TCC Danielaevaristodossantos
TCC Danielaevaristodossantos
TCC Danielaevaristodossantos
Garanhuns
2019
1
Garanhuns
2019
2
3
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________
Médica Veterinária, Profa Dra Tania Alen Coutinho
Unidade Acadêmica de Garanhuns – UFRPE (Orientadora)
__________________________________________________
Médica Veterinária, Profa Dra Rute Chamié Alves de Souza
Unidade Acadêmica de Garanhuns – UFRPE (Titular)
__________________________________________________
Médica Veterinária, Jaciara Melo dos Santos
Hospital Veterinário É O Bicho – Maceió/AL (Titular)
__________________________________________________________
Médica Veterinária, Profa Dra Elizabete Rodrigues da Silva
Unidade Acadêmica de Garanhuns – UFRPE
4
I. ESTAGIÁRIA
NOME: Daniela Evaristo dos Santos MATRÍCULA: 360190078
CURSO: Medicina Veterinária PERÍODO LETIVO: 11o
ENDEREÇO PARA CONTATO: Av. Bom Pastor, s/n, Boa Vista, Garanhuns/PE
FONE: (87) 99900-0607
ORIENTADORA: Profa Dra Tania Alen Coutinho
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente aos meu pais, Luciene Evaristo e José Geraldo, por todo amor,
amizade, carinho, dedicação, compreensão, por sempre acreditarem em mim e por me
proporcionarem o início da minha graduação, mesmo tão longe de casa. Obrigada por serem
meu porto seguro nos momentos difíceis. Obrigada por tornarem possível meu sonho. Amo
vocês infinitamente!
Às minhas queridas irmãs, Damila e Dayana, por todo carinho, amizade, apoio e
incentivo durante todos esses anos. A saudade foi imensa e toda a persistência foi graças a
vocês. Amo vocês, meu muito obrigada!
Aos meus “bebês” peludos Snowbell, Lorena, Pandora, Sasa, Julie e Bethoven, pelo seu
“animor” incondicional.
À minha avó e tias, que me recepcionaram em Garanhuns, foi fundamental a presença
de vocês nesse momento, em especial à Zeza, seus conselhos e apoio tornaram minha adaptação
muito mais fácil. Amo vocês!
À Universidade Federal Rural de Pernambuco, Unidade Acadêmica de Garanhuns, pela
oportunidade de cursar uma graduação, por toda a estrutura oferecida para que eu pudesse
concluir meu curso tão sonhado. Meu muito obrigada!
A todos professores da graduação que tanto me incentivaram durante esses anos na
UAG, contribuindo para meu crescimento profissional e pessoal, em especial aos professores
Wallace Telino, Rachel Neves, Rita Cardoso, Elizabete da Silva e Rute Chamié, vocês são
pessoas excepcionais que levarei pra sempre comigo, meu muito obrigada!
À melhor orientadora do mundo, Tania Alen Coutinho. Professora você é uma pessoa
sensacional, obrigada por acreditar em mim, por toda a dedicação, pelas nossas conversas
maravilhosas, infinitas às vezes (“kkkkk”), pelos conselhos, paciência e pelo apoio acima de
tudo. Espero continuar encontrando essa paulistana “arretada” sempre. Meu muito obrigada!
Foi maravilhoso trabalhar com você durante esses anos.
Aos amigos que fiz aqui em Garanhuns e levarei para sempre em meu coração, em
especial à Jaciara Melo, Sergio Silva, José Alexandre, Isabela Buriti, Brenda Macena,
Elizabetty Almeida, Maria Erika, Veruska Dinar e à irmã de Garanhuns, Gilmara Matias. Vocês
fizeram com que essa jornada fosse mais leve e alegre, muito obrigada por compartilhar essa
experiência comigo. Amo vocês!
7
RESUMO
ABSTRACT
LISTA DE FIGURAS
Página
LISTA DE TABELAS
Página
Tabela 1 - Diagnósticos presuntivos ou definitivos dos 130 casos atendidos/
acompanhados do HVP da ANCLIVEPA/ SP entre 05 de agosto a 06
de setembro de 2019 (Unidade Zona Norte)
............................................................................................................. 27
Tabela 2 - Diagnósticos presuntivos ou definitivos dos 96 casos atendidos/
acompanhados do HV da FMVZ – UNESP/ Botucatu entre 16 de
setembro a 25 de outubro de 2019 .................................................... 36
Tabela 3 - Mecanismo de ação e efeitos adversos de fármacos antieméticos e
procinéticos utilizados para controle de vômito em gatos ............... 61
14
LISTA DE SÍMBOLOS
% Porcentagem
h Hora
IV Via intravenosa
Kg Quilograma
mg Miligrama
min Minutos
SC Via subcutânea
VO Via oral
17
SUMÁRIO
Página
PARTE I – RELATÓRIO DE ESTÁGIO SUPERVISIONADO
OBRIGATÓRIO .................................................................................................... 19
1 INTRODUÇĀO ........................................................................................ 20
2 HOSPITAL VETERINÁRIO PÚBLICO – ANCLIVEPA/SP ............ 21
2.1 DESCRIÇĀO DO LOCAL ........................................................................ 21
2.2 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS ......................................................... 24
2.2.1 Casuística .................................................................................................. 25
3 HOSPITAL VETERINÁRIO DA FMVZ – UNESP – BOTUCATU .. 29
3.1 DESCRIÇĀO DO LOCAL ........................................................................ 29
3.2 ATIVIDADES DESENVOLVIDAS ......................................................... 33
3.2.1 Casuística .................................................................................................. 34
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................. 38
PARTE II – TRABALHO DE CONCLUSĀO DE CURSO – VÔMITO
CRÔNICO EM GATOS: REVISĀO DE LITERATURA ................................. 39
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................... 40
2 REVISĀO DE LITERATURA ............................................................. 42
2.1 ASPECTOS ANATÔMICOS E PARTICULARIDADES DO TRATO
GASTROINTESTINAL DE GATOS ..................................................... 42
2.2 FISIOPATOGENIA DO VÔMITO ........................................................ 43
2.3 PRINCIPAIS CAUSAS DE VÔMITO CRÔNICO EM GATOS ........... 46
2.3.1 Linfoma alimentar ................................................................................. 47
2.3.2 Alergia e intolerância alimentar .......................................................... 48
2.3.3 Processos obstrutivos e corpo estranho gástrico ................................ 48
2.3.4 Distúrbios parasitários e infecciosos .................................................... 50
2.3.5 Doença renal crônica ............................................................................. 50
2.3.6 Doença intestinal inflamatória ............................................................. 51
2.3.7 Doença hepática crônica ....................................................................... 52
2.3.8 Pancreatite ............................................................................................. 53
2.3.9 Tríade felina ........................................................................................... 53
2.3.10 Hipertireoidismo .................................................................................... 53
18
PARTE I
1 INTRODUÇÃO
O HVP (Unidade Zona Norte), segundo hospital veterinário público aberto na cidade de
Sāo Paulo (inauguração em 2014), faz parte de uma parceria estabelecida entre a Prefeitura de
São Paulo com a ANCLIVEPA/SP, cujas despesas são totalmente custeadas pela primeira e
administradas pela segunda (Figura 1). O HVP (Unidade Zona Norte) prioriza o atendimento
de animais da população de baixa renda do município.
O HVP (Unidade Zona Norte) dispõe de serviços nas áreas de Clínica Médica Geral,
Oftalmologia, Odontologia, Dermatologia, Cirurgia de Tecidos Moles, Anestesiologia e
Diagnóstico por Imagem (Radiologia e Ultrassonografia).
A estrutura física do hospital é composta por uma recepção com hall de espera e sala de
assistência social, seis consultórios (cinco para atendimento clínico médico e um para clínico
cirúrgico), um ambulatório para atendimentos emergenciais, um ambulatório para atendimento
de doenças infectocontagiosas, duas enfermarias, uma sala para medicação, um ambulatório
para exames radiográficos com sala para laudos adjacente, um ambulatório para exames
ultrassonográficos, um centro cirúrgico (o qual é composto por duas salas de cirurgia, uma sala
para paramentação, uma sala de recuperação anestésica, e uma sala para lavagem e preparo de
22
instrumental cirúrgico), setor de estoque de materiais de consumo e copa para uso da equipe e
funcionários do HVP (Unidade Zona Norte) (Figuras 2, 3, 4 e 5).
A B
A – recepção e B – hall de espera.
A B
A – ambulatório clínico médico e B – ambulatório clínico cirúrgico.
A B C
D E F
A – ambulatório de emergência, A – ambulatório de doenças infectocontagiosas, C – sala de medicação, D –
enfermaria, E – sala de pós-operatório e F – sala de cirurgia.
A B C
A – sala de radiologia, B – sala de ultrassonografia e C – sala de laudos.
2.2.1 Casuística
60 43
34 35
40
18
20
0
Macho Fêmea Macho Fêmea
Canina Felina
CANINA FELINA
No No
Diagnóstico/ suspeita Diagnóstico/ suspeita
casos casos
8 Cinomose 13 DTUIF1
5 Hemoparasitose 3 Micoplasmose
4 HAC2 3 Hidrotórax
4 Pancreatite 3 Fratura em Mandíbula
3 Endocardiose de mitral 3 DRC3
Gastroenterite de etiologia Complexo gengivite-estomatite-
3 3
indefinida Faringite
3 DRC 2 FIV4/ FeLV5
2 Diabetes mellitus 2 Pneumonia
2 Cardiopatia 1 Herpes vírus felino/ úlcera de córnea
2 Parada cardiorrespiratória 1 IRA6
2 Parvovirose 1 Intoxicação a esclarecer
2 Piometra 1 Doença inflamatória intestinal
2 Otohematoma 1 Doença renal policística
2 Miíase 1 Complexo respiratório felino
2 IRA 1 Platinosomose
1 Osteossarcoma 1 Septicemia
1 Otite 1 Sofrimento fetal
1 Intoxicação por chumbinho 1 Politraumatismo
1 Intussuscepção 1 Prolapso retal
1 Neoplasia intestinal 1 Trauma medular
1 Leptospirose 1 Tromboembolismo aórtico
1 Linfoma 1 Cistite idiopática
1 Lipoma 1 Corpo estranho linear gástrico
27
CANINA FELINA
No No
Diagnóstico/ suspeita * Diagnóstico/ suspeita
casos casos
1 Hiperplasia testicular/ prostática 1 Fecaloma
1 Eclampsia 1 Abscesso articular
1 Neoplasia tegumentar 1 Flegmão
1 Pneumotórax 1 Fecaloma
1 Reação vacinal 1 Neoplasia em cavidade oral
1 Urolitíase
1 Endoparasitose
1 Shunt portossistêmico
1 Traqueobronquite infecciosa canina
1 Trauma automobilístico
1 Giardíase
1 Crise epiléptica
1 Dermatite atópica
1 Dioctiofimose
1 Distrofia de córnea
1 Doença inflamatória intestinal
1 Cetoacidose diabética
1 DRC congênita
1 Cardiomiopatia dilatada
1 Ceratoconjuntivite seca
1 Broncopneumonia
1 Adenocarcinoma intestinal
1
doença do trato urinário inferior de felinos; 2 hiperadrenocorticismo; 3 doença renal crônica;
4
imunodeficiência viral felina; 5 leucemia viral felina; 6 insuficiência renal crônica.
Fonte: A própria autora.
28
20 19
18
18
16
Número de casos
14
12
10 9
8 8
8 7 7 7
6 6
6 5 5
4
4 3 3 3
2 2 2
2 1 1 1 1 1 1
0 0 0 0 0
0
Canina Felina
A estrutura do Setor de Clínica Médica de Pequenos Animais conta com: uma recepção
com hall de espera e sala de assistência social, nove ambulatórios (sendo um para triagem, três
para clínica geral, um para dermatologia, um para cardiologia, um para nefrologia, um para
neurologia e um para atendimento de felinos), uma sala de fluidoterapia, sala para atendimentos
emergenciais, uma farmácia, um consultório de medicina legal, uma sala dos residentes e uma
copa para uso da equipe setorial (Figuras 9, 10 e 11).
O HV funciona de segunda a sexta-feira das 08h00min às 12h00min e das 14h00min às
18h00min, e aos finais de semana, no mesmo horário, em esquema de plantão, atendendo
somente animais em quadros emergenciais (o HV não possui serviço de internação 24 horas).
A equipe do HV é formada por docentes, residentes, discentes e estagiários que atuam
em sistema de rodízio por todas as áreas do hospital.
O atendimento diário aos cães e gatos é feito por ordem de chegada de tutores ao HV,
onde primeiramente os pacientes passam pelo serviço de triagem, no qual é realizada uma breve
anamnese e exame físico, e em seguida os mesmos são encaminhados para a área mais
adequada, conforme a queixa principal. Todos os atendimentos são registrados num sistema
eletrônico “online” interno da FMVZ-UNESP/ Botucatu. Desta forma, todo histórico do
paciente fica disponível para todos os setores do HV, facilitando o repasse de informações e
contribuindo para a celeridade na elucidação dos casos.
31
A B
A – recepção e hall de espera e B – sala de triagem.
A B
A e B – sala ambulatorial de emergências.
A B C
D E F
A – sala de fluidoterapia,
B – consultório clínico,
C – ambulatório de cardiologia,
D – ambulatório de dermatologia,
E -ambulatório de felinos,
F – ambulatório de nefrologia,
G – ambulatório de neurologia e
H – farmácia.
G H
Fonte: Arquivo pessoal.
33
3.2.1 Casuística
33 36
40
Número de animais
30
16
20 11
10
0
Macho Femea Macho Femea
Canina Felina
CANINA FELINA
No No
Diagnóstico/ suspeita Diagnóstico/ suspeita
casos casos
8 Hemoparasitose 6 DTUIF1
7 DRC2 3 Linfoma
5 Endocardiose de mitral 3 Micoplasmose
4 Crise epiléptica 2 Complexo respiratório felino
4 IRA3 2 Doença intestinal inflamatória
2 Pneumonia 2 DRC
2 Demodicose 1 Broncopneumonia
Gastroenterite de etiologia
2 1
indefinida Carcinoma de células escamosas
2 Doença do disco intervertebral 1 Carcinoma mamário
2 Doença intestinal inflamatória 1 Colangiohepatite/ DRC
2 Parvovirose 1 Hipertireoidismo
2 Linfoma 1 IRA por micoplasmose
1 Intoxicação/ úlcera gástrica 1 Fecaloma
1 Dermatite atópica 1 Lipidose hepática
Dermatofitose/ demodicose/ otite/
1
piodermite 1 Neoplasia em seio nasal/ sinusite
1 Gestação
1 Giardíase
HAC4/ colapso de traqueia/
1
broncopneumonia/ CCS5
1 IRA congênito
1 Abscesso vacinal
36
CANINA FELINA
No No
Diagnóstico/ suspeita Diagnóstico/ suspeita
casos casos
1 Acidente crotálico
1 Agenesia de vesícula biliar
1 Anemia hemolítica imunomediada
1 Ataxia a esclarecer
1 Broncopneumonia
Carcinoma de células escamosas/
1
hemangiossarcoma
1 Cardiopatia
1 Cetoacidose Diabética
1 Cinomose
1 Criptococose
1 Neoplasia vesical/ crises epilépticas
1 Osteomielite
1 Piotórax
1 Reação vacinal
1 Síndrome vestibular central
1 Traqueobronquite infecciosa canina
1
doença do trato urinário inferior de felinos;
2
doença renal crônica;
3
insuficiência renal crônica;
4
hiperadrenocorticismo;
5
Ceratoconjuntivite seca.
14
14
12 11
Número de casos
10
8
8 7
6
6 5 5 5
4 44 4 4
4 3 3
2 2 2
2 11 1
0 0 0 0 0
0
Canina Felina
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
PARTE II
1 INTRODUÇÃO
De acordo com o Instituto Pet Brasil no ano de 2018, os gatos somaram 23,9 milhões
de animais de estimação nos lares brasileiros e aponta que a população de felinos domésticos
vem crescendo cerca de 8 % ao ano desde 2013. A crescente escolha dos gatos pelos tutores se
deve as características que esses animais apresentam, como a habilidade de adaptação a
ambientes pequenos e maior independência comparado aos cães, destacando o gato como
animal de companhia para o homem moderno (GERALDES, 2019). Apesar dos gatos serem
animais mais reservados e independentes, essas características podem ser prejudiciais quanto à
observação de enfermidades por seus tutores, levando à detecção tardia de doenças (HELENO;
AVELAR, 2016).
Nas consultas veterinárias em medicina felina, os distúrbios do trato gastrintestinal
representam até 12 % das queixas, sendo o vômito uma apresentação frequente nos pacientes.
Muitas vezes esse sinal clinico é visto como algo “normal” pelos tutores, fato relacionado ao
hábito de ingestão de pelos (durante auto higienização) e posterior eliminação através do
vômito, entretanto, esta manifestação pode representar um quadro mórbido, principalmente
quando o vômito se torna recorrente (DANIEL, 2015).
O vômito ou também chamado de êmese é definido como a ejeção de parte ou de todo
o conteúdo estomacal e/ ou do intestino delgado pela cavidade oral. Vale salientar que, o vômito
é um sinal clínico e está associado a diversas patologias de causa base. O mecanismo que leva
ao vômito é coordenado pelo sistema nervoso central (SNC), mas propriamente dito pelo centro
do vômito, o qual é localizado no tronco encefálico. Esta região é responsável por iniciar e
controlar o ato da êmese e responde diretamente a estímulos de várias partes do corpo (LITTLE,
2015).
O vômito pode apresentar-se de forma aguda ou crônica, sendo esta última definida pelo
tempo de evolução (2 semanas ou mais) e pela não responsividade à terapêutica inicial
(HAUCK, 2016). A manifestação emética está associada à uma grande variedade de distúrbios
gastrointestinais e não gastrointestinais. Dentre os distúrbios primários do trato gastrointestinal
que manifestam-se por meio de êmese (entre outros sinais clínicos) podem ser elencadas causas
infecciosas, inflamatórias, parasitárias, anatômicas (obstrutivas), tóxicas e nutricionais.
Enquanto que, entre as causas extra gastrointestinais configuram endocrinopatias
(hipertireoidismo), doenças metabólicas (insuficiência renal), doenças hepáticas, pancreatite,
desequilíbrios ácido-base/ eletrolítico e neoplasias (ZORAN, 2019). O estudo das causas de
base que manifestam-se por vômito é de extrema importância na Medicina Felina, visto que
41
esse sinal clínico pode levar o animal a quadros mórbidos gravíssimos e culminar até mesmo
no óbito. O controle terapêutico do vômito deve ser direcionado à causa base com o objetivo
de reverter a doença e oferecer ao felino qualidade de vida verdadeira (HAUCK, 2016).
A explanação dos mecanismos que culminam com o vômito faz-se necessária para uma
melhor compreensão pelo Médico Veterinário acerca das causas associadas à esta manifestação
clínica, além de proporcionar terapêutica mais adequada para cada caso (LITTLE, 2015).
Diante do exposto, o objetivo desta revisão foi abordar as principais enfermidades que levam a
quadros crônicos de vômito em gatos, além de destacar técnicas diagnósticas disponíveis e
terapêuticas aplicadas para os quadros eméticos.
42
2 REVISÃO DE LITERATURA
O trato gastrointestinal (Figura 14) é um tubo oco que se estende desde a cavidade oral
até o ânus, com segmentos anatomicamente distintos, sendo eles: cavidade oral, faringe,
esôfago, estômago, intestino delgado e intestino grosso. Cada região citada apresenta funções
específicas, complementares e integrativas, formando um complexo sistema responsável por
promover a digestão e a remoção de produtos residuais (ROBBINS; COTRAN, 2010). O fígado
e o pâncreas são órgãos anexos ligados ao trato gastrointestinal, tendo respectivos ductos
drenando diretamente para o interior do sistema digestório (DYCE, 2010).
A cavidade oral é composta por músculos esqueléticos, língua, dentes, glândulas
salivares e tonsilas. A partir da boca e faringe, o alimento chega ao esôfago, o qual é responsável
por conduzir a ingesta até o estômago. A parede do esôfago possui certa flexibilidade e
capacidade expansiva, tornando possível a distensão e contração deste tecido. Os dois terços
distais do esôfago felino é composto por músculo liso disposto em uma camada circular interna
e uma longitudinal externa. O esfíncter da parte inferior do esôfago protege a mucosa
esofagiana do refluxo gástrico (CARLTON; MCGAVIN, 1998).
O estômago de cães e gatos possui anatomia simples e é comparada a do homem com
ação secretora de ácido-pepsina. Ele é composto por quatro regiões: cárdia, fundo, corpo e
antro (ETTINGER; FELDMAN, 2010). Os gatos apresentam estômago pequeno e com menor
capacidade de distensão, sendo adaptado a pequenas quantidades de alimento por refeição,
contudo, esta característica força esta espécie à maior frequência de ingestão. O período de
armazenamento do conteúdo alimentar é limitado (média de 1 a 4 horas) (JERICÓ, 2015).
O intestino delgado é um tubo muscular de comprimento variável que começa no piloro
e termina na válvula ileocecal. Essa porção do intestino é composta por duodeno, jejuno e íleo.
Os felinos apresentam uma particularidade anatômica que os diferem das demais espécies, os
ductos pancreático e biliar se unem em um canal comum que desemboca no duodeno (COSTA,
2014).
O intestino grosso é formado anatomicamente pelo ceco, cólon (ascendente, transverso
e descendente), reto e ânus. Em gatos, trata-se de um órgão curto, o qual possui limitada
capacidade de absorção de nutrientes, tendo como principal função a absorção de água e
eletrólitos (principalmente sódio, potássio e cloro). Esta função do intestino grosso é muito
43
importante, pois a absorção de água assegura a formação das fezes com consistência ideal e
previne quadros de desidratação nos felinos (WORTINGER, 2009).
Faringe Estômago
Fígado Cólon
Boca e língua
incidente na detecção de corpos estranhos quando comparada aos cães. Contudo, considerando
a incidência de corpo estranho linear, os gatos apresentam maior frequência de ocorrência na
clínica. Os corpos estranhos lineares mais comuns são fios de costura presos a agulhas, fios de
tecido, fios de várias magnitudes como cordas cortantes e barbantes (Figura 19) (QUESSADA,
2011).
Jericó (2015) descreveu a doença renal crônica (DRC) como um processo resultante da
perda gradativa e irreversível de componentes estruturais ou funcionais do rim, que culminam
com déficit metabólico, endócrino ou excretor, apontando a espécie felina como a mais afetada.
51
2.3.8 Pancreatite
A tríade felina é uma enfermidade que engloba três doenças inflamatórias concomitantes
(fígado, pâncreas e intestino delgado). Esta afecção é observada principalmente em gatos, em
virtude de sua peculiaridade anatômica hepatobiliar. Regularmente há associação entre
hepatopatia inflamatória, doença intestinal inflamatória e pancreatite. As manifestações clínicas
mais frequentemente observáveis são sinais gastrintestinais (como vômitos e diarreia). O
diagnóstico definitivo é obtido a partir da demonstração do processo inflamatório nos órgãos
envolvidos, além de exame histopatológico de amostras obtidas por biópsia (CATTIN, 2015).
2.3.10 Hipertireoidismo
Segundo Little (2015), a abordagem do paciente com vômito crônico deve seguir várias
etapas para chegar ao diagnóstico definitivo, em virtude da quantidade de diferenciais possíveis.
As etapas a serem seguidas vão desde uma anamnese extensa (sinais e histórico), exame físico
completo, exames complementares (hemograma, urinálise, radiografia, ultrassonografia,
endoscopia e biopsia) até utilização de terapêutica e controle das doenças subjacentes, como
demonstrado na figura 20.
Inicialmente, a avaliação parte da determinação da gravidade do processo instalado,
visando diferenciar necessidades de exames pontuais, tratamentos sintomáticos de
investigações e terapias extensas (BACHELOR et al., 2013).
Na anamnese, deve-se descrever informações como idade, raça e sexo dos gatos e se há
ou não presença de contactantes doentes. O fator idade é importante para diferenciar algumas
doenças mais comuns em gatos jovens, como a ingestão de corpos estranhos, intussuscepção
ou causas parasitárias e/ ou infecciosas, enquanto outras doenças de acometimento sistêmico e
crônico são mais comuns em gatos idosos (LITTLE, 2015).
As predisposições raciais em determinados diagnósticos diferenciais também são
importantes, por exemplo os gatos siameses são mais predispostos a doenças gastrointestinais,
já gatos de raça pura tem predisposição ao adenocarcinoma, estenose pilórica e gastroenterite
linfoplasmocítica. Com relação ao sexo do paciente, podemos diferenciar as causas de base tais
como anormalidades uterinas ou doença prostática (BACHELOR et al., 2013).
55
GI – gastrintestinal
fPLI – imunorreatividade à lipase pancreática felina
fTLI – imunorreatividade tripsinoide felina
A - Exame da língua;
B – Presença de nódulos na tireoide.
adicionais forem necessárias ou em casos de alterações nos exames iniciais, uma gama de outros
testes podem auxiliar na melhor abordagem clínica do paciente emético. Assim, em achados
clínicos condizentes com hipertireoidismo e em gatos acima de seis anos, a mensuração de T4
total deve ser considerada (DEVAUCHELLE et al., 2012).
O teste de dieta de eliminação é utilizado como método de eleição para diagnósticos de
intolerâncias ou alergias alimentares. As sorologia para FIV e FeLV, exame
coproparasitológico, testes de Tritrichomonas fetus, teste do vírus da panleucopenia, análise de
líquido peritoneal ou torácico, citologia aspirativa por agulha fina de qualquer órgão ou massas
anormais encontrados, teste de infecção por dirofilariose (em áreas enzoóticas), também são
testes adjuvantes a terem sua implementação considerada para se determinar diagnósticos
diferenciais de gatos com processo emético (DEVAUCHELLE et al., 2012)
É possível a utilização de exames de imagem para examinar o estômago e os intestinos
(radiografia, ultrassonografia e endoscopia) (WILLIAMS; WARD, 2018). A radiografia é
método útil para detectar anormalidades no esôfago ou estômago. O uso de radiografias
contrastadas podem ser apropriadas na identificação de obstruções, tumores, úlceras, corpos
estranhos, entre outros achados pertinentes ao caso. A ultrassonografia é outro método
diagnóstico para visualização de obstruções e tumores, sendo sua escolha muito atraente na
tentativa de investigar alterações de mucosa como processos inflamatórios em órgãos
cavitários (WILLIAMS; RUOTSALO; TANT, 2018).
No entanto, em muitos casos, essas técnicas não invasivas não permitem um
diagnóstico definitivo, sendo necessário a realização de exames mais invasivos, como
celiotomia exploratória ou endoscopia. A endoscopia é um método minimamente
invasivo para a obtenção de biopsias das mucosas do estômago, duodeno, íleo e cólon
(WILLIAMS; RUOTSALO; TANT, 2018). A endoscopia também apresenta limitações como
a dificuldade de acesso a determinadas partes do trato digestivo e superficialidade do material
coletado. Diferentemente da abordagem cirúrgica, a qual possibilita biopsias digestivas de
espessura total, demonstrando assim, papel importante quando se busca diagnósticos
diferenciais entre doença inflamatória intestinal grave e linfoma gastrointestinal, bem como,
quando são necessárias biópsias hepáticas e pancreáticas (RESTLE; WHITTEMORE, 2019).
Quando o objetivo do clínico for pesquisar doença gástrica ou intestinal, a endoscopia será a
melhor escolha (Figura 23), e quando optar pela celiotomia deve-se atentar para o grau de
invasividade da técnica e sua inadequação para pacientes mais gravemente debilitados
(RESTLE; WHITTEMORE, 2019).
59
(a, b) - granularidade aumentada; (c) - friabilidade da mucosa; (d, e, f) - erosões estão associadas
a sinais gastrointestinais e lesões histopatológicas em gatos afetados
Fonte: Jergens (2012).
Essa classe de antieméticos possui vasta atuação tanto a nível central como em mucosa
gástrica (VIANA, 2000). Os principais representantes desta classe são a proclorperazina e
clorpromazina e estes impedem a estimulação do processo emético na ZDQ por meio de
antagonismo dos receptores dopaminérgicos, histaminérgicos do tipo 1 e colinérgicos, bem
como, no centro do vômito (em altas doses) por meio de antagonismo de receptores α2 -
adrenérgicos (TREPANIER, 2010).
Segundo Little (2015) os gatos apresentam maior sensibilidade no controle de vômito,
utilizando-se derivados de fenotiazina, pois os receptores α2 - adrenérgicos são essenciais para
o desenvolvimento de êmese em gatos. O efeito direto das fenotiazinas sobre estes receptores
geram efeitos colaterais como vasodilatação e hipotensão. As fenotiazinas diminuem o limiar
convulsivo e por este motivo devem ser utilizadas com precaução em pacientes epiléticos. Em
altas doses, sinais de fraqueza, tremores, rigidez e inquietação podem ser observados. Em
alguns casos, o uso desses medicamentos, eleva o risco de sedação. Diante do exposto, o uso
das fenotiazinas está limitado ao uso de pacientes internados com vômitos persistentes e sua
dose recomendada é de 0,2 a 0,4 mg/ kg, SC, TID.
2.5.5 Procinéticos
2.5.6 Mirtazapina
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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