Alexandre assis,+15.+Fernandes,+Edicléa+okok
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Introdução
Revista Interinstitucional Artes de Educar. Rio de Janeiro, V. 6 – N. Especial – pág. 245 – 263 – (jun. – out. 2020):
“Educação e Democracia em Tempos de Pandemia”. DOI: https://doi.org/10.12957/riae.2020.51912 246
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Os jornalistas, submetidos às exigências que as pressões ou as censuras de
poderes internos e externos fazem pesar sobre eles, e sobretudo a
concorrência, portanto a urgência, que jamais favoreceu a reflexão, propõem
muitas vezes, sobre os problemas mais candentes, descrições e análises
apressadas, e amiúde imprudentes; e o efeito que produzem, tanto no universo
intelectual como no universo político, é ainda mais pernicioso, às vezes,
porque estão em condição de se fazer valer mutuamente e de controlar a
circulação dos discursos concorrentes, como os da ciência social
(BOURDIEU et al., 1997, p. 733).
Ou, por outro lado, deslocam o foco da argumentação que poderia assumir um caráter
de discussão mais ampliada para o modelo hegemônico social meritocrático e do herói, em
tempos de pandemia é o idoso de 104 anos, ex-combatente que venceu o vírus; ou a pessoa com
deficiência com agravos de saúde que sobreviveu ao Covid, isolando assim a questão individual
e os condicionantes sociais. Este caráter aniquilador da mídia, ao deslocar a discussão do
panorama social geral para o individual, é também analisado por Gohn (2014):
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sinais? Ou termos e conceitos complexos que dificultam a popularização das informações
científicas?
As soluções de orientação prescritas pela Organização Mundial de Saúde e pelos órgãos
de saúde dos países falam para interlocutores que representam uma determinada parcela da
população. Como afirma Araujo e Fernandes (2020) em estudo acerca do cuidado com pessoas
com deficiência em tempos de Covid-19:
O direito de acesso aos bens e serviços tem sido uma luta do movimento das pessoas
com deficiência iniciado na década de 1960, junto a demais movimentos de luta pela igualdade
de direitos e a outros movimentos de segmentos excluídos socialmente. Na década de 1970,
consolidaram-se em diversos países leis e atos normativos que garantiam a entrada de crianças
e jovens com deficiência nas escolas públicas locais, nascendo assim o movimento da
integração e as modalidades de atendimento da Educação Especial.
No Brasil, embora tenhamos a história do atendimento a cegos e surdos desde o Brasil
Império, foi também na década de 1970 que é criado o primeiro sistema normativo nacional da
Educação Especial, o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP). Sendo assim, estados
e municípios iniciam a implantação de seus serviços de atendimento, com modalidades de salas
de recursos, itinerância, classes e escolas especiais e, ainda previstas, mas não consolidadas na
maior parte dos estados brasileiros, as classes hospitalares e os atendimentos pedagógicos
domiciliares.
Os vinte anos que seguiram à implantação do CENESP revelaram questões inquietantes
como, por exemplo, o fato dos serviços de Educação Especial não atenderem alunos com
deficiência, indica o fracasso escolar como apontado em estudos como Paschoalick (1981),
Yamamoto (1988), Schielmann (1989) analisados em Fernandes (1991).
Neste caminho, a tendência internacional, apontada nas Declarações de Jomtien
(UNESCO, 1990), Salamanca (UNESCO, 1994) e Dakar (UNESCO, 2000), propunha a
educação inclusiva para os direitos do acesso à educação de segmentos excluídos dos sistemas
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educacionais, bem como o destino do fracasso escolar e evasão destes grupos, dentre eles as
pessoas com deficiência. Por influência destas Declarações e Convenções Internacionais, o
Brasil passa a ser signatário e a incorporar ao seu sistema legal os princípios destas Convenções,
assumindo em suas políticas, não somente no âmbito da acessibilidade à educação, mas também
os demais bens e serviços.
Nos últimos vinte anos, tivemos uma série de legislações nacionais que garantem a
acessibilidade ao segmento das pessoas com deficiência. Destacamos algumas destas
legislações: o Decreto n. 5.296/2004 que estabeleceu os princípios da acessibilidade não
somente no plano físico, mas também comunicacional e atitudinal; a Lei n. 10.436/2002 que
instituiu oficialmente a Língua Brasileira de Sinais (Libras); e o Decreto n. 6.949/2009 que
incorpora o texto legal da Convenção Internacional de Direitos da Pessoa com Deficiência de
2008.
O Decreto n. 7.612/2011 instituiu a Política Nacional de Direitos da Pessoa com
Deficiência, o Plano Viver sem Limites, cuja finalidade era promover, por meio da integração
e da articulação de políticas, programas e ações, o exercício pleno e equitativo dos direitos das
pessoas com deficiência para garantir a participação em um sistema educacional inclusivo; e
acesso à saúde, aos equipamentos de apoio, ao trabalho, à tecnologia, à inovação e aos
programas de combate à pobreza, como benefício de prestação continuada, residências
inclusivas. Essa política propunha quatro eixos: acesso à educação, atenção à saúde, inclusão
social e acessibilidade. E destaca-se como auge desta luta a promulgação da Lei Brasileira de
Inclusão (LBI) ou Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146/2015), pautada no Decreto
n. 6.949/2009 e na Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que se
destina a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das
liberdades fundamentais da pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.
O importante marco teórico desta lei foi deslocar o conceito de deficiência do âmbito
pessoal, a partir de uma racionalidade médica, para o contexto social. Neste sentido, a
deficiência passa a ser relativizada a partir do momento que barreiras sejam suprimidas.
Portanto, os suportes são fundamentais, sejam eles físicos, tecnológicos ou humanos.
A LBI é uma lei nova que implica uma ruptura epistemológica com lógicas coloniais e
normalizadoras, que propõem políticas de educação, saúde e urbanismo a partir de padrões de
corpos, comunicação e cultura impostos por modelos considerados normais e universais. Não
basta somente o texto da lei para que as rupturas aconteçam como de forma mágica, pois as
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concepções encontram-se arraigadas em modelos preconceituosos que normalizam a ausência
de acessibilidade como algo da prática da benevolência ao invés de uma violação de direitos.
Em Epistemologias do Sul, Santos e Meneses (2009, p. 30-31) nos ajudam a
compreender a necessidade dessa ruptura ao afirmarem que “a negação de uma parte da
humanidade é sacrificial, na medida em que constitui a condição para a outra parte da
humanidade se afirmar enquanto universal”. Baseado numa perspectiva de ecologia de saberes
e da não submissão a um modelo colonial, há a necessidade da percepção de um pluralismo
epistemológico, não mais um monopólio epistêmico.
Porém esse monopólio sistêmico é vivenciado no dia a dia das pessoas com deficiência
quando não têm acesso a transportes, rampas, guias e piso podo-táteis nas calçadas para se
locomoverem com bengalas, sinais sonoros, informações em Libras e em código Braille. E
ocorre nas escolas com a falta de intérpretes de Libras, de livros acessíveis, carteiras e materiais
didáticos adaptados aos diferentes perfis anatômicos.
Como vimos na seção anterior, as pessoas com deficiência, como todas as outras, têm o
direito de acesso a informação, educação, saúde, lazer, transporte, entre outros, como é citado
na legislação brasileira. Entretanto, nem sempre a sociedade está preparada para as
especificidades de cada público. Tais necessidades são omitidas de maneira que muitos se
sentem ainda mais segregados.
No que diz respeito à inclusão, é necessário entendermos de que maneira é possível
promover a equidade de acesso para todos. Segundo o site do Ministério da Ciência,
Tecnologia, Inovações e Comunicações do governo brasileiro (2020), a tecnologia assistiva
compreende o desenvolvimento e pesquisa de instrumentos; e tem o intuito de ampliar a
autonomia de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida em todas as suas atividades do
dia a dia. Englobam-se produtos, metodologias, recursos, estratégias práticas e serviços com o
objetivo de promover a qualidade de vida, independência e inclusão social.
Podemos citar alguns destes recursos de acessibilidade que devem estar disponíveis em
todas as áreas supracitadas, a exemplo da audiodescrição, que é voltada prioritariamente para
pessoas com deficiência visual, cegas e com baixa visão. Todavia o recurso pode beneficiar
pessoas com deficiência intelectual, transtorno do espectro autista, síndrome de Down, dislexia,
déficit de atenção, além de idosos e pessoas com baixo letramento.
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A audiodescrição é uma tradução do signo visual para o verbal, ampliando o
entendimento do público. Descrições de ações, características físicas, expressões faciais,
objetos, entre outros, estão no escopo do recurso, segundo Sá (2015). Aplica-se em programas
de TV, sites da internet, redes sociais digitais, eventos pedagógicos como aulas, palestras,
seminários, além do material de divulgação elaborado pelo setor da saúde, segundo Motta e
Romeu Filho (2010).
As pessoas com deficiência visual podem contar ainda com auxílios no computador que
facilitem o aumento das letras, lupas, telelupas e leitores de tela para possibilitar o acesso à
internet. Neste sentido, é necessário que orientações impressas, emitidas por órgãos de saúde,
sejam produzidas em fonte ampliada, com alto contraste, além do Braille. As mídias televisivas
devem ter audiodescrição em toda a sua programação e os sites da internet com acessibilidade
total, corroborando com o art. 67 da Lei Brasileira de Inclusão/Estatuto da Pessoa com
Deficiência n. 13.146, de 06 de julho de 2015, caput e incisos I, II e III:
A Libras é uma língua visual necessária ao processo de comunicação das pessoas surdas
e, desde 24 de abril de 2002, foi reconhecida como a segunda língua oficial brasileira pela Lei
n. 10.436. É constituída por sinais e gestos com estrutura própria e de eficiência comunicativa
como as línguas orais. Esta língua necessita ser incorporada em meios digitais de informação,
nos ambientes educacionais e no atendimento da área de saúde.
As pessoas que não oralizam e não possuem a escrita funcional, tais como com
deficiência intelectual, transtorno do espectro autista, entre outros, podem contar com a
comunicação alternativa. Segundo Massaro (2012), tal comunicação colabora para o processo
de aquisição e desenvolvimento da linguagem e para o desenvolvimento da competência
comunicativa, a exemplo dos pictogramas, que são imagens que transmitem informações sem
o apoio de textos. Para Dranka (2012), são representações gráficas de objetos, conceitos
abstratos e narrativas que têm por finalidade uma comunicação simples com eficiência e de
maneira direta sem a necessidade do apoio de textos. Essa interação ocorre através das pranchas
de comunicação que são elaboradas de forma personalizada para atender às especificidades do
usuário.
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Exposto este panorama da ausência de acesso à comunicação e acessibilidade para as
pessoas com deficiência, podemos imaginar, ao longo do ciclo de vida dessas pessoas, situações
inquietantes e que violam direitos como, por exemplo: uma criança de três anos que não sustenta
o tronco e não há uma carteira adaptada em sua sala de aula da pré-escola; um graduando cego
que não utiliza a biblioteca porque não há computador com leitor de tela; uma mulher surda em
trabalho de parto e não há profissional que se comunique em Libras; uma peça de teatro sem
audiodescrição; um folder sobre prevenção de diabetes sem linguagem simples em seu texto e
nenhuma imagem ilustrativa, inacessível a pessoas com limitações cognitivas, ou ainda sem
versão em Braille; escadas na entrada da promotoria; ruas sem piso podotátil.
Este é o mundo, ou pelo menos o retrato da situação brasileira em fevereiro de 2020,
quando as autoridades sanitárias mundiais e os órgãos públicos oficializaram a pandemia e os
primeiros casos no país. Neste contexto, refletimos sobre o universo das pessoas com
deficiência em suas singularidades e restrições já anteriores a este cenário.
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Diante deste quadro exposto, pode-se perceber a invisibilidade das pessoas com
deficiência: professores produzem aulas dentro das condições possíveis de seus lares sem
acessibilidade a muitos de seus alunos, que por vezes sequer possuem algum tipo de acesso à
internet e, se tiverem a necessidade de uma audiodescrição ou Libras, ficarão fora do contexto.
Por outro lado, prefeitos e governadores fazem previsões de retorno às aulas se a redução da
pandemia ocorrer, mas os alunos com deficiência não fazem parte destas previsões com
adequações necessárias.
Não podemos descartar as minorias que representam uma grande e densa parte da
população brasileira, que muitas vezes se alojam ou habitam áreas consideradas periferias
urbanas. Os espaços considerados periféricos geralmente são caracterizados como
desqualificados, marginalizados e subordinados aos grandes centros. Segundo Lima (2015), as
periferias se mantêm como minorias subordinadas ao centro que, por sua vez, permanece
consolidando sua supremacia.
Por outro lado, não se pretende, neste artigo, conceber as periferias urbanas como
espaços meramente passivos, mas como espaços de crescimento e desenvolvimento
sociocultural, inclusive de pessoas que apresentam deficiências diversas, o que não lhes impede
de atuarem no mercado de trabalho, produzindo em iguais condições de quaisquer pessoas,
independente dos espaços periféricos onde habitam. A trajetória de pessoas com deficiência em
âmbito social, educacional, tecnológico e laboral não é neutra por estar envolvida nas
contradições de luta, resistência e resiliência no dia a dia, e a luta pela acessibilidade é uma
constante.
A acessibilidade tem caráter decisório para a inclusão social das pessoas com
deficiência, pois “[...] se constitui como uma quebra de paradigmas, de uma perspectiva
meramente adaptacionista da pessoa com deficiência para uma perspectiva de direito e
funcionalidade” (FERNANDES; ORRICO, 2012, p. 99). A tentativa de minorias sair da
invisibilidade impulsionou a criação de conselhos de direitos com equivalência na paridade dos
membros, constituindo representações de diversos grupos que se apresentam como minorias,
estimulando a vez e a voz destas, as quais também são peças imprescindíveis para o avanço do
quebra-cabeça que são as políticas públicas neste país.
As pessoas com deficiência e condições raras diversas precisam de um mundo
apropriado às suas necessidades, tanto em relação aos espaços físicos como aos
comunicacionais, inclusive no aspecto das atitudes dos indivíduos no que diz respeito a este
grupo social. Percebe-se ao longo do texto que no mundo pré-pandemia esses direitos ainda não
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estavam consolidados. E estas imposições sanitárias e incertezas ou expuseram de vez a total
vulnerabilidade em que vivem ou, pior ainda, maior invisibilidade deste segmento.
Os movimentos sociais e os conselhos de direitos são fundamentais na busca por essas
garantias. Embora, desde a década de 1960, diversas associações passem a se organizar nessa
luta para direitos de acesso a educação, saúde, trabalho, locomoção e lazer; ainda não se
constitui como realidade. Observemos o que afirma Santos (2020) em relação às pessoas com
deficiência:
Como viverão a nova quarentena, sobretudo quando dependem de alguém que a viole
para lhes prestar alguma ajuda? Como já há muito se habituaram a viver em condições de algum
confinamento, sentir-se-ão agora mais livres que os “não deficientes” ou mais iguais a eles?
Verão tristemente na nova quarentena alguma justiça social?
Aos Conselhos, cabe o registro das denúncias recebidas, bem como as devidas
orientações e providências. As deliberações também fazem parte das ações destes, porém um
dos pontos fundamentais de associações de direitos e do sistema de conselhos é o de serem
espaços de formação. Gohn (2014) esclarece que movimentos sociais são espaços não formais,
sobretudo em espaços periféricos:
A educação não formal é aquela que se aprende “no mundo da vida”, via os
processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e
ações coletivos cotidianas. Nossa concepção de educação não formal articula-
se ao campo da educação cidadã – a qual no contexto escolar pressupõe a
democratização da gestão e do acesso à escola, assim como a democratização
do conhecimento. Na educação não formal, essa educação volta-se para a
formação de cidadãos(as) livres, emancipados, portadores de um leque
diversificado de direitos, assim como de deveres para com o(s) outro(s).
[...] a educação não formal é uma ferramenta importante no processo de
formação e construção da cidadania das pessoas, em qualquer nível social ou
de escolaridade, destacando, entretanto, sua relevância no campo da
juventude. Pelo fato de ser menos estruturada e mais flexível, consegue atingir
a atenção e o imaginário dos jovens. Quando é acionada em processos sociais
desenvolvidos em comunidades carentes socioeconomicamente, ela
possibilita processos de inclusão social via o resgate da riqueza cultural
daquelas pessoas, expressa na diversidade de práticas, valores e experiências
anteriores (GOHN, 2014, p. 40-42).
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O momento atípico que estamos vivenciando devido à pandemia que se instalou em
nosso país nos leva a indagar sobre as transformações, as quais estão sendo priorizadas em
nossas vidas, em diversas esferas: familiar, profissional, acadêmica, funcional e outras. O
impacto gerado atingiu vários âmbitos: educação, saúde, economia, esporte e lazer. Os órgãos
governamentais, sem planejamento prévio, tiveram urgência em criar possibilidades
alternativas, ou até mesmo paliativas, com a finalidade de dar continuidade a suas programações
do ano em curso.
De acordo com Gohn (2006), a transmissão de informação e formação política e
sociocultural é uma meta na educação não formal, pois prepara os cidadãos, educa o ser humano
para a civilidade, em oposição à barbárie, ao egoísmo e ao individualismo. E os sistemas de
conselho precisaram reinventar suas práticas de reuniões por meio de canais de internet para
garantirem seus vínculos e espaços de luta. Simson, Gohn e Fernandes (2007) explicitam onde
as práticas de educação não formal ocorrem:
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especializado e 15 não oferecem educação precoce para alunos com necessidades especiais de
0 a 5 anos; apenas 1 município oferece residência inclusiva, 11 ofertam abrigos e somente 2
com Centro de Convivência para Jovens e Adultos. Em relação à acessibilidade urbana que se
refere à estrutura física, como calçadas, praças e parques acessíveis, terminais de ônibus,
estações de trem e metrô, terminal de barcas com acessibilidade, espaços de lazer e ônibus
adaptado, mais da metade do quantitativo dos municípios presentes não oferece essas condições
básicas para locomoção das pessoas com deficiência.
Além da representação de lideranças de Conselhos do Estado do Rio de Janeiro, o
referido encontro reuniu importantes associações emergentes, como Associação Lótus que
reúne famílias de crianças acometidas pela Síndrome Congênita pelo Zika Vírus; e o Comitê
Estadual para Doenças Raras, como Fibrose Cística, Acondroplasia, Osteogênese Imperfeita,
Síndrome de Prader-Willi e Esclerose Múltipla, que reúne representantes de diversas
associações.
Em relação ao processo de formação que encontros de conselhos propiciam, é uma
riqueza de trocas de experiências horizontais. Os encontros de conselhos nacionais, estaduais e
regionais atualizam as diversas formas de participação, empoderando as pessoas com
deficiência e suas famílias. Os enfrentamentos das barreiras no dia a dia já não são poucos e,
nesse momento de pandemia, irrompem todas as faltas das políticas, mas também podem surgir
as brechas para resiliências por meio das trocas e parcerias.
Gohn (2014) enfatiza a ideia de que a participação tende a aumentar à medida que o
indivíduo envolve-se no processo de socialização, quanto mais as pessoas participam, mais
tendem a continuar neste caminho, por romperem com a tradição de distanciamento de decisões.
Somente atuando o indivíduo se habilita à participação, no sentido pleno da palavra, que inclui
o fato de tomar e ter parte no contexto em que estão inseridos. A autora (GOHN, 1997) destaca
ainda:
A pandemia tem suscitado mudanças dos modos de produção pautados num modelo do
capital selvagem. Os bens de consumo básico, marcas famosas, empresas de turismo, tudo passa
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a ser relativizado. Algumas cidades em lockdown, distanciamento social e alto índice de
desemprego têm exposto de maneira dramática os nichos da exclusão social de segmentos
pobres da população sem acesso a saneamento, água potável e moradias dignas. Expôs a
fragilidade da organização dos sistemas de saúde na atenção básica e complexidade, da
educação e da mobilidade urbana.
Neste sentido, pergunta-se: Haverá possíveis brechas e rupturas epistemológicas que
possamos localizar no momento social advindo da pandemia?
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graduações e programas de pós-graduação do Estado do Rio de Janeiro e do país; bem como
publicações textuais, legislação internacional, nacional e vídeos de instituições da área. Outra
importante fonte de consulta é o Banco de Dados de Adaptações Curriculares, que conta com
aproximadamente 350 adaptações confeccionadas por alunos da disciplina “Prática Pedagógica
em Educação Inclusiva”, dos cursos de Licenciaturas da UERJ. Esses materiais servem de apoio
didático para o processo de ensino e aprendizagem de alunos com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento, altas habilidades e superdotação.
O NEEI conta também com computadores com leitores de tela, bookreader para
escaneamento de textos, regletes, punções e sorobã para oficinas de tecnologia. No espaço
virtual, os interessados podem buscar as produções científicas no site (www.neeiuerj.org.br).
Os pesquisadores graduandos e pós-graduandos estão vinculados ao Diretório de Grupos de
Pesquisa do CNPQ: Produção de Materiais Didáticos Acessíveis em Contextos Formais e
Informais de Educação.
O grupo vem desenvolvendo de março a junho de 2020 pesquisa e extensão com o
objetivo de contribuir não somente na perspectiva dos temas científicos, mas também no
processo de acessibilidade de lives destinadas à orientação de profissionais e pessoas com
deficiência. Outro objetivo é contribuir para o empoderamento de associações e conselhos de
direitos em seus espaços de atuação neste momento de isolamento, com ênfase nos espaços da
periferia do Estado do Rio de Janeiro.
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Congênita pelo Zika Vírus. No vídeo, discutem-se as causas e os agravos à saúde das crianças,
sobretudo no comprometimento das vias aéreas superiores e função pulmonar, e orienta sobre
os cuidados a serem tomados para evitar o contágio pelo Covid neste grupo de risco (Disponível
em: https://youtu.be/mfcOb9D4BhM).
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Fluminense. Consiste em um painel com especialistas, contando com acessibilidade em
tradução para Libras (Disponível em: https://youtu.be/9-rfmrHTR1E).
Rap Juntos contra o Coronavírus
O rap foi organizado como uma campanha publicitária do Conselho Municipal de Direitos da
Pessoa com Deficiência do Município de São João de Meriti. A letra é de composição de pessoa
com deficiência visual, a edição, audiolegendagem inicial e versão em Libras realizadas pelos
membros do conselho e apoio dos pesquisadores do NEEI/UERJ. A acessibilidade às imagens
do vídeo, a sequência das imagens, bem como a versão simultânea em Libras oportunizam
informação sobre prevenção de forma acessível e representa um trabalho colaborativo entre
Conselho de direitos, universidade e artistas (Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1niWESINJF--
I3I_RWbOA1fZFEVOvtk8y/view?usp=sharing).
Considerações finais
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estudantes, especificamente os que vivem em espaços periféricos, que são subordinados aos
grandes centros, em condições sub-humanas. Muitas vezes estes estudantes não têm acesso às
condições sanitárias básicas e, em algumas ocasiões, a presença da deficiência ainda se
superpõe às questões sociais.
Apesar da existência de leis, garantindo os direitos das pessoas com deficiência, e dos
programas propostos nos últimos anos, que culminaram com a promulgação da LBI (Lei n.
13.146/2015), os recursos de tecnologia assistiva são oferecidos de forma insuficiente. Tais
recursos promovem a autonomia e independência deste público, especificamente os que
contribuem para a equidade comunicacional, como a audiodescrição, a Libras, as pranchas de
comunicação, os pictogramas e a linguagem simples. Dentro desta realidade, que invisibiliza
esta parte da população, entendemos que a criação dos conselhos de direitos das pessoas com
deficiência estimulou, nas últimas décadas, a voz e a vez das minorias, fomentando as políticas
públicas no Brasil.
Finalmente concluímos que, se por um lado a pandemia trouxe lutos, dores, incertezas
e denúncia exacerbada da ausência de acessibilidade em todos os níveis de segmento das
pessoas com deficiência, por outro lado demonstrou a resiliência dos movimentos sociais, das
associações, conselhos de direitos e pesquisadores que de forma colaborativa, a partir do uso
de recursos das redes sociais, vêm fomentando debates, orientações e, sobretudo, demonstrando
que é possível uma comunicação inclusiva, a popularização da ciência aos grupos da periferia,
na contramão do que a mídia e os órgãos públicos propiciam.
Referências
Revista Interinstitucional Artes de Educar. Rio de Janeiro, V. 6 – N. Especial – pág. 245 – 263 – (jun. – out. 2020):
“Educação e Democracia em Tempos de Pandemia”. DOI: https://doi.org/10.12957/riae.2020.51912 261
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7612.htm. Acesso em:
15 maio 2020.
GOHN, M. da G.. Movimentos, ONGs e lutas sociais no Brasil nos anos 90. In: Os sem-terra,
ONGs e cidadania: a sociedade civil brasileira na era da globalização. São Paulo, Cortez,
1997.
Revista Interinstitucional Artes de Educar. Rio de Janeiro, V. 6 – N. Especial – pág. 245 – 263 – (jun. – out. 2020):
“Educação e Democracia em Tempos de Pandemia”. DOI: https://doi.org/10.12957/riae.2020.51912 262
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UNESCO. Declaração mundial sobre educação para todos e plano de ação para satisfazer
as necessidades básicas de aprendizagem. Jomtien, Tailândia: UNESCO, 1990.
UNESCO. Educação para todos: o compromisso de Dakar. Dakar, Senegal: UNESCO, 2000.
i
Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Comunicação em Periferias Urbanas
FEBF/UERJ e do Programa de Pós-Graduação em Ciências, Tecnologia e Inclusão/UFF. Rio de Janeiro, Brasil.
E-mail: professoraediclea.uerj@gmail.com ORCID: http://orcid.org/0000-0003-3998-2016
ii
Mestrando em educação, cultura e comunicação em periferias urbanas. FEBF/UERJ. Rio de Janeiro, Brasil. E-
mail: consultorfelipemonteiro@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8814-9245
iii
Mestranda em educação, cultura e comunicação em periferias urbanas. FEBF/UERJ. Rio de Janeiro, Brasil. E-
mail: aidaguerreiroeduc@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9846-7666
Revista Interinstitucional Artes de Educar. Rio de Janeiro, V. 6 – N. Especial – pág. 245 – 263 – (jun. – out. 2020):
“Educação e Democracia em Tempos de Pandemia”. DOI: https://doi.org/10.12957/riae.2020.51912 263