Vem Comigo No Leva-Me Contigo

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Universidade Católica Portuguesa

Faculdade de Ciências Humanas

Vem Comigo no
Leva-me Contigo
Afonso Reis Cabral, 2019. “Leva-me Contigo”

Unidade Curricular: Cultura Portuguesa


Orientação: Professora Doutora Marília dos Santos Lopes
Turma 2

Lourenço Abreu- 130321100


Tomás Manuel Guedes de Campos Almeida-130321009

24 de novembro de 2021
ÍNDICE

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 3

2. QUEM É O AUTOR? .............................................................................................. 4

3. O PORQUÊ DE VIAJAR ........................................................................................ 5

4. “LEVA-ME CONTIGO” ......................................................................................... 7

4.1. O DESEJO DE PARTILHAR ......................................................................... 7

4.2. A HITÓRICA VIAGEM DE CHAVES A FARO .......................................... 8

1º relato: .................................................................................................................... 8

2º relato: .................................................................................................................. 10

3º relato: .................................................................................................................. 10

4.3. A EXPERIÊNCIA DE ANDAR A PÉ .......................................................... 11

4.4. A PARTILHA ATRAVÉS DAS REDES SOCIAIS ..................................... 13

5. O DOCUMENTÁRIO: “LEVA-ME CONTIGO .................................................. 15

6. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 16

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 17

CITAÇÕES ................................................................................................................... 18

2
1. INTRODUÇÃO

Quando pensamos em viajar, vêm-nos inúmeras palavras à cabeça. Curiosidade,


vontade, espírito livre, conhecimento e autoconhecimento são algumas das
características que se as misturamos e reformularmos, formamos uma das definições do
porquê de viajar. E afirmo uma das, porque nunca se vai saber quantas razões existem.
O porquê de viajar pode ser definido como (e utilizando os conceitos anteriores) um
espírito livre que tem a vontade e a curiosidade de conhecer o mundo e de se conhecer a
si próprio.

Um viajante tem sempre uma única vontade: a vontade de aproveitar a viagem,


ou seja, ter uma experiência com diferentes níveis de aprofundamento, onde tenta
absorver a maior quantidade de coisas que pode aprender. Toda esta experiência é
vivida através do olhar do viajante e da forma como ele interpreta tudo à sua volta.

A escrita de viagens é exatamente isto, o descrever/ retratar as viagens que


fazemos, onde incluímos os nossos pensamentos e reflexões, os espantos e as surpresas,
os percalços e as coisas boas. É isto que um autor de escrita de viagens faz nas suas
obras: partilha com os leitores a sua visão sobre alguma viagem que fez. E os leitores só
podem agradecer, por terem a oportunidade de conhecer o mundo e as influências que o
mesmo pode ter nas pessoas.

Afonso Reis Cabral quis fazer isso mesmo: transformar uma viagem inédita
numa perpetuação de memórias escritas para todos aqueles que tenham vontade de
viver um pouco do que ele viveu. Assim, escreveu um livro onde relatava os
acontecimentos mais marcantes de uma das maiores viagens da sua vida.

Ao longo deste relatório vamos perceber o que fez com que este viajante quisesse
viajar e partilhar a sua experiência com o mundo, tentando fazer sempre pontos de
encontro com outros autores viajantes que também tenham partilhado as suas viagens
em livro.

3
2. QUEM É O AUTOR?

Afonso Reis Cabral nasceu na cidade de Lisboa em 1990 e começou a escrever


quando tinha apenas 9 anos de idade.

Licenciou-se em Estudos Portugueses e Lusófonos, na Faculdade de Ciências


Sociais e Humanas da Universidade Nova, local onde acabou por tirar um Mestrado em
Estudos Portugueses, com a vertente “A Orquestra Oculta” - Os Estudos Portugueses
da Consciência e a Literatura.

A sua vida no mundo na escrita começou muito cedo. Em 2005 Reis Cabral
lançou o seu primeiro livro de poesia com o título “Condensação”. No ano de 2008,
participou num concurso de estudantes europeus, onde foi o único português a
participar, tendo ficado em oitavo lugar, no meio de 3500 concorrentes.

Em 2014 laçou o livro “O Meu Irmão” e foi em 2019 que se sagrou vencedor do
Prémio Literário José Saramago 2019, com o livro “Pão de Açúcar”. Foi nesse ano que
Afonso Reis Cabral escreveu o seu mais recente livro e aquele que vai servir de mote
para este relatório. “Leva-me Contigo” é um relato na primeira pessoa do jovem de 24
anos, que decidiu realizar uma viagem pela maior estrada de Portugal, aquela que liga o
Norte ao Sul, aquela que percorre Portugal ao longo de 739 quilómetros: a Estrada
Nacional 2. Uma viagem que podia ser simples, mas que Afonso Reis Cabral quis fazer
diferente.

Foi a pé.

Ilustração 1. Afonso Reis Cabral

4
3. O PORQUÊ DE VIAJAR

Afonso Reis Cabral é um viajante. Um viajante que percorre não só caminhos,


como também estradas de sentimentos, montanhas de pensamentos e rios cheios de
histórias e curiosidades.

Quando Reis Cabral toma a decisão de percorrer a Estrada Nacional 2 a pé, não
está ciente de todo o conhecimento que irá reter desta viagem. Ao longo do livro o autor
relata diversos episódios que mostram a humanidade que é vivida como sentimento, a
alegria em forma de atos e a aventura em obstáculos. O que é certo é que Afonso sentia.
E sentia verdadeiramente. Sentia tudo, as sensações, os pensamentos, as atitudes. E este
sim é o verdadeiro porquê de viajar. Na introdução apresentei a definição do porquê de
viajar como “um espírito livre que tem a vontade e a curiosidade de conhecer o mundo
e de se conhecer a si próprio”, e é exatamente este o porquê de o Afonso querer partir
para a aventura.

Este explorador utiliza um exemplo de um livro que retrata a essência e a sua


motivação para esta viagem:

“O Melville começa o “Mobby Dick” por um capítulo


chamado “Miragens” em que descreve como a multidão
nova-iorquina que se dirige para perto da água, (...) e quer,
no fundo, pensar na vida, (...) [na] vitalidade da vida” 1.

Quando falamos no porquê de Afonso Reis Cabral querer fazer esta viagem, não pode
faltar a tentativa de “re”elevar a importância que esta estrada tem e que em tempos teve para todo
o Portugal. Se pensarmos bem, esta é a primeira (e única) estrada que liga Portugal inteiro, de
Norte a Sul, sem desfazer o centro do nosso país. Como refere no seu livro:

“Quando as autoestradas foram construídas, a Nacional perdeu-se


como via e ligação, mas deixou-nos o fio pendendo de Chaves a
Faro” 2.

5
Para mostrar a beleza e a grandiosidade da N2, Reis Cabral descreve-a de uma forma
quase épica, elevando-a a um patamar, que em tempos foi esquecido, como referiu na citação
anterior.

“São onze distritos, trinta e cinco concelhos, onze cidades, dezenas


de aldeias e localidades, várias serras e muitos rios...” 3.

Esta caracterização da estrada faz com que a vontade de a fazer seja elevada e traz para os
leitores uma ânsia de a descobrir, que talvez não existia antes de ouvir/ler o que Afonso Reis
Cabral nos conta.

A ideia de fazer uma viagem nunca antes realizada, talvez por ser um pouco dolorosa,
não fez com que o viajante desistisse de ir. Um dos fatores que talvez o tenha influenciado a
seguir em frente, foi o simples facto de ainda ser jovem. E ao contrário do que se pode pensar
isso é um peso importante quando se pensa em fazer uma viagem como esta. Um outro jovem
que viajou sem nunca desistir foi Gonçalo Cadilhe, que planeou a sua viagem de percorrer o
mundo em 12 meses, e não foram os 30 anos de espera que o fez desistir. Um exemplo de força
para seguir o sonho é João Leitão, que apesar de todas as adversidades que teve durante as suas
viagens e que o faziam repensar a ideia de continuar, conseguiu sempre dar a volta por cima e
seguir em frente com a ideia e conhecer o mundo. Assim como não foi a malária que fez com
que o blogger desistisse da sua viagem, não foram também as bolhas nos pés, a solidão, o
cansaço, e todos os outros obstáculos, que fizeram com que Afonso Reis Cabral desistisse da sua
viagem.

Estas comparações servem para mostrar que o que importa numa viagem é tudo o que se
vive nela, e que nunca serão as pedras que aparecem no caminho que farão um verdadeiro
viajante desistir da sua aventura, porque para ele, na realidade, o que importa mesmo é o
caminho e todas as experiências que vive ao percorrê-lo, sejam elas boas ou más.

6
4. “LEVA-ME CONTIGO”

De forma a dar voz à sua vontade de elevar e de partilhar a sua viagem, Afonso
Reis Cabral decidiu escrever um livro com o título “Leva-me Contigo – Portugal a pé
pela estrada nacional 2”.

Este livro foi escrito com o desejo de poder dar a conhecer ao mundo a sua
experiência, no entanto, o viajante já o havia feito diariamente, ao longo de toda a sua
viagem, através de publicações no Facebook. Essa é a grande particularidade deste
livro. É que esta não é a primeira vez que Afonso Reis Cabral partilha a sua viagem.
Neste livro existe um relato das suas experiências e aventuras, que vêm sempre
acompanhados por uma compilação de reações por parte do público, às publicações
feitas pelo aventureiro.

Esta é talvez a característica do livro que me despertou mais curiosidade em


relação aos outros. O facto de Reis Cabral ter conseguido contar a sua história sem
esquecer o apoio direto e indireto que recebia através da sua rede social, mostra um
nível de agradecimento pelo próprio para com aqueles que o tentaram ajudar, mesmo
não estando presentes fisicamente.

4.1. O DESEJO DE PARTILHAR

Quando tentamos perceber o porquê de Afonso Reis Cabral ter tido a vontade de
partilhar a sua história, basta olharmos e pensarmos no título que atribuiu ao seu livro.
“Leva-me Contigo” representa um apelo que agarra os leitores e que dá a entender que
estes querem partir à aventura com o autor.

No entanto, quando lemos o livro, apercebemo-nos da dimensão que o título tem.


Para além de se dirigir aos leitores este pedido retrata mesmo uma situação vivida pelo
autor enquanto percorria a Estrada Nacional 2 a pé.

“Nem roupa lavada ou decente para a idade. Com oito anos,


aparentava cinco. Tentou expressar-se, falar das estradas e

7
dos caminhos e da vida. Talvez só quisesse continuar a
brincar com os amigos. Mal o percebia. Antes de eu partir,
conseguiu por fim endireitar o português e disse-me: “Leva-
me Contigo”” 4

A citação acima retrata um episódio que Afonso Reis Cabral viveu durante a sua
viagem. Enquanto saia de Torrão, uma freguesia perto de Alcácer do Sal, Afonso
deparou-se com 3 crianças. Ao olhar para elas, Reis Cabral ficou em baixo por perceber
que estas não viviam com as condições que três crianças normais precisariam. Com
roupa suja e com um corpo e um olhar de fome, os meninos ficaram muito
entusiasmados por verem o viajante. O mais novo dos três, o rapaz de 8 anos, em êxtase
por ter visto o autor, começou a apontar para todos os caminhos que conhecia perto de
onde estava. No final, o menino que falava um “romenês” conseguiu fazer com que
Afonso Reis Cabral percebesse duas palavras por si pronunciadas: “Leva-me Contigo”.

Através deste exemplo conseguimos perceber que “Leva-me Contigo” representa


os sentimentos, os momentos e as emoções vividas pelas pessoas que partilharam a
viagem com Afonso Reis Cabral, aquelas que viviam a viagem através do Facebook e
aquelas que tiveram o privilégio de o encontrar ao longo desta aventura.

4.2. A HITÓRICA VIAGEM DE CHAVES A FARO

Afonso Reis Cabral percorreu ao longo de 24 dias cerca de 738 quilómetros,


tendo partido em Chaves no dia 22 de abril e terminado em Faro no dia 15 de maio.
Aventurou-se pela Estrada Nacional 2, sozinho e a pé onde passou por tudo aquilo que
podia imaginar, mas ainda mais importante, passou também por coisas que nunca lhe
passariam na cabeça. De todos os relatos que fez decidi destacar três:

1º relato:
“A mim faltava-me a força para andar mais depressa do que
o burro” 5

8
“Fui buscar um iogurte líquido e a mulher da caixa não mo
vendeu porque só vendiam o pacote de seis. Incapaz de levar
os seis, fui-me embora. (...) Quinhentos metros depois, um
carro acelerou na minha direção, apitou, o vidro desceu. Era
uma senhora que assistira à cena do supermercado. Uma
senhora com um iogurte na mão. (...) Mal acabei de o beber,
outro carro com outra senhora trouxe-me outro iogurte. (...)
Qual inveja das quatro patas do burro- estas pessoas é que
são invejáveis.” 6

Este primeiro relato situa-se no primeiro capítulo do livro, ou seja, no primeiro


dia da sua viagem. Neste primeiro momento do livro percebemos o confronto entre o
autor e a realidade da sua viagem. Através da primeira citação percebemos que o autor,
ao encontrar um burro que carregava sem dificuldade uma enorme quantidade de coisas,
começa a invejá-lo, pela força que o animal demonstrava. Através deste exemplo o
viajante mostra que não se sente tão preparado como pensava para enfrentar esta dura
viagem que terá pela frente, tendo em conta que a mesma lhe exigia um esforço físico
muito grande e um esforço psicológico ainda maior.

No entanto, após a leitura da segunda citação conseguimos perceber que Reis


Cabral ganha motivos para continuar a sua viagem. Ao deparar-se com a bondade das
pessoas que o auxiliaram Afonso ganha alguma esperança para o resto da viagem.
Agora pode continuar a sua viagem feliz mas arrependido de ter tido inveja do burro,
porque tem é inveja das boas pessoas, que mesmo sem o conhecerem, quiseram ajudá-lo
e servir-lhe o “banquete” que ele não podia levar.

Como foi referido anteriormente, o autor junta as suas histórias com as reações
das pessoas que o acompanhavam através do Facebook. Através de um comentário
divulgado no livro, podemos concluir este capítulo citando o mesmo:

“É bom termos tempo e vontade para valorizar as coisas


simples… magnífico.” Xana Azevedo- Facebook 7

9
2º relato:
"(...) estava uma família de ciganos. Interromperam o almoço
para me observarem: quinze pessoas e respectivos olhos.
Como me encaravam sem ceder, decidi sentar-me com eles.
A matriarca entregou-me de imediato a sua cadeira e deu
ordens aos familiares para me porem confortável. (...) Apesar
das dores a companhia acalmou-me. (...) Aliviado naquela
cadeira de plástico, lembrei-me do empregado do restaurante
nos arredores de Viseu, que resistira a deixar-me sentar
quando pedi um café." 8

O segundo relato escolhido foi aquele onde Afonso percorreu cerca de 30


quilómetros, entre Viseu e Adiça. Como percebemos após a leitura da citação, Reis
Cabral encontrou uma família de ciganos durante o seu percurso. Aquilo que podia ter
sido uma situação intimidadora, com quinze pessoas a olhar para uma pessoa só,
rapidamente tornou-se num momento especial e acolhedor para o viajante. Esta citação
mostra a essência da viagem e reforça mais uma vez o porquê de Afonso Reis Cabral
não desistir na mesma. A convivência com as pessoas e o perceber que de facto, ainda
há muitas pessoas que fazem o bem, faz com que o viajante queira continuar a conhecer.
A conhecer as paisagens, os cheiros, as pessoas e as suas histórias.

Outro retrato da bondade das pessoas para com Afonso é a reação que ele vai
tendo ao longo da sua viagem. A seguinte citação prova que, mesmo à distância, é
possível criarmos uma forte ligação com alguém:

“Adormeci sem saber de ti… acordei e fui procurar-te…


ainda bem que estás bem e vais bem. Que bom ler-te. Bom
caminho meu amigo” Marina Maia- Facebook 9

3º relato:
“Naveguei neste grande rio que desce Portugal, vendo na
sua água de asfalto o que nunca tinha visto, encontrando
quem nunca tinha encontrado. Comi banquetes de iogurtes.
Dormi sozinho em albergues que guardavam a memória de

10
peregrinos e caminhantes. Acordei em camas alheias no
cume de serras. Visitei olarias onde a forma do barro
revelava a forma da mão. Aprendi a ser bicho da chuva e
do sol. Soube andar quando só era possível descansar e
descansar quando só era possível andar.” 10

“Mas sobretudo espantei-me: a estrada foi mesmo um rio


que me levou às margens de novas pessoas, novas histórias.
Também me espantei com o entusiasmo por este diário do
caminho, dentro e fora do Facebook. E com tanto apoio. O
que agora escrevo já estava escrito em forma de saudade
antes de chegar ao marco simbólico dos 738 quilómetros”11

Estas duas citações foram retiradas do último capítulo do livro, o que quer dizer
são referentes à última caminhada desta viagem feita por Afonso Reis Cabral. Neste
último capítulo percebemos que o viajante caminha com o sentimento de nostalgia
sempre muito presente. Talvez por se estar a aperceber que conseguiu cumprir o seu
objetivo e que a viagem está a acabar. Quando Reis Cabral afirma, na última citação,
que a estrada foi um rio, mostra que esta viagem cumpriu o seu dever, conhecer novas
pessoas e histórias que elas tinham para contar. Mais uma vez, o Facebook também teve
muita influência no tópico de histórias, porque foi através dos comentários que foram
sendo feitos ao longo da viagem, que o autor ia encontrando alguma motivação para não
desistir. Quando afirma que: “O que agora escrevo já estava escrito em forma de
saudade” percebemos que, mesmo ainda não tendo terminado a sua viagem, a vontade
de a viver novamente é imensa.

4.3. A EXPERIÊNCIA DE ANDAR A PÉ

A forma de viajar é escolhida por cada viajante. Alguns viajam de barco, outros
de carro, mas Afonso Reis Cabral destacou-se por ter utilizado a forma mais comum do
ser humano: a pé. Este viajante decidiu caminhar pelo desconhecido. Pode parecer uma

11
loucura, no entanto, desde o início que Afonso tinha a certeza que este era o método
certo para cumprir esta viagem.

“(…) andar, para mim, era simplesmente chegar à noite,


por exemplo e dar um passeio de três quartos de hora, ou há
hora do almoço também um passeio de meia hora. E achava
que isto era perfeitamente conciliável, o gosto de andar e
querer descobrir o país, o interior do país, as pessoas do
interior e descobrir a Nacional 2 (…)” 12

Para Afonso Reis Cabral, esta viagem nunca poderia ter sido realizada com outro
meio de transporte. Para o autor, arte de ver a andar é muito ampla e muito mais
sensacional, ou seja, a andar, não estamos fechados entre quatro paredes. Temos a
liberdade de olhar para todos os lados sem nos restringir-mos àquilo que uma janela nos
permite ver. E é isso mesmo: ver não é através da janela do carro. É ver fisicamente,
com um campo de visão amplo, onde pode sentir tudo, a forma das coisas, os cheiros, o
vento, sentir, no verdadeiro significado da palavra. E estas sensações só são possíveis de
obter se andarmos a pé. A célebre frase: “O verdadeiro tesouro foi o que viveram até
encontrarem o baú” prova que a importância desta viagem foram exatamente estas
sensações que Afonso viveu intensamente no decorrer da mesma.

O olhar de Afonso é o único que não o deixa duvidar das coisas, porque os
nossos olhos não mentem. Aquilo que vemos é a realidade, mesmo que seja a nossa
realidade, e é nisso que acreditamos. Essa é mais uma das vantagens que o nosso olhar
nos dá. A veracidade daquilo nos mostra é quase indubitável. Um outro autor que se
destacou na história de viagens pelo seu olhar foi Cesário Verde. Apesar de serem
viagens completamente diferentes, Cesário também deambulava pela cidade para
observar e perceber o mundo. Apesar de não esquecer a subjetividade das coisas o poeta
viaja pela cidade e observa tudo à sua volta, para tentar entender o porquê das coisas.

É importante frisar que a forma de ver de um viajante não é a mesma que a de


uma pessoa que viaja por lazer. Quando um turista viaja quer, no máximo, obter uma
aprendizagem a nível cultural, sem nunca aprofundar e sem se questionar sobre o
porquê das coisas. Contrariamente a este, um viajante viaja para conhecer o mundo de
12
um modo mais profundo, mas acima de tudo viaja introspetivamente para se conhecer a
si próprio.

A melhor definição por mim encontrada foi um comentário de Teolinda Gersão


que afirma:

“Os turistas fogem em geral de si mesmos e procuram,


obviamente, as cidades reais. Os viajantes vão à procura de
si, noutros lugares e preferem as cidades imaginadas. Com
sorte conseguem encontrá-las. Ao menos uma vez na
vida”13

4.4. A PARTILHA ATRAVÉS DAS REDES SOCIAIS

Afonso, como muitos outros, decidiu partilhar a sua história. O que não foi tão
similar aos restantes escritores de viagens, foi o facto de antes de lançar o livro, a sua
história já estar publicada nas redes sociais, o que servia de motivação para Reis Cabral
continuar a sua viagem.
"Só esperava não ficar pelo caminho, o que era bem
possível, embora um bom falhanço também fosse uma
coisa boa; (...) para o conter, propus-me publicar um diário
do caminho" 14
No final do dia, antes de se deitar, o viajante publicava no Facebook um relato do
que havia acontecido nesse dia. No entanto, percebeu que a história não devia ficar por
aí. Rapidamente, e quando acabou a sua viagem, começou a escrever o seu livro. Apesar
de, ao primeiro pensamento, não parecer fazer sentido dar-se ao trabalho de escrever um
livro quando já tinha tudo publicado, se pensarmos melhor, o reviver da viagem, o ter de
escolher os momentos mais marcantes, aqueles que lhe deram outro rumo, tanto à
viagem como à sua própria pessoa, faz com que o autor faça um introspeção mais
profunda sobre tudo o que aprendeu. Escrever após a viagem dá aos leitores uma visão
um pouco mais profunda, pelo simples facto de o autor já ter tido tempo para pensar

13
naquilo que viveu e aperceber-se das situações realmente marcantes e importantes ao
longo do percurso.
Também a vontade de partilhar com o público foi um fator decisivo na
publicação do livro. A necessidade de enriquecer as pessoas com as suas histórias e com
as histórias daqueles com que se cruzava faz com que Afonso queira transmitir a maior
parte de tudo o que aprendeu.
No entanto não nos podemos esquecer que, apesar de tudo o que foi escrito e
publicado no livro ter sido verdade, uma leitura nunca vai ser uma experiência tão
enriquecedora como aquela que é viajar. Aquelas sensações descritas por Afonso vão
ser sentidas somente por ele. Nós podemos imaginar, mas para ele vão ser sempre uma
memória.

14
5. O DOCUMENTÁRIO: “LEVA-ME CONTIGO

Após o sucesso atingido com o lançamento do livro, surgiu pela mão de João
Pedro Félix a ideia de transformar a história num documentário, onde estivesse
registado certos pormenores que podiam ser ainda mais aprofundados.
O filme, que se baseia na experiência de Afonso Reis Cabral na Estrada Nacional
2, enaltece uma vez mais, a vontade do autor do livro, de partilhar a sua história, e com
isto, dar a conhecer às pessoas, um lado da história que podia ter ficado em aberto.
O documentário estreou a 16 de agosto de 2020 e é protagonizado pelo próprio
autor do livro.
Um pormenor digno de um parágrafo é a música que foi escrita propositadamente
para o documentário. “Memórias de Amor” canta a história de Afonso Reis Cabral,
enfatizando sempre as pessoas e as memórias que perpetuam na mente do viajante. Uma
música com o mar sempre como som de fundo, que mostra que o caminho andando por
Afonso teve sempre como principal objetivo, ir a pé até ao mar. Deixo agora o refrão
escrito, considerando que é uma boa conclusão para este parágrafo (e sentindo-me mal
por não poder fazer com que ouçam a música com a forma que eu ouço):

“Leva-me Contigo,
Perder a terra à vista,
Memórias de amor,
Saio do meu canto.
A saudade por cantar,
Deixo tudo atrás,
Leva-me contigo,
Só o vento faz mudar.” 15

15
6. CONCLUSÃO

Após a redação deste trabalho e da leitura do mesmo, existem várias conclusões a


que podemos chegar. A mais geral de todas é a perceção de que os viajantes viajam para
conhecer, e é graças à sua curiosidade e ao seu livre espírito que conseguem viajar a
sentir o mundo e a entenderem-se a eles próprios.
Relativamente ao livro “Leva-me Contigo” considero-o um grande exemplo da
escrita de viagens. Os livros deste género literário dão a conhecer o mundo pelos olhos e
pelas palavras de quem o viajou e é exatamente essa a função do livro em questão. A
proximidade que o autor cria com o público que o acompanhou durante a sua viagem é
um ponto de modernidade deste livro. Este público ficou cativado pela curiosidade e
pelo fantástico que a viagem de Afonso Reis Cabral foi, e são exatamente estas as
características principais do livro
É importante realçar a última ação relatada pelo autor no seu livro. Quando
chegou à praia, como forma de dar um ponto final nesta viagem, e em forma de alívio e
de “finalmente”, Afonso Reis Cabral mergulhou no mar. Esta viagem que o viajante fez
para conhecer o mundo e para se autoconhecer, foi uma viagem única, que lhe
proporcionou novos conhecimentos e que lhe abriu novos horizontes num mundo que
irá ser sempre desconhecido.

16
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 REIS CABRAL, Afonso, Leva-me contigo, 2019.

 SANTOS LOPES, Marília, Identidade em Vigem. Para uma História da Cultura


Portuguesa, 2015

 https://www.google.com/search?q=AFONSO%20REIS%20CABRAL%20POR
QUE%20A%20NACIONAL%202

 https://www.comunidadeculturaearte.com/primeiro-trailer-de-leva-me-contigo-
documentario-de-afonso-reis-cabral-o-jovem-escritor-que-percorreu-a-en2-a-pe-
em-24-dias/

 https://vidaextra.expresso.pt/artes/2019-09-25-Leva-me-Contigo-conheca-o-
documentario-que-acompanha-Afonso-Reis-Cabral-pela-Nacional-2

 https://umaturistanasnuvens.com/15-motivos-pelos-quais-viajar-e-tao-bom/

 https://www.researchgate.net/publication/308227227_Literatura_Portuguesa_de_
Viagens_pensar_viajar_e_escrever_no_seculo_XVI

 https://www.almadeviajante.com/livros/

 http://www.mediotejo.net/a-descoberta-afonso-reis-cabral-e-escritor-e-
descobriu-a-peos-738km-da-en2/

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CITAÇÕES

1. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo- O Documentário”


2. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, página 10
3. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, página 10
4. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, página 133
5. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, página 27
6. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, página 27
7. Comentário de Xana Azevedo, publicado no Facebook
8. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, páginas 61 e 62
9. Comentário de Marina Maia, publicado no Facebook
10. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, página 163
11. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, página 163
12. Afonso Reis Cabral, entrevista a RDP, junho de 2019
13. Teolinda Gersão, Cidade de Ulisses
14. Afonso Reis Cabral, “Leva-me Contigo”, página 21
15. Caio, “Memórias de Amor”, refrão

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