Ge 17
Ge 17
Ge 17
Volume 17 • No 1 • 2022
Conceitos em Genética
Genética e Sociedade
Na Sala de Aula
Materiais Didáticos
Resenhas
Um Gene
Índice
Conceitos em Genética
Correlação entre diversidade genética e diversidade de espécies (SGDC):
uma abordagem da genética de comunidades.........................................................................1
Camila Maria Ribeiro da Silva Filha, Aliane D’Oliveira Ricardo, Ramilla dos Santos Braga-Ferreira,
Mariana Pires de Campos Telles, José Alexandre Felizola Diniz Filho
O DNA como um novo dispositivo de armazenamento de dados...........................................10
Danyel Fernandes Contiliani, Tiago Campos Pereira
Genética e Sociedade
A genética por trás da oitava praga do Egito.........................................................................17
Victor Campos Khuriyeh, Letícia Grillo G. Pereira, Lucas Costa Silva, Yanca Tonhasca Lau,
Matheus Salustio C. Petrucci, Lúcia Elvira Alvares
Modelos animais no estudo de doenças genéticas humanas.................................................26
Felipe Tadeu Galante Rocha de Vasconcelos, Laura Machado Lara Carvalho, Lucas Santos e Souza, Igor Neves Barbosa,
Carolini Kaid Dávila, Mayana Zatz, Mariz Vainzof
Ancestralidade: genética, herança e identidade.....................................................................41
Lilian Kimura, Renan Barbosa Lemes, Kelly Nunes
Na Sala de Aula
Ensino de genética humana: novas abordagens para sensibilização
de estudantes no contexto das síndromes genéticas.............................................................53
Gabriela Garcia de Carvalho Laguna, Cintia Rodrigues Marques
Mendel para todas as idades - uma prática na educação de jovens e adultos........................61
Luiz Filipe de Macedo Bartoleti
Isoenzimas de amilase: acessando a diversidade genética.....................................................73
Kátia Luiza Kraemmer, Marcos Trindade da Rosa, Lenira M. N. Sepel, Elgion L. S. Loreto
Materiais Didáticos
Jogo CSI, simulando a análise de um crime para ensinar genética.........................................80
Tiago M. Degrandi, Franciele F. Kerniske, Karine F. Colesel, Mara C. de Almeida, Roberto F. Artoni
Modelo didático para compreender variações genéticas humanas.......................................103
Iasmin Souza Lima, Gabriella Almeida Santos de Santana, Felipe dos Santos Barbieri, Larissa Fernandes,
Diego Coimbra, Cintia Rodrigues Marques
Resenhas
EvoDesign: um servidor para design de sequências proteicas
baseadas em perfis estruturais e evolutivos.........................................................................114
Ivania Samara dos Santos Silva, Adeilma Fernandes de Sousa, Francisco Carlos de Medeiros Filho,
Rafael Trindade Maia, Magnólia de Araújo Campos
Integrated view of population genetics................................................................................116
Rafael Trindade Maia, Magnólia de Araújo Campos
Um Gene
O gene MUTYH e o seu papel na etiologia dos tumores em humanos................................118
Lázaro Batista de Azevedo Medeiros, Ana Helena Sales Oliveira
Mth: o gene "Matusalém" e a longevidade em moscas.......................................................124
Yasmin de Araújo Ribeiro, Tiago Campos Pereira
Gene Lep e a obesidade......................................................................................................131
Karynne de Nazaré Lins de Brito, Marina Saldanha da Silva Athayde, Rafael Lima Kons,
Yara Costa Netto Muniz, Juliana Dal-Ri Lindenau
CONCEITOS EM GENÉTICA Genética na Escola – ISSN: 1980-3540
Camila Maria Ribeiro da Silva Filha1, Aliane D’Oliveira Ricardo1, Ramilla dos Santos Braga-Ferreira2,
Mariana Pires de Campos Telles3, José Alexandre Felizola Diniz Filho4
1
Programa de Pós-Graduação em Genética e Biologia Molecular, ICB, Laboratório de Genética & Biodiversidade, Universidade Federal de Goiás. Goiânia, GO
2
INCT EECBio, Laboratório de Genética & Biodiversidade, ICB, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, GO
3
Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Escola de Ciências Médicas e da Vida, Laboratório de Genética & Biodiversidade, Universidade Federal de Goiás,
Goiânia, GO
4
Laboratório de Ecologia Teórica & Síntese, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Goiás. Estrada do Campus, Goiânia, GO
Autor para correspondência - tellesmpc@gmail.com
* Artigo desenvolvido dentro do contexto da disciplina “Ensino de genética” do programa de Pós-Graduação em Genética e Biologia Molecular da Universidade
Federal de Goiás, vinculado ao projeto INCT EECBio.
É importante ressaltar que nosso objeti- nos diferentes níveis é governada por forças
vo aqui não é detalhar as análises SGDCs, semelhantes, ou seja, acreditando-se que lo-
mas sim apresentar os conceitos básicos re- cais com alta diversidade de espécies também
lacionados à SGDC para, então, mostrar a comportaria alta diversidade genética das
importância desses estudos no planejamen- mesmas. Entretanto, muitos estudos, como
to das ações de conservação simultânea da algumas análises SGDCs, têm mostrado que
diversidade genética e de espécies, algo que isso nem sempre acontece e que existe a ne-
tem se mostrado mais problemático do que cessidade de se repensar as ações práticas de
parecia ser até pouco tempo. conservação para desenvolver métodos que
consigam abranger os diferentes níveis de
buída ao acaso. Por outro lado, a população análises em Genética de Populações, que
P.3 está estruturada de maneira que não há pode ser entendida como sendo a frequên-
diversidade genética dentro dos indivíduos, cia esperada de heterozigotos nas condições
toda a diversidade acontece entre os indiví- de Equilíbrio de Hardy-Weinberg, ou seja,
duos. As populações P.4 e P.5 também pos- se não há um efeito importante de algum
suem a mesma quantidade de diversidade ge- fator evolutivo na população. A partir dessa
nética considerando o componente riqueza, medida, a população P.2 possui maior di-
a diferença entre elas está na frequência em versidade genética do que a população P.5
que os alelos ocorrem. Na população P.5, a (Figura 1); assim, os alelos raros pouco con-
grande maioria dos indivíduos possui ape- tribuem para He e a proporção em que as
nas o alelo azul; os alelos verde, vermelho formas alélicas ocorrem têm peso maior do
e amarelo, são alelos raros nessa população que o componente riqueza para a quantifi-
e não contribuem de maneira efetiva para cação da diversidade genética, porque capta
a diversidade genética. Considerando-se o o efeito do balanço das frequências alélicas.
conjunto de populações (P.1 a P.5), podemos Todo esse raciocínio pode ser estendido para
inferir que, em termos de riqueza de formas, a comparação entre as diferentes populações,
as populações P.4 e P.5 têm maior diversida- em diferentes níveis hierárquicos, portanto,
de genética do que as outras populações; em de modo que a heterozigose nesse nível passa
contrapartida, considerando-se a proporção a ser uma medida de diferenciação entre as
em que as formas ocorrem, as populações populações, sendo a base das famosas esta-
P.2 e P.4 são mais diversas. E, considerando- tísticas-F de Sewall Wright. Entretanto, no
-se ao mesmo tempo os dois componentes, contexto das relações SGDC, o foco, por
riqueza e frequência dos alelos, qual é mais enquanto, está mais na diversidade genética
diversa a população, P.2 ou a P.5? A grande dentro de cada população ou subpopulação,
questão é: até que ponto a riqueza de alelos como discutido anteriormente.
é o componente mais importante da diversi-
dade genética? Se a riqueza for mais impor- A diversidade ecológica também pode ser
tante, a população P.5 é mais diversa, porque avaliada a partir da composição de espécies
possui mais alelos. E ainda, até que ponto das comunidades, de habitat ou mesmo de
a proporção em que as formas ocorrem é o biomas em uma região, também com base nos
componente mais importante da diversidade mesmos dois componentes de riqueza e fre-
genética? Se a frequência dos alelos é mais quência relativa das abundâncias das unida-
importante, a população P.2 é mais diversa des básicas. As medidas mais comuns usam
do que a população P.5. espécies como unidades básicas, mesmo con-
siderando uma série de dificuldades na sua
Existem diversas formas de medir a diversi- definição ou conceituação. A diversidade de
dade genética, cada índice capta um ou outro espécie, portanto, pode ser expressa também
dos dois componentes (riqueza ou frequên- por diferentes métricas combinando a rique-
cia de alelos) ou, ainda, ponderam os compo- za de espécies e a abundância (número de
nentes. A escolha da medida de diversidade indivíduos) dessas espécies em um ou mais
a ser utilizada depende dos objetivos da aná- locais. Essas medidas de diversidade genética
lise. Outra medida de diversidade genética e de espécies têm sido extensivamente apli-
que pode ser utilizada é o número médio de cadas para estudar os padrões espaciais de
alelos por lócus polimórfico (Ap), calculada biodiversidade e para definir estratégias de
pela diferença entre o número de alelos do conservação de forma independente. Recen-
lócus polimórfico pelo número total de ló- temente pensou-se que a diversidade genéti-
cus. Tal medida possui um problema relacio- ca e a diversidade de espécies podem ser cor-
nado ao efeito de amostragem, mas é possível relacionadas ao longo do espaço geográfico,
corrigir utilizando amostras de tamanhos gerando assim as relações SGDC, avaliando
semelhantes. se esses níveis hierárquicos da biodiversidade
são controlados por processos não-indepen-
A heterozigosidade esperada sob Equilíbrio dentes. As análises SGDCs fornecem um ar-
de Hardy-Weinberg (He) é uma medida de cabouço teórico e empírico que possibilitam
diversidade genética bastante utilizada nas
investigar como a variação genética dentro cem informações úteis para compreender as
das espécies, a diversidade de espécies e os forças que atuam sobre a biodiversidade na
fatores ambientais interagem. Assim, forne- formação dos padrões espaciais e temporais.
Figura 1.
Populações com diferentes
quantidades de diversidade
genética. Os pares de
círculos representam
indivíduos diploides e cada
cor corresponde a um alelo
diferente. Considere: P.1:
População 1; P.2: População
2; P.3: População 3; P.4:
População 4 e P.5: População 5.
Figura 2.
Influência de processos
microevolutivos na diversidade
genética e suas consequências
na diversidade de espécies.
Considere DG x DE: Correlação
entre diversidade genética
e diversidade de espécies;
DER: deriva genética; END:
endogamia; FLG: fluxo gênico;
MUT: mutação SEL: seleção
natural.
Figura 3.
Diferença entre α-SGDC e
β-SGDC. Considere α: α-SGDC;
β: β-SGDC; P.1/C.1: População
1/Comunidade 1; P.2/C.2:
População 2/ Comunidade
2; P.3/C.3: População 3/
Comunidade 3; P.4/C.4:
População 4/ Comunidade
4; P.5/C.5: População 5/
Comunidade 5. Populações
(de P.1 a P.5) referem-se às
populações da espécie focal
representadas pelos pontos
em azul-claro, e Comunidades
(de C.1 a C.5) corresponde às
comunidades com diferentes
composições de espécies, sendo
que cada cor representa uma
espécie diferente.
Figura 4.
(A) Variação simultânea
Aplicações e diversidade genética e de espécies covariavam
nas comunidades. Esses autores utilizaram
da diversidade genética
dentro de populações e da
importância dos conceitos já bem estabelecidos para a inter-
pretação dos processos determinantes da
diversidade de espécies nas
comunidades em função da
Estas observações sugerem uma relação de aplicada, podem ser importantes para auxi-
independência entre os dois níveis de di- liar na elaboração de ações para conservação
versidade biológica em resposta aos proces- da diversidade biológica levando em conside-
sos ecológicos e evolutivos decorrentes de ração diferentes níveis hierárquicos.
mudanças nas condições ambientais, que
pode estar relacionada, por exemplo, com a
historia evolutiva das espécies e a dinâmica Referências/
espacial de habitats adequados. Outra ques-
tão bastante discutida, nesse sentido, é que Para saber mais
a abundância de uma espécie correlaciona-se KAHILAINEN, A.; PUURTINEN, M.; KOTIA-
positivamente com sua diversidade genética, HO, J. S. Conservation implications of species–
ao mesmo tempo que correlaciona-se nega- genetic diversity correlations. Global Ecology and
Conservation, v. 2, p. 315 – 323, 2014.
tivamente com a abundância de outras espé-
cies em uma localidade (LAMY et al., 2013). LAMY, T.; JARNE, P.; LAROCHE, F.; POINTIER,
J.-P.; HUTH, G.; SEGARD, A.; DAVID, P.
É necessário, portanto, maior cuidado na Variation in habitat connectivity generates positive
elaboração de planos para conservação da correlations between species and genetic diversity
biodiversidade e, nesse sentido as SGDCs in a metacommunity. Molecular Ecology, v. 22, n. 17,
p. 4445-4456, 2013.
fornecem informações valiosas. O sinal da
α-SGDC informa diretamente se a con- LAMY, T.; LAROCHE, F.; DAVID, P.; MASSOL,
servação de um nível de biodiversidade in- F.; JARNE, P. The contribution of species–genetic
diversity correlations to the understanding of com-
terfere negativamente ou positivamente no
munity assembly rules. Nordic Society Oikos, v. 126,
outro. Uma α-SGDC positiva indica que, p. 759 – 771, 2017.
ao conservar a diversidade de espécies em
um local, conserva-se também a diversidade MACARTHUR, R. H.; WILSON, E. O. The theory
of island biogeography. Princeton Univ. Press, Princ-
genética intrapopulacional (ou vice-versa), eton, 1967.
sendo possível aplicar uma estratégia única
ou geral de conservação. Em contrapartida, MARCHESINI, A.; VERNESI, C.; BATTISTI, A.;
FICETOLA, G. F. Deciphering the drivers of neg-
uma α-SGDC negativa sugere que a preser-
ative species–genetic diversity correlation in Alpine
vação da diversidade de espécies local pode amphibians. Molecular ecology, v. 27, n. 23, p. 4916-
comprometer a diversidade genética dentro 4930, 2018.
da população (ou vice-versa), sendo neces-
REISCH, C.; SCHMID, C. Species and genetic diversi-
sário, nessa situação, mesclar estratégias ty are not congruent in fragmented dry grasslands.
de conservação para abarcar os diferentes Ecology and evolution, v. 9, p. 664 – 671, 2019.
níveis de diversidade. A β-SGDC fornece
informações sobre a composição genética ROUSSET, F. Genetic differentiation and estimation
of gene flow from F-statistics under isolation by
e de espécies entre localidades e isso é ex- distance. Genetics, v. 145, n. 4, p. 1219-1228, 1997.
tremamente útil se pensarmos em um nível
mais abrangente de conservação como, por SCBD (2010). COP-10 Decisão X/2: Plano Estratégico
para Biodiversidade 2011–2020. Secretariado da
exemplo, a possibilidade de criar redes de Convenção sobre Diversidade Biológica. Nagoya,
conservação com localidades biologicamen- Japan, 2010.
te complementares.
SOININEN, J.; MCDONALD, R.; HILLEBRAND,
Os estudos de SGDCs são cada vez mais H. The distance decay of similarity in ecological
importantes como uma primeira aproxima- communities. Ecography, v. 30, n. 1, p. 3-12, 2007.
ção combinando os trabalhos de Genética de VELLEND, M. Island biogeography of genes and spe-
Populações e Ecologia de Comunidades que cies. The American Naturalist, v. 162, p. 358 – 365,
se propõem a investigar a influência dos pro- 2003.
cessos microevolutivos na diversidade gené- VELLEND, M.; GEBER, M. A. Connections between
tica e de espécies, ajudando na compreensão species diversity and genetic diversity. Ecology Let-
simultânea de processos ecológicos e evoluti- ters, v. 8, p. 767 – 781, 2005.
vos. Além disso, esses estudos são essenciais WRIGHT, S. Breeding structure of populations in re-
na determinação da estrutura e dinâmica das lation to speciation. The American Naturalist, v. 74,
comunidades e, em uma perspectiva mais n. 752, p. 232-248, 1940.
O DNA como um
novo dispositivo de
armazenamento de dados
A elevada produção global de informação digital torna urgente o aprimoramento das tecnolo-
gias atuais de armazenamento de dados, como dispositivos magnéticos, ópticos e eletrônicos,
empurrando-as cada vez mais próximas ao abismo da obsolescência. Diante das inúmeras
características que inviabilizam a capacidade de armazenamento de dados a longo prazo por
estes dispositivos tradicionais, o DNA surge como um material durável, replicável, resisten-
te, recuperável e com alta capacidade de armazenamento. Dados computacionais podem ser
traduzidos em um sistema análogo ao código genético e armazenados, no formato de oli-
gonucleotídeos, em células por meio do uso da maquinaria do sistema imune procariótico,
CRISPR. A partir do sequenciamento genômico, tais informações podem ser decodificadas
novamente à linguagem computacional e, portanto, reproduzidas. Assim, o DNA recording
é uma solução promissora para problemas atuais da tecnologia da informação e uma aposta
para a próxima geração de dispositivos de armazenamento de dados.
Marcadores genéticos:
Informações que caracterizam
e/ou diferenciam indivíduos
O ácido desoxirribonucleico (DNA) con- números) em 64 possíveis combinações de ou organismos. Em especial,
siste em uma macromolécula complexa ca- códons (trincas de bases nucleotídicas no aqui a expressão “marcadores
paz de armazenar as inúmeras informações RNAm), sintetizaram moléculas de DNA genéticos” refere-se a
essenciais para o desenvolvimento e manu- contendo uma mensagem entre um par de sequências nucleotídicas que
caracterizam uma determinada
tenção de todas as formas de vida. Em geral, marcadores genéticos e as armazenaram em informação.
sua estrutura possui duas cadeias compos- uma carta, a qual foi enviada para os próprios
tas por nucleotídeos (com as seguintes ba- autores via correio. Quando eles a recebe-
ses nitrogenadas - adenina, timina, citosina ram, utilizaram a técnica de PCR (do inglês,
PCR: Acrônimo para
e guanina), os quais realizam pareamentos Polymerase chain reaction) para amplificar o Polymerase Chain Reaction
específicos entre si por meio de ligações de número das moléculas de DNA escondidas (em português, Reação em
hidrogênio (modelo conhecido como parea- no ponto final do texto redigido. Assim, após Cadeia da Polimerase). Consiste
mento de bases Watson-Crick). Em poucas o sequenciamento deste DNA, os pesquisa- em uma técnica de biologia
molecular, capaz de amplificar
palavras, após uma sequência de DNA ser dores identificaram a sequência nucleotídica o número de fragmentos
transcrita em RNA mensageiro (RNAm), específica e, traduzindo-a novamente para o específicos de um genoma,
agrupamentos de três nucleotídeos – cha- alfabeto romano, foram capazes de decodifi- gerando milhões de cópias.
mados de códons – são traduzidos em ami- car a mensagem com sucesso (Figura 1).
noácidos correspondentes a diferentes com-
binações destes conjuntos de bases. Dessa E, se nós pudéssemos não apenas armazenar
forma, o código genético garante instruções informações de texto no DNA, mas também
às nossas células para construir cada uma das informações digitais (em código binário),
Código binário: Linguagem
proteínas do nosso organismo. como fotos, músicas e filmes? Seríamos ca- básica de instrução
pazes de reescrever informações tão robus- computacional, na qual os
Curiosamente, um sistema análogo ao códi- tas e complexas em estruturas nanoscópicas valores são representados por
go genético (código de interpretação de ami- como os genomas? Se sim, poderemos tornar 0 e 1.
noácidos a partir dos códons) também pode o DNA em um novo substituto para os CDs,
ser utilizado como uma forma de criptogra- DVDs e pendrives em um futuro próximo.
Criptografia: Técnica
fia. Em 1999, pesquisadores da Escola de Neste texto, mostraremos como o casamento de proteção a uma dada
Medicina de Monte Sinai, em Nova Iorque, entre a tecnologia da informação e as ferra- informação secreta que apenas
escreveram uma mensagem secreta baseada mentas atuais de biologia molecular podem o remetente e o destinatário
em sequências de DNA. Após a conversão transformar o DNA em um dispositivo de podem acessar.
de caracteres do alfabeto romano (letras e armazenamento de dados.
Figura 1.
Criptografia de DNA. De forma
esquematizada, a imagem
retrata a amplificação das
moléculas de DNA (escondidas
no ponto final da carta) por
meio da técnica de PCR (do
inglês, Polymerase chain
reaction). Em seguida, as
sequências nucleotídicas
amplificadas são decifradas por
sequenciamento de DNA e,
por fim, decodificadas para o
alfabeto romano, revelando a
mensagem secreta. Elementos
gráficos da Noun Project: DNA
– ProSymbols; Monitor – Andy
Mc (CC BY 2.0).
plo, embora os disquetes tenham sido muito interferência - ocorre quando a bactéria é
utilizados nos anos 1990, nenhum dos com- infectada novamente pelo bacteriófago e a
putadores atuais possui leitores para este tipo enzima Cas9 forma um complexo ribonu- Complexos
de dispositivo – inclusive muitos notebooks já cleoproteico com o crRNA que reconhece ribonucleoproteicos:
não apresentam leitores de CD e DVD. e, por fim, destrói a sequência genética viral. Agregados formados por RNA e
proteínas.
Quando o código genético foi reportado pela O entendimento do sistema biológico CRIS-
primeira vez como uma possível forma de PR-Cas abriu portas para o uso de uma ma-
criptografia, a comunidade científica e em- quinaria no desenvolvimento de ferramentas
presas de tecnologia voltaram os olhos para biotecnológicas com aplicações na medici-
uma iminente solução aos problemas das tec- na, na agricultura, na indústria e na ciência
nologias atuais de armazenamento de dados. básica. Devido às profundas implicações da
Afinal, se era possível escrever mensagens de técnica de CRISPR-Cas na sociedade, as
texto em moléculas de DNA, por que não pesquisadoras Emmanuelle Charpentier e
seria possível a inserção de dados cada vez Jennifer A. Doudna foram laureadas ao Prê-
mais robustos? Para isso, assim como apren- mio Nobel de Química em 2020 pelo desen-
demos a traduzir textos de um idioma para volvimento desta tecnologia. Dentre tantas
outro em uma folha de papel, é necessário possibilidades para o uso do sistema CRIS-
aprendermos como traduzir os dados com- PR-Cas, uma nova aplicação tecnológica foi
plexos em código genético e escrevê-los em recentemente reportada: o DNA recording.
um DNA. De forma intrigante, as bactérias
serão as nossas professoras.
2. DNA recording
1.1 CRISPR por CRISPR
O DNA recording consiste no armazena-
Desde os primórdios, em meio às guerras mento de informações específicas (digitais
contra bacteriófagos, as bactérias reescreve- ou não) em ácidos nucleicos. Em linhas ge-
ram os seus próprios genomas como uma es- rais, de acordo com Shipman et al. (2017),
tratégia de defesa. Em alguns genomas pro- o processo se resume a três etapas centrais:
carióticos existem lócus (regiões) compostos (i) escrita, (ii) armazenamento e (iii) leitura
por sequências nucleotídicas repetidas que (Figura 2).
se intercalam com sequências espaçadoras. Bacteriófagos: Vírus que
Estes lócus são conhecidos como CRISPR infectam bactérias.
(Repetições Palindrômicas Curtas Agrupa- 2.1 Princípios
das e Regularmente Interespaçadas) e, junto moleculares
a um conjunto de genes Cas (genes associa-
dos às CRISPR), formam um sistema imune Inicialmente, a escrita é feita a partir da co-
Pixel: Aglutinação das palavras
adaptativo de procariotos, o qual se resume dificação da informação digital (em código em inglês, Picture e Element.
em três etapas: (i) adaptação, (ii) biogênese binário) em sequências de nucleotídeos (có- Consiste no menor elemento de
do crRNA e (iii) interferência. digo genético). Ao supor que estamos traba- uma imagem digital, composto
lhando com uma imagem a ser codificada, por 3 pontos (verde, vermelho
A etapa de adaptação ocorre quando uma precisamos traduzir a informação de cada e azul), os quais formam
combinações que definem
bactéria é infectada pela primeira vez por pixel em código genético. Para isto, Shipman 256 tonalidades diferentes
um bacteriófago e o complexo enzimático e seus colaboradores (2017) estabeleceram quando oito bits são usados
Cas1-Cas2 cliva o material genético viral em um dicionário atribuindo valores binários a para a informação de cada cor
pequenos fragmentos (~32 nt), subsequen- cada base nucleotídica (i.e., C = 00, T = 01, primária.
temente integrando-os no lócus de CRISPR A = 10 e G = 11) e, em seguida, sintetiza-
como sequências espaçadoras. Em seguida, ram uma cadeia de DNA com 28 nucleotí-
a transcrição deste lócus composto por se- deos (denominados de oligonucleotídeos)
quências virais leva à biogênese do crRNA Oligonucleotídeos: polímeros
que codificam 9 pixels, cada um codificado curtos de ácidos nucleicos,
(RNA derivado de CRISPR), que consiste por uma trinca de bases (Figura 2A). Desta geralmente contendo entre seis
em pequenas moléculas de RNA corres- forma, a informação binária de cada conjun- e trinta nucleotídeos.
pondentes aos espaçadores. A etapa final – to de 9 pixels da imagem foi traduzida em
Figura 2.
Esquema do processo de DNA
recording por CRISPR. Em
A, conjuntos de pixels de uma
imagem são geneticamente
codificados e sintetizados em
oligonucleotídeos. Em B, as
moléculas são introduzidas
na célula bacteriana, cujo
sistema CRISPR trabalha
na incorporação das
oligonucleotídeos no genoma.
Em C, o DNA bacteriano é
sequenciado e decodificado em
linguagem computacional para
a reconstrução da informação
armazenada. Elementos gráficos
da Noun Project: DNA – Olivia;
Vectors Market (CC BY 2.0).
3. Vantagens e 4. Perspectivas
desvantagens A quantidade de informação gerada nos últi-
mos anos tem crescido descontroladamente,
Como uma iminente solução para os pro- excedendo os limites físicos para o seu ar-
blemas atuais de armazenamento de dados mazenamento. O advento da tecnologia de
em dispositivos magnéticos, ópticos e eletrô- DNA recording, que utiliza ácidos nucleicos
nicos, o DNA apresenta propriedades alta- para o armazenamento de dados, abre portas
mente relevantes: a alta densidade de infor- para a resolução deste importante problema,
Zettabytes: Unidade de
possibilitando o armazenamento de toda
a informação estimada a ser produzida até Para saber mais medida equivalente a 1021 bytes
ou 109 terabytes.
2025 (175 zettabytes) em uma única sala. CAMPBELL, Mark. DNA data storage: automated
Entretanto, o importante gargalo da perfor- DNA synthesis and sequencing are key to un-
mance de síntese e sequenciamento de DNA locking virtually unlimited data storage. Comput-
ainda precisa ser resolvido. Para isso, a au- er, v. 53, n. 4, p. 63-67, 2020.
tomação do armazenamento de dados em DE CARLI, Gabriel J. et al. A revolucionária técnica
DNA é um dos focos principais do DNA de edição genética “CRISPR”. Genética na escola,
Data Storage Alliance, um grupo formado por v. 12, n. 2, 114-123.
mais de dez organizações importantes, como SHIPMAN, Seth L. et al. CRISPR–Cas encoding of
a Microsoft e a Universidade de Washing- a digital movie into the genomes of a population
ton. Assim, nos próximos anos, os avanços of living bacteria. Nature, v. 547, n. 7663, p. 345-
destes grupos poderão viabilizar o uso de 349, 2017.
DNA como uma solução para lacunas atuais CC BY 2.0: https://creativecommons.org/licenses/
das tecnologias de armazenamento de dados. by/2.0/br/
A genética
por trás da oitava
praga do Egito
Victor Campos Khuriyeh1, Letícia Grillo G. Pereira1, Lucas Costa Silva1,
Yanca Tonhasca Lau1, Matheus Salustio C. Petrucci1, Lúcia Elvira Alvares2
1
Graduandos do Instituto de Biologia (IB), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
2
Departamento de Bioquímica e Biologia Tecidual, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, Campinas, SP
Autor para correspondência - lealvare@unicamp.br
Os gafanhotos são insetos de grande relevância ecológica, pois estão na base da cadeia alimen-
tar de vários ecossistemas. Contudo, em certas condições, podem desenvolver comportamen-
to gregário, formando enxames que geram prejuízos econômicos e sociais, visto que muitas
vezes atingem áreas de produção agrícola, principalmente em regiões acometidas por pobreza
extrema. A partir desse cenário, surge a necessidade de alternativas que controlem esses enxa-
mes, mas que não gerem danos ecológicos, dada a importância dos gafanhotos. Neste artigo,
o gene drive é apresentado como uma possível alternativa ao combate dos gafanhotos, mas que
ainda deve permanecer no âmbito das pesquisas científicas até que seja possível aplicá-lo com
segurança em populações naturais.
Figura 1.
Ilustração representando a
oitava praga do Egito antigo,
causada por uma invasão de
Vida e vimento holometábolo, existem, entre o ovo
e o adulto, as fases de larva e pupa, que são
gafanhotos, conforme relatado
na Bíblia. Ilustração elaborada
comportamento bem diferentes da forma adulta. por: Isadora Maria Pace.
Há ainda outras espécies de gafanhotos mi- estudada como um organismo modelo para
gratórios, como Locusta migratoria, encontra- compreender como mudanças na morfolo-
da na Europa meridional e na África, que é gia, no comportamento e na fisiologia dos
uma das principais pragas agrícolas do con- gafanhotos ocorrem na transição da fase so-
tinente africano. A L. migratoria vem sendo litária para a gregária.
Figura 2.
Ciclo de vida dos
gafanhotos, que apresentam
desenvolvimento
hemimetábolo. Neste tipo de
desenvolvimento, não existem
larvas ou pupas, sendo que as
ninfas representam os estágios
imaturos. Imagem criada com
BioRender.com.
Figura 3.
Variação de coloração das
ninfas de gafanhotos da espécie
Schistocerca gregaria. Assim
como as ninfas, os gafanhotos
adultos apresentam colorações
distintas. Enquanto a forma
solitária possui coloração
discreta, que se confunde com
o meio ambiente, a gregária
apresenta coloração vistosa,
facilmente discernível no seu
entorno. Na parte superior, foi
ilustrada uma ninfa da forma
solitária desta espécie de
gafanhotos e, na parte inferior,
uma ninfa gregária. Ilustração
elaborada por: Vitória Reis.
O gene drive requer a conexão do gene de in- forma, o gene drive permite que uma caracte-
teresse (alelo mutante) a elementos genéticos rística artificial, projetada em laboratório, se
capazes de fazer uma cópia de si mesmos e do espalhe por toda a população de uma dada
alelo de interesse conectado, além de inserir espécie, até o ponto em que a característica
ambos no mesmo lócus do cromossomo ho- torne-se comum em toda a população e, com
mólogo (Figura 4). Os elementos genéticos o decorrer do tempo, até mesmo em toda a
usados para “carregar” os genes de interesse espécie. Tem-se então que esses elementos
podem ser endonucleases que ocorrem na- genéticos conseguem “burlar” as regras da
turalmente no genoma de diferentes espécies seleção natural e da herança mendeliana,
ou, então, sequências preparadas por enge- aumentando em frequência a cada geração,
nharia genética em laboratório, como aquelas mesmo sem conferir aos indivíduos uma
do sistema CRISPR/Cas9 (Figura 4). Dessa vantagem adaptativa.
Box explicativo
Por muitos anos, apesar dos pesquisadores visualizarem diversas aplicações para o gene dri-
ve, tiveram dificuldades de desenvolvê-las em laboratório. O sistema CRISPR/Cas9 é uma
técnica revolucionária, que ajudou a reduzir esses obstáculos. O sistema em questão consiste
no uso de uma endonuclease (Cas9), uma enzima natural que cliva (corta o DNA), em con-
junto com uma molécula de RNA cuja função é atuar como um guia (RNA guia, sintetizado
em laboratório). O guia “mostra” à endonuclease qual a sequência específica do DNA que
deve ser cortada, permitindo que regiões de interesse no DNA sejam modificadas, removidas
ou adicionadas no local onde houve a quebra do DNA. No caso do gene drive mediado pelo
sistema CRISPR/Cas9, as sequências do alelo mutante e da enzima Cas9 são fornecidas às
células do organismo a ser modificado geneticamente, para que elas as utilizem para fazer
uma cópia dos mesmos durante o reparo do DNA danificado, através do processo conhecido
como “reparo dirigido por homologia”. Nesse processo, tanto o alelo mutante como a própria
Cas9 são inseridos no local determinado pelo RNA guia. Portanto, através desse sistema, é
possível implementar, com mais sucesso, o gene drive para edição do genoma de diferentes
espécies. Uma vez no DNA, por si só, o gene drive é capaz de espalhar-se por toda uma po-
pulação de organismos.
Isso posto, os gene drives poderiam ser pro- solitários teriam a sobrevivência assegurada e,
duzidos com foco naqueles genes que são ne- mesmo sob influência das mudanças ambien-
cessários na mudança da fase solitária para a tais que são gatilhos para a troca de fenótipo,
fase gregária, ou na manutenção das caracte- não chegariam a assumir as características
rísticas gregárias. Dessa forma, os gafanhotos gregárias, ou não conseguiriam mantê-las.
Figura 4.
Comparação da distribuição
de um alelo mutante, criado
em laboratório, por meio da
Estudos realizados na espécie Locusta mi- sência desse fator hormonal também impede
herança Mendeliana normal (à
gratoria revelaram que a expressão de genes mudanças morfológicas no corpo dos gafa- esquerda) e utilizando o gene
envolvidos no controle do voo de longa dis- nhotos associadas à gregarização e, portanto, drive (à direita). Por meio da
tância e no comportamento alimentar desses o gene Crz também é um candidato possível reprodução sexuada normal, um
gafanhotos é modificada durante a transição ao gene drive. alelo mutante tem apenas 50%
de chance de ser herdado. Em
da fase solitária para a fase gregária. Por- contraste, com o gene drive, o
tanto, tais genes são potenciais alvos para O olfato também é um fator importante
alelo mutante é copiado para o
modificações, visando impedir ou diminuir na gregarização, pois permite que os gafa- mesmo lócus no cromossomo
o processo de gregarização. Um outro es- nhotos sintam os demais indivíduos de sua homólogo, de maneira que
tudo mostrou que o silenciamento do gene espécie nas proximidades e realizem uma todos os descendentes
comunicação química, através, por exemplo, sempre irão herdá-lo. Embora
Corazonina (Crz), que codifica o hormônio outras estratégias possam ser
peptídico [His7]-corazonina, afeta a colora- de feromônios de gregarização. Nesse con-
empregadas para impulsionar
ção característica da fase gregária em Schis- texto, as proteínas ligantes a odores (OBP o alelo mutante na população,
tocerca gregaria, causando um clareamento - odorant-binding proteins) são importantes, o sistema CRISPR/Cas9 é uma
que se aproxima do padrão da fase solitária. pois solubilizam e transportam sinais quí- das possibilidades mais viáveis.
micos, incluindo odores e feromônios, até os Nesse caso, o drive contém
O hormônio é expresso no cérebro, gânglios os componentes detalhados
nervosos e na região cardíaca dos gafanhotos, receptores olfativos dos gafanhotos. O gene no Box 1. Imagem criada com
e se mostrou muito importante no polifenis- LmigOBP4, que codifica uma dessas proteí- BioRender.com.
mo de fase, estando presente em quantidades nas, parece ser um possível alvo para o gene
muito maiores durante a fase gregária. A au- drive, pois, quando ele é silenciado durante
Modelos animais no
estudo de doenças
genéticas humanas
Felipe Tadeu Galante Rocha de Vasconcelos1*, Laura Machado Lara Carvalho1*,
Lucas Santos e Souza1*, Igor Neves Barbosa2*, Carolini Kaid Dávila3,
Mayana Zatz3, Mariz Vainzof3
1
Doutorando(a) do Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas (Biologia-Genética), Departamento de Genética e
Biologia Evolutiva, Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, SP
2
Mestrando do Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas (Biologia-Genética), Departamento de Genética e
Biologia Evolutiva, Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, SP
3
Pesquisadora do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva, Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-Tronco,
Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, SP
*
Felipe, Laura, Lucas e Igor contribuíram igualmente para o artigo.
Autor para correspondência - mvainzof@usp.br
Palavras-chave: modelos animais, genética humana, doenças genéticas, zebrafish, camundongo, cão, 3R’s
Modelos animais são espécies não humanas que têm sido utilizadas em inúmeras pesqui-
sas científicas, permitindo a compreensão do funcionamento de organismos vivos complexos,
além do desenvolvimento de tecnologias aplicadas à saúde humana, como medicamentos, so-
ros e vacinas. Esses modelos são utilizados na mimetização de doenças, na expectativa de se
poder posteriormente utilizar o conhecimento gerado em humanos. Nesta leitura você pode-
rá conhecer alguns dos principais modelos utilizados em experimentação, implicações éticas e
legais do seu uso, além de exemplos de aplicações que contribuíram significativamente para a
sociedade, principalmente no campo da genética humana.
Farmacologia - ciência
que estuda como diferentes
substâncias, os fármacos,
interagem com o organismo e
que resposta desencadeiam.
animais para
estrutura e o funcionamento
década de 1980, com o aperfeiçoamento das
de moléculas biológicas, em
tecnologias de biologia molecular e edição especial as que constituem o
estudar doenças gênica, houve uma explosão nas possibilida-
des de manipulação genética de animais mo-
material genético.
Princípio genético da
transformação - também
chamado de transformação
bacteriana. Por esse processo,
ocorre a captura de pedaços
de DNA do ambiente e
incorporação ao genoma da
bactéria.
Figura 1.
Exemplos de experimentos com
modelos animais que foram
importantes para a humanidade.
Figura 2.
Monumento ao camundongo de
laboratório, em um parque em
frente ao Instituto de Citologia
e Genética da Academia de
Ciências da Rússia, na cidade
de Novosibirsk. Observa-se
um camundongo tricotando
uma molécula de DNA, que
representa a gratidão da
humanidade pelo animal
que é utilizado em pesquisas
genéticas para entender
mecanismos biológicos e
desenvolver novas drogas e
tratamentos para doenças.
Autora: Irina Gelbukh (2013).
Licença Creative Commons
atribuída.
Apresentaremos a seguir três modelos ani- vimento. Em cerca de três meses, o zebrafish
mais muito utilizados nas pesquisas de atinge a maturidade sexual e cada casal pode
doenças genéticas humanas: o zebrafish, o produzir de 200 a 300 ovos semanalmente.
camundongo e o cão. Outra vantagem é que os embriões são trans-
parentes e se desenvolvem fora do corpo, o
Zebrafish ou que permite a visualização macroscópica
para estudo desse desenvolvimento.
peixe-zebra Não só o desenvolvimento, mas também a fe-
Ortólogo - genes que estão
em espécies diferentes, mas
Figura 3.
Alguns benefícios da utilização
do zebrafish como modelo
animal.
Outra utilidade é validar genes candidatos induzidas pela metodologia CRISPR cau-
a doenças. Por exemplo, se for observado saram microcefalia em zebrafish e o fenótipo Distrofias musculares - grupo
que alguns recém-nascidos com microcefalia em humanos é correspondente. de doenças caracterizadas por
têm mutação em certo gene, essa causalida- fraqueza progressiva e perda de
O zebrafish tem sido utilizado, por exemplo, massa muscular.
de pode ser verificada em zebrafish. Pode-se
editar o gene candidato no embrião de zebra- em estudos sobre distrofias musculares,
fish para verificar se o peixinho expressará tal obesidade, câncer, albinismo ocular, micro- Albinismo ocular - forma
fenótipo (cabeça pequena) (Figura 4). Por cefalia, fendas orofaciais, doenças hepáticas, de albinismo que leva à
exemplo, mutações nos genes map11 e cdc6 surdez etc. falta de pigmentação da íris,
prejudicando a visão.
Fendas orofaciais -
malformações no palato (céu da
boca) e/ou lábio.
Figura 4.
Microcefalia em zebrafish.
Figura 5.
Benefícios de se utilizar o
camundongo (Mus musculus)
como modelo animal.
As linhagens dos animais de laboratório podem ser divididas em dois grandes grupos:
Animais não consanguíneos são os que apresentam na constituição genética uma alta taxa de
heterozigose (~99%), o que faz com que seja mantida uma grande diversidade genética e feno-
típica num grupo de animais.
As linhagens isogênicas são de especial interesse para os grupos de pesquisa pois apresentam
um conjunto único de características. Mas, por que isso é interessante? Imagine que se pretende
comparar um grupo de animais em que foi utilizada determinada terapia com um grupo em que
não se utilizou. É importante, nesse caso, que ambos os grupos sejam geneticamente parecidos,
porque variações genéticas poderiam interferir nos resultados do experimento. Ao se comparar
um grupo de animais que teve um gene editado com um grupo não editado, deve-se seguir o
mesmo raciocínio: é importante que os animais que os originaram tenham uma constituição
genética muito próxima pois, do contrário, variantes em outros genes que não o editado podem
interferir fenotipicamente, atrapalhando a análise dos resultados do experimento.
Figura 6.
Camundongo nude.
familiaris) A resposta imune dos cães tem maior simila- potencial de gerar informações
ridade com a do humano do que outros mo- ou ferramentas aplicáveis à
saúde humana.
delos. Além disso, o tamanho maior dos cães
Por que utilizar o melhor amigo do homem
torna-os fisiologicamente mais próximos dos
em pesquisas? Existem pelo menos 450
humanos. Isso contribui, por exemplo, para
doenças que surgem espontaneamente em
mimetizar melhor a biodistribuição de fár-
cães e 80% delas também afetam humanos. Biodistribuição - passagem
macos em um tratamento experimental. Afi- de um fármaco da corrente
Além disso, em muitos casos, a manifesta-
nal, a biodistribuição tende a ser facilitada sanguínea para os tecidos. É
ção dessas doenças nos cães é comparável ao
no corpo de animais menores. Muitos me- afetada por fatores fisiológicos
que ocorre em humanos - considerando sua e propriedades físico-químicas
dicamentos testados em pequenos animais
complexidade social, comportamental, e do do próprio fármaco.
podem não alcançar seus alvos moleculares
ambiente em que estão inseridos - e, assim
em humanos com a mesma eficácia, já que
sendo, o potencial translacional do modelo
somos muito maiores, o que é uma barreira
canino para o estudo de doenças humanas é
translacional.
Figura 8.
Alguns benefícios de se utilizar
o cão como modelo animal.
A variação genética entre cães de raças dife- bientais. O mesmo não ocorre com animais
rentes é maior que entre os da mesma raça. mantidos em biotérios especializados com
Biotérios - ambientes em
Assim sendo, cada raça de cão possui uma ambiente rigidamente controlado (quanto à que são mantidos animais
alta homogeneidade de fenótipo, em grande temperatura, dieta, luminosidade, condições em condições adequadas à
parte por causa do processo de seleção arti- sanitárias etc.). Embora em muitos contex- utilização em experimentos
ficial conduzida por humanos para gerar ani- tos científicos o ambiente controlado seja científicos ou produção
biotecnológica (ex.: de vacinas
mais com características desejadas em apa- positivo para o sucesso do experimento, é e soros).
rência e comportamento. No entanto, esse importante avaliar também uma intervenção
processo de seleção imposto por criadores em um ambiente mais comparável ao do ser
acabou gerando também uma alta frequência humano e, nesse caso, o cão doméstico tende
de doenças genéticas em cães ditos “de raça/ a reproduzir melhor o que acontece conosco.
pedigree”. Isso acontece porque a consangui- Seleção artificial - processo
A sociabilidade e o comportamento emoti- pelo qual humanos selecionam
nidade propicia uma maior probabilidade de animais ou plantas com
ocorrer em homozigose alelos recessivos po- vo dos cães facilitam a avaliação clínica das
características desejáveis para
tencialmente patogênicos, ou seja, cães ditos condições de saúde e intervenções terapêuti- efetuar cruzamentos, com o
“de raça” são mais propensos a certas doenças cas, pois eles expressam mais claramente dor objetivo de obter organismos
(as autossômicas recessivas) que os sem raça e incômodo. Essas características também com fenótipos desejados.
definida (ditos “vira-latas”). Isso abre oportu- permitem que os próprios donos consigam
nidades na pesquisa científica para elucidar a relatar a melhora ou a piora dos cães, o que
relação entre genes e doenças. também pode facilitar a detecção de efeitos
colaterais e efetividade de tratamentos a lon-
Doenças são causadas por alterações genéti- go prazo.
cas, condições ambientais, ou por uma inte-
ração entre variantes genéticas e o ambiente. Apesar das vantagens apresentadas, os es-
Os cães domésticos compartilham, em gran- tudos com cães não são tão frequentes e as
de parte, do mesmo ambiente que os seres principais razões são a dificuldade de se ob-
humanos e, em consequência, disso podem ter o número necessário de indivíduos com a
desenvolver diversas patologias que nos afe- condição estudada (o que é importante para
tam, já que estão expostos a microrganismos, que os resultados sejam estatisticamente sig-
poluentes, toxinas e outras variáveis am- nificativos) e o alto custo de manutenção de
um canil - desde a alimentação, contratação Dmdmdx, que tem um quadro leve, os cães
de pessoal especializado (como médicos ve- GRMD têm uma progressão clínica compa-
terinários e cuidadores), à alocação de espaço rável com a Distrofia Muscular de Duchenne
físico adequado e limpeza. em humanos. Em ambos os casos (cão e hu-
mano), os afetados têm perda progressiva de
Um bom exemplo de modelo canino para o massa muscular e a doença culmina na morte
estudo de uma doença humana é a Distrofia por insuficiência respiratória ou cardíaca em
Muscular em Golden Retrievers (GRMD), idade prematura. Por isso, esse modelo ca-
que ocorre por mutação espontânea no gene nino mimetiza melhor tal condição humana
da distrofina. Ao contrário do camundongo que o modelo Dmdmdx murino (Figura 9).
Figura 9.
Análise comparativa entre
modelos de Distrofia Muscular
Recentemente, percebeu-se que uma va- ram estudar o gene JAGGED1 para tentar de Duchenne.
riante genética rara no gene JAGGED1, encontrar soluções técnicas terapêuticas
quando presente no modelo GRMD, é pro- para a Distrofia Muscular de Duchenne em
tetiva para a progressão da doença, isto é, humanos. Esse tipo de descoberta pode aju-
animais com variante patogênica no gene da dar no desenvolvimento de novas terapias
distrofina tinham uma melhor qualidade de para esta e outras doenças, tendo como alvo
vida (mais semelhante à dos cães selvagens) genes que podem impedir que o indivíduo
se apresentassem também a variante em desenvolva a patologia, os chamados “genes
JAGGED1. Os pesquisadores agora procu- protetores”.
Como escolher um
Células progenitoras
Sabemos que naturalmente existem diferen- neuronais - células que se
ças entre humanos e modelos animais e, a diferenciam nas células maduras
modelo animal? depender do modelo, uma mutação em um do sistema nervoso (neurônios,
astrócitos e oligodendrócitos).
gene pode ser patogênica em humanos, mas
Cada modelo animal tem suas particulari- ter consequências mínimas em animais no
dades (Figura 10). Uma escolha criteriosa contexto clínico, isto é, alterações fenotípi-
do modelo animal é um ponto fundamental cas imperceptíveis ou mesmo inexistentes. A
do planejamento da pesquisa. A decisão por escolha do melhor modelo depende de que
um modelo específico depende dos objetivos pergunta queremos responder e de que ma-
do projeto e deve ser tomada com base em neira podemos extrapolar e aplicar os resul-
argumentos científicos e verificação de carac- tados obtidos à espécie humana.
terísticas intrínsecas das opções de espécies
Figura 11.
A norma técnica dos 3R’s.
Ilustrações Financiamento
As figuras 1 e 3 a 11 foram produzidas pelos Os autores são gratos pelo apoio das agências
autores utilizando recursos Mind the Graph de fomento FAPESP, CAPES e CNPq, que
(https://www.mindthegraph.com/), respei- financiam seus projetos (CEPID e INCT) e
tando as condições de seus termos de uso. bolsas de pós-graduação.
Ancestralidade: genética,
herança e identidade
De onde vieram nossos antepassados? Essa pergunta tem guiado milhares de pessoas em
uma busca por suas origens, alimentada pela divulgação de testes genéticos nas redes sociais,
comercializados por empresas privadas que oferecem respostas para questionamentos como
esse. Assim, os testes de ancestralidade vêm ganhando popularidade, levantando questões
importantes sobre seu impacto na ciência e no cotidiano da sociedade. No presente artigo são
abordados conceitos de genética de populações que constituem a base para os testes, além de
reflexões sobre as possibilidades de aplicação das informações obtidas a partir dos dados ge-
néticos - da expansão do conhecimento sobre a história evolutiva humana aos usos indevidos
que podem levar à segregação social.
(substâncias mutagênicas, raios ultravio- ção que ocorre a cada geração, e uma peque-
leta, entre outros), indicando que o DNA na parcela (5-7%) corresponde a variações
de qualquer um de nós está sujeito a sofrer resultantes de histórias evolutivas distintas
mutações e apresentar variantes genéticas. entre indivíduos de regiões/continentes di-
Estima-se que a cada geração, em média, ferentes; isso quer dizer que apenas uma
175 novas variantes genéticas podem surgir fração mínima do genoma pode ser, de fato,
em um indivíduo. A maioria dessas variantes informativa sobre a origem geográfica de um
ocorre em células somáticas, não reproduti- indivíduo e/ou de seus ancestrais.
vas, diploides, que possuem dois conjuntos
cromossômicos completos e não são trans- Para inferir a ancestralidade genética de uma
mitidas para seus descendentes. Apenas mu- pessoa, é preciso olhar exatamente essa pe-
tações que ocorrem em células germinativas quena fração do genoma (0,1%), com foco
que produzem gametas, dotados do conjun- especial nos 5-7% desses que diferem entre
to haploide do material genético, podem ser populações. Parte-se da premissa de que
transmitidas aos descendentes, podendo au- indivíduos com ancestrais comuns (um ou
mentar de frequência ao longo de gerações e vários) tendem a compartilhar um número
se tornar parte do conjunto de variantes de maior de variantes genéticas. Da mesma for-
uma população. ma, grupos populacionais de uma mesma re-
gião geográfica ou continente tendem a apre-
Mutações podem ocorrer em qualquer par- sentar mais variantes genéticas em comum
te do genoma, tanto nas regiões codificado- entre si do que com grupos de regiões/conti-
ras, as que envolvem os genes, como nas não nentes distintos e mais distantes geografica-
codificadoras. Mas, as variantes genéticas mente, evidenciando que as populações mais
resultantes só se tornam frequentes quando próximas passaram pelos mesmos processos
resistem aos processos evolutivos pelos quais de deriva genética e pressões seletivas e, por-
poderiam ser eliminadas pela seleção natural tanto, compartilharam uma mesma histó-
ou por deriva genética. Indivíduos e seus ge- ria durante o processo de evolução. Porém,
nomas estão sujeitos a pressões seletivas do embora possa ser detectada, a diferenciação
ambiente, a seleção natural, e possuem chan- genética entre indivíduos e/ou grupos popu-
ces diferentes de gerar descendentes devido lacionais é extremamente sutil e pode ser um
às probabilidades distintas de sobrevivência gradiente, ou seja, observa-se um gradiente
ou por questões de fertilidade; por conse- de variação genética entre os grupos popu-
quência, variantes genéticas não vantajosas lacionais, sem diferenças abruptas, fazendo
podem desaparecer em uma ou poucas ge- com que, do ponto de vista genético, as de-
rações. Já pelo processo de deriva genética, limitações geográficas entre continentes ou
variantes podem se tornar raras ou muito países não sejam nítidas, refletindo, em par-
frequentes em uma população, devido a mu- te, a história dos movimentos de migração e
danças aleatórias nas frequências alélicas de interação entre os grupos. Portanto, é preci-
uma geração para outra decorrente do acaso so prudência na interpretação e na utilização
na distribuição dos gametas, e que não estão de informações genéticas, como detalhado
relacionadas a pressões seletivas. adiante.
Podemos, então, nos perguntar o quanto o
acúmulo dessas variantes genéticas pode re- Marcadores
fletir em diferenças entre indivíduos e gru-
pos populacionais. Desde a década de 1990, moleculares de
vários estudos têm buscado responder a essa
questão, e todos apontam para os mesmos
ancestralidade
resultados: (i) genomas de quaisquer indiví- A ancestralidade genética de um indivíduo
duos tomados ao acaso são 99,9% semelhan- pode ser inferida a partir do estudo de di-
tes; (ii) do 0,1% de diferenças observadas, a ferentes tipos de marcadores moleculares,
maior parte (93-95%) é decorrente da varia- como chamamos as variantes genéticas com
ção casual proveniente do processo de muta- papel informativo para diversos estudos. Os
mais utilizados são os polimorfismos de base tido ao longo das gerações apenas pelos in-
única, ou SNPs (do inglês single nucleotide divíduos do sexo masculino; o cromossomo
polymorphisms), as inserções ou deleções de X dos indivíduos do sexo masculino sempre
uma ou mais bases nucleotídicas (INDELs) é herdado das mães, enquanto os indivíduos
e os microssatélites, sequências curtas de 3-7 do sexo feminino herdam um cromossomo
nucleotídeos que se repetem sucessivamente X de cada genitor; e o DNA mitocondrial
e que variam em número de repetições entre também tem padrão de herança uniparental,
os indivíduos. sendo transmitido apenas pelo lado materno,
aos indivíduos de ambos os sexos (Figura 1).
Esses marcadores podem estar localizados Esses diferentes padrões de herança permi-
nos 22 pares de cromossomos humanos au- tem que a ancestralidade seja revelada sob
tossômicos, nos cromossomos sexuais que, diferentes pontos de vista: o cromossomo Y
na espécie humana são denominados X e Y, conta a origem dos ancestrais masculinos; o
e no DNA mitocondrial. Os marcadores au- DNA mitocondrial, dos ancestrais femini-
tossômicos apresentam herança biparental, nos; e os autossomos e o cromossomo X, a
na qual um indivíduo herda um do lado pa- história conjunta com todas as nuances de
terno e outro do materno; o cromossomo Y miscigenação.
apresenta herança uniparental, e é transmi-
Figura 1.
Na figura estão representados
os padrões clássicos de herança
do DNA. (A) herança biparental
dos cromossomos autossômicos;
os cromossomos dos pais são
transmitidos para os filhos
aleatoriamente. (B) herança do
cromossomo X; um indivíduo do
sexo masculino transmite seu
cromossomo X apenas para as
filhas e os indivíduos do sexo
feminino, que possuem dois,
aleatoriamente os transmitem
para filhos e filhas. (C) herança
uniparental do cromossomo Y,
que é transmitido ao longo das
gerações apenas pelos homens.
(D) herança uniparental do
DNA mitocondrial; neste caso,
a transmissão é materna, e as
mulheres transmitem o DNA
mitocondrial para filhos e filhas.
Figura autoral utilizando ícones
do PowerPoint e do BioRender.
com (https://biorender.com/).
vos de ancestralidade, ou AIMs (do inglês, que atualmente custa em média 100 dólares,
ancestry informative markers). O número de ainda é proibitivo para a maior parte da po-
marcadores dos painéis varia entre dezenas pulação, restringindo o acesso do produto
e centenas, a depender do quão diferentes às pessoas com maior renda. Mesmo assim,
forem os grupos populacionais que irão re- de acordo com dados das quatro principais
ferenciar as ancestralidades testadas. Esses empresas internacionais que comercializam
painéis são amplamente utilizados e, devido testes de ancestralidade, mais de 26 milhões
ao seu baixo custo, ganharam notoriedade de consumidores fizeram testes em 2018, e
como ferramenta auxiliar nos estudos de ge- estima-se que, em 2021, esse número chegue
nética forense, quando, por exemplo, tem-se a 100 milhões.
a amostra de DNA, mas falta qualquer outra
informação sobre o indivíduo em questão. A motivação para a procura pelos testes varia
desde o desconhecimento sobre os ascenden-
A segunda abordagem utiliza dados genômi- tes recentes. A maioria das empresas oferece
cos em larga escala: microarranjos com cen- o serviço direcionado à busca por parentes,
tenas de milhares de marcadores genéticos, algo atrativo para pessoas que foram adota-
sequenciamento de exomas ou de genomas das e que desejam saber sobre seus pais bio- Exoma - fração do genoma
completos. Nesse caso, é importante desta- lógicos, ou por falta de informação histórica que corresponde ao conjunto
car que apenas uma parcela muito pequena mais detalhada sobre um lado da família, ou de éxons, as sequências
dos marcadores são AIMs; assim, para in- até mesmo simples curiosidade. Não pode- codificadoras do material
genético (DNA). O exoma
ferir a ancestralidade, são necessárias meto- mos descartar que a divulgação da ances-
representa de 1,5-2,0% do
dologias de análise mais robustas, que levem tralidade de pessoas famosas, revelada pelo nosso genoma.
em consideração os padrões de variação ao DNA, também se tornou um chamariz pu-
longo do genoma. Os dados em escala genô- blicitário para que pessoas comuns de uma
mica têm como vantagem possibilitar, além população busquem suas origens.
da inferência da ancestralidade, investigações
de padrões demográficos associados. Exem- Apesar da facilidade para a obtenção dos
plos: redução dos tamanhos populacionais, dados genéticos, frequentemente surgem dú-
padrões de migrações, número de eventos vidas a respeito dos resultados, que muitas
migratórios. vezes são disponibilizados com explicações
vagas, dificultando a real compreensão do ce-
isolamento restrito a um período de tempo/ 50% do nosso DNA com cada um deles; e
gerações é condição para uma inferência ser esse compartilhamento fica em torno de 25%
mais ou menos precisa, uma vez que, quanto com cada um dos avós maternos e paternos
mais gerações se volta no tempo, menor será (Figura 2). Dessa forma, conforme gerações
a contribuição de um antepassado à geração cada vez mais antigas são consideradas, per-
atual. cebemos que nosso genoma é formado pela
contribuição de vários antepassados e o grau
Sob a perspectiva da genética, as relações de de compartilhamento de DNA com cada as-
parentesco podem ser compreendidas à luz cendente (ou com indivíduos que comparti-
dos seguintes fatos: nosso DNA é 50% idên- lham os mesmos ascendentes - tal como nos-
tico ao do nosso pai e 50% ao da nossa mãe sos primos) deve ser proporcional ao nível de
e, portanto, dizemos que compartilhamos parentesco.
Figura 2.
A figura mostra
esquematicamente o
compartilhamento do material
genético ao longo das gerações
em uma genealogia. O DNA
está contido nos cromossomos
representados por barras
coloridas, nas quais cada cor se
refere à origem da sequência.
Se tomarmos como referência
o indivíduo na parte inferior da
figura, podemos notar que seu
material genético é cerca de
50% idêntico ao de seus pais
e 25% ao de seus avós. Figura
autoral utilizando ícones do
PowerPoint.
Outra situação recorrente é a pessoa esperar des mais remotas podem ser perdidas, uma
uma dada ancestralidade em seu genoma e vez que o tamanho do segmento de DNA
não a encontrar, ou descobrir uma ancestra- herdado de um ancestral será cada vez mais
lidade incompatível com a história que ela reduzido quanto mais distante for o paren-
conhece. Aqui, abrimos um leque de possi- tesco do ascendente, aumentando, por sua
bilidades: (i) como discutido, dependendo vez, a probabilidade do segmento não ser
do banco de populações parentais utilizado, transmitido à próxima geração.
haverá maior ou menor capacidade de de-
tectar um dado grupo/origem geográfica; É de se supor que os resultados inesperados
(ii) determinados grupos populacionais coloquem em dúvida a confiabilidade dos
ainda estão pouco representados nos ban- testes comerciais. Vale dizer que as empre-
cos de dados disponíveis para comparação, sas e laboratórios privados, em sua maioria,
especialmente as populações indígenas, o são altamente capacitados tecnicamente
que exige cautela na interpretação dos re- para gerar dados de qualidade. No entanto,
sultados; (iii) alguns grupos populacionais, a análise desses dados e a interpretação dos
como os europeus, apresentam intensa his- resultados são fatores críticos para a com-
tória de migração dentro do continente, e o preensão das informações pelo público e,
alto grau de fluxo gênico entre esses povos justamente por não ser trivial, as simplifi-
dificulta distingui-los; (iv) por fim, devido cações e/ou falta de esclarecimentos podem
ao embaralhamento e distribuição ao acaso levar a entendimentos equivocados e con-
dos cromossomos na meiose, ancestralida- troversos.
te Pääbo, do Instituto Max Planck para An- pode mudar com o tempo e mesmo entre lu-
tropologia Evolutiva de Leipzig (Alemanha), gares. Portanto, é um conceito definido pela
revelou que um fragmento ósseo encontrado sociedade, e não pelos nossos genes.
numa caverna no Monte Altai na Rússia
pertencia a uma menina, chamada carinho- Não é por acaso que a maioria dos cientistas
samente de Denny, que viveu há 90.000 anos tem buscado demolir o conceito de raça bio-
atrás, cujo pai era um Neanderthal e a mãe lógica para a espécie humana. Aparentemen-
Denisova. Além disso, testes de ancestrali- te, na contramão desse combate, os testes de
dade revelaram que descendentes atuais de ancestralidade, que classificam os indivíduos
povos não africanos apresentam proporções dentro de grupos continentais - africanos,
de 2-5% de ancestralidade Neandertal e/ou europeus, asiáticos - têm se tornado mais
Denisova em seus genomas. Essa é uma evi- populares e acessíveis, ganhando força e
dência praticamente irrefutável de que esses destaque na mídia. Essa aparente contradi-
grupos humanos arcaicos e modernos deixa- ção requer uma análise cuidadosa para que
ram descendentes férteis e, portanto, do pon- os dados genéticos não sejam utilizados de
to de vista biológico, são da mesma espécie. forma leviana, podendo levar ao afloramento
de comportamentos segregacionistas funda-
Sabemos, no entanto, que a ideia de sepa- mentados em pequenas variações no DNA
rar os humanos em grupos, usando o termo que jamais poderiam sustentar a divisão bio-
raça, na qual as pequenas diferenças entre as lógica de grupos populacionais humanos em
populações são exaltadas, leva a consequên- raças.
cias políticas, sociais e econômicas reais de
categorização e discriminação, que fazem A utilização dos dados de ancestralidade ge-
parte da vida cotidiana de indivíduos de nética como respaldo científico para validar
muitas nações, inclusive do Brasil. Por isso, a classificação de indivíduos a um determi-
o uso de interpretações equivocadas sobre o nado grupo racial é imprudente e precipita-
conhecimento científico atrelado ao racismo da. É preciso compreender que o conceito
é visto com muita preocupação e precisa ser de ancestralidade genética não é soberano,
esclarecido e combatido. pelo contrário, está sujeito a nuances que não
permitem que as classificações dos grupos
Para entender as bases do racismo científico, sejam estanques. De fato, existem diferenças
é preciso voltar para meados do século 18. sutis observáveis na diversidade genética en-
Em 1735, em seu livro Systema Naturae, Carl tre grupos ancestrais, que podem se refletir
Linnaeus propõe classificar a espécie huma- em consequências biológicas como varia-
na no reino animal, e seus indivíduos em “ti- ção de características normais (morfologia,
pos” ou “variantes”, de acordo com a origem
continental: Europaeus albus, Americanus
rubescens, Asiaticus fuscus e Africanus niger.
Apenas na 10ª edição do livro, em 1758, essa
classificação foi substituída e ele sugeriu ou-
tra, de acordo com características como cor da
pele, traços físicos, comportamento, modo de
vestir, sistema de governos etc. Ao adicionar
esses atributos comportamentais, culturais e
políticos, os fatores puramente geográficos
e ambientais foram afastados. Essa mistura
arbitrária de algumas características físicas,
culturais e políticas acabou criando as bases
para o racismo científico. Assim, ao longo
dos últimos três séculos, a falta de um pensa-
mento crítico e o uso de conceitos científicos
incorretos têm sido utilizados para apoiarem
o racismo. Nesse cenário, raça é uma cons-
trução social de categorização de pessoas que
cor de pele etc.) ou mesmo patológicas, por e compreender seu valor. Em uma repor-
exemplo, fibrose cística é mais prevalente tagem de um portal de notícias, tratando
em europeus e, anemia falciforme, em afri- justamente da temática dos testes, Ailton
canos. Essas diferenças são importantes em Krenak, líder indígena, ambientalista e es-
especial para o diagnóstico em medicina de critor, traz uma pertinente reflexão: qual
precisão que busca adequar a prática médica seria o impacto sobre a coletividade e na
(diagnóstico e tratamento) ao indivíduo ba- melhoria da qualidade de vida das pessoas
seando-se na utilização de testes genéticos. saber sobre sua ancestralidade revelada pelo
Porém, essa diversidade genética não assume DNA? Em uma sociedade já tão dividida e
diferenças morais, sociais ou qualquer outra polarizada por questões como a cor da pele,
característica que permita o ranqueamento não seria esse dado mais um ponto a favor
de grupos, algo utilizado e promovido pelos da segregação?
movimentos racistas.
Por esse ponto de vista, estaríamos atribuin-
Outro ponto que também precisa ficar claro do ao DNA o papel de único detentor de
é que indivíduos de populações miscigena- memórias, sendo que elas podem estar pre-
das, como a brasileira, geralmente apresen- sentes em outros campos da vida, como no
tam ancestralidade complexa. Essa mistura conhecimento sobre o preparo dos alimen-
de composição genética ancestral não invali- tos, aprendido com os antepassados; ou nas
da como o indivíduo se percebe cultural e so- danças e tradições, que são ensinadas pelos
cialmente. Deve-se ressaltar que, no contexto avós; ou ainda, nas histórias familiares que
sociocultural, a ancestralidade é um conceito são contadas ao longo das gerações.
amplo e complexo, e os dados biológicos não
estão diretamente relacionados a questões Sem obviamente desconsiderar a importân-
sociais de classificação de grupos, como iden- cia das pesquisas científicas sobre a compo-
tidade e pertencimento. sição genética brasileira e o valor recreativo
dos testes comerciais, talvez seja o momento
A grande importância dos estudos de an- de enxergarmos a ancestralidade como uma
cestralidade genética é o seu uso como fer- esfera mais ampla da nossa existência, e que
ramenta para recuperar parte importante da o conhecimento nos conecta com o que so-
nossa história perdida. Por exemplo, apesar mos em um fluxo contínuo que faz parte da
de haver um vasto registro histórico sobre história evolutiva humana. A ancestralidade,
o número de africanos que foram traficados sob um ponto de vista social, mais do que
oficialmente ao Brasil entre os anos de 1535 compartilhamento de variantes no DNA, es-
e 1888, existem grandes lacunas de informa- taria relacionada com o legado que os nossos
ções sobre regiões de origem e de destino dos antepassados nos deixaram.
indivíduos, que foram perdidas ou simples-
mente queimadas ao longo de séculos. Pode-
-se também resgatar parte das informações
Para saber mais
genéticas sobre os povos originários indíge- MATHIESON, I; SCALLY, A. What is ancestry?
nas que foram dizimados durante o processo PLoS Genetics, vol. 16 (3), p. 1-6, 2020.
de colonização do Brasil e continuam a ser MEYER, D. (2017). Existem raças humanas? Disponí-
dizimados até hoje. vel em: <https://darwinianas.com/2017/01/17/
existem-racas-humanas/> Acesso em
Este artigo apresenta uma proposta pedagógica para sensibilização de estudantes de gradua-
ção quanto às síndromes genéticas, visando a inclusão de pessoas com necessidades específicas
e uma assistência profissional integral. Para isso foram utilizadas metodologias ativas e formas
de expressão artística, como o cinema e o teatro. No artigo, compartilhamos estratégias que,
aplicadas em sala de aula para o curso de medicina, mostraram-se potentes para uma apren-
dizagem significativa, com a compreensão empática das dificuldades enfrentadas por pessoas
com necessidades específicas e suas famílias, alinhada a proposições de como reduzi-las.
3. Aula 4: Examinar problemas enfrentados em diferentes âmbitos da vida Uma aula de 50 minutos
Desenvolvimento do relacionados a necessidades específicas e propor soluções
arco de Maguerez
5. Aula 7: Nomear terminologias para reduzir o impacto estigmatizante Uma aula de 50 minutos
Discussão sobre e negativo relativo a pessoas com necessidades específicas
terminologias no diálogo cotidiano e, em especial, com a família em um
contexto de atendimento em saúde
proximidade com o filho permite que iden- identificadas no filme, seguindo a técnica
tifique nele pontos fortes e passe a amá-lo. de braimstorming (chuva de ideias). Inicial-
mente os alunos comentaram livremente,
No decorrer da obra, a potência da rede de expondo seus pontos de vista, percepções e
apoio no enfrentamento dos desafios relacio- vivências. Depois, eles foram direcionados a
nados à síndrome é evidenciada, como o do discutir coletivamente os seguintes pontos:
suporte familiar e profissional demonstrados i. abandono paterno; ii. rejeição paterna; iii.
pelo afeto da mãe, do avô, e pelo apoio da te- exclusão social (amigos, escola e ambientes
rapeuta à família para o enfrentamento das públicos em geral); iv. estímulo adequado ao
dificuldades encontradas. A prática de na- desenvolvimento da criança; v. acolhimento
tação pelo garoto, enquanto atividade física, familiar e médico.
apresenta-se como uma forma de produzir
saúde, desenvolver habilidades e encontrar Espera-se que, a partir dessas aulas, os alu-
novas possibilidades de resistência. nos compreendam que existem dificuldades
relativas às síndromes genéticas, exemplifi-
Abordagem do filme cadas pela Síndrome de Down, que podem
ser reduzidas com mudanças de atitude pes-
A utilização de diferentes cenários de práti- soais, familiares e sociais. Essas mudanças
ca auxilia no processo de ensino-aprendiza- podem e devem começar pelo estudante e
gem nos cursos da área da saúde quanto ao ser promovidas no âmbito da assistência e da
atendimento especializado envolvendo sín- educação em saúde.
dromes genéticas. No entanto, essa prática é
pouco explorada devido a restrições quanto
à quantidade de alunos, por exemplo. Desse
Problematização
modo, é comum os alunos terminarem suas e mapa mental
graduações sem terem contato com pessoas Após a exposição do filme e discussão livre e
com necessidades específicas e, portanto, dei- guiada dos temas que se destacaram nele, os
xando de desenvolver habilidades relativas à 40 alunos elaboraram coletivamente um úni-
abordagem desses grupos. Nesse sentido, o co mapa mental sobre as dificuldades enfren-
filme pode ser mais acessível e possibilita o tadas por pessoas com síndromes genéticas
reconhecimento de situações plausíveis em e suas famílias. O objetivo dessa ferramenta
cenários reais. foi identificar e esquematizar problemas, de
A ideia principal dessa abordagem foi esti- modo a facilitar a definição de estratégias de
mular nos alunos a empatia com a situação enfrentamento para a redefinição desse con-
familiar. A Síndrome de Down, exemplifica- texto enquanto futuros profissionais da saú-
da no filme, recebeu enfoque devido à preva- de e cidadãos.
lência: as chances de os alunos terem contato Para essa atividade, os alunos foram separa-
com essas pessoas é maior do que com pes- dos em 5 grupos de 8 alunos e cada grupo fi-
soas com outras síndromes. Além disso, exis- cou responsável por problematizar e elencar
tem dificuldades comuns entre ela e as outras dificuldades sobre um tópico do mapa men-
síndromes abordadas nas aulas referentes ao tal, com palavras-chave predefinidas para
conteúdo teórico de genética. Assim, o racio- cada grupo, sendo elas: família, sociedade,
cínio exercitado nas aulas para problemati- escola, trabalho e saúde. Esses tópicos estão
zar e buscar estratégias de cuidado efetivas, relacionados, mas foram separados no mapa
em conjunto com a família e a equipe médica, mental para evitar que questões fossem es-
pode ser extrapolado para outros contextos quecidas. Essa etapa durou 15 minutos.
da saúde.
O mapa mental foi construído de forma co-
O filme foi assistido em aula. Realizou-se laborativa. Cada grupo escreveu sobre seu
uma discussão coletiva, envolvendo os 40 tópico nos principais ramos do mapa mental.
alunos da turma, durante 20 minutos, so- Foi solicitado que os alunos escrevessem pa-
bre as dificuldades em diferentes âmbitos da lavras ou frases curtas que representassem o
vida relacionadas a necessidades específicas que foi discutido nos grupos (15 minutos).
Após o preenchimento do mapa, cada grupo riências, acrescentar à discussão outras difi-
apresentou uma síntese do que foi discutido culdades que identificaram e, a partir disso,
e esquematizado no mapa (5 minutos/gru- os grupos complementaram o mapa mental.
po). A Figura 1 mostra um modelo digital basea-
do no mapa mental construído pelos alunos
Depois de todos os grupos apresentarem, os em sala.
alunos ficaram livres para compartilhar expe-
Figura 1.
Modelo do mapa mental
produzido durante a aula pelos
Desenvolvimento ponsável por desenvolver um Arco de Ma-
guerez e apresentar no formato de uma en-
alunos (autoral).
para pensarem sobre como interferir nessa A aplicação à realidade, nessa proposta de
realidade e melhorá-la. Feito isso, buscaram aula, foi realizada através da encenação, que
embasamento teórico para formular hipóte- deveria apresentar as reflexões suscitadas
ses de soluções viáveis para a problemática, o pelo Arco de Maguerez e conter uma solução
que envolveu criatividade e praticidade. para a problemática levantada.
Figura 2.
Esquema da aplicação do Arco
de Maguerez (autoral).
O Quadro 2 apresenta uma síntese das pro- do Arco de Maguerez e para as proposições
blemáticas expostas no mapa mental, que ser- encenadas pelos alunos, como uma adaptação Quadro 2.
Quadro de possíveis situações
viram como base para a etapa de observação da aplicação à realidade do método. enfrentadas por pessoas com
necessidades específicas e
propostas de intervenção
elaboradas e apresentadas pelos
alunos durante as encenações.
Situações problema enfrentadas Propostas de intervenção
por pessoas com necessidades específicas apresentadas nas encenações
Família - Isolamento do sujeito com a síndrome genética da família e de Preparo para acolher a pessoa com síndrome genética,
outras pessoas por vergonha, medo do julgamento e/ou com a mediado pela equipe de saúde a partir do diagnóstico,
intenção de poupá-lo do preconceito, que em dois extremos pode para que a família reconheça que existem dificuldades
segregá-los ou incluí-los como menos válidos e capazes, de forma devido à condição, mas que elas por si só não impedem
vertical e injusta, o que causa sofrimento o desenvolvimento de habilidades para uma vida
satisfatória, com autonomia
- Papel de cuidador centralizado em uma única pessoa, que é
sobrecarregada e abdica de outros aspectos de sua vida, como o É importante que o profissional de saúde estimule
trabalho e a saúde a atribuição e divisão de tarefas, a partir das
possibilidades da família e no seu tempo, a fim de
- Senso comum de que o sujeito com síndrome genética não é capaz
ajudar na construção da autonomia da pessoa com
de realizar atividades e consequente limitação da autonomia, o que
necessidades específicas, bem como na redução da
também alimenta a sobrecarga da pessoa que cuida
sobrecarga do cuidador
Sociedade - Isolamento contribui para a “falsa impressão” de que existem A educação para a inclusão deve envolver diferentes
poucas pessoas com síndromes genéticas, o que reduz a agentes como a família e a escola, sendo um pilar
visibilidade de suas demandas importante para a construção da percepção de que
existem outras possibilidades válidas de existência.
- O estigma da incapacidade permeia o âmbito social, de modo
O profissional de saúde pode participar desse processo
que pessoas envolvidas em diversas áreas da vida da pessoa com
promovendo espaços de diálogo em escolas, com
necessidades específicas podem dificultar sua permanência e seu
respaldo científico
desenvolvimento na escola e no trabalho, por exemplo
Escola/ - A instituição pode, injustamente, declarar-se inapta para incluir o Instituições formais, como escolas e universidades, não
Trabalho sujeito e/ou alegar que ele não consegue acompanhar a turma em devem se limitar a aceitar pessoas com necessidades
que estuda específicas em seus espaços, mas sim garantir condições
para que essas pessoas se desenvolvam e sintam-se
- A dificuldade de acesso dificulta que reservas de vagas em
pertencentes ao grupo
universidades e empregos sejam preenchidas, o que gera
desemprego e conduz esses sujeitos a subempregos A instituição considerada inapta para incluir deve
investir em recursos, melhorar sua estrutura, informar e
promover capacitações continuadas, porque a inclusão é
um direito dos cidadãos. E cabe a cobrança por políticas
públicas que o garantam
É importante que o profissional de saúde informe a
família sobre esse direito, acione outros setores como a
assistência social quando for o caso e que assegure uma
estrutura inclusiva no ambiente de atendimento
Saúde - Um olhar biologista do profissional restringe a percepção das A equipe de saúde deve acolher e construir com
questões de saúde e doença vivenciadas pela família ao eixo a família estratégias para o enfrentamento de
da síndrome genética, de modo que outras demandas sejam dificuldades, de modo a otimizar sua qualidade de vida
ofuscadas de forma interdisciplinar e integral. Isso inclui práticas
para o desenvolvimento de competências e autonomia,
- Quanto ao diagnóstico da síndrome, a maneira como ele acontece
bem como suporte psicossocial, compreendendo que a
pode contribuir para uma visão estigmatizada da condição e
pessoa não se reduz ao diagnóstico da síndrome
reforçar as dificuldades mencionadas
A educação em saúde é fundamental, com informações
seguras, enfoque nas potências do sujeito e adequação
da linguagem para reduzir o impacto negativo e
estigmatizante na comunicação
Capacitações para a formação continuada são
necessárias, como nos outros setores de serviços
Este artigo relata a aplicação de uma prática simples e de baixo custo utilizada para trazer a
complexidade dos temas da genética para as salas de aula da Educação de Jovens e Adultos
(EJA). A atividade coloca os alunos no papel de Gregor Mendel ao realizar cruzamentos en-
tre diferentes plantas de ervilha e busca demonstrar, de forma lúdica, os processos que guiam
a formação dos diferentes fenótipos. Espera-se que esta atividade sirva como um ponto de
partida para a apresentação e discussão de temas mais profundos da genética que despertam
a curiosidade dos alunos.
ramente voltado aos conteúdos que são mais sam em homozigose) e dominantes (que
frequentes nos vestibulares do país, sem ne- se expressam em homozigose e heterozi-
cessariamente estabelecer relações com o co- gose);
tidiano dos alunos. É importante, então, que
os docentes encontrem maneiras de abordar - a característica observável na prole depen-
as bases da genética de forma a aproximar os de do estado dos alelos oriundos de am-
estudantes do assunto, sempre que possível bos os parentais;
estabelecendo um diálogo entre o conteúdo - num cruzamento entre heterozigóticos
e suas experiências de vida e corrigindo con- para uma característica com dominância
ceitos errôneos frequentemente assimilados completa, a proporção fenotípica da prole
em situações não escolares. respeitará a proporção 3:1.
Objetivos Contextualização
Esta proposta buscou elaborar uma dinâmi-
ca de baixo custo para trabalhar a primeira
das turmas
Lei de Mendel com alunos dos anos finais A atividade foi aplicada em duas turmas do
do Ensino Fundamental na modalidade de 3º termo (equivalente ao 8º ano do ensino
Educação de Jovens e Adultos. A dinâmica fundamental) do período noturno da EME-
é centrada na simulação de cruzamentos en- JA Nísia Floresta Brasileira Augusta, em
tre plantas de ervilha-de-cheiro (Pisum sa- Campinas/SP, sendo uma turma no primei-
tivum), similares aos realizados por Gregor ro semestre de 2019 e a outra turma no se-
Mendel (1822-1884) no século XIX, sendo mestre seguinte. A faixa etária dessas turmas
os alunos responsáveis por realizar todos os variava dos 26 aos 68 anos. Apesar da dife-
cruzamentos, anotar os genótipos e inferir os rença nas idades, eram turmas de convivên-
fenótipos de cada indivíduo. Assim, os alu- cia bastante harmoniosa e que, em comum,
nos assumiriam o protagonismo do experi- não conheciam e nem dominavam quaisquer
mento, não se limitando a decorar as propor- conceitos relacionados à genética.
ções passadas pelo professor.
Dentre os seus objetivos específicos, essa di-
1ª parte: abordagem
nâmica busca que o aluno compreenda que: prévia dos assuntos
- as características hereditárias são transmi- Para que fosse assegurada a total compreen-
tidas pelos parentais por meio de estrutu- são da prática, alguns assuntos foram trata-
ras denominadas cromossomos, presentes dos anteriormente na forma de aulas expo-
nos gametas masculino e feminino; sitivas. Os temas abordados foram: natureza
do material genético, o que é e onde se encon-
- nos cromossomos existem segmentos de tra o DNA; hereditariedade das característi-
DNA chamados genes que são as unida- cas genéticas e como o DNA dos parentais é
des genéticas das informações hereditá- transmitido à prole; os estados possíveis de
rias; dominância entre alelos (alelos dominantes
e recessivos); como é determinado o fenótipo
- os gametas dos parentais contêm apenas
em caracteres monogênicos com dominância
metade do número de cromossomos da
completa, isto é, de que forma os genes ex-
espécie;
pressam características que podemos obser-
- a união dos gametas masculino e feminino var externamente nos organismos; como se
recompõe o número original de cromos- dá a reprodução sexuada, com enfoque prin-
somos e dá origem a uma prole com mate- cipal em plantas angiospermas, em estrutu-
rial genético formado por metade de cada ras florais envolvidas na reprodução sexuada
parental; entre indivíduos diferentes. Todos os assun-
tos foram adaptados - tanto na forma quanto
- os alelos de um gene podem se apresentar no tempo dispensado a cada um deles - para
em dois estados: recessivos (que se expres- serem adequados à realidade de salas de EJA.
Cerca de cinco aulas foram utilizadas para mar o nome de um cientista. Muitas vezes
abordar todos esses conteúdos, num modelo a resposta é o silêncio. Assim, mostrar que
prevalente de: explicação teórica mais debate Mendel fugia do estereótipo esperado de um
simultâneo, leitura de textos de apoio e reali- cientista, pode aproximá-lo dos estudantes.
zação de exercícios de fixação.
Além disso, a abordagem histórica da ciên-
2ª parte: Gregor Mendel, cia é fundamental para compreendê-la como
mutável e dinâmica. Frequentemente os alu-
muito prazer nos são informados que a ciência traz res-
No dia de aplicação da atividade prática, o postas definitivas, estáticas, de forma que
processo foi iniciado pela contextualização passam a desacreditá-la quando as descober-
histórica de Gregor Mendel. O objetivo não tas de hoje contradizem as de outra época.
foi fornecer descrição detalhada de sua vida e Entender que a mudança e a quebra de para-
obra, mas apenas chamar a atenção dos alu- digmas estão no cerne do processo científico
nos para quem era o cientista por trás da des- é fundamental para a sua devida compreen-
coberta. Chama bastante atenção o fato de são. Nesse sentido, é sempre necessário que
os alunos da EJA não estarem familiarizados o docente se aproprie do método científico
com cientistas quando se pergunta, em uma e busque trabalhar quaisquer conteúdos das
sala cheia de alunos, quantos saberiam infor- ciências naturais sob essa ótica.
Figura 1.
Estátua de Gregor Mendel,
localizada no mosteiro
onde viveu e realizou seus
experimentos em Brno, atual
República Tcheca (Créditos da
imagem: autoria própria).
Figura 2.
Acima - Sementes de
ervilha destacando fenótipos
observados por Mendel (cores
verde ou amarela, textura lisa
ou rugosa). Abaixo - Canteiros
de ervilhas, similares aos
cultivados por Mendel. Notar
a proporção 3:1. Mendel
Museum, Brno, atual República
Tcheca (Créditos das imagens:
autoria própria).
Todo o material utilizado nesta prática já es- sentavam os alelos dominantes e os alunos
tava disponível na escola, e a preparação foi deveriam identificá-los com a letra “A”, e os
feita individualmente por cada aluno. Mate- da outra cor eram os alelos recessivos, iden-
riais necessários: tificados com a letra “a”. Então, como ambos
os parentais eram heterozigóticos para a ca-
- Copos plásticos (2 por aluno); racterística estudada, os alunos colocaram o
- Papel colorido (duas cores contrastantes, mesmo número de círculos de cada cor em
de preferência do mesmo material); cada um dos copos, representando a propor-
ção idêntica da produção de gametas com o
- Tesoura; alelo dominante e o alelo recessivo.
- Caneta (para escrever no copo plástico e A partir disso, cada aluno iniciou os cruza-
no papel colorido); mentos, retirando um círculo colorido do
copo correspondente ao P1 e outro do copo
- Folha sulfite com a tabela do Anexo I im-
correspondente ao P2. Os alelos representa-
pressa.
dos por cada círculo foram transcritos para
Cada aluno recebeu dois copos plásticos, re- uma das linhas de uma tabela entregue pre-
presentando os dois parentais, e foram ins- viamente (Anexo I), já impressa com a sepa-
truídos a identificá-los com a caneta como ração por cruzamentos, e o fenótipo inferido
“P1” e “P2”. Em seguida, receberam pedaços para cada cruzamento também foi anotado.
dos papéis coloridos, que deveriam recortar Os alelos retirados em cada cruzamento fo-
em pequenos círculos de mesmo tamanho, ram devolvidos aos copos, para que a propor-
o que é muito importante para que não haja ção entre dominantes e recessivos não fosse
diferenças na probabilidade de sorteio de alterada. Esse processo foi repetido por 15
um dos alelos. Os círculos de uma cor repre- vezes.
Figura 3.
Representação esquemática
da dinâmica. Os dois copos
plásticos são os parentais, com
números iguais de círculos
de duas cores diferentes, que
correspondem aos gametas
com os alelos dominantes
e recessivos. À direita,
representação da ficha de
cruzamentos, indicando o alelo
proveniente de cada parental
e o fenótipo de cada indivíduo
da prole (V = vermelha, B =
branca).
Após a finalização desse processo por cada 15 cruzamentos feitos por cada aluno. Na
aluno, houve o compilamento das informa- lousa, foi efetuada a soma das flores verme-
ções de toda a sala e a construção de uma lhas e brancas obtidas. Para obter a propor-
tabela única. Nela, deveriam constar apenas ção entre os dois fenótipos, foi feita a divisão
a informação de quantas flores vermelhas e entre o número total de flores vermelhas pelo
brancas foram obtidas em cada conjunto de número de brancas.
Figura 4.
Tabela construída por uma das
turmas em que a atividade foi
aplicada (Créditos da imagem:
autoria própria).
Após a ampla discussão dos mais variados fil de alunos que costuma concluir os estudos
temas levantados por meio da atividade prá- do Ensino Fundamental sem nunca ouvir fa-
tica, os alunos foram convidados a realizar al- lar do assunto.
guns exercícios de fixação de conteúdo (Ane-
xo II). Esses exercícios buscavam verificar se A ideia de colocar os alunos como realiza-
a dinâmica havia cumprido os seus objetivos dores dos cruzamentos foi primordial para o
específicos, de forma a propiciar a apropria- engajamento na aula. Embora feita de forma
ção dos conceitos pelos alunos. As questões individual, a dinâmica gerou uma extensa
em que os alunos apresentaram maiores di- troca de comentários por todos que estavam
ficuldades foram as dissertativas (4, 5 e 6). ávidos em saber se os resultados obtidos pe-
Na primeira, a principal dificuldade foi a ca- los colegas eram semelhantes aos seus. Nesse
pacidade de abstração, ou seja, de reconhecer sentido, a prática cumpriu o papel de estimu-
que o conhecimento aplicado para a colora- lar os alunos a participarem da construção do
ção das flores de ervilhas também se aplica aprendizado e a compreenderem o processo
às características monogênicas humanas. Na realizado por Mendel.
questão 5, a grande dificuldade foi transpor A partir dessa simples dinâmica, puderam
o conhecimento consolidado para a forma de ser abordados diversos temas, não apenas os
resposta escrita estruturada. É interessante relacionados às leis de Mendel. As discus-
notar que, mesmo após a incorporação dos sões após a prática centraram-se amplamen-
termos genéticos adequados em seu vocabu- te no método científico e no fazer ciência:
lário, os alunos continuaram utilizando em como extrapolar os resultados de seus expe-
suas respostas expressões que já conheciam e rimentos e criar modelos que sejam válidos
que cumprem bem o papel da ideia que eles para outras situações e/ou outros organis-
queriam passar (alelos “mais fortes” ou “mais mos? Em que ponto o modelo estruturado
fracos” em vez de “dominantes” e “recessivos”). passa a ser uma “lei”? Com isso, aspectos da
Por fim, as respostas dadas para a questão 6 filosofia e história da ciência tiveram que
mostram que houve consolidação do conhe- ser trazidos para a discussão, esclarecendo
cimento sobre a relação entre características a necessidade de que o experimento possa
observáveis (fenótipo) e as características ge- ser replicado e que obtenha resultado se-
néticas (genótipo) e a maneira como elas in- melhantes em outras condições e com ou-
fluenciam a determinação de características tros organismos antes de ser caracterizado
da prole. como Lei; e, também, a própria história dos
resultados de Mendel, que não foram pron-
Analisando a tamente aceitos e ficaram eclipsados até o
início do século XX, quando foram redesco-
experiência bertos, mostra que o percurso da ciência não
é sempre linear, mas sim caracterizado por
Dinâmicas e práticas como a apresentada mudanças constantes.
buscam aliviar o peso de aulas puramente
expositivas e promover a assimilação dos A discussão também contemplou a extra-
conteúdos por meio da participação ativa polação do observado nos cruzamentos com
dos alunos. Embora exista uma infinidade ervilhas para as características genéticas em
de atividades práticas criadas para trabalhar geral, principalmente as humanas. Traços
este conteúdo específico, optou-se por de- como a cor da pele, apesar de não serem es-
senvolver uma nova abordagem que levasse tritamente mendelianos, foram levantados
em consideração o perfil dos alunos, os co- pelos alunos e utilizados como exemplos
nhecimentos prévios da turma e a utilização para auxiliar na compreensão do papel dos
apenas de materiais comumente disponíveis genes na determinação das características
em escolas da Educação de Jovens e Adultos. observáveis. Outros traços como tipo san-
Assim, a prática que apresentamos, apesar de guíneo e daltonismo, que seguem herança
não esgotar ou aprofundar o tema das leis de mendeliana, foram trazidos também para
Mendel, foi eficaz em apresentá-lo a um per- complementar os exemplos.
Outro aspecto que chamou bastante a aten- o cálculo foi realizado utilizando a soma de
ção dos estudantes foi o cálculo da proporção todos os cruzamentos, o valor encontrado
entre flores vermelhas e brancas. Boa parte chegou consideravelmente mais próximo da
deles argumentou que esperava que o resulta- proporção esperada. Assim, compreende-
do fosse exatamente 3, como predito pela hi- ram que a quantidade de cruzamentos afeta
pótese. Nesse ponto, foi necessário retomar o diretamente a proporção encontrada, e que
que são modelos científicos, além de aprofun- quanto mais cruzamentos forem realizados,
dar um pouco no que já havia sido falado de maiores as chances de alcançar um número
probabilidade. A compreensão por parte dos mais próximo ao esperado pelo modelo. As
alunos foi maior quando entenderam que a possíveis dificuldades e resistência esperadas
proporção de 75% para 25% é um modelo que em relação à matemática por parte dos alunos
considera um número infinito de cruzamen- foram facilmente contornadas, o que ressalta
tos, ou seja, essa é a probabilidade esperada, e as vantagens de se trabalhar esses conceitos
a chance de obtermos uma flor vermelha em de forma lúdica e prática. É importante que
um cruzamento é três vezes maior do que a essas dificuldades não desestimulem a apli-
de obtermos uma flor branca. Seguindo essa cação dessa atividade nem a abordagem de
discussão, também foi bastante interessante outros conteúdos que exijam certo grau de
falar sobre tamanho amostral. Observando compreensão matemática; é fundamental que
os cruzamentos realizados individualmen- o professor busque maneiras diferenciadas
te, eles perceberam que poucos encontra- de abordar esses temas, de modo a facilitar a
vam-se perto da proporção de 3:1. Quando compreensão pelos alunos.
Anexo I:
Tabela para a realização dos cruzamentos.
Cruzamento 1
Cruzamento 2
Cruzamento 3
Cruzamento 4
Cruzamento 5
Cruzamento 6
Cruzamento 7
Cruzamento 8
Cruzamento 9
Cruzamento 10
Cruzamento 11
Cruzamento 12
Cruzamento 13
Cruzamento 14
Cruzamento 15
Lembre-se:
AA, Aa ou aA = vermelha
aa = branca
Anexo II:
Exercícios de fixação dos conteúdos apresentados aos alunos após a prática.
Isoenzimas de amilase:
acessando a
diversidade genética
Em nossas atividades os alunos colocam a sadores que trabalhavam com milho tinham
mão na massa fazendo o experimento. São coleções de sementes para plantas que pro-
questionados a interpretar os resultados e, duziam espigas com grãos de cores e formas
posteriormente, são abordados aspectos his- variadas.
tóricos sobre as pesquisas com isoenzimas.
Não apresentamos aqui uma receita de uma Na natureza parecia ser diferente, não se
atividade prática, mas o relato de como foi observavam tantas variantes nas populações
feito. Sugerimos aos interessados em imple- selvagens, fossem de animais ou de plantas.
mentá-la em sala de aula que realizem tes- Fora dos laboratórios, é raro encontrar indi-
tes e façam as adaptações necessárias para o víduos de Drosophila melanogaster que não
contexto em que estão inseridos. Entretanto, tenham olhos vermelhos. Os organismos
antes de descrever a atividade prática, apre- de uma mesma espécie seriam, na natureza,
sentaremos uma contextualização histórica, todos geneticamente muito parecidos? As
para que, principalmente para os que não vi- comparações entre as populações naturais
veram o período de pesquisa em genética em e as mantidas em laboratório criaram mui-
que as isoenzimas eram uma ferramenta de tas dúvidas sobre a variabilidade genética
vital importância, possam compreender as presente nas populações. A primeira ideia
questões daquela época. foi atribuir ao processo de seleção natural a
exclusão de todas as variações genéticas que
rentes alelos, mas também podem ser pro- homogeneizadas e aplicadas em um gel, geral-
dutos de genes diferentes (Box 1). Quando mente feito de amido, agarose ou de poliacri-
as isoenzimas são devidas a alelos diferentes, lamida. O gel com as amostras é submetido
também podem ser chamadas de aloenzimas a um campo elétrico e as proteínas que estão
ou alozimas. nas amostras se deslocam no interior do gel. A
migração das proteínas ocorre de acordo com
Para o estudo de isoenzimas por eletrofore- a carga elétrica, a forma ou o tamanho delas.
se, amostras de um tecido ou organismo são
BOX 1.
Na parte A da figura, o gene K tem dois alelos, K-1 e K-2. O alelo K-2 tem duas mudanças de bases em relação a K-1, acarre-
tando substituições de aminoácidos de carga (-) por aminoácidos com carga (+); assim, os alelos K-1 e K-2 codificam proteínas
que têm cargas elétricas diferentes. O gene W não apresenta variações alélicas e codifica para uma enzima de maior tamanho.
Na parte B da figura, as isoenzimas em um gel, representado pelas linhas formando uma rede, estão sob ação de um campo
elétrico e vão migrar (setas). As proteínas com carga elétrica líquida positiva vão migrar para o polo negativo. Quanto mais
carregado positivamente, mais rápida será esta migração. Isoenzimas com diferentes pesos moleculares migrarão também com
velocidade diferente. As moléculas menores migram mais rapidamente que as maiores porque estas vão ter mais dificuldade de
percorrer a matriz formada pelos polímeros que compõem o gel. Neste caso, a isoenzima codificada pelo gene W migra mais
lentamente, pois tem maior tamanho.
Depois que o processo de eletroforese termi- diferentes) elas se deslocam com velocidades
na, as enzimas podem ser detectadas no gel distintas durante a eletroforese. A velocida-
utilizando-se os substratos que elas reconhe- de de migração típica de cada isoenzima faz
cem. A reação que uma enzima catalisa deve com que elas apareçam em posições diferen-
ocorrer e o produto da reação enzimática tes no gel. Assim, através da separação por
será visualizado geralmente pela produção eletroforese, é possível acessar uma parcela
de alguma alteração de cor no local da reação. de variantes enzimáticas que existem nos or-
ganismos, ou seja, é possível observar a exis-
As isoenzimas podem ser estudas em con- tência de isozimas que tenham migrações em
junto porque utilizam o mesmo substrato e velocidades de deslocamento diferentes du- Figura 1.
realizam a mesma catálise, mas por terem di- rante a eletroforese. Essa é apenas uma parte
Um exemplo de padrão
ferenças em suas estruturas primárias (pre- eletroforético para isoenzimas.
da variabilidade genética possível para as en- Pode-se observar diferentes
sença de aminoácidos com cargas elétricas zimas (Figura 1). isoenzimas pelas posições
que elas ocupam no gel após
o processo de migração. As
amostras 3, 4, 9, 10 e 12 são
homozigotas e carregam o
mesmo alelo. Os indivíduos 5, 8
e 9 também são homozigotos,
evidenciado por terem uma
só banda, mas têm alelos
diferentes, pois migram
em posições diferentes no
gel. As amostras 1, 2, 6 e
7 representam genótipos
heterozigotos pois a coloração
no gel indica a presença de
duas bandas.
A atividade tem como objetivo principal de amostra (glicerol 90%; completar com so-
apresentar aos alunos a variabilidade ge- lução de bromofenol 2%, em tampão TAE).
nética observável em relação às proteínas. A adição do tampão de amostra facilitará a
A execução da prática permite também re- aplicação no gel (Figura 2-C) e permitirá,
visar conteúdos de biofísica e bioquímica. pela presença do azul de bromofenol, acom-
A técnica de eletroforese e sua aplicação à panhar o processo de migração das amostras
investigação de isoenzimas também propi- no gel.
cia discussões sobre a história recente das
pesquisas em Genética, considerando que Preparação das amostras
esta metodologia permitiu redimensionar a
presença da variabilidade genética das po-
e eletroforese
pulações e fomentou a discussão das teorias A amilase é uma enzima presente em muitos
neutralistas e selecionistas. Os selecionistas organismos. No experimento aqui descrito,
defendiam que a principal força para moldar são analisadas amilases de cinco amostras:
a evolução é a seleção natural. Os neutralistas saliva humana; cotilédones de feijão; Sito-
apontavam que a deriva genética é uma força philus oryzae (animais adultos); larvas de Tri-
importante, capaz de explicar a grande varia- bolium castaneum; e larvas de Stegobium pani-
bilidade genética observada molecularmente. ceum. As larvas são de coleópteros também
As evidências mostraram que os neutralistas conhecidos como gorgulhos, são fáceis de
estavam certos e que, embora a seleção na- encontrar porque são pragas muito comuns
tural seja responsável pela evolução adaptati- em cereais armazenados. Os cotilédones de
va, ocorrem mudanças evolutivas, por deriva feijão foram coletados de plântulas com 3 a 4
genética, em caracteres que não estão sobre dias de germinação em algodão e água.
pressão adaptativa.
Com a mão
na massa
Além de estimular a curiosidade sobre as-
pectos históricos e discussões clássicas sobre
a importância da variabilidade genética nas
populações e sobre as teorias que explicam
a manutenção dessa variabilidade, também é
Sitophilus oryzae
possível discutir o uso das isoenzimas como
ferramenta para estudos filogenéticos.
O sistema de eletroforese
O gel é de ágar bacteriológico ou agarose
(1%) em tampão TAE usado para eletro-
forese de DNA: (“T” de tris hidroximetil
aminometano - 40 mM; “A” de ácido acético
- 20 mM e “E” de EDTA - 1 mM). O siste-
ma de eletroforese é o de mini-gel horizon- Tribolium castaneum
tal submarino (Figura 2-A) e os poços para
aplicação da amostra também são feitos com Todas as amostras foram maceradas em água,
o mesmo pente usado para eletroforese de mas com volumes adequados a cada tipo de
DNA (Figura 2-B). material. A padronização dos volumes para
cada amostra foi uma etapa importante para
Para a aplicação das amostras, também foi possibilitar a repetibilidade dos resultados e
usado o procedimento típico de aplicação as comparações entre as amostras. Os volu-
de DNA em gel; as amostras contendo as mes preestabelecidos de água são apresenta-
isoenzimas foram misturadas com tampão dos na Tabela 1.
Figura 2.
Separação de isoenzimas
por eletroforese. A) Sistema
para eletroforese em mini-
gel horizontal, comumente
empregado para separação de
DNA; B) Preparação do gel
de agarose com o pente para
a formação dos poços onde
as amostras são aplicadas; C)
Aplicação das amostras com
auxílio de uma micropipeta no
gel submerso em tampão na
cuba para eletroforese.
em água corrente para remover a solução de das isoenzimas no gel), contrastando com
amido. Depois de lavado, o gel deve ser ex- o fundo escuro no qual não há presença de
posto a gotas de lugol ou tintura de iodo 2%. amilase (Figura 3). Esse padrão de coloração
A solução de iodo 2% pode ser comprada em é explicado pelo fato de a solução de amido
farmácia, pois é usada como desinfetante lo- ter se difundido no gel (por isso todo o gel
cal. O gel deve ficar na solução de iodo por cora com a solução de iodo) mas, nas regiões
cerca de 5 minutos e, depois desse período, do gel onde estão as moléculas de amilase, o
será novamente lavado em água corrente amido foi degradado (por isso a coloração
para remover o excesso de iodo e permitir a será mais clara). A solução de iodo interca-
visualização das bandas. la-se à do amido, dando uma cor escura e as
amilases consomem o amido que entra em
As regiões claras observadas no gel corres- contato com elas, reduzindo a coloração nas
pondem às bandas das isoenzimas (posição regiões onde estão presentes.
Figura 3.
O gel de ágar-ágar tratado
com amido hidrolisado após
revelação com solução de
iodo. Podem ser vistas as
bandas claras no fundo escuro:
1) Gorgulho do arroz; 2)
Cotilédone de feijão; 3) Larvas
de gorgulho da farinha; 4)
Tribolium; 5) saliva humana.
A amostra 5, ao contrário das
demais, migrou um pouco para
o polo positivo.
Palavras-chave: genética forense, tipo sanguíneo, cariótipo humano, sequenciamento de DNA, marcador genético
O jogo CSI inclui um conjunto de análises da genética e biologia molecular, aplicadas no con-
texto da investigação de um crime. Os alunos assumem a posição de investigadores e devem
analisar um conjunto de pistas para indicar um suspeito. O jogo favorece o desenvolvimento
de trabalhos em equipe, a troca de conhecimentos e a criatividade. Com aplicação deste jogo, o
professor pode abordar integradamente diferentes temas como tipo sanguíneo, cariótipo hu-
mano, composição e sequenciamento do DNA, tornando o processo de ensino mais dinâmico
e estimulante. A aplicação deste jogo pode ser realizada com estudantes de ensino médio e de
graduação.
Após a introdução do jogo, forneça a Carta professor pode utilizar este espaço para criar
(Figura 1), o Boletim de ocorrência (Figura 2), interações entre os grupos.
a Figura dos personagens (Figura 3) e o item
Procedimento aos alunos. Os Testes devem ser Ao final do jogo, cada grupo deve apresentar
fornecidos seguindo a sequência dos mesmos a história como um todo, explicando como
à medida que tenham sido concluídos corre- os testes realizados foram eliminando cada
tamente pelo grupo. Além disso, durante o um dos suspeitos até chegar na identifica-
jogo existem duas pausas para que os alunos ção do culpado. O professor deve solicitar
realizem apostas para culpados. A primeira que cada grupo escreva uma matéria para o
delas ocorre após os alunos identificarem jornal local, relatando as novas evidências
os suspeitos e analisarem os álibis apresen- do Caso Suzy que permitiram a solução do
tados no Boletim de ocorrência. A segunda é caso. Esta tarefa pode ser entregue na sema-
realizada após a finalização do teste n. º 7, o na seguinte.
f. Teste n.º 6 - Teste de paternidade da família Demétrio (Figura 10): Os testes de paternidade são realizados utili-
zando o padrão de amplificação do DNA de marcadores STR que consistem em sequências curtas de DNA repeti-
tivo que variam em tamanho devido ao número de repetições. Neste teste em particular, foram então utilizadas as
amostras de DNA da Lavínia (mãe), do Olavo (pai), do Xavier (irmão), e da amostra n.º 1 considerando o padrão
de seis marcadores STR. Para realizar a interpretação deste teste, utilizem a régua para comparar cada uma das
bandas amplificadas entre os pais, o Xavier e a amostra n.º 1 (Figura 10). Deve-se observar o número de bandas
compatíveis entre os pais e os filhos. Marque com um X as bandas compatíveis. A amostra n.º 1 pertence a Suzy?
O teste de paternidade confirma a suspeita de que Xavier não é filho biológico do casal?
g. Teste n.º 7 - Teste do tipo sanguíneo dos suspeitos (Figura 11): Partindo para a análises dos suspeitos identifi-
cados, também foi realizado o teste do tipo sanguíneo buscando identificar se um deles pode ser compatível com
a amostra n.º 3, que foi coletada no cabo da faca. Determine o tipo sanguíneo de cada um dos suspeitos e elimine
os suspeitos cujo tipo sanguíneo não seja compatível com a amostra n.º 3.
h. Pausa para uma nova rodada de aposta para culpado: Após alguns dos suspeitos terem sido eliminados pelo teste
do tipo sanguíneo e diante deste novo cenário onde restaram Xavier Demétrio, David Petrel e Lucian Ramires como
suspeitos, realize uma nova discussão e aposta para o culpado. Caso tenham apostado em Xavier, David e Lucian e
não queiram trocar, continue para o teste n.º 8.
i. Teste n.º 8 - Teste de comparação do perfil genético entre a amostra 3 e os suspeitos Xavier Demétrio, David Petrel
e Lucian Ramires, baseado em 6 marcadores STR (Figura 12). O resultado deste teste é primeiramente analisado
na técnica de eletroforese, semelhante ao teste de paternidade que foi realizado anteriormente. Realize a análise
comparativa entre as bandas do DNA da amostra de n.º 3 e os suspeitos. Marque as bandas compatíveis, no caso
de todas as bandas serem compatíveis o resultado será inconclusivo e deve-se proceder para o teste de sequencia-
mento do DNA. Algum dos suspeitos pode ser eliminado com este teste?
j. Teste n.º 9 - Sequenciamento do DNA de seis marcadores STR para a mostra n.º 3 (Figura 13), para David Petrel
(Figura 14) e Lucian Ramires (Figura 15). Considerando o resultado do teste anterior, os suspeitos David e Lucian
não puderam ser excluídos, pois todas as bandas (alelos) presentes nos respectivos perfis coincidem com as bandas
no perfil da amostra n.° 3. Portanto, neste caso é indicado o sequenciamento do DNA. Os seis marcadores STR
amplificados foram sequenciados, no entanto, para fins didáticos e para não tornar a atividade muito extensa, aqui
é apresentado uma análise parcial da sequência de cada marcador STR. Nas Figuras 13, 14 e 15, cada marcador
pode conter até 15 bases do DNA, e o polimorfismo do tamanho é representado na variação do número de bases
que cada marcador pode conter. Para obter a sequência completa do DNA, você deve analisar cada lócus, reali-
zando a leitura das colunas da esquerda para direita. O espaço indicado ao lado deve ser utilizado para escrever a
sequência no sentido 5’-3’. Após a montagem, realize a comparação das sequências do DNA dos suspeitos David
Petrel e Lucian Ramires com a amostra n.º 3 e elimine o suspeito que não possui as sequências compatíveis. Foi
possível encontrar o culpado?
k. Teste n.º 10 - Banco Nacional de Perfis Genéticos (BNPG) (Tabela 1): A última opção desta investigação é tentar
encontrar se a sequência do DNA da amostra n.º 3 possui compatibilidade com algum criminoso registrado no
BNPG. O BNPG, inclui o registro do sequenciamento do DNA de criminosos presos no Brasil, que foram conde-
nados por outros crimes. Sendo assim, para tentar encontrar o suspeito do desaparecimento da Suzy, utilize a se-
quência do DNA da amostra n.º 3 e faça uma busca por similaridade no Banco Nacional de perfis genéticos (BNPG)
(Tabela 1). Utilize a ferramenta localizar do leitor de PDF para encontrar cada uma das sequências da amostra n.º
3 no banco de dados, registre os nomes dos criminosos que forem compatíveis com a sequência. O culpado deve
apresentar todos os marcadores STR compatíveis com a amostra n.º 3. Foi possível encontrar o culpado?
Figura 1.
Carta da senhora Lavínia Anjos Demétrio.
Figura 2.
Boletim de ocorrência.
Figura 3.
Imagens representativas dos personagens e das amostras de sangue coletadas no local.
Figura 4.
Teste para tipo sanguíneo das amostras coletadas no local do crime.
Figura 5.
Teste do cariótipo da amostra n.º 1.
Figura 6.
Teste do cariótipo da amostra n.º 3.
Figura 7.
Teste para determinação do sexo das amostras n.º 1 e n.º 3.
Figura 8.
Teste para tipo sanguíneo na família Demétrio.
Figura 9.
Teste para padrão de herança esperado para o tipo sanguíneo.
Figura 10.
Teste de paternidade família Demétrio.
Figura 11.
Teste do tipo sanguíneo dos suspeitos.
Figura 12.
Teste de comparação do perfil genético entre a amostra n.º 3 e os suspeitos
Xavier Demétrio, David Petrel e Lucian Ramires, baseado em 6 marcadores STR.
Genética na Escola | Vol. 17 | Nº 1 | 2022 Sociedade Brasileira de Genética 94
MATERIAIS DIDÁTICOS Genética na Escola – ISSN: 1980-3540
Figura 13.
Sequenciamento do DNA de seis marcadores STR para a amostra n.º 3.
Figura 14.
Sequenciamento do DNA de seis marcadores STR para David Petrel.
Figura 15.
Sequenciamento do DNA de seis marcadores STR para Lucian Ramires.
Teste nº 10:
Banco nacional de perfis genéticos do jogo CSI
Tabela 1.
Banco nacional de perfis genéticos do jogo CSI.
NOME STR 1 STR 2 STR 3 STR 4 STR 5 STR 6
Isabelle Silva CCATGTATCTGCA ATCTATCT GAAGAAAGAAAA ACTATCTATCTATC TGCATGCATGCATGC CGACGACGA
Figura 16.
Cariótipo masculino, com
2n = 46 cromossomos.
tro bases nitrogenadas (Adenina, Guanina, de menor massa migrarão mais rapidamente.
Citosina e Timina), os iniciadores, tampões As bandas de diferentes tamanhos podem
e o DNA molde que será copiado. O mix de ser classificadas usando um DNA marcador,
reagentes é colocado no Termociclador, que com tamanho conhecido que é comparado
irá repetir vários ciclos alternados de tem- com cada uma das bandas da amostra.
peratura que são divididos em três fases:
desnaturação, quando as pontes de hidro- Teste de Paternidade
gênio que ligam a dupla fita do DNA são Para realizar um teste de paternidade é pre-
rompidas; hibridização, quando os inicia- ciso coletar o material genético dos envolvi-
dores fazem ligação no local complementar dos (normalmente sangue ou saliva) e reali-
do DNA; Extensão, que consiste na etapa zar a extração do DNA. O DNA extraído é
de cópia do DNA que é realizado pela Taq submetido à técnica de PCR para análise de
polimerase adicionando os nucleotídeos 13-16 marcadores STR que serão analisados
por homologia à fita-molde. Após estes vá- por eletroforese que produzirá um perfil de
rios ciclos, milhares de cópias do DNA são DNA de cada envolvido.
produzidas e o DNA pode ser então ana-
lisado por diferentes técnicas, incluindo a A análise consiste em comparar o perfil do
eletroforese em gel. DNA da mãe, do (a) filho (a) e do suposto
pai, nos casos mais comuns. Na comparação
Eletroforese dos perfis, espera-se que o filho apresente
A eletroforese é uma técnica de separação metade dos alelos herdados da mãe e metade
de moléculas que leva em conta o peso mo- do pai biológico. Caso não haja compatibili-
lecular da amostra, durante a aplicação de dade entre os alelos do filho e do suposto pai,
uma diferença de potencial. Sabe-se que o esse último é excluído de ser o pai
DNA possui carga negativa e, portanto, na Sequenciamento do DNA
eletroforese ele migrará em direção ao polo
positivo do sistema. Ao migrar através do O sequenciamento de DNA é o processo
gel, as moléculas de DNA serão separadas realizado para determinar a sequência exata
de acordo com o seu tamanho, sendo que as de nucleotídeos em uma molécula de DNA.
O modelo didático exposto neste trabalho possibilita que graduandos de ciências biológicas
e ciências da saúde possam entender melhor conceitos teóricos referentes aos mecanismos
de transcrição e tradução. O modelo apresentado foi desenvolvido a partir de uma simulação
envolvendo o gene da β globina e as mutações e polimorfismos relacionados à anemia falcifor-
me. A atividade proposta tem a finalidade de demonstrar como a informação gênica contida
na molécula de DNA é transcrita e traduzida, e de que forma uma mutação ou polimorfismo
pode interferir na formação do produto final, a proteína.
Contextualizando
O sequenciamento do genoma humano revolucionou a pes-
quisa científica e o entendimento de como funciona a maqui-
naria molecular, atualizando e revelando informações impor-
tantes, tais como pequenas variações genéticas - mutações e
polimorfismos - encontradas na sequência de DNA nas po- Fenótipo - características de
pulações humanas. As mutações são mudanças no DNA que um indivíduo formadas pela
podem abranger tanto cromossomos inteiros (variações no interação do genótipo com o
ambiente em que a pessoa está
número de cromossomos) quanto sequências nucleotídicas
inserida.
Recessivo - caráter que se individuais. Uma mutação pode se fixar e ter uma frequência
manifesta apenas quando o na população superior a 1% e, quando isso acontece, recebe o
alelo que o determina está nome de polimorfismo. As variações genéticas podem ou não
presente em dose dupla.
gerar algum efeito no fenótipo, como podem também estar
diretamente relacionadas a algum tipo de doença, como é o
caso da anemia falciforme.
A anemia falciforme é uma condição hemolítica autossômica Hemolítica - relativo à lise das
recessiva caracterizada pela deformação das hemácias em hi- hemácias.
póxia. A causa dessa doença é uma mutação no braço curto
Hipóxia - baixa disponibilidade Autossômica - padrão de
de oxigênio. do cromossomo 11 (Figura 1A), mapeada na região 11p15.4, herança de genes localizados
resultado da substituição de uma Adenina por uma Timina no nos cromossomos autossomos
gene da β globina (gene HBB - subunidade beta da hemoglo- (1 a 22).
bina), resultando em uma troca de aminoácido de ácido glutâ-
mico pela valina (GAG→GTG: Glu6Val) no 6º aminoácido
Gene - sequência de DNA que
da sequência proteica. A sequência nucleotídica do gene β glo-
é transcrita em um RNA.
bina, apresentada na Figura 1B, é composta por 1608 pares de
bases e codifica um polipeptídeo com 147 aminoácidos. Para
se tornar funcionalmente ativa, após a tradução, essa proteína
sofre algumas alterações que incluem a remoção do primeiro
aminoácido traduzido, a metionina.
Figura 1.
A) Imagem representativa
do cariótipo humano, com
destaque para o braço curto do
cromossomo 11, região onde
está localizado o gene da β
globina. B) Sequência do gene
da β globina. Estão destacados,
em amarelo, os éxons e, em
rosa, os códons de início
(atg) e de finalização (taa) da
tradução. O equivalente, no
DNA, ao 6º códon do RNAm,
posição em que ocorre a
mutação que causa a anemia
falciforme, está realçado
em cinza (NCBI, 2021). A
sequência selecionada para ser
trabalhada na atividade prática
está destacada em negrito e
sublinhada.
Anexo 1
Figuras 2-6
Figura 2.
Representação dos processos
de transcrição e tradução.
A - indica os locais de
corte; B - posicionamento
da RNA polimerase e C -
posicionamento do ribossomo.
Figura 3.
RNA polimerase. A linha
branca representa o RNAm
em processo de síntese, com a
extremidade 5’ destacada. Os
tracejados verticais deverão
ser recortados para entrada (à
direita) e saída (à esquerda) da
fita molde de DNA.
Figura 4.
Ribossomo. Estão representados
3 locais de ligação ao tRNA:
E (saída), P (ligação dos
aminoácidos) e A (entrada
dos tRNA). Para cada local,
é demonstrado o tRNA. Em
amarelo, encontra-se o RNAm
(obtido na etapa anterior) com
indicação para extremidades
5’ e 3’. As linhas verticais
tracejadas indicam o local onde
deve ser cortado.
2a Base
U C A G
UUU Fenilalanina UCU UAU Tirosina UGU Cisteína U
(Fen / F) (Tir / Y) (Cis / C)
UUC UCC Serina UAC UGC C
U (Ser / S)
UUA Leucina UCA UAA Fim UGA Fim A
(Leu / L) Triptofano
UUG UCG UAG Fim UGG (Trp / W) G
CUU CCU CAU Histidina CGU U
(His / H)
CUC Leucina CCC Prolina CAC CGC Arginina C
1a Base
C
CUA
(Leu / L)
CCA (Pro / P)
CAA CGA
(Arg / R)
A
3a Base
Glutamina
(Gln / Q)
CUG CCG CAG CGG G
AUU ACU AAU Asparagina AGU Serina U
Isoleucina (Asn / N) (Ser / S)
AUC (Ile / I) ACC Treonina AAC AGC C
A (Tre / T)
AUA ACA AAA Lisina AGA Arginina A
AUG Metionina
(Met / M) ACG AAG
(Lis / K)
AGG
(Arg / R)
G
(início)
GUU GCU GAU Aspartato GGU U
(Asp / D)
GUC Valina GCC Alanina GAC GGC Glicina C
G (Val / V) (Ala / A) (Gli / G)
GUA GCA GAA Ácido GGA A
Glutâmico
GUG GCG GAG (Glu / E) GGG G
Figura 5.
O código genético. Organização
da informação genética em
formato de trincas de bases
nucleotídicas, os códons.
Figura 6.
Tabela de resultados da
investigação genética. Os
alunos devem adicionar a
resposta da investigação
genética analisada pelo grupo
e entregar uma cópia da
resposta para o professor(a).
Após a discussão da atividade
pelo(a) professor(a), preencher
o restante da tabela com os
demais genótipos e fenótipos.
Prosseguir com as respostas do
item 11.
A AA Aa
a Aa aa
EvoDesign: um servidor
para design de sequências
proteicas baseadas em perfis
estruturais e evolutivos
Ivania Samara dos Santos Silva1, Adeilma Fernandes de Sousa1, Francisco Carlos de Medeiros Filho2,
Rafael Trindade Maia3, Magnólia de Araújo Campos1
1
Universidade Federal de Campina Grande, Programa de pós-graduação em Ciências Naturais e Biotecnologia, Cuité, PB
2
Universidade Federal Rural do Pernambuco, Programa de Pós-graduação em Química, Recife, PE
3
Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido, Sumé, PB
Autor para correspondência - ivania.samara@hotmail.com
Palavras-chave: desenho racional, ferramentas computacionais, simulação molecular, predição de estruturas, modelagem, proteínas
Dentre as aprimoradas ferramentas utilizadas que analisa a acoplagem entre uma proteína
para desenho de novas proteínas com função e seu receptor, mostrando ao estudante que
biológica está o EvoDesign, livremente dispo- uma proteína de alta complexidade pode ser
nível em http://zhanglab.ccmb.med.umich. redesenhada, apresentando menor tamanho e
edu/EvoDesign. Esse servidor cruza algorit- a mesma funcionalidade da proteína base ou
mos computacionais e experimentais de bio- até mesmo melhor atuação, o que otimizaria a
química, envolvendo campos de força basea- síntese química e aplicação industrial.
dos em física pela teoria termodinâmica de
Anfinsen e busca de Monte Carlo, que é feita Existem vários servidores que podem redese-
em banco de dados de proteína, como o Pro- nhar uma estrutura proteica, como, por exem-
tein Data Bank (PDB). A estrutura proteica plo, um fármaco, para um tamanho menor e
que se deseja estudar é cruzada e comparada que seja mais barato para ser sintetizado. O
com sequências proteicas semelhantes, par- EvoDesign destaca-se por acoplar diversas
tindo do princípio da evolução que cada pro- informações físicas, químicas e evolutivas, de-
teína homóloga pode ter sofrido. monstrando ser mais satisfatório do que pro-
tocolos que se baseiam em apenas um tipo de
No ensino de genética, tal ferramenta pode ser informação ou procedimento.
usada para mostrar quais proteínas derivam
da mesma família e que as regiões conservadas A utilização desse servidor web é abrangente
podem ser um indicativo de aminoácidos cha- já que inclui uma gama de recursos, pois pode
ve para a atuação esperada, pois a nova proteí- projetar diversas sequências proteicas basea-
na, construída através do servidor, poderá ser das em uma única estrutura, chamada de scaf-
aplicada e testada em outros diversos servido- fold ou andaime. A estrutura sequencial base
res, como, por exemplo, de docking molecular, é analisada e reprojetada, podendo originar
Figura 1.
Esquematização dos resultados
do EvoDesing. Fonte: dados do
autor.
Integrated view of
population genetics
Rafael Trindade Maia1, Magnólia de Araújo Campos2
1
Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido, Sumé, PB
2
Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Educação e Saúde, Sítio Olho D’água, Rio de Janeiro, RJ
Autor para correspondência - rafael.rafatrin@gmail.com
O livro Integrated View of Population Genet- genetics – seção que aborda concomitante-
ics, que tem como editor Rafael Maia, pu- mente a genética populacional e quantitativa
blicado em 2019 pela editora internacional e disponibiliza um capítulo sobre o uso da
de livros técnicos e científicos IntechOpen, genética quantitativa para avaliar o vigor em
com sede em Londres (Inglaterra), aborda o linhagens de videiras (Vitis riparia); 3) Ge-
tema de uma forma ampla, didática e mul- netic Diversity in Crop Management – aborda
tidisciplinar. É uma obra em inglês editada a importância de se acessar a diversidade ge-
por geneticistas da Universidade Federal de nética de cultivares para um melhor manejo
Campina Grande, tendo como público-alvo e produtividade. Neste tópico é apresentado
acadêmicos de todos os níveis (graduação, um capítulo focado no arroz vermelho como
pós-graduação, docentes e pesquisadores) modelo de estudo de competição, evolução
que tenham interesse pela área de genética e diversidade devido às suas implicações na
populacional e evolutiva. produtividade; 4) Population genetics for con-
servation studies – seção que aborda a apli-
O livro consiste de capítulos de trabalhos cabilidade da genética populacional para
científicos selecionados e revisados sobre o conservação das espécies, em que o capítulo
tema genética de populações, e é dividido em apresenta resultados inéditos de uma pesqui-
quatro seções: 1) Introduction – que contém sa conduzida com uma espécie de peixe (Hy-
o capítulo introdutório intitulado Population porthodus semptemfasciatus) de importância
genetics – The Evolution as a genetic function, econômica no litoral de países asiáticos ( Ja-
escrito pelos próprios editores do livro. É pão, Coreia e China), para a qual foi utilizada
uma introdução geral e conceitual do tema a técnica de AFLP fluorescente para verificar
para os leitores se situarem sobre o conteú- as diferenciações genéticas entre populações
do do livro; 2) Population and quantitative reprodutoras e descendentes.
O gene mutY é muito conservado entre as espécies e está presente em diversos organismos, como
bactérias e humanos. A expressão gênica de mutY resulta na formação da adenina DNA Glicosi-
lase (MUTY), uma enzima que está relacionada ao reparo de DNA em uma via chamada BER
(do inglês: Base Excision Repair). A enzima MUTY apresenta uma atividade muito peculiar, pois
é a única enzima de reparo de DNA capaz de remover uma base que não está danificada. Nos
seres humanos, o gene é designado de MUTYH (do inglês: human mutY homolog) e as mutações
nesse gene resultam na predisposição hereditária aumentada a diversos tipos de cânceres, princi-
palmente o câncer colorretal denominado de MAP (do inglês: MUTYH-Associated Polyposis).
Figura 1.
Árvore filogenética dos reinos biológicos com a indicação das espécies nas quais o gene mutY está presente (grafadas em preto), ou ausente
(grafadas em vermelho). Entre parênteses, estão os nomes populares de algumas espécies ou então a sua importância biológica.
Figura 2.
A ilustração da enzima MUTYH
com 535 aminoácidos está
baseada no seu transcrito mais
A enzima MUTYH é muito importante sionado. O processo de replicação do DNA longo. A MUTYH é uma enzima
que apresenta vários domínios
para a manutenção da estabilidade genômica contendo a 8-OxoGuanina tem como con-
de ligação ao longo da sua
e apresenta uma caraterística bastante pecu- sequência a incorporação de uma Adenina estrutura para interagir com a
liar nesse processo, pois é a única enzima de resultando na formação do par Adenina:- Adenina e se ligar aos parceiros
reparo de DNA capaz de remover uma base 8-OxoGuanina. Este par é substrato para a proteicos específicos (RPA,
de DNA que não está danificada. A enzima enzima MUTYH que atua no reparo pós- MSH6, APE1 e PCNA).
MUTYH atua de forma coordenada com a -replicação e apresenta atividade direciona-
enzima OGG1 para prevenir mutações que da para a fita de DNA recém-sintetizada. A
OGG1 (do inglês:
podem surgir durante a replicação do mate- MUTYH reconhece e remove a Adenina in- 8-OxoGuanine DNA
rial genético na presença da 8-OxoGuanina, corporada de forma inapropriada no DNA, Glycosylase) - É uma enzima
a qual é uma lesão de DNA originada pela e assim fornece uma nova oportunidade para que remove a guanina oxidada
ação dos radicais livres na Guanina (Figura a enzima OGG1 realizar a sua atividade de do DNA, e juntamente com a
MUTYH participa do sistema
3A). A OGG1 é responsável por reconhe- remoção da lesão (Figura 3C). A atividade GO que faz parte da via BER.
cer e remover a 8-OxoGuanina (Figura 3B) coordenada das enzimas MUTYH e OGG1
A enzima OGG1, porém, pode falhar ou se é essencial nesse mecanismo de reparo, pois
Radicais livres - São moléculas
atrasar para efetuar a remoção da lesão, mas o acúmulo dessas mutações no genoma hu- ou átomos altamente reativos
as atividades celulares são muito dinâmicas e mano contribui para a etiologia de diversos que em condições normais são
a célula pode replicar o material genético le- tumores. essenciais para o funcionamento
do organismo, mas em excesso
podem danificar biomoléculas
como proteínas, lipídios e DNA.
Figura 3.
predisposição ao câncer
na prevenção das mutações
que podem surgir durante a
replicação do DNA contendo
em humanos uma Guanina oxidada
(8-OxoGuanina) a qual é
originada pela ação dos radicais
Existem vários alelos identificados para o gene MUTYH e al-
livres. A replicação do DNA
Polipose - Doença que se guns possuem alterações que podem ocasionar a produção de contendo a 8-OxoGuanina
caracteriza pela formação de uma enzima MUYTH não funcional, a qual é incapaz de cum- pode resultar em uma mutação
pólipos múltiplos no cólon ou
em outras porções do tubo prir o seu papel na remoção de lesões. Dessa forma, os indiví- após dois ciclos de replicação
duos que possuem alelos alterados de MUTYH em homozigo- (A). A OGG1 é responsável
digestivo, e que podem evoluir
por reconhecer e remover a
para a malignização. se estão mais susceptíveis ao acúmulo de mutações no genoma 8-OxoGuanina presente no
e, consequentemente, ao desenvolvimento da Polipose, essa DNA (B). No entanto, em
característica é denominada de MAP (do inglês MUTYH-As- casos de falhas ou atrasos da
sociated Polyposis). Cerca de 80-90% dos portadores homozigo- OGG1, uma Adenina pode ser
Tabela 1. tos das alterações no gene MUTYH serão afetados pela doença incorporada em frente à lesão
Risco para o desenvolvimento e resultar na formação do
de diferentes tipos de tumores por volta dos 48 anos de idade. Adicionalmente, esses pacientes par Adenina:8-OxoGuanina.
na população em geral e em também apresentam risco aumentado para o desenvolvimento A MUTYH atua no reparo
indivíduos com alterações no de vários outros tipos de tumores (Tabela 1). pós-replicativo e remove a
gene MUTYH em homozigose. Adenina presente na fita
recém-sintetizada fornecendo
Tipo de Risco da Risco dos Portadores Idade média do
uma nova oportunidade para
tumor População geral de alterações em MUTYH surgimento dos tumores a OGG1 (C) (modificado de
Colorretal 5,5% 80%-90% 48 anos OLIVEIRA et al., 2014).
Duodenal < 0,3% 4% 61 anos
Ovariano 1,3% 6%-14% 51 anos
Urotelial 1%-4% 6%-8% mulheres; 6%-25% homens 61 anos
Mamário 12% 25% 53 anos
Figura 4.
O gene MUTYH está localizado na região cromossômica p34.1 do cromossomo 01
humano (A). O aumento do risco para o desenvolvimento de tumores ocorre em
25% dos descendentes de um casal heterozigótico saudável, isto é, quando ambos
apresentam apenas um alelo alterado no lócus do gene MUTYH (B). A probabilidade
aumenta para 50% para casal composto por um indivíduo heterozigótico (apresenta
um alelo do gene MUTYH alterado) e o outro indivíduo com ambos alelos de MUTYH
alterados (C). No caso do casal em que ambos os indivíduos apresentem os dois
alelos alterados para MUTYH, toda a descendência terá risco aumentado para o
desenvolvimento de tumores. (Modificado de Oliveira et al., 2021).
A busca pela longevidade acompanha o homem desde os primórdios, por meio de histórias
fantásticas como as que rodeavam a alquimia. Com o avanço científico, essa busca adquiriu
um novo caráter e passou a incluir também a investigação de genes que estivessem associados
a uma maior expectativa de vida. Nesse contexto, estudos investigando o gene Mth da mosca
de fruta Drosophila melanogaster mostraram que este, quando mutado, pode prolongar a vida
do organismo. O gene Mth codifica um receptor transmembrana para os peptídeos endóge-
nos Stunted A e B, e se acopla à proteína G. Receptores acoplados à proteína G estão relacio-
nados a diversas atividades biológicas como neurotransmissão, fisiologia hormonal, resposta a
drogas e transdução de estímulos. Desse modo, tal receptor atua recebendo e repassando in-
formações para a célula, e assim, interferindo em sua longevidade. Estudos como esses fazem
com que, aos poucos, nosso entendimento sobre a expectativa de vida torne-se mais amplo e
detalhado, o que também traz a longevidade para mais perto da nossa realidade.
Figura 1.
Representação do receptor de insulina ativo. Quando o receptor de insulina (representado em laranja) está ativo, moléculas de insulina
(representada em rosa) conseguem se ligar a ele. Assim, o receptor é ativado, o que também resulta na ativação da proteína AGE-1. Esta
proteína atua catalisando a conversão de bifosfato de fosfatidilinositol (PIP2) em trisfosfato de fosfatidilinositol (PIP3). Em seguida, o PIP3 se
liga ao complexo AKT-1/AKT-2, expondo locais de fosforilação. Em paralelo, a quinase PDK-1 por ligação ao PIP3, fosforila e ativa AKT-1. Por
fim, a AKT-1 fosforila o fator de transcrição DAF-16 e, assim, assegura sua retenção no citoplasma. Uma vez fosforilado, DAF-16 não consegue
adentrar no núcleo, e é impedido de auxiliar na transcrição de genes codificadores de proteínas de resposta a estresses. Dessa forma, temos
o acúmulo de espécies reativas de oxigênio (EROS; representadas por OH, H2O2, O2•-), o que causa danos nas membranas, proteínas e ácidos
nucleicos da célula. Como fenótipo, temos o envelhecimento da célula e a redução da expectativa de vida do organismo. Imagem feita por
Ribeiro Y.A., utilizando elemento gráfico da Noun Project (DNA por Shuai Tawf).
Figura 2.
Representação do receptor de insulina inativo. Com o receptor de insulina inativo (representado em cinza e marcado com um ‘x’) a molécula
agonista não pode ser reconhecida, e a cascata de reações é inviabilizada (também marcada com um ‘x’). Uma vez que a via está inativa, o fator de
transcrição DAF-16 (representado em marrom) está livre para adentrar no núcleo celular. No núcleo celular, DAF-16 atua na transcrição de genes
importantes para a resistência ao estresse. Após a transcrição, os RNAms resultantes são traduzidos, e assim, as proteínas necessárias para lidar com
o estresse, como enzimas antioxidantes (representadas em azul), são sintetizadas, e estão prontas para lidar com as espécies reativas de oxigênio
(EROS; representadas por OH, H2O2, O2•-). Imagem feita por Ribeiro Y.A., utilizando elemento gráfico da Noun Project (DNA por Shuai Tawf).
O estudo realizado por Lin e colaboradores 57 dias, as moscas mutantes vivem 77 dias.
(1998) em Drosophila, mostrou que a muta- Além disso, tais moscas apresentam resistên-
ção no gene Mth resulta em uma expectativa cia a estresses como calor, fome, dessecação e
de vida aumentada em 35% (Figura 3) em dano oxidativo. Não à toa, esse gene recebe
relação ao tempo de vida média. De modo o nome de Mth, do inglês Methuselah, em
específico, o estudo em questão mostrou que, referência à personagem que conhecemos no
enquanto moscas selvagens vivem em média início deste artigo, Matusalém.
Figura 3.
Representação da
longevidade de Drosophila
melanogaster. Com o
receptor ‘matusalém’ inativo
(representado à direita) a mosca
apresenta uma longevidade
35% maior do que quando a
mesma proteína está ativa,
mosca selvagem (representada
à esquerda). Imagem feita
por Ribeiro Y.A., utilizando
elemento gráfico da Noun
Project (mosca da fruta por
Phạm Thanh Lộc).
Figura 4.
Representação do gene Mth.
O gene Mth possui nove éxons
(representados por retângulos
em azul claro) e oito íntrons
(representados por linhas em
Aparentemente, a espécie humana é despro-
vida de um gene homólogo ao Mth, entretan- Mecanismo de azul escuro), com total de 3580
nucleotídeos. Após os eventos
to, alguns grupos de pesquisa argumentam
que o gene ADGRG6 (do inglês, adhesion ação de Mth de transcrição, podemos
ter até três tipos de RNAm
(representados em verde), que
G protein-coupled receptor G6) seria o homó- O gene Mth codifica uma proteína que atua denominamos de RNAm A, com
logo em nossa espécie, apesar de haver uma como receptor na membrana da célula, com 1967 nt; RNAm B com 1882 nt;
baixa similaridade de sequência das proteí- dois ligantes conhecidos - os peptídeos endó- RNAm E com 2420 nt. Seguida
nas codificadas por eles - somente 23% de se- a tradução, os respectivos
genos Stunted A e B. Esse receptor é classifi- RNAm resultam na Isoforma A
melhança. Indivíduos homozigotos com mu- cado como ‘receptor associado à proteínas G’ com 514 aa; Isoforma B com
tações nesse gene apresentam a "síndrome 9 (GPCR, do inglês G Protein-Coupled Recep- 522 aa e Isoforma E com 514 aa
de contratura congênita letal", caracterizada tor), ou seja, ela associa-se a uma família de (representadas em vermelho).
pela degeneração de neurônios da medula es- proteínas de ligação a nucleotídeos de guano- Imagem feita por Ribeiro Y.A.,
pinhal, atrofia muscular esquelética extrema utilizando elemento gráfico da
sina, denominada de ‘proteínas G’. Sua estru- Noun Project (mosca da fruta
e contrações permanentes e involuntárias das tura consiste em um ectodomínio contendo por Phạm Thanh Lộc).
articulações; sem relação com longevidade. um local de ligação ao ligante, sete segmentos Ectodomínio - uma porção
de uma proteína de membrana
que se estende para o espaço
extracelular.
Figura 5.
Atuação da proteína transcrita pelo gene Mth. Após o ligante
(representado em rosa – peptídeo Stunted A ou B) interagir com
GPCR (representado em marrom; observe os sete segmentos
transmembrana), a proteína G (representada em verde com
suas respectivas subunidades) é ativada. Sua subunidade α
troca a molécula GDP (representada em amarelo) por uma GTP
(representada em azul), o que resulta na sua dissociação do receptor.
Em seguida, a subunidade α é direcionada para a enzima efetora
(representada em amarelo na membrana) a jusante, dando início a
uma cascata de sinalização que varia de acordo com a função da
enzima e informação passada. Imagem feita por Ribeiro Y.A.
Transmissão sináptica
Conclusões
De modo mais específico, devido à semelhan- - processo pelo qual uma
informação gerada ou
ça do receptor Mth com outros de função já
processada por um neurônio é
conhecida, cientistas concluíram que ele atua transmitida a outro neurônio ou
Identificar a função de um gene, ou de muta-
como um GPCR relacionado à transmissão célula efetora.
ções no mesmo, é um grande passo para elu-
sináptica. Embora sua atuação celular seja
cidar a relação entre nossos genes e a longe-
bastante especulativa, pesquisas mostraram Exocitose - processo que leva
vidade, bem como entendê-la de modo mais à expulsão de determinada
que Mth regula positivamente a exocitose de
profundo. Cada informação obtida é como substância do interior da célula.
neurotransmissores, controlando o tráfego
uma peça de um quebra-cabeça que contri-
de vesículas pré-sinápticas. Nesse sentido, Neurotransmissores -
bui para, futuramente, entendermos o qua-
como as moscas mutantes Mth têm trans- moléculas que agem como
dro geral e delinearmos com detalhes os pro- mensageiros químicos entre
missão sináptica defeituosa, é possível que
cessos biológicos que envolvem a vida. Por neurônios, enviando um sinal
Mth faça parte de um controle do envelhe-
fim, estudos analisando a relação dos mutan- entre eles.
cimento animal relacionado ao sistema ner-
tes Mth com uma maior/menor incidência
voso.
de problemas tipicamente associados com o
A relação entre transmissão sináptica e pro- transcorrer do tempo biológico são impor-
longamento da expectativa de vida é ainda tantes para termos um entendimento melhor
um grande enigma. Com o intuito de tentar sobre a interação de todos esses elementos,
compreender esse cenário, embora não haja tais como câncer e doenças neurodegenera-
dados moleculares de como Mth atua, os tivas. O incentivo a pesquisas relacionadas
pesquisadores postulam que a longevidade ao tema pode nos deixar mais próximos de
seja um reflexo da regulação da transmis- compreender e, quem sabe, alcançar uma
são sináptica e/ou da resistência ao estresse. maior longevidade, isto é, dentro dos limites
Nesse sentido, a expectativa é que a ausência impostos pela biologia, fortuitamente, com
do receptor codificado por Mth tenha efeito saúde e qualidade de vida.
Vesículas pré-sinápticas -
similar a outros receptores, como o receptor
Para saber mais
pequenas bolsas membranosas
de insulina em C. elegans (Figura 2) resul- que armazenam os
tando na resistência aos estresses de forma neurotransmissores liberados
secundária. A resistência ao estresse, isto é, CVEJIC, S. et al. The endogenous ligand Stunted of pelos neurônios.
the GPCR Methuselah extends lifespan in Dro-
como lidar com os danos celulares, é um as- sophila. Nature cell biology, v. 6, n. 6, p. 540-546,
pecto importante quando mencionamos en- 2004.
velhecimento. e está amplamente relacionada
a longevidade. LIN, Y. j. ; SEROUDE, L.; BENZER, S.. Extended
life-span and stress resistance in the Drosophila
mutant methuselah. Science, v. 282, n. 5390, p.
Saiba mais em https://tinyurl.com/3hsff-
943-946, 1998.
c4d.
PAABY, A. B.; SCHMIDT, P. S. Functional signifi-
Finalmente, é possível também que a relação cance of allelic variation at methuselah, an aging
entre a função reguladora de Mth e a longe- gene in Drosophila. PLoS One, v. 3, n. 4, p. e1987,
vidade seja direta já que os estudos até então 2008.
não foram conclusivos e uma vez que apenas SOLON-BIET, S. M. et al. Macronutrients and ca-
o detalhamento dos mecanismos molecula- loric intake in health and longevity. The Journal of
res que envolvem o gene Mth podem trazer endocrinology, v. 226, n. 1, p. R17, 2015.
luz para compreensão da longevidade esten- SONG, W. et al. Presynaptic regulation of neurotrans-
dida das moscas. mission in Drosophila by the g protein-coupled
receptor methuselah. Neuron, v. 36, n. 1, p. 105-
119, 2002.
A descoberta da leptina demonstrou o papel fundamental das funções do tecido adiposo como
regulador do metabolismo energético e do consumo de alimentos. A leptina é um hormônio
peptídico produzido principalmente pelos adipócitos ou células gordurosas e sua descoberta
marcou uma importante transição sobre os pensamentos acerca das funções desse orgão. O
Gene Lep está ligado à obesidade e fatores associados e a leptina pode ser um agente que
contribui com a doença em dois aspectos, ou o indivíduo possui uma deficiência na produção
da leptina pelos adipócitos ou este possui uma resistência à sua ação, o que leva a um dese-
quilíbrio entre consumo calórico e gasto energético, contribuindo para o aumento de peso e,
consequentemente, um risco potencial à obesidade.
Recombinação alternativa
- Processamento diferencial
Figura 1.
Esquema da localização e
estrutura do gene LEP. O gene
da leptina está localizado na
região 7q32.1 do cromossomo
7 em seres humanos. O gene
apresenta três éxons, sendo
que a região codificando para o
leptina encontra-se nos éxons
2 e 3.
Figura 2.
Mecanismo de ação do
hormônio leptina. A leptina
é secretada pelas células do
tecido adiposo branco e age
sobre as células do hipotálamo,
que apresentam em suas
membranas os receptores
específicos de Leptina
denominados LEPR. A ligação
do receptor com o hormônio
ativa uma via de sinalização
regulatória, denominada Jak-
STAT, que regula a expressão
de vários genes envolvidos na
homeostase energética.
A leptina atua como um mecanismo de re- seja, este hormônio comunica ao cérebro Lipólise - Processo de
troalimentação negativa do tecido adiposo se as reservas de gorduras são suficientes e degradação de lipídios em
ácidos graxos e glicerol.
para o cérebro, sendo que a sensação de sa- reduz o consumo de alimentos. Além disso,
ciedade e diminuição da fome estão relacio- estimula o maior gasto energético, sendo um
nadas a uma maior secreção desta proteína importante regulador do metabolismo ener-
(Figura 3). Quanto maior a quantidade de gético, ao estimular, por exemplo, a lipólise
gordura corporal, maior é a secreção de lep- do tecido adiposo e inibir a lipogênese neste Lipogênese - Processo
tina e menor é a ingestão de alimentos, ou tecido. metabólico que sintetiza ácidos
graxos e triglicérides.
Figura 3.
Relação da secreção de
leptina com a taxa de gordura
corporal. A síntese de leptina
é proporcional à quantidade
de tecido adiposo. Indivíduos
que apresentam alta taxa de
massa de gordura expressam
e secretam mais leptina na
circulação do que indivíduos
magros. O hormônio leptina age
sobre o hipotálamo, levando à
maior sensação de saciedade e
maior gasto energético, além
de reduzir o apetite. Indivíduos
que possuem menor taxa de
gordura corporal secretam
menos leptina e apresentam
maior apetite e menor sensação
de saciedade.
Hiperfagia - Desordem
Obese de camundongos foi caracterizado em tecido adiposo, o qual foi, durante muito alimentar causada pela
humanos. tempo, considerado como apenas um local ingestão excessiva de alimentos
ultrapassando a quantidade
de armazenamento de gordura. Tal revelação
Desde sua descoberta, o gene LEP foi iden- necessária para atender as
elevou o tecido adiposo de um simples arma- demandas energéticas do
tificado em diferentes espécies de mamíferos, zenador para um órgão endócrino altamente organismo.
como ratos, coelhos e morcegos, além de importante no metabolismo energético, uma
répteis e peixes. Ele é altamente conservado vez que a leptina é um hormônio que apre-
entre espécies, sendo que a leptina humana Adiponectina - Hormônio
senta um papel fundamental na sinalização proteico secretado pelo tecido
possui cerca de 84% de semelhança com a para o cérebro do controle da ingestão de adiposo na corrente sanguínea
leptina de camundongos. A função da lepti- alimentos e do gasto energético. Atualmente, associado à obesidade,
na é também conservada tanto em mamífe- sabe-se que o tecido adiposo secreta outras síndrome metabólica e diabetes
ros quanto em não mamíferos. moléculas, tais como adiponectina e diver-
tipo 2.
O alelo ob do gene LEP é caracterizado por sos tipos de citocinas, confirmando o tecido
Citocinas - Grupo de pequenas
uma mutação sem sentido, que codifica uma como importante órgão imunoendócrino re- proteínas que regulam
proteína truncada, sem atividade funcional. gulador do metabolismo corporal, envolvido a resposta imunológica,
Camundongos homozigóticos recessivos com uma gama de processos fisiopatológicos. importantes para imunidade,
inflamação e hematopoiese.
para o alelo ob/ob são obesos, hiperfágicos, A expressão de LEP é regulada por vários
diabéticos e estéreis. fatores metabólicos e endócrinos (Figura 4).
Seres humanos com mutações no gene LEP, Por exemplo, a insulina é um importante
Insulina - Hormônio produzido
ou no gene do receptor LEPR, que inviabi- regulador de LEP, sendo que baixos níveis pelo pâncreas endócrino
lizam a função do hormônio, também apre- plasmáticos desse hormônio estão relaciona- responsável por controlar os
sentam obesidade e hiperfagia. Em huma- dos à diminuição da leptina. A baixa expres- níveis de glicose no sangue.
nos, entretanto, a associação da leptina com são de LEP também está relacionada a baixas
obesidade não é assim tão clara, porque a temperaturas, estimulação adrenérgica, GH,
GH - Hormônio do Crescimento
obesidade é uma característica (ou condição) hormônios tireoidianos. Já o aumento na - além de estar relacionado
multifatorial, determinada por vários genes expressão de LEP está relacionado a altas ao desenvolvimento ósseo
concentrações plasmáticas de hormônios gli- e crescimento em estatura,
(poligênica) em combinação com o estilo de esse hormônio produzido pela
vida e fatores ambientais, como sedentaris- cocorticoides e citocinas pró-inflamatórias.
adeno-hipófise também está
mo e dieta com alto teor calórico, por exem- A secreção de leptina varia de acordo com o relacionado à regulação do
plo. Devido à natureza multifatorial da obe- metabolismo energético, tendo
ciclo circadiano, sendo maior durante a noi- uma ação semelhante à da
sidade, as mutações no gene da leptina não te. Também possui variação pelo sexo, uma leptina.
são a única causa da condição. vez que já foi observado que entre mulheres
e homens que apresentam a mesma massa de Hormônios tireoidianos - São
Pode-se dizer que a descoberta do gene LEP os hormônios Triiodotironina
e a função da leptina revolucionaram o en- gordura, a secreção de leptina é mais acen- (T3), Tiroxina (T4) e calcitonina,
tendimento que se tinha até então sobre o tuada em mulheres. responsáveis por controlar o
metabolismo e a homeostase
em todo o organismo.
Figura 4.
Representação esquemática dos mecanismos regulatórios da expressão
de LEP. A caixa verde apresenta os fatores estimulatórios da expressão
do gene e a caixa vermelha apresenta fatores inibitórios da síntese de
leptina. Setas para cima indicam aumento dos níveis plasmáticos; setas
para baixo indicam diminuição dos níveis plasmáticos. Fonte: autores.