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SÃO PAULO
2022
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Resumo
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Abstract
Among the countless critics of the movement, this study intends to investigate
how two of them, disparate in their backgrounds, managed to reach close conclusions
about the movement: José Ramos Tinhorão, music critic and known for his relations with
the Brazilian Communist Party, and Roberto Schwarz, a literary critic of Adornian origin.
From different points of view, both pointed to the authoritarian character of Tropicalism,
which would meet, albeit with its endless subtleties, the regime established in 1964.
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Introdução
1
A noção de “linha evolutiva” da Música Popular Brasileira seria trabalhada por Caetano Veloso ao longo
de sua obra. Ela começaria com Dorival Caymmi, passaria por João Gilberto e recairia sob o próprio
Caetano.
4
de época, quer de Caetano Veloso, quer de Gilberto Gil. Segundo Heloísa Buarque de
Hollanda2, o Tropicalismo seria, desta maneira, produto de uma crise “tanto dos projetos
de poder (à esquerda, obviamente), quanto da própria crise das vanguardas históricas”
(NAPOLITANO/VILLAÇA, 1998, s/p).
2
Para a referida leitura de Heloísa Buarque de Hollanda, conferir HOLLANDA, Heloísa Buarque de.
Impressões de viagem. CPC, Vanguarda e Desbunde. São Paulo: Brasiliense, 1979.
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Em trabalho anterior, Ridenti desenvolveu a tese de que as manifestações culturais deste período
comungariam de certo “romantismo revolucionário”. Em sua visão, o Tropicalismo, ainda que visando a
implodir esta cultura, seria um ramo deste tipo singular de romantismo. Neste sentido, vide RIDENTI,
Marcelo. Em busca do povo brasileiro: artistas da revolução, do CPC à era da TV. São Paulo: Editora
da Unesp, 2014.
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Haveria, contudo, diferenças cruciais entre as obras homônimas de Oiticica e
Caetano. Seguindo a interpretação de Napolitano e Villaça,
José Ramos Tinhorão foi um crítico musical que sempre foi reconhecido pelo seu
nacionalismo exagerado, ortodoxo, além de seus vínculos com a ideologia do Partido
Comunista Brasileiro (PCB), ainda que nunca tenha se filiado a esse. O PCB, vale
lembrar, era caro às ideologias do realismo socialista zdanovista, emulado durante os anos
de Stálin. Alain Corbin, analisando a questão dos sinos durante a Revolução Francesa,
apontou que, em momentos de crise nas sensibilidades, surgem os românticos, nostálgicos
em relação a um passado que muitas vezes é idealizado, fruto de uma lembrança da perda
ou da privação, da qual emergem um desejo de reconstituição (CORBIN, 1994, cap. 1).
Como já dito, analisando a cultura política do período sob o qual nos debruçamos aqui,
Ridenti apontou para a noção de “romantismo revolucionário” (RIDENTI, 2014, pp. 07
– 44). O “romantismo revolucionário” não seria contra a modernização, mas encontraria
em elementos do passado pré-capitalista, como a autenticidade da cultura popular, do
homem brasileiro, etc. uma saída de contrapeso aos horrores do moderno capitalismo
industrial.
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Analisando em perspectiva comparada as leituras de Corbin e Ridenti, é possível
conjecturar que a metodologia crítica de José Ramos Tinhorão penda mais ao primeiro e
escape ao segundo. Como veremos adiante, Tinhorão se colocava contra a modernização,
entendendo essa como processo de espoliação das “autênticas” culturas populares. Seria,
assim, um romântico que oscila entre o restitucionista e o resignado, mas não
revolucionário4, o que o torna figura singular posto ser alguém que comungava de ideais
revolucionários, vide sua análise cara às teorias de Marx e Engels5.
Vale lembrar, ainda, que Tinhorão possui uma trajetória única: é ele quem,
provindo de um núcleo de memorialistas da cultura popular/musical, verte-se em
historiador deste objeto, com materiais e metodologia para tal. Como ele mesmo declarou,
foi ele quem foi “do jornalismo ao livro” (LORENZOTTI, 2010, p. 115). Marcos
Napolitano, analisando a obra historiográfica, por assim dizer, de Tinhorão (isto é, aquela
em livro, com investigação de caráter histórico baseada em fontes – e que esta pesquisa
pretende tomar como tais) dirá que, nesta, “a trajetória da música popular no Brasil era o
maior exemplo de ‘expropriação cultural’ das classes populares (rurais e urbanas) pelas
elites, representadas pela classe média ‘branca e americanizada’”, tendo, este processo de
expropriação se tornado irreversível com a Bossa Nova e os festivais da canção da década
de 1960 (NAPOLITANO, 2006, p. 143). À luz de tal metodologia, Tinhorão considerará
4
Esta terminologia é cara à interpretação de Michael Löwy e Robert Sayre realizada em LÖWY,
Michael/SAYRE, Robert. Revolta e melancolia: o romantismo na contramão da modernidade.
Petrópolis: Vozes, 1995.
5
Em entrevista dada no ano 2000 ao programa Roda Viva, Tinhorão recomendou as leituras de Marx e
Engels como saída para o esclarecimento. Declarou ainda que autores como Gramsci e Lukács seriam “a
perfumaria do marxismo”, realçando, outra vez mais, sua ortodoxia. A entrevista se encontra disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=meTizBT9grY&t=1567s. Acesso em 17.01.2022.
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o Tropicalismo como a face cultural do regime instaurado em 1964 (TINHORÃO, 1998,
p. 325), em duas de suas obras: História Social da Música Popular Brasileira e Pequena
História da Música Popular: segundo seus gêneros. Napolitano, comentando estas obras,
dirá que sua síntese reside em que “quanto mais sofisticado e capitalizado o meio
técnico/social de divulgação, mais se configura o processo de afastamento das classes
populares em relação à música popular, isolando-a de suas raízes nacionais e sociais”
(NAPOLITANO, 2006, p. 144).
6
“Schwarz lê um romance e vê formas, e, a partir das formas, ele vê classes”. Tradução nossa.
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desenvolver)7. Arantes, comentando a metodologia de Schwarz, traça paralelo com o
impacto de 1964 para sua produção, visando elucidar a relação entre dependência e
dualidade:
Nesta pesquisa, pretendemos analisar três ensaios de Schwarz, contudo, sendo que
apenas um deles reflete suas visões sobre um livro. O primeiro deles é Notas sobre
vanguarda e conformismo, em que Schwarz apontará para as relações entre o sentido de
vanguarda e a capitulação ao capital, em interpretação ainda não direcionada por inteiro
ao Tropicalismo, mais voltada para a vanguarda musical (grupo Música Nova), que se
integrará, em partes, ao Tropicalismo momentos depois8. Ainda a seguir, analisaremos o
seminal ensaio Cultura e política, 1964 – 1969. Este, verdadeiro Terra em transe
acadêmico, é, a nosso ver, a interpretação de Schwarz para a derrota que representou
1964. Diferentemente das de Tinhorão, estas são interpretações feitas no calor da hora, à
luz de emoções e sentidos que respingavam diretamente no autor, como se vê na nota de
rodapé acrescida ao texto em 1978: “a análise social no caso tinha menos a intenção de
ciência que de reter e explicar uma experiência feita, entre pessoal e de geração, do
momento histórico. Era antes a tentativa de assumir literariamente, na medida de minhas
forças, a atualidade de então” (SCHWARZ, 2008, p. 70). Embora crítico literário,
Schwarz irá historicizar a derrota, apontando para a fragilidade da aliança da intelligentsia
com a burguesia nacional. Ademais, formulará a clássica máxima, já apresentada, de que,
apesar da ditadura de direita, haveria relativa hegemonia cultural das esquerdas (idem,
ibidem, p. 71). Em leitura muito cara à Teoria da Dependência, irá comparar o método
Paulo Freire ao Tropicalismo; o teatro de Arena com o Teatro Oficina. Em síntese, fará
7
Vide OLIVEIRA, Francisco de. Crítica à razão dualista. In: Crítica à razão dualista/O ornitorrinco.
São Paulo: Boitempo editorial, 2003.
8
Para uma interpretação do grupo Música Nova, ver ZERON, Carlos Alberto Ribeiro de Moura.
Fundamentos histórico-políticos da Música Nova e da música engajada no Brasil, a partir de 1962: o
salto do tigre de papel. Dissertação (Mestrado em História Social). São Paulo: FFLCH/USP, 1991.
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uma leitura ainda cara ao que Ridenti chamou de “romantismo revolucionário”, porém
via dialética – não à toa que finaliza o texto com elogio ao romance Quarup, de Antonio
Callado, fazendo leitura favorável da experiência de luta armada.
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(SCHWARZ, 2012, p. 79)9. Seu caráter pós-moderno estaria no sentido de querer superar
o moderno, ou seja, a cultura pré-golpe, assim como seu caráter conservador viria com a
tentativa autoritária de impor a nova realidade (de 1964) às esquerdas por via niilista, isto
é, entendendo que a derrota fora tamanha que seria insuperável e a única maneira de
manter uma respiração (ainda que artificial) seria enveredar-se pela lógica da assimilação
da nova realidade.
O que esta pesquisa pretende é apontar para os caminhos que levam a autores de
formações e trajetórias tão díspares, caminharem para uma interpretação próxima, que
apontam para as relações do Tropicalismo com 1964, seu caráter de superação das
produções até então praticadas, bem como de irreversibilidade, seja da derrota em 1964,
seja da sobrevida da cultura popular (do qual este reivindica ser parte propositora). Neste
sentido, se o Tropicalismo foi produto de uma crise (para a qual não hesitou em oferecer
saídas) (NAPOLITANO/VILLAÇA, 1998, s./p.) e apontou para o mercado e a inserção
na indústria cultural como formas de retomar o contato com as massas – ainda que de
forma intermediada, centrista, conciliatória (SANCHEZ, 2000, p. 55) – como
compreender a resistência que certos setores da intelectualidade, também à esquerda,
apresentaram em reação ao movimento (de vanguarda, que ao menos se dizia como
representante das esquerdas)? Qual seria a saída para a crise vivenciada na visão destes
autores? Por que chegaram, ainda que partindo de posições díspares, a conclusões
similares, que apontavam para a relação do Tropicalismo com 1964? Essas são perguntas
a que esta pesquisa procurará responder, visando construir um sentido para o
Tropicalismo que permita explicar tais aproximações e distâncias entre as análises.
Objetivos
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Neste ensaio, publicado em 2012, Roberto se apoia na questão do caráter pós-moderno do Tropicalismo
em Nicholas Brown. Para uma interpretação deste autor, ver BROWN, Nicholas. Tropicália, pós-
modernismo e a subsunção real do trabalho sob o capital. In: CEVASCO, Maria Elisa/OHATA, Milton
(Org.). Um crítico na periferia do capitalismo: reflexões sobre a obra de Roberto Schwarz. São Paulo:
Companhia das Letras, pp. 295 – 309, 2007.
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musical de orientação comunista/stalinista chegou a conclusões próximas às de um crítico
literário de matriz adorniana. Neste sentido, buscaremos compreender um circuito
intelectual que tenha se formado entre as esquerdas do período no processo de crítica ao
Tropicalismo.
Metodologia
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uma nova realidade que exige respostas, posto que é preciso se adaptar à nova ordem
estabelecida, bem como demarcar território ante à derrota colossal que o golpe de 1964
representou.
Plano de trabalho
Cronograma
Fontes
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_________________. Cultura e política: 1964 – 1969. In: O pai de família e outros
estudos. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, pp. 70 – 111.
Bibliografia
CAMPOS, Augusto de. Balanço da bossa e outras bossas. São Paulo: Perspectiva, 2015.
14
___________________________________________/OHATA, Milton (Org.). Um
crítico na periferia do capitalismo: reflexões sobre a obra de Roberto Schwarz. São
Paulo: Companhia das Letras, 2007.
GALVÃO, Walnice Nogueira. MMPB: uma análise ideológica. In: Sacos de gatos e
outros ensaios críticos. São Paulo: Duas Cidades, 1976.
MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento
histórico. Revista brasileira de História. São Paulo, v. 20, no. 39, p. 203 – 221, 2000.
MORETTI, Franco. A new intution: on Roberto Schwarz’s critical work. New Left
Review, 131, September – October, 2021.
MOTA, Carlos Guilherme. Ideologia da cultura brasileira (1933 – 1974). São Paulo:
Editora 34, 2014.
15
______________________. A historiografia da Música Popular Brasileira: síntese
bibliográfica e desafios atuais da pesquisa histórica. ArtCultura, v. 8, pp. 135 – 150,
2006.
NOBRE, Marcos/José Roberto ZAN. A vida após a morte da canção. serrote, v.6,
nov./2010.
RIDENTI, Marcelo. Em busca do povo brasileiro. São Paulo: Editora da Unesp, 2014.
SCHWARZ, Roberto. Que horas são? São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
16
_________________. Martinha versus Lucrécia. São Paulo: Companhia das Letras,
2012.
TINHORÃO, José Ramos. Música popular: do gramofone ao rádio e TV. São Paulo:
34, 2014.
VELOSO, Caetano. Verdade tropical. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.
_______________. O mundo não é chato. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
_______________. Letra só. São Paulo: Companhia das Letras, 2v., 2003.
17
WISNIK, Guilherme. Caetano Veloso (coleção Folha Explica). São Paulo: Publifolha,
2005.
WISNIK, José Miguel. Sem receita: ensaios e canções. São Paulo: Publifolha, 2004.
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