Moda e Literatura Uma Relação Semiótica
Moda e Literatura Uma Relação Semiótica
Moda e Literatura Uma Relação Semiótica
doi.org/ 10.51891/rease.v7i11.3108
ABSTRACT: With the advances in the media and the consolidation of new
technologies, Fashion created new forms of innovative manifestations that
determined and affirmed its importance as a cultural and economic segment.
Following the theoretical and methodological apparatus of Greimasian semiotics and
important authors who follow this line, our work seeks to understand how the process
of signification is carried out from the images that make up the editorial analyzed
here. To achieve this goal, the images constructed in the editorial Romeu e Julieta
(2008), by Vogue USA, will be analyzed, in the photos produced by Annie Leibovitz.
Thus, our analysis is based on studies related to enunciation, supported by what is
called, in semiotics, the generative path of meaning.
INTRODUÇÃO
1Doutorando em Linguística pela UFPE. Bolsista CAPES. Mestre em Linguística pela UFPE. Graduado
em Letras Português/Inglês e suas respectivas literaturas pela UAG/UFRPE.
2 A VOGUE, foi lançada no dia 17 de dezembro de 1892 na cidade de Nova York um editor aristocrata
chamado Arthur Baldwin Turnure e Harry McVickar, como um pequeno folhetim de moda, com
aproximadamente 30 páginas, destinado às mulheres da alta sociedade de Nova York no final do século
19, sendo hoje o título mais prestigiado entre as revistas de moda em todo o mundo.
3 Fotógrafa americana responsável por várias campanhas publicitárias de Vogue USA.
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A imagem acima faz parte do ensaio de Romeu e Julieta4 para a Vogue USA de
2008, produzido por Annie Leibovitz. Nela, podemos perceber a intertextualidade com
4A edição de dezembro da Vogue traz, tradicionalmente, um editorial especial, quase sempre com temas
fantasiosos e escapistas. Coco Rocha encarna a heroína de William Shakespeare e o bailarino Roberto
obra literária, pois a imagem da “cena balcão” descrita na obra de Shakespeare aqui é
construída com uma sensualidade não apresentada no texto de base (ou original), além
de ser destacado o apelo à nudez parcial de Romeu, que representa, aqui, tanto um
objeto de valor à Julieta – do ponto de vista da narrativa interna –, quanto o corpo
idealizado e querido por muitos homens (sem gorduras, com a massa corpórea bem
distribuída e estruturada), do ponto de vista do enunciatário do editorial.
A sensualidade como conceito ou tema foi recuperada na análise da imagem
pelas figuras nela presentes. Do mesmo modo, no texto shakespereano, traços de
sensualidade também aparecem, mas de acordo com os padrões sociais da época em
que o texto fora escrito, a exemplo do fragmento abaixo.
Romeu: Está falando. Oh! Fala ainda, anjo luminoso! Porque esta noite
apareces tão resplandecente sobre a minha cabeça como um alado
mensageiro do céu, diante dos olhos enlevados e maravilhados dos
mortais que se inclinam para trás para contemplá-lo, quando ele galga as
nuvens preguiçosas e navega no seio do mar.
O modo como os adjetivos são usados na construção do texto quando o
personagem Romeu está diante de seu objeto de valor (Julieta), ressaltam a
sensualidade presente no texto escrito através de suas construções e articulações 825
figuras e temas.
Sabemos que desde o seu nascimento, o ser humano é moldado para pertencer
a determinados grupos. A nudez, seu estado natural, é ocultada pela cultura, a exemplo
do que mostram os trabalhos do fotógrafo Spencer Tunick5 ou do fato de que a exibição
de certas regiões do corpo não é permitida por determinados grupos e é aceitável para
outros (burca, trajes indígenas, etc.). O ser humano busca mais do que reinventar a
moda, procura reinventar o próprio corpo, dotando-o de significados e o exibindo de
diferentes formas, ocultando ou revelando partes e ampliando, portanto, sua
capacidade de significação.
A pele é o maior órgão do ser humano e é responsável pelo revestimento da
estrutura morfológica humana, em seu estado natural. A roupa, por sua vez, funciona
como uma segunda pele, atendendo às necessidades humanas de formas diversas. A
Bolle é Romeu. É para suspirar e sonhar, ainda mais quando Julieta veste McQueen, Vera Wang, Nina
Ricci, Christian Lacroix.
5 É um fotógrafo dos Estados Unidos da América, conhecido pelas suas fotografias de grandes
Eixo Paradigmático
Esquema usado para representação das articulações propostas por Saussure e discutidas e aplicadas a
outros estudos por Barthes.
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Romeu e Julieta (VOGUE USA). Por Annie Leibovitz
A imagem acima representa o baile no salão da casa dos Capuletos, onde Romeu
fica frente a frente com uma mulher bela, que ele pensa não a conhecer. Como pode
ser recuperada nos fragmentos shakespearenos abaixo:
“Romeu- (a um servidor.) Quem é aquela dama que enriquece a mão daquele cavalheiro? (...) ela deve
ensinar às tochas como devem brilhar esplendidamente (...) até esta noite jamais conheci a verdadeira
beleza.”
Este trecho remete a curiosidade sentida por Romeu, ou seja, a identidade dele é
exaltada. Mas no trecho seguinte acontece o inverso, pois ele descobre que se
apaixonou pela filha da família rival a sua. Como no fragmento “Romeu-(a Julieta). É
uma Capuleto? Que cara conta! Sou devedor de minha vida a meu inimigo”.
Ou seja, a alteridade é eufórica, pois as normas sociais prevalecem durante toda
a trama do texto base e consequentemente também acontece nas imagens do editorial.
Isto significa que o ser criado pela identidade, para ambos os personagens, é negativo,
pois eles não podem viver a paixão do amor, tendo em vista que a alteridade, isto é a
voz do “outro” (a família e a sociedade, por exemplo) modaliza seus modos de vida
tanto é que desenvolveram um romance secreto ( não parecem amantes, mas são),
sendo reconhecido o estado de verdade apenas por poucos personagens durante a
narrativa.
Após a produção dos contraditórios (pela negação), coloca-se um dos dois
contraditórios em oposição ao contrário a partir do qual ele foi projetado a fim de que
apareça, então, o outro contrário como pressuposto não recíproco. Essas relações, por
sua vez, são chamadas de complementaridade e a operação que as constitui se apresenta
como uma implicação. Em seguida eis a forma que toma o quadrado semiótico, a partir
das relações acima descritas:
Quadrado Semiótico
Identidade Alteridade
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Como se disse a /identidade/ é disfórica e a /alteridade/ é eufórica. Ao
sobremodalizarmos tais termos, com os universais /natureza/ e /cultura/,
respectivamente ressalta-se o sentido disfórico da /identidade/, relacionada a coerções
sociais que proíbem a vivência de paixões positivas ao sujeito, mas, no discurso em
questão, ela é sobreposta pelo termo /cultura/, cuja assunção inseriria os sujeitos em
situações “positivas”. Isto significa que o sujeito deve, segundo o discurso dos textos
analisado, ser guiado (ser e fazer) pelas coerções sociais impostas pela cultura.
Na imagem acima a ama sempre acompanha Julieta, que pela intriga de família
a sociedade não permite a relações dos dois. Ao lado, o Frei Lourenço permite o
encontro às escondidas, mas pede a deus que o perdoe por tal ato. Veja o trecho abaixo:
“Frei Lourenço: (olhando para o alto). Oh! Pecado mortal! Oh! Negra
ingratidão.
A ideia que aqui se desenvolve é a de um esquema narrativo canônico, que se
trata justamente da instauração de um sujeito para um determinado fazer e, depois,
esse sujeito será sancionado. Esse percurso se inicia com a manipulação e com a fase
da competência, que, na sequência, possibilitam ao sujeito realizar a performance que 831
dele é esperada. Por fim, ele é sancionado.
Romeu e Julieta (Vogue USA). Por Annie Leibovitz
Frei Lourenço: (a Julieta). Volta para casa, a noite quando estiveres sozinha, toma
esse frasco e bebe até a última gota deste licor destilado. Imediatamente correrá por
tuas veias um humor frio e letárgico porque nenhuma pulsação continuara seu curso,
tudo parará. (...) as janelas dos teu olhos se fecharão, como quando as fecha a morte à
luz da vida.
Ama: (para a senhora Capuleto). Que dia lamentável. (...) olhai, olhai, oh! Que dia
de azaigo.
Senhora Capuleto: (em direção à filha). Ai de mim! Minha filha, minha própria vida!
Revive, abre os olhos ou morrerei contigo.
Como Romeu não sabe desse plano, ele fica sabendo que ela está morta vai até
o cemitério com um frasco de veneno, e, ao ver sua amada morta decide tomá-lo:
Romeu: (bebendo o veneno). Portas da vida, com um legitimo beijo selai o pacto
infinito com a morte. (...) por minha amada.
Quando o Frei Lourenço chega até o cemitério e descobre que Romeu não
recebeu a carta que revela o segredo, porém já tarde demais Romeu está morto ao lado
da cova de Julieta. Que desperta e pergunta ao Frei onde está Romeu, este por sua vez
se cala, então ela olha para o lado e vê seu amado morto, veja abaixo:
Julieta: (em direção de Romeu). Uma taça apertada nas mãos de meu fiel amor?
Veneno, estou vendo, foi à causa de seu prematuro fim. Beijarei s teus lábios!...
Talvez haja neles veneno para fazer-me morrer como algo reconfortante.(arrebata
a adaga de Romeu). Está é a tua bainha( apunhala-se) Enferruja-te e deixa-me
falecer.
Em síntese, o recorte da micronarrativa aqui considerada fundamenta-se na
articulação das quatro fases do esquema narrativo canônico:
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CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, Diana Luz Pessoa de. Teoria do discurso: fundamentos semióticos. 3ª.
Ed. São Paulo: Humanitas, 2002.
FIORIN, José Luiz. Linguagem e Ideologia. 3a ed. São Paulo: Ática, 1993.
______________. Elementos de Análise do Discurso. 4 a. Ed. São Paulo:
Contexto, 1994.
GREIMAS, Algirdas Julien. Sobre o sentido: ensaios semióticos. Trad. Ana Cristina
Cruz César et alii. Petrópolis, Vozes, 1975
_____________________. & Joseph COURTÉS, J. Dicionário de Semiótica. São Paulo:
Cultrix, 1979.