Decisão Maria Claudia Bucchianeri

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Tribunal Superior Eleitoral

PJe - Processo Judicial Eletrônico

27/09/2022

Número: 0600301-20.2022.6.00.0000
Classe: REPRESENTAÇÃO
Órgão julgador colegiado: Colegiado do Tribunal Superior Eleitoral
Órgão julgador: Juíza Auxiliar - Ministra Maria Claudia Bucchianeri
Última distribuição : 07/09/2022
Valor da causa: R$ 0,00
Assuntos: Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Extemporânea/Antecipada
Objeto do processo: Trata-se de Representação proposta pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES
(PT) - Nacional em face de DELTAN MARTINAZZO DALLAGNOL, de MICARLA ROCHA DA SILVA
MELO e PAULO EDUARDO LIMA MARTINS, Deputado Federal, sob a seguinte alegação:

- os Representados Deltan e Paulo, fazendo uso de seus perfis pessoais nas redes sociais
Instagram e Twitter, respectivamente, veicularam vídeo em ataque ao pré-candidato à Presidência
da República, Luiz Inácio Lula da Silva. O referido vídeo foi igualmente divulgado pelo portal de
notícia Terra Brasil Notícias.

Destacam-se os seguintes trechos:

"Muito emocionante o "novo" jingle da campanha do Lula. Assistam"

"É preciso reconhecer. Esse jingle/clipe do Lula transmite exatamente o conteúdo e o significado
da candidatura do Luís Inácio à presidência. Faça justiça social, combata a ignorância, compartilhe
o vídeo"

"Comparação do jingle de Lula com falas sobre delações da Lava jato ganha a web; Veja o vídeo"
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO
Partes Procurador/Terceiro vinculado
PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) - NACIONAL ROBERTA NAYARA PEREIRA ALEXANDRE (ADVOGADO)
(REPRESENTANTE) MARIA EDUARDA PRAXEDES SILVA (ADVOGADO)
EDUARDA PORTELLA QUEVEDO (ADVOGADO)
FERNANDA BERNARDELLI MARQUES (ADVOGADO)
VICTOR LUGAN RIZZON CHEN (ADVOGADO)
MIGUEL FILIPI PIMENTEL NOVAES (ADVOGADO)
MARIA DE LOURDES LOPES (ADVOGADO)
MARCELO WINCH SCHMIDT (ADVOGADO)
ANGELO LONGO FERRARO (ADVOGADO)
VALESKA TEIXEIRA ZANIN MARTINS (ADVOGADO)
CRISTIANO ZANIN MARTINS (ADVOGADO)
EUGENIO JOSE GUILHERME DE ARAGAO (ADVOGADO)
GEAN CARLOS FERREIRA DE MOURA AGUIAR
(ADVOGADO)
DELTAN MARTINAZZO DALLAGNOL (REPRESENTADO) JACQUELINE AMARILIO DE SOUSA (ADVOGADO)
UBIRATAN MENEZES DA SILVEIRA (ADVOGADO)
MAIRA DANIELA GONCALVES CASTALDI (ADVOGADO)
MARCELLI DE CASSIA PEREIRA (ADVOGADO)
MICARLA ROCHA DA SILVA MELO (REPRESENTADA) RAIMUNDO RAFAEL DE PAIVA RODRIGUES (ADVOGADO)
DONNIE ALLISON DOS SANTOS MORAIS (ADVOGADO)
PAULO EDUARDO LIMA MARTINS (REPRESENTADO) NELSON JUNKI LEE (ADVOGADO)
Procurador Geral Eleitoral (FISCAL DA LEI)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
15815 27/09/2022 16:26 Decisão Decisão
0494
index: REPRESENTAÇÃO (11541)-0600301-20.2022.6.00.0000-[Propaganda Política -
Propaganda Eleitoral - Extemporânea/Antecipada]-DISTRITO FEDERAL-BRASÍLIA

TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

REPRESENTAÇÃO Nº 0600301-20.2022.6.00.0000 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL


Relator: Ministro Maria Claudia Bucchianeri
Representante: Partido dos Trabalhadores (PT) – Nacional
Advogados: Gean Carlos Ferreira de Moura Aguiar e outros
Representado: Deltan Martinazzo Dallagnol
Advogados: Marcelli de Cassia Pereira e outros
Representado: Paulo Eduardo Lima Martins
Advogado: Thomé Sabbag Neto
Representada: Micarla Rocha da Silva Melo
Advogados: Donnie Alisson dos Santos Morais e outro

DECISÃO

Trata-se de representação ajuizada pelo Diretório Nacional do Partido dos


Trabalhadores (PT) em desfavor de Deltan Martinazzo Dallagnol; Paulo Eduardo Lima Martins; e
da empresa Terra Brasil Notícias, por suposta prática de propaganda eleitoral antecipada
negativa.
Na petição inicial, o representante alega, em síntese, que (ID 157533647):
a) o representado Deltan Dallagnol, na data de 11 de abril de 2022, fazendo uso da
rede social Instagram, veiculou, em seu perfil pessoal, vídeo com trechos descontextualizados
em ofensa à imagem do pré-candidato ao cargo de Presidente da República Luiz Inácio
Lula da Silva, constando da publicação mais de 100 (cem) mil visualizações;
b) o vídeo (com duração de 2 minutos e 12 segundos) apresenta trechos de
depoimentos de testemunhas colhidos de audiência da ‘Operação Lava Jato’, encaixados no
conhecido jingle de campanha “Lula Lá”;
c) o representado Paulo Eduardo Lima Martins postou vídeo, em seu perfil no
Twitter, escrevendo mensagem de texto de que: “É preciso reconhecer. Esse jingle/clipe do
Lula transmite exatamente o conteúdo e o significado da candidatura do Luiz Inácio à
Presidência [da República]” – constando da publicação mais de 162 (cento e sessenta e duas)
mil visualizações (p. 4);
d) o portal Terra Brasil Notícias, também “circulou o vídeo em suas páginas” (p. 4);
e) a configuração de propaganda eleitoral antecipada negativa encontra amparo nos
arts. 3°-A da Res.-TSE nº 23.610/2019 e 36-A da Lei nº 9.504/1997, bem como em precedente do
TSE, visto que “busca angariar votos ao depreciar a imagem ou atributos de um pretenso
candidato” (p. 7);
no vídeo, o pré-candidato acabou sendo inocentado pela Justiça Brasileira.
Ao final, requer: i) o reconhecimento da prática de propaganda eleitoral antecipada

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negativa pelos representados; ii) a remoção do vídeo impugnado, nos termos do art. 17, § 1º-A,
da Res.-TSE nº 23.608/2019; e iii) a condenação dos representados ao pagamento de multa, no
valor máximo previsto em lei.
Em sua defesa, o representado Paulo Eduardo Lima Martins sustenta (ID
157553872):
a) não houve veiculação de inverdades no vídeo publicado, uma vez que o conteúdo
revela tão somente fatos pretéritos da vida de Luiz Inácio Lula da Silva narrados por Antônio
Palocci, Leo Pinheiro e pelo próprio Sr. Luiz Inácio, portanto são fatos públicos e notórios;
b) não há falar em propaganda eleitoral antecipada negativa, pois não houve
pedido explícito de não voto ou ofensa à honra e à imagem de pré-candidato, mas apenas
mero “exercício do direito de crítica política, trazendo à luz fatos pretéritos, sobejamente
conhecidos do público” (p. 7);
c) a remoção do vídeo da Internet ofende o direito à liberdade de expressão, ante a
“tentativa de esconder fatos verdadeiros, públicos e notórios” (p. 8).
A representada Terra Brasil Notícias apresentou defesa em que afirma, em resumo:
a) não ser a autora do vídeo impugnado e que apenas repostou, em seu sítio eletrônico, o
conteúdo que reflete fatos verídicos; b) não teriam sido ultrapassados os limites legais suficientes
para a caracterização do ilícito de propaganda eleitoral negativa, de modo que é necessário
garantir a intervenção mínima do Poder Judiciário e assegurar a liberdade de expressão e
informação (ID 157558606).
Em sua defesa, o representado Deltan Martinazzo Dallagnol suscita preliminarmente
a ilegitimidade ativa do representante para se insurgir contra suposta propaganda eleitoral
negativa de terceiro, ainda que seu filiado, porquanto não observa o disposto no art. 18 do Código
de Processo Civil, uma vez que a agremiação não possui candidato oficialmente escolhido em
convenção partidária. Quanto ao mérito, aduz que (ID 157572560):
a) o “vídeo ora questionado encontra abrigo na liberdade de expressão, até mesmo
porque, não há qualquer ilícito ou conteúdo eleitoral no caso concreto, tampouco propaganda
eleitoral antecipada” (p. 6);
b) a publicação não vai além de eventual mera crítica política, agasalhada pelo
direito à livre manifestação de pensamento, de modo que o art. 28, § 6º, da Res.-TSE nº
23.610/2019 estabelece que “a manifestação espontânea na internet de pessoas naturais em
matéria político-eleitoral, mesmo que sob a forma de elogio ou crítica a candidato ou partido
político, não será considerada propaganda eleitoral” (p. 10);
c) não há, no vídeo impugnado, pedido explícito de não voto, discurso de ódio,
afirmação sabidamente inverídica, ofensa à honra e, muito menos, violação ao princípio da
igualdade de oportunidades entre os candidatos, não se verificando, portanto, a configuração
de propaganda eleitoral antecipada, nos termos do art. 36-A da Lei nº 9.504/1997 e na linha dos
precedentes do TSE.
O Vice-Procurador-Geral Eleitoral manifestou-se pela improcedência do pedido por
meio de parecer assim ementado (ID 157605631):

Eleições 2022. Representação por propaganda eleitoral antecipada negativa em


campanha presidencial. A divulgação de vídeo em redes sociais, sem conteúdo
ofensivo e fatos inverídicos, não perfaz o ilícito. Parecer pela improcedência do
pedido.

Em razão do término do biênio do e. Ministro Raul Araújo como ministro substituto


desta Corte e, consequentemente, o fim da atuação de Sua Exa. como Ministro Auxiliar, os autos
foram a mim redistribuídos.

É o relatório. Passo a apreciar os pedidos veiculados pelo representante.

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De início, convém o registro de que esta representação foi ajuizada em 13.5.2022
pelo Partido dos Trabalhadores (PT), data anterior, portanto, à oficialização da Federação
Partidária denominada Brasil da Esperança (FE BRASIL), integrada pela referida agremiação,
cuja formalização se deu em 24.5.2022, por ocasião do julgamento do RFP nº 0600228-48/DF,
por este Tribunal Superior.
Feito o registro, afasto a preliminar suscitada pelo representado Deltan Martinazzo
Dallagnol de ilegitimidade ativa de Diretório Nacional de partido político para ajuizar esta
representação.
Nos exatos termos dos arts. 96 da Lei nº 9.504/1997 e 3º da Res.-TSE nº
23.608/2019, “as representações, as reclamações e os pedidos de direito de resposta poderão,
observada a respectiva legitimidade, ser feitos por qualquer partido político, federação de
partidos, coligação, candidata e candidato”.
Na verdade, quando a representação versar alegada prática de propaganda eleitoral
antecipada nas eleições presidenciais, o respectivo ajuizamento, nesta Corte Superior, deve ser
promovido pelo diretório nacional das agremiações partidárias, entendimento
multiplamente aplicado nestas eleições de 2022 (Rp nº 060015491, de minha relatoria, DJe
de 30.3.2022; Rp nº 0600064-83/DF, rel. Min. Raul Araújo, DJe de 11.2.2022; e Rp nº 0600007-
87/DF, de minha relatoria, DJe de 30.3.2022).
Para além disso, nos termos da inicial, o representante busca proteger interesses de
seu próprio filiado e pré-candidato à presidência da República, sendo certo que, em tal contexto
prévio, qualquer dano à esfera jurídica do futuro postulante refletirá, direta ou indiretamente, na
esfera jurídica da respectiva agremiação, sendo evidente, assim, a pertinência subjetiva para a
ação.
No mérito, o que se sustenta é que o vídeo publicado em 11.4.2022 pelos
representados na Internet - contendo trechos extraídos de depoimentos prestados por Antônio
Palocci e Leo Pinheiro no contexto da denominada ‘Operação Lava Jato’, além de falas e
imagens em que Luiz Inácio Lula da Silva se manifesta sobre o coronavírus e sobre a política de
repressão a atos infracionais cometidos por adolescentes, tudo isso encaixado no conhecido
jingle de campanha “Lula Lá” – configuraria propaganda eleitoral antecipada negativa, ante
seu conteúdo supostamente ofensivo à honra e à imagem do futuro postulante, denotando
pedido explícito de não voto.
Transcrevo a degravação na íntegra do vídeo impugnado, postado ainda em abril
de 2022, que tem como som de fundo o conhecido jingle “Lula Lá” (ID 157534306):

Mensagem escrita pelo representado Deltan Dallagnol: Muito Emocionante o


“NOVO” Jingle da Campanha do Lula. Assistam!

Imagem e som: emocionante música da campanha do pré-candidato Lula nas


Eleições 2022 ao tempo em que se visualizam imagens de depoimentos do Sr.
Antônio Palocci e do Sr. Leo Pinheiro em sala de audiência.

Depoimento do Sr. Antônio Palocci: o Dr. Emílio Odebrecht fez uma espécie de
pacto de sangue com o Presidente Lula. Ele procurou o Presidente Lula nos últimos
dias do seu mandato e levou um pacote de propinas para o Presidente Lula, que
envolvia: esse terreno no estudo, que já estava comprado, que o Sr. Emílio
apresentou ao presidente Lula; o sítio para uso da família do Presidente Lula (que já
estava fazendo a reforma em fase final) e ele disse ao Presidente Lula que o sítio já
estava pronto e também disse ao Presidente Lula que ele tinha à disposição dele,
para o próximo período, para fazer as atividades políticas dele, trezentos milhões de
reais.

Depoimento do Sr. Léo Pinheiro: o apartamento era do Presidente Lula desde o dia

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que me passaram para estudar os empreendimentos da Bancoop. Já foi me dito que
era para o Presidente Lula e sua família; que eu não comercializasse e tratasse
aquilo como uma coisa de propriedade do [...].

Fala do pré-candidato Lula: ainda bem que a natureza, contra a vontade da


humanidade, criou esse [inaudível] chamado coronavírus.

Fala do pré-candidato Lula: eu não posso ver mais jovem, de 14 ou 15 anos,


assaltando e sendo violentado, assassinado pela polícia, .... ou porque roubou
um celular.

Imagens reais de um crime de latrocínio.

O segundo representado, de seu turno, ao compartilhar a mesma mídia, teceu os


seguintes comentários:

“É preciso reconhecer. Esse jingle/clipe do Lula transmite exatamente o conteúdo e


o significado da candidatura do Luiz Inácio à presidência. Faça justiça social,
combata a ignorância, compartilhe o vídeo”.

Consoante tenho pontuado em diversas decisões, o meu entendimento pessoal é


no sentido do minimalismo judicial em tema de intervenção no livre mercado de ideias políticas,
de sorte a conferir tratamento preferencial à liberdade de expressão e ao direito subjetivo do
eleitor e da eleitora de obterem o maior número de informações possíveis para formação de sua
escolha eleitoral, inclusive para aquilatar eventuais comportamentos supostamente desleais ou
inapropriados.
Esse meu olhar da matéria ganha contornos ainda mais fortes, quando em debate
eventuais limitações discursivas no período da pré-campanha, considerado o período
excessivamente curto das campanhas oficiais, tal como pontuei no voto que proferi no
Recurso na Rp 0600229-33, assim ementado:

“ELEIÇÕES 2022. RECURSO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL


ANTECIPADA – ART. 36-A DA LEI Nº 9.504/97 – PROIBIÇÃO LEGAL QUE SE
LIMITA AO PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTO OU AO USO DE MEIOS PROSCRITOS
PELA LEGISLAÇÃO MESMO NO PERÍODO OFICIAL DE CAMPANHA – NORMA
PERMISSIVA QUE DEVE SER INTERPRETADA NO SENTIDO DA MÁXIMA
EFETIVIDADE DA LIBERDADE DISCURSIVA DE PRÉ-CANDIDATOS,
CONSIDERADO O PRAZO OFICIAL EXCESSIVAMENTE CURTO DAS
CAMPANHAS ELEITORAIS E A NECESSIDADE DE SE CONFERIR A TODOS OS
PLAYRES ELEITORAIS, MÍNIMA COMPETITIVIDADE, E AO SISTEMA,
CONDIÇÕES MÍNIMAS DE RENOVAÇÃO POLÍTICA (...). RECURSO
DESPROVIDO.

1. A liberdade de expressão durante o processo eleitoral qualifica-se como


pressuposto indispensável ao legítimo exercício do direito de sufrágio de
modo informado e esclarecido.

2. A propaganda eleitoral, enquanto projeção qualificada da liberdade de


expressão no processo eleitoral, é a força motriz do livre mercado de ideias

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eleitorais, ambiente em cujo contexto os eleitores podem se informar sobre
candidaturas e plataformas, qualidades e defeitos dos concorrentes, pressuposto
necessário à própria liberdade de escolha pelos cidadãos.

3. A intervenção judicial sobre o livre mercado de ideias políticas deve sempre


se dar de forma excepcional e necessariamente pontual, apenas se legitimando
naquelas hipóteses de desequilíbrio ou de excesso capazes de vulnerar
princípios fundamentais outros, igualmente essenciais ao processo eleitoral, tais
como a higidez e integridade do ambiente informativo, a paridade de armas
entre os candidatos, o livre exercício do voto e a proteção da dignidade e da
honra individuais.

4. A legislação eleitoral, ao encurtar sensivelmente o prazo oficial de campanhas,


trouxe como cláusula de abertura, como forma de preservar uma mínima
competitividade de novos players e algum grau de renovação política, profunda
permissividade aos discursos permitidos na fase da pré-campanha.

5. Nos termos do art. 36-A da Lei nº 9.504/97, e desde que não haja pedido
explícito de voto, são lícitos comportamentos como falar de si e de possíveis
qualidades pessoais, falar da política, dos problemas coletivos, divulgar pré-
candidatura, pedir “apoio político”, anunciar projetos futuros, objetivos, propostas
e ações políticas a serem desenvolvidas, externar posições pessoais sobre os
temas que afetam a comunidade.

6. Para que o encurtamento do prazo de campanha, associado à excessiva tutela


nos meios de propaganda, não se convertam em impeditivo material à ascensão de
novas lideranças, com o comprometimento da própria vivacidade democrática, é
imprescindível que ao art. 36-A da Lei nº 9.504/97 e a todas as condutas ali tidas
como expressamente permitidas seja dada a interpretação mais generosa
possível.

(...)

10. Ainda que o pedido explícito de voto possa ser extraído de outras palavras, as
chamadas “palavras mágicas”, como “vote”, “eleja”, “tecle a urna”, ou “derrote”, “não
eleja”, “não vote”, a interpretação do que deve ser entendido como pedido explícito
de voto, para fins de incidência da vedação legal, não pode esvaziar a literalidade
dos inúmeros comportamentos expressamente permitidos durante a pré-campanha
pelo art. 36-A da Lei nº 9.504/97, cuja interpretação deve se dar de forma sempre
maximizadora, sob pena de criação de um modelo eleitoral em que o prazo oficial de
campanha é excessivamente curto e no qual não há margem razoável de
apresentação de futuros postulantes em período anterior, com claro
comprometimento da competitividade eleitoral e da renovação política.

11. Recurso desprovido.

No entanto, o Plenário desta Corte Superior, no julgamento do referido recurso


(Recurso na Rp 0600229-33), teve entendimento distinto, tendo fixado, para o presente pleito
eleitoral de 2022, a premissa segundo a qual o pedido explícito de voto ou de não voto
proibido pela norma inscrita no art. 36-A da Lei nº 9.504/97 pode ser extraído do contexto
em que as falas foram proferidas, do chamado “conjunto da obra”, bem assim da semelhança
entre o ato praticado a destempo com os atos típicos e próprios do momento oficial de
campanha eleitoral, verbis:

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“Agora, o conjunto da obra, tudo junto aqui, eu perguntaria só uma questão: aqui
estamos analisando campanha antecipada; se nós tirarmos o “antecipada”
campanha e trouxermos para agora, a campanha que vem sendo realizada é
exatamente igual à que foi realizada nesse período, exatamente igual” (Ministro
Alexandre de Moraes);

“(...). nós estamos constatando isso empiricamente, quer dizer, o conteúdo


implícito na fala aqui do, enfim, do representado. Mas, na verdade, existem
inúmeros estudos acadêmicos, já há muito tempo, que tratam, analisam a semântica
do discurso político. São estudos interessantíssimos que mostram que os políticos,
muitas vezes querendo dizer uma coisa, falam, ou dizem, usando palavras, enfim,
distintas daquilo que realmente gostariam de exprimir (...)” (Ministro Ricardo
Lewandowski).

Já no recente julgamento do Referendo na Rp 0600390-43/DF, esta Corte Superior,


por unanimidade, entendeu haver propaganda eleitoral antecipada negativa em postagem que
associada determinado pré-candidato ao suposto uso de “farinha”, o que poderia insinuar o uso
de entorpecentes, em situação tida como ofensiva à honra e à imagem do futuro postulante,
apta a gerar ato de campanha a destempo.
Sendo essa, portanto, a métrica fixada pelo Plenário da Casa, constato, de saída, a
inequívoca conotação eleitoral (AI nº 0600805-86/MA, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de
10.5.2021) das publicações feitas pelos representados, ainda em abril deste ano.
Os próprios comentários feitos pelo representado Deltan Dallagnol, ao compartilhar
a mídia ora impugnada em seu perfil pessoal no Instagram, explicitam a repercussão
inequivocamente eleitoral daquela postagem, muito embora o prazo oficial para campanhas
ainda não tivesse sido iniciado: “Muito emocionante o ‘novo’ jingle da campanha do Lula.
Assistam!”.
Também assim os comentários de Paulo Eduardo Lima Martins, ao compartilhar a
mesma mídia em seu perfil pessoal no Twitter: “É preciso reconhecer. Esse jingle/clipe do Lula
transmite exatamente o conteúdo e o significado da candidatura do Luiz Inácio à
presidência. Faça justiça social, combata a ignorância, compartilhe o vídeo”.
Nesse cenário, portanto, constatado o contexto explicitamente eleitoral subjacente
aos comportamentos ora questionados, passo a apreciar se as publicações questionadas
configuram propaganda antecipada negativa, por veicularem, antes do período oficial, ofensa à
honra e à imagem do candidato, pedido explícito de não voto ou prática de atos típicos de
campanha em momento inadequado, considerada, insisto, a métrica já estabelecida pelo E.
Plenário desta Corte, para o pleito eleitoral em curso.
E, ao fazê-lo, percebo que a hipótese não se ajusta aos limites e contornos
conferidos à fase da pré-campanha pelo Plenário desta Corte, para o pleito eleitoral de 2022.
O compartilhamento de mídia cujo conteúdo é de clara propaganda eleitoral
negativa ainda em abril do ano eleitoral, sob a suposta alegação de se tratar do “jingle de
campanha” de pré-candidato adversário, com a exortação para que seja visto e compartilhado,
bem assim com o apelo ao usuário para que “combata a ignorância, compartilhe o vídeo”,
tudo isso ainda em momento distante do início da disputa, ajustam-se à ideia de pedido de não
voto a destempo, tal como definido pelo Plenário desta Casa.
O contexto das postagens questionadas (e a própria investigação em torno do
contexto em que praticado o comportamento tido como eleitoralmente prematuro foi tida como
possível e necessária nos mencionados precedentes firmados para este pleito eleitoral,
quando em análise atos de pré-campanha) revelam claríssima intenção de demover o eleitor
de optar futuramente por determinada candidatura, mediante a propagação de conteúdo
claramente negativo e tipicamente eleitoral.
Tanto o conteúdo divulgado ainda em abril é claramente eleitoral, que as mesmas
falas ali exploradas, com poucas alterações, fizeram parte dos programas oficiais de rádio

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e de televisão durante a fase oficial de campanha, a revelar, assim, “queimada de largada”
pelos representados, que, antes do período oficial, compartilharam clara propaganda eleitoral
negativa, em contexto revelador de pedido de não voto, o que viola a jurisprudência desta
Corte Superior para as presentes eleições.
Nos dizeres do Ministro Alexandre de Moraes acima transcritos, “se nós tirarmos o
“antecipada” e trouxermos para agora, a campanha que vem sendo realizada é exatamente
igual à que foi realizada nesse período, exatamente igual”, a revelar propaganda antecipada.
Por outro lado, afasto a alegada irregularidade de matéria jornalística veiculada
pela empresa Terra Notícias Brasil, que se limitou a noticiar a existência do referido vídeo e de
seu compartilhamento em perfis de rede social, alertando tratar-se de uma edição do jingle ‘Lula
lá’. Reproduzo o conteúdo da matéria publicada:

O deputado Paulo Eduardo Martins (PL-PR) publicou no Twitter uma edição do


jingle de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com delações da Lava Jato e gafes do ex-
presidente. A versão do vídeo também foi compartilhada pelas deputadas Carla
Zambelli (PL-SP) e Bia Kicis (PL-DF)

“É preciso reconhecer. Esse jingle/clipe do Lula transmite exatamente o conteúdo e


o significado da candidatura do Luíz Inácio à presidência”, escreveu Martins.

Jingle Lula lá

A reedição do jingle “Lula lá”, foi apresentada por Janja, noiva do ex-presidente,
durante o lançamento, neste sábado 7, da pré-campanha de Lula e Alckmin à
Presidência. Janja disse que o vídeo era o seu presente de casamento para o
petista.

Como lembrou o site Poder 360, a versão original de “Sem Medo de Ser Feliz” foi
apresentada pela 1ª vez com as vozes de Chico Buarque, Gilberto Gil e Djavan.
Agora, o jingle foi protagonizado por artistas como Pablo Vittar, Chico César, Duda
Beat e Paulo Miklos. Há alterações na letra, como a substituição dos trechos “cresce
a esperança” por “renasce a esperança”, e “com toda a certeza para você” por “o
Brasil merece outra vez”.

A publicação realizada pela empresa Terra Notícia Brasil – embora reproduza o


vídeo por meio do link de acesso do perfil do representado Paulo Eduardo Martins – tem natureza
de matéria jornalística e está amparada na liberdade de imprensa e informação, nos termos dos
arts. 5º, XIV, e 220 da Constituição Federal.
Ante o exposto, julgo parcialmente procedente a representação, para condenar
os representados Deltan Martinazzo Dallagnol e Paulo Eduardo Lima Martins por propaganda
eleitoral antecipada negativa, nos termos do art. 36, § 3º, da Lei 9.504/97, aplicando-se,
individualmente, a sanção de multa no valor mínimo de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Conforme o disposto no art. 38, §§ 1º e 4º, da Res.-TSE nº 23.610/2019, determino
a remoção dos conteúdos localizados nas seguintes URLs indicadas na petição inicial:

i) https://twitter.com/PauloMartins10/status/1523144155534266368?s=20&t=aEY3Pu
8v38fosylBT4ObTg;

ii) https://www.instagram.com/p/CdbCMSqFQ1F/

Oficie-se os provedores de aplicação Twitter e Instagram para cumprimento da


determinação judicial de remoção, no prazo de 48 (quarenta e oitos horas), conforme preceito

Assinado eletronicamente por: MARIA CLAUDIA BUCCHIANERI - 27/09/2022 16:26:31 Num. 158150494 - Pág. 7
https://pje.tse.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=22092716262947400000156837334
Número do documento: 22092716262947400000156837334
normativo previsto no art. 17, § 1º-B, da Res.-TSE n º 23.608/2019.
Publique-se.
Brasília, 27 de setembro de 2022.

Ministra Maria Claudia Bucchianeri

Relatora

Assinado eletronicamente por: MARIA CLAUDIA BUCCHIANERI - 27/09/2022 16:26:31 Num. 158150494 - Pág. 8
https://pje.tse.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=22092716262947400000156837334
Número do documento: 22092716262947400000156837334

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