Desapropriação

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IV - DESAPROPRIAÇÃO

1 - Fundamento

É a forma de intervenção do Estado na propriedade mais forte e mais coercitiva, de


manifestação do poder do império do Estado e de supremacia do interesse público sobre o
privado (individual do proprietário). A administração, em geral, tenta promover um contrato
de compra e venda, mas isso é facultativo. Seus aspectos procedimentais estão no Decreto-
Lei 3365/41.
Seu objetivo é a transferência do bem desapropriado para o acervo do expropriante,
sendo que esse fim só pode ser alcançado se houver os motivos mencionados no conceito,
ou seja, a utilidade pública ou interesse social. E a indenização pela transferência constitui a
regra geral para as desapropriações, só por exceção se admitindo a ausência desta.
Ocorre a utilidade pública quando a transferência do bem se afigura conveniente
para a Administração, conceito que abrange a necessidade pública, que decorre de
situações de emergência, cuja solução exija a desapropriação do bem. O interesse social
consiste naquelas hipóteses e,m que mais se realça a função social da propriedade, pois o
Poder Público, nesses casos, tem preponderantemente o objetivo de neutralizar de alguma
forma a desigualdade coletiva. Ressalte-se que tanto a utilidade pública quanto o interesse
social espelham conceitos jurídicos indeterminados, sendo que as hipóteses serão aquelas
que as leis respectivas consideram como ostentando um ou outro dos pressupostos
constitucionais, ou seja, serão ex vi legis.
O Estado edita um decreto declaratório da utilidade pública daquele bem. A partir
dele, ele propõe uma ação de desapropriação. O objetivo dessa ação não é dizer se pode ou
não desapropriar, mas definir o valor da indenização a ser paga. Qualquer questão a parte é
em ação separada (mandado de segurança, por exemplo). Só depois de paga a indenização
o Estado adquire a propriedade. No entanto, o Estado pode ter emissão provisória da posse 1,
com o depósito de algum valor determinado pelo juiz, e utilização prévia do imóvel, antes da
desapropriação. O fundamento desse poder de Estado é o domínio público iminente 2, que
tem característica de soberania territorial, sendo potencialidade de exercício de poder sobre
todas as coisas no território do Estado. Esse domínio ocorre de uma visão real de Estado, em
que o rei fazia concessões ao particular, sendo proprietário em última instância (a exemplo
da herança jacente e da terra devoluta, devolvida ao Estado).

2 - Conceito

A desapropriação é uma aquisição compulsória da propriedade pelo Estado ou por


seus delegatários (Professor Aragão).
Pode ser conceituada como a substituição compulsória do objeto da propriedade. É o
instrumento através do qual o poder público substitui por dinheiro a propriedade de um bem
(Professor André Cirino). O art. 2o do DL 3365 demonstra que essa é uma espécie
repressiva de intervenção do Estado na propriedade.
Carvalhinho conceitua a desapropriação é o procedimento de direito público pelo qual
o Poder Público transfere para si a propriedade de terceiro, por razões de utilidade pública
ou de interesse social, normalmente mediante o pagamento de indenização.

3 - Natureza jurídica

1 Posse é a aparência da propriedade.


2 É diferente de domínio público patrimonial, em que o Estado é proprietário do bem, como qualquer particular.
A natureza jurídica da desapropriação é de procedimento, conjunto de atos
devidamente formalizados e produzidos (pelo Poder Público e pelo particular) com
seqüência, com vistas a ser alcançado seu objetivo, que tem seu curso quase sempre em
duas fazes. Na primeira, a fase administrativa, o Poder Público declara seu interesse na
desapropriação e começa a adotar as providências visando à transferência do bem. Havendo
acordo com o proprietário, a desapropriação se esgota nessa fase, mas isso não é muito
comum, o normal é prolongar-se até a fase judicial, consubstanciada através da ação a ser
movida pelo Estado contra o proprietário.
Trata-se de uma aquisição (e não compra e venda forçada, expressão que é um
contrasenso) originária (e não derivada, como a maioria, em que a propriedade se legitima
em razão da cadeia de propriedade anterior, da cadeia dominial; se é proprietário por
adquirir do proprietário), já que a legitimidade da propriedade independe dos títulos
anteriores (assim como a usucapião, em que se adquire a propriedade em razão da posse
continuada), e decorre do ius imperium do Estado. Assim, surgem dois importantes efeitos: a
irreversibilidade da transferência, ainda que tenha sido indenizado terceiro e não o dono do
bem desapropriado, e a extinção de direitos reais de terceiros sobre a coisa, como se dispõe
no art. 31 do DL 3365.
Se o Estado pagar à pessoa errada, a desapropriação não é nula, em virtude de ser a
aquisição originária de propriedade. A hipoteca também não anula a desapropriação.

4 - Competência legislativa (art. 22, II, da CF)

Quem desapropria é quem tem competência material para lidar com o motivo da
desapropriação. A competência legislativa é privativa da União. Os demais entes podem até
ter normas de legislação interna, mas não podem legislar. O parágrafo único do art. 22
estabelece uma competência legislativa estadual condicionada, a qual só se consumará
quando for editada a lei complementar autorizadora referida no dispositivo.

5 - Competência para o ato declaratório e para promover a desapropriação

A desapropriação tem dois momentos: o do decreto declaratório de utilidade pública


e o da execução da desapropriação. O decreto não é desapropriação, mas condição para a
propositura da ação de desapropriação (art. 2o do DL 3365).
Quanto ao decreto, a regra é ser por ato executivo, do Chefe do Poder Executivo. A
competência para declarar a utilidade ou o interesse social é concorrente da União, dos
estados, do DF, do Município e dos Territórios (se vier a serem criados), conforme o art. 2o
do DL 3365. Discute-se se é possível fazê-lo por lei, mas a doutrina majoritária acha que
isso é competência administrativa.
Essa regra, contudo comporta exceções, eis que atribui-se competência para declarar
utilidade pública ao DNIT (autarquia administrativa), para o fim de ser promovida
desapropriação visando à implantação do Sistema Nacional de Viação (art. 82, IX, da lei
10.233/01) e à ANEEL (autarquia federal), com o objetivo de serem desapropriadas áreas
para a instalação de concessionários e permissionários de energia elétrica (art. 10 da lei
9074/95). Carvalhinho considera isso discutível, pois o juízo público de valor no qual
consiste a declaração de interesse social ou utilidade pública é próprio das pessoas da
federação.
A reforma agrária é privativa do Chefe do Pode Executivo Federal (Presidente da
República), como registra o art. 184 da CF.
A competência para declarar utilidade pública de imóvel para fins urbanísticos é do
Município, o que encontra fundamento nos arts. 30, I e VIII e 182, § 3o da CF,
abrangendo não só a desapropriação urbanística sancionatória, mas também a
desapropriação urbanística ordinária, prevista no art. 5o, i, do DL 3365.
A desapropriação é uma atuação judicial, por ação de desapropriação. No âmbito
da União Federal, é feita pela AGU, mas pode ser feita por estabelecimentos públicos
(autarquias), outorgados (correios) e concessionários (delegatários em geral do poder
público), de acordo com o art. 3o do DL 3365. Isso é um dos poderes de império que o
particular pode exercer sobre o outro.
A competência executória, portanto, divide-se em incondicionada, da União, Estados,
DF e Municípios, que estão livres para a propositura da ação expropriatória; e competência
condicionada, onde estão as pessoas que exercem funções delegadas do Poder Público, visto
que só podem propor a ação se estiverem estiverem expressamente autorizadas em lei ou
contrato (art. 2o, § 3o do DL 3365).

6 - Fase declaratória - Decreto expropriatório

A declaração expropriatória é a manifestação emitida pelas pessoas federativas


no sentido de expressar a vontade de transferir determinado bem para seu patrimônio ou
para o de pessoa delegada, com o objetivo de executar atividade de interesse público
prevista em lei. Ela precisa individuar, com precisão, o bem ou os bens no qual o Poder
Público tem interesse para fins expropriatórios, bem como deve expressar o fim a que essa
desapropriação se destina. Alguns autores defendem ser necessário que a declaração
apresente o dispositivo legal da lei expropriatória que contém o objetivo pretendido pelo
Poder Público em relação ao bem ( Bandeira de Mello e Maria Sylvia Di Pietro), mas
Carvalhinho discorda, defendendo que esse dispositivo pode ser aconselhável e conveniente,
mas nunca obrigatório.
A declaração de utilidade ou necessidade pública se dá através de um decreto que
provoca uma seqüência de atos, os quais culminam na incorporação do bem ao patrimônio
público. O decreto é ato administrativo proveniente do Chefe do Executivo (art. 6o do DL
3365). Conforme o art. 8o do DL 3365, o Poder Legislativo pode tomar a iniciativa, mas
quem dá seqüência é o Poder Executivo.
Quando a declaração expropriatória provêm de entidade exclusivamente
administrativa e não política, como é o caso do DNIT e da ANEEL, será o ato administrativo
que conterá a declaração, sendo irrelevante sua denominação. Há autores, entretanto, que
defendem a promulgação de lei para esse tipo de declaração expropriatória (Maria Sylvia Di
Pietro e Diógeres Gasparini).
É uma atividade típica da Administração Pública. Há quem diga que o Poder
Legislativo edita uma lei, outros que é um decreto legislativo. O ideal é que a desapropriação
seja, no entanto, voltada para seus objetivos, para suas funções, senão haveria violação da
separação dos Poderes. O art. 8o do DL 3365 deve ser interpretado em consonância com a
CF.
Esse decreto não é um regulamento, pois se direciona para um caso concreto, não
tendo a pretensão de atingir sujeitos indeterminados.
O ato administrativo do decreto expropriatório é ato discricionário: é um juízo de
conveniência e oportunidade da Administração, contudo os parâmetros de atuação do
administrador são de natureza legal e, sob essa ótica, o ato seria vinculado. A rigor, não é
discricionário, mas fundado em conceito jurídico indeterminado. De qualquer forma, há um
esvaziamento da possibilidade de controle jurisdicional, de discussão do mérito da
desapropriação. O art. 9o do DL 3365 demonstra esse caráter discricionário ou fundado em
conceito jurídico indeterminado da desapropriação. Por ação autônoma, pode o particular, no
entanto, discutir coisas, como a existência de necessidade pública.
Esse ato é passível de controle judicial, mas somente quanto a aspectos de
legalidade e não quanto ao mérito.
São três os efeitos imediatos do decreto: permitir que as autoridades competentes
adentrem o prédio, sendo possível o recurso à força policial para o caso de resistência (art.
7o do DL 3365); iniciar a contagem do prazo para a caducidade do ato 3 (art. 10 do DL
3365 e art. 3o da lei 4132/62); determinar o momento, o parâmetro, para a aferição do
estado do bem para o cálculo da indenização devida.
Quanto à esse último efeito, cabem duas observações: as benfeitorias necessárias
são absolutamente indenizáveis e as úteis, o serão somente quando autorizadas pela
Administração Pública, conforme o art. 26, § 1o do DL 3365 (as voluptuosas, a seu turno,
não serão indenizadas); a Súmula 23 do STF traz a possibilidade de licença para obras no
imóvel já declarado de utilidade pública ou de interesse social, a qual a Administração não
pode negar, mas, a seu turno, o valor acrescido não será indenizado.

7 - Fase executória - administrativa e judicial

A fase declaratória desencadeia a executória, que tem dois momentos.


A fase administrativa é a busca da desapropriação amigável, em que a
Administração se volta ao particular para ver se ele concorda com o valor a ser pago de
indenização (consensualidade administrativa). Se for firmado o acordo, se dará a
desapropriação amigável, e deverá esse negócio jurídico bilateral ser formalizado através
de escritura pública (art. 167, I, no 34) ou por outro meio que a lei venha especificamente
a indicar. Normalmente, são oferecidos valores extremamente baixos nessa fase, por isso ela
acaba sendo uma fase de insucesso.
Não obtido sucesso, deve ser proposta a ação de desapropriação, conforme o art.
o
9 do DL 3365, tendo início então a fase judicial. Alguns autores dizem que essa
impossibilidade de discutir outros assuntos na ação é inconstitucional, mas isso é errado, já
que não é impossível que isso seja discutido em outra ação. Carvalhinho contempla duas
hipóteses: se a discussão versar sobre o conteúdo da vontade administrativo, ocorrendo
dúvida do adrministrador quanto à desapropriação, a matéria não pode ser admitida na ação
de desapropriação, mas em ação autônoma; contudo, se o objetivo da declaração for
atividade que não se encontre contemplada em lei, a discussão será quanto à inexistência de
pressuposto considerado pela lei passível de gerar a desapropriação, hipótese na qual
Carvalhinho entende que o juiz pode ex officio apreciar a questão e até mesmo extinguir o
processo sem julgamento do mérito por falta de condição da ação.
O sujeito ativo da ação de desapropriação é sempre o Poder Público ou a pessoa
privada que exerce função delegada, quando autorizada na lei ou no contrato. O réu da
ação, a seu turno, será sempre o proprietário do bem a ser desapropriado, conforme o art.
16 do DL 3365/41. A pretensão do expropriante é a de consumar a transferência do bem
desapropriado para seu patrimônio, devendo a inicial conter indispensavelmente a oferta de
preço, bem como os requisitos do art. 13 do DL 3365. O art. 20 do DL 3365 estabelece
que a contestação somente poderá versar sobre vício do processo (questões preliminares,
constantes no art. 267 do CPC) ou impugnação ao preço, não cabendo a discussão sobre o
mérito, a qual poderá se dar em ação diversa.
Pode ser produzida prova pericial, de acordo com o art. 23 do DL 3365.
Há discussão sobre a intervenção do Ministério Público, eis que a lei foi omissa: há os
que defendem ela não ser obrigatória, pelo fato de que a causa, por encerrar apenas a

3 A Administração tem 5 anos para dar prosseguimento à ação e, apenas um ano depois da caducidade, pode ser
editado novo ato., em caso de desapropriação por utilidade pública. Se ela se der por interesse social, esse prazo
será de 2 anos.
discussão sobre a fixação do valor indenizatório, não ensejaria a caracterização de que nela
houvesse interesse público que pudesse a justificar a presença dos órgãos do Parquet;
Carvalhinho, contudo, não concorda, defendendo que o interesse público que caracteriza a
desapropriação já justifica a necessidade de intervenção do MP. Além disso, a LC 76/93
estabelece em seu art. 18, § 2o, a obrigatoriedade da intervenção do MP.
O art. 27 do DL 3365 fala da sentença da ação de desapropriação, a qual deve
conter os fatos que motivaram o convencimento do juiz, devendo ainda atender: à estimação
dos bens para efeitos fiscais; ao preço de aquisição e interesse que deles aufere o
proprietário; à sua situação, estado de conservação e segurança; ao valor venal dos da
mesma espécie, nos últimos cinco anos, e à valorização ou depreciação de área
remanescente, pertencente ao réu.
Paga a indenização, o expropriante passa a providenciar a regularização da
transferência da posse, de acordo com o art. 29 do DL 3365. A sentença, portanto, tem
duplo efeito no caso: 1o) autoriza a imissão definitiva na posse do bem em favor do
expropriante; e 2o) consubstancia título idôneo para a transcrição da propriedade no Registro
de Imóveis ou para a efetivação da tradição, em se tratando de bens móveis.

8 - Imissão provisória na posse

O rito da desapropriação visa que a Administração adquira aquele bem de forma


célere, criando para ela a prerrogativa da imissão provisória na posse, pois não se pode
esperar uma sentença judicial para iniciar as obras. Há uma natureza cautelar, que visa a
satisfação de interesse urgente, em a Administração imitir-se na posse do bem antes da
sentença, mediante dois pressupostos: a urgência e o depósito da quantia arbitrada.
Ressalte-se aqui que o art. 15, § 2o do DL 3365 fixa o prazo de 120 dias, a partir da
alegação de urgência, para que o expropriante requeria ao juiz a imissão na posse.
O art. 15 do DL 3365 prevê que ela deposita a quantia arbitrada, não podendo o
juiz negar a emissão (não há a emissão sem depósito prévio). Isso é um artifício da
Administração para impedir o particular de receber uma quantia justa de indenização, pois o
particular pode levantar somente 80% do valor desse depósito (arts. 33, § 2o e 34 do DL
3365). Carvalhinho entende que tal posição não parece justa, defendendo, já na avaliação
prévia, um montante mais próximo ao valor real do bem. Além disso, para fazer o
levantamento, o particular deve cumprir os requisitos do art. 34 do DL 3365.

9 - Indenização (preços, juros moratórios e compensatórios)

A indenização deve ser justa, prévia e em dinheiro, de acordo com o art. 5o, XXIV
da CF. Esse valor vai ter duas parcelas: o valor de 80% levantado na emissão e a diferença,
depois, no fim do processo, com a execução da sentença através de precatório 4, conforme o
art. 100 da CF.
Os juros compensatórios têm natureza de indenização ou compensação pela
imissão provisória na posse. O art. 15-A do DL 3365 fixa juros compensatórios sobre a
diferença entre o valor da data de imissão e de execução. Ressalta-se que "até 6%" foi
declarado inconstitucional pela ADIN 2332, não devendo ser menos de 6%.
Os juros moratórios, relativos à demora na indenização, são calculados com base
no valor fixado na sentença. O art. 15-B do DL 3365 teve a expressão "até 6%" e o termo
a quo como 1o de janeiro do ano seguinte declarados inconstitucionais em relação à
indenização prévia e justa. O STF suspendeu a eficácia dessa norma.
É viável a cumulatividade dos dois, em face da Súmula 102 do STJ.
4 Vide art. 78 do ADCT.
A Súmula 561 do STF e a Súmula 67 do STJ firmam o entendimento de que é
cabível a atualização monetária, conforme os índices oficiais.
O art. 27, § 1o do DL 3365 também teve seus efeitos suspensos em relação à
limitação do valor dos honorários advocatícios. O STF entendeu irrazoável essa restrição,
ainda que as ações de desapropriação sejam milionárias. Os honorários, cabe ressaltar, são
calculados em função da diferença, sendo estabelecidos de acordo com o princípio do ônus
da sucumbência e de acordo com os mesmos fatores de avaliação previstos no CPC.
Na desapropriação para fins de reforma agrária, constante no art. 184 da CF, a
indenização é paga através de títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor
real, resgatáveis no prazo de até 20 anos, a partir do 2 o ano de sua emissão, ressaltando-se
que as benfeitorias úteis e necessárias devem ser indenizadas em dinheiro.
Na desapropriação para fins urbanísticos, prevista no art. 182, § 4o, III, da CF, o
pagamento da indenização será feito através de títulos da dívida pública, de emissão
anteriormente aprovada pelo Senado, com prazo de resgate de até 10 anos, em parcelas
iguais e sucessivas, sendo assegurados, todavia, o valor real da indenização e os juros
legais.
Saliente-se ainda a situação excepcional da desapropriação confiscatória, onde não é
devida indenização ao proprietário.

10 - Desapropriação indireta

A desapropriação indireta é aquela que ocorre através de fato administrativo e é, em


geral, o fenômeno pela qual a Administração esvazia o valor econômico da propriedade. Ao
invés de declarar a utilidade pública da propriedade, restringe o direito de propriedade por
uma série de atos. É um desvio de finalidade, a exemplo de dizer que área não é edificante.
Fica ainda mais evidente o abuso da administração de suas prerrogativas para desapropriar.
Seu fundamento consta no art. 35 do DL 3365.
Surge para o particular o direito de pleitear em juízo a indenização, a qual é paga por
precatório. Essa ação do expropriado é uma ação real, em virtude da situação particular do
litígio, no qual o pleito indenizatório se funda se funda na perda da propriedade. Há a
dispensa de intervenção do MP, uma vez que o interesse que inspira a causa é meramente
fazendário e não revela interesse público evidenciado pela natureza da lide ou pela qualidade
da parte.
O foro da ação será o do local do imóvel.

11 - Tredestinação e retrocesso

Tredestinação é quando o imóvel teve uma destinação diversa da inicial, mas com
utilidade e necessidade pública na destinação nova. A tredestinação para um interesse que
seja um interesse público secundário (para o erário, por exemplo), é ilícita e dá direito à
retrocessão, conforme o art. 35 do DL 3365. Diogo Moreira Neto diz que não há esse
direito de retrocesso, mas sim mero direito de preferência, conforme o art. 519 do CC.
Carvalhinho acha que há sim o direito de retrocessão quando há desvio de retrocesso. Há
ainda entendimento moderado no caso de abandono da coisa, que defende o caráter
temporário do abandono do imóvel pela Administração.
A tredestinação gera direito de reivindicação de retrocesso pelo particular? Há três
correntes: 1a) abandono e finalidade diversa do interesse público primário gerariam direito
de indenização; 2a) apenas finalidade diversa do interesse público geraria o direito; 3 a) não
gera nunca, pois a mera incorporação do bem à Administração Pública já atenderia a um
interesse público.
12 - Espécies e legislação aplicável

a) Desapropriação comum ou ordinária


CF, art. 5o, XXIV - regra fundamental para as desapropriações em geral
DL 3365/41 - dispõe sobre os casos de desapropriação por utilidade pública (a enumeração
desses casos consta em seu art. 5o)
Lei 4132/62 - define os casos de desapropriação por interesse social e dispõe sobre sua
aplicação.
DL 1075/70 - regula a imissão liminar da posse em imóveis residenciais e urbanos

- Necessidade ou utilidade pública


É a forma geral de desapropriação, tendo previsão no art. 5o, XXIV, da CF e formas
atadas no art. 2o do DL 3365.
Há quem diga que é ato vinculado, em razão dessa previsão. O Professor Aragão
acha isso um exagero. O Estado não está obrigado a desapropriar: é um conceito jurídico
indeterminado. Há outras leis específicas para essa forma e, no silêncio delas, aplica-se esse
decreto.
O interesse público é voltado para o Estado como um todo.

- Interesse social e interesse social para fins de reforma agrária (art. 184 da CF, lei
8629/93 e LC 76/93)
O interesse social visa a beneficiar determinados grupos sociais. Há previsão também
no art. 5o, XXIV, da CF e as possibilidades estão dispostas no art. 2o da lei 4132/62.
Todos os entes da federação pode desapropriar por interesse social ou por
necessidade ou utilidade pública, e a indenização é sempre prévia e justa.
Na redistribuição de terras, diz-se que só a União pode desapropriar, com o
fundamento de que os impulsos populistas da União são menores. A indenização, nesse
caso, deve ser também justa e prévia, mas não precisa ser em dinheiro, podendo ser em
títulos da dívida agrária. Contudo, não há impedimento que o estado promova a
desapropriação por interesse social de imóvel rural, o que lhe é vedado é fazê-lo para os fins
de reforma agrária.
Ela só pode ser feita em áreas que não estão cumprindo a sua função social (art.
186 da CF), o que é visto como um grande retrocesso em relação à reforma agrária, já que
é necessário prévio processo administrativo para desapropriar. Entende-se que o terreno só
pode ser desapropriado para esses fins e as benfeitorias devem ser indenizadas em dinheiro.
O assentamento rural, sem o nome de reforma agrária, pode ser pago em dinheiro?
A doutrina majoritária diz que o estado e o município podem fazê-lo, assim como a União,
desde que não expresso como fim a reforma agrária. Há quem diga que isso é um desvio de
finalidade.
Quando a desapropriação é apenas por interesse social, não é necessário provar a
improdutividade da terra.

c) Desapropriação urbanística sancionatória5


Trata-se de uma sanção pelo não cumprimento da função social nos grandes centro
urbanos, podendo ser adotada a título de penalização ao proprietário do solo urbano que
não atender à exigência de promover o adequado aproveitamento de sua propriedade ao
plano diretor municipal. Prevista pelo art. 184, § 4o, III, da CF, necessitava de
regulamentação, o que foi feito pela lei 10257/2001 (Estatuto da Cidade) que, em seu
5 Alguns autores, assim como o Professor Aragão, denominam essa modalidade de desapropriação-sanção.
art. 8o cuida do assunto. Ficou estabelecido que cabe a cada Município 6, que vai figurar
como expropriante, editar sua lei específica para a área em que se implementarão as ações
de polícia urbana, ressaltando-se que essa área já deverá estar incluída no plano diretor da
cidade.

d) Desapropriação-confisco
Prevista no art. 243 da CF, a desapropriação de confisco é uma intervenção mais
drástica na propriedade, já que não confere ao proprietário direito indenizatório. A perda da
propriedade, nesse caso, tem como pressuposto o fato de que nela estão localizadas culturas
ilegais de plantas psicotrópicas. Consumada a expropriação, essas áreas são destinadas a
assentamento de colonos com vistas ao cultivo de produtos alimentícios e medicamentos. O
processo adotado para essa espécie está disciplinado na lei 8257/91.

13 - Objeto

A regra geral é que a desapropriação possa ter por objeto qualquer bem móvel ou
imóvel dotado de valoração patrimonial, como expressa o art. 2o do DL 3365, incluindo-se
os corpóreos e incorpóreos. Conforme depreende-se da Súmula 476 do STF, são também
desapropriáveis ações, cotas ou direitos relativos ao capital de pessoas jurídicas. As ações
representativas do capital de uma empresa podem ser, em teste, desapropriadas, mas o
Professor Aragão acha que desapropriar aqui seria inconstitucional, devendo ser feita
encampação. Entra aí a ingerência do Estado da economia (intervenção). É o resultado, o
objetivo da desapropriação que está sujeito a controle.
Há, entretanto, algumas situações que tornam impossível a desapropriação de um
bem, as quais podem ser agrupadas em impossibilidades jurídicas e materiais. As
impossibilidades jurídicas são as que se referem a bens que a própria lei considere
insuscetíveis de determinado tipo de desapropriação (ex: a propriedade produtiva não pode
ser objeto de desapropriação com fins de reforma agrária, conforme o art. 185, II da CF).
Por outro lado, as impossibilidades materiais são aquelas pelas quais alguns bens, por
sua própria natureza, se tornam inviáveis de desapropriação, como ocorre com a moeda
corrente7, os direitos personalíssimos e as pessoas físicas ou jurídicas, pois são sujeitos e não
objetos de direitos.
Há controvérsia quanto à possibilidade de desapropriação de cadáver: uns defendem
que pode desde que atendidos os pressupostos do instituto, outros têm pensamento
contrário, inadmitindo o instituto por razões de ordem moral e religiosa e por não haver
como identificar o sujeito da propriedade. Carvalhinho admite que podem ocorrer situações
excepcionalíssimas que reclamem a desapropriação de um cadáver, como para a pesquisa
científica e proteção da sociedade, por exemplo.
Bens patrimoniais inalienáveis também são uma questão controversa: o interesse
público poderia ficar dependente desse ato unilateral? Mas não é esse ato publicamente
protegido também? Carvalhinho entende que nada obsta que eles sejam desapropriados,
porque a inviabilidade de alienação não pode prevalecer diante do ius imperii do Estado,
exigindo-se, contudo, um dos motivos previstos na lei expropriatória.
Bens públicos podem ser desapropriados (art. 2o da lei 4132/62), de acordo com o
art. 2o, § 2o do DL 3365. O § 3o requer a autorização do Presidente da República para a
desapropriação de ações, cotas e direitos representativos do capital de instituições e

6 O Distrito Federal também tem capacidade para essas atividades urbanísticas, visto que, pelo art. 32, § 1o, da
CF, ele congrega competências estaduais e municipais.
7 Hely Lopes lembra que as moedas antigas, que têm valor patrimonial extrínseco, podem ser objeto de
desapropriação.
empresas cujo funcionamento dependa de autorização do Governo Federal e se subordine à
sua fiscalização, mas pode ser a concessão ou a permissão, pois há uma interpretação
genérica da palavra.
Bens públicos propriamente ditos podem se desapropriados, mas apenas de ente
menor por ente maior, dentro de seu território, mas submete-se a uma condição inafastável,
a qual seja a autorização por lei específica para tal. Há quem diga que isso é inconstitucional,
pois viola a igualdade entre os entes, mas isso é minoritário, pois não há superioridade, mas
maior abrangência dos interesses.
Quanto aos bens particulares tombados, há duas hipóteses: se o tombamento
provém de entidade figurativa menor, será possível, em tese, a desapropriação do bem por
entidade maior, desde que comprovado que o interesse público a ser atendido por esta tem
prevalência sobre o que gerou o tombamento; a recíproca, porém, é inviável, porque é de se
supor que o interesse atendido pela entidade maior prevalece sobre a proteção do
patrimônio local objeto do ato restritivo, sendo possível a desapropriação somente com a
autorização da autoridade maior (Carvalhinho).
As entidades da administração indireta estariam incluídas nessa hierarquia? As de
direito público, entende-se que sim. Quanto à possibilidade de uma entidade menor
desapropriar autarquia ou empresa pública vinculadas a pessoa federativa maior, há
discrepância entre os autores: para alguns é sempre possível (Sérgio de Andréa Ferreira);
outros advogam a tese de que somente será possível    quando se trata de bens
desvinculados do objeto institucional da pessoa administrativa, mas inviável quando esses
bens consubstanciam a execução dos serviços públicos a que estão preordenadas (Hely
Lopes e Diógenes Gasparini); Carvalhinho e Bandeira de Mello entendem que deve ser
adotado o princípio da hierarquia da pessoa federativa a que está vinculada a entidade
federativa (o STJ e o Stf já se manifestaram nesse sentido). A discussão maior é sobre as de
direito privado: há quem diga que elas não têm essa proteção, pois seria impor limites a uma
pessoa pública para desapropriar uma pessoa privada, e outros que têm, por tratar-se de
entidade de interesse público. O STF e o STJ entenderam que as entidades de direito privado
(a exemplo das docas) estão incluídas no previsto no DL 3365. Elas, portanto, não são
desapropriáveis normalmente.
As margens dos rios navegáveis têm provocado algumas controvérsias em relação à
sua natureza jurídica, o que acarreta efeitos quanto à viabilidade de desapropriação: Hely
Lopes sempre sustentou que tais faixas terrestres, consideradas reservadas pelo Código das
Águas, integram a propriedade privada, estando destacadas apenas para uso da
Administração, em forma de servidão administrativa; a Súmula 479 do STF, todavia, as
considera de domínio público, insuscetíveis de expropriação e excluídas de indenização.
Carvalhinho defende que elas podem pertencer ou não ao domínio privado, embora a regra
as atribua ao domínio público (art. 31 do Dec 24.643/34 - Código das Águas), de modo
que não haverá desapropriação e indenização se as margens integrarem o domínio público,
podendo haver, no entanto, se elas pertencerem ao domínio privado.

14 - Destinatários dos bens desapropriados

A regra geral reside na circunstância de que os bens desapropriados devem integrar


o patrimônio das pessoas ligadas ao poder público que providenciaram a desapropriação e
pagaram a indenização. Há de se observar, entretanto, que a integração do bem expropriado
no patrimônio das pessoas componentes do Poder Público pode ser definitiva, quando a
desapropriação tiver sido processada em seu próprio benefício ou em benefício do público,
ou provisória, quando ,apesar de o bem ter sido desapropriado pelo Poder Público, este o
tiver feito para possibilitar sua utilização e desfrute por terceiro.
Em princípio, a integração do bem deverá ser definitiva, mas nos casos especiais, nos
quais ela será provisória, os bens deverão ingressar primeiramente no patrimônio do
expropriante e somente depois no patrimônio de terceiros, pois há a impossibilidade da
transferência direta.

a) Desapropriação por zona (art. 4o do DL 3365)


É aquela desapropriação que abrange as áreas contíguas necessárias ao
desenvolvimento da obra realizada pelo Poder Público e zonas que vierem a sofrer
valorização extraordinária em decorrência da mesma obra. A lei autoriza a revenda a terceiro
dessas últimas, sendo permitido ao expropriante que a venda se faça por valor atualizado.
Há aqui uma desapropriação com destinação para terceiros: o Estado desapropria
para obra ou melhoria e valoriza as áreas em volta. Poder-se-á fazer uma contribuição de
melhoria, prevista no art. 145, III da CF, mas a estratégia de revenda pode substituí-la,
por ter igual objetivo. Isso foi feito na Avenida Presidente Vargas, em que foram apropriadas
também as áreas lindeiras da avenida.
O professor Celso Mello acha que é inconstitucional, pois assim o Estado age com
interesse público secundário, sendo especulador, mas o STF tem aceito essa forma
expropriatória.

b) Desapropriação para urbanização


Considera-se aqui desapropriação urbanística aquela pela qual o Poder Público
pretende criar ou alterar planos de urbanização para as cidades, só sendo possível a sua
implementação mediante a retirada de algumas propriedades das mãos de seus donos.   
Ressalte-se que somente será admissível a transferência dos bens expropriados para
terceiros quando ultimado o projeto urbanístico, o Poder Público, desinteressado de
permanecer com os bens expropriados, tenha mesmo de repassá-los a terceiros.
Esses são os conhecidos planos de reurbanização de áreas da cidade que ficaram
degradadas, fora do planejamento público, não tendo o mercado imobiliário capacidade de
recuperação. O Estado não se torna proprietário, apenas reurbaniza. Foi o que aconteceu no
Pelourinho (Salvador - BA).
Exemplos: desapropriação para fins de urbanização e implantação de distritos
industriais (art. 5o, "i" do DL 3365); desapropriação urbanística para adequação dos
imóveis ao plano diretor do Município (art. 184, § 4o, III, da CF e lei 10.257/01).

c) Desapropriação por interesse social


Os casos em que a lei considera como de interesse social estão no art. 2o da lei
4132/62. O objetivo aqui é a redução da desigualdade social, fazendo assentamentos para
destinação social. Outro exemplo é a hipótese de desapropriação para abastecimento da
população, prevista na lei delegada no 4/62.

d) Desapropriação-confisco (art. 243 da CF)


Haverá destinação provisória dos bens ao patrimônio do Poder Público e definitiva no
dos colonos, sendo esta condicionada ao fim expresso na CF.

15 - Direito de extensão

Direito de extensão é o direito do expropriado de obrigar que a desapropriação


abranja a área total (remanescente) de sua propriedade, quando esta parte remanescente
ficar sem conteúdo econômico. Está previsto no art. 12 do Decreto federal 4956/1903 e
ainda no art. 4o do LC 76/93. Ele pode ser exercido na desapropriação normal e na
indireta.
Diogo Figueiredo Moreira Neto acha que esse direito foi revogado pelo art. 27 do DL
3365, que fala do cálculo da indenização de desvalorização da área remanescente. O
Professor Aragão, por sua vez, acha que desvalorizar é diferente de perder o valor
econômico.

16 - Desistência da Desapropriação

Desaparecidos os motivos que provocaram a iniciativa do processo expropriatório,


tem o expropriante o poder jurídico de desistir da desapropriação, inclusive no curso da ação
judicial. Há quatro requisitos para a desistência: 1 o) seja ela definida pelo expropriante antes
de ultimada a desapropriação; 2o) ressarcimento pelo expropriante de todos os danos que
causou ao expropriado; 3o) ressarcimento das despesas processuais; 4o) devolução do
mesmo bem.

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