Capítulo 1 Do E-Book-mesclado

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DEMOGRAFIA

BÁRBARA BÄCKSTRÖM, FÁTIMA DE SOUSA E HELENA DIAS

UNIVERSIDADE ABERTA | 2021


Copyright © UNIVERSIDADE ABERTA — 2021
Palácio Ceia • Rua da Escola Politécnica, 147
1269-001 Lisboa – Portugal
www.uab.pt

Coleção: eUAb | Coleção Universitária; N.º 26


ISBN: 978-972-674-902-8
DOI: https://doi.org/10.34627/wwgv-k927
INDICE

PREFÁCIO

INTRODUÇÃO

1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA


1.1 O QUE É A DEMOGRAFIA?
1.2 SOMOS TODOS ATORES POPULACIONAIS
1.3 OS ASPETOS FUNDAMENTAIS E OBJETIVOS DA DEMOGRAFIA
1.4 UNIDADE E DIVERSIDADE DA DEMOGRAFIA
1.5 CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO E DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO

2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS
2.1 O QUE É UMA POPULAÇÃO?
2.2 PRIMEIROS ESCRITOS SOBRE A POPULAÇÃO E A CONSTITUIÇÃO DA CIÊNCIA
DEMOGRÁFICA
2.3 OS PRIMEIROS DEMÓGRAFOS
2.4 TEORIA DA TRANSIÇÃO DEMOGRÁFICA

3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À


QUALIDADE DOS DADOS
3.1 OS DADOS EM DEMOGRAFIA
3.2 OS RECENSEAMENTOS
3.3 AS ESTATÍSTICAS DEMOGRÁFICAS DE ESTADO CIVIL
3.4 OUTRAS FONTES DEMOGRÁFICAS
3.5 QUALIDADE DOS DADOS – TESTES ELEMENTARES À QUALIDADE DOS DADOS
3.5.1 A Relação de Masculinidade dos nascimentos
3.5.2 O Índice de Irregularidade das idades
3.5.3 O Índice de Whipple
3.5.4 O Índice Combinado das Nações Unidas (ICNU)

4. A NATALIDADE, FECUNDIDADE, NUPCIALIDADE E DIVÓRCIO


4.1 A NATALIDADE E A FECUNDIDADE
4.1.1 Taxa bruta de natalidade

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ÍNDICE

4.1.2 Taxa de fecundidade geral


4.1.3 Índice sintético de fecundidade
4.1.4 Taxa bruta de reprodução e taxa líquida de reprodução
4.1.5 Fecundidade – nível de substituição
4.2 NUPCIALIDADE E DIVÓRCIO: MEDIDAS ELEMENTARES DE ANÁLISE
4.2.1 Taxa bruta de nupcialidade
4.2.2 Casamento e família
4.2.3 Sexualidade
4.2.4 Contraceção e controle da natalidade

5. A MORTALIDADE
5.1 A MORTALIDADE
5.2 MEDIR A MORTALIDADE
5.2.1 A Taxa Bruta de Mortalidade
5.2.2 A mortalidade por idades e por grupos de idades
5.3 A MORTALIDADE INFANTIL
5.3.1 A Taxa de Mortalidade Infantil clássica
5.3.2 As componentes da Mortalidade Infantil
5.3.3 A mortalidade materna
5.4 A MORTALIDADE DIFERENCIAL. CAUSAS DE MORTALIDADE
5.5 TÁBUA DE MORTALIDADE. A ESPERANÇA DE VIDA
5.5.1 O Princípio da Translação: a construção das tábuas de mortalidade

6. AS MIGRAÇÕES
6.1 O QUE É MIGRAÇÃO?
6.2 DETERMINANTES DA MIGRAÇÃO
6.3 TEORIAS DE MIGRAÇÃO
6.4 MIGRAÇÃO INTERNACIONAL
6.5 IMPACTOS DA MIGRAÇÃO
6.5.1 Impacto no tamanho, composição da população e nas taxas de crescimento
6.5.2 Impacto na Força de Trabalho e na economia
6.5.3 Impacto na composição social
6.6 ANÁLISE DOS MOVIMENTOS MIGRATÓRIOS
6.7 PROBLEMAS E POLÍTICAS DE MIGRAÇÃO

7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES


7.1 TIPOS, VOLUMES E RITMOS DE CRESCIMENTO DE UMA POPULAÇÃO
7.1.1 Tipos de População

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ÍNDICE

7.1.2 As medidas do crescimento


7.2 ANÁLISE DAS ESTRUTURAS DEMOGRÁFICAS: A REPARTIÇÃO POR SEXO E IDADES
7.2.1 Pirâmide de idades
7.2.2 As relações de masculinidade
7.2.3 Os Grupos Funcionais
7.2.4 Índices Resumo
7.2.5 O Envelhecimento da População

8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO


8.1 O MODELO DEMOGRÁFICO DO ANTIGO REGIME
8.2 CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO MUNDIAL ANTES DE 1650
8.3 O CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO NA EUROPA OCIDENTAL E O TERCEIRO “MUNDO
CHEIO”
8.4 O CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO
8.4.1 A Futura população do planeta Terra
8.4.2 Alguns dados sobre a população mundial
8.5 A EXPLOSÃO DEMOGRÁFICA: UM FENÓMENO NOVO OU UM VELHO PROBLEMA
COM NOVAS CARACTERÍSTICAS
8.6 A TERRA NO VIGÉSIMO PRIMEIRO E NO VIGÉSIMO SEGUNDO SÉCULOS
8.6.1 Considerações Ecológicas
8.6.2 Considerações sociológicas e filosóficas

9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLITICAS DE POPULAÇÃO


9.1 DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO
9.1.1 Distribuição da População do Mundo
9.1.2 Distribuição Residencial (geográfica) e urbanização
9.1.3 Consequências da distribuição da população
9.1.4 Distribuição Económica
9.2 POLÍTICAS DE POPULAÇÃO
9.2.1 Como os governos afetam os processos demográficos
9.2.2 As conferências sobre população e desenvolvimento
9.2.2.1 A Primeira Conferência Mundial de População
9.2.2.2 A Segunda Conferência Mundial de População
9.2.2.3 A Terceira Conferência Mundial de População
9.2.3 Politicas que afetam a fecundidade, a mortalidade e a migração

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ÍNDICE

GLOSSÁRIO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS/BIBLIOGRAFIA GERAL – OBRAS DE


REFERÊNCIA

ANEXOS

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PREFÁCIO

Este livro é um recurso ideal para alunos de graduação e pós-graduação em Demografia.


Explica de forma clara as questões demográficas e é orientado para as Ciências Sociais.
Destaca o impacto significativo da tomada de decisão no nível individual – especialmente
em relação à fecundidade, mas também à mortalidade e à migração – na mudança
populacional. O texto permite envolver os estudantes, fornecendo inúmeros exemplos de
aplicações práticas da demografia nas suas vidas e demonstra a extensão da sua relevância
examinando uma ampla seleção de dados de vários países. Cobre os principais tópicos
da Demografia e dos estudos sobre a população e incentiva os estudantes a considerar
as amplas implicações do crescimento populacional e mudança para desafios globais,
como a degradação ambiental.

A Demografia está sempre em mudança. A população global já atingiu e ultrapassou a


marca de 7 bilhões. Pela primeira vez na história da humanidade, mais pessoas começaram
a viver nas cidades do que nas áreas rurais. Ocorreu uma grande crise financeira que teve
reversões demográficas em todo o mundo. E as tendências de longo prazo intensificaram-
se nos dois grupos de processos demográficos inter-relacionados de envelhecimento e
declínio da fecundidade. Por exemplo, a taxa de crescimento mundial continua a diminuir e,
muito em breve, os idosos ultrapassarão o número de crianças pequenas no mundo. Quase
metade da população global que vive em todas as regiões do mundo agora está abaixo
da fecundidade de substituição. Saúde, educação e ganhos de rendimentos aceleraram
nos últimos anos para muitos países em desenvolvimento. No entanto, a pobreza global
e as doenças permanecem questões urgentes e preocupações ambientais decorrentes do
aumento do consumo global continuam a aumentar. Como as tendências acima deixam
claro, a capacidade de compreender e moldar processos da população humana é crucial
para o futuro. Os demógrafos têm as ferramentas e uma perspetiva global para melhorar
a vida das gerações atuais e futuras. Usando dados empíricos, baseados em evidências,
os demógrafos moldam a política governamental e contribuem com ideias para a melhoria
da sociedade. Na sua essência, a Demografia é um campo interdisciplinar extraído de
uma diversidade variedade de disciplinas, incluindo ciências da saúde, epidemiologia,
economia, sociologia, antropologia, história, políticas públicas, matemática e estatística.

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INTRODUÇÃO

A Demografia está em constante mudança. O nosso mundo experimentou uma série de


marcos demográficos importantes. A população global atingiu e ultrapassou a marca de 7
bilhões. Ocorreu uma grande crise financeira que teve repercussões demográficas em todo
o mundo e agora uma grave crise pandémica à escala mundial com elevados impactos
na Demografia, na sociedade, na economia e que ainda está a ser sentida. As tendências
de longo prazo se intensificaram nos dois processos demográficos inter-relacionados de
envelhecimento e declínio da fecundidade. Quase metade da população global que vive
em todas as regiões do mundo agora tem uma fecundidade abaixo do nível de reposição.
Os ganhos em saúde, educação e receita aceleraram nos últimos anos para muitos países
em desenvolvimento. No entanto, a pobreza global e as doenças continuam a ser questões
prementes e as preocupações ambientais decorrentes do aumento do consumo global
continuam a aumentar.

O presente E-book tem como objetivo orientar e facilitar o trabalho do estudante da


Unidade Curricular de Demografia, enquanto instrumento didático, atual e adequado
às condições específicas de ensino a distância, os estudantes da Universidade Aberta,
mas não só. Pretende-se que seja acessível ao público em geral que tenha interesse
pelo tema e pretendemos facultar ao estudante um acompanhamento da matéria, por
meio de síntese e esquematização de conteúdos, conceitos e problemáticas que nele são
abordados; agregar as informações disponíveis, atuais e complementares que contribuam
para a continuidade lógica e epistemológica da sequência de aprendizagem proposta no
programa da disciplina; oferecer ao estudante pistas e instrumentos que lhe permitam o
exercício, a consolidação e o aprofundamento da aprendizagem.

No final, o estudante de Demografia ou o leitor em geral deve ser capaz de enquadrar


o papel da Demografia no contexto específico das ciências sociais e sua importância
numa articulação teórica com as Ciências Sociais, para o entendimento dos fenómenos,
tendências e práticas sociais; utilizar de forma sistemática os principais instrumentos de
recolha e tratamento de dados estatísticos respeitantes à população, assim como proceder
ao enquadramento desses dados através das principais variáveis; saber interpretar os
dados referidos, recorrendo à conciliação das abordagens qualitativas e quantitativas,
através da intersecção com as estruturas e práticas sociais mais alargadas; compreender
e enquadrar a situação demográfica mundial e europeia, possibilitando discernir vetores
fundamentais de análise para a compreensão de novos cenários de desenvolvimento,
das relações internacionais e das migrações, das estruturas familiares, dos fenómenos

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INTRODUÇÃO

de exclusão social, dos mundos rurais e urbanos e do Ambiente, articulando-os com o


futuro e o funcionamento dos ecossistemas; analisar as estruturas demográficas e as
estruturas sociais do cenário português, explorando as potencialidades da Demografia
enquanto ciência social para enquadrar os principais problemas e desafios da sociedade
portuguesa do presente século, em especial das últimas três décadas; compreender os
principais fenómenos sociodemográficos da realidade portuguesa das últimas décadas,
nomeadamente a imigração/a emigração, as disparidades regionais, a fragmentação
territorial, o crescimento natural e o desenvolvimento; articular a situação demográfica
mundial e europeia com as questões sociais essenciais do mundo contemporâneo,
como a urbanização, educação, saúde, trabalho, feminização, ecologia e ambiente;
descrever a evolução demográfica recente da população; aplicar técnicas adequadas de
análise das variáveis do sistema demográfico: volumes populacionais, estruturas etárias,
natalidade/ fecundidade, mortalidade e mobilidade populacional; explicar a ligação entre
os comportamentos demográficos e a evolução do estado da população; identificar
alguns efeitos da dinâmica do sistema demográfico sobre a organização e estruturação
das sociedades contemporâneas.

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

Objetivos
1. Identificar os aspetos fundamentais do objeto de estudo da Demografia;

2. Compreender a razão pela qual a Demografia atual é simultaneamente una e


diversa;

3. Compreender o fenómeno do crescimento demográfico e a Distribuição da


População.

1.1 O QUE É A DEMOGRAFIA?


Primeiro, vamos começar com uma definição informal. Vamos definir Demografia em
termos das perguntas a que ela tenta responder, e que são: quantas pessoas, de que
tipo, onde é que estão? Porquê? E então?

A Demografia é a ciência de populações que examina:


1. o tamanho e a composição das populações de acordo com diversos critérios:
idade, etnia, sexo, situação de união (conjugal ou coabitação), percurso
educacional, espacial distribuição e assim por diante;

2. processos dinâmicos de curso de vida que mudam esta composição: nascimento,


morte, uniões, migração e

3. relações entre a composição e a mudança populacional, e o mais amplo ambiente


social e físico em que existem.

A compreensão desses processos lança uma luz sobre importantes aspetos sociais,
económicos, políticos, e questões ambientais e os seus impactos, como o crescimento
populacional, a urbanização, mudança familiar, imigração e saúde humana e a longevidade.
Uma das coisas mais fascinantes que encontrará sobre a Demografia é que quase todos os
tópicos são relevantes para algo que já experimentou ou ainda irá experimentar nalgum
momento da sua vida. Consideremos as seguintes perguntas:
1. Quando e onde você nasceu? Quantos outros nasceram na sua geração? Que
condições a sua geração enfrentará que a distinguem de outras gerações?

2. Qual é o seu género e como é que essa identidade moldará o resto da sua vida?

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

3. Quantos anos você tinha (ou terá) quando teve relações pela primeira vez? Com
que frequência você tem relações e usa anticoncetivos?

4. Qual é a probabilidade de ir morar com um parceiro íntimo, casar, divorciar-se?


Ou casar novamente?

5. Você vai ter filhos? Quantos? Você vai ter netos? Você estará vivo para ver os
seus bisnetos?

6. Que tipo de trabalho você terá? Com que frequência você mudará de emprego?
Com que idade vai reformar–se?

7. Quantas vezes mudará de residência na vida? Você vai mudar-se para o exterior
do país?

8. Por quanto tempo você terá saúde na sua vida? Quando você vai morrer? Como
você vai morrer?
(Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015, p. 2)

Cada uma delas é uma questão demográfica relevante (Lundquist, Anderton, Yaukey,
2015, p.1-3).

Uma breve definição de demografia é o estudo sistemático e científico das


populações humanas. A palavra Demografia vem das palavras gregas δημος (demos)
para população e γραφια (graphia) para descrição ou escrita, portanto, a frase,
“escritos sobre população”. O termo Demografia foi usado pela primeira vez em
1855 pelo estatístico belga Achille Guillard no seu livro Elements of Human Statistics or
Comparative Demography (Poston & Bouvier, 2017).

Definição resumida: o estudo científico do tamanho, composição e distribuição das


populações humanas e suas mudanças resultantes da fecundidade, mortalidade e
migração.

Definição alargada: a ciência social que estuda o tamanho, a composição e a distribuição


das populações humanas num ponto específico no tempo; as mudanças no tamanho
e composição da população; as componentes dessas mudanças, isto é, fecundidade,
mortalidade e migração; os fatores que afetam essas componentes; as consequências
das mudanças no tamanho, composição e distribuição da população, ou as próprias
componentes.

A Demografia é a ciência das populações, e a ciência social que estuda e examina (Poston
& Bouvier, 2017, p. 3-4):
1. o tamanho, a composição e a distribuição da população humana numa

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

determinada área e num ponto específico do tempo de acordo com diversos


critérios: idade, etnia, sexo, união (estado civil ou coabitação), nível de
escolaridade, distribuição espacial e assim por diante;

2. as mudanças no tamanho e composição da população, e os processos dinâmicos


do curso de vida que mudam essa composição, ou seja, os componentes dessas
mudanças (fecundidade, mortalidade e migração);

3. as relações entre a composição e mudança da população e o ambiente social e


físico mais amplo em que existem;

4. os fatores que afetam esses componentes e as consequências das mudanças em


tamanho da população, composição e distribuição, ou nos próprios componentes
(Poston & Bouvier, 2016; Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

Piché (2013) diz que a Demografia é uma ciência social e partilha com as outras ciências o
estudo de uma parte da vida em sociedade. O que a distingue das outras ciências sociais
é o facto de que o seu campo de investigação e de intervenção está bem delimitado. A
Demografia estuda essencialmente os mecanismos na base da renovação das populações.
Concebe-se, pois, a Demografia, como o estudo de um sistema de entradas e de saídas que
contribuem para o aumento (nascimentos, imigração) ou para a diminuição (mortalidade,
emigração) da população. Por exemplo, ao fim de um ano, a população de um país (ou
de outra região geográfica) terá aumentado graças aos novos nascimentos e aos novos
imigrantes, mas terá igualmente diminuído por causa das mortes e das partidas de
emigrantes.

Uma parte da Demografia consiste em estabelecer relatórios, fazer o acompanhamento


dos níveis dos três fenómenos demográficos (fecundidade, mortalidade e migração) e
eventualmente propor hipóteses de projeções da população.

A Demografia pode ser definida de forma mais ampla como o estudo científico do tamanho,
composição e distribuição das populações humanas e as suas mudanças resultantes da
fecundidade, mortalidade e migração. A Demografia preocupa-se com o quão grande
(ou pequeno) são as populações; como as populações são compostas de acordo com
a idade, sexo, raça, estado civil e outras características; e como as populações estão
distribuídas fisicamente no espaço (por exemplo, o quão urbano e rural são). A Demografia
está também interessada nas mudanças ao longo do tempo no tamanho, composição e
distribuição das populações humanas e como estes resultam dos processos de fecundidade,
mortalidade e migração (Poston & Bouvier, 2017, p. 3).

Vejamos algumas definições de Demografia que encontramos nos principais manuais e


dicionários especializados.

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

Segundo Henry,

“A Demografia é a ciência que tem por objeto o estudo científico das


populações humanas no que diz respeito à sua dimensão, estrutura, evolução e
características gerais analisadas principalmente do ponto de vista quantitativo”
(Henry, 1981, conforme citado em Nazareth, 2004, p.44).

No dicionário de Demografia de W. Petersen

“A Demografia pode ser definida em sentido restrito e em sentido lato.


A Demografia formal consiste na colheita da análise estatística e na
apresentação técnica dos dados da população; baseia-se no ponto de vista
de que o crescimento da população é um processo autoestruturado, com uma
interligação mais ou menos fixa entre fecundidade, mortalidade e estrutura
por idades”. (Petersen, 1986, conforme citado em Nazareth, 2004, p44).

Para Ross

“A Demografia é o estudo quantitativo das populações humanas e das


mudanças nelas ocorridas devido à existência de nascimentos, óbitos e
migrações. Quando se consideram as determinantes biológicas, sociais,
económicas ou legais, esta disciplina toma o nome de estudos de população”.
(Ross, 1982, conforme citado em Nazareth, 2004, p. 44)

Landry, em 1945, no seu Tratado de Demografia, é dos primeiros a tomar consciência da


questão da necessidade de um rigor quantitativo, o que tenha feito com que a Demografia
rapidamente se afirmasse como ciência. No confronto com o malthusianismo e a teoria
da transição demográfica, Landry ocupa uma posição charneira (Landry, 1945, conforme
citado em Nazareth, 2004, p. 51).

Existe uma Demografia Quantitativa cujo objeto essencial é o estudo dos movimentos
que se produzem numa população, acompanhado dos resultados desses movimentos;
mas também existe uma Demografia Qualitativa que se ocupa das qualidades dos seres
humanos e que diz respeito aos aspetos qualitativos do fenómeno social das populações e
ainda à genética demográfica ou biologia das populações, à biometria (estatística aplicada
à investigação biológica).

Para Wunsch e Termote (1978)

“Demografia é o estudo da população, do seu aumento através dos nascimentos


e imigrantes, da sua diminuição através dos óbitos e dos emigrantes”
(conforme citado em Nazareth, 2004, p 45).

Em Shryock e Siegel (1976) encontramos a seguinte definição:

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

“como na maior parte das ciências, a Demografia pode ser definida em sentido
restrito e em sentido lato; o sentido restrito é a Demografia Formal, que se
preocupa com questões como a dimensão, a distribuição, a estrutura e a
mudança das populações; em sentido amplo, inclui outras características tais
como as étnicas, as sociais e as económicas” (conforme citado em Nazareth,
2004, p 45).

Em Sauvy (1976b) existem igualmente duas definições de Demografia: a Demografia pura


ou análise demográfica, que é uma contabilidade de homens e a Demografia alargada,
que estuda os homens nas suas atitudes, comportamentos e que se preocupa com as
causas e as consequências dos fenómenos.

Em Poulalion (1984) encontramos a definição:

“a ciência da população estuda as coletividades humanas enquanto tal; não


considera apenas o aspeto estático e mensurável (Demografia quantitativa)
mas também o aspeto causal e relacional (Demografia qualitativa)” (conforme
citado em Nazareth, 2004, p. 45).

1.2 SOMOS TODOS ATORES POPULACIONAIS

Todos nós somos atores populacionais. Realizamos atos demográficos em nossas vidas
diárias através da criação de um filho, mudança para um novo lugar, escolha de um
estilo de vida saudável ou obtenção de educação. A Demografia estuda eventos da vida,
como nascimentos, mortes, casamentos, divórcios e migrações (Poston & Bouvier, 2017).

Todos nós somos agentes populacionais; devemos refletir sobre isso: os nossos pais
realizaram um ato demográfico quando fomos concebidos. Por sua vez, realizamos atos
demográficos semelhantes quando decidimos ter ou não ter filhos. Nalgum momento
durante a vida vamos mover-nos uma ou talvez várias vezes. Esses também são atos
demográficos. Finalmente, morreremos. A morte não será do mesmo tipo de ato como a
tomada de decisão dos seus pais quando foi concebido e porque não se decide durante
quanto tempo se vai viver e quando se vai morrer. No entanto, temos muito a dizer sobre
quantos anos teremos quando morrermos. Ou seja, temos muitas opções que podem,
ou não, estender as nossas vidas. Estas incluem comportamentos como parar ou nunca
começar a fumar, limitar a ingestão de álcool, manter uma dieta saudável e praticar
exercício. Outro comportamento muito importante que prolongará as nossas vidas é a
educação, especificamente obter um diploma universitário. Por exemplo, com a idade de
25 anos, espera-se que os indivíduos com diploma universitário vivam mais cinquenta e
sete anos em comparação com cinquenta e um anos para os que têm apenas o ensino

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

médio, ou seja, uma diferença de seis anos. Em resumo, nós somos todos atores da
população. Estamos muito envolvidos com a Demografia no nosso dia-a-dia, embora
nem sempre percebamos isso. A Demografia é o estudo de alguns dos eventos mais
importantes das nossas vidas.

Para além do nascimento e da morte, outros eventos muito importantes na vida de muitos
de nós incluem o casamento e, também para alguns de nós, o divórcio. Outro evento
realmente importante que quase cada um de nós fará pelo menos uma vez, senão muitas
vezes, nas nossas vidas é mudar de uma residência para outra, no mesmo país ou entre
vários países.

Como o eminente demógrafo Samuel Preston afirmou:

“O estudo da população oferece algo para todos: o dia a dia, sexo e morte,
política e guerra; o entrelaçamento de indivíduos em todos os seus níveis e
grupos e os confrontos da natureza e da civilização” (Poston & Bouvier, 2017,
p. 4-5).

1.3 OS ASPETOS FUNDAMENTAIS E OBJETIVOS DA DEMOGRAFIA


A Demografia é uma Ciência Social. Como a sociologia, a etnologia, a história, faz parte
das Ciências que têm por objeto os diferentes aspetos das sociedades humanas. A
Demografia não é uma Ciência natural. Envolve dois aspetos: por um lado, tem como
fundamento realidades suscetíveis de ser facilmente quantificadas: são os nascimentos,
os casamentos, as mortes, as ruturas de união, as deslocações de homens. Por outro
lado, para compreender as causas e as consequências das evoluções quantitativas destes
eventos, a Demografia deve aceder a outros tipos de conhecimentos, como as dos
eventos demográficos elementares: estudo dos fatores determinantes nesses eventos,
estudos dos efeitos derivados das quantidades e das evoluções dos eventos, estudo dos
comportamentos, e dos dados psicossociológicos. Ignorar sistematicamente o segundo
aspeto para ver apenas na Demografia estatísticas leva a eliminar um elemento essencial
(Dumont, 1993).

Definir Demografia parece ser a primeira questão que se põe quando abordamos esta área.
Definimos Demografia no início deste capítulo como o estudo sistemático e científico das
populações humanas. A Demografia é o estudo de três processos básicos: fecundidade,
migrações e mortalidade. Estes são chamados de processos demográficos. Quando a
população muda em tamanho, composição ou distribuição, as mudanças dependem
unicamente de um ou mais desses três processos demográficos.

Em sentido geral, uma população pode ser encarada como um conjunto de indivíduos ou

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

de unidades que podem ser de natureza muito diversa. Numa perspetiva demográfica,
as populações humanas são consideradas com características específicas, num espaço
limitado e com um certo significado social.

No que respeita às características da população humana, as unidades de observação


que compõem a população de referência (ou de observação) devem ser naturalmente,
de seres humanos no seu sentido lato (homens ou mulheres). Neste contexto, o termo
genérico “população” será utilizado designando uma “população humana”.

Relativamente à delimitação espacial, esta característica diz respeito ao território


claramente identificável, isto é, o conjunto de indivíduos que vivem sobre um determinado
espaço delimitado e constituem a população considerada.

No que diz respeito ao significado social, a população considerada deverá ter um certo
significado de coerência social.

Apesar da preocupação com os problemas da população remontar à Antiguidade, a


Demografia como ciência apenas aparece na segunda metade do século XVIII.

Com base em inúmeras definições, observamos que a Demografia tem por objeto o estudo
científico da população. Mas o que é exatamente o estudo científico da população?

Uma definição aprofundada de Demografia comporta cinco elementos fundamentais:

Em primeiro lugar, é a análise de conjuntos de pessoas delimitadas espacialmente e com


um certo significado social. Esta análise é feita observando, medindo e descrevendo a
dimensão, a estrutura e a distribuição desse conjunto de pessoas. A dimensão significa o
volume da população (x milhões de habitantes); a estrutura significa a sua repartição por
subconjuntos específicos (x solteiros, y casados, z viúvos e divorciados); a distribuição
diz respeito à sua repartição no espaço. Ao conjunto destes três elementos chama-se o
estado da população.

Em segundo lugar, este estudo científico preocupa-se em descrever o estado da população


num determinado momento no tempo (aspeto estático), mas também em saber quais as
mudanças ocorridas e qual será a intensidade e a direção dessas mudanças.

Em terceiro lugar, analisa os fatores, ou as variáveis demográficas que são responsáveis


pelas variações ocorridas no estado da população: natalidade, mortalidade e migrações.
Esta última variável, micro demográfica, abrange três situações distintas – emigração,
imigração e migrações internas. A nupcialidade não é uma variável micro demográfica
autêntica porque a sua variação não contribui diretamente para a modificação do estado
da população, mas atua através da natalidade. Assim, o estado da população tem uma
determinada dimensão, estrutura e distribuição espacial porque nesse conjunto de pessoas
acontecem nascimentos, óbitos e migrações.

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

Em quarto lugar, a Demografia também se ocupa dos efeitos que cada uma das variáveis
micro demográficas tem nos aspetos globais e estruturais da população, bem como o
inverso (por exemplo, até que ponto um aumento da natalidade modifica estruturalmente
a população ou em que medida uma mudança estrutural da população se reflete na
modificação da evolução da natalidade).

Finalmente, a Demografia também se preocupa com questões relacionadas com os


determinantes dos comportamentos demográficos e com as consequências da evolução
do estado da população.

1.4 UNIDADE E DIVERSIDADE DA DEMOGRAFIA


O estudo da Demografia insere-se num contexto mais vasto – o das ciências sociais –
considerando-se uma ciência autónoma, diferente da Sociologia ou da Economia e exige
que à partida haja uma clarificação dos principais conceitos. No entanto, sabemos que
não é possível traçar fronteiras entre as diversas ciências sociais, tendo todas o homem
como objeto de estudo. Nesta ótica, a Demografia não difere das outras ciências sociais.
O seu objeto de estudo também é o comportamento do homem em sociedade e também
necessita das informações das outras ciências sociais.

Numa primeira análise, a Demografia aparece-nos como uma resposta científica a um


conjunto de questões relacionadas com a descrição da população humana. Para além disso,
a Demografia estuda aspetos relacionados com o ordenamento espacial da população,
a alteração de estruturas familiares, as consequências do envelhecimento demográfico
no futuro da segurança social, a composição da população ativa, as necessidades e a
localização de equipamentos sociais. A Demografia contribui também para a resolução
de algumas questões importantes noutras áreas científicas. Temos, por exemplo, o
planeamento dos recursos humanos, a questão ambiental, a saúde pública e as projeções
demográficas.

A procura de um grande rigor na medição dos fenómenos demográficos desenvolveu um


vasto número de métodos e técnicas de análise, próprios da ciência demográfica, o que
veio reforçar ainda mais a construção do objeto de estudo da Demografia.

A Demografia enquanto estudo da população está associada a um conjunto de aspetos


relacionados com a população humana e, naturalmente, nos aspetos que dizem respeito
à sua saúde. Como qualquer fenómeno social, o estudo da Demografia é de grande
complexidade estando associado com múltiplos fenómenos que vão desde a saúde, à
política, à cultura, aos aspetos económicos, educação, etc.

A Demografia, enquanto ciência que tem por objeto de estudo a população humana,

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

assume assim, naturalmente, um papel fundamental nas ciências sociais.

O fenómeno demográfico pode ser ilustrado da seguinte forma:

Variáveis “com portam entais” Variáveis de“estado”

Mortalidade
(óbitos) Dinâmica Evolução dos
Natural Volumes
Natalidade / fecundidade Populacionais
(nados-vivos)

Mobilidade Populacional Evolução da


Dinâmica
(migrações) Migratória
Estrutura
Etária

Figura 1. O fenómeno demográfico

Destas cinco variáveis demográficas, duas tratam do estado (volumes e estrutura etária)
e as outras três referem-se aos comportamentos que influem diretamente sobre as
alterações observadas no “estado” da população (mortalidade, natalidade/ fecundidade,
mobilidade populacional).

Embora a Demografia seja, classicamente, encarada como o estudo quantitativo da


população humana, esta ciência tem desenvolvido, ao longo do tempo, os seus métodos
de trabalho e de análise que atualmente ultrapassa o aspeto puramente descritivo.

Existe uma Demografia Formal ou Análise demográfica, onde se analisam apenas as


variáveis demográficas dependentes (macro demográficas) e independentes (micro
demográficas).

A Análise demográfica estuda os fenómenos demográficos observados em populações


concretas.

A Demografia formal é o estudo de populações humanas num determinado momento


em relação ao tamanho, a distribuição e a estrutura da população. A Demografia
formal também analisa as mudanças que ocorrem na população ao longo do tempo,
principalmente o crescimento populacional. A maior ou menor ocorrência de nascimentos,
óbitos e migrações são as causas básicas do crescimento populacional. Assim, há interesse
em estudar dois tipos de variáveis demográficas. Um grupo de variáveis descreve algumas
características de interesse da população. Referem-se a um determinado espaço geográfico
e a um momento específico do tempo, por isso, compõem a análise estática da população.

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

O tamanho da população é simplesmente o número total de pessoas na população. A


distribuição da população é o número de pessoas na população por unidade geográfica. A
estrutura ou composição da população é o número de pessoas na população por género
(masculino; feminino) e/ou por grupo de idade (em geral, de 5 em 5 anos).

As variáveis, natalidade, mortalidade e migração, referem-se a um determinado espaço


geográfico e a um determinado período de tempo e fazem parte da dinâmica demográfica.
Na análise demográfica formal, também é estudada a Inter-relação entre as variáveis
da análise estática e da dinâmica demográfica. Por um lado, a natalidade, a mortalidade
e a migração são fatores que modificam a população. Por outro lado, esses fatores
modificadores dependem fortemente dos aspetos gerais da população.

Um ramo da Demografia que rapidamente ganhou autonomia a partir do fim da Segunda


Guerra Mundial foi a Demografia histórica: é o estudo retrospetivo das populações numa
determinada época pertencente ao passado e, particularmente daquela em que não
existem estatísticas do tipo moderno (estatísticas demográficas ou recenseamentos), ou
seja, cujos dados disponíveis não foram produzidos com fins demográficos. Neste contexto,
utilizam-se normalmente registos paroquiais, listas nominativas, genealógicas, etc.

Landry publica em 1945, o seu Tratado de Demografia; A. Sauvy, em 1946, lança a revista
Population. Mas o que verdadeiramente se passou de novo foi o aparecimento do método
científico baseado na reconstituição das famílias, inventado quase simultaneamente por
P. Goubert e L. Henry (1958) (conforme citado em Nazareth, 2004, p. 51-52).

A Demografia histórica, mais do que qualquer outra ciência social, tornou-se particularmente
atenta à qualidade dos dados. A Demografia histórica deixou de ser uma ciência auxiliar,
para passar a uma ciência autónoma com métodos e técnicas próprias, diferentes das
outras ciências, inclusive da própria Demografia.

Quando se consideram as relações entre as variáveis demográficas e as outras variáveis


económicas, sociais, culturais, biológicas, num determinado momento do tempo surge a
Demografia social: é o estudo das relações entre o estado das populações ou movimento
da população e a vivência das sociedades. A Demografia social faz uma interpenetração
disciplinar preocupando-se com as questões da população enquanto causas ou
consequências dos fenómenos da sociedade. Trata assim do sistema demográfico de uma
forma abrangente encarando as relações com os outros sistemas (economia, política,
saúde, educação, religião, etc.…).

Assim, sem pretendermos ser exaustivos, podemos dizer que as grandes preocupações
da Demografia Social nos dias de hoje são as seguintes:
• As causas e as consequências do declínio da natalidade

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

• Os efeitos das migrações no sistema demográfico e social

• As consequências demográficas e sociais da luta contra a morte

• A desigualdade sexual e social face à morte

• Os progressos científicos, bioéticos e equilíbrios demográficos

• A defesa, segurança e estratégia face às mutações demográficas

• As desigualdades regionais e ordenamento do território

• As consequências do envelhecimento demográfico

• As consequências sociais da mutação das estruturas familiares

• A Demografia escolar

• A Demografia face ao processo de urbanização

Para além destes dois principais ramos da Demografia (histórica e social) existem outros
dois domínios importantes nos quais a Demografia tem um papel fundamental: as Políticas
demográficas e a Ecologia Humana.

O objetivo teórico das políticas demográficas consiste em atuar sobre os modelos (ou sobre
os efetivos) tendo em conta determinados objetivos económicos e sociais. A ideia de atuar
sobre o movimento demográfico a fim de que este se adapte a imperativos económicos
e sociais é uma preocupação de muitos países. Mas até que ponto esta preocupação se
traduziu na existência de autênticas políticas demográficas?

A Ecologia Humana parte do princípio que existem dois sistemas em interação constante:
o sistema-homem (que recebe e descodifica a informação) e o sistema ambiente que
elabora uma ação de resposta. A população, na perspetiva da Ecologia Humana, é um
conjunto de indivíduos num sistema interdependente de atividades. Cada atividade produz
um output e os ingredientes utilizados na produção desses outputs são os inputs de
outra atividade. Esta rede complexa que assim se estabelece é um processo específico
da Ecologia em geral e da Ecologia Humana em particular: o ecossistema.

A Demografia caminhou de uma unidade inicial, onde a sua problemática era formulada
em termos simples, para uma crescente diversidade e complexidade.

Também as suas ligações com as outras ciências alargaram a sua problemática. A


Demografia tem a vantagem de ser simultaneamente uma das ciências sociais mais exatas
e de ser o ponto de encontro das ciências sociais e humanas com a Biologia, o Direito, a
Economia e as Ciências Políticas.

A Demografia utiliza métodos e técnicas de tratamento demográfico dos dados, com o

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

objetivo de descrever e analisar de uma forma rigorosa o estado das populações, ou seja,
os seus efetivos e a sua composição segundo vários critérios (idade, sexo, localização
geográfica); os diversos fenómenos que influem diretamente sobre essa composição e
evolução da população (natalidade, fecundidade, mortalidade, migrações); as relações
recíprocas que existem entre estado/evolução da população e os fenómenos demográficos.

Os termos Demografia pura e Demografia formal às vezes são usados para distinguir
interesses mais restritos na composição da população e dinâmica demográfica, lidando
inteiramente com variáveis demográficas. Um exemplo de análise demográfica formal seria
desenvolver um modelo teórico especificando a relação entre mudanças na fecundidade
(tratada como uma causa) e mudanças na composição etária (tratada como um efeito).
Uma abordagem mais ampla e menos focada para a Demografia está implícita nos estudos
populacionais, mas também abrange o estudo das relações entre dados demográficos e
variáveis não demográficas. As implicações de longo alcance das variáveis ​​demográficas
noutras disciplinas geraram amplo interesse em campos de estudo como Demografia
social, Demografia económica, Demografia antropológica, Biodemografia e Demografia
histórica. Mais duas observações preliminares precisam de ser feitas. Um dos pontos fortes
da Demografia é que nos permite ver como o indivíduo e suas experiências se encaixam
no quadro demográfico mais amplo do mundo. A Demografia leva essas experiências
intensamente pessoais e as considera no nível agregado das pessoas, não ao nível
individual. O segundo ponto é que a Demografia é geralmente quantitativa e estatística,
embora alguns demógrafos também usem métodos qualitativos. A Demografia lida com
populações, e as características das populações são mais frequentemente medidas por
contando as pessoas na população total, ou em segmentos dela, e comparando aquelas
contagens. Assim, a Demografia pode facilmente apresentar descrições básicas da
população em tabelas e gráficos (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

Demografia Histórica

Recentemente, os demógrafos desenvolveram métodos para inferir o comportamento


demográfico e a estrutura populacional de épocas anteriores a partir de outros dados
históricos. Esses dados e métodos passaram a ser conhecidos como Demografia histórica.
Uma fonte importante de dados para a Europa são registros paroquiais de batismos,
casamentos e enterros por católicos e protestantes clérigos. Esses registros assinalam não
apenas o evento e sua data, mas também informações dos nomes dos participantes. Um
método fecundo de análise de tais registros paroquiais é a reconstituição familiar. Ligando
datas de nascimento, casamento e morte dentro das famílias, eventos vitais podem ser
narrados para criar muitas variáveis ​​demográficas importantes. Isso inclui intervalos de
nascimento, tamanho da família, idade das pessoas no casamento, idade da mãe em

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

cada nascimento, mortalidade infantil, e fecundidade conjugal. A construção de histórias


de vida do indivíduo a partir de registros tão antigos, um tanto incompletos e sempre
difíceis de ler, é uma tarefa tediosa e demorada. Felizmente, as tecnologias digitais estão
a transformar esses recursos em bancos de dados abrangentes e vinculados, levando a
uso dados históricos inovadores de famílias anteriormente inexplorados. A Demografia
histórica também aplica uma variedade de outros métodos a várias fontes de dados tais
como testamentos, genealogias, lares e enumerações familiares e registos organizacionais,
todos contendo valiosos dados demográficos sobre populações no passado. E, em boa
tradição histórica, os demógrafos também contam com observações escritas por pessoas
que vivem num período que está sendo descrito. Eles encontram os dados e os registos
em fontes diversas como cartas, diários e romances da época e relatórios de observadores
contemporâneos treinados (como estatísticos avaliando seus próprios dados na introdução
dos seus relatórios) e por médicos que relatam seus pacientes e em condições gerais de
saúde. Muito do que sabemos sobre o papel do casamento e da limitação da fecundidade
dentro do casamento durante o início do declínio da fecundidade europeu vem desses
estudos em demografia histórica. A coleção mais notável, embora longe de ser o único
estudo, é a do Projeto de fecundidade de Princeton. Quando a fecundidade caiu na Europa,
houve dois componentes do declínio. Um foi o atraso e / ou redução do casamento. Coale
(1973) rotulou este de transição Malthusiana, após Thomas Malthus. (Malthus esperava
que atrasasse o casamento e funcionaria como um controle preventivo do crescimento
populacional). O outro componente foi o declínio da procriação de casais. Coale chamou
isso de transição neomalthusiana (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015, p. 220-221).

1.5 CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO E DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO


O tamanho da população tem três facetas. A primeira é o tamanho absoluto. O tamanho
absoluto da população da Terra atingiu 7,2 bilhões em 2014 e espera-se que cresça
para cerca de 11 bilhões de pessoas no próximo século. Os dez países com as maiores
populações do mundo são a China, India, Estados Unidos, Indonésia, Brasil, Paquistão,
Nigéria, Bangladesh, Rússia e Japão (Population Reference Bureau, 2014) (ver figura 2).
Tanto a China quanto a Índia abriga bem mais de um bilhão de pessoas, e em ambos os
casos, o tamanho da população muito grande teve efeitos significativos sobre a política,
cultura e desenvolvimento económico dessas nações. Uma segunda faceta do tamanho
da população é a distribuição ou tamanho relativo. Se compararmos as populações, vemos
que China e Índia juntas têm bem mais de um terço de toda a população mundial. Esses
dez países juntos contam mais da metade (4,3 bilhões) da população mundial. Embora os
Estados Unidos sejam o terceiro país maior em tamanho, representa apenas um quarto do

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

tamanho da população da Índia. A terceira faceta do tamanho da população é a densidade.


Uma das principais consequências de grandes proporções e distribuição populacional
desigual é que pode levar a aglomeração ou populações densamente povoadas (Lundquist,
Anderton, Yaukey, 2015, p.4). Refere-se à relação entre o tamanho da população e o
espaço no qual a população está localizada. Para grandes unidades geográficas, pode-se
medir a densidade em pessoas por quilómetro quadrado.

PAÍS (ou território


POSIÇÃO POPULAÇÃO DATA FONTE
dependente)

1 China 1 402 509 320 2020 Estimativa oficial

2 Índia 1 361 865 555 2020 Estimativa oficial

3 Estados Unidos 329 634 908 2020 Estimativa oficial

4 Indonésia 266 911 900 2019 Estimativa oficial

5 Paquistão 220 892 311 2020 Estimativa oficial

Estimativa oficial;
6 Brasil 211 755 692 2020
IBGE Brasil

7 Nigéria 206 139 587 2020 Estimativa oficial

8 Bangladesh 168 557 578 2020 Estimativa oficial

9 Rússia 146 745 098 2020 Estimativa oficial

10 Japão 125 950 000 2020 Estimativa oficial


Fonte: https://population.un.org/wpp/DataQuery/s do mundo

Figura 2. Os dez países com as maiores populações do mundo

O Crescimento populacional explica-se a partir dos seguintes processos demográficos:


• O tempo t contém Pt pessoas e, um ano depois, contém Pt+1 pessoas

• Nt a t+1 : o número de nascimentos ocorridos na população entre os tempos


t e t+1 .
• Ot a t+1 : o número de mortes (óbitos) ocorridas na população entre os tempos
t e t+1.
• It a t+1 : o número de imigrantes para a população entre os tempos t e t+1.

• Et a t+1 : o número de emigrantes da população entre os tempos t e t+1.

Aumento natural quando Nt para t+1 > Ot para t+1.

Diminuição natural quando Nt para t+1 < Ot para t+1.

Migração líquida: It para t+1 − Et para t+1.

(in Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015; Poston, Bouvier, 2017, p.6)

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

Todos os três processos demográficos desempenham papéis importantes na contabilização


do tamanho, composição e distribuição de uma população. Deve ficar claro que o tamanho
de uma população só pode mudar através dos processos de fecundidade, mortalidade
e migração. Há apenas duas maneiras de entrar na população – nascer ou morrer e/ou
sair / entrar nela. Um dos fatos fundamentais sobre a mudança populacional é que as
populações só podem mudar por meio de um número limitado e contável de eventos.
Por exemplo, considere o tamanho da população de um país. Suponha que este país no
momento t contém Pt pessoas, e que um ano depois contém Pt+1 pessoas. Podemos
escrever isso como a seguinte equação:

A equação (1.1)

Pt+1=Pt+Nt tot+1 − Ot tot+1 + It tot+1 − Et tot+1


onde Nt para t+1 e Ot para t+1 são, respetivamente, o número de nascimentos e
óbitos ocorridos na população entre os tempos t e t+1; e It para t+1 e Et para t+1 são,
respetivamente, o número de imigrantes (ou migrantes internos) para e emigrantes (ou
migrantes externos) da população entre os tempos t e t+1. A equação (1.1) é conhecida
como a equação demográfica básica, ou às vezes como o equilíbrio demográfico ou
equação contável. Afirma que o tamanho da população de uma área pode mudar por
causa de apenas três tipos de eventos demográficos: nascimentos, mortes e migrações.
Esses três eventos são conhecidos como os componentes da mudança demográfica e
também como os três processos.

A quantidade (Nt para t+1 − Ot para t+1) é a diferença entre o número de nascimentos
e o número de mortes que ocorreram durante o período t para t+1 e é conhecido
como aumento natural; se Nt tot + 1 < Ot tot + 1, então o número de mortes excede
o número de nascimentos durante o intervalo t para t+1, significando aumento natural
negativo, ou seja, diminuição natural. A quantidade (It para t+1 − Et para t+1) refere-se
à diferença entre o número de imigrantes (pessoas que entram num país) e o número de
emigrantes (pessoas que deixam um país) durante o período de tempo, e é conhecido
como migração internacional líquida (ou, no caso de migração interna menos migração
externa, migração interna líquida). Se It para t+1 < Et para t+1, então mais pessoas
saem (emigram de) do que entram na área (imigrar para), e a quantidade é conhecida
como migração internacional líquida negativa. Finalmente, se a quantidade It para t+1>
Et para t+1, então temos migração internacional líquida positiva.
Em muitos países em desenvolvimento, é frequente a migração internacional líquida
negativa porque It para t+1 < Et para t+1. Países como México, China, Índia e as Filipinas
são chamadas de países remetentes; têm mais pessoas que saem dos seus países do que
entram e, portanto, são caracterizados pela migração internacional líquida negativa. As

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1. UMA INTRODUÇÃO À DEMOGRAFIA

Filipinas enviam cerca de 1,5 milhão de pessoas para o exterior todos os anos, incluindo
300.000 que trabalham em navios em todo o mundo. Cerca de 10 por cento da população
do país vive no exterior (Martin, 2013). Dentro dos países, no entanto, geralmente há
muitas variações significativas na equação demográfica.

O fenómeno de diminuição natural é de importância e de relevância crescente nos Estados


Unidos e especialmente na Europa. Para ilustrar, em 2008, mais da metade de todos os
países da Europa tiveram mais mortes do que nascimentos. Isso inclui quase todas as
províncias da Alemanha, Hungria, Croácia, Roménia e Bulgária, Estados Bálticos, Grécia
e Itália.

“A longo prazo a continuação da diminuição natural resultará na diminuição


contínua da população, e eventualmente ao seu desaparecimento, a menos
que o excesso de óbitos sobre os nascimentos seja compensado pela migração
líquida” (Poston & Bouvier, 2017, p. 7).

Destes exemplos podemos confirmar que os três processos demográficos têm um papel
determinante não só no tamanho, mas na composição de qualquer população humana.
Mudanças nas variáveis são o resultado do nosso comportamento enquanto atores
populacionais. Isto é o cerne da Demografia: compreender como estes diversos fatores
causam mudanças no comportamento demográfico e que as consequências destes
comportamentos estão todas interrelacionadas (Poston & Bouvier, 2017, p.5-8).

Atividade formativa
1. Uma definição aprofundada de Demografia, comporta cinco elementos
fundamentais. Quais são?

2. Por que todos nós somos atores da população?

3. Distinga os diferentes ramos da Demografia: A análise demográfica, a Demografia


histórica, a Demografia social, a Ecologia Humana.

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

Objetivos
1. Conhecer o pensamento dos primeiros demógrafos;

2. Conhecer as principais características do pensamento malthusiano;

3. Identificar as principais fases e a importância da teoria da transição demográfica.

Introdução

As teorias demográficas ou teorias da população são correntes de opinião que tentam


explicar ou prever a evolução dos fenómenos demográficos, as interações entre estes e
os fenómenos económicos, sociais, psicológicos, do ambiente e outros, tentando prever
as consequências que possam levar à elaboração de uma política demográfica.

Nesta unidade, tentaremos explicar como foi evoluindo a Demografia relativamente aos
seus aspetos quantitativos da dinâmica populacional. Para além disso tentaremos perceber
como se foi constituindo lentamente a Demografia como ciência. Durante os séculos XVII
e XVIII a Demografia emerge como ciência.

Iremos ver também quem foram e o que disseram os homens que transformaram em
ciência a Demografia, qual é realmente o objeto de estudo da Demografia, quais são as
grandes teorias e os grandes problemas da Demografia contemporânea e porque é que a
Demografia é simultaneamente una e diversa e quais as grandes divisões da Demografia
atual.

2.1 O QUE É UMA POPULAÇÃO?


Define-se uma população

“como um conjunto humano situado no seio de um espaço geográfico delimitado


(…) Este conjunto humano corresponde geralmente aos habitantes de um
país ou de um conjunto de um país com determinados traços comuns de um
ponto de vista político ou socioeconómico. (…). Pode também corresponder à
população de uma parte do território de um país dotado de particularidades
política, sociológica ou económica (províncias, bairros, zonas rurais, regiões
linguísticas, regiões geográficas, etc.) “(Gérard & Wunsch, 1973).

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

O próprio termo população refere-se ao número de pessoas residentes em alguma


área geográfica específica, seja uma sala de aula ou uma nação. Da mesma forma, a
demografia descreve características de populações, não de membros individuais dessas
populações (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015, p.3).

Numa definição mais geral, a população é o conjunto de todos os habitantes de um


determinado local, definida em termos espaciais e temporais. Pode não ser necessariamente
um grupo. A análise da população humana é intrinsecamente dinâmica porque a atenção
é focada nas mudanças e alterações da mesmo no tempo.

Alguns dos principais sinónimos de população são: residentes; indivíduos; moradores;


habitantes; cidadãos; público; povo; massa; multidão e amostra. O termo demografia
é aliás por vezes utilizado como sinónimo de população, no sentido de um conjunto de
indivíduos que coexistem num dado momento e delimitado segundo critérios variados de
pertença. Etimologicamente, a palavra população originou-se a partir do latim medieval
popŭlus, que significa literalmente povo.

Uma população caracteriza-se pelo seu tamanho (número de indivíduos) e a sua composição
e está em perpetua evolução, pelo facto das entradas (nascimentos e imigrações) e das
saídas (mortes, emigrações). É fácil perceber então que uma parte essencial do trabalho
dos demógrafos será tentar explicar o que motiva a evolução dos comportamentos
demográficos. Na base, fecundidade, mortalidade e migrações dependem de processos que
têm na origem uma mesma lógica: partindo de pré-condições biológicas características da
espécie humana, as propensões em procriar, migrar, morrer, são largamente influenciadas
por um conjunto extremamente complexo de determinantes, próximos ou longínquos,
de ordem ecológica, geográfica, económica, sociológica, política, cultural, filosófica e que
variam no tempo e consoante as sociedades.

Em terminologia estatística, a palava população pode designar toda coletividade de


unidades distintas: é então sinónimo de universo. É comum usar a palavra população
para designar o conjunto de habitantes de um certo território, por vezes, uma fração
apenas desse conjunto: população de idade escolar, mas nesse caso, trata-se de uma
subpopulação. Repare-se que até ao XVIII século, a palavra população tinha também um
sentido ativo que foi perdendo, entretanto. Designava a ação de povoar, e foi substituído
pela palavra povoamento. Muitas vezes se entende por população, não a coletividade
em si, mas em termos de efetivos, isto é, o número dos seus habitantes.

A Demografia é o ramo de estudo que analisa as populações humanas, as suas


transformações. Neste contexto, a população costuma ser classificada em duas categorias:
população absoluta e relativa.

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

A população absoluta consiste no número total de habitantes de um lugar (país, estado,


região, etc). Atualmente a população absoluta mundial está na média de 7,8 bilhões de
pessoas. Prevê-se que chegue a 8 bilhões de pessoas no início de 2023 e 10 bilhões em
2050.

A população relativa, por outro lado, corresponde ao número de habitantes por área.
Este tipo de população também é conhecido por densidade demográfica ou densidade
populacional. Para obter a população relativa é necessário dividir a população absoluta
de determinado local pela área, normalmente em km2.

O ano 2020 foi marcado pela pandemia do Covid -19. Considera-se, contudo, que essa
não terá um impacto demográfico significativo. Observa-se que as pessoas falecidas são
maioritariamente idosas, população que já não teria tido filhos, não interferindo neste
caso com o número de nascimentos nos próximos anos (Institut Montaigne, 2021).

2.2 PRIMEIROS ESCRITOS SOBRE A POPULAÇÃO E A CONSTITUIÇÃO


DA CIÊNCIA DEMOGRÁFICA
Quando se procura as origens longínquas das doutrinas de população, a maioria das obras
de história do pensamento demográfico e manuais, depois da referência à Bíblia: “Mas vós
frutificai, e multiplicai-vos; povoai abundantemente a terra” (https://bible.knowing-jesus.
com/Portuguese/G%C3%AAnesis/9/7), dedicam à China antiga (Confucius, Lao-Tseu) e
aos pensadores da Antiguidade grega algumas linhas ou páginas.

No caso de Platão (428-348 a.C.), foram as considerações sobre a demografia da cidade


ideal que legitimaram essa procura das origens. No fim dos seus diálogos, as Leis, Platão
idealiza uma população estacionária onde o número de fogos, por razões políticas e sociais,
seria de 5040. Platão acredita que é possível intervir no sentido de manter constante o
volume da população da sua cidade ideal, através da fixação de uma idade mínima para
o casamento (30 anos para os homens e 18 para as mulheres) e da limitação da idade
da procriação (apenas os 10 ou 14 anos de casamento); o risco de a população diminuir
resolver-se-ia através de uma punição para os que não queriam ter filhos, os celibatários
e os casais estéreis.

Estamos, pois, perante um percursor do pensamento demográfico. Por um lado, é


efetivamente de uma população de uma unidade territorial bem definida de que se trata:
a população é uma variável claramente identificada, cujas relações com o ambiente não
são ignoradas. Por outro lado, de maneira aparentemente bastante moderna, Platão
calcula com muita precisão algumas variáveis demográficas chaves, tais como a idade no
casamento ou a duração da vida fecunda. Enfim, ele parece introduzir uma verdadeira

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

política demográfica: medidas de incentivo ou de travão da fecundidade, recurso à


emigração ou imigração, com o objetivo de controlar o número global da população
(Charbit, 2002).

Aristóteles (384-322 a.C.) é mais realista do que o seu mestre Platão, ao pensar sobretudo
num número estável de habitantes. Esta procura de estabilidade não implica um número
fixo de habitantes. Pelo contrário, ao aperceber-se que a natalidade e a mortalidade fazem
variar o volume populacional, propõe uma “justa dimensão” da população.

Na idade Média, Santo Agostinho (345-430) e São Gregório (540-604) defendem que o
casamento une marido e mulher para gerar filhos. Esta linha de pensamento é dominada
pelo pensamento cristão, numa perspetiva teológica e moral, enquanto que as duas
anteriores formas (pertencentes à Antiguidade) foram analisadas numa perspetiva política
e social.

Com o início dos tempos modernos, as ideias respeitantes à população separam-se das
questões morais e passam progressivamente a depender de preocupações políticas e
económicas. É nesta linha de ideias e de acontecimentos que se deve interpretar o culto
pelo ideal mercantilista da riqueza, associado à valorização do Estado. Neste contexto, as
doutrinas mercantilistas são consideradas, no seu conjunto, explicitamente populacionistas.
Este populacionismo permitiu acelerar o processo que irá conduzir ao aparecimento da
Demografia como ciência.

No mercantilismo italiano dois pensadores merecem referência especial: Maquiavel


(1467-1527) e Botero (1540-1617). Maquiavel não defende todas as ideias mercantilistas,
nomeadamente no que diz respeito ao princípio que o Estado só é forte quando favorece
o enriquecimento dos cidadãos, mas, ao defender que uma população numerosa reforça
o poder do Príncipe, adota uma atitude populacionista. Para Botero, uma população
numerosa deve ser a primeira preocupação do Estado.

No mercantilismo francês existem duas correntes diferenciadas: a que defende um


populacionismo intransigente (Bodin e Montchrestien) e a que defende um populacionismo
mais racional (Vauban). Jean Bodin (1530-1596) afirma que uma população numerosa
permite a valorização de um país. Ficou conhecido com a frase “Não existe maior riqueza
nem maior força do que os homens”. Montchrestien (1575-1621) também defende o ponto
de vista de que a grande riqueza da França é a inesgotável abundância dos seus homens.

Vauban (1633-1707) é populacionista ao defender que a falta de população é a maior


desgraça que pode acontecer ao reino. Ficou conhecido na história do pensamento
demográfico pelas estimativas que faz e por chamar a atenção para a utilidade dos
recenseamentos da população.

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

Em Inglaterra, o mercantilismo é menos homogéneo do que em Itália e em França e


evolui ao longo do tempo. Consequentemente, a atitude face à problemática da população
também evolui.

Nesta evolução aparecem duas correntes de pensamento distintas: no princípio, a


população é considerada uma variável entre tantas outras do sistema social; depois, a
população aparece como interessante em si própria; são os primórdios da Demografia
científica.

Na primeira corrente encontramos autores que procuram refletir sobre o melhor equilíbrio
entre a população e os recursos. Thomas More (1478-1535) ao estudar as causas da
miséria do seu país, pensa que esta deve-se a três fatores: o luxo da nobreza, a existência
de muitos domésticos improdutivos e a extensão da criação de carneiros. Se existem
autores preocupados com esta questão do equilíbrio população-recursos, no século XVII,
em Inglaterra, a Demografia dá os seus primeiros passos como ciência e pensadores
como William Petty, John Graunt, Edmund Halley começam a considerar que os problemas
populacionais devem ser analisados e medidos independentemente das relações que
possam ter com quaisquer outros problemas económicos, políticos e sociais.

A morte durante muito tempo foi estudada na Antiguidade e Idade média na perspetiva
da longevidade, isto é, da idade mais elevada que o homem podia esperar atingir. O
termo mortalidade designava até ao século XVII as destruições causadas pelas guerras e
epidemias. Com Petty e John Graunt que em 1661 publicam o primeiro livro de Demografia,
Natural and Political Observations Mentioned in a Following Index, and Made Upon the
Bills of Mortality na cidade de Londres, aparece a ideia moderna da mortalidade, a de uma
evolução regular dos riscos de morte com a idade. Os dois homens imaginam as primeiras
tábuas de mortalidade que indicam o número de mortes observados a cada idade num
grupo de pessoas seguidas desde o seu nascimento. O número de sobreviventes numa
determinada idade deduz-se por simples substração das mortes ocorridas entre essa idade
e a anterior (Enciclopédia Universalis, 2021).

A invenção das primeiras tábuas de mortalidade pelo inglês John Graunt constitui o
certificado de nascimento dessa nova ciência. Os conceitos estatísticos das tábuas de
mortalidade são ainda hoje elementos fundamentais dos métodos demográficos. Com
as tábuas de mortalidade de Graunt, a Demografia define-se como ciência que, a partir
da observação de dados, mede o risco dos fenómenos demográficos e que, a partir dos
resultados dessas medidas, aspira a conhecer não apenas o presente e o passado, mas
também a aventurar-se na prospeção do futuro. É esta ambição prospetiva que vai acionar
a formulação de teorias universais da população, de que são principais expressões: o
malthusianismo e a teoria da transição demográfica (Leston Bandeira, 1996c).

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

No entanto, a palavra demografia só foi inventada em 1855 pelo francês Guillard.

As teorias demográficas ou teorias da população são correntes de opinião que tentam


explicar ou prever a evolução dos fenómenos demográficos, as interações entre estes e
os fenómenos económicos, sociais, psicológicos, do ambiente e outros, tentando prever
as consequências que possam levar à elaboração de uma política demográfica.

Dupâquier em História da demografia de Jacques e Michel Dupâquier (1985) assinalam o


livro de Graunt em 1661 como sendo a obra que comporta pela primeira vez no mundo
três elementos singulares, o primeiro quadro estatístico por ano e por causa de morte
observados em Londres, o primeiro enunciado de uma lei demográfica, isto é, a proporção
constante de homens e mulheres na população e a primeira tabela de mortalidade
mostrando quantas pessoas sobrevivem a cada idade a partir de 100 conceções (e não
100 nascimentos) iniciais. Os Dupâquier lembram que Graunt é considerado como o “pai”
da demografia por muitos historiadores da disciplina (Dupâquier, 1985; Le Bras, 2013).

A partir do século XVII a Demografia elege o homem e a sociedade como objeto do


conhecimento científico. Os progressos da nova ciência influenciarão o debate entre
populacionistas e anti populacionistas que se intensificará durante o século XVII.

A questão do crescimento demográfico aparecerá sempre, entre os anti populacionistas,


associada ao problema das subsistências e, por arrastamento, das desordens sociais e da
miséria decorrentes do excesso de população. Entre os anti populacionistas predominava
uma visão pessimista. Ao contrário dos seus adversários, defendiam que a pobreza e a
desordem social não eram devidas à má organização social, mas antes ao desequilíbrio
entre o crescimento dos homens e o crescimento das subsistências. O que implicava
a necessidade imperiosa de restrições e de controle da reprodução humana (Leston
Bandeira, 1996a). A publicação, em 1798, da 1.ª edição do Ensaio de Malthus virá ampliar
a repercussão social e científica deste debate.

2.3 OS PRIMEIROS DEMÓGRAFOS


Segundo Landry (1945) o termo demografia foi utilzado pela primiera vez por Achille
Guillard, em 1855 (in Guillard, A. Éléments de statistique humaine ou demographie
comparée, 1855) inventando o nome de Demografia Comparada, dando destaque ao
seu aspeto quantitativo (estatístico).

Este autor dá a seguinte definição de Demografia

“Em sentido amplo, abrange a história natural e social da espécie humana;


em sentido restrito, abrange o conhecimento matemático das populações, dos
seus movimentos gerais, do seu estado físico, intelectual e moral” (Guillard,
1855, conforme citado em Nazareth, 2004, p. 43).

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

Do grego: DÊMOS = POPULAÇÃO GRÁPHEIN = ESCREVER / DESCREVER / ESTUDAR,


o objetivo da Demografia é analisar populações humanas e suas características gerais.

Mas o desenvolvimento da Demografia, como ciência, fez com que nas últimas décadas
se multiplicasse o número de investigadores e de obras publicadas. Mas o que é afinal
a Demografia? É o estudo das populações humanas, claramente delimitadas no tempo
e no espaço.

A opinião pública parece limitar a Demografia a uma análise estritamente quantitativa,


uma “contabilidade de homens” (Sauvy, 1976, p. 16). Ora a Demografia envolve não só
elementos estatísticos, mas também tem em conta as realidades económicas, sociológicas.

Malthus

“O século XVIII foi fértil em ideias e ideais (...) debates apaixonados, e nem
sempre muito bem fundamentados, relativos às questões da população, e
sobre o sub ou sobre povoamento do Mundo, da Europa ou de alguns países”,

escreve Maria Luís Rocha Pinto (2010, p. 48).

Deve-se também, segundo ela, ao aparecimento de várias teorias e ideologias pelo facto
de não haver verdadeiros recenseamentos.

É neste contexto que surge “uma obra que marcará quer o pensamento demográfico,
quer a demografia, quer ainda as políticas de população até aos dias de hoje”. Trata-se da
obra de Thomas Robert Malthus, An essay on the principle of on population as it affects
the future improvement of society with remarks on the speculations of Mr. Godwin, Mr.
Condorcet and other writers – 1.ª edição 1798. Esta obra foi seguida, ainda em vida de
Malthus, por mais cinco edições até 1826, até mais tarde comentada, discutida, contestada
ou apoiada, em várias línguas, transformando o malthusianismo em uma doutrina.

Thomas Malthus, padre inglês que viveu no século XVIII (1766-1834), professor de
História Moderna e Economia Política em Inglaterra, grande observador de fenómenos
populacionais, estabeleceu o célebre paralelo entre a multiplicação do homem e a sua
subsistência.

Em 1798, Malthus publica o Ensaio sobre o Princípio da População. O livro faz escândalo
devido a uma das suas teses:

“a assistência aos pobres é inútil porque não serve senão para os multiplicar
sem os consolar”. (conforme citado em Nazareth, 2004, p. 26)

Também faz escândalo devido a um parágrafo:

“um homem que nasce num mundo ocupado, se não lhe é possível obter dos
seus pais os meios de subsistência… e se a sociedade não tem necessidade

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

do seu trabalho, não tem direito a reclamar a mínima parte da alimentação e


está a mais…”. (conforme citado em Nazareth, 2004, p. 26)

A sua teoria baseia-se no facto de uma população ter um aumento constante e esse
aumento ser mais rápido do que os meios de subsistência, sendo o equilíbrio entre o
tamanho da população e o nível de subsistência mantido através do controle do crescimento
da população.

Princípio de População de Thomas Malthus

O pensamento demográfico de Malthus pode ser sistematizado em torno de três temas


fundamentais: População e subsistências, obstáculos e remédios. Quanto ao primeiro tema
população e subsistências – o autor distingue duas leis antagónicas: a lei da população
que cresce em progressão geométrica e a das subsistências, que cresce em progressão
aritmética. Para Malthus, quando uma população não é controlada, duplica todos os 25
anos.

De acordo com Malthus, as populações tendem a crescer mais rapidamente do que os meios
de subsistência; isto é, as populações tendem a crescer numa progressão geométrica (1,
2, 4, 8, 16 etc.). Por outro lado, não existe essa tendência para os meios de subsistência se
expandirem por progressão geométrica; em vez disso, eles se expandem por progressão
aritmética (1, 2, 3, 4, 5, 6, etc.).

A população é mantida dentro dos limites dos meios de subsistência principalmente por
meio de controles positivos, aqueles operando através das taxas de mortalidade. Quando
os meios de subsistência não são adequados para cuidar de uma população de um
determinado tamanho, a taxa de mortalidade aumentará até que a população encolha a
um nível suportável.

Da mesma forma, sempre que surgir um excedente nos meios de subsistência, isso tenderá
a diminuir temporariamente a taxa de mortalidade (e aumentar a taxa de crescimento
natural) até que a população tenha crescido até os limites dos novos meios de subsistência.
Este é o “dilema malthusiano”.

Hipoteticamente, a saída do dilema é a aplicação de “controles preventivos” ao crescimento


populacional, operando por meio da taxa de natalidade. Estes enquadram-se em duas
categorias: “restrição moral” e “vício”.

Chegamos ao segundo tema: os obstáculos ao crescimento da população. Para Malthus,


existem dois tipos de obstáculos: os positivos (ou Regressivos), que serão todos os
obstáculos que podem de algum modo diminuir a vida humana (Ex: pobreza, epidemias,
fomes, etc...) e os preventivos, que serão os acontecimentos que levam à diminuição da
fecundidade, isto é, casamentos adiados (criando condições para que os cônjuges casem

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

mais tarde), abstinência antes do casamento (limitações morais), casamentos tardios dos
pobres ou até apelo ao celibato “A miséria deriva do crescimento excessivamente rápido
da população” (conforme citado em Nazareth, 2004, p.33). Quanto ao terceiro eixo – os
remédios, Malthus não hesita em afirmar que o único obstáculo que não prejudica nem
a felicidade moral, nem a felicidade material é a obrigação moral.

“Restrição moral”, conforme defendida por Malthus, consiste em não se casar até
que se possa sustentar os filhos resultantes e em permanecer sexualmente casto fora
desse casamento. Além disso, se o casamento e a companhia sexual precisam de ser
conquistados, as pessoas trabalharão mais arduamente para ganhar esse prêmio,
aumentando assim os meios de subsistência agregados.

“Vício”, de acordo com Malthus, inclui promiscuidade, homossexualidade, adultério e


controle de natalidade (incluindo o aborto). A sua objeção declarada foi em bases morais.
Envolver-se em qualquer um desses vícios representava uma indulgência nos apetites
sexuais sem a aceitação da responsabilidade pelas consequências de tal indulgência.
Foi uma rejeição da responsabilidade individual, e Malthus viu a aceitação dessa
responsabilidade como – no longo prazo – a única esperança da humanidade para sair
do dilema (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

Duas correntes alternativas surgem em paralelo – o neomalthusianismo e anti


malthusianismo.

O malthusianismo dá rapidamente lugar aos movimentos neomalthusianos, iniciados


no Reino Unido, logo em 1822 por Francis Place, que, ao contrário de Malthus, vão
preconizar o controle dos nascimentos no seio do casamento, vai defender abertamente
a contraceção. Ser malthusiano, anti malthusiano ou neomalthusiano, vai depender muito
mais das práticas do que das teorias económicas e políticas. São movimentos que vão
percorrer o resto do século XIX e o século XX (Rocha Pinto, 2010).

A primeira corrente aposta na limitação dos nascimentos, enquanto a segunda relaciona


o número de habitantes com os “meios de existência” (produtos alimentares, vestuário,
habitação, entre outros). O pensamento liberal de tendência antimalthusiana é
representada fundamentalmente por A. Dumont (1849-1902) e Durkheim (1858-1902).
Dumont constata a existência de uma oposição entre o crescimento demográfico e o
desenvolvimento do indivíduo. Para Durkheim, um dos pilares da sociologia, a expansão
demográfica é acompanhada de uma mudança qualitativa da sociedade.

O pensamento demográfico do século XX é particularmente enriquecido com as


contribuições de A. Sauvy. Também é considerado um antimalthusiano e um natalista,
mas a riqueza do seu pensamento merece alguma atenção. Em primeiro lugar, devemos

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

a Sauvy a elaboração da teoria do “ótimo da população”, ou seja, qual deve ser o número
de habitantes de um dado território para que o nível de vida de cada um seja o mais
elevado possível?

Se, para os neomalthusianos o único problema é o excesso da população, Sauvy considera


que, se existem países que têm “gente a mais”, outros têm gente a menos. Mas, o nome
deste autor está sobretudo ligado à explicação do dilema com que todos os países do
mundo são confrontados – crescer ou envelhecer?

Nas últimas décadas, uma perspetiva neomalthusiana usou parte da teoria de Malthus como
uma justificativa para programas de planeamento familiar em todo o mundo. As perspetivas
neomarxistas e a teoria do desenvolvimento económico, entretanto, promoveram políticas
de desenvolvimento como tecnologia agrícola aprimorada, oportunidades e acesso ao
crédito para grupos sociais marginalizados e sistemas de distribuição social eficientes
dentro das regiões menos desenvolvidas. Não surpreendentemente, essas duas perspetivas
são complementares, refletindo o numerador (ou seja, o tamanho da população) e o
denominador (ou seja, meios de subsistência) para a densidade populacional. Ambos têm
claramente um papel nas preocupações com o crescimento populacional. A contribuição
de Malthus foi chamar a atenção para a importância do crescimento populacional nesta
equação.

Muitos países deram importância ao crescimento populacional. A China, por exemplo,


passou a reconhecer a sua enorme população e rápido crescimento como causa do
subdesenvolvimento contínuo e tomou medidas na forma de regulação da fecundidade
para neutralizá-lo (no entanto, as evidências mostram que o declínio da fecundidade
começou na China antes da regulamentação). Embora poucos países tenham adotado uma
abordagem tão extrema e controversa quanto a da China, as autoridades em muitos países
têm respeito pelas possíveis consequências negativas de um crescimento populacional
totalmente descontrolado.

Por outros lado, assiste-se a políticas de planeamento familiar que os países implementaram
para tratar das preocupações com o crescimento populacional. Essas políticas são exemplos
de neomalthusianismo, que defende abertamente o uso de controles preventivos para
escapar do dilema malthusiano. Isso inclui, principalmente, o controle da natalidade
(que Malthus chamou de “vício”), um produto da era vitoriana. Malthus, em vez disso,
defendeu “restrição moral” por meio da abstinência e do adiamento do casamento. Apesar
dessa diferença, os neomalthusianos e o movimento de planeamento familiar moderno
descendem diretamente de Malthus e contam com uma noção geral de seu “princípio de
população” como apontando para a necessidade de programas de planeamento familiar
(Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015, p.70).

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

2.4 TEORIA DA TRANSIÇÃO DEMOGRÁFICA


Toda a segunda metade do século XX é dominada pelo pensamento produzido pela
Teoria da Transição Demográfica, com aparecimento e estruturação antes da segunda
Guerra Mundial. O termo “revolução demográfica” foi primeiro introduzido em 1929 pelo
demógrafo polaco Léon Rabinowicz e adotado no mesmo ano pelo demógrafo americano
Warren Thompson; foi mais tarde utilizado pelo francês Adolphe Landry (1943), na sua
obra intitulada La révolution démographique, Études et essais sur les problèmes de la
population; Notestein, desenvolve a teoria a uma escala mundial, chamando-lhe Transição
Demográfica (Rocha Pinto, 2010, p.54).

Outros autores vão desenvolver o conceito em teoria explicativa da evolução da população


ao longo do século XX, nascendo assim um modelo com o objetivo de explicar a evolução
da população. Economicamente, os países da Europa Ocidental já tinham progredido
nas suas revoluções agrícolas antes do século XIX. Durante o período de transição
demográfica, eles estavam a passar por um complexo conjunto de mudanças chamado de
revolução industrial, com mudanças sociais associadas, como urbanização, alfabetização,
secularização e crescente consumismo.

Na segunda metade do século XX pensava-se que as teorias da transição demográfica,


estabelecidas para tentar dar conta de mudanças e transformações demográficas (Landry,
1943 ; Davis, 1945 ; Notestein, 1945) eram a chave, não só para a compreensão das
evoluções passadas ou em curso, mas também para a especulação sobre as perspetivas
futuras (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

Assim, se desde o fim dos anos 1950, os especialistas das Nações Unidas puderam prever
que o Planeta estaria povoado por 6 bilhões de homens no ano 2000, logo a teoria da
transição demográfica fornecia um corpo de hipóteses particularmente exato sobre a
evolução da dinâmica das populações de países em desenvolvimento, principal foco para
o futuro da população mundial da época (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

O conceito de transição ocupa um lugar central na teoria da mudança demográfica. Exprime


essencialmente a passagem de um regime de fecundidade e de mortalidade a um outro.
Este tipo de mudança encontra-se caracterizado na “teoria da transição demográfica” que
constitui para muitos demógrafos uma teoria geral da população (D. O. Cowgill, 1963,
em “Transition Theory as General Population Theory”, Social Forces, 41, pp. 270-274).
Três contributos estão na origem desta teoria, os de Warren S. Thompson, de Adolphe
Landry e de Frank W. Notestein.

O esboço da teoria da transição demográfica, formulado por W. S. Thompson em 1929


(“Population”, The American Journal of Sociology, pp. 959-975) coloca-se no centro

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

da velha questão demográfica, isto é, a do equilíbrio entre crescimento demográfico e


subsistências. Mas Thompson limitou-se a sistematizar três grandes grupos de população,
consoante a respetiva dinâmica demográfica, estabelecendo o princípio segundo o qual
esse dinamismo é condicionado pela disponibilidade de terras.

Neste artigo publicado em 1929, Thompson classifica os países do mundo em três grandes
grupos segundo o seu crescimento demográfico:
– o grupo A: baixas taxas de mortalidade, taxas de natalidade em diminuição
rápida, declínio das taxas de crescimento natural; declínio do crescimento da
população; aproximação rápido do estado estacionário;

– o grupo B: taxas de natalidade lentamente sob controle; taxas de mortalidade


que descem mais rapidamente do que as taxas de natalidade; aumento das
taxas de crescimento natural;

– o grupo C: pouco controle voluntário das taxas de natalidade e de mortalidade;


crescimento rápido da população. (Piché e Poirier, 1990)

Em relação a Malthus, Thompson apresenta duas novidades: o reconhecimento da


existência de diferentes estados – e não estádios – de população e a utilização, como
critérios diferenciadores de três desses estados, das tendências da mortalidade e da
natalidade. Mas em Thompson não existe ainda a ideia evolucionista de transição. Esta
será apresentada pela primeira vez, em 1945, por Notestein, na sua teoria dos estádios
de desenvolvimento das populações (Leston Bandeira, 1996b).

Numa obra publicada em 1934, La Révolution Démographique. Paris, Librairie Sirey, Landry
distingue também três regimes de população para dar conta da situação demográfica
presente e passada de certos países da Europa (Piché e Poirier, 1990):
– o regime primitivo no qual a fecundidade não sofre nenhuma restrição de ordem
económica. A população tende para um máximo que será alcançado quando a
mortalidade terá atingido o nível da natalidade;

– o regime intermédio no qual as preocupações de ordem económica provocam


restrições da nupcialidade com vista a manter para os indivíduos e suas famílias
um certo grau de bem-estar. A nupcialidade torna-se então o principal regulador
da população;

– o regime contemporâneo caracterizado por um aumento da produtividade, a


diminuição da mortalidade e a limitação da procriação. O progresso técnico
intervém como fator regulador do crescimento da população.

Em 1945, Notestein volta à tipologia de Thompson no quadro de uma análise mais


dinâmica. Para ele, os três tipos de crescimento descrevem as etapas de um processo de

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

passagem de um regime demográfico caracterizado por taxas elevadas de mortalidade


e de natalidade para um outro, em que estas taxas são fracas (Notestein, 1945, in Piché
e Poirier, 1990).

A primeira grande interpretação da transição demográfica provem diretamente da teoria


estruturo-funcionalista que monopoliza a sociologia anglo-saxónia (sobretudo americana)
nos anos 50-60. Nessa perspetiva, a transição demográfica inscreve-se num conjunto de
transformações estruturais ligadas à industrialização e à urbanização.

O essencial da teoria pode resumir-se de seguinte modo: a industrialização transforma


as estruturas económicas e sociais, as quais trazem mudanças na estrutura familiar que,
por sua vez, provocam uma diminuição da fecundidade.

Entre as transformações estruturais as mais importantes, notam-se as seguintes: a


diminuição da mortalidade, a diminuição das atividades agrícolas a favor da generalização
de uma economia de mercado urbana-industrial, a mobilidade geográfica e a urbanização,
a melhoria do estatuto da mulher e o aumento da escolarização. Perante essas
transformações, a família conhece uma série de adaptações, o antigo sistema familiar
tornando-se disfuncional. No meio destas adaptações, os demógrafos da transição
realçaram sobretudo a diminuição da importância da parentalidade e a nuclearização
estrutural da família, o aparecimento de novos papéis familiares, nomeadamente no que diz
respeito ao valor económico e social dos filhos, uma maior igualdade e comunicação entre
os cônjuges e um novo tipo de casamento essencialmente baseado na livre escolha. Os
casais desse novo tipo de família desejam menos filhos e, graças à contraceção moderna,
planeiam famílias menos numerosas (D. Heer, 1968; C. Goldscheider, 1971; B. C. Rosen
e A. B. Simmons, 1971, in Piché e Poirier, 1990).

A teoria da transição demográfica clássica enfatiza o declínio da fecundidade como


consequência do declínio da mortalidade e devido às mudanças na vida social que
acompanham a industrialização e a urbanização (Thompson, 1930; Notestein, 1945).

Assim, a transição demográfica, a passagem de uma sociedade agrícola com uma alta
fecundidade para uma sociedade industrial com uma diminuição da fecundidade, efetua-
se pela passagem forçada para a industrialização.

Mesmo se se trata essencialmente de uma teoria explicativa para a diminuição da


fecundidade, considerada aqui como variável dependente, as duas outras variáveis
demográficas – ou seja, a mortalidade e a migração, são igualmente explicitamente
incluídas no modelo, contudo como variáveis independentes, isto é, agindo na fecundidade.

Assim, a baixa da mortalidade constitui um papel central nas primeiras formulações da


teoria da transição. De facto, com uma baixa mortalidade infantil, os casais não precisam
ter tantos filhos.

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

Quanto à migração, constitui também um papel importante pois permite a mobilidade da


zona agrícola-rural para a economia industrial-urbana.

No entanto, a hipótese central da nuclearização da família será contestada nos trabalhos


históricos de Anderson (1971) e de Hareven (1975) e, por outro lado, a industrialização
deixa de ser considerada como uma condição necessária para a diminuição da fecundidade.

A teoria de transição demográfica foi descrita pela primeira vez nos anos 40. Desde então
tem sido modificada, acrescentada e escrita de novo. A definição clássica desta teoria foi
descrita por Notestein (1945), Blacker (1947) e outros autores e define-se do seguinte
modo: existem uma série de estádios durante os quais a população se move de uma
situação onde tanto a mortalidade como a natalidade são altas, para uma posição onde
tanto a mortalidade como a natalidade são baixas. O crescimento de ambos os indicadores
antes e depois da transição demográfica é muito baixo. Durante a transição, o crescimento
da população é muito rápido devido essencialmente ao declínio da mortalidade ocorrer
antes do declínio da fecundidade.

Seguindo a revisão de Mason da teoria da transição demográfica (1997), Lundquist,


Anderton, Yaukey (2015, p.58) identificam seis teorias de transição principais.

A abordagem microeconómica neoclássica (Becker, 1981) enfatiza o custo crescente de criar


filhos e o desejo por usos alternativos dos recursos familiares (por exemplo, consumismo
crescente e bens de consumo alternativos).

Easterlin e Crimmins (1985) expandem esse pensamento para incluir os custos psicológicos
ou sociais de limitar a fecundidade. A teoria ideativa (Cleland e Wilson, 1987) atribui o
declínio da fecundidade à difusão de informações anticoncecionais e à mudança das
normas sobre procriação.

A maioria das críticas a essas teorias gerais de transição demográfica surgem ou da


simplicidade com que as transições são caracterizadas (Mason, 1997) ou de expetativas
excessivamente altas de previsão (Feeney, 1994). Feeney observa que mesmo a teoria de
transição mais satisfatória pode não prever o início do declínio da fecundidade. Embora as
teorias de transição sejam úteis para compreender as mudanças de comportamento, não
há evidência de que elas podem prever o momento preciso das mudanças demográficas
em um determinado conjunto de circunstâncias.

Mason (1997, conforme citado em Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015, p. 59), resume o
que os demógrafos estabeleceram sobre a transição demográfica:
1. O declínio da mortalidade é geralmente uma condição necessária, mas não
suficiente, para o declínio da fecundidade.

2. As transições de fecundidade ocorrem em diferentes circunstâncias, quando

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

várias combinações de condições são suficientes para motivar ou permitir que


as populações adotem o controle da natalidade.

3. Uma transição causada por circunstâncias numa determinada população pode


influenciar ou difundir-se para outras regiões de circunstâncias diferentes.

4. Tais influências podem ocorrer em velocidades diferentes, dependendo de uma


variedade de circunstâncias.

5. O número de crianças que as famílias podem sustentar varia entre as populações


anteriores à transição.

6. Se as famílias excederem a sua capacidade de sustentar os filhos, os pais


recorrerão a alguma forma de controle de fecundidade.

7. O controle da fecundidade após a gravidez ou nascimento depende das formas


disponíveis e aceitáveis ​​de tal controle (por exemplo, aborto ou infanticídio).

8. Quando as condições limitarem esses controles após a gravidez, os controles


pré-natais, como anticoncecionais ou espaçamento entre nascimentos, serão
incentivados (especialmente se auxiliados por políticas ou programas estaduais).

Maria Luís Rocha Pinto (2010, p. 55) resume as quatro fases em que todos os países já
passaram, estão a passar ou passarão:
a) uma fase do “quase equilíbrio” antigo, (ou de pré-transição) entre uma
mortalidade elevada e uma fecundidade igualmente elevada o que implica
um crescimento natural da população reduzido – característica de sociedades
agrícolas e rurais. À esta primeira fase, dá-se o nome de fase de pré-transição
ou pré-industrialização, caracterizada por um equilíbrio de baixo nível. Durou
milhares de anos quando o mundo era caracterizado por altas taxas de natalidade
e mortalidade e crescimento populacional estável. Na maioria dos países do
mundo, esta época está terminada. A fase pré-transicional foi seguida pela fase
de transição (Fase 2), caracterizada por uma taxa de fecundidade elevada e o
declínio da taxa de mortalidade.

b) A segunda fase, fase do declínio da mortalidade e da consequente aceleração


do crescimento natural da população, diz respeito à etapa em que a mortalidade
diminui, mas com grande aceleração do crescimento da população, em que a
fecundidade se mantem elevada: é uma fase de crescimento demográfico rápido.
Vários países em desenvolvimento estarão ainda nesta fase, o que suscitou
inúmeros debates sobre os efeitos negativos do crescimento demográfico rápido
no desenvolvimento económico.

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

A mortalidade começou a diminuir em muitos países do mundo com o início da


industrialização e modernização, e sob a ação de um aumento dos orçamentos
da saúde e medidas sanitárias.

A fecundidade permaneceu alta, no entanto a população continuou a aumentar.

Assim, a taxa de crescimento populacional foi alta.

Exemplos: Guatemala, Iraque, África Subsaariana

c) A fase do declínio da fecundidade; a mortalidade continua a declinar embora


a um ritmo mais moderado e o crescimento natural da população diminui de
intensidade. Esta terceira fase caracterizou durante muito tempo as sociedades
industriais e urbanas, quando a revolução demográfica produziu baixos níveis
de fecundidade e de mortalidade. Hoje, fala-se até de uma revolução mundial,
na medida em que os níveis de fecundidade estão baixos.

Esta fase foi caracterizada por um crescimento populacional decrescente devido


a menores taxas de natalidade, recuo da fecundidade e da mortalidade seguida
por uma contração do crescimento natural;

d) uma última fase do “quase-equilíbrio” moderno entre uma mortalidade


com baixos níveis e uma fecundidade igualmente baixa, tendendo para um
crescimento nulo, abaixo do nível de substituição da população (menos de
2,1 filhos por mulher) e anuncia uma possível diminuição da população em
números absolutos. Nesta fase (chamada declínio incipiente), a fecundidade e
a mortalidade são muito baixas. Durante esta fase, entretanto, frequentemente
ocorrem pequenas flutuações na fecundidade.

Exemplos: Brasil, Alemanha e Japão

No Japão, a queda da taxa de natalidade explica-se sobretudo pela prática do


aborto, legalizada pelo Estado, e em Perto-Rico, o declínio provem parcialmente
da esterilização.

Quase todos os países do mundo já passaram pela segunda fase (declínio da mortalidade) e
quase todos já chegaram à terceira fase (declínio da fecundidade). A transição demográfica
começou nos países mais avançados da Europa no século XVIII quando a mortalidade
começou a declinar numa forma consistente e continuada. Chegando ao século XX, o
declínio da mortalidade expande-se a todos os países europeus e aos outros continentes.
O aumento da população acelera. A tendência pesada da evolução da população mundial
aponta, atualmente para uma situação em que, a partir de meados deste século, se admite

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2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

o início de um processo que conduzirá a um declínio progressivo da população mundial,


através da diminuição do número total de nascimentos.

A ideia central da teoria da transição demográfica, que é a de provar a existência dos


efeitos da modernização nos comportamentos demográficos, parece estar mais do que
demonstrada pelos factos. A revolução sanitária fez que no mundo, nos anos 90, não
existissem países com uma esperança de vida à nascença inferior a 50 anos. Os raros países
que se encontravam nessa situação pertencem todos à África subsariana. A revolução
contracetiva fez também generalizar a ideia de que um baixo nível de fecundidade é um
símbolo de modernidade, seja à escala de um país seja à microescala dos indivíduos e
dos casais.

A esta transição demográfica no sentido restrito, Piché (2013) acrescenta outras


transições fundamentais. Relacionado com a fecundidade, menciona a transição familiar:
aparecimento de novos modelos familiares e de uniões, mudanças nos papéis dos homens
e das mulheres. Para além dos níveis de mortalidade, considera de modo mais global uma
transição em saúde, isto é, mudanças nas causas de morte (a transição epidemiológica)
e dos novos fatores de risco (novos vírus, poluição, etc.). Uma das transições das mais
importantes para as suas consequências sociais e económicas é a passagem de uma
sociedade jovem para uma sociedade envelhecida (transição da estrutura por idade).

Acrescenta, por fim, a transição migratória, caracterizada pelo fim do êxodo rural e a
importância crescente da migração internacional no crescimento demográfico.

Além de observar estas diversas transições, o importante, segundo Piché (2013) é mostrar
que estas transições estão todas ligadas, produzindo assim uma teoria global da mudança
social.

Maria Luís Rocha Pinto (2010) nota que para Landry existem apenas três fases ou “regimes
demográficos” que se sucedem no tempo:
a) “regime primitivo” em que a pressão das subsistências, isto é a economia,
apenas afeta a mortalidade, e em que o homem deixa à natureza a regulação
dos excedentes; esta espécie de regulação “natural” faz com que a população
tenda sempre para o máximo possível pelas subsistências disponíveis; este
efetivo da população tem a longo prazo um crescimento muito lento, alterado
regularmente por crises de sobre mortalidade (epidemias, guerras, fomes);

b) “regime intermédio”, em que o progresso, técnico, científico, de circulação,


permite à população manter ou elevar o seu nível de vida; desenvolvimento
provocando a diminuição da natalidade, inicialmente devido ao retardamento
da idade do casamento;

© Universidade Aberta 43
2. TEORIAS DEMOGRÁFICAS

c) “regime moderno” em que a natalidade baixa fortemente e não somente em


função de considerações económicas individuais.

A teoria da transição demográfica é uma teoria descritiva. Descreve as diferentes fases


vivenciadas por uma determinada população. Limita-se à interpretação dos momentos
decisivos da evolução demográfica sem fornecer um sistema de relações lógicas e explícitas
que poderiam permitir fazer deduções, fazendo assim predições da evolução. (Genné,
1981, 559)

A transição demográfica descreve a passagem de um regime demográfico para outro


e relaciona os níveis de fecundidade e de mortalidade em diferentes sociedades em
diversas etapas da sua história. Esta teoria permite descrever a evolução demográfica
em diversas fases.

Atividade formativa
1. Descreva a Teoria da Transição Demográfica e as suas fases.

2. Explique o “Problema Malthusiano” e como os escritos de Malthus foram


interpretados e criticados.

© Universidade Aberta 44
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA
E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

Objetivos
1. Conhecer as características fundamentais e o conteúdo dos principais sistemas
de informação existentes;

2. Identificar as vantagens e os inconvenientes de cada um dos sistemas de


informação demográfica, tendo em consideração as necessidades de dados de
uma investigação em análise demográfica;

3. Conhecer as principais técnicas de análise da qualidade dos dados demográficos,


e aprender a escolher essas técnicas em função dos sistemas de informação
utilizados.

Introdução

À medida que as civilizações crescem e as nações se desenvolvem, os governos constroem


sistemas para reunir informações sobre o seu povo. No mínimo, eles desejam saber
quantos, de que tipo, onde estão. O atual sistema padrão de recolha de dados evoluído,
no Ocidente, tem como base o recenseamento decenal. Mas um recenseamento (ou
censos) remete apenas para um momento no tempo. Portanto, neste sistema, os censos
são complementados pelo registo de outros eventos populacionais (nascimentos, óbitos)
e / ou por sondagens ou inquéritos por amostragem. Com o advento da alfabetização
tecnológica nas sociedades modernas, há um enorme potencial inexplorado para medir os
traços digitais deixados para trás pelos utilizadores da Internet e telemóveis, tornando-se
um método emergente de recolha de dados num futuro próximo (Palmer et al., 2013;
Watts, 2007), fontes de dados emergentes, comumente chamadas de “big data”. Mas
mesmo com a mais sofisticada combinação desses elementos, ainda permanecerão lacunas
que devem ser preenchidas por estimativa.

Os elementos brutos da Demografia são os dados recolhidos nos censos, em estudos,


nos registos dos vários sistemas, etc. Estes dados podem ser apresentados de muitas
maneiras, mas sobretudo, de duas formas fundamentais.

Em primeiro lugar temos os dados recolhidos dos censos da população ou inquéritos


semelhantes ao censo. O censo produz o registo das pessoas num dado momento, ou
seja, produz uma informação “fotográfica” transversal da população existente, o seu

© Universidade Aberta 45
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

tamanho, a sua estrutura, como ela é observada no momento do censo. As comparações


dentro de um censo, ou entre censos, envolvem em geral, quer números absolutos quer
o cálculo de proporções.

Segundo, existem dados normalmente recolhidos pelos registos dos diferentes sistemas.
Os dados produzidos são o registo dos acontecimentos durante um determinado intervalo
de tempo, em geral um ano. Os dados são essencialmente dinâmicos na sua natureza,
porque fornecem informação no decorrer do tempo.

O número de nascimentos, óbitos, movimentos da população, ou outros acontecimentos,


ocorrem durante um período, e estes são afetados pelo número de pessoas “em risco”, de
ser “um nascimento”, um “óbito”, uma “migração”, etc., sendo comum, nesse contexto,
serem calculadas taxas de ocorrências, permitindo comparações de níveis de mortalidade,
fecundidade, mobilidade, etc. em vez de somente o número de nascimentos, de óbitos
ou de migrações.

Tendo em conta que alguns desses dados podem conduzir a enviesamentos, a recolha
de dados demográficos tem de ser hierarquizada e explicitada, pois estes influenciarão
os modos de análise restringindo as possibilidades de algumas análises.

Poucos são os dados que são recolhidos principalmente com fins demográficos. A maior
parte deles são produzidos para, ou como, produto de atividades administrativas levadas a
cabo ou controladas pelos governos ou agências internacionais e onde os demógrafos têm
pouco controle do modo preciso como eles são recolhidos, agregados ou apresentados.
Contudo estes dados são utilizados pois geralmente são os que estão disponíveis.

A origem dos dados para análise demográfica são os registos vitais, os censos, os controles
de migração, as campanhas de saúde pública, os programas de controlo da população,
os inquéritos especiais, entre outros.

Os dados em Demografia são principalmente gerados pelas atividades dos governos


centrais e suas agências ou por organizações internacionais. A quantidade e a qualidade
dos dados que se obtêm dependem, em parte, da existência de boas organizações e
ainda dos seus objetivos, embora também dependam das atitudes sociais em relação à
recolha desses mesmos dados.

3.1 OS DADOS EM DEMOGRAFIA


As estatísticas usadas para manusear os dados são em geral taxas, razões e proporções.
Elas constituem os maiores instrumentos básicos da Demografia formal. Elas permitem
fundamentalmente comparações eliminando diferenças devido a tamanhos diferentes de
população.

© Universidade Aberta 46
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

As taxas são o instrumento de medida mais usado em análise demográfica. Por definição,
uma taxa mede a frequência de um fenómeno numa população durante um período de
tempo determinado. Qualquer que seja a duração do período, uma taxa tem sempre uma
dimensão anual.

Uma taxa é simplesmente qualquer número dividido por qualquer outro número.

Exemplo: a taxa de mulheres é a relação da população total de mulheres (numa dada


população) a dividir pelo total da população. Geralmente a fórmula é

Outro exemplo: a taxa de mulheres em relação aos homens será o número de mulheres
a dividir pelo número de homens numa dada população. Geralmente a fórmula é

Na perspetiva do estabelecimento do balanço demográfico anual, o instrumento de


medida utilizado é a taxa bruta. A taxa bruta de mortalidade, por exemplo, mede a
frequência anual da mortalidade, a qual exprime também o risco médio anual de morte
para cada mil habitantes. Qualquer taxa bruta resulta do quociente entre o número de
acontecimentos (nascimentos, óbitos, migrações, casamentos) produzidos durante um
determinado período e a população média desse mesmo período. Como todas as taxas,
a taxa bruta tem uma dimensão anual, o que significa que os acontecimentos, mesmo
quando relativos a períodos inferiores ou superiores a um ano – devem sempre ser
reduzidos a essa unidade temporal.

Uma razão é usada livremente em Demografia, como em outras situações similares, e


pode causar alguma confusão. Em sentido estrito o numerador da razão é o número de
acontecimentos, tais como nascimentos ou óbitos, que ocorrem num determinado período
de tempo. Aqui o denominador é o número de “pessoas ano expostas ao fenómeno
considerado” durante o período em causa. O aspeto mais importante a considerar é que
o período de tempo tem que ser aqui especificado. As razões em Demografia são usadas
a maior parte das vezes por períodos de um ano. Isto significa que o número de pessoas/
ano expostas ao fenómeno pode geralmente ser aproximado à população existente no
meio do ano. Por exemplo, considerando a razão anual de mortalidade, cada pessoa que
sobrevive num ano completo, contribuirá um ano para o número total de anos expostos
ao fenómeno, enquanto aquelas pessoas que morrem durante o ano, só contribuirão
para uma fração desse mesmo ano. Esta fração será, em média, metade do ano se as
pessoas morrerem ao longo do tempo. O número total de anos expostos ao fenómeno
será o somatório destas frações que são o contributo daqueles que sobrevivem, ou seja,

© Universidade Aberta 47
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

a média da população total durante um ano que contribui para o total da exposição ao
fenómeno durante um ano.

Assim a média da população será normalmente aproximada à população total no meio


do ano. Isto explica porque é que as estatísticas que os serviços produzem anualmente
são calculadas em relação ao meio do ano em vez do início do ano.

Devemos ainda chamar à atenção que muitas medidas que são comumente designadas
de frações em Demografia são estritamente taxas, proporções ou outros índices. Ex:
“fração de literação” será a proporção da população que é literata enquanto a “taxa bruta
de nascimento” é realmente uma taxa porque inclui no seu denominador os idosos, as
crianças e homens, nenhum deles em risco de dar à luz uma criança.

Uma proporção será um tipo especial de taxa na qual o numerador está incluído no
denominador isto é: . Por exemplo a proporção da população do
sexo feminino será o número de mulheres dividido pelo total de homens e mulheres em
conjunto. A proporção pode variar entre 0,0 e 1,0. Esta medida é, em geral, expressa em
percentagem que se obtém multiplicando o valor obtido por cem.

3.2 OS RECENSEAMENTOS
Um recenseamento é um conjunto de operações baseadas em registos individuais, que
permitem conhecer todo (universalidade) o efetivo populacional de um território numa
data precisa (simultaneidade), com detalhes sobre a repartição dessa população por
unidades administrativas e segundo um número mais ou menos vasto de características
(sexo, idade, residência, profissão).

Devem respeitar uma determinada periodicidade (de 10 em 10 anos no caso de Portugal).

Os censos existem fundamentalmente para ajudar o planeamento, especialmente o


aprovisionamento e regulamentação dos serviços básicos (água, vias de comunicação
e outros serviços, por exemplo). Na maior parte dos países democráticos a distribuição
da população, dada pelo censo, também determina o nível de representação eleitoral e
a possibilidade do padrão de recursos do governo central. Muitas das intervenções do
governo, no campo da saúde e da segurança social, produzem dados demográficos, que
em geral resultam de dados do programa de avaliação dessas intervenções.

Determinados inquéritos muitas vezes orientados com um objetivo bem definido, também
são fonte de dados demográficos que são, mais ou menos, independentes do sistema
convencional.

As principais características de um censo, e que o diferencia de um inquérito, é que em


primeiro lugar ele é um registo global do total da população dentro de uma determinada
© Universidade Aberta 48
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

área geográfica definida. Em segundo lugar, como não envolve amostragem, cada pessoa
é enumerada separadamente. Em terceiro lugar, ele não é um exercício voluntário e
tem que ter uma base legal para o tornar compulsório e ser incluída e providenciada a
informação pretendida. Finalmente, é obrigatório ser relacionado com um dado momento
no tempo e não num período.

Um censo é uma recolha de dados sobre a população levada a cabo de uma só vez num
dado país e envolve: formulação de um questionário, planeamento e organização de uma
equipa, processamento e análise dos dados e divulgação dos resultados.

Censos: Sobre Censos, o que são, para que servem, Censos em Portugal, Censos no
mundo, ver Censos 2021 em https://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpgid=censos21_sobre_
censos&xpid=CENSOS21&xlang=pt.

Ver Recenseamento (Censos) de 2011 em https://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpid=


CENSOS&xpgid=ine_censos_publicacao_det&contexto=pu&PUBLICACOESpub_boui=
73212469&PUBLICACOESmodo=2&selTab=tab1&pcensos=61969554, dados gerais do
Censos – Resultados definitivos. Portugal – 2011 e outros resiltados dos Censos 2011:
https://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpid=CENSOS&xpgid=censos2011_apresentacao.

Ver Censos 2021 em https://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpgid=censos21_


main&xpid=CENSOS21&xlang=pt e em https://censos.ine.pt/xportal/
xmain?xpgid=censos21 &xpid=CENSOS21&xlang=pt.

O quadro 1 (anexo 1) apresenta uma síntese das variáveis a observar nos Censos 2021
e as excluídas face aos Censos 2011.1 (ver o anexo 1 – Quadro 1. Síntese das variáveis
a observar nos Censos 2021 e excluídas face aos Censos 2011).

3.3 AS ESTATÍSTICAS DEMOGRÁFICAS DE ESTADO CIVIL


São o conjunto de informações sobre os nascimentos, óbitos, casamentos, divórcios
e separações judiciais, saídas ou entradas, ocorridas num território durante um
determinado período (normalmente um ano), baseadas nos boletins de registo civil
desses acontecimentos, com detalhes sobre a sua repartição por unidade administrativa
e segundo um número mais ou menos vasto de características (sexo, idade, etc.).

O sistema de registos vitais e os controles de migração existem acima de tudo por


questões legais: a produção de certificados de nascimento e de óbito, passaportes,
cartões de identidade, certificados de autorização de trabalho, autorização de residência
e de cidadania, etc.

1
https://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=censos_historia_portugal

© Universidade Aberta 49
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

Na maioria dos países desenvolvidos o sistema de registo dos acontecimentos vitais fornece
a maior parte da informação dos nascimentos, casamentos, óbitos e por vezes os dados
de migração. Nos países em desenvolvimento, estes sistemas de recolha de informação
são na maior parte das vezes incompletos e por vezes nem existem, nem são explorados
com fins demográficos. Isto explica que os objetivos do registo desta informação são
essencialmente administrativos e legais e não demográficos2.

3.4 OUTRAS FONTES DEMOGRÁFICAS


Os Inquéritos demográficos são inquéritos por amostragem baseando-se na recolha de
informações, com base numa amostra representativa do universo da população em análise,
visando aprofundar o estudo sobre uma questão demográfica particular (Ex: Inquérito
português à fecundidade, que inclui variáveis como “o uso de métodos contracetivos, o
número de filhos desejado, local de residência na infância”, etc.).

Os inquéritos por amostragens usados em Demografia podem ter uma variedade de


aspetos, mas o aspeto essencial é que ele envolve uma amostra da população. A vantagem
da amostra é que ela reduz o esforço referido e por consequência o custo, quando
comparado com um censo tipo completo. No entanto, podem surgir erros de medição.
Se a amostra tiver uma base adequada, este erro pode ser medido e assim minimizado.

Os inquéritos por amostragens são, contudo, fontes importantes de dados demográficos


frente aos problemas acima mencionados do censo e do registo da informação – por ex: a
impossibilidade de fazer muitas perguntas ou perguntas complexas e, especialmente nos
países em desenvolvimento a pobre qualidade dos dados que produzem. As vantagens
dos inquéritos por amostras, para além de serem mais económicos, é que podem ser
organizados e executados de forma relativamente rápida e podem recolher muito mais
detalhes que um censo, incluindo informação de comportamentos para os quais os
entrevistadores podem ser treinados.

A sua principal desvantagem é a introdução de erros de amostragem. Isto significa que


são necessários grandes números para produzir resultados fiáveis. Do ponto de vista dos
inquéritos demográficos, a unidade de observação é o domicílio, não o indivíduo, e esta
ajuda a reduzir custos e especialmente complexidade administrativa.

Existem vários tipos de inquéritos por amostragem em Demografia:

2
Ver estatísticas demográficas em https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_
publicacoes&PUBLICACOEStipo=ea&PUBLICACOEScoleccao=107661&selTab=tab0&xlang=pt e as
Estatisticas demográficas de 2019 em https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_
publicacoes&PUBLICACOESpub_boui=71882686&PUBLICACOESmodo=2

© Universidade Aberta 50
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

Primeiro, existem informações dos censos tipo, o que talvez substitua um censo
completo ou simplesmente o existente, fazendo uma ampla distribuição de questões
numa amostra da população envolvida. Os inquéritos designados para investigar alguns
tópicos particulares, como o uso de contracetivos, emprego das mulheres, ou causas e
consequências da migração também caem nesta categoria de exemplos.

Segundo, existem inquéritos retrospetivos, assim designados pois fazem perguntas acerca
de acontecimentos que ocorreram no passado, nos países em desenvolvimento inicialmente
utilizados para reunir informação que os sistemas normalmente fornecem.

O nível das perguntas retrospetivas, grosseiramente usadas pelos demógrafos, são por
ordem de importância: número total de crianças que nasceram vivas, número de crianças
que vivem em casa, número de crianças que saíram e morreram (usado para conferir o
número e para fazer uma estimativa da mortalidade infantil), tempo decorrido desde o
último nascimento (usado principalmente para determinar os nascimentos no último ano),
se a mãe é viva, se o pai é vivo, se o primeiro marido é vivo.

Existem ainda uma larga gama de técnicas indiretas sofisticadas, que podem servir para
a recolha de dados sobre questões específicas que deverão ser formuladas e utilizadas
de acordo com o objetivo e o grau de precisão que se pretende obter.

Outras fontes a salientar são as estatísticas de saúde e os anuários estatísticos.

Em conclusão, poderemos dizer que existem três grandes fontes para a recolha de dados
em Demografia (informação dos censos tipo, inquéritos por amostragem, técnicas indiretas
de perguntas por questões específicas) que não são alternativas umas das outras, embora
uma possa, eventualmente, ser usada na ausência ou deficiência da outra.

Um censo é mais ou menos essencial para fornecer uma base de dados sem a qual o sistema
de registo ou um inquérito por amostra é menos útil. Nos países em desenvolvimento,
os inquéritos por amostragem podem investigar determinados aspetos deficientes nos
censos e dar mais fiabilidade à informação disponibilizada pela má qualidade fornecida
por esses censos.

Os censos, ou inquéritos dos censos tipo, geralmente produzem informação da população


existente num determinado momento no tempo; enquanto os sistemas de registos vitais
produzem informação em fluxos, números ou acontecimentos que ocorrem ao longo do
tempo. Estes últimos podem também ser obtidos indiretamente através de perguntas
retrospetivas em inquéritos e censos ou por inquéritos prospetivos. Ambos os tipos de

© Universidade Aberta 51
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

dados são largamente usados, frequentemente em combinação e em análise demográfica3.

Outros sítios de informação demográfica

Eurostat

O Eurostat produz estatísticas europeias em parceria com os institutos nacionais de


estatística e outras autoridades nacionais dos Estados-Membros da UE. Esta parceria
é conhecida como Sistema Estatístico Europeu (ESS). Também inclui as autoridades
estatísticas dos países do Espaço Económico Europeu (EEE) e da Suíça.

O Eurostat, autoridade estatística da União Europeia, foi criado em 1953 e é atualmente


uma Direcção-Geral (DG) da Comissão Europeia que tem como papel fundamental fornecer
estatísticas à Comissão e às outras instituições europeias para que possam ser definidas,
implementadas e analisadas as políticas comunitárias4.

PORDATA

A PORDATA é uma abrangente e diversificada base de dados com estatísticas oficiais


certificadas sobre Portugal. Disponibiliza a todos os cidadãos, informação rigorosa e
isenta que permite aprofundar o conhecimento e enriquecer o debate público sobre os
grandes temas nacionais. A PORDATA assume-se como uma base de dados portuguesa
abrangente em termos de diversidade de temas e de amplitude temporal, já que inclui
estatísticas, sempre que disponíveis, referentes ao período entre 1960 e a atualidade,
reunindo informação relevante e harmonizada relativa a doze temas distintos: População,
Saúde, Educação, Proteção Social, Emprego e Mercado de Trabalho, Empresas e Pessoal,
Rendimentos e Despesas Familiares, Habitação e Conforto, Justiça, Cultura, Contas
Nacionais e Contas do Estado5.

3.5 QUALIDADE DOS DADOS – TESTES ELEMENTARES À QUALIDADE


DOS DADOS
Nenhum sistema estatístico é inteiramente livre de distorções. No caso dos censos,
os erros mais comuns são os de sub enumeração, sobre enumeração e classificação

3

Ver exemplos de inquéritos em https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_
estudos&xlang=pt; https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_publicacoes&
PUBLICACOEStipo=ea&PUBLICACOEScoleccao=107773&selTab=tab0&xlang=pt;
https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_destaques&DESTAQUESdest_
boui=415655178&DESTAQUESmodo=2; http://www.ine.gov.mz/operacoes-estatisticas/
inqueritos/inquerito-demografico-e-de-saude (IDS de Moçambique).
4
https://ec.europa.eu/info/departments/eurostat-european-statistics_pt
5
(PORDATA: Site: www.pordata.pt).

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3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

errónea. O primeiro, que normalmente atrai mais atenção, surge quando uma parcela da
população não é contada, por omissões na organização do censo ou por vontade própria,
por exemplo no caso de imigrantes clandestinos ou outros indivíduos com motivos para
evitar a enumeração. Normalmente, erros deste tipo podem ser detetados através de um
levantamento amostral, executado logo depois do censo, que serve para avaliar a sua
qualidade e definir fatores de correção.

Depois, de termos analisado as principais fontes demográficas vejamos agora a questão


da qualidade dos dados.

3.5.1 A Relação de Masculinidade dos nascimentos

A relação de masculinidade dos nascimentos permite testar a qualidade das estatísticas de


estado civil. Inicialmente concebido para avaliar a qualidade de registo dos nascimentos,
este teste revelou-se um bom indicador da qualidade global dos dados estatísticos
demográficos.

Este indicador relaciona o número de nascimentos masculinos por cada 100 nascimentos
femininos, ou seja

É a relação dos nascidos vivos masculinos com os nascidos vivos femininos realizados
num determinado período. Permite ver se existem ou não erros ao nível dos registos dos
nascimentos (desequilíbrios ao nível dos registos dos sexos).

Como funciona este teste? Sabemos que nos países com boa qualidade de estatísticas
demográficas a relação de masculinidade dos nascimentos anda à volta de 105 (ou seja,
por cada 100 raparigas nascem 105 rapazes).

A existência de desvios acentuados, em relação a este valor, não pode ser senão a
consequência direta das flutuações aleatórias, mesmo no caso de estarmos em presença
de uma observação perfeita. Não podemos concluir logo que a qualidade dos dados é
má. Existem as flutuações que têm a ver com o número de ocorrência.

É necessário ver se se deve à dimensão da população ou à má qualidade dos dados.

Em função do número de nascimentos observados é, no entanto, possível precisar o


intervalo de variação deste erro, que é devido à existência de populações pouco numerosas.
Para tal existe uma fórmula, para se encontrar o intervalo de confiança dentro do qual os
nascimentos masculinos podem variar:

Para um total de 1000 nascimentos temos, em teoria, 512 nascimentos masculinos e 488
nascimentos femininos, ou seja, uma proporção de 0,512.

© Universidade Aberta 53
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

Os limites do intervalo de confiança a 95% são determinados pela fórmula:

onde é o número total de nascimentos.

Depois calcula-se e , para encontrar os limites do intervalo de


confiança. Se o valor encontrado no cálculo das relações de masculinidade dos nascimentos
estiver incluído no intervalo de confiança, podemos afirmar que a qualidade de registo de
nascimentos é boa. Se o valor encontrado no cálculo das relações de masculinidade dos
nascimentos não estiver incluído no intervalo de confiança pode dever-se a:
• má qualidade dos dados;

• sobre registo de nascimentos masculinos;

• sub registo de nascimentos femininos.

A preocupação de rigor, que caracteriza a Demografia e o uso frequente de estatísticas


de qualidade muito duvidosa, faz com que o demógrafo sinta a obrigação constante,
antes de iniciar qualquer análise demográfica, de testar a qualidade dos dados que vai
trabalhar e se possível, corrigi-los.

Os métodos para testar dados incompletos e incorretos são inúmeros, sendo os mais
importantes, divididos em duas categorias:

3.5.2 Índice de Irregularidade das idades

Se o método anterior se destina a analisar a qualidade dos dados das estatísticas de


estado civil, este tem por fim analisar a qualidade dos dados dos recenseamentos.

Este teste serve para provar se existe ou não concentração em determinadas idades.

Trabalha-se com sexos separados.

A sua elaboração é bastante simples:


• Colocam-se os efetivos das idades cuja atração se pretende medir em numerador
(por exemplo, se pretendemos medir a atração pelo 6, os numeradores serão
efetivos com 6, 16, 26, 36, 46, 56, 66, 76,…anos);

• No denominador, colocam-se as médias aritméticas dos efetivos dos 5 anos


que enquadram essas idades. (por exemplo, no caso dos 6 anos, soma-se a
população com 4, 5, 6, 7, 8 anos e divide-se por cinco, no caso dos 16 anos,
soma-se a população com 14, 15, 16, 17, 18 e divide-se por cinco, e assim
sucessivamente);

© Universidade Aberta 54
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

• Partindo do princípio que as idades centrais correspondem à média dos efetivos


de 5 anos que enquadram essas idades, divide-se o numerador pelo denominador
em cada caso e multiplica-se o resultado por 100;

• Obtêm-se assim diversos índices (no exemplo dado I6, I16, …) que são
representados graficamente; quando os índices obtidos têm um valor superior
a 100 existe atração; quando os índices obtidos têm um valor inferior a 100
existe repulsão.

A relação entre o efetivo real e o efetivo teórico fornece-nos um índice, que à medida
que se afasta da unidade (ou de 100 se multiplicarmos por este número) demonstra a
força do arredondamento.

Exemplo: selecionar todas as idades terminadas em 6 e aplicar a fórmula:


– Numerador – todos os indivíduos que declararam ter idades terminadas em 6 e
de um dos sexos.

– Denominador para a idade 36 = vou buscar 2 idades antes (34, 35) e 2 depois
(37, 38), vou adicionar todas e dividir por 5.

Resultados possíveis:

Atração máxima – se todos dizem que têm 36 (total de 500).

Repulsa máxima – se ninguém tem 36 (dá-nos um total de 0).

Se os valores andarem à volta de 100 podemos assumir que a qualidade é boa.

3.5.3 O Indice de Whipple

Existe o Índice de Whipple que também pode ser utilizado para testar a qualidade dos
recenseamentos. Os Demógrafos usam dados de anos de idade para determinar se há
irregularidades ou inconsistências nos dados (Nazareth., 2004).

Procura demonstrar se uma população tende a relatar certas idades (digamos, aquelas
que terminam em 0 ou 5) em detrimento de outras idades.

Têm sido identificados diversos tipos de atrações pelo número 0 e 5 em detrimento de


outros números ou, pelos pares, em detrimento dos impares, mas o índice de Whipple
mede a atração por 0 e 5.

O cálculo processa-se da seguinte forma:


– Somar o número de pessoas que têm entre 23 e 62 anos inclusive;

– Somam-se as pessoas que no intervalo considerado têm idades que terminam


em 0 e 5;

© Universidade Aberta 55
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

– O índice é obtido fazendo a relação entre a segunda soma e 1/5 da primeira


soma.

Este índice pode variar entre 100 (ausência total de concentração) e 500 (caso limite em
que todas as pessoas se declaram em idades terminadas em 0 e 5).

As Nações Unidades elaboraram uma tabela de base empírica que permite interpretar a
validade dos resultados obtidos:

Dados muito exatos < 105


Dados relativamente exatos 105-110
Dados aproximados 110-125
Dados grosseiros 125-175
Dados muito grosseiros > 175

3.5.4 O Índice Combinado das Nações Unidas (ICNU)

Este indicador, em vez de medir a atração por determinadas idades, mede a qualidade
global de um recenseamento. Trata-se de um instrumento muito cómodo de calcular e
que possibilita a realização de comparações interessantes no tempo e no espaço.

Em termos práticos, o ICNU calcula-se da seguinte forma:


• Preparam-se os dados de modo a termos uma distribuição da população por
sexos e grupos de idades quinquenais (não convém ultrapassar os 80 anos de
idade);

• Calculam-se as relações de masculinidade em cada grupo de idades dividindo os


efetivos masculinos pelos efetivos femininos e multiplicando o resultado por 100;
fazem-se as diferenças sucessivas entre as diversas relações de masculinidade
obtidas, somam-se em módulo e calcula-se a diferença média para se obter o
índice de regularidade dos sexos;

• Para cada sexo calcula-se um índice de regularidade das idades; este índice
constrói-se calculando, em primeiro lugar, as relações de regularidade dividindo
cada grupo de idades pela média aritmética dos dois grupos que o enquadram;
posteriormente fazem-se as diferenças a 100 e faz-se a média das diferenças
absolutas;

• O ICNU obtém-se dando um coeficiente 3 ao obter o índice de regularidade dos


sexos e um coeficiente 1 aos dois índices de regularidade das idades.

De forma a facilitar a interpretação as Nações Unidas, sugerem uma grelha classificativa:

© Universidade Aberta 56
3. AS FONTES DE INFORMAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS TESTES À QUALIDADE DOS DADOS

< 20 Bom
20-40 Mau
> 40 Muito Mau

Atividade formativa
1. Veja os dados das estatísticas demográficas para 2000 (Nascimentos) e para
2001 (Nascimentos e óbitos) e do recenseamento de 20016 e quadros 2, 3 e 4
em anexo.

a) Aprecie a qualidade dos dados das estatísticas demográficas.

b) Calcule o Índice Combinado das Nações Unidas no ano de 2001.

Como considera estes dados?

6
(ver em www.ine.pt)

© Universidade Aberta 57
4. A NATALIDADE, FECUNDIDADE, NUPCIALIDADE E
DIVÓRCIO

Objetivos

1. Conhecer a lógica do cálculo das taxas Brutas de Natalidade, enquanto medidas


elementares de análise;

2. Aplicar o conceito de taxa às Taxas de Fecundidade Geral;

3. Conhecer alguns tipos particulares de fecundidade;

4. Conhecer medidas elementares de análise da nupcialidade e divórcio.

4.1. A NATALIDADE E A FECUNDIDADE

A procriação, ou fecundidade, das populações tem recebido mais atenção dos


demógrafos do que qualquer outro tópico, e há várias razões para isso.

Primeiro, a fecundidade determina em grande parte a estrutura etária de uma


população: uma alta fecundidade é responsável pela dependência de jovens em algumas
regiões; o declínio da fecundidade é responsável por um envelhecimento das populações
noutras regiões. A variável fecundidade também criou grandes flutuações em tamanho
de coorte, como os baby-booms, em muitos países.

Uma segunda razão para o interesse na fecundidade é a sua contribuição para o


crescimento populacional: continuando uma alta fecundidade, depois da mortalidade
começar a diminuir, produziu-se o episódio de crescimento populacional mais explosivo
dos tempos modernos. Uma razão é que o potencial biológico para a procriação, ou seja,
a fertilidade, está cada vez mais sob controlo voluntário, desde o século passado. Como
resultado, as pessoas podem planear as suas gravidezes e os formuladores de políticas
podem razoavelmente tentar influenciar essas escolhas.

Embora a fecundidade continue a ser a força motriz do crescimento da população


mundial, a fecundidade mundial provavelmente nunca foi tão baixa como é hoje, e é
improvável que aumente muito no futuro próximo. Mais de um terço de todas as nações
e praticamente todas dos países mais desenvolvidos, têm níveis de fecundidade abaixo
daqueles que substituiriam as suas populações existentes. Além disso, o declínio da
fecundidade espalhou-se para muito menos países desenvolvidos (Nações Unidas,
2013). As causas, as consequências e o futuro curso provável desta transição da
fecundidade mundial estão entre as questões demográficas mais atraentes do nosso
tempo (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015, p. 219).

58
© Universidade Aberta
Tal como acontece com a mortalidade, a característica principal da natalidade no século
XX e XXI é o seu declínio, declínio esse que é em geral posterior ao da mortalidade. Em
muitos países não desenvolvidos esse declínio ainda não ocorreu ou está ainda no início
do processo.

Nos países não desenvolvidos, esse declínio, quando já ocorreu, é relativamente recente.
A África, no conjunto do continente, tem os níveis mais elevados o que nos indica que
na maior parte dos países africanos o declínio da natalidade ainda não ocorreu. Ao
observarmos as diferenças entre as regiões, facilmente nos damos conta de que existe
uma grande diversidade de situações; nos restantes continentes, além de valores globais
bastante mais baixos, as diferenças deixam de ser tão acentuadas.

Como consequência, desenvolveram-se estudos para procurar as causas do declínio da


natalidade. Mas a procura dessas causas não é tão simples como no caso da mortalidade.
Se nesta última podemos encontrar uma variável global - as condições gerais de saúde
- com diferentes variáveis específicas, o mesmo não acontece com a natalidade, onde
existem vários fatores bastante diferenciados responsáveis pela sua evolução: fatores
biológicos, relações sexuais, leis e costumes, divórcio, viuvez e abstinência, contraceção
e aborto, fatores económicos, fatores sociais, fatores culturais, urbanismo e
escolaridade.

A fecundidade não é alheia ao meio. Existem determinantes diretos e indiretos que


influem na fecundidade. A educação/escolaridade é um determinante indireto da
fecundidade enquanto que os métodos contracetivos são determinantes diretos.

Os demógrafos estão interessados em saber onde e como, e que fatores sociais,


económicos, culturais e ambientais influenciam tanto a probabilidade de uma mulher ter
um bebé, ou ficar grávida, ou qual o número de bebés que ela terá na sua vida. Foi
demonstrado, por exemplo, que a classe social, o status económico, as crenças
religiosas, a disposição psicológica, os artifícios sobre crianças e outros fatores
influenciam a decisão de ter um bebé, bem como o número de bebés (de zero a alguns)
uma mulher terá. Os demógrafos mostraram, por exemplo, que quanto mais anos de
educação uma mulher tem, menos filhos ela terá. Por que seria? Por que mais anos de
educação completa resultariam, ao contrário, numa mulher que tinha poucos filhos? Um
dos motivos é que as mulheres que ficam mais tempo na escola tendem a se casar mais
tarde e adiar os filhos, em comparação com as mulheres que frequentaram a escola por
um menor período de tempo. Assim, a variável educacional tem uma influência na
fecundidade através das chamadas variáveis proximais ou intermediárias que se
encontram entre a fecundidade e as variáveis sociais, económicas, culturais e
ambientais. Em 1956, dois demógrafos muito famosos, Kingsley Davis e Judith Blake,
escreveram um artigo influente sobre as variáveis comportamentais e biológicas que são

59
© Universidade Aberta
"intermediárias" e que influenciam diretamente a fecundidade. Essas variáveis
particulares foram diferenciadas de todos os outros tipos de variáveis porque, mais por
necessidade, influenciam a fecundidade operando por meio das poucas variáveis
imediatas especificadas por Davis e Blake (1956). Kingsley Davis e Judith Blake listaram
os determinantes próximos da fecundidade na ordem da sequência de tempo envolvida
na produção de bebés em três estágios: (1) relação sexual, (2) conceção e (3) gestação
e parto. Foi determinado que os seguintes fatores explicam a grande maioria da variação
na fecundidade entre grupos: proporção das uniões; uso de anticoncecionais;
infertilidade pós-parto e aborto (Bongaarts, 1982). Davis e Blake (1956) chamaram esses
determinantes próximos de "variáveis intermediárias". Isso ocorre porque a explicação
da fecundidade até a introdução de sua lista tinha em grande parte explicado pelo fundo.
Eles enfatizaram que a única maneira de uma diferença (por exemplo, na riqueza,
religião, etc.) produzir uma diferença de fecundidade foi causando variação num ou mais
dos determinantes próximos na sua lista. Se especificarmos os determinantes próximos
da fecundidade de coorte muito alta ou muito baixa para um grupo de pessoas, estamos
numa posição melhor para direcionar uma política para influenciar essa fecundidade. Se
os pobres têm mais filhos porque têm menos acesso a equipamentos contracetivos
modernos, podemos fornecer esses anticoncecionais com mais facilidade do que
podemos melhorar o padrão de vida, embora este seja certamente um objetivo digno
por si só. Na verdade, a maioria das políticas modernas de redução da fecundidade nas
regiões menos desenvolvidas tem sido baseada em programas de planeamento familiar
com base nesta explicação causal (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015, pp 245- 245;
Poston & Bouvier, 2017, pp 74-77).

4.1.1. A Taxa Bruta de Natalidade

A Taxa Bruta de Natalidade mede a frequência anual da natalidade por cada mil
habitantes. Este instrumento de medida refere-se à relação entre os nascimentos
ocorridos num determinado espaço geográfico e a respetiva população média1, durante
um determinando período, normalmente um ano civil (habitualmente expressa em
número de nados-vivos por 1000 (10^3) habitantes).

As taxas brutas de natalidade possibilitam a observação das tendências da natalidade ao


longo de períodos mais ou menos longos, apresentando-se como bons instrumentos de
comparação.

1
População calculada pela média aritmética dos efectivos em dois momentos de observação, habitualmente
em dois finais de anos consecutivos (INE-Metainformação).

60
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Taxa bruta de natalidade
Que países têm mais e menos bebés por 1.000 residentes?
Grupos/Países Taxa bruta de natalidade

Anos 1960 2019


Pro 9,3
UE27 (2020) - União Europeia 27 (desde 2020) -
DE - Alemanha 17,4 Pro 9,4
AT - Áustria 17,9 9,6
BE - Bélgica 16,8 10,1
BG - Bulgária 17,8 8,8
CY - Chipre - Pro 10,9
HR - Croácia 18,4 8,9
DK - Dinamarca 16,6 10,5
SK - Eslováquia 21,7 10,5
SI - Eslovénia 17,6 9,3
ES - Espanha 21,7 Pro 7,6
EE - Estónia 16,7 10,6
FI - Finlândia 18,5 8,3
FR - França 17,9 Pro 11,2
GR - Grécia 18,9 Pro 7,8
HU - Hungria 14,7 9,5
IE - Irlanda 21,5 s 12,1
IT - Itália 18,1 Pro 7,0
LV - Letónia 16,7 9,8
LT - Lituânia 22,5 9,8
LU - Luxemburgo 16,0 10,0
MT - Malta 26,2 8,6
NL - Países Baixos 20,8 Pro 9,7
PL - Polónia 22,6 9,9
PT - Portugal 24,1 8,4
CZ - República Checa 13,4 10,5
RO - Roménia 19,1 Pro 9,6
SE - Suécia 13,7 11,1
UK - Reino Unido 17,5 Pro 10,7
IS - Islândia 28,0 12,3
NO - Noruega 17,3 10,2
CH - Suíça 17,7 10,0
Taxa bruta de natalidade
Fontes de Dados: Eurostat | NU | Institutos Nacionais de Estatística - Recolha de
Dados Rapid, Joint, Nowcast
Fonte: PORDATA
Última actualização: 2020-11-09

A taxa bruta de natalidade obtém-se através do quociente entre o número dos


nascimentos (nados-vivos) ocorridos, durante um período em análise, e a população
média desse período.

61
© Universidade Aberta
TBN = Nascimentos /População Média *1000

Exemplo:
Total de Nados-vivos (1990): 116 383 População média total (1990): 9 862 540

TBN1990 = _116383_ *1000=11,8‰


9 862 540

Apesar de ser um indicador muito utilizado, sobretudo como medida comparativa, deverá
ter-se em conta que a taxa bruta de natalidade, tal como todas as taxas brutas, é
enviesada pelos efeitos de estrutura das populações (quanto às diferenciações existentes
por idade e sexo).

4.1.2. A Taxa de Fecundidade Geral

A Taxa de Fecundidade Geral mede a frequência da fecundidade no conjunto da


população feminina em idade de procriar. Este instrumento de medida refere-se à
relação entre o número de nados-vivos observado durante um determinado período de
tempo, normalmente um ano civil, e o efetivo médio de mulheres em idade fértil (dos
15 aos 49 anos) desse período (habitualmente expressa em número de nados-vivos por
1000 (10^3) mulheres em idade fértil).

Taxa de fecundidade geral


Quantos filhos existem em cada 1.000 mulheres em idade fértil?
Anos Taxa de fecundidade geral
1961 95,7
1962 96,6
1963 93,0
1964 95,3
1965 93,0
1966 92,7
1967 91,7
1968 89,6
1969 88,3
1970 84,6
1971 84,6
1972 81,0
1973 79,1
1974 77,8
1975 80,0
1976 82,2

62
© Universidade Aberta
1977 79,0
1978 72,3
1979 68,5
1980 ┴ 66,9
1981 63,7
1982 62,7
1983 59,5
1984 58,5
1985 53,1
1986 51,4
1987 49,8
1988 49,2
1989 47,6
1990 46,5
1991 46,3
1992 45,5
1993 44,9
1994 42,8
1995 41,8
1996 42,8
1997 43,6
1998 43,7
1999 44,6
2000 45,9
2001 43,0
2002 43,6
2003 42,9
2004 41,8
2005 42,1
2006 40,7
2007 39,7
2008 40,8
2009 39,0
2010 40,0
2011 38,6
2012 36,3
2013 33,9
2014 34,3
2015 36,0
2016 37,1
2017 37,2
2018 37,9
2019 37,9

Taxa de fecundidade geral


Fontes de Dados: INE - Estatísticas de Nados-Vivos
INE - Estimativas Anuais da População Residente
Fonte: PORDATA
Última actualização: 2020-06-15

63
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A taxa de fecundidade geral obtém-se através do quociente entre o número dos
nascimentos (nados-vivos) ocorridos numa população, durante um período em análise,
e a população média total feminina em idade fértil (dos 15 aos 49 anos) desse período.

TFG = Nascimentos/ População média feminina dos 15 aos 49 anos*1000

Exemplo:

Total de nados-vivos (1990): 116 383

População média total feminina dos 15-49 anos (1990): 2 479 494

TFG1990 = ___116 383___ * 1000= 46,9‰

2 479 494

A taxa de fecundidade geral, referida ao total da parcela de mulheres dos 15 aos 49


anos, anula em parte os efeitos perturbadores da estrutura. Todavia, tal como a taxa
bruta de natalidade, pode ser considerada uma medida de tipo global. Numa análise
mais fina do comportamento da fecundidade, são as taxas de fecundidade por idades
das mulheres que assumem maior pertinência.

As taxas de fecundidade geral por idades ou taxas especificas de fecundidade medem a


frequência da fecundidade que ocorre em grupos da população feminina determinados
em função da idade. As taxas obtêm-se através dos quocientes entre o número dos
nados-vivos por idades das mães ocorridos numa população, durante um período em
análise, e a população média feminina por idades, desse período.

Exemplo:

Para a classe etária dos 15 aos 19 anos

TFG (15-19) = Nados-Vivos por idades das mães (15-19)/População Média


Feminina (15-19)*1000

É a partir das taxas de fecundidade por idades que se podem calcular os indicadores
relativos à intensidade e ao calendário da fecundidade.

64
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4.1.3. O Índice Sintético de Fecundidade

O Índice Sintético de Fecundidade (ISF) consiste numa estimativa do número médio de


filhos que uma mulher tem ao longo da vida. Nesse sentido, esse indicador relativo à
intensidade da fecundidade expressa a condição reprodutiva média das mulheres de um
determinado local, sendo um dado importantíssimo para a análise da dinâmica
demográfica.

O ISF define-se como o número médio de crianças vivas nascidas por mulher em idade
fértil, admitindo que as mulheres estariam submetidas às taxas de fecundidade
observadas no momento. É o valor resultante da soma das taxas de fecundidade por
idades, ano a ano ou grupos quinquenais, entre os 15 e os 49 anos, observadas num
determinado período (habitualmente um ano civil). No caso de grupos quinquenais,
multiplica-se o valor da soma por 5 (amplitude de cada grupo etário).

ISF = (∑ taxas de fecundidade por idades/1000) *5

Exemplo:

∑ Taxas de Fecundidade Geral por idades * 5 anos = Índice Sintético de Fecundidade,


ou seja, ∑ T.F.G. * 5 = I.S.F.

1.º. Calcula-se as TFG em cada um dos grupos etários (nascimentos em cada um dos
grupos etários / população média feminina em cada um dos grupos etários), ou seja,
TFG (GE) = Nados-Vivos por idades das mães (GE)/População Média Feminina (GE)

2.º. Somam-se todas as TFG calculadas para os grupos etários

3.º. Multiplica-se o somatório das T.F.G. por grupos etários por 5 que corresponde à
amplitude de cada grupo etário.(*)

(*) Nota: No caso de já se ter multiplicado por 1000 as TFG por GE, é necessário dividir o seu somatório
por 1000 para calcular o valor do ISF = (somatório tx de fecundidade por grupos etários *5) /1000

Para que a reposição populacional seja assegurada, convencionou-se que o ISF não pode
ser inferior a 2,1 filhos por mulher, pois as duas crianças substituem os pais e a fração
0,1 é necessária para compensar os indivíduos que morrem antes de atingir a idade
reprodutiva.

65
© Universidade Aberta
Conforme dados do Relatório sobre a Situação da População Mundial 2010, do Fundo de
População das Nações Unidas (Fnuap), o ISF é de 2,52 filhos por mulher. Esse resultado
confirma uma tendência mundial de redução no número de filhos, contudo, a ritmos
diferenciados segundo as grandes áreas geográficas. Com efeito, a Organização das
Nações Unidas (ONU), baseada em dados de 2009, divulgou os seguintes resultados:
Europa (1,52), Canadá e Estados Unidos da América (2,02), América Latina (2,17), Ásia
(2,3), Oceânia (2,42), África (4,45). No Brasil, o ISF é de 1,94 filho por mulher.

A queda do ISF é consequência de vários fatores, tais como projetos de educação sexual,
planeamento familiar, utilização de métodos contracetivos, maior participação da mulher
no mercado de trabalho, expansão da urbanização, entre outros. Fatores que evoluem
de forma diferenciada segundo as realidades culturais e socioeconómicas dos vários
países.

4.1.4. A Taxa Bruta de Reprodução

A intensidade da fecundidade remete para a capacidade de autorreprodução de uma


população. Neste sentido e tratando-se de fecundidade feminina, a taxa bruta de
reprodução permite medir essa capacidade incidindo sobre a proporção de nados-vivos
do sexo feminino.

A taxa bruta de reprodução resulta da multiplicação entre o ISF e um coeficiente


determinado para a proporção de nascimentos do sexo feminino ou taxa de feminilidade
ao nascimento. Este valor é universalmente estabelecido em 488 por mil nascimentos.

Taxa Bruta de Reprodução: R= ISF*0,488

O R é o número médio de filhas procriadas por cada mulher, na ausência de mortalidade.


Com um valor igual ou superior a 1 remete para uma substituição das gerações
assegurada. Todavia, este indicador deve ser lido com alguma prudência, pois não
integra a interferência da mortalidade2.

2
Deste modo, implica, sempre que possível, a confirmação complementar através do cálculo da denominada
Taxa Liquida de Reprodução.

66
© Universidade Aberta
Índice sintético de fecundidade e taxa bruta de reprodução
Quantos filhos existem, em média, por mulher em idade fértil?
Quantas filhas tem, em média, cada mulher em idade fértil?
Índice Taxa Bruta
Anos Sintético de de
Fecundidade Reprodução
1960 3,20 1,56
1970 3,00 1,46
1971 2,99 1,46
1972 2,85 1,39
1973 2,76 1,35
1974 2,69 1,31
1975 2,75 1,34
1976 2,81 1,37
1977 2,68 1,31
1978 2,45 1,20
1979 2,31 1,13
1980 2,25 1,10
1981 2,13 1,04
1982 2,08 1,02
1983 1,96 0,96
1984 1,91 0,93
1985 1,73 0,84
1986 1,67 0,81
1987 1,63 0,80
1988 1,62 0,79
1989 1,58 0,77
1990 1,57 0,77
1991 1,56 0,76
1992 1,54 0,75
1993 1,52 0,74
1994 1,45 0,71
1995 1,41 0,69
1996 1,45 0,71
1997 1,47 0,72
1998 1,48 0,72
1999 1,51 0,74
2000 1,55 0,76
2001 1,45 0,71
2002 1,47 0,72
2003 1,44 0,70
2004 1,41 0,69
2005 1,42 0,69
2006 1,38 0,67
2007 1,35 0,66
2008 1,40 0,68
2009 1,35 0,66
2010 1,39 0,68
2011 1,35 0,66
2012 1,28 0,62
2013 1,21 0,59
2014 1,23 0,60

67
© Universidade Aberta
2015 1,30 0,63
2016 1,36 0,66
2017 1,37 0,67
2018 1,41 0,69
2019 1,42 0,69
Fonte: PORDATA/ Indicadores de Fecundidade: Índice sintético de fecundidade e taxa bruta de reprodução
Fontes de Dados: INE - Indicadores Demográficos
Última actualização: 2020-06-16

4.1.5 Idade média das mães ao nascimento dos filhos

A idade média das mães ao nascimento dos filhos é um indicador do calendário da


fecundidade. Obtém-se através do quociente entre a soma total dos anos vividos pelas
mães até ao nascimento dos filhos (convencionando-se que, em média, os nascimentos
ocorreram no meio do intervalo entre dois aniversários) a multiplicar pelas taxas de
fecundidade por idades e a soma total de todas as taxas de fecundidade por idades. No
caso de grupos quinquenais, multiplica-se o valor de cada taxa por 5 (amplitude de cada
grupo etário).

I = ∑pontos médios*(taxas de fecundidade por idades*5)/ ∑taxas de


fecundidade por idades*5

Exemplo:

Grupos de idade: 15-19 ponto médio = 17,5 17.5 * Taxa*5

…. ….

45-49 ponto médio = 47.5 47,5 * Taxa*5

IMF= Σ (Pontos médios * tx *5)/ Σ tx*5

A idade média das mães ao nascimento dos filhos remete na atualidade para a
problemática do adiamento do momento de procriar. Nos países mais desenvolvidos a
tendência atual é para que as mulheres adiem o momento de procriar para idades, em
média, acima dos 30 anos. Em Portugal, em 2020, a idade média das mulheres ao
nascimento de um filho situou-se nos 31,6 anos.

68
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Idade Média ao Nascimento de um filho, Portugal 2000-2020

Anos IMNF

2000 28,6
2001 28,8
2002 28,9
2003 29
2004 29,2
2005 29,3
2006 29,4
2007 29,5
2008 29,6
2009 29,7
2010 29,8
2011 30,1
2012 30,2
2013 30,4
2014 30,7
2015 30,9
2016 31,1
2017 31,2
2019 31,4
2018 31,4
2020 31,6

Fonte: INE – Indicadores demográficos

Ao tentar avaliar se a fecundidade é alta ou baixa, as pessoas não ficam satisfeitas


simplesmente a comparar populações. Em vez disso, procuram algum nível ou padrão
mais absoluto para comparar a fecundidade atual, que mostra as implicações desse nível
de fecundidade para o bem-estar da população. O padrão atual é a fecundidade ao nível
de reposição, que é o nível em que as mulheres, em média, têm filhas suficientes para
"substituir-se” a si próprias na população (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015; Poston &
Bouvier, 2017).

Para estar no nível de reposição, o ISF deve estar acima de 2,0, uma vez que, em pelo
menos, um filho nasce para cada filha, e algumas mães em potencial morrem antes de
terem os seus filhos, mesmo na coorte hipotética mais saudável. Como estimativa geral,
o ISF de reposição é considerado 2,1 nas regiões mais desenvolvidas e 2,3 nas regiões
menos desenvolvias, onde as taxas de mortalidade são mais altas. Países com o ISF
abaixo desses níveis são considerados abaixo da fecundidade de substituição. Os países
que se encontram com fecundidade abaixo do nível de reposição tendem a preocupar-
se com os problemas do lento crescimento populacional e declínio populacional. Existem

69
© Universidade Aberta
atualmente onze países ou territórios que começaram a experimentar níveis de
fecundidade mais baixos sem precedentes, caindo abaixo de 1,3 filhos por mulher.

No entanto, a fecundidade é apenas uma fonte de mudança no crescimento populacional


de um país. Seria um erro supor que a fecundidade abaixo da reposição sempre resultará
em tamanho da população em declínio. Entre os setenta e cinco países que agora têm
menos fecundidade de substituição (48% da população mundial), muitos continuarão a
experimentar um crescimento populacional devido quer à imigração, quer às estruturas
de idade mais jovem, com grandes coortes entrando na idade reprodutiva. Não são
apenas as regiões mais desenvolvidas que têm baixa fecundidade. Um terço dos países
menos desenvolvidos do mundo têm uma substituição abaixo dos níveis de fecundidade
(Nações Unidas, 2011). Incluem alguns dos mais populosos países em desenvolvimento,
como China, Brasil, Irão, Tailândia, Vietname e Coreia do Sul (Nações Unidas, 2013).

Figura 3. Número de filhos por mulher – Índice Sintético de Fecundidade

Regiões geográficas 2000-2005 2005-2010 2010-2015 2015-2020


Africa 5,08 4,90 4,73 4,44
Asia 2,45 2,33 2,21 2,15
Europa 1,43 1,56 1,60 1,61
América latina e caribe 2,49 2,26 2,14 2,04
América do Norte 1,99 2,01 1,85 1,75
Oceânia 2,46 2,54 2,44 2,36
Fonte: adaptado de https://www.statista.com/statistics/1034075/fertility-rate-world-continents-1950-2020/

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4.2. NUPCIALIDADE E DIVÓRCIO: MEDIDAS ELEMENTARES DE
ANÁLISE

A melhor maneira de apresentar a nupcialidade é através da história conjugal imaginária


de uma coorte de nascimento (Cherlin, 2010b, 1981). Todo mundo começa a sua vida
sem ter casado ou solteiro. Uma vez que esta é uma história de um casamento, vamos
ignorar alternativas ao casamento, como coabitar. No entanto, queremos mencionar que
a coabitação está se a tornar cada vez mais comum em muitas nações industrializadas,
especialmente para casais de 20 a 34 anos, que estão nos primeiros anos de
fecundidade. Nalguns países, como a Dinamarca e a Finlândia, parceiros coabitantes
podem entrar numa união civil legalizada, e os registros mostram que cerca de três em
cada dez casais em idade avançada vivem em tais uniões civis (OCDE, 2012). Membros
da coorte, viúvos ou divorciados podem reingressar no atualmente casado pelo processo
de novo casamento. Assim que estiverem de volta ao estatuto de casados, podem
reingressar num novo ciclo de não casamento pela morte de seu novo cônjuge ou por
divórcio. Alguns desses estatutos combinam-se em categorias maiores. Por exemplo, os
demógrafos usam o termo solteiro ou não casado para combinar “nunca casado,
divorciado e viúvo”. Já casado, inclui os atualmente casados, divorciados e viúvos.
Anteriormente casado significa aqueles atualmente divorciados ou viúvos. Da mesma
forma, os processos de primeiro casamento e novo casamento combinam-se para formar
o processo de casamento. Os processos de mortalidade do cônjuge e divórcio combinam-
se para fazer o processo de dissolução conjugal.

A nupcialidade não é uma variável micro demográfica autêntica na medida em que o seu
aumento ou a sua diminuição não afetam diretamente a dinâmica populacional. Esta
variável intervém na dinâmica populacional indiretamente através da fecundidade, se
bem que, neste princípio de milénio, é cada vez mais forte a tendência para a separação
entre os comportamentos da nupcialidade e da fecundidade.

4.21. Taxa bruta de nupcialidade

O processo mais simples que existe para medirmos o nível da nupcialidade consiste em
dividir o total de casamentos observados pela população média.

TBNup = Casamentos/População média*1000

Exemplo:

Casamentos: 72330 População total média: 9 675 573

T.B.Nup. = 72330/9675573 * 1000 = 7,48‰

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Outras taxas de nupcialidade:

• Taxa de Nupcialidade geral: casamentos/pop. média com + 15 anos * 1000

• Taxa de Primonupcialidade: casamentos de ordem 1 (primeiros casamentos) /


solteiros com + 15 anos * 1000

• Taxa de recasamentos: casamentos de ordem superior a 1/ viúvos e divorciados


* 1000

• Taxa de Nupcialidade por idades ou grupos de idades e sexos: exemplo:


casamentos H (25-29 anos) / população média H (25-29 anos) * 1000

• Taxa Bruta de Divórcio: Divórcios/ população média * 1000

• Taxa Bruta de Viuvez: Viúvos / população média * 1000

4.2.2 Casamento e família

Até ao século XVII, os casamentos eram usados principalmente para ganhar legitimidade
ancestral e estabelecer laços militares e comerciais. A poliginia foi proibida por volta do
século XVII, e o número de famílias extensas diminuiu. No final do século XVIII na
Europa Ocidental, a “união por amor” tornou-se normativa, com o marido cuidando da
família e a esposa concentrando-se na vida familiar (família tipo “Ozzie e Harriet”).

Primeiras uniões: coabitação e casamento

Houve pouca mudança, entre 1995 e 2010, nas percentagens de mulheres com idades
entre 15 e os 44 anos que não estão numa união (28%), mas houve mudanças drásticas
nas percentagens de casamentos e coabitações. Na coabitação, de um terço das
mulheres, em 1995, passou-se para metade das mulheres em 2006-2010, nos Estados
Unidos. Quanto ao casamento, passou de 39% em 1995 para 23% em 2006-2010. Da
metade das mulheres que coabitam, 40% fizeram a transição para casar, 32%
permaneceram coabitantes e 27% romperam o relacionamento. De acordo com Wendy
Manning (2013), apenas 11% das mulheres com idades entre os 19 e os 44 anos
relataram coabitar, em 1965-74, antes de seu primeiro casamento, percentagem que
subiu para 46% em 1985-89, para 59% em 1995-99 e para 66% em 2005- 2009. A
coabitação é o “novo normal” nos dias de hoje, as taxas são diferentes dependendo dos
níveis de educação. Continuando com o exemplo dos Estados Unidos, em 2009-10, 74%
das mulheres, com habilitações abaixo do ensino secundário, declararam coabitar ou já
ter coabitado, o mesmo também declararam 57% das mulheres com um a três anos de
faculdade, e 50% das mulheres com 4 ou mais anos de faculdade.

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Em relação ao número de bebés nascidos fora do casamento, em 2013, nos Estados
Unidos, quase 41% de todos os bebés nasceram de mães solteiras. Enquanto, no final
da década de 1950, apenas 5% dos nados-vivos eram filhos de mães solteiras, passando
para 14% e 30% em meados da década de 70 e da década de 1980, respetivamente.

Houve grandes mudanças neste panorama: a legalização do aborto, a contraceção


amplamente disponível e eficaz, o aumento da percentagem de mães solteiras, a
mudança de atitudes sociais em relação à paternidade solteira.

Quanto às idades das mães solteiras, em 2013, nas mulheres com menos de 15 anos,
praticamente todos os nascimentos foram de solteiras; nas mulheres dos 15 aos 19 anos,
a percentagem é de 89% de nascimentos referidos a solteiras; nas mulheres entre 20 e
24 anos, são mais de 65% dos nascimentos; nas mulheres dos 25 aos 29 anos são
quase 36% e no grupo dos 30 aos 34 anos são mais de 32%. Quanto mais velha for a
mulher, maior a probabilidade de ela se casar e menos probabilidade de não estar casada
ao dar à luz (Poston & Bouvier, 2017, p. 95-110).

4.2.3. Sexualidade

As três dimensões da sexualidade são a autoidentificação da sexualidade, a preferência


sexual/ desejo sexual e o comportamento sexual real. Todas as dimensões não
concordam necessariamente umas com as outras.

A dimensão comportamental pode ser a heterossexual (ter apenas parceiros do sexo


oposto e nenhum parceiro do mesmo sexo), homossexual (ter apenas parceiros do
mesmo sexo e nenhum parceiro do sexo oposto). A dimensão de autoidentificação, a
preferência/desejo, pode ser heterossexual (aqueles que se sentem atraídos apenas ou
principalmente pelo sexo oposto) ou homossexual (aqueles que se sentem atraídos
apenas ou principalmente pelo mesmo sexo).

Existem diversas parcerias familiares: duas pessoas vivendo juntas como um homem e
uma mulher casados, um homem e uma mulher que coabitam, um homem casado ou
coabitando com um homem, uma mulher casada ou coabitando com uma mulher (Poston
& Bouvier, 2017, p. 110-112).

4.2.4. Contraceção e controlo da natalidade

Hoje, a maioria das mulheres e homens casados e solteiros, sexualmente ativos nos
Estados Unidos e em outros países desenvolvidos estão a limitar o tamanho das suas
famílias e / ou a controlar o tempo e o espaçamento de seus nascimentos por meio
do controlo da natalidade. Poucas pessoas nos países em desenvolvimento usam

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métodos de prevenção dos nascimentos. Há uma variedade de métodos disponíveis para
mulheres e homens para prevenir partos, e os mais populares em todo o mundo são
a contraceção, a esterilização e o aborto. A eficácia desses métodos difere uns dos outros
e cada um tem as suas vantagens e desvantagens (Poston & Bouvier, 2017, p. 123).

A noção de prevenção do nascimento apareceu no início da história humana. Os cinco


melhores livros que fornecem relatos abrangentes de contraceção são: Medical History
of Contraception de Norman Himes, publicado pela primeira vez em 1936, com uma
edição em brochura em 1970; este é o clássico. É uma pesquisa exaustiva de
contraceção cobrindo muitas culturas em todo o mundo ao longo de três mil anos;
Contracepção: uma história de seu tratamento pelos teólogos católicos e canonistas de
John T. Noonan foi escrita em 1966. Traça a história da contraceção desde a era pré-
cristã até à década de 1960, com ênfase na interpretação e receção da contraceção na
Igreja Católica; Contracepção: Uma História de Robert Jutte, escrito em 2008. A versão
original foi publicada em alemão alguns anos antes. Ele estende e atualiza muito do
trabalho de Himes e Noonan; História da contracepção: da antiguidade aos dias
atuais, escrito por McLaren em 1992; um importante tratamento histórico; Ervas de Eva:
uma história de contraceção e aborto no Ocidente, escrito por West em 1999. Este livro
também é um relato histórico e também enfoca o uso de plantas e produtos à base de
ervas para regular a fecundidade. Além desses cinco livros, há também registos escritos
de remédios anticoncecionais e técnicas de aborto em papiros egípcios (1900–1100 aC),
nas obras latinas de Plínio, o Velho (23-79 dC) e Discórides (40-90 dC), nos escritos
gregos de Sorano (ca. 100), e em obras que tratam da medicina árabe no século X
(Poston & Bouvier, 2017, p. 123-124).

A maioria dos métodos de controlo de fecundidade documentados nesses tratamentos


foram relativamente ineficazes, com exceção do aborto induzido e da abstinência.
Praticamente todos os métodos anticoncecionais, exceto os métodos baseados em
hormonas, estavam disponíveis e eram usados no final do século XIX. Os preservativos
estavam disponíveis desde meados do século XVII. Os dispositivos intrauterinos (DIU)
foram desenvolvidos pela primeira vez na Alemanha na década de 1920. A pesquisa de
DIU não foi possível nos Estados Unidos até muito mais tarde, devido a restrições legais
e outros tipos de restrições. O método de aspiração manual para aborto foi descrito pela
primeira vez pelo ginecologista da Rainha Vitória da Inglaterra. Os princípios fisiológicos
por detrás dos anticoncetivos orais foram desenvolvidos na década de 1920, “mas o
método não progrediu, em parte devido à falta de uma fonte barata de esteroides e
também porque a pesquisa de anticoncetivos não era academicamente aceitável”
(Poston & Bouvier, 2017, p. 125).

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De acordo com dados de vários países recolhidos entre 2002 e 2012, 63% das mulheres
casadas em todo o mundo estavam a usar métodos de planeamento familiar: 72% das
mulheres nos países desenvolvidos e 62% nos países em desenvolvimento.

É digno de nota que, embora o uso de anticoncetivos nos países em desenvolvimento já


tenha quase atingido o nível atingido no mundo desenvolvido, o uso de métodos de
planeamento familiar é bastante desigual nos vários países. A percentagem de mulheres
casadas que usam métodos modernos varia dos 1% no Sudão do Sul e Somália e 2%
no Chade aos 84% no Reino Unido e China. Os dois países com as maiores percentagens
de mulheres casadas que usam qualquer método de planeamento familiar são a Noruega
com 88% e Portugal com 87%.

Os métodos anticoncecionais podem ser divididos em métodos modernos e tradicionais.


Os principais métodos modernos de planeamento familiar são o contracetivo oral (isto
é, pílula), o dispositivo intrauterino (DIU), injeção de contraceção, o preservativo, e a
esterilização masculina e feminina. Outros métodos modernos incluem
o diafragma, anticoncecionais vaginais, incluindo várias espumas e gel, vários tipos de
implantes anticoncecionais, o preservativo feminino e métodos de planeamento familiar
"naturais", também conhecidos como métodos de conscientização da fecundidade, como
o Standard Days Method e o método Billings e ovulação. Os métodos tradicionais de
planeamento familiar incluem métodos “naturais” menos eficazes, como o método do
ritmo do calendário (isto é, a abstinência periódica), coito interrompido (isto é, a
retirada), abstinência de longo prazo e amamentação prolongada.

Relativamente às diferenças no uso de anticoncetivos, embora as mulheres em


diferentes regiões do mundo variem nos principais métodos anticoncetivos utilizados, os
padrões de seu uso não mudaram muito entre 1990 e 2012. A esterilização feminina é
comum na Ásia, América Latina, Caribe e América do Norte, e 18% das mulheres casadas
em todo o mundo em idade reprodutiva foram esterilizadas, sobretudo através da
laqueação de trompas, muitas vezes sem consentimento da própria. Os outros métodos
mais populares são o DIU (13%), o anticoncetivo oral e o preservativo masculino (ambos
com 8%), injetáveis (5%) e esterilização masculina (3%). O DIU continua a ser
importante na Ásia e na Europa, e a pílula tem a distribuição geográfica mais ampla de
todos os métodos. De particular interesse é o facto de que, entre quase todos os países
do mundo, um ou dois métodos anticoncecionais representam metade ou mais do uso
total de anticoncetivos entre as mulheres casadas ou em união de facto: a pílula é o
método dominante em 20 países e os métodos tradicionais são dominantes em 11 países
(Poston & Bouvier, 2017, p. 125-162).

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ATIVIDADE FORMATIVA

1. Temos duas taxas brutas de natalidade:

TBN (País A- desenvolvido) = 778 526/61 283 600 *1000= 12,70 por mil

TBN (País B- não desenvolvido) = 54 043/1 428 082 *1000= 37,84 por mil

Segundo estes dois resultados, poderíamos dizer que a diferença de nível entre os dois
países seria de 198 %.

Comente este resultado e explique porque o resultado foi este.

2. TFG (País A - desenvolvido) = 778 526/14 309 800 *1000 = 54,41 por mil

TFG (País B - não desenvolvido) = 54 043/319 084 *1000 = 169,37 por mil

Segundo estes dois resultados, poderíamos dizer que a diferença de nível entre os dois
países seria de 211% em vez de 198%. Compare as diferenças de nível entre os dois
países e entre os dois tipos de taxas.

Se utilizarmos a TBN estamos a subestimar a diferença em 13%. A que se deve esta


diferença?

3. Defina os conceitos de Natalidade e de Fecundidade.

4. Com base nos dados do quadro seguinte relativos à população a meio do ano de
1991 e aos nados vivos de 1991, calcule:
Idade das População
Nascimentos
mães Feminina
15-19 12888 102
20-24 19392 1099
25-29 22465 2695
30-34 22367 2047
35-39 16802 654
40-44 10904 61
45-49 5954 3
Total 110772 6662

a) A Taxa de Fecundidade Geral. Interprete.

b) As taxas de fecundidade por grupos de idade. Interprete os dados.

c) O Índice Sintético de Fecundidade e a Taxa Bruta de Reprodução. Interprete cada


um dos resultados.

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5. Observe os dados respeitantes à População Francesa em 1960:
Idade das População
Nascimentos
mães Feminina
15-19 1 700 913 37 366
20-24 1 339 837 225 183
25-29 1 492 444 268 780
30-34 1 633 472 175 269
35-39 1 636 435 87 394
40-44 1 421 557 26 719
45-49 1 132 994 1 344
Total 10 357 652 822 055

População total média: 46 997 703

a) Calcule a Taxa Bruta de Natalidade.

b) Calcule a Taxa de Fecundidade Geral.

c) Calcule as Taxas de Fecundidade Geral por Grupos de Idades.

d) Calcule o Índice Sintético de Fecundidade e a Taxa Bruta de Reprodução.


Interprete os resultados obtidos.

e) Calcule a Idade Média de Fecundidade.

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© Universidade Aberta
5. A MORTALIDADE

5. A MORTALIDADE

Objetivos

 Conhecer a lógica e o processo de cálculo das taxas Brutas de Mortalidade enquanto


medida elementar da mortalidade geral e compreender as razões das suas limitações
enquanto instrumento de análise;
 Compreender, saber calcular e interpretar as medidas de mortalidade (por idades),
mortalidade infantil e mortalidade por causas;
 Perceber a metodologia de construção das tábuas de mortalidade e o contributo na
análise da mortalidade;
 Compreender a construção e interpretar o indicador Esperança de vida;
 Aplicar os conhecimentos adquiridos à resolução de alguns problemas concretos;
 Saber analisar a evolução global do fenómeno demográfico mortalidade e do contributo
das várias causas para esse valor total;
 Ser capaz de relatar e interpretar a evolução dos vários componentes da mortalidade
estudados.

5.1 MORTALIDADE

A morte é o último evento demográfico da nossa vida.

Trata se de um fenómeno demográfico que tal como a natalidade, fecundidade


nupcialidade e divórcio se carateriza por um evento (o óbito) que, o demógrafo
contabiliza geralmente em períodos anuais.

A morte não ocorre na mesma forma para todas as pessoas; algumas morrem mais cedo
do que outras. O impacto da mortalidade varia significativamente de acordo com as
características sociais e demográficas dos indivíduos.

A principal característica da mortalidade durante o século XX foi o seu declínio. Mas esse
declínio não se fez observar em todos os países ao mesmo tempo, e nos países em que
isso aconteceu não declinou com a mesma velocidade nos diversos tipos de grupos que
integram as estruturas sociodemográficas.

Na realidade podemos afirmar que anteriormente à época contemporânea, a mortalidade


era bastante elevada por seis razões principais: fomes, subnutrição, guerras, epidemias,
pestes e ausência de condições sanitárias. (Nazareth, 2004, p. 188-189).

A identificação destes fatores permitiu uma imediata explicitação das principais causas
do declínio da mortalidade:
© Universidade Aberta

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5. A MORTALIDADE

• Fatores educacionais (mais conhecimentos sobre alimentação, vestuário);

• Fatores sanitários (melhores condições sanitárias, de higiene e de habitação);

• Fatores médicos (mais prevenção, diagnóstico e cura de doenças);

• Fatores económicos (desenvolvimento das economias de mercado, redes de


comunicação, aumento dos níveis de bem-estar social e económico);

• Fatores sociais (melhores condições de habitação e no trabalho).

Estes fatores contribuíram para que a mortalidade declinasse de tal forma que a
esperança de vida mais do que duplicou. Mas esse declínio não foi igual em todo o
mundo. Daí a diversidade de situações que encontramos.

A razão dessa divergência deriva do facto de nos países desenvolvidos todos os fatores
enunciados anteriormente terem concorrido para o declínio da mortalidade, ao passo
que na maior parte dos países não desenvolvidos o declínio observado tem sido devido
a fatores médicos e sanitários. (Nazareth, 2004, p. 189)

A mortalidade não é, assim, democrática. Existe uma enorme desigualdade perante a


morte. Mas a evolução tem sido muito positiva, sobretudo ao nível do declínio da
mortalidade infantil.

Em suma, para além das condições médico-sanitárias, a mortalidade varia em função de


vários fatores como o nível socioeconómico, as práticas alimentares, as condições de
habitação e no trabalho.

5.2 MEDIR A MORTALIDADE


5.2.1. A Taxa Bruta de Mortalidade

A medição da mortalidade remonta a John Graunt (1620-1674) e as suas análises das


"Contas de Mortalidade".

A mortalidade refere-se à frequência relativa de morte numa população.

Os demógrafos usam dois conceitos diferentes quando se referem à mortalidade:

A Expectativa de vida, que é o "limite de idade da vida humana" numérico e a Esperança


de vida, que é o número médio esperado de anos de vida vividos por uma determinada
população em um determinado momento. (Poston & Bouvier, 2017)

Como primeira medida da análise da mortalidade calcula-se a Taxa Bruta de Mortalidade


(ou taxa de mortalidade).

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78
5. A MORTALIDADE

As taxas Brutas são em geral utilizadas para caracterizar tendências conjunturais ou de


longo prazo. No caso da mortalidade, enquanto indicadores globais, servem para
sintetizar as condições sanitárias do momento (Leston Bandeira, 2004, p. 189).

Na prática consiste em dividir o total de óbitos num determinado período (um ano) pela
população existente nesse mesmo período.

Esta medida é conhecida como Taxa Bruta de Mortalidade e podemos representá-la por:
TBM.

Uma vez que a população total muda a cada instante no decorrer de um ano, surge a
dúvida sobre qual a população a considerar no denominador. Como a TBM é uma medida
de risco, teríamos que ter no denominador todas as pessoas submetidas a esse risco.

Se tomamos a população no início do ano, nela não estão incluídas as crianças que vão
nascer durante o ano. Por outro lado, aquelas pessoas que estão vivas no início do ano
e que vão falecer antes do fim do ano não poderão entrar com o mesmo peso do que
aquelas que vão sobreviver.

Se tomamos a população no final do ano, nela não estarão incluídas, por um lado,
aquelas pessoas que faleceram durante o ano e, por outro, estarão incluídas
integralmente as crianças que nasceram em diferentes momentos no decorrer do ano e
que não estiveram submetidas ao risco de morte durante todo o ano.

Idealmente, deveríamos contabilizar no denominador o número de pessoas/ano da


população em estudo. Isso significa que todo indivíduo presente no início e no fim do
ano deveria ser contado como uma pessoas-ano; os indivíduos presentes no início e que
vierem a falecer nesse ano e todas as crianças nascidas durante o ano deveriam ser
contabilizados pela fração de ano vivido. Ainda que o conceito de pessoas/ano seja muito
simples, o seu cálculo exato é extremamente difícil.

Como uma aproximação para o total de pessoas/ano, adota-se a estimativa da população


total no meio do ano, na suposição de que os nascimentos e óbitos na população
ocorram uniformemente no decorrer do ano. Como se trata de um período curto (12
meses), tal suposição não introduz, de maneira geral, distorções significativas.

Ainda que o mais usual seja calcular a TBM referente ao ano calendário, ela também
pode ser obtida para qualquer conjunto de 12 meses consecutivos.

A Taxa Bruta de Mortalidade relaciona, assim, o número de óbitos durante um dado ano
com a população média desse ano.

A população média é a população no meio do ano que estimamos eventualmente como


média aritmética das populações nos dias 1 de janeiro que enquadram o ano. Trata-se,

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5. A MORTALIDADE

de uma estimativa do número de pessoas que, durante um ano inteiro, correram o risco
de falecer (Rollet, 2007, p.60).

TBM = _____óbitos____ *1000

população total (média)

Usualmente esta taxa é representada pelo número de óbitos por mil habitantes, para
maior facilidade de interpretação.

Exemplo:

Em Portugal tivemos em 1990, 103 115 óbitos e a população média registada era de

9 883 400 habitantes. A taxa bruta de mortalidade em 1990 obtém-se do seguinte modo:

TBM (1990) = _103 115 _ *1000 = 10,43 por mil

9 883 400

Então dizemos que a Taxa Bruta de Mortalidade de Portugal em 1990 era de 10,43 óbitos
por mil habitantes.

O nível da TBM dependerá de dois componentes básicos: a intensidade com que se


morre a cada idade (porque em diferentes idades as pessoas estão sujeitas a diferentes
riscos de morte) e a distribuição etária proporcional da população.

No que concerne o primeiro componente, por exemplo os recém-nascidos e os idosos


têm maior chance de morrer do que os adolescentes. O segundo componente decorre
do primeiro, pois se os riscos são diferenciados por idade, há de se levar em conta o
maior ou menor peso dos diversos grupos etários.

Assim, a Taxa Bruta de Mortalidade, na medida em que é influenciada pela estrutura


etária de cada população em cada momento, não mede efetivamente unicamente a
frequência da mortalidade podendo originar conclusões erradas quando se pretende
efetuar comparações (Leston Bandeira, 2004, p.189).

Por tratar-se, então, de um instrumento grosseiro que não tem em conta a estrutura
etária da população, devemos ter em conta algumas precauções: fazer coincidir a
população média com a população de um recenseamento.

Os dois fatores intervenientes nas taxas brutas são o modelo e as estruturas. A taxa
bruta é a soma de produtos das estruturas relativas de cada idade pelas taxas nessas
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80
5. A MORTALIDADE

mesmas idades. Como ao conjunto das taxas por idade se chama o modelo do fenómeno,
a taxa bruta pode ser redefinida como uma resultante da interação entre o modelo e a
estrutura (Nazareth, 2004, 190-191).

5.2.2. A mortalidade por idades e por grupos de idades

Um elemento evidente de diferenciação da mortalidade segundo os indivíduos é a idade.


Daí que se calculem as taxas por idade ou grupos de idades.

As taxas específicas enquanto instrumento de medida da análise demográfica são mais


fiáveis do que as taxas brutas.

O que diferencia estas taxas é o facto de que, enquanto as taxas brutas consideram
como população média de referência toda a população, as taxas específicas medem a
frequência dos fenómenos demográficos numa parte dessa população, definida pela
pertença ao mesmo grupo etário ou idade (Leston Bandeira, 2004).

Temos, deste modo a Taxa Específica de Mortalidade (TEM), que se refere ao risco de
morte em cada idade ou em cada grupo etário. Corresponde ao quociente entre o total
de óbitos, num determinado ano, em cada idade ou grupo etário e a população
correspondente a esse grupo no meio do ano em análise (Pressat, 1980).

TEM por idade(s)

TEM = _____óbitos na_idade x___ *1000

população total idade x (média)

TEM por grupos etários

TEM = _____óbitos no grupo etário X-X+n___ *1000

população total no grupo etário X-X+n (média)

Onde x refere-se à idade limite inferior do grupo etário, n a amplitude do intervalo do


grupo.

A Taxa Bruta de Mortalidade é a média ponderada das taxas específicas de mortalidade,


cujos pesos são dados pela população em cada idade ou grupo etário. Demonstra-se,
assim, que a Taxa Bruta de Mortalidade depende da intensidade e da distribuição etária
proporcional (Pressat, 1980).
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81
5. A MORTALIDADE

Do exposto, fica claro que duas populações com as mesmas Taxas Especificas de
Mortalidade podem gerar Taxas Brutas de Mortalidade distintas, por terem distribuições
etárias proporcionais diferentes.

Também outras situações podem ocorrer: imaginemos as populações A e B, onde em


qualquer idade, a TEM de A seja maior do que de B. Neste caso, podemos afirmar que
o nível de mortalidade de A é superior ao de B. No entanto, dependendo das respetivas
distribuições etárias proporcionais, a TBM de A pode ser menor do que de B. Conclui-se
que as Taxas Brutas de Mortalidade não são bons indicadores para se analisar
diferenciais de níveis de mortalidade entre populações diferentes, a não ser em casos
em que as populações tenham distribuições etárias proporcionais iguais (Nazareth,
2004).

O conceito de taxas específicas que usamos em relação à idade pode ser estendido para
outras variáveis que influenciam o risco de morrer. Assim, podemos definir taxas
específicas por sexo, por estado civil, causas de morte, por grupos socioeconómicos etc.

Do mesmo modo, calculam-se também as taxas por idade e por sexos separadamente.

A forma de cálculo deste tipo de taxas é a mesma que a da taxa bruta de mortalidade:
relacionam-se os óbitos de cada sexo ocorridos num dado ano na idade considerada,
com a população média desse mesmo sexo com essa idade durante esse ano (Leston
Bandeira, 2004).

5.3. A MORTALIDADE INFANTIL

A mortalidade infantil é objeto de atenção especial e de um modo de determinação


particular dado que diz respeito à mortalidade de crianças com menos de 1 ano.

Determina-se, geralmente, sem distinção de sexos pelo facto de que a diferença que
existe entre mortalidade masculina e feminina não é significativa, nessas idades.

O conceito de mortalidade infantil designa a relação entre o número de óbitos ocorridos


antes do primeiro aniversário e o número de nascimentos. Trata-se do risco que corre
um recém-nascido de morrer antes de completar o ano de idade (Rollet, 2007, p. 60).

A mortalidade infantil remete, assim, para o número de mortes de crianças com menos
de 1 ano, num dado ano X e numa dada população N, por cada 1.000 nascimentos nessa
população Y e nesse mesmo ano X.

Ela corresponde ao risco que um nascido vivo tem de vir a falecer antes de completar
um ano de idade. Está implícito neste conceito a ideia de probabilidade. Como as crianças
nascidas durante um ano, digamos A, só completarão um ano de idade no ano seguinte,

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82
5. A MORTALIDADE

A + 1, a mortalidade infantil entre os nascidos num ano-calendário ocorrerá durante dois


anos consecutivos, A e A + 1.

No ano A ocorrerão óbitos infantis de nascidos em A - 1 e A, e em A + 1 ocorrerão óbitos


infantis de nascidos em A e A+ 1

Seria necessário esperar dois anos para se poder calcular a Taxa de Mortalidade Infantil
(TMI) dos nascidos vivos num determinado ano e dada a dificuldade prática de separar-
se, em cada ano do calendário, do total de óbitos infantis aqueles referentes a crianças
nascidas no próprio ano e a crianças nascidas no ano anterior.

Este erro será normalmente pequeno, a não ser que haja entre dois anos consecutivos
grande diferença no número de nascimentos e/ou grande mudança na mortalidade de
crianças abaixo de um ano. Pode-se considerar, então, como uma boa medida de
mortalidade infantil e tomá-la como uma probabilidade. Deste modo, a mortalidade
infantil é usualmente medida pela taxa de mortalidade infantil (clássica) calculada a
partir de uma observação de acontecimentos produzidos durante um ano civil (Leston
Bandeira, 2004, p. 195).

5.3.1. A Taxa de Mortalidade Infantil Clássica

A taxa de mortalidade infantil é um dos principais e mais relevantes indicadores da


situação sanitária de uma população num dado momento, transmitindo assim o nível de
desenvolvimento global dessa população (Leston Bandeira, 2004, p. 196).

A taxa de mortalidade infantil clássica assume a configuração de uma taxa entre


aniversários. Tem a particularidade da população de referência, que figura no
denominador da taxa, não ser o efetivo médio da população com menos de 1 ano de
idade, mas o total de nados-vivos ocorridos durante o ano.

Agregando os resultados obtidos através desta taxa em sequência temporal, podemos


conhecer não só as condições de sobrevivência infantil do momento, mas também a sua
evolução ao longo do tempo, médio e longo prazo.

Fórmula TMI Clássica

TMI = __óbitos menos 1 ano no_ano x__ *1000

nados-vivos ano x

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5. A MORTALIDADE

Exemplo: Portugal – mortalidade infantil em 1973

Nascimentos em 1973 – 172 324

Óbitos com menos de 1 ano em 1973 – 7726

Taxa de Mortalidade Infantil Clássica: 7726/172 324 X 1000 = 44, 83 por mil

A Taxa de Mortalidade infantil Portugal em 1973 era de 44,84 óbitos de crianças com
menos de 1 ano por cada mil nascimentos.

5.3.2. As componentes da mortalidade infantil

“Na produção da vida humana intervém uma multiplicidade de fatores que


antecedem e acompanham o ato de nascer e condicionam as possibilidades de
sobrevivência de um novo ser. (...)

Na luta pela sobrevivência, o tempo para o recém-nascido tem um significado


particular, medindo-se em unidades de dimensão diminuta, contado a partir do
instante do chegar à vida em minutos e depois, à medida que vai sobrevivendo, em
horas, dias, semanas, meses e, enfim, 1 ano. E à medida que o tempo passa e o
capital-saúde se afirma, aumentam as probabilidades de sobrevivência e o risco de
mortalidade vai se amenizando.” (Leston Bandeira, 2004, p. 200).

Por este facto, a mortalidade infantil deve ser abordada e analisada tomando por
referência duas fronteiras temporais muito precisas: no início, a formação do feto; no
fim, o primeiro aniversário. Entre estas duas fronteiras, o risco de mortalidade vai
mudando de natureza e de intensidade.

Deste modo, elaboram-se um conjunto de conceitos e instrumentos de medida centrados


em todas componentes da mortalidade infantil, bem como na mortalidade fetal.

Assim, consoante a duração em que ocorre, o risco de mortalidade infantil decompõe-


se em: mortinatalidade, mortalidade neonatal e mortalidade pós neonatal (Rollet, 2007,
p.61).

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5. A MORTALIDADE

A mortinatalidade

Um nado morto, usualmente designado como aborto ou morte fetal, é um feto que não
nasceu vivo; assim, não é registado como morte porque não nasceu.

Um feto pode morrer antes do início do trabalho de parto, ou seja, no útero, devido a
complicações na gravidez ou por várias doenças maternas. Ou um feto pode estar vivo
no início do trabalho de parto, mas morrer durante o processo e, assim, nascer morto.

A mortinatalidade designa, assim, a mortalidade intrauterina dos fetos com uma


gestação superior a um determinado valor temporal mínimo (Leston Bandeira, 2004, p.
202).

As principais causas deste tipo de mortalidade são complicações (evitáveis) durante o


processo de parto, infeções maternas e distúrbios maternos, especialmente diabetes e
hipertensão.

A taxa de mortinatalidade mede a relação entre nados-mortos e nados-vivos, que se


exprime da seguinte forma:

TMN = nados-mortos / nados-vivos + nados-mortos

Taxa de mortalidade neonatal

Na mortalidade neonatal, que ocorre durante os primeiros 28 dias temos de considerar


também a mortalidade neonatal precoce, que é a que acontece entre o nascimento e o
7º dia exato.

A taxa de mortalidade neonatal mede a frequência da mortalidade infantil até às


primeiras 4 semanas (28 dias):

TMNN = Óbitos (0,28 dias) / Nados-vivos

Para o calculo da mortalidade neonatal precoce são considerados apenas os óbitos dos
7 primeiros dias de vida.

TMNP = Óbitos (0,7 dias) / Nados-vivos

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5. A MORTALIDADE

Mortalidade Perinatal

Da soma da mortinatalidade com a mortalidade neonatal precoce resulta a mortalidade


perinatal que se refere a gravidezes que não resultaram em nascidos vivos (foram mortes
fetais) ou resultaram em nascidos vivos de bebés que viveram apenas sete dias ou
menos.

A mortalidade perinatal designa os efeitos do risco sofrido durante o período crucial que
vai do momento em que se perfaz a formação no útero ao nascimento e se conclui a
primeira semana de vida.

A taxa de mortalidade perinatal resulta da adição das taxas de mortinatalidade e de


mortalidade neonatal.

Taxa de mortalidade Pós Neonatal

Para o cálculo da taxa de mortalidade pós neonatal são considerados os óbitos ocorridos
após o 28º dia.

TMPN = Óbitos (28, 365 dias) / Nados-vivos

Exemplo: Portugal ano de 1973.

Nascimentos para 1973 – 172 324

Óbitos com menos de 1 ano para 1973 – 7726

Óbitos com menos de 7 dias para 1973 - 2502

Óbitos com menos de 28 dias para 1973 – 3647

Óbitos com 28-365 dias para 1973 – 4079

População a ½ do ano de 1973 com menos de 1 ano – 165 300

Taxa de Mortalidade Infantil Neonatal: 3647/172 324 X 1000 = 21,16 por mil

Taxa de Mortalidade Infantil Neonatal precoce: 2502/172 324 x 1000 = 14,52 por mil

Taxa de Mortalidade Infantil Pós Neonatal: 4079/172 324 X 1000 = 23, 67 por mil

Apesar do numerador da TMI corresponder aos óbitos de crianças com idade abaixo de
um ano, a distribuição dos óbitos dentro deste intervalo não é uniforme e ocorre de
maneira desigual.

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5. A MORTALIDADE

Para aquelas populações onde a taxa de mortalidade infantil é baixa, os óbitos


concentram-se nas primeiras semanas de vida das crianças, porque, neste caso, as
mortes são principalmente por causas genéticas e causas ligadas ao parto.

A mortalidade neonatal é, em suma, extremamente sensível às condições da gravidez e


do parto e às malformações (Rollet, p. 2007, p. 61).

Naquelas populações onde a TMI é alta, os óbitos são menos concentrados nas primeiras
semanas de vida, porque muitos dos óbitos infantis são devidos a fatores ligados ao
meio em que a criança vive, tais como condição de saneamento, nutrição etc. A
mortalidade pós neonatal mais sensível ao meio ambiente, aos comportamentos e às
doenças infeciosas, está intimamente associada às condições de vida (Rollet, 2007, p.
61).

Em populações com níveis de mortalidade infantil baixas, a mortalidade infantil neonatal


tem maior peso do que a mortalidade infantil pós-neonatal. Nessas populações, a
mortalidade infantil neonatal explica a quase totalidade da mortalidade infantil (do 1.º
ano de vida).

Podemos classificar as causas que originaram a mortalidade infantil em duas grandes


categorias: endógenas e exógenas.

As causas endógenas surgem devido a causas anteriores ao nascimento ou resultam do


próprio nascimento, sendo consequência de deformações congénitas (que nascem com
o indivíduo) de taras hereditárias ou de traumatismos causados pelo parto. Neste caso,
os óbitos ocorrem geralmente durante o primeiro mês de vida da criança, sobretudo nos
primeiros dias.

As causas exógenas por sua vez, estão associadas a causas exteriores (doenças
infeciosas, subalimentação, cuidados hospitalares insuficientes e acidentes diversos).
São deste modo resultado de condições sanitárias ou contextos sociais desfavoráveis à
sobrevivência da criança.

“O interesse principal desta distinção entre mortalidade infantil endógena e


mortalidade infantil exógena decorre dos ensinamentos quanto à melhoria das
políticas sociais e de proteção à infância e à maternidade, sendo adquirido que essa
melhoria produzirá efeitos principalmente sobre a redução dos fatores responsáveis
pela mortalidade exógena”. (Leston Bandeira, 2004, p. 204)

Para podermos separar os óbitos infantis por causas endógenas ou exógenas teremos
de ter acesso a estatísticas de óbitos por causas de morte.

No entanto, existe um método que permite obter essa separação sem termos a
informação dos óbitos por dias e idades. Trata-se, pois, de aumentar em 25% os óbitos
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87
5. A MORTALIDADE

registados no intervalo 31-365 dias, ou aumentar em 22,8% os do intervalo 28-365 dias


e obtemos o total de óbitos exógenos.

Parte-se, então, do princípio de que os óbitos endógenos acontecem no primeiro mês


de vida e por sua vez, os exógenos ocorrem nos restantes meses. Dado que nem todos
os óbitos produzidos no primeiro mês de vida são endógenos, determina-se a
percentagem de óbitos exógenos por meio das regras anteriormente referidas.

Os óbitos exógenos obtêm-se calculando a diferença entre o total de óbitos infantis e os


óbitos endógenos.

A Taxa de Mortalidade Infantil Endógena calcula-se dividindo o total de óbitos endógenos


pelos nascimentos.

TMIend = __óbitos endógenos_ *1000

nados-vivos ano x

A Taxa de Mortalidade Infantil Exógena obtém-se dividindo o total de óbitos exógenos


pelos nascimentos.

TMIexo = __óbitos exógenos_ *1000

nados-vivos ano x

Por conseguinte, a Taxa de Mortalidade Infantil Clássica é igual à soma da Taxa de


Mortalidade Infantil Endógena com a Taxa de Mortalidade Infantil Exógena (Nazareth,
2004, p. 200).

Retomando o exemplo: Portugal ano de 1973.

Nascimentos para 1973 – 172 324

Óbitos com menos de 28 dias para 1973 – 3647

Óbitos com 28-365 dias para 1973 – 4079

População a ½ do ano de 1973 com menos de 1 ano – 165 300

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5. A MORTALIDADE

Para obter os óbitos exógenos somamos aos óbitos com 28-365 dias (4079) os óbitos
exógenos com menos de 28 dias, isto é, 4079 x 0,228 (22,8%) = 930

Logo:

óbitos exógenos: 930 + 4079 = 5009

óbitos endógenos: 7726 - 5009 = 2717

Taxa de Mortalidade Infantil Endógena: 2717/172 324 X 1000 = 15,77 por mil

Taxa de Mortalidade Infantil Exógena: 5009/172 324 x 1000 = 29,07 por mil

Taxa de Mortalidade Infantil Clássica: 15,77 + 29,07 = 44,84 por mil.

5.3.3. A mortalidade materna

A OMS define uma morte materna como a morte de uma mulher durante a gravidez ou
no prazo de 42 dias após a interrupção da gravidez, independentemente da duração ou
local da gravidez, de qualquer causa relacionada ou agravada pela gravidez ou seu
tratamento, mas não de causas acidentais ou incidentais (Poston & Bouvier, 2017).

A taxa de mortalidade materna (TMMR) é o número de mortes num ano de mulheres


que morrem como resultado de complicações na gravidez, parto e puerpério (ou seja, a
condição da mulher imediatamente após o parto, geralmente terminando quando a
ovulação começa novamente), por 100.000 nascimentos ocorridos nesse ano.

Às vezes, as mortes (o numerador) são designadas de mortes devido a causas


puerperais. A fórmula de calculo é:

TMMR = óbitos mulheres (grávidas ou no puerpério) / 100 000 nascimentos

Os dois fatores mais importantes que levam à morte materna são a idade e a paridade
(o número de vezes que uma mulher deu à luz; também se refere à ordem de
nascimento, por exemplo, um segundo filho, que seria um filho de segunda paridade).

Os riscos de morte por maternidade (durante a gravidez) são maiores para mulheres
muito jovens e mulheres mais velhas do que para mulheres na casa dos vinte e trinta
anos.

Mulheres com alta paridade e mulheres com intervalos curtos entre partos também estão
em alto risco devido a doenças crónicas e desnutrição, pobreza, gravidez indesejada,
cuidados pré-natais e obstétricos inadequados e falta de acesso a um hospital (Poston
& Bouvier, 2017).

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89
5. A MORTALIDADE

5.4. A MORTALIDADE DIFERENCIAL. CAUSAS DE MORTALIDADE

A mortalidade por meses

De modo a compreender-se as relações da variável mortalidade (geral e infantil) com o


meio envolvente, analisam-se as suas variações pelos meses do ano. Os métodos mais
utilizados são o método das proporções (ou percentagens), método das taxas mensais
e o método dos números proporcionais.

O método das proporções corresponde à divisão dos óbitos registados em cada mês pelo
total de óbitos anuais, multiplicando o resultado obtido por 100 de modo a termos o
resultado em percentagem.

Contudo, dado que cada mês tem uma diferente amplitude, este método acaba por
originar distorções na análise dos dados obtidos. Assim, recorre-se ao método das taxas
mensais.

Com o método das taxas mensais convertem-se as taxas aos efetivos anuais dado que
se multiplica o número médio de óbitos mensais pelo número de dias do ano divididos
pela população média. Isto é:

(óbitos mensais / dias do mês) x (365 ou 366 / população média) x 1000

ou [(365 ou 366 / dias do mês) x óbitos mensais)] x população média x 1000

Finalmente, o método dos números proporcionais permite uma melhor comparação


nomeadamente quando se representam os dados obtidos graficamente.

Este método assenta na mesma lógica que o anterior no qual se dividem os óbitos
mensais pelo número de dias do mês. Porém, os resultados obtidos são depois
substituídos por números proporcionais de modo a que o seu total seja igual a 1200.

Deste modo, cada mês fica representado por um número, independentemente da


duração do mês, de forma a que o seu desvio (positivo ou negativo) em relação a 100
identifique a particularidade de cada mês (Nazareth, 2004, p. 201-202).

“…a morte é provocada por uma ou uma combinação de uma grande variedade de
causas, ou doenças, e a compreensão da mortalidade requer uma compreensão das
tendências em cada uma das principais causas de morte” (Bogue, 1969, conforme
citado em Poston & Bouvier, 2017).

A maioria dos governos nacionais classifica as causas de mortes de acordo com a


Classificação Internacional de Doenças (CID), desenvolvida pela Organização Mundial da
Saúde (OMS). Esta classificação passa por uma revisão periódica (Poston & Bouvier,
2017).
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90
5. A MORTALIDADE

Na décima revisão da CID (adaptada em 1992), as causas de morte são classificadas em


vinte e duas categorias principais. Atualmente já está disponível o CID 11.1

A morte é um comportamento complexo. Existem milhares de maneiras diferentes de


morrer; algumas causas de morte ocorrem com mais frequência do que outras.

Nem todas as pessoas morrem pelas mesmas causas principais, e isso se deve em
grande parte aos níveis socioeconómicos dos países.

A mortalidade varia com a idade, mas as causas de morte também variam com a idade.

As principais causas estão associadas a doenças degenerativas e crónicas.

Os homens têm menos probabilidade de morrer de Doenças degenerativas do que


mulheres em todas as idades, e essa diferença aumenta entre os mais velhos. As
mulheres vivem mais do que os homens e, portanto, têm maior probabilidade de morrer
de doenças crónicas e degenerativas (Poston & Bouvier, 2017).

Fomes

A fome foi considerada uma causa de morte. As populações dos tempos pré-industriais
tinham muito menos controle sobre seu suprimento de alimentos do que temos hoje.
Houve declínios graves na população em grande parte da Europa durante os anos de
fome de 1315–1317. Na década de 1690, um sexto da população em algumas províncias
suecas morreu após graves quebras de safra. A fome da batata irlandesa de 1846-1851,
conhecida na Irlanda como a Grande Fome, matou cerca de um milhão de pessoas,
embora algumas estimativas apontem para um número tão alto quanto 1,5 milhão.

A última grande fome na Europa foi a fome finlandesa de 1868. Além disso, cerca de 19
milhões de pessoas provavelmente morreram na Índia entre 1891 e 1910 como resultado
da fome.

Uma das fomes mais destrutivas no registo demográfico ocorreu na China entre 1958 e
1961. Estima-se que entre 30 e 40 milhões de chineses morreram como resultado direto
da fome, com 12 milhões das mortes de pessoas menores de dez anos.

A principal causa da fome resultou do programa mal concebido e excessivamente


ambicioso do Grande Salto para a Frente, iniciado em 1958 por Mao Zedong e projetado
para "envolver uma luta revolucionária contra a natureza para realizar o grande potencial

1 https://www.who.int/classifications/classification-of-diseases
https://icd.who.int/browse11/l-m/en

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91
5. A MORTALIDADE

da agricultura, maximizando as vantagens do coletivo economia” (Aird, 1972, conforme


citado em Poston & Bouvier, 2017, p.179).

Epidemias

Uma epidemia é um grande aumento ou aumento de uma doença infeciosa em uma


área que resulta em um grande número de mortes, seguido por um declínio. Muitas
infeções e doenças contagiosas se tornaram epidérmicas, incluindo escarlatina, sarampo,
gripe e cólera.

As epidemias geralmente começam em um nível local e, em seguida, se espalham para


áreas próximas. Se uma epidemia atinge vários países ou continentes, é conhecida como
pandemia. As pandemias são muito mais perturbadoras demográfica, económica e
socialmente do que as epidemias.

As epidemias foram importantes para o desenvolvimento da demografia moderna,


especialmente no rastreamento das mortes de uma população. Por exemplo, a epidemia
de gripe espanhola resultou no estabelecimento do Sistema de Vigilância do Crescimento
pela Liga das Nações.

Uma das piores epidemias da Europa, a Peste Negra, que resultou na morte de cerca de
um terço da população do continente. O número estimado de mortes causadas pela
Peste Negra varia de um mínimo de 25 milhões até um máximo de 60 a 75 milhões. Este
é um valor surpreendente, dado que toda a Europa no século 14 provavelmente contava
com cerca de 80 a 90 milhões de habitantes.

Uma epidemia recente foi a epidemia de gripe espanhola. Ela espalhou-se pela Europa
em 1918 e depois para o resto do mundo. Os Epidemiologistas estimam que a epidemia
resultou na morte de cerca de 50 milhões de pessoas. A gripe espanhola pode muito
bem ter infetado quase 1 bilhão de pessoas, ou quase metade da população do mundo
naquela época (Poston & Bouvier, 2017).

HIV / AIDS (síndrome da imunodeficiência adquirida) atinge o mundo há mais de trinta


e cinco anos. Poderá, em breve, ser responsável por mais mortes do que os 100 milhões
de vítimas da peste negra e das epidemias de gripe espanhola.

O vírus da imunodeficiência humana (HIV), que causa a AIDS, foi isolado em 1983 no
Instituto Pasteur em Paris.

No final da década de 1980 e início da década de 1990, o HIV / AIDS foi identificado em
todas as regiões do mundo.

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92
5. A MORTALIDADE

No início do ano de 2014, a Organização Mundial da Saúde estimou que 74 milhões de


pessoas em todo o mundo foram infetadas desde que o vírus foi reconhecido pela
primeira vez em 1981; destes, 39 milhões morreram, e a maioria dos 35 milhões que
vivem com HIV provavelmente morrerá de causas relacionadas ao HIV.

Só em 2013, 1,5 milhão de pessoas morreram de causas relacionadas ao HIV. A cada


ano, no mundo, ocorrem mais de 2 milhões de novos casos de HIV. Isso significa que
talvez por volta do ano de 2030, haverá mais de 100 milhões de casos de HIV em todo
o mundo, quase todos morrerão de causas relacionadas ao HIV (Poston & Bouvier,
2017).

Guerras

As consequências demográficas da guerra em relação à mortalidade não são fáceis de


determinar. Alguns historiadores e arqueólogos militares definem a guerra como todos
os tipos de conflitos envolvendo mais de dois combatentes. Além das mortes militares
registadas, há também a questão das perdas civis que ocorrem em consequência da
guerra, incluindo a infeção por doenças transportadas pelos soldados, assassinatos
associados a pilhagem, fome após a destruição de terras agrícolas e sofrimentos que
ocorrem como resultado de desorganização económica e social. Os dados de mortalidade
da guerra são mais bem documentados para atividades no século XX em comparação
com eras anteriores.

“O tamanho plausível do número de mortos de militares e civis seria de cerca de


8,5 milhões na Primeira Guerra Mundial e 40 milhões na Segunda Guerra Mundial”
(Etherington, 2003, conforme citado em Poston & Bouvier, 2017, p.186).

Frequentemente, o número de mortes de civis excede o número de mortes de militares.


É provável que, durante a Segunda Guerra Mundial na Rússia, 60% das mortes tenham
sido civis (Poston & Bouvier, 2017, p.186).

Medidas das causas de mortalidade

“O conhecimento dos padrões comparativos de mortalidade inclui o estudo das


doenças ou outros fatores que constituem as causas determinantes da mortalidade”
(Leston Bandeira, 2004, p. 229).

Para analisar as causas de mortalidade utilizamos os indicadores de medida


anteriormente apresentados.

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5. A MORTALIDADE

Assim, a Taxa Bruta de Mortalidade por Causa é o mais imediato instrumento de medida
de que dispomos.

Obtém-se por meio do quociente entre o número de óbitos pela causa C e a população
total média (Leston Bandeira, 2004, p. 229).

TBMC = ____óbitos pela causa C__ *1000

População Total média

As taxas obtidas desta forma permitem efetuar comparações, pois sintetizam o peso
relativo de uma dada doença na estrutura de uma população. No entanto, os resultados
obtidos com as mesmas não permitem saber quais os tempos de maior ou menor
incidência do risco na vida dos indivíduos. Deste modo, será conveniente recorrer-se ao
cálculo de taxas de mortalidade segundo a causa e a idade. Podem calcular-se estas
taxas para todas as causas permitindo conhecer o peso relativo de cada grupo de causas
de mortalidade nas diferentes idades (Leston Bandeira, 2004, p. 233-234).

5.5. TÁBUA DE MORTALIDADE. A ESPERANÇA DE VIDA

Como vimos anteriormente, a Taxa Bruta de Mortalidade não é uma boa medida para se
comparar duas populações com estruturas etárias diferentes. Uma alternativa seria
analisar o conjunto das Taxas Específicas de Mortalidade.

Entretanto, dado o elevado número de Taxas Específicas de Mortalidade e a diversidade


de estruturas de mortalidade, segundo a idade, em duas ou mais populações, a
comparação entre Taxas Específicas de Mortalidade pode dificultar a análise dos níveis
de mortalidade (Pressat, 1980).

Um dos indicadores que têm a característica de ser uma medida resumo e que não sofre
a influência da estrutura etária da população é a esperança de vida.

Na realidade, a esperança de vida, ao contrário da Taxa Bruta de Mortalidade, não


depende da estrutura etária das populações, mas apenas dos seus níveis de mortalidade.
Para além disso, o cálculo da esperança de vida, possibilita comparar níveis de
mortalidade entre populações diferentes.

A esperança de vida é, deste modo, um indicador importantíssimo de mortalidade que


caracteriza-se por ser um índice de síntese ou um indicador sintético da mortalidade
(Leston Bandeira, 2004).

A esperança de vida numa determinada idade pode ser interpretada como o número
médio de anos que um indivíduo viverá a partir daquela idade, considerando o nível e a
estrutura de mortalidade por idade observados naquela população.
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5. A MORTALIDADE

A esperança de vida à nascença, (ou média de vida) representa, assim, o número médio
de anos vividos por uma geração (Rollet, 2007).

Por exemplo, a esperança de vida à nascença de 70 anos é o número médio de anos


que um indivíduo nascido num determinado momento do tempo pode viver, se as
condições de saúde observadas nesse momento não se alterarem ao longo do tempo.
Isto é se forem mantidos os níveis de mortalidade verificados nas diferentes idades.

Em suma, nessa população com uma esperança de vida ao nascer de 70 anos por uma
criança que nasce viverá em média 70 anos.

No início dos anos 1950, a esperança de vida no mundo era de apenas 46 anos, mas
chegou a 69 anos em 2010. A ONU projetou que em 2050, a esperança de vida para o
mundo chegará a 76 anos e a 82 anos em 2100.

No entanto, a esperança de vida no mundo desenvolvido em 1950 já era de 65 anos,


em 2010 era de 77 anos, e a projeção é de 83 anos em 2050 e 89 anos em 2100 (Poston
& Bouvier, 2017, p.173).

A vida média na idade x, ou esperança de vida, resume as expetativas de sobrevivência


dos indivíduos numa geração ou no momento.

Dado que representa o número médio de anos vividos por uma geração, calcula-se
adicionando o número de anos vividos pelo conjunto da geração (ou gerações) durante
um ou mais anos, dividindo o resultado obtido pelos respetivos efetivos iniciais (Leston
Bandeira, 2004).

“Devemos partir do principio que as pessoas falecidas entre dois aniversários são
distribuídas linearmente no tempo: assim, entre 0 e 1 ano, o número de anos vividos
em média é de 0,5 ano, entre 1 e 2 anos, de 1,5 ano, etc.” (Rollet, 2007, p. 67).

A esperança de vida à nascença obtém-se a partir da construção da tábua de


mortalidade.

A descrição dos fenómenos demográficos, numa tábua, incide sobre um grupo cuja
identidade é determinada por um mesmo acontecimento (acontecimento – origem).

No que toca à mortalidade, o acontecimento origem é o facto de um grupo de pessoas


terem nascido no mesmo ano, constituírem assim uma geração. Ao longo das idades, as
pessoas são submetidas aos riscos de casar, procriar, divorciar-se, de morrer, etc. A
amplitude destes riscos varia em função da idade.

Para medir a probabilidade que um dado acontecimento ocorra numa geração entre duas
idades, utiliza-se o quociente. Este instrumento de medida constitui a medida chave na
construção de uma tábua.

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95
5. A MORTALIDADE

O quociente de mortalidade, que ao contrário das taxas, não tem uma dimensão anual
mede o risco de alguém de idade X, pertencente à geração G, morrer antes de atingir o
aniversário X+a.

A probabilidade complementar a este risco mede o seu contrário, sendo que o


complemento a 1 do risco de mortalidade é a probabilidade de sobrevivência (Leston
Bandeira, 2004).

A tábua de mortalidade é constituída por três séries de base:

- a série dos Sobreviventes {Sx}, que mede a lei de sobrevivência da geração,

- a série dos óbitos entre a idade x e a idade x+a; {O (x,x+a)}

- a série dos quocientes {aqx}

Toma-se como efetivo inicial da tábua um múltiplo de 10 (1 000, 10 000 ou 100 000),
denominado por Raiz da Tábua (S0). Conhecidos ou já calculados os quocientes,
multiplica-se esse efetivo inicial pelo quociente de mortalidade entre 0 e 1 ano (1q0),
obtendo-se deste modo o número de óbitos da tábua {O (0,1)}, ocorridos entre dois
aniversários. Subtraindo estes óbitos ao efetivo inicial, obtém-se o número de
sobreviventes no primeiro aniversário (S1).

Efetuam-se estas operações de forma sucessivas pelas várias classes de idades até à
extinção da série dos sobreviventes.

A construção de uma tábua de mortalidade possibilita descrever de forma subtil o destino


de uma geração: de que modo uma determinada geração percorreu as várias idades da
vida até acabar por desaparecer completamente após 100 anos. Traduz, pois, a
frequência do fenómeno mortalidade numa coorte, ao longo do tempo, ou seja, das
idades percorridas pelos indivíduos que compõem essa coorte.

A tábua de mortalidade descreve como desapareceram progressivamente os indivíduos


de uma geração, assim, como sobreviveram nas idades sucessivas. Reconstitui deste
modo, de forma sintética, a progressão dos acontecimentos (neste caso, a morte) numa
geração.

A tábua de mortalidade pode ser apresentada de forma completa, tratando-se neste


caso de uma descrição exaustiva, ano a ano, das leis de sobrevivência e de mortalidade
da geração. Ou pode apresentar-se de forma resumida, agrupando as idades por grupos
quinquenais, a partir dos 5 anos.

Por outro lado, podemos falar de uma tábua bruta quando a mesma mede o risco de
mortalidade na ausência de migrações, ou de uma tábua líquida se na mesma forem
tidos em consideração os efeitos das migrações (Leston Bandeira, 2004).

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96
5. A MORTALIDADE

As tábuas de mortalidade de geração, na perspetiva de uma análise longitudinal, são na


realidade hoje pouco utilizadas. O recuo progressivo da mortalidade nas sociedades
modernas e o facto de os dados disponíveis não permitirem facilmente a sua construção
reduziu a sua utilização.

Na verdade, “na maioria dos casos, interessa-nos muito mais observar as condições
de mortalidade existentes num determinado momento do que seguir uma geração
durante umas largas dezenas de anos. Por outras palavras, mesmo que os dados
estejam disponíveis, é sempre aconselhável construir uma tábua de mortalidade do
momento ou em transversal” (Nazareth, 2004, p. 204).

As tábuas de mortalidade do momento possibilitando o conhecimento da mortalidade


numa dada época (um ou mais anos) permitem avaliar as condições sanitárias do
momento, assim como, permitem através da comparação com tábuas de épocas
anteriores, acompanhar a evolução das tendências da mortalidade ao longo do tempo
(Leston Bandeira, 2004).

5.5.1. O Princípio da Translação: a construção das tábuas de


mortalidade

O princípio em que assenta a tábua de mortalidade do momento é o principio da geração


ou coorte fictícia.

A tábua vai transformar a informação na transversal para uma informação na


longitudinal, ou seja, a transformação do que se observa num determinado momento do
tempo para uma coorte fictícia.

Consiste em submeter um grupo fictício de recém-nascidos à experiência de mortalidade


em cada idade, que é na verdade o risco calculado para um ano em estudo. Ou seja,
atribui-se toda uma sucessão de riscos a uma geração fictícia que na verdade foram
observados em gerações diferentes (Leston Bandeira, 2004).

Apresentam-se seguidamente as diversas funções de uma tábua de mortalidade


tomando por exemplo a tábua de mortalidade de Portugal, sexos reunidos, no período
2014/2016, com a designação atual das séries de base (quocientes, sobreviventes e
óbitos) utilizadas pelo INE e a nível internacional e com a introdução das séries derivadas
mais recorrentes. (Anexo 5 Tábua Completa de Mortalidade para Portugal 2014-2016
(Ambos os sexos) e Anexo 6 - Tábua Completa de Mortalidade para Portugal 2014-2016
(Homens)).

1. A primeira coluna é a das idades: as idades são apresentadas não sob a forma de
grupos etários, mas nos terminais das idades exatas (0, 1, 5, 10, 20, 25…);
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97
5. A MORTALIDADE

2. Na segunda coluna temos a função nqx (ou aqx); são os quocientes de mortalidade,
isto é, a probabilidade de morte, entre a idade exata x e a idade exata x + n, onde n é
a amplitude dos grupos de idade.

3. Na terceira coluna temos Ix (ou Sx): os sobreviventes em cada idade exata x. Para
tornar possível as comparações temporais e espaciais, aplica-se a um mesmo efetivo
(normalmente a raíz da tábua l0 =100.000) a lei da mortalidade definida pelos nqx ou
de sobrevivência definida pelos npx. Sendo que npx = 1 – nqx.

4. Na quarta coluna temos ndx (ou O (x, x+a)): é a distribuição dos óbitos (tendo em
conta o efetivo inicial de 100.000) por idades ou grupos de idades, entre um grupo etário
e outro, por idades exatas: ndx = Ix-Ix+n

5. Na quinta coluna temos nLx: é o número de anos vividos pelos sobreviventes lx entre
as idades exatas x e x + n, ou seja, entre duas idades ou sobreviventes em anos
completos. Obtém-se multiplicando os efetivos médios entre idades exatas pelo número
de anos.

6. Na coluna seis temos Tx: é uma função anos de vida intermédia. Começa-se pelo fim
da tábua, soma-se de baixo para cima. É o total de anos vividos pela coorte (fictícia)
depois da idade x. Como nLx é o número de anos vividos entre as idades exatas x e x +
n, para obter o total de anos vividos basta somar os nLx.

7. A coluna sete é a esperança de vida ex: é a esperança de vida na idade x, ou seja, o


número médio de anos que resta viver às pessoas que atingiram a idade x. Quando x =
0, temos a esperança de vida à nascença, ou seja, o número total de anos vividos desde
o nascimento, dividido pelo efetivo inicial.

Ex=Tx / Ix ou E0 = T0 / I0

Vamos agora construir uma tábua de mortalidade:

O ponto de partida de uma tábua de mortalidade é o cálculo das taxas de mortalidade


por grupos etários e sexos separados.

É necessária a informação sobre óbitos por grupos etários, efetivos por sexos separados.

1º : Calcula-se as taxas de mortalidade por grupos de idade (nTx), ou seja as Taxas


Especificas de Mortalidade (TEM), mantendo 5 casas decimais - é o ponto de partida da
tábua de mortalidade.

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98
5. A MORTALIDADE

2º: nqx. Quocientes de mortalidade, isto é, a probabilidade de morte (nqx), entre a


idade exata x e a idade exata x+n; no seu cálculo utiliza-se a seguinte fórmula:

nqx=2n * nTx

2+n*nTx

onde n é a amplitude dos grupos de idade.

Exemplos:

1q0= T.M.I.C.= óbitos - 1 ano 90/91

nascimentos 90/91

O 1q0 é a verdadeira Taxa de Mortalidade Infantil.

4q1= 2*4*0.00092

2+4*0.00092

Isto, se a taxa de mortalidade do grupo etário 1- 4 for 206(204+208/2)/223244


(população do censo de 91) = 0.00092.

5q5=2*5*0.00048 = 0.0048 = 0.0024

2+5*0.00048 2.0024

Isto, se a taxa de mortalidade do grupo etário 5 – 9 (5T5) for 0.00048

No caso do último grupo de idades, nqx é igual à unidade, uma vez que todas as pessoas
terão necessariamente que desaparecer.

3º lx

Sobreviventes em cada idade exata x. Para tornar possível as comparações temporais e


espaciais, aplica-se a um mesmo efetivo (normalmente a raiz da tábua l0 =100000) a
lei da mortalidade definida pelos nqx ou de sobrevivência definida pelos nPx.

Obtém-se assim os sobreviventes em cada idade exata x através da seguinte relação:

lx+n=1x*nPx

l0=100000
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99
5. A MORTALIDADE

4l1= lx+n= lx*nPx

4º ndx

É a distribuição dos óbitos (tendo em conta o efetivo inicial de 100000) por idades ou
grupos de idades, entre um grupo etário e outro, por idades exatas: ndx=lx-lx+n

5º nLx

É o número de anos vividos pelos sobreviventes lx entre as idades exatas x e x+n, ou


seja entre duas idades ou sobreviventes em anos completos. Obtém-se multiplicando os
efetivos médios entre idades exatas pelo número de anos.

Exemplo:

Se tivermos 20 alunos no início do ano letivo e no final do ano, os mesmos 20 alunos,


viveram-se 20 anos: (20 (partida) + 20 (chegada)) *1=20

Se forem 5 anos, foram vividos 100 anos.

Se partirem 20 e chegarem 10, ao fim de um ano = 20+10/2=15*1=15

Ao nível dos primeiros anos de vida não se verifica a linearidade da função de


sobrevivência, obtendo-se uma aproximação mais exata através das seguintes
expressões:

1L0=K’’ l0 + K’ l1

4L1=K’’ l1 + K’ l5 , onde K’’= 0.05 e K’= 0.95

Para as restantes idades, excetuando a 1ª e a 2ª (0-1 e 1-4), se eu tenho L5 e L10 e


se quero saber o nº médio de anos vividos calculo

nLx = (lx+lx+n) * n (amplitude)

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100
5. A MORTALIDADE

Os diversos nLx ao serem considerados como o número de anos vividos pelos


sobreviventes entre as idades x e x+n, podem também ser considerados como os
sobreviventes em anos completos.

Quanto ao último nLx (l80+) obtém-se através da seguinte expressão:

Lk+ = Tk, L80+ = l80/T80+

6º Tx

É uma função anos de vida intermédia. Começa-se pelo fim da tábua, soma-se de baixo
para cima.

É o total de anos vividos pela coorte (fictícia) depois da idade x. Como nLx é o número
de anos vividos entre as idades exatas x e x+n, para obter o total de anos vividos basta
somar os nLx.

Assim temos:

Tx = ∑ nLxO último Tx (ou Tk), que é igual a Lk+, obtém-se através da seguinte
expressão:

expressão:
lk
Tk = mk onde mk+ é a taxa de mortalidade do último grupo de idades.

7º ex

É a esperança de vida na idade x, ou seja, o número médio de anos que resta viver às
pessoas que atingiram a idade x. Quando x=0, temos a esperança de vida à nascença,
ou seja, o número total de anos vividos desde o nascimento, dividido pelo efetivo inicial

e0= T0, ou seja, ex = Tx

l0 lx

Obtém-se assim o número médio de anos vividos desde o nascimento.

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101
5. A MORTALIDADE

ATIVIDADES FORMATIVAS

Temos duas taxas brutas de mortalidade:

TBM (1950) = 102 915/8 441 315*1000 = 12,19 por mil

TBM (1990) = 103 115/9 883 400 *1000 = 10,43 por mil

Segundo estes dois resultados, tivemos em 40 anos, um declínio de apenas 14 %.


Comente este resultado e explique porque o resultado foi este.

1.Observe os seguintes dados para Portugal:

Grupos Óbitos Óbitos Grupos População População


de idades 1949/52 1959/62 de idades 1950 1960
1 19277 18106 1 174855 187739
1-4 9426 5956 1-4 714859 713671
5-9 1528 1012 5-9 798678 851145
10-14 928 599 10-14 799693 839400
15-19 1551 691 15-19 810964 747225
20-24 2279 920 20-24 761703 705209
25-29 2256 1102 25-29 681256 673194
30-34 1905 1324 30-34 541099 637452
35-39 2301 1593 35-39 567333 591184
40-44 2721 1734 40-44 524737 499411
45-49 3148 2585 45-49 460041 510724
50-54 3628 3584 50-54 390566 481429
55-59 4412 4649 55-59 331777 409026
60-64 5985 5984 60-64 294239 334019
65-69 7408 7949 65-69 229976 264150
70 + 34162 40056 70 + 359539 444419
Total 102915 97844 Total 8 441 315 8 889 397

Nota: 1949/52: Nascimentos 1949 =208712, Nascimentos 1952= 205163 1959/62:


Nascimentos 1959 =213062, Nascimentos 1962= 213895

a) Aprecie a evolução da mortalidade através das TBM no período1950-1960.

b) Calcule a taxa de mortalidade infantil em 1950 e 1960.

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5. A MORTALIDADE

2. Observe as tabelas dos anexo 5 Tábua Completa de Mortalidade para Portugal


2014-2016 (Ambos os sexos) e anexo 6 - Tábua Completa de Mortalidade para Portugal
2014-2016 (Homens)

a) Interprete a tábua de mortalidade

b) Descreva as seguintes colunas: nqx, lx, Tx.

c) Comente a esperança de vida ex

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6.AS MIGRAÇÕES

6.AS MIGRAÇÕES

Objetivos

 Identificar a especificidade dos movimentos migratórios enquanto elemento


fundamental da dinâmica de crescimento das sociedades contemporâneas;
 Conhecer e aplicar os métodos de análise dos movimentos migratórios;
 Distinguir os diferentes tipos de migrações.

Introdução

Neste capítulo, apresentamos o componente restante do crescimento populacional, a


migração.

Começaremos por definir a migração. Em seguida, descreveremos os principais padrões


de migração interna e internacional e teorias sobre as causas ou determinantes da
migração. Finalmente, abordaremos as consequências e as preocupações políticas da
migração internacional, especialmente o fluxo populacional das regiões menos
desenvolvidas para as regiões mais desenvolvidas do mundo.

Além da fecundidade e da mortalidade, a terceira maneira pela qual as populações


mudam de tamanho é por meio da migração; o tamanho da população diminui na área
de origem e aumenta na área de destino. Ao contrário dos eventos anteriores, o evento
de migração pode ocorrer em várias ocasiões ou nunca ocorrer durante nossa vida.

6.1. O QUE É MIGRAÇÃO?

A migração é mais difícil de definir do que outros processos de crescimento demográfico,


mortalidade e fecundidade. Nem todos os movimentos através das fronteiras geográficas
são migrações, uma vez que nem todos envolvem mudança de residência. Nem há
tentativas consistentes de registar todos os movimentos através das fronteiras
geográficas à medida que ocorrem.

A migração é mais difícil de definir do que mortalidade ou fecundidade. Enquanto todos


os nascimentos contribuem para a fecundidade e todas as mortes contribuem para a
mortalidade, nem todos os movimentos contribuem para a migração. Uma viagem de
férias, uma mudança para um apartamento vizinho, uma tarefa para a loja, uma viagem
diária para o trabalho: essas mudanças não são migrações.

Quais movimentos os demógrafos consideram migrações?

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6.AS MIGRAÇÕES

As migrações são os movimentos populacionais que aumentam ou diminuem os


membros de uma população ou sociedade. Para os demógrafos, a pertença a uma
população está intimamente ligada à ideia de residência. Residência, neste contexto,
significa mais do que apenas estar fisicamente presente numa localização geográfica
num momento no tempo; implica estar socialmente “inserido” numa população.

A migração, ou mudança no número de membros da população, é então identificada


demograficamente como uma mudança na residência. Para ser mais preciso, os
demógrafos exigem uma mudança para satisfazer três condições para se qualificar como
uma migração: (1) Deve envolver uma mudança permanente ou semipermanente na
sua residência; (2) deve cruzar algum limite administrativo; e (3) deve ocorrer durante
um determinado momento ou período (Pressat, 1985). Esta é a definição mais simples
de migração, uma mudança na residência através de alguma fronteira geopolítica num
determinado período de tempo.

Nota-se que esta definição de migração não usa o critério de distância nem o de duração,
pelo menos não diretamente. Uma mudança de residência ao atravessar a rua pode ser
uma migração se cruzar as fronteiras administrativas, enquanto uma viagem de férias
ao redor do mundo pode não ser. Um cidadão de um país pode viver por anos em outro
sem alterar a sua cidadania, enquanto um refugiado pode adotar imediatamente a sua
nova casa como país de residência. Os demógrafos podem usar a distância de
movimento e a duração da estadia - ou mesmo a duração pretendida - como um
indicador para a mudança de residência, mas a “reinserção” continua a ser o critério
subjacente.

Que tipo de movimento fica então de fora dessa definição demográfica de migração?
Uma exclusão seria a mudança de pessoas que não têm residência geograficamente
durável, antes ou depois da mudança, como populações nómades ou sem-teto. Outra
exclusão seria os movimentos de curto prazo de tipo periódico, por exemplo,
deslocamento para o trabalho ou viagens anuais de férias. Outra exclusão categórica
seria uma mudança de residência dentro de uma unidade geopolítica, como mudar de
uma casa atual para outra na mesma área administrativa.

Esta última exclusão levanta uma dificuldade na definição de migração. A determinação


de quais movimentos serão chamados de migrações depende da escala das unidades
geopolíticas que se considera, a área que define a migração (Pressat, 1985). Falar de
migração internacional, significa não falar das mudanças que podem ocorrer entre as
províncias ou estados dentro das nações.

Por causa dessa ambiguidade, os demógrafos têm o cuidado de especificar a qual escala
de migração se referem. Por exemplo, eles distinguem universalmente entre migração
internacional e interna.

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6.AS MIGRAÇÕES

Uma mudança residencial permanente, local ou jurisdicional, é geralmente definida como


uma mudança de residência, com duração de pelo menos um ano (Poston & Bouvier,
2017, p. 217).

A migração residencial de pessoas que se mudam para uma área de destino é chamada
de migração interna; a migração de pessoas que saem de uma área de origem é
conhecida como emigração. É possível que um migrante volte para sua área de origem
durante o curso de sua vida, e esse retorno residencial é conhecido como migração de
retorno.

Quando subtraímos o número de migrantes externos do número de migrantes internos


de uma determinada área geográfica, obtemos a migração líquida. O saldo líquido pode
ser positivo, negativo ou zero.

Quando adicionamos a migração interna e externa de uma área, obtemos a migração


bruta.

Chamamos um grupo de migrantes com uma área comum de origem e uma área comum
de destino durante um intervalo de migração especificado um fluxo de migração.

Um contra fluxo de migração, geralmente menor em tamanho, move-se na direção


oposta do fluxo de migração durante o mesmo intervalo de tempo. Um intervalo de
migração é o tempo decorrido entre dois eventos, nomeadamente a hora de chegada à
área de destino e a hora de saída da área de origem.

A migração diferencial é o estudo das diferenças nas populações migrantes de acordo


com as suas características demográficas, sociais e económicas. Algumas pessoas têm
maior probabilidade de migrar do que outras, enquanto outras podem ter maior
probabilidade de permanecer devido aos seus atributos diferenciais. Chamamos isso de
seletividade de migração (Poston & Bouvier, 2017, p.219).

O vocabulário da migração é mais facilmente introduzido ao examinar o diagrama


esquemático de migração simplificado mostrado na Figura 7.

Figura 7-Diagrama da Migração entre duas áreas

Fonte: Lundquist, Anderton, Yaiukey, 2015, p. 327, figure 9-1.

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6.AS MIGRAÇÕES

Observamos duas áreas, A e B, cada uma com uma população residencial especificada
no início de um ano. Durante aquele ano, um conjunto de pessoas cruza da área A para
a área B e outro conjunto atravessa da área B para a área A. Suponhamos que essas
passagens de fronteira signifiquem mudanças de residência - que são migrações.

Esta situação de migração pode ser vista de uma perspetiva ampla ou estreita. Em
termos gerais, podemos pensar nas áreas A e B como partes de um todo maior, como
ao estudar a migração entre regiões de um país. Mais estreitamente, podemos identificar
com apenas uma das áreas e ver a migração apenas em termos de seu impacto naquela
área, como a maioria das nações vê a sua migração internacional.

O foco de interesse está nos fluxos de migração. Um fluxo de migração consiste nas
pessoas que migram de uma área especificada para outra num determinado período de
tempo. As setas na Figura 7 mostram dois fluxos. Os números dentro das setas indicam
de quantas pessoas se trata e o tamanho da seta representa o tamanho do volume.
Cada volume possui uma área de origem e uma área de destino. Os demógrafos às vezes
preocupam-se com a força coletiva das duas correntes e às vezes com o equilíbrio entre
as duas correntes; isto é, eles podem enfocar a migração bruta (ou o volume da
migração), a soma dos dois fluxos (150, na figura) ou a migração líquida, as diferenças
entre os dois fluxos (50, na figura).

De uma perspetiva local, as prioridades são diferentes. Consideremos a posição da área


A, sendo as áreas A e B nações. Dessa posição, os 100 que se movem da área B para a
área A representam a imigração; os 50 que se mudam da área A para a área B
representam a emigração. Se as áreas não fossem nações, mas subunidades (ou seja,
se a migração fosse interna), então os processos poderiam ser rotulados de migração
externa em vez de emigração, e migração interna em vez de imigração. A migração
líquida para a área A seria a migração interna (100) menos a migração externa (50),
para um ganho de 50 pessoas. A migração líquida para a área B seria menos 50. A
migração interna é uma mudança geográfica que resulta numa mudança de residência
que atravessa uma fronteira política ou jurisdicional, geralmente uma unidade
geográfica. A migração de pessoas que saem de uma área de origem é conhecida
como emigração. É possível que um migrante volte para sua área de origem durante o
curso de sua vida, e esse retorno residencial é conhecido como migração de retorno.

As taxas de migração podem ser calculadas para cada um desses aspetos da migração,
mas o seu significado tende a ser menos claro do que as taxas de mortalidade ou de
natalidade. As taxas de emigração (ou emigração) fazem algum sentido. A população
residente total numa área tem alguma semelhança com o número de pessoas que
poderiam mudar-se. Assim, taxas brutas, ou mesmo específicas por idade, podem ser
usadas para medir a emigração relevante para uma população residente em risco de

105
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6.AS MIGRAÇÕES

sair. Mas a taxa de imigração (ou migração interna) entre os residentes atuais faz menos
sentido. A população residente não corre risco de imigração, e seu tamanho absoluto
tem pouco a ver com o número de pessoas que poderiam mudar-se para a área. Quando
as taxas de imigração (migração interna) são calculadas, geralmente é para indicar a
taxa na qual a imigração impacta a população residente na área de destino. Da mesma
forma, a taxa de migração líquida frequentemente é usada para indicar o impacto líquido
da imigração e da emigração na população da área de destino.

Outra dimensão importante é a migração seletiva. Os demógrafos, como vimos, estão


interessados não apenas nas mudanças do tamanho da população, mas também na
composição da população. Na medida em que a composição do fluxo migratório líquido
difere da composição da população residente na área de destino, a migração terá
impacto na composição da população residente; o mesmo acontecerá na área de origem
(Poston & Bouvier, 2017, p. 227; Lundquist, Anderton, Yaiukey, 2015, p. 326-328).

6.2 DETERMINANTES DA MIGRAÇÃO

Por que razão as pessoas migram? O estudo teórico da migração começou com
observações de que (1) nem todas as pessoas têm a mesma probabilidade de se mover
- na verdade, a grande maioria no mundo não migra internacionalmente e (2) sabendo
quais pessoas têm maior probabilidade de se mover pode ajudar a entender as forças
subjacentes à migração. A identificação dos grupos com maior probabilidade de migrar
fornece generalizações empíricas sobre a migração que podem então contribuir para as
explicações teóricas da migração (Pressat, 1985).

Sobre o volume de migração, Lee (1966) afirma:

1. O volume de migração dentro de um determinado território varia com o grau de


diversidade das áreas incluídas nesse território.

2. O volume de migração varia com a diversidade de pessoas.

3. O volume de migração está relacionado com a dificuldade de superar os obstáculos


intermediários.

4. O volume de migração varia com as flutuações da economia.

5. A menos que controles severos sejam impostos, tanto o volume quanto a taxa de
migração tendem a aumentar com o tempo.

6. O volume e a taxa de migração variam com o estado de progresso de um país ou


área.

Em fluxos de migração e contra fluxos, ele observa:

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6.AS MIGRAÇÕES

1. A migração tende a ocorrer principalmente dentro de fluxos bem definidos.

2. Para cada fluxo de migração principal, um contra fluxo se desenvolve.

3. A eficiência do fluxo (a razão entre o fluxo e o contra fluxo) é alta se os principais


fatores no desenvolvimento de um fluxo de migração forem fatores negativos na origem.

4. A eficiência do fluxo e contracorrente tende a ser baixa se a origem e o destino forem


semelhantes.

5. A eficiência dos fluxos será alta se os obstáculos intermediários forem grandes.

6. A eficiência de um fluxo migratório varia com as condições económicas, sendo alta


em tempos de prosperidade e baixa em tempos de depressão.

Lee continuou a observar que a migração não é apenas seletiva, mas o grau de
seletividade varia (1966, pp. 56-57).

Onde a migração é influenciada principalmente pelas atrações para a área de destino,


então os migrantes provavelmente serão selecionados positivamente. Ou seja, aqueles
que têm maior probabilidade de vencer na competição por essas qualidades atraentes
(por exemplo, empregos) têm maior probabilidade de migrar. Por outro lado, onde a
migração é impulsionada principalmente por forças negativas na área de origem (como
turbulência política ou calamidade natural), então a emigração tende a ser menos
seletiva. Obstáculos entre a área de origem e destino - distância, barreiras legais,
ameaças à sobrevivência - tendem a tornar a migração mais seletiva. E, com o tempo,
há uma tendência à erosão da seletividade num fluxo migratório, como nas migrações
pioneiras, nas quais jovens adultos aventureiros iniciam o fluxo e, posteriormente,
mandam buscar as suas famílias e amigos.

Lee (1966) também observou que a migração é especialmente provável nas transições
entre as fases da vida: casar, entrar no mercado de trabalho, quando os filhos saem de
casa, divorciar-se, aposentar-se, ficar viúvo... Como vimos, uma expressão disso é a
seletividade quase universal por idade da migração à medida que jovens adultos
ingressam na força de trabalho. A migração também seleciona por sexo, mas a natureza
dessa seleção varia, dependendo de questões como a definição dos papéis de género.

Tradicionalmente, a migração é selecionada para homens jovens em busca de trabalho


ou dinheiro no exterior. Mas a seletividade sexual torna-se mais variada à medida que
as barreiras à participação das mulheres no mercado de trabalho são reduzidas e,
particularmente, devido à globalização da procura por profissionais de saúde (UNCTAD,
2012; Chant e Radcliffe, 1992, conforme citado em Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

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6.AS MIGRAÇÕES

6.3. TEORIAS DE MIGRAÇÃO

A teoria da migração tem sido uma das áreas demográficas mais frutíferas e de rápido
desenvolvimento nas últimas décadas. Vários autores reviram e avaliaram as teorias
predominantes de migração (por exemplo, Brettell e Hollifield, 2007; Castles, 2007;
Nações Unidas, 1998a, 1998b; Stahl, 1995; Massey et al., 2005, 1994). Uma revisão das
principais teorias de migração atuais é apresentada abaixo.

Economia neoclássica (teoria macro). Uma das primeiras teorias de migração, a


teoria económica neoclássica tenta explicar a relação entre migração de trabalho e
desenvolvimento económico teorizando que a migração em massa tenderá a fluir de
países com uma oferta excessiva de trabalho para aqueles com pedidos de trabalho não
atendidos. Em teoria, o capital, incluindo o capital humano altamente qualificado,
também tenderá a migrar de áreas de abundância para áreas de escassez, onde podem
obter retornos mais elevados (ou seja, geralmente movendo-se na direção oposta das
migrações de trabalho em massa). Sem restrições, a migração de trabalho e capital
continuará até que um equilíbrio internacional de oferta e procura de trabalho seja
alcançado. Esta é uma macro teoria no sentido de que não dá muita atenção às
características ou motivações dos migrantes, exceto por suas habilidades, ou capital
humano, e os salários disponíveis para eles em diferentes áreas.

Economia neoclássica (micro teoria). Relacionada com a teoria macro, essa visão é
formulada ao nível do migrante individual. De acordo com essa teoria, os indivíduos
fazem escolhas racionais sobre a migração com base em cálculos de custo-benefício.
Esses cálculos não se limitam a ganhos e perdas imediatos, mas também incluem
expetativas futuras. Em teoria, e excluindo as restrições à migração, um migrante
mudar-se-á para onde o valor esperado de retornos futuros é maior.

Nova teoria económica da migração. Este ponto de vista desafia as conclusões da


teoria económica neoclássica e assume que não apenas os indivíduos, mas também as
unidades sociais, como famílias e domicílios, tomam decisões de migração. Essas
unidades são capazes de fazer planos de migração mais complexos devido ao potencial
de diversificação da mão de obra familiar. Alguns membros da família podem
permanecer trabalhando em casa, por exemplo, enquanto outros migram para
oportunidades de trabalho distantes e podem enviar rendimentos ou remessas de volta
para suas famílias. Especialmente em países em desenvolvimento, essas estratégias
podem ser usadas para minimizar os riscos enfrentados por uma família. Enviar um
membro da família para o exterior pode fornecer uma fonte de rendimento para garantir
contra os tempos difíceis locais de desemprego, quebra de colheita, queda dos preços
das colheitas, falta de capital e assim por diante. Isso sugere que a fonte, não apenas a
quantidade, da receita é importante. Os membros da família podem migrar pelo seguro

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© Universidade Aberta
6.AS MIGRAÇÕES

que as remessas oferecem, mesmo quando as diferenças salariais são pequenas, e não
resultariam em migração de acordo com as teorias neoclássicas. Da mesma forma, o
sentido de privação relativa de uma família influencia as decisões de migração de
maneiras não explicadas apenas pelos salários. Se, por exemplo, o desenvolvimento
económico aumenta as expetativas de estilo de vida numa comunidade, os indivíduos
podem ter maior motivação para buscar ganhos através da migração, mesmo que os
seus salários também tenham melhorado durante o desenvolvimento.

Teoria do mercado de trabalho dual. Esta teoria explica a migração como resultado
das necessidades da força de trabalho e das políticas de migração das sociedades
industriais modernas. Países desenvolvidos, pós-industrializados, muitas vezes
desenvolvem mercados de trabalho duais, com um setor de alta qualificação, alto salário
e capital intensivo, proporcionando oportunidades de emprego atraentes e baixa
qualificação, baixo salário e mão de obra. Os países mais desenvolvidos acham cada vez
mais difícil preencher empregos de baixos estatutos com a sua mão de obra nativa de
alta aspiração. As tendências demográficas nos países desenvolvidos agravam a
escassez de mão de obra menos qualificada. O declínio da fecundidade reduziu a
proporção de jovens trabalhadores não qualificados dispostos a aceitar temporariamente
empregos de baixo estatuto. Casamentos posteriores, taxas crescentes de divórcio e
acesso ao ensino superior estimularam as mulheres a ingressar na força de trabalho
altamente qualificada, tornando-as menos dispostas a aceitar empregos de baixo
estatuto. Aumentos aceitáveis nos salários não melhorarão suficientemente a situação
relativa dos empregos de baixa qualificação e podem simplesmente aumentar ainda mais
a escala salarial e as aspirações. Portanto, para atender às necessidades de mão de obra
de baixa qualificação, as economias desenvolvidas recrutam mão de obra migrante do
exterior, o que não requer aumento de salários. Na verdade, os salários são mais
frequentemente controlados por meio de mecanismos institucionais e políticas de
migração.

Teoria dos sistemas mundiais. Aplica--se a uma visão abrangente do


desenvolvimento global para explicar os movimentos de migração. Uma teoria da
migração baseada na análise dos sistemas mundiais teoriza que a migração
simplesmente decorre da organização política e económica de um mercado mundial
capitalista em constante expansão ou da divisão mundial do trabalho. A penetração
capitalista nas economias em evolução cria um desenvolvimento perturbador e uma
população móvel desenraizada na periferia da economia mundial. O uso da força por
países capitalistas que procuram proteger os investimentos no exterior e expandir a
economia mundial também pode criar populações de refugiados deslocadas. Ao mesmo

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6.AS MIGRAÇÕES

tempo, fortes laços materiais e culturais são formados com os países centrais durante a
penetração capitalista (e o domínio colonial anterior). A migração internacional de
populações desestruturadas flui então na direção oposta da entrada do capital, em
direção à cultura, aspirações e oportunidades recém-familiares nas economias centrais.
Considerações económicas podem influenciar as decisões dos migrantes, mas não são a
principal causa da migração. O impulso para a migração nos países em desenvolvimento
é o deslocamento da população decorrente da entrada de capital.

Teoria dos sistemas de migração. Esta teoria é um pouco diferente das outras
teorias porque se concentra na auto perpetuação dos fluxos de migração. Uma vez que
o fluxo de migração tem começado, podem surgir efeitos sistemáticos que apoiem a
migração contínua. Qualquer que seja a causa original da migração, ela pode tornar-se
menos importante à medida que esses sistemas de migração se tornam mais fortes.

A teoria das redes, por exemplo, enfatiza que as redes sociais são uma forma de capital
social. Quando um número suficiente de migrantes com uma identidade social comum
chega a uma área, eles podem constituir uma rede que pode oferecer ajuda aos recém-
chegados - desde o conforto material até a simples redução dos custos psíquicos da
migração para um lugar estranho. Os membros da rede também mantêm laços com a
sua comunidade de origem e podem oferecer informações ou assistência a possíveis
migrantes. De ambas as maneiras, as redes contribuem para um fluxo de imigração
autossustentável.

A teoria institucional enfatiza o papel semelhante das organizações sociais, variando de


organizações humanitárias voluntárias a serviços privados de imigração no mercado
“negro”. Como as redes, essas instituições podem perpetuar e, às vezes, lucrar com a
migração, independentemente das razões iniciais para o fluxo de migração. Ambas as
teorias refletem causalidade em que cada decisão de migração muda o contexto no qual
as decisões subsequentes são tomadas, geralmente perpetuando a migração (Massey et
al., 2005; Massey, 1990, conforme citado em Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

Todas essas teorias da migração não são contraditórias, pois são potencialmente
complementares.

Cada uma das principais teorias da migração pode ser usada para explicar a migração
interna e também internacional. À medida que as migrações interna e internacional se
tornam mais indissociáveis devido ao aumento da globalização, é útil teorizar os dois
tipos de movimentos como parte do mesmo fenómeno (King e Skeldon, 2010). O estudo
da migração interna, no entanto, tem preocupações únicas que deram origem a uma
série de teorias específicas de médio alcance (por exemplo, Nações Unidas, 1994; Frey,
1998; Fokkema et al., 1993; Todaro, 1997, conforme citado em Lundquist, Anderton,
Yaukey, 2015).

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6.AS MIGRAÇÕES

6.4 MIGRAÇÃO INTERNACIONAL

Acredita-se que a primeira migração internacional de humanos ocorreu cerca de 60 000


anos atrás. E ainda vemos migrações internacionais continuando até hoje. A migração
internacional é um movimento geográfico que envolve uma mudança de residência que
atravessa as fronteiras de dois ou mais países. A migração internacional tem impactos
positivos e negativos nas áreas de origem e nos países de destino (Poston & Bouvier,
2017).

Muito da história da migração humana ocorreu antes dos demógrafos começarem a


recolher dados sobre a migração. Para colocar o estudo num contexto histórico, seria
útil rever esses padrões de migração pré-históricos e históricos até aos tempos
modernos. Contudo, apenas serão aqui tratados de forma mais detalhada os fluxos de
migração modernos e os seus impactos nas nações recetoras.

A migração forçada em várias formas resulta, indireta ou diretamente, de expansões e


conflitos de estado. As nações em expansão frequentemente estabelecem postos
comerciais avançados, como fizeram os fenícios e os gregos ao redor do Mediterrâneo.

Os movimentos de refugiados cada vez mais importantes dos tempos modernos


testemunham a persistência das migrações forçadas.

Com fluxos contínuos e variáveis, escolhemos como ponto de partida para introduzir a
migração moderna o ano de 1965, embora a mudança dos padrões de migração pré-
modernos para os modernos na verdade tenha abrangido o período do final da Segunda
Guerra Mundial até então. Durante estas duas décadas, os padrões de migração
sofreram uma mudança fundamental de migrações amplamente influenciadas pela
expansão da população europeia e história política, para migrações cada vez mais
influenciadas pela globalização, a demografia dos países pós-transição soviética e
movimentos de refugiados de conflitos e guerra civil. A Figura 8 mapeia os principais
fluxos de migração do período moderno.

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6.AS MIGRAÇÕES

Figura 8 - Principais fluxos de migração do período moderno

Fonte: Lundquist, Anderton, Yaiukey, 2015, p. 337, figure 9-2

Migração voluntária

Nos Estados Unidos, quando as restrições à imigração foram amenizadas em meados da


década de 1960, deu-se lugar a uma quarta onda. Os países de onde veio a quarta onda
de imigrantes, no entanto, são muito diferentes do que antes ou durante as guerras
mundiais. A imigração da Europa para os Estados Unidos continuou, mas em níveis
diminuídos. Na América, o fluxo dominante de migração mudou de europeus indo para
a América do Sul e do Norte para latino-americanos indo para a América do Norte, com
a imigração diminuindo em torno do período da Grande Recessão.

Na Europa, os realinhamentos políticos do pós-guerra, a reconstrução e a prosperidade


da Europa Ocidental atraíram imigrantes da Europa Oriental, durando até à dissolução
da União Soviética. A prosperidade na Europa e o envelhecimento da força de trabalho
europeia atraíram imigrantes do norte da África e do Oriente Médio (3), embora esses
fluxos tenham estagnado temporariamente durante a recessão de 2007-2009 e as suas
consequências. Essas mudanças resultaram numa mudança, como na América, dos
fluxos de migração norte-sul para sul-norte.

Embora as causas sejam bem diferentes, uma reversão semelhante nos padrões de
migração ocorreu na Federação Russa e na Comunidade de Estados Independentes.

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6.AS MIGRAÇÕES

Após a dissolução da União Soviética, os antigos fluxos de migração para colonizar as


regiões menos desenvolvidas ao Norte e ao Sul foram revertidos por migrações de volta
à Rússia central e por minorias étnicas retornando às terras natais ancestrais. Em 1991,
cerca de 25 milhões de Russos viviam em estados sucessores não-russos. A migração
de retorno para a Rússia das Repúblicas da Transcaucásia (Armênia, Azerbaijão e
Geórgia) sozinha atingiu um pico de quase 600 000 em 1993. Apesar das diferenças,
essa mudança tem algumas semelhanças com os casos europeu e americano.

Em todas as três áreas descritas acima, os fluxos de migração pré-segunda guerra


mundial que fluíam das regiões mais desenvolvidas para as menos desenvolvidas
mudaram de direção.

Os fluxos de migração interna entre os países europeus também aumentaram de forma


constante com o surgimento da União Europeia (UE) e a abertura das fronteiras dentro
da UE.

As migrações modernas diferem dos fluxos de migração pré-Segunda Guerra Mundial de


outras maneiras. Nem todas essas migrações são realocações permanentes.

As migrações temporárias e os deslocados de refugiados superam as migrações


permanentes em mais de dez para um nos tempos modernos.

Migração forçada

Uma segunda grande mudança no período de migração moderna é uma mudança nos
níveis e padrões da migração forçada. Desde o final da Segunda Guerra Mundial, o
tamanho da migração forçada aumentou. A população global de refugiados, por
exemplo, aumentou de menos de 2 milhões em 1965 para mais de 15 milhões de pessoas
em 2013 (Nações Unidas, 2013b; ACNUR, 2005).

São indivíduos que devem deixar as suas casas para a sua própria segurança ou
sobrevivência, muitas vezes devido a guerras ou desastres naturais. Ao incluir o número
de pessoas que também foram deslocadas internamente, o número de refugiados sobe
para cerca de 43 milhões em todo o mundo (Nações Unidas, 2013b).

As origens dos movimentos de refugiados também mudaram: nas décadas de 1940 e


1950, as migrações forçadas foram principalmente consequências das guerras europeias
e do declínio dos impérios europeus. As migrações forçadas hoje têm sido em grande
parte o resultado das guerras dos EUA no Médio Oriente e de conflitos entre alguns
países menos desenvolvidos. A mudança na origem global dos refugiados ao longo do
tempo reflete essa mudança: na década de 1950, os refugiados eram em grande parte

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6.AS MIGRAÇÕES

de países europeus; em 2012, mais da metade de todos os refugiados eram do


Afeganistão e do Iraque ou de países em guerra civil, como a Síria, Sudão e Somália.

Migrações forçadas durante e após a Segunda Guerra Mundial (por exemplo, milhões de
judeus provindos da Alemanha como refugiados políticos durante a ascensão de Hitler
ao poder nos anos 1930) prenunciaram a importância crescente dos movimentos de
refugiados no período moderno. O fim da Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria que
se seguiu resultaram em imensas migrações forçadas. Cerca de 20 milhões de pessoas
na Europa Central e Oriental estiveram envolvidas em vários tipos de voos, trocas,
expulsões e transferências. A maioria dessas pessoas mudou-se para a Europa; alguns
acabaram na América do Norte ou em outros países fronteiriços. Na Ásia, 3 milhões de
japoneses que se mudaram para partes distantes do império foram devolvidos por
decreto à pátria.

A emergência do sistema colonial no pós-guerra também resultou em migrações


forçadas. A divisão da Índia e do Paquistão em 1947, por exemplo, resultou na fuga de
cerca de 7 milhões de hindus para a Índia e igual número de muçulmanos para o
Paquistão. Em 1948, após o estabelecimento do Estado de Israel, cerca de 700 000
árabes palestinos fugiram. A vitória comunista na China em 1949 causou a migração de
incontáveis milhões para outras partes da Ásia, como Taiwan. A revolução cubana enviou
uma onda de migrantes através do Atlântico Sul para as costas da Flórida e além. A
guerra indo-paquistanesa em 1971 deu origem ao estado de Bangladesh e desencadeou
a troca de outros milhões entre aquele país, Índia e Paquistão.

O estabelecimento de estados africanos pós-coloniais, com fronteiras arbitrariamente


designadas por antigas potências coloniais, resultou em migrações maciças e preparou
o cenário para conflitos futuros na região. Esses fluxos são identificados com o número
5 na Figura 8. Conflitos e guerras civis dentro dos estados africanos resultaram em
migrações significativas de refugiados na Somália, Sudão, República Democrática do
Congo e Mali, entre outros. A invasão do Afeganistão e do Iraque pelos EUA, o conflito
árabe-israelita e o conflito na Síria geraram outros movimentos de refugiados.

Os países asiáticos acolhem quase metade dos refugiados do mundo, muitos dos quais
são afegãos deslocados pela guerra EUA-Afeganistão. Os países africanos também
recebem uma proporção substancial, mais de 30%, dos refugiados.

Além da migração de refugiados, outro tipo de migração forçada é o tráfico humano


moderno. O tráfico de seres humanos é definido como recrutamento pela força ou
engano para fins de exploração sexual ou trabalho forçado. A Figura 9 mostra as origens
regionais das vítimas do tráfico transnacional.

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6.AS MIGRAÇÕES

Figura 9 -Origens regionais das vítimas do tráfico transnacional

Fonte: Lundquist, Anderton, Yaiukey, 2015, p. 339, figure 9-3

As setas apontam para países onde a procura é mais prevalente. Regiões mais ricas,
como América do Norte, Europa Ocidental e Oriente Médio alimentam grande parte da
procura por migração traficada, enquanto a maioria das vítimas vem de regiões mais
pobres, como Leste e Sul da Ásia, Europa Oriental e África subsaariana. Na Europa, os
Africanos são as vítimas mais comumente “traficadas”, enquanto na América são os
asiáticos. As vítimas de tráfico no Oriente Médio são de uma grande variedade de origens
regionais. Estima-se que 20,9 milhões de pessoas sejam vítimas de tráfico de pessoas
em todo o mundo, 27% das quais são crianças (UNODC, 2012).

Por se tratar de uma atividade clandestina e não definida como crime em todos os países,
a prevalência e a gravidade do tráfico de pessoas são subestimadas. Mas o fenómeno
ganha cada vez mais atenção internacional, com 134 países oficialmente criminalizando
a prática. O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime promove a
conscientização sobre a atividade do tráfico e recolhe dados sistemáticos para ajudar os
países a, em primeiro lugar, reconhecer o fenómeno e, em segundo lugar, processar os
traficantes e repatriar as vítimas.

Migração de trabalho voluntário temporário

A terceira grande mudança criando os padrões modernos de migração têm sido o


aumento da força de trabalho temporária em larga escala com deslocalizações das
economias menos desenvolvidas para as mais desenvolvidas. Isso é frequentemente
conhecido como migração "circular" realizada por "trabalhadores convidados". Os fluxos

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6.AS MIGRAÇÕES

internacionais deste tipo tornaram-se consideráveis no contexto moderno de


globalização e sistemas de transporte de alta velocidade.

As mesmas condições que atraíram a imigração voluntária para a Europa e América do


Norte (ou seja, uma força de trabalho em envelhecimento e prosperidade relativa),
quando combinadas com as restrições de imigração, incentivam a importação de
migrantes estrangeiros com estatuto não permanente, trabalhador convidado ou
indocumentado para atender às necessidades da força de trabalho.

Os fluxos de migração para esses países de regiões menos desenvolvidas incluem


migrações de mão-de-obra temporária substanciais. Nos países ricos em petróleo do
Golfo, grandes percentagens da população são compostas por imigrantes trabalhadores
convidados. Em alguns desses países, como Kuwait, Catar e Emirados Árabes Unidos, os
imigrantes são uma maioria.

As primeiras ondas de imigrantes foram recrutadas principalmente de países mais pobres


do Médio Oriente, como Palestina, Iêmen e Jordânia, mas a maioria dos trabalhadores
temporários nos estados do Golfo hoje é recrutada na Ásia (Kapiszewski, 2006).

Duas correntes de migração da Ásia consistem substancialmente em migrações de mão-


de-obra temporária. O primeiro desses fluxos foi do Centro-Sul da Ásia (por exemplo,
Bangladesh, Índia, Paquistão e Sri Lanka) para outros países asiáticos e no exterior para
o Médio Oriente e Oceânia. Outro grande fluxo de migração é o do sudeste asiático (por
exemplo, Indonésia, Filipinas e Tailândia) e leste da Ásia (por exemplo, China e Coreia)
para a Ásia ocidental e no exterior.

Nem todos os fluxos de migração da força de trabalho são migrações temporárias e


mesmo aquelas que começam como temporárias na intenção podem não permanecer
assim. Esses fluxos de migração são, no entanto, uma parte importante dos padrões
modernos de migração. Podem representar problemas tanto para os países de
acolhimento quanto para os imigrantes devido à ambiguidade de seu estatuto
temporário.

Migração irregular

Os migrantes internacionais são frequentemente classificados como legais ou ilegais,


autorizados ou não autorizados e sem documentos. Um imigrante não autorizado é um
migrante internacional que imigra para um país de acolhimento “através de canais
irregulares ou extralegais” e não foi admitido pelo país de acolhimento para residência
permanente “e não está num conjunto de estatutos temporários autorizados específicos
que permitem residência de longo prazo e trabalhar.” (Poston & Bouvier, 2017, p. 260).

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6.AS MIGRAÇÕES

Um migrante internacional não é autorizado quando 1) a pessoa entra ilegalmente sem


inspeção; ou 2) o migrante ultrapassa o limite de tempo de um visto temporário de não-
imigrante obtido legalmente. Em relação ao volume de imigrantes não autorizados em
todo o mundo, a Organização Internacional para as Migrações estima o número entre
30 e 35 milhões de pessoas, constituindo cerca de 15 por cento ou mais do número total
estimado a 232 milhões de migrantes internacionais. A maioria dos imigrantes não
autorizados vem de países em desenvolvimento e tende a ir para certos países que
servem como imãs para imigrantes não autorizados. Na África, a África do Sul pós-
apartheid tornou-se o principal destino de imigrantes não autorizados de outros países
africanos. Na Ásia, a maioria dos fluxos de imigrantes não autorizados vai para o Japão,
Coreia do Sul e Malásia. Na Europa, os principais países de destino costumavam ser o
Reino Unido, Alemanha, França, Bélgica, Holanda e Suíça, mas na década de 1990, esses
países introduziram leis de imigração rígidas. Os fluxos de imigrantes não autorizados
então deslocaram-se para o Sul, para a Itália, Espanha e Portugal (Poston & Bouvier,
2017).

6.5. IMPACTOS DA MIGRAÇÃO

6.5.1. Impacto no tamanho, composição da população e nas taxas de


crescimento

Passemos do estudo da migração internacional como um processo populacional para o


estudo do impacto desse processo no tamanho e na composição da população. São esses
resultados líquidos, e não os movimentos em si, que causam mais preocupação,
especialmente nos países de destino.

Podemos ver que as regiões menos desenvolvidas perderam migrantes e que as regiões
mais desenvolvidas ganharam os mesmos migrantes. A Ásia teve a maior migração
líquida negativa, com a maioria das outras perdas líquidas de migração provenientes da
África, América Latina e Caribe. A Europa e a América do Norte (EUA e Canadá) foram
as regiões com maior ganho líquido de migrantes.

A figura 10 permite avaliar aproximadamente o impacto da migração líquida nas


populações da região de destino durante o período moderno. Especificamente, informa
as percentagens de populações regionais que eram estrangeiras nascidas em 1965 e em
2010 e o aumento (ou diminuição) entre esses dois anos.

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6.AS MIGRAÇÕES

Figura 10- Percentagens de populações migrantes nascidas em 1965 e em 2010 nas


diversas regiões do mundo

Fonte: Lundquist, Anderton, Yaiukey, 2015, p. 343, table 9-2

As regiões mais desenvolvidas têm uma proporção maior de estrangeiros nascidos do


que as menos desenvolvidas, e a lacuna aumentou com o período moderno. O impacto
da migração líquida num país ou região é influenciado não apenas pelo número líquido
de migrantes que ele recebe, mas também pelo tamanho da população residente
recetora. A Oceânia (dominada pela Austrália-Nova Zelândia) dramatiza esse ponto.

A migração internacional aumenta o tamanho e a taxa de crescimento da população no


país de destino e diminui no país de origem. É óbvio que a migração líquida de uma
população para outra diminuiria a população de origem no mesmo número absoluto que
aumentaria a população de destino.

Menos óbvio, o grau de impacto na taxa de crescimento das duas populações não seria
o mesmo. Esse impacto depende do tamanho da população migrante líquida em relação
ao tamanho da população residente. A migração líquida de uma pequena para uma
grande população, por exemplo, causaria uma diminuição maior na taxa de crescimento
da pequena população de origem do que um aumento na taxa de crescimento da maior
população de destino.

Uma pequena cidade, por exemplo, pode ter a sua população devastada enviando a
maioria de seus ex-habitantes para uma cidade grande e mais desenvolvida, enquanto
os habitantes dessa cidade dificilmente sentirão o acréscimo. Inversamente, uma
determinada cidade de destino pode sentir-se oprimida pelo seu crescimento se tornar
o destino exclusivo de um fluxo de migrantes (o que é frequentemente o caso).

Os efeitos indiretos da migração também podem alterar as taxas de crescimento.


Separações, custos de migração e especialmente a seletividade por idade podem alterar
as taxas de fecundidade, nupcialidade e mortalidade nas populações de origem e

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6.AS MIGRAÇÕES

destino. Níveis mais altos de fecundidade migrante também operam indiretamente para
aumentar as taxas de crescimento nos países de destino.

6.5.2 Impacto na Força de Trabalho e na economia

De preocupação mais imediata tem sido o impacto sobre a composição da população,


especialmente nos países recetores. Um foco dessa preocupação é o efeito das
mudanças na composição da força de trabalho. Os efeitos da migração internacional
sobre a força de trabalho não são simples.

Teoricamente, a imigração de países menos desenvolvidos para países mais


desenvolvidos seleciona explicitamente os jovens adultos. Como os países mais
desenvolvidos têm populações residentes mais velhas, eles ganham o benefício de um
aumento necessário na sua força de trabalho jovem. Em contraste, os países menos
desenvolvidos têm populações muito jovens e a remoção de adultos em idade produtiva
tornaria ainda piores as taxas de dependência de idade já altas. Em geral, os países mais
desenvolvidos de destino beneficiam da seletividade por idade da migração, enquanto
os países menos desenvolvidos sofrem.

A imigração internacional também geralmente favorece os adultos empregáveis que são


necessários nos países de destino. Dependendo do fluxo de migração, pode favorecer
mão de obra altamente qualificada ou mão de obra menos qualificada.

Teoricamente a migração internacional de trabalhadores beneficia as economias dos


países de destino, mas há um grande debate sobre como e em que medida as economias
de destino beneficiam dessa imigração.

O impacto da seletividade de qualificações na força de trabalho dos países de origem é


igualmente complexo. Teoricamente, as economias de origem ganhariam com a
emigração; poderia, por exemplo, aumentar a procura por trabalhadores que
permanecem na força de trabalho dos países menos desenvolvidos e, portanto, as suas
taxas de emprego e níveis salariais. No entanto, aqueles com maior probabilidade de
emigrar são os mais qualificados.

A perda de indivíduos com maior escolaridade para a migração (chamada “fuga de


cérebros”) é motivo de preocupação para muitos países. O impacto de tal dreno seria
maior nas regiões que já enfrentam escassez de trabalhadores altamente qualificados e
economias estagnadas. Estudos, entretanto, mostraram que os benefícios da emigração
de mão de obra qualificada podem trazer mais benefícios do que negativos para as
sociedades de envio (Clemens, 2009). A chave é desenvolver programas e
infraestruturas que facilitem a migração de retorno ou o investimento sustentado pelas
comunidades da diáspora emigrantes, de modo que possam usar as suas habilidades e

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6.AS MIGRAÇÕES

experiências de trabalho como um “ganho intelectual” para os seus países de origem


(UNCTAD, 2012).

Embora seja provável que a emigração selecione os mais empregáveis de um país de


origem, esses migrantes “selecionados positivamente” ainda podem sofrer em
comparação com a força de trabalho residente no país de destino. Na verdade, a teoria
das economias duais sugere que os imigrantes tendem a estar entre os trabalhadores
menos qualificados, menos educados e com salários mais baixos no país de destino. Os
salários dos trabalhadores migrantes, por exemplo, são apenas cerca de três quartos
dos da população nativa na Alemanha e nos Estados Unidos, e menos da metade dos da
população nativa que trabalha em muitas das mesmas indústrias na Coreia do Sul
(Duleep e Dowhan, 2008; Nações Unidas, 1998a).

A migração contribui para o desenvolvimento global. Por causa das estratégias de


migração familiar, muitos trabalhadores no exterior enviam remessas (rendimentos)
para as suas famílias, o que reduz a pobreza, tendo efeitos multiplicadores na economia
nacional, fornecendo uma importante fonte de divisas. O fluxo de capital envolvido não
deve ser subestimado. Em 2012, por exemplo, as remessas para os países menos
desenvolvidos totalizaram US $ 406 bilhões, excedendo em muito o que muitos desses
países recebem em assistência ao desenvolvimento ou investimento estrangeiro (UNFPA,
2013; Martin e Widgren, 2002). Esses valores estão subestimados porque dependem de
relatórios oficiais de bancos e outras instituições financeiras, mas não de transferências
informais feitas diretamente por migrantes. Embora as mulheres imigrantes tendam a
ganhar menos do que os homens, elas enviam para casa uma proporção maior de seus
salários para membros da família (UNFPA, 2013). Para alguns países, as remessas de
imigrantes representam uma parte importante do produto interno bruto. Por exemplo,
as remessas enviadas de volta para o Haiti, Samoa, Libéria, Moldávia, Tajiquistão,
Ruanda e Nepal representaram mais de 20% do PIB de cada país em 2012 (UNCTAD,
2012).

Os fluxos de remessas não são um simples caso de troca económica de países mais
desenvolvidos para países menos desenvolvidos. Como a maioria dos imigrantes
internacionais se muda para países vizinhos nas suas regiões, e não para os países mais
desenvolvidos, a maioria das remessas são de países menos desenvolvidos ligeiramente
mais ricos para outros países menos desenvolvidos. Os países que dependem fortemente
dessas remessas tornam-se vulneráveis a mudanças nas condições de emprego e / ou
políticas de imigração no país de destino. Além disso, a privação relativa e a desigualdade
social na comunidade de origem podem ser ampliadas pelo acesso desigual às remessas.
Em suma, os efeitos da migração sobre a força de trabalho são mistos. Em geral, as
economias dos países mais desenvolvidos de destino beneficiam da imigração líquida,

120
© Universidade Aberta
6.AS MIGRAÇÕES

embora alguns segmentos de suas populações, especialmente os novos imigrantes,


podem sofrer; e, em geral, as economias de origem dos países menos desenvolvidos
ganham com as remessas do exterior, mas podem sofrer com a perda imediata de
trabalhadores qualificados, especialmente nas áreas de saúde. Um quadro tão complexo
não leva facilmente à formulação das políticas de migração (Lundquist, Anderton,
Yaukey, 2015).

Os argumentos económicos sobre os custos e benefícios da migração internacional são


extensos, complexos e diversos.

Existem duas perspetivas básicas sobre a migração internacional: uma positiva e aberta
e outra negativa e fechada.

Organizações e organismos como a Igreja Católica e o Banco Mundial defendem uma


migração internacional mais ampla e mais livre porque “as pessoas não devem ser
confinadas aos seus países de origem por fronteiras nacionais, e que mais migração
aceleraria o crescimento económico e o desenvolvimento tanto nos países emissores
como nos países recetores" (p.358).

Uma posição oposta é defendida por muitas organizações, defendendo a redução no


número de imigrantes internacionais. A maioria das análises na Europa Ocidental e nos
Estados Unidos mostra muito claramente que o impacto da imigração sobre empregos e
salários é fraco ou inexistente. Os imigrantes muitas vezes acabam nos “trabalhos sujos,
difíceis e perigosos (ou degradantes) ... evitados pelos trabalhadores locais”. As
evidências mostram pouca competição nestes tipos de empregos entre imigrantes e
residentes locais. Os imigrantes são frequentemente os primeiros a serem demitidos e
também “ganham menos do que os trabalhadores locais em empregos semelhantes”.
Algumas pesquisas mostram como a imigração pode ter um impacto negativo no
mercado de trabalho. Essa seria a situação em indústrias ou áreas geográficas com
grande concentração de trabalhadores estrangeiros; às vezes, isso resulta em “pressão
sobre os empregos e as condições de trabalho da força de trabalho local” (p. 358). Em
relação aos salários, alguns acreditam que mesmo que os imigrantes não aceitem
empregos de trabalhadores locais, os salários seriam diminuídos. A pesquisa de vários
estudos nos EUA e na Europa é mista, com a maioria indicando pouco ou nenhum
impacto negativo sobre os salários locais.

Aqueles que mostram efeitos negativos da imigração sobre os salários relatam um efeito
muito pequeno, da ordem de –0,3% a –0,8 %. Algumas análises mostram que a
presença de imigrantes tende a aumentar os salários locais, especialmente os dos mais
qualificados.

121
© Universidade Aberta
6.AS MIGRAÇÕES

Há um ganho económico real para muitos países ao admitir trabalhadores qualificados.


De todos os países desenvolvidos, os Estados Unidos foram os que mais ganharam no
que diz respeito à atração de imigrantes qualificados. Em 2000, os Estados Unidos
admitiram mais de 10,5 milhões de imigrantes altamente qualificados, enquanto perdiam
pouco mais de 431 mil graduados para outros países, com um ganho líquido de 10
milhões. Os imigrantes de países em desenvolvimento para os Estados Unidos têm quase
o dobro da educação do que os seus conterrâneos que permanecem no seu país.

Milhões de migrantes que vivem fora de seus países de nascimento enviam bilhões de
dólares para as suas casas a cada ano. O valor total das remessas em todo o mundo
aumentou de pouco menos de US $ 200 bilhões em 2000 para US $ 511 bilhões em
2013. Essas remessas são indispensáveis para a sobrevivência económica de muitos
países em desenvolvimento. Ajudam a levantar o capital de investimento, desenvolver
negócios e reduzir a pobreza (Poston & Bouvier, 2017).

6.5.3 Impacto na composição social

É difícil rever os debates populares passados e presentes dos países mais desenvolvidos
sobre as políticas de imigração sem suspeitar que eles são fortemente motivados pela
xenofobia. Esse medo de estrangeiros etnicamente distintos resultou em muitos grupos
de migrantes sendo vistos como “problemas” pelas populações nos países de destino, e
racionalizados com estereótipos étnicos negativos nos debates políticos. Na verdade,
quase todos os grupos de imigrantes com qualquer diferença identificável da população
anfitriã foram discriminados nas políticas de migração, diferindo principalmente em grau.
As políticas de imigração e os debates nacionais têm, por sua vez, perpetuado e
solidificado atitudes discriminatórias em relação aos imigrantes. Os migrantes são
caracterizados em várias ocasiões, por exemplo, como um perigo para a saúde pública,
uma ameaça à segurança do emprego, um esgotamento dos sistemas de previdência
social, como criminosos e terroristas e uma ameaça aos grupos ou culturas dominantes
do país de acolhimento. Esses sentimentos em relação aos migrantes têm maior
probabilidade de afetar a política de migração.

Em vários momentos da história, algumas preocupações discriminatórias com a


composição dos fluxos de migrantes eram claramente plausíveis. Um exemplo histórico
é a quarentena de migrantes. Quarentenas de países específicos com doenças
endémicas generalizadas, por exemplo, foram justificáveis, mesmo que discriminatórias,
em alguns casos anteriores. Se o surto de Ébola tivesse sido acompanhado por fluxos
de migrantes dos países afetados, as sociedades recetoras teriam estabelecido
quarentenas ou mesmo proibições temporárias de migração. No entanto, em outros

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6.AS MIGRAÇÕES

casos, o mesmo motivo foi usado para deter migrantes sem evidências plausíveis de
uma ameaça à saúde pública.

Também é importante reconhecer que a qualquer momento a visão dos migrantes como
um “problema social” pode ser genuína para alguns e uma desculpa para a discriminação
de outros. Por exemplo, o temor de que a importação de mão de obra estrangeira resulte
em queda de salários para ocupações de baixa qualificação no país anfitrião é uma
crença comum entre muitos - uma preocupação genuína para alguns e uma desculpa
para discriminar outros.

6.6 ANÁLISE DOS MOVIMENTOS MIGRATÓRIOS

Analisámos em capítulos anteriores as duas variáveis micro demográficas responsáveis


pelo movimento natural da população. Os movimentos migratórios são de natureza
diferente.

Em primeiro lugar, abrangem três situações distintas: a emigração, a imigração e as


migrações internas.

Em segundo lugar, as suas variações no tempo e no espaço dependem de fatores sócio-


económicos complexos internos e externos.

Os movimentos migratórios não respeitam tendências, é difícil de controlar.

Comecemos por ver quais são as fontes de dados. Na verdade, mesmo a fonte mais
confiável de dados de imigração sofre de muitos desafios.

As Fontes de dados

As estimativas de migração interna e internacional geralmente vêm de quatro fontes


principais, e o peso colocado nessas fontes de dados difere entre o estudo da migração
interna e internacional: (1) registros administrativos, (2) inferências feitas de residências
passadas e presentes, conforme relatado em censos ou pesquisas, (3) pesquisas que
visam especificamente os imigrantes, e (4) estimativas de migração feitas a partir do
conhecimento de crescimento e os outros componentes do crescimento (Henning e
Hovy, 2011; Zlotnik et al., 2010; Santo Tomas et al., 2009; Nações Unidas, 1998a).

Registros Administrativos

Fontes administrativas de dados de migração incluem registros populacionais, registros


de estrangeiros, pedidos (para vistos, residência e autorizações de trabalho), autorização
de saída, estatísticas de controle de fronteira e registos e qualquer outra fonte de

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6.AS MIGRAÇÕES

informação gerada pelo processamento burocrático de mudanças. Dados administrativos


geralmente estão disponíveis para migrações internacionais, embora o número de países
que publicam dados administrativos relevantes ainda seja limitado. Além disso, não são
projetados principalmente para coletar informações sobre migração e são de uso limitado
para esse propósito e, como diferentes agências burocráticas estão envolvidas no
processo de coleta de dados, a comparabilidade dos dados administrativos é bastante
questionável (Zlotnik et al., 2010; Nações Unidas, 1998a).

Na ausência de dados sobre partidas, não se pode estimar o tamanho da imigração com
precisão dentro de um país, mas à medida que mais países divulgam registros
administrativos para agências de dados internacionais, a comparação dos registros do
país de origem e do país de destino pode tornar-se possível (Santo Tomas et al., 2009).
Por exemplo, o Escritório Internacional do Trabalho (OIT) coleta dados sobre a admissão
de trabalhadores migrantes, e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Económico (OCDE) tem compilado dados sobre autorizações de residência emitidas nos
estados membros. O Escritório do Alto Comissariado para Refugiados (ACNUR) também
coleta informações sobre refugiados com base nos registros administrativos dos países
de asilo (Zlotnik et al., 2010).

Registos de passagens de fronteira

Um tipo de registo administrativo especialmente útil é o registo de passagens de


fronteira. Uma maneira de rastrear um processo demográfico - seja mortalidade,
fecundidade ou migração - é registar os eventos que constituem o processo à medida
que ocorrem. Os dados recolhidos nas passagens de fronteira ocorrem no momento dos
movimentos e têm a vantagem de serem recolhidos com frequência tanto para
estrangeiros como para cidadãos. Lamentavelmente, a maioria das estatísticas de
fronteira fornece dados não confiáveis sobre a migração internacional.

Um problema é que as duas nações envolvidas - a de origem e a de destino - podem


diferir nos seus registos. As nações tendem a preocupar-se mais com informações
detalhadas sobre as pessoas que se juntam a elas (imigrantes) do que com as pessoas
que estão de partida (emigrantes). Além disso, as decisões sobre como determinar a
residência e quais características dos transportadores são importantes para registar e
variam de país para país. O resultado é que os dois países envolvidos em qualquer fluxo
de migração têm probabilidade de registá-lo de forma diferente. Isso dificulta a
combinação dos seus dados para estimar a migração líquida.

Outra categoria de problemas é logística. O simples registo de todas as passagens de


fronteira que mais tarde podem vir a ser migrações pode ser uma tarefa difícil. É mais

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6.AS MIGRAÇÕES

fácil para nações cujas portas de entrada e saída são limitadas, como ilhas. No outro
extremo, alguns países têm longas fronteiras terrestres que normalmente não são
totalmente patrulhadas, como as fronteiras norte e sul dos Estados Unidos. E,
finalmente, as fronteiras das unidades políticas dentro da nação geralmente são
relativamente sem importância, de modo que as nações raramente monitoram a
travessia de fronteiras internas como fazem com as externas.

Perguntas retrospetivas do censo

A maioria dos governos depende de pesquisas domiciliares, na forma de censos e


pesquisas, para estimar a migração. Entre 2005 e 2010, 78 países realizaram um censo
populacional, e 59 deles coletaram informações sobre país de nascimento, país de
cidadania, ano de chegada ou uma combinação dessas questões (Zlotnik et al., 2010).

A medição indireta da migração a partir dos dados do censo, até agora, tem sido os
dados mais comparáveis sobre a migração internacional (Zlotnik et al., 2010). Como
esses métodos identificam os migrantes, mas não o momento exato da migração, eles
são mais úteis para medir o tamanho do volume de migrantes internacionais de uma
população do que para medir o fluxo de migração.

O método é particularmente limitado para medir a emigração, exigindo um procedimento


complexo de comparar censos ao longo do tempo para identificar aqueles que partiram
e aqueles com registros de óbitos para identificar as pessoas perdidas na emigração e
não na morte.

Se os censos nacionais fizerem perguntas semelhantes sobre o local de nascimento ou


residência anterior para áreas geográficas mais detalhadas dentro do país, a migração
interna pode ser estimada.

Há vantagens em fazer perguntas sobre o local de residência anterior (em vez do local
de nascimento): o período mais curto entre os dados da residência anterior e a data do
censo significa que menos mudanças intervenientes não serão registadas. Além disso, o
tempo daqueles que são registados é delimitado de forma mais restrita e as migrações
recentes são frequentemente de maior interesse. A desvantagem é que os dados se
referem a um período de calendário muito limitado.

Inquéritos por sondagem

Como os inquéritos por amostragem são menos caros do que os censos, podem ser
usados para investigar mais profundamente as migrações do seu menor número de
entrevistados. Por outro lado, têm a fragilidade de não fornecer informações sobre todas

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6.AS MIGRAÇÕES

as áreas locais, apenas aquelas que estão incluídas na amostra. O equilíbrio ideal parece
ser incluir tantas perguntas quantas puderem ser oferecidas em censos decenais ou
grandes amostras nacionais, e então complementá-las com pesquisas periódicas e mais
intensivas. Inquéritos de migração retrospetivos intensivos tentam registar toda a
sequência de mudanças ao longo da vida dos respondentes, as áreas de origem e
destino, o momento da migração e eventos relacionados com o curso de vida que podem
revelar os determinantes ou consequências das migrações. Alternativamente, inquéritos
repetidos, que seguem uma coorte ao longo do tempo (por exemplo, as Pesquisas
Longitudinais Nacionais), podem rastrear a história da migração de indivíduos conforme
ela se desenrola.

Globalmente, o Projeto de Migração da África do Banco Mundial tem coletado dados


sobre migração internacional e remessas, e a OIT tem ajudado os governos a coletar
dados sobre o trabalho de migrantes. A União Europeia tem pesquisas de rotina que
coletam o comportamento da força de trabalho de migrantes internacionais e tem
publicado dados por meio do sistema Eurostat. Outras pesquisas exclusivas, como o
MMP e o LAMP, produzem informações valiosas sobre os migrantes por meio de
pesquisas domiciliares especializadas e entrevistas aprofundadas nos países de origem
e de destino.

Embora essas pesquisas especializadas forneçam dados detalhados valiosos sobre a


imigração, elas também enfrentam muitos desafios exatamente porque são
especializadas. Frequentemente, pesquisadores ou instituições específicas realizam
essas pesquisas com base em prioridades e motivos diferentes, de modo que podem
adotar definições diferentes de migração e fazer perguntas específicas que não são
comparáveis a outras. Elas também são conduzidas numa base ad-hoc devido a
orçamentos limitados. Além disso, por serem especializados, nem todos os dados estão
disponíveis para uso público (Zlotnik et al., 2010).

Imigração Indocumentada

As fontes de dados discutidas até agora não são completamente satisfatórias para medir
até mesmo a migração documentada, então pode-se imaginar como é difícil estimar a
migração não documentada, onde o migrante geralmente tem a intenção de permanecer
incontável.

O método de estimativa mais comum para contar a imigração indocumentada é o método


residual. O procedimento conta toda a população estrangeira documentada (cidadãos
naturalizados, residentes legais permanentes, refugiados e residentes legais
temporários) e subtrai esse resultado do total da população estrangeira contada no

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© Universidade Aberta
6.AS MIGRAÇÕES

censo. A população residual restante é a população imigrante sem documentos (Passel


e Cohn, 2011). O USCIS afia ainda mais essa estimativa usando registros administrativos
de imigrantes que entraram legalmente, mas ultrapassaram o período permitido de
visita, mortalidade entre imigrantes sem documentos e assim por diante. Os dados de
passagem de fronteira são usados para identificar visitas não concluídas nas partidas
subsequentes. Censos e pesquisas de população atual são usados para ajustar
populações nascidas no exterior para subestimar. Procedimentos mais complexos são
usados para estimar as partidas, ou emigração, de populações indocumentadas que
chegam. Embora a integração dessas fontes de dados e métodos de estimativa permita
um erro considerável, as últimas estimativas dos EUA variaram de 10,7 a 13,9 milhões,
dependendo das suposições feitas (Hoefer et al., 2012).

Poucos países investiram tanto esforço na estimativa dos fluxos de migração


indocumentada quanto os Estados Unidos. No entanto, todos os países usam os mesmos
tipos básicos de dados para estimar as tendências de migração e fazem alguns esforços
para monitorar as migrações não documentadas de outra forma (Lundquist, Anderton,
Yaukey, 2015).

Estimativa de crescimento entre censos

Se um país tem censos repetitivos e contagens ou estimativas contínuas de mortalidade


e fecundidade, ele pode usá-los para deduzir a migração líquida. Como essa estratégia
não envolve a contagem real dos movimentos conforme eles acontecem, ou mesmo
inferir movimentos específicos de mudanças na residência relatada, essas técnicas foram
chamadas de indiretas ou residuais. Uma técnica é o método de estatística vital, baseado
na equação de crescimento (mais à frente ver a equação de concordância):

P1-PO = (N-O) + M

Para estimar a migração líquida, a equação pode ser convertida para


M = (P2 –P1)–(N–O)

Ou seja: A migração líquida entre censos (M) é igual ao crescimento total entre os censos
(P2 - P1) menos o aumento natural entre os censos (N - O). Uma vez que a maioria dos
países está relativamente confiante nos seus totais de censo e desenvolveu métodos
para fazer pelo menos estimativas aproximadas de seu total de mortes e nascimentos,
este método é geralmente considerado o mais confiável para medir a migração líquida
(Bogue, 1993).

Além de ser limitado à migração líquida, o método de estatísticas vitais também pode
ser impreciso. Os censos erram e as estimativas de fecundidade e mortalidade podem

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© Universidade Aberta
6.AS MIGRAÇÕES

ser aproximadas. Além disso, uma vez que a componente de migração na equação é
geralmente pequena em comparação com aqueles de crescimento e aumento natural,
mesmo um pequeno erro absoluto nesses outros componentes pode resultar numa
grande estimativa errônea da migração líquida (Bogue, 1993).

Exatidão à parte, os métodos indiretos são limitados na abrangência das informações


que fornecem. Eles estimam a migração líquida, mas não descrevem fluxos de migração,
a menos que complementados com outros dados. Eles não identificam automaticamente
a composição da população migrante líquida residual, a menos que sejam aplicados aos
dados de nascimento, óbito e população disponíveis separadamente para cada um
desses grupos. No entanto, no mundo “imperfeito” das estatísticas de migração, eles
desempenham um papel importante.

Exemplo: Observe a tabela seguinte:

Figura 11 - Aplicação do método de estatísticas vitais para estimar a migração líquida


para as regiões do mundo durante o ano anterior a 2015

Fonte: Lundquist, Anderton, Yaiukey, 2015, p. 325, table 9-12

A figura 11 ilustra a aplicação do método de estatísticas vitais para estimar a


migração líquida para as regiões do mundo durante o ano anterior a 2015.

A coluna 1 da tabela mostra a população no final do período. As colunas 2 e 3 registam


estimativas de nascimentos e mortes no ano anterior (usando as médias anuais dos
cinco anos de 2010-2015). A coluna 4 é o aumento natural resultante do excesso de
nascimentos sobre as mortes, obtido subtraindo a coluna 3 da coluna 2. O crescimento
da população na coluna 5 é a diferença entre a população de 2015 e a população do
ano anterior (estimado subtraindo a média crescimento anual nos cinco anos anteriores).

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6.AS MIGRAÇÕES

Subtraindo o aumento natural, na coluna 4, do crescimento total, na coluna 5, observa-


se uma mudança residual que se deve à migração líquida - coluna 6.

Podemos observar que as regiões menos desenvolvidas perderam migrantes (ou seja,
tiveram uma migração líquida negativa) em direção às regiões mais desenvolvidas. A
Ásia teve a maior migração líquida negativa, em números absolutos; a África teve a
menor. A Europa e a América do Norte foram as regiões com o maior ganho líquido de
migrantes, com menos deslocações para a Oceânia.

Métodos de análise dos movimentos migratórios

Se a população só evoluísse com os que nascem e os que morrem, a evolução seria mais
lenta.

O saldo natural ou dinâmica natural, é um indicador da taxa de crescimento que só entra


em consideração com estas duas variáveis.

A Dinâmica populacional: considerando também os movimentos migratórios, temos


a dinâmica total (dinâmica natural + dinâmica migratória), e a taxa de crescimento anual
média total/global.

As taxas de crescimento: Taxa de Crescimento Anual Média = Taxa de crescimento


Anual Média Natural (saldo natural) + Taxa de crescimento Anual Média Migratória (saldo
migratório)

O saldo migratório é a diferença entre as saídas – emigração e as entradas – imigração.


Se a diferença for de 0, pode significar que saiu muita gente, mas também entrou muita
gente.

Taxa de crescimento anual média total = log Pn = n log (1+ a)

P0

Taxa de crescimento anual média natural = log P0 + N-O = n log (1+ a)

P0

Se for uma década, n = 10.

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6.AS MIGRAÇÕES

Multiplicamos “a” por 100, e lê-se “ Por ano a população se apenas tivesse sido fruto
nessa década desta situação, teria aumentado ou diminuído x.”

• Taxa de crescimento migratória (Imigração - Emigração):

log P0 + I-E = nlog (1+ a)

P0

• Taxa de crescimento anual média total = Taxa de crescimento anual média


natural + Taxa de crescimento migratória

• Taxa de crescimento anual média total – Taxa de crescimento anual média


natural = Taxa de crescimento migratória

Os Métodos diretos de análise dos movimentos migratórios

São os que utilizam diretamente os dados disponíveis. São as taxas brutas.

Taxa Bruta de Emigração = Emigrantes/ população * 1000

Taxa Bruta de Imigração = Imigrantes/ população * 1000

Taxa Bruta de Migração Total= [(Emigrantes + Imigrantes) / população] * 1000

O problema do estudo dos movimentos migratórios são os dados estatísticos que são
muito incompletos. A informação que existe ao nível das migrações internas é muito
pobre e há falta de registos oficiais. Por vezes recorre-se a métodos indiretos (por
exemplo através dos recenseamentos eleitorais). Ao nível interno, existem muitas
assimetrias num mesmo espaço, e dicotomias entre os meios (rural/urbano). As pessoas
não se deslocam ao acaso: procuram trabalho num espaço específico.

Ao nível das migrações externas, por exemplo na década de 80, 50 % dos emigrantes
eram clandestinos. Há falta de um maior controle legal e muita gente escapa a esse
controle. Por vezes existe um choque de povos e culturas. Na década de 90 o governo
português restringiu a imigração.

Os métodos indiretos de análise dos movimentos migratórios

Os métodos indiretos, servem para estimar a intensidade e a direção dos movimentos


migratórios que não são possíveis medir diretamente. O mais conhecido trata-se do
método da equação de concordância.

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6.AS MIGRAÇÕES

A equação de concordância

Vejamos a lógica deste instrumento de análise:

Px + n= Px+ N- O + I –E

Px+n - Px= N-O+I-E

Px+n = Px + Crescimento Natural + Crescimento Migratório

Px+n- Px=N-O+I-E

Exemplo:
Px = 276 895
Px+n =205 197
Px+n- Px=71698
N 60/70= 41 053
O 60/70= 25 760
N 60/70 – O 60/70 = + 15 293
Saldos Migratórios = - 86 991
Emigrantes Oficiais = 9 009
Imigrantes Oficiais = 18
I-E Oficiais = - 8 991

PX+n = Px + (N-O) + (I-E), onde (N-O) é o saldo natural e (I-E) o saldo migratório.

205197=276895+15293+ (-8991)

(PX+n - Px) - (N-O) = (I-E) = Saldo migratório total

(205197-276895)-15293= -8991

-71698-15293= -8991

-86991=-8991…+(-78000) - diferença inexplicada que remete potencialmente para os


movimentos migratórios - partindo do principio que os recenseamentos são de qualidade
razoável e que os dados sobre os nascimentos e os óbitos são fidedignos.

-86991+8991= -78000

O resultado desta equação remete para o caso de um país de emigração onde poderá
ter havido alguns milhares de emigrantes que saíram clandestinamente. Estamos
perante uma situação de mau registo dos emigrantes.

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6.AS MIGRAÇÕES

6.7 PROBLEMAS E POLÍTICAS DE MIGRAÇÃO

As consequências da migração são sentidas tanto por migrantes individuais quanto pelas
coletividades sociais (por exemplo, estados-nação) de onde saem e ingressam. Ao nível
individual, a maioria das teorias de migração sugere que, em última análise,
esperaríamos um efeito positivo para os imigrantes e empregadores que os contratam.
Essa, supostamente, era a expetativa dos migrantes individuais, pelo menos na migração
livre. No entanto, os problemas populacionais e as políticas geralmente são definidos
num nível coletivo.

Quais são os efeitos coletivos da migração nas populações de origem e destino?

Obviamente, a movimentação do número de pessoas pode afetar diretamente o


tamanho e as taxas de crescimento das populações de origem e de destino. A migração
também pode alterar o tamanho e a composição da força de trabalho em ambos os
países. Uma troca de moradores entre as populações também altera a composição social
e cultural de cada uma.

Embora a imigração internacional seja geralmente vista como algo positivo tanto para
as nações emissoras quanto para as recetoras, um número crescente de países vê pelo
menos algumas consequências da imigração e da emigração como problemas
significativos (Nações Unidas, 2013a). Isso é notável numa tendência crescente dos
países de intervir politicamente nos fluxos de imigração e emigração; ou seja, uma
disposição em declínio de deixar a migração sem controle.

A Figura 12 mostra a percentagem de países intervindo para aumentar ou diminuir os


seus níveis de imigração em 1976 e em 2011 (não são mostradas as percentagens sem
políticas de imigração ou que têm políticas para manter os níveis atuais).

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6.AS MIGRAÇÕES

Figura 12- Percentagem intervindo para aumentar ou diminuir seus níveis de


imigração em 1976 e em 2011

Fonte: Lundquist, Anderton, Yaiukey, 2015, p. 356, figure 9-8

No lado esquerdo da figura estão as percentagens de países que adotaram políticas para
aumentar a imigração e no lado direito estão as percentagens com políticas para reduzir
os níveis de imigração no seu país. Em 1976, quando as Nações Unidas começaram a
monitorar as políticas dos governos sobre o nível de imigração, os países desenvolvidos
estavam mais aptos a ter políticas para desencorajar a imigração, enquanto os países
em desenvolvimento tinham políticas em vigor para encorajar a imigração. Em 2011,
esse padrão mudou.

Hoje, uma proporção maior de regiões mais desenvolvidas (MDRs) do que de regiões
menos desenvolvidas (LDRs) tem políticas de imigração destinadas a aumentar a
imigração, não diminuí-la. Por outro lado, mais LDRs têm políticas para diminuir a
imigração. A reversão dessa tendência ao longo do período reflete diferenças nas taxas
de crescimento de MDRs e LDRs. Os MDRs reconhecem cada vez mais a imigração como
uma forma de compensar as taxas de crescimento lento, enquanto os LDRs podem ver
menos valor na imigração, desde que as suas próprias taxas de crescimento
permaneçam altas.

A situação é um pouco diferente para a emigração, mostrada na Figura 13:

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6.AS MIGRAÇÕES

Figura 13 - Percentagem intervindo para aumentar ou diminuir seus níveis de


emigração em 1976 e em 2011

Fonte: Lundquist, Anderton, Yaiukey, 2015, p. 357, figure 9-9

A percentagem de países mais desenvolvidos com políticas intervencionistas de


emigração mudou pouco, diminuindo ligeiramente ao longo do período.

Nas regiões menos desenvolvidas, a percentagem com políticas de intervenção na


emigração mais do que duplicou, seja para aumentar ou diminuir a emigração. Alguns
PMDs podem beneficiar-se de altas taxas de emigração, especialmente se o crescimento
populacional ultrapassa a sua infraestrutura ou se eles têm um sistema de captura de
remessas bem desenvolvido. Mas noutros países, um número desproporcionalmente
grande de profissionais altamente qualificados emigram a cada ano, um fenómeno às
vezes conhecido como “fuga de cérebros” (já referido acima). Nesse caso, é mais
provável que os governos vejam a emigração como um problema que precisa de ser
reduzido. Poder-se-ia pensar que os MDRs também estariam preocupados com a
emigração, especialmente porque a perda de população pode agravar os problemas
decorrentes de suas populações já envelhecidas e taxas de crescimento lento. Mas os
MDRs tendem a preocupar-se menos do que os LDRs com a emigração, em parte porque
os seus fluxos de emigração são menores e têm um impacto insignificante.

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6.AS MIGRAÇÕES

ATIVIDADE FORMATIVA

1. Num determinado país desenvolvido, a população no período 60 /70 passou de


56 180 000 para 60 650 599 habitantes. Houve no período 1961-70, 8 936 332
nascimentos, 6 226 565 óbitos, 316 950 emigrantes e 2 043 882 imigrantes.
Calcule a Equação de Concordância.
2. Propostas para debate e reflexão:
 Qual é a diferença entre um “imigrante” e um “refugiado”?
 Liste e discuta alguns dos efeitos económicos da migração internacional.
 A migração internacional promove [ou reduz] as desigualdades económicas
entre os países.
 Os fluxos de migração internacional provavelmente continuarão a aumentar,
mesmo que o crescimento populacional nos países menos desenvolvidos
continue a diminuir.
 Nas próximas décadas, os “problemas” populacionais serão definidos cada
vez mais em torno da migração e menos em torno da fecundidade.

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES


Objetivos

 Descrever a evolução dos volumes populacionais de uma população, com base no cálculo
de medidas de variação desses volumes: taxas de variação, taxas de crescimento anual
médio e tempo de duplicação em anos;
 Descrever a evolução da estrutura etária portuguesa;
 Determinar a composição da população, segundo a idade e o sexo;
 Perceber a metodologia de construção das pirâmides de idade. Saber identifica las;
 Saber calcular as Relações de masculinidade e o seu contributo na analise demográfica;
 Saber determinar e interpretar grupos funcionais e Índices Resumo.
 Saber definir e analisar o envelhecimento demográfico

7.1. TIPOS, VOLUMES E RITMOS DE CRESCIMENTO DE UMA


POPULAÇÃO

Ao caracterizar uma população humana, pensamos inicialmente no seu tamanho:


quantas pessoas existem numa localidade, num determinado momento?

A distribuição geográfica pode ser avaliada pelo conhecimento da densidade da


população, isto é, a população por quilómetros quadrados. (Número de habitantes /
Km2).

Este valor, porém, considerado em relação ao total da área estudada, pode não traduzir
a verdadeira distribuição da população, pois esta encontra-se mais aglomerada em
certas zonas e mais dispersa noutras. Esta situação é traduzida pelo coeficiente de
localização.

Para estudar a densidade populacional é conveniente dividir o território em zonas mais


pequenas - no caso de um país, podem adotar-se as divisões administrativas, no caso
de uma cidade, podem considerar-se os bairros, etc.

A população pode ainda distribuir-se por aglomerados rurais e urbanos. A primeira reside
isolada no campo ou em pequenos núcleos. A segunda vive nas cidades ou em
povoações de certa importância populacional.

Sob o ponto de vista estatístico é necessário distinguir os aglomerados urbanos e rurais.


O centro urbano designa uma localidade, qualquer que seja a categoria legal (cidade,
vila, etc.) que, na sua área urbana demarcada pela Câmara Municipal respetiva conta
com 10 000 ou mais habitantes.

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Pensamos também sobre a sua composição: quantas pessoas maiores de 50 anos


existem? quantas são do sexo feminino? quantas são economicamente ativas? quantas
estão casadas? etc.

Uma outra questão importante que surge seria: como é que as mudanças num ou mais
destes componentes da população poderiam afetar os outros componentes?

Como abordado, como principais variáveis demográficas temos então: tamanho da


população; distribuição por sexo, idade, estado civil; distribuição segundo região
geográfica de residência atual, anterior e de nascimento; natalidade, fecundidade,
mortalidade. Como vimos, a Demografia trata, pois, dos aspetos estáticos de uma
população num determinado momento - tamanho e composição -, assim como também
da sua evolução no tempo e da Inter-relação dinâmica entre as várias variáveis
demográficas.

7.1.1. Tipos de População

Imaginemos a população de uma determinada área geográfica, num determinado


momento.

Suponhamos também que, a partir de uma população inicial num passado longínquo,
não tenha havido entrada e saída de pessoas da área. Trata-se de uma população
fechada, isto é, sem movimentos migratórios. A trajetória entre aquela população inicial
e a população atual é totalmente explicada pelas mortes e nascimentos ocorridos no
período.

Estamos, assim, perante uma população fechada quando a sua estrutura é mantida ou
alterada apenas pelos nascimentos e óbitos, isto é, não afetada por migrações
exteriores. Neste caso as modificações são de três tipos: aumento através dos
nascimentos, diminuição através dos óbitos, e envelhecimento de todos os
sobreviventes.

Se uma população fechada à migração sofre comportamentos constantes de taxas de


fecundidade e mortalidade específicas por idade, ela desenvolverá uma distribuição de
idade constante e crescerá a uma taxa constante, independentemente da distribuição
de idade inicial da mesma. Assim, os demógrafos às vezes afirmam que “populações
estáveis esquecem seu passado.” A distribuição por idade da população estável depende
de dois itens, a saber, as taxas de mortalidade específicas por idade subjacentes e a
taxa de crescimento. (Poston & Bouvier, 2017)

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Nas populações fechadas existem três tipos de modificações anuais: aumento, por meio
da natalidade, diminuição através da mortalidade e envelhecimento de um ano de todos
os sobreviventes. (Leston Bandeira, 2004)

A estas modificações, acrescem, no caso de uma População Aberta (quando está sujeita
a fenómenos migratórios): as entradas de indivíduos de diferentes idades e as saídas de
indivíduos de diferentes idades.

A população é assim de tipo Progressivo quando apresenta um número crescente de


nascimentos ano a ano.

A população será de tipo Regressivo quando apresenta um número decrescente de


nascimentos ano a ano.

Finalmente, uma população estacionária diz respeito a uma população estável em que a
taxa de natalidade é igual à taxa de mortalidade, sem mudanças no tamanho da
população, logo com uma taxa de crescimento nulo. (Nazareth, 2004)

7.1.2. As medidas do crescimento

Ao longo do tempo o número de habitantes de um determinado espaço modifica-se.

O número de pessoas que estão presentes num determinado espaço territorial define-
se como volume populacional. Uma população não tem sempre o mesmo número de
habitantes, evoluí a um determinado ritmo (que pode ser diferente consoante os
períodos):

• Se o crescimento for positivo (crescimento positivo): a população está a aumentar

• Se o crescimento for negativo (crescimento negativo): a população está a diminuir

•Se o crescimento for nulo (crescimento zero): a população mantém se idêntica.

“O jogo de entradas e saídas na população constitui o movimento de qualquer


população e o seu crescimento.” (Leston Bandeira, 2004, p 166)

A dinâmica da população está dependente de três acontecimentos relevantes:


nascimentos, óbitos e mobilidade da população. O crescimento da população tem duas
componentes: o crescimento natural e o crescimento migratório ou balança migratória.

Justamente a alteração do volume populacional é o resultado do efeito combinado destes


dois fatores: saldo natural (diferença entre nascimentos e mortes) e o saldo migratório
(diferença entre o número de pessoas que entraram e saíram do espaço territorial em
análise).

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Suponhamos uma população que num momento 0 é P0, num momento 1 é P1, num
momento 2 é P2… num momento n é Pn e que cresce a uma taxa a.

Existem essencialmente três processos para medir o ritmo de crescimento de uma


população: o contínuo, o aritmético e o geométrico.

Para o ritmo de crescimento contínuo temos:

Pn = P0 e an (e = 2,718282)

Ln (Pn/P0) = an a = (ln (Pn/P0))/ n

No caso do ritmo de crescimento aritmético temos: a = (Pn - P0) / (P0 x n)

Para o ritmo de crescimento constante ou geométrico temos:

Pn = P0(1+a) n onde a = ritmo de crescimento que é o que quero conhecer: Log(1+a)


n nLog (1+a)

Pn = P0(1+a) n

Pn/P0 = (1+a) n

Log Pn/P0 = Log (1+a) n

Log Pn/P0 = nLog (1+a)

Nota: O Log pode ser facilmente calculado na máquina de calcular, bastando acionar a
função Log.

O resultado “a” lê-se “Em média por ano cresceu x”. Se multiplicarmos a por 100, a*100,
lê-se “Por ano, por cada 100 indivíduos aumentou (ou diminuiu ou manteve-se) x, em
média anual entre P0 e P1”.

Com base no calculo do ritmo de crescimento geométrico podemos calcular a taxa de


variação e o tempo de duplicação em anos.

A taxa de variação tem a seguinte formula:

a = (Pn – P0 / P0) x 100

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Exemplo: Calculo da taxa de crescimento anual médio da população de Portugal entre


1960 e 1970, através do ritmo do crescimento aritmético e da taxa de variação.

População em Portugal

- 15/12/1960: 8 889

- 15/12/1970: 8 663

Ritmo de crescimento aritmético

a = (P1970 - P1960) / (P1960 x n)

a = (8 663 – 8 889) / (8 889 x 10)

a = - 226 / 88 890 = - 0,00254

a = - 0,25 %

Taxa de variação:

a = (Pn – P0 / P0) x 100

a = (8 663 – 8 889 / 8 889) x 100

a = (- 226 / 8 889) x 100 = - 0,02542 x 100

a = - 2,54% A dividir por 10 anos é de – 0,25%

Em Portugal, no período de 1960/70, por ano e por cada 100 pessoas, a população
diminui 0,25.

Tempo de duplicação em anos

Com base na lógica do cálculo da taxa de crescimento geométrica podemos calcular o


tempo de duplicação em anos. Se a taxa a é uma taxa de crescimento constante, ao fim
de quantos anos n duplicará a população? Assim temos:

n = log 2/log (1+a)

Se uma população mantivesse as suas taxas atuais de natalidade e mortalidade ano após
ano, quanto tempo levaria para duplicar de tamanho? Os demógrafos às vezes usam a
Regra de 69,3 (logaritmo natural de 2 X 100) para perceber se a taxa de crescimento de
uma população é rápida ou lenta.

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Ou seja, se dividirmos 69,3, pela taxa de crescimento positivo da população expressa


em percentagem, saberemos quantos anos levará a população a duplicar de tamanho
mantendo as suas taxas atuais de natalidade e mortalidade.

Exemplo:

Vamos comparar as taxas de crescimento populacional de dois países com


aproximadamente o mesmo tamanho, com taxas de crescimento muito diferentes. O
Níger tem uma população de 18 milhões com uma taxa bruta de natalidade de 50 e uma
taxa bruta de mortalidade de 11, o que equivale a uma taxa de crescimento de 3,9 por
cento. A Holanda tem uma população de pouco menos de 17 milhões de pessoas, com
uma taxa bruta de natalidade de 10 e uma taxa bruta de mortalidade de 8, resultando
numa taxa de crescimento populacional de 0,2 por cento.

Quão diferentes são essas duas taxas de crescimento de 3,9% e 0,2%?

A população do Níger duplicaria em menos de 18 anos e a população da Holanda


duplicaria em quase 347 anos!

Este é um cenário improvável do mundo real, uma vez que as taxas de natalidade e
mortalidade raramente são constantes, mas permite avaliar a importância de uma
determinada taxa percentual de mudança populacional.

7.2. ANALISE DAS ESTRUTURAS DEMOGRÁFICAS: A REPARTIÇÃO POR


SEXO E IDADES

A Idade e o sexo são as características mais importantes e relevantes das populações


para os demógrafos. Em primeiro lugar, os processos demográficos de fecundidade,
mortalidade e migração produzem a idade e a estrutura sexual da população, que por
sua vez influencia os processos demográficos.

Em segundo lugar, a divisão do trabalho nas sociedades tradicionais baseia-se quase


inteiramente na idade e no sexo.

Em terceiro, ao nível individual, idade e sexo são as duas primeiras características que
reconhecemos numa pessoa, principalmente com base nas aparências externas.

Em quarto, no estudo do curso de vida e do desenvolvimento humano, a idade e o sexo


permitem-nos comparar o momento dos eventos com nossas expectativas ou
cronogramas sociais.

Em quinto, ao nível social, as mudanças na distribuição de idade e sexo têm implicações


importantes para o desenvolvimento socioeconómico e demográfico, bem como para a
participação da força de trabalho e as relações de género.

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

A Demografia lida, deste modo, não apenas com o tamanho e crescimento da população,
mas também com a composição da população. As dimensões mais importantes da
composição, indiscutivelmente, são a idade e o sexo. A idade, em particular, está a
passar por um grande fluxo, à medida que as populações do mundo envelhecem. O
envelhecimento da população será o principal foco demográfico do século XXI.

Em 2050, pela primeira vez na história da humanidade, haverá mais idosos do que
crianças no mundo. Isso deve se principalmente às reduções de fecundidade, mas
também reflete o fato de que a expectativa de vida aumentou.

Viver vidas mais longas é talvez a maior história de sucesso da história moderna, graças
às inovações na saúde pública, medicina e desenvolvimento económico. Ao mesmo
tempo, o envelhecimento da população pode trazer sérios desafios para a sociedade. A
dependência da velhice pode levar a uma produtividade económica reduzida e
sobrecarregar os sistemas de saúde e previdência. Mas se esses desafios forem
antecipados, eles podem ser compensados com as políticas sociais e económicas. Não
esquecendo contudo que a transição do envelhecimento precoce de uma população
dependente de jovens para uma população em idade ativa traz grandes oportunidades,
fenómeno conhecido como “dividendo demográfico”. (Poston & Bouvier, 2017)

As sociedades constroem papéis e atribuem status com base na idade e sexo mais do
que em quaisquer outras características. Consequentemente, as nações incluem
questões sobre a idade e sexo nos questionários do censo. Tão importante é a
composição idade-sexo, que muitos demógrafos lhe dão um rótulo especial: a estrutura
populacional.

As mudanças em qualquer um dos processos demográficos fornecem informações,


igualmente importantes, de como as populações são compostas na sua estrutura. Em
relação à fecundidade, definida como o “gerar” crianças, nascem mais homens que
mulheres (cerca de 105 homens para 100 mulheres). Ainda, a fertilidade, que é a
possibilidade de gerar essas crianças varia segundo o sexo, sendo possível nas mulheres
geralmente entre os 15 e os 49 anos, e nos homens entre os 15 e os 79 anos.

Em relação à mortalidade, isto é, a frequência com que ocorre a morte numa população,
as mulheres têm taxas mais baixas de mortalidade do que os homens em qualquer idade
da vida. Além disso, a mortalidade por causas específicas está geralmente também
relacionada com a idade. Justamente, no que concerne a relação entre a idade e o risco
de morte, a idade pode ser considerada a variável demográfica mais importante na
análise de mortalidade.

A migração também difere por idade e sexo. Tradicionalmente, os homens e as mulheres


não migraram para os mesmos lugares e ambientes da mesma forma e em igual número.

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

A migração de longa distância tende a ser maior entre os homens enquanto que as de
curta distância são predominantes no caso das mulheres, especialmente no caso nos
países em desenvolvimento. No entanto, com a maior equidade de género, a migração
feminina tende a aproximar-se à masculina. De fato, quase metade dos migrantes
internacionais agora são mulheres. A migração interna também é seletiva, com o maior
número de migrantes encontrados entre os jovens adultos.

A Idade e sexo não são as únicas variáveis importantes na Demografia e outras variáveis
estão também intimamente relacionadas com o processo demográfico. O casamento e
o estado civil são importantes quando se estuda a fecundidade. A educação é uma
variável especialmente importante a considerar. Regra geral, quanto maior a educação,
menor é a fecundidade e menor é a mortalidade. De facto, todas estas variáveis são
tanto a causa quanto o efeito da mudança populacional.

A definição de idade é direta. É uma característica atribuída, embora mutável. Nos censos
da população, geralmente é definida em termos da idade de uma pessoa no seu último
aniversário.

As Nações Unidas definem idade como “o intervalo de tempo estimado ou calculado


entre a data de nascimento e a data do censo, expresso em anos solares completos”.

Na maioria dos censos, pede-se ao entrevistado que forneça a sua idade atual, bem
como a data em que nasceu, permitindo assim que se corrija qualquer discrepância na
idade relatada do entrevistado. Este método ajuda a minimizar o efeito acumulado de
idade.

O Sexo também é uma característica atribuída e, para a maioria das pessoas, imutável.
Justamente, para a grande maioria das pessoas, o sexo é fixo desde o nascimento.

Quando os demógrafos identificam o sexo de uma pessoa ou sua distribuição na


população, quase sempre confiam na definição social de auto-identificação e não em
considerações biológicas.

Relativamente à distinção entre sexo e género, na maior parte das vezes, embora nem
sempre, o sexo é uma variável atribuída cuja designação é baseada na biologia. O
género, por outro lado, é mais frequentemente usado ao discutir diferenças não
biológicas entre homens e mulheres, por exemplo, diferenças de status socioeconómico.
Os demógrafos tendem a usar o termo sexo ao discutir diferenças biológicas e não
biológicas devido, talvez, ao foco principal da demografia na fecundidade e mortalidade.
Isso não significa que os demógrafos não estejam interessados nas diferenças não
biológicas entre os sexos. Mas eles usam o termo sexo para uma discussão mais ampla.
As diferenças entre homens e mulheres na migração, casamento e divórcio e participação

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

na força de trabalho, para citar apenas alguns, são diferenças não biológicas de interesse
significativo para os demógrafos. (Poston & Bouvier, 2017)

Os demógrafos, em particular, estão interessados na composição de idade e sexo das


populações, porque a estrutura de idade e sexo de uma população ajuda a compreender
a história demográfica de uma população.

Pessoas da mesma idade constituem um grupo ou coorte de pessoas que nasceram


durante o mesmo período e, portanto, foram expostas a fatos e condições históricas
semelhantes. Muitas vezes, essas experiências também variam de acordo com o sexo.

Resumindo, uma população é composta por um conjunto de pessoas, as quais não se


distribuem de forma idêntica pelas várias características. Isto significa que, o número de
homens não é igual ao número de mulheres, que o número de pessoas com estado civil
de casados, solteiros, viúvos ou divorciados é diferente, que o número de pessoas nas
idades jovens, ativas ou idosas não é semelhante, etc.

Em termos demográficos existe um traço particularmente importante desse perfil, que é


a composição da população segundo a idade ou também designado por estrutura etária.

Os efetivos de uma população são o número de indivíduos que compõem essa


população. Esses efetivos são identificados nos recenseamentos.

Os recenseamentos dão a conhecer o estado de uma população num determinado


momento do tempo. Conhecer o estado da população remete para a sua caracterização,
segundo diferentes critérios, como sejam o estado civil, a atividade económica, o grau
de instrução, o lugar de residência, etc. A delimitação de qualquer um desses critérios
conduz à definição de diferentes sub-populações da população: população casada,
população ativa, população analfabeta, população urbana, etc.

Mas as categorias primordiais de qualquer população são como vimos rigorosamente


duas: a idade e o sexo. A bipolarização entre população masculina e população feminina
traduz diferenças de género essenciais do ponto de vista demográfico, que decorrem de
clivagens incontornáveis não apenas biológicas – em particular, no que concerne à
procriação – mas também sociais e culturais.

Quanto à importância da idade, ela decorre essencialmente de dois aspetos:

1) A ação permanente do tempo provoca mudanças das características dos indivíduos e


da população, que condicionam as suas aptidões e capacidades (efeito de idade).

2) Os comportamentos e o significado sócio demográfico de cada classe etária variam


consoante as épocas (efeito de geração) (Nazareth, 2004).

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7.2.1. Pirâmide de idades

A pirâmide de idade/sexo, ou pirâmide populacional é uma representação gráfica da


estrutura de idade/sexo da população. A pirâmide de idades sintetiza o estado da
população num dado momento.

Uma pirâmide populacional nada mais é do que dois histogramas comuns (gráficos de
barras), representando as populações masculina e feminina, geralmente agrupados em
categorias etárias de 1 ou 5 anos, posicionados lado a lado.

Trata-se, assim, de um duplo histograma, formado por uma ordenada comum (vertical)
- que representa as idades (aniversários) – e duas abcissas, que representam os efetivos,
respetivamente do sexo masculino (à esquerda) e do sexo feminino (à direita).

Em suma, a construção das pirâmides de idades tem como base os grupos de idades
consideradas e os sexos correspondendo aos retângulos dos histogramas.
Convencionou-se que os efetivos do sexo masculino figuram à esquerda do eixo e os
efetivos do sexo feminino à direita do eixo do gráfico.

Existem três grandes tipos de pirâmides de idade:

1. Em Acento Circunflexo – populações jovens

Figura 14 Pirâmide em acento circunflexo

Esta pirâmide tem uma base muito larga (elevadas proporções de jovens), que diminui
rapidamente conforme se avança para idades mais avançadas, pelo que apresenta um
topo com efetivos reduzidos (diminutas proporções de pessoas idosas). Justamente,
trata se de uma pirâmide de países com elevados níveis de natalidade e mortalidade. A

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

pirâmide em acento circunflexo é típica de populações de países em vias de


desenvolvimento, das populações do Antigo Regime ou das sociedades tradicionais.

2. Em Urna – muita população a meio da pirâmide

A pirâmide em Urna remete para populações onde se assiste a uma progressiva quebra
da fecundidade e da mortalidade. Neste tipo de pirâmide, a base destaca se como a
parte mais reduzida do gráfico (baixas proporções de jovens) e apresenta um topo
empolado (elevadas proporções de pessoas idosas). Nestes casos, a pirâmide toma o
formato de uma urna e é típica dos países desenvolvidos que se encontram na última
fase da transição demográfica.

Figura 15 - Pirâmide em urna

3. Em Às de Espadas - população envelhecida

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

Figura 16 - Pirâmide em Às de Espadas

Este gráfico assume a forma de um Às de Espadas ou maçã, pois a parte mais larga da
pirâmide corresponde às idades intermédias. Face à diminuição da fecundidade, a
natalidade acaba por cair para valores muito baixos e a base da pirâmide diminui – a
representatividade dos idosos na população torna-se superior à dos jovens. Nestes
casos, os níveis de natalidade já estão muito baixos e, por isso, a base da pirâmide é
alimentada com menos indivíduos, o que provoca o seu estreitamento – trata-se do
envelhecimento na base da pirâmide.

Por outro lado, a mortalidade também é baixa o que causa o alongamento das classes
correspondentes aos idosos – trata-se do envelhecimento no topo da pirâmide.

A distribuição da população por sexo e idade é registada na altura dos recenseamentos


da população. Os efetivos da população masculina e feminina, são dados por cada ano
de idade, constituindo uma informação exaustiva de base.

Como não é prático trabalhar a informação assim apresentada, convencionou-se agrupar


as idades em classes, para facilitar a leitura e a análise dos dados.

A OMS recomenda os seguintes agrupamentos para fins gerais:

<1 ano, de ano a ano até aos 4 anos inclusive, por grupos de cinco anos, (desde os 5
anos aos 84 anos), de 85 e mais anos.

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O efetivo de cada grupo de idades (absoluto ou relativo) é representado por um


retângulo cuja área é proporcional ao efetivo respetivo. Quando a distribuição por idades
é dada por classes de igual intervalo, a construção do gráfico não oferece dúvida, pois
as bases do retângulo correspondem à amplitude das classes e o comprimento aos
efetivos correspondentes.

Sempre que a distribuição por idades é feita em grupos etários de diferentes amplitudes,
torna-se necessário reduzir os efetivos a uma unidade comum.

Exemplo:
Idades Efetivos masculinos Efetivos femininos
0 X Y
1-4 X+1 Y +1
5-9 X+2 Y+2
10 - 14 X+3 Y+3

Assim, temos:

A altura ou base do retângulo que corresponde ao número de anos ou do grupo de idade


considerado.

O comprimento do retângulo que corresponde ao efetivo E do grupo de idade


considerado dividido pelo intervalo de classe, isto é, E/N. A área do retângulo é igual ao
produto do comprimento pela altura.

Construção das Pirâmides de idade (estruturas relativas e grupos de idades


quinquenal)

1.º – Calcula-se a estrutura etária relativa – sexos separados:

Divide-se a população (sexos separados) de cada grupo de idades pelo total da


população (sexos reunidos) e multiplica-se cada resultado por 100.

Grupos de Idade Homens Mulheres Homens (%) Mulheres (%)

0–4 30 25 2,0 1,7

5–9 25 22 1,7 1,5

..

..

75 – 79 10 14 0,7 0,9

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80 + 15 25 1,0 1,7

Total 1500 100 100

No caso do último grupo de idade (aberto), se os seus valores forem superiores aos do
grupo fechado anterior dividem-se esses valores por 2 até se obterem valores
dificilmente representáveis.

Objetivo: não deformar o topo da pirâmide.

Grupos de idades (Anos) Homens (%) Mulheres (%)

80 -84 0,5 0,9

85 - 89 0,3 0,4

90+ 0,2 0,4

2.º. Conta-se o número de G.I que se vão considerar

(no caso: do GI de 0 - 4 ao GI de 90 e mais anos existem 19 GI )

3.º. Verifica-se qual a percentagem (%) máxima obtida (por hipótese 6%)

4.º O eixo das abcissas (horizontal) é constituído por dois sub-eixos: à esquerda (sexo
masculino), à direita (sexo feminino), (cada sub-eixo vai variar de 0% a 6%) e fixa-se
uma medida a atribuir a cada variação de 1% (por exemplo 1 cm).

5.º. Traça-se a base, deixando um espaço para o corredor central (onde se irão colocar
os Grupos de Idade).

6.º A altura da pirâmide deve ser encontrada após a aplicação do seguinte princípio:
altura = 2/3 da base. (altura = 2/3 *12 cm ou seja = 8 cm)

7.º. Determina-se a escala a atribuir a cada grupo de idades dividindo-se a altura total
pelo número de grupos de idade considerados.

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

(8 cm/19 GI = 0,4 cm - Se se considerar 0,5 cm para cada GI a altura total da pirâmide


(9,5 cm) continuará menor que a largura da base).

8.º. Por fim, traça-se o eixo vertical e representa-se, para cada GI (sexos separados),
as % correspondentes, sendo o comprimento de cada retângulo proporcional a essas
percentagens.

Os Gráficos seguintes mostram as pirâmides de Portugal nos Recenseamentos de 2001


e 2011.

Figura 17 - Pirâmides de Portugal nos Recenseamentos de 2001 e 2011

Fonte: INE – Recenseamento geral da população

Como se pode observar através da largura da base das pirâmides, o Continente


apresenta em 2001 uma população mais jovem do que em 2011. A pirâmide de 2011
apresenta uma forma mais estreita na base, denotando uma população envelhecida na
base e no topo.

A diminuição das taxas de natalidade é evidente no afunilamento das pirâmides, em


2001 e em 2011, nas classes dos 0 aos 15 anos.

Finalmente, para se comparar 2 pirâmides de idades ou 2 populações devem-se


comparar no tempo assim como, comparar no espaço.

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7.2.2. As relações de masculinidade

Deve-se sempre complementar uma pirâmide de idades com o cálculo das relações de
masculinidade por grupos de idade.

De facto, as pirâmides de idades não são simétricas. Em primeiro lugar nascem mais
rapazes que raparigas o que faz com que a base de uma pirâmide seja sempre maior do
lado masculino do que do lado feminino.

Em segundo lugar, a mortalidade que é o fator decisivo na redução dos efetivos é sempre
mais precoce no sexo masculino. Assim, conforme avançamos na idade, a superioridade
dos efetivos masculinos vai diminuindo, geralmente entre os 20-30 anos de idade a
importância dos sexos é igual, e nos últimos grupos de idades o sexo feminino apresenta
sempre maior volume populacional do que o sexo masculino.

“Este modelo natural, que é formado apenas pela evolução e pelos níveis de mortalidade
e de natalidade, pode, no entanto, ser perturbado por outros fatores, tais como: as
migrações, por serem movimentos que normalmente incidem mais em determinados
grupos etários”. (Nazareth, 2004, p. 113).

Em cada população ou em cada classe etária, torna se por estes motivos necessário
analisar a representação quantitativa dos efetivos masculinos e dos efetivos femininos.

Esta representação é medida relacionando os efetivos masculinos com os efetivos


femininos e designa se por relação de masculinidade.

A relação de masculinidade exprime se pelo quociente seguinte:

Rm = Pm / Pf x 100

Podemos, também, medir a relação de masculinidade nas diferentes classes etárias x:

Rm (x) = Pm (x) / Pf (x) x 100

A comparação entre efetivos masculinos e femininos devem também ser calculada no


momento do nascimento. Porém, neste caso, a relação de masculinidade é medida a
partir de dados do movimento da população; os nascimentos.

Rm (n) = N (m) / N (f) x 100

Em qualquer população, a relação de masculinidade no nascimento varia entre 105 e


107 nascimentos masculinos para 100 nascimentos femininos. Esta assimetria altera se,
contudo, com o efeito da idade.

Exemplo:

©Universidade Aberta 150


7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

Segundo o recenseamento de 1991, residiam em Portugal 9 862 540 pessoas, das quais
4 754 632 do sexo masculino e 5 107 908 do sexo feminino. Na classe etária dos 10 aos
15 anos tínhamos 398 442 rapazes e 383 142 raparigas. Nesse ano nasceram 116 383
crianças, dos quais 59 953 eram do sexo masculino e 56 430, do sexo feminino. Logo:

Rm 1991 = 4 754 632 / 5 107 908 x 100 = 93,08

Rm (10-15) 1991 = 398 442 / 383 142 = 104,0

Rm (n) 1991 = 59 953 / 56 430 = 106,24

Significa que no conjunto da população portuguesa, em 1991, por cada 100 pessoas do
sexo feminino havia 93, 08 do sexo masculino e que por cada 100 raparigas dos 10 aos
15 anos havia 104,0 rapazes. Nesse ano, houve 106,24 nascimentos masculinos por cada
100 nascimentos femininos.

7.2.3. Os Grupos Funcionais

Em análise demográfica, quando se quer ter uma visão rápida da evolução ou da


diversidade das estruturas, opta-se por compactar a informação segundo determinados
critérios. O mais importante é o da idade, ou seja, concentra-se num reduzido número
de grupos a totalidade da informação, tornando mais funcional a análise: são os grupos
funcionais.

A população passa a estar dividida em três grandes grupos etários, sexos separados ou
reunidos:

Jovens J 0 -19 anos ou 0 - 14 anos

Ativos A 20 - 59 anos ou 15 - 64 anos

Idosos I 60+ anos ou 65+ anos

Os grupos funcionais expressam, assim, essencialmente o peso relativo dos três grandes
grupos sócio demográficos presentes em qualquer população.
Geralmente, parte se do principio de que no grupo de menos de 15 anos, existe um
escasso potencial produtivo, e grande consumo de bens.

No grupo dos 15 aos 64 anos, temos um grupo considerado economicamente ativo em


que geralmente a sua produção excede o consumo.
O grupo dos 65 e mais anos, traduz um grupo com uma produtividade reduzida, mas
ainda com um menor índice de consumo comparado com o grupo de população com
menos de 15 anos. (Nazareth, 2004)

©Universidade Aberta 151


7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

A importância relativa destes dois grupos, mede o grau de envelhecimento da população.

Uma vez decomposta uma estrutura demográfica em grupos funcionais, torna-se


necessário proceder à sua manipulação no sentido de os transformar em indicadores
que resumam a informação existente numa repartição por sexos e idades: são os índices-
resumo.

7.2.4. Índices Resumo

Na análise da estrutura etária das populações devem calcular-se certas relações entre
efetivos, não só para observar a sua evolução ao longo dos anos, mas também para
avaliar certas implicações sócio económicas.

Temos assim:

• Percentagem de jovens: (pop. 0-14 Anos/ população total) x 100

Este indicador mede a importância da juventude na população, medindo de igual modo


o envelhecimento demográfico na base da pirâmide de idades.

• Percentagem de “potencialmente ativos”: (pop. 15-64 Anos/ população total) x 100

Este indicador mede o potencial demográfico dos ativos.

• Percentagem de idosos: (pop. 65 e + anos/ população total) x 100

Este indicador mede a importância dos idosos na sociedade, medindo igualmente o


envelhecimento demográfico no topo da pirâmide de idades.

O conjunto destes indicadores permite fazer a seguinte leitura: Por cada 100 pessoas
temos x jovens, y potencialmente ativos, e z idosos.

• Índice de Juventude: (pop. 0-14 anos/ população 65 e + anos) x 100

Este indicador mede igualmente o envelhecimento demográfico, e permite comparar


diretamente a população jovem com a população idosa.

• Índice de Envelhecimento: (pop. 65 e + anos/ pop. 0-14 anos) x 100.

Por sua vez, este indicador de medida do envelhecimento, compara diretamente a


população idosa com a população jovem.

Leitura dos indicadores: Por cada 100 idosos existem x jovens (Índice de Juventude) e
por cada 100 jovens existem x idosos (Índice de Envelhecimento).

A relação de dependência traduz o encargo que os grupos inativos representam para os


grupos ativos. Temos, assim:

©Universidade Aberta 152


7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

• Índice de Dependência de Jovens : (pop. 0-14 anos/ população 15-64 anos) x 100

• Índice de Dependência de “Idosos”: (pop. 65 e + anos/ população 15-64 anos) x 100

• Índice de Dependência Total: (pop. 0-14 anos e 65 e + anos/população 15-64 anos) x


100

Leitura dos indicadores: Por cada 100 potencialmente ativos temos x jovens e y idosos.

7.2.5. O Envelhecimento da População

“(…) Na história das populações europeias, o envelhecimento demográfico é um fato


inteiramente novo que significa que, numa dada população, a proporção de idosos deixa
de ser estável (à volta de 5-6%) e começa a aumentar progressivamente, ultrapassando,
num dado momento, a fasquia dos 10%.” (Leston Bandeira, 2004, p. 183).

Pensou se durante muito tempo que o envelhecimento demográfico teve a sua origem
na baixa da natalidade e da mortalidade. Atualmente, pensa-se ainda que o aumento da
esperança de vida e a baixa da mortalidade determinaram o envelhecimento
demográfico. Não obstante, verificou-se que nas populações onde esse fenómeno
predomina, o mesmo fora provocado essencialmente pela quebra da natalidade e não
pela baixa da mortalidade. Constata-se, assim, que o envelhecimento acontece nas
populações onde tendencialmente a natalidade é baixa. (Leston Bandeira, 2004)

Mas a verdade é que a população mundial está a envelhecer e todos os países do mundo
estão a assistir a um crescimento no número e na proporção de pessoas idosas da sua
população.

O envelhecimento populacional está prestes a tornar-se numa das transformações


sociais mais significativas do século XXI, com implicações transversais a todos os setores
da sociedade – no mercado laboral e financeiro; na procura de bens e serviços como a
habitação, nos transportes e na proteção social; e nas estruturas familiares e laços inter-
geracionais.

Estima-se que o número de idosos, com 60 anos ou mais, duplique até 2050 e mais do
que triplique até 2100, passando de 962 milhões em 2017 para 2,1 mil milhões em 2050
e 3,1 mil milhões em 2100.

Em todo o mundo, a população com 60 anos ou mais está a crescer mais rapidamente
do que todos os grupos etários mais jovens. A população com mais de 60 anos está a
crescer a uma taxa de cerca de 3% por ano.

Em 2017 estimava-se que, em todo o mundo, 962 milhões de pessoas tinham 60 anos
ou mais – representando 13% da população global.

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

Atualmente, a Europa tem a maior percentagem da população com 60 anos ou mais


(25%). O envelhecimento rápido também ocorrerá noutras partes do mundo e até 2050
todas as regiões do mundo, exceto África, terão quase um quarto ou mais das respetivas
populações com mais de 60 anos.

Globalmente, o número de pessoas com 80 anos ou mais deverá triplicar até 2050
passando de 137 milhões, em 2017, para 425 milhões em 2050. As pessoas mais velhas
são cada vez mais vistas como contribuintes para o desenvolvimento, cujas
competências devem estar interligadas com políticas e programas transversais.

No entanto, nas próximas décadas, muitos países irão enfrentar pressões fiscais e
políticas na esfera dos sistemas públicos de saúde, providência e proteção social para a
população com a faixa etária mais avançada (Organização das Nações Unidas, 2021)

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

ATIVIDADES FORMATIVAS

1. Com base nos dados apresentados no quadro seguinte (população portuguesa,


distribuída por grupos etários quinquenais, para 1991 – sexos separados e reunidos):

Figura 18 - População portuguesa, distribuída por grupos etários quinquenais, para


1991 – sexos separados e reunidos

Grupos etários Homens Mulheres HM

0-4 278679 544309

5-9 331337 646161

10-14 398620 781933

15-19 428240 845588

20-24 386651 765248

25-29 359556 726628

30-34 340986 694606

35-39 321775 661076

40-44 307655 634519

45-49 271665 569623

50-54 265623 559346

55-59 263265 562041

60-64 245150 533325

65-69 211990 470049

70-74 149226 344747

75-79 109813 271089

80 + 86544 256859

Total 4 756 775 9 867 147


Fonte INE, recenseamento da população 1991.

a) Preencha a coluna do efetivo de mulheres.

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7. A DINÂMICA POPULACIONAL POR SEXO E IDADES

b) Calcule a percentagem de jovens, de pessoas em idade ativa e idosos (sexos


reunidos)

c) Calcule, para os sexos reunidos, o índice de envelhecimento, a relação de


dependência total, a relação de dependência de jovens. Interprete cada um dos
resultados obtidos.

d) Construa a pirâmide de idades e o gráfico das relações de masculinidade. Comente


as figuras obtidas.

2. Observe o seguinte quadro :

Figura 19 – Índices 1981 e 1991

Índices 1981 1991

% de Jovens 25,5 20,0

% pop. Ativa 63,0 66,4

% de Idosos 11,4 13,6

Índice de Envelhecimento- IE (%) 44,9 68,1

Relação de Dependência dos Jovens – RDJ


40,5 30,1
(%)

Relação de Dependência dos Idosos – RDI


18,2 20,5
(%)

Relação de Dependência Total – RDT (%) 58,6 50,6

a) Comente a evolução dos índices apresentados de 1981 para 1991.

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8.MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO
DO TEMPO
Objetivos

 Descrever os traços gerais de evolução da população


 Descrever os traços essenciais que caracterizam a evolução global da população
do continente europeu durante o Antigo Regime
 Identificar quais as etapas do arranque demográfico da Europa Ocidental
segundo o Modelo de Dupâquier
 Fazer o ponto da situação demográfica contemporânea a nível mundial e
distinguir os países em desenvolvimento dos desenvolvidos

Introdução

As primeiras civilizações de que dispomos algumas informações escritas respeitantes à


população, revelam-nos a existência de uma dinâmica populacional pouco conhecida,
complexa e diversificada. Muito há a esperar ainda das investigações em curso. Porém,
apesar da sua diversidade, existem alguns elementos comuns: guerra, crises de
mortalidade motivadas pela fome, conhecimentos de contraceção, a existência de
grandes migrações. É uma Demografia de povos migrantes cuja errância ritma a história,
misturando populações, costumes e civilizações.

Com uma população mundial triplicando de 2 bilhões para 6 bilhões ao longo do século
20, e alcançando 7,2 bilhões apenas 14 anos depois, não há tendência demográfica mais
óbvia do que o crescimento populacional. A população está projetada para continuar
crescendo no futuro, embora mais lentamente, nivelando-se perto de 10,9 bilhões de
pessoas no século 22 (Nações Unidas, 2013).

8.1 O MODELO DEMOGRÁFICO DO ANTIGO REGIME

Três traços essenciais caracterizam a evolução global da população do continente


europeu durante o Antigo Regime: o crescimento moderado da população de 70 milhões
no início do século XIV para 111 milhões em meados do século XVIII, as quebras de
crescimento populacional ocasionado pelas crises de mortalidade e as crises de
subsistência.

As crises de mortalidade têm duas fases: a fase da peste e a fase das epidemias sociais
que se estende até ao início da época contemporânea. A mortalidade era um fator
regulador e um fator destruidor das populações desta época. Alguns historiadores da
população têm uma visão mecanicista das sociedades humanas nesta época ao
pensarem que o verdadeiro elemento regulador é a morte. Esta visão mecanicista não

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© Universidade Aberta
8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

resistiu à vaga de investigações sobre o sistema demográfico do Antigo Regime que


caracteriza os nossos dias com o desenvolvimento da Demografia Histórica. Os
Dupâquier foram os grandes pioneiros no final dos anos 70 ao levantar a seguinte
questão: como é que 18 milhões de súbditos de Luís XIV mal alimentados, aumentaram
num século para 27 milhões vivendo numa relativa abundância e reagindo à oscilação
de preços? (Dupâquier, 1979).

A característica demográfica definidora dos tempos recentes é a explosão populacional


moderna. A população mundial continua a crescer hoje, mas agora a sua taxa de
crescimento começou a diminuir. À medida que muitas nações passam pelo outro lado
de suas transições demográficas, a principal preocupação demográfica do século XXI
acabará voltando-se para o “envelhecimento” da população (IIASA, 2012). Alguns países
já começaram a enfrentar esse processo. O envelhecimento da população global num
futuro próximo é um resultado direto das transições de mortalidade e fecundidade que
acompanharam a explosão populacional do século passado (Lundquist, Anderton,
Yaukey, 2015, p. 47)

8.2 CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO MUNDIAL ANTES DE 1650

Houve longos períodos de crescimento estacionário, até por volta da época de Cristo,
quando a população mundial era de aproximadamente 250 milhões. A população não
duplicou novamente até cerca do ano 1600. A taxa média anual de crescimento foi de
apenas 0,04 por cento nesse período. Essas condições estacionárias continuaram até
aproximadamente 1650, quando a população mundial foi estimada em cerca de 650
milhões. Durante muitos milhares de anos, a população mundial foi mantida em tamanho
pequeno pelos vários testes malthusianos. A população cresceu de cerca de 650 milhões
em 1650 para 1 bilhão em 1850. Em seguida, levou menos de 80 anos para duplicar
novamente em 1927. Com a Revolução Industrial, as pessoas começaram a deslocar-se
do campo para as cidades para trabalhar em fábricas e moinhos, e o nível de urbanização
aumentou. Muito do crescimento deveu-se a taxas de mortalidade mais baixas, enquanto
as taxas de natalidade permaneceram altas. A melhoria do padrão de vida resultante da
industrialização ajuda a explicar o declínio das taxas de mortalidade. O rápido
crescimento populacional foi limitado principalmente à Europa Ocidental. Noutros
lugares, as taxas de natalidade e mortalidade permaneceram altas. O declínio da
mortalidade nas nações desenvolvidas foi seguido por um declínio na fecundidade. Na
década de 1930, as taxas de crescimento populacional estavam em declínio. Ao contrário
do declínio populacional anterior, desta vez o crescimento foi muito lento devido à baixa
fecundidade e baixa mortalidade. As taxas de mortalidade permaneceram muito altas
nas regiões menos desenvolvidas até depois da Segunda Guerra Mundial, quando houve

© Universidade Aberta 156


8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

melhorias significativas na longevidade. Os declínios na fecundidade são mais


complicados do que os declínios na mortalidade. Com a urbanização, surgiu a diminuição
do tamanho das famílias; a redução da mortalidade infantil garantiu que muitas crianças
sobrevivessem até a idade adulta; o declínio da fecundidade nos países em
desenvolvimento tem sido lento, gerando preocupações sobre a superpopulação. Em
muitos países africanos, as taxas de fecundidade permanecem acima de cinco
nascimentos por mulher e acima de seis nascimentos por mulher em alguns países da
África Central (Poston & Bouvier, 2017).

Após milénios de crescimento lento, a população mundial evoluiu para uma taxa sem
precedentes, começando nos anos 1600 e atingindo o pico no final dos anos 1960. Os
padrões de consumo da população - mais do que o crescimento populacional - podem
desafiar a capacidade de suporte do planeta, embora a fecundidade tenha começado a
diminuir em todo o mundo. As preocupações com os padrões de consumo excessivo da
população incluem as emissões de carbono que levam à mudança climática, o
esgotamento dos recursos pesqueiros e de água doce e assim por diante. A explosão
populacional moderna não foi igualmente intensa em todo o mundo. Tudo começou onde
hoje são os países mais desenvolvidos. Eles experimentaram, com a sua modernização,
uma sequência de declínios nas taxas de mortalidade e natalidade descrita como a
transição demográfica. Alguns desses países, mesmo agora, têm uma fecundidade
abaixo do índice de reposição (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015, p. 84).

8.3 O CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO NA EUROPA OCIDENTAL E O


TERCEIRO “MUNDO CHEIO”

O crescimento da população na segunda metade do século XVIII é um fenómeno


europeu que ultrapassa o quadro das regiões industrializadas e que não pode ser
explicado apenas pela revolução agrícola.

Os Dupâquier esquematizam o arranque demográfico da Europa Ocidental da seguinte


forma:

 1ª etapa (1650-1750): as populações submetidas a crises periódicas de


mortalidade põem a funcionar em pleno o mecanismo auto-regulador; este
mecanismo, ao fazer aumentar de intensidade a nupcialidade, proporciona a
existência de estruturas de idades muito jovens;
 2ª etapa (segunda metade do século XVIII): os acidentes sendo menos
frequentes, diminuem a mortalidade e a população aumenta; mas, o mecanismo
regulador, que tinha funcionado bem numa direção, revelou-se ineficaz na
direção inversa; mais ainda, este mecanismo tem um peso oposto nos destinos

© Universidade Aberta 157


8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

individuais – os quocientes de nupcialidade diminuem, a idade média do


casamento aumenta, os jovens têm cada vez mais dificuldades em estabelecer-
se; a indústria nascente passa a dispor de uma reserva de mão-de-obra
abundante e a baixo preço; as tensões sociais aumentam e aparecem conflitos
de gerações;
 3ª etapa (primeira metade do século XIX): a industrialização, ao permitir fazer
baixar a idade no casamento, relança o crescimento demográfico; a emigração
para o outro lado do Atlântico vai-se tornando cada vez mais importante;
 4ª etapa (segunda metade do século XIX): o recuo da mortalidade, associado a
um grande progresso da medicina e das condições de higiene e saúde, acaba de
vez com o mecanismo autorregulador; com o aumento da duração de vida dos
pais, as jovens gerações camponesas perdem a esperança de se estabelecerem
com uma idade razoável; não lhes resta mais do que escolher entre o celibato
definitivo ou o êxodo para sítios mais ou menos longínquos (como operários,
como funcionários, como militares ou como colonos).

A grande mutação não resultou de um modelo simplista que apenas considera os efeitos
diretos e indiretos das condições de saúde (modelo simplificado), mas de um modelo
mais complexo que integra diversas componentes (Modelo de Dupâquier, conforme
citado em Nazareth, 2004, p. 90-93):

Figura 20 do Modelo de Dupâquier


ALGUM PROGRESSO TÉCNICO
ESTRUTURAS DE
POPULAÇÃO CADA
OUTROS FACTORES VEZ MAIS JOVENS

ARRANQUE INDUSTRIAL

DECLÍNIO DA IDADE PROGRESSO TÉCNICO E SOCIAL


MÉDIA DO MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE
CASAMENTO HIGIENE E SAÚDE

AUMENTO DOS DIMINUIÇÃO DOS


NASCIMENTOS ÓBITOS

EXPLOSÃO
Fonte: adaptado de Nazareth, 2004, p. 93, figura 5

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8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

8.4 O CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO

O mundo contemporâneo conhece uma transformação demográfica considerável


composta por três componentes: crescimento populacional, evolução da fecundidade e
da mortalidade e mudanças correspondentes na pirâmide etária. (Bloom, D., 2020)

Demorou mais de 50 000 anos para que a população mundial atingisse um bilhão. Desde
1960, bilhões de habitantes foram adicionados a cada dez ou vinte anos. A população
mundial era de três bilhões em 1960; atingiu seis bilhões na virada do século e, segundo
projeções da Organização das Nações Unidas (ONU), ultrapassará nove bilhões até 2037.
Essa taxa de crescimento populacional desacelerou, após atingir mais de 2% por ano no
final da década de 1960, está agora em torno de 1%, e deverá cair para a metade até
2050.

Embora o rendimento mundial por habitante tenha mais do que duplicado, a expetativa
de vida aumentada em 16 anos, e que a educação das crianças na educação primária
se tivesse tornado praticamente universal entre 1960 e 2000, o rápido crescimento
populacional apresenta inúmeros desafios assustadores, tanto públicos quanto privados,
incluindo: atender às crescentes necessidades de alimentos, roupas, habitação,
educação e infraestrutura; integrar efetivos consideráveis em empregos produtivos; e
proteger o meio ambiente com mais rigor. Receios antigos de uma explosão demográfica
mundial deram lugar a outros receios de um rápido crescimento populacional,
especialmente em alguns países e regiões. A desaceleração geral da taxa do crescimento
demográfico global oculta diferenças consideráveis na distribuição da população do
planeta dependendo do estado de desenvolvimento e da região geográfica. Os países
classificados pela ONU como menos desenvolvidos contavam com 68% dos habitantes
do planeta em 1950; hoje representam 84%. Esta proporção continuará a aumentar
pois, aos 2 bilhões de habitantes que deverão juntar-se à população mundial nos
próximos 30 anos, praticamente todos nascerão em países menos desenvolvidos. Este é
um grande desafio, uma vez que as regiões menos desenvolvidas tendem a ser mais
frágeis – a nível político, social, económico e ambiental – do que as regiões mais
desenvolvidas. Com 1,44 bilhão de habitantes, a China é atualmente o país com maior
população do mundo, seguido pela Índia, com 1,38 bilhão de habitantes. Mas no final
da década, prevê-se que a India vá liderar, com projeções de 1,5 bilhão de habitantes,
contra 1,46 bilhão na China. Entre 2020 e 2050, prevê-se que a Nigéria (que deverá
ultrapassar os Estados Unidos, tornando-se o terceiro país com mais população do
planeta) e o Paquistão (que já se encontra entre os dez países com maior população)
vão conhecer um salto excecional. A Ásia continuará a ter uma população dominante,
mas descrente relativamente à população global (60% hoje e 54% em 2050) (Bloom,
2020).

© Universidade Aberta 159


8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

8.4.1 A Futura população do planeta Terra

As projeções populacionais sugerem que ocorrerá um equilíbrio na população.


Uma projeção populacional refere-se ao número de pessoas que formarão a população
de uma área em algum momento futuro, de acordo com suposições demográficas
claramente definidas sobre os processos demográficos de fecundidade, mortalidade e
migração. A população mundial era de 7,2 bilhões em 2013; está projetada para atingir
8,1 bilhões em 2025, 9,6 bilhões em 2050 e 10,9 bilhões em 2100. O cenário mediano
indica que a população mundial continuará a crescer. Pode parecer contraditório projetar
aumentos tão importantes enquanto a própria taxa de crescimento está em queda. Três
fatores são responsáveis por isso: primeiro, a própria população está expandindo-se; em
segundo lugar, as taxas de mortalidade infantil caíram rapidamente em muitos países
em desenvolvimento. Em terceiro, em qualquer população jovem, há um impulso para
o crescimento (impulso populacional).

Durante a maior parte dos séculos, os humanos estiveram na Terra, a população cresceu
muito lentamente. Eventualmente, a população mundial deve parar de crescer porque
habitamos um espaço finito. Podemos atingir essa meta por meio de altas taxas de
mortalidade que equilibram as altas taxas de natalidade, ou pode ser alcançado por uma
combinação de baixas taxas de natalidade e baixas taxas de mortalidade (Poston &
Bouvier, 2017).

8.4.2. Alguns dados sobre a população mundial

Existe uma acentuada aceleração demográfica. As Nações Unidas referem essa


aceleração demográfica. Em 1950, cinco anos após a fundação das Nações Unidas, a
população mundial era estimada em cerca de 2,6 bilhões de habitantes. Atingiu 5 bilhões
de pessoas em 1987 e 6 bilhões em 1999. Em outubro de 2011, como já vimos, os 7
bilhões de pessoas no planeta tinham sido ultrapassados. Este momento único na
história da humanidade foi ao mesmo tempo uma conquista e um desafio. Como agência
das Nações Unidas responsável por marcar este ponto de inflexão, o Fundo das Nações
Unidas para a População (FNUAP) conduziu uma campanha inovadora chamada “7
bilhões de ações”, que se focou em desafios, oportunidades e ações necessários para o
futuro comum do Planeta. Como já referido, e de acordo com as projeções, a população
mundial deverá aumentar em 2 bilhões de pessoas nos próximos trinta anos, passando
de 7,7 bilhões para 9,7 bilhões em 2050. Pode até chegar a um número próximo a 11
bilhões de pessoas. Muito desse crescimento desenfreado da população mundial nos
últimos dois séculos deve-se a avanços na medicina moderna e melhorias nos padrões

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8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

de vida. Esses avanços permitiram reduzir consideravelmente a mortalidade infantil e


materna e aumentar a esperança de vida. No entanto, essas tendências terão
repercussões importantes para as gerações vindouras.

Os Países com mais população são a China e a Índia. 61% da população mundial vive
na Ásia (4,7 bilhões de indivíduos), 17% na África (1,3 bilhão de habitantes), 10% na
Europa (750 milhões de pessoas), 8% na América Latina e Caraíbas (650 milhões) e os
restantes 4% encontram-se na América do Norte (370 milhões) e na Oceânia (43
milhões). A China e a Índia representam os países mais povoados no mundo, com
respetivamente 1,44 bilhões de habitantes para o primeiro e 1,39 bilhões para o
segundo, ou seja, 19 e 18% da população mundial. Em 2027, a Índia deverá ultrapassar
a China nesta classificação, já que a população do país deverá diminuir em 31,4 milhões
(cerca de 2,2%) entre 2019 e 2050, de acordo com as previsões. São as Perspetivas da
População Mundial das Nações Unidas (United Nations, 2019).

Projeções para o ano 2100 - A população mundial deverá atingir 8,5 bilhões de pessoas
em 2030, e crescer para 9,7 bilhões em 2050 e 11,2 bilhões em 2100, de acordo com
as estatísticas e previsões populacionais das Nações Unidas. Essas projeções baseiam-
se em variações médias, que pressupõem uma queda na taxa de fecundidade e um
aumento na expetativa de vida em muitos países.

Crescimento deslumbrante em África – Mais da metade do crescimento da população


mundial até 2050 acorrerá em África. Proporcionalmente, esta é a região que
experimentará a mudança demográfica mais forte. A população da África Subsaariana,
por exemplo, devera duplicar até 2050. Apesar de várias incertezas quanto às projeções
relacionadas com a taxa de fecundidade, a perspetiva é de um boom demográfico,
principalmente porque um grande número de jovens atingirá a idade adulta nos
próximos anos e estará em idade fértil.

O crescimento populacional diminui na Europa.

Ao invés, prevê-se que as populações de 55 países ou regiões do mundo diminuam até


2050, nomeadamente de pelo menos 10% para 26 países. Prevê-se ainda que vários
países tenham o seu declínio demográfico em cerca de 15% no mesmo período, incluindo
Bósnia e Herzegóvina, Bulgária, Croácia, Hungria, Japão, Letónia, Lituânia, República da
Moldávia, Roménia, Sérvia e Ucrânia. A taxa de fecundidade em todos os países
europeus é agora inferior à necessária para atingir um limiar de renovação populacional
a longo prazo (ou seja, uma média de 2,1 filhos por mulher).

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8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

Os fatores que influenciam o crescimento demográfico:

- A taxa de fecundidade. O crescimento da população mundial dependerá fortemente da


evolução da taxa de fecundidade global. Prevê-se que passe de 2,5 filhos por mulher em
2019 para 2,2 filhos por mulher em 2050.

- Esperança de vida. No geral, a expetativa de vida aumentou nos últimos anos. De


acordo com os números mais recentes, espera-se que a esperança de vida ao nascer
aumente de 72,6 anos em 2019 para 77,1 em 2050. Um progresso notável foi feito na
redução das desigualdades na expetativa de vida entre os países, mas ainda há fortes
disparidades a nível global. Em 2019, a esperança de vida ao nascer nos países menos
desenvolvidos, estava 7,4 anos abaixo de média global, em grande parte devido às altas
taxas de mortalidade infantil e materna, violência e conflitos ou consequências da
HIV/SIDA.

- Migração internacional: A migração internacional influencia as mudanças demográficas,


mas em grau muito menor do que o número de nascimentos e a taxa de mortalidade.

No entanto, em várias regiões de países do mundo, a migração tem consequências para


o tamanho da população, principalmente em países que recebem grande número de
emigrantes económicos ou dos quais grande número sai, bem como em países afetados
pelo aumento do fluxo de refugiados. Entre 2010 e 2020, catorze países e regiões verão
uma parcela semelhante da sua população deixar o território (Fonte:
https://www.un.org/fr/sections/issues-depth/population/index.html).

Os dados sobre a população mundial são publicados com alguma regularidade através
das diversas organizações, nomeadamente: Nações Unidas1, Banco Mundial2, PRB
(Popluation Reference Bureau)3, União Europeia (Eurostat)4, Conselho da Europa,
Serviços Nacionais de Estatística, “Our World in Data5, entre outros. Os dados são
traduzidos por onze indicadores: a superfície, população no meio do ano civil, taxa de
natalidade, taxa de mortalidade, projeção, taxa de mortalidade infantil, índice sintético
de fecundidade, proporção de indivíduos com menos de 15 anos e mais de 65 anos,
esperança de vida dos homens e das mulheres, produto nacional bruto por habitante e
o produto interno bruto por habitante6.

1
https://www.un.org/development/desa/pd/
2
https://data.worldbank.org/
3
https://www.prb.org/
4
https://ec.europa.eu/eurostat/
5
https://ourworldindata.org/
6 Ver https://www.unfpa.org/data/world-population-dashboard

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8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

8.5 A EXPLOSÃO DEMOGRÁFICA: UM FENÓMENO NOVO OU UM VELHO


PROBLEMA COM NOVAS CARACTERÍSTICAS

A preocupação com o “excessivo número de habitantes” não é um fenómeno exclusivo


da época contemporânea, nem tão pouco a explosão demográfica observada nos dias
de hoje é um fenómeno inteiramente novo.

Em dois momentos anteriores à época contemporânea, acreditou-se que o “mundo


estava cheio” e que não havia lugar para tanta gente à superfície da terra. Quais são as
características diferentes que este fenómeno apresenta nos dias de hoje?

A primeira grande diferença reside no facto de, globalmente, a humanidade nos aparecer
no século XX dividida em dois blocos: o dos países em desenvolvimento onde se
concentra 80 % da população mundial, com um crescimento anual médio que chega
quase aos 2 %, uma mortalidade infantil elevada, elevadas percentagens de jovens,
baixas percentagens de idosos, e um PNB per capita que raramente ultrapassa os 1000
dólares.

No bloco dos países desenvolvidos, temos 20 % da população mundial, um crescimento


natural praticamente igual a zero, uma mortalidade infantil reduzida, baixas
percentagens de jovens, elevadas percentagens de idosos e um PNB per capita que é
quase vinte vezes superior.

Se a primeira grande característica deste novo “mundo cheio” é a divisão do mundo em


dois grandes blocos, a segunda é a unidade de contagem: no primeiro “mundo cheio”
era o milhão, no segundo as dezenas de milhão, no terceiro a unidade de contagem
passou a ser o milhar de milhão.

A terceira característica consiste nas unidades de tempo utilizadas na contagem: no início


da nossa era, a população mundial é estimada em 252 milhões de habitantes e em 1600
é de 578 milhões, ou seja, foi preciso esperar dezassete séculos para que a população
mundial duplicasse; nos dias de hoje a população mundial duplica cada 40 a 50 anos.

Finalmente, a quarta e última dimensão é a capacidade de previsão. A ciência


Demográfica, ao ter desenvolvido as técnicas de projeção, consegue extrapolar
tendências.

8.6 A TERRA NO VIGÉSIMO PRIMEIRO E NO VIGÉSIMO SEGUNDO


SÉCULOS
8.6.1 Considerações Ecológicas

Quais seriam os impactos de 10 bilhões de habitantes da Terra se tivéssemos uma visão


“ecológica ” da população? a interação da população, organização, meio

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8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

ambiente e tecnologia (o complexo POET – population, organization, environment,


technology).

É provável que a população mundial em 2100 chegue a cerca de 10 bilhões e pode ser
maior. A população dos Estados Unidos agora é de 321 milhões e provavelmente chegará
a cerca de 460 milhões em 2100.

Vamos considerar como os números estão relacionados a recursos, poluição e


tecnologia.

Primeiro, olhe para os recursos, especificamente petróleo e água. Muitos países estão a
limitar o uso do petróleo e a encontrar fontes alternativas de energia. A água é um
recurso muito menos confiável do que o petróleo. Não há substitutos para a maioria de
seus usos. À medida que a população cresce, há um aumento da pressão para esgotar
os reservatórios de água, que são essenciais para grande parte da vida.

Em seguida, considere o meio ambiente. O famoso ecologista humano Amos Hawley


(1968, conforme citado em Poston & Bouvier, 2017, p. 421) definiu o meio ambiente
como "tudo o que é externo e potencialmente ou realmente influente num fenómeno
sob investigação." O aquecimento global é a evidência de um aumento na temperatura
da Terra. Muitas vezes é referido como "mudança climática" ou alterações climáticas. A
poluição está intimamente relacionada com o aquecimento global. Existem vários tipos
de poluição, como ar, água e ruído. De todos os problemas associados ao rápido
crescimento populacional contínuo, o lixo e a eliminação de resíduos podem estar entre
os mais visíveis. Os problemas ambientais gerais que o planeta enfrenta incluem "invasão
de desertos, aumento do nível do mar, desmatamento, precipitação ácida, morte
florestal, contaminação tóxica de suprimentos alimentares, oxidação do solo e poluição
dos lençóis freáticos, redução da camada de ozono, aumento de gases de efeito estufa
e mudança climática". O crescimento populacional é um contribuinte, direto ou indireto,
para todos esses desafios para o nosso planeta (Poston & Bouvier, 2017).

8.6.2. Considerações sociológicas e filosóficas

Apresentado até agora, é um quadro bastante sombrio do crescimento populacional e o


seu impacto no mundo. No entanto, Ester Boserup, uma economista dinamarquesa já
falecida, argumentou que o crescimento populacional era um estímulo para a mudança
social. Herbert Simon, um economista americano também já falecido, também era
demograficamente otimista. Ele foi um dos principais defensores do argumento de que
“o crescimento populacional é neutro”. Uma área em que os otimistas e os pessimistas
podem concordar é a tecnologia. As mudanças tecnológicas no mundo, desenvolvidas e

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8. MUDANÇA DA POPULAÇÃO MUNDIAL AO LONGO DO TEMPO

em desenvolvimento, especialmente durante a última metade do século XX, foram


notáveis.

A humanidade está a evoluir. Vemos isso no nosso comportamento, nas nossas


atividades de mudança, na globalização do conhecimento e nos nossos relacionamentos.

Considere tudo o que evoluiu nas últimas gerações, não apenas no que diz respeito aos
computadores e à Internet, mas também no que diz respeito à medicina, ao projeto do
genoma e à pesquisa com células-tronco. Na verdade, aconteceram mais coisas na
última geração (nos últimos trinta a trinta e cinco anos) do que nas gerações anteriores.

Estamos a enfrentar uma população monumental e desafios ambientais; estamos a


testemunhar enormes avanços na tecnologia. A era da Revolução Industrial há muito
acabou; agora estamos a experienciar a revolução da informação.

Na verdade, estamos no início de transformações dramáticas nunca antes imaginadas; o


tamanho e a mudança da população estão no meio desse fenómeno incrível.

Nesta era iminente de globalização, fazemos a pergunta: "Será que todos vamos nos dar
bem?" A resposta depende de como nos adaptamos uns aos outros no equilíbrio do
século XXI (Poston & Bouvier, 2017).

Por fim, o Covid-19 e a demografia. Qual será o impacto desta crise de saúde na
população mundial? Segundo Bruno Tertrais, cientista político francês, especializado em
análise geopolítica e estratégica, vice-diretor da Foundation for Strategic Resarch (FSR),
membro sénior do Instituto Montaigne e consultor científico do Alto-Comissariado
Científico para o Planeamento, afirma que como somos muitos na Terra e porque a
reação internacional foi bastante rápida, a pandemia deve ter um impacto muito limitado,
em termos de mortalidade total previsível, na espécie humana. Durante os dias da gripe
espanhola, uma pandemia muito grande ainda poderia causar uma redução na
população. Este não é mais o caso hoje. Num artigo no Jornal Le Monde, Martine Valo
(4/04/2021) diz que a pandemia Covid-19 criou um “baby flop” global. A crise da saúde
resultou numa queda na taxa de natalidade em 2020, sem paralelo desde a Segunda
Guerra Mundial, especial nos países desenvolvidos (Institut Montaigne, 2021).

ATIVIDADES FORMATIVAS

1. Reflita acerca das quatro grandes dimensões que caracterizam as diferenças


entre a “antiga” e a “nova” explosão demográfica. Quais poderão ser as
consequências da situação atual num futuro próximo?
2. Quais são alguns dos problemas ambientais enfrentados pelo nosso planeta?

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE
POPULAÇÃO

Objetivos

 Compreender como é que a população está distribuída no mundo;


 Analisar as consequências da distribuição da população;
 Conhecer algumas das políticas de população que influenciam a fecundidade, a
mortalidade e a migração.

9.1. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO

Os habitantes não estão distribuídos igualmente por todo o planeta. Algumas partes do
mundo são densamente povoadas, enquanto outras não. O “World Population Clock"
estimou que o tamanho da população do mundo em outubro de 2015 era de quase 7,3
mil milhões de pessoas. Mas esses mil milhões de habitantes não estão igualmente
distribuídos em todo o planeta. A distribuição da população reflete níveis de fecundidade,
mortalidade e migrações.

Seja olhando para o planeta Terra, África ou Estados Unidos, é claro que a população
está longe de estar distribuída igualmente. A maioria sabe que a população da China é
de mais de 1,3 mil milhões e que a população dos Estados Unidos é de cerca de 321
milhões. No entanto, muitos podem não estar cientes de que a China e os Estados Unidos
são muito próximos em tamanho geográfico. Em alguns países, é mais provável que as
pessoas sejam rurais do que urbanas. Geralmente, no entanto, há um movimento
de urbanização em todo o mundo:

“Sem dúvida, a característica dominante da distribuição espacial nos Estados Unidos


e em outros países desenvolvidos é a concentração da população em áreas urbanas
densamente povoadas” (Poston e Bouvier, 2017, p. 365).

9.1.1. Distribuição da População do Mundo

Apenas cerca de um terço da superfície da Terra é habitada permanentemente. Áreas


como o Ártico e a Antártica, bem como os vastos desertos, por exemplo, o Saara, têm
muito poucas pessoas. A situação é semelhante quando as montanhas escarpadas
tornam quase impossível a sobrevivência dos humanos. A distribuição geográfica da
população global concentra-se no Sul da Ásia (principalmente Índia) e no Leste Asiático
(principalmente China), sendo as regiões mais populosas do mundo, e a Oceânia

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

(principalmente a Austrália) a menos. Hoje, quatro países têm populações que


ultrapassam 200 milhões e são liderados pela China e pela Índia. Em 1930, Grã-
Bretanha, França, Alemanha e Itália estavam entre as dez maiores nações do mundo.

As mudanças demográficas desde então refletem o rápido crescimento nas nações em


desenvolvimento e o crescimento lento e até em declínio em muitas das nações
desenvolvidas.

Em 2050, a Índia provavelmente terá ultrapassado a China como a nação mais populosa
do mundo, e isso será principalmente o resultado da menor fecundidade dos chineses e
do fato de que a atual taxa de aumento natural da Índia é três vezes maior que a da
China, ou seja, 1,5 por cento contra 0,5 por cento. Os Estados Unidos e a China são
semelhantes em tamanho, mas não em população.

Outra forma de considerar isso é com o conceito de densidade populacional, ou seja, o


número de pessoas por quilómetro quadrado. A densidade populacional mundial em
2014 era de 53 pessoas por quilómetro quadrado. A densidade dos Estados Unidos era
de 33 e da China, de 143. A Europa Ocidental é muito mais densamente povoada do que
a Ásia Ocidental, e o Leste Asiático é a mais densamente povoada e a mais populosa de
todas as regiões. Nos Estados Unidos, vastas porções dos estados montanhosos são
escassamente habitadas em comparação com o Nordeste e partes da Costa Oeste.

A medida de densidade populacional usada é uma medida rudimentar porque divide o


número de pessoas na população pelo número de quilómetros quadrados (ou milhas) de
território no país ou área. Uma alternativa e talvez uma medida mais significativa e
precisa usa a quantidade de área de terra arável como denominador. Uma dessas
medidas é a densidade fisiológica. É calculada dividindo o número de pessoas no país
pela quantidade de terras aráveis do país (em quilómetros quadrados ou milhas).

Muitos fatores influenciam a distribuição da população. Isso inclui fatores geográficos


(clima, terreno e solos e recursos naturais), fatores económicos, sociais e políticos (o
tipo de atividade económica e a forma de organização social) e fatores demográficos
(principalmente as taxas de mudança populacional devido aos três processos de
fecundidade, mortalidade e migração). Esses fatores continuam a contribuir para a
distribuição da população mundial, alguns mais do que outros (Poston e Bouvier, 2017,
pp 366-369).

9.1.2. Distribuição Residencial (geográfica) e urbanização

Ao observar a distribuição da população, é costume os demógrafos examinarem as


percentagens das populações que vivem em áreas rurais e urbanas. A economia das
áreas rurais tende a ser predominantemente agrícola em comparação com as áreas

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

urbanas, que são mais diversificadas e não agrícolas. Os sociólogos há muito apontam
que os estilos de vida tendem a ser diferentes em áreas rurais e urbanas. Émile Durkheim
chamou-os de mecânicos e orgânicos. Normalmente, existem diferenças demográficas
acentuadas entre as áreas rurais e urbanas. A fecundidade é geralmente mais alta nas
áreas rurais do que nas urbanas. O nível de escolaridade geralmente é menor nas áreas
rurais. Nas nações industrializadas, muitas das diferenças entre o rural e o urbano foram
reduzidas devido à difusão dos media modernos e à rápida comunicação. Mas as
diferenças ainda são muito aparentes nas nações menos desenvolvidas do mundo. Ao
longo da maior parte da história, os humanos foram moradores rurais. Depois da
Revolução Agrícola, muitos ainda viviam em fazendas, mas não precisavam mais vagar
em busca de alimento e abrigo. A verdadeira urbanização ocorreu após a Revolução
Industrial na Europa Ocidental e das suas colónias (Poston e Bouvier, 2017, p 370).

Urbanização

A urbanização em grande escala (mudanças na proporção de pessoas que moram nas


cidades) é um desenvolvimento moderno. A urbanização é diferente do termo sociológico
“urbanismo” que reflete o estilo de vida. A China tem a tradição urbana mais longa de
qualquer país do mundo. As cidades surgiram pela primeira vez na China há mais de 2
mil anos. Três condições devem estar presentes para que a urbanização e as cidades se
desenvolvam. Deve haver: um excedente de produtos agrícolas, um meio de transporte
desses produtos para as áreas urbanas, para serem processados em alimentos, roupas
e abrigo, uma tecnologia suficientemente desenvolvida nas áreas urbanas para usar os
produtos agrícolas e criar empregos para o habitante urbano. Os Estados Unidos servem
de exemplo de como os impactos da Revolução Industrial contribuíram para o
crescimento das cidades, principalmente do meio de transporte disponível. No início do
século XIX, a água era a principal fonte de transporte. Depois veio a era da ferrovia no
século XIX. Isso abriu mais áreas para o crescimento urbano. O automóvel e a
construção do sistema de rodovias interestaduais também contribuíram para esse
crescimento urbano. Em 1800, apenas 3% da população mundial era classificada como
urbana. Como as mudanças tecnológicas e económicas criaram grandes excedentes
agrícolas, as pessoas começaram a migrar para as cidades em busca de empregos nas
fábricas - a urbanização estava em andamento. Em 1950, 29% de todos os residentes
viviam em áreas urbanas. Em 2014, 54 % de todos os habitantes do mundo foram
classificados como urbanos.

Esse fenómeno refere-se à urbanização ou simplesmente ao crescimento urbano?

A urbanização refere-se à percentagem da população de uma região ou país que vive


numa área urbana. O crescimento urbano refere-se a um aumento no número de

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

pessoas que vivem nas áreas urbanas. A partir de 1900, a rápida urbanização começou
em muitas partes do mundo. As Nações Unidas definem aglomeração urbana como uma
área urbana de pelo menos 1 milhão de habitantes, incluindo todos os habitantes do
território circundante que vivam em níveis urbanos de densidade residencial (Poston &
Bouvier, 2017, p. 370-373).

Embora o mundo tenha-se movido em direção à urbanização ao longo da história, a


industrialização desencadeou uma explosão urbana. As atuais regiões mais
desenvolvidas industrializadas começaram as suas explosões urbanas primeiro, e no
momento são as mais urbanizadas. As regiões menos desenvolvidas têm o crescimento
mais rápido das suas populações urbanas e também o ritmo mais rápido de urbanização.
O crescimento da população urbana supera em muito o da população rural. Este ritmo
acelerado da urbanização deve continuar nas regiões menos desenvolvidas. Além disso,
podemos esperar maiores e mais megacidades e corredores urbanos no futuro próximo
que podem ser encontrados nas regiões menos desenvolvidas. A migração foi sempre a
principal causa demográfica da urbanização e continua a ser, embora agora o aumento
natural urbano também contribua para o crescimento urbano, assim como faz para o
crescimento rural, nas regiões menos desenvolvidas. Há uma preocupação generalizada
nos países menos desenvolvidos sobre as consequências da migração massiva de rural
para urbano. As migrações podem melhorar as circunstâncias do indivíduo e, a longo
prazo, a comunidade recetora pode obter tipos desejáveis de migrantes. No entanto, a
pressão constante e imediata do rápido crescimento urbano pode mascarar outros
benefícios. As políticas de migração para controlar este fluxo de migração rural-urbana
têm, no entanto, tido pouco efeito. Uma razão para a ineficácia das políticas de migração
é a forte expetativa de muitos migrantes de que a cidade oferece um futuro mais
promissor, independentemente dos custos imediatos da migração. Outra razão pela qual
as políticas de migração têm pouco impacto é que muitas vezes entram em conflito com
políticas de desenvolvimento económico que encorajam o crescimento económico
contínuo nas áreas urbanas, o que por sua vez reduz a procura de mão-de-obra agrícola
nas zonas rurais. As políticas que enfatizam a sustentabilidade do crescimento nas
cidades agora estão moldando o planeamento urbano estratégico das regiões menos
desenvolvidas. Ironicamente, enquanto as regiões menos desenvolvidas estão
preocupadas com a alta velocidade do crescimento metropolitano, as regiões mais
desenvolvidas experimentaram uma grande desconcentração urbana. A tendência é para
a suburbanização e mudanças regionais nas atividades industriais e oportunidades de
emprego. A suburbanização envolveu a fuga de residentes mais abastados das cidades
e em cidades e subúrbios metropolitanos, onde as oportunidades económicas estão cada
vez mais concentradas, distantes dos problemas da vida urbana. Enquanto isso, a
segregação, discriminação e desvantagem social persistente têm contribuído para uma

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

concentração de bairros de alta pobreza e decadência urbana nas cidades do interior.


As cidades que não se podem expandir para incorporar o crescimento económico nas
suas franjas, veem as suas necessidades sociais crescerem à medida que as suas receitas
fiscais diminuem. No início do século XXI, houve sinais de um ligeiro movimento de
reurbanização de volta à vida na cidade. No entanto, a recessão global de 2007-2009
levou à estagnação no crescimento e nos movimentos populacionais regionais. A
tendência global em direção à urbanização - tanto nas cidades centrais quanto nos
subúrbios - ao longo do século XXI é provável que continue inabalável em escala
mundial, e uma percentagem crescente da população mundial viverá a experiência
urbana.

9.1.3. Consequências da distribuição da população

Existem várias questões relativas ao movimento geográfico de pessoas. As atividades


económicas foram realojadas para as partes circulares das áreas metropolitanas. A classe
média emigrante foi substituída nas áreas centrais por uma população relativamente
desfavorecida. A importância desta concentração de pessoas em desvantagem
económica e social nas cidades centrais é dupla: a crescente procura por serviços sociais
e a situação económica da população residente ser reduzida.

A gentrificação, ou seja, a migração da classe média e dos povos ricos para as áreas
antes mais pobres das cidades, ocorre em algumas cidades centrais mais antigas, por
exemplo, São Francisco. Os termos explosão populacional e implosão
populacional parecem contraditórios. No entanto, ambos estão ocorrendo atualmente
em todo o mundo. Os demógrafos Avery Guest e Susan Brown deram um exemplo desse
duplo fenómeno numa frase muito interessante sobre a distribuição da população nos
Estados Unidos. Observaram que “a área metropolitana de Las Vegas triplicou entre
1980 e 2000, enquanto 46 dos 53 condados do estado de Dakota do Norte perderam
população”. Podemos apenas especular se essa será a direção da distribuição da
população no século XXI, não apenas em Nevada e Dakota do Norte, mas em todo o
mundo (Poston e Bouvier, 2017, pp 384-385).

9.1.4. Distribuição Económica

Uma população também pode ser classificada de acordo com seu nível de
desenvolvimento económico. Duas medidas comuns são 1) rendimento per capita, e 2)
consumo de energia per capita. Cada medida produz resultados semelhantes com
respeito à distribuição da população: menos de 20% da população mundial reside nas
regiões mais desenvolvidas economicamente. Espera-se que essa proporção diminua no

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

futuro. Em 2050, pode estar abaixo de 15% porque as taxas de crescimento populacional
são muito maiores nas nações em desenvolvimento do que nas desenvolvidas. A
migração maciça das regiões em desenvolvimento para as regiões desenvolvidas é
improvável devido às barreiras políticas erguidas por estas últimas para impedir tais
movimentos internacionais. No entanto, apesar das muitas e variadas limitações, estima-
se que um grande número de pessoas, cerca de 30 a 35 milhões, esteja a mudar de um
país para outro sem documentos oficiais (Poston e Bouvier, 2017, p. 374).

9.2. POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

Uma política populacional é um arranjo ou programa deliberadamente construído “por


meio do qual os governos influenciam, direta ou indiretamente, as mudanças
demográficas”. Estes programas no interesse da sobrevivência nacional são medidas
legislativas, programas administrativos e outras ações governamentais com o propósito
de alterar ou modificar algumas tendências populacionais e o bem-estar.

As políticas populacionais são geralmente entendidas como representativas de


estratégias para governos, ou às vezes, embora com menos frequência, organizações
não governamentais (ONGs), para atingir objetivos específicos.

Os países que apresentam condições demográficas de crescimento muito alto ou muito


baixo costumam desenvolver políticas cujos objetivos são tentar restaurar o equilíbrio
demográfico (Poston e Bouvier, 2017, p. 386).

9.2.1. Como os governos afetam os processos demográficos

Geralmente influenciam indiretamente o comportamento demográfico. Mas, muitas


vezes, a mera legislação ou propaganda é insuficiente para atingir o objetivo
pretendido. Nestes casos, os governos agirão diretamente, digamos, para aumentar ou
diminuir os níveis de fecundidade ou para forçar as pessoas a mudarem-se ou não.

A tarefa de formular uma política populacional é complicada porque pode haver alguma
discordância quanto à magnitude do problema (se é que há um problema) de
crescimento ou declínio populacional.

Questões de discordância:

 Deve haver uma declaração explícita de um governo de que existe uma política?

 Tem que haver um curso de ação ou programa planeado?

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

 Os objetivos de uma política devem ser demográficos ou podem ser sociais e


económicos?

O objetivo de levantar essas questões é ilustrar que geralmente não há respostas


"corretas".

A questão do crescimento da população humana como um problema ou questão


preocupante é realmente um fenómeno do século XX. Durante o século XVIII, Malthus
declarou que a superpopulação era limitada pela natureza. Mas foi somente na década
de 1960 e no início da década de 1970 que o público tomou consciência do problema. A
partir da década de 1970, houve um debate considerável nos círculos académicos, com
muitos defendendo o planeamento familiar voluntário.

Em 1965, o presidente Lyndon Johnson estabeleceu um Gabinete de População no


Departamento de Estado e a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento
Internacional (USAID). O objetivo da USAID era convencer os governos dos países em
desenvolvimento a promover o uso de anticoncecionais entre seus cidadãos. No entanto,
as autoridades do país anfitrião perguntaram porque os Estados Unidos promoviam o
planeamento familiar em vez de atender, de acordo com sua maneira de pensar, a
necessidades mais prementes, como assistência para aliviar milhões de pessoas que
sofrem de malária. Em parte, para neutralizar esse problema, os Estados Unidos
trabalharam com as Nações Unidas para ajudar a criar, em 1969, o Fundo das Nações
Unidas para a População (FNUAP). O FNUAP serviu como uma importante fonte de
recursos para iniciativas populacionais em países em desenvolvimento.

Posteriormente, três conferências mundiais sobre a população foram realizadas em


1974, 1984 e 1994 e emolduraram a história do planeamento familiar internacional que
se desenvolveu desde os anos 1970.

9.2.2. As conferências sobre população e desenvolvimento

A primeira Conferência sobre População organizada pela ONU e com a presença de


delegações oficiais aconteceu em Bucareste, em 1974, seguida pela de 1984 no México
e a de 1994 no Cairo (Poston e Bouvier, 2017).

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

9.2.2.1. A Primeira Conferência Mundial de População

A 1ª Conferência Mundial da População foi realizada em Bucareste, Romênia em 1974.


Organizada por membros da ONU, foi uma tentativa de reunir funcionários do governo
de todo o mundo e ilustrar para eles os fatos e consequências do rápido crescimento
populacional (problema populacional).

Em vez disso, a maioria das nações em desenvolvimento enfatizou a sua preocupação


com a importância do desenvolvimento socioeconómico. Clamavam por uma “Nova
Ordem Económica”, cuja posição estava resumida na expressão “O desenvolvimento é o
melhor contracetivo”.

A Conferência de 1974 em Bucareste ficou dividida entre os "controlistas" e os


"desenvolvimentistas". No contexto da Guerra Fria, os países capitalistas mais ricos,
capitaneados pelos Estados Unidos, defendiam a conceção neomalthusiana de reduzir a
fecundidade para promover o desenvolvimento e a erradicação da pobreza. Mas a União
Soviética e os países do Terceiro Mundo, liderados pela China e pela Índia, defendiam a
prioridade do fortalecimento das políticas de apoio ao desenvolvimento em
contraposição ao controle da natalidade e ao planeamento familiar.

9.2.2.2. A Segunda Conferência Mundial de População

A 2ª conferência foi realizada na Cidade do México em 1984. Muitos países em


desenvolvimento mudaram as suas opiniões sobre o crescimento populacional e estavam
interessados em assistência direcionada a seus programas de planeamento
familiar incipientes.

Um programa de planeamento familiar é um esforço sistemático para promover o


controle moderno da fecundidade. Nessa altura, a China comunista, que liderou o
combate ao neomalthusianismo em Bucareste, passou a adotar, a partir de 1979, a
política de filho único, ou seja, a política neomalthusiana mais draconiana da história. Os
Estados Unidos, por outro lado, sob a liderança do governo neoliberal de Ronald Reagan,
abandonaram a defesa do controle da natalidade e passaram a defender o laissez-faire
populacional, ou seja, a não-intervenção estatal.

9.2.2.3. A Terceira Conferência Mundial de População

A Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), ocorreu em


1994 no Cairo. O principal resultado foi uma nova definição de política populacional,

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

dando destaque à saúde reprodutiva e minimizando a justificativa estritamente


demográfica para a política populacional.

De acordo com o demógrafo John May, a conferência do Cairo “enfatizou a importância


das escolhas individuais e a necessidade de dar poder ainda mais às mulheres”.

Também não houve uma posição "antipopulação" na Conferência de 1994. A CIPD do


Cairo ocorreu após o fim da Guerra Fria e foi a primeira a incorporar a palavra
desenvolvimento no seu título. Também incluiu os princípios da Conferência das Nações
Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, conhecida como Rio-92, apontando a
necessidade de os países adotarem políticas públicas no sentido de promover o
"crescimento econômico sustentado no contexto de um desenvolvimento sustentável".
Se o consenso do Cairo apontou a necessidade da estabilização do crescimento da
população mundial, isto se deu por razões evidentes de que não é possível haver
crescimento infinito em um mundo finito, mas a CIPD não marcou data e nem criou os
meios para efetivar tal objetivo.

O ponto forte da CIPD do Cairo foi a defesa dos direitos humanos e dos direitos
reprodutivos. No capítulo II do Programa de Ação estão explicitados os 15 princípios
gerais da Conferência. O princípio 1 reafirma os compromissos da Declaração Universal
dos Direitos Humanos de 1948. O princípio 2 diz que o ser humano é o elemento central
do desenvolvimento sustentável e tem o direito a uma vida sã e produtiva em harmonia
com a natureza, sendo que toda pessoa tem o direito a um nível de vida adequado para
si e sua família. A CIPD definiu os direitos reprodutivos como sendo a liberdade de
escolha das pessoas para definir como, quando e quantos filhos querem ter (incluindo o
direito à fecundidade zero, evitando a maternidade forçada). A Conferência do Cairo
defendeu o direito à conceção e à contraceção, ficando a cargo dos cidadãos e cidadãs
decidir, livremente, sobre as opções de escolha.

9.2.3. Políticas que afetam a fecundidade, a mortalidade e a migração

Antes do século XX, a maioria das políticas de fecundidade preocupava-se com o


aumento do crescimento populacional. Essas políticas geralmente eram de três tipos:
propaganda pró-natalista; medidas relacionadas à família, como programas de auxílio-
família e restrições à distribuição e uso de anticoncecionais e ao aborto.

No século XX, o movimento pró-natalista atingiu seu ápice na Alemanha, Itália e Japão
durante os anos entre a Primeira Guerra Mundial e a Segunda Guerra Mundial. Países
como França e Roménia adotaram políticas pró-natalistas em vários momentos após a
Primeira Guerra Mundial. Essas políticas representaram uma reação à baixa fecundidade
que acompanhou a modernização. Às vezes, os países têm políticas que têm efeitos pró-

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

natalistas e anti natalistas (Exemplo: França). Singapura é outro exemplo de país que
reverte as suas políticas de crescimento populacional. A determinação de diminuir o
crescimento por meio de fecundidade reduzida foi muito bem-sucedida. Esses esforços
incluíram medidas indiretas, como melhores instalações para saúde e educação. Da
mesma forma, a Coreia do Sul e Taiwan adotaram programas de incentivo para
aumentar o número de crianças por família. Até hoje, entretanto, há pouca evidência de
sucesso no aumento da fecundidade e o Índice Sintético de Fecundidade (ISF)
permanece muito abaixo do nível de reposição. Em 2013, o ISF da Coreia do Sul era 1,2
e o de Taiwan 1,1. A China, sem dúvida, tem uma das políticas populacionais mais
rigorosas da história da humanidade. Na verdade, uma das razões pelas quais a China é
um país tão interessante e intrigante para os demógrafos estudarem são precisamente
as suas políticas de fecundidade. Outra razão, conforme observado pelo demógrafo
Nathan Keyfitz, é que na China os líderes políticos são capazes de controlar o número
anual de nascimentos com considerável precisão.

A situação atual em praticamente todos os países do mundo desenvolvido é de taxas de


fecundidade bem abaixo do nível necessário para repor a população. Essas taxas baixas
durante um longo período têm muitas consequências, não menos das quais é um
envelhecimento dramático da população e, posteriormente, uma redução no tamanho
da população. Assim, há preocupação com a fecundidade abaixo da reposição nos países
do mundo desenvolvido e em alguns outros países, por exemplo, Coreia do Sul e Taiwan,
para citar apenas dois. A preocupação não é apenas com o declínio populacional, mas
também com o envelhecimento da população como resultado da baixíssima fecundidade.
O desenvolvimento de políticas pró-natalistas em tais países é difícil de promover. Hoje,
as políticas de planeamento familiar são baseadas numa lógica de igualdade de
oportunidades e visam ajudar as mulheres a combinar a criação dos filhos com o
emprego. Alguns países implementaram políticas de fecundidade envolvendo remessas
financeiras para cada filho nascido, políticas liberais de licença parental e garantia de
cuidado infantil e escolaridade para as crianças. Em suma, as políticas de fecundidade
variam em todo o mundo, e isso acontece há décadas. Em algumas regiões, as taxas de
natalidade são altas; em outras, são baixas. As agências governamentais e não
governamentais têm tentado restaurar algum equilíbrio demográfico nas respetivas
sociedades

Alguns demógrafos sustentam que as políticas relacionadas com a mortalidade não


devem ser consideradas políticas diretas de população. A redução da mortalidade deve
ser a meta de todos os governos, mesmo daqueles que desejam reduzir as suas taxas
de crescimento populacional. As políticas de mortalidade que recebem mais atenção são
aquelas que apoiam o desenvolvimento do conhecimento médico com potencial para
expandir a expectativa de vida. As políticas governamentais podem contribuir

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

diretamente para reduzir a mortalidade. Todos os países desenvolvidos do mundo, com


exceção dos Estados Unidos, oferecem assistência médica gratuita ou subsidiada a todos
os seus cidadãos. Se aceitarmos o fato de que existem medidas ou políticas
governamentais que contribuem para o declínio da mortalidade, devemos também
aceitar o fato de que algumas políticas governamentais podem levar ao aumento da
mortalidade. Medidas que colocam em risco a saúde, embora não intencionalmente,
acabarão por aumentar a mortalidade (Poston e Bouvier, 2017, pp 392-401).

Ao longo da maior parte da história humana, as pessoas foram livres para se movimentar
em busca de uma vida melhor. Essa liberdade de movimento internacional foi
significativamente restringida desde o final do século XIX, em algumas regiões do
mundo. Muitos países introduziram leis que infringem a liberdade de circulação da
migração internacional. Ao mesmo tempo, alguns governos tomaram medidas para
incentivar o movimento para algumas áreas e para fora de outras. Alguns países
encorajam a imigração (migração de outro país para um país) a fim de aumentar o
tamanho de sua população.

Hoje, no mundo desenvolvido, existem três tipos principais de regimes nacionais de


imigração. O primeiro regime é o denominado regime tradicional de imigração. Os
Estados Unidos, Canadá e Austrália são os três países tradicionais de imigração mais
importantes e consideráveis. O número de pessoas legalmente admitidas nesses três
países é classificado em termos de unificação familiar, necessidades económicas do país
e refugiados.

O segundo tipo de regime de imigração nacional é a categoria de países que permitem


principalmente a entrada de imigrantes como trabalhadores convidados. Estes são
principalmente “países europeus que recrutaram mão-de-obra temporária
(trabalhadores convidados) ou receberam migração colonial substancial durante as
expansões econômicas pós-Segunda Guerra Mundial” (Freeman, 2003, 515, conforme
citado em Poston & Bouvier, 2017, p 405).

O terceiro tipo de regime de imigração são os países do sul e do leste europeu “que têm
mais probabilidade de receber do que de enviar imigrantes”. Os quatro países mais
proeminentes nesta categoria são Grécia, Espanha, Portugal e Itália.

A migração, talvez, pudesse ser usada como um meio de repor a população perdida com
a fecundidade. As projeções populacionais preparadas para a Coreia do Sul para as
próximas décadas indicam que os números absolutos e relativos das populações mais
velhas aumentarão tremendamente. Uma solução seria a migração internacional, uma
estratégia que permitiria à Coreia do Sul trazer membros apoiantes para a sua população
direta e imediatamente.

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9. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO E POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

Em síntese, muitos governos aprovaram leis e regulamentos que lidam com seus níveis
de fecundidade, mortalidade e migração, especialmente a migração. Mas as políticas,
quaisquer que sejam as suas intenções e razões para a sua génese, nunca terão sucesso
a menos que levem em consideração o meio social, cultural e económico em que ocorre
o comportamento demográfico, e a menos que considerem os efeitos indiretos e diretos
(Poston e Bouvier, 2017, pp 404-406).

ATIVIDADES FORMATIVAS

1. Quais são as três condições que devem estar presentes para o desenvolvimento das
cidades?

2. Explique as diferenças entre explosão populacional e implosão populacional e dê


exemplos de como esses dois processos estão a ocorrer simultaneamente ou como eles
são contraditórios.

3. Descreva cada uma das três Conferências da População Mundial realizadas em 1974,
1984 e 1994. Qual era o foco pretendido de cada conferência e o que cada conferência
alcançou?

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