2015 - Acessibilidade Educação para Alunos Com Ah - SD

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ACESSIBILIDADE EDUCACIONAL: O QUE NOS DIZEM OS

ESTUDANTES COM ALTAS HABILIDADES/SUPERDOTAÇÃO?

Renata Gomes Camargo 1 - UFSC


Luana Zimmer Sarzi2 - UFSC

Grupo de Trabalho – Diversidade e Inclusão


Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Abordar as temáticas Altas Habilidades/Superdotação e Acessibilidade Educacional, apesar


da aparente facilidade em compor tal discussão, impõe o desafio ao pesquisador, de refletir de
forma relacional sobre as implicâncias pedagógicas dessas para os estudantes que apresentam
características/indicadores relacionados à primeira. Assim, este artigo tem por objetivo
apresentar e discutir o que os estudantes com AH/SD consideram importante para a
constituição da sua acessibilidade educacional, a partir das experiências vivenciadas por eles
em espaços educacionais voltados ao enriquecimento extracurricular. Os alunos participantes
da pesquisa frequentam três diferentes Programas de Enriquecimento Extraescolar, o
Programa de Incentivo ao Talento – PIT, o Centro de Educação e Difusão do Talento de
Vitória -CT – VITÓRIA e o Instituto para Otimização da Aprendizagem – INODAP-. A
investigação foi qualitativa, o instrumento de coleta foi uma entrevista semiestruturada
realizada com os estudantes e a abordagem dos dados seguiu os princípios da Análise de
Conteúdo. Como principais resultados e discussão dos mesmos, tem-se que as atividades,
recursos e mediações realizadas nos Programas de Enriquecimento Extraescolar são efetivos e
contribuem significativamente para o aproveitamento do potencial dos já referidos alunos,
assim contribuindo para o atendimento das suas necessidades educacionais especiais. Por fim,
destaca-se que as falas dos estudantes com AH/SD evidenciaram que as ações desenvolvidas
nos Programas de Enriquecimento Extraescolar estudados são efetivas e importantes para a
constituição da sua acessibilidade educacional. Assim, é possível afirmar que os Programas
de Enriquecimento Extraescolar estudados atuam e desenvolvem estratégias educacionais
voltadas para estudantes com AH/SD, que contribuem significativamente para a constituição
da sua Acessibilidade Educacional e, que podem contribuir também para a acessibilidade e
inclusão na escola.

Palavras-chave: Altas habilidades/Superdotação. Acessibilidade educacional. Programas de


Enriquecimento Extraescolar.

1
Mestre em Educação e Doutoranda em Distúrbios da Comunicação Humana pela UFSM. Professora de
Educação Especial do Colégio de Aplicação da UFSC. E-mail: re_kmargo@hotmail.com.
2 Mestre em Educação pela UFSM. Professora de Educação Especial do Colégio de Aplicação da UFSC. E-
mail: luh.edesp@gmail.com.

ISSN 2176-1396
22996

Introdução

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva


apresenta o seguinte conceito sobre Altas Habilidades/Superdotação-AH/SD-:

Alunos com altas habilidades/superdotação demonstram potencial elevado em


qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica,
liderança, psicomotricidade e artes, além de apresentar grande criatividade,
envolvimento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse
(BRASIL, 2008, p.9).

Os comportamentos/indicadores de AH/SD geram características que são observáveis


nas ações dos estudantes com AH/SD. Alencar e Fleith (2001, p. 65-66) apontam uma série de
possíveis características relacionadas aos comportamentos/indicadores de AH/SD e, afirmam
que o sujeito com AH/SD:

• É curioso.
• É persistente no empenho de satisfazer os seus interesses e questões.
• É crítico de si mesmo e dos outros.
• Tem senso de humor altamente desenvolvido
• Não é propenso a aceitar afirmações, respostas ou avaliações superficiais.
• Entende com facilidade princípios gerais.
• Tem facilidade em propor muitas ideias para um estímulo específico.
• É sensível a injustiças, tanto ao nível pessoal como social.
• É um líder em várias áreas.
• Vê relações entre ideias aparentemente diversas.

Quando se pensa nos comportamentos/indicadores de AH/SD, faz-se essencial refletir


sobre a apreciação desses nos diferentes espaços educacionais frequentados por essas pessoas.
Sendo assim, acredita-se que um item importante para a promoção e efetivação da inclusão
dos estudantes com necessidades educacionais especiais, como os com AH/SD, é a construção
da sua Acessibilidade Educacional. Isso significa mais do que acesso a espaços educacionais,
dentre estes a escola, implica também na sua participação e envolvimento no processo de
aprendizagem, bem como sua permanência qualificada nesses.
Neste sentido, o objetivo deste trabalho é apresentar e discutir o que os estudantes com
AH/SD consideram importante para a constituição da sua acessibilidade educacional, a partir
das experiências vivenciadas por eles em espaços educacionais voltados ao enriquecimento
extracurricular.
22997

Desenvolvimento

Este trabalho é parte de um capítulo da dissertação de mestrado intitulada “Estratégias


de acessibilidade para e por estudantes com Altas Habilidades/Superdotação”. A forma como
a discussão feita nesse foi entendida como importante na pesquisa realizada, porque acredita-
se que, ao focar na investigação das estratégias de Acessibilidade Educacional, é essencial
saber a opinião, apresentar e refletir sobre o que pensam as pessoas para as quais as referidas
estratégias se direcionam.
O artigo teve sua metodologia embasada na investigação qualitativa (GIL, 2010), a
partir de falas de estudantes com AH/SD. Neste trabalho, traz-se um recorte das referidas falas
no quadro 1, no qual apresentam-se as percepções de seis estudantes do grupo de 24 ao todo
que participaram da investigação.
Estes alunos frequentam três diferentes programas de enriquecimento extraescolar, o
Programa de Incentivo ao Talento – PIT, o Centro de Educação e Difusão do Talento de
Vitória -CT – VITÓRIA e o Instituto para Otimização da Aprendizagem – INODAP-. Sua
participação na pesquisa constituiu-se por meio da realização de uma entrevista
semiestruturada (GIL, 2010). Os responsáveis pelos estudantes assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido –TCLE, uma vez que eles tinham idade entre 10 a 15
anos. Ainda, o estudante deveria estar participando por, no mínimo, um ano do programa de
enriquecimento extraescolar e cursando os anos finais do Ensino Fundamental para que eles
pudessem participar da pesquisa. É válido ressaltar que a pesquisa foi aprovada pelo Comitê
de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria- UFSM.
Ao trazer a análise de conteúdo (BARDIN, 2011) para investigar as falas dos
estudantes, assim definida:

A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise de comunicações.


Não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos: ou, com maior
rigor, será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de
formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações
(BARDIN, 2011, p. 37).
Entre as categorias de análise que compuseram a referida dissertação, elegidas a partir
dos elementos de significação presentes nas respostas dos estudantes aos questionamentos da
entrevista semiestruturada escolheu-se para elaboração deste artigo o estudo os achados
relativos à categoria: “Estratégias de acessibilidade: atividades e recursos materiais”, ao
objetivar traçar uma reflexão sobre acessibilidade educacional a partir das falas dos estudantes
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com AH/SD participantes da pesquisa. No quadro 1, apresenta-se as falas dos estudantes


selecionadas para exemplificar a categoria de análise.
Apesar das leis (DECRETO 7.611, 2011; LEI 9.394, 1996; DECRETO 5.692, 2004);
garantirem direitos que dão suporte para a constituição de acessibilidade educacional e
inclusão escolar dos estudantes com AH/SD, ainda assim tais estudantes não ou pouco são
reconhecidos e menos ainda atendidos como apontam as estatísticas da educação no Brasil. O
último dado que se tem é de que somente 5.786 estudantes com AH/SD foram declarados no
censo escolar (INEP, 2009).
Logo, a escola ainda precisa contar com espaços educacionais extraescolares que deem
o aporte para a identificação e reconhecimento destes sujeitos. Assim como para o
atendimento de suas necessidades educacionais especiais.
Atender às estas necessidades de estudantes constitui-se um objetivo que tem
demandado ações independentemente das leis serem colocadas em prática na escola. É um
dos fatores, que muitas vezes caracteriza os Programas de Enriquecimento Extraescolar,
dentre estes o PIT, CT-VITÓRIA e INODAP estudados nesta dissertação, que mesmo tendo
parcerias com escolas, executam suas atividades com autonomia, em prol do desenvolvimento
dos potenciais de estudantes com AH/SD.
É pertinente a explicação do que se entende por Programa de Enriquecimento
Extraescolar. O “extra”, nesta pesquisa, é colocado como referência ao espaço, horário e/ou
organização e/ou atividades educacionais dos programas que se diferenciam da escola. Porém,
quanto às atividades desenvolvidas na abordagem/concepção de enriquecimento, por vezes,
pode não diferir entre o que é oferecido na escola, especialmente no âmbito do atendimento
educacional especializado, e no espaço extraescolar.
Enriquecimento diz respeito à “[...] abordagem educacional que oferece à criança
experiências de aprendizagem diversas das que o currículo normalmente apresenta”
(SABATELLA e CUPERTINO, 2007, p. 74).
Gerson e Carracedo (2007) apontam a proposta de enriquecimento educacional para
estudantes com AH/SD como programas instigantes e favorecedores dos potenciais desses,
que contemplam experiências que geralmente a escola, por meio do seu currículo 3 comum,
não oferece. Os programas possibilitam que os estudantes tenham acesso à informação,

3
Define-se um currículo como um: “[...] conjunto de propostas que levam a determinar, executar e avaliar as
atividades e conteúdos oferecidos de forma sistemática aos alunos da escola” (NICOLOSSO e FREITAS, 2002,
p. 19).
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conhecimentos, materiais e atividades avançadas, seguindo metodologias e estratégias que


contemplam suas características e demandas socioeducativas.
Segue uma breve descrição de cada um dos três programas de enriquecimento
investigados. Para tanto, utilizou-se como subsídio materiais impressos cedidos pelos três
Programas de Enriquecimento Extraescolar, (projetos, relatórios e quadros organizacionais)
de acordo com a autorização institucional assinada pelos coordenadores e presidente desses.
As nomenclaturas, especialmente as que dizem respeito ao conceito de estudante com AH/SD
foram mantidas de acordo com os documentos originais consultados.
O Programa de Incentivo ao Talento –PIT- há 12 anos desenvolve suas atividades,
com excelência e empenho na qualificação dessas, contando com profissionais com formação
inicial em Educação Especial. Apesar do PIT contar essencialmente com profissionais
voluntários, espaço cedido e precisar concorrer anualmente há editais para ter algum tipo de
recurso financeiro, não deixa de proporcionar aos estudantes vivências em outros espaços
educacionais, materiais e ou recursos, para que possam ser contempladas as suas demandas.
O Centro de Educação e Difusão do Talento de Vitória -CT – VITÓRIA-apresenta-
se como uma instituição organizada, com a maior equipe dos três programas, bem como
maior amplitude de “parcerias do conhecimento”, possibilitando abranger e contemplar em
atividades uma maior gama da multiplicidade de manifestações e interesses que surgem das
demandas educacionais dos alunos com AH/SD que identificam.
O CT-VITÓRIA, assim como o Instituto para Otimização da Aprendizagem –
INODAP-, oferece oportunidades aos estudantes com AH/SD com condições
socioeconômicas menos favorecidas, especialmente através da concessão de bolsas de auxílio
financeiro, contribuindo significativamente para evitar o não reconhecimento e
aproveitamento dos potenciais por vezes apagados e/ou não valorizados na realidade em que
se encontram.
O INODAP destaca-se pela na diversidade dos atendimentos oferecidos, uma vez
que, para além das atividades de enriquecimento, traz a possibilidade de atendimento com
psicólogos e psicopedagogos, para atender possíveis aspectos de dificuldade pedagógica e/ou
sócio emocional dos estudantes vinculados à 80 instituições. Além disso, é a única das três
instituições que possui sede própria, o que propicia aos estudantes uma maior proximidade e
identificação com este espaço.
Ainda, sobre os três Programas de Enriquecimento Extraescolar abordados nesta
pesquisa, cabe destacar a preocupação com a formação dos profissionais que atuam
23000

diretamente ou como colaboradores eventuais, sendo que todos possuem formação mínima
sobre AH/SD. Também, se sobressai o envolvimento com outros aspectos e contextos, para
além das questões educacionais, que envolvem os estudantes que participam de suas
atividades, pensando nesses em sua globalidade. Dentre outras ações, os programas
proporcionam que os professores, pais e/ou responsáveis possam estar conhecendo mais
sobre AH/SD, possivelmente, auxiliam no entendimento das questões que envolvem este
comportamento dos seus educandos/filhos.
A relação que se realizou nesta investigação, qual seja, AH/SD e acessibilidade
educacional, não foi encontrada em procura por pesquisas precedentes. Em busca, no Portal
de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-CAPES
(CAPES, 2012), foram localizados 302 registros na temática “acessibilidade”, mas nenhuma
produção que abordasse acessibilidade para pessoas com AH/SD. Em procura somente pela
temática “AH/SD” ou em combinação com “acessibilidade” ou com “acessibilidade
educacional”, também não foi encontrada nenhuma produção.
Com esta busca, verificou-se que apesar de os estudantes com AH/SD terem
necessidades educacionais especiais e se constituírem como público-alvo da Educação
Especial, a acessibilidade educacional, processo importante para que a inclusão escolar
aconteça, ainda é pouco discutida no âmbito da Educação Comum e da Educação Especial.
Tem-se que as pessoas com necessidades educacionais especiais:

[...]são aquelas público-alvo da atuação da educação especial que compreende os


estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação (BRASIL, 2011).

Assim, pensou-se no estudo de Programas de Enriquecimento Extraescolar, visto que


tais espaços educacionais são exclusivamente organizados para estudantes com AH/SD,
verificando-se na configuração desses, as interessantes e pertinentes estratégias de
Acessibilidade Educacional desenvolvidas para os referidos educandos. Tais espaços são
pensados e organizam seu trabalho com foco exclusivo nas características e necessidades
educacionais especiais dos estudantes com AH-SD. Logo, para se pensar a acessibilidade
educacional destes estudantes em outros contextos educacionais pode-se partir das atividades
e experiências que são proporcionadas em espaços exclusivos a eles, sendo que tais ações
podem ser visualizadas no quadro 1.
23001

Quadro 1 – Exemplos de falas dos estudantes com AH/SD, organizadas a partir da categoria de análise
“Estratégias de acessibilidade: atividades e recursos materiais”.

CATEGORIA “ESTRATÉGIAS DE ACESSIBILIDADE: ATIVIDADES E


ESTUDANTE
RECURSOS MATERIAIS”.

“No (nome do programa) é dirigido que nem nas matérias, só que nas matérias,
informática não conta como uma matéria no colégio, a gente vai com a professora que
quiser, e no (nome do programa) a gente tem uma área só assim de informática, outra de
brincar, outra de historia, e eu acho que é bem diferente do colégio [...] a gente tem que
achar as peças que se encaixam, tem que ter criatividade pra pensar em como que elas vão
se juntar, como que vai fazer as coisas [...] no (nome do programa) acho que tem mais
A atividade pra gente se divertir, pra brincar e pra aprender mais fácil, uma área, uma coisa
que a gente não aprende no colégio [...] Sim, primeiro a gente montou duas vez, uma foi
com materiais recicláveis e outra com materiais sólidos, como ferros, parafusos, acho que
essa ideia foi legal porque a gente podia fazer outras coisa, trabalhar com outros materiais
tipo carpintaria, madeira [...] Eu acho que sim, porque eu entendo essa área da robótica,
que é uma coisa que eu sei muito, internet, eu to sempre por dentro, olho sempre aquele
site de, o Baixaki, site de estudo [...] Depende da área, tem umas áreas que eu acho assim
mais fácil, outras mais difícil, matemática eu acho que é uma área mais difícil, tem que
prestar muito mais atenção [...] no colégio eu tenho nove matérias, aulas assim que eu
tenho que saber de todas, do assunto, depois eu tenho que lembrar disso e de mais uma
coisa nova, é complicado, e no (nome do programa) a gente ve uma coisa assim por mês,
dois mês, daí a gente muda.”

“Acho que é os passeios e as brincadeiras; no colégio não tem como fazer brincadeiras,
por causa das aula, dia que tem prova, pior ainda [...] No de esportes, as brincadeiras são
mais usando os braços e as pé, no GTEC era mais os braço, que tinha que montar as coisa,
tinha que usar a cabeça também [...] Os três grupos que eu participei, no de musica a gente
tava usando os instrumentos, a gente tava usando bastante coisa até, a gente tocava
algumas coisas quando traziam, era bem divertido [...] Elas são diferentes, são fácil de
fazer algumas, eu quase nunca falto, daí eu venho, presto atenção em tudo [...] Ás vezes
sim, ás vezes não, às vezes dá umas coisa errada, eu me sinto feliz, porque daí tem mais
uma chance de fazer de novo, daí a vezes a gente erra bastante coisa, no GTEC eu fiz
bastante coisa errada, não conseguia fazer o robô por causa do prego, eu não consegui
grudar na cabeça do robô, pra prende o pescoço com a cabeça, daí eu tava tentando bater
com um cano, pra ver se entrava dentro do copo [...] Acho que sim. Acho que foi na
B montagem do GTEC, no grupo de música, porque já passou, porque nesse de esportes a
gente não sabe o que mais vai acontecer, porque tá no meio do ano ainda, não tá lá perto
do fim. O da música foi a melhor aprendizagem da musica, o GTEC foi aprender mais
sobre o que eu queria, sobre os computadores, robôs, informática [...] Sim, às vezes eu
aprendo algumas coisa aqui no (nome do programa) e eu digo lá pros meus colega no
colégio que não estão aqui, tem alguns que querem entrar aqui pra saber como é que é [...]
Às vezes eu consigo, acho que foi no (laboratório de universidade), a montagem dos
carros, daí um monte de gente na sala queria ver, como é que é, quer saber, porque tem
gente que não sabe como é que se monta aqueles carrinhos [...]”

“A, é aquilo que eu te falei logo no começo, é que a escola, é mais pra você ficar lá,
estudando, dar as matérias entendeu? Agora aqui no (nome do centro) não, cê pode fugir
um pouco da aula entendeu, a poxa vamo ver aqui na internet aqui, não é só fica ali em
cima do robô, a vamo pensar aqui, não vai no computador ali pesquisa um negócio, é
assim né. [...] posso refletir mais, no programa eu, de robótico eu entendo pra caramba, na
escola também, só que não é igual, porque eu gosto muito de robótica[...] É, as atividades
que eu faço, a robótica estimula sim, entendeu? [...]Computador, internet, às vezes
também a gente usa, a vamo botar uma fita aqui, entendeu a gente usa isso também [...]
Bom, eu consigo sim, objetivo nas atividades, é aquilo que, tudo que eu começo eu
termino entende? [...] Sim, muito, minha vontade é construir uma casa, um carro, um
C carro que anda sozinho, uma casa toda eletrônica, isso tão construindo também agora, um
avião todo autônomo, um barco autônomo [...] Bom, porque aquilo que eu falei né, eu
23002

acho que hoje eu aprendo as coisas mais fácil porque, a sei lá, porque seu so dotado, so
superdotado, sei lá. Aram, quando tem reunião aqui do (nome do centro), aí pede pra falar
um pouco o que aconteceu no ano, aí eu falo foi isso e isso, aconteceu isso também, a
gente conseguiu montar o robô, a gente não conseguiu [...] Na escola eu acho um pouco
mais difícil as matérias assim entendeu? É um pouco mais chato na verdade, mais eu
aprendo, basta querer. A na escola não, a porque, sei lá, não é aquela coisa divertida como
é na robótica entendeu? Que na escola, quando cê tá com, quando se tá anotando a
matéria, cê não pode sair pra pesquisar o que aconteceu ali e tudo, na robótica a gente
pode, a vo ali no computador pra ve, entendeu? Acho que é por isso.”

“É porque assim, se você tá na escola é aquele monte de aluno, vamos botar por exemplo,
30 alunos, e quando você vem pra cá você tem 10 a 12 crianças, então a atenção tá quase
toda focada em vocês, pra mim naquele pouquinho ali você aprende mais, não tem aquele
negocio, V não fala isso, não tem, você fica ali, já que tem doze alunos, o professor vai
explicar melhor e ninguém, e todo mundo quer aprender, se já uma atividade extra,
ninguém vai atrapalhar né [...] Bem, a gente utiliza o tatame que amortece a nossa queda,
o kimono só, tem a semana toda, menos domingo, a gente chega põe o kimono [...]
D cumprimenta o nosso professor que a gente chama de sansei [...] a gente começa os
handori que é a luta, aí a gente começa a treinar [...] Por enquanto sabe que não, por
enquanto eu só tenho um objetivo, ficar treinando, dar o melhor de mim, eu não gosto de
ficar em segundo, eu acho que eu não sei perde, porque às vezes o ser humano não admite
que não sabe perder [...] Claro, é assim, você fica eufórica, você tá aqui e pensa no outro
momento ali [...] eu aprendo com facilidade já falei, só não gosto muito de estudar [...] se
você fala comigo eu já gravo porque aquilo pode ser importante [...] Tenho, consigo, eu
sou uma pessoa assim, não fala não e nem talvez pra coisas que vem pra mim, porque a
porta só abre uma vez, se eu jogar esta oportunidade pela janela, vai ter uma pessoa ali
embaixo que vai pegar ela.”

“Tem mais atividades [...] No grupo de Educação Física, a gente utiliza coisa de Educação
Física, como corda, bambolê, coisas assim, no grupo de Artes a gente utilizava cartolina
algumas vezes, quando a gente tinha que fazer cartaz por exemplo, papel, lápis, caneta,
canetinha, a gente podia escolher o que queria usar, por um lado sim, porque dá pra se
expressar por essas formas assim [...] Sim, porque dá vontade de realmente tentar de novo
e fazer outras coisas também, trabalhos de arte, a gente aprendeu uma nova técnica no
grupo de artes ano passado, trouxeram um cara que eu acho que já era formado em artes,
E e aí ele mostrou pra nós um programa no computador que dá pra desenhar com aparelho
lá, chamado tablet eu acho, mas não é um tablet de mão, é um de desenhar assim, aí eu
queria um daqueles [...] Sim, por causa da técnica de aprendizado ser diferente como eu
falei, eles usam mais atividades do que só de aula assim [...] Sim.”

“Eu acho que não tem muita diferença assim, só que eles apresentam mais as coisa [...] O
material que a gente usa é corda, ã toalha, bola, tipo na Educação Física do colégio eles
não falam que tinham esses esportes de cegos, dos que não movimentam as pernas. No
F outro grupo de Ciências, não tinha materiais diferentes, só mostrava coisas assim que a
gente não sabia, se eu não me engano era uma balinha que, sal de cozinha misturado na
agua daí botava aquela bolinha, daí começou a ferver tudo [...] Sim, eles tão sempre
perguntando assim, o que a gente quer, se a gente gostou, se a gente procurou alguma
coisa procurar mais, a professora procura também. Sim, eu procuro fazer o meu melhor
nas atividades pra poder aprender assim [...] Sim, porque são coisas que são assim, eu
acho que eu consigo aprender, já me disseram que eu aprendo mais rápido do que as
outras pessoas [...] Sim, é diferente do (nome do programa) como é muita gente, ficam
falando assim, eu acabo ficando com dor de cabeça, e aí eu não consigo prestar atenção na
aula, não consigo entender às vezes assim. [...] lá o (nome do programa) a pessoa pode
escolher o que gosta, e também é mais calmo, as pessoas como faz o que gosta, ficam
mais quieta.”

Fonte: Dados organizados pelos autores.


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Pensar em acessibilidade educacional faz presente a reflexão sobre as relações


interpessoais com o professor. Chagas e Fleith (2010), por meio de uma pesquisa realizada
com estudantes com AH/SD, apontaram a importância dos professores na vida destes. A
maioria dos participantes informou que um ou outro professor fez um diferencial na sua
trajetória, e que sem estes provavelmente não teriam tido o desenvolvimento que
apresentavam no momento da pesquisa:

Ainda com relação aos aspectos acadêmicos, enfatizamos o papel da mediação de


mentores no desenvolvimento do talento [...] Entre os adolescentes que participaram
da pesquisa, 80% indicaram ter recebido influência de um mentor ou professor [...]
(CHAGAS e FLEITH, 2010, p.99-100).

O papel dos professores está bastante evidenciado nas falas dos estudantes, quando
descrevem a natureza das mediações realizadas por eles, destacando aspectos como: desafio,
criatividade e diversificação de materiais. Estes aspectos são instigadores do aproveitamento
do potencial dos estudantes com AH/SD, em contrapartida, os mesmos sentem-se que
efetividade e qualidade na sua participação nas ações, aspectos de grande relevância para a
constituição da sua Acessibilidade Educacional.
Em contrapartida, Camargo (2010) aponta que muitas vezes o professor pode tornar-se
um desestimulador das AH/SD, por diversos fatores, dentre estes, uma dificuldade de empatia
entre estudante com AH/SD e professor. Logo, é importante que os professores da escola
tentem aproximar e aplicar cada vez mais nas mediações que realizam, metodologias que os
profissionais que atuam em outros espaços especializados para estudantes com AH/SD tem
utilizado e encontram efetividade nas suas propostas, como é ressaltado pelos estudantes.
Sobre acessibilidade educacional e expressão das AH/SD, tem-se à reflexão de como
ela acontece e quais elementos influenciam as suas diferentes linguagens (ARMSTRONG,
2001; GARDNER, 2011). Partiu-se do entendimento de que existem múltiplas linguagens que
se constituem em sistemas diferenciais de interação, logo, possuem diferentes meios de
expressão e compreensão dos conhecimentos. Estes sistemas foram citados por todos os
estudantes entrevistados, a medida em que, no espaço dos Programas de Enriquecimento
Extraescolar tem suas singularidades contempladas nas propostas de trabalho oferecidas
nestes locais.
De acordo com Camargo, Dal Forno e Freitas (2010), a acessibilidade voltada para
estudantes com AH/SD diz respeito à contemplação das atividades desenvolvidas e dos seus
comportamentos/indicadores e características diferenciadas dos estudantes, e que isto
23004

geralmente é vivenciado em espaços extraescolares que trabalham com enriquecimento


escolar. Estes espaços possibilitam aos participantes, atividades que atendam suas
necessidades educacionais específicas.
Tais atividades são destacadas pelos estudantes com AH/SD, em geral, ainda
completam com a informação que dificilmente essas são oportunizadas na escola. Assim,
pode-se pensar em como organizar estas ações também no ambiente escolar, possibilitando
uma maior significação das aprendizagens a serem desenvolvidas por estes estudantes.
Assim, quando se pensa em diferentes configurações da acessibilidade e se volta o
olhar para as pessoas com AH/SD, pode-se falar na construção de uma Acessibilidade
Educacional que propicie melhores condições para as suas aprendizagens, ao desenvolver,
dentre outras, ações que instiguem a expressão das AH/SD nas diferentes linguagens que
podem assumir. Tais linguagens, podem ser expressadas, por exemplo, em movimentos do
judô ou na construção de um robô, como verifica-se nas falas dos estudantes.
Sabe-se que Programas de Enriquecimento Extraescolar oferecem atividades
educacionais direcionadas aos estudantes com AH/SD, proporcionando experiências que
geralmente não são oferecidas na escola comum, que englobam conteúdos, informações,
materiais e metodologias que contemplam as necessidades educacionais específicas dos
estudantes, bem como exigem profissionais preparados para a atuação junto desses (GERSON
e CARRACEDO, 2007; SABATELLA e CUPERTINO, 2007).
Neste contexto, a visualização de como é possível vivenciar e explorar o potencial de
estudantes com AH/SD e a eles, o que pode ser proporcionado pela participação nos espaços
supramencionados, aspectos apresentados neste artigo, possivelmente despertará a percepção
dos educadores e a organização dos espaços educacionais com novas formas de interagir com
os diferentes conhecimentos exigidos para a Educação desses estudantes.
Isso concerne ações de promoção da Acessibilidade Educacional de estudantes com
AH/SD, que trazem contribuições para a constituição da sua Inclusão Escolar e educacional,
ao entender a última como mais ampla que a primeira (GARCIA, 2008), pois engloba a
discussão sobre a qualidade da educação e a apreciação das singularidades das pessoas na
escola e em outros espaços educativos.

Considerações Finais

As falas dos estudantes com AH/SD evidenciaram que as atividades, os recursos e as


mediações desenvolvidas nos Programas de Enriquecimento Extraescolar estudados são
23005

efetivos e importantes para a constituição da sua acessibilidade educacional. Assim, é


possível afirmar que os Programas de Enriquecimento Extraescolar estudados tem seu foco
sobre ações voltadas para estudantes com AH/SD, que contribuem significativamente para a
constituição da sua Acessibilidade Educacional e, que podem contribuir também, para a
acessibilidade e inclusão na escola.
Em contrapartida, o sucesso das ações, que se concretizam por meio de estratégias de
Acessibilidade Educacional, também está associado à solidificação das parcerias em primeira
ordem com as escolas de onde advêm os estudantes com AH/SD participantes dos programas.
Isso porque é no espaço delas que mais facilmente se pode identificar e reconhecer tais
estudantes.
Em segunda ordem está à parceria com instituições diversas que proporcionam
atividades, na maioria das vezes com atuação de profissionais voluntários. Os profissionais
vinculados a tais instituições tem seu trabalho orientado por profissionais que atuam
diretamente nos Programas de Enriquecimento Extraescolar, o que proporciona que os
estudantes com AH/SD possam experimentar com qualidade e efetividade sua(s) área(s) de
interesse com maior profundidade no conhecimento, com recursos mais especializados e
pessoas que compartilham e apreciam as suas demandas educacionais.
Acredita-se que as diferentes parcerias que são buscadas para qualificar as atividades
oferecidas no âmbito dos Programas de Enriquecimento Extraescolar, podem também ser
procuradas pelas escolas. A busca por parcerias poderia proporcionar ações diferenciadas do
currículo comum, que podem vir a estimular os potenciais já reconhecidos, bem como aqueles
que ainda serão descobertos nestas instituições.
Programas de Enriquecimento Extraescolar e escolas, ao trabalharem de forma
conjunta, em que um busca apoio e qualificação do seu trabalho, dentre outros aspectos, ao
olhar o que é desenvolvido por outrem, e vice e versa, tendem a cada vez mais consolidar a
constituição da Acessibilidade Educacional dos estudantes com AH/SD. Assim, a inclusão
destes estudantes pode tornar-se um processo cada vez mais qualificado e expressivo.

REFERÊNCIAS

ALENCAR, E. M. L. S.; FLEITH, D. S. Superdotados: determinantes, educação e


ajustamento. 2ª. ed. São Paulo: EPU, 2001.

ARMSTRONG, T. As inteligências múltiplas na sala de aula. Tradução: Maria Adriana


Veríssimo Veronese. 2ª ed. Porto Alegre: Artmed Editora, 2001.
23006

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Tradução: Luís Antero Reto, Augusto Pinheiro, São
Paulo: Edições 70, 2011.

BRASIL. Decreto Nº 5.296, de 2 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis nos 10.048, de 8


de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10.098,
de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção
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