Representações Sociais Sobre A Saúde-Doença Na Velhice: Um Diagnóstico Psicossocial Na Rede Básica de Saúde
Representações Sociais Sobre A Saúde-Doença Na Velhice: Um Diagnóstico Psicossocial Na Rede Básica de Saúde
Representações Sociais Sobre A Saúde-Doença Na Velhice: Um Diagnóstico Psicossocial Na Rede Básica de Saúde
Esta tese foi julgada adequada para a obtenção do título de Doutor em Enfermagem; área
de Concentração: Filosofia em Saúde. Foi aprovada na sua forma final pelo Programa de
Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina em 22 de
Dezembro de 1999.
j ;
-Membro-
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeço à Profa. Clélia pela sua sensibilidade, dedicação,
disponibilidade e capacidade para me orientar nos meus estudos de pós-graduação no
Brasil.
A meu esposo, não só pela sua dedicação para eu poder realizar minha tese, mas
também pelo seu amor e apoio que nunca me faltaram.
A Pós-graduação em Enfermagem que tomou possível minha formação em Pós-
graduação, em especial às professoras Lúcia, Alacoque e aos funcionários Helena,
Cecília, Sandro e Danilo.
A minha mãe que com tanto amor fez parte desta tese apoiando-me
incondicionalmente em tudo o que necessitei.
A um amigo muito especial, Brígido, que além de se dispor a ser membro de
minha Banca, ajudou-me sempre que eu necessitei.
A minha filha Sabine que está por nascer, ela também fez parte deste trabalho.
A meus colegas e amigos de Doutorado que também me ajudaram neste trabalho,
embora longe de mim: Clara, Marta, Carin, Mauro e Geney.
A todas as pessoas que voluntariamente se dispuseram para colaborar como
sujeitos de pesquisas para este trabalho.
RESUMO
O presente estudo concentrou-se ao redor de duas temáticas, a representação social da saúde-doença na
velhice e as necessidades de saúde de dois grupos de pessoas idosas. O objeto de estudo desta pesquisa
(saúde- doença na velhice) está intimamente relacionado às práticas de saúde de pessoas idosas e de
trabalhadores da saúde. A saúde-doença constitui um assunto que continuamente tenta ser explicado pelos
indivíduos. Ao redor desse saber, os grupos de pessoas tecem todo um conjunto de conhecimentos de senso
comum no intuito de compreendê-lo. Perante a ausência de um conhecimento acabado sobre o que significa
ser saudável ou doente na velhice, as pessoas idosas tentam construir teorias de senso comum que
expliquem os aspectos que não compreendem e que são tão importantes para suas vidas. Dessas teorias de
senso comum dependem muitas vezes as práticas que eles terão em relação à sua saúde ou à sua doença. Os
idosos não são as únicas pessoas interessadas na temática saúde-doença na velhice. Os indivíduos cujas
práticas sociais se direcionam ao idoso, também constroem representações sociais acerca do fenômeno
saúde-doença na velhice. Dentre esses indivíduos podemos citar os trabalhadores dos centros de saúde da
rede básica de saúde ou as pessoas que se dedicam a cuidar de pessoas idosas. Um dos problemas mais
freqüentes do planejamento de programas sanitários na população idosa é, muitas vezes, a falta de
correspondência entre os objetivos dos serviços de saúde e as necessidades reais desse grupo etário. A
representação social pode agir como uma expressão fenomenológica de necessidades sentidas de saúde dos
idosos. A problemática deste trabalho centrou nos seguintes questionamentos: - como, em nivel de senso
comum, pessoas idosas, cuidadores de idosos e os próprios trabalhadores da saúde, tomam familiar o
conceito saúde-doença na velhice?; - existirão atritos e conflitos nos três modos de representar esse
assunto?; - como a teoria das representações sociais pode contribuir para a expressão fenomenológica de
necessidades sentidas em matéria de saúde? Nosso interesse em explorar os conteúdos representaciones da
saúde e da doença do idoso em três dos principais gestores do atendimento (o trabalhador, o cuidador de
pessoas idosas e o cliente idoso), estabeleceu-se a partir do seguinte juízo: cada uma das representações
permite analisar qual é a relação que existe entre as representações dos idosos acerca da sua saúde e de sua
doença, a dos cuidadores, e a de quem está oferecendo o serviço de saúde. Os participantes do estudo foram
distribuídos em quatro grupos. Um grupo de quarenta (40) idosos que procuravam serviços de atendimento
por problemas de saúde, quer dizer, diziam sentir-se doentes no momento da coleta de dados. Um outro
grupo de quarenta (40) idosos que eram atendidos na Policlínica, não por sentirem-se doentes, e sim para
receber orientações sobre cuidados preventivos de saúde. Um grupo de quarenta (40) trabalhadores de um
Centro de Saúde da rede municipal do Sistema Único de Saúde de Florianópolis (Policlínica II do Bairro de
Estreito). Por último, um grupo de vinte (20) pessoas, que cuidavam de idosos hospitalizados na Clínica
Médica do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, ou que
acompanhavam idosos doentes que eram atendidos nas consultas ambulatoriais do mesmo hospital. As
técnicas de coleta de dados foram duas: uma Técnica de Evocação Livre de Palavras e uma Técnica de
Entrevista Padronizada. Os resultados obtidos nos grupos de idosos (fundamentalmente, o grupo de idosos
doentes) mostram que, de acordo com o que tem sido normatizado na Política Nacional do Idoso, há
problemas de saúde que não deveriam existir. Não existe a esperada correspondência entre os programas de
saúde e as necessidades sentidas de saúde dos grupos entrevistados. O problema está nos serviços de
atendimento do Centro de Saúde pesquisado. Ao que parece, esse centro não consegue implementar todos
os programas necessários para resolver os problemas de saúde da população idosa que atende. Os
resultados obtidos mostram que as representações sociais podem ser uma ferramenta muito importante para
a exploração de necessidades sentidas de saúde dos idosos participantes. O diagnóstico psicossocial de
representações sociais da saúde-doença na velhice que foi obtido, refletiu como o indivíduo leigo (neste
caso os grupos de idosos e de cuidadores de pessoas idosas), têm consciência do que é a saúde de um idoso
e do porquê de sua doença. Acredita-se que o trabalho mostra que as necessidades de saúde de um idoso
não devem ser deduzidas somente de pessoas doentes. Encontraram-se vários conteúdos de representações
da saúde-doença que foram compartilhados entre os diferentes grupos de pesquisa. Isso indica que os
achados deste trabalho podem contribuir com a eficácia daquelas ações de saúde, direcionadas ao idoso,
que a Policlínica pretenda desenvolver.
ABSTRACT
The present study was concentrated around two thematics: the social representation o f the health-illness in
the old age and the health necessities o f two groups o f elderly people. The study object of this research
(health-illness in the old age) is intimately related to elderly people health practices and workers o f the
health. The health-illness forms a subject that tries continuosly to be explained by individuals. Around this
learning, the group o f people weave a joint o f knowledges o f conunom sense with the purpose of
comprehend it. Before the absence of an unfinished knowledge about what means to be health or ill in the
old age, elderly people try to build theories o f common sense that explain the aspects that they don’t
understand and are so important for their lives. Many times the practices that they will have, related to
health or illness, depends on these theories o f common sense. Elderly people are not the only ones
interested in the health-illness in the old age thematic. The individuals whose social practices are directed
to the elderly people also build social representations about the health-illness in the old age phenomenon.
Among these individuals we can quote the health centers workers of the basic health network or the people
who dedicate themselves to elderly people care. One o f the most frequent problems o f the sanitary
programs planning in the elderly population is, many times, the lack o f correspondence between the health
services aims and the real necessities o f this age group. The social representation can act as an
phenomenological expression of health felt necessities of the elderly people. The problematic o f this work
was concentraded in the following questionings: - how do the elderly people, people that take care o f them
and the workers of health themselves become familiar with the concept of health-illness in the old age in
the level o f common sense?; - there will be disagreements and conflicts among the three ways of represent
this subject?; - how can the theory o f the social representations contribute to the phenomenological
expression of felt necessities talking about health? Our interest in exploit the representional contents of
health and illness o f the elderly in three o f the principal service managers (the worker, the one who takes
care o f elderly people and the elderly client) was established from the following sense: each o f the
representations allows us to analyze what is the relation among the elderly people representations around
health and illness, the ones who take care o f them and the one who is offering the health service. The
participants o f this study were divided in four groups. One group o f forty (40) elderly people that were
looking for service programs because o f health problems, it means, they said they were feeling ill in the
moment o f the data collection. Another group o f forty (40) elderly people who were being attended in
“Policlínica”, not for feeling ill but to receive orientations about health preventive cares. One group o f forty
(40) workers o f a Health Center o f the municipal network o f the Unique Health System of Florianópolis
(Policlínica II o f Estreito Neighborhood). Finally, a group o f twenty (20) people who took care of
hospitalized elderly people in the Medical Clinic o f the University Hospital o f Universidade Federal of
Santa Catarina, Florianópolis or accompanied ill elderly people who were attended in the out-patient clinic
consultation in he same hospital. There were two data collection techniques: a Free Word Call To Mind
Technique and a Standardized Interview Technique. The obtained results with the elderly group
(fundamentally, the ill elderly group) show that, according to what has been standardized in the Elderly
National Politics, there are health problems that should not exist. There isn’t the hoped correspondence
among the health programs and the health felt necessities of the interviewed groups. The problem is in the
service programs o f the Health Center that was researched. We can see that this center can not establish all
the necessary programs to solve the elderly population health problems that it attends. The obtained results
show that the social representations can be a very important tool to the exploitation o f health felt necessities
o f the elderly people participant. The psychosocial diagnoses o f social representations o f the health-illness
in the old age that was obtained reflects how the lay individual (in this case the group o f elderly people and
the ones who take care o f them) has the conscious o f what is health of an elderly person and the why of
his/her illness. It’s believed that the work shows that the health necessities o f an elderly person can not be
deducted only as ill people. Many health-illness representation contents that were shared among the
different research groups were found. This indicates that the things found with this work can contribute to
the effectiveness o f those health actions directed to the elderly people that “Policlinica” intends to develop.
SUMARIO
1. INTRODUÇÃO....................................................................................................1
2. REFERENCIAL TEÓRICO.............................................................................. 10
2.1. ALGUMAS CONCEPÇÕES SOBRE O PROCESSO SAÚDE-DOENÇA
........................................................................................................................... 10
2.2. PLANEJAMENTO DE SAÚDE E NECESSIDADES DE SAÚDE........ 28
2.3. POLÍTICAS E PROGRAMAS DE SAÚDE AO IDOSO NO BRASIL... 37
2.3.1. A primeira república (1889-1930).................................................... 37
2.3.2. O período populista (1930-1950)...................................................... 38
2.3.3. Período de desenvolvimento (1950-1960)........................................ 40
2.3.4. Período do Estado Militarista e o Milagre Brasileiro (1964-1984).... 41
2.3.5. O período da Nova República: a Reforma Sanitária e a Saúde nos anos
80-90...................................................................................................45
2.4. A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS.................................. 51
2.4.1. O conceito de representação social................................................... 51
2.4.2. Análise estrutural das representações sociais.................................... 65
2.4.3. Os processos de elaboração e funcionamento da representação social:
a ancoragem e a objetivação.............................................................. 68
2.5. REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E NECESSIDADES DE SAÚDE........ 74
3. METODOLOGIA...............................................................................................84
3.1. MODELO DO ESTUDO E PARTICIPANTES....................................... 84
3.2. MÉTODOS................................................................................................88
4. DISCUSSÃO DE RESULTADOS..................................................................... 93
4.1. CARACTERIZAÇÃO GERAL DOS GRUPOS PESQUISADOS.......... 93
4.1.1. Idosos doentes....................................................................................93 -v.
4.1.2. Idosos saudáveis................................................................................ 94
4.1.3. Trabalhadores do Centro de Saúde II do Bairro de Estreito............. 94
4.1.4. Grupo de Cuidadores de Pessoas Idosas:.......................................... 95
4.2. DISCUSSÃO DE RESULTADOS DA TÉCNICA DE EVOCAÇÃO
LIVRE.....................................................................................................95
ix
LISTA DE TABELAS
TABELA 1: Saúde na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pela amostra total. Florianópolis, 1999.....................................................98
TABELA 2: Saúde na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pelo grupo de idosos doentes. Florianópolis, 1999................................. 101
TABELA 3: Saúde na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pelo grupo de idosos saudáveis. Florianópolis, 1999............................. 102
TABELA 4: Saúde na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pelo grupo de Trabalhadores da saúde. Florianópolis, 1999.................. 103
TABELA 5: Saúde na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pelo grupo de Cuidadores de pessoas idosas. Florianópolis, 1999......... 105
TABELA 6: Doença na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pela amostra total. Florianópolis, 1999................................................... 117
TABELA 7: Doença na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pelo grupo de idosos doentes. Florianópolis, 1999................................. 119
TABELA 8: Doença na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pelo grupo de idosos saudáveis. Florianópolis, 1999............................. 121
TABELA 9: Doença na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pelo grupo de Trabalhadores da saúde. Florianópolis, 1999.................. 123
TABELA 10: Doença na velhice. Freqüência de evocação e Ordem média de palavras
evocadas pelo grupo de Cuidadores de pessoas idosas. Florianópolis, 1999......... 124
XI
LISTA DE DENDOGRAMAS
DENDOGRAMA 1: Distribuição das classes na representação de um idoso saudável-
Grupo de idosos (n=80). Florianópolis, 1999......................................................... 144
DENDOGRAMA 2: Distribuição das classes na representação de um idoso saudável-
Grupo de trabalhadores da saúde (n=40). Florianópolis, 1999.............................. 154
DENDOGRAMA 3: Distribuição das classes na representação de um idoso saudável-
Grupo de cuidadores de pessoas idosas (n=20). Florianópolis, 1999..................... 165
DENDOGRAMA 4: Distribuição das classes na representação de um idoso doente-
Grupo de idosos (n=80). Florianópolis, 1999......................................................... 171
DENDOGRAMA 5: Distribuição das classes na representação de um idoso doente-
Grupo de trabalhadores da saúde (n=40). Florianópolis, 1999............................... 185
DENDOGRAMA 6: Distribuição das classes na representação de um idoso doente -
Grupo de cuidadores (n=20). Florianópolis, 1999.................................................. 196
1. INTRODUÇÃO
teoría, cujo valor heurístico nos últimos 10 anos tem sido cada vez mais produtivo: a
Teoria das Representações Sociais.
Justo na introdução deste trabalho, não gostaríamos de ter que recorrer a citações,
entretanto achamos pertinente ressaltar um aspecto que foi assinalado pelo próprio
Moscovici na Quarta Escola de Verão sobre Representações Sociais e Comunicação,
realizada em São Sebastian, Espanha, em 1998 e da qual participamos. Moscovici referiu
um aspecto que concerne a nós, psicólogos sociais, e que acho de vital importância: um
psicólogo social não deve separar os fenômenos psíquicos dos fenômenos sociais e deve
pesquisar os fenômenos que são de relevância social. A saúde-doença é, na nossa opinião,
um fenômeno social extremamente importante e problemático, dadas as condições sociais
pelas quais o Brasil passa na atualidade.
Uma das justificativas que faz com que a Teoria das Representações Sociais
mantenha seu valor heurístico deve-se ao fato de que ela consegue resgatar a relação que
existe entre o indivíduo e os objetos que fazem parte de seu mundo. Em outras palavras, a
teoria permite refletir sobre como o sujeito e o grupo constroem o mundo e a si próprios.
Só que não se trata de um mundo qualquer, e sim do mundo que faz parte de sua vida
cotidiana, que age como foco de suas conversas. É por essas razões que a Teoria das
Representações Sociais conseguiu atingir o cruzamento da Psicologia Social com as
Ciências Sociais.
A representação social constitui um universo consensual de conhecimentos que é
produzido pelo indivíduo para poder comunicar-se e entender tudo aquilo que lhe é
estranho e não familiar. Essa última afirmação evidencia o seguinte: qualquer assunto não
se toma um objeto de representação social para os grupos, e em consequência, nem todos
os fenômenos do mundo que rodeiam o indivíduo são tributários de converterem-se em
problemas de pesquisa científica da representação social. Daí a importância da tomada de
decisões sobre qual será o objeto de estudo de uma representação social.
No caso de nosso objeto de estudo (a saúde e a doença na velhice), salientamos
que não é a primeira vez que o mesmo faz parte da pesquisa em representação social,
seja, como diz Sá (1998), pelo caráter extremamente ameaçador que a saúde e a doença
têm para o indivíduo, ou pela atualidade que a temática apresenta não só para os que
3
constroem teorias científicas, mas também para os amadores que tentam entender o
porquê da sua saúde e de sua doença.
Gostaríamos de salientar que, apesar do grande número de pesquisas feitas no
Brasil ao redor do conceito de representação social, nosso trabalho não é o resultado de
uma simples euforia investigativa a mais. Na identificação da problemática deste estudo
intervieram alguns fatos que, no nosso modo de ver, justificaram o trabalho, assim como
a relevância social que ele pretendeu atingir.
O objeto de estudo desta pesquisa (saúde- doença na velhice) está intimamente
relacionado às práticas de saúde de pessoas idosas e de trabalhadores da saúde. A saúde-
doença constitui um assunto que continuamente tenta ser explicado pelos indivíduos. Ao
redor desse saber, os grupos de pessoas tecem todo um conjunto de conhecimentos de
senso comum no intuito de compreendê-lo.
Perante a ausência de um conhecimento acabado sobre o que significa ser
saudável ou doente na velhice, as pessoas idosas tentam construir teorias de senso comum
que expliquem os aspectos que não compreendem e que são tão importantes para suas
vidas. Dessas teorias de senso comum dependem muitas vezes as práticas que eles terão
em relação à sua saúde ou à sua doença.
Os idosos não são as únicas pessoas interessadas na temática saúde-doença na
velhice. Os indivíduos cujas práticas sociais se direcionam ao idoso, também constroem
representações sociais acerca do fenômeno saúde-doença na velhice. Dentre esses
indivíduos podemos citar os trabalhadores dos centros de saúde da rede básica de saúde
ou as pessoas que se dedicam a cuidar de pessoas idosas.
Pressupomos, que dentro das práticas e dentro dos universos representacionais de
conhecimentos de idosos, de trabalhadores da saúde e de cuidadores, o fenômeno saúde-
doença na velhice poderia atingir diversos pontos de confronto. A partir desse elemento
surgiu um primeiro questionamento que nos fez pensar na possibilidade de execução
desta pesquisa. Contudo, essa questão que em princípio inquietou-nos, somente se tomou
um ponto de partida para investigar outros fatos que objetivamente pudessem justificar o
problema de pesquisa. A seguir, expomos esses fatos e suas interpretações.
Um primeiro fato está relacionado a fatores de ordem sociodemográfica. Em
1900, no Brasil, a expectativa de vida ao nascimento era de 33,7 anos. No entanto, com o
4
decorrer do século XX, essas cifras dobraram-se, até atingir, nos anos 80, 63,5 anos
(Berquó, 1996). Hoje, o país se encontra numa fase de transição epidemiológica, embora
essa não se comporte uniformemente em todo o território nacional. As regiões de maior
migração populacional, menores taxas de mortalidade infantil, baixos índices de
fecundidade e melhores condições socioeconómicas, parecem ser as mais privilegiadas
para esse envelhecimento demográfico.
Essa transição demográfica do Brasil se reflete no aumento dos números totais e
relativos de idosos no país. Para o ano 2000, o crescimento das proporções de pessoas
acima de 65 anos em relação ao número total da população será de 4,36 para os homens,
e 5,86 para as mulheres. Para 2020, essas cifras aumentarão, no sexo feminino, para 8,80,
e no masculino, para 6,37 (Berquó, 1996).
Segundo os Anais do I Seminário Internacional de Envelhecimento Populacional
para o ano 2020, realizado em Brasília em 1996, o Brasil será, em 2020, o quinto país em
população de idosos em nível mundial, com 33 milhões de pessoas, o que seria quase três
vezes mais do que há hoje. Os principais problemas associados a esse envelhecimento são
a velocidade com que o mesmo geralmente ocorre e a quantidade de idosos com
dependência funcional e doenças crônicas com sérios efeitos incapacitantes (Ministério
da Previdência e Assistência Social, 1996). Nesse seminário, o Diretor do Programa de
Saúde e de Envelhecimento da Organização Mundial da Saúde assinalou o seguinte:
“Envelhecer é um triunfo, mas para gozar da velhice é preciso dispor de
políticas adequadas que possam garantir um mínimo de condições de qualidade
de vida para os que chegam” (Kalache, 1996, p. 14).
A partir dessa nova situação demográfica, o governo desenhou uma política
nacional de atenção ao idoso que inclui, dentro de suas ações prioritárias, as questões
relacionadas à saúde.
O crescimento do número de pessoas maiores de 60 anos requer que, do ponto de
vista social, sejam levadas em consideração múltiplos fatores que já foram colocados na
Primeira Assembléia Mundial do Envelhecimento, em Viena, que reuniu representações
de 98 países (OMS, 1984). Um desses fatores está relacionado aos cuidados em saúde.
Segundo algumas das conclusões dessa assembléia, as práticas sanitárias em relação ao
idoso exigem, mais do que em qualquer outra idade, uma série de medidas. Por exemplo:
5
questão das perdas em detrimento dos ganhos. Alguns conteúdos remeteram a doenças, a
incapacidades, à velhice como paralisia da vida, ao sofrimento do corpo e à morte, entre
outros (Guimarães, 1997; 1998).
Um último fato diz respeito ao seguinte: na rede básica de saúde de Florianópolis,
não existem estudos da compreensão do processo saúde-doença na perspectiva da noção
da representação social, no que se refere ao próprio idoso, ao cuidador da pessoa idosa e
ao trabalhador que oferece seus serviços.
Associado a esse fato, existe o seguinte pressuposto básico: um planejamento de
programas de saúde que pretenda satisfazer as necessidades de saúde de sua população
precisa compreender os problemas que a atingem. Em várias ocasiões, os trabalhadores
de saúde não conhecem com profundidade esses problemas e, na maioria das vezes, nem
se interessam pelas teorias de senso comum que a população que atendem tem da saúde e
da doença.
Um dos problemas mais freqüentes do planejamento de programas sanitários na
população idosa é, muitas vezes, a falta de correspondência entre os objetivos dos
serviços de saúde e as necessidades reais desse grupo etário. Existe uma certa
descontinuidade entre a história da sociedade, dos grupos, e classes que a compõem, e os
planos normativos de saúde. Um processo de planejamento deve-se iniciar com a procura
de problemas advindos da própria comunidade. Não negamos a importância que têm os
métodos normativos de planejar programas de saúde. No entanto, existem outros métodos
que também ajudam a planejar programas programas de saúde. Trata-se aqui daqueles
métodos participativos que podem diagnosticar as necessidades de saúde a partir das
referências diretas da comunidade.
Sabe-se que um diagnóstico de necessidades está precedido da identificação de
problemas de saúde. Cabe nos perguntar se os próprios idosos não saberiam
compreender, representar e expressar quais são seus principais problemas de saúde.
Justamente, é ao redor deste fato que se encontra a contribuição deste trabalho de
pesquisa.
A interpretação desses cinco fatos conduziu-nos à seguinte questão: as práticas de
saúde devem negar os conhecimentos leigos dos idosos que atendem? Parece-nos que
não. Junto ao reconhecimento dessa realidade, é requerida uma explicação para ela. Uma
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idosos acerca da sua saúde e de sua doença, a dos cuidadores, e a de quem está
oferecendo o serviço de saúde.
Os objetivos do estudo foram os seguintes:
Objetivo Geral: explorar as representações sociais da saúde-doença que têm
vários grupos de indivíduos (idosos, cuidadores de pessoas idosas e trabalhadores de um
centro de saúde).
Objetivo Específico 1: delimitar os conteúdos e as informações das representações
sociais sobre a saúde e sobre a doença na velhice que têm diferentes idosos, cuidadores
de pessoas idosas, e trabalhadores de um centro de saúde.
Objetivo Específico 2: organizar a saliência dos conteúdos dessas representações
sociais da saúde e da doença na velhice.
A partir desses objetivos, esperou-se que, dentre os benefícios deste estudo,
estivesse a possibilidade de que o programa de atendimento ao idoso da Policlínica II do
Bairro de Estreito, em Florianópolis e o Hospital Universitário da Universidade Federal
de Santa Catarina incluam no seu atendimento alguns dos resultados obtidos neste
trabalho. Em última instância, esses resultados oferecem elementos sobre a compreensão
que idosos, cuidadores e trabalhadores da saúde têm acerca do que é a saúde e do porquê
da doença na velhice.
O presente trabalho está estruturado da seguinte forma: após a introdução da tese
segue um capítulo que contém o referencial teórico relacionado ao problema de pesquisa
deste estudo. Nesse referencial teórico foram desenvolvidos os seguintes temas:
• Algumas concepções sobre o processo saúde-doença;
• Planejamento de saúde e necessidades de saúde;
• Políticas e programas de saúde ao idoso no Brasil (desde a Primeira
República em 1889 até o período da Reforma Sanitária nos anos 80-90);
• Teoria das Representações Sociais (conceito de representação social, análise
estrutural das representações sociais e a ancoragem e a objetivação como
processos de elaboração e funcionamento da representação social;
• Representações sociais e necessidades de saúde.
9
que davam ao fato de que, na última fase da vida, existia maior probabilidade de se ficar
doente.
Já na Grécia Clássica, iniciou-se uma nova fase na história da medicina sustentada
no empirismo em que se procuravam estabelecer alguns princípios racionais de
observação para a interpretação da saúde e . da doença. Conforme Ferreira (1978),
existiram duas grandes descobertas naquela época que mudaram as concepções mágicas.
Uma, dizia que as doenças não eram caprichos dos deuses nem fruto da magia, e sim de
processos naturais que têm suas próprias leis, assim como a natureza tem as suas. A
outra, afirmava que o corpo humano tem seus poderes naturais de cura que não deviam
ser contrariados em estado de doença. Uma vez que a Grécia foi decaindo, a medicina
perdeu dois grandes avanços: seu humanitarismo, que só se restaurou durante o
cristianismo, e seu caráter racional, que foi reconquistado muito tempo depois, após as
primeiras descobertas científicas na segunda metade do século XIX.
Em geral, toda aquela medicina antiga e medieval explicava a origem das doenças
e da saúde a partir da teoria dos fluidos corporais, advinda da perspectiva humoral de
Hipócrates e seus seguidores. Outra das idéias para explicar a doença era pensar que
umas substâncias, chamadas miasmas, provenientes dos cheiros da putrefação, eram as
causas principais de muitos males.
A concepção humoral dos gregos a respeito da temática e sua ênfase na higiene
foi continuada por Galeno na Roma antiga. Segundo ele, a saúde deveria ser avaliada por
critérios de equilíbrio. Para Galeno, a saúde era o equilíbrio íntegro da natureza, e dos
humores que existem no homem na forma de uma cômoda harmonia de seus elementos.
A doença era, para ele, uma afecção, uma disposição, uma mutação do estado natural
para o antinatural. Nessas definições não existe uma concepção relacional entre o homem
e a natureza, ou seja, predomina uma visão parcial de equilíbrio que não pressupõe a
atividade do sujeito. De alguma maneira, são conceituações estáticas que demonstram
passividade no indivíduo, e não questionam nitidamente sobre aquilo que é natural no ser
vivo e o que não o é (Berlinguer, 1988; Sevalho, 1993).
Já durante toda a Idade Média, as representações da saúde e da doença
mantiveram um profundo caráter religioso. De uma parte, as noções de saúde individual e
saúde da comunidade estiveram muito limitadas pelos conceitos teológicos do pecado. De
13
e o escorbuto. Com isso, assentavam-se as bases para uma futura saúde pública, que
trataria dos problemas de saúde de pobres e de trabalhadores dos meios urbanos mais
desfavorecidos. No entanto, a humanidade teve que esperar até o século XVIII para o
nascimento de uma medicina clínica mais social. Conforme Foulcault (1979), foi somente
no século XVIII que, especialmente na França e na Alemanha, ampliaram-se as
intervenções médicas, penetrando o domínio do ambiente social. Aconteceu o tão
esperado advento de uma medicina social.
Durante a primeira metade do século XIX, países como a Inglaterra já apontavam
a existência de um círculo vicioso entre o adoecer e a pobreza. Defendia-se a idéia de que
os homens e mulheres adoeciam porque eram pobres e, ao mesmo tempo, o fato de serem
pobres piorava o seu estado de saúde. O século XIX ainda foi cenário de muitas
discussões acerca das origens miasmáticas das doenças e do contágio das mesmas. Era
uma medicina social, que ainda admitia que os miasmas e gases pútridos emanados do
apodrecimento de matérias eram os responsáveis pela doença.
A propósito da teoria dos miasmas, é interessante destacar que a mesma, também,
refletiu-se em Florianópolis em fins do século XVII. O historiador Cabral (1979, p. 471),
em seu livro sobre Nossa Senhora do Desterro, relata ao seu respeito o seguinte:
“A Câmara determinou logo as sempre lembradas medidas de asseio que, a não
ser em tais circunstâncias e apertos, nunca eram tomadas, exigindo a limpeza
dos quintais e dos logradouros, enquanto distribuía pelas esquinas barris de
alcatrão, aos quais se ateava fogo, para que a sua fétida fumaça afugentasse os
miasmasf...], e, visando o que pensava ser o agente propagador da febre
amarela, os tais miasmas”.
Segundo Sevalho (1993), o clima da medicina social teve graves conseqüências
sobre as populações pobres, no sentido de serem elas as portadoras da imundície social.
Isso provocou fortes debates acerca do chamado cheiro de rico e cheiro de pobre.
No decurso do século XIX, aconteceram alguns fatos que mudaram o rumo das
crenças que os pesquisadores daqueles tempos tinham sobre a saúde e a doença.
Um desses fatos deve-se às descobertas da era bacteriológica, iniciada em 1870
por Pasteur, Koch e Lister, que contribuíram com um modelo unicausal para a
comprensão da saúde e da doença. Para esses pesquisadores, tanto a saúde quanto a
16
doença eram respostas à presença ativa de agentes externos de tipo biológico. Outro fato
relevante deveu-se a um conjunto de questionamentos feito por vários estudiosos, ao
pesquisarem a origem de muitas epidemias naturais e artificiais que, nos séculos XVIII e
XIX, desenvolveram-se na Europa, estudo da influência de fatores como a pobreza e as
profissões sobre o estado de saúde. Muitas das causas da maioria das epidemias deviam-
se ao efeito de condições econômicas e sociais desfavoráveis sobre a saúde e sobre a
doença.
Nas décadas de 40 e 50 do século passado, na medicina, surgiu um movimento
reivindicatório que estabelecia alguns dos princípios da nova Medicina Social. Um desses
princípios estabelecia que a saúde do povo era um objeto de inequívoca responsabilidade
social do Estado. Outro dizia respeito às condições econômicas e sociais como fatores
que têm efeitos importantes na saúde e na doença. Um último princípio relevante
estabelecia que deviam ser tomadas providências, tanto sociais quanto médicas, para
promover a saúde e combater as doenças Esses princípios ficaram organizados num
projeto de lei de Saúde Pública, que foi submetido à aprovação na Sociedade Berlinense
de Médicos e Cirugiões, em Março de 1849 (Rosen, 1980).
A partir de 1848, essa Medicina Social desenvolveu-se como uma empresa de
intervenção sobre as condições de vida, o meio ambiente e até sobre a própria revolução
industrial. Durante todo o século passado, os poderes públicos começaram a se interessar
por assegurar alguns serviços de saúde que não eram garantidos pelas iniciativas
privadas. Progressivamente, ia-se gerando todo um pensamento de prevenção em saúde,
que alargaria o espaço da medicina curativa.
Além de todo o exposto anteriormente, nós concordamos com Rosen (1980)
quando afirma que, no desenvolvimento da medicina social, existiram dois pilares
fundamentais: os avanços da própria medicina da época e o desenvolvimento das ciências
sociais (antropologia, psicologia social, sociologia e economia).
Depois da Primeira Guerra Mundial, diferentes serviços organizados de saúde
pública foram se estendendo rapidamente por todo o mundo. Muitos países assumiram
diversos projetos para o controle de doenças, problemas de saúde escolar, rural e urbana,
problemas de saneamento, de bacteriologia, de epidemiologia, higiene industrial, higiene
dos alimentos e protecção matemo-infantil, entre outros. Ainda, na perspectiva de saúde
17
A partir de todas essas reflexões, como eles definem saúde? Canguilhem (1978) a
define pela capacidade de tolerância que o indivíduo tem com as infidelidades do meio.
Portanto, pode-se falar de saúde quando temos os meios para enfrentar as nossas
dificuldades e os nossos compromissos, sendo que a conquista e a ampliação desses
meios são tarefas individuais e coletivas. Todavia, o autor explicita o seguinte, a respeito
dos conceitos normal e saudável:
“O homem se sente normal, quando se adapta ao meio e a suas exigências, se
sente normativo, quando pode seguir suas normas de vida” (Canguilhem, 1978,
P-161).
Parece-nos que, mais do que em qualquer outra idade, ser sadio na velhice
representa possuir uma margem maior de tolerância às infidelidades do meio social
humano. Já a doença pode aparecer quando acontece uma redução dessa margem de
tolerância.
San Martin (1984) apresenta uma concepção muito semelhante à anterior. Para
ele:
“saúde é uma noção relativa que repousa sobre critérios objetivos e subjetivos
(adaptação biológica, mental e social), e que aparece como um estado de
tolerância e compensação física, psicológica, mental e social fora da qual,
qualquer outro estado percebe-se pelo indivíduo e\ou pelo grupo, como uma
manifestação de doença” (p. 80-1).
Observa-se, no conceito anterior, que o autor deixa claro que a saúde não é
privativa só do médico, mas relaciona-se com o ambiente de vida da população e do
indivíduo, com sua cultura e educação, com os comportamentos sociais e com o nível de
desenvolvimento social.
A propósito da referência que San Martin (1984) fornece sobre a relação que
existe entre o complexo saúde-doença e cultura, não se pode desprezar que uma das
qualidades que distingue o homem, é ser o criador e o transmissor de sua cultura. Como
tal, os múltiplos aspectos da cultura estão relacionados, direta ou indiretamente, aos
problemas de saúde e de doença do indivíduo ou do grupo. E ainda mais, a saúde e a
doença são valores sociais que se desenvolvem como resultado de condições de
22
restrição ou falta de capacidade para executar uma atividade dentro dos padrões
chamados normais. Por último, a invalidez é a desvantagem que um indivíduo apresenta
como conseqüência de uma deficiência e de uma incapacidade. A representação dessa
desvantagem como anormal dependerá da idade, do sexo e, principalmente, de fatores
socioculturais que o próprio indivíduo avalia.
O traço fundamental dos estados de invalidez é seu caráter socializado. Para o
indivíduo, esses estados representam as conseqüências sociais e ambientais derivadas da
presença de deficiências e de incapacidades (OMS, 1984). Vejamos, como se manifestam
essas conseqüências sociais.
Qualquer estado de invalidez constitui um fenômeno social e individual. O grau
de autonomia de um idoso e, em conseqüência, sua condição de sadio ou doente está em
função das relações que possam existir entre a deficiência, a incapacidade e a invalidez
que ele sente diante das demandas do meio. Nesse sentido, é muito ilustrativo o exemplo
fornecido pelo Informe Técnico antes mencionado. A Artrite é uma deficiência com a
qual uma pessoa pode viver muito tempo. Uma pessoa que tenha uma Artrite Moderada
nos joelhos, pode ter alguma incapacidade e sentir-se uma inválida se morar num
segundo andar, por exemplo, e tiver que subir escadas, ou fazer algum trabalho físico
para viver. Entretanto, outra pessoa com a mesma incapacidade, mas que more no térreo e
que não precise trabalhar por ter uma renda financeira boa, sentir-se-á muito menos
inválida que a primeira (OMS, 1984).
A relatividade implícita no conceito de saúde foi discutida até pelo próprio
Durkheim (1963) dentro do campo da filosofia e da sociologia. Ele refletia e assinalava
que a saúde do idoso não é a do adulto, assim como a do adulto não é a da criança.
Na relação “ser sadio / ser doente” na velhice poderíamos dizer, também, que a
noção de estar saudável remete-nos à idéia de estado compensado ou de equilíbrio
dinâmico, no qual é retardada a transição da deficiência à invalidez. Nesse estado, o
indivíduo pode receber agressões do meio e conseguir tolerá-las sem chegar ao
desequilíbrio. Já o estar doente reflete uma descompensação, uma intolerância, uma
invalidez e um desequilíbrio que termina numa falta de adaptação social.
27
sociais que os idosos têm do processo saúde-doença como uma forma de interpretar suas
necessidades de saúde.
pesquisa, toda ação que se implementa em nível desses determinantes, terá um efeito
sobre a saúde e vice-versa. Esse modelo tenta explorar aspectos observados e sentidos da
população no que diz respeito a um problema de saúde. Quer dizer, é um enfoque que
possibilita criar algumas ações de saúde a partir das referências que os indivíduos fazem
da condição de estar saudáveis ou doentes, em função das capacidades para se ocuparem
das suas funções pessoais, sociais e de trabalho.
Para um planejador de saúde, essas duas vias de investigação podem representar
dois enfoques complementares. O primeiro, atinge certas relações de causalidade entre
fatores e problemas de saúde; o segundo, explora o contexto sociocultural de todas as
ações possíveis que podem ser executadas rumo à condição de saudável de uma
população.
Em qualquer uma dessas formas de pesquisa, o objetivo mais importante de um
serviço sanitário é garantir a adequação entre as necessidades de saúde de uma
população, e os recursos colocados à sua disposição. E essa a principal razão pela qual
um conceito de saúde em qualquer idade tem que ultrapassar a definição científica que é
dada ao mesmo, para integrar os elementos leigos sentidos pelos indivíduos a respeito do
que é estarem doentes ou saudáveis. São esses últimos alguns dos indicadores sociais de
saúde mais esquecidos no planejamento sanitário. O subdesenvolvimento do sistema de
saúde de um país não diz respeito, somente, à falta de serviços em saúde, mas também à
dependência da população desses serviços, fenômeno que San Martin & Pastor (1989)
denominam como medicalização da saúde.
Consideramos que o fenômeno saúde-doença pode ser representado e interpretado
na ótica intercomunicacional dos indivíduos. Ele, da mesma forma que qualquer outro
assunto de interesse para os grupos, é susceptível de tomar-se um outro tipo de realidade:
a representação social da saúde-doença, através da mediação da comunicação, no cenário
das conversações da vida cotidiana. Segundo Birman (1991), são os sujeitos, membros de
grupos coletivos e históricos, os principais artífices e suportes da transmissão das
representações sociais. Essa concepção de saber comum sobre a saúde e a doença pode
ser tão valiosa quanto o próprio saber científico. É justamente nesse contexto que estão
inseridos alguns métodos de planejamento de saúde comunitária. Um modelo de
31
planejamento desse tipo toma como ponto de partida o estado de saúde sentida e
expressada pela população.
Pressupomos que, no caso de alguns grupos populacionais de idosos, poderia ser
executada, além da pesquisa epidemiológica de detecção de problemas de saúde, uma
abordagem social que permita explorar quais são as necessidades de saúde que essas
pessoas têm, a partir de seus próprios auto-informes. Esses auto-informes indicariam
aquela morbidade sentida que age como um indicador psicossocial de saúde.
A partir dos elementos anteriores cabe agora perguntar: o que é uma necessidade
de saúde e o que é um problema de saúde? Segundo Pineault & Daveluy (1989), a
determinação de necessidades de uma população vai além da identificação dos problemas
de saúde. A mesma precisa de uma análise dos serviços sanitários e dos recursos
disponíveis. No presente capítulo somente será feita uma discussão teórica no que diz
respeito às necessidades e aos problemas de saúde, de acordo com os objetivos desta tese.
E difícil uma definição precisa da noção de necessidade porque, assim como
acontece com a noção de saúde, ambas podem ser tanto objetivas quanto subjetivas. Esse
duplo significado se expressa não só na população, mas também nos próprios
programadores de saúde. De um lado, um grupo populacional pode confundir as
necessidades com os desejos e, de outro, o programador de saúde pode interpretar as
necessidades da população em função da demanda aos serviços curativos, segundo o
modelo de saúde que predomine.
Há muitas classificações das necessidades que o ser humano tem. San Martin
(1984) salienta que, do ponto de vista antropológico, por exemplo, existem necessidades
naturais e sociais. As primeiras, são absolutamente indispensáveis para a vida de um
indivíduo e originam-se nas exigências biológicas da espécie; as outras, são geradas na
vida em sociedade. No caso do ser humano, muitas necessidades sociais tomaram-se
naturais com o advento do desenvolvimento social, como por exemplo, alimentação,
moradia, vestuário, calefação, saúde e educação. Não existem contradições entre ambos
os tipos de necessidades. As oposições que podem ser geradas entre as duas ocorrem
quando os bens produzidos não correspondem às necessidades reais sentidas pela
população. Daí o fato de que o grau de satisfação das necessidades humanas de uma
população é um indicador bastante objetivo do nível de desenvolvimento de um país.
32
práticas têm demonstrado que atingir o ponto de convergência é, geralmente, uma tarefa
difícil. O alcance desse ponto chega até a ser um dilema. Na análise que San Martin &
Pastor (1989, p. 154) fazem da Economia da Saúde, eles expõem com bastante nitidez
este dilema, refletindo acerca dos múltiplos obstáculos que impedem atingir o ponto de
convergência:
“[...] as comunidades humanas declaram suas necessidades sentidas de saúde
(embora as mesmas não sejam as reais); ao mesmo tempo os epidemioíogistas
fazem o diagnóstico de saúde da comunidade (identificação de problemas e
riscos de saúde); os economistas da saúde intervêm nas prioridades e decisões
introduzindo o critério de eficácia econômica; os políticos que governam, com
uma ideologia determinada, decidem, em última instância, ao formular a
política de saúde (que deve representar os objetivos políticos do sistema social
que eles governam), o que se realizará na prática”
O ponto de convergência proposto por esses autores tem sido profundamente
discutido, também, por vários especialistas de organismos internacionais da saúde. Por
exemplo, em 1992, pesquisadores da Organização Panamericana da saúde (OPS) se
reuniram para refletir sobre algumas questões da chamada crise da saúde (Serie
Desarrollo de Recursos Humanos, 1992). No documento resumo dessefcencontro
aparecem duas características da crise: uma delas é a incapacidade de a saúde pública
atender as necessidades sociais de saúde; a outra, a ignorância da saúde pública no que
diz respeito às concepções e às práticas da população, em relação ao assunto saúde-
doença.
O documento (Serie Desarrollo de Recursos Humanos, 1992) salienta que este
quadro conduz a duas contradições no planejamento sanitário dos serviços de saúde: a
primeira consiste na manipulação quase exclusivamente individual dos problemas de
saúde e de doença, quando na realidade, os mesmos têm uma origem social comum; a
segunda diz respeito à ineficácia social das ciências da saúde e dos serviços médico-
sanitários.
Como apontam San Martin & Pastor (1989), uma crise é uma situação em que se
coloca a ruptura de uma continuidade. É certo que a crise mundial atual não está restrita
ao setor da saúde. Todos os setores sociais são afetados pelas consequências da crise da
36
economia mundial. No caso particular da saúde, San Martin & Pastor (1989),
acrescentam que a crise da saúde se manifesta através de três fenômenos, que aliás,
encontram-se muito presentes na sociedade brasileira:
“[...]crise dos custos (aumento permanente e vertiginoso), crise da
acessibilidade (aumento dos grupos marginais sem atendimento em saúde) e,
crise de eficácia (estancamento dos indicadores de saúde)” (San Martin &
Pastor, 1989; p. 23).
O presente trabalho pretende mostrar uma possível solução, pelo menos no que
diz respeito ao terceiro fenômeno (crise de eficácia). Se algumas das necessidades sociais
que mais preocupam os grupos humanos são as da sua saúde e do ambiente de vida,
então, o desenvolvimento social de alguns serviços de saúde poderia sustentar-se nas
necessidades de saúde sentidas por esses grupos. A única forma que o indivíduo tem de
conhecer suas necessidades de saúde é sabendo o que é a saúde-doença através de uma
boa educação sanitária e através da participação na gestão de sua própria saúde.
Nosso intuito aqui é tentar mostrar como a noção psicossociológica de
representação social pode contribuir para o alcance do ponto de convergência
anteriormente exposto, pressupondo, de fato, que a representação não é um simples
reflexo do real. É uma construção, assim como o são, também, a saúde e a doença. Tanto
uma quanto as outras agem como construções que ultrapassam as fronteiras dos
trabalhadores da saúde para atingir o conhecimento leigo da população.
Para garantir a procura do ponto de convergência descrito por San Martin &
Pastor (1988), qual seria o método de planejamento sanitário que possibilitaria estudar os
problemas e as necessidades de saúde? Dentre a grande quantidade de enfoques
existentes para a identificação de necessidades (enfoque por indicadores, enfoque por
questionários e enfoque a partir de consenso), Pineault & Daveluy (1989) referem-se à
entrevista como uma técnica que, dentro do enfoque por questionário, é muito valiosa na
coleta de informações, embora ela se tome bastante difícil quando se trata de grupos
populacionais muito grandes. É neste ponto que achamos que o estudo da representação
social sobre a saúde e a doença pode ser uma valiosa ferramenta metodológica que
contribui com as técnicas da entrevista para a determinação de necessidades sentidas de
37
saúde nos grupos populacionais de idosos. É neste ponto, também, que nosso trabalho
apresenta sua contribuição.
A seguir, apresentamos uma síntese das principais políticas e programas de saúde
no Brasil, fazendo uma ênfase especial nas políticas de saúde ao idoso.
políticas e dos serviços de saúde era evitar que as doenças proliferassem, prejudicando a
exportação (Mendes, 1993). O principal coordenador desses serviços era a Diretoria
Geral de Saúde Pública.
Esse modelo de campanhas sanitárias destinava-se a combater de uma forma
interventiva e até repressiva, as epidemias urbanas e as endemias rurais que surgiam.
Segundo Luz (1991), foi-se consolidando toda uma estrutura de saúde de caráter
centralista, tecnoburocrática e corporativista que era ligada a um corpo médico
proveniente da oligarquia agrária. A partir da década de 10, e com o gradual processo de
industrialização do Brasil, o modelo econômico agroexportador foi desaparecendo, dando
passagem a um novo momento, que condicionou o surgimento das primeiras políticas e
programas de saúde vindos da Previdência Social.
Com a Lei Elói Chaves, de 1923, cria-se no país essa Previdência Social e, com
ela, diversas Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs), organizadas por empresas,
administradas e financiadas por empresários e trabalhadores (Mendes, 1993).
Relacionamos a seguir algumas das ações governamentais que foram dispostas
durante esse período para proteger a saúde das pessoas idosas.
No início do século XX, a cidade de Florianópolis, junto a outras regiões do país,
entrou num programa de urbanização e de higienização que teve como objetivos mais
relevantes “limpar” do atraso econômico as cidades, tirando as misérias sociais e todos
aqueles aspectos que denotassem certa distância da nascente industrialização. Na opinião
de muitos governantes, um dos elementos que mais refletia esse atrasso econômico eram
as pessoas de rua pobres e desvalidas. Obviamente, muitos idosos faziam parte desse
exército de pobres e necessitados. Eles eram obrigados a usar um botão de identificação
que lhes dava direito a uma quantidade de alimentos e remédios, ou simplesmente eram
enviados para asilos. Sabe-se que, em 1902, a primeira sociedade beneficente em cujo
estatuto se deu abrigo às pessoas idosas no estado de Santa Catarina (SC), foi o Asilo de
Mendicidade Irmão Joaquim (Sant'Anna, 1996).
urbanos, gerando uma grande massa operária que necessitava de atendimento de saúde.
Durante aqueles anos, o traço principal da assistência sanitária foi ser incluída nos
benefícios do seguro social, o que determinou, entre outras conseqüências, que a proteção
da saúde ficava muito restrita a trabalhadores urbanos que estavam sindicalizados, ou
formalmente vinculados ao mercado de trabalho. Uma outra característica importante do
funcionamento das CAPs naquele período era o fato de que, no seu financiamento,
aparecer um terceiro contribuinte: o Estado. Segundo Luz (1991), as principais
características desses anos foram:
• Proliferação de diferentes Institutos de Seguridade Social, organizados por
categorias profissionais.
• Impregnação de práticas clientelistas nos programas e serviços de atenção à
saúde. A maior parte deste clientelismo baseava-se no atrelamento dos
sindicatos e dos institutos ao estado.
De uma parte, a saúde pública no Brasil caracterizou-se por um forte centralismo,
verticalismo e autoritarismo corporativos, e de outra, as instituições médicas e a
Previdência Social adquiriram marcados traços de clientelismo, populismo e
paternalismo.
Do ponto de vista das políticas para com as pessoas maiores de sessenta anos, em
1934 foi decretado, pelo governo federal, a Pensão aos Idosos, alegando-se um certo
princípio de justiça social. Era, segundo Sant'Anna (1996), uma espécie de caridade
estatal processada legislativamente. Os legisladores daquela época viam a previdênca
como um recurso em favor da maternidade, contra as consequências de doenças na
velhice, contra a invalidez e contra a morte.
Durante aquele período, as ações governamentais em favor da saúde do idoso
estiveram muito influenciadas pelas políticas que o sistema previdenciário brasileiro
estava desenvolvendo. A partir de todo esse dispositivo legislativo da Previdência Social,
o governo planejou as políticas do idoso, mas, no seu planejamento, nem todos eram
merecedores da atenção do estado, quer dizer, nem todos os idosos eram cidadãos. Eram
privilegiadas aquelas pessoas organizadas em sindicatos ou em categorias profissionais
que faziam parte da política previdenciária. Segundo Sant'Anna (1996), no caso
específico de Santa Catarina, nos 40, 50 e 60, os índices de aposentadoria eram
40
ciências da saúde uma corrente fenomenológica que defendia, e ainda defende, que a cura
está baseada em valores, símbolos e sistemas de significados compartilhados, e que,
infelizmente, os mesmos estavam decrescendo, à medida que a medicina moderna se
tomava mais tecnológica e se afastava da experiência da vida cotidiana do ser humano.
No decorrer dos anos 80, com as primeiras eleições livres para o congresso,
desenvolveu-se no país um período de transição democrática.
Com base nas características deste período, segue uma breve resenha das políticas
de saúde que o governo criou para proteger o idoso. Nesse sentido concordamos com
Pinotti (1984) quando aponta que a adoção de qualquer política sanitária efetiva vai estar
influenciada pelo ponto de vista que os governantes têm do problema. Cabe ressaltar aqui
que ainda muitos dos legisladores do Ministério de Saúde avaliavam a saúde como um
produto a mais que o mercado vendia, e como tal só era comprado por aqueles que
tinham meios para isso. Era um sistema de saúde que continuava deformado.
Naqueles anos 60 e 70, o governo, e até os poucos médicos que atendiam idosos
no país, representavam a aposentadoria como um veneno social, um tóxico que debilitava
e aniquilava a sociedade. E obviamente, como a maioria dos aposentados eram pessoas
que ultrapassavam os 60 anos, a perda do vínculo empregatício significava uma mudança
social indesejável para qualquer cidadão. Associada a essa representação, Sant'Anna
(1996) aponta a aproximação da morte e o fato de não trabalhar que formavam, naquela
época, uma aliança inquebrável do Ministério de Saúde e de muitos médicos dedicados à
assistência aos idosos. De um lado existiam governantes que promoviam o crescimento
econômico, e de outro, aqueles médicos que tentavam retardar a velhice, como se o
aumento da expectativa de vida não refletisse o desenvolvimento econômico de um país.
Afortunadamente, essa situação não era a mesma em todos os estados. Dentro do
próprio clima reformista daquele momento, alguns jornais do país chamavam a atenção
da população para receber o idoso na sociedade com a dignidade que eles mereciam. Em
1965, criou-se a Associação Brasileira de Pessoas Idosas, entre outras associações de
aposentados. Na história do Brasil, a primeira atenção especial concedida aos idosos data
da Portaria 82 do Instituto Nacional da Previdência Social, de 4 de julho de 1974. Nela,
ficou previsto o amparo previdenciário para as pessoas maiores de 70 anos,
45
descentralizadora das Ações Integradas de Saúde (AIS) constituiu a base de uma nova
estratégia nas políticas de saúde. Mendes (1993) assinala que, em 1984, havia 112
municípios conveniados nas AIS e esse número passou a ser de 2.500 em 1987. Nesse
mesmo ano, o Ministério de Saúde e o Ministério da Previdência e Assistência Social
decretaram a criação do Sistema Unificado e Descentralizado da Saúde (SUDS).
Nos anos 80, exatamente em 1986, ocorreu em Brasília, no marco da Nova
República, um dos fatos de maior importância para a história da saúde no Brasil: a VIII
Conferência Nacional de Saúde que reuniu uma amostra representativa de trabalhadores
da saúde de todo o país e dela derivaram-se vários acordos que foram cruciais nesse
campo (Documentos da 8a Conferência Nacional de Saúde, 1986).
Um deles diz respeito à determinação social, histórica e econômica do estado de
saúde da população num país. Outro, refere-se à concepção da saúde como um direito
civil, quer dizer, como dever do estado e como direito do cidadão. Salienta-se aqui, como
um outro acordo extremamente importante, a proposta de reformular o Sistema Nacional
de Saúde e substituí-lo por um Sistema Único de Saúde (SUS), altamente descentralizado
e de participação popular.
A partir dessa etapa, aumenta a eficácia dos serviços e dos programas sanitários,
respondendo um pouco mais às demandas da população. Iniciou-se um período de revisão
crítica da excessiva medicalização do processo saúde-doença e desenvolveu-se a
necessidade de um atendimento fundamentado nos modelos participativos de saúde.
Mendes (1996, p. 77) aponta uma conclusão importante a respeito dos ganhos e das perdas
do SUS durante todos esses anos:
“Em outros termos, os ganhadores do SUS são a maioria silenciosa que conta
pouco no jogo político e na formação de opinião. Alcançaram, com o SUS,
cidadania na saúde, mas permanecem sub-cidadãos políticos”
Compartilha-se com Mendes (1996) da idéia de que o SUS ainda é um processo
social em construção. O mesmo pode circunscrever-se dentro de toda a reforma sanitária
dos países da América que, no fundamental, tenta resgatar alguns dos direitos dos
cidadãos, tais como proporcionar serviços aos usuários e colocar o cidadão no coração do
processo decisorio.
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transporte público, entre outros benefícios. Meses mais tarde, a portaria federal número
810 de Setembro de 1989 declarou algumas normas para o funcionamento de Casas de
Repouso, Clínicas Geriátricas e outras instituições encarregadas do atendimento a idosos
(Cavalcanti, 1990).
Em Dezembro de 1993, foi aprovada a Lei 8.742, enquanto Lei Orgânica da
Assistência Social, dispondo toda a política social direcionada à população idosa (Costa,
1996).
Por parte do governo, a coordenação e promoção de articulações interministeriais
em matéria de política do idoso foram conferidas ao Ministério da Previdência e
Assistência Social. Para isso, criou-se a Lei número 8.842 de 4 de Janeiro de 1994, que
dispôs sobre a Política Nacional do Idoso e criou o Conselho Nacional do Idoso.
Conforme a autora (Costa, 1996), a lei representava um passo importante no sentido de
reconhecer a importância desse segmento da população e foi votada pelo Congresso
Nacional, após extensos debates entre organizações governamentais e não
governamentais interessadas no envelhecimento. Foi reconhecida pela sociedade civil
como uma das leis mais avançadas do mundo, embora tenha sido ditada doze anos após o
Plano Mundial sobre o Envelhecimento- PAME, proposto pela Assembléia Mundial do
Envelhecimento de Viena.
A Lei de 1994, no seu capítulo IV - Das Ações Governamentais (Diário Oficial,
1994), estabeleceu ações de saúde prioritárias para a população idosa, algumas das quais
citamos a seguir:
• Garantir ao idoso a assistência à saúde, nos diversos níveis do SUS;
• Prevenir, promover, proteger e recuperar a saúde do idoso, mediante
programas e medidas profiláticas;
• Adotar normas de funcionamento e aplicá-las às instituições geriátricas e
similares, com fiscalização pelos gestores do SUS;
• Elaborar normas de serviços hospitalares geriátricos;
• Incluir a Geriatria como especialidade clínica, para efeito de concursos
públicos federais, estaduais e municipais;
• Criar serviços alternativos de saúde para o idoso;
50
falem a respeito da participação dos idosos nas tomadas de decisões em relação aos
serviços de saúde, que são planejados em nível municipal. É esse um dos confrontos que
devem ser resolvidos, e de alguma maneira este estudo pretende aprofundar a razão do
mesmo e como se manifesta essa divergência.
Traduz-se numa necessidade iminente o fato de que o estado e todos os seus
níveis de ação consigam satisfazer as demandas e as necesidades da população idosa do
país. O envelhecer bem e o uso máximo das capacidades funcionais não deve ser um
problema estritamente individual, assim como, também, ele não é um problema só do
Estado. Como afirma Neri (1997), se encararmos esse “envelhecer bem” como uma
responsabilidade individual, estaríamos caindo na armadilha do estado quando argumenta
que está impossibilitado de conceder e gerir os devidos benefícios sociais para seus
idosos aposentados.
A seguir, apresentamos os aspectos da Teoria das Representações Sociais que,
acreditamos, tossem os mais relevantes para a sustentação teórica do trabalho.
1 Segundo De Rosa (1993), a razão pela qual Moscovici defende essa posição é porque ele
acredita que o estudo das representações sociais é uma espécie de sociologia clínica direcionada ao
estabelecimento de arquivos psicossociais de cultura. Algo assim como um estoque de base material para a
análise de valores, de afetos e de pensamentos sociais.
55
toda uma ciência total e uma filosofía de vida, em que se reflete sua prática social e a
natureza de suas relações sociais. De alguma maneira o mito, na sociedade atual, é um
modo arcaico e inferior de se situar no mundo. A noção de representação social exprime
um significado totalmente diferente. Uma representação social não é, simplesmente, uma
filosofia de pensamento em que se reflete a vida do homem moderno. Ao contrário, elas
formam parte das práticas sociais e das conversações dos grupos, são geradas nessa
convivência intercomunicacional e, além disso, a representação social é a forma concreta
em que o homem de hoje se apropria de seu mundo. A mesma, como diz Moscovici
(1978), possui aquela contextura psicológica autônoma, que é própria de nossa cultura.
Ideologia é um outro termo amplamente discutido em tomo da representação
social. Num trabalho de Moscovici, o autor explica quais são as diferenças entre os
termos ideologia e representação social (Aebischer et al., 1991). Num sugestivo capítulo
desse livro intitulado “O fim das representações sociais?”, Moscovici explica que a
ideologia é uma forma de conhecimento de senso comum que, ao ser institucionalizada e
dogmatizada, adquire força de legitimação. Em outras palavras, ideologia é um senso
comum que é dogmatizado pelo grupo que o adota e que o defende. De alguma maneira,
os grupos que defendem determinadas ideologias não admitem críticas negativas às
mesmas. Avaliam essas críticas como ilegítimas a seus interesses. A ideologia representa
uma interpretação de algum aspecto da realidade que legitima as relações entre os
indivíduos, e entre eles e o meio em que vivem.
Por outro lado, uma representação social não é um ponto de vista que se define a
priori. A representação social de algum aspecto da realidade existe somente se esse
aspecto apresenta para os grupos um significado social no âmbito das conversações
cotidianas, isto é, um objeto somente será socialmente representado, no seio das
intercomunicações diárias, quando o mesmo detem uma valorização social para o grupo.
A representação social constrõe-se consensualmente2 Pressupõe-se que a base em que se
estuda o conhecimento compartilhado da representação social é a comunicação
interindividual nos grupos. Assim, da mesma forma que a representação social é estável,
2 Nos próximos parágrafos serão expostos outros elementos teóricos que justificam a natureza
consensual das representações sociais.
57
diferenciação social que permitem ao indivíduo, num determinado contexto, situar sua
posição face à de outros. Emfim, a atitude (favorável, desfavorável ou neutra) reflete a
orientação global em relação ao objeto que é socialmente representado (Moscovici,
1978).
Diferente de uma atitude, a representação social é uma forma particular de
conhecimentos, cujas funções são: tomar familiares todos aqueles saberes, desconhecidos
ou não familiares, que são objeto das conversações entre os indivíduos; remodelar e
reconstituir os elementos do meio ambiente em que têm lugar os comportamentos; e
influenciar os próprios comportamentos das pessoas (Moscovici, 1978). O estudo da
representação social não pressupõe um corte entre o universo exterior do objeto que está
sendo representado e o universo de interesses do grupo ao qual o indivíduo pertence. Por
essa razão, o objeto da representação está inscrito no contexto dinâmico da construção e
da reconstrução daquilo que é representado. A atitude pode ser encarada como uma
concretização e uma parcialização das representações sociais mais globais.
Tanto a atitude quanto a representação social têm um papel importante na
construção, na preservação das identidades grupais, na integração dos indivíduos nos
grupos sociais, e, de uma maneira geral, como ressalta Lima (1993), na manutenção do
status quo. Uma atitude, porém, pode ser encarada unicamente como do lado da resposta
e como preparação para a ação. Nas palavras de Moscovici (1978), ela ostenta uma
virtude preditiva, uma vez que, de acordo com o que o indivíduo diz, pode-se deduzir o
que ele vai fazer. Já a relação da representação social com o comportamento é muito mais
complexa. Conforme Moscovici (1978, p. 49):
“ Portanto, se uma representação social é uma preparação para a ação, ela não o
é na medida em que guia o comportamento, mas sobretudo na medida em que
modela e reconstitui os elementos do meio ambiente em que o comportamento
teve lugar. Ela consegue incutir um sentido ao comportamento, integrá-lo numa
rede de relações em que está vinculado ao seu objeto, fornecendo ao mesmo
tempo as noções, as teorias e os fundos de observação que tomam essas
relações estáveis e eficazes”
59
contexto ativo e dinâmico, em que não existe um corte entre o universo exterior e o
universo do grupo que representa o objeto. O sentido da representação social encontra-se,
justamente, no fluxo das intercomunicações entre grupos e pessoas. As mesmas agem na
forma de estruturas significantes sociocognitivas que, a partir das dinâmicas sociais,
podem ser construídas na produção do senso comum que, segundo Moscovici (1988),
Hannah Arendt chama de quinto atributo humano essencial. Nas palavras de Jodelet
(1986, p. 475):
“[...] toda representação social é representação de algo e de alguém. Assim,
não é o duplicado do real, nem o duplicado do ideal, nem a parte subjetiva do
objeto, nem a parte objetiva do sujeito [...] constitui o processo pelo qual se
estabelece sua relação”
Segundo Moscovici (1984) a Psicologia Social, como manifestação do
pensamento científico, estuda os sistemas cognitivos, pressupondo que os indivíduos
normais reagem a fenômenos, pessoas ou acontecimentos, do mesmo modo que o fazem
os cientistas. Na sociedade, os grupos de indivíduos precisam compreender a realidade
que os rodeia. Nas últimas duas décadas, o termo representação social tomou-se um dos
conceitos mais inovadores da psicologia social, tendo uma ampla aplicação em diversos
problemas das ciências humanas. Esse conceito explica como são construídas as
representações sociais no contexto das conversações cotidianas, e quais as funções que
esse tipo de conhecimento tem para os grupos sociais e para os indivíduos que as
elaboram e as adotam. As representações sociais são influenciadas pelas condições sócio-
históricas que lhes deram origem. Como apontou Moscovici (1993) na Primeira
Conferência Internacional de Representações Sociais em 1992, as representações sociais
não são auto-explicativas e têm que ser explicadas a partir das condições sociais dos
grupos que lhes deram origem.
A representação classifica e rotula os objetos, pessoas ou acontecimentos,
localizando-os numa categoria determinada que é compartilhada pelo grupo. De certa
maneira, a representação social é prescritiva, na medida em que se impõe sobre nós com
uma força irressistível. Moscovici (1984), a respeito desse poder prescritivo porém não
dogmático de uma representação, comenta que as crianças que nascem no mundo
ocidental encontram todo um jargão psicanalítico já pronto do qual irão compartilhar no
61
coletiva de Durkheim. Moscovici (1988); Flament (1994) e Rose et al (1995) dizem que
nenhuma representação social é homogênea.
A seguir, serão descritos alguns aspectos que explicam como as representações
sociais, que os grupos constroem, se estruturam e organizam.
facilmente acessíveis, ou porque algumas das imagens que podem ser lembradas pelos
grupos constituem tabus. Moscovici (1978) descobriu, no seu estudo das representações
sociais da psicanálise, que o modelo popular do aparelho psíquico derivado da psicanálise
era o inconsciente e o consciente (aquilo que era reminiscente de dualidades tais como
involuntário-voluntário, intemo-extemo, visualizados no espaço, como um estando sobre
o outro). Nos próximos parágrafos, quando forem explicados os processos de ancoragem
e objetivação da representação, poderemos aprofundar a idéia de como a proposta de
modelo figurativo relaciona-se a esses processos.
Sá (1996; 1998) coloca que a abordagem complementar da teoria do núcleo
central constitui uma valiosa contribuição feita à teoria das representações sociais. A
teoria do núcleo central foi desenvolvida pela primeira vez por Abric, em 1976, e propõe
que cada representação possui, na sua estrutura, uma hierarquia interna de conteúdos.
Esses conteúdos podem ser divididos em elementos centrais e periféricos, em função de
sua contribuição para a organização da representação. Conforme Sá (1998), a proposta de
Abric não limita o núcleo imaginante ao seu papel genético. O núcleo central trascende os
aspectos figurativos. A teoria do núcleo central está sustentada em outros trabalhos da
Psicologia acerca dos fenômenos de atribuição e de organização que, de alguma maneira,
estão relacionados à percepção social de Heider e de Asch, respectivamente. Cada
representação oferece a determinadas informações um valor privilegiado.
Toda representação social é fortemente marcada pela memória e pelas práticas
sociais do grupo (Moscovici, 1981). Sem as convenções e a memória dos grupos, é
impossível criar as representações sociais. Abric (1994) também compartilha a noção de
importância da memória do grupo na gênese das representações sociais, afirmando que o
sistema central de uma representação é fortemente marcado pela memória coletiva do
grupo que está envolvido com essa representação do objeto ou do assunto. Constitui a
base comum, compartilhada e consensual da representação social e suas funções são
fornecer uma certa continuidade e permanência à representação. Um núcleo é central,
porque reveste um laço privilegiado com o objeto da representação, no sentido de gerar,
de alguma maneira, a significação da própria representação e sua organização. São, nas
palavras de Moscovici (1991-1992 a), os elementos da representação que não são
negociáveis tão facilmente, mostrando a estabilidade da mesma.
67
pesquisa que reflete com muita clareza a existência dessas nomeações. Trata-se dos
trabalhos de Herzlich, do final dos anos sessenta, sobre a representação social da saúde e
da doença. Moscovici explica que o rótulo convencional de “fadiga”, encontrado pela
pesquisadora em seu estudo, é qualitativamente diferente das representações de saúde e
de doença. A nomeação de fadiga refere-se a um conjunto de sintomas vagos que
expressam sensação de cansaço e falta de bem-estar, tão típicos da sociedade moderna.
A classificação e a nomeação constituem duas formas de ancorar, em
representação, um aspecto, objeto ou assunto da realidade, que é socialmente valorizado
pelo grupo, nas conversações cotidianas. Quando os grupos classificam e dão nome a
determinados assuntos, não o fazem, simplesmente, para rotulá-los, mas para
compreendê-los.
Segundo Jodelet (1986), a ancoragem articula as três funções básicas da
representação: integração da novidade, interpretação da realidade, e a orientação de
condutas e de relações sociais. Permite, nas palavras de Moscovici (1988), atribuir um
significado ao objeto representado.
Por outro lado, o processo de objetivação expressa tudo o que é social na
representação. Segundo o autor, a objetivação:
“Transforma uma abstração em algo quase físico, traduz algo que existe em
nossos pensamentos em algo que existe na natureza” Moscovici (1981, p. 192).
É um processo que permite intercambiar percepção e conceito, é uma operação
formadora de imagens. Objetivar algum objeto é reabsorver seu excesso de significados,
materializando-os. Essa operação faz com que se tome real um esquema conceituai; com
que se dê a uma imagem uma contrapartida material; com que se reduza a defasagem que
existe entre a massa de palavras que circula e os objetos que a acompanham (Moscovici,
1978).
Os aspectos figurativos da representação social, que foram descritos na análise
estrutural das representações sociais, são resultado do processo de objetivação que
possibilita toda uma constituição formal de conhecimentos de senso comum,
materializados nas palavras. Conforme Moscovici (1981) assinala, nem todas as palavras
são suscetíveis de serem ligadas a imagens e, somente as imagens que têm a capacidade
de reproduzir um complexo de idéias ou padrão, são as que conformam os chamados
71
núcleos figurativos das representações sociais. Segundo o autor, objetivar alguma coisa
significa descobrir a qualidade icônica de uma idéia, reproduzindo-a numa imagem.
No processo de objetivação podem ser descritas três fases. Na primeira, são
selecionados e descontextualizados os elementos do discurso inicial. Nessa fase, objetivar
significa descobrir os aspectos icônicos de uma idéia ou de um conceito mal definido, de
maneira tal que se faça equivaler o conceito à imagem. Aqui os grupos selecionam todas
as informações em função de seus critérios culturais-normativos. Como não é possível
objetivar todas as palavras na forma de imagens, somente as frações de palavras que têm
um potencial de imagem serão incorporadas ao que Moscovici (1978) chama de núcleos
figurativos. Essa constitui a segunda fase: a fase de conformação do núcleo figurativo. E
a fase na qual a imagem é totalmente assimilada, e o que é percebido substitui o que é
concebido.
“Uma vez que o grupo tenha adquirido tal modelo ou núcleo figurativo, será
capaz de falar mais facilmente sobre o que este modelo representa. Fórmulas e
clichês se desenvolvem, simplificando e unificando as imagens que estavam no
início desconectadas. Não se toma apenas um tópico de conversação, mas
também é utilizado em várias circunstâncias sociais para compreender outras
pessoas, nós mesmos, escolher ou decidir” (Moscovici, 1981, p. 200).
Na mesma pesquisa de Herzlich (1991), obtiveram-se outros esquemas figurativos
para representar saúde-doença: indivíduo/saúde e sociedade/doença. Segundo a autora, a
origem da doença é organizada através das diversas agressões do modo de vida (coação
da sociedade sobre o indivíduo sadio). Entretanto, a saúde associou-se à própria pessoa de
uma forma harmoniosa, como se isso fosse natural e não precisasse de explicação. Tem-
se a sorte de ter nascido com uma boa constituição e, em conseqüência, goza-se de uma
boa saúde. É como se esse modelo figurativo tomasse compreensível as formas abstratas
e científicas de conhecimento sobre a saúde e a doença. Ele funciona, como aponta
Moscovici (1978), na forma de um ponto comum entre a teoria científica e sua
representação social, observando-se que tem uma dinâmica própria.
Numa outra pesquisa desenvolvida por Nascimento-Schulze (1995), acerca das
representações sociais da saúde e da doença de quatro grupos de pessoas (médicos,
psicólogos, e estudantes de medicina e de psicologia), a autora descobriu que, em geral, a
72
possui um discurso em que a saúde ocupa um lugar central, ainda que muito
ambíguo. De outro lado, o modelo em curso da representação da saúde e da
doença; o do indivíduo sadio em oposição ao indivíduo doente, estendeu-se até
incluir hoje a própria medicina” (Herzlich, 1991, p.34).
A abordagem do processo saúde-doença, na perspectiva da noção de
representação social, desloca a problemática da chamada saúde individual para o
reconhecimento do poder instituinte da vida social, nos seus diferentes planos e
instituições. Permite a valorização e materialização da saúde coletiva. Embora
reconheçamos que existem diferentes definições da saúde , gostaríamos de ressaltar, nas
3 É difícil encontrar definições nítidas dos diversos conceitos de saúde. No entanto, existem certos
consensos para diferenciar alguns enfoques de outros. Vejamos alguns deles:
Saúde pública: segundo a Organização Mundial da Saúde, a saúde pública se ocupa de todas as
atividades relacionadas com a saúde-doença de uma população, o estado sanitário-ecológico, a organização,
planejamento e funcionamento dos serviços. Ocupa-se da saúde global das populações sob seus aspectos de
promoção, proteção de doenças, cura, readaptação e educação para a saúde (San Martin, 1984, p 26-7). A
saúde pública, diferente da medicina social, tem-se preocupado, fundamentalmente, com as causas, com a
distribuição e com a prevenção das doenças crônicas transmissíveis. A saúde pública é responsável por
algumas tarefas: pesquisa em ciências básicas para aumentar o conhecimento sobre a saúde e sobre a
doença, estudos epidemiológicos, pesquisas em administração, planejamento de serviços e recursos
humanos em saúde, etc.
Medicina Social: segundo Ferreira (1978), a denominação da medicina, enquanto ciência social,
tem mais de cem anos. A partir de 1848 (pelos efeitos negativos da industrialização), diversos
investigadores começaram a estudar a influência de fatores sociais sobre a saúde e a doença (Rosen 1980;
Nunes, 1989). No conceito mais lato, medicina social é a medicina preventiva alargada ao campo das
necessidades médicas, criadas pelas condições socioeconómicas. A medicina social é uma medicina da
sociedade. No campo da medicina social, a saúde é um direito social a ser conquistado pelas
individualidades. Desde meados do século XVIII, a medicina adquire legitimidade sobre a saúde,
planejando estratégias coletivas nas quais é realizado um esquadrinhamento sistemático do espaço social.
Junto com ela aparecem as primeiras críticas ao fato de reduzir a enfermidade à racionalidade biológica
(Birman, 1991). Outros autores apontam que foi a medicina social a que reconstituiu o objeto de estudo da
epidemiología, reconhecendo o caráter histórico-social do processo saúde-doença, ou seja, em articulação
com os processos sociais (Quevedo & Hernandez, 1994).
Saúde coletiva: conjunto de ações direcionadas às populações, ao meio ambiente e à sociedade,
englobando todos os tipos de assistência à saúde, com base na expressão das necessidades sentidas da
78
palavras de Egry (1996), qual é nossa intenção aqui, ao colocar o termo "saúde coletiva",
que não é um simples neologismo ôu tentativa de modernização da saúde pública. É uma
categoria que designa os novos conteúdos e projeções da saúde pública, que resultaram
do movimento sanitarista latino-americano e, particularmente no Brasil, da Reforma
Sanitária. A saúde coletiva propõe a determinação histórica do processo de produção da
saúde e da doença. O termo saúde coletiva reflete a contribuição que desejamos que tenha
a noção de representação social na procura de necessidades sentidas de saúde, enquanto
recurso de expressão da população idosa.
Perante esse processo, caberia a nos perguntar como as diferentes políticas
sanitárias questionam o que é estar saudável ou doente na velhice, dentro do vasto campo
da saúde coletiva? Compartilhamos com Birman (1991,p. 17) da sua colocação a respeito:
“[...] é preciso enunciar que o conceito de saúde coletiva não se identifica com
os de saúde pública e de medicina social, pois seus campos de objetividade, os
seus objetos teóricos e os horizontes de suas práticas sociais são radicalmente
diversos. No campo da saúde coletiva a diversidade e a diferença são
exigências fundamentais para o reconhecimento das comunidades sociais e das
individualidades”
Birman (1991) afirma que, nas ciências da saúde, a principal vantagem da noção
de representação social é que esta propõe que no planejamento sanitário seja reconhecida
a vida social e aqueles que constroem essa vida social.
É provável, então, que uma representação do estado de saúde-doença do idoso em
termos de morbidade seja característica de enfoques tradicionalistas sanitaristas de corte
flexneriano. Entretanto, uma representação em termos de funcionalidade e de autonomia
na vida social é típica do enfoque coletivo da saúde.
Esse fenômeno tem um caráter muito problemático na velhice, pois esta é uma das
etapas da vida que exige que a compreensão de saúde seja avaliada em dependência do
grau de desempenho funcional com que se pode realizar a atividade individual e social.
população. Sugere que, além das instituições governamentais, o indivíduo também é responsável pela sua
saúde e pela sua doença. Incorpora as ciências sociais ao estudo do fenômeno saúde-doença e à prestação
de serviços as populações (Carvalho, 1993; Egry, 1996).
79
4 O conceito de grupo orgânico ou estruturado refere-se aos grupos nos quais as relações entre os
membros estão baseadas em direitos, deveres, obrigações ou até na base de laços biológicos. Geralmente
seus membros se encontram numa relação face a face (Sá, 1998).
85
5 Para maiores referências sobre o conceito de Grupo Operativo na área de saúde remetemos o
leitor para Zimerman (1998).
86
o estado civil, o número e tipo de doenças de que padeciam, a renda familiar, o número
de filhos e com quem os idosos moravam no momento da coleta de dados.
O grupo de trabalhadores da sáude desempenhava suas funções nessa Policlínica
II do Bairro de Estreito, e foram entrevistados no próprio local de trabalho sobre as
disponibilidades de tempo para colaborar com o estudo. As variáveis descritivas gerais
que contextualizaram os dados desse grupo foram a idade, o sexo, o tipo de profissão, o
estado civil, os anos de formado, e os anos de trabalho na rede básica de saúde.
As entrevistas com o grupo de cuidadores de pessoas idosas aconteceram na
Clínica Médica do Hospital Universitário de Florianópolis, onde se encontravam idosos
hospitalizados (os mesmos foram entrevistados nos seus períodos livres de cuidado ao
idoso doente), ou nos corredores do mesmo hospital, quando o cuidador acompanhava
um idoso doente à consulta ambulatorial. A inclusão desse quarto grupo de pessoas
deveu-se ao seguinte propósito: explorar a representação social da saúde e da doença na
velhice de pessoas que estão diretamente envolvidas com o processo de cuidado do idoso
doente, o que poderia ser um ponto de referência importante sobre possíveis necessidades
de saúde que o idoso sente, e que muitas vezes pode expressar ao cuidador (como aquela
pessoa que está mais próxima dele na condição de saudável ou de doente). O fato de o
cuidador não ser familiar ao idoso doente não foi um critério de exclusão da amostra.
Somente agiu como critério de seleção o fato de ser a pessoa que rotineiramente
se ocupava de ajudar o idoso quando este apresentava problemas de saúde. Para cumprir
esse requisito da escolha do cuidador, utilizamos o próprio idoso como fonte de
informação. Para contextualizar a análise dos dados, pesquisaram-se variáveis tais como a
idade, o sexo, o grau de parentesco com o idoso, o estado civil, o número de filhos (caso
tivesse), e o tempo que fazia que cuidava do idoso.
Uma observação final sobre os grupos da pesquisa: a participação deles foi
absolutamente voluntária. Na fase de análise e divulgação dos resultados garantiu-se a
cada um dos participantes o anonimato, trocando seus dados de identidade pessoal (o
nome) por códigos de números.
88
3.2. MÉTODOS
A escolha do método se vincula à natureza de nosso objeto de estudo (a saúde-
doença na velhice), e à própria noção de representação social. O seu desenvolvimento
efetuou-se através de duas técnicas de coleta de dados: uma técnica de evocação livre de
palavras e uma entrevista padronizada (com um roteiro previamente estabelecido).
A técnica de evocação livre de palavras é um dos métodos associativos que
permite procurar a saliência dos conteúdos de uma representação social, portanto, é um
método que conduz ao levantamento dos elementos que podem constituir os sistemas
periféricos e centrais da representação social, a mesma consiste em pedir aos
participantes que, a partir de um termo indutor, (freqüentemente o mesmo objeto da
representação), digam as palavras ou expressões que imediatamente lhes vierem à mente.
As questões que orientaram o uso dessa técnica foram:
• Diga três palavras ou expressões que lhe vêm à mente quando se fala em
“saúde na velhice”.
• Diga três palavras ou expressões que lhe vêm à mente quando se fala em
“doença na velhice”.
Esta técnica possibilitou fazer uma hipótese de centralidade daqueles léxicos
semânticos de destaque (centrais) e secundários (periféricos), que foram atribuídos à
saúde e à doença na velhice, e também permitiu destacar os elementos que ficaram
mascarados com a técnica de entrevista.
A interpretação dos resultados da técnica de evocação livre realizou-se através de
uma análise freqüencial que se inspirou na proposta de Vergés (1991-1992). Para a
seleção das palavras mais evocadas Vergés (1991-1992) utiliza dois critérios que são a
freqüência de evocação de palavras e sua ordem média de evocação. Isso facilitou o
levantamento de alguns dos conteúdos que pertencem aos sistemas centrais e periféricos
das representações sociais.
Para o cálculo das palavras de maior freqüência de evocação e menor ordem
média de evocação procedeu-se da seguinte maneira:
• Numa primeira etapa, em cada um dos grupos pesquisados consideraram-se
como um mesmo tipo de evocação as palavras de igual conteúdo e igual
significado. Por exemplo, cuidar e cuidado agruparam-se como se fossem um
89
figurativos com que a representação pode ser objetivada. As perguntas que iniciaram a
entrevista foram as seguintes:
• 1. No seu entendimento, como você vê ou percebe um idoso saudável?
• 2. No seu entendimento, como você vê ou percebe um idoso doente?
A partir das respostas às entrevistas, foram levadas em conta outras variáveis
descritivas gerais que, por estarem ligadas à história de vida dos participantes, eram de
interesse para a discussão dos dados. Essas variáveis descritivas coletadas foram expostas
após a descrição dos grupos de sujeitos feita em parágrafos anteriores.
Conforme a proposta de Camargo (1998) para a análise dos dados obtidos nas
entrevistas, seguiram-se os seguintes passos:
• Todas as entrevistas foram gravadas em fitas com autorização prévia dos
entrevistados.
• Para o tratamento analítico dos dados, utilizou-se um software de análise
quantitativa de dados textuais denominado Alceste (Reinert, 1990), que
permitiu organizar o material verbal contido nas entrevistas. Cada entrevista
era constituída de um corpus semântico, que era o material original sobre o
qual o programa Alceste iniciaria a análise dos dados. A entrada de dados no
Alceste foi feita através de um único arquivo (de tipo texto-txt), no qual, além
do material transcrito, existiam linhas de comando cujo objetivo era separar
as unidades de contexto naturais (respostas dos sujeitos às perguntas da
entrevista), das palavras com asterisco que consistiam naquelas variáveis
descritivas dos entrevistados (por exemplo: sexo, idade, nível de escolaridade,
estado civil e outras). Todo esse material é chamado de “corpus” no Alceste.
O nome que o Alceste dá a esses corpus semânticos é de unidades de contexto
iniciais (u.c.i).
A análise posterior e conjunta das entrevistas envolveu 4 etapas, que Camargo
(1998) descreveu num Curso oferecido no Laboratório de Psicossociologia da
91
6 Também remetemos o leitor ao Anexo 3, que contém uma saída de dados do Alceste de um dos
grupos pesquisados (n= 80 idosos - idosos doentes e idosos saudáveis).
92
Nesse grupo o índice maior de doenças foi em relação ao Diabetes (15 pessoas).
Na ordem hierárquica descendente, seguem a Hipertensão Arterial com dez (10) pessoas,
oito (8) com Artrite, e sete (7) com osteoporose e Doenças Cardiovasculares. Muitos
desses idosos apresentavam mais de uma das doenças antes mencionadas, mostrando a
freqüente pluripatologia que caracteriza a velhice.
Nesse grupo, vinte e três (23) pessoas estavam formadas há mais de 20 anos, treze
(13) entre 11 e 20 anos, e quatro (4) entre 1 e 10 anos. Vinte (20) pessoas trabalhavam na
Rede Pública de Saúde entre 11 e 20 anos e dezessete (17) o faziam há mais de 20 anos.
Somente três (3) pessoas trabalhavam na rede pública entre 1 e 10 anos. O fato anterior
mostra que o tempo de experiência desse grupo no atendimento público de saúde era alto.
Vale salientar que todos os médicos entrevistados alternavam o atendimento público e o
atendimento privado.
Para facilitar a compreensão dos resultados lembramos que, a cada um dos grupos
de participantes perguntou-se quais eram as palavras ou expressões que lhes vinham à
mente ao escutar os termos “saúde na velhice” e “doença na velhice”. Todas as respostas
dos sujeitos foram registradas na mesma ordem em que eram evocadas. Com base nessa
pergunta, a análise e discussão dos resultados dessa técnica será da seguinte forma:
• Apresentar-se-ão as diferentes tabelas que combinam a frequência absoluta
das palavras evocadas e a média da ordem média de evocação das mesmas.
Num primeiro momento, serão mostrados os resultados das palavras evocadas
a partir do termo saúde na velhice em toda a amostra pesquisada, ou seja, nos
140 participantes do estudo.
• Num segundo momento, na medida que são discutidas as palavras e
expressões evocadas na amostra total, serão analisados os resultados parciais
da técnica de evocação livre em cada um dos grupos entrevistados.
• Os dois procedimentos anteriores serão válidos para as duas discussões de
resultados (com os termos saúde na velhice e doença na velhice).
Conforme a metodologia de Vergés (1991-1992), cada um dos resultados das
tabelas da técnica de evocação livre é apresentado na forma de quatro quadrantes, que
conferem diferentes hipóteses de graus de centralidade às palavras que os compõem,
sendo o primeiro quadrante superior esquerdo o que contém os prováveis elementos
centrais da representação. Este terá as palavras de maior freqüência absoluta e de menor
ordem média de evocação. Esse primeiro quadrante possibilitará definir as categorias
centrais da representação, quer dizer, as palavras do primeiro quadrante superior esquerdo
organizam uma hipótese dos chamados sistemas ou núcleos centrais da representação
social. Acrescentamos, também que, para identificar as palavras que definem esses
núcleos centrais serão utilizadas outras expressões, que pelo seu conteúdo estão
relacionadas a elas, embora estejam localizadas em outros quadrantes. Resumindo, as
palavras que organizam os sistemas centrais são as que se localizam no primeiro
quadrante superior esquerdo, mas a esses núcleos podem estar associadas outras palavras
de conteúdo semelhante, embora estejam localizadas em outros quadrantes das tabelas.
As palavras dos quadrantes restantes contribuirão com o levantamento das
hipóteses dos núcleos periféricos próximos e distantes dos conteúdos centrais das
I
97
Houve 142 palavras diferentes num total de 420 evocações. Conforme a proposta
de Vergès (1991-1992), ao dividir as 420 evocações entre as 142 palavras diferentes,
obteve-se uma média de 3. A partir desse cálculo, fizeram parte da tabela 34 palavras que
tinham uma freqüência de evocação igual ou superior a três (3). O resultado da somatória
99
das freqüências de evocação das 34 palavras foi de 257. Ao dividir essa somatória (257)
pelo número total de palavras, a média da freqüência que se obteve foi,
aproximadamente, 8. A média da ordem média foi obtida dividindo a soma das médias
das ordens médias de cada uma das 34 palavras (72,8) por 34. Nesse caso o resultado foi
2,1. Esse mesmo procedimento será utilizado, também, no cálculo das médias de
freqüência e de ordem média dos resultados nos quatro grupos separadamente.
Observa-se que, dos resultados contidos no primeiro quadrante superior esquerdo,
podem ser deduzidos alguns dos conteúdos de maior centralidade na representação social
da saúde na velhice. Essas expressões foram as de maior freqüência de evocação e, por
sua vez, as que foram evocadas com média inferior ou igual a 2,1. Para a definição das
categorias centrais, tomaram-se como conteúdos as palavras ou expressões contidas nesse
primeiro quadrante superior esquerdo.
E como já foi explicado, essas categorias também são explicadas por outras
palavras, que relacionam-se com às mesmas pelo seu conteúdo, embora estejam
localizadas em outros quadrantes. Na tabela 1, existem cinco categorias que podem ser
consideradas como núcleos ou sistemas centrais:
• Saúde na velhice em dependência de estabilidade psíquica: definida pelas
palavras mente/ corpo/ espírito/ depende da mente/ mentalidade/mente boa/
bons pensamentos/ cabeça; disposição/ ânimo/ estar disposto; harmonia/
equilíbrio/ estabilidade; otimismo.
• Saúde na velhice associada à prática de atividades: definida pelas palavras
andar/ caminhar; trabalhar/ trabalho; não ficar parada/ fazer movimentos/ não
parar; atividade física/ exercício físico.
• Saúde na velhice associada a estados emocionais positivos: definida pelas
palavras algo gostoso/ coisa boa/ bom; alegria/ felicidade; paz/ viver em paz;
bem-estar; maravilhoso/ lindo/ maravilha; viver bem.
• Saúde na velhice em função de cuidados preventivos: definida pelas palavras
cuidado/ cuidado constante; prevenção; alimentação/ cuidado na alimentação/
comida/ comer; hábitos de vida/ cuidados na vida/ estilo de vida/ modo de
vida; qualidade de vida.
• Saúde na velhice associada à renda financeira: definida pela palavra dinheiro.
100
Trabalhadores da saúde.
Vejamos, a seguir, na tabela 4, as evocações obtidas com os trabalhadores da
saúde.
média, 1,9. As duas categorias que podem ser consideradas como centrais na
representação social da saúde na velhice são:
• Saúde na velhice em função de cuidados preventivos: definida pelas palavras
prevenção; cuidado; exercício físico; estilo de alimentação; qualidade de vida.
• Saúde na velhice associada a estados emocionais positivos: definida pelas
palavras felicidade/alegria; bem-estar.
Os conteúdos periféricos próximos da representação social da saúde na velhice
agruparam-se através das seguintes categorias:
• Saúde na velhice associada aos serviços de saúde: definida pelas palavras
atenção/atendimento, tratamento, mal atendimento.
• Saúde na velhice associada à renda financeira: definida pela palavra dinheiro.
• Saúde na velhice como problema: definida pela palavra problema.
• Saúde na velhice em dependência de redes de apoio sócio-familiar: definida
pelas palavras abandono/ descaso; companhia; carinho e família.
O sistema periférico distante expressou-se através da categoria:
• Saúde na velhice em dependência de estabilidade psíquica: definida pelas
palavras estar bem de cabeça/cabeça boa/ espírito; harmonia.
provavelmente, uma das causas do fato de estar saudável na velhice seja o exercício
autônomo de diferentes atividades.
segunda interpretação do cuidado ajusta-se mais ao termo doença na velhice, o qual será
discutido mais adiante.
A respeito do cuidado preventivo, não pode ser esquecido um termo que está
estreitamente ligado a ele: o auto-cuidado, que se refere à capacidade de o indivíduo
exercer o próprio cuidado da sua saúde sem a intervenção de outras pessoas; no entanto
esse auto-cuidado não implica, somente, a tomada de medidas preventivas individuais
intuitivas, quer dizer, por si só, espontaneamente, mas envolve outros aspectos
relacionados à educação em saúde, meio ambiente, condições de vida, riscos e benefícios,
entre outros (OMS, 1984; Femandez-Ballesteros et al., 1992; Kane & Kane, 1993).
Uma pessoa, independentemente da idade que possua, nunca poderá executar
cuidados sobre si mesma se não tiver um mínimo de conhecimentos básicos sobre saúde,
meio ambiente, fatores de risco para desenvolver doenças, medicamentos, alimentação e
higiene, entre outros. É de grande relevância o fato de que as palavras cuidado, prevenção
e alimentação, entre outras, tenham alcançado freqüências altas na técnica de evocação
(Tabelas 1, 2, 3, 4 e 5). Isso demonstra como os participantes entrevistados valorizam a
prevenção como uma via para a manutenção do estado de saúde na velhice.
De outro ponto de vista, é lícito esclarecer que, obviamente, quando se fala de
auto-cuidado, não significa transferir para as pessoas idosas aquelas responsabilidades
governamentais dos serviços de saúde. Contudo, a intervenção da própria pessoa no seu
cuidado representa um avanço no alcance da autonomia (Guia de Atención a la Salud del
Anciano, 1992).
Aqui seria interessante fazer uma rápida comparação com alguns dos conteúdos
que Herzlich (1991) obteve na sua pesquisa sobre a representação social da saúde-doença.
A pesquisadora encontrou representações da origem da saúde relacionadas, também, com
a própria pessoa, como se a saúde fosse natural e não precisasse de explicação. Nesse
estudo, chamou positivamente nossa atenção o fato de que a prevenção, o cuidado e a
alimentação, parecem-nos depender da pessoa (não possuem uma origem espontânea).
São recursos que devem ser aprendidos e sem eles seria impossível ser saudável na
velhice.
110
Existe um outro sistema periférico próximo que pode ser discutido em conjunto:
saúde na velhice como problema (Tabela 1). Além da amostra total, as palavras
problema, difícil e impossível apareceram como conteúdo periférico próximo no grupo de
idosos doentes (Tabela 2), no grupo de trabalhadores (Tabela 4) e no grupo de cuidadores
de pessoas idosas (Tabela 5). Acredita-se que representar saúde na velhice como
problema, como algo difícil e até impossível, pode estar relacionado à qualidade dos
serviços de saúde.
Duas interpretações podem ser feitas aqui: a primeira diz respeito ao fato de
pensar que é difícil ser saudável na velhice devido à pouca qualidade no atendimento
básico; a segunda tem a ver com o fato de representar saúde na velhice como algo
impossível e inatingível. Esta última interpretação faz parte de um dos sistemas
periféricos da representação do grupo de idosos doentes (Tabela 2). É provável que, para
estes, a saúde seja vivenciada como algo muito desejado7 e ao mesmo tempo difícil, que
chegue a ser representado como inatingível.
Existem alguns modelos teóricos e pesquisas que mostram como uma pessoa pode
ser saudável na velhice, embora tenha mais de uma doença crônica. A respeito, uma das
propostas gerontológicas mais aceitas é o Modelo de Envelhecimento Bem Sucedido de
Baltes (1987).
Apesar de muitos autores demonstrarem essa possibilidade de ser saudável na
velhice, não existem dúvidas de que, no contexto atual, ser saudável toma-se um
problema, sobretudo se os idosos não têm acesso aos serviços de saúde, se não têm os
medicamentos necessários para se curar em caso de estarem doentes; e se não tiverem
uma renda financeira básica para viver e satisfazer suas necessidades (Durkheim, 1970;
Heckhausen et al., 1989; Kane & Kane, 1993; Baltes, 1994). Grande parte das vezes, essa
é a realidade de muitos idosos brasileiros.
7 Verificou-se que, na amostra total (Tabela 1) e no grupo de idosos saudáveis (Tabela 3), a saúde
na velhice, também foi representada como algo desejado na forma de núcleos periféricos próximos.
114
com quem contar caso precise. É justamente nesse sentido que se fala dos efeitos
amortecedores que o apoio social tem quando o idoso enfrenta situações vitais, tais como
a morte de familiares e amigos, as doenças, a viuvez, etc. Um amigo, um apoio, ou uma
simples companhia podem tomar-se um valioso contribuinte para o bem-estar e para a
saúde de uma pessoa idosa.
Um último elemento a ser comentado é o seguinte: é relevante o fato de que os
trabalhadores da saúde compreendam que a saúde na velhice também depende das redes
de apoio social. Uma rede social de relações que é efetiva, às vezes, pode reduzir o
trabalho de uma rede básica de saúde. Não nos esqueçamos de que, muitas vezes, um
idoso pode manifestar inúmeras queixas de saúde, que longe de estarem associadas a
problemas físicos de saúde, relacionam-se a carências de apoio social. Nas mãos dos
trabalhadores da saúde está, muitas vezes, o fato de poder ajudar o idoso, caso precise de
orientação no que diz respeito a relações sociais.
forma que se procedeu com a apresentação das evocações do termo saúde na velhice
tomaram-se, para a definição das categorias centrais, as palavras ou expressões contidas
no primeiro quadrante superior esquerdo. Posteriormente, as categorias também são
explicadas por outras palavras que, pelo conteúdo, relacionam-se a elas, embora estejam
localizadas em outros quadrantes. O total de participantes evocou 145 palavras diferentes,
que equivalem a 420 evocações. Conforme mostra a tabela 6, a média da freqüência
média foi 7 e a média da ordem média foi 1,9.
117
e a média da ordem média foi 1,8. As categorias que podem ser consideradas como
centrais na representação social da doença na velhice são.
• Doenca na velhice como expressão de algo ruim: definida pelas palavras
ruim; sofrimento e desgraça.
• Doença na velhice expressa através de enfermidades concretas: definida pelas
palavras coração/ problemas do coração; diabetes; hipertensão; reumatismo;
tontura/ labirintite.
• Doenca na velhice como expressão de tristeza: definida pelas palavras
desânimo/ falta de disposição e tristeza.
• Doença na velhice em função da idade cronológica: definida pelas palavras
idade e velhice.
• Doença na velhice em funcão do cuidado: definida pelas palavras cuidado e
alimentação.
No grupo de pessoas idosas doentes, os conteúdos ou núcleos periféricos
próximos da representação social da doença na velhice agruparam-se através das
seguintes categorias:
• Doença na velhice como expressão de problema: definida pela palavra
problema.
• Doença na velhice associada à morte: definida pela palavra morte.
• Doença na velhice associada à renda financeira: definida pela expressão falta
de dinheiro.
• Doença na velhice em dependência de redes de apoio sócio-familiar: definida
pelas palavras solidão; sem apoio.
• Doença na velhice associada à incapacidade: definida pela expressão não
poder trabalhar.
• Doença na velhice associada a crenças religiosas: definida pela palavra Deus.
• Doença na velhice definida pelo seu contrário: uso da palavra saúde.
No que diz respeito ao sistema periférico distante da representação social obteve-
se a seguinte categoria:
• Doença na velhice em dependência de estabilidade psíquica: definida pela
palavra cabeça da gente.
121
8 A respeito da morte, num dos mais completos livros escritos sobre a velhice, Beauvoir (1990),
usava o exemplo de Freud ao se referir à morte. Para o criador da Psicanálise, se ele pudesse ter estado
sozinho, o mesmo teria acabado com a vida muito tempo antes. Freud justifica-se com a doença. Beauvoir
(1990, p. 641) reproduz um fragmento de uma de suas cartas escrita a Jones: “ Penso ter descoberto que o
desejo do descanso eterno não é algo elementar e original: exprime a necessidade de ficar livre do
sentimento de inadequação que afeta a idade, em particular nos pequenos detalhes da vida”.
129
Sabe-se que, com o envelhecimento, uma das principais perdas com que o ser
humano depara-se é a doença, a enfermidade. Nas palavras de Baltes (1991), começam a
ser percebidas as diferenças entre um envelhecimento normal, um envelhecimento ótimo
e um envelhecimento patológico. Justamente, uma das causas desse envelhecimento
patológico seriam as doenças.
Não só a doença, mas também a saúde representam formas diferentes em que a
vida dos corpos organizados pode-se manifestar. A doença, nesse caso, é uma dessas
manifestações que, embora seja natural, quase sempre é percebida como algo indesejável
pelo ser humano. As palavras evocadas que permitiram organizar esse núcleo central da
representação social da doença na velhice, exemplificam nitidamente a naturalidade do
estado da doença. O fato de ter encontrado essa categoria permite-nos retomar alguns
elementos teóricos do capítulo de concepções da saúde e da doença.
Nesse capítulo expunha-se que a saúde e a doença podem ser interpretadas como
um processo dinâmico e natural, que o indivíduo atravessa pelas condições de sadio ou de
doente. O fato desses grupos (amostra total e grupo de cuidadores) evocarem os termos
fisiológico, natural, normal, idade e aceitar, ao escutar a expressão “doença na velhice”,
significa que estão fazendo uma interpretação da doença como algo intrínseco ao próprio
desenvolvimento humano. São essas doenças as que naturalmente começam a ameaçar a
existência do ser humano, como dizia San Martin (1984). Em termos fenomenológicos, as
doenças representam as manifestações concretas do desequilíbrio biológico, ecológico ou
psicossocial do ser humano.
Canguilhem (1978) afirmava que nem sempre aquilo que é anormal tem de ser
patológico. Para que algum estado anormal se torne patológico, precisa ter implicações de
sofrimento e de impotência para o ser humano. Será que os cuidadores de pessoas idosas
compreendem a doença na velhice nessa perspectiva de Canguilhem? Será que eles
representam a doença na velhice na ótica da diversidade, porém não necessariamente do
sofrimento? De fato são bem diversificadas as doenças do idoso, mas nem todas as
doenças conduzem necessariamente ao sofrimento e à morte, se forem bem tratadas.
Na nossa opinião, atribuir naturalidade ao fenômeno doença na velhice é, sob
certo ponto de vista, um elemento positivo, já que permitiria ao indivíduo preparar-se
para o advento das enfermidades e avaliá-las como o resultado natural e normal do
130
saúde, que são sentidas pelos idosos entrevistados, gira ao redor da manutenção de
autonomia e de independência.
Ainda mais, o fato de os trabalhadores da saúde e os idosos terem evocado o
termo incapacidade ao escutar a expressão “doença na velhice” demonstra que, nesse tipo
de representação, existe um certo encontro das necessidades normativas e as necessidades
sentidas de saúde.
Discutamos, a seguir, alguns elementos que dizem respeito ao sistema periférico
doença na velhice como expressão de problema. Dos quatro grupos participantes,
somente o grupo de cuidadores referiu-se à doença como problema em termos de núcleo
central. Os grupos restantes, incluindo a amostra total, agruparam-na sob a forma de
núcleo periférico próximo ou distante.
Deduzimos que, para os cuidadores, doença na velhice pode ser representada
como um problema pois, caso não seja bem cuidada ou tratada, levará o idoso à condição
de incapaz e de dependente dos outros. Obviamente, isso tem a ver com o conceito de
expectativa de vida autônoma (OMS, 1984). Para muitas pessoas jovens, o
prolongamento da vida é um fenômeno muito bem aceito. Para as pessoas idosas e para
outros indivíduos estreitamente ligados a elas, o mais importante é a qualidade desse
envelhecimento em termos de autonomia. Por isso estabelecemos a relação entre os dois
conteúdos encontrados: a incapacidade e o problema.
Como a incapacidade é um dos núcleos centrais da representação social da doença
na velhice, isso faz pensar na relação estreita que existe entre essa incapacidade e o
centro da representação. No entanto, movimentando-nos desse centro da representação
para sua periferia, encontramos um conteúdo que, de alguma maneira, suporta um pouco
melhor as contradições dos grupos: a doença representada como um problema, central
para os cuidadores e os idosos saudáveis, mas periférico para os trabalhadores e os idosos
doentes. Em qualquer indivíduo, toda falta de autonomia para se desenvolver no meio
gera desconforto. Para alguns, além de a doença classificar-se em termos de
incapacidade, foi também integrada às experiências concretas de muitos dos
participantes. Em outras palavras, doença na velhice pode gerar o problema de incomodar
os outros, se estiver associada à perda de autonomia e de independência.
135
traços de catolicismo. Associar doença na velhice a aspectos religiosos pode até ser
interpretado em termos de concepção de mundo.
Essa representação social da cura da doença na base da religiosidade pertence,
obviamente, ao senso comum desses sujeitos. Em termos psicológicos, são aspectos que
podem estar imbricados com alguns conceitos como a autoconfiança e a segurança em si
mesmo. Esses últimos conceitos deveriam fazer parte do diagnóstico de saúde que um
trabalhador faz no momento de atender um paciente idoso. Daí o encontro tão desejado
entre as necessidades de saúde sentidas pela população e as necessidades normativas que
são determinadas pelos especialistas em saúde.
do Brasil, o dinheiro seja uma das vias mais importantes para a obtenção da cura, o que
está determinado, entre outros fatores, pela ineficiência de muitos dos serviços públicos
de saúde. Em algumas ocasiões, devido a essa ineficiência dos serviços públicos, o idoso
terá que recorrer aos serviços privados, que são caros demais.
sua situação de saúde. Lembre-se também que, no caso dos idosos doentes, que são
dependentes para realizar as atividades da vida diária, o apoio sócio-familiar é
indispensável para que eles possam satisfazer suas necessidades.
Uma última colocação sobre este sistema periférico próximo pode ser feita ao
redor dos cuidadores. De todos os grupos entrevistados, o grupo de cuidadores foi o mais
envolvido com o cuidado de um idoso doente. No entanto, assim como aconteceu com o
termo “saúde na velhice”; os sujeitos deste grupo que foram entrevistados, não evocaram
termos que pudessem ser incluidos neste sistema. Observe-se na Tabela 10 que, muitas
das palavras evocadas, associam a doença na velhice com uma falta de cuidados ao longo
do curso de vida de uma pessoa. Será que para os cuidadores entrevistados, o cuidado
preventivo ou a prevenção de problemas de saúde é mais importante que aquele cuidado
que eles podem exercer quando o idoso já ficou doente e incapacitado.
presente a interpretação preventiva que a doença pode ter, isto é, os hábitos de vida que
uma pessoa teve influenciarão a probabilidade de ter uma velhice sadia e sem doenças,
pelo menos do tipo incapacitante. Chamou favoravelmente nossa atenção o fato de
continuar encontrando a palavra alimentação dentro dessa categoria do cuidado
preventivo. Nos países mais ricos e em muitos dos países em desenvolvimento, a
obesidade, junto à má nutrição e à inatividade, constituem alguns dos problemas de saúde
mais importantes dos idosos (OMS, 1984; Berquó, 1996).
E de grande relevância que nesse conteúdo do cuidado preventivo exista um
consenso entre todos os sujeitos entrevistados. Isso demonstra que, além da diversidade
de termos evocados em cada um dos grupos, há conteúdos que são compartilhados entre
eles. Entre os dois grupos de idosos e o grupo de trabalhadores, o consenso identificou-se
dentro dos conteúdos do núcleo central da representação da doença na velhice. Em
termos fenomenológicos, isso pode constituir um passo de avanço para a obtenção do
ponto de convergência entre as necessidades sentidas, a oferta de serviços de saúde e a
demanda de serviços, que San Martin & Pastor (1988) colocam. No universo de senso
comum existe esse consenso; então, por que não aplicá-lo ao universo reifícado das
políticas e programas de saúde não só da população idosa, mas também da população
jovem? Afinal de contas, a possibilidade de ser saudável na velhice vai depender muito
dos hábitos de vida anteriores.
Parece-nos pois, que nos conteúdos relacionados ao cuidado preventivo não
existem atritos entre os diferentes grupos participantes.
A dimensão do cuidado em termos de carinho, atenção àquele idoso que está
doente está expressa através de duas evocações desse núcleo periférico da representação
social na amostra total: cuidar e cuidar para ficar saudável (Tabela 6). Nesse caso,
estamos diante daquele tipo de assistência em saúde, ou cuidado em saúde que é feito a
pessoas doentes com a finalidade de que elas voltem à condição de pessoas sadias.
estados de ânimo negativos podem contribuir para a condição de estar doente, ou que
estados negativos de ânimo poderiam ser causa de doença. Nesse sentido, a estabilidade
emocional toma-se um indicador de saúde.
Resumindo as descobertas sobre a expressão “doença na velhice”, pressupõe-se
que, na amostra total, as palavras que definem a representação social da doença na
velhice foram a tristeza, o tipo de serviço de saúde que é fornecido no SUS, alguns tipos
concretos de enfermidades, a normalidade da doença na velhice, a incapacidade e a
religiosidade. Neste estudo apareceram outros conteúdos periféricos que, em nosso modo
de ver, são menos estáveis, mais flexíveis e funcionais, e concretizaram-se nos termos
problema, morte, dinheiro, apoio sócio-familiar, cuidado, doença como algo terrível,
piedade e estabilidade psíquica.
A seguir, apresentamos a segunda parte da discussão referente ao tratamento
analítico dos dados da entrevista. Num primeiro momento, serão discutidos os resultados
relacionados à pergunta de como os participantes percebiam um idoso saudável e,
posteriormente, serão discutidas as classes de representação social referentes à pergunta
de como percebiam um idoso doente.
Das 187 u.c.e em que o corpus foi dividido, na etapa da Análise Hierárquica
Descendente foram obtidas 105 u.c.e, quer dizer, para a análise considerou-se 56,15% do
total de u.c.e que o corpus tinha, descartando-se 43,85% restante das u.c.e.
No Dendograma 1, apresenta-se a distribuição que as três classes de
representações sociais apresentaram no grupo de pessoas idosas, ao lhes perguntarmos
como percebiam um idoso saudável.
DENDOGRAMA 1: Distribuição das classes na representação de um idoso saudável- Grupo de idosos (n=80).
Florianópolis, 1999.
145
Outras u.c.e encontradas nessa classe apontam para outros conteúdos relacionados
ao bem-estar, à alegria e à felicidade. De maneira semelhante a como foram encontradas
essas mesmas palavras na técnica de evocação livre (com o termo saúde na velhice), os
idosos que tipificam essa representação social citaram vários elementos ao redor de um
idoso saudável representado como uma pessoa alegre. Por exemplo:
“O idoso saudável para mim é aquela pessoa que sempre está contente, sem
importar nem a própria doença. É a alegria de viver [ ... ] Quando ele tem aquele
contentamento e quando tem alegria de viver, quando ele sabe controlar não ter
dores, não ter doenças e ter uma boa cabeça para estar sempre alegre”
(Entrevistado 23, grupo de idosos doentes, casado, mora com a esposa, recebe
R$ 3.500,00/mês e tem 63 anos).
“Estar saudável na velhice é estar com um bom astral, lutar por tudo na vida.
Quando eu vejo alguém doente, eu fico longe, porque saúde se contamina, mas
doença também” (Entrevistado 58, grupo de idosos saudáveis, viúva, mora com
uma irmã, recebe R$ 500,00/mês e tem 80 anos).
De alguma maneira, essa classe mostra como os idosos (principalmente, os que
pertencem ao grupo de pessoas doentes), compartilham uma representação social de
necessidades sentidas de saúde na base do bem-estar emocional. Para se sentir numa
condição de sadio é preciso manter um equilíbrio emocional, o que dependerá grande
parte das vezes da própria pessoa. Ao representar um idoso saudável em função de
aspectos psicológicos, esses idosos entrevistados estão se comprometendo com a sua
saúde e, de alguma forma, contribuindo com o trabalho dos programas de saúde. Essa
representação social mostra que, em nível grupai, as pessoas idosas estão dispostas a
participar da saúde.
que tipificam a classe foram produzidas por mulheres. Destas, seis moravam sozinhas no
momento da entrevista, e 9 moravam com o esposo ou com outras pessoas. Do total de 16
mulheres que se agruparam nessa classe, 11 tinham entre dois e quatro filhos, e 5 pessoas
não tiveram filhos.
Pelas suas u.c.e ou pelas palavras típicas da classe (caminha/caminhar, divertir,
faz/fazer, pode/podem/poder/podes, entre outras); os conteúdos da mesma apontam para
uma representação de um idoso saudável em função de autonomia no dia a dia.
O conceito de saúde na velhice, como já foi apontado no referencial teórico, tem
evoluído muito e cada vez fica mais próximo da qualidade com que essas pessoas podem
desenvolver-se na vida diária, ou seja, o estar saudável na velhice verifica-se em função
da autonomia do indivíduo, e não simplesmente a partir do número de doenças.
Sabe-se, também, que ainda existem dificuldades para chegar a um consenso
operativo de como definir a autonomia na velhice, mas a Organização Mundial da Saúde
(OMS, 1984), já vem trabalhando nisso a partir do indicador de independência nas
atividades da vida diária. As deficências que na velhice, não chegam a produzir
incapacidades são muito menos importantes que as que acabam interferindo o dia a dia da
pessoa maior de sessenta anos.
Concordamos com o critério da OMS (1984), que afirma que um dos melhores
indicadores de autonomia de um idoso é o grau em que este consegue se desenvolver na
sociedade como deseja. Neste trabalho, as únicas pessoas que citaram esse tipo de
conteúdo representacional para definir um idoso saudável pertencem ao sexo feminino.
Pela predominância do sexo feminino nessa classe, consideramos a autonomia um forte
indicador de saúde na velhice. Parece que essas idosas representam um idoso saudável a
partir de sua independência e capacidade para manter seu lar, viajar, passear, realizar as
atividades cotidianas, ter mobilidade.
Nessa classe foram as mulheres as que mais evocaram este tipo de conteúdo. É
possível que possam ser feitas algumas reflexões. Femandez-Ballesteros et al (1992),
apontam que, em estudos epidemiológicos realizados na Europa sobre prevalência de
incapacidades na velhice na faixa etária de 65 a 69 anos, essas incapacidades e as perdas
na autonomia aumentam nas pessoas do sexo feminino mais que nos homens. Essa
diferença tende a diminuir na medida em que a idade aumenta. Um dos elementos que
149
está envolvido é a maior sobrevida que as mulheres ainda têm em comparação com os
homens. E provável que nossa descoberta nesse tipo de representação social esteja
relacionada ao que foi obtido do ponto de vista epidemiológico.
Uma outra interpretação pode ser feita. Existe uma influência do fator cultural na
interpretação que as mulheres e os homens fazem da autonomia. Por exemplo, em
algumas sociedades, o padrão diz que a mulher é quem deve preparar a comida. É certo
que um homem autônomo poderia fazê-lo também, mas se nunca aprendeu, ele julga-se
incapaz. Neste estudo, foram pessoas do sexo feminino as que mais apontaram conteúdos
relacionados à autonomia, e é provável que o fator cultural possa explicar isso. Na nossa
sociedade, ainda são as mulheres quem mais se encarregam do trabalho doméstico, o que,
de alguma maneira, influencia o fato de elas valorizarem tanto a independência na vida
diária. Só que, além do trabalho doméstico da mulher, prevaleceram outros conteúdos que
diziam respeito à autonomia para poder viajar, passear, divertir-se, etc. É provável que
essas idosas que moram em regiões urbanas, como Florianópolis, estejam interessadas
tanto no trabalho doméstico quanto no lazer fora de casa. Vejamos a seguir algumas u.c.e
das participantes:
“E a coisa mais maravilhosa do mundo, é uma pessoa que tem muita saúde, que
pode viajar bastante, que faz tudo o que ele quer. Um idoso saudável gosta de
se arrumar, de ir para tudo o que é canto e se divertir, que não fica dentro de
casa [...]” (Entrevistado 19, grupo de idosos doentes, viúva, mora sozinha,
recebe R$ 130,00/mês e tem 73 anos).
“E o idoso que caminha, que faz tudo, que possa levar a vida para frente”
(Entrevistado 21, grupo de idosos doentes, casada, mora com o esposo, recebe
R$ 360,00/mês e tem 61 anos).
“E uma pessoa que pode passear, que pode ir a excursões, caminhar, sair, se
divertir e fazer tudo o que Deus manda. São pessoas que até podem ser mais
felizes que qualquer moço, porque o idoso aproveitando pode ser muito mais
feliz que as pessoas jovens, mas para isso precisa de saúde” (Entrevistado 80,
grupo de idosos saudáveis, viúva, mora com uma amiga, recebe R$ 700,00/mês
e tem 82 anos)
150
Nessa última u.c.e aparece uma ampla comparação do idoso com o jovem. De
alguma maneira essa entrevistada está se referindo a esse preconceito social de que a
pessoa idosa não pode ser feliz pelo simples fato de ter mais de sessenta anos. Para ser
feliz não é imprescíndivel a juventude. Um idoso também pode sê-lo mas, parece que
para estes idosos existe uma condição necessária: estar saudável.
No anexo 3 (passo Dl), verifica-se como quase todas as u.c.e dessa classe
representam o idoso saudável em função do exercício da autonomia. Tal como aponta
Gonçalves et al (1992), a saúde e a autonomia na velhice são conceitos estreitamente
relacionados.
Das 16 u.c.e que tipificaram essa classe, 9 pertenciam a mulheres que estavam
doentes no momento da coleta de dados. E provável que nessa condição de saúde, a
representação social que elas têm de um idoso saudável reflita suas necessidades de saúde
naquele momento. Deduz-se portanto, que nessas u.c.e existem exemplos de como a
representação social pode tomar-se uma ferramenta na detecção de necessidades de
saúde.
Um último aspecto que pode ser discutido neste classe diz respeito à relação que
existe entre representações sociais e práticas sociais. Na nossa opinião, a classe: idoso
saudável em função de autonomia reflete alguns aspectos psicodinâmicos da
representação. Quer dizer, nos exemplos de u.c.e apresentados estão contidos elementos
que apontam para como se conduzir no dia a dia para ser uma pessoa idosa saudável.
O parágrafo anterior nos permite deduzir que, nesta classe de representação social
do assunto idoso saudável, está contida uma das funções da representação: permitir
justificar as tomadas de posições e os comportamentos dos indivíduos e dos grupos.
Classe: O idoso saudável como aquela pessoa que não incomoda a família.
O número de u.c.e que compõe esta classe foi de 12 (11,43%). Nesse grupo de 80
pessoas idosas, ela foi a menos importante. Das 12 u.c.e que tipificaram a classe, a maior
parte das u.c.e foram produzidas por pessoas do grupo de idosos saudáveis que
participavam dos grupos preventivos em saúde. Da mesma forma que na classe anterior,
todas as u.c.e dessa classe foram produzidas por mulheres. Dessas 12 mulheres, nove
eram viúvas, duas eram solteiras e uma era casada. A maioria da mulheres viúvas tiveram
entre dois e quatro filhos, sendo que a idade delas estava entre os 60 e 70 anos.
151
grupo de idosos saudáveis, viúva, mora com uma filha, recebe R$ 130,00/mês e
tem 75 anos).
Um conteúdo visivelmente central e muito compartilhado por esse grupo de
mulheres idosas que se diziam saudáveis, é uma representação da saúde do idoso
associada à possibilidade de independência da família. As pessoas que tipificaram as u.c.e
dessa classe temem ter que depender do próximo para poder viver. É possível que isso
explique o fato de que a maioria delas pertença aos grupos que faziam prevenção na
Policlínica. Cuidar-se precocemente pode retardar o desenvolvimento de incapacidades.
Essa participação nos grupos de prevenção em saúde poderia justificar um certo tipo de
treinamento que essas pessoas estão fazendo para o autocuidado e para a prevenção de
problemas de saúde. A prevenção em saúde é uma das áreas mais importantes dos
programas sanitários direcionados ao cuidado do indivíduo por si mesmo, sobretudo, nas
sociedades em que as redes sociais de apoio social ainda são escassas (programas
direcionados a amigos, vizinhança, etc), ou nos países em que não existem programas
suficientes de educação e de treinamento a familiares para o cuidado do idoso.
Achamos que, no caso específico do grupo de idosos, impõe-se uma breve
reflexão acerca da relação que existe entre necessidades de saúde e representação social.
Os tipos de representações sociais sobre um idoso saudável que foram obtidos nessa
amostra de pessoas idosas, permitem-nos refletir sobre o seguinte: na atenção comunitária
podem ser executadas estratégias de saúde baseadas na orientação por problemas. Para
atingir esses problemas de saúde é necessário que as pessoas expressem suas
necessidades, ou seja, que expressem aquilo que deve ser feito para que a situação
problemática tome-se uma situação desejada. As representações obtidas aqui, no
referente a um idoso saudável, de alguma maneira refletem o que Pineault & Daveluy
(1989) falam a respeito do estado de saúde ideal de um idoso. E esse estado ideal de
saúde é a situação desejada que, em termos de saúde, essas pessoas gostariam de ter.
Nas representações sociais que foram obtidas expressaram-se vários elementos
acerca daquilo que os idosos esperam dos serviços de saúde, e até dos órgãos sociais
governamentais. Em outras palavras, são exigidas dos serviços de saúde recursos de
atendimento que prolonguem cada vez mais a expectativa de vida autônoma do idoso,
que contribuam para seu bem-estar, e que forneçam um serviço equilibrado capaz de
153
abranger aspectos físicos, psicológicos e sociais, entre outros. Na medida em que essas
necessidades forem satisfeitas, poderá ser encontrado o ponto de convergência que San
Martin e Pastor (1988) assinalam entre as necessidades de saúde, as demandas de saúde e
a oferta de serviços de saúde.
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155
O fato de poder fazer tudo na vida e ser independente naquilo que a pessoa idosa
faz, dão consistência a esse campo representacional da saúde na velhice. Nesse grupo,
uma das categorias considerada mais apropriada para ancorar o assunto idoso saudável
foi a autonomia na vida diária.
“Para mim, saudável é a ausência de doenças, mas saudável seria hoje um idoso
que não tem doenças, que tenha uma vida equilibrada, que beba
moderadamente, que tenha uma atividade física, que caminhe, que tenha uma
vida boa” (Entrevistado 18, médico, 30 anos de formado, 18 anos de trabalho
na Rede Pública, 50 anos).
A partir dessas u.c.e, não há dúvidas de que existe um consenso para representar
um idoso saudável baseado na prática de exercícios físicos. Essa prática parece ser um
dos melhores indicadores para estar saudável na velhice. Isso tem sido comprovado em
vários dos estudos epidemiológicos que os grupos técnicos de pesquisa da Organização
Mundial da Saúde têm desenvolvido.
Do ponto de vista cultural, a prática de atividades físicas contém um profundo
selo social. Antigamente, acreditava-se que a melhor situação de um idoso era ficar o
mais passivo possível. Felizmente, depois que se iniciaram os primeiros estudos de
envelhecimento, e a partir da Primeira Assembléia Mundial de Envelhecimento de Viena
em 1982 (Kerrigan, 1982), provou-se o contrário: quanto mais passivo for um idoso, mais
probabilidade tem de desenvolver doenças físicas e psíquicas.
As u.c.e dessa classe foram produzidas, fundamentalmente, por médicos. O
sentido dessa representação de idoso saudável consistiu em fazer depender esse estado à
prática de atividades. Chamaram nossa atenção alguns elementos representacionais da
última u.c.e que apareceram nos exemplos, e que afirmam que o idoso saudável é aquele
que não tem doenças. Provalvelmente esse conteúdo ancora-se num fato bastante
improvável, conforme o mostram diferentes achados epidemiológicos que comprovam
que é difícil chegar aos sessenta anos sem ter, pelo menos, alguma doença (Hood &
Dincher, 1995; Lachs & Pillemer, 1995).
odontólogo e 1 por uma psicóloga). Outra variável que tipificou a classe foram os anos de
formado (entre 11 e 20 anos), e o tempo de trabalho na rede pública (entre 11 e 20 anos).
Os conteúdos dessa representação social remetem a questões relacionadas com
diferentes formas de trabalho. No Dendograma 2, observam-se várias palavras associadas
a essa questão: trabalhar/trabalharam/trabalho/trabalhou, pessoa/pessoas e coisa/coisas.
Socialmente, a vida no trabalho é uma fonte muito importante de engajamento
social de uma pessoa e o trabalho tradicionalmente representa a fase ativa da vida de uma
pessoa. Conforme Santos (1990), o desenvolvimento de uma identidade pessoal está em
função de múltiplos fatores, alguns dos quais são os papéis profissionais que a pessoa
assume na sua vida. Esses papéis sociais estão profundamente imbricados com o trabalho.
Daí a estreita relação que existe entre a identidade pessoal e o trabalho de um indivíduo.
Para ilustrar ainda mais a importância que o trabalho pode ter na vida de uma
pessoa, transcrevemos uma colocação de Hemingway a respeito da aposentadoria
encontrada no livro de Beauvoir (1990, p. 325):
“A pior morte para um indivíduo é perder o que forma o centro de sua vida, e
que faz dele o que realmente é. Aposentadoria é a palavra mais repugnante da
língua. Seja escolha nossa ou imposição do destino, aposentar-se é abandonar
nossas ocupações; essas ocupações que fazem de nós o que somos, equivale a
descer ao túmulo”
A obtenção dessa classe nos permite algumas outras reflexões só que, antes de
proseguir com a discussão, gostaríamos de relacionar algumas das u.c.e que a tipificam:
“Trabalhar em coisas alternativas e sobretudo que a sociedade esteja preparada
para dar esse amparo, para dar uma continuidade a essa vida, para que a velhice
não seja o início de uma morte, ainda quando essa pessoa está lúcida e cheia de
vida” (Entrevistado 29, psicóloga, 12 anos de formada, 12 anos de trabalho na
Rede Pública, 34 anos).
“[... ] que seja ainda um indivíduo que possa dar alguma coisa para a sociedade,
que possa se sentir útil, que seja feliz” (Entrevistado 28, médico, 28 anos de
formado, 20 anos de trabalho na Rede Pública, 54 anos).
“Um idoso totalmente integrado à sociedade, que pode trabalhar, que tem
condições para fazer alguma coisa. Uma pessoa pode ser aposentada e ter a
160
idoso consegue trabalhar da mesma forma a como o fazia 20 anos atrás. Essa é a razão
pela que devemos destacar o que assinalou o sujeito número 29: se a sociedade não
estiver preparada para acolher um idoso e fornecê-lhe um novo papel social ligado ao
trabalho, ocorre o que diz o sujeito nro 2 do estudo anterior: os usa, mas os joga fora
quando seu ritmo não lhe convém mais (Veloz et al., 1999).
Façamos uma breve comparação entre as três classes de representações anteriores
(o idoso saudável em função da independência nas atividades da vida diária; o idoso
saudável em dependência da prática de atividades e o idoso saudável em função da sua
capacidade de trabalhar), e as palavras evocadas pelos oitenta idosos pesquisados na
técnica de evocação livre.
Segundo mostram as tabelas 2 e 3 da discussão, as palavras trabalho/trabalhar,
andar/caminhar e atividade física/exercício físico, entre outras, refletem um certo ponto
de convergência entre aquilo que os idosos expressam como conteúdos centrais da saúde
na velhice e o que os trabalhadores da saúde avaliam como critério para representar a
saúde na velhice. Em conseqüência observa-se, também, um certo consenso
representacional entre os três grupos no que diz respeito ao trabalho e à atividade como
condições para estar sadio na velhice. No plano representacional, haveria aqui uma
convergência entre as necessidades sentidas de saúde expressas pelos idosos e as
necessidades normativas que são determinadas pelos especialistas em saúde (e que neste
último caso, as mesmas foram exploradas a partir de conhecimentos consensuados, de
representações sociais).
“Agora o fator econômico é muito importante, porque sem ele tu não tens
acesso a boas instituições, a bons atendimentos e a boa alimentação”
(Entrevistado 13, auxiliar de enfermagem, 23 anos de formado, 16 anos na rede
pública, 40 anos).
Vê-se aqui uma representação social que é veiculada através de aspectos
econômicos e financeiros, o que também foi observado em algumas das palavras da
técnica de evocação livre. O serviço público de saúde ainda não resolve todas as
necessidades sentidas pelos idosos. O serviço privado de saúde também não, sobretudo se
levarmos em conta que este é fundamentalmente curativo. No entanto, caso o idoso não
tenha acesso ao primeiro, precisa de uma boa situação financeira que lhe garanta o acesso
ao segundo.
Em função do que foi dito anteriormente, fica nítido o seguinte: seria mais viável
oferecer serviços preventivos de saúde pública, e até aperfeiçoar os serviços curativos
existentes, do que fazer com que a população idosa dependa do setor privado de saúde.
Na maioria dos casos, a realidade do idoso brasileiro é a de um idoso com falta de
recursos econômicos.
revezados e dois eram cuidadores únicos e os parentescos que os cuidadores tinham com
os pacientes idosos eram variados.
Assim como a maioria das u.c.e que tipificaram a classe, as palavras de maior
associação com essa classe (feliz, pode/podem/poder, saudável e o termo estar, entre
outras) remetem a noções de promoção de saúde e de cuidados no estilo de
comportamento ao longo do curso de vida. São esses estilos de vida que determinam o
fato de ser saudável ou doente na velhice. Um dos documentos da Carta de Ottawa para a
promoção da saúde, estabelece que é a população que deve possuir os meios para cuidar
de si mesma e ter um controle sobre sua saúde (Organización Panamericana de la Salud,
1992).
Em linhas gerais, o estilo de vida relaciona-se à maneira de viver de uma pessoa.
Essa maneira de viver baseia-se na interação que se estabelece, entre as condições de vida
e os padrões individuais de comportamentos, os quais têm uma forte influência de fatores
socioculturais e pessoais (Organización Panamericana de la Salud, 1992). Nas seguintes
u.c.e pode observar-se como os cuidadores de pessoas idosas representaram o idoso
saudável a partir dos aspectos anteriores de vida de uma pessoa:
“Eu acho que para poder estar saudável na velhice, as pessoas não podem
maltratar tanto o corpo quando são jovens. Saúde é poder ter toda essa estrutura
de jovem para poder segurar a velhice, que infelizmente só traz doença à gente”
(Entrevistado 1, Cuidador revezado, nora do idoso, primeiro grau, 48 anos).
“Saúde num idoso é ser muito adequado em seus hábitos de vida, mas não
agora que está velho, e sim ao longo de toda a vida. Só assim, é que se está
saudável na velhice” (Entrevistado 17, Cuidador revezado, nora do idoso,
primeiro grau, 39 anos).
“Eu acho que estar saudável na velhice é ter estado saudável durante toda a
vida da gente” (Entrevistado 5, único cuidador, filho do idoso, primeiro grau,
29 anos).
“Eu acho que isso é muito individual. Para mim ser saudável na velhice é o
resultado de toda uma história de vida que deve ser construída com muito
carinho e cuidados de todo tipo” (Entrevistado 13, Cuidador revezado, amiga
do idoso, primeiro grau, 65 anos).
167
Da mesma forma que é difícil falar de um estado ideal de saúde, é difícil, também,
definir os estilos de vida que podem ser considerados como ótimos para todas as pessoas.
Para considerar um estilo de vida como bom ou ruim, é necessário ter em conta uma série
de fatores, dentre os quais cita-se a cultura, a renda financeira, a vida social, a idade, as
capacidades físicas, as tradições, o ambiente familiar e o próprio trabalho, entre outros.
No campo da representação social desses sujeitos, há diferentes alusões aos
aspectos descritos no parágrafo anterior. E muito interessante que parte dos cuidadores
que participaram do estudo tenham manifestado esse consenso acerca do assunto idoso
saudável. Como apontou Moscovici (1978, p. 58):
“De fato, representar uma coisa, um estado, não consiste simplesmente em
desdobrá-lo, repeti-lo ou reproduzi-lo; é reconstruí-lo, retocá-lo, modificar-lhe
o texto”
O objeto da representação social que foi estudado (idoso saudável) é, sem dúvida
alguma, um objeto abstrato. No entanto, nessas u.c.e aparecem conteúdos concretos que
explicam sob a base de quais elementos ancorou-se nosso objeto de representação. Nesse
caso, a representação social de um idoso enraizou-se socialmente, utilizando elementos
mais conhecidos e familiares para os entrevistados e que têm a ver com os hábitos de vida
e a história de vida de cada um, entre outros.
Permitam-nos fazer uma rápida comparação entre a classe de representação social
obtida por nós neste trabalho e a que foi obtida por Herzlich (1991) no seu estudo sobre
representação social da saúde e da doença. No que diz respeito à saúde, a pesquisadora
teve como achado uma associação harmoniosa da saúde à pessoa, como se isso fosse
natural e não precisasse de explicação. E como se o indivíduo tivesse a sorte de nascer
com uma boa constituição e, em conseqüência, tivesse uma boa saúde. Nesse trabalho,
quase trinta anos depois do estudo de Herzlich, um grupo de entrevistados não atribui
naturalidade ao fato de estar saudável na velhice. Pelo contrário, conforme as u.c.e
relacionadas, uma pessoa pode nascer com uma boa constituição, mas isso não determina
que ela vai ser saudável na velhice. Conforme os conteúdos dessas unidades de contexto
elementares, os estados de saúde na velhice são construídos pelas pessoas ao longo de
todo o curso de vida.
168
Do ponto de vista histórico, passaram quase trinta anos desde que a pesquisa de
Herzlich foi desenvolvida, e nosso trabalho mostra que algumas pessoas têm evoluído no
que diz respeito ao conceito leigo de saúde que construíram. Mostra que a representação
social também está influenciada por fatores históricos, embora o estudo de Herzlich e o
nosso tenham acontecido em culturas e momentos históricos diferentes.
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172
em alguns dos conteúdos que já tinham sido obtidos na técnica de evocação livre e um
exemplo dessa relação foi o referente ao cuidado.
Tradicionalmente, o cuidado familiar de um idoso doente tem sido
responsabilidade de filhas, de noras ou de netas. E possível que esse seja um dos fatores
que contribuiu para que as u.c.e que tipificaram essa classe fossem produzidas por
mulheres. Vale ressaltar que nesse estudo encontraram-se, também, entrevistados do sexo
masculino (filhos, netos) que cuidavam de idosos doentes hospitalizados.
Na atualidade muitas mulheres atravessam múltiplas dificuldades ao ter que
cuidar uma pessoa idosa doente. Isso se deve, entre outros fatores, à mudança do papel
social da mulher, diretamente relacionado à atividade de trabalho. As mulheres são, na
sociedade atual, cada vez mais uma força de trabalho fundamental, o qual tem reduzido
ostensivamente a probabilidade de que elas estejam sempre disponíveis para o cuidado de
idosos doentes.
Para compensar essa dificuldade, em alguns países criam-se redes de apoio
estruturadas a partir de parentes, vizinhos e amigos que, por um lado, facilitam o contato
social, e por outro, fornecem a assistência e o cuidado de que um idoso doente necessita
(OMS, 1984; Femández-Ballesteros et al, 1992; Kane & Kane, 1993; Guia de Atención a
la Salud del Anciano, 1992). Em Florianópolis, por exemplo, o Núcleo de Estudos da
Terceira Idade (NETI) da Universidade Federal de Santa Catarina oferece cursos
especiais para pessoas que queiram dedicar-se ao cuidado e a assistência de pessoas
idosas que moram na comunidade. Essa pessoas são formadas como monitores de ação
gerontológica e, sem dúvida alguma, tomam-se uma fonte muito proveitosa de assistência
e de cuidado social comunitário.
O apoio social que pode ser fornecido ao idoso, seja pela família, pelos amigos ou
pela sociedade em geral, constitui uma poderosa ferramenta que auxilia a cura do idoso
doente, ou que previne a doença nos idosos que ainda são saudáveis. O consenso obtido
entre os idosos entrevistados no que diz respeito a esse tipo de conteúdo mostra como
eles reconhecem os benefícios que têm as relações sociais para a saúde de pessoas
maiores de sessenta anos.
A seguir algumas u.c.e que confirmam o consenso desses conteúdos:
174
produzidas por mulheres viúvas que moravam sozinhas ou com filhos. Por essa razão, a
viuvez foi uma das variáveis que caracterizou a representação social desse grupo.
Observe-se no dendograma que as palavras de maior associação com a classe
apresentaram conteúdos que remetem à uma imagem muito triste de um idoso doente, por
exemplo triste e ruim.
Na seção I da Lei no 8.842 de 4 de janeiro de 1994, estabeleceu-se que, no Brasil,
um dos princípios da Política Nacional do Idoso é a obrigação que a família, a sociedade
e o estado têm de assegurar a ele os direitos de cidadania e que não sofra qualquer tipo de
discriminação (Diario Oficial, 1994). A Política Estadual do Idoso em Santa Catarina
também estabeleceu leis e prioridades no que diz respeito ao cuidado de um idoso
(sobretudo do idoso doente). Dessas legislações se deduz que o atendimento ao idoso
deve ser priorizado, mas a rede de serviços nem sempre consegue garanti-lo.
Do ponto de vista da infra estrutura de saúde, em Florianópolis-capital, existem
mais de 40 centros de saúde, e de acordo com os conteúdos das u.c.e encontradas no
campo da representação social dessa classe, nem sempre o idoso recebe a atenção e os
cuidados de que ele precisa. Por exemplo:
“Para mim é a coisa mais triste porque tem filhos que não querem cuidar dos
pais doentes e os abandonam. Por isso é triste. Eu imagino um idoso doente
sempre abandonado, que não tem ninguém para cuidar dele, que em geral não
tem dinheiro para comprar seus remédios, que ninguém liga para eles, porque
para que? Já está velho demais” (Entrevistado 64, grupo de idosos saudáveis,
viúva, mora com um filho, recebe R$ 130,00/mês e tem 72 anos).
“O governo deveria se preocupar com o atendimento social dele, com seus
problemas, se ele está na rua, por exemplo, porque os jovens de hoje não ligam
mais para o idoso, imagina o governo” (Entrevistado 5, grupo de idosos
doentes, viúva, mora com um filho, recebe R$ 260,00/mês e tem 62 anos).
“E triste, é o pior que tem na vida. É aquele idoso que além de estar doente, sua
situação financeira quase sempre é ruim. Um idoso doente é, muitas vezes, um
idoso desprezado. Nós estamos neste mundo, mas as pessoas diferenciam os
outros pela situação de dinheiro. E isso é muito ruim, e nós quase nunca temos
177
Foi intencional o fato de colocar este número grande de u.c.e como exemplos da
classe. Ficou claro que uma das formas de nomear um idoso doente é através da morte.
Esse grupo compreendeu o assunto de um idoso doente a partir de um protótipo social
muito mórbido e pejorativo, mas que tem um cunho social concreto. Como diz Debert
(1996, p.39), ao se referir à imagem de um velho brasileiro:
“Um ser indiscriminado, empobrecido, isolado, dependente da família ou do
Estado, em crise de identidade, com um atestado prematuro de óbito físico e
social”
Se um idoso ficar doente, e segundo as u.c.e produzidas por estes entrevistados, a
morte chega a ser um fato desejado por eles. Chama a atenção que, das cinco u.c.e
relacionadas, três foram produzidas por pessoas que estavam sendo atendidas na
Policlínica por apresentarem problemas de saúde, ou seja, no momento da coleta de dados
eles se diziam pessoas doentes. Contudo, achamos que o tipo de doenças que eles
possuíam não era tão grave ao ponto de determinar essa representação social do idoso
doente associada a morte. Então, a partir de que fato esses idosos puderam desenvolver
essa relação tão negativa com a doença na velhice?
Ao analisarmos essas u.c.e podemos discernir um outro elemento que diz respeito
às doenças incapacitantes que limitam a vida do idoso e a vida das outras pessoas que
deverão cuidar deles. Vivemos numa sociedade em que se valoriza tanto a independência,
que os idosos doentes preferem morrer a ter que correr o risco de depender dos outros.
Nesses conteúdos representacionais cumpre-se a antiga crença popular de que para uma
pessoa doente, a morte não é o problema, mas sim o processo de morrer. Nas u.c.e que
foram citadas anteriormente está presente este medo ao processo de morrer sofrendo.
Em relação a esse temor pelo processo de morrer que a pessoa idosa sente quando
está doente e incapacitada, Beauvoir (1990), cita no seu livro sobre a velhice o desejo de
morte que Freud sentia nos seus últimos anos de vida. Numa das cartas escritas por Freud
a um de seus amigos, a autora conta que o pai da Psicanálise desejava morrer para ficar
livre do sentimento de inadequação que afetava a idade.
Observa-se nessa terceira classe de representação social que, entre as pessoas que
a compartilham, existe um consenso para desejar a morte quando suas necessidades de
saúde não podem mais ser solucionadas pelos serviços de saúde. Deduz-se, pois que, se o
181
problema de saúde não pode ser curado, o grupo compartilha da idéia de que há uma
única solução: a morte.
“Para mim, sempre a cabeça é mais importante que o corpo, mas um depende
do outro. Eles estão muito ligados, agora, é a cabeça quem comanda tudo. Tudo
aquilo que te leva para o espiritual te leva a estar doente ou sadio. A cabeça te
mantém a estabilidade” (Entrevistado 23, grupo de idosos doentes, casado,
mora com a esposa, recebe R$ 3.500,00/mês e tem 63 anos).
“A doença depende da cabeça da gente. A cabeça faz a doença do corpo. Eu,
por exemplo, o outro dia tive uma queda e melhorei rápido porque meu marido
só fez uma missa para rezar por mim e me curar. Isso pode ser saudável”
(Entrevistado 55, grupo de idosos saudáveis, casada, mora com o esposo e um
filho, recebe R$ 130,00/mês e tem 74 anos).
As u.c.e anteriormente descritas indicam que essa classe de representação social
do idoso doente organizou-se em tomo de duas noções centrais, uma das quais é
justamente o aspecto psico-emocional. A outra noção refere-se aos aspectos físicos da
doença em termos de incapacidade.
De acordo com Femandez-Ballesteros et al (1992), existem pesquisas que
comprovam a relação que existe entre os aspectos emocionais e o fato de estar doente na
velhice. De um lado, este tipo de conhecimento reificado tem apontado, entre outros
achados, para o pessimismo dos idosos em resposta a determinadas doenças, pelo
impacto que estas produzem na sua vida diária. De outro lado, apontam para a seguinte
hipótese: um estado de ânimo pessimista pode levar a um idoso a sentir-se doente.
O parágrafo anterior faz alusão a aspectos reificados do conhecimento científico,
que também estão presentes no senso comum de conhecimentos que é compartilhado por
esse grupo de idosos (conforme as u.c.e anteriormente reproduzidas). Nas noções e juízos
desses sujeitos não existem conceitos e definições próprias da linguagem científica.
Contudo, parece-nos relevante o fato de que, para explicar e tomar familiar o assunto
idoso doente, este grupo tenha utilizado elementos presentes no conhecimento científico,
só que desta vez com verbalizações típicas do senso comum. Por exemplo: a doença
depende da cabeça da gente.
Nessa classe de representação há uma estreita relação entre os dois tipos de
universos de conhecimentos: o reificado e o consensual. A relação que existe entre os
aspectos emocionais e a probabilidade de adoecer pode ter sido uma das características
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Florianópolis, 1999.
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doente na velhice não pela doença em si, mas sim pela dependência que ela pode
provocar na pessoa.
A seguir apresentamos duas u.c.e, cujos conteúdos chamaram nossa atenção. Uma
delas por refletir certa rejeição ao idoso doente, e a outra, por citar questões de prevenção
em saúde.
“Os idosos doentes ficam reclamando, fazem senhas [...] Tomam muito chata a
vida dos outros” (Entrevistado 20, auxiliar de enfermagem, 18 anos de formado
e 18 anos de trabalho na Rede Pública, 44 anos).
“É aquela mulher que durante a menopausa não tomou remédios e fica doente e
com osteoporose [...] O idoso doente é aquele que teve um acidente vascular
encefálico e fica dependente dos outros e de tudo numa cama” (Entrevistado
31, médico, 23 anos de formada e 22 anos de trabalho na Rede Pública, 46
anos).
No referencial teórico ficou explicado que a noção de representação social é uma
forma prática de saber que liga um grupo a um objeto determinado. Somente num
contexto grupai de inter-comunicações é que faz sentido falar de representações sociais.
O conteúdo da u.c.e do sujeito número 20 não foi compartilhado pelo resto do grupo de
trabalhadores. Isso permite inferir que é uma opinião à qual a entrevistada aderiu-se, mas
da qual não compartilha o resto do grupo.
Na unidade de contexto elementar do sujeito número 31, aparece uma forma de
atribuição de causalidade ao fato de estar doente na velhice. O conteúdo dessa unidade
diz respeito à falta de prevenção como uma das causas de doença e de incapacidade na
velhice e é muito válido. No entanto, as estratégias de promoção em saúde são
insuficientes, pois não possuem um nível suficiente de abrangência para educar a
população sobre os aspectos que devem direcionar o comportamento preventivo em
saúde.
tipificaram a classe foram os anos de formado e os anos de trabalho na rede pública (em
ambos os casos foram mais de 20 anos).
Conforme foi colocado em parágrafos anteriores, alguns tipos de doença do idoso
não incidem na vida diária dos mesmos. Contudo, eles precisam de um tipo de cuidado
preventivo e curativo, que lhes permita usufruir dos serviços de saúde, sempre que
necessitem deles. Para poder manter a condição de um idoso sadio, independentemente
das doenças que eles tenham, é imprescindível um mínimo de fatores, dentre os quais se
encontram as redes de apoio familiar ou social, as relações de amizade e uma renda
financeira suficiente, entre outros.
Citemos um exemplo cotidiano de como se desenvolveria o dia a dia de um idoso
doente qualquer que é portador de deficiências e de incapacidades: imaginemos um idoso
com sérias limitações na sua capacidade funcional, incontinência de esfincteres e
problemas na locomoção. Para compensar essas deficiências, é necessário um grande
esforço para que os familiares possam cuidar dele e, ainda a atenção domiciliar desse
idoso demanda altas despesas econômicas. Se essas condições sociais não pudessem ser
implementadas, a condição física e psíquica do idoso seria cada vez mais afetada,
podendo provocar até sua própria morte.
Os conteúdos do campo da representação social desta classe mostram como
diferentes aspectos sociais podem afetar a saúde física e mental de uma pessoa idosa, e
principalmente piorar o estado de um idoso que já está doente. Vejamos, a seguir,
algumas u.c.e típicas da classe:
“As pessoas têm que se apegar a Deus para poder lidar com as doenças. A pior
doença que tem a velhice é o desamparo dos idosos, que vai fazendo com que
essas pessoas caiam na depressão e na solidão” (Entrevistado 9, auxiliar de
enfermagem, 23 anos de formada e 5 anos de trabalho na Rede Pública, 49
anos).
“Doença na velhice traz tudo o que é mau. O idoso doente sente medo em
virtude da situação econômica em que vivemos hoje. São poucos os idosos que
têm dinheiro suficiente para viver. Hoje, eles têm uma falta de recursos para
tudo na vida, para encontrar uma vaga num hospital, para acordar cedo e poder
190
que o rodeia. Os conteúdos dessa classe de representação social remetem às duas formas.
Esses trabalhadores compreendem o fenômeno doença na velhice a partir de elementos
biomédicos e, também, de fatores socioeconómicos.
Os conteúdos desse campo de representação social mostram como os
trabalhadores da saúde que produziram as u.c.e típicas da classe, compreendem que o fato
de adoecer na velhice depende, além da doença física ou mental, de aspectos de tipo
econômico, especificamente de relações sociais de poder. Em outras palavras, as
desigualdades sociais que os idosos apresentam associadas à renda financeira, às posições
sociais ou às condições de vida, também, podem levá-los à condição de doentes. Por
exemplo:
“[. ..] Claro não é apenas a presença de doenças específicas, tanto físicas quanto
mentais, mas como aquele idoso que também é fragilizado no seu aspecto
econômico” (Entrevistado 33, médico, 12 anos de formado e 12 anos de
trabalho na Rede Pública, 44 anos).
“O idoso doente é um problema social muito sério, é um problema social e
financeiro. Também essas são as doenças da velhice” (Entrevistado 6, auxiliar
de enfermagem, 10 anos de formada e 10 anos de trabalho na Rede Pública, 41
anos).
“Doente é aquele que vive com dor, tomando remédios, que tem incapacidades
para trabalhar, viajar. Idoso doente é falta de higiene, e se a pessoa não tiver
estes fatores em bom estado, ele pode ser considerado doente. As vezes a
doença deveria ser vista também, pelas suas condições financeiras, porque se
ele não tem dinheiro; ele não é saudável física, mental e economicamente”
(Entrevistado 24, médico, 23 anos de formado e 20 anos de trabalho na Rede
Pública, 48 anos).
“A doença não é só física, ela pode ser psicológica, funcional e econômica pela
falta de recursos e de condições” (Entrevistado 29, psicóloga, 12 anos de
formada e 12 anos de trabalho na Rede Pública, 34 anos).
Nestas u.c.e apreciam-se que não é unicamente a doença aquela que pode
provocar a condição de doente num idoso. Existem outros fatores que também podem
agir como causas potenciais de enfermidade na velhice. Semelhante ao estudo da
195
uma única repartição do corpus em que foram obtidas duas classes de representação
social (as classes 1 e 2). A seguir, serão discutidas essas classes.
“O idoso doente é aquele que tem doenças, mas fica totalmente incapacitado e
dependente dos outros. A dependência é a pior das doenças na velhice”
(Entrevistado 10, Cuidador revezado, filha do idoso, universitária, 32 anos).
Este campo representacional mostra como os cuidadores compreendem que a
condição de estar doente na velhice não descarta um diagnóstico médico, mas o perpassa.
Eles têm em consideração o significado pessoal e social que tem um idoso doente
dependente. Estar doente na velhice, porém manter-se autônomo, é motivo de bem-estar
para muitos idosos e para os próprios cuidadores que podem continuar seu estilo de vida
tradicional. São bem maiores o esforço e o desgaste do cuidador quando ele tem de
abandonar seus papéis sociais para dedicar-se ao atendimento de um idoso inválido. Em
correspondência a isso, um dado de interesse para essa interpretação é o fato de que as
u.c.e anteriores pertencem a cuidadores de idosos doentes hospitalizados.
Um outro conteúdo desta classe de representação social faz referência uma vez
mais à relação que existe entre os estilos de vida que o idoso desenvolveu ao longo da
vida e a dependência na velhice. Por exemplo:
“Um idoso doente é aquele que nunca quis cuidar de si mesmo e que agora
depende dos outros para poder viver” (Entrevistado 5, único cuidador, filho do
idoso, primeiro grau, 29 anos).
A u.c.e antes relacionada mostra um aspecto da prevenção de problemas de saúde,
que na atualidade está sendo muito pesquisado. Esperemos que, pelo menos, esses
cuidadores de pessoas idosas consigam levar um estilo de vida tal, que lhes permita
retardar ou evitar o desenvolvimento de estados de dependência na velhice.
“É uma pessoa que sofre, que precisa de muita atenção [...], que seja muito
bem cuidado” (Entrevistado 9, cuidador revezado, filha do idoso, primeiro
grau, 50 anos).
Nessa classe de representação social houve alguns conteúdos que exemplificavam
o desgaste físico e psíquico que alguns cuidadores experimentaram pela responsabilidade
do cuidado de um idoso doente.
“É muito chato porque às vezes incomoda e outras vezes a gente sente pena e
deixa a gente muito mal” (Entrevistado 18, cuidador revezado, esposa do idoso,
primeiro grau, 57 anos).
“Eles querem que a gente sempre esteja por perto e ainda reclamam de tudo o
que a gente faz” (Entrevistado 13, cuidador revezado, parente do idoso,
primeiro grau, 65 anos).
Nessa última representação social a ser discutida, as últimas três u.c.e
apresentadas refletem ambivalências: de um lado, os entrevistados argumentam a
necessidade de um cuidado especial; de outro, manifestam um desgaste frente à tarefa do
cuidado. Cabe assinalar aqui, que toda representação social deve ser entendida no cenário
das interrelações sociais. Esse é um dos fatores que determina mudanças nas
representações, que não são estáticas, mas negociáveis e diversificadas.
As u.c.e desta classe de representação social mostram, justamente, essa
diversidade. Ao mesmo tempo que os cuidadores que produziram esses conteúdos,
sentem pena e compreendem que o idoso doente necessita de cuidado e de atenção
especiais, expõem o estresse que está contido no cuidado. Seria interessante explorar qual
desses dois conteúdos nos cuidadores age como um elemento negociável e qual como um
aspecto central, o que infelizmente não foi possível pesquisar através deste estudo.
Após esse capítulo de análise e discussão dos resultados, serão expostas as
considerações finais do trabalho.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desses aspectos funcionais, deduz-se que, para os quatro grupos entrevistados o cuidado
preventivo representa um dos comportamentos necessários para estar saudável na velhice,
tais como cuidar dos hábitos de alimentação e do estilo de vida.
A estabilidade psíquica foi outro dos conteúdos que apareceu fortemente ligado à
história do grupo de idosos saudáveis. Na amostra total, também encontrou-se essa
estabilidade na forma de núcleo central. Já no grupo de trabalhadores, este conteúdo
expressou-se na forma de núcleo periférico distante. Estas diferenças de saliência
mostram como diversos grupos individualizam os mesmos conteúdos das representações
sociais, de acordo com suas experiências e práticas sociais. Conforme as características e
funções dos sistemas centrais e periféricos, deduzimos que, no grupo de idosos saudáveis,
a estabilidade psíquica foi um dos elementos que definiu a homogeneidade da
representação nesse grupo. Dentro dessa representação social de saúde na velhice, a
estabilidade psíquica foi um dos conteúdos que mais contribuiu com a estabilidade e a
coerência da mesma.
Para o grupo de trabalhadores da saúde, diferente do grupo anterior, a estabilidade
psíquica não fez parte dos elementos não negociáveis da representação social da saúde na
velhice, ou seja, não se apresentou como um conteúdo central.
A renda financeira foi um dos conteúdos que, julgamos, agiu como um aspecto
normativo da saúde na velhice. Tanto no grupo de idosos doentes quanto no grupo de
trabalhadores, a renda financeira foi identificada na forma de núcleo periférico próximo.
Esses grupos avaliam que, ao ter uma boa renda financeira (expressada através da palavra
“dinheiro”), o idoso poderá manter melhor sua saúde. Estes dois grupos compartilham
que, dependendo da renda financeira, as ações de saúde de um idoso lhe permitirão ou
não manter o estado de saudável.
Na Teoria do Núcleo Central das Representações Sociais coloca-se que, na
organização interna das representações sociais, as características dos núcleos periféricos
fazem com que os mesmos se integrem melhor às experiências, às histórias dos grupos, e
aos contextos sociais mais imediatos. Daí que suportem melhor as heterogeneidades dos
grupos. Neste estudo, muitos dos núcleos periféricos encontrados (próximos e distantes)
mostraram essas heterogeneidades.
203
países do mundo deviam programar com a participação dos próprios idosos. Por um lado,
a saliência de muitos dos conteúdos encontrados nos grupos de idosos doentes e
saudáveis, reflete o que, dezessete anos antes, essa assembléia estabeleceu. Por outro, a
saliência desses mesmos conteúdos mostra algumas das necessidades de saúde que eles
sentem. A prática de atividades, o cuidado preventivo, uma renda financeira razoável e a
qualidade nos serviços de saúde, entre outras, podem estar expressando necessidades de
saúde que estas pessoas têm.
Esses achados mostram que as representações sociais podem ser indicadores de
necessidades sentidas de saúde, compartilhadas pelos grupos de idosos saudáveis e
doentes, e que as mesmas podem ser socializadas. Considera-se que a expressão de
algumas necessidades sociais, como é o caso das necessidades de saúde, apresentam-se
com muita mais força nos grupos do que num indivíduo isoladamente. Acredita-se que os
programas de saúde ao idoso da Policlínica beneficiariam-se com o conhecimento destas
necessidades de saúde de alguns dos idosos que atende.
Os núcleos das representações sociais que foram encontrados podem agir como
novas categorias no diagnóstico de necessidades e de problemas de saúde dos idosos
entrevistados. Contudo, salientamos que, pelas características do estudo, as considerações
somente podem atingir os programas de saúde da Policlínica envolvida na pesquisa.
Ainda vale a pena ressaltar um dos benefícios do estudo para o trabalho deste
Centro de Saúde. Tendo em conta a saliência dos núcleos das representações sociais
encontradas, pode ser feita uma hierarquia de necessidades de saúde dos idosos
entrevistados. Esse poderia ser um ponto de partida para que aquelas situações
problemáticas tomem-se situações desejadas de saúde e, portanto, para que os idosos
ajam como sujeitos coletivos e construtores de sua prória saúde.
Uma necessidade de saúde pode estar explicada, entre outros fatores, pela
existência de um problema de saúde que está sendo percebido. Nem sempre os grupos
populacionais conseguem expressar seus problemas de saúde e, em conseqüência, suas
necessidades de saúde. Acredita-se que a utilização do conceito de necessidade de saúde
está estreitamente associado ao conceito de representações sociais da doença. Conforme
San Martin & Pastor (1989), essa associação pode mudar segundo a interpretação que
façam os especialistas em saúde. No caso particular deste estudo, obtiveram-se alguns
205
nos conteúdos das representações sociais correspondem-se com muitos dos decretos da
referida Política. O problema está nos serviços de atendimento do Centro de Saúde
pesquisado. Ao que parece, esse centro não consegue implementar todos os programas
necessários para resolver os problemas de saúde da população idosa que atende e
sobretudo dos problemas de saúde daqueles idosos que procuram o atendimento por
sentir-se dontes. Em síntese, as expressões evocadas pelo grupo de idosos doentes
refletem a contradição que existe entre a situação atual dos serviços de saúde da
Policlínica e as necessidades dos idosos que foram entrevistados.
A técnica de entrevista possibilitou obter informações acerca do campo da
representação social dos assuntos “idoso saudável” e “idoso doente”. Mediante o
procesamento dos dados no software Alceste, foram obtidas diferentes classes de
representação social, cuja importância condicionou-se pelo número de unidades de
contexto elementar (u.c.e.) que as compunham. As classes que foram consideradas mais
importantes eram as que apresentaram um número maior de u.c.e. É sobre essas classes
que as considerações finais foram elaboradas.
Nos grupos de idosos saudáveis e doentes, o campo da representação organizou-se
em tomo de duas proposições principais: os fatores psicológicos e a autonomia. Os
fatores psicológicos relacionam-se com a influência que o psiquismo pode exercer na
manutenção do estado de saúde de um idoso. A maior parte das u.c.e. típicas desta classe
fizeram alusão à importância que a estabilidade psíquica tem na vida de uma pessoa
idosa. Chamou a atenção o uso frequente da expressão “cabeça da gente”. Como se o
estar saudável dependesse dos pensamentos de cada um. Parafraseando as u.c.e.
produzidas pelos grupos entrevistados (idosos saudáveis e idosos doentes), uma pessoa
idosa poderá ser classificada de saudável se a mesma manifesta bons pensamentos e
mantém a alegria de viver. Confirma-se como os idosos entrevistados lhe atribuem uma
estreita relação aos fatores físicos e psíquicos na manutenção da saúde.
Já a questão da autonomia diz respeito a explicar a condição de saudável a partir
da independência que as pessoas idosas têm na sua vida diária. Uma vez mais confirmou-
se que, para esses sujeitos, a independência na execução de atividades cotidianas é um
dos indicadores mais importantes de saúde na velhice.
207
as que o ser humano se relaciona. Alguns problemas nessas áreas podem levar aos idosos
à condição de pessoas doentes.
Já a representação social de “idoso doente como uma pessoa incapaz” apresentou
conteúdos que foram semelhantes aos obtidos em alguns núcleos periféricos próximos e
distantes, de idosos doentes e de trabalhadores, respectivamente, na técnica de evocação
livre. Pode comentar-se que, com uma técnica de evocação livre, obtém-se mais
facilmente o universo semântico desejado. Contudo, a técnica de entrevista
complementou alguns dos conteúdos que já tinham sido encontrados mediante a
evocação.
Isto mostra que, para o grupo de trabalhadores, um estado de doença na velhice
não deve mensurar-se unicamente pelo número de atos médicos ou pelos índices de
morbidade, mas também pelo número de dias que um idoso passa sem incapacidades.
No grupo de cuidadores de pessoas idosas, o campo de representação social mais
importante associou-se com a noção de “idoso doente como uma pessoa dependente”.
Como explicou-se no capítulo de discussão, acreditamos que tenha sido a prática social
deste grupo a que determinou a produção dessa classe. Uma pessoa toma-se cuidador de
um idoso quando este último precisa do cuidado dos outros. Chegado a este ponto, infere-
se que o idoso, além de estar doente, é dependente de outra pessoa. O papel que os
cuidadores desempenhavam no momento da coleta de dados era, justamente, o de cuidar
de idosos doentes com diferentes graus de incapacidade.
A síntese de resultados que foi apresentada mostra que as representações sociais
podem ser uma ferramenta muito importante para a exploração de necessidades sentidas
de saúde dos idosos participantes. O diagnóstico psicossocial de representações sociais da
saúde-doença na velhice que foi obtido, refletiu como o indivíduo leigo (neste caso os
grupos de idosos e de cuidadores de pessoas idosas), representa o que são a saúde e a
doença de um idoso.
Acredita-se que o trabalho mostra que as necessidades de saúde de um idoso não
devem ser deduzidas somente de pessoas doentes. Encontraram-se vários conteúdos de
representações da saúde-doença que foram compartilhados entre os diferentes grupos de
pesquisa. Isso mostra que os achados deste trabalho podem contribuir com a eficácia
daquelas ações de saúde, direcionadas ao idoso, que a Policlínica pretenda desenvolver.
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C O M IT Ê D E É T IC A EM P E S Q U IS A C O M SE R E S H U M A N O S
P a re c e r
Instituição: UFSC
Inform am os que o parecer dos relatores foi aprovado, por unanim idade, em
reunião deste Com itê na data de 05/04/99.
Florianópolis, 07/04/99.
C oordenadora
U F S C — M o d . 1007 lm p r« n » a U n i v f n l ú r i *
ANEXO 2: EXEMPLO DE PLANILHA DE CÁLCULOS
TÉCNICA DE EVOCAÇÃO LIVRE
palavras frequência ordem média
alegria/fel icidade 12 1.6
caminhar/andar 8 2
disposição 6 2.1
dinheiro 6 2.6
paz 5 1.6
coisa boa 4 1
trabalhar 4 2.5
alimentação 3 1.6
tratamento 2 1.5
impossível 2 1.5
difícil 2 1.5
vida 2 2
independência 2 2.5
cuidado 2 2.5
atenção 2 3
viajar 2 3
problema 2 3
modo de vida 1 1
forças 1 1
exercícios 1 1
não ficar parado 1 1
prioridade 1 1
espetacular 1 1
atendimento 1 1
acolhimento 1 1
preparação 1 1
útil 1 1
afazeres 1 1
saúde 1 1
vitalidade 1 1
deus 1 1
sorte 1 1
missão concluída 1 1
doença 1 1
desejada 1 1
aceitar 1 1
viver bem 1 2
fazer movimentos 1 2
discriminação 1 2
apoio 1 2
consolo 1 2
normal 1 2
227
dormir bem 2
boa cama 2
alto astral 2
passear 2
sair 2
\esperança 2
¡estrutura familiar 2
final da vida 2
compartilhar 2
amor 2
lutar 2
qualidade de vida 3
bem-estar 3
ânimo 3
mente boa 3
bons pensamentos 3
descaso 3
carência 3
orientação 3
biológico 3
genética 3
conversar 3
dançar 3
vida abalada 3
procurar o próximo 3
ter meus remédios 3
não sofrer 3
sensibilidade 3
não se entregar 3
Total de palavras = 71
Total de evocaçôes=120
as palavras de frequência igual ou superior a 1.6 farão parte da tabela
Média da freqüência média = 3
Média da ordem média = 2.0
228
C:\Arquivos de Programas\ALCESTE4\Cris\Alidsaud.doc\&&_0\
Alidsaud.txt
ET 1 1 1 1
A 1 1 1
B 1 1 1
C 1 1 1
D 1 1 1 0 0
Al 1 0 0
A2 3 0
A3 1 1 0
B1 0 4 0 1 1 0 1 1 0
B2 2 2 0 0 0 0 0 0
B3 10 4 1 1 0 0 0 0 0 0
Cl 0 121
C2 0 2
C3 0 0 1 1 1 2
D1 0 2 2
D2 0
D3 5 a 2
D4 1 -2 1
D5 0 0
A1 : Lecture du corpus
A 2 : Calcul du dictionnaire
K O Nombres en chiffre
M 2 Mots en majuscules
U 0 Mots non trouvés dans DICIN (si existe)
X 1 formes non reconnues et fréquentes
0 2 Auxiliaire ESTAR
1 2 Auxiliaire TER
2 2 Auxiliaire HAVER
3 2 Auxiliaire SER
4 2 Prépositions simples et locutions prépositives
5 2 Conjonctions et locutions conjonctives
6 2 Interjections
7 2 Pronoms
8 2 Numéraux
9 2 Adverbes
1 Formes non reconnues
Nombre d'u.c.i. : 80
Nombre moyen de "mots” analysés /u.c.e. : 10.593580
Nombre d'u.c.e. : 187
Nombre d'u.c.e. sélectionnées : 187
100.00% des u.c.e. sont sélectionnées
Nombre de couples : 4335
B 2 : Calcul de DONN.l
B 2 : Calcul de DONN.2
230
RCDH1 * RCDH2
classe * 1 2 3
poids •k 76 18 18
1 79 ★ 75 0 4
2 21 * 1 18 2
3 12 ★ 0 0 12
RCDH1 * RCDH2
classe ★ 1 2 3
poids * 76 18 18
1 79 90 ■-51 -24
231
21 * -47 92 O
12 * -28 -2 70
------- I ---------i ---------i ---------i ---------i ---------i ---------i ---------i -------- i ---------I
Cl. 1 ( 7 5uce) I
18
Cl. 3 ( 12uce) I ------------------------------- + i
19---------------------------------------------------------- +
Cl. 2 ( 18uce) I--------------------------------------------------- +
5 8. 8. 100. 00 3 46 alimenta+
13 13 . 13. 100 .00 5 93 cabeca
19 25. 29. 86. 21 4 29 coisa+
28 10 . 10. 100. 00 4 42 das
34 7. 7. 100. 00 3 00 dinheiro
38 13. 13. 100. 00 5 93 doenca+
39 10. 10. 100. 00 4 42 doente+
57 16. 16. 100. 00 7 55 idade
59 13 . 14 . 92 .86 3 63 import+
90 11. 12. 91. 67 2 72 problema+
113 12. 13. 92 .31 3 17 velhice
232
14 4. 4. 100.00 20 10 caminh+
15 3. 5. 60.00 6 79 cas +
31 3. 8. 37.50 2 53 deu+
36 5. 5. 100.00 25 38 divert+
37 4. 6. 66. 67 10 99 do
41 2. 3. 66. 67 5 33 dos
47 8 . 24 . 33. 33 5 74 faz +
49 5. 9. 55 .56 10 23 feliz+
50 8 . 15. 53 .33 16 14 fic+
54 7. 9. 77.78 25 48 gost+
62 5. 5. 100.00 25 38 ir
74 5. 5. 100.00 25 38 mundo
84 9. 32 . 28.13 3 91 pod+
85 4. 8. 50.00 6 58 poss +
86 3. 7. 42 .86 3 49 precis+
92 6. 8. 75.00 20 41 quer+
96 3. 3. 100.00 14 93 sair+
101 3. 3. 100.00 14 93 sint+
105 4. 12 . 33.33 2 50 tenh+
131 -k 2. 3. 66.67 5 33 •k 2 ha
138 ■k 13. 60. 2 1 .67 2 02 * 4 de
152 ■* 16. 76. 21.05 2 96 :k 5 que
153 ■k 7 . 24 . 29.17 3 17 ★ 5 se
158 -k 2. 3. 66. 67 5 33 ★ 7 alguem
162 ★ 4 . 12 . 33. 33 2 50 ★ 7 ele
165 ★ 2. 3. 66. 67 5 33 ★ 7 esse
168 * 6. 16. 37.50 5 51 •k 7 isso
169 * 3. 7. 42 .86 3 49 * 7 me
184 ★ 3. 8. 37.50 2 53 7 outros
185 ★ 5. 16. 31.25 2 64 ★ 7 o-que
187 * 2. 4. 50.00 3 16 * 7 qualquer
201 ★ 4 . 10 . 40.00 4 07 ★ 9 ainda
203 * 7 . 17 . 41.18 8 25 ★ 9 bem
206 •k 2. 3. 66. 67 5 33 * 9 hoje
212 ■
k 2. 4. 50.00 3 16 •k 9 nunca
219 •k 9 . 29. 31.03 5 44 * M E
231 * 2. 3. 66. 67 5 33 •k *id_66
241 * 18 . 83 . 21.69 5 76 ■
k *sx f
243 •k 6. 18 . 33.33 4 01 ■k *Conv 1
249 •k 5 . 10. 50.00 8 40 ■k *Filh 0
258 ■k 2. . 4. 50.00 3 16 •k *Filh 7
340 •k 2. 3. 66. 67 5 33 ■k *S 75
★ Classes * 1 2 3
M * 55 * 35 12 8
0 20 ★ 16 3 1
1 ★ 68 ★ 50 8 10
2 ★ 3 * 1 2 0
3 * 30 k 18 7 5
4 * 173 * 122 30 21
5 ★ 175 •k 122 34 19
6 ★ 18 k 14 3 1
7 * 366 k 260 64 42
8 * 26 * 19 5 2
9 * 179 ★ 123 39 17
★ Classes * 1 2 3
M ★ 55 * -1 0 0
234
0 * 20 * 0 0 0
1 * 68 * 0 -2 0
2 * 3 * -1 4 0
3 * 30 * -1 0 0
4 * 173 * 0 0 0
5 * 175 * 0 0 0
6 * 18 * 0 0 0
7 * 366 * 0 0 0
8 * 26 * 0 0 0
9 * 179 * 0 1 0
19 *Ren 3
18 *Eciv 1
17
16 *id 3
15
14
13 *Filh_2 I
12 I
11 I
10 *Conv l*Filh 0 *sx_m I
9 #01*Filh_8 *id_4
8 *id 651
7
6 !
5 #0 2 I
4 *Conv 2
3
2
1 *Ren 1 +id_2
0 --*Filh 3
1
2
3 *Eciv 2
4
5
6
7
8
9 *sx f
10
11
12
13
14
15
16
17 *Filh 4
18
19 *Ren_4
20 *Eciv_3 #03 *Conv 3*Ren 2
21 *Gru 2
■I - -I-
X y nom
2 gost+ probleraa+
1 quer + I
0 i~faz+-- ---+
1
2 cast depend+
3 feliz+ I
4 boa+
5 idos + vez +
6
7
8 da I
9
10
11 saud+ I
12 I
13
14
15 lev+pessoa+
16 lind+cu±d+
17 frente
18 urna
19 osajud+
20 famili+vaifilhos
21 incomod+pela+
X y nom
30 9 fal+
30 9 sent+
30 9 vontade
31 8 dinheiro
10 1 outros 1 naopara |
11 1 E 1 mas I
12 1 1 mimque-se |
13 1 ser 1
14 1 1 a 1
15 1 essa 1 tendo 1
16 1 pouco 1 cómela |
17 1 1 nem |
18 1 1 ninguem I
19 1 quem 1 ter aquelaminha I
20 1 embora sou
+ --- -- 1--------- 1----------1- ------ +-- ----- 1--- ----- 1--------- ¡----- +
X y nom
A4 idade : idade(16);
A3 cabeca : cabeca(19);
A3 doenca+ : doenca(13), doencas(3);
A2 coisa+ : coisa(18), coisas(13);
A2 das : das (10);
A2 doente+ : doente(6), doentes(6);
A2 viv+ : vive(l), viver(9), viveu(l);
Clé sélectionnée : A
36 17 eu me divirto sempre, vamos a festas. A #doenca nao esta nas #pernas, esta
na #cabeca, no coracao. nao #importa ter uma pequena #coisa, o bom e ter alegria de
#viver.
12 14 essa e uma #das #coisas que mais peco a deus, porque nao adianta tu ter
#dinheiro e nao ter a saude. nao adianta nada, eu #acho que o #dinheiro e
#importante, mas ele nao resolve nada quando estamos #doentes.
52 5 0 idoso saudavel, para mim, e aquele-que sempre esta contente, sem
#importar nem a propria #doenca. E a alegria de #viver.
60 5 E aquela pessoa que e alegre, que nao e preguiçoso, que esta sempre firme,
para mim o-mais #importante e a #cabeca #das pessoas, eu, por exemplo, #falo uma
#coisa e tas #vezes perco o assunto, porque a #idade faz com-que isso ocorra, mas eu
#faco outras #coisas para nao dar tanta importancia a isso.
96 5 para mim, o-que mais #fala de saude na #velhice e a #alimentacao.
142 5 A #gente #vive toda uma #vida abusando de tudo, sobretudo #da #alimentacao
e quando a Sgente chega a uma certa #idade, ai e quando e. A #gente esta #cheia de
Idoencas e de saude nada. A saude e urna reliquia que-se a #gente a tem, tem que
cuidar muito bem dela.
145 5 saude na (fvelhice, sem #dinheiro nao existe.
51 4 quando ele tem contentamento e quando tem alegria de #viver, quando ele
sabe controlar nao ter #dores, nao ter #doencas e ter uma #boa #cabeca para estar
sempre alegre.
134 4 estar saudavel na #velhice e estar com um bom astral, lutar por tudo na
#vida. quando eu vejo alguem #doente eu fico longe, porque saude se contamina, mas
#doenca tambem.
163 4 A saude e tudo na #vida e na #velhice e melhor ainda, ser idoso e ainda
poder curtir a #vida e muita #coisa linda viu. saude e #vida, nao #importa a #idade
que a #gente tenha.
7 3 em qualquer #idade a saude e prioridade, a saude e todo na #vida. A #vida
e a saude, a vitalidade, assim tem_se a #disposicao para a #vida e para #viver.
88 3 0 idoso saudavel, para mim, olha eu #acho que tudo esta na #cabeca #da
#gente. ha idosos que nao tem nada e estao #doentes, porque eu #acho que e um
#problema #da #cabeca #das pessoas, e um #problema psicologico e muitas fvezes eles
ficam #doentes para Ichamar a atencao porque estao com falta de carinho.
135 3 saude e nao ter nada de #doenca. quando a #gente tem um pequeno fproblema,
ja nao e mais saudavel.
14 2 E a saude. um idoso com saude e poder ter tudo, porque na saude vai tudo
o-que voce possa imaginar, desde #alimentacao ate #dinheiro. saude para mim, e poder
fazer minhas #coisas sem ajuda de ninguém, agora mesmo eu nao tenho saude porque
#dependo de outros pelo #problema #da #perna que esta me estourando, me atrapalha
tudo.
22 2 Jacho que a #grande felicidade #da #vida e poder #viver com saude,
resolver os #problemas, porque a #doenca e o-pior que existe, principalmente no
idoso, porque ja ele tem uma #idade e se a #doenca #vir junta e bem pior, e o fim
#da #vida.
74 2 saude e nao pensar em besteiras e em #problemas, porque a #gente ve que os
salarios sao horriveis, e ainda nao ser saudaveis e demais para minha #cabeca.
75 2 E uma #coisa maravilhosa porque se tu tens a saude tu tens tudo na #vida.
E aquela pessoa que faz tudo #sozinha, nao #importa a #idade, o-que #importa e a
saude.
87 2 E aquele-que faz tudo, que e alegre, que tem #vontade de fviver, que tem
sua #cabeca #boa, que pode trabalhar que e o-mais #importante na #vida.
101 2 eu #conheco pessoas que so #falam de mal, de #doenca, conversa que nao
leva a crescer, que so te puxa para baixo, em qualquer #idade a sabedoria esta em
poder administrar a #cabeca de cada quem, tenho certeza absoluta disso.
Clé sélectionnée : B
44 18 E a coisa mais #maravilhosa #do #mundo, e uma pessoa que tem #muita saude,
que #pode viajar bastante, que #faz tudo o-que ele #quer. um #idoso saudavel #gosta
de se arrumar, de #ir para tudo o-que-e canto e se #divertir, que nao #fica dentro-
de icasa, porque nao tem nada pior que #ficar dentro-de #casa e se a gente se
arrumar e #sair, isso e saude.
77 17 eu #gosto de ser trabalhadora e isso e #poder ter a saude que eu #quero.
nao #quero nunca #ficar dependendo #dos outros.
186 15 E uma pessoa que #pode passear, que #pode #ir a excursões, #caminhar,
#sair, se #divertir e #fazer tudo o-que #deus manda, sao pessoas que ate #podem ser
240
mais #felizes que qualquer moco, porque o #idoso aproveitando #pode ser muito mais
#feliz que as pessoas #jovens, mas para isso #precisa de saude.
173 13 ha cinco Sanos atras eu ainda trabalhava como domestica, hoje, nao #posso
mais, porque tem dias que nao me #sinto bem e eu nao #gosto de faltar ñas tcasas de
minhas patronas.
43 11 E aquele-que nao se considera morto de espirito, que esta bem, que
acompanha o #mundo bem. participar de tgrupos e muito-bom e e saude. E bom nao
#ficar isolado, amar, se #divertir, #fazer tudo o-que ele #quer e #principalmente
cuidar da sua saude.
184 9 eu #fico #feliz e #fico idesejando que essas pessoa #possa continuar assim
por muito #tempo ainda. para mim, e uma #alegria e uma #felicidade porque a pessoa
#pode #ir a todo quanto e #lugar sem #precisar de ajuda de ninguem.
16 8 E jfcaminhar, e #poder #fazer aquilo que a gente #gosta, e #poder ter
alguem junto com essa pessoa, e #poder ter apoio na vida, ter #atencao, que esse
#idoso nao #precise jffazer tudo o-que ele #quer, por exemplo,
48 8 E tudo na vida, seria o-melhor #do #mundo, mas quase nunca a gente #pode
ter a saude total. E o #idoso que (tcaminha, que #faz tudo, que #possa levar a vida
para a frente.
164 8 um #idoso saudavel e a coisa melhor #do #mundo. ha dois coisas que me
deixam #felizes, um #idoso bem cuidado e uma crianca. O #idoso saudavel e aquele-que
acorda de-manha, que nao tem preguica de nenhum tipo, que #faz tudo #sozinho em
qualquer momento, que #gosta de #fazer tudo com-amor e sacrificio sem pedir nada em
troca.
25 7 eu #gosto de desenho animado, de #alegria e isso e saude, nao #ficar
dentro-de #casa. eu me #sinto bem. E a #mente quem coordena todos nossos passos.
17 5 que-se ele #quer #fazer algo tdificil que Stenha ajuda de outros, devem
existir pessoas que #possam ajudar para-que esse #idoso se #sinta #feliz, amado e
querido.
33 3 E loma pessoa que nao #fica sempre cobrando #dos outros, dizendo que o
antigo era bem-melhor que agora, eu acho assim, eu #tenho varios netos que sao
criados #do jeito de hoje e meu marido #fica cobrando deles direto.
34 3 isso nao e bom, isso nao e saudavel. O #mundo muda e e dinámico, entao tu
ïiao apodes cobrar, isso nao e saudavel. acho que uma pessoa que aceita mudancas e
üconseque conviver com isso, e uma pessoa saudavel.
133 3 estar saudavel e #poder #fazer o-que a gente #quer, ser #alegre, ser
#feiiz, #ver a vida bem, lutar pelo que a gente #quer.
165 3 saude e tudo na vida de um Sidoso. E aquele-que #gosta de se Sdivertir e
que nao #fica reclamando de tudo.
71 2 E aquela pessoa que tem um bem de #deus, porque e uma #alegria, ja-que
ççtar velho e ainda ter a saude, e muito lindo, #sabe. E um bem de #deus. ser
e- fpctfier #casd.nhar, andar, #sair, se #divertir, #ir a uma igreja, rezar,
isso so #pode ser feito por alguem que #tenha saude.
Clé sélectionnée : C
104 75 E a #pessoa alegre que #vai para #frente, que nao #incomoda #os outros,
que convive com tos Sfilhos e que nao e #uma carga para a #familia.
137 27 E #pessoa animada, que nao Sincomoda, que #vai para a tírente, que
sempre esta feliz e conforme com vida. eu acho que #saude e nao ter que #reclamar de
nada.
149 27 ÿsaude e Ler um bom ambiente #familiar, ter boas amizades e #levar tudo
parc, a ¡¡frente sem problemas. E ter ffotimismo para enfrentar #os problemas da vida.
92 21 para mim, e ter #saude, ser feliz, porque quem-e feliz e porque tem
#saude. #uma fpessoa idosa saudavel e quem faz tudo sem a #ajuda de ninguem, sem ter
que #incomodar a #familia, #aos #filhos.
132 14 E aquela #pessoa que para mim, eu sempre diqo que eu quero ser fuma
#pessoa idosa saudavel, porque para mim, #saude e nao #incomodar #os meus #filnos
i i Ler que depender de outras ¡¡pessoas.
158 1? 0 idoso saudavel eu acho #otimc, porque da para fazer muitas coisas, por
exemplo, #cuidar de #criancas, #ajudar #os #filhos e nao #incomodar ninguem. para
rsim, e #ctiir;o ter essa #saude, embora ter que fazer tudo devagarinho, o importante e
poder fazer tudo com calma, devaqar, mas indo pouco a pouco,
i li 12 E tluma coisa muito boa, eu assim, que a #pessoa ja e idosa, e as vezes ela
j "incomoda #os outros e tendo #saude ela ja nao #vai #incomodar mais #os outros.
; 12? 11 “ -r.-. ~i~., : :~'_jla Spcssoa que esta de bem com a #familia toda, que tem
! síTvukíI í u , -que iluta aiüda ¡¡pela vida, que qosta de se reunir com a
I ïïfaiU-Li-icl . \
! 121 :- S wsaudè e estar bem com tua #familia, curti r a #faTni1ia. eu sou saudavcJ.
I porque tenho #ur.a #fa«ilia c nao #incomodo minha #familia. eu sou velha, mas eles
I nao tem que-se preocupar comigo, porque eu sou saudavel.
I 157 7 em casa quem #ajuda sou eu e quem faz tudo sou eu. isso e a #saude na
I v'elhice. E nao ^incomodar ninguem nunca, nem a propria #f a m i l i a . _____
241
179 2 #saude e um #presente precioso que esta na gente e tem que ser #cuidado
com- amor e carinho, pena que a #familia da gente nao aprecia isso.
2 30 para mim
2 25 por exemplo
2 L4 na vida
2 12 gost+ de
2 10 eu nao
2 9 faz+ tudo
2 9 da gente
2 8 um idos+
2 8 que nao
5 8 sem a ajud+ de ninguem
2 8 a gente
2 8 pessoa+ que
2 8 da vida
2 7 nao e
3 7 tudo na vida
2 7 eu sou
3 7 que nao tem
2 7 que esta
2 7 que tem
3 7 que a gente
2 1 14 para mim
2 1 9 na vida
2 1 6 que nao
2 1 6 da gente
2 1 5 nao e
2 1 5 um idos+
2 1 5 por exemplo
2 1 4 A gente
2 1 4 minhas coisa+
2 1 4 eu nao
3 1 4 eu ach+ que
2 1 4 eu ach+
3 1 4 que a gente
2 1 4 tendo saud+
2 1 4 pessoat que
2 1 3 nao import+
2 1 3 isso e
2 1 3 que esta
2 1 3 que tem
5 1 3 sem a ajud+ de ninguem
2 2 6 gost+ de
2 2 4 ele quer+
2 2 4 se divert+
2 2 3 do mundo
3 2 2 nao e saudavel
2 2 2 nao fic+
2 2 2 um idos+
2 2 2 eu tenh+
2 2 2 que o
3 2 2 que a gente
242
2 2 2 que pod+
2 2 2 de saud+
2 2 2 e uma
3 2 2 e pod+ ter
2 2 2 a vida
2 2 2 pessoa+ que
3 2 2 faz+ tudo o-que
5 2 1 0 idos+ saudavel e aquele-
4 2 1 E aquele-que nao se
2 2 1 E aquele-que
2 3 5 para mim
2 3 3 os outros
3 3 2 que nao incomod+
2 3 2 ter que
3 3 2 e nao incomod+
2 3 2 a famili+
2 3 2 feliz+ e
2 3 2 faz+ tudo
3 3 1 0 idos+ saudavel
4 3 1 E aquela pessoa+ que
3 3 1 E a pessoat
3 3 1 E uma pessoa+
5 3 1 E uma coisa+ muito boa+
3 3 1 A saud+ e
2 3 1 nao tem
2 3 1 nao incomod+
2 3 1 bem com
6 3 1 isso e a saud+ na velhice
3 3 1 eu sou saudavel
2 3 1 eu sou
I- -I- -I-
A4 idade
A3 cabeca
A3 doenca+
A2 viv+ ------- +
A2 coisa+
A2 das
A2 doente+
I ----------I -
B6 divert+
B6 ir
B6 quer+
B6 gost+
B5 fic+
B6 mundo
B3 faz + •
B4 feliz+ - + -------------------+
B2 pod+
* Fin de l'analyse *
Temps d'execution : Oh 3 mn 35 s