Convergências Entre Os Modelos de Piaget e Fuster
Convergências Entre Os Modelos de Piaget e Fuster
Convergências Entre Os Modelos de Piaget e Fuster
Cérebro e Mente:
Convergências entre os modelos de Piaget e Fuster
Helena Vellinho CORSO
uma vasta literatura que trata dos mecanismos psicofísicos e neurais da interação sensó-
rio-motora, a base da neurocibernética e da robótica.
Coll (2004) argumenta que a ideia original do construtivismo teve uma pri-
meira formulação articulada e precisa nos trabalhos de Piaget e colaboradores, sendo
que esta ideia caracteriza um determinado paradigma do psiquismo humano. Segundo
tal paradigma o conhecimento resulta de uma dinâmica de interação entre as caracterís-
ticas do objeto e os aportes do sujeito, sendo fruto, portanto, da atividade mental cons-
trutiva
cognits – a partir do ciclo percepção-ação. Tal ciclo vai dando lugar, pelo próprio funci-
onamento cerebral, e a partir de redes já presentes no início do desenvolvimento (estru-
turas inatas, ou memória filogenética), à formação de redes neurais progressivamente
mais complexas. O modelo apresenta toda a organização hierárquica dessas redes neu-
rais – redes cognitivas, ou, ainda, memórias – no córtex cerebral. Enquanto as redes per-
ceptivas localizam-se no córtex posterior, as redes motoras ou executivas encontram-se
no córtex frontal. Essa distribuição não é casual: nos mamíferos o eixo nervoso divide-se
longitudinalmente em duas partes, cada uma dedicada a uma das duas funções que são
as funções por excelência do sistema nervoso: a parte posterior para a função sensitiva,
e a anterior para a ação. Nos primatas, as áreas posteriores do córtex são dedicadas à
sensação, e as frontais ao movimento. No córtex cerebral humano, vemos isto aplicado
também às funções cognitivas, já que o córtex occipital, parietal e temporal dão suporte
à percepção e à memória perceptiva, enquanto o córtex frontal dá suporte à ação e à
memória executiva ou motora.
longo prazo que foram evocados e reativados por inputs sensoriais. Deste modo, os in-
puts novos vão estabelecer novos links associativos com links mais antigos, já estabele-
cidos. Assim, novas memórias, ou novas redes, são expansões de redes anteriores.
1 As áreas primárias, também chamadas de áreas de projeção, estão diretamente relacionadas com a motri-
cidade ou a sensibilidade. As áreas associativas são de dois tipos - de associação unimodal (envolvidas no
processamento do mesmo tipo de informação que as áreas primárias às quais elas se encontram bem pró-
ximas), e de associação heteromodal ou supramodal (relacionam informações de diferentes modalidades)
(Cosenza, 2004). Nos seres humanos, cerca de 75% do córtex cerebral está formado por áreas de associação;
elas integram informações variadas dos córtices senosoriasis e enviam a informação integrada ao córtex
motor, dando início ao comportamento intencional e à expressão de pensamento lógico e refletido (Ster-
neberg, 2008).
Fuster explica que, de modo muito parecido com o que acontece nas áreas
corticais posteriores, as áreas frontais abrigam também uma hierarquia, mas aqui envol-
vida com a representação e o processamento da ação. No nível mais baixo desta hierar-
quia frontal está o córtex motor primário. Acima dele estão as áreas de associação uni-
modal, e acima destas estão as áreas do córtex pré-frontal. A memória motora, portanto,
também é hierárquica, como a memória perceptual, e as memórias motoras são repre-
sentadas de uma maneira ordenada naquela hierarquia das áreas frontais. Mais ainda,
de forma similar ao modo como a percepção é processada hierarquicamente no setor
cortical posterior, assim também a ação é processada hierarquicamente no setor frontal.
A execução de ações motoras resulta em grande medida da recuperação de memórias
motoras, isto é, de redes executivas no lobo frontal, e do seu papel na preparação do
aparato motor para a sua reapresentação.
Nem todos os construtos da ação, mesmo que longos e complexos, estão re-
presentados no córtex pré-frontal, como é o caso das ações de sequência automática ou
bem ensaiadas. As áreas pré-frontais estão envolvidas em ações sequenciadas apenas
durante o estágio de aprendizado da tarefa. Depois é como se o engrama da tarefa, a
memória procedural dela, tivesse migrado para áreas mais baixas da hierarquia frontal.
Mas as variantes novas de estruturas de ação antigas são também representadas no cór-
tex pré-frontal.
que, no caso de gestalts temporais, incluem ordem das ações e também o timing, ou a
habilidade de execução no tempo certo. Importante destacar que, ao aproximar a estru-
tura da ação do conceito de gestalt, isto parece se dar em função da noção de totalidade
presente no conceito. Fuster faz uma ressalva importante ao tomar emprestada a noção
de gestalt, o que o aproxima novamente da posição piagetiana acerca do conhecimento
e do desenvolvimento cognitivo. Ele esclarece que a sua posição diverge da psicologia
da Gestalt no sentido de não concordar com o inatismo que prejudica a teoria gestáltica
clássica. Segundo ele, o organismo não experimenta meramente gestalts temporais; ele
as constrói sob forma de comportamento, com a assistência fundamental do córtex pré-
frontal.
elementos retirados da estrutura anterior, que serão recombinados num novo plano. A
nova estrutura se faz a partir da anterior, ao mesmo tempo que a engloba. Do ponto de
vista psicológico, este processo de abstração é característico do pensamento lógico ma-
temático e se faz sobre as ações ou as operações prévias do próprio sujeito com seus
resultados. Trata-se de um processo de reconstrução, num plano superior, do que foi
transferido ou retirado de um plano inferior, permitindo a integração da estrutura pre-
cedente numa mais rica e de nível superior.
informações relevantes e checar essas informações junto ao esquema de ação e seu obje-
tivo. Essas operações são as funções executivas, que, segundo Fuster, são basicamente
três. Este é um número cardinal: não há uma ordem entre as funções, e elas aparecem
completamente inter-relacionadas, de modo que a descrição separada é feita apenas por
razões operacionais. A atenção executiva, primeira das funções executivas nomeadas
pelo autor, adota três formas complementares: preparação, memória de trabalho, e con-
trole da interferência. A segunda função é o planejamento, e a terceira é a tomada de
decisão. Tais funções não correspondem a localizações anatômicas, pois são funções in-
tegrativas – integram inputs de muitas regiões corticais e subcorticais, e, portanto, são
distribuídas na corticalidade. Mesmo assim, há um foco de domínio dentro do córtex
pré-frontal.
terceira função executiva, descrita por ele, é definida como a formulação de um curso de
ação com a intenção de executá-la e envolve a análise e avaliação de uma variedade de
itens vindos da percepção sensorial, memória e motivação, sendo que a maioria desses
itens, ou todos eles, podem ser inconscientes.
Considerações finais
Referências
COSENZA, Ramon M. Bases estruturais do sistema nervoso. In: ANDRADE, Vivian Maria; SAN-
TOS, Flavia Heloísa; BUENO, Orlando (Org.). Neuropsicologia Hoje. São Paulo: Artes Médicas,
2004, p. 37-59.
FUSTER, Joaquín M. The prefrontal cortex (4th ed.). London: Academic Press, 2008.