Psicologia de Desenvolvimento - CAP - ISDB - Técnico Superior

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 37

2023

UNIVERSIDADE CATÓLICA DE ANGOLA

INSTITUTO SUPERIOR DOM BOSCO


“Veritate in Caritas”

Formador: Dilson Teixeira


Manuel Botelho, psicólogo
e professor

Dom Bosco
23/9/2023 – actualizado e
ampliado

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
CURSO DE AGREGAÇÃO PEDAGOGICA – ENSINO SUPERIOR

Dilson Botelho, psicólogo e professor


Contactos: 925359919 / 991359919; email: botelhosdelegado@gmail.com
INSTITUTO SUPERIOR DOM BOSCO
“Veritate in Caritas”

Curso de Agregação Pedagógica para Técnico Superior

Psicologia do Desenvolvimento

Dilson Botelho
Professor e Psicólogo

Luanda, 23 de Setembro de 2023

1
Epígrafes

“NINGUEM É TÃO GRANDE QUE


NÃO POSSA APRENDER, nem tão
pequeno que não possa ensinar”
(Esopo)

“Lembrai-vos de que a educação é


questão de coração…”
(Dom Bosco)

“A educação é o grande mentor do


desenvolvimento pessoal. É através dela que a
filha de um camponês se torna médica, que o
filho de um mineiro pode chegar a chefe de
minas, que o filho de trabalhadores rurais pode
chegar a presidente de uma grande nação”
(Nelson Mandela)

2
CONTEÚDO PROGRAMÁTICOS

CAPÍTULO I: PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO


HUMANO ---------------------------------------------------------------------------------- 5
1.1. Definição dos termos ---------------------------------------------------------------- 5
1.1.1. Psicologia------------------------------------------------------------------------- 5
1.1.2. Desenvolvimento ---------------------------------------------------------------- 5
1.1.3. Psicologia do Desenvolvimento ----------------------------------------------- 6
1.2. Breve história da Psicologia do Desenvolvimento ---------------------------- 6
1.3. Objecto de estudo da Psicologia do Desenvolvimento ------------------------- 8
1.4. Objectivos da Psicologia do Desenvolvimento ---------------------------------- 8
1.5. Factores que influem o Desenvolvimento humano ----------------------------- 8
1.6. Áreas do Desenvolvimento humano ---------------------------------------------- 9
1.6.1. Desenvolvimento cerebral/cognitivo --------------------------------------- 9

CAPÍTULO II: FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOLOGIA


DO DESENVOLVIMENTO ------------------------------------------------------ 11
2.1. Modelo de Ciclo de Vida ------------------------------------------------------------- 11
2.2. Teoria cognitivo-desenvolvimentista, de Piaget ----------------------------------- 11
2.3. Teoria Psicanalista-culturalista / Psicossocial, de Erikson------------------------ 13
2.4. Perspectiva etológica ------------------------------------------------------------------ 14
2.4.1. Teoria da Vinculação, de John Bowlby ------------------------------------------- 14
2.5. Perspectiva sociocognitiva, de Vygotsky ------------------------------------------- 18
2.6. Modelo bioecológico, de Bronfrenbrenner ----------------------------------------- 20

BIBLIOGRAFIA ---------------------------------------------------------------------- 22
ANEXOS ---------------------------------------------------------------------------------- 25

3
INTRODUÇÃO
O ser humano funciona como um sistema e as suas mudanças ocorrem em simultâneo em
um organismo “normal”, como um todo. Pois o humano é considerado um ser biológico;
psicológico; social; espiritual e histórico-cultural. E o seu desenvolvimento sucede, na
sua maioria, nestas dimensões. Por isso a interacção dessas proporções são harmoniosas
e complementam-se mutuamente.
O desenvolvimento humano é um processo que tem o seu início na concepção e só finda
com o seu desaparecimento físico.
O ser humano desde a fase de concepção tem a primazia evolutiva inata, o que é biológico;
formando uma complexa “máquina” de compreendê-la.
Na sua natureza de evolução precisa sempre de um ambiente adequado para a sua melhor
harmonia no seu processo sistemático e ordenado de crescimento.
O homem desde o início deparou-se com várias curiosidades a respeito da existência de
sua natureza e dos fenómenos que ocorrem sobre a vida: suas mudanças, emoções,
sentimentos e outros processos psicológicos e não só. Em função destas curiosidades
levaram-no a fazer-se certas indagações, que nos primórdios, sem respostas
“musculosas”, mas que com o passar do tempo foram encontradas algumas explicações,
nas várias áreas do saber, aqui em especial em Psicologia.
Como a Psicologia é considerada uma ciência recente ou “jovem”, logo tardiamente
surgiram as reais investigações e esclarecimentos sobre o desenvolvimento humano. Pois
a história da Psicologia como ciência é datada, somente, no século XIX; já a Psicologia
evolutivas, enquanto ramo, surge ainda um pouco mais tarde.
Compreender as contínuas mudanças que o ser humano apresenta, ao longo da vida,
descobrir e interpretar todas essas mudanças, tem sido o desafio para a Psicologia.
Neste módulo o foco é procurar a análise, discussão e a compreensão da forma como as
pessoas crescem e se desenvolvem, durante a vida; e elucidar o modo como essas
informações podem ser essenciais para o processo docente-pedagógico.
Nela vamos abordar os conceitos de Psicologia; desenvolvimento; Psicologia do
desenvolvimento; breve história da Psicologia do desenvolvimento; objecto de estudo;
objectivos; factores que influem o desenvolvimento; áreas do desenvolvimento;
fundamentos teóricos da Psicologia do Desenvolvimento…

4
CAPÍTULO I: PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
HUMANO
1.1. Definição dos termos.

1.1.1. Psicologia
A palavra Psicologia, na sua etimologia, deriva dos termos grego psyché, que
significa alma; mente; e logos, que equivale a estudo; razão…
A Psicologia é uma ciência e, como todas as outras, procura os princípios gerais
(Gleitman, et al. 2009). Como tal ela apresenta diversas definições, fruto de
contribuições de vários pesquisadores.
Nos primórdios a Psicologia era definida como estudo da alma ou da vida mental.
Actualmente, de forma a encontrar-se uma acepção mais harmónica entre os
especialistas, a Psicologia é definida como “a ciência que estuda o comportamento
e os processos mentais” (sensação, percepção, pensamento, sentimentos, etc).
Para Spector (2012) é a ciência do comportamento humano […], da cognição, da
emoção e da motivação.

1.1.2. Desenvolvimento humano


O desenvolvimento humano refere-se ao desenvolvimento orgânico/físico, mental...
O desenvolvimento é o conjunto de processos sucessivos que, de forma ordenada,
conduzem um organismo à sua maturidade.
Bock, et al (2009) define desenvolvimento sendo um processo ininterrupto em que os
aspectos biológicos/físicos, psicológicos, sociais e culturais se interconectam, se
influenciam reciprocamente, produzindo indivíduos com um modo de pensar, sentir
e estar no mundo absolutamente singulares e único.
Para Bronfenbrenner (2004, apud Pessanha, et al. 2012), desenvolvimento é um
fenómeno da continuidade e da modificação nas características biopsicológicas dos
seres humanos, quer como indivíduo, quer como grupo.
O desenvolvimento mental é uma construção contínua, que se caracteriza pelo
aparecimento gradativo de estruturas mentais (Bock, et al 2009 p. 117).
Compreender o desenvolvimento humano é importante para a Pedagogia (educação),
pois perceber as características comuns de cada faixa etária dos indivíduos permite
reconhecer os seus aspectos peculiares e nos leva a uma melhor interpretação dos seus
comportamentos.

5
Para Bock et al. (2009), compreender o desenvolvimento humano é uma condição
para tentar responder o porquê das condutas do bebé, da criança, do adolescente, do
jovem, do adulto e dos mais velhos.
Para melhor compreensão do desenvolvimento, em termo específico da área de
estudo, pensámos necessário que se perceba o termo maturidade.
1.1.2.1. Maturidade, em termos biopsicológico, é o nível de
desenvolvimento em que a pessoa se encontra, em relação as outras
da mesma idade (Piletti, 2006).
Reforça o mesmo autor, “um comportamento é maduro na medida em que for
adequado à idade do indivíduo”.
A maturidade pode ser: física/biológica, intelectual, social, afectiva/emocioanal,
sendo todas interdependentes.

1.1.3. Psicologia do Desenvolvimento


Psicologia do Desenvolvimento é um ramo da Psicologia que estuda os processos de
modificações psicológicas, que ocorrem ao longo da vida humana.
Para Davidoff (2001), a Psicologia do desenvolvimento é agora definida em termo de
todo o ciclo de vida. Abrange a investigação do crescimento estrutural física, o
comportamento e o funcionamento mental, desde qualquer ponto de seu surgimento
até qualquer ponto antes da morte.
Já Coll; Marchesi e Palácios, et al (2004), definem-na como o estudo dos “processos
de mudança psicológica, que ocorrem desde a nossa concepção até nossa morte”.
Reforçam Gleitman, et al (2009) que os psicólogos do desenvolvimento mental
humano querem saber como as crianças adquirem as operações intelectuais básicas,
que são parte do pensamento humano adulto – como aprendem a contar, a
compreender que os acontecimentos têm causas, etc.
Ela “estuda os processos de modificações intra-individual e ambiental do
comportamento”.

Este ramo abrange várias áreas da Psicologia, como a Psicologia da Personalidade; da


Aprendizagem; a Social; a Psicopatologia; a Percepção, a Psicofisiologia; e, ainda,
ciências afins, como Genética; Antropologia; a Sociologia; Educação; etc.

6
1.2. Breve história da Psicologia do Desenvolvimento
Todo e qualquer conjunto de conhecimento para atingir o patamar de ciência é
imprescindíveis que cumpra com os critérios a que são necessários. Os principais
requisitos são possuir um objecto de estudo, métodos, objectivos e outros.
A psicologia, nos seus primórdios, era estudada pelos filósofos - pertencia a Filosofia,
tida como a “maestra” das ciências. A mesma granjeou, apenas, a sua autonomia
científica nos finais do século XIX. Vários autores e estudiosos deram os seus
contributos para a sua “liberdade” académico-científica; desde filósofos, fisiologistas,
psicólogos, só para citar alguns. Todavia, a paternidade científica da Psicologia é
atribuída ao fisiologista e psicólogo alemão Wilhelm Wundt (1832 a 1920), que
fundou em 1879 o primeiro laboratório de Psicologia experimental, na Universidade
de Leipzig, na Alemanha, fazendo, assim, a ruptura a Psicologia da Filosofia. Para
Wundt, o objecto de estudo da Psicologia era a sensação e percepção imediatas; os
seus estudos tinham como base a introspecção, sendo o método primário e cujo
objectivo era descrever as sensações, percepções e as emoções… um dos principais
tratados da Psicologia foi o Livro de Wundt “Princípios de Psicologia Fisiológica”.

A Psicologia do Desenvolvimento é um dos ramos da Psicologia. A sua história


enceta-se na análise da evolução sobre a infância (criança) e a adolescência.
Nos séculos anteriores, a infância não tinha um período de desenvolvimento
diferenciado ou específico. Afirmam Monteiro e Santos, que o historiador Philippe
Ariès, nos anos 60, argumenta que nas sociedades não existiam um “sentimento de
infância nem adolescência”. Considera que não se distinguiam tipos de actividades,
divertimentos e até de trabalho entre os mais novos e dos adultos.
Gleitman, et al. (2009) reforçam, que nos séculos anteriores os “empiristas e os
inatistas consideravam a criança como muito semelhantes a um adulto”: a visão dos
empiristas sobre a criança era como um “adulto-em-treino”. Já os inatistas viam-nas
como “adulto-em-miniatura”. Essas ideias vincularam durante muito tempo.
Palácio, (1999 apud Pessanha, et al. 2012) realça que a Psicologia do
desenvolvimento contemporânea surgiu no momento em que o estudo dos processos
de modificação psicológica ultrapassou as fronteiras da infância e da adolescência,
passando a integrar no seu estudo a análise do desenvolvimento durante a idade adulta
e dos processos de envelhecimento.

7
As primeiras preocupações de questões de carácter evolutivo, de acordo com uma
perspectiva psicológica, situam-se na segunda metade do século XIX e início do XX,
devido a implementação das ideias da genética no campo da Psicologia. Pois a
Psicologia Genética foi a precursora imediata da Psicologia do desenvolvimento
contemporânea. Autores como John Locke, David Hume – empiristas; Rousseau, I.
Kant, Darwin - naturalistas; Karl-Ernst von Baer, Jean Piaget, Freud, Hall, etc., deram
um contributo relevante em prol da evolução desse ramo da Psicologia.
Realçam Monteiro e Santos, que um aspecto relevante desta história foi no século
XX, tido como o dos direitos humanos, onde foi consignado os direitos da criança.
Já Pessanha, et al (2012) sublinham que no início deste século, esta área foi dominada
pelos modelos mecanicistas - tradição do empirismo – cujo foco são os estímulos
externos que moldam o humano; e pelos modelos organísmicos ou organicistas –
inatistas, que atribuíam mais importância aos processos internos. De acordo com estes
últimos, existiria uma certa necessidade evolutiva que faria com que o
desenvolvimento passasse, em todos os indivíduos, por determinados estádios, que
eram considerados, na espécie humana, como marcos universais.
Um dos proeminentes para o surgimento da Psicologia do Desenvolvimento foi
William Preyer (1842 - 1897), que em 1882 publicou a obra “Mente da Criança”,
que impulsionou as pesquisas na área do desenvolvimento.
Muitos outros pesquisadores teceram o seu contributo para a evolução deste ramo.
Portanto, várias pesquisas atribuem a sua paternidade científica ao psicólogo
americano G. Stanley Hall (1844 a 1924), considerado o que deu início ao primeiro
laboratório de Psicologia nos Estados Unidos da Americano, em 1881 (3) - o chamado
“laboratório de Psicofisiologia, bem com o primeiro periódico americano de
Psicologia, em 1887 – Journal of Psychology. Foi o primeiro presidente da Clerk
University e o primeiro presidente da Associação Americana de Psicologia (APA,
fundada em 1892), fruto de seu grande esforço (Schultz e Schultz, 2009 p. 173).
Criou a 1ª revista dedicada a Psicologia do desenvolvimento intitulada “Pedagogical
Seminary”, em 1893; e rebaptizou-o em 1927 como “The Journal of Genetic
Psichology”. Por isso foi-lhe atribuído o mérito deste ramo (Material de Apoio de
Psicologia de Desenvolvimento, 2006).
Schultz e Schultz afirmam que Hall pretendia com o referido periódico, que servisse
de vínculo para as pesquisas sobre Psicologia infantil e educacional.

8
Os autores reforçam que a ambição de Stanley Hall estava na aplicação da Psicologia
à educação. Foi professor de vários famosos como J. Dewey e J. Cattell.
O psicólogo e professor Hall era, muitas vezes, chamado de “o psicólogo genético”,
devido à sua preocupação com o desenvolvimento humano e animal e os problemas
relacionados à adaptação. Seus interesses genéticos o levaram ao estudo da Psicologia
da Infância (Schultz e Schultz, 2009).
Segundo Averill (1999 p. 127 apud Schultz e Schultz, 2009 p. 175) “a criança tornou-
se o laboratório de Hall”; que lhe era elogiado como a “autoridade do mundo sobre o
estudo da criança”.
O mesmo tinha um trabalho muito influente sobre Adolescência (1904), que muitos
estudiosos atribuem-no como o “mentor” do referido estágio de desenvolvimento.
Sustentam os autores citados, que Hall à medida que envelhecia foi crescendo o
interesse a respeito das fases tardias do desenvolvimento humano e publicou
Senescence, em 1922, a primeira pesquisa em larga escala sobre assuntos psicológicos
da velhice. Era, igualmente, apelidado de “Darwin da Mente”.
Hall desenvolveu o método de questionário (técnica desenvolvida por Francis
Galton), com numerosas questões sobre a infância e a velhice. Sugeriu, igualmente,
que o desenvolvimento do indivíduo (ontogenia) repete as várias fases na evolução
da espécie (filogenia).

Um outro autor fundamental para o crescimento desta área foi James Mark Baldwin
(1861 - 1934). Seu estudo baseou-se na sistematização da Psicologia do
Desenvolvimento.
Foi um dos fundadores da 1ª revista científica de Psicologia; sua ideia influenciou
Piaget e Vygotsky. Para ele, o “conhecimento depende de um processo de
sociogéneses, que é o primeiro resultado de uma construção social”.

Um outro elemento, primordial, na história deste ramo foi a construção dos primeiros
testes mentais e suas aplicações. Aqui realçar a influência de autores como James M.
Cattel (1860 a 1944), americano que cunhou a expressão “testes mentais”; Alfred
Binet (1857 a 1911), francês que introduziu o conceito “idade mental” e “quem

9
desenvolveu o primeiro teste verdadeiramente psicológico de habilidade mental”
(Schultz e Schultz, 2009 p. 199).
O médico espanhol Juan Huart (1530 a 1592), pelos seus estudos primários sobre as
“diferenças individuais”. Schultz e Schultz (2009 p. 135) salientam que Huart, nos
seus estudos, “apresentava uma grande variedade de diferenças individuais da
capacidade humana”. O mesmo sugeria que as pessoas começassem a estudar desde
cedo para que a educação pudesse ser planeada individualmente de acordo com as
suas habilidades. E o inglês Francis Galton (1822 a 1911), pelas suas ideias e estudos
sobre “hereditary genius”, as “diferenças individuais” e sobre as “impressões
digitais”. Foi ele quem deu origem ao conceito de testes mentais.

1.3. Objecto de Estudo da Psicologia do desenvolvimento


O objecto de estudo da Psicologia do desenvolvimento é o estudo das distintas etapas
da vida humana, bem como do desenvolvimento dos mecanismos biológicos e
psicológicos, que são inerentes às interacções estabelecidas entre o indivíduo e o meio
ambiente (Matias, 2015 p. 39).
Para Pessanha, et al. (2012 p. 33), o seu objecto de estudo “é toda a vida dos
indivíduos e os processos de modificação psicológica que nela ocorrem”.
Já Monteiro e Santos reforçam, que o objecto de estudo deste ramo da Psicologia é o
próprio ser humano em permanente evolução, analisando as várias etapas da vida –
infância, adolescência, fase adulta e velhice, - do desenvolvimento dos processos
biológicos e psicológicos nas relações interactivas da pessoa e do meio.

1.4. Objectivos da Psicologia do Desenvolvimento


A Psicologia do Desenvolvimento tem como objectivos identificar e explicar as
continuidades e mudanças experimentadas por indivíduos ao longo do tempo.
Refere Kipp Shaffer (2012), que os três objectivos essenciais das ciências do
desenvolvimento são: descrever, explicar e melhorar o desenvolvimento.
Acrescentam Coll, Marchesi e Palácios, et al. (2004 p. 18); além da descrição e
explicação, citada, também a predição dos processos de mudança psicológica...

10
1.5. Factores que influem o Desenvolvimento humano
O ser humano apresenta um modelo único de desenvolvimento. A sua fase de infância
é prolongada e leva tempo para alcançar a idade adulta, em relação a outras espécies.
Nestas etapas que vai passando, vai mudando os seus comportamentos. Estas
mudanças ocorrem por influência de diversos factores.
Braghirolli, et al. (2010) argumentam que o desenvolvimento humano é contínuo e
sistemático, embora há estágios críticos, em que os factos parecem se precipitar.
Reforça Davidoff (2001), que o desenvolvimento humano é influenciado pelas
interacções permanentes entre a genética; meio ambiente e a maturidade.
Corrobora com a mesma ideia Mussen (1980), afirmando que todas as características
e habilidades do indivíduo, bem como todas as mudanças de desenvolvimento, são
produtos de dois processos básicos, embora complexo: maturidade e experiência; aqui
os agrupámos em dois grupos: internos e externos.
 Internos: Genética / Hereditariedade; crescimento orgânico e maturidade.
 Externos: Ambiente /aprendizagem; alimentação e preservação da Natureza.

1.6. Áreas do desenvolvimento humano


O desenvolvimento humano deve ser encarado na sua generalidade, contudo para a
nossa abordagem associámo-los em cinco áreas; segundo Bock, Furtado e Teixeira
(2009); etc.: Físico-motor; Social; Cognitivo; Linguagem e Afectivo / emocional.

11
1.6.1. Desenvolvimento cerebral/neurológico (cognitivo)
O desenvolvimento neurológico do humano, diferente do físico, inicia mais tarde;
aproximadamente ao 3 - 4 meses após a concepção. O crescimento do feto começa a
se aparecer com uma miniatura de bebé, com alguns sistemas orgânicos em
actividades e um certo número de reflexos primitivos – sucção. Aos 7 meses, o feto
cresce quase 40 cm, já dispõe de um padrão de reflexos completamente desenvolvido,
pode chorar, engolir, etc. e tem boas probabilidades de sobreviver se nascer
prematuramente, nesta altura. Nove (9) meses depois, o feto humano deixa o útero e
é expelido pelo exterior – nascido (Gleitman, et al. 2008 p. 730).
O cérebro humano, em fase de desenvolvimento, é bastante sensível às influências
do ambiente interno e externo e com estresse tóxico na primeira infância.
Sustenta Schacher (1981 apud Gleitman, et al. 2008), o bebé humano à nascença é
muito delicado, indefeso e totalmente dependente dos adultos. A sua imaturidade
situa-se em quase todo organismo.
No sistema nervoso (SN), os neurónios ou célula nervosa começam a sua maturação
nas fases mais avançadas do crescimento pré-natal e os seus axónios e dendrites
formam interconexões cada vez mais complexas com outras células nervosas. Mas,
no momento do nascimento, o cérebro ainda não está com maturidade (Gould, 1977
apud Gleitman, 2008 p. 731).
Além dos neurónios, o SN é composto pelas células gliais, que “ocupam os espaços
interneurónios, que nutrem e modulam a sua função” (Mesquita e Duarte, 1997).
Para que o neurónio mantenha a sua actividade e garanta as suas funções tem de ser
alimentado com oxigénio e glicose - são as células da glia, que alimentam, isolam e
controlam o crescimento dos neurónios.
As células da glia (cola) têm a função de sustentação dos neurónios adultos e
contribuem para o processo de reparação se o tecido cerebral for lesionado.
São cruciais para a comunicação neuronal. Actuam com fio-guia dos neurónios em
crescimento; aumentam a velocidade de comunicação dos neurónios.
O neurónio tem como principal característica, a capacidade de conduzir os impulsos
eléctricos, estando ligados a outras células, através das sinapses (químicas ou
eléctricas), onde os sinais são transmitidos.

12
Os estímulos transmitidos ao cérebro pelos circuitos sensoriais, os períodos pré e pós-
natal, e também nos demais estágios da vida diferenciam a função dos neurónios e
dos circuitos neurais (Mustard, 2010).
Um neurónio típico possui três estruturas/elementos fundamentais: corpo celular,
axónios e dendrites.

Quanto ao tamanho do cérebro, o do recém-nascido é quase do tamanho do do adulto


e está quase completamente formado. O recém-nascido humano só atinge 23% da sua
capacidade craniana adulta à nascença e está ainda apenas a 75% dela aos dois anos
e meios (Gould, 1977 apud Gleitman, 2008 p. 731).
Continuam os autores, a imaturidade do bebé humano e o ritmo lento do
desenvolvimento tornam inevitável um período extenso de dependência o que, de
certo modo, constitui um grande inconveniente tanto para a criança como para os pais.
Mas este longo período de dependência é o exactamente necessário para uma criatura
cuja principal especialização é a capacidade de aprender e cuja invenção básica é a
cultura. Os bebés têm muitas coisas para aprender e uma enorme capacidade de
aprendizagem.

13
CAPÍTULO II: FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA
PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
A Psicologia do Desenvolvimento, assim com a Psicologia Geral, apresenta diversas
concepções, resultado de contributos de alguns autores para o alavancar da mesma
área. Nesta abordagem trazemos algumas dessas concepções e seus respectivos
autores, como: o modelo de ciclo de vida; cognitivo-desenvolvimentista, de Piaget; a
psicanalista culturalista, de Erikson; perspectiva etológica, de Bowlby; perspectiva
sociocognitiva, de Vygotsky e o modelo bioecológico de Urie Bronfenbrenner.

2.1. Modelo de Ciclo de Vida


O modelo de Ciclo de vida surgiu como uma perspectiva de oposição aos modelos
primários da Psicologia do Desenvolvimento, como os mecanicistas e organísmicos,
que defendiam a análise da evolução do indivíduo só na infância e adolescência.
Este modelo enfatiza, que os processos de modificação psicológica se verificam em
todo o ciclo de vida do humano, desde a vida ultra--uterina até a morte.
Para os autores deste modelo, não existiam metas de desenvolvimento universais,
consideram o desenvolvimento multidireccional – orientado para metas diferentes,
não universais nem necessárias. Salientavam, a influência de variáveis de natureza
histórica e cultural no desenvolvimento dos indivíduos (Pessanha, et al. 2012).
Reforçam os referidos autores, que esta concepção do desenvolvimento era menos
restritiva, mais sensível aos aspectos evolutivos, que a mecanicista, mais sensível a
influência do meio que na organismíca e mais preocupada com o papel desempenhado
pela cultura no desenvolvimento (Palácio, 1995).
Eis as fases: vida pré-natal; infância; idade escolar; adolescência; adulta e velhice.

2.2. Teoria cognitivo-desenvolvimentista, de Piaget


Jean Piaget (1896 a 1980) foi biólogo; epistemologista, psicólogo e construtivista
suíço; a sua teoria assenta-se em dois pressupostos: epistemológico e biológico.
No quesito epistemológico, Piaget realça que o desenvolvimento da cognição resulta
da “interacção entre o sujeito e a realidade” ou melhor da “acção do sujeito sobre o
objecto” (Pessanha, et al. 2012 p. 42).
Afirma Matias (2015 p. 41), que o epistemologista recorre a Biologia para explicar
como se processa a interacção entre o sujeito e o exterior.

14
O suíço acreditava que o desenvolvimento cognitivo de uma criança, com sãs
faculdades intelectuais, inicia a sua descoberta da realidade por meio dos órgãos de
sentidos. Para Piletti (2006), Piaget entende o desenvolvimento como um processo de
equilibração constante. E esse equilíbrio leva o indivíduo a adaptação, que é resultado
de dois processos básicos: a assimilação e a acomodação.
Segundo Piaget, cada etapa é caracterizada por aquilo que o indivíduo consegue fazer
de melhor nessas faixas etárias (Bock, et al. 2009).
Na sua pesquisa epistemológica, Piaget propôs quatro (4) estádios principais de
desenvolvimento cognitivo.

Estádios Características do desenvolvimento cognitivo


(idade)

1. Sensório- - Inteligência prática, ligada ao sensorial e à acção motora;


motor (0 a 2 - Estabelecimento do comportamento intencional;
anos) - Construção de objectos permanentes e das primeiras representações;
- Acesso à funções simbólicas.

2. Pré- - Desenvolvimento progressivo dos processos de simbolização;


operatório (2 a 7 - Egocentrismo cognitivo;
anos) - Ausência de reversibilidade;
- Insensibilidade à contradição;
- Pensamento ligado à percepção e ao raciocínio intuitivo

3. Operações - Superação do egocentrismo;


concretas (7 a - Aparecimento da lógica e da reversibilidade;
11 anos) - Operações possíveis em situações particulares

4. Operações - Aparecimento da lógica formal, da característica de operar logicamente com


formais ou entidades linguísticas;
abstractas (a - Pensamento capaz de operações dedutivas, de exactidão lógica e de análise
partir da teórica.
adolescência)
Adaptação da obra de Pessanha, et al. (2012).

15
2.3. Teoria Psicanalista culturalista / Psicossocial, de Erikson
Erik Erikson (1902 a 1994) foi um psiquiatra alemão; o foco de sua teoria baseia-se
na “interacção recíproca entre o indivíduo, o ambiente imediato e as influências
históricas culturais, processando-se segundo as orientações de um plano biológico,
que evolui em interacção com o meio (Pessanha, et al. 2012 p. 67).
Afirma Cloninger (2003 apud Pessanha, et al. 2012), de que Erikson, nas suas ideias
teóricas, propôs o princípio de que “tudo o que cresce tem um plano básico, e é a
partir deste que se erguem as partes, tendo cada uma delas o seu próprio tempo de
ascensão até que todas tenham surgido para formar um todo em funcionamento”.
Braghirolli, et al. (2010) reforça, que para Erikson os “indivíduos enfrentam diferentes
tarefas sociopsicológicas à medida que crescem”.
Reforça Matias (2015), a medida, positiva ou negativa, com que o indivíduo
ultrapassa o conflito, que o aflige, está relacionada com as suas vivências pessoas, e
isso irá repercutir-se nos estádios subsequentes. Segundo o psiquiatra, o ser humano
apresenta duas formas de lidar com as crises: modo adaptativo e o modo inadaptativo.
Pois é com a resolução dos conflitos próprios de cada fase que se torna possível a
progressão normal do desenvolvimento psicossocial do indivíduo.
Para Erickson cada período de desenvolvimento é caracterizado por tarefas
específicas e pela experiência de determinado conflito ou crise.
É com a progressão dos estádios psicossociais que implica a construção da
personalidade, que acompanha o individuo em tudo ciclo de vida.

Os oito estádios de desenvolvimento de Erikson


1. Confiança versus desconfiança (0 a 1 ano);
2. Autonomia versus dúvida e vergonha (1 a 3 anos);
3. Iniciativa versus sentimento de culpa (4 a 5anos);
4. Actividade versus inferioridade (6 a 11 ano);
5. Identidade versus confusão de papéis (11 a 18 ano);
6. Intimidade versus isolamento (18 a 45 ano);
7. Produtividade versus estagnação (45 a 65 anos);
8. Integridade versus desespero (65 ano em diante).

Att. Para mais informação confere as descrições em anexo.

16
2.4. Perspectiva Etológica
Este modelo de desenvolvimento surgiu com base nos trabalhos desenvolvidos pelo
naturalista britânico Charles Darwin (1809 a 1882) e pelo etólogo austríaco Konrad
Lorenz (1903 a 1989), que estudaram o comportamento animal em termos dos seus
antecedentes filogenéticos, da sua importância para a sobrevivência e da sua
adaptação ao nicho bioecológico em que a existência desses animais se desenrola
(Pessanha, et al. 2012).
Estes observaram que existem espécies em que as crias nascem preparadas para
seguirem a progenitora de forma a manterem a proximidade e o contacto com ela, o
que permite assegurar a alimentação e os cuidados necessários à sua sobrevivência.
Os mesmos estudiosos afirmaram que o “ser humano, ao nascer, não é uma tábua
rasa”, uma vez que traz inscritos no seu organismo uma série de comportamento
concretos (reflexos e padrões fixos de comportamentos) e de tendência de
comportamento que são activados em contacto com os estímulos do meio, em
particular com o de tipo social, considerados como os mais importantes para o ser
humano (Pessanha, et al. 2012 p. 37).
Esta perspectiva tem várias teorias, todavia abordaremos, apenas, a de Bowlby.

2.4.1. Teoria da Vinculação de John. Bowlby


Uma das principais teorias desta perspectiva foi a realizada pelo médico e psiquiatra
inglês Edward John Bowlby (1907 a 1999) em relação ao Apego ou Vinculação
(Pessanha, et al. 2012).
Os referidos autores argumentam que o psiquiatra conceptualizou a vinculação como
um repertório de comportamento pré-adaptativos que promovem a interacção.
Bowlby e os seus seguidores, nos seus estudos, mostraram de que forma os bebés,
com base em comportamentos e padrões de respostas inatas (como: chorar, sorrir, e
procurar o contacto) desenvolvem vínculos emocionais fortes com os adultos, com os
quais estabelecem interacções (adulto cujo comportamento encontra-se, também,
orientado para a interacção com os bebés) (Pessanha, et al. 2012).
Constatou, Bowlby, no seu estudo sobre os efeitos da ausência e separação da mãe
em criança, que a falta de mãe pode levar ao retardo físico, emocional e intelectual
aos bebés ou crianças (Braghirolli, et al. 2010 p. 167).

17
Já Gleitman, et al (2009 p. 786) realçam que a “vinculação dos bebés à pessoa que
cuida deles é considerado, por vezes, como base de toda as relações posteriores com
os outros”. Reforça Bowlby, que a interacção social é intrinsecamente reforçante para
os bebés. Para ele, os bebés não se vinculam porque procuram comida ou calor, mas
sim eles nascem com necessidades sociais, tendências inatas para procurar o contacto
directo com um adulto (em geral a mãe).
Segundo Bowlby, o comportamento de vinculação não é apenas motivado pelo prazer
do contacto, mas também por um medo inato do desconhecido e do não familiar.
Reforça, ainda, que o medo do desconhecido é que produz a vinculação. É certo que
a mãe fornece a alimentação e o calor, mas no que diz respeito à vinculação o que
deveras interessa é a sensação de segurança, conforto e refúgio dada pela mãe
(Gleitman, et al. 2009).
Concernente a vinculação (afecto), no processo pedagógico é necessário que o
docente tenha a “compreensão dos outros” (aluno e de outros funcionários) – que é a
aptidão para sentir o que os outros pensam e sentem; ter a sensibilidade social ou
empatia e a flexibilidade de comportamento (Minicucci, 2013).
Na compreensão dos outros, o docente, deve ter em atenção a personalidade das
crianças (alunos), em função do seu comportamento. Neste contexto, Minicucci
(2013) traz os termos criança natural e criança adaptada; o que pressupõe, que o
docente tenha a necessidade de perceber que tipos de crianças são os seus alunos para
melhor compreendê-los e vincular com eles.
Segundo o autor, criança natural é aquela que tem um comportamento próprio,
espontâneo, criativo, ingénua. Já a adaptada é que se comporta como um adulto (pai
e a mãe) queriam, de maneira submissa, retraída, ou com modos precoces.
Realça Sabino (2012) que a cognição e a afectividade não são aspectos dissociáveis
no ser humano. A escola é um espaço onde as gerações se encontram ou se
desencontram em relação afectiva, na busca pela construção de conhecimento e
saberes necessários à formação de identidades individuais e sociais.
Continua a autora, “onde existem relações entre as pessoas, há afectividade. E, no
fenómeno educativo, não é diferente.

18
Factores que activam os comportamentos de vinculação
Condições internas Fadiga, fome, doença, dor, etc.
Características ambientais Ocorrências de eventos alarmantes, rejeição por
outros adultos ou crianças, estranheza do meio.
Localização e resposta da mãe Mãe ausente, mãe que se afasta, mãe que
desencoraja a proximidade, alarme da mãe

Comportamentos mediadores da vinculação


Comportamento de sinalização Comportamento de aproximação
Choro chamar Sugar aproximar-se
Sorriso olhar Agarrar-se seguir
Balbuciar

Desenvolvimento da vinculação
Sincronia relacionada com necessidades fisiológicas. O prestador de cuidados
0 a 3 meses aprende a discriminar entre os sinais reflexos da criança e as comunicações
afectivas
A criança e o prestador de cuidados desenvolvem sequências encadeadas de
3 a 6 meses interacção.
Facilitada pelo desenvolvimento sensório-motor e cognitivo, a criança
6 a 12 meses desenvolve a capacidade de distinguir meios e fins. O comportamento torna-se
intencional e os padrões de resposta alternados são adoptados a situação em
mudança.
Últimos meses Crescente papel activo da criança. O prestador de cuidados assume o papel de
do 1.º ano base.
A criança desenvolve expectativas claras sobre a disponibilidade e
Final do 1.º responsabilidade do prestador de cuidados. Esta organização das expectativas é
ano denominada por Bowlby (1973) por Modelo Operativo Interno.
Fonte: Pessanha, et al (2012)

19
A qualidade de prestação de cuidados é importante devido ao facto de estar intimamente
relacionada com o desenvolvimento social, cognitivo e da linguagem das crianças
(Pessanha, et al. 2012).
Actualmente, é evidente que além da herança dos genes (genética) os cuidados afectivos,
no início da vida, são bastante essenciais para o desenvolvimento humano primário; a sua
escassez/carência têm efeitos nefastos, afectando o seu crescimento, a aprendizagem e a
saúda física e mental durante o ciclo de vida.
Reforça Paus (2013), que as relações de cuidados no decorrer dos primeiros anos de vida
favorecem a saúde física e mental, bem como o aprendizado ao longo da vida. Os
cuidados assistenciais dos adultos, atentos e sensíveis são necessários não só ao bom
desenvolvimento do cérebro da criança, como protegem-no dos efeitos prejudiciais. Pois,
a separação precoce da mãe à criança pode conduzir a danos psicológicos duradouros à
criança.
Bowlby afirma que “qualquer perturbação da vinculação inicial da criança à mãe tornará
essa criança mais insegura no futuro”. Continua o autor, dizendo que “a separação é
psicologicamente perigosa, uma vez que a continuidade da relação da criança com a
primeira figura de vinculação é um elemento necessário para a saúde mental da criança
(Gleitman, et al. 2009 p. 796).

20
2.5. Perspectiva sociocognitva de Vygotsky
Lev Semenovic Vygotsky (1896 a 1934) foi um psicólogo soviético (Dic.
Enciclopédico de Psicologia, 2008).
Foi um dos teóricos que buscou uma alternativa dentro do materialismo dialéctico
para o conflito entre as concepções idealista e mecanicista na Psicologia.
Vygotsky entendia o homem como um ser activo, que age sobre o mundo, sempre em
relações sociais e transforma essas acções para que constituam o funcionamento de
um plano interno (Bock, et al. 2009).
Para o referido autor, Vygotsky, com auxílio de Lúria e Leontiev, descreveu o
desenvolvimento infantil a partir de três aspectos: instrumental; cultural e histórico.

Aspecto Descrição segundo Vygotsky


Refere-se à natureza basicamente mediadora das funções psicológicas
Instrumental complexas. Não apenas respondemos aos estímulos apresentados no
ambiente, mas o alteramos e usamos suas modificações como um
instrumento de nosso comportamento.
Aspecto da teoria envolve os meios socialmente estruturados pelos quais a
sociedade organiza os tipos de tarefa que a criança em crescimento enfrenta
Cultural e os tipos de instrumento, tanto mentais como físico, de que a criança
pequena dispõe para dominar as tarefas. Um dos instrumentos básicos
criados pela humanidade é a linguagem. Por isso o pesquisador dá ênfase à
linguagem e sua relação com o pensamento.
Lúria afirma que o aspecto histórico funde-se com o cultural, pois os
instrumentos que o homem usa para dominar seu ambiente e seu próprio
comportamento foram criados e modificados ao longo da história social da
civilização. Os instrumentos culturais expandiram os poderes do homem e
Histórico estruturaram seu pensamento, de maneira que, se não tivéssemos
desenvolvido a linguagem escrita e aritmética, não possuiríamos hoje a
organização dos processos superiores que possuímos.
Já Vygotsky reforça que a história da sociedade e o desenvolvimento do
homem caminham juntos e, mais do que isso, estão de tal forma intrincados
que um não seria o que é sem outro.

21
Vygotsky embora com a sua morte prematura, deixou um legado, em relação a Psicologia
do desenvolvimento e especificamente no desenvolvimento cognitivo; nos finais dos anos
70 e 80. Nas suas variadas ideias fecundantes, duas tiveram mais realce, que e a
“internalização” e a “zona proximal de desenvolvimento”.

Internalização
O autor, ao contrário das ideias de Piaget, que focava de “dentro para fora” – na ênfase
do aspecto biológico e maturidade do desenvolvimento, Vygotsky (1962, 1978) adopta
uma abordagem diferente, enfatiza o papel do meio ambiente no desenvolvimento
intelectual das crianças. Postula que o desenvolvimento procede de “fora para dentro”,
pela internalização - absorção do conhecimento proveniente do contexto. Baseada nas
influências sociais, em vez de biológico, são fundamentais na sua teoria (Teixeira, 2015).
No dia-a-dia, realça o mesmo, em casa, na escola, na rua ou noutros locais, as crianças
observam o que as pessoas dizem e como dizem isso, o que fazem e por que fazem isso.
Depois, elas internalizam o que veem, transformando-o em sua propriedade. Recriam,
dentro de si próprias, as espécies de conversações e de outras interacções observadas em
seu mundo. Segundo Vygotsky, então, grande parte do desenvolvimento das crianças
ocorre pelas interacções infantis no ambiente, que determina muito o que ela internaliza.
Para Vygotsky, o desenvolvimento humano, principalmente o psicológico ou mental
depende da aprendizagem, na medida em que se dá por processos de internalização de
conceitos, que são promovidos pela aprendizagem social, principalmente a planeada no
meio escolar (Fiocruz, 2004 apud Rabello e Silveira).

Zona proximal de desenvolvimento (ZDP)


A zona de potencial desenvolvimento são as habilidades que estão fora das habilidades
actuais das crianças. É a amplitude de capacidade na qual uma criança pode ser capaz de
alargar os limites de seu desempenho, a fim de aproximar-se mais estreitamente de sua
competência potencial.
A ZDP é a amplitude de capacidade observável (desempenho) de uma criança e a
capacidade latente (competência da criança, o que a qual não é directamente obvia).

22
Sustentam Rabello e Silveira, que Vygotsky enfatiza o processo histórico-social e o papel
da linguagem no desenvolvimento do indivíduo. Focava na aquisição de conhecimento
pela interacção do sujeito com o meio.
O mesmo, na sua teoria, buscava a síntese do homem com ser biológico, histórico e social.
Mesmo o que tomamos por mais individual de um ser humano foi
construído a partir de uma relação com o indivíduo.
(Vygotsky, 1988)

Segundo Neto e Rocha (2015), Vygotsky afirma que a “aprendizagem é condição


imprescindível para gerar desenvolvimento”. Continuam os autores, já para Piaget, o
desenvolvimento deve anteceder a aprendizagem, já que ninguém pode aprender além ou
aquém da sua estrutura cognitiva permite fazê-lo.

2.6. Modelo bioecológico, de Urie Bronfenbrenner.


Urie Bronfenbrenner (1917 a 2005) foi um psicólogo russo. A sua teoria surgiu no
final da década de 70, como crítica às teorias dominantes na altura, que para ele, tais
pesquisas limitavam-se, na maioria das vezes, a situações laboratoriais.
A teoria surge com intuito de reformular a maneira de olhar e analisar o
desenvolvimento humano. A mesma trouxe à ciência importantes premissas para o
planeamento e desenvolvimento de pesquisas em ambiente naturais.
A teoria ecológica tradicional focava-se, apenas, a pessoa em desenvolvimento dentro
de ambientes restrito e estático, sem a devida consideração das múltiplas influências
dos contextos em que os sujeitos viviam (Martins e Szymanski, 2004).
Essa enfatizava o ambiente como “ingrediente” fundamental para a compreensão de
como a pessoa desenvolve-se.
Ecologia estuda a interacção entre os seres vivos e o ambiente em vive.
Na sua visão, as pesquisas sobre do desenvolvimento humano deve ser efectuadas
tendo em conta os contextos naturais da vida do indivíduo (Pessanha, et al. 2012).
Bronfenbrenner (apud Pessanha, et al. 2012) chama atenção para os contextos do
comportamento e sua importância no estudo do desenvolvimento humano.

23
O autor, no seu novo modelo, agora bioecológico, traz a ênfase nas características
biopsicológicas da pessoa em desenvolvimento (Martins e Szymanski, 2004).
Ainda os autores acima reforçam que Bronfenbrenner propôs, na sua teoria, o termo
“constructo teórico processo proximais”, visto como formas particulares de
interacção entre o organismo e o ambiente, que operam ao longo do tempo e
compreendem os primeiros mecanismos que produzem o desenvolvimento humano.
Na sua reformulação teórica, o autor propõe modelos teóricos e empíricos que
representam a evolução, na medida em que expandem os níveis que procurou
sintetizar no seu modelo, isto é, os aspectos biológicos integrados nos níveis amplo
da ecologia do desenvolvimento humano (Pessanha, et al. 2012).
Neste modelo são apresentados quatro (4) aspectos multidireccionais inter-
relacionados, designado como modelo PPCT - Pessoa, Processo, Contexto e Tempo.
Pessoa – é o repertório de características biológicas, cognitivas, emocionais e
comportamentais. Processo – corresponde a interacção entre pessoa e o contexto.
Contexto – sistema interdependentes da ecologia do desenvolvimento. E o tempo –
corresponde o período longo do desenvolvimento humano. É constituído por micro,
meso e macro tempo.
Continuam os autores, o modelo bioecológico evoluiu no sentido de incorporar duas
proposições que promovem uma perspectiva dinâmica e relacional do binómio
pessoa-contexto no âmbito do processo de desenvolvimento humano.
Bronfenbrenner, ainda, na sua teoria apresenta cinco tipos de contexto, segundo
Morin (2005): Microssistema (família, a turma); Mesossistema (interacção entre
microssistemas); Exossistema (emprego dos pais); Macrossistema (contexto
sociocultural mais amplo) e Cronossistema (evolução dos contextos ao longo do
tempo).
Bronfenbrenner, na sua teoria, explica a necessidade dos pesquisadores ficarem
focados e cuidadosos à diversidade que qualifica o ser humano – os seus processos
psicológicos, a sua participação dinâmica nos ambientes, as suas características
pessoais e a sua construção histórico-sócio-cultural.
Em síntese, no modelo bioecológico, as características da pessoa funcionam como um
produtor indirecto e como produto de desenvolvimento (Pessanha, et al. 2012).

24
BIBLIOGRAFIA

1. BOCK, Ana; FURTADO, Odair e TEIXEIRA, Maria (2009). Psicologias, 14ª Ed.
Saraiva, Brasil;
2. BRAGHIROLLI, Elaine, et al (2010). Psicologia Geral, 30ª ed., Vozes, Brasil.
3. COLLIN, Catherine, et al (2020). O Livro da Psicologia, Marcador “Grandes
ideias de todos os tempos”, Lisboa.
4. COLL, César; MARCHESI, Álvaro; PALÁCIOS, Jesús e colaboradores (2004).
Desenvolvimento Psicólogico e Educação “Psicologia Evolutiva”, tradução, Vol.
1, 2ª ed., Artmed, Porto Alegre.
5. DAVIDOFF, Linda L. (2001). Introdução à Psicologia, 3ª ed., tradução, Pearson,
São Paulo.
6. DICIONÁRIO ENCICLOPÉDICO DA PSICOLOGIA “História e teóricos”
(2008), tradução de Hélder Viçoso, Texto & Grafia, Lisboa.

7. GLEITMAN, Henry; FRIDLUND, Alan e REISBERG, Daniel (2009).


Psicologia, 8ª ed., Fundação Calouste Gulbenkian, tradução, Portugal;
8. LIUBLINSKAIA, A.A. (1973). O Desenvolvimento Psíquico da Criança,
Estampa, tradução, Lisboa.
9. MARTINS, Edna e SZYMANSKI, Heroisa (S/d). Abordagem Ecológica de Urie
Bronfenbrenner, em estudo com Família, em www.Scholar.google.com, acessado
a 18/01/2020.
10. MATIAS, Gabriela (2015). Psicologia 12ª Classe, Letras, Angola;
11. MINICUCCI, Agostinho (2013). Relações Humanas “Psicologia das Relações
Interpessoais”, 6ª ed., 10 ª reimpressão, Atlas, São Paulo.
12. MONTEIRO, Manuela e SANTOS, Melice Ribeiros dos. Psicologia, Porto
editora,
13. MORIN, Edgar (2005). Teoria da complexidade, em www. Portfóliodepsicologia,
acessado a 18/01/2020
14. MUSSEN, Paul. H. (1980). O Desenvolvimento Psicológico da Criança, 9ª ed.,
tradução, edit. Zahar, Rio de Janeiro.
15. MYERS, David G. (2006), Psicologia, tradução: Eduardo Jorge da Silva e Maria
dos Anjos Rouch, 7ª ed., Itc, Rio de Janeiro.

25
16. NETO, Grigorio Duarte e ROCHA, Livia J.L.F (2015). Psicologia do
Desenvolvimento Humano: as teorias de Vygotsky e Piaget – artigo; disponível
em www.siteantigo.portaleducacao.com.br acesso a 26/9/2020.
17. PESSANHA, Manuela, et al. (2012). Psicologia da Educação, Plural Editores –
Grupo Porto Editora;
18. PILETTI, Nelson (2006). Psicologia Educacional, 17ª ed., Atica, Brasil;
19. RABALLO, Elaine Passo e SILVEIRA, José (s/d). Vygotsky e o
Desenvolvimento humano – artigo, disponível em www.josesilveira.com, acesso
a 26/9/2020.
20. SABINO, Simone (2012). O afeto na prática pedagógica e na formação docente
“Uma presença silenciosa”, Paulina, S. Paulo – colecção Educação em foco.
21. SPERLING, Abraham e MARTIN, Kenneth. (1999). Introdução à Psicologia,
Thomson – Pioneira, tradução, Brasil.
22. SCHULTZ, Duane P. e SCHULTZ, Sydney Ellen (2009). História da Psicologia
Moderna, Cengage Learning, tradução, São Paulo.
23. TEIXEIRA, Hélio (2015). Teoria do Desenvolvimento Cognitivo de Lev
Vygotsky, disponível em www.siteantigo.portaleducacao.com.br acesso a
20/9/2020.
24. MESQUITA, Raúl e DUARTE, Fernanda (1997). Psicologia Geral e Aplicada,
Plátano, 6º ed., Lisboa.
25. MUSTARD, Fraseu J. (2010). Desenvolvimento cerebral e desenvolvimento
humano, artigo, disponível em www.enciclopedia.crianca.com/cerebro/sintese,
acesso 25/3/2021.
26. PAUS, Tomás (2013). Cérebro-síntese – Enciclopédia sobre o Desenvolvimento
na primeira Infância, artigo, disponível em www.enciclopedia.crianca.com,
acesso 25/3/2021.
27. www.mundoeducacacao.uol.com.br, acessado aos 15/2/2021.

26
Guia de estudo
A psicologia do desenvolvimento é um ramo (…), que analisa os processos de
modificações psicológicas, que ocorrem ao longo da vida humana.
1. Dê uma definição, de desenvolvimento e de Psicologia de Desenvolvimento,
baseado na sua percepção, desde que encaixes as palavras-chave.
2. Dê seu comentário na necessidade de, enquanto “aspirante” a docente, teres o
módulo de Psicologia do desenvolvimento, no currículo.
3. O ser humano é considerado como um ser biológico, psicológico, social e cultural.
Concordas? Justifica a sua resposta.
4. Na história da Psicologia do desenvolvimento humano afirma-se que nos séculos
anteriores, a infância e a adolescência não tinham um período de desenvolvimento
diferenciado e específico. Dê um argumento sobre isso.
5. O ser humano desenvolve-se de muitas formas durante a vida. E esse
desenvolvimento implica mudanças. Cite as partes onde se implicam as mudanças
no desenvolvimento humano.
6. Mencione (pesquisando) as fases intra-uterina do desenvolvimento humano.
7. Nos factores que influenciam o desenvolvimento humano descrevemos dois tipos:
o interno e externo.
a) Explique tais factores internos: genética; hereditariedade e maturidade.
b) Dê dois exemplos da influência do ambiente no desenvolvimento humano.
8. Explique, a sua escolha, duas áreas do desenvolvimento humano.
9. Explique, em breve trecho, as razões do surgimento do modelo de Ciclo de vida.
10. Faça um estudo comparativo observando o dia-a-dia das nossas crianças com os
estádios de desenvolvimento humano, segundo Piaget.
11. Explique o essencial das teorias do desenvolvimento humano descritas e os seus
respectivos autores.

Formador: Dilson Botelho

27
Anexo nº 1 Descrição das etapas do desenvolvimento de Erickson

28
Anexo nº 2

29
Anexo nº 3

30
Anexo nº 4 Estádios de desenvolvimento de Piaget

31
Anexo:

32
Anexo: Quadro resumo do estágio de Piaget

33
Anexo: Estágios de desenvolvimento de Freud

34
Anexo

Anexo: Quadro resumo do estágio de Freud

35
36

Você também pode gostar