505 - Ana Paula Rodrigues Carvalho

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FASCISMO E ENSINO

Direção Editorial

Lucas Fontella Margoni

Comitê Científico

Profa. Dra. Márcia Elisa Teté Ramos


Universidade Estadual de Londrina (UEL)

Profa. Dra. Marlene Cainelli


Universidade Estadual de Londrina (UEL)

Prof. Dr. Renilson Rosa Ribeiro


Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)
FASCISMO E ENSINO

UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE A EMPATIA HISTÓRICA EM SALA DE AULA

Ana Paula Rodrigues Carvalho


Diagramação: Marcelo A. S. Alves
Capa: Carole Kümmecke - https://www.conceptualeditora.com/

A Editora Fi segue orientação da política de


distribuição e compartilhamento da Creative Commons
Atribuição-CompartilhaIgual 4.0 Internacional
https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR

O padrão ortográfico e o sistema de citações e referências


bibliográficas são prerrogativas de cada autor. Da mesma
forma, o conteúdo de cada capítulo é de inteira e
exclusiva responsabilidade de seu respectivo autor.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


CARVALHO, Ana Paula Rodrigues

Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula [recurso eletrônico]
/ Ana Paula Rodrigues Carvalho -- Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2022.

262 p.

ISBN: 978-65-5917-505-5
DOI: 10.22350/9786559175055

Disponível em: http://www.editorafi.org

1. Educação Histórica; 2. Empatia Histórica; 3. Representações Identitárias; 4. Literacia histórica;


I. Título.

CDD: 900
Índices para catálogo sistemático:
1. História 900
Sobre o Mestrado em História Social da
Universidade Estadual de Londrina

O Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade


Estadual de Londrina (PPGHS) foi credenciado pela CAPES em julho de
2006 e iniciou suas atividades no primeiro semestre de 2007. A área de
concentração é História Social e estava organizado inicialmente em três
Linhas de Pesquisa: “Territórios do Político”; “Culturas, Representações
e Religiosidades” e “História e Ensino”. Com as discussões e debates que
ocorreram ao longo desse período de funcionamento do curso e também
por recomendação do Comitê de Avaliação da CAPES, houve uma reor-
ganização na estrutura do programa. A partir de 2013, o Programa
passou a ser organizado em quatro Linhas de Pesquisa: “Territórios do
Político”; “História e Linguagens”; “Práticas Culturais, Memória e Ima-
gem” e “História e Ensino”.
Ao completar quinze anos, o PPGHS escolheu alguns trabalhos re-
presentativos das dissertações defendidas para serem publicados e
distribuídos, na forma de livro eletrônico, ao público leitor, em um es-
forço de ampliar a disseminação do conhecimento produzido
academicamente e solidificar os pressupostos da produção do conheci-
mento histórico baseada em uma relação metodológica entre quadros
teóricos e material empírico.
Este livro é parte deste esforço.
À minha mãe, Eva.
AGRADECIMENTOS

Com a aproximação da conclusão deste trabalho foi um exercício


prazeroso relembrar as pessoas que contribuíram para tornar esta tra-
jetória possível, mais leve e divertida. Me sinto muito abençoada por ter
tanto a agradecer.
Em especial à minha família. Mãe, pai e Paulo, obrigada pela tor-
cida entusiasta a cada boa notícia e pelas orações. Mesmo distantes o
cuidado e o carinho de vocês sempre me acompanharam. O amor de vo-
cês me tranquiliza e faz feliz. Amo muito vocês!
À professora Dra. Márcia Elisa Teté Ramos, agradeço não só pela
orientação competente e eficaz, mas principalmente pela paciência,
pelo cuidado em aconselhar, pela disponibilidade que superava suas
funções de orientadora. Foram dois anos de muitas leituras e aprendi-
zagens.
Aos professores doutores Marlene Cainelli e Renilson Ribeiro, pelo
tempo dedicado ao meu trabalho e pelas contribuições dadas na banca
de qualificação. Além disso, agradeço a professora Marlene pela disci-
plina de Teoria de Ensino de História. Foram momentos de muitas
dúvidas, preocupações, perguntas e aprendizagem. Aprendi muito sobre
Educação Histórica com você.
À minha primeira orientadora e também amiga, professora Dra.
Maria Paula Costa (AKA Pauleti). Pauleti é tanta coisa para agradecer
que sintetizo aqui dizendo que sem teu incentivo e apoio este trabalho
não existiria. A minha iniciação à pesquisa não poderia ter sido mais
proveitosa e divertida. Fica aqui a minha gratidão por ter me apresen-
tado este campo de pesquisa que tanto me entusiasma.
À direção das escolas que prontamente aceitaram participar deste
estudo. Às coordenações pedagógicas sempre disponíveis em ajudar e a
organizar da melhor forma possível os trabalhos em sala de aula.
Um agradecimento especial aos professores de História, mas tam-
bém de Física, de Filosofia e de Artes, por aceitarem participar e por
disponibilizarem suas aulas para realização da pesquisa. Em um ano le-
tivo tão conturbado e anômalo o ato de ceder aulas além de demonstrar
generosidade reflete a compreensão da importância de se investigar
acerca do ensino.
Aos alunos que aceitaram participar e responder de forma com-
prometida as inúmeras perguntas ao longo deste estudo. Sem a
participação de vocês está pesquisa seria inviável.
Agradeço também aos professores que acompanharam minha for-
mação desde a graduação. Em especial à professora Dra. Carmem Lúcia
De Salis, pelas orientações sérias, pelas risadas no quiosque, pelos con-
selhos e amizade. Ao Laboratório de Ensino de História (LEHIS/
Unicentro – Santa Cruz), pelas discussões no grupo de estudos e pela
possibilidade de participar dos projetos de Extensão em algumas escolas
na cidade. Foram anos de muitas trocas de ideias, de aprendizagem e
claro, de confraternizações. Ao professor Ms. André Ulisses De Salis, por
todas as referências bibliográficas e pelos livros sobre o fascismo. À pro-
fessora Dra. Beatriz Anselmo Olinto, por ter me ensinado tanto sobre
Teoria da História, pela disponibilidade em discutir metodologia, Fou-
cault e tantos outros temas. A sua atuação em sala de aula é uma
inspiração para mim.
Aos professores doutores com quem tive a oportunidade de apren-
der durante as disciplinas de mestrado na UEL. Ao Francisco Ferraz, por
ter me ensinado tanto sobre o debate historiográfico da Era Vargas e
pelos textos e dicas de leitura sobre periódicos. Ao Hélio Rebello e Igor
Ramos, pelas discussões teóricas e a full immersion em Foucault, foi de-
safiador e por isso estimulante aprender com vocês. Ao Pablo Pozzi, da
Universidade de Buenos Aires, pelo intensivo em História Oral, foi um
prazer aprender a partir de tantos relatos práticos e instigantes. Ao Ri-
chard Gonçalves, pela disciplina de Método e Pesquisa e por todas as
leituras que acabaram por integrar minha pesquisa. Tua disciplina e as
leituras sugeridas foram essenciais para a redação do meu terceiro ca-
pítulo.
Fica aqui um agradecimento sincero aos amigos conhecidos em
Guarapuava: Alejandro Ramos, Jefferson Santana, Francielle Araújo,
Carla Paulo, Tia Rute, Miltinho Stanczyk, André Andreola, Tiago Bon-
fim, Amanda Crissi, Odinei Ramos e Andri Ramos. Um agradecimento
especial à Melanie Goede, a melhor amiga que eu poderia ter, parceiri-
nha de farra, de conversas de coração aberto e de ajuda na hora do
sufoco. À Lisi Zvir, pela amizade que já supera os 4 anos da graduação,
pelas risadas na sala de aula, pelas conversas no quiosque e pelos reen-
contros divertidos. Bruno Zeni e Daniela Carvalho (AKA Brunette e
Danette), amigos queridos e sempre dispostos a me acolherem, sem vo-
cês minhas idas à Guarapuava não seriam tão divertidas. Luciélen Ienke
e Francisco Ferreira (AKA Lu e Xico), amigos prezados e parceiros de
boemia sempre prontos para adentrar a noite com o espírito propício.
Ao Ivan Gavioli, pelas perguntas, pelo interesse e acima de tudo
pela ajuda com o inglês.
Aos amigos de Londrina que me acolheram tão bem e me fizeram
sentir em casa. Um obrigada especial para o Danilo Pontes, amigo de
primeira hora, divertido em sala de aula e fora. Super disponível, várias
vezes correu pela UEL para me ajudar a resolver problemas burocráti-
cos. À Gabriela Torres, pela risada contagiante e pela parceria em
procurar lugares legais para ouvir um sambinha. À Vanessa Cruz, Ma-
quieli Menegusso, Ana Beatriz Accorsi, Jéssica e Amanda Santos pelas
conversas sérias, pela ajuda na hora do aperto, por estarem sempre
prontas “pra festá” e pelo pagode anos 90 sempre no ar.
Ao Tiago Bonato, meu parceirinho de ofício e de vida, fica aqui o
meu sincero agradecimento. Por acreditar no meu trabalho e por me
incentivar sempre. Por se interessar por este estudo, por perguntar e
por querer aprender mais sobre o Ensino de História. Como não agra-
decer pela paciência com que suportou minhas ausências, momentos de
desespero e ansiedade? Como não apreciar os bons conselhos e sua ca-
pacidade de me acalmar e me fazer sentir bem de novo? Por todas as
trilhas, viagens, ‘caiacadas’, passarinhos, filmes, hortas e plantinhas
que vivemos juntos. Obrigada por me afastar do trabalho e me fazer ver
que viver não se resume a isso.

Verão 2016 – Nanuque (MG)


“Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.

Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do
vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono
pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Dei-
xaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo.

Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são
pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o
vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo
não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado”.
(Rubem Alves)
SUMÁRIO

PREFÁCIO 19
Márcia Elisa Teté Ramos

INTRODUÇÃO 27

1 36
TEORIAS DA APRENDIZAGEM E EDUCAÇÃO HISTÓRICA
TEORIAS DA APRENDIZAGEM ...............................................................................................................................................................................37
TEORIA BEHAVIORISTA ..............................................................................................................................................................................................37
TEORIA COGNITIVISTA................................................................................................................................................................................................42
CONSTRUTIVISMO SOCIAL ......................................................................................................................................................................................47
UMA BREVE PANORÂMICA SOBRE A EDUCAÇÃO HISTÓRICA E A APRENDIZAGEM HISTÓRICA ..............................52
CONTRIBUIÇÕES DO CONCEITO DE LITERACIA HISTÓRICA ..............................................................................................................60

2 69
TRAJETÓRIA METODOLÓGICA: CONHECENDO OS SUJEITOS DA PESQUISA E SUAS IDEIAS PRÉVIAS
SOBRE O FASCISMO E A NATUREZA DA DISCIPLINA DE HISTÓRIA
AS ESCOLAS ......................................................................................................................................................................................................................72
PERFIL DOS JOVENS PARTICIPANTES DA PESQUISA ..............................................................................................................................75
COMPARAÇÃO ENTRE OS ALUNOS DA ESCOLA A E DA ESCOLA B ............................................................................................89
MAPEAMENTO DAS IDEIAS PRÉVIAS DOS ALUNOS: INSTRUMENTO DE PESQUISA E CATEGORIZAÇÃO............94
QUESTÃO NÚMERO 1.................................................................................................................................................................................................96
QUESTÃO NÚMERO 2.................................................................................................................................................................................................97
QUESTÃO NÚMERO 3..............................................................................................................................................................................................100
NÍVEL 1- SEM CONDIÇÕES DE CATEGORIZAÇÃO ................................................................................................................................. 100
NÍVEL 2 – HISTÓRIA TRADICIONAL .................................................................................................................................................................101
NÍVEL 3 – HISTÓRIA TOTAL ..................................................................................................................................................................................104
NÍVEL 4 – HISTÓRIA PASSADO PRESENTE- FUTURO............................................................................................................................ 106
QUESTÕES 4,5,6 E 9...................................................................................................................................................................................................108
QUESTÃO 7 ....................................................................................................................................................................................................................115
QUESTÃO 8 ....................................................................................................................................................................................................................116
QUESTÃO 10..................................................................................................................................................................................................................118
NÍVEL 1 – SEM CONDIÇÕES DE CATEGORIZAÇÃO............................................................................................................................... 119
NÍVEL 2- ERUDIÇÃO ..................................................................................................................................................................................................119
NÍVEL 3 – FACTUAL/DOCUMENTAL ..............................................................................................................................................................121
NÍVEL 4 - OPERAÇÃO HISTORIOGRÁFICA................................................................................................................................................... 123
COMPARAÇÃO ENTRE ALUNOS DA ESCOLA A E DA ESCOLA B ................................................................................................. 124

3 131
DAS REPRESENTAÇÕES IDENTITÁRIAS AO CONCEITO DE EMPATIA HISTÓRICA: UMA ANÁLISE DO
JORNAL LA PROVINCIA DI BOLZANO
A IMPRENSA FASCISTA ........................................................................................................................................................................................... 132
A ITALIANIZZAZIONE DO ALTO ADIGE: REPRESENTAÇÕES DE ITALIANIDADE A PARTIR DO JORNAL LA
PROVINCIA DI BOLZANO ......................................................................................................................................................................................... 137
PROBLEMAS E DEFINIÇÕES DO CONCEITO DE EMPATIA HISTÓRICA...................................................................................... 149
ESTUDO PILOTO ......................................................................................................................................................................................................... 168

4 172
ESTUDO PRINCIPAL: ANÁLISE E CATEGORIZAÇÃO DAS IDEIAS HISTÓRICAS DOS ALUNOS
ESTUDO PRINCIPAL .................................................................................................................................................................................................. 172
ANÁLISE E CATEGORIZAÇÃO ............................................................................................................................................................................. 174
QUESTÃO 1 .................................................................................................................................................................................................................... 175
NÍVEL 1 - CÓPIA E FRAGMENTOS .................................................................................................................................................................... 176
NÍVEL 2 – PESSOAL ................................................................................................................................................................................................... 177
NÍVEL 3 – DITADOR................................................................................................................................................................................................... 178
NÍVEL 4 - ANÁLISE DA SITUAÇÃO.................................................................................................................................................................... 179
QUESTÃO 2 .................................................................................................................................................................................................................... 180
NÍVEL 1 – CÓPIA E FRAGMENTOS ................................................................................................................................................................... 180
NÍVEL 2 – PRESENTISMO ....................................................................................................................................................................................... 181
NÍVEL 3 – EMPATIA HISTÓRICA RESTRITA .................................................................................................................................................. 182
NÍVEL 4 – EMPATIA HISTÓRICA CONTEXTUALIZADA......................................................................................................................... 183
QUESTÃO 3 .................................................................................................................................................................................................................... 184
NÍVEL 1 – TAUTOLÓGICO ..................................................................................................................................................................................... 186
NÍVEL 2 – TESTEMUNHAS ..................................................................................................................................................................................... 187
NÍVEL 3 – QUANTIDADE E SOMA DE FATORES ...................................................................................................................................... 190
NÍVEL 4 – CONTEXTUALIZAÇÃO E SUBJETIVIDADE ............................................................................................................................. 193
QUESTÃO 4 .................................................................................................................................................................................................................... 195
NÍVEL 1 – ACRÍTICO .................................................................................................................................................................................................. 196
NÍVEL 2 – CRÍTICA ...................................................................................................................................................................................................... 198
COMPARAÇÃO ENTRE ESCOLA A E ESCOLA B ....................................................................................................................................... 200

CONSIDERAÇÕES FINAIS 214

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 229


JORNAL............................................................................................................................................................................................................................. 236
ANEXOS

ANEXO 1 241

ANEXO 2 242

ANEXO 3 243
QUESTIONÁRIO SOCIOECONÔMICO E CULTURAL DOS DISCENTES ........................................................................................ 243

ANEXO 4 248
QUESTIONÁRIO DAS IDEIAS TÁCITAS ...........................................................................................................................................................248

ANEXO 5 252
TEXTO 1. O FASCISMO ............................................................................................................................................................................................252
TEXTO 2. A ITALIANIZAÇÃO DA REGIÃO DE TRENTINO ALTO ADIGE ...................................................................................... 253

ANEXO 6 254

ANEXO 7 260
ATIVIDADE ......................................................................................................................................................................................................................260

ANEXO 8 261
ATIVIDADE ......................................................................................................................................................................................................................261
PREFÁCIO

Márcia Elisa Teté Ramos

Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica


em sala de aula. Como se não bastasse o título instigante, Ana Paula Ro-
drigues Carvalho nos apresenta um trabalho que subverte pelo menos
dois direcionamentos generalizados na pesquisa em Ciências Humanas,
especificamente na área de História e seu ensino. Ingressa em um
campo investigativo, a Educação Histórica, utilizando-se devidamente
de suas fundamentações teórico-metodológicas, mas não o reduz, não o
limita. Antes, o ultrapassa, o complementa e assim o enriquece.
“Campo”, como articula Bourdieu, é um espaço de legitimação e valida-
ção efetivada pelas relações interdependentes entre consenso e
dissenso, pelas lutas, pelas classificações sobre o que seria do campo e o
que está fora dele. Mesma coisa quando nos referimos à Educação His-
tórica, que para ser consolidada contou com um acúmulo de pesquisas
grandioso – bom lembrar de Maria Auxiliadora Schmidt e Marlene Cai-
nelli no Brasil –, estabelecendo conceitos, métodos e prismas.
Neste trabalho o leitor poderá averiguar que, empregando autores
nunca trabalhados na Educação Histórica, se dinamiza o campo com cri-
atividade e originalidade. Sim, todo campo corre o risco de saturação,
ou seja, nas teses, dissertações e estudos publicados sob a forma de
20 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

livros, capítulos ou artigos científicos, em trabalhos apresentados em


congressos e na bibliografia de cursos universitários, terminamos por
visualizar as mesmas referências, os mesmos argumentos e até as mes-
mas citações. É o caso do conceito de “empatia histórica”, de laboração
inicial geralmente atribuída à Peter Lee, expoente da Educação História
inglesa. Peter Lee definiu conjuntamente com vários parceiros de pes-
quisa a empatia histórica como capacidade de compreender os
sentimentos, perspectivas, noções, ideias de outra pessoa, grupo ou so-
ciedade do passado ou do presente, acrescentando que poderíamos
substituir a palavra “empatia” por “compreensão”. Mais precisamente:
“compreensão histórica”, que não é um sentimento, “Embora envolva o
reconhecimento de que as pessoas possuem sentimentos” (LEE, 2003, p.
20). Os alunos deveriam reconstruir os objetivos, os valores, as crenças
do Outro, aceitando que estes podem ser diferentes dos seus. O autor
destaca a empatia histórica como “disposição” (reconhecimento de que
ações e pensamentos são próprios de um contexto histórico) e como “re-
alização” (compreensão da intenção dos sujeitos nas ações humanas em
outro contexto temporal) (LEE, 2003 p. 20-21). Contudo, o conceito aca-
bou sofrendo um processo de banalização, transformando-se em
“colocar-se no lugar do outro” e aceitação do Outro a qualquer custo. O
que se encontraria à revelia do próprio Peter Lee, para quem nem sem-
pre a empatia significa aceitação absoluta ou compartilhamento de
cultura seja ela qual for (LEE, 2003, p. 20). É neste ponto que o presente
texto nos auxilia com seu objetivo de investigar as narrativas históricas
de estudantes de Ensino Médio sobre o conceito de história, empatia
Márcia Elisa Teté Ramos • 21

histórica e posicionamento em relação às mídias, a partir de um inqué-


rito realizado com excertos de um jornal fascista italiano.
Para além de Peter Lee para entender a empatia histórica, Ana
Paula reporta-se a autores como Sarah Brooks, Darren Bryant e Penney
Clark, Martyn Davison, Stuart Foster e Lukas Perikleous. No seu estudo,
Ana Paula critica o modo como o conceito de empatia histórica vem
sendo apropriado em alguns trabalhos, pois próxima à identificação, o
que se torna problemático, pois nem sempre se quer alunos identifi-
cando-se com determinados agentes históricos ou com determinadas
culturas. Mais do que pensar o conceito de empatia histórica superando
a discussão já posta pelo campo, esta pesquisa apresenta com pertinên-
cia como acercar-se do que os alunos pensam sobre este conceito. E
mais: como nós, profissionais da história, devemos ter empatia histó-
rica para com nossos (jovens) alunos, os compreendendo sem
essencializações e preconceitos, os inserindo em dada realidade escolar
estabelecida por dado contexto histórico.
Outra banalização recorrente é rompida pela pesquisa: na Educa-
ção Histórica se tem usado abundantemente a metodologia proposta
pela Grounded Theory (Teoria Fundamentada), por vezes, sem um apro-
fundamento quanto à questão. Não é o que ocorre aqui. Há um trabalho
metodológico de várias etapas, denso e pormenorizado, quantitativo e
qualitativo, dedutivo e indutivo, transformando os dados em categorias,
e, em sequência, em itens de análise. Vale destacar que a categorização
foi elaborada conforme outro conceito de Peter Lee, de “progressão”
como aptidão de os alunos operarem metodologicamente as evidências
históricas mobilizando determinados conceitos históricos, no caso,
22 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

principalmente de empatia histórica. Por isso o jornal italiano serve de


mote para compreender como alunos interpretam uma evidência histó-
rica. A natureza do jornal como evidência histórica, como mídia,
também nos oportuniza perceber como os alunos consideram as mídias,
as mensagens veiculadas, a legitimidade delas para contarem o ocor-
rido.
Ana Paula converge vertentes diferentes, quando usa, além de Pe-
ter Lee (History Education) o filósofo da História Jörn Rüsen (Didática da
História alemã) oferecendo uma empiria engajada. Muitos autores da
Educação Histórica conseguem realizar este “encontro epistemológico”
– expressão empregada pelo pesquisador Ronaldo Cardoso Alves (2013)
–, entretanto, seguindo a direção deste prefácio que busca apresentar o
diferencial desta pesquisa, há que se recordar também das apropriações
de Rüsen não tão assertivas ou coerentes. Evidentemente, este tipo de
apropriação problemática não ocorre apenas na Educação História, haja
vista outras “invenções de tradições”.
Um exemplo é a concepção histórico-crítica de Demerval Saviani
disposta em seu livro de 1983, Escola e Democracia que já alcançou sua
43ª edição. Nele, o autor subdivide as teorias didático-pedagógicas em
“não críticas”, “crítico-reprodutivistas” e “críticas”. No caso da teoria
crítico-reprodutivismo, abarcando a Teoria do Sistema de Ensino como
Violência Simbólica, desenvolvida na obra de Pierre Bourdieu e Jean-
Claude Passaron em 1975 intitulada “A Reprodução: elementos para uma
teoria do sistema de ensino”; a Teoria da Escola como Aparelho Ideoló-
gico do Estado desenvolvida por Louis Althusser em seu texto intitulado
“Ideologia e aparelhos ideológicos de Estado” publicado na revista La
Márcia Elisa Teté Ramos • 23

penseé de julho de 1970 e a Teoria da escola Dualista, desenvolvida por


C. Baudelot e R. Establet, sendo exposta no livro L’École Capitaliste em
France (1971). Não obstante a perspectiva de Saviani seja contributiva
para reflexão, pois denuncia visões reducionistas da escola como re-
flexo/reprodução dos interesses das classes dominantes, fica instaurada
uma tradição, uma forma de lidar com a temática desconsiderando au-
tores que realizam também uma importante discussão. Saviani faz o que
é comum nos campos investigativos: desprestigia outras perceptivas
para selar a sua, que chama de progressista, como a ideal e, portanto, a
única a ser adotada.
Tomamos este exemplo para seguindo a classificação de Afrânio
Mendes Catani, Denice Bárbara Catani e Gilson R. de M. Pereira (2001, p.
65) ao questionarem à interpretação dada a Bourdieu como “crítico-re-
produtivista” por Saviani. Assim, voltamos às apropriações/leituras
quanto à Rüsen ou ainda quanto à Peter Lee. Estas, apresentam-se por
meio de citações incidentais caracterizada por referências rápidas ao au-
tor: “Nas apropriações incidentais, não é possível estabelecer relação
entre a argumentação empreendida no texto e a referência, ou então a
menção guarda relação muito tênue com o argumento desenvolvido”.
Outra forma de apropriação é a conceitual tópica, “caracterizada pelo
fato de deixar entrever a utilização, conquanto não sistemática, de cita-
ções e eventualmente de conceitos do autor” como o de “consciência
histórica” de Rüsen ou de “empatia histórica” de Peter Lee. Outra seria
a apropriação do modo de trabalho, “constituindo-se em maneiras de
apropriação reveladoras da utilização sistemática de noções e conceitos
do autor” e “mostram preocupação central com o modus operandi da
24 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

teoria”. É este último tipo de apropriação que se faz dos autores neste
estudo que o leitor tem em mãos, pois inclui as referências na constru-
ção do objeto, na realidade empírica, no pensar relacional e na análise
reflexiva.
Para finalizar com mais uma quebra de barreiras empreendida, en-
fatizamos a habilidade e o destemor de enfrentar um grande desafio,
qual seja, o uso de autores que recorrem à corrente pedagógica sob viés
psicológico denominada Construtivismo. É comum nos depararmos
com a crítica veemente quanto à concepção de Piaget como contributo
às pesquisas sobre ensino e aprendizagem histórica. De certo, as pes-
quisas no campo da Educação Histórica vêm apresentando resultados
refutadores da teoria de invariância dos estágios de desenvolvimento
cognitivo, porém, essa crítica quando excessiva, acaba recaindo em uma
desqualificação de reflexões advindas da educação, da pedagogia e da
psicologia. Esquece-se que Rüsen buscou argumentos de Karl Jaspers,
da área da psicologia, para definir consciência histórica e de que Peter
Lee chega à ideia de progressão por intermédio do conceito de equili-
bração de Piaget (BARCA, 2001). Finda-se então o entendimento destas
áreas como alternativas possíveis para adensar as investigações. O
Construtivismo, segundo a perspectiva de Ana Paula adotada por inter-
médio de autores como Mario Carretero (1997) e Marília Gago (2012) –
esta autora, vinculada à Educação Histórica –, remete à (re)elaboração
do conhecimento realizada pelo sujeito em um movimento complexo
envolvendo vivência, experiência, ideias prévias e contexto, sem des-
cartar aspectos biológicos, mas não os tornando determinantes. Marca-
se que as ideias prévias dos alunos não podem ser ignoradas como se
Márcia Elisa Teté Ramos • 25

estes sujeitos fossem “recipientes vazios que necessitam ser preenchi-


dos por um conhecimento que lhes é exterior” e assim, a idade não pode
ser considerada um empecilho para que os alunos obtenham condições
de adquirir conceitos considerados mais abstratos (CARVALHO, 2018, p.
223). Em última instância, a Educação Histórica é uma das vertentes que
entende a aprendizagem histórica como a qualidade de articular a ex-
periência do tempo à sua própria subjetividade, dotando-a de
significância e usos para sua vida prática”, apenas possível quando “a
História deixa de ser ensinada como um emaranhado de informações
que devem ser absorvidas” (CARVALHO, 2018, p.224).
Este é o crédito damos ao trabalho de Ana Paula: não ter um campo
de pesquisa como intocável, com o qual temos que realizar intensa pac-
tuação, e, ao mesmo tempo respeitar seu conjunto de embasamentos
originários os estendendo, os flexibilizando e os (re)consolidando. Neste
movimento, um texto diferenciado nos é proporcionado, servindo aos
desígnios daquele que pesquisa e que ensina História.

14 de fevereiro de 2022

REFERÊNCIAS

ALVES, Ronaldo Cardoso. “História e Vida: o encontro epistemológico entre Didática da


História e Educação Histórica”. História & Ensino. v.19, n. 1, jan/jun 49-69, 2013.

BARCA, Isabel. O pensamento histórico dos jovens. Ideias dos adolescentes acerca da
provisoriedade da explicação histórica. Braga: Centro de Estudos em Educação e
Psicologia, Instituto de Educação e Psicologia, Universidade do Minho, 2000.
26 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

CARRETERO, Mario. Construtivismo e Educação. Porto Alegre: Artmed, 1997.

CARVALHO, Ana Paula Rodrigues. Contribuições da Educação Histórica para a


aprendizagem histórica. História & Ensino, v. 24., n. 1, p.199-227, jan/jun. 2018.

CATANI, Afrânio Mendes; CATANI, Denice Bárbara; Gilson R. de M. PEREIRA, “As


apropriações da obra de Pierre Bourdieu no campo educacional brasileiro, através
de periódicos da área”. Revista Brasileira de Educação. n. 17, mai/jun/ago, 2001.

GAGO, Marília. Pluralidade de olhares. Construtivismo e multiperspectiva no processo


de aprendizagem. Maputo: EPM-CELP, 2012.

SAVIANI, Demerval. Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze


teses sobre educação e política! 32. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 1999.
INTRODUÇÃO

Em uma conferência realizada em 1995 na Columbia University, Um-


berto Eco declarou que o “Ur-Fascismo ainda está em torno de nós, às
vezes com roupas civis. [...] Ur-Fascismo pode ainda retornar sob o dis-
farce mais inocente. Nosso dever é desmascarar e apontar o dedo a cada
uma de suas novas formas - todos os dias, em todas as partes do mundo”
(ECO, 1997, p. 47). Nesta conferência Eco discorreu sobre o fascismo
eterno (Ur’ Fascismo), como algo que persiste, e, portanto, advertiu so-
bre a necessidade de conhecê-lo para poder contrastá-lo em todas as
suas novas formas.
A escolha de trabalhar com o tema fascismo remete a um incômodo
que surgiu durante um período de residência de dez anos na Itália. Du-
rante este tempo, de forma recorrente, presenciei declarações positivas
sobre a ditadura fascista e seu líder, Mussolini. Para algumas pessoas,
aspectos como a violência, a censura, os assassinatos e a guerra desva-
neceram deixando espaço a uma ideia positiva de fortalecimento e de
orgulho nacional que em períodos de crise parecem obter muitos pro-
sélitos.
A escolha de investigar este tema no mestrado ultrapassa aspectos
puramente pessoais. A partir do incômodo e das questões por ele susci-
tadas, foram em seguida elaboradas problemáticas que transcenderam
28 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

a esfera pessoal e atingiram um espaço mais amplo, com especial perti-


nência para se pensar o Ensino de História.
A decisão de trabalhar com o tema fascismo com alunos brasileiros
foi considerado relevante por acreditar que este movimento não é um
tema de interesse restrito à história da Itália. Como advertiu Eco, o fas-
cismo não morreu com a Segunda Guerra Mundial. Suas características
encontraram e ainda encontram acolhida além das fronteiras italianas
ou europeias. Assim como Eco (1997), acredito que seja importante o es-
tudo desta temática “para lembrar o que ocorreu e para declarar
solenemente que ‘eles’ não devem fazê-lo nunca mais”.
Além disso, a pertinência do tema deve-se ao fato de que, mesmo
que o fascismo e a Segunda Guerra Mundial sejam assuntos de História
Geral contemporânea abordados nas escolas brasileiras, muitas vezes o
tema é tratado de forma bastante asséptica pelos autores de materiais
didáticos. O foco da discussão permanece em torno de assuntos políticos
e militares, enquanto pouco ou quase nada se sabe do contexto social e
do impacto que o regime fascista teve sobre a população em geral 1.
Durante as atividades com os alunos a temática foi problematiza
por meio de um jornal fascista italiano chamado La Provincia di Bolzano.
A utilização deste periódico teve por intuito propor uma abordagem
mais humanizada do tema. Por meio das tramas tecidas pelo jornal foi
possível estabelecer um contato, na medida do possível, com o cotidiano

1 Este foi um dos aspectos analisados no meu trabalho de conclusão de curso (TCC) na graduação de História
na Universidade do Centro Oeste do Paraná publicado em: CARVALHO, R. A. Paula. As histórias, os sujeitos, as
narrativas: análise do regime fascista nos livros didáticos. História & Ensino, Londrina, v. 21, n. 1, p. 289-306,
2015.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 29

vivido por uma população que não se considerava italiana e se encon-


trava sobre o domínio do regime fascista. O jornal se mostrou uma
ferramenta rica para a análise das ideias dos alunos a respeito da histó-
ria, do conceito de empatia histórica e dos meios de comunicação atuais.
Pensar a aprendizagem histórica priorizando a figura dos alunos
como sujeitos produtores de conhecimento remete à própria historici-
dade do ensino de História no país. A década de 1980 foi prolífica quanto
à elaboração de novas propostas de como ensinar. Segundo Selva Fon-
seca (1993, p. 90), “professores e alunos superam a condição de meros
expectadores, receptáculos de um saber produzido em outras esferas e
assumem o trabalho pedagógico como reflexão, como pesquisa”. O que
se buscou com estas novas propostas foi a superação da ideia de que se-
ria possível alcançar meios satisfatórios de aprendizagem graças a
elaboração de métodos eficientes e de professores capazes de transmiti-
los em sala de aula.
Nesta perspectiva de ensino, acreditava-se que o professor dotado
de um bom método era suficiente para fazer com que os alunos apren-
dessem História: “a ênfase é na formação de um professor qualificado,
competente, que domine conteúdos, metodologias e que saiba fazer”
(FONSECA; ZAMBONI, 2008, p. 116). Essa concepção de ensino percebia
o professor como figura que deveria dominar conteúdos e técnicas efi-
cazes de ensino, sendo considerado apenas como “um instrumento de
transmissão de saberes produzidos por outros” (MONTEIRO, 2007, p. 13).
A partir deste ponto de vista o papel dos alunos era limitado a “con-
dição de receptáculos de informações, conteúdos, currículos, livros e
materiais didáticos” (SCHMIDT, 2008, p. 56). Os alunos não eram
30 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

percebidos como portadores de ideias históricas e, portanto, não assu-


miam posição ativa na construção do saber em sala de aula. Em
consonância com esta perspectiva de aprendizagem os bons alunos
eram aqueles capazes de absorver passivamente o que era dito em sala
pelo professor.
Todavia, esta visão de ensino foi superada, e a sala de aula não é
mais considerada “apenas um espaço onde se transmite informações,
mas onde uma relação de interlocutores constroem sentidos”
(SCHMIDT, 2008, p. 57). Como asseverava Katia Abud (1999, p. 149), “o
sistema educativo não vulgariza, simplesmente, as ciências de referên-
cia das disciplinas, mas produz ele mesmo, um saber próprio: o saber
escolar”. De acordo com os debates recentes em torno do ensino, a sala
de aula é vista como um local de produção de conhecimento. O saber
deixa de ser visto como algo alheio à realidade escolar e propalado de
forma simplificada visando à transmissão de um conhecimento pronto
e acabado, pois os professores e alunos passam a ser considerados su-
jeitos no processo de aprendizagem.
Atualmente as pesquisas que se debruçam sobre o ensino de His-
tória se voltam para os alunos, considerando suas aptidões, interesses e
limitações como fundamentais para a aprendizagem histórica. Por
aprendizado histórico entende-se “o processo mental de construção de
sentido sobre a experiência do tempo através da narrativa histórica, na
qual as competências para tal narrativa surgem e desenvolvem”
(SCHMIDT et al., 2010, p. 43). Dentro desta proposta, a eficácia da apren-
dizagem histórica ocorre quando o aluno é capaz de vincular a
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 31

experiência do tempo a sua própria subjetividade dotando-a de signifi-


cância e usos para sua vida prática.
Em consonância com este pensamento surgem campos de pesqui-
sas que se preocupam em investigar a escola e os seus sujeitos enquanto
produtores de conhecimento. Um destes campos é o da Educação Histó-
rica, que consiste em uma “área de investigação centrada nas questões
relacionadas à cognição e metacognição histórica, tendo como funda-
mento principal a própria epistemologia da História” (CAINELLI;
OLIVEIRA, 2011, p. 127). Ao contrário das teorias generalistas sobre o
processo de aprendizagem, a Educação Histórica tem como base teórica
a própria racionalidade histórica.
Inserida neste campo científico, esta pesquisa propõe como tema
investigar, a partir de um inquérito realizado com trechos de um jornal
fascista italiano, as narrativas históricas de estudantes do Ensino Médio
sobre o conceito de história, empatia histórica e posicionamento pe-
rante as mídias. Trabalhar com um jornal fascista em sala de aula pode
ser um exercício interessante para incentivar o desenvolvimento de ha-
bilidades como a análise crítica de fontes históricas e o
desenvolvimento da empatia histórica. O uso da fonte estimula a con-
textualização e a tradução inteligível do comportamento das pessoas
que viveram sob o regime fascista. O jornal também possibilita refletir
sobre o presente, sobre os meios de comunicação atuais e como os alu-
nos se posicionam perante as narrativas veiculadas por estes meios.
A pesquisa foi realizada em quatro turmas do Ensino Médio de duas
escolas estaduais do Paraná, localizadas na cidade de Guarapuava. A me-
todologia aplicada foi a da teoria fundamentada (Grounded Theory) e o
32 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

estudo de campo foi realizado em três etapas (estudo exploratório – es-


tudo piloto – estudo principal), entre os meses de agosto e dezembro de
2015 e contou com a participação de 82 alunos.
No primeiro capítulo, Teorias da aprendizagem e Educação Histórica,
foram apresentadas as teorias da aprendizagem advindas das correntes
behavioristas, cognitivistas e construtivistas. Buscou-se mapear as
principais características de cada corrente e suas implicações para a
sala de aula. Neste capítulo tratou-se também da formação do campo de
investigação da Educação Histórica seus principais preceitos e contri-
buições. Entre estes o conceito de literacia histórica, proposto por Peter
Lee, que prevê a investigação das ideias dos estudantes sobre a disci-
plina de História como também busca entender de que forma o
conhecimento histórico é mobilizado para fins de orientação para vida
prática e para construção de projeções de futuro. Segundo Lee, o ensino
de história deve ser capaz de dotar os alunos de ferramentas que lhes
possibilitem se situar e intervir na sociedade de forma autônoma e
consciente. Para Lee, a literacia histórica obtida através do conúbio en-
tre uma estrutura utilizável do passado somada a compreensão da
disciplina de história é uma forma de se atingir esta meta. 2
No segundo capítulo foi delineado o procedimento metodológico
empreendido neste estudo. Foram apresentados os dados obtidos no es-
tudo exploratório, que compõe a primeira das três etapas desta

2 Sobre literacia histórica ver: LEE, Peter. Em direção a um conceito de literacia histórica: Towards a concept
of historical literacy. Educar, Curitiba, Especial, Editora UFPR, p. 131-150, 2006; LEE. Peter. Educação Histórica,
consciência histórica e literacia histórica. In. BARCA, I. (Org.). Estudos de consciência histórica na Europa,
América, Ásia e África. Braga: Uminho, 2008.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 33

investigação. Por meio de dois questionários buscou-se estabelecer es-


tratégias para conhecer os jovens alunos participantes da pesquisa e
suas representações iniciais sobre o conceito substantivo fascismo e so-
bre a natureza do conhecimento histórico (conceitos de segunda
ordem). A importância de se mapear as ideias prévias dos alunos deriva
do fato que para a aprendizagem ser considerada eficaz e significativa
o aluno deve operar de forma ativa sobre o novo conhecimento. Isto só
é possível quando o aluno, a partir de sua vivência, experiência e saberes
é capaz de vincular a nova informação aos seus saberes anteriores. Não
se trata de uma simples assimilação passiva do que é ensinado, mas sim
de uma reconstrução, resultado da interação entre o novo e o que já se
possuía. Desta forma mapear as ideias dos alunos é uma etapa impor-
tante em direção de uma mudança conceitual. 3 No primeiro
questionário os alunos responderam algumas questões sobre aspectos
socioeconômicos e culturais tais como idade, sexo, naturalidade, renda
familiar, nível de escolaridade dos pais ou responsáveis, tempo passado
vendo TV ou na internet, quantidade de livros lidos em um ano, prefe-
rência musical entre outros. No segundo questionário os participantes
foram instigados a responderem questões sobre a disciplina de história
e a construção da narrativa histórica; sobre o conceito substantivo fas-
cismo e sobre os meios de comunicação atuais. Em seguida estes dados
foram analisados e categorizados de acordo com a progressão das ideias
históricas apresentadas.

3 Sobre mudança conceitual ver: CARRETERO, Mario. Construtivismo e Educação. Porto Alegre: Artmed, 1997.
34 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

O terceiro capítulo trouxe em pauta a análise do jornal La província


di Bolzano e a explanação do conceito de segunda ordem que se pretende
investigar, a saber, o conceito de empatia histórica. O trabalho com fon-
tes em sala de aula requer por parte do pesquisador ou professor um
conhecimento aprofundado do material e da temática proposta. Desta
forma, procedeu-se com a discussão sobre o papel da imprensa durante
o fascismo na Itália e posteriormente, de forma mais específica, sobre a
forma como o jornal La Provincia di Bolzano atuou no processo de itali-
anizzazione da região do Alto Adige. O uso de fontes em sala de aula vem
corroborar a ideia de que não basta um conhecimento substantivo, é ne-
cessário que os alunos compreendam os conceitos próprios da ciência
da história. Como colocado por Marilia Gago (2012), os conceitos de se-
gunda ordem possibilitam a compreensão do processo de construção do
saber histórico. Neste capítulo também foi explanado o estudo piloto
realizado entre doze alunos (três de cada turma) das duas escolas parti-
cipantes. Os alunos selecionados apresentavam níveis de rendimento
escolar diferentes (insuficiente, mediano e bom). O objetivo desta etapa
foi verificar se a tarefa proposta para trabalhar o conceito de empatia
seria compreendida pelos alunos. Conforme a análise realizada, o ques-
tionário elaborado para a realização do Estudo Principal foi modificado
e uma questão sobre o posicionamento dos alunos diante das mídias foi
reinserida.
No quarto capítulo foi realizada a análise e categorização das nar-
rativas obtidas através do questionário que compõe o estudo Principal.
As questões deste estudo giraram em torno da explicação das ações de
Mussolini e das pessoas que viviam em Bolzano, assim como sobre a
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 35

forma que os alunos lidaram com as informações contidas nos trechos


do jornal. Uma questão do estudo principal abordou o posicionamento
dos alunos frente os meios de comunicação atuais. Posteriormente, es-
tas respostas foram analisadas e categorizadas conforme os níveis de
progressão das ideias históricas que emergiram sobre a concepção de
história e empatia histórica.
1
TEORIAS DA APRENDIZAGEM E EDUCAÇÃO
HISTÓRICA

Se nosso conhecimento do mundo presente não é nunca um “conhecimento ins-


tantâneo”, e nos traz, quer queira, quer não, alguma concepção substantiva do
passado, então, ser historicamente ignorante é, justamente, ser ignorante.
Peter Lee

Várias são as interrogações acerca de como se aprende ou de como


se origina o conhecimento. As respostas dadas as estas inquietações são
diversas e resultaram em teorias da aprendizagem. Neste capítulo pre-
tende-se concentrar especificamente em três vertentes, a saber, a teoria
behaviorista, a teoria cognitivista, e o construtivismo. Não se pretende
aqui discorrer de forma exaustiva e aprofundada sobre estas teorias da
aprendizagem, mas sim trazer em pauta algumas das suas principais
características e suas implicações pedagógicas para sala de aula.
Após discutir sobre as teorias da aprendizagem mencionadas
acima buscou-se discorrer sobre a Educação Histórica, uma “[...] área de
investigação centrada nas questões relacionadas à cognição e metacog-
nição histórica, tendo como fundamento principal a própria
epistemologia da História” (CAINELLI; OLIVEIRA, 2011, p. 127). Não se
trata de uma nova teoria da aprendizagem, mas de um campo de pes-
quisa que por meio do construtivismo social pensa o Ensino de História
a partir de pressupostos ancorados na racionalidade da ciência História.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 37

Segundo Flávia Caimi, o que diferencia os Estudos Cognitivos da


Educação Histórica, é o fato de que para explicar a aprendizagem histó-
rica, a primeira parte da cognição e a segunda parte da epistemologia
da história. São pontos de partida diferentes, mas que têm como priori-
dade “a noção de que o aprender implica em um processo
construtivo/reconstrutivo do sujeito, dado que o conhecimento não se
copia, não se transmite, mas se estrutura progressivamente nas intera-
ções qualificadas entre o sujeito, o meio físico, social, simbólico” (CAIMI,
2009, p. 65).

TEORIAS DA APRENDIZAGEM

TEORIA BEHAVIORISTA

Segundo Ignacio Pozo (2006) as concepções de aprendizagem em-


piristas têm origem na tradição grega iniciada por Aristóteles. Este teria
substituído a teoria das ideias inatas, ou seja, que o conhecimento é
sempre uma projeção das nossas ideias inatas ou puras – como exposto
por Platão no mito da caverna –, pela da tabula rasa. O princípio da ta-
bula rasa se baseia na asserção que todo “o conhecimento tem sua fonte
fora do indivíduo e que ele é interiorizado através dos sentidos” (KAMII,
1990, p. 24).
Para Pozo (2006), Aristóteles pode ser considerado o pai do associ-
acionismo e nos séculos XVII e XVIII com Hume, Locke e Hobbes
alcançou sua máxima expressão na filosofia. Acreditava-se que o conhe-
cimento era alcançado por meio de associações realizadas com base nos
38 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

princípios de semelhança, causalidade e contiguidade espacial e tempo-


ral.
Na psicologia da aprendizagem os preceitos advindos do associaci-
onismo foram denominados de behaviorismo. Este movimento foi
caracterizado “[...] por la aplicación de su paradigma objetivista, basado
en los estudios de aprendizaje mediante condicionamiento, que consi-
dera innecesario el estudio de los processos mentales superiores para la
comprensión de la conducta humana” (POZO, 2006, p. 18). A Psicologia
behaviorista é definida como a “ciência do comportamento” (observá-
vel) e a conduta é percebida como resultado de pressões externas ou
estímulos. Segundo o behaviorismo, as reações obtidas a partir de de-
terminados estímulos poderiam ser previstas e controladas.
Esse movimento foi caracterizado por uma grande dispersão teó-
rica que deu origem a diversas facções dentro do behaviorismo. Estas
podem ser divididas, grosso modo, entre behaviorismo extremo ou radi-
cal que negava a existência da consciência e o behaviorismo
metodológico que não negava a existência da consciência, mas acredi-
tava que os processos mentais não poderiam ser considerados objeto de
pesquisa por não serem observáveis empiricamente. Para Watson, cria-
dor da vertente do behaviorismo metodológico, o behaviorismo era uma
“psicologia experimental, objetiva, científica e determinista, cuja única
fonte seria o comportamento diretamente observável” (LIMA, 1990, p.
6).
Conforme Pozo (2006), não obstante as diversas correntes teóricas
que surgiram dentro do behaviorismo é possível delinear algumas ca-
racterísticas que lhes eram comuns. O associacionismo, por exemplo,
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 39

pode ser considerado uma característica central dentro do behavio-


rismo. Se inicialmente todos são tábulas rasa que adquirem
conhecimento por meio de mecanismos de associações torna-se funda-
mental dentro do behaviorismo entender de que forma a aprendizagem
é possível. Portanto, vários estudos foram realizados com o intento de
estabelecer os parâmetros dessas associações.
Outra característica do behaviorismo é o condicionamento alcan-
çado por meio de uma combinação entre estímulo e resposta. Esta
característica está intrinsecamente ligada ao associacionismo já que
“toda conducta, por compleja que sea, es reducible a una serie de asoci-
aciones entre elementos simples, en este caso, estímulos y respuestas”
(POZO, 2006, p. 28). No behaviorismo “o Homem é pensado como um ser
que responde a estímulos exteriores de um modo mais ou menos auto-
mático e fortuito” (GAGO, 2012, p. 13). Portanto a aprendizagem é vista
como uma forma de mudar condutas por meio de estímulos capazes de
provocarem reações específicas.
A Lei do Efeito cunhada por Edward Thorndike, explicita de que
forma a conexão entre estímulo e reação pode ser reforçada ou inibida
quando o empenho é recompensado ou punido. Ou seja, é mais provável
que a mesma reação seja obtida se esta for recompensada pelo professor
(reforço positivo). Ao contrário, uma dada reação será coibida quando
resultar em situações punitivas para o aluno (reforço negativo).
Outro atributo do behaviorismo é a ênfase no meio em que o aluno
está inserido, por destacar o fato que a aprendizagem se inicia e é con-
trolada pelo ambiente. Para Pozo (2006), este pressuposto é coerente
quando se considera a passividade do aluno que se limita a responder a
40 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

estímulos externos, afinal, segundo o behaviorismo, a aprendizagem


não é algo intrínseco ao Homem, pois necessita do impulso do ambiente.
Burrhus Frederic Skinner afirmava que para se obter uma aprendiza-
gem satisfatória era necessário identificar as condições estimuladoras
capazes de obter condutas desejáveis.
Outra característica atribuída ao behaviorismo é a Equipotenciali-
dade. Segundo este princípio, “las leyes del aprendizaje son igualmente
aplicables a todos los ambientes, especies e individuos. Lo que equivale
a afirmar que sólo existe una única forma de aprender: la asociación”
(POZO, 2006, p. 29). Como consequência todos os organismos da mesma
espécie se equivalem entre si, a especificidade de cada um é anulada.
Outro ponto importante é a asserção que a aprendizagem está subme-
tida somente à leis de associação, sendo assim qualquer estímulo ou
resposta são equivalentes e qualquer estímulo pode ser associado a ou-
tro estímulo ou resposta independentemente do conteúdo. A única lei
que importa é a da associação vinculada aos estímulos dados.
Segundo Pozo, em meados do século XX houve um retrocesso das
posições behavioristas em favor da psicologia cognitivista. No entanto
como afirma o autor, “el muerto goza de una salud aceptable, al menos
para estar muerto”( POZO, 2006, p. 19). Esta declaração alude ao fato que
muitas das práticas pedagógicas perpetradas ainda hoje em sala de aula
provem de pressupostos behavioristas.
Fernando Becker (1993) em uma pesquisa realizada com professo-
res, nos quais estes eram questionados sobre o que é o conhecimento,
identificou a persistência de concepções behavioristas em sala de aula.
Conforme o autor, princípios empiristas foram encontrados nas falas de
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 41

professores desde a pré-escola até universidades, incluindo professores


de programas de pós-graduação stricto sensu. Na fala dos professores
foi recorrente a ideia, por exemplo, de que o conhecimento "se dá sem-
pre via cinco sentidos, de uma ou outra maneira" ou "se dá à medida que
as coisas vão aparecendo e sendo introduzidas por nós nas crianças". O
conhecimento é também considerado como uma reação resultante de
estímulos dados pelo educador; outro professor afirmou que "o aluno é
como a anilina no papel em branco que a gente tinge: passa para o papel
– o aluno elabora, coloca com as próprias palavras" (BECKER, 1993, p.
89).
A partir destes exemplos é nítido como o aluno ainda é considerado
uma tabula rasa, visto que o conhecimento se encontra fora dele e se
concentra na figura do professor ou nos livros. Segundo Marta Darsie
(1999, p. 11), um dos indícios da presença do behaviorismo no ensino é a
manutenção da “disciplina do silêncio, só o professor fala, o aluno tem
que ouvir; o professor mostra, o aluno tem que olhar. Ver e ouvir em
silêncio, sem desviar os sentidos para que o conhecimento possa ‘entrar’
no indivíduo”.
Trata-se de um método de aprendizagem mecanicista pautado
principalmente em exercícios de repetição que estimula a memorização
dos conteúdos. Nesta perspectiva o aluno não é considerado um sujeito
ativo no processo de aprendizagem, ele é tido como um recipiente vazio
e suscetível a modificações decorrentes de estímulos nos quais suas re-
ações seriam recompensadas ou punidas de acordo com os objetivos
posto pelo professor.
42 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

TEORIA COGNITIVISTA

A Psicologia Cognitiva, contrariamente ao Behaviorismo, enfatiza


os processos internos. Volta-se para o processo de cognição com o qual
o sujeito atribuiu sentidos à realidade. Analisa o processo de compreen-
são, modificação e usos da informação adquirida e investiga as leis
gerais que enseja este mecanismo. Segundo Pozo,

en lugar de posiciones ambientalistas, el procesamiento de información de-


fenderá la interacción de las variables del sujeto y las variables de la tarea o
situación ambiental a la que está enfrentado el sujeto. Por último, el sujeto
del conductismo, fundamentalmente passivo y receptivo, se convierte en un
procesador activo de información, en un «informívoro» que busca y reelabora
activamente información (POZO, 2006, p. 44).

De acordo com a teoria cognitivista, a aprendizagem não se limita


a uma simples resposta à estímulos externos. Trata-se de um processo
ativo de interpretação e organização do conhecimento adquirido, o que
comporta uma modificação cognitiva no sujeito. Conforme Marilia
Gago, o educando é “um agente ativo, capaz de criar o seu próprio
mundo e de evoluir, continuamente, à medida da experiência que vai
adquirindo e vivenciando” (GAGO, 2012, p. 15).
A corrente cognitivista apresenta um núcleo teórico razoavel-
mente coerente, no entanto é possível dividir esta corrente em dois
grupos. Alguns dão ênfase aos processos cognitivos como Jerome Bru-
ner, Jean Piaget e David Ausubel, enquanto outros se concentram em
aspectos que envolvem a esfera afetiva também denominados de huma-
nistas como Carl Rogers e George Kelly. A seguir discorrer-se-á de
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 43

forma mais específica sobre as principais contribuições para a Educação


de Bruner, Piaget e Ausubel.
Para Jerome Bruner a aprendizagem deveria ser reputada como um
processo de descoberta (Discovery learning). De acordo com este pensa-
mento o conteúdo escolar deveria ser posto como um problema a ser
resolvido, com lacunas a serem preenchidas. Segundo Bruner, por meio
da experimentação, da observação, da pesquisa e de debates o conheci-
mento adquirido poderia ser enfim organizado e colocado em relação
aos saberes já possuídos pelo sujeito. Para o autor,

A participação ativa no processo de aprendizado da criança pode resultar


nos seguintes benefícios: aumento do potencial intelectual, bem como via-
bilizar mais rapidamente a informação adquirida para solucionar
problemas, e favorecer a construção do conhecimento através das ativida-
des de aprendizagem visto que o este seria uma recompensa intrínseca da
própria descoberta 4 (BRUNER, 1961, p. 24).

Para que a aprendizagem ocorra Bruner ressalta a importância dos


problemas e questões utilizados para encaminhar o processo de desco-
berta. É necessário que estes sejam considerados relevantes a nível
pessoal e social, desta forma os alunos se sentiriam mais envolvidos no
seu próprio processo de aprendizagem.
Assim como Bruner, Jean Piaget também acreditava a aprendiza-
gem é um processo de exploração e descoberta. Entretanto, Piaget não

4 Tradução livre da autora. No original “The active participation in the learning process by the child might
result in the following hypothesized benefits: an increase in intellectual potency so as to make the acquired
information more readily viable in problem solving, the enaction of the learning activities in terms of the
intrinsic reward of discovery itself” (BRUNER, 1961, p. 24).
44 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

desenvolveu exatamente uma teoria educativa, mas uma teoria sobre o


desenvolvimento cognitivo e sobre como os esquemas mentais evoluem
ao longo dos anos.
Conforme Piaget o desenvolvimento cognitivo do sujeito ocorre
por meio de dois processos o de assimilação e o de acomodação. Não im-
porta em que estágio cognitivo se encontra o indivíduo, o mecanismo de
aquisição de conhecimento é sempre pautado em um primeiro mo-
mento pela assimilação, ou incorporação de algo novo e em seguida pela
acomodação, no qual o sujeito modifica seus esquemas em decorrência
da incorporação da nova informação. De acordo com Circe Bittencourt,

O funcionamento constante dos dois processos – assimilação/acomodação


- corresponde ao princípio de desenvolvimento das estruturas mentais e
ao crescimento da capacidade cognitiva: o sujeito responde por meio de
compensações ativas aos desafios exteriores, aos desequilíbrios criados pe-
los problemas enfrentados, pelos conflitos, e esse “reequilíbrio” promove o
desenvolvimento intelectual (BITTENCOURT, 2011, p. 185).

Sendo assim o desenvolvimento intelectual ocorre por meio da as-


similação, da acomodação e pelo processo de equilibração “que se produz
quando se tenha alcançado um equilíbrio entre as discrepâncias ou con-
tradições que surgem entre a informação nova que assimilamos e a
informação que já tínhamos e a qual nos acomodamos” (CARRETERO,
1997, p. 25). Como visto, portanto, a aprendizagem não é resultado de
memorização ou cópia, mas resulta de uma organização mental.
Um aspecto muito importante da teoria de Piaget diz respeito aos
estágios de desenvolvimento cognitivo – Sensório-motor, Pré-operaci-
onal, Operacional concreto e Operacional-formal. Estes estágios de
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 45

desenvolvimento têm caráter sequencial e integrativo, no sentido que


sua sequência é invariável e integrativa porque cada fase sucessiva é
uma extensão da anterior. Ou seja, “no processo do conhecimento, nada
aparece sem uma ligação com as conquistas que precederam a que está
sendo alcançada aqui e agora, e que toda aquisição nova prepara o ca-
minho para os progressos subsequentes” (SEBER, 1991, p. 16). A
aprendizagem não é uma cópia ou fruto de memorizações e sim resul-
tado de uma modificação interna nos esquemas que o sujeito possui.
Conforme Mario Carretero (1997, p. 22), “o desenvolvimento cognitivo
pode ser compreendido como aquisição sucessiva de estruturas lógicas,
cada vez mais complexas, que subjazem às distintas áreas e situações
que o sujeito é capaz de ir resolvendo à medida que cresce”.
Uma das críticas feitas a Piaget diz respeito ao fato que a evolução
cognitiva estaria vinculada a maturidade física. Este aspecto da sua te-
oria foi criticado por estudos como o de Vygotski e de outros
construtivistas que afirmavam que o social e as experiências pessoais
são a base para a aprendizagem. Desta forma a idade não é o fator de-
terminante na formação de um pensamento mais elaborado.
Uma das principais contribuições de David Ausubel para a Educa-
ção foi a valorização dada ao conhecimento prévio do aluno. Para
Ausubel, o novo conhecimento não se sustenta por si só, ele necessita
estar ancorado sobre o conhecimento que o aluno já possui. O conceito
principal desenvolvido por Ausubel é o da aprendizagem significativa que
declara que “a aprendizagem deve ser uma atividade significativa para
a pessoa que aprende e tal significação está diretamente relacionada
46 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

com a existência de relações entre o conhecimento novo e o que o aluno


já possui” (CARRETERO, 1997, p. 15).
Para que a aprendizagem significativa ocorra o novo conhecimento
não deve se relacionar de forma discricionária com os esquemas men-
tais do sujeito. Um conceito importante para entender a aprendizagem
significativa é o subsunçor, trata-se de uma proposição uma ideia já
presente na estrutura cognitiva capaz de servir de ancoradouro para o
novo conhecimento. Graças a ele o novo conhecimento interage de
forma significativa na estrutura cognitiva do sujeito.
O uso dessas teorias em sala de aula levou a uma valorização do
aluno enquanto sujeito ativo no processo de aprendizagem e não mera-
mente um ser que responde a estímulos. Seu conhecimento prévio,
decorrente das suas experiências pessoais, torna-se “condição necessá-
ria para construção de novos significados e esquemas” (BITTENCOURT,
2011, p. 189). Tal proposta presume um ensino voltado para construção
do conhecimento a partir daquilo que o aluno já sabe, por meio de ati-
vidades desafiadoras, de pesquisa e de análise capazes de possibilitar
uma aprendizagem significativa.
A despeito das contribuições desses autores, críticas pertinentes
têm sido feitas às suas teorias. Para Carretero (1997), a aprendizagem
pensada por estes psicólogos é uma atividade solitária visto que o aluno
aprende à margem de seu contexto social. Mesmo que considerem a in-
teração do sujeito com o seu meio importante não analisam
efetivamente o papel das relações entre o social e o indivíduo no pro-
cesso de aprendizagem. De acordo com Carretero (1997, p. 25), “a ênfase
nos estágios [cognitivos] fez com que se considerasse o professor mais
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 47

como um espectador do desenvolvimento e favorecedor dos processos


de descobrimento autônomo de conceitos do que como um agente que
pode intervir ativamente na assimilação de conhecimento”.

CONSTRUTIVISMO SOCIAL

Tendo em vista as aproximações do presente trabalho com o campo


de investigação da Cognição Histórica e por conseguinte com a teoria
pedagógica construtivista, busca-se aqui analisar algumas característi-
cas do construtivismo. O construtivismo nasce no bojo da Psicologia
Cognitiva e como apontado por Carretero não se trata de um termo uní-
voco. Segundo o autor, trata-se de uma posição compartilhada por
diversas correntes de pensamento, entre estas é possível mencionar as
teorias de Piaget, Vygotsky e Ausubel.
Conforme Carretero, construtivismo é

[...] a idéia que sustenta que o indivíduo – tanto nos aspectos cognitivos e
sociais do comportamento como nos afetivos – não é um mero produto do
ambiente nem um simples resultado de suas disposições internas, mas, sim,
uma construção própria que vai se produzindo, dia a dia, como resultado da
interação entre esses dois fatores (CARRETERO, 1997, p. 10).

O conhecimento segundo esta corrente é uma construção do indi-


víduo resultante da mobilização de fatores internos (inteligência,
experiência) e de fatores externos (interação social). A aprendizagem do
ponto de vista construtivista é “um processo ativo no qual o aluno com-
para, expande, restaura e interpreta o conhecimento, recorrendo à
experiência e à informação que a todo o momento recebe” (GAGO, 2012,
48 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

p. 24). Para o construtivismo, os níveis de construção do conhecimento


não estão inteiramente vinculados a aspectos como idade ou maturi-
dade biológica.
Para que a aprendizagem possa ser considerada eficaz e significa-
tiva, o aluno deve operar ativamente sobre a nova informação
assimilando-a. Por assimilação não se entende uma cópia exata do que
foi aprendido, mas de uma reconstrução. Michel de Certeau, em seu co-
nhecido trabalho A invenção do cotidiano, faz uma interessante reflexão
sobre os usos e ressignificações dos textos por parte dos leitores. Essa
reflexão pode ser usada quando pensamos na aprendizagem, uma vez
que, conforme Certeau, o leitor dotado de táticas, de criatividade e de
inventividade não se limita a consumir ou assimilar no sentido de ‘tor-
nar se semelhante’ àquilo que leu ou aprendeu. Segundo Certeau (2008,
p. 261) – e em consonância com o construtivismo –, assimilar algo cor-
responde a “‘torná-lo semelhante’ ao que se é, fazê-lo próprio,
apropriar-se ou reapropriar-se dele”. Isto significa romper com a ideia
que “a eficácia da produção implica a inércia do consumo” (CERTEAU,
2008, p. 262). Em outras palavras, quem consome age sobre o produto. O
consumidor não é um ser passivo, mas sim dotado de uma inventividade
própria que lhe permite ir além do auspicado pelos produtores.
Segundo Certeau (2008, p. 269-270), “os leitores são viajantes; cir-
culam nas terras alheias, nômades caçando por conta própria através
dos campos que não escreveram, arrebatando os bens do Egito para usu-
fruí-los”. Discorrendo sobre a atividade leitora Certeau assevera que o
leitor/aprendiz é capaz de produção própria e lança à História, à Peda-
gogia escolar e à Sociologia o desafio de analisar esta produção.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 49

Dentro do paradigma construtivista a habilidade de se apropriar,


de fazer próprio e de construir o que se aprende ocorre por meio de es-
quemas ou construções mentais. Os esquemas são construções de quem
aprende e são utilizados para a elaboração de novas situações. Segundo
Driver,

Lo que se aprende no depende, pues, solamente de las características de la


situación presentada (sea el texto de un libro o un fenómeno físico), sino de
los «esquemas» que tiene disponibles el que aprende. En otras palabras, el
proceso de aprendizaje es una interacción entre los esquemas mentales del
que aprende y características del medio de aprendizaje (DRIVER, 1988, p.
111).

A interação constante entre os esquemas que o sujeito possui e a


realidade faz com que estes esquemas estejam em constante transfor-
mação, tornando-os cada vez mais complexos e sofisticados. É
importante ressaltar, no entanto, que a base para a transformação des-
tes esquemas são as próprias ideias prévias ou representações iniciais
que se tinha sobre a nova informação. Pois, a partir da interação do novo
com os esquemas mentais já presentes que o conhecimento é constru-
ído. Desta forma, o construtivismo coloca no centro do processo de
aprendizagem o aluno e o conhecimento que ele dispõe, suas ideias pré-
vias.
Conforme Gago (2012, p. 26), a ideia prévia é “aquela que o aluno
dispõe no seu sistema cognitivo para explicar determinado fenómeno
ou conceito. Esta ideia resulta da sua experiência e vivência pessoal pró-
pria e individual, face a determinada realidade ou problema”. Como
apontado por Barca (2001), as diferentes esferas de sociabilidade do
50 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

aluno (família, meios de comunicação) contribuem para formação do


seu conhecimento histórico e portanto não devem ser ignorados em sala
de aula. Desta forma, a escola perde a exclusividade de locus de apren-
dizagem e as representações de mundo que os alunos dispõem adquirem
centralidade em sala de aula para que uma mudança conceitual ocorra.
A mudança conceitual surge do conflito entre as ideias prévias e as ci-
entíficas. Espera-se que deste conflito resultem ideias mais válidas do
ponto de vista disciplinar. Não se trata de um percurso fácil, por isso
não basta mapear o que os alunos sabem é preciso analisar de que forma
a interação entre os saberes que os alunos possuem reagem aos novos.
Elaborar estratégias educativas tendo em vista a mudança das re-
presentações inicias dos alunos é um desafio, pois trata-se de ideias bem
arraigadas e por isso dificilmente são modificadas. Conforme Maria Pe-
reira,

o conhecimento tácito está presente e convocável, pois está ancorado nas


experiências idiossincráticas e na matriz cultural dos indivíduos. Sendo es-
truturas de longa duração, e como tal, resistentes a mudanças abruptas, ele
constrói-se através de um diálogo entre os sujeitos e o meio envolvente,
procurando encontrar explicações eficazes para as nossas próprias contra-
dições, incongruências e conflitos (PEREIRA, 2005, p. 3).

Carretero (1997) traz como exemplo desta dificuldade um trabalho


realizado com um grupo de alunos colocados diante de situações que
contradiziam suas ideias prévias. O autor notou que alguns não perce-
beram a existência de incoerências e mantiveram as mesmas ideias;
alguns mudaram suas ideias por outras mais simples e incorretas do
ponto de vista científico e um número pequeno de alunos mudou suas
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 51

ideias. Segundo o autor, o confronto entre ideias prévias e científicas é


útil, porém nem sempre os resultados são os esperados. Para Pereira, a
persistência destas ideias

[...]deriva da dificuldade dos indivíduos se distanciarem e de exercerem au-


tocrítica; -São fáceis de serem recordadas porque pertencem muitas vezes
a contextos vivenciais que foram ou são relevantes para os alunos (sensibi-
lidade, sentimentos, etc.); -Os alunos encontram nelas semelhanças com a
situação ou fenômeno científico em estudo, e finalmente - estas ideias per-
sistem porque contém em si mecanismos circulares de auto alimentação e
legitimação/reprodução pacíficas (PEREIRA, 2001, p. 45).

Segundo Pereira (2001), quando os alunos são colocados diante a


situações de conflito cognitivo 5 alguns cenários são possíveis. O aluno
pode aceitar o novo modificando o próprio conhecimento ou rompendo
totalmente com o velho, como também pode adotar estratégias distintas
visando manter sua posição. Por exemplo, pode ocorrer uma adição en-
tre as suas ideias e a nova; as duas ideias podem ser consideradas
equivalentes; pode selecionar determinados elementos para confirmar
sua posição; sua ideia é considerada como exceção à regra.
As dificuldades que acompanham o percurso que leva a mudança
conceitual não deve indispor, mas ajudar a cartografar os pontos neces-
sários para consecução da tarefa. E para isso, é de vital importância que
o professor conheça essas ideias para poder modificá-las. Afinal, no
construtivismo o aluno assume um papel central na construção do seu

5 O conflito cognitivo ocorre quando as ideias que o aluno já possui são colocadas em confronto com uma
nova informação ou situação. O confronto tem por objetivo fazer com que o aluno perceba as insuficiências
da primeira. (Carretero, 1997, p.71).
52 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

conhecimento e entender este processo deve ser o foco para uma apren-
dizagem significativa. A consciência da persistência das ideias prévias
dos alunos requer do professor uma prática que leve em consideração a
importância do exercício constante de confrontação entre ideias novas
e prévias, de repetição, de exercício e de auxílio. É preciso repensar
constantemente quais os métodos e estratégias adotar para se obter
uma progressão do pensamento histórico mais elaborado por parte dos
alunos.
Ainda sobre as características do construtivismo, além das ideias
prévias dos alunos e das estratégias cognitivas adotados por estes, o
professor “deve conhecer a estrutura da disciplina na sua dimensão
epistemológica” (GAGO, 2012, p. 23). Ou seja, é necessário repensar os
princípios psicopedagógicos à luz dos princípios específicos da disci-
plina de História. Segundo Barca (2001, p. 20), “a aprendizagem deve
processar-se no contexto da resposta à natureza da disciplina”. Desta
forma, a partir de contribuições advindas do construtivismo é possível
articular elementos específicos da disciplina de História para pensar si-
tuações concretas de ensino e de aprendizagem visando uma progressão
do pensamento histórico dos alunos.

UMA BREVE PANORÂMICA SOBRE A EDUCAÇÃO HISTÓRICA E A


APRENDIZAGEM HISTÓRICA

A Educação Histórica é um campo de investigação da história que


se desenvolveu a partir da década de 1970 na Inglaterra com o objetivo
de investigar as ideias de alunos e professores sobre a natureza do co-
nhecimento histórico. Trata-se de uma área de pesquisa em expansão.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 53

Vários estudos sobre cognição histórica têm sido conduzidos em diver-


sos países como Canadá, Portugal, Espanha, Estados Unidos e Brasil.
Em oposição a uma concepção evolutiva do desenvolvimento cog-
nitivo com base na idade, nos moldes de Piaget, ou de um ensino de
história validado pela quantidade de informações que o aluno era capaz
de reter, a Educação Histórica propõe analisar a cognição em história
com base na própria racionalidade da história. De fato, a característica
peculiar desta área de investigação é ter “como pressuposto teórico (...)
a natureza do conhecimento histórico e, como pressuposto metodoló-
gico, a análise de ideias que os sujeitos manifestam em e acerca da
história, através de tarefas concretas” (BARCA, 2001, p. 13).
De acordo com Márcia Ramos e Marlene Cainelli (2015, p. 24),

a investigação em Educação Histórica tem como objetivo entender as rela-


ções que alunos e professores estabelecem com o conhecimento histórico,
com seus conceitos e categorias históricas. A pesquisa em Educação Histó-
rica tem especial interesse na forma pela qual o trabalho com fontes,
incluindo os objetos históricos, as estratégias de ensino, os materiais didá-
ticos, entre outros, colaboram para com a formação do pensamento
histórico e para com a consciência histórica de alunos e professores.

As ideias históricas de alunos e professores se tornaram objeto de


análise nas pesquisas sobre cognição histórica na Inglaterra em um
contexto de debate sobre reestruturação curricular. Segundo Peter Lee
(2001, p. 13), nos anos 1960 “surgiu o receio de que os alunos deixassem
de estudar História, o que de fato quase aconteceu. Existia um currículo
descentralizado em Inglaterra e poucos alunos escolhiam a disciplina de
História”. O pouco interesse suscitado encontrava justificativa no fato
54 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

de que a disciplina era reputada como tediosa e sem finalidade prática


pelos alunos.
Objetivando reverter esta situação foi elaborado o The History 13-
16 Project sob a coordenação de Peter Lee e, posteriormente, de Denis
Shemilt. Este programa teve como público alvo jovens de 13 a 16 anos e
foi colocado em prática em mais de um terço das escolas da Inglaterra.
Estes pesquisadores partilhavam da convicção que “para compreender-
mos a História, precisamos de falar de situações específicas do passado
e de promovermos a sua interpretação” (LEE, 2001, p. 14).
O trabalho com fontes em sala de aula possibilitou uma aproxima-
ção com a metodologia da disciplina e o desenvolvimento de
capacidades importantes para a análise contextualizada e de crítica do-
cumental. O uso de fontes em sala de aula vem a corroborar a ideia que
não basta um conhecimento baseado nos conceitos substantivos. É ne-
cessário que os alunos compreendam os conceitos meta históricos, ou
de segunda ordem, próprios da ciência da história. Como colocado por
Marilia Gago (2012, p. 61), os conceitos de segunda ordem “providenciam
a compreensão da História como uma forma de conhecimento, isto é,
mostram como se faz História, e que conceitos se constroem, como
causa, evidência, narrativa, mudança…”. Lee declarou que:

com o Projecto as crianças passaram a olhar para a História como uma dis-
ciplina interessante e difícil como a matemática (...). Com efeito, um dos
objetivos do Projecto era fazer da História uma disciplina séria. Era neces-
sário haver algo que as crianças apreendessem progressivamente, que se
operassem mudanças nas ideias e que elas conseguissem perceber essas
mudanças (LEE, 2001, p. 14).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 55

No CHATA Project (Concepts of History and Teaching Approaches) es-


tes pesquisadores aprofundaram os estudos anteriores ao investigarem
como os alunos lidavam com narrativas divergentes sobre um mesmo
tema histórico. Este estudo foi posto em prática entre crianças de 6 a 14
anos, em um total de 320 alunos. A pesquisa foi desenvolvida em várias
fases, nas quais os alunos foram interpelados a responderem questões
sobre: compreensão de causas em História; empatia; objetividade da
pesquisa histórica; evidência e narrativa.
Uma das tarefas que os alunos tiveram que responder dizia res-
peito a ocupação romana das ilhas britânicas. Foram apresentados dois
textos com narrativas divergentes sobre a ocupação das ilhas e os alu-
nos foram solicitados a responderem como podia haver diferenças ao
contar-se a mesma história? As ideias históricas contidas em cada uma
das narrativas recolhidas foram organizadas em níveis partindo de
ideias mais simples para um nível mais elaborado. De acordo com Lee
(2001), alguns alunos não perceberam que se tratavam de narrativas
contraditórias, outros asseriram que a diferença era devido a maneira
de contar, uns porque não foi possível para os historiadores encontra-
rem todas as informações a respeito do tema e assim elas podem estar
incompletas ou serem inventadas, alguns alunos apontaram para a
questão do ponto de vista e enfim outros concluíram que as diferenças
são um fator intrínseco a natureza do conhecimento histórico.
A partir destes estudos, Lee concluiu que com o avançar da idade o
número de alunos que apresentaram um nível mais elaborado de pen-
samento histórico foi maior. No entanto, alunos com 7 e 8 anos também
se alocaram em níveis mais sofisticados. Segundo o autor, “há crianças
56 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

que já sabem que as histórias não são cópias do passado, elas são cons-
truídas. Se dermos apenas factos a estas crianças, estaremos a desiludi-
las” (LEE, 2001, p. 20). Portanto, a pesquisa rompeu com a ideia de que
os alunos quando avançam em idade, naturalmente também avançam
em sua explicação histórica, e, se há “avanços”, são outros os fatores que
contribuem para tal.
Estas atividades permitiram investigar o grau de sofisticação das
ideias históricas apresentadas pelos alunos. A progressão do pensa-
mento histórico é mensurada com base na própria episteme da história
e não em estágios de desenvolvimento como proposto por Piaget. No
projeto 13-16 a tarefa desenvolvida pelos alunos “funcionou como um
desafio positivo e aliciante, o que pode confirmar a hipótese de que a
compreensão dos métodos, lógica e perspectivas da História pelos alu-
nos pode ser progressivamente desenvolvida” (GAGO, 2012, p. 79).
Para Lee (2008) uma vez reconhecido que a aprendizagem histórica
perpassa pela compreensão da natureza da história, é possível pensar
em viabilizar o desenvolvimento de uma progressão conceitual. Não em
um sentido restrito que prevê apenas uma acumulação de informação e
sim no que tange ao desenvolvimento progressivo de ideias históricas
mais elaboradas. De acordo o autor, o conceito de progressão consente
uma “mudança de ideias deficitárias de senso-comum, que não permi-
tem ou reduzem a possibilidade de compreensão ou explicação
histórica, para ideias que a tornem possível” (LEE, 2008, p. 15).
Ao ressaltar a importância dos conceitos de segunda ordem o autor
não subestima a relevância de conceitos substantivos, ligados aos con-
teúdos da disciplina, para a consecução de uma aprendizagem histórica
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 57

significativa. O conúbio entre os conceitos substantivos e de segunda


ordem é tido como essencial. É graças aos conceitos meta históricos que
os conteúdos aprendidos podem ser operados de forma mais eficaz.
Conforme Lee (2008, p. 19), trabalhar para desenvolver a progressão
“significa equipar os alunos com ideias mais sofisticadas/poderosas, por
exemplo acerca de como nós podemos conhecer o passado e por que é
que as narrativas históricas dos historiadores diferem”.
Além da compreensão da disciplina de história a Educação Histó-
rica atribui uma função social à aprendizagem histórica. Conforme
Ronaldo Cardoso (2011, p. 35), “o ensino de História propicia condições
aos alunos de forma tal que possam adentrar o passado, por meio do
raciocínio histórico, com o objetivo de diagnosticar as questões fulcrais
do presente com o fim de antecipar o futuro”.
A partir da década de 1990 iniciou-se um diálogo entre os pesqui-
sadores da Educação Histórica com os pesquisadores alemães da
Didática da História, o que resultou na inserção nas pesquisas do con-
ceito de consciência histórica, proposto por Jörn Rüsen. Segundo ele, a
consciência histórica seria a aplicação do conhecimento histórico na
práxis, ou seja, o conhecimento sobre o passado atuaria como um fator
de orientação temporal na vida prática. No entanto, o autor adverte que
a orientação temporal nem sempre ocorre mediante preceitos históri-
cos, pois aspectos como senso-comum, preconceitos, sentimentos de
pertença e questões identitárias podem interferir nas tomadas de deci-
são. Para Rüsen, a formação histórica é o meio para garantir que a
orientação temporal seja baseada em pressupostos históricos. Sendo as-
sim, formação histórica é,
58 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

O conjunto das competências de interpretação do mundo e de si próprio,


que articula o máximo de orientação do agir com o máximo de auto- reali-
zação ou de reforço identitário. Trata-se de competências simultaneamente
relacionadas ao saber, à práxis e à subjetividade. (...) A categoria da forma-
ção refere-se à vinculação entre saber e agir exigida pela carência de
orientação do sujeito agente, pois insere-se na representação do todo que
constitui a situação em que o agente deve lidar com seus problemas. For-
mação leva muito a sério esse direcionamento à carência de orientação
(RÜSEN, 2010, p. 95).

A formação é uma categoria da Didática da História responsável


pela relação entre saberes científicos e seus usos práticos. Segundo
Rüsen (2010), a formação histórica possibilita a integração do saber his-
tórico obtido pela pesquisa em saberes históricos relevantes para a
práxis e eficazes para orientação. A subjetividade reside não na acumu-
lação de saberes, mas com as formas de lidar com estes e aplicá-los aos
problemas de orientação. Se trata de um processo dinâmico de reelabo-
rar continuamente saberes na orientação da vida prática.
O conceito de aprendizagem de Rüsen se encontra extremamente
vinculado a categoria da formação histórica. Pois aprender pode ser de-
finido como a “elaboração da experiência na competência interpretativa
ativa, e formação histórica não mais é do que uma capacidade de apren-
dizado especialmente desenvolvida” (RÜSEN, 2010, p. 104). Para o autor,
o aprendizado histórico ocorre quando um dado objetivo que ocorreu no
passado torna-se subjetivo e em seguida passa a desempenhar um papel
no ordenamento interno no sujeito. Segundo Rüsen (2010), o movimento
de aprendizado é duplo: em um primeiro momento tem-se a passagem
do dado objetivo à apropriação subjetiva, e em seguida da busca
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 59

subjetiva de afirmação de si ao entendimento objetivo. Esse duplo mo-


vimento de aprendizagem de aquisição do conhecimento histórico por
meio da experiência e auto realização se dá através de três operações:
isto é, a experiência, a interpretação e a orientação.
Rüsen assevera que a aprendizagem histórica comporta o cresci-
mento da experiência sobre os saberes que aconteceram no passado.
Mas não basta saber o que ocorreu no passado, é preciso saber distinguir
qualitativamente entre o passado e o presente e que mesmo se tratando
de diferentes temporalidades, permanências do passado se encontram
no presente. É importante ainda saber relacionar esse saber do passado
no presente no quadro de orientação da vida prática. Se trata de uma
aquisição ativa dessa experiência do passado.
Conforme Schmidt (2010), a aprendizagem histórica aumenta a ca-
pacidade para encontrar significado. O aumento da experiência e do
saber transforma-se numa mudança produtiva dos modelos de inter-
pretação, também chamado de quadro histórico. Esses modelos são
flexíveis, dinâmicos e se modificam qualitativamente. De acordo com a
autora, os modelos tradicionais se tornam exemplares, os exemplares,
críticos, e os críticos, genéticos. O processo de aprendizagem pode ser
descrito como a passagem de um dogmatismo quase natural das posi-
ções históricas à colocação do saber histórico em perspectiva.
Para Rüsen (2010), a aprendizagem histórica acarreta também no
aumento da competência de orientação. Se trata da capacidade dos su-
jeitos de correlacionar os modelos de interpretação, cheios de
experiência e saberes, com seu próprio presente e com sua própria vida.
As três dimensões do aprendizado histórico estão interligadas. Não há
60 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

experiência histórica livre de interpretação, nem orientação histórica


livre de experiência. É ainda comum considerar que quanto maior o vo-
lume de informações mais história se aprende. O problema é que o saber
apropriado apenas de forma passiva não fomenta a capacidade de inter-
pretação das experiências nem sua utilização para fins de orientação na
vida prática. É importante que haja equilíbrio entre a história como
dado objetivo e a história como construto subjetivo da orientação prá-
tica.
De acordo com a Educação Histórica, a aprendizagem histórica
ocorre quando o aluno é capaz de vincular a experiência do tempo a sua
própria subjetividade dotando-a de significância e usos para sua vida
prática. Apenas quando a história deixa de ser ensinada como um ema-
ranhado de informações que devem ser absorvidas e passa a ser
considerada uma atividade fruto de levantamento de hipóteses e res-
postas possíveis, a história poderá ser apropriada pelos alunos de forma
significativa e se tornar fator de orientação da vida prática. A Educação
Histórica objetiva desenvolver nos alunos competências ou ferramentas
intelectuais essências à vida social. A capacidade de ler o mundo histo-
ricamente permite situar-se e intervir nele de forma crítica e
autônoma.

CONTRIBUIÇÕES DO CONCEITO DE LITERACIA HISTÓRICA

No Dicionário Priberam da Língua Portuguesa a palavra literacia é


definida “como capacidade de ler e de escrever; capacidade para perce-
ber e interpretar o que é lido” (Acesso em: 25, Fevereiro, 2016). O
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 61

conceito de literacia histórica aplicado neste trabalho tem como refe-


rência a definição desenvolvida por Peter Lee a partir de considerações
filosóficas de autores como Collingwood, Lorenz, Oakeshott e Rüsen, do
qual Lee utiliza o conceito de consciência histórica. Literacia histórica,
para Lee, ultrapassa o simples ato de ler ou entender. Trata-se da capa-
cidade de compreensão da disciplina de História associada a uma
estrutura utilizável do passado capaz de fornecer orientação para vida
prática (LEE, 2006, p. 145).
O conceito de literacia histórica prevê a investigação das ideias dos
estudantes sobre a disciplina de História como também busca entender
de que forma o conhecimento histórico é mobilizado para fins de orien-
tação para vida prática e para construção de projeções de futuro.
Segundo Rüsen, a capacidade de orientação temporal é uma carac-
terística antropológica. Esta habilidade é definida como consciência
histórica e segundo o autor se trata da “soma das operações mentais
com as quais os homens interpretam sua experiência de evolução no
tempo do seu mundo e de si mesmos, de forma tal que possam orientar,
intencionalmente, sua vida prática no tempo” (RÜSEN, 2011, p.57).
O conceito de literacia histórica é mais específico que o de consci-
ência histórica de Rüsen, pois como aponta Lee, “a consciência histórica
é mais ampla do que o tipo de alfabetização histórica que deve ser ofe-
recida por uma educação histórica e nem todas as formas de consciência
histórica atendem aos padrões da história” 6 (LEE, 2011, p. 61). O conceito

6 Tradução livre da autora. No original “historical consciousness is wider than the kind of history literacy
that should be offered by a history education, and not all forms of historical consciousness meet the standards
of history” (LEE, 2011, p.61).
62 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

de literacia histórica abarca o conceito de consciência histórica, entre-


tanto a orientação para a vida prática deve estar ancorada a
pressupostos da disciplina de História e não por ideias pautadas no
senso comum, na tradição, em sentimentos de identidade ou de per-
tença. Afinal, “o pensamento histórico requer uma orientação para o
passado pautados em evidências e regras de argumentação” 7
(WINEBURG, 2007, p. 6).
Como apontado por Schimdt (2009), à diferença das teorias psico-
lógicas sobre ensino e aprendizagem, os componentes necessários para
o desenvolvimento da literacia histórica se encontram ancorados em
pressupostos pautados na racionalidade da ciência História e, portanto,
pode ser definida como cognição histórica situada.
A ênfase na ciência de referência deve-se ao fato que “la historia es
un conocimiento que posee unas particularidades que exigen para su
enseñanza la comprensión de su propia formulación” (GÓMEZ et al.,
2014, p. 8). Para Carretero (1997, p. 9), “não é mais possível falar de uma
capacidade cognitiva do tipo geral, senão que a inteligência, o conheci-
mento, ou como se lhe queira chamar, desenvolve-se em relação com a
compreensão de conteúdos específicos, que têm a ver com as distintas
matérias escolares”.
Como já assinalado, uma das ferramentas necessárias para o de-
senvolvimento da literacia histórica apontada por Lee é a compreensão
da disciplina de história. Conforme o autor, é preciso que “os alunos en-
tendam algo do que seja história, como um compromisso de indagação.

7 Tradução livre da autora. No original “historical thinking requires an orientation to the past informed by
disciplinary canons of evidence and rules of argument” (WINEBURG, 2007, p. 6).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 63

(...) Isso sugere que os alunos devem entender, por exemplo: como o co-
nhecimento histórico é possível, o que requer um conceito de evidência”
(LEE, 2006, p. 116). A partir dessas ideias, as fontes históricas utilizadas
na produção do conhecimento histórico passam a ser vistas não como
meros veiculadores de informação, mas como suportes para questiona-
mentos e análise histórica visando interpretações plausíveis sobre o
passado.
É importante que os alunos entendam que a narrativa histórica não
é uma cópia exata do passado, que o conhecimento histórico se dá de
forma indireta a partir de vestígios e das inferências elaboradas a partir
de sua análise. Para Lee (2006, p. 140), “a compreensão de como as afir-
mações históricas podem ser feitas, e das diferentes formas nas quais
elas possam ser mantidas ou desafiadas, é uma condição necessária para
a literacia histórica”.
Outro componente importante para o entendimento da natureza
do saber histórico perpassa a compreensão contextualizada das ações
dos sujeitos do passado. O que pressupõe o conceito de empatia, en-
quanto o entendimento:

[...] das crenças e valores das pessoas do passado são entendidos como não
necessariamente os mesmos que os nossos, e até mesmo considerados es-
tranhos, todavia eles ainda são reconhecidos como inteligíveis e defensável
em seus próprios termos e ajudam a dar sentido às crenças e valores do
presente 8 (LEE, 2011, p. 145).

8 Tradução livre da autora. No original “the beliefs and values of people in the past are understood as not
necessarily the same as ours, and even as passing strange, but they are still recognized as intelligible and
defensible in their own terms, and as helping make sense of present beliefs and values” (LEE, 2011, p. 145).
64 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Sendo assim, a compreensão da disciplina de História está intima-


mente ligada ao próprio oficio do historiador, e, portanto, não se
resume apenas a memorização de conteúdos sobre acontecimentos e
datas do passado. Os autores fazem notar que:

La comprensión histórica implica unos complejos procesos de pensamiento


que permitan interpretar esos contenidos (conceptos de primer orden), a tra-
vés de estrategias propias de la disciplina (conceptos estratégicos o de
segundo orden). Para adquirir estas habilidades es necesario la participación
de los alumnos en la práctica del historiador (GÓMEZ et al., 2014, p. 5).

De acordo com o conceito de literacia histórica, a compreensão do


conhecimento histórico decorre do desenvolvimento de competências
vinculadas a própria epistemológica da história. Conforme Lee, a com-
preensão histórica é uma forma de ver o mundo, o que implica entender:

as idéias-chaves que tornam possível o conhecimento do passado e os dife-


rentes tipos de afirmações feitas pela história, incluindo o conhecimento de
como inferimos e testamos as declarações, explicamos eventos e processos
e narramos o passado 9 (LEE, 2011, p. 140).

Além dos conceitos substantivos ou de primeira ordem, ligados aos


conteúdos disciplinares, a Educação Histórica propõe também trabalhar
com conceitos de segunda ordem em sala de aula. Os conceitos de se-
gunda ordem ou conceitos meta históricos permitem a compreensão da
construção do saber histórico, ou seja, revelam como se faz a história.

9 Tradução livre da autora. No original “[…] the key ideas that make knowledge of the past possible, and of
the different kinds of claims made by history, including knowledge of how we infer and test statements,
explain events and processes, and give accounts of the past” (LEE, 2011, p. 140).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 65

São conceitos como evidência, narrativa, explicação, mudança, empatia.


Este tipo de “conocimientos históricos están relacionados con habilida-
des propias del historiador que se concretan en: la búsqueda, selección
y tratamiento de fuentes históricas” (GÓMEZ et al., 2014, p. 9).
Um dos empecilhos para se alcançar a compreensão histórica de-
corre da pouca importância dada aos conceitos de segunda ordem.
Segundo Lee (2011), mesmo com todas as reflexões feitas a respeito, é
ainda recorrente pensar a disciplina escolar de história como um ema-
ranhado de informações a serem aprendidas. Versões mais engajadas
sobre a aprendizagem histórica chegam a considerar a importância da
compreensão histórica, mas não percebem sua relação com os conceitos
específicos da disciplina. Para o autor, é como “se as ferramentas mais
poderosas disponíveis para as crianças fossem ocultadas ou escondidas
delas, e a própria base da ‘autonomia’ obscurecida" 10 (LEE, 2011, p. 134).
Para que o passado se torne uma ferramenta poderosa de orienta-
ção temporal a compreensão do conhecimento histórico deve estar
atrelada a uma história substancial. A dicotomia sustentada pela ideia
que contrapõem conteúdo à conceitos de segunda ordem é prejudicial
para consecução da literacia histórica. Como colocado por Lee, a trans-
formação que a literacia proporciona na forma de ver e atuar no mundo
ocorre “através e na presença do conhecimento histórico substantivo

10 Tradução livre da autora. No original “It is as if the most powerful tools available to children are to be
concealed or withheld from them, and the very basis of ‘autonomy’ obscured” (LEE, 2011, p. 134).
66 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

em que passado e presente não são desvinculados um do outro” 11 (LEE,


2011, p.146).
Após esclarecer a importância do conhecimento substantivo da
história o autor destaca a dificuldade de fornecer aos alunos um grande
quadro do passado. A história que os alunos aprendem é fragmentada,
esboçada e baseada predominantemente em eventos bem específicos. O
passado, na maioria das vezes, aparece como desvinculado do presente,
como se as decisões do presente ou projeções de futuro não fossem en-
gendradas a partir dele. O Ensino de história posto nestas condições
impede que os alunos desenvolvam um quadro mais organizado e útil
do passado. De acordo Lee, uma estrutura histórica utilizável deveria
abarcar:

um ponto de vista geral de padrões de mudanças a longo prazo, não um


mero esboço de história folheando picos do passado. Deve ser ensinada ra-
pidamente e sempre revisitada, pois assim os alunos podem assimilar novas
histórias em relação à estrutura existente ou adaptar a mesma. Seguindo
Rüsen, essa matéria deve ser a história humana, não alguns subconjuntos
privilegiados dela. Uma UHF irá seguir, inicialmente, amplos desenvolvi-
mentos nas sociedades humanas, questionando sobre os padrões de
mudança na subsistência humana e na organização política e social (LEE,
2006, p. 146-147).

Para fornecer um grande quadro do passado o ensino de história


necessitaria abster se de histórias eventificadas. Os alunos devem ser
orientados a entenderam a história da humanidade como um todo e não

11 Tradução da autora. No original “[…] through and in the presence of substantive historical knowledge in
which past and present are not cut off from one another” (LEE, 2011, p.146).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 67

apenas como uma coleção de fragmentados colocados em ordem crono-


lógica. Para Gago (2012), este grande quadro do passado deve ser
elaborado pelos alunos, e por se tratar de uma estrutura aberta pode ser
constantemente revisitada com base no que é aprendido ao longo do seu
percurso de aprendizagem. Segundo Lee, "o objetivo é usar o quadro
continuamente, modificando-o e dando aos alunos o espaço para desen-
volver uma visão mais ampla do passado” 12 (LEE, 2011, p. 145). Uma UHF
(estrutura histórica utilizável) permite que o aluno entenda que não
existe uma fronteira que delimita o passado do presente e torna possível
que ele se localize no tempo e veja o passado como vinculante para sua
orientação no presente e no futuro.
A conquista da literacia histórica transforma o modo que o aluno
vê o mundo e permite a sua atuação neste de forma consciente. Con-
forme Lee, este deveria ser o objetivo principal do ensino de história.
Um ensino capaz de formar jovens engajados e emancipados deve se
preocupar em dotá-los de ferramentas conceituais com as quais eles se-
rão capazes de aprender a pensar por si mesmos.
Sam Winenburg adverte “em um mundo dominado por apelos
emocionais, citações arrancadas de contexto, linguagem incendiária e
análises jornalísticas que visam extinguir a sobriedade em vez de cul-
tivá-la, o papel de um pensamento histórico tão unnatural nunca
pareceu tão urgente” 13 (WINENBURG, 2007, p. 11).

12 Tradução da autora. No original “[…] the aim is to use the framework continuously, modifying it and giving
students the space to develop big pictures of the past” (LEE, 2011, p. 145).

13 Tradução da autora. No original “In a world dominated by emotional appeals, quotations ripped out of
context, incendiary language, and journalistic analyses that aim at extinguishing sobriety rather than
cultivating it, the role of such unnatural historical thinking has never seemed more imperative” (WINEBURG,
2007, p. 11).
2
TRAJETÓRIA METODOLÓGICA: CONHECENDO OS
SUJEITOS DA PESQUISA E SUAS IDEIAS PRÉVIAS
SOBRE O FASCISMO E A NATUREZA DA DISCIPLINA
DE HISTÓRIA

A educação é um processo social, é desenvolvimento.


Não é a preparação para a vida, é a própria vida.
John Dewey

A partir de pressupostos construtivistas e, mais precisamente, da


Educação histórica buscou-se estabelecer estratégias para conhecer os
jovens alunos participantes da pesquisa, suas representações iniciais
sobre o conceito substantivo fascismo e sobre a natureza do conheci-
mento histórico. Como já mencionado, esta investigação tem por
objetivo analisar, por meio da fonte o jornal La Provincia di Bolzano, a
concepção de empatia histórica, a compreensão da disciplina de história
por parte de jovens alunos e seu posicionamento diante das mídias.
A forma como esta pesquisa foi conduzida metodologicamente se-
gue alguns preceitos da Ground Theory. Esta metodologia baseia-se em
“algumas diretrizes, ainda que flexíveis, para coletar e analisar os dados
visando à construção de teorias ‘fundamentadas’ nos próprios dados”
(CHARMAZ, 2009, p. 15). Na Ground Theory a teoria é gerada ao longo da
pesquisa, conforme os dados são recolhidos e analisados. O procedi-
mento de análise e de codificação dos dados coletados contribuem para
organização das fases subsequentes. Segundo Pais,
70 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

a informação é recolhida sem que esteja condicionada por hipóteses ou pre-


ocupações teóricas de partida. A análise da informação é praticamente
simultânea à sua recolha, o que pressupõe uma reflexão sistemática sobre
o material que vai recolhendo (PAIS, 2003, p. 88).

Os conceitos gerais adotados para organizar a pesquisa inicialmente


assumem caráter provisório e podem ser modificados e abandonados caso
resultem irrelevantes. Desta forma, são os próprios dados que indicam a
trajetória a seguir, a pesquisa vai tomando forma conforme a atividade
simultânea de coleta e análise de dados vai ocorrendo.
Os dados que sustentam esta pesquisa foram coletados entre os
meses de agosto e dezembro de 2015. 14 A coleta dos dados foi dividida
em três etapas: estudo exploratório, estudo piloto e estudo principal.
Tendo como base essas preocupações metodológicas a estrutura deste
trabalho reflete a trajetória empreendida. Sendo assim, no segundo ca-
pítulo a ênfase é dada ao estudo exploratório que marca o início da
recolta dos dados. No terceiro capítulo será abordado o estudo piloto e
no quarto o estudo principal.
Nesta primeira etapa foram adotados dois instrumentos de pes-
quisa (Anexo 3 e Anexo 4), um questionário sócio econômico cultural e
um questionário sobre as ideias prévias acerca do fascismo e da disci-
plina de história. O estudo exploratório teve como objetivo conhecer os
jovens alunos participantes e investigar suas representações iniciais so-
bre o tema abordado. O primeiro instrumento tinha como finalidade
traçar o perfil discente. A partir de 28 questões buscou-se recolher

14 O estudo de campo realizado foi autorizado pela direção das escolas conforme Anexo 1 e 2.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 71

informações que contribuíssem para levantar o perfil socioeconômico e


cultural dos participantes da pesquisa. Este instrumento de pesquisa se
concentrou em investigar aspectos como idade, sexo, naturalidade, na-
cionalidade, nível de escolaridade dos pais, renda familiar entre outros.
As questões que se concentraram nos aspectos culturais visaram enten-
der as atividades de lazer preferidas pelos alunos, como eles passam o
tempo fora dos muros da escola, que música ouvem, quais livros leem,
o que assistem na TV e por quais páginas navegam na internet. A finali-
dade deste questionário foi recolher dados para subsidiar informações
para elaborar um perfil dos estudantes pesquisados.
Fatores como a predisposição dos participantes no momento de
responder, falta de conhecimento ou disponibilidade em responder de-
terminadas questões, como por exemplo as que se referem a renda
familiar 15 entre outras, são limitações intrínsecas em um questionário
diretivo. É importante considerar estes fatores no momento da análise
dos dados, no entanto, as problemáticas expostas não invalidam esta
metodologia que disponibiliza subsídios fundamentais para traçar o
perfil dos alunos e que irão integrar um corpo de dados maior contri-
buindo assim para uma saturação dos dados.
O segundo instrumento de pesquisa utilizado era composto por dez
questões de caráter aberto. Este questionário tinha como intuito

15 Segundo Alves e Soares, obter respostas fidedignas sobre a renda familiar nem sempre é possível. O fato
que os alunos não são os responsáveis principais pela renda familiar aumenta a probabilidade de respostas
inválidas. Mas como apontam os autores, “mesmo entre os responsáveis, há muitos que não respondem a esta
questão, por exemplo, aqueles que têm uma inserção precária no mercado de trabalho, os que têm um
rendimento muito variado, ou mesmo os que preferem não revelar a renda. Além disso, os economistas
alertam para a distinção entre a renda do trabalho e a renda do capital, sendo que os detentores de mais
capital tendem muito mais a omitir a própria renda” (ALVES, 2009, p. 7).
72 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

cartografar as ideias prévias que os alunos têm sobre o conceito subs-


tantivo fascismo, o que eles pensam sobre os meios de comunicação na
atualidade e como eles definem a disciplina de história e a forma como
o conhecimento histórico é produzido.
Esta pesquisa foi realizada entre jovens estudantes de duas Escolas
Estaduais no Paraná, localizadas na cidade de Guarapuava. Não se es-
pera que os dados obtidos aqui equivalha a uma representação universal
da realidade escolar brasileira, a intenção foi de obter elementos que
propiciassem uma reflexão acerca do desenvolvimento do pensamento
histórico de jovens alunos. No entanto, acredita-se que a partir dos da-
dos alcançados seja possível identificar aspectos importantes e
subjacentes a uma realidade mais vasta.

AS ESCOLAS

Esta pesquisa foi realizada em dois entre os trinta e um colégios


estaduais da cidade de Guarapuava, no ano de 2015. Segundo o último
levantamento do IDEB o município de Guarapuava passou da 143ª para
a 161ª colocação em 2015. O município atingiu nota 6,0, (acima do limite
estipulado 5,8) mas sua evolução foi menor quando comparado a outros
municípios.
A primeira escola, que a partir deste momento será definida como
Escola A está situada em uma região central da cidade, em proximidade
de uma grande avenida abastecida por serviços de transporte público, o
que facilita o acesso. De fato, esta escola recebe alunos de outros bairros
mais distantes. A Escola B se encontra mais afastada do centro em um
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 73

bairro residencial considerado de classe média/ alta e nas proximidades


de um bairro resultante de uma invasão. Esta escola também é servida
por transporte público e recebe alunos de diferentes bairros da cidade. 16

Tabela 1
Distribuição de alunos conforme o local de residência

Escola A Escola B

bairro n. alunos bairro n. alunos

Santa Cruz 14 Vila bela 6

Boqueirão 10 Cascavel 6

Centro 4 Bairro dos Estados 5

Vila bela 2 Boqueirão 4

Trianon 3 Jardim das Américas 3

Batel 1 Vila Carli 3

Bairro dos Estados 2 Batel 2

Santana 1 Conradinho 2

Alto da XV 1 Jardim Pinheirinho 1

Tancredo Neves 1 São Vicente 1

Colônia Vitória 1 Santa cruz 1

Não respondeu 4 Alto Cascavel 1

Palmeirinha* 1

Plante 1

total 44 total 37

* distrito do município de Guarapuava

Se escolheu trabalhar com estas duas escolas por considerá-las in-


termediarias na hierarquia das escolas da cidade, no sentido que não são
consideradas as melhores escolas da cidade, mas nem mesmos são consi-
deradas escolas ruins. Outro motivo decorreu do fato que essas escolas

16 O IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) é calculado com base nos resultados do Prova Brasil
(português e matemática) e na taxa de aprovação. Para mais informações consultar:
http://www.qedu.org.br/cidade/2575-guarapuava/ideb.
74 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

recebem alunos de vários bairros e realidades diferentes o que possibili-


tou trabalhar com uma amostragem mais variada de alunos. Outra razão
determinante para a escolha destas instituições se deve ao fato que du-
rante a graduação pude fazer a disciplina de Estágio Supervisionado em
uma das escolas e, portanto, o contato prévio com a professora de Histó-
ria da escola e a relação que se instaurou entre as professoras de estágio
da Unicentro e a escola foi importante para o desenvolvimento desta pes-
quisa. O mesmo ocorreu na outra escola, o fato que alunos da Unicentro
realizam estágio nesta estrutura propiciou o estreitamento de um relaci-
onamento entre a universidade e a escola, o que favoreceu o
desenvolvimento de pesquisas de ensino de História nesta estrutura.
A estrutura das escolas se assemelham, possuem um único pavi-
mento e por causa do muro seu interior é pouco visível do lado de fora.
A Escola A possui 30 turmas distribuídas em três turnos. Esta escola
atende alunos do Ensino Fundamental, Ensino Médio e desde 2006 alu-
nos na modalidade de ensino EJA (Educação de Jovens e Adultos). No
momento desta pesquisa a escola contava com 851 alunos matriculados,
dos quais 274, no Ensino Médio, EJA incluso. Atualmente nesta escola
trabalham 94 professores e 19 funcionários. Em sua infraestrutura pos-
sui treze salas de aulas, laboratório de informática, biblioteca, sete
banheiros (um adaptado para cadeirantes), cozinha, cantina, ginásio de
esportes coberto, mini quadra de esportes aberta, um auditório com ca-
pacidade para 80 pessoas. A estrutura da escola se apresenta bem
conservada. Os muros estão pintados e limpos e o ambiente em geral é
bem cuidado. Assim como o jardim do pequeno pátio logo após a en-
trada. É desde 2002 que a escola começou a participar do programa de
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 75

inclusão de alunos com necessidade especiais, principalmente de alunos


surdos que são auxiliados por intérpretes durante as aulas.
A Escola B, no total, atende a 401 alunos, dos quais 130 se encon-
tram matriculados no Ensino Médio. A escola possui 16 turmas
distribuídas em três turnos que atende alunos do Ensino Fundamental
e Médio. As turmas de Ensino Médio são distribuídas entre os turnos
matutino e noturno. A escola conta com 67 professores e 14 funcioná-
rios. Assim com a Escola A, a estrutura desta escola é boa. O colégio
possui dez salas de aula, biblioteca, cozinha, cantina, seis banheiros (um
para alunos cadeirantes), laboratório de informática, pátio coberto,
quadra de esportes, sala de recursos audiovisuais.

Tabela 2
Escolas e matrículas no Ensino Fundamental, Médio e EJA

Escola A Escola B

n. turmas n. alunos n. turmas n. alunos

Ensino Fundamental 16 439 10 271

Ensino Médio 8 206 6 130

EJA 6 206

Total 30 851 16 401

PERFIL DOS JOVENS PARTICIPANTES DA PESQUISA

Consciente da importância dos jovens alunos participantes desta


pesquisa, enquanto figura central para se entender de que forma ocorre
o desenvolvimento do pensamento histórico, torna-se fundamental en-
tender quem são estes jovens e quais são suas ideias prévias sobre o
tema tratado - Fascismo italiano.
76 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

O conceito de juventude aqui utilizado, busca ir além do aspecto


meramente geracional, no qual ser jovem se resume a uma “mera cate-
goria etaria que posee, sin distinciones, características uniformes”
(MARGULIS; URRESTI, 1996, p. 14). Para Bourdieu (1978, p. 1), “as classi-
ficações por idade (más também por sexo, ou, é claro, por classe...)
acabam sempre por impor limites e produzir uma ordem onde cada um
deve se manter em relação à qual cada um deve se manter em seu lugar”.
Margulis e Urresti (1996, p.16) declaram que,

Ser joven, por lo tanto, no depende sólo de la edad como característica bio-
lógica, como condición del cuerpo. Tampoco depende solamente del sector
social a que se pertenece, con la consiguiente posibilidad de acceder de ma-
nera diferencial a una moratoria, a una condición de privilegio. Hay que
considerar también el hecho generacional: la circunstancia cultural que
emana de ser socializado con códigos diferentes, de incorporar nuevos mo-
dos de percibir y de apreciar, de ser competente en nuevos hábitos y
destrezas, elementos que distancian a los recién llegados del mundo de las
generaciones más antiguas.

A juventude aqui é entendida enquanto um grupo que compartilha


de uma mesma estrutura de significados própria do seu contexto sócio
histórico. Em consonância com Pais, os jovens podem ser definidos
como “uma fatia de coetâneos movendo-se através do tempo, cada um
deles com a sua própria experiência de vida, influenciada por circuns-
tâncias históricas e sociais específicas” (PAIS, 2003, p.71).
Todos os jovens participantes desta pesquisa se encontravam, no
momento da recolta dos dados, no Ensino Médio. Da Escola A participa-
ram alunos do 2º e 3º ano e da Escola B alunos do 1º e 3º ano, todos
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 77

estudavam no período da manhã. Estas turmas foram selecionadas, pri-


meiramente, porque o critério de seleção previa que as turmas no
decorrer de sua trajetória escolar já tivessem estudado o tema fascismo
italiano e, não menos importante, porque os professores destas turmas
aceitaram disponibilizar suas aulas para realização desta pesquisa.
O estudo exploratório pode contar com a participação de 81 alunos.
A maioria dos participantes tinha, naquele momento, entre 14 e 17 anos
(87,8%). Na Escola A a faixa etária predominante era de dezesseis a de-
zessete anos (67,6%) e na Escola B as faixas etárias que mais
concentraram número de participantes foi a de quatorze anos e dezes-
sete anos com 31,1% e 24,5% respectivamente. Com relação a idade foi
possível observar que 10,8% dos alunos da Escola A, encontravam-se em
defasagem 17 em relação a idade- série que cursavam no momento. En-
quanto todos os alunos das turmas participantes da Escola B se
encontravam em conformidade com idade recomendada pelo INEP (Ins-
tituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). A
percentual maior de alunos “defasados” na Escola A pode ser atribuída
ao fato que umas das series era uma turma B. Nas escolas tem-se ainda
o hábito de separar os alunos mais bem-sucedidos (em relação as notas)
e com idade prevista para cursar a serie em “turmas A”, sendo as turmas
B, C e assim por diante destinadas aos alunos considerados mais

17 O cálculo da Taxa de Distorção Idade-Série é calculada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira – INEP. Este indicador permite calcular o percentual de alunos, em cada série,
com idade superior à idade recomendada (2 anos a mais da idade ideal). Fonte:
<http://dados.gov.br/dataset/taxas-de-distorcao-idade-serie-escolar-na-educacao-basica> Acesso em 12 de
maio de 2016. Cf. BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira. Taxa de Distorção Idade-Série, por Escola – 2014. Disponível em
http://portal.inep.gov.br/indicadoreseducacionais>. Acesso em 12 de maio de 2016.)
78 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

problemáticos do ponte de vista disciplinar e da aprendizagem. Obser-


vou-se também que na escola A havia uma leve predominância de
alunos do sexo feminino (54,05%), enquanto na Escola B o número de
alunos de sexo masculino (55,5%) era maior.

Tabela 3
Distribuição dos alunos conforme sexo e idade

idade Escola A Escola B

anos fem. masc. total fem. masc. total

14 0 0 3 9 12

15 1 2 3 7 4 11

16 7 8 15 4 5 9

17 6 4 10 4 7 11

18 1 2 3 1 0 1

19 3 0 3 0 0 0

20 2 0 2 0 0 0

21 1 1 0 0 0

total 20 17 37 19 25 44

Conforme a Tabela 4 alguns alunos já estabeleceram relações com


o mundo do trabalho, mesmo que as quatro turmas participantes sejam
do turno matutino cerca de 25,92% trabalham. Na Escola A 8 alunos
(21,63%) trabalham e na Escola B 13 alunos (29,54%) trabalham. Interes-
sante notar que 5 entre os alunos que trabalham da Escola B declararam
participar do Programa de Iniciação Científica Junior (ICJ) 18.

18 O Programa de Iniciação Científica Junior tem por objetivo desenvolver projetos de educação cientifica com
alunos do Ensino Médio. Para mais informações ver: < http://cnpq.br/ic-jr/faps>.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 79

Tabela 4
Distribuição dos alunos que exercem atividade remunerada

Escola A Escola B

Nunca trabalhou 23 62,16% 27 61,36%

Trabalha 8 21,63% 13 29,54%

Desempregado 6 16,21% 4 9,10%

total 37 100,00% 44 100,00%

Na Escola A a maioria dos jovens alunos participantes ainda viviam


com a família de origem (72,23%), composta por pai, mãe e irmãos e em
alguns casos tios e avós. Cerca de 19,44% dos alunos moravam somente
com a mãe e apenas um declarou habitar com o pai. Duas alunas se de-
clararam casadas, formalmente ou não, e viviam com seus respectivos
maridos em um núcleo independente da família de origem. A mesma
tendência foi observada na Escola B, a maioria dos alunos viviam com
os pais, sendo a parcela que vive somente com a mãe maior daquela que
vive apenas com o pai. Uma aluna da Escola B declarou morar sozinha,
esta aluna é originária de Laranjeiras do Sul, uma cidade de pequeno
porte nas proximidades de Guarapuava.

Tabela 5
Distribuição dos alunos conforme núcleo doméstico

unidade de moradia Escola A Escola B

Mãe e pai 26 72,23% 31 70,45%

Pai 0 0 1 2,28%

Mãe 7 19,44% 10 22,73%

Sem os pais 1 2,77% 1 2,27%

Marido/convivente 2 5,56% 0 0

Sozinho 0 0 1 2,27%

total 36 100,00% 44 100,00%


80 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Quanto ao quesito escolaridade dos pais a amostragem da escola A


mostrou uma ascensão dos alunos em respeito aos progenitores. Mais
da metade dos alunos da Escola A estava prestes a ultrapassar o nível de
escolaridade dos pais: 26 pais (70,27%) e 26 mães (70,27%) não havia con-
cluído o Ensino Médio. Na escola B ocorreu o inverso: 28 pais (65,1%) e
24 mães (55,8%) não só havia concluído o Ensino Médio como também 15
dentre eles possuíam diploma de graduação e alguns de pós-graduação.

Tabela 6
Distribuição dos alunos conforme níveis de escolaridade do pai e da mãe

Escola A Escola B
nível de escolaridade
pai mãe pai mãe

Não frequentou a escola 1 1

Até a 4ª série (5º ano) 19 19 7 6

Até a 8ª série (9º ano) 1 3 5 7

Ensino Médio incompleto 5 3 3 4

Ensino Médio completo 10 8 17 11

Superior incompleto 3 6

Superior completo 4

Pós- graduação incompleta 1

Pós- graduação completa 1 2 3 5

Mestrado incompleto

Mestrado completo 1

Doutorado incompleto

Doutorado completo 1

Não respondeu 1 1 3

total 37 37 44 44
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 81

Outra disparidade percebida foi com relação a renda familiar, na


Escola A a maior parte dos alunos pertencem a classe D 19, também de-
nominada classe média-baixa, 40,5% das famílias tem renda mensal
entre um a três salários mínimos. Para onze alunos (29,73%) desta escola
a renda familiar é até um salário mínimo. Já na Escola B a renda mensal
das famílias foi superior quando comparada à Escola A. Metade das fa-
mílias participantes se encontram na Classe C ou classe média, 50% das
famílias tem renda mensal entre três a oito salários. Apenas 5 alunos
(11,36%) declararam que a renda familiar é até um salário mínimo.
Quando interrogados sobre a possibilidade de prosseguirem os es-
tudos após a conclusão do Ensino Médio seis alunos (16,22%) da Escola
A responderam negativamente, enquanto na Escola B apenas 2 alunos
(4,55%) declaram não terem intenção de ingressar em nenhuma insti-
tuição de Ensino Superior. De forma geral, o número de alunos que não
pretendem continuar os estudos é pequeno, no entanto, essa diferença
parece fazer eco as afirmações sobre o impacto que a renda familiar e a
baixa escolaridade dos pais têm sobre a vida escolar dos alunos. Certa-
mente, os fatores que levam à interrupção dos estudos não se
circunscrevem apenas em aspectos materiais, entretanto são condicio-
nantes que devem ser levados em consideração.

19 Em 2015 o salário mínimo era R$ 788,00 reais. O critério utilizado para a classificação econômica das
famílias obedeceu aos critérios do IBGE 2015, baseado no número de salários mínimos.
82 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Tabela 7
Distribuição dos alunos conforme renda familiar
renda familiar Escola A Escola B

Até um salário mínimo 11 29,73% 5 11,36%

De 1 a 3 salários 15 40,54% 15 34,09%

De 3 a 8 salários 10 27,03% 21 47,73%

De 8 a 12 salários 1 2,27%

De 12 a 15 salários

Mais de 15 salários 1 2,27%

Não respondeu 1 2,70% 1 2,27%

total 37 100% 44 100,00%

Tabela 8
Distribuição dos alunos conforme intenção de prosseguir os estudos
Escola A Escola B

Pretende prosseguir 31 83,78% 42 95,45%

Não pretende prosseguir 6 16,22% 2 4,55%

Não respondeu 0 0,00% 0 0,00%

total 37 100,00% 44 100,00%

No que diz respeito a relação que os alunos têm com os livros, além
daqueles didáticos, pode-se afirmar que 75% dos participantes declara-
ram ler livros por lazer e não por motivos ligados a escola. Entretanto
quando analisamos as escolas separadamente notamos algumas dife-
renças, por exemplo, a quantidade de alunos que não leem nem mesmo
um livro durante o ano é maior na Escola A (29,73% - Escola B 20,45%).
O número de leitores continua maior na Escola B no que diz respeito ao
quesito quantidade de livros lido em um ano. Segundo a tabela abaixo
43,18% dos alunos da escola B declararam ler mais de três livros em um
ano, enquanto na Escola A a percentual desce para 24,32%.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 83

Tabela 9
Distribuição dos alunos conforme quantidade de livros lidos em um ano

Escola A Escola B

Nenhum 11 29,73% 9 20,45%

1 livro 8 21,62% 6 13,64%

De 1 a 3 livros 8 21,62% 10 22,73%

De 3 a 5 livros 8 21,62% 8 18,18%

Mais de 5 livros 1 2,70% 11 25,00%

Não respondeu 1 2,70% 0 0,00%

total 37 100,00% 44 100,00%

No que diz respeito a apropriação do tempo nas horas


vivenciadas para além dos muros da escola foi possível observar
algumas similitudes no comportamento dos participantes. A
Tabela 10 mostra as atividades preferidas pelos alunos. Foram
dadas algumas opções de atividades recreativas e foi pedido que
eles respondessem com que frequência realizavam as dadas
atividades (sempre, às vezes, quase nunca, nunca) 20. As três
atividades mais frequentes entre os alunos da Escola A foi:
navegar pela internet, em segundo lugar ouvir música e em
terceira posição ver TV e praticar esportes. Na Escola B as
respostas foram: navegar na internet, ouvir música e ver TV. De
forma geral, é possível afirmar que os alunos de ambas escolas
vivenciam o tempo fora da escola de maneira bastante similar.

20 Foram calculadas as atividades declaradas como realizadas sempre pelos alunos.


84 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Tabela 10
Distribuição dos alunos conforme atividades recreativas

atividades Escola A Escola B

Internet 27 36

Música 24 31

Esportes 8 16

TV 18 14

Sair com os amigos 11 12

Igreja 17 10

Centro Comercial 4 9

Parque 1 1

Livro 1 9

Balada 4 1

Cinema 1 1

Ler jornais e revistas 0 1

Museu 0 0

As Tabelas 11 e 12 retratam a quantidade de tempo que os alunos


dedicam a navegar na internet e a assistir televisão. Quase metade dos
alunos da Escola A (40,5%) respondeu que passa mais de cinco horas na
internet, enquanto o número de horas passado na frente da televisão
diminuiu, apenas 24,3% dos alunos declararam ver televisão por mais de
cinco horas. O tempo dedicado na frente da televisão para a maioria dos
alunos da Escola A é em média menos de três horas por dia, segundo
62,16% dos participantes. Na Escola B observou-se a mesma tendência,
sendo a diferença entre horas dedicadas à internet em detrimento da
televisão ainda maior. Mais da metade dos alunos da Escola B, cerca
59,09%, passam mais de cinco horas navegando na internet, enquanto
aqueles que veem televisão por mais de cinco horas são apenas 9,09%.
Segundo 70,46% dos alunos da Escola B, o tempo passado vendo
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 85

televisão é menos de três horas por dia. E três alunos declararam não
ver televisão.

Tabela 11
Distribuição dos alunos conforme tempo passado com TV e internet

Escola A

TV internet

Não assiste/navega 1 2,70%

Menos de 1 hora 8 21,62% 5 13,51%

De 1 a 3 horas 15 40,54% 7 18,92%

De 3 a 5 horas 5 13,51% 9 24,32%

Mais de 5 horas 9 24,32% 15 40,54%

Não respondeu 0 0,00% 0 0,00%

total 100,00% 37 100,00%

Tabela 12
Distribuição dos alunos conforme tempo passado com TV e internet

Escola B

TV internet

Não assiste/navega 3 6,82%

Menos de 1 hora 14 31,82% 2 4,55%

De 1 a 3 horas 17 38,64% 6 13,64%

De 3 a 5 horas 5 11,36% 8 18,18%

Mais de 5 horas 4 9,09% 26 59,09%

Não respondeu 1 2,27% 2 4,55%

total 100,00% 44 100,00%

As Tabela 13 e 14 ilustram de que forma eles passam o tempo vendo


televisão e navegando na internet. As tabelas retratam apenas as opções
86 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

assinaladas como as mais vistas 21, o aluno podia escolher mais de uma
opção. Em alguns pontos, nota-se uma certa similitude de hábitos entre
os alunos das escolas participantes, como quando declararam que o pro-
grama mais visto são filmes e seriados (Escola A 43,24% - Escola B
45,45%). Programas musicais também obtiveram percentual parecida
entre as duas escolas com 21,62% de preferência na Escola A e 22,73% na
Escola B. Contabilizou-se um percentual bastante parecida também no
que diz respeito a frequência em assistir os Reality Show cerca de 6,82%
dos alunos da Escola B e 5,41% da Escola A. A maior diferença foi obser-
vada com relação a preferência em assistir novelas (Escola A 32,43 % -
Escola B 4,55%) e jornais (Escola A 8,11% - Escola B 0) pelos alunos da
escola A.

Tabela 13
Distribuição dos alunos conforme programas de TV preferidos

programa Escola A Escola B

Filmes e séries 16 43,24% 20 45,45%

Esportes 4 10,81% 7 15,91%

Jornais 3 8,11% 0 0,00%

Música 8 21,62% 10 22,73%

Novelas 12 32,43% 2 4,55%

Programa de auditório 1 2,70% 1 2,27%

Reality Show 2 5,41% 3 6,82%

Notícias sobre artistas 2 5,41% 0 0,00%

Jornais que abordam crimes violentos 2 5,41% 2 4,55%

Culinária 1 2,70% 1 2,27%

Religião 1 2,70% 0 0,00%

Programa político 0 0,00% 0 0,00%

21Esta escolha é devida ao fato que muitos alunos deixaram em branco algumas opções quando se pedia para
responder em uma escala de l a 5, sendo 5 para os programas mais visto e 1 para os programas que eles não
assistiam. É provável que eles tenham deixado em branco os programas que não assistiam, portanto se
escolheu trabalhar apenas com os programas que obtiveram nota 5.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 87

Como visto acima, os jovens passam bastante tempo navegando


pela internet, a próxima Tabela mostra quais são os usos que eles fazem
desta ferramenta. Observou-se que os alunos de ambas instituições ele-
geram as redes sociais como o principal interesse durante a navegação
(Escola A 64,86% - Escola B 63,64%). Mas este foi o único ponto em co-
mum, por exemplo, os alunos da Escola B (25%) se mostraram mais
interessados aos jogos online do que os alunos da Escola A (8,11%). No-
tou-se também que os alunos da Escola A parecem ser mais ecléticos em
respeito aos alunos da Escola B, estes parecem se concentrarem durante
seu tempo on line principalmente em páginas de redes sociais e jogos,
enquanto os alunos da Escola A usam mais a internet para pesquisas
escolares (Escola A 16,22% - Escola B 2,27%) e em sites de notícias (Escola
A 8,11% - Escola B 2,27%).

Tabela 14
Distribuição dos alunos conforme sites preferidos

sites Escola A Escola B

Redes sociais 24 64,86% 28 63,64%

Jogos 3 8,11% 11 25,00%

Pesquisa para escola 6 16,22% 1 2,27%

Notícias em geral 3 8,11% 1 2,27%

Pesquisas culturais 1 2,70% 2 4,55%

No que se relaciona aos ritmos musicais preferidos pelos jovens


participantes foi possível traçar paralelos. A Tabela 15 aponta que os
alunos de ambas escolas têm certa predileção pela música sertaneja (Es-
cola A 37,84% - Escola B 38,64%) e eletrônica (Escola A 13,51% - Escola B
18,18%). Os ritmos menos apreciados pelos alunos foram o Samba, a
88 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

MPB, o Forró e o Axé, nenhum desses ritmos foram assinalados como


preferência musical. Outros ritmos, também apontados, obtiveram
pontuação parecida em ambas as escolas como por exemplo o Funk (Es-
cola A 8,11% - Escola B 9,09%), a música Gaúcha (Escola A 8,11% - Escola
B 9,09%). Diferenças substanciais foram observadas no que diz respeito
ao Pop, ritmo apreciado na Escola B com 11,36% das preferências, en-
quanto na Escola A não foi apontado por nenhum aluno. O mesmo
ocorreu com a música Gospel, na Escola A este ritmo obteve 8,11% en-
quanto na Escola B não foi mencionado por ninguém.

Tabela 15
Distribuição dos alunos conforme ritmos musicais preferidos

ritmos Escola A Escola B

Sertanejo 14 37,84% 17 38,64%

Rock 4 10,81% 12 27,27%

Tecno- eletrônica 5 13,51% 8 18,18%

Pop 0 0,00% 5 11,36%

Gaúcha 3 8,11% 4 9,09%

Funk 3 8,11% 4 9,09%

Rap 5 13,51% 4 9,09%

Pagode 1 2,70% 2 4,55%

Reggae 3 8,11% 2 4,55%

Samba 0 0,00% 0 0,00%

Forró 0 0,00% 0 0,00%

MPB 0 0,00% 0 0,00%

Axé 0 0,00% 0 0,00%

Gospel 3 8,11% 0 0,00%


Ana Paula Rodrigues Carvalho • 89

COMPARAÇÃO ENTRE OS ALUNOS DA ESCOLA A E DA ESCOLA B

Os resultados a que se chegou após a análise do questionário soci-


oeconômico e cultural permite entrever o perfil dos alunos
participantes desta pesquisa. A ideia de comparar os dados obtidos nas
escolas não tem por finalidade hierarquizar os resultados, mas apenas
fornecer uma análise das duas escolas separadamente. Com base nas
respostas dadas pelos jovens alunos da Escola A e B foi possível traçar
algumas similitudes e diferenças entre esses dois grupos e a partir des-
tes dados inferir algumas considerações iniciais.
Os alunos da Escola A em sua maioria vivem com núcleo familiar
de origem formado por pai, mãe e irmão. A renda familiar, assim como
o nível de escolaridade dos familiares dos alunos da Escola A é inferior
em comparação aos familiares dos alunos da Escola B. Observou-se
também que a distorção entre serie e idade é maior entre os alunos desta
escola. Quando interrogados sobre a possibilidade de prosseguir os es-
tudos 16,22% dos alunos responderam que não tem interesse em prestar
vestibular. A intenção de prosseguir os estudos foi inferior aos dos alu-
nos da Escola B.
Os alunos da Escola B também vivem com o núcleo familiar original
composto por pai, mãe e irmãos. As famílias destes alunos apresenta-
ram uma renda familiar e um nível de escolaridade superior em relação
às famílias da outra escola. A distorção idade serie foi menor, provavel-
mente porque as duas turmas participantes da pesquisam eram turmas
A. Por mais que seja possível apontar algumas variações entre a reali-
dade surgida nas respostas dos alunos das escolas não é razoável
90 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

afirmar que estamos trabalhando com jovens pertencentes a extremos


sociais. Tratam-se afinal de alunos que em sua maioria sempre estuda-
ram em escolas públicas e provenientes de famílias de classe média. No
entanto, as variações percebidas consentem propor algumas reflexões
acerca dos resultados recolhidos.
De acordo com a sociologia da educação proposta por Pierre Bour-
dieu, os alunos da escola A, no que concerne a renda familiar e o nível
de escolaridade dos pais, partiriam em desvantagem com respeito aos
alunos da Escola B. De fato, a sociologia da educação afirma que os alu-
nos herdam das suas famílias elementos essenciais, para o êxito escolar,
conforme os meios sociais que têm à disposição. Para Bourdieu (2007),
há uma relação entre o êxito escolar e a posição social da família, pois,
segundo o autor, o sistema de ensino tende a garantir a reprodução da
estrutura das relações de classe.
Esta reprodução ocorre no sistema de ensino porque a cultura es-
colar valoriza a cultura dos grupos sociais dominantes e demanda de
todos os alunos o conhecimento desta. Neste sentido, a escola, sob uma
roupagem democrática, reivindica um tratamento igualitário de todos
os alunos, sem levar em consideração a disparidade entre os alu-
nos/herdeiros de famílias dotadas de capital cultural e os alunos de
famílias mais populares. Desta forma, a escola “enmascara su natura-
leza social y la presenta como la cultura objetiva, indiscutible,
rechazando al mismo tiempo las culturas de los otros grupos sociales.
La escuela, legitima de tal manera la arbitrariedade cultural”
(BOURDIEU; PASSERON, 1996, p.18).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 91

Um conceito importante para entender a contribuição da escola na


reprodução da estrutura social é o conceito de capital cultural. O capital
cultural que a família dispõe “indica acesso a conhecimento e informa-
ções ligadas a uma cultura específica; aquela que é considerada como a
mais legítima ou superior pela sociedade como um todo” (SILVA, 1995,
p.27). O capital cultural principalmente em seu aspecto incorporado
ocorre no ambiente familiar de forma implícita e acarreta vantagens
entre os beneficiários.
De acordo com Bourdieu e Passeron:

La reproducción de las relaciones de clase, en realidad, es también el resul-


tado de una acción pedagógica que no parte de una tabula rasa, sino que se
ejerce sobre sujetos que recibieron de su familia o de las acciones pedagó-
gicas precedentes (es decir, de la llamada «educación primera») por un lado
cierto capital cultural y por el otro un conjunto |te posturas con respecto a
la cultura. Cada acción pedagógica tiene, pues, una eficacia diferenciada en
función de las diferentes caracterizaciones culturales preexistentes de los
sujetos y que son de naturaleza social (BOURDIEU; PASSERON, 1996, p.17).

A escola ao desconsiderar essas diferenças acaba por prejudicar os


alunos originários de famílias pouco escolarizadas ao cobrar destes um
conhecimento que não puderam herdar. A bagagem cultural de alunos
provenientes de ambientes sociais desiguais inviabiliza uma aprendiza-
gem uniforme. O fato que um determinado capital cultural é legitimado
e elevado em detrimento de outro comporta a exclusão ou fracasso es-
colar dos sujeitos privados dos instrumentos decodificadores dos bens
culturais que devem ser apreendidos. Bourdieu mostra como:
92 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

El éxito de toda educación escolar, y en general de todo TP secundario de-


pende fundamentalmente de la educación primera que la ha precedido,
incluso y sobre todo cuando la Escuela no tiene en cuenta esta prioridade
en su ideología y en su práctica y hace de la historia escolar una historia sin
prehistoria (BOURDIEU; PASSERON, 1996, p.84).

Como visto, o capital cultural herdado pela criança há um peso


enorme sobre o desempenho escolar. Entre outros motivos, porque os
pais com um nível de escolaridade alto tenderiam a reconhecer a im-
portância da escola e a incentivar um bom desempenho dos próprios
filhos, além de estarem dispostos e qualificados para ajudarem nas ta-
refas de casa. Sob este ponto de vista, as respostas dos alunos da Escola
B inicialmente confirmam estas suposições quando se analisa o hábito
de leitura e o número de alunos que pretendem prosseguir os estudos.
É importante, no entanto ressaltar como a herança cultural não
segue uma trajetória automática, vários fatores incidem nas formas de
transmissão e nas maneiras como ela é percebida pelos herdeiros. Fran-
çois Singly demonstra como “os herdeiros não estão às ordens, não têm
de dar continuidade à sequência das relações culturais de seus pais sem
contestar; eles podem inovar” (SINGLY, 2009, p.26). Para Singly (2009),
o testamento seria uma negociação entre pai e filho, sujeito ativo, e não
apenas herdeiro passivo de uma herança cultural privilegiada.
Os fatores sociais, culturais, simbólicos, ou econômicos herdados
da família influenciam de forma decisiva no êxito escolar, no entanto
não devem ser considerados determinantes. De acordo com Bourdieu,
não se deve “chegar ao exagero de certos estruturalistas que transfor-
mam agentes em meros "suportes" de estruturas investidas com o
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 93

poder” (BOURDIEU, 2007, p.296). Desta forma, mais que uma determi-
nante a herança familiar é considerada uma condicionante importante
na vida dos estudantes.
Segundo Bernard Lahire (1997), são vários os fatores responsáveis
pelo sucesso escolar dos jovens. Em sua obra Sucesso escolar nos meios
populares: as razões do improvável, o autor busca analisar de que forma a
configuração familiar tem consequências para o bom êxito ou fracasso
escolar dos filhos. Entre os elementos apontados como condicionantes
o autor cita as condições socioeconômicas das famílias, sua relação com
a cultura escrita e os investimentos pedagógicos realizados. Lahire de-
mostra que não se trata de isolar fatores, mas pensar a dinâmica de cada
configuração familiar específica. O autor assevera:

A presença objetiva de um capital cultural familiar só tem sentido se esse


capital cultural for colocado em condições que tornem possível sua "trans-
missão". (...) E por essa razão que, com capital cultural equivalente, dois
contextos familiares podem produzir situações escolares muito diferentes
na medida em que o rendimento escolar desses capitais culturais depende
muito das configurações familiares de conjunto. Podemos dizer, lembrando
uma frase célebre, que a herança cultural nem sempre chega a encontrar as
condições adequadas para que o herdeiro herde (LAHIRE, 1997, p.338).

Cada família mobiliza de forma diferente seu capital cultural, não


basta possuí-lo é necessário mobilizá-lo de forma a garantir sua trans-
missão. Conforme Lahire, as dinâmicas familiares são fundamentais
para o êxito escolar seja na transmissão do capital cultural ou no caso
de famílias pouco dotadas de capital cultural para incentivar um bom
desempenho escolar dos filhos.
94 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Apesar das diferenças socioeconômicas apontadas os alunos reve-


laram muitas similitudes quanto a gosto musical e formas de
passatempo. Como já mencionado acima trata-se de um grupo que com-
partilha de uma mesma estrutura de significados própria do seu
contexto sócio histórico. Essas semelhanças, portanto, decorrem do fato
deles participarem de uma mesma cultura juvenil. O uso do termo cul-
tura juvenil é feita em um sentido lato, não se trata de uma cultura
homogênea e única. Segundo Pais, por cultura juvenil “pode entender-
se o sistema de valores socialmente dominantes atribuídos à juventude
(tomada como conjunto referido a uma fase da vida), isto é, valores a
que aderirão jovens de diferentes meios e condições sociais” (PAIS, 1990,
p.163). Considerando sempre que a apropriação desses valores será feita
de acordo com os meios sociais de cada um.

MAPEAMENTO DAS IDEIAS PRÉVIAS DOS ALUNOS: INSTRUMENTO DE


PESQUISA E CATEGORIZAÇÃO

O segundo instrumento de pesquisa utilizado teve por objetivo fa-


zer emergir das narrativas dos alunos o que sabem sobre o conceito
substantivo “fascismo”; quais os seus posicionamentos acerca dos meios
de comunicação; como definem a disciplina de história e o processo de
construção do saber histórico. As análises destes dados, posterior-
mente, irão auxiliar a elaboração do questionário Piloto e Principal
acerca do conceito de empatia histórica. O questionário das ideias pré-
vias era composto por dez questões. Duas delas eram de caráter objetivo
e as demais de caráter aberto. As questões feitas foram as seguintes:
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 95

1) Qual é a tua disciplina preferida?


2) Você gosta de estudar História?
3) O que é História para você?
4) Qual a primeira palavra que vem à sua cabeça quando você ouve a palavra Fascismo?
5) O que você se lembra sobre o Fascismo?
6) As pessoas que viveram durante o regime fascista apoiaram este tipo de governo? Por que?
7) Quando desejo me informar sobre alguma notícia eu ......
8) Os meios de comunicação atuais (jornais, TV, internet, whatsapp, e outros) são neutros e objetivos? Por que?
9) Os jornais durante o Fascismo eram neutros e imparciais? Por que?
10) Como o historiador escreve a História?

Após a leitura e análise qualitativa das informações obtidas nas


respostas dos alunos, procedeu-se a categorização das ideias expostas.
Na codificação dos dados o foco foram os elementos mais frequente-
mente encontrados nas respostas. Posteriormente, as respostas foram
agrupadas de acordo os níveis de sofisticação apresentado. Buscou-se
categorizar as ideias dos alunos em níveis de progressão partindo do
mais simples ao mais elaborado. Em um segundo momento, realizou-se
uma análise quantitativa descritiva simples com base nos níveis de pro-
gressão apresentado pelos alunos das duas escolas participantes.
96 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

QUESTÃO NÚMERO 1

Na questão 1, os alunos da Escola A responderam sobre qual é a


disciplina escolar preferida por eles. As disciplinas que se posicionarem
entre as três primeiras foram: Educação Física, Biologia e Matemática,
nesta ordem. História não foi elegida como matéria favorita por ne-
nhum dos alunos desta escola. Dois alunos não responderam essa
questão.

Figura 1- Gráfico sobre distribuição dos alunos conforme disciplina preferida


Ana Paula Rodrigues Carvalho • 97

Os alunos da Escola B elegeram como matérias escolares preferidas


as seguintes disciplinas: Educação física, Matemática, Biologia e Quí-
mica. História foi apontada como matéria preferida por 4 alunos. Um
aluno não respondeu esta questão.

Figura 2 Gráfico sobre distribuição dos alunos conforme disciplina preferida

QUESTÃO NÚMERO 2

Na questão 2, os alunos responderam se gostavam da disciplina de


história. Na Escola A, a maioria dos alunos revelou uma atitude positiva,
sendo que 18 (51%) destes declararam que “provavelmente sim”, gostam
da matéria. Apenas 9 alunos demonstraram rejeição à disciplina, entre
estes 3 afirmaram categoricamente não gostar de história. Na Escola B,
mais da metade dos alunos (77%) afirmaram gostar de história. Entre
98 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

estes 32% afirmaram que “definitivamente sim” gostavam da matéria.


Seis alunos se declaram indecisos e três responderam que, definitiva-
mente, não gostavam de história.
De acordo com Isabel Solé (1998), o gosto por uma disciplina deve
ser considerado como fator motivacional importante na dinâmica do
processo de aprendizagem dos alunos. Gostar de uma disciplina implica
em atitudes de comprometimento, de curiosidade, de interesse; todas
condutas que colaboram para uma aprendizagem mais significativa. Os
fatores que motivam um aluno a gostar ou não de uma disciplina são
vários. Entre eles, é possível mencionar que uma matéria escolar se
torna fonte de interesse quando o aluno é capaz de ligar tal conheci-
mento com suas próprias necessidades.
Segundo Luis Fernando Cerri, um dos fatores que provoca a rejei-
ção e desinteresse pela disciplina de história se deve a “um confronto de
concepções muito distintas sobre o tempo histórico tal como aparece na
narrativa de caráter quase biográfico das nações e da humanidade”
(CERRI, 2011, p.17). A diferença entre a história ensinada e a história vi-
vida e transmitida de geração em geração faz com que a história não
seja percebida como relevante ou significativa para as tomadas de deci-
são da vida prática. Fazer com que o ensino de história seja considerado
“pelos jovens como significativo em termos pessoais, de modo a lhes
proporcionar uma compreensão mais profunda da vida humana” se pre-
figura como meta principal da educação histórica (SCHMIDT et al., 2010,
p.11). Segundo os autores, a história se encontra enraizada às necessi-
dades sociais e é uma ferramenta importante para uma orientação
fundamentada no tempo. Entender as implicações para a vida prática
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 99

da disciplina de história seria, portanto, uma das formas de motivar a


aprendizagem histórica.

Figura 3 Gráfico sobre distribuição dos alunos da Escola A conforme gosto pela disciplina de história

Figura 4 Gráfico sobre distribuição dos alunos da Escola B conforme gosto pela disciplina de história
100 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

QUESTÃO NÚMERO 3

Na questão 3, os alunos definiram o que é história. De acordo com


as respostas dadas foram desenvolvidas quatro categorias com base nos
níveis de progressão das ideias dos alunos: Nível 1 - Sem condições de
categorização (SCC), Nível 2 - História tradicional, Nível 3 - História to-
tal e Nível 4 - História passado/presente/futuro. Cada categoria
analítica e os seus respectivos subgrupos seguem explanados abaixo.

NÍVEL 1- SEM CONDIÇÕES DE CATEGORIZAÇÃO

Neste nível encontram-se as narrativas nas quais o núcleo central


da resposta pode ser compreendido, mas pela forma como foi redigida
e por falta de mais elementos não foi possível inseri-las em outras ca-
tegorias. Como se pode notar das narrativas de Adriana 22, 3º ano, Escola
A e João, 1º ano, Escola B.

- É a descoberta dos historiadores que tiveram que obter para entende-la. (Adriana, 3º ano, Escola A)

- O registro do tempo. (João ,1º ano, Escola B)

22 Para preservar a identidade dos alunos participantes os nomes utilizados são fictícios.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 101

NÍVEL 2 – HISTÓRIA TRADICIONAL

Neste nível de progressão observou-se que a história é concebida


como disciplina que se ocupa de fatos já ocorridos. A tônica das respos-
tas recai sobre o passado pelo passado, pois se valoriza este como
especificidade da história. Um passado sem relação com o presente ou
com o futuro. Na concepção destes alunos a história seria um grande
catálogo de acontecimentos que narrariam os fatos mais importantes
de cada época, desde suas origens. Entre os acontecimentos dignos de
serem contados percebeu-se uma tendência em se destacar os aconte-
cimentos de cunho político. O passado é percebido como estático e
cumulativo, conforme for passando o tempo, mais história existirá. O pas-
sado também é visto como exótico, praticamente um novo mundo. Essa
diversidade o mantém relegado ao passado e desvinculado de sentido
para o presente ou futuro. Porém, mesmo que não tenha muito a dizer
sobre o presente, ele carrega consigo uma carga de fascinação que o
torna interessante.
102 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

- É um meio de saber como tudo começou, a história do país, as crises que ocorreu durante os tempos e etc.
(Matilde, 3º ano, Escola A)

- Para mim é um descobrir praticamente um novo mundo, por mais que esses fato ja tenham ocorrido, eles me
fascinam muito. (Francisco, 2º ano, Escola A)

- É a ciência que estuda os tempos passados, praticamente tudo que já aconteceu, desde a origem das coisas
até os seus desenvolvimentos, história é algo que sempre vai existir, conforme for passando o tempo, mais
história existirá. (Íris, 3º ano, Escola B)

- Que estuda o passado, os fatos importantes de antigamente. (Beatriz, 1ºano, Escola B)

- É uma disciplina que estuda fatos acontecimentos que marcaram determinada época, em algum lugar.
Estuda também a formação das cidades e a política. (Hugo, 3ºano, Escola B)

Dentro deste nível de categorização encontra-se um outro sub-


grupo. A tônica permanece na história como disciplina que se ocupa do
passado, porém para estes alunos o passado é prenhe de lições para o
presente e até mesmo futuro. Os conteúdos advindos da experiência
carregariam em seu bojo regras gerais capazes de orientar ações con-
cretas hoje. Como assevera Rüsen, dentro desta perspectiva a história é
concebida

a partir dos inúmeros acontecimentos do passado que transmite, regras ge-


rais do agir. A memória histórica volta-se para os conteúdos da experiência
do passado que representam, como casos concretos de mudanças no tempo
(no mais das vezes por causadas ações intencionais), regras ou princípios
tomados como válidos para toda mudança no tempo e para o agir humano
que nela ocorre (RÜSEN, 2010, p.51).

Esta definição de passado em que a relação passado, presente e fu-


turo é mecânica, foi inserida no nível 1, porque na concepção destes
alunos não se verificou uma ideia de ruptura ou permanências entre
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 103

passado/presente. A concepção de tempo remete a uma ideia de tempo


cíclico, a algo que está sendo desenvolvido novamente. Reinhart Koselleck,
em sua obra Futuro passado, declara que esta concepção de história “re-
mete a uma possibilidade ininterrupta de compreensão prévia das
possibilidades humanas em um continuum histórico de validade geral”
(KOSELLECK, 2006, p.43).
Conforme Hartog (2003), a partir desta perspectiva a história esta-
ria fadada a repetir-se e conhecer o passado seria uma maneira de estar
preparado para as eventualidades futuras. A história estuda o passado,
um passado que retorna ao presente e regula o futuro.

- Aquilo que se passou e esta sendo desenvolvido novamente. (Jorge, 2º ano, Escola A)
- É passado aproveitar nos ensinar. 23 (Lorena, 2ºano, Escola A)

Um terceiro subgrupo foi identificado nesta categoria analítica. A


ênfase permanece na história como uma disciplina que se ocupa de fatos
importantes do passado. A história se ocuparia do estudo das antigui-
dades, da pré-história, de guerras e de outras datas mais importantes. À
diferença das outras narrativas apresentadas, neste subgrupo os alunos
mencionam o uso de fontes para a construção deste passado. A concep-
ção de fonte apresentada, no entanto, é limitada. Nota-se que a história
não deve ser escrita com qualquer tipo de fontes: estas devem ser

23 Em um primeiro momento, a narrativa desta aluna foi inserida no nível 1, mas após conversar com a
intérprete de libras da sala ficou claro que a forma como os alunos com deficiência auditiva se expressam de
forma escrita é diferente dos alunos sem déficit auditivo. Segundo Sueli Fernandes, a flexão de tempo e pessoa
dos verbos, a ordem das palavras na oração, a concordância nominal ou verbal, entretanto, não correspondem
às regras da língua portuguesa. (FERNANDES, 2006, p.2). Portanto, esta frase foi inserida no segundo nível de
categorização. Ver também: SILVA, Marília da Piedade Marinho. A construção de sentidos na escrita do aluno
surdo. São Paulo: Plexus Editora, 2001.
104 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

verdadeiras, provas reais que comprovam veridicamente que aconteci-


mentos relevantes marcaram um determinado período.

- É o estudo da antiguidade que contém certas histórias com provas reais e algumas que podem ou não ser mito.
(Aline, 1º ano, Escola B)

- É a compreensão dos fatos que marcaram épocas e acontecimentos relevantes que comprovam veridicamente
a existência concreta de como se desenvolveu as formas de vida humana. (Edgar, 3º ano, Escola B)
- História é um conhecimento que estuda as datas mais importantes, períodos, fontes históricas, pré História,
as guerras mais importantes. (Yasmin, 1º ano, Escola B)

Figura 5 Variações dos subgrupos dentro do nível 2

NÍVEL 3 – HISTÓRIA TOTAL

As narrativas sobre a disciplina de história dos alunos inseridos


nesta categoria compartilham da convicção que a história tem como
principal função o estudo das ações humanas passadas. Neste caso, a
ênfase se encontra nos feitos dos homens ao longo do tempo. Os acon-
tecimentos narrados podem ser de grande ou pouca importância. Assim,
não somente aspectos de cunho político são considerados temas histó-
ricos. Na perspectiva destes alunos a história concentra seus esforços
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 105

em todos os âmbitos relacionados a vida do homem. Os temas tratados


pela história, portanto podem ser políticos, sociais, econômicos, cultu-
rais, militares. Enfim, na prática a história se ocupa de tudo aquilo que
os povos viveram antigamente.

- É o estudo de ações passadas, independentemente de ser de grande ou pouca importancia, ou até mesmo de
invenções. (Simão, 3º ano, Escola B)

- É a ciência que estuda os acontecimentos passados; desde como as pessoas viviam, como era a sociedade, a
política, a economia, os direitos, as guerras, cada povo e cada cultura diferente, etc. (Inês, 3º ano, Escola B)

- É tudo aquilo que os povos viveram antigamente. (Lara, 2ºano, Escola A)

Nesta categoria analítica emergiram também ideias sobre como a


história não se limitaria a estudar fatos passados, mas também atuais.
A história seria o estudo que se ocuparia de escrever a história dos acon-
tecimentos da vida desde o passado até os dias de hoje. A tónica
permanece centrada nas ações dos homens, mas a história não se limi-
taria a narrar somente acontecimentos do passado. A menção que se faz
ao presente neste grupo não pode ser considerada um avanço teórico
satisfatório. A história, assim como no nível anterior, aparece como um
grande catálogo de acontecimentos e nesta categoria o catálogo se es-
tende até a atualidade. Este nível apresenta uma perspectiva mais
sofisticada com respeito ao nível 2 por entender que a história é o es-
tudo do homem no tempo. Aqui todos os homens são sujeitos da história
e todos os aspectos da vida, desde o âmbito político ao cultural, são abar-
cados pela história.
106 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

- São fatos que ocorreram ou ocorre na humanidade, ou seja, é tudo onde um ser está incluído. (Clara, 1º ano,
Escola B)

- É a cultura de povos, tanto atuais como antigos. É onde se discute formas de governo, características de vida e
socializações. Pra mim isso é história. (Rute, 1º ano, Escola B)

- É a matéria que estuda os acontecimentos da vida, estuda o que aconteceu no passado e como foi o desenvolvimento
até os dias de hoje. (Alice, 3º ano, Escola A)

- É a ciência que estuda a história da vida da sociedade, do mundo. Coisa que aconteceu há milhares de anos atrás
até os dias de hoje. (Noa, 3º ano, Escola A)

Figura 6 Variações dos subgrupos dentro do nível 3

NÍVEL 4 – HISTÓRIA PASSADO PRESENTE- FUTURO

A concepção de história dos alunos que se enquadram neste nível


se caracteriza por perceber o elo entre o passado e presente. O passado
forma o presente, mas não no sentido de repetição e sim como processo
histórico dotado de rupturas e permanências visíveis no tempo pre-
sente. Não se trata de um passado estático e desvinculado das tramas
contemporâneas. Ao contrário, pode ser convocado a responder
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 107

interpelações do presente. O historiador se volta em direção ao passado,


com base nas fontes e referências passadas, em busca de respostas para
problemáticas do presente. Ou como exposto por Marta para entender as
transformações do homem de hoje.

- Entender as transformações do homem de hoje com base nas fontes e referências passadas. (Marta, 1º ano,
Escola B)

Observou-se ainda neste nível de progressão uma menção à relação


entre presente, passado e futuro. Segundo a narrativa exposta no qua-
dro abaixo, o objeto da história não se limitaria ao estudo de um passado
estático, cristalizado e sem nenhum tipo de vínculo ou relevância para
o presente. O passado consubstancia o presente e é capaz de engendrar
horizontes de expectativas. O referimento ao vínculo existente entre
passado e futuro indica uma noção do que é história mais elaborada. A
disciplina de história concebida de tal maneira adquire relevância vital
ao se tornar uma ferramenta importante de atuação consciente e autô-
noma para a vida prática do aluno. Para François Dosse (2003), conhecer
o passado proporciona uma ação eficaz sobre o presente.
Este subgrupo do nível 4 de explicação remete ao que Rüsen consi-
dera como uma constituição genética de tempo. Nesta tipologia o tempo
é visto de forma dinâmica como “abertura de perspectivas de futuro,
que vão qualitativamente além do horizonte do que se obteve até o mo-
mento” (RÜSEN, 2010, p.58). A experiência do passado é dinamizada no
presente e engendra novas possibilidades futuras. Como assevera Cerri,
as dimensões do tempo são tomadas de forma dinâmica “a vida é orien-
tada de acordo com as perspectivas de mudanças em suas próprias
108 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

relações e em direção ao futuro, pela possibilidade de exceder as opor-


tunidades que havia no passado” (CERRI, 2011, p.102-103). O ensino de
história ganha sentido ao propiciar a articulação entre saberes e ação. A
história não se limita a estudar o passado. Possibilita a compreensão do
vínculo significativo existente entre presente, passado e futuro de
forma a oferecer orientação para a vida prática fundamentada histori-
camente. Pois o agir “é um processo em que continuamente o passado é
interpretado à luz do presente e na expectativa do futuro, seja ele dis-
tante ou imediato” (CERRI, 2011, p.28-29).

- O estudo de fatos acontecidos no passado para descobrir a influencia deles no presente e no futuro. (Ernesto, 1º
ano, Escola B)

Figura 7 Variações dos subgrupos dentro do nível 4

QUESTÕES 4,5,6 E 9

As questões 4,5,6 e 9 investigam quais as ideias que os alunos têm


sobre o conceito substantivo “fascismo”. As respostas foram tratadas
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 109

conjuntamente por objetivar formar um esquema geral acerca daquilo


que os alunos entendem sobre fascismo, de modo a organizar o questi-
onário piloto de forma coerente com as respostas.
Na questão número 4 os alunos foram exortados a escrever uma
palavra que associavam ao fascismo. As repostas foram bastante varia-
das. Na Escola A quatro alunos (10,81%) relacionaram o fascismo ao
nazismo e a Hitler. A associação não está equivocada. De fato, o nazismo
alemão é considerado um movimento de cunho fascista. Três alunos
(8,11%) relacionaram o fascismo à disciplina de história – o que mostra
que provavelmente estes alunos consideram o tema restrito ao âmbito
escolar. Como já apontado acima, a distância entre a história ensinada
e a história vivida pelos alunos faz sim que o tema apareça sem impli-
cações para a vida prática. Cinco alunos (13,51%) se concentraram em
descrever as caraterísticas do governo como sendo ditatorial, autoritário
e nacionalista. Realmente o fascismo foi uma ditadura de cunho nacio-
nalista, no entanto seria mais correto defini-lo como totalitário. 24 De
qualquer forma, asserir que o fascismo é um regime autoritário não pa-
rece tão grave, visto que tais conceitos não são discutidos de forma
aprofundada em sala de aula.
Muitas vezes conceitos como autoritarismo e totalitarismos são
utilizados como adjetivos sem nenhuma preocupação em entender o de-
bate historiográfico que envolve o uso de tais termos. Apenas dois
alunos (5,41%) relacionaram o fascismo à Itália e Mussolini; sendo que

24 Ver PAXTON, O. Robert. A anatomia do fascismo. São Paulo: Paz e Terra, 2007. PAXTON, O. Robert. The Five
Stages of Fascism. The Journal of Modern History, V. 70, N. 1, 1998. MANN, Michael. Fascistas. Rio de Janeiro:
Record, 2008.
110 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

um aluno fez menção à palavra feixe, o que remete a ideia do movimento


como um grupo unido e forte. A palavra fascismo deriva da palavra ita-
liana fascio, que significa feixe ou maço. De acordo com Robert Paxton
(2007, p.14-15), “a palavra remetia ao fasce latino, um machado cercado
por feixe de varas que era levado diante dos magistrados, nas procissões
públicas romanas, para significar a autoridade e unidade do Estado”.
Nove alunos (24,32%) associaram fascismo as palavras escravidão, fácil,
fascinação, idolatria, tais respostas foram categorizadas como Fragmen-
tos devido à dificuldade de entender a natureza da associação declarada.
A maioria dos alunos, cerca de doze (32,43%), não responderam esta
questão. Visto as respostas dadas, este pode ser um indicio importante
do quanto os alunos não estão familiarizados com este tema.
Na Escola B a termo fascismo foi relacionada, de forma coerente, à
palavras que remetem as características do governo como desigualdade,
não liberdade, opressão, censura, nacionalista, totalitário, ditadura, ra-
cismo - por doze alunos (27,27%). Cinco alunos (11,36%) associaram o
fascismo a Mussolini e Itália e outros cinco (11,36%) relacionaram ao na-
zismo e a Hitler. Seis alunos (13,64%) fizeram menção à palavra grupo,
talvez uma provável associação aos grupos paramilitares do movimento
fascista. Um aluno (2,27%) relacionou o fascismo à história escolar. Nove
alunos (20,45%) fizeram referimento a revolução nos EUA, pão e fasci-
nante. Estas respostas foram categorizadas no nível Fragmentos por não
ser possível entender as associações feitas pelos alunos. Seis alunos
(13,64%) não responderam esta questão.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 111

Tabela 16
Distribuição dos alunos conforme resposta à questão 4

Escola A Escola B

Fragmentos 9 24,32% 9 20,45%

Comparação Nazismo/Hitler 4 10,81% 5 11,36%

Função do Estado 5 13,51% 12 27,27%

Disciplina escolar 3 8,11% 1 2,27%

Associação 2 5,41% 6 13,64%

Itália/ Mussolini 2 5,41% 5 11,36%

Não respondeu 12 32,43% 6 13,64%

Na questão 5 os alunos foram inquiridos a escreverem o que sabiam


sobre o fascismo. Na Escola A, o quadro que emergiu das respostas indi-
cou imprecisão e desconhecimento sobre o tema. A maioria, cerca de vinte
e oito alunos (75,68%), não respondeu esta questão. Por outro lado, quatro
alunos (10,81%) elencaram características do Estado fascista como sendo
um regime ditatorial, rígido, em que as pessoas eram oprimidas. Estas
respostas refletem de fato características do regime fascista. Martim do
2º ano respondeu: “Acho que quando uma pessoa promete algo e não cumpre
dai ele é facista”. A resposta dada por Renan reflete sobre como o termo
fascismo vem sendo utilizado atualmente, considerando a conjuntura po-
lítica no país. Ele é bastante empregado para adjetivar fatores
comportamentais, na maioria das vezes é usado para desqualificar ou de-
saprovar determinadas atitudes ou posicionamentos, não
necessariamente políticos. Trata-se de um termo que gera ainda hoje de-
bates acerca de sua definição conceitual 25 e que com o tempo passou a

25 Sobre a discussão historiográfica acerca do conceito ver: COSTA PINTO, A. The Nature of Fascism Revisited.
Nova Iorque: SSM-Columbia University Press, 2012. GENTILE, Emilio. Il fascismo in tre capitoli. Roma-Bari:
Laterza, 2004. PAXTON, O. Robert. A anatomia do fascismo. São Paulo: Paz e Terra, 2007. PAXTON, O. Robert.
The Five Stages of Fascism. The Journal of Modern History, V. 70, N. 1, 1998. MANN, Michael. Fascistas. Rio de
112 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

fazer parte do vocabulário corrente. O uso deturpado da palavra resultou


em uma grande polissemia incoerente, que parece alimentar ainda mais
seu uso indiscriminado, causando mais incompreensões a respeito.
Na Escola B, 11 (22,45%) alunos não responderam esta questão. Em
duas respostas (4,08%) o fascismo apareceu como algo que aconteceu na
Europa ou Rússia e revolução que ocorreu nos Estados Unidos da Amé-
rica. Estas respostas foram categorizadas no nível Fragmentos. No
geral, o restante dos alunos da Escola B conseguiram elaborar um qua-
dro aproximativo com características do que foi o fascismo. De acordo
com as respostas dadas por vinte alunos (40,82%), o fascismo foi um re-
gime militar, rígido, antidemocrático, ultranacionalista, totalitário que
ocorreu na Itália sob a liderança de Mussolini. Sete alunos (14,29%) cita-
ram as semelhanças com o nazismo e dois alunos mencionaram que o
fascismo italiano foi a base para o nazismo.

Tabela 17
Distribuição dos alunos conforme resposta à questão 5

Escola A Escola B

Fragmentos 1 2,70% 2 4,08%

Comparação Nazismo/Hitler 7 14,29%

Função do Estado 4 10,81% 20 40,82%

Associação 2 4,08%

Itália/ Mussolini 4 10,81% 7 14,29%

Não respondeu 28 75,68% 11 22,45%

Na questão 6 os alunos tiveram que responder se as pessoas que


viveram durante o fascismo apoiaram o regime. Sete alunos (18,92%) da

Janeiro: Record, 2008. PAYNE, Stanley G. Fascismo, Modernismo e Modernização. Penélope: revista de história
e ciências sociais, n.11, p. 85-102, 1993.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 113

Escola A responderam que a população não apoiava o regime, pois se


tratava de um governo ditatorial no qual não podiam se expressar livre-
mente. Quatro alunos (10,81%) responderam que a população apoiava o
fascismo, e dois destes declararam que a política do regime era mais
correta e as coisas melhoraram. Destes quatro alunos, um afirmou que
a população apoiava o governo, porque eram obrigados e outro aluno
declarou que os apoiadores estavam defendendo seus interesses finan-
ceiros. Vinte cinco alunos (67,57%) não responderam esta questão.
Na Escola B a maioria dos alunos acreditava que a população não
apoiava o regime e quem o fazia era porque estava sob ameaça. Doze
alunos (27,27%) responderam que a população não apoiava o regime,
pois se tratava de um governo ditatorial, que praticava a censura e vio-
lava a liberdade da população. Doze alunos (27,27%) responderam que a
população apoiava o regime, no entanto somente três destes alunos
acreditavam que o apoio era devido ao fato de que o fascismo era consi-
derado a solução contra a crise e a corrupção. Os nove alunos restantes
declararam que o apoio era derivado do medo, ou porque as pessoas
eram de alguma forma manipulados pelos meios de comunicação e pelo
carisma dos líderes. Cinco alunos (11,36%) afirmaram que algumas pes-
soas apoiavam e outras não, porque algumas pessoas simplesmente
concordavam com o regime e outras não. Dez alunos (22,73%) não res-
ponderam esta questão.

Tabela 18
Distribuição dos alunos conforme resposta à questão 6

Escola A Escola B

Apoiaram o regime 4 10,81% 12 27,27%


114 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Não apoiaram o regime 7 18,92% 17 38,64%

Alguns sim e outros não 1 2,70% 5 11,36%

Não respondeu 25 67,57% 10 22,73%

Na questão 9 os alunos responderam se os jornais durante


o regime fascista eram neutros e imparciais. Observou-se que a
palavra imparcial causou um pouco de confusão entre os alunos.
Alguns afirmaram que os jornais eram imparciais e no momento
de justificar a resposta alegavam que o governo exercia censura
e, portanto, não eram livres para escrever o que queriam. Devido
ao fato de os alunos não entenderem o vocábulo optou-se por
levar em consideração a justificativa dada. Quatorze alunos
(37,84%) da Escola A afirmaram que os jornais não eram
imparciais. As causas alegadas remetiam a interferência do
governo nos meios de comunicação. Segundo os alunos, a
censura era constante e somente as notícias em consonância com
as diretrizes do fascismo poderiam ser publicadas. Apenas dois
alunos (5,41%) responderam que os jornais durante o fascismo
eram neutros e diziam a verdade, porque as pessoas saberiam se
não estivessem dizendo a verdade. Vinte alunos (54,05%) não
responderam esta questão. Na Escola B, com a exceção de dois
alunos (4,55%), todos responderam que os meios de
comunicação durante o fascismo eram manipulados pelo
governo. As justificativas dadas pelos alunos que responderam
esta questão abarcaram razões como a forte intervenção exercida
pelo governo, a censura impedia que os jornais comunicassem o
que realmente estava acontecendo no país. Dois alunos
mencionaram que os jornais eram utilizados como meio de
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 115

propaganda do governo e somente notícias positivas eram


veiculadas. Seis alunos (13,64%) não responderam esta questão.

Tabela 19
Distribuição dos alunos conforme resposta à questão 9
Escola A Escola B

crítica 14 37,84% 30 68,18%

acrítica 2 5,41% 2 4,55%

SCC 1 2,70% 6 13,64%

não respondeu 20 54,05% 6 13,64%

QUESTÃO 7

Na questão 7 os alunos indicaram quais são os meios de comunica-


ção ou as pessoas a quem recorrem quando precisam se informar sobre
alguma notícia. A resposta obtida foi muito parecida. Os alunos de am-
bas as escolas recorrem respectivamente à internet, à televisão e em
menor medida aos pais. Os alunos da Escola B, porém, demonstraram
uma maior propensão do que os da Escola A em procurar os professores.
A televisão e a internet são de fato veículos de informação importantes
na construção do conhecimento acerca do presente e do passado. Estes
meios de comunicação são instrumentos eficazes de divulgação, pois
conseguem ao mesmo tempo entreter e veicular conhecimento. Inves-
tigar de que forma os alunos pensam os meios de comunicação atuais
116 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

permite pensar a maneira como as narrativas veiculadas pelas mídias


são processadas por eles.

Figura 8 Distribuição dos alunos conforme meios de se manter informados

QUESTÃO 8

Na oitava pergunta os alunos foram questionados sobre a imparci-


alidade dos meios de comunicação atuais. Para os alunos da Escola A,
principalmente os alunos do 3º ano, as mídias são consideradas neutras
e apartidárias. Para dezessete alunos (45,95%) os meios de difusão de
informações efetuam um papel importante na vida das pessoas, pois
mantêm a população informada sobre o que está acontecendo. Segundo
Alice, 3ºano, as mídias são confiáveis, porque “apresentam as notícias em
tempo “real” e objetivamente para informar as pessoas sobre o que acontece
no mundo”. A resposta dada por Alice resume, em parte, a visão acrítica
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 117

demonstrada por alguns alunos. O fato que as notícias são dadas em


tempo real foi fator determinante, para a maioria destes alunos, para
provar de maneira incontestável a veracidade destes meios. Doze alunos
(32,43%) demonstraram um posicionamento mais crítico. Para eles as
mídias nem sempre dizem a verdade, porque existem interesses, sejam
eles econômicos ou políticos, que impedem a veiculação das notícias de
forma neutra e objetiva. As repostas de cinco alunos foram contabiliza-
das como “Sem condições de categorização”, porque não foi possível
identificar de forma patente seus posicionamentos a respeito do tema
tratado. 26

Tabela 20
Distribuição dos alunos conforme postura em relação aos meios de comunicação

Escola A
Total %
2º ano 3º ano

crítica 6 6 12 32,43%

acrítica 4 13 17 45,95%

SCC 2 3 5 13,51%

não respondeu 1 2 3 8,11%

Na Escola B o número de alunos que assumiram um posiciona-


mento crítico a respeito da existência de uma suposta neutralidade dos
meios de comunicação social foi maior. Para vinte e quatro alunos
(54,55%) os meios de comunicação de massa nem sempre dizem a ver-
dade. Marta do 1º ano, afirmou que “sempre há interesses políticos que
envolvem dinheiro por trás disso tudo, então, o jornal beneficiado por

26 Alguns alunos não entenderam a pergunta e acabaram escrevendo sobre qual mídia acreditavam ser mais
ou menos confiável. Foram também consideradas inconclusivas as respostas em que não foi possível entender
o núcleo central da mensagem devido a incoerência da escrita.
118 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

exemplo, vai sempre tender a uma determinada visão política afim de mani-
pular os telespectadores”. Dez alunos (22,73%), no entanto, professaram
acreditar cegamente nas notícias transmitidas pelos meios de comuni-
cação. Para Beatriz, 1ºano, os meios de comunicação são imparciais,
“porque eles são uma forma de nos informar o que está acontecendo ao nosso
redor, nos atualizar nos assuntos atuais de nosso cotidiano”. A resposta de
Sabrina sintetiza a posição tomada por esta parcela de alunos que vêm
nas mídias apenas um aparelho que tem por objetivo informar a popu-
lação sobre os eventos ocorridos de forma simples e neutra. Três alunos
(6,82%) não responderam esta questão e sete respostas (15,91%) foram
consideradas “Sem condições de categorização”.

Tabela 21
Distribuição dos alunos conforme postura em relação aos meios de comunicação

Escola B
Total %
1º ano 3º ano

crítica 9 15 24 54,55%

acrítica 8 2 10 22,73%

SCC 7 0 7 15,91%

não respondeu 3 0 3 6,82%

QUESTÃO 10

Na questão número 10 os alunos foram exortados a dissertar acerca


do ofício do historiador. Em prática responderam sobre como o histori-
ador elabora a narrativa histórica. Com base nas respostas obtidas
foram identificados quatro níveis de progressão: Nível 1 - Sem Condi-
ções de Categorização (SCC), Nível 2 - Erudição, Nível 3 -
Factual/Documental e Nível 4 - Operação historiográfica.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 119

NÍVEL 1 – SEM CONDIÇÕES DE CATEGORIZAÇÃO

As narrativas que se encontram nesta categoria apresentam um


nível alto de incoerência com a pergunta proposta, o que dificultou uma
análise mais aprofundada da ideia que o aluno tentou expor. Também
se inserem neste nível analítico as narrativas que não forneceram sub-
sídios suficientes para serem inseridas nas demais categorias. Alguns
alunos pareceram não entender a pergunta e deram respostas descon-
textualizadas. É possível entender, por exemplo, que para Filippa o
historiador trabalha com o tempo e a partir do homem, a resposta não
está errada, no entanto esta frase não fornece subsídios claros de como
esses elementos se inserem no processo de construção do conhecimento
histórico. Estas respostas poderiam também assinalar um problema
mais grave que é a dificuldade de leitura interpretativa. A ausência de
elementos uteis para aprofundar a concepção de construção do saber
histórico ligado ao oficio do historiador são as principais características
das narrativas que se encontram neste nível.

- Ver de sempre matéria bem documentado. (Joyce, 3º ano, Escola A)


- Como era as coisas e quase tudo que acontece. (Noa, 3º ano, Escola A)
- Com o tempo e a partir do homem. (Filippa, 1º ano, Escola B)
- Escreve de como foi a história de como foi vivido, de como sofreu no país, etc. (Yara, 3ºano, Escola B)
- De forma que se possa compreender a sociedade mais antiga do que a que estamos. (Matias, 3º ano, Escola B)

NÍVEL 2- ERUDIÇÃO

Neste nível de progressão os alunos inseriram o ofício do historia-


dor no rol dos eruditos. O saber histórico é elaborado a partir de
descobertas, leituras, pesquisa bibliográfica, horas de estudos e
120 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

colaboração com outros supostos historiadores. Conforme Rúbem, 1º


ano, Escola B, “o historiador escreve a partir do conhecimento, que ele já
tem dentro de sua cabeça”. Outros alunos, como Malena e Juan, deram
ênfase na questão da descoberta de coisas interessantes e na acumula-
ção de informações por meio dos estudos. O historiador seria um
colecionador de estórias, como “o erudito quer totalizar as inumeráveis
"raridades" que as trajetórias indefinidas de sua curiosidade lhe tra-
zem” (CERTEAU, 1982, p.81). No entanto como afirma Certeau, “a
crônica ou a erudição que se contenta com adicionar particularidades
apenas ignora a lei que a organiza” (CERTEAU, 1982, p.91). Nenhuma das
narrativas do quadro abaixo faz menção ao trabalho metodológico que
envolve a construção do conhecimento histórico. Durval Muniz de Al-
buquerque, no artigo Da história detalhe a história problema: o erudito e o
intelectual na elaboração e no ensino do saber histórico, disserta sobre a
substituição da figura do historiador erudito para a do historiador pes-
quisador. Citando Alexandre Herculano, historiador português do
século XIX, Albuquerque relembra a crítica direcionada a este tipo de
história que “ignorava a investigação e a pesquisa metódica, vivendo da
reprodução de convenções e tradições (ALBUQUERQUE JUNIOR, 2004,
p.59). De acordo com as narrativas que seguem no quadro abaixo, o ofi-
cio do historiador parece não requerer nenhum tipo de
profissionalização ou especialização, a história poderia ser escrita por
um aficionado ou um grande leitor:
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 121

- Ele primeiro descobria sobre a História e depois que ele descobria tudo ele acha intereçante e escrevia para o povo
saber mais sobre o que tinha antigamente. (Mariana, 2º ano, Escola A)
- Atraves do conhecimento que foi passado à ele. (Malena, 3º ano, Escola A)
- Atravéz de muitos anos de estudo, para dai ele poder colocar em prática. (Juan, 3º ano, Escola A)
- O historiador escreve a partir do conhecimento, que ele já tem dentro de sua cabeça, aí ele escreve e passa seu
conhecimento para o seu público. (Rúbem 1° Ano, Escola B)
- Pesquisando nos livros, perguntando para outros historiadores. (Catarina, 3º ano, Escola B)

NÍVEL 3 – FACTUAL/DOCUMENTAL

Neste nível de progressão os alunos ressaltaram a importância das


fontes para a construção do saber histórico. Estes alunos entendem que
o conhecimento histórico é elaborado a partir de fontes, no entanto a
figura do historiador aparece subordinada e até mesmo anulada diante
dessas fontes e dos fatos históricos. Esta concepção de escrita da histó-
ria se encontra em consonância com algumas respostas obtidas na
primeira pergunta deste questionário. Esta percepção de escrita da his-
tória se assemelha a definição da disciplina de história dada por alguns
alunos do Nível 2 (História Tradicional), que declararam que a história
é construída a partir de fontes verdadeiras.
A concepção do métier do historiador, destes alunos, sob alguns
pontos, parece remeter a perspectiva da escola metódica. As respostas
reunidas neste nível analítico indicam um verdadeiro culto às fontes.
Como observado por Bourdé e Martin (2000, p.102), “a escola metódica
despreza o papel essencial das questões colocadas pelo historiador as
suas fontes e louva o apagamento do mesmo historiador por detrás dos
textos”. Segundo Frederica, 2ºano, da escola A, o historiador a partir de
fontes seguras pode alcançar a verdade. Para Luna, 3º ano, Escola B, o
122 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

historiador relata de forma imparcial o que é revelado pelas fontes. Ed-


gar, 3ºano, declara que o historiador analisa e fala a verdade, transcreve
a história com transparência, ou seja, o historiador anula sua subjetivi-
dade diante da fonte para fazer emergir a verdade. O bom historiador
transcreve com fidelidade o conteúdo das fontes e somente assim ele
estará deixando um legado dentro do ramo histórico. Este posicionamento
foi defendido por Ranke quando declarou que o bom historiador “regis-
tra o facto histórico, de maneira passiva, como o espelho reflecte a
imagem de um objeto” (MARTIN; BOURDÉ, 2000, p.114). Para que a his-
tória seja considerada legítima é necessária uma cisão completa entre
sujeito e objeto, o historiador apenas relata o que os fatos históricos a
priori apresentam.

- Pesquisando em fontes seguras, por meios de muitos estudos até chegar a “verdade”. (Frederica, 2º ano,
Escola A)

- Ele escreve os acontecimentos baseados em “provas” encontradas por ele, que comprovam um devido
acontecimento histórico. (Alice, 3ºano, Escola A)

- Escreve relatando os fatos. (Murilo, 3º ano, Escola A)

- Por meio de fotos, roupas, objetos, desenhos que é encontrado, e vai dando origem a nossa historia,
pessoas que viveram ou que tem parentes que viveram o corrido também são importantes. (Beatriz, 1º ano,
Escola B)

- Relata os acontecimentos de uma forma imparcial; escreve como acontecia, como eram as pessoas, os
objetivos, os lugares, a cultura etc. (Luna, 3º ano, Escola B)

- A partir do momento em que ele analisa e fala a verdade, transcreve a história com transparência,
espontaneidade e conhecimento podemos dizer que ele realmente está deixando um legado dentro do ramo
histórico, essencial para a vida futura. Fora disso, são meros diplomas sem função diferencial. (Edgar, 3º
ano, Escola B)
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 123

NÍVEL 4 - OPERAÇÃO HISTORIOGRÁFICA

As narrativas agrupadas nesta categoria demonstraram uma noção


mais complexa sobre o processo de escrita da história. De acordo com
as respostas obtidas, o oficio do historiador não se restringiria ao ato de
relatar o que consta na documentação de forma imparcial. Nas frases do
quadro abaixo os alunos fazem menção às fontes, mas também a um
trabalho de pesquisa. Não aparece explicitamente em que consiste a ati-
vidade de pesquisa, mas estas respostas foram categorizadas em um
nível mais avançado que o Factual/Documental por dar a entender que
a elaboração da narrativa histórica ultrapassa o simples gesto de averi-
guação da veracidade da fonte e sua transcrição.

- Através dos fatos que ocorrem e por métodos de pesquisa. (Matilde, 3º ano, Escola A)
- Ele busca ir a fundo sobre um assunto em particular, entender primeiro os acontecimentos que marcaram algum
acontecimento histórico, para então depois, começar alguma tese ou algo do gênero. (Giacomo, 1º ano, Escola B)

Ainda se observou neste nível de progressão uma noção mais ela-


borada sobre o oficio do historiador. Para Tomás, a escrita da história
resulta da análise realizada pelo historiador a partir das fontes. O aluno
parece entender que toda interpretação historiográfica se relaciona ao
sistema de referências do historiador. Entretanto, o aluno parece não
resvalar em um relativismo cético ao tornar a afirmar que a história só
pode ser escrita com fontes, com documentos, com objetos que provem ela. A
existência de diversas teses para um único tema é imputada a análise de
cada historiador ou ao lugar social do historiador que “infiltrando-se no
trabalho de análise, organizando-o à sua revelia, remete à
124 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

"subjetividade" do autor” (CERTEAU, 1982, p.66). Conforme Certeau, é


em relação ao lugar de referência do autor que “se instauram os méto-
dos, que se delineia uma topografia de interesses, que os documentos e
as questões, que lhes serão propostas, se organizam” (CERTEAU, 1982,
p.66).

- Atraves das fontes históricas, tem a analise de cada historiador, exemplo são as diversas teses para um único
tema. Mais a historia so pode ser escrita com fontes, com documentos, com objetos que provem ela. (Tomás, 1º ano,
Escola B)

COMPARAÇÃO ENTRE ALUNOS DA ESCOLA A E DA ESCOLA B

Analisando conjuntamente os dados obtidos, com o questionário


das ideias prévias pelos alunos das duas escolas em questão, foi possível
traçar algumas comparações. Por exemplo, observou-se que os alunos
da Escola B tem uma atitude mais positiva com respeito a disciplina de
História. Cerca de 77% declaram gostar de História e para 9% destes His-
tória foi eleita a disciplina preferida. Nenhum aluno da Escola A
declarou como preferida a matéria de História, porém 64% demonstra-
ram uma atitude positiva em relação a disciplina. Apenas 3 alunos
declararam categoricamente não gostar de história.
No que diz respeito a questão número 3, observou-se que de forma
geral, a maioria dos alunos em ambas escolas apresentaram uma visão
tradicional de história. A percentual foi maior entre os alunos da Escola
A, onde cerca de 83,78% dos alunos acreditam que a história é uma dis-
ciplina que se ocupa do passado, principalmente de acontecimentos
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 125

políticos, nacionais, militares – em suma, de eventos e personalidades


relevantes de cada período.
O percentual de alunos que compartilham uma concepção de his-
tória total foi mais equilibrado, cerca de 13,51% de alunos na escola A e
18,18% de alunos da Escola B. Para estes alunos a história é um grande
catálogo que descreve as ações humanas ao longo tempo. Todos os as-
pectos da vida humana, assim como todos os sujeitos históricos são
objetos para a história. A história seria responsável pela compilação das
ações humanas desde tempos antigos até os dias atuais. Tanto no nível
1 quanto no nível 2 a disciplina de história é percebida como desvincu-
lada do presente e sem relevância para a vida prática. Os alunos que
mostraram uma concepção cíclica de tempo, percebem a história como
fornecedora de bons exemplos para o presente. No entanto o presente
não é visto como relevante para a construção do passado. O passado
existe per se e é preciso apenas conhecê-lo para entender como se com-
portar quando uma dada situação se repetir.
Se encontram no nível de progressão “história passado/presente e
futuro” 20,45% dos alunos da Escola B. Estes alunos apresentaram uma
concepção de história mais complexa. Para eles história é uma disci-
plina útil porque permite entender as transformações da nossa
sociedade a partir de referências passadas. Um aluno faz menção da re-
lação entre passado, presente e futuro, ao declarar as formas sob as
quais o passado influencia o presente e futuro. Como observou Koselleck
(2006, p.308),
126 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

As condições da possibilidade da história real são, ao mesmo tempo, as con-


dições do seu conhecimento. Esperança e recordação, ou mais
genericamente, expectativa e experiência (...) são constitutivas, ao mesmo
tempo, da história e de seu conhecimento, e certamente o fazem mostrando
e produzindo a relação interna entre passado e futuro, hoje e amanhã.

Entender que de fato o passado molda o presente e futuro é uma


caraterística importante para se entender a importância da disciplina
de história para a vida prática. Afinal, o conhecimento do passado per-
mite agir de forma eficaz sobre o presente e influi sobre as expectativas
que criamos sobre o futuro.

Tabela 22
Distribuição dos alunos conforme concepção de história (em %)

concepção de história Escola A Escola B

Sem condições de categorização 2,70% 2,27%

H. tradicional 83,78% 59,09%

H. total 13,51% 18,18%

Passado/presente/futuro 0 20,45%

Das questões (4,5,6,9) que investigavam as ideias dos alunos sobre


o conceito substantivo fascismo emergiu um quadro bastante díspar. A
maioria dos alunos da Escola A não responderam estas questões e alguns
alunos fizeram menção a escravidão e a “uma” (indefinida) revolução
dos EUA. Estas respostas, e a ausência delas, sugerem o desconheci-
mento do tema por parte destes alunos. De maneira geral, os alunos da
Escola B aparentaram ter uma ideia mais clara do que foi o regime fas-
cista em relação aos alunos da Escola A. No entanto os números de
alunos que não responderam (11 alunos) e a imprecisão que emergiu das
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 127

repostas no que diz respeito a localização espacial, temporal e à forma


de governo sugere que talvez seja oportuno buscar contornar esta situ-
ação antes de propor o inquérito com o jornal La Provincia di Bolzano.
Os meios de comunicação mais utilizados pelos alunos de ambas as
escolas foram a internet e a televisão. Entretanto, pelas respostas obti-
das na questão 8, é possível afirmar que o posicionamento dos alunos
diante destas mídias é desigual. Os alunos da Escola A (45,95%) mostra-
ram um comportamento menos crítico em relação as mídias ao
afirmarem que são veículos de informação confiáveis e imparciais. So-
mente 32,43% declararam ceticismo diante das informações passadas
mencionando as manipulações e os interesses presentes. Já a maioria
dos alunos da Escola B se demonstraram céticos com relação aos meios
de comunicação de massa. Para 54,55% dos alunos os interesses de or-
dem econômico e político envolvidos na elaboração das notícias que são
veiculadas à população impede que estas sejam percebidas como objeti-
vas e apartidárias.
Sobre o que diz respeito a concepção que os alunos têm sobre a
forma como a narrativa histórica é escrita, observou-se que os alunos
de ambas as escolas (Escola A 37,84% - Escola B 59,09%) se encontram,
em sua maioria, no nível Factual. A narrativa histórica é resultado das
informações que o historiador consegue levantar a partir das fontes.
Esta conjectura não é totalmente errada, no entanto é restrita por não
levar em consideração toda a operação historiográfica que sustenta a
construção do conhecimento histórico. Para 7 alunos (18,92%) da Escola
A e 4 alunos (9,09%) da Escola B a escrita da história é fruto de estudos
e leituras por parte do historiador. Em nenhum momento estes alunos
128 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

consideraram o trabalho metodológico que envolve a escrita da história.


Cerca de 5,41% das narrativas da Escola A e 18,18% da Escola B foram
categorizadas no nível SCC. O número de alunos que não responderam
esta questão foi visivelmente maior entre os alunos da Escola A (32,43%
- Escola B 9,09%). Em relação ao nível de progressão Operação historio-
gráfica apenas 2 alunos na Escola A e 2 da Escola B mencionaram que a
construção do saber histórico envolve além do levantamento de fontes
também um trabalho de pesquisa metodológico. Entre estas respostas
apenas um aluno Escola B atingiu um nível de concepção mais elaborado
sobre a escrita da história. O aluno mencionou que a intepretação das
fontes está submetida ao sistema de referências do historiador o que
explica a multiplicidade de narrativas sobre um mesmo tema.

Tabela 23
Distribuição dos alunos conforme concepção de escrita da história
níveis de progressão Escola A Escola B

Sem condições de categorização 2 5,41% 8 18,18%

Erudição 7 18,92% 4 9,09%

Factual 14 37,84% 26 59,09%

Operação historiográfica 2 5,41% 2 4,55%

Não respondeu 12 32,43% 4 9,09%


Ana Paula Rodrigues Carvalho • 129

Figura 9 Níveis de progressão sobre concepção de escrita da história

Os alunos da Escola B, no que diz respeito ao questionário das


ideias prévias, aparentam ter um conhecimento mais elaborado do que
seja história e de como a construção do conhecimento histórico é pos-
sível. Mostraram também saber mais a respeito do conceito substantivo
fascismo ao apresentar um quadro mais nítido do que foi o regime fas-
cista. No que diz respeito os meios de comunicação, estes alunos
também demonstraram uma postura mais crítica do que os alunos da
Escola A. As causas desta disparidade são difíceis de identificar. Entre-
tanto as informações obtidas nos questionários forneceram alguns
subsídios para buscar explicar as variações observadas entre os alunos
pesquisados.
Como visto, os alunos da Escola B mostraram maior interesse pela
disciplina de história, o que é um fator importante no processo de
aprendizagem. Sabe-se também que os alunos da Escola A partem em
130 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

desvantagem no que concerne o aspecto socioeconômico e sociocultural


e, como mostram as pesquisas do ponto de vista macrossociológico, a
correlação entre trajetórias escolares bem-sucedidas e essas categorias
é relevante. Os resultados, à primeira vista, tendem a confirmar os es-
tudos macrossociológicos. Todavia, o percentual de alunos da Escola A
que se alocaram em níveis de categorização mais elaborados não per-
mite realizar afirmações que colocariam estes alunos de classes menos
avantajadas como mero suportes de uma macroestrutura totalizante. O
desfecho de uma trajetória escolar exitosa ou malsucedida não é mecâ-
nica, mas resultado de dinâmicas complexas que escapam à suposições
meramente sócio econômicas. A desigualdade social tem um peso rele-
vante no percurso escolar e deve ser levado em consideração, mas não
pode ser considerado como único fator determinante na trajetória es-
colar. Como afirma Lahire, os elementos que incidem na vida escolar
são múltiplos. Para os pesquisadores que se voltam para o estudo das
trajetórias escolares, os alunos devem ser tratados “caso por caso,
nunca similares entre si, apanhados em um contexto de classe particu-
lar, com pais, desempenhos e um comportamento escolar singulares”
(LAHIRE, 1997, p.14).
3
DAS REPRESENTAÇÕES IDENTITÁRIAS AO CONCEITO
DE EMPATIA HISTÓRICA: UMA ANÁLISE DO JORNAL
LA PROVINCIA DI BOLZANO

O jornal, em vez de ser um sacerdócio, se tornou um meio para todos os partidos;


de meio, virou comércio, e, como todos os comércios, não tem moral nem princí-
pios.
Honoré de Balzac

Neste capítulo se procedeu com a análise do jornal La Província di


Bolzano (LPB), que foi utilizado como fonte nos questionários do estudo
piloto e principal. Buscou-se analisar o contexto da imprensa italiana
durante o regime fascista e mais especificadamente sobre o papel que
desempenhou o jornal no processo de italianizzazione da região recém
anexada ao território italiano, o Alto Adige. A partir de trechos 27 que
retratam as representações identitárias do que viria a ser considerado
um comportamento cônsono a um “verdadeiro” italiano, foram investi-
gadas as ideias históricas dos alunos sobre o conceito de empatia.
O conceito de empatia histórica foi discutido de acordo com a pers-
pectiva da Educação Histórica e atrelado aos objetivos que se propôs
alcançar por meio do questionário do estudo piloto. Esta segunda etapa
da pesquisa de campo foi realizada entre doze alunos (3 de cada turma)
das duas escolas participantes. O objetivo foi estabelecer se alunos que
apresentavam diferentes níveis de rendimento escolar (insuficiente,

27 Os excertos do jornal utilizados para as atividades em sala de aula foram traduzidos pela autora.
132 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

regular e bom) conseguiriam compreender a tarefa proposta. Com base


nos resultados obtidos nesta etapa o questionário principal foi revisi-
tado e levemente modificado.

A IMPRENSA FASCISTA

Os periódicos são fontes interessantes por trazerem as dinâmicas


cotidianas vividas em determinados contextos e períodos. Entretanto
este material não deve ser entendido como testemunho direto, neutro
ou objetivo das realidades que busca retratar. Conforme Capelato e
Prado apud De Luca (2010, p.140), o historiador ao se debruçar sobre pe-
riódicos esta cônscio de que se trata de um “instrumento de
manipulação de interesses e de intervenção na vida social” e não de
“mero veículo de informações, transmissor imparcial e neutro dos
acontecimentos”.
As intencionalidades deste material, no entanto, não inviabilizam
as diferentes apropriações que podem ser realizadas por parte do leitor,
na medida em que este apresenta seus próprios códigos culturais que
serão mobilizados na leitura. A subjetividade e os interesses silenciosos
que envolvem a produção e a publicação de um jornal não o torna uma
fonte desprezível para construção do conhecimento histórico, pelo con-
trário, o periódico torna-se uma fonte privilegiada para entender
determinados processos sociais, desde que sejam tomados os cuidados
metodológicos necessários para o uso dessa fonte.
Levando em consideração que “os discursos adquirem significados
de muitas formas, inclusive pelos procedimentos tipográficos e de
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 133

ilustração que os cercam. A ênfase em certos temas, a linguagem e a


natureza do conteúdo tampouco se dissociam do público que o jornal ou
revista pretende atingir” (DE LUCA, 2010, p.140). A análise do jornal vai
além do conteúdo propalado, pois os aspectos como o formato, sua or-
ganização, o corpo editorial, o público alvo, a sua área de alcance, a sua
relação com o mercado e outros poderes faz com o a imprensa perca sua
áurea de neutralidade.
À luz dessas reflexões, se faz necessária uma análise do jornal LPB
para discutir sobre o papel da imprensa durante o fascismo na Itália e
entender de que forma este jornal atuou no processo de italianizzazione
na região do Alto Adige.
Para David Forgacs, o fato que a imprensa italiana passou por um
processo de fascistizzazione 28 já nos primeiros anos do regime indica a
influência da precedente experiência jornalística de Mussolini no jornal
Avanti. Mussolini, enquanto jornalista, assim como seus colaboradores,
“entendiam os jornais; sabiam como funcionavam e compreendiam a
importância e influência política” 29 (FORGACS, 2000, p.108). Segundo
Forgacs (2000), por mais que no início da década de 1930 as taxas de
analfabetismo chegassem a 20% na Itália, em geral, e em algumas regi-
ões atingisse quase metade da população, o jornal impresso ainda era o
meio de comunicação mais difuso na Itália.

28 Por fascitizzazione se entende o processo de controle e censura pelo qual os jornais italianos foram
submetidos durante o vinteno fascista. Segundo Forgacs, “se tratava de uma reorganização do staff editorial
e de controle político de todos os artigos; em alguns casos significou também alteração do proprietário do
jornal” (FORGACS, David. L’industrializzazione della Cultura Italiana (1880 - 2000). Bologna: Il Mulino, 2000.
p.108).

29 Tradução da autora. No original “capivano i giornali; sapevano come funzionavano e ne comprendevano


l’importanza e l’influenza politica” (FORGACS, 2000, p.108).
134 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Desta forma, a imprensa, desde o princípio, é percebida como um


meio determinante para manutenção do consenso entre a população
italiana, “para tornar aceitáveis à opinião pública as suas batalhas, os
seus desenhos hegemônicos e as suas guerras, para suscitar no país um
espírito “nacional” e “fascista”, no qual cada cidadão poderia identifi-
car-se” 30 (FORNO, 2005, p.7). Devido à influência exercida pela imprensa
perante a opinião pública o controle e a censura eram constantemente
exercidos. Mussolini em uma reunião para tratar acordos com o Vati-
cano em 1929, por exemplo, lança uma advertência:

O regime está em alerta – disse o duce – e nada passa despercebido. Que


ninguém pense que o insignificante panfleto que sai da anódina paróquia
não seja, a um certo ponto, notório para Mussolini. Não permitiremos res-
surreições de partidos e de organizações que destruímos para sempre 31
(MUSSOLINI apud MURIALDI, 2008, p.69).

A fascistizzazione da imprensa italiana envolveu diferentes formas


de controle nos diversos âmbitos que envolviam sua produção. Logo
após a Marcha sobre Roma verificou-se uma fase de desordens e violên-
cia, os camicie nere, agindo muitas vezes com a conivência da polícia, se
voltaram contra os jornais de oposição incendiando e danificando os
maquinários. Neste primeiro momento bancas de jornais que vendiam

30 Tradução da autora. No original “per rendere accettabili all'opinione pubblica le sue battaglie, i suoi disegni
egemonici e le sue guerre, per imprimere al paese uno spirito “nazionale” e “fascista”, in cui ogni cittadino si
sarebbe potuto identificare” (FORNO, 2005, p.7).

31 Tradução da autora. No original “Il regime è vigilante – disse il duce – e nulla gli sfugge. Nessuno creda
che l’ultimo fogliucolo che esce nell’ultima parrocchia non sai, ad um certo punto, conosciuto da Mussolini.
Nonpermetteremo ressurrezioni di partiti e di organizzazioni che abbiamo per sempre distrutti” (MUSSOLINI
apud MURIALDI, 2008, p.69).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 135

os periódicos de oposição também se tornaram alvo da violência fas-


cista.
Em um segundo momento, uma estratégia mais sutil foi dispen-
sada aos proprietários de jornais. A imprensa italiana não passou por
um processo de estatização e, portanto, cativar os proprietários foi pri-
mordial para conseguir o apoio da imprensa. A relação entre o fascismo
e a cultura não pode ser vista como uma série de diretrizes feitas do alto
verso o baixo, se tratou, efetivamente, de uma complexa interação que
buscava conjugar tanto interesses políticos como econômicos. É inte-
ressante notar que em 1940 a propriedade de grande parte da imprensa
se encontrava ainda nas mãos dos mesmos proprietários de 1920. Para
Forno (2005), este resultado é devido ao fato que o regime se compro-
meteu em favorecer e financiar os proprietários dispostos a apoiar os
ideais fascistas e a colaborar com o governo. Eles eram em sua maioria
industriais e homens ligados ao mundo das finanças e necessitavam do
apoio do fascismo para sobreviver e proliferar.
Em janeiro de 1923 o Assessoria de Imprensa do Gabinete do Primeiro-
Ministro passou pela sua primeira reorganização. Segundo Forno (2005,
p.31), “a Assessoria de Imprensa desempenhou o papel principal seja nas
intervenções de eliminação dos jornais e na fundação de novos, seja na
distribuição de financiamentos para os jornais ‘amigos’ 32. Após se ocu-
par da organização da imprensa em todo território nacional o regime

32 Tradução da autora. No original “l’ufficio sttampa avrebbe svolto um ruolo primário sai negli interventi di
soppressione di giornali e di fondazione di nuovi, sai nell’elargizione di finanziamenti a singole testate
‘amiche’ (FORNO, 2005, p.31).
136 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

voltou sua atenção para as pessoas que produziam os jornais, ou seja os


jornalistas.
Em 1922 a maioria dos jornalistas se encontravam organizados em
duas associações nacionais: a Federação Nacional de Imprensa Italiana
(FNSI) e o Sindicado Nacional Fascista dos Jornalistas (SNFG). Depois das
tentativas falidas de cooptar a FNSI o partido resolveu em 1926 fundir
estas duas associações formando o Sindicado Nacional Fascista dos Jor-
nalistas Italianos, esta associação tinha como ambição promover uma
auto fascistizzazione entre os jornalistas. Esperava-se que o sindicato de
categoria pudesse “transformar o jornalismo italiano em um eficaz
construtor de consenso no território nacional e um veículo eficaz de
propaganda a nível internacional” 33 (FORNO, 2005, p.56).
Outro evento importante para se compreender o processo de fascis-
tizzazione pela qual passou a imprensa italiana está ligado ao assassinato
do deputado socialista Giacomo Matteotti em junho de 1924. Este crime,
cometido pela milícia fascista logo após seu discurso de denúncia de
fraude eleitoral na Câmara, causou grande impacto. O fato foi denunciado
nos jornais, até mesmo entre aqueles que apoiavam o regime. Diante
deste cenário, Mussolini decidiu aplicar o decreto de 15 de julho de 1923
que sancionava juridicamente as práticas que já estavam sendo colocadas
em prática. Vários jornais foram sequestrados, alguns ainda nas tipogra-
fias e outros já nas bancas. Estas práticas se tornaram sempre mais
recorrentes o que ocasionou gravíssimos danos aos jornais e contribuiu
para alinhar a imprensa aos interesses do governo.

33 Tradução da autora. No original “trasformare il giornalismo italiano in um potente costruttore di consenso


in ambito nazionale e in un efficace veicolo propagandístico a livello internazionale” (FORNO, 2005, p.56).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 137

Conforme Forgacs (2000), com exceção da imprensa antifascista


clandestina, no final de 1926 todos os jornais haviam sido fascistizzati.
Na prática isso significou o fim da liberdade de imprensa e a dependên-
cia para a escrita das notícias de uma agência que se encontrava sob o
controle fascista. A Agência Stefani enviava às redações as notícias que
deviam ser retratadas e de que forma eles deveriam ser escritas.

A ITALIANIZZAZIONE DO ALTO ADIGE : REPRESENTAÇÕES DE ITALIANIDADE


A PARTIR DO JORNAL LA PROVINCIA DI BOLZANO

La Provincia di Bolzano foi publicado pela primeira vez em abril de


1927 e circulou pela cidade de Bolzano, Merano e Bressanone até setem-
bro de 1943. Por se tratar de um diário, era publicado todos os dias da
semana, exceto às segundas-feiras. De acordo com Forno (2005), a tira-
gem do jornal era de 2.300 cópias em 1929 e era vendido pelo preço de £
0,25 (vinte cinco centavos de liras italianas). Conforme Murialdi (2008),
durante os dezesseis anos do seu funcionamento, o jornal passou por
várias alterações em sua direção: L Negrelli, 1927; A. Giarratana, 1927-
28; S. Maurano, 1931-33; M. Ferrandi, 1934-42. A quantidade de páginas
do jornal variava de 4 a 8. Este diário encontra-se em versão digitalizada
e disponibilizada no site da Biblioteca Provinciale Italiana Claudia Au-
gusta de Bolzano graças a um investimento do Banca di Trento. Os
números disponibilizados do jornal La Provincia di Bolzano vão desde o
ano de 1927 a 1941. 34

34 Os números disponíveis são os que seguem: 1927 n.001 - n.218; 1928 n.001 - n.310; 1929 n.001 - n.311; 1931
n.001 - n.310; 1932 n.001 - n.312; 1933 n.001 - n.309; 1934 n.155 - n.309; 1935 n.001 - n.311; 1936 n.001 - n.310;
1937 n.001 - n.311; 1938 n.001 - n.311; 1939 n.001 - n.310; 1940 n.001 - n.311; 1941 n.001 - n.61.
138 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

O jornal La Provincia di Bolzano não passou pelo processo de fascis-


tizzazione, pois seu nascimento ocorreu sob a proteção do Partido
Nacional Fascista (PNF). La Provincia di Bolzano foi o primeiro diário em
língua italiana na região do Trentino Alto Adige - Itália. Esta região, que
antes pertencia ao Império Austro-Húngaro, foi anexada ao território
italiano após a primeira Grande Guerra Mundial pelo Tratado de Saint
Germain em 1919. Segundo Faustini (1995), este jornal foi o órgão oficial
do fascismo altoatesino. Desta forma, enquanto órgão oficial do partido
fascista, estava vinculado ao dever de “instruir, educar, orientar, tran-
quilizar, incutir orgulho” 35 nas massas (FORNO, 2005, p.123).
Segundo Assunta Esposito, mesmo antes da escola ou da migração
em massa de italianos à região recém anexada a imprensa representou
para o fascismo o primeiro instrumento a disposição capaz de transmi-
tir “a voz da Itália regenerada pelo fascismo” 36 (ESPOSITO, 2008, p.5).
Conforme Forno (2005, p.9), “a imprensa representava o espelho fiel do
modelo ideal de nação que os governantes queriam divulgar” 37 e desem-
penhou papel fundamental no projeto de edificação do nuovo italiano.
A questão identitária da região recém anexada logo se tornou alvo
das políticas fascistas. E o jornal além de procurar consenso entre a co-
munidade de Bolzano tinha como particularidade o objetivo de infundir
uma italianità entre um grupo que não se reconhecia como tal. Afinal, a
maioria da população de Bolzano era de origem eslava ou germânica.

35 Tradução da autora. No original “istruire, educare, orientare, rassicurare, inorgoglire” (FORNO, 2005, p.123).

36 Tradução da autora. No original “la voce dell’Italia rigenerata dal fascismo” (ESPOSITO, 2008, p.5).

37 Tradução da autora. No original “la stampa rappresentarono la specchio fedele del modello ideale di nazione
che i governanti intendevano divulgare” (FORNO, 2005, p.9).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 139

A questão da italianizzazione da região do Alto Adige foi colocada


em pauta por Mussolini mesmo antes de sua ascensão ao poder. Durante
um comício nas campanhas eleitorais de 1921 ele declarou:

[...] os alemães estão ilegalmente no Alto Adige italiano. Acrescento que se


o governo fosse menos covarde e menos deficiente, os 180 mil alemães do
Alto Adige seriam reduzidos a uma cifra mais modesta; e digo também que
nós fascistas faremos o possível para italianizzare aquela região. Creio que
o novo Governo e a nova casta política [...] conseguirá transformar o Alto
Adige italiano 38 (MUSSOLINI apud SCARANO, 2012, p.291).

A italianização da população do Alto Adige era fundamental dentro


dos projetos nacionalistas do PNF e o jornal foi o mensageiro desta pro-
posta como também colaborou com a construção de uma representação
do que viria a ser italiano. Entende-se aqui por representação “os es-
quemas geradores das classificações e das percepções, próprias de cada
grupo ou meio, como verdadeiras instituições sociais, incorporando sob
a forma de categorias mentais e de representações coletivas as demar-
cações da própria organização social” (CHARTIER, 2002, p.18). Para
Chartier, as representações revelam de que forma em diferentes lugares
e tempos a realidade social foi construída.
Segundo Sandra Jatahy Pesavento (1995, p.115), a identidade en-
quanto representação “pode ser dada e atribuída mediante um processo
de “ilusão do espírito” e intencionalidade deliberada”. Para Pollak, as

38 Tradução da autora. No original “[...] i tedeschi sono abusivamente nell’Alto Adige italiano. Aggiungo che
se ci fosse stato un governo meno imbelle e meno deficiente, i 180 mila tedeschi dell’Alto Adige sarebbero
ridotti ad una cifra più modesta; e dico anche che noi fascisti faremo il possibile per italianizzare quella
regione. Penso anche che il nuovo Governo e la nuova casta politica di domani, [...] riuscirà a rendere italiano
l’Alto Adige” (MUSSOLINI apud SCARANO, 2012, p.291).
140 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

identidades coletivas estão ligadas a “todos os investimentos que um


grupo deve fazer ao longo do tempo, todo o trabalho necessário para dar
a cada membro do grupo - quer se trate de família ou de nação - o sen-
timento de unidade, de continuidade e de coerência” (POLLAK, 1992,
p.206).
O jornal LPB é uma fonte rica para se pensar os esforços feitos pelo
partido com o intuito de postular uma identidade coerente e comparti-
lhada tanto pelos italianos como pela população do Alto Adige. Um dos
pilares utilizados pelo PNF em defesa de uma identidade italiana no Alto
Adige se baseava na convicção que na realidade os habitantes da Alto
Adige em sua essência permaneciam italianos.
Como apontado por Scarano (2012), Mussolini acreditava que pelo
menos metade dos Tirol meridional não fosse de etnia germânica e sim
italiana que foi germanizzata por séculos de dominação Asburga e, por-
tanto, era necessário restituir a eles a sua italianitá. Esse postulado é
visível no primeiro número do jornal:

O Duce escolheu o dia do aniversário de Roma, esta data primaveril e de


imensa glória, para inauguração do nosso jornal. Nós obedecemos, como to-
dos, ao seu sinal. Conscientes da delicadeza da nossa tarefa nos unimos com
fé às filas das imprensas dedicada ao Regime que devolveu a raça italiana a
sua quase esquecida alma antiga (...) Mas a nossa província há característi-
cas peculiares que nos impõe uma bem mediada linha de condução. Entre
as fronteiras naturais da Itália restaurados pelas nossas armas vitoriosas
vivem, entremeados aos latinos autóctones, pessoas de outra língua e de
outros costumes. Séculos de abandono nacional e sutis perversidades polí-
ticas e administrativas desviaram consciências e, por muito tempo
gerações, apagaram dos seus lares a nossa fala afetuosamente gentil.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 141

Despertá-la, dirigir ao sol do meio dia mentes ainda entorpecidas em dire-


ção setentrional é tarefa da nossa geração de reconstrutores” 39 (La Provincia
di Bolzano, Bolzano, p.1A, 21 abr. 1927).

O propósito do jornal é claro, além de se colocar a serviço do fas-


cismo, toma como sua tarefa despertar nos habitantes do Alto Adige a
sua italianità supostamente esquecida durante o período em que eles vi-
veram sob o Império Austro-Húngaro. Segundo Woodward (2000, p.11),
“uma das formas pelas quais as identidades estabelecem suas reivindi-
cações é por meio do apelo a antecedentes históricos”. O jornal ao apelar
para o passado italiano da região esperava fazer com que estes se reco-
nhecem na representação identitária construída pelo regime.
O apelo ao passado italiano daquela região foi um recurso muito
utilizado pelo jornal como prova da real identidade daquela população.
No trecho que segue um jornalista do LPB respondendo aos intelectuais
austríacos que defendiam a origem germânica da região do Alto Adige
escreveu:

Todos estão de acordo que os primeiros habitantes dos vales do Alto Adige
eram de origem etrusca. [...] por mais que seja um mistério a origem do povo

39 Tradução da autora. No original “Il Duce ha scelto il giorno natale di Roma, questa data di primavera e di
immensa gioia, per l’uscita del nostro giornale. Noi obbedimmo, come tutti, al suo cenno. Consci della
delicatezza nel nostro compito ci allineamo con fede salda nei ranghi della stampa devota al Regime che ha
ridato alla razza italiana la sua quasi dimenticata anima antica. (...) Ma la nostra provincia ha delle
caratteristiche particolari che ci impongono una ben meditata linea di condotta. Entro i confini naturali
storici d’Italia restaurati dalle nostre armi vittoriose vivono, frammischiati ai latini autoctoni, genti d’altra
lingua e di altro costume. Secoli di abbandono nazionale e di sottili perversità politiche e amministrative del
regime austriaco hanno traviato coscienze e, per lungo volgere di generazioni, hanno spento d’intorno ai
focolari la nostra parlata affettuosamente gentile. Ridestarla, rivolgere al sole del mezzogiorno menti ancora
imbambolate verso il settentrione é compito della nostra generazione di ricostruttori” (La Provincia di
Bolzano, Bolzano, p.1A, 21 abr. 1927).
142 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

etrusco é inquestionável que fosse uma civilização do Mediterrâneo e que


seu berço foi a Toscana.
O período etrusco foi sucedido pelo período romano, o que consagra pela
segunda vez a italianidade desta região. Somente com a queda do Império
Romano, em 476 d. C. iniciaram-se as invasões bárbaras que fizeram su-
cumbir tanto o Alto Adige como toda a Itália 40 (La província di Bolzano,
Bolzano, p.1F, 22 mai. 1927).

Segundo o autor da matéria, a origem etrusca e em seguida sua


participação no Império Romano são provas incontestáveis da verda-
deira identidade do Alto Adige. O jornal na tentativa de italianizzare os
seus leitores parte de um conceito essencialista de identidade. O jornal
partindo do pressuposto que a identidade é algo fixo e imutável buscou
fundamentar a primazia da identidade italiana sobre aquela austríaca a
partir de um passado histórico em comum compartilhado desde o perí-
odo etrusco e em seguida durante o Império Romano.
Desta forma, a italianizzazione não poderia ser considerada um
processo forçado de snazionalizzazione e sim um processo de revelação
da própria identidade esquecida. Como escrito no primeiro número do
jornal, a sua tarefa era aquela de comunicar da forma “mais sincera, di-
reta e prática o amor à Pátria para os filhos que retornaram, (...) depois

40 Tradução da autora. No original “E’ pacifico che gli originali abitatori delle valli alto-atesine erano un
popolo di ceppo ‘etrusco’ [...] Per quanto possa essere ancora oscuro il mistero delle origini del popolo etrusco,
è incontrovertibile che il suo focolaio di irradiazione fu il Mediterraneo, e la sua culla, almeno nel periodo
storico, la Toscana. Al periodo etrusco successe immediatamente il ‘periodo romano’, che consacrò per la
seconda volta la italianità di quelle popolazioni. Solo col 476 dopo Cristo, alla caduta dell’Impero, si iniziò la
invasione barbarica, alla quale non soltanto l’Alto Adige, ma bensì tutta l’Italia soggiacque” (L’italianità
dell’Alto Adige. La província di Bolzano, Bolzano, p.1F, 22 mai. 1927).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 143

de tanto tempo ao seio materno” 41 (La Provincia di Bolzano, Bolzano,


p.3A, 21 abr. 1927).
De acordo com Woodward (2000), todo processo de identidade en-
volve o outro, no sentido que para a identidade italiana existir, ela
necessitava de algo externo a ela, ou seja, outra identidade que diferen-
ciasse dela e que ao mesmo tempo fornecesse condições para a sua
própria existência. Neste caso, a outra identidade foi a austríaca. O
marco de diferenciação mais sentido foi a língua e logo se converteu em
um campo de embate cruel entre as identidades em confronto. Segundo
Hobsbawm (1990, p.127):

Para os alemães e italianos, a sua língua nacional não era meramente uma
conveniência administrativa ou um meio para unificar a comunicação am-
pliada do Estado. (...) Era, na verdade, a única coisa que os fazia alemães e
italianos e consequentemente tinha um peso maior para a identidade naci-
onal do que, digamos, o inglês tinha para quem o lia ou escrevia.

A presença de uma minoria etno-linguística ameaçava o mito da


unidade nacional e da identidade italiana. E, portanto, uma série de me-
didas foram tomadas para eliminar a língua alemã da região e dar início
ao processo de italiazzazione forçada da região recém anexada.
O regime passou a incentivar a migração de italianos para reduzir
a densidade da população que falava alemão, foram criadas uma série
de medidas legislativas para impor como língua oficial o italiano, as es-
colas bilíngues foram abolidas, os nomes das praças, ruas, montanhas e

41Tradução da autora. No orginal “più schietta e più pratica l’amore grande della Patria verso i figli dopo
tanto tempo ritornati, (...) al seno della Madre” (La ‘Voce del Sella’ si fonde con ‘La Provincia di Bolzano’. La
Provincia di Bolzano, Bolzano, p.3A, 21 abr. 1927).
144 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

os sobrenomes foram traduzidos para o italiano. Foram também elabo-


rados decretos que proibiam o uso da língua alemã na vida pública e os
nomes dos hotéis, lojas, guias turísticos e mapas geográficos foram mo-
dificados. Para Janečková (2015, p.16), “um dos principais objetivos da
política linguística do fascismo era restaurar os ideias do purismo lin-
guístico e renovar a pureza nacional da língua” 42.
O jornal LPB enquanto órgão oficial do regime fascista na região
contribuiu para ampliar o raio de propagação das medidas impostas. Gi-
arratana, o editor do jornal em 1927, com frases curtas que ocupavam
duas colunas da segunda página do jornal escrevia sobre o que era con-
siderado o comportamento de um verdadeiro italiano, corroborando
com a representação de identidade estipulada pelo fascismo. No dia 7 de
setembro de 1927 escreveu, “os italianos que querem demonstrar real-
mente que são italianos, boicotam todas as indústrias e comércios que
mantém nos seus documentos os nomes em alemão” 43 (La Provincia di
Bolzano, Bolzano, p.2CD, 7 set. 1927). Alguns dias antes havia declarado
que: “os italianos que querem demonstrar realmente que são italianos,
boicotam todas as lojas que usam os jornais austríacos Dolomiten e

42 Tradução da autora. No original “restaurare gli ideali di purismo linguistico e rinnovare la purezza
nazionale della lingua, (...)fu uno degli obiettivi principali della politica linguistica del fascismo” (JANEČKOVÁ
, 2015, p.16). Marika. Lingua e potere ..., op. cit., p.16.

43 Tradução da autora. No original “gli italiani si devono dimostrare tali veramente, boicotando tutte le Ditte
commerciali e industriali che mantengono le loro carte intestate in tedesco” (La Provincia di Bolzano, p.2CD,
7 set. 1927).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 145

Volksbote para fazer propaganda” 44 (La Provincia di Bolzano, Bolzano,


p.2CD, 4 set. 1927).
Estas declarações refletem a importância da língua para a afirma-
ção da identidade italiana na região. O verdadeiro italiano não
corroboraria com comerciantes que usavam ainda o nome em alemão
em sua documentação e não seria cliente de lojas que usavam jornais
estrangeiros para publicizar seus negócios.
A língua neste momento se tornou um fator de distinção no campo
da disputa de representações identitárias. Afinal, se o diretor do jornal
se sentiu impelido a pedir aos seus leitores que boicotassem os comer-
ciantes que não haviam aderido a língua italiana na sua prática de
trabalho está a demonstrar como de fato a representação identitárias
italiana não foi acolhida por todos.
O jornal em si não seria suficiente para explorar de forma ade-
quada a amplitude da aceitação ou rejeição da identidade italiana entre
os habitantes de Bolzano. No entanto é possível hipotetizar a partir de
algumas matérias a resistência por parte da comunidade de se adequar
àquilo que o regime considerava um comportamento cônsono para um
italiano.
Em um artigo de agosto de 1927 lê-se:

Que existem pessoas pouco inteligentes, todos podemos constatar, mas em


Bolzano além de existir pessoas pouco inteligentes, existe uma categoria de
sem vergonhas, que não percebem que isso em um regime Fascista é uma

44 Tradução da autora. No original “gli italiani si devono dimostrare tali veramente, boicottando tutte le Ditte
che fanno la loro pubblicità sui giornali Dolomiten e Volksbote” (La Provincia di Bolzano, Bolzano, p.2CD, 4
set. 1927).
146 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

imprudência. Temos aqui uma circular da Liga para Tutela da Pesca (em
alemão) que foi enviada para todos os prefeitos. Evidentemente esses se-
nhores acreditam ser mais prático mandar as circulares em alemão,
enquanto nós podemos demonstrar que são uns tolos, visto que os prefeitos
receberam ordens para que todas as circulares em alemão fossem jogadas
no lixo, sem serem lidas. Se a Liga pela Tutela da Pesca quer tutelar alguma
coisa, deve mandar as circulares em italiano. Não acreditamos ser possível
ter que dar este conselho no dia 12 de agosto 1927, depois de dez anos de
vida italiana desta província, e no ano quinto do regime fascista 45 (La Pro-
vincia di Bolzano, Bolzano, p.2A, 12 ago. 1927).

Este trecho vem a corroborar com a importância que a língua ita-


liana assumiu no processo de italianizzazione e que de fato a não adoção
do italiano por parte dos dirigentes era algo considerado grave o sufici-
ente para ser denunciado no diário da cidade. Este excerto, no entanto,
também sinaliza o fato que mesmo após dez anos de vida italiana as pes-
soas continuavam usando o alemão para se comunicar. Mesmo após
todos os decretos e medidas legislativas que buscavam cancelar a cul-
tura germânica na região as pessoas, onde podiam, demonstravam
sinais de resistência a italianizzazione.

45 Tradução da autora. No original “Che esista della gente poco intelligente, tutti lo possono constatare; ma a
Bolzano, oltre ad esservi la solita gente poco intelligente, esiste una categoria di sfacciati, la quale
evidentemente non sa rendersi conto che l’essere sfacciati, in un regime fascista, potrebbe costituire una
imprudenza. Abbiamo tra le mani una circolare della Lega per la tutela della pesca, che è stata mandata a
tutti i Podestà. (...) Evidentemente questi signori credono di essere pratici mandando le loro circolari in
tedesco, mentre noi potremmo dimostrare che sono semplicemente sciocchi, in quanto i Podestà hanno già
istruzioni che tutte le circolari in tedesco devono essere gettate nel cestino, senza esser lette. Se la Lega per
la tutela della pesca vuol tutelar qualche cosa, deve mandare le sue circolri in italiano. Non credevamo di
dover dare questo consiglio il giorno 12 agosto 1927, dopo dieci anni di vita italiana di questa provincia, e
nell’anno quinto del regime fascista” (La Provincia di Bolzano, Bolzano, p.2A, 12 ago. 1927).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 147

Para Chiarini (2006) a língua pode ser considerada um símbolo de


identidade e também como um desejo de celebrar a participação ou não
em uma comunidade real ou imaginária. Conforme Ibrahim (apud
CHIARINI, 2006, p.33), a adoção de uma outra língua sugere “o desejo de
pertencer a um lugar, a uma política, a uma memória, a uma história e,
enfim, a uma representação” 46. A rejeição por parte dos dirigentes, dos
comerciantes e de outros episódios análogos relatados pelo jornal de-
monstram que os investimentos realizados pelo PNF com o escopo de
atingir um consenso em torno da representação de italianità não foi pa-
cífica e consensual.
Segundo Pesavento:

Formular uma identidade nacional, desenhar um perfil do cidadão, estere-


otipar o caráter de um povo ou de uma cidade correspondem a práticas que
envolvem relações de poder e que objetivam construir mecanismos de coe-
são social. Ou seja, como construção social imaginária, a representação
identitária pode ser dada ou atribuída, mas também implica em opções e
escolhas que não decorrem de manipulações, mas de um endosso voluntário
na busca de padrões de referência com alta carga de positividade
(PESAVENTO, 1995, p.116).

Para a autora, todo esforço vinculado a proposição de uma repre-


sentação identitária implica uma opção ou escolha. A tensão gerada
entre os efeitos de sentidos propostos pelo discurso de italianità do jor-
nal e os seus leitores revela um campo de lutas simbólicas no qual a
representação proposta e o sentido gerado nem sempre coincidem. Para

46 Tradução da autora. No original “il desiderio di appartenere a un luogo, a una politica, a una memoria, a
una storia e, di conseguenza, a una rappresentazione” (IBRAHIM apud CHIARINI, 2006, p.33).
148 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Chartier (2002), a eficácia de uma representação depende da percepção


e do julgamento de seus destinatários, da adesão ou da distância ante
mecanismos de apresentação e de persuasão postos em ação.
Segundo Woodward (2000), a afirmação política das identidades
exige alguma forma de autenticação e o jornal se apoiou principalmente
em duas. Primeiramente buscou autenticar a representação de identi-
dade italiana por meio de um suposto passado compartilhado. Não um
passado qualquer, mas um passado glorioso que atrelava a história das
pessoas do Alto Adige à história do Império Romano. Pretendia-se a
partir deste investimento despertar o “verdadeiro eu” desta população
e convertê-los novamente a sua pátria original.
Neste contexto a língua italiana foi um importante indicador da
aceitação da italianidade proposta. As medidas legislativas e decretos
que previam a mudança dos nomes das cidades, praças, ruas, comércios
e dos sobrenomes da população remetem ao desejo de anulação da cul-
tura germânica. Era por meio da língua que se expressaria o desejo de
pertencimento e assentimento à identidade italiana. No entanto, como
visto nos exemplos acima, há discordâncias entre a representação cons-
truída e os sentidos gerados por ela. Por mais eficientes e pragmáticas,
a nível teórico, as metas de representação identitária para obterem su-
cesso dependiam, na prática, do consenso de pessoas. Pessoas dotadas
de uma memória, de uma história, de uma política, de identidades fluí-
das e inovadoras, mas identidades que, provavelmente, não se
reconheciam naquela imposta pelo fascismo.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 149

PROBLEMAS E DEFINIÇÕES DO CONCEITO DE EMPATIA HISTÓRICA

Segundo Faria, “levar jornais/revistas para a sala de aula é trazer o


mundo para dentro da escola. Jornais e revistas são, portanto, media-
dores entre a escola e o mundo” (FARIA, 2001, p.11). A utilização do
jornal La Província de Bolzano em sala de aula visa possibilitar o estabe-
lecimento de laços entre a escola e uma sociedade que apesar de
afastada no tempo pode se aproximar da vivência dos alunos através da
empatia histórica suscitada pela evidência, fundamental para a compre-
ensão da História.
O jornal permite o contato com o contexto social vivido pelas pes-
soas durante o regime fascista e os alunos. Segundo Lee, o uso de fontes
em sala de aula permite o desenvolvimento da empatia histórica nos
alunos “entendida como uma realização – algo que acontece quando sa-
bemos o que o agente histórico pensou, quais seus objetivos, como
entenderam aquela situação e se conectamos tudo isto com o que os
agentes fizeram” (LEE, 2003, p.20). O jornal fascista La Provincia di Bol-
zano, enquanto reflexo plausível do vivido da comunidade de Bolzano
sob o fascismo, torna-se ferramenta para formação de empatia nos alu-
nos por os colocarem em contato com as tramas cotidianas relatadas
pelo jornal.
De acordo com o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, o termo
empatia é definido como “forma de identificação intelectual ou afetiva
de um sujeito com uma pessoa, uma ideia ou uma coisa” (Acesso em: 15,
Novembro, 2016). Trata-se de uma palavra bastante utilizada em outras
áreas do conhecimento, como por exemplo na Psicologia. A palavra
150 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

empatia remete a uma ideia de compartilhamento de sentimentos que


permite que um dado sujeito seja capaz de identificação com o outro.
Devido a esta possível interpretação a utilização do conceito de empatia
no Ensino de História tem se demonstrado problemática e vem susci-
tando críticas.
Lukas Perikleous (2011) traz em pauta algumas críticas que foram
feitas ao conceito de empatia histórica. Por exemplo, o autor menciona
como Harris e Foreman criticaram as atividades que se concentravam
em fazer com que os alunos se identificassem com os personagens do
passado de forma a-histórica. O conceito também foi atacado por auto-
res que criticavam a noção em que o conceito estaria mais ligado a uma
ideia generalizada de compartilhamento de sentimentos ao invés de
uma atividade que requer conhecimento cognitivo.
Para melhor entender a definição do conceito de empatia histórica
busca-se aqui explanar o contexto em que o conceito passou a ser utili-
zado em aulas de História, os erros que muitas vezes
acompanharam/am sua aplicação, as dificuldades inerentes ao seu de-
senvolvimento por parte dos alunos e a sua importância para o
desenvolvimento de um pensamento histórico mais sofisticado.
Segundo Lee e Shemilt (2011), os anos 1960-88 ficaram conhecidos
na Inglaterra como um período de exploração e experimentação do En-
sino de História. Através do uso de fontes em sala de aula os alunos eram
questionados sobre como o conhecimento do passado era possível. Por
volta dos anos 70 os professores de História passaram a questionar seus
estudantes a respeito do comportamento das pessoas do passado. A ten-
tativa de entender as crenças, os valores e as ações do passado ficou
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 151

conhecida como empatia histórica. O conceito de empatia movimentou


debates entre professores de história, historiadores e políticos. No en-
tanto, por volta da metade da década de 1980, o modo como o conceito
foi trabalhado em sala de aula se tornou alvo de críticas contundentes.
De acordo com Perikleous, são inúmeros os exemplos de:

Práticas pedagógicas, livros didáticos e tarefas de avaliação que utilizam a


empatia de forma errônea e transformam-na de uma maneira de entender
as pessoas no passado para um jogo de imaginação, uma ferramenta para
resumir informações que descrevem um período ou evento, promovendo
metas sociais através da manipulação dos sentimentos dos alunos 47
(PERIKLEOUS, 2011, p.221).

Lee e Shemilt (2011) identificaram os dois erros mais comumente


cometidos entre aqueles que se voltavam para o ensino da empatia his-
tórica em sala de aula. O primeiro se refere ao fato que os professores,
preocupados em tornar a história mais humana e menos voltada para
datas e guerras, acabaram por vincular o conceito de empatia a um exer-
cício de livre imaginação histórica. Mesmo reconhecendo a importância
da imaginação histórica para pesquisa e ensino, os autores veem de
forma crítica como a demarcação entre imaginação histórica e invenção
literária era facilmente anulada.
O segundo erro está diretamente ligado a escolha do termo empa-
tia. Segundo Lee e Shemilt (2011, p.40), a empatia é pensada como uma

47 Tradução da autora. No original “teaching practices, textbooks and assessment tasks misusing empathy
and transforming it from a way to understand people in the past to a game of imagination, a tool for merely
summarizing information which describes a period or event, promoting social goals through the
manipulation of students’ feelings” (PERIKLEOUS, 2011, p.221).
152 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

necessidade “de compromisso afetivo com os sujeitos históricos, por


simpatia e identificação com o esforço e sofrimento” 48. A falha desta
concepção de empatia é que esta transcende a necessidade de explicar e
compreender como as pessoas do passado pensavam e agiam. A empatia
é vista somente como um exercício afetivo e não uma atividade pautada
em fontes e evidências.
Como consequência desta concepção afetiva de empatia os alunos
estariam mais propensos a provarem empatia por determinados sujei-
tos históricos, como vítimas de ditaduras, operários e outras minorias.
Já com os sujeitos históricos responsáveis por atos de violência e catás-
trofes não seria possível provar empatia e, portanto, suas ações
permaneceriam inexplicáveis. Mas como revelam os autores, empatia
não diz respeito ao livre exercício de imaginação, simpatia ou identifi-
cação com os predecessores.
Para Stuart Foster (1999), os principais problemas decorrentes do
uso equivocado do conceito de empatia histórica podem ser resumidos
em três palavras: identificação, simpatia e imaginação. Segundo o autor,
o problema com a identificação é que “nenhum historiador ou aluno da
história tem a capacidade de se identificar com uma pessoa de outro
lugar e tempo diferente” 49 (FOSTER, 1999, p. 19). Para Perikleous, a em-
patia histórica não é um modo especial de entrar na mente das pessoas
ou uma maneira para se identificar com elas. Segundo o autor, “tal

48 Tradução da autora. No original “for affective engagement with predecessors, for sympathy and
identification with striving and suffering” (LEE, SHEMILT, 2011, p.40).

49 Tradução da autora. No original “no historian or student of history has the ability to embrace the persona
of another from a different place in time” (FOSTER, 1999, p. 19).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 153

habilidade não pode ser ensinada mesmo se aceitarmos sua existência.


Além disso, identificar-se com pessoas no passado é em muitos casos
indesejável, já que muitos professores não querem que seus alunos se
identifiquem com certas pessoas” 50 (PERIKLEOUS, 2011, p.223).
De acordo com Lee e Ashby (2001, p.23), “não seria razoável tentar
compartilhar os sentimentos das pessoas no passado, uma vez que não
compartilhamos suas crenças. Também não podemos compartilhar suas
esperanças ou medos, já que sabemos se eles se tornaram verdadeiros
ou não” 51. Empatia histórica tão pouco significa capacidade de compar-
tilhar sentimentos ou de provar simpatia.
De acordo com Foster (1999), se por um lado provar simpatia por
alguns personagens históricos, como as crianças operárias na Revolu-
ção Industrial ou com as vítimas do Holocausto, seja positivo este não é
o objetivo principal da história. O estudo histórico deveria depender “de
um processo de raciocínio disciplinado baseado em evidências históri-
cas disponíveis. O envolvimento emocional com personagens históricos
potencialmente põe em perigo essas importantes considerações” 52

(FOSTER, 1999, p.19). Para Foster, o estudo da história deve estar pau-
tado em bases objetivas e não afetivas.

50 Tradução da autora. No original “such an ability cannot be taught even if we accept its existence.
Furthermore identifying with people in the past is in many cases undesirable, since many teachers do not
want their students to identify with certain people” (PERIKLEOUS, 2011, p.223).

51 Tradução da autora. No original “It would be unreasonable to try to share the feelings of people in the past,
since we do not share their beliefs. We also cannot share their hopes or fears, since we already know if they
came true or not” (LEE; ASHBY, 2001, p.23).

52 Tradução da autora. No original “a process of disciplined reasoning based upon available historical
evidence. Unexamined emotional involvement with historical characters potentially endangers these
important considerations” (FOSTER, 1999, p.19).
154 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Foster também assevera que empatia não deve ser confundida com
imaginação. O autor declara que:

As atividades dos livros didáticos geralmente exigem que os alunos imagi-


nem que eles estavam presentes em uma época passada (por exemplo,
imagine que você estava no Mayflower, imagine que você é um índio Apa-
che). Essa visão da empatia histórica, no entanto, leva a uma compreensão
irresponsável e errônea do nosso passado. A história verdadeira depende de
uma investigação cautelosa e de um exame atento das evidências disponí-
veis 53 (FOSTER, 1999, p.19).

Assim como Foster, Perikleous adverte sobre a ineficiência de ati-


vidades que requerem que os alunos se imaginem no lugar de pessoas
do passado sem o devido conhecimento substantivo e disciplinar neces-
sário para pensar sobre o passado. De acordo com o autor, “enquanto
inferência e especulação são partes da empatia histórica como uma
forma de preencher as lacunas do que é conhecido, ambos são baseados
em nosso conhecimento do contexto histórico, evidência e dos resulta-
dos da situação que estudamos” 54 (PERIKLEOUS, 2011, p.223).
Perikleous (2011, 2014), assim como Foster (1999) e Lee (1997, 2001,
2003, 2004, 2011) não desconsideram a importância da imaginação para
a construção do conhecimento histórico, porém reconhecem que a ima-
ginação perde validade quando descolada das evidências e dos

53 Tradução da autora. No original “Textbook assignments commonly require students to imagine they were
present in a bygone age (e.g., imagine you were on the Mayflower; imagine you are an Apache Indian). That
view of historical empathy, however, leads to an irresponsible and erroneous understanding of our past. True
history depends on cautious inquiry and close examination of available evidence” (FOSTER, 1999, p.19).

54 Tradução da autora. No original “while inference and speculation are parts of historical empathy as a way
to bridge the gaps in what is known, they are both based on our knowledge of historical context, evidence
and the outcomes of the situation we study” (PERIKLEOUS, 2011, p.223).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 155

princípios metodológicos próprios da história. Em consonância com


esta linha de pensamento, Peter Lee (2004) declara que os dados e a ima-
ginação são como o óleo e o petróleo para a máquina, o excesso de um
não compensa a falta do outro.
Chevalier ao discorrer sobre a relação entre a imaginação e o pen-
samento racional afirma,

Pero imaginar no es demostrar. Las dialécticas son de orden diferente. Los


critérios del simbolismo serán la constancia en lo relativo captado intuiti-
vamente, la puesta en correlación de lo inconmensurable; los del
racionalismo, la medida, la evidencia y la coherencia científicas. (...)Si esos
pasos deben guardar sus caracteres específicos, responden no obstante uno
y otro a unas necesidades, cada uno en su orden. El mismo progreso de las
ciencias, y particularmente de las ciências del hombre, exige su coexisten-
cia (CHEVALIER; GHEERBRANT, 1986, p.35).

Logo, para Chevalier (1986), nas ciências humanas a razão e a ima-


ginação se relacionam para poder subsistir; a razão preserva a
imaginação de cometer abusos, enquanto a imaginação enriquece a ra-
zão com suas explorações.
Ainda sobre a importância da imaginação, Robin George Col-
lingwood (2001) afirma que o trabalho do historiador não se limita a
descrever simplesmente as informações relatadas nas fontes, pois infe-
rências são realizadas com o intuito de ir além do que está dado. O
exercício de extrapolar o que é dado é definido pelo autor como imagi-
nação.
O autor usa o exemplo do navio e do mar. Ao observar um navio à
distância de 5 minutos nota-se que houve uma mudança em sua posição.
156 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Não foi possível acompanhar toda a trajetória realizada durante aqueles


minutos, mas pela imaginação é possível supor as posições intermedia-
rias. Conforme Collingwood, a imaginação é a “acção que, preenchendo
as lacunas entre os elementos que nos são fornecidos pelas fontes, dão
continuidade a narrativa ou descrição histórica” (COLLINGWOOD, 2001,
p.365).
Para o autor:

A imagem que o historiador dá ao seu objecto, quer seja uma sequência de


acontecimentos quer um estado de coisas passado, surge desta forma como
uma teia de construção imaginativa, estendida entre certos pontos fixos,
fornecidos pelas declarações das fontes. E se estes pontos forem suficiente-
mente numerosos e os fios ligados uns aos outros - estiverem construídos
com o cuidado devido, sempre por meio da imaginação a priori e nunca por
fantasia meramente arbitrária, todo o quadro é constantemente verificado
em correspondência com estes dados, havendo pouco perigo de perder o
contacto com a realidade que representa (COLLINGWOOD, 2001, p.367).

De acordo com Collingwood (2001), a construção realizada pelo his-


toriador se dá pela interação entre imaginação e evidência. O próprio
trato com as fontes, as perguntas que se fazem a ela são atividades da
imaginação. Segundo Edward Carr (1982), a imaginação é importante
para o historiador “compreender a mente das pessoas com as quais está
lidando e o pensamento que conduz os seus atos” o autor especifica tra-
tar de “‘compreensão com imaginação’ e não ‘simpatia’, com receio de
que simpatia possa significar concordância implícita” (CARR, 1982,
p.49). É por meio da imaginação que é possível compreender os sujeitos
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 157

e suas ações passadas, desta forma, empatia e imaginação devem sim se


relacionar, mas com as devidas precauções.
Para Lee, quando se busca entender outras pessoas é necessário
utilizar a imaginação para analisar atitudes e crenças diferentes das
próprias. Logo seria equivocado afirmar que,

lo puramente imaginario no tiene un papel que jugar en la historia.(...) La


imaginación en la ficción histórica debe reconocer las limitaciones impues-
tas por la evidencia y los hechos establecidos históricamente, pero al mismo
tiempo debe cumplir con los criterios de coherencia y probabilidade (LEE,
2004, p.103).

Os problemas elencados acima, como identificação, simpatia e


imaginação, se devem aos significados que o termo empatia evocam. De-
vido aos desentendimentos provocados e aos maus usos do conceito de
empatia histórica em sala de aula, foi colocado em pauta sua utilidade e
seus benefícios para o ensino de história. Diante deste empasse, faz-se
necessário definir de forma clara o conceito de empatia histórica para
melhor expor seu papel no desenvolvimento de uma aprendizagem his-
tórica mais elaborada.
Para Lee, a empatia é necessária para a história, porque, muitas
vezes, não é possível tecer relações, ter contato direto com os sujeitos
analisados, entender seus valores e anseios. Para o autor, empatia é “es-
tar en posicion de contemplar (no necesariamente de compartir) estas
creencias y de considerar el impacto de estas emociones (y no necesari-
amente sentirlas). (...) Es una condicion necesaria (pero no suficiente)
para la comprension histórica” (LEE, 2004, p.92).
158 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

De acordo com Lee, Ashyb e Dickinson, “a compreensão da ação in-


dividual e das práticas sociais na história estão ligadas a necessidade de
seguir as razões, o que envolve a compreensão das relações entre con-
juntos de crenças, valores e metas” 55 (LEE; DICKINSON; ASHYB, 1997,
p.233-244). Trata-se de um esforço de entender como as pessoas do pas-
sado pensavam, porque agiram de uma determinada maneira
considerando o contexto de sua ação.
Para entender o que aconteceu no passado é preciso entender o
comportamento humano e, portanto, entender as ideias e as intenções
que mobilizaram o agir dos sujeitos do passado. Para alcançar este nível
de compreensão é necessário entender que as ideias, os valores e o modo
como viam o mundo é provavelmente diferente das pessoas do presente.
Como assevera Lee, a empatia

supone una manera específica de relación con el pasado en donde los suje-
tos del presente, sin verse comprometidos con metas y creencias que les son
ajenas, son perfectamente capaces de desprenderse de las suyas para su-
mergirse en un universo que en principio se les aparece como extraño (LEE,
2004, p.87).

Ter consciência destas diferenças “previne a nós e aos nossos alu-


nos de ver o mundo do passado como culturalmente homogêneo com o
nosso mundo atual e de explicar o comportamento "estranho" de seu

55 Tradução da autora. No original “understanding individual action and wider social practices in history are
linked by need to follow reasons, which involves understanding relationships among sets of beliefs, values,
and goals” (LEE; DICKINSON; ASHYB, 1997, p.233-244).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 159

povo como resultado de sua inferioridade ou irracionalidade” 56


(PERIKLEOUS, 2014, p.26). É importante entender que as pessoas no pas-
sado se comportaram de forma racional, de acordo com suas crenças,
seus valores, sua visão de mundo tendo como base o contexto em que
estavam inseridas. De acordo com Foster, um dos perigos que podem
ocorrer na tentativa de se desenvolver a empatia histórica é o anacro-
nismo. Conforme o autor, as pessoas do passado “não devem ser
julgadas por valores, costumes, crenças e por aquilo que sabemos hoje” 57
(FOSTER, 1999, p.19).
Para Foster a empatia histórica envolve também “uma apreciação
do contexto histórico e da cronologia na avaliação de eventos passados.
Para provar empatia, os estudantes devem estar cientes dos principais
eventos, personalidades e cultura do período em questão” 58 (FOSTER,
1999, p.19). Sendo assim, a empatia histórica demanda conhecimento
substantivo do contexto histórico e cultural no qual as ações dos sujei-
tos do passado se situavam.
A empatia é um exercício que não se sustenta por si só, não basta
buscar entender o comportamento das pessoas do passado é preciso ter
subsídios que sustentem tal intepretação. Estes devem ser “baseado na
evidência histórica disponível, nos métodos e na lógica da disciplina da

56 Tradução da autora. No original “protects us, and our students, from viewing the different world of the
past as culturally homogenous with our present world and from explaining the 'strange' behaviour of its
people as the result of their inferiority or irrationality” (PERIKLEOUS, 2014, p.26).

57 Tradução da autora. No original “must not be judged by the values, mores, beliefs, and knowledge of today”
(FOSTER, 1999, p.19).

58 Tradução da autoa. No original “an appreciation of historical context and chronology in the evaluation of
past events. To empathize, students must be aware of the key events, personalities, and culture of the period
under scrutiny” (FOSTER, 1999, p.19).
160 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

história” 59 (PERIKLEOUS, 2014, p.27). De acordo com Foster, “os alunos


devem estar envolvidos no exame e interpretação da evidência histórica
para estabelecer uma compreensão mais apropriada das ações passa-
das” 60 (FOSTER, 1999, p.19). Conforme Foster, os alunos devem ser
capazes de construir uma argumentação baseada em evidencias histó-
ricas capaz de sustentar as conclusões a que chegaram.
Empatia histórica também tem a ver com o entendimento das con-
sequências das ações passadas. Os alunos têm a seu favor o fato de
conhecer as consequências geradas pelas escolhas realizadas no pas-
sado. Desta forma, “alunos devem estar conscientes das consequências
das ações passadas e devem ser capazes de refletir sobre como as ações
tomadas no passado afetam eventos futuros” 61 (FOSTER, 1999, p.19).
Enfim, empatia histórica requer respeito e sensibilidade para en-
tender a complexidade que envolve as ações humanas do passado. O
estudo da história não é exato, não existem regras possíveis de serem
aplicadas para entender ou prevê as ações humanas. Pessoas diferentes
passando por uma mesma situação podem agir de forma distinta.
Lee e Shemilt de forma bastante didática propõe um quadro em que
explicita o que é e o que não é empatia histórica:

59 Tradução da autora. No original “based on the available historical evidence and the methods and the logic
of the discipline of history” (PERIKLEOUS, 2014, p.27).

60 Tradução da autora. No original “students must be involved in the examination and interpretation of
historical evidence to establish a more considered understanding of past actions” (FOSTER, 1999, p.19).

61 Tradução da autora. No original “students must be aware of the consequences of actions and be able to
reflect thoughtfully on how the actions taken by any historical character affected future events” (FOSTER,
1999, p.19).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 161

A empatia não é uma maneira misteriosa de entrar nas cabeças das pessoas
do passado.
É onde chegamos quando, com base em evidências, reconstruímos as cren-
ças e os valores das pessoas de forma a tornar inteligíveis as ações e práticas
sociais. (É uma 'realização' não um 'processo').
A empatia não é compartilhar os sentimentos das pessoas.
Mas podemos saber que sentimentos as pessoas tinham e o que eles signi-
ficavam.
A empatia não é uma "habilidade" que possa ser praticada.
É uma maneira de explicar as formas de vida passadas que eram diferentes
das nossas, é uma disposição para reconhecer a possibilidade e a importân-
cia de torná-las inteligíveis 62 (LEE; SHEMILT, 2011, p.48).

Perikleous (2011) afirma que para compreender porque as pessoas


do passado agiram de uma determinada forma é preciso entender suas
ideias, o modo como viam o mundo e o contexto histórico no qual esta-
vam inseridos. De modo contrário, a Educação Histórica não poderá
afirmar que está desenvolvendo o pensamento histórico nos alunos sem
ajudá-los a entenderem as pessoas do passado.
Além das críticas decorrentes dos maus usos do conceito, a empa-
tia histórica também foi criticada por ser considerada um conceito
muito vago e complexo para ser ensinado em sala de aula. Estas críticas
se sustentam na ideia de que os alunos “não possuíam o conhecimento
contextual, o conhecimento sobre evidência histórica e a experiência de

62 Tradução da autora. No original “Empathy is not a mysterious way of getting into past people's heads. It is
where we get when, on the basis of evidence, we reconstruct people's beliefs and values in ways that make
actions and social practices intelligible. (It is na 'achievement' not a 'process'.) Empathy is not sharing people's
feelings. But we can know what feelings people had and what they meant. Empathy is not a 'skill' that can be
practised. It is a way of explaining past forms of life that were different from ours, and a disposition to
recognise the possibility and importance of making them intelligible” (LEE; SHEMILT, 2011, p.48).
162 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

vida necessárias para dar sentido ao agir das pessoas no passado” 63


(PERIKLEOUS, 2011, p.222).
Mas Perikleous rebate a esta crítica afirmando que ensinar Histó-
ria ou qualquer outra disciplina não é uma questão de all-or-nothing. O
objetivo do Ensino de História deve ser “desenvolver ideias mais sofis-
ticadas e, nesse sentido, a aspiração de desenvolver a aprendizagem
histórica, mesmo no caso de conceitos difíceis como a empatia histórica,
é um objetivo legítimo” 64 (PERIKLEOUS, 2011, p.222).
Outra dificuldade apontada por Lee (2011), refere-se ao fato que os
alunos quando são apresentados a ações ou situações estranhas do pas-
sado estes tendem a não perceber estas situações como problemáticas.
Segundo o autor, os alunos estão tão acostumados a conviver com coisas
que gostam ou não, que as situações estranhas do passado são assimila-
das dentro do quadro inexplicável da diversidade do comportamento
humano.
Outro comportamento observado em pesquisas com alunos sobre
o conceito de empatia histórica e que estes tendem a interpretar o pas-
sado com base em ideias e valores do presente. Wineburg definiu está
tendência como “presentismo”. O presentismo baseia-se na ideia de um
passado familiar e similar ao presente. O passado é percebido como
“culturalmente homogêneo com o presente, mas habitada por pessoas
menos inteligentes / racionais ou menos morais do que as pessoas de

63 Tradução da autora. No original “lacked the contextual knowledge, historical evidence and life experience
needed to make sense of people in the past” (PERIKLEOUS, 2011, p.222).

64 Tradução da autora. No original “develop more powerful ideas, and in this sense the aspiration of
developing their understanding, even in the case of difficult concepts such as historical empathy, is a
legitimate aim” (PERIKLEOUS, 2011, p.222).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 163

hoje” 65 (PERIKLEOUS, 2011, p.225). Esta ideia de passado deficitário se


encontra em quase todos os estudos que se voltam para a análise da em-
patia histórica em alunos. Estes tendem a ver as pessoas do passado
como menos inteligentes, porque não contavam com o progresso e tec-
nologia de hoje. Alguns alunos são incapazes de pensar as pessoas do
passado como indivíduos que viviam um mundo diferente feito de ideias
e valores distintos dos próprios. De acordo com Brooks, “Este ato não é
simplesmente um mau costume em que alguns caem, mas uma "condi-
ção psicológica, uma maneira de pensar que vem bastante
naturalmente” 66 (BROOKS, 2008, p.130-131).
Muitas vezes os alunos quando interpelados a justificarem o com-
portamento das pessoas do passado o fazem empregando projeções
pessoais, ignorado o contexto histórico e o conhecimento substantivo
da situação em questão. Trata-se de uma justificativa restrita do com-
portamento humano, as decisões não são somente resolvidas a partir de
uma vontade individual, fatores como contexto e a situação em questão
são elementos relevantes no campo do agir humano e devem ser levados
em consideração.
Perikleous afirma que esta maneira de lidar com o passado de
forma simples e estereotipada está vinculada a tendência:

[...] de usar a maneira mais fácil de pensar e no caso da história, o mais fácil
é ver o passado como uma outra versão do presente. Esse fenômeno não é

65 Tradução da autora. No original “culturally homogenous with the present, but inhabited by people who
were less smart/ rational or less moral than people today” (PERIKLEOUS, 2011, p.225).

66 Tradução da autora. No original “this act is not simply a bad habit that some fall into, but a “psychological
condition at rest, a way of thinking that comes quite naturally” (BROOKS, 2008, p.130-131).
164 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

restrito a história, pois é provável que as dificuldades dos alunos em levar


em consideração as diferentes ideias e crenças de outras pessoas também
se apliquem quando tiverem de lidar com as ações, práticas e instituições
nas culturas contemporâneas com as quais eles não estão familiarizados 67
(PERIKLEOUS, 2011, p.226).

Provavelmente por isso a empatia histórica seja uma realização tão


difícil de alcançar, porque vai na contramão do senso comum e de uma
tendência natural de pensar. Entretanto, mesmo com todas as críticas e
dificuldades o conceito de empatia histórica tem sido aplicado em pes-
quisas e em sala de aula e resultados positivos têm sido obtidos.
Peter Lee, Alaric Dickinson e Rosalyn Ashby (1997), pelo projeto
CHATA, buscaram mapear a progressão das ideias históricas de alunos
entre 7 a 14 anos de idade. O foco deste estudo foram os conceitos de
segunda ordem, entre estes o de empatia histórica. Com o intuito de
mapear o desenvolvimento da empatia histórica os alunos responderam
a questões relativas a vida na Bretanha antes da conquista romana e as
relações entre britânicos e romanos após a conquista. De maneira mais
específica tiveram que explicar as razões de determinadas ações, como
a invasão da Bretanha pelo imperador Cláudio. Com base nas narrativas
recolhidas os autores chegaram à conclusão que quase todas as crianças,
até mesmo as mais jovens, foram capazes de fornecer explicações plau-
síveis para ações individuais em história. Os autores também

67 Tradução da autora. No original “[…] to use the easiest way of thinking and in the case of history, the easiest
one is to see the past as another version of the present. This phenomenon is not restricted in the case of
history, since it is likely that students’ difficulties in taking into consideration the different ideas and beliefs
of other people also apply when they have to deal with the actions, practices and institutions in contemporary
cultures with which they are not familiar” (PERIKLEOUS, 2011, p.226).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 165

observaram uma progressão nas ideias dos alunos que iam desde a ex-
plicação pautada por questões meramente pessoais à necessidade de
explicar a ação com base nos objetivos esperados e de acordo com o con-
texto em questão.
Lukas Perikleous (2011) analisou as ideias de empatia histórica de
alunos cipriotas entre 9 -12 anos de idade. O foco principal do estudo
era analisar como estes alunos entendiam algumas práticas sociais e
institucionais do passado. Os alunos responderam a duas questões que
versavam sobre o tratamento que as crianças cipriotas recebiam na Es-
parta Antiga e no início do século XX. Como já relatado em outros
estudos, Perikleous observou que o presentismo dominava as ideias his-
tóricas destes alunos. Assim como a tendência dos alunos interpretarem
o passado em termos deficitários, como se as pessoas do passado fossem
menos inteligentes e não agissem com base em escopos racionais. Como
já mencionado no estudo conduzido por Lee, Dickinson e Ashby, Peri-
kleous também ressaltou o potencial dos alunos mais jovens capazes em
desenvolver conceitos de segunda ordem como o de empatia histórica.
Martyn Davison (2012) em sua tese de doutorado buscou desenvol-
ver e analisar a progressão da concepção de empatia histórica de alunos
neozelandeses entre 14 e 16 anos de idade. O autor abordou com os alu-
nos a participação dos australianos e dos neozelandeses na Primeira
Guerra Mundial focando-se principalmente na campanha de Gallipoli de
1915. As questões se concentraram principalmente em torno de duas
questões: o que motivou estes jovens a viajarem tão longe para combater
na Guerra e o que eles provaram lutando na península de Gallipoli em
1915.
166 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

A partir do uso em sala de aula de uma vasta documentação como


filmes, transcrições de relatos de veteranos, fotos e jornais de época,
Davison tinha como objetivo estimular tanto a esfera afetiva como cog-
nitiva dos alunos. De acordo com Davison, o aspecto afetivo deve ser
levando em consideração no desenvolvimento da empatia histórica,
pois é por meio destes que os alunos poderão tentar entrar no passado.
Em sua pesquisa ele buscou demonstrar como a mobilização de aspectos
afetivos e cognitivos são eficientes para o desenvolvimento do conceito
de empatia em sala de aula e que é possível desenvolver ideias históricas
mais elaboradas em jovens alunos do ensino médio.
Estas pesquisas, entre outras, demonstram que é possível desen-
volver um conceito de empatia histórica mais elaborado em sala de aula.
Como já mencionado acima, a empatia é um fator importante para a
compreensão das ações do homem no passado. Segundo Lee (2004, p.92),
sem empatia não seria possível compreender as ações históricas e, “es
por esto que adquirir la disposicion hacia la empatia es una parte esen-
cial del aprendizaje de la historia”.
Para Darren Bryant e Penney Clark, a empatia histórica:

Fornece a chave para deslocar os alunos de uma empatia sentimental para


uma rica compreensão dos agentes históricos e dos contextos em que eles
viveram, ao mesmo tempo, reconhecendo a vasta distância entre eles, os
agentes históricos e os eventos que eles estão investigando 68 (BRYANT;
CLARK, 2006, p.1060).

68 Tradução da autora. No original “provides the key to moving students beyond emotive empathy to a rich
understanding of historical agents and the contexts in which they lived, while also recognizing the vast
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 167

Pensar de forma empática o comportamento humano do passado


além de possibilitar uma compreensão válida do passado contribui para
o desenvolvimento de habilidades importantes no presente. Segundo
Martyn Davison, a empatia histórica envolve a “capacidade de ouvir ati-
vamente, reconhecer diferentes pontos de vista, negociar e
compartilhar ideias” 69 (DAVISON, 2012, p.12). São características impor-
tantes para o convívio em sociedade. A capacidade de escutar e aceitar
pontos de vistas diferentes do próprio são competências importantes
para o desenvolvimento da tolerância e do pensamento crítico.
A partir desta perspectiva a empatia histórica, portanto, exerce pa-
pel relevante na formação de cidadãos aptos para o convívio
democrático. Brooks, com base no trabalho de Barton and Levstik
(2004), afirma que, “a deliberação democrática depende da capacidade
de reconhecer que os valores, as atitudes, as crenças e as intenções de
outras pessoas podem ser diferentes dos seus próprios e que essas pers-
pectivas possuem méritos” 70 (BROOKS, 2008, p.130). É importante que
os alunos entendam que a existência de perspectivas diferentes em dis-
cussões na esfera pública é comum e válido. A diversidade de
pensamento é saudável e característico de sociedades democráticas e
estas devem ser vistas como base para uma discussão ponderada e

distance between them as historical investigators and the historical agents and events they are investigating”
(BRYANT; CLARK, 2006, p.1060).

69 Tradução da autora. No original “ability to listen actively, recognise different points of view, negotiate,
and share ideas” (DAVISON, 2012, p.12).

70 Tradução da autora. No original “democratic deliberation depends on the ability to recognize that other
people's values, attitudes, beliefs, and intentions may be different from one's own and that these perspectives
have potential merit” (BROOKS, 2008, p.130).
168 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

respeitosa e não como uma anomalia que precisa ser suprimida. A em-
patia histórica além de permitir o reconhecimento de perspectivas
diferentes possibilita a contextualização histórica das próprias pers-
pectivas, o que favorece o entendimento do diverso e a comunicação
com o outro.
Por mais complexo que seja o conceito de empatia histórica seu de-
senvolvimento deve ser buscado em sala de aula. Porque “capacita os
alunos a compreenderem a vida dos outros, do passado e do presente,
afetivamente ajustando-se a traços humanos compartilhados e compre-
endendo cognitivamente por que outra pessoa possui um conjunto
diferente de crenças” 71 (DAVISON, 2012, p.14). Pois, como visto, a capa-
cidade de compreender as ações humanas no passado é fundamental
tanto para a consecução da aprendizagem histórica quanto para a for-
mação de sujeitos aptos para o convívio democrático.

ESTUDO PILOTO

Com base na análise dos dados recolhidos no estudo exploratório


foram elaborados dois textos informativos (Anexo 5) para auxiliar os
alunos nas atividades propostas no estudo piloto. Como visto, muitos
alunos apresentavam ideias vagas sobre o que foi o fascismo. Sendo as-
sim, no primeiro texto foi considerado necessário localizar espaço-
temporalmente o movimento fascista, fornecer uma definição do termo
e descrever suas principais características.

71 Tradução da autora. No original “enables students to understand the lives of others, past and present, by
affectively tuning in to shared human traits and by cognitively comprehending why another person holds a
different set of beliefs” (DAVISON, 2012, p.14).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 169

Devido a especificidade do tema em questão os alunos também re-


ceberam um segundo texto informativo. Neste foram abordadas as
questões relativas a anexação da região do Trentino Alto Adige após a I
Guerra Mundial e ao processo de italianização dessa região. Foram tam-
bém distribuídos entre os alunos um caderno de fontes (Anexo 6)
contendo excertos do jornal La Provincia di Bolzano e dois mapas do ter-
ritório europeu antes e após a I Guerra Mundial.
A segunda etapa da pesquisa de campo foi realizada entre doze alu-
nos das duas escolas participantes. Foram selecionados três alunos de
cada uma das quatro turmas participantes. A seleção destes alunos se
deu de acordo com o nível de rendimento escolar: foram selecionados
alunos com notas acima da média, na média e abaixo da média. O intuito
de tal seleção era verificar se alunos com rendimento escolar distintos
eram capazes de compreender e responder as questões propostas.
Os alunos responderam ao estudo piloto na biblioteca durante as
aulas de História. As questões que compunham o questionário (Anexo 7)
são as que seguem:

1) Por que para Mussolini era tão importante italianizar a cidade de Bolzano e toda e a região do Alto Adige?

2) Por que os dirigentes da Liga para tutela da pesca (Fonte 7) escreviam os documentos em alemão mesmo
sabendo que era proibido pelo governo?

3) Assinale semelhanças ou diferenças nas atitudes dos comerciantes e dos alunos apresentadas pelas fontes
3, 8 e 9 e explique o porquê desses comportamentos.

4) Na fonte 13 o jornalista italiano, da Provincia di Bolzano, acusa o jornalista austríaco, o senhor Mumelter, de
ter inventado algumas notícias. Quando um historiador encontra fontes que contam histórias diferentes sobre
o mesmo assunto o que ele pode fazer para se aproximar da verdade?
170 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Na primeira questão, Por que para Mussolini era tão importante ita-
lianizar a cidade de Bolzano e toda e a região do Alto Adige?, os alunos
deveriam justificar de forma plausível a ação individual de Mussolini
tendo como base o contexto em questão e as motivações ideológicas do
regime e do próprio ditador. Como dito, a empatia histórica não requer
identificação com o personagem histórico em questão. Como explicita
Davison, a empatia “às vezes exige temporariamente levar a sério pon-
tos de vista que podem parecer estranhamente diferentes dos nossos.
Isso não significa ter que concordar ou se identificar com essas opini-
ões” 72 (DAVISON, 2012, p.12).
Nas questões número dois e três os alunos deveriam fornecer ex-
plicações para o comportamento da população de Bolzano durante o
regime fascista. Para responder de forma válida estas questões os alu-
nos deveriam conseguir justificar comportamentos distintos da
população frente ao regime. Por um lado, existiam os membros da liga
para tutela da pesca e comerciantes que ainda adotam a língua alemã
em suas comunicações e publicidade, por outro lado, tem-se alunos que
recebem encômios do jornal por se sobressaírem no aprendizado da lín-
gua italiana.
A questão número quatro, Quando um historiador encontra fontes
que contam histórias diferentes sobre o mesmo assunto o que ele pode
fazer para se aproximar da verdade?, pode ser analisada a partir de

72 Tradução da autora. No original “sometimes requires temporarily taking seriously views that might seem
strangely different to our own. This doesn’t mean having to agree or identify with these views” (DAVISON,
2012, p.12).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 171

diferentes perspectivas. Seria possível analisar como os alunos lidam


com narrativas divergentes sobre o mesmo tema, como também seria
possível investigar qual a concepção de evidência revelada por estes. O
objetivo desta questão foi de complementar a pergunta número 10 do
questionário das ideias tácitas, que versou sobre a escrita da história.
Neste sentido, buscou-se entender como os alunos consideram as fontes
e o trabalho metodológico do historiador necessários para a escrita da
história.
A partir da análise dos doze questionários recolhidos foi possível
constatar que os alunos haviam compreendido de forma geral quase to-
das as tarefas propostas. No entanto, observou-se que a questão número
três causou algumas incompreensões. Nenhum dos doze alunos conse-
guiram inferir, a partir dos excertos selecionados, a incongruência
entre o comportamento dos comerciantes e dos alunos elogiados pelo
jornal e a partir daí justificar esta distinção. Tratam-se de alunos que
não estão acostumados a este tipo de atividades com fontes e esta ques-
tão demandava um nível de abstração maior.
Com base nos resultados obtidos, decidiu-se manter as questões
um, dois e quatro e implementar o estudo principal com uma questão
referente as mídias. A intenção era averiguar se, de alguma forma, o fato
dos alunos manusearem o jornal La Provincia di Bolzano durante o es-
tudo principal causaria modificações nos padrões de respostas obtidos
no questionário das ideias previas.
4
ESTUDO PRINCIPAL: ANÁLISE E CATEGORIZAÇÃO
DAS IDEIAS HISTÓRICAS DOS ALUNOS

A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo
da busca. E ensinar e aprender não pode dar-se fora da procura, fora da boniteza
e da alegria.
Paulo Freire

Neste capítulo foram analisadas as narrativas dos alunos obtidos


no Estudo Principal. A partir da Grounded Theory, as narrativas foram
agrupadas e categorizadas em níveis de progressão. Foram investigadas
as ideias históricas dos alunos sobre o conceito de empatia histórica, seu
posicionamento diante dos meios de comunicação atuais e suas ideias
acerca da escrita da história. Posteriormente estes dados foram anali-
sados quantitativamente afim de possibilitar ulteriores análises a
respeito das respostas obtidas nas duas escolas participantes.

ESTUDO PRINCIPAL

Os alunos participantes desta última fase da pesquisa de campo


eram membros das turmas analisadas nas etapas precedentes. No total,
82 alunos participaram do Estudo Principal, 39 alunos da Escola A e 43
da Escola B. O Estudo Principal desenvolveu-se durante uma aula de
História e desenrolou-se em duas etapas: em um primeiro momento foi
feita a leitura dos textos informativos (Anexo 5) e do caderno de fontes
(Anexo 6). Logo em seguida, o questionário (Anexo 8) foi lido aos alunos
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 173

com uma explicação sobre os objetivos das tarefas propostas. Neste mo-
mento foi explicado, por exemplo, que os textos informativos e as fontes
deveriam auxiliá-los na tarefa, no entanto não continham as respostas
das questões. Sendo assim, foi esclarecido aos alunos que não deveriam
copiar frases destes documentos. A partir da temática fascismo e por
meio do jornal La Provincia di Bolzano os alunos foram desafiados a pro-
porem explicações acerca de algumas ações humanas do passado, com o
intuito de analisar em seguida suas concepções de empatia histórica.
O questionário utilizado nesta fase se manteve semelhante ao
questionário proposto no estudo piloto. Entretanto, uma questão que
causou incompreensões foi substituída por uma que averiguava o posi-
cionamento dos alunos frente as mídias. Esta questão já havia sido feita
no questionário das ideias prévias. Todavia, após uma reformulação, foi
reproposta nesta fase. O intuito aqui foi estabelecer se o contato com o
jornal La Provincia di Bolzano causaria alguma alteração em comparação
às respostas obtidas na fase anterior.
As questões que os alunos responderam no Estudo Principal foram:

1) Por que para Mussolini era tão importante italianizar a cidade de Bolzano e toda a região do Alto Adige?
2) Por que os dirigentes da Liga para tutela da pesca (Fonte 7) escreviam os documentos em alemão sabendo
que isso era proibido pelo governo?
3) Quando um historiador encontra fontes que contam histórias diferentes (Fonte 13) sobre o mesmo
assunto o que ele pode fazer para se aproximar da verdade?
4) Os meios de comunicação (televisão e jornais) atuais são confiáveis, pois contam as notícias da forma
como elas ocorreram. Você concorda com esta afirmação?

( ) Sim. Justifique tua resposta.

( ) Não. Justifique tua resposta.


( ) Outro. Justifique tua resposta.
174 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

ANÁLISE E CATEGORIZAÇÃO

As narrativas dos alunos foram processadas e sistematizadas qua-


litativamente por um modelo inspirado na Grounded Theory. Em um
primeiro momento se procedeu com uma codificação aberta, com uma
categorização mais empírica levou-se em consideração os níveis de ela-
boração das respostas. Partiu-se de um nível mais baixo de
compreensão da tarefa proposta, de respostas mais fragmentadas e re-
sultado de cópias dos textos informativos e fontes, passando para um
nível de compreensão avançado da questão, respondida de forma pes-
soal e crítica. Este primeiro momento de codificação é importante por
deixar em aberto a possibilidade de que novas ideias e nuances possam
emergir. Esta flexibilidade estaria comprometida caso os dados já esti-
vessem sido inseridos em categorias a priori.
Em seguida, prosseguiu-se com a elaboração de categorias nas
quais foi possível inserir as narrativas que apresentavam o mesmo pa-
drão de respostas. 73 Nestas categorias buscou-se acolher narrativas que
apresentavam conteúdos semelhantes em termos de ideias sobre a

73 A elaboração das categorias desta pesquisa foi influenciada por outros estudos da área, como: LEE, Peter;
DICKINSON, Alaric; ASHBY, Rosalyn. “Just another emperor”: Understanding action in the past. International
Journal of Educational Research, v.3, n.27, pp. 233-244, 1997. LEE, Peter. Nós fabricamos carros e eles tinham
que andar a pé”: compreensão das pessoas do passado. In. BARCA, Isabel. Educação histórica e museus. Actas
das Segundas Jornadas Internacionais de Educação Histórica. Braga: Lusografe, 2003. BARCA, Isabel; GAGO,
Marília. Aprender a pensar em História: um estudo com alunos do 6º ano de escolaridade. Revista Portuguesa
de Educação, v.1, n. 14, pp. 239-261, 2001. DAVISON, Martyn. “It is Really Hard Being in Their Shoes”:
Developing Historical Empathy in Secondary School Students. 2012. 246 f. Tese (Doutorado em Educação) –
Faculdade de Educação, The University of Auckland, Auckland, 2012. PERIKLEOUS, Lukas. Why Did They Treat
Their Children Like This?: A Case Study of 9-12 year-old Greek Cypriot Students’ Ideas of Historical Empathy,
in: PERIKLEOUS, L and SHEMILT, D (Org.). The future of the past: Why does history education matters,
Nicosia: AHDR, 2011.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 175

empatia histórica, posicionamento diante as mídias e concepção de es-


crita da história. A análise mais profunda permitiu uma reformulação
das categorias, com objetivo de inserir todos os padrões encontrados.
Este procedimento permitiu identificar um modelo de progressão nas
respostas obtidas. Os dados foram em seguida analisados quantitativa-
mente com o intuito de retratar em números o percentual de alunos em
cada nível identificado e fornecer um quadro comparativo entre os alu-
nos das escolas participantes.
A categorização das repostas dos alunos em níveis de progressão
não tem por objetivo vincular os resultados obtidos à ideia de fracasso
escolar ou mapear o desenvolvimento do aprendizado histórico, seja ele
escasso ou avançado. A classificação é útil por permitir identificar as
ideias históricas dos alunos e a partir disso elaborar estratégias eficazes
para endereça-las a níveis mais avançados. É de fundamental importân-
cia conhecer as ideias históricas dos alunos, pois é através destas que
eles constroem seu pensamento histórico.

QUESTÃO 1

Na primeira questão os alunos foram solicitados a responder a se-


guinte pergunta: Por que Mussolini queria italianizar a cidade de Bolzano
e toda a região do Alto Adige? Como mencionado anteriormente, o con-
ceito de empatia não está vinculado a ideia de identificação. Os alunos
não precisam se identificar com o ator da ação analisada para compre-
ender as razões que levaram Mussolini a italianizzare a região do Alto
Adige. A empatia histórica requer que se leve em consideração ideias e
176 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

perspectivas diferentes das próprias. E como assevera Davison (2012),


isso não significa concordar ou se identificar com esses pontos de vista.
Conforme Lee (2003, p.21), “é possível considerar os objectivos e as cren-
ças ou convicções das pessoas no passado sem as aceitar”.
As categorias foram elaboradas com base nas razões atribuídas
para explicar as ações de Mussolini e a presença, ou não, de referências
ao contexto da situação. Os perfis designados seguem o modelo pro-
posto por Peter Lee, Alaric Dickinson e Rosalyn Ashyb (1997) no Project
CHATA. As narrativas foram codificadas de acordo com o nível de com-
plexidade das respostas. Foram identificados quatro níveis de
progressão: Nível 1 - Cópia e Fragmentos, Nível 2 - Pessoal, Nível 3 -
Ditador e Nível 4 - Análise do contexto.

NÍVEL 1 - CÓPIA E FRAGMENTOS

Nesta categoria foram inseridas respostas que utilizaram de forma


inconsistente fragmentos dos textos informativos ou demonstraram
pouco compreensão da questão, não fornecendo algum tipo de explica-
ção para as ações de Mussolini.
Algumas destas cópias resultaram em frases com pouco
sentido como é o caso da resposta de Isadora. Foram também
incluídas nesta categoria narrativas como as de Joyce, trata-se de
uma cópia do texto informativo e ao mesmo tempo revela pouca
compreensão da questão. O excerto copiado descreve algumas
mudanças que ocorreram na região devido o processo de
italianizzazione, mas não explica as razões que levaram
Mussolini e o regime fascista a tomar este procedimento.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 177

- Porque ele achava que poderia ter a fronteira de um país dentro do outro e [mando?] abaixar sua bandeira
(Isadora, 1º Ano, Escola B)
- Por poder, as pessoas tiveram que trocar suas identidades, crianças teriam que ir pro colégio (Yara, 3º Ano, Escola
B).
- O fascismo foi uma ditadura sob liderança de Mussolini com o fim da I guerra a italia estava em crise como
solução ele italianizou Bolzano e a regiao do Alto Adige (Frederica, 2º Ano, Escola A).
- Os nomes das pessoas tiveram que mudar, ser italianizados, bem como o nome dos estabelecimentos comerciais,
jornais, ruas e praças da cidades (Joyce, 3º Ano, Escola A).

NÍVEL 2 – PESSOAL

Neste nível as justificativas dadas ao comportamento de Mussolini


se limitaram a mencionar o que ele queria, quais eram seus desejos pes-
soais. O processo de italianizzazione derivava de uma necessidade
pessoal. Para Marlon, ele era italiano e queria que todos fossem igual a ele.
Os alunos sabiam que estavam tratando com ações de um ditador fas-
cista, mas em nenhum momento nas justificativas seu comportamento
foi vinculado ao seu papel político ou ao contexto da situação. Nestas
narrativas não foram identificadas razões para o comportamento de
Mussolini, mas apenas desejos pessoais, também não fizeram menção
ao contexto no qual a ação em questão se efetivou.

- Porque era uma região estratégica para Mussolini (Fábio, 3° Ano, Escola B).

- Porque ele acreditava que seria melhor para a região (Nicole, 1° Ano, Escola B).
- Porque ele queria que as pessoas assumissem a identidade italiana, e com isso houve várias mudanças e o italiano
passou a ser usado como a língua oficial (Matilde, 3° Ano, Escola A).
- Porque ele era italiano e queria que todos fossem igual a ele que os italiano eram melhor que os outros (Marlon,
2º Ano, Escola A).
178 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

NÍVEL 3 – DITADOR

As respostas inseridas nesta categoria explicaram o comporta-


mento de Mussolini levando em consideração apenas o fato de este ser
um ditador. Ou seja, Mussolini era um ditador e, portanto, agia como
tal. Sua linha de conduta decorria do cargo por ele ocupado. Sendo as-
sim, em consonância com seu papel, a italianizzazione foi percebida por
estes alunos como um modo de demonstrar um poder maior sobre os pa-
íses mais próximos. Ou como escreveu Roberto, para que o seu regime
mostrasse como a Itália era uma potência.
Este tipo de explicação do agir humano no passado pode também
ser definido como: Estereótipos Generalizados. Ocorre quando as ações
passadas são explicadas “em termos de estereótipos convencionais de
papéis, instituições etc” 74 (LEE, DICKINSON; ASHYB, 1997, p.242). Neste
caso, o comportamento de Mussolini é explicado com base naquilo que
geralmente os ditadores querem e fazem.

- Para que o seu regime mostrasse como a Itália era uma potência, a grandeza nacional. Assim aumentando a
Itália (Roberto, 1° Ano, Escola B).

- Eles tiveram que mudar porque o fascismo é como o nazismo na Itália e o Mussolini é um Hitler italiano, ele quer
levantar e expandir o território italiano (Filipe, 1° Ano, Escola B).

- Para mostrar poder, já que o território foi conquistado pela Italia quando a Austria perdeu na Primeira Guerra
Mundial (Luna, 3° Ano, Escola B).

- Para poder ter um poder maior sobre os países mais próximos (Juan, 3° Ano, Escola A).

74 Tradução da autora. No original “in terms of conventional stereotypes of roles, institutions etc” (LEE,
DICKINSON; ASHYB, 1997, p.242).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 179

NÍVEL 4 - ANÁLISE DA SITUAÇÃO

Foram inseridas neste nível de progressão as respostas dos alunos


que conseguiram conectar as ações de Mussolini ao contexto e a ideolo-
gia do regime fascista. Suas ações não são vistas apenas como fruto de
um desejo pessoal ou natural a qualquer outro ditador. Nestas narrati-
vas as medidas tomadas por Mussolini são explicadas de forma mais
complexa.
Nas respostas do quadro abaixo os alunos fizeram menção a ane-
xação da região do Trentino Alto Adige e explicitaram como o alto
nacionalismo, o ‘orgulho fascista’, o patriotismo são aspectos relevantes
para se entender o porquê da italianizzazione daquela região. As ações
de Mussolini neste nível são explicadas levando em consideração o con-
texto em questão, suas ideias, seus valores e qual objetivo esperado.

- Já que essa região foi anexada à Itália, ela teria que ter a mesma cultura, economia e política do restante do país.
O ‘orgulho fascista’ não deixaria que outros povos (agora anexados a Itália) não seguissem a ideologia (Heitor, 3°
Ano, Escola B).
- Pois um dos ideais do movimento (regime) era reerguer a nação e defender o direito de todos. Com a apropriação
do território austríaco (húngaro). Mussolini reafirmava a unidade do povo, garantia mais habitantes para a nação
e colocaria em prática a anulação dos direitos individuais de milhares de pessoas em prol do bem da Nação. Isto
também serviria de recado aos outros países, garantindo a conquista de territórios e patriotas (Edgar, 3° Ano,
Escola B).
- Porque na parte governamental toda a região pertencia a Itália e com a rigidez do governo fanático pelo
patriotismo que evitou qualquer coisa que tivesse parte germânica tirando da região e impondo o seu italianismo
(Afonso, 3° Ano, Escola A).
- Porque estas regiões foram anexadas ao território italiano após a assinatura do Tratado de Saint-Germain. E por
causa do seu alto nacionalismo (Clara, 1° Ano, Escola B).
180 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

QUESTÃO 2

Na segunda pergunta os alunos foram solicitados a responder: Por


que os dirigentes da Liga para tutela da pesca (Fonte 7) escreviam os
documentos em alemão sabendo que isso era proibido pelo governo? A
partir da leitura dos textos informativos, em geral, e da fonte 7, em par-
ticular, esperava-se que os alunos fossem capazes de estabelecer
“conexões entre a situação na qual as pessoas se encontravam, as cren-
ças que tiveram sobre essa mesma situação, os seus valores e ideias
sobre o mundo” (LEE, 2003, p.21).
Com base nos dados obtidos as respostas foram categorizadas em
quatro níveis de progressão: Nível 1 – Cópia e Fragmentos, Nível 2 –
Presentismo, Nível 3 – Empatia Histórica Restrita e Nível 4 – Empatia
Histórica Contextualizada.

NÍVEL 1 – CÓPIA E FRAGMENTOS

Nesta categoria encontram-se narrativas derivadas de cópias dos


textos informativos ou dos excertos do jornal. Em algumas respostas,
além das frases ou expressões copiadas também foram acrescidos al-
guns comentários pessoais do autor. No entanto, algumas respostas são
inteiramente fruto de cópia, como é o caso da resposta dada por Samara.
Algumas destas cópias foram feitas de forma inconsistente, o que difi-
culta a compreensão, como é o caso da resposta dada por Isadora.
Percebe-se uma dificuldade por parte destes alunos de entenderem o
que foi solicitado na tarefa além de problemas de entendimento restrito
das informações contidas nos textos e nas fontes.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 181

- Para mudar a língua do país, mas assim ele nem liam a tutela (Isadora, 1° Ano, Escola B).

- Pois eles eram sem vergonhas, e que pelos ordens recebidas, teriam que jogar os documentos fora (Liam, 3° Ano,
Escola B).
- Os alemães eram poucos inteligente. Eles tinham uma categoria sem vergonha. (Mariana, 2° Ano, Escola A).
-Esse dirigentes escreviam em alemão porque acreditavam que ser mais prático mandar as cartas para as pessoas.
E proibido mandar as circulações em alemão, só é permitido mandar em italiano. (Elisa, 3° Ano, Escola A).
- Porque esses senhores acreditavam ser mais prático mandar as circulares em alemão enquanto nós podemos
demonstrar que são uns tolos. Os prefeitos recebiam ordens para que todas as circulares em alemão fossem jogadas
no lixo sem serem lidas (Samara, 3° Ano, Escola A).

NÍVEL 2 – PRESENTISMO

Neste nível de categorização as narrativas selecionadas revelaram


um esforço de compreensão histórica das ações dos dirigentes da Liga
pela tutela de pesca. No entanto, os alunos forneceram explicações com
base na sua própria experiência, sem levar em consideração o contexto
e a distinção entre o passado e presente. É bastante comum que os alu-
nos “projetem seus próprios sentimentos nos sujeitos históricos e
tentem imaginar como seria estar em uma dada situação” 75 (BRYANT;
CLARK, 2006, p.1041). Trata-se de uma justificativa restrita do compor-
tamento humano, uma vez que decisões não são tomadas com base
apenas em vontades individuais. Aspectos como contexto e situação são
fatores relevantes no campo da ação humana e devem ser levados em
conta.
As respostas dadas neste nível de categorização refletiram uma
restrita capacidade de compreensão e explicação do comportamento em

75 Tradução da autora. No original “project their own feelings into the historical actors and try to imagine
what it would be like to be in the situation” (BRYANT; CLARK, 2006, p.1041).
182 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

questão. Tratou-se sobretudo de um exercício de imaginação, no qual os


alunos se projetaram naquela situação e forneceram explicações com
base em pressupostos válidos no presente. Para estes alunos os dirigen-
tes escreviam em alemão, porque nem todos tinham a capacidade de
aprender tão rápido outra língua, ou porque era mais fácil e por costume.
Como mencionado, esta tentativa de explicação do comportamento
das pessoas no passado revelou uma projeção pessoal por parte dos alu-
nos. Todavia, não foi acrescida de noções fundamentais para
consecução da empatia histórica como compreensão das ideias, das in-
tenções dos agentes históricos, do contextual situacional e a capacidade
de ligar tudo isso às ações tomadas por eles.

- Porque nem todos tinham a capacidade de aprender tão rápido outra língua (Filippa, 1° Ano, Escola B).

- Por acreditarem ser mais fácil (Davide, 1° Ano, Escola B).

- Pela praticidade em escrever em alemão, por costume (Diego, 3° Ano, Escola B).

- Para que não fossem lidos e assim ele fazia o que bem queria (Jorge, 2° Ano, Escola A).

- Porque como os criadores [de peixes] eram alemães, eles acreditavam que teria uma certa facilidade em mandar as
cartas em alemão (Sílvio, 1° Ano, Escola B).

- Porque queriam manter a língua nativa (Danilo, 3° Ano, Escola A).

NÍVEL 3 – EMPATIA HISTÓRICA RESTRITA

As respostas inseridas nesta categoria forneceram explicação das


ações passadas fazendo menção a situação de proibição da língua. Estes
alunos foram capazes de vincular o comportamento dos agentes histó-
ricos ao processo de italianizzazione. De acordo com as narrativas
selecionadas, os dirigentes da Liga escreviam em alemão mesmo sendo
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 183

proibido, porque mudar sua língua sua cultura era revoltante ou para mos-
trar que o alemão não iria ser extinto no local.
Neste nível de progressão os alunos demonstraram entender a si-
tuação de proibição da língua alemã que não foi mencionado nas
narrativas do nível anterior. No entanto, a concepção de empatia histó-
rica foi considerada restrita, porque não foram capazes de tecer um
quadro maior do contexto da situação e também por fornecerem um
número restrito de razões para explicar o comportamento dos agentes
históricos.

- Pois eles defendiam a opinião contraria e ter que mudar sua língua sua cultura era revoltante, eles teriam que
aprender uma nova língua sozinhos p/ eles era mais fácil usar sua própria língua até como forma de revolta
(Eugênio, 1° Ano, Escola B).
- Para que o povo pudesse entender claramente, e em certo ponto mostrar que o alemão não iria ser extinto no local
(Eva, 3° Ano, Escola B).
- Porque acreditavam que seria mais fácil mandar em alemão. Mesmo sendo proibido pelo governo mandavam em
alemão como se fosse uma crítica ao governo. (Chiara, 3° Ano, Escola A).
- Porque eles queriam mostrar que o alemão ainda estar fluente e assim mandavam os documentos em alemão
mesmo sendo proibido. (Martim, 2° Ano, Escola A).

NÍVEL 4 – EMPATIA HISTÓRICA CONTEXTUALIZADA

As narrativas inseridas nessa categoria se assemelham às do nível


precedente. Entretanto, trazem explicações à ação dos agentes históri-
cos pautadas em um contexto mais amplo da situação, além de
fornecerem um número maior de razões para tal comportamento. Ed-
gar e Roberto, por exemplo, entenderam a manutenção da língua alemã
como uma questão de resistência ao fascismo, um movimento contra o re-
gime e a afirmação que ainda existem germânicos dentro do território e que
estes não queriam ser italianizados.
184 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Estas narrativas demonstraram entender que para explicar o agir


humano no passado é preciso considerar o contexto, as ideias e inten-
ções que mobilizaram o agir dos sujeitos do passado. A compreensão do
porquê as pessoas do passado agiram de uma determinada maneira re-
sulta da tentativa de entender suas ideias, o modo como viam o mundo
e o contexto histórico no qual estavam inseridos.

- Pois com isso demonstravam uma certa resistência com o regime fascista e demonstravam que ainda existem
germânicos dentro do território e estão aptos a iniciar um movimento contra este regime, isto que é estritamente
proibido dentro da nação (Edgar, 3° Ano, Escola B).

- Por vários motivos entre eles estão: para criticar o fascismo fazendo criticas em alemão para que as pessoas que
estivessem sendo ‘italianizadas’ acabassem notando o que estava acontecendo. Outro motivo era porque o idioma
falado por ele era alemão e ele não queria ser italianizado (Roberto, 1° Ano, Escola B).

QUESTÃO 3

Na terceira questão os alunos responderam a seguinte pergunta:


Quando um historiador encontra fontes que contam histórias diferen-
tes (Fonte 13) sobre o mesmo assunto o que ele pode fazer para se
aproximar da verdade? Ao se questionar sobre como o historiador se
aproxima da verdade, não se está sugerindo que a história lida com ver-
dades absolutas. Como declarou Jacques Le Goff, “a objetividade
histórica – objetivo ambicioso – constrói-se pouco a pouco através de
revisões incessantes do trabalho histórico, laboriosas verificações su-
cessivas e acumulação de verdades parciais” (LE GOFF, 1990, p.33). As
pretensões de verdade na história são mais modestas, parciais e sujeitas
à historicidade.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 185

O historiador abandonou suas ambições de reconstruir de forma


objetiva os acontecimentos do passado do modo em que ocorreram. Com
o reconhecimento dos seus limites sobreveio o ‘tempo da desconfiança’.
Para Certeau, a história reconheceu que “toda interpretação histórica
depende de um sistema de referência; que este sistema permanece uma
"filosofia" implícita particular; que se infiltrando no trabalho de aná-
lise, organizando-o à sua revelia, remete à "subjetividade" do autor”
(CERTEAU, 1982, p.66).
No entanto a impossibilidade de narrar o passado como realmente
ocorreu não significa que a história desistiu de suas pretensões de ver-
dade. Segundo Roger Chartier, abandonar “essa intenção de verdade,
talvez desmesurada mas certamente fundadora, seria deixar o campo
livre a todas as falsificações, a todos os falsários que, por traírem o co-
nhecimento, ferem a memória” (CHARTIER, 2002, p.100).
Mesmo reconhecendo que o conhecimento histórico é fruto de se-
leção, que os fatos históricos são construídos e que a história é também
uma prática social, parte-se aqui do pressuposto que a narrativa cons-
truída não é ficcional. O conhecimento histórico não resulta de um ato
de imaginação pura,

ele é suportado e inferido com base em evidências, as quais o historiador


deve ser capaz de interpretar, isto é capaz de reconstituir – construir his-
toricamente – tendo em atenção o problema e as questões das quais partiu
e a que tenta dar resposta (GAGO, 2012, p.38).

Buscou-se com esta questão investigar como os alunos entendem


o trabalho metodológico realizado pelo historiador. No questionário das
186 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

ideias prévias os alunos mencionaram a importância das fontes para a


escrita da história. Entretanto, foram poucos os que fizeram menção ao
fato de que a escrita da história é fruto de construções por parte do his-
toriador. Com base nos dados obtidos nesta questão foram identificadas
quatro categorias: Nível 1 – Tautológico, Nível 2 – Testemunhas; Nível
3 – Quantidade e Soma de Fatores e; Nível 4 – Contextualização e Sub-
jetividade.

NÍVEL 1 – TAUTOLÓGICO

As respostas inseridas nesta categoria têm em comum sua natu-


reza redundante. Para estes alunos quando o historiador se depara com
fontes que contam histórias diferentes sobre o mesmo tema a solução é
pesquisar mais e se aprofundar no assunto. Nas narrativas contidas no
quadro abaixo não foi exemplificada nenhuma saída válida para o em-
passe proposto pela questão. As respostas tendiam a repetir a mesma
ideia em termos diferentes ou são dadas soluções vagas como pesquisar
a história. O fato de pesquisar mais e se aprofundar no assunto não re-
vela nada sobre o trabalho metodológico necessário para a construção
do conhecimento histórico.

- Pesquisar a história (Ariel, 1° Ano, Escola B).

- Pesquisar mais e se aprofundar no assunto (Levi, 1° Ano, Escola B).


- Pesquisar mais sobre o assunto (Valentina, 3° Ano, Escola B).
- Buscar os fatos, datas, nomes, etc (Simão, 3° Ano, Escola B).
- Ele pode sair pesquisando sobre o assunto que ele quer saber assim ele vai entender o que realmente se passou ou
passa (Martim, 2°Ano, Escola A).
- Pesquisando e investigando melhor para fazer suas histórias (Juan, 3° Ano, Escola A).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 187

NÍVEL 2 – TESTEMUNHAS

As respostas inseridas neste nível de progressão propuseram como


solução para a existência de versões diferentes sobre o mesmo tema
consultar testemunhas, pessoas ou familiares que viveram esse fato. Para
estes alunos o historiador para se aproximar da verdade deve recorrer
aos relatos humanos. Percebe-se uma desvalorização do escrito. O olhar,
o fato de poder testemunhar, torna-se instrumento privilegiado para o
estabelecimento da ‘verdade’.
Conforme Dosse (2013), desde o surgimento do gênero histórico
atribuiu-se à testemunha ocular um papel de relevo. A importância das
testemunhas é notável em obras como História de Heródoto e na História
da Guerra do Peloponeso de Tucídides. Na Grécia Antiga “criou-se um
vínculo entre ver e saber, estabelecendo como uma evidência que, para
saber, é necessário ver, de preferência a ouvir” (HARTOG, 2011, p.212).
Como afirmou Candolo, “os ouvidos são menos crédulos do que os olhos”
(HERÓDOTO, 2006, p.33).
Quando não é possível ver, resta a possibilidade de ouvir o que
ocorreu. Heródoto testemunhou a grande guerra entre persas e gregos
e escreveu com base em testemunhos próprios e de terceiros. No livro
II, enquanto discorria sobre a história e os costumes do Egito, revelou a
importância da testemunha ocular para obter a veracidade sobre o
acontecimento estudado.

Disse até aqui o que vi e o que consegui saber por mim mesmo em minhas
pesquisas. Falarei agora do país, baseado no que me disseram os Egípcios,
188 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

acrescentando à minha narrativa o que tive ocasião de observar com meus


próprios olhos (HERÓDOTO, 2006, p.177).

Assim como Heródoto, Tucídides acredita que “o saber histórico é,


então, exclusivamente o ver” (DOSSE, 2003, p.23). Consequentemente, o
oficio do historiador estaria restrito ao período e local em que se situa-
ria. Tucídides, para narrar o conflito entre a Liga do Peloponeso e a Liga
de Delos pôde contar com o próprio testemunho e em alguns casos re-
correu à terceiros. Logo no livro I, o autor afirma que a escrita da
História da Guerra do Peloponeso foi realizada,

[...] com o maior rigor possível, seja no caso de eventos dos quais participei,
seja naqueles a respeito dos quais obtive informações de terceiros. O empe-
nho em apurar os fatos se constituiu numa tarefa laboriosa, pois as
testemunhas oculares de vários eventos nem sempre faziam os mesmos re-
latos a respeito das mesmas coisas, mas variavam de acordo com suas
simpatias por um lado ou pelo outro, ou de acordo com sua memória
(TUCÍDIDES, 2001, p.14).

Para Tucídides, portanto, a história só poderia ocorrer por meio de


testemunhos, por pessoas que presenciaram o acontecimento ou, como
algumas vezes ocorreu no seu caso, através de informações obtidas por
testemunhas oculares. Porém, o autor reconhece as complicações ine-
rentes a este método ao mencionar como a subjetividade e a memória
podem alterar o testemunho. A suspeita levou a elaboração da autopsia,
método que Tucídides usava para depurar as informações obtidas. O
testemunho para ser considerado válido deveria passar por um filtro
crítico.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 189

Com a profissionalização da história, a primazia da oralidade foi


substituída pela autoridade do documento escrito. Como declarou Char-
les-Victor Langlois (1946, p.15), “a história se faz com documentos”.
Entretanto, como aponta Dosse (2013), por volta do final da década de
1970 observou-se o retorno da valorização do depoimento, o retorno da
testemunha. Mas o relato oral não estava imune à suspeita, o depoi-
mento da testemunha ocular pode também ser objeto de desconfiança.
Nas narrativas identificadas neste nível de categorização não fo-
ram, no entanto, observado nenhum tipo de suspeito. Para estes alunos,
o fato das testemunhas estarem presentes é considerado, di per se, fator
que valida a veracidade do depoimento. Como asseverou Hartog (2011),
é recorrente a confusão entre autenticidade e veracidade. A necessidade
de testemunhas para resolução da diferença entre fontes resulta, por
parte destes alunos, em uma concepção de operação historiográfica res-
trita ao tempo presente.

- Procurar se conectar com pessoas que foram próximas do assunto (Sílvio, 1° Ano, Escola B).

- Usar pessoas, ou seja, fala com pessoas ou familiares que viveram esse fato (Beatriz, 1° Ano, Escola B).

- Procurar pistas, pessoas, relatos que ajudem a saber a verdade (Gaia, 1° Ano, Escola B).

- É necessário confirmar o fato através de relatos humanos, e ter na sua mente a AMPLA CAPACIDADE de
relacionar os diferentes extremos do fato e ir em busca de opiniões e fontes que cooperem com o ocorrido, para
assim, analisar de forma neutra e imparcial aquilo que realmente e veridicamente deve ser divulgado (Edgar, 3°
Ano, Escola B).

- Ir atrás de pessoas mais velhas que possa ter visto o acontecido ou através de jornal (Filippa, 1° Ano, Escola B).
190 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

NÍVEL 3 – QUANTIDADE E SOMA DE FATORES

As respostas que se encontram nesta categoria propuseram, como


solução para a existência de fontes que narram histórias diferentes so-
bre o mesmo tema, a busca e a análise de um maior número de
documentação. As narrativas destes alunos foram inseridas em nível
mais avançando em relação ao nível Testemunhas por conceberem que
é possível, por meio de fontes e vestígios, reconstruir o tema em questão
sem necessariamente ser preciso o depoimento de alguém que tenha
presenciado o ocorrido.
Para Matias, por exemplo, buscar outras fontes ajudaria a ir com-
plementando essas. Ele também propõe buscar uma terceira fonte de
autoria neutra como solução para as contradições emergentes nas fon-
tes. Eugênio, por outro lado, parece não achar suficiente apenas mais
uma fonte e propõe buscar varias fontes p/ poder defender a qual ele [his-
toriador] julga certa.
No manual Introdução aos estudos históricos, Langlois e Seignobos
dissertaram sobre a importância de se “reunir documentos de várias es-
pécies, principalmente escritos, relativos ao passado remoto a ser
estudado” (LANGLOIS; SEIGNOBOS, 1946, p.17). Sobre a importância das
fontes, Langlois declarou que “nada supre os documentos: onde não há
documentos não há história” (LANGLOIS; SEIGNOBOS, 1946, p.15). O au-
tor ainda ressalta a importância da heurística ao constatar que,

muitas obras de erudição ou de história, elaboradas em estrita conformi-


dade com as regras do método mais exato, nasceram viciadas ou totalmente
se anularam, pela simples circunstância material de ignorar o autor a
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 191

existência de documentos que esclareciam, completavam ou destruíam

aqueles que tinha em mãos e com os quais se contentara (LANGLOIS;

SEIGNOBOS, 1946, p.15).

A premissa defendida pelos alunos que se encontram nesta catego-


ria assemelha-se ao que Langlois asseverou sobre a relevância de um
número suficiente de documentos para realização do ofício do historia-
dor. De acordo com estes alunos, um número maior de fontes forneceria
uma maior quantidade de informações e, portanto, seria a forma mais
eficaz de pôr fim às incongruências encontradas. Com base nesta pre-
missa, o papel do historiador se limitaria “ao controle da veracidade dos
eventos relatados graças às suas fontes documentárias. Sua missão
acaba assim que tenha verificado sua autenticidade” (DOSSE, 2013, p.42-
43). Como escreveu Eugênio, após pesquisar em várias outras fontes o
historiador pode chegar a qual ele julga certa.

- Encontrar novas fontes e ir complementando essas. Uma terceira fonte de autoria neutra (Matias. 3° Ano,
Escola B).

- Deve analisar os fatos, buscar mais fontes para ver outras visões e analisar para ver se isso é verdade (Murilo, 3°
Ano, Escola A).

- Fazendo pesquisas mais afundo, procurando outras fontes do mesmo ocorrido (Davide, 1° Ano, Escola B).

- Pode buscar os fatos na raiz do problema, tentar entender e buscar varias fontes p/ poder defender a qual ele
julga certa (Eugênio, 1° Ano, Escola B).

Ainda nesta categoria foram inseridas respostas que remetiam a


possibilidade de assemblar elementos comuns às duas fontes como
forma para se aproximar da ‘verdade’. A tónica destas respostas
192 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

consistia em juntar os fatos que coincidem. Para Jorge, a solução seria usar
apenas algo que as duas histórias retratem.
Collingwood, ao criticar o modo de fazer história que ele definiu de
“cola e tesoura”, mencionou a forma como as informações eram utiliza-
das:

Em regra, quando dispõe de muitas informações para escolher verifica que


uma delas lhe diz o que outra não diz; então, ambas, ou todas até, são incor-
poradas. Por vezes, chega à conclusão de que uma delas contradiz uma
outra; então, a menos que descubra um meio de conciliá-las tem de se de-
cidir por uma, deixando a outra fora (COLLINGWOOD, 2001, p.387).

A ideia de incorporar à narrativa informações contidas em fontes


diferentes remete a uma noção de soma. A história seria feita a partir
de uma atividade de cola e tesoura em que as informações seriam em
seguida assembladas de modo a forma uma narrativa inteligível. No
caso de haver contradição entre as informações seria possível buscar
uma reconciliação ou prosseguir com a eliminação do componente dis-
sonante. Chiara, propõe algo semelhante quando sugere que o
historiador pode tentar juntar os fatos parecidos.

- Juntar os fatos que coincidem, e colocar as diferenças (Erika, 1° Ano, Escola B).

- Usar apenas algo que as duas histórias retratem (Jorge, 2° Ano, Escola A).

- Ele pode tentar juntar os fatos parecidos para que a história possa se aproximar da verdade (Chiara, 3° Ano,
Escola A).

- Ler as duas, e chegar em uma conclusão, vendo as diferenças, e achando um ponto certo (Benjamin, 3° Ano,
Escola B).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 193

NÍVEL 4 – CONTEXTUALIZAÇÃO E SUBJETIVIDADE

Neste nível de categorização encontram-se as repostas que fizeram


menção a necessidade de se conhecer o contexto e a autoria das fontes.
Para estes alunos o historiador quando se depara com fontes que des-
crevem situações discordantes não precisa apelar para o depoimento de
testemunhas e nem de ir à caça de um número maior de documentação
para se aproximar da ‘verdade’. De acordo com Marta, é preciso também
ver o contexto histórico em que a fonte foi escrita.
Estas respostas indicam que as fontes não são um banco de fatos
históricos do qual é possível extrair informações, mas devem também
ser “estudados em si mesmos, em sua organização discursiva e material,
suas condições de produção, suas utilizações estratégicas” (CHARTIER,
2002, p.13). De acordo com Certeau, o historiador quando lida com fon-
tes não se limita a “fazer falar estes ‘imensos setores adormecidos da
documentação’ e dar voz a um silêncio, ou efetividade a um possível.
Significa transformar alguma coisa, que tinha sua posição e seu papel,
em alguma outra coisa que funciona diferentemente” (CERTEAU, 1982,
p.82).
O historiador não se anula perante a fonte, não se limita a trans-
crever passivamente as informações que ali se encontram após a
purificação da sua documentação por meio da crítica externa e critica
interna, como aconselhado por Langlois e Seignobos. A partir de inqui-
etações e interpelações do presente o historiador faz falar suas fontes e
constrói seus fatos. Como asseverou Lucien Febvre (1977, p.20),
194 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

“elaborar um facto é construir. Se se quiser, é fornecer uma resposta a


uma pergunta. E se não há pergunta, só há o nada”.
As respostas selecionadas neste nível de categorização também
apontaram para a importância de se conhecer quais povos estão contando
a história. De acordo com Rute e Diego, historiador precisa considerar o
histórico dos participantes e os interesses dos dois lados envolvidos. Con-
forme Edward Carr, o historiador não deveria tanto se preocupar com
os dados que contém as fontes, mas com quem a escreveu. Porque “os
fatos da história nunca chegam a nós “puros”, desde que eles não exis-
tem nem podem existir numa forma pura: eles são sempre refratados
através da mente do registrador” (CARR, 1982, p.47).
Para Carr,

Nenhum documento pode nos dizer mais do que aquilo que o autor pensava
- o que ele pensava que havia acontecido, o que devia acontecer ou o que
aconteceria, ou talvez apenas o que ele queria que os outros pensassem que
ele pensava, ou mesmo apenas o que ele próprio pensava pensar. Nada disso
significa alguma coisa, até que o historiador trabalhe sobre esse material e
decifre-o. Os fatos, mesmo se encontrados em documentos, ou não, ainda
têm de ser processados pelo historiador antes que se possa fazer qualquer
uso deles (CARR, 1982, p.43-44).

Os alunos que mencionaram a necessidade de análise do contexto


e da autoria da fonte demonstraram entender que a narrativa histórica
resulta de um processo que vai além da simples descrição das fontes. A
narrativa histórica não é uma cópia de eventos passados, esta é fruto de
uma seleção, de intepretação e de questionamentos. No manejo das fon-
tes o historiador se interroga sobre sua origem e o seu vínculo com a
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 195

sociedade que a produziu. Toda fonte é uma versão de um dado mo-


mento, conhecer seu autor, sua visão de mundo e possíveis
intencionalidades é fundamental para construção do conhecimento his-
tórico.

- Ver o contexto histórico em que a fonte foi escrita (Marta, 1° Ano, Escola B).

- Buscar as características da sociedade na época. O histórico dos participantes, se possível e procurar vestígios
de verdade em cada ponto (Rute, 1° Ano, Escola B).

- Ver o contexto, quais povos estão contando a história basicamente se imaginar na época (Roberto, 1° Ano,
Escola B).

- Pesquisar pelo contexto histórico e os interesses dos dois lados (Diego, 3° Ano, Escola B).

QUESTÃO 4

Na quarta questão os alunos responderam a seguinte pergunta: Os


meios de comunicação (televisão e jornais) atuais são confiáveis, pois con-
tam as notícias da forma como elas ocorreram. Você concorda com esta
afirmação? Justifique. Esta pergunta foi inserida novamente no estudo
principal para averiguar se a utilização dos excertos do jornal La Provin-
cia di Bolzano havia provocado alguma mudança no padrão de respostas.
As mídias estão constantemente veiculando uma quantidade
enorme de informações e acontecimentos. Ao mesmo tempo em que
produz uma ideia de atualização e conhecimento sobre a história ime-
diata no leitor/ telespectador, esta participa ativamente na construção
do material transmitido. Conforme Pierre Nora (1995, p.181), “imprensa,
rádio, imagens não agem apenas como meios dos quais os
196 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

acontecimentos seriam relativamente independentes, mas como a pró-


pria condição de sua existência”.
Diante deste quadro se faz necessário analisar as ideias que os alu-
nos manifestam sobre os meios de comunicação e sobre a maneira como
processam as informações propaladas. Estariam estes jovens munidos
de instrumentos para processar de forma analítica e crítica a produção
de informações pelas mídias? Com base nos dados coletados as respos-
tas foram categorizadas em dois níveis de progressão conforme ao
posicionamento revelado: Nível 1 – Acrítico e Nível 2 – Crítico.

NÍVEL 1 – ACRÍTICO

Encontram-se nesta categoria as respostas dos alunos que afirma-


ram acreditar que os meios de comunicação são objetivos e confiáveis.
Para Gaia, por exemplo, os meios de comunicação são atendíveis, porque
ao narrar a notícia apresentam fontes e relatos. Yan deposita sua confi-
ança na celeridade com que os meios de comunicação mantêm a
população informada. O fato de uma coisa que aconteceu do outro lado do
mundo nós já ficamos sabendo algumas horas depois justifica sua resposta.
De acordo com Nora,

O próprio do acontecimento moderno encontra-se no seu desenvolvimento


numa cena imediatamente pública, em não estar jamais sem repórter-es-
pectador nem espectador-repórter, em ser visto se fazendo (...) Daí essa
impressão de jogo mais verdadeiro que a realidade, de divertimento dramá-
tico, de festa que a sociedade dá a si própria através do grande
acontecimento (NORA, 1995, p.186).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 197

A essa espécie de ‘voyeurismo do acontecimento’ ou, o poder ob-


servá-lo enquanto é construído, segue a sensação de transparência e
autenticidade sobre o ocorrido. O imediatismo proporcionado pela tec-
nologia inviabiliza, para alguns telespectadores, pensar de forma crítica
a produção midiática. Para Dosse, a sociedade midiatizada “tem o efeito
paradoxal de facilitar a tomada de conhecimento do acontecimento,
porque ela acelera o processo de transmissão e torna, ao mesmo tempo,
a apreensão, a doação de sentido mais difícil” (DOSSE, 2013, p.262). Cria-
se o imperativo de que nada pode ficar desconhecido e o indivíduo se vê
lançado em um turbilhão de informações ao qual não é capaz de tomar
distância, de repousar um instante para processar de forma crítica so-
bre o que está acontecendo.
Outro elemento apontado para justificar a neutralidade e veraci-
dade das notícias narradas se deve a convicção que a principal função
da mídia é informar a população sobre o que ocorre. A resposta dada por
Hugo, em que afirma que hoje todo mundo está por dentro dos assuntos
graças aos meios de comunicação, é um exemplo disto. Esta declaração
remete ao que Rui Barbosa considerava como papel do bom jornalismo:

A imprensa é a vista da nação. Por ela é que a nação acompanha o que lhe
passa por perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe
ocultam e tramam, colhe o que sonegam ou roubam, percebe onde lhe alve-
jam ou nodoam, mede o que lhe cerceiam ou destroem, vela pelo que lhe
interessa, e se acautela do que a ameaça (BARBOSA, 1990, p.20).

- Sim. Pois não contam só a noticia, e sim apresentam fontes e relatos (Gaia, 1° Ano, Escola B).

- Sim. Pois eles trazem as noticias para nós de uma forma tão rápida. Tipo uma coisa que aconteceu do outro
198 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

lado do mundo nós já ficamos sabendo algumas horas depois. (Yan, 1° Ano, Escola B).

- Sim pois hoje todo mundo está por dentro dos assuntos, e se torna mais fácil ficar por dentro dos assuntos por
causa das tecnologias (Hugo, 3° Ano, Escola B).

- Sim. Tudo o que acontece em nossa cidade eles que trabalham na TV ou no jornal falam a verdade. Tipo se
acontece de alguém morrer ou assassinarem ela e claro que vão dizer a verdade; pode passar na TV ou na Rede
sul (Mariana, 2° Ano, Escola A).

NÍVEL 2 – CRÍTICA

Neste nível de progressão os alunos se posicionaram de forma crí-


tica frente aos meios de comunicação atuais. Para estes alunos as mídias
enganam e manipulam os espectadores, no sentido de forjar ou alterar os
dados, para tornar eloquente o discurso que transmitem. Para Dosse,
optar por um certo “tipo de descrição equivale a engajar um processo de
interpretação que depositará o acontecimento descrito em determinada
categoria semântica” (DOSSE, 2013, p.267). A forma como um aconteci-
mento é narrado desempenha papel fundamental sobre o modo em que
este será recepcionado.
Alguns alunos declararam que a manipulação por parte dos meios
de comunicação ocorre, porque as grandes mídias geralmente são patro-
cinadas por partidos políticos e porque cada diretor de emissões, possuem
pontos de vista diferente. De fato como asseverou Derocina Sosa,

A informação obedece, assim, ao critério de uma seleção editorial, que por


sua vez está ligada ao espaço social. O discurso, pois, contido nessas infor-
mações segue as intenções mais diversas, seja do autor da matéria, do editor
do jornal, dos patrocinadores ou do governo. Nenhuma informação, por
maior pretensão que tenha de ser imparcial, consegue sê-lo (SOSA, 2006,
p.121).
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 199

No entanto, é preciso abster se de incorrer no risco de considerar


os meios de comunicação como instrumentos exclusivos de manipula-
ção capazes de fabricar o que bem lhes apraz. Como afirmou Rüdiger, “o
princípio da imprensa não é o de ser manipuladora, no entanto reco-
nhece que ela, enquanto forma de poder, não pode ser dissociada do
elemento manipulação em função das condições ditadas por cada época”
(RÜDIGER apud SOSA, 2006, p.119).
A formação da opinião pública não se esgota no protagonismo dos
meios de comunicação. Seus efeitos são relativizados pelo leitor/espec-
tador que os apropria de forma distinta do esperado. As notícias
veiculadas pelas mídias podem ser selecionadas, adaptadas e, dependo
das circunstancias, rechaçadas. O espectador é um sujeito ativo, não se
encontra a mercê dos meios de comunicação. Como asseverou Eduardo
Meditsch, “o jornalismo, como instituição, e seus agentes, participam de
produção da realidade, especialmente no seu âmbito simbólico, mas
nunca isoladamente, porém em diálogo permanente com os demais ato-
res sociais” (MEDITSCH, 2010, p.40).
200 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

- Não. Na mídia sempre há uma intenção por trás das notícias, muitas vezes é uma manipulação da forma
de pensar dos espectadores. Se grandes mídias geralmente são patrocinadas por partidos políticos, então
as notícias serão tendenciosas (Marta, 1°Ano, Escola B).

- Sim. Eles contam as informações em tempo real, mas varia bastante, pois cada diretor de emissões,
possuem pontos de vista diferente (Nicole, 1° Ano, Escola B).

- Outro. Apesar de varias vezes falarem a verdade certas noticias podem ser omitidas ou alteradas a mando
de governos ou empresas (Luiz, 1° Ano, Escola B).

- Não. A mídia procura alienar as pessoas conforme sua opinião própria. De forma que apresente
informações incompletas com esse objetivo (Diego, 3° Ano, Escola B).

- Não. Muitas vezes são comprados para manipular uma população inteira, repassando falsas notícias,
enganando todas as pessoas que tem acesso a essa fontes de noticia. Nos dias de hoje muitas vezes o
dinheiro fala mais alto tudo e todos são movidos por ele (Ivan, 3° Ano, Escola A).

- Não. Nem tudo que vimos ou ouvimos é verdade nem sempre as fontes são confiáveis (Frederica, 2° Ano,
Escola A).

COMPARAÇÃO ENTRE ESCOLA A E ESCOLA B

Depois da análise qualitativa dos dados obtidos, que deram origens


às categorizações acima discutidas – acerca da empatia histórica, da es-
crita da história e do posicionamento perante às mídias – foi realizada
uma análise quantitativa descritiva simples. Com base nas categoriza-
ções identificadas foi possível elaborar tabelas de modo a traçar
algumas comparações entre os alunos das duas escolas participantes.
No que diz respeito a primeira questão do Estudo Principal, con-
forme a Tabela 24, observou-se uma grande quantidade de respostas
concentradas no nível 1, “Cópias e Fragmentos”, em ambas as escolas. A
percentual mais alta foi encontrada entre os alunos da Escola B, onde
cerca de 46,51% das respostas não apresentaram explicações para a de-
cisão de Mussolini ou eram resultantes de cópias dos textos
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 201

informativos ou das fontes disponibilizadas. Muitos destes alunos se li-


mitaram a copiar informações ou forneceram descrições a respeito do
processo de italianizzazione pelo qual passou a região do Trentino Alto
Adige durante o fascismo.
O percentual de respostas inseridas nos níveis 2 e 3 respectiva-
mente, “Ditador” e “Análise do Contexto”, foi mais equiparado. No nível
3, Ditador, encontram-se 23,08% dos alunos da Escola A e 25,58% dos
alunos da Escola B. Nestas respostas as justificativas dadas ao compor-
tamento de Mussolini verteram sobre a sua função política. Nesta
categoria a justificativa das ações em questão são explicadas através de
papeis estereotipados e ahistóricos. Para estes alunos Mussolini era um
ditador e isto era suficiente para explicar sua decisão de dominar e sub-
jugar a população do Alto Adige.
Se encontram no nível de progressão mais elaborado, “Análise do
Contexto”, 12,82% dos alunos da Escola A e 18,60% dos alunos da Escola
B. Estas respostas foram as que apresentaram uma concepção de em-
patia histórica mais complexa. Neste nível os alunos souberam vincular
a decisão de Mussolini de italianizzare Bolzano com o contexto em ques-
tão e com aspectos ligados à suas ideias como a crença em relação a
superioridade da cultura italiana e o nacionalismo exacerbado do movi-
mento fascista. A competência de se considerar tanto o contexto como
o ponto de vista provável dos agentes históricos é sintomática de uma
concepção de empatia histórica sofisticada das ações humanas do pas-
sado.
A disparidade maior entre as respostas foi constata no nível 2,
“Pessoal”. Cerca de 30, 77% dos alunos da Escola A foram alocados nesta
202 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

categoria, enquanto apenas 9,30% dos alunos da Escola B. As argumen-


tações utilizadas para explicar a decisão de italianizzare a região recém
anexada pautou-se principalmente em motivos pessoais. O Trentino
Alto Adige foi italianizzato porque assim queria Mussolini. Referências
a respeito do seu papel de governante ou do contexto situacional não
foram registradas. Dois alunos da Escola A não responderam a esta per-
gunta.

Tabela 24
Distribuição dos alunos conforme concepção de empatia histórica

ESCOLA A ESCOLA B TOTAL

Cópia e Fragmentos 11 28,21% 20 46,51% 31 37,80%

Pessoal 12 30,77% 4 9,30% 16 19,51%

Ditador 9 23,08% 11 25,58% 20 24,39%

Análise do contexto 5 12,82% 8 18,60% 13 15,85%

Não respondeu 2 5,13% 0 0,00% 2 2,44%

Total 39 100% 43 100,00% 82 100,00%

Figura 10 Gráfico sobre distribuição dos alunos conforme a concepção de empatia histórica
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 203

Na segunda questão os alunos foram inquiridos a fornecerem ex-


plicações para o comportamento dos dirigentes da Liga pela tutela da
pesca. Como se vê na Tabela 25, cerca de 53,85% dos alunos da Escola A
e 32, 56% dos alunos da Escola B não foram capazes de fornecer alguma
explicação para a persistência do uso da língua alemã pelos dirigentes.
Nestas respostas os alunos se limitaram a copiar excertos do jornal ou
dos textos informativos muitas vezes de forma inconsistente, o que re-
sultou em frases com pouco nexo.
O percentual de alunos alocados no nível “Presentismo” foi supe-
rior entre os alunos da Escola B com 32,56%. A tónica destas respostas
recaíram em justificativas fundamentadas em parâmetros de compor-
tamento considerados válidos hoje. Por exemplo, os dirigentes
persistiam em falar alemão porque não é fácil aprender outra língua ou
porque já estavam familiarizados com ela. Não foi constatado, nestas
respostas, a compressão por parte destes alunos "que as pessoas do pas-
sado, com as mesmas capacidades de pensamento e sentimento que as
pessoas hoje, poderiam ter pensado e sentido de forma diferente” 76
(LEE; SHEMILT, 2011, p.45).
Estes alunos não compreenderam que há diferenças significativas
entre o passado e o presente e que o comportamento humano não fun-
ciona a partir de preceitos de validade geral. Eles conseguiram fornecer
explicações para as ações passadas, conseguiram se colocar no lugar da-
queles dirigentes, mas se identificar com as pessoas do passado não é
suficiente para a consecução da empatia histórica. Faz-se também

76 Tradução da autora. No original “that predecessors with the same capacities for thought and feeling as
people today might have thought and felt in different way” (LEE; SHEMILT, 2011, p.45).
204 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

necessário situar o comportamento analisado com os seus sujeitos mas


também com o contexto que abrigou e moldou tal comportamento.
No nível de progressão “Empatia Histórica Restrita”, figuraram
20,51% dos alunos da Escola A e 16,28% dos alunos da Escola B. Neste
nível de categorização os alunos explicaram o emprego da língua alemã
levando em consideração as ideias e convicções que provavelmente di-
recionaram as ações dos dirigentes, mas também fizeram menção ao
processo de italianizzazione pela qual passava a região que se encon-
trava ausente nos níveis anteriores. A persistência em escrever em
alemão foi visto como uma forma de resistência e de crítica contra o
governo fascista.
No nível “Empatia Histórica Contextualizada”, observou-se uma
percentual maior de alunos da Escola B, com 13,95%. Foram alocados
neste nível as respostas que conseguiram fornecer explicações para as
ações dos dirigentes pautadas tanto em aspectos pessoais como de con-
texto. Estas narrativas foram inseridas em um nível mais avançado,
porque conseguiram arregimentar um número maior de possíveis razões
para o comportamento analisado e por forneceram um quadro mais am-
plo e complexo da região do Trentino Alto Adige. Ao se considerar a soma
dos últimos dois níveis foi possível perceber que os alunos das escolas
participantes atingiram um percentual semelhante de empatia histórica,
cerca de 23,07% de alunos da Escola A e 30,23% alunos da Escola B.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 205

Tabela 25
Distribuição dos alunos conforme concepção de empatia histórica

ESCOLA A ESCOLA B TOTAL

Cópia e Fragmentos 21 53,85% 14 32,56% 35 42,68%

Presentismo 8 20,51% 14 32,56% 22 26,83%

Empatia histórica restrita 8 20,51% 7 16,28% 15 18,29%

Empatia histórica contextualizada 1 2,56% 6 13,95% 7 8,54%

Não respondeu 1 2,56% 2 4,65% 3 3,66%

Total 39 100,00% 43 100,00% 82 100,00%

Figura 11 Gráfico sobre distribuição dos alunos conforme concepção de Empatia Histórica

Na terceira questão os alunos foram solicitados a refletir sobre a


escrita da história. Estes deveriam argumentar sobre como o historia-
dor lida com a existência de fontes diferentes sobre o mesmo tema.
Observou-se que os alunos da Escola A manifestaram dificuldades em
responder esta pergunta, uma vez que cerca de 18% não foram capazes
de respondê-la.
O nível “Tautológico” foi o que contabilizou o maior número de res-
postas. Como mostra a Tabela 26, cerca de 51,28% dos alunos da Escola
206 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

A e 39,53% dos alunos da Escola B inseriram-se nesta categoria. Estes


alunos não foram capazes de oferecer uma explicação ao empasse ex-
posto na questão. Limitaram-se em declarar, de forma redundante, que
o historiador deveria pesquisar mais ou estudar mais a respeito do as-
sunto. No nível 2 - “Testemunha”, foram identificados 9,30% dos alunos
da Escola B e nenhum aluno da Escola A. Nestas respostas, a possibili-
dade de poder consultar testemunhas diretas do fato ocorrido foi
apresentada como solução para a existência de histórias diferentes so-
bre o mesmo tema.
No nível 3 – “Quantidade e Soma de Fatores”, foram alocadas as res-
postas que propuseram como solução pesquisar em um maior número de
fontes ou estabelecer os elementos em comum entre as fontes para se
aproximar da verdade. A porcentagem observada foi equilibrada entre os
alunos das duas escolas participantes. Cerca de 30,77% dos alunos da Es-
cola A e 34,88% dos alunos da Escola B situaram-se neste nível de
progressão. Estes alunos encontram-se em um nível mais avançado em
relação ao nível “Testemunha”, porque demonstraram compreender que
a história é possível mesmo na ausência de depoimentos de observadores
diretos. No entanto, falharam por considerar o oficio do historiador ape-
nas como uma atividade de “tesoura e cola”. O trabalho metodológico que
envolve a escrita da história não se resume a uma atividade de encontrar
fontes, recolher o maior número possível de informações, ver o que coin-
cide para posteriormente escrever.
No nível 4 – “Contexto e Subjetividade” foram inseridas as respos-
tas que consideraram a necessidade de se conhecer o contexto e a
autoria das fontes como fundamental para solução do empasse
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 207

proposto. Nestas respostas os alunos assinalaram entender que a fonte


é mais que um repositório de dados e que é necessário entendê-las por
si mesmas. Trata-se de situá-las em seu próprio contexto de produção
e entender que esta é produto de um dado autor que carrega em seu bojo
convicções e intenções que emergem na fonte. De acordo com a Tabela
26, cerca de 16,28% dos alunos da Escola B encontram-se neste nível, por
outro lado não foi possível contabilizar nenhuma resposta entre os alu-
nos da Escola A neste nível.

Tabela 26
Distribuição dos alunos conforme concepção de escrita da história

ESCOLA A ESCOLA B TOTAL

Tautológico 20 51,28% 17 39,53% 37 45,12%

Testemunhas 0,00% 4 9,30% 4 4,88%

Quantidade e Soma de Fatores 12 30,77% 15 34,88% 27 32,93%

Contexto e Subjetividade 0,00% 7 16,28% 7 8,54%

Não respondeu 7 17,95% 0 0,00% 7 8,54%

Total 39 100,00% 43 100,00% 82 100,00%

Na quarta questão os alunos foram solicitados a responderem o que


pensavam sobre as mídias, especificamente se eles as consideravam
neutras e imparciais. Conforme a Tabela 27, cerca de 20,51% dos alunos
da Escola A e 18,60% dos alunos da Escola B encontram-se neste nível
de progressão. O posicionamento destes alunos que veem as mídias ape-
nas como meio de informação apartidário remete às declarações
realizadas por Evelyne Bévort e Maria Luísa Belloni sobre as mídias e
educação. Segundo as autoras, os meios de comunicação ocupam um es-
paço importante na nossa sociedade e faz se necessário “oferecer a
208 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

todos os cidadãos, principalmente aos jovens, as competências para sa-


ber compreender a informação, ter o distanciamento necessário à
análise crítica, utilizar e produzir informações e todo tipo de mensa-
gens” (BÉVORT; BELLONI, 2009, p.1081).
O nível 2 – “Crítico”, reuniu as respostas da maioria dos alunos. De
acordo com a tabela abaixo, 69,23% dos alunos da Escola A e 81,40% dos
alunos da Escola B encontram-se neste nível. Estes alunos manifesta-
ram um posicionamento crítico perante as mídias. Foram apontados
como causa desta suspeita os prováveis interesses políticos, financeiros,
pessoais que estão implicados na difusão das notícias. Todos os alunos
da Escola B responderam a questão, todavia 10,26% dos alunos da Escola
A preferiram não se manifestar.

Tabela 27
Distribuição dos alunos conforme posicionamento diante dos meios de comunicação

ESCOLA A ESCOLA B TOTAL

Acrítica 8 20,51% 8 18,60% 16 19,51%

Crítica 27 69,23% 35 81,40% 62 75,61%

Não respondeu 4 10,26% 0 0,00% 4 4,88%

Total 39 100,00% 43 100,00% 82 100,00%

Com base nos dados recolhidos durante o Estudo Principal, assim


como os dados angariados nos questionários precedentes foi possível
traçar um quadro geral dos jovens participantes da pesquisa. Os questi-
onários aplicados na primeira fase do estudo de campo demonstraram
que os alunos da Escola B manifestaram um nível mais alto no que diz
respeito aspectos relativos aos fatores socioeconômicos e cultural. Os
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 209

pais destes alunos apresentaram um nível de escolaridade e de renda


mensal superior aos pais dos alunos da Escola A.
De acordo com pesquisas realizadas no campo da sociologia da edu-
cação, do ponto de vista macrossociológico, a correlação entre trajetórias
escolares bem-sucedidas e essas categorias é relevante. Os resultados, à
primeira vista, tenderam a confirmar os estudos macrossociológicos. Os
alunos da Escola A tiveram maior percentual em níveis de progressão
mais avançados quando comparados aos alunos da Escola B.
Como já mencionado anteriormente, além dos aspectos socioeco-
nômicos foram também levados em consideração outros aspectos, como
o fato que as turmas participantes da Escola B eram formadas por tur-
mas A, enquanto na Escola A uma turma era B. Este fator foi
considerado na análise, pois sabe-se que é ainda comum nas escolas se-
parar os alunos mais bem sucedidos (em relação as notas) e com idade
prevista para cursar a serie em “turmas A”, sendo as turmas B, C e assim
por diante destinadas aos alunos considerados mais problemáticos do
ponte de vista disciplinar e da aprendizagem. Os alunos da Escola B de-
monstraram também maior interesse pela disciplina de história o que,
de fato, é considerado um fator importante para obtenção de bons re-
sultados no processo de aprendizagem.
Sobre o que diz respeito a compreensão da disciplina de história,
os alunos de ambas as escolas manifestaram uma visão tradicional. A
maioria declarou que a história é um saber que lida apenas com o pas-
sado, principalmente de acontecimentos políticos, nacionais, militares,
de eventos e personalidades relevantes de cada período. Observou-se,
no entanto, que cerca de 20, 45% dos alunos da Escola B, mencionaram
210 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

a relação entre presente, passado e futuro. Entretanto nenhum aluno da


Escola A compartilhou esta concepção de história viva e relacionada
com o presente e com projeções de futuro.
Nas questões relativas a escrita da história prevaleceu a ideia de
história factual em ambas as escolas. Para os alunos a história é escrita
a partir de fontes. Esta concepção não é errada, no entanto estes alunos
não fizeram menção ao trabalho metodológico que envolve a escrita da
história. O oficio de historiador se restringiu a compilação das informa-
ções contidas nas fontes. Foram identificados no nível de progressão
mais avançado, “Operação historiográfica”, um percentual semelhante
entre os alunos da Escola A e da B.
Quando interrogados sobre a forma como o historiador lida com a
existência de fontes que relatam histórias diferentes sobre o mesmo
tema, percebeu-se uma coerência com as repostas obtidas no questio-
nário das ideias previas. A concepção de história factual foi reforçada
mais uma vez. Um percentual semelhante de respostas entre os alunos
de ambas as escolas propôs a obtenção de mais fontes como solução para
o problema. No entanto, como nas outras questões relativas a natureza
do conhecimento histórico, nenhum aluno da Escola A se posicionou no
nível de progressão mais elaborado da questão. Na escola B, 28% dos
alunos mencionaram que o historiador, além recolher as informações
contidas na fonte, deve se voltar também para o contexto de produção
e autoria das fontes em questão.
De forma geral, os alunos da Escola B demonstraram um nível de
compreensão maior do que é a disciplina de história e dos procedimen-
tos empreendidos para a construção deste saber. No entanto, observou-
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 211

se que no manejo do jornal La Provincia di Bolzano e nas respostas rela-


tivas ao conceito de empatia histórica os alunos da Escola A se alocaram
quantitativamente e qualitativamente em níveis de progressão seme-
lhantes aos alunos da Escola A.
Na primeira questão que solicitava a explicação para as ações de
Mussolini no nível mais avançado, “Análise do contexto” o percentual en-
tre os alunos da escola A e B foram parecidos. A segunda questão, sobre o
comportamento dos dirigentes da Liga pela Tutela da Pesca também
apresentou resultados semelhantes. A soma dos dois níveis mais avança-
dos de empatia - “Empatia história restrita” e “Empatia histórica
contextualizada” - mostrou valores próximos nas duas escolas. Porém, é
importante ressaltar que os alunos da Escola B conseguiram fornecer um
número maior de razões e contextualizaram de forma mais válida a situ-
ação pela qual passava a população do Alto Adige durante o fascismo.
A pergunta relativa ao posicionamento dos alunos diante dos meios
de comunicação apresentou resultados divergentes em relação a mesma
questão feita no questionário das ideias prévias. Na primeira fase do es-
tudo de campo os alunos da Escola B mostraram um posicionamento mais
crítico frente as mídias (Escola B 54% - Escola A 32,43%). Por outro lado,
cerca de 45,95% dos alunos da Escola A declararam que os meios de comu-
nicação eram imparciais e apartidários. Apenas 32,43% dos alunos da
Escola A demonstraram ceticismo diante das notícias veiculadas.
Todavia, após a atividade com o jornal proposta no Estudo Princi-
pal, observou-se uma variação considerável no padrão de respostas
desta questão. Quase 70% dos alunos da Escola A e 81,40% da Escola B
afirmaram que as mídias nem sempre são imparciais, pois outros
212 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

interesses estão envolvidos na construção da notícia. Nos Gráficos 12 e


13 é possível acompanhar a variação das respostas nas duas Escolas. Esse
resultado é ainda mais interessante se levado em conta que em nenhum
momento o jornal foi objeto de análise em sala de aula. Os trechos do
jornal foram apenas lidos e em seguida os alunos foram solicitados a
responder as quatro questões que formaram o Estudo Principal.

ESCOLA A
Acritica Critica Não Respondeu - SC

80,00%
70,00% 69,23%
60,00%
50,00%
45,95%
40,00%
30,00% 32,43%

20,00% 21,62% 20,51%


10,00% 10,26%
0,00%
Escola A

Figura 12 Comparação do posicionamento dos alunos em relação as mídias no


Questionário das Ideias previas e no Estudo Principal
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 213

ESCOLA B
Acritica Critica Não Respondeu - SC

90,00% 81,40%
80,00%
70,00%
54,54%
60,00%
50,00%
40,00%
30,00% 22,73%
18,60%
20,00%
10,00% 0,00%
0,00%
Escola B

Figura 13 Comparação do posicionamento dos alunos em relação as mídias no


Questionário das Ideias previas e no Estudo Principal

Com o resultado obtido é possível constatar que o exercício com


fontes gerou mudança no posicionamento dos alunos, criando uma pro-
gressão nas ideias por eles apresentadas em relação aos meios de
comunicação.
O trabalho com fontes em sala de aula visa permitir uma aproxi-
mação com a metodologia da disciplina e o desenvolvimento de
capacidades importantes para a análise contextualizada e de crítica do-
cumental. O desenvolvimento de tais competências não se limita ao
exercício de critica as fontes usadas apenas nas atividades propostas em
sala de aula. O desenvolvimento de um pensamento histórico mais ela-
borado possibilita a ampliação de tais habilidades para lidar de forma
válida também com as narrativas, as informações que circulam cons-
tantemente em uma sociedade de informação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo dessa pesquisa foi investigar as ideias históricas de jo-


vens alunos do Ensino Médio a partir de pressupostos teóricos e
metodológicos da Educação Histórica. Foram discutidas, no primeiro
capítulo, algumas teorias da aprendizagem – a teoria behaviorista e a
teoria cognitivista à luz do construtivismo social. Uma vez que a Educa-
ção Histórica parte dos pressupostos defendidos pelo construtivismo
social para pensar o ensino de História, considerou-se oportuno esta-
belecer as diferenças entre essas teorias da aprendizagem.
O construtivismo rompe com a teoria behaviorista ao se opor à
ideia de um ensino que ocorre por meio de estímulos e respostas em que
o aluno é um sujeito passivo no processo, ocupado apenas em reagir aos
incitamentos externos aos quais é submetido. Além disso, o construti-
vismo supera a teoria cognitivista quando ressalta a relevância da esfera
social no processo de aprendizagem, e quando transcende a uma visão
de desenvolvimento cognitivo pautado em uma progressão biológica.
A Educação Histórica, enquanto campo de pesquisa, parte do cons-
trutivismo para pensar a aprendizagem histórica por acreditar que o
aluno não é simplesmente um produto do meio ou das suas disposições
internas, e sim resultado de uma construção própria que se realiza con-
tinuamente através da mobilização de fatores internos e externos.
Trata-se de um campo de investigação que pensa a cognição em história
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 215

com base na própria racionalidade da história. Conforme Barca, a pecu-


liaridade da Educação Histórica é ter como pressuposto teórico “a
natureza do conhecimento histórico e, como pressuposto metodológico,
a análise de ideias que os sujeitos manifestam em e acerca da história,
através de tarefas concretas” (BARCA, 2001, p.13).
A preocupação de investigar as ideias que os alunos manifestam
acerca da história está diretamente ligada a importância da compreen-
são da natureza da disciplina para a consecução da aprendizagem
histórica. Não em um sentido restrito que prevê apenas uma acumula-
ção de informação, mas sim no que tange ao desenvolvimento
progressivo de ideias históricas mais elaboradas. A compreensão da dis-
ciplina de história pressupõe o entendimento sobre como se dá a
construção do saber histórico, ou seja, sobre como o conhecimento so-
bre o passado é possível.
Neste sentido os conceitos de segunda ordem ou metahistóricos
adquirem importância por que viabilizam a compreensão do trabalho
metodológico necessário para a construção do saber histórico, e por-
tanto, para a compreensão da disciplina de história. Dentro desta
proposta, o trabalho com fontes em sala de aula torna-se imprescindí-
vel, uma vez que possibilita, por meio de tarefas concretas, que os
alunos desenvolvam competências importantes para a análise docu-
mental e entendam como se dá a construção do conhecimento histórico.
O estudo aqui apresentado foi realizado com 82 alunos de dois co-
légios estaduais do Paraná, localizadas na cidade de Guarapuava.
Durante as três etapas do estudo – estudo exploratório, estudo piloto e
estudo principal – os alunos participantes responderam a diferentes
216 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

questionários. Os dados obtidos foram analisados de acordo com a me-


todologia proposta pela Grounded Theory, utilizada por investigadores
da Educação histórica que se preocupam com a análise qualitativa das
ideias históricas de alunos. Os dados obtidos durante o estudo de campo
foram codificados e categorizados com base no grau de progressão que
apresentavam sobre o conceito em questão.
Tratou-se de uma pesquisa essencialmente qualitativa e, portanto,
sem pretensões de fornecer um modelo que equivalha a uma represen-
tação universal da realidade escolar brasileira. A intenção desta
pesquisa foi de contribuir para aprofundar a compreensão sobre a con-
cepção de história, o oficio do historiador, o conceito de empatia
histórica e o posicionamento frente os meios de comunicação, tendo
como tema o fascismo italiano.
O estudo exploratório, primeira etapa do estudo de campo, forne-
ceu um quadro socioeconômico e cultural dos jovens participantes. No
tocante a esfera cultural os alunos da Escola A e Escola B apresentaram
uma quantidade relevante de similitudes quanto à gosto musical e ou-
tras formas de passatempo. Como já mencionado anteriormente,
tratou-se de um grupo que compartilha de uma mesma estrutura de
significados própria do seu contexto sócio histórico e, sendo assim, par-
ticipam de uma mesma cultura juvenil.
Por outro lado, o quadro que emergiu com base nos aspectos soci-
oeconômicos declarados pelos alunos revelou dissonâncias entre o
público das duas escolas. Os elementos que apresentaram maior grau de
variação foram observados nas questões relativas a renda mensal fami-
liar e nível de escolaridade dos pais. A renda familiar entre os alunos da
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 217

Escola A é inferior em comparação aos alunos da Escola B. Para 40,5%


dos alunos da Escola A, a renda familiar era de um a três salários míni-
mos. E para onze alunos (29,73%) desta escola a renda familiar é de até
um salário mínimo. Já na Escola B metade das famílias participantes
tem renda mensal entre três a oito salários. Apenas 5 alunos (11,36%)
declararam que a renda familiar é de até um salário mínimo.
O nível de escolaridade dos pais dos alunos da Escola A também
resultou inferior em relação aos pais dos alunos da Escola B. O percen-
tual de pais e mães que não concluíram o Ensino Médio foi de 70,27%, o
que demonstrou que os alunos desta escola, no quesito escolaridade, en-
contram-se em ascensão em relação aos pais. Na escola B o panorama
foi diferente. Mais da metade das mães e dois terços dos pais (55,8% e
65,1%, respectivamente) concluíram o Ensino Médio. Além disso, 15 den-
tre eles possuíam diploma de graduação e alguns de pós-graduação.
À luz da sociologia da educação e com base nos trabalhos de Pierre
Bourdieu (1978, 1996, 2007), François Singly (2009) e Bernard Lahire
(1997) discorreu-se sobre o papel dos fatores socioeconômicos e cultu-
rais familiar para o êxito escolar. Para Bourdieu, no que concerne a
renda familiar e o nível de escolaridade dos pais, os alunos da Escola A
partiriam em desvantagem com respeito aos alunos da Escola B. Para o
autor, os alunos herdam das suas famílias elementos essenciais para o
êxito escolar, conforme os meios sociais que têm à disposição.
Se por um lado, de fato, observou-se um maior percentual em ní-
veis de progressão mais avançadas entre os alunos da Escola B, também
ficou evidente que alunos da Escola A também se alocaram em catego-
rias mais elevadas de progressão. O que demonstra, como apontou
218 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Singly e Lahire, que a herança cultural familiar não segue uma trajetória
automática e que diversos fatores incidem nas formas de transmissão.
Como propôs Lahire, mais do que isolar fatores condicionantes com re-
lação ao êxito escolar é preciso pensar a dinâmica de cada configuração
familiar e as formas como elas mobilizam fatores como as condições so-
cioeconômicas, sua relação com a cultura escrita e os investimentos
pedagógicos realizados.
Sem desconsiderar a relevância dos aspectos socioeconômicos e
das dinâmicas familiares, Bernard Charlot (1996) ressaltou a importân-
cia da relação que os alunos tem com os saberes veiculados pela escola.
Desta forma, o foco da sua análise se concentrou na relação dos alunos
com os saberes transmitidos pela instituição escolar. Como declarou o
autor,

a escola não é pura e simplesmente uma máquina de selecionar, que se pode


analisar sem dar importância as atividades que ali se desenvolvem. Ela é
uma instituição que preenche funções específicas de formação e que seleci-
ona jovens através dessas atividades específicas (CHARLOT, 1996, p.49).

Ainda na primeira etapa da pesquisa de campo foram investigadas


s ideias dos alunos sobre o conceito substantivo acerca da temática em
questão, o fascismo italiano. Conclui-se, com base nas narrativas obti-
das, que os alunos de ambas as escolas, em diferentes proporções,
apresentaram um conhecimento lacunar sobre a temática.
Na questão quatro do questionário das ideias Prévias 56,75% dos
alunos da Escola A não responderam ou forneceram respostas não pas-
siveis de categorização. A mesma situação foi observada em 34,09% dos
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 219

alunos da Escola B. As categorias que mais obtiveram adesão foram


“Comparação Nazismo/Hitler” e “Função de Estado”. Nestas categorias
a tónica das respostas recaiu sobre as analogias entre o fascismo itali-
ano com o nazismo alemão, bem como com adjetivos para descrever o
regime fascista como violento, antidemocrático e cerceador.
Com base nas respostas obtidas nas questões que abordavam a te-
mática fascismo, foram elaborados dois textos informativos: o
primeiro, sobre o que foi o fascismo e suas principais características. O
segundo, sobre a anexação do território do Trentino Alto Adige e o pro-
cesso de italianização pelo qual passou esta região. Estes textos
acompanharam o caderno com os excertos do jornal LPB e auxiliaram
na realização das tarefas propostas nos Estudos Piloto e Principal.
As ideias dos alunos sobre o que é história e a forma como enten-
dem a construção da escrita da história foram investigadas por meio de
três questões, inseridas no questionário das ideias prévias e no Estudo
Principal. A análise das respostas coletadas mostrou a prevalência de
uma concepção de história tradicional entre a maioria dos alunos de
ambas as escolas (respectivamente 84% e 59% nas escolas A e B). Para
estes alunos a história se ocupa apenas de coisas ocorridas no passado,
principalmente com acontecimentos políticos ou personalidades consi-
derados relevantes de cada período.
Foi possível observar ainda que 20% dos alunos da escola B tem
uma concepção de história mais complexa. Estes alunos foram alocados
no nível de progressão “história passado/presente e futuro”, pois decla-
raram, em linhas gerais, que a história é uma disciplina útil para vida
por permitir entender as transformações da nossa sociedade a partir de
220 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

referências passadas. Um aluno também mencionou a relação entre


passado, presente e futuro, ao declarar que o passado influencia nossas
decisões no presente e nossos planos futuros. Entender a dinâmica exis-
tente entre passado, presente e futuro é uma caraterística fundamental
para se entender a importância da disciplina de história para a vida prá-
tica. Afinal o conhecimento do passado permite agir de forma eficaz
sobre o presente e influi sobre as expectativas que são criadas sobre o
futuro. Nenhum aluno da Escola A foi inserido neste nível de progres-
são.
No que diz respeito à concepção de escrita da história apresentada
pelos alunos, constatou-se que a maioria foi inserida no nível de pro-
gressão “Factual” (Escola A 37,84% - Escola B 59,09%). Para estes alunos
a narrativa histórica resulta das informações que o historiador foi capaz
de obter por meio das fontes. Esta conjectura, mesmo que não seja to-
talmente equivocada, é restrita por desconsiderar todo o trabalho
metodológico empregado na escrita da história. O oficio do historiador,
na concepção destes alunos, se limitaria a recolher e transcrever fatos
obtidos na documentação.
No nível “Erudição” foram inseridos 18,92% dos alunos da Escola A
e 9,09% da Escola B. Nesta categoria foram incluídas as respostas que
definiam a escrita da história como resultado de estudos e leituras por
parte do historiador. Também neste nível não foi feita nenhuma men-
ção ao trabalho metodológico envolvido na escrita da história. As
ênfases destas respostas recaíram sobre a descoberta de fatos interes-
santes e na acumulação de informações por meio dos estudos. O
historiador seria um colecionador de estórias e um grande leitor.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 221

No nível mais avançado, “Operação historiográfica”, foram encon-


trados 5,41% dos alunos da Escola A e 4,55% dos alunos da Escola B.
Nestas respostas os alunos mencionaram que a construção do saber his-
tórico envolve, além do levantamento de fontes, também um trabalho
de pesquisa metodológico. Em uma das respostas inseridas nesta cate-
goria um aluno mencionou que a intepretação das fontes está submetida
ao sistema de referências do historiador, fato que explicaria a multipli-
cidade de narrativas sobre um mesmo tema. Na Escola A 32,43% dos
alunos não responderam esta questão, enquanto na Escola B foram
9,09%.
Como visto, portanto, o nível “Factual” foi o que teve o maior nú-
mero de narrativas categorizas – 38% dos alunos da escola A e 59% dos
alunos da escola B. Com base nesse resultado, foi inserida uma questão
no estudo Piloto e Principal, interrogando o que o historiador deveria
fazer quando diferentes fontes narram histórias divergentes sobre o
mesmo tema. Com esta questão, buscou-se criar um empasse que colo-
cava em cheque a concepção de escrita da história veiculada por grande
parte dos alunos.
Observou-se que os alunos da Escola A manifestaram dificuldades
com a questão, já que cerca de 18% não foram capazes de respondê-la.
No primeiro nível, “Tautológico” foi contabilizado o maior número de
respostas (51,28% Escola A – 39,53% Escola B). Estes alunos não foram
capazes de oferecer uma explicação ao empasse exposto na questão, se
limitaram a responder de forma redundante que o historiador deveria
pesquisar mais ou se aprofundar mais no assunto.
222 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

No terceiro nível, “Quantidade e Soma de Fatores”, foram incluídos


30,77% dos alunos da Escola A e 34,88% dos alunos da Escola B. Como
solução para a existência de fontes que contavam histórias divergentes
sobre o mesmo assunto, foi proposto pesquisar em um maior número
de fontes ou estabelecer os elementos em comum entre as fontes para
se aproximar da verdade. Estas respostas seguem a tendência já obser-
vada anteriormente na questão sobre a escrita da história. A narrativa
histórica é realizada a partir de fontes e se existem divergências entre
as histórias é preciso pesquisar em um número maior de fontes possível.
Assim como na questão anterior nesta também não foi feita menção ao
trabalho metodológico empregado na construção do conhecimento his-
tórico.
No nível 4, “Contexto e Subjetividade”, foram inseridas as respos-
tas que fizeram menção a necessidade de se conhecer o contexto e a
autoria das fontes para solucionar o empasse proposto. Nesta categoria
foram inseridos 16,28% dos alunos da Escola B e nenhum aluno da Escola
A. Nas narrativas incluídas, os alunos demonstraram entender que a
fonte é mais que um repositório de dados e que o oficio do historiador
vai além da transcrição de informações.
No tocante à relação dos alunos com os meios de comunicação, a
partir das respostas dos questionários das ideias prévias, constatou-se
que os alunos da Escola B assumiram um posicionamento mais crítico
em relação as mídias do que os alunos da Escola A. Enquanto na escola
A quase metade dos alunos (46%) entendem a mídia como neutra e apar-
tidária, apenas 23% na escola B apresentaram esse posicionamento. De
outro lado, 55% dos alunos da escola B apresentaram um
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 223

posicionamento crítico em relação à mídia, afirmando que as notícias


podem ser manipuladas com base nos interesses que se buscam defen-
der. Na escola A, 32% dos alunos deram respostas nesse sentido.
No Estudo Principal foi novamente proposta uma questão sobre o
posicionamento dos alunos diante das mídias. O intuito foi averiguar se
a atividade com os excertos do jornal La Provincia di Bolzano acarretaria
alguma modificação nas respostas. O resultado obtido foi positivo. O in-
cremento do percentual de alunos que assumiram um posicionamento
crítico diante das mídias foi consideravelmente maior em ambas as es-
colas. No estudo principal, 69% dos alunos na escola A e 81% na escola B
declararam suas suspeitas perante a forma como as notícias são veicu-
ladas. Por outro lado, 20,51% dos alunos da Escola A e 18,60% dos alunos
da Escola B ainda mantiveram um posicionamento acrítico quanto aos
meios de comunicação. É importante ressaltar que os excertos utiliza-
dos do jornal foram apenas lidos, o jornal não foi foco de análise em
nenhum momento. Este resultado vem a corroborar com a importância
dada ao uso de fontes em sala de aula e sua importância para o desen-
volvimento de competências como a análise crítica documental e de
ideias históricas mais sofisticadas. A partir da dinâmica proposta foi
possível constatar uma progressão nas ideias que os alunos apresenta-
vam sobre os meios de comunicação.
As ideias históricas apresentadas pelos alunos sobre o conceito de
empatia histórica foram investigadas em duas questões do Estudo Prin-
cipal. A elaboração das categorias utilizadas pautou-se em trabalhos de
Peter Lee, Alaric Dickinson, Rosalyn Ashby, Isabel Barca e Marilia Gago.
224 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Com base nas respostas obtidas na primeira questão do Estudo Princi-


pal, foram identificados quatro níveis de progressão:

- Nível 1 – Cópias e Fragmentos – neste nível os alunos, para explicarem as ações


empreendidas por Mussolini, copiaram trechos parciais ou completos dos ex-
certos dos jornais ou dos textos informativos. Esta escolha pode decorrer de
inúmeros fatores, mas também se encontra em consonância com a ideia ex-
pressa pela maioria dos alunos sobre a escrita da história e o ofício do
historiador. Como já mencionado, um percentual considerável de alunos pensa
a escrita da história como resultado da transcrição de informações contidas nas
fontes e resume o oficio do historiador àquele de relatar de forma objetiva os
dados destas. O percentual de alunos alocados nesse nível foi de 46,51% na escola
B e de apenas 28,21% na escola A.
- Nível 2 – Pessoal – Os alunos, para explicarem o comportamento de Mussolini,
utilizaram motivações pessoais. A justificativa dada para italianizzare a região
do Trentino Alto Adige adveio de aspectos puramente individuais. Aspectos
como contexto histórico ou funções políticas não foram mencionadas. Este foi
o nível com maior grau de variação entre as escolas. Se por um lado 30, 77% dos
alunos da Escola A se enquadraram neste nível, apenas 9,30% dos alunos B se
encontraram nesta categoria.
- Nível 3 - Ditador - Encontram-se neste nível 23,08% dos alunos da Escola A e
25,58% dos alunos da Escola B. Nestas respostas os alunos relacionaram as ações
de Mussolini ao fato de este ser um ditador. Tratam-se de explicações estereo-
tipadas. O fato de Mussolini ser um ditador foi considerado suficiente por estes
alunos para explicar a decisão de subjugar a população de Bolzano e região.
- Nível 4 – Análise do contexto – As respostas inseridas neste nível vincularam a
decisão de Mussolini com o contexto situacional, com as suas crenças e com as
ideologias que serviram de suporte para o movimento fascista. O fato destes
alunos considerarem tanto o contexto como o ponto de vista provável dos agen-
tes históricos é sintoma de uma concepção de empatia histórica mais elaborada
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 225

das ações humanas do passado. Na Escola A, 12,82% dos alunos encontram-se


neste nível e na Escola B, 18,60%.

Com base nas repostas obtidas na segunda questão foram destaca-


dos quatro níveis de progressão das ideias históricas dos alunos acerca
do conceito de empatia histórica: Nível 1 – Cópia e Fragmentos, Nível 2
– Presentismo, Nível 3 – Empatia Histórica Restrita e Nível 4 – Empatia
Histórica Contextualizada.

- Nível 1 – Cópia e Fragmentos – Assim como na questão precedente observou-se,


um percentual maior de concentração de respostas neste nível. Na Escola A fi-
guraram 53,85% dos alunos e na Escola B 32,56%. Os alunos neste nível, para
explicar o comportamento dos dirigentes da Liga pela tutela de pesca, copiaram
trechos dos textos informativos ou dos excertos do jornal. Este tipo de resposta
segue a tendência, já mencionada, da concepção que os alunos manifestaram
sobre a escrita da história e o oficio do historiador. Para estes alunos a história
é escrita a partir de fontes, não sendo considerado o trabalho metodológico en-
volvido na construção da narrativa histórica. As fontes são pensadas como
limitadas a um repositório de informações a serem relatadas de forma inteligí-
vel pelo historiador.
- Nível 2 – Presentismo – Figuraram neste nível um número maior de alunos da
Escola B, 32,56%. Na escola A, foram 20,51%. Estes alunos forneceram como ex-
plicação motivos pautados em parâmetros de comportamentos válidos na
atualidade. Nestas respostas foram disponibilizadas explicações para o compor-
tamento com base em justificativas plausíveis no presente. Entretanto, a
empatia histórica requer que os alunos sejam capazes de relacionar as ações do
passado com as ideias e crenças do sujeito atuante e o contexto no qual a ação
se passou.
- Nível 3 – Empatia histórica restrita – Nesta categoria encontraram-se 20,51%
dos alunos da Escola A e 16,28% dos alunos da Escola B. As respostas alocadas
226 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

neste nível conseguiram relacionar a persistência do uso da língua alemã por


parte dos dirigentes com o contexto em questão. A manutenção da língua foi
apontado como um ato de rebeldia e resistência contra o regime fascista.
- Nível 4 – Empatia histórica contextualizada – As respostas agrupadas nesse ní-
vel forneceram um quadro mais completo do contexto, além de enumerarem
um número maior de razões possíveis para explicar as ações passadas em aná-
lise, no caso, a decisão dos dirigentes da Liga de seguirem utilizando a língua
alemã nas documentações. Na Escola B, 13,95% dos alunos figuraram nesta ca-
tegoria. Nenhum aluno da Escola A foi inserido neste nível. Todavia, ao se
considerar os últimos 2 níveis de progressão observa-se um percentual de em-
patia histórica mais equilibrado entre os alunos das Escolas A e B (23,07% e
30,23% respectivamente).

Conclui-se neste estudo que a concepção de história dos alunos


participantes permanece ainda ancorada em uma ideia de história res-
ponsável pelo estudo do passado e sem nenhum tipo de vínculo com
questões presentes ou futuras. Alguns alunos, sobretudo na Escola B,
manifestaram uma concepção de história mais elaborada, enquanto um
saber ligado à práxis, quando mencionaram a importância do passado
para entender questões atuais e sua participação nas decisões e proje-
ções de futuro.
A concepção de escrita da história e do oficio do historiador que
emergiu dos dados coletados revelou uma concepção factual da narra-
tiva histórica. Para a maior parte dos alunos de ambas as escolas a
narrativa histórica é construída a partir de fontes que o historiador se
limita a recolher e transcrever. Mesmo diante de fontes que mostravam
perspectivas diferentes sobre o mesmo tema, a solução proposta foi
pautada em uma concepção factual da escrita da história: a pesquisa em
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 227

um número maior de fontes e a união de informações coincidentes en-


tre elas. Somente uma pequena parcela de alunos mencionou o trabalho
metodológico envolvido na construção da escrita da história.
Quanto ao posicionamento dos alunos frente os meios de comuni-
cação atuais, constatou-se uma variação considerável entre o
Questionário das ideias prévias e o Estudo Principal. O percentual de
alunos que assumiu um posicionamento crítico aumentou entre o pri-
meiro e o terceiro questionário. Concluiu-se deste resultado que o
manuseio de trechos do jornal para a realização das atividades propos-
tas no Estudo Principal resultou em uma progressão das ideias que os
alunos manifestaram sobre as mídias.
Com respeito a concepção de empatia histórica, os alunos das duas
escolas participantes demonstraram uma propensão em copiar excertos
dos textos e trechos de jornal oferecidos para auxiliar as tarefas. Esta
escolha pode decorrer de hábitos já cultivados em sala de aula, em que
tarefas resultantes de cópias do livro didático ou de outros materiais
são aceitos. A prática também pode indicar uma coerência com as res-
postas obtidas sobre a concepção de escrita da história. Neste caso o fato
de copiar partes do jornal estaria em consonância com a ideia que um
percentual considerável de alunos manifestou sobre a construção da
narrativa histórica e do oficio do historiador.
A frequência de respostas pautadas em estereótipos e ou em moti-
vações válidas no presente se encontra em consonância com resultados
obtidos em pesquisas realizadas em outros países como Inglaterra, Por-
tugal, Chipre e Nova Zelândia. Em proporção menor, mas igualmente
relevante, foi observado entre os alunos uma concepção de empatia
228 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

histórica contextualizada, pois os participantes foram capazes de rela-


cionar as ações do passado com as ideias e valores do sujeito histórico e
o contexto no qual a ação foi desenvolvida.
Este estudo buscou investigar as ideias históricas que alunos do
ensino médio manifestaram acerca da história, da empatia histórica e
das mídias. A análise das ideias históricas dos alunos sobre conceitos
estruturantes da disciplina de história tem por intuito o desenvolvi-
mento de um pensamento histórico mais sofisticado. Como já
mencionado, para aprender história é necessário entender os procedi-
mentos envolvidos na sua construção. Sendo assim, a discussão em sala
de conceitos ligados à epistemologia da disciplina são essências para
que se alcance uma aprendizagem histórica satisfatória. Uma aprendi-
zagem que dote os alunos de ferramentas intelectuais que lhes
possibilite ler o mundo historicamente para que possam se situar e in-
tervir nele de forma autônoma
Aprender história não é algo instantâneo e definitivo. Trata-se de
um percurso que envolve trabalho constante em direção a uma progres-
são do pensamento histórico. Desta forma, torna-se imprescindível
conhecer as ideias que os alunos manifestam acerca dos temas que se
busca tratar. Um ensino de história que ignora as ideias histórias dos
alunos é tão inútil quanto a organização de uma expedição que desco-
nhece seu próprio local de partida.
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ANEXOS
ANEXO 1
ANEXO 2
ANEXO 3

QUESTIONÁRIO SOCIOECONÔMICO E CULTURAL DOS DISCENTES

Escola:
Série: Turma:
1) Nome:
2) Idade:_____________ 3) Sexo: Masculino ( ) Feminino ( )
4) Naturalidade (cidade em que nasceu):
Guarapuava ( ) outro Estado ( ) outra cidade ( ) outro país ( )
Qual?
_____________________________________________________
5) Estado civil: Solteiro (a) ( ) Casado (a) ( ) Separado (a) ( ) Divorciado (a) ( )
Viúvo (a) ( ) Mora junto ( )
6) Ocupação: Nunca trabalhou ( ) Trabalha atualmente ( ) Desempregado ( )
Que trabalho exerce?
___________________________________________
7) Quantas horas você dedica ao trabalho?
( ) até 2 horas ( ) de 2 a 4 horas ( ) de 4 a 6 horas ( ) de 6 a 8 horas ( ) Não trabalho
8) Escolaridade: ( ) sempre estudou em escola pública ( ) estudou em escolas públicas
e privadas
9) Após concluir o Ensino Médio você pretender continuar os estudos?
( ) sim ( ) não
( ) curso técnico. Qual?
__________________________________________________
( ) curso universitário. Qual?
__________________________________________________
244 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

10) Em qual bairro mora?


__________________________________________________
11) Com quem você mora?
( ) pai ( ) mãe ( ) irmão (ã). Quantos? ____ ( ) outros. _____________
12) A sua casa é: ( ) própria ( ) alugada ( ) cedida
15) Renda familiar ( o salário mínimo em 2015 é R$ 788,00):
( ) até um salário mínimo ( 788,00)
( ) de 1 a 3 salários mínimos ( de 788,00 a 2364,00)
( ) de 3 a 8 salários mínimos ( de 2364,00 a 6304,00)
( ) de 8 a 12 salários mínimos ( de 6304,00 a 9456,00)
( ) de 12 a 15 salários mínimos ( de 9456,00 a 11820,00)
( ) mais de 15 salários ( acima de 11820,00)
16) Escolaridade do pai ou responsável paterno:
( ) não frequentou a escola. ( ) Pós- graduação incompleta
( ) até 4ª série ( 5° ano) ( ) Pós- graduação completa
( ) até a 8ª série ( 9° ano) ( ) Mestrado incompleto
( ) Ensino Médio incompleto ( ) Mestrado completo
( ) Ensino Médio completo ( ) Doutorado incompleto
( ) Superior incompleto ( ) Doutorado completo
( ) Superior completo
17) Escolaridade da mãe ou responsável materno:
( ) não frequentou a escola. ( ) Pós- graduação incompleta
( ) até 4ª série ( 5° ano) ( ) Pós- graduação completa
( ) até a 8ª série ( 9° ano) ( ) Mestrado incompleto
( ) Ensino Médio incompleto ( ) Mestrado completo
( ) Ensino Médio completo ( ) Doutorado incompleto
( ) Superior incompleto ( ) Doutorado completo
( ) Superior completo
18) Indique, entre os parênteses, a quantidade presente em tua casa dos seguintes
objetos:
( ) TV ( ) Automóvel ( ) Geladeira
( ) Telefone fixo ( ) Computador de mesa ( ) Video - game
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 245

( ) Celular ( ) Notebook ( ) Máquina de lavar


( ) Fogão ( ) Aparelho de som ( ) Internet
( ) Microondas ( ) TV por assinatura ( ) Aparelho de DVD
19) O que você faz nas horas em que não está na escola?
Ler livros: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Cinema: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Navega na internet: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Assiste TV: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Ouve Música: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Igreja: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Parque: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Balada: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Praticar esportes: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Sair com os amigos: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Museu: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Centro comercial: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
Ler jornais ou revistas: ( ) Sempre ( ) Às vezes ( ) Quase Nunca ( ) Nunca
20) Quais são os gêneros musicais que você costuma ouvir. Indique um número de 1 a
5 (sendo 5 para o gênero que mais gosta).
( ) axé ( ) rap ( ) reggae ( ) pagode ( ) sertanejo (
) gaúcha ( ) forró ( ) pop ( ) samba ( ) mpb (
) rock ( ) tecno- eletrônica ( ) funk ( ) gospel (
) outros. Quais? _______________________
21) Quanto tempo você passa vendo TV?
( ) Não assisto ( ) Menos de 1 hora ( ) De 1 a 3 horas
( ) de 3 a 5 horas ( ) mais de 5 horas
22) Programas de TV que você mais assiste. Indique um número de 1 a 5 ( sendo 5 para
o programa que mais gosta).
( ) Novelas ( ) Programa de auditório
( ) Jornais de notícias gerais ( ) Programa político
( ) Jornais que abordam crimes violentos ( ) Esportes
( ) Filmes e Séries ( ) Religião
246 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

( ) Música ( ) Culinária
( ) Notícias sobre artistas ( ) Reality show
( ) Outros. Quais?
_____________________________________________________
__
23) Quanto tempo passa na internet?
( ) Não uso ( ) Menos de 1 hora ( ) De 1 a 3 horas
( ) de 3 a 5 horas ( ) mais de 5 horas
24) Utilização da Internet. Indique um número de 1 a 5 ( sendo 5 para os sites que você
mais frequenta).
( ) redes sociais ( facebook, twitter, instagram, google+, whatsapp entre outros)
( ) sites de notícias gerais
( ) jogos
( ) pesquisas para a escola ( Wikipédia, info escola, entre outros)
( ) pesquisas culturais ( museus, universidades, viagens, shows)
( ) outros. Quais?
_____________________________________________________
__
25) Quantos livros lê por ano? (desconsidere os livros didáticos)
( ) Nenhum ( ) 1 livro ( ) de 1 a 3 livros ( ) de 3 a 5 livros ( ) mais de 5 livros
26) Escreva os títulos dos livros favoritos por ordem de preferência:
1.
_____________________________________________________
_______________
2.
_____________________________________________________
_______________
3.
_____________________________________________________
_______________
27) A escola é:
( ) perto da tua casa ( ) perto do teu trabalho ( ) nenhuma das anteriores
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 247

28) Para ir até a escola você utiliza meios de transporte?


( ) não, vai à pé ( ) carro de um familiar ( ) ônibus
( ) bicicleta ( ) carro próprio ( ) carro contratado
( ) motocicleta ( ) carona

Obrigada por participar desta pesquisa!


ANEXO 4

QUESTIONÁRIO DAS IDEIAS TÁCITAS

Nome: ______________________________________ Série:


Turma:

1) Qual é a tua disciplina preferida?


_______________________________________

2) Você gosta de estudar História?


( ) Definitivamente sim ( ) Provavelmente sim ( ) Indeciso
( ) Provavelmente não ( ) Definitivamente não

3) O que é História para você?


____________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
_______________________________________
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 249

4) Qual a primeira palavra que vem à sua cabeça quando você ouve a palavra
Fascismo?
________________________________________________
________________________________________________
___________________________________________

5) O que você se lembra sobre o Fascismo?


_____________________________________
________________________________________________
__________________________
________________________________________________
__________________________
________________________________________________
__________________________
________________________________________________
__________________________
________________________________________________
__________________________

6) As pessoas que viveram durante o regime fascista apoiaram este tipo de


governo? Por que?
________________________________________________
____________________
________________________________________________
_________________________
________________________________________________
_________________________
250 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

________________________________________________
_________________________
________________________________________________
_________________________

7) Quando desejo me informar sobre alguma notícia eu ......


( ) vejo os noticiários na TV ( ) recebo a maioria das notícias pelo whatsapp
( ) procuro na Internet ( ) leio no facebook
( ) pergunto aos meus pais ( ) pergunto a um professor

8) Os meios de comunicação atuais (jornais, TV, internet, whatsapp, e outros)


são neutros e objetivos? Por que?
________________________________________________
________________________________________________
__________________________
________________________________________________
__________________________
________________________________________________
__________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
____

9) Os jornais durante o Fascismo eram neutros e imparciais? Por que?


________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 251

________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
______________________________

10) Como o historiador escreve a História?


________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
__________________________
ANEXO 5

TEXTO 1. O FASCISMO

O fascismo foi uma ditadura totalitária que se instaurou na Itália


sob a liderança de Benito Mussolini entre os anos de 1922 e 1944. Com o
fim da I Guerra Mundial a Itália se encontrava mergulhada em uma crise
social, econômica e política e o fascismo se apresentou como a solução
para os problemas que afligiam o país.
Entre as principais características do fascismo podemos citar: o es-
pírito antidemocrático; a formação de um Estado extremamente
centralizado que se acreditava capaz de reerguer a nação e defender o
interesse de todos; a exaltação do ódio e da violência em nome de uma
superioridade nacional e em defesa dos ideais fascistas; a economia cor-
porativista percebida como solução para o conflito entre capital e
trabalho. Por fim a anulação dos direitos individuais, pois o regime bus-
cava a unidade e grandeza nacional. Para que isso fosse possível todos
deveriam se anular para o bem da Nação e para o cumprimento desta
política os direitos individuais de milhares de pessoas poderiam ser,
como foram, anulados.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 253

TEXTO 2. A ITALIANIZAÇÃO DA REGIÃO DE TRENTINO ALTO ADIGE

Com o fim da I Guerra Mundial o território do Império Austro Hún-


garo foi desmembrado. Em 1919, após a assinatura do Tratado de Saint-
Germain as regiões austríacas do Trentino e do Tirol Meridional foram
anexados ao território italiano e passaram a ser chamadas de Trentino-
Alto Adige.
Esta região era habitada e a maioria dos seus habitantes eram de
origem germânica, portanto falavam alemão. Quando o regime fascista
chegou ao poder a região do Trentino Alto Adige passou por um pro-
cesso de italianização, ou seja, as pessoas desta região tiveram que
assumir uma identidade italiana. Isso ocasionou uma série de mudanças
na vida dessas pessoas. O italiano passou a ser a língua oficial, ensinado
às crianças nas escolas; os nomes das pessoas tiveram que mudar, ser
italianizados, bem como o nome dos estabelecimentos comerciais, jor-
nais, ruas e praças das cidades.
ANEXO 6

Fonte 1) Mapa da Itália antes da I Guerra Mundial.

Figura 14 Primeira Guerra fez impérios sumirem do mapa; veja os países divididos.
Disponível em: http://noticias.uol.com.br. Acesso em: 1 nov. 2015.

Fonte 2) Mapa da Itália após o fim da I Guerra. Os territórios da região de Tren-


tino e Tirol, antes pertencentes a Áustria-Hungria, passaram a fazer parte da
Itália.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 255

Figura 15 Primeira Guerra fez impérios sumirem do mapa; veja os países divididos.
Disponível em: http://noticias.uol.com.br. Acesso em: 1 nov. 2015.

Fonte 3) O inspetor escolar visita as nossas escolas


“O inspetor Dalpiaz, o diretor didático Zorzi e o prefeito Vindimian visitaram
nos últimos dias as nossas escolas. O inspetor exprimiu sua satisfação pelos
resultados positivos obtidos pelo ensino da língua italiana. Elogiou principal-
mente os estudantes do quinto ano” (Jornal “A província de Bolzano”, Bolzano,
p.2F, 19 mai. 1927).
Fonte 4) A Italianidade do Alto Adige
“Nós acreditávamos que fosse supérfluo gastar palavras para demonstrar a
italianidade da região do Alto Adige se não tivéssemos que combater um
tendencioso movimento de propaganda de alguns publicitários alemães que
com panfletos e artigos pseudo-culturais tentam desviar o direito de um povo
e o direito da História. (...) no esforço de provar que o Alto Adige é de origem
germânica desde o dia da sua criação.
Todos estão de acordo que os primeiros habitantes dos vales do Alto Adige eram
de origem etrusca. (...) por mais que seja um mistério a origem do povo etrusco
256 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

é inquestionável que fosse uma civilização do Mediterrâneo e que seu berço foi
a Toscana (Itália).
O período etrusco foi sucedido pelo período romano, o que consagra pela se-
gunda vez a italianidade desta região. Somente com a queda do Império
Romano, em 476 d. C. iniciaram-se as invasões bárbaras que fizeram sucumbir
tanto o Alto Adige como toda a Itália” (Tradução do Jornal “A província de
Bolzano”, Bolzano, p.1F, 22 mai. 1927).

Fonte.5) Mussolini discurso 6, fevereiro 1926. “No Alto Trentino nós fazemos
política de italianidade! Nós os consideramos cidadãos italianos e aplicamos as
nossas leis: se assim não o fizéssemos teríamos na fronteira um país dentro de
outro país.... nós adotaremos a política romana de severa equidade.... a Itália
fascista pode, se for necessário, levar para além da fronteira italiana a sua ban-
deira, abaixá-la jamais” (Tradução adaptada do Jornal “A província de
Bolzano”, Bolzano, p.1 CD, 25 ago. 1927).

Fonte.6) “Que a estátua de Walter von Vogelweider poeta lírico de grande fama
e de origem incerta – certamente não italiana - construída em 1891 na praça
principal de Bolzano tivesse que mudar de lugar se sabia há muito tempo. A sua
presença na praça decorre de razões políticas que não combinam com uma ci-
dade cujo Fascismo mudou a face e quer mudar o espírito” (Jornal “A província
de Bolzano”, Bolzano, p.7B, 10 mar. 1935).

Fonte.7)“Que existem pessoas poucos inteligentes, todos podemos constatar,


mas em Bolzano além de existir pessoas pouco inteligentes, existe uma catego-
ria de sem vergonhas, que não percebem que isso em um regime Fascista é uma
imprudência.
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 257

Temos aqui uma circular da Liga para Tutela da Pesca (em alemão) que foi en-
viada para todos os prefeitos.
Evidentemente esses senhores acreditam ser mais prático mandar as circula-
res em alemão, enquanto nós podemos demonstrar que são uns tolos, visto que
os prefeitos receberam ordens para que todas as circulares em alemão fossem
jogadas no lixo, sem serem lidas.
Se a Liga pela Tutela da Pesca quer tutelar alguma coisa, deve mandar as cir-
culares em italiano.
Não acreditamos ser possível ter que dar este conselho no dia 12 de agosto 1927,
depois de dez anos de vida italiana desta província, e no ano quinto do regime
fascista” (Jornal “A província de Bolzano”, Bolzano, p.2A, 12 ago. 1927).

Fonte.8) “Os italianos que querem demonstrar realmente que são italianos, boi-
cotam todas as lojas que usam os jornais austríacos Dolomiten e Volksbote para
fazer propaganda” (Tradução adaptada do jornal “A província de Bolzano”, Bol-
zano, p.2CD, 4 set. 1927).

Fonte.9)“Os italianos que querem demonstrar realmente que são italianos, boi-
cotam todas as indústrias e comércios que mantém nos seus documentos os
nomes em alemão” (Jornal “A província de Bolzano”, Bolzano, p.2CD, 7 set.
1927).

Fonte 10) "Aos fascistas do Alto Adige não falta coragem. Em abril um grupo de
oito fascistas de Bolzano foram uma noite na cidade de Salorno e em represália
incendiaram a casa de um famoso líder alemão que havia batido em dois fas-
cistas de Salorno” (Tradução adaptada do jornal “A província de Bolzano”,
Bolzano, 2 out. 1927).
258 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

Fonte.11)“Fatos e não palavras: Das 790 séries iniciais da província de Bolzano


permaneceram neste ano somente 35 em que a língua alemã é ainda ensinada”
(Jornal “A província de Bolzano”, Bolzano, p.2CD, 25 set. 1927).

Fonte.12)“Fatos e não palavras: Em Bressanone* o colégio dos Agostinianos foi


fechado. Em Merano* o colégio dos Benedetinos está proibido de matricular,
assim como no colégio dos Franciscanos em Bolzano*. A influência alemã nas
nossas escolas está desaparecendo” (Jornal “A província de Bolzano”, Bolzano,
p.2BC, 28 set. 1927).

* cidades da região do Alto Adige – Itália, que faziam parte do Tirol meridional,
antigo território austríaco.

Fonte.13) A propaganda contra a Itália patrocinada pelo governo austríaco

“Como funciona a central austríaca que se ocupa da propaganda anti italiana?


Antes de tudo ela é patrocinada pelo governo da região do Tirol. Não consegui
saber para qual finalidade, mas sei de fonte segura que essa central recebe todo
mês do governo provincial do Tirol 300 xelins, ou seja, pouco menos de mil
liras. Não é muito, mas o fato é importante. (...) De qualquer forma, o Tirol pen-
sou no fiel semeador de discórdia Mumelter, jornalista austríaco, dando-lhe o
cargo de secretário na seção austríaca da Liga das Nações, com sede em Viena.
Entre as “invenções” mais malignas deste jornalista podemos citar: as proibi-
ções das árvores de Natal no Alto Adige dois anos atrás; aquela sobre o
assassinato de um camponês pelas milícias fascistas perto de Bolzano e aquela
do pintor alemão jogado no rio Passiria em Merano (Itália). Inútil dizer que to-
das essas notícias foram completamente inventadas. A história do assassinato
do pintor jogado no rio foi publicada em Londres e Paris onde foi publicada no
Ana Paula Rodrigues Carvalho • 259

imundo “Correio dos italianos” que errou cidade contando que os fascistas de
Innsbruck [Áustria] tinham jogado no rio Inn um alemão!” (La Provincia di Bol-
zano, Bolzano, p.1EF, 14 mai. 1927).

Fonte 14) “O Diretório decidiu aplicar uma solene e exemplar lição aos mais
subversivos. Em uma noite todos os militantes fascistas (15 no total) se escon-
deram nas proximidades do Hotel Gasser, onde deveria se reunir um grupo de
cinquenta subversivos. Assim que eles apareceram os fascistas os atacaram
com cassetetes, porradas e chutes até que eles se dispersaram” (La Provincia di
Bolzano, Bolzano, p.3F, 2 out. 1927).
ANEXO 7

ATIVIDADE

Nome: Serie: Turma:


Escola:

- Com base na leitura das fontes e dos textos informativos responda as questões
que seguem:

1) Por que para Mussolini era tão importante italianizar a cidade de Bolzano e
toda e a região do Alto Adige?

2) Por que os dirigentes da Liga para tutela da pesca (Fonte 7) escreviam os do-
cumentos em alemão mesmo sabendo que era proibido pelo governo?

3) Assinale semelhanças ou diferenças nas atitudes dos comerciantes e dos alu-


nos apresentadas pelas fontes 3, 8 e 9 e explique o porquê desses
comportamentos.

4) Quando um historiador encontra fontes que contam histórias diferentes so-


bre o mesmo assunto o que ele pode fazer para se aproximar da verdade?

Obrigada por participar desta pesquisa!


ANEXO 8

ATIVIDADE

Nome: Serie: Turma:


Escola:

1) Por que para Mussolini era tão importante italianizar a cidade de Bolzano e
toda e a região do Alto Adige?
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________

2) Por que os dirigentes da Liga para tutela da pesca (Fonte 7) escreviam os do-
cumentos em alemão mesmo sabendo que era proibido pelo governo
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
262 • Fascismo e Ensino: uma investigação sobre a Empatia histórica em sala de aula

4) Quando um historiador encontra fontes que contam histórias diferentes so-


bre o mesmo assunto o que ele pode fazer para se aproximar da verdade?
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________

6) Os meios de comunicação (televisão e jornais) atuais são confiáveis, pois


contam as notícias da forma como elas ocorreram. Você concorda com esta
afirmação?
( ) Sim. Justifique tua resposta.
( ) Não. Justifique tua resposta.
( ) Outro. Justifique tua resposta.
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