Educação Especial
Educação Especial
Educação Especial
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Prof.ª Dr.ª Fabiany de Cássia Tavares Silva
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Prof.ª Dr.ª Geovana Lunardi Mendonça Mendes
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Prof.ª Dr.ª Alexandra Anache Ayache
[...] todos os seres humanos, apesar das inúmeras
diferenças biológicas e culturais que os distinguem
entre si, merecem igual respeito, como únicos entes no
mundo capazes de amar, descobrir a verdade e criar a
beleza. É o reconhecimento universal de que, em razão
dessa radical igualdade, ninguém - nenhum indivíduo,
gênero, etnia, classe social, grupo religioso ou nação -
pode afirmar-se superior aos demais.
Existem pessoas em nossas vidas que nos deixam felizes pelo simples fato de
terem cruzado o nosso caminho, simplesmente porque cada pessoa que passa em nossa
vida é única, sempre deixa um pouco de si e leva um pouco de nós. Reconheço com
gratidão as contribuições de muitos pela compreensão, incentivo e amor que
manifestaram ao longo destes dois anos de estudo. Obrigada a todos, principalmente a:
À Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, por ter sempre lutado pela
melhoria dos cursos implantados por essa instituição e pela escolha dos melhores
professores formadores de opinião.
Aos meus pais, irmã e sobrinho Breno, pelo incentivo e pelo ombro amigo nas
horas de desabafos e lágrimas.
Este estudo objetiva, de forma geral, investigar porque a escola para todos parece estar
sendo tratada como política predominantemente restrita aos indivíduos com
deficiências, distúrbios e problemas, anteriormente tratados pela educação especial. Em
âmbito mais específico, analisar a escola para todos, nesse momento da história,
buscando as interpretações que dão a inclusão escolar como uma proposta
completamente inovadora, que nada tem a ver com o passado e que inaugura uma nova
etapa na educação mundial: a educação para todos, inclusive para os “alunos com
necessidades educativas especiais”, na construção de uma sociedade inclusiva. Diante
disso, apresenta como recorte temporal os anos de 1990 a 2008, por reinventarem os
discursos e as propostas de uma Escola para Todos, a partir das reformas educacionais
da Educação Especial e seus paradigmas, bem como da política de Educação Inclusiva
desencadeada na década de 1990. Para tanto, fundamentados em concepções crítico-
dialéticas, utilizamos a abordagem qualitativa, para dar forma aos seguintes
procedimentos: pesquisa bibliográfica para dar suporte teórico às áreas de discussões
envolvidas; análise documental organizada a partir do levantamento dos dispositivos
legais vigentes nas Legislação Nacional e Declarações Internacionais. Refletindo sobre
a problemática do desenho para a implantação e a regulamentação da Escola para
Todos, percebe-se que há um desafio coletivo posto à sociedade: não um desafio único a
ser superado, ou um modelo único a ser implantado. É preciso pensar a escola como um
lugar eminente de ensino, da criação de conhecimentos e entender que ela deve estar
atenta ao sentido educacional e quanto ao seu significado estrito de formadora de
cidadãos.
The aim of this study is to investigate in a general way why the School for All seems to
be treated as policies predominantly restricted to the deficient individuals with
disturbance and problems; prior, they were treated by the Special Education. In a
specific field, to analyze the School for All at this moment of history, searching for the
interpretations that give the inclusion school as an innovative proposal, it has nothing to
do with the past and it inaugurates a new stage in the world education: the education for
all, including for the "deficient educational special students", in the construction of an
inclusive society. In that way, it presents a temporary space from 1990 to 2008 for
reinventing the speeches and the proposals of a School for All, from the education
reformation of the Special Education and its paradigms, as well as the policies of
Inclusive Education which began in the 1990s. For it, we use the qualitative method,
based on the critical and dialectical conceptions as the following procedures: the
bibliographical research to give the theoretical support to the discussion areas involved;
organized documental analysis from the survey of the legal devices that are in the
National Legislation and the International Declarations. Pondering over the problem
about the installation and settlement of School for All, it is noticed there is a collective
challenge to the society: not an exclusive challenge to be overcome, or something only
to be implanted. It is necessary to think about school as an eminent place of teaching,
knowledge creation, and to understand that it should be attentive to the educational
sense and as far as to its strict meaning of forming citizens.
Key words: School for all; School inclusion; Special education; Education.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 12
1 OS PARADIGMAS INTERPRETATIVOS DA EDUCAÇÃO
ESPECIAL: POR ENTRE OS DISCURSOS E AS PROPOSTAS DE
UMA ESCOLA PARA TODOS 15
REFERÊNCIAS 94
INTRODUÇÃO
1
O termo “invenção das tradições” é utilizado por Eric Hobsbawm para designar um conjunto de práticas
reguladas por regras táticas ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam
inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica, automaticamente,
numa continuidade em relação ao passado. Ver mais em HOBSBAWM, 1997.
12
essa escolaridade, bem como as questões das aprendizagens necessárias neste momento da
educação especial.
Sabemos que grandes conflitos marcam as sociedades atuais, muitos deles
provocados por questões educacionais. Por isso e diante desse contexto, acreditamos que é
necessário avançar a reflexão em torno das pesquisas que visam à política de educação
para todos em uma perspectiva inclusiva.
É certo que a educação formal esteve sempre identificada com os princípios
geradores de desigualdades e diferenças marcadas pela história social, cultural e
educacional brasileira. É certo também que essas tendem a crescer cada vez mais, caso não
dermos um basta nessas atitudes nem sempre veladas e mascaradas, para um
comportamento de respeito mútuo, justiça e solidariedade.
15
CAPÍTULO I
fazer e de inculcar uma cultura que possa intervir na formação dos indivíduos e de
promover transformações nas condições ideológicas e materiais. Para Viñao-Frago (2000)
“[...] esses modos de fazer e de pensar – mentalidades, atitudes, rituais, mitos, discursos,
ações”, estão ancorados em uma infinidade de pressupostos que delimitam que esses
saberes e essas práticas sofrem diversas influências e posicionamentos por parte da escola.
Nesse enfoque, a Educação Especial que, por muito tempo, configurou-se como
um sistema paralelo de ensino, redimensionou seu papel, antes restrito ao atendimento dos
indivíduos deficientes, passando a atuar como suporte à escola regular. Nessa nova
perspectiva, a Educação Especial passa a ser entendida como:
analisar a Educação para Todos e a Educação Inclusiva como prática de educação social,
importante para a inclusão dos alunos deficientes na vida em sociedade.
Na mesma época, houve iniciativas oficiais em âmbito nacional buscando oferecer
aos excepcionais condições de aprendizagem, embora, todas as campanhas tivessem por
finalidade a educação em ambientes específicos, com educadores especializados, treinados
para atender a deficiência individual de cada indivíduo.
A Lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional n. 4024, de 1961, influenciou
decisivamente o movimento de transição do Paradigma de Institucionalização para o
paradigma de serviços. Essa Lei teve como objetivo a garantia do direito à educação em
todos os níveis, inspiradas nos princípios de “liberdade” e nos ideais de “solidariedade
humana” (Dos Fins de Educação, art. 1º §g. no Título II - Do Direito da Educação, no art.
3º) - O direito à educação é assegurado pelas obrigações e no título X – Da Educação de
Excepcionais: artigos 88 e 89.
deficientes também estavam na seleção dos alunos que não respondiam aos padrões
estabelecidos pela escola.
Nesse contexto, portanto, a educação especial foi constituída pelo caráter
caritativo, fundamentada no conceito de normalidade e anormalidade, que determinou
formas de atendimento clinico-terapêutico. Diante disso, surgiram críticas ao Paradigma da
Institucionalização, entre as décadas de 50 a 60 do século passado e, a partir daí,
produziram-se novas idéias fundamentadas no princípio da Normalização.
Esse paradigma norteava, então, sua ação pedagógica por princípios de:
normalização, integração e individualização, entre outros. O princípio da Normalização
fundamentou-se na modificação do indivíduo para sua posterior integração à sociedade; o
de integração envolveu a aceitação daquele que se inseria no contexto social; e o de
individualização pressupunha a adequação do atendimento educacional a cada indivíduo
com deficiência, respeitando seu ritmo e suas características pessoais.
Destacam-se, ainda, as diferentes denominações que foram utilizadas para o
atendimento educacional, nos quais a escola passava a ter um papel importante na
promoção das condições e transformações significativas para a construção da identidade
individual e coletiva dos indivíduos.
Após a revolução de 1964, com a nova forma de governo adotada no país, houve
o surgimento de algumas ações concentradas na área educacional, principalmente devido à
falta de vagas nas escolas e planejamento específico para promover a melhoria do sistema
de escolarização.
Para isso, buscou-se uma solução com a assinatura da Lei n. 4440/1964, que criou
o Salário-Educação destinado à manutenção das quatro séries iniciais para alunos na faixa
etária de sete a doze anos, com a finalidade de combater o analfabetismo. Houve, também,
anterior a essa data, a Conferência de Punta Del Este (1962), ocasião em que o Brasil
assumiu o compromisso de erradicar o analfabetismo, visto que era o país da América
Latina com maior índice de analfabetos.
Após essas decisões, as escolas passaram a receber verbas para sua melhoria,
tanto no aspecto didático quanto para o aprimoramento dos professores, e a Educação
Especial foi contemplada com recursos financeiros de 5%. Foi, também, adotada a Semana
Nacional da Criança Excepcional (de 21 a 28 de agosto), em todos os municípios. O que se
desejava com esse movimento era uma reflexão para mobilizar a sociedade em torno das
necessidades dos deficientes. Até hoje perdura essa comemoração com a alteração,
sugerida pela Organização das Nações Unidas (ONU), para “Semana Nacional das Pessoas
Portadoras de Deficiências”.
Em meio a esse cenário surge a Campanha de Educação e Reabilitação de
Deficientes Mentais, por meio do Decreto n. 48961, de 1960, com a finalidade de
promover em todo o território nacional a educação, treinamento, reabilitação e assistência
educacional das crianças “retardadas” e com outras deficiências. Com essa mesma
disposição, isto é, a visão de reabilitação dos deficientes, a Lei n. 4024/1961 trataria da
Educação Especial.
25
[...] a primeira seria a avaliação, que identificava tudo que deveria ser
modificado no individuo de forma a torná-lo o mais normal possível; a segunda
seria a intervenção, na qual a equipe ofereceria ao indivíduo deficiente,
atendimento formal e sistematizado e a terceira o encaminhamento do deficiente
aos demais serviços da comunidade (BRASIL, 1998)2.
2
Síntese extraída do livro Escola Viva. Do MEC/SESPE/FGV-IESAE n.1/88. O Processo Histórico de
Construção de um Sistema Educacional Inclusivo no Brasil – 1998.
28
imediato e contínuo aos recursos disponíveis poderia ser normalizada sua condição e,
assim poder conviver com os demais considerados “normais”.
Assim, no Paradigma de Serviços, o trabalho era organizado com base em um
conjunto de terapias individuais (fisioterapia, fonoaudiologia, psicologia, psicopedagogia),
com atuação a partir de um modelo médico ou clínico e com pouca ênfase na atividade
acadêmica. O trabalho educacional era realizado em forma de “exercícios de prontidão
para a alfabetização” (GLAT, 1989).
Devido a todos esses direcionamentos, entende-se que, no real funcionamento das
instituições, essa igualdade sempre esteve longe de ser efetiva. As discriminações que
operavam nessa realidade são consideradas mais como ilegítimas e resultantes dos
desajustes do sistema. Porém, por trás desse procedimento, baseado na negligência em
relação às diferenças entre os indivíduos, sempre houve uma função discriminadora,
apoiada no tratamento igual para os diferentes, como sendo uma função socializadora e
integradora, firmada na existência de um mecanismo comum a todos.
O Paradigma de Serviços, que veio substituir o Paradigma de Institucionalização,
trouxe um conceito de integração bastante equivocado, pois transferiu toda e qualquer
responsabilidade de mudança para o indivíduo deficiente com a incumbência dele se
assemelhar aos demais indivíduos para, então, ser integrado ao convívio social.
Essa condição integradora, no caso específico do deficiente, resultou em uma
exclusão automática desse segmento, pois o contingente dos possíveis “eleitos”, não
deficientes, atendidos pelo sistema regular de ensino e com reais perspectivas de sucesso
social mais abrangente foi priorizado. Ser diferente implica em estigmatização,
preconceitos sociais, culturais e até mesmo familiares que, talvez por excesso de zelo,
impede o deficiente de participar como indivíduo com os mesmos direitos sociais e
políticos na sociedade.
Somente com a aprovação da Lei n. 5692, de 1971, encontramos uma proposição
diferenciada para a Educação Especial, que passou de uma visão de Reabilitação dos
deficientes à atividade paralela do ensino comum. No artigo 9º, essa Lei previa “tratamento
especial aos excepcionais”.
A sociedade brasileira é uma só, porém formada pela pluralidade de indivíduos,
com suas características próprias e peculiares, as quais, apesar de diferenciarem-se entre si,
devem ser tratadas igualmente, já que a lei não faz diferença entre elas. Essa nova visão
sobre igualdades e diferenças requeria uma nova abordagem de educação, de escola e de
indivíduo.
29
Por meio do Decreto n. 72.425, de três de julho de 1973, foi criado o Centro
Nacional de Educação Especial (CENESP). Esse órgão ficou responsável pelo atendimento
aos excepcionais, com a finalidade, entre outras, de planejar, coordenar e promover o
desenvolvimento da Educação Especial. No ano seguinte, o Parecer n. 3.763/74 dispõe
sobre o tratamento especial para o aluno cego no exame vestibular.
Em 1977, a Portaria Interministerial n. 477, do Ministério de Educação, estabelece
as diretrizes de ensino para o atendimento integrado dos excepcionais no sistema regular
de ensino e em instituições especializadas com assistência médico-psicossocial. Surgiram
os centros de reabilitação e as clínicas especializadas; proliferaram as escolas especiais,
geralmente oferecendo serviços de avaliação, de intervenção e de acompanhamento.
O princípio da normalização dizia respeito a uma colocação seletiva do indivíduo
deficiente na classe comum do ensino regular. Nesse caso, o professor de classe comum
não receberia um suporte do professor da área de educação especial. Os estudantes do
processo de normalização precisavam demonstrar que seriam capazes de permanecer nessa
classe comum pelo próprio esforço.
No complexo quadro econômico, político e social mundial, um novo modelo de
atendimento na Educação Especial ganhou força e evoluiu para o Paradigma de Suporte,
cuja contribuição visou preparar a integração do indivíduo na vida em comunidade.
conquista pelos méritos pessoais. Essa mudança podia ser alcançada se o indivíduo
deficiente atingisse um nível compatível com os padrões sociais vigentes.
O Paradigma de Suporte substituiu o de Serviços e propôs uma visão mais
coerente de inclusão, por revelar que havia uma série de medidas que deveriam ser
tomadas em relação aos indivíduos deficientes, além de avaliá-los e capacitá-los. Essas
medidas passavam por atitudes de respeito, dignidade e justiça, principalmente de
superação da questão do indivíduo isolado. Entendia-se por adaptação a transferência dessa
responsabilidade de mudança para a sociedade, que deveria garantir o acesso a todos,
independentemente das peculiaridades de cada indivíduo.
Esse suporte seria oferecido no âmbito social, econômico, físico, instrumental,
para, então, efetivar a inclusão social. Sabe-se, porém, que ainda há muito a ser feito para
efetivar esses princípios, sem deixar de considerar, também, uma série de entraves sociais e
políticos que devem ser superados para que se atinja o proposto. Para Aranha (2003, p. 15),
Paradigma de Suporte é todo [...] “e qualquer tipo de ajuda que permita à pessoa com
deficiência o maior nível de autonomia e de independência, na administração e no
gerenciamento de sua própria vida, em ambiente o menos restritivo possível”.
O Paradigma de Suportes, portanto, objetiva-se no ajuste do contexto social, de
forma a poder garantir, inclusive ao segmento populacional constituído pelos indivíduos
com deficiência, as condições que cada um necessita para ter acesso ao espaço comum da
vida em comunidade e participar do debate social de idéias e dos processos decisórios da
sociedade.
A relação da sociedade com os indivíduos deficientes, no contexto desse novo
paradigma, mudou substancialmente, já que se buscou garantir serviços e recursos que
pudessem "modificar" a pessoa portadora de deficiência, no sentido de favorecer-lhe a
aproximação maior possível do estado "normal".
A partir de 1970, fortalece-se, cada vez mais, um sistema paralelo de ensino,
nesse contexto de educação regular e especial. Porém, com a promulgação da Lei n.
5692/1971, que assegurava as reformas do 1º e do 2º graus de ensino, com ênfase ao ensino
profissionalizante, houve uma motivação para numerosas ações de dinamização da
educação e amparo aos excepcionais.
Para Bueno (1994), Ferreira (1994) e Jannuzzi (1992), 1970 foi uma década de
significativa importância para a Educação Especial, não só pela ampliação dos serviços,
mas também na questão das políticas públicas de atendimento ao indivíduo deficiente.
31
oportunidades ganharam força nas políticas públicas norteadas por vários documentos,
bem como, a mobilização de grupos sociais e organizações políticas.
Em 1985, o CENESP elabora um novo plano, intitulado “Educação Especial –
Nova Proposta”, com a finalidade de atendimento aos indivíduos com deficiência, com
problemas de conduta e superdotação “seja compreendido como responsabilidade coletiva”
(MAZZOTTA, 2003, p. 102).
Em 1986, foi instituída a Coordenadoria para a Integração da Pessoa Portadora de
Deficiência (CORDE), que elaborou um Plano de Educação Especial, com o objetivo de
implantar uma “Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência”.
Esse Plano destaca que o atendimento aos indivíduos deficientes “só podia ser equacionado
dentro do contexto geral das políticas sociais, e por meio dos sistemas básicos de saúde,
educação, previdência e assistência” (MAZZOTTA, 2003, p. 108).
De 1986 a 1989, o Plano Nacional de Desenvolvimento da Nova República
aponta como principal diretriz para a educação: “assegurar acesso a todos ao ensino de boa
qualidade” “[...] enquanto direito social, com base em soluções que traduzem os anseios da
coletividade” (MAZZOTTA, 2003, p. 104).
Pode-se perceber que, entre as décadas de 1980 e 1990, ampliou-se o debate de
idéias acerca do processo de integração, passando a contar, inclusive, com a participação
do próprio segmento populacional constituído pelos indivíduos com deficiência. Os
principais argumentos apresentados defendiam que elas tinham, sim, o direito a receber
todo e qualquer serviço de que necessitassem para seu desenvolvimento e alcance do
melhor nível de autonomia social e pessoal possível.
Um dos argumentos de defesa, no que se refere aos indivíduos deficientes pelos
dispositivos garantidores de direitos a essa população, foi a legislação, ainda em vigor,
marco fundamental de mudança na escola pública. A Constituição Federal de 1988, no
artigo 208, inciso III, estabelece como direito o atendimento “educacional especializado,
preferencialmente na rede regular de ensino”.
Esse dispositivo tem conferido a legalidade constitucional aos discursos que
enfatizam, com base nos princípios de garantia de direito dos alunos deficientes, de terem o
acesso e a permanência de todos no contexto da escola. Embora, em âmbito federal,
diversas leis e diretrizes institucionais passaram a estabelecer como direito social aos
indivíduos deficientes freqüentarem o ensino comum, essa experiência ainda está por se
concluir nas escolas brasileiras.
33
para Todos, realizado em Jomtien, na Tailândia, Espanha em 1990, marco de uma nova
história para a educação mundial.
Portanto, ao se pensar em inclusão, não se pode ter uma visão ingênua, de que está
garantido em lei, vai acontecer, é preciso aproveitar o discurso atual de “escolas para
todos” e buscar caminhos para que ela se efetive tendo como meta uma educação de
qualidade.
Com a elaboração do Plano Nacional de Educação, aprovado em 10 de fevereiro
de 1998, pelo Projeto de Lei n. 4155, propõe-se à apresentação de novos objetivos: a
elevação do nível de escolaridade, a melhoria da qualidade do ensino, a redução das
desigualdades e a democratização da gestão do ensino público. Nesses objetivos está
previsto atender às necessidades educacionais da maioria da população; mudar o modelo
social vigente; transformar a sociedade e torná-la de fato democrática.
Não podemos negar os avanços das proposições em defesa da política de inclusão,
baseada nos princípios éticos voltados para a busca de igualdade e justiça social,
principalmente, quanto à democratização de uma educação pública, gratuita, laica e de
qualidade para todos. A falta de qualidade desse ensino coloca-nos frente ao quadro
demonstrativo de exclusão, em todos os níveis e modalidades, quando esse se apresenta
por uma grande parcela da população escolar.
A crise educacional brasileira tem-se expressado, ao longo de décadas, por altos
índices de repetência e evasão escolar, mas sabe-se também, que elas extrapolam as
questões pedagógicas. Isso tem sido agravado e reforçado pelo conjunto das políticas
públicas adotadas pelo governo brasileiro e, principalmente, aos ditames das políticas
definidas pelo Banco Mundial. Em conseqüência do alinhamento com a política neoliberal,
o País vem sofrendo com a limitação das verbas destinadas à educação.
Nesse sentido, evidencia-se a necessidade de políticas públicas e legislações
educacionais voltadas para a proposta e diretrizes educacionais, condizentes com as
necessidades dos indivíduos com deficiência, historicamente excluídas da escola, para a
compreensão e a intenção de garantir educação para todos.
Carmo (2001) afirma existirem duas correntes no que diz respeito à educação
inclusiva: “a que respalda a inclusão em base legal do “direito de todos” e dever do Estado,
e a dos que visam adaptar a escola em seu caráter aparente”. Para o autor, essas correntes
não apresentam consistência em seu discurso para sustentar a inclusão.
Dessa forma, os que buscam respaldar a inclusão nos termos da parte legal,
acabam pondo em prática uma ação desarticulada, sem consistência e compromisso, com a
40
realidade objetiva das escolas, proporcionando segregação dos indivíduos deficientes, que,
incapazes de responder às exigências da escola regular, acabam mais uma vez excluídos de
seu interior. Os que acreditam que para ocorrer inclusão o mais importante é reformar as
escolas, promovendo mudanças, tais como: adaptações arquitetônicas, adequação dos
conteúdos curriculares, preparação dos professores e outras alterações de caráter
metodológico, desconsideram a incompatibilidade histórica que sempre existiu entre os
projetos político-pedagógicos das escolas especiais e os das regulares, propondo alterações
superficiais na organização do espaço escolar.
Entende-se que o momento atual é, talvez, o mais importante e ao mesmo tempo o
mais conflitante para a Educação Especial, tanto no Brasil como no mundo, pois a junção
entre Educação Geral e Educação Especial transforma-se na dicotomia existente entre
ambas em vertente única: a Educação Inclusiva. Carmo (2001, p. 47) afirma ser necessário,
na perspectiva inclusiva:
para uma perfeita integração. Para que de fato a escola seja integradora e inclusiva, aberta
à diversidade dos alunos, é fator essencial a participação da comunidade.
Quanto às escolas especiais, a política de inclusão as reorienta para prestarem
apoio aos programas de integração. Mas esse atendimento não se limita à área educacional,
mas na articulação e na cooperação. Essas dependem da colaboração, inclusive em termos
de recursos de diferentes órgãos do Poder Público, em particular os vinculados à saúde,
assistência e promoção social.
Para analisar o dispositivo constitucional impresso nas normas brasileiras, quanto
à valorização e a permanência dos alunos nas classes regulares, eliminando a nociva
prática de encaminhamento para classes especiais daqueles que apresentam dificuldades
comuns de aprendizagem, problema de dispersão de atenção ou de disciplina, requer um
esforço determinado das autoridades educacionais para que se concretize a política de
inclusão.
É por meio da educação, que o indivíduo exerce sua cidadania e seu
desenvolvimento e se qualifique para o trabalho, com essa medida, espera-se contribuir
para a redução das desigualdades sociais e regionais.
De acordo com Mendes (2001), a educação inclusiva faz aflorar a defesa dos
direitos dos indivíduos em situação de exclusão no processo educacional. Dessa forma,
refletir sobre os fundamentos da educação inclusiva significa analisar o que está na base
dessa reflexão, e é importante enfatizar os dispositivos legais favoráveis à inclusão. Osório
(2007, p. 44) afirma que:
CAPÍTULO II
Hoje, dezoito anos após a promulgação dessa Lei, na análise desse documento fica
evidente a influência legal dos direitos atribuídos à infância e à juventude. Podemos dizer,
também, que, até hoje, nenhum documento legal foi capaz de tornar exeqüível a realidade
de igualdade, tanto do ponto de vista específico como global. Portanto, os problemas
enfrentados pelas crianças e pelos adolescentes, ou melhor, a violação de seus direitos,
parece fazer parte da cultura adultocêntrica.
Nosso País exige soluções que precisam ser subsidiadas por um corpo de
conhecimentos significativamente mais amplo e mais confiável, como as leis e além delas.
Essa leitura nos dá a garantia de pistas de que esses direitos sociais expressos guiam para a
necessidade de colaboração da sociedade e da família para o alicerce e promoção do
desenvolvimento saudável das crianças e jovens. O acesso à educação e a freqüência com
sucesso em uma instituição educativa significa, além do aprendizado dos conteúdos
formais, a aquisição de sociabilidade e o exercício da cidadania. As condições para a
construção de uma sociedade com justiça social dependem, na maioria das vezes, da
universalização do ensino básico com qualidade.
Existe, entretanto, muito a ser feito para que essa Lei se torne, de fato, uma
ferramenta de amparo infanto-juvenil, sobretudo, quando se trata da educação e do trabalho
infantil, visto que qualquer criança ou adolescente tem o direito de matricular-se numa
escola pública ou particular, visto que, “lugar de criança é na Escola”.
Cabe ressaltar, ainda, que, no Brasil, cresceu o número de matrículas nas escolas
públicas, contrapondo-se a essa posição, a permanência desses ainda está retratada na
46
figura do funil, muitos entram, mas poucos permanecem. Para repensar esse lugar que é a
escola, faz-se necessário o mapeamento do número de crianças com idade entre 7 e 14
anos, que estão fora da escola, período em que são introduzidos os valores sociais. Essas
crianças em início de aprendizado estão vivendo na rua ou em trabalhos escravos, lugares
pouco contributivos para o bem estar dessas crianças.
Segundo dados da Unesco, no Brasil, existem cerca de 33 milhões de analfabetos,
sendo que 5,5 milhões são crianças. As desigualdades sociais refletem também na
educação, visto que, nas classes menos favorecidas e com o agravamento da crise
econômica, torna-se mais visível o exército de crianças e adolescentes oriundos das
famílias pobres que desenvolveram nas ruas estratégias de sobrevivência. Esse fato muito
contribuiu para que inúmeras crianças ingressassem cada vez mais cedo no mercado de
trabalho.
Um país que não consolida em suas legislações o amparo legal às crianças e aos
adolescentes esgota muitas possibilidades de se criar um caráter civilizador capaz de
formar a base de um referencial de identidade do futuro adulto.
As leis contribuem para romper barreiras na difusão dos direitos, às vezes,
inacessíveis para as classes sociais desfavorecidas. Nesse sentido, juristas enfatizam que o
Estatuto não deve ser utilizado apenas como instrumento de punição, mas como caminho
para implementar políticas públicas e ensinamentos que têm o objetivo de reeducar,
socializar e proteger as crianças e os adolescentes.
Para o entendimento de tais proposições e para seguir a lógica temporal,
sugerimos a análise dos compromissos assumidos nos artigos da Constituição Federal de
1988, sobretudo no art. 205, que contempla “a educação como direito de todos” e no art.
214, a obrigatoriedade de elaborar um Plano de Educação Nacional, que conduza à:
I – erradicação do analfabetismo;
II – universalidade do atendimento escolar;
III – melhoria da qualidade do ensino;
IV – formação para o trabalho;
V – promoção humanística, científica e tecnológica do país (p. 8).
do Plano foi a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais que atendem à atual
dinâmica escolar.
O Plano Nacional de Educação (PNE) é um documento-referência que contempla
dimensões sociais, culturais, políticas e educacionais brasileiras, e que reflete o caráter
coletivo e democrático de sua elaboração e a defesa clara de princípios éticos voltados para
a busca de igualdade e justiça social, embasando-se nas lutas e proposições daqueles que
defendem uma sociedade mais justa e igualitária e, em decorrência, uma educação pública,
gratuita e de qualidade para todos, em todos os níveis e modalidades.
As discussões abertas para a elaboração do Plano respondem a uma expectativa da
sociedade brasileira e que se construiu sobre um patamar de experiências em planejamento
e administração educacional, para contemplar princípios e compromissos, nas diretrizes,
em prioridades, metas e estratégias de ação. Sendo resultado de um esforço histórico da
sociedade brasileira, no âmbito dessa legislação que, ao longo desses dez anos (1993-
2003), foram construindo o patamar sobre o qual este Plano foi formulado e aprovado.
A reflexão desses dez anos refletiu nas experiências que mesclaram êxitos e
frustrações e foram capazes de descortinar em uma visão ampla as necessidades e as
possibilidades da educação brasileira. Dessa forma, o PNE é tributário de uma longa
história e, ao mesmo tempo, é uma novidade pelas características próprias que agrega.
Pode-se considerar, portanto, que esse Plano, apesar de ter como meta o financiamento
oferecido pelas organizações internacionais para construção de uma escola para todos,
trouxe à tona a oportunidade de uma discussão das bases (comunidade escolar). Convém
lembrar, porém, que responder às diferentes necessidades de cada aluno pode ser
considerada uma nova cultura escolar, embora Torres (2001) nos sinalize que isso pode
levar a escola a continuar fazendo o que sempre fez, ou seja, “potencializar uma autêntica
revolução”.
Contudo, não se pode negar que as novas políticas educacionais se encontram
inseridas no contexto de reorganização do modelo de desenvolvimento capitalista,
ameaçadas não somente pelas quedas de produtividade nos setores empresariais, mas,
principalmente, pelas contradições sociais, pelo elevado nível de desigualdade social e pela
incapacidade do Estado em arcar com toda essa demanda.
Essa modernização capitalista impulsiona a reorganização no sistema produtivo
para adaptá-la às novas condições econômicas, sociais e políticas. É nesse sentido que as
novas políticas educacionais voltadas ao desenvolvimento têm como meta priorizar a
educação básica, pois a educação por si só não basta para a mobilidade social, os novos
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A prática educacional, durante toda essa década, foi orientada por esse Plano,
mas, como todo plano, é um documento de trabalho e, portanto, um instrumento que
orienta a ação política e administrativa dos sistemas de ensino, podendo atingir todas as
metas ou não. Mesmo assim, ele entra na história da educação brasileira com seis
qualificações que o distinguem de todos os outros já elaborados:
Conhecer as leis é como acender uma luz numa sala escura cheia de carteiras, mesas e
outros objetos. As leis acendem uma luz importante, mas elas não são todas as luzes. O
importante é que um ponto luminoso ajuda a seguir o caminho.
Nesse sentido, a inclusão escolar, para Bueno (2008, p. 43), surge como a “nova
missão da escola”. Apesar de, no seu interior, as opiniões, as disputas e os confrontos se
manifestarem de várias formas.
Analisar os meandros dessa questão, no reconhecimento da escola para todos e da
inclusão e, conseqüentemente, da diferença, por mais acentuada que seja, representa
apenas um dado a mais no universo plural em que vivemos. A dinâmica de
condicionamentos de toda ordem no cotidiano escolar, como nas relações e na
intencionalidade técnica do ato pedagógico, repousa em uma explicação funcionalista e
mecanicista.
Na LDBEN n. 9394/1996, a educação de alunos que apresentam deficiência
enquadra-se no sistema geral de ensino, ressaltando no art. 58:
Artigo 58: entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a
modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente3 na rede regular
de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. O art. 59 coloca
que os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais
currículos, métodos técnicas, recursos educativos e organização específica para
atender às suas necessidades. E, no art. 60: sobre as instituições especiais
privadas Dessa forma, é garantido legalmente o atendimento especializado a
todos os educandos, de acordo com as suas necessidades (BRASIL/MEC/1996).
3
Grifo nosso.
52
Face aos desafios postos hoje, ao ensino fundamental, de prover o domínio dos
conhecimentos básicos em nossa cultura, fica a questão colocada aos sistemas de ensino de
como organizar as atividades escolares para que ninguém seja excluído desse direito de
acesso, o que se caracteriza como uma nova maneira de se entender a educação desses
indivíduos, assegurando-lhes o direito de permanência na educação.
Em relação a esse direto, ainda predomina a questão do fracasso escolar como
sendo um fenômeno que se intensificou, em particular na escola pública, com a grande
ampliação da clientela da escolaridade obrigatória para todos. E, conforme prevê o artigo
11, dessa Lei, ao estender a matrícula do Ensino Fundamental para crianças com seis anos
de idade, o ensino fundamental passaria para nove anos, e é o que aconteceu na maioria
dos municípios brasileiros (a partir de 2008). Essa incorporação implica em redução de
gastos, com a manutenção da educação infantil, hoje, atribuída aos municípios.
Conquanto essas medidas possam favorecer mudanças, a análise da situação atual,
tanto na estrutura como no funcionamento do ensino, revela um quadro de fragmentação e
desarticulação entre as legislações e as unidades escolares. Essa desarticulação pode ser
vista na formação dos professores que atendem alunos com seis anos de idade, fator que
indica a necessidade de uma proposta pedagógica diferenciada.
Não sabemos, ainda, se essa ação pode contribuir para uma mudança na estrutura
e na cultura escolar, para as crianças de seis anos, só o tempo vai nos dizer. Isso não é nada
animador, pois, na maioria das vezes, os conteúdos transmitidos são os da alfabetização
tradicional, ao invés de ser uma nova proposta curricular, que considere as singularidades
dos alunos, principalmente aos que apresentam algum tipo de deficiência.
Não se pode falar, portanto, em política pública fora da relação entre Estado e
sociedade. Essa compreende tudo o que o Estado faz ou deixa de fazer, tanto nos
investimentos como nos segmentos beneficiados ou excluídos pelos serviços, ainda mais,
quando analisamos o atrelamento da política pública vigente, ao movimento neoliberal,
que arrasta os indivíduos a produzirem mais valia, através do mercado do capital humano.
O que não podemos garantir, nessa compreensão sobre as políticas públicas
ocorridas no Brasil, até os dias de hoje, é que ela tenha trazido algum beneficio no sentido
de igualdade de direto e de mobilidade social aos indivíduos, já que o modelo capitalista
nega cada vez mais a possibilidade de uma vida digna para a maioria da população.
Após muitas discussões e reformulações em alguns setores da educação nacional,
visando à melhoria da qualidade de ensino no país, esse discurso ainda não recebeu o
53
tratamento devido no que se refere à infra-estrutura, aos recursos materiais das escolas
brasileiras e aos salários dos professores, entre outros.
As políticas públicas retratadas pelas escolas públicas só poderão responder
satisfatoriamente aos desafios que lhe são feitos se a sociedade e todos os segmentos que
atuam no interior das escolas (profissionais, pais e alunos) puderem expressar que a
melhoria da educação ainda pode representar expressivo desenvolvimento para o país.
Vale ressaltar que a base da fundamentação legal apresentada até aqui teve o
intuito de refletir sobre o impacto provocado pelas várias reformas implantadas no país.
Nesse andamento, é relevante destacar a Resolução do Conselho Nacional de Educação
(CNE/CEB 02 de 2001), que institui as Diretrizes Nacionais de Educação Especial na
Educação Básica, documento esse, norteador da política de inclusão implantada no ensino
regular. Essa resolução determina que os sistemas de ensino constituam e façam funcionar
um ensino que dê sustentação e viabilize o processo de construção da educação inclusiva
para todos.
A política educacional, embasada anteriormente pelo modelo integracionista, com
a nova proposta, está baseada nos princípios de inclusão, tendo como objetivo ultrapassar
esse modelo anterior e potencializar um projeto voltado para a construção de aceitação de
todos, com a perspectiva de qualidade para a educação. Do ponto de vista da base legal,
representa um passo importante nessa caminhada, principalmente nas ações que se
seguiram após a Resolução 02 (2001) que, em seu artigo 2º, determina:
(Parecer CNE/CEB N. 17/2001, p. 42), como intérprete para os alunos surdos, Braille para
os cegos e sala de recursos no turno contrário em que o aluno estiver estudando.
Isso reitera a importância de o aluno com necessidades especiais receber
atendimento na Educação Básica, de modo que a escola garanta, além de professor
especializado, flexibilização curricular, apoio pedagógico, quando necessário e, acima de
tudo, a garantia de “acolhimento à diversidade humana, aceitação das diferenças e
oportunidade de desenvolvimento” (Parecer n.17/2001, p. 20), entre outros. O grande
avanço dessa Resolução, ao estabelecer os objetivos e metas da oferta de matrícula para os
alunos com deficiência nas classes comuns do ensino regular, está na adoção de
acessibilidade física, ao atendimento especializado e a formação docente, mas, no campo
das contradições, fica evidente que as leis pautam no discurso de atender a todos, todavia
não conseguem cumprir o processo de escolarização a todos os alunos.
Na concretização da educação inclusiva, pressupõe-se a formação docente e a
organização das escolas para garantia do direito de todos à educação, a partir daí, a base
legal dessa Resolução leva em conta a elaboração das normas para a Educação Especial, a
fim de reorganizar a proposta escolar dos alunos com necessidades educacionais especiais,
no contexto do sistema de ensino regular com foco no discurso da função social da escola,
em assumir o seu papel como formadora de indivíduos e, com isso, definir seu currículo e
suas práticas heterogêneas e inclusivas.
A complexidade que envolve a questão do direito dos indivíduos com
necessidades educacionais especiais de realizar seus estudos no ensino comum requer
princípios de “preservação da dignidade, busca da identidade e o exercício da cidadania”.
Aliada a esses princípios, e a partir dessa lógica, a escola regular precisa organizar-se para
receber todas as crianças cujas diferenças estejam ou não explícitas.
Em uma reflexão sobre a análise do respaldo legal dessa Resolução, observamos
que o sistema escolar não se estruturou realmente para o oferecimento de serviços
educacionais, para atender a diversidade dos alunos. Para Prieto (2003), essa Resolução
apresentou definições, gerando muitas preocupações, principalmente na forma com que o
texto do art. 5º, I, II e III foi elaborado, principalmente, os adjetivos usados não contribuiu
para romper com o enquadramento dos alunos nas classificações previstas nesse artigo.
A partir das análises realizadas, podemos inferir que a reforma educacional traz,
em sua essência, o fortalecimento de todos os segmentos envolvidos, sendo necessário,
para isso, acompanhamento e avaliação sistemática, caso contrário à proposta imputada
55
nessa política pode não atender às necessidades reais da população e ainda ficar sujeita à
fragilidade e descontinuidade.
A proposta de atender aos alunos com deficiências, nas classes comuns, implica
atentar para mudanças, no âmbito dos sistemas de ensino, das unidades escolares, da
prática de cada profissional da educação, em suas diferentes dimensões (PRIETO, 2003).
Os debates em torno da elaboração dos planos de educação que devem nortear a
educação especial devem estar calcados no desenvolvimento da democracia, pois inclusão
é a garantia, a todos, de acesso à vida em sociedade. Dessa forma, a ampliação do
compromisso político com a educação inclusiva é de tornar a escola um espaço
democrático, voltado para a prática da cidadania, em uma dinâmica de respeito com as
diferenças.
Ao fazer essa leitura, é relevante salientar que, em 2007, com o Plano de
Aceleração do Crescimento (PAC) foi lançado o Plano de Desenvolvimento da Educação
(PDE). Com o propósito de reafirmar a inclusão dos indivíduos com deficiência no ensino
regular. Foram organizados trabalhos por um grupo de estudiosos e pesquisadores para
elaborarem a Política Nacional de Educação Especial, nomeado pela Portaria n. 555/2007,
na Perspectiva da Educação Inclusiva, tendo como eixo dessa ação a acessibilidade
arquitetônica dos prédios escolares, a implantação de salas de recursos e a formação
docente para o atendimento educacional especializado, na busca de superar a oposição
entre educação regular e educação especial.
À atual Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação
Inclusiva (2008) cabe explicitar que a educação especial, do ponto de vista dessa
legislação, tem como objetivo assegurar a inclusão escolar de todos os alunos com
deficiência, com o direito de se matricular no sistema de ensino regular. Consideram-se
[...] alunos com deficiência àqueles que têm impedimentos de longo prazo, de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que em interação com diversas
barreiras podem ter restringida sua participação plena e efetiva na escola e na
sociedade (MEC/SEESP, 2008, p. 15).
Cabe aos sistemas de ensino todo o investimento nesse alunado, para vislumbrar a
possibilidade de transformação em um ambiente escolar recontextualizado, em que possa
lhe proporcionar aquisições enriquecedoras e modificações contínuas em seus
desenvolvimentos, em que envolva também processos de seleção, distribuição e
56
O atual debate sobre a educação para todos, a partir da década de 1990, tendo como
princípio básico a igualdade de direitos e de oportunidades entre todos os membros da
comunidade, trouxe um novo pensar e a exigência de uma nova postura da escola e de todos
os envolvidos com a educação.
Um aspecto que nos parece relevante dessa proposta é a avaliação das políticas que
visam à educação para todos, que não dizem respeito apenas às deficiências, mas a todas as
situações representativas pelas dificuldades de aprendizagem. Da mesma forma, que a
escola nova, buscou responder a uma expectativa daquele tempo histórico, será que a escola
atual tem se apresentado em condições de responder a essas políticas de educação para
todos.
Dentro do movimento em prol de uma escola para todos, tendo como defesa os
princípios de cidadania e de direito, a educação dos indivíduos que apresentam deficiência é
uma atitude historicamente recente em nossa sociedade, portanto, digna de investigação.
58
Embora, como direito, não existam mais dúvidas de que a educação de alunos que
apresentam deficiência pode enquadrar-se ao sistema geral de educação, nessa divisão dos
sistemas educacionais em comum e especial, ela deve desaparecer. Mas, no andamento
histórico, essa divisão contribuiu para que os educandos, de uma maneira geral, se
considerassem como pertencentes a mundos distintos.
O texto da Política de Educação Especial, da Secretaria de Educação Especial do
Ministério de Educação e do Desporto /SEESP/MEC, apresentou a Educação Especial, em
1994, como:
[...] crianças com deficiência e crianças bem dotadas; crianças que vivem nas
ruas e que trabalham; crianças de populações distantes ou nômades; crianças de
minorias lingüísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros grupos ou zonas
desfavorecidos ou marginalizados (CONFERÊNCIA MUNDIAL SOBRE
NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS, 1994, p. 17-18).
Nesse sentido, as crianças deficientes são apenas uma, entre tantas outras, das
expressões concretas das chamadas necessidades educacionais especiais. Assim, as escolas
devem acolher pessoas com ou sem deficiência e adaptar-se às necessidades do alunado,
respeitando-lhes o ritmo e os processos de aprendizagem. Essa expressão trouxe, também,
59
uma confusão para escola, principalmente, quando essa deve oferecer atividades
diferenciadas e em quais circunstâncias.
Na história da educação brasileira e na expectativa de mudanças quanto ao grande
número de exclusão e discriminação das pessoas com deficiência, a “inclusão” ganhou
amplitude com o termo “necessidades educativas especiais”. A Declaração de Salamanca,
1994, esclarece que com esse termo se entende àqueles:
ação. Assim sendo, interação, entre esses princípios, fica longe do princípio adotado na
proposta de inclusão.
Diante de todas essas questões, há que se atentar para a necessidade de, cada vez
mais, não deixar sucumbirem esses direitos historicamente conquistados, mas, sim, que
esses sejam assegurados e possam proporcionar condições adequadas à inclusão escolar e
social de todos os alunos. Contudo, somente leis inspiradas no princípio da inclusão não
bastam; aliadas a elas são necessárias mudanças de atitudes, pois somos todos iguais na
condição humana e diferente naquilo que nos dá identidade enquanto indivíduos.
A relevância desses direitos pressupõe não somente lidar com elementos de
superação das diferenças e com rupturas de todas as ordens de discriminação, mas,
também, com uma leitura descredenciadora do processo de integração em que o aluno
deveria estar preparado para ingressar na escola, já que na proposta inclusiva a escola deve
estar preparada para receber todos os alunos. Nesse sentido, Saint-Laurent (1997, p. 68)
distingue três fases de desenvolvimento da integração referindo-se às décadas de 1970 a
1990:
nas políticas que propõem uma Escola para Todos. Principalmente, quando levamos em
conta vários fatores: despreparo dos professores do ensino regular para atenderem os
alunos com “necessidades educacionais especiais”; inadequadas condições físicas e
materiais das escolas; qualidade do ensino distante do que se considera desejável e ações
políticas de largo alcance para que, de fato, demandem modificações profundas e radicais
no âmbito das ações políticas e das escolas, para a ampliação efetiva das oportunidades
educacionais para todos.
O Brasil enfrenta uma série de desafios na área da educação para a
universalização do acesso ao ensino fundamental e médio. Com vista a essa superação dos
mecanismos que impedem o acesso e a permanência de todos os alunos, inclusive os com
“necessidades educacionais especiais” (alunos deficientes), entendemos que essas
diferenças e déficit, por si só, não determinam o acesso e a permanência desses alunos, mas
eles são determinados pelo poder de competência lingüística que os indivíduos devem
adquirir no processo de escolarização, controlados pelos Parâmetros Curriculares
Nacionais.
Para se criar possibilidades de modificar essa realidade, são necessárias
discussões, não só perpassadas pela constituição da diferença dos indivíduos pelas
diferenças biológicas, mas também pela concepção do currículo imposto nos Parâmetros
Nacionais.
É preciso ter clareza do que queremos para nossos alunos, o que eles precisam de
fato aprender, para torná-los indivíduos possuidores de cidadania. Os mecanismos que as
instituições devem trilhar para a criação de respeito às identidades culturais, muitas vezes
causadoras da separação desses indivíduos, nos é lembrada por Silva (2000, p. 100),
quando ele afirma que, na medida em que “a diversidade biológica pode ser um produto da
natureza; o mesmo não se pode dizer da diversidade cultural”.
Apesar de as leis assegurarem o direito de todos à educação e eleger como
fundamento da nossa república a cidadania e a dignidade da pessoa, sem preconceito de
origem, raça, sexo, cor, etc. ou quaisquer outras formas de discriminação, esses
dispositivos legais, tornam importantes, na medida em que toma como direito de todos os
brasileiros o acesso na escola regular, na mesma sala de aulas diferentes culturas e
diferenças especiais e pessoais.
Existem, entretanto, reconhecimentos das dificuldades enfrentadas nos sistemas
de ensino causadores das práticas discriminatórias, no sentido característico da palavra
“especial” utilizada pela proposta oficial, em relação às condições diferenciadas de
62
barreira no aprendizado dos alunos ao lidar com as diversas deficiências. Para Bueno
(1998), nessa Lei, “não fica claro nem a natureza dessa especialidade, nem se o curso deve
ser mais específico ou mais generalista”. Por um lado, há necessidade de apoio das
universidades que possam auxiliar na formação dos profissionais. Não se pode negar a
importância dessas instituições para somarem aos preceitos relativos à educação inclusiva,
mas se pode dizer que há um longo caminho a ser percorrido por todos, não pelo simples
descrédito das políticas públicas, mas pelo envolvimento que essa proposta demanda.
Pelo exposto, percebe-se que a orientação da política educacional brasileira deve
levar com mais a seriedade a proposta de educação inclusiva, não só em relação à
formação docente, mas em relação à estrutura, dotada de recursos materiais e financeiros
que viabilizem e dêem sustentação ao processo de construção de um discurso da Educação
Inclusiva, apoiada na Educação Básica, conferida na Resolução CNE/CEB n. 2/2001 que,
no artigo 3º, estabelece:
se pode afirmar em relação à prática, que se transformou em um grande desafio, tanto para
a escola como para os alunos.
O que nos faz concluir que, por um lado o poder público preconiza nas leis a
universalização da educação, mas, por outro, restringe as verbas, ficando, o discurso da
escola, atrelado a possíveis modificações do sistema, dos alunos ou dos professores,
mesmo sabendo que a inclusão se desenvolve em um processo cheio de imprevistos, sem
fórmulas prontas e que exige aperfeiçoamento constante.
Uma conseqüência visível da proposta de inclusão, resultante dos discursos
expostos acima, reside na aplicação das legislações, no interior da escola, cujo direito de
escolarização se baseia nos princípios de preservação da dignidade humana e na busca da
identidade e exercício da cidadania.
Para se fazer uma análise desses princípios em relação ao entendimento da escola
deve-se considerar como pilares de sustentação: 1) estrutura (equipamentos, material
didático, prédios, etc.); 2) redes comunitárias (famílias, professores, etc.). Só assim, a
escola vê nessa proposta a possibilidade para se inserir todos os alunos com ou sem
deficiência no ensino regular. Mas o mínimo que as famílias e os alunos esperam, além
desses fatores importantes, é que sejam elaboradas ações compatíveis com essas
exigências, para amparar as atribuições da escola, e que esta, além de fazer cumprir o que
determina as leis, deve acolher e oferecer um ensino de qualidade para todos.
As expectativas de concretização da política de inclusão escolar somadas com a
política de escola para todos adotadas nos principais documentos, entre esses, pode-se
destacar a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006), aprovada pela
Organização das Nações Unidas (ONU), em que estabelece e assegura um sistema de
educação inclusiva em todos os níveis de ensino, adotando medidas para garantir que:
[...] sua formação com base na formação inicial e continuada [...] em desenvolver
sua capacidade interdisciplinar nas salas do ensino regular,... e [...] visando sua
atuação com desenvolvimento de projetos em parcerias (2008, p. 17).
Essa colocação nos faz lembrar o modelo de discurso de Bernstein (1996), que
nos permite analisar a autonomia que é dada aos professores, em situação de sala de aula, a
67
inovação atrelada às novas propostas de inclusão. Sobre isso, também Morais (2004, p. 9)
coloca que:
[...] a autonomia que é dada ao professor no interior do sistema escolar {...] (eles)
devem estar conscientes de que as potencialidades e limites da sua intervenções
pedagógica, em termos de inovação, dependem da recontextualização que podem
ocorrer nos vários níveis do sistema educacional.
Para construir os novos conhecimentos em torno dos novos discursos que vão se
fazendo e legitimando-se por meio das legislações, novos investimentos são necessários
para a formação dos profissionais da educação, tanto no que diz respeito às inovações
acadêmicas oferecidas nas instituições superiores, como a formação continuada oferecida
pelas Secretarias de Estado e dos municípios.
A escola nos parece cumprir as determinações a ela atribuídas, mas não leva em
consideração determinadas “categorias” (direitos, democracia, cidadania, entre outras), isso
se tem alargado a tal ponto que se corre o risco de se perder boa parte dos discursos
vigentes, na medida em que ações políticas e pedagógicas parecem ratificar as diferenças
entre os indivíduos.
É importante explicar, também, que a hegemonia neoliberal reforçou e consolidou
essas diferenças, quando coloca o mercado como o fundamento e o centro da nossa
sociedade. Nesse sentido, a busca da riqueza individual passou a ser o mais importante
objetivo na vida da maioria das pessoas e a mercadoria tornou-se o objeto principal de
desejo.
Como se pode perceber, estar excluído do mercado não significa estar excluído da
sociedade e do alcance dos meios de comunicação social que socializam os mesmos
desejos de consumo; os pobres são estimulados à prática do consumo de bens sofisticados
e supérfluos, ao mesmo tempo em que lhes é negada a possibilidade de acesso à satisfação
das necessidades básicas para a sua sobrevivência digna.
A política adotada, com a influência da globalização, apresenta um
distanciamento dos preceitos fundamentais constitucionais sobre os direitos de ordem
econômica e social marcado pelas desigualdades. Dessa maneira, Bobbio (1992, p. 37)
afirma que “o importante não é fundamentar só os direitos do homem, mas protegê-lo”.
É óbvia a execução desses direitos, contudo, ainda estamos muito longe de
concretizar o que preconizam as leis brasileiras, percebendo que fica muito mais fácil
68
CAPÍTULO III
Até o presente momento, utilizamos em nossa pesquisa a idéia que a escola está se
(re) inventando para assumir novas regras diante do complexo atendimento às diferenças
do alunado, na perspectiva da escolarização para todos.
A escolarização constitui, nos indivíduos, um processo dialético que envolve sua
própria história, a do contexto escolar e a das relações entre si e o meio. De certo modo,
educar dentro e para a diversidade exige, sobretudo, uma mudança profunda nas práticas
educacionais para oferecer resposta à diversidade e a necessidade de todos os alunos.
Refletindo sobre as exigências atuais da educação, pode-se dizer que a sua função
essencial é promover e possibilitar mudanças internas nos indivíduos, articuladas com o
meio sócio-cultural. A escola tem o compromisso não só de transmitir conteúdos, mas de
dar suporte e condição de integração e adaptação de todos à sociedade.
No momento atual, a escola ainda está fortemente marcada por sua ação
disciplinadora, normalizadora e excessivamente burocrática e, sobre isso, vale lembrar
Goodson (2003), quando ele diz que o currículo pode ser considerado um processo pelo
qual se “inventa tradição” e, para Hobsbawn (1985, p. 1), o termo tradição inventada
inclui:
históricas, das escolas e dos professores, em compreender e lidar com o que é diferente e
estranho aos padrões estabelecidos por eles, partindo do pressuposto de que a relação que
as escolas e os professores estabelecem com esse alunado responde ao que é aplicado por
eles em situação de sala de aula, ou seja, conteúdos iguais para indivíduos diferentes.
A discussão que está colocada, desde 1994, nas condições de escolarização dos
alunos deficientes, tem avançado do ponto de vista legal, mas ao traçar a trajetória de
nossas escolas, vê-se que as práticas exercidas por elas são norteadas pela dificuldade de se
trabalhar com a inteligência dos alunos, ou com que ele é capaz de realizar. Há um padrão
estabelecido pela escola, cuja ênfase está relacionada ao aluno ideal e não no contexto das
diferenças individuais.
A escola é um lugar social onde o contato com a ciência, com a leitura e com a
escrita enquanto modalidade de construção de conhecimento se dá de forma sistemática e
intensa. Contudo, o grande desafio ainda está por ser enfrentado: o de tornar essa
escolaridade significativa para o desenvolvimento intelectual dos alunos considerados
deficientes.
Diante disso, a educação inclusiva não acaba quando se coloca o aluno deficiente
na escola comum. Para Giméno-Sacristán (2001, p. 22):
escolarização remetem ao período colonial. Discussões essas que promovem a idéia de que
não houve um desenvolvimento histórico linear, de forma que não pode ser compreendido
apenas como um conceito formulado pelo macro-sistema, mas que trouxe à tona as
representações e reinterpretações oriundas do cotidiano escolar. Enfocamos essas
reinterpretações partindo do pressuposto que o princípio teórico do currículo oficial não se
configura necessariamente no currículo em ação. Certamente, a educação tem, hoje, um
grande desafio de ressignificar suas práticas frente a uma realidade social e educacional
excludente.
Diante disso, entende-se que a escola democrática que prima pela igualdade social
e respeito às diferenças, deve privilegiar uma educação sem exclusão. E para que isso
ocorra, é preciso que as escolas, assim como os professores, estejam preparadas para atuar
com os diversos tipos de alunos, inclusive os deficientes.
A necessidade de se pensar um currículo para a escola inclusiva foi oficializada a
partir das medidas desenvolvidas pelo Ministério da Educação, com a criação dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (1999), a orientação das ações educativas do ensino
obrigatório. Com os Parâmetros Curriculares, a escola é chamada a desempenhar novas
funções que leve em conta à diversidade, que deve ser, antes de tudo, flexível, e passível de
adaptações, sem perda de conteúdo. Segundo esses Parâmetros, a educação dos alunos
deficientes deve contemplar as “diferenças individuais” (Brasil, 1999, p. 18). Deve ser
desenhado tendo como objetivo geral a “redução de barreiras atitudinais e conceituais”, e
se pautar em uma resignificação do processo de aprendizagem na sua relação com o
desenvolvimento humano.
A despeito desse documento, não estão explícitas as implicações pedagógicas e
escolares no princípio de inclusão, visto que as implicações encontradas favorecem a
matrícula dos alunos deficientes nas classes regulares, mas não garantem que irão
permanecer, ou que irão aprender o que lhes serão ensinados e, muito menos, que serão
oferecidas oportunidades de desenvolverem suas potencialidades.
Cada escola, apesar dos processos normativos e institucionais a que está sujeita
pelas leis, políticas educacionais, entre outras tantas normas, está revestida também de
influência e dos significados culturais da comunidade que se encontra inserida. Daí a
necessidade de sua proposta pedagógica estar voltada para os princípios filosóficos e
sociológicos de formar uma identidade inspirada e articulada de modo a beneficiar todos,
respeitando as diferenças e superando as desigualdades.
76
Para visar à flexibilização do currículo, para que ele possa ser desenvolvido de
maneira efetiva em sala de aula, e atender as necessidades individuais de todos os alunos.
De acordo com o MEC/SEESP/SEB (1999), essas adaptações curriculares realizam-se em
três níveis:
que podemos exemplificar pelas diversas deficiências que muitas vezes não favorecesse
aos indivíduos se utilizarem dessas medidas reforçadoras da escrita.
A escola, não necessariamente por omissão, mas principalmente por inadequação
de conteúdo e método, tem dificuldade em tornar o conhecimento significativo para
aqueles que por ela passam. E, nesse sentido, que o imobilismo da escola tem caráter tanto
social quanto didático-pedagógico. Não é necessário grande esforço para perceber que um
pouco do conteúdo estudado na escola contribui para uma melhor interação do indivíduo
com o mundo. Essa interação, no caso, não tem o sentido de adaptação ao meio, mas de
diálogo, de participação consciente, de possibilidade de intervenções adequadas.
A escola trabalha, essencialmente, com o conteúdo das várias áreas de
conhecimento e, sem dúvida, de alguma forma, contribui para o desenvolvimento cognitivo
dos alunos. Ao pensar que o conhecimento é aquele que se transforma em instrumento
cognitivo para o aluno, contribuindo para a ampliação da forma do seu pensamento, dessa
maneira a escola exerce papel especial na possibilidade de inclusão do indivíduo na
coletividade, sendo ela uma das responsáveis pela construção das bases para o seu
desenvolvimento psíquico e cognitivo.
Assim, sendo a escola, no processo histórico de sua construção assumiu um
conjunto de significados e de sentidos, que justificaram sua “invenção” e que atualmente,
sustentam nossas convicções em tornar a necessidade de sua existência e também a
ampliação de seu trabalho. Caminhar sob esse enfoque supõe que seja importante a sua (re)
invenção assentada na sua função maior de atualmente, escolarizar todos em uma visão
inclusiva.
Todavia, a contribuição da escola não chega a ser tão significativa no
desenvolvimento intelectual, quando comparada ao potencial de aprendizagem das
crianças, normalmente evidenciado em situações não-escolares. Isso porque a escola não
tem trabalhado com questões desafiadoras e também com relação às demandas de hoje, de
tornar os indivíduos autônomos, cidadãos produtores de conhecimentos, capazes de
analisar a realidade e de atuar sobre ela e transformá-la.
Percebemos, porém, na possibilidade formativa da educação escolar, que a forma
e o conteúdo na apropriação do conhecimento definem diferentes modos de participação
nas práticas sociais dos alunos. Para tanto, a escola não deve só prever a adaptação do
aluno, a esse mundo, mas também no conjunto das condições da revalorização do aspecto
ético e humano.
79
Acredita-se que a apropriação dessas condutas, perpassa por ensinar o aluno com
deficiência junto com os demais, sendo esse o grande nó e o desafio da Educação
Inclusiva, pois é neste aspecto que a inclusão deixa de ser uma filosofia, uma ideologia ou
uma política, e se torna ação concreta em situações reais envolvendo indivíduos com
dificuldades e necessidades específicas. Pois, pelo menos em nosso país, a inclusão que se
almeja ocorre no momento e em um contexto de escola deficitária e em muitos casos
“falida”, demonstradas pelas estatísticas de repetência, fracasso e evasão escolar.
Com isso, podemos deduzir que essa amostra não retrata apenas os alunos com
deficiências, mas principalmente, pelo grande entrave na formação do professor que não
foi preparado para lidar com a diversidade dos alunos, ficando aqui uma chamada de
atenção aos cursos de graduação um dos responsáveis por essa preparação.
Para que possa se transformar o currículo tradicional em um “currículo inclusivo”
e assim atender a diversidade dos alunos, faz-se necessário repensar a prática pedagógica
dos professores em geral. A mudança de paradigma que a inclusão propõe a escola regular
como um todo, incluindo os professores como principais atores desse processo devem se
transformar para que haja aproveitamento acadêmico dos alunos com deficiências. Caso
isso não ocorra estaremos criando um sistema especial dentro da escola regular.
Ao ressaltar o papel da escola regular, na ação específica feita nas adaptações
propostas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, no que se refere à inclusão de alunos
deficientes no ensino comum, observamos que na teoria é uma coisa e na prática é outra
questão. Porém, essa análise dá lugar à preocupação, pois a inclusão conforme se tem
observado tem sido nada mais do de deixar o aluno com deficiência ocupando um lugar
junto com os demais alunos, não sendo reconhecidos nem mesmo como indivíduos
capazes.
Para conferir o exposto acima, podemos considerar que os objetivos colocados
hoje para a escola, e, fortemente reforçados pelos Parâmetros Curriculares Nacionais são
extremamente contraditórios. Embora se saiba que a Educação por si só não transforma
uma sociedade, é necessário apontar para a construção de uma nova prática pedagógica que
lute contra a discriminação, contra a seletividade, contra a marginalidade, na forma de
garantir a todos os cidadãos um ensino de melhor qualidade, direcionando-os para a
formação emancipatória de todos em suas existências pessoal e coletiva.
Cabe, contudo, destacar que a escola desenhou esse universo da diversidade com
traços uniformes e homogêneos, com isso não oportunizou a esse alunado a possibilidade
de sucesso escolar. Pois, por meio da escola e do currículo o estudante pode exercer as
80
Apesar de não haver, nos PCN, uma ligação explícita com os objetivos da política
neoliberal vigente em nosso País, existe, nesses, indícios suficientes para não se descartar
tal vinculação, sobretudo, quando se tem estampado a ausência de uma perspectiva política
sobre as relações entre divisões educacionais e divisões sociais e quando se faz referência
constante de padrões e medições, sinalizadores suficientes de que o documento analisado
se inscreve numa política educacional mais ampla de inclinação claramente neoliberal
Diante disso, entende-se que as proposta de uma escola democrática, que prima
pela igualdade social e de respeito às diferenças, a partir das reivindicações de grupos
historicamente excluídos, exige pensar em uma aprendizagem em outros moldes, pois
acreditamos que uma educação escolar voltada apenas para a afirmação dos princípios de
cidadania, democracia e liberdade, não bastam, pois essas podem ser feitas apenas no plano
do discurso.
Desse modo, há necessidade de construir uma escola voltada para conhecimentos
que concorrem para o desenvolvimento dos indivíduos em conjunto e por meio da
aprendizagem dos próprios conteúdos escolares. O desenvolvimento das capacidades
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[...] a ação pedagógica não pode ser prevista somente por condicionantes de
ordem intrínseca que esgotam as possibilidades de aprendizagem, uma vez que a
própria dinâmica educativa está inserida em um contexto social no qual deveria
ocorrer a democratização dos conhecimentos construídos. Em se tratando de uma
ação que, como tendência, tem se apresentado como especial – por revelar a
contradição entre o procedimento metodológico de ensino e o processo social em
que está mergulhada – essa teoria opera a recontextualização dos procedimentos
didáticos ‘especiais’, ao propor um modelo de aprendizagem ‘orientado’ e em
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Na elaboração de uma ação pedagógica diferenciada, cabe uma análise, visto que,
apesar de todos os discursos e dos benefícios acerca da escolarização do alunado deficiente
em usufruir os mesmos direitos dos demais alunos não deficientes no ensino comum; na
prática, a experiência e percepção da escola como direito universal, essa parece não ter
entendido de fato o porquê de sua existência.
O modo como a escola tem se organizado parece reforçar a inexistência de uma
inovação pedagógica capaz de torná-la um marco de referência, no qual o mais importante
seja satisfazer às exigências das diferenças para a construção de um sistema de ensino que
possa, efetivamente, se construir, cada vez mais, por sua própria natureza e função,
permitir práticas que favoreçam e contribuam para uma efetiva formação básica para
todos.
Nessa perspectiva, Anache (1997, p. 3) afirma que “a aprendizagem é processo
comum a toda pessoa, e se configura ao longo do desenvolvimento, envolvendo os
aparatos biológicos, psicológicos e sociais”. Portanto, para o indivíduo que apresenta
dificuldade para aprender seja pelos aspectos biológicos, psicológicos ou sociais, quando
atendidos pela escola, em suas práticas educativas em condições adequadas pode obter
êxito em seus processos acadêmicos.
Por outro lado, situar as práticas educativas da escola, conforme analisa Silva
(2006), é entender que “as práticas educativas e culturais podem tanto potencializar como
restringir as possibilidades de desenvolvimento dos indivíduos”. Essas práticas educativas
oferecidas em situação de sala de aula não podem ser restritas ao currículo a ser cumprido,
mas, podem, sobretudo, lembrando Lunardi (2004, p. 2) “democratizar o acesso aos
conhecimentos, construindo práticas efetivas de emancipação que auxilie no processo de
superação das desigualdades sociais”.
As práticas inclusivas, no atual discurso, dão à escola o papel de exercitar esse
embate entre a prática que se alimentam pelas diferenças dos alunos atendidos por ela, e a
ideologia desse discurso, haja vista que, na escola, exige-se atuação em níveis diversos,
não só nas práticas educativas, mas no campo político que lhe impõe rumos distintos. Por
um lado o conjunto de formação educacional que traz efeito na escolarização e por outro o
seu papel na socialização.
Resta esclarecer, então, que estamos em uma sociedade cada vez mais complexa e
contraditória e a educação se move nesse quadro agravante de maneira contínua, quanto
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aos objetivos, aos conteúdos e aos métodos pedagógicos, em um contexto no qual se chega
a duvidar do papel que a escolarização pode desempenhar no ideal de uma educação igual
para todos, pois, no percurso histórico percorrido pela escola comum ao se julgar incapaz
de escolarizar todos os alunos com deficiência, delegou esse direito à educação especial.
Fazendo jus hoje, essa dicotomia entre o ensino especial e o regular (comum).
A escola que queremos para este século deve ser construída no sentido de
“respeitar a singularidade individual e fomentá-la, sem discriminações para todos”
(GIMENO SACRISTÁN, 2001, p. 77), ou seja, a escola, ao despertar as diferenças entre
os alunos, fomenta um caráter contraditório de um atendimento igual aos desiguais nas
formas de pensar e de transmitir conhecimentos. Essa alusão à desigualdade, na medida em
que o professor não respeita a singularidade existente nos indivíduos, limita as suas
possibilidades de sucesso que o levará a evasão e a repetência, ou a sua condução à
educação especial.
De acordo com essa visão, o processo educacional oferecido na escola se inscreve
pela forma da organização do currículo e da cultura estabelecida no seu interior, nessa
perspectiva as experiências pedagógicas que a escola e os alunos constroem seus
conhecimentos, tornam cada vez mais dependentes da esfera cultural e dos interesses
econômicos. Para Silva & Menegazzo (2004, p. 7):
Na atual situação da escola, a intenção e a forma, com que ela desempenha suas
funções, não podem ser entendidas isoladamente, considera-se assim, sua relação com o
contexto simbólico de regras e práticas sociais. Para entender a importância do currículo e
da cultura no âmbito da escola, pode-se dizer que existem inúmeras características comuns
entre ambos, essa compreensão coloca a escola e a sociedade diante do propósito de
analisar o currículo escolar como prática cultural. Silva explica que, [...] a cultura escolar é
tanto o conjunto de saberes sobre os quais a escola se debruça no trabalho pedagógico,
como também estão presentes nas determinações dos mitos e comportamentos, tradições,
inovações e relações sociais (2006, p. 6).
Na organização da escola e na forma como ela apresenta seus aspectos essenciais,
da plena integração dos indivíduos, buscando contribuir para uma estrutura ampla de
sociedade, na qual todos se identificam como parte integrante para formação dessa cultura,
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ela. O que se pode perceber no plano da escola e nos elementos que compõem o processo
de ensino oferecido por ela, é não ter claro nos objetivos (para quem ensinar), nos
conteúdos (o que ensinar) e nos métodos e técnicas de (como ensinar). Hoje, os objetivos,
os conteúdos, os métodos e as práticas estão fundamentados nas práticas tradicionais de
exclusão.
Analisando o papel da escola para as diferentes classes sociais, Bernstein (1996,
p. 27) explica, primeiramente, que a escola “é uma instituição em que cada aspecto no
presente está perfeitamente ligado a um futuro distante”. Com isso, espera-se que a meta da
escola seja apoiar o desenvolvimento da consciência de todos os alunos, para transformá-la
em um ambiente não discriminatório, Daí que, entre a escola e a comunidade a que
pertencem alguns alunos, pode existir uma descontinuidade cultural baseada em dois
sistemas de comunicação radicalmente diferentes, o da família e o da comunidade escolar.
Assim, muitas crianças representadas pelas minorias, quando entram para a
escola, estão a penetrar num sistema simbólico que não lhes oferece qualquer ligação com
a sua vida familiar e comunitária e podem vir a fracassar no seu processo de aprendizagem
e até se tornarem deficientes.
É importante ressaltar que, na visão de Bernstein (1996), os fatores sociológicos
que afetam as realizações lingüísticas das famílias, às vezes são críticas para a
socialização, por outra a classe social que tem uma influência mais formativa sobre os
procedimentos dessa socialização, não são preparadas para contribuir para que essas
relações aconteçam de forma satisfatória.
As influências de tais resultados apontam que é preciso que a escola conheça
melhor todo o alunado, a fim de atenuar a exclusão entre as minorias, buscando obter
elementos significativos para a melhor compreensão dos elementos que estejam impedindo
a aprendizagem dos mesmos. Nesse sentido, a adequação da proposta pedagógica, para
atender as necessidades específicas dos alunos com deficiência, deve se pautar na
valorização e na construção de um sistema de significados contextualizados e em diversas
formas de comunicação alternativas de expressão. Isto possibilita a independência e o
desenvolvimento da autonomia moral e intelectual, de todos os alunos, não só dos
deficientes.
A problemática vivida pela escola, em relação ao convívio com diferentes alunos
e níveis de desenvolvimento e estilos de aprendizagem é uma situação que pode apresentar
dificuldades iniciais, angústias, conflitos, desequilíbrios. Mas, na realidade, essa polêmica
possibilita toda equipe da escola, o convívio de se trabalhar e crescer com as diferenças. E
89
então, com essa oportunidade, pode-se provocar a aprendizagem e os desafios para uma
reflexão conjunta, motivada para impulsionar trocas positivas de interação, de ajuda e
cooperação para resolução de problemas no cotidiano escolar.
Assim, o processo pedagógico é construído a partir das possibilidades, das
potencialidades, daquilo que o aluno já dá conta de fazer. É isso que o motiva a trabalhar, a
continuar se envolvendo com as atividades escolares, garantindo, assim, o sucesso de sua
aprendizagem. Para tanto, há necessidade de cooperação e troca com a família, para que
nessa oportunidade de trocas, a escola possa ser informada sobre os gostos, preferências,
rejeições, vivências e informações sobre o aluno.
O êxito no processo de aprendizagem dos conteúdos e das atividades está
explícito nos significados que têm para os alunos, que devem partir das experiências
positivas, dos interesses, dos significados e sentidos atribuídos por eles. Também, depende
de uma pedagogia de projetos, atividades que possam ser desenvolvidas coletivamente, de
maneira que as dificuldades sejam diluídas e superadas pela qualidade de solicitação do
meio, pela ajuda do professor e cooperação dos colegas não-deficientes.
Dessa forma, a educação não deve ser orientada por modelos que induzem o
professor a trabalhar segundo princípios pré-estabelecidos, utilizando instrumentos e
recursos pré-determinados e em condições de aprendizagem semelhantes, ignorando a
realidade concreta de cada aluno. Portanto, não há modelos imutáveis se a meta do
professor for à emancipação do ser humano.
É fundamental que a ação pedagógica tenha como meta atender às especificidades
de escolarização de cada aluno, incentivando, desenvolvendo e respeitando, tanto o seu
potencial a partir de sua realidade, como suas diferenças decorrentes das questões sócio-
culturais, étnicas, lingüísticas e, também, de problemas de ordem física, sensorial ou
intelectual.
Mas o fio condutor de toda essa explanação é a preocupação com a parcela da
sociedade com algum tipo de deficiência e que sempre estiveram alijadas do processo
educacional. A escolarização da parcela desses indivíduos tem ficado à mercê do abandono
e da exclusão, da maioria deles. Bueno (1999, p. 18) refere que:
modos de ver as coisas, imbricadas na cultura. Como se pode perceber na cultura escolar,
essa situação é evidenciada, pelo entendimento da reconstrução de uma cultura, de que
somente o saber especializado garante o atendimento do aluno com algum tipo de
deficiência.
Hoje, esse apêndice de uma educação especializada como redentora da prática
pedagógica, na busca de superar a condição da escolarização do aluno deficiente, tem que
ser desmitificada. Assim, independente do tipo de escola particular ou pública as práticas
metodológicas, de organização e funcionamento seguem uma determinação federal.
Pode-se dizer, então, que essa ênfase se dá em um debate permanente na política
da educação pública com vista à política inclusiva implantada no País. Não podemos
negar, porém, que existem condições de conflitos dado pela escolarização desse alunado,
que não passa unicamente pela via da especialização dos professores, mas principalmente
por uma cultura implantada no contexto da escola e também na sociedade.
Nesse sentido, como nos coloca Lunardi (2008, p. 118), “as práticas curriculares
são coletivas históricas e culturais”. Essa idéia da prática escolar como traço cultural, é
traduzida nas seguintes palavras de Gimeno-Sacristán (1999, p. 91):
A prática educativa é algo mais do que a expressão do ofício dos professores, é algo que
lhes pertence por inteiro, mas um traço cultural compartilhado [...] a prática educativa tem
gênese em outras práticas que interagem com o sistema escolar (apud LUNARDI, 2008,
p. 113-114).
Cabe à escola refletir em sua função, se ela existe é para atender uma clientela,
que em virtude da transmissão de seus saberes contextualizados, vai proporcionar a esses
uma atuação mais confortável no meio social. Mesmo que esse meio social, torne cada vez
mais competitivo, por meio dos conhecimentos, acham-se novas formas de atuar diante
dela, pois uma sociedade eficiente torna seu espaço também eficiente.
Quando se analisam as novas possibilidades de serem transmitidos os conteúdos
curriculares de forma eficaz, com a intermediação das tecnologias para se formar uma
escolaridade universalizada, nem sempre, essa é vista com bons olhos por parte de seus
dirigentes. Pois a cultura da escola cristalizou os conhecimentos transmitidos de forma
ritualizada. Hoje, a escola não é mais vista como conteudista, mas com uma proposta cada
vez mais reducionista, ficando sucumbida a um currículo mínimo a ser cumprido.
Nesse caso, não se pode perder de vista, que a educação especial deve estar
atrelada à educação comum com todos os componentes curriculares, tendo como
contribuição a tarefa de garantir educação de qualidade a todos. Para tanto, os avanços
desejados para a implantação da política de inclusão, na esfera educacional dizem respeito
a amplas e profundas transformações no sistema de ensino, enquanto espaço responsável
pela escolarização de alunos que apresentem demandas educacionais específicas.
Com essa proposta a escola deve adaptar-se às necessidades de escolarização dos
alunos com deficiência. Vale enfatizar a importância de canalizar os recursos humanos e
materiais de forma a atingir toda a educação básica que sem dúvida, tem um papel
fundamental de resgatar valores sociais, condizentes com a igualdade de direitos e de
oportunidades para todos.
Para se proporcionar uma educação satisfatória, com base na compreensão de
Marchesi (2001, p. 82), é necessário uma “reforma global da escola” para que seja
“satisfatória para alunos com necessidades educativas especiais em escolas regulares,
implica esforços coordenados de toda escola”. No discurso de Guerra, a organização da
escola é vista como:
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