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ABSTRACT: This article aims to describe the critical areas in the acqui-
sition of Portuguese in Mozambique. From the methodological point of
view, the study adopts a qualitative approach and takes natural data from
semi-structured interviews produced by Portuguese learners in an inter-
mediate stage of acquisition. The results of this study show that the critical
areas of Portuguese learners’ interlanguage grammar include the change
of the verbal categorical selection properties, the choice of verbal tense,
the omission of the articles and the embedding of subordinate clauses.
KEYWORDS: Critical Areas; Portuguese Acquisition; Mozambique.
1. INTRODUÇÃO
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contacto linguístico1 em que ela se encontra com as línguas do grupo bantu (LB) e a
ausência de uma exposição à norma europeia do português (PE), que é o modelo-alvo,
são factores fundamentais que explicam o desencadeamento de uma nova variedade
desta língua – o Português de Moçambique (PM) (GONÇALVES, 2002; 2010a). Este
facto tem implicações no que respeita ao processo de aquisição desta língua uma vez que,
tal como refere Gonçalves (2002, p. 344), as evidências que poderiam conduzir à fixação
de parâmetros da língua-alvo são menos robustas. Consequentemente, a gramática dos
aprendentes caracteriza-se por apresentar desvios relativamente ao PE ao nível das
diferentes componentes.
O conhecimento das áreas críticas na aquisição do português em Moçambique,
isto é, das dificuldades dos aprendentes no estabelecimento das propriedades gramaticais
desta língua, constitui uma importante fonte de informação sobre as etapas de
desenvolvimento linguístico dos aprendentes no processo de aquisição. Nesse sentido,
tendo em consideração que o sucesso da aquisição do português se torna mais dependente
do acesso ao ensino formal – dado o contexto social em que a sua gramática emerge –
este tipo de informação tem relevância no que se refere à elaboração de programas e
produção de materiais de ensino desta língua.
O presente artigo situa-se neste âmbito geral e tem como objectivo descrever as
áreas críticas na aquisição do português por parte dos aprendentes em Moçambique. Com
efeito, embora já estejam disponíveis estudos que façam uma descrição de diferentes
aspectos relacionados com as gramáticas de interlíngua dos aprendentes do português
em Moçambique2, este estudo pretende ser mais um contributo para a sistematização
das dificuldades dos aprendentes do português em Moçambique, sobretudo no estágio
intermediário de aquisição. Na verdade, tal como afirma Gonçalves (2010a):
1
Veja-se Gonçalves e Chimbutane (2015) para uma visão sobre as assimetrias que se observam
nas mudanças induzidas por contacto linguístico em Moçambique.
2
Veja-se Companhia (2017) para uma visão panorâmica dos estudos sobre a gramática de
interlíngua dos aprendentes do português em Moçambique.
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2. AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM
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sucedido, sendo que o último nível de proficiência alcançado pelo aprendente nem
sempre é semelhante ao de falantes que aprendem essa mesma língua como L1. O termo
“fossilização” foi proposto por Selinker (1974, p. 36) para explicar este fenómeno e
alberga os itens linguísticos, regras e subsistemas que os aprendentes de uma L2 tendem
a conservar na sua gramática de interlíngua.
Os investigadores que trabalham na área da Aquisição de Língua Segunda se
interessam em compreender os factores da fossilização, tentando, igualmente, prever as
formas particulares da interlíngua potencialmente fossilizáveis. Long (2003, p. 516-517)
destaca a falta de sensibilidade ao input associada à saliência perceptiva das estruturas
da língua-alvo. Na óptica do autor, a sensibilidade ao input compreende a habilidade
de os aprendentes identificarem as propriedades das estruturas da língua-alvo no input,
enquanto a saliência perceptiva diz respeito à frequência destas mesmas estruturas no
input. Tomando como base o trabalho de Todeva (1992), o autor identifica um conjunto
de “categorias linguísticas de alto risco” potencialmente candidatas à fossilização
destacando-se, nomeadamente, as categorias em que não existe uma relação forma-
função como é o caso das regras semi-produtivas, cujas exceções constituem conjuntos
definidos como, por exemplo, a alternância dativa em inglês e as unidades de natureza
altamente arbitrária (preposições e a atribuição do género dos nomes).
3. METODOLOGIA
3
Note-se, porém, que, este tipo de pesquisa, não elimina a existência de um quadro teórico que
direcione a recolha, análise e a interpretação dos dados.
4
Para a constituição deste corpus-amostragem, foram selecionadas quatro entrevistas por província
(2 de informantes de cada sexo) e o critério para a sua seleção foi o número de palavras produzidas
por entrevista, sendo que, para cada província, foram selecionadas as que apresentavam maior
número de palavras.
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Trata-se de uma grelha tipológica usada no âmbito do “Projecto Panorama do Português Oral
de Moçambique” (PPOM) cujo objectivo era constituir um corpus de língua oral que fosse
representativo da comunidade moçambicana de locutores de Português. Com mais ou menos
adaptações, essa grelha foi usada em vários outros estudos sobre o português de Moçambique
(Siopa et al., 2003; Gonçalves, 2010b) e Europeu (Leiria, 2006).
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Variável Província
sociolinguística Zambézia C. Delgado P. Maputo C. Maputo Total
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Sexo M 2 13 2 13 2 13 2 13 8 50
F 2 13 2 13 2 13 2 13 8 50
Idade 9 0 0 0 0 0 0 1 6.5 1 6
10 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
11 0 0 0 0 3 19 0 0 3 19
12 1 6.5 0 0 0 0 1 6.5 2 12
≥ 13 3 13 4 25 1 6 2 13 10 63
L1 LB 4 25 0 0 1 6 2 13 7 44
Port. 0 0 4 25 3 19 2 13 9 56
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Total
Nº de ocorrências Percentagem
Área Tipo de desvio
Tipo de Tipo de
Área Área
desvio desvio
Neologismos de forma 18 19
Léxico Neologismos semânticos 75 77
97 12
Empréstimos 4 4
Seleção categorial 175 67
Seleção semântica 5 2
Passiva 13 5
Expressões locativas 8 3
Léxico-Sintaxe Expressões quantitativas 6 2
Expressões temporais 7 3
Expressões recíprocas 1 1
Pronome pessoal reflexo 24 261 9 32
Género 22 8
Pronome pessoal – colocação 31 17
Encaixe 49 28
Sintaxe Determinação 5 3
Artigo 82 178 46 23
Ordem de palavras 11 6
Concordância verbal 44 20
Concordância nominal 31 14
Infinitivo 10 4
Morfossintaxe
Tempo verbal 98 44
Pronome pessoal – flexão 16 7 28
Formas de tratamento 25 224 11
Dispersos 43 43 5 5
Total Geral 811 811 100
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5.1. Léxico-sintaxe
(5f). Exemplos:
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Neste quadro, o símbolo → quer dizer “em contextos em que o PE seleciona…”. Por exemplo
SPem→SPa significa que no corpus ocorre um SP regido pela preposição em em contextos em que
o PE prevê um SP regido pela preposição a.
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5.2. Morfossintaxe
De acordo com o quadro acima, a maior parte dos desvios diz respeito aos casos
que envolvem o uso do infinitivo em vez do presente com 40.8% do total dos casos.
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5.3. Sintaxe
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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
ELLIS, R. The study of second language acquisition. Oxford: Oxford University Press,
2008.
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I. LÉXICO
1. Chegaram limparam todo dinheiro (=…roubaram…). (CD. NEL)
2. Aí atrás tinha um elefante. (=...havia…) (CD. NEL)
3. Lutaram quase a noite de manhecer (=…amanhecer). (PZ. JUM)
4. Batem-lhe se fazer uma coisa ingostosa. (=…feia) (PZ. ELD)
5. Magagada estava aí dentro (=…mandioca seca…). (PZ. ELD)
II. LÉXICO-SINTAXE
1. Chegaram bateram o miúdo (=…bateram no miúdo). (CM. LUI)
2. O filho foi na pesca (=…à pesca). (PM. JOA)
3. É porque você é forte do mundo (=…o mais forte…). (CD. JUA)
4. Ao andar do tempo (=…com o andar do tempo). (CD. JUA)
5. Foi amarrado com o coelho (=…pelo coelho). (PZ. JUM)
III. SINTAXE
1. Descascar batatas meter hum (=…as batatas…). (CM. LAT)
2. Vou tentar que apanho (=…tentar apanhar). (CD. JUA)
3. Disse que “eu não quero comer” (=…disse: eu não quero…). (PM. ZIT)
4. Ele se mostrou (=…mostrou-se). (CD. BEN)
5. Atropelou o homem a criança (=…o homem atropelou a criança). (CD. FAD)
IV. MORFOSSINTAXE
1. Depois levo a frigideira põe no lume (=…ponho…). (CM. LUI)
2. Uma vez ganhámos três bola (=…três bolas). (CD. FAD)
3. O meu irmão provocou ele (=…provocou-o). (CM. LAT)
4. Quando você apanhas estás no meio dá (=…apanha…está…). (CD. JUA)
5. Se ser um dia de jogo assistimos (=…for…). (PZ. JUM)
7
No final de cada frase, apresenta-se o código do informante que produziu a frase. Assim, as
primeiras duas letras indicam a província enquanto as três últimas indicam as iniciais do nome
do informante.
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