Ceravolo e Talamo 2000 - Tratamento Da Informação
Ceravolo e Talamo 2000 - Tratamento Da Informação
Ceravolo e Talamo 2000 - Tratamento Da Informação
TRATAMENTO E ORGANIZAÇÃO DE
INFORMAÇÕES DOCUMENTÁRIAS EM MUSEUS
Embora tida como uma atividade tão antiga L ’Office International des Musées (O.I.M)1
quanto as instituições que a abrigam, a procuraram dar a essa documentação uma
documentação de museus desenvolveu-se feição mais especializada, ainda que num
lentamente, ficou à margem ou à deriva primeiro momento de forma indireta, pois
durante muito tempo, realizada sem método e nesse período privilegiavam-se mais os
considerada como a “parente pobre” dentre as registros de posse e propriedade das chama
atividades dessas instituições (Olcina 1986: das obras de arte, como garantia e salvaguarda
307). A partir do início do século XX, na contra roubos. Mas, por causa da necessidade
Europa, especialmente entre 1927 e 1945, de descrever e intercambiar tais obras, ainda
organismos de porte internacional como o nessa época, surgem as primeiras propostas de
normatização para registros voltadas principal
mente para catálogos iconográficos (Aubert
(*) Museu de Anatomia Veterinária da Faculdade de
M edicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de
São Paulo.
(**) Departam ento de B ib liotecon om ia e D ocu m en (1) Órgão internacional com sede em Paris, parte do
tação da Escola de Com unicações e Arte da U niversi In tern ational In stitute o f In telectu al C ooperation ,
dade de São Paulo. este um desdobramento da Liga das Nações.
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CERAVOLO, S.M .; TÁLAM O , M .F.G.M . Tratamento e organização de inform ações docum entárias em m useus.
R evista do M useu de A rqu eologia e E tnologia, São Paulo, 10: 241-253, 2000.
pálmente sob a égide das propostas de Rivière manteve nas décadas seguintes vista como
e por ele disseminada para outros países meta ideal a ser alcançada. Para isso não
através do ICOM, já que foi seu presidente por faltaram precursores, instituições ou projetos,
muitos anos. No bojo dessas propostas, nasce nos quais a alavanca temática era informatizar
a concepção de que museus podem ser as informações sobre as coleções. Visava-se,
considerados como ‘Centros de Documenta principalmente, agilizar o cruzamento, busca e
ção’ em potencial, tendo na própria documen recuperação de dados, como também elencá-
tação o alicerce para criar o “museu-laborató- los para formar os tão desejados catálogos de
rio”, uma associação entre o “museu cultural” museus (Chenhall 1975). No entanto, para que
(musée culturel) e o “museu-científico” (musée isso pudesse ocorrer usando-se com plenitude
scientique) (La Muséologie Selon G.H.R., os computadores, urgia, em primeiro lugar,
1989: 175 e 179). Uma outra tendência da compreender o que Lenore Sarasan chamou de
documentação em museus pode ser chamada “teoria da documentação” e os “sistemas de
de “tecnicista”, pois visa em primeiro lugar o documentação”, elementos a serem obrigatori
acesso rápido aos objetos e seus respectivos amente definidos antes da implantação de
registros. Aqui busca-se preferencialmente o qualquer sistema informatizado (Sarasan
controle das coleções por meio da conexão 1981:45), ou mesmo manual. No final da década
entre registros, fichas e fichários, com referên de 80, e no início dos anos 90, a ênfase recai
cias cruzadas para que possam ser recupera sobre a importância do controle de vocabulári
dos. O escrivão (registrar), é a figura profissi os e de terminologias descritivas especializa
onal responsável pela criação, manutenção e das.6 No entanto, essa importância vincula-se
cuidado permanente com os registros, e os mais à necessidade de operacionalizar a
curadores pela pesquisa do objeto e sua informatização das coleções e menos à preocu
catalogação (Dudley et alii 1976). Esta pação de tomar acessíveis para um amplo
tendência desenvolve-se com força em público as informações sobre as coleções.
território norte-americano. O foco diferen- Leonard Will, em 1993, considera que a
ciador entre uma e outra instala-se na aborda documentação em museus ainda está na sua
gem do objeto de museu e nas funções da infância, pois estas instituições não se vêem
documentação uma privilegiando a necessida como prestadores de serviços de informação
de de compreendê-lo, desvendando e regis (Light, Roberts, Stewart 1986).
trando em detalhes, e a outra enfatizando os
aspectos administrativos onde o documentar
coleções vincula-se fortemente à idéia de (6) Em 1987, form a-se o Grupo de Trabalho para o
eficiência no seu gerenciamento. Controle T erm inológico (T erm inology C on trol
Tal como em outras áreas, os museus Working Group), ligado ao CIDOC. Segundo este
também não escaparam da idéia de que a órgão, há 43 tesauri para museus, elaborados para
auxiliar a descrição de objetos, nas áreas de: agricultu
informática poderia resolver tudo, ou quase
ra, armas, arqueologia, arquitetura, artes decorativas,
tudo, do acesso aos objetos à elaboração de cerâmica, construções, cultura material de forma
catálogos, atribuindo-se as possíveis ou geral, cutelaria, engenharia, esculturas, ferramentas e
futuras possibilidades de informatização a transportes, film es e fotografias, indumentária,
organização e recuperação das informações instrumentos marítim os, instrum entos m usicais,
sobre as coleções. Envolvida na aura da jóias, livros, manuscritos, material etnográfico,
m obiliário, moedas, objetos cerim oniais, objetos de
informatização, no decorrer dos anos 80, a
m etal, objetos eclesiásticos, objetos históricos,
‘informação’ passou a ser considerada como objetos relacionados à ciência e tecnologia, pinturas,
fator de evidência (Lewis 1986: V). Na visão de relógios, tapeçaria, têxteis, trabalhos em papel e
alguns autores, os museus deixariam de ser um outros tipos de impressos, e termos para designar a
show-room, na medida em que poderiam amarração e costura em livros raros. Em língua
prover seus públicos com outros subsídios portuguesa contamos com o Tesauro p a ra a cervo s
m u seológicos, publicado em 1987 por H elena D.
informativos (Elisseff 1970/1:5).
Ferrez e Maria Helena S. Bianchini (D irectory o f
De fato, comenta-se sobre as possibilida thesauri f o r ob ject names, CIDOC, 1994). A década
des de informatização no universo dos museus de 80 concentrou, até agora, o maior número dessas
desde o final da década de 60, idéia que se publicações.
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na seleção de nomes ou classes de objetos, coleção deve ter índices cruzados de tantas
acompanhadas de números, e textos livres para formas quantas sejam possíveis ou as informa
descrições sintéticas (Chenhall 1975, Light et ções contidas nos registros não poderão ser
alii 1986). O controle de vocabulário e a usadas” (Chenhall 1975:9). Portanto, a recupe
normatização de terminologias ficaram depen ração das informações nos SDMs dependia
dentes da necessidade de informatizar, com o desses índices remissivos, embora fossem
propósito de recuperar as informações e vistos como lugar de fixação de dados trans
facilitar seu intercâmbio. postos de um registro para outro. Se tais
Embora raramente na década de 80 use-se referências aos índices correspondem ao
a expressão “sistemas de informação”, o fato controle de vocabulário, sabe-se que esta
significativo é que os sistemas de documenta operação é algo que o sistema não pode
ção de museus passam a ser imprescindíveis realizar por si sem o aporte da Análise Docu
para essas instituições garantindo o controle e mentária (AD). É função da AD tratar da
o acesso às coleções. Observa-se, entretanto, análise, síntese e representação da informação,
que na estruturação dos sistemas, tal como se para que seja recuperada e disseminada,
apresentam, não há distinção entre o tratamen caracteriza-se como uma atividade metodoló
to dos dados para acompanhamento do objeto gica específica no interior da Documentação
(suporte) e o tratamento e organização das (Cintra et alii 1994:24). Por outro lado, o
informações propriamente dito, ainda que simples uso de recursos informatizados não
ambos não prescindam da linguagem no poderia executar por si tais remissivas. Natu
sentido amplo. As etapas dos SDMs ficaram ralmente, tal perspectiva de ‘sistema’ influi
muito vinculadas ao trajeto que o objeto sobre os procedimentos de produção, organi
percorre no interior da instituição museu, zação, manutenção e recuperação da informa
tomando-se como idêntico o acompanhamento ção em museus.
do percurso do objeto e a informação sobre o
objeto, dando a ambos um tratamento global.
No entanto, a ação documentária (ciclo e Ausência de princípios
tratamento documentários) baseia-se, em documentários em museus: exemplos
primeiro lugar, na distinção entre agente
(suporte/objeto), e consecutivamente nas Há no âmbito da documentação de museus
metodologias envolvidas nesses proces ações que são por natureza documentárias, e,
samentos, sendo que para cada uma delas há caso não estejam conceituadas, corre-se o
uma linguagem controlada a ser usada. Disto risco de emprestar palavras da Documentação,
decorre que não há previsão nos SDMs de sem, no entanto, conhecer o seu conteúdo
etapas específicas, com metodologias também conceituai.
particulares para o tratamento da informação, Isto pode ser observado no contexto dos
sendo este tratamento uma conseqüência manuais de documentação de museus, nos
posterior. De fato, não priorizava-se uma significados atribuídos à ‘catalogação’, e ao
Política de Informação para esses sistemas. ‘catalogar’. ‘Catalogação’, refere-se à pesquisa
Conclui-se, portanto, que os SDMs do objeto (ou coleções) e parece ser consenso
operam na direção do controle das coleções, que se trate de função de especialistas (ou
atuando preferencialmente sobre o eixo curadores) (Dudley et alii: 1979). Quanto ao
administrativo/gerencial. Tais sistemas não ‘catalogar’ percebem-se divergências: Chen
podem ser caracterizados como sistemas de hall (1975: 9) remete à associação entre regis
informações documentárias (SIDMs). Apesar tros e um objeto, e entre este e objetos simila
disso, deduz-se que exista alguma operação res, com base num sistema de classificação;
para o tratamento da informação, ainda que de para Dudley et alii (1979: 31), é uma função da
modo implícito. Tal fato pode ser inferido da classificação e os fichários devem ser manti
afirmação de Chenhall quando comenta a dos por ‘registradores’ tendo por base infor
importância dos índices remissivos: “(...) mações fornecidas pelos curadores; para
qualquer documentação de objetos numa Scheiner (1985: 57), trata-se de uma questão
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OBJETO
D E C O D I F I C A Ç Ã O DO OBJETO
ORGANI ZAÇÃO
TRATAMENTO DO SUPORTE TRATAMENTO DA INFORMAÇÃC
Notações para Controle SISTEMA DE SIDM
Técnica
Classificação
INFORMAÇÃO
Indexação
I NFORMAÇÕES DOCUME NT Á RI A S
RECUPERAÇÃO
(16) Inform ação docu m en tária depende de procedi (Kobashi 1994: 50). D istingue-se assim, sob a
m entos m eto d o ló g ico s exp lícitos, “é uma representa perspectiva da A nálise Docum entária (A D ), das
ção construída a partir de um objeto efetivam ente ‘inform ações brutas’, ‘principais’, ‘sign ificativas’ ou
presente, que o substitui para certas finalidades” ‘essen cia is’.
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VOCABULÁRIO CONTROLADO
4
4 1
LD INFORMAÇÃO
ASSOCIADA
1
DESCRITOR -► RIM *4-PEÇA
a n a tô m ic a
RECUPERAÇÃO
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