Resenha Quarto de Despejo
Resenha Quarto de Despejo
Resenha Quarto de Despejo
Carolina Maria de Jesus era uma anônima até o lançamento do seu primeiro
livro Quarto de Despejo, publicado em agosto de 1960. A obra era uma reunião
de cerca de 20 diários escritos pela mulher negra, mãe solteira, pouco instruída
e moradora da favela de Canindé, em São Paulo. Quarto de Despejo foi um
sucesso de vendas e de público porque lançou uma olha original da favela e
sobre a favela. Traduzido para 13 idiomas, Carolina ganhou o mundo e foi
comentada por grandes nomes da literatura brasileira como Manuel Bandeira,
Raquel de Queiroz e Sérgio Millier. No Brasil, os exemplares de Quarto de
Despejo alcançaram a tiragem de mais de 100 mil livros vendidos em um ano.
O livro narra de modo fiel o cotidiano passado na favela. Em seu texto, vemos
como a autora procura sobreviver como catadora de lixo na metrópole de São
Paulo, tentando encontrar naquilo que alguns consideram como sobra o que a
mantém viva. Os relatos foram escritos entre 15 de julho de 1955 e 1 de janeiro
de 1960. As entradas no diário são marcadas como dia, mês e ano e narram
aspectos de rotina de Carolina.
Os seus meninos, como ela costuma chamar, passam muito tempo sozinho em
casa e vira e mexe são alvos de críticas da vizinhança que dizem que as
crianças são mal-educadas. Embora nunca se diga com todas as letras, a
autora atribui a reação das vizinhas com seus filhos pelo fato dela não ser
casada. Diz assim, elas aludem que eu não sou casada, mas eu sou mais feliz
do que elas têm marido. Ao longo da escrita, Carolina sublinha que sabe a cor
da fome e ela seria amarela.
A catadora teria visto amarelo algumas vezes ao longo dos anos e essa era
uma daquelas sensações que ela mais tentava fugir. Eu que antes de comer
via o céu, as árvores, as aves, tudo amarelo, depois que comi tudo se
normalizou aos meus olhos. Além de trabalhar para conseguir comprar comida,
a moradora da favela do Canindé também recebia doações e buscava resto de
alimentos nas feiras até no lixo quando era preciso. Era uma das suas entradas
no diário, ela comentou assim, a tontura do álcool nos impede de cantar, mas a
da fome nos faz tremer. Eu percebi que é horrível de ter só ar dentro do
estômago, pior do que a fome dela, a fome que mais doía era a que assistia
nos filhos.
É uma leitura dura, difícil, que expõe situações críticas de quem não teve a
sorte de ter acesso a uma mínima qualidade de vida. Extremamente honesto e
transparente, vemos na fala de Carolina a personificação de uma série de falas
possíveis de outras mulheres que se encontram igualmente em uma situação
social de abandono. A gente destaca agora alguns pontos chave para a análise
do livro. O estilo de escrita de Carolina. A redação de Carolina, que é a sintaxe
do texto, por vezes foge ao português padrão e por vezes incorpora palavras
rebuscadas que ela parece ter aprendido com suas leituras.
Muitas vezes ao longo do livro, esse pragmatismo aparece como uma tábua de
salvação onde Carolina se agarra para avançar nos seus afazeres. Por outro
lado, inúmeras vezes ao longo do texto, a narradora se depara com a raiva,
com o cansaço e com a revolta de não se sentir capaz e nutrir as necessidades
básicas da família.