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museu, que ouvem música. Por que essas atividades são tão disseminadas? Ele se
pergunta:
por que esse desejo de completar a nossa vida incompleta através de outras
figuras e outras formas? Por que, da penumbra do auditório, fixamos o nosso
olhar admirado em um palco iluminado, onde acontece algo que é fictício e
que tão completamente absorve a nossa atenção? (2002, p. 12).
experiência de décadas como professora e diretora de escola que foi. Quintana, sutil e
docemente, apresentava as memórias de alunos inquietos e questionamentos sobre o
ensino da gramática.
A atividade se deu em quatro momentos subseqüentes. No primeiro deles, cada
aluno recebeu alguns poemas de um mesmo autor, para proceder a uma leitura
silenciosa individual. No segundo momento, os alunos foram reunidos em grupos
formados por aqueles que haviam lido o mesmo autor; nessa etapa, conversaram sobre
os poemas lidos e trocaram impressões e visões. No terceiro momento, os grupos foram
desfeitos e os alunos se reorganizaram em novos grupos, formados cada um por quatro
alunos, cada um trazendo poemas de um autor diferente. Nessa etapa, cada aluno foi
responsável por mostrar aos outros o que havia sentido na leitura de “seu“ poeta,
somando suas impressões pessoais com as dos colegas do grupo anterior. No quarto e
último momento, abriu-se um grande círculo e alguns alunos, voluntariamente, leram
em voz alta os poemas. Alguns alunos demonstraram pouca familiaridade com a
linguagem poética; outros, talvez marcados por uma herança do adestramento para o
vestibular, perdiam-se buscando uma “melhor” interpretação, definindo figuras de
estilo, fórmulas, esquecendo-se de fruir a poesia, de se deixar levar pelo encantamento,
sem buscar a “resposta certa”. Foi preciso enfatizar que esse não era um exercício
avaliativo, que não estava se buscando um modelo único de interpretação, que o
objetivo naquele momento era o de se aproximar da poesia, tentar perceber, pelo olhar
dos poetas, como a realidade escolar pode ser sentida e vivenciada. Foi ressaltada a
idéia de que, em arte, a polissemia é desejada, pois a riqueza estética de uma obra está
diretamente ligada a sua possibilidade de diferentes leituras. Como já afirmou Umberto
Eco (1988), a “obra é aberta”, o que significa que não existem interpretações melhores
ou mais corretas: todas as leituras são possíveis e cabíveis. Obviamente, a leitura de
alguém, com “competência artística” (PORCHER, 1982), será mais aprofundada e
poderá nos ajudar a perceber outras nuanças da obra de arte; no entanto, ela nunca será
definitiva e insuperável, nem ocupará o espaço da subjetividade de cada um. O debate
acerca dessa questão repetiu-se nos momentos de apreciação de outras linguagens
artísticas, evidenciando a pouca experiência e insegurança dos alunos nesse campo.
A terceira experiência desenvolveu-se com respeito à fotografia. A princípio, foi
estabelecido um diálogo sobre a visão dos alunos sobre fotografia como linguagem
artística. Percebeu-se que pouquíssimos alunos já haviam tido a experiência de ir a uma
exposição fotográfica. Para a grande maioria, a fotografia era vista apenas como registro
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Foi possível perceber a pouca familiaridade dos alunos com as produções, até
mesmo com aquelas já consagradas e bastante divulgadas, como as de Degas ou
Matisse. Surpreendentemente, nem mesmo os alunos oriundos dos cursos da área de
arte, como Música e Educação Artística, mostrava conhecimento muito maior do que os
colegas de outros cursos.
Esses foram os cinco grupos de experiências estéticas proporcionadas. Contudo,
apesar de sua pequena expressão em carga horária, seu desdobramento foi evidente. A
partir dessas experiências, muitos alunos passaram a trazer para a aula relatos de outros
eventos que passaram a freqüentar. Esses relatos foram devidamente valorizados e os
alunos foram estimulados a investirem nos seus próprios processos de formação
cultural. Constituiu-se, mesmo, em algumas turmas, uma rede de informações, uma
espécie de agenda cultural que era constantemente alimentada. Dessa forma, as
atividades em sala serviram como um descortinar de possibilidades, mas o fundamental
é que foi garantida uma postura autônoma dos alunos no sentido de perceberem as suas
limitações no campo da estética e se comprometerem com o investimento necessário
para superá-las.
Dessa forma, conseguiu-se que os alunos reconhecessem a dupla importância de
se enriquecerem culturalmente: por um lado, como futuros professores, a formação
cultural é fundamental, pois permitirá a eles lidar melhor com a alteridade dos alunos,
uma vez mais familiarizados com as diferentes leituras de mundo; por outro, como
pessoas humanas que, ao tomarem posse de todo um legado construído ao longo dos
séculos, enriquecem-se e reinventam sua própria dimensão de humanidade.
lançam pontes necessárias para programas futuros” (1999, p. 300). Nesse sentido, ela
não contribui para alavancar medidas que efetivamente proporcionem a construção de
um processo de formação cultural, atingindo a totalidade dos alunos e não apenas o
pequeno número que já faz parte de um grupo privilegiado em relação ao acesso aos
bens culturais.
Para o grupo maior, aquele formado por alunos que não puderam usufruir de
uma formação cultural sólida no âmbito familiar ou no da educação básica, essas
iniciativas passam desapercebidas, pois não os mobiliza, nem os convoca a uma postura
de responsabilidade perante sua própria formação (NOGUEIRA, 2006). Dessa forma, a
universidade reforça o fosso cultural existente, no nosso país, que separa os “bem
nascidos”, os que têm acesso aos bens culturais produzidos pela humanidade, da grande
massa que consome apenas os produtos de valor estético duvidoso que a indústria
cultural lhes oferece.
Por fim, é preciso ressaltar que todo professor, seja qual for a disciplina que
ministre, pode, independentemente da organização de uma política cultural institucional,
permear sua prática docente com manifestações culturais. Isto poderá acontecer,
obviamente, sem prejuízo da luta pela implementação de uma política cultural por parte
da universidade, pela assunção de sua responsabilidade na superação das desigualdades
culturais de seus alunos. No entanto, ao privilegiar manifestações da arte e da cultura
em sua prática docente, poderá ele efetivamente contribuir para o alargar dos
referenciais de seus alunos, operando naquilo que, em síntese, é o fulcro de uma vida
acadêmica: a universalidade e o diálogo entre os múltiplos saberes.
Bibliografia:
ADORNO, T. W. Teoria da semicultura. Educação e Sociedade. Revista quadrimestral
de Ciência da Educação, ano XVII, no. 56. Campinas: Papirus/Cedes, 1996.
CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru: EDUSC, 1999.
ECO, Umberto. Obra aberta. São Paulo: Perspectiva, 1988.
FISCHER, Ernst. A necessidade da arte. 9a. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2002.
GOULART, Cecília. Reinventando diálogos, vínculos, razões e sensibilidades. In:
TEIXEIRA, Inês Assunção de Castro e LOPES, José de Sousa Miguel (orgs.). A escola
vai ao cinema. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
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