A Metodologia de Santo Tomás
A Metodologia de Santo Tomás
A Metodologia de Santo Tomás
Introdução.
1
Estes autores nos presentearam, basicamente, dois métodos: um dedutivo, o platônico e
outro indutivo, o aristotélico. Mas isso não significa que Aristóteles não se valia da dedução
ou que Platão não aplicava a indução. O fato é que o rico legado platônico e aristotélico
persistem até hoje sob outras formas variantes de dedução e indução.
método ou, como nos alude Leo Elders, os seus métodos2. Um ou muitos,
parece-nos que independente disso, o procedimento era o mesmo, pois só
diversificava quanto à aplicação. Seria um equívoco igualar o método tomista
ao método escolástico, comumente valido pelos demais autores medievais,
sem mostrar as diferenças introduzidas pelo Aquinate3. A palavra metodologia
serve adequadamente para significar aqui o estudo filosófico do método de
investigação de São Tomás de Aquino.
1. A Metodologia Tomista.
7
ALARCÓN, E. Uma cuestión de método. Consideraciones previas a la interpretación de
Sto. Tomás de Aquino , Aquinate, 1 (2005), pp. 200-213.
8
In II Met. lec5.
9
STh.I,q1,a1,c.
10
FAITANIN, P. Principium individuationis: Estudio metafísico de la doctrina de la individuación en
Tomás de Aquino. Tesis doctoral. Pamplona: Universidad de Navarra, 2001, 21-31.
real11. Até aqui temos o procedimento básico do método tomista, que não
erraríamos se o denominássemos de método gnosiológico, por pertencer
naturalmente ao modo como o nosso intelecto conhece a realidade e como,
por abstração, forma os conceitos. Mas a grande contribuição tomista para a
metodologia passa pela metafísica. Vejamos.
2. Método metafísico.
11
STh. I,q79,a8,c.
12
In de Trin. lec.2,q2,a1,c3.
13
STh.I,q30,a3,ad2;In II Sent.d24,q3,a1,c.
14
In I Periher. lec. 3,n.3.
15
STh.I,q11,a3,c.
16
STh.I,q13,a9,c.
17
STh.I,q29,a1,ad1.
18
In I Periher. lec.10.
19
STh.I,q30,a4,c.
29
In VII Met. lec13.
30
De ente et ess. c3.
31
STh. III,q13,a12,c.
32
STh.q27,a2,ad2.
33
In I Sent. d2,q1,a3.
34
CG.IV,11.
35
In I Perih.lec.16.
36
In De Trin.lec2,q2,a1,c3.
naquilo que existe por essência e tudo o que é devir no ser37. O método
filosófico é posto a serviço da teologia.
O método próprio da teologia é o resolutivo ou dedutivo, ou seja, o que
vai dos princípios universais e simples dos quais derivam todos os outros38. O
que move o teólogo a argumentar não são os primeiros princípios metafísicos,
mas os artigos de fé. Contudo, o Aquinate compõe a sua demonstração
teológica com uns e outros, harmonizando-os39. Por meio dos artigos de fé, o
crente pode vir a chegar a outras conclusões, discorrendo dos princípios às
conclusões40. Por isso, a teologia é, também, ciência e todas as demais ciências
a ela se subordinam, porque seus princípios se subordinam, na demonstração,
aos princípios da teologia, que são os artigos de fé41. Ao método dedutivo se
junta à metodologia teológica tomista o argumento de autoridade, cuja
autoridade é a Sagrada Escritura.
O método indutivo da filosofia é instrumento do da teologia. A filosofia
mediante o seu método pode demonstrar os preâmbulos da fé, mas não os
artigos de fé, que são dados revelados pela Escritura. O método filosófico
pode indicar certa conveniência dos fatos da fé, tentar dar uma explicação
limitada pelo intelecto e demonstrar a conexão entre os artigos de fé. Por via
negationis o método de demonstração filosófico pode estabelecer como os
argumentos contrários aos artigos de fé são falsos e inconclusivos42. Em
qualquer caso, o método filosófico é fundamental para a demonstração
teológica. Com ele, são igualmente importantes os princípios da metafísica
tomista, porque são os elementos de toda e qualquer ulterior demonstração.
Neste sentido, as noções de primeiros princípios, ente, ato de ser, essência e
existência são fundamentais para a metodologia tomista.
37
De subst. sep.c9,n94.
38
STh.I-II,q14,a5,c.
39
In De Trin.proem.q2,a2.
40
In De Trin.proem.q2,a2.
41
STh.I,q1,a2,c.
42
In De Trin.proem.q2,a3.
43
STh.I q33 a1, c.
44
STh. I-II,q57,a1.
45
STh.I-II,q35,a4,c.
46
STh.I-II,q.77,a2,ob3.
47
In I Peri. c.16.
48
STh.I-II,q94,a2.
49
In IV Met. lec.6.
50
STh.I-II,q94,a2;De ver.q5,a2,ad7.
51
STh.I,q13,a7.
52
STh.I-II,q94,a2;De ver.q5,a2,ad7.
53
In IV Sent.d1,q1,a4;STh.I,q79,a13.
54
In I Sent.d35,q1,a1.
55
STh.I,q5,a6,ad3/q13,a10,c;In II Sent. 22,1,3,ad2.
56
C.G.4,49.
57
C.G.1,33.
58
STh.I,q4,a2,c.
59
In I Met. lec.9, n.139.
60
STh.I,q3,a5,c.
61
STh.I,13,a5,c.
62
STh.I,13,a10,c.
63
In I Sent.22,1,3,ad2.
64
In V Met. lec.9, n.885.
propriamente ser65 e, por esta razão, não há ciência acerca do ente por
acidente66. O ente que é considerado abstraído da realidade concreta, pelo
intelecto, é denominado ente abstraído ou ente de razão67. Há o ente de razão
com fundamento no real, dito desta maneira porque resultou da abstração de
uma realidade concreta, como o conceito de maçã. Há, também, o ente de
razão raciocinado, enquanto produzido pela razão só a partir dos dados da
imaginação, com as imagens que já existem nela, daí ente de razão derivado do
raciocínio da razão, como produzido pela imaginação, por exemplo, uma
maçã com asas, ou minotauro.
Daí, ente de razão com fundamento no real e ente de razão raciocinado
ou raciocinante. De qualquer modo, a consideração do ente de razão é própria
da Lógica68 e do ente real, considerado em si mesmo, é próprio da Metafísica.
Em um e outro caso, o estudo do ente é primeiríssimo, porque é o que
primeiro capta o intelecto quando considera o real69. Concluindo, quando o
intelecto concebe o ente afirma que o ente é aquilo que é e o não-ente aquilo
que não é, sendo impossível conceber o ente sendo e não sendo ao mesmo
tempo. Desta captação do conceito de ente, o intelecto, a partir da aplicação
dos primeiros princípios de conhecimento - que possui como hábitos -
formula a noção de ente em ato. Como veremos, a noção de ente em ato
constitui uma das principais doutrinas tomistas. Lembremos que até aqui foi
aplicado o método indutivo, que partiu da consideração singular e ascendeu
por abstração a conceitos abstraídos e separados de suas condições
individuais, tal como a natureza da coisa existe na realidade.
65
In XI Met. lec.8, n.2272.
66
In VI Met. lec.2, n.1172-1176.
67
STh.I-II,q8,a1,ad3.
68
In IV Met. lec.4, n.574.
69
In I Met. lec.2, n.46.
70
In VI Met. lec.2, n.1171.
71
In IX Met. lec.3, n.1805.
72
In IX Met. lec.5, n. 1828-1831.
73
In IX Met. lec.7, n. 1845.
74
In V II Met. lec.2, n. 1278; IX, lec.7, n. 1847-1848; IX, lec.8, n. 1856; In XII, lec.4, n.
2480-2481; In XII lec.6, n. 2506.
que a potência, pois a sua privação é o mal75; diz-se ato primeiro o ser de algo
e ato segundo sua operação, que provém do ser. Daí que o operar segue o ser. A
potência é dupla: a potência ao ser que é da matéria e a potência de operar que
é da forma76. Diz-se potência ativa a de operar e potência passiva a de receber
algo de outro77. A potência ativa pode ser imanente, quando permanece no
agente e transeunte, quando termina em outro78. A potência da matéria é
princípio de recepção do ser e a potência da substância é princípio de
operação. A potência metafísica é a da ordem do ser, como a da matéria à
forma. A contínua consideração abstrata do ente pelo método metafísico,
conduz o intelecto à distinção do ser e da essência.
Temos visto que o ente é o que tem ser79, ato de ser80, perfeição, pela
qual alguma coisa existe81, subsiste e é o que de mais nobre82, perfeito, digno e
íntimo83 há na natureza da coisa84, como ato de todos os atos85 e ato de tudo o
que existe e de qualquer forma que venha a existir86 como substância.
Num primeiro sentido metafísico, essência indica a natureza individual da
substância e num segundo sentido, agora lógico, indica a qüididade ou
essência da substância individual, abstraída pelo intelecto. Então, a essência no
primeiro sentido metafísico é sinônima de substância e a essência no sentido
lógico é sinônima de qüididade, ou seja, a essência considerada como
conceito, abstraída e na mente87. Na consideração lógica a essência é o que o
intelecto capta da união e composição de matéria e forma88. Por isso, a
essência na mente indica o que é comum de muitos89. Na consideração
metafísica a essência é na própria substância a composição de matéria e forma.
Ora, na substância é a forma que dá o ser e é a matéria que o recebe. Em
75
In IX Met. lec. 10, n. 1883-1885.
76
STh.I-II.q55,a2,c.
77
STh.I,q25,a1,c.
78
STh.I,q9,a2,c.
79
In XII Met. lec.1, n.2419.
80
In IV Met. lec.2, n.556-558.
81
In IX Met. lec.3, n.1805.
82
CG.I,c28,n260;In I Sent.d17,q1,a2,ad3.
83
De anima. a9;De nat. accid. c.1,n.468.
84
In I Sent.d33,q1,a1,ad1.
85
CG.III,c3;C.Theo.I,c.11,n.21.
86
Quodl. XII,q5,a1;STh.I,q4,a1,ad3.
87
STh.I,q3,a3,c.
88
STh.Iq29,a2,ad3.
89
De ente et ess.c2.
4. Analogia e participação.
90
C.Theo. I,XI.
91
In IX Met. lec.3, n.1805.
4.1. A analogia.
92
CG.I,30.
93
STh.I,q5,a6,ad3/q13,a10,c;In II Sent. 22,1,3,ad2.
94
C.G.4,49.
95
C.G.1,33.
96
STh.I,q4,a2,c.
97
In I Sent.22,1,3,ad2.
98
STh.I,13,a5,c.
99
STh.I,13,a10,c.
100
STh.I,13,a5,c.
101
STh.I,13,a10,c.
102
In I Sent.22,1,3,ad2.
significada de modos diversos, mas semelhantes, como por exemplo, ser dito
do homem, do anjo e de Deus; de atribuição, quando um dos sujeitos possui a
perfeição em sua plenitude e os demais por participação ou de modo
derivado, como por exemplo, intelecto dito de Deus e por atribuição do
homem e do anjo.
4.2. A participação.
5. Conclusão.
103
In De Hebd.lec2,n24.
104
C.G.I,26.
105
In De causis, pro. 25; De pot.q3,a5.