01 Tese Claudelir
01 Tese Claudelir
01 Tese Claudelir
CAMPUS DE TOLEDO
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL E
AGRONEGÓCIO – DOUTORADO
CLAUDELIR CLEIN
TOLEDO – PR
2021
CLAUDELIR CLEIN
TOLEDO – PR
2021
CLAUDELIR CLEIN
COMISSÃO EXAMINADORA:
__________________________________ _______________________________
Prof. Dr. Lucilio Rogério Aparecido Alves Prof. Dr. Walter Belik
(Escola Superior de Agricultura “Luiz de (Instituto de Economia/Universidade
Queiroz”/Universidade de São Paulo) Estadual de Campinas)
__________________________________ _____________________________
Prof. Dr. Gilmar Ribeiro de Mello Prof. Dr. Martin Airton Wissmann
(Unioeste) (Unioeste)
__________________________________
Prof. Dr. Pery Francisco Assis Shikida
(Orientador – Unioeste)
Para Marilei, minha esposa.
Para Robert, Rillary e Raíssa, meus filhos.
Para Alvino e Lori, meus pais.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, por me iluminar e dar forças nos momentos mais difíceis, e a
Jesus Cristo, exemplo e fonte de vida que me torna confiante e perseverante, não desistindo
mesmo em situações limites.
A minha esposa, Marilei Clein, pelo incentivo e confiança em todos os momentos,
companheira e mãe que não mede esforços para que todos da família alcancem seus objetivos.
Aos meus filhos, Robert Junior Clein, Rillary Beatriz Clein, e Raíssa Pamela Clein,
pessoas maravilhosas que proporcionam alegrias incomparáveis e fazem minha vida ter muito
mais sentido.
Aos meus pais, por todos os ensinamentos e tudo o que fizeram e fazem para que seus
filhos sejam pessoas de bem, além de ser exemplo de superação diante dos obstáculos que juntos
enfrentam.
Aos meus irmãos, pelo companheirismo em tantas vivências, não se deixando vencer
diante dos obstáculos.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Pery Francisco Assis Shikida, um exemplo de pessoa e
profissional que tive a honra de conhecer e aprender, o qual demonstrou compromisso
incontestável para com a sociedade, primando pela qualidade e excelência na pesquisa e
trabalhos realizados.
Ao meu coorientador, Prof. Dr. Luciano Rodrigues, pelas observações e contribuições
para a melhoria do estudo.
A todos os Professores e Servidores Administrativos do PGDRA que, de forma direta
ou indireta, possibilitaram a concretização do sonho de concluir o doutorado.
Aos colegas de turma, Diogo, Marcílio, Márcio, Patrícia e Vilmar, pelo empenho e
companheirismo no desenvolvimento de atividades, pela amizade e parcerias.
Ao Allan G. N. Strauch, Athena M. da C. Stanoga, Cristian J. P. Aguilar, Renata
Cattelan, Samara C. V. Piacenti e Suellen B. dos Santos, pela preciosa ajuda dada ao trabalho.
A comissão examinadora, Professores Doutores: Walter Belik, Lucilio Rogerio
Aparecido Alves, Gilmar Ribeiro de Mello e Martin Airton Wissmann, por disponibilizar de
tempo e dedicação em participar e contribuir com o estudo realizado.
A Alcopar, por contribuir para que a pesquisa realizada tivesse êxito em relação aos
objetivos propostos e na contribuição para com a academia científica.
A Universidade Tecnológica Federal do Paraná, por possibilitar o tempo para dedicação
ao estudo e à qualificação do quadro de profissionais.
Aos profissionais da iniciativa pública e privada que participaram da pesquisa de campo
(qualitativa) das cidades de Cambará, Engenheiro Beltrão, Perobal, Porecatu e Rolândia.
Agradeço a todos que de uma forma ou de outra, contribuíram para que meus objetivos
se tornassem realidade. Com grande carinho, obrigado de coração!
“As coisas que são impossíveis aos
homens são possíveis a Deus”
Lucas 18:27
RESUMO
O Brasil é um dos maiores produtores de cana, açúcar e etanol do mundo, gerando divisas da
ordem de US$ 5,5 bilhões com as exportações açucareiras e US$ 981,9 milhões com as
exportações alcooleiras, além de milhares de empregos. Contudo, a agroindústria canavieira
vivencia uma crise no setor que está provocando sérios prejuízos, com problemas de
recuperação judicial e falência de várias usinas. Diante disso, o presente estudo procurou
evidenciar e analisar quais os motivos e consequências da falência de agroindústrias canavieiras
no Estado do Paraná. Para tanto, foram utilizadas duas abordagens metodológicas concatenadas
entre si, uma quantitativa e outra qualitativa. O modelo de dados em painel dinâmico buscou
verificar como se comportou o PIB de cinco cidades paranaenses (Cambará – operou a Usina
Casquel; Engenheiro Beltrão – Sabarálcool/Matriz; Perobal – Sabarálcool/Filial; Porecatu –
Central do Paraná; e Rolândia – Corol), onde existiam agroindústrias canavieiras que atuavam
como forças motrizes e faliram. As variáveis independentes explicativas para o comportamento
do PIB foram: o PIB defasado de um período; IFDM educação; IFDM emprego; área colhida;
Quociente Locacional (QL), ambas com relação positiva em relação à variável dependente
(PIB). As outras variáveis apresentaram relação negativa (empregos na agricultura; fator
experiência – média de anos de experiência dos trabalhadores do município; mão de obra
masculina), implicando em uma elasticidade na qual o aumento em uma dessas variáveis, fez
decrescer o PIB. As contribuições da análise quantitativa sugerem que o PIB dos cinco
municípios estudados, de certa forma, apresentou relação com o malogro das usinas. Os
resultados do método qualitativo (pesquisa de campo nos municípios supracitados), segundo
apontaram dez representantes dos setores públicos e privados (de forma geral), deu-se na
redução de empregos, renda e arrecadação. Quanto aos fatores considerados determinantes para
o fechamento das unidades pesquisadas verificou-se, conforme percepção dos dez
entrevistados, que a falta de gestão foi o principal motivo para a falência das usinas.
Comparando as duas abordagens, quantitativa e qualitativa, corrobora-se a lógica de algumas
variáveis que resultaram em explicativas para o desempenho do PIB nos cinco municípios
visitados, quando vários respondentes apontaram, por exemplo, que a derrocada das usinas
abriu espaço para outras atividades, isto está relacionado com o QL na análise econométrica.
Ou seja, quando as usinas faliram, a agricultura passou a ser menos concentrada (relativamente),
deixando de focar em uma atividade específica.
Brazil is one of the largest producers of cane, sugar, and ethanol in the world, generating a
foreign exchange of approximately US$ 5.5 billion with sugar exports and US$ 981.9 million
with alcohol exports, in addition to maintaining thousands of jobs. Nevertheless, the sugarcane
agribusinesses is experiencing a crisis in the sector, causing severe losses, problems of judicial
recovery, and several plants' bankruptcy. Given this, the present study sought to highlight and
analyze the reasons and consequences of the sugarcane agribusinesses bankruptcy in the State
of Paraná. For this purpose, two methodological approaches concatenated with each other were
used, a quantitative one and a qualitative one. The dynamic panel data model sought to verify
how the GDP of five cities in Paraná (Cambará – operated the Casquel plant; Engenheiro
Beltrão – Sabarálcool/Headquarters; Perobal – Sabarálcool/Branch; Porecatu – Central do
Paraná; and Rolândia – Corol), where sugarcane agribusinesses existed as driving forces and
went bankrupt. The independent explanatory variables for GDP behavior were the outdated
GDP for one period; IFDM – Firjan Municipal Development Index – education; IFDM
employment; harvested area; Locational Quotient (QL), both positively related to the dependent
variable (GDP). The other variables showed a negative relationship (agricultural jobs;
experience factor – average years of experience of the municipality’s workers; male labor),
implying an elasticity in which the increase in one of these variables decreased the GDP. The
quantitative analysis contributions suggest that the GDP of the five municipalities studied was
related to the collapse of the plants in a way. According to ten representatives of the public and
private sectors (in general), the qualitative method's results (field research in the municipalities
mentioned above) showed reduced jobs, income, and collection. As for the factors considered
decisive for the closure of the surveyed units, it was found that the lack of management was the
main reason for plant failure, according to the perception of the ten interviewees. Comparing
the two approaches, quantitative and qualitative, the logic of some variables that resulted in
explanations corroborates the GDP performance in the five municipalities visited, for example,
when several respondents pointed out that the plants' collapse made room for other activities,
this is related to the QL in the econometric analysis. In other words, when the plants went
bankrupt, agriculture started to be less concentrated (relatively), failing to focus on a specific
activity.
KEYWORDS: sugarcane economy; market analysis; bankruptcy; panel data; field research;
Paraná.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Gráfico 1 – Produção de açúcar (em mil ton.) e etanol (em mil m3) no Brasil – 1990/1991 a
2019/2020 ................................................................................................................................. 26
Gráfico 2 – Produção de açúcar (em mil ton.) e etanol (em mil m3) no Paraná – 1990/1991 a
2019/2020 ................................................................................................................................. 45
LISTA DE QUADROS E TABELAS
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 13
1.2 Problema e justificativa ...................................................................................................... 16
1.3 Objetivos ............................................................................................................................ 20
1.3.1 Objetivo geral .................................................................................................................. 20
1.3.2 Objetivos específicos....................................................................................................... 20
1.4 Estrutura do trabalho .......................................................................................................... 21
2 REVISÃO DE LITERATURA .......................................................................................... 22
2.1 A evolução da agroindústria canavieira no Brasil .............................................................. 22
2.1.1 Caracterização histórica da evolução da agroindústria canavieira .................................. 22
2.1.2 A agroindústria canavieira no contexto técnico-produtivo ............................................. 27
2.1.3 Situação atual da agroindústria canavieira: fase de crise ................................................ 36
2.2 A agroindústria canavieira no Paraná................................................................................. 42
2.2.1 Agroindústrias canavieiras desativadas ou paralisadas no Paraná .................................. 47
3 REFERENCIAL TEÓRICO .............................................................................................. 54
4 METODOLOGIA ............................................................................................................... 63
4.1 Tipologia da pesquisa: notas introdutórias ......................................................................... 63
4.2 Abordagem quantitativa ..................................................................................................... 64
4.2.1 Dados em Painel .............................................................................................................. 66
4.2.2 Regressões no modelo econométrico de dados em painel .............................................. 68
4.2.3 Modelo de dados em painel dinâmico ............................................................................. 71
4.3 Abordagem qualitativa ....................................................................................................... 72
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................................................ 75
5.1 Abordagem quantitativa: determinação do modelo e análise dos resultados e discussão .. 75
5.2 Abordagem qualitativa: resultados e discussão .................................................................. 83
6 CONCLUSÕES ................................................................................................................... 94
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 97
ANEXO – Localização das usinas ativas, desativadas, paradas e em recuperação judicial no
Brasil – posição junho 2018 ................................................................................................... 111
13
1 INTRODUÇÃO
Com um legado de mais de quatro séculos, a cultura canavieira no Brasil tem sido objeto
de muitas análises acadêmicas. Pina (1972) ressalta que o cultivo da cana-de-açúcar faz parte
da história agropecuária nacional como nenhuma outra cultura faz. Neves, Trombin e Consoli
(2010), Neves et al. (2011) e Neves (2014), em contexto analítico mais recente da economia
(séculos XX e XXI), destacam que a agroindústria canavieira brasileira tem grande relevância
por proporcionar – em alta escala – dois importantes produtos, o açúcar, para a segurança
alimentar, e o etanol, para a segurança energética, gerando resultados significativos tanto para
o mercado interno como para o mercado internacional.
Tecnicamente, o setor sucroenergético “envolve a produção canavieira que avança para
além da fabricação de açúcar e álcool, incorporando a geração de energia elétrica” (INÁCIO,
2014, p. 22). De forma similar, o conceito de agroindústria canavieira compreende os
segmentos agrícola e industrial processadores da cana-de-açúcar, com geração de produtos e
subprodutos oriundos dessa atividade (SHIKIDA, 1997).
Alguns problemas enfrentados por este setor geraram muita instabilidade ao longo da
sua história. Esse é o caso do etanol na matriz energética no País que “[...] não foi delineada a
partir de um plano objetivo e transparente, com mecanismos e medidas específicas a esse
mercado”, tanto que em determinados momentos seu ideário de segurança energética
sustentável sucumbiu ante às preocupações com o avanço da inflação e/ou déficit público
(RODRIGUES, 2015, p. 106).
Segundo Meurer (2014) e Andrade (2017), apesar de avanços no próprio setor, as
agroindústrias canavieiras também necessitam do papel ativo de outros agentes do mercado
para produzirem as inovações que promovam melhorias de produtividade e competitividade.
Nesse cenário, as instituições públicas (universidades e instituições de pesquisas, por exemplo)
e privadas (Centro de Tecnologia Canavieira – CTC, por exemplo) exercem papel essencial no
desenvolvimento e na disseminação de tecnologias avançadas, como no caso de prevenção e
resistência a pragas e doenças que permeiam a produção de cana-de-açúcar.
De forma geral, em todo o País as usinas e destilarias estão passando por uma
reorganização de suas estruturas produtivas, utilizando-se de múltiplas formas tecnológicas.
Essas unidades produtivas procuram melhores formas de produção, inovação de produtos,
processos e gestão organizacional, para fazer frente ao competitivo mercado sucroalcooleiro
(RISSARDI JÚNIOR, 2015). Como consequência, observam-se regiões com maior número
dessas unidades produtivas pertencentes a um único grupo, evidenciando uma nova conjuntura
14
objetivo de controlar a inflação, prejudicou ainda mais este segmento produtivo que já
vivenciava uma conjuntura difícil (FERREIRA; VIEIRA FILHO, 2019; SANTOS, 2021).
Nesse contexto, Bechlin et al. (2020, p. 252) corroboram que este setor vem passando
por um momento claramente difícil, porquanto: “no início de 2019, de um total de 444 usinas
instaladas no País, 22,75% estão paradas. Das 343 usinas que estão operando, 4 estão com status
jurídico ‘falida’ e 48 em ‘recuperação judicial’”. Esses autores complementam afirmando que
tal situação prejudica, com maior intensidade, os pequenos municípios onde essas unidades
produtivas funcionam como força motriz, em que boa parte dos trabalhadores locais tem vínculo
direto e/ou indireto com as usinas ou destilarias.
Isto posto, o objetivo deste trabalho consiste em analisar quais os motivos e as
consequências da falência de agroindústrias canavieiras no Estado do Paraná. Destarte, para a
realização do presente trabalho foi utilizado como procedimento metodológico uma pesquisa
considerada de natureza explicativa, com uso de instrumentais quantitativo e qualitativo
intercalados entre si.
No tocante ao procedimento quantitativo, a coleta de dados secundários se deu por meio
de pesquisas com literaturas afins, base de dados e sites com informações sobre o setor
sucroenergético. O intento é o de estimar e analisar, a partir de um instrumental econométrico
de melhor ajuste, o que houve com municípios paranaenses (Cambará, Engenheiro Beltrão,
Perobal, Porecatu e Rolândia) que tiveram agroindústrias canavieiras que faliram. Cumpre
destacar que essas unidades produtivas atuavam como forças motrizes nessas localidades, sendo
esta a motivação da escolha desses municípios.
Conforme Rippel e Lima (2009), uma indústria motriz, em uma determinada localidade
de contingente populacional relativamente reduzido, ao crescer tem o poder de afetar a estrutura
econômica e populacional por meio da expansão da renda regional. Ao revés, ao falir, o efeito
é reverso. A periodização temporal escolhida para isto foi os anos de 2007 a 2016.
O estudo qualitativo procura, mediante pesquisa de campo (LAKATOS; MARCONI,
2010), investigar e analisar a percepção dos agentes econômicos municipais ligados, direta e
indiretamente, com unidades sucroenergéticas paranaenses selecionadas que deixaram de
funcionar. Buscar informações primárias sobre os fatores relacionados à falência dessas
agroindústrias canavieiras, bem como sua influência sobre os aspectos econômico e social para
os municípios onde existiam, torna-se premente para entender não somente as causas desse
quadro, como as suas consequências.
Com este fito, faz-se premente entrevistar profissionais, representantes do setor privado
(ou diretores dos sindicatos rurais ou associações comerciais e industriais, representantes
16
A grandeza da economia canavieira no Brasil está em alguns dos seus dados, porquanto
foram produzidos, na safra 2019/2020, 642,7 milhões de toneladas de cana, que resultaram na
produção de 29,6 milhões de toneladas de açúcar (segundo maior produtor mundial dessa
commodity) e 35,6 milhões de litros de etanol total (segundo maior produtor mundial). Foram
geradas divisas da ordem de US$ 5,5 bilhões com as exportações açucareiras e US$ 981,9
milhões com as exportações alcooleiras (UNICA, 2021). Ressalta-se que, mesmo diante desses
números, a produção canavieira vinha caindo no Brasil, ininterruptamente, desde a safra
2015/2016, voltando a se recuperar apenas na safra 2019/2020.
Uma pesquisa do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada – Cepea (2017)
mostrou o PIB (Produto Interno Bruto) da cadeia produtiva da cana, que considera os segmentos
de insumos, atividades primárias (produção agrícola), indústria e serviços (transporte e
comércio), com um valor estimado de R$ 156 bilhões, sendo um dos maiores PIB’s do
agronegócio brasileiro. Perdeu apenas para a bovinocultura de corte, com R$ 194,5 bilhões;
17
mas superou a soja, com R$ 103,2 bilhões, a bovinocultura de leite, com R$ 69,4 bilhões, e o
algodão, com R$ 16,1 bilhões.
Ademais, Shikida e Souza (2009) ressaltaram a importância da agroindústria canavieira
para o desenvolvimento local mediante empregos gerados e consequente crescimento de renda
para o município, que ainda tem o efeito de estimular outras atividades, como o comércio, a
construção civil etc. Embora os dados revelem uma pujança média da economia canavieira na
agricultura local, nacional e internacional, muitas usinas e destilarias estão passando por crises
econômicas.
Lucros em queda, elevado endividamento, falta de capital de giro e, principalmente,
baixa competitividade e ausência de experiência empresarial, são motivos que explicam, de
modo geral, a alta mortalidade dos mais diversos tipos de negócios (MOLLO, 2015; MAMEDE,
2017). Não obstante seja correto dizer que a taxa de sobrevivência mede “a relação entre o
número de empresas sobreviventes e a população de empresas no ano de referência”
(INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE, 2017, p. 82), isto
depende também de uma série de variáveis como porte da empresa, tipo de atividade,
localização geográfica, ano em que foi criada etc.
Nesse contexto, a evolução das taxas de sobrevivência das empresas criadas no Brasil
mostra um cenário nada positivo. No cômputo do mais recente trabalho da área divulgado pelo
IBGE, intitulado Demografia das Empresas, considerando o período de 2008 a 2015, 22,8%
das empresas, em média, não sobreviveram ao primeiro ano de funcionamento, enquanto
52,5%, em média, encerraram suas atividades antes de completar cinco anos de existência
(IBGE, 2017).
O ambiente de crise experimentado pela economia canavieira no Brasil evidencia,
segundo Bechlin et al. (2020), que 101 agroindústrias canavieiras estavam paradas no início de
2019 (22,75% do total), daquelas que estavam operando, 4 estavam com status jurídico de falida
e 48 se encontravam em recuperação judicial.
Com base em estudos da RPA Consultoria, as empresas desse setor que não
conseguiram cumprir seus compromissos com credores e que buscaram proteção judicial, ou
aquelas que acabaram decretando falência, foram afetadas pela grande deterioração financeira,
resultado da crise setorial iniciada em 2008, com queda nos preços do açúcar e etanol,
adversidades climáticas (instabilidade no regime de chuvas e geadas), alto grau de
endividamento e erros de gestão. Nesse cenário, acredita-se que algumas unidades em situação
de recuperação judicial não voltarão a operar, pois já foram “desmontadas” ou estão numa
situação cujo aporte financeiro para sua reativação seria tão alto que não valeria o investimento
18
(RAMOS, 2017). Isto reforça a importância de se atentar para o estudo das razões e também
consequências do término dessas empresas.
As razões da falência de uma agroindústria canavieira, sejam elas quais forem,
frequentemente estão associadas com crises macroeconômicas e/ou estratégias desacertadas por
parte das firmas. Mas, o que vem a ser crise? Santos et al. (2016) assim definem:
[...] pode-se considerar que uma crise de natureza econômica trata-se da contração do
nível de produção de determinado bem ou serviço, inerente ao próprio ambiente
competitivo de um setor, com reflexos negativos na produção, comercialização,
consumo, preços, empregos, entre outros, em dado período de tempo. Ela pode ser
provocada por um evento ou fenômeno derivado tanto de estratégias empresariais
equivocadas, quanto por desastres naturais que afetam a produção, pela contração de
crédito, pelo ambiente macroeconômico adverso, por desestabilização do mercado,
entre outros (SANTOS et al., 2016, p. 19).
It was noted that from 2007 to 2013 many groups bought many traditional industrial
plants in the sugar and alcohol sector, which were experiencing financial difficulties,
mainly due to the international financial crisis of 2008. From 2013, many of these
large buyer groups did not have the expected return and have been experiencing the
same difficulties as traditional groups, and have been acquired by others more
discerning groups in their choices (SIQUEIRA; SHIKIDA, CARDOSO, 2017, p.
151).
Outro aspecto que deve ser realçado é que existem diversos interesses no interior dessa
atividade que são complexos de serem analisados, sobretudo em face das mudanças que
alteraram a sua dinâmica de mercado e que, portanto, também influenciam a condição de
sobrevivência das usinas/destilarias. Sobre isto, houve um período – de 1933 (ano de criação
do IAA) até 1990 (ano que marca a extinção do IAA) – em que o Estado, agindo de forma
intervencionista, ditava as regras de comercialização, definia políticas de exportação, estoques
e preços, determinava quotas de produção etc. (QUEDA, 1972; RISSARDI JÚNIOR, 2015;
WISSMANN, 2017).
19
Dessa forma, o produtor se submetia a uma série de arranjos institucionais que ligavam
os interesses do setor público com as vontades da agroindústria canavieira, eminentemente
privada. A partir da extinção do IAA, que implicou o afastamento do Estado e a predominância
do livre mercado, houve uma nova institucionalidade setorial que afetou os fornecedores de
cana-de-açúcar, empresários de usinas e destilarias, distribuidoras de combustível,
consumidores etc. Essa mudança, denominada “desregulamentação”, passou a exigir do
empresariado da agroindústria canavieira uma busca crescente por eficiência técnica, pois o
modelo subvencionista – outrora existente durante vigência do IAA – foi substituído por um
modelo de mercado mais suscetível às insolvências (BELIK; MORAES, 2000; CHAGAS,
2009; RISSARDI JÚNIOR, 2015; WISSMANN, 2017).
Por último, mas não menos importante, a indagação de quais razões e consequências da
falência das agroindústrias canavieiras surgiram, também, a partir da sequência de resultados
dos trabalhos acadêmicos. Nesses trabalhos foram observadas várias fases neste setor, sendo as
mais recentes: “a desaceleração e crise do Proálcool e ruptura do paradigma subvencionista”
(1986/1987 a 1995/1996); “recrudescimento da desregulamentação, explicitação da debilidade
estrutural e o surgimento da diversidade de interesses” (1996/1997 a 2002/2003); e “retomada
do etanol com o mercado flex-fuel, Investimentos Diretos Estrangeiros (IDE) e falta de
planejamento por parte do governo federal na condução da política de precificação da gasolina”
(2003/2004 a 2017/2018), que contribuiu para arrefecer o consumo doméstico de etanol em
certos momentos, agravando a crise setorial (SHIKIDA, 2014; SANTOS, 2021).
Diante desse cenário, com base em Rissardi Júnior (2015), não foi sem propósito que
usinas e destilarias faliram no Brasil, com evidências de muitos escores dos fatores F1
(“modernização da agroindústria canavieira e especialização”) e F2 (“rendimentos agrícola e
industrial”) negativos. Conforme Meurer (2014), houve, ainda, clara comprovação de que
grande parte das agroindústrias canavieiras instaladas no País domina fundamentalmente as
capacidades tecnológicas básica (simple routine) e intermediária (adaptive duplicative). Porém,
no tocante à gradação avançada (innovative risky), que é a que possibilita excelência
competitiva, ainda há muito que avançar, destacadamente em termos de inovação de processo
e em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D).
Passados 46 anos de produção e uso do etanol como combustível veicular em larga
escala, e tendo mais de cinco séculos de produção açucareira de realce, uma pesquisa que possa
responder, no padrão exigido pela comunidade acadêmica, quais são os motivos que explicam
a falência das usinas no Estado do Paraná e suas consequências, dará sequência a uma série de
trabalhos que buscam analisar e compreender características, idiossincrasias e vicissitudes desta
20
1.3 Objetivos
2 REVISÃO DE LITERATURA
Segundo Pina (1972, p. 11), “a história do Brasil se encontra tão intimamente ligada ao
cultivo da cana-de-açúcar, que se faz impossível uma dissociação, sob a pena de incorrer-se em
uma falsidade”.
Com efeito, Rissardi Júnior (2015) ressalta que a agroindústria canavieira é uma
atividade que suscita muitos estudos no Brasil, de cunho histórico, socioeconômico, cultural
etc., alguns com sofisticados modelos econométricos e/ou aplicações empíricas de
levantamento de dados primários. Do ponto de vista de sua gênese, a cana-de-açúcar foi
“introduzida em terras brasileiras nos primórdios do século XVI, com o objetivo de defender e
alavancar sua colonização e, ao mesmo tempo, gerar divisas para a Coroa Portuguesa”, sendo
que seu crescimento foi tão expressivo a ponto de caracterizar, entre 1530 e 1650, o ciclo do
açúcar, período em que a economia colonial brasileira fundamentou-se nas exportações de
açúcar (RISSARDI JÚNIOR, 2015, p. 17).
A indústria açucareira, considerada moderna, surgiu no Brasil no século 19 e registros
demonstram que em 1920 já existia uma produção incipiente de álcool, porém, sua produção
em grande proporção teve início somente nos anos 70. Em 1930 havia em operação no País 83
usinas produtoras de açúcar e álcool, embora o açúcar fosse produzido desde o século XVI
(SZMRECSÁNYI, 1979; UNIÃO DOS PRODUTORES DE BIOENERGIA – UDOP, 2018).
23
Tendo-se como base as fases citadas para a agroindústria canavieira no Quadro 1, esse
segmento produtivo tem sofrido influências (positivas e negativas) no decorrer do tempo devido
a vários fatores. Não obstante, serão citadas aqui apenas as que impactaram desfavoravelmente,
quais sejam: oscilações da produtividade; limitações financeiras expressivas, incluindo-se a
falta de crédito; ociosidade em relação à capacidade produtiva etc. (CHAGAS, 2014). Assim
como os fatores mencionados, há também outros condicionantes que pressionam negativamente
este setor, sendo os diretamente ligados ao próprio segmento (por exemplo, intempéries
climáticas), e os que exercem influência por sua magnitude como, por exemplo, as crises de
caráter internacional, as oscilações no preço do petróleo e a recente prática de contenção dos
preços de combustíveis fósseis desalinhada dos preços externos, com o escopo de controlar a
inflação (FERREIRA; VIEIRA FILHO, 2019).
Em termos de evolução, o Gráfico 1 retrata as produções de açúcar e etanol no Brasil
entre 1990/1991 e 2019/2020, onde nota-se um quadro evolutivo mais instável para o etanol em
cotejo com o açúcar. Ressalta-se a retomada do crescimento nesse mercado com a introdução
do flex-fuel em 2003, sendo positiva essa fase até 2008/2009, para a partir desse momento
oscilar entre períodos de quedas e elevações na produção alcooleira. A taxa geométrica média
anual de crescimento da produção de etanol, de 1990/1991 a 2019/2020, foi de 4,2% a.a.1
Gráfico 1 – Produção de açúcar (em mil ton.) e etanol (em mil m3) no Brasil – 1990/1991 a
2019/2020
45.000
40.000
35.000
30.000
25.000
20.000
15.000
10.000
5.000
0
1
O cálculo da taxa geométrica média anual de crescimento se baseia em Hoffmann e Vieira (1987).
27
Fonte: Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), extraído de Gasques, Souza e Bastos (2018, p. 58).
2
Para um maior detalhamento das especificidades regionais de produção desse setor, bem como sua dinâmica a
partir dos dados do Censo Agropecuário 1995, 2006 e 2017, ver: Shikida e Cattelan (2020).
29
Sobre o destaque paulista na agroindústria canavieira, cabe citar que este estado possui
algumas características que beneficiam o cultivo e a comercialização da cana-de-açúcar e seus
derivados, como: a existência de uma adequada infraestrutura de transportes; condições de solo
e clima favoráveis; proximidade dos maiores mercados consumidores; e robusta base de
desenvolvimento tecnológico e científico, essencial para incrementar a produtividade agrícola,
industrial e gerencial observada nesse setor (MEURER, 2014).
Para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES e o Centro
de Gestão e Estudos Estratégicos – CGEE (2008), a produção de cana-de-açúcar é, sem dúvida,
uma importante geradora de fontes econômicas para o País ao proporcionar os produtos açúcar,
etanol e energia derivada da queima do bagaço da cana, além de outros que derivam dessa
matéria-prima e são de usos alternativos em diversos segmentos (como gás carbônico, torta de
filtro etc.).
Melo e Sampaio (2016) constataram certa preferência pela produção de açúcar quando
comparada com a de etanol, sendo que os produtores percebem o mercado de açúcar como mais
consolidado. Consideram-se as premissas de menor potencialidade do etanol no exterior, já “o
mercado de açúcar guarda fortes laços com o setor externo”, e [...] “os preços domésticos
refletem as condições de oferta e demanda global” (MELO; SAMPAIO; 2016, p. 63).
Entretanto, tudo depende do momento vivenciado pelas duas principais commodities do
setor. Conforme Gasques, Souza e Bastos (2018, p. 58), “na situação atual – em que os preços
do açúcar estão em queda –, a tendência é o direcionamento da produção para o etanol”. Nas
quatro últimas safras citadas no Gráfico 1 (2016/2017 a 2019/2020), por exemplo, nota-se um
crescimento da produção alcooleira e decréscimo da açucareira.
A agroindústria canavieira traz perspectivas de vantagens que podem ser obtidas por sua
instalação em uma região como potencial para o desenvolvimento local. No entanto, há a
necessidade de cuidados quanto aos fatores considerados positivos e negativos dos seus
diversos impactos ambientais, e de outros que se fazem inerentes quando da instalação de uma
unidade produtora de cana em escala industrial (SHIKIDA; SOUZA, 2009).
De acordo com o approach teórico neoschumpeteriano, a base da relação entre indústria
e mercado é o que permite caminhos de oportunidades tecnológicas em termos de seleção e
utilização de inovações, como meio de lucratividade no que se refere aos produtos e processos
(POSSAS, 1989; VIEIRA FILHO, 2009).
Para a produção de valor no capitalismo, a inovação é fator determinante. Com efeito, a
inovação possibilita conquistar novos mercados e introduzir novos produtos e meios de
produção, além de formas de matérias-primas ou partes que integram as indústrias. Já quem faz
30
Nesse sentido, o crédito (recurso/capital essencial para o investimento) se torna fomentador das
inovações tecnológicas necessárias ao desenvolvimento organizacional.
No processo de agroindustrialização do setor sucroenergético ocorreu uma
diversificação na produção com oferta de álcool combustível e a sua introdução para o mercado
automotivo. Essa diversificação engendrou esforços tendo como foco ampliar a opção do
consumidor em relação ao uso de um combustível mais sustentável ecologicamente. Assim, ao
pensar em diversificação na agroindústria canavieira, deve-se ter como base duas vertentes: a
base tecnológica; e as competências essenciais. No tocante à base tecnológica, é preciso
proporcionar condições mínimas de tecnologias para um bom desempenho produtivo. Já no que
tange às competências essenciais, corresponde saber utilizar as ferramentas e os meios possíveis
para que as estratégias empresariais possam produzir os efeitos esperados (CHAGAS, 2014).
Para Pedro (2008), o percurso pelo qual passaram o avanço tecnológico e a pesquisa,
canalizada ao estudo da cana-de-açúcar, contempla dois importantes períodos: 1970 a 1990 e
1990 a 2005. Pode-se verificar que, no primeiro período, a regulamentação estatal teve papel
fundamental para o desenvolvimento do setor, enquanto que, no segundo, houve o afastamento
do Estado que reduziu suas intervenções. Não obstante, no período 1996/2008 muitas
modificações institucionais transcorreram, influenciando na melhoria da governança de
mercado e produção de cana-de-açúcar, direta ou indiretamente, conforme os seguintes pontos:
1. Desregulamentação e mudança no papel do Estado, reduzindo sua participação e
interferências no setor;
2. Lei de Propriedade Industrial (LPI) (Lei nº 9.279, de 14/5/1996), criada para regulação
dos direitos e obrigações condizentes à propriedade industrial;
3. Lei de Proteção de Cultivares (LPC) (Lei nº 9.456, de 25/4/1997), instituidora da Lei de
Proteção de Cultivares e atribuidora de outras providências;
4. Adesão à União Internacional para a Proteção de Novas Variedades Vegetais (UPOV)
(Decreto nº 3.109, de 30/6/1999), consolidando e padronizando os direitos de
propriedade intelectual no Brasil. A Lei julga serem estas variedades como um bem
móvel para todos os efeitos legais;
5. Lei de Defesa Fitossanitária (Decreto nº 5.741, de 30/3/2006), que estrutura, de forma
sistematizada, o sistema unificado de atenção à sanidade agropecuária, e dá outras
providências;
6. Fundos setoriais (CT-Agro com a Lei nº 10.332, de 19/12/2001; e o CTBiotecnologia
com a Lei nº 10.332, de 19/12/2001), que estabelece os meios de financiamento para o
Programa de Ciência e Tecnologia para o Agronegócio, para o Programa de Fomento à
32
superioridade de valor, causando impacto negativo neste setor devido ao aumento das dívidas,
principalmente para os produtores médios. Além da valorização do dólar, outros fatores fizeram
parte das dificuldades enfrentadas pela agroindústria canavieira (como condições
edafoclimáticas desfavoráveis em algumas ocasiões), não podendo considerar uma variável
isolada para explicar determinado fenômeno nesse setor que tem uma complexa rede de
variáveis influentes de sua dinâmica (ALVES, BACCHI, 2004; GRAEF et al., 2016).
Para Cruz, Malacoski e Shikida (2019), o que se percebe na agroindústria canavieira no
período mais recente é a manutenção do carro flex-fuel que oportuniza uma retomada para a
venda de etanol e avanços do segmento, mas com falta de planejamento que debilita o setor.
Paralelamente com os avanços que o carro flex-fuel proporciona, vem ocorrendo a
movimentação em torno da preocupação com questões ambientais em todo o mundo,
pressionando o mercado a manter/buscar alternativas de energias renováveis que promovam o
desenvolvimento sustentável.
De acordo com Rissardi Júnior (2015), diante dos desafios após a desregulamentação
setorial a partir de 1990, ocorreu a necessidade de adaptação de produtores e consumidores em
relação ao cenário que se desenvolvia, sendo mais intenso o livre mercado. Com isso,
precisaram atuar visando redução de custos de produção, utilizando inovações tecnológicas em
seus processos produtivos para o alcance de maior capacidade produtiva, além de aproveitar de
forma mais intensa os subprodutos gerados pela agroindústria canavieira.
Vale lembrar que os produtores que dependiam em grande proporção de arranjos
institucionais proporcionados por ações governamentais de caráter subvencionista, com o fim
dessas e frente às dificuldades econômicas, tanto nacional como internacional, juntamente à
falta de iniciativas para melhorias em suas capacidades tecnológicas, logo apresentaram
fragilidades financeiras e econômicas. Diante da possibilidade de subvenção estatal, ainda
durante vigência do IAA, as agroindústrias tinham como garantia margens de lucros, reserva
de mercado, concessão de subsídios etc. Porém, ao se depararem com as regras mais próximas
de livre mercado, pós-1990, muitas ficaram impossibilitadas de prosseguirem com as atividades
ou foram incorporadas por agroindústrias mais desenvolvidas (MEURER, 2014).
Segundo Michellon, Santos e Rodrigues (2008), o governo brasileiro buscou
proporcionar, por diferentes estímulos, a motivação para o consumo de automóveis que utilizam
combustível etanol para sua movimentação, sendo que:
a) O Estado procurou privilegiar o consumo de etanol no abastecimento de veículos;
b) Determinou que, na composição do combustível gasolina, um percentual de etanol (à
época, 20%) deveria ser adicionado;
35
c) O preço deveria ser incentivo para o aumento da revenda de etanol hidratado, não
podendo ultrapassar 65% do preço estipulado para a comercialização do combustível
gasolina;
d) Diminuiu impostos para os carros que viessem a ser fabricados, tendo como intenção a
ampliação da demanda de etanol;
e) Os táxis movidos a etanol deveriam ser isentos da cobrança de impostos
(MICHELLON; SANTOS; RODRIGUES, 2008).
Embora o governo tenha buscado criar formas de estímulo para o consumo de etanol,
esses não foram suficientes para garantir lucratividade ou sobrevivência econômica de certas
agroindústrias canavieiras. Vale dizer que o Brasil desponta como o maior produtor desse
biocombustível resultante da cana-de-açúcar, sendo que a industrialização desse produto se
torna essencial para dar suporte à matriz energética brasileira (NASSER; SILVA, 2016).
Além disso, entre 2011 e 2014, o mercado de etanol enfrentou um forte golpe por parte
do governo pelo fato da execução de uma política de preços da Petrobras, usada com intuito de
manter a inflação controlada. Na época, a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, determinou a
“proteção” dos preços do óleo diesel e da gasolina quanto às oscilações do valor do petróleo no
comércio internacional, episódio que causou prejuízos à Petrobras superiores a 200 bilhões de
reais (SANTOS et al., 2016; SOCIEDADE NACIONAL DE AGRICULTURA – SNA, 2019).
Diante dessa manobra do governo, o segmento alcooleiro foi diretamente afetado, tendo
uma queda de mais de 30% em relação ao consumo de etanol, ocorrendo perda do seu potencial
competitivo. Contudo, as oscilações no mercado alcooleiro estão presentes desde a década de
1970, quando foi criado o Proálcool, consequência da inexistência de políticas governamentais
brasileiras voltadas para esta atividade. A liberação da política de preços vinculada à Petrobras
ocorreu somente em 2016, na época do governo de Michel Temer.
Já na sequência, em 2017, foi lançada outra medida com impacto no mercado de etanol.
Trata-se do RenovaBio, uma política de combustíveis que entrou em vigor a partir de 2020,
visando investimentos para o segmento alcooleiro no decurso de uma década (SNA, 2019).
Sobre isto, Shikida e Cattelan (2020, p. 363) apontam que:
Sobre esse contexto, Santos et al. (2016) ressaltam outro aspecto para esse momento de
euforia para a agroindústria canavieira, que foi o impulso dado pelo Programa de Incentivo a
Fontes Alternativas de Energia (Proinfa), instituído pela Lei nº 10.438/2002. Este Programa
procura contribuir para a diversificação da matriz energética nacional fortalecendo, entre outras
fontes, a cogeração de energia a partir da queima da biomassa da cana-de-açúcar, oportunizando
a redução de emissões de gases de efeito estufa.
Porém, a partir da crise internacional que teve início no ano de 2008, cuja origem foi
nos Estados Unidos, a qual impactou a economia mundial por motivo de diminuição do fluxo
financeiro entre países, o Brasil sofreu como consequência a redução de suas exportações e
complicações em sua economia interna, deixando de gerar aproximadamente 3,7 milhões de
novos postos de trabalho formais entre outubro de 2008 a julho de 2009. Destaca-se,
igualmente, em questões de vendas para o exterior, a perda de cerca de R$ 52 bilhões se
comparado com o mesmo período dos anos 2007/2008 (FACHINELLO; MEURER, 2017).
Duas são as problemáticas evidenciadas com a crise internacional de 2008 para o setor
sucroenergético: 1º) essa crise gerou efeitos de proporções elevadas dentro do setor, sobretudo
pelas dificuldades advindas das limitações produtivas (a competitividade foi afetada pela
redução de recursos para investimentos) e redução das vendas; 2º) houve malsucedidas
estratégias de gestão, que foram tidas como ideais pelos gestores das agroindústrias diante da
situação desencadeada pela crise, mas que gerou efeitos adversos a posteriori (GOEBEL et al.,
2020).
Santos et al. (2016) também destacam que a crise que a agroindústria canavieira
experimentou, a partir do final da década de 2000 e início da década seguinte, está ligada ao
contexto de elevação dos custos de produção agrícola, devido diminuição das margens de lucro
das indústrias e aumento dos custos dos créditos financeiros, juntamente com as políticas
governamentais de controle dos combustíveis fósseis. Para os autores, “estes fatores têm levado
à busca de novos arranjos de controle acionário, fusões e venda de ativos, resultando
concentração da produção”, com a “hipótese de ter havido euforia seguida da crise, [...] ilustrada
pelo crescente financiamento público a taxas vantajosas por meio do BNDES” (SANTOS et al.,
2016, p. 40-41).
O período anterior à crise internacional de 2008 teve uma fase considerada positiva entre
os anos de 2003 e 2007, que se caracterizou principalmente pelo aumento do PIB, redução de
taxas de inflação, alta oferta de créditos e maiores fluxos comerciais. Posteriormente, a partir
de meados de setembro de 2008, quando o banco de investimento Lehman Brothers foi a
falência e a crise externa engendrou um fenômeno sistêmico, gerou-se impactos que
38
influenciaram negativamente a maioria dos países, com fortes quedas do PIB em vários deles
(GUIMARÃES; VIEIRA, 2015).
No biênio 2014/2015, uma outra crise econômica mundial se estabeleceu via choques
de oferta e demanda. Não obstante, tal crise revelou, por fatores internos de instabilidade
governamental no Brasil, a vulnerabilidade da condução de políticas econômicas e, com isso,
gerou-se elevação de custos fiscais (BARBOSA FILHO, 2017).
Segundo Ramos (2017) e Silva (2019), embora a escassez de recursos financeiros no
cenário nacional e a incapacidade na tomada de decisões de alguns gestores tenham sido dois
fatores cruciais para a crise das usinas/destilarias, os aspectos condizentes às questões
climáticas ocorridas nos últimos anos, bem como a política de contenção dos preços dos
derivados de petróleo, também foram responsáveis pelos problemas que fizeram recrudescer as
dificuldades econômicas enfrentadas pela agroindústria canavieira no País.
Neste ínterim, a disparidade existente entre as agroindústrias canavieiras se torna maior
a cada ano que se passa, segundo apontam indicadores do setor sucroenergético. Em maio de
2019, a multinacional holandesa bancária e de serviços financeiros Rabobank gerou um
relatório demonstrando que o cenário que se verifica é de estagnação, forçando as instituições
financeiras a uma seleção mais rigorosa quanto à disponibilização de crédito para essas
agroindústrias (NOVACANA, 2019b).
Nesse contexto, as unidades sucroenergéticas com situação financeira melhor alcançam
grau superior de receita juntamente com menores custos, comparando-se com as que se
encontram em situação financeira mais precária. Essa realidade fortalece as unidades em
melhores condições financeiras porque possibilita investimentos de maior proporção tanto na
parte industrial das usinas/destilarias como na renovação dos canaviais. Nesse panorama, as
empresas com fluxo de caixa precário são incapazes de renovar seus canaviais (considerando a
dependência de áreas próprias) e de cobrir os custos de suas atividades industriais. Isso
engendra um ciclo vicioso que explica a situação de parcela do setor, ou seja, algumas
companhias obtêm êxito nessas condições e logram sucesso competitivo, enquanto outras
sofrem por não estarem preparadas para esse ambiente adverso, culminando com processos de
recuperação judicial ou mesmo falência (GOEBEL et al., 2020; NOVACANA, 2019b).
Silva (2019), ao realçar que 96 unidades produtoras do setor sucroenergético no Brasil
e de moagem de cana-de-açúcar encerraram suas atividades entre 2008 e 2015, reforça que um
dos fatores cruciais para esta situação crítica foi o aumento do custo de captação e restrições ao
crédito.
39
Com efeito, os bancos apontam que a saúde financeira das empresas sucroenergéticas
que permitem adquirir financiamentos está condicionada aos seus indicadores de desempenho
e aos números de produtividade em si. Porém, as últimas safras não expressaram elementos
motivadores para o setor. Em abril de 2019, durante a realização de um evento, Manoel Pereira
de Queiroz, gerente sênior de relacionamento do Rabobank, expressou que, para o setor
sucroenergético brasileiro as dívidas contraídas tiveram um aumento de 20% na safra
2018/2019 e se devem à valorização do dólar pari passu com a diminuição da moagem da cana-
de-açúcar (NOVACANA, 2019b).3
Para Manoel Pereira de Queiroz, “o endividamento na temporada passada ficou entre
R$ 137 e R$ 146 por tonelada de cana processada, versus R$ 120/t no ciclo 2017/18. Assim, o
intervalo de endividamento que projetamos é o maior desde os R$ 148/t registrados em
2014/15” (NOVACANA, 2019b, s/p.). Explica, ainda, que o endividamento sofre influência do
câmbio, “entre 30% e 40% da dívida das usinas está em dólar. E o dólar deu um pulo de 18,94%
na última safra. Além disso, a moagem caiu 4,90%” (NOVACANA, 2019b, s/p.).
A partir desse trabalho feito pelo banco Rabobank, a Novacana (2019b) expôs uma
análise da dívida líquida para a agroindústria canavieira. De acordo com essa análise, a amostra
foi dividida em quatro partes equivalentes, em que se observou que 25% dos grupos
apresentaram números inferiores à média, tendo para cada tonelada de cana endividamento
entre R$ 33/t e R$ 107/t, figurando como os menos endividados. Em contrapartida, existiram
usinas com montante de dívidas entre R$ 154/t e R$ 245/t, figurando neste caso como as mais
endividadas.
Outro item que a análise da Novacana (2019b) retrata, considera a liquidez como um
dos índices vitais para uma avaliação também criteriosa dessas empresas, haja vista que uma
usina/destilaria que tiver liquidez pode gerenciar melhor suas dívidas, equacionando-as com
melhores prazos. Os números apresentados para a amostra em estudo mostram que o cenário
de alcance de liquidez oscila de momentos de baixa liquidez para pequena recuperação desse
índice, denotando uma certa fragilidade.
Outro ponto a ser observado refere-se à inadimplência das empresas do setor frente aos
empréstimos junto ao BNDES, que apresenta o setor de açúcar e álcool com inadimplência de
16,9% em dezembro de 2016, para dívidas vencidas há mais de 30 dias (BNDES, 2017). Bassi
(2019, s/p.) aponta que o setor sucroenergético é um dos maiores devedores do agronegócio,
3
Quanto aos dados ora divulgados, o banco Rabobank relata que representam uma amostra de usinas que são
periodicamente analisadas pela instituição. Trata-se de 35 usinas representando aproximadamente 50% da moagem
brasileira ou, em termos de produção, pouco mais de 300 milhões de toneladas, para a safra 2017/2018.
40
“ao todo, 1.376 empresas – entre usinas, canavieiros e comercializadores de açúcar e etanol –
devem R$ 69,2 bilhões à União”.
Vale dizer que o elevado nível de endividamento em uma agroindústria canavieira traz
como efeitos a elevação das taxas de juros para novos financiamentos e empréstimos, além de
mais obstáculos para obtenção de crédito devido limitação de garantias. Tudo isso contribui
para a redução da capacidade de recuperação orçamentária de uma unidade produtiva em
situação vulnerável (SILVA, 2019).
Rodrigues e Rodrigues (2018), mediante caracterização do panorama econômico-
financeiro do setor sucroenergético no Brasil, a partir de dados advindos de demonstrações
financeiras de 150 usinas (para as safras 2014/2015 e 2015/2016), também encontraram uma
contundente heterogeneidade nesse setor. Foram encontrados nesse estudo quatro grupos
distintos: um grupo que apresentou empresas com alta liquidez e baixo endividamento; dois
grupos intermediários com empresas possuidoras de moderada alavancagem e liquidez, porém,
com performances operacionais variando de alto a baixo; e o quarto grupo com empresas com
alto endividamento, baixa liquidez e margens operacionais negativas.
Corroborando com as informações comentadas, dados da Unica (2021) apontam queda
da produção de cana no Brasil, retratando que desde a safra 2015/2016, quando foram
produzidas 666.824 mil toneladas de cana, até a safra 2018/2019 (620.876 mil toneladas), houve
apenas decréscimo na produção. Esta tendência somente se recuperou na última safra disponível
neste cômputo (de 2019/2020), quando foram produzidas 642.677 mil toneladas de cana, um
aumento de 3,5% em relação à safra anterior, mesmo assim, inferior ao recorde de produção
canavieira atingido em 2015/2016.
Segundo informações da RPA Consultoria contidas em Novacana (2019a), a
agroindústria canavieira vivencia uma crise no setor que está provocando sérios prejuízos. Esta
Consultoria expõe que havia no Brasil, em 2019, um total de 444 agroindústrias canavieiras
regulares, das quais 79 unidades (18%) estavam enfrentando na justiça processo de recuperação
judicial e, ainda, 27 defrontando-se com a lamentável situação de falência (6%) (Quadro 2).
Todavia, outro agravante reforça um alerta para o setor, isto é, além das montas supracitadas,
um contingente de mais de 20 unidades pretendiam, à época, iniciar um modelo de
reorganização econômica para impedir sua falência.
41
Como corolário, os fatores que mais influenciaram o fracasso dessas agroindústrias foram:
escassez de recursos financeiros; fluxo de caixa inapropriado; custo elevado de empréstimos;
gestão e planejamento inadequados; além do controle artificial do preço da gasolina.
Apesar de muitas agroindústrias canavieiras estarem em condições desfavoráveis no
mercado em que atuam (atingidas por sérios problemas financeiros), podendo ingressar na
justiça com pedido de recuperação judicial, algumas procuram evitar tal alternativa criando
possibilidades estratégicas de mercado que possam ser economicamente viáveis para uma
retomada financeira. Isso se deve, em grande parte, pela inflexibilidade dos bancos em
renegociar dívidas, o que promove a busca por outras saídas que não seja a recuperação judicial
(GOEBEL et al., 2020; SANTOS, 2021).
O Paraná não esteve entre os líderes da economia açucareira nos primeiros séculos
relativos à colonização do Brasil, focando em setores que possibilitavam sua subsistência, isto
é, retirada de madeira, erva-mate e atividades de condutores de tropas (tropeirismo). Com a
descentralização brasileira na produção de cana, açúcar e álcool ocorrida a partir da segunda
guerra mundial (1939-1945), provocada pela falta de açúcar no Centro-Sul do País, é que
estados como o Paraná, sem tradição canavieira, e de forma incipiente, puderam participar do
cultivo e produção em maior escala nesse ramo.
43
Gráfico 2 – Produção de açúcar (em mil ton.) e etanol (em mil m3) no Paraná – 1990/1991 a
2019/2020
3.500
3.000
2.500
2.000
1.500
1.000
500
Observa-se que a produção de etanol, em grande parte dos anos 90, foi preponderante,
muito em função do Proálcool. No entanto, a produção de açúcar passou a ser mais expressiva
a partir da safra 1998/1999. Mais recentemente, vide as três últimas safras analisadas, nota-se
uma inversão de tendência, com a produção de açúcar caindo, enquanto que a alcooleira
aumentou. Conforme informação do Sindicato e Organização das Cooperativas do Estado do
Paraná – Ocepar (2019), em 2019 cerca de 55% da produção canavieira foi direcionada para a
produção de etanol e 45% destinado para o açúcar.
A taxa geométrica média anual de crescimento da produção do açúcar no Paraná, para
o período 1990/1991 a 2019/2020, correspondeu a 9% a.a., enquanto essa mesma taxa para o
etanol foi de 2,8% a.a. Já a taxa geométrica média anual de crescimento da produção de cana-
de-açúcar foi de 4,7% a.a. Diferentemente do cenário nacional, no Paraná as diferenças entre
os percentuais dessas taxas de crescimento das produções foram mais acentuadas mostrando,
em média, um posicionamento melhor para o açúcar vis-à-vis o etanol.
Outra importante análise evolutiva pode ser feita mediante o cotejo dos dados da cana-
de-açúcar no Paraná, relativamente ao Brasil entre os Censos de 1995, 2006 e 2017, com base
no estudo de Shikida e Cattelan (2020). Observa-se no Quadro 3 que o Paraná, após um leve
aumento, perdeu em termos de participação percentual na produção nacional de cana-de-açúcar,
6,96%, 7,04% e 5,92%, em 1995, 2006 e 2017, respectivamente. Um cenário de gradual perda
relativa se verificou para o valor da produção das lavouras e número de estabelecimentos
agropecuários com cana. A exceção foi a área colhida nas lavouras canavieiras no Paraná em
46
cotejo com o Brasil, que apresentou uma leve queda em 2006 para depois crescer relativamente
em 2017.
produção de açúcar e etanol, o Grupo Renuka do Brasil detém empresas que atuam na geração
e cogeração de energia elétrica e produção de levedura (RENUKA DO BRASIL, 2020).
Nesse contexto, “o grupo sucroalcooleiro Renuka do Brasil, controlado pela companhia
indiana Shree Renuka desde 2009, [...] não consegue honrar suas dívidas com fornecedores de
cana e bancos há mais de um ano” (SCARAMUZZO, 2016, s/p.). A Shree Renuka que, ao
iniciar os trabalhos nos anos 2000 foi classificada como uma das gigantes mundiais no tocante
à produção de açúcar, “entrou no Brasil com a expectativa de avançar no País, [...] os planos de
expansão dos indianos foram frustrados no Brasil com a crise que se abateu sobre o setor
sucroalcooleiro” (SCARAMUZZO, 2016, s/p.). Na questão de seus processos de pedido de
falência e de recuperação judicial, esses tiveram início no ano de 2014.
Goebel et al. (2020) apontam no caso da empresa Dasa-Destilaria Americana, que no
ano de 2011, não conseguindo cumprir com pagamentos diversos e dívidas por motivo de
contratempos financeiros, iniciaram-se os pedidos de recuperação judicial. Conforme parecer
expedido pela MBF Agribusiness (2011), uma organização que atua na
assessoria/gestão/monitoramento de empresas, responsável pelo levantamento de dados e
geração de laudo econômico do processo de recuperação judicial da Dasa, a crise vivenciada
pela empresa teve seu princípio no ano de 2007. O que gerou sua instabilidade financeira condiz
com a oferta abundante de etanol no mercado, forçando a baixa dos preços, os quais eram
negociados por valor inferior ao custo de produção. Juntamente com isto, houve o
desprovimento de crédito para dar suporte aos problemas financeiros que a acometiam,
somados com adversidades climáticas, como as chuvas que reduziram a produtividade
canavieira para os anos de 2008 e 2009, prejudicando a geração de produtos competitivos
economicamente extraídos do processamento agrícola.
Concernente à empresa Dail (Clarion), esta “atua em grande parte das etapas da cadeia
de produção do agribusiness: no esmagamento de soja, no refino e na comercialização de óleos
vegetais, no refino do açúcar, na moagem de cana e produção de álcool” (CLARION, 2012, p.
3). Em meio aos imbróglios financeiros que surgiram, a partir do ano de 2011, a empresa
direcionou seus esforços na produção de açúcar e etanol como forma de ter maiores condições
de atuação, já que estava presenciando a ausência de recursos financeiros para suas atividades
no mercado. Isso atrapalhava a “obtenção de Capital de Giro no exercício de 2011, o que acabou
gerando uma significativa redução de suas atividades” (CLARION, 2012, p. 25). Diante desse
cenário, a empresa Dail (Clarion) em 2011 e 2012 iniciou o processo de recuperação judicial,
buscando sobreviver no mercado.
50
Em 2008 a Usina Corol passou a vivenciar realmente a crise, na qual muitos produtores
tiveram prejuízos pelo fato de a cana-de-açúcar ter permanecido no solo sem autorização para
a colheita de acordo com contrato estabelecido. Esses produtores não tinham se quer liberação
para negociar, mesmo que houvesse interesse de outras usinas (MARQUES, 2011).
Conforme a Infocana (2018b), na safra 2013/2014, a Usina Central do Paraná não
apresentou nenhum procedimento produtivo pertinente. Isso não quer dizer que essa empresa
não pretende voltar a investir futuramente, recuperando o plantio concernente à cana-de-açúcar.
Os investimentos que se pretende realizar são de aproximadamente 100 milhões, os quais
necessitam da efetivação das:
Outro Grupo de usinas que está com suas operações paralisadas é o Grupo Sabarálcool,
não apenas na filial instalada no município de Perobal, mas também na matriz que se encontra
fixada no município de Engenheiro Beltrão. Pode-se notar, no Quadro 5, que ocorreu redução
na quantidade de moagem de cana-de-açúcar entre 2013/2014 e 2014/2015. Os problemas
enfrentados agravaram-se na safra 2015/2016, em que não se verificou informações sobre a
moagem de cana, produção de açúcar e etanol. Com isso a desestabilização econômica desse
Grupo ficou notória, sendo que a crise forçou as duas unidades a suspenderem suas atividades
e demitir funcionários, abandonando definitivamente os canaviais (USINA DE ÁLCOOL EM
PEROBAL..., 2015, s/p.). Bechlin et al. (2020, p. 262) expõem um efeito perverso desse cenário
de encerramento de atividades no emprego:
arrecadação etc. (BERNARDO et al., 2018). Ademais, a desativação de uma usina, como a de
Engenheiro Beltrão, “[...] criou uma lacuna que dificilmente será preenchida. [...] Perdemos
parte da população, que se foi embora e, com isso, uma parcela do Fundo de Participação dos
Municípios” (JORNAL PARANÁ, 2017, p. 5).
Um dado adicional é a perda de posição relativa que as cinco usinas foco deste trabalho
tiveram ao longo do tempo – entre o período de expansão de suas atividades até a falência.
Tomando como parâmetro a safra 2000/2001, sendo 16 grupos de usinas operando, a Central
do Paraná moeu 1.548.830 toneladas de cana (a 3ª maior produção desse grupo, com 8% da
participação canavieira estadual), antes de falir era a 10ª produção, com 2,8% da participação
estadual. O Grupo Sabarálcool moeu 1.117.806 toneladas de cana (a 5ª maior produção, com
5,8% da participação estadual), antes de falir era a 7ª produção, com 4,2% da participação
estadual. A Corol moeu 542.883 toneladas de cana (a 11ª produção, com 2,8% da participação
estadual), antes de falir era a 14ª produção, com 1,9% da participação estadual. A Casquel moeu
230.000 toneladas de cana (a 15ª produção, com 1,2% da participação estadual), antes de falir
era a menor produção no Paraná, com os mesmos 1,2% de participação) (GRAEF et., 2016).
Segundo Santos et al. (2016), por meio de um estudo realizado em relação aos quarenta
anos de etanol em larga escala no Brasil, considerando o processo de expansão, estagnação,
crise, expansão e novamente crise, trazem à tona, de maneira clara, principalmente essas
vicissitudes, isto é, expansão e novamente crise relativa às organizações sucroenergéticas.
Ficou evidenciado que, em fases adversas, houve paralisação e mesmo pedidos de falência ou
processo de recuperação judicial. Relata-se similarmente que, assim como tem ocorrido no
Paraná, esses momentos de crise também atingiram outras regiões produtoras de etanol, não
sendo particularidade somente desse estado.
Rissardi Júnior (2015) e Goebel et al. (2020) chamam a atenção para o fato de que as
usinas e destilarias que entraram em falência ou pararam suas operações decorreu, também, do
pouco preparo para a gestão de seus negócios, complicações climáticas e por interposição do
governo referente a controlar os preços de venda dos derivados de petróleo, fragilizando a
competitividade do etanol. Esta situação gerou dívidas que não conseguiam ser sanadas, e com
o crédito pouco acessível, criou-se um círculo vicioso que culminou, em muitos casos, com a
falência ou aquisição por parte de outra empresa.
A respeito dessa crise na agroindústria canavieira, na mesma direção apontam Santos et
al. (2016, p. 40-41), ou seja, “situações críticas com endividamento superando a receita anual,
a partir de 2012, além de margens operacionais reduzidas para todos os agentes”, sendo
participantes influentes pelo aumento dos custos envolvidos com a produção agrícola,
53
3 REFERENCIAL TEÓRICO
4
Cumpre relembrar que a agroindústria canavieira, pela sua peculiaridade produtiva, “é intensiva em capital, tanta
para reposição e manutenção de ativos industriais, quanto para a renovação dos canaviais e garantia das operações
e tratos culturais (SILVA, 2019, p. 83), o que significa dizer um aporte significativo de recursos monetários nessa
atividade.
58
Nesse contexto, embora sejam expostas três fases, no que diz respeito à ampliação e
maturidade, nem todas as organizações chegam nesse estágio. Isso porque muitas empresas não
conseguem superar as adversidades, acabando por fracassar e ir a falência, fato não comentado
ou relatado por ser julgado pela sociedade como algo depreciativo. Afora isto, a falta de
referencial teórico condizente com o tema falência é causada pela confusão que a sociedade
muitas vezes faz entre o insucesso de um negócio com o malogro do próprio empreendedor
(GULST; MARITZ, 2010).
Quanto ao fracasso empresarial são muitos os fatores desencadeadores dessa condição,
todavia, alguns aspectos estão relacionados, por exemplo, com a: limitada experiência no ramo
em que se atua; reduzida margem de lucro; carga tributária elevada; mão de obra pouco
qualificada; crédito e financiamentos insuficientes (CHER, 1991). Em contrapartida, para
59
Pereira e Santos (1995), dois são os aspectos de maior influência no fracasso das organizações,
inexperiência e incompetência para a gestão empresarial.
No entanto, existem outras causas relacionadas com a falência dos empreendimentos,
estando atreladas com a falta de conhecimento quanto ao: mercado; concorrência; produtos;
serviços; além dos diferentes tipos de clientes. Essa fragilidade interfere negativamente na
questão das empresas se posicionarem diante do mercado e, assim, faz com que enfrentem
inconvenientes que podem levar, em certos casos, as empresas ao fracasso. Nessa acepção,
Hisrich, Peters e Shepherd (2009, p. 481), esclarecem que conhecimento de mercado pode ser
entendido como “estar de posse de informações, tecnologia, know-how e competência para
analisar um mercado e seus clientes”. Contudo, quando se deparam em condições de insucesso,
os empreendedores geralmente responsabilizam fatores externos, entre eles: o governo; a
situação econômica vivenciada; os concorrentes desleais; as altas taxas de juros dos bancos; a
tributação elevada; e o limitado número de clientes (PEREIRA, 1995).
O insucesso empresarial pode surgir por meio de diferentes conjunturas. Primeiro, o
fracasso tende a ser atribuído aos líderes, ou seja, concerne ao topo da organização. Nessas
circunstâncias compreende-se que faltou vislumbrar o futuro, realizar planejamento e gestão
organizacional. Segundo, atribui-se a falência ao pouco conhecimento que se tem do mercado
e das demandas dos clientes, trazendo desvantagens para segmentação e colocação de produtos
e serviços para comercialização. Terceiro, a ruína vem da carente gestão financeira, não se
tendo competência para fazer o controle dos gastos e capital de giro, assim como deixar de
utilizar mecanismos eficazes para a constituição de orçamentos. Por fim, mas com semelhante
importância, o fracasso corresponde a não consecução dos resultados almejados, sendo uma
falha estrutural e de métodos adotados, fragilizando a capacidade de otimizar suas técnicas e
práticas operacionais (LONGENECKER; SIMONETTI; SHARKEY, 1999).
Estar preparado para as oportunidades apresentadas pelo mercado é determinante para
quem deseja empreender, proporcionando identificação antecipada de atividades lucrativas por
parte de algumas pessoas em relação às outras. Dessa forma, a criação e a ampliação das
organizações se dão pela inquietação dos empreendedores em estar atentos às oportunidades
que aparecem (KIRZNER, 1979).
Segundo Dumais, Ellison e Glaeser (2002), as empresas passam por um ciclo de vida
com base nos seguintes aspectos: geração de empregos por meio da abertura de empresas do
setor e ampliação de suas atividades; substituição do ramo da empresa, atuando em outros
negócios; e término de ocupações de trabalho por meio da compra, união ou fechamento de
empresas. Dentre esses aspectos do ciclo de vida organizacional, salienta-se o fechamento com
60
maior destaque. Roggia, Colombo e Terra (2015), tendo como fundamento estudos de
abrangência internacional, apresentam uma compilação das principais causas para o fracasso
das empresas (Quadro 7):
Conhecendo as causas de insucesso das organizações, contar com dados para a tomada
de decisões torna-se um diferencial. Assim sendo, Altman (1968) considera que as empresas
que fazem uso das informações contábeis na rotina diária conseguem prever possíveis riscos.
Nesse caso, a utilização de ferramentas contábeis proporciona analisar o balanço patrimonial,
permitindo saber se em pouco tempo a empresa poderá falir.
A contabilidade é um caminho para uma empresa conhecer a sua realidade, munindo os
gestores com dados para a tomada de decisões que possa viabilizar ao empreendimento saúde
financeira mais permanente (OLIVEIRA; SOUZA, 2013).5 Também é preciso considerar a
disposição financeira no cenário em que atua, considerando que faz parte da tomada de decisões
dos gestores (KAVESKI et al., 2015). Essa disposição financeira demonstra as fontes de capital
que a empresa utiliza, isto é, a proporção de capital próprio ou de terceiros, ou ainda, se é
constituída por um só desses capitais (LOCATELLI; NASSER; MESQUITA, 2015).
Segundo Durand (1952), uma estrutura de capital tida como ótima pode ser
caracterizada a partir de uma combinação adequada de capital próprio e de terceiro, que deve
ser elencada pelas empresas como forma de elevar seu valor de mercado. Diante disso, trabalhar
com uma estrutura que não pondera essa premissa aumenta o risco de falência de uma empresa.
5
Na contabilidade existe um cálculo chamado Fator de Insolvência (FI), que usa uma combinação de índices
ponderados estatisticamente para determinar a tendência de uma empresa falir ou não, qual seja: FI = 0,05 X1 +
1,65 X2 + 3,55 X3 –1,06 X4 – 0,33 X5. Em que: X1 = Lucro Líquido / Patrimônio Líquido; X2 = Liquidez Geral;
X3 = Liquidez Seca; X4 = Liquidez Corrente; X5 = Exigível Total / Patrimônio Líquido (SILVA, 2010).
61
E, em caso de encerramento das atividades de uma organização, conforme Gitman (2010), pode
vir a ocorrer o não cumprimento de compromissos com terceiros por parte dessa organização
falida.
Mas não é somente o fator econômico e financeiro que tem relevância significativa
atinente ao fracasso organizacional. Outro fator que as pesquisas demonstram ser impactante
para isso é a governança corporativa, bem como sua conexão com meios de antecipar
possibilidades de recuperação de empresas ou de suas falências (DAILY; DALTON, 1994;
UZUN; SZEWCZYK; VARMA, 2004; CHAN et al., 2016).
Conforme Shailer (2004), a governança corporativa propicia para a organização
estabelecer formas de controlar suas ações de gestão. Já para Liang et al. (2016), na prevenção
da falência a governança corporativa ampara os gestores com indicadores que são empregados
em modelos para esse fim profilático. No confronto dos resultados gerados pela utilização de
tais indicadores juntamente com os de origem financeira, expressa de forma mais clara a
realidade da empresa do que quando se utiliza unicamente indicadores financeiros.
Todavia, o fechamento de uma organização pode ser causado por elementos intangíveis,
como o conhecimento tácito e explícito dos colaborados ser limitado ou inexistente, sobretudo
o desconhecimento por parte dos gestores dos riscos que pode resultar no insucesso do negócio.
O suporte para tomada de decisões para ações de curto ou longo prazo é proporcionado pelo
conhecimento aprofundado desses elementos, contribuindo para identificar a necessidade de
investimentos para o êxito das decisões na execução dessas ações. No entanto, conhecer
somente as organizações internamente resulta em decidir equivocadamente ou planejar sem
cogitar pontos necessários, o que debilita o cumprimento de obrigações e aumenta a propensão
do fracasso empresarial (NASCIMENTO et al., 2013).
Na gestão de uma empresa se faz relevante frisar que a escolha pela continuação com o
ciclo de vida ou mesmo de encerrá-lo, deve ser pautada na avaliação dos custos sociais e
econômicos, quer dizer, decidir pelo encerramento se torna mais vantajoso quando esses custos
são inferiores aos custos de buscar pela recuperação do negócio (MELLO; FICHMANN, 2013).
Contudo, Frezatti et al. (2010, p. 384 e 387) ressaltam que:
4 METODOLOGIA
Primeiramente, cabe destacar que o ambiente desta pesquisa são as instituições, agentes
(públicos e privados) e organizações que estão de alguma forma relacionadas com a estrutura
de mercado do setor sucroenergético.
Em segundo lugar, este estudo pode ser classificado como explicativo (GIL, 2019), por
buscar identificar e compreender os motivos e as consequências das falências de agroindústrias
canavieiras no Estado do Paraná a partir de dois métodos: um quantitativo
(experimental/estatístico) e outro qualitativo (pesquisa de campo).
A escolha desses dois métodos frisa-se, complementares, deu-se mediante necessidade
de um maior aprofundamento do problema estudado, concomitante com uma base de resultados
econométricos que reflitam a realidade do setor em análise. Ademais, conforme Minayo (2002)
destaca, entre as pesquisas qualitativas e quantitativas não há supressões ou oposições, tendo
sim interação dinâmica entre elas.
Assim, esta metodologia possui três pilares básicos como estratégia de ação, quais
sejam:
1º) Dentro de uma perspectiva inicial, partiu-se de uma acurada revisão da evolução
histórica da agroindústria canavieira no Brasil e Estado do Paraná. Cumpre citar que este
procedimento procurou examinar as mudanças ocorridas a partir de um novo ambiente
institucional e organizacional que passou a predominar nesse setor com a desregulamentação.
Este método histórico-descritivo – o mesmo usado em parte das teses de Rissardi Júnior (2015)
e Wissmann (2017) – permitiu contextualizar e ampliar a compreensão da literatura relacionada
não só com essa evolução setorial, como também sobre as falências organizacionais. O
conhecimento do referencial teórico auxilia na sustentação conceitual para abordar e analisar a
problemática das falências.
2º) Este primeiro passo fundamentou e qualificou o pesquisador para procurar mensurar,
econometricamente, a conjuntura relacionada com os fatos ocorridos na agroindústria
canavieira no Paraná, que de algum modo estão relacionados com a falência das usinas durante
sua trajetória no mercado. Para análise dos dados quantitativos, foi utilizado o modelo
econométrico de dados em painel.
3º) Com estes dois procedimentos iniciais realizados, fez-se uma pesquisa de campo nas
cidades onde as usinas falidas operavam, entrevistando agentes econômicos ligados, direta e
indiretamente, com este contexto e que, portanto, tiveram experiências práticas com o
64
problema. O critério de escolha dessas pessoas foi o seu conhecimento técnico de, pelo menos,
duas décadas e meia de conhecimento sobre o assunto.
Nesta tese optou-se por colocar no capítulo da metodologia os dois instrumentais
utilizados para evidenciar e analisar quais os motivos e consequências da falência de
agroindústrias canavieiras no Estado do Paraná, sendo que no capítulo seguinte serão
apresentados os resultados e discussão das duas metodologias empregadas.
Alguns desses dados, devido a sua característica monetária, foram deflacionados, quais
sejam: salário médio na agropecuária e o PIB (variável dependente), que passaram a representar
o salário médio real e PIB real. O deflator utilizado para ambos foi o Índice Geral de Preços
(IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), pois registra a inflação de preços desde matérias-
primas agrícolas e industriais até serviços e bens finais.
Também foi realizado o cálculo do Quociente Locacional (QL) que, segundo Alves
66
Em que:
QL = Quociente Locacional;
𝐸𝑎𝑔𝑟 𝑖 = Emprego na agropecuária no município i;
Para Greene (2002) o modelo econométrico com dados em painel proporciona que o
pesquisador possa incluir as diferenças comportamentais acerca das unidades econômicas do
objeto de análise. O método de dados em painel exige uma forma particular na disposição de
dados, na qual cada unidade, indivíduo ou instituição é observado levando em consideração
dois ou mais espaços de tempo.
O painel de dados pode ser balanceado, quando os dados acham-se disponíveis para a
totalidade de indivíduos em todos os decursos de tempo apreciados na análise, ou não
balanceado, quando não há disponibilidade da totalidade dos dados em relação a todos os
indivíduos e lapsos temporais (BERTO, 2009; OLIVEIRA; BUENO, 2019). Segundo Gujarati
e Porter (2011) e Santos (2016), o painel balanceado ocorre quando a quantidade de
67
observações é a mesma para cada unidade de corte transversal; enquanto o painel desbalanceado
se verifica quando o número de observações é diferente para cada uma das unidades.
Baltagi (2005), Paiva, Quaglio e Fonseca (2018) discorrem que as vantagens da
utilização dos dados em painel são: certas unidades de cortes transversais podem apresentar
heterogeneidade, nesse caso as técnicas de corte transversal ou séries temporais não conseguem
controlá-las, o que pode acarretar em análises enviesadas; ao fazer a combinação da análise de
repetidas observações em corte transversal, é possível obter número maior de graus de liberdade
e versatilidade, além de menor colinearidade entre as diferentes variáveis que compõem o
estudo, ainda que com dados que oferecem informações mais detalhadas para avaliação das
mudanças e seus movimentos; contribuem para uma melhor mensuração dos efeitos que não
poderiam ser detectados por meio de séries temporais ou cortes transversais, isto é, os que
implicam na análise de modelos que expressam comportamento complexo, possibilitando a
distinção e acompanhamento das variáveis e seus efeitos no tocante aos indivíduos.
De acordo com Berto (2007) e Oliveira e Bueno (2019), na utilização de dados em painel
obtêm-se também outras vantagens, tais como: diminuição de efeitos da colinearidade
(existência de relação linear entre duas variáveis explicativas); combinação das informações de
ordem dinâmica intertemporal referente às informações individuais de cada entidade; controle
das características individuais; reconhecimento e estimação de efeitos que não são detectados
por meio de cortes transversais e séries temporais de maneira isolada; concepção e teste de
modelos que apresentam comportamento de maior complexidade; e erradicação dos vieses que
resultam da agregação de dados.
Já para Brooks (2008) e Santos (2016), o uso da análise de dados em painel oferece três
vantagens, quais sejam: assegura a possibilidade de se trabalhar com uma gama maior de
questões, além solucionar problemas de complexidade elevada; torna possível fazer
combinação de séries temporais e dados transversais, considerando que é interessante examinar
o comportamento das variáveis e as relações entre elas, assim como as mudanças que ocorrem
nas mesmas de forma dinâmica ao longo do tempo; por fim, contribui para que se possa remover
o efeito do viés das variáveis que foram omitidas quando da realização da regressão.
Outras vantagens da utilização dos dados em painel, em comparação aos dados
seccionais, estão na possibilidade de aumentar os graus de liberdade e de se fazer um número
maior de registros. Além de promoverem inferências de modelos paramétricos de forma mais
precisa, têm condições para levantar hipóteses mais realistas quanto ao comportamento das
variáveis e esclarecem feitos que se tornam possíveis somente quando dinâmicas temporais são
consideradas (HSIAO, 2014; ASSIRATI, 2018).
68
Gujarati e Porter (2011), Paiva, Quaglio e Fonseca (2018), mencionam que os dados em
painel podem ser usados para enriquecer análises em séries temporais ou em caso de cortes
transversais.
Os dados em painel (longitudinais) compreendem uma série temporal de elementos
examinados num certo interstício de tempo. Destaca-se que pelo fato dos dados em painel terem
uma peculiaridade cronológica, promovem benefícios na realização de pesquisas por serem
capazes de fazer a revelação de heterogeneidades das variáveis selecionadas para investigação,
às quais são identificadas somente quando se investiga um espaço temporal de forma contínua
(MARQUES, 2000; ASSIRATI, 2018).
Todavia, os dados em painel divergem dos dados seccionais, porquanto para sua coleta
se utiliza apenas um instante específico de tempo. Nesse caso, podem dar impressão equivocada
de invariabilidade, deixando de considerar possíveis variações das informações (ASSIRATI,
2018).
A principal motivação para a utilização dos dados em painel neste estudo é que este
possibilita a resolução do problema de variáveis omitidas. Ademais, os dados em painel
possibilitam o aumento da exatidão no tocante às estimativas realizadas (CAMERON;
TRIVEDI, 2005; WOOLDRIDGE, 2010; SANTOS, 2016).
Referente à formação mais simples para dados em painel, basta que se faça o
agrupamento conjunto das observações de corte transversal e de série temporal. Na literatura,
este modelo é conhecido como pooled regression ou dados empilhados (GUJARATI;
PORTER, 2011; AVELAR; STAMM, 2019). Isto pode ser representado pela Equação 2:
O teste de Hausman testa a ortogonalidade, ou seja, a propriedade dos vetores que têm
produto escalar nulo, na questão dos efeitos aleatórios com relação aos regressores. O teste de
Hausman tem como hipótese nula a ausência de correlação dos efeitos individuais em relação
às variáveis explicativas. Concernente à hipótese nula, tanto a estimativa de efeito fixo quanto
a estimativa de efeito aleatório não devem discordar sistematicamente, sendo que o teste pode
se basear na diferença encontrada. Nesse teste, o resultado primordial se apresenta quando a
covariância (grau de interdependência entre duas variáveis aleatórias) de um determinado
estimador eficiente é zero, a partir da diferença encontrada quanto a um estimador ineficiente.
Portanto, ao não rejeitar a hipótese nula, conclui-se que o modelo de efeitos fixos não é
adequado, logo, o modelo de efeitos aleatórios é preferível (GREENE, 2002; GALLINA;
FERREIRA; ARAÚJO, 2019).
Após a identificação do modelo de melhor ajuste, é importante aplicar o teste de
autocorrelação para constatar se há presença ou ausência de autocorrelação de observações ao
longo do tempo, que no caso de séries transversais é possível que ocorra omissão de variável
importante (WOOLDRIDGE, 2010). Se observada correlação nos dados de corte transversal,
denomina-se autocorrelação espacial, apresentando correlação condizente ao espaço e não ao
longo do tempo. Para estimar a presença ou não de autocorrelação na análise de corte
transversal, deve-se atentar para que a ordenação dos dados tenha um interesse econômico e/ou
alguma lógica (GUJARATI; PORTER, 2011).
Foi analisado ainda a presença ou ausência de heterocedasticidade, que pode decorrer
como resultado de dados discrepantes (outliers), diferindo para muito mais ou para menos no
que se refere às observações da amostra. Quando estas observações são inclusas ou exclusas,
essencialmente se o tamanho da amostra diferir para menos, podem gerar alteração substancial
dos resultados da análise de regressão. A heterocedasticidade também pode surgir da assimetria
na distribuição de um ou mais regressores que são inclusos no modelo (GUJARATI; PORTER,
2011).
Se o teste de heterocedasticidade rejeitou a hipótese nula de ausência de
heterocedasticidade, enquanto o teste de autocorrelação aceitou a hipótese de ausência de
autocorrelação, para dados em painel, no caso de identificação de autocorrelação e/ou
heterocedasticidade nos modelos apresentados anteriormente, sugere-se como opção de
correção destes problemas o modelo de dados em painel dinâmico.
Por opção do autor, a abordagem quantitativa, no tocante à determinação do modelo,
está na parte da análise dos resultados e discussão, posto serem realizados, nessa fase, os
procedimentos econométricos para escolha do melhor modelo.
71
Ao estudar o PIB, deve-se considerar a possibilidade que este sofra ou não alterações
no decorrer do tempo, ou seja, não se pode desprezar a hipótese de que esta variável se mantenha
inalterada. Diante desse fato, o controle da estimação pelo fator dinâmico é determinante para
a caracterização do modelo. Para um painel dinâmico, a variável dependente se apresenta
defasada no vetor das variáveis explicativas, isto é, os níveis de atividades observadas, em um
dado momento passado, tendem a exercer influência em níveis de atividades futuras
(BLUNDELL; BOND, 1998; GAMA, 2013). A formalização deste modelo é representada pela
Equação 5:
ln𝑦𝑖𝑡 = 𝛽𝑦𝑖(𝑡−1) + 𝛽1 ln𝑋𝑖𝑡 + 𝑢𝑖𝑡 (5)
Sendo que 𝑦𝑖𝑡 representa a variável dependente, o PIB; 𝑦𝑖(𝑡−1) , a variável dependente
com defasagem de um ano; 𝑋, o conjunto de variáveis explicativas; e 𝑢, o resíduo. Assume-se
que no termo de erro estejam inclusos os efeitos específicos no PIB, 𝜂𝑖 , e os choques aleatórios
não observados ao longo do tempo, 𝑣𝑖𝑡 , conforme Equação 6.
𝑢𝑖𝑡 = 𝜂𝑖 + 𝑣𝑖𝑡 (6)
Neste sentido, pode-se reescrever o modelo de dados em painel dinâmico conforme
Equação 7:
ln𝑦𝑖𝑡 = 𝛽𝑦𝑖(𝑡−1) + 𝛽1 ln𝑋𝑖𝑡 + 𝜂𝑖 + 𝑣𝑖𝑡 |𝛽| < 1 (7)
O termo de perturbação 𝑣𝑖𝑡 apresenta média nula, acarretando que a esperança
matemática seja zero, 𝐸[𝑣𝑖𝑡 ] = 𝐸[𝜂𝑖 , 𝑣𝑖𝑡 ] = 0 para i = 1, 2, 3, ..., N e para t = 1, 2, 3, ..., T,
então o erro não é autocorrelacionado. Assim, para expurgar os efeitos fixos sobre o PIB no
decorrer do tempo, procede-se a uma transformação ao estimar o modelo. Para isso,
primeiramente estima-se o modelo para remover os elementos que não variam no tempo, de
acordo com a Equação 8.
ln𝑦𝑖𝑡 − ln𝑦𝑖(𝑡−1) = 𝛽[ln𝑦𝑖(𝑡−1) − ln𝑦𝑖(𝑡−2) ] + 𝛽1 [ln𝑋𝑖𝑡 − ln𝑋𝑖(𝑡−1) ] + [𝑣𝑖𝑡 − 𝑣𝑖(𝑡−1) ] (8)
6
Embora tenha sido escolhido o número de dez profissionais para a abordagem qualitativa, vários outros
(agricultores, gerentes do comércio, presidentes de clubes de serviço, funcionários públicos e do setor privado etc.)
também foram ouvidos durante a pesquisa de campo. No entanto, serão considerados, para fins deste estudo,
apenas os dez profissionais escolhidos, posto suas vivências/expertises com as usinas falidas, sendo a exigência
de conhecimento/relação com a usina de, pelo menos, 25 anos. Mesmo assim, ouvir mais pessoas sobre o tema
analisado permitiu ao pesquisador ampliar sua compreensão sobre a atividade.
Outro ponto a ser observado diz respeito ao fato de não priorizar, neste estudo, a opinião dos proprietários/diretores
ou aspectos técnico-contábeis das usinas falidas, porquanto isto foi feito, de certa forma, por Bernardo et al. (2018),
Bechlin et al. (2020) e Goebel et al. (2020).
73
consequências das falências das unidades em análise. Cabe ressaltar que esta parte do trabalho,
assim como expõem Babbie (1999) e Yin (2010), busca uma melhor compreensão de
generalidades para o estabelecimento de bases visando uma investigação mais sistemática e
precisa. Ou seja, com esta pesquisa de campo, é possível realizar um diálogo entre os resultados
da abordagem quantitativa com a abordagem qualitativa, e vice-versa, maximizando a
compreensão não somente das causas da falência de agroindústrias canavieiras, como também
suas consequências.
Outrossim, como as amostragens não probabilísticas possuem uma linha tênue entre os
critérios de um estudo e sua representatividade, para ampliar o feeling dos profissionais
entrevistados, optou-se pela escolha de um representante do setor público de cada município
(ou secretários da indústria/comércio, agricultura, planejamento/desenvolvimento ou outros
representantes do poder público municipal) e de um representante do setor privado de cada
município (ou diretores dos sindicatos rurais ou associações comerciais e industriais,
representantes comerciais ou prestadores de serviço), que vivenciaram a falência das usinas nas
suas respectivas localidades. Desta maneira, tanto a visão de mercado como a visão do setor
público estão contidas na pesquisa qualitativa.
Como um aditamento construtivo ao presente trabalho, também foi enviado um
questionário e feita uma visita in loco à Alcopar (Associação de Produtores de Bioenergia do
Estado do Paraná) no primeiro bimestre de 2021, conquanto se trata de uma Instituição com
forte expertise na área, tendo como fito:
A Alcopar foi fundada em 13 de julho de 1981, sendo uma importante entidade de classe
voltada aos interesses dos produtores de bioenergia do Estado do Paraná.
75
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Sendo:
𝑙𝑛 = logaritmo neperiano;
PIB_D = PIB real dos municípios;
IFDMedu = IFDM educação;
IFDMemp = IFDM emprego;
A_colhida = área colhida (em hectares);
E_agric = quantidade de emprego formal na agricultura;
QL_agric = Quociente Locacional da agricultura;
Exper = média de anos de experiência dos trabalhadores do município;
Homem = Percentual de participação da mão de obra masculina;
SMagrop = Salário médio na agropecuária;
𝑢 = termo de erro.
No MQO, para que os coeficientes estimados tenham consistência, é necessário que haja
ausência de correlação do termo de erro com as variáveis explicativas (WOOLDRIDGE, 2010).
Caso contrário, o problema da simultaneidade pode ocorrer em função de alguns regressores
serem endógenos e geralmente terem correlação com o termo de erro. Nesse sentido, para que
7
Faz-se necessária uma ressalva sobre as variáveis utilizadas, porquanto não foi isolado o efeito do fechamento
das usinas sobre o PIB municipal. Sobre isto é importante destacar que a falência, especialmente em uma
agroindústria canavieira, não é um fenômeno pontual, ou seja, a empresa está bem em um ano e no outro fali. Esse
fenômeno é dinâmico (leva um certo tempo), razão pela qual os anos escolhidos foram de 2007 a 2016, ou seja,
englobou tanto a crise financeira internacional de 2008, como a crise decorrente do represamento dos preços dos
combustíveis fósseis que prejudicou o mercado do etanol durante o governo Dilma (2011 e 2014). Dessa forma,
procurou-se analisar o desempenho do PIB onde as usinas atuavam como forças motrizes, para captar possíveis
reflexos dessas falências no contexto macroeconômico municipal, a partir de variáveis que permitam uma relação
com o setor em estudo.
76
Para investigar a adequação dos modelos, aplicou-se o teste de Chow, o qual tem como
hipótese nula (H0) que o modelo de melhor ajuste é o modelo restrito (pooled). Portanto, em
caso de rejeitar H0, o modelo irrestrito (efeitos fixos) será preferível (CAMERON; TRIVEDI,
2009; SANTOS, 2016).
No presente estudo, verificou-se pelo teste de Chow que o modelo de efeitos fixos é
preferível ao modelo pooled, pois a hipótese nula foi rejeitada.
Para a escolha de qual modelo adotar, entre o de efeitos fixos e o de efeitos aleatórios,
encontra-se a apuração de autocorrelação entre as variáveis explicativas com referência ao
termo de erro (WOOLDRIDGE, 2002). Já para decidir sobre qual dos modelos é o mais
adequado, na realização da estimação dos parâmetros, trata-se da detecção de correlação entre
a heterogeneidade não observada e as variáveis explicativas ao fazer o confronto das estimativas
que se obteve referente a cada uma das abordagens (WOOLDRIDGE, 2010).
No modelo de efeitos aleatórios, uma hipótese de identificação é o fato da
autocorrelação ser nula entre as variáveis explicativas relativamente ao efeito específico,
considerando o termo de erro como sendo uma variável aleatória. Diante disso, o terceiro
modelo estimado foi o de efeitos aleatórios.
Para realizar o método de efeitos aleatórios utilizou-se a Equação 11:
ln𝑃𝐼𝐵_𝐷𝑖𝑡 = 𝛽𝑖 + 𝛽ln𝐼𝐹𝐷𝑀𝑒𝑑𝑢𝑖𝑡 + 𝛽ln𝐼𝐹𝐷𝑀𝑒𝑚𝑝𝑖𝑡 + 𝛽ln𝐴_𝑐𝑜𝑙ℎ𝑖𝑑𝑎𝑖𝑡 + 𝛽ln𝐸_𝑎𝑔𝑟𝑖𝑐𝑖𝑡 +
𝛽ln𝑄𝐿_𝑎𝑔𝑟𝑖𝑐𝑖𝑡 + 𝛽ln𝐸𝑥𝑝𝑒𝑟𝑖𝑡 + 𝛽𝐻𝑜𝑚𝑒𝑚𝑖𝑡 + 𝛽𝑀𝑢𝑙ℎ𝑒𝑟𝑖𝑡 + 𝛽ln𝑆𝑀𝑎𝑔𝑟𝑜𝑝𝑖𝑡 + 𝜔𝑖𝑡 (11)
transformação que possibilita a remoção do efeito não observado antes da estimação, onde todas
as variáveis explicativas relacionadas com o fator tempo são removidas. Já o estimador de
efeitos aleatórios implica que o efeito não observado não tem correlação com todas as variáveis
explicativas (WOOLDRIDGE, 2010).
Comparando-se os resultados do modelo de efeitos fixos com o de efeitos aleatórios, foi
possível perceber a existência de diferenças substanciais entre ambos. Para determinar qual dos
dois modelos deve ser escolhido, pode-se aplicar o teste de Hausman. No referido teste, a
hipótese nula sugere que os estimadores do modelo de efeitos fixos e o modelo de componentes
dos erros (MCE) não diferem. O teste de Hausman pode apresentar uma disposição assintótica
𝜒². Se a hipótese nula for rejeitada, conclui-se que o MCE não é apropriado pelo motivo de que
os efeitos aleatórios podem estar correlacionados com um ou mais regressores, logo, o modelo
de efeitos fixos seria preferível (GUJARATI; PORTER, 2011).
Dessa forma, aplicou-se o teste de Hausman, cuja hipótese nula sugere que o modelo de
efeitos aleatórios apresenta melhor ajuste. Caso H0 seja rejeitada, então o modelo de efeitos
fixos é preferível (WOOLDRIDGE, 2011). Como resultado, evidenciou-se que o teste não
rejeitou H0, portanto o modelo de melhor ajuste é o de efeitos aleatórios. Pela estatística do teste
de Hausman, o modelo de efeitos aleatórios apresentou melhor ajuste do que o modelo de
efeitos fixos para o presente estudo.
Na sequência, foi realizado o teste de autocorrelação para identificar se há presença ou
ausência de correlação no modelo, a qual é definida por Gujarati e Porter (2011, p. 416) como:
“correlação entre integrantes de séries de observações ordenadas no tempo [como as séries
temporais] ou no espaço [como nos dados de corte transversal]”. O teste de autocorrelação tem
como hipótese nula que há ausência de autocorrelação no modelo. Como corolário, não foi
rejeitada H0, então não há presença de autocorrelação, consistindo em um bom resultado.
Por fim, aplicou-se o teste de heterocedasticidade de Wald modificado/aperfeiçoado,
que tem como hipótese nula a ausência de heterocedasticidade. Quando uma observação difere
com intensidade (muito maior ou muito menor) em relação às observações da amostra,
considera-se como discrepante (outliers) (GUJARATI; PORTER, 2011). No teste efetuado
neste estudo, houve rejeição de H0, ou seja, houve heterocedasticidade, que precisou ser
corrigida.
Na sequência, a Tabela 1 opta por mostrar os resultados dos dados em painel dinâmico,
pois foi o que apresentou melhor ajustamento. Cabe salientar que nos três primeiros modelos
processados, o teste de Hausman apontou que o modelo mais adequado para o presente estudo
foi o modelo de efeitos aleatórios, porém, este apresentou heterocedasticidade. Para corrigir
78
Nesta parte econométrica, vale lembrar, a variável dependente utilizada é o PIB dos
municípios de Cambará, Engenheiro Beltrão, Perobal, Porecatu e Rolândia, procurando captar
possíveis reflexos das falências das usinas no contexto macroeconômico municipal.
A partir do resultado do modelo de painel dinâmico, no tocante ao parâmetro estimado
do PIB defasado (primeiro que aparece no modelo), cabe destacar que a geração do PIB no
período passado tem influência na geração do PIB contemporâneo. Isto mostra que a variação
de 1% no PIB defasado de um período, induz uma variação de 0,465% no PIB contemporâneo
– significativo a 1% (Tabela 1).
Dando sequência aos resultados, pode-se observar que o IFDM educação apresentou
relação direta em relação ao PIB (sendo significativa a 10%). Isso expressa que a cada 1% de
aumento do IFDM educação nos municípios, influenciou um crescimento médio no PIB de
0,477%. Borges e Raquel (2016) ressaltam que a qualificação do trabalhador é um fator que,
em geral, contribui para maior empregabilidade no competitivo mercado de trabalho. Para tanto,
tornam-se importantes, seja em período de desemprego ou não, o investimento na educação
formal e informal, nos cursos profissionalizantes, técnicos etc. Quanto à realidade das cinco
cidades analisadas, devido à redução das atividades proporcionadas pelas agroindústrias
canavieiras, os indivíduos que ali permaneceram buscaram maior qualificação exigida em
outros segmentos da economia.
Para o diretor-presidente da Alcopar, Miguel R. Tranin, o que houve no setor
sucroenergético, com o avanço da mecanização, foi que os trabalhadores mais novos “[...] estão
no trator, estão na máquina. Fizeram cursos de treinamento para outras habilidades. Estão na
79
indústria. Enfim, houve uma acomodação desse trabalhador na indústria e também nos
municípios que estamos presentes” (UDOP, 2020, s/p.). Com efeito, ao se defrontar com a
necessidade de buscar rendimentos em novas atividades, o trabalhador precisa atender aos
requisitos condizentes com a realidade enfrentada, isso faz com que a educação seja o caminho
adequado para esse fim.
Quanto ao IFDM emprego, constata-se que o mesmo tem relação direta e significativa
a 10%, ou seja, quando o nível de emprego aumenta em 1%, o PIB cresce em torno de 0,148%.
Para Galvão (1997) e Mattei (2018), a geração de postos de trabalho é uma das principais
preocupações de políticas econômicas para o crescimento e melhoria do padrão de vida dos
municípios brasileiros. Por meio deste resultado, a relação positiva entre emprego e PIB
também foi observada para Cambará, Engenheiro Beltrão, Perobal, Porecatu e Rolândia.
Referente à área colhida, observa-se uma relação direta e significativa a 1%,
evidenciando que a cada 1% de aumento da área colhida, houve um crescimento médio no PIB
de 0,015%. Essa quase inexpressiva relação entre a área colhida e o PIB se justifica porque a
fronteira agrícola paranaense, de modo geral, esgotou-se ainda no século XX. Logo, o que está
ocorrendo no Paraná é uma mobilidade entre culturas, sendo que o pouco avanço que ocorreu
nas cidades pesquisadas foi decorrente da entrada de cultivares em algumas áreas de pastagens.
Conforme Alves e Shikida (2001, p. 18), com as fronteiras agrícolas esgotadas no Paraná, “[...]
a agricultura passou a expandir suas atividades através de substanciais realocações dos recursos
produtivos entre culturas”. Nesse caso, houve opção dos agricultores pela expansão de área
daquelas atividades agropecuárias mais estáveis e rentáveis.
Cabe considerar que o fechamento das usinas analisadas causou dois efeitos imediatos:
ou a área de cana-de-açúcar plantada foi destinada para processamento industrial em uma outra
unidade produtiva ativa; ou a área canavieira, antes destinada ao processamento industrial da
unidade falida, tornou-se uma atividade agropecuária distinta. Isto ocorreu notadamente para a
cultura de grãos (soja e milho), mas também ganhou certa expressão o segmento florestal, antes
irrelevante no Paraná, mas que contabilizou, conforme Bastian et al. (2020), 5% do Valor Bruto
da Produção Agropecuária estadual em 2017.
No que diz respeito aos empregos na agricultura (E_agric.), identifica-se uma relação
inversa e significativa a 1%. Assim sendo, nota-se que um aumento de 1% nesse tipo de
emprego contribuiu para a redução média de 0,121% no PIB. Um dos pontos que pode justificar
a relação inversa apresentada é o fato dos municípios estudados terem passado por problemas
decorrentes de falências de suas usinas, com diminuição considerável do número de
trabalhadores formais nas atividades agrícolas. E ainda existe, conforme Bernardelli et al.
80
(2018), a questão da mecanização do corte da cana, que reduziu a mão de obra no setor agrícola
de forma intensa, mesmo antes da insolvência das usinas.
Ademais, o trabalho urbano (comércio, por exemplo), mesmo sentindo os efeitos
negativos da derrocada de uma indústria agrária cuja força motriz era expressiva, passou a
ganhar maior expressão (relativa) diante do trabalho rural. Vale citar que no setor serviços
existe, nessas cidades, uma parcela de funcionários públicos municipais, estaduais e federais
que, com a falência ou não das usinas, contribuirá para manutenção do emprego não agrícola.
Dessa forma, quanto menor o emprego na agricultura, maior o emprego de outros setores, com
maior participação no PIB.
Mattei (2015) alerta para o comportamento recente do emprego agrícola no Brasil (2002
a 2013). Nesse período houve uma tendência de diminuição “[...] da participação do emprego
agrícola no conjunto do emprego do País, exatamente no período em que o nível de ocupações
nos demais setores de atividade econômica cresceu expressivamente na maioria deles
(MATTEI, 2015, p. 41).” Para esse autor, a agricultura não consegue absorver todo contingente
populacional demandante de trabalho, devida elevada substituição da mão de obra pela força
mecânica, em contexto de intenso processo de modernização agrícola que vem ocorrendo nesse
setor. Concomitantemente, as pessoas do meio rural estão indo em busca de emprego no
mercado urbano, o que afeta a dinâmica demográfica rural e também a urbana.
A agropecuária no Paraná, de modo geral, é considerada intensiva em capital, sendo o
uso de máquinas e equipamentos um dos fatores que alavanca a produtividade desse setor,
influenciando positivamente o seu Valor Bruto da Produção (BASTIAN et al., 2020). Não é
sem fundamento que o estudo de Mattei (2015) apontou que as maiores reduções da
participação do emprego agrícola, no conjunto das ocupações regionais, ocorreram nas regiões
Sudeste e Sul. O Paraná, em especial, reduziu consideravelmente a necessidade de mão de obra
agrícola ao usar culturas, particularmente grãos (soja, milho e trigo sobretudo), que utilizam
máquinas e equipamentos praticamente em todas as etapas do ciclo produtivo.
Assim, além dos fatores mencionados por Mattei (2015) e Bastian et al. (2020), nas
cinco cidades em que a agroindústria canavieira atuava como força motriz, as falências
afetaram, ainda mais, o já decrescente emprego agrícola local e, consequentemente, o PIB.
Concernente ao Quociente Locacional (QL) da agricultura, constata-se uma relação
direta, com 5% de significância, representando que quanto mais alto é o QL, mais
especializada/concentrada é a atividade no município (em relação à respectiva microrregião).
Em termos de elasticidade, a variação de 1% no QL, induz um crescimento de 0,108% no PIB.
Logo, quando as usinas encerraram suas atividades, a agricultura passou a ser menos
81
concentrada (relativamente), deixando de focar em uma atividade específica. A busca por novos
ramos de atuação visando suprir o desemprego causado pelo fechamento das usinas, as quais
eram pontos de referência para o emprego da mão de obra de muitos trabalhadores, é uma
explicação para esta relação.
Tschá et al. (2010) analisaram o encadeamento produtivo, localização e associação
geográfica da agroindústria canavieira no Paraná, entre os anos de 1995 e 2005, portanto, antes
das falências das 5 usinas estudadas. Conforme observaram, a localização e a associação
geográfica dessa atividade no Norte do Paraná geraram encadeamentos e estimularam o
processo de crescimento econômico regional, principalmente quando o setor sucroalcooleiro
possuía um QL ≥ 1. Especificamente nas cinco cidades objeto deste estudo, o fechamento das
usinas implicou, pela sua importância anterior, em redução considerável de empregos formais
em suas localidades, e os efeitos, anteriormente positivos de encadeamento produtivo,
localização e associação geográfica, passaram a ser negativos. O aspecto positivo desse cenário
foi o município deixar de focar em uma atividade específica.
No tocante ao fator experiência, percebe-se uma relação inversa e significativa a 10%,
retratando que os anos de experiência do trabalhador por si só não são capazes de gerar mais
produto. Logo, a variação de 1% no fator experiência, induz uma variação de -1,395% no PIB
(a única relação elástica e de maior magnitude constatada). O dado encontrado sugere que as
mudanças de profissões provocadas pela ocorrência do fechamento das usinas, fez com que o
trabalhador entrasse em novas funções, porém, tendo menos tempo de experiência. A saída de
trabalhadores das usinas, com mais experiência, foi constatada nas cidades visitadas durante a
pesquisa de campo. Ademais, conforme o diretor-presidente da Alcopar, Miguel R. Tranin, os
trabalhadores de cana, mormente os mais novos, buscaram outras atividades, “[...] os mais
antigos, praticamente todos, nesse período, se aposentaram” (UDOP, 2020, s/p.).
O resultado quanto ao fator experiência, relacionando-se com o IFDM educação, traz
uma relação aparentemente contraditória, ou seja, na medida em que o PIB subiu pelo aumento
do IFDM educação, por outro lado o PIB diminuiu no período analisado em relação aos anos
de experiência do trabalhador. Esta comparação é relevante porque a busca por maior educação
para realização de novas atividades, fez com que a quantidade de anos de vivência prática fosse
menor nessas funções, de modo que não é a experiência que contribuiu para o crescimento do
PIB nas cidades supracitadas e, sim, a educação/capacitação.
Relativo à questão da participação percentual da mão de obra masculina, observa-se que
existe uma relação inversa e significativa a 1% (a cada 1% de aumento da mão de obra
masculina nos cinco municípios, induz uma diminuição média no PIB de -0,85%). Como a
82
Figura 5 – Percurso realizado pelo pesquisador para a pesquisa de campo nos municípios de
Cambará (1º visitado), Porecatu (2º), Rolândia (3º), Engenheiro Beltrão (4º) e Perobal (5º)
Nas cidades visitadas foram realizados contatos prévios com pessoas/instituições (junto
aos membros da comunidade local de reputação e história de vida na região), tanto do setor
público como do setor privado, que pudessem indicar profissionais com expertises de décadas
ligadas, diretamente e indiretamente, com a temática falência das agroindústrias canavieiras
locais. Um ponto de corte para entrevistar tais pessoas, além dessa indicação prévia, era o seu
conhecimento na atividade em que atuou (alguns já eram aposentados) ou atua de, no mínimo,
25 anos de prática. A média de anos das dez pessoas entrevistadas, no tocante ao conhecimento
demandado, foi de aproximadamente 30 anos. Isto denota a seriedade nos critérios dessa
amostra por tipicidade que, ainda não sendo aleatória, favoreceu a representatividade no estudo.
Ressalta-se que após a abordagem inicial para explicação do teor do estudo, o
questionário era entregue ao entrevistado. Ao respondê-lo, esse podia tecer comentários sobre
a falência da usina ocorrida na sua localidade, fazendo do questionário também um norte para
a entrevista, onde algumas informações foram além das indagações postas. Isto permitiu maior
interação entre o pesquisador e os entrevistados, possibilitando profícuas conversas. Nesse
contexto, mesmo com o rigoroso cuidado com a saúde, por conta da pandemia da COVID19
(uso de máscara, distanciamento regular – apenas nas fotos houve uma maior proximidade –,
84
uso de álcool gel etc.), não se optou pela entrevista de forma remota, devido exatamente a maior
interatividade que o contato pessoal possibilita. A Figura 6 mostra algumas fotos da pesquisa
de campo.
Os resultados dos fatores influentes no insucesso das usinas, segundo percepções dos
dez profissionais entrevistados, estão sintetizados na Tabela 2.
Tabela 2 – Resultado dos fatores influentes no insucesso das usinas conforme entrevistados
nos municípios de Cambará, Engenheiro Beltrão, Perobal, Porecatu e Rolândia (PR)
Falta de dinheiro/recursos financeiros (%)
Questão 1.1
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público - - 20 - 80
Representantes pesquisados do Setor Privado - - 40 20 40
Total Geral dos pesquisados - - 30 10 60
Fluxo de caixa precário (%)
Questão 1.2
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público - - - 60 40
Representantes pesquisados do Setor Privado - 20 - - 80
Total Geral dos pesquisados - 10 - 30 60
Despesas operacionais elevadas (%)
Questão 1.3
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público - - 20 40 40
Representantes pesquisados do Setor Privado - - 40 40 20
Total Geral dos pesquisados - - 30 40 30
Insuficiência de conhecimento administrativo/operacional (gestão e planejamento) (%)
Questão 1.4
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público 20 - 20 40 20
Representantes pesquisados do Setor Privado - - - - 100
Total Geral dos pesquisados 10 - 10 20 60
Indisponibilidade de empréstimos empresariais (%)
Questão 1.5
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público 20 - 40 40 -
Representantes pesquisados do Setor Privado 20 20 40 - 20
Total Geral dos pesquisados 20 10 40 20 10
Indisponibilidade de capital próprio para o negócio (%)
Questão 1.6
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público 20 20 20 20 20
Representantes pesquisados do Setor Privado - - 40 20 40
Total Geral dos pesquisados 10 10 30 20 30
Alto custo dos empréstimos (%)
Questão 1.7
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público - 40 - 20 40
Representantes pesquisados do Setor Privado - 20 60 - 20
Total Geral dos pesquisados - 30 30 10 30
Elevado endividamento (%)
Questão 1.8
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público - - 20 20 60
Representantes pesquisados do Setor Privado - - 20 - 80
Total Geral dos pesquisados - - 20 10 70
Vendas inadequadas (etanol/açúcar e demais produtos e subprodutos da cana-de-açúcar) (%)
Questão 1.9
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público 20 20 60 - -
Representantes pesquisados do Setor Privado 20 - 20 40 20
Total Geral dos pesquisados 20 10 40 20 10
Crescimento prematuro e expansão empresarial sem planejamento (%)
Questão 1.10
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público 40 20 20 20 -
Representantes pesquisados do Setor Privado - - - - 100
Total Geral dos pesquisados 20 10 10 10 50
Ambiente competitivo (predatório) (%)
Questão 1.11
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público 20 40 40 - -
Representantes pesquisados do Setor Privado - 40 20 40
Total Geral dos pesquisados 10 40 30 20 -
Adversidades climáticas (%)
Questão 1.12
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público 20 80 - - -
Representantes pesquisados do Setor Privado 40 20 20 - 20
Total Geral dos pesquisados 30 50 10 - 10
Interferência do governo inadequada (na política do etanol) (%)
Questão 1.13
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público - 40 40 - 20
Representantes pesquisados do Setor Privado 20 - 40 20 20
Total Geral dos pesquisados 10 20 40 10 20
Crise internacional (%)
Questão 1.14
Sem importância Pouco importante Importante Muito importante Extremamente importante
Representantes pesquisados do Setor Público 20 40 20 20 -
Representantes pesquisados do Setor Privado - 20 60 20 -
Total Geral dos pesquisado 10 30 40 20 -
Fonte: Dados da Pesquisa (2021).
Obs.: as áreas sombreadas denotam os maiores % de ocorrência: cor amarela (para total geral dos pesquisados),
lilás (para pesquisados do setor público) e verde (para pesquisados do setor privado).
86
Tabela 3 – Resultado das considerações sobre o insucesso das usinas conforme entrevistados
nos municípios de Cambará, Engenheiro Beltrão, Perobal, Porecatu e Rolândia (PR)
Representantes Representantes
Total Geral dos
Questões pesquisados do Setor pesquisados do Setor
pesquisados
Público Privado
2.1 – O insucesso das usinas contribui para tornar o Sim (%) Não (%) Sim (%) Não (%) Sim (%) Não (%)
setor mais “fragilizado” (mostrando, por exemplo,
falta de articulação institucional, planejamento e/ou 40 60 100 - 70 30
estratégia para superar crises...)
2.2 – O insucesso das usinas contribui para tornar o
setor mais “consolidado” (pois unidades fragilizadas
60 40 80 20 70 30
deixam de operar, ficando apenas as mais “saudáveis”
no mercado)
2.3 – O insucesso das usinas contribui para tornar o
setor mais “concentrado” (pois unidades mais 100 - 100 - 100 -
competitivas adquirem as menos competitivas)?
2.4 – Para o município, quais foram os fatores Fatores desfavoráveis Fatores favoráveis
decorrentes da quebra/insolvência da usina? Setor Público Setor Privado Setor Público Setor Privado
Desemprego/que-
Respondente 1 da da arrecadação
- - -
Respondente 2 - Desemprego - -
Desemprego/perda Abriu mais áreas
Respondente 3 para o comércio
-
para grãos
-
Desemprego/que-
Respondente 4 - da da arrecada- - -
ção/queda da renda
Desemprego/que- Abriu mais áreas
Respondente 5 - -
da da arrecadação para grãos
Respondente 6 - Desemprego - -
Respondente 7 Queda da renda - - -
Queda da
população/queda
Respondente 8 - da arrecadação/não - -
consegue mais
industrializar
Desemprego/crise Abriu mais áreas
Respondente 9 financeira dos - para o -
agricultores agronegócio
Desemprego/que- Descentraliza-
Respondente 10 - -
da da arrecadação ção da renda
2.5 – Em sua opinião, por que a Usina quebrou (em 3 Setor Público Setor Privado
palavras apenas, e por ordem de importância)? 1ª 2ª 3ª 1ª 2ª 3ª
Desvirtu-
Desvirtu-
Faltou amento
Respondente 1 amento dos - - -
gestão das
recursos
funções
Faltou Adm. Faltou
Respondente 2 - - -
gestão familiar política
Faltou Faltou
valorização dinheiro/ Faltou
Respondente 3 - - -
do recursos política
colaborador públicos
Baixa
Faltou Fluxo de
produti-
Respondente 4 - - - planeja- caixa
vidade de
mento precário
cana
Faltou
Faltou Faltou
Respondente 5 capital de - - -
gestão controle
giro
Faltou Faltou Faltou
Respondente 6 - - -
gestão dinheiro controle
Faltou
Faltou Desvio de
Respondente 7 capital - - -
gestão objetivo
próprio
Alta
Avesso à
Faltou competi-
Respondente 8 - - - moderni-
gestão ção entre
zação
as usinas
Faltou Faltou
Faltou
Respondente 9 negocia- moderni- - - -
gestão
ção zação
Faltou Faltou Faltou
Respondente 10
gestão gestão gestão
Fonte: Dados da Pesquisa (2021).
89
Cabe salientar, no cotejo entre os representantes do setor público e setor privado, nas
questões 2.1 e 2.2 da Tabela 3, a menor dispersão dos entrevistados do setor privado, que foram
praticamente unânimes em referendar que o insucesso das usinas contribui para tornar o setor
mais “fragilizado” e mais “consolidado”.
Já para os municípios (item 2.4), segundo indicado pelos representantes dos setores
entrevistados, os principais fatores desfavoráveis decorrentes da insolvência da usina foram o
desemprego, queda da renda e da arrecadação dos municípios. Quanto aos fatores favoráveis,
os respondentes do setor público fizeram mais apontamentos como, por exemplo, abertura para
o cultivo de grãos e expansão para outras atividades do agronegócio. Neste tocante, um
entrevistado do setor privado pontuou como fator favorável decorrente das bancarrotas de
usinas a descentralização da renda.
A queda de emprego e renda também foram encontradas por Bernardo et al. (2018) e
Bechlin et al. (2020).
Embora não tenha sido realçado na Tabela 3, constatou-se em pesquisa de campo com
vários agentes entrevistados, que as usinas ao falirem não cumpriram seus compromissos
financeiros com parte de seus credores (fornecedores de cana, empresas de insumos etc.).
Gitman (2010) salientou que uma organização, ao encerrar suas atividades, pode vir a não
cumprir seus compromissos com terceiros. Isto foi uma tônica observada em todas as cidades
visitadas durante este trabalho. Vale rememorar que a pesquisa de campo tabulou os dados dos
dez profissionais escolhidos para a abordagem qualitativa. No entanto, vários outros
(agricultores, gerentes do comércio, presidentes de clubes de serviço, funcionários públicos e
do setor privado etc.) também foram ouvidos durante as visitas in loco, ampliando a
compreensão sobre o que ocorreu nos municípios analisados.
Finalizando os questionamentos da Tabela 3 (item 2.5), os respondentes mencionaram,
em ordem de importância, as três causas fundamentais para que as agroindústrias canavieiras
viessem a falir, constatando-se que a causa fundamental determinante da falência foi falta de
gestão. Embora outras especificações não foram expressadas como “gestão”, fazem parte do
seu contexto, ou seja, falta de planejamento/controle, fluxo de caixa precário, negociação,
90
questão da gestão das usinas (que foi muito enfatizada pelos pesquisados do setor público e
privado), embora algumas variáveis, ou mesmo palavras-chaves citadas, estejam relacionadas
com a administração dessas empresas.
Como corolário da análise dos resultados do estudo quantitativo, comparando alguns
dos apontamentos feitos pelos entrevistados, corrobora-se a lógica de algumas variáveis que
resultaram em explicativas para o desempenho do PIB nos cinco municípios visitados. Quando
vários respondentes (inclusive da Alcopar) apontaram, por exemplo, que a derrocada das usinas
abriu espaço para outras atividades, isto está relacionado com o QL na análise econométrica.
Ou seja, quando as usinas faliram, a agricultura passou a ser menos concentrada (relativamente),
deixando de focar em uma atividade específica. A redução de postos de trabalho que ocorreu,
sobretudo no mercado masculino nessas localidades, também foi um apontamento que relaciona
diretamente os resultados da análise econométrica com a percepção dos entrevistados (sendo
que estes profissionais não tinham a ideia desses resultados do modelo). Com efeito,
praticamente todos os entrevistados foram unânimes em referendar que houve queda de
empregos na agricultura, principalmente no tocante à mão de obra masculina, preponderante
em agroindústrias canavieiras.
Assim, observa-se a relevância de um trabalho que não somente utilizou dados
secundários (no estudo quantitativo, mediante uso de instrumental econométrico), mas também
dados primários (com base em pesquisa de campo, investigando e analisando a percepção de
agentes econômicos municipais ligado ligados, direta e indiretamente, com usinas paranaenses
que deixaram de funcionar), concatenando resultados que, em uma ou outra metodologia
apenas, ficaria incompleta.
A Figura 7 procura, a exemplo de Neves, Trombin e Consoli (2010), Bacha (2018) e
Bielschowsky (2000), sumarizar o presente estudo em uma única exposição, porém, sem perda
da qualidade. A visualização do contexto proposto e dos principais resultados obtidos, ao
contrário de uma perspectiva reducionista, busca proporcionar um panorama geral, construído
passo a passo, concatenando capítulos e ideias, permitindo ao leitor a observância desta tese de
forma compilada.
93
L.PIB_D IFDM educ. IFDM empr. Área colhida E_agric QL agricult. Experiência Homem
↑ de 1% no ↑ de 1% no 1% de ↑ do 1% de ↑ na 1% de ↑ do no 1% de ↑ no 1% de ↑ no 1% de ↑ da
PIB defasado IFDM IFDM empre- área colhida emprego fator QL fator mão de obra
de um período educação nos go nos muni- nos agrícola nos agricultura experiência masculina nos
nos 5 5 municípios cípios induz municípios municípios influenciou induz uma ↓ municípios
municípios, induz um ↑ um ↑ médio induz um ↑ induz uma ↓ um ↑ médio média no PIB induz uma ↓
induz um ↑ médio no PIB no PIB de médio no PIB média no PIB no PIB de de 1,395%. média no PIB
médio de de 0,477%. 0,148%. de 0,015%. de 0,121%. 0,108%. Aposentado- de 0,850%.
0,465% no Educação co- Relação posi- Fronteira agrí- Relação com a Com malogro rias e entrada Com a falên-
PIB contem- mo caminho tiva esperada cola parana- falência das das usinas a de trabalhado- cia das usinas,
porâneo. para melhor entre IFDM ense esgotada. usinas e me- agricultura res no merca- os homens
Relação posi- inserção no emprego e Avanço em canização da ficou menos com menos foram os mais
tiva esperada. mercado. PIB. pastagens. agricultura. concentrada. experiência. prejudicados.
Resultado das considerações Resultado dos fatores Quais foram os principais Por que a Usina quebrou
sobre o insucesso das usinas influentes no insucesso das fatores decorrentes da (em 3 palavras apenas, e
(total geral dos pesquisados) usinas insolvência da usina para por ordem de
Foram considerados Para a maioria dos o município? importância)?
“extremamente importantes” pesquisados, o insucesso das Os principais fatores A principal causa determinan-
para o malogro das usinas: usinas contribui para que o desfavoráveis decorrentes da te da falência das usinas foi:
falta de dinheiro/recursos setor se torne mais fragilizado insolvência da usina foram: falta de gestão.
financeiros; fluxo de caixa e mais consolidado. Todos os desemprego; queda da renda e Embora outras especificações
precário; insuficiência de entrevistados concordaram da arrecadação. não sejam expressadas como
conhecimento administrativo/ que o setor se torna mais Quanto aos fatores favoráveis, “gestão”, fazem parte do seu
operacional; elevado endivi- concentrado, onde as unidades os respondentes do setor contexto, ou seja, falta de
mento; crescimento prema- que atuam com maior público apontaram a abertura planejamento/controle, fluxo
turo e expansão empresarial competitividade têm para o cultivo de grãos e de caixa precário, negociação,
sem planejamento. capacidade de adquirir as que expansão de outras atividades políticas, desvirtuamento das
Foram “pouco importantes” não demonstram o mesmo do agronegócio. Um funções e recursos, desvio de
para a falência das agroindús- desempenho. entrevistado do setor privado objetivo e ser avesso à
trias canavieiras no PR: No cotejo entre os pontuou como fator favorável modernização.
ambiente competitivo e representantes do setor a descentralização da renda. Os resultados deste
adversidades climáticas. público e privado, houve Constatou-se em pesquisa de questionamento sobre as
Observação: constatou-se menor dispersão dos campo com vários agentes considerações do insucesso
muita relação desses resulta- entrevistados do setor privado, entrevistados, que as usinas ao das usinas corroboram com os
dos com o que foi citado no que foram praticamente falirem não cumpriram seus resultados discutidos a partir
referencial teórico ligado ao unânimes em referendar que o compromissos financeiros dos fatores influentes no
tema falência; as posições dos insucesso das usinas contribui com parte de seus credores. fracasso das usinas e suas
representantes pesquisados do para tornar o setor mais Gitman (2010), por exemplo, gradações, bem como com
setor público e privado não “fragilizado” e mais salientou esta perspectiva no muitas citações apontadas no
foram homogêneas. “consolidado”. referencial teórico. referencial teórico.
Considerações finais sobre os motivos e consequências da falência de agroindústrias canavieiras no Estado do Paraná
As contribuições da análise quantitativa sugerem que o PIB dos cinco municípios estudados apresentou relação com a insolvência das usinas. O
indicativo de elasticidades negativas de três variáveis e outros comportamentos de relação positiva com o PIB, como da variável QL, são plausíveis
com um cenário de falência de uma agroindústria que atuou como força motriz naquele município. A redução de postos de trabalho que ocorreu,
sobretudo no mercado de trabalho masculino, também relaciona diretamente os resultados da análise econométrica com a percepção dos
entrevistados.
Com a realização da pesquisa qualitativa foi possível constatar que a maior consequência desse malogro, segundo apontaram os representantes dos
setores públicos e privados (de forma geral), deu-se na redução de empregos, renda e arrecadação. A falta de gestão foi o principal motivo para a
falência das usinas. Logo, o preparo para a gestão empresarial se torna um diferencial competitivo para o alcance de resultados positivos.
Relevância/inovação desta tese: sobre a temática proposta, concatenar resultados quantitativos com qualitativos que, em uma ou outra metodologia
apenas, ficaria incompleta.
Fonte: Elaborado pelo autor (2021).
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6 CONCLUSÕES
outros estados do Brasil, para fins de cotejo. Acredita-se que isto permitirá conhecer melhor os
fatores que favorecem o êxito organizacional, de maneira que seja possível identificar se outros
aspectos estão atrelados com o insucesso ou sucesso das agroindústrias canavieiras.
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ANEXO
Figura do Anexo – Localização das usinas ativas, desativadas, paradas e em recuperação
judicial no Brasil – posição junho 2018