O filme "Deslembro" (2018) retrata o impacto da ditadura militar brasileira através da história de Joana, uma jovem que retorna ao Brasil após viver anos na França com sua família de exilados políticos. Ao lidar com traumas do passado e sua própria adolescência turbulenta, Joana gradualmente começa a compreender como os eventos da ditadura ainda afetam aqueles ao seu redor e como manter vivas as memórias do período é essencial.
O filme "Deslembro" (2018) retrata o impacto da ditadura militar brasileira através da história de Joana, uma jovem que retorna ao Brasil após viver anos na França com sua família de exilados políticos. Ao lidar com traumas do passado e sua própria adolescência turbulenta, Joana gradualmente começa a compreender como os eventos da ditadura ainda afetam aqueles ao seu redor e como manter vivas as memórias do período é essencial.
O filme "Deslembro" (2018) retrata o impacto da ditadura militar brasileira através da história de Joana, uma jovem que retorna ao Brasil após viver anos na França com sua família de exilados políticos. Ao lidar com traumas do passado e sua própria adolescência turbulenta, Joana gradualmente começa a compreender como os eventos da ditadura ainda afetam aqueles ao seu redor e como manter vivas as memórias do período é essencial.
O filme "Deslembro" (2018) retrata o impacto da ditadura militar brasileira através da história de Joana, uma jovem que retorna ao Brasil após viver anos na França com sua família de exilados políticos. Ao lidar com traumas do passado e sua própria adolescência turbulenta, Joana gradualmente começa a compreender como os eventos da ditadura ainda afetam aqueles ao seu redor e como manter vivas as memórias do período é essencial.
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CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC
SANTO AMARO
Edemilson Roberto da Silva Junior
Resenha Deslembro (2018), dirigido por Flávia Castro
São Paulo 2020 Resenha do filme “Deslembro” (2018)
Manter a memória viva é um dos valores mais preciosos da humanidade. Entre as
famílias que sofreram com a Ditadura Militar de 1964, este é um preceito recorrente. Lembro da história de como meu bisavô foi levado preso – uma imagem muito clara em minha mente, mesmo que não a tenha presenciado. Era um homem bem-quisto, que pertencia ao partido socialista da cidade, uma pequena ilha de Santa Catarina. Todos os dias, recebia em sua varanda (hoje a casa dos meus avós) vizinhos e políticos que o procuravam para conversar – como um médico em seu consultório. E foi ali, enquanto estava sentado na sua velha cadeira de balanço, que foi levado coercitivamente pelos policiais. Apesar do breu provocado pela noite densa naquela rua mal iluminada, formou- se uma pequena aglomeração que acompanhou atônita a situação. Ele foi solto da prisão pouco tempo depois. Todavia, aquilo provavelmente o mudou para sempre. E, consequentemente, toda a nossa família. “Deslembro” (2018), dirigido e roteirizado por Flávia Castro, compreende o impacto atroz de agressões como esta pela ditadura. Que transforma em vítima não apenas os perseguidos diretamente, mas toda as pessoas que os cercam. Compartilhando alguns temas com o ótimo “A Memória que me Contam” (2012), de Lúcia Murat, o filme acompanha Joana (Jeanne Boudier), uma jovem que morava na França com sua família de exilados políticos. É então que, durante o período de reabertura, decidem retornar ao Brasil – revisitando reminiscências dolorosas, como o assassinato de Eduardo (Jesuíta Barbosa), pai da menina e vítima do regime. É possível categorizar o filme dentro do subgênero de “coming of age”. As problemáticas são tratadas conforme Joana lida com seu amadurecimento. Desde a primeira cena vemos como é difícil para ela abandonar Paris. Seus amigos, um vizinho próximo, o estilo de vida e todas as agonias do passado no Brasil tornam esse retorno angustiante. E é admirável a abordagem de “Deslembro” de moldar tudo que presenciamos pela subjetividade da protagonista – uma escolha correta que valida e intensifica todos os dilemas propostos. Um exemplo é quando, ainda na França, a adolescente escuta uma música apresentada por Luis (Julián Marras), atual companheiro de sua mãe (Sara Antunes). A mixagem sonora de Valéria Ferro condiciona o que ouvimos a ela. O mesmo acontece quando sua vó, Lúcia (Eliane Giardini), está mostrando a casa em que vive. A mulher gesticula, aponta para quadros e fala com um sorriso no rosto, contudo o único som audível é o de Caetano Veloso cantando repetidamente “show me from behind the wall”, que toca nos fones de Joana. É só quando os retira que podemos participar da conversa. Além de inserir a trilha-musical na diegese, a importância desses momentos está em explicitar que as percepções da moça filtram a realidade apresentada. A fotografia de Heloísa Passos também é hábil em acentuar esses elementos. Nos flashbacks, a diretora adota uma câmera baixa buscando simular o olhar de uma criança – condizente com a idade dela no período. A adolescência é um dos períodos mais intensos e tumultuados da vida – gerado por uma demanda hormonal e emocional que excede a experiência e maturidade. Assim, apesar do contexto histórico, é fácil se identificar com os impasses da jovem. A inadequação é um sentimento constante e a direção de arte retrata essas aflições através do figurino. Durante grande parte da projeção, Joana usa roupas pretas e opacas, enquanto sua família costuma alternar entre o vermelho (principalmente a mãe), o azul e o amarelo. Sobretudo nas primeiras cenas, após a viagem, essa escolha também soa como um ato de resistência ao “novo” país – além de escuras, as modelagens são compridas e parecem muito quentes para o clima brasileiro. É notável como as cores são usadas também para estabelecer relações entre os personagens. Joana e Enesto (Antonio Carrara), em seu primeiro encontro em uma festa, são os únicos com trajes negros. Esta estratégia os isola dos outros e logo estabelece uma conexão entre eles – que futuramente se tornará um romance. Um artifício semelhante é usado para delinear a relação da garota e sua mãe. Elas possuem um convívio difícil e estão constantemente em conflito. Portanto, até quase metade do filme, as duas nunca usam roupas da mesma cor. Isso só muda quando Joana começa a aceitar sua nova vida e quebrar as barreiras que as separam. Assim, em uma cena que Ana pergunta à filha qual camisa deve usar, ela responde apontando para uma cinza (do mesmo matiz que está vestindo). É inegável, no entanto, que o núcleo dramático de “Deslembro” se concentra na memória e os vestígios do regime militar. Todos os personagens são afetados de alguma forma pelas brutalidades do período. Ana sofre com toda a agonia que viveu e não é capaz de lidar com isso abertamente. Paco perdeu a mãe, Luis a esposa – ambos a terra natal. Lúcia nunca desistiu de solucionar a morte do filho. O quarto dele permanece intocado como um museu. Ela guarda jornais, documentos e dados que investigou. Quando perguntada se acha que um dia vão descobrir o que aconteceu com Eduardo, responde: “...o importante é a gente continuar procurando. E lutando para que o Estado reconheça o seu crime”. Mostrando como uma das maiores violências da ditadura está em abrir uma ferida que nunca desvanece. E que em Joana foi capaz de supurar até as emoções e sentidos. Apesar de tentar suprimir recordações da época, esses traumas surgem pusilânimes. Do escuro, em sua cama, emergem fragmentos do tempo da clandestinidade. Ao ver a foto de seu pai, recorda uma caminhada com ele e a mãe pela rua. Uma jabuticaba suscita os olhos esverdeados de seu progenitor. E todas essas memórias doridas que tanto suprimiu formaram uma base instável sobre a qual construiu a vida. E a direção de arte evoca isso ao criar uma alegoria usando raízes/galhos. Eles aparecem em um relevo no quarto da moça, em uma cena logo após ela ver o retrato de seu pai, de forma relacional no plano detalhe das veias da mão de uma escultura de aleijadinho (que também se torna uma rima visual de Ernesto acariciando Joana) e, especialmente, na casa em que se escondiam dos militares. É a sinalização de como aquele episódio originou todo o sofrimento que se sucedeu. Até o ponto de a adolescente sofrer por uma lembrança de algo que nunca ocorreu. E o diálogo entre a menina e a mãe sobre essas memórias se coloca, não como uma solução para as perdas, entretanto como um apaziguador, um mecanismo para lidar com os traumas. Algo que é ilustrado pelo figurino de Joana ao final do filme. No carro com a família, ela usa verde pela primeira vez – uma cor ligada ao seu pai (tom de seus olhos e que ele aparece vestindo em um dos flashbacks). Foi através de uma conversa parecida com minha mãe, que descobri que muitas recordações que tinha de meu bisavô, Antenor, não eram reais. A casa de onde foi levado pela polícia não era a atual de meus avós (como a imagem tão clara que criei). Pois só foi construída anos depois do ocorrido. Ele não ficou preso apenas por alguns dias (chegou a ser torturado em cárcere). Após sofrer ameaças, teve que se exilar do Brasil – passou todos os anos da ditadura longe do país. Voltando apenas durante a reabertura. Uma história muito semelhante à da família de Joana. Que eu fui modificando com o tempo e só redescobri através dessa investigação sobre o passado. Um aprendizado que compartilho com a protagonista de “Deslembro”: manter a memória viva é um dos valores humanos mais importante.