Modelo de Memoriais para Julgamento

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR RELATOR DA 5a

CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL n.º 1738700-24.2013.8.13.0024

Apelante: Ministério Público do Estado de Minas Gerais


Apelado: Fernando Antônio da Silveira
Interessado: Massa Falida de Mediodonto – Assistencial LTDA.

EGRÉGIO TRIBUNAL,
COLENDA CÂMARA,
EMINENTES JULGADORES,

MARIA CELESTE MORAIS GUIMARÃES, já devidamente cadastrada e


qualificada nos autos em epígrafe, na qualidade de Administrador Judicial da Massa
Falida de MEDIODONTO ASSISTENCIAL LTDA. vem, respeitosamente,
apresentar MEMORIAIS, pelos fatos e fundamentos a seguir aduzidos:
1. DOS FATOS

I- Inicialmente, tem-se que distribuídos em 17.03.2013 Embargos de


Terceiros ajuizados por FERNANDO ANTÔNIO DA SILVEIRA, ora Apelado, em
face de DANIELLE MORAIS BOURGUIGNON e AGÊNCIA NACIONAL DE
SAÚDE SUPLEMENTAR – ANS, nos quais se alega, em apertada síntese: a) o
embargante adquiriu, no ano de 2006, 07 (sete) lotes da sociedade ASMÉDICA –
SERVIÇOS MÉDICOS ASSISTENCIAIS S/C LTDA., desembolsando, para
tanto, a quantia de R$21.000,00 (vinte e um mil reais); b) foi firmado, como título,
contrato de promessa de compra de venda (fls. 12/17), datado de 20.06.2004; c)
sustentou que, em razão de dificuldades financeiras, não procedeu ao registro do
aludido documento no cartório competente; d) no ano de 2012, ao tentar alienar os
imóveis adquiridos, foi informado de que estavam indisponíveis, em razão de averbação
de penhora; e) no mérito, alega ser senhor e possuidor dos referidos lotes; f) pugna pela
aplicação, in casu, da Súmula 84 do STJ, para que seja levantada a penhora dos imóveis.

II- Documentos juntados às fls. 12/27.

III- Despacho do Juízo de fl. 28 intimando o Autor a promover o


saneamento do polo passivo do feito.

IV- À fl. 29, o Autor requereu a inclusão, no polo passivo, da MASSA


FALIDA DE MEDIODONTO – ASSISTENCIAL LTDA., procedendo-se, para
tanto, à exclusão dos litisconsortes passivos originariamente indicados.
V- Em despachos de fls. 38 e 41, foi intimada a Administradora Judicial
para apresentar contestação aos Embargos. Não obstante, a Síndica, à época, quedou-se
inerte, sendo que, em despacho de fl. 42, decretou-se a revelia da Massa Falida.

VI- Em Parecer de fls. 44/48, a i. Representante do Ministério Público


opinou pela improcedência dos embargos, sustentando, em resumo, que o
embargante, ao não efetuar o registro do instrumento, não adquiriu a propriedade dos
bens, sendo seu direito unicamente pessoal em relação aos compromissários
vendedores, não opondo, assim, eficácia erga omnes a terceiros.

VII- Sentença de fls. 50/52 decidiu pela procedência dos embargos, aduzindo,
em suma, a aplicação da Súmula 84 do STJ, a qual admite a oposição de embargos de
terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda,
ainda que desprovido do registro.

VIII- Irresignado, o Ministério Público apresentou recurso de apelação (fls.


53/61), argumentando: a) ab initio, a subsistência dos pontos elencados no Parecer de
fls. 44/48; b) após, que o embargante não fez prova do pagamento avençado na
promessa de compra e venda, seja por recibo ou transações bancárias; b) ademais, que
não comprovou sequer a posse do imóvel, elemento indispensável à propositura dos
Embargos, consoante afirma a própria Súmula 84 do STJ.

IX- Contrarrazões apresentadas às fls. 64/69, pugnando pela manutenção da


sentença por seus próprios argumentos.

X- Em Parecer de fls. 75/77, o i. Procurador de Justiça, trouxe à baila


preliminar de nulidade de citação, ante a confusão verificada em relação ao nome da
parte-ré – MEDIODONTO, e o nome em face de quem foi determinada a constrição
– ASMÉDICA SERVIÇOS MÉDICOS ASSISTENCIAIS S/C LTDA. Alegou
possível vicio na identificação do Administrador Judicial, isto é, na pessoa que
representa a parte-ré. No mérito, subscreveu as razões do apelo ministerial.

XI- Em observância aos princípios da não-surpresa e do contraditório


substancial, artigos 9° e 10, do CPC/15, o Exmo. Desembargador Relator determinou a
oitiva das partes em relação à preliminar aduzida pelo Ministério Público.

XII- Manifestação do Apelado às fls. 84/95.

XIII- Em Despacho de fl. 98, o Exmo. Desembargador Relator vislumbrou


possível causa de invalidade do instrumento contratual de promessa de compra e venda.
Novamente, em apreço aos artigos 9o e 10 do CPC/15, determinou a intimação das
partes para que se manifestassem.

XIV- A Apelante (fls. 105/109) aderiu à causa de nulidade do instrumento


contratual, sustentando a ocorrência de venda a non domino. Assim, pugnou pelo
reconhecimento da nulidade, com a conseqüente cassação da sentença recorrida,
mantendo-se, assim, a constrição judicial sobre os bens imóveis em análise.

XV- Não houve manifestação do apelado e dos interessados.

XVI- É a síntese do necessário.

2. DAS PRELIMINARES

XVII- Inicialmente, cumpre ressaltar que, apesar de nos documentos de fls.


19/24 constar a título de proprietário o nome ASMÉDICA SERVIÇO MÉDICO
ASSISTENCIAL S/C LTDA., assim como se percebe na averbação de
indisponibilidade dos imóveis, conforme bem ressaltado pelo i. Procurador de Justiça,
tem-se que na 9a Alteração Contratual de fls. 15/16, datada de 07.02.2006, e averbada
em 02.03.2006, foi alterado o nome empresarial da sociedade de ASMÉDICA
SERVIÇO MÉDICO ASSISTENCIAL S/C LTDA. para MEDIODONTO –
ASSISTENCIAL LTDA.

XVIII- Por outro lado, verifica-se que desde 10.01.2012, data do termo
de posse, até 08.03.2017, data da Decisão que a destituiu, a Administradora Judicial da
Massa Falida de Mediodonto – Assistencial LTDA era Úrsula Catarine Rocha Matos.
Neste sentido, observando-se as certidões de fls. 38/v. e 41/v. percebe-se que as
intimações foram efetivamente realizadas na pessoa da aludida Administradora, sendo,
pois, válidas.

XIX- Desta forma, não ocorreu o vício processual de representação, da forma


como foi sustentado pelo Ministério Público.

XX- Não obstante, é incabível a decretação de revelia em desfavor da


Massa Falida. Explica-se: cediço que a decretação da revelia e a produção de seus
efeitos são institutos diferentes. A decretação da revelia ocorre quando, devidamente
citado, o réu não comparece, ou, comparecendo não apresenta defesa, nos termos do
artigo 344, do CPC/15. Noutro giro, a presunção de veracidade dos fatos afirmados na
inicial, principal efeito da revelia, não é automático da decretação desta, como muitos
desavisados acreditam.

XXI- Em preciosa lição, Fredie Didier JR. aduz: “Não se pode confundir a revelia,
que é um ato-fato, com a presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo autor, que é um dos seus
efeitos. A revelia não é um efeito jurídico; a revelia encontra-se no mundo dos fatos e é um ato fato
jurídico”.1

XXII- Neste sentido, tal presunção é afastada nas hipóteses do artigo 345, do
CPC/15. Logo, in casu, é mais que certo que a presunção de veracidade não se aplica ao
caso em testilha, haja vista tratarem-se os direitos em discussão de indisponíveis,
consonante o inciso II, do referido artigo. Os interesses da Massa Falida não são de
livre disposição pelo Administrador Judicial, o qual exerce notável munus público, na
defesa dos credores e da própria lei.

XXIII- Com efeito, não seria possível nem mesmo a decretação da


revelia. Ocorre vício no sentido de que, transcorrido o prazo sem manifestação do
Administrador, deveria o julgador ter suspenso o processo, com vistas à
destituição/substituição daquele. Ora, evidente que quedar-se inerte em relevante
processo de interesse da Massa Falida é justificativa para que, inclusive de ofício,
houvesse a destituição do Administrador, nos termos do artigo 31, da Lei 11.101/05.

XXIV- Não é razoável, muito em razão dos princípios que regem o processo
falimentar, notadamente o do melhor interesse dos credores, que estes ficassem a ver
navios em razão da desídia da Administradora Judicial, a qual não contestou ação de
relevantíssimo interesse, haja vista, ao que tudo indica, serem os imóveis em análise os
únicos bens da Massa Falida.

3. DO MÉRITO

XXV- Superada, ad argumentandum, a questão exposta no tópico anterior,

1DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao Direito Processual Civil,
Parte Geral e Processo do Conhecimento – Volume I. 17a Edição; Salvador, Juspodium, 2015
cumpre fazer um breve histórico da sociedade que originou a presente Massa Falida:
XXVI- Nesta toada, resta, ainda, indiscutível a nulidade do contrato de promessa
de compra e venda objeto dos embargos de terceiro. Tem-se que o instrumento
contratual encontra-se datado de 20.08.2004. Entretanto, verifica-se que é na 9a
Alteração Contratual, datada de 07.02.2006, já mencionada, que houve a retirada dos
sócios primevos José Eustáquio Pereira e Divina Maria da Silva, com a entrada dos
novos sócios MAURÍCIO DUARTE, portador de 99.000 (noventa e nove mil) quotas
de R$1,00 (hum real) e JOSÉ ALBERTO DUARTE LOURENÇO, titular de 1.000
(hum mil) quotas de R$1,00 (hum real). Ocorre que na promessa de compra e venda
assinam como promitentes vendedores, representando a sociedade proprietária
do imóveis, os mesmos MAURÍCIO DUARTE E JOSÉ ALBERTO DUARTE
LOURENÇO.

XXVII- Ora, conforme bem percebido pelo Exmo. Desembargador


Relator e sustentado pela i. Representante do Ministério Público, os aludidos
promitentes vendedores não eram representantes legais da ASMÉDICA, sequer
integrando a sociedade à época do negócio jurídico em comento (20.08.2004), de modo
que, de forma alguma, poderiam transferir a propriedade de bens da sociedade
(certidões de fls. 19/24).

XXVIII- Trata-se de cristalina venda a non domino. Os promitentes


vendedores dispuseram de mais direitos que os que efetivamente possuíam, incorrendo
o negócio em nulidade, nos termos do artigo 166, inciso II, do CC/02.

XXIX- Ressalte-se que a nulidade supramencionada envolve objeto ilícito, pois


não pode um sujeito vender aquilo que não lhe pertence. Assim, de acordo com o
artigo 168, também do CC/02, tal vício pode ser declarado de ofício pelo julgador, em
qualquer grau de jurisdição, não sendo passível de confirmação ou convalidação.

XXX- Não pode nem mesmo o Apelado invocar erro material na data aposta
no contrato, notadamente em face da leitura de sua inicial, na qual mencionam
múltiplas ocasiões que o negócio foi realizado em 20 de agosto de 2006 (20.08.2006),
diferindo de 20 de agosto de 2004 (20.08.2004). Isto se dá, pois, mesmo se considerar
a data de assinatura supracitada, veremos que o reconhecimento de firma constante do
verso do instrumento (fl. 14/v.) é de 24.05.2006, isto é, a autenticação teria ocorrido
três meses antes da formalização do contrato, algo evidentemente impossível!

XXXI- Vale ainda sustentar que a MEDIODONTO submeteu-se a


procedimento de liquidação extrajudicial, nos termos da Lei 6.024/74, haja vista tratar-
se de sociedade operadora de plano de assistência à saúde. Somente após a conclusão
de tal procedimento é que pode ser requerida a falência deste tipo de sociedade, nos
termos do artigo 21, da supramencionada legislação. Ainda, nos termos, do artigo 15,
parágrafo 2o, também será atribuído à liquidação extrajudicial Termo Legal, o qual
indicará a data em que se tenha caracterizado o estado que a determinou, fixando-o em
prazo que não poderá ser superior a 60 (sessenta) dias contados do primeiro protesto
por falta de pagamento ou, na falta deste, do ato que haja decretado a intervenção ou a
liquidação. Na espécie, consoante documento de fl. 25, tem-se que, decretada a
liquidação extrajudicial da MEDIODONTO em 17.11.2006, o termo legal foi
fixado em 04.07.1997.

XXXII- Ora, afirma o Apelado várias vezes em sua inicial ter agido de
boa-fé ao efetuar o negócio de compra e venda. Entretanto, qualquer que seja
considerada a data de assinatura do contrato, estar-se-á dentro dos limites do termo
legal da liquidação, muito antes, inclusive, da avença que o Apelado afirma ser boa, isto
é, para todos os fins da lei, a sociedade promitente vendedora já estava em crise. Não
há, pois, como se esquivar, notadamente em face da latente nulidade já
exaustivamente mencionada no contrato, das datas contraditórias, da abrangência
pelo termo legal, além do valor irrisório pelo qual foram vendidos os lotes (R$21.000,00
pelos sete), sendo que a ASMÉDICA os comprou por R$70.000,00 (setenta mil reais),
de possível conluio entre as partes.

XXXIII- Por outro lado, tem-se que o embargante, ora Apelado, em


nenhum momento comprovou a efetiva posse dos imóveis. Como é cediço, a
posse é o exercício de fato, pleno ou não, de alguns do poderes inerentes à propriedade,
como bem preceitua o artigo 1.196 do CC/02. Tem-se, pois, que foi adotada pelo
ordenamento pátrio a Teoria Objetiva da Posse, de Ihering, a qual dispõe que posse é
aparência, é verificável objetivamente por terceiro, haja vista que possuidor é aquele que
exerce alguns dos poderes inerentes ao proprietário.

XXXIV- Leia-se a Súmula 84 do STJ: “É admissível a oposição de


Embargos de Terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de
compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro”. Evidente que a ratio do
entendimento esposado é permitir a propositura dos embargos de terceiro possuidor
quando fundada em título de compromisso de compra e venda. É inegável que quando
realizado o referido negócio, muitas vezes transfere-se a posse, de modo que o
promitente comprador já começa a se utilizar do bem. Imprescindível, pois, é a
verificação da efetiva posse do bem, nos termos do artigo 674, parágrafo 1o, do
CPC/15 e do artigo 1.046, parágrafo 1o, do CPC/73.

XXXV- Cumpre ressaltar que a Súmula 84 do STJ veio superar a Súmula


621 do STF, a qual não permitia Embargos de Terceiro fundados em compromisso de
compra e venda não inscrita no registro de imóveis. A superação se deu exatamente
para o efeito de se permitir que o compromisso de compra e venda, ainda que não
registrado, servisse como título à alegação de efetiva posse, a qual, como já dito, muitas
vezes já era exercida desde a formalização do contrato. Não se pode negar, pois, a
possibilidade de Embargos do unicamente possuidor.

XXXVI- No caso em comento, o Apelado não juntou documentos


comprobatórios de efetiva posse, quais sejam, fotos dos lotes edificados, guias de
pagamento de IPTU, ou outras contas públicas, como água, luz e nem mesmo trouxe à
baila qualquer depoimento testemunhal, não bastando, para tanto, mera alegação de
posse civil ou jurídica.

XXXVII- Os Embargos, pois, são incabíveis, devendo a d. Sentença


apelada deve ser reformada, mantendo-se a constrição judicial sobre os imóveis
já descritos até o julgamento definitivo da ação de falência.

4. DA CONCLUSÃO

XXXVIII- Ante o exposto, requer este Administrador Judicial que seja dado
PROVIMENTO ao recurso interposto às fls. 54/61, com a consequente reforma da
Sentença exarada às fls. 50/52, pelos fundamentos aqui expostos, a fim de se manter a
indisponibilidade dos bens imóveis em questão.

Belo Horizonte, 05 de junho de 2017.

________________________________________________
MARIA CELESTE MORAIS GUIMARÃES
OAB/MG 37.745
Administrador Judicial

_____________________________________________
PEDRO HENRIQUE GUIMARÃES COSTA
OAB/MG 177.316

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