Antropologia Brasileira Uniasselvi
Antropologia Brasileira Uniasselvi
Antropologia Brasileira Uniasselvi
Brasileira
Indaial – 2022
1a Edição
Elaboração:
Prof.ª Thamirez Lutaif Lopes
173p.
ISBN 978-85-515-0621-9
ISBN Digital 978-85-515-0617-2
“Graduação - EaD”.
1. Antropologia 2. Brasil 3. Etnia
CDD 306
Bibliotecário: João Vivaldo de Souza CRB- 9-1679
Impresso por:
APRESENTAÇÃO
Olá, acadêmico! Bem-vindo ao livro da disciplina de Antropologia Brasileira.
Essa disciplina tem por objetivo introduzir esse campo de conhecimento no contexto do
Brasil. Vamos abordar diversos importantes para aqueles que querem entender desde
os debates tradicionais até os debates atuais da antropologia brasileira.
Bons estudos!
Prof.ª Thamirez Lutaif
GIO
Olá, eu sou a Gio!
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dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!
LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
disciplina e com ela um novo conhecimento.
REFERÊNCIAS....................................................................................................................... 61
REFERÊNCIAS......................................................................................................................117
REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 172
UNIDADE 1 -
PANORAMA INICIAL DA
ANTROPOLOGIA BRASILEIRA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
1
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!
Acesse o
QR Code abaixo:
2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 -
O DESENVOLVIMENTO DO CAMPO
DA ANTROPOLOGIA NO BRASIL
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 1, abordaremos a definição de antropologia, como se deu o
desenvolvimento no Brasil e um panorama histórico da antropologia brasileira. Antes
de avançarmos nossos estudos, é importante que você entenda o conceito geral de
antropologia e qual é a diferença entre essa disciplina e as outras ciências sociais e
humanas. Do mesmo modo, é importante que entenda qual é o objeto de estudo da
antropologia e o que fazem antropólogos do mundo.
2 O QUE É A ANTROPOLOGIA?
Afinal, o que é a antropologia? Você já pode ter ouvido falar sobre esta disciplina,
mas vamos aprofundar o seu conceito ao longo da nossa disciplina, refletindo juntos
sobre o seu desenvolvimento no nosso país. A palavra “antropologia” possui uma origem
grega, sendo que anthropos significa homem e logos, estudo. Assim, podemos assumir
que a antropologia versa sobre o estudo do homem, ou, melhor ainda, sobre o estudo
dos seres humanos.
IMPORTANTE
Nos livros de ciências humanas é comum que a palavra “homem” seja utilizada
como um sinônimo de seres humanos. Contudo, é importante lembrar que o
termo “seres humanos” é mais adequado porque não exclui as mulheres.
3
Outras disciplinas, como a filosofia e a biologia, também versam sobre o estudo
dos seres humanos. Mas o que a antropologia tem de diferente em relação às outras
disciplinas? Podemos dizer que a antropologia foi baseada no estudo comparativo entre
diversas sociedades das mais variadas regiões do mundo. Enquanto disciplinas como
a biologia e a filosofia estavam baseadas principalmente nas sociedades consideradas
“civilizadas”, a antropologia se voltou para as sociedades consideradas “primitivas”
(LAPLANTINE, 1987).
IMPORTANTE
Vale lembrar que os termos “civilizado” e “primitivo” devem ser usados com
cuidado, pois se corre o risco de soar etnocêntrico. Em outras palavras,
dizer que uma sociedade é civilizada e outra primitiva pode dar a entender
que tal sociedade civilizada é melhor que a sociedade primitiva, o que é um
grande erro. Um dos maiores desafios dos antropólogos é fazer com que as
sociedades mais afastadas tenham sua importância reconhecida, validando
suas próprias culturas e modos de viver.
NOTA
O termo “etnocêntrico” é muito usado no campo da antropologia e deriva da
palavra “etnocentrismo”. O etnocentrismo está relacionado ao pensamento
de quem entende que a sua etnia é mais importante que as outras,
lembrando que devemos tomar cuidado para não pensar dessa maneira,
pois cada grupo tem a sua importância.
4
FIGURA 1 – INDÍGENA BRASILEIRO DA ETNIA KAYAPÓ
IMPORTANTE
Hoje em dia, não podemos mais dizer que os objetos de estudo da
antropologia são as sociedades não ocidentais por parte dos antropólogos
de sociedades ocidentais. Existem novas áreas na antropologia, como
a antropologia urbana, que possui como objeto de estudo as relações
sociais da cidade. Por isso, podemos dizer que o trabalho do antropólogo
está mais no modo de analisar as sociedades a partir de teorias
antropológicas que no movimento do ocidental para o não ocidental.
Aqui vale nos atentarmos para uma questão importante sobre a ideia de tecnologia.
Podemos pensar que tecnologia tem a ver somente com equipamentos da cidade
como grandes máquinas e produtos que dependem de eletricidade, mas esse
pensamento é equivocado. Antes de qualquer coisa, a tecnologia diz respeito a um
conjunto de métodos e técnicas que também fazem parte daquelas sociedades
não ocidentais. Por exemplo, o uso de ferramentas, como o arco e flecha, para
caçar animais, por parte de sociedades indígenas, é uma grande tecnologia.
5
A arqueologia está baseada no estudo do ser humano considerando a pré-
história, ou seja, aquele período anterior à invenção da escrita. A partir de vestígios
materiais, como fósseis, a arqueologia busca presumir qual eram os modos de
organização social de sociedades humanas que não mais existem (LAPLANTINE, 1987).
FIGURA 2 – ARQUEOLOGIA
A antropologia linguística, por sua vez, tem a ver com o estudo das sociedades
humanas a partir da linguagem, tanto oral como escrita. Devemos ter em mente que a
linguagem não diz respeito somente a palavras faladas, mas também a outras formas
de comunicação não verbal, como o conjunto de gestos presente em performances e
danças (LAPLANTINE, 1987).
Por fim, a antropologia social e cultural pode ser considerada a área mais
abrangente da antropologia. Ela estuda os diversos segmentos das sociedades humanas,
considerando elementos como o casamento, organização social, o parentesco, a família,
a divisão social do trabalho, a educação, a religião, entre outros.
6
INTERESSANTE
Hoje em dia, não podemos mais dizer que os objetos de estudo da antropologia
são apenas as sociedades humanas. Como herança da antropologia biológica,
surgiu a chamada antropologia multiespécie, que vem sendo muito discutida
nos cursos de pós-graduação em antropologia. O objeto da antropologia
multiespécie é a análise das relações entre seres humanos e não humanos
ou mesmo das relações entre os não humanos entre si a partir de teorias
antropológicas.
Vamos entender isso melhor? Por exemplo, quem vive nas cidades, está
acostumado a dormir na cama, acordar, acender as luzes da casa, tomar água do filtro
ou da torneira da cozinha, tomar banho com a água quente que vem do chuveiro, fazer
comida no fogão e colocar roupas e sapatos para sair de casa. Fazem isso todos os dias,
o que os faz pensar que é algo natural.
7
Agora, vamos supor que você decide fazer uma pesquisa de campo em
antropologia e vai a uma sociedade indígena afastada da cidade e experimenta viver
como aquelas pessoas. Você chega na aldeia, que não possui luz elétrica, dorme na
rede, precisa buscar água no rio para beber, toma banho na água gelada do rio, busca
lenha para fazer comida na fogueira, não precisa colocar tantas roupas ou mesmo
sapatos. Isso causaria uma sensação de estranhamento, certo?
NOTA
Para não gerar dúvidas, podemos entender que a principal diferença entre a
antropologia e a sociologia é que a antropologia busca entender as relações
humanas a partir de elementos culturais em nível micro e a sociologia, a partir
de instituições sociais a nível macro.
8
De um lado, havia a sociedade envolvente que era regida pela legislação brasileira
e suas grandes instituições e, de outro, havia uma série de sociedades espalhadas pelo
país que eram regidas por seus próprios elementos culturais. O principal conflito se ateve
ao fato de que a sociedade nacional estava carregada pelo processo de expansionismo
e integração, enquanto as outras sociedades tidas como tradicionais tentavam manter
seus próprios modos de viver desvinculados do desenvolvimento capitalista (PEIRANO,
2000).
INTERESSANTE
Depois, a própria Constituição Federal de 1988, em seu artigo 231, reconheceu
aos indígenas suas próprias organizações sociais, costumes, línguas nativas
e tradições, o que foi uma grande conquista para o movimento a favor do
reconhecimento dos direitos das populações tradicionais.
DICA
Se tiver curiosidade a respeito dos conflitos que nasceram da tentativa de
homogeneizar as diversas etnias indígenas do Brasil e o resto da sociedade
envolvente em um único Estado soberano que representasse a todos, leia o
artigo Nações dentro da nação: um desencontro de ideologias, da antropóloga
Alcida Rita Ramos da Universidade de Brasília.
Em suma, existe uma relação direta entre a antropologia como ciência social
no Brasil e a própria construção da nação brasileira, fazendo o casamento da unidade
e da diversidade. Enquanto a antropologia ao redor do mundo estava preocupada em
estudar os “outros” de regiões mais afastadas, a antropologia brasileira passou a se
preocupar com as relações entre as diversas etnias e a sociedade envolvente que ora
compunham a população brasileira (VELHO, 2008).
9
Um dos maiores desafios dos antropólogos brasileiros foi, e ainda é, trabalhar
com as pessoas dessas etnias, não como se fossem simples informantes para os
escritos de antropologia, mas verdadeiros interlocutores e aliados políticos. Por isso,
antropólogos brasileiros possuem o dever ético de lutar pelos direitos dessas etnias em
conjunto com elas, e não as tratar como se fizessem parte apenas daqueles “outros”
distantes (VELHO, 2008).
DICA
Sugerimos que assistam aos filmes Ex-Pajé e A última floresta, dirigidos por
Luiz Bolognesi, que foram premiados internacionalmente e podem ser
considerados novos clássicos dos filmes da antropologia brasileira. Esses
filmes são importantes, sobretudo, porque os roteiros foram escritos em
conjunto com os próprios indígenas das etnias Suruí Paiter e Yanomami,
respectivamente.
NOTA
Vale lembrar que o termo “favelados” não deve ser usado de maneira
pejorativa ou preconceituosa, mas diz respeito a uma pessoa que vive em
uma favela – um conjunto de habitação popular urbana que normalmente
é construída em torno de morros.
10
Já a Antropologia da Sociedade Nacional tinha outras áreas de pesquisa, como
“a Sociedade Agrária e Campesinato, a Antropologia Urbana, as Minorias Sociais e
Étnicas, a Família, os Movimentos Sociais, as Religiões Populares e a Cultura Nacional”
(CARDOSO DE OLIVEIRA, 1998). Logo, a preocupação da Antropologia da Sociedade
Nacional estava mais baseada na questão da estrutura e da organização da sociedade
e por isso estava um pouco mais próxima da sociologia.
DICA
Se quiser saber mais sobre essa etnia, sugerimos que leiam o livro “A
queda do céu: palavras de um xamã Yanomami”, escrito pelo Yanomami
Davi Kopenawa e pelo antropólogo francês Bruce. Esse livro é um clássico
importante da antropologia produzida no Brasil, que ficou muito famoso
ao redor do mundo. Como comentamos, era comum que antropólogos
europeus buscassem sociedades mais afastadas em outras regiões
do mundo para se pesquisar e por isso Bruce Albert veio ao Brasil. Ele
passou anos de sua vida morando junto com os Yanomami em Roraima,
produzindo escritos etnográficos e lutando pelos direitos desse povo. Isso
nos mostra como é interessante que o antropólogo construa uma relação
duradoura com seus interlocutores.
11
FIGURA 4 – CASA COLETIVA YANOMAMI
IMPORTANTE
Hoje em dia, não podemos mais dizer que são somente os antropólogos
brancos vindos da sociedade envolvente que estudam as sociedades
mais afastadas do Brasil. Já existem muitos antropólogos de sociedades
tradicionais, como quilombolas e indígenas, que pensam suas próprias
culturas e mesmo a cultura dos brancos a partir de noções da antropologia.
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NOTA
O termo sociedade diz respeito à sociedade nacional brasileira em seu
sentido amplo em contraposição às sociedades tradicionais, como as
indígenas e quilombolas.
De acordo com o autor, o primeiro período foi datado entre os anos de 1835 e 1933.
O ano de 1835 foi importante, pois marcou a descoberta de um material arqueológico na
Lagoa Santa em Minas Gerais, por Peter Lund. Já o ano de 1933 marcou o fim do período,
considerando que a fundação da Universidade de São Paulo (USP) aconteceu em 1934.
A tabela, a seguir, nos traz alguns dos principais antropólogos da época e seus focos de
estudos (SALZANO, 2009).
TABELA 1 – OS PIONEIROS
13
TABELA 2 – PERÍODO FORMATIVO
Por fim, o terceiro período começou em 1955 de se estendeu até os dias atuais,
tendo em vista a criação da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) naquele ano. A
tabela, a seguir, revela duas fases da ABA, sendo que a primeira era conhecida por ser
uma instituição mais elitista, com dificuldades para o ingresso, e a segunda, por ser uma
instituição que os estudantes de graduação e pós-graduação poderiam participar com
mais facilidade.
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FONTE: <https://bit.ly/3zQVVq5>. Acesso em: 16 jan. 2022.
15
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:
• A antropologia tem a ver com o estudo dos seres humanos a partir da comparação
entre várias sociedades de diferentes regiões do mundo.
• A diversidade étnica do Brasil gerou uma série de conflitos, os quais tentaram ser
compreendidos pelas antropólogas e antropólogos brasileiros.
16
AUTOATIVIDADE
1 Enquanto estudiosos de outras disciplinas, como a Biologia e a Filosofia, estavam
voltados para o estudo das sociedades que consideravam civilizadas, os estudiosos
da antropologia estavam voltados para as sociedades que consideravam primitivas.
Sobre as noções de “civilizado” e “primitivo”, que são fundamentais para o saber
antropológico, assinale a alternativa CORRETA:
2 A antropologia é a disciplina que tem como objeto principal o estudo dos seres hu-
manos, considerando diversidades culturais, geográficas e históricas. Existem diver-
sas áreas de estudos especializados dentro do campo da antropologia: antropologia
biológica, arqueologia, antropologia linguística, antropologia psicológica, antropolo-
gia social e antropologia cultural. Sobre essas áreas, analise as sentenças a seguir:
17
Assinale a alternativa CORRETA:
3 A história da antropologia brasileira pode ser dividida em três grandes fases: a fase
dos pioneiros, a fase do período formativo e a fase contemporânea. Sobre essas
fases, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas.
a) ( ) V – F – F – V – F – F.
b) ( ) V – V – F – F – V – V.
c) ( ) F – V – V – F – F – V.
d) ( ) F – F – V – V – V – F.
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UNIDADE 1 TÓPICO 2 -
OBRAS E AUTORES CLÁSSICOS
NA ANTROPOLOGIA BRASILEIRA
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 2, abordaremos as principais obras e autores clássicos da antropologia
brasileira. Partiremos de um dos mais importantes campos da antropologia que é a
Etnologia Indígena. Os estudos voltados para os povos indígenas, suas culturas e seu
modo de viver é um ponto fundamental da antropologia mundial e, em particular, da
antropologia brasileira. Assim, conheceremos alguns dos pesquisadores que realizaram
importantes trabalhos entre as mais de 300 etnias presentes no Brasil.
19
apoio aos índios – hoje em número de, pelo menos dezesseis em
todo o Brasil – e com a mobilização dos próprios indígenas e ainda
com o interesse pelo estudo de grupos indígenas por parte de
pesquisadores ligados a disciplinas não antropológicas (MELATTI,
2018, p. 254).
NOTA
Existem mais de 300 etnias indígenas no Brasil! Caso tenha interesse e
deseje se aprofundar nos estudos de alguma etnia indígena em particular,
sugerimos que use os quadros a seguir para tomar como base os autores
que também estudaram essa etnia para que assim comece suas pesquisas.
Em qualquer pesquisa, é importante recorrermos às primeiras pessoas que
estudaram aquela etnia, ou seja, aos clássicos!
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QUADRO 1 – CLÁSSICOS DOS ESTUDOS EM ORGANIZAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA
Etnias indígenas
Pesquisadores
pesquisadas
Apinayé Roberto da Matta
Asuriní Roque de Barros Laraia
Awetí George de Cerqueira Leite Zarur
Jon Christopher Crocker; Zarco Levak; Renate Brigitte Viertler;
Borôro
César Albisetti; Angelo Jaime Venturelli
Cinta Larga Carmen Junqueira; Betty Lafer
Juruna Adélia Engracia de Oliveira
Kaapór Roque Laraia
Kalapalo Ellen Basso
Kamayurá Carmen Junqueira, Roque Laraia
Terence Sheldon Turner; Donald Hunderfund; Simone Dreyfus,
Kayapó
Gustaaf Verswijver
Krahô Julio Cezar Melatti; Manuela Carneiro da Cunha; Gilberto Azanha
Kreen Akarôre Etephan Schwartzman
Krinkatí Jean Elisabeth Carter Lave
Makú Peter Silverwood-Cope; Howard Reid
Marúbo Julio Ceezar Melatti; Delvair Montagner Melatti
Meináku Thomas Gregor
Munduruku Robert Murphy; Steve Brian Burkalter
Múra Pirahân Adélia Engrácia de Oliveira
Pakaá Nóva Alan Wilfrid Mason
Parintintín Waud Kracke
Suruí Carmen Junqueira; Roque Laraia
Suyá Anthony Seeger
Tenetehara Laís Cardia
Txikâo Patrick Menget
Waiwái Niels Fock
Wayâna Jean Lapointe
David Maybury-Lewis; Maria Aracy Lopes da Silva Ribeiro;
Xavante
Bartolomeu Giaccaria; Adalberto Heide; Helena Fanny Ricardo
Xikrin Luz Boelitz Vidal
Xokleng Gregory Urban
Hans Becher; Alcida Ramos; Judit Shapiro; Bruce Albert; Ettore
Yanomami
Biocca
Yawalapití Eduardo Viveiros de Castro
FONTE: Adaptado de Melatti (2018)
21
Os principais pesquisadores na temática de mitologia e ritual, por sua vez,
partiam dos estudos gerais sobre organização política e ritual, com a ressalva de que
faziam a pesquisa de campo buscando, sobretudo, colecionar os mitos e histórias
daqueles povos. De acordo com Melatti (2018, p. 259):
O início dos estudos sobre os mitos no contexto brasileiro foi marcado pelo
trabalho do antropólogo brasileiro Egon Schaden, que realizou um trabalho sobre a
mitologia entre algumas indígenas no Brasil em 1945. Em seguida, trabalhos marcantes
foram os do antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro entre os Kadiweu, em 1950, e do
antropólogo francês Claude Lévi-Strauss entre diversas etnias, a partir de 1964.
Em seguida, inúmeras outras pesquisas entre as etnias indígenas brasileiras foram
desenvolvidas, como podemos conferir no quadro a seguir.
Etnias indígenas
Pesquisadores
pesquisadas
Asuriní Anton Lukesck; Carlos Kukesch
César Albisetti; Angelo Jaime Venturelli; Renate Vietler;
Borôro
Neusa Maria Bloemer
Desâna Umusin Panlon Kumu; Tolaman Kenhiri
Diversas etnias Claude Lévi-Strauss
Erikpátsa Adalberto Holanda Pereira
Irântxe Adalberto Holanda Pereira
Kadiwéu Darcy Ribeiro
Pedro Agostinho da Silva; Roque de Barros Laraia; Orlando
Kamayurá
Villas Boas; Cláudi Villas Boas; Etienne Samain
Karajá Odilon de Sousa Filho
Kayabí Miguel Pedro Alves Cardoso
Kayapó Turner; Lukesch
Kayapó Lux Boelitz Vidal; Gustaaf Verswijver
Krahô Manuela Carneiro da Cunha; Julio Cezar Melatti
Makú Peter Silverwood-Cope
Marúbio Delvair Montagner Melatti
Mundurukú Yolanda Murphy; Robert Murphy
Nambiquaras Adalberto Holanda Pereira
22
Timbíra Roberto da Matta; Julio Cezar Melatti
Trumaí Aurore Monod-Becquelin
Xavante Bartolomeu Giaccaria; Maria Aracy da Silva Ribeiro
Yanomami Bruce Albert
FONTE: Adaptado de Melatti (2018)
23
Parrel Addison Posey; Eric Cravero; Joan
Kayapó
Bamarger Turner
Mawé Anthony Hennman
Nambiquaras Eloene Setz
Paresí Eloene Setz
Suruí Carlos Coimbra; Everaldo Alvarez
Uaupés Janet Chernela
Yanomami Kenneth Taylor
FONTE: Adaptado de Melatti (2018)
24
Cinta Larga Paulo Barbosa Magalhães
Etnias do Centro-Oeste George Zarur
Guajajara Dolores Newton
Kadiwéu Sandra Wellington
Kamayurá Rafael Batos
Ana Biró Stern; Martha Teresita Manarini;
Maria Heloisa Fenelon Costa; João Pacheco
Karajá
de Oliveira Filho; Edna de Melo; Günther
Hartmann;
Karitiana Paulo Barbosa Magalhães
Kayabí Elisabeth Lins
Maxakalí Neli Ferreira Nascimento
Nambiquaras Thomas Avery; Kristen Avery; Desidério Aytai
Pakaá Nóva Paulo Barbosa Magalhães; Omar Landi Santos
Rio Negro Ana Biró Stern; Martha Teresita Manarini
Suruí Paulo Barbosa Magalhães
Suyá Anthony Seeger
Timbira Dolores Newton
Tiriyó Protásio Frikel
Maria Heloisa Fenelon Costa; João Pacheco de
Tukuna
Oliveira Filho
Wayâna Lucia Hussak van Velthem; Daniel Schoepf
Xavante Regina Müller; Virgínia Valadão; Desidério Aytai
Xikrín Irmeli Marjata Suvíola
Ana Biró Stern; Martha Teresita Manarini; Maria
Xingu Helena Heloisa Fenelon Costa; João Pacheco
de Oliveira Filho; Cristina Sá; Berta Ribeiro
Yawalapití Sandra Wellington
FONTE: Adaptado de Melatti (2018)
No caso dos clássicos dos estudos voltados para o contato interétnico entre os
povos indígenas e o restante da sociedade brasileira, é interessante notar que a maioria
dos pesquisadores foram os próprios brasileiros e não tanto os estrangeiros como
nas outras áreas de estudo. Esses pesquisadores se voltaram tanto para as políticas
indigenistas como para a atuação dos missionários no país.
25
dos Sessenta, que se forma um grupo em torno do proieto “Estudo
de Áreas de Fricção Interétnica no Brasil”, de Roberto Cardoso de
Oliveira, gerando trabalhos sobre os Tukúna (CARDOSO DE OLIVEIRA,
1972), os Suruí, Akuáwa e Gaviões (LARAIA & MATTA, 1978), os Krahó
(MELATTI, 1967 e 1972). Posteriormente, novos alunos do Museu
Nacional se engajaram em pesquisas, de certo modo, ligadas a este
projeto, produzindo trabalhos sobre os Xokleng e demais indígenas
de Santa Catarina (Sílvio Coelho dos SANTOS, 1960 e 1973), sobre os
Kaingâng e Guarani do Paraná (HELM, 1974 e 1977) (MELATTI, 2018,
p. 264).
Etnias indígenas
Pesquisadores
pesquisadas
Akuáwa Roque de Barros Laraia; Roberto da Matta
Aparaí Dominique Gallois
Apinayê José Reginaldo Santos Gonçalves
Apurinan Marcos Lazarin
Diversas etnias Darcy Ribeiro
Erikpátsa Sonia Coqueiro Garcez
Etnias de Minas Gerais Sonia Marcato
Etnias de Rondônia Bernand von Graeve
Etnias de Santa Catarina Sílvio Coelho dos Santos
Etnias do Acre Anthony Gross
Etnias do Nordeste Paulo Marcos Pires de Amorim
Etnias do Rio Negro Ana Gita de Oliveira; Eduardo Galvão
Etnias do Xingu Ellen Fischer; Eduardo Galvão; Nobue Myazaki
Galibí Eneida de Assis
Gaviões Roque de Barros Laraia; Roberto da Matta
Guajajara Mércio Pereira Gomes
Cecília Maria Vieira Helm; Maria Ligia Moura Pires; Peter
Guarani
Silverwood-Cope; Ana Gita de Oliveira
Irântxé Sonia Coqueiro Garcez
Kaapór Virginia Valadão
Cecília Maria Vieira Helm; Maria Ligia Moura Pires; Ligia
Kaingang
Simonian; Peter Silverwood-Cope; Ana Gita de Oliveira
Karajá Nancy Antunes Tsupal
Karipuna Eneida de Assis
Kawahib Miguel Menezes
26
Kaxinawá Terri Valle de Aquino
Kayabí Miguel Cardoso
Krahô Julio Cezar Melatti
Makú Alcida Ramos
Mawé Jorge Romano
Mayongong Alcida Ramos; João Koch
Mundurukú José Sálvio Leopoldi
Nambiquara Paul Leslie Aspelin
Oyampí Dominique Gallois
Paresí Sonia Coqueiro Garcez
Pataxó Maria Rosário de Carvalho
Pukobyê Maria Helena Barata
Suruí Roque de Barros Laraia; Roberto da Matta
Terena Beatriz Buschinelli
Terênia Edgard de Assis Carvalho
Tukano Leonardo Figoli
Tukano Alcida Ramos
Roberto Cardoso de Oliveira; João Pacheco de Oliveira
Tukuna
Filho
Tumucumaque Roberto Maria Cortez de Souza
Tuxuá Nássara Antônio de Souza Nasser
Txukahamâi Vanessa Lea
Waurá Marco Antonio Melo
Wayâna Dominique Gallois
Xavante Tsupal; Clarice da Mota; Guariglia
Xokleng Sílvio Coelho dos Santos
Xokó Karirí Vera Cavalheiros
Yanomami Luizi Ponzo; Alcida Ramos
FONTE: Adaptado de Melatti (2018)
27
3 CLÁSSICOS DOS ESTUDOS SOBRE NEGROS
FONTE: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/62/3%C2%AA_Marcha_das_Mulheres_Ne-
gras_no_Centro_do_Mundo%2C_no_RJ.jpg>. Acesso em: 16 jun. 2022.
IMPORTANTE
Ao contrário do que vimos no tópico anterior sobre os estudos dos
indígenas, os estudos sobre os negros no nosso país não foram tão
carregados de autores brasileiros.
28
Já a partir da década de 1930, considerando a fundação das universidades no
Brasil, esses estudos começaram a tomar mais corpo. Os anos de 1934 e 1937 foram
um marco nesse sentido, quando aconteceram dois Congressos de Estudos Afro-
Brasileiros, sendo o primeiro organizado por Gilberto Freyre, em Recife, e o segundo,
por Arthur Ramos, em Salvador. Isso nos faz perceber a importância dessas outras duas
figuras que, de certa forma, seguiram os passos de Nina Rodrigues (SOUZA, 2013).
DICA
Caso você tenha interesse na trajetória de vida de Arthur Ramos, sugerimos
o curto documentário intitulado Arthur Ramos – vida e obra (2016),
dirigido por Almir Guilhermino. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=Espuvbj4zPQ.
DICA
Sugerimos que assista ao pequeno documentário chamado Casa-Grande e
Senzala (1974), dirigido por Geraldo Sarno, cuja sinopse foi inspirada no livro
de Gilberto Freyre. Recomendamos também uma série de dois episódios
chamada Casa-Grande e Senzala (2000), dirigida por Nelson Pereira dos
Santos e igualmente inspirada no livro de Gilberto Freyre. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=ZGG32QVye-4.
29
O pensamento de Nina Rodrigues, considerando que era um médico legista,
estava voltado para o direito penal e sua implicação nas questões raciais e na formação
da nação brasileira. Naquela época, uma das preocupações da medicina legal era a
relação entre raça e criminalidade. Em outras palavras, os estudiosos dessa área se
perguntavam se existia alguma característica biológica em certas pessoas que poderia
fazer com que elas fossem mais propensas a cometer crimes que outras (SILVA, 2013).
IMPORTANTE
Ainda que o pensamento de Nina Rodrigues fosse avançado para sua época,
o seu pensamento pode ser considerado racista e por isso precisamos
tomar cuidado ao citar esse autor que, ainda assim, não pode passar
desapercebido no que diz respeito às questões raciais no Brasil.
ESTUDOS FUTUROS
As questões raciais e alguns termos muito usados em antropologia, como
raça, racismo, serão abordados na Unidade 2 do nosso curso.
Arthur Ramos, por sua vez, deu continuidade aos estudos de Nina Rodrigues,
mas tomou outro rumo em seus pensamentos sobre os negros brasileiros. Em seus
primeiros escritos sobre o negro brasileiro, Arthur Ramos já passa a criticar a visão de
Nina Rodrigues, dizendo que teria um falso ângulo científico. Portanto, esse autor foi
contra a ideia de inferioridade de algumas raças e dos supostos problemas que seriam
fruto da mestiçagem (LIMA, 2013).
30
Arthur Ramos analisava a cultura dos negros como se fosse primitiva na medida
em que os fenômenos eram explicados não por causas naturais de cunho científico, mas
sim por causas míticas. Os mitos e narrativas da cultura africana traziam explicações
para acontecimentos como nascimento, doença e morte, o que era visto pelo autor
como uma característica de primitividade (LIMA, 2013).
NOTA
Embora para alguns críticos da antropologia o pensamento de Arthur Ramos
seja considerado tão perigoso quanto o de Nina Rodrigues, por questões
relativas ao racismo, em 1949 o autor recebeu o convite para liderar o
Departamento de Ciências Sociais da UNESCO devido ao seu importante
trabalho sobre questões raciais.
NOTA
Conforme os estudos feministas, a teoria do patriarcado diz respeito a
uma organização sociopolítica que coloca os homens em uma situação de
privilégio, ou seja, em uma situação que eles detêm poder sobre as mulheres
e subjugam as mesmas.
31
Podemos dizer que os movimentos feministas no Brasil surgiram de fato a
partir da década de 1970, assim como em outros lugares do mundo. Contudo, esses
movimentos ficaram mais fortalecidos somente a partir das décadas de 1980 e 1990.
A ditadura foi um período de turbulência política no Brasil, trazendo à tona diversos
debates sobre o governo e a forma de organização da sociedade, o que contribuiu para
a emergência dos debates de gênero (SILVA, 2000).
IMPORTANTE
Desde aquela época até os dias atuais, as reivindicações trabalhistas
costumam explicitar as desigualdades de gênero, sobretudo no caso de
salários inferiores para as mulheres com relação aos homens.
32
Ao contrário do que vimos a respeito dos estudos sobre os indígenas e sobre
os negros, os estudos sobre as mulheres no Brasil não possuem tanta linearidade e
são mais dispersos. Logo, é mais difícil sistematizar as obras, as pesquisadoras e os
pesquisadores dessa área, conforme foram feitos nos itens anteriores. Portanto, o que é
mais importante entendermos aqui é o contexto histórico em que esses debates sobre
gênero, mulheres e feminismo surgiram no nosso país.
Para finalizar nossa abordagem sobre os estudos sobre gênero no país, há uma
pesquisadora estrangeira que não pode passar desapercebida, chamada Margareth
Mead. Sua obra intitulada Sexo e temperamento em três sociedades primitivas,
escrita em 1935, é um grande clássico no que diz respeito às pesquisas de gênero em
antropologia no Brasil e no mundo. A autora foi uma pioneira nos estudos de relações
de gênero e muitas das pesquisas atuais recorrem a esse clássico para análises mais
aprofundadas (FELIPPE; OLIVEIRA-MACEDO, 2018).
33
Ao lado de seu marido, que também era antropólogo, Mead realizou uma pesquisa
de campo na Nova Guiné, focalizada em três povos: os Arapesh, os Mundugumor e os
Tchambuli. A pesquisadora teve como principal objetivo analisar as personalidades dos
homens e mulheres desses povos e uma de suas conclusões foi que as inclinações
psicológicas femininas e masculinas são padrões culturais. Em suma, o comportamento
de homens e mulheres não seria natural a cada um, mas sim transmitido de uma geração
a outra. A grande importância desse escrito se dá pela ideia de que a cultura é quem
adapta a forma de ser de cada gênero e, por isso, grande parte dos pesquisadores em
gênero recorrem a esse clássico (FELIPPE; OLIVEIRA-MACEDO, 2018).
O ponto alto do trabalho foi pensar na representação dos corpos das pessoas e
como isso é construído socialmente.
DICA
Se quiser saber mais sobre o trabalho da autora, sugerimos que leia na íntegra
o texto De perto ninguém é normal: estudos sobre corpo, sexualidade, gênero e
desvio na cultura brasileira. Disponível em: https://bit.ly/3JEVUZP.
34
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• Dentre os autores mais conhecidos nos estudos sobre os negros no Brasil, estão:
Raimundo Nina Rodrigues, Arthur Ramos e Gilberto Freyre.
• Antes dos principais autores citados, os estudos sobre os negros não eram
difundidos no Brasil.
• Margareth Mead é uma antropóloga clássica que serve de base para pesquisas de
gênero no Brasil e no mundo.
35
AUTOATIVIDADE
1 Os estudos sobre as mulheres no Brasil começaram a partir da década de 1970.
Esse período foi marcado por diversos acontecimentos políticos, como o governo da
ditadura militar e diversas manifestações por direitos trabalhistas. Considerando o
surgimento do ativismo político feminista na época, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) A luta pelos direitos das mulheres era uma reivindicação tanto de homens como
de mulheres.
b) ( ) O estudo sobre as mulheres estava voltado para debates como patriarcado e
opressão masculina em relação às mulheres.
c) ( ) Desde o início do movimento feminista no país, estava presente a atuação de
ONGs.
d) ( ) Naquela época, tanto homens como mulheres recebiam salários iguais e, por
isso, essa não era uma das reivindicações feministas.
2 Apesar dos primeiros estudos voltados para os povos indígenas terem sido feito
por pesquisadores estrangeiros, os pesquisadores brasileiros também tomaram as
rédeas do assunto. Considerando os pesquisadores da área da etnologia indígena,
analise as sentenças a seguir:
I- Nas décadas de 1970 e 1980, foram feitos mais projetos de pesquisa em Etnologia
Indígena que atualmente.
II- Existem mais de 300 etnias indígenas no Brasil, o que gera interesse de
pesquisadores brasileiros e estrangeiros.
III- Roberto da Matta foi um pesquisador sobre estudos em organização social e política
da etnia Apinayé no Brasil.
IV- A maioria dos pesquisadores sobre contato interétnico foram estrangeiros.
3 Os estudos sobre os negros no Brasil contam com três autores clássicos: Raimundo
Nina Rodrigues, Arthur Ramos e Gilberto Freyre. Sobre a trajetória de vida e o
pensamento desses três autores, classifique V para as sentenças verdadeiras e F
para as falsas:
36
( ) Nina Rodrigues, Arthur Ramos e Gilberto Freyre foram antropólogos e médicos.
( ) Nina Rodrigues pode ser considerado o pioneiro dos estudos sobre os negros no
Brasil.
( ) A década de 1930 foi um marco para os estudos sobre os negros no país,
considerando os congressos organizados por Gilberto Freyre e Arthur Ramos sobre
o assunto.
( ) O livro Casa-Grande e Senzala escrito por Gilberto Freyre teve repercussão
internacional.
a) ( ) V – F – F – F.
b) ( ) V – F – F – V.
c) ( ) F – V – V – V.
d) ( ) F – F – V – F.
4 Uma das áreas mais famosas da antropologia brasileira é a Etnologia Indígena, que
é voltada para o estudo dos povos indígenas. Considerando a grande diversidade
étnica que nosso país abriga, os estudos sobre as populações indígenas podem ser
divididos em algumas temáticas principais. Disserte sobre essas temáticas e traga
pelo menos um autor que estudou esse campo.
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38
UNIDADE 1 TÓPICO 3 -
ENTENDENDO A CULTURA BRASILEIRA
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 3, abordaremos o conceito de cultura brasileira. Esse é um tema
que gera um amplo debate, tendo em vista que, antes da colonização, nosso país era
habitado pelas etnias indígenas. Assim, entenderemos as influências que as outras
nações do mundo tiveram sobre a formação da cultura do nosso país e quais foram
essas nações. Além disso, também pensaremos a respeito da influência dos africanos e
afrodescendentes que foram trazidos ao Brasil na época da escravatura.
ESTUDOS FUTUROS
O conceito de cultura em particular será abordado na próxima unidade dos
nossos estudos, mas podemos adiantar que cultura diz respeito basicamente
a um conjunto de pensamentos, práticas e objetos compartilhados por uma
sociedade.
39
Logo, não existe uma uniformidade ou uma homogeneidade do que chamamos
de cultura brasileira e por isso podemos pensar mais em culturas brasileiras no plural.
De acordo com o pesquisador Fernando de Azevedo (1964), isso se deve a várias
características do nosso país, como sua grande extensão territorial, a diversidade
geográfica, diferença do tempo de incorporação à civilização, aos meios de transporte e
comunicação, entre outros fatores. Nas palavras do autor:
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FIGURA 7 – INDÍGENAS
IMPORTANTE
A história do Brasil e a relação entre indígenas e colonizadores vem sendo
reconstruída nos últimos tempos. Para termos uma visão mais coerente
da história do nosso país e da formação da cultura brasileira, devemos
manter em mente o protagonismo dos povos indígenas, os quais foram
erroneamente todos entendidos “índios”. Ao generalizarmos e chamarmos
todos de “índios”, estamos desconsiderando suas pluralidades étnicas e o
termo mais correto seria “indígena”. Quando os colonizadores chegaram
ao Brasil, pensaram que estavam chegando nas famosas Índias e por isso
chamaram os habitantes do território de “índios”. Contudo, “indígena” se
refere a quem é o nativo da terra, sendo o termo mais correto a ser utilizado.
41
FIGURA 8 – NEGRO ESCRAVIZADO NO BRASIL COLONIAL
IMPORTANTE
Assim como a história do Brasil e a relação entre indígenas e colonizadores
vêm sendo reconstruída nos últimos tempos, o mesmo acontece com a
relação entre os negros e os brancos. Também é importante mantermos
em mente o protagonismo dos povos afrodescendentes para a formação
da cultura brasileira em vários aspectos, como arte, língua, religião, entre
outros.
Como sabemos pela história do nosso país, africanos foram trazidos à força
ao Brasil para servirem de escravos nas colônias. Contudo, resistiram à tentativa de
colonização sobre suas culturas e mantiveram seus hábitos na medida do possível. Nas
palavras da pesquisadora Maria Arlete Santos (2016, p. 219):
42
Muitos dos elementos que representam a cultura brasileira foram herança dos
povos africanos, como o samba, que nasceu de casas de baianas no Rio de Janeiro, no
início do século XX e a capoeira que foi originada a partir de uma luta típica de Angola.
Palavras como macumba, farofa, quindim, canjica, miçanga, marimbondo, dendê,
quiabo, capenga e banguela também são um exemplo da herança desses povos sobre
a nossa língua. Algumas dessas próprias palavras já nos revelam a influência africana
sobre a culinária, que é um dos aspectos da cultura brasileira.
ESTUDOS FUTUROS
Não podemos deixar de mencionar também a influência dos africanos e
afrodescendentes na cultura brasileira em termos religiosos. Esse tema
será aprofundado na próxima unidade dos nossos estudos quando
abordarmos o sincretismo religioso.
43
FIGURA 9 – ARTESANATO POPULAR
No entanto, a cultura popular envolve uma noção de classe que distingue o que
é da elite e o que é do povo. De acordo com o professor Aldo Vanucchi (1999), um curso
sobre cultura popular seria por si só algo de elite, enquanto o povo estaria preocupado
com outras coisas como “a vida, o trabalho, a família, a luta cotidiana de sobrevivência,
o descanso, a festa, a felicidade de viver” (VANUCCHI, 2006, p. 97).
Portanto, é difícil delimitar o que seria de fato essa cultura popular brasileira,
mas de todo modo é uma cultura muito mais voltada para o “fazer” do que para o “saber”.
Ela está manifestada no cotidiano do povo e nos meios que essas pessoas encontram
para sobreviver. Ela tem a ver com as práticas que são ensinadas oralmente pelo povo.
Aqui, por povo podemos compreender aquelas pessoas que foram colocadas à margem
da sociedade capitalista e que não tiveram oportunidade de ascensão econômica.
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IMPORTANTE
Ainda que as práticas da cultura popular não estejam necessariamente
submetidas a um rigor acadêmico ou científico, elas não devem ser
menosprezadas! Por isso a importância de reconhecermos essas práticas
como fazendo parte da cultura popular para que assim sejam legitimadas.
Agora, vamos refletir sobre o folclore, que está diretamente vinculado à cultura
popular. Para o questionamento se folclore é um sinônimo de cultura popular ou há
diferença entre eles, Vanucchi (1999, p. 99-100) nos responde o seguinte:
FIGURA 10 – FOLCLORE
A palavra folclore, por sua vez, deriva do termo folklore, da língua inglesa, no
qual folk está relacionado ao povo e lore, ao saber. Ela foi criada pelo arqueólogo inglês
Willian John Thoms no ano de 1846, ou seja, há muito tempo. De acordo com a cientista
45
social Vivian Catenacci (2001), quando essa palavra foi incorporada à língua portuguesa,
passou a significar os saberes tradicionais dos camponeses que eram transmitidos
oralmente.
DICA
Se tiver interesse em conhecer em detalhes algumas das lendas e mitos
do folclore brasileiro, sugerimos o livro Lendas e mitos do Brasil, escrito por
Theobaldo de Miranda.
Vamos ver algumas das lendas mais famosas do folclore brasileiro na tabela a
seguir:
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É uma linda mulher conhecida por ser a sereia dos rios. Seu
Iara canto comovente é usado para enfeitiçar os homens e levá-
los para o fundo do rio.
A transformação do lobisomem acontece em noites de lua
Lobisomem
cheia, quando alguém vira meio lobo meio homem.
A lenda do boto é contada nos arredores da Amazônia. Esse
Boto boto seria um rapaz que aparece à noite para conquistar
mulheres bonitas e depois some as deixando grávidas.
É uma criatura com corpo de humano e cabeça de jacaré que
Cuca
costuma amedrontar quem não obedece às mães e pais.
Um monstro peludo que vive na Floresta Amazônica
Mapinguari
procurando pessoas para comer.
Uma bruxa velha que pode se transformar em um pássaro de
Matinta perara
mau agouro que habita a região Norte do Brasil.
Uma mula com fogo no lugar da cabeça que pode ser
Mula sem cabeça
encontrada em estradas do interior.
Um menino que montou em um cavalo nos pampas do Sul do
Negrinho do
Brasil para fugir de um fazendeiro cruel. As pessoas costumam
pastoreio
rezar para ele para encontrar objetos perdidos.
É um menino negro de uma perna só com um gorro vermelho
e um cachimbo na boca. Em torno de sua perna, há um
Saci-pererê redemoinho de vento. Ele costuma fazer travessuras entre as
pessoas e dizem que quem conseguir roubar seu gorro terá
qualquer pedido atendido.
É uma planta que somente se abre à noite. De acordo com
mitos indígenas, uma mulher se apaixonou pela lua e foi morar
Vitória-régia com ela no céu e virar uma estrela. Essa mulher ficou na beira
do igarapé admirando a lua e acabou morrendo, virando uma
estrela das águas que é a vitória-régia.
FONTE: <http://www.multirio.rj.gov.br/media/PDF/pdf_4251.pdf>. Acesso em: 16 jan. 2022.
4 ESTUDOS PÓS-COLONIAIS
Para encerrar a primeira unidade dos nossos estudos, vamos entender o
pensamento pós-colonial no Brasil. A noção de pós-colonial surgiu na década de
1970 e foi mais difundida na década de 1980 no contexto britânico. O maior desafio do
pensamento pós-colonial é compreender as estratégias de resistência ao eurocentrismo
a partir do ponto de vista dos povos que foram dominados na fase da colonização ao
redor do mundo (MATA, 2014).
47
DICA
O termo “eurocentrismo” diz respeito ao pensamento que tende a analisar
os acontecimentos a partir de valores europeus. Esse termo é perigoso
na medida em que pode dar a entender que os valores europeus são os
corretos e os demais, errados ou mesmo inferiores.
48
brasileira. Felizmente, já se afastam os dias em que a presença
literária negra, salvo as marcantes exceções que todos conhecemos,
fazia-se sentir, paradoxalmente, pela eloquência de um silêncio
carregado de vozes abafadas (GOMES, 2006, p. 8).
FIGURA 11 – FAVELA
49
DICA
Para pensar mais a respeito das formas de expressão que surgiram no
período pós-colonial, bem como do ponto de vista dos povos dominados,
sugerimos a leitura do romance Cidade de Deus, escrito por Paulo Lins.
IMPORTANTE
Atualmente, a ideia de “descobrimento” do Brasil vem caindo por terra.
Esse termo não é mais considerado correto porque não refletem os fatos:
se alguém descobriu o Brasil foram os povos indígenas que habitavam
o território antes da chegada dos colonizadores portugueses. O termo
correto para o que os colonizadores fizeram pode ser “tomada de posse”,
“invasão” ou “conquista”, o que tem sido alterado nas próprias escolas do
nosso país.
50
FIGURA 12 – INDÍGENAS NO SENADO
IMPORTANTE
O uso de tecnologias da cidade, como televisão, celular e computador,
por parte de indígenas, é um tema que gera muitas divergências. Ainda
que uma parcela do senso comum entenda que os indígenas deixam
de ser indígenas por usarem tecnologias da cidade, os antropólogos lutam
por contestar esse tipo de discurso. Em resumo, nenhum indígena deixa de
ser indígena por usar uma tecnologia da cidade ou mesmo viver na cidade. As
tradições culturais indígenas, assim como todas as outras, são dinâmicas e assim
transformadas ao longo da história. Contudo, é preciso manter em mente que os
seus modos de viver e de pensar sempre estarão arraigados na cultura da etnia
indígena que fazem parte. Assim como uma pessoa branca da cidade não vira
indígena por viver na aldeia e usar um cocar, o indígena não vira branco por se
adaptar aos moldes da cidade.
51
LEITURA
COMPLEMENTAR
O TRABALHO DO ANTROPÓLOGO
52
totalidade dos moradores (ou quase) contando as redes dependuradas nos mourões da
maloca dos membros de cada grupo doméstico. Observaria, também, as características
arquitetônicas da maloca, classificando-a segundo uma tipologia de alcance planetário
sobre estilos de residências, ensinada pela literatura etnológica existente.
Retomando o nosso exemplo, veríamos que para se dar conta da natureza das
relações sociais mantidas entre as pessoas da unidade residencial (e delas entre si, em
se tratando de uma pluralidade de malocas de uma mesma aldeia ou "grupo local"),
somente o Olhar não seria suficiente. Como alcançar apenas pelo Olhar o significado
dessas relações sociais sem conhecermos a nomenclatura do parentesco, por meio
da qual pode- remos ter acesso a um dos sistemas simbólicos mais importantes das
sociedades ágrafas e sem a qual não nos será possível prosseguir em nossa caminhada?
O domínio das teorias de parentesco pelo pesquisador torna-se, então, indispensável.
Para chegar, entretanto, à estrutura dessas relações sociais, o etnólogo deverá se valer,
preliminarmente, de um outro recurso de obtenção dos dados. Vamos nos deter um
pouco no Ouvir.
53
O ouvir
Creio não ser ocioso mencionar que o exemplo indígena, tomado como ilustração
do Olhar etnográfico, não pode ser considerado como sendo incapaz de gerar analogias
com outras situações de pesquisa, com outros objetos concretos de investigação. O
sociólogo ou o politólogo por certo terão exemplos tanto ou mais ilustrativos para mostrar
o quanto a teoria social pré-estrutura o nosso olhar e sofìstica a nossa capacidade de
observação. Julguei, entretanto, que exemplos bem simples são geralmente os mais
inteligíveis. Como a Antropologia é a minha disciplina, continuarei a me valer dos seus
ensinamentos e de minha própria experiência profissional com a esperança de, assim
fazendo, poder proporcionar uma boa noção dessas etapas, aparentemente corriqueiras
da investigação científica. Portanto, se o Olhar possui uma significação específica para
um cientista social, o Ouvir também o tem.
Evidentemente tanto o Ouvir quanto o Olhar não podem ser tomados como
faculdades totalmente independentes no exercício da investigação. Ambos se
complementam e servem para o pesquisador como duas muletas (que não nos percamos
com essa metáfora tão negativa...) que lhe permitem caminhar, ainda que tropegamente,
na estrada do conhecimento. A metáfora, propositadamente utilizada, permite lembrar
que a caminhada da pesquisa é sempre difícil, sujeita a muitas quedas... É nesse ímpeto
de conhecer que o Ouvir, complementando o Olhar, participa das mesmas precondições
deste último, na medida em que está preparado para eliminar todos os ruídos que lhe
pareçam insignificantes, i.e., que não façam nenhum sentido no corpus teórico de
sua disciplina ou para o paradigma no interior do qual o pesquisador foi treinado. Não
queremos discutir aqui a questão dos paradigmas; foi possível fazê-lo no livro Sobre
o pensamento antropológico (1988b), e não temos tempo aqui de abordá-la. Bastaria
entendermos que as disciplinas e seus paradigmas são condicionantes tanto de nosso
Olhar quanto de nosso Ouvir.
Imaginemos uma entrevista por meio da qual o pesquisador sempre pode obter
informações não alcançáveis pela estrita observação. Sabemos que autores como
Radcliffe-Brown sempre recomendaram a observação de rituais para estudarmos
sistemas religiosos. Para ele, "no empenho de compreender uma religião devemos
primeiro concentrar atenção mais nos ritos que nas crenças" (RADCLIFFE-BROWN,
1973). O que significa dizer que a religião podia ser mais rigorosamente observável na
conduta ritual por ser ela "o elemento mais estável e duradouro" se a compararmos com
as crenças. Porém isso não quer dizer que mesmo essa conduta, sem as ideias que a
sustentam, jamais poderia ser inteiramente compreendida. Descrito o ritual, por meio
do Olhar e do Ouvir (suas músicas e seus cantos), falta - vale a plena compreensão
de seu "sentido" para o povo que o realizava e a sua "significação" para o antropólogo
que o observava em toda sua exterioridade. Por isso, a obtenção de explicações, dada
pelos próprios membros da comunidade investigada, permitiria se chegar àquilo que
os antropólogos chamam de "modelo nativo", matéria-prima para o entendi- mento
antropológico. Tais explicações nativas só poderiam ser obtidas por meio da "entrevista",
portanto, de um Ouvir todo especial. Todavia, para isso, há de se saber ouvir.
54
Se aparentemente a entrevista tende a ser encarada como algo sem maiores
dificuldades, salvo, naturalmente, a limitação linguística – i.e., o fraco domínio do idioma
nativo pelo etnólogo –, ela torna-se muito mais complexa quando consideramos que a
maior dificuldade está na diferença entre "idiomas culturais", a saber, entre o mundo do
pesquisador e o do nativo, esse mundo estranho no qual desejamos penetrar. De resto,
há de se entender o nosso mundo, o do pesquisador, como sendo ocidental, constituído
minimamente pela sobreposição de duas subculturas: a brasileira, no caso de todos nós
em particular; e a antropológica, aquela na qual fomos treinados como antropólogos e/
ou cientistas sociais. É o confronto entre esses dois mundos que constitui o contexto
no qual ocorre a entrevista. É, portanto, num contexto essencialmente problemático
que tem lugar o nosso Ouvir. Como poderemos, então, questionar as possibilidades da
entrevista nessas condições tão delicada?
Penso que esse questionamento começa com a pergunta sobre qual a natureza
da relação entre entrevistador e entrevistado. Sabemos que há uma longa e arraigada
tradição na literatura etnológica sobre a relação. Se tomarmos a clássica obra de
Malinowski como referência, vemos como essa tradição se consolida e, praticamente,
trivializa-se na realização da entrevista. No ato de ouvir o "informante", o etnólogo
exerce um "poder" extraordinário sobre o mesmo, ainda que ele pretenda se posicionar
como sendo o observador mais neutro possível, como quer o objetivismo mais radical.
Esse poder, subjacente às relações humanas – que autores como Foucault jamais
se cansaram de denunciar, já na relação pesquisador/informante vai desempenhar
uma função profundamente empobrecedora do ato cognitivo: as perguntas, feitas
em busca de respostas pontuais lado a lado da autoridade de quem as faz (com ou
sem autoritarismo), criam um campo ilusório de interação. A rigor, não há verdadeira
interação entre nativo e pesquisador, porquanto na utilização daquele como informante
o etnólogo não cria condições de efetivo "diálogo". A relação não é dialógica. Ao passo
que, transformando esse informante em "interlocutor", uma nova modalidade de
relacionamento pode (e deve) ter lugar. Essa relação dialógica, cujas consequências
epistemológicas, todavia, não cabem aqui desenvolver, guarda pelo menos uma
grande superioridade sobre os procedimentos tradicionais de entrevista. Faz com que
os horizontes semânticos em confronto – o do pesquisador e o do nativo – se abram
um ao outro, de maneira a transformar um tal "confronto" num verdadeiro "encontro
etnográfico". Cria um espaço semântico partilhado por ambos os interlocutores, graças
ao qual pode ocorrer aquela "fusão de horizontes" (como os hermeneutas chamariam
esse espaço), desde que o pesquisador tenha a habilidade de ouvir o nativo e por ele ser
igualmente ouvido, encetando um diálogo teoricamente de "iguais", sem receio de estar,
assim, contaminando o discurso do nativo com elementos de seu próprio discurso.
Mesmo porque acreditar ser possível a neutralidade idealizada pelos defensores da
objetividade absoluta é apenas viver numa doce ilusão... Trocando ideias e informações
entre si, etnólogo e nativo, ambos igualmente guindados a interlocutores, abrem-se a
um diálogo em tudo e por tudo superior, metodologicamente falando, à antiga relação
pesquisa- dor/informante. O Ouvir ganha em qualidade e altera uma relação, qual
estrada de mão única, numa outra, de mão dupla, portanto, uma verdadeira interação.
55
Tal interação na realização de uma etnografia, envolve, em regra, aquilo que
os antropólogos chamam de "observação participante, o que significa dizer que o
pesquisador assume um papel perfeitamente digerível pela sociedade observada, a
ponto de viabilizar uma aceitação senão ótima pelos membros daquela sociedade, pelo
menos afável, de modo a não impedir a necessária interação. Mas essa observação
participante nem sempre tem sido considerada como geradora de um conhecimento
efetivo, sendo-lhe frequentemente atribuída a função de "geradora de hipóteses", a
ser testadas por procedimentos nomológicos – estes sim, explicativos por excelência,
capazes de assegurar um conhecimento proposicional e positivo da realidade estudada.
O escrever
Mas se o Olhar e o Ouvir podem ser considerados como os atos cognitivos mais
preliminares no trabalho de campo (trabalho que os antropólogos se acostumaram a
se valer da expressão inglesa fieldwork para denominá-lo), é seguramente no ato de
Escrever, portanto, é na configuração final do produto desse trabalho, que a questão do
conhecimento se torna tanto ou mais crítica. Um livro relativamente recente de Clifford
Geertz, Trabalhos e vidas: o antropólogo como autor, infelizmente, ao que eu saiba, ainda
não traduzido para o português, oferece importantes pistas para desenvolvermos esse
tema. Geertz parte da ideia de separar e, naturalmente, avaliar, duas etapas bem distintas
na investigação empírica: a primeira, que ele procura qualificar como a do antropólogo
"estando lá" (being there), isto é, vivendo a situação de estar no campo; e a segunda,
que se seguiria àquela, corresponderia à experiência de viver, melhor dizendo, trabalhar
"estando aqui" (being here), a saber, bem instalado em seu gabinete urbano, gozando
o convívio com seus colegas e usufruindo tudo o que as instituições universitárias e
de pesquisa podem oferecer. Nesses termos, o Olhar e o Ouvir seriam parte da primeira
etapa, enquanto o Escrever seria parte inerente da segunda.
56
definitivo tanto no processo de comunicação interpares (i.e., no seio da comunidade
profissional), quanto no de conhecimento propriamente dito. Mesmo porque há uma
relação dialética entre o comunicar e o conhecer, uma vez que ambos partilham de
uma mesma condição: a que é dada pela linguagem. Embora essa linguagem seja
importante em si mesma, como tema de reflexão, haja vista aquilo que poderíamos
chamar de "guinada linguística" (ou linguistics turn), que perpassa atualmente tanto a
filosofia como as ciências sociais, o aspecto que desejo tratar aqui, se bem que de modo
muito sucinto, é unicamente o da disciplina e de seu próprio idioma, por meio do qual
os que exercitam a antropologia (ou, mesmo, qualquer outra ciência social) pensam e
se comunicam. Alguém já escreveu que o homem não pensa sozinho, num monólogo
solitário, mas o faz socialmente, no interior de uma "comunidade de comunicação" e
"de argumentação" (APEL, 1985). Ele está, portanto, contido no espaço interno de um
horizonte socialmente construído (no caso o da sua própria sociedade e/ou de sua
comunidade profissional). Desculpando-me pela imprecisão da analogia, diria que ele se
pensa no interior de uma "representação coletiva": expressão essa, afinal, bem familiar
ao cientista social e que, de certo modo, dá uma ideia aproximada daquilo que entendo
por "idioma" de uma disciplina. Como podemos interpretar isso em conexão com os
exemplos etnográficos?
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RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:
• A cultura portuguesa foi uma das maiores influências sobre a cultura brasileira por
causa da colonização.
• A cultura dos indígenas que habitavam nosso país antes da colonização e a cultura
dos negros escravizados também influenciaram muito a formação da cultura
brasileira.
• A cultura popular tem a ver com as manifestações cotidianas do povo brasileiro, que
incluem desde crenças até músicas.
• Existem diversas lendas brasileiras que variam de acordo com a região do país.
58
AUTOATIVIDADE
1 O pensamento pós-colonial surgiu a partir da década de 1970 entre os ingleses.
Esse movimento se voltava para os meios de resistência dos povos colonizados em
relação aos colonizadores. Sobre o pós-colonialismo no Brasil, assinale a alternativa
CORRETA:
I- Vários dos personagens principais do folclore brasileiro punem pessoas que não
respeitam a natureza.
II- O curupira é um menino cujos pés são virados para trás, o que confunde os
caçadores que seguem seus rastros.
III- Iara é uma linda mulher que engana homens e os esconde nas matas.
IV- A lenda do boto é contada nos interiores do país e tem a ver com um homem que
engravida misteriosamente as mulheres.
V- O Saci-pererê é um menino indígena de uma perna só que anda com um gorro
vermelho nas matas.
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3 O período de formação da cultura brasileira contou com a participação de nações
europeias e não europeias, fora a influência das etnias indígenas que já habitavam
o território antes da chegada dos dominadores. Sobre o contexto da colonização,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:
a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – V – F.
c) ( ) F – V – V.
d) ( ) F – F – V.
5 A cultura popular brasileira está diretamente vinculada ao folclore brasileiro. Ambos são
considerados como fazendo parte das manifestações culturais tradicionais do povo
brasileiro. Diante disso, disserte sobre esses dois conceitos e aponte se há diferença
entre eles ou se possuem o mesmo significado.
60
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, M. R. A atuação dos indígenas na história do Brasil: revisões historiográficas.
Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 37, n. 75, 2017, p. 17-38. Disponível em:
https://bit.ly/3QlqLfL. Acesso em: 27 maio 2022.
HEILBORN, M. L.; SORJ, B. Estudos de gênero no Brasil. In MICELI, Sérgio (Org.). O que
ler na ciência social brasileira (1970-1995), ANPOCS/CAPES. São Paulo: Editora
Sumaré, 1999, p. 183-221. Disponível em: https://bit.ly/3zDyLlx. Acesso em: 16 jan.
2022.
61
LAPLANTINE, F. Aprender antropologia. São Paulo: Brasiliense, 1987, 205p.
LIMA, M. Por uma antropologia do negro: o diálogo convergente entre Arthur Ramos
e Dante de Laytano. Em Tempo de Histórias, n. 22, Brasília, jan-jul. 2013, p. 78-100.
Disponível em: https://bit.ly/3zzUkUm. Acesso em: 27 maio 2022.
62
SOUZA, T. De Nina Rodrigues a Arthur Ramos: a reinvenção de Palmares nos “estudos
do negro”. Temporalidades, v. 5, 2013, p. 161-180. Disponível em: https://periodicos.
ufmg.br/index.php/temporalidades/article/view/5481. Acesso em: 16 jan. 2022.
63
64
UNIDADE 2 —
ANTROPOLOGIA
BRASILEIRA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de
reforçar o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
65
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!
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UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
ANTROPOLOGIA BRASILEIRA E A
QUESTÃO DA CULTURA NACIONAL
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 1, abordaremos a antropologia brasileira e sua relação com a identidade
e a cultura nacional. Para que você entenda mais sobre o conceito de cultura em termos
gerais, vamos fazer a distinção entre natureza e cultura, que é um ponto-chave para
pensarmos nesse conceito. Do mesmo modo, é importante que você entenda algumas
questões, como o determinismo biológico e o determinismo geográfico, que são
amplamente debatidas entre os antropólogos do Brasil e do mundo.
2 CULTURA
Para entendermos mais sobre o conceito de cultura, precisamos passar pelo
dilema que existe entre a natureza e a própria cultura. Conforme aponta o antropólogo
Roque de Barros Laraia (2001), esse dilema tem a ver com a unidade biológica e a
diversidade cultural dos seres humanos. Em outras palavras, constituímos uma única
espécie, mas também as inúmeras sociedades espalhadas pelo mundo possuem modos
de viver diferentes, o que é marca dessa grande diversidade cultural. Nas palavras do
autor:
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NOTA
O conceito de monogenismo mencionado pelo autor diz respeito a uma
teoria segundo a qual todos os seres humanos teriam uma descendência
em comum.
IMPORTANTE
É um dos deveres de os estudantes de antropologia combater esse suposto
determinismo porque, como os exemplos trazidos pelo autor nos mostram,
isso pode desencadear uma série de preconceitos. Por preconceitos, aqui
entendemos ideias errôneas e pré-concebidas sobre aquelas “raças” ou
grupos humanos.
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Outro ponto importante com relação a esse determinismo perpassa a questão
da sexualidade. Podemos pensar que as divergências entre os comportamentos das
pessoas de sexos diferentes são determinadas a partir de um padrão biológico. Contudo,
o fato de uma pessoa nascer com o que entendemos por um sexo ou por outro no senso
comum não é o que dita o padrão de comportamento desse indivíduo.
ESTUDOS FUTUROS
A ideia de uma pessoa ser de um sexo ou de outro no senso comum será
aprofundada adiante nos estudos sobre gênero. No entanto, podemos
adiantar que a divisão entre o sexo masculino correspondente a homens
e o sexo feminino correspondente a mulheres também é uma elaboração
cultural.
Para confirmar esse pensamento, Laraia (2001) nos traz um exemplo do próprio
Brasil na região do Parque Nacional do Xingu. O autor comenta que etnias indígenas
como Kamayurá, Kalapalo, Trumai e Waurá não usam grandes mamíferos como fonte
de alimentação porque possuem proibições de ordem cultural e preferem peixes ou
pequenas aves. Por outro lado, os Kayabi, que também habitam o Parque Nacional do
Xingu, usam dos grandes mamíferos como o veado ou o porco caititu como a base de
sua alimentação.
Logo, a diversidade cultural não pode ser explicada a partir das supostas
limitações de ordem biológica ou geográfica sobre os seres humanos. Assim entendemos
melhor o dilema entre natureza e cultura, sendo que a natureza – que tem a ver com
elementos biológicos e geográficos – não é determinante da cultura, apesar de exercer
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influência sobre ela. Em poucas palavras, o pensamento antropológico moderno entende
que os fatores naturais somente colocam possibilidades para o desenvolvimento da
cultura, mas não a determina por si só (LARAIA, 2001).
Até o século XVI, esse termo era usado, sobretudo, para tratar de algo voltado
para o cultivo de plantas ou mesmo atividades agrícolas. A partir do fim desse século,
o significado do termo se expandiu, sendo que deixou de identificar somente o
desenvolvimento da agricultura e passou a também identificar o desenvolvimento dos
hábitos humanos em todos os sentidos (CANEDO, 2009).
FIGURA 1 – AGRICULTURA
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O pensamento desse antropólogo foi um divisor de águas para romper de vez com os
“laços entre o cultural e o biológico, postulando a supremacia do primeiro em detrimento
do segundo” (LARAIA, 2001, p. 16). Conforme aponta Laraia:
3 RAÇA E ETNIA
FIGURA 2 – DIVERSIDADE RACIAL
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teve influência de diversas culturas do mundo desde o período da colonização. Assim, é
fundamental sabermos diferenciar os conceitos de raça e etnia para nos aprofundarmos
na antropologia brasileira.
Os conceitos de raça e etnia muitas vezes são confundidos por seres muito
próximos, mas vamos conhecer mais suas diferenças a seguir. O termo raça deriva da
palavra italiana razza, a qual também derivou do latim ratio, que significa categoria ou
mesmo espécie. Esses termos começaram a ser difundidos para designar espécies
animais e vegetais e somente depois passaram a englobar os grupos humanos
(MUNANGA, 2003, p. 1).
Podemos dizer que o primeiro conceito de raça foi desenvolvido pelo antropólogo
francês François Bernier no ano de 1684 em um escrito que tentou diferenciar as raças
que habitavam o nosso planeta. Já no ano de 1790, foi feito o primeiro censo populacional
estadunidense que distinguiu mulheres e homens brancos das demais pessoas, como
os nativos da região e os negros escravizados. Já em 1890, esse censo foi atualizado e
passou a distinguir as pessoas a partir de termos como “branco, preto, chinês, japonês
e índios” (SANTOS et al., 2010, s.p.).
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IMPORTANTE
Apesar do pensamento de Marvin Harris ter sido importante na época, a
ideia de que a criança nascida pertenceria ao grupo “inferior” é também
discriminatória na medida em que cria uma hierarquia entre as raças.
Pelo menos até o começo do século XX, essa era uma categoria
totalmente antinatural; somos uma nação que se formou
com a escravidão, e essa escravidão não era uma escravidão
generalizada de todos os povos, mas somente daqueles localizados
numa determinada parte do continente africano. Os povos que
escravizamos vieram da África ocidental e da África meridional, hoje
Congo, Angola, Moçambique, Zaire e, subindo a costa ocidental, a
Nigéria, o Níger e Golfo do Benin. Foram dessas regiões que vieram
os povos escravizados em toda a América. Um sistema muito próprio
de comercialização que envolvia negreiros da Holanda, de Portugal,
do Brasil, da Inglaterra, da França etc., alguns reinos africanos e as
colônias americanas. Essas pessoas escravizadas foram chamadas
de “africanas” e “negros”; essas foram, digamos, as duas identidades
criadas originalmente na sociedade escravocrata brasileira, em que
o negro tinha um lugar e esse lugar era a escravidão (GUIMARÃES,
2003, s. p.).
NOTA
O médico Nina Rodrigues teve muita influência na disseminação do conceito
de raça no Brasil, tendo em vista que seu estudo sobre as pessoas se dava
a partir de uma perspectiva supostamente biológica de raças superiores e
raças inferiores.
Nesse sentido, Guimarães comenta que, como a história do Brasil o fez um país
extremamente racialista, o conceito de raça se tornou fundamental na medida em que
organizava as posições sociais das pessoas. Essas posições sociais eram entendidas
como classes sociais.
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Isso porque, no nosso caso, a relação social era fechada pela cor –
negro –, que sinalizava seja a ideia de raça, seja a ideia de cultura
e civilização, seja a ideia religiosa de uma descendência divina. As
pessoas comuns, entretanto, sempre se referiram a essa divisão entre
“senhores” e “escravos” como uma divisão de classes (GUIMARÃES,
2003, s. p.).
FIGURA 3 – INDÍGENAS
O termo etnia derivou da palavra grega ethnos, que tem a ver com um grupo
que possui o mesmo ethos, ou seja, que compartilha dos mesmos elementos culturais.
Dentre esses elementos culturais, podemos considerar o parentesco, a língua, a religião,
o território compartilhado e outros. O sentimento de pertencimento a determinada
etnia é entendido como etnicidade, ou seja, etnicidade diz respeito a uma identidade
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étnica. Como vimos na unidade anterior, o Brasil é um país que sofreu a colonização de
diversas nações do mundo e por isso o reconhecimento das várias identidades étnicas
é fundamental para que direitos previstos na nossa Constituição sejam eficazes.
DICA
Se tiver interesse em pesquisar mais sobre as questões raciais e étnicas
no âmbito da legislação brasileira, o que é fundamental para a área da
antropologia, sugerimos que leiam o Estatuto da Igualdade Racial (Lei
n. 12.288, de 20 de julho de 2010). O Art. 2o desse Estatuto prevê que
é dever do Estado garantir oportunidades iguais aos cidadãos brasileiros,
independentemente da etnia ou da cor da pele.
4 GÊNERO
NOTA
A imagem anterior que escolhemos para iniciar nossos estudos sobre
gênero apresenta uma balança simbolizando a igualdade de gêneros, na
qual o símbolo à direita pertence ao masculino e o símbolo à esquerda, ao
feminino.
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Na unidade anterior deste livro didático, conhecemos o percurso dos estudos
feministas no Brasil, o que está diretamente relacionado aos estudos sobre as relações
de gênero. Agora, vamos nos voltar principalmente para o conceito de gênero no
sentido amplo e alguns de seus desdobramentos no Brasil. Afinal, por que é importante
entendermos as discussões de gênero?
No que diz respeito ao debate sobre gênero no Brasil, Piscitelli (2009) comenta
que a igualdade ainda está longe de ser alcançada. Apesar de estatisticamente, as
mulheres possuírem mais anos de estudo que os homens, os homens continuam a
receber maiores salários e essa desigualdade é mais explícita quando se trata de
mulheres negras. Além disso, as mulheres que trabalham fora de casa também
costumam gastar mais horas realizando os trabalhos domésticos que os homens. Ou
seja, além de receberem salários menores, também trabalham durante mais tempo!
NOTA
Adriana Piscitelli (2009) comenta que as mulheres brancas recebem
40% menos e mulheres negras recebem 60% menos que homens para
um mesmo trabalho, o que são dados alarmantes no indicativo entre as
desigualdades de gênero no Brasil.
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Fora as diferenças no que diz respeito aos salários e ao tempo de trabalho, as
violências sofridas pelas mulheres brasileiras tornam mais explícita essa desigualdade
entre os gêneros. Dentre essas violências, estão principalmente as situações de
agressão (física ou psicológica) por parte dos companheiros e violência sexual por
diversas pessoas, sejam próximas, distantes ou mesmo em situações de custódia do
Estado como nas prisões femininas (PISCITELLI, 2009).
DICA
Sugerimos que assista ao filme brasileiro Um céu de estrelas (1996), dirigido
por Tata Amaral. Esse filme trata da história da relação violenta de uma
cabeleireira chamada Dalva com Vitor, seu namorado.
DICA
Para saber mais sobre o trabalho de Simone de Beauvoir, sugerimos que leia
o artigo Auê sobre o Segundo sexo, escrito pela historiadora Sylvie Chaperon
baseado no livro de Beauvoir.
Disponível em: https://bit.ly/3So7vjP.
A inferiorização das mulheres com relação aos homens pode variar de acordo
com o lugar e com o contexto histórico. Entretanto, podemos afirmar que ela é universal
porque acontece em todos os lugares e contextos, inclusive no Brasil de hoje em dia.
Por isso, Piscitelli (2009, p. 122) nos chama a atenção:
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DICA
Dentre os trabalhos escritos por pesquisadoras brasileiras, destacamos
o livro Uma questão de gênero, das sociólogas Albertina de Oliveira Costa e
Cristina Bruschini.
NOTA
O conceito de gênero ganhou força com a antropóloga estadunidense Gayle
Rubin a partir de seu ensaio O tráfico de mulheres: notas sobre a economia
política do sexo (1975), que também é uma referência importante para as
pesquisadoras em antropologia brasileira.
DICA
Se tiver curiosidade em pensar nas relações de gênero a partir da literatura
brasileira, sugerimos o clássico Grande sertão: veredas, escrito por Guimarães
Rosa. Esse livro perpassa a situação de Riobaldo, o protagonista do livro, que
sente um afeto homossexual por seu colega cangaceiro Diadorim.
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A classificação de pessoas como “homens” e “mulheres” a partir do sexo se
torna simplista diante desse amplo debate, sendo que os antropólogos brasileiros
que pesquisam gênero costumam resistir a esse tipo de linearidade. Nesse contexto,
também abrimos margem para falar sobre intersexos, travestis e transexuais.
DICA
Se quiser se aprofundar na discussão sobre os intersexos e transexuais,
sugerimos o ensaio Fantasias corporais, da antropóloga Mariza Corrêa, o texto
O sexo dos anjos: um olhar sobre a anatomia e a produção do sexo (como se
fosse) natural, da psicóloga Paula Sandrine Machado e a tese de doutorado
Vidas que desafiam corpos e sonhos: uma etnografia do construir-se outro no
gênero e na sexualidade, da cientista social Flavia do Bonsucesso Teixeira.
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RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:
• Apesar dos seres humanos fazerem parte de uma única espécie, as inúmeras
sociedades espalhadas ao redor do mundo marcam uma grande diversidade cultural.
• A diversidade cultural dos seres humanos não pode ser explicada a partir do
determinismo biológico ou do determinismo geográfico.
• A cultura tem a ver com os elementos que constituem o ser humano enquanto
membro de uma sociedade, como os conhecimentos, crenças, artes, morais, leis,
costumes etc.
• Etnia é um conceito que tem a ver principalmente com características culturais dos
seres humanos.
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AUTOATIVIDADE
1 Os estudos sobre as relações de gênero perpassam inúmeras discussões, como a
dominação masculina, o feminismo, sexualidade, trabalho, entre outras. Sobre esses
temas, assinale a alternativa CORRETA:
I- Até o século XX, o termo cultura era utilizado somente para designar o cultivo de
espécies vegetais.
II- O primeiro conceito de cultura em termos antropológicos foi formulado pelo inglês
Edward Tylor em 1971.
III- A cultura tem a ver com algo aprendido que não é transmitido somente
biologicamente ou por questões geográficas.
IV- Acultura humanatem avercom conhecimentos, crenças e costumas de um grupo social.
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( ) O primeiro conceito de raça foi desenvolvido pelo antropólogo francês François
Bernier em 1684.
( ) No ano de 1790, o conceito de raça foi usado para distinguir os homens das mulheres
nos EUA.
( ) Carolus Linnaeus, criador do termo Homo sapiens, classificou cinco categorias de
seres humanos em 1758: americanos, europeus, asiáticos, africanos e monstruosos.
( ) O antropólogo alemão Johann Blumenbach classificou quatro variedades de
seres humanos em 1775, sendo que a primeira deles era composta somente pelos
europeus e norte-americanos.
a) ( ) V – F – F – V.
b) ( ) V – F – V – F.
c) ( ) F – V – F – V.
d) ( ) F – F – V – F.
5 Os conceitos de raça e etnia são um dos principais temas no que diz respeito à
antropologia brasileira. Apesar de muito próximos, esses conceitos podem e devem ser
diferenciados para realizarmos análises assertivas. Assim, conceitue cada um desses
conceitos indicando suas diferenças.
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UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
ANTROPOLOGIA BRASILEIRA E
AS DISCUSSÕES ÉTNICO-RACIAIS
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 2, abordaremos os principais desdobramentos acerca dos conceitos
de raça e etnia aprendidos no tópico anterior. Partiremos da noção de racismo no seu
sentido amplo para depois pensarmos nas questões de racismo próprias do nosso país,
o que é um dos principais temas da antropologia brasileira atual.
2 RACISMO
FIGURA 5 – MANIFESTAÇÃO ANTIRRACISTA
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Para iniciar nosso estudo sobre as questões etnicorraciais no contexto da
antropologia brasileira, é inevitável comentarmos sobre o racismo. Antes de nos
voltarmos especificamente para o racismo no Brasil, vamos entender o que esse
conceito significa em termos gerais. De acordo com o sociólogo francês Michel Wieviorka
(2007), que é uma importante referência para as antropólogas e antropólogos brasileiros
que pesquisam o tema, o racismo diz respeito à caracterização de determinado grupo
humano a partir de características naturais.
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religião, suas tradições, seus costumes. O novo racismo, nessa
perspectiva, insiste na ameaça que a diferença dos grupos visados
faria pesar sobre a identidade do grupo dominante. [...] Segundo esse
ponto de vista, que parece renovar o discurso e a prática racistas,
cada comunidade, étnica ou racional, constitui uma expressão
particular da natureza humana, nem superior, nem inferior: diferente
(WIEVIORKA, 2007, p. 34-35).
ESTUDOS FUTUROS
A relação entre o racismo e as religiões afro-brasileiras, que é um assunto
próprio do racismo religioso, será abordada adiante no item sobre racismo
religioso em que explicaremos um pouco mais sobre a disseminação da
Umbanda e do Candomblé no Brasil.
Agora que entendemos mais sobre o que significa o racismo em termos gerais,
vamos conhecer o pensamento do sociólogo brasileiro Antônio Sérgio Guimarães, que
trata das questões de raça e racismo especificamente no nosso país. Segundo esse autor,
o conceito de raça pode ser diferenciado de outros conceitos essencialistas, sobretudo,
por dois motivos: o conceito de raça não se refere a diferenças unicamente físicas como
a de sexo, mas o conceito classifica os indivíduos a partir de critérios ambíguos, embora
sejam justificados por uma teoria centrada na ideia de raça (GUIMARÃES, 1999).
De acordo com Guimarães (1999), todo racismo deve ser entendido de acordo
com sua própria história. Assim, existe uma lógica específica por trás do racismo brasileiro
a partir da constituição das identidades nacional e regional. No Brasil, a discriminação
do “Outro racial”, conforme denomina o autor, se dá mediante diferenças físicas e
culturais que não são assimiladas por algumas pessoas. “Daí esta noção, tão central ao
pensamento brasileiro, de embranquecimento, e a consequente rejeição simbólica do
‘negro’ e do ‘africano’” (GUIMARÃES, 1999, p. 10-11).
NOTA
Esse ponto tratado pelo autor nos leva ao debate da presença dos brancos
em religiões de matriz africana como o Candomblé, sejam eles mesmos
racistas ou antirracistas.
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forma sistemática de discriminação que tem a raça como fundamento, e que se manifesta
por meio de práticas conscientes ou inconscientes que culminam em desvantagens ou
privilégios para indivíduos, a depender do grupo racial ao qual pertençam” (DE ALMEIDA,
2018, p. 25).
O racismo estrutural, por sua vez, pode ser considerado o mais importante
para pensarmos no caso do Brasil e do desenvolvimento da antropologia brasileira. A
partir do conceito de racismo estrutural, passamos a questionar o racismo institucional
enquanto uma mera consequência. Em outras palavras, o racismo estrutural nos faz
pensar que as instituições são racistas porque toda a estrutura da sociedade em que
vivemos é racista. Nas palavras do autor:
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IMPORTANTE
O racismo é considerado um crime no Brasil! De acordo com o art. 1o da
Lei n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989, “Serão punidos, na forma desta Lei, os
crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião
ou procedência nacional.”. O art. 20 da mesma Lei também prevê pena de
reclusão de um a três anos e multa para quem “Praticar, induzir ou incitar
a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência
nacional”. Além disso, o crime de injúria racial está disposto no art. 140 do
Código Penal brasileiro, que consiste em “Injuriar alguém, ofendendo-lhe a
dignidade ou o decoro”, sendo que a pena é aumentada para reclusão de um
a três ano e multa no caso de racismo conforme o parágrafo 3o do referido
artigo: “Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça,
cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de
deficiência”.
FONTE: <https://bit.ly/3vJ8Ess>. Acesso em: 27 maio 2022.
3 SINCRETISMO RELIGIOSO
FIGURA 6 – CANDOMBLÉ
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Em poucas palavras, o sincretismo é uma mistura de elementos culturais.
O sincretismo religioso, por sua vez, está voltado principalmente para a mistura de
elementos da religião das culturas que doravante entraram em contato. Assim, podemos
dizer que o sincretismo religioso no Brasil tem a ver com a fusão que aconteceu entre
as práticas religiosas que os negros escravizados trouxeram ao país e o Catolicismo,
religião dos colonizadores portugueses (VALENTE, 1955).
NOTA
Na linha de pensamento controversa de Nina Rodrigues, os rituais de
Candomblé eram considerados bárbaros e demonstravam o suposto
subdesenvolvimento do homem negro. Os estudantes de antropologia
brasileira lutam para que essa ideia seja rebatida em nome da liberdade
religiosa.
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do arco-íris e da fertilidade. Omolu é Orixá das doenças infecciosas e das suas curas.
Euá cuida do solo sagrado em que moram os mortos. Xangô é Orixá do trovão e da
justiça. Iansã é Orixá do vento, da tempestade, do raio e da sensualidade. Obá é Orixá
das correntezas dos rios e da vida doméstica das mulheres. Oxum é Orixá do amor, da
fertilidade e das águas doces. Iemanjá é dona das grandes águas, mãe de todos os
deuses que cuida do equilíbrio emocional e da loucura. Ossaim é Orixá das folhas, que
conhece seus segredos e poderes de cura. Oxalá é o criador do humano, senhor do
princípio da vida, do ar e da respiração.
Os Orixás não podem ser escolhidos, as pessoas é que são escolhidas por eles.
Para identificar a constelação de Orixás que acompanha alguém, é preciso consultar
os búzios, o oráculo tradicional africano. Assim, quando uma pessoa é dita filha de
algum Orixá, passa a ter algumas responsabilidades, tais como realizar oferendas com
os elementos preferidos pelo seu santo. “Os reinos animal, vegetal e mineral estão à
disposição do ser humano. [...] Cada Òrìsà possui um determinado animal, vegetal,
mineral e comidas, e tudo libera energia. É uma alquimia que depende de muita
habilidade...” (BENISTE, 2002, p. 68).
A cabeça é uma parte do corpo fundamental nos ritos do Candomblé, como nas
oferendas. Ela é o centro em que o filho carrega o seu Orixá porque é entendido que ele
mora na cabeça.
A Umbanda, por sua vez, pode ser considerada um dos principais exemplos
para pensarmos no sincretismo religioso no contexto do nosso país, sendo que é uma
verdadeira fusão entre elementos africanos e católicos. Apesar dos negros escravizados
terem reconstituídos algumas de suas práticas religiosas no formato do Candomblé,
esses ritos sofreram fortes perseguições e repreensões desde a época da colonização
até o período da ditadura militar (NASCIMENTO, 2010).
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quando o filho de determinado Orixá é possuído por esse próprio Orixá, a possessão
na Umbanda acontece quando um adepto é possuído por entidades espirituais que
incluem os pretos-velhos e os caboclos (NASCIMENTO, 2010).
FIGURA 9 – UMBANDA
91
IMPORTANTE
É comum também que o Orixá Exu, de extrema importância para as práticas
religiosas afro-brasileiras, seja correspondido ao diabo católico. Precisamos
entender que, para as religiões afro-brasileiras, não existe uma distinção
entre bem e mal tal como acontece no Catolicismo, sendo que Exu não é um
Orixá “do mal” nem ruim. Portanto, essa associação é considerada errônea e
pode passar por preconceituosa!
4 RACISMO RELIGIOSO
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DICA
Se quiser assistir a um filme que trata de algumas questões de intolerância
e racismo religioso, contemplando temas de capoeira e religiosidade afro-
brasileira, sugerimos o filme nacional Besouro (2009), dirigido por João Daniel
Tikhomiroff.
A Iyalorixá Cris ty Oxum, por exemplo, que tem sua casa de candomblé
na cidade de Aparecida de Goiânia, enfrentou perseguição de um
vizinho durante alguns anos desde a fundação da casa em meados
de 2011. O agressor realizava protestos e cultos com uma caixa de
som na porta do terreiro, jogava pedras e bombinhas no telhado. Iya
Cris conta que todas as vezes que havia festa na casa ele chamava a
polícia. Durante as primeiras atividades realizadas, quando o terreno
ainda não tinha muro e os vizinhos conseguiam ver algo que fazia
ali, o mesmo vizinho acusou de estarem realizando rituais de magia
negra. Culminou com uma agressão física na qual ele tentava invadir
a casa durante uma festa. Derrubou o portão da casa da sacerdotisa
e provocou a fratura em um de seus pés. Foram registrados boletins
de ocorrência na delegacia e o processo se arrastou sem que ele
fosse punido. Outro caso foi o de uma filha do Babalorixá Raimundo
ty Oya que tentava se consultar no posto de saúde do setor onde fica
o terreiro, também em Aparecida de Goiânia. A jovem teve que lidar
com uma funcionária que queria “expulsar o demônio” de seu corpo
porque portava as vestimentas características de um recém-iniciado
no candomblé (contas no pescoço, torso/turbante, roupa branca)
(MOTA, 2018, p. 25).
NOTA
O termo “terreiro” é usado para se referir ao local sagrado em que ocorrem
os rituais religiosos da Umbanda e do Candomblé.
Embora a liberdade religiosa no Brasil seja legalizada, parece que isso não se
aplica às religiões de matriz afro-brasileira na prática, como podemos argumentar a
partir desse racismo religioso estrutural e das incontáveis violações aos praticantes e
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templos. Em outras palavras, as religiões cristãs como o Catolicismo continuam como
religiões dominantes e as demais, como a Umbanda e o Candomblé, precisam ser
toleradas, mas não são igualmente reconhecidas em suas legitimidades (MOTA, 2018).
IMPORTANTE
A Constituição Federal de 1988, em diálogo com esses temas abordados
pela antropologia brasileira, instituiu em seu art. 5o, inciso VI, o dispositivo da
liberdade religiosa: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei,
a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.
FONTE: <https://bit.ly/38hv88w>. Acesso em: 27 maio 2022.
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RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• O conceito de raça está voltado sobretudo para o fenótipo do ser humano, ou seja,
suas características biológicas.
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AUTOATIVIDADE
1 O racismo religioso pode ser considerado um grande problema do nosso país e por
isso é amplamente estudado no campo da antropologia brasileira. Tendo em vista
essa temática, assinale a alternativa CORRETA:
I- O racismo pode ser entendido como uma prática sistemática de discriminação que
possui a raça como seu principal fundamento.
II- Apesar do racismo ser estrutural no Brasil, ele não culmina em desvantagens ou
privilégios para indivíduos de acordo com a raça que pertencem.
III- O racismo é considerado um crime no Brasil, tendo em vista a Lei n. 7.716 de 1989 e
o Código Penal brasileiro.
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( ) O orixá africano Iansã corresponde à santa católica Santa Bárbara.
( ) O orixá africano Iemanjá corresponde à santa católica Santa Ana.
a) ( ) V – F – F – V – V.
b) ( ) V – F – V – V – F.
c) ( ) F – V – F – V – F.
d) ( ) F – F – V – F – V.
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UNIDADE 2 TÓPICO 3 -
ANTROPOLOGIA BRASILEIRA:
ESTUDOS RURAIS E URBANOS
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 3, abordaremos o conceito de antropologia rural. Esse é um tema
que gera um amplo debate, tendo em vista que retoma os conflitos da distinção entre
natureza e cultura, bem como a distinção entre campo e cidade. Assim, levando em
consideração a dinâmica de dependência entre campo e cidade, pensaremos a respeito
das condições de vida das populações rurais enquanto foco da antropologia rural.
Por fim, refletiremos sobre a antropologia da mídia. Para isso, vamos entender
como essa área do conhecimento foi iniciada no mundo e qual sua abrangência no
Brasil.
2 ANTROPOLOGIA RURAL
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Depois de aprendermos o que significa a distinção entre natureza e cultura
em termos antropológicos, agora vamos conhecer mais sobre a antropologia rural. Em
poucas palavras, a antropologia rural é uma área de estudo voltada para a compreensão
das condições de vida da população que vive nos campos, ou seja, mais próxima do que
entendemos por natureza e mais afastada dos grandes centros urbanos.
Ora, vamos entender isso melhor. Nas grandes cidades, as pessoas costumam
comprar seus alimentos, que são fundamentais para a sobrevivência, em mercados ou
feiras. Um grande costume do brasileiro é tomar seu café preto logo de manhã. Mas
quem de fato produz esse café que chega em nossa mesa? São os trabalhadores que
vivem em áreas rurais! Por isso, é importante que os estudos em antropologia brasileira
passem pela antropologia rural que, por sua vez, está diretamente relacionada à
antropologia urbana.
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Como podemos derivar das palavras de Willems (2009), a produção dos
trabalhadores rurais também está diretamente relacionada ao mundo capitalista em que
vivemos. Assim, quando compramos esses produtos produzidos pelos trabalhadores
rurais, estamos todos fazendo parte de uma engrenagem de mercado capitalista baseada
na demanda e no consumo. Essas relações são uma das principais preocupações da
antropologia urbana assim como as condições de vida das populações rurais.
Por outro lado, além dos trabalhadores rurais, também existe uma população
que vive afastada dos centros urbanos e que não está tão condenada às regras do
mercado:
101
NOTA
O indicativo de módulos fiscais na legislação brasileira é usado para
determinar a extensão de uma propriedade rural, sendo que o imóvel
rural com área inferior a um módulo fiscal é caracterizado como
minifúndio e o imóvel rural com área entre um e quatro módulos fiscais
é caracterizado como pequena propriedade.
102
3 ANTROPOLOGIA URBANA
A antropologia urbana, como o próprio nome diz, tem a ver com os estudos
antropológicos voltados para os centros urbanos. Como vimos no começo da nossa
disciplina, a antropologia em termos gerais tem como objeto de estudo aquele “outro”
distante. Aqui entra um ponto particular da antropologia urbana: o que acontece quando
os antropólogos nascidos e criados nas grandes metrópoles se voltam para a análise
antropológica desses mesmos espaços?
103
clássico, essa disciplina se mantém fiel às teorias e metodologias da antropologia e,
portanto, é considerada como uma das áreas da antropologia. É exatamente aqui
também que se encontra o maior desafio da antropologia urbana.
DICA
Caso se interesse mais pela temática da antropologia urbana, sugerimos o
livro Na metrópole: textos de antropologia urbana, escrito pelos antropólogos
Lilian de Lucca Torres e José Guilherme Magnani. Uma questão interessante
abordada nesse livro diz respeito ao conceito de “tentação da aldeia”, que
significa a tentativa de se aplicar a abordagem etnográfica no contexto das
grandes metrópoles.
104
No que diz respeito ao espaço, Magnani (2003) traça um paralelo com Roberto
Da Matta, outro antropólogo muito importante em antropologia brasileira, tendo em
vista as noções de “rua”, “casa” e “pedaço”:
DICA
Se quiser conhecer mais sobre o trabalho de Roberto Da Matta, sugerimos a
leitura do livro do autor, intitulado “A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher
e morte no Brasil”, que também trata de temas voltados para a antropologia
urbana brasileira.
105
Podemos dizer também que esses estudos da antropologia urbana têm a ver
com o tempo livre das pessoas. Ora, e se têm a ver com o tempo livre, também têm a
ver com o tempo de trabalho dessas pessoas que, quando não estão trabalhando, estão
livres e podem fazer outras atividades. Essas simples atividades, como ir ao bar depois
do expediente com os colegas de trabalho antes de voltar para casa, é considerada
um dos objetos de estudo da antropologia urbana! Isso pode nos dizer muito, como a
relação entre o mundo doméstico e o mundo do trabalho, os lugares, as relações que
derivam disso etc. (MAGNANI, 2003).
4 ANTROPOLOGIA DA MÍDIA
A antropologia da mídia é uma área de estudo antropológico que flerta com os
estudos de comunicação social. Como vimos no início da nossa disciplina, a antropologia
é uma pesquisa baseada na etnografia, ou seja, na pesquisa de campo. Contudo, assim
como toda a dinâmica da vida terrestre mudou com o curso da história, isso não foi
diferente com a antropologia! Ora, o que isso quer dizer?
106
defendeu que de fato a antropologia da mídia pudesse constituir uma nova área do
conhecimento. Considerando a comunicação em massa e o avanço das tecnologias
da informação, Spitulnik levanta a possibilidade de que isso seja estudado a partir das
teorias e métodos antropológicos (CAMPANELLA; MARTINELI, 2010).
107
LEITURA
COMPLEMENTAR
PRECONCEITO DE COR E RACISMO NO BRASIL
108
O racismo surge, portanto, na cena política brasileira, como doutrina científica,
quando se avizinha à abolição da escravatura e, consequentemente, à igualdade política
e formal entre todos os brasileiros, e mesmo entre estes e os africanos escravizados.
Como não posso me alongar sobre esse ponto, remeto-os a alguns trabalhos já clássicos
sobre o período, entre os quais cabe destacar: A escola Nina Rodrigues, de Mariza Corrêa
(1998); e O espetáculo das raças, de Lilia Schwarcz (1993).
O racismo brasileiro, entretanto, não deve ser lido apenas como reação à
igualdade legal entre cidadãos formais, que se instalava com o fim da escravidão; foi
também o modo como as elites intelectuais, principalmente aquelas localizadas em
Salvador e Recife, reagiam às desigualdades regionais crescentes que se avolumavam
entre o Norte e o Sul do país, em decorrência da decadência do açúcar e da prosperidade
trazida pelo café. Quem não se lembra do temor de Nina Rodrigues ao ver se desenvolver
no Sul uma nação branca, enquanto a mestiçagem campeava no Norte?
109
Pois bem, Gilberto Freyre promove uma verdadeira revolução ideológica
no Brasil moderno ao encontrar na velha, colonial e mestiça cultura luso-brasileira
nordestina a alma nacional. Ethos esse que logo ganhará, em seus escritos políticos,
a partir de 1937, o nome de “democracia social e étnica”, por oposição à democracia
política da América do Norte e dos ingleses. Se há razão para dizer que as escolas de
direito e de medicina importaram as teorias raciais europeias de meados do século XIX
para atualizar e naturalizar, pela ciência, as desigualdades sociais e raciais brasileiras do
final do século (SCHWARCZ, 1993), com igual razão, pode-se afirmar que a “democracia
racial”, rótulo político dado às ideias de Gilberto, reatualizou, na linguagem das ciências
sociais emergentes, o precário equilíbrio político entre desigualdade social, autoritarismo
político e liberdade formal, que marcou o Brasil do pós-guerra.
110
Contudo, apenas em 1942, Pierson publica, em Nova Iorque, Negroes in Brazil,
fruto de sua pesquisa de doutorado na Bahia, entre 1935 e 1937. No prefácio à edição
brasileira de 1945, Arthur Ramos registra a novidade de um trabalho sociológico,
sistemático e em profundidade, para estudar as “relações raciais” que se desenvolvem
numa comunidade.
Essa mudança fora gestada nos Estados Unidos desde os anos 1910, quando os
primeiros cientistas sociais negros americanos, seguindo Franz Boas, desfizeram-se da
armadilha da definição biológica de “raça”, que explicava a condição social dos negros a
partir da hipótese de sua inferioridade inata, para realçarem, analisarem e discutirem a
heterogeneidade social, política e cultural do meio negro, concentrando-se na hipótese
de que a discriminação racial era o principal obstáculo para o progresso social, político
e cultural dos negros naquele país (Williams Jr., 1996). A outra vertente boasiana, aquela
desenvolvida por Herskovits em seus estudos de aculturação, fora paulatinamente
marginalizada pela sociologia que faziam os intelectuais negros, mais interessados em
realçar as oportunidades e as condições de vida como determinantes da situação social
e das atitudes pessoais e coletivas, em detrimento de fenômenos culturais.
De fato, para esses intelectuais, entre os quais podemos citar Du Bois, Monroe
Work, Brooker Washington, Alain Locke, entre outros, o transpasse do paradigma de
raça em Boas significava afirmar que as diferenças raciais (biológicas), ainda que não
inteiramente negadas, não poderiam ser responsabilizadas nem pela falta de integração
do negro nas sociedades americanas nem pelo seu desempenho inferior em relação
ao branco. Os fatores explicativos mais importantes para ambos os fenômenos seriam,
ao contrário, o preconceito, a discriminação e a segregação raciais. A explicação pela
“cultura”, que segundo Herskovits poderia ser um fator condicionante das dificuldades da
integração, adquirira, nos anos 1940, um caráter “conservador”, que só foi ultrapassado
depois dos anos 1960, quando a política de identidade passou a ser o principal foco do
ativismo negro.
A agenda de pesquisa que Pierson levou para a Bahia em 1935, como aluno de
doutorado em Chicago, sob a orientação de Robert Park, incorporava já a preocupação
principal com a integração e a mobilidade social dos negros, a hipótese de que o
preconceito racial seria o principal obstáculo a esta integração, em detrimento dos
aspectos de aculturação, conforme os ensinamentos de Park, que teorizou o ciclo da
assimilação social.
111
Entretanto, Pierson já encontrou aqui, entre os acadêmicos brasileiros, uma
história social do negro, desenvolvida por Gilberto Freyre, que fizera da miscigenação
e da ascensão social dos mulatos as pedras fundamentais de sua compreensão da
sociedade brasileira. Ou seja, para ser mais claro, eram fatos estabelecidos, já em 1935,
pelo menos entre os intelectuais modernistas e regionalistas, que: (a) o Brasil nunca
conhecera o ódio entre raças, ou seja, o “preconceito racial”; (b) as linhas de classe não
eram rigidamente definidas a partir da cor; (c) os mestiços se incorporavam lenta mas
progressivamente à sociedade e à cultura nacionais; (d) os negros e os africanismos
tendiam paulatinamente a desaparecer, dando lugar a um tipo físico e a uma cultura
propriamente brasileiros.
112
Em outras palavras: se não existia preconceito racial entre nós – tal como Blumer
(1939) o definia –, existiria preconceito de cor – tal como definido por Frazier (1942)? Ou
teríamos apenas preconceito de classe, como queria Pierson? Lembremo-nos de que o
preconceito racial é entendido, na sociologia de então, a partir do paradigma de Herbert
Blumer, como fundamentalmente um processo coletivo, que opera pelos “meios públicos
em que indivíduos que são aceitos como porta-vozes de um grupo racial caracterizam
publicamente um outro grupo racial”, definindo, neste processo, seu próprio grupo. Para
Blumer, isso equivale a colocar ambos os grupos em relação recíproca, definindo suas
respectivas posições sociais. São quatro os sentimentos que, segundo Blumer, estarão
sempre presentes no preconceito racial do grupo dominante: (a) de superioridade; (b) de
que a raça subordinada é intrinsecamente diferente e alienígena; (c) de monopólio sobre
certas vantagens e privilégios; e (d) de medo ou suspeita de que a raça subordinada
deseje partilhar as prerrogativas da raça dominante.
113
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:
• A antropologia rural tem a ver com o estudo das condições de vida das populações
rurais.
• A antropologia urbana tem a ver com o estudo das relações e dos espaços das
grandes cidades.
• Atualmente, as mídias digitais e as redes sociais também são usadas como meio
para pesquisas de campo em antropologia.
114
AUTOATIVIDADE
1 A antropologia da mídia pode ser considerada uma nova área dos estudos
antropológicos que surgiu na década de 1990 nos EUA. No Brasil, ela vem sendo
difundida aos poucos e a pandemia colaborou para isso, já que a internet e as redes
sociais começaram a ser mais utilizadas para as pesquisas etnográficas. Sobre a
antropologia da mídia, assinale a alternativa CORRETA:
2 A antropologia rural pode ser aproximada da etnologia indígena, tendo em vista que
ambas estão voltadas para a compreensão das populações mais negligenciadas
diante da sociedade envolvente. Com base nas informações sobre os objetos de
estudo da antropologia rural, analise as sentenças a seguir:
115
3 A antropologia urbana pode também ser considerada uma antropologia dos espaços
urbanos, já que um dos seus principais focos é o espaço em que acontecem as
relações sociais da cidade. De acordo com esse pressuposto, classifique V para as
sentenças verdadeiras e F para as falsas:
a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – V – V.
116
REFERÊNCIAS
ARRUDA, R. Etnologia indígena no Brasil: dos primórdios aos estudos de gênero. In:
Revista Sociedade e Ambiente. V. 1, n. 1, 2020, p. 107-122. Disponível em: https://bit.
ly/3BLfVvx. Acesso em: 10 fev. 2022.
BASTIDE, R. O candomblé da Bahia: rito nagô. Tradução de Maria Isaura Pereira Quei-
roz. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
BENISTE, J. As águas de Oxalá: (awon omi Osala). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.
CARDOSO DE OLIVEIRA, R. O que é isso que chamamos de antropologia brasileira? In: So-
bre o pensamento antropológico. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1998, p. 109-128.
GUIMARÃES, A. S. A. Preconceito de cor e racismo no Brasil. In: Rev. Antropol. 47 (1), 2004.
LARAIA, R. Cultura: um conceito antropológico. 14. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
Ed., 2001. Disponível em: https://bit.ly/3QqUwfs. Acesso em: 10 fev. 2022.
LIMA, M. Por uma antropologia do negro: o diálogo convergente entre Arthur Ramos e
Dante de Laytano. In: Em tempo de histórias. n. 22, Brasília, jan./jun. 2013, p. 78-100.
LODY, R. O povo do santo: religião, história e cultura dos orixás, voduns, inquices e
caboclos. Rio de Janeiro: Pallas, 1995.
PEIRANO, M. 2000. A antropologia como ciência social no Brasil. In: Etnográfica, Vol.
IV (2), pp. 219-232.
SANTOS, D.; PALOMARES, N.; NORMANDO, D.; QUINTÃO, C. Raça versus etnia: diferen-
ciar para melhor aplicar. In: Dental Press J. Orthod. 15 (3), jun. 2010. Disponível em:
https://bit.ly/3zAaNrw. Acesso em: 10 fev. 2022.
SILVA, M.; SOARES, R. Reflexões sobre os conceitos de raça e etnia. In: Entrelaçando.
n. 4, ano 2, nov. 2011, p. 99-115.
VELHO, O. 2008. A antropologia e o Brasil, hoje. In: RBCS, Vol. 23 nº. 66.
118
UNIDADE 3 —
O CAMPO DA
ANTROPOLOGIA
BRASILEIRA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
A cada tópico desta unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar
o conteúdo apresentado.
CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.
119
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!
Acesse o
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120
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
PANORAMA DA GRADUAÇÃO
E PÓS-GRADUAÇÃO EM
ANTROPOLOGIA NO BRASIL
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 1, abordaremos como pode ser realizada a formação em antropologia
no Brasil. Mas para que você entenda mais sobre isso, vamos pensar a respeito do
caminho que os antropólogos percorreram no Brasil desde a consolidação da disciplina
no nosso país.
NOTA
Não existem tantos cursos de graduação em Antropologia no Brasil
reconhecidos pelo MEC. Isso se deve ao fato de que, nos cursos de graduação,
é mais comum que a disciplina da antropologia apareça como uma das áreas
do curso de graduação em Ciências Sociais.
121
Do mesmo modo, também encontramos, no Brasil, várias universidades
públicas e privadas que disponibilizam cursos de pós-graduação e especialização em
Antropologia, ou mesmo cursos livres, como é o caso da UNIASSELVI.
INTERESSANTE
O antropólogo Nina Rodrigues, que já conhecemos anteriormente na nossa
disciplina, foi um desses primeiros estudiosos de antropologia no Brasil.
122
DICA
Se quiser saber mais sobre o trabalho de Lévi-Strauss, que é uma das maiores
referências para os antropólogos brasileiros, sugerimos que leia o texto Tristes
Trópicos, no qual o autor relata sobre os indígenas do Brasil Central. Disponível
em: https://docero.com.br/doc/8c8551.
IMPORTANTE
É importante termos em mente que a formação do antropólogo passa tanto
pelo estudo qualitativo quanto pelo estudo quantitativo. Enquanto o estudo
quantitativo tem a ver com cálculos matemáticos e estatísticas, o estudo
qualitativo tem a ver com a análise de resultados individuais dos participantes
da pesquisa de modo mais descritivo.
123
FIGURA 1 – UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
124
Sobre a formação do antropólogo no Brasil, Cordovil (2008, p. 2-3) também
aponta que:
125
3 O TRABALHO DO ANTROPÓLOGO EM CAMPO
De acordo com Roberto Cardoso de Oliveira (1996), o trabalho do antropólogo
consiste, sobretudo, em três atos: olhar, ouvir e escrever. No que diz respeito ao
trabalho do antropólogo em campo em especial, podemos considerar que os atos mais
preliminares são o olhar e o ouvir! Ora, vamos entender isso melhor.
ESTUDOS FUTUROS
O ato de escrever, que também faz parte do trabalho de campo, como
podemos observar nos chamados “diários de campo” dos antropólogos, pode
ser considerado um ato seguinte ao olhar e ouvir. Para fins de organização,
pensaremos mais a respeito desse ato de escrever no tópico seguinte quando
tratarmos do trabalho do antropólogo no gabinete.
NOTA
O termo “objetos de pesquisa” para se referir aos povos afastados pelos
antropólogos merece uma ressalva: apesar de serem nomeados como
“objetos”, precisamos ter em mente que são pessoas e grupos vivos que
possuem seus modos de viver particulares e devem ser tratados com respeito
e não somente como “objetos” de estudo!
126
do pela teoria disponível. Tendo por base essa teoria, o observador
bem preparado, enquanto etnólogo, iria olhá-la como um objeto de
investigação previamente já construído por ele, pelo menos numa
primeira prefiguração: passaria, então, a contar os fogos (pequenas
cozinhas primitivas), cujos resíduos de cinza e carvão indicariam
que em torno de cada um deles estiveram reunidos não apenas
indivíduos, porém “pessoas”, portanto “seres sociais”, membros de
um único “grupo doméstico”; o que lhe daria a informação subsidiária
que pelo menos nessa maloca, de conformidade com o número de
fogos, estaria abrigada uma certa porção de grupos domésticos,
formados por uma ou mais famílias elementares e, eventualmente,
de indivíduos “agregados” (originários de outro grupo tribal). Saberia,
igualmente, a totalidade dos moradores (ou quase) contando as redes
dependuradas nos mourões da maloca dos membros de cada grupo
doméstico. Observaria, também, as características arquitetônicas da
maloca, classificando-a segundo uma tipologia de alcance planetário
sobre estilos de residências, ensinada pela literatura etnológica
existente.
Esse exemplo tratado pelo autor nos mostra bem como seria o ato de olhar
realizado pela pesquisadora ou pelo pesquisador. Em poucas palavras, quando um
antropólogo chega em campo, ele passa a observar por meio do olhar tudo que o cerca,
nos mínimos detalhes, sendo que esse é o ponto de partida para qualquer trabalho de
campo!
127
rigorosamente observável na conduta ritual por ser ela "o elemento
mais estável e duradouro" se a compararmos com as crenças. Porém
isso não quer dizer que mesmo essa conduta, sem as idéias que a
sustentam, jamais poderia ser inteiramente compreendida. Descrito
o ritual, por meio do Olhar e do Ouvir (suas músicas e seus cantos),
faltava-lhe a plena compreensão de seu "sentido" para o povo que o
realizava e a sua "significação" para o antropólogo que o observava
em toda sua exterioridade. Por isso, a obtenção de explicações,
dada pelos próprios membros da comunidade investigada, permitiria
se chegar àquilo que os antropólogos chamam de "modelo nativo",
matéria-prima para o entendi- mento antropológico. Tais explicações
nativas só poderiam ser obtidas por meio da "entrevista", portanto, de
um Ouvir todo especial. Mas, para isso, há de se saber Ouvir.
Ainda de acordo com Cardoso de Oliveira (1996), o ato de ouvir está diretamente
relacionado ao método de pesquisa antropológico, conhecido como observação
participante. A partir desse método, o antropólogo passa a participar ativamente da
realidade do grupo em questão de modo que podem interagir “de igual para igual” com
aquele povo e assim obter conclusões mais assertivas.
DICA
Se quiser saber mais sobre o trabalho de Geertz nesse sentido, o que é uma
grande referência para os feitos da antropologia brasileira, sugerimos que leia
seu texto intitulado Trabalhos e vidas: o antropólogo como autor. Disponível
em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/1364.
128
Vamos ver como Cardoso de Oliveira (1996, p. 22) trata o tema em suas palavras:
129
Devemos entender, assim, por Escrever o ato exercitado por
excelência no gabinete, cujas características o singularizam de
forma marcante, sobretudo quando o compararmos com o que se
escreve no campo, seja ao fazermos nosso diário, seja nas anotações
que rabiscamos em nossas cadernetas. E se tomarmos ainda Geertz
por referência vemos que, na maneira pela qual ele encaminha suas
reflexões, é o Escreve aqui", portanto fora da situação de campo, que
cumpre sua mais alta função cognitiva. Por quê? Devido ao fato de
iniciarmos propriamente no gabinete o processo de textualização dos
fenómenos socioculturais observados "estando lá". Já as condições
de textualização, i.e., de trazer os fatos observados (vistos e ouvidos)
para o plano do discurso, não deixam de ser muito particulares e
exercem, por sua vez, um papel definitivo tanto no processo de
comunicação interpares (i.e., no seio da comunidade profissional),
quanto no de conhecimento propriamente dito. Mesmo porque há
uma relação dialética entre o comunicar e o conhecer, uma vez
que ambos partilham de uma mesma condição: a que é dada pela
linguagem. Embora essa linguagem seja importante em si mesma,
como tema de reflexão, haja vista aquilo que poderíamos chamar de
"guinada lingüística" (ou linguistics turn), que perpassa atualmente
tanto a filosofia como as ciências sociais, o aspecto que desejo
tratar aqui, se bem que de modo muito sucinto, é unicamente o da
disciplina e de seu próprio idioma, por meio do qual os que exercitam
a antropologia (ou, mesmo, qualquer outra ciência social) pensam
e se comunicam. Alguém já escreveu que o homem não pensa
sozinho, num monólogo solitário, mas o faz socialmente, no interior
de uma "comunidade de comunicação" e "de argumentação"(Apel,
1985). Ele está, portanto, contido no espaço interno de um horizonte
socialmente construído (no caso o da sua própria sociedade e/ou de
sua comunidade profissional). Desculpando-me pela imprecisão da
analogia, diria que ele se pensa no interior de uma "representação
coletiva": expressão essa, afinal, bem familiar ao cientista social e
que, de certo modo, dá uma ideia aproximada daquilo que entendo
por "idioma" de uma disciplina.
130
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu:
131
AUTOATIVIDADE
1 Para pensarmos a respeito da formação em antropologia no Brasil, é inevitável
percorrermos um caminho histórico que conta com a criação das primeiras
universidades até a criação dos primeiros cursos de pós-graduação na área. Tendo
em vista esse contexto em nosso país, assinale a alternativa CORRETA:
132
( ) As principais Universidades para cursar a graduação em Antropologia no sudeste
do Brasil são a UFF, a UFMG e a UFSCar.
( ) A região norte do Brasil não oferece possibilidade de graduação em Antropologia
em suas Universidades.
( ) As principais universidades que oferecem cursos de graduação em Ciências Sociais
no Brasil estão localizadas na região sudeste.
a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.
5 De acordo com Roberto Cardoso de Oliveira, o ato de escrever é algo que acontece,
sobretudo, depois da pesquisa realizada em campo. Nesse contexto, disserte sobre os
fundamentos da escrita antropológica a partir do pensamento desse autor.
133
134
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE
ANTROPOLOGIA NO BRASIL I:
GLOBALIZAÇÃO CULTURAL
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 2, nós abordaremos alguns conceitos atuais fundamentais para os
pensadores da antropologia brasileira. Partiremos da noção de globalização no seu
sentido amplo para depois pensarmos nas questões de globalização cultural.
FIGURA 5 – BANDEIRAS
135
Depois de aprendermos mais a respeito da formação e do trabalho das
antropólogas e dos antropólogos brasileiros, agora vamos entender mais sobre o
conceito de globalização cultural! Antes de qualquer coisa, para ficar claro o que é a
globalização cultural, vamos pensar mais a respeito do próprio conceito de globalização.
De acordo com Ribeiro (2011), existem duas definições básicas sobre o conceito
de globalização. A primeira definição tem a ver com a ampliação na circulação de coisas,
pessoas e informações numa escala global. Nas palavras do autor:
136
Já a segunda definição do conceito de globalização tratado pelo está relacionado
com uma verdadeira mistura das relações entre os lugares do mundo. Nas palavras de
Ribeiro (2011, p. 7):
ESTUDOS FUTUROS
A ideia de globalização, que gira em torno da raiz global, será importante para
entender a respeito do multiculturalismo adiante.
Agora que entendemos mais sobre a globalização em si, vamos, enfim, pensar
sobre a globalização cultural. Em poucas palavras, a globalização cultural tem a ver
com a influência da globalização sobre as culturas dos povos espalhados pelo globo.
Tomando a primeira definição de globalização consolidada por Ribeiro (2011), podemos
pensar antropologicamente a globalização, tendo em vista a circulação de coisas,
pessoas e informações.
DICA
Um texto muito importante com relação ao tema da globalização cultural,
que serve de referência para as antropólogas e os antropólogos brasileiros,
é intitulado Dimensões culturais da globalização, escrito pelo antropólogo
indiano Arjun Appadurai. Caso queira se aprofundar mais no tema, sugerimos
essa leitura! Disponível em: https://docero.com.br/doc/excexve.
137
“grupos étnicos, zonas ecológicas e locais de produção” (RIBEIRO, 2011, p. 12) a partir
das mercadorias de troca. Esse fenômeno, por sua vez, é uma marca do capitalismo
contemporâneo.
Ribeiro (2011, p. 16) cita o exemplo dos bichos de obra para pensar nesse tema:
138
De fato, o estudo de migrações internacionais provê cenários
interessantes para pensar e repensar as teorias sobre identidades
sociais e étnicas. O estudo dos bichos de obra, em particular,
provou-se altamente profícuo. Eram pessoas expostas, ao longo
de toda a sua vida laboral, aos interesses e efeitos do capitalismo
transnacional. No caso concreto de Yacyretá, a segmentação étnica
do mercado de trabalho estava estruturada de tal forma que no
topo da pirâmide encontravam-se italianos que trabalhavam para
a empreiteira principal, responsável pela execução da obra. As
grandes empresas transnacionais da construção civil possuem
obras em desenvolvimento em diferentes países do mundo. Os seus
trabalhadores, sobretudo os técnicos especializados, são transferidos
de obra em obra em escala global. O conjunto das obras conforma
os circuitos migratórios dos grandes projetos. Os bichos de obra são
pessoas que entram no circuito migratório dos grandes projetos e nele
passam a viver permanentemente durante sua vida de trabalho ativo.
Mais ainda, como encontrei entre os trabalhadores especializados
de origem italiana casos de até terceira geração de pessoas que
vivem permanentemente vinculadas aos circuitos migratórios dos
grandes projetos em escala mundial, considerei como o bicho de
obra arquetípico a pessoa nascida e criada em acampamentos de
grandes obras pelo mundo afora e que assume estes circuitos e
acampamentos como definidores de suas identidades.
140
FIGURA 8 – INDÚSTRIAS
ESTUDOS FUTUROS
A ideia de modernidade será importante para entender a relação entre o
multiculturalismo nas sociedades modernas no próximo item dos nossos
estudos.
141
na grande sociedade, ao hedonismo do prazer imediato e fácil, ao
permissivismo comportamental e ético, e ao consumismo oferecido
pela nova ordem econômica mundial fundada na hegemonia do livre
mercado globalizado.
FIGURA 9 – CONSUMO
INTERESSANTE
O sociólogo francês Michel Maffesoli (apud VIEIRA, 2014), professor da
Universidade de Sorbonne, afirma que o Brasil é um “laboratório da pós-
modernidade”. De acordo com o autor, nosso país seria dotado de uma
criatividade da juventude brasileira, um foco no presente e uma rejeição ao
individualismo que seriam próprios dessa era pós-moderna!
142
QUADRO 1 – DIFERENÇAS ENTRE MODERNIDADE E PÓS-MODERNIDADE
Modernidade Pós-modernidade
Redes de percepção e
Imprensa Audiovisual
conhecimento
Linha (história e Ponto (atualidade e
Figura do tempo
progresso) acontecimento)
Idade canônica O adulto O jovem
Logos (utopias, Imago (afetos e
Paradigma de atração
sistemas e programas) fantasmas)
Símbolo Sistemas (ideologias) Modelos (tecnologia)
Classe espiritual Inteligência laica Mídia (difusores e
(detentora do sagrado (professores e doutores) produtores)
social) O conhecimento A informação
O ideal (é necessário, é A performance (é
Referência legítima
verdade) necessário, funciona)
Motor de obediência A lei (dogmatismo) A opinião (relativismo)
Meio normal de influência A publicação A aparição
Estatuto do indivíduo Cidadão (a convencer) Consumidor (a seduzir)
Meio de identificação O herói A “star”
Li no livro (verdade Vi na TV (verdade como
Dicção da autoridade
como palavra impressa) uma imagem direta)
Regime de autoridade O legível (o fundamento O visível (o acontecimento
simbólica ou a verdade lógica) ou o verossímil)
O teórico ou o chefe O aritmético ou o líder
Unidade de direção social
(princípio ideológico) (princípio estatístico)
Centro de gravidade
A consciência O corpo
subjetiva
FONTE: <https://images.app.goo.gl/PfNKmU7Syp4LN3m28>. Acesso em: 10 mar. 2022
DICA
Por fim, sugerimos a leitura do texto Culturas híbridas: estratégias para entrar e
sair da modernidade, escrito pelo antropólogo argentino Néstor García Canclini,
que é uma grande referência para os antropólogos brasileiros.
FONTE: CANCLINI, N. G. Culturas Híbridas - estratégias para entrar e sair
da modernidade. Tradução de Ana Regina Lessa e Heloísa Pezza Cintrão. São
Paulo: EDUSP, 1997.
143
4 MULTICULTURALISMO
FIGURA 10 – MULTICULTURALISMO
Ora, a justiça social e a luta por direitos, sejam eles sociais, políticos, econômicos
e mesmo culturais, fazem parte de uma luta maior pela igualdade. De acordo com o
importante sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, amplamente utilizado
como referência para os antropólogos brasileiros, o multiculturalismo significa “a
coexistência de formas culturais ou de grupos caracterizados por culturas diferentes no
seio de sociedades ‘modernas’” (SANTOS; NUNES, 2003, p. 26).
144
a construção de um multiculturalismo emancipatório. Diante dessa
tensão, questionam os autores: Como é possível, ao mesmo tempo,
exigir que seja reconhecida a diferença, tal como ela se constituiu
através da história, e exigir que os “outros” nos olhem como iguais e
reconheçam em nós mesmos direitos de que são titulares?
Esse questionamento citado por Kretzmann nos faz retornar ao que foi
mencionado sobre a coexistência de diferentes culturas nas sociedades modernas.
Assim como o conceito de pós-modernidade, o conceito de multiculturalismo também
apresenta suas dificuldades na hora de ser definido. Contudo, a autora afirma que o
multiculturalismo passou a ser um conceito usado para “descrever as diferenças
culturais em um contexto transnacional e global” (KRETZMANN, 2017, p. 15).
DICA
Caso queira saber mais sobre a luta pela igualdade pautada no
multiculturalismo, sugerimos a leitura do texto Reconhecer para libertar: os
caminhos do cosmopolitismo multicultural, organizado por Boaventura de
Sousa Santos. Disponível em: https://wandersoncmagalhaes.files.wordpress.
com/2013/12/reconhecerparalibertar.pdf. Acesso em: 23 jun. 2022.
145
Dada a globalização, muitos dos países espalhados pelo mundo são considerados
multiculturais. Países como Canadá, México, Austrália, Brasil e mesmo países da Europa
possuem lutas multiculturais em torno da luta pelos direitos dos grupos à margem da
sociedade. Sobre os países americanos, Kretzmann (2017, p. 15-16) comenta que:
146
IMPORTANTE
Dentre esses países que possuem as características específicas do
multiculturalismo que foram mencionadas, devemos destacar o nosso próprio
país! O Brasil abrange uma enorme pluralidade cultural e étnica, como vimos
ao longo de toda a nossa disciplina, e por isso podemos dizer que o Brasil
é de fato multicultural. Além disso, como também já vimos, existem grupos
sociais, como indígenas e quilombolas, que são inferiorizados perante a
sociedade dominante e que reúnem inúmeras lutas pelo reconhecimento de
seus direitos. Esse é um fenômeno próprio do multiculturalismo brasileiro.
147
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu:
• A segunda definição de globalização tem a ver com a mistura das relações entre os
diversos locais do planeta.
• A globalização cultural, por sua vez, está voltada para a influência da globalização
sobre as culturas espalhadas pelo planeta.
• O multiculturalismo tem a ver com a luta pelo reconhecimento dos direitos das
populações inferiorizadas na sociedade.
148
AUTOATIVIDADE
1 A modernidade é uma era que nasceu a partir do Iluminismo na Europa durante o
século XVIII, marcando a primazia do pensamento racional. Sobre a modernidade no
Brasil e no mundo, assinale a alternativa CORRETA:
149
( ) Uma frase comum que marca o contexto pós-moderno é a “eu vi na TV”, tomando a
verdade como uma imagem direta.
( ) O contexto pós-moderno dá mais importância para o que é legível do que para o
que é visível.
( ) O grande fluxo de informação disponibilizado na mídia é uma marca do contexto
pós-moderno.
a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.
150
UNIDADE 3 TÓPICO 3 -
TEMAS CONTEMPORÂNEOS DE
ANTROPOLOGIA NO BRASIL II: ANTROPOCENO
E BRASIL PÓS-PANDEMIA
1 INTRODUÇÃO
No Tópico 3, nós abordaremos o conceito de Antropoceno. Esse é um tema
que gera uma ampla discussão, pois coloca em xeque a época em que vivemos. Assim,
tendo em vista a ação humana sobre o planeta como um todo, pensaremos a respeito
de algumas de suas consequências.
2 O QUE É ANTROPOCENO?
151
Talvez você já tenha ouvido algo sobre o conceito de Antropoceno, mas,
afinal, o que ele quer dizer? Esse termo foi empregado pela primeira vez pelo biólogo
estadunidense Eugene Stoemer na década de 1980, mas somente foi formalizado nos
anos 2000 numa publicação em conjunto com o Prêmio Nobel de Química pelo químico
holandês Paul Crutzen. Nesse escrito, o termo Antropoceno foi utilizado para se referir
à era geológica atual, enfatizando a atuação do homem sobre a geologia e a ecologia e
o coincidente aumento das concentrações de gás carbônico e gás metano no mundo
(SILVA; ARBILLA, 2018).
NOTA
O gás carbônico e o gás metano são compostos químicos produzidos,
sobretudo, pela queima de combustíveis fósseis como o petróleo, por
queimadas e desmatamentos, pela pecuária, entre outros fatores. Esses
gases são responsáveis pela maior parte do efeito estufa, aquele fenômeno
relacionado ao aquecimento global do nosso planeta. Isso é perigoso devido
a algumas consequências como o derretimento das calotas polares, elevação
dos níveis oceânicos e extinção de espécies.
INTERESSANTE
Eugene Stoemer criou o termo, mas Paul Crutzen que foi o vencedor do
Prêmio Nobel de Química, popularizou o uso da palavra Antropoceno.
Crutzen comenta que usou o termo Antropoceno no calor do momento,
rebatendo alguém que havia comentado algo sobre o Holoceno, e tornou
o termo famoso.
152
Vivemos em um mundo de paisagens em ruínas e inesperadas
catástrofes ambientais. As mudanças climáticas são uma das
grandes pautas da ciência e da política contemporâneas, e perdas
de biodiversidade nos levam ao que vem sendo chamado de a Sexta
Extinção. Nas últimas décadas, cunhou-se o termo Antropoceno para
se referir ao impacto de proporções geológicas que a jornada humana
teve sobre a transformação da dinâmica ambiental do planeta. É
um debate que tem transformado também os estudos ambientais,
tanto nas Ciências da Natureza, quanto nas Ciências Humanas, sob o
desafio de observar esse processo em andamento (TSING, 2019, p. 5).
ESTUDOS FUTUROS
Anna Tsing também é uma referência para os antropólogos brasileiros que
pesquisam sobre a antropologia multiespécie, como veremos adiante.
DICA
Caso queira explorar mais o tema do Antropoceno e seus impactos,
sugerimos que visite o chamado Atlas Feral disponível no link https://
feralatlas.org. O site reúne um trabalho colaborativo entre diversos cientistas,
pesquisadores da área acadêmica, artistas e escritores de diversas partes do
mundo. Esse trabalho teve por objetivo analisar alguns fenômenos mundiais
nesse período do Antropoceno.
153
QUADRO 2 – ESCALA DE TEMPO GEOLÓGICO INTERNACIONAL
Outro fato importante com relação ao Antropoceno é que autores como Stoemer
defendem que ele corresponde ao início da Revolução Industrial e à criação da máquina a
vapor. Isso tudo marcou um período de grandes transformações com relação à evolução
do planeta Terra. Além disso, no ano de 2004 foi publicado um livro chamado Global
Change and the Earth System: A Planet Under Pressure pelo Internacional Geosphere-
Biosphere Programme (IGBP). O mencionado livro considerou que existe uma série de
fatores ambientais e socioeconômicos que marcaram o início do Antropoceno, os quais
foram chamados de Grande Aceleração (SILVA; ARBILLA, 2018).
154
A Grande Aceleração envolve principalmente os fatores que os pesquisadores
Silva e Arbilla resumiram a seguir:
DICA
Se quiser ler mais sobre o Antropoceno no contexto antropológico,
sugerimos o livro do antropólogo francês Bruno Latour Onde aterrar? Como se
orientar politicamente no Antropoceno, muito difundido entre os antropólogos
brasileiros.
155
3 ABORDAGENS DA ANTROPOLOGIA MULTIESPÉCIE
Agora que entendemos mais sobre o termo Antropoceno, vamos refletir sobre
as abordagens da antropologia multiespécie. Ora, o que significa o termo multiespécie?
Em poucas palavras, podemos dizer que multiespécie se refere a um tipo específico de
relação que envolve seres de diferentes espécies. Em primeiro plano, essas relações se
referem ao que acontece entre seres humanos e não humanos, mas também podem se
referir a relações entre seres não humanos e outros seres não humanos. Dentre esses
seres não humanos estão os animais, as plantas, os fungos, entre outros.
NOTA
O termo antropocentrismo é usado para se referir a uma linha de
pensamento que entende o ser humano como o centro do universo e de
certa forma superior a todos os outros seres que existem no mundo.
156
Conforme aponta o pesquisador brasileiro Felipe Süssekind (2018) da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, estudioso das relações multiespécie, para
entendermos essas relações devemos passar por duas etapas. A primeira etapa tem
a ver com o próprio antropocentrismo que conduz o pensamento antropológico na
medida em que coloca a vida humana como superior à vida de todos aqueles que não
são humanos. A segunda etapa, por sua vez, está voltada para aquela distinção entre
cultura e natureza que vimos no início de nossa disciplina.
DICA
Se quiser conhecer mais sobre os escritos recentes voltados para as relações
multiespécie no campo da antropologia brasileira de outros pesquisadores,
sugerimos que leia os textos: Brotou batata para mim, de Ana Gabriela Morim
de Lima, Entre plantas e palavras, de Joana Cabral de Oliveira, O funeral do
caçador: caça e perigo na Amazônia, de Uirá Garcia e A cosmopolítica dos
animais, de Juliana Fausto.
157
contemporâneas. A compreensão da inter-relação entre a ação
humana e os fenômenos naturais e ambientais revela, além disso,
possíveis pontes entre o pensamento científico contemporâneo e o
pensamento de povos e culturas que de fato nunca conceberam o
humano como um domínio separado e oposto àquela da natureza. O
diálogo com cosmologias indígenas, a catástrofe climática, a extinção
de espécies, as paisagens devastadas e os modos de vida ligados a
elas, esses são também temas cruciais para os debates em torno dos
estudos multiespécies.
DICA
Além dos estudos estrangeiros de Anna Tsing, outra grande referência para
os antropólogos brasileiros que são interessados nas relações multiespécie
é a antropóloga estadunidense Donna Haraway, mencionada por Süssekind.
Por isso, também sugerimos que procure pelos trabalhos desta autora.
Ora, isso quer dizer que não existe vida humana sem as outras espécies e sem
a relação com as outras espécies! Os processos sociais e culturais dos seres humanos
também envolvem a relação com outras espécies.
INTERESSANTE
Além do âmbito antropológico, a questão das relações multiespécie também
tem perpassado o âmbito da própria legislação brasileira no que diz respeito
ao reconhecimento de famílias multiespécie no caso da guarda de animais
domésticos. Isso acontece quando uma família reconhece seus animais de
estimação como membros da própria família e assim passam a reivindicar
os direitos de família a esses animais. No caso de separação de um casal,
por exemplo, isso pode ter como consequência a guarda compartilhada
dos animais domésticos, o que anteriormente só acontecia com relação
aos filhos humanos. Por isso, mais uma vez se torna importante a análise
antropológica sobre esse assunto!
158
4 DOENÇAS INFECCIOSAS, AGRONEGÓCIO E BRASIL PÓS-
PANDEMIA
159
DICA
Se quiser saber mais sobre a relação entre a pandemia do novo coronavírus
e o agronegócio, sugerimos que leia o texto Pandemia e agronegócio escrito
por Rob Wallace.
FIGURA 17 – AGRONEGÓCIO
Ainda de acordo com Wallace, conforme comenta Silva (2000, p. 428), outras
doenças infecciosas e mesmo surtos epidêmicos como a gripe aviária e a gripe suína,
assim como a Covid-19, surgiram em função da expansão do agronegócio mundial, o qual
“destrói sistemas florestais inteiros e aumenta a interface com vetores de transmissão,
facilitando assim o chamado transbordamento (spillover) sobre populações humanas”.
160
INTERESSANTE
Movimentos a favor dos direitos dos animais, como o veganismo, também
reforçam essas ideias estabelecidas por Wallace e por isso são contra a
produção de animais para consumo humano. As pessoas que fazem parte
da corrente vegana boicotam o consumo a qualquer produto animal ou que
seja derivado de animais, como carnes, ovos, laticínios e mesmo roupas de
couro ou qualquer outra coisa que venha de animais.
161
DICA
Sugerimos que leia o texto Agronegócio e pandemia no Brasil: uma sindemia
está agravando a pandemia da Covid-19, na íntegra. Disponível em: https://bit.
ly/3QudMbJ. Acesso em: 23 jun. 2022.
Ora, o que significa fazer parentes e não bebês? Isso não significa que os seres
humanos deveriam parar de se reproduzir ou ter filhos, mas outra coisa! Isso significa
que os seres humanos deveriam expandir a sua abrangência de parentes, ou seja, que
deveriam não somente abranger os seres humanos como seus parentes, mas também
novos parentes multiespécie. De acordo com Haraway (2016), uma saída para a crise
mundial que vivemos é estabelecer novas formas de relações com animais, plantas e
outros seres no sentido de que todos dependemos uns dos outros e que devemos nos
cuidar!
Vamos terminar nossa disciplina com as palavras de Anna Tsing (2019), quem
assume que estamos vivendo em tempos difíceis ou mesmo em uma “ruína”:
162
As paisagens globais de hoje estão repletas desse tipo de ruína. Ainda
assim, esses lugares podem ser animados apesar dos anúncios de
sua morte; campos de ativos abandonados às vezes geram novas
vidas multiespécies e multiculturais. Em um estado global de
precariedade, não temos outras opções além de procurar vida nessa
ruína (TSING, 2019, p. 2).
DICA
Sugerimos que leia o texto Viver nas ruínas: paisagens multiespécie no
antropoceno, de Anna Tsing na íntegra. Disponível em: https://bit.ly/3vRw3bg.
163
LEITURA
COMPLEMENTAR
ANTROPOCENO, CAPITALOCENO, PLANTATIONOCENO, CHTHULUCENO:
FAZENDO PARENTES
Donna Haraway
164
Anna Tsing (2015), em um artigo recente chamado “Feral Biologies”, sugere que
o ponto de inflexão entre o Holoceno e o Antropoceno pode eliminar a maior parte dos
refúgios a partir dos quais diversos grupos de espécies (com ou sem pessoas) podem
ser reconstituídos após eventos extremos (como desertificação, desmatamento…). Isso
tem parentesco com o argumento da World-Ecology, Research Network, coordenada
por Jason Moore, de que a natureza barata está no fim; o barateamento da natureza
não pode continuar mais a sustentar a extração e a produção no e do mundo
contemporâneo, porque a maioria das reservas da terra foram drenadas, queimadas,
esgotadas, envenenadas, exterminadas e, de várias outras formas, exauridas. Vastos
investimentos em tecnologias extremamente criativas e destrutivas podem conter esse
acerto de contas, mas a natureza barata realmente acabou. Anna Tsing argumenta que
o Holoceno foi um longo período em que os refúgios, os locais de refúgio, ainda existiam,
e eram até mesmo abundantes, sustentando a reformulação da rica diversidade cultural
e biológica. Talvez a indignação merecedora de um nome como Antropoceno seja a da
destruição de espaços-tempos de refúgio para as pessoas e outros seres. Eu, juntamente
com outras pessoas, penso que o Antropoceno é mais um evento-limite do que uma
época, como a fronteira K-Pg entre o Cretáceo e o Paleoceno. O Antropoceno marca
descontinuidades graves; o que vem depois não será como o que veio antes. Penso que
o nosso trabalho é fazer com que o Antropoceno seja tão curto e tênue quanto possível,
e cultivar, uns com os outros, em todos os sentidos imagináveis, épocas por vir que
possam reconstituir os refúgios.
Então, penso que mais do que um grande nome, na verdade, é preciso pensar
num novo e potente nome. Assim, Antropoceno, Plantationoceno e Capitaloceno
(termo de Andreas Malm e Jason Moore antes de ser meu). E também insisto em que
precisamos de um nome para as dinâmicas de forças e poderes chthonicas em curso,
das quais as pessoas são uma parte, dentro das quais esse processo está em jogo.
Talvez, mas só talvez, e apenas com intenso compromisso e trabalho colaborativo com
outros terranos, será possível fazer florescer arranjos multiespécies ricas, que incluam
as pessoas. Estou chamando tudo isso de Chthuluceno – passado, presente e o que está
por vir. Estes espaços-tempos reais e possíveis não foram nomeados após o pesadelo-
racista e misógino do monstro Cthulhu (note diferença na ortografia), do escritor de
ficção científica H. P. Lovecraft, e sim após os diversos poderes e forças tentaculares de
toda a terra e das coisas recolhidas com nomes como Naga, Gaia, Tangaroa (emerge da
plenitude aquática de Papa), Terra, Haniyasu-hime, Mulher-Aranha, Pachamama, Oya,
Gorgo, Raven, A’akuluujjusi e muitas mais. “Meu” Chthuluceno, mesmo sobrecarregado
com seus problemáticos tentáculos gregos, emaranha-se com uma miríade de
temporalidades e espacialidades e uma miríade de entidades em arranjos intra-ativos,
incluindo mais-que-humanos, outros-que-não-humanos, desumanos e humano-
como-húmus (human-ashumus). Mesmo num texto em inglês-americano como este,
Naga, Gaia, Tangaroa, Medusa, Mulher-Aranha, e todos os seus parentes, são alguns
165
dos muitos mil nomes próprios para uma linhagem de ficção científica que Lovecraft
não poderia ter imaginado ou abraçado – ou seja, teias de fabulação especulativa,
feminismo especulativo, ficção científica e fatos científicos. O que importa é que
narrativas contam narrativas, e que conceitos pensam conceitos. Matematicamente,
visualmente e narrativamente, é importante pensar que figuras figuram figuras, que
sistemas sistematizam sistemas.
Todos os mil nomes propostos são grandes demais e pequenos demais; todas
as histórias são grandes demais e pequenas demais. Como Jim Clifford me ensinou, nós
precisamos de narrativas (e teorias) que sejam grandes o bastante (e não mais que isso)
para reunir as complexidades e manter as bordas abertas e ávidas por novas e velhas
conexões surpreendentes (CLIFFORD, 2013).
Uma maneira de viver e morrer bem, como seres mortais no Chthuluceno, é unir
forças para reconstituir refúgios, para tornar possível uma parcial e robusta recuperação
e recomposição biológica-cultural-política-tecnológica, que deve incluir o luto por
perdas irreversíveis. Thom van Dooren (2014) e Vinciane Despret (2013) me ensinaram
isso. Há tantas perdas já, e haverá muitas mais. Esse renovado florescimento generativo
não pode ser criado a partir de mitos de imortalidade ou do fracasso de nos tornarmos
parte dos mortos e extintos. Há um monte de trabalho para o Orador dos Mortos de
Orson Scott Card (1986) e ainda mais para a reformulação de Ursula Le Guin em Always
Coming Home.
166
possa abraçar a diversidade das pessoas. É chegada a hora de as feministas exercerem
liderança também na imaginação, na teoria e na ação, para desfazer ambos os laços: de
genealogia/parentesco e parentes/espécies.
Bactérias e fungos são excelentes para nos dar metáforas, mas, metáforas a
parte (boa sorte com isso!), nós temos um trabalho de mamífero a fazer com os nossos
colaboradores e cotrabalhadores sim-poiéticos, bióticos e abióticos. Precisamos fazer
parentes sim-chthonicamente, sim-poieticamente. Quem e o que quer que sejamos,
precisamos fazer-com – tornar-com, compor-com – os “terranos” (obrigado por esse
termo, Bruno Latour-em-modo anglófono)[13]. Nós, pessoas humanas em todos os
lugares, devemos abordar as urgências sistêmicas intensas; no entanto, até agora, como
Kim Stanley Robinson (2012) colocou em 2312, estamos vivendo tempos de “Hesitação”
(esta narrativa de ficção científica, que vai de 2005 a 2060, é demasiado otimista?), um
“estado de agitação incerto”. Talvez “A Hesitação” seja um nome mais apropriado do
que Antropoceno ou Capitaloceno! “A Hesitação” será gravada nos estratos rochosos
da terra; na verdade, já está escrita nas camadas mineralizadas da terra. Os sim-
ctônicos não hesitam; eles compõem e se decompõem, práticas tão perigosas quanto
promissoras. O mínimo que se pode dizer é que a hegemonia humana não é um caso
sim-chthonico. Como definem os artistas ecossexuais Beth Stephens e Annie Sprinkle,
a compostagem é tão quente!
Meu propósito é fazer com que “parente” signifique algo diferente, mais do
que entidades ligadas por ancestralidade ou genealogia. O movimento suave de
desfamiliarização pode parecer, por um momento, um erro, mas depois (com sorte)
aparecerá sempre como correto. Fazer parentes é fazer pessoas, não necessariamente
como indivíduos ou como seres humanos. Na Universidade, fui movida pelos trocadilhos
de Shakespeare, kin e kind (parente e gentil em português) – os mais gentis não eram
necessariamente parentes de uma mesma família; tornar-se parente e tornar-se gentil
(como categoria, cuidado, parente sem laços de nascimento, parentes paralelos, e
vários outros ecos) expande a imaginação e pode mudar a história. Marilyn Strathern
me ensinou que os “parentes”, em inglês britânico, eram originalmente “relações
lógicas” e só se tornaram “membros da família” no século 17. Este, definitivamente, está
entre os factoides que eu amo. Saia do inglês e os selvagens se multiplicam. Penso
que a extensão e a recomposição da palavra “parente” são permitidas pelo fato de que
todos os terráqueos são parentes, no sentido mais profundo, e já passaram da hora de
começar a cuidar dos tipos-como-arranjos (não espécies uma por vez). Parentesco é
uma palavra que traz em si um arranjo. Todos os seres compartilham de uma “carne”
comum, paralelamente, semioticamente e genealogicamente. Os antepassados
mostram-se estranhos muito interessantes; parentes são não familiares (fora do que
pensávamos ser a família ou os genes), estranhos, assombrosos, ativos. Demais para
um pequeno slogan, eu sei! Ainda assim, tente. Nos próximos dois séculos, ou mais,
talvez os seres humanos deste planeta possam ser novamente dois ou três bilhões,
167
aproximadamente e, nesse tempo, fazer parte de um bem-estar cada vez maior para
os diversos seres humanos e outros seres, agindo como meios e não apenas como fins.
Então, faça parentes, não bebês! O que importa é como parentes geram parentes.
FONTE: <http://climacom.mudancasclimaticas.net.br/antropoceno-capitaloceno-plantationoceno-
chthuluceno-fazendo-parentes/>. Acesso em: 10 mar. 2022.
168
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu:
• Antropoceno tem a ver com essa época marcada pelo aumento das concentrações
de gás carbônico e gás metano no planeta.
• Antropoceno também tem a ver com uma época em que as ações dos seres
humanos passaram a ser consideradas uma nova força geológica sobre o planeta.
169
AUTOATIVIDADE
1 Com base na definição acerca do conceito de Antropoceno, os pesquisadores da
antropologia brasileira encontraram novas formas de refletir sobre a época em que
vivemos. Tendo em vista esse conceito, assinale a alternativa CORRETA:
170
( ) Multiespécie é um termo utilizado para se referir a um tipo de relação que envolve
seres de diferentes espécies.
( ) O estudo sobre as relações multiespécie pertence ao âmbito da antropologia na
medida em que se distancia da biologia.
( ) O estudo sobre as relações multiespécie representou uma verdadeira virada
nos estudos antropológicos, sendo que trouxe uma forma de escapar do
antropocentrismo.
a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.
5 Alguns estudiosos afirmam que há uma relação direta entre o agronegócio global e a
proliferação de doenças infecciosas e mesmo pandemias. Tendo em vista essa afirmação,
disserte sobre como isso tem a ver com o contexto brasileiro.
171
REFERÊNCIAS
ABRASCO. IPEN. Agronegócio e pandemia no Brasil: uma sindemia está agravando
a pandemia de Covid-19? 2021. Disponível em: https://www.abrasco.org.br/site/wp-
content/uploads/2021/05/Agronegocio-_-ABrasco-IPEN.pdf. Acesso em: 27 fev.
2022.
172
SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência
universal. Rio de janeiro: Record, 2010.
TSING, A. L. Viver nas ruínas: paisagens multiespécie no antropoceno. Brasília: IEB Mil
Folhas, 2019. Disponível em: https://bit.ly/3vRw3bg. Acesso em: 8 mar. 2022.
173