1-Introdução Ao Evangelho de João

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EVANGELHO DE JOÃO – INTRODUÇÃO

Finalidade João tinha em mente fortalecer a fé dos leitores. Ele próprio atesta que o seu Evangelho foi
escrito “para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus e para que acreditando tenhais a vida
em Seu nome” (Jo 20,30-31). Esta proclamação da messianidade e da filiação divina de Jesus, a partir
dos “sinais” é para desenvolver a fé em Cristo como meio de obter a vida. Estes dois pontos de fé
estavam sendo atacados pelos rabinos da renovada comunidade judaica. Do ponto de vista cristológico
podemos afirmar que a finalidade do quarto Evangelho é a de testemunhar que Aquele em quem se
cumprem todas as promessas e expectativas veterotestamentárias (o Cristo), Aquele unicamente de
quem pode depender a salvação do mundo, porque Filho enviado pelo Pai, é exatamente Jesus. O
destaque dado por João deve ser tomado globalmente no sentido de evidenciar que não existe hiato
entre Jesus de Nazaré, que viveu e pregou na Galiléia e na Judéia, e o Cristo da fé presente na Igreja e
que continua a santificar as almas mediante os sacramentos. Divisão e Estrutura do Evangelho O
Evangelho se divide em duas grandes partes, com um Prólogo e uma Conclusão. 1,1-18 Prólogo:
profunda e breve meditação sobre a eternidade e divindade do Verbo (Logos) e sobre a sua Encarnação.
1º Parte: 1,19-12,50 Manifestação de Jesus como o Messias mediante os “sinais” (milagres). Livro dos
sinais e das obras. Abrange a vida pública de Jesus. A auto-revelação de Jesus ao mundo em palavras e
sinais e a resposta imperfeita: 12,42-43 ou mesmo negativas dos homens 1,11; 12,37-41. Podem ser
delimitadas várias seções: 1 Jesus, autor da nova economia salvífica: primeiras manifestações da fé -
1,19-4,54. 2 Jesus manifesta a sua divindade 5 3 Jesus é o pão da vida: 6 4 Jesus é a Luz do mundo:
7-10 5 Jesus é a vida do mundo: 11-12. 2º Parte: 13-21- Manifestação de Jesus como o Messias Filho
de Deus na sua Paixão, Morte e Ressurreição. O retorno de Jesus ao Pai. Livro da Paixão e da
Glorificação. Aqui podemos ter três seções: 1- A Última Ceia 13-17 a auto-revelação de Jesus no círculo
dos seus. 2- A narrativa da Paixão e Morte 18-19 o “ir ao Pai”, a glorificação de Jesus pela sua morte e
ressurreição. 3- Aparição de Jesus ressuscitado 20- 21. O capítulo 21 é o Epílogo. Estrutura Neste
Evangelho existe um fio condutor que é a revelação e a fé. O relato de João é conduzido de modo a
deixar aparecer a progressiva auto-revelação de Jesus e daí a progressiva manifestação da fé e da
incredulidade. Cada episódio contem uma revelação de Jesus que obriga a tomar uma decisão: ou a fé ou
a incredulidade. Em cada seção está presente de algum modo, o tema da Luz e da Vida oferecida aos
homens. A Paixão é o vértice para o qual tudo converge e está presente implícita ou explicitamente, em
todas as partes. Cada seção é relacionada mais ou menos claramente com alguma festa do ano litúrgico
judaico, apresentando um tema correspondente: três Páscoas e o Pão da Vida: 2,13; 6,4; 11,55; uma
festa não específica e o sábado e trabalho: 5,1.9; uma festa das Tendas e a Água e a Luz: 7,2.11 e uma
festa da Dedicação e o Templo: 10,22. A unidade do Evangelho não é apenas unidade de estrutura, é
também uma unidade temática. Os grandes temas da Luz e da Vida, do Testemunho, do Juízo, da Glória
atravessam o livro todo. Mas dois temas (ou perspectivas) constituem, mais que os outros, esta unidade
e encontram-se indicados em 20,30s: o Sinal e a Fé. Características do Livro São diversas as
características do Quarto Evangelho, eis algumas: O livro é composto de grandes episódios, em que se
misturam narrativa, diálogo e discurso. Segue um esquema geográfico e cronológico peculiar. Sob certo
aspecto, trata-se verdadeiramente de um Evangelho menos atento aos detalhes históricos e mais
positivamente voltado para os dados “simbólicos” da vida de Cristo; sob um outro aspecto, é
exatamente o Evangelho cuja moldura histórica parece aceitável. Ele menciona diversas subidas de Jesus
a Jerusalém, respeitando assim muito mais de perto o que provavelmente constitui o dado histórico
efetivo, do que os Sinóticos, que tendem a concentrar toda a ação e a pregação de Jesus numa só
viagem para a capital. João transferiu para Jesus o seu próprio modo de se expressar, ao passo que os
Sinóticos conservaram suas palavras em uma forma mais primitiva. Embora se concentre na pessoa de
Jesus seu conteúdo biográfico e muito mais reduzido que os outros Evangelhos. Seleciona alguns fatos
importantes que apresenta e desenvolve com singular talento literário. Mais que doutrina, oferece
matéria de contemplação. Sua realidade é simbólica, carregada de um excesso de sentido, que a fé
descobre e a contemplação assimila. João tem características literárias e doutrinais muito peculiares.
Emprega um vocabulário muito típico e reduzido, o menos rico de todo o Novo Testamento, apenas
umas 920 palavras diferentes. Seu grego é simples e cheio de influências aramaicas, escreve em grego
com a sensibilidade de um semita. Este número surpreendentemente reduzido de vocábulos pode ser
atribuído em parte à predileção, tipicamente hebraica, pelo paralelismo (o desenvolvimento das idéias
por expressões paralelas, tanto do mesmo sentido como de sentido oposto) e se concretiza na repetição
quase literal de partes da frase:” Quem nele crê não é condenado; quem não crê, já está condenado,
porque não acreditou no nome do Filho único de Deus ”(Jo 3,18); ” Em verdade, em verdade, vos digo:
se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós.
Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna e eu o ressuscitarei no último dia”(
Jo 6,53-54); ” Um pouco e não me vereis e novamente um pouco e me vereis” (Jo 16,17-19). A
simplicidade narrativa de João contrasta com a sua riqueza e profundidade doutrinal. Assim, ao anotar as
coisas mais pequenas, o faz com uma característica profundidade de visão: quando Judas sai do
Cenáculo, diz que era noite, (13,30) mas não se trata de uma simples referência temporal, pois parece
aludir ao poder das trevas que avançava ao chegar a hora de Jesus; ao apresentar Jesus tratando a sua
Mãe por mulher, (2,4; 19,26) quer aludir à “nova Eva”, a mulher da profecia de Gn 3,15; ao dizer que as
enormes talhas de água das bodas de Caná eram seis e de pedra, (2,6) parece aludir à Lei de Moisés que
se tornou inútil. O simbolismo tão típico do quarto Evangelho insere-se nesta visão profunda de fé; mas
não é esta subjetividade que cria os relatos; ela ilumina-os e enche-os de sentido: o sentido da cura do
cego de nascença (9,1-41) é apresentar Jesus como a Luz do mundo, e a água da piscina com que ele
se lava simboliza a água do Batismo; a ressurreição de Lázaro mostra Jesus como a Ressurreição e a
Vida (11,25-26); e o sangue e a água que brotam do lado aberto do Senhor simbolizam a Eucaristia e o
Batismo (19,34-37). O Quarto Evangelho parece estruturado à volta das festas judaicas, mostrando
como Jesus põe fim às instituições antigas, e também à volta dos grandes temas joaninos, alguns logo
apontados no prólogo, dando-se uma progressiva revelação de Jesus como Messias e Filho de Deus o
objetivo da obra, suscitando a cada passo atitudes opostas de fiel adesão e de dramática hostilidade,
que levam o evangelista a exclamar num doloroso desabafo ao terminar a primeira parte da sua obra:
“Embora tivesse feito tantos milagres diante deles, não acreditavam nEle!” (12,37). João segue um
plano próprio diferente dos Sinóticos, apoiando-se em algumas idéias fundamentais, que vai
desenvolvendo ao longo do seu Evangelho: a sucessão das festas judaicas que balizam o relato; o
desenvolvimento de certos conceitos, como a substituição do Antigo Testamento pelo Novo, os temas
da Vida, do Pão da Vida, da Luz, da Verdade, do Amor, etc.; e, finalmente, a manifestação progressiva e
dramática de Jesus como o Messias e Filho de Deus, perante a obcecação crescente dos judeus que O
rejeitam, até chegar ao ponto culminante da “hora” de Jesus e do poder das trevas. Estas linhas
entretecem o Evangelho e dão-lhe uma certa estrutura e coesão temática. É certo que João, mais do
que os Sinóticos, apresenta afinidade com o pensamento helenístico. O interesse marcante por tudo o
que concerne ao conhecimento e à verdade, o uso do título Logos, em particular o emprego da alegoria
demonstram isso. Embora utilize os mesmos vocábulos helenísticos as significações variam: assim, o
Logos joanino não aparece como uma criatura intermediária entre Deus e o universo, mas como o Filho
preexistente, perfeitamente associado à ação do Pai. A influência judaica também se faz notar no estilo
através da presença de numerosas expressões semíticas. Se João cita raramente o Antigo Testamento
de maneira explícita e tem suas preocupações voltadas a separar nitidamente a antiga economia da
nova, ele não deixa de usar numerosas fórmulas do Antigo Testamento e, em particular, temas da
literatura sapiencial: a água, o alimento celeste e o maná, o pastor, a vinha, o Templo. Tudo se passa
como se João tivesse um conhecimento dos temas e de suas diversas variações, mas quisesse empregá-
los de modo pessoal e original.

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