2015_Roberto Nascimento de Albuquerque
2015_Roberto Nascimento de Albuquerque
2015_Roberto Nascimento de Albuquerque
BRASÍLIA – DF
2015
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BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________________
Professora Doutora Moema da Silva Borges – Presidente da Banca
Universidade de Brasília – Campus Darcy Ribeiro
_______________________________________________________________
Professora Doutora Ivone Kamada – Membro Efetivo
Universidade de Brasília – Campus Darcy Ribeiro
_________________________________________________________________
Professora Doutora Janaína Meirelles Sousa – Membro Efetivo
Universidade de Brasília – Campus Ceilândia
___________________________________________________________________
Professora Doutora Diana Lúcia Moura Pinho – Membro Suplente
Universidade de Brasília – Campus Darcy Ribeiro
3
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, por sua capacidade de acreditar e investir em mim. Mãe, seu cuidado e sua
dedicação foram a esperança e o incentivo para seguir. Pai, sua presença significou a
segurança e a certeza de que não estou sozinho nesta caminhada. Minhas saudades eternas e o
meu amor mais profundo.
Aos meus irmãos, José Herculano, Denise e Daisy, que nunca deixaram de acreditar em mim
e no meu potencial. Obrigado pela paciência, pelo incentivo, pela força e, principalmente, por
todo o carinho. Esta vitória também é de vocês!
Aos meus sobrinhos, Ana Carolina, Brunno, Carla Desirée, Maria Clara, Mariana, Rodrigo,
Marina, Alexia, Ana Gabriela, que estiveram próximos a mim, fisicamente e/ou
emocionalmente, fazendo esta vida valer cada vez mais a pena. Amo todos vocês!
Ao Danilo, que de forma especial e atenciosa me deu força e coragem desde o início desta
caminhada. Ao Stone, que me incentivou e cuidou dos meus passos nas últimas semanas desta
jornada. Meu muito obrigado!
Aos meus amigos, pelas alegrias, tristezas e angústias compartilhadas. Com vocês, as pausas
entre um parágrafo e outro de produção me trouxeram muita paz e alegria.
Aos meus alunos, pessoas com quem amo partilhar a vida. Com vocês me sinto vivo de
verdade. Obrigado por cada olhar, cada sorriso, cada abraço que recebo todos os dias. Tudo
isso me traz paz na correria de cada semestre e a certeza de que estou no caminho certo.
5
Ao curso de Enfermagem, que me ensinou a ver o ser humano de uma maneira holística, de
verdade. Ensinou-me a perceber que exerço uma das mais belas profissões; que cuidar de
alguém vai além de uma profissão, é um estilo de vida.
Às professoras Dra. Ivone Kamada, Dra. Janaína Meirelles Sousa e Dra. Diana Lúcia Moura
Pinho que puderam fazer parte deste momento tão importante da minha vida e que
compartilharam suas experiências e vivências neste campo tão importante que é a
espiritualidade na saúde.
Aos meus professores e colegas do mestrado, pessoas com quem convivi nesses dois últimos
anos. Obrigado pelas risadas, companheirismo e troca de conhecimentos.
E, por fim, a minha orientadora e companheira de sonho, professora Dra. Moema da Silva
Borges. Agradeço, do fundo do meu coração, por mais de quinze anos de amizade e
companheirismo. Obrigado pela persistência, pela dedicação, pelo desempenho, pelo
profissionalismo, pelos puxões de orelha, pelo respeito e pela competência durante essa longa
jornada. Muito do que sou como pessoa e profissional devo a você!
6
Marie-Françoise Collière
7
Resumo
Nos últimos anos, pesquisas no âmbito da saúde têm apontado que a fé e a esperança
representam aspectos imprescindíveis para a apreensão do processo de recuperação da saúde e
o enfrentamento das doenças. Dessa forma, a espiritualidade tem se configurado como uma
variável relevante na composição do indicador de saúde na busca da promoção de um cuidado
integral. Objetiva-se, nesta pesquisa, analisar as vivências de enfermeiros e pacientes acerca
da abordagem da dimensão religiosa/espiritual nos cuidados de enfermagem com vistas a sua
integralidade, à luz da Teoria Transpessoal do Cuidado de Jean Watson. Trata-se de uma
pesquisa exploratória, descritiva, de abordagem qualitativa, realizada com enfermeiros e
pacientes de um hospital universitário do Distrito Federal. Foram realizadas entrevistas a
partir de um roteiro semiestruturado no período de agosto e setembro de 2014. A análise do
conteúdo do corpus gerado foi realizada com auxílio do software Alceste. Da análise dos
resultados das entrevistas dos enfermeiros, emergiram dois eixos. O primeiro eixo, Formação
Profissional, apontou uma lacuna na formação do profissional enfermeiro em relação aos
cuidados frente à dimensão espiritual. No segundo eixo, Desafios e Possibilidades para o
Cuidado Integral, emergiram duas categorias que assinalam os fatores que impedem a prática
do cuidado espiritual e as possibilidades para a prática dos mesmos. Em relação à análise de
conteúdo das entrevistas com os pacientes, emergiram também dois eixos. O primeiro,
denominado Suporte Terreno, foi composto pelas categorias: a travessia pessoal, a travessia
com a família e os outros ajudantes na travessia e fazem referência ao caminho trilhado pelos
pacientes ao longo do diagnóstico da doença-internação-tratamento-cura. O segundo eixo,
denominado Suporte Divino, relata o papel do sagrado na busca do enfrentamento da doença.
Esse eixo foi composto pelas categorias: as fontes do Sagrado, os enviados do Sagrado e Deus
– a fonte da fé. Os resultados apontam que é importante que as instituições formadoras e
promotoras do cuidado de enfermagem rompam com a lógica capitalista de organização de
serviços e formação profissional. Além disso, os enfermeiros devem estar atentos para a
dimensão espiritual de seus pacientes. Os cuidados de enfermagem para essa dimensão devem
contemplar ações voltadas para a integralidade do ser humano, priorizando tanto o Suporte
Terreno quanto o Suporte Divino. Assim, torna-se necessário considerar a complexidade da
natureza humana, incluir as discussões filosófico-espirituais no plano de cuidado de
enfermagem e resgatar a essência do cuidado de enfermagem. A enfermagem precisa se
mover para além do objetivável, do cientificismo, da preocupação extenuante com a técnica.
É o momento do enfermeiro se dedicar às verdades ocultas, desenvolver novos conhecimentos
que fomentem a discussão da dimensão espiritual e sua importância no âmbito do cuidado
integral de enfermagem; significa buscar uma nova maneira de cuidar do outro numa
sociedade que se recusa a valorizar esse cuidar.
Abstract
In recent years, health surveys have pointed out that faith and hope represent essential aspects
for the apprehension of the health recovery process and confront the disease. Thus, spirituality
has been configured as a relevant variable in the composition of the health indicator in the
pursuit of promoting a comprehensive care. The objective this research is analyze experiences
of nurses and patients about the religious/spiritual dimension approach in nursing care with a
view of Transpersonal Care Theory of Jean Watson. It is an exploratory, descriptive,
qualitative approach, performed with nurses and patients of a university hospital in the
Federal District, Brazil. The interviews were conducted from a semi-structured between
August and September 2014. The analysis of the corpus generated content was performed
using the software Alceste. Analyzing the results of interviews with nurses, two axes
emerged. The first axis, Vocational Training, pointed out a gap in nursing professional
education in relation to the spiritual dimension. In the second axis, Challenges and
Possibilities for Integral Care, two categories emerged that indicate the factors that impede the
practice of spiritual care and the opportunities to practice them. Regarding the content
analysis of interviews with patients also emerged two axes. The first, called Ground Support
was composed by categories: a personal journey, the journey with the family and other
helpers in the journey and reference the path taken by patients during the diagnosis of the
disease-hospitalization-treatment-cure. The second axis, called Divine Support, reports the
role of the Sacred in the pursuit in fighting the disease. This axis is composed of the
categories: the Sacred supplies, the envoys of the Sacred and God - the source of faith. The
results show that it is important that educational institutions and promoters of nursing care
break with the capitalist logic of organizing services and vocational training. In addition,
nurses should be aware of the spiritual dimension of their patients. Nursing care for should
include actions for the completeness of the human being, emphasizing both the Ground
Support as the Divine Support. Therefore, it is necessary to consider the complexity of human
nature, include the philosophical and spiritual discussions in nursing care plan and rescue the
essence of nursing care. Nursing needs to move beyond the objectifiable, of scientism, of
strenuous concern with the technique. It is time nurses devote to hidden truths, develop new
skills that foster discussion of the spiritual dimension and its importance within the whole
nursing care; It means seeking a new way of caring for others in a society that refuses to value
this care.
Resumen
En los últimos años, las investigaciones en salud han señalado que la fe y la esperanza
representan aspectos esenciales para la aprehensión del proceso de recuperación de la salud y
enfrentar la enfermedad. Por lo tanto, la espiritualidad se ha configurado como una variable
relevante en la composición del indicador de salud en la búsqueda de la promoción de una
atención integral. El objetivo de esta investigación es analizar las experiencias de los
enfermeros y los pacientes sobre el enfoque de la dimensión religiosa/espiritual en la atención
de enfermería, con miras a su totalidad a la luz de la Teoría Transpersonal de la Atención de
Jean Watson. Es un estudio exploratorio, com enfoque descriptivo, cualitativo, realizado con
los enfermeros y los pacientes de un hospital universitario en el Distrito Federal, Brasil. Se
realizaron entrevistas a partir de um guión semiestructurado entre agosto y septiembre de
2014. El análisis de los contenidos generados fue realizado a partir del software Alceste.
Analizando los resultados de las entrevistas con los enfermeros, surgió dos ejes. El primer eje,
Formación Profesional, señaló uma brecha en la educación professional en enfermería en
relación con el cuidado con la dimensión espiritual. En el segundo eje, Desafíos y
Posibilidades de Atención Integral, emergieron dos categorías que indican los factores que
impiden la práctica del cuidado espiritual y las oportunidades para practicar ellos. En cuanto
al análisis de contenido de las entrevistas con los pacientes también surgió dos ejes. El
primero, llamado de Apoyo en Tierra, fue compuesta por tres categorías: un viaje personal, el
cruce con la familia y otros ayudantes en el cruce que hacen referencia a la ruta tomada por
los pacientes durante el diagnóstico de la enfermedad, la hospitalización, el tratamiento y la
cura. El segundo eje, llamado Apoyo Divino, informa el papel del Sagrado en la lucha contra
la enfermedad. Este eje se compone de las categorías: las fuentes del Sagrado, los enviados
del Sagrado y Dios - la fuente de la fe. Los resultados muestran que es importante que las
instituiciones educativas y promotoras de la atención de enfermería puedan romper con la
lógica capitalista de la organización de los servicios y de la formación profesional. Además,
los enfermeros deben estar conscientes de la dimensión espiritual de sus pacientes. La
atención de enfermería debe incluir acciones para la integridad del ser humano, priorizando
tanto el apoyo en la tierra como el apoyo. Es necesario tener en cuenta la complejidad de la
naturaleza humana, incluir las discusiones filosóficas y espirituales en el plan de cuidados de
enfermería y rescatar la esencia de los cuidados de enfermería. Enfermería tiene que ir más
allá del objetivable, del cientificismo, de la preocupación extenuante con la técnica. Es tempo
de los enfermeiros dedicarsen a las verdades ocultas, desarrollar nuevas habilidades que
fomentan la discusión de la dimensión espiritual y su importancia dentro de toda la atención
de enfermería; Esto significa la búsqueda de una nueva forma de cuidar a los demás en una
sociedad que se niega a valorar esta atención.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Dendograma com os eixos e categorias que emergiram da análise das entrevistas dos
enfermeiros. Brasília, 2014.......................................................................................................54
Figura 2. Dendograma com os eixos e categorias que emergiram da análise das entrevistas dos
pacientes. Brasília, 2014...........................................................................................................77
11
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Perfil dos enfermeiros que atuam no cenário da pesquisa. Brasília, 2014...............52
Tabela 2. Perfil dos pacientes que participaram da pesquisa. Brasília, 2014...........................75
12
LISTA DE QUADROS
LISTA DE SIGLAS
AC – Análise de Correspondência
BMMRS-p – Brief Multidimensional Measure of Religiousness and Spirituality
CHD – Classificação Hierárquica Descendente
COFEN – Conselho Federal de Enfermagem
CRE – Coping Religioso-Espiritual
EBSERH – Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares
FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz
HUB – Hospital Universitário de Brasília
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INCA – Instituto Nacional do Câncer
NANDA – North American Nursing Diagnosis Association
OMS – Organização Mundial de Saúde
QV – Qualidade de Vida
SAE – Sistematização da Assistência de Enfermagem
SUS – Sistema Único de Saúde
TCLE – Termo de Consentimento Livre Esclarecido
UCE – Unidades de Contexto Elementar
14
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO......................................................................................... 17
INTRODUÇÃO............................................................................................... 19
Objetivo Geral 20
Objetivos Específicos 20
1 REFERENCIAL TEÓRICO............................................................................ 22
1.3.3 Postulados...................................................................................................... 34
2 O MÉTODO................................................................................................... 46
15
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO.................................................................. 51
4 CONCLUSÃO................................................................................................ 90
REFERÊNCIAS............................................................................................. 94
APÊNDICES.................................................................................................. 102
17
APRESENTAÇÃO
Meu interesse por questões espirituais vem desde criança. Nascido em uma família
religiosa, a busca pela religiosidade/espiritualidade sempre esteve presente na minha vida.
Durante minha graduação em enfermagem, na Universidade de Brasília, busquei
conhecer e aprender sobre como a espiritualidade poderia influenciar nos meus cuidados de
enfermagem. Em meus estágios curriculares, percebia que muitos dos pacientes internados
nos hospitais por onde passei apresentavam necessidades religiosas/espirituais afloradas.
Apoiavam-se bastante nessas necessidades para enfrentar as adversidades da vida.
Após viver alguns anos nos Estados Unidos (2006-2009), tive a oportunidade de
conhecer outros profissionais da área de saúde e fazer cursos que foram extremamente
importantes para o meu crescimento pessoal e profissional; conheci e conversei com
enfermeiros de diversas partes do mundo e muitos me mostraram uma enfermagem que se
preocupava, também, com as questões espirituais dos seus pacientes. Isso me instigou
bastante.
Ao retornar ao Brasil, continuei a trilhar meus caminhos na enfermagem. E um deles
foi a docência universitária. Lecionei em três diferentes regiões do país: Centro-Oeste
(Brasília), Sudeste (Minas Gerais) e Nordeste (Aracaju). Em todas elas, os pacientes
internados demonstravam necessidades espirituais bem afloradas no processo de adoecimento
e internação.
Em 2013, em Aracaju, em uma das minhas caminhadas pela orla de Atalaia, conheci
uma feira de cultura sergipana. Nessa feira me deparei com um estande que vendia livros
espíritas. E o título de um desses livros me chamou atenção: Espiritualidade no Cuidado com
o Paciente: por quê, quando, como, o quê. Neste momento a curiosidade foi maior: comprei.
Ao chegar a minha casa, pensei que o livro fosse de temática espírita ou de cunho religioso.
Porém, para a minha surpresa, era um livro que apresentava diversas pesquisas científicas
realizadas sobre a influência da espiritualidade na saúde. O interesse foi tanto que li suas 140
páginas em menos de três horas.
As pesquisas contidas no livro evidenciavam que a espiritualidade auxilia as questões
relacionadas à saúde tanto física quanto mental e à qualidade de vida; demonstravam
resultados benéficos do envolvimento religioso em relação à dor, debilidade física, doenças
do coração, pressão sanguínea, dentre outras; demostravam que pessoas que apresentavam
envolvimento religioso tinham menor probabilidade de usar/abusar de álcool, cigarros e
18
drogas, menores taxas de suicídio e lidavam melhor com doenças graves como câncer e
AIDS.
Chamou-me tanta atenção que resolvi compartilhar sobre a leitura desse livro nas
minhas redes sociais, principalmente com meus alunos e colegas de profissão. Não muito
depois recebo uma mensagem dizendo que o autor do livro, Harold Koenig, médico
americano, era um dos maiores expoentes do assunto no mundo. Depois dessa notícia, resolvi
comprar outros livros sobre o tema – Medicina e Saúde: o encontro da ciência e da
espiritualidade; Handbook of Religion and Health - e ler artigos e revistas que versavam
sobre saúde e espiritualidade.
Então comecei a me questionar: que tipo de formação eu tive na graduação para poder
atender às necessidades espirituais do meu paciente? O que são realmente necessidades
espirituais? Espiritualidade e religiosidade são a mesma coisa? Por que ciência e
religião/espiritualidade se distanciaram tanto? Na minha vivência assistencial como
enfermeiro, percebi que muitos pacientes buscam questões religiosas/espirituais para lidar
com a doença. Por que nós, enfermeiros, não sabemos lidar com essa dimensão do ser
humano? Por que a dimensão espiritual é “dispensável” dos cuidados de enfermagem,
delegando essa assistência aos religiosos e religiosas que visitam os hospitais? Será que essa
questão de integralidade do ser e a necessidade de o enfermeiro ver o seu paciente como um
ser biopsicossocial e espiritual são uma utopia?
Frente a esses questionamentos, os resultados desta pesquisa podem auxiliar a
enfermagem na busca de novo olhar sobre a dimensão espiritual e a inclusão de cuidados
voltados a ela. Tenho certeza de que os pacientes poderão se beneficiar desses resultados. Mas
tenho convicção de que eu fui o primeiro beneficiado.
Considerando-se, sobretudo, a necessidade de agregar conceitos de integralidade e
espiritualidade no cuidado dos pacientes, novos estudos como este são necessários, em
especial no Brasil. Estes estudos podem prover dados empíricos que possam ser utilizados no
planejamento de intervenções de enfermagem espiritualmente embasados.
Nesse contexto, esta pesquisa buscou fundamentar, ancorar e ampliar as discussões
sobre a necessidade de inclusão da dimensão espiritual no cuidado integral de saúde e de
enfermagem. Além disso, por meio do discurso dos pacientes, ratificou-se a importância de se
abordarem questões relacionadas à espiritualidade no contexto do cuidado de enfermagem e
entender que espiritualidade vai além de oferecer assistência religiosa.
19
INTRODUÇÃO
contribuir para a melhoria da prática clínica e para a inclusão de cuidados de enfermagem que
atendam às necessidades espirituais dos pacientes.
Dessa forma, este estudo teve como objetivo geral analisar as vivências de enfermeiros
e pacientes acerca da abordagem da dimensão religiosa/espiritual nos cuidados de
enfermagem com vistas a sua integralidade.
Pretende-se ainda atingir os seguintes objetivos específicos:
- apreender as vivências dos enfermeiros quanto à dimensão espiritual do cuidado sob
o ponto de vista da integralidade do cuidado em saúde;
- identificar as estratégias utilizadas no manejo das necessidades espirituais dos
pacientes;
- compreender a percepção dos pacientes sobre os cuidados de enfermagem em relação
ao atendimento das suas necessidades espirituais.
Embora não conste do objetivo geral do estudo, optou-se também por identificar as
necessidades espirituais dos pacientes nos cuidados em saúde. Espera-se que o levantamento
dessas necessidades possa subsidiar de forma mais precisa os cuidados prestados pela equipe
de enfermagem.
O presente estudo está estruturado em quatro partes, organizando-se da seguinte
forma:
Parte I – O Referencial Teórico
o A Integralidade e Suas Polissemias: busca discutir as diversas
abordagens que o termo integralidade assume nos cuidados em saúde e
define a abordagem adotada neste estudo;
o A Espiritualidade e a Integralidade no Cuidado em Saúde: objetiva o
esclarecimento das dimensões do ser humano e a importância da
dimensão espiritual no cuidado em saúde; a distinção entre
espiritualidade e religiosidade; a compreensão da dimensão espiritual
na perspectiva da integralidade e dos cuidados de saúde e de
enfermagem; discute sobre algumas questões que devem permear a
formação do enfermeiro para o cuidado integral;
o A Teoria do Cuidado Transpessoal: apresenta a teoria proposta por Jean
Watson, suas fontes teóricas, seus postulados, o marco filosófico e
conceitual da teoria; a definição operacional dos principais conceitos; o
poder do campo energético no cuidado transpessoal; os Caritative
21
1 REFERENCIAL TEÓRICO
Assim, a medicina integral discute a integralidade como uma visão holística do ser
humano. Isso significa compreender o indivíduo como um todo, isto é, considerando as
dimensões de seu corpo físico, intelecto, sentimento e espírito; todas essas dimensões
constituem a totalidade indivisível do ser humano. Como se pode perceber, essa abordagem
integral busca anular a visão de um ser humano fragmentado, visto como partes distintas, num
esforço para contemplar na prática do cuidado em saúde os seus aspectos: biológico,
psicológico, social e espiritual (LINARDI; CASTRO, CRUZ, 2011).
Nessa linha argumentativa, Morin (2002) refere que um olhar sistêmico, no contexto
da integralidade, é essencial para a compreensão do ser humano, da sua saúde e da sociedade.
Para o autor, é impossível conhecer o todo sem conhecer as partes, e conhecer as partes sem
conhecer o todo. Portanto, ao se discutir o termo integralidade exprimem-se conceitos como
unidade, multiplicidade, totalidade, diversidade, organização e complexidade do cuidado
(MORIN, 2002).
Complementando a visão de Morin, Gelbcke et al. (2011), ao tratar sobre o tema no
âmbito da ciências sociais, humanas e, sobretudo, na área da saúde, referem que não se pode
pensar no ser humano de maneira individualista e objetiva; é preciso olhar esse Ser humano
de maneira completa, levando-se em conta suas emoções, sentimentos, paixões e sensações,
como um ser subjetivo, embora tenha manifestações objetivas.
Santos et al. (2012), por sua vez, acrescentam outros aspectos importantes para a
discussão e o entendimento do termo integralidade: para os autores, o ser humano integral é
composto por matéria, alma e espírito. Nessa perspectiva, cuidar do ser humano em sua
integralidade é atender seus sentimentos, emoções e desejos, progredindo para um patamar
além das necessidades fisiológicas (SANTOS et al., 2012).
Assim, frente à polissemia do termo integralidade, é nesse último sentido que este
estudo buscará compreender a integralidade do ser humano e dos cuidados de enfermagem.
Considera-se que a qualificação do cuidado em saúde e enfermagem deve atender as
necessidades manifestadas pelo ser humano em todas as suas dimensões, avançando para além
do olhar fragmentado e reducionista do cuidado biomédico.
24
profissionais de saúde abordassem essa dimensão espiritual e comentassem sobre ela durante
a consulta e o tratamento (KOENIG, 2005).
Sabe-se que a presença de emoções e do diálogo possibilitam manifestações de afeto,
altruísmo, solidariedade, respeito e confiança no outro e estabelecem conexões importantes
em busca da espiritualidade do ser e, consequentemente, o respeito à integralidade do ser
humano (Coscrato, 2013). Desta maneira, são claras as demandas que justificam a discussão
da dimensão espiritual no cuidado em saúde.
Estudos têm demonstrado que a mobilização da dimensão espiritual nos cuidados em
saúde pode promover alívio da angústia e ansiedade, melhorando o estado de saúde emocional
e física do ser humano (Pedrão; Berezin, 2010). Como exemplo dessas pesquisas na área da
saúde e espiritualidade, Koenig (2001) investigou 225 estudos que evidenciaram resultados
benéficos do envolvimento religioso/espiritual em relação à dor, debilidade física, doenças do
coração, pressão sanguínea, infarto, funções imunes, neuroendócrinas, doenças infecciosas,
câncer e mortalidade (KOENIG, 2001).
O autor comprovou que pessoas que apresentam envolvimento religioso têm menor
probabilidade de usar/abusar de álcool, cigarros e drogas, ou de apresentar comportamento de
risco, como atividades sexuais extramaritais, delinquência e crime. Observou, também, a
influência da religiosidade nos adolescentes, sendo a sua falta relacionada negativamente ao
suicídio e atividade sexual/gravidez prematuras (KOENIG, 2001).
Outras pesquisas também demonstraram que a espiritualidade/religiosidade tem
relação direta com a melhora da qualidade de vida (QV) do indivíduo, família e comunidade.
Os estudos evidenciaram que as organizações religiosas contribuem para a integração da
comunidade, consequentemente aumentando a QV; além disso, os princípios da religião
podem atrair pessoas com disposição para a felicidade e podem justificar um propósito na
vida que promova bem-estar (FERRIS, 2002).
No âmbito da enfermagem, um dos primeiros trabalhos de revisão de literatura sobre o
significado de espiritualidade foi desenvolvido por Dyson (1997) com o objetivo de
identificar como a Espiritualidade era tratada na literatura corrente, bem como estabelecer
quais seriam os possíveis entendimentos sobre necessidades espirituais.
O autor identificou a espiritualidade como uma aspiração para o bom relacionamento
com o Sagrado, com o outro e consigo mesmo, seguido de um sentido para a vida. Verificou
que a esperança é uma necessidade espiritual dos pacientes pesquisados; outro dado foi a
necessidade da escuta ativa e da sensibilidade aguçada dos enfermeiros para que eles
pudessem acessar a dimensão espiritual de seus pacientes (PENHA, 2012).
26
Desde que surgiu a vida, os cuidados existem, já que é necessário “cuidar da vida”
para que ela se perpetue. Porém, é necessário reconciliar, ligar, ou seja, relacionar o que diz
respeito ao corpo e ao espírito; unir sentimento, espiritualidade e racionalidade científica aos
cuidados de enfermagem ao ser humano. O desafio da enfermagem é unir esse cuidado que
tem sido cada vez mais fragmentado (COLLIÈRE, 2003).
Quando uma pessoa vivencia situações de crise, que fogem ao seu controle, ou mesmo
encontra dificuldade de contorná-las, ela tende a procurar recursos, muitas vezes relacionados
à fé e à espiritualidade. Essa busca pela dimensão espiritual a mantém o mais conectada
possível com o mundo que a rodeia trazendo tranquilidade, esperança, conforto e melhor
perspectiva de vida (Souza, Maftum, Bais, 2008; Carvalho, 2008). Essa crise pode ser
29
Ansiedade espiritual Você está com medo de que Deus não esteja presente quando
você precisar?
Culpa espiritual Você já fez algo que poderia levar Deus a se zangar com você?
Raiva espiritual Você está com raiva de Deus por permitir que você adoeça?
Acredita que Deus é injusto com você?
Desespero espiritual Você alguma vez sentiu que não há esperança de ter o amor de
Deus? Que Ele não o ama mais?
Práticas espirituais Descreva suas práticas espirituais habituais e qualquer coisa que
interfira em sua capacidade de executá-las. Posso ajudar de
alguma maneira para assegurar os préstimos necessários para
essas práticas (Bíblia, cristais, rosários, ícones)?
Relação entre crenças Descreva os meios pelos quais suas crenças espirituais afetam
espirituais e a vida sua vida diária (dieta, higiene, relacionamentos). Você
diária considera essa influência saudável ou destrutiva? Cont.
31
Significado e Propósito O que é que dá sentido a sua vida? Está motivado para ficar
bom? Qual é a coisa mais importante ou poderosa na sua vida?
Força interior O que você pode fazer para se sentir vivo e grande de espírito?
Quais são suas forças pessoais? Que objetivos de vida propôs a
si mesmo? De que forma a doença influenciou o seu destino?
Capacidade de entrega à Quem são as pessoas mais importantes na sua vida?Pode pedir
família, amigos, grupos ajuda às pessoas quando precisa? Consegue partilhar os seus
sociais e de perdoar aos sentimentos com outros? Que ações carinhosas que você já fez e
outros que já fizeram para você? Consegue perdoar aos outros? Cont.
32
Sentimento de ligação De que forma seu meio interage com o seu bem-estar? Está
com a vida, natureza; preocupado com a sobrevivência do planeta?
consciência dos efeitos
do meio na vida e no
bem-estar
Fonte: Adaptação Taylor; Lillis; LeMone (2008); Balzer-Riley, 2004); Dossey (1998).
quadro na parede de um dos quartos de uma criança que dizia: A vida não é um problema
para ser resolvido, mas um mistério para ser vivido (PENHA, 2012).
Para Watson (2002), essa experiência foi a inspiração para desenvolver uma nova
forma de pensar e fazer Enfermagem. Para ela o processo de Cuidar envolve um íntimo
relacionamento entre dois Seres, distintos de personalidade, mas iguais em essência e que
independe da cura para ser sustentado em si mesmo. Watson, por meio da estruturação da
Teoria do Cuidado Transpessoal, buscou modificar as práticas e modelos de cuidado a partir
do paradigma espiritualista nas relações interpessoais que são inerentes ao processo de Cuidar
em Enfermagem (PENHA, 2012).
1.3.3 Postulados
Watson (2002) propõe que o cuidado e o amor são “forças cósmicas” universais e
misteriosas, que compreendem a energia psíquica primária e universal. Para isso, desenvolveu
sua teoria sob a égide de seis pilares (pressupostos): 1) um pressuposto ontológico de
unicidade, totalidade, unidade, relação e conexão; 2) um pressuposto epistemológico segundo
o qual existem múltiplas formas de conhecer; 3) a diversidade de conhecimento assume tudo,
e várias formas de evidência podem estar envolvidas; 4) um modelo de Ciência do Cuidado
torna essas diversas perspectivas explícitas e diretas; 5) a integração moral-metafísica e
ciência evoca o espírito; tal orientação não é apenas possível, mas também necessária para a
ciência, humanidade, sociedade/civilização e mundo/planeta; 6) a emergência da Ciência do
Cuidado, fundamentada sobre os novos pressupostos, torna explícita uma visão de mundo
35
unitária, expandida, energética, com uma ética de atendimento humano relacional e uma
ontologia como seu ponto inicial (WATSON, 2002).
Para Watson (2009), existe uma dimensão “sagrada” no Cuidado e que buscamos uma
fonte espiritual quando estamos vulneráveis, suscetíveis, temerosos ou mesmo doentes.
Assim, o enfermeiro, ao assumir a Ciência do Cuidado, deve compreender que: a) o Cuidado
não pode ser assumido como verdadeiro e único; b) há envolvimento entre as Artes, as
Ciências Humanas e as Ciências da Saúde na Ciência do Cuidado; c) o conhecimento envolve
ética, intuição, experiências pessoais, empíricas, estéticas e espirituais e; d) o Cuidado existe
em toda e qualquer sociedade, onde cada pessoa tem cuidado umas com as outras. As
influências culturais são responsáveis pela transmissão da Relação do Cuidado, sendo que a
cultura da Enfermagem, enquanto disciplina e profissão, tem papel científicossocial vital na
preservação e avanço do cuidado humano (WATSON, 2009).
atentas ao sentido de harmonia entre mente/emoções e corpo, mais ainda à medida que
crescemos e permitimos que o lado existencial e espiritual do Eu se desenvolva;
- Um Evento ou Ocasião Real de Cuidar – envolve as ações do enfermeiro e do
indivíduo. O momento do atendimento proporciona a ambos a oportunidade de decidir como
será o relacionamento e o que fazer com o momento. As duas pessoas (enfermeiro e o outro)
juntas, com as suas histórias de vida únicas e o campo fenomenológico numa transação de
cuidar, abrangem um evento. Um evento, como uma ocasião real de cuidar, é um ponto focal
no tempo e no espaço, no qual a experiência e a percepção estão a tomar lugar. Porém a
ocasião real do cuidar tem um campo próprio, que é maior do que a própria ocasião. Deste
modo, o processo pode ir além dele próprio, e ainda salientar-se de aspectos seus que se
tornam parte da história de vida de cada pessoa, assim como parte de um padrão de vida mais
amplo, mais profundo e mais complexo.
O momento da ocasião do cuidar torna-se parte da história de vida passada de ambas
as pessoas (enfermeiro e o outro) e dá a ambas novas oportunidades. Tal ideal de
intersubjetividade entre o enfermeiro e o usuário é baseado na crença de que aprendemos uns
com os outros como seres humanos, identificando-nos com os outros ou encontrando os
dilemas em nós próprios. O que todos ganham com isso é o autoconhecimento;
- Eu: é a Gestalt conceitual organizada, composta de percepções de características do
“eu” e percepções do relacionamento do “eu” com os outros e com vários aspectos da vida;
- Tempo: a ocasião real do cuidar num momento presente tem o potencial de
influenciar no futuro tanto o enfermeiro quanto o usuário. A ocasião do cuidar torna-se então
parte do subjetivo, da realidade vivida e da história de vida de ambos. São ambos
coparticipantes ao tornarem-se no agora e no futuro; são partes de um padrão de vida mais
amplo, mais profundo e complexo.
defeitos dos outros; consequentemente terá uma energia de frequência mais elevada. A
compaixão, a serenidade de temperamento, o amor, o cuidar e o perdão fluem através do
corpo e chegam até os outros. Assim o cuidado transpessoal será efetivo (WATSON, 2002a).
Watson defende que esta consciência de cuidar, de energia e de conexão, de um para o
outro, tem um potencial de cura. O enfermeiro adepto ao cuidado transpessoal entende que o
cuidar é, sobretudo, um modo de ser; aquele que cuida tem pensamentos de alta frequência e a
consciência de cuidar; esta frequência mais elevada da consciência de cuidar, por sua vez,
ajuda a tranquilizar, a acalmar ou a potenciar o todo de uma pessoa com um sistema de baixa
frequência - o que frequentemente é o caso se alguém está doente ou em sofrimento
(WATSON, 2002a).
Unidas ao conceito de energia, outras modalidades do cuidar transpessoal são
propostas por Jean Watson, tais como: as artes, o toque terapêutico, a música, a massagem e a
visualização. Situadas num paradigma transpessoal, essas modalidades devem ser integradas
na prática clínica da enfermagem convencional (WATSON, 2002a).
Quadro 3 - Comparativo entre o Caritative Factors (1979) e o Clinical Caritas Process (2008)
pessoa como um Ser que tem sua história no contexto familiar e social carregada de
sentimentos, emoções e valores (TOMEY, ALLIGOOD, 2004; SILVA, 2011).
Assim, a Teoria do Cuidado Transpessoal desvia o foco da Enfermagem de seu atual
modelo tecnicista para um modelo com ênfase na integralidade do cuidado e na busca de uma
maior atenção aos aspectos sociais, emocionais e espirituais do paciente (SILVA, VALENTE,
BITENCURT, BRITO, 2010).
Watson considera que o desafio atual da enfermagem é romper com os velhos laços da
preocupação com os procedimentos, definições rígidas, racionalismo severo, operacionalismo,
manipulação variável, e assim sucessivamente. A autora defende a necessidade de identificar
outras vias de conhecimento e perspectivas alternativas da ciência, com abordagens adicionais
para estudar e investigar a área da experiência humana na saúde-doença e no cuidar. Isso
acontece pela defesa da autonomia da liberdade de escolha, que favorece o autoconhecimento
e autocontrole do paciente (WATSON, 2002a).
Os objetivos para os ideais da sua teoria estão associadas a uma visão integral do ser
humano e um crescimento mental-espiritual para o Eu e os Outros, encontrando significado na
principal existência e experiência pessoal, descobrindo um poder e controle interiores e
potencializando instâncias de transcendência e autorrecuperação (WATSON, 2002a).
Assim, nessa linha argumentativa, Jean Watson fundamentou sua teoria em fatores que
facilitam a compreensão do papel da enfermagem frente à integralidade do cuidado.
O profissional de saúde envolvendo-se nesta perspectiva detém uma consciência e
intencionalidade de cuidar no sentido do todo como um ideal moral, e não uma
técnica interpessoal. Neste modelo, olhamos para além da doença externa per si. O
cuidar transpessoal procura fontes mais profundas de cura interior, definida mais em
termos espirituais do que em eliminação da doença (WATSON, 2002a, p. 117).
2 O MÉTODO
A visão do fenômeno saúde, não limitada às causas e aos sintomas, pode ser traduzida
através do método fenomenológico, ampliando-o para uma perspectiva multifacetada
mediante os diversos fatores de ordem econômica, política, social, psicológica, cultural e
espiritual com os quais se inter-relaciona (GOMES et al., 2008).
para ouvir apenas os enfermeiros, já que os mesmos são legalmente responsáveis pela
prescrição dos cuidados de enfermagem.
Vale ressaltar que, ao iniciar os contatos com os enfermeiros, verificou-se que a
maioria deles eram recém-concursados e lotados na Clínica Médica há menos de seis meses,
sendo o mais antigo empossado há seis meses e o mais novo há duas semanas. Esse aspecto
deveu-se ao fato de a gestão do Hospital Universitário de Brasília ter sido assumida pela
Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) e a mesma ter realizado concurso
público recentemente.
Dessa forma, para não prejudicar a pesquisa, optou-se por abrir mão do critério de
inclusão de lotação mínima de seis meses no campo de estudo. Mas, apesar do pouco tempo
de lotação na Clínica Médica (média de 2,5 meses), 06 (50%) enfermeiros entrevistados
possuíam mais de cinco anos de formado. Assim, muitos deles já acumulavam experiência
prévia nas práticas do cuidado em enfermagem.
A coleta de dados com os pacientes foi realizada preferencialmente no início da noite.
Esse horário foi escolhido, porque, por tratar-se de um hospital universitário, registra-se uma
movimentação intensa de profissionais e estudantes no setor durante o dia. À noite, a maioria
dos procedimentos médicos e de enfermagem, além das visitas multiprofissionais, já haviam
sido realizados. Isso facilitou a aproximação do pesquisador com os pacientes e uma maior
tranquilidade para os pacientes discutirem as questões sugeridas no roteiro de entrevista
semiestruturada. A escolha dos pacientes privilegiou aqueles que estavam sem acompanhantes
ou com apenas outro paciente na enfermaria. Quando existiam dois pacientes no mesma
enfermaria, optou-se por realizar a entrevista com os dois. Esse critério foi bastante
interessante, pois a conectividade do(s) paciente(s) com o pesquisador foi intensa,
favorecendo um envolvimento maior de todas as partes envolvidas.
Os dados obtidos por meio das entrevistas foram transcritos e o corpus das entrevistas
submetidos à análise com auxílio do software Alceste (análise lexical por contexto de um
conjunto de segmentos de texto).
Este software analisa qualitativamente os dados textuais e tem como base as leis de
distribuição do vocabulário nos textos, sejam de origem verbal ou escrita. A análise estatística
propõe desvendar as informações essenciais contidas no texto, obtendo assim enunciados
simples. As palavras características desses enunciados são identificadas e contribuem para o
50
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Tabela 1 - Perfil dos enfermeiros que atuam no cenário da pesquisa. Brasília, 2014.
Variáveis Mulheres Homens Total
nº (%) nº (%) nº
Sexo 10 (83,3) 2 (16,7) 12
0 – 1 ano 1 (8,3) - 1
Tempo de 1 – 3 anos 2 (16,7) 1 (50) 3
Formação 3 – 5 anos 1 (8,3) 1 (50) 2
5 – 10 anos 2 (16,7) - 2
10 – 15 anos 2 (16,7) - 2
Mais 15 anos 2 (16,7) - 2
Total 10 (100) 2 (100) 12
Figura 1: Dendograma com os eixos e categorias que emergiram da análise das entrevistas dos enfermeiros.
Brasília, 2014
Este eixo desvelou que existe uma lacuna na formação acadêmica dos sujeitos do
estudo, quanto aos cuidados de enfermagem relativos à dimensão espiritual. Os resultados
apontaram que os enfermeiros conhecem o significado do termo “integralidade”, que vai ao
encontro da abordagem utilizada no estudo, ou seja, referindo-se à necessidade de considerar
todas as dimensões que envolvem o ser humano durante a prática do cuidado.
Esse lado da espiritualidade da gente, eu acho que ninguém nunca estudou. Podem
ter vários estudos, mas não focam nisso (E10).
Como vou dar aquilo que não sei, que não fui instruída pra dar? (E1).
56
Nesta categoria, a presença dos verbos lembrar, estudar, ter, ver, e dos advérbios de
negação nunca, nada, não no discurso dos participantes do estudo, fazem referência às
inadequações, ou mesmo à inexistência de discussões durante a graduação que incluíssem ou
abordassem a dimensão espiritual nos cuidados de enfermagem. Os enfermeiros relataram que
durante o período de graduação não lembram, não tiveram ou mesmo não viram nenhum
aspecto relacionado às questões espirituais de seus pacientes. Os fragmentos dos discursos, a
seguir, exemplificam essa situação:
Na minha formação eu acho que esse lado da espiritualidade nem foi abordado.
Não me lembro de ter em algum momento ter sido abordado. Eu não tenho
lembrança disso (E2).
Na minha época de formação não teve nada sobre isso de espiritualidade. E olha
que foi há trinta e tantos anos que eu me formei (E3).
Os resultados corroboram estudos que apontam que, apesar de terem clareza sobre as
dimensões que favorecem a integralidade do cuidado e reconhecerem que a espiritualidade é
um aspecto fundamental da assistência de Enfermagem, muitos profissionais ainda se sentem
hesitantes e com pouca confiança para abordar esses aspectos devido à falta de inclusão
adequada dessa temática durante o processo de formação acadêmica (McSHERRY &
JAMIESON, 2011).
Essa questão também foi observada por Penha (2012) ao referir que a formação
acadêmica dos enfermeiros não tem contemplado aspectos relacionados a questões de
espiritualidade no cuidado. Segundo o autor, superficialmente trazem a discussão do
atendimento humanizado, questões básicas de religiosidade, mas, mesmo assim, insuficientes
para a construção de um plano de cuidados que aborde tais questões (PENHA, 2012).
Entretanto, concorda-se com a perspectiva de Vasconcelos (2006) ao explicitar que a
espiritualidade deve estar presente nos espaços de formação profissional, dentro de uma
pedagogia científica que valorize a discussão, a reflexão e a crítica. É necessário valorizar a
espiritualidade na formação profissional por se tratar de uma exigência na realidade do
trabalho em saúde. Não seria científico deixar de refletir e estudar a dimensão espiritual e não
57
seria uma pedagogia científica que evitaria a sua discussão e o estudo nos espaços de
formação profissional (VASCONCELOS, 2006).
Nessa linha argumentativa, Watson (2002) menciona que a formação do enfermeiro
deve (re)valorizar o conceito de “alma” e de “espírito”. Para ela, a alma refere-se ao espírito,
ao “eu” interior ou à essência da pessoa, que está ligada a um sentido maior de conhecimento
próprio, um grau de consciência mais elevado, uma força interior e um poder que pode
expandir capacidades humanas e permitir que uma pessoa transcenda o seu “eu” habitual
(WATSON, 2002).
Para Watson, a abordagem da dimensão espiritual nunca desapareceu, realmente, do
ato da cura, pois a brecha entre a ciência e a espiritualidade não é tão ampla como se tinha
pensado (WATSON, 2002a).
Nessa perspectiva, Watson sugere que será preciso forjar novas formas de pensar e
sentir as vivências humanas reafirmando um elevado sentido de consciência e valorização do
eu interior, embora a cultura racional e científica negue essas possibilidades (Watson, 2002).
Entende-se que essas possibilidades devem ser valorizadas pela enfermagem.
Nesse sentido, para que a formação em enfermagem assuma um novo paradigma e
que possa resgatar o cuidado espiritual em sua prática cotidiana, é preciso que os enfermeiros
e a enfermagem se curem de um século de domínio do modelo biomédico, que valoriza a
ciência positivista e a fragmentação do sujeito. A contínua aderência a esse modelo
fragmentado da prática de enfermagem não tem sido adequado para abordar todo o fenômeno
do cuidar e para dar respostas aos problemas de saúde atuais (WATSON, 2002a).
Watson (2002a) critica o modelo vigente de formação e atuação do enfermeiro, pois ao
assumir um fazer essencialmente técnico esse profissional reproduz acriticamente o fazer do
médico, distanciando-se da essência do cuidado de enfermagem. Observa-se que os
enfermeiros assumiram muitas tarefas que previamente estavam dentro do domínio médico,
tais como administração de medicamentos, avaliações físicas. Essas novas práticas foram cada
vez mais valorizadas e difundidas nas instituições formadoras de enfermagem. Porém
conceitos invisíveis como cuidar, confortar, ter compaixão, oferecer cuidados emocionais e
espirituais foram colocados à parte dos cuidados de enfermagem (WATSON, 2002a).
Assim, reiterando o pensamento de Watson (2002a), a formação do enfermeiro deve
reforçar valores como compaixão, gentileza, amor e responsabilidade mútua como maneiras
eficazes de explorar a dimensão espiritual de seus pacientes.
Outra questão, apontada por Watson e que merece destaque, é a necessidade de
repensar o modo de ensinar dos professores de enfermagem. Aqui se observa que há uma
58
Vale ressaltar que, apesar de alguns sujeitos afirmarem ter tido algum contato com o
tema espiritualidade durante o período de graduação, essas abordagens foram pontuais em
determinados contextos na graduação. Alguns relataram ter tido certo contato com os temas
em discussão referentes à Teologia, Humanização em Saúde, Saúde do Idoso, Saúde Mental e
Psicologia; ou mesmo que dependia de cada professor a abordagem do tema.
Vê-se que, apesar de os enfermeiros saberem da existência da multidimensionalidade
do ser humano e da integralidade do cuidado, a discussão sobre a dimensão espiritual ainda é
incipiente no processo de formação do enfermeiro brasileiro. Seria necessária uma
reformulação do projeto pedagógico dos cursos de graduação em enfermagem a fim de
contemplar a dimensão espiritual nos cuidados integrais de saúde e de enfermagem. O que se
observa nos relatos a seguir é a fragmentação do olhar dos cuidados em enfermagem:
Tive um módulo dentro da Psiquiatria. Dentro dele a gente abordou um pouco esse
aspecto, mas nada direcionado à espiritualidade não (E1).
Tive uma disciplina chamada Teologia da Saúde, mas nela a gente discutia a
importância de olhar o paciente como um todo e respeitar a religião e a
individualidade do paciente (E5).
Devido ao seu caráter subjetivo, a dimensão espiritual pode ser abordada sob
diferentes ângulos. No âmbito da Psiquiatria, estudos demonstram que existe um valor
positivo da integração da espiritualidade na prática clínica em saúde mental. Essa prática pode
ser verificada em todas as fases do tratamento psíquico, desde a prevenção e promoção da
saúde mental, até o enfrentamento das adversidades por parte dos pacientes psiquiátricos e
seus familiares, na reabilitação e reinserção social (MOREIRA-ALMEIDA, 2012; KOENIG,
2007; GUIMARÃES & AVEZUM, 2007; PERES, SIMÃO & NASELLO, 2007).
60
Vale ressaltar que uma unidade de Clínica Médica deveria acolher pacientes de
cuidados mínimos ou no máximo de cuidados intermediários. Segundo o Conselho Federal de
Enfermagem- COFEN, o paciente de cuidados mínimos é aquele paciente estável, sob o ponto
de vista clínico e de enfermagem, e fisicamente autossuficiente quanto ao atendimento das
necessidades humanas básicas. Já os de cuidados intermediários, são aqueles pacientes
estáveis, sob o ponto de vista clínico e de enfermagem, mas que requerem avaliações médicas
e de enfermagem e apresentam parcial dependência dos profissionais de enfermagem para o
atendimento das necessidades humanas básicas (COFEN, 2004).
Observa-se que na unidade de Clínica Médica do hospital onde foi realizado o estudo,
há pacientes de cuidados semi-intensivos, intensivos e alguns em cuidados paliativos; essa
realidade contribui para a sobrecarga da equipe de enfermagem. Apreendeu-se que
aproximadamente 06 enfermeiros no plantão diurno e 04, no noturno se revezam para cuidar
de 67 pacientes (capacidade máxima das duas alas). Acredita-se que exista um déficit de
pessoal na unidade.
Muito provavelmente, em decorrência desse contexto, somado a outros, desvelou-se
também que a rotina de cuidados é caracterizada pelo predomínio de ações técnico-biológicas
no cuidado. Isso pode ser demonstrado nos relatos abaixo:
Eu aqui na Clínica Médica tenho que entender de tudo. Tenho paciente que é da
Oncologia. Tenho que saber de todos os cuidados, intercorrências, tudo o que pode
acontecer. Tenho paciente da Cardiologia e que preciso saber da bomba de
heparina, amiodarona, do trombo do átrio direito. Tenho outro no box de
emergência que está em respiração mecânica. Tenho que vir e ler o traçado de um
eletrocardiograma. Como fazer tudo isso, individualizar meu cuidado e incluir a
espiritualidade? É muito difícil (E1).
Muitas vezes a gente passa a visita de manhã, conversa com o paciente, vê como ele
está, mas depois o foco mesmo é nos procedimentos que têm pra fazer e não deixar
o paciente sem assistência. A rotina atrapalha porque você não vai ter aquele
cuidado tão integral com aquele paciente. Ainda mais quando esse paciente
necessita de cuidados paliativos (E7).
A rotina daqui não inclui esse aspecto espiritual. Não sei se pelo fato da rotina ser
muito corrida, ter muitos pacientes, muitos procedimentos pra serem feitos, como
colocação de sonda, curativos, abertura de prescrições...E às vezes tem que resolver
os problemas que acontecem, encaminhar exames. Essa correria faz com que a
gente não dê muita importância pra essas questões religiosas e espirituais (E8).
62
Aqui na Clínica Médica tem muito serviço, muitos procedimentos. Muita bagunça,
muita gritaria. Como trabalhar a espiritualidade do paciente nesse ambiente?
(E12).
Watson refere que a enfermagem ainda tem um longo caminho a percorrer para
atender ao ambiente e às artes básicas de cura, conforme a tradição que Nightingale
transmitiu.
Futuramente, a enfermagem e outras profissões de saúde, que trabalham num
hospital, deverão criar novos centros para cuidar-curar e necessitarão de estar
envolvidas em pelo menos duas missões: criar espaços de cuidar-curar, do ponto de
vista ambiental e transpessoal e; fazer parte de relações curativas, sistemas e
comunidades (WATSON, 2002, p. 253-254).
Acaba que dentre os meus pacientes que talvez sejam os que mais precisam de uma
atenção, de uma escuta qualificada, são os pacientes que estão internados há mais
tempo e que acabam ficando com menos assistência. Isso porque eu já sei o quadro
clínico deles e não posso ficar indo lá porque eu tenho paciente grave pra cuidar.
Realmente é muito difícil (E1).
Não vou mentir pra você. Eu me canso espiritualmente. Fisicamente a gente já tira
isso de letra porque faz parte. Se tiver que pegar peso a gente pega. Mas não ver o
paciente de uma maneira integral parece que a espiritualidade da gente cansa, a
alma sai (E10).
Aqui os pacientes são atendidos mais nas suas demandas físicas, de dor,
medicamentos que tem que fazer. São realmente poucos os que a gente consegue
sentar e fazer outros cuidados, voltados para essa questão psicológica, pra essa
questão espiritual. Na verdade a gente tem oferecido pouco do básico. Isso me
angustia (E12).
Nessa categoria, os verbos escutar e ouvir, juntamente com as palavras oração, fé,
tolerância, pensamento positivo, individualidade, protocolos e educação permanente e
continuada permitiram deduzir que, apesar das dificuldades reveladas, os enfermeiros
elencaram um conjunto de estratégias que podem ser adotadas para atender as necessidades
espirituais de seus pacientes, dentre elas destacaram: a escuta qualificada e todos os
sentimentos e atitudes que a favorecem, a implantação da SAE e educação permanente.
A escuta qualificada:
Ouvir o paciente, o que a pessoa que tá ali tem a dizer. Às vezes ela clama alguma
coisa pra gente. Se a gente conseguir, pelo menos, ouvir com atenção, a gente já tá
ajudando (E9).
assume uma conformação capaz de mergulhar na espiritualidade e no modo que cada paciente
manifesta seu sofrimento e suas angústias durante o processo de doença (MAYNART et al.,
2014).
Os enfermeiros demonstraram sensibilidade ao elencar um conjunto de sentimentos
que compõem uma escuta qualificada, sugerindo uma série de atitudes que favorecem o
cuidado da dimensão espiritual. Entende-se que, para uma boa escuta qualificada, a empatia
torna-se extremamente relevante. Essa empatia é a capacidade de se colocar no lugar do outro,
de modo a sentir o que o outro sente, caso esteja em seu lugar (MIRANDA & MIRANDA,
1996).
Além da empatia, sentimentos como a amorosidade e o otimismo são primordiais para
qualificar a escuta. Esses sentimentos também foram verificados nos relatos dos enfermeiros:
Seria bom se a gente tivesse tempo pra poder se sentar, ficar um tempo ali ouvindo,
dialogando, e tentar motivar a busca da espiritualidade. Uma palavra de conforto
que você já dá pro paciente, eu acredito que é muito positivo. Um conforto. Um
incentivo (E5).
incentivando o paciente a pegar aquela fé pra enfrentar esse desafio, essa etapa que
ele está passando (E4).
Tem gente que por si só tem mais fé, já é mais espiritualizado, mais tranquila,
acredita que tudo vai dar certo. A gente observa que o paciente que é
espiritualmente mais desenvolvido, com mais fé, ele é um paciente mais seguro, que
confia mais nas coisas, que vai ficar bem (E12).
Poderia ter um protocolo de admissão e conversar com esse paciente, saber o que
ele tá sentindo, o que ele espera do tratamento e ao longo desse tratamento ir
conversando pra ver se ele está satisfeito, se está confiante, talvez algo nesse
sentido (E12).
Deixa eu ver aqui, pera um pouquinho, pra ver se na admissão a gente pergunta
alguma coisa sobre a religião do paciente...Verificar...A gente tem um processo, um
papel novo de admissão...Mas normalmente a admissão são orientações
básicas...Diagnósticos, procedimentos, condições de alta, condições da morte, alta,
transferência...Identificação...Data, idade, estado civil, local, cor,
sexo...Parentesco...Nome do pai, da mãe...Profissão...Nada sobre religião ou
espiritualidade do paciente (E12).
70
objetos de suas casas ou arredores - fronhas, lençóis, brinquedos, se possível. Tudo isso
possibilita a diminuição do estresse da hospitalização (WATSON, 2002a).
O toque, como modalidade transpessoal tátil, também é fundamental para os cuidados
de enfermagem. Pode ajudar a integrar e harmonizar, dar conforto, totalidade, integridade e
mesmo um sentido de segurança. O uso intencional do toque, massagens e toque terapêutico
são usados como parte das práticas holísticas e transpessoais. Algumas abordagens como
Reiki e Shiatsu são terapêuticas baseadas na energia e usadas para diminuir a ansiedade,
aliviar a dor e facilitar o processo de cura (WATSON, 2002a).
Dar ênfase na dieta, alimentos, texturas, aromas, aparência, atmosfera e ambiente são
considerações pós-modernas. Personalizar os gostos e hábitos individuais pode fazer a
diferença no cuidado transpessoal. O cuidar do corpo através da comida e sabores, com todas
as associações e significados alimentares na vida do paciente, aumenta sua capacidade física e
espiritual, o que também pode servir de prescrições de cuidados de enfermagem (WATSON,
2002a).
O uso intencional da modalidade mental-cognitiva pode ser traduzida como
visualizações formais, imaginárias, terapia cognitiva, uso do humor, da brincadeira, da
narrativa, da literatura, da poesia, da arte, de afirmações positivas, do diálogo e do ensino,
podem auxiliar no cuidado transpessoal e auxiliar no silêncio, solidão e práticas
contemplativas e meditativas (WATSON, 2002a).
A cinesiologia aplicada como a quiropraxia e o Reiki são consideradas modalidades
cinestésicas. O uso de movimentos suaves e fluentes, a dança e o fluir rítmico estão sendo
incorporados, de forma crescente, nas terapias e programas de terapia formal, também sendo
consideradas transpessoais e que ajudam o paciente a acessar a sua espiritualidade
(WATSON, 2002a).
O uso da modalidade da consciência de cuidar envolve o estar presente. Essa presença
pode ser tanto física quanto psicológica ou terapêutica. A presença física refere-se ao “estar
presente” para o outro; o estar fisicamente presente. A presença psicológica é o “estar com o
outro”; envolve ligação mente-a-mente; é o estar disponível para o outro, ambos com uma
relação de ajuda básica e utilizar competências de comunicação como escutar, empatia,
consideração incondicional e aceitação sem julgar. A presença terapêutica está intimamente
ligada com a consciência de cuidar, atenção, intencionalidade e cuidar transpessoal; envolve a
meditação, intencionalidade, abertura, comunhão, o amar e a conexão. Este nível de presença
pode ser traduzido em presença transpessoal (WATSON, 2002a).
73
Acho que poderia trazer pra cá quadros, situações, quadro de respostas dos
pacientes, porque deve haver estudos sobre isso. Paciente fala assim, ele reage
assim. E a partir disso a gente ter uma orientação pra nossa resposta, como fazer,
como lidar com a situação (E12).
Seria bom ter orientações como lidar, como conversar, como você responder às
situações que vão ocorrendo, referente à espiritualidade (E12).
Eu não consigo pensar como fazer isso. Acho que deveria vir uma equipe
especializada nisso, em espiritualidade (E6).
Acho que o pessoal das igrejas que vem aqui está mais preparado pra isso. Como eu
vou oferecer aquilo que não sei, que não fui treinada pra fazer? (E8).
Guimarães & Avezum (2007) afirmam que os enfermeiros têm transferido para essas pessoas
a incumbência de lidar com as questões espirituais/religiosas dos pacientes, talvez por falta de
clareza de como abordar as questões espirituais de seus pacientes devido a uma lacuna na
formação, ou devido à sobrecarga de trabalho (ou os dois). Apesar de a enfermagem enfatizar
a importância de reconhecer a religião e a espiritualidade como fontes para o enfrentamento
de doenças, os enfermeiros ainda não conseguem incluí-los de maneira efetiva na sua prática
clínica diária (GUIMARÃES; AVEZUM, 2007).
Os enfermeiros devem utilizar as atividades religiosas como adjuvantes ao tratamento,
paralelamente aos cuidados diretos prestados ao paciente. Ações como cirurgias espirituais,
meditação, cultos, missas e visitas religiosas podem ser incentivadas, a depender da crença do
paciente (SPADACIO; BARROS, 2009).
Observou-se, portanto, que a assistência de enfermagem frente às necessidades
espirituais dos pacientes ainda tem sido incipiente. Apesar de concordarem que a dimensão
espiritual é uma dimensão importante do paciente internado, os enfermeiros ainda não se
sentem preparados para cuidar dessa dimensão; ou por falta de preparo ou por motivos
inerentes à rotina, à sobrecarga de trabalho e à ambiência desfavorável da Clínica Médica.
A seguir, serão apresentadas as vivências dos pacientes sobre suas necessidades
espirituais.
Tabela 2 - Perfil dos pacientes que participaram da pesquisa quanto ao sexo, idade, diagnóstico clínico e religião.
Brasília 2014.
Variáveis Mulheres Homens Total
nº (%) nº (%) nº
Sexo 4 (67) 2 (33) 6
35 - 40 1(25) - 1
41 - 45 1 (25) - 1
Idade 46 – 50 1 (25) 2 (100) 3
Acima de 50 1(25) - 1
Total 4 (100) 2 (100) 6
Carcinoma 4 (100) - 4
Sem diagnóstico - 1 (50) 1
Diagnóstico Diabetes e suas
Clínico Complicações - 1 (50) 1
Total 4 (100) 2 (100) 6
Católica 2 (50) - 2
Religião Cristão (s/religião) - 2 (100) 2
Evangélico 1 (25) - 1
Seicho-No-Iê 1 (25) - 1
Total 4 (100) 2 (100) 6
Fonte: Dados da pesquisa.
Figura 2: Dendograma com os eixos e categorias que emergiram da análise das entrevistas dos pacientes.
Brasília, 2014.
Fonte: Dados da pesquisa.
religiosos, etc.) que levam a fé e a esperança para o paciente enfrentar a doença durante o
período de internação.
Eu não sentia nada antes. Eu era uma mulher de ferro. Trabalhava dia e noite. E
numa madrugada eu senti uma forte dor no estômago. Aí os médicos me
consultaram, e na tomografia eles descobriram. A gente nunca está preparado pra
uma notícia assim. No momento eu perdi o chão (P1).
Eu vim pra cá semana passada. O meu problema foi esse no braço, esse sistema
neurológico. E também o meu pé. Sou diabético e não sabia. Começou com essa
ferida no pé. Começou arranhando e acabou tendo que amputar a cabeça do
dedinho aqui. Deu gangrena. E aí tem um mês que tô nessa vida, sem trabalhar, sem
nada, nessa sofrendo. Agora ainda vem esse problema de tremer (P4).
Tem quatro meses que vou e volto. Dessa vez eu já tô aqui tem três dias. Em vez de
fazer as necessidades, eu tava inchando. Aí descobriram que era câncer de
intestino. Fiz a cirurgia e agora eu tenho que vir pra cá pra fazer a quimioterapia
pra tirar os resíduos e a bolsa de colostomia (P6).
Meu filho que me ajudou muito. Quando recebi a notícia da doença, ele pegou e
falou assim...Mãe, tudo o que vier a você, pense que é uma bola num campo de
futebol, mate no peito, deixe cair na grama. E essa bola quem te chutou foi Deus.
Então chute e deixe fazer o gol (P2).
Eu tenho um companheiro que tem muita fé em Deus. Muitas vezes eu falava que
não queria ir pra quimioterapia, mas era ele que me incentivava e me
acompanhava. Ele tem muita fé em Deus, sabe. E foi por causa dele que me apeguei
mais ainda em Deus pra vencer esse câncer, sabe (P6).
Percebe-se que a internação e a doença não são encaradas apenas pelo paciente, mas
vista como uma ameaça vivenciada de maneira grupal, fazendo com que a família redefina
seus papéis e modifique seus hábitos de vida. E essa presença familiar para o paciente traz
segurança afetiva, tranquilidade e diminuição do estresse advindo da doença (SILVEIRA,
2004).
80
Dessa maneira, a família do paciente acometido por uma doença grave torna-se a
principal fonte de apoio para o paciente no momento inicial da doença (Wanderbroocke,
2005). Esse apoio permite estabilidade emocional para o paciente lutar contra as adversidades,
suprir suas carências emocionais e alcançar uma melhor aceitação do diagnóstico e tratamento
(Mistura et. al., 2011; Waidman, 2004). Desta maneira, a presença da família torna a travessia
mais segura.
Nos relatos, observou-se que a família desempenhou três fatores que, para Watson
(2002), são primordiais para a criação de uma relação de ajuda-confiança no processo de
cuidar: coerência, empatia e calor humano não-possessivo. A coerência implica ser
verdadeiro, honesto, genuíno e autêntico. A empatia envolve a capacidade de compreender as
perspectivas e sentimentos do outro e transmitir essa compreensão. E o calor humano não-
possessivo demonstra uma postura aberta, afetiva, de acolhimento (Watson, 2002). Para a
autora, essa relação de ajuda-confiança (encontrada entre pacientes-família da pesquisa)
representa um dos princípios elementares para o cuidar transpessoal (WATSON, 2002).
Assim, a família desempenha um papel importante para transformar conceitos e
comportamentos dos pacientes durante o período de adoecimento, tornando-se um
sustentáculo emocional, físico, financeiro e espiritual para eles (Melo, Silva & Fernandes,
2005; Corbellini, 2001). Esse suporte estimulou um ajuste saudável à nova condição do
paciente, constituindo-se num componente essencial na sua travessia.
Às vezes aqui passam voluntárias pra ler uns trechinhos da Bíblia pra gente. Mas se
a enfermagem lesse pra gente também seria muito bom. Quando falam de Deus,
assim, pra gente, a gente sente mais amor, mais carinho, ajuda a gente a ficar mais
forte, dá uma palavra mais fortificante. (P1)
Acho muito importante que venham falar sobre a nossa fé. E quando alguém vem
falar sobre isso com a gente, eu fico alegre, porque eu sei que a cada dia que passa,
Deus, além de me proteger, está cuidando de mim. Foi uma tremenda alegria
conversar com você porque tô precisando mesmo desabafar. Deus me mandou você
pra vir conversar comigo. (P4)
A gente se sente muito pesada com essa doença, num quarto assim. Muitas vezes as
pessoas vêm aqui, falam da quimioterapia, outras falam da doença, outra vem e
fura a gente, mas não fala de vida, de fé, de Deus pra gente. A palavra de Deus é
um conforto, é um alívio na vida da gente, principalmente quando a gente está
internada. Sabe por quê? Porque eleva os pensamentos da gente na nossa família,
nos nossos filhos, na nossa mãe, nos nossos sonhos, na nossa vida. (P6)
Foi possível apreender nas falas dos pacientes um profundo respeito pelas
manifestações de fé, derivadas das crenças religiosas. Desta forma, observa-se que este
posicionamento traduz uma necessidade de abertura e atenção aos mistérios espirituais e
dimensões existenciais da vida-morte, expressos no décimo elemento do Caritative Factors,
defendido por Watson – reconhecimento da existência de forças fenomenológicas-
existenciais-espirituais. A autora afirma que a manutenção da fé, o respeito à crença do
semelhante e a cura da ferida da alma são elementos essenciais no ato de conectar-se com o
outro (Watson, 2002). Concordo com Mathias (2007) quando diz que, sem qualquer
menosprezo à ciência, a fé e a esperança aumentam a capacidade do ser para os diferentes
enfrentamentos da vida.
O respeito à crença do paciente também se correlaciona com o que Watson comenta
como campo fenomenológico, um dos principais conceitos de sua teoria. Para a autora, ao
analisar o campo fenomenológico das experiências humanas na saúde e na doença, tais como
pensamentos, sensações e crenças espirituais, o enfermeiro terá dados necessários para
entender a condição humana e, consequentemente, buscar estratégias para atender às
necessidades espirituais dos seus pacientes (WATSON, 2002).
Observa-se que o discurso dos pacientes ratifica que, no período de adoecimento e
internação, a crença religiosa se une à racionalidade da medicina moderna; essa união é vista
pelos pacientes como uma maneira de se encontrar a paz e solucionar seus problemas. Isso
reitera as palavras de Watson, quando ela diz que sua teoria transpessoal não rejeita a ciência,
82
mas lhe presta homenagem e constrói, com base nela, para poder expandi-la (WATSON,
2002).
Nessa linha argumentativa, outros autores citam o respeito às crenças espirituais e
religiosas como fonte de suporte do paciente. Sendo assim, Martins (2008) verificou que o
Sagrado tem um grande potencial vinculado à recuperação de pacientes; quando eles se
deparam com o sofrimento e doença, eles claramente podem buscar apoio na religião
(MARTINS, 2008).
Para as pessoas que seguem uma religião, muitas das doutrinas ou ensinamentos de
sua fé oferecem orientação moral e prática com relação a como promover, conservar ou
recuperar a saúde ou o bem-estar físico e emocional. Além das regras presentes nos
ensinamentos religiosos, a consideração do corpo humano como sagrado, frequentemente
presente nas mesmas, leva o crente a valorizar os cuidados de saúde (VASCONCELOS,
2010).
Justiniano (2003) afirma que, ao esculpir a realidade mediada pelo pensamento
religioso, o paciente encara a doença e busca explicações para ela transpondo a ciência; neste
sentido a crença religiosa passa a ter um papel de resignação na vida da pessoa doente,
contribuindo para a construção de pensamentos positivos relacionados à doença e ao
tratamento.
O apoio à crença religiosa e o incentivo à prática espiritual fortalecem a conexão com
o Sagrado. Nesse sentido, o paciente sente-se acolhido pela proteção de um Ser superior que o
acompanha e o ajuda a enfrentar os obstáculos da doença (KAOUPA et. al., 2007; SILVA;
ACKER, 2007).
Também foi verificado por Kubler-Ross (2005), Boff (2006) e Vasconcelos (2006)
que diante da doença é notável o apelo à religião por parte de pacientes e familiares, através
de promessas e orações que servem como fonte de esperança na sobrevivência do doente e
como forma de suportar a situação. Watson (2002) ressalta que a enfermagem deve adotar um
novo paradigma, transformador do cuidar-curar, superando a medicalização da saúde e das
experiências humanas e incluir a espiritualização da saúde e a cura interior (WATSON, 2002).
Concorda-se com Watson (2002) quando ela afirma que o agente de mudança na
condição de saúde do paciente não é o médico, nem o enfermeiro, nem a medicação, nem o
tratamento ou a tecnologia em si, mas os mecanismos pessoais, mentais-espirituais interiores
da pessoa que lhe permitem ser curada através de vários meios, internos ou externos; e a fé se
enquadra neste aspecto.
83
Eu sei que vocês estão muito ocupados com os afazeres, ou são poucos enfermeiros
e que não sobra tempo pra isso, falar sobre Deus. Mas assim, me desculpe, também
falta preparação. Nem todos estão preparados. Porque na verdade é uma coisa
muito séria. Vocês não podem chegar e falar da espiritualidade sem estar
preparadas pra isso (P2).
Aqui no hospital tem um padre que veio me visitar duas vezes. A gente se sente bem,
que Jesus tá nos protegendo. Algumas enfermeiras falam de Deus, mas poucas (P5).
espirituais. Isso pode ser resultado de restrições econômicas, quadro de pessoal precário e
cuidados de alta tecnologia, que forçam os enfermeiros a se concentrarem nas necessidades
biológicas (CAVENDISH et al, 2003; WILKINKSON & VAN LEUVEN, 2010).
Watson (2002) defende, entre os dez Caritative Factors, princípios elementares da
prática de Enfermagem, o Cultivo da Sensibilidade em Si e no Outro, isto é, habitar a
condição humana significa basicamente Sentir e envolve relacionamento com os outros,
consigo, com a natureza, com Deus ou um Poder Superior. Esta habilidade é desenvolvida a
partir dos estados emocionais e determina a intensidade do envolvimento do profissional nas
relações de cuidado (PENHA, 2012).
No discurso dos pacientes, as palavras igreja, religião, fiel, Deus e os verbos curar,
conversar, procurar evidenciaram a necessidade de os pacientes em apoiar-se em uma
religião ou mesmo buscarem uma congregação religiosa que os auxiliem nessa travessia da
doença para a cura. Essa busca pela religião torna-se uma maneira efetiva de ligar-se ao
Sagrado. Isso pode ser demonstrado nos relatos a seguir.
Todos os caminhos nos levam a Deus. Todas as religiões são escolas do espírito, da
alma. Então isso é muito importante pra gente, porque numa hora dessa que a gente
recebe um diagnóstico de que você está com câncer, é uma pancada na cabeça. E
foi na minha conversa com Deus, peguei os livros da minha igreja, comecei a ler e,
conversando com Deus, vi que não estava sozinha. Por isso nessa minha luta diária,
a minha ida à igreja me fortifica, sem essa busca na igreja a gente fica frágil (P2).
Deus vai tocar no meu coração pra eu procurar uma religião. Eu quero seguir. Eu
quero ser fiel a Deus. Na hora que eu tiver bom e puder calçar um sapato, por uma
roupa, pisar no chão...Aí com fé em Deus eu vou procurar uma religião pra mim e
agradecer (P4).
Quando eu entrei no hospital eu achava que não ia ficar nem um mês. Mas a minha
fé, de Deus e das correntes de oração da minha igreja me ajudaram. Muita gente da
minha igreja pediu por mim e eu creio que foi isso que me deu força pra eu estar
bem até aqui (P5).
Watson (2002) afirma que os profissionais de saúde têm estado tão divididos na
percepção do físico-material versus espírito-não-físico, que apenas agora começaram a se
preocupar com as necessidades da alma (Watson, 2002). E a religião tem se tornado cada vez
mais um instrumento de explicações que ajudam a dar significado ao processo saúde-doença,
85
Assim, para um paciente fragilizado, pertencer a um grupo religioso pode ser um fator
importante de sobrevivência e de solução de problemas para os quais a sociedade não
responde (ALVES; JUNGES; LÓPEZ, 2010).
Nesta categoria, verbos como apoiar, dedicar, cuidar, ajudar, salvar bem como
palavras como abençoados, dedicados, coração bom permitiram dizer que, apesar de os
pacientes não terem tido oportunidades de discutir sobre religiosidade/espiritualidade com os
profissionais de saúde, eles os veem como enviados do Sagrado para cuidar deles e curá-los.
Os relatos a seguir demonstram essa confiança que os pacientes transferem aos seus
cuidadores:
Eu tive muita sorte com esse hospital aqui. Fui muito abençoada por todos que me
apoiam aqui, por todos que me carregam, sabe. Aqui sinto esse aconchego maior de
poder falar sobre mim, sobre Deus (P1).
Eu queria que vocês continuassem assim como vocês são, tendo um coração bom
pra ajudar quem precisa. Peço que uma pessoa nunca faça uma coisa, um favor pra
outro com o coração fechado, com maldade. Que venha ajudar e cuidar da gente
com o coração aberto, não com má vontade. Se não puder cuidar da gente com
carinho, chama outro, mas não faça de má vontade (P3).
Ao observar o dendograma desse eixo, verificou-se que esta categoria possui uma
elevada importância para os pacientes, pois representou mais da metade do percentual
atribuído ao eixo. Nesse sentido, talvez os enfermeiros ainda não se deram conta da
importância que eles têm para os pacientes.
A necessidade de estar presente é fundamental para que essa relação se fortaleça e as
necessidades espirituais dos pacientes sejam atendidas. Não adianta os enfermeiros delegarem
essa função apenas aos voluntários e religiosos que visitam o hospital; o estar presente do
enfermeiro é primordial, pois são considerados pelos pacientes como enviados do Sagrado, do
Divino.
87
Assim, o papel dos profissionais de saúde precisa ir além dos cuidados; deve incluir o
emocional e o espiritual. O trabalho emocional é um processo pelo qual os profissionais, e em
especial os enfermeiros, conseguem regular as suas emoções, gerindo-as de uma forma
saudável para cuidar da pessoa holisticamente (WATSON, 2006).
Vilelas (2013) ressalta a importância de os profissionais compreenderem e
interpretarem as necessidades físicas das pessoas, responderem às suas necessidades
emocionais, ou seja, gerir as próprias emoções, para melhor compreendê-las. E este olhar
além das necessidades biológicas gera sentimentos de fé, amor e gratidão por parte dos
pacientes. Por sua vez, conseguem acessar as necessidades espirituais.
Os enfermeiros, vistos como “enviados” do Sagrado, corroboram com o que Watson
(2002) define como Processo Real de Cuidar. Para a autora, se a ocasião de cuidar é
transpessoal, permitirá a presença do espírito do enfermeiro e do paciente; isso faz com que
amplie e expanda a espiritualidade de ambos e se desenvolvam as potencialidades humanas
(WATSON, 2002).
O profissional de enfermagem difere do paciente ou de um amigo, uma vez que ajuda
a integrar a experiência subjetiva e as emoções, com uma visão objetiva externa da situação.
O envolvimento pessoal, num espaço profissional, não é uma alternativa para outros tipos de
envolvimento. É uma síntese de envolvimento, a participação de todo o eu, usando toda a
dimensão da pessoa como uma fonte no relacionamento profissional (WATSON, 2002).
Watson defende que esta consciência de cuidar, de energia e de conexão, de um para o
outro, tem um potencial de curar. O enfermeiro adepto ao cuidado transpessoal entende que o
cuidar é, sobretudo, um modo de ser; aquele que cuida tem pensamentos de alta frequência e a
consciência de cuidar. Esta frequência mais elevada da consciência de cuidar, por sua vez,
ajuda a tranquilizar, a acalmar ou a potenciar o todo de uma pessoa com um sistema de baixa
frequência - o que frequentemente é o caso se alguém está doente ou em sofrimento
(WATSON, 2002a).
Além de modular a frequência da consciência do cuidar, o enfermeiro precisa estar
presente no ato de cuidar. Watson (2002a) destaca três níveis de presença. O primeiro nível é
a presença física – “estar presente” para o outro; isso implica verdadeiro contato corpo-corpo;
envolve o toque, o abraço. O segundo nível é a presença psicológica – é o “estar com o
outro”; é a ligação mente-mente; inclui uma intenção consciente para estar disponível para o
outro; envolve a escuta ativa, a congruência, a consideração incondicional e a aceitação sem
julgar. E o terceiro nível é a presença terapêutica – intimamente alinhada com a consciência
de cuidar, atenção, intencionalidade e cuidar transpessoal; incorpora a intencionalidade, a
88
abertura, a comunhão, o amar e a conexão. Este nível de presença e o estar presente deste
“enviado do Sagrado” pode ser traduzido em presença transpessoal (WATSON, 2002a).
Depois dessa minha doença, minha fé tá dobrada. Eu tô sozinho, mas sei que Deus
tá me protegendo como se eu tivesse em casa. Ele que não me deixou cair. É a fé em
Deus em primeiro lugar (P4).
Deus na minha vida é muito importante. Deus foi quem me curou. E agora eu sei
que ele não vai me deixar (choro). Tenho a imagem Dele bem grandona no meu
quarto. Toda vez que eu olho pra Ele eu vejo a luz vindo em cima de mim. Sei que é
através Dele que eu vou ser curada (P6).
Ao discutir o significado de “fé”, Costa (2013) afirma que é um dom divino que,
acolhido pelo homem, envolve todo o seu ser e promove a entrega incondicional e obediente
àquele que é a fonte de salvação. No âmbito da Psicologia, Amatuzzi (2003) define a fé como
aquilo que efetivamente anima a vida de uma pessoa ou lhe dá um sentido; numa visão
antropológica, a fé é uma relação com o fim visado e que dinamiza todo o processo de ir em
direção a ele; seria a determinação que dá toda energia ao agir (SEGUNDO, 1997).
Watson (2002a), ao discutir os sistemas de valores preconizados na teoria do cuidado
transpessoal, demonstrou um profundo respeito pela fé das pessoas; ela reconhece a existência
do Sagrado ou de um Poder Superior e sua influência no processo de cuidar e crescimento
interior. Porém, a ciência ocidental, a psicologia e mesmo a enfermagem têm lidado de forma
incipiente com o lado espiritual do homem (WATSON, 2002a).
Reiterando as ideias de Watson, Trentini et al. (2005) relatam que uma das formas de
enfrentamento da doença está no sentimento de fé em Deus. Para os autores, a fé é um
sentimento arraigado na cultura brasileira e torna-se tão necessária no processo de
adoecimento-cura quanto o tratamento medicamentoso (TRENTINI et al., 2005).
89
CONCLUSÃO
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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUÇÃO EM ENFERMAGEM
Você está sendo convidado(a) a participar de um projeto de pesquisa que visa compreender a
percepção dos enfermeiros sobre o papel da espiritualidade na integralidade do cuidado de
enfermagem.
Tal projeto visa, principalmente, conhecer como os enfermeiros avaliam e interpretam as
necessidades espirituais dos pacientes, compreender como os enfermeiros vivenciam a integralidade
do cuidado e conhecer a percepção dos pacientes sobre os cuidados de enfermagem em relação ao
atendimento de suas necessidades espirituais.
Como instrumentos de coleta, aplicaremos uma entrevista semiestruturada. No período da
coleta dos dados, o pesquisador observará a atuação da equipe de enfermagem e sua relação
interpessoal com os pacientes. Manteremos a sua identidade em segredo e não será possível
identificar a sua resposta na análise dos dados ou quando esses forem publicados, uma vez que será
dado tratamento genérico.
Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências da Saúde, sob o
parecer nº 714.467 de 09/07/2014, e nos comprometemos a desenvolver a pesquisa tal como foi
aprovada. Ainda assim, você pode se retirar dela, mesmo após ter dado o seu consentimento, bastando
para isto comunicar a um dos pesquisadores. Os dados serão publicados na forma de artigos
científicos, comunicações ou painéis em eventos ou revistas científicas, independente de quais forem
os resultados.
Para que você possa participar desta pesquisa, é necessário que assine as duas vias deste
termo, retendo consigo uma cópia. E, caso deseje mais informações sobre a pesquisa ou mesmo fazer
alguma denúncia, reclamação ou sugestão, por favor, entre em contato com o pesquisador responsável,
Roberto Nascimento de Albuquerque, pelo número (61) 93025894 – celular, 32733807 (telefone do
Departamento de Enfermagem ou ainda no Comitê de Ética da Faculdade de Ciências da Saúde (61)
31071947.
Caso você se sinta motivado e queira participar desta pesquisa, pedimos que assine abaixo, no
espaço destinado ao sujeito da pesquisa, para que possamos usar as informações que você venha a nos
fornecer.
Os gastos necessários para sua participação na pesquisa serão assumidos pelos pesquisadores.
Fica também garantida a indenização em caso de danos, comprovadamente decorrentes da participação
na pesquisa, conforme decisão judicial ou extrajudicial.
Brasília, _____/_____/______
103
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FACULDADE DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUÇÃO EM ENFERMAGEM
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percepção dos enfermeiros sobre o papel da espiritualidade nos cuidados de enfermagem.
Tal projeto visa, principalmente, compreender como os enfermeiros avaliam e interpretam as
necessidades espirituais dos pacientes, compreender se os enfermeiros cuidam dos seus pacientes de
maneira integral e conhecer a percepção dos pacientes sobre os cuidados de enfermagem em relação
ao atendimento de suas necessidades espirituais.
Para coletarmos os dados para a pesquisa, faremos uma entrevista com você. Na entrevista
queremos ouvir e registrar as suas necessidades durante a sua internação no hospital. Manteremos a
sua identidade em segredo e não será possível identificar a sua resposta na análise dos dados ou
quando esses forem publicados, uma vez que seu nome não aparecerá na pesquisa.
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parecer nº 714.467 de 09/07/2014, e nos comprometemos a desenvolver a pesquisa tal como foi
aprovada. Ainda assim, você pode se retirar dela, mesmo após ter dado o seu consentimento, bastando
para isto comunicar a um dos pesquisadores. Os dados serão publicados na forma de artigos
científicos, comunicações ou painéis em eventos ou revistas científicas, independente de quais forem
os resultados.
Para que você possa participar desta pesquisa, é necessário que assine as duas vias deste
termo, ficando uma com você. E, caso deseje mais informações sobre a pesquisa ou mesmo fazer
alguma denúncia, reclamação ou sugestão, por favor, entre em contato com o pesquisador responsável,
Roberto Nascimento de Albuquerque, pelo número (61) 93025894 – celular, 32733807 (telefone do
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Religião/doutrina/crença:
( ) Ateu
( ) Sem religião, mas espiritualizado (acredita em Deus, mas não pertence a nenhuma
religião)
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