25 - Alta Tensão

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Muito provável que esteja ficando maluco.

É o que Ben considera ao refletir sobre


o que fez a três horas atrás...

Pensando bem agora…

Sim, ele definitivamente pirou. Só pode ser isso que o fez dirigir em alta
velocidade por uma estrada chuvosa e escorregadia para terminar onde está no
momento. Isso tudo para provar uma tese contra ele mesmo. Uma espécie de
auto avaliação ele diria.

Protegido pelas luvas de couro preto ele se inclina para frente e começa a limpar a
quantidade de gelo que fica sobre o pequeno arco de concreto.

Seus dedos descem para limpar o epitáfio abaixo do nome das duas pessoas as
quais ele conhecia muito bem. Ali eles são descritos como, dois professores
dedicados e pais amorosos.

Ele observa aquelas palavras. O nome em cada uma das lápides, concordando em
absoluto de que os dois foram duas das pessoas mais dedicadas e apaixonadas
por seu trabalho e família que ele já conheceu. Mesmo colocando a sua em
comparativo.

Sua mente se inunda com lembranças, desde a criação de Rey ao pequeno ciclo
familiar que os três formaram. Sempre foram apenas os três. Ele suspira ao
recordar de como eles eram em vida.

Sua respiração provoca a subida e a queda de seu peito abaixo do casaco grosso e
escuro, com os pulmões cheios do ar gelado de Cambridge.

Ele olha bem ao redor, percebendo sua quase solidão em meio a uma quantidade
enorme de sepulturas. Ao fundo ocorre uma cerimônia fúnebre para um outro
alguém que partiu.

Olhar aquelas pessoas, chorando e se despedindo o faz pensar que lidar com o
luto é um processo que exige certa sabedoria emocional.

Aceitar que alguém é simplesmente arrancado da sua vida não é uma tarefa fácil.
Costuma gerar negação, internalização de raiva, além da sensação de um vazio
que nada é capaz de preencher.

Aceitar a partida de alguém é só o último passo do processo mais difícil que se


pode encarar na vida…

Diante disso ele pensa nas palavras de seu pai a respeito do seu luto. Ele pensa
também em como Rey teve que lidar com tudo isso.
Por um tempo ele se recusou a pensar na morte de Cassian. Estar ali foi uma das
coisas que ele sinceramente cogitou cortar da sua lista de possibilidades.

Quando eram vivos. Boston, acabou se tornando a sua segunda morada. No seu
período de formação ele pode contar que esteve mais vezes na casa do seu
melhor amigo, do que em seu próprio apartamento em Nova York.

Passaram-se apenas seis meses, cobrar qualquer recuperação tendo em vista o


laço afetivo que ele sentia por Cassian seria loucura. O luto dele por seu avô dura a
dez anos. Ainda hoje ele sente a dor da perda muito fresca na memória.

Rey obviamente não superou isso. Assim como, não colocou nele o peso dos
sentimentos que pertenciam aos seus pais. Não é como se ele tivesse salvado a
pátria por estar com ela. Eles dois sofreram a mesma perda.

Eles dois precisavam um do outro. Ben demorou a se dar conta de que, aquela era
uma ajuda da qual ele também precisava.

Rey colocar essa carga sentimental nele, seria como substituir Cassian e Jyn. E ela
jamais faria algo assim. Ela teve seu momento de despedida, agora era hora de ter
o dele…

Ben coloca o ramalhete de flores, comprado na entrada do cemitério sobre o


túmulo de Jyn primeiro. Depois ele se levanta e guarda as mãos no bolso do
casaco para observar o túmulo do amigo.

Antes de externalizar seus pensamentos. Ele respira fundo esperando que o peso
em seu peito seja apenas pelo frio intenso ao redor e não por uma emoção que
está prestes a explodir...

"Eu queria tanto que você estivesse aqui agora para eu poder gritar que você é
um completo idiota por considerar aquela conversa. Nós dois estávamos
bêbados. Eu não achei que estivesse falando sério. O que faz com que a culpa de
tudo isso seja inteiramente sua"

É assim que ele começa tentando manter seu corpo agitado no lugar. Deveria ser
fácil se abrir quando ninguém está vendo, mas infelizmente não é…

"Sei que demorei a aparecer. Tem acontecido tanta coisa que… Foda-se, a quem
eu quero enganar? Você me conhece. Nós sabemos que eu não vim porque não
tive coragem. Talvez seja a minha culpa, ou a vergonha. Provavelmente as duas
coisas.

Eu ferrei com tudo. Você me fez fazer uma promessa que eu não pude cumprir. A
primeira que eu não pude, aliás. Eu falhei com a sua filha e agora estou aqui
tentando me redimir enquanto falo com a porra de um túmulo. Se você me visse
agora, diria que estou ridículo…"

Ele faz uma pausa e discretamente olha ao redor para ver se ninguém está
observando seu monólogo bizarro, porém necessário.

"Enfim, eu obviamente não sei o que acontece com uma pessoa quando ela
morre. Eu não faço ideia de onde você está agora e tão pouco sei rezar. Então
lide com isso…"

Ele geme e sorri com a ironia, balançando a cabeça negativamente ao olhar de


volta para a sepultura de Cassian. Espera com sinceridade que ele esteja ouvindo
a tudo aquilo de algum lugar.

Apesar de saber que está fazendo isso como forma de calar sua consciência. Além
de francamente acalmar a necessidade dentro dele de ainda querer ouvir alguma
coisa do amigo, mesmo que seja apenas em seu interior.

Respirando fundo por mais uma vez. Ele diminui sua distância da lápide e então
se agacha para se apoiar na planta dos pés, limpando novamente o pouco de
geada ao redor do nome de seu amigo.

De repente as palavras ficam presas. Ele pensa em como seria explicar tudo o que
tem vivido com a filha dele olhando em seus olhos e ele sente a culpa dominando
toda sua coragem.

Ben suspira e sente seu peito arder. Deve ser o mesmo que um soldado sente ao
perder uma missão. Ele tinha uma e falhou nela.

No que ele é bom agora?

Pensando nisso, ele reúne forças para falar, para expressar o que está sentindo,
mesmo quando está lutando contra as lágrimas.

"Eu juro que não queria perdê-la. Eu não queria rejeitá-la também. Eu gosto
demais dela. Obrigado por isso, aliás. Você nem mesmo pode me culpar, não é?"

Ben sussurra as palavras em meio ao ar frio. Fechando os olhos por um instante


para se recuperar.

"Sou só um cara fodido agora. E eu odeio essa maldita sensação. Odeio ter
falhado com ela, odeio a ideia de ter decepcionado você e odeio mais ainda
sentir a sua falta"

Ele engole e então prossegue, fungando algumas vezes...


"Mas eu juro que vou consertar tudo isso. Não vou esquecer do que prometi. Eu
vou buscá-la, irei cuidar dela. E ninguém vai me impedir, nem que eu leve a
minha vida inteira ao redor dela para isso…"

Ben acena positivamente para a sepultura e então se levanta.

"Espero que a Jyn ainda esteja puxando sua orelha por falar de boca cheia, ou
ficar um porre quando bebe. Espero que vocês me perdoem. E que saibam…
aonde quer que estejam, que apesar de serem dois malucos, vocês criaram uma
filha incrível".

A estadia temporária de Ben tem razões a mais que não envolvem apenas uma
visita experimental ao túmulo de seus amigos, ainda que para saber como ele
está lidando com o luto.

Existem pendências a serem resolvidas.

Tendo em vista agora que adiar o momento não foi uma escolha sábia de sua
parte ele decide que o melhor a fazer é cuidar de certas inquietações de uma vez.
Ainda existe um lugar tão difícil de visitar quanto o túmulo de Cassian...

Ao sair do cemitério ele dirige por alguns minutos até parar em frente ao temido
local. A casa dos Andor Erso.

Ben observa a fachada, notando o trabalho que a imobiliária tem tido para
manter a grama aparada entre o corredor de tijolos que leva até a porta.

Está exatamente como eles a deixaram antes de falecer. Ben se certificou disso.
Foi uma das primeiras coisas feitas por ele, assim que levou Rey para Nova York.

Ele pediu para que tudo fosse embalado, que o imóvel passasse por um seguro de
prevenção contra qualquer dano. Aquela casa é a herança dela, ele jamais deixaria
que o patrimônio dela se perdesse.

Se Rey decidisse vendê-la essa seria uma decisão dela. O que cabia a ele no
momento era ajudá-la a manter o que seus pais lhe deixaram. Muito mais do que
isso, era um dever dele com os pais dela.

Ali parado dentro do carro, Ben acaba descobrindo que essa, não será uma tarefa
simples de se cumprir. Visitar o túmulo de Cassian não lhe deixou tão nervoso
como agora.

Parece tão estúpido esse tipo de pensamento mas soa plausível na concepção
dele. A verdadeira essência de Cassian e Jyn está naquela casa.
Há muitas lembranças frescas o bastante em sua memória sobre o tempo que
passou ali, sobre o que viveu de sua amizade naquele lugar.

Ele simboliza o seu começo, assim como Cassian que representa seus primeiros
passos na carreira. E foi naquela mesma casa que a amizade entre eles iniciou...

Ben não teve irmãos, os primeiros anos de seu pai na aeronáutica foram intensos,
sua mãe estava empenhada demais na carreira de direito e isso o fez desejar ter
uma companhia, alguém com quem brincar ou mesmo implicar.

Não importava, desde que envolvesse ação e alguma emoção no meio. Ele só
queria alguém com quem dividir coisas que não se dividia com os pais.

Por mais amigos que tivesse no colégio, sempre foi tudo tão preto no branco.
Festas, bebidas, garotas e uma disputa territorialista interminável.

Por cansaço e por estar enjoado de toda a puberdade, Ben acabou como os pais,
soterrado em sonhos futuros de uma carreira brilhante. Que por sinal foi difícil de
escolher à princípio.

O que mudou tudo foi ter percebido que seu avô passou a ser desde a sua
infância uma figura de exemplo. Às vezes durante sua adolescência ele se sentiu
dividido entre o que seu pai exercia e o que seu avô havia construído para a sua
mãe e seu tio.

As duas vocações o chamaram, seu avô o incentivou, assim como a sua mãe,
dizendo que: deveria escolher aquilo que mais tivesse a ver com seu interior.
Desde o emocional até o racional.

E apesar de seu espírito livre, assim como o de seu pai. Ben cogitou inúmeras
coisas. Seu avô foi uma constante em sua vida, claro que ele não sabia que
aqueles seriam seus últimos anos ao lado dele. Quando Anakin adoeceu, Ben
desejou de alguma maneira poder honrá-lo.

Na sua cabeça de adolescente pré formado no colegial. Quando o avô o visse


seguindo seus passos, ficaria tão feliz que acabaria se recuperando. Como sua
mãe sempre lhe dizia nas orações; Aquele seria seu santo milagre.

Acontece que ele descobriu da maneira mais dura que milagres não acontecem.

Talvez por isso que Han tenha ficado tão decepcionado na ocasião em que ele
escolheu o direito ao invés da aeronáutica. Isso quase o fez desistir para seguir
carreira ao lado de seu pai. O medo de decepcioná-lo.

Até hoje ele escuta piadas sobre isso. Han nunca usou as palavras diretamente,
mas sempre deixou o desejo nos olhos falar por si. Mesmo hoje, ele ainda vê esse
desejo em seu pai. Assim como sabe que esse é o verdadeiro motivo para que ele
implique tanto com o "poderoso Skywalker" como ele gosta de chamar.

A morte de seu avô mudou muitas coisas. Naquele mesmo ano em que o perdeu
ele teve que lidar com seu primeiro pro bono. O mesmo em que Cassian seria seu
cliente.

Cassian representou uma fase de escolhas difíceis e da recuperação de uma


perda dolorosa. Ele o fez ter certeza do caminho que estava trilhando.

As semelhanças objetivas entre ele e seu avô, apesar das diferenças profissionais
eram marcantes. Ben passou a admirá-lo pelas mesmas razões que admirava
Anakin.

Com o tempo, talvez até um pouco difícil de se admitir, Ben pensou em como ele
seria sendo um pai de família, vendo o amigo se dar tão bem nesse aspecto, além
de outros.

É claro que a vontade não durou a medida que ele amadureceu, lhe restando
apenas a admiração pela experiência de vida.

Talvez tenha sido o dom de mestre e educador de Cassian. O fato dele ser o seu
único amigo mais velho, a questão era que, ele se tornou com o tempo o irmão
que ele nunca teve.

Haviam muitas semelhanças, entre eles na amizade, mas sobretudo diferenças


que sempre o desafiaram a ser melhor de alguma maneira. O que Cassian foi na
verdade, era exatamente o que ele estava sendo para Rey - pelo menos tentando
ser mesmo que de um jeito torto - Cassian era um mentor.

O que Ben não se deu conta na época e hoje ao refletir ele nota, é que Cassian
também acabou sendo um remédio para a dor da perda, um alívio e um divisor
no momento em que ele mais precisou. Ben pensa se está sendo exatamente isso
com Rey…

Se está sendo exatamente o que seus pais disseram. Talvez seja verdade, em
partes. Ela pode vê-lo como ele o viu assim que lidou com a perda de seu avô. Mas
isso passou… O convívio, toda a bagagem e experiência o fizeram criar um outro
tipo de admiração que não aquela alimentada pela necessidade que um luto
infligi.

O que tem acontecido entre ele e Rey parece ter sobreposto a barreira do luto. É
estranho se pensar que de uma necessidade surtiu esse desejo desenfreado. Ele
sente o escárnio de si próprio ao pensar nisso.
Bela forma ele escolheu de honrar com os ensinamentos que seu amigo lhe deu
sobre amadurecimento e respeito. Ficando com sua filha após a morte.

A ironia na questão de que tanto ele quanto Rey havia sentido exatamente o
mesmo amparo vindo de pessoas às quais ambos admiravam, o faz ter certeza de
que seus pais não estão absolutamente errados, mas também não totalmente
certos.

Ben afasta o pensamento, enquanto considera e reconsidera se deve de fato


entrar ali. Certo, talvez ele não tenha contado com isso quando decidiu cruzar a
cidade inteira. Não pensou que fosse se acovardar diante das próprias
lembranças.

Ali ele viveu coisas memoráveis. Agora entende como Rey teve a sensação de que
nada havia mudado. Ele quase consegue acreditar que Cassian irá sair por aquela
porta para recebê-lo.

Criando coragem ele sai do carro depois de pegar a chave reserva que sempre
fica em sua carteira. Ele entra na casa sem dificuldade passando pela porta
branca de madeira com passos curtos.

Ao entrar verdadeiramente ali, ele respira fundo e dá uma boa olhada ao redor. Já
esperava encontrar tudo tão esteticamente limpo a ponto de mau reconhecer
como uma casa.

Vendo alguns móveis cobertos e uma quantidade enorme de caixas lacradas e


rotuladas com cada objeto guardado nelas.

Ele caminha para dentro da sala de estar pequena com o sofá diante das
poltronas exatamente como sempre foi. E por um momento ele hesita. O lugar
lhe provoca uma vulnerabilidade com a qual ele é pouco capaz de lidar no
momento.

Ele cogita a ideia de seguir com seus compromissos na cidade, no intuito de


deixar toda a carga emocional que a casa lhe traz, mas acaba desistindo ao se
deparar com uma das caixas que está sobre a mesa de centro da sala de estar.
Está rotulada como lembranças, o que chama sua atenção.

Ben se aproxima dela, puxando a fita que a lacra e ao abrir, ele encontra uma
outra caixa, essa muito menor, porém mais pesada. Feita de madeira, com
gravuras pequenas ao redor. Além dela há também as esculturas de madeira que
Cassian tinha o costume de fazer, como hobbie.

Ele era um bom carpinteiro, isso não havia como negar. Ben se lembra de ter rido
de suas primeiras tentativas como artesão, quando ele simplesmente decidiu que
seria um. Cassian era acostumado a decidir ser muitas coisas, em quase todas elas
ele desistia.

A caixa, claramente havia sido feita por ele também a julgar pelas figuras
desconexas em tamanhos e formas. Ele sorri imaginando as muitas falhas que
foram necessárias para se chegar no que se parecia com estrelas.

O feixe não está totalmente lacrado, ele o puxa pela ausência de um cadeado e o
que encontra o deixa surpreso. Ele fica tão fascinado que mal percebe quando
caminha para trás e se senta sobre o sofá plastificado, ignorando até mesmo o
material rangendo sob o seu peso.

A uma série de fotografias lá dentro. Muitas delas são de Jyn e de Rey, ele começa
a olhar, uma por uma. Notando como eles registraram cada fase de crescimento
dela, fase essa que ele não acompanhou ou se sim, foi de muito longe enquanto
frequentador da casa.

Em todas elas Rey parece estonteante, o mesmo sorriso iluminado que ela dá
carinhosamente a todo mundo. As fotos só o fazem confirmar as semelhanças
que ela tem com os dois. Mas dentre as lembranças as que mais lhe roubam o
fôlego, são as suas…

Fotos suas com Cassian, ou com Jyn ou com os três foram guardadas ali. Em uma
delas ele está sentado com eles na mesa do jardim durante um churrasco. Rey
está ali também, não tão solta como nas outras fotos.

Ela é muito mais da maneira que ele a conheceu. Tímida, encolhida ao lado da
mãe. Durante grande parte da infância dela, ele a viu assim, sempre
envergonhada demais, discreta demais. Ele até se assustava quando ela aparecia
sorrateiramente de algum lugar quando Jyn a chamava. Isso o faz pensar no
quanto ela evoluiu desde então, o que é de se admirar.

Olhando novamente para a foto ele se lembra desse dia, era o trigésimo quinto
aniversário do Cassian. Ele estava nervoso, sempre odiou comemorar a data.

Dizia que era apenas uma coisa ilusória criada para definir sua chegada ao
orfanato e que a mesma marcava o dia em que ele foi abandonado por alguém
que não o amava o suficiente para mantê-lo.

Apesar da lembrança amarga, ele passou por cima disso para dar a filha o que
comemorar. Sendo apenas os três, ele sempre imaginou que Rey carecia de mais
comemorações, por mais que ele odiasse aquela data, por mais que ela remetesse
coisas tristes a ele.
Cassian pensou primeiramente no bem estar da filha. Rey nunca soube disso, Jyn
tão pouco tinha ideia do quanto aquilo o machucava. Quando Cassian lhe
confidenciou ele também não soube entender…

Não naquela época… Porque hoje ele entende.

Entende que para o Cassian, toda a dor e sofrimento se tornou pequena diante do
que ele ganhou em seguida. Ele tinha ao lado dele as duas pessoas que ele mais
amava na vida, e era capaz de engolir, superar e fazer qualquer coisa por elas.

A grandiosidade disso o faz se sentir em paz por todos os anos de amizade. Ele
fecha a caixa entendendo o que enfim Rey encontrou ao ir ali.

Foi a gratidão pelo o que teve e não apenas a dor do que havia perdido. E Ben é
infinitamente grato. Grato por ter vivido ao lado de um cara tão incrível e por ter
ganho através dele, uma segunda família.

Ben mal se dá conta do tempo que passou olhando as fotos na casa. Quando ele
sai dali já está escurecendo. Ele tem mais uma pendência a resolver. E essa vai lhe
exigir mais tempo do que uma visita reflexiva.

Ele chega ao prédio da assistência um pouco tarde, quase torce para que não
tenha de lidar com a senhorita Wells, embora saiba que essa é uma questão
inadiável. Ainda se sente culpado por ser um verdadeiro zero à esquerda como
tutor.

Seus desejos se sobrepuseram aos seus deveres. Ele quase consegue imaginar a
cara da pobre mulher, se pudesse ler seus pensamentos agora.

Tanto seus pais quanto Rey passaram por uma entrevista basicamente resumida
sobre como tem lidado com a situação da guarda.

Ter a tutela dela autorizada pelos próprios pais o torna um indivíduo parcialmente
confiável. Ele infelizmente a encontra e a coisa toda rola por horas. Coisas do tipo;

Sim, ela se adaptou ao colégio, e a moradia compartilhada.

Sim os estudos dela estão indo muito bem - embora ultimamente esteja muito
longe do razoavelmente aceitável -

Sim, ele se adaptou às mudanças muito rápido. Tão rápido que passou a sentir
tesão por ela - É claro que essa parte ele omite.

E sim, sua mãe resolveu bancar a bruxa má do oeste, limitando as possibilidades


da garota.
Deus! Ben bufa discretamente para si mesmo. É claro que a assistente social
entende aquilo como exaustão. Mas na verdade ele está mesmo indignado. Há
tanto por baixo dos panos.

Nada disso a beneficia. Ele está longe de lutar por ela como o pai dela fazia, ele
está longe de ser dignamente responsável e isso o deixa consternado.

Decidindo mudar um pouco de assunto, a senhorita Wells lhe confidencia a


informação de que sua mãe tem mobilizado por conta própria os trâmites com
um juiz de Nova York a respeito da guarda.

Isso não o surpreende, na verdade é algo que ele faria. Usar a influência para
conseguir agilizar as coisas parece uma atitude incorreta. Mas de que outra
maneira eles poderiam tornar todo esse processo o mais sigiloso e tranquilo para
Rey?

Ele lê os documentos e descobre que isso vinha sendo feito a muito tempo. Na
verdade tudo está praticamente certo. Uma medida arriscada ele diria. Ainda que
não o faça discordar.

Não seria a primeira vez que Leia teria que lidar com uma situação a qual a
colocava à margem do certo ou errado. Ele pensa sobre abordar isso com sua mãe
enquanto retorna.

****

Está tarde. Ben passa mais tempo em Boston do que imagina. O retorno para a
cidade o faz pensar na sua ideia - impensada - de ter saído no meio do dia para
encarar três horas de viagem.

Embora, fosse uma tarefa inadiável, da qual ele justamente estava adiando. Ele
vinha fazendo muito isso, demorando a tomar decisões.

Ainda está lidando com a sensação de fracasso devido às consequências do que


houve com seus pais, as escolhas pressionam sua mente inquieta por tempo
demais. A visita ao juizado, o deixou ainda mais incomodado.

Embora isso o tenha feito entender que se sua decisão de ir até Boston foi
precipitada. A de ir até a casa de seus pais para buscar Rey, com certeza não será.

Durante o caminho ele pensou em façanhas que pudessem resolver a situação.


Porém, dentre as opções, todas em definitivo os levaria a uma discussão sem fim
sobre os malefícios de sua relação com Rey.
Ele precisava fazer alguma coisa, era inadmissível para ele permitir que a
repressão de sua mãe durasse mais tempo do que já havia durado.

Prestar atenção na estrada ao voltar para Nova York de certa forma manteve sua
mente ocupada. Claro que isso não foi o suficiente para impedi-lo de cogitar um
desvio até Hamptons.

No entanto, ele sabia que isso seria exaustivo demais, além de ser uma maluquice
absoluta. Tentar ir a casa de seus pais sem ideia do que dizer só pioraria tudo.

Pelo menos agora que está de volta, poderá colocar a cabeça no travesseiro para
pensar com calma no que fará assim que o dia amanhecer.

Ele segura o casaco nas mãos e enterra os dedos nos cabelos, sentindo o alívio ao
cruzar o pequeno hall do seu apartamento, indo direto para a porta de entrada.

Ben se ocupa com as chaves na fechadura, quando estranhamente percebe que


sua porta está aberta. Por mais exausto que esteja, tem plena consciência de que
a deixou trancada assim que saiu.

Hoje não é o dia em que Maz aparece, o que o faz pensar que quem quer que
esteja lá dentro tem as chaves. Diante disso, só lhe resta duas opções possíveis.

Ao abrir a porta com certa desconfiança ele logo se dá conta de que tem visita,
duas delas. Conhecidas por ele, mais do que por qualquer outra pessoa.

— O que estão fazendo aqui? — É seu primeiro questionamento ao ver seus pais
parados no meio de sua sala.

Han é o primeiro a notá-lo. Já que, ao que parece, sua mãe está ocupada no
telefone. Apesar disso, estar ocupada com a ligação não é o suficiente para
impedi-la de avançar em sua direção no momento em que o vê.

— Onde você estava? Cadê a Rey? — Ela o cobra, acusatória e incisiva, encerrando
a chamada com quem quer que seja.

O rompante o deixa sem reação, pelo menos nos primeiros cinco segundos, é o
tempo que seu cérebro leva para registrar a atitude agressiva dela.

Ben não tem ideia de como responder a isso, depois de se deparar com os dois no
meio da sua sala, olhando em sua direção como se tivesse cometido algum tipo
de crime hediondo.

— Como assim, cadê a Rey? — Ele devolve no mesmo tom incisivo de sua mãe.
Seus olhos desviam na direção de seu pai que além da carranca, tem aquela
expressão familiar de preocupação, que faz o centro de suas sobrancelhas franzir.

É a mesma que ele sempre faz quando tem alguma coisa muito séria
acontecendo. Dá última vez que ele o olhou com essa mesma expressão, seu avô
havia morrido. Foda-se. Isso não é bom, isso não é nada bom.

Ao contrário de seu pai, sua mãe retorna ao que estava fazendo evasivamente,
como se não tivesse acabado de atacá-lo por um motivo que ele ainda
desconhece.

Ben se atenta a pergunta que ela lhe fez e acontece que nenhum dos dois se
digna a explicar o que diabos estão fazendo ali. E porque estão questionando a
ele, onde Rey está.

Seu pai se aproxima o suficiente para ficar diante de seus olhos e então
lentamente repete a pergunta.

— Você não estava com ela? —

Ben o encara com descrença sem conseguir entender e também acreditar que
eles estão insistindo nisso. De repente aquela sensação familiar começa a surgir
dentro dele como uma coceira.

A mesma que lhe diz que tem uma merda muito errada acontecendo ali. Ele
estreita os olhos com desconfiança ao olhar para os dois.

— Porque eu estaria com a Rey? O que está acontecendo? —

Ele pergunta um pouco alterado devido à possibilidade do que aquela pergunta


significa. Encarando os dois, um de cada vez, ele espera impacientemente por
uma explicação, enquanto deixa seu casaco e par de luvas sobre o aparador na
entrada.

Retornando para dentro do espaço, ele nota quando seus pais passam a trocar
olhares.

— Falem de uma vez! — Ele exige.

Seu pai se aproxima novamente, erguendo as mãos para lhe pedir calma. Isso não
vai acontecer, é evidente que não. Pelo menos até que lhe expliquem seja lá o que
for. E é então que seu pai o faz. Direto, sem rodeios, como costuma ser.

— Não sabemos onde Rey está. Antilles foi buscá-la na aula de balé e não a
encontrou... —
O estômago de Ben afunda com a notícia. Confirmar suas suspeitas torna a
situação alarmante. Ignorando um possível apavoro crescente, ele tenta ser o
mais racional possível.

Ele esfrega uma das mãos na boca enquanto pensa. E antes que comece a
sucumbir, decide botar a cabeça para funcionar.

Se ela não está com eles, então talvez, esteja ali… — Ela não está aqui? Chamaram
por ela? Olharam todos os cômodos? —

Ele diz isso enquanto se adianta para subir as escadas até que seu pai o
interrompe — Sim. Foi a primeira coisa que fizéssemos ao chegar aqui… Ela não
está… —

Han termina assim que ele se agarra ao corrimão da escada e para no primeiro
degrau. Diante da resposta, Ben tenta pensar novamente.

Certo. Isso já aconteceu antes. Na vez em que ela se atrasou por culpa daquele
teste estúpido feito pelas líderes de torcida do colégio.

Isso o faz se lembrar de suas tentativas falhas de comunicação com ela na


ocasião. O que também o faz lembrar de outro detalhe importante. Seu celular…

Logo que saiu do escritório ele o desligou para que ninguém o incomodasse. O
que agora, com toda certeza, ele julga ter sido uma idéia absolutamente idiota.
Desde que a tecnologia existe, todos sabem que estar incomunicável por opção, é
uma ideia de merda.

— Tentaram o celular dela? A Rose, vocês tentaram ligar para a Rose? — Han
afirma respirando fundo com uma exaustão aparente.

— Já fizemos isso. Ligamos para todos os contatos dela. A professora, amigas do


colégio e nada. Cerca de meia hora antes ela ligou para o Antilles e ele disse que já
estava a caminho. Ela concordou em esperar por ele —

Ben sente sua pressão arterial subindo a cada segundo. É claro que seus pais
haviam tentado ligar, seu cérebro não está funcionando direito, inferno.

Ele desce o degrau e tenta procurar pelo seu celular. Incapaz de ignorar a pontada
em seu peito. A maldita sensação de que tem um prédio começando a desabar
sobre a sua cabeça.

Ele respira fundo e tenta pensar. Se ela estava diante do estúdio talvez tenha ido
até o escritório.
— O escritório. Ela pode ter ido até o escritório — Ele divide o pensamento
enquanto procura pelo celular no bolso da calça.

— Ligamos para lá também. Seu assistente, além de nos dizer que ela não havia
aparecido, ainda nos disse que você havia deixado o escritório no início da tarde.
Você não retornou e, por isso imaginamos que ela estivesse com você… —

Dessa vez é Leia quem se pronuncia, fazendo com que ele erga os olhos das mãos
que vasculham seus bolsos para olhar na direção dela...

— Bom, acabou de perceber que não. Deveria saber que eu não deixaria de
avisá-los caso ela estivesse aqui, comigo —

Se sua mãe não estivesse evidentemente aflita. Ben poderia dizer que os dois
estão a ponto de soltar faíscas um para o outro. Ele poderia considerar a
chateação dela também mas não consegue se importar menos com isso nesse
momento...

Sua energia e total atenção estão canalizadas no esforço em tentar entender os


motivos para que Rey de uma hora para a outra desistisse de esperar por Antilles.

Tentando buscar uma razão lógica nisso tudo, ele ignora o olhar ferido junto ao
tom amargurado de sua mãe para se concentrar nas informações que os dois já
tem...

— Há quanto tempo estão sem notícias dela? — Seu pai que está caminhando até
o sofá se senta e esfrega o rosto através da expressão pesada.

— Já se passaram sete horas. Não sabíamos se ela estava com você então viemos
correndo para cá —

— Porra… — Ben murmura para si mesmo, enquanto seus dedos percorrem as


mechas escuras. O que é um sinal evidente de seu nervosismo.

Sete horas…. Já se passaram sete malditas horas…

Ela definitivamente não se atrasou com algum empecilho como na outra vez, tão
pouco os avisou o que não é uma decisão comum nela.

Há duas opções, uma absurdamente dolorosa de se pensar e outra que, em vista


da situação faz todo o sentido.

Ela provavelmente fugiu. Toda essa maldita pressão em cima dela. A situação com
ele, Rey provavelmente está desapontada por ele não ter insistido por ela.
Porra, já se passaram semanas e ele não fez uma tentativa de quebrar a condição
de sua mãe. O que agora ele considera e conclui que foi errada em níveis
astronômicos.

Tentando raciocinar novamente ele se lembra de que deixou o celular no bolso de


seu casaco. Indo apressadamente até ele, Ben o encontra de fato e o liga para
checar as chamadas.

Os registros são vários. Ligações perdidas de seus pais, do escritório, um número


desconhecido, mas nenhum que seja dela. Não há mensagens, nada que indique
a ele de que ela teve intenção de avisá-lo.

Ele pragueja frustrado consigo mesmo. Pensando que isso anula um pouco mais
as chances de conseguir encontrá-la. Se ela realmente decidiu ficar sozinha, não
faria sentido tentar avisá-los.

Ou talvez ela tenha tentado, ele pensa. De repente lhe ocorre que o número
desconhecido pode significar alguma coisa. Encontrando-o novamente, ele
retorna a ligação e espera que alguém o atenda.

"Vamos lá, Rey. Vamos lá..."

Ele sussurra para si, percebendo seu pai se aproximar de suas costas, na tentativa
de saber se a única informação possível encontrada em seu celular é de alguma
valia.

Ben se vira para observá-lo, enquanto escuta o som da chamada, esperando que
alguém a conclua.

— Já tentaram rastrear o aparelho dela? O que exatamente vocês fizeram além de


esperar que eu aparecesse com ela? —

Ele diz mais ríspido do que gostaria. Nesse momento é impossível ignorar sua
preocupação e a irritação pelas opções de encontrá-la que estão se esgotando.

Ele observa o olhar desgostoso de seu pai enquanto espera, ainda segurando o
aparelho no ouvido.

— Ficar nervoso agora não vai fazer com que ela apareça — Seu pai o alerta
quando ele mal consegue prestar atenção nisso. O número está chamando e
ninguém o atende.

— Porra! — Ele grita de irritação diante do aparelho tentando re-discar uma


última vez. E mesmo assim, nada.
Buscando não se desesperar, ele tenta pensar. É mais fácil quando se mantém a
calma, nisso ele precisa concordar com seu pai.

Contando com as possibilidades positivas para se negar a crer no lado negativo


delas, ele foca no número. Talvez ele deva tentar mais uma vez, agora, mas
ligando diretamente para ela.

Discando para o celular de Rey, na esperança de que ela atenda, ele escuta um
toque de chamada em algum lugar da sala. Seus olhos vasculham pelo local até
que ele enfim percebe o que está nas mãos de sua mãe desde que chegou.

É impossível para ele não reconhecer o fundo de tela. Uma foto de Rey usando
um pingente de rosa no colar. Aquele aparelho é o dela. Além disso o fato óbvio
de seu nome ter aparecido no visor enquanto a ligação estava ativa. Só confirma a
tese.

Sua mãe confiscou o celular de Rey. Por isso ela não lhe mandou mensagens, por
isso o corte repentino de contato…

Ele inala profundamente, as narinas dilatadas e o olho esquerdo se contraindo e


anunciando sua raiva que começa a se intensificar.

Isso acontece porque, a inegável conclusão lhe ocorre, como chumbo grosso
dentro da mente. A constatação do que fez com que a situação chegasse a esse
ponto o deixa fervendo…

É então que Ben começa a listá-las mentalmente, uma a uma.

As medidas descabidas impostas para salvaguardar a integridade da garota - uma


coisa da qual ele jamais pensou em violar - A forma como foi tratado logo após
seu flagrante.

Sua tentativa de se explicar, que fora rejeitada. O estado de Rey relatado por seu
pai, agora o seu sumiço ou muito provavelmente fuga das condições impostas a
ela de uma maneira quase tirânica.

Tudo, absolutamente tudo, o atinge de uma só vez. Ele olha na direção de Leia
que parece não ter notado seu estado de humor. Bem, pelo menos por alguns
segundos. Porque isso fica evidente no momento em que ele abre a boca para
falar.

— Consegue perceber, não é? — Diz ele. Fazendo com que sua mãe olhe em sua
direção.

— Se Rey está fora do radar agora é porque provavelmente ficou de saco cheio do
que você vem fazendo com ela! —
Ele enfim explode, provocando um olhar surpreso em seu pai que estava de
cabeça baixa provavelmente tentando pensar no que fazer. Leia por sua vez o olha
incrédula antes de contestar sua acusação...

— Eu venho fazendo com ela? Você começou a alimentar essa relação doentia.
Você deveria ter evitado isso tudo desde o princípio —

Ben acena positivamente, com a raiva correndo nas veias. A indignação por sua
mãe nem mesmo reconhecer o exagero em suas decisões, provoca ainda mais a
sua raiva.

— Eu deveria mesmo. Deveria ter evitado é que você começasse com essa
estupidez! Se ela estivesse comigo, nada disso estaria acontecendo! —

Ele não está gritando, na verdade Ben está rugindo. O que faz com que sua mãe
fique ainda mais surpresa e defensiva.

— Olhe bem como fala comigo. Não me venha com esse absurdo agora
Benjamin. Não tente jogar sobre mim a culpa pelos seus erros —

Ben caminha de um lado para o outro. Esfregando uma das mãos nos lábios
enquanto movimenta a cabeça refletindo consigo mesmo. Ele mal dá atenção ao
que sua mãe está dizendo.

— Eu sabia. Sabia que essa sua mania de querer consertar o que não está
quebrado, iria acabar ferindo ela. Está feliz agora? —

Ele termina de explodir, repetindo o gesto dela, em uma disputa clara de quem
errou mais. Isso faz com que Leia reaja ostensivamente, antes da retórica.

— Se alguém machucou ela aqui esse alguém foi você! — Ela grita ainda que não
o suficiente para controlar o ânimo exaltado dele.

Nesse momento ele deixa o desejo de puni-la tomar conta. Diminuindo seu tom
obstinadamente ele se enche do próprio argumento, fazendo as palavras
escorregarem com acidez de sua boca...

— Ela nunca quis fugir daqui por estar infeliz, ela não ficou com distúrbio
alimentar e com problemas de desempenho embaixo do meu teto, foi do seu! —

Ben não consegue conter o ressentimento amargando seu interior. Aliás ele não
consegue conter absolutamente nada a essa altura. Seus lábios estão tremendo,
seu corpo todo está.
Ele inala bruscamente, vendo como sua resposta deixa sua mãe sem palavras. Isso
só lhe mostra que ela sabe. Ela tem ideia absoluta de que passou dos limites.

Os olhos de Leia desviam na direção de Han. E acontece que dessa vez ele não vai
permitir que seu pai seja punido por ter sido humanamente racional em avisá-lo
do que vinha acontecendo.

Cruzando o caminho dela ele a questiona novamente… — O que? Achou que eu


não fosse saber? Me diz mãe, quem foi que prejudicou Rey aqui? —

Ele cobra vendo como os olhos dela vacilam diante dos seus. O semblante
culpado o faz se perguntar se o que vê é arrependimento. Além do olhar dela, o
rompante de seu pai também o faz recuar.

— Chega! — Han vocifera para os dois.

— Nós precisamos encontrá-la. Já são quase uma e meia da madrugada e vocês


não percebem que tudo isso fugiu dos limites. Toda essa situação. Estou farto
disso! Vocês vão fazer o que eu disser agora, me entenderam? —

Ben olha na direção de seu pai, antes de dar um suspiro cansado, começando a
caminhar na direção da porta com sua determinação direta e costumeira.

É a primeira coisa que deveria ter feito assim que soube do desaparecimento dela.

— Pode deixar. Eu não vou ficar de braços cruzados… —

Se ela está por aí o que ele deve fazer é procurá-la. Esse é o seu intuito, no
entanto, o aviso tempestivo de Han Solo o impede...

— Não, você não vai. Precisamos de você aqui. Mesmo que queira sair por aí para
procurá-la não temos ideia de onde ela está —

Ben se vira para vê-lo com o dedo apontado em sua direção como um sinal claro
de que aquilo é uma ameaça.

— Você quer que eu fique aqui? E o que sugere que façamos aqui parados? Ela
está lá fora, na chuva. Essa cidade é um inferno. Existe todo tipo de maluco
circulando por Manhattan agora. Como eu vou ficar aqui parado esperando que
por um milagre ela resolva aparecer? —

Ben o contesta retornando para a sala.

— Eu estou ligando para todos os hospitais, para a delegacia. Estou passando as


informações sobre ela, se souberem de alguma coisa irão nos comunicar. É o que
podemos fazer, já tentamos todos os meios… —
Leia os interrompe com a voz embargada. Isso faz com que ambos olhem em sua
direção.

Ben respira fundo, vendo como o estado de sua mãe consegue afetá-lo. A raiva
ainda está ali presente o suficiente para impedir seu arrependimento pelas
palavras, mas isso não o torna imune ao sofrimento dela…

A preocupação de seu pai e o choro de sua mãe. Toda a situação somada ao


desaparecimento de Rey, o faz pensar que não lhe resta escolha a não ser dar o
braço a torcer.

É o que ele fará, pelo menos por alguns minutos. Ele está tentando se manter no
lugar, mas o que acontece é que esse não é o seu modo de agir. Sentar e esperar
por notícias não condiz com ele...

Ben tenta não pensar nas piores coisas que podem acontecer a uma garota
andando sozinha no meio de uma cidade, ainda mais a noite. Ele tenta pensar
que de alguma maneira ela irá atravessar a porta dizendo que está tudo bem.

Ele tenta acreditar nessa possibilidade para que não dificulte ainda mais as coisas.
O que não significa que o pensamento irá segurá-lo ali por muito tempo.

— Vinte minutos. Se em vinte minutos não tivermos notícias sobre ela eu vou sair
para procurá-la. Não importa aonde —

Ele murmura, vendo seu pai se aproximar de sua mãe para abraçá-la, enquanto
acena positivamente. O choro dela se torna audível.

Ele se inclina e cobre a cabeça para abafar seus pensamentos ruins, mas é em
vão. Ele só quer que esse pesadelo acabe. Que Rey surja de alguma forma, mas
sente que nada disso vai acontecer sem que ele se mexa.

Pensando no que pode fazer enquanto está atado. Ele bufa contra a palma das
duas mãos que cobrem seu rosto. Informação, ele mal obteve informações…

Erguendo o rosto ele observa seu pai já sentado ao lado de sua mãe enquanto a
conforta. Ben aperta os lábios e começa com seu interrogatório…

— Você disse que ela estava esperando por Antilles no estúdio. O que aconteceu
exatamente durante esse tempo? —

Diante da sua pergunta, seu pai começa a lhe explicar que tudo começou como
mais um dia comum, apesar do que vinha acontecendo.
Ela foi para a aula como sempre, mesmo cabisbaixa e desanimada. Ambos sabem
como ela gosta da dança. Uma vez ela lhe disse, durante o processo de separação
e definição do que eles tinham, que o balé a ajudava a se esquecer dos
problemas. Por isso ele não se surpreende que mesmo sem ânimo, ela tenha se
forçado a ir.

O problema começou depois que a aula terminou. Antilles não pode chegar a
tempo. O trânsito se torna insuportável quando a chuva cai sobre as ruas de nova
york. Ele sabe, apesar de achar inacreditável que Antilles não tenha se adiantado
tendo isso em vista.

Segundo seu pai, ele demorou por cerca de meia hora… Ela ligou para dizer que
estava esperando por ele na porta.

Quando ele chegou ao estúdio não a encontrou onde ela havia dito que estaria.
As luzes estavam apagadas o que significava que ela não estava lá dentro.

Antilles então ligou para ela. O celular novo - que agora ele sabe que ela havia
ganhado - tocou por diversas vezes. Rey não atendeu, tão pouco retornou a
nenhuma delas.

Logo em seguida, Antilles ligou para os seus pais. Os dois imaginaram o mesmo
que ele imaginou. De que ela havia buscado abrigo contra a chuva no prédio da
SOS.

Pensar na possibilidade de que ela pudesse ter ido até lá o fez desejar que tivesse
sido assim. Ao menos lá ela teria pessoas para mantê-la segura até que ele
chegasse.

Rey infelizmente não havia ido para lá. Eles ligaram para ela e apesar do número
estar chamando de início, isso não durou por muito tempo.

Eles também ligaram para o seu aparelho que estava desligado. Foi a ideia mais
idiota que ele já teve em anos. Ben sente o arrependimento corrosivo dentro dele
por isso.

Porra era só manter o celular ativo, ele só tinha que fazer isso, quanto mais cedo
retornasse mais rápido eles poderiam encontrá-la. Agora fazem mais de sete
horas que ela desapareceu…

A ansiedade faz com que seu intestino se retorça por dentro. Ele se levanta para ir
até o escritório e então se senta diante de sua mesa. Ouvir sua mãe chorar
enquanto seu pai a consola o está deixando ainda mais culpado.
Ben apoia os cotovelos sobre o tampo tentando acalmar seus nervos. É só então
que ele se dá conta das brechas que estão deixando. Por esse motivo ele pensa
nos recursos que tem para encontrá-la.

Ele cogita o rastreio do aparelho… Se não pode andar por aí com seu carro, a
solução mais eficaz no momento é rastreá-la.

Ben pesquisa o número de sua investigadora. A mesma que ele utiliza durante
um processo. Todo advogado corporativo tem meios de livrar seus contratantes
de problemas, uma investigadora particular é o que há de mais eficaz nesses
casos.

Apesar de seu contato com Kaydel ser estritamente para suas diligências
investigativas ele decide que essa é uma situação com caráter de urgência. Ele
sabe que ela tem meios o suficiente para não apenas grampear ligações, como
também rastreá-las.

Ele tenta ligar mas ela obviamente não o atende. Praguejando baixo, ele segura a
cabeça com as duas mãos e tenta não se frustrar por isso. Só irá servir para
limitá-lo. Apesar de sua cabeça zunindo. Ele tenta agilizar sua segunda opção

Essa é considerar as imagens de câmera em frente ao estúdio. Ele precisa de um


ponto de partida e precisa de imediato.

É então que Ben decide ligar para Hux.


A ligação começa a chamar e depois do que ele julga ser uma eternidade, seu
associado o atende.

"Hux, eu preciso que você faça uma coisa por mim. Estou tentando entrar em
contato com Kaydel mas ela não me atende. Preciso que você consiga umas
imagens de câmera de segurança. São do estúdio de balé ao lado do escritório..."

Ben tenta continuar quando seu associado o interrompe...

"Você tem ideia de que horas são? Por Deus, Solo eu estava dormindo, caramba"

Hux o responde com voz de sono. Claro que sua resposta o faz perder a pouca
paciência que lhe resta…

"Hux! Faça o que eu estou mandando, agora! Eu não posso perder tempo isso é
urgente, porra"

Ben esbraveja enquanto bate a palma da mão com força contra a mesa. E apesar
de seu descontrole, Hux tenta argumentar do outro lado da linha.
"Você sabe que é impossível conseguir imagens de câmera de segurança sem
uma ordem judicial. Como diabos eu vou fazer isso?"

"O que não falta são juízes me devendo favores. Eu preciso disso imediatamente,
que parte disso você não entendeu? Ligue para o Jimmy, ou Trent. Não importa,
mas faça…"

Ben rebate esbravejando novamente.

"Solo, é uma e meia da noite. Esses juízes irão mandar eu ir me foder se eu ligar
para pedir algo assim, eles já devem estar dormindo…"

Ter noção do que seu associado está dizendo o faz proferir todos os nomes mais
sujos que ele consegue pensar em um tom alto o bastante para deixar Hux calado
do outro lado da linha.

Ben chegou ao pico do que é um surto por estresse. Isso nem é culpa de seu
associado. Ele se sente impotente, exausto por meio de medidas que estão
falhando uma a uma.

Ben se inclina sobre a cadeira tentando respirar e se acalmar… Ele fecha os olhos
enquanto nota sua pressão arterial pulsando incontrolável através dos ouvidos…

Do outro lado da linha a voz de Hux surge cautelosa... "Certo. Você está
claramente fora de si. Pode me explicar o que está acontecendo?"

Ben não sabe se tem forças para falar. Está lutando contra a necessidade de
desabar. Se algo terrível aconteceu com ela… Ele nunca, jamais, irá se perdoar…

Tentando manter seu tom de voz com menos rouquidão possível, ele enfim
consegue contar o que está havendo.

"Rey desapareceu a mais de sete horas. Nosso motorista foi buscá-la em frente ao
estúdio de balé e não a encontrou… Eu preciso achá-la Hux… então… só… por
favor… consiga essa ordem pra mim…"

Ben respira fundo em busca de ar, é como se seu fôlego tivesse se esvaído. No
meio disso ele percebe como Hux fica em silêncio por alguns segundos, antes de
tornar a falar.

"Certo. Eu, farei todo o possível… Prometo isso a você"

Ben lhe passa o resto das informações sobre o que aconteceu e Hux encerra
dizendo que irá averiguar o quanto antes.
A essa altura sua mente é a maior inimiga que tem. Lhe dando diversas
possibilidades, uma pior do que a outra sobre o que houve.

Não lhe resta dúvidas de que Rey fugiu. De que com razão se apavorou com tudo
o que vem passando. Como ele poderia culpá-la, apesar de sua preocupação.

O que mais o deixa frustrado é saber que é o grande responsável por isso. Jogar a
culpa em sua mãe foi uma forma de extravasar a raiva.

Por mais que ela tenha sua parcela, as atitudes que ela julgou ser cabíveis são
decorrência de toda a situação gerada por ele…

Envolver Rey nisso mais do que deveria, só serviu para magoá-la e torná-la
confusa. Ele foi irresponsável, por mais que isso não tenha relevância agora… já
que o crucial é encontrá-la.

Determinado a ligar novamente para Kaydel ele começa a re-discar o número,


mas interrompe suas ações ao ouvir a porta de seu escritório se abrir… Por entre a
abertura o rosto de seu pai aparece com certa agitação.

— Encontraram uma garota com as mesmas descrições de Rey. Precisamos ir


agora… —

Seu pai se retira antes que ele possa perguntar qualquer coisa. Isso o faz dar um
solavanco da cadeira para sair de seu escritório e com isso dar início a uma
perseguição pelo corredor de seu apartamento.

— Espere aí. Onde a encontraram? —

Ben se pergunta se isso deveria importar agora. Se de fato ela foi encontrada, o
que ele quer é ir buscá-la. Mesmo assim, com seus passos largos logo a frente seu
pai lhe responde…

— Ela está no Brooklyn — Ben franze o rosto se perguntando o motivo para ela ter
ido tão longe de onde deveria estar.

A voz de seu pai sai alta, mas começa a falhar quando ele se vira para concluir…

— Ela está em um hospital, no Brooklyn —

Isso faz com que Ben pare de andar imediatamente. Ali, bem no meio do
caminho. Ele sente seu corpo inteiro gelar com uma rapidez homérica.

Não demora para que seu pai perceba seu estado de choque. Ainda que, por fora,
Han não consiga ter ideia de como ele está agora.
Categoricamente assustado. Seu corpo entra em um estado de angústia maior. O
detalhe do local o faz ficar apavorado.

Se ela está em um hospital… É porque…

Ele não consegue concluir o raciocínio. O pensamento lhe provoca náuseas. Ele se
equilibra na parede enquanto seu pai o alcança.

— Filho, olhe para mim. Eu sei que mais do que ninguém você é forte o bastante
para lidar com isso agora. Ainda não sabemos se é ela, temos que ir até lá para
identificá-la… —

As mãos de seu pai repousam em seus ombros o despertando de seu estado


atordoado com pensamentos pessimistas. Ben acena tentando concordar com o
ponto de vista de seu pai.

Pode não ser ela…

Parte dele quer acreditar que é ela, a outra torce para que não seja, porque esse é
o pior cenário possível para encontrá-la. Deus, ele acabou de prometer ao pai
dela… Porra ele disse que cuidaria dela.

Não. Nada de perder a cabeça agora…

Se recuperando do baque inicial com a notícia, Ben tenta se recompor. Seu pai
tem toda a razão, ele precisa ser forte, resistente o bastante para confirmar as
suspeitas.

Não adianta se apavorar agora…

Retomando o caminho ele vai na frente para ligar o carro. Seus pais descem logo
atrás, e o encontram já pronto para dar partida. Ele se sente revivendo coisas…
coisas horríveis, coisas insuportáveis…

O caminho até o hospital passa tão rápido por seu campo de visão. A paisagem
através da janela do carro é um borrão.

Sim, ele consegue chegar ao destino mantendo seus pais sãos e salvos. Descer do
veículo para entrar no prédio repleto por luzes acesas e sirenes de ambulância é
que é outra coisa…

O frio na barriga o faz se agarrar ao volante enquanto seus pais são os primeiros a
descer. O oposto do que houve antes já que foram os últimos a entrar.

Ben não consegue soltar suas mãos dali. Seu pai se inclina para observá-lo
esperando que ele reaja, mas isso pode levar mais tempo do que ele imagina…
É tão diferente do que ocorreu a meses atrás, quando ele cruzou a cidade para
velar o corpo do amigo. Sabendo exatamente o que o esperava assim que ligou a
chave na ignição…

Quando ele chegou a primeira coisa que fez foi sair em disparada para o interior
do hospital. Ela estava a sua espera naquele dia. Rey havia sobrevivido a um
acidente.

Ele teve que lidar com a perda e por mais difícil que tenha sido…

Hoje, ele não consegue nem mesmo lidar com o fato de que novamente, pode
encontrá-la em um leito de hospital, sabe se lá em que estado…

Isso é insuportável demais para ele. Por mais que ele precise saber, por mais que
seus pais o estejam esperando…

Ele só consegue se concentrar na dor que se acumula dentro do seu peito. Se Rey
estiver nesse hospital, se ela estiver ferida, ele não sabe se irá aguentar… Só de
pensar em perdê-la…

Ele nunca sentiu um medo tão intenso. Contudo, por mais que deseje fugir de
uma obrigação da qual ele não pode negar. Ele precisa saber… Ele precisa ter
certeza.

Porque se essa garota não for ela, isso irá significar que a busca por ela terá que
continuar… E isso é o bastante para fazer com que ele queira entrar no maldito
lugar.

O hospital está parcialmente vazio. Ele dá uma boa olhada ao redor antes que
junto aos seus pais chegue ao balcão de informações.

Lá eles perguntam sobre a garota depois de uma descrição detalhada de Leia


sobre as roupas que Rey estava usando quando saiu de casa. Eles precisam
aguardar alguns minutos e isso o deixa inquieto.

Felizmente não demora muito para que um oficial da policial se aproxime deles
acompanhado daquela que pelas roupas deve ser a médica de plantão.

— Vocês são os possíveis familiares da garota encontrada? — O oficial pergunta.


Sua mãe é a primeira a afirmar.

— Podem nos acompanhar? Precisamos fazer um reconhecimento da vítima,


antes de falarmos sobre o seu estado de saúde —

Vítima, estado de saúde.


Ben sente seu corpo tremer diante daquelas palavras. Soa tão aterrorizante que
ele mal consegue assimilar.

Por mais vacilantes que sejam seus passos. Os três seguem as duas pessoas que
caminham pelos corredores, passando por quartos e leitos com pessoas enfermas
em observação. Olhar aquilo faz o estômago de Ben afundar.

Eles param diante de uma enorme janela de vidro que dá acesso a uma sala que
ao que tudo indica é de observação.

Dando mais alguns passos ele consegue perceber de que se trata de um quarto,
tem aparelhos espalhados pelo local, ele não consegue reconhecer o suficiente
para identificar nenhum deles.

Tão pouco poderia já que seus olhos observam apreensivos o que começa a surgir
em seu campo de visão, a cada passo que ele dá para o centro da janela.

Agora de frente para o quarto ele consegue ver perfeitamente uma cama.

Nela está deitada uma garota, enrolada em uma espécie de manta metálica, com
aparelhos ligados ao peito além de uma máscara de oxigênio atada ao seu rosto.

De fundo ele consegue ouvir o choro de sua mãe. Mas seus olhos não desgrudam
daquela imagem. Ben sente seu coração desacelerar um pouco antes de bater
com extrema violência.

Isso porque, ele já teve essa visão antes. Tem vozes ao fundo, falando coisas que
ele não consegue compreender, seu pai está tentando acalmar sua mãe e só o
que ele consegue fazer é ficar ali, paralisado.

Observando como ela respira devagar com seus olhos fechados parecendo serena
diante de tudo. Não lhe resta dúvidas. Para nenhum deles, na verdade.

Os mesmos traços que ele não vê a semanas, os cabelos castanhos e claros


esparramados pelo travesseiro. O rosto que embora esteja pálido, traz os detalhes
bonitos dela.

É a mesma visão que ele teve quando a encontrou em Boston. Naquela ocasião
ela não parecia tão mal. Afinal havia acabado de se mostrar uma garota forte e
resistente, uma sobrevivente de fato…

Isso o faz pedir internamente para que essa seja a mesma situação. Ele tem
vontade de gritar para que ela se levante dali. O que ele não daria agora para vê-la
acordar necessitada do seu abraço como foi naquele dia.
Lutando contra a pressão em seu peito, Ben deixa um suspiro trêmulo escapar
por entre os lábios antes de conseguir perguntar.

— O que houve com ela? — Ele engole, para usar o máximo de frieza possível ao
fazer a pergunta sem desviar os olhos de Rey por um segundo sequer.

— Um funcionário do metrô a encontrou desmaiada na plataforma de embarque


através das câmeras. Nós averiguamos as imagens e ao que tudo indica houve
uma tentativa de assalto. Ela acabou reagindo, o que fez com que o assaltante a
ferisse —

— Jesus Cristo — Han murmura enquanto sua mãe roga para o ser superior ao
que seu pai clama.

Diferente dos dois, ele decide desviar os olhos para olhar com incredulidade na
direção do policial.

Ben não sabe ao certo dizer o que está sentindo… Mas talvez sua determinação
raivosa sirva para camuflar sua dor no momento.

— Como assim ele a feriu? Digam tudo de uma vez… — Ele sibila enquanto seu pai
ergue uma das mãos para tentar controlá-lo.

Acontece que ele não quer se controlar. Ele quer é que digam as coisas sem
rodeios dessa vez….

— Ben, mantenha a calma — Seu pai pede.

— Como você me pede isso pai? Olha pra ela! Eu preciso saber sobre o estado
dela… —

Ben explode fazendo com que as pessoas ao redor olhem em sua direção. Ele não
dá a mínima se está sendo grosso ou escandaloso demais. Tudo o que quer agora
é saber como ela está. Isso. E apenas isso.

Ele vê como seu pai estreita os olhos e como sua mãe suspira deixando cair por
completo toda aquela postura ostensiva de antes. É então que, trocando olhares
com o oficial, a médica decide se pronunciar.

— Ela está em um quadro severo de hipotermia. Além disso, ela tem um corte
superficial no lado esquerdo do quadril. Felizmente não foi profundo o bastante
para atingir algum órgão. A camada de roupas ajudou a protegê-la, com exceção
da queda de temperatura. Ela estava úmida demais para poder se aquecer… —

Ben sente sua respiração estremecer novamente. Olhando na direção de Rey


através do vidro. Pensar que alguém a feriu o deixa enojado e com ódio. Seus
dedos formigam com a vontade de arrancar pedaço por pedaço de quem fez essa
merda com ela.

Mas mais do que isso, ele sente a raiva de si mesmo o consumir. Não há como ele
negar a própria culpa…

Se sente responsável. Se sente um inútil por não ter podido protegê-la


justamente quando ela mais precisou dele.

Ele tem tantas perguntas a fazer, quer saber se ela ficará bem. Quer saber quando
poderá tocá-la, quando ele poderá dizer a ela que está ali, apenas para que ela
saiba que não está sozinha.

Que ele nunca mais a deixará assim novamente. Rey parece tão abatida que olhar
para ela o deixa destroçado.

— Isso significa que ela corre algum risco de vida? — É exatamente o que sua mãe
pergunta emocionada ao fundo, roubando sua atenção novamente.

Seus olhos desviam para a médica com uma expectativa que provoca o
retorcimento de seu intestino mais uma vez.

— Não podemos dizer com certeza. Tudo vai depender de como o corpo dela vai
reagir aos procedimentos. Após conter a hipotermia precisamos ficar atentos com
um possível quadro de pneumonia. Isso é algo que pode agravar um pouco mais
o estado dela. Mas estamos fazendo o possível… —

Ele fecha os olhos e por pouco não desmorona. A incerteza é angustiante. Vê-la
daquela maneira é angustiante.

Mas nada, absolutamente nada se compara com a possibilidade de saber que ela
pode morrer…

Ben está apavorado. Com um temor muito mais real agora, do que o que estava
sentindo no carro, quando encontrá-la era apenas uma probabilidade.

Ele quer estar aliviado por estar vendo ela, mas não consegue. Só o que sente é
aflição na sua forma mais pura. Ao fundo sua mãe se culpa para seu pai. Entre eles
a médica tenta tranquilizá-la da maneira que pode.

Enquanto ele ainda está ali, observando-a obsessivamente. Imaginando que de


alguma maneira, ela está lutando para permanecer viva...

No fundo ele acredita no quão forte ela é, por mais que seu temor o deixe cego
quanto a isso…
Não. Ele precisa acreditar ou do contrário, acabará louco e impossibilitado de
cuidar dela quando acordar. Porque sim, é nessa esperança que ele se agarra
agora.

Distante dos demais ele consegue ouvir quando o oficial começa a dar mais
detalhes do que aconteceu.

— O assaltante a golpeou sem qualquer precisão o que indica que não tinha
intenção inicial de ferí-la. Isso ocorreu devido a reação dela… Pelas imagens
pudemos ver que ela lutou contra o agressor… —

O instinto de sobrevivência dela. Só em pensar no medo que ela sentiu, sozinha


em um lugar que ela não conhecia.

Isso o deixa frustrado. São tantos sentimentos juntos agora, são tantas sensações
que ele não consegue pensar direito. Apesar do questionamento que fica
martelando em sua cabeça.

Porque ela decidiu pegar um metrô para ir parar em um lugar que não conhecia?
Talvez toda a situação a tenha feito surtar. Isso era provável.

Por mais serena que pareça naquela cama, ele ainda assim consegue notar o
desgaste físico dela. Rey parece apática e mais magra do que costuma ser… Como
ele pode deixar a situação chegar a esse ponto? Sua omissão colocou a vida dela
em risco.

— Eu quero saber se já conseguiram pegá-lo? — Ben cobra com a raiva trovejando


dentro dele. Não espera nada além de eficiência diante das circunstâncias.

— Estamos vasculhando a área. Mas lamento dizer que esse tipo de ocorrência é
muito comum pela região. Os passageiros costumam evitar as linhas em
determinados horários… —

Comum. Para ele isso está longe de ser comum, se não estivesse tão preocupado
com o estado dela, sem sombra de dúvidas cuidaria disso. Ele pretende aliás.
Assim que sua prioridade estiver completamente a salvo.

Ele arqueia uma sobrancelha interrogativa para o oficial diante da simplicidade


com que tudo é tratado. Propositadamente sua cobrança sai mais ríspida do que
o normal.

— Eu só espero que Rey não seja mais uma estatística de algo que costuma
acontecer nesse maldito lugar e que vocês se empenhem em encontrar esse
desgraçado… —
— Nós já estamos trabalhando e averiguando tudo. Se necessário precisaremos
do depoimento de vocês. Mas por enquanto é isso. Traremos mais informações
assim que possível… —

O policial termina sua - digamos - parte, recebendo um aceno compreensível e


agradecido por parte dele. Não lhe resta nada a fazer a não ser esperar. Isso por
todos os meios possíveis, já que…

Eles são instruídos a ficar na sala de espera. Qualquer atualização sobre o estado
de Rey, eles serão avisados o quanto antes.

Essa é a pior parte. Passar pelo fluxo interminável de espera que ameaça deixá-lo
louco. Aliás, já se passaram horas e ninguém os procurou. Já está quase
amanhecendo também…

Ben não consegue ser positivo a tudo isso. Tudo bem, ele não tem mais que
procurá-la. Não tem mais que imaginar onde ela pode estar ou que tipo de
atrocidade está acontecendo com ela…

Mas de que isso adianta? Rey terminou exatamente da maneira que ele mais
temia. Ferida e pior do que isso, correndo risco de vida.

Ele cogita a ideia de transferi-la para um hospital melhor. Mas desiste por julgar
estar sendo ridículo demais. Isso só a colocaria em uma vulnerabilidade maior.

Sentado, solitariamente no canto da sala de espera ele medita e observa como


sua mãe murmura uma prece atrás da outra, ainda que a sua maneira.

Seu pai mantém os olhos fechados muito provavelmente de exaustão em vista de


tudo que aconteceu nas últimas horas. Os anos de descanso e conforto em uma
casa de veraneio o deixaram enferrujado.

O físico de Han Solo, grande piloto e acrobata de planadores já não é mais o


mesmo. Apesar disso, ele demonstrou um domínio emocional impressionante
para lidar com o desaparecimento de Rey, para amparar sua mãe e acima disso
tentar mantê-lo com a cabeça no lugar. Isso sem sombra de dúvidas lhe foi
essencial.

Agora Ben pensa em como seu próprio estado de humor está. Na verdade ele não
consegue sentir cansaço, apenas ansiedade. Ben nunca foi bom em pedir coisas,
muito menos em apelar, implorando para o criador por uma solução.

Mas nesse momento ele confessa estar disposto a tentar essa opção. O desespero
o leva a isso. Suas mãos estão atadas, sua ineficiência diante da situação o
incomoda. Se dependesse dele, não estaria parado agora, torcendo para que Rey
fique bem. Ele iria além disso...
Enquanto pensa em uma maneira de pedir a solução pelo que infelizmente não
pode resolver… Ele percebe que seu associado está se aproximando pelo corredor.
E ele tem companhia.

Isso o surpreende apenas em partes. Durante esse tempo ele o avisou de que
haviam encontrado Rey.

Ben sabia que Hux iria passar a noite em claro para lhe ajudar a encontrá-la e uma
vez que já não havia mais necessidade ele ligou para tranquilizá-lo.

Ele fez o mesmo com Rose. Depois de ser questionada por seus pais, a garota
ligou para ele por diversas vezes. Ele não sabe ao certo porque ela imaginou que
ele teria informações além das que seus pais haviam lhe dado.

Mas isso era irrelevante…

Ele sabe o quanto ela gosta de Rey. O quanto ambas se adoram. Por essa razão
ele não pensou duas vezes em avisá-la assim que se sentou na sala de espera.

Ele disse que enquanto estivessem aguardando não havia muito o que fazer. Pelo
o visto ela não conseguiu ficar em casa esperando por notícias, o que ele
compreende.

Mal consegue se conter esperando por isso exatamente onde Rey está. Os dois se
aproximam. Cumprimentando seus pais antes dele, até que, Rose
surpreendentemente o abraça.

Ben enrijece. Não porque receber um abraço da garota seja desconfortável, mas
porque esse nível de conforto e afeto vindo de alguém nesse momento o faz ficar
vulnerável.

Desde que isso começou, ele está lutando para que não aconteça. Ele não quer
desabar, não agora… Seu instinto lhe diz que ele tem que se manter forte, pelos
seus pais e principalmente por Rey.

Ainda que, com tudo isso em mente, ele acaba se deixando levar pela troca de
afeto da garota. Ben a abraça de volta enquanto olha na direção de Hux sobre os
ombros dela.

— Perdão. Eu não consegui ficar em casa esperando por notícias. Como ela está?
Ela vai ficar bem não vai? —

Rose se afasta para observá-lo, o que o faz ponderar… — Sim, Rose. Eu acredito
que sim… — Ben afirma ao trocar olhares novamente com Hux que se coloca atrás
deles.
Na verdade ele gostaria de ter essa certeza, mas o fato de não ter ideia de como
as coisas estão indo lá dentro o faz vacilar…

— É claro que ela vai princesa. Rey só tem dezesseis anos. Isso é fichinha para ela.
Não digo o mesmo se fosse comigo ou com Ben. Você sabe, somos mais velhos,
cada dia mais fodidos —

— Armie… — Rose o repreende. Isso faz com que Ben sorria pelo comentário. Não
há qualquer novidade com as piadinhas de Hux. Nem mesmo em momentos
como esse.

O ruivo lhe estende a mão para um cumprimento. Ben a pega enquanto observa
como Rose abraça seu associado encostando seu rosto sobre o suéter preto que
ele está vestindo.

Os três se sentam juntos no canto da sala. Hux amparando Rose enquanto sua
atenção também se estende a Ben.

— Eu sinto muito pela forma como fiquei na ligação. Eu estou uma pilha, só
consigo pensar no quão cego eu fui por não prever algo assim... —

Ele lamenta ao perceber que seu associado observa seu estado.

— Esqueça isso. Não foi nada que já não seja natural do seu humor charmoso…
Além do mais eu reagiria da mesma maneira se alguém tão importante para mim
desaparecesse —

Ben acena positivamente enquanto encara suas mãos unidas em frente ao corpo,
ao se inclinar para apoiar os cotovelos sobre as pernas.

— Você acha que ela teve um surto ou algo do gênero? — Hux o questiona.

— Ela já não estava bem. Eu só consigo pensar que toda a pressão a fez fugir… Não
há outra explicação… —

Assim que Ben partilha seu pensamento, Rose entra no assunto refletindo em voz
alta.

— Não me parece com algo que Rey faria —

— Ela disse alguma coisa a você? — Ele questiona vendo a garota pensar por
alguns segundos.

— As coisas estavam complicadas. Eu tentei por diversas vezes manter uma


perspectiva positiva para ela, mas isso meio que não estava funcionando… Ainda
assim, mesmo com tudo isso, ela seguia com a rotina. Me espanta pensar que ela
tenha tido um surto. Rey é sempre tão disciplinada —

Ele sabe disso. Sabe o quão persistente ela consegue ser, mesmo quando todo o
resto está desmoronando ao redor dela. Desde que perdeu os pais, ela tem
reagido dessa maneira.

— Sim ela é. Mas vinha lidando com coisas demais e a possibilidade disso
acontecer dadas as circunstâncias… Foda-se isso agora. Eu sou responsável por
tudo… —

— Escute, ela vai acordar e quando isso acontecer ela vai ficar feliz em saber que
você está aqui. Esqueça essa culpa. Ela só vai fazer com que você fique ainda mais
angustiado… — Hux rebate e Rose concorda.

— Eu queria que fosse simples assim Armitage… — Ben bufa com exaustão.

— Ben… — Hux o chama, fazendo com que ele estranhe a familiaridade de seu
associado ao utilizar seu primeiro nome. Ele nunca faz isso…

— O que eu disse para a Rose é sério. Rey vai ficar bem. E quando ela estiver em
casa, você vai poder ser um mala com ela outra vez… —

Ben sente a pontada de provocação costumeira para fazê-lo descontrair. Hux


costuma ser bom nisso. Apesar do momento, o truque faz efeito. Com isso Ben o
encara com os olhos estreitos.

— Eu vou me certificar de que você lembre do que acabou de me chamar quando


tudo isso passar… — Hux sorri com sua ameaça e acena positivamente.

— É esse o espírito. E pode ficar tranquilo, eu vou cuidar de tudo no escritório… —

Ben sorri diante da tranquilidade com que Hux afirma sua responsabilidade. Ele
nem mesmo se preocupa em afirmar. Já que sobre isso, não lhe resta dúvidas de
que ele o fará.

****

Ben passa cerca de quatro horas na mesma posição em que ficou assim que
sentou na poltrona. Nem um músculo a mais ou a menos se move, enquanto ele
ainda reflete com sua família ao redor.

Com aquele a quem deve dizer que sem sombra de dúvidas é seu amigo,
acompanhado pela melhor amiga da razão de sua aflição.
Apesar do ambiente. O frio vai diminuindo assim que as primeiras horas do dia
começam.

Todos os cinco passaram a noite em claro. Observando pacientes e


acompanhantes passando pela recepção em meio aos funcionários do hospital
transitando pelos corredores, trabalhando por horas a fio, para atender um a um
que cruzava a porta.

Depois de mais alguns minutos hesitantemente ele reconhece a figura da Dra.


Mothma - que ele agora sabe o nome - adentrando a sala de espera.

Ele tenta traduzir o que ela trás no olhar quando os encontra. E apesar de
reconhecê-lo, é de se esperar que vá diretamente aos seus pais para dar a tão
aguardada atualização sobre o estado de saúde de Rey.

Ben não consegue nem mesmo julgá-la pela mudança de opção. Ele não foi lá
muito receptivo ao chegar no hospital. Depois de toda essa espera ele consegue
se acalmar parcialmente ao ponto de perceber que, estava absolutamente
descontrolado… Todos olham para ela com expectativa pouco antes que ela
comece.

Talvez as preces fervorosas de sua mãe tenham surtido efeito. Já para ele se trata
mais de uma questão de eficiência por parte da equipe médica.

Mas o fato é que, Rey está a salvo…

— Conseguimos estabilizar o quadro, o corpo dela reagiu bem, a temperatura já


voltou ao normal e o corte já foi suturado. Ela está bem. —

Enquanto ele escuta todos respirarem aliviados. Ele se dá conta do quanto


segurou seu próprio fôlego durante todo esse tempo. Ao mesmo tempo em que,
o alívio vai consumindo seu interior, ele se lembra de tudo que prometeu a
Cassian.

Talvez ele tenha parte nisso. Apesar da injustiça em tirar todo o mérito de sua
filha. Ben jamais deixaria de reconhecer que uma parte de sua melhora se deve
aos médicos, enquanto a outra se deve a vontade de viver, que ela tem.

— Nós podemos vê-la? — Sua mãe pergunta vendo como a médica avalia.

— Ela ainda está na sala de observação, já acordou mas está um pouco zonza
devido aos medicamentos. Então só autorizamos a entrada de uma pessoa.
Quando for para o quarto o resto da família pode entrar... —

— Então é melhor que Ben seja o primeiro a entrar — Han oferece fazendo com
que os olhares sejam dirigidos a ele. Inclusive o de Ben.
— O que? — Ele soluça um pouco surpreso pela decisão de seu pai quando o
mesmo faz um aceno para afirmar o que diz.

— Faz um tempo que ela não o vê. Fará bem a ela tê-lo por perto em um
momento como esse. Ela deve estar assustada... Vá garoto, nós iremos depois… —

Os olhos de Ben desviam para os de sua mãe. Leia sem hesitar acena
positivamente no intuito de incentivá-lo, assim como seu pai está fazendo.

Hux e Rose estão sentados de longe ocupados demais enquanto a melhor amiga
de Rey comemora. Ele não sabe bem como reagir a tudo isso.

Depois de tudo, pensou que a primeira coisa que fariam seria culpá-lo. Nem
mesmo sua mãe o impede agora permitindo que as coisas estejam apaziguadas.

Com Rey fora de perigo, ele poderia esperar pelo tempo que fosse para ter o seu
momento, bastou saber que ela está a salvo. Só não imaginou que o teria assim,
antes de seus pais, antes de qualquer um…

Um pouco sem jeito ele agradece aos dois antes de se levantar para acompanhar
a doutora. Depois de caminharem lado a lado pelo mesmo corredor onde passou
para reconhecê-la. Ele termina diante da porta.

As dobradiças a fazem ranger. Ele respira fundo achando o barulho um pouco


alto. Mas suspeita de que talvez seus sentidos estejam um pouco mais aguçados.
Já que seus nervos estão aflorados demais.

Ela termina de abrir, dando espaço suficiente para que entre. Quando ele o faz, a
porta se fecha, até enfim deixá-lo a sós… com ela.

Olhar para ela desacordada agora é como mais uma vez, voltar no tempo. Aquele
mesmo turbilhão de sentimentos o atinge de novo e de novo.

Ben dá alguns passos para perto da cama, puxando uma cadeira que está
próxima ao tubo de oxigênio no caminho. Ele a deixa ao lado dela e então se
senta.

Naquela época, quando a observou desacordada ele se atentou aos traços que ela
tinha muito semelhantes aos de seus pais. Naquela época, ele não a conhecia o
bastante para distinguir a diferença de cada mínimo detalhe.

Bem… acontece que ele os conhece perfeitamente agora.

Ben estende a mão para segurar a dela. Os dedos longos e grossos entram em
contato com os pequenos e frágeis. Embora ela pareça tão pálida e fria, a
temperatura de sua mão é quente o bastante para fazer o corpo dele se aquecer
também.

O que ele sente a seguir é uma onda de alívio que faz seu peito zumbir junto de
sua respiração descompassada.

Ele sente alívio porque, apesar de notar que seu rosto antes sempre corado esteja
um pouco mais apático agora, e que seu corpo esteja mais magro do que o
habitual. Ela ainda é a mesma.

Ela ainda é a sua Rey…

Ben traceja com seus dedos pelo antebraço dela. Seus olhos vão percorrendo o
caminho que os dedos fazem. Sua mão direita permanece na dela. Por isso ele a
leva até os lábios e a beija.

Os dedos da outra mão sobem até os cabelos dela, eles se enrolam nas mechas
castanhas antes de irem para as maçãs da face. Ele deveria parar de tocar nela
agora, ele deveria deixar que ela durma, que ela descanse, mas ele não pode...

Porque a horas atrás ele acreditou que nunca mais fosse conseguir fazer isso
outra vez, porque a horas atrás ele pensou que nunca mais fosse ver o rosto
perfeito dela de novo…

Porque agora ele precisa checá-la com vida, uma, duas ou dez mil vezes. A
quantidade não importa. Ele só precisa saber...

Se dando conta de que é real. Ben enfim se deixa levar pelo seu emocional. Não
pelo alívio momentâneo em vê-la com vida outra vez, mas sim pelo alívio
verdadeiro de saber que ele está tendo outra chance de fazer isso…

E ele não pensa nem por um minuto em desperdiçar a oportunidade.

Ben inclina seu corpo deixando que sua testa repouse na cama ao lado dela, se
rendendo às lágrimas.

Ele se permite chorar, por todas as reservas, pelo medo que sentiu, por ter
suportado a dor dentro dele desde que ela se foi de sua casa, pela culpa, pelo
estado dela.

Ele chora, como nunca havia chorado na vida. Porque é diferente agora. É distinto
de chorar por uma partida. É a sensação de ter ganhado tudo, ainda que sem
merecer ganhar…
As lágrimas turvam sua visão mas ele não consegue parar. Ele não consegue ser
forte o bastante para se segurar na frente dela, não quando sente um misto de
alívio e culpa.

Ele fica por dois ou três minutos encostado com seu rosto ao lado do corpo dela,
até que não lhe reste mais pelo o que se emocionar…

Talvez daqui a mais dois minutos ele faça isso de novo porque sente que nunca
vai parar de ser grato por tê-la outra vez.

Em meio a sua comoção ele sente um toque suave subindo entre as mechas do
seu cabelo. Rapidamente ele identifica, que são dedos… os dedos dela. O toque
dela.

Ele ergue o rosto para assisti-la piscar lentamente sobre a máscara. Ben soluça
surpreso por vê-la acordada - apesar de não ter respeitado tanto quanto gostaria
o repouso dela -

A mão de Rey não deixa de tocá-lo. Seus dedos deslizam dos cabelos, indo em
direção ao rosto dele. Usando a ponta dos dedos para inspecionar suas feições.

Parece tão calma, respirando e piscando com sonolência, ao tocar a pequena


linha abaixo do olho dele por onde as lágrimas caíram. Ben segura a sua mão
mantendo-a contra o próprio rosto.

Antes que isso o faça desabar novamente, ele encosta os lábios suavemente na
extensão do pulso dela. Ele planta alguns beijos do pulso a palma completamente
exultante.

Antes de se inclinar um pouco mais perto, ele tenta reprimir o nó que está
ardendo através de sua garganta para poder falar mas…

Ainda que queira, isso se torna um ponto esquecido, quando seus olhos se
encontram. Ela não tira os seus dos dele. É como se quisesse acreditar que ele
está ali.

Ben não está diferente disso. Também sente a mesma necessidade por dentro.
Apesar de buscar se recompor por fora. Ele seca as próprias lágrimas e em
contrapartida Rey faz seu movimento também.

Ela leva sua mão livre e trêmula até o próprio rosto para tocar a máscara de
oxigênio, percebendo o objeto ali. Assim que isso acontece ela o puxa tentando
tirá-lo. O que faz com que Ben reaja.

— Ei, ei, ei... vai com calma — Ele diz com tom suave e baixo, muito próximo dela.
Seus dedos ficam sobre os dela, enquanto a impedem de prosseguir...
— Você não precisa ter pressa. Está tudo bem agora… — Ele comenta e a vê
balançar a cabeça insistentemente, na verdade, ela parece mais agitada do que
ele consegue prever.

Tendo em vista o nervosismo dela, Ben decide deixar que ela tire a máscara. Ao
fazer, ela suspira profundamente com seus olhos distantes, seu rosto vira em
direção a janela no canto esquerdo de sua cama.

Parece estar averiguando se o dia amanheceu. Seus olhos vagam ao redor do


quarto tentando reconhecer o lugar antes de retornar para ele.

Ben percebe que ela está prestes a chorar. E tentando impedir que ela fique tão
aflita ele se levanta da cadeira para sentar-se na lateral da cama.

Sua mão se estende até o rosto dela, e com seu polegar Ben interrompe as
lágrimas que ameaçam cair. Ele sorri sutilmente para tranquilIzá-la, mas os lábios
dela tremem, assim como todo o resto do corpo.

A reação de Rey o faz pensar no quão traumatizada ela está com tudo o que
houve. Isso faz com que a culpa o consuma novamente… É doloroso vê-la assim,
ainda mais quando de certa forma se é responsável.

— Rey, me escuta… Você está segura agora. Não vou deixar que mais nada
aconteça a você. Eu juro… — Ela soluça e ele a acaricia no dorso da mão.

— Eu, sinto muito. A culpa é toda minha. Se eu tivesse insistido mais, se eu não
tivesse me conformado… Você não estaria aqui. Você não precisaria fugir… —

Suas palavras fazem os olhos dela ficar arregalados, enquanto as lágrimas caem.
Rey parece estar tentando falar enquanto toca em sua garganta
desesperadamente com a ponta dos dedos.

O gesto dela o deixa preocupado, por isso ele segura a mão dela tirando-a dali…

— Não precisa se esforçar, eu não vou a lugar algum. O pior já passou. Você é uma
garota corajosa Rey… Não que eu já não soubesse o quão corajosa você é… —

O seu encorajamento, apesar de sincero faz com que ela reaja rápido demais.
Com um impulso Rey se senta para alcançá-lo, seu corpo se choca ao dele em um
abraço apertado.

Ele geme com o impacto se surpreendendo com o corpo dela agarrado ao seu.
Suas mãos rapidamente repousam nas costas dela para ampará-la. De repente é
como se ele tivesse desaprendido a fazer isso…
Seus dedos deslizam suaves pelas costas dela. E ali contra o seu corpo ele percebe
que de fato ela está bem mais magra. Suspirando pela constatação, ele a envolve
de olhos fechados e ambos estremecem atados um ao outro…

Ainda que por mais cuidado que esteja tomando para não quebrá-la. O que
levando em consideração a intensidade de sua necessidade não seria algo
impossível de acontecer, ele tenta se controlar.

Ele não sabia que precisava tanto disso até tê-la justamente assim pressionada
contra o seu peito. Com seu coração batendo forte, como sinal de vida plena.

O nariz dele se afunda nos cabelos dela. E apesar de tudo ao redor camuflar a
familiaridade em seu cheiro, apesar do ambiente frio, da camisola verde de
hospital que ela está vestindo, do aroma do éter em seu corpo.

Ben ainda consegue desfrutar do que ela tem em essencial. A maciez dela e quão
confortável ela fica contra o seu corpo. Os dois respiram profundamente como se
estivessem perdendo o fôlego. Ele apenas a segura, satisfeito pelo fato de estar
com ela.

Apesar desse alívio espontâneo, ele não deixa de notar o choro dela. Rey está
soluçando com sua bochecha esfregando-se no casaco dele. Ela parece ter suas
necessidades também.

A de desesperadamente sentir a presença dele. Isso o deixa mais do que


preparado para cumprir e suprir toda e qualquer necessidade dela.

Os lábios dele encostam em seus cabelos enquanto ele sussurra repetidamente


que sente muito. Tão necessitado quanto ela, ele a segura com um pouco mais de
força e isso a faz gemer, possivelmente de dor.

— Me desculpa. Estamos indo rápido demais, você precisa descansar… — Ele


recua um pouco. E ela novamente se nega a aceitar um afastamento, o que faz
com que Ben suspire…

— Shhh. Está tudo bem… — Ele começa a sussurrar repetidamente, encarando-a


nos olhos.

— Ben, eu quero falar… eu, eu preciso… — Rey consegue sussurrar com rouquidão
na voz. Ainda em negação quanto ao incentivo dele para que se mantenha calma.
As mãos dela vão em direção ao seu rosto para segurá-lo, enquanto os olhos se
tornam penetrantes nos seus.

Entendendo a sua maneira o que a aflição dela significa, ele de imediato toma a
iniciativa de tranquilizá-la. Ben acaricia o rosto dela circulando a bochecha com o
polegar, antes de levar seus dedos até os fios de cabelo para escová-los.
— Rey, se está assim porque acha que ficamos bravos pelo seu desaparecimento,
esqueça. Estão todos lá fora, esperando para ver você… —

Ela soluça contra o rosto dele, mas Ben insiste… — Estamos felizes porque você
está a salvo. Não importa que você tenha vindo para cá ou para qualquer outro
lugar. Só o que eu quero agora é levar você para casa… Mas você precisa de
repouso para que isso aconteça —

Rey se esforça para falar, há uma urgência dentro dela agora que de nenhuma
maneira ele consegue acalmar.

Antes que ele a impeça novamente, seu ímpeto de se expressar a faz falar, mesmo
que em breves palavras, o suficiente para deixá-lo mudo.

— Ben… foi o Poe… — Nesse momento ele sente o sangue correr do seu rosto. O
olhar angustiado dela é diferente do seu agora.

Ele encara os olhos dela um pouco ou muito atordoado. Suas mãos se afastam
dela e seu corpo automaticamente segue o exemplo.

Talvez seja seu estado semi-lúcido ou o dela, ele não sabe dizer, mas acredita que
não ouviu direito… Quando cogita a possibilidade de perguntar para que ela repita
as palavras outra vez, a porta se abre e por ela a doutora aparece...

— Vejo que já está acordada. Muito bem, o quarto já está pronto. Vamos
transferi-la para ele agora. Senhor Solo, pode nos acompanhar? —

Ben reluta enquanto seus olhos permanecem nos de Rey. Dois minutos, só mais
dois minutos com ela. É o que ele precisa para entender o que aquilo significa.

Porque diabos ela está mencionando o nome daquele desgraçado? Ele tem parte
nisso? Foi ele quem fez isso com ela? Ben não consegue encaixar as peças, seu
sangue está bombeando com violência.

Ele precisa saber, o quanto antes...

Tendo em vista de que estão esperando para transferi-la ao quarto, ele não tem
escolha a não ser hesitantemente sair do caminho. Ele a segue, como um falcão.

Não leva mais do que cinco minutos para que Rey esteja instalada no quarto. É
mais confortável do que a sala de observação.

Tem poltronas, uma janela com vista ao lado de sua cama e uma TV que está
ligada com o que parece ser uma reprise de American Idol.
Seus pais são os primeiros a entrar, estavam ansiosos por isso. Ele os acompanha
em seguida. Notando a bandeja sobre o suporte em frente ao rosto de Rey.

Sobre ela está o café da manhã. Ela ignora sua refeição hospitalar. Escolhendo um
copo com água ao invés das frutas, torradas e pudim de chocolate que estão
sobre a bandeja.

A enfermeira afasta o suporte para que ela se ajeite e assim que se acomoda aos
travesseiros ela os vê. Já sentada ela coloca a mão sobre o quadril como um
possível reflexo da dor e isso a faz respirar profundamente.

Ben não se aproxima o bastante, por mais que sua mente esteja girando com a
necessidade de informações por parte dela. Ele teve seu momento, ele terá mais
dela depois e ver como seu pai sorri aliviado ao vê-la o faz relaxar por um tempo.

Sua mãe, por sua vez, não esboça tanta confiança assim com a aproximação. O
receio dela é notável. E sobre isso, ele compreende muito bem. Sentiu essa
mesma culpa quando a viu.

Seu pai se inclina para beijá-la na testa e com isso ela sorri. É um alívio olhar para
o sorriso dela de novo, ainda que não seja destinado a ele em particular.

Han sussurra alguma coisa para ela que Ben não consegue compreender, mas é o
suficiente para deixá-la emocionada enquanto está rindo.

Os olhos dela vão de encontro aos de sua mãe e nesse momento ambas parecem
ficar apreensivas. O que também é fácil de se compreender…

Ben se conhece o bastante para saber quando costuma pecar por excessos. Essa
característica típica não é nada além de genética. Em palavras mais claras, ele
teve a quem puxar…

Exatamente por esse motivo, ele sabe que no momento em que sua mãe se senta
ao lado de Rey para segurar sua mão ela vai tentar consertar cada passo errado
que deu até aqui…

Ela vai tentar se redimir, vai tentar recuperar o que ela mesma quebrou; não por
desencargo de consciência, mas pela necessidade de fazer com que Rey saiba o
quanto ela se importa. E sem qualquer surpresa é exatamente isso o que
acontece.

— Querida, eu estou tão feliz que você esteja bem. Eu sei que fui uma pessoa
horrível com você… E eu sinto tanto por isso, Rey… — Ben cruza os braços quando
seu pai olha em sua direção.

— Leia… — Rey tenta falar, quando é interrompida.


— Não querida, me deixe terminar… Eu fui dura demais com você, comigo... com
todos aqui. Eu juro, juro pela minha vida que nunca mais irei tratá-la dessa
maneira outra vez —

Rey não diz nada como Leia havia lhe pedido. Ao invés disso ela concorda com
tudo que ela está dizendo.

— Eu sei que não sou sua mãe, e no momento talvez nem tenha o direito de
querer ser... Mas eu só quero o seu bem, você é a filha que qualquer pessoa
gostaria de ter. E eu só quero a sua felicidade, todos nós queremos —

As palavras de sua mãe a emocionam. Não há como evitar que o arrependimento


de Leia e suas palavras comova aos três de certa forma. É o retrato perfeito de
uma família feliz, ainda que com falhas que não se apagam da noite para um dia.
E ele está falando das suas…

Rey a abraça. As duas se emocionam e seu pai acaba sorrindo de satisfação por
ver a coisas entrando nos eixos.

Por mais que Ben ache aquilo tudo muito bonito, ele se considera precavido
demais para entender que no calor da emoção, as coisas são levadas a níveis um
pouco exagerados. Depois da raiva incontrolável, vem o amor exacerbado, as
promessas exageradas…

Não que ele tenha dúvidas sobre o arrependimento da inabalável Leia Organa -
agora não tão inabalável assim - ele a conhece o bastante para saber que é
sincero. Que seu lado mãe está imperando na balança outra vez.

Contudo, ele prefere que o tempo dite como as promessas devem funcionar.
Principalmente as que ele fez. Por isso ele se silencia distante da interação dos
três.

Ele não consegue pensar em outra coisa se não no que Rey lhe disse a pouco. Eles
precisam conversar…

Rey parece entender que por mais pesado ou injusto que tudo isso tenha sido, foi
apenas uma tentativa medonha a que sua mãe teve de tentar fazê-los enxergar.

Acontece que ele ainda não desistiu da promessa que fez, tão pouco se esqueceu
de que precisa fazê-los entender tudo o que está acontecendo.

Não que isso tenha relevância nesse momento. Não que ele se abstenha da sua
parcela de culpa nessa história. É só o fato de que Rey é doce demais para negar
qualquer coisa que venha deles. E ele só consegue ser infinitamente grato por
essa dedicação dela, por mais que o preocupe as vezes.
Com o canto dos olhos ele percebe seu pai se aproximando aos poucos. Virando
seu rosto para olhá-lo ele suspira dando espaço para que ele fique ao seu lado
enquanto as duas conversam ao fundo.

— O que você sussurrou que a fez rir? — Ben pergunta fazendo com que Han olhe
para ele dando de ombros.

— Segredo nosso… Você sabe, coisa de Solo — Ben estreita os olhos com ceticismo
enquanto segura o sorriso. Balançando a cabeça em negação.

— Tudo bem, não vai me contar. Já entendi… — Seu pai cantarola com algum tipo
de compreensão que não o alcança. Alguma coisa que ele não entende e então se
vira para olhá-lo de frente.

— Você quer saber como eu faço, não é? Essa coisa é por ela, ou por mim? — Han
pergunta projetando o queixo com desafio.

— Que coisa? — Ben responde já ciente das armadilhas do pai, quando ele
começa com toda a baboseira enigmática, é porque está sondando.

— Como é mesmo que costumavam chamar no meu tempo... ciúmes… — Han diz
ao estalar os lábios e cruzar os braços exatamente como Ben estava a segundos
atrás.

— O que te faz pensar que eu estou com ciúmes? — Ben pergunta com uma
surpresa sincera.

— Ah você sabe. Eu sei como fazer as mulheres sorrirem. Tenho minhas inúmeras
qualidades, tenho meu charme arrasador… Sou o melhor Solo… —

Seu pai ignora o olhar de descrença que está lhe dando no momento. Ele sorri
presunçosamente ao descrever seus próprios atributos - o que para Ben são
imaginários -. Tudo bem, talvez não tão imaginários assim. Ainda que ele não vá
admitir para não estragar a provocação.

— Sabe, eu estou mais tranquilo que estejamos em um hospital. Você tá


precisando ser atendido urgentemente por um médico, pai. Acho que tá ficando
senil… —

Desta vez Han se vira, arqueando uma sobrancelha irônica para ele. Ben pisca sob
falsa inocência vendo como seu pai deixa os lábios em uma linha fina.

— Se você está com coragem o bastante para me desrespeitar assim garoto. Isso é
sinal de que está bem… Não tenho mais o que fazer aqui… —
— Espere aí, isso era um plano? — Ben pergunta indignado.

— Depende. Eu o distraí o bastante pra evitar que acabemos emocionados como


aquelas duas ali? —

Agora sim Ben não consegue conter sua própria risada — Eu diria que sim… —

— Então muito bem, era esse meu plano o tempo todo. Que funcionou
perfeitamente como tudo o que eu planejo fazer... —

Planos e Han Solo… Uma combinação perigosa e improvável. Ben considera isso
ao responder.

— Nós dois sabemos que essa parte é mentira, pai. Mas eu ainda preciso de uma
coisa… —

— E o que seria? — Seu pai questiona com uma curiosidade palpável.

Bem, e então acontece…

Como seu pai consegue convencer sua mãe a deixar o quarto com ele, Ben não
sabe dizer.

Mas ele considera que foi um trabalho árduo utilizar todos os argumentos
possíveis para convencer Han Solo a deixá-lo a sós com Rey por mais alguns
minutos.

Tendo em vista a preocupação pelo repouso dela, era de se esperar que ele fosse
ser um pouco resistente. Mas a coisa funciona e os dois os deixam.

Fechando a porta assim que eles saem. Ben se vira para olhá-la, vendo como ela o
examina acomodada pelos travesseiros em suas costas…

Ben se senta diante dela, na lateral da cama, dando um suspiro prolongado ao se


ajeitar apreensivo com o que pode vir e até mesmo desconfortável. Rey pisca
lentamente em sua direção e sem mais delongas ele começa…

— Ok. Nós vamos conversar agora… —

****

Já se passaram horas desde a última vez em que Rey esteve acordada. Não que
ela tenha conseguido dormir integralmente durante isso.
Borrões e flashes do que fez durante esse tempo vão surgindo em seu
subconsciente, é difícil distinguir as partes que são sonho dentre as que de fato
aconteceram.

A essa altura é possível perceber que ao menos uma delas é real o bastante para
manter seu coração em paz.

Ela está entre os seus… Não passou para um outro plano, não encontrou com o
espírito de seus pais, encaminhando-a para herdar com eles o reino dos céus,
como lhe diziam as freiras no colégio católico.

Os remédios para a dor a deixaram semi-lúcida. Mas ela se lembra perfeitamente


do momento em que acordou… Assim como se lembra do momento em que
desmaiou.

Essa parte é muito difícil de se esquecer...

O medo que sentiu, a solidão e o desamparo, além da dor lhe assolando. Foram os
minutos mais horríveis de sua vida. Sendo a segunda vez em que ela teve que
lutar por ela. Ela pensa em como a situação a levou ao limite, testando sua
coragem…

Coragem. Ela é uma garota corajosa. A palavra ressoa em sua mente, através da
voz que ela tanto quis ouvir naqueles últimos minutos. No momento em que seus
olhos se abriram, ela o encontrou.

Pensou a princípio que talvez fosse uma recompensa herdada pelo paraíso. Ou
talvez uma condenação por sua imprudência. Ter que olhar para ele pela
eternidade sem poder verdadeiramente tocá-lo. Punição muito semelhante com
a qual ela estava vivendo antes de seu incidente.

Quando seus dedos trêmulos o tocaram, ela então soube que estava viva, a
maciez nos fios de cabelo, os suspiros longos que ele deu ao sentir seu toque…

A emoção de ver os olhos dele encontrando os seus marejados, vermelhos e


perdidos. A princípio foi um pouco confuso, ela não sabia onde estava.

Teve que se adaptar as sensações desagradáveis em seu corpo. A fadiga, a


queimação irritante em sua garganta, e uma dor latente em seu quadril.

Mas nada disso teve tanto peso quanto saber que estava viva e mais do que isso,
com Ben ao seu lado, esperando-a despertar.

Pela segunda vez, depois de uma experiência dolorosa, ela abriu os olhos para
encontrá-lo ali, diante dela, pronto para ampará-la.
E como ela precisava dele naquele momento. Como sentiu falta de olhar para ele,
apenas olhar… Nada muito exigente, ela não seria exigente agora.

Estar com Ben se tornou confortável. Foram semanas sem vê-lo e embora pareça
um exagero dizer que mais se pareceu com anos, ela não se importa em fazer o
comparativo. Ela poderia dizer que é como se décadas houvessem passado.

Não tem relevância temporal, quando se foi doloroso o bastante para lhe trazer
alívio assim que o viu novamente. Assim que ouviu a voz dele outra vez. Ela nunca
se sentiu tão aliviada como no momento em que ele a segurou de volta.

Depois dele houveram mais rostos familiares… Leia, Han, Rose e Hux. Ela estava
tão grata por isso, de alguma forma ela estava de volta daquele abismo vazio do
qual vinha caindo. Sem cordas, sem uma mínima ideia de quão fundo ele a estava
levando…

Pensar no que aconteceu ainda a assusta. Embora o conforto de estar protegida


entre as pessoas que ama a faz evitar a lembrança.

Ela precisou contar a Ben o que houve. Todo o caminho que percorreu quando
Poe a levou, absolutamente tudo o que aconteceu. Teve medo de que ele fosse se
zangar, de que ele fosse se sentir culpado quando soubesse o que havia
acontecido. Mas ao invés disso ele ficou estranhamente calado.

Ele a beijou, a abraçou e lhe disse que sentia muito, apesar de saber que de certa
maneira isso aconteceu por reflexo da culpa, ela aceitou todo o carinho e afeto
que ele lhe deu desde as primeiras horas em que o viu.

Foi a melhor sensação do mundo ser amparada por ele, ser aceita por Leia mais
uma vez, entender seus motivos e mais do que isso perdoá-los. Não que ela tenha
considerado o perdão em algum momento.

Nunca foi necessário. Talvez pelo acidente, talvez por saber que poderia não estar
com eles novamente, mas tudo o que houve antes, se tornou insignificante perto
de estar viva.

Ela dormiu durante as pequenas visitas a medida que seu sono permitia. Queria
estar mais tempo com sua amiga, com seus tutores e principalmente com Ben.

Mas a batalha contra o efeito dos remédios muitas vezes foi perdida. Da última
vez que acordou se lembra de ter visto Han sentado com um jornal nas mãos,
lendo alguma coisa nas páginas policiais.

Essa foi a única vez em que Ben não esteve presente. Das outras, ela o encontrou
sentado, velando com atenção seu sono. Seu interior sorriu por vê-lo novamente,
mas sua consciência se tornou pesada vendo como, mais do que outros, ele mal
teve tempo para descansar.

A Dra. Mothma, também fez suas visitas avaliativas, para saber como estava. E
apesar de estar sentindo um pouco de dor devido aos pontos em seu quadril,
tudo parecia normal. Rey não sentia mais o frio. Ela injetou algum outro remédio
que fez efeito dentro de três minutos.

Rey se lembra de adormecer aos poucos, observando enquanto Ben entrava no


quarto durante a noite com seu suéter preto, com seu perfume inconfundível e
seus cabelos molhados…

Os primeiros raios de luz atingem a janela de frente para a sua cama. Ela pisca
algumas vezes tentando lidar com a claridade excessiva e a visão turva.

Seus olhos se apertam um pouco antes de se abrirem completamente para a


manhã de inverno através dos vidros no segundo andar de seu quarto hospitalar.

Ela confessa que preferia acordar em sua já tão familiar cama no apartamento de
Ben, mas algo em particular melhora o tom azedo de seu desejo não atendido.

A voz dele ao fundo…

Ela está deitada com a lateral direita de seu corpo em direção a janela. Assim que
sua visão se acostuma o bastante ela percebe que há uma espécie de caixa na
bandeja de remédios ao lado de sua cama.

Ela geme um pouco dolorida por passar tanto tempo nela e seus olhos logo
desviam da caixa para o homem sentado sobre a poltrona de couro azul e
desconfortável que faz com que as pernas dele pareçam ter o dobro de seu
tamanho.

Ele está vestido exatamente como ela o viu na noite passada. O que significa que
ele ficou ali, naquela posição desconfortável durante a noite toda. Ter ideia disso a
deixa um pouco mal.

Ben está no telefone. Parece distraído quando seus olhos a encontram. Isso a faz
sorrir, como um reflexo inevitável a presença dele.

"Certo, Mitaka. Eu agradeço. Ela parece estar acordando, pode deixar que eu direi
a ela…" Ele diz para a pessoa na linha. Que agora ela sabe de quem se trata.

Ben desliga a ligação e se aproxima da cama para sentar-se na lateral


observando-a com uma atenção terna.
— Mitaka lhe desejou melhoras… — Ele diz. Fazendo com que ela sorria por isso.
Está ficando mal acostumada com tanta atenção e carinho, mas não há do que
reclamar, ela pensa.

— Você passou a noite inteira ali? Naquela poltrona desconfortável? —

Rey não consegue esconder sua aversão a ideia de saber que ele ficou tão
desconfortável por tanto tempo ao apontar para o móvel um pouco incrédula.

— Você não deveria se preocupar com isso. Mas se vai lhe deixar mais calma, eu
dormi o bastante durante a troca de visita com meu pai. Estou descansado… —

— Você tem certeza disso, Ben? — Ela pergunta com receio vendo como ele
afirma sem nem mesmo considerar.

Rey morde o lábio inferior notando o olhar de aviso dele para deixar o assunto
para lá. Ela sabe como ele é teimoso e isso só serviria para fazê-los girar em círculo
sobre como ele deve priorizar um pouco mais o sono dele no momento.

Não há necessidade de tanto esforço. Ela está bem, todos tem revezado no
primeiro dia de sua internação, não há porque Ben exigir mais de seu físico do
que já está exigindo.

Tentando não tocar mais no assunto. Ela volta sua atenção ao objeto que
encontrou ao lado de sua cama, logo que seus olhos se abriram.

— Ben, o que é isso? — Ela se inclina para pegar a caixa, segurando a mão em
seus pontos com receio de que eles possam abrir.

— Não a reconhece? — Ele pergunta fazendo com que ela desvie os olhos com
curiosidade para ele, antes de olhar novamente para a caixa.

É só quando as gravuras tomam forma em sua memória que ela consegue


reconhecer os pequenos detalhes desenhados nela por seu pai.

Seus lábios se abrem em meio ao suspiro impressionado pelo o que está vendo.
Imediatamente ela solta o feixe para abrir a tampa e se deparar com um mar de
fotos e lembranças de sua vida.

— Oh meu Deus. Como você... — Rey está tão tomada de emoção que mal
consegue concluir a frase. A caixa que seu pai havia feito para guardar as
recordações que tinham.

— Ontem, nós não tivemos muito tempo para conversar… Depois do que você
contou… —
Ben faz uma pausa, chamando a atenção dela para a conversa que tiveram sobre
Poe. Ele engole e então continua...

— Todos queriam lhe ver, você estava cansada, eu acabei me esquecendo disso…
Tinha deixado no carro, então resolvi trazer. Se lhe deixar triste eu o levo embora…

— Não — A sugestão dele a faz responder de imediato levando a caixa o mais


perto dela possível.

— Você… você foi até lá? — Ela pergunta sem acreditar que ele lhe trouxe algo tão
incrível.

— Sim. Digamos que eu precisasse passar pela minha despedida também… E eu


encontrei a caixa no meio das esculturas do seu pai… — Ele diz um pouco
humorado.

Rey sorri por isso. Está tão emocionada, ao recordar das esculturas que seu pai
costumava fazer. Ele sempre terminava machucado por conta delas de alguma
maneira…

— Eu precisava de um momento, então quis ficar sozinho, incomunicável. Foi uma


decisão estúpida… — Rey seca as lágrimas que caem de seus olhos por ver todas
aquelas fotos.

Ao ouvir as palavras de Ben ela pensa em tudo o que houve novamente. Ao fazer
isso ela entende o que ele está tentando com aquilo. Uma espécie de justificativa
que ela em hipótese alguma, jamais cobraria.

— Foi uma decisão necessária. Eu também precisei me despedir deles… Entendo


perfeitamente que você também tenha precisado. Eu jamais culparia você pelo o
que houve Ben… —

Ben pisca um pouco chocado, embora ela não entenda o motivo. Sabe para onde
ele está indo com isso e não vai permitir que ele se martirize pelo o que já passou.

— Sua compreensão as vezes me irrita, sabia? Como você consegue não se


magoar com nada? Comigo? As vezes eu fico impressionado com isso… —

Isso não é verdade. Ela se magoa com muitas coisas. Ela já se magoou com ele
inúmeras vezes, mas acontece que agora… agora o que ela quer de verdade é
aproveitar cada minuto de sua terceira chance.

Quantas pessoas puderam ter o privilégio de escapar da morte duas vezes? Só de


estar olhando para ele agora, ela já se sente a garota mais sortuda do mundo.
— Eu senti tanto sua falta… —

Rey compartilha seu pensamento sem medo ou reservas. São palavras sinceras.

Ela esperou tanto pelo momento em que seu castigo acabaria, para poder estar
com ele de novo e agora que isso está acontecendo outra vez, ela mal sabe como
começar a descrever a sensação…

Nesse momento, ele está olhando diretamente em seus olhos, seu sorriso está se
abrindo aos poucos.

Um sorriso contido, que contudo, consegue ser lindo o bastante para fazer o
coração dela palpitar cheio daquela vontade de viver novamente. Ele está prestes
a dizer alguma coisa, algo que a faz querer ouvir desesperadamente…

Mas o momento fica suspenso, quando Leia entra no quarto com sua presença
espirituosa e elegante.

— Bem, acho que meu turno acabou… — Ben diz olhando-a assim que seus olhos
retornam de onde sua mãe está. Observando a maneira como ela entra tão
apressada.

Isso faz com que ela ria. Ainda mais por Leia estar abanando as mãos no ar indo
em direção aos dois para beijá-los na testa. Ben parece pouco à vontade com a
mudança repentina. Mas Rey particularmente adora.

É como se a Leia que conheceu estivesse de volta. Feliz, radiante e acolhedora.

— Não se preocupe, ainda vou buscar um expresso para beber. Só vim ver como
nossa menina forte está essa manhã… —

Rey olha na direção de Ben vendo como ele arqueia uma sobrancelha irônica que
a faz sorrir um pouco mais. Ele também parece estar se divertindo com a
mudança de sua mãe.

— Muito bem, Leia. Obrigada… —

Leia assente e então com um suspiro aliviado vai caminhando em direção a porta,
sem deixar de falar com Ben no caminho.

— Eu volto já, meus filhos. Você precisa ir descansar um pouco… Han logo estará
aqui, ficaremos os dois com ela. Vá para casa querido… —

Ela diz apontando para Ben que acompanha seus passos com o olhar, até que a
porta se feche novamente.
— É. Parece que é oficial, a Leia Organa que conhecemos está de volta… —

Ele comenta olhando para ela novamente com a mesma ironia no olhar. Rey não
consegue fazer outra coisa que não sorrir feito uma boba para ele.

— Eu volto mais tarde pra ficar com você, vou deixar que eles te mimem um
pouco agora… —

O comunicado dele faz seu peito apertar um pouco. Ela sabe que está sendo
absurda, não é como se ele fosse sumir outra vez…

Na verdade ele nem mesmo sumiu. Foram semanas de um afastamento tortuoso


e incessante… Isso a faz suspirar pelo receio.

— Você vai mesmo voltar? — Ela pergunta sem conseguir evitar seus próprios
medos lhe atingindo agora.

— Não tenha dúvidas que eu volto. Não desgrudo mais meus olhos de você… Se
acostume com isso —

O modo como ele diz aquilo é tudo. Tudo o que ela precisa para se satisfazer com
a onda de alívio invadindo seu corpo. Ela sorri quando os lábios dele ficam colados
em sua testa.

O beijo terno a faz suspirar como em todas as vezes que ele se despede para ir á
algum lugar.

Dessa vez eles não estão separados, não há ninguém os afastando um do outro.
Não há nada que a impeça de tornar a vê-lo novamente.

****

Hux está a ponto de ter um colapso nervoso. Ao todo ele passou por seis reuniões
diferentes com cerca de dez sócios diferentes de um dia para o outro.

Um bla bla bla infinito sobre jurisdições de empresas e seus danos causados em
regiões, devido a poluição.

As indústrias Hutt vem sofrendo processos intermináveis devido ao acúmulo de


gás carbônico que tem afetado os moradores em vilarejos próximos à fábrica. Ele
precisa contornar essa situação evitando que isso vá parar na corte e faça com
que a Hutt perca milhões por processos.
Apagar esse incêndio não é fácil. Não quando os requerentes se recusam a fazer
um acordo onde a Hutt fica encarregada de cobrir uma nova moradia, além claro,
dos gastos hospitalares.

Sem a gestão de seu mentor no processo, as coisas se tornam mais difíceis. Ele
nunca pensou que diria isso mas, sente falta do mau humor contínuo de Ben
agora que ele não está ali. Solo se ausentou por poucas vezes desde que ele
começou a trabalhar ali.

Agora ele entende o motivo para ele ser tão viciado nisso. Mal há tempo para
respirar direito. Está certo, foi ele quem ofereceu cuidar de tudo, não pode
reclamar de nada agora.

Além do mais, Ben precisa de um tempo para esfriar a cabeça com a família. Vem
lidando com tanta merda ultimamente.

É que de repente Hux considera que é muito mais fácil quando se está preparado
para a coisa toda, ou quando se está sentado como plano de fundo, vendo Ben
lidar com aquilo, como se fosse simples.

Por mais rapidamente racional que seja ele não é tão ágil assim, porra. Como é
que ele faz isso? Jesus Cristo.

Ele tem que sair da caderneta de associados em dois minutos para estar na sala
de reuniões e atender o conselho de sócios da Hutt Industries. Luke disse que o
acompanharia, mas ele está levando pouca fé na possibilidade.

O homem é mais atolado do que o próprio Solo. Ele chega na sala para descobrir
que Luke elegeu um assistente jurídico e um outro novo associado para ajudá-lo
com o andamento da reunião.

Nada de Dameron. Luke o vem deixando de molho a semanas, desde que Ben o
confrontou sobre Hoffman e sobre a Motors. Tony, um dos associados tinha lhe
dito entre os intervalos que Dameron andava estranho.

Os caras o pegaram no banheiro uma vez estranhamente agitado depois de se


trancar em um das cabines.

Hux sabia o que aquilo podia significar, apesar de achar uma estupidez absoluta
que ele estivesse de fato usando algo ilícito em seu horário de trabalho. Talvez por
saber que o teste de drogas era feito apenas uma vez ao mês nos funcionários, ele
tenha se achado no direito de arriscar.

O problema é que Dameron não tinha aparecido na empresa a dias, até essa
manhã. Quando Hux passou pela sala de Luke o viu reunido com ele em uma
conversa talvez um pouco tensa demais, pelo semblante de ambos.
Portas de vidro em escritórios tornam as discussões um assunto de domínio
público. Ele irá se lembrar disso quando tiver a sua. O fato é que o cara estava um
bagaço completo. Seja lá o que ele estava usando, era coisa pesada.

Hux ignora a tragédia de Dameron, para lidar com sua própria tragédia. Ele checa
suas pastas, duas ou três vezes ao entrar na sala de reuniões. Ajeitando o seu
terno em seguida, isso antes que os sócios entrem lá. Ele se senta ao lado do mais
novo associado de Luke, Andrew - em fase de teste, ele sabe bem como é a
pressão -

Grato pelo voto de confiança que Luke está lhe dando além da compreensão por
seu estado de nervos. Ele respira fundo, se sentindo pronto para começar. Não é
fácil ser sócio gerente, tão pouco sócio sênior.

Talvez isso lhe sirva como teste, ele adora ser testado, apesar de estar no limite de
sua boa vontade. Hux se estica em sua cadeira ergonômica, e observa o
desenrolar da coisa toda.

Parece que felizmente sua ideia de acordo está sendo proveitosa. Ele vai precisar
de uma bolsa de gelo em seu trapézio depois de carregar essa manada de
elefantes industriais.

Seu celular vibra sobre a mesa e discretamente ele o pega para checar as
mensagens. Ele sabe de quem se trata, mas tenta enganar sua mente de que está
apenas checando coisas sobre o trabalho.

A diabinha de olho puxado. Rose parece ser movida a dois mil watts por hora. Ele
a deixou na porta de casa a cinco horas atrás. Passaram quase toda a noite
trocando mensagens, uma mais provocativa do que a outra.

Apesar dele compreender o quão feliz ela esteja com relação a melhora de Rey.
Torturá-lo com mensagens dizendo que está indo para o banho ou que esqueceu
de se vestir ao dormir, são pura maldade humana misturada a tortura psicológica.

Ele está exausto e ela já está de pé. Acordou atrasado, teve que correr para o
banho e terminar vestindo aquilo que deveria se parecer com um terno
minimamente apresentável.

Ele sorri quando a mensagem dela aparece em seu visor.

< Rose >

Ocupado?
< Hux >

Atolado... Ao ponto de cogitar pedir demissão.

< Rose >

Não esqueça o que prometeu ao Ben, ele está confiando em você.

É claro que não se esqueceu. Como poderia? Seus nervos em frangalhos não
permitem. Revirando os olhos para si com o pensamento que lhe ocorre, ele
digita...

< Hux >

Não me diga que você também entrou para o Team Solo?

< Rose >

Sempre fui

Hux ri discretamente com a resposta. Certo, não é como se ele estivesse em


algum time adversário. Ele faz tão parte deste tanto quanto ela.

< Rose >

Estou saindo agora do colégio para visitar Rey no hospital, mas essa chuva não
está ajudando...

Rose lhe envia uma foto dela com o uniforme escolar, isso provoca o pisca alerta
em seu cérebro, fazendo-o se ajeitar na cadeira.

Antes fosse apenas o uniforme erótico pra caralho, ele ainda está meio molhado
na região dos seios, permitindo que ele veja a transparência revelando um colo
avantajado, com dois pares de seios enormes prontos para serem degustados.

Mas que diabos… Ele engole dando uma olhada ao redor antes de respondê-la
rapidamente.

< Hux >

Você vai para o hospital desse jeito?

< Rose >

Que jeito? Assim?


Rose o envia outra foto, essa muito mais ousada do que a primeira. Dessa vez ela
está dentro do carro com os primeiros botões da camisa abertos.

Porra, seu cérebro derrete e seu pau luta para não endurecer. Hux responde,
frenético e nervoso.

< Hux >

Puta merda Rose! Estou em reunião, você vai me fazer perder o emprego.

< Rose >

Mas, eu não fiz nada...

Ele sente a ironia e a provocação a quilômetros de distância e porra, ele quer


muito colocar suas mãos nela agora.

< Hux >

Sua diabinha! Você sabe muito bem do que estou falando…

< Rose >

Eu tenho roupas secas no carro, não se preocupe. Minha dignidade está salva...
além do mais não estou afim de conquistar nenhum médico bonito hoje

< Hux >

Hoje?

Ele questiona com seu ânimo alterado, dando uma segunda olhada para ver se
alguém percebeu seu pau querendo saltar para fora da cueca. Não basta deixá-lo
louco segurando o sexo, ela tem que provocá-lo no processo.

É a primeira vez que alguém desafia seus limites assim, talvez isso o esteja
deixando tão fascinado por essa garota dos infernos de tão gostosa.

< Rose >

Amanhã é um novo dia…

< Hux >


Rose!

< Rose >

Estou brincando Armie ;)

Rose se esquece de torturá-lo depois de minutos de provocação incessante, o que


felizmente o ajuda a se acalmar. Ele tem tempo de sobra na reunião para lidar
com seu amiguinho agitado dentro das calças.

Os ânimos se acalmam e aos poucos eles vão montando uma estratégia para
evitar que os requerentes tirem proveito de seu cliente. No fim as coisas
funcionam e a situação é contornada.

Ele agradece ao time de sócios, assim como seus dois auxiliares na reunião, os
encaminhando até a porta. Hux está pronto para relaxar em sua humilde divisória
na sala dos associados, quando ele percebe que Ben está ali.

Vindo em sua direção, bem arrumado apesar da ausência do terno. É sério? Esse
maluco não consegue mesmo largar o trabalho nem mesmo por dois dias?

Hux coloca as mãos no bolso e se prepara para fazer sua piada sobre a obsessão
de Ben, mas ele interrompe sua fala assim que ele se aproxima o bastante para
entender que sua expressão não está para piadas.

— Solo? O que está fazendo aqui, não era para estar no hospital? — Hux espera
por uma resposta mas ela não vem. Ben olha em sua direção com um olhar tão
frio que ele mal consegue reconhecer.

Passando diretamente por ele sem dizer uma palavra ele segue com seus passos
duros corredor a frente, o que obriga Hux a segui-lo.

Ele pensa que ele irá para a sua sala, para que lá finalmente o explique o que está
havendo… Só que, isso também não acontece. No lugar ele faz um desvio direto
para a sala de Luke…

Mas o que… Antes que Hux termine de se perguntar o que diabos deu em seu
chefe. Suas pernas travam diante da porta de Luke, ao se deparar com Ben
agarrando o maltrapilho Poe Dameron para jogá-lo sobre a mesa de seu tio,
derrubando tudo que está em cima dela com a ação.

Hux fica boquiaberto. Ele mal consegue acreditar no que está vendo quando o
som nauseante de um golpe violento, irrompe os ossos da face de Dameron.
Depois deste há uma sequência interminável.
A essa altura o escritório para em meio ao corredor para assistir espantado o sócio
sênior da firma tomado por uma fúria massiva, golpeando incansavelmente o
rosto de um de seus funcionários enquanto seu sócio está gritando acuado do
outro lado da mesa.

É como assistir a um gorila, massacrando uma ovelha indefesa. Hux fica imóvel
como todo o resto das pessoas, apesar dos suspiros espantados. Nesse momento
lhe escapa dos lábios a única frase possível vinda de sua mente derretida feito
geléia...

"Puta que pariu!"

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