelectual, ou uma geração de intelectuais, é gestado por
meio de um “acontecimento fundador”. Sirinelli (2003), ao explanar sobre a história dos intelectuais,
enfatizou a necessidade de compreender o intelectual incluindo-o em uma geração, porém não se
pode simplificar o termo compreendendo-o exclusivamente como uma questão de “idade”, mas
como um conjunto de fatores, entre eles o “acontecimento fundador”, cuja as ideias e atuações
terminam por ser projetadas e gestam grupos de intelectuais. Tal evento, ainda que com sua ação
limitada no tempo, influencia a gênese dos grupos de intelectuais, marcando características que
estarão presentes em sua ação.
No percurso de Paulo Freire na Secretaria Municipal de Educação, notam-se evidências de
tensões internas na administração municipal e junto ao Partido dos Trabalhadores. As tensões
observadas estão associadas aos embates em torno da construção da sua memória como intelectual
da educação e das críticas e elogios que suas obras suscitaram, alcançando a memória consagrada
e defendida por um grupo coeso de freireanos e críticos. De acordo com as considerações de Pollak
(1992) a coesão de grupo favorece a memória enquadrada, presente nas narrativas acerca da
trajetória de Paulo Freire, a maioria de cunho biográfico enaltecedor. Por outro lado, há também
uma bibliografia, especialmente de viés marxista, que o criticou por trabalhar com uma perspectiva
ingênua e nacional-desenvolvimentista. Essas leituras são fundamentais para adentrar a análise
de documentos da Secretaria Municipal de Educação do período e publicações da revista “Teoria e
Debate” da fundação Perseu Abramo, entre 1988 e 1992.
A pesquisa se organizou de modo a rever a bibliografia que pudesse elucidar a trajetória (Sirinelli,
2003) de Paulo Freire e encontrou um conjunto de produções que foram separadas de acordo com
a identificação de dois grupos, o primeiro de freireanos e o segundo de críticos. No primeiro grupo,
encontram-se aqueles que participam da “rede de sociabilidade” organizada em torno do Instituto
Paulo Freire, cuja abordagem sobre a atuação do intelectual transita em enunciados de divulgação
e propagação das suas ideias e de sua imagem como ideal de educador e pensador progressista; no
segundo, um grupo que apresenta uma análise crítica do seu pensamento e de sua ação, propondo
uma leitura que não pretende fazer militância pelas ideias e imagem do intelectual. O segundo grupo
é composto por pesquisadores que se empenharam em identificar algumas contradições e tensões
do pensamento e ação de Paulo Freire; Vanilda Paiva, Emanuel de Kadt e Demerval Saviani são os
intelectuais que apresentaram uma análise crítica. Tais autores propuseram mostrar as contradições
de uma figura que estava em seu tempo, nem aquém tampouco além, passível de ácidas críticas
e objeto de observáveis contradições. Kadt (2003) e Paiva (2000) trabalharam de forma elaborar
um trabalho crítico sobre Paulo Freire, asseverando que ele não contribuiu para a libertação das
classes oprimidas, mas avançou para torná-las parte da manutenção do sistema vigente. A ideia
de que Paulo Freire sentou-se à mesa de negociações com a elite para tornar possível o plano de
alfabetização, na década de 1960, tornou-se uma acusação pesada, talvez por esse motivo que
freireanos, de certa forma, tenham respondido com a idealização de Paulo Freire, propondo uma
visão menos crítica, mais enaltecedora. Saviani (2013), em História das ideias pedagógicas no Brasil,
incluiu Paulo Freire, no capítulo X, intitulado “Crise da pedagogia nova e articulação da pedagogia
tecnicista”, como pensador de uma escola nova popular. No item 5, Paulo Freire e a emergência das
ideias pedagógicas libertadoras, apresentou-o numa breve biografia e sintetizou as principais ideias
de sua obra, além de descrição sobre as operações do método que leva seu nome. Uma das críticas
que se apresentou neste item é a de que Freire propunha “uma espécie de ‘Escola Nova Popular’”,
ainda presa às ideias de uma educação dos grupos dominantes. Na sequência, talvez como resposta
à citada visão de seu trabalho em Escola e democracia, indicou ter sido Freire “um dos maiores
educadores” e que “sua figura carismática provocava adesões, por vezes de caráter pré-crítico, em
contraste com o que postulava sua pedagogia”. (SAVIANI, 2013, p. 335-336).
A comparação entre a bibliografia militante e a bibliografia crítica revelou uma tensão e um
conflito de visões que puderam ser observados nas reações de grupos do Partido dos Trabalhadores,
no momento em que passou a ser governo, com a vitória da candidata Luíza Erundina. Assim, a
bibliografia freireana, que apresenta lacunas de informações, sobretudo ao abordar a crítica sofrida
por Paulo Freire, pôde ter sua narrativa com lacunas diminuídas com tal comparação. Neste aspecto,
as publicações da revista da fundação Perseu Abramo, no período mencionado, puderam compor
um conjunto de textos que puseram luz a tensões e dificuldades por que passou Luíza Erundina e,
consequentemente, Paulo Freire.
A pesquisa evitou fixar-se na visão elogiosa por um lado ou a interpretação mais ácida por
outro. O trabalho que aqui se projeta compreende o homem Paulo Freire conhecedor de aparatos
discursivos que foram incorporados a seu arcabouço para a interpretação do trabalho com a
educação popular, passando pela experiência de sua ação política. Parafraseando as palavras
de Thompson (1981), considerar o conceito de experiência significa reconhecer os sujeitos como
agentes na história os quais refletem sobre suas ações, que adaptam conteúdos e métodos, porque
está em jogo a sobrevivência no nível material de suas vidas e também, de forma ampliada, no nível
da sobrevivência da produção de um intelectual e de seu legado dentro de um campo.
Para a análise dos documentos utilizou-se a Análise do Discurso que toma a conceituação de
discurso, como interação entre sujeitos e de enunciados como elementos responsivos, de acordo
com Bakthin (2010) que compreende a linguagem como fenômeno mais complexo que a soma de
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 1019
palavras e sentenças em suas estruturas. Para ele, a linguagem real, construída pelos sujeitos sociais,
se faz a partir de enunciados compreendidos como unidades reais da comunicação discursiva,
também reforça que esses enunciados são formas mais ou menos conclusivas que possibilitam
aos sujeitos se alternarem nas respostas. Assim formam-se “réplicas interligadas” que exprimem
posições, suscitam respostas, por isso são formas responsivas.
No âmbito da administração pública, as fontes indicaram que, na tarefa de ser governo e
administrar a res pública, na prefeitura de São Paulo, entre 1989 e 1991, Paulo Freire herdou as tensões
do partido. As fontes da secretaria indicam que a principal demanda da gestão era atuar de modo a
garantir a democracia. Assim, pôde-se observar enunciados discursivos que promovem um diálogo
com o momento histórico da ditadura militar, num empenho intenso em promover a participação
popular com o Conselho de Escola, que passou a fazer parte do Regimento Comum das escolas
municipais de São Paulo. A solução que se observou pautou-se pelo conceito de gestão democrática,
na ampliação e flexibilização dos conceitos de classe e seus conflitos, administrando a concepção
de cidadania; elemento que gerou oposição de grupos do partido. Desta forma, verificaram-se as
principais demandas e mudanças na gestão da educação municipal, pautados no ideal de Escola
Democrática Popular, portanto a proposta de trabalho na rede apresentou resistências dos docentes.
Tais tensões apresentam relações com a desistência do secretário em maio de 1991.
ISSN 2358-3959
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A aproximação sincrética entre Santo Antônio e Exu, a princípio, poderia parecer estranha e
mesmo inconciliável. Entre os africanos, entretanto, a representação priápica de Exu exalta a
potência sexual, a fertilidade e a garantia da geração de prole numerosa. Ora, a santidade, segundo
o catolicismo, afirma-se na negação da sexualidade ou, ao menos, na sua sublimação, de modo
que a castidade, a abstinência sexual e o celibato são tidos como virtudes heroicas e uma forma
de martírio profético e que compõe inescapavelmente o clichê da santidade exigível a uma pessoa
digna dos altares.
De que modo se poderá coadunar as virtudes do santo católico – representado recorrentemente
com o atributo do lírio, símbolo da pureza e da inocência, e invocado como modelo de castidade – e
as qualidades de um orixá cuja a representação exalta valores e potências diametralmente opostas,
tais como a virilidade, a exaltação sexual e as forças propiciadoras do amor carnal?
A popularização da fama casamenteira de Santo Antônio tornou-se irrefreável, aliás como boa
parte das manifestações devocionais e religiosas criadas pelo catolicismo popular. Assentadas
em complexos processos de sincretização, a religiosidade popular precisou construir formas de
ocultação de elementos culturais alheios à cultura dominante. Velar e também ressignificar são
movimentos próprios da cultura dominada para se proteger da censura eclesiástica, evitar a reação,
em geral, violenta a tudo o que fere e escapa ao controle da sociedade colonizadora constituída a
partir de cima, e inventar formas outras de sobrevivência. Uma vez que nas hagiografias de Santo
Antônio nada se encontra que pudesse justificar a fama casamenteira do santo, foi preciso que a
Igreja oficial e hierárquica elaborasse as suas próprias versões fundadas em narrativas populares
que melhor se coadunassem à moral e a ortodoxia católicas.
Fica evidenciado o teor pedagógico-moralizante dessas narrativas que refletem os ideais
conservadores da família de tipo burguês. São claras as suas finalidades normatizadoras das
relações entre os sexos, de modo a exaltar o matrimônio e a maternidade como os máximos anseios
da mulher, permitir o controle da sexualidade, sobretudo a feminina, e a submissão da mulher ao
homem na instituição do casamento e da família, em que o marido exerce poder, domínio e comando.
Não é, aqui, nosso objetivo discutir as disputas que envolvem o conceito de sincretismo nas
ciências sociais, cabendo apenas esclarecer que seguimos os referenciais apresentados por Ferretti
(2014) e que nos dão o suporte necessário para considerar que o conceito é bastante pertinente para
analisar os fenômenos religiosos e histórico-sociais mais amplos, no Brasil.
O estudo contribui com as análises que focam os processos históricos de educação não formal
cujos influxos passam ao largo da escola, em geral, incipiente e minoritária, no Brasil, até o século
XX, ante outros meios sociais utilizados para a transmissão e elaboração da cultura dominante.
Educar e impor novos padrões culturais e sexuais que se coadunassem a moral cristã, coibir os
comportamentos considerados pecaminosos e controlar a sexualidade através do matrimônio
sempre foi uma das tarefas pedagógicas dos missionários, desde o início da colonização. Mas
esse não foi o único movimento produzido. As culturas dominadas encontram nesse processo de
aculturação espaços e interstícios muitos propícios a vincar e a modificar a cultura do dominador,
de modo que o colonizador também adotou diversos elementos da cultura nativa e daquelas que
aqui foram chegando. Pois, ao modo que afirmou Vainfas (2014), a história do Brasil está repleta de
exemplos de ambos os processos de “aculturação às avessas”.
Percebemos o quão devemos avançar nos estudos culturais que tematizam as matrizes étnicas
que formam o Brasil. O estudo mais aprofundado da história da África e das suas culturas, línguas
e religiões ancestrais é forma de também conhecer melhor o Brasil tão mestiço, plural e sincrético.
Nas últimas décadas, esforços significativos foram empreendidos nessa direção, desde acréscimos à
legislação educacional, introduzindo a obrigatoriedade dos estudos referentes à história e à cultura
africanas, ao aparecimento de diversos trabalhos importantes de pesquisa, inclusive a produção de
livros e materiais de cunho didático.
A historiografia, ao considerar o africano para além da escravidão, enriquece substancialmente
o conhecimento acerca da cultura negra na diáspora colonial. Mas há muito a ser feito nessa área
de estudo, inclusive maior investimento dos historiadores que tratam da história da educação aos
estudos que elegem o período colonial brasileiro e a busca de novas fontes que, certamente, não
se resumiriam a documentos e a antigos manuscritos perdidos nos arquivos. Parafraseando Freyre
(1959), os indícios dessa história são encontrados, menos na escola que serviu a uma pequena elite
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 1022
que na rua e nos costumes do povo; menos na cultura erudita que nas manifestações da arte popular
dos iletrados; menos nas estátuas dos acadêmicos que nas imagens dos santeiros populares.
O culto a Santo Antônio casamenteiro, amplamente vigente na atualidade e difundido no Brasil
inteiro, é a ponta de um novelo que envolve uma história que, para ser melhor tramada, precisa se
deslocar no espaço e no tempo. No caso desse estudo, encetar um movimento em direção à África
e volver ao século XV, quando o antigo reino do Congo se converte ao cristianismo. Os milhares de
bantos oriundos da região centro-africana, Congo e Angola, povoaram muitas partes do Brasil, em
especial, a região sudeste. Nem sempre consciente, vige entre nós uma série de traços culturais que
são o produto da elaboração de um Brasil que abraçou culturalmente a África.
Referências
BOXER, Charles. A Igreja e a expansão ibérica. Lisboa, Edições 70, 1981.
FERRETTI, Sergio. Sincretismo e Hibridismo na cultura popular. Revista Pós Ciências Sociais.
Maranhão, v. 11, n. 21, jan/jun, p. 14-34, 2014.
KARASH, Mary Catherine. A vida dos escravos no Rio de Janeiro: 1808-1850. São Paulo: Companhia
das Letras, 2000.
VAINFAS, Ronaldo; MELLO e SOUZA, Marina. Catolização e poder no tempo do tráfico: o reino do
Congo da conversão coroada ao movimento antoniano, séculos XV-XVIII. Tempo. Rio de Janeiro:
Universidade Federal Fluminense, v.3, n.6, dez/1998, pp. 95-118.
VAINFAS, Ronaldo. A tessitura dos sincretismos: mediadores e mesclas culturais. In: FRAGOSO, João;
GOUVÊA. Maria de Fátima. O Brasil Colonial: 1443-1580. Vol. 1, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2014. p. 357-388.
ISSN 2358-3959
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Essa pesquisa tem como objetivo apresentar e compreender a produção sobre a infância nas
revistas do campo de pesquisa da história da educação entre os anos de 1997 a 2017. Tal recorte
temporal representa o início das publicações e o último número consultado das revistas escolhidas,
a saber: Revista de História da Educação, Revista Brasileira de História da Educação, Cadernos de
História da Educação e Revista de História e Historiografia da Educação. A pergunta que mobiliza
este trabalho é: em que medida a infância tem sido tomada como objeto de pesquisa no campo da
história da educação?
A escolha pelas quatro revistas citadas se deu por serem as mais representativas no campo de
pesquisa da história da educação e por serem os principais suportes para a divulgação de trabalhos
acadêmicos produzidos na área. Galvão et al. (2008) apontam que as revistas são importantes e
permanentes canais de comunicação entre os pesquisadores. Para os autores, esse veículo de
divulgação facilita a produção de conhecimento no campo, constituindo, assim, um espaço de
disseminação de trabalhos produzidos no Brasil e também no exterior.
Este trabalho parte de uma breve pesquisa bibliográfica, passando pelo levantamento de
dados nas revistas citadas para posteriores análises de informações. Segundo Lima e Mioto
(2007), a pesquisa bibliográfica e o levantamento de dados sobre determinado objeto de pesquisa
são considerados como um trabalho científico a partir do momento que, permite uma melhor
compreensão do campo de pesquisa. Sendo bem elaborados, essa revisão e esses levantamentos
podem despertar questionamentos, diálogos críticos e sinalizar leituras específicas sobre o que está
sendo investigado.
As pesquisas no contexto brasileiro sobre a infância apontam que, a condição de infância que
temos hoje, de sujeitos de cuidados e educação foi formada ao longo do tempo. Pois, até o início
do século XX, eram recorrentes o abandono e o analfabetismo infantil, sendo a infância no Brasil
marcada pela pobreza.
Em pesquisas podemos falar sobre criança, por meio de duas perspectivas: a biológica, como
uma etapa da vida; e a social, considerando que o contexto histórico e o lugar social em que a criança
vive podem interferir diretamente em sua vivência. Ou seja, toda a construção histórica pela qual a
criança passa remete a outra constituição, mais social, que constitui a infância. Para Kuhlmann Jr.
(2015), a infância é uma condição de criança, ou seja, infância é a criança permeada pelas questões
sociais.
Assim, pensando nessa concepção de infância, utilizou-se para a realização desta pesquisa os
seguintes procedimentos metodológicos. Mobilizou-se, então, a pesquisa quantitativa para posterior
análise qualitativa. Pois, de acordo com Lima e Mioto (2007), o levantamento de dados e a pesquisa
bibliográfica proporcionam apontamento de lacunas no campo, o que favorece ao desenvolvimento
de outras questões sobre o tema investigado.
O primeiro foi a realização de leituras sobre o contexto do tema de pesquisa bem como a revisão
de literatura. Esse primeiro passo se justifica pela imersão do pesquisador no tema de pesquisa,
corroborando para a compreensão do mesmo sobre o que tem sido produzido no campo. O segundo
passo foi a escolha das revistas e posteriormente a construção do banco de dados, que dispõe a
oportunidade de organização, visualização e melhor compreensão e análise dos dados coletados, e
por fim, realizou-se uma análise sobre os dados coletados.
Pensando em quantificar a produção sobre a infância no campo da história da educação, o
segundo passo foi a escolha da base de dados em que fosse realizado em levantamento. A princípio,
foram pensados como base de busca os congressos no campo da história da educação; o banco
de teses e dissertações da Capes; e as revistas representativas da área. Contudo, acreditando na
riqueza de informações que os periódicos podem nos oferecer, optou-se por privilegiar as revistas,
consideradas por Galvão et al. (2008) como um dos principais meios de comunicação e circulação de
conhecimento do campo.
Portanto, as revistas escolhidas foram: a Revista de História da Educação, a Revista Brasileira de
História da Educação, os Cadernos de História da Educação e a Revista de História e Historiografia da
Educação. Segundo Galvão et al. (2008), pode-se afirmar que esses periódicos são consolidados no
campo da educação brasileira. Percebendo o grau de excelência dessas revistas, tem-se a exigência
mínima de doutores, podendo, quando publicar, no máximo três pessoas. Ainda assim, uma delas
deve ter titulação de doutor, tendo os demais títulos de mestre. Essas revistas têm como função
divulgar reflexões históricas, qualificando o debate acerca da educação do país.
Escolhidas as revistas, o próximo passo foi buscar, em seus sites de divulgação, os artigos
que tomavam a infância como objeto de pesquisa. Para isso, foi utilizado o recurso de “busca”,
disponibilizados pelas páginas de acesso online dos referidos periódicos. As palavras-chave
utilizadas foram: infância, criança, menor e infantil. Os artigos localizados tiveram seus resumos
lidos para verificar se estavam inseridos no objetivo deste trabalho. Para facilitar e melhorar a
compreensão dos dados, os artigos identificados foram lançados em um banco de dados com as
seguintes informações: número de anos de circulação, ano de circulação, edição e volume, título do
artigo, autores e local onde esses autores atuam.
A partir, do banco de dados, construiu-se uma tabela elucidativa com as informações coletadas.
Calculou-se a porcentagem referente ao quantitativo do objeto de pesquisa (infância) mostrando o
quanto ele é pesquisado no campo de história da educação. Em seguida, atentou-se para os detalhes
que cada revista, em seu exemplar e seu ano, informava, analisando-os. Tais procedimentos se
justificam pelo viés da pesquisa, que é a análise do quantitativo de pesquisa sobre a infância no
campo da história da educação.
O recorte temporal adotado neste trabalho, (1997 a 2017), corresponde à publicação do primeiro
exemplar pesquisado das revistas escolhidas e vai até o último exemplar disponibilizado para
a consulta. Portanto, verifica-se a importância dessa pesquisa, pois, ela apresenta reflexões e
questionamentos sobre o objeto de investigação “infância”.
A partir do levantamento realizado nos exemplares das quatro revistas, percebe-se que as
publicações sobre o objeto de pesquisa “infância” são bastante reduzidas no campo de pesquisa
da história da educação. Dos 1405 artigos publicados, somente 94 falam de alguma forma sobre
a infância. Assim, percebe-se que a infância ainda está à margem das pesquisas no contexto de
história da educação.
A infância é muito pouco mobilizada no campo da história da educação. Essa afirmativa é
respaldada pelo trabalho de Galvão et al. (2008), que já anunciavam a pouca produção sobre a
infância na Revista Brasileira de História da Educação, no período entre 2001 e 2007. A pesquisa
apontava apenas duas publicações referentes a infância em meio a uma profusão de temas de
investigação, mais explorados no campo. Isso aponta para a necessidade de busca de novas fontes
e novos interesses e perguntas de pesquisa em que a infância possa estar inserida. Pois, a partir
de pesquisas que tomam a infância como objeto de investigação, torna-se possível perceber
informações diversas sobre a educação que são postas em circulação.
Acredita-se que um possível investimento nas pesquisas sobre a infância poderia corroborar
com o entendimento dos processos de escolarização e de educação ao longo da história brasileira,
XII COLUBHE - ANAIS DE RESUMOS • 1025
assim como em seu processo de formação e constituição enquanto um sujeito social historicamente
situado. Ademais, poderiam contribuir, também, com questões relativas ao currículo, à relação
família e escola, a relação família e criança, as relações políticas e sociais, colaborando para uma
melhor compreensão da diversidade da infância e da educação no país.
Referências
GALVÃO, Ana Maria et al. Difusão, apropriação e produção do saber histórico: a Revista Brasileira de
História da Educação (2001-2007). In: Revista Brasileira de História da Educação, n. 16, p. 171-243,
jan./abri. 2008.
KUHLMANN JR. Moysés. Infância e educação infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre:
Mediação, 2001.
Este trabalho[1] apresenta análises iniciais sobre a história da escolarização da criança pobre e
o desenvolvimento das caixas escolares no Rio Grande do Sul no período de 1917 a 1929. A caixa
escolar foi criada com objetivo de promover a filantropia dos alunos mais ricos com os mais pobres,
além de propiciar a frequência dos alunos pobres com auxilio de insumos como roupas, alimentos e
transporte. Tais considerações foram realizadas a partir das análises da legislação[2] do Rio Grande
do Sul e dos relatórios[3] oficiais da Instrução Pública.
A caixa escolar, como objeto de pesquisa, ainda é pouco analisada no Brasil. Durante o processo de
produção deste trabalho, realizou-se um levantamento bibliográfico em que apenas três dissertações
que tratam sobre o assunto foram encontradas. A primeira é de Fabiana Bernardo e foi realizada
na Universidade Federal de Minas Gerais. Nela a frequência é central no desenvolvimento da caixa
escolar em Minas Gerais; a análise se concentra entre os anos de 1911 a 1913. A segunda autora é
Priscilla Bahiense, cujo trabalho, também realizado na Universidade Federal de Minas Gerais, enfoca
a filantropia e analisa os discursos da população para implementação da caixa escolar. Sua análise
se detém nos anos de 1911 a 1918. A terceira autora, Sélia Zonin, analisou o estado de Santa Catarina,
e sua dissertação foi defendida na Universidade do Estado de Santa Catarina. Nesse trabalho, cujo
enfoque é os de 1938-1945, pesquisou-se mais sobre o auxílio da caixa à frequência, não enfatizando
a filantropia realizada para que esses alunos se mantivessem na escola.
Para o estudo aqui proposto, importa observar que a partir da constituição do Império, a escola
passou a ser legalmente acessível a toda população. Aos poucos, no século XX, essa acessibilidade
foi ganhando caráter de direito dos cidadãos. Todavia, o Estado não assumiu por completo, desde
o início, a responsabilidade de fornecer auxílios para que todos pudessem frequentá-la como a
lei da obrigatoriedade escolar[4] instituía. Dessa forma, alguns projetos foram estabelecidos com
a finalidade de atribuir responsabilidades educativas aos particulares e às famílias. Um desses
projetos foi a caixa escolar, objeto de estudo desta pesquisa em que a sistematização da constituição
da caixa escolar se evidenciou pela análise da legislação do Rio Grande do Sul, cujo incentivo recaía
sobre a filantropia discente.
Ademais, a legislação se destaca na produção de discursos com o objetivo de atrair sócios,
inclusive de fora da escola, para que pudessem financiar a educação dos alunos pobres. Além disso,
analisaram-se os relatórios da Instrução Pública no Rio Grande do Sul, em especial naquilo que se
referia ao número de alunos auxiliados, e os insumos oferecidos para permanência dos alunos na
escola.
A primeira caixa escolar no Rio Grande do Sul data de 1917 de acordo com os relatórios oficiais da
instrução pública. No entanto, é apenas em 1927 que surge a primeira legislação que a regulamenta.
Nessa lei, o caráter filantrópico da caixa escolar fica bastante evidente, pois ela seria fundamental
para o desenvolvimento do altruísmo na criança abastada, visto que, com a filantropia, os alunos
pobres poderiam frequentar a escola, além de serem presenteados com o conhecimento que os
afastaria do obscurantismo da ignorância. Na mesma legislação em que se institucionalizaram os
objetivos da caixa escolar, atribuíram-se as regras de funcionamento e as obrigações dos sócios
que se vinculassem à caixa escolar, além de a dividir em duas carteiras, sendo uma econômica e a
outra beneficente. No decurso das análises, foi possível compreender o funcionamento de ambas as
carteiras na prática escolar cotidiana.
A carteira beneficente, cujos sócios podiam ser tanto alunos e professores, quanto pessoas
estranhas à escola, possuía a função de compra de materiais, comida e roupas para os alunos pobres.
Já a carteira econômica, cujos sócios não podiam ser de fora do corpo escolar, não era tão específica
em relação aos valores arrecadados e aos gastos realizados.
Apesar de a caixa escolar datar de 1917, apenas a de Passo Fundo começou a operar nesse mesmo
ano; as outras tardaram até cinco anos para o início do funcionamento. Dessa forma, é apenas
em 1923 que elas passam a ser detalhadas com valores gastos, saldos e descrição dos materiais
adquiridos e dos alunos auxiliados. Tal data, posterior em seis anos à criação da primeira caixa
escolar, deve-se ao grande número de caixas instaladas em 1922. Portanto, é apenas em 1923 que as
caixas escolares aparecem nos relatórios como indicador de auxílio aos alunos pobres.
No relatório da Instrução Pública de 1923, são citados os anos de criação da caixa escolar nos
Colégios Elementares e nos Grupos Escolares. Ademais, esse relatório conta com dados bastante
descritivos permitindo constatar que a maioria dos auxílios se dava a partir da compra, através
dos valores arrecadados na carteira beneficente, e doação de roupas. Em outros relatórios, esses
insumos variam desde alimentos até passagens de bonde. Porém, em alguns anos, não foram
encontrados dados específicos de quantos alunos foram auxiliados, constando apenas os valores
recebidos de doações e os valores gastos para compra de insumos. Nos relatórios da Instrução
Pública, é possível notar que a preocupação com a frequência dos alunos pobres era muito mais
evidente do que a filantropia.
O período de análises dos relatórios e da legislação finaliza em 1929, pois, entre 1929 e 1930, em
função do movimento político que ocorreu em 1930 no país, que levou Getúlio Vargas a assumir a
presidência da República, os relatórios da Instrução Pública no Rio Grande do Sul se modificam e sua
publicação fica suspensa durante um período, impedindo mais análises sobre a caixa escolar nessa
primeira etapa de pesquisa.
Em síntese, neste trabalho pretendeu-se destacar a finalidade e o funcionamento da caixa escolar
nos Colégios Elementares e Grupos Escolares no Rio Grande do Sul durante o período de 1917-1929. Pela
análise da legislação, constatou-se que a filantropia foi central na instauração da caixa escolar, sendo,
na legislação, mais importante que a manutenção da frequência dos alunos pobres. Nos relatórios,
por outro lado, destacam-se as considerações acerca da importância da caixa escolar para a garantia
a ida à escola pelos alunos pobres auxiliados por esses recursos. Tais resultados demonstram que o
desenvolvimento da caridade entre os alunos mais ricos promovia uma noção de elite benfeitora, que
contribuiria para o desenvolvimento do país, em concordância com a política local, que incentivava
que o Estado necessitava da ajuda dos particulares para desenvolver a educação.
Desse modo, a pesquisa contribui para a compreensão do conjunto de questões que colaborou
com a possibilidade de grupos historicamente excluídos da escola frequentarem essa instituição,
além de permitir compreender outros aspectos, que tem sido ainda pouco pesquisados no Rio
Grande do Sul e no Brasil, sobre a instauração da caixa escolar no estado.
Referências
BAHIENSE, Priscilla Nogueira. A fim de “arrancar do erro e da ignorância pequeninos seres”: as
caixas escolares em Belo Horizonte (1911-1918). Dissertação (Mestrado em Educação). Faculdade
de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2013.
LUCHESE, Terciane Ângela. História da obrigatoriedade escolar no Rio Grande do Sul. In: VIDAL,
Diana Gonçalves; SÁ, Elisabeth Figueiredo de; SILVA, Vera Lúcia Gaspar da. Obrigatoriedade escolar
no Brasil. Cuiabá/MT:EDUFMT, 2015. P. 275- 301.
ZONIN, Sélia Ana.A caixa escolar na escolarização da infância catarinense (1938-1945). Florianópolis:
UDESC, 2017. 107 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação,
Faculdade de Educação, Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2017.
[1] O presente trabalho foi realizado com apoio da Pró-Reitoria de Pesquisa da Universidade à qual estou vinculada
através da bolsa de Iniciação Científica.
[2] A Legislação da Instrução Pública analisada para produção deste trabalho refere-se aos anos de 1876, 1897, 1898,
1906,1909 e 1927.
[3] Os Relatórios da Instrução Pública analisados para produção deste trabalho referem-se aos anos de 1909 a 1929.
[4] A obrigatoriedade escolar no Rio Grande do Sul foi proclamada a partir da lei 771 de 4 de maio de 1871 (LUCHESE,
2015)
ISSN 2358-3959
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A pesquisa tem como objetivo compreender a expansão do ensino primário em Maricá, município
localizado no interior do estado do Rio de Janeiro, durante a Primeira República (1889-1930), por
meio, em especial, das escolas rurais existentes, considerando o discurso educacional em voga, as
alianças políticas e a posição ocupada pela cidade no cenário econômico fluminense.
A partir de uma leitura crítica de literatura sobre o tema, embasada nas produções de Dias
(2012), Leal (2013), Pinto (1998), Schueler e Magaldi (2009), Souza (2008) e outras fontes, tais como:
mensagens dos presidentes de estado do Rio de Janeiro, relatórios dos diretores de instrução
pública, exemplares do jornal O Paiz, ofícios, nomeações de professores e mapas escolares, oriundos
do Fundo Departamento de Educação, do Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ), que
é dividido por municípios e catalogado como dossiês, sendo cada um identificado por números. No
que se refere ao recorte estudado, constam mapas escolares de Maricá dos anos de 1926 a 1930.
Maricá era um município predominantemente agrícola e sua base econômica advinha dos gêneros
alimentícios produzidos em grandes latifúndios, com a finalidade de abastecer o Distrito Federal e a
capital fluminense, a cidade de Niterói. Existiam atividades urbanas, em menor grau, como olarias,
exploração de minerais e comércio. De maneira a escoar a produção mais rapidamente, a construção
da estrada de ferro foi uma opção adotada pela classe dirigente local ainda no período imperial.
A escola primária fluminense situa-se em um contexto histórico em que tanto o movimento
abolicionista quanto o republicano haviam eclodido e forças sociais influenciaram no surgimento
de ideias, na formulação de novas políticas educacionais e modelos pedagógicos. Nesse sentido, a
educação era considerada a mola propulsora para o desenvolvimento econômico e a modernização
do país, sendo essencial para a manutenção do regime. Assim, a escola assume um papel civilizador
do povo, devendo oferecer o “desenvolvimento de virtudes morais, de sentimentos patrióticos e de
disciplina na criança”. (SCHUELER; MAGALDI, 2009, p. 45)
A educação maricaense tinha o papel de formar o trabalhador rural, municiá-lo de saberes
elementares para aprender novas técnicas de manejo da terra e, assim, elevar a produtividade
agrícola, tendo em vista o cumprimento da “vocação agrária” do local e do estado. Atrelado aos
interesses econômicos ruralistas, o caráter civilizatório fazia parte do cotidiano escolar com o intuito
de ensinar valores morais e hábitos ligados à higiene.
Os proprietários rurais eram os principais líderes políticos e viam a instrução como uma
importante aliada na obtenção de votos ao prover a alfabetização do povo, de tal modo que
muitos deles permitiam a utilização do espaço de suas fazendas para atender os filhos, os próprios
funcionários e a comunidade. Vale ressaltar que parte desses agricultores já possuía formação em
nível superior, compondo um grupo letrado que confiava no potencial progressista da educação,
inclusive exercendo cargos na esfera estadual e nacional.
Claudiani F C Rodelini
O presente trabalho vincula-se ao campo da História da Educação, cujo foco principal está ligado
ao estudo da atuação religiosa e educacional da Congregação das Irmãs Franciscanas da Penitência
e Caridade Cristã, oriundas da Província do Rio Grande do Sul, que migraram para o sul de Mato
Grosso[1], a partir de 1954 mais precisamente se dirigiram para os municípios de Rio Brilhante,
Dourados e Itaporã. Para tanto, esse trabalho busca analisar os fatores que contribuíram para a
vinda dessas Irmãs franciscanas ao município de Itaporã, bem como compreender suas ações
educacionais e religiosas no período de 1958 a 1972. A delimitação temporal da pesquisa tem como
marco inicial o ano de 1958, com a chegada da congregação das Irmãs Franciscanas da Penitência e
Caridade Cristã ao município de Itaporã, e finda no ano de 1972, por sinalizar o período em que as
Irmãs enceraram suas atividades no Hospital Cristo Redentor e também deixaram a administração
do Grupo Escolar Antônio João Ribeiro em Itaporã. No que diz respeito à delimitação espacial, este
trabalho justifica-se por deslocar a atenção da história dos grandes centros urbanos e dos grandes
acontecimentos para a história do interior de estados brasileiros situados na região centro-oeste
do país, e mais precisamente para o município de Itaporã localizado na região sul do estado de
Mato Grosso, que foi palco da criação da Colônia Municipal de Dourados (CMD), entre os anos de
1946 e 1953. Nesse período, o Sul do então estado de Mato Grosso, espaço de fronteira devido à
proximidade com o Paraguai, recebeu grande contingente populacional, a partir de 1946, quando a
Prefeitura do município de Dourados decidiu criar uma base para a colonização, tornando-se espaço
povoado por “não índios”, já em 1948. A pesquisa se constituiu de fontes documentais oriundas da
Diocese de Itaporã, como as “crônicas”, livro Tombo da Paróquia São José de Itaporã, documentos
do Lar menino Jesus, arquivos escolares, documentos do Centro de Documentação Regional
(DCR), e do arquivo público de Cuiabá-MT. Também foram incorporados ao trabalho entrevistas e
os documentos dos acervos fornecidos por sujeitos que vivenciaram o cotidiano da congregação
no período delimitado para o estudo. Para as entrevistas selecionamos duas irmãs cujas trajetórias
de vida estão permeadas por temas que versavam sobre suas vivências individuais e sobre o
cotidiano da Missão Franciscana em Itaporã. As duas Irmãs foram professoras e diretoras de escolas
que estavam sobre a administração da Congregação Franciscana. Irmã Lúcia Valesca Wolfart, ao
relembrar o cotidiano vivido pelas Irmãs, afirmou que além dos trabalhos escolares, acontecia uma
forte atuação na catequese e obras assistencialistas. De acordo com as crônicas da Escola Santo
Antônio (1958-2002). Em novembro de 1968, o Conselho Provincial resolveu assumir o Hospital
Beneficente de Itaporã, que na prática já estava em pleno funcionamento, pois os médicos: Nelson
Kosorowski e Arlindo Sulzbacher já haviam transferido seus consultórios para o primeiro piso do
prédio do Instituto Santo Antônio. Ao que indicam as fontes arroladas, para sair em missão, as Irmãs
se preveniam para atender ao tripé: evangelização, saúde e escola (objetivos característicos da
congregação das Irmãs Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã. As entrevistas foram realizadas
por meio de um roteiro com questões semi estruturadas e utilizou-se da técnica do gravador. Após
a coleta das entrevistas, todas elas foram transcritas para posterior análise. Todos os entrevistados
assinaram um Termo de Livre Consentimento Esclarecido (TECLE), concedendo os direitos de usos
dos dados na pesquisa. Essas fontes foram analisadas à luz dos conceitos de “estratégias” e “táticas”
de Certeau (1994). As estratégias, segundo Certeau (1994), representam a capacidade de “produzir,
mapear e impor” o “lugar do poder” almejado pelo estrategista que busca meios de manutenção
dentro de relações externas. Já as táticas, por sua vez, são apresentadas por Certeau (1994) como
“ações desviacionistas que geram efeitos imprevisíveis”. Os resultados apontaram que as Irmãs
Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã chegaram ao município de Itaporã no ano de 1958,
poucos anos depois de sua emancipação como distrito do município de Dourados, convidadas por
famílias e políticos de Itaporã para residir no município e assim prestar serviços educacionais. Essas
irmãs foram escolhidas para virem para Itaporã por já terem instrução e experiência na área da
educação, segundo dados da entrevista com a Irmã Maria Sérgia Wolfart (2013). Quando essas Irmãs
chegaram ao município de Itaporã em 1958, havia duas escolas na cidade, a Escola Reunida de Itaporã
e o Grupo Escolar Antônio João Ribeiro. Nessas circunstâncias, no dia primeiro de março de 1958, as
Irmãs iniciaram suas atividades no Grupo Escolar Antônio João e, neste mesmo ano, a Irmã Paulina
(Tecla Neutsling) foi nomeada para exercer o cargo de diretora do Grupo Escolar Antônio João Ribeiro.
Ainda no ano de 1958, a Irmã Tarcisia Kleinubing chegou à cidade de Itaporã e assumiu o cargo de
superiora da comunidade. Na década de 1960, as Irmãs ampliaram ainda mais suas atividades em
Itaporã, com a chegada de novas religiosas pertencentes à Congregação, a Irmã Veronica Willers, por
exemplo, foi nomeada diretora da Escola Reunida de Itaporã em 1961. Além disso, as Irmãs criaram e
colocaram em funcionamento um Jardim de Infância Paroquial, para atender as crianças que ainda
não tinham idade para frequentarem o Grupo Escolar Antônio João Ribeiro e Escola Reunida de
Itaporã. Essas novas religiosas também tiveram o propósito de providenciar a construção do Instituto
Santo Antônio, esta era a finalidade, sobretudo da Irmã Anizia Seidel. A esse respeito, em entrevista
Maria Sérgia Wolfart (2019) relatou que o Instituto Santo Antônio tinha o objetivo de ser uma escola
confessional católica particular nos mesmos moldes da Escola Imaculada Conceição, que já havia
sido construída em Dourados e estava sob a administração da congregação Franciscana. Essas
Irmãs também passaram a ofertar a comunidade da cidade e até mesmo das áreas rurais, cursos
de corte e costura. Mesmo com todos os compromissos educacionais que as Irmãs Franciscanas da
Penitência e Caridade Cristã assumiram em Itaporã, essas religiosas tinham como grande interesse
a ampliação da fé católica dessa localidade e de seu entorno, fato esse bem evidenciado, no ano
de 1959, quando dos 45 alunos formandos no Grupo Escolar Antônio João Ribeiro, onde as Irmãs
estavam à frente da direção dessa instituição escolar, 09 eram juvenistas, ou seja, um jovem que se
prepara para a vida religiosa. Desse modo, pôde-se observar que, historicamente, esta congregação
teve suas singularidades vinculadas à expansão da Igreja Católica, a qual utilizou como estratégia
o investimento, sobretudo, na educação. Aspecto esse evidenciado, na atuação que essas Irmãs
Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã tiveram no Sul de Mato Grosso, como no município de
Itaporã, onde as religiosas exerceram papéis importantes no processo de escolarização da localidade,
papéis esses que permitiam que elas colocassem em funcionamento algumas “estratégias” e
“táticas”, conforme menciona Certeau (1994), que possibilitaram as essas religiosas ao mesmo
tempo trabalharem na educação formal na localidade, vinculando este trabalho também a difusão
da religião católica, pois, até mesmo em espaços escolares pertencentes à iniciativa pública, como
era o caso do Grupo Escolar Antônio João Ribeiro, em Itaporã, uma instituição pertencente ao estado
de Mato Grosso, elas conseguiam com o seu trabalho educacional atrelar ao Catolicismo. Assim, foi
possível destacar o papel dos principais agentes sociais dessa construção histórica e identificar a
contribuições das Irmãs Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã no processo de educação no
sul de Mato Grosso, no Município de Itaporã.
REFERÊNCIAS
CERTEAU, M. de. A invenção do cotidiano: 1. Artes de fazer. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.