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Artigo de Revisão

Orientação nutricional de crianças e adolescentes e os novos


padrões de consumo: propagandas, embalagens e rótulos
Nutritional guidance for children and adolescents and the new consumption patterns:
advertising, packaging and labeling

Tatiana Elias Pontes1, Thalita Feitosa Costa1, Annete Bressan R. F. Marum2, Anne Lise D. Brasil3, José Augusto de A. C. Taddei4

RESUMO nutrição. Torna-se urgente a adoção de práticas preventivas


com esclarecimento aos pais e familiares cujos filhos parti-
Objetivo: Compilar e debater conhecimentos sobre os ró-
cipam ativamente da sociedade de consumo, visando mini-
tulos, as embalagens e a divulgação e promoção de alimentos
mizar os efeitos deletérios da ingestão rotineira de alimentos
processados que progressivamente passam a compor a dieta
obesogênicos.
da população infanto-juvenil.
Fontes de dados: Artigos nos bancos de dados eletrô-
Palavras-chave: criança; propaganda; hábitos alimenta-
nicos, Medline e SciELO nos últimos dez anos, nas línguas
res; televisão; educação em saúde.
portuguesa e inglesa, utilizando os descritores “criança”,
“marketing”, “hábitos alimentares”, “televisão”, “educação ABSTRACT
em Saúde”. Também foram consultados livros, textos re-
centes e artigos considerados relevantes para realização dessa Objective: To debate knowledge on labeling, packag-
revisão. ing, releases and promotion of processed foods that have
Síntese dos dados: O artigo discute o marketing de been included progressively in the diets of children and
alimentos, segundo os tópicos: propagandas, embalagens e adolescents.
rótulos. Quanto à publicidade televisiva, foi abordada sua Data source: On-line articles from Medline and SciELO
influência na formação dos hábitos alimentares infanto- database published over the last ten years in Portuguese
juvenis, a qualidade nutricional dos alimentos veiculados e and English using the keywords “child”, “marketing”, “eat-
as alternativas para que pais e educadores possam lidar com ing habits”, “television”, “health education”. Also, books,
os novos padrões de consumo. Além disso, debateram-se as recent texts and articles considered relevant for the present
embalagens enquanto meios de comunicação entre fabri- review were included.
cante e consumidor. Sobre os rótulos, foram abordadas as Data synthesis: The present article discusses the food
novas regras da Agência Nacional de Vigilância Sanitária a marketing according to propaganda, packaging and labeling.
respeito da Rotulagem Nutricional Obrigatória, bem como This review also approaches the influence of TV advertis-
a importância da leitura adequada para a adoção de escolhas ing on building of children and adolescents’ eating habits;
alimentares saudáveis. the nutrition quality of advertised foods and alternatives
Conclusões: Espera-se que este artigo seja instrumento that parents and teachers could use to deal with these
de atualização dos profissionais da Saúde, proporcionando new patterns of consumption. Additionally, it is discussed
atuação mais incisiva no processo de educação em saúde e packaging as a communication tool between manufacturer

Instituição: Departamento de Pediatria da Universidade Federal de São Endereço para correspondência:


Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp-EPM), São Paulo, SP, Brasil José Augusto de A. C. Taddei
1
Graduandas em Medicina pela Unifesp-EPM, São Paulo, SP, Brasil Rua Loefgreen, 1.647
2
Mestre em Nutrição pela Unifesp-EPM, São Paulo, SP, Brasil CEP 04040-032 – São Paulo/SP
3
Doutora em Pediatria, médica assistente da Disciplina de Nutrologia do E-mail: taddei.dped@epm.br / nutsec@yahoo.com.br
Departamento de Pediatria da Unifesp-EPM, São Paulo, SP, Brasil
4
Professor-associado da Disciplina de Nutrologia do Departamento de Fonte financiadora do projeto: Conselho Nacional de Desenvolvimento
Pediatria da Unifesp-EPM, São Paulo, SP, Brasil Científico e Tecnológico (CNPq)

Recebido em: 6/5/08


Aprovado em: 1/9/08

Rev Paul Pediatr 2009;27(1):99-105.


Orientação nutricional de crianças e adolescentes e os novos padrões de consumo: propagandas, embalagens e rótulos

and consumer. Regarding labeling, the “Agência Nacional de dados eletrônicos Medline e SciELO nos últimos dez
de Vigilância Sanitária” (Anvisa) new rules on Regulatory anos, nas línguas portuguesa e inglesa, bem como de livros
Nutritional Labeling as well as the importance of proper e textos recentes.
label reading for healthy choices are discussed. Espera-se que, com as considerações subsequentes, estes
Conclusions: The present article is intended to be a tool profissionais tornem-se aptos a participar ativamente do
for updating health professionals and encouraging them to processo de educação em saúde e nutrição, orientando ade-
act more effectively in health education and nutrition. It is quadamente seus paciente e familiares sobre como proceder
urgent to adopt prevention practices enlightening parents a uma leitura mais crítica das propagandas, embalagens e
and relatives whose children actively participate in the con- rótulos de alimentos, com ciência do forte impacto do con-
sumption society in order to minimize the harmful effects sumo consciente na qualidade de vida a longo prazo.
of the obesogenic foods routine ingestion.
A participação do marketing no novo
Key-words: child; propaganda; food habits; television; padrão de consumo alimentar
health education.
A formação dos hábitos alimentares se processa gradu-
Introdução almente, principalmente durante a primeira infância, de
forma que quaisquer inadequações devem ser retificadas
O profissional de saúde que faz a orientação nutricional no tempo apropriado sob orientação correta. Nesse pro-
de crianças e adolescentes precisa se informar sobre rotula- cesso, também estão envolvidos valores culturais, sociais,
gem, divulgação e promoção de alimentos processados que, afetivos ou emocionais e comportamentais, de modo que
progressivamente, passam a compor a dieta da população se tornou crescente a percepção de que existe grande
infanto-juvenil. diferença entre comer (um ato social) e nutrir-se (uma
O crescimento geométrico de alternativas alimentares que atividade biológica)(1).
caracterizam a sociedade pós-moderna traz em si grandes A criança exerce um papel ativo desde os primeiros anos
vantagens nutricionais ao facilitar o transporte, armazena- de vida, quando já é capaz de influenciar os cuidados e as
mento e preparo de refeições para crianças e adolescentes. São relações familiares de que participa. É um processo que ocorre
grandes as possibilidades de enriquecimento com micronu- dentro das relações bidirecionais, em que a criança influencia
trientes, pró e pré-bióticos, assim como as oportunidades de e é influenciada por aqueles ao seu redor(2).
formulação de alimentos que levem a mais conforto, prazer A mídia televisiva tem participação ativa e majoritária
e melhores níveis de saúde. nas atividades prosaicas infanto-juvenis; assim, os meios
Tal crescimento, no entanto, traz em seu bojo algumas de comunicação acabam por desempenhar papel estrutu-
influências negativas que vêm piorando o padrão de consumo rador na construção e desconstrução de hábitos e práticas
de crianças e adolescentes. A alimentação inadequada está alimentares(3).
vinculada ao estímulo de alimentos em quantidade excessi- Logo, a propaganda agrada às emoções, não ao intelecto,
va e qualidade inadequada, com excesso de açúcares, sódio, afetando mais profundamente crianças que adultos; o falso
gorduras e deficiência de fibras e micronutrientes. conceito de alimento como algo que dê poder é perigoso por
A possibilidade de orientação da população quanto ao permitir que as indústrias alimentícias explorem a vulnera-
consumo adequado de alimentos pode corrigir erros alimen- bilidade das crianças(4).
tares, diminuir seus efeitos deletérios e, simultaneamente,
promover o redirecionamento da oferta de alimentos pelo O marketing alimentício na TV
setor produtivo à sociedade de consumo e seus mecanismos
de divulgação. Almeida, Nascimento e Quaioti(5) realizaram uma aná-
Nesse contexto, deseja-se fornecer instrumentos ao pro- lise qualitativa do marketing alimentício e reconstruíram
fissional de saúde que atende à criança e ao adolescente, a pirâmide alimentar a partir das propagandas analisadas.
aprimorando a abordagem dos temas em questão na prática Diferentemente da pirâmide considerada ideal, 60%
clínica. As informações presentes nessa revisão resultam da concentraram-se no grupo de gorduras, óleos e doces, com
compilação e análise crítica de artigos obtidos nos bancos consequente redução do grupo de pães, cereais e massas,

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além da ausência de carboidratos complexos (frutas e ve- aprendizado da importância de uma boa alimentação para
getais in natura)(5). a saúde a longo prazo. Por outro lado, no universo escolar,
Em geral, tal padrão nutricional é mantido, de modo que a as crianças e adolescentes deveriam compreender de modo
maioria dos alimentos veiculados em propagandas televisivas é lógico e esclarecido os hábitos alimentares praticados por
de alta densidade energética, ricos em sódio, gorduras e açúcares, seus pais e que, tão precocemente, tiveram por referencial;
e pobres em fibras alimentares e carboidratos complexos(6,7). logo, se tornariam aptos a criarem suas próprias opções de
cardápio e estilo de vida(9).
Brincadeiras e atividades físicas: Brincar é mais que uma atividade física sem consequências
promoção de saúde para a criança. Brincando, ela não apenas se diverte, mas
também aprende, cria e recria e relaciona-se com o mundo.
Quaisquer intervenções feitas por profissionais da saúde Desenvolve, ao mesmo tempo, aptidões nos campos cogni-
devem levar em conta a adoção de hábitos alimentares sau- tivo, linguístico, espacial e visual, corporal e social – como
dáveis, estando inseridas em um amplo contexto de promo- a capacidade de esperar (tolerância), de estabelecer acordos
ção de saúde e adaptadas à realidade social infanto-juvenil, e de criar vínculos afetivos(2).
atuando sobretudo no ambiente familiar e escolar. Por mais educativa que a programação possa ser, a intera-
No ambiente familiar é fundamental que os pais partici- ção com os desenhos e personagens animados é autolimitada.
pem ativamente das escolhas alimentares de seus filhos desde Em geral, as imagens são veiculadas rapidamente e a criança
a primeira infância. Participar deste processo, no entanto, é não tem tempo suficiente para compreender parte do que
muito mais do que o preparo da comida; é preconizar que é transmitido, nem para desenvolver um senso crítico ou
as refeições sejam feitas à mesa, tornando aquele momento raciocínio lógico a respeito de tais informações(9).
prazeroso à criança e ao adolescente. Assim sendo, como a televisão abrevia parte da criativida-
Por outro lado, vale salientar a importância dos pais na de das crianças, os pais devem investir nas brincadeiras, como
adoção, ou não, de hábitos saudáveis. Durante o desenvol- alternativa extremamente benéfica ao desenvolvimento cog-
vimento neuropsicomotor da criança, a figura materna e nitivo de seus filhos. Afinal, além da função educativa, o ato
paterna é tida como referenciais a serem seguidos e imitados. de brincar pode ser ótimo exercício para o corpo. Percebidas
Assim, escolhas nutricionalmente adequadas serão incorpo- como atividades físicas, as brincadeiras em ambiente aberto
radas aos comportamentos alimentares futuros da criança se atuam como uma importante medida preventiva e mesmo
a dieta de seus próprios pais for condizente com aquela que terapêutica contra a obesidade infanto-juvenil e devem, por-
preconizam. tanto, ser fomentadas tanto em casa como na escola.
Logo, ações sobre o ambiente familiar requerem interven- Em suma, parece evidente que a introdução da TV no
ções sobre um amplo contexto e implicam não só mudanças cotidiano das crianças brasileiras tem progressivamente
de hábitos de toda a família, englobando desde refeições à obliterado parte de experiências imprescindíveis para seu
mesa – e não à frente da TV – até prática de atividades físicas desenvolvimento, para o fortalecimento dos laços fami-
em conjunto, sejam elas desportivas, sejam passeios alter- liares e mesmo para a criação de vínculos sociais. Logo, é
nativos aos finais de semana. Assim, evita-se que crianças e imprescindível que quaisquer ações estimulem uma dieta
adolescentes fiquem reclusos e sedentários em casa, assistindo alimentar equilibrada, associada a brincadeiras e atividades
à televisão ou usando o computador. físicas, e fomentem alternativas atraentes e prazerosas que
Quanto ao ambiente escolar, a meta da educação nutri- ocupem o tempo de lazer em substituição à televisão e ao
cional deve ser a instrução das crianças e adolescentes sobre computador(9).
os princípios gerais de nutrição e alimentação, orientando
comportamentos específicos para que estes se tornem aptos As embalagens como meio
a fazerem escolhas conscientes ao longo de suas vidas(8). de comunicação
Com isso, se no ambiente familiar a promoção de há-
bitos saudáveis se faz principalmente por certa ‘imitação’ Uma embalagem é o recipiente, pacote ou o envoltório
dos comportamentos dos próprios pais, na escola ocorre destinado a garantir a conservação e facilitar o transporte e
a conscientização das escolhas alimentares, por meio da manuseio dos alimentos(10). Tradicionalmente, as embalagens
incorporação de conhecimentos básicos de nutrição e do para alimentos têm sido planejadas para proteger o produto

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Orientação nutricional de crianças e adolescentes e os novos padrões de consumo: propagandas, embalagens e rótulos

funcionando, assim, como uma barreira inerte entre o ali- seu próprio nome ou sua marca, especialmente quando am-
mento e o ambiente(11). bos já estão difundidos no mercado de consumo. Logo, uma
Para o consumidor, é a parte visível do alimento, que boa legibilidade garantirá ao consumidor uma rápida e fácil
traduz a identidade do produto e o fabricante, definindo as visualização do alimento desejado na prateleira.
reações de vinculação, aceitação ou rechaço do produto. Em Entretanto, talvez a coloração seja o atributo de maior
muitos casos, é o único meio de comunicação entre o produtor importância. Utiliza-se a influência da cor e dos seus efeitos
e o consumidor do alimento. Dessa forma, as embalagens psicológicos e sensitivos sobre o consumidor para lançar pro-
apresentam-se como o principal elo de comunicação entre o dutos que agem diretamente sobre esses fatores(12). Em geral,
consumidor, o produto e a marca, de modo que através dela a cor relaciona-se, sobretudo, com a característica do produto.
este identifica, escolhe e usa ou não o produto. Assim, ela segue determinados padrões que, normalmente, são
No segmento alimentício, utilizar a embalagem e o rótulo usados por designers de embalagens. As cores quentes, como
para atrair a atenção, aumentar o valor da marca entre os o vermelho e amarelo, são aplicadas preferencialmente em
consumidores finais e comunicar os benefícios do produto embalagens de alimentos, bebidas e redes de fast-food, uma
diretamente na prateleira da loja constitui-se, decerto, em vez que estimulam o sistema nervoso central, abrem o apetite,
fator de vantagem competitiva(12). instigam uma sensação de bem-estar e alegria, destacam-se
visualmente e são as mais rapidamente identificadas. Em
As embalagens: “vendedores mudos” contrapartida, cores frias como azul, prata e tons pastel são
frequentemente usadas em alimentos light, já que provocam
Nas últimas décadas, as empresas alimentícias passaram a a sensação de leveza, equilíbrio, frescor e a diminuição do
investir fortemente no design das embalagens de seus produ- apetite. Já outras cores, como o verde, são pouco empregadas
tos, agregando valor a eles ao adequá-los de forma eficiente em guloseimas como biscoitos, porque lembram bolor, dando
às necessidades e expectativas do consumidor, dando enfoque falsa impressão de que o alimento está estragado(14).
especial à praticidade, conveniência, conforto e proteção ao
produto. Tais atributos podem ser potencializados pela em- A praticidade das embalagens
balagem graças ao seu alto poder de comunicação, evocando
valores emocionais, que também têm reflexos práticos e O ritmo acelerado da vida moderna criou um novo con-
objetivos como percepção de funcionalidade, identidade e, sumidor, o qual se caracteriza fundamentalmente pela falta
principalmente, fidelidade à marca(13). de tempo. As empresas alimentícias incorporaram à estética
As embalagens, como vendedores mudos, contêm em seu e funcionalidade de suas embalagens componentes que su-
design mensagens visuais diretas, transmitindo significados e prissem essa demanda. As formas tornaram-se mais arrojadas
imagens que despertam no consumidor a predisposição para e os tamanhos mais reduzidos, facilitando o transporte e o
aceitação, compra e utilização do produto. Logo, a percepção consumo. As atuais embalagens individuais de sucos naturais,
das informações dependerá de fatores cognitivos e motiva- refrigerantes e bebidas lácteas, prontas para o consumo, são
cionais do consumidor, dos tipos de códigos utilizados e da facilmente transportadas na bolsa ou na mochila escolar das
forma como são apresentadas na embalagem(12). crianças e adolescentes.
Vistas como alternativas práticas e criativas, pouco se
O design das embalagens discute sobre as implicações da introdução destas novidades
na dieta. Aparentemente inofensivas em seu tamanho redu-
Cada vez mais é necessária a ajuda da estética no marketing. zido, as porções individuais podem apresentar quantidades
Diante de produtos similares, a embalagem é um ponto de significativas de calorias e alto teor de carboidratos, gorduras
diferenciação entre os concorrentes(12). Tendo isso em vista, e sódio. Como o indivíduo come uma menor quantidade do
certos atributos do design agregam valor ao produto e à marca, produto por embalagem, ele acaba ingerindo mais porções
em termos de praticidade e de conveniência e, principalmen- do alimento por dia; isto é, apesar de o consumo de várias
te, no sentido de atrair o consumidor, despertar sua atenção unidades poder levar ao desequilíbrio energético e nutricional
e evocar emoções. da dieta diária(9).
A legibilidade em design diz respeito à clareza das palavras É notória a plasticidade das empresas alimentícias, já
na embalagem. O “cartão de visita” de muitos produtos é o que elas costumam renovar a linha de seus produtos no

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sentido de atender às novas demandas. Contudo, a so- Quanto à informação nutricional obrigatória, algumas
ciedade vem, de forma progressiva, renegando refeições alterações aprovadas pela Resolução da Diretoria Colegiada
nutritivas e adequadas à saúde em nome da praticidade e (RDC) nº 359 e a nº 360 foram(17,18):
da comodidade proporcionadas pela introdução de novas • Elementos fundamentais e obrigatórios dos rótulos: lista
embalagens. de ingredientes em ordem decrescente de quantidade uti-
Se esse é um fato irreversível, para evitar danos maiores, lizada no produto; a origem referente ao fabricante, local
as indústrias poderiam produzir embalagens individuais de de fabricação, etc; prazo de validade; lote para controle da
alimentos nutricionalmente adequados, com mais fibras e empresa em caso de algum erro na produção, facilitando
a localização de todas as outras unidades produzidas
menos gorduras, açúcares e sal. Exemplos dessa tendência
conjuntamente; conteúdo líquido expresso em massa ou
positiva são as barras de cereais. Fica, no entanto, com a
volume; e informação nutricional obrigatória(17).
difusão desses hábitos, mesmo com adequação nutricional
• Componentes a serem declarados obrigatoriamente: valor
dos alimentos, não assegurada a gratificação emocional e
energético, carboidratos, proteínas, gorduras totais, sa-
afetiva do preparo do alimento, da refeição em família e o turadas e trans, fibras alimentares e sódio. A informação
significado cultural dessa prática(9). nutricional deve ser expressa em porções do alimento (g
ou mL) e apresentar medida caseira correspondente, tendo
Rótulos como referência utensílios domésticos (colheres, xícaras
ou copos)(17). As vitaminas e os sais minerais, quando pre-
Rótulo é qualquer informação referente a um produto que sentes em quantidades maiores ou iguais a 5% da ingestão
esteja transcrita na embalagem. É um elo na comunicação diária recomendada (IDR) por porção, bem como outros
entre produtores e consumidores, principalmente quando se nutrientes considerados relevantes pelo fabricante podem
trata da rotulagem de alimentos(15). ser declarados opcionalmente. Não obstante, sabe-se que
Dados recentes demonstraram que 70% das pessoas con- tais nutrientes estão frequentemente presentes nos rótu-
sultam rótulos dos alimentos no momento da compra; no los e até nas propagandas televisivas de produtos como
entanto, mais da metade não compreende adequadamente salgadinhos do tipo snacks e guloseimas. Na maioria das
o significado das informações. Outra pesquisa, realizada vezes, a informação não é enganosa; entretanto, pode levar
em Brasília, confirma esse resultado: 74,8% dos pesqui- a uma interpretação errônea da qualidade nutricional e
sados leem as informações nutricionais, embora apenas de supostas vantagens no consumo de alimentos que,
25% desse grupo tenha o hábito de ler os rótulos de todos como se sabe, devem ser desestimulados na dieta infanto-
os alimentos. Mais da metade desses consumidores que juvenil.
consultava os rótulos lia apenas os referentes a alimentos • Valor de referência diária (%VD) em 2.000kcal: o valor
de 2.000kcal, pré-estabelecido como padrão para ser
específicos, com o objetivo de conhecer seu valor calórico.
utilizado em rótulos de alimentos embalados (%VD),
Os resultados obtidos em ambas as pesquisas indicaram
não pode ser utilizado como referência para todas as
que, apesar de a população considerar importante que o
faixas etárias. Por conseguinte, é necessária a observação:
rótulo de alimentos contenha as informações nutricionais,
% Valores Diários com base em uma dieta de 2.000kcal
a maioria não sabe utilizá-lo(16). ou 8.400kJ. Seus valores diários podem ser maiores ou
menores dependendo de suas necessidades energéticas(18).
Agência Nacional de Vigilância Sanitária e Apesar de tal frase contemplar a variabilidade das neces-
regulamentações sidades nutricionais das crianças segundo sexo, idade e
atividade física, o fato é que os pais desconhecem os valo-
Desde 2003, quando se tornou obrigatória a rotulagem res do IDR infanto-juvenis(19). Assim, o % VD com base
nutricional, as informações contidas nos rótulos tornaram- em uma dieta de 2.000kcal acaba se tornando referência,
se mais complexas. Passou-se a exigir maior habilidade do dando uma dimensão incorreta do quão representativo
consumidor para interpretá-las e entendê-las e, consequen- para o consumo diário serão os alimentos. Consomem-se
temente, ainda mais conhecimento do profissional da saúde muito mais guloseimas e refrigerantes, por exemplo, sem
para instruir os pacientes e seus familiares. a idéia de que isto pode facilmente ultrapassar a IDR.

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Orientação nutricional de crianças e adolescentes e os novos padrões de consumo: propagandas, embalagens e rótulos

Portanto, durante a orientação alimentar, é imprescindível canismos naturais de defesa do corpo e que, adminis-
que o profissional da saúde enfatize aos pais que nem sempre trados adequadamente, conferem benefícios à saúde(21).
os percentuais do IDR indicados nos rótulos correspondem Na indústria alimentícia são encontrados em laticínios
à alimentação adequada à idade de seus filhos. como leite fermentado, iogurtes e queijos. Já os pre-
Quanto às informações nutricionais complementares, bióticos são carboidratos não-digeríveis que afetam
estas são quaisquer representações que afirmam ou sugerem beneficamente o corpo, estimulando seletivamente a
que um alimento possui uma ou mais propriedades nutri- proliferação e/ou atividade de bactérias desejáveis no
cionais particulares relativas ao seu valor energético e/ou seu cólon. Utilizados na fabricação de inúmeros alimen-
conteúdo de nutrientes(18,20). Destacam-se: tos, conferem consistência a produtos lácteos, maciez
• Alimentos diet versus alimentos light(20): os alimentos diet a produtos de panificação e crocância a biscoitos com
têm formulação especial para atender pessoas que apresen- baixo teor de gordura(21).
tam disfunção e/ou distúrbio físico ou metabólico e neces-
sitam de dietas específicas, como os portadores de diabetes Selos de qualidade
melito, hipertensão e fenilcetonúria. Estes alimentos
não devem ter algum determinado ingrediente (açúcar, Em 1991, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC)
sódio, glúten, entre outros), o qual será substituído por criou o Selo de Aprovação – SBC para certificar a qualidade de
elementos permitidos em suas dietas, estritamente por alimentos cuja composição nutricional atende às exigências
razões de saúde. Todavia, isso não significa a redução do estabelecidas pela comunidade científica para a prevenção dos
valor calórico do alimento em questão. Por outro lado, os fatores de risco cardiovasculares, promoção ou manutenção
alimentos light são aqueles que têm reduzido valor energé- da saúde ou cuja composição não represente risco à saúde(22).
tico, contendo quantidades inferiores a valores pré-fixados Os alimentos candidatos à obtenção do selo submetem-se à
pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), criteriosa análise da composição nutricional, em laboratórios
conforme o tipo de componente. Assim, há redução de credenciados pela Anvisa. Portanto, um produto “aprovado”
qualquer um de seus macronutrientes, comparados a um segue rigorosamente os critérios estabelecidos pelo Comitê
produto convencional do mesmo tipo. do Selo de Aprovação SBC, baseados em padrões nacionais
• Alimento fonte versus alimento rico ou de alto teor: estes e internacionais de alimentos considerados saudáveis ao
termos normalmente se referem à quantidade de proteí- coração(22).
nas, fibras alimentares, vitaminas e minerais, nutrientes A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) também tem
cujo consumo é desejável e deve ser estimulado. Um seu selo: o Selo de Certificação da SBP, destinado não só ao
alimento fortificado/enriquecido é aquele ao qual foi segmento alimentício, mas também às indústrias de brinque-
adicionado um ou mais nutrientes essenciais contidos dos, vestuário, cosméticos e higiene, além de serviços como:
ou não no alimento, com o objetivo de reforçar o seu escolas de educação infantil, hospitais, profissionais especia-
valor nutritivo e/ou prevenir ou corrigir deficiência(s) lizados no atendimento de crianças e adolescentes(23).
demonstrada(s) em um ou mais nutrientes na alimen- Tais iniciativas representam uma importante aliança
tação da população ou em grupos específicos(20). Nesse entre profissionais da saúde e indústria alimentícia, sendo
contexto, o que diferencia um alimento fonte de um uma oportunidade ímpar de órgãos médicos competentes e
rico é a quantidade mínima de nutriente (em g ou % respeitados avaliarem a qualidade de produtos destinados ao
do IDR de referência) em 100g ou em 100mL do pro- público infanto-juvenil e à sociedade como um todo.
duto, segundo valores pré-fixados pela Anvisa(20). Como É fato que, principalmente, entre as classes mais abastadas,
propõem os próprios termos, os alimentos de alto teor a preocupação com uma alimentação saudável e seus benefí-
sempre conterão quantidades superiores de determinado cios a longo prazo criou um novo perfil de consumidor, cada
nutriente em relação às fontes. Se o consumidor tiver tal vez mais consciente em relação à importância da qualidade
conhecimento, decerto suas escolhas poderão ser feitas dos produtos que compõem sua mesa. Esses certificados sur-
com maior critério e propriedade. gem, pois, como alternativas ao desconhecimento da leitura
• Alimentos probióticos versus prebióticos: probióticos dos rótulos por parcela considerável da sociedade brasileira.
são culturas que estimulam a proliferação de bactérias Ainda que o consumidor não saiba ler corretamente as in-
benéficas da microbiota intestinal, reforçando os me- formações nutricionais, a presença de um ‘selo de garantia’

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emitido por profissionais da área médica é vista como uma as gerações de crianças nascidas em ambiente que esti-
‘marca da saúde’ de diversos produtos presentes nas prate- mula o sedentarismo e o consumo excessivo e rotineiro
leiras dos supermercados. Confere-se, portanto, maior cre- de alimentos pouco saudáveis acumulam riscos desde o
dibilidade aos alimentos e fabricantes e, simultaneamente, nascimento. Estarão, portanto, mais propensos a desen-
maior segurança para o consumidor em relação aos benefícios volverem doenças crônicas limitantes mais precocemente.
do consumo adequado daquele produto. Por esses motivos, torna-se urgente a adoção de práticas
preventivas com esclarecimento aos familiares, visando
Conclusões minimizar tais efeitos.
Logo, o conhecimento sobre a composição nutricional de tais
A partir desta abordagem sobre as propagandas de ali- alimentos, as regras de rotulagem e embalagem, assim como as
mentos e sobre o significado das embalagens e dos rótulos técnicas de propaganda e marketing são, de fato, indispensáveis
e sua importância no momento da compra, é fundamental para que o profissional de saúde infantil possa alertar e orientar
que os profissionais da saúde saibam lidar com um marketing adequadamente seus pacientes e familiares na prática clínica.
que, em nome da lucratividade, tem investido pesadamente
no design de seus produtos, em prol das novas tendências de Agradecimentos
consumo de seus consumidores.
A literatura evidencia que os riscos nutricionais e de Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
sedentarismo para o desenvolvimento da obesidade e do- Tecnológico (CNPq) e ao Instituto Alana – Projeto Criança
enças crônicas associadas são cumulativos. Dessa forma, e Consumo.

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