Citogenética

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Citogenética

Citogenética
Milton Muniz

Florianópolis, 2009.
Governo Federal Comissão Editorial Viviane Mara Woehl, Alexandre
Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva Verzani Nogueira, Milton Muniz
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Copyright © 2009 Universidade Federal de Santa Catarina. Biologia/EaD/ufsc


Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada sem a
prévia autorização, por escrito, da Universidade Federal de Santa Catarina.

M966c Muniz, Milton


Citogenética / Milton Muniz. – Florianópolis : BIOLOGIA/EAD/
UFSC, 2009.
126 p.

ISBN 978-85-61485-20-7

1.Citogenética – Ensino auxiliado por computador. 2. Biologia –


Estudo e ensino. I Título.
CDU: 575.1

Catalogação na fonte elaborada na DECTI da Biblioteca Universitária da


Universidade Federal de Santa Catarina.
Sumário

Apresentação........................................................................................ 9

1. Introdução à Citogenética............................................................13
Resumo............................................................................................................................... 23
Referências........................................................................................................................ 23

2. Cromossomos I...............................................................................25
2.1 Cromossomo dos Vírus............................................................................................. 29
2.2 Cromossomo dos Procariotos ............................................................................... 29
2.3 Epissomos................................................................................................................... 32
2.4 Cromossomo dos Eucariotos.................................................................................. 32
2.4.1 Componentes Químicos..............................................................................37
2.4.2 Cromossomo Mitótico em Metáfase.........................................................38
2.4.3 Cromossomo Meiótico Profásico...............................................................38
2.4.4 Cromossomo Plumoso................................................................................ 40
2.4.5 Cromossomo Politênico de Glândula Salivar.........................................41
2.4.6 Replicação, Transcrição e Tradução......................................................... 44
2.4.7 Condensação e Função dos Cromossomos.............................................47
2.4.8 Funções Cromossômicas............................................................................ 48
2.4.9 Sinapse........................................................................................................... 48
2.4.10 Permutação..................................................................................................49
2.4.11 Segregação...................................................................................................49
2.4.12 O Significado da Ligação...........................................................................49
2.4.13 Compensação de Dose...............................................................................50
2.4.14 Cromatina.....................................................................................................51
Resumo............................................................................................................................... 54
Referências........................................................................................................................ 54
3. Transmissão e Continuidade.........................................................57
3.1 Mitose . ........................................................................................................................ 60
3.2 Meiose e Gametogênese . ...................................................................................... 62
3.2.1 Meiose I........................................................................................................... 66
3.2.2 Leptóteno ou filamento fino.......................................................................70
3.2.3 Zigóteno ou filamento pareado................................................................71
3.2.4 Paquíteno ou filamento grosso..................................................................71
3.2.5 Diplóteno ou filamento duplo...................................................................71
3.2.6 Diacinese.........................................................................................................72
3.2.7 Metáfase I........................................................................................................72
3.2.8 Anáfase I..........................................................................................................72
3.2.9 Telófase I..........................................................................................................72
3.2.10 Meiose II ........................................................................................................73
3.3 Meiose e Genética Mendeliana...............................................................................74
3.4 Meiose, Ligação e Permuta......................................................................................74
3.4.1 Ordem Linear dos Genes e Distâncias no Mapa.....................................75
3.4.2 Interferência...................................................................................................75
3.4.3 As Bases Cromossômicas da Permutação...............................................76
3.4.4 Permutação Somática ou Mitótica...........................................................76
3.4.5 Prova Cromossômica da Permutação......................................................76
3.4.6 Acontecimentos Discrepantes na Permuta.............................................77
3.4.7 Posição e Frequência de Permuta..............................................................77
3.4.8 O Mecanismo da Permutação . .................................................................78
Resumo............................................................................................................................... 78
Referências........................................................................................................................ 78

4. Cromossomos II..............................................................................81
4.1 Estrutura...................................................................................................................... 83
4.1.1 Deleções ou Deficiências..............................................................................83
4.1.2 Duplicações....................................................................................................85
4.1.3 Inversões......................................................................................................... 86
4.1.4 Translocação...................................................................................................89
4.1.5 Isocromossomos........................................................................................... 90
4.1.6 Cromossomos em Anel.................................................................................91
Resumo............................................................................................................................... 92
Referências........................................................................................................................ 92

5. Número Cromossômico.................................................................95
5.1 Variações...................................................................................................................... 97
5.1.1 Aneuploidia.....................................................................................................97
5.1.2 Trissomias....................................................................................................... 98
5.1.3 Monossomias................................................................................................ 98
5.1.4 Aneuploidia dos Cromossomos Sexuais.................................................. 98
5.1.5 Cromossomos acessórios.......................................................................... 100
5.1.6 Fusão Cêntrica..............................................................................................101
5.1.7 Euploidia........................................................................................................102
Resumo.............................................................................................................................104
Referências......................................................................................................................104

6. Cromossomos Humanos em Metáfase......................................107


6.1 Alterações nos Cromossomos Autossômicos....................................................113
6.1.1 Síndrome de Down......................................................................................116
6.1.2 Síndrome de Edwards.................................................................................119
6.1.3 Síndrome de Patau.....................................................................................120
6.1.4 Síndrome do 5p–..........................................................................................120
6.2 Determinação do Sexo, Diferenciação Sexual e
Alteração dos Cromossomos Sexuais............................................................... 121
6.2.1 Diferenciação Sexual Normal e Anômala.
Alterações dos Cromossomos Sexuais....................................................121
6.2.2 Estado Sexualmente Neutro.....................................................................122
6.2.3Diferenciação Sexual Masculina..............................................................122
6.2.4 Diferenciação Sexual Feminina...............................................................122
6.2.5 Determinação Anômala do Sexo............................................................122
6.2.6 Pseudo-Hermafroditismo Feminino.......................................................123
6.2.7 Pseudo-Hermafroditismo Masculino.....................................................123
6.2.8 Hermafroditismo.........................................................................................123
6.2.9 Síndrome de Turner....................................................................................123
6.2.10 Síndrome de Klinefelter............................................................................123
6.3 Cromossomo Mitocondrial................................................................................... 123
Resumo............................................................................................................................. 124
Referências...................................................................................................................... 125
Apresentação

A Citogenética faz uma ponte de conhecimento entre os fundamentos mi-


croscópicos da Citologia e os princípios das mutações, da variabilidade, da
permuta e da segregação Genética, tendo como paradigma os cromossomos
como estrutura física no transporte dos genes na mitose, na meiose e na repro-
dução. A Citogenética estuda a estrutura e o comportamento dos cromosso-
mos na transmissão da informação genética de uma célula a outra e na repro-
dução dos organismos.

É uma ciência em desenvolvimento, visto que conhecemos muito pouco da


nossa fauna e flora quanto da informação sobre os cromossomos quanto ao
número, estrutura e evolução. É uma tarefa que cabe a nós brasileiros, preo-
cupados com o conhecimento e a utilização sustentável dos nossos recursos
genéticos, de flora e fauna.

Sua dedicação, como estudante desta disciplina, pode e deve estimular os


seus alunos a perceberem a enorme tarefa que deveremos executar num futu-
ro próximo, conhecer e reconhecer o valor da nossa biodiversidade. Essa tarefa
é enorme e cabe, também, aos Citogeneticistas.

No plano da saúde, a Citogenética Humana é uma forte aliada no diagnós-


tico de muitas doenças difíceis de serem avaliadas por outros métodos, as cro-
mossomopatias. Dentre estas, destacam-se, as síndromes relacionadas com
as trissomias dos cromossomos 21, 18, 13, 5, X e Y, entre outros.

Para a obtenção de cromossomos para estudo, destacam-se duas aborda-


gens: a preparação direta, a partir do esmagamento de células, e a cultura in
vitro.

Este livro é o elo físico entre você, aluno, e os responsáveis pela implemen-
tação da Citogenética, dentro do currículo do curso, tutores e professor. Espero
uma interação produtiva entre nós. Ele faz uma abordagem no plano horizon-
tal da Citogenética mostrando a estrutura dos cromossomos e suas alterações
numéricas e estruturais e suas repercussões no desenvolvimento do organis-
mo. Discute os processos de divisão celular, nos eucariotos: mitose e meiose,
como mecanismos de formação, desenvolvimento e de transmissão da infor-
mação genética de uma célula à outra e, de uma geração à outra, mostrando
as condições normais e suas alterações. Aborda, igualmente, os cromossomos
nos procariotos e mitocôndrias. E indica a constituição cromossômica em dife-
rentes espécies de organismos.

Milton Muniz
c a p í t u lo 1
c a p í t u lo 1
Introdução à Citogenética
Você terá acesso a uma abordagem histórica que procura
nos envolver com os Cientistas precursores da Biologia, da
Genética que levaram ao desenvolvimento do conhecimen-
to e a sistematização da Citogenética, como Ciência. É uma
abordagem horizontal, na expectativa de que o estudante a
aprofunde como complemento de sua aprendizagem.
Introdução à Citogenética 15

A Citogenética é a ciência que estuda os cromossomos. Ela se


estruturou pela fusão dos conhecimentos da Citologia com os
princípios da Genética, tendo a célula como objeto de investiga-
ção e, os mecanismos da herança e da continuidade genética como
método.
A citologia hoje referenciada como Biologia Celular, de-
senvolveu-se a partir da observação de estruturas biológicas,
ao microscópio, por Robert HOOKE (1635-1703), ver a Fi-
gura 1.1.
Essa linha de investigação teve continuidade com os traba-
lhos de Nehemiah GREW (1641-1712) e Marcello MALPI-
GHI (1628-1694). Estas observações levaram Matthias Jakob
SCHLEIDEN (1804-1881) e Friedrich Theodor SCHWANN
(1810-1882) a concluir, em 1838-1839, que a célula é a uni-
dade básica da vida, e a definir como teoria celular. Em 1858,
Robert REMAK (1815-1865) e Rudolf Ludwig Karl VIR-
CHOW (1821-1902) desenvolveram o conceito de que toda
célula provém da divisão de células pré-existentes.

Figura 1.1 – Estrutura do súber Este conceito foi fundamental para o fortalecimento do pen-
observada e desenhada, ao samento científico, desenvolvendo a compreensão do processo
microscópio, por Robert Hooke,
em 1665, que as denominou de continuidade celular, princípio que Charles Robert DARWIN
células quando este era tecido (1809-1882), em 1859, havia demonstrado para as espécies. Em
vivo, segundo Robert Hook
2009.
1870, Walther FLEMMING (1843-1905) descreveu como croma-
tina a porção intensamente corada no núcleo das células. Ele deu o
nome de mitose (do grego, filamento), ao processo de divisão ce-
16 Citogenética

lular e passou a ser considerado como o fundador da Citogenética,


ver a Figura 1.2. Em 1875, Oscar HERTWIG (1849-1922) descre-
veu a fecundação e em 1888, Wilhelm WALDEYER (1836-1921),
cunhou o termo cromossomo.
Em 1885, August Friedrich Leopold WEISMANN (1834-1914)
previu a formação dos gametas, através de um diferente tipo de
divisão celular, no qual o número de cromossomos nas células des-
cendentes seria reduzido à metade. O que foi confirmado pelos Figura 1.2 - Cromossomas
numa célula da glândula
trabalhos de: Theodor Heinrich BOVERI (1849-1922), Edouard salivária de Chironimus,
van BENEDEN (1846-1912) e HERTWIG, demonstrando a for- desenhados por Walther
Flemming, em 1882,
mação de quatro células descendentes a partir de uma só divisão segundo Walther Flemming,
cromossômica, na divisão celular que leva a formação de gametas, 2009.
o que se define como meiose, isto é, a produção de células haploi-
des a partir de células diploides, ver a Figura 1.3.

2n 2n

1
2n 2n 2n 2n
G
2n 2n 2n 2n 2n 2n 2n 2n

2n C1 2n

P1
3 n’’

n’’ n’’ C2 n’’

n n n n E1 n n
n P2
O n
n n n n E2

Figura 1.3 – Meiose: representando os processos de espermatogênes e ovulogênese. Redesenhada de


Beiguelman, Figura 5.21.
Introdução à Citogenética 17

Em outro sentido, mas com o mesmo objetivo, traçar a linha do


tempo que levou ao desenvolvimento concomitante da Genética,
Evolução e, consequentemente, da Citogenética, a Genética Mo-
lecular poderá ser uma atividade prazerosa e instrutiva. Em 1859,
Charles Robert DARWIN (1809-1882) e Alfred Russel WALLACE
(1823-1913) publicaram, de comum acordo, a teoria da Evolução
pela seleção natural, isto é, os seres vivos hoje existentes teriam
uma origem comum. Posteriormente, Darwin, baseando-se na
farta documentação geológica e fossilífera que produziu, publicou
o livro “A Origem das Espécies”. Este livro é, para muitos, a obra
de maior valor heurístico já produzida na Biologia. Em 1865, Gre-
gor Johann MENDEL (1822-1884) formulou as leis da hereditarie-
dade, hoje, conhecidas como leis de Mendel, que fundamentam a
Genética. A Evolução e a Genética se complementam e continuam
produzindo conhecimentos fundamentais sobre os seres vivos e
seus processos vitais como, por exemplo, o Projeto Genoma (que
hoje já não é mais projeto). Existem vários genomas já com os res-
pectivos DNAs sequenciados. Sabemos, hoje, que cada molécula
de DNA é empacotada em um único cromossomo. Estes são o ob-
jeto de estudo dos Citogeneticistas.
Em 1875, Louis PASTEUR (1822-1895), trabalhando com mi-
croorganismos, refutou, definitivamente, a crença na geração es-
pontânea que dificultava a compreensão sobre a origem comum
Sobre Geração Espontânea dos seres vivos atuais, postulada por Darwin e fundamental para
ver: <http://www.ufmt.br/
bionet/conteudos/15.07.04/ o desenvolvimento do conhecimento sobre a evolução. Em 1885,
falha_abiog.htm>. Friedrich Leopold August WEISMANN (1834-1914) postulou
que as células germinativas forneciam os materiais básicos da he-
rança, óvulo e espermatozoide. Por volta de 1890, Friedrich MIES-
CHER (1844-1895) descobriu o DNA. Em 1900, quando foram
redescobertas, para a comunidade científica, as leis de Mendel, os
conhecimentos sobre a célula, o núcleo e os cromossomos já eram
significativos e consolidados. Entre 1902 e 1903, Walter Stanbo-
rough SUTTON (1877-1916) e BOVERI formularam a teoria cro-
mossômica da herança. Em 1924, Robert FEULGEN (1884-1955)
demonstrou que o DNA se localizava nos cromossomos.
Em 1928, Frederick GRIFFITH (1881-1941) demonstrou que as
proteínas não poderia ser o material genético e descreveu o princí-
18 Citogenética

pio da transformação genética, através de um experimento que se


tornou clássico na Biologia, conhecido hoje como Experimento de
Griffith, ver a Figura 1.4.
Em 1944, Oswald Theodore AVERY (1877-1955), Colin Munro
MACLEOD (1909-1972) e Maclyn MCCARTY (1911-2005) con-
cluíram que o DNA é material hereditário, ver a Figura 1.5. Em
1953, James Dewey WATSON (1928), Francis Harry Compton
CRICK (1916-2004) e Maurice Hugh Frederick WILKINS (1916-
2004) evidenciaram a estrutura do DNA e seu modelo de repli-
cação como sendo semiconservativo, isto é, em cada molécula de
DNA produzida na fase S, o ciclo celular tem uma fita velha, da
molécula anterior, e uma fita nova, produzida por replicação do
DNA, naquela fase, ver a Figura 1.6.
O experimento de Matthew Stanley MESELSON (1930-) e
Franklin William STAHL (1929-), mostra que o DNA replica-se
abrindo as fitas da dupla hélice sintetizando duas novas fitas com-
plementares a cada uma das fitas separadas da dupla hélice origi-
nal, ver a Figura 1.7, confirmando que modelo de replicação do
DNA é semiconservativo, modelo este proposto por Watson e Cri-
ck. Alfred HERSHEY (1908-1997) e Martha CHASE (1927-2003)
usando fósforo e enxofre radioativos, ver a Figura 1.8, reafirma-
ram que o DNA é o material genético.
Para sintetizar esta introdução histórica e apresentar o objeto
de sua aprendizagem, a Citogenética, você deverá rever, como re-
capitulação, os experimentos que foram apresentados na Genética
Molecular, e na ordem indicada aqui: experimento de GRIFFITH;
experimento de HERSHEY e CHASE; estrutura da molécula de
DNA de WATSON e CRICK; e experimento de MESELSON e
STAHL. O conhecimento sobre os procedimentos e o significado
destes quatro experimentos facilitará muito o seu desempenho na
discussão sobre a Citogenética. Esses experimentos foram discuti-
dos por você em Genética Molecular.
Outro aspecto que lhe será requerido é a mobilização da sua
capacidade de abstração sobre o conceito de unidade e dimensões
da célula, que você discutiu em Biologia Celular. A Citogenética
de cada organismo considerado é abordada através de uma úni-
Introdução à Citogenética 19

Pneumococos
avirulentos
(acapsulados) Mistura de
células virulentas mortas Morte
pelo calor e células vivas
não virulentas Biópsia

Pneumococos Princípio
avirulentos transformante Recuperação de células
(capsulados) cápsulas virulentas vivas
mortos pelo calor

Capsuladas acapsuladas Capsuladas


mortas vivas vivas

Figura 1.4 - Experimento de Griffth: o qual demonstra a Transformação Genética e indica que a proteína não é
material genético como se acreditava. Original de Mirsky, Scientific American, 188 (2): 47-57, 1952 Redesenhado de
Costa, Figura 2.1

Pneumococos Precipitado
Fracionamento químico
capsulados alcoólico
mortos pelo calor rico em DNA

“Princípio
transformante”

Figura 1.5 - Experimento Aparecimento de Transformação


de Avery, Macleod células transformantes
e Mccarty: o qual capsuladas e patogênicas
demonstra que o DNA Cultura de
é o material genético. pneumococos
Redesenhado de Costa, acapsulados
Figura 2.2.
20 Citogenética

AT
CG
CG

TA
CG
GC

TA
TA Molécula Mãe
AT

TA
AT
CG

TA
T A
G C
C G
C G
A T
T A
GC
GC
GC AT
GC
AT TA
TA Fita Nova
Fita Nova
GC GC
TA AT
TA TA
GC CG

AT
AT GC
GC Velhas GC
GC TA
TA

TA TA
AT AT Figura 1.6 - Modelo da molécula de DNA
CG CG proposto por Watson e Crick. Original
Novas
de Watson, The Molecular Biology of
TA the Gene, W.A. Benjamin Inc. 1965.
TA CG
CG Redesenhado de Costa, Figura 2.10.

Percebeu o longo caminho percorrido pelos cientistas para que


você saiba hoje o que é o material genético e como ele funciona?
Uma outra possibilidade, em tempos de internet, é ler biografias
de cientistas acima referidos (confira os endereços eletrônicos que
estão nas Referências desse livro).
Introdução à Citogenética 21

Infecção

Agitação (liquidificador)

Figura 1.7 - Experimento


de Meselson e Stahl: o qual
demonstra que o modelo E. coli contém
de replicação do DNA é radiação tipo 32P Cápsulas dos fagos
semiconservativo. Redesenhado contêm radiação tipo 35S
de Costa, Figura 7.2.

14N / 15N

14N /14N 15N /15N 15N 15N DNA parental

15N 14N 14N 15N 1ª geração

2ª geração

3ª geração
Menor densidade Maior densidade

Sedimentação

Figura 1.8 – Experimento de Hershey e Chase: o qual reafirma que o DNA é o material genético. Redesenhado
de Costa, Figura 2.3.
22 Citogenética

ca célula ou com uma sequência delas. A Citogenética tem sido


de grande valia na definição do perfil cromossômico tanto nos
procariotos quanto no eucariotos. Os primeiros pela simplicidade
de seu cromossomo, constituído de uma única molécula de DNA
circular, ver a Figura 1.9, e o processo de propagação por divisão
binária, os demais, de propagação assexuada, apresentam uma re-
dundância cromossômica, ao longo das gerações. Logo antecipo,
são fundamentais para a Citogenética os cromossomos, a divisão
celular e o processo de propagação através da produção de game-
tas, ou não.
pol B
sul B
pol C
*le A
*uv
xA
r

po 95 0 5
lA
uv 90 10
rD rB
rec phhr A
F 85 15 p vr B*
u
80 20
sul A*

75 25 umu C*
umu D*
tag
70 30

65 35

60 40 h
xt im A
55 45 hA *
rec B

50
c
C
re

uvlrk
cA

a B
ung

sbc
*re

C*
lig A

* Genes reguladores pela proteína LexA

Figura 1.9 - Cromossomo circular de bactéria. Redesenhado de Costa, figura 9.19.

Indiquei da necessidade do seu empenho sobre a capacidade


de abstração. Ver uma célula exige uma formidável tecnologia que
amplia a capacidade de visão do observador, devido a suas dimen-
sões reduzidas. Logo o núcleo é uma subestrutura da célula e, os
cromossomos são estruturas sub-nucleares, por se encontrarem
em seu interior. Ver, observar e analisar cromossomos exige uma
tecnologia mais sofisticada ainda.
Introdução à Citogenética 23

As limitações tecnológicas, devido às reduzidas dimensões dos


cromossomos, vem sendo resolvidas pelos pesquisadores, técni-
cos ou cientistas e estudiosos, com o desenvolvimento de novos
microscópios, como ferramentas ópticas e, no desenvolvimento
de métodos citoquímicos os quais vem permitindo o desenvolvi-
mento da Citogenética como Ciência. O conhecimento científico
e aprendizagem escolar não se fazem por saltos, eles são processos
contínuos.
Leitura auxiliar recomendada: Brody, David Eliot e Brody, Ar-
nold R. - As Sete Maiores Descobertas Científicas da História e
seus Autores. Companhia da Letras. Neste livro, os autores apre-
sentam de forma muito didática a origem e o desenvolvimento
histórico da ciência contemporânea.

Resumo
Conhecemos os cientistas que desenvolveram e vem desenvol-
vendo os conhecimentos, e suas contribuições em Ciências Bioló-
gicas são de fundamental importância no processo de aprendiza-
gem. Repare, não se deu apenas uma abordagem da Citogenética,
objeto do presente livro, ela foi além, abrindo diversas janelas para
o conhecimento dos seres vivos, de forma ampla. Partiu-se da pri-
meira observação da célula, das primeiras visualizações dos cro-
mossomos, concluindo que o DNA é o material genético. Cada
cromátide cromossômica é portadora de uma única molécula de
DNA, nos eucariotos. Nos procariotos, o cromossomo é a própria
molécula de DNA.

Referências
Costa, Sérgio Olavo Pinto (organizador). Genética Molecular e
de Microorganismos. São Paulo: Manole, 1987.
SWANSON, Carl Pontius; MERZ, Timothy; YOUNG, William J.
Citogenética. São Paulo: Edusp, 1969.
c a p í t u lo 2
c a p í t u lo 2
Cromossomos I
Neste capítulo, faremos uma abordagem descritiva dos cro-
mossomos dos procariotos e eucariotos e, uma exposição dos
principais eventos envolvidos na Citogenética, como tipos de
cromossomos, funções cromossômicas, permutação, segrega-
ção, compensação de dose e cromatina.
Cromossomos I 27

“A vida na Terra surgiu há mais ou menos 3,8 bilhões


de anos. Os primeiros organismos foram procarion-
tes (bactérias), encontrados como fósseis em estratos
que se formaram há 3,5 bilhões de anos. Durante o
bilhão de anos que se seguiu, a vida na Terra consis-
tiu apenas em procariontes”. (Mayr, 2009)

O estudo dos cromossomos está indissociavelmente atrelado


ao conhecimento da divisão celular em células somáticas. Eles são
identificáveis na forma de unidades durante a mitose termo criado
por FLEMMING em 1880. Mitose é o processo de divisão celular
que leva a formação de células diploides, isto é, com um conjunto
cromossômico oriundo do pai e outro da mãe, a partir de células
igualmente diploides nos eucariotos. O conhecimento sobre a mito-
se permitiu compreender o ciclo celular. Em 1888, von WAL-
DEYER-HARTZ cunhou o termo cromossomo. O período que
G1
separa uma mitose da outra no ciclo celular é conhecido como
interfase, e o núcleo é chamado de núcleo interfásico, neste pe-
ríodo. O ciclo celular tem seu início ao final de uma mitose se-
M
guido pelas fases G1, S, G2 e outra mitose, o sistema é cíclico,
ver a Figura 2.1. Ele forma um processo de sucessões, durante
G2 o desenvolvimento de um organismo, após a fecundação, até
sua morte, nas células somáticas, ou atinge as células germi-
S nativas desenvolvendo a meiose, que é o processo de formação
de células haploides a partir de células diploides. As células
Figura 2.1 – Ciclo celular: fases. haploides são os gametas que através da fecundação formarão
Redesenhado de Beiguelman,
figura 3.1. um novo indivíduo e, consequentemente, as gerações futuras.
28 Citogenética

Os experimentos da Genética Molecular que você viu por re- C


Cromossomo
capitulação, mostraram-lhe que o DNA é o material genético, por
confiarmos no trabalho científico e na nossa capacidade racional:
podemos assumir que isso é verdadeiro. E mais, cada cromossomo
carrega uma única molécula de DNA em sua estrutura. Logo a Centrômero
C trôm
Cent m
porção genética da citogenética está, em grande medida, nos cro-
mossomos. Por isso, a teoria cromossômica da herança genética,
desenvolvida colaborativamente por diferentes pesquisadores, nas
primeiras décadas do século XX, foi consolidada em 1915 por Tho-
mas Hunt MORGAN (1866-1945), Alfred Henry STURTEVANT
(1891-1970), Hermann Joseph MULLER (1890-1967), Calvin Bla-
ckman BRIDGES (1889-1938). Esta consolidação permitiu inter- Cromátidee
pretar corretamente como a informação genética é transmitida.
Figura 2.2 – Cromossomo
Não são apenas os genes que são transportados nos cromossomos, metafásico típico, mostrando
mas o genoma como um todo, de uma geração a outra, ver a Fi- o centrômero e as duas
gura 2.2. cromátides. Redesenhado de
Alberts, figura 4.52.
Conhecer o cromossomo, compreender e explicar o seu com-
portamento na divisão celular e na reprodução são atribuições da
Citogenética. Os cromossomos se tornam unidades facilmente
identificáveis na metáfase.
Os resultados dos experimentos de Mendel levaram a conclusão
de que a transmissão das características, de uma geração à outra
nos organismos de reprodução sexuada e de fecundação cruzada,
se fazia por partículas e, não por líquidos miscíveis, como era acei-
to na comunidade científica da época, as quais ele chamou de fato-
res. Em 1909, Wilhelm Ludvig JOHANNSEN (1857-1927) criou, a
partir do grego, o termo gene, “que dá nascimento a”, e os concei-
tos de genótipo como conjunto de genes e fenótipo às caracterís-
ticas observáveis. Na genética clássica, ou genética mendeliana, o
conceito de gene pode ser definido como unidade de segregação,
unidade de permuta, unidade de mutação, o que persistiu até a
compreensão de que o DNA é o material genético. George Wells
BEADLE (1903-1989) e Edward Lawrie TATUM (1909-1975), em
1941, cunharam a expressão de um-gene-uma-enzima, partindo
da hipótese formulada por Archibald Edward GARROD (1857-
1936), em 1909, de que os genes seriam responsáveis pela produ-
ção das enzimas.
Cromossomos I 29

Em 1961, François JACOB (1920-) e Jacques Lucien MONOD


(1910-1976), desenvolveram a hipótese do operon. O operon é
formado pelos genes promotor, operador e genes estruturais, para
explicar a produção de lactose em Escherichia coli, ver a Figura 2.3.
Genes estruturais são responsáveis pela produção do RNA mensa-
geiro que codifica a sequência de aminoácidos na produção de um
polipeptídio ou proteína. A hipótese do operon representou uma
ampliação do conceito de um-gene-uma-enzima, formulado por
BEADLE E TATUM.

R(i) P O E,(z) E2,(y) E2,(a)

Operon

Figura 2.3 – Genes regulalador R, operador O e estruturais E1, E2, E3 do operon da


lactose em Escherichia coli. Redesenhados de Azevedo, figura 9.6.

2.1 Cromossomo dos Vírus


Existem diferentes tipos de vírus. Os vírus que atacam bacté-
rias recebem o nome de bacteriófagos: em geral, eles possuem uma
molécula de DNA, ou tendo como material genético o RNA em
fita simples ou dupla. Eles têm só DNA ou só RNA como material
genético em um cromossomo linear ou circular, ver a Figura 2.4.
O DNA do bacteriófago l é circular, ver a Figura 2.5.
Os vírus que tem o RNA como material genético são denomina-
dos de retrovirus e são responsáveis pelo desencadeamento de al-
Figura 2.4 – Cromossomo do
guns tipos de câncer, e causadores de algumas doenças, entre elas
fago T4. Original de C.A. Thomas
Jr. Redesenhado de Swanson, a AIDS.
figura 2.3.

2.2 Cromossomo dos Procariotos


As bactérias e algas verde-azuladas podem ser classificadas
como procariotos pela inexistência de membrana nuclear, mito-
côndrias e aparelho mitótico definido. As bactérias apresentam o
seu DNA em um único cromossomo circular, ver a Figura 2.6.
30 Citogenética

Gene A Gene R
5’
terminal m CCCGCCGCTGGA
5’
GGGCGGCGACCT terminal m’

5’
A TC
G C m
G A
T G
C CG G
G CG
C G G 5’
m’ C
G C
CC
Endonuclease (reconhece a
sequência de 12 pares apenas)
Ligase

A R

Figura 2.5 – Cromossomo circular do fago λ. Redesenhado de Azevedo, fig 4.21.

o pq r
n
l m
l l
P.C.
f
l

A B C

Figura 2.6 – Cromossomo circular de bactéria, mostrando a replicação do DNA. Redesenhado de Swanson, figura 2.5.
Cromossomos I 31

O cromossomo do procarioto é constituído, fundamentalmen-


te, de uma única fita ou molécula de DNA, executando as codifica-
ções auto reguladas, necessárias e suficientes para sua reprodução,
manutenção e desenvolvimento. Nos eucariotos, ao contrário, eles
apresentam uma estrutura, morfologia, tamanho e número muito
diferenciado e, aparentemente, executam as codificações corres-
pondentes às dos procariotos. Essas mudanças são acompanhadas
da existência de núcleo, membrana nuclear, aparelho mitótico res-
ponsável pela continuidade genética e um aparelho meiótico res-
ponsável pela transmissão da informação genética de uma geração
à outra, na reprodução.
Os genes nas bactérias estão contidos em uma única molécula
de DNA normalmente circular, ver a Figura 2.7. Ele está associado
a proteínas diferentes das presentes nos cromossomos dos euca-
riotos. É assim chamado de “cromossomo” bacteriano. Sua estru-
tura é diferente da observada nos cromossomos eucarióticos. Ela é
menos conhecida nas arqueobactérias. Logo, nossa discussão dará
prioridade sobre a estrutura dos cromossomos dos eucariotos.

Origem da
replicação

Figura 2.7 - Cromossomo


circular de bactéria, mostrando A
sequências gênicas na
replicação do DNA e, ao centro Escherichia coli k-12
fotomicrografia de bactérias. B 4.639.221 pares de nucleotídeos
Originais: (A) Toni Brain em
Science Photo Library; (B) F. R. Término da
Blattner et al: Science 277: 1453- replicação
1462, 1997.
32 Citogenética

2.3 Epissomos
Os epissomos são formados por material genético, constituído
de filamentos duplos de DNA, podendo ocorrer autonomamente
no citoplasma, ou de forma integrada ao DNA da bactéria. Quan-
do integrado ao cromossomo da bactéria ele replica como o cro-
mossomo da bactéria. Quando autônomo, ele replica independen-
temente do hospedeiro. Os epissomos são formas particulares dos
plasmídios, os quais são elementos de herança extra cromossômi-
ca em microorganismos.

2.4 Cromossomo dos Eucariotos


O cromossomo, como unidade, é capaz de replicar, transcrever,
segregar, mutar, diferenciar, condensar, parear, permutar. Ele sin-
tetiza uma estratégia evolutiva que reduz o número de unidades de
segregação, aumenta a eficiência na manutenção do balanço gêni-
co dando uma disposição linear das unidades genéticas, os genes,
mantendo-os independentes.
Nos eucariotos, o DNA concentra-se, em grande parte, empa-
cotado nos cromossomos, que durante a interfase estão no núcleo
da célula. A principal função do DNA é expressa na função gênica.
Esta função já era uma velha conhecida dos pesquisadores quando
se descobriu que os genes são constituídos de DNA. Isto é, cada
gene é um seguimento definido de uma molécula de DNA que for-
ma vários genes, simultaneamente. Cada cromossomo é portador
de uma única molécula de DNA e esta é portadora de vários genes.
Logo, a Citogenética fornece valiosas informações sobre o DNA
quanto à replicação, transcrição, tradução e regulação, além da sua
transmissão de uma geração à outra.
A fusão dos gametas, na fecundação, restabelece a fase diploide
da espécie definindo o início do desenvolvimento ontogênico do
novo organismo, que se faz por mitoses sucessivas, que levam a
diferenciação formando tecidos e órgãos. A diferenciação celular
leva a formação de um número significativo de células, vinte ou
mais, que exercem atividades fisiológicas, morfológicas e de re-
gulação, diferentes em cada tecido ou órgão. Todas essas diferen-
Cromossomos I 33

ciações ontogênicas, morfológicas, fisiológicas e de regulação são


definidas, em última análise, pelos genes. Esses, por sua vez como
as células, assumem funções variadas, o que os levam a ter uma
adjetivação bastante extensa, trinta ou mais. Descrevê-las e inter-
pretá-las, nesse momento, passa ser uma tarefa discente.
O conhecimento sobre os cromossomos se refere, em geral, a
estrutura e função, arquitetura e morfologia. A estrutura e fun-
ção reproduzem o princípio da Biologia e são interdependentes.
A arquitetura evidencia suas propriedades e comportamento no
transcorrer do ciclo celular. A morfologia varia com o ciclo celu-
lar no desempenho de atividades específicas. Os cromossomos se
replicam, promovem o metabolismo através da transcrição em di-
ferentes RNAs, tendo como resultante sua tradução em diferentes
proteínas.
A estrutura é composta por uma molécula de DNA muito longa
e proteínas associadas que contem parte (ou toda) da informação
genética de um organismo. É especialmente evidente em células
de plantas e animais durante a meiose ou mitose, quanto cada cro-
mossomo é condensado, formando uma estrutura semelhante a
um carretel, compacta e visível sob o microscópio ótico.
O DNA é, termicamente, a molécula mais estável dos cromosso-
mos e a ela associam-se proteínas conhecidas como histonas e pro-
taminas, definindo a estrutura do cromossomo, ver a Figura 2.8.
Nos organismos diploides, de reprodução sexuada e fecundação
cruzada, os cromossomos ocorrem aos pares, sendo um de origem
materna e outro de origem paterna. Eles são conhecidos como
cromossomos homólogos, ao longo dos quais estão os genes em
sequência linear. Cada cromossomo, íntegro, tem o mesmo núme-
ro de genes e cada indivíduo tem, na mesma posição do cromosso-
mo, dois genes, podendo ser iguais, isto é, a mesma forma genética
no mesmo loco, ao que se chama homozigose, ou formas genéticas
diferentes no mesmo loco, ao que se chama heterozigose. E, nas
duas condições de homozigose ou heterozigose, elas respondem
pela mesma função, definindo uma característica ou fenótipo.
Quando as formas genéticas, de um mesmo loco, são diferentes,
cada uma delas recebe o nome de alelo. Quando um determinado
34 Citogenética

Região curta da 2 nm
dupla hélice do DNA

“contas num cordão”


11 nm
forma de cromatina

30nm da cromatina fibra de


nucleossomos compactados 30 nm

Região do cromossomo
numa forma estendida 300 nm

Região condensada 700 nm


do cromossomo

Centrômero

Cromossomo 1400 nm
mitótico inteiro

Resultado final: Cada molécula de DNA é


empacotada em um cromossomo mitótico
que é 10 mil vezes maior

Figura 2.8 – DNA: mostrando como se dá o seu empacotamento no cromossomo.


Redesenhado de Alberts, figura 4.55.

loco gênico tem mais de dois alelos, cada um deles com frequência
igual, ou superior, a 1% diz-se que o loco é polimórfico. Ao contrá-
rio, quando o loco tem apenas uma forma genética com frequência
superior a 1% diz-se que o loco é monomórfico. As formas genéti-
cas diferentes que ocupam o mesmo loco e apresentam frequência
inferior a 1%, na população, são consideradas como sendo varian-
tes raras.
Cromossomos I 35

O acomodamento do genoma em um número, definido e fixo,


de cromossomos também difere entre as espécies eucarióticas. O
quadro 2.1 mostra o número diploide em diferentes espécies de
vegetais e animais. Mesmo espécies muito relacionadas com geno-
mas de tamanho similar, podem apresentar número e tamanhos
cromossômicos muito distintos. Assim, não há uma regra simples
para o número cromossômico, a complexidade da espécie e o ta-
manho total do genoma. Ao contrário, o genoma e os cromosso-
mos das espécies atuais foram moldados por uma história parti-
cular de eventos genéticos aparentemente ao acaso, nos quais a
pressão seletiva atuou.

Espécies 2n
Bixa orellana (urucu) 14
Passiflora edulis (maracujá) 18
Victoria amazônica (vitória régia) 20
Caesalpinia echinata (pau-brasil) 24
Araucária angustifólia (pinheiro-do-paraná) 26
Vegetais

Hevea brasiliensis (seringueira) 36


Manihot esculenta (mandioca) 36
Anacardium occidentale (caju) 42
Gossypium hirsutum (algodão) 52
Artocarpus integrifólia (jaca) 56
Saccharum officinarum (cana-de-açúcar) 80
Ipomoea batatas (batata-doce) 90
Culex pipiens (muriçoca, pernilongo) 6
Musca domesticus (mosca) 12
Schistosoma mansoni (esquistossomo) 16
Didelphis albiventris (gambá) 22
Periplaneta americana (barata) 32
Animais

Biomphalaria glabrata (caramujo) 36


Bothrops jararaca (cobra jararaca) 36
Heliconius erato (borboleta) 42
Arapaima gigas (pirarucu) 56
Cavea aperea (preá) 64
Canis familiares (cachorro) 78
Gallus domesticus (galinha) 78

Quadro 2.1 – Número diploide de cromossomos em vegetais e animais – Modificado de


Guerra, quadro 1.1.
36 Citogenética

Centrômero, ou constrição primária, é a região heterocromáti-


ca do cromossomo que, no ciclo celular após a fase S, e durante a
divisão celular até a anáfase, mantém as cromátides-irmãs unidas.
Do centrômero partem as fibras do fuso acromático que ligadas ao
centríolo promoverão a separação das cromátides irmãs e, conse-
quentemente, a divisão do próprio centrômero, compondo o cro-
mossomo no próximo ciclo celular até a próxima fase S, quando
será novamente duplicado, ver a Figura 2.9 que representa a mi-
tose entre duas interfases. A Figura 2.10, obtida por microscopia
de varredura, representa um cromossomo em metáfase, visuali-
zando suas duas cromátides. Na continuidade da divisão celular,
da metáfase para a anáfase, as fibras do fuso acromático ligam o
centrômero de cada cromossomo ao centríolo. A inserção das fi-
Figura 2.9 (abaixo) – Mitose
bras ao centrômero é visualizada na Figura 2.11. A morfologia de
separada por duas interfases
um cromossomo em metáfase, destacando suas duas cromátides, é do ciclo celular em eucariotos.
representada na Figura 2.2. Redesenhada de Alberts, figura
4.20.

Fuso
miótico

Transcrição, Mitose Divisão


Tradução, celular
Replicação do
Cromossomos cromossomo Cromossomos
interfásicos mióticos
Interfase Fase M Interfase

Hetero centromérica
Figura 2.10 (esquerda)
Cromossomo com as
cromátides duplicadas. Cinetócoro
Microtúbulos no centrômero
Original de Terry D. do fuso
Allen, copiado de
Alberts, figura 4.21B.

Figura 2.11 (direita)


Centrômero: desenho
mostrando a inserção Placa interna do
das fibras. Original cinetócoro, formada Heterocromatina formada
de T.D. Murphy e G.H. pelo cinetócoro e por pelo DNA satélite α
Karpen, Cell 93:317- proteínas ligadas ao
320. Redesenhado de DNA satélite α Placa externa do cinetócoro
Alberts, figura 4.50B.
1 µm formada por proteínas específicas
Cromossomos I 37

2.4.1 Componentes Químicos


Além do DNA, o cromossomo dos eucariotos tem RNA, histo-
na, protamina, proteína residual, lipídio, cálcio, magnésio e possi-
velmente ferro e enzimas como a DNA polimerase. A molécula do
DNA tem presença constante após a fecundação e, após cada ciclo
celular, tem continuidade de forma semiconservativa, isto é, a cada
replicação da molécula formando duas novas moléculas, cada uma
destas tem uma fita nova sintetizada e uma fita velha, original do
ciclo celular anterior, ver a Figura 2.12 a e b. Enquanto isso, as
demais moléculas são substituídas e alteradas quantitativa e qua-
litativamente, ao longo dos vários ciclos celulares, por moléculas
novas. O RNA deve estar envolvido na transferência de informa-
ção para o citoplasma e na regulação metabólica. A quantidade de
DNA dobra durante a interfase e a células germinativas chegam
Figura 2.12 (abaixo) ater ¼ dessas quantidades. O número cromossômico altera entre
Replicação do DNA:
(A)esquema do modelo
células diploides e haploides de um mesmo organismo, e, aproxi-
semiconservativo, madamente, metade deste nas células germinativas, ou gametas,
redesenhada de Alberts, de um mesmo indivíduo, mantidas as condições diploide e haploi-
figura 5.5;
(B) fotomicrografia de de, respectivamente.
uma molécula circular
destacando as forquilhas
de replicação, original
de Jerome Vinograd.
Modificadas de Alberts,
figura 5.6.
Replicação

Replicação

forquilhas de
replicação

Replicação

A B
38 Citogenética

2.4.2 Cromossomo Mitótico em Metáfase x

O cromossomo em metáfase mostra as cromátides individuali- x


a
zadas e unidas pelo centrômero devido a sua grande condensação,
em relação às demais fases do ciclo celular. São diferentes do que
x
se observa na interfase, podendo ser identificadas, estruturalmen- b
te, constrições primária e, eventualmente, secundária e satélite, se
x
houver, quando observados em microscopia ótica. Eles apresen- c
tam o centrômero em uma constrição primária dividindo-o, mor-
fologicamente, em dois braços, o que permite classifica-lo em me-
d
tacentrico, submetacentrico e acrocentrico. A exceção fica para o
cromossomo telocêntrico que tem um único braço, isto é, a porção Figura 2.13 – Cromossomos:
terminal de uma extremidade da cromátide é próprio centrômero morfologia em relação a posição
do centrômero.
e, da outra, o telômero, ver a Figura 2.13. (a) Metacêntrico;
(b) submetacêntrico;
Ao centrômero fixam-se as fibras ou túbulos, ligando-o aos pó- (c) acrocêntrico;
los do fuso, orientando sua migração e separação na anáfase, ver (d) telocêntico.
a Figura 2.14.

2.4.3 Cromossomo Meiótico Profásico.


A meiose é combinação de duas divisões celula-
res simultâneas que levam a formação dos gametas.
Estes são células haploides formadas a partir de cé-
lulas diploides. A primeira é a meiose I ou divisão
reducional, na qual as cromátides estão duplicadas
e, o centrômero não. A segunda é a meiose II ou di- A
Célula em divisão Célula em repouso
visão equacional, na qual ocorre a divisão do cen-
trômero, ver a Figura 1.3 (do cap 1).
A prófase I é longa, em comparação ao tempo de
duração da meiose. No transcorrer desta prófase,
ocorre pareamento dos cromossomos homólogos
duplicados, recombinação genética entre cromá-
tides não-irmãs, forma o complexo sinaptotênico
por cada par de homólogos duplicados, ver a Figura
2.15. Ela é dividida em cinco estágios, em sequên- B
10 µm
cia: leptóteno, formado pela condensação dos cro-
Figura 2.14 – Metáfase e interfase: fotomicrografia
mossomos homólogos duplicados; zigóteno, forma- em a; desenho em b. Original de Peter Shaw,
do pelo bivalente de cromátides-irmã, iniciando a reproduzido e redesenhado de Alberts, figura 4.1.
Cromossomos I 39

Elemento Filamento formação do complexo sinaptotênico; paquíteno,


transverso
Nódulo de
central formado pela sinapse completa; diplóteno, for-
recombinação mado pela identificação do quiasmata; diacinese,
formado pela recomposição dos núcleos celulares,
ver a Figura 2.16 A e B.

Região Figura 2.15 (esquerda) Complexo


100 nm sinaptotênico – Redesenhado de Alberts,
central
figura 20.13.
Eixos proteicos
(elementos laterais)

Cromatina de
cromátides-irmãs Cromatina de Figura 2.16 (abaixo) a, Eventos da prófase
1 e 2 (paternas) cromátides-irmãs I da meiose – Redesenhados de Alberts,
3 e 4 (maternas) figura 20.12; b, fotomicrografia de
cromossomos plumosos. Modificada de
Alberts, figura 4.36.

A
LEPTÓTENO PAQUÍTENO

Cromátide1
Cromátides-irmãs
paternas Desassociação dos
Formação da região lixos das proteínas
Cromátide 2 central do complexo (elementos laterais)
sinaptotênico
Cromátide 3
Cromátides-irmãs
maternas
Cromátide 4
INTERFASE ZIGÓTENO DIPLÓTENO
SEGUIDO PELA DIACINESE

0,1 mm 20 µm
40 Citogenética

2.4.4 Cromossomo Plumoso


Os cromossomos plumosos foram observados, em 1882, em
anfíbios, por Walther Flemming (1843-1905). Eles apresentam
a cromatina estendida para fora do eixo central formando alças
laterais, o que lhes confere o nome, onde ocorre a transcrição e ou-
tras atividades cromossômicas. Aparecem no diplóteno em várias
espécies de animais, como peixes, aves, répteis, insetos e anfíbios,
inclusive em ovócitos humanos. O Quadro 2.2 mostra diferentes
espécies em que ocorrem cromossomos plumosos. Ocorre, ain-
da, em células meióticas de fungos, algas e plantas superiores. A
Figura 2.17 é uma fotomicrografia de cromossomos plumosos e,
podemos ver ainda a estrutura de um cromossomo plumoso.

Espécies Estágio da meiose


Acetabularia mediterranea
Incerto
(alga verde)
Coprinus lagopus (fungo) Paquíteno a diplóteno
Zea mays (milho) Diacinese na antera
Loligo vulgaris (lula) Diplóteno da fêmea
Início da prófase I a diplóteno do
Drosophila hydei (drosófila)
macho (restrito ao Y)
Grillus domesticus (grilo) Paquíteno do macho e da fêmea
Schistocerca paranensis (gafanhoto) Paquíteno a diplóteno do macho
Echinaster sepositus
Diplóteno da fêmea
(estrela-do-mar)
Xenopus laevis (sapo-de-garra) Diplóteno da fêmea
Crocodilus niloticus (crocodilo) Diplóteno da fêmea
Columba livia (pombo) Diplóteno da fêmea
Macaca mulatta (macaco) Paquíteno a diplóteno do macho
Homo sapiens (homem) Diplóteno da fêmea

Quadro 2.2 – Espécies em que ocorrem cromossomos plumosos. Modificado de Guerra,


quadro 6.2.

Os cromossomos plumosos representam um recurso evolutivo


importante, que é a amplificação da capacidade de transcrição, isto
é, quando determinado gene necessita produzir um grande núme-
ro de cópias de RNA, em células do tecido germinativo e, em fases
específicas do ciclo reprodutivo.
Cromossomos I 41

0,5 mm
Cromossomos plumosos
pareados

Quiasma

Alça

Cromômero
Eixo

Região de um
único cromossomo

Cromatina
estendida
em uma alça
10 µm

Pequena região
de um único
cromossomo
mostrando as Eixo
cromátides irmãs
Cromatina unindo
Cromômeros formados a partir
Figura 2.17 – Estrutura de um cromômeros adjacentes
de cromatina altamente
cromossomo plumoso. Redesenhada condensada
de Alberts, figura 4.37.

2.4.5 Cromossomo Politênico de Glândula Salivar


Os cromossomos politênicos são os maiores cromossomos co-
nhecidos. Foram descobertos, em 1881, por Edouard Gerard BAL-
Sobre dípteros ver: BIANI (1823-1899), em células de glândulas salivares de dípteros.
<http://www.icb.ufmg.br/ São facilmente visualizados em glândulas salivares de larvas e al-
biq/prodap/2000/diptera/
dipteros.html>. guns dípteros, ver a Figura 2.18.
42 Citogenética

Braço direito do
cromossomo 3
Cromossomo X Cromossomos
mitóticos normais
na mesma escala

Cromossomo 4
Região onde dois
cromossomos homólogos
estão separados
Cromocentro

Braço
direito do
cromossomo 2

Braço
Braço esquerdo do
esquerdo do cromossomo 2
cromossomo 3

20 µm

Figura 2.18 – Cromossomos politênicos. Original de T.S. Painter. J. Hered. 25:465-476,


1934. Redesenhados de Alberts, figura 4.38

Os cromossomos politênicos são produzidos pela endorepli-


cação. Neste processo, a molécula de DNA passa por replicações
sucessivas, sem a correspondente divisão celular, multiplicando o
número de cópias de genes em fases definidas do desenvolvimen-
to ontogênico. Os cromossomos politênicos aumentam a quanti-
dade de moléculas de DNA dentro de uma mesma célula. A poli-
tenia, através dos cromossomos politênicos, é muito estudada em
Cromossomos I 43

glândulas salivares de larvas Drosophila. Eles são facilmente visu-


alizados, possibilitando a comparação dos pares de homólogos,
permitindo aos citogeneticistas mapear vários genes em Droso-
phila, por serem facilmente obtidos, a partir células de glândulas
salivares de insetos. Crodowaldo PAVAN (1919-2009) em 1952,
observando os cromossomos politênicos na mosca Rynchosciara
angelae, ver a Figura 2.19, demonstrou que, em determinados te-
cidos de organismos vivos, certos genes não funcionam. Até en-
tão, acreditava-se que todas as células tinham a mesma quantida-
de de DNA. PAVAN derrubou esse paradigma científico quando
demonstrou que em alguns cromossomos o DNA se multiplica e
em outros não. Pavan foi o primeiro cientista a propor o fenôme-
no de amplificação do DNA.

I II III IV I II III IV
c
-b d

I II III IV
abc defg abc defg abcdefg abcde

b d
d
20µ

Figura 2.19 – Cromossomo


politênico em Rynchosciara:
ampliação. Redesenhado de
Pavan, figura 18.
44 Citogenética

Os maiores cromossomos politênicos são observados na mosca


Rhynchosciara. A identificação se faz pela ocorrência de bandas
cromáticas e acromáticas alternadas ao longo do cromossomo.

2.4.6 Replicação, Transcrição e Tradução


Replicação é o processo pelo qual uma molécula de DNA produz
outra molécula de DNA. Ela ocorre nos procariôtos e eucariôtos e
representa a continuidade da informação genética entre uma cé-
lula e outra, que por consequência, representa a continuidade das
espécies ao longo das sucessivas gerações. Nas células de procari-
ôtos, ela é a fase S do ciclo celular e ocorre no núcleo. O modelo de
replicação, que ocorre na maioria dos organismos é o semiconser-
vativo, proposto por Watson e Crick, em 1953, quando propuseram
o modelo de dupla hélice para o DNA, ver a Figura 2.20.
A replicação foi descrita, em detalhes, para procariotos e euca-
riotos, no capítulo II de Genética Molecular do presente curso.
Transcrição é o processo pelo qual a molécula de DNA se trans-
creve em uma molécula de mRNA (mensageiro), através do qual
transfere a informação genética, contida no DNA, ao sítio de sín-
tese proteica. O mRNA é produto da transcrição gênica em uma
fita única de bases nitrogenadas complementar a uma das fitas do
DNA, na qual a timina (T) é substituída pela uracila (U). Nos eu-
cariotos, a transcrição ocorre no núcleo e o mRNA é produzido,
como você já estudou em Genética Molecular, em sequências de
íntrons e éxons, de forma intercalada, quando transportado ao ci-
toplasma sofre um processo de maturação, perdendo os segmen-
tos íntrons, unindo os seguimentos éxons que irão constituir no
mRNA propriamente dito, ou maduro. O gene transcrito em um
mRNA recebe a denominação de gene estrutural. Existem, ainda,
RNA transportador, tRNA, RNA ribossômico, rRNA, RNA de in-
terferência ou regulador, iRNA, ver a Figura 2.21.
A transcrição foi descrita, em detalhes, no capítulo III de Gené-
tica Molecular do presente Curso.
Tradução é o processo pelo qual o DNA produz um polipeptí-
dio através do mRNA e o sítio de síntese proteica. O mRNA é lido
no sítio de síntese proteica, em sequências de três bases nitrogena-
Cromossomos I 45

Sentido da síntese 5’ 3’
A B
Filamento molde 3’
Forquilha de
5’ 5’ duplicação
Replicação descontínua
Filamento contínuo 3’ 5’
3’
3’
Movimento da forquilha
5’

Sentido da síntese 3’ 5’ 3’ 5’

Figura 2.20 – DNA; replicação semiconservativa. Redesenhadas: (A) Griffiths, figura 7.16; (B) Azevedo, figura 6.13.

A Cadeia não molde Cadeia molde


do gene 1 RNA do gene 2


3´ TA G C C C ATAG 5´
CGGGUAU
UA AU
C G
5´ CGGAUGCA 3´

C
T 3´
A

G C C T A C G
T


Filamento molde Filamento não molde RNA
RNA RNA
do gene 1 do gene 2 polimerase
polimerase

Gene 1 Gene 2

B 3´
S
P 5´ Acréscimo na extremidade 3´da cadeia
U 3´ S P S P S P S P S P S P S P 5´

A C G G A U G

Cadeia A T G C C T A C
molde
de DNA 5´ P S P S P S P S P S P S P S P S 3´

C Transcrição Tradução
DNA RNA Proteína

Replicação

Figura 2.21 – (A-B) Transcrição. Redesenhada de Griffiths, figura 8.5; (C) Tradução. Redesenhada de Thompson.
46 Citogenética

das, formando a unidade do código genético, o códon. Sua leitu-


ra se dá por três bases complementares, o anticódon presente no
tRNA quando este já está carregado com o aminoácido codificável
pelo códon. O aminoácido é inserido na sequência codificado pelo
DNA, formando o polipeptídio ou proteína.
O conjunto de códons que codifica uma proteína forma o códi-
go genético. Esse é quase universal, isto é, se aplica em quase todos
os organismos, no sequenciamento dos aminoácidos na proteína,
ver a Figura 2.22.

C A
C G A
T T T T C G A T T A
C Molde de DNA
A A A A G C T A A T
C G T
G C G T
U

RNA
U

A polimerase
mRNA G
U U C
U U

Para o fen arg


citoplasma
P ser P ile
Complexos RNAt-AA
A G
A G C
A
A G C U A A
U U U U C G A U U C G C A A A

No ribossomo

Figura 2.22 – Síntese proteica. Redesenhada de Thompson, fig 3.14.

A tradução foi descrita no capítulo III da Genética Molecular do


presente Curso.
É atribuída aos processos de replicação, transcrição e tradução
a denominação de dogma central da biologia. Esta denominação
deve ser assumida com cautela, pois em Ciência recorrer a ideia de
“dogma” é, no mínimo contraditório. É importante compreender
as possibilidades que o modelo oferece, por exemplo, a estratégia
evolutiva usada pelos retrovírus, ou seja, os vírus cujo material ge-
nético é RNA e não DNA. A replicação é o processo pelo qual a
Cromossomos I 47

molécula de DNA produz outra molécula de DNA, enquanto que


a transcrição é a produção do mRNA pela por uma das fitas da
molécula de DNA, e tradução é a produção de um polipeptídio
pelo encadeamento de uma sequência de aminoácidos nos ribos-
somos, para compreender esse processo, ver a Figura 2.21B.

2.4.7 Condensação e Função dos Cromossomos


A morfologia dos cromossomos varia de acordo com estágio do
ciclo celular, mitótico ou meiótico. A condensação dos cromosso-
mos, nos eucariotos, é variável e progressiva a partir da fase G1,
atingindo o seu maior valor na metáfase de células somáticas e na
metáfase meiótica de células germinativas.
A condensação está relacionada com a atividade funcional do
Sobre corpúsculo de Barr cromossomo como mostram os cromossomos politênicos, cro-
acessar: <http://psique.unip.
vilabol.uol.com.br/ mossomos plumosos e na cromatina ou corpúsculo de Barr nos
texto_bio2.htm>. mamíferos placentários.
A inativação do cromossomo X leva a forma-
ção do corpúsculo de Barr, descrito por Murray
Zigoto
Llewellyn Barr (1908-1995) e Ewart G. Ber-
XpXm
tram em 1949, estudando células nervosas de
Primeira gatos e outros mamíferos observaram que os nú-
XpXm XpXm
clivagem cleos corados nas células femininas apresentavam
uma estrutura intensamente corada, o que não
Inativação
Xp Xp
acontecia com o núcleo das células masculinas,
aleatória Xm Xm
do X com igual tratamento. Logo as fêmeas eram cor-
púsculo de Barr positivas, e os machos negativos.
Xp Xm Xm Xp Estudos posteriores indicaram que o corpúsculo
de Barr, conhecido, também, como cromatina se-
Mosaico
feminino xual do X, e devido à inativação de um dos cro-
adulto mossomos X como mecanismo de compensação
de dose. Esse mecanismo foi esclarecido pelos
trabalhos de Mary Frances Lyon (1925-), Lian-
ne Russell (-), Ernest Beutler (1928-2008)
e Susumo Ohno (1928-2000), realizados de for-
ma independente, e foi denominado de hipótese
Figura 2.23 – Inativação do cromossomo X. de Lyon. A inativação do cromossomo X é mos-
Redesenhada de Thompson, figura 5.16. trada em mosaico na Figura 2.23.
48 Citogenética

2.4.8 Funções Cromossômicas


A distribuição de vários genes em uma estrutu-
ra única, os cromossomos, é uma estratégia evo-
5
lutiva que permite move-los, simultaneamente, na
divisão celular mitótica e meiótica nos eucariotos.
A isso se chama sintenia, isto é, vários genes estão
juntos em um mesmo cromossomo. Aos genes de
um mesmo cromossomo, que na meiose segregam 4
juntos, chama-se ligação. Esse é um conceito rela-
tivo, dependente da frequência de permutas que
ocorrem entre cromátides homólogas e o segmen-
to de genes considerados. Aos genes próximos, em
um mesmo cromossomo, entre os quais não ocor-
3
re permuta, são denominados genes ligados. Eles
formam os blocos de ligação, segregando como se
fosse um único gene. Do ponto de vista evolutivo,
estas variações têm grande significado na meiose.
No estágio de pareamento meiótico dos cro- 2
mossomos homólogos pode ocorrer crossing-over,
permuta ou sobrecruzamento. Este evento envolve
a troca de segmentos entre cromátides homólogas,
introduzindo variabilidade genética através da re-
produção sexuada, pela produção de descendentes 1

recombinantes, diferentes das configurações gené-


ticas dos pais. A Figura 2.24 mostra várias possibi- a
b
lidades de permuta.
Figura 2.24 – Permuta. Redesenhada de
Beiguelman, figura 5.7.
2.4.9 Sinapse
A sinapse é caracterizada pelo efetivo pareamento dos cro-
mossomos homólogos na meiose. O pareamento ocorre entre as
cromátides homólogas não irmãs. É um fenômeno observável ao
microscópio ótico, recebe o nome de complexo sinaptotênico. A
sinapse permite a troca de segmentos entre os cromossomos ho-
mólogos. Ela é uma importante fonte de variabilidade genética,
permitindo o aparecimento, nos descendentes, de tipos recombi-
nantes, isto é, portadores de informação genética nova, não pre-
sente nos tipos parentais.
Cromossomos I 49

2.4.10 Permutação
A permutação é a troca de segmentos de cromátides não irmãs
de cromossomos homólogos, durante a meiose, alterando a confi-
guração dos blocos de ligação e produzindo tipos recombinantes
diferentes das configurações paternas. Nem todas as espécies pos-
suem esse mecanismo de recombinação, e mesmo dentro de uma
espécie os diferentes gêneros ou mesmo partes cromossômicas fo-
gem da recombinação.
As permutações possibilitam a construção de mapas genéticos,
isto é, medir as distâncias relativas entre genes ligados, medidos
pela frequência de fenótipos recombinantes entre os descendentes.

2.4.11 Segregação
Na mitose e na meiose os cromossomos de origem paterna e
materna distribuem-se, ao acaso, nas células descendentes. Esse
processo é conhecido como segregação cromossômica na divisão
celular. Este processo permite diferentes configurações genotípicas
entre os descendentes de um mesmo casal, o conceito pode ser
estendido a cromossomos, gametas, genes, fenótipos e genótipos,
dependendo da abordagem que se faz.

2.4.12 O Significado da Ligação


Dois genes muito próximos entre si, em um mesmo cromosso-
mo, seguem juntos em um mesmo gameta ao final da meiose.
A probabilidade de dois genes, presentes em um mesmo cro-
mossomo, permanecerem juntos durante a meiose é dependente
da distância física que os separa. Quanto maior for distância, maior
será a probabilidade deles se separarem na meiose. Se dois genes
estiverem, no mesmo cromossomo, muito próximos, não ocorrerá
permutação entre eles, consequentemente, permanecerão juntos e
segregarão como se fosse um único gene. A este fenômeno dá-se
a denominação de genes ligados. Na espécie humana existem 24
grupos de ligação, correspondentes aos 24 cromossomos. Existem
22 grupos de ligação dos cromossomos autossômicos e dois gru-
pos de ligação correspondentes aos dois cromossomos sexuais.
50 Citogenética

Comprimento físico em Comprimento genético


Grupo de ligação é diferente do conceito de mil pares de bases (kb) em centimorgans (cM)
genes ligados. Genes ligados estão sempre no cdc 24
mesmo grupo de ligação. A recíproca poderá
cdc 19
não ser verdadeira, dois genes podem estar no
mesmo grupo de ligação a uma grande distancia,
que se comportarão, na meiose, como se estives- cdc 24 mak 16
se em grupos de ligação diferentes. A análise da cdc 19

frequência de recombinação entre genes permi- cys3


te a construção de mapas genéticos. A unidade mak 16
spo 7
de distância entre dois genes é o centimorgam,
cys 3 0 centrômero
cM, que corresponde a 1% de probabilidade de spo 7 cdc 15
dois genes se separarem por um evento de re-
combinação, na meiose. Um grupo de ligação
cdc 15
pode apresentar mais de 100 cM, indicando a
ocorrência de permutas duplas. Genes ligados
são genes próximos que segregam como uma FLO 1
FLO 1
unidade. Uma outra maneira de construir mapa
pholl
genético é medir a co-herdabilidade de marca-
dores de DNA, a Figura 2.25 compara as duas 240 51
metodologias de construção de mapas genéticos.
Figura 2.25 – Mapas: físico e genético comparados.
Redesenhados de Alberts, figura 20.14.
2.4.13 Compensação de Dose
A quantidade de produto gênico tem uma relação direta com
o número de genes autossômicos responsáveis pela formação do
produto. Isso não se aplica aos cromossomos sexuais do sexo ho-
mogamético. O que se observa é que o sexo homogamético, isto é,
aquele em que os cromossomos sexuais são iguais, produz a mes-
ma quantidade de produto que é produzida no sexo heterogamé-
tico, isto é, aquele em que os cromossomos sexuais são diferentes.
A esse processo chama-se compensação de doso. No caso da es-
pécie humana, a compensação de dose é feita pela inativação do
cromossomo X, que aparece nas células interfásicas na forma de
10 µm
cromatina X, ou cromatina de Barr, ou seja, pela inativação de um
dos cromossomos X na mulher, ver a Figura 2.26. Figura 2.26 – Cromatina de
Barr. Original de H.e. Dawes
et al., Science 284:1800-
1804, 1999.
Cromossomos I 51

2.4.14 Cromatina
O empacotamento do DNA em cromossomo estabelece algu-
mas propriedades que se tornaram fundamental na investigação
científica. Uma delas é sua afinidade por corantes específicos e
vem desta afinidade o termo cromatina, do grego chroma, nome
a que se dá ao complexo DNA e proteínas. A unidade básica da
cromatina é nucleossomo, constituído de DNA que envolve em
duas voltas o octâmero de histonas. Octâmero é constituído de
duas subunidades de quatro histonas, cada uma com quatro histo-
nas. Em núcleos interfásicos distinguem-se dois tipos de cromati-
na: heterocromatina e eucromatina, ver a Figura 2.27. A diferença
entre eucromatina e heterocromatina é o reflexo no grau de con-
densação do DNA no cromossomo, e a consequente afinidade por
corantes.

Eucromatina
Eucromatina representa regiões cromossômicas que coram nor-
malmente, na qual se encontram genes normalmente funcionan-
tes. A Figura 2.28 mostra um conjunto cromossômico, a Figura
2.29 mostra um único cromossomo, ambas destacam, as regiões
eucromáticas e heterocromáticas.

Heterocromatina
Heterocromatina é a região densamente corada do cromossomo
devido a grande condensação de DNA. Em células típicas de ma-
míferos, a heterocromatina representa, aproximadamente, 10% do
genoma, e está concentrada em muitas regiões dos cromossomos,
incluindo centrômeros e telômeros.
A maior parte do DNA da heterocromatina não contém genes.
Ela é responsável pelo funcionamento adequado de telômeros e
centrômeros e há diferentes tipos de cromatinas compactas com
funções e características diferentes.
Os cromossomos são mosaicos de formas distintas de croma-
tina. A heterocromatina pode se espalhar em uma grande região,
e contrair, diminuindo sua frequência. Esta variação é responsá-
vel pelo efeito variegado de posição. Ela protege a extremidade do
52 Citogenética

cromossomo, evitando que ela seja reconhecida como região de


quebra, além de regular o comprimento dos telômeros e auxiliar
no pareamento dos cromossomos na mitose.
A heterocromatina presente no entorno do centrômero, é deno-
minada heterocromatina centromérica.

Região curta de
dupla hélice do 2nm
DNA

Nucleossomos: a
unidade básica da 11 nm
cromatina

Fibra de cromatina
de nucleossomos 30 nm
compactados

Figura 2.27 – Cromatina: estrutura. Original de P.J. Horn e C.L. Peterson.


Science 297:1827, 2002. Redesenhadas de Griffiths, figura 10.29.
Cromossomos I 53

5
9 LII
12 3
11 9SI
2

7 8SI 10
4
1 8I

A B

Figura 2.28 – Cromatina: eucromatina e


heterocromatina. Original de C.M. Rick,
Scientific Amerin, Inc. Redesenhadas de
Griffiths, figura 4.14.

Heterocromatina

Nucléolo

Organizador
nuclear

Centrômero

Eucromatina

Figura 2.29 – Cromatina: eucromatina,


heterocromatina e Nucléolo. Original
de P. Moens e L. Butler, Can. J. Genet.
Cytol. 5:364-370, 1963. Redesenhados de A B
Griffiths, figura 3.15.
54 Citogenética

Resumo
Foi feita, neste capítulo, uma descrição dos cromossomos dos
procariotos e eucariotos. Foram discutidos: componentes quími-
cos, cromossomos mitóticos, cromossomos meióticos profásicos,
cromossomos plumosos, cromossomos politênicos em glândulas
salivares de insetos. Demonstrou-se como é produzida a variabili-
dade genética através da permuta, recombinação e segregação na
gametogênese. Descreveu-se compensação, inativação cromossô-
mica, compensação de dose e cromatina.

Referências
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Martin; Roberts, Keith; Walter, Peter. Célula. Porto Alegre:
Artmed, 2007.
Arias, Gerardo. Em 1953 foi descoberta a estrutura do DNA.
Disponível em: <http://www.cnpt.embrapa.br/biblio/do/p_do44.
pdf>. Acesso em: 19 jan. 09.
Azevedo, João Lúcio. Genética de Microorganismos. Goiânia:
Editora da UFG, 1998.
Beiguelman, Bernardo. Citogenética Humana. Guanabara,
1986.
Griffiths, Anthony J. F.; Wessler, Susan R.; Lewontin,
Richard C.; Gelbart, William M.; Suzuki, David T.; Miller,
Jeffrey H. Introdução à Genética. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanaba-
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tica. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Genética, 2004.
Nussbaum, Robert L., McInnes, Roderick R.; Willard,
Huntington F.. Thompson e Thompson: Genética Médica. 6. ed.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002.
Cromossomos I 55

KASAHARA, S. Práticas de citogenética. Ribeirão Preto: Socie-


dade Brasileira de Genética, 2003. v. 1. [Série Cadernos].
SWANSON, Carl Pontius; MERZ, Timothy; YOUNG, William J.
Citogenética. São Paulo: USP, 1969.
c a p í t u lo 3
c a p í t u lo 3
Transmissão e Continuidade
Você estudará em detalhe os principais eventos da mitose,
da meiose, da gametogênese e da transmissão da informação
genética, aproveitando para tanto os processos de divisão ce-
lular: Mitose e Meiose.
Transmissão e Continuidade 59

“Depois de mais ou menos um bilhão de anos de vida


exclusivamente bacteriana na Terra, o evento que
talvez seja o mais importante da história da vida
ocorreu: o surgimento dos eucariontes. Estes diferem
marcadamente dos procariontes pelo fato de possuí-
rem um núcleo envolvido em uma membrana e que
contém cromossomos individuais. O surgimento do
primeiro eucarionte foi um passo evolutivo impor-
tante.” (Mayr, 2009).

Os processos de divisão celular levam à formação de duas célu-


las, geneticamente equivalentes, na mitose, e uma variedade de ga-
metas e esporos, na meiose. A mitose mantém a estabilidade e con-
tinuidade genética. Enquanto a meiose em relação à continuidade
genética oferece a oportunidade de variação pela ocorrência da
sinapse, da permutação e da segregação, pela ocorrência de segre-
gação aleatória dos cromossomos homólogos e de recombinação.
Os cromossomos são agrupados em telocêntricos, acrocêntri-
cos, submetacêntricos e metacêntricos, ver a Figura 2.13 (cap 2)
Os cromossomos permitem na reprodução sexuada a manuten-
ção da espécie e, simultaneamente, a introdução da variabilidade
na descendência. A divisão da célula somática, mitose, é a base da
continuidade genética no indivíduo. A meiose garante a estabili-
dade genética intra-específica. Os dois processos contribuem para
a transmissão e continuidade das características herdadas.
60 Citogenética

Embora seja uma discussão longa, podemos definir espécie como


sendo um conjunto natural de indivíduos capazes de intercruzarem
entre si e produzirem descendentes igualmente férteis. Assim defi-
nida, a espécie garante a continuidade hereditária, a livre distribui-
ção gênica em uma população panmítica na qual os cruzamentos
ocorrem ao acaso, isto é os parceiros sexuais não se escolhem. A
manutenção da vida depende da capacidade das células em arma-
zenar e traduzir a informação genética necessária à manutenção
do organismo vivo e, da espécie. A informação genética é passada
de uma célula às suas células descendentes na divisão celular e, na
reprodução. As instruções genéticas são contidas em unidades, os
genes, que representam o indivíduo e a espécie a qual pertence.

3.1 Mitose
A divisão das células somáticas, a mitose, resulta
Célula Células
na preservação do número cromossômico. Ocor- original filhas
rem variações acidentais ou em baixa frequência.
Em organismos pluricelulares o crescimento e o Estágios do ciclo celular:
M
M = mitose
desenvolvimento são dependentes da produção S = síntese de DNA
contínua de células geneticamente semelhantes. G = intervalo
G2 G1
A mitose é o processo de divisão celular que, par-
tindo de célula somática diploide formam-se duas S
novas células igualmente diploides e, geneticamente equivalentes,
se não iguais. Ao final de uma mitose, inicia uma nova série de
eventos que levarão a célula a uma nova mitose, que é a formação Figura 3.1 – Ciclo Celular:
de duas novas células igualmente diploides, ao que se chama ciclo fases. Redesenhado de
Griffiths, figura 3.23.
celular, formado pelos estágios de mitose ou M, síntese de DNA ou
S, e intervalos G, ver a Figura 3.1.
Os estágios do ciclo da divisão celular são comuns na maioria
dos organismos. Suas partes básicas são a interfase e a mitose. Na
fase S ocorre a replicação do DNA. Assim na metáfase cada cro-
mossomo tem duas cromátides irmãs e, cada cromátide uma mo-
lécula de DNA. A mitose leva a formação de duas células descen-
dentes, as quais mantém o número de cromossomos, partindo de
uma única célula. As fases convencionais da mitose são:
Transmissão e Continuidade 61

a) prófase – as cromátides irmãs tornam-se visíveis, e os cromos-


somos se espessam;
b) metáfase – os pares de cromátides de alinham no plano equa-
torial da célula; anáfase – as cromátides irmãs são levadas para
pólos opostos da célula por microtúbulos que se ligam ao cen-
trômero. É o estágio da mitose, no qual os cromossomos estão
fortemente ligados ao fuso mitótico no seu equador, mas ainda
não estão separados na direção dos pólos opostos;
c) telófase – as cromátides chegam aos pólos completando o pro-
cesso, ver a Figura 3.2. O primeiro evento é o aumento de ta-
manho da célula, seguido da divisão dos centríolos, replicação
do DNA, síntese da histona. Células humanas em cultura gas-
tam um tempo significativo para cumprir o percurso do ciclo
celular. E o tempo gasto da prófase à telófase é, proporcional-
mente a este, insignificante.
Replicação
do DNA Dentro do ciclo celular, a interfase é caracterizada pelos perío-
dos G1, S e G2 seguidos da divisão. Os períodos G1 e G2 delimi-
tam o período S, sendo este a replicação do DNA e centríolo.
O aumento relativo do tamanho da célula pode ser relacionado
com o aumento de conteúdo celular representado pela replicação
do DNA com a duplicação da quantidade de nucleotídeos, síntese
de novas proteínas e a consequente inclusão de novos aminoáci-
dos, que serão utilizadas nos processos de divisão e, a consequente
formação das duas células subsequentes, que representam o dobro
do volume da célula que entrou em divisão. A duração do ciclo
celular, nos eucariotos, deve ser relacionada com a espécie consi-
derada, estágio de desenvolvimento, tipo de tecido e órgão.
O fuso mitótico ou fuso acromático é constituído por um con-
Divisão junto de fibras que promove a separação dos centríolos e dos cro-
celular
mossomos. Parte destas fibras se liga ao centríolo já dividido e es-
tacionado em um único ponto da célula, afastando um do outro,
posicionando-os nos respectivos pólos celulares. A outra parte das
fibras ligam os cromossomos, em metáfase na posição equatorial
da célula, arrastando cada cromátide ao respectivo pólo, promo-
Figura 3.2 – Mitose: fases.
vendo a divisão do centrômero. Os fusos surgem no início da pró-
Redesenhada de Griffiths,
figura 3.24. fase, mas só se ligam aos cromossomos no final da mesma com o
62 Citogenética

desaparecimento da membrana nuclear, e a metáfase se caracteri-


za pelo posicionamento dos cromossomos na placa equatorial na
metáfase com o desaparecimento da membrana nuclear. O fuso
mitótico se liga a região centromérica dos cromossomos em posi-
ções opostas, e equidistantes entre os pólos.
O centrômero se divide e cada uma das cromátides irmãs mo-
vem-se de forma oposta em direção aos pólos correspondentes na
anáfase. Com a telófase a membrana nuclear se recompõe e os cro-
mossomos se distendem, os nucléolos aparecem em seguida a ci-
tocinese que define o surgimento duas células novas que passam a
ocupar o espaço e as funções da célula precedente, restabelecendo
a continuidade genética no interior do organismo.

3.2 Meiose e Gametogênese


Meiose é o processo de divisão que forma células haploides a
partir de células diploides: esta relação é mostrada na Figura 3.3.
São duas divisões nucleares sucessivas, produzindo gametas nos
animais e esporos sexuais nas plantas e fungos. Gameta e esporo
representam a fase haploide do ciclo de vida nos organismos de
reprodução sexuada. A meiose ocorre nas células germinativas e
promove a fecundação, recuperando a fase diploide da espécie em
duas divisões celulares consecutivas.
O núcleo da célula tem o número de cromossomos, que com-
plementado pelo tamanho, posição do centrômero, e constrições
secundárias, são característicos da espécie eucariótica. A fertiliza-
ção em organismos de reprodução sexuada se faz pela fusão dos
núcleos dos gametas masculinos, originados no pai, e femininos,
na mãe. Foi demonstrado por Van Beneden, entre 1883-1884, que
o número de cromossomos, na fertilização, é o mesmo vindo de
cada gameta, isto é um conjunto haploide, reconstituindo o núme-
ro diploide da espécie. Weismann, em 1887, formulou a hipótese
de redução no número de cromossomos nas células germinativas
de animais e plantas separavam em dois grupos haploides. O pro-
cesso de meiose tem duas divisões celulares e, um único momen-
to de replicação do DNA, antes da primeira divisão. Na primeira
Transmissão e Continuidade 63

Diplóide heterozigoto (A/a)


MITOSE MEIOSE
Centrômeros
Replicação pré- A Replicação pré-
mitótica do DNA mitótica do DNA

a
A
A
Aa A
a
a
a
Única Duas
divisão divisões

A A A
a

a a
a

Duas células filhas também Quatro produtos meióticos haploides ½ A, ½ a


com o genótipo A/a

Figura 3.3 – Mitose e Meiose: comparação das sequências. Redesenhadas de Griffiths, fig. 3.1.

divisão, os cromossomos homólogos se separam, na segunda di-


visão as cromátides irmãs se separam, produzindo quatro células
haploides, ou gametas.
Em animais, a meiose ocorre antes da fertilização formando es-
permatozoide e óvulo. A união destes, na fertilização, forma o zigoto
diploide que através da clivagem, desenvolvimento e diferenciação
formando o corpo característica de cada espécie, ver a Figura 3.4.
64 Citogenética

fertilização

óvulo zigoto
(23 cromos- (46 cromos-
somos) somos)
meiose espermatozoide
(23 cromossomos)
meiose

embrião
mitose com 3
semanas

embrião
Figura 3.4 – Ciclo reprodutivo
com 6
humano. Original de Lima, 1984.
semanas
feto com 38 Redesenhado de Borges-Osório,
semanas fig. 3.11.
feto com 16
(pronto para semanas
nascer)

Nas plantas, o tempo entre a meiose e a fertilização varia de for-


ma significativa dependendo da espécie.
Em algumas plantas, certas algas e fungos o tempo entre a meio-
se e a fertilização varia de forma significativa dependendo da espé-
cie. a meiose ocorre após a fertilização, o resultado são os esporos
haploides.
Didaticamente, a meiose é dividida em fases. A replicação ocor-
re na interfase pré-meiótica I e a prófase tem cinco estágios, ver a
Figura 3.5.
Na reprodução sexuada, células diploides formam uma geração
de células haploides, seguida por gerações de células diploides.
Durante a meiose, os cromossomos homólogos trocam segmentos
de DNA por permuta, formando novas combinações gênicas que
se expressarão nos indivíduos descendentes por recombinação ge-
nética, ver a Figura 3.6.
Transmissão e Continuidade 65

Pareamento de
Divisão Meiótica I
cromossomos
Bivalentes
homólogos
Homólogo alinhados
duplicados
paterno no fuso

Homólogo
materno Replicação
do DNA

Divisão Meiótica II

Divisão celular I

Divisão
Gametas
celular II

Figura 3.5 – Meiose. Redesenhada de Alberts, fig. 20.7.

Cromossomos meióticos Produtos meióticos

A B A B
Parental
Meioses sem A B A B
Parental
crossing-over
entre os genes
a b a b
Parental
a b a b
Parental

A B A B
Parental
Meioses com A B A B
Recombinante
um crossing-over
entre os genes a b a b
Recombinante
a b a b
Parental

Figura 3.6 – Permuta e recombinantes. Redesenhados de Griffiths, fig. 4.9.


66 Citogenética

A compreensão de que os gametas são haploides e, portanto, Homólogo Homólogo


paterno materno
devem ser produzidos por um tipo especial de divisão celular, veio
de uma observação que também estava entre as primeiras a sugerir
que os cromossomos carregam informação genética. Em 1883, foi
descoberto que, enquanto o zigoto (ou ovo fecundado) de um ver-
Replicação
me nematódeo contém quatro cromossomos, o núcleo do oócito e do DNA
cada espermatozoide contem apenas dois cromossomos.
Os organismos de reprodução sexuada possuem cromossomos
autossomos, isto é, cromossomos comuns a ambos os sexos, e de Pareamento de
cromossomos sexuais. Estes são responsáveis pela determinação cromossomos
homólogos
do sexo em um grande número de organismos. Existem outros duplicados
mecanismos, não cromossômicos, de determinação do sexo. Mas
não só eles. Quando os cromossomos são iguais, no mesmo or- Bivalentes
ganismo, este é chamado sexo homogamético, se diferentes, sexo alinhados
no fuso
heterogamético. Os cromossomos que formam pares nas células
diploides são chamados cromossomos homólogos.
Na fase S da interfase, por replicação do DNA, são formadas
duas cópias idênticas de cada molécula de DNA, e desta forma
cada cromossomo fica constituído de duas cromátides-irmãs. Nes-
te estágio da mitose os cromossomos estão fortemente ligados ao
fuso mitótico. Cada cromossomo duplicado pareia com seu ho- Divisão celular I

mólogo, igualmente duplicado, formando um bivalente, que con-


tém quatro cromátides, formando a placa equatorial. O pareamen-
to ocorre durante prófase da meiose, podendo vários dias e, até
anos seguidos. Na metáfase subsequente, os bivalentes se alinham
Figura 3.7 – Meiose: divisão I.
no fuso e, na anáfase, os dois homólogos duplicados se separam e
Redesenhada de Alberts, figura
movem-se para os pólos opostos do fuso, ver a Figura 3.7. 20.6.

3.2.1 Meiose I
Na meiose I, como na mitose de células somáticas, ela pode ser
dividida em: prófase I, o DNA foi replicado e as cromátides irmãs
estão duplicadas e pareadas formando as díades, unidas pelo cen-
trômero. As díades de cromossomos homólogos formam pares,
formando os bivalentes, ou tétrades; metáfase I, os bivalentes se
dispõem no plano equatorial da célula, ligando-se nas fibras do
fuso; anáfase I, cada uma das díades é levada para pólos diferentes;
telófase I, forma-se um núcleo em cada pólo da célula. Na sequên-
Transmissão e Continuidade 67

cia ocorre a divisão II da meiose, sem que haja replicação de DNA.


Os eventos da meiose e a mitose são mostrados na Figura 3.8.

Meiose Divisão celular mitótica

Homólogo
paterno
Homólogo
materno
Replicação do DNA Replicação do DNA

Pareamento de cromossomos
homólogos duplicados

Bivalentes alinhados
no fuso

Cromossomos
duplicados
alinhados
individualmente
no fuso

Divisão celular I

Divisão
celular II

Gametas

Figura 3.8 – Mitose e Meiose: comparação de fases. Redesenhadas de Alberts, fig. 20.7.
68 Citogenética

A meiose produz dois tipos de rearranjos genéticos, ao acaso.


Um é devido a distribuição aleatória dos cromossomos homólogos
maternos e paternos para as células-filhas na divisão meiótica I, é
a recombinação cromossômica, ver a Figura 3.9.
O outro rearranjo ocorre na prófase meiótica I, na ocorrência
de permuta, é a recombinação genética, ver a Figura 3.10.

Três pares de Um par de


cromossomos homólogos cromossomos homólogos

Materno
Materno
Paterno Paterno

Arranjo independente Rearranjo durante


de homólogos maternos a prófase I da meiose
e paternos durante a
divisão meiótica I

Divisão meiótica II

Divisões meióticas I e II

Gametas possíveis

Figura 3.9 – Recombinação cromossômica: Figura 3.10 – Recombinação Genética: prófase


divisão meiótica I. Redesenhada de Alberts, meiótica I. Redesenhada de Alberts, fig. 20.8B.
fig. 20.8A.
Transmissão e Continuidade 69

Na recombinação cromossômica as moléculas de DNA das cro-


mátides homólogas, não-irmãs, quebram-se, trocando seguimen-
tos entre si, o que configura a recombinação genética, ver a Figura
3.11.

Figura 3.11 – Quiasma: mostrando os quiasmata. Redesenhado de Alberts, fig. 20.11.


70 Citogenética

Na longa prófase da divisão meiótica I ocorre o pareamento dos


cromossomos homólogos duplicados, inicia a permuta entre cro-
mátides homólogas, não-irmãs, formação do complexo sinaptotê-
nico, ver a Figura 2.15 (cap. 2). O pareamento dos cromossomos
homólogos se dá durante a formação do complexo sinaptotênico,
o qual consiste de uma proteína central longa, separando os dois
pares de homólogos duplicados. A prófase I é tradicionalmente
dividida em cinco estágios sequenciais, ver a Figura 3.12.

Figura 3.12 – Prófase da Meiose I: estágios dos cromossomos. Original de Brian Wells.
Redesenhados de Alberts, fig. 20.12.

3.2.2 Leptóteno ou filamento fino


No estágio de leptóteno ou leptonema as cromátides são longas
e finas, com algumas partes mais condensadas. Suas partes mais
condensadas são os cromômeros. É a primeira fase da prófase I
da meiose. Ele inicia com os cromossomos já duplicados na fase
S da interfase. As cromátides irmãs estão unidas de tal forma que
não é permitido identificá-las como unidades, essa união se dá
por um conjunto de proteínas chamadas de coesinas. A sequência
de seus cromômeros pode permitir identificar os cromossomos. Figura 3.13 – Leptóteno. Original
Inicia-se o reconhecimento e pareamento dos cromossomos, ver de M.A. Ferguson-Smith.
Redesenhado de Beiguelman
a Figura 3.13. fig. 5.1.
Transmissão e Continuidade 71

3.2.3 Zigóteno ou filamento pareado


No estágio de zigóteno ou zigonema os cromossomos homó-
logos estão terminando seu pareamento. É o segundo estágio da
divisão I da meiose. O complexo sinaptotênico começa formar-se
entre os dois grupos de cromossomos homólogos formando o bi-
valentes, isto é, com as duas cromátides identificáveis ao microscó-
pio. A sinapse é visível neste estágio, permitindo visualizar como
Figura 3.14 – Zigóteno. Original
se dá o pareamento, ver a Figura 3.14.
de M.A. Ferguson-Smith.
Redesenhado de Beiguelman
fig. 5.3. 3.2.4 Paquíteno ou filamento grosso
No estágio de paquíteno ou paquinema, os cromossomos estão
ainda mais condensados, sendo visualizados mais grossos. É o es-
tágio final do pareamento dos cromossomos e suas cromátides são
visíveis formando os bivalentes, ver a Figura 3.12.
É importante ter em mente que o processo de pareamento dos
homólogos é um processo contínuo, que se inicia no leptóteno e
finaliza-se no paquíteno. O mesmo ocorre com a compactação dos
cromossomos, iniciando no leptóteno da prófase I e chegando ao
ponto máximo na metáfase, fase as seguir. O paquíteno começa
quando a sinapse está completa.

3.2.5 Diplóteno ou filamento duplo


No estágio de diplóteno ou diplonema os cromossomos homó-
logos pareados iniciam a separação mostrando-se em filamentos
duplos ou diplonema, evidenciando a recombinação através dos
quiasmas, como mostra a 3.12. Isso ocorre porque o complexo si-
naptotênico, que ligava fisicamente os dois homólogos se desfaz,
assim eles começam a se separar, mantendo-se unidos pelos pon-
tos onde houve a recombinação, chamados de quiasmatas (plural
de quiasmas). É uma conexão física entre duas cromátides homó-
logas, não irmãs, que ao microscópio se apresenta na forma de um
X. esta imagem em X indica a região onde ocorre a permuta.
72 Citogenética

3.2.6 Diacinese
É o processo do início de separação das cromátides irmãs, em
sequência ao diplóteno. No estágio de diacinese a condensação dos
cromossomos é maior e estes estão, distribuídos uniformemente
no centro celular. Este estágio é definido pelas alterações morfoló-
gicas associadas com a condensação cromossômica e a formação
(sinapse) e a separação (desinapse) do complexo sinaptotênico. A
prófase I pode ocupar o maior tempo gasto por toda a meiose.
Após término da prófase I, seguem-se duas divisões celulares
sucessivas sem que ocorra síntese de DNA.

3.2.7 Metáfase I
Na fase de metáfase a membrana do núcleo desaparece e for-
mam-se os fusos acromáticos. Na verdade os fusos acromáticos
já estão formados e, ficam do lado de fora da membrana nucle-
ar. Com o desaparecimento da membrana nuclear eles entram em
contato com os cromossomos e se ligam a eles, os bivalentes se
alinham no eixo equatorial da célula através dos movimentos dos
fusos ligados a eles, formando a placa metafásica. Os dois centrô-
meros de cada bivalente se orientam de forma oposta em direção a
cada um dos pólos celulares, ver a Figura 3.15.

3.2.8 Anáfase I
Na fase de anáfase os bivalentes se separam e cada cromosso-
mo do par de homólogos migra para os respectivos pólos, redu-
zindo o número de cromossomos em cada pólo pela metade. As
cromátides irmãs são ainda mantidas unidas pelas coesinas e pelo
centrômero não dividido. Nesta fase os cromossomos começam a
descondensar novamente, ver a Figura 3.15.

3.2.9 Telófase I
Na fase de telófase a membrana nuclear é reconstituída, sem a
correspondente divisão do citoplasma, pode ou não haver uma ci-
tocinese, segue-se um momento de interfase, porém sem passagem
pela fase S e, portanto, sem uma nova replicação, ver a Figura 3.15.
Transmissão e Continuidade 73

3.2.10 Meiose II
Homólogo Os princípios biológicos que regem a
paterno meiose são comuns a animais e plantas
Homólogo
materno tanto nos machos como nas fêmeas. A pro-
Replicação do DNA
dução dos gametas se completam com a
maturação dos oócitos e espermatozoides.
Esta segunda divisão da meiose é de
natureza equacional, enquanto que a pri-
Pareamento de cromossomos
homólogos duplicados meira divisão da meiose é de natureza re-
ducional. Segue-se um processo mitótico
pela separação das cromátides e formação
Metáfase I de quatro núcleos haploides pela migração
Bivalentes alinhados
no fuso das cromátides aos pólos correspondentes,
ver a Figura 3.15.
Ao termino da meiose I, formam-se dois
Anáfase I núcleos-filho pela formação das respecti-
vas membranas nucleares, na ausência de
interfase, a meiose II inicia.
A prófase II é rápida: ocorre condensa-
Divisão celular I ção cromossômica, formação dos fusos,
a membrana nuclear se rompe e os fusos
Meiose II entram em contato com os cromossomos
que começam a se movimentar, até que se
Telófase I
alinham na placa equatorial. Esse momen-
to é chamado de metáfase II, quando os
cromossomos se encontram em máxima
condensação e estão alinhados na placa
Divisão equatorial. As díades migram para o plano
celular II
equatorial. A anáfase II, cada uma das cro-
mátides irmãs de uma díade é levada para
um núcleo descendente diferente na se-
quência que a célula se divide pela segun-
Gametas
Telófase II da vez. A telófase II é um evento rápido,
formam-se quatro núcleos haploides, com-
Figura 3.15 – Etapas da Meiose. Redesenhada de Alberts, pletando-se a meiose, ver a Figura 3.15.
figura 20.7.
74 Citogenética

3.3 Meiose e Genética Mendeliana


As leis de Mendel são as bases para a análise clássica da genéti-
ca. Sua ferramenta básica são os testes de herança que acompanha
os fenótipos produzidos por um par de alelos, nos organismos di-
ploides, por sucessivas gerações e nos organismos haploides, pelo
fenótipo expresso por cada gene.
A observação da relação do gene com uma estrutura celular foi
feita por Sutton, Boveri e de Vries entre 1901 e 1902. O compor-
tamento dos genes é correspondente ao comportamento dos cro-
mossomos na fertilização e na meiose:
1. “A fertilização tanto em plantas como em animais envolve a
união de núcleos maternos e paternos, fornecendo o meio para
a união de características dos pais na descendência”;
2. “A meiose proporciona uma redução no número de cromos-
somos no óvulo e no espermatozoide, com a fertilização resti-
tuindo o número somático no zigoto”;
3. “Através do processo da sinapse é provido um mecanismo para
a segregação dos derivativos maternos e paternos de todos os
pares de cromossomos”.
Thomas Hunt MORGAN (1866-1945) e Calvin Blackman
BRIDGES (1889-1938) demonstraram a relação entre genes e cro-
mossomos em Drosophila melanogaster. Essa descoberta permitiu
aos citogeneticistas localizarem em que cromossomo se encon-
trava um gene específico, iniciando então a construção de mapas
genéticos
Os mapas genéticos mostram a distancia entre genes e suas
sequências em um dado cromossomo. Trabalhos de mapeamen-
to permitiram desenvolver o Projeto Genoma Humano e, conse-
quentemente, o Projeto Genoma.

3.4 Meiose, Ligação e Permuta


A segregação e a transmissão dos cromossomos na meiose ex-
plica igualmente a transmissão e a segregação dos genes. Os ge-
Transmissão e Continuidade 75

nes devem ser considerados como unidades inseridas ao longo do


cromossomo, ao que se chama ligação ou sintenia. No entanto, as
cromátides homólogas trocam seguimentos entre si, processo que
chamamos de permuta, recombinação ou crossing-over, separan-
do, na meiose, genes que estavam juntos ou em sintenia e alteran-
do nos descendentes as combinações gênicas observadas nos pais.
Em geral, a ligação completa é rara. Ela é restrita aos genes que
estão fisicamente próximos, em um segmento cromossômico.
Os locos de um mesmo cromossomo estão em sintenia, isto
é, juntos. Ligação é a co-herança de dois ou mais locos genéticos
próximos entre si, no mesmo cromossomo. Teoricamente, quanto
menor for a distância entre dois locos maior é a ligação entre eles,
menor será a frequência de recombinação entre eles.

3.4.1 Ordem Linear dos Genes e Distâncias no Mapa


Morgan postulou que os genes ocupam uma posição fixa ao
longo do cromossomo e seu alelo está na posição correspondente
no cromossomo homólogo. Alfred Henry Sturtevant (1891-
1970) elaborou um teste que permite identificar o lugar de um ter-
ceiro gene em relação a outros dois já localizados, hoje é conheci-
do como cruzamento de três pontos. A distância entre três genes é
relacionada com a frequência de permutas que ocorrem entre eles.
Em um cruzamento teste serão formados quatro grupos fenotí-
picos descendentes, sendo que o grupo com os fenótipos mais nu-
merosos é igual aos tipos fenotípicos parentais. Os outros três gru-
pos, dois sofreram permuta única e, o grupo de menor frequente
representa permutas duplas. O mapa genético indica a ordem dos
locos ao longo do cromossomo, bem como a distância entre eles.
Os mapas genéticos são construídos a partir das frequência de re-
combinação genética que ocorre entre os cromossomos.

3.4.2 Interferência
Se os genes estão ligados na ordem indicada, seria possível pre-
dizer a frequência de permuta dupla quando se conhece no mapa
o comprimento dos intervalos entre os genes correspondentes. In-
terferência pode ser definida como a tendência de uma permuta-
76 Citogenética

ção interferir na ocorrência de outra em sua vizinhança. Ela tem


maior efeito quanto mais próximos estiverem os genes.

3.4.3 As Bases Cromossômicas da Permutação


O acompanhamento dos fenômenos da meiose evidencia a base
física da permutação. Na prófase I, o paquíteno indica o parea-
mento completo e longitudinal dos homólogos. Na microscopia
eletrônica este pareamento fica evidenciado, com a formação do
complexo sinaptonêmico, um complexo proteico que une de telô-
mero a telômero os homólogos. Os homólogos começam a se se-
parar no diplóteno, com o desaparecimento do complexo sinapto-
tênico, mas alguns pontos de união são mantidos, os quiasmatas,
marcando os locais onde houve permuta. A permuta representa
a troca de material genético entre cromossomos homólogos tam-
bém chamados de recombinação. Um quiasma em bivalente for-
ma duas cromátides parentais e duas permutadas, a frequência de
recombinantes é metade da frequência de quiasmas. Na maioria
dos organismos, é impossível examinar todos os produtos de uma
única sequência meiótica, ver a Figura 3.11.

3.4.4 Permutação Somática ou Mitótica


A permutação pode ocorrer, também, com menor frequência,
em células somáticas. Ela foi descrita inicialmente em Drosophila,
pela ocorrência de uma mancha única ou dupla de fenótipo re-
cessivo diferente do tipo selvagem circundante. Bridges postulou
que as manchas eram produzidas por perda de cromossomos X.
Coube a Curt Stern (1902-1981) descrever que o mosaicismo
era causado pela permutação somática seguida de uma segregação
mitótica normal de cromátides. A permutação somática ocorre em
fungos no ciclo parassexual.

3.4.5 Prova Cromossômica da Permutação


A permutação pode envolver um gene ou blocos de genes com
posição distal ao quiasma. A prova experimental foi produzida por
Harriet Baldwin Creighton (1909-2004) e Barbara McClin-
tock (1902–1992) trabalhando com milho, em 1931. A indaga-
Transmissão e Continuidade 77

ção se os quiasmas podem ser considerados como o resultado de


permutação foi confirmada por Spencer W. Brown (-) e Daniel
Zohary (1926-), em células meióticas do lírio.

3.4.6 Acontecimentos Discrepantes na Permuta


Na meiose ocorre, com maior frequência, a formação de game-
tas que levarão a formação de gametas que produzirão descen-
dentes com genótipo igual ao do pai. No entanto, podem ocorrer
eventos biológicos que levarão a formação de descentes geneti-
camente diferentes do progenitor. Estes eventos são as mutações
gênicas ou cromossômicas. Dentre estes destacamos permuta por
ela permitir a formação de novas combinações ao nível dos grupos
de ligação. A permutação ocorre na meiose no estágio de quatro
filamentos entre cromátides homólogas, ver a Figura 3.16.

quiasma centrômeros

cromossomo homólogo
paterno replicado
bivalente
cromossomo homólogo
materno replicado

cromátides-irmãs

Figura 3.16 – Permuta: entre cromátides homólogas. Redesenhada de Alberts, fig. 20.9.

3.4.7 Posição e Frequência de Permuta


Para determinar a posição da permutação é necessário localizar
a posição dos genes nos mapas cromossômicos, sendo estes gené-
ticos ou citológicos. A ordem dos genes nos mapas cromossômi-
cos é a mesma nos mapas genéticos, as distâncias podem variar e
devem ser tomadas a partir do centrômero, próximas do qual elas
não são frequentes. Afetam a frequência de permutação: o sexo, a
idade o genótipo e fatores externos. Hoje se sabe que muitos fato-
res podem influenciar na recombinação e que a mesma não ocor-
re com a mesma frequência em qualquer ponto do genoma, que
existem hot spots de recombinação. A frequência de recombinan-
tes entre dois genes é constante entre os dois sexos na ervilha-de-
78 Citogenética

cheiro; maior nas fêmeas de camundongo, e homem; maior nos


machos de pombos.

3.4.8 O Mecanismo da Permutação


Em organismos diploides a permutação ocorre entre cromáti-
des homólogas; os seguimentos permutados são, em geral, iguais;
a interferência evita permutação dentro de uma distância mínima
entre si; a frequência de permutação é regulada por fatores intrín-
secos e extrínsecos. As diferentes possibilidades de permutas estão
representadas na Figura 2.24. (cap. 2).

Resumo
O conteúdo do presente capítulo tratou do comportamento dos
cromossomos na mitose, meiose e gametogênese, da transmissão
e continuidade do material genética. Descreveram-se os processos
e a construção de mapas genéticos.

Referências
Alberts, Bruce; Johnson, Alexander; Lewis, Julian; Raff,
Martin; Roberts, Keith; Walter, Peter. Célula. Porto Alegre:
Artmed, 2007.
Beiguelman, Bernardo. Citogenética Humana. Guanabara,
1986.
Griffiths, Anthony J. F.; Wessler, Susan R.; Lewontin,
Richard C.; Gelbart, William M.; Suzuki, David T.; Miller,
Jeffrey H. Introdução à Genética. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanaba-
ra Koogan, 2006.
GUERRA, M. (Org.). FISH - Conceitos e aplicações na citogené-
tica. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Genética, 2004.
KASAHARA, S. Práticas de citogenética. Ribeirão Preto: Socie-
dade Brasileira de Genética, 2003. v. 1. [Série Cadernos].
Transmissão e Continuidade 79

SWANSON, Carl Pontius; MERZ, Timothy; YOUNG, William J.


Citogenética. São Paulo: USP, 1969.

Bibliografia Comentada
Recomendo a leitura do livro de Ernest Mayr (1904-2005), O
Que é a Evolução. O autor explica, de forma acadêmica rigorosa, a
Evolução para leigos especialistas.
Mayr, Ernest. O Que é a Evolução. Rio de Janeiro: Rocco, 2009.
c a p í t u lo 4
c a p í t u lo 4
Cromossomos II
Ao final deste capítulo, você poderá descrever a estrutura
dos cromossomos e distinguirá com propriedade as variações
estruturais dos mesmos.
Cromossomos II 83

4.1 Estrutura
O cromossomo é o suporte físico que comporta vários genes
distribuídos longitudinalmente ao longo de cada cromátide. Esta
estrutura pode sofrer alterações de forma espontânea ou induzi-
das, através de radiações ionizantes ou produtos químicos, levan-
do ao que se convencionou chamar de aberrações ou mutações
cromossômicas. Estas podem ser agrupadas em: deleções ou defi-
ciências; duplicações; inversões; translocações; isocromossomos e
cromossomos em anel.

4.1.1 Deleções ou Deficiências


O termo deleção, em Citogenética, é de uso corrente na litera-
tura em inglês. Na língua portuguesa o seu termo correspondente
é deficiência. Logo os dois termos são equivalentes. São tipos de
mutações em que um único nucleotídeo, ou uma sequência de nu-
cleotídeos, são removidos do DNA cromossômico.
Os termos deleção ou deficiência explicam a existência de cro-
mossomos que apresentam perdas de um, ou mais seguimentos
de DNA, em relação aos cromossomos normais. Em citogenética,
cromossomo normal é aquele que ocorre com frequência majori-
tária na população, correspondendo ao que se chama selvagem em
outras áreas da Genética.
Os segmentos cromossômicos sem centrômeros tendem a se
perder na divisão celular, pois não se ligam ao fuso havendo falta
84 Citogenética

de orientação em relação aos pólos da célula, o que não


acontece com os segmentos cromossômicos que possuem
centrômero.
As deleções provocadas por uma única quebra cromos-
sômica são denominadas terminal, com a provável rege-
neração da atividade telomérica no seguimento cromos-
sômico com centrômero. Quando ocorrem duas quebras
e, perda de seguimento cromossômico e a consequente fu-
são da parte terminal ao seguimento com centrômero, no
mesmo braço de um cromossomo, elas são denominadas
intersticial, ver a Figura 4.1.
Os organismos que apresentam em alguma fase do seu
desenvolvimento cromossomos plumosos ou politênicos
são ferramentas importantes, possibilitando identificar e
compreender as alterações cromossômicas, nestes orga-
nismos. Ver fig 4.2.
Figura 4.1 – Deficiência ou
A análise do efeito das deleções parte do princípio que há perda Deleção. Redesenhada de
Swanson, fig. 4.1.
de material genético, sendo que o resultado é dependente do ta-
manho do seguimento perdido, e importância dos genes afetados,
dependendo também de estarem em homozigose, isto é, estar pre-
sente nos dois genes, ou em heterozigose, envolvendo apenas um
gene. As deleções, em alguns casos, possibilitam o mapeamento
gênico, que é a locação de determinado gene em um segmento
cromossômico, dependendo da viabilidade de seus portadores.
A Drosophila representa um gênero de inseto dos mais usados
em laboratório para ensaios conduzidos por Geneticistas. A dro-
sophila foi um dos primeiros organismos que possibilitou as aná-
lises genéticas e, principalmente, alterações cromossômica, pela
ocorrência de cromossomos politênicos na sua fase larval. Esse fe-
nômeno é provocado pela endoreplicação da fita de DNA em cen-
tenas de vezes, dando ao cromossomo uma significativa amplia-
ção morfológica, permitindo a construção de mapas citológicos
pela visualização microscópica de pequenas alterações estruturais,
como deleções ou deficiências.
Em humanos, além de outras, a leucemia mieloide crônica está
associada a uma deficiência do braço longo do cromossomo 22, a
Cromossomos II 85

B
Bar revertido
C

F
15
16
A

B
Bar

Duplo bar
Normal

Bar

Bar
Figura 4.2 – Duplicação: em
cromossomo politênico.
Original de T.H. Morgan, C.R.
Bridges e J. Schultz, Carnegie Duplo Bar
Inst. Wash. Yrbk., 31:303-307.
Redesenhada de Swanson, Bar revertido (normal)
fig. 4.6.

síndrome do 5p− é uma deleção do braço curto do cromossomo 5


que define uma importante cromossomopatia.
Mutantes morfológicos, produtos de deleção, em milho per-
mitiram a McClintock a desenvolver uma série de experimentos
científicos de grande valor social, melhoria agronômica deste ce-
real e a compreensão de biologia.

4.1.2 Duplicações
As duplicações são definidas como a adição de um segmento
cromossômico anormal em um cromossomo normal. Este seg-
mento adicional pode ter origem no cromossomo homólogo por
uma permuta desigual, ou em outro cromossomo não homólogo
86 Citogenética

por uma translocação. Esse evento pode, reciprocamente, originar


uma deficiência equivalente em outro cromossomo e, eventual-
mente em outro zigoto.
Se a duplicação for produzida por uma permuta desigual e for-
mar uma sequência de seguimentos, de forma contígua e em fila,
ela recebe designação tandem.
Na natureza, as duplicações cromossômicas são mais frequentes
do que as deleções em virtude de sofrerem menor pressão seletiva,
favorecendo a duplicação de locos favoráveis ao processo evoluti-
vo e, formação e fixação de novos genes.
Na Genética Humana e Médica as duplicações, mais extensa-
mente estudadas, ocorrem nos locos estruturais, isto é, nos locos
que codificam cadeias polipeptídicas, das hemoglobinas. O estudo
da variabilidade genética desta proteína, responsável pelo trans-
porte de oxigênio no interior do organismo, permitiu saber as cau-
sas de importantes hemoglobinopatias que afetam muitas pessoas.
Permitiu, igualmente, conhecer o seu parentesco com a mioglo-
bina, a proteína responsável pela formação muscular, elas foram
originadas de um mesmo ancestral comum.

4.1.3 Inversões
A inversão altera a sequência linear dos genes de um cromos-
somo, mantendo inalterado de forma significativa a estruturas dos
locos envolvidos na dupla quebra. Ela é a alteração cromossômica
mais frequente em populações naturais, constituindo em impor-
tante instrumento de observação em citogenética, desde os seus
primórdios. É o tipo de mutação na qual um segmento de um cro-
mossomo está invertido. No pareamento de cromossomos homó-
logos elas determinam a formação de alças, fornecendo informa-
ções de grande valia na investigação sobre os genes envolvidos, no
mapeamento citológico e informação genética, pelas figuras for-
madas e suas variações ao longo do processo meiótico.
Elas são classificadas em paracêntricas quando envolvem um
braço cromossômico e pericêntricas envolvendo os dois braços
cromossômicos, invertendo a orientação do centrômero na divi-
são celular.
Cromossomos II 87

Inversões Paracêntricas
Esta inversão envolve só um dos braços cromossômicos quan-
to a sequência linear dos genes. Na meiose, os cromossomos com
inversões paracêntricas em heterozigose mostram alça de inversão
no pareamento dos homólogos.
Ao final, se houver permuta dentro da alça de inversão, são recu-
perados como produtos da recombinação, o cromossomo normal,
o cromossomo invertido, um seguimento cromossômico dicêntri-
co e um seguimento cromossômico acêntrico, ver a Figura 4.3.
O segmento cromossômico acêntrico se perde na anáfase pela
impossibilidade de se ligar a um fuso acromático.
O segmento dicêntrico pode se fixar no fuso acromático com
tração dipolar, perdendo-se, isto é, não migrando para nenhuma
das células descendentes, podendo, eventualmente, inviabilizar o
seu desenvolvimento.

A B C D E Sequência normal
Sequência invertida
A C B D E

B C
A B C D E
Permutação
D
na prófase meiótica
A E

A B C D E
E D B C D E
Produtos da
A B C A
recombinação
E D B C A

D E
C
B D
A E
A
C
C

B B
A
A D E
C
B
D E
Configuração Configuração
no paquinema na anáfase I

Figura 4.3 – Inversão Paracêntrica. Redesenhada de Swanson, fig. 4.10.


88 Citogenética

A inversão paracêntrica reduz pela metade a produção de ga-


metas viáveis, diminuindo a fertilidade do indivíduo. Como 50%
dos gametas são viáveis, isto é, são capazes de gerarem novos zigo-
tos, as inversões paracêntricas permanecem ao longo das gerações,
mesmo sendo desfavoráveis.
As inversões paracêntricas múltiplas no mesmo braço cromos-
sômico influenciam o processo evolutivo, podendo ser reconstitu-
ídas, na família ou na espécie, por inversões sobrepostas.

Inversão Pericêntrica
Esta inversão envolve os dois braços de um mesmo cromosso-
mo, invertendo a orientação do centrômero em relação aos respec-
tivos telômeros, alterando, ou não, a morfologia do cromossomo
quando as respectivas quebras ocorrerem equidistantemente do
centrômero, nas respectivas cromátides.
A ocorrência de uma única permuta dentro da alça de inversão,
não forma segmentos cromossômicos acêntrico ou dicêntrico, no
entanto, produz novas sequências de segmentos cromossômicos,
ver a Figura 4.4. Dado ao tamanho da deleção, ou duplicação, en-
volvida no processo de quebra de cromátide poderá ocorrer redu-
ção no valor adaptativo.

A B C D
Sequência normal
A C B D
Sequência invertida

B B C C

A A D D

A B C D Normal
A B C A Dup.-def.
D B C D Dup.-def.
A C B D
Invertido

Figura 4.4 – Inversão Pericêntrica. Redesenhada de Swanson, fig. 4.13.


Cromossomos II 89

4.1.4 Translocação
A translocação é o processo de inserção em um cromossomo de
um segmento, originário de um cromossomo não homólogo. Ela
pode ser unidirecional o que possibilita novos arranjos gênicos,
por duplicação no cromossomo que recebe o segmento translo-
cado, ou por deficiência ou deleção no cromossomo que perde o
segmento para a translocação. Por outro lado, ela pode ser bidire-
cional, gerando duas inserções, não homólogas, recíprocas, man-
tendo, no indivíduo, o equilíbrio gênico. Nas duas situações, se
não houver a formação de segmentos cromossômicos acêntricos
ou dicêntricos, o resultado se expressará na geração subsequente,
caso o cromossomo duplicado e, ou o deficiente venha a participar
na formação de um novo zigoto, ver a Figura 4.5.

Normal 10
Normal 8
Intertrocado 108
Intertrocado 810

Figura 4.5 – Translocação. Original de M.M. Rhoads, 1955. Redesenhada de Swanson, fig.
4.17.

As translocações podem existir em homozigose e heterozigose,


não sendo letais, formando novos grupos de ligações. Existem vá-
rios exemplos de processos evolutivos envolvendo translocações,
as translocações que chamam a atenção em plantas são as que
ocorrem em Oenothera e Datura, que são plantas diferentes, ver a
Figura 4.6.
90 Citogenética

gametas parentais

gametas produzidos

Figura 4.6 – Translocação heterozigótica. Redesenhada de Swanson, fig. 4.21.

Na Oenothera a segregação é regular, provavelmente, pelo fato


de seus cromossomos serem submetacêntricos facilitando a mo-
bilidade na placa metafásica. O curso da evolução a levou os cro-
mossomos a formação de anéis complexos, seguida da incorpora-
ção de letais, e autopolinização, nesta ordem o sistema tem sentido
evolutivo.

4.1.5 Isocromossomos
Eles são formados, em geral, por cromossomos metacêntrico,
cujos braços têm a mesma informação genética duplicada em sen-
tido invertido a partir do centrômero, ver a Figura 4.7.

1 2 3

1 2 3

1 2 3 3 2 1

b
a

Figura 4.7 – Isocromossomo. Original de Rhoads, Genetic, 25:483-520. Redesenhado de


Swanson, fig. 4.23.
Cromossomos II 91

4.1.6 Cromossomos em Anel


O cromossomo em anel é formado pela quebra e perda das duas
regiões telomérica simultaneamente e, a consequente fusão das
duas extremidades preservando o centrômero, nos eucariotos e, é
considerado como alteração cromossômica, podendo ser elimina-
dos em populações experimentais. Nos procariotos, cromossomo
em anel é condição normal, ver a Figura 4.8.

Anáfase
1 8

2 7
Interfase Prófase
1 8 1 8 3 6
2 2 c 4 5
7 7
a a
3 6 3 6 5 4
4 5 4 5 6 3 c
b b
7 2

8 1

Anáfase Anáfase Anáfase


avançada Telófase avançada Telófase avançada Telófase
1 8 1 8 1 8 1 8 1 8 1 8
2 7 2
2 7 7
2 7 2 7 2 7
3 6 3 6
3 6
3 6 3 6 3 6
4 5 4 5
4 5 4
4 5 4 5 4 5
5 4
5 4 6 3 4
6 3

5 4 5 5
5 4
6 3 6 3 6 3
6 3
7 2 7 2 7 2 7 2
7 2 7 2
8 1 8 1 8 1 8 1 8 1
8 1

A B C

Figura 4.8 – Cromossomo em anel. (A) Original de J. Carn, Cold Spring Harbor Symp.
On Quant. Bio., 28:43-36, 1963; (B) original de C. Fulton, Genetic, 52:55-74, 1965.
Redesenhado de Swanson, fig. 2.5.
92 Citogenética

Resumo
O presente capítulo tratou da estrutura e suas variações: deleção
ou deficiência, duplicação, versões, translocações, isocromosso-
mos e cromossomos em anel.

Bibliografia
Alberts, Bruce; Johnson, Alexander; Lewis, Julian; Raff,
Martin; Roberts, Keith; Walter, Peter. Célula. Porto Alegre:
Artmed, 2007.
GUERRA, M. (Org.). FISH - Conceitos e aplicações na citogené-
tica. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Genética, 2004.
KASAHARA, S. Práticas de citogenética. Ribeirão Preto: Socie-
dade Brasileira de Genética, 2003. v. 1. [Série Cadernos].
LORETO, E. L. S.; SEPEL, L. M. N. Atividades experimentais e
didáticas de biologia molecular e celular. 2. ed. São Paulo: So-
ciedade Brasileira de Genética, 2003. v. 1. [Cadernos de biologia
molecular e celular].
SWANSON, Carl Pontius; MERZ, Timothy; YOUNG, William J.
Citogenética. São Paulo: USP, 1969.
c a p í t u lo 5
c a p í t u lo 5
Número Cromossômico
O número e a forma dos cromossomos são constantes para
cada espécie, e a partir desse capítulo você poderá reconhecer
esses números e estudará as alterações numéricas dos cro-
mossomos na célula.
Número Cromossômico 97

5.1 Variações
Excluídos os erros e alterações durantes os processos de divisão
celular, o número e a forma dos cromossomos são constantes para
cada espécie. Consequentemente, também, é constante o número
de genes ou locos. Como as alterações numéricas e estruturais dos
cromossomos são inevitáveis, tanto quanto para as mutações gê-
nicas, pode-se encontrar entre alguns indivíduos de uma mesma
espécie alterações numéricas e estruturais nos cromossomos e di-
ferentes formas de genes, isto é alelos.
Nas espécies diploides as alterações numéricas são de duas or-
dens de grandeza; temos a aneuploidia, quando a variação envolve
um par ou pares cromossômicos; euploidia, quando a variação en-
volve o conjunto haploide de cromossomos.

5.1.1 Aneuploidia
Aneuploidia é a alteração numérica dos cromossomos de carióti-
po, sendo classificada em hipodiploidia ou hiperdiploidia, redução
ou aumento do número de cromossomos do par, respectivamente:

Hipodiploides
nulissomia 2n - 2
monossomia 2n - 1
monossomia dupla 2n – 1 – 1
monossomia tripla 2n – 1 – 1 -1
98 Citogenética

Hiperdiploides
trissomia 2n + 1
trissomia dupla 2n + 1 + 1
trissomia tripla 2n + 1 + 1 + 1
tetrassomia 2n + 1 + 1 + 1 + 1 etc.

Ela poderá ter origem pré-zigótica, estando presente nos pais, ou


na meiose que produz um gameta por perda ou ganho cromossô-
mico envolvido na fecundação que originou o zigoto aneuploide.
Podendo, por outro lado, ser pós-zigótica, surgindo durante o pro-
cesso de desenvolvimento embrionário. Neste caso, podem surgir
células hipodiploides 2n - 1, normais e hiperdiploides 2n + 1, cons-
tituindo o que se convencionou chamar mosaico cromossômico.

5.1.2 Trissomias
Elas ocorrem na descendência de organismos diploides, 2n + 1.
São estudados no milho, tomate, tabaco e Drosophila, que produ-
zem fenótipos mutantes. Na espécie humana observam-se carióti-
pos com trissomia envolvendo diferentes pares de cromossomos.
As trissomias de cromossomos humanos mais frequentes e, con-
sequentemente mais usadas como modelos para discussões, são as
trissomias dos cromossomos 21, 18 e 13 e cromossomos sexuais.

5.1.3 Monossomias
Monossomias são representadas pelos indivíduos com carióti-
pos 2n – 1, formados pela perda de um cromossomo do par. São
achados raros entre os organismos diploides e, são raríssimas as
monossomias autossômicas, todas elas inviáveis, no homem. So-
mente as monossomias dos cromossomos X e Y são condições
normais no homem.

5.1.4 Aneuploidia dos Cromossomos Sexuais


A variação do número de cromossomos sexuais são eventos
mais frequentes do que os observados nos cromossomos autos-
Número Cromossômico 99

somos. Em Drosophila o X determina o feminino e o Y contro-


la a fertilidade masculina. A definição sexual nesse díptero está
relacionada ao balanceamento gênico, definido pela relação entre
autossomos e cromossomos sexuais, como mostra o Quadro 5.1.

Drosophila Melandrium
Constituição Constituição
Sexo Razão X/A Sexo Razão X/Y
Cromossômica cromossômica
2 A XXX Superfêmea 1,5 2 A XX Fêmea 0,00
2 A XYY Macho 0,5
2 A XX 2 A XY
2 A XXY 3 A XY
Fêmea 1,0 Macho 1,0
3 A XXX 4 A XY
4 A XXXX 4 A XXYY
3 A XX
Intersexo 0,67
3 A XXY 4 A XXXYY Macho 1,5
4 A XXX Intersexo 0,75
2 A XXY
2AX 3 A XXY Macho
2,0
2 A XY 4 A XXY (flor ocasional)
Macho 0,50
2 A XYY 4 A XXXXYY
4 A XX
3AX Supermacho 0,33 3 A XXXY Macho
3,0
4 A XXXY (flor ocasional)

Hermafrodita
4 A XXXXY 4,0
(flor ocasional)

Quadro 5.1 – Sexo em Drosophila. Modificada de Swanson, tab. 5.2.

No homem, o Y define o sexo masculino. Sua participação na


definição sexual masculina se dá na diferenciação gonadal. As
mulheres com cariótipo 45,X são relacionadas com o fenótipo da
Síndrome de Turner, como mostra o Quadro 5.2, sua variação fe-
notípica é associada a variações de deficiência no braço curto do
cromossomo X. Em camundongos as fêmeas X0 e XX são férteis.
100 Citogenética

Número de
Constituição dos
Número de corpos de
cromossomos Fertilidade Observações
cromossomos cromatina
sexuais
sexual (Barr)
46 XY 0 + Macho normal
47 XYY 0 ± Macho
Habitus masculinos

Síndrome de Klinefelter:
47 XXY 1 −
mentalmente retardado
48 XXXY 2 − Semelhante a Klinefelter
49 XXXXY 3 − Severamente retardado
49 XXXYY 2 − Semelhante a Klinefelter
48 XXYY 1 − Semelhante a Klinefelter
46 XX 1 + Fêmea normal
Habitus femininos

45 XO 0 − Síndrome de Turner
Síndrome do X triplo;
47 XXX 2 ±
mentalmente retardado
48 XXXX 3 ? Mentalmente retardado
49 XXXXX 4 ? Mentalmente retardado
Aparência de ♂ ou ♀;
45/46 XO/XY 0 −
♂ Pseudo-hermafrodita
45/46 XO/XX 0/1 − Síndrome de Turner
Mosaicos

46 XX/XY 0/1 − Hermafrodita verdadeiro


46/47 XX/XXY 1 − Síndrome de Klinefelter
Alguns são hermafroditas
46/47 XX/XXX 1/2 −
verdadeiros
45/46/47 XO/XX/XXX 0/1/2 − Semelhantes a Turner
45 + “Y deficiente”; pode ter
Mudanças estruturais

0 −
fragmento Xy habitus ♂ ou ♀

45 + “X deficiente” nenhum
1 (pequeno) −
fragmento Xx defeito mental sério
“Isocromossomo X”
46 X 1 (grande) −
semelhante a Turner

Quadro 5.2 – Sexo no homem. Original de V. O. J. Miller, Am. J. Obstet. Gynecol., 90: 1078-1139, 1964. Modificada de Swanson, tab. 5.3.

5.1.5 Cromossomos acessórios


Nos cariótipos de plantas e de animais ocorrem cromossomos
supranumerários apresentando pouca homologia com os cromos-
Número Cromossômico 101

somos do conjunto haploide. Não se conhece a origem e a função


dos cromossomos acessórios.

5.1.6 Fusão Cêntrica


A aneuploidia altera, com aumento ou redução, o número diploi-
de de cromossomos. A fusão e fissão cêntrica podem, eventualmen-
te, alterar o número de centrômeros mantendo constante o número
de braços cromossômicos, com pequenas perdas de material cro-
mático. A fusão é possível com dois cromossomos acrocêntricos,
formando um cromossomo metacêntrico ou submetacêntrico, de-
pendendo do tamanho dos cromossomos envolvidos na fusão cên-
trica. O processo inverso é a dissociação ou fissão, formando dois
cromossomos acrocêntricos, sem perda da atividade centromérica.
A fusão cêntrica entre cromossomos acrocêntricos é conheci-
da como translocação robertsoniana que estabelece “o número de
cromossomos pode variar, e o número de braços é constante. Estes
eventos já foram observados no processo de evolução dos carió-
tipos de vários grupos de animais, são exemplos os mussaranhos
macho e fêmea, ver a Figura 5.1, e caracol marinho ver a Figura
5.2. Entre os grandes primatas existe uma variação acentuada en-
tre o número de cromossomos acrocêntricos, mantendo constante
o número diploide, Quadro 5.3.

Morfologia Cariotípica
Autossomos Cromossomos
Num. sexuais
Espécie Acrocêntricos
diploide Metacêntricos
Grande Pequeno X Y
Pongo pygmaeus
48 26 16 4 M M
(orangotango)
Gorilla gorilla gorilla
48 30 12 4 M M
(gorila das baixadas)
Gorilla gorilla beringei
48 30 12 4 M ?
(gorila das montanhas)
Pan troglodytes troglodytes
48 34 8 4 M A
(chimpazé)
Pan troglodytes paniscus
48 36 8 2 M A
(chimpanzé pigmeu)
Homo sapiens 46 34 6 4 M A
Quadro 5.3 – Cariótipos em Primatas. Original de J.L. Hamerton e cols. Cytogenetics, 2: 240-263, 1963. Modificado de Swan-
son, tab. 5.4.
102 Citogenética

A fusão cêntrica pode unir o cromossomo X a cromossomos


autossomos, alterando o padrão de autossômicos para ligados ao
sexo, em adição, formar um novo cromossomo Y. Processo veri-
ficado, em pelo menos, 12 espécies de Drosophila, e em algumas
outras moscas, nos escaravelhos, por exemplo, e na sub-família
Morabinae, e os gafanhotos sem asa na Austrália.
Os cariótipos da truta arco-íris indicam que há fusão e dissocia-
ção cêntrica entre indivíduos de diferentes espécies e, nos tecidos
de um mesmo indivíduo. O número diploide varia de 58 a 104
cromossomos, como mostra o Quadro 5.4.

Número diploide 58 59 60 61 62 63 64 65
Acrocêntricos 12 14 16 18 20 22 24 26
Embrião inicial 6 40 8 10 2 5
Baço 2 14 7
1 mês

Rim 3 14 1
Fígado 3 19 22 3 6 1
Baço 13 15 3 1
8 meses

Rim 10 10 4
Ovário ou 3 1 6 5 9 2
Testículos 19
Quadro 5. 4 – Cromossomos na
Baço 19
meses

Truta. Segundo S.Ohno, E. Faisst


18

Testículos 4 16 5 3 e M. T. Zenzes. Modificada de


Swanson, tab. 5.5.

5.1.7 Euploidia
É a variação do conjunto haploide de cromossomos. Ela apare-
ce nas formas haploide, diploide, triploide, tetraploide, octaploide,
entre outras. A forma haploide tem um único genoma. A forma
diploide tem dois conjuntos haploides, iguais ou diferentes.

Haploidia
A haploidia é, usualmente, considerada anormal. No entanto ela
é normal nos estágios gametofíticos em plantas inferiores e nos
machos de alguns insetos. Nos machos de abelhas melíferas, na
primeira divisão meiótica os cromossomos migram para uma úni-
ca célula viável. A segunda divisão meiótica é regular, consequen-
Número Cromossômico 103

temente não há redução do número de cromossomos na meiose de


machos haploides.

Autopoliploidia
Uma espécie diploide tem dois genomas AA, seu autotriploide
é AAA que pode ser produzido pela fecundação de um gameta
haploide por outro diploide que não sofreu redução na meiose, o
autotetraploide é AAAA que pode ser produzido pela fecundação
de dois gametas que não sofreram redução na meiose. As autodi-
ploidias são raras em populações naturais. No entanto, podem ser
obtidas em laboratório.
Os organismos autopoliploides possuem células maiores em te-
cidos ou órgãos.
Citologicamente, os autopoliploides são caracterizados e identi-
ficados pela ocorrência de multivalentes na meiose I.

Alopoliploidia
Um alotetraploide do tipo AABB pode ser gerado pela dupli-
cação do número de cromossomos de um híbrido F1 entre as es-
pécies A e B. A duplicação do número de cromossomos forman-
do o alotetraploide AABB cria as condições necessárias para sua
segregação regular, se a hibridação não envolver esterilidade, ou
a viabilidade dos híbridos. É o que se observa no cruzamento ex-
perimental entre Rhaphanus e Brassica, são dois gêneros vegetais
cujas espécies mais conhecidas popularmente são o rabanete e a
couve, respectivamente. Este experimento indica que o mesmo
pode ocorrer entre espécies na natureza.
O trigo é um hexaploide, 2n é 42, dos genomas A, B e D que
foram relacionados com parentes selvagens. Na meiose ocorre a
formação de bivalentes e gametas com 21 cromossomos. A poli-
ploidia entre os vegetais pode representar um alto significado evo-
lutivo entre esses organismos.

Poliploidia em Animais
Entre os animais, em relação ao que ocorre entre as plantas, a
poliploidia pode ser muito limitada. Onde ela é conhecida, pode,
eventualmente, estar relacionada a partenogênese.
104 Citogenética

Resumo
Discutiu-se a variação numérica dos cromossomos na célula. So-
bre as aneuploidias que são variações do número de cromossomos
do par. Aneuplodias autossômicas: trissomias, que trata da ocor-
rência de um cromossomo adicional ao mesmo par; monossomia,
que a ocorrência de falta de um cromossomo no par. Aneuploidias
dos cromossomos sexuais. Cromossomos acessórios. Fusão cên-
trica, que reduz o número cromossômico mantendo constante o
número de braços. Euploidias, que a variação no número n, isto é
o conjunto haploide de cromossomos na célula, como importante
mecanismos evolutivo, destacando-se, nos vegetais, haploidia, au-
topoliploidia, alopoliploidia e, poliploidia em animais.

Bibliografia
Alberts, Bruce; Johnson, Alexander; Lewis, Julian; Raff,
Martin; Roberts, Keith; Walter, Peter. Célula. Porto Alegre:
Artmed, 2007.
Griffiths, Anthony J. F.; Wessler, Susan R.; Lewontin,
Richard C.; Gelbart, William M.; Suzuki, David T.; Miller,
Jeffrey H. Introdução à Genética. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanaba-
ra Koogan, 2006.
GUERRA, M. (Org.). FISH - Conceitos e aplicações na citogené-
tica. Ribeirão Preto: Sociedade Brasileira de Genética, 2004.
KASAHARA, S. Práticas de citogenética. Ribeirão Preto: Socie-
dade Brasileira de Genética, 2003. v. 1. [Série Cadernos].
LORETO, E. L. S.; SEPEL, L. M. N. Atividades experimentais e
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SWANSON, Carl Pontius; MERZ, Timothy; YOUNG, William J.
Citogenética. São Paulo: USP, 1969.
c a p í t u lo 6
c a p í t u lo 6
Cromossomos Humanos em
Metáfase
Você poderá descrever a metodologia tradicional de ob-
tenção de cromossomos humanos em metáfase, as síndromes
envolvendo alterações numéricas e estruturais dos cromos-
somos 21, 18, 13, 5, Y e X, e suas principais consequências.
Estudará a determinação e a diferenciação sexual masculina
e feminina.
Cromossomos Humanos em Metáfase 109

O passo inicial para estudar os cromossomos humanos em


metáfase é importante saber como eles são obtidos. Em geral, os
cromossomos podem ser estudados em fase da divisão celular, ou
mesmo do ciclo celular, tanto em coleta in vivo, quanto em prepa-
ração in vitro. Em laboratórios de Citogenética Humana, em geral,
prefere-se a cultura de células. Sejam elas de origem fetal, sanguí-
nea ou epitelial. Para alcançarmos nossos objetivos, isto é, identifi-
car os cromossomos, será abordada apenas cultura temporária de
linfócitos, ver a Figura 6.1.
Usa-se, em geral, meio de cultura de células, a este adiciona:
água tri-destilada para dissolução, bicarbonato de sódio como sis-
tema tampão da atividade de divisão celular, penicilina G, estrep-
tomicina e micostatin para evitar a proliferação de microorganis-
mos presente, naturalmente, no sangue. O meio assim preparado é
filtrado em placas de celulose, distribuído em alíquotas em frascos
estéreis hermeticamente fechados.
Para cultura de linfócitos usa, em geral, sangue venoso coletado
com heparina estéril. Separar as hemácias por sedimentação na-
tural, evitando a centrifugação. Usar só o creme leucocitário que
se forma na interface das hemácias com o plasma, transferindo-o
em gotas aos frascos com meio de cultura. Na sequência, adicionar
fito-hemaglutinina com a finalidade de estimular a divisão dos lin-
fócitos. Manter os frascos com as células em cultura em estufa de
cultura de tecido, com temperatura constante de 37ºC por 70/72
horas. Antes do final deste tempo, de 2 a 4 horas, adicionar colchi-
cina, com a finalidade de interromper a continuidade da divisão
celular na metáfase.
110 Citogenética

Cultura Celular Preparação


sangue
periférico fitoemoaglutinina colchicina
(mitógeno) (aproximadamente 2h)
linfócitos

multiplicação
centrifugação
celular
aproximadamente
72h
meio sedimento
nutritivo celular
Solução hipotônica
de cloreto de potássio
(aproximadamente 20 min)
centrifugação

pipetagem centrifugação

sedimento
fixação
celular
distribuição do material,
gota, sobre a lâmina

coloração colocação da lâmina


aquecimento

preparação

cuba de coloração

análise ao microscópio

fotografia e
recorte

Figura 6.1 – Método de


cultura de linfócitos para
análise de cromossomos
em metáfase. Fonte:
Passarge, 1995.
cariograma ou cariótipo metáfase ao microscópio Redesenhado de Borges-
Osório, Figura 4.3.
Cromossomos Humanos em Metáfase 111

Primeiro Passo-a-Passo
1. Colocar heparina estéril na seringa ou tubo coletor de sangue;
2. Coletar sangue venoso;
3. Separar as hemácias do plasma por sedimentação natural,
evitar centrifugação;
4. Descartar o plasma sobrenadante;
5. Usar o creme leucocitário rico em linfócitos, fração esbran-
quiçada sedimentar que separa o plasma das hemácias;
6. Transferir gotas do creme leucocitário para frascos com
meio de cultura previamente preparados;
7. Adicionar fito-hemaglutinina ao frasco de cultura;
8. Levar o frasco de cultura para a estufa de cultura de células,
a 37 graus centígrados, por 68 a 70 horas;
9. Adicionar colchicina ao frasco de cultura, ao final daquele
tempo, mantendo-o na estufa por 2 a 4 horas;
10. Fazer a preparação citológica.

A preparação citológica é feita ao final do tempo da cultura, se-


parando as células em suspensão do meio de cultura por centrifu-
gação. As células são tratadas com solução hipotônica adequada
com a finalidade de encher as células em mitose na fase de me-
táfase. Nesta fase a célula só tem a membrana plasmática sem a
membrana nuclear. A hipotonização das células promoverá a dis-
tribuição dos cromossomos de forma homogênea por todo o seu
interior. As células hipotonizadas são tratadas com uma solução
de metano, como fixador. Em seguida as células, em suspensão,
são transferidas para lâminas de microscopia por gotejamento. As
lâminas são tratadas com corante específico para cromossomos,
secada ao ar e observá-las ao microscópio óptico.
112 Citogenética

Segundo Passo-a-Passo
1. Separar as células em suspensão no meio de cultura por
centrifugação;
2. Hipotonizar as células com solução adequada;
3. Fixar as células com solução de metanol;
4. Transferir as células em suspensão para lâminas de micros-
copia, por gotejamento, secar as lâminas ao ar;
5. Corar os cromossomos com corante específico, sobre as lâ-
minas, secá-las ao ar;
6. Observar as lâminas coradas ao microscópio ótico.
7. Fazer a preparação citológica.

Os procedimentos aqui discutidos permitem identificar os cro-


mossomos e analisar alterações numéricas e algumas estruturais
maiores. As diferentes técnicas de bandeamentos cromossômicos
e, marcadores fluorescentes permitem identificar aberrações cro-
mossômicas menores e, são de grande valia no diagnóstico de im-
portantes cromossomopatias.
O conjunto haploide de cromossomos humanos é constituído
de 22 cromossomos autossômicos mais o cromossomo Y e/ou o
cromossomo X. Logo, o seu conjunto diploide é constituído de 44
cromossomos autossômicos mais XX ou XY, ou seja, os cariótipos
de mulher e homem são, respectivamente, 46,XX e 46,XY.
Os pares dos cromossomos autossômicos são numerados, em
ordem decrescente de tamanho, de 1 a 22, e os cromossomos se-
xuais são denominados de X e Y. Os cromossomos são ordenados
pelo tamanho e posição do centrômero nos grupos A, B, C, D, E,
F, e G, na montagem do cariograma, que é a forma de apresenta-
ção dos cariótipos. Esta é uma forma convencional e, sua acurácia
dependerá do poder de resolução da técnica utilizada e, da capaci-
tação técnica do laboratório.
Cromossomos Humanos em Metáfase 113

•• Grupo A: é o grupo dos cromossomos metacêntricos grandes.


Ele é constituído pela ordenação dos pares 1, 2, 3, ver a Figura 6.2;
•• Grupo B: é o grupo dos cromossomos submetacêntricos gran-
des. Ele é constituído pela ordenação dos pares 4, 5, ver a Figura
6.3;
•• Grupo C: é o grupo dos cromossomos submetacêntricos mé-
dios. Ele é constituído pela ordenação dos pares 6, 7, 8, 9, 10, 11,
12 mais o(s) cromossomo(s) X, ver a Figura 6.4. O cromossomo
X tem tamanho intermediário entre os cromossomos 6 e 7;
•• Grupo D: é o grupo dos cromossomos acrocêntricos grandes.
Ele é constituído pela ordenação dos pares 13, 14, 15, ver a Fi-
gura 6.5;
•• Grupo E: é o grupo dos cromossomos submetacêntricos peque-
nos. Ele é constituído pela ordenação dos pares 16, 17, 18, ver a
Figura 6.6;
•• Grupo F: é o grupo dos cromossomos metacêntricos pequenos.
Ele é constituído pela ordenação dos pares 19, 20, ver a Figura 6.7;
•• Grupo G: é o grupo dos cromossomos acrocêntricos pequenos.
Ele é constituído pela ordenação dos pares 21, 22 mais o cro-
mossomo Y, se houver, ver a Figura 6.8.

6.1 Alterações nos Cromossomos Autossômicos


Pouco se conhecia sobre citogenética humana até 1956, quando
Joe-Hin Tijo (1919-) e Albert Levan (1905-1998) desenvolveram
as técnicas que permitiram o estudo dos cromossomos humanos.
Em 1959, Lejeune demonstrou que a Síndrome de Down se devia a
trissomia do cromossomo 21. Sabemos hoje que as anomalias cro-
mossômicas constituem uma categoria importante de doenças gené-
ticas. Elas estão relacionadas, principalmente, à deficiência mental.
A origem das alterações cromossômicas está relacionada com:
idade materna avançada, genes predisponentes à não-disjunção
dos cromossomos na divisão celular, doenças auto-imune, ra-
114 Citogenética

6
7 6 6
3 5 5
4 4 6 5 5
3 5 1 1
p 2 2 3 2 4 4 4
2
1 1 3 3 3
6 2 21 21
2 5
1
21 1
2 1 4
1 4
3 1 3 1
3
3 1 2 2
1 2 2 1 3
1 1
1 1 1
2 1 2 4
1 2 1 3 1 2 3 5
4 3 2 4
1 5 1
1 1 6 2 2
2 2 2 2 7 3
q 3 2 3 3 8
4 4
5 4 1
1 2 5 1 2
3 1 6 2 3
2
1 2 3 3 3 4
2 3 3 78 4 5
4 3 4 9 5
4 5
6
7
1 2 3 4 5

A B

1 2 3 4 5

Figura 6.2 – Cromossomos do Grupo A. Redesenhados de Borges- Figura 6.3 – Cromossomos do Grupo B. Rede-
Osório, Figura 4.5 e 4.15. senhados de Borges-Osório, Figura 4.5 e 4.15.

5
4
2 3 2 2
2 1 3 4
1 2 2 3 5
5 2 2 5 1 3
p 4 1 1 1 4 4
1 1 3 3 3 1 2
2 2 3 2 2
2 1 1
1 2 1 1
1 1
21 1 1 1 2 1 1
3 1 1 1 1 3 2
2 2 1
1 4 1 3 3 1 1
3
2 4 4
5 2 1 5
6 2 1 2 1
1 2 2 2
3 2
q 1 2 2 1 4 3 2 1
1 2 3 2
3 2 5 4
2 3 3 3 5 3
2 3 45 4 6 4
4 4
5 6
6
7
6 7 8 9 10 11 12

6 7 8 9 10 11 12

Figura 6.4 – Cromossomos do Grupo C. Redesenhados de Borges-Osório, Figura 4.5 e 4.15.


Cromossomos Humanos em Metáfase 115

p 3 1 3 1 23 1
1 21 2 1 1 3 3
1 2 1
2 1 2
1
2 3 2 1 1
1 3 1 3 1 4 1 1
4 5
1 1
2 2 1 1 2 1 12
q 1 2 1 12
3 2 3 3
2 2
4 4 1
1
1 1 5
2 2 2 2 1
3 2
3 3 2
6 3 3 2 2
4 4 4 3
5
13 14 15 16 17 18

D E

13 14 15 16 17 18

Figura 6.5 – Cromossomos do Grupo D. Redesenhados de Borges- Figura 6.6 – Cromossomos do Grupo E. Redesenhados de
Osório, Figura 4.5 e 4.15. Borges-Osório, Figura 4.5 e 4.15.

1 3 1 3
p 2
Bandas Q e G negativas 2 1
1
ou de coloração clara Figura 6.7 (à esquerda)
1
Bandas R positivas 1 2 1 1 Cromossomos do Grupo F.
q 2 Redesenhados de Borges-
Bandas Q e G positivas 3 3
Osório, Figura 4.5 e 4.15.
Bandas R negativas 19 20

Bandas Variáveis F

2
19 20 2 1

1 1
1
1 3 3
1 1 1 2
21 2
1 3
1 1 1
1
1 1 2 1 1
2 2
2 2 3
3 4
2 5
21 22 Y 6
7
8
G X

Figura 6.8 – Cromossomos ou


do Grupo G. Redesenhados 21 22
de Borges-Osório, Figura 4.5
e 4.15. XX = XY =
116 Citogenética

diação ionizante, vírus, agentes teratogênicos e anormalidades


cromossômicas.
As aberrações cromossômicas são classificadas em numéricas e
estruturais. As aberrações numéricas são classificadas em euploi-
dias e aneuploidias. A euploidia é alteração no número de Geno-
ma. São os cariótipos haploide ou, monoploide ou n, triploide ou
3n, tetraploide ou 4n, octaploide ou 8n. A aneuploidia é a variação
do número de cromossomo de um ou mais pares.

São as nulissomia ou 2n-2, monossomia ou 2n-1, trissomia ou


2n+1, tetrassomia ou 2n+2, trissomia dupla ou 2n+1+1. As aber-
rações estruturais alteram a distribuição ou a sequência dos genes
ao longo do cromossomo. São elas: translocação unidirecional;
translocação recíproca; translocação robertsoniana; inserção; de-
ficiência ou deleção; inversão paracêntrica; inversão pericêntrica;
cromossomo em anel; cromossomo dicêntrico e isocromossomo.
A monossomia do X e Y é condição normal no homem e, a nulis-
somia do Y é condição normal na mulher.

A nomenclatura dos cromossomos e o registro das aberrações


cromossômicas são feitos segundo normas de notação preconiza-
das pelas Conferências de Denver, em 1960; Londres, em 1963;
Chicago, em 1966; Paris, em 1971; Estocolmo, em 1977; Edimbur-
go, em 1979, além de outros.
São modelos de estudo das aberrações autossômicas, entre ou-
tras, Síndrome de Down, Síndrome de Edwards, Síndrome de Pa-
tau, Síndrome do Miado do Gato.

6.1.1 Síndrome de Down


A Síndrome de Down, Síndrome da Trissomia do Cromossomo
21, foi descrita por John Langdon Haydon DOWN (1828-1896)
sob o nome de idiotia mongólica em 1866. A trissomia do cro-
mossomo 21 foi descrita por Jérôme Jean Louis Marie LEJEUNE
(1926-1994), Marthe Gautier (-) e Raymond Alexandre TUR-
PIN (1895-1988) em 1959, relacionando-a a Síndrome de Down.
Cromossomos Humanos em Metáfase 117

A Síndrome do Down foi a primeira anomalia cromossômica des-


crita. Em 1960 havia 39 confirmações da etiologia da Síndrome
de Down como sendo devidas a trissomia do cromossomo 21. A
denominação mongolismo não deve ser usada.
As principais características, entre outras, são: Q.I. situado en-
tre 15 e 50; apresentam uma boa capacidade imitativa e rítmica;
são alegres; braquicefalia com a face achatada; fendas palpebrais
oblíquas; pregas epicânticas, sobreposição proximal da pálpebra
superior; cílios curtos e ralos; estrabismo convergente; nistágmo,
movimento involuntário do globo ocular; nariz pequeno e acha-
tado; língua protusa; palato ogival, dentição irregular; maxilar hi-
poplásico, pouco desenvolvido em relação a mandíbula; pavilhão
auricular pequeno e dismórfico; pescoço curto e grosso; defeitos
septais; pênis pequeno; clitóris e lábios vaginais pouco desenvolvi-
dos; dedos curtos e grossos; prega única no quinto dedo; prega pal-
mar transversal única; hálux afastado, dedo grande dos afastados;
sindactilia, dedos colados um ao outro; baixa estatura; frouxidão
dos ligamentos; hipotonia, tônus muscular baixo. Ver Figura 6.9.

Figura 6.9 – Síndrome de Down: principais sinais. Original em Beçak, Figura 5.8.

A incidência, aproximada, da Síndrome de Down ao nascimen-


to, na décima sexta semana de gestação e, entre a nona e a décima
primeira semana de gestação em relação à faixa etária ou a idade
materna é mostrada na Tabela 5.
118 Citogenética

  Exame
Idade Ao nascimento 16ª semana 9ª a 11ª semana
15/19 1/1.250 ... ...
20/24 1/1.400 ... ...
25/29 1/1.100 ... ...
30 1/900 ... ...
31 1/900 ... ...
32 1/750 ... ...
33 1/625 1/420 1/370
34 1/500 1/333 1/250
35 1/385 1/250 1/250
36 1/300 1/200 1/175
37 1/225 1/150 1/175
38 1/175 1/115 1/115
39 1/140 1/90 1/90
40 1/100 1/70 1/80
41 1/80 1/50 1/50
42 1/65 1/40 1/30
43 1/50 1/30 1/25
44 1/40 1/25 1/25
45 e + 1/25 1/20 1/15

Quadro 6.1 – Síndrome de Down: frequências ao nascimento, décima sexta semana de


estação, nona a décima primeira semana de gestação. Originais de Hsu, 1998 e Gardner
e Sutherland, 1996. Modificado de Thopson, quad. 10.1

A sobrevivência dos portadores da Síndrome de Down está re-


lacionada ao nível de assistência à saúde que recebem.
A Citogenética na Síndrome de Down pode ser assim resumi-
da: Trissomia do Cromossomo 21; Translocação Robertsoniana;
Translocação 21q21q; Síndrome de Down em Mosaico; Trissomia
Parcial do Cromossomo 21.
Cromossomos Humanos em Metáfase 119

6.1.2 Síndrome de Edwards


A Síndrome de Edwards foi descrita por John Hilton Edwards
(1928-2007) e colaboradores em 1960, como sendo devida a tris-
somia do cromossomo 18. A trissomia do cromossomo 18 foi a se-
gunda aberração cromossômica descrita. O cariótipo é, em geral,
47,XX +18 ou 47,XY +18.
As mães dos portadores da Síndrome de Edwards têm, em ge-
ral, mais de 35 anos de idade. A incidência dessa Síndrome é da
ordem de 1/8.000. Seus portadores morrem, em geral, na infância.
E apresentam, entre outros, os seguintes sinais: hipodesenvolvi-
mento físico e mental; hipertonia; boca pequena; palato ogival,
micrognatia/retrognatia; orelhas dismórficas, mal formadas, com
implantação baixa; pescoço curto; cardiopatias congênitas; crip-
torquidia, testículos não descem para bolsa escrotal; flexão anor-
mal do indicador; calcanhares proeminentes; artéria umbilical
única; apneia; rins em forma de ferradura; divertículo de Meckel,
hérnia de intestino. Figura 6.10.

Figura 6.10 – Síndrome de Edwards: principais sinais. Originais de W. Pinto Jr.


Modificados de Beiguelman, figura 7.6.
120 Citogenética

6.1.3 Síndrome de Patau


A trissomia do cromossomo 13 foi descrita por Klaus Patau
(1908-1975) e colaboradores em 1960. O cariótipo é, em geral,
47,XX +13 ou 47,XY +13 ou mosaico. Os portadores desta Sín-
drome morrem, em geral, até o segundo ano de vida. Eles apre-
sentam, entre outros, os seguintes sinais: microcefalia; hiperte-
lorismo ocular, distância interpupilar aumentada; microftalmia,
globo ocular reduzido; anoftalmia, ausência de globo ocular; ore-
lhas dismórficas com implantação baixa; pescoço curto; apneias
prolongadas; cardiopatias congênitas; criptorquidia, testículos
não descem para bolsa escrotal; polidactilia; polegares retrofle-
xíveis; prega palmar transversal única; anomalias dos rins e vias
urinárias; lábio e palato fendidos; ovários hipoplásticos; persis-
tência da hemoglobina Gower 2. Figura 6.11.
A incidência é da ordem de 1/10.000, aumentando com o avan-
ço da idade materna. Em mulheres com mais de 35 anos ela de
1/720.

6.1.4 Síndrome do 5p–


A Síndrome do 5p– foi originalmente designada de Síndrome
du cri du chat ou Síndrome do Miado do Gato. Ela foi descrita e
diagnosticada por Lejeune em 1963. Figura 6.11 – Síndrome
de Patau: principais sinais.
A Síndrome do 5p– é causada pela monossomia parcial do bra- Originais de W. Pinto Jr.
ço curto do cromossomo 5. Os seus portadores apresentam, entre Modificados de Beiguelman,
figura 7.8.
outros, os seguintes sinais: choro típico; hipotonia muscular; mi-
crocefalia; pavilhão auricular dismórfico com ou sem implantação
baixa; hipertelorismo ocular, distância interpupilar aumentada;
fenda palpebral antimongoloide; pregas epicânticas, sobreposição
proximal da pálpebra superior; palato ogival; micrognatia e/ou re-
trognatia, mandíbula menor e/ou com implantação anterior; cli-
nodactilia; sindactilia; zigotactilia; prega palmar transversal única
bilateral ou não; trirrádio axial com deslocamento distal; deficiên-
cia mental; hipotrofia muscular. Figura 6.12.
Figura 6.12 – Síndrome do
5p–: Originais de W. Pinto Jr.
Modificado de Beiguelman,
figura 7.12.
Cromossomos Humanos em Metáfase 121

6.2 Determinação do Sexo, Diferenciação Sexual


e Alteração dos Cromossomos Sexuais
A determinação do sexo na espécie humana é definida na fe-
cundação pelo espermatozoide. Se na sua formação contiver o cro-
mossomo Y, será determinada a formação de um zigoto 46,XY, e o
fenótipo será masculino. Ao contrário, se ele contiver o cromosso-
mo X, será determinada a formação de um zigoto 46,XX, e o fenó-
tipo será feminino. Os homens são considerados heterogaméticos
por produzirem dois tipos diferentes de gametas e as mulheres, ao
contrário, são homogaméticas.

6.2.1 Diferenciação Sexual Normal e Anômala.


Alterações dos Cromossomos Sexuais
O diagnóstico do sexo é definido pela aparência dos genitais
externos. A criança ao nascer, se normal, e apresentar pênis e bolsa
escrotal é classificada como do sexo masculino, ou se apresentar
vagina é classificada como do sexo feminino, ao que pode ser cha-
mado de sexo genital externo. Esta classificação é definida pelas
aparências dos genitais externos, no entanto, Beiguelman (1986),
demonstra que em muitos casos é necessário considerar outros
critérios objetivos. É necessário, igualmente, que a aparência dos
genitais externos tenha correspondência com o sexo genital inter-
no, e o sexo gonadal. É importante que à presença de testículos e
genitais masculinos corresponda o cariótipo 46,XY, e, ovários e ge-
nitais femininos corresponda o cariótipo 46,XX. Os cromossomos
sexuais indicam, para cada cariótipo, o respectivo sexo cromossô-
mico. Os núcleos interfásicos de células masculinas são cromatina
X negativa e, cromatina Y positiva, o inverso ocorre com os núcle-
os interfásicos femininos, são cromatina X positivas e cromatina
Y negativos, isso se dá o nome de sexo nuclear. A diferenciação
hormonal, importante no desenvolvimento e aparecimento dos
caracteres sexuais secundários, é definida como sexo endocrinoló-
gico. A aceitação, ou não, do indivíduo ao sexo que lhe é atribuído
define o sexo psicológico. As ações da sociedade sobre as pessoas,
aceitando-as em um outro sexo, define o sexo social.
122 Citogenética

6.2.2 Estado Sexualmente Neutro


O sexo do zigoto é definido na fecundação, o qual é sexualmen-
te neutro anatomicamente até a 7a semana de gestação. Na 6a se-
mana constata-se a presença de pregas gonadais; células germi-
nativas primordiais, as quais são fontes das espermatogônias ou
ovogônias. As gônadas embrionárias, até a 7a semana, são indi-
ferenciadas ou bissexuais. Os dutos de Wolff, que vão dar origem
aos genitais masculinos e, os dutos de Müller, que dão origem aos
genitais femininos, estão presentes, simultaneamente, até a 7a se-
mana de gestação.

6.2.3Diferenciação Sexual Masculina


Ela se dá na presença do cromossomo Y, e por ação do antíge-
no HY que transforma a gônada bissexual em testículos e genitais
internos e externos. As mulheres são antígenos HY negativas. Par-
ticipam os hormônios antimüllerianos e testosterona.

6.2.4 Diferenciação Sexual Feminina


Ela é passiva e se dá na ausência do gene SRY, de hormônio
antimülleriano e testosterona. Isto é, na ausência do cromossomo
Y. A presença de dois cromossomos X íntegros, na ausência do
cromossomo Y, é condição necessária para o desenvolvimento de
ovários funcionais.

6.2.5 Determinação Anômala do Sexo


Os cariótipos 47, XXY, 48,XXYY, etc. determinam a formação
de testículos azoospérmicos, não produzem espermatozoides. O
cromossomo Y supranumerário, acompanhado de um único cro-
mossomo X não provoca, em geral, alterações sexuais. O cariótipo
45,X leva ao desenvolvimento de disgenesia ovariana. Os carióti-
pos 45,X ou 46,XX,q- determinam a esterilidade e constituem a
disgenesia gonadal pura, mal formação das gônadas . Os mosaicos
45, X/46, XY; 45, X/47, XYY formam disgenesias gonadais mistas
e, genitais externos ambíguos.
Cromossomos Humanos em Metáfase 123

6.2.6 Pseudo-Hermafroditismo Feminino


Cariótipo 46,XX, leva ao desenvolvimento de ovários e dutos
genitais femininos. Apresenta genitais externos masculinizados
em grau variado. A Síndrome Adrenogenital apresenta herança
autossômica recessiva.

6.2.7 Pseudo-Hermafroditismo Masculino


Apresenta cariótipo 46, XY, gônadas anormais. Na Síndrome da
Feminilização Testicular ocorre genitália externa feminina, testí-
culos localizados na região inguinal, vagina em fundo cego, ame-
norreia primária. É de ocorrência familial.

6.2.8 Hermafroditismo
Apresenta cariótipos 46, XX ou 46, XX/46, XY, é a ocorrência de
tecidos testicular e ovariano no mesmo indivíduo.

6.2.9 Síndrome de Turner


O cariótipo é 45, X. apresenta infantilismo se-
xual, baixa estatura e pescoço alado. Ver figura
6.13.

6.2.10 Síndrome de Klinefelter


O cariótipo é 47, XXY. Apresenta ginecomas-
tia, microrquidia e azoospermia. Ver figura 6.14.

6.3 Cromossomo Mitocondrial


Quando se discute cromossomos é natural não
considerar os cromossomos nas mitocôndrias, o
que é compreensível, por ele ser considerado, na
Figura 6.13 – Síndrome Figura 6.14 – Síndrome maioria das vezes, como um cromossomo em
de Turner: principais de Klinefelter: principais
sinais. Originais de sinais. Original de M.A. simbiose com o genoma dos eucariotos. Ao estu-
Goodman e Gorlin. Ferguson-Smith, 1966. dar os cromossomos em geral e, em particular, os
Modificado de Borges- Modificado de Thopson,
Osório, figura 4.35. figura 10.17.
124 Citogenética

cromossomos humanos é importante considerá-lo, por que não o


vigésimo quinto cromossomo humano, ver a Figura 6.15.

Surdez induzida por


aminoglicosídeo Surdez
Miopatia
MELAS Deficiência respiratória
MELAS MILS
PEO 12S F
V Miopatia
Miopatia, PT
cardiomiopatia, Miopatia
16S Citb
diabetes e surdez
E LHON/
MELAS L Distonia
ND6
LHON ND1 MELAS
PEO I mtDNA humano
Cardiomiopatia Q
M 16.569 pb ND5
ND2
Coréia W Deleção
MILS A típica em
N L
PEO C KSS/PEO S Anemia
Y H
Encefalopatia Miopatia
COX I
Miopatia ND4L/4 LHON
S
D R
MERRF COX II ND3 LHON/
COX III
K ATPase 8/6 G Distonia
Surdez, ataxia;
mioclono Cardiomiopatia
Surdez, MELAS
cardiomiopatia MERRF NARP
Mioglobinúria Encefalomiopatia
MILS
FBSN

Figura 6.15 – Cromossomos mitocondrial: mapa do DNA mitocondrial humano. Original


de S. DiMauro et al., Biochim. Biophys. Acta 1366:199-210, 1998.

Resumo
Discutiu-se, sobre os cromossomos humanos, alterações autos-
sômicas destacando as síndromes clássicas que ilustram os respec-
tivos conteúdos: Síndrome de Down ou trissomia do cromossomo
21; Síndrome de Edwards ou trissomia do cromossomo 18; Síndro-
me de Patau ou trissomia do cromossomo 13; Síndrome do Miado
do Gato ou monossomia parcial do braço cruto do cromossomo 5,
ou síndrome do 5p-. Sobre os cromossomos sexuais, abordou-se,
Cromossomos Humanos em Metáfase 125

preliminarmente, os temas: a determinação do sexo, diferenciação


sexual normal e anômala; seguidos de: determinação anômala do
sexo cromossômico; pseudo hermafroditismo masculino e femi-
nino; hermafroditismo; Síndrome de Turner; Síndrome de Kline-
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