Religião e Movimento Social No Brasil
Religião e Movimento Social No Brasil
Religião e Movimento Social No Brasil
novos religiosos em relação aos problemas sociais que reclamam uma ação do Estado
se envolvendo cada vez mais em movimentos sociais e instâncias de luta coletiva com
em que a doutrina católica esteve presente na vida política, sobretudo nos anos de 1930
com as camadas e setores dirigentes onde estava a alta intelectualidade nacional entre
eles artistas, filósofos e literatos que emergem no cenário cultural brasileiro no final
dos anos de 1920 com expressividade até os anos de 1940, entre eles merecem destaque
época. Os intelectuais católicos da década de 60, por sua vez resgatam o discurso
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A atuação da revista A Ordem, marcadamente política coloca a religião como epicentro da organização
social balizada pela matriz da ordem. Interessante notarmos a plataforma política de Jackson de
Figueiredo que consiste então em organizar uma elite espiritual que deveria por direito (teo)lógico
conduzir a vida nacional. Assim sua tarefa se resume em criar instituições que formem a partir do culto da
ordem novos quadros capazes de intervir, em nome do catolicismo e em consonância estrita com as
diretrizes da Igreja, em todas as dimensões da realidade brasileira.
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militante e evocam a postura combativa da Igreja representada pela corrente da
porque nesse momento surge o programa da doutrina social católica, com propostas que
assistencial e trabalhista.
governo de Getúlio Vargas, pois a Liga Eleitoral Católica (LEC) ampliou seu raio de
ação conseguindo reformas constitucionais expressivas tanto para o clero como para a
A Igreja nesse período por meio de suas lideranças procurou manter uma postura
consensual com o governo. Assim até 1943 a relação entre ambos caminhou no sentido
de uma política que buscava a harmonia social, entre os assalariados urbanos, por
Círculos operários.
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Como pudemos ver a passagem do interesse “sacro” para o temporal por parte da
Igreja Católica não ocorreu de forma aleatória, pelo contrário a adesão do movimento
hierúrgico, que impõe sua ordem estatuída às ações de determinado âmbito de vigência
que num primeiro momento a Igreja Católica esteve a dianteira desse processo, e
por todos que se propõem a analisá-la, tampouco devemos nos esquecer de que há um
ação recíproca entre essa esfera e as esferas econômica, política e cultural que
Entendemos ser de suma importância fazer à análise das mudanças de orientação que
para que possamos ver em que medida o maior engajamento dos protestantes
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Trata-se de uma situação efetiva de imposição da vontade de dominadores que influencia a ação de
dominado (Cf. Max Weber, EeS 2: 191), mas de um tipo específico, aquele no qual a dominação se dá
“em virtude de autoridade (poder de mando e dever de obediência” (EeS 2: 188) e não do tipo no qual ela
se dá por constelação de interesse, como no mercado pelo monopólio.
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(Pentecostais) com os movimentos sociais, no caso em específico com o sindicalismo
religiosa, ainda que esta esteja imbricada num conjunto de normas e regras moralmente
elaboradas.
conflitos, tanto internos (diferentes ordens religiosas católicas na relação com a Santa
Sé, assim como dissidências nas seitas protestantes) quanto externos, conflitos que se
radicalmente.
As religiões mundiais3 como religiões de salvação estudadas por Weber tem por
na Igreja Católica a necessidade de realizar “boas obras” como prova do amor cristão,
presente (injusta, má) assegura a salvação num paraíso futuro (justo, bom).
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Na sociologia compreensiva de Weber o estudo das religiões surge como aparato explicativo da
dinâmica social, no entanto para o autor são cinco as “religiões mundiais” confucionismo, hinduísmo,
budismo,cristianismo, islamismo e judaísmo, apesar de serem seis idéia de salvação está implícita nas
cinco últimas. (Ensaios de Sociologia, p.309)
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Do ponto de vista sociológico a identificação das religiões mundiais com o
dualismo metafísico adquire importância, justamente, por terem como teleologia a idéia
que cada um recebe o que merece. A problemática está no fato dessa compensação
Ela provoca, pois, uma dicotomia mundo\tempo. Há com isto uma reprovação da
Igrejas cristãs, mais elas se chocaram com os valores do mundo e suas ordens. Ou seja,
vinculada às suas condições alheias à fraternidade, condições que devem ser seus meios
e fins. Assim a ética fraternal não estabelece relação com a ética social orgânica.
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Nesse sentido a igreja ainda que alicerçada numa fraternidade, sustenta traços
sobremodo nos últimos anos com maior participação na esfera social, aqui entendida
como uma esfera que só é possível ser alcançada quando se da a ascensão do privado
no que Arendet chama de riqueza privada ou privatividade para o público o comum nas
sociedades modernas, sendo muito distintos das esferas públicas (esfera da liberdade) e
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Nessa perspectiva é que queremos entender as transformações no
religioso no Brasil, a relação Igreja e Estado merece destaque, justamente por balizar a
consensual, os anos 50 por sua vez inaugura uma nova posição da Igreja perante o
Estado.
finalidade era a de fazer oposição frente aos movimentos sociais e políticos da época,
Católica movimento que ganharia relevância nos anos posteriores no seio da Igreja. D.
Hélder Câmara, teve importante papel na ACB que mais tarde daria lugar a CNBB
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De acordo com o decreto 119 de 7 de fevereiro de 1890, a Igreja Católica adquiriu personalidade
jurídica e se viu apartada do Estado, perdendo s atributos e privilégios até então garantidos pelo padroado.
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politização por parte do clero, onde já não mais se aceitava uma Igreja subserviente e
romanização. Deste modo, a Igreja procurou intervir nas ordens seculares com o
política, no sentido da utilização do Estado para seus fins, ou seja, no geral influenciar
sua luta, sobretudo em relação ao comunismo e o marxismo. Em face disso, era mister
clericalizar a fé do povo. Daí o papel dos padres da Ação Católica ter logrado êxito
de dominação.
Quando se exalta a função da Igreja na classe média a favor das classes inferiores,
esquece-se simplesmente uma coisa: que esta função não estava ligada à Igreja como
econômicos bastante concretos, que devia lutar contra outras ordens que pretendiam
diminuir a sua importância. Logo, esta função foi subordinada e incidental: mas os
camponeses não eram menos escorchados pela Igreja do que pelos senhores feudais.
Talvez possa-se dizer que a “Igreja” como comunidade dos fiéis, conservou e
organização clerical, até a Revolução Francesa, cujos princípios são próprios das
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comunidades dos fiéis contra o clero como ordem feudal aliada ao rei e ao nobres. Por
isso muitos católicos consideram a Revolução Francesa como um cisma e uma heresia,
isto é, uma ruptura entre pastor e rebanho, do mesmo tipo da Reforma, mas
historicamente mais madura por ter-se verificado no terreno do laicismo; não padres
contra padres, mas fiéis-infiéis contra padres. O verdadeiro ponto de ruptura entre
do braço secular (em grande estilo) contra os luteranos e abdicou da sua função
transformações e rupturas.
História, se por um lado a década de 1930 foi caracterizada por uma religiosidade
formal descolada das questões sociais uma vez que a falta de autonomia era em si um
impedimento para qualquer tipo de engajamento. Pode mesmo parecer que a análise
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Mas a década de 1950 significou o divisor de águas para a Igreja Católica no país.
orientação dos fiéis que mais tarde culminou com a criação da CNBB, e por sua vez as
clerical de 1930; agora a Igreja viu-se impelida a mudar o que parecia imutável. Dessa
tenha por preocupação apontar a interação que se estabelece entre a ação social e a
estrutura que facilita tal ação mesmo numa esfera que se caracteriza por seu
ethos religioso. Entretanto a Ação Católica não aconteceu num vácuo, lideradas por
atores com inspiração divina; tampouco houve uma mudança estrutural profunda que
leigos e parte da hierarquia eclesiástica que estavam propondo uma nova leitura do que
era ser cristão, o que inevitavelmente trouxe profundas conseqüências para sua ação
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Uma definição simples e consistente de CEBs pode ser lida em Reginaldo Prandi & André Ricardo de
Souza: “A carismática despolitização da Igreja Católica” in: Antonio Flávio Pierruci & Reginaldo Prandi
(org), A Realidade Social das Religiões no Brasil (São Paulo: Ed. HUCITEC, 1996), pp. 69 ss: As Cebs
se definem em razão de três termos: 1) comunidade: aglomerado de pessoas unidas por laços de
solidariedade, compondo uma identidade geograficamente definida (os membros das CEBs são, antes,
integrantes de uma vizinhança); 2) eclesial : de ecclesia (assembléia , igreja), portanto , congregação de
fiéis que é parte componente da Igreja Católica; 3) de base: apesar de identificadas com as camadas
populares e definidas no discurso teológico como comunhão do povo pobre e oprimido em comunidade,
as CEBs se dizem de base de um ponto de sociológico, por apresentarem as características de assembléia
estável de fiéis, que formariam assim a Igreja local.
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Pensando numa linha de interação entre agência e estrutura a Ação Católica é um
exemplo fundamental dos novos espaços alcançados pelos atores sociais no final da
sua complexidade.
propunham uma nova concepção teológica para a prática religiosa católica foram
No Brasil, a ACB foi criada já em 1920. A JUC, em 1930 como partes da ACB.
Seu fim era cristianizar a elite. No final da década de 1940, era, porém, mais autônoma
1947, a ACB se organizou segundo as profissões, de acordo, então, com classes sociais
e, assim, voltou-se para questões de classe. No final dos anos 1950, experimentou certa
radicalização que a levou, mais tarde, à ruptura com a hierarquia. Em 1959 assumiu a
ação política como parte de seu compromisso evangélico. Em 1960, sai o documento
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Algumas Diretrizes de um ideal histórico cristão para o povo brasileiro9 onde se critica
Após o declínio da JUC em 1961 a Ação Popular deu continuidade aos trabalhos
3.000 membros, dos quais alguns eram líderes na educação popular, no trabalho
católicos. Algumas noções da Ação Popular, como seu humanismo, sua ênfase na
Depois do golpe, o movimento foi feito clandestino e passou por uma radicalização
1973, passou a fazer parte do PC do B, abandonou com o tempo, suas origens cristãs,
ainda que não se trate do fenômeno em seu nível sistêmico, e sim apenas da
mentalidade católica uma idéia uma forma específica de representar o mundo e a vida,
“Sob esses aspectos, a Ação Popular antecipou a ideologia dos intelectuais da Igreja popular
das décadas de 70 e 80. Não havia uma relação caudal direta entre a AP e a Igreja Popular, mas
a AP realmente estabeleceu uma tradição de humanismo radical dentro do catolicismo
brasileiro que continuou depois de o próprio movimento ter abandonado suas origens católicas”
(MAINWARING, 1989: 87)
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Ver L. Gonzaga de Lima, op. cit., PP. 84-97
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Vimos até então que a relação da Igreja com os movimentos sociais no Brasil, no
instituição viveu momentos distintos em seu trato com as questões sociais, no entanto
transformou, e com isso a forma de interação entre ambos nos oferece elementos
num primeiro momento buscarmos as origens dessa preocupação por parte do clero
causas sociais com ênfase na atuação dos pentecostais que cada vez mais despontam
como sujeitos atuantes em movimentos sociais, como por exemplo, entre os operários
BIBLIOGRAFIA UTILIZADA
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AZZI, R. O Catolicismo Popular no Brasil - Aspectos Históricos. Petrópolis:
Vozes,1978.
FRAZÃO, Maria Gorete e Sousa, Ney. In. Catolicismo no ABC Paulista. Da doutrina
social ao movimento popular. (Revista Eletrônica)
PETRINI, Giancarlo. CEBs: um novo sujeito popular. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
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SANCHES, Pierre. Catolicismo: cotidiano e movimentos. São Paulo: Loyola. (Coleção
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