O Boneco Nos Cruzamentos Da Arte e Da Comunicação
O Boneco Nos Cruzamentos Da Arte e Da Comunicação
O Boneco Nos Cruzamentos Da Arte e Da Comunicação
IMAGENS MARIONETÁVEIS:
Porto Alegre
2014
YARA MARINA BAUNGARTEN BUENO
IMAGENS MARIONETÁVEIS:
Porto Alegre
2014
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação ( CIP )
CDD 659.1
Ficha elaborada pela bibliotecária Anamaria Ferreira CRB 10/1494
YARA MARINA BAUNGARTEN BUENO
IMAGENS MARIONETÁVEIS:
O BONECO NOS CRUZAMENTOS DA ARTE E DA COMUNICAÇÃO
BANCA EXAMINADORA:
______________________________________________
Profa. Dra. Sandra Portella Montardo
Universidade Feevale
______________________________________________
Prof. Dr. Carlos Gerbase
PUCRS
______________________________________________
Prof. Dr. Juremir Machado da Silva - Orientador
PUCRS
Porto Alegre
2014
AGRADECIMENTOS
É o que me possibilitam meus pais, Pedro e Yara Lourdes e meu querido Rodrigo
dMart, que além disso revisam, formatam e dão cor a este trabalho.
É o que iluminou esta escrita, pelas leituras e entrevistas com o professor Michel
Maffesoli e pelas motivações precisas e preciosas de meu orientador Juremir
Machado da Silva.
Esta pesquisa tem como objetivo relacionar a figura do boneco nos produtos
audiovisuais realizados a partir dos anos 1890 até a primeira década do século 21,
investigando ocorrências desde o teatro, passando pelo cinema até chegar à
televisão. Nesse sentido, é traçado um panorama histórico das artes e da
comunicação para dar conta, na pós-modernidade, de uma presença que faz
referência às manifestações culturais do imaginário.
This research aims to relate the figure of the puppet in audiovisual products
made from the 1890s until the first decade of the 21st century, investigating its
appearance in theater, cinema and television. In this sense, is traced a historical
overview of the arts and communication to give account, in postmodernity, of a
presence which refers to cultural manifestations of the imaginary.
Figura 42: Caco no programa Sam and Friends (1955) ......................................... 111
Figura 44: Caco regendo uma canção com o ator John Cleese ............................. 113
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11
2 O BONECO NO IMAGINÁRIO.............................................................................. 17
2.1 OBJETO E PERSONAGEM DE PESQUISA ............................................... 17
2.2 O PRAZER LÚDICO DOS BONECOS ........................................................ 24
3 ARTICULAÇÕES DO BONECO: TEATRO, ESTÉTICA E MANIPULAÇÃO ........ 37
3.1 BONECO: SUA ALMA NO TEMPLO, SUA IMAGEM NO TEATRO ............ 37
3.2 A RESPEITO DE UMA HISTÓRIA DO TEATRO DE BONECOS ............... 39
3.3 COMMEDIA DELL’ARTE ............................................................................. 40
3.4 SOBRE AS TÉCNICAS DE MANIPULAÇÃO ............................................... 46
3.5 SOBRE A ESTÉTICA E ENREDOS DAS NARRATIVAS DOS BONECOS.. 50
3.6 FALANDO SOBRE OS BONECOS ............................................................. 56
4 FILMES DE ANIMAÇÃO ...................................................................................... 65
11
Com o mote dos bonecos, estivemos pesquisando numa biblioteca,
escutando nossos mestres, batendo papo com os amigos, assistindo às suas
representações, preenchendo o tempo livre e fazendo da diversão fonte de
pesquisa. Trazendo esse tema à luz de uma metodologia compreensiva,
percebemos a força espiritual de um passado arcaico no hoje presenteísta, como
aponta Maffesoli (1985), que faz conviver os sonhos de um futuro, ainda não vivido,
com as lembranças de um tempo não experienciado.
E o que o boneco vai nos contar, pelas suas narrativas e aplicações, desde
os primórdios do teatro até a atualidade? Ele vai nos mostrar que somos e trazemos
conosco todas as trajetórias já percorridas. A partir dele, através dele, com ele,
estamos-junto. Socializamos.
Dito isso, temos a noção de que a vontade do saber é uma pulsão. E que
saber é prazer. Que o fluxo intermitente de imagens – e como propomos, de
bonecos – tem relação com o desfrute imaginal do contemporâneo.
Bonecos contam histórias, para crianças e adultos. Eles são, sem dúvida, um
entretenimento. São populares, agradam. Oportunizam experiências e interagem.
12
Entendemos que nossa abordagem sobre a ludicidade e a narratividade, e
mais ainda, sobre a imagem do boneco, poderá auxiliar na compreensão de nossas
maneiras de imaginar, relacionar e divertir na pós-modernidade. De estar e ser no
imaginário. De ficcionar o cotidiano, de realizar o sonho. De sermos ludens, como
detecta Johan Huizinga, depois de faber, como descreve Vilém Flusser, até o
demens do método de Edgar Morin. De vermos no outro, nós mesmos. De
brincarmos, para concretizar.
Atualmente, temos meios dos mais variados para efetivar nossa criatividade.
Temos ao nosso dispor as informações, as técnicas, os suportes. O cinema, a
televisão, a internet, os anais históricos, as possibilidades artesanais e as
promessas do amanhã. E vivemos o agora. Nosso hoje nos alimenta, sobretudo, de
imagens. Com um pouco de interesse, com mais um tanto de esforço, podemos
conhecer.
Mas, como indagação sobre o momento presente, cabe a nós refletir: já não
estamos tão sobrecarregados desses conhecimentos, a ponto de anulá-los? Muitos
pensadores apontam para o esgotamento da imagem. Régis Debray, em Vida e
morte da imagem (1993), vê, no acúmulo, a morte das imagens, em uma
visualização que controla. Já Marshall Mcluhan, na sua obra Os meios de
comunicação como extensões do homem (1969), condiciona ao poder econômico,
elétrico e instantâneo, uma possível diminuição da importância do visual, pois
fragmentado, na organização social e experiência pessoal.
13
Colocamos como projeto de pesquisa o questionamento de como os
cruzamentos entre arte e comunicação contribuem para a criação de conteúdos e
discursos, levando em consideração as aparições do boneco como elemento
narrativo, no teatro e nos produtos audiovisuais.
14
Internationale de la Marionnette, em francês da sigla original), poucos são os
voltados para o viés das práticas audiovisuais e da comunicação. Por isso,
adequamos as noções que Amaral e Bell nos dispõem, a respeito da constituição
histórica e técnica do teatro de bonecos, aos âmbitos do imaginário, neste capítulo.
15
Neste ponto, iniciamos nossa análise dos programas escolhidos como objeto
de estudo, os americanos The Muppet Show (1977) e Frango Robô (2005), e o
brasileiro Pandorga (1988). No capítulo, pretendemos reavivar as noções da
Sociologia Compreensiva como método compreensivo que, para Michel Maffesoli
(1985), permite uma abordagem indutiva, descrevendo o “vivido naquilo que é” (p.
25), para estipularmos nossas considerações em termos da forma e do conteúdo
audiovisual disponível, discernindo assim “as visadas dos diferentes atores
envolvidos” (p. 25).
Com isso, e por tudo isso, esperamos que tenhamos todos uma boa jornada
com os bonecos.
16
2 O BONECO NO IMAGINÁRIO
17
Dentro de uma vasta gama de inserções da presença do boneco na
“videosfera performática” descrita por Régis Debray (1993), que abarca o domínio da
brincadeira, do jogo e do entretenimento, vamos ver esta figura aparecer no teatro,
com a tradição do teatro de marionetes do Leste Europeu, com o milenar teatro de
sombras, com os bonecos gigantes do grupo Bread and Puppet e com o espetáculo
multimidiático do Blue Man Group; nas artes visuais, com Man Ray e seus Mr. and
Mrs. Woodman e a boneca de Hans Bellmer; nos quadrinhos, com a graphic novel A
Trágica Comédia ou A Cômica Tragédia de Mr. Punch, de Neil Gaiman e David
McKean; no cinema, com a vanguarda da animação em stopmotion dos tchecos Jiri
Trnka e Jan Švankmajer, com os bonecos das animações dirigidas por Tim Burton,
com os inúmeros filmes de cinema em animação com computação gráfica e 3D, com
os procedimentos inovadores de Norman McLaren e a instituição do Office National
du Film do Canadá; nos brinquedos Transformers, que já foram desenhos animados
e que ocupam agora a tela grande em blockbusters; nos videogames, com a série
God of War e também as adaptações em Lego para sucessos de Hollywood; nos
videoclipes, com o apresentador virtual Max Headroom, na Inglaterra dos anos 80;
em programas televisivos como os americanos Muppets, Vila Sésamo e os
brasileiros TV Colosso e Pandorga; na publicidade, como recursos para comerciais,
como o dirigido pelo cineasta indie Spike Jonze para a Ikea.
Na página seguinte:
18
19
São esses alguns dos casos que vamos conhecer mais nessa proposta, uma
vez que, dispondo de argumentos a respeito da teatralidade e da representação, que
podem ser encontrados nas narrativas com os bonecos como “elementos dinâmicos
do conhecimento” (MAFFESOLI, 1985, p. 135), estamos considerando essas
histórias como manifestações de um imaginário contemporâneo, pensando que o
“‘reencantamento’ passa acima de tudo pelo imaginário, o lugar-comum do próximo,
da proximidade” (DURAND, 1998, p. 56).
A estética dos usos do boneco passa também pelo imaginário, que segundo
Edgar Morin (1987, p. 80), “começa na imagem-reflexo, que ele dota de um poder
fantasma – a magia do sósia – e se dilata até os sonhos mais loucos”.
Essas intenções são parte das “tramas do vivido” que, na ficção, são também
trançadas pelos bonecos, e dão conta da afirmação de Maffesoli (1985, p. 142), ao
dizer que “claro está que, sob todas as suas formas, a ficção nos tem lembrado à
frequência do imaginário; a vida do dia-a-dia caracteriza-se, do mesmo modo, por
um fantástico irreprimível”. Segundo Juremir Machado da Silva (2006, p. 8), “todo
imaginário é uma narrativa”, talvez com histórias inacabadas, lembra ele, mas por
certo, uma “narrativa mítica da era da mídia”.
21
imaginário, presente na mídia e na arte.
22
atestar ao longo da pesquisa histórica no teatro, cinema e televisão, que dão conta
que os três casos escolhidos utilizam linguagens e técnicas híbridas das áreas da
arte e da comunicação para realizar produtos audiovisuais que, em sua época, e
ainda hoje, foram e são inovadores tanto nos conteúdos quanto nos formatos
televisivos. Desta forma, temos dois programas estrangeiros, voltados para o público
adulto, Frango Robô e Muppet Show, e um programa sul-rio-grandense, Pandorga,
voltado ao público infantil.
23
efêmero, conquistadora do presente e do atual”, na qual a vida e o fazer artístico são
investigados do ponto de vista de que
Maffesoli (1985, p. 138) afirma que “é preciso apreciar o real em função das
obras do irreal”. De tal forma, se “todo imaginário é real” (SILVA, 2006, p. 7), e se o
boneco, com sua carga imagética dependendo do engajamento do espectador que a
admira, tem potencial para se inserir nas tecnologias do imaginário, cabe aqui citar
Morin (2002, p. 133), que ressalta que a estética – nas manifestações de teatro,
literatura, enfim, na arte – tem no âmbito das produções artísticas uma parte em
comum com o imaginário: “a estética alimenta o imaginário e é, em parte, alimentada
por ele”.
24
E a “função fantástica desempenha um papel direto na ação: não há ‘obras
de imaginação’ e toda criação humana, mesmo a mais utilitária, não é sempre
aureolada de alguma fantasia?” (DURAND, 2002, p. 397).
Nesse sentido, citamos Silva (2006, p. 13), que coloca que o imaginário é
uma “fonte racional e não-racional de impulso para a ação”, que relaciona os seres
de maneira individual e, ao mesmo tempo, coletiva.
25
Régis Debray (1993, p. 192) postula que na imagem – e pela imagem –,
“cada cultura, ao escolher sua verdade, escolhe sua realidade: aquilo que ela se
permite reconhecer como visível e digno de representação”. O boneco, a máscara,
as imagens digitalizadas para formar narrativas, uma pedra, nossos dedos. Estas
são as formas manipuláveis, todas as imagens o são.
26
Campo Midiasfera Autoridade Figura do Centro de
simbólica tempo gravidade
subjetivo
27
Para Silva (2006, p. 70), o imaginário mostra, entre tantas configurações, que
“cada olhar é uma imagem. Que cada imagem é um olhar. Imaginação do olhar.
Olhar da imaginação”. Para nós, são as imagens “marionetáveis”.
Vale lembrarmos que, como coloca Debray (1993, p. 23), a palavra ídolo vem
de “eídolon que significa fantasma dos mortos, espectro e, somente em seguida,
imagem, retrato”. Designada por toda a potência do ser, a imagem do duplo – de
viés religioso, artístico e financeiro, para citarmos as três idades do olhar: logosfera,
grafosfera e videosfera, propostas por Debray (1993) – é “a busca fantástica da
construção do homem pelo homem” (MORIN, 2001, p. 33).
28
instintos, orientam as emoções”, e ainda
qual de nós não se viu várias vezes dirigindo-se a um objeto inanimado, por
exemplo, um botão de um colarinho recalcitrante, com a maior seriedade,
atribuindo-lhe uma vontade perversa, censurando-o e injuriando-o por sua
diabólica teimosia?
Em seu livro O imaginário (1998), Gilbert Durand vai propor uma tripartição
estrutural: esquizomorfa ou heróico-mística ou participativo-sintética ou, melhor
ainda, “disseminadora”. (DURAND, 1998, p. 81), que, para ele, resulta “além da
identidade, uma lógica – ou melhor, uma alógica – do imaginário, seja ele o sonho, o
onírico, o mito ou a narrativa da imaginação” (p. 82).
Para o sociólogo,
29
Aí estão, nas imagens, os bonecos e seus manipuladores, numa relação
mútua de ação e reação, um se apossando da personalidade do outro em uma
imagem dinâmica. O duplo presente na imaginação de quem se dispõe a trocar, e aí
está o homem lúdico.
Falamos de jogo dos bonecos pensando que sua atuação é dessa natureza.
Jogar, tocar, atuar, como na palavra inglesa play e na francesa jouer. O jogo é um
movimento de cataclisma, “um sintoma de uma concepção entrópica do universo”
(FOUILLET, 2010, p. 7), de uma humanidade que joga, considerando como “’jogo’
toda e qualquer atividade humana” (HUIZINGA, 2007, prefácio).
A busca deste prazer é constante, como coloca Huizinga (2007, p. 180), pois
o jogo pode servir para descansar do trabalho, como uma espécie de tônico,
na medida em que dá repouso à alma. Mas o lazer não parece conter toda a
alegria nem todo o prazer da vida. Ora, esta felicidade, ou seja, o fim da
necessidade de lutar por aquilo que não se tem, é o telos.
1
Maffesoli (2010, p. 13) vai citar o jogo solitário praticado pelos esquimós como uma confirmação de que aquele
que joga se insere na comunidade, que com a qual compartilha a tensão, excitação ou relaxamento.
30
O homo ludens, na utilização do termo cunhado por Johan Huizinga (2007, p.
179), está cercado das aptidões e dos apetites do jogo (na filosofia, no direito, na
arte), no qual se pode reconhecer “a existência de um laço indissolúvel”.
Johan Huizinga, que escreveu seu livro Homo Ludens, nos anos 1930, separa
nitidamente a livre expressão do momento do jogo – praticado nas horas de ócio –,
das pressões que o cotidiano imporia, pela seriedade da vida cotidiana, sendo a
brincadeira, para os adultos, uma “função que poderia ser facilmente dispensada”
(HUIZINGA, 2007, p. 10).
Roger Caillois, que debate estes temas na obra Os jogos e os homens (1990),
traz a perspectiva de que o jogo é uma atividade “sem consequências na vida real”
(p. 9), sendo improdutivo, ao mesmo tempo em que livre e criativo. No presente
vivenciado, em que a criação, o prazer, o hedonismo abundam, o jogo afirma, com
sua existência, “radicalmente a posição particular da vida na ordem do mundo”
(FOUILLET, 2010, p. 9) 4. Este mundo, que se relaciona em si mesmo, vai “confiar
na potência intrínseca que o constitui” (MAFFESOLI, 1996, p. 28), seja na
tecnologia, no virtual, no imaginário.
2
“Ainsi, plutôt que d’y voir une quelconque frivolité à l’usage de quelques-uns, avant-garde, bohème artistique,
peut-être serions -nous mieux inspirés de repérer dans ce ludisme un des facteurs essentiels de la vie sociale qui
est en train de (re)naître dans les sociétés contemporaines”. Tradução da autora.
3
Em entrevista aos integrantes do grupo Imagem e Imaginários, da PUCRS, Michel Maffesoli cita o termo latino
“puer eternus” para se referir à sua hipótese que trata da criança eterna. Em 20 de novembro de 2012. Tradução
da autora.
4
“Son existence affirme radicalement la position particulière de la vie dans l’ordre du monde”. Tradução da
autora.
31
“As grandes atividades arquetípicas da sociedade humana são, desde o início,
inteiramente marcadas pelo jogo” (HUIZINGA, 2007, p. 7) – da linguagem, do mito,
como “uma imaginação do mundo exterior” (p. 7), e do culto:
Caillois (1990) propõe uma classificação para o jogo, em quatro formas, que
combinadas ou não, vão sugerir a competição (agôn), a sorte (alea), o simulacro
(mimicry) e a vertigem (ilinx). Estas dimensões do jogo se incluem, ainda, em duas
grandes categorias – ou maneiras de jogar – a paidia, do âmbito da algazarra, da
agitação e do frêmito, e o ludus, que absorve e disciplina a excitação da paidia,
criando regras e disciplinando o jogador 5. O autor alerta para a “intenção
civilizadora” do ludus, que ilustra “os valores morais e intelectuais de uma cultura,
bem como contribuem para determiná-los e desenvolver” (CAILLOIS, 1990, p. 48).
5
Os termos latinos, usados por Caillois (1990) para conceituar as formas de jogo, foram mantidos nos grifos do
original.
32
simulacros: os estáticos (em barro, madeira, metal, pintura ou fotografia) e os em
movimento (figuras bi e tridimensionais, autômatos, robôs e as imagens criadas no
cinema, TV, vídeo ou computador). São maneiras de “exteriorizar atributos do
homem” (p. 43).
De tal forma, cabe-nos citar Gilbert Durand (2002, p. 397), que vai situar os
jogos como um “primeiro ensaio dos mitos, lendas, e contos”, e para quem “a função
fantástica desempenha um papel direto na ação: não há ‘obras de imaginação’ e
toda criação humana, mesmo a mais utilitária, não é sempre aureolada de alguma
fantasia?”. (p. 397)
33
O mesmo se dá com os bonecos, em relação à brincadeira e em relação à
sua representação social. Ele pode ser o suporte do jogo, enquanto brinquedo, “um
objeto manufaturado, um objeto fabricado por aquele que brinca; uma sucata,
efêmera, que só tenha valor para o tempo da brincadeira, um objeto adaptado”
(BROUGÈRE, 2004, p. 62). Pode, ainda, ser uma mídia, um vetor cultural e social,
que transmite, para o adulto e para a criança, certos conteúdos que são “imagens e
representações produzidos pela sociedade que a cerca” (p. 63).
Para Marshall McLuhan (1969, p. 267), “o jogo é uma máquina que começa a
funcionar só a partir do momento em que os participantes consentem em se
transformar em bonecos temporariamente”. Sob esse ponto de afirmação, temos,
pela heterogeinização que desvincula a identidade de um único endereço –
localizado geograficamente, e ainda, de um único estado comportamental, um
personagem na “persona” que joga: um ser manipulável, manejável, com gostos,
desejos e afetos efêmeros e manobráveis, e também onipresentes.
34
solidariedade específica” (MAFFESOLI, 1996, p. 16), um estar-junto que é uma
“religação mística sem objeto particular” (p. 29).
Maffesoli (2012) detém sua atenção para a contingência acidental que reúne
os homens contemporâneos, na virtualidade de suas representações. Falando de
cibercultura, ele lembra que, nos jogos e encontros eletrônicos, a encarnação de
facetas diversas é “expressar um fantasma que lhe é proibido na vida de todos os
dias” (MAFFESOLI, 2012, p. 99). Se essas “fantasmagorias” são “indomáveis”, é
porque “a máscara que vestimos, na verdade, é momentânea. (...) Privilegia o
presente, até mesmo o instante” (p. 100).
“O que foi imagem vai continuar a sê-lo”, aposta Debray (1993, p. 41). A
nossa intuição é a de que estará contida no imaginário a presença lúdica dos
bonecos, seja esta experienciada através de imagens automatizadas que podem
acabar perdidas (tecnicamente), seja pela sombra projetada pela luz do abajur na
qual um pai cria um personagem para distrair um filho.
35
congraçamento de realizações “não remete apenas à simples produção que
reinveste o onírico, a fantasmagoria, o lúdico, a fantasia”, mas também a “uma
remagificação, que amplifica o gozo e a fruição, que permite que se viva várias
vidas, que se viva uma vida surreal dentro do real”.
36
3 ARTICULAÇÕES DO BONECO: TEATRO, ESTÉTICA E MANIPULAÇÃO
Dentre os diversos objetos carregados numa cesta para o culto de Dionísio, à época em que
os mistérios ainda não se encontravam inteiramente assimilados pela polis, um curioso
boneco de engonço se sobressaía: miniaturizado, articulado e rusticamente entalhado em
madeira, esse arremedo da divindade permitia que fosse externalizada sua mais notória
particularidade – ele saltava.
Edelcio Mostaço
Em torno da anima – a animação
Huizinga (2007, p. 156) aponta para uma “tendência inata do espírito”, que fez
com que a atitude lúdica estivesse “presente antes da existência da cultura ou da
linguagem humana”. As imagens, propõe Debray (1993), durante muito tempo, eram
referência mútua de “figurar” e “transfigurar”.
37
No Ocidente6, para o qual se volta este estudo, as performances teatrais com
o uso de bonecos remontam dos ritos religiosos e culturais do Egito, Grécia e Roma,
na “personificação dos deuses e dos espíritos sob uma forma animal” (HUIZINGA,
2007, p. 156). Para o homem primitivo, “a comunicação entre diferentes
manifestações de vida, entre o mundo vegetal e o mundo animal, não era nenhum
fenômeno estranho” (AMARAL, 1996, p. 27).
Para McLuhan (1969, p. 266), “a Arte, como os jogos, tornou-se uma catarse
e um eco mimético da velha magia de envolvimento total”. Ditos de eterno retorno
hegeliano, adaptados às culturas ocidentais do olhar influenciadas pelas revoluções
técnicas (Debray), de conhecimento em espiral, de um tempo que retorna
(Maffesoli).
sem nos prendermos muito aos termos, é aqui importante destacar este
animismo social que vivifica tudo aquilo que o cerca. Deus ou Máquina, é
sempre um deus ex-machina que serve de prótese à nossa existência e
que, de um modo mais ou menos consciente, nos integra num circuito
amplo e complexo (MAFFESOLI, 1985, p. 142).
6
Já no Oriente, com destacada ocorrência na Índia, Indonésia e China, está o teatro de sombras, tendo como
característica a temática divina, com ênfase no misticismo e no inconsciente, aproximando-se de um estilo
cerimonial de representação (AMARAL, 1996, p. 75). O papel da sombra, associado ao duplo, na captação
mecânica e técnica da imagem artística – na fotografia, no cinema – é, para Morin (2001), determinante como
analogia criativa. Discorreremos mais sobre o assunto da sombra no capítulo referente ao cinema de animação.
38
3.2 A RESPEITO DE UMA HISTÓRIA DO TEATRO DE BONECOS
Por volta do século 5 a.C., os bonecos aparecem nas farsas mímicas gregas,
que tinham uma temática mundana, sem uma necessária evocação aos deuses, nas
quais se apresentavam marionetes que imitavam os autores das peças. Nessas
montagens, conforme Sussman (2001), a presença de deuses ex-machina resolvia a
estória. A constituição técnica desses personagens aproximava-se de uma
estatutária autômata primitiva, com mobilidade baseada no uso de articulações e
contrapesos, como indicado pelo matemático Heron de Alexandria.
Figura 1: Maccus
Desenho do personagem romano
Fonte: http://www.theworldthroughwoodeneyes.co.uk/punch.html
39
Já durante o Império Romano, a interpretação realizada pelas atelanas 7 um
tipo de farsa popular na Roma antiga, era originalmente feita de improviso, e nelas
se podia distinguir a presença de personagens-tipo, geralmente mascaradas (não
maquiadas como acontece na comédia e na tragédia), como o estúpido Maccus, o
avarento Baccus, o parasita Dossenus, segundo Amaral (1996, p. 102). De conteúdo
satírico e político, esse gênero de teatro vai influenciar “nos tipos da commedia
dell’arte, e que por sua vez se transformaram depois em personagens do teatro de
bonecos popular europeu” (AMARAL, 1996, p. 102).
No medievo, a comédia usual é uma trama que começa mal e acaba bem,
tendo um roteiro apresentando “normalmente cinco pessoas, um marido, uma
esposa, um amante, um amigo, e um escravo” (NICOLL, 1963, p. 175). Os
personagens dividem-se entre os sérios, aqueles que atuam com vestes normais e
com o rosto descoberto, e os cômicos, que usam máscaras, caracterizadas com
“nariz grande, olhos pequenos, sobrancelhas enrugadas, cabeças carecas” (p. 233).
7
Atelana é uma representação teatral romana, farsesca, que tem o nome derivado da cidade de Atella, em cujo
teatro os próprios moradores apresentavam-se, usando máscaras para não serem reconhecidos. O estilo vai se
espalhar pelo império e influenciar os espetáculos cômicos nos séculos seguintes. Fonte:
www.prosoponteatro.com
40
Tem-se então a descrição de protagonistas, tais como o Arlequim, a Colombina e o
Polichinelo, tornados clássicos pelo teatro italiano da comédia.
8
Molière é o nome artístico de Jean-Baptiste Poquelin (1622 – 1673). Dramaturgo, ator e diretor, usou de humor
para criticar governo e costumes do seu tempo, através da comédia satírica. São de sua autoria as peças
Tartufo, As Eruditas e O Doente Imaginário. Com inspiração na comédia italiana, suas histórias têm na estrutura
os personagens dos servos, dos patrões, dos apaixonados.
41
Com uma grande circulação na Europa, as trupes de bonequeiros
reinterpretavam narrativas cotidianas através do teatro de bonecos. Como exemplo,
pode-se citar o personagem Punch, de origem predominantemente inglesa, um
personagem trapalhão, histriônico e agressivo, corcunda e barrigudo, surgido pela
necessidade do advento de um herói local, ou até mesmo nacional (BELL, 2005, p.
18). Em 2012, Punch comemorou seus 350 anos de existência. O boneco, relata
Amaral (1996, p. 111), estreou no Convent Garden, em 1662, pelas mãos do
marionetista Pietro Gimondi.
42
Figura 4: Punch enfrenta o crocodilo
Imagem de montagem do espetáculo, por volta de 1910, pelos irmãos Jesson
Fonte: http://www.theworldthroughwoodeneyes.co.uk/punch.html
O palco do teatro possibilita, como nos diz Rancière (2012, pp. 126-127), um
lugar privilegiado para a representação, por ser um “espaço de manifestação
inteiramente dedicado à presença” e onde a realidade de uma ação é “idêntica à sua
irrealidade”. O teatro alimenta o imaginário popular, “dos contos de serão, narrações
de saltimbancos, da tradição oral” (MORIN, 1987, p. 59), dando uma “irrelevante
compensação, um agradável e imaginário escape para as inclinações ilícitas que a
43
lei e a opinião pública reprovam e condenam” (CAILLOIS, 1990, p. 104). De tal
maneira que “aclamar o escandaloso e triunfante fantoche é vingar-se, sem grande
custo, da série de obrigações e proibições que a moral lhe impõe, na realidade” (p.
104).
Figura 5: Mamulengo
O nome Mamulengo é uma contração da
expressão mão molenga, usada no Nordeste
brasileiro, para o uso do boneco do luva
(fantoche). Esta cena é da peça Casamento
de Chiquinha muito prazer filha do coronal
João Redondo com Tião sem Sorte -
Mamulengo Alegria / DF
Fonte:
http://confrariadospoetasdejaguarao.blogspot.
com.br/2010/08/festival-internacional-de-
bonecos-de.html
9
O nome do espetáculo refere-se ao casal protagonista, o marido Punch e a esposa Judy.
44
Para Amaral (1996), a trajetória de Pulcinella, através de Nápoles até a
América, chega ao Brasil Colônia, instituindo uma tradição de teatro de bonecos,
desenvolvida especialmente nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste.
45
3.4 SOBRE AS TÉCNICAS DE MANIPULAÇÃO
46
ilusão de que aquele boneco age por si mesmo, descreve Amaral (2007). Ora, ele
atua daquela forma porque é manipulado, porque está sendo controlado pela força
motora de um homem, mesmo que este bonequeiro não seja visível.
47
Figura 9: Stephen Kaplin
Puppet Tree11 - Fonte: BELL (2001)
11 Os números representam (1) Caco, dos Muppets (2) A Face de Deus, do diretor Peter Schumann, que requer
8 manipuladores (3) Uma figura de sombras Kayon, da cultura do Wayang da Indonésia, e que representa a
árvore da vida (e a árvore de bonecos) (4) Um dalang da Malásia. Este mestre bonequeiro opera sozinho todos
os personagens de narrativas como Mahabharata e Ramayana (5) Mãe Terra – uma figura gigante do grupo
Bread and Puppet Pageant, que necessita de todo o elenco da Companhia para manipulá-la. As imagens 4 e 5
representam os extremos da dimensão da quantidade de performers por objeto manipulável. (6) Um dueto
romântico com fantoches (7) Boneco do Bunraku japonês, e seu bonequeiro (8) Fausto, representado por uma
antiga marionete tcheca (9) Boneco de massinha para stop-action dos Aardman Studios (do filme Wallace and
Grommit). Eles são manipulados no espaço de tempo entre os disparos da filmadora (10) Armadura de
dinossauro para stop-action do filme Caveman (1981). Estes bonecos eram bastante comuns antes do advento
da animação por computação gráfica (11) Dois dinossauros mecânicos do filme Jurassic Park (1993), operadores
via computador (12) Luvas sensoras de movimento para manipulação virtual (13) Manny Calavera, astro do jogo
de computador Grim Fandango (LucasArts), representante do futuro digital dos performing objects (14)
Manipulação por controle-remoto desenvolvida para a Martian Sojourner da NASA, que representa o extremo
possível de manipulação à distância da tecnologia atual (KAPLIN, in: BELL, 2001, p. 20 e 21).
48
O pesquisador Steve Tillis, na análise Toward An Aesthetics of The Puppet
(1992) cita o pensamento de dois bonequeiros americanos do século 20: Paul
McPharlin e Bill Baird. Ambos os artistas descreveram os bonecos como criaturas
passíveis da manipulação. McPharlin definiu o boneco como “uma figura cênica
movida sob o controle humano” (TILLIS, 1992, p. 17), e Baird o classificou como um
“ser inanimado que é levado ao movimento através dos esforços do homem” (p. 17).
49
Por ser uma representação, o boneco tende a ser o personagem das
narrativas no qual a crítica está mais presente, mesmo que não deflagrada de
maneira direta, dando suporte a conteúdos de publicidade, filmes, jogos, obras de
arte, histórias em quadrinhos e programas de televisão, em imagens que são
manipulações de técnicas, tecnologias e conceitos.
50
Bell (2005, p. 7) nos dá uma listagem desses usos:
Na virada dos anos 1800 para os anos 1900, o uso do teatro de bonecos
como ferramenta didática era “uma espécie de instrumento de boas maneiras, com
refinamentos e conceitos morais” (AMARAL, 1996, p. 117), acompanhando as
normas de uma estruturação pessoal, que Maffesoli (1985, p. 156) determina como
um “imperativo categórico dificilmente evitável”.
12
O gênero de teatro de vaudeville foi popular nos Estados Unidos e no Canadá, entre os anos 1890 e 1930. As
apresentações eram uma mescla de diversos estilos, e contavam com números teatrais, quadros cômicos, de
acrobacias e malabarismo, participações de animais em cena, exibições de pessoas com deficiências físicas, em
esquetes conhecidos como freakshows, além de pequenos filmes cinematográficos, tudo isso exibido dentro de
salas de espetáculos. Pode-se reconhecer estruturas semelhantes desde os anos 1700, quando, na França,
começaram a surgir atrações músico-teatrais, baseadas na figura dos menestréis, chamadas de comédia em
vaudeville. O nome provém, possivelmente, da expressão em francês voix de ville, a voz da cidade ou região.
Outros exemplos de shows similares, anteriores ao vaudeville, são o cabaret francês (o Moulin Rouge é
destaque no gênero, a partir de 1889), no qual o principal chamariz eram os números sensuais com mulheres; o
music hall inglês (os artistas faziam suas performances no palco e os consumidores sentavam-se em um espaço
de mesas, em um esquema conhecido como song-and-supper, a partir de 1830), e nos Estados Unidos, os
minstrels shows (shows musicais e de variedades, cujos performers pintavam o rosto de negro, e que era comum
com o fim da Guerra de Secessão, em 1865) e o american burlesque (que, a partir de 1850, atraia a plateia com
comediantes e stripteases femininos).
Quando o teatro de vaudeville se espalha pela América do Norte, seu principal concorrente é o teatro de revista,
mais elitizado nas temáticas e nos valores dos ingressos (se o vaudeville custava 0,15 centavos de dólar, para o
teatro de revista era cobrado cerca de 5 dólares). O mais reconhecido dos espetáculos americanos desta época
é Ziegfeld Follies, criado por Ziegfeld Florenz, em cartaz na cidade de Nova York, entre 1907 e 1931, e
precursor, por seus atrativos cênicos grandiosos, no que se conhece hoje como os musicais da Broadway. Na
França, o destaque é da casa de shows Folies Bergère, que ainda hoje se encontra operante, e que, nos
primeiros anos do século 20, tinha como atração principal a vedete Josephine Baker.
51
bonecos são caracterizados como “arlequins, palhaços de rosto pintado, e notáveis
acrobatas”, em shows que “fizeram milhões rirem”, como garantem os cartazes da
época (BELL, 2005, p. 27).
Há, então, uma mescla de tradição e inovação, de forma que “novos materiais
trazidos pela indústria se acrescentam aos antigos processos de confecção”
(AMARAL, 1996, pp. 121-124). A iluminação elétrica e a sonorização confere ao
teatro nova amplitude técnica, mas que não deixa de lado as “dramatizações em
estilo ritualístico e imbuídas de religiosidade” (p. 124).
Para Gilbert Durand (1998, p. 35), “os bastões da resistência dos valores do
imaginário no seio do reino triunfante do cientificismo racionalista foram o
Romantismo, o Simbolismo e o Surrealismo”. Nas vanguardas culturais, residia a
“reavaliação positiva do sonho, do onírico, até mesmo da alucinação” (p. 35).
O formato de vaudeville no teatro vai cair em desuso com a popularização dos cinemas e pela crise econômica
desencadeada pela quebra da Bolsa de Nova York, em 1929. A partir dos anos 1950, a mistura de artes no palco
deu origem também ao chamado sistema de dinner theater americano, no qual os espectadores fazem suas
refeições em meio aos números de dança e música. Há, ainda, a partir dos anos 1920, a implantação do
chamado teatro de variedades, muito parecido com o vaudeville, mas conduzido por um mestre de cerimônia
(host). O estilo das apresentações acaba sendo adaptado para a televisão, tornando-se um dos formatos mais
representativos do meio, muito em voga até meados dos anos 1980. O programa Ed Sullivan Show, da rede
americana CBS, é uma marca do show de variedades, recebendo uma miscelânea de atrações, de Beatles aos
Muppets. Um programa de variedades tem geralmente uma longa duração (mais de duas horas), assistido por
uma plateia, sendo dividido por quadros, que envolvem competições por dinheiro, shows de calouros com
talentos variados (cantores, comediantes, dançarinos, animais amestrados), sessões de encontro de casais,
participação de celebridades, além de momentos de interação com o auditório.
No Brasil, o teatro de revista foi uma importante forma de representação teatral e o gênero esteve ativo entre
1859 até os anos 1960. Suas principais características eram a comicidade do texto e a versatilidade musical,
incluindo os ritmos brasileiros, como o samba e as marchinhas, nos espetáculos. Muitos filmes nacionais, nas
décadas de 1940 e 1950, seguiam a fórmula, principalmente as produções estreladas por Oscarito, Grande Otelo
e Zé Trindade para a companhia cinematográfica Atlântida. A vertente brasileira do teatro de revista termina por
se desdobrar na comédia escrachada, nas apresentações de nudez total e no chamado besteirol (já nos anos
1980). Quanto aos programas de variedades televisivos, pode-se destacar as produções encabeçadas por
Abelardo Barbosa, o Chacrinha (1907-1988), como Discoteca, Buzina e Cassino do Chacrinha, nas TVs
Excelsior, Bandeirantes e Globo. Estas atrações continham muito do burlesco, do popularesco e do kitsch,
marcantes do gênero teatral de vaudeville (Chacrinha, inclusive, cunhou a frase “na televisão, nada se cria, tudo
se copia”). Atualmente, a programação dominical do canal SBT é um exemplo de programas de variedades, pois
intercala vários segmentos, comandados por Sílvio Santos e outros apresentadores, durando normalmente das
11 horas da manhã até a meia-noite.
52
Trazendo a inspiração do movimento Surrealista, Marcuse (1975, p. 136)
lembra que o fazer artístico está impregnado pela “divagação, a atividade lúdica, o
‘fluir da consciência’”. De tal forma que
com os Românticos do início dos anos 1800, que viam emoção e intuição
como equivalentes à razão; continuando através de manifestações como o
Movimento de Artes e Ofícios, que valorizava o papel das manufaturas
tradicionais na era do design industrial; e culminado com os Simbolistas do
final do século 19, que enfatizavam estados internos da mente sobre o
naturalismo.
Surge daí, para Amaral (1996, p. 124), uma tendência que funde o ator, a
mímica e o teatro de bonecos com as artes plásticas, a música e a cenografia,
criando uma nova linguagem, o teatro de animação.
Uma hibridização das formas animadas que é feita aos moldes das colagens,
tratando de “reunir, num mesmo gesto, formas e conteúdos que, mesmo
encontrando-se dispersos nem por isso deixam de fazer parte da estrutura mundana
em uma dada época” (MAFFESOLI, 1985, p. 146).
53
Assim, volta à tona, na ficção dos bonecos e suas metamorfoses entre
suportes e mídias, “o essencial da trama social” que, para Maffesoli (1985, p. 156),
são “os rituais cotidianos, as práticas anódinas do habitar, do deambular, do ‘bater
papo’, do amar, do bancar o esperto”. Enfim, conclui ele, “a carga mítica que move a
socialidade de base” (p. 158).
Com essas afirmações, percebemos que, na mídia dos filmes, dos programas
de televisão, dos comerciais, e também na internet, temos – como lembranças
pueris ou surpresas maduras – bonecos apresentando telejornais (Les Guignols de
l'info, na França), bonecos ensinando (Vila Sésamo, em mais de 120 países),
bonecos recitando sacanagens (Marcelinho lendo contos eróticos, no Brasil).
54
Figura 11: Marcelinho lendo contos eróticos
(Brasil)
Fonte: AltaCúpula Vídeos
Para Morin (2001, p. 36), essa magia é polarizada, entre o duplo, dissolvido
pelo reflexo, sombra, fantasia, e o que ele chama de “imagem-emoção, prazer,
curiosidade, sonho, sentimento vago”. Uma imagem localizada numa “zona
sincrética, fluída, que se chama domínio do sentimento, da alma e do coração” (p.
36), uma imagem presencial, “carregada de uma qualidade latente de tempo
reencontrado”.
55
3.6 FALANDO SOBRE OS BONECOS
Somente julgamos os seres por analogia em relação a nós mesmos. Tal é a origem dessa natural
propensão dos homens a personificar os seres, mesmo os inanimados, a atribuir-lhes um modo de
existência semelhante àquele que o homem em si mesmo pressente.
Henri Dontenville
56
Figura 13: Emília
A personagem Emília, do Sítio do Picapau Amarelo, em ilustração
de Manoel Victor Filho para o livro A Reforma da Natureza (editora
Brasiliense, 1972), de Monteiro Lobato.
Fonte: http://desenhossitio.blogspot.com.br
Nesse rápido rol de produções, percebemos que muito das inspirações dos
roteiros cinematográficos e televisuais apostam em adaptar, parodiar e recontar
algumas dessas histórias nos quais os bonecos figuram.
A última peça escrita por Shaw foi para o teatro de bonecos. Em Shakes vs.
Shav, de 1949, o irlandês é transformado em boneco, colocando-se em cena numa
disputa argumentativa contra William Shakespeare. No roteiro, o boneco Shav
57
defende, e prova, por meio de uma batalha, que os personagens de Rob Roy, texto
de Walter Scott, são mais valentes que os de Macbeth, de Shakespeare.
Outro admirador do teatro de bonecos foi o alemão Heinrich von Kleist (1777-
1811). Contista, poeta e dramaturgo, Kleist escreveu tragédias e comédias, muitas
das quais adaptando o estilo cômico de Molière. Entre suas peças mais conhecidas,
está A Bilha Quebrada.
13
Tradução da autora, do original:
Peace, jealous Bard,
We both are mortal.
For a moment suffer
My glimmering light to shine.
Fonte: wikilivros.
58
Rilke reflete sobre a alteridade da nossa condição, dizendo:
Falando no “ator que anima os títeres”, o autor, na Quarta Elegia (1972, pp.
22-23), vê a força do homem deslocada do mundo, precisando de um objeto que o
oriente:
59
miscelânea de artefatos que iam de animais empalhados como jacarés e serpentes
– exóticos para a época e local – até exemplares de arte étnica africana e asiática.
Configurados como o poderio de determinado rei ou nobre, a posse dos autômatos
expandiu-se ainda para os jardins e solários, com réplicas das estátuas hidráulicas
sendo instaladas em grutas.
O ser humano, entendido como máquina, para depois ser perseguida a utopia
da máquina com características humanas, não apenas no feito corporal – pele,
cabelo e cartilagens – mas com racionalidade mental e sensibilidade emotiva, quase
sempre apresentado como figura feminina ou proveniente de uma terra distante.
60
O corpo com um objeto mecânico foi substituído pela máquina como um
objeto corporificado. Se no homme-machine a imagem da máquina era
idêntica com a do corpo humano, então as consequências dessa
objetivação tornaram-se manifestas na imagem da máquina viva: a
separação do corpo do sujeito (...). A racionalidade do mundo da máquina
se transformou em uma mitologia (ASENDORF, 1993, pp. 44-45).
61
O grande truque do Automaton Chess Player pode ser descrito como “um
homem dentro de um homem”. Enquanto o apresentador exibia as partes que
constituíam o interior mecânico do aparato, a pessoa que operava o jogador de
dentro cumpria uma sequência de posições para se esconder, sendo ocultada por
um jogo de espelhos e metais. As jogadas realizadas de dentro pelo manipulador
eram combinadas entre o controle do braço do Turco e os movimentos das peças
que haviam sido magnetizadas 14.
Como podemos ver, o uso dos bonecos se manteve “fiel aos temas
melodramáticos (disfarces, sósias, gêmeos), herdeiros da mais antiga e universal
tradição do imaginário (a tragédia grega, o drama elisabetano)” (MORIN, 1987, p.
60). Popularizando-se, foi também alvo de abordagens filosóficas e ficcionais, na
literatura, no teatro, em textos críticos.
14
Sussman (2001) não deixa de perceber o truque do autômato como prenúncio da tecnologia que iria levar o
campeão mundial de xadrez, o russo Garry Kasparov a enfrentar o computador Deep Blue e perder a partida, em
1997.
62
Seguimos agora, nos próximos capítulos, para o campo da comunicação de
massa, que através do cinema e, posteriormente, da televisão, adapta as temáticas,
usando os bonecos, “ao quadro urbano moderno” (MORIN, 1987, p. 60), no qual “a
cultura industrial (...) não faz senão investir na corrente do imaginário popular” (p.
60). Mas antes, apresentamos uma tabela remissiva dos períodos do teatro que
abordamos nesta parte do trabalho, vinculando e exemplificando com imagens o
boneco na referida manifestação artística.
Na página seguinte:
63
64
4 FILMES DE ANIMAÇÃO
Animações não são apenas “interpretações de sonhos”, na perspectiva freudiana de realidade, mas
também uma interpretação de realidade dentro da perspectiva do sonho.
Richard Weihe
15
A técnica de pixilation consiste em filmar, um quadro por vez, personagens ou objetos, cujos movimentos são
controlados inteiramente pelo cineasta. Usada desde os anos 1900, por Segundo de Chomón e Émile Cohl, a
autoria do termo pixilation é atribuída ao diretor Grant Munro, que atuava no National Film Board, do Canadá.
Norman McLaren usou essa técnica em Neighbours (1952), uma fábula anti-guerra vencedora do Oscar de 1952,
bem como em A Chairy Tale (1957) e Opening Speech (1961), dois filmes onde as histórias giram em torno da
recusa de objetos do cotidiano (uma cadeira e um microfone) que se negam a se comportar como o esperado.
(Fonte: www.nfb.ca)
65
não são virtuais – como no desenho animado –, e sim, reais. Para cada instante
editado, um movimento físico-espacial do objeto deve ser retratado.
16
Eadweard Muybridge (1830-1904), fotógrafo inglês, conhecido por seus experimentos com o uso de múltiplas
câmeras para captar o movimento. Muybridge é reconhecido por ter resolvido um duradouro debate sobre o
movimento e locomoção animal, mostrando, através de seu mecanismo de fotografias quadro a quadro, que as
quatro patas de um cavalo saem do chão durante o galope. Atualmente, tem-se agregado ao trabalho de
Muybridge a influência do cientista Étienne-Jules de Marey (1830-1904). Muybridge visitou o estúdio de Marey,
que trabalhava na França com a chamada “photographic gun”, e viu estudos de stop-motion, antes de retornar
aos Estados Unidos, para promover seu próprio trabalho na mesma área. Já a pesquisa de Marey auxiliou, em
1885, no desenvolvimento do filme fotográfico à base de emulsão de gelatina de brometo de prata,
comercializado por George Eastman (Kodak). Por seus experimentos, ambos ficaram conhecidos como
chronophotographers, ou fotógrafos do tempo. Fonte: Watch me move.
17
O zoopraxiscópio, dispositivo para projetar os retratos de movimento, seria o precursor da película de celulóide
que é usada ainda hoje em animação 2D. Em 1888, Muybridge propôs uma associação do zoopraxiscópio e o
aparelho de captação de som de Thomas Edison, o fonógrafo. Temendo complicações pela estrutura do
zoopraxiscópio, Edison não aceitou a parceria, e desenvolveu, ele mesmo, o kinetoscópio, que podia gravar e
reproduzir objetos em movimento. A primeira exibição do equipamento aconteceu em 1983, nos Estados Unidos.
Fontes: Watch me move e http://memory.loc.gov/ammem/edhtml/edmvhist.html.
66
equipamento capaz de exibir imagens em movimento” (WELLS, 2011, p. 18), o que
acontece a partir de 1892, em Paris, três anos antes da estreia do cinematógrafo
dos Irmãos Lumière. No Théâtre Optique, figuravam, em movimento, mais de 500
desenhos individuais, pintados em uma banda de couro, quadro a quadro, no que
poderia ser chamado de cartoons primitivos.
18
Os Irmãos Lumière são Auguste Marie Louis Nicolas (1862-1954) e Louis Jean (1864-1948).
19 O dispositivo é descrito em detalhe na patente de 13 de fevereiro de 1895, publicada conjuntamente pelos
irmãos Lumière, como de costume, embora fosse Louis, que tenha encontrado o seu princípio. Este princípio
está resumido no preâmbulo da patente: "o mecanismo deste dispositivo tem por característica essencial a ação
intermitente de uma fita regularmente perfurada de maneira a imprimir deslocamentos sucessivos separados por
períodos de descanso, durante o qual se opera sobre a impressão, gerando a visão dos testes". É,
essencialmente, um processo muito semelhante ao de uma máquina de costura, que faz sucessivamente
avançar e parar o tecido, enquanto o ponto é feito. Fonte: http://www.institut-lumiere.org/patrimoine_index.html.
20
Em 28 de dezembro de 1895, no Salão Indiano do Grand Café de Paris, a primeira sessão de cinema continha
os seguintes títulos (mantidos em francês):
1. La Sortie de l'Usine Lumière à Lyon (46 segundos),
2. Le Jardinier (l'Arroseur Arrosé) (49 segundos),
3. Le Débarquement du Congrès de Photographie à Lyon (48 segundos),
4. La Voltige (46 segundos),
5. La Pêche aux poissons rouges (42 segundos),
6. Les Forgerons (49 segundos),
7. Repas de bébé (41 segundos),
8. Le Saut à la couverture (41 segundos),
9. La Places des Cordeliers à Lyon (44 segundos),
10. La Mer (Baignade en mer) (38 segundos).
Fonte: http://www.institut-lumiere.org/francais/films/1seance/accueil.html
67
Segundo Aumont (2011, p. 89), o cinema poderia ter se tornado um “elemento
de investigação científica, um instrumento de reportagem ou de documentário, um
prolongamento da pintura”. Mas o destino do cinema deu realce a sua “vocação de
contar histórias por procedimentos específicos” (p. 89).
21
Diz-se que Méliès estava presente já na primeira exibição promovida pelos Lumière (MALTHÊTE, 2008).
68
Os elaborados roteiros de esquetes de Méliès dão conta de que seus “temas
cinematográficos serão geralmente os do teatro de ilusão e dos espetáculos de
lanterna mágica e por conta disso, a cinematografia será para ele apenas outra
maneira de praticar o ilusionismo” (MALTHÊTE, 2008, p. 14). Com isso, Morin (2001)
assinala que as duas caras da revolução do espetáculo e da transformação do
cinema, empreendidas por Georges Méliès, são a trucagem e a fantasia, que
surgem justamente da “mais realista das máquinas”.
Remetendo ao Regador regado, uma das mais célebres filmagens dos Irmãos
Lumière, Morin (2001) acusa-os como realistas absolutos, ao passo que Méliès abria
a tela para “espectros que surgem em sobreposição com uma espontaneidade
perturbadora, como se inscrevesse o cinematógrafo na linha dos espetáculos de
sombra” (p. 52), lembrando as experiências de Athanasius Kircher com a lanterna
mágica, nos anos 1600.
69
do cinema como um suporte para contar histórias tem, para Xavier (1984),
correspondência com a “ilusão de continuidade (...), condição para a similaridade
entre a tela do cinema e o mundo” (p. 89).
70
Como exemplos, podemos citar os esquetes de Méliès, muitos dos quais
serviam para a demonstração de truques de mágica, com enredos levemente
diferentes, ora situados no Oriente exótico, ora em períodos medievais europeus.
Também podemos perceber que, apesar da falta de intrigas ou até mesmo
personagens, animações, como as produzidas por Norman McLaren, Synchromy
(1971) ou Blinkity Blank (1955), para elencar algumas, são extremamente
envolventes, criando sensações e abrindo possibilidades de que se interpretem
narrativas visuais.
71
para o inconsciente e para o estranho, para a loucura internalizada e para medos
mais profundos, a dominação por conta do estrangeiro e a revolução popular
nascida do individual.
73
Para tratarmos das aparições dos bonecos nas telas dos cinemas,
escolhemos citar alguns diretores que, convergindo o teatro e as possibilidades de
trucagens e criações da nova tecnologia, criaram filmes e histórias nas quais
personagens e técnicas de manipulação constroem a linguagem e a estética do que
hoje conhecemos por cinema de animação.
74
Na Espanha, o diretor Segundo de Chomón (1871-1929) trabalhou com filmes
de atores (live-action), com efeitos de trucagens em stop-motion e pixilation (em
especial, movimentos de objetos inanimados, como malas, escovas, roupas). Suas
obras são repletas de elementos fantasmagóricos, como objetos que se movem
“sozinhos”, brincadeiras infantis com bonecos que ganham vida, móveis que
desaparecem, assombrações e monstros, sendo um destaque de sua produção o
filme El Hotel Eléctrico (1908).
Outro destacado criador de filmes de animação, a partir dos anos 1920, foi
Oskar Fischinger (1900-1967). Baseados principalmente em música, seus filmes
eram conhecidos como visual music, como em An Optical Poem (1937). Realizou
experimentos diretamente na película (animação em celuloide), o que chamou de
abstrações cinemáticas. Seu trabalho inspirou Norman McLaren e o trabalho vídeo-
musical do compositor norte-americano John Cage (1912-1992). Fischinger
trabalhou, ainda, com efeitos especiais de ficção científica, como no longa alemão
Woman in the moon (1928, dir: Fritz Lang).
75
Figura 22: An Optical Poem
Filme de Oskar Fischinger, 1937.
Fonte: www.robotmafia.com
O animador Jiri Trnka (1912-1969), que foi chamado de Walt Disney do Leste,
era ilustrador, desenhista e designer de bonecos. Por sua obra, ele recebeu um
prêmio no Festival de Cannes, de 1946, e o troféu Hans Christian Andersen de
literatura infantil, em 1968. Trnka foi responsável por filmes como The Emperor’s
Nigthingale (1949) e Sonho de Uma Noite de Verão (1959). Responsável pela
instituição do departamento de animação do Film Studio de Praga, seu último filme,
A Mão (1965), foi banido pelo governo comunista da República Tcheca. A Mão é um
libelo filmado, com crítica contra os regimes totalitários que impedem a livre criação
e expressão artística.
76
Já Jan Švankmajer (n. 1934) é um cineasta, especialista em animação stop-
motion e artista ligado ao movimento Surrealista. Produziu obras com conteúdos
polêmicos, chegando a ser banido da República Tcheca nos anos 70. Entre suas
obras-primas, estão Punch and Judy (1966), Dimensões do Diálogo (1983),
Conspiradores do Prazer (1996), Alice (1988), Darkness/Light/Darkness (1989),
Down to the Cellar (1983) e Faust (1994). Sua obra é referência para cineastas
como Tim Burton (Frankenweenie, 1984-curta, 2012-longa), Terry Gilliam (As
Aventuras do Barão de Münchausen, de 1988) e os Irmãos Quay (The Cabinet of
Švankmajer, de 1984).
77
grande sucesso pela Pixar (hoje também de propriedade da Walt Disney Co.).
78
recentemente, adquiriu a licença das histórias e produtos da saga Star Wars.
79
objeto no trabalho da animação, suas transformações e aberrações possibilitadas
pelo uso da câmera.
80
George Pal (1908-1980) foi outro artista que teve destacada presença no
cinema, sendo especialista em efeitos especiais e maquiagem. Além de produzir
bonecos de massinha, Pal trabalhava com os aspectos dos rostos e máscaras, com
notório resultado no longa As sete faces do dr. Lao (1964), no qual o ator Tony
Randall interpreta todas as atrações de um circo ambulante.
22
Como saberemos mais no capítulo sobre a análise dos programas, a franquia Muppet conta com 9 filmes em
longa-metragem. A primeira realização, The Muppet Movie, data de 1979, com direção de James Frawley. Fonte:
MuppetWiki.
81
Uma posterior maneira de execução de seres fantásticos e míticos são os
CGI (computer-generated imagery) virtuais. Inúmeros personagens animados – por
mecânica, eletrônica ou computação – aparecem no cinema, sobretudo, nos
gêneros de ficção científica, aventura e terror. Temos, entre vários, Jabba, the Hutt,
o gordo vilão alienígena de Star Wars – O retorno de Jedi (1983, dir: Richard
Marquand), os robôs da franquia O exterminador do futuro (1984, 1991, dir: James
Cameron), o assustador monstro de Tubarão (1975), o simpático ET – o
extraterrestre (1982), e os dinossauros de Jurassic Park (1993), esses três últimos
dirigidos por Steven Spielberg23.
23
Não por acaso, a maior parte destes títulos acima citados teve seus efeitos especiais criados pela empresa
Industrial Ligth and Magic, com exceção de Tubarão (que teve o boneco animatrônico criado pelo produtor Joe
Alves e pelo supervisor de efeitos mecânicos Robert Mattey). Especializada em efeitos eletrônicos e digitais,
desde que foi fundada em 1975, pelo cineasta George Lucas, a companhia começou se destacando pelo
desenvolvimento da motion control photography, para atender as exigências de produção do longa Star Wars IV:
Uma nova Esperança (1977). Junto com o técnico John Dykstra, a equipe da ILM desenvolveu um sistema de
câmera que podia ser controlada para gravar e reproduzir, através de uma pré-programação, os mesmos
movimentos de câmera repetidas vezes, como a panorâmica, o foco, e as mudanças na abertura da lente.
Para o longa O Dragão e o Feiticeiro (1981, dir: Matthew Robbins), a empresa trata de minimizar as
desvantagens de estilo e de tempo de produção em stop motion, desenvolvendo o processo chamado de Go-
Motion, que operava na fusão de ambos os componentes eletrônicos e mecânicos da câmera, em um dispositivo
que poderia gravar os movimentos do dragão com base no design de um animador e reproduzi-los de volta para
a câmera, que iria capturá-los como eles ocorreram. Já em 1985, a IML cria o primeiro personagem totalmente
animado em CGI, o chamado "homem de vidro manchado", no longa O Enigma da Pirâmide (dir: Barry
Levinson). Ainda nos anos 1980, a Kodak e a ILM criam em parceria o primeiro scanner de entrada
cinematográfica de alta resolução. Com o dispositivo, o filme poderia agora ser digitalizado, manipulado dentro
do computador e transposto de volta à película, sem a perda de geração associado com métodos ópticos. Alguns
anos mais tarde, a descoberta de um processamento de imagem digital, chamado morphing, permitiu que uma
imagem fosse progressivamente alterada para se transformar em outra imagem, sem cortes, em um efeito que
combinava muitas técnicas, como bonecos, cenas de ação ao vivo de uma atriz, um tigre real e outros
elementos. O resultado pôde ser visto a partir do filme de fantasia mítica Willow na terra da magia (1988, dir: Ron
Howard).
Entre 1989 e 1992, a Industrial Light & Magic criou o primeiro personagem tridimensional, baseado em líquido,
gerado por computador, com o "pseudópode”, de O Segredo do Abismo (1989, dir: James Cameron). No mesmo
ano, é lançado O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final, também de Cameron, que tem o primeiro
personagem principal incrementado com gráficos de computador, com o robô T-1000, encarnado por Arnold
Schwarzenegger. Em 1992, o filme A Morte lhe cai bem (dir: Robert Zemeckis) marca a primeira vez que a
textura da pele humana foi gerada por computador. Já no ano de 1993, pela primeira vez, a tecnologia digital foi
usada para criar um ser vívido e dotado de movimentos de respiração, pele, músculos, textura e atitude. Essas
criaturas podem ser vistas na série de filmes Parque dos Dinossauros.
Em 2001, a ILM lança a primeira visualização em tempo real interativo on-set, permitindo aos cineastas colocar
atores em cenários virtuais, proporcionando total liberdade de movimentos de câmera. Steven Spielberg usa
esse processo em A.I. Inteligência Artificial. Quatro anos mais tarde, em 2006, para o filme Piratas do Caribe: O
Baú da Morte surge a Imocap - captura de performance on-set, com os efeitos sendo renderizados diretamente
no set de filmagem, em conexão com os atores. E a partir de 2009, os filmes de aventura, como os da série
Harry Potter, contam com elementos de efeitos especiais totalmente criados em CG, como explosões em alta
resolução, devido ao desenvolvimento de softwares de simulação.
Fonte: http://www.ilm.com/
82
4.3 FICÇÕES SERIADAS
Arlindo Machado (2003) aponta que o seriado no cinema entra em cena por
volta dos anos 1910, como resultado das características vigentes no mercado das
salas de exibição. Esse foi um período no qual vigorava ainda o sistema de
apresentações quase ambulantes, em feiras e lonas de circo. Os grandes
cineteatros ainda não estavam disseminados, e os filmes de longa duração –
resultado da capacidade métrica dos rolos de película –, que se adequavam aqueles
salões, apenas começavam a ser distribuídos.
83
“o filme em série permitia atender às duas demandas simultaneamente.
Eram filmes de duração mais longa, que podiam ser exibidos nos salões de
cinema destinados à classe média, mas podiam também ser exibidos em
partes nos nickelodeons, que concentravam o público mais pobre da
periferia”.
84
De acordo com Machado (2003), com cerca de 10 episódios, Les Vampires,
que tratava de bandos de ladrões na França, coordenados pela personagem Irma
Vep, tinha os roteiros improvisados na hora da filmagem, sem um final pré-
concebido.
Assim, nos Estados Unidos, a ideia de criar figuras que fossem recorrentes
85
nas narrativas visava aumentar a audiência e fidelizar o público. Em filmes
prioritariamente de curta duração, aparecem, no campo da animação
cinematográfica, Mickey Mouse, Pato Donald, Pateta e Pluto (entre 1928 e 1938), de
Walt Disney e Betty Boop (1934), de Max Fleischer.
Na página seguinte:
86
87
5 TELEVISÃO E TEATRO DE BONECOS
88
(MACHADO, 2003, pp. 28-29)”. Acessamos, ainda, pela internet, o que nos interessa
a cada momento, e usamos aplicativos para, não apenas ver, mas também veicular
conteúdo, que podemos criar e compartilhar.
89
Importa-nos salientar que, qualquer que seja o aparelho transmissor em maior
uso neste momento, a análise do audiovisual através da observação da ficção segue
representando “um instrumento de indubitável eficácia para entender, também de
forma mais ampla, até onde vão os meios, os usuários e a comunicação em geral”
(VILCHES, 2013, p. 12).
Pretendemos refletir sobre alguns pontos que permeiam a estrutura geral das
programações das redes de broadcasting, com seus programas e faixas temáticas,
para abordarmos como o sistema de produção de conteúdo e formatos sedimenta-
se no que conhecemos por televisão, e para depois vermos como os bonecos fazem
parte deste circuito.
Gerações tiveram a televisão como uma tutora (no Brasil, a partir de 1950),
que fazia companhia, distraia e esperava-se, até mesmo, que ensinasse. De tal
forma que muito do ideário afetivo contemporâneo – as lembranças da vivência da
infância, os projetos de “o que você quer ser quando crescer”, – é perpassado pela
“companhia da telinha”.
90
Longe de estar às ordens do tempo, a memória permite um redobramento
dos instantes e um desdobramento do presente; ela dá uma espessura
inusitada ao monótono e fatal escoamento do devir, e assegura nas
flutuações do destino a sobrevivência e a perenidade de uma substância.
(...) A memória pertence de fato ao domínio do fantástico, dado que
organiza esteticamente a recordação. É nisso que consiste a ‘aura’ estética
que nimba a infância, é o arquétipo do ser eufêmico, ignorante da morte,
porque cada um de nós foi criança antes de ser homem. (DURAND, 2002,
p. 402)
91
As singularidades de cada programa, que faz com ele se distinga dos demais,
costumam-se ser dispostas em condições de gêneros, formatos e temáticas.
Situados em grades de programação, que geralmente apresentam-se por tabelas
diárias de títulos variados, os programas de continuidade, que não se encerram ou
se renovam por temporada, costumeiramente são produzidos em sistemas de
episódios semanais ou então diários. Para Machado (2003, p. 28), as características
contemporâneas das escolhas de programação nas redes dão-se pelo costume da
televisão em
Traçando uma linha do tempo, podemos adiantar que o The Muppet Show
tem sua gênese a partir dos anos 1950, e se consolida como um programa semanal
de variedades, com apresentação de números musicais e quadros humorísticos, em
1977, durando até 1980, prioritariamente pelo canal americano CBS. Já o brasileiro
Pandorga começa a ser desenvolvido em 1988 e segue no ar, costumeiramente com
três emissões diárias, uma inédita e duas reapresentações, de segunda a sexta-
feira. Enquanto o semanal americano Frango Robô é veiculado desde 2005,
entrando, em setembro de 2013, na sua sexta temporada.
92
Começando com The Muppet Show, podemos inscrevê-lo como um herdeiro
das primeiras tentativas de construção de uma linguagem televisiva para os
espetáculos de entretenimento, o que, por analogia, se assemelha à passagem do
cinematógrafo ao cinema, em sua iniciativa de modificações narrativas, muito
determinada por inúmeras tentativas de erro e acerto, até estabelecer-se como um
formato de sucesso. Seu criador, Jim Henson, trabalhava a manipulação de bonecos
na televisão desde os anos 1950, e ao longo de duas décadas, foi construindo e
estabelecendo seus personagens, feito crucial para a identificação do público com o
sapo Caco e sua trupe em cena.
Frango Robô, que começa a ser veiculado pelo canal de TV por assinatura
Adult Swim, atingindo seis países, entre os quais, o Brasil, ganhou, desde seu
princípio, um website próprio, dando ao público a possibilidade de rever quadros e
93
episódios completos, além de manter um canal oficial no YouTube (além de
incontáveis postagens de trechos, feitas por admiradores do show).
24
Roberto Wild fez pós-graduação na ECA/USP e é o autor do artigo Teatro de Bonecos na Era do Virtual (in:
AMARAL, 2007, p. 58).
94
ainda, da implicação da natureza da sombra e do reflexo retidos ali. Deste conceito,
adveio o cinematógrafo, o cinema, a televisão, manifestações herdeiras, para o
autor, da nomenclatura da sombra, do reflexo e do duplo, ou seja, a fotogenia que
permite que “as potências afetivas próprias da imagem mental fixem-se na imagem
saída da reprodução mecânica” (MORIN, 2001, p. 39).
John Bell (2005) cita alguns nomes que foram pioneiros nesse sentido: Remo
Bufano (1894-1948), em filmes como Yolanda e o Ladrão (1945), já a partir de 1939;
Burr Tillstrom (1917-1985), com seu próprio programa de fantoches Kukla, Fran and
Ollie (1947); e Frank Paris (m. 1984), com uma soap opera semanal de marionetes,
As Aventuras de Toby, no canal americano NBC (1947).
95
Figura 33: Kukla, Fran e Ollie
Chamada do programa no canal NBC
Fonte: nbc.com
Pelas questões técnicas, o programa Kukla, Fran and Ollie, por exemplo, era
veiculado sem roteiro definido, com o manipulador operando os bonecos de luva,
posicionado atrás de uma cortina translúcida, assistindo a um monitor para encaixar
os movimentos dos fantoches ao enquadramento da tela (BELL, 2005, p. 91).
96
entrevistas como The Today Show (1952-ainda no ar), The Ed Sullivan Show (1948-
1971) e The Jimmy Dean Show (1957-1975).
97
5.3 TELEVISÃO E BONECOS NO BRASIL
25
Em Porto Alegre, Assis Chateubriand abriu os trabalhos da TV Piratini, canal 5, em 20 de dezembro de 1959.
No dia seguinte à inauguração, o roteiro de exibição mostrava, “das 17h até a meia-noite teleteatros, jornalismo,
shows, esporte e comerciais. Além dos programas locais e dos enlatados fílmicos estrangeiros, circulavam no
Canal 5 programas produzidos no Rio-São Paulo e que eram reprisados nas capitais onde as Associadas tinham
afiliadas, quase sempre com um apresentador local. Mantinham-se os quadros-programa e o elenco (que
semanalmente percorria de avião o país), só que o programa adquiria um tom singular na figura do
apresentador-âncora, especialmente no caso de shows ou entrevistas, nos programas de auditório. Os esquetes
e seriados, de estúdio, às vezes viajavam com toda a equipe; às vezes substituía-se o elenco base por atores
locais e os técnicos eram próprios também” (KILPP, 2000, p. 41). Quanto à programação infantil, a Piratini
apresentava, aos sábados, o Teatrinho Mesbla. O Clube do Guri Neugebauer era transmitido do auditório da
Rádio Farroupilha, aos domingos, na matinê. O fechamento da TV Piratini aconteceu em 1980, junto com a
derrocada de toda a rede dos Diários Associados. A concessão do Canal 5 de Porto Alegre passou ao grupo do
SBT, de Sílvio Santos, atuando como retransmissora da empresa paulista. O prédio onde estava instalada a
Piratini, agora de propriedade do INSS, é reocupado pelas emissoras do estado do Rio Grande do Sul, TVE
(fundada em 1974) e FM Cultura (aberta em 1989), a partir de 1981. Fonte: http://projetores-
yuri.blogspot.com.br/2011/09/tv-piratini-esta-no-ar.html
98
A aposta da televisão brasileira no teleteatro assemelha-se, sem dúvida, ao
que foi feito nos primórdios do cinema, com o teatro filmado. Todavia e, sobretudo, a
inspiração maior para os precursores da TV nacional era o rádio, que seguiu
predominante no gosto da audiência, em parte pelo alto custo dos aparelhos
receptores de televisão disponíveis no país durante a década de 1950, em outra
parte, pela agilidade de transmissão que o veículo radiofônico ainda dominava.
99
e influenciaram o gênero”, afirma Souza (2004, p. 117), ao exemplificar a colocação
com atrações como Vila Sésamo, a versão brasileira, produzida pela TV Cultura,
para 123 Sesame Street – programa idealizado por Jim Henson e que conta com
bonecos muppets – e o próprio O Sítio do Picapau Amarelo.
100
A produção nacional de ficção seriada para o público infanto-juvenil tem,
ainda como destaque, propostas como O Vigilante Rodoviário (Rede Tupi, entre
1962 e 1967), Shazam, Xerife & Cia, (Rede Globo, 1972), entre outros27. O
entretenimento televisivo era garantido, ainda neste período, por produtos ditos
“enlatados”, importados da Ásia, como Ultraman (com exibição ininterrupta no Brasil,
entre 1966 e 1986) e National Kid28 (veiculada no país a partir de 1964 até início dos
anos 1970) e dos Estados Unidos, como Lassie (que foi produzida entre 1954 e
29
1974) e As aventuras de Rin-tin-tin (com episódios realizados entre 1954 e 1959) .
27
Vale destacar que, mesmo não tendo bonecos como protagonistas ou personagens de diversos programas, a
televisão brasileira teve, em seu início, uma forte produção de atrações para o público infanto-juvenil. “Todas as
emissoras que foram sendo inauguradas tiveram seus ‘circos’. Na Tupi de São Paulo, o Grande Circo, com
Walter Stuart no comando, mais o Fuzarca e o Torresmo. Na Paulista e depois na TV Record, o Circo do Arrelia,
e no Rio, o Circo do Carequinha”, destaca Boni (2011). “A TV Globo, quando começou em 1965, (…) também
pensou em uma linha infantil, com o Uni Duni Tê, apresentado pela tia Fernanda, e o Capitão Furacão, do Hélio
Tys, apresentado pelo Pietro Mário, que, além de desenhos animados, trazia muitos conselhos e dicas úteis para
as crianças” (2011, pp. 379-380).
28
Uma série de programas se adequam ao gênero conhecido no Japão como Sentai. Nos anos 1980, os mais
conhecidos no Brasil eram, por exemplo, Jaspion e Changeman. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Super_Sentai.
29
Na programação da TV Tupi, episódios destas séries eram exibidas dentro de atrações diárias, no turno da
tarde, como Clube do Capitão Aza (a partir de 1966) e Clube do Mickey (que apresentava o seriado Zorro).
Fonte: http://redetupitv.blogspot.com.br/
101
Voltado para o público jovem, a Rede Globo apresentou, durante os anos de
1984 a 1987, o programa semanal Clip Clip, que era comandado por dois bonecos,
Edgar Ganta e Muquirana Jones. Os personagens foram concebidos e interpretados
por Luís Ferré e Roberto Dornelles, do grupo gaúcho de teatro de bonecos Cem
Modos. A fórmula consistia em colocar os bonecos, que eram articulados pela
técnica da manipulação direta, com as mãos dos bonequeiros aparentes, em
cenários variados (o Oriente Médio, por exemplo), para chamar videoclipes dos
artistas mais vendidos do momento, de Michael Jackson ao brasileiro Leo Jaime.
Ainda neste período, são exibidas séries nas quais os personagens centrais
são bonecos e robôs, como Alf, o ETeimoso (criada pela rede americana NBC,
estreando no Brasil em 1987), Super Vicky (da rede ABC, no Brasil, chega em 1987)
e, a partir dos anos 1990, a Família Dinossauros (produzida pela Disney, com
conceito e bonecos criados por Jim Henson, e exibida no Brasil a partir de 1992),
todos estes citados em veiculação predominante na Rede Globo. Já no estado do
Rio Grande do Sul, a década de 1980 é marcada pela criação, de um programa
infantil Firulim30, baseado no teatro de bonecos, produzido pela extinta TV Guaíba,
canal 2 de Porto Alegre, atual Record RS.
30
Fundada em 1979, a TV Guaíba coloca no ar o infantil Guaíba Criança em abril de 1981, primeiramente como
programetes de interprogramação, de 2 a 3 minutos de duração, muitos deles executados ao vivo pelo artista
plástico, cenógrafo e ator Elton Manganelli. Mais tarde, a atração passa a ser exibida a partir das 14h30,
preenchendo as tardes com desenhos animados e brincadeiras infantis. Com o formato expandido, entram em
cena os atores Roberto Oliveira e Flávia Aguiar. Oliveira, vestindo uma fantasia desenhada por Manganelli,
transforma-se no personagem Remendão, nome escolhido por votação popular dos telespectadores. O boneco
Remendão, de tamanho avantajado e criado aos moldes de Garibaldo, da Vila Sésamo, torna-se sucesso entre
as crianças que frequentavam os estúdios da emissora para compor a plateia da atração. Alguns anos mais
tarde, entre os anos de 1985 e 1986, a produção da Guaíba concebeu o programa Firulim, todo comandado por
bonecos, manipulados por bonequeiros como Maria Inês Falcão, Ubiratã e Tiaraju Carlos Gomes, Mario de
Ballentti, entre outros. Com mudanças no comando da emissora, a equipe do infantil muda-se para a TVE do Rio
Grande do Sul, fazendo parte da gênese do programa Pandorga. Fonte: Vera Vergo, produtora executiva da TVE
e uma das organizadoras do projeto do Pandorga, em entrevista para a autora, em 20 de novembro de 2013, e
os sites http://avidaeaobra.wordpress.com/2008/10/18/reportagens-remasterizadas-05-o-remendao/ e
http://tv2guaiba.blogspot.com.br/.
102
Em 1993, estreia na TV Globo o que pode ser considerado o mais elaborado
programa infantil com bonecos, a TV Colosso. Partindo da expertise do grupo Cem
Modos no Clip Clip, a emissora lança o programa comandado por cachorros em
substituição ao Xou da Xuxa, que estava há sete anos no ar. O pano de fundo das
histórias é um canal de televisão, no qual os animais se dividem em tarefas como
apresentação, reportagem e produção. O cotidiano de uma redação de TV31 serve
de apoio para as intrigas e romances de personagens como a sheepdog Priscila,
que produzia e era estrela de um programa infantil, o bulldog Borges, que era diretor
de cena, o apresentador de telejornal Walter Gate, entre outros. Os esquetes
serviam ainda para intercalar a apresentação de desenhos animados.
31
Os bastidores de programas de TV são utilizados em diversos outros programas com bonecos. Podem ser
citados exemplos como 31 minutos, do Chile, Le Guignols de la tele, da França e ainda Muppets Tonight, nos
Estados Unidos.
32
Em outubro de 2013, a TV Cultura alega cortes de verbas para fechar o núcleo de produção de programas
infantis. O Cocoricó e seus derivados, como o TV Cocoricó, deixam de ser diários e novos episódios devem ser
feitos por equipes terceirizadas. Fonte: http://noticiasdatv.uol.com.br/noticia/televisao/sem-dinheiro-para-
continuar-no-ar-cultura-corta-nucleo-infantil-476
103
Figura 39: Cocoricó
TV Cultura, 1996
Fonte: tvcultura.cmais.com.br
No Rio Grande do Sul, a Fundação Cultural Piratini, por meio de seu canal de
televisão, a TVE, retransmite muitas destas produções, e produz localmente o
programa Pandorga. Também baseado no teatro de bonecos, há o programa Mundo
da Leitura, produzido desde 2005 pela Universidade de Passo Fundo (UPF), com
transmissão nacional pelo Canal Futura.
33
Segundo informações disponíveis em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,animacao-hi-tech-une-
atores-e-bonecos,1093018,0.htm
104
Figura 41: Mundo da Leitura
Universidade de Passo Fundo/Canal Futura, 2005
Fonte: mundodaleitura.upf.br
Na página seguinte:
105
106
6. ANÁLISE
2. A forma, que é “formante e não formal” (p. 27), e faz emergir a “recusa da
discriminação, quanto ao objeto, ou a rejeição do dualismo, quanto ao método” (p.
26). Aqui encontramos o vigor das “correntes quentes do vivido”, como nos afirma
Maffesoli, para “descrever, de dentro, os contornos, os limites e a necessidade das
situações e das representações constitutivas da vida cotidiana” (p. 26).
4. Uma pesquisa estilística, que nos tem permitido encontrar “um modo de
expressão que saiba exprimir a polissemia de sons, situações e gestos, que
constituem a trama social” (p. 38), fazendo do “saber dizer” polifônico um
procedimento para o “movimento em espiral da reflexão” (p. 39). Uma
correspondência entre a forma e a empatia que facilite, mas que não diminua o rigor
da pesquisa, com a “metáfora e a analogia como elementos centrais da nossa
diligência” (p.38), na qual a experiência societal, disposta pelo autor, é feita de
“gestos, de palavras, de teatralidade, de obras em caracteres maiúsculos ou
107
minúsculos, da qual é preciso que se dê conta” (p. 36).
108
Descrição temporal do uso dos bonecos
nas narrativas da sociedade ocidental
Tabela 6: Descrição temporal do uso dos bonecos nas narrativas da sociedade ocidental. Fonte: a
autora.
109
Objetos de análise:
Programas televisivos com bonecos
THE MUPPET FRANGO ROBÔ PANDORGA
SHOW
110
6.1.1 Os Muppets
34
James Maury Henson nasceu em 1936, no estado do Mississipi, Estados Unidos. Começou a carreira como
bonequeiro para televisão aos 19 anos, ganhando um Emmy em 1958, pelo programa Sam and Friends.
Interpretando a maioria dos bonecos, nos anos 60, ele conquistou a fama para os Muppets aparecendo em
programas de TV, como The Jimmy Dean Show. Ao criar os personagens de Vila Sesamo, Henson abre caminho
para a concretização de um show solo dos Muppets e também para os produtos agregados – filmes, séries e
merchandise. Sua carreira foi marcada ainda por uma constante atuação no cinema, como roteirista e diretor.
Destacam-se trabalhos como o curta experimental Time Piece, indicado ao Oscar de 1965, e os longas O Cristal
Encantado (1982) e Labirinto (1986). Ainda na televisão, ele realizou a série adulta The Cube (1969), o infantil
Fraggles Rock (1983-1985) e concebeu o programa infanto-juvenil Família Dinossauros (1991-1994). O
bonequeiro faleceu em 1990, em Nova York, por conta de uma infecção generalizada. Atualmente, a Jim Henson
Company não tem o direito de usar o nome Muppets, mas segue realizando trabalhos baseados em técnicas e
tecnologias de atuação com teatro de bonecos, como é o caso do filme A Máscara da Ilusão (2005). Fonte: sites
Jim Henson Legacy e Jim Henson Company.
111
de Vila Sésamo35 (123 Sesame Street), no qual os personagens Elmo e Garibaldo
(Big Bird) se destacam.
por causa da maneira que nós decidimos escolher para fazer o show, o que
nós estávamos fazendo era um pequeno espetáculo de vaudeville em frente
a uma audiência em um pequeno palco com coxias. (…) Do jeito que era
gravado, nós podíamos montar e gravar, o que significa que cada peça do
material podia durar de meia-hora a inúmeras horas para gravar, então era
um longo e vagaroso processo. Você não trabalha de verdade em frente a
uma plateia desta forma.
35
O programa Vila Sésamo, que, em 2012, completou 45 anos, com mais de 4300 edições gravadas, é uma
atração concebida pela televisão pública norte-americana PBS e pela CTW (Children’s Television Workshop),
mesclando entretenimento e atividades educacionais, voltadas para crianças em idade pré-escolar. Pioneiro no
gênero por seus elementos multiculturais, como personagens humanos e animados com deficiências físicas,
idosos, diferenças raciais, entre outros, Vila Sésamo tem sido retransmitido em mais de 120 países, sendo
adaptado para realidades locais em outros 20, incluindo o Brasil, no qual chega em 1972. Segundo José
Bonifácio de Oliveira Sobrinho (2011), que foi coordenador dos núcleos de programação da rede Globo, os
direitos do programa para versão brasileira foram adquiridos por ele em nome da Globo, mas, por conta da
extensão do projeto, a produção foi executada pela TV Cultura de SP, que atualmente veicula a série no país. No
RS, Vila Sésamo é apresentada atualmente, aos domingos, pela TVE. Fontes: MuppetWiki e
memoriaglobo.globo.com.
112
shows, como o de David Letterman, para citar exemplos ainda no ar. Outro filão da
televisão dos Estados Unidos são as apresentações de comédia em esquetes e
stand-ups, das quais se destaca Saturday Night Live (1975), não por acaso, um dos
programas que Jim Henson participava, levando seus bonecos.
113
Figura 45: Miss Piggy e Johnny Cash
Fonte: Jim Henson Legacy
114
Figura 46: Statler e Waldorf
Atores vestem os personagens, que são
espectadores ranzinzas do Muppet Show.
Fonte: http://themuppetmindset.blogspot.com.br
36
Forma narrativa japonesa de teatro de bonecos, o Bunraku surge por volta dos anos 1680. Com os bonecos
pesando até 20 quilos, a manipulação exige, no mínimo, três atores/manipuladores. Para praticar a técnica, são
necessários 10 anos de estudo, e apenas interpretam bonequeiros do sexo masculino. As temáticas giram
entorno das tradições do Japão antigo. Fonte: AMARAL (1996).
37
No Brasil, a denominação empanada é usada para descrever o palco elevado, atrás do qual se escondem os
manipuladores, normalmente, nas peças de bonecos de luva. Fonte: AMARAL, 1996).
115
Ao longo de seis anos, o programa Muppet Show atingiu mais de 230 milhões
de telespectadores, sendo retransmitido em 100 países e, como enumera o site Jim
Henson Legacy, ganhando três prêmios Emmy, pelas aparições na TV americana, e
dois prêmio televisivos BAFTA, na Inglaterra. A série rendeu oito filmes 38 no cinema,
projetos de internet, desenho animado, histórias em quadrinhos, um parque temático
na Disney World e incontáveis aparições em todas as mídias.
116
de Junk in the trunk. O show foi indicado e venceu quatro prêmios Emmy, nos anos
de 2006, 2007, 2009 e 2010, nas categorias Outstanding Short-Format Animated
Program e Outstanding Individual Achievement in Animation.
117
Dead (2010) – quando os monstros atacam o criador da HQ que inspirou a série,
Robert Kirkman, e o jovem nerd acaba casando com uma loira zumbi. No site
imdb.com, que atua de forma colaborativa, pode-se encontrar uma crítica de um
usuário, que diz que Frango Robô é “televisão especialmente formulada para a
geração da síndrome do déficit de atenção”.
Dos fundadores da série, quem mais se destaca é Seth Green 40, um ator com
relativo sucesso na carreira hollywoodiana, que estreou na carreira, em 1984, em
séries de televisão e trabalhando com vozes para desenhos animados. Entre seus
filmes, estão as três produções do agente Austin Powers, em 1997, 1999 e 2002,
nos quais interpreta o filho do Dr. Evil (vivido pelo ator Mike Meyers), além de outras
películas, como Um golpe de mestre (2003), a releitura do policial Um golpe à
italiana, estrelado por Michael Caine, em 1969.
40
Green atua em Frango Robô, criando as vozes de inúmeros personagens, e usa sua experiência na indústria
cinematográfica para atrair nomes conhecidos para participarem do programa, muitos deles, no elenco regular,
como Macaulay Culkin, da franquia Esqueceram de Mim (1990), Mila Kunis, do seriado That 70’s Show (1998) e,
mais recentemente, do longa Cisne Negro (2010) e Sarah Michelle Guellar, do seriado Buffy, a Caça Vampiros
(1997). Como convidados especiais, o programa já recebeu músicos, como o rapper Snoop Dogg, e atores como
Mark Hamill, da saga Star Wars (1977), além do diretor George Lucas.
41
O programa não foca na história do Frango Robô até o episódio 100, quando o boneco consegue fugir. Livre,
ele descobre que o cientista que o torturava havia raptado sua namorada, uma galinha. Para salvá-la, Frango
Robô mata o cientista. Na atual sexta temporada, a abertura está invertida, com o frango adaptando o humano
em um ser mecanizado, fazendo com que ele passe a assistir forçosamente os aparelhos de TV. Fonte:
Wikipedia.
118
Figura 48: logo americano de Robot
Chicken
Fonte: http://adultswim.com
119
mensagens se organizem de modo híbrido, à maneira de uma colagem42.
6.1.3 Pandorga
42
No episódio "1987" (2006), um personagem, interpretado pelo ator e comediante Michael Ian Black, afirma que
essa sequência diz ao espectador que eles (o público) são o frango(s) robô(s), sendo forçados a assistir aos
esquetes. Fonte: Wikipedia.
120
regionalidade da produção, o Pandorga estreia na grade da TVE do Rio Grande do
Sul, em agosto de 1988.
Assim, com uma pipa posta no ar, cruzando os cenários mais reconhecidos
da paisagem de Porto Alegre, começam os primeiros episódios do projeto. Os
bonecos, confeccionados em sua maioria em espuma e lã, eram a jacaré Jacobina,
uma menina bastante consumista, sua avó, que vinha do interior para cuidar da
neta, o sapo Caco, o boneco roqueiro Betão Galera, o Samuca, e, entre os
humanos, estava a atriz Lúcia Achutti, como uma apresentadora que representava
programas infantis como os de Xuxa.
121
Nos anos 2000, é feita uma renovação do elenco de personagens, com novos
bonecos e cenários, que são feitos em miniatura e aplicados em Chroma key43 na
pós-produção do programa. A atual turma do Pandorga, como são conhecidos os
personagens, é composta pelas garotas Nina e Beti, os meninos Jura e Tinta e o
cachorro Zé Cão. A confecção dos bonecos foi realizada pelo grupo A Caixa do
Elefante, coordenada por Paulo Balardin e Mário de Ballentti, que já havia
trabalhado na proposta de Firulim, da extinta TV Guaíba, e que esteve a cargo da
manipulação de bonecos da TV Colosso, da Globo. Os personagens humanos são,
entre outros os apresentadores do telejornal Jornal Legal, Carlos Arroba e Anete E-
mail, e o chef Priori, que dá dicas de culinária para crianças.
43
Chroma key é uma técnica que consiste em colocar uma imagem sobre uma outra através do anulamento de
uma cor padrão, normalmente o verde ou o azul, isolando personagens ou objetos de interesse que
posteriormente são combinados com uma outra imagem de fundo. Fonte: http://www.lbcomunica.com/saiba-tudo-
sobre-chroma-key!.php
122
colocar a criança como participante ativa no processo da comunicação;
incentivar o gosto pela leitura;
informar e divertir.
Uma das iniciativas tomadas pela produção, em prol dos objetivos citados, foi
a execução, no ano de 1988, concomitante com as eleições municipais, de uma
eleição dentro do programa, na qual o público podia votar em dois personagens, a
Bruxa Eufriges e Zezé Natureza.
123
grupo AnimaSonho, sendo eles:
o Texera e Texerão: bonecos batizados em homenagem ao cantor
tradicionalista gaúcho Teixeirinha, os quais cantam músicas
nativistas;
o Corvo e Corvão: bonecos que cantam rock.
Além das edições diárias inéditas e suas reprises, o programa exibiu edições
especiais, que levaram os bonecos a outras localidades do Rio Grande do Sul.
Exemplos disso são os especiais produzidos em mais de dez edições do Festival
Internacional de teatro de Bonecos, na cidade de Canela, na serra gaúcha. Outros
especiais temáticos também foram realizados, em menção ao dia das Crianças, à
Feira do Livro de Porto Alegre, ao Dia Mundial da Leitura, entre outros. O Pandorga
teve ainda, em 1991, um jornal impresso gratuito, o Pasquim Pandorga, com cerca
de 150 assinantes.
45
Conforme divulgado em http://www.tve.com.br/agenda/
124
A atração recebeu alguns prêmios durante sua veiculação, entre eles, o da
Associação Rio-Grande de Imprensa, a ARI, na categoria especial de TV, no ano de
1991, o prêmio Açorianos de Literatura, da Prefeitura de Porto Alegre, como
destaque em mídia televisiva, em 2003 e o prêmio especial da Associação Gaúcha
de Teatro de Bonecos, a AGTB, em 2004.
125
apresentado. The Muppet Show e Pandorga se baseiam em diferentes instâncias do
teatro de bonecos, desde a manipulação direta um-a-um, conforme vimos na figura 9
(página 48), até quadros inspirados no teatro japonês Bunraku, com diversos
marionetistas em cena. Já Frango Robô usa o stop-motion do cinema.
126
cada episódio. Dos nossos três exemplos, este é o que apresenta a maior cartela de
quadros e cenários. Embora o programa se aproprie destes bonecos, algumas
necessidades específicas precisam ser adequadas, sendo então possível advir
modificações nos brinquedos originais, em termos de movimentação e figurinos. A
produção de Frango Robô também recorre à estratégia de corpos e cabeças
variáveis, sendo o corpo construído pela equipe e os rostos implantados, vindos de
outros bonecos industrializados. Isso faz ainda com que a proposta tenha seus
cenários adaptados a cada quadro, contextualizando com as temáticas escolhidas.
127
6.2.2 Conteúdos
128
seus quadros anunciam uma sequência (por exemplo, o texto “quintas, às oito da
noite, as maiores porradas já filmadas”, do episódio Lixo na Mala), ao estilo das
chamadas de programas nos intervalos televisivos.
The Muppets Show, que está situado em um teatro, também usa quadros de
programa televisivos, como o Muppet Flash News, com o intuito de criar passagens
entre as cenas realizadas no palco, em uma simulação de serem feitas no tempo
real de um espetáculo. E o Pandorga transforma um de seus personagens, o menino
Tinta, em repórter em diversas situações, buscando sempre interagir com os
humanos presentes, de atendentes de espaços culturais aos passantes na rua.
129
A partir destas percepções, nos é permitido convencionar que a cultura pop,
vinculada primeiramente ao país original de emissão dos programas Frango Robô e
The Muppet Show, os Estados Unidos da América, mas longamente espalhada
internacionalmente, é o subterfúgio para que se insiram nas emissões a crítica
política e social e a quebra da lógica do politicamente correto. Com a apropriação
desta cultura, adicionada ao pretexto da comédia, assistimos, por exemplo, no
episódio Lixo na mala, de Frango Robô, a uma sequência de mensagens em relação
ao uso de drogas, às situações da saúde masculina, ao crescimento da violência
urbana e social e, enfim, à banalização das temáticas da comunicação televisiva.
Frango Robô articula-se em um clima de permissividade de assuntos, que acaba por
referir até mesmo aos Muppets, em momentos nos quais temos, inclusive, uma cena
de sexo entre Caco e Miss Piggy (no quadro The fattest fat loser46).
46
Disponível no Youtube, no link http://www.youtube.com/watch?v=VraZ3-1cwXI
130
Apesar da formatação de conteúdo visar determinado espectador, a
veiculação pode ser acompanhada por qualquer pessoa e, na pós-modernidade, o
método de separação por idades perde a sua pertinência. Michel Maffesoli (2012)
comenta que “quando vemos, por exemplo, um pai com seu filho ou um pai com
crianças, que vão olhar uma emissão televisiva, eles vão olhar para ela da mesma
maneira, e, assim, não há uma diferença real. O que é, para mim, uma das
47
especificidades da pós-modernidade” .
131
videoclipes, e também acompanhou a trajetória dos Muppets na mídia. E o
Pandorga resulta das narrativas importadas e das construídas pela televisão
brasileira, lidando com modos de superar obstáculos de recursos e produção para
garantir a sua permanência no ar.
132
7 APONTAMENTOS FINAIS
Acreditamos que a construção de toda uma base histórica para tratarmos dos
bonecos nos auxilia em percebemos como nos relacionamos com o mundo, como
imaginamos a nós mesmos e como reagimos perante o outro. Defendemos aqui que
uma criatura como uma marionete, um fantoche, um autômato, que pode ser
construída de diferentes formatos e materiais, é a reconstrução do nosso duplo –
uma mítica sombra fantasma, um espelho criativo, lúdico e crítico - que conta sobre
nossa vida, de maneira, por vezes, sarcástica e indiscreta.
Vimos que esta figura, tornada personagem cômica, dramática, satírica, cria e
estimula laços entre os que fazem – os manipuladores, os produtores, os
animadores – e os que assistem, seja no palco, na sala escura do cinema, em casa,
pela televisão. No teatro, a relação é direta, e o público pode saciar sua curiosidade
com uma visita aos bastidores da peça. No cinema e na televisão, o entorno tem
sido cada vez mais revelado, primeiro, com a acessibilidade do manuseio de
equipamentos e do desenvolvimento amador de técnicas, antes caras e reservadas
ao âmbito profissional. E depois, por opções de linguagem, que abolem as barreiras
entre o que é cena e o que é backstage, como percebemos em toda a estruturação
do The Muppet Show, e ainda, em Frango Robô, que estimula o riso através da
reconstrução do imaginário popular televisivo norte-americano.
133
vive hoje na Europa. O rapaz, de cerca de 30 anos, reconheceu-a na rua por ter sido
telespectador do programa na sua infância em Porto Alegre.
Relembrando Gilbert Durand (2002), dizemos aqui que nos bonecos, através
destas simples exemplificações, reside o domínio do fantástico, da estética da
recordação que se desdobra na memória, que para Michel Maffesoli (2012) é da
ordem do vínculo, das emoções e da partilha de paixões.
134
Saindo do teatro, fomos adentrar no cinema, forma de representação
narrativa que para Morin (2001) é a constituição do mundo imaginário. Demos
atenção ao fator da disponibilidade técnica, que já havia sido incluída no teatro de
bonecos, a partir dos anos 1800, e que foi transposta para as narrativas fílmicas.
Disso, percebemos que o gênero da animação esteve intimamente conectado com o
boneco, e, por isso, convencionamos intitular o terceiro capítulo como “Filmes de
animação”. Procuramos, em toda nossa construção de pesquisa acadêmica,
salientar o percurso visual e temático pelo qual atravessaram os bonecos. Para isso,
destacamos inúmeros casos de obras cinematográficas, autores e diretores que se
voltaram para esta figura em suas narrativas.
135
cinematográfica advém o modelo, que se transforma no que vai se configurar em
programas via televisão. É a consciência do animus que reflete a modernidade do
racionalismo, com o qual são administradas as doses de ficção na tradição da
animação do cinema.
136
cinema e a televisão - torna-os partícipes do imaginário pós-moderno, pois seguem
eles as eternas leis da imitação que nos propõe Maffesoli (2012), lembrando-nos
que “o que tem que acontecer inelutavelmente advém” (p. 115).
137
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143
ANEXOS
ANEXO 1
49
Realizada com auxílio dos resumos disponíveis em http://muppet.wikia.com/wiki/Episode_524:_Roger_Moore
144
joga para cima todo o conteúdo da bandeja que carrega, sujando toda a sala e
atingindo Caco, inclusive.
Miss Piggy adentra em uma sala de estar, onde Roger Moore está, pensando
que ele a aguarda. Ela tenta, sedutoramente, conseguir a atenção de Roger,
cantando "On a Slow Boat to China". Enquanto ela abraça e se insinua para o ator,
ele protesta, dizendo que não faz o tipo da personagem e que está aguardando
outra pessoa para um encontro. Quando a campainha toca, aparece a personagem
Annie Sue, outra boneca suína, que é rival de Piggy como diva da trupe Muppet.
Então Roger Moore informa para uma Piggy estarrecida, que ambos vão assistir a
uma montagem da peça Hamlet. Piggy fica sozinha em cena, e derruba um porta-
retrato de Moore, com um golpe de caratê.
Corte para Statler e Waldorf, que comentam como a cena foi tocante, com
007 e 700, o codinome de James Bond e o peso de Miss Piggy.
Caco vai até a cortina e avisa que Lew Zealand é o próximo a se apresentar.
A cena seguinte mostra Zealand e seus peixes cantores interpretando uma versão
“molhada” de You Light Up My Life", até que ele é retirado do palco por um gancho
vaudeviliano50 administrado por Miss Piggy.
50
Nos espetáculos de vaudeville, era comum a interrupção de um número artistísco considerado malfadado, por
meio de um bastão pastoril em formato de gancho, preso no pescoço do artista, forçando-o a deixar a cena.
Proposta semelhante é usada em show de calouros na televisão, quando soa alguma sirene ou buzina para
interromper a apresentação.
145
outro programa. Piggy sai de cena indignada e Moore se aproxima de Caco para
perguntar se o show era sempre assim. O que você quer dizer com isso, pergunta
Caco. Essa loucura, responde Moore. Caco se demonstra surpreso, pois para ele a
noite está sendo bem calma, sem nenhum desastre inesperado. Nesse momento, os
atores Muppets do próximo esquete passam para o palco, atropelando Caco. Roger
Moore brinca dizendo: “Não aconteceu nenhum desastre imprevisto?”, ao que Caco
retruca, afirmando que esse era um desastre bem conhecido.
Apresenta-se então outro quadro, chamado Bear on Patrol, aos moldes dos
seriados policiais, como Hill Street Blues (da NBC, veiculado entre 1981 e 1987). O
urso Fozzie, travestido como patrulheiro, e o chefe Hogthrob, um suíno
caracterizado como xerife, estão no aguardo de um vendedor de perucas.
Aguardando na delegacia, Fozzie reclama que perdeu seu frisbe, e pergunta se ele
está na cabeça do chefe. Um vendedor chega, mas, ao contrário do esperado, ele
propõe uma demonstração de novas algemas, testando nos punhos do urso e do
porco. Presos, os dois policiais terminam por serem assaltados pelo vendedor, que
os deixa apenas com as roupas de baixo. Ambos protestam que não podem ser
deixados daquela maneira, e o ladrão concede a eles uma moeda de 25 centavos. O
que nós vamos fazer com isso?, perguntam os algemados. Isso é para vocês
comprarem um frisbe melhor, retruca o assaltante.
146
A ação retorna ao backstage do teatro, onde vemos o sapo Caco ao telefone,
solicitando um bando de espiões para o serviço secreto. Mal Caco termina a frase e
três agentes, vestidos com gabardines e chapéus, aparecem em sua volta. Eles
querem saber como o sapo teve acesso ao seu contato, e Caco responde que o
número de telefone estava nas páginas amarelas 51. Resolvido o impasse, o sapo
explica o motivo da chamada. Ele quer que os agentes participem do ato de
encerramento do espetáculo, que será protagonizado por James Bond. A menção do
nome do famoso personagem faz com que os espiões se agitem, ansiosos para
estar em cena com Bond, ou como eles proclamam, para dar um jeito nele. “Você
nunca mais será importunado por ele”, garantem a Caco.
Após a saída dos bonecos espiões, Roger Moore vem conversar com o sapo
a respeito de sua participação. A despeito de estar vivendo James Bond nos
cinemas, o ator pretende que seu número seja bastante atrativo, ou fofo, nas
palavras dele. Moore quer interpretar a canção Talk to the animals, rodeado de uma
grande quantidade de criaturas bonitinhas. Apesar de seus esforços ao contrário,
Caco concorda com a ideia. Ouvindo a confirmação do gênero a ser posto em cena,
os espiões rapidamente buscam camuflagem para entrar no número, uma vez que
eles são mestres do disfarce.
Segue a atração com o flash de notícias Muppet, no qual o âncora relata que
uma rede de espionagem está tentando infiltrar notícias descabidas no noticiário. A
próxima nota é a respeito de um peixe que foi eleito rei. O apresentador duvida da
veracidade da história, até que o novo monarca chega ao estúdio. Você quer ser
consagrado cavaleiro (knighted)?, pergunta o peixe-rei. Sim, responde o âncora,
abaixando-se. O peixe dá uma porrada nele com o cetro, e diz, boa noite (good
night).
51
O conceito do livro diretório de telefones comerciais surgiu nos Estados Unidos, no estado do Wyoming, em
1883. A primeira publicação impressa data de 1886, e rapidamente se difundiu globalmente. Fonte:
http://muppet.wikia.com/wiki/Yellow_Pages.
147
Caco informa a Scooter que os espiões misturaram-se sorrateiramente por
entre os animais. Scooter anuncia para os bonecos, "Não há espiões no número de
encerramento! Espiões devem ir para casa!". Mas ninguém sai. Caco então vai para
a frente da cortina para apresentar o que seria um excitante número de
contraespionagem, cheio de ação, mas que não vai acontecer. Ele chama então o
engraçado e encantador Roger Moore.
148
ANEXO 2
Para separar cada trecho, são usados takes de uma tela de televisão fora de
sintonia, com chuviscos cinzas, numa referência de que o cientista, que comanda os
controles remotos das televisões em frente ao frango robô, trocou de canal.
Nova tela de corte e vemos uma moça em uma cozinha muito bem equipada,
segurando uma frigideira. Seu texto é “esse é o seu cérebro”, mostrando um ovo, “e
149
isto é heroína”, apontando para a frigideira. “E isto é o que rola com o seu cérebro
com heroína”, esmagando o ovo com a panela. A mensagem antidrogas se
transforma em um acesso de violência por parte da mulher, que vai citando todas as
repercussões do uso da droga em sua vida, enquanto quebra a casa, bate com a
frigideira na avó, sai para rua e destrói um carro, acerta os passantes, policiais,
ataca um gato vira-latas.
Optimus Prime vai ao médico para tentar resolver seu problema, e precisa
fazer um exame retal para examinar sua próstata. O diagnóstico do robô é câncer
terminal. Cercado de amigos no hospital, Prime falece e se transforma em um
caixão.
Na sequência, ele aparece sentado, dizendo que “nós, robôs, não corremos o
risco de ter câncer, mas você sim”, dirige-se ao espectador. A mensagem final é
“não tenha medo de levar dedada”. A linguagem chula vai se consolidando como
uma marca da série, tanto no original em inglês, como sendo mantida na versão
dublada em português.
Outro corte. Narrador, em voice over diz: os reality-shows nunca foram tão
sinceros e brutais. carros batem de frente, desce um lutador e uma cadeirante. o
lutador bate na cadeirante. Uma vinheta cobre a imagem: as maiores porradas já
filmadas no mundo (fistfights). Um rapaz com óculos leva tapas, bate com sua
cabeça na parede, um assaltante segura um pessoa de ponta-cabeça na beira de
um prédio. Tarzan ataca Xita com um tacape. homem de terno rouba um doce de
um bebe em um carrinho, dando um soco na criança, que abre um berreiro. Robô de
lata bate no cientista, que termina com o rosto desfigurado. Menino negro usa um
mictório e um jogador de hóquei dá um encontrão e a criança fica desmaiada.
150
Fade
Fade
Fade
151
Surge Dorgan na tribuna, agradecendo. Como representante da…
Fade
Fade
152
Cena com boneca a semelhança da atriz Gillian Anderson, que interpretava a
agente Scully no seriado. Ao lado dela, está um boneco que faz referência ao
personagem Neo, da trilogia Matrix, interpretado pelo ator Keanu Reeves. A claquete
dispara o teste: Scully diz: então estamos lidando com um tipo de elo perdido da
cadeia evolucionária? Reeves responde: é isso mesmo, Scully, o nome científico da
fera seria Rondondondus Marcipius do gênero enprieclis, O ator ri e Anderson olha
para a câmera.
Corte
Claquete anuncia a primeira tomada do teste do ator Mister T. Scully tenta dar
o mesmo texto anterior, mas Mister T interrompe: podes crer, Scully, elo perdido
entre os humanos, isso é um mau exemplo para as crianças, tá tirando onda com a
minha cara, sua vadia?. Anderson balança a cabeça, apontando para o ator.
Corte
Entra imagem em preto e branco. Lois Lane está amarrada em uma cadeira,
cercada de dois assaltantes. Superman, me salva, Superman. O quadro abre e
revela Superman cambaleando, com uma garrafa na mão. Ele diz, com a voz
embriagada e arrotando: esse é um trabalho para o Super Homem. O ator com uma
arma na mão pergunta para a produção, enquanto Super segue bebendo: e aí,
manda ver? … Aponta a pistola para o herói: nem o Super Homem é mais rápido
que… uma bala. Superman bate na cabeça do bandido com a garrafa. Ai, minha
cara. Você me deu uns soco no olho, reclama o ator, ajoelhado. Por que você fez
isso? Superman está gritando: você está salta. Para o alto e avante, salta pela
janela, derrubando o cenário e revelando os bastidores do estúdio.
153
1978 e 1986)? Conseguimos algumas cenas do seriado clássico, que nunca foram
ao ar.
Voice over: aqui está uma rara cena de erro do desenho de sucesso
Pokémon. O monstrinho amarelo diz: Pikachu, pika, pika, yey! O mostro azul diz:
Squirtle, Squirtle, Squirtle. O amarelo responde: Pika, Pika, Pikachu, Pika, Pika.
Squirtle, Squirtle, até que se ataca e reclama: mas que (pi) é essa? Essa (pi) não faz
o menor sentido. Pikachu, tentando acalmar o outro: Diz a frase, senão você leva
gás. Squirtle: Criançada, vai ler um livro ou então bater umazinha.
Volta o apresentador, sentado em uma mesa: E por hoje isso é tudo que
temos, pessoal. Mas semana que vem voltamos com mais erros de gravações. Ele
puxa uma corda e sobe para se enforcar. Ao som da claque, sobem os créditos
finais, com as vozes dos atores na versão original em inglês, entre eles, Macaulay
Culkin e o criador da série, Seth Green.
154
ANEXO 3
PROGRAMA 01
ANETE
ANETE
Atenção, Brasília!
ANETE E @
ANETE
155
ANETE
Pois se tu não sabes, o nosso novo comentarista, o Prof. Sabe Tudo, primo do
Dr.Google vai contar.
Mas Pandorga também pode ser uma maneira de se divertir e aprender através dos
nossos quadros, histórias e brincadeiras. Quer saber mais? Então fique com a gente!
ANETE
É verdade Anete. Voltamos daqui a pouco com o Jornal Legal. Até lá, pessoal!
(VINHETA/TURMA DO PANDORGA)
Prédio de Tinta com um cartaz de aluga-se em uma janela. Sobre a imagem, passam
indícios das quatro estações até chegar o inverno. Tinta está em frente ao prédio olhando
para cima. Jura chega.
JURA
Tinta. O apartamento em cima do teu continua vazio?
TINTA
É, faz tanto tempo que ninguém mora ali. Mas, às vezes, no meio da noite eu escuto
uns barulhos muito estranhos.
JURA
Vozes? Gritos? Risadas apavorantes?
TINTA
Não! Só uns estalos esquisitos.
156
JURA
Pode ser os esqueletos dos fantasmas que andam pelo apartamento.
TINTA
Jura, e desde quando fantasma tem esqueleto? Eles são como fumaça.
JURA
Claro! Que “mico”.
(PAUSA)
JURA
E será que as gurias lembram disso?
Continuam o papo e riem muito.
157
Tinta boceja e se espreguiça
TINTA
Amanhã vai ser um dia especial. Treino do time da escola, e pra completar, passar um
trote nas gurias.
O garoto começa a ouvir alguns estalos. Em seguida, o som de móveis sendo arrastados. À
medida que os barulhos continuam, ele vai ficando mais assustado.
TINTA
Começaram os barulhos. Hummm. Agora passos. Mas o que é isso? Não to gostando
nada desta história. Eu sei que fantasmas não existem, mas... Parece que tem alguém
arrastando alguma coisa ali em cima.
Ouve-se um grande estrondo. Tinta grita.
TINTA
Mãe!
(Vinheta/Mexa-se)
MEXA-SE: RESPIRAÇÃO
158
Gostou? Então repete mais tarde.
(Vinheta/Jornal Legal)
@
Está entrando no ar mais uma edição do seu Jornal Legal.
ANETE
A notícia Temporal!
@
E vamos então... aaatchim!
JUNTOS
Primeira Notícia!
@
O clima são as mudanças no tempo de um determinado local. Para definir o clima de
uma região, os estudiosos observam a temperatura, a pressão do ar, os ventos, a
chuva e a umidade.
ANETE
Você sabia @, que o Brasil é um País tão grande que o clima pode mudar
completamente de um lugar para outro?
@
Sim! Uma grande parte do Brasil é tropical, mas existem outros climas.
ANETE
(OFF)
Nas regiões mais ao sul do Brasil, os verões são quentes e úmidos e os invernos frios
e secos. Tão frios que é preciso se agasalhar.
Animação: Bit bit de casaco tremendo de frio.
@
(OFF)
No Sertão Nordestino, há poucas chuvas e temperaturas altas quase todo o ano.
Animação: Robson o Ratinho de chapéu de cangaceiro.
ANETE
(OFF)
E na Amazônia, há chuvas em grande quantidade e altas temperaturas. Um calorão!
Animação: Bit Bit a Caneta da Anete de Guarda Chuvas.
159
E vamos a uma reportagem especial com o Professor Sabe Tudo que vai nos mostrar
como está o clima agora em algumas partes do Brasil.
Uai, sô, to aqui em BH. E aqui tá bom demais, tá frio não, tá quente não, tá morno sim.
Este trem tá bom demais da conta, sóóóóóó. Acho que vô até comer um pãozinho de
queijo pra ver como é que tá o clima lá em São Paulo.
Ô meu, hoje até que o dia tá bonito, nem sei por que que eu sai com este guarda-
chuva. Ihhhh, lá vem garoa (Trovões). Vô lá pro sul.
Oigalê, mas que barbaridade este frio aqui no Alegrete no Rio Grande Do Sul, tchê.
Este frio tá de rachar as canelas. Bah, não fica nem cusco na rua. Só um chimarrão
pra esquentar. Que loucura este país.
(Volta para estúdio, Anete e @ estão com calor. Enquanto ele se abana, ela está com um
ventilador no rosto).
@
O tempo está mudando muito rapidamente
Ouvem-se trovões no estúdio.
ANETE
Entre os fatores que contribuem para as Mudanças Climáticas está o descuido com
nosso meio ambiente. Entre eles o desmatamento, a poluição e as queimadas.
Houve-se nova trovoada no estúdio, e começa a nevar. Anete E @ colocam casacos,
toucas, e cachecóis enquanto se despedem.
@
E nós vamos encerrando por aqui mais uma edição do seu Jornal Legal
ANETE
Hoje com a Notícia Temporal.
Começa a nevar enquanto os créditos sobem.
@
Atchimm! Que loucura este tempo hein?
ANETE
160
Tu me emprestas uma luva.
@
Mas eu tenho duas mãos.
ANETE
Eu também, mas daí ao menos uma fica quentinha.
@
Tu quer dizer que uma fica geladinha.
(Vinheta/Galeria de Arte)
GALERIA DE ARTE
SAMUCA
Oi Jura.
JURA
SAMUCA
JURA
SAMUCA
“É uma grande pena que não se possa estar ao mesmo tempo nos dois lugares”.
JURA
SAMUCA
É que essa conversa toda me lembrou dum livro da Cecília Meireles que se chama
“Ou Isto Ou Aquilo”.
JURA
161
SAMUCA
É um livro cheio de poesias legais. Uma delas se chama “Ou Isto Ou Aquilo”. É mais
ou menos assim ó...
SAMUCA
“Ou se Tem Chuva e não se tem sol. Ou se tem sol e não se tem chuva. Ou se calça a
luva e não se põe o anel. Ou se põe o anel e não se calça a luva. Quem sobe nos ares
não fica no chão. Quem fica no chão não sobe nos ares”.
JURA
SAMUCA
O livro tem outras poesias muito legais, como “A Bailarina”, “O Colar De Carolina”, “A
Chácara do Chico Bolacha” e mais um monte de outros poemas.
JURA
Báh Samuca. Legal mesmo. Mas tenho que te falar uma coisa. Tu não me ajudaste em
nada.
SAMUCA
JURA
Por que agora eu não sei se eu jogo videogame com o Tinta, jogo bola com o Tuca, ou
leio esse livro ai.
SAMUCA
JURA
Quer saber? Já que eu tô aqui mesmo, eu vou pegar o livro. Valeu Samuca!
SAMUCA
Tchau, Jura!
162
ANEXO 4
DVD contendo episódios dos programas The Muppet Show, Frango Robô e
Pandorga.
163