Linguagem Visual Na Historiografia
Linguagem Visual Na Historiografia
Linguagem Visual Na Historiografia
NA HISTORIOGRAFIA
2ª Edição
Indaial - 2020
UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090
Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
ISBN 978-65-5646-015-4
ISBN Digital 978-65-5646-016-1
CDD 701.15
Impresso por:
Sumário
APRESENTAÇÃO.............................................................................5
CAPÍTULO 1
História e Linguagem Visual..........................................................7
CAPÍTULO 2
Linguagem Visual, Modernidade e Tecnologia.........................61
CAPÍTULO 3
Imagem e Ensino de História.....................................................119
APRESENTAÇÃO
Os conteúdos abordados nesta disciplina buscam desenvolver habilidades
em relação à linguagem visual. Entendendo-a em suas especificidades, o
inquérito ao qual submetemos um produto visual na perspectiva historiográfica
requer instrumentos específicos. No entanto, não há como selecionar e normatizar
critérios universais, elencados como os mais aptos ao saber histórico. A princípio,
cabe dizer que no decorrer dos debates que aqui terão lugar buscaremos romper
com a gaiola epistemológica que limita a imagem a um documento visual,
interpelado iconograficamente, apenas. Como sugere o historiador Ulpiano
Bezerra de Meneses (2012), é crucial que o historiador/a se familiarize com as
inúmeras variáveis que definem a natureza da imagem e com a multiplicidade
de papéis que ela pode assumir historicamente. Quer dizer, ainda que não
percorramos todos os métodos e caminhos pensados para se “ler” uma imagem,
interpretar os seus signos ou o seu conteúdo intrínseco, será preciso realizar uma
cartografia dos aportes oferecidos a esta inquirição pela história da arte, pela
história das técnicas, pelas ciências da percepção, da comunicação, da cultura
visual e da semiótica, entre outros.
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Capítulo 1 HISTÓRIA E LINGUAGEM VISUAL
1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Realizar uma leitura crítica de imagens, imprescindível ao saber histórico,
requer o conhecimento dos critérios investigativos da imagem enquanto produto
cultural, coisa feita por homens e mulheres, com intenções, que comunicam e
que expressam através de diferentes aportes: plasticidade, elementos formais,
estéticos, iconográficos etc. Para que possamos inquerir uma imagem, qualquer
que seja, enquanto produto visual ou como fonte documental, que aporta um
testemunho, será preciso caminhar primeiro entre o universo das artes e seu
encontro com a semiótica. Deste encontro resultaram diferentes métodos de
leitura de imagens, os quais teremos a oportunidade de conhecer e “provar” em
um primeiro momento deste Capítulo I.
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banhamos no mesmo rio duas vezes. Assim, mesmo aquelas obras, imagens ou
produtos visuais mais disseminados, com os quais nos depararmos em diversos
momentos da vida, ganham aqui uma nova oportunidade.
2 INTRODUÇÃO À LEITURA DE
IMAGENS
Diz o ditado popular remetido a Confúcio: uma imagem vale mais do que mil
palavras. O contexto de produção desta lógica, a Antiguidade Oriental, difere em
absoluto das nossas sociedades contemporâneas. Dispomos de recursos visuais
infinitamente mais complexos do que aqueles aos quais o filósofo teve acesso.
Na época, possivelmente, esteve no centro da lógica do ditado citado, que remete
ao século V a. C, a forma de comunicação simbólica chamada de ideograma. Tal
ditado popular é utilizado, nos dias atuais, para expressar a ideia de que uma
única imagem possui a capacidade explicativa de mais de mil palavras. Cabe-nos
indagar o seguinte: resulta correta essa afirmação? Nas páginas que seguem,
problematizaremos a relação entre imagem e expressão/comunicação, a começar
por uma introdução do que seria uma “leitura” da visualidade enquanto linguagem.
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FONTE: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2016/05/grafite-com-beijo-de-
trump-e-putin-ilustra-temor-dos-lituanos.html>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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Esse exercício de inquerir a imagem sobre seu lugar de produção, sobre as suas
características visuais e sobre o seu significado, constitui uma primeira aproximação ao
tema da leitura de imagens, que agora veremos de maneira mais teórica. Maria Emilia
Sardelich (2006) realizou uma síntese dos conceitos que fundamentam as propostas
de leitura de imagens no campo do ensino de artes, o que nos interessa no sentido
de situar os debates e as diferentes perspectivas desse campo do conhecimento que
aqui se situa entre a história e a linguagem. Quem sabe, ao final desta abordagem,
poderemos identificar qual metodologia de “leitura” de imagens mais nos interessa, ou
melhor, a que se apresenta mais útil para nós, enquanto historiadores e historiadoras.
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preza pelo processo de dar forma, de caracterizar o que se apresenta diante dos olhos,
tendo inspirado intelectuais não só do campo das artes, mas fundado também uma
escola psicanalítica.
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Capítulo 1 HISTÓRIA E LINGUAGEM VISUAL
Descrevendo: o que você vê nesta imagem? Como são as suas linhas? Ausentes,
nítidas, angulosas, indefinidas? Que cores foram utilizadas e que cores predominam?
São fortes, misturadas ou chapadas? Há jogos entre claro e escuro? Quais são as
texturas da obra, lisas, ásperas, macias? Você observa na imagem formas orgânicas,
geométricas ou difusas?
Revelando: como você faria uma obra sobre este mesmo tema? Experimentação
artística, cuja obra, resultante desta leitura, poderá também ser apreciada seguindo os
passos propostos.
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Do método proposto por Ott (1984 apud SARDELICH, 2006) para a leitura de
imagens podemos destacar algumas especificidades. A primeira e mais evidente
é que ela se destina ou, pelo menos assim foi pensada, para uma mediação
professor/aluno cujo objetivo seria o de “ensinar” a ler uma imagem. A segunda
característica do método seria a sua aplicação limitada, sobretudo, a obras de
arte, pois os passos e, consequentemente, o inquérito que o mediador propõe
em relação à imagem se centra no processo artístico-criativo, nas formas, nas
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Capítulo 1 HISTÓRIA E LINGUAGEM VISUAL
Estágio I, descrição: o que é esta imagem? O que ela mostra? O que chama
nela mais a atenção? Que narrativa possível está inscrita nesta imagem?
Estágio II, construção: Como a obra foi feita? Qual a técnica empregada?
Como são as linhas, as cores, a textura? Como se dá a composição dos
elementos? Ela se pretende realista?
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FONTE: <http://g1.globo.com/distrito-federal/noticia/2016/04/brasilia-recebe-maior-
exposicao-feita-no-pais-sobre-mexicana-frida-kahlo.html>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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Hans Belting, um dos principais nomes das teorias da visualidade, para quem
a produção e a memória das imagens têm no corpo o agente principal de sua
concepção.
FONTE: <https://www.terra.com.br/diversao/gente/de-einstein-
a-lennon-site-mostra-supostos-passaportes-de-famosos,2f08c9
32e7bc0410VgnVCM10000098cceb0aRCRD.html>.
Acesso em: 6 nov. 2019.
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jogo, não tem o mesmo peso e consequência do que o relato confidenciado por
uma mulher a sua vizinha ou o narrar de acontecimentos por uma menina em seu
diário íntimo. Mas tal relativização, aplicável de maneira distinta a cada um dos
documentos, não possui valor em si mesma, já que a crítica é instrumento do
método e não o fim do método em si.
A erudição, por maior que seja, cai no vazio quando se limita a detectar o
contexto da produção documental sem investigar seus motivos, sem disto produzir
conhecimento, mesmo quando “falsos”. No caso das inconsistências da natureza
humana, fiquemos com o exemplo dado por Bloch (2001): confiaríamos mais no
diagnóstico de um médico, que analisou com cuidado a situação de seu paciente,
ou na sua descrição dos móveis do quarto em que se encontrava o enfermo? Ou
este: ou as nuvens mudaram de forma desde a Idade Média, já que as descrições
de então revelam visões de cruzes e espadas, ou o relato informa não sobre o
que se viu na realidade, mas sobre o que, em sua época, era estimado natural
ver. E mesmo no caso da falsificação e da manipulação sua existência interpela
uma atmosfera social que assume ela mesma um valor documental, ou seja: a
falsificação pode, igualmente, dar-se à utilização como fonte documental.
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FONTE: <https://www.metmuseum.org/art/collection/
search/435658>. Acesso em: 6 nov. 2019.
FONTE: <https://en.wikipedia.org/wiki/Madonna_of_
the_Carnation>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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FONTE: <https://www.nationalgallery.org.uk/paintings/raphael-
the-garvagh-madonna>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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De acordo com Bloch, a crítica deve mover-se entre estes dois extremos:
a similitude que justifica e a que desacredita. Com esta ressalva, o autor
atentava para o fato de que, em que pese inúmeras semelhanças e mesmo a
possibilidade da livre inspiração de um documento, imagem ou artefato, com base
em um modelo (ou ainda, que tenham bebido na mesma fonte) são muitas as
combinações no mundo para que seja possível produzir provas idênticas, sem
que por um ato voluntário de imitação. Isto talvez seja mais notável em relação ao
campo das artes plásticas, e mais problemático, por exemplo, no tempo presente,
em relação ao universo digital. Na velocidade com que a informação se projeta,
como atestar de quem é a autoria de dado texto, esboço ou identidade visual?
Quem o publicou primeiro? Enfim, de qualquer maneira, a crítica do testemunho
apoia-se na lógica do semelhante e do dessemelhante, do um e do múltiplo.
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Dada a trajetória do estudo das artes pelo saber historiográfico parece certo
afirmar ser mais profícua a análise de séries de documentos de um mesmo tipo,
que pertençam a um mesmo contexto ou temática, do que um artefato singular.
Ou, melhor ainda, o cruzamento de documentos de distintos suportes e tipos.
Caso contrário, tendemos a adotar o quadro, imagem etc., como um todo
significante no conjunto de suas partes. Como pontuamos anteriormente, nem
tudo o que compõe uma obra foi logicamente posto nela a fim de produzir um
sentido. Além disso, no caso do campo visual, o estilo e as ideias podem ser dos
seus autores, individuais, portanto, mas a “gramática”, a linguagem através da
qual se expressa ou produz sentido, é do seu tempo, deixando-se ver melhor em
perspectiva comparada.
Em História, entretanto, por mais que o/a historiador/a “saiba”, nunca será
suficiente se não puder convencer o leitor ou leitora do conhecimento produzido. A
imperiosa necessidade de demonstrar “como sei o que estou afirmando”, tornou-
se a base do método historiográfico, como ele vem sendo construído ao longo
do século XX. Isto porque o destaque que conferimos às fontes documentais –
expresso nas listas de fontes utilizadas, ao final dos trabalhos, na referência a
cada um dos arquivos consultados e nas incontáveis notas de rodapé ao longo da
narrativa – baseia-se no preceito moral de que os dados possam ser verificados e,
assim, a consistência das afirmações que produzimos. Cabe-nos indicar “o mais
brevemente possível, sua proveniência, ou seja, o meio de encontrá-lo equivale,
sem mais, a se submeter a uma regra universal de probidade” (BLOCH, 2001, p.
94-95).
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Capítulo 1 HISTÓRIA E LINGUAGEM VISUAL
Há, enquanto proposta metodológica, uma terceira via? Burke acredita que
sim, que há outro caminho sendo trilhado por historiadores e historiadoras, mas
que inexiste, por ora, um manual. Entretanto, sabe-se já que esta terceira via não
se situa no meio da estrada, entre as duas propostas apresentadas anteriormente
(a positivista e a estruturalista), mas fazendo cuidadosas distinções que se referem
aos dois pressupostos teórico-metodológicos da prática histórica tradicional
(lugar de produção do documento e questionário a ele aplicado), inserindo as
críticas pertinentes do campo visual. A título propositivo, Burke apresenta quatro
observações, das quais podemos nos aproximar no trabalho de análise
crítica de imagens.
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FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Puni%C3%A7%C3%B5es_
(14205232887).jpg>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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Qual é o testemunho dado por esta imagem? Com certeza, ela testemunha
a presença humana na região; que estas pessoas manipulavam o ocre vermelho;
que representavam figuras humanas; e que, em suma, expressavam-se
pictoricamente. Já em relação ao que a imagem indicia – no sentido de vestígio,
possibilidade, evidência – pode-se pontuar a existência de códigos de conduta
e práticas de castigo. O que não podemos afirmar, senão por meio de outras
fontes, são as motivações do castigo, se eram perpetrados por homens ou por
mulheres, se os castigados eram crianças ou adultos, quais eram as funções da
representação desta prática, dentre outras questões que a imagem nos suscita.
Com isso queremos colocar uma questão inicial: o testemunho oferecido por
uma imagem tem limites, não podendo ser compreendido como manifestação de
uma mensagem autevidente, tampouco super interpretado, inferindo-se sobre ele
muito mais do que apenas indicia.
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Esse é o caso da impressionante pintura de Jan Van Der Heyden (Figura 11),
um expoente da pintura holandesa do século XVII, em A barragem e Damrak. A
imagem é povoada por gentes e por construções de diferentes períodos históricos,
mas ela não deixa de apresentar-se organizada e asseada. Isso é o resultado de
uma “limpeza” estética, típica do gênero. O inverso de tal “limpeza” também pode
ocorrer: a desordem e a sujeira podem ser destacadas ou exageradas quando a
imagem possui uma retórica política ou moral. Ainda sobre a obra de Heyden, seu
fator realidade reside na segurança que ela expressa em relação ao testemunho
ocular do artista. Ou seja, ela nos convence, dada a sua técnica apurada, a
perfeita perspectiva e o jogo de sombras, que o artista estava justamente no
mesmo lugar que ocupamos a admirar a paisagem urbana.
FONTE: <https://www.harvardartmuseums.org/collections/
object/228161?position=0>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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O exemplo da Figura 12 pode tornar mais claro tal argumento. A obra, uma
aquarela de Jean-Baptiste Debret, foi produzida entre 1820 e 1830 e intitula-se
Loja de Sapateiro. A imagem retrata um sapateiro português, proprietário de seu
comércio e dos africanos escravizados que o auxiliam nos serviços que presta.
Um deles, em razão possivelmente de dano causado a alguma peça, é visto
sendo castigado com uma palmatória, sob o olhar temeroso do companheiro à
direita do observador e caçoísta da senhora à esquerda, possivelmente, a esposa
do sapateiro, a amamentar uma criança.
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FONTE: <https://nacoesunidas.org/especial-entre-o-brasil-e-a-africa-
houve-uma-troca-forte-e-poderosa-alberto-da-costa-e-silva/loja_de_
sapateiro_aquarela_jean-baptiste_debret/>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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FONTE: <https://ensinarhistoriajoelza.com.br/caricaturas-do-segundo-
reinado-critica-com-humor-e-ironia/>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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já que ele é a fonte de seu status quo. O elemento pictórico em si corrobora este
enunciado: a representação tribal de um líder sentado confortavelmente em uma
grande almofada suscita o sentimento de que ele e o regime que representa
estão situados em outro tempo social. Voltando à questão que temos feito: o
que imagens como essa podem testemunhar? Nesse caso, elas são, no mínimo,
testemunhas da criação de instrumentos para expressar, visualmente, uma ideia
subjetiva sobre o Imperador Pedro II.
FONTE: <https://www.deviantart.com/gukpard/art/President-Getulio-
Vargas-painting-1938-700235104>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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Capítulo 1 HISTÓRIA E LINGUAGEM VISUAL
FONTE: <https://super.abril.com.br/historia/como-eram-os-rituais-de-
canibalismo-dos-indios-brasileiros/>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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Capítulo 1 HISTÓRIA E LINGUAGEM VISUAL
Neste sentido, parece importante situar o caso das imagens como produto
da cultura de massa. Para esta “leitura”, em específico, são fundamentais as
contribuições de Roland Barthes (1915-1980). Barthes foi um sociólogo francês
que se destacou, dentre outros, no campo da semiologia – lembremo-nos da
semiótica: ciência, teoria ou campo de conhecimento dos sistemas de signos.
Através do estudo das imagens, das artes e da produção midiática em geral,
Barthes realizou uma etnografia da sociedade francesa através dos signos que
ela emitia, oferecendo uma contribuição em relação à maneira de “ler” a produção
visual contemporânea.
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Capítulo 1 HISTÓRIA E LINGUAGEM VISUAL
FONTE: <https://www.metropoles.com/gastronomia/beber/coca-cola-quer-
incentivar-publico-a-consumir-menos-acucar/amp>. Acesso em: 6 nov. 2019.
FONTE: <https://www.inteligemcia.com.br/coca-cola-influenciou-pesquisas-
que-tinham-seu-patrocinio-revela-estudo/>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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Do ponto de vista da análise que temos feito até aqui, a publicidade se insere
na dinâmica enquanto testemunha de um momento histórico, indiciando sobre a
vestimenta da época, o mobiliário e os objetos, os penteados. Mas a imagem não
pode representar tal momento histórico porque a família em tela não existe: a
imagem é a composição de um conjunto de fatores que enunciam o embricamento
entre família, felicidade e Coca-Cola.
O que não está dito é que tudo o que está representado, desde a família,
o cenário, o produto ou a festividade, foi naturalizado, como se não fossem,
todos estes elementos, construções culturais que variam mesmo dentro de
uma mesma cidade, classe ou etnia. Também fica evidente que um produto
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FONTE: <https://exercicios.mundoeducacao.bol.uol.com.br/exercicios-historia-brasil/
exercicios-sobre-governo-juscelino-kubitschek.htm>. Acesso em: 6 nov. 2019.
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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Qualquer artefato cultural se inscreve numa cadeia que engloba quem o
produziu, quem o utilizou, quem o analisou, quem o empregou de outra forma.
Mas as imagens, além de oferecerem seus testemunhos e indícios, permitem
que se formem visões do passado, pois através delas imaginamo-lo melhor.
Essa relação entre imagem e imaginação está presente na própria etimologia de
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Capítulo 1 HISTÓRIA E LINGUAGEM VISUAL
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REFERÊNCIAS
ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro:
LTC, 2006.
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ROSSI, Maria Helena. Imagens que falam. Porto Alegre: Mediação, 2003.
VALENTE, André. A linguagem nossa de cada dia. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.
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C APÍTULO 2
LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E
TECNOLOGIA
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Capítulo 2 LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E TECNOLOGIA
1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Em primeiro lugar, comecemos por dizer que modernidade é um termo
polissêmico. Ou seja, a depender do referencial teórico adotado, do fenômeno
específico a ser abordado ou até mesmo do lugar e do período em que se está
situado, podemos encontrar concepções distintas de modernidade, que apesar de
se sobrepuserem em muitos sentidos, certamente não coincidem por completo.
No entanto, é possível destacar de antemão que todas estas possíveis definições,
incluindo variações semânticas como modernização e modernismo, guardam
consigo uma intrínsica dimensão temporal que as convertem em conceitos
históricos de enorme relevância.
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cada vez mais utilizados para descrever o crescente afastamento entre espaço
de experiência (passado) e horizonte de expectativa (futuro), assim como para
explicar a própria História (KOSELLECK, 2014).
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Capítulo 2 LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E TECNOLOGIA
2 ARTE E REPRODUTIBILIDADE
TÉCNICA
Técnica, arte ou ofício. Três conceitos que designam maneiras de realizar
uma ação ou um conjunto de ações. Conhecimentos que abrangem métodos,
instrumentos, procedimentos, ferramentas: um modo de fazer. Interpelando a
técnica por este prisma, fica claro que a possibilidade de reproduzir uma obra
de arte sempre esteve à disposição de homens e mulheres que, atentos/as aos
procedimentos, puderam refazer um objeto original. Na Antiguidade Clássica, por
exemplo, os aprendizes de ofícios mais destacados eram aqueles que logravam
melhor imitar a arte de seus mestres. A cunhagem de moedas, desde quatro
mil anos atrás, constitui um dos mais antigos procedimentos de reprodução em
massa. No Oriente, a xilogravura – técnica de gravura que utiliza uma matriz
de madeira onde está esculpida uma imagem – é conhecida desde o século
VI, antecedendo, portanto, a reprodução tipográfica da escrita. Em termos de
reprodução técnica, a imagem surgiu antes da palavra.
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FONTE: <https://thonyc.wordpress.com/2018/11/01/apples-pears-
comparing-print-technologies/>. Acesso em: 13 dez. 2019.
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Capítulo 2 LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E TECNOLOGIA
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De acordo com Wagner Souza e Silva (2012), no estado da arte atual que
se relaciona à produção de imagens técnicas, esse conceito – técnica – não se
refere apenas a um meio de produção, mas também a um modo de percepção
produzido pelo aparato tecnológico. Apesar de usados indiscriminadamente,
técnica e tecnologia possuem significados diferentes. Para o autor, o termo técnica
sugere uma conexão mais íntima com as necessidades e motivações da práxis,
enquanto tecnologia corresponde aos aparatos e aos discursos que estipulam os
modos de atuação. Os usos, formas de proceder e as maneiras de produção de
sentidos através do aparato tecnológico, por exemplo, são as técnicas, ou ainda,
as razões para fotografar, por exemplo. O sentido de ambos os conceitos está
explícito na maneira como os utilizamos corriqueiramente: quando se aborda um
“modo de fazer” de dado fotógrafo – uma expressão prática da necessidade que
leva a uma ação – não afirmamos que ele possui sua “tecnologia própria”, mas
sim uma “técnica própria”, ou pessoal. Em síntese, tecnologia se define pela
conjunção do material e da teoria que foram originados por uma técnica.
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Capítulo 2 LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E TECNOLOGIA
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Por mais bem-feita que seja a cópia manual de uma obra de arte ou as
possibilidades abertas pelas formas de sua reprodução técnica, a obra de arte
possui uma existência única no lugar onde se encontra, seu “aqui e agora” a que
Benjamin vai designar “aura”. A aura que habita a obra autêntica “é a essência
de tudo o que ela comporta de transmissível desde a sua origem, da duração
material a sua qualidade de testemunho histórico” (BENJAMIN, 2017, p. 15). A
sua autoridade de coisa original, fruto de um gênio e de uma materialidade única
não pode ser copiada sequer pelo próprio artista, se fizesse de sua própria obra
uma reprodução manual cinco minutos depois da primeira. A autoridade reside
justamente nisso: a segunda, realizada em relação de subordinação à primeira,
dá um testemunho absolutamente diferente. Talvez seja menos o caso desta não
possuir uma aura, do que o de ser habitada por outra, mas igualmente singular,
como a obra original.
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Capítulo 2 LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E TECNOLOGIA
O caráter único da obra de arte autentica seu lugar junto ao ritual de sua
utilização primeira, e também sua função social. É a isso que Benjamin se refere
quando fala da inserção da obra de arte no contexto da tradição. Realizada
para fazer pensar, inspirar, cultuar, a obra de arte está carregada de emoção e
de todos os sentimentos que avultam da criação artística original, os quais não
estão presentes na sua cópia ou reprodução. Com os diferentes métodos de
reprodução técnica da obra de arte, a possibilidade de sua exposição cresceu
numa proporção tamanha, mensurada pela fissura que se abriu entre o valor de
culto de uma imagem (culto no sentido religioso, espiritual, mas também culto
no sentido de cultuar a genialidade da obra originária) e seu valor expositivo.
Enquanto a obra de arte tradicional tem sua existência sob o valor de culto, a ser
fruída por um público seleto em uma exposição ou museu, a essência da obra de
arte reproduzida é o seu valor expositivo, já que sua razão de ser é a apreciação
por diversas coletividades em espaços diferentes ao mesmo tempo. Isto não
apenas subverte o “aqui e agora” da obra original, mas sugere, para o autor, que
quanto mais reproduzida, menos ritualizada se converte a obra original.
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e o disco – manifestam minimamente sua aura, “seu aqui e agora”, seja pela
reprodução em massa, seja porque são produzidas com a finalidade, justamente,
de serem reproduzidas. Ou seja, há nisso uma crítica contundente à cultura de
massa como instrumento da indústria da arte e nesta, uma reflexão sobre
a apreciação das artes sem o pensamento crítico necessário. Onde reside
o “aqui e agora” de uma narrativa fílmica, se a ilusão criada pela técnica não é
resultado da atuação do ator, mas sim de um conjunto de montagens? Eis, por
exemplo, uma das reservas do autor.
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Capítulo 2 LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E TECNOLOGIA
mensagem sem código próprio, conotada apenas em sua relação com o verbal.
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desenvolvida no Brasil, entre 1941 e 1972, para onde veio com a ascensão do
nazismo na Europa. Em Filosofia da caixa preta: ensaios para uma futura filosofia
da fotografia, originalmente publicada em 1983, Flusser sustenta que a invenção
das imagens técnicas representa a segunda de duas grandes viradas na cultura
humana (sendo a primeira a invenção da escrita linear). Situada na evolução
da cultura ocidental como resposta à textolatria oitocentista, o resultado da
massificação das imagens técnicas foi devastador para a cultura, segundo o autor,
porque ela substitui o real por sua imagem, criando uma ilusão de experiência
vivida quando na realidade vive-se no plano das imagens e seus efeitos. No
glossário que propõe para uma futura filosofia da fotografia, textolatria aparece
como a idolatria do texto devido à incapacidade de decifrar seus códigos, não
obstante a capacidade do leitor de lê-los. Neste sentido, as imagens técnicas se
diferem de outras formas de linguagem pictórica porque estas representavam,
sugeriam, propunham uma visão do mundo e das coisas, enquanto aquelas as
substituem.
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Capítulo 2 LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E TECNOLOGIA
FONTE: <https://noticias.universia.com.br/destaque/noticia/2014/05/09/1096363/
futurismo-charge-of-the-lancer-umberto-boccioni.html>. Acesso em: 13 fev. 2020.
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Embora haja relatos de que Aristóteles (384-322 a.C.) tenha feito a primeira
descrição do funcionamento de uma câmara escura, foi o árabe Abu al-Hasan Ibn
al-Haytham (965-1038 d.C.) quem descreveu, trabalhou a técnica e ampliou-a,
conferindo-lhe também outros usos, como a observação de eclipses lunares e
solares, que seriam fundamentais para o desenvolvimento do telescópio e do
microscópio. Grosso modo, a técnica fotográfica consiste numa caixa, que
pode ser do tamanho de um quarto ou ter as medidas da palma de uma mão,
sendo três lados escuros e um claro. A parede oposta à clara deve conter um
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Capítulo 2 LINGUAGEM VISUAL, MODERNIDADE E TECNOLOGIA
orifício por onde entra a luz que projeta, na parede clara, a imagem do objeto
que está do lado de fora da câmara escura, em frente ao orifício. A imagem da
câmera fotográfica como sinônimo de aparato industrial é apenas uma de uma
série de experiências com a câmara escura: desde os experimentos escolares
com caixinhas de fósforo, até as Dirkons elaboradas em papel na extinta União
Soviética demonstram como a técnica é acessível, mas também como ela está
arraigada à cultura ocidental moderna.
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FONTE: <https://blogdojuanesteves.tumblr.com/
post/149474501166/ligeiramente-fora-de-foco-
robert-capa/embed>. Acesso em: 13 dez. 2019.
FONTE: <http://100photos.time.com/photos/henri-cartier-bresson-
behind-gare-saint-lazare>. Acesso em: 13 dez. 2019.
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FONTE: <https://focusfoto.com.br/recife-recebera-exposicao-
fotografica-de-sebastiao-salgado/>. Acesso em: 13 dez. 2019.
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FONTE: <https://galeriachroma.com.br/artistas/galeria/
parques-nacionais>. Acesso em: 13 dez. 2019.
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FONTE: <https://michaels.com.au/collections/pre-owned-products/
products/kodak-3-a-autographic-f7-7-6>. Acesso em: 13 dez. 2019.
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Cada uma das categorias analisadas constitui unidades culturais que devem
ser realocadas em categorias espaciais, estabelecidas para a estruturação final
da análise. Esse procedimento de instrumentalizar a noção de espaço como
chave de leitura das mensagens visuais é comum na produção historiográfica
que lida com imagens técnicas. Os campos espaciais – fotográfico, geográfico,
do objeto, da figuração e da vivência – permitem o restabelecimento dos códigos
de representação social de comportamento, mas também reconstruções de
realidades sociais do passado nos marcos de sua historicidade.
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4 REGISTROS AUDIOVISUAIS:
CINEMA E TELEVISÃO
Em um conjunto de textos de André Bazin (2014) publicados postumamente
em 1960, intitulado O que é o cinema, o teórico francês analisa a imagem
fotográfica e a imagem cinematográfica desde uma perspectiva comparada,
realizando algumas definições. Para o autor, a fotografia possui caráter centrípeto
(atuando como uma força que puxa o corpo, neste caso, os olhos, para o centro
do movimento). Os olhos do/a observador/a ficam restritos aos limites da moldura,
não questionam se existe algo mais, além daquilo que veem: trata-se de uma
imagem “acabada”. No cinema, por sua vez, a imagem é regida por uma força
centrífuga (uma força inercial que empurra para fora um corpo em movimento de
rotação). Há o deslocamento constante do olhar, pois a imagem está sempre em
movimento, em processo. Ao contrário da imagem acabada e finita da fotografia,
no cinema convive-se com a possibilidade constante de que algo novo entre
em cena, existindo muito além do que se deixa ver no momento, pelo menos
enquanto possibilidade.
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FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Lanterna_m%C3%A1gica>.
Acesso em: 13 dez. 2019.
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FONTE: <http://lounge.obviousmag.org/cultura_intratecal/2014/02/a-
escadaria-de-odessa-e-as-referencias.html>. Acesso em: 13 dez. 2019.
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Como parece claro para nós, que nascemos e crescemos sob a influência, em
maior ou menor medida, do aparato televisivo, o fluxo contínuo da programação
não se encerra nem mesmo com a inserção de inúmeros comerciais entre um
bloco e outro de conteúdo. Isso porque as propagandas são parte constitutiva
do fluxo que compõe a transmissão. Escasseando-se cada vez mais o tempo
de propaganda, ele tende a encarecer-se, já que em “comercial” se incluem as
chamadas da própria programação, que compete pela audiência do público com
os produtos oferecidos, mas também com o conteúdo a ser exibido em outros
canais. Esse fenômeno é ainda mais evidente nos canais de assinatura pagos:
o/a espectador/a, adquirindo o acesso à transmissão, reduz drasticamente a
necessidade de que a programação seja financiada pela propaganda.
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melhor do que em qualquer outro gênero abordado pelo gênero noir. Este gênero,
habitado por criminosos, prostitutas, oportunistas e corruptos teve seu ápice nos
Estados Unidos entre os anos 1939 e 1950.
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FONTE: <http://marquinadotempo.blogspot.com/2013/04/a-visao-
da-oficina-3-sobre-o-filme.html>. Acesso em: 16 fev. 2020.
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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Ao longo deste capítulo, abordamos um roteiro convencional relativo à
temática da arte, da imagem e da reprodutibilidade técnica. Isso significa, por um
lado, que você acadêmico tem nesse material os conteúdos fundamentais para
desenvolver saberes e práticas nesse campo de estudo. Nisso a que chamo
“convencional”, inserem-se alguns conceitos-chave da discussão que envolve arte
e técnica, autores/as com os quais é possível ou necessário dialogar e conteúdos
que é imprescindível que sejam dominados. Por outro lado, dada a complexidade
e amplitude do campo, muito ainda pode ser buscado por vocês. Filmes, livros,
exposições, pesquisas em sites, blogues e mídias, há muito material disponível e
que deve fazer parte do cotidiano do professor-pesquisador em História, já que o
fim de uma disciplina ou um curso não significa que estejamos prontos, completos
em relação a dado conjunto de conhecimentos.
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REFERÊNCIAS
BARTHES, Roland. A mensagem fotográfica. In: BARTHES, Roland. O óbvio e o
obtuso. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990, pp. 11-25.
FREIRE FILHO, João. História da televisão: Teoria e Prática. In: XXVII Congresso
Brasileiro de Ciências da Comunicação – INTERCOM, 2004, Porto Alegre. Anais,
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Porto Alegre: PUC Rio Grande do Sul, 2004. Disponível em: <http://www.portcom.
intercom.org.br/pdfs/119106480770841596670106571215914498247.pdf>.
Acesso em: 16 jan. 2020.
MAUAD, Ana Maria; LOPES, Marcos Felipe de Brum. História e Fotografia. In:
CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS, Ronaldo. (Orgs.). Novos domínios da
história. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, pp. 263-281.
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STEINBECK, John; CAPA, Robert. Um diário russo. São Paulo: Cosac Naify,
2011.
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C APÍTULO 3
IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA
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Capítulo 3 IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA
1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Percorrendo a trajetória de estudos desta disciplina sobre Linguagem Visual
na Historiografia, temos que o despontar da noção de que uma imagem poderia ser
lida deu-se no campo de estudos das artes, e mais especificamente, no ensino de
artes. Ao longo do século XX, com ênfase na segunda metade em diante, diferentes
autores e autoras sugeriram estágios ou etapas de apreensão visual pelas quais
alunos e alunas seriam conduzidos/as pelo/a professor/a visando a ampliação de
seus conhecimentos técnicos, formais e estéticos, para que pudessem apropriar-
se de um “informe” contido numa pintura, numa ilustração, numa imagem fixa
qualquer. No Capítulo I, elencamos duas contribuições fundamentais para o
desenvolvimento desses saberes, o formalismo e a semiótica, os quais deram
origem a métodos de ensino-aprendizagem que estiveram centrados no estudo
descritivo da representação visual de símbolos, formas, temas e técnicas que
compõem uma linguagem visual.
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Linguagem Visual na HistoriograFia
quanto para o/a professor/a que pretende utilizar essa produção em sala de aula,
mas também iniciar os/as alunos em práticas de pesquisa em História.
Cada tipo de produto visual, e no interior de um mesmo tipo, cada uma das
formas tomadas pelos critérios de diferenciação (na fotografia, os retratos e as
paisagens, no cinema, a discussão sobre os gêneros, por exemplo) compõem
linguagens específicas que não podem ser compreendidas senão através do
conhecimento acerca de sua produção. Isso porque, conforme a concepção
de linguagem que temos utilizado não se desconsidera o conteúdo veiculado,
mas uma linguagem é um meio através do qual esse conteúdo é materializado.
O professor-pesquisador precisa dos conhecimentos acerca das técnicas de
produção visual e audiovisual para fazer o seu trabalho com qualidade, já que
elas são instrumentos de produção de sentido que atuam em nível muito mais
profundo do que o “dizível”. Por essa razão dedicamos todo um capítulo às
imagens técnicas, ao seu processo de desenvolvimento em diferentes momentos
históricos, ao maquinário do qual resultam seus usos, especificidades etc.
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Capítulo 3 IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA
neste primeiro quartel do século XXI. As razões dessas demandas são diversas
e relacionam-se ao próprio conteúdo da disciplina, mas também às novas formas
de apropriação do conhecimento histórico disponíveis nos tempos em que
vivemos. Elencamos, para um breve comentário, três fatores interligados que
compõem o quadro situacional da dinâmica escolar em relação à História: 1) o/a
professor/a e a escola não são mais os únicos (ou principais) fontes de irradiação
do conhecimento histórico; 2) o momento de midiatização vivido pelas sociedades
modernas promove a inserção das crianças e dos jovens numa cultura das
“telas”, do imaginativo, do imagético e do ficcional desde muito cedo; 3) como
um conhecimento que está sempre em movimento, a História se vê no centro de
uma polarização política evidenciada a nível mundial, alvo de revisionismos e de
narrativas contestatórias.
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O problema é que essas sínteses não estão sendo oferecidas por professores/
as de fato, ou seja, não são produzidas por profissionais que dominam, para
além dos acontecimentos, o processo de construção de narrativas sobre os
acontecimentos. A absorção de conteúdo pelos/as alunos/as, como sabemos,
não é o objetivo de a disciplina de História constar no currículo escolar. Nisso
residem as ressalvas em relação a “aprender” História através de almanaques
audiovisuais: importa a capacidade de memorização que eles mobilizam ou
o seu fracasso em potencializar o pensamento crítico? Essa “disputa”, na falta
de termo mais adequado, entre a escola e os novos formadores de opinião, que
se apresentam quase exclusivamente através das redes, conduz ao segundo
elemento alvo de nossos comentários: a inserção constante e precoce das
crianças e dos jovens na dinâmica das mídias e dos aparatos tecnológicos.
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Capítulo 3 IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA
A máxima de que tudo tem dois lados, havendo sempre diversas opiniões
sobre um mesmo tema, é a expressão de um maniqueísmo infértil para o
conhecimento histórico. Se um regime foi bom, mal, quem nele agiu certo ou
errado, por exemplo, são respostas que podem ou não ser respondidas por cada
aluno/a no processo de apropriação de conteúdos e sua significação sempre
subjetiva sobre eles. Não convém ao professor/a respondê-las, mas apresentar
todos os elementos, de forma crítica, ainda que isso não signifique incorporar
a falácia da neutralidade que, sabemos, não pode ser sustentada, já que
professores e professoras são sujeitos com as suas próprias crenças e valores.
Mas o que vemos no material produzido e disseminado à revelia pelas redes –
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3.1 CINEMA
Ficha técnica
Ano: 2º ano do Ensino Médio
Tema: marginalização social no Brasil
Produto: cinema
Sugestões: 1) Cinco vezes favela (1962). Dir.: Marcos Farias, Miguel
Borges, Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade e Leon Hirszman;
2) 5x favela – agora por nós mesmos (2010). Dir.: Manaíra Carneiro,
Wagner Novais, Rodrigo Felha, Cacau Amaral, Luciano Vidigal, Cadu
Barcelos.
Objetivo: realizar uma leitura crítica das representações da
marginalização social no Brasil em dois tempos.
Questionário: em que contextos históricos estas obras foram produzidas?
Que lugares sociais ocupam os que realizaram essas produções? Há
estereótipos representados? Há personagens ou relações idealizadas?
Quais são as causas da marginalização social no Brasil? Quais são os
obstáculos para a superação desta condição? Quais os efeitos técnicos,
visuais ou sonoros utilizados para expressar a angústia, a tristeza e o
desespero nas duas obras? Por que o cinema brasileiro aborda a favela
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Uma opção interessante seria elencar um capítulo inteiro de cada uma das
produções. Couro de gato (de 1962) e Arroz com feijão (de 2010), por exemplo,
são capítulos que abordam dilemas morais vividos por personagens infantis. Couro
de gato faz uma etnografia da prática da caça a gatos de rua, com a aproximação
do Carnaval, para a confecção de instrumentos de percussão. Isso gerava algum
recurso econônimo para as crianças, que se divertiam ao fazê-lo. No enredo, um
dos meninos furta um gato de uma mansão, afeiçoando-se a ele. No entanto,
acoçado pela fome, acaba vendendo o felino ao fabricante de instrumentos,
dotando ainda mais a história de um aspecto triste. Feijão com arroz, por sua
vez, conta a história de Wesley, um menino que deseja “presentear” o pai com
um frango no dia de seu aniversário. Tendo ouvido a reclamação paterna de que
em casa só se comia arroz com feijão, Wesley realizou diversas atividades, sem
poder, no entanto, adquirir o frango almejado, roubando-o com o auxílio de seu
amigo Orelha. O tom mais divertido dessa história em relação à Couro de gato
resulta também no acirramento de seu teor moral: se na anterior vigora a lógica
da privação, a “explicar” o delito, aqui prevalece a ideia de que o ilícito é errado
mesmo que a intenção seja nobre. Trata-se de histórias que permitem pensar as
formas de viver a infância na favela, suas práticas de sobrevivência e o modo
como a materialidade da vida vai construindo padrões de conduta que articulam
frustração, privações e ilegalidade.
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De acordo com Roberto Elísio dos Santos (2011), o acirramento das posições
políticas oriundas da Guerra Fria marcou a produção cinematográfica do início dos
anos 1960. No Brasil, o Cinema Novo surgiu como um movimento estético e
político que se caracterizou pela denúncia da miséria e das desigualdades
sociais e regionais do país. Seus membros buscaram construir uma
proposta artística que fosse nacional, popular e engajada na transformação
da sociedade. Deste período e proposta resultam algumas das obras mais
importantes do cinema nacional, tais como Deus e o Diabo na terra do Sol (1964),
de Glauber Rocha, e Vidas Secas (1963), de Nelson Pereira dos Santos. A marca
dessa produção – que à exceção de Cinco vezes favela traz como cenário a
região mais pobre do Brasil, o Nordeste – foi o desenvolvimento de uma “Estética
da Fome”, uma proposta de emprego da realidade não produzida para dar cabo
da representação visual e estética do povo brasileiro, que em sua grande maioria
era assediado pela violência enquanto manifestação cultural da pobreza e das
privações.
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Capítulo 3 IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA
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FONTE: <https://guia.folha.uol.com.br/cinema/2015/04/1620775-filmes-raros-de-
movimento-iconico-sao-exibidos-em-sessoes-gratis.shtml>. Acesso em: 21 jan. 2020.
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3.2 CHARGES
Ficha técnica
Ano: 3º ano do Ensino Médio
Tema: Ditadura Militar
Produtos: charges
Sugestões: no site <https://www.chargeonline.com.br/> pode-se realizar
buscas por charges organizadas por autoria e data.
Objetivo: analisar o período da ditadura militar brasileira segundo fatores
econômicos, sociais, culturais e políticos; problematizar a memória
acerca do período e os argumentos tendentes ao revisionismo do
conhecimento histórico sobre ele.
Questionário: quais elementos são responsáveis pelo humor em cada
uma das charges reproduzidas? De que forma poderíamos sintetizar
o que foi a ditadura militar em termos políticos, através das charges
reproduzidas? Qual é a relação entre arquivos, ossadas e a ditadura
militar? O que foram as Comissões da Verdade e por que elas foram
instituídas? Por que há escárnio em relação ao ímpeto dos militares em
“virar essa página da História”? Como explicar os números oriundos do
“milagre econômico”? Por que a Anistia “à brasileira” dá lugar atualmente
a um sentimento de injustiça em relação aos civis e de privilégio em
relação aos militares? O que poderia significar que uma parte da
população brasileira esteja a requisitar uma intervenção militar “avulsa”
no tempo presente?
Proposta avaliativa: como se trata de um tema recente da História do
Brasil, para o qual há muita documentação disponível, há igualmente
muitos elementos a serem trabalhados: os personagens, períodos,
principais características, acontecimentos etc. Estas informações são
relevantes para a compreensão de fenômenos sociais recentes, mas
também costumam ser objeto dos exames de admissão para o Ensino
Superior. Por isso sugerimos que a avaliação desse tema seja a
construção de um mapa mental individual, material de estudo elaborado
pelos próprios alunos que permite a incorporação de informações e
nuances contínuas, além daquelas abordadas em aula.
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Capítulo 3 IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA
FONTE: <https://descomplica.com.br/artigo/ditadura-4-charges-
que-te-ajudam-a-entender-a-abertura-politica-nos-governos-
geisel-e-figueiredo/430/>. Acesso em: 21 jan. 2020
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Linguagem Visual na HistoriograFia
FONTE: <https://www.otempo.com.br/charges/charge-o-
tempo-26-09-2017-1.1524296>. Acesso em: 21 jan. 2020.
FONTE: <https://descomplica.com.br/artigo/ditadura-4-charges-
que-te-ajudam-a-entender-a-abertura-politica-nos-governos-
geisel-e-figueiredo/430/>. Acesso em: 21 jan. 2020.
144
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FONTE: <https://www.ocafezinho.com/2016/12/01/grupo-que-financiou-ditadura-
adquire-distribuidora-de-gas-da-petrobras/>. Acesso em: 21 jan. 2020.
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FONTE: <https://jovemnerd.com.br/nerdbunker/mulher-maravilha-se-
esconde-na-trincheira-em-nova-foto/>. Acesso em: 21 fev. 2020.
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Até que ponto Batman é um simples justiceiro – à margem da lei – que pune
outros criminosos e até que ponto é um filantropo milionário que compreende
os condicionamentos negativos a que estão submetidas as pessoas menos
abastadas ou até excluídas da sociedade, é um dilema que perpassa o
personagem em várias HQs, mas também as adaptações do personagem para
o cinema, como na trilogia dirigida pelo cineasta Christopher Nolan ou no filme
Batman Vs. Superman (2016). Em termos de currículo escolar pode-se trabalhar
ainda, nesse sentido, o desenvolvimento do Estado de Bem-Estar Social como
alternativa ao liberalismo econômico, assim como o desmantelamento neoliberal
contemporâneo, tema cuja abordagem pode ser realizada através de recortes do
filme Coringa (2019).
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FONTE: <http://baixarquadrinhos.com/Hq-Quadrinho/ler-hq-online-
a-piada-mortal-alan-moore/>. Acesso em: 21 fev. 2020.
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crítico na medida em que seu surgimento está ligado a todo um esforço de guerra
que envolvia inclusive propaganda junto à população civil e justificativas perante a
comunidade internacional.
O exposto acima não significa que haja uma correlação direta e contínua
entre a indústria cultural e os interesses de Estado. Até recentemente, um link
no site oficial da Hydra, mantido pela editora Marvel, conduzia o/a internauta
diretamente para a página oficial do presidente Donald Trump, insinuando que o
inimigo/nazista agora seria o próprio líder dos EUA (ver: Marvel alfineta Trump em
ação promocional da saga, Jovem Nerd, 2017. Disponível em: <https://jovemnerd.
com.br/nerdbunker/secret-empire-marvel-alfineta-trump-em-acao-promocional-
da-saga/>. Acesso em: 21 fev. 2020). Da mesma forma, as últimas HQs do Capitão
América, um dos super-heróis que melhor representa o patriotismo estadunidense,
vem levantando questionamentos sobre uma suposta identificação com o ideário
nazista (ver a seguinte matéria: Capitão América sempre foi um vilão, confirma
Marvel Comics, Zero Hora, 2017. Disponível em: <https://gauchazh.clicrbs.com.
br/cultura-e-lazer/noticia/2017/04/capitao-america-sempre-foi-um-vilao-confirma-
marvel-comics-9777492.html>. Acesso em: 21 fev. 2020).
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Capítulo 3 IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA
FONTE: <https://www.torredevigilancia.com/o-nazismo-em-quadrinhos-
conheca-otimas-hqs-sobre-a-segunda-guerra/>. Acesso em: 21 fev. 2020.
Por mais preparados que estejamos para realizar uma leitura crítica de
produtos culturais como aqueles oriundos do cinema hollywoodiano, por exemplo,
nunca é demais lembrar que a imagem em movimento, super produzida, que
envolve nossos sentidos e nossas emoções, tem o poder de nos convencer e,
inclusive, fazer com que questionemos nosso olhar enquanto críticos de uma
hegemonia econômica, cultural e simbólica que é a razão pela qual os Estados
Unidos e o seu modo de vida suscitam encanto e admiração entre alguns de
nós. Estamos sendo demasiadamente críticos com aqueles que, afinal de
contas, cumpriram papéis tão importantes nos acontecimentos chave do século
XX? Não seria, de fato, a produção cultural norte-americana a maior e a mais
adequada a ser seguida, como um guia que nos conduzirá a um novo estágio
civilizatório? É claro que as respostas para essas questões, propositadamente
estereotipadas, não são afirmativas. Os Estados Unidos, lembremos, atuaram
nas Grandes Guerras Mundiais segundo uma lógica e interesses próprios. Sua
versão da História e sua filosofia ideológica, expressas de maneira naturalizada
pelo cinema de heróis e heroínas, não são senão olhares subjetivos e parciais
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3.4 MAPAS
Ano: 7º ano do Ensino Fundamental
Tema: Grandes Navegações
Produtos: mapas históricos
Objetivo: compreender o empreendimento realizado pelas nações
que impulsionaram as grandes navegações entre o final do século XV
e começo do XVI, as visões de mundo dos homens e mulheres que
habitavam este espaço-tempo e como elas foram transformadas pelo
encontro com novos territórios e populações.
Questionário: sob quais perspectivas cada um dos mapas foi elaborado?
Qual é a relação entre as visões de mundo da época da produção
dos mapas e a representação dos territórios? Quais são os elementos
pictóricos representados em cada uma das imagens? O que esses
elementos informam sobre o seu lugar de produção? Quais eram as
possíveis funções exercidas pelos mapas quando foram produzidos,
além da sua utilidade evidente? Há equívocos, por exemplo, de forma ou
escala nos mapas reproduzidos? Por quais possíveis razões?
Proposta avaliativa: a atividade prevista para essa temática deve ser
realizada em conjunto com a disciplina de Geografia e consiste na
elaboração de um mapa cartográfico que aborde elementos físicos,
geográficos, históricos e simbólicos da espacialidade retratada. Na
avaliação do produto final, devemos levar em consideração tanto o
correto uso da escala, coordenadas e posição quanto a imaginação e a
criatividade dos elementos incorporados. O espaço-tempo representado
pode ser real ou fictício.
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FONTE: <https://www.unicamp.br/unicamp/ju/artigos/eduardo-marandola-
jr/sobre-antipodas-mapas-e-terra-plana>. Acesso em: 23 fev. 2020.
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Capítulo 3 IMAGEM E ENSINO DE HISTÓRIA
Na Figura 10, temos um mapa do século XV, por exemplo, no qual estão
apenas os três continentes conhecidos pelos europeus até então. Além disso, há
uma representação plana da Terra e não esférica. A visão teocêntrica do mundo
fica evidenciada pela presença de vários elementos mítico-religiosos, como a
Arca de Noé e a narrativa do repovoamento do mundo pelos seus três filhos: Sem
(Ásia/alto), Jafé (Europa/esquerda) e Can (África/direita). O/a professor/a pode
ponderar que se trata de uma interpretação muito particular e preconceituosa da
passagem bíblica na qual Noé teria condenado os descendentes de Can a serem
servos dos seus irmãos. Esse foi um dos argumentos utilizado durante muito
tempo para legitimar a escravidão moderna dos povos africanos, tema abordado
mais adiante no currículo escolar.
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FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Planisf%C3%A9rio_de_Cantino#/
media/Ficheiro:Cantino_planisphere_(1502).jpg>. Acesso em: 23 fev. 2020.
O mapa Terra Brasilis de 1519 – também conhecido como Mapa Miller, nome
do seu último proprietário – por sua vez, é uma fonte visual que traz informações
importantes sobre diversos aspectos do início do período colonial. Dentre eles
podemos destacar a exportação da cultura e das instituições modernas europeias
para outras partes do mundo, mas que se dá de modo muito desigual, através
de exploração colonial, como fica evidente na representação do pau-brasil
como mercadoria obtida pelo trabalho forçado dos povos ameríndios. Mais
especificamente, esse mapa remete a um período particular da História do
Brasil, muitas vezes chamado de pré-colonial, anterior à fixação definitiva dos
portugueses na América, o que está simbolizado na restrição das caravelas ao
oceano. Além de recursos comerciais, a curiosidade pelo caráter exótico da fauna
e pela flora também se destacam.
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FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Atlas_Miller#/media/
Ficheiro:Brazil_16thc_map.jpg>. Acesso em: 23 fev. 2020.
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FONTE: <http://tudomonster.blogspot.com/2011/08/piratas-do-
caribe-2-o-bau-da-morte.html>. Acesso em: 23 fev. 2020.
3.5 FOTOGRAFIAS
Ano: 8º ano do Ensino Fundamental ou 2º ano do Ensino Médio
Tema: Crise da monarquia e Proclamação da República
Produtos: fotografias
Sugestões: o site Brasiliana Fotográfica reúne acervos fotográficos de
várias instituições, podendo-se realizar buscas temáticas, por exemplo,
pesquisando-se por “D. Pedro II” (ver: <http://brasilianafotografica.bn.br/
brasiliana/visualizar-grupo-trabalho/66>. Acesso em: 23 fev. 2020).
Objetivo: analisar a derrocada do Império brasileiro sob perspectiva
cultural, atentando para as especificidades do monarca e sua situação à
frente do regime; situar o lugar das “questões” no advento da República,
bem como seu caráter oportuno no contexto do final da década de 1880.
Questionário: qual é a representação predominante de Pedro II na
memória histórica acerca dos anos finais da monarquia brasileira? Em
que medida seu acervo pessoal de fotos revela um perfil diferente ou
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da princesa Isabel. Por outro lado, o reinado de Pedro II parecia ter características
aparentemente contraditórias. Por um lado, era “esclarecido”, amante das artes,
das viagens, da história, da tecnologia e possuía tendências políticas liberais,
como fica evidente na criação do Conselho de Ministros em 1847, inspirado no
regime parlamentarista inglês. Por outro lado, mantinha intactas as prerrogativas
absolutistas do Poder Moderador, do qual frequentemente se utilizava para
controlar as disputas de poder entre os partidos Liberal e Conservador. Alguns
dos biógrafos de Pedro II, como Lilia Schwarcz (2014), chegam a sugerir que,
se não fosse ele próprio o titular do trono, bem poderia haver sido republicano.
Talvez esse descompasso entre seus posicionamentos políticos, seu espírito e o
lugar que ocupava tenha se demonstrado no desdém que emanava do regime em
relação aos seus símbolos e signos, já que a pompa e o requinte que caracterizava
o Império – bandeiras, vestimenta, ornamentos em ouro, carruagens etc. – tudo
andava um tanto desleixado nos últimos anos do monarca nos trópicos.
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FONTE: <https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/
reportagem/o-que-aconteceu-com-a-familia-imperial-brasileira-apos-
queda-da-monarquia.phtml>. Acesso em: 23 fev. 2020.
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FONTE: <https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/
reportagem/o-que-aconteceu-com-a-familia-imperial-brasileira-apos-
queda-da-monarquia.phtml>. Acesso em: 23 fev. 2020.
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4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Ao longo deste capítulo, que se dedicou a fazer diálogos entre imagens e
ensino de História, reforçamos o postulado segundo o qual desaconselha-se o uso
meramente ilustrativo de produtos visuais em sala de aula: se as consideramos
linguagens, isso requer que estejamos atentos/as às maneiras pelas quais e
através das quais apreendemos seu enunciado. Essa análise crítica das imagens
como produtos oriundos de uma cultura, um lugar, um período e uma autoria,
específicos ou indiciários, pode embasar nosso planejamento das aulas de
História, dos anos iniciais do Ensino Fundamental até o Ensino Médio e além, no
Ensino Superior.
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REFERÊNCIAS
BARBOSA, Angela et al. (Orgs.). Como usar as histórias em quadrinhos na
sala de aula. 4. ed. (Coleção Como usar na sala de aula). São Paulo: Contexto,
2014.
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BUENO, Eduardo. Brasil: uma História. A incrível saga de um país. São Paulo:
Ática, 2003.
HOBSBAWN, Eric. A Era dos Extremos: o breve século XX. São Paulo: Cia das
letras, 1995.
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