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Exame IED 2022.01.03 Com Tópicos

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Introdução ao Estudo do Direito

Exame final / 2.ª frequência – época ordinária – 3 de janeiro de 2022


Advertências:
As perguntas devem ser lidas cuidadosamente e as respostas devem ser concisas, objetivas e
devidamente justificadas, sempre que possível com recurso à lei.
A ordem de resposta às perguntas pode ser alterada, desde que as respostas identifiquem clara-
mente a questão a que se referem.
É permitida a consulta de quaisquer diplomas legais.
O tempo disponível: exame final: 2:30 horas; 2.ª frequência: 1:15 horas
Cotação das perguntas: 8 (5+3) – 6 – 6.
Avisos importantes:
- os alunos devem responder a cada um dos três grupos em folhas de prova separadas;
- os alunos que fazem a 2.ª frequência só devem responder aos grupos II e III (também em
folhas separadas).
I
1. Explique sucintamente o que entende por:
a) Tutela compulsória;
b) Lacuna;
c) Argumento “a contrario sensu”;
d) Critério da posteridade;
e) Ónus jurídico.
2.
a) Classifique segundo o critério da autonomia privada o artigo 440.º do Código Civil.
b) Identifique a caraterize a técnica legislativa usada no art. 1093.º, n.º 2, do Código Civil.
Tópicos:
a) Tutela compulsória
- medidas que pretendem fazer cessar o mais rapidamente possível a violação do Direito,
compelindo o “infrator” a adotar o comportamento devido
- violação do Direito (da norma jurídica) já verificada – tutela reativa (1,0)

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b) Lacuna
- ou caso omisso, situação não regulada na lei nem no direito consuetudinário (0,5)
- mas que se apresenta como juridicamente relevante, isto é, merecedora da tutela do Direito
(que reclama uma resposta do Direito) (0,5)
c) Argumento “a contrario sensu”
- argumento utilizado na interpretação enunciativa (aquela pela qual o intérprete deduz de uma
norma um preceito que nela apenas está virtualmente contido) (0,25)
- através deste argumento deduz-se de um ius singulare, ou seja, da disciplina excecional
estabelecida para certo caso, um princípio-regra de sentido oposto para os casos não
abrangidos pela norma excecional (0,75)
d) Critério da posteridade
- critério de resolução de conflitos normativos, aplicável a normas da mesma hierarquia (0,25)
-revogação tácita da norma mais antiga pela norma mais recente, em razão da
incompatibilidade entre LN e LA ou da circunstância de a LN regular toda a matéria da LA, art.
7.º, n.º 2 , CC (0,75)
e) Ónus jurídico
- consiste na observância de determinado comportamento prescrito pela lei como condição da
obtenção ou manutenção de uma certa vantagem ou para evitar certa desvantagem (0,75)
- a omissão do ato não implica uma sanção ou um dever de indemnizar, assim se distinguindo do
dever jurídico (0,25)
2.
a)
- trata-se de uma norma dispositiva, porque confere autonomia/ relevância à vontade das
partes /pode ser afastada pela vontade das partes (0,75)
- dentro das normas dispositivas, é interpretativa, já que visa atribuir um sentido ao
comportamento dos contraentes (no caso, a entrega de algo que coincida, no todo ou em parte,
com a prestação a que ficou adstrito) (0,75) [em alternativa, atribuiu-se 0,25 a quem referiu
tratar-se de uma norma supletiva]
b)
- técnica legislativa: presunção legal, em que a lei parte de um facto conhecido para firmar um
facto desconhecido (0,50)

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- função: facilitar a prova, alterando as regras do ónus da prova; “quem tem a seu favor a
presunção escusa de provar o facto a que ela conduz”; 350.º, n.º 1, CC (0,5)
- presunção absoluta; não pode ser ilidida, não admite prova em contrário; 350.º, n.º 2 (0,5)
II
Suponha que, com o objetivo de proteger as famílias em situações de fragilidade decorrente de
falta de apoio familiar, entrou em vigor em 1 de Setembro de 2021 a seguinte norma: “As mães
solteiras, divorciadas ou viúvas beneficiam de uma redução de 50% no seu horário de trabalho
até os filhos completarem 1 ano de idade, mantendo integralmente a respetiva retribuição”.
Gilberto é pai e viúvo desde 1 de Dezembro de 2021, tendo a mulher morrido no parto. Estando a
prever voltar ao trabalho a partir de 1 de Março de 2022, Gilberto considera que só terá de
cumprir 50% do seu horário de trabalho, por entender que, de acordo com o objetivo da norma
em causa, e apesar de a letra da lei se referir exclusivamente a “mães”, e de a expressão “mães”
só ter um sentido, os pais devem beneficiar da mesma proteção. Para fundamentar a sua
pretensão, Gilberto invoca ainda que o valor jurídico fundamental de proteção das famílias em
situação de precaridade e de proteção da maternidade e da paternidade corresponde a um
imperativo de justiça que impõe a aplicação da mesma solução às situações concretas em que a
família seja monoparental e o progenitor em causa seja pai e não mãe.
Pelo contrário, o empregador de Gilberto considera que, sendo pai, terá de cumprir o horário total
de trabalho, uma vez que a lei só se refere às “mães”.
Tendo em conta os diferentes resultados da interpretação que estudou, identifique os resultados a
que chegam Gilberto e o seu empregador e, se for o caso, explicite os respetivos argumentos.
Tópicos:
- Empregador: Interpretação declarativa; (1,0)
- o intérprete limita-se a eleger um dos sentidos que o texto direta e claramente comporta
(o intérprete escolhe, de entre os sentidos literais possíveis, o mais frequente ou mais comum);
(0,5)
- a letra da lei refere-se a mães, é com esse sentido que a norma deve valer. (0,5)
- Gilberto: Extensão teleológica (1,0)
- novos resultados de interpretação, necessidade de atender à finalidade da norma/ a
interpretação deve orientar-se pelo sentido e fim da norma (0,5)
- teor literal da lei é demasiado estrito e, com fundamento na sua finalidade, alarga-se
letra a casos não literalmente abrangidos (aplicação a casos não diretamente abrangidos pela
letra, mas pela finalidade da mesma) (1,5)
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- ultrapassa-se os limites impostos pela teoria da alusão (9.º, n.º 2) (0,5)
- a letra refere apenas às mães, quando o espírito pretende abranger a proteção da
parentalidade em situações de monoparentalidade e falta de apoio familiar; isto é, também os
pais; (0,5)
[Também se aceita a solução de quem concluir pela interpretação extensiva]
- interpretação extensiva; (0,5)
- o intérprete conclui que a letra da lei fica aquém do seu espírito; que a fórmula verbal
adotada peca por defeito, pois diz menos do que aquilo que se pretendia dizer; (0,5)
- então, o intérprete alarga ou estende o texto, fazendo corresponder o texto ao espírito
da lei; (0,5)
- respeitando o limite imposto pela teoria da alusão (art.9.º, n.º 2, CC); (0,25)
- a letra refere apenas as mães, quando o espírito pretende abranger a protecção da
parentalidade em situações de monoparentalidade e falta de apoio familiar; isto é, também os
pais (0,5)
- argumento: a pari ou de identidade de razão; (0,5)
- onde a razão de decidir seja a mesma, a mesma deve ser a decisão. (0,25)

III
A Lei 64/2018, de 29 de outubro, veio trazer várias alterações ao art. 1091.º do Código Civil em
matéria de arrendamento no que se refere ao direito de preferência do inquilino na venda ou
dação em cumprimento do imóvel arrendado. A preferência do inquilino consiste no direito de
adquirir o imóvel arrendado nas mesmas condições oferecidas por terceiro.
Das muitas alterações trazidas pelo diploma, duas merecem especial destaque: (i) nos
arrendamentos para habitação, a comunicação para preferência passa a ter de ser feita pelo
senhorio por carta registada com aviso de receção, e (ii) o inquilino passa a ter direito de
preferência desde que o contrato de arrendamento dure há mais de dois anos. A comunicação
para preferência é uma comunicação dirigida pelo senhorio ao inquilino na qual o informa da
decisão de vender o imóvel, podendo então o mesmo inquilino, em resposta, declarar se pretende
ou não exercer o seu direito de preferência, e tendo 30 dias para o fazer.
Antes desta alteração, (i) a comunicação para preferência poderia ser feita por qualquer forma
(mesmo verbalmente), e (ii) o direito de preferência só se constituía ao fim de três anos de
duração do arrendamento.

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Com base unicamente nas disposições do Código Civil, e no pressuposto de que a Lei 64/2018
nada previa quanto ao momento da sua entrada em vigor, responda às seguintes questões:
1. Quando entrou em vigor a Lei 64/2018?
2. Imagine que António (senhorio) telefonou a Bernardo (inquilino), no dia 2 de novembro de
2018, informando-o de que pretendia vender a Carlos o imóvel arrendado por Bernardo. Bernardo
limitou-se a agradecer o telefonema. No dia 3 de novembro, Bernardo telefonou a António
informando-o de que teria de repetir a comunicação agora por carta registada com aviso de
receção. Bernardo terá razão?
3. Imagine agora que Diogo tinha arrendado um apartamento a Eduardo e acordou vender esse
mesmo apartamento a Francisco, em dezembro de 2018. Tendo em conta que, nesse mês, o
contrato de arrendamento entre Diogo e Eduardo cumpria dois anos e dois meses de duração,
Diogo consultou o seu advogado para saber se teria de dar preferência a Eduardo. Qual terá sido a
resposta do advogado de Diogo?
Tópicos:
1.
Uma vez que a LN não define o seu início de vigência, aplicam-se os art. 2.º, n.º 2, e 1.º, n.º 2, da
Lei n.º 74/98, que estabelecem um prazo de cinco dias desde o dia da disponibilização do
diploma no sítio da internet da Imprensa Nacional para o início de vigência da lei (vacatio
legis), ou seja, a LN teria entrado em vigor no dia 3 de novembro de 2018. (0,5 v).
2.
Temos um conflito de leis no tempo: (i) existe uma sucessão de leis no tempo, (ii) a LN vem
regular de forma diferente a mesma questão de direito (formalidade da comunicação), e (iii)
temos uma situação jurídica em contacto com as duas leis, pois o contrato foi celebrado ao
abrigo da LA e ainda estava em vigor quando a LN entrou em vigor. (0,75 v).
Dado que a LN vem alterar uma formalidade para o exercício de um direito, aplica-se,
diretamente ou por analogia, o art. 12.º, n.º 2, 1.ª parte, no que se refere aos requisitos de
validade formal (0,75 v).
Assim, a LN só visa os factos novos e, portanto, não se aplica à comunicação de António pois
ainda não estava em vigor quando a mesma foi realizada (0,5 v). A comunicação estava de
acordo com a lei em vigor no momento em que foi realizada, logo Bernardo não tem razão (0,5
v).
3.
Temos um conflito de leis no tempo: (i) existe uma sucessão de leis no tempo, (ii) a LN vem

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regular de forma diferente a mesma questão de direito (pressupostos do direito de preferência),
e (iii) temos uma situação jurídica em contacto com as duas leis, pois o contrato foi celebrado
ao abrigo da LA e ainda estava em vigor quando a LN entrou em vigor. (0,75 v).
A LN vem regular o direito de preferência do inquilino, modificando um dos seus pressupostos,
logo vem dispor diretamente sobre o conteúdo da relação jurídica (0,75 v).
Além disso, a LN tem força imperativa, pelo que abstrai do facto que deu origem à relação
jurídica de arrendamento (0,75 v).
Assim, aplica-se o art. 12.º, n.º 2, 2.ª parte: a LN aplica-se imediatamente às relações já
constituídas (0,5 v) e, por isso, Eduardo tem direito de preferência (0,25 v).
[NOTA: não se pode aplicar o art. 297.º pois a lei não vem dispor sobre prazos, mas sim regular
os pressupostos da constituição do direito de preferência no quadro da relação de
arrendamento; está em causa o decurso do tempo enquanto facto-pressuposto da constituição de
um direito, pelo que a norma é aplicável imediatamente a todas as relações de arrendamento
urbano, pouco importando que parte, ou mesmo a totalidade, dos dois anos tenha decorrido sob
o âmbito de vigência da LA].
FIM

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