Alfabetizacao e Letramento With Cover Page v2
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Alfabetização e Letramento
Fernanda Saldanha
Alfabetização e Letramento
Magda Becker Soares
Antônio Augusto Gomes Batista
Reitora da UFMG Ana Lúcia Gazzola
Vice-reitor da UFMG Marcos Borato
Alfabetização e Letramento
Magda Becker Soares
Antônio Augusto Gomes Batista
Nota: As publicações desta coleção não são numeradas porque podem ser
trabalhadas em diversas seqüências de acordo com o projeto de formação.
CDD - 372.41
FICHA TÉCNICA
Coordenação
Maria da Graça Costa Val
Revisão
Maria da Graça Costa Val
Heliana Maria Brina Brandão
Leitor Crítico
Marco Antônio de Oliveira
Projeto Gráfico
Marco Severo
Editoração Eletrônica
Júlia Elias
Lívia Marotta
Marco Severo
Patrícia De Michelis
Direitos reservados ao Ministério da Educação (MEC) e ao Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (Ceale)
Proibida a reprodução desta obra sem prévia autorização dos detentores dos direitos
INTRODUÇÃO 11
2. O QUE É ALFABETIZAÇÃO? 17
4. O QUE É LETRAMENTO? 49
APÊNDICE 59
Alfabetização e Letramento
u Apresentação do Programa de Formação Continuada
4) ter como centro a prática de ensino e a experiência do educador, para, com essa base, favorecer
a ampliação dos referenciais teóricos e culturais dos docentes e de sua autonomia no trabalho
e em sua própria formação.
Para cumprir esses requisitos, o Ceale preparou esta primeira coleção de oito cadernos,
que se destina à formação teórica do professor e discute conceitos fundamentais para a
compreensão do que sejam os processos de alfabetização e letramento. Entretanto, o
objetivo de formação teórica não distancia os cadernos da prática de sala de aula. Pelo
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contrário, o que eles buscam, primordialmente é articular a teoria com suas possibilidades
Apresentação do Programa de
Formação Continuada
práticas, explorando situações escolares que poderiam ser compreendidas e/ou alteradas
em função da reflexão teórica, além de propor e discutir atividades e exercícios.
Esses cadernos se organizam segundo uma estrutura básica que permitirá ao formador
e ao professor fazerem levantamento de conhecimentos prévios sobre o tema; situarem
a temática na área de conhecimento a que pertence; conhecerem os objetivos de cada
caderno; realizar exercícios de aplicação, que podem se referir à revisão de conceitos, à
reflexão sobre o processo de aprendizagem, a pesquisas e aplicações práticas na sala de aula.
Visando atender as diferentes demandas das redes de ensino, o Ceale elaborou esta
primeira etapa do Programa com uma estrutura maleável, própria para se adequar à diver-
sidade da realidade brasileira. Assim, os oito cadernos podem se organizar diferentemente,
de modo a compor três cursos distintos:
u Caderno 3: Língua, texto e interação (Maria da Graça Costa Val e Martha Lourenço Vieira)
Alfabetização e Letramento
com carga horária de 108h (60h presenciais + 48 não-presenciais)
u Caderno 3: Língua, texto e interação (Maria da Graça Costa Val e Martha Lourenço Vieira)
Cada um dos oito Cadernos apresenta-se em duas versões: uma para o professor que
fará o curso e outro para o formador responsável por ministrá-lo. O Caderno do
Formador traz o mesmo conteúdo do Caderno do Professor, acrescido de orientações
e comentários específicos para quem vai encaminhar o Curso.
Esperamos que nossos Cadernos cumpram os objetivos para os quais foram elaborados, sendo
efetivamente úteis ao seu projeto individual de aperfeiçoamento profissional e ao projeto cole-
tivo de Formação Continuada de Professores assumido por sua escola e seu município.
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Alfabetização e Letramento
u Introdução
O que são a alfabetização e – esse novo conceito – o letramento? Em que consiste alfabetizar
e letrar? Que conhecimentos e capacidades estão envolvidos na alfabetização e no letramen-
to? Qual a importância desses conceitos para a prática de ensino da linguagem escrita?
Discutir, sob um ponto de vista teórico, respostas a essas perguntas é o objetivo cen-
tral deste Caderno. Você pode estar pensando: para que discutir teoricamente, para que
discutir conceitos se os problemas em sala de aula são tão urgentes que queremos
respostas práticas e não teóricas?
Acreditamos que há duas razões que justificam o exame teórico dos conceitos de alfa-
betização e letramento.
A primeira delas é que uma adequada reflexão sobre diretrizes metodológicas, bem como
uma consciente tomada de decisões, em sala de aula, pressupõe, dentre outros fatores, o
conhecimento dos fundamentos teóricos que deram origem a essas diretrizes metodológi-
cas, que podem dar base a decisões em sala de aula, que podem justificar direções seguidas.
Em outras palavras: metodologia e teoria são duas faces de uma mesma moeda e são,
por isso, inseparáveis. Não é possível atuar, com autonomia, em sala de aula, sem o
conhecimento do objeto que se deseja ensinar e de cuja natureza e características
decorrem, em larga medida, a utilização – e, por que não, a criação – de princípios,
diretrizes e procedimentos metodológicos. Assim, conhecimentos de natureza teórica
são um elemento importante para a construção de uma atuação autônoma de qualquer
professor e, por isso, devem integrar sua formação.
nessa tarefa de permanente formação são pouco acessíveis se você não dominar algu-
mas das referências teóricas que orientam a produção desses trabalhos ou se você não
conhecer as relações que se estabelecem entre eles.
Quer dizer: se você desconhecer aspectos dos fundamentos teóricos da área, ficará
muito difícil dar prosseguimento, com autonomia, a sua formação.
É por essas duas razões, portanto, que nos voltaremos, agora, para pressupostos teóricos
que podem fundamentar sua atuação como alfabetizador. Vale a pena lembrar: esses
pressupostos podem auxiliá-lo a assegurar sua autonomia na condução de seu trabalho
em sala de aula e no desenvolvimento de sua formação continuada.
Discutiremos esses pressupostos da seguinte forma. Daremos atenção aos dois principais
conceitos em torno dos quais se organiza a discussão sobre o ensino-aprendizado da
linguagem escrita: os conceitos de alfabetização e de letramento.
Nos estudos atuais sobre o ensino da linguagem escrita, há diferentes modos de abordar e
de compreender esses dois conceitos. Não seria possível – e, a nosso ver, nem necessário
– examinar todas essas diferentes perspectivas. Por isso, exploraremos a perspectiva que
nos parece mais relevante para auxiliar o trabalho do professor em turmas de alfabeti-
zação. Sempre que tratarmos, porém, de pontos controversos, procuraremos evidenciá-
los, remetendo a esses outros pontos de vista e a textos por meio dos quais você poderá
estudá-los de modo mais aprofundado, se desejar.
Ao longo do trabalho com este Caderno, esperamos que você seja capaz de:
u compreender e distinguir os conceitos de alfabetização e letramento;
u identificar os principais fundamentos teóricos que sustentam os dois con-
ceitos, para que possa aprofundar o seu domínio;
u compreender as relações entre alfabetização e letramento;
u identificar as conseqüências desses conceitos no processo de ensino-apren-
dizado da linguagem escrita.
Para possibilitar que esses objetivos sejam alcançados, o Caderno se organiza em cinco
seções:
u na primeira seção, introduziremos os conceitos de alfabetização e letramento;
13
Alfabetização e Letramento
u
Alfabetização e Letramento
O que diferencia alfabetização de letramento?
1
ATIVIDADE 1
Grupo 3: crianças que ainda não se apropriaram do sistema de escrita, mas se envolvem
em práticas de leitura e de escrita
Grupo 4: crianças que ainda não se apropriaram do sistema de escrita, nem se envolvem
em práticas de leitura e escrita.
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Os conceitos de alfabetização e letramento vão ser discutidos nas seções seguintes, mas
O que diferencia alfabetização
de letramento?
b)
tente já inferir:
u Em que grupo(s) as crianças ainda não adquiriram o sistema de escrita – ainda estão
no início do processo de alfabetização?
u Em que grupo(s) as crianças não se interessam pelos usos da linguagem escrita, não
participam de práticas de leitura e escrita – não se envolvem em práticas de letramento?
c) Com base nas duas questões anteriores, você pode já tentar formular, por inferência, as
diferenças entre estes dois processos – alfabetização e letramento. Responda à pergunta
seguinte e guarde sua resposta: ao final deste Caderno, você voltará a ela, e poderá verificar
se acertou, nas inferências feitas neste momento inicial.
u Uma criança pode estar ainda em processo de alfabetização, mas já manifestar com-
portamentos de letramento?
u Uma criança pode estar já alfabetizada, mas não manifestar comportamentos de letramento?
17
Alfabetização e Letramento
O que é alfabetização?
2
ATIVIDADE 2
a) Forme uma sentença com os sinais apresentados no quadro. Não é preciso utilizar todos!
Registre o que se passa em sua mente: as dificuldades que você está encontrando e as soluções
que está dando a elas; os procedimentos e os conhecimentos que você está utilizando para
realizar a atividade.
A não ser que saiba utilizar a escrita ideográfica chinesa, você deve ter tido sérias dificuldades
para redigir a sentença.
Que tal mais uma tentativa? Utilize o dicionário abaixo:
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O que é alfabetização?
Conseguiu formar a sentença? Registre agora como você conseguiu formá-la: que conheci-
mentos e procedimentos você teve de utilizar para articular essa forma de escrita?
A primeira condição importante é saber que os sinais apresentados servem para represen-
Alfabetização e Letramento
tar algo (que está ausente), isto é, que os sinais integram um sistema de representação,
assumindo uma função simbólica.
Alguns dos sinais chineses guardam, certamente, alguma semelhança com o que repre-
sentam – como os sinais para “homem” e “mulher”. Mas tanto esses sinais quanto os
demais não são empregados para representar diretamente a “realidade” e não são, por-
tanto, desenhos.
Saber, então, o que os sinais representam é uma terceira condição para usá-los na
atividade feita acima. O que eles representam?
É fácil descobrir: quando com eles escrevemos uma sentença, os colocamos na ordem
com que falamos, estabelecendo a mesma seqüência da fala e, assim, as mesmas funções
sintáticas (sujeito e predicado, por exemplo) da fala. Podemos, assim, lê-los, transfor-
mando-os em fala.
Agora já podemos responder à pergunta feita mais acima. O sistema de escrita que você
utilizou representa que aspecto da linguagem humana, do signo lingüístico?
Alfabetização e Letramento
os dois primeiros capítulos.
Como você viu, os chineses não utilizam um alfabeto; as palavras não são
escritas com letras, mas com símbolos que parecem desenhos. Esses símbolos
ou ideogramas representam os significados das palavras.
Representar os significados e não os sons das palavras foi uma boa solução para
os chineses. Como se estima que se falem entre 23 a 150 línguas na China, a
comunicação fica mais fácil quando se representam os significados. É que,
desse modo, a pronúncia de uma palavra se torna independente de sua escrita.
Assim, o ideograma
pode ser lido por pessoas que falam diferentes línguas. O ideograma pode ser
lido como “grande” (em português), “grand” (em francês), “big” (em inglês) ou
“da” em chinês mandarino (que é a língua falada pela maior parte da popu-
lação da China).
ATIVIDADE 3
Esta atividade é para verificar se você entendeu dois conceitos importantes, que serão uti-
lizados mais à frente. É também para possibilitar a seu formador consolidar, com você,
esses conceitos.
Alfabetização e Letramento
b)
Com certeza, embora você tenha podido usar os ideogramas e saiba, agora, muitas
coisas sobre a escrita ideográfica, teria ainda um longo caminho para adquirir profi-
ciência no domínio desse sistema de escrita.
Apesar disso, ao empregá-lo para formular uma pequena sentença, explicitamos os con-
hecimentos e procedimentos básicos em torno do qual se realiza seu aprendizado. Trata-
se de procedimentos e conhecimentos que permitem dominar e utilizar uma determina-
da tecnologia de representação da linguagem humana, no caso, a escrita ideográfica.
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Entendemos, aqui, a palavra "tecnologia" em seu sentido
O que é alfabetização?
ATIVIDADE 4
Alfabetização e Letramento
Estes três exercícios têm duas finalidades diferentes. O primeiro pretende levá-lo a apreen-
der globalmente o conteúdo da seção e também a auxiliar seu formador em seu trabalho
de discussão de dúvidas e questionamentos. O segundo exercício tem por objetivos levá-lo
a aplicar, numa atividade prática, os fundamentos abordados e auxiliá-lo na integração das
discussões realizadas nas diferentes unidades sobre a alfabetização e o letramento. O ter-
ceiro exercício, por fim, pretende fazer você refletir sobre o ponto de vista de um não alfa-
betizado diante da escrita, para que você possa, assim, auxiliá-lo de modo mais adequado
em sua tarefa de se alfabetizar.
b) Consulte diferentes livros de alfabetização em sua escola. Você vai notar que muitos deles,
nas primeiras unidades, exploram diferentes sistemas de representação: desenho, escrita,
números, logomarcas, por exemplo.
Alfabetização e Letramento
Quais os fundamentos do conceito de alfabetização?
3
ATIVIDADE 5
Esta atividade pretende levá-lo a ativar seus conhecimentos prévios e a mobilizá-los para a
discussão que se fará a seguir. Assim, não se espera que você acerte, necessariamente, as
respostas, mas que reflita e tome consciência dos fenômenos que estudaremos. Mais tarde
voltaremos a suas respostas, para que você possa, com base nos conhecimentos adquiridos
nesta seção, rever o que pensava inicialmente sobre o processo de aprendizado da escrita.
Escrita 2
29
Escrita 3
Alfabetização e Letramento
Observe: as escritas de número 3 a 6 foram feitas a partir
de um ditado semelhante. Estão presentes em todas as
escritas: "rei da selva", "passarinho", "tubarão"; "festa junina"
aparece na escrita 3 e crocodilo nas escritas 3 e 5.
Escritas 4 e 5
30
Escrita 6
Quais os fundamentos do conceito
de alfabetização?
rei da seuva
pasarino
tubarano
qroqrodilo
O que as crianças devem pensar sobre a escrita para escrever desse modo? Para isso, utilize
o quadro abaixo.
b) Justifique e exemplifique as duas afirmativas abaixo. Para isso, leve em conta o exercício
acima.
1. ( ) todas as crianças sabem que os sinais gráficos por elas empregados representam algo,
que eles exercem uma função simbólica.
2. ( ) apenas uma das crianças não distingue a escrita de outros sistemas de representação,
como, por exemplo, o desenho;
31
3. ( ) algumas crianças sabem que os sinais gráficos por elas empregados são um tipo de
Alfabetização e Letramento
escrita, de representação da linguagem humana;
4. ( ) todas as crianças compreendem que a escrita alfabética representa o aspecto sonoro
da linguagem, quer dizer, o significante do signo lingüístico;
5. ( ) algumas crianças estabelecem adequadamente correspondências e associações entre
os sinais gráficos (as letras) e aquilo que elas representam.
Quando nos alfabetizamos, aprendemos alguma coisa. O quê? Que características pos-
sui esse objeto que genericamente chamamos de ler e de escrever? Quando aprendemos
esse objeto, entretanto, aprendemos de uma determinada maneira. Alguns objetos,
saberes ou procedimentos são aprendidos por meio de treinamento: é o que ocorre, por
exemplo, quando aprendemos a datilografar ou a usar o teclado de um computador.
Outros parecem se basear na imitação, na prática e na aquisição de algumas técnicas,
como dançar e cozinhar ou nadar. Como será que aprendemos a linguagem escrita?
Responder a essas duas perguntas é o objetivo das duas subseções que se seguem.
Começaremos pela última pergunta.
33
Alfabetização e Letramento
Como aprendemos a linguagem escrita?
3.1
Antes de começar a discutir esse tema, será preciso chamar sua atenção para três pon-
tos muito importantes.
O primeiro deles tem a ver com o modo como se deve entender o verbo “aprender”,
utilizado na pergunta. Muitas vezes, utilizamos essa palavra como sinônimo de ensinar,
equacionando os dois termos – aprender e ensinar – mais ou menos do seguinte modo:
aprendemos algo tal como nos foi ensinado. Se pensamos dessa maneira, a resposta a
nossa questão será fácil: “Como aprendemos a linguagem escrita? Depende, podemos
aprendê-la por meio do método global, do silábico, do fônico...”
Não é, evidentemente, desse modo que entendemos o verbo “aprender”. Por meio dele,
estamos, aqui, querendo designar o que e como o ser humano, dadas determinadas
condições, apropria-se do mundo, de seus objetos, de si mesmo. Vale dizer, queremos
designar os mecanismos ou processos psicológicos – os procedimentos, comportamen-
tos, capacidades e conhecimentos – que nos permitem apreender algo. Formulando
por meio de perguntas: o que se passa em nossas mentes quando, diante de um deter-
minado objeto de conhecimento – a linguagem escrita, os fenômenos biológicos ou a
organização do espaço – dizemos que o aprendemos? que dele nos apropriamos?
O segundo ponto importante diz respeito à razão pela qual devemos conhecer como e
o que pensam as crianças a respeito de um determinado objeto de ensino. Imagine que
você está ensinando ortografia para alunos já alfabetizados. É muito comum que,
durante algum tempo, as crianças pensem que a grafia de uma palavra reproduz, exata-
mente, os sons da fala, e que, por isso, escrevam, por exemplo, “mati”, em vez de
“mate”, “gatu”, em vez de “gato”. Se você, professor, não sabe dessa idéia que as cri-
anças fazem da escrita – ou dessa hipótese sobre a relação entre escrita e fala – sua
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tendência será apenas a de corrigir, dizendo, artificialmente, em voz alta, que não é
Como aprendemos a linguagem escrita?
Esse modo de agir pode resolver, momentaneamente, a grafia das duas palavras, mas
pode gerar dois problemas para o aprendizado da criança: por um lado, pode justa-
mente reforçar a idéia de que se escreve como fala (o que reforçará uma concepção bas-
tante equivocada das relações entre fala e escrita) e, por outro lado, pode criar, na cri-
ança, a falsa idéia de que ela fala errado.
O terceiro e último ponto muito importante tem a ver com o fato de que não existe
uma única teoria da aprendizagem nem uma única teoria da aprendizagem da lin-
guagem escrita. Discutiremos aqui – como já evidenciamos antes – um determinado
modo de compreender o processo de aprendizagem, aquele que julgamos capaz de
fornecer uma boa base para a organização da alfabetização.
35
Alfabetização e Letramento
Os estudos de Emília Ferreiro, Ana Teberosky e seus colaboradores, sobre a aquisição
da escrita (ou sobre a psicogênese da escrita), fornecem uma excelente base para fun-
damentar discussões de natureza metodológica. Na seção anterior, também utilizamos
muitas das conclusões desses estudos.
As idéias que sustentam esses estudos – que se originam das investigações de Jean
Piaget – podem ser resumidas do seguinte modo:
Com base nessas idéias mais gerais sobre como os seres humanos aprendem, as
pesquisas sobre a psicogênese da linguagem escrita descobriram que as crianças desen-
volvem as hipóteses apresentadas em seguida.
36
AS
Como aprendemos a linguagem escrita?
Em contato com a linguagem escrita, a criança dirige sua atenção para diferentes
dimensões desse objeto.
Distinguindo o que “serve para ler” do que não serve, a criança busca estabelecer
critérios ou princípios de natureza gráfica para definir o que é passível de ser lido e de
ser escrito. Dois princípios são, então, estabelecidos:
u o princípio da quantidade mínima de letras, de acordo com o qual uma
escrita, para ser lida, deve possuir um número suficiente de letras (mais de
uma letra, no mínimo);
u e o princípio da variedade interna de letras, de acordo com o qual, um
objeto gráfico, para ser lido, deve apresentar caracteres diferentes (um con-
junto de letras iguais, como AAAA, por exemplo, não constituiriam algo
passível de ser lido).
De acordo com os estudos psicogenéticos, esses dois princípios ou critérios são de fun-
damental importância para a reformulação das hipóteses da criança, porque funcionam
como um fator de desequilíbrio nos esquemas por ela construídos: são dois princípios
que trazem “problemas” para as hipóteses que posteriormente serão construídas.
Voltaremos a esses princípios mais à frente.
Depois de estar atenta apenas aos aspectos gráficos da escrita, a criança pode voltar sua
Alfabetização e Letramento
atenção para a finalidade da escrita: para que ela serve? Fazendo essa pergunta, a cri-
ança progressivamente – vivenciando situações em que a escrita é utilizada – infere que
ela serve para “dizer alguma coisa”, isto é, que textos “dizem algo”, manifestam uma
intenção comunicativa. São, portanto, algo que tem por função simbolizar ou repre-
sentar outra coisa e que essa “coisa” é um significado lingüístico, em geral, para a criança,
um nome. Descobrindo que a escrita representa um significado lingüístico, a criança
dá, assim, um passo extremamente importante para sua alfabetização: ela descobre, na
verdade, que a escrita representa uma dimensão da linguagem humana.
AS HIPÓTESES FONOGRÁFICAS
Como você pôde observar acima, a criança chega à conclusão de que a escrita repre-
senta uma dimensão da linguagem: o significado dos nomes. Se você relacionar essa
hipótese aos conteúdos que discutimos na primeira seção deste Caderno, pode, então,
constatar que a criança imagina que nossa escrita é – como a escrita chinesa – ideográ-
fica. Das duas faces do signo lingüístico – o significado e o significante –, a escrita repre-
sentaria a primeira face. Se a criança estivesse aprendendo esse tipo de escrita, ela
estaria, praticamente, “alfabetizada”.
Desse modo, uma palavra como “cidade” – que possui três sílabas, poderia ser represen-
Como aprendemos a linguagem escrita?
tada como AEO (quando a criança ainda não controla as letras que deve utilizar), ou
IAE (quando já controla as letras, no caso, utilizando vogais), ou, ainda, CDE (uti-
lizando consoantes e vogais).
Você se lembra de que, bem cedo no seu aprendizado da escrita, a criança elaborou o
princípio da quantidade mínima de letras, quer dizer, que uma ou duas letras não
poderiam ser uma escrita, algo passível de ser lido? Se a criança fosse escrever “giz”,
“sol”, “mel”, pela lógica da hipótese silábica, teria de grafar “I”, “O” e “E” (utilizando,
nesse exemplo, apenas as vogais). Mas, de acordo com o princípio da quantidade míni-
ma de letras, apenas uma letra não pode fazer uma escrita. Como sair dessa?
Com base na hipótese silábica, como uma criança escreveria “banana” utilizando apenas
as vogais? Como ela escreveria, utilizando apenas consoantes, as palavras “papo”, ou
“tatu”? A solução, de acordo com a lógica da hipótese silábica, seria AAA, para “banana”
e PP e TT para “papo” e “tatu”. Mas você deve, com certeza, lembrar que, de acordo
com o princípio da variedade interna de letras, estabelecido anteriormente pela criança,
não é possível escrever uma palavra apenas com uma letra. Como sair de mais essa?
39
Alfabetização e Letramento
Em seu contato com a escrita, na escola e na família para algumas crianças, ou apenas
na escola, para outras, elas tendem a aprender “de cor” a grafia de algumas palavras,
particularmente a de nomes próprios: seu nome, o de seus irmãos, de seus colegas, de
sua professora ou professor, de sua escola. Quando confrontadas com a leitura dessas
palavras, de acordo com a hipótese silábica, “sobram letras”, apesar de as crianças
saberem que a grafia das palavras está correta. Como sair também dessa?
Todos esses problemas trazem, para a criança, conflitos cognitivos, quer dizer, confli-
tos entre diferentes hipóteses por ela elaboradas. Como resolver esses problemas? De
acordo com a pesquisa psicogenética, a criança vai em busca de soluções. Procura com-
binar a escrita de vogais com consoantes, escrevendo, por exemplo, BAN, para
“banana”. Combinando consoantes e vogais, ela passaria, progressivamente, a estabele-
cer que, em nossa escrita, representaríamos não as sílabas das palavras, mas as peque-
nas unidades que as compõem: os sons.
Essa perspectiva, entretanto, tem sido objeto, nos últimos anos, em diferentes países,
de um conjunto de controvérsias, algumas que nos parecem inadequadas, outras que
nos parecem pertinentes.
Um ponto da teoria psicogenética que nos parece importante – o que nos levou a incorporá-
lo – diz respeito ao modo pelo qual a criança alcançaria as hipóteses fonográficas, inferindo
que as letras ou grafemas representam o significante, ou unidades sonoras da linguagem.
É que, de acordo com pesquisas cognitivistas, a criança apresentaria, após realizar, nos
primeiros anos de vida, o progressivo domínio de sua língua materna, dificuldades para
“naturalmente” voltar sua atenção para o aspecto sonoro da linguagem. Como a lin-
guagem escrita estaria baseada, em geral, na representação desse aspecto sonoro – os
grafemas tendem a representar os sons da língua – seria necessária uma instrução direta
para que as crianças desenvolvessem, conscientemente, a capacidade de segmentar e
analisar as palavras em fonemas. Em outros termos, o desenvolvimento da consciência
fonológica (atenção consciente ao extrato sonoro da língua) seria um pré-requisito
(para uns) ou um requisito importante (para outros) para a apreensão de que a lin-
guagem escrita representa, em linhas gerais, essas unidades sonoras mínimas.
40
Você pode encontrar uma resposta equilibrada da linha psico-
Como aprendemos a linguagem escrita?
Também para essa perspectiva, seria mais fácil para a criança perceber, inicialmente, os
sons – e, posteriormente, sua correspondência com um grafema – posicionados no iní-
cio, depois no final de palavras e, por último, no meio de palavras.
CASA
YUWVSKYKAYTRO
Qual delas você leu com automatismo? Qual delas você teve
de ler partindo de processos "menores" (reconhecer letras,
formar sílabas, etc.)?
ATIVIDADE 6
Alfabetização e Letramento
u
u tivesse estabelecido a hipótese silábica, mas não usasse, ainda, letras que, de fato, são
utilizadas na grafia das palavras;
u tivesse estabelecido a hipótese silábica, mas usasse letras que, de fato, são utilizadas na
grafia das palavras.
b) Com base nos estudos sobre a psicogênese da escrita, refaça os exercícios da Atividade 5,
desta seção. Você consegue, agora, analisar os diferentes tipos de escrita infantis? Se você
já conseguia, em que você avançou?
c) Vimos, acima, que a criança constrói, ao final de um longo processo, a idéia de que a escri-
ta seria um sistema de representação da fala, isto é, que cada letra ou grafema representaria
um som da fala.
Se a hipótese feita pela criança é correta, cada uma das letras utilizadas vai corresponder a
um som, e cada som pronunciado corresponderá a uma letra. Escreva, como você fala, as
palavras acima e responda: nosso sistema de escrita é, como pensam as crianças, um sis-
tema de representação dos sons da fala?
No início desta seção, prometemos que iríamos buscar responder a duas perguntas:
como aprendemos a linguagem escrita? o que aprendemos quando nos alfabetizamos?
Alfabetização e Letramento
O que aprendemos quando nos alfabetizamos?
3.2
Ao longo das seções anteriores, fornecemos diferentes elementos para responder a essa
pergunta.
Apesar de mais completa, essa definição, porém, ainda é insatisfatória. Não apren-
demos esse objeto em si mesmo, mas no interior de processos de leitura e de escrita.
Isso significa que capacidades ou procedimentos como, por exemplo, reconhecer letras,
categorizar letras grafadas de forma diferente, realizar processos de análise e síntese de
sílabas e palavras, adquirir fluência em leitura e rapidez na escrita, são também impor-
tantes dimensões daquilo que aprendemos quando nos alfabetizamos.
Também fazem parte desse objeto certas habilidades motoras e cognitivas, envolvi-
das no uso e na manipulação de instrumentos e equipamentos de escrita. Isso signifi-
ca, dentre outras coisas, segurar adequadamente o lápis, desenvolver a coordenação
motora necessária à escrita, posicionar-se adequadamente para ler e escrever, saber
como se faz a seqüenciação do texto nas páginas, conhecer a organização gráfica do
escrito na página.
ATIVIDADE 7
O que aprendemos quando
nos alfabetizamos?
Nesta seção e na seção anterior, nós discutimos o conceito de alfabetização e seus funda-
mentos teóricos. Empregue os conhecimentos que você adquiriu para analisar um caso
concreto de uma aluna de 4a série.
Débora tem 12 anos e já “repetiu de ano” duas vezes. Ela está numa turma equivalente à
4a série da educação fundamental. Lê e escreve com tanta dificuldade que não se consid-
era alfabetizada. Numa entrevista com a supervisora de sua escola, ela disse: “não sei escr-
ever direito; quando faço alguma coisa, faço errado”. Na mesma entrevista, quando inda-
gada sobre as pessoas que, em sua casa, sabem ler e escrever, ela respondeu que todos sabi-
am, menos ela e sua irmã. Sua irmã está na terceira série e tem dez anos.
Débora vive na região metropolitana de Belo Horizonte, na periferia de uma das várias
cidades que compõem essa região. Sua família é pobre e, às vezes, passa por períodos difí-
ceis. Mas seus pais são alfabetizados e, de acordo com ela, sua mãe, “anota as coisas para
não ficar devendo” e seu pai “costuma escrever as contas”. De outras pessoas que, na viz-
inhança, usam a escrita, Débora lembra-se de uma vizinha que escreve para saber “o que
faz no serviço e as coisas que está precisando em casa”.
Débora já sabe que a escrita representa sons da língua, o que é um passo muito importante
em seu processo de alfabetização. Ela escreve e lê corretamente muitas palavras: algumas
porque decorou sua forma; outras porque são mais simples. Por exemplo, num ditado,
escreveu corretamente “caneta” e “caderno”, dentre outras palavras.
Mas Débora apresenta também erros de escrita estranhos, que não condizem com seus
acertos: ela troca sempre, por exemplo, o P pelo T, duas letras muito diferentes grafica-
mente e que representam sons também muito diferentes, escrevendo “latis”, em vez de
“lápis”; “latiseira”, em vez de “lapiseira”. Débora, do mesmo modo, escreve de maneira
pouco previsível outras palavras: “zir”, em vez de “giz”, “sena”, em vez de “semana”, “trino”,
em vez de “tio”.
45
Na leitura, a lentidão, a hesitação e a necessidade de decompor cada sílaba mostram como,
Alfabetização e Letramento
para ela, é difícil decodificar palavras. Tão difícil que, lendo textos, o sentido de palavras
e passagens se perde. Débora manifesta várias dificuldades na leitura: não consegue ler
globalmente as palavras; sílabas pouco comuns (e, em geral, mais difíceis para um apren-
diz) terminam por exigir um grande dispêndio de tempo e de energia, como em “elefante”,
“tigre”, “leão” e “coelho”.
Com certeza, Débora já sabe muitas coisas importantes sobre a linguagem escrita. Mas
deveria saber muito mais aos 12 anos, na 4a série: em razão de suas dificuldades na codi-
ficação e na decifração de palavras, apresenta sérias limitações para escrever e ler textos;
apresenta sérias limitações para usar a escrita na escola para aprender novos conteúdos e
para desenvolver novas habilidades.
De acordo com as informações da supervisora da escola onde Débora estuda, ela é uma
menina bem comportada e quieta. Está sempre com o uniforme limpo, o cabelo arruma-
do em tranças que correm rentes à sua cabeça. No recreio, conversa com os colegas, brin-
ca, corre. Débora é uma menina que não possui qualquer deficiência cognitva ou lingüís-
tica.
oi
brigada tela [pela] carta ce [que] você mondou [mandou] para min [...] você deve
ser legau
Nao~ pre siza desipre acuta [não precisa de se preocupar]
descute [desculpe] pela
com a letre [letra]
Eugost ei da car t a
um abraço
escr evada
Débora di novo
CEALE. Ciclo Inicial de Alfabetização. Belo Horizonte: Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais, 2004. p.12-14.
u Por quê?
Alfabetização e Letramento
O que é letramento?
4
Ao longo do século XX, porém, esse conceito de alfabetização foi sendo progressiva-
mente ampliado, em razão de necessidades sociais e políticas, a ponto de já não se con-
siderar alfabetizado aquele que apenas domina o sistema de escrita e as capacidades
básicas de leitura e escrita, mas aquele que sabe usar a linguagem escrita para exercer
umaprática social em que essa modalidade da língua é necessária.
aquele que sabe usar a leitura e a escrita para exercer uma prática social em que
O que é letramento?
a escrita é necessária.
Essa ampliação do conceito revela-se mais claramente em estudos censitários
desenvolvidos a partir da última década, em que são definidos índices de alfa-
betizados funcionais (e a adoção dessa terminologia já indica um novo con-
ceito que se acrescenta ao de alfabetizado, simplesmente), tomando como
critério o nível de escolaridade atingido ou a conclusão de um determinado
número de anos de estudo ou de uma determinada série (em geral, a quarta do
ensino fundamental), o que traz, implícita, a idéia de que o acesso ao mundo
da escrita exige habilidades para além do apenas aprender a ler e a escrever. Ou
seja: a definição de índices de alfabetismo funcional utilizando-se, como
critério, anos de escolaridade, evidencia o reconhecimento dos limites de uma
avaliação censitária baseada apenas no conceito de alfabetização como “saber
ler e escrever” ou “saber ler um bilhete simples”, e a emergência de um novo
conceito, que incorpora habilidades de uso da leitura e da escrita desenvolvi-
das durante alguns anos de escolarização.
(Soares, M. Alfabetização: a ressignificação do conceito. Alfabetização e Cidadania. Revista de Educação de Jovens e Adultos. RaaB,
ATIVIDADE 8
a) De acordo com o Censo de 2000, cerca de 14% da população brasileira com 15 anos ou
mais é analfabeta. De acordo com o mesmo Censo, cerca de 25% da população com a
mesma faixa etária seria analfabeta funcional. Com base no texto acima, responda:
u O que é que, segundo dados coletados em 2000, 14% da população brasileira jovem
e adulta não sabia?
u O que é que, segundo dados coletados em 2000, 25% da população brasileira jovem
e adulta não sabia?
Alfabetização e Letramento
cação de um teste de capacidades de leitura e de um ques-
tionário sobre as práticas de escrita e leitura da população. O
termo alfabetismo, utilizado no INAF, é sinônimo de letramento.
Nível 1: “As pessoas que acertaram de 3 a 9 itens do teste foram classificadas no nível 1 de
alfabetismo (...). Esse grupo acerta com freqüência os itens mais simples, consegue
localizar informações explícitas em textos muito curtos (...). Consegue também ler títulos
bem destacados e, quanto à localização de informações, o reconhecimento de números é
um elemento facilitador. Questões mais complexas tiveram porcentual muito mais baixo
de acerto nesse grupo (...).
(RIBEIRO, Vera Masagão et al. Letramento no Brasil: alguns resultados do Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional.
Das atividades anteriores, você pode concluir que, hoje, a alfabetização – o saber codificar
e decodificar, o domínio das “primeiras letras”, segundo a definição do dicionário
Houaiss – não é mais suficiente. A sociedade atual, extremamente grafocêntrica, isto é,
centrada na escrita, exige também o saber utilizar a linguagem escrita nas situações em
que esta é necessária, lendo e produzindo textos com competência.
É para essa nova dimensão da entrada no mundo da escrita que se cunhou uma nova
palavra, letramento. O conceito designa, então,
carta, uma história. Ainda não aprendeu a ler e escrever, mas é, de certa forma,
Alfabetização e Letramento
letrada, tem já um certo nível de letramento.
Uma pessoa pode ser alfabetizada e não ser letrada: sabe ler e escrever, mas não
cultiva nem exerce práticas de leitura e de escrita, não lê livros, jornais, revis-
tas, ou não é capaz de interpretar um texto lido; tem dificuldades para escrever
uma carta, até um telegrama – é alfabetizada, mas não letrada.
ATIVIDADE 9
a) Releia as informações sobre os alunos Pedro, Daiane, Júlia, Marcos, Felipe e Luana, apre-
sentadas na Seção 1, e caracterize-os de novo, agora usando os adjetivos “alfabetizado” e
“letrado”:
u Qual ou quais dos cinco alunos são alfabetizados, mas pouco letrados?
u Qual ou quais não estão ainda alfabetizados, mas já revelam ser letrados, em certo nível?
b) Retome a resposta que você deu, na Seção 1, à pergunta “Qual é a diferença entre alfabetiza-
ção e letramento?” e, agora, após ter-se apropriado dos conceitos de alfabetização e de
letramento, avalie:
u Você concorda com a resposta que deu naquele momento inicial? Escolha entre estas
três opções: concordo inteiramente; concordo parcialmente; não concordo.
u Justifique, complete ou reformule a resposta dada naquele momento inicial de acordo
Alfabetização e Letramento
Aprendizagem inicial da linguagem escrita:
5 alfabetização e letramento
Desde meados dos anos 1980, porém, concepções psicológicas, lingüísticas e psicolingüís-
ticas de leitura e escrita vêm mostrando que, se o aprendizado das relações entre as letras e
os sons é uma condição para o uso da linguagem escrita, esse uso também é uma condição
para a alfabetização, o aprendizado das relações entre as letras e os sons da língua.
ATIVIDADE 10
Aprendizagem inicial da linguagem escri-
ta: alfabetização e letramento
a) Com base nessas considerações sobre a criação, em sala de aula, de um ambiente alfabeti-
zador, justifique a afirmação seguinte:
Mas não é apenas o ambiente alfabetizador que deve articular, na sala de aula, alfabetiza-
ção e letramento. Esses dois processos, embora diferentes, são indissociáveis também
no processo de aprendizagem inicial da linguagem escrita. O texto seguinte esclarece
essa indissociabilidade:
“Dissociar alfabetização e letramento é um equívoco porque, no quadro das
atuais concepções psicológicas, lingüísticas e psicolingüísticas de leitura e
escrita, a entrada da criança (e também do adulto analfabeto) no mundo da
escrita se dá simultaneamente por esses dois processos: pela aquisição do sis-
tema convencional de escrita – a alfabetização –, e pelo desenvolvimento de
habilidades de uso desse sistema em atividades de leitura e escrita, nas práticas
sociais que envolvem a linguagem escrita – o letramento. Não são processos
independentes, mas interdependentes, e indissociáveis: a alfabetização se
desenvolve no contexto de e por meio de práticas sociais de leitura e de escrita,
isto é, através de atividades de letramento, e este, por sua vez, só pode desen-
volver-se no contexto da e por meio da aprendizagem das relações fonema-
grafema, isto é, em dependência da alfabetização.”
ATIVIDADE 11
a) Com certeza, você conhece diferentes métodos de alfabetização (se não conhece, faça uma
entrevista com um colega que os conhece). Examine e discuta as afirmações abaixo.
Alfabetização e Letramento
u
b) Lembre-se de como foi o seu processo de alfabetização e responda às questões abaixo (se
você não se lembra do processo pelo qual se alfabetizou, considere algum processo de alfa-
betização que tenha acompanhado: de um filho, um sobrinho...). Analise esse processo à
luz dos conceitos de alfabetização e letramento.
c) Faça uma pesquisa em diferentes livros didáticos para a alfabetização. Dentre as atividades
dos livros procure encontrar pelo menos quatro exercícios em que a apropriação do sistema
de escrita – a alfabetização – é desenvolvida no contexto de práticas sociais de leitura ou
de escrita – em contextos de letramento. Analise essas atividades, demonstrando a articu-
lação, nelas, dos processos de alfabetização e letramento.
e) Ao responder às perguntas sobre o caso de Débora, na seção anterior, você já avaliou se ela
está alfabetizada ou não, e justificou sua avaliação; reveja as respostas que deu naquele
momento e agora, à luz do que foi discutido nesta última seção, reavalie:
Alfabetização e Letramento
u Apêndice
ATIVIDADE 1
Essa atividade tem como objetivos levantar e ativar conhecimentos e posturas prévios do
professor, que são mobilizados na análise feita ao longo do Caderno. Além disso, ela é base
da avaliação do Caderno, uma vez que o professor a retomará para modificar, especificar
ou ampliar suas respostas.
ATIVIDADE 2
ATIVIDADE 3
a)
ulados, uma cadeia sonora, sem um significado conhecido. É a esse conjunto de sons, ao
qual se atribui, por convenção, um significado, o que denominamos significante. O signifi-
cante de um signo lingüístico pode ser pensado como sua forma, ao passo que o significado
pode ser pensado como seu conteúdo. Um signo lingüístico é o resultado da associação,
arbitrária, de um conteúdo a uma forma.
b) Para transformar o desenho em escrita, é preciso colocar o desenho de cada um dos ele-
mentos da cena numa ordem em que possam ser lidos, como uma sentença lingüística.
Para que os desenhos sejam transformados em escrita, a ordem em que eles aparecem deve
ser tal que reproduza a organização sintática da frase: sujeito, verbo, complemento do
verbo. Só assim, o desenho se transformará em escrita, porque estará representando não
uma caçada, mas um enunciado lingüístico, uma frase.
ATIVIDADE 4
a) Os itens dessa atividade são de natureza aberta. No entanto, é importante que o professor
não se limite a copiar passagens do texto, mas tente reproduzir as principais idéias que
apreendeu, acrescentando a elas fatos e situações conhecidos, para ilustrar ou exemplificar.
É também importante que o professor não fique inibido em apresentar o que não tiver
compreendido e se disponha a discutir suas dúvidas com os colegas e com o formador.
ATIVIDADE 5
O que se espera nessa Atividade é que o professor reflita e tome consciência dos fenômenos
que estão sendo estudados, e não que “acerte” as respostas. Essas respostas serão retomadas
59
posteriormente, para que o professor, com base nos conhecimentos adquiridos nesta seção,
Alfabetização e Letramento
reveja o que pensava inicialmente sobre o processo de aprendizado da escrita.
a) e b) Para responder a essas questões, o professor pode se basear tanto em suas crenças a respeito do
aprendizado da escrita quanto em alguns indícios, presentes no enunciado geral da atividade
anterior e nas escritas feitas pelas crianças. Mais à frente, o Caderno fornecerá subsídios que
permitirão responder de modo mais sistemático e com uma base mais sólida a essa questão.
d) Atividade preparatória, na qual é importante que o professor expresse seus pontos de vista e
conclusões, sem sobrepor sua experiência prévia à análise realizada nas questões anteriores.
ATIVIDADE 6
Questão (a)
u Se a criança não distingue desenho de escrita, deve fazer desenhos dos objetos repre-
sentados pelas palavras.
u Se a criança já estabeleceu a hipótese silábica, mas não usa ainda letras que, de fato,
são utilizadas na grafia das palavras, vai escrever as palavras da lista de tal modo que
a quantidade de letras corresponda à quantidade de sílabas, sem usar a seqüência de
letras presente na escrita ortográfica das palavras. Exemplo: OALF (SABONETE);
EFT (LÂMPADA); UTG (AZEITE); RA (ARROZ); EA (CAFÉ); T ou TB (MEL).
60
Se a criança estabeleceu a hipótese silábica e usa letras presentes na escrita ortográfi-
Apêndice
ca das palavras, vai fazer a lista utilizando, para cada palavra, uma quantidade de
letras correspondente ao número de sílabas, utilizando letras que aparecem ou pode-
riam aparecer na grafia das palavras. Exemplo: AOEI (SABONETE); APD
(LÂMPADA); AEI (AZEITE); AR (ARROZ); AF (CAFÉ); E ou EL ou ML (MEL).
Questão (b)
u Escrita 3: escrita produzida com base na hipótese silábica: para cada sílaba, a criança
utiliza uma letra (só ocorre uma exceção, quando ela acrescenta uma letra a mais na
grafia de TUBARÃO – isto talvez tenha ocorrido pela forma como a palavra foi dita-
da; o adulto pode ter dito TU-BA-RÃ-O). Além disso, a criança já utiliza letras que,
de fato, aparecem nas sílabas representadas, com poucas exceções, como a letra O
usada para a sílaba SEL, em REI DA SELVA.
u Escritas 4 e 5: escritas feitas com base na hipótese silábica, mas diferentes da escrita
3, porque as crianças não controlam a qualidade das letras que utilizam (usam qual-
quer letra para indicar uma sílaba, até letras que não representam sons presentes na
sílaba representada).
u Escrita 6: escrita com base na hipótese alfabética ou fonética: para cada som, uma letra.
Questão (c)
Dependendo do dialeto regional, é possível registrar escritas como vassora, pexi, muintu ou
muntchu, tambeym ou tambeim, cantarãw ou cantarãu. Essas escritas demonstram que a
hipótese de que nosso sistema de escrita é fonético ou alfabético é inadequada: ele não rep-
resenta apenas os sons da fala, mas tem outras motivações que procuram anular a variação
dos modos de falar; é uma escrita alfabético-ortográfica.
ATIVIDADE 7
Alfabetização e Letramento
betizada. Entretanto, ela ainda: a) não domina certas associações entre grafemas e fonemas
e certas estruturas silábicas mais complexas, tanto na escrita como na leitura (por esse
critério, não será considerada alfabetizada); b) não aprendeu que nossa escrita tem natureza
ortográfica (por esse critério, não será considerada alfabetizada); c) não tem compreensão e
fluência em leitura, não consegue decifrar as sílabas mais complexas, não compreende textos,
sentenças e mesmo palavras (ainda precisaria dar mais passos para ser considerada alfabetizada).
ATIVIDADE 8
ATIVIDADE 9
ATIVIDADE 10
Apêndice
ATIVIDADE 11
Alfabetização e Letramento
u Sugestões de leitura complementar
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização & Lingüística. São Paulo: Scipione, 1989.
CARRAHER, Terezinha Nunes. Alfabetização: três faces do problema. In: KRAMER, Sônia
(Org.). Alfabetização: dilemas da prática. Rio de Janeiro: Dois Pontos, 1986. p. 47-98.
LEMLE, Miriam. Guia teórico do alfabetizador. 15 ed. São Paulo: Ática, 2000.
MORAIS, Artur Gomes de. Ortografia: ensinar e aprender. São Paulo: Ática, 1998.
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RIBEIRO, Vera Masagão (Org.). Letramento no Brasil. São Paulo: Global, 2003.
TEBEROSKY, Ana; COLOMER, Teresa. Aprender a ler e escrever: uma proposta con-
strutivista. Porto Alegre: Artmed, 2003.