Revista o Biologo 57
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O BIÓLOGO | JUL/AGO/SET 2021 | 3
EDITORIAL
Caros leitores,
Encaminhamo-nos para o fim do ano de 2021 observando que a superação da grave crise
sanitária, que já vitimou quase 600 mil brasileiros, ainda segue lentamente, sem previsão
segura de término. Um relatório recente da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiver-
sidade e Serviços Ecossistêmicos (Ipbes) alerta para o risco da eclosão de novas pandemias,
caso não haja uma reversão do processo de degradação ambiental e de perda da biodiver-
sidade, conforme destacamos na reportagem de capa desta edição.
A próxima COP-15 da Convenção da Biodiversidade (CDB) oferecerá uma oportunidade para
que os países se mobilizem num esforço mundial para deter o acelerado processo de extin-
ção de espécies. A reportagem mostra o trabalho de Biólogos brasileiros na conservação da
biodiversidade em iniciativas internacionais, como a CDB e a Ipbes, e nacionais, como a Pla-
taforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (Bpbes) e o Instituto Virtual
da Biodiversidade (Biota-Fapesp), aqui em São Paulo.
O texto destaca o trabalho de Biólogos registrados no CRBio-01 na conservação da biodi-
versidade no Pantanal. Na APA Baía Negra, em Ladário, nos deparamos com um caso con-
creto de uma população ribeirinha que zela pela proteção do meio ambiente, em linha com
estudos mundiais que valorizam a atuação e saberes de povos tradicionais. Conhecemos
também a atuação de nossos colegas tanto em diagnósticos macros sobre as ameaças ao
Pantanal, quanto em pesquisas sobre a perda da chamada biodiversidade oculta.
A reportagem também apresenta o engajamento de profissionais registrados no nosso
conselho na conservação ex situ, complementar ao in situ, que oferece boas oportunidades
profissionais, e um trabalho importante em zoológicos e aquários com 25 espécies brasilei-
ras em risco de extinção.
Em complementação ao texto, assista aos vídeos com entrevistas com os Biólogos Carlos
Joly e Cristiana Seixas e ouça os podcasts com os colegas Horacio Teles e Dione Meger.
Na seção de resenha de documentários, tratamos de Rompendo barreiras: nosso planeta,
que examina os limites planetários propostos por um grupo de 28 especialistas mundiais
liderados pelo cientista sueco Johan Rockström.
A resenha de tese apresenta o trabalho da Bióloga Alice de Moraes, que identificou iniciati-
vas na área rural do município de São Luiz do Paraitinga (SP) enquadradas no conceito de
ecosystem stewardship.
Na seção “Em Campo”, conheça a rotina de trabalho do Biólogo Cauê Monticelli, da Fun-
dação Parque Zoológico de São Paulo, pela conservação da perereca-pintada, uma espécie
sob risco de extinção.
E na seção “Grandes Biólogos”, contamos com satisfação a linda história de amor, entre si
e com a Biologia, do casal Arnildo e Vali Pott, referência em estudos da flora do Pantanal.
Boa leitura!
O trabalho de
Biólogos e Biólogas
pela conservação de
espécies no país mais
biodiverso do mundo
BIODIVERSIDADE
AMEAÇADA
A PARTICIPAÇÃO da comuni- versidade, foi ratificada por fazer história com a assina-
dade científica brasileira – lide- 196 países e consolidou-se tura de documentos com
rada por Biólogos e Biólogas –, como o principal articulador um conjunto de metas para
diplomacia e terceiro setor no das ações para conservação os próximos dez anos e ob-
esforço para reverter o acele- da biodiversidade planetá- jetivos amplos para 2050. O
rado processo global de per- ria. Nas reuniões das partes acordo substituirá as Metas
da da biodiversidade pode ser (COPs) da CDB, realizadas de Aichi, estabelecidas na
ilustrada pelo fato de a assina- a cada dois anos, represen- COP-10, no Japão, para o pe-
tura da Convenção Sobre Di- tantes dos governos discu- ríodo de 2010 a 2020.
versidade Biológica (CDB) ter tiram e assinaram compro- Depois de dois adiamen-
acontecido no Brasil, durante missos para o cumprimento tos devido à pandemia, é
a Conferência das Nações Uni- de metas e tratados especí- grande a expectativa de es-
das sobre o Meio Ambiente e o ficos sobre biodiversidade. pecialistas e governos pela
Desenvolvimento (Rio-92). A COP-15, que começa em COP-15, que será realizada
A CDB, também conhecida outubro deste ano em Kun- em dois momentos: uma
como Convenção da Biodi- ming, na China, promete versão híbrida (virtual e pre-
ção foram criadas no papel e não foram implementadas. mento global e perda da
Em outros aspectos, especialmente os drivers que estão biodiversidade, estão inter-
por trás das cinco principais causas da perda de biodi- conectados e deveriam ser
versidade, praticamente não avançamos. Quais são os discutidos conjuntamente”,
drivers que estão por trás do desmatamento? É o avan- pondera Carlos Joly.
ço da fronteira agrícola, da pecuária, para a abertura de
novas áreas para pastagem, da grilagem de terras públi- Ipbes, Bpbes e Biota
cas? Quais são os drivers que levam ao aumento da po- Biólogos e Biólogas são pro-
luição? Não estamos controlando as emissões industriais tagonistas no esforço de pre-
e domésticas, não temos um sistema de saneamento servação da biodiversidade.
adequado, e principalmente não estamos diminuindo a Eles integram equipes mul-
queima de combustíveis fósseis e a produção de plástico. tidisciplinares em organiza-
A ideia da convenção é que, de 2020 a 2030, a gente con- ções internacionais, como a
siga estabelecer todos os mecanismos necessários para Ipbes, cuja secretária executi-
reverter as forças que estão causando esses problemas. va é a francesa Prof. Dra. Anne
Tudo isso tem que estar estabelecido e funcionando en- Larigauderie, que tem mes-
tre 2020 e 2030, para que até 2050 a gente tenha reverti- trado em Biologia Molecular
do esse processo, atingindo a meta de viver em harmo- e doutorado em Ecologia.
nia com a natureza. Essa é a proposta ambiciosa dessa Sediado em Bonn, na Ale-
COP, que vai precisar ser bastante negociada para que manha, a Ipbes é uma orga-
todos os países adotem e sigam as decisões. nização intergovernamental
criada em 2012 e atualmen-
Nas negociações, há divergências entre países te com 137 países-membros.
desenvolvidos e em desenvolvimento? Ela foi concebida para exer-
A tensão é muito grande. Nós, países do hemisfério sul, cer um papel similar ao do
de uma maneira geral, América Latina e África, e tam- Painel Intergovernamental
bém parte do Sudeste Asiático, detemos a maior par- sobre Mudanças Climáticas
te da biodiversidade, mas não temos a tecnologia para (IPCC) para as questões do
usá-la de forma sustentável. Toda briga é sobre a trans- aquecimento global.
ferência de tecnologia. Nós não queremos ser somente A Dra. Cristiana Simão Sei-
fornecedores de matéria prima da nossa biodiversidade xas (veja entrevista na pági-
para indústria farmacêutica, de cosméticos e de alimen- na 12), Bióloga pesquisadora
tos no hemisfério norte, como somos fornecedores de do Núcleo de Estudos e Pes-
commodities de grãos e minérios. Nós queremos traba- quisas Ambientais (Nepam)
lhar a biodiversidade, desenvolver fármacos e alimentos da Unicamp, relata que ao
a partir da nossa biodiversidade, agregando valor a ela. menos 15 brasileiros com
Os países megadiversos querem a tecnologia. O hemis- formação em Ciências Bio-
fério norte quer que nós aumentemos as nossas áreas lógicas já contribuíram com
de conservação, preservemos a nossa biodiversidade e a Ipbes. Ela foi cocoorde-
sejamos fornecedores de insumos para a sua indústria. nadora do Diagnóstico Re-
Isso, obviamente, não pode dar certo. Nós temos que gional de Biodiversidade e
participar desse desenvolvimento. A própria Conven- Serviços Ecossistêmicos das
ção da Biodiversidade prevê uma divisão justa e equi- Américas, elaborado de 2015
tativa dos benefícios oriundos do uso sustentável da a 2018, e é editora de revisão
biodiversidade e é essa a briga que coloca os países do do capítulo 2 do Relatório
hemisfério sul contra os do norte. Temático sobre Uso Susten-
Dois sistemas essenciais do Reino Unido foram à Su- O que difere essa produção
para a vida no planeta en- écia roubar rainhas de abe- das demais é a abordagem
contram-se em situação lhas-europeias, que estão integrada dos múltiplos as-
intermediária: a poluição extintas no seu país desde pectos da crise e a busca por
do ar e a poluição quími- os anos 90. Essa espécie é uma visão panorâmica das
ca (por substâncias tóxicas, polinizadora na produção ameaças à vida humana.
plásticos, metais pesados e de alimentos. Em comum com outros do-
contaminação radioativa). A biodiversidade precisa cumentários, a produção
Nesses casos, já ultrapassa- ser protegida não só por alerta para a necessidade
mos a zona de segurança, ser bela ou por termos res- de ações imediatas, confor-
mas ainda não adentramos ponsabilidade moral, mas me enfatiza Rockström: “O
a zona de perigo. também porque é a engre- que fizermos entre 2020 e
Rockström avalia que já ul- nagem fundamental para 2030, considerando os da-
trapassamos as barreiras em termos comida, ar puro, dos que temos hoje, será
quatro sistemas essenciais. água potável, sequestro de decisivo para o futuro da
O primeiro, já citado, diz carbono e reciclagem de humanidade na Terra. O
respeito à elevação da tem- nutrientes. que vai acontecer nos pró-
peratura média global. Pas- Rockström conclama a co- ximos séculos será deter-
samos também dos limites munidade internacional a minado pelas atitudes que
com relação à destruição de estabelecer urgentemente tomarmos nesta década”.
biomas – devido ao desma- um compromisso que fixe Por fim, cabe ressaltar que
tamento e outras alterações como meta zerar a perda de os Biólogos monitoram as
no uso do solo, por exemplo, biodiversidade no planeta. mudanças e eventos do
para produção agrícola – e O documentário analisa in- planeta, levantam dados de
ao uso excessivo de fertili- dividualmente cada um dos tudo o que se relaciona com
zantes, que provoca a eutro- nove sistemas planetários os seres vivos, seus ambien-
fização de corpos de água, essenciais, mas ressalta sua tes e hábitos e ainda desen-
como rios, lagos e oceano. interligação. A Prof. Ricarda volvem alternativas para
O documentário aponta que Winkelmann, que integra uso sustentável de recursos
também entramos na zona a equipe de Rockström no naturais e para a recupera-
de perigo quanto à perda de Instituto Potsdam para Pes- ção de ambientes degrada-
biodiversidade. A Dra. Anne quisa de Impacto Climático, dos, visando ao reestabele-
Larigauderie, da Plataforma afirma: “O sistema plane- cimento do equilíbrio dos
Intergovernamental sobre tário é interconectado. Se ecossistemas e dos biomas.
Biodiversidade e Serviços uma parte do sistema cli- Além de coletores e espec-
Ecossistêmicos (Ipbes), des- mático chegar ao ponto de tadores da riqueza das espé-
taca que um milhão de es- inflexão, aumentará a pro- cies, como foram na era dos
pécies de plantas e animais babilidade de outras partes grandes naturalistas, hoje os
estão atualmente ameaça- do sistema também cru- Biólogos partem para o de-
das de extinção. zarem o limiar crítico, num senvolvimento tecnológico
Rockström conta que um efeito dominó”. em busca de conhecimen-
episódio noticiado pela im- Rompendo barreiras: nos- tos em prol da conservação,
prensa sueca chamou a sua so planeta figura entre as da preservação, da recupe-
atenção para a gravidade várias opções no streaming ração e do uso sustentável
do impacto da perda da de documentários sobre a dos recursos oferecidos por
biodiversidade. Cientistas crise ambiental planetária. nosso planeta.
GERALMENTE a seção
Grandes Biólogos fala de
uma pessoa que se desta-
cou em seu campo na Bio-
logia. Desta vez, falaremos
de dois profissionais, que português. Conheceram-se Bilac & E.M. Bonfim – aju-
não apenas se destacaram, aos 18, em Panambi, em dou a despertar o interesse
mas também fizeram isso uma festa de Ano Novo, à pela natureza do país. O avô
juntos, em um trabalho tão meia noite. Vali conta que ficou impressionado que
interligado que seria difícil “Feliz Ano Novo” foram as ele não largava o livro e dizia
tratar dos dois separada- primeiras palavras que dis- “estuda para ser professor,
mente: Arnildo e Vali Pott. seram um ao outro – e não poderás usar terno branco,
O casal Pott é conhecido se separaram mais. Em co- fumar charuto e ter o res-
por sua grande contribui- mum, já tinham o interesse peito de todos”.
ção à Botânica brasileira, por Botânica. “Eu tinha 13 anos quando
especialmente da região do “De família já temos esse entrei para a escola agrícola
Pantanal, onde se radica- pendor por plantas. Diziam de Panambi. Chegou uma
ram nos anos 1980. Mas sua que a mãe da Vali tinha um coleção de mudas e semen-
história de amor – um com jardim botânico no quintal. tes e eu comecei a copiar
o outro e com a Biologia – A minha mãe gostava mais os nomes científicos”, conta
data de muito antes. de plantas comestíveis, mas ele. “Um professor disse que
Nasceram em 1946, no Rio tinha flores também”, relata eu iria ficar louco com todos
Grande do Sul, Arnildo em Arnildo. aqueles nomes. Mas o dire-
Panambi e Vali em Cara- Arnildo conta que, aos 7 tor disse: deixa ele, ele já está
zinho. Descendentes de anos, um pequeno livro, louco por isso. Esse diretor
imigrantes alemães, apren- clássico de sua época – sempre dizia que eu tinha
deram alemão antes do Atravez do Brazil, de Olavo que fazer faculdade”. Era o
A fotografia de autoria de Thais Martins (@thaismartins_bio) foi a mais curtida com a hashtag
#MinhafotonoCRBio01 no terceiro trimestre de 2021. Para divulgar suas fotografias com o #CR-
Bio01, compartilhe seu trabalho e use a hashtag #MinhafotonoCRBio01 no Instagram!
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