2 Entre o Amor e A Honra-Yvis Writer
2 Entre o Amor e A Honra-Yvis Writer
2 Entre o Amor e A Honra-Yvis Writer
Copyright © 2022
Autora: Yvis Writer
Título: Entre o Amor e a Honra (Volume 2)
Capa e Diagramação: Will Nascimento
Revisão: Pat Sue - Revisão e Copidesque
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Conforme a Lei 9.610/98, é proibida a reprodução total e parcial ou
divulgação comercial sem a autorização prévia e expressa do autor (artigo
29). Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e eventos
descritos são produtos da imaginação do autor. Qualquer semelhança com
evento real é mera coincidência.
–
Todos os direitos reservados.
Um
Giovanni olhou para o padre com ódio. Ele havia decidido descarregar toda
sua raiva pela traição da esposa no desgraçado do amante. E isso incluía
muito mais sofrimento do que simplesmente matá-lo com um tiro na testa.
Ele chutou o estômago do homem com força, fazendo-o se curvar de
dor. O padre estava nu, com pés e mãos amarrados, jogado no chão frio e
molhado de um armazém abandonado.
— Ligue essa merda! — Giovanni ordenou, furioso.
O segurança virou a chave e descarregou choques elétricos no corpo
do padre. Ele gritou, chorou e pediu clemência a Deus.
— Desligue. — Giovanni se aproximou. — Dio não está aqui, pezzo
de merda… — Ele segurou os cabelos do homem e olhou nos olhos. — Ele
está cansado de você e me mandou para fazê-lo se arrepender dos seus
pecados. — O italiano riu, diabólico. — Muito prazer em conhecê-lo. Io sono
il diavolo[1].
— Socorro! — gritou o padre.
— Mais choques, senhor? — perguntou o segurança.
— Não, caso contrário, o farabutto vai morrer… — Agachou-se e o
encarou, o prisioneiro estava chorando feito uma criança. — Eu não quero
que morra, disgraziato, eu quero que sofra…
A imagem de Gabriela surgiu em sua mente. De algum modo,
Giovanni estava se vingando em seu nome. Mesmo que não admitisse isso
para si mesmo, ou para qualquer outra pessoa. Ela não saía de seus
pensamentos. Fazia uma semana que tudo havia acontecido. O italiano
dormia e acordava pensando na esposa. Ele estava desnorteado desde aquele
dia.
— Me solte pelo amor de Deus… — implorou o padre com a voz
fraca, era quase um gemido. — Peço perdão por ter sido fraco e não ter
respeitado meus votos a Deus. Peço perdão por todas as mulheres que seduzi,
desvirginei, pelos filhos que mandei tirar ou que não assumi. Solte-me, por
favor… — suplicou.
— Ainda não, padre figlio di puttana — sussurrou Giovanni próximo
ao ouvido do homem. — Você vai pagar pelo que fez. Por ter se deitado com
minha mulher… — rosnou entredentes. — Sabe o que a máfia faz com os
homens que dormem com nossas mulheres? A gente tira seu cavolo[2] e enfia
em seu culo.
— Eu fui obrigado… — balbuciou as palavras. — Eu fui obrigado…
eu não queria fazer aquilo.
Giovanni arregalou os olhos negros.
— O que disse?
— Me obrigaram a fazer aquilo...
O corpo do homem começou a tremer como se tivesse tendo uma
convulsão.
— Quem te obrigou? — gritou, furioso, porém, o padre fechou os
olhos. — Acorde, disgraziato…
Os homens o colocaram sobre uma mesa, cobriram o corpo com
cobertores e começaram a tentar reanimá-lo.
— Ele não tem batimentos cardíacos — disse Ângelo, nervoso. —
Vamos, massageiem o peito dele.
Os seguranças de Giovanni usaram todos os métodos que conheciam
para reanimar o homem, mas após quinze minutos, eles olharam para o chefe
e declararam:
— Ele está morto, chefe.
Giovanni virou de costas e amaldiçoou o universo. Finalmente, o
homem havia resolvido falar alguma coisa, no entanto, morreu.
— Ângelo! — gritou, furioso.
— Sim, senhor — respondeu o guarda-costas, temeroso.
— Descubra quem está por trás disso — ordenou.
— Eu descobrirei, senhor. Com licença.
†††
Giovanni entrou no quarto da filha, a fim de verificá-la e acariciou
seus cabelos.
— Como ela está? A febre abaixou? — indagou para a babá.
— Ela vai e volta. É emocional...
O italiano não deixou a moça terminar a frase. Ele já sabia que a filha
estava daquele jeito por causa de Gabriela. Assim como o filho, que se
negava a tomar o leite em mamadeiras, com isso berrava dia e noite.
O homem estava em frangalhos.
Fazia dias que não dormia. Ele passara a noite olhando para sua cama.
Para as coisas que ela havia deixado.
Ele a odiava, mas a amava na mesma proporção.
Giovanni virou o copo de uísque. Ele queria que a bebida fizesse o
efeito desejado. Que o relaxasse e o fizesse dormir.
Ele andou pelo quarto, pegou a camisola dela e a cheirou.
— Gabriela, mia rossa, tesoro mio — sussurrou, com os olhos
marejados. O cheiro dela ainda permanecia impregnado em suas roupas,
trazendo para o italiano a lembrança tão recente de tudo que tinham vivido.
— Ti amo, ti amo così tanto, Gabriela!
Com raiva de sua fraqueza, ele jogou o copo no espelho onde ela se
arrumara. Pegou a camisola e a rasgou até que só restassem farrapos.
— Disgraziata! — Cobriu os lábios e chorou. — Você me destruiu,
sua maldita. Você me destruiu…
Ele se sentou no chão com a garrafa ao lado e permaneceu ali.
Giovanni nunca tinha sofrido tanto por uma mulher. Nem mesmo por
Patrícia, com quem foi casado por cinco anos.
Giovanni descobriu que o verdadeiro amor tinha sido o que viveu com
Gabriela. Todo resto era pequeno perto do que sentia por ela.
— Eu vou te esquecer, disgraziata…
†††
†††
†††
†††
†††
†††
Um mês depois
†††
Gabriela caminhou depressa para o banheiro mais próximo. Ela não queria
que as pessoas a vissem chorando. Isso poderia chamar a atenção para sua
presença na escola.
Ela entrou numa porta. Havia uma cabine ocupada e sobre a pia
alguns pertences da pessoa.
Gabriela se aproximou da pia e se olhou no espelho. O rosto estava
abatido, havia olheiras enormes abaixo dos olhos, os cabelos estavam
desgrenhados, sujos e sem brilho.
A moça jogou uma água no rosto e viu o crachá da funcionária à sua
frente. A dona do crachá era loira e de algum modo se parecia com ela.
Principalmente, naquele momento em que estava tão descuidada.
A jovem nunca tinha cometido roubos, mesmo que fossem pequenos e
inocentes. E isso incluía roubar crachás. Mas se pretendia ver Madeleine de
novo, ela precisava de um desses.
Gabriela pegou o crachá e enfiou dentro da roupa. Pediu perdão em
pensamento e saiu o mais rápido que podia.
†††
Ela fez sinal para o ônibus e subiu apressada. Pelo relógio do coletivo
ela chegaria ao colégio da enteada em 30 minutos.
A moça sentou-se e aguardou ansiosa pelo encontro. Apenas o fato de
ver a menina já a deixava feliz. No entanto, o que mais a fazia sofrer era não
poder ver o filho.
Gabriela fungou e controlou o choro. Fazia tempo que estava
chorando todos os dias, ela precisava parar de se lamentar e agir.
Enfim, o ônibus estacionou, ela seguiu para a portaria de funcionários,
sorriu para o porteiro, mostrou o crachá e entrou.
O coração estava disparado. Definitivamente, Gabriela nunca tinha
feito tantas coisas erradas em sua vida.
Um pouco mais tranquila, ela seguiu para o pátio onde as crianças
aguardavam o início das aulas. Parou em uma lixeira e fingiu arrumá-la.
Enquanto isso, os olhos vasculharam a entrada dos alunos. Em alguns
minutos, viu sua princesinha.
Madeleine abriu um sorriso lindo. Gabriela se controlou, olhou-a com
firmeza, e indicou o banheiro.
Elas não poderiam ser vistas em público. Era perigoso demais.
Gabriela entrou no sanitário feminino, seguida por Madeleine. A
moça sorriu, agachou-se e apertou a enteada nos braços.
— Que saudades de te abraçar, Made!
— Eu também, Gabi…
A madrasta encheu a enteada de beijos e a olhou de um jeito
profundo.
— Estou feliz que possamos nos ver, meu amor! Mas não posso vir
todos os dias. Eu tenho um trabalho e não posso me atrasar.
— O que faz, Gabi? Por que veste essas roupas tão feias?
Gabriela torceu os lábios.
— Meu trabalho é muito legal… eu cuido da limpeza de um colégio
— disse, mostrando empolgação.
— Isso não é legal. Por que não é professora?
Gabriela respirou fundo.
— Estou procurando algo melhor. Mas, por enquanto, é isso que
tenho. E apesar de não parecer legal, é um trabalho que tenho muito orgulho.
— Eu sei, Gabi. Desculpe. — A garotinha abaixou-se em direção à
sua mochila, pegou um recipiente e entregou para a ruiva. — Eu trouxe para
você. São aqueles biscoitinhos que você gosta. Pedi para a cozinheira fazer.
Pegue, Gabi.
Gabriela se emocionou. Pegou o recipiente e abraçou a menina.
— Obrigada, meu amor. Vou comer na hora do meu lanche. Agora…
eu preciso ir e voltarei só na sexta-feira. Tudo bem?
— Tudo bem. Ficarei com saudades.
A ruiva a abraçou mais uma vez.
— Eu também… — Inspirou com tristeza. — Matteo está bem?
— Ele não fala, então não sei.
A moça riu.
— Dê um beijo nele por mim. Estou com saudades dele. — Os olhos
embaçaram-se com as lágrimas.
— Vou dar. Eu contei pra ele que vi você. Ele sorriu, Gabi. Mas só o
Matteo sabe.
— Tá bom. Preciso ir. — Acariciou os cabelinhos de Madeleine. —
Vá, Made, daqui a pouco alguém virá atrás de você.
A menininha a abraçou.
— Ti amo, Gabi.
— Eu também.
†††
†††
†††
†††
†††
Gabriela deixou o terreno onde ficava seu quarto, entrando em uma rua
estreita e malcuidada do bairro onde morava.
O lugar era pobre, as construções precárias e não havia rede de
saneamento. Era um bairro em construção. Pessoas humildes o procuravam
para começar sua vida. Quase todos os terrenos eram invadidos, as
edificações irregulares e fora dos padrões da prefeitura.
O quartinho onde morava ficava numa dessas construções. Um
sobrado construído precariamente, dividido em dezenas de pequenos quartos,
onde, muitas vezes, moravam famílias inteiras.
Era um lugar triste de muitos modos, mas feliz, ao mesmo tempo. A
luta e a coragem daquelas pessoas faziam com que Gabriela não desistisse.
Sua vida era ruim, no entanto, daquelas pessoas era muito pior.
Ela agachou-se perto de algumas crianças e conversou com elas.
A comunidade era repleta de crianças. Em sua maioria malcuidada e
entregue à própria sorte. Gabriela gostava de conversar com elas. Isso a fazia
relembrar sua vida quando era uma professora.
A moça se despediu e seguiu pela rua estreita e sinuosa. Olhou para
trás algumas vezes, preocupada.
Faltou dizer que o lugar era perigoso. Muitos traficantes exerciam seu
poder violento sobre o local. Explorando e sufocando os comerciantes locais
com suas taxas de proteção e extorsão.
Havia um poder paralelo. Onde a lei quem ditava não era o estado,
mas sim os traficantes e milicianos.
Se existia um inferno na terra, aquele era o endereço.
Ela segurou a bolsa com força e caminhou o mais rápido que podia.
Havia um homem atrás dela. Ele mantinha certa distância, mas o fato de
acompanhá-la em sua trajetória até o colégio a estava preocupando.
Quando finalmente chegou ao colégio, inspirou aliviada.
Gabriela subiu até o primeiro andar da escola e colocou o uniforme.
Olhou por uma pequena janela e viu o estranho encostado em um poste.
Ela franziu a testa.
— O que foi, amiga?
A ruiva virou-se e sorriu.
— Bom dia, Edi. — Olhou novamente pela janela e o viu comendo
um cachorro-quente. — Aquele homem, ele me seguiu até aqui…
A outra mulher olhou através da janela.
— Será que é um tarado? Eles perseguem a mulher até que consigam
pegá-la num lugar escuro.
— Passei por muitos lugares escuros, ele não me pegou…
— Vamos observar, talvez tenha sido só coincidência.
Gabriela saiu da janela e seguiu para sua rotina.
†††
Dias Depois
A moça olhou para trás mais uma vez. Aquele homem continuava
seguindo-a.
Um sexto sentido a avisou que era um dos homens de Giovanni. Isso
lhe causava medo e apreensão. Gabriela já não sabia mais quem era o ex-
marido.
Ela se lembrou do que ele disse naquele dia fatídico. Sobre a morte da
falecida esposa.
Talvez Gabriela soubesse desde o início quem era Giovanni. No
entanto, preferiu se enganar.
O italiano lindo e sedutor em nada se parecia com um criminoso. O
amor a cegou. Então, ela preferiu se ater ao cavalheiro gentil, protetor e
carinhoso, mas não ao que as pessoas diziam que ele era.
A jovem aproveitou a confusão do ponto de ônibus e despistou o
rapaz.
Ele não poderia vê-la chegando à escola de Madeleine. Isso faria com
que seus planos fossem por água abaixo, e as duas nunca mais poderiam se
ver.
Gabriela sorriu para si mesma.
Era divertido pensar como tinha se tornado esperta desde que fora
jogada na rua pelo homem que amava.
Gabriela descobrira que enganar um homem era muito mais fácil do
que imaginava. As lojas cheias, os comércios de rua ou mesmo um policial,
bastavam para que seu perseguidor se atrapalhasse e sumisse.
— Obrigada, Sr. policial… — Sorriu sedutora. — Devo virar à direita
e depois à esquerda, é isso?
— Sim, senhora… quer que a acompanhe?
— Não, imagine. Eu consigo chegar lá. — Sorriu mais uma vez,
deixando o policial encantado. — Um ótimo trabalho para o senhor e muito
cuidado. Essa rua está cheia de bandidos.
— Para a senhora também. Pode deixar, estamos de olho neles.
Pronto, ela tinha arrumado um amigo, ou melhor, um inimigo para
seu amigo oculto.
Em poucos minutos, a ruiva já estava dentro do colégio. Em
segundos, ela e Madeleine estavam escondidas, abraçando-se e matando as
saudades.
Gabriela a apertou tanto que a garotinha reclamou.
— Chega, Gabi. Assim fico sem ar. — Riu cheia de graça.
— Eu adoro te apertar, apertar, apertar até virar uma paçoca.
A menina riu mais. Abriu a mochila e tirou um envelope.
— O que é isso? — Gabriela indagou, confusa.
— Um convite…
A moça enrugou a testa.
— Para quê? — Pegou o envelope e o abriu, puxou o papel prateado e
leu… — Baile Anual de Réveillon… — O que é isso, meu amor?
— Papai vai fazer uma festa em casa. Peguei esse convite para você.
Gabriela olhou para Madeleine. Talvez a garotinha estivesse com
febre.
Como ela poderia ir a um baile na casa de seu pai? O homem a
expulsaria.
— Made, não posso ir…
— É de máscara, Gabi… ninguém vai ver você — disse, serelepe,
dando a entender que a madrasta estava lenta no raciocínio. — Eu te ajudo a
ver o Matteo.
A moça arregalou os olhos, e pensou: a enteada devia ser uma
daquelas crianças com a inteligência acima da média. Ela era esperta demais
para sua idade.
— Oh, Made, é perigoso… e se seu pai me ver?
— Ele não vai ver, Gabi. Ouvi dona Rute dizendo que muitas pessoas
irão.
— E a babá? — perguntou a moça para a garotinha. Como se ela
fosse a adulta da história. — Como vou despistá-la?
— Eu distraio a babá. Deixe comigo. Ela é boba! — Riu travessa.
— Não sei, Made… não tenho uma máscara ou roupas…
— Por favor, Gabi. Eu prometi para o Matteo. Eu disse que traria
você — suplicou, com sua vozinha doce, o olhar meigo e apaixonante.
Gabriela riu.
— Você é um gênio, sabia? — Agarrou-a e a encheu de beijos. — Eu
vou tentar, prometo. Tá bom!
— Tá bom. Eu e o Matteo vamos esperar por você.
— Você está me saindo melhor que a encomenda.
As duas se abraçaram e curtiram mais um pouco, o pouco tempo que
ainda tinham.
†††
†††
†††
Gabriela girou o corpo em um vestido prateado, e se olhou no
espelho.
— Ficou perfeito em você, Gabi — afirmou a amiga. — Gostaria
tanto de emagrecer um pouco para caber nesses vestidos — choramingou.
Gabriela torceu os lábios.
— É lindo, mas fico tão exposta. — Virou de costas e se olhou pelo
espelho. As costas estavam nuas, assim como braços, ombros, colo…
— Mas qual o problema? — Edi indagou. — Você está linda e
elegante. Era o que precisava para passar despercebida. Coloque a máscara
— ordenou, apressada.
A ruiva encaixou a máscara ao rosto e se olhou no espelho. Apenas os
olhos e lábios ficavam expostos. Além dos cabelos loiros, é claro.
— Você está irreconhecível.
Gabriela concordou com a amiga. Ninguém conseguiria reconhecê-la.
A moça respirou fundo.
— Seja o que Deus quiser. — Benzeu-se. — Reze para que não seja
descoberta.
— Você não será. — Pegou uma bolsa prateada e entregou para a
ruiva. — Vamos, o Baiano está nos esperando.
†††
†††
†††
†††
Dias Depois
Heloísa olhou para o endereço que o detetive tinha lhe passado, e
confirmou a informação.
A professorinha trabalhava agora como servente de limpeza.
A advogada gargalhou. Giovanni realmente tinha se superado. Ele até
podia ser apaixonado pela ruiva horrorosa, mas seu lado maldoso falava
sempre mais alto.
A mulher de Giovanni Bennedetti estava comendo o que o diabo
amassou. E ela sentia-se orgulhosa de ter participado da derrocada da plebeia.
Heloísa quase desistiu de acabar com a ex-noviça. Ela estava
abandonada à própria sorte. Giovanni a deixou desamparada. E isso era muito
satisfatório. Mostrava o quanto o amor dele estava ferido.
Todavia, a ruiva era perigosa. Ela exercia fascínio sobre o italiano.
Heloísa não poderia deixar espaço para recaídas.
Como Sr. Bennedetti dizia, o coração de Giovanni era seu grande
inimigo. O italiano era adorável quando estava apaixonado, mas o amor o
enfraquecia. Patrícia descobriu seu ponto fraco e quase o destruiu.
Aliás, a advogada odiara a amiga. Ela tinha tido tudo que ela sempre
quis, mas não ficou satisfeita.
Entretanto, Gabriela era diferente. Uma jovem adorável, doce,
delicada e sonhadora. E para piorar, apaixonada por Giovanni.
Isso sim era um grande problema para Heloísa.
A advogada a esperou sair da escola e a seguiu a certa distância. O
lugar onde morava era horrível. A pobreza e a miséria eram gritantes. Não
entendia como alguém conseguia viver num local como aquele.
A advogada se lembrou de seu apartamento duplex, da jacuzzi
quentinha e de seus lençóis de seda.
Definitivamente, a mulher não tinha nascido para ser pobre. Mesmo
que para isso tivesse que trabalhar para criminosos.
Ela viu a moça entrar em um terreno de terra batida. Numa edificação
mal construída onde havia inúmeras portas.
Heloísa segurou sua arma, mas desistiu de tentar eliminá-la ali
mesmo. Teria que ser algo mais discreto. Na rua, por exemplo.
A advogada fez o retorno.
— Amanhã cedo, queridinha… vou acabar com seu sofrimento.
Nove
Gabriela olhou ansiosa para os carros que passavam na rua onde ficava a
mansão de Giovanni.
Ela estava arrasada de muitas formas. Primeiramente, por ter ficado
tão pouco tempo com o filho. Segundo, por ter chegado tão perto de
convencer o marido de que tudo tinha sido uma armação. Entretanto, ele
nunca acreditaria nela. Era inútil insistir, não havia provas. Apenas sua
palavra, contra uma cena completamente esclarecedora.
Ela tinha certeza de que tinha sido dopada. Ela lembrava-se das
últimas palavras que disse para o padre Túlio, do seu sorriso estranho, mas de
repente tudo se apagou.
Ela fechou os olhos, relembrando o amor que fizeram e do quanto
tinha sido maravilhoso.
O gosto e o cheiro de Giovanni estavam em seu corpo, em seus lábios.
Ela se deixou embriagar. Não haveria outra vez, ela não permitiria. Se o
italiano não a queria mais como esposa, então ela não seria sua amante.
Uma buzina chamou sua atenção, e o carro velho e barulhento do
namorado da amiga piscou os faróis, ou melhor, um farol. O outro estava
apagado.
A amiga abriu a porta e arregalou os olhos.
— Você é doida? Não deveria ter tirado a peruca.
— Ele descobriu, Edi. — Sentou-se desolada.
— Oh, meu Deus! Você não conseguiu ver o seu menino?
Gabriela sorriu fraco.
— Eu o vi. Está tão lindo, forte, no entanto, foi muito pouco.
Giovanni desconfiou de mim e veio atrás. Ele me pegou no quarto de Matteo.
— Pelo visto não arrancou nenhuma parte de seu corpo… isso é um
bom sinal. — Riu debochada.
A ruiva estava exausta. Então, preferiu não contar que fizeram sexo, e
que sim, ele tinha levado parte de seu corpo, na verdade, o coração.
— Estou cansada… — reclamou. — Ainda assim, feliz. Eu vi Matteo
e Madeleine. Agora não sei quando isso se repetirá. Mas ele me disse que me
deixará ver meu filho, disse que entrará em contato com os termos sobre a
visita.
— Que bom, Gabi. Vai dar tudo certo. Ele está magoado, por isso está
fazendo essas coisas. É difícil para um homem aceitar uma traição…
— Eu não o traí, lembra-se? — indagou, raivosa.
— Mas para ele você o traiu, Gabriela… eu também não acreditaria
em sua versão, é muito espetaculosa, sabe? — disse Baiano.
— Espetaculosa? — ela indagou, furiosa. — Espetaculosa vai ser sua
morte, Baiano.
Baiano gargalhou.
— Estou sendo sincero, ruiva. Que homem não acharia que foi traído
ao ver a esposa na cama com um homem.
— Eu sei — concordou —, mas é que eu nunca trairia o meu marido.
É duro ser chamada de infiel quando não se fez nada. É revoltante.
— Nós sabemos, amiga. Eu acredito em você… e o Baiano também.
— Edi socou o braço do namorado. — Vamos, meu nego… estou morta,
dessa vez a gente se superou, né? — indagou, maliciosa. — Fomos num
motel, ruiva. Foi uma loucura! — Riu escandalosa.
Gabriela girou os olhos.
— Não me conte, não quero saber. — Encolheu-se no banco do carro
e tentou dormir.
†††
†††
A amiga fez várias perguntas, mas Gabriela preferiu falar pouco. Ela
sabia que a vida do marido era recheada de pontos cegos, coisas que ela não
entendia e que não queria entender.
Ela cochilou, quando abriu os olhos estava no hotel onde Giovanni a
havia trazido. Cujo restaurante chamava-se Mia Rossa.
— A senhora ficará aqui. — Ele deixou o carro, deu a volta e a ajudou
sair. — Vou levá-la até seu quarto.
O segurança a conduziu pelo hotel. Entrou no elevador e selecionou o
último andar.
— A senhora não poderá sair daqui. Não é uma prisão, no entanto, a
senhora não poderá sair. Alguém tentou matá-la. Então, não saia! — ordenou,
ríspido.
Ela respirou e inspirou.
— Quem tentou me matar?
— Ainda não sabemos. Mas vamos descobrir. — Sorriu sem vontade.
O elevador chegou, o homem abriu uma porta e Gabriela se viu numa
espécie de apartamento. Era lindo, luxuoso e impecável.
— Fique à vontade, senhora Gabriela. Aqui é sua nova casa.
— E minhas coisas? — indagou, preocupada.
— Depois traremos. — Seguiu até a porta. — Para sua segurança, não
saia. Tudo que precisar poderá ser solicitado pelo interfone. Ficarei de
segurança. Se precisar de mim, me chame. — Abriu a porta e saiu.
Gabriela cobriu seu rosto e bufou esgotada.
— Era só o que me faltava.
Dez
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†††
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Dias Depois
Apesar de Gabriela não poder mais amamentar – não havia mais leite em
suas mamas – ela aninhou o bebê ao seu seio, apenas para sentir o prazer de
tê-lo ali.
— Sinto muito, filho. Eu adorava amamentá-lo. — As lágrimas
escorreram de seus olhos. — Mas essa mamadeira é bem gostosa. —
Esfregou o bico em seus lábios. — Vamos, meu gorducho… vamos comer
para ficar grande e forte, igual ao papai.
Ela pensou em Giovanni e o coração apertou.
— Papai ficará muito orgulhoso de saber que mamou toda a
mamadeira. Eu vou contar para ele. — Acariciou os cabelinhos do bebê. —
Vou vê-lo hoje… — Ela apertou os olhos e chorou. — Vai dar tudo certo,
filho. Papai vai voltar para casa em breve.
Seu bebê olhou fixamente em seus olhos. Ele tinha nascido com os
olhos de Gabriela, mas de algum modo, ele se parecia com Giovanni.
Ele moveu seus lábios em um sorriso discreto.
— Está feliz, meu Matteo? Eu também, meu amor. Papai passou por
mais um desafio, hoje o levaremos para outro hospital. Mamãe não vai
desistir dele, nunca!
Ela inspirou e se deixou relaxar.
As últimas horas tinham sido as piores de sua vida. Gabriela não
conseguiu pregar os olhos a noite inteira. Estava preocupada com a saúde de
Giovanni, mas não era só isso, estava preocupada com sua segurança.
Matteo acabou sua mamadeira. Gabriela levantou-se e caminhou com
ele pelo quarto. Esperou que o bebê arrotasse e o colocou no berço.
— Mamãe precisa ir agora. Volto mais tarde — Beijou sua testa e
saiu.
A jovem caminhou até o quarto da enteada a fim de checar se ela
estava brincando.
— Oi, minha gatinha…
A garotinha levantou a cabeça e veio correndo ao encontro da
madrasta.
— Vou sair um pouco, mas volto antes do anoitecer.
— Posso ir? — indagou, sorrindo.
— Hoje não. Mas prometo que em breve poderemos passear. —
Acariciou os cabelos da garota. — Made, estamos passando por um momento
delicado. Seu papai não está aqui e existem pessoas más que querem fazer
mal a nós…
— Eu sei, Gabi. Papai já me explicou essas coisas.
Gabriela tentou sorrir.
— Tá… por este motivo, precisamos tomar cuidado, mas vai ficar
tudo bem. — Beijou sua testa. — Agora, preciso ir...
— Onde você vai? — Pegou a boneca que ela a presenteou e penteou
seus cabelos.
— Resolver alguns problemas, deseje-me sorte.
— Sorte, Gabi.
A ruiva sorriu, virou-se e seguiu para o quarto. Em cima da cama
estava a arma de Giovanni, que fora entregue com seus pertences. Ela a
pegou com cuidado e a observou. Não era uma arma grande, era uma pistola
de cano curto, discreta e que se encaixava com perfeição em sua mão.
Gabriela ensaiou segurá-la numa posição de tiro. Isso fez o coração
disparar. Imediatamente, a devolveu para a cama e ficou indecisa sobre o que
deveria fazer. Apenas a ideia de usar uma arma lhe causava arrepios. Mas ela
estava com medo. E o medo provocava mudança nas pessoas.
Se aquele homem surgisse do nada, ela precisava estar preparada.
A jovem pegou a pistola e a colocou dentro de sua bolsa. Seguiu para
o banheiro e foi terminar de se aprontar.
†††
A governanta a seguiu até a porta.
— Não se esqueça, dona Rute, se alguém ligar para saber sobre
Giovanni diga que não está autorizada a dar informações sobre seus patrões.
— Sim, senhora! — disse, obediente.
Desde o retorno de Gabriela, a governanta estava diferente. Talvez,
mais humilde.
— Qualquer problema, me ligue, dona Rute. Por favor.
— Não se preocupe, dona Gabriela. Tome cuidado, e se puder, diga
ao Sr. Bennedetti que estou orando por ele.
Gabriela lembrou-se que a mulher disse ser ateia. No entanto, não
valia a pena questionar sua fé neste momento.
— Eu direi… — Segurou suas mãos e as apertou. — Em breve ele
estará em casa.
— Amém, senhora, amém…
A ruiva virou-se e seguiu com firmeza até onde Ângelo a esperava.
Entrou no carro e partiu com ele para o hospital onde Giovanni estava
hospitalizado.
— Ângelo, certifique-se de que ninguém está nos seguindo —
solicitou, temerosa.
Ângelo olhou pelos retrovisores, ligou para os carros que os
acompanhavam e respondeu.
— Não, senhora…
— Da próxima vez iremos de helicóptero — afirmou, estressada. —
Eu deveria ter pensado nisso antes, alguém poderá nos seguir...
— Se acalme, estamos tomando todos os cuidados possíveis. Temos
drones ao redor da mansão vigiando o perímetro. Estamos saindo em quatro
carros iguais, cada um está indo em uma direção.
— Sim, eu sei, mas acho que o helicóptero será mais seguro.
— Tudo bem, dona Gabriela. — Ele se calou ao ver que a mulher
estava muito nervosa.
Minutos depois, o carro estacionou no hospital.
Gabriela e Ângelo seguiram apressados pelos corredores. Havia uma
equipe de seguranças no andar onde Giovanni estava internado. Mesmo
assim, Gabriela estava receosa.
Ela segurou a bolsa com a arma e respirou fundo. Se fosse preciso, ela
a usaria.
Na recepção, ela conversou com a enfermeira de plantão.
— Como ele passou a noite? — perguntou, aflita.
— Ele está estável. Seus sinais vitais estão normais. Ele é um homem
forte. — Sorriu amável.
— O doutor está, preciso conversar com ele.
— Sim, vou chamá-lo.
Gabriela virou-se e viu Ângelo reunido com os seguranças. Ela olhou
ao redor e a cada pessoa que entrava no local, o coração acelerava.
Era tanta tensão que ela sentiu uma tontura forte. Seguiu até uma
poltrona e se sentou.
— Se acalme, não vá ter um chilique agora — disse para si mesma.
Logo o médico surgiu na porta da UTI. Ela levantou-se apressada e
seguiu até ele.
— Olá, doutor. Como ele está?
— Estável. Conversei com meus colegas da UTI e achamos que ele
pode ser removido hoje. Liguei para o hospital de referência que te falei. Pedi
para reservar uma vaga para ele.
— Sim, obrigada. Doutor, meu marido sofreu um atentado — disse,
seriamente. — Ninguém pode saber para onde ele está sendo transferido.
— Senhora…
— Não, me ouça — afirmou —, nós vamos transferi-lo hoje e ficará
tudo bem. Só não diga para ninguém para onde estamos levando-o.
— Tudo bem… a senhora quer vê-lo?
Ela mordeu os lábios.
— Sim, quero, quero muito. — Seus olhos embaralharam-se com as
lágrimas.
Os dois seguiram por um corredor, entraram em uma sala, e Gabriela
pôde vê-lo. Havia ataduras em várias partes de seu corpo, além de aparelhos
conectados e medicamentos, mas o rosto estava descoberto, com pequenos
cortes que pareciam terem sido causados por vidros estilhaçados.
Ela se aproximou emocionada, segurou delicadamente sua mão e o
chamou.
— Giovanni…
— Ele está sedado. As queimaduras causam muita dor. Tivemos que
enxertar algumas partes. Mas ele é um homem grande e havia pele para
reconstruir os ferimentos mais graves. Fizemos o melhor que pudemos, mas
ele precisa de cuidados especiais.
— Oi, meu amor… estou aqui! — conversou com ele, mesmo
sabendo que estava sedado. — Vamos levá-lo para outro lugar. Mais seguro,
continue lutando… você é um guerreiro. — Aproximou seu rosto do dele e
beijou seus lábios. — Eu te amo — sussurrou em seu ouvido.
Suas pálpebras se mexeram.
— Ele não está consciente, mas o subconsciente responde a estímulos
— explicou o médico.
— Quanto tempo levará para ele ficar bem? — Acariciou ternamente
o rosto do marido.
— Até um ano de tratamento, mas isso depende de cada pessoa.
— Não tem problema, ele está conosco e é isso que importa.
— Sim, ele teve sorte, é difícil sobreviver a um acidente como esse.
— Ele é um guerreiro — disse Gabriela, com os olhos atentos ao seu
rosto. — O senhor pode verificar se está tudo certo para a transferência? Vou
ficar um pouco com ele.
— A aeronave da UTI já está preparada. Só vou assinar os
documentos, então o levamos para o heliponto. Dá licença.
Gabriela depositou pequenos beijos em sua face. Acariciou seus
cabelos e deslizou seus dedos pelas ataduras. Ela nunca o vira tão frágil e isso
a assustava.
Giovanni precisava dela como nunca precisou.
O médico retornou ao quarto.
— Pronto, dona Gabriela, vamos aprontá-lo para a transferência.
— Sim, doutor. É seguro mesmo? Não há risco?
— É seguro, serão poucos minutos fora do ambiente hospitalar.
Chegando lá, haverá uma equipe esperando-o.
— Obrigada. Obrigada por tudo. Deus tem anjos na terra, e o senhor é
um deles.
O homem sorriu, Gabriela depositou um beijo no rosto de Giovanni e
se afastou.
— Irei junto com ele, na aeronave.
†††
†††
†††
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†††
Um Mês Depois
†††
Gabriela entrou no quarto onde Giovanni estava. Olhou para sua cama
e o viu sem os aparelhos que o mantinham entubado.
Uma alegria repentina se apoderou de seu coração. Ela acelerou o
passo e se aproximou de sua cama. Deixou a bolsa ao seu lado e acariciou seu
rosto.
— Giovanni, estou aqui! — Seus olhos encheram-se de lágrimas. —
Você não está mais entubado. Graças a Deus! — Chorou de emoção.
Uma enfermeira chegou perto de Gabriela e a cumprimentou.
— Olá… — A ruiva sorriu. — Ele não está mais com os aparelhos.
— Sim, os médicos resolveram tirar. Ele venceu a infecção e os
exames dele melhoraram bastante. Ele está conseguindo vencer.
Gabriela abraçou a enfermeira e chorou feito uma criança. Afastou-se
e sorriu.
— Rezei tanto, você não tem ideia.
— Ah, eu tenho sim… quer me ajudar a limpá-lo? É muito bom para
o paciente sentir a presença das pessoas que ama. Ele sabe que você está
aqui.
— Eu adoraria — concordou Gabriela, emocionada.
As duas mulheres prepararam as esponjas, sem seguida começaram a
higienizar o corpo do homem. Gabriela viu suas feridas e chorou.
— Elas ficarão mais bonitas depois — disse a enfermeira, bem-
humorada. — Estão feias agora, mas com o tempo melhoram… já vi casos
piores.
— Não ligo para a aparência, mas para a dor que isso causa nele.
— Ele está tomando analgésicos potentes… conforme o tempo passa
e a cicatrização acontece, a dor melhora.
— Eu quero que ele saia daqui logo, eu vou cuidar dele. — Acariciou
os cabelos do marido.
— Oh, quanto amor, eu sinto daqui. — Riu, pegou as coisas e deixou
Gabriela sozinha.
— Eu o amo demais — disse, olhando para seu rosto. — Você me
ouve? — Beijou seus lábios demoradamente. — Volte pra mim, Giovanni…
volte para seus filhos.
Ela sentou-se ao seu lado da cama, pegou sua mão e colocou sobre
sua barriga.
— Tem um bebezinho aqui, sabia? — Acariciou a mão dele sobre a
sua barriga. — Estou grávida, vamos ter mais um italianinho ou italianinha…
Ele não reagiu, e isso a deixou arrasada.
Gabriela aproveitou o pequeno espaço que tinha ao lado da cama,
deitou-se espremida, e segurou a mão dele.
— Eu preciso contar para Made que você está hospitalizado, mas só
queria fazer isso quando já pudesse falar com ela. Não quero assustá-la.
Então, se você quiser me ajudar e parar de dormir um pouco… — Riu com
tristeza. — Acorde, amor, estou com saudades dos seus beijos… de ouvi-lo
me chamar de mia rossa. — Fechou os olhos. — Estou tão cansada. —
Enxugou as lágrimas que molharam o rosto. — Vou dormir um pouco, tá
bom!
Giovanni mexeu seus olhos, mas Gabriela já estava dormindo. Aos
poucos, a sedação estava indo embora, e o cérebro do homem começava a dar
os primeiros sinais de consciência.
— Mia rossa — ele balbuciou as palavras com dificuldades. Mas ela
não ouviu.
Dezesseis
†††
Um Mês Depois
†††
Era início da manhã quando policiais da Força Federal invadiram a
casa de Giacomo.
O homem pulou da cama com o celular tocando e ao som de tiros.
— O que está acontecendo, budiúlos? — gritou, nervoso ao telefone.
— Policiais Federais invadiram sua casa, Sr. Bianchi. Pegue a saída
secreta, vamos resgatá-lo no telhado.
O homem xingou furioso, seguiu para o closet e começou a pegar
roupas.
— O que está acontecendo, Giacomo? — perguntou a esposa,
assustada.
— A polícia… — colocou a camisa e a calça. — Vou sumir por uns
tempos. Não abra a boca, Kyara. Se souber que disse alguma coisa sobre
mim, eu te mato!
A mulher, cuja barriga estava enorme, a poucos meses do bebê
nascer, encolheu-se na cama.
Giacomo abriu uma porta falsa dentro da suíte do casal, subiu
algumas escadas e saiu no telhado da mansão. Uma aeronave já estava
sobrevoando o local. Ela desceu alguns metros e fez um resgate
cinematográfico do italiano, com direito a cordas e balas de fuzis nos
policiais que tentavam impedir que a aeronave subisse.
Quando Giacomo finalmente sentou-se. Seu advogado estava dentro
da cabine.
— O que está acontecendo? Por que esses desgraçados invadiram
minha casa? Que merda andou fazendo, cazzo?
— O senhor foi denunciado para a justiça italiana. Os promotores de
seu país solicitaram ao governo brasileiro sua extradição. A Polícia Federal
está caçando-o, senhor.
Giacomo arregalou os olhos.
— O que está dizendo, budiùlo? Quem me denunciou?
— O advogado de Giovanni Bennedetti entrou em contato com um
promotor italiano e o entregou. A ruiva do seu primo o quer atrás das grades,
Sr. Bianchi. Existe uma recompensa para quem der informações sobre seu
paradeiro.
— Disgraziata! — gritou, enfurecido. — Matem essa mulher, acabem
com a família inteira.
— Sr. Bianchi, o senhor precisa ir para um dos esconderijos. Não
podemos chamar a atenção da polícia. Depois o senhor mata a ruiva. Agora,
vamos escondê-lo. Se for pego será extraditado para a Itália e morto pela
máfia.
Giacomo respirou ofegante. Quando veio para o Brasil achou que
tinha se livrado dos processos que havia contra ele. Antes de fugir da Itália,
Giacomo explodiu um carro com três magistrados que estavam tentando
condená-lo. Ele nunca achou que um dia teria que pagar por isso.
Disseram para ele que o Brasil era o lugar certo para se esconder. E
Giacomo tinha certeza disso. A impunidade reinava no país latino. A justiça
era corrupta, assim como os agentes públicos.
Ele olhou furioso para o advogado.
— Ajude meus homens a acharem Giovanni. Ele está escondido em
algum hospital da cidade.
— O que pretende, Sr. Bianchi? Preocupe-se com a sua segurança
agora. Esqueça seu primo.
— Se ele estiver vivo, ele mandará me matarem. E tenha certeza de
uma coisa. Os homens dele não falharão como os policiais — disse, nervoso.
— Encontre onde ele está, mande os homens para lá e o matem.
O advogado bufou.
— Sim, Sr. Bianchi. Mas preciso de dinheiro… preciso tentar abafar o
caso, comprar o juiz que autorizou a ação que tentou pegá-lo.
— Meus homens levarão até você. Enquanto isso, tente negociar.
O homem balançou a cabeça negativamente.
— Sem dinheiro, sem negociações, Sr. Bianchi. Somente os relógios
trabalham de graça. Preciso de muito dinheiro para calar as pessoas. E vamos
rezar para o juiz de seu caso ser corrupto. Caso contrário
Giacomo o interrompeu.
— Caso contrário, mando alguém matá-lo. E você, como meu
advogado, indicará o novo juiz do caso. — Sorriu com deboche. — Eu que
mando aqui, não você.
O homem bufou nervoso.
O italiano olhou para o guarda-costas e ordenou.
— Quero que me mantenha informado enquanto estiver no
esconderijo. Se falharem de novo. Eu mesmo irei matar meu primo.
Dezessete
†††
†††
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Dias Depois
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†††
Gabriela esgueirou-se nas pontas dos pés e tentou alcançar o galho mais alto
da árvore de Natal. Mas não conseguiu. No entanto, braços fortes envolveram
sua cintura e a levantaram.
Ela olhou para trás e sorriu, esgueirou-se mais um pouco e pendurou a
bola dourada.
— Pronto, tesoro? — Giovanni colocou-a no chão e olhou para a bela
árvore que a esposa tinha enfeitado. — Juro que nunca vi árvore tão bonita.
A linda ruiva riu alegremente, pegou uma nova bola e olhou para o
marido.
— Essa é a última, prometo.
Giovanni a ergueu mais uma vez, esperou-a colocar o enfeite e a
colocou no chão.
— Você está compulsiva, tesoro! — disse, debochado. — Está há um
mês enfeitando essa árvore, e olhe só, é noite de Natal!
Gabriela abraçou seu pescoço e o beijou apaixonada.
— Feliz Natal, meu amor! Cheguei a pensar que nunca teríamos
oportunidade de comemorar essa data juntos. — Os olhos lacrimejaram.
— É preciso ter fé, não é mesmo?! — indagou, sarcástico, afinal o
italiano não era dado a esse tipo de sentimento.
— Sempre tive. — Acariciou seu rosto, e o olhou com suas pupilas
hipnotizantes. — Fé que você acreditaria em mim, que se salvaria e que
seríamos felizes… para sempre!
— Sua fé me move, principessa… você é o meu milagre!
Gabriela sorriu radiante, abraçou e beijou o marido com sofreguidão.
O acidente de Giovanni os tinha unido ainda mais do que antes.
Mas um pigarro os desconcertou. Os dois separaram seus lábios e
olharam em direção ao barulho. A governanta estava parada em frente a eles
e os olhava sem graça.
— Vittorio acordou, senhora — avisou, sacudindo a criança em seus
braços.
— Claro, é hora de ele mamar.
A moça seguiu apressada até seu bebê e pegou-o com carinho.
— Oi, querido, está com fome? — Olhou para a governanta e sorriu.
— Obrigada, dona Rute. — Seguiu até uma poltrona e ajeitou o vestido,
tirando um dos seios para o bebê sugar. — Onde estão Made e Matteo, eles
estão demorando?
— A babá está acabando de arrumá-los. Madeleine estava ensinando
Matteo a pintar, então, imagina o que aconteceu com os dois. — Riu
discretamente.
Ela olhou ansiosa para Giovanni.
— Amor, veja o que está acontecendo, eles já deveriam ter descido.
Edileusa e sua família estão chegando.
— Deixe comigo, amore mio… trarei os dois pelas orelhas! — disse,
bem-humorado, deixando-a sozinha com o filho.
A ruiva olhou para seu bebê e sorriu. Seu segundo filho era uma cópia
do primeiro. Forte, grande e faminto. Os filhos de Giovanni Bennedetti
prometiam esvair a mãe de tanto que mamavam.
— Se acalme, Vittorio Giovanni Bennedetti, assim você vai se
engasgar — ralhou, diante do desespero do bebê.
O barulho nas escadas chamou sua atenção, ela olhou e viu Madeleine
e Matteo no colo do pai, um de cada lado de seu braço.
— Pronto, tesoro… aqui estão seus bambini!
— Deixe-me ver como ficaram com as roupas novas — disse,
animada.
O marido os colocou no chão e os dois saíram correndo em sua
direção. Ela cobriu os lábios e riu. Chegava a ser engraçado ver pai, filhos e
mulher com roupas quase iguais. Gabriela e Made estavam com um vestido
vermelho com a barra enfeitada de motivos natalinos. Giovanni e Matteo
estavam com uma camisa vermelha com os mesmos enfeites, já Vittorio
vestia um macacão de bebê combinando com os pais e irmãos.
— Vocês estão fofos! — exclamou, extasiada.
— Eu me sinto um tanto quanto ridículo! — Giovanni riu. — Mas
tudo bem. O que não faço pela mia bella donna!
— Não se esqueça de que temos ainda os pijamas. — Cobriu os
lábios. — Você vai ficar lindo, Giovanni...
— Sim, ficarei lindo, parecendo um...
Gabriela olhou feio para ele.
— Parecendo um Papai Noel, era isso que iria dizer. — Sorriu
sedutor. — Vou pegar um vinho, mia rossa…
A jovem olhou para o chão e sorriu. Matteo estava em cima do
Lúcifer, fazendo-o de cavalinho ou carrinho. Ela não sabia ao certo.
— Cuidado, Matteo, não machuque o Lulu.
Lúcifer olhou para a dona com a língua de fora, parecia tão feliz no
meio das crianças.
— Né, Lulu, diga a esse bebê que suas orelhas não foram feitas para
servirem de volantes.
— Gabi, nós vamos colocar a roupinha no Lulu? — Made indagou,
serelepe.
Gabriela olhou para a roupinha vermelha que Made tinha pedido para
comprar para o cachorro, e riu. Era impossível colocar a peça no cão. Ele já
tinha rasgado duas outras.
— Peça para o papai, meu amor, vamos ver se ele consegue colocá-la
no Lulu.
A garotinha saiu correndo para a sala de jantar.
— Pappa! Pappa! — gritou, enquanto atravessava a sala.
Gabriela riu.
— Vamos ver se o papai tem coragem, meninos. — Olhou para os
filhos.
Matteo abriu um sorriso lindo para a mamãe.
— Vá lá, Matteo, chame o papai, ele precisa vestir o Lulu.
O lindo garotinho levantou e saiu correndo pela casa.
— Pappa… Pappa… Pappa...
Ela mexeu nas mãozinhas do bebê.
— Só falta você, Vittorio, para deixar papai maluco. — Riu. — Não
vejo a hora.
†††
†††
Meses Depois
†††
†††
A prisão de Palermo era o destino para os grandes chefes da máfia
siciliana. Salvatore Bennedetti passara a ser um de seus “hóspedes”.
Giovanni se identificou e foi conduzido até a sala onde os presos
recebiam visitas.
Sentou-se a uma mesa e aguardou impaciente.
Quando ouviu passos, levantou a cabeça e viu seu pai. Com as mãos
algemadas à frente de seu corpo, o velho homem usava um uniforme roto do
presídio. Na face, um ar cansado e descontente. No entanto, quando viu
Giovanni, abriu um sorriso largo e acelerou o passo em sua direção.
— Giovanni, meu filho!
Giovanni levantou-se e o abraçou. Mas estava rígido. Era difícil estar
com o pai depois de saber que havia conspirado contra ele.
— Como o senhor está?
— Uma merda. — Riu bem-humorado. — E você, meu menino? —
Olhou para o filho atentamente. — Sua mãe disse que foi um milagre ter se
salvado. Aquele desgraçado…
— Ele está morto, pai.
— Quem matou o maldito? Diga-me que irei parabenizá-lo!
— Gabriela, ela o matou.
A expressão do homem mudou.
— Você voltou com a vadia, não é mesmo?
Giovanni esmurrou a mesa.
— Nunca mais a chame assim.
O velho riu com sarcasmo.
— Ela o colocou contra mim. E irá destruí-lo.
Giovanni o interrompeu.
— O senhor tem noção do que fez? — perguntou, exasperado. — Do
sofrimento que causou a mim e a Gabriela?
— Fiz isso para o seu bem. Porque o amo… e quero o melhor para
nossa família.
— Não, o senhor não me ama. Se me amasse não teria feito o que fez.
O senhor ama sua organização, a máfia e o poder — afirmou, cheio de
mágoa.
— Me tire daqui — ordenou Salvatore, agitado. — Arrume o melhor
advogado da Europa. Não posso deixar a organização na mão daquele
imbecil.
— Prometa-me que não voltará à organização e que deixará Vincenzo
como capo. Então, o tirarei daqui — declarou, decidido.
— Não me faça rir, Giovanni. Já que trocou a honra de ser um
integrante da Cosa Nostra pelo amor de uma mulher, serei eu a honrar nosso
sobrenome. — Encarou-o. — Você é um desertor e uma desonra para nossa
família.
Giovanni travou as mandíbulas.
— Não me sinto em dívida com você, pai. Pois não foi minha escolha
ser um criminoso, o senhor me obrigou a ser um soldado da máfia quando era
apenas um menino — disse Giovanni, com tristeza. — Sempre odiei essa
vida de merda e o futuro sombrio coberto de sangue e mortes que me
prometera. Fui para o Brasil para fugir do senhor e da organização.
O homem mudou sua expressão. E Giovanni já a conhecia.
Para homens como Salvatore – fiéis às regras e costumes da Cosa
Nostra – a atitude de Giovanni era uma traição, uma desonra.
Aos traidores da máfia só havia uma sentença: a morte. Todavia, às
vezes, o traidor poderia ter uma sentença ainda mais dolorosa: a morte de sua
família.
Giovanni decidiu que não esperaria para ver.
— Sinto muito, pai. — Levantou-se e seguiu a passos firmes em
direção à saída da penitenciária.
— Você vai se arrepender, Giovanni… Você é um traidor.
O italiano não olhou para trás. Chegou ao carro onde o primo estava e
entrou.
— Como foi, primo? Pela sua cara, a visita não foi muito boa.
— Mate-o, Vincenzo… esse é meu último pedido.
Os homens se entreolharam.
— Você tem certeza? — Vincenzo indagou, seriamente.
— Sim, tenho. Hoje — ordenou. — Antes que ele consiga se articular
e mande matar a mim ou a minha esposa.
O homem gesticulou a cabeça lentamente, pegou seu celular e fez
uma ligação. Quando desligou, tinha um olhar feroz.
— O colega de cela de seu pai fará o serviço. Em contrapartida, você
pagará um bom advogado para ele.
— Não quero meu nome envolvido com a máfia. Mandarei uma
quantia razoável para o advogado e para você. Seguirá na próxima
embarcação que enviar ao Mediterrâneo. Eu o aviso.
— Tudo bem. — Sorriu satisfeito.
— É isso, Vincenzo, adeus, amigo — disse, taciturno.
O primo afagou seu ombro.
— Você está fazendo a coisa certa. Ele nunca o deixará em paz. Nem
a você e a sua família.
Giovanni meneou a cabeça.
— Eu sei. Obrigado, irmão. — Abriu a porta e seguiu para o outro
carro. — Avise-me quando tudo estiver acabado.
O italiano inspirou profundamente.
Era uma decisão muito difícil, no entanto, somente assim ele poderia
viver em paz com Gabriela.
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Sobre a Autora
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Yvis Writer é o pseudônimo escolhido pela autora para assinar suas obras.
Paulistana, casada e mãe de duas filhas, se formou em Economia, e trabalhou
a maior parte de sua vida na área financeira.
Apesar do gosto por exatas, sua verdadeira paixão sempre foram as
palavras e o poder que elas tem sobre as pessoas. O desafio de escrever uma
obra é conseguir transmitir em palavras a emoção de um personagem, a
beleza de uma cena, ou simplesmente a paixão em palavras. Encantada com a
possibilidade de emocionar, tocar o coração e alma das pessoas apenas com
um emaranhado de palavras, Yvis Writer começou a escrever livros.
O tempo passou e em 2016, conheceu uma plataforma on-line de livros
gratuitos, onde leitores e autores interagiam. Gostou da experiência e sem
nenhuma pretensão, começou a publicar seus primeiros manuscritos. A
receptividade dos leitores foi enorme, então, influenciada por eles, foram
surgindo novas
histórias.