Fernando Pessoa Analise
Fernando Pessoa Analise
Fernando Pessoa Analise
O Fingimento Artístico
A Dor de Pensar
A Nostalgia da Infância
O Fingimento Artístico
O poeta é um fingidor.
A dor, as emoções que são descritas no poema não foram as sentidas pelo poeta no momento em
questão, foram conceções intelectuais feitas através da análise da situação vivida. Ou seja, a
poesia resulta da memória, da recordação e da sua reprodução racional, coerente e inteligente.
Por isso, F. Pessoa afirma que o poeta finge todos os sentimentos que transpõe para o papel
porque, no momento em que escreve, ele já não está a sentir o que sentiu no instante a que se
refere na poesia.
Podemos então distinguir 3 dores: a dor sentida pelo poeta no momento em que acontece algo, a
dor fingida pelo poeta quando se recorda do momento em que sofreu a dor sentida e a reproduz
como texto, e a dor lida pelo leitor quando analisa o poema e interioriza as palavras do poeta.
É importante frisar que «fingimento» utiliza-se num sentido de representar, é uma tentativa de
transfigurar o que se sente naquilo que se escreve, utilizando paralelamente a imaginação e a
intelectualidade. Fingir é inventar, criando conceitos que exprimam as emoções o melhor possível.
Ao poeta cabe-lhe «sentir com a imaginação», ou seja, transformar a vivência real numa obra de
arte, usufruindo da imaginação e o pensamento. As emoções são despersonalizadas e a
sinceridade espontânea dá lugar à sinceridade intelectual.
A Dor de Pensar
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Fernando Pessoa vive em constante conflito interior. Tendo consciência de que é um homem
racional de mais, ele deseja arduamente pensar menos, ser mais inconsciente, aproveitar a vida
sem questionar. Mas, como na realidade tem uma necessidade permanente de se questionar, de
pensar, de intelectualizar toda e qualquer situação, ele sente-se frustrado.
Pessoa inveja o gato porque o gato é feliz na sua ingenuidade, respondendo simplesmente a
instintos. Pessoa inveja uma ceifeira simples porque ela canta só porque lhe apetece, alegremente.
Ele nunca conseguirá ter estas reações de abstração para com o pensamento porque insatisfação
e a dúvida acerca da importância da racionalidade são constantes. O que ele deseja é ser
inconsciente, tendo consciência disso. Como isso é muito inconcebível, cada vez a dor de pensar é
maior.
A Nostalgia da Infância
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E eu as oiço brincar,
Começa a se alegrar
Isto no me coração.
O poema fala-nos da infância. O sujeito poético remete-nos para a alegria que rodeia as crianças
durante as suas constantes brincadeiras. Ele próprio, ao observar tamanha simplicidade e magia,
se deixa invadir por sentimentos agradáveis “Qualquer coisa em minha alma/Começa a se alegrar”.
No entanto, esta alegria que o sujeito lírico sente, fá-lo lembrar-se da sua própria infância que, por
ter sido tão apagada de alegrias e brincadeiras, passa por nunca ter existido, algo que ele frisa
bem: “E toda aquela infância/ que não tive...”
Com uma pontinha de nostalgia, o eu poético termina com uma quadra mais complexa, mas que
se traduz simplesmente. Já que ele não sabe bem o que chamar à sua infância pobre em afecto, se
não se reconhece no próprio passado, nem sabe quem virá a ser no futuro – tudo o que ele pode
fazer é imaginar, adivinhar, ter uma visão, então, resta-lhe sentir a alegria e a felicidade que lhe
invadem o coração quando, no presente, observa as crianças contentes.
Quando era criança
Aquela lembrança.
E hoje sinto
O sorriso alheio
Mais uma vez, o poema aborda o tema da nostalgia da infância. O sujeito poético, na infância, não
tinha, como qualquer outra criança, consciência da realidade – “Vivi, sem saber,”. No entanto,
agora tem-na. E mesmo que teime em relembrar esses tempos, ele sabe que nunca irão regressar,
ele agora pensa. Por isso, é “Só para hoje ter/ Aquela lembrança.”
Depois, vemos que o eu poético sabe que apenas agora, que pensa, consegue perceber e sentir o
que foi e o que viveu na infância: “E hoje sinto/ Aquilo que fui”. Mas, no entanto, a vida dele, neste
presente, passa-se numa mentira “Minha vida flui,/Feita do que minto.” Ele não mente,
efetivamente, mas acha que não está a viver realmente, o que acaba por tornar a sua vida numa
constante dúvida e conflito existencial.
Por fim, na última quadra, ele conclui simplesmente. Como não se pode esquivar da vida que tem,
da mentira que supostamente vive (“Mas nesta prisão”), então restam-lhe unicamente as memórias
dos tempos que já passaram (“Livro único, leio”) e que, apesar de felizes, já não lhe pertencem
porque ele já não é assim (“O sorriso alheio/De quem fui então”).
Para atenuar a dor de pensar, Pessoa revive a infância, utilizando o fingimento artístico. No
entanto, F. Pessoa não fala da infância dele, fala da infância em geral, como sinónimo de
felicidade, calma, tranquilidade. A criança deixa-lhe saudades e ele sente-se cada vez mais longe
dela, mais velho. No fim, quando regressa do devaneio, choca com o presente e ainda se sente
pior, com a dor mais agravada pela saudade.