@livrarialivros - William Hale - A Arte de Ler em Latim

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A arte de ler em latim

William Gardner Hale


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Publicado originalmente em inglês sob o título
The Art of Reading Latin: How to Teach it

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EDITORA MONERGISMO
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Brasília, DF, Brasil — CEP 70.775-98
www.editoramonergismo.com.br

1.ª edição, 2024

Tradução: William Bottazzini


Editor: Felipe Sabino de Araújo Neto
Capa: Thiago McHertt
Dedico este opúsculo a JOHN WILLIAMS WHITE e
a JAMES B. GREENOUGH;
à influência de seus métodos de ensino
se deve em grande parte
qualquer aceitação que vier a ter
Sumário
Prefácio à edição brasileira
Prefácio do autor
A arte de ler em latim: como ensiná-la
Prefácio à edição brasileira

O papel do latim na tradição pedagógica do Ocidente é muito maior do que desconfiam


os próprios latinistas. Suas origens são mais remotas; sua constituição, mais sólida; sua
finalidade, muito mais elevada do que imaginamos. A afirmação de que o latim é apenas uma
língua — por inquestionável que possa parecer — é apenas parcialmente verdadeira; não é por
ser língua, não é como língua que o latim foi ensinado nos últimos dois mil anos, mas como
disciplina liberal, cujo propósito era desenvolver certas faculdades do espírito humano. Tal ideia,
hoje, soa quase sempre absurda — afinal, se a questão é aprender um idioma estrangeiro, por que
latim, e não grego ou italiano? — e é com pesar que declaro não ter conhecido um único
professor que soubesse responder com clareza a essa justa perplexidade.
Em semelhantes condições, não surpreende que os métodos de ensino do latim se tenham
perdido em discussões inúteis, sempre centradas na questão do como, quando deveriam
perguntar, antes de tudo, o que queremos com nosso trabalho. Partese do princípio de que o
problema é ensinar uma língua, mas ao mesmo tempo não podemos deixar de ouvir, como que
detrás do palco, os sussurros de um fantasma, que às vezes parece afirmar, com a voz de
Napoleão Mendes de Almeida, ser objetivo do latim “desenvolver raciocínio e concentração”;
outras vezes, é um jesuíta lembrando o “estudo dos clássicos”; e ainda muitas vozes diversas se
misturam, nem sempre claras, nem sempre compreensíveis. Sentimos sua influência caótica nos
métodos, que trazem essas exigências misturadas umas às outras, sem saber de onde vieram ou
qual é seu lugar na disciplina.
Escrever uma introdução a este livro, para mim, é uma oportunidade singular de pôr em
perspectiva o que se vem fazendo nos estudos clássicos, e examinar com cuidado, diante da
tradição que nos foi legada, a pergunta terrível: para que estudar latim? No fundo, nada
distingue os métodos e as pedagogias, senão a resposta, geralmente implícita e inconsciente, que
dão a essa pergunta. O que torna The Art of Reading Latin [A arte de ler latim] especial é haver
aqui uma resposta razoável e rigorosamente aplicada à pedagogia, surgida não de especulações
acadêmicas, mas do desejo sincero que sentia um professor de ver seus alunos lendo e
apreciando os clássicos latinos. Quero começar pela simples exposição dessa louvável proposta,
em alguns de seus aspectos técnicos mais importantes, para em seguida mostrar que ela possui
uma base mais sólida do que aparenta, que remonta (e faz jus) a uma tradição mais antiga, e que
há um enorme risco em desviarnos, como estamos nos desviando, dos princípios que regiam essa
tradição.
O Prof. William Hale exige que os estudantes não se contentem com a técnica tradicional
de análise sintática, mas que aprendam também a ler na ordem em que liam os romanos,
percebendo como o sentido se manifesta na sintaxe latina. Foi esse o primeiro motivo que
encontrei para simpatizar com as ideias do Prof. Hale: eu mesmo havia sentido uma deficiência
desse gênero nos meus estudos universitários e, quando criei o Curso de Latim Online, fiz
questão de evitála com uma espécie de “leitura analítica ao vivo”, em que, ao mesmo tempo que
lia os textos originais palavra por palavra, eu explicava como a minha mente se comportava em
cada etapa do processo. O resultado foi maravilhoso, ao ponto dos alunos terem aprendido em
um só ano o que eu levara três para absorver na universidade. E o melhor: consegui usar somente
textos originais, desde a primeira aula. Qual não foi minha satisfação ao descobrir que, ao menos
nos princípios mais gerais, o Prof. Hale propusera justamente esse método de ensino?
O leitor que chegar a este livro com domínio da gramática latina, mas deficiências na
prática da leitura, tirou a sorte grande: pode aplicálo imediatamente, pois tem sucesso garantido.
Aquele, porém, que vier aqui procurando uma introdução ao latim sairá, infelizmente,
decepcionado, pois não há sequer de compreender os exemplos e o material didático proposto
pelo autor. Eu gostaria, então, de dirigirme em primeiro lugar a esse iniciante, sugerindolhe um
caminho para chegar ao conhecimento de que precisará para aproveitar A arte de ler latim. E
qual seria o método mais claro de exposição desses requisitos, senão partir de um trecho do
próprio livro? Na citação abaixo, o Prof. Hale apresenta a primeira palavra de um parágrafo de
Tito Lívio e narra que perguntas fez (entre aspas), e que respostas obteve de seus alunos (em
itálico).
Tarquinium. “Que Tito Lívio quer dizer quando coloca aquela palavra no início da
frase?” Que a pessoa mencionada nela é neste momento de notável importância.
“Qual o caso de Tarquinium?” Acusativo singular. “Que esse fato significa para
vocês?”
Aqui a maior parte deles fica de certo modo atordoada por não estar acostumada com
a palavra significado, a mesma palavra que deve ser constantemente usada quando se
lida com sintaxe ou com a chamada “análise sintática”. Assim, muito provavelmente
eu tenha que dizer: “Será que significa a duração do tempo da ação a que se refere?”
Não, dizem. Pergunto: “Por que não?” Alguém diz: “Porque o nome de uma pessoa
não pode indicar tempo.” Digo: “Dê-me algumas palavras que podem indicar tempo.”
Eles me dão dies, noctes, aetatem, etc. Então eu pergunto: “Será que significa
extensão do espaço?” Não, dizem, e justificam sua resposta de modo semelhante.
Quando lhes peço palavras que possam indicar extensão do espaço, dão-me, talvez,
mille passuum, tres pedes, etc. Em seguida, pergunto: “Será que indica a extensão da
ação do verbo, a medida até a qual a ação se estende?” Não, respondem por uma razão
semelhante.

Este é apenas o começo da aula, e deve ser mais que suficiente para dar ao leitor uma ideia das
exigências que a “análise antecipatória” comporta. Neste ponto é possível reagir de duas
maneiras: a primeira delas é o desânimo completo, já que, distantes como estamos desse nível de
domínio gramatical em qualquer idioma — quem dirá em latim — não nos parece possível
recuperar o tempo perdido em menos de uma longa década. Responderei a essa falsa impressão
depois, mas adianto que é inteiramente possível atingir o nível mínimo para aplicar este método,
em não mais que uns poucos anos de estudo sério. A segunda reação possível, a mais confortável
e adaptada à petulância do nosso tempo, é responder ao Prof. Hale que suas exigências são
exageradas e até inúteis; que não é preciso dominar tanta gramática, se queremos apenas
aprender uma língua; e que, para sermos francos, “existem meios mais eficazes de aprender
latim”. Concluiríamos citando, para contradizer o autor, o começo do seu próprio livro:
Os recentes ataques feitos aos estudos de grego e, em certa medida, aos de latim, se
sustentam na convicção de que os resultados obtidos são muito desproporcionais com
relação aos anos de esforço dispensados nessas línguas tanto pelo aluno do ensino
básico como pelo universitário.

Fazse necessário esclarecer essa enorme confusão. As palavras reproduzidas acima foram ditas
em 1886. Já então o ensino de línguas clássicas era visto com desconfiança, e a tradição
ameaçava ruir; já se falava da necessidade de aperfeiçoar as metodologias de ensino, que
pareciam lentas demais para compensar o tempo a elas dedicado. Contudo, a crítica do Prof.
Hale será mal compreendida por parte dos leitores, e mais especialmente por aqueles que,
baseados num ou noutro defeito de seus avós, já os julgaram e condenaram. A resposta
oferecida por nosso autor ao problema é muito diferente das que vêm sendo dadas mais
recentemente por outros professores universitários e pela corrente mais popular — porque mais
vulgar — do chamado “método direto”. E é para que fiquem mais claras as virtudes de um, que
exibirei os vícios dos outros, de modo que não se confunda o remédio com a mera progressão
nos estágios da doença.
Os extremistas são geralmente melhores que os moderados, porque (com raras
exceções) não se distinguem tanto pela estupidez — nela, encontramse em pé de igualdade —
como pela coragem. De fato, eles ousam dizer em voz alta o que outros sussurram, e levar às
últimas consequências os dogmas fundamentais de sua escola. Por isso, quando examinamos e
reprovamos os extremistas, todos os moderados ruins caem por terra juntamente; pois não
passam de versões mais polidas e covardes de seus irmãos, a quem, significativamente, chamam
de “exagerados”. Pode uma virtude ser exagerada? De modo algum. Quanto mais a
intensificamos, melhor ela fica; se algo, intensificado, tornase vício, é que nunca foi virtude, e
apenas nos confundia com uma forma suave, como os bandidos que, vestidos como pessoas
comuns, desaparecem na multidão. E se é assim também nas discussões metodológicas,
refutaremos os reformadores mais sinceros e radicais, para que juntamente caiam todos os
cupins.
A proposta essencial do “método direto” é que uma língua seja aprendida sem
intermediação de outras línguas e, se possível, de conceitos e explicações: sem dicionário
bilíngue, sem traduções e, preferencialmente, sem definições e análises gramaticais, partindo do
uso e somente do uso para habituar o estudante às formas próprias do idioma em questão.
Como (dizem eles) é assim que aprendemos nossa língua nativa, chamam também sua doutrina
de “método natural”; esse seria o modo normal de aprender — o que vinha sendo usado até
então era “artificial”, “indireto” e, a depender da radicalidade do debatedor, “antinatural”. No
caso dos que desejam aplicar essas noções às línguas clássicas, é especialmente chamativa sua
exigência de que sejam faladas, para que as estudemos como “línguas vivas”.
Desde logo, é preciso desfazer um sofisma publicitário: a ideia de que alguém que “até”
fala latim, certamente lê bem os textos clássicos. Quantas pessoas falam português
corretamente?
E quantas dessas pessoas leem e compreendem o poema Os Lusíadas? Quantos falam
inglês “com fluência”? Nossos cursos de idiomas prometem conseguilo em dois ou três anos.
Quantos, não digo dos alunos desses cursos, mas de seus professores, são capazes de ler
Shakespeare? Eis a verdade: passamse quatro, cinco, seis anos de estudo do idioma falado, e
não apenas o aluno continua a falálo mal, como não se torna nem um pouco mais apto a ler os
textos clássicos desse mesmo idioma. Aprender a falar não acelera o desenvolvimento da leitura
— ao contrário, é uma habilidade que, para firmarse, exige mais energia e tempo, os quais
evidentemente são roubados da leitura. Qualquer professor de idiomas que seja moderadamente
inteligente sabe muito bem disso e, se enfatiza a fala em primeiro lugar, é porque seus alunos
normalmente dão maior importância ao turismo ou ao uso da língua no ambiente de trabalho, do
que à leitura dos clássicos.
O inverso também não é totalmente verdadeiro. Aqueles que leem muito numa língua
não necessariamente a falam bem. Por outro lado, é evidente que precisam de pouco
treinamento para entendêla quando a ouvem — especialmente se receberam alguma espécie de
instrução fonológica quando aprenderam a ler. Os leitores, além disso, possuem um vocabulário
muito mais rico do que aqueles que apenas falam. É verdade que boa parte desse vocabulário
não será usada nos diálogos mais comuns; mas nós por acaso aprendemos latim para ter
conversações vulgares? E não é verdade, igualmente, que quem lê tem um senso mais amplo
das possibilidades de uma língua, e maior sensibilidade à sua estrutura gramatical?
Mas eis o que deve ser o argumento mais claro em favor da leitura: o vocabulário
passivo precede e prepara o ativo. Todos os falantes de uma língua, em qualquer estágio de
aprendizado, possuem maior vocabulário passivo que ativo, e só aqueles que vivem em
ambientes linguisticamente medíocres conseguem, com o tempo, atingir uma relação menos
desigual entre esses dois tipos de vocabulário. Em outras palavras, sempre sabemos mais
palavras do que as que somos capazes de usar numa conversação; antes de usálas, temos de
conhecêlas por via passiva, o que normalmente se dá através da audição — mas pode muito
bem ocorrer enquanto lemos. E o que é mais: a leitura permite tamanho controle sobre o
processo, tal abundância de palavras e tão elevada qualidade estilística, que supera a audição
com grande vantagem como meio para absorver um idioma.
Em suma, falar não ajuda a ler; e se ler não leva naturalmente a falar, devese porém
confessar que cria uma base firme para a fala em vários níveis, além de ser instrumento
insubstituível da formação intelectual. Podese, com razão, afirmar que o melhor caminho para
falar um idioma é falálo desde o princípio; mas nas línguas antigas o objetivo primeiro é ler. Se
uma coisa não leva à outra, por que deveríamos perder tempo com a aquisição de mais uma
habilidade? Tampouco me interessa, neste espaço, a proposta de recuperar o uso vivo do latim
como “língua da cultura”, idioma universal dos estudiosos — é claro que, ao empreender um
projeto desse gênero, não poderíamos dispensar a fala, mas o que está em discussão aqui é
apenas seu papel instrumental para ler os clássicos.
Cabe, enfim, um argumento em favor da língua falada como instrumento didático: a fala
tem apelo psicológico singular, por produzir uma relação comunicativa direta entre dois
seres humanos. Assim, a audição seria o meio preferível de adquirir vocabulário passivo, ao
menos até certo ponto — pois o léxico disponível em conversação vulgar, na maioria das
línguas, não passa de oitocentas palavras. Só a partir daí a leitura teria preferência, por abrir
possibilidades mais amplas de aprendizado. Este é o melhor argumento que consegui encontrar
para o uso da fala em estágios básicos do ensino, e ele merece ser pesado pelos professores
honestos.
Contudo, resta uma dificuldade mais sutil e, não por acaso, muito mais importante: qual
é a relação entre o latim falado e os textos clássicos? O Prof. Hale, neste mesmo livro, chega a
comentar rapidamente a proposta de ensinar latim como se fosse uma língua moderna. Ele se
limita a dizer que as línguas antigas são “difíceis demais” para serem aprendidas assim. Seria
um erro acreditar que, nessa sentença, o autor se refere ao latim coloquial — que é tão fácil
quanto qualquer outro idioma, pois era falado por todo tipo de gente. É claro que ele enxerga
alguma diferença entre o latim que se falava nas ruas da antiga Roma, e aquele que nós
desejamos ensinar nas escolas e universidades. Ele também não acredita, evidentemente, no
latim coloquial como uma porta para esse outro, porque a fala sofre, como já mostramos, de
enormes limitações, tanto do ponto de vista vocabular quanto do gramatical.
Ademais, recuperar a fala não é o ponto crucial para a restauração do ensino. No
processo de decadência do latim escolar, a fala não foi abandonada de imediato: primeiro, no
modelo humanista, foi enfatizada como a coisa mais importante. Mas isso não interrompeu a
queda das línguas clássicas na hierarquia das disciplinas escolares. Elas, que eram o centro e a
base do currículo primário, foram relegadas, paulatinamente, a espaços menores, até se
restringirem a uma classe muito específica de pessoas, as que vão à faculdade de Letras — e,
por fim, só às que querem doutorarse no estudo de autores antigos.
Não obstante, o latim continuou sendo falado em sala de aula. Até o século XIX as
crianças aprendiam a escrever na língua latina, e eram capazes de falar com fluência moderada,
embora não fosse esse o objetivo da instrução. Não foi, portanto, a ausência da fala, como
instrumento pedagógico, que causou a perda de importância do latim nas escolas; na verdade,
foi ela um dos últimos acessórios a cair em desuso, prenunciando que o resto do edifício ruiria
em menos de um século — como de fato ruiu. A verdadeira causa do processo pode encontrarse
em fatores externos — como a mudança de sentido da instituição escolar ou em alguma outra
degradação interna do ensino, mas não no abandono da fala como instrumento didático.
“Justamente”, respondem nossos revolucionários, “embora o latim fosse falado, o
método de ensino era antiquado demais. Nós nos livraremos do resto, e ensinaremos o latim
como língua viva”. Contra a autoridade ancestral da disciplina das letras? Pois se falar latim
fosse suficiente, por que é que os jovens romanos passariam sete anos na escola do
grammaticus, memorizando declinações e conjugações verbais, recitando e explicando poemas
e fazendo — ó horror! — exercícios de reordenação de frases (que alguns ignorantes dizem ser
efeito da nossa fraqueza como falantes de línguas analíticas)? Por que faziam eles paráfrases de
poemas em prosa? Por que praticavam variar gênero, número e caso de todas as palavras numa
dada frase? Não eram falantes nativos? Não basta falar para ler os clássicos?
Não, por Hércules! Além de todas as limitações da fala, que demonstrei mais acima, é
preciso dizer que ela não substitui de modo algum o restante da disciplina tradicional que,
embora tenha sido incorporada ao ensino das línguas clássicas, não serve exatamente para
aprender um idioma específico, mas para desenvolver certa faculdade do espírito, a qual se
aplica a todo e qualquer idioma. De fato, quando o Prof. Hale define o objetivo de seu método
(e a convicção que o originou), descreveo nos seguintes termos: “ler como os romanos liam”. E
explica que isso significa ler: 1) na ordem em que os romanos liam; 2) no meio que os romanos
usavam; 3) numa velocidade que não pareça intoleravelmente lenta. Mas o autor omitiu um
quarto elemento, por não poder imaginar que, algum dia, seria necessário dizêlo em voz alta: 4)
atendendo a todas as exigências, na interpretação dos textos, a que um aristocrata romano era
treinado para atender.
Em outras palavras, para além de toda discussão sobre o ensino de línguas estrangeiras,
os defensores do método direto são incapazes de compreender que os elementos didáticos que
lhes causam tanto horror não visam — e jamais visaram — ao aprendizado do latim enquanto
língua. Se fosse esse o caso, os próprios romanos não teriam insistido que seus filhos, falantes
nativos de latim, aprendessem essas mesmas coisas na escola. Isso significa que as línguas
clássicas, e especialmente a latina, carregam consigo uma dimensão pedagógica mais ampla,
que foi embutida nessas mesmas línguas e associada a elas pela tradição.
A verdade é que, da antiga Grécia à Idade Média europeia, o ensino de idiomas não era
uma preocupação da pedagogia. Os tratados de educação geralmente o consideram uma
inconveniência, não lhe dedicando sequer um capítulo inteiro e passando rapidamente ao que
verdadeiramente lhes interessa: a grammatica, palavra derivada do grego γραμματική — arte
das letras, que engloba o modo correto de falar e escrever (ratio loquendi scribendique) e a
interpretação dos poetas (enarratio poetarum), seu objetivo máximo. Em tempos arcaicos, uma
versão primitiva dessa disciplina era praticamente a educação inteira do aristocrata —
descontadas, naturalmente, as artes e o treinamento físico. No período clássico, ela se tornou
uma espécie de ensino básico, ao qual estavam limitadas, por exemplo, as mulheres, e que, para
os homens, precedia o curso de Retórica. Na Idade Média, era a base do Trivium, considerada
por muitos pedagogos como a disciplina mais importante, o fundamento mesmo da inteligência.
Passo em branco qual era o papel da grammatica, e portanto dos clássicos latinos, na aquisição
da sapientia, a verdadeira finalidade do Trivium, embutida nas três disciplinas que o compõem.
Discutamos seus aspectos mais mundanos e, por ora, fiquemos satisfeitos com isso.
Ocorre que o ensino do latim deriva precisamente dessa disciplina antiga, abrangendo o
que hoje chamamos de “gramática” (embora, evidentemente, numa forma mais rudimentar) e a
explicação dos poetas clássicos. Essa estrutura nunca foi abandonada, mesmo quando as artes
liberais foram substituídas pelo modelo da “educação de massas”, enciclopédico, técnico e
avesso ao que há de humano no homem. O latim permaneceu como resquício do sistema
anterior, e foi perdendo espaço aos poucos, até dissolverse completamente. No processo,
primeiro os poetas perderam a maior parte de sua importância, e no fim até a gramática, sem a
qual não há domínio consciente da linguagem, foi considerada um fardo. Hoje chegamos ao
ponto em que os ditos especialistas realmente discutem a idéia de ensinar as “línguas” clássicas
de modo isolado, isto é, separandoas de toda a disciplina tradicional, que “fica para depois”.
Não é difícil prever que, com mais algumas décadas, também os poetas serão completamente
abolidos; para lêlos como as crianças medievais, que tinham essa oportunidade em poucos anos
de escola, os estudantes modernos terão de envelhecer numa instituição universitária
especializada. Não há rigorosamente nenhum motivo para ir a Virgílio se nosso objetivo é
apenas aprender “uma língua”: é mais prático ler outros materiais, adaptados a essa finalidade,
que serão produzidos em número cada vez maior. Pensando bem, por que ler? Passemos dos
textos puros aos quadrinhos, dos quadrinhos ao vídeo!
Para que não digam, porém, que minhas críticas e previsões apocalípticas são
infundadas, mostrarei um exemplo concreto de como o processo já está em andamento. O
material mais popular de ensino “direto” do latim é o de Hans Ørberg, intitulado Lingua Latina
Per Se Illustrata; nele já se vêem diversos elementos da degradação acima descrita. Cito o texto
de uma das primeiras “lições”, e peço ao leitor que pronuncie tudo, pacientemente, em viva
voz:
Iulia cantat: “Lalla.” Iulia
laeta est. Marcus: “St!”
Marcus laetus non est.
Iulia cantat: “Lalla, lalla.”
Marcus: “Ssst!” Marcus
iratus est. Iulia cantat:
“Lalla, lalla, lalla.”
Marcus Iuliam pulsat.
Iam Iulia non cantat, sed plorat:
“Uhuhu!” Marcus ridet: “Hahahae!”
Não me pareceu apropriado reproduzir as ilustrações. Para que o aluno não tenha — coitadinho!
— de ver um vocabulário, em que laetus apareceria ao lado da tradução “alegre, feliz”, temos de
repetir, como doentes mentais: Iulia laeta est; Marcus laetus non est, enquanto olhamos para as
ilustrações, em que Iulia aparece sorrindo, e Marcus, zangado. Depois de ser golpeada por
Marcus, lemos, Iulia non cantat, sed plorat, o que já seria suficientemente repulsivo a qualquer
inteligência viva — mas falta ainda o complemento: uhuhu. E, como se Marcus ridet não fosse
bastante óbvio, ainda temos de recitar, com a gravidade própria da sala de aula: hahahae. Quem
conheça os cursos de idiomas que grassam por aí já está familiarizado com esses artifícios, e
sabe que, em sala de aula, devem ser complementados por mímicas e outras atividades circenses.
É esse o preço a pagar, se queremos eliminar as traduções. Antes, líamos Cícero e Horácio para
as crianças; agora, meditamos Iulia e seu uhuhu.
Sei que muitos, principalmente aqueles cuja mentalidade já foi irremediavelmente
deformada pela pedagogia moderna, alegarão ser isso necessário para os pequenos. Que me
dizem dos adultos que estudam pelo mesmo método, e que são, aliás, maioria? Este tempo já
degenerou ao ponto de perder noção do óbvio? Quem se rebaixa a ler em voz alta — pior, a
encenar — a história reproduzida acima, abafando a natural revolta e o senso do ridículo,
tornase mais estúpido no ato. Não há caminho mais rápido para a burrice do que idiotizarse
voluntariamente; isso sempre foi de conhecimento dos homens, por virtude da mera intuição.
Hoje, além de tudo, existe até a desenvolvida disciplina do psicodrama, usada por engenheiros
sociais para reduzir a pó os cérebros das crianças, transformandoas suavemente em autômatos.
Os cursos de idiomas se valem dessas técnicas para inculcar hábitos linguísticos, e a maioria dos
usuários pensa que nada mais acontece no processo. É uma ingenuidade irresponsável.
Os grandes pedagogos sempre reconheceram a importância de ensinar com material de
alta qualidade — “alta”, não do ponto de vista da eficácia didática, mas do valor literário
objetivo. Nem a simples recitação de um texto poderia dispensar o exame de seu conteúdo, pois
ele seria impresso na memória e, portanto, teria algum efeito sobre a alma. Essa prática
degenerou, na Idade Moderna, em mero adestramento moralista (desembocando na monstruosa
manipulação psicológica promovida hoje nas salas de aula por organizações globalistas), mas
era, originalmente, mais ambiciosa: visava a imprimir no espírito da criança imagens de tudo o
que fosse bom e belo, e havia sempre de ser o melhor desde o começo. Era essa a exigência de
Quintiliano, talvez o maior pedagogo da Antiguidade e certamente um dos mais influentes, tanto
na Idade Média como no Renascimento: que a criança, tão logo começasse a escrever as
primeiras palavras, copiasse excertos dos poetas e máximas de elevado conteúdo moral; e que,
quando estivesse lendo com alguma facilidade, lesse desde logo o grande Virgílio. E
acrescentava, prevendo talvez a objeção dos modernos: “para compreender as virtudes de
Virgílio, é preciso uma inteligência mais treinada; contudo, haverá bastante tempo para isso, e
ele não será lido apenas uma vez...” Que pensaria Quintiliano da nossa laeta Iulia e seu Marcus
iratus, que são aplaudidos, não digo por crianças inexperientes e imaturas, mas até por adultos
nas universidades? Especule o leitor.
Mais de mil anos depois, Erasmo de Roterdã escreveu seus Colloquia Familiaria para
facilitar o aprendizado do latim falado — que, na época, além de instrumento pedagógico, era
um recurso bastante eficaz para viajar pela Europa sem saber cinco idiomas diferentes. Os
Colloquia, apesar de possuírem vocabulário relativamente simples e uma estrutura mais didática
que a dos textos de Cícero, são diálogos de grande elegância, cujo estilo lembra bastante o de
Terêncio. Alguns críticos afirmam ter sido nos Colloquia que Erasmo atingiu sua expressão
literária mais perfeita. Não obstante, no prefácio nosso autor teve de justificarse por, sendo
homem maduro, dedicar sua atenção a “infantilidades”. A obra parecia excessivamente pueril e
vulgar, uma vez que o assunto dos diálogos era leve, e seu tratamento, suavemente cômico —
características literariamente convenientes ao gênero, mas pouco aceitas pela moralidade da
época, formada como era nos princípios de Quintiliano. Tampouco Erasmo pensava muito
diferente — ele reafirma muitas vezes, em seu De Ratione Studii, que é preciso ler os melhores
materiais desde o início — e justificou esses textos mais leves como o açúcar que acrescentamos
a certos remédios, para facilitar que as crianças os tomem. Se seus diálogos, que são verdadeiras
obras literárias, eram para ele como um remédio adoçado, que diria ele de Hans Ørberg? Açúcar
puro, e sem o remédio junto! Que resultado pode ter algo assim, senão um tipo de diabete
intelectual?
O que digo de Ørberg vale, guardadas as proporções devidas, para qualquer método que
use textos adaptados ou facilitados, ou que siga os princípios do “método natural”. E no entanto
muitos, cada vez mais, continuarão a usálos e a justificarse, enquanto adiam de novo e de novo,
já adultos, o que os alunos do bemaventurado Alcuíno faziam na mais tenra infância. É que
“ainda não estão preparados” para os clássicos; os métodos antigos são “muito duros”. Jane
Welsh Carlyle, esposa do ensaísta Thomas Carlyle, memorizou sozinha, aos quatro anos de
idade, a declinação da palavra penna, para convencer seu pai a enviála à escola de latim. Aos
nove, ela lia Virgílio. No século XIX, esse método era bom o bastante para uma inglesa de
quatro anos; mas já não funciona para um americano de trinta, hoje. Não me fale, Erasmo, de
“infantilidades”. Esta é a era das infantilidades. E isso, infelizmente, tem um preço.
Em suma, o adiamento progressivo da gramática analítica e dos auctores clássicos, e sua
posterior eliminação completa, não são respostas à decadência do ensino do latim: são seus
próximos estágios. Aqueles que criticam Napoleão Mendes de Almeida pela aridez de seu
método e, contra ele, propõem ensinar latim como uma língua qualquer, são seus inimigos no
que ele tinha de bom, e seus continuadores no que ali havia de errado. A falta dos pedagogos que
nos precederam era isso mesmo: falta, não excesso. Não nos cabe, como se diz, jogar o bebê fora
com a água do banho; bem ao contrário, é preciso acrescentar à disciplina anterior os elementos
que lhe darão mais sentido e melhor ordem. O desejo de tornar o aprendizado mais fácil e
prazeroso é, certamente, louvável, mas em hipótese alguma deve ele ter prioridade sobre os
objetivos do ensino: não faria sentido algum tornar o processo de construção de um arranhacéu
mais fácil se, como resultado, conseguíssemos apenas uma simpática casa de subúrbio. Se os fins
não permanecem, pouco importa a qualidade dos meios.
E se estiver o leitor convencido da necessidade de alguma gramática, e não somente
daquela necessária para o uso da língua, mas também da que manipula conscientemente a forma
da linguagem, podemos falar, enfim, de como se chega a obter o mínimo necessário para praticar
o que se ensina neste livro.
O Prof. Hale escreveu um First Latin Book, que não recomendo, porque não segue o
conselho que ele mesmo nos deu neste volume. O conselho era que os alunos recebessem desde
cedo o latim como era escrito pelos autores clássicos, na ordem e na complexidade original; a
prática do First Latin Book, porém, é usar frases adaptadas e simplificadas, como os demais
métodos introdutórios da época. Por que a incoerência? Porque, suponho, o autor estava
habituado a ensinar àqueles que já tinham aprendido o básico, e essa sua experiência refletiuse
melhor neste livro, do que no outro, destinado a iniciantes.
Quanto a mim, quero que o aluno faça o que nos aconselhou o Prof. Hale: que aprenda
desde o começo com os melhores, que absorva a disciplina gramatical mediante prática
frequente, e que faça muita análise antecipatória tão logo lhe seja possível. É verdade que, se
tentar atingir primeiro o nível dos alunos de latim da Harvard do século XIX, precisará
memorizar a gramática de Allen e Greenough; mas eu mesmo provei, na minha prática
pedagógica, que é possível exercitar esse tipo de análise desde o princípio, sem adquirir senão
algumas noções básicas da teoria gramatical. O mais importante é que alguma análise seja feita,
que os textos ganhem complexidade quanto antes. Em vez de usar, por exemplo, uma frase
adaptada como puellam magistra laudat, leio em meu curso estes versos de Horácio: quis multa
gracilis te puer in rosa / perfusus liquidis urget odoribus? É difícil descrever com justiça o
prazer que sentem os alunos durante a investigação, enquanto classificam cada um dos termos,
anotam seus significados e tentam combinálos de todas as maneiras razoáveis, até achar um
sentido definitivo para o período; mas maior ainda é o deleite de, depois de terem assim
organizado a frase, retornar ao original e lêlo na ordem, sendo capazes de entender palavra por
palavra, sem jamais terem dedicado tempo algum a quaisquer infantilidades “introdutórias”.
A tradução, contudo, só deve ser usada instrumentalmente. Não faça o leitor como os
instrutores criticados pelo Prof. Hale: não comece a traduzir antes mesmo de ler. A tradução
frasal não é o começo do processo, mas o fim: só se pode traduzir aquilo que primeiro se
entendeu. Monte para si o vocabulário do texto, investigando e anotando cuidadosamente os
sentidos possíveis de cada palavra, e depois, se não consegue ler a frase na ordem original,
reordenea, sem traduzir, aproximando sua sintaxe da língua portuguesa, mas preservando a
estrutura fundamental do latim. Ponha juntos os nomes que concordam em caso e número: quis
puer gracilis perfusus; ordene os termos de tal modo que o sujeito preceda o verbo, e o verbo, ao
objeto. Fique sossegado, que os jovens romanos faziam exercícios muito parecidos, e isso não
corrompeu seu aprendizado. Lembrese apenas de sempre retornar ao original, lêlo na ordem e
só recorrer à análise completa e à reordenação quando se fizer necessário. Não trate isso como a
leitura “normal” em latim, mas como instrumento hermenêutico, a ser usado somente em caso de
necessidade — e a necessidade, que de início é a norma, deve ficar cada vez mais rara conforme
se progride no aprendizado. É assim que apresento essa e outras técnicas aos meus próprios
alunos.
Cabe, por fim, alertar que este texto foi escrito com o propósito de orientar uma leitura
correta de The Art of Reading Latin. Para atingir o objetivo, foi necessário esclarecer e
sistematizar a técnica do Prof. Hale num nível ao qual o próprio autor talvez não tenha chegado.
Ele repete muitas vezes, por exemplo, que seu desejo é passar da análise consciente para a
prática “inconsciente”; termo infeliz, que pode refletir má formação de conceitos ou, ao menos,
rudeza na expressão. Afinal, se o objetivo fosse usar a língua de modo “inconsciente”, por que
não poderíamos aprendêla inconscientemente, como advoga o método direto? Mas os romanos
que ouviam Cícero no Senado — os quais o Prof. Hale pergunta, jocosamente, se faziam análise
sintática, se procuravam o verbo principal e o sujeito enquanto escutavam o discurso — não
aprenderam latim de modo “inconsciente”. Eram aristocratas educados na meticulosa disciplina
das letras; tinham memorizado versos e discursos e, certamente, desfizeram muitos hipérbatos na
escola. Se é verdade que eles atingiram — e nós devemos atingir — certa facilidade no uso geral
da língua, nem por isso a arte da gramática foi aprendida em vão; é instrumento intelectual da
maior utilidade, que garante a percepção da estrutura material da linguagem, como dizia Dante,
e possibilita o uso disciplinado, rigoroso, arquitetônico dessa mesma estrutura. Não a
aprendemos para usarmos constantemente todos os seus recursos, mas para que alguns deles se
incorporem ao nosso espírito, regendo espontaneamente a manipulação da língua que o Prof.
Hale chama de “inconsciente”, enquanto os demais restam estacionados, em vigília, esperando o
momento da batalha.
Apesar dessa e de algumas outras imprecisões vocabulares ou conceituais, minha única
objeção séria às recomendações deste livro diz respeito ao grau de exatidão gramatical que
parecem requerer da formação teórica do aluno, antes que ele possa tocar num texto de César ou
Salústio. Está muito bem que se nos exija traduzir “de ouvido”; mas que sejamos obrigados, ao
ouvir, a ter em mente, suspensos, todos os usos possíveis do acusativo, com seus nomes e
definições técnicas, é rigor demais para o começo dos estudos. Como já sugeri, essa deficiência
(ou excesso) do Prof. Hale provavelmente se deve ao fato de ter ele trabalhado com alunos já
formados numa tradição eminentemente teórica e sistemática de ensino gramatical. Nossa
atenção, porém, não deve estar em conseguir exatidão e completude nos conceitos da gramática,
mas em desenvolver gradualmente as faculdades do espírito, exigindo do aluno tanto quanto for
possível, sem sacrificar o interesse e a humanidade dos estudos. Para isso, repito, é melhor que
tenha contato com os clássicos desde cedo, e só com o tempo, enquanto desenvolve seu
vocabulário e suas habilidades em geral, vá se habituando aos diferentes usos que cada caso
possui. Aprender a gramática em forma de catálogo, memorizando todas as regras antes de
conhecer os auctores, não me parece apresentar nenhuma vantagem, exceto para professores
incompetentes.
Em suma, o que vejo de defeito no Prof. Hale não é dele, mas de sua época; e as
qualidades de sua inteligência são tão pujantes, tão evidentemente luminosas que, se tivessem
sido seguidas com rigor e examinadas com lucidez, teriam dado origem a uma verdadeira
restauração dos estudos clássicos. Não julgo possível, nas atuais condições do mundo — e
especialmente do Brasil — atingir o ideal de que eu e o Prof. Hale compartilhamos, mas também
não digo que seja estritamente necessário. Se cumprirmos as funções essenciais da antiga
grammatica, desenvolvendo nos alunos a sensibilidade básica para a estrutura da linguagem,
dandolhes os meios para ler os clássicos e apreciar suas imensas virtudes, mostrandolhes por que
são ainda hoje modelos invictos de escrita e pensamento, já teremos firmado os fundamentos da
educação, e os estudantes poderão avançar por conta própria. Nada pode ser obtido com pressa
indevida, com saltos e precipitações infantis; mas pacientemente, respeitando mais a prática de
nossos ancestrais do que quaisquer novidades chamativas, desprezando os truques publicitários e
atentando a experiência, iremos tão longe quanto precisamos, e mereceremos a gratidão de
nossos filhos e netos.
RAFAEL FALCÓN
https://rafaelfalcon.com.br/
Prefácio do autor

O método de ensino defendido aqui teve início, há muitos anos, no desejo de conhecer a
literatura latina e na impaciência com a real capacidade de leitura alcançada por um curso
universitário. Desde o princípio, havia a convicção de que a mente moderna não podia estar tão
degenerada a ponto de ser incapaz de ler em latim como os romanos, ou seja, na ordem romana,
com os meios romanos e em uma velocidade que não fosse intoleravelmente lenta na leitura de
uma língua moderna. A natureza do objetivo determinou o método por empregar e o emprego do
método demonstrou a sensatez da convicção original.
Por alguns anos, o autor teve a intenção de publicar uma descrição desse método segundo a
forma que havia adquirido na experiência prática com sucessivas turmas. Em primeiro lugar,
entretanto, desejou apresentá-lo oralmente diante de vários professores reunidos. Destarte, como
um primeiro passo, o discurso que abre o opúsculo foi lido para a Conferência de Férias dos
Diretores Acadêmicos Associados do estado de Nova Iorque, ocorrido em Syracuse em
dezembro passado. O interesse com que o trabalho foi recebido foi tão gentil e os pedidos para
que fosse publicado sem demora tão prementes que pareceu ser o melhor não prender-se à
primeira intenção.
O opúsculo não tem a forma que foi inicialmente planejada, ou seja, a exposição pura e simples,
pois, apesar da repetição do pronome pessoal, a forma do apelo direto e da explicação natural
mostrou ter suas vantagens para um discurso. Foi necessário, contudo, acrescentar ao discurso
um suplemento considerável.
Embora não se encontrem sugestões explícitas com relação ao ensino de grego, a essência do
método certamente se aplica da mesma forma a ambas as línguas.
Agradeço a muitos alunos desses últimos anos cujo apoio ao método, apesar de ter sido abordado
por eles sob a cruel necessidade de uma revolução total de hábitos mentais consolidados, deu-me
a confiança que nasce de resultados concretos. Agradeço, porém, especialmente a minha irmã,
senhorita Gertrude Elisabeth Hale, tanto pelas sugestões feitas no início como resultado de sua
própria experiência (a ferramenta mencionada na página 31 se originou, no que diz respeito ao
meu próprio caso, com ela) quanto pela crítica minuciosa do original do presente opúsculo
segundo a perspectiva de um professor de escola preparatória.
Ithaca, 18 de abril de 1887.

A arte de ler em latim: como ensiná-la


DISCURSO PROFERIDO AOS DIRETORES ACADÊMICOS ASSOCIADOS DO ESTADO DE NOVA IORQUE EM 28 DE
DEZEMBRO DE 1886.

Os recentes ataques feitos aos estudos de grego e, em certa medida, aos de latim, se sustentam na
convicção de que os resultados obtidos são muito desproporcionais com relação aos anos de
esforço dispensados nessas línguas tanto pelo aluno do ensino básico como pelo universitário. O
perigo que atualmente ameaça os estudos clássicos neste país se deve, em grade parte, ao fato de
que essa convicção tem sua lógica. Se não fosse assim, se o universitário médio fosse capaz de
ler textos comuns em grego e latim com fluidez e deleite, toda a questão estaria assentada em
bases muito diferentes daquelas em que ora debilmente se assenta.
Aprender a ler em grego e em latim com fluidez e deleite e depois, se os gostos pessoais se
voltarem para algum tipo de literatura ou arte, desenvolver-se nisso; conhecer com familiaridade
e paixão aquelas que são as grandes fontes no registro dos pensamentos e sentimentos da raça
humana, ou seja, as literaturas da Grécia e de Roma – esse é um objetivo que todos nós devemos
estabelecer para nossos alunos. Mas, de modo geral, nossos alunos, seus e meus, não chegam a
amar aquelas literaturas. Talvez as tolerem, talvez as respeitem. Mas amá-las e fazer delas uma
parte substancial de sua vida intelectual, isso é algo que muitos estudantes, moldados, portanto,
por gostos e habilidades naturais, não conseguem alcançar, e nunca estão conscientes da perda
que isso representa. Isso me parece, lançando um olhar aos longos anos de estudos dedicados ao
grego e ao latim e à grande ênfase colocada neles nos pré-requisitos para a admissão em nossas
faculdades, uma coisa muito triste.
Ora, a culpa disso tudo deve ser repartida em três partes: o latim e o grego em si, os professores
nas escolas preparatórias e os professores nas universidades. Os primeiros culpados estão fora de
nosso alcance. São línguas difíceis; e assim devem continuar a sê-lo. E isso faz com que toda a
responsabilidade prática seja dividida entre os professores das escolas preparatórias e os
professores universitários, ou, dando um exemplo concreto por causa de nossa conferência, entre
vocês e mim.
Não tentarei dizer qual dos dois tem mais culpa. Partindo de minha segura observação, direi
somente o seguinte: a influência para a formação do caráter intelectual exercida pelos professores
que preparam os jovens para a faculdade é praticamente indelével. O jovem que vem para a
faculdade com o hábito de pensar é capaz de aprender a ler em latim (e agora deverei ater-me ao
tema, embora toda a essência do que tenho por dizer se aplique com igual força ao ensino de
grego) com facilidade e fluidez; o jovem que vem sem esse hábito carrega limitações que um
curso universitário dificilmente pode curar. Que um jovem deva aprender a pensar antes de vir
para a faculdade é, pois, do ponto de vista dos estudos de latim, algo indispensável. O fato de
isso ser verdadeiro para qualquer ponto de vista deixa nosso argumento ainda mais forte.
Mas há outra coisa que, cedo ou tarde, também se torna indispensável para um grande sucesso (e
em latim não há senão um sucesso), a saber, o método que o jovem aprende a usar para formular
seu pensamento deve ser o correto, - o resultado de uma observação extremamente diligente das
dificuldades práticas por superar e o estudo muito cuidadoso das melhores maneiras de superá-
las.
Quando reunimos essas dificuldades, colocando-as na ordem em que seriam sentidas por um
iniciante, notamos que se trata das seguintes:
1. O vocabulário.
2. O sistema de inflexões.
3. O uso elaborado desse sistema de inflexões para expressar significado no lugar de nossos
métodos mais modernos do uso de preposições, auxiliares e coisas do tipo; ou, em uma palavra,
sintaxe.
Suponho que o principiante deva pensar que essas três dificuldades abrangem o terreno todo e
que se ele tiver fixado o vocabulário e as inflexões e compreendido o que se chama de sintaxe,
poderá ler em latim com grande desenvoltura. Contudo, estaria muito equivocado de pensar
assim. Não se mencionou a dificuldade mais desafiadora. A frase latina é construída em um
plano completamente diferente do da inglesa. Até que esse plano se torne tão familiar para o
estudante como o do inglês; até que, página após página, absorva as ideias com prontidão e
naturalidade tanto em um plano como no outro; resumindo, até que uma única leitura regular da
frase leve sua mente ao mesmo desenvolvimento de raciocínio que ocorreu na mente do autor,
não poderá ler em latim a não ser de maneira lenta e dolorosa. Assim, uma coisa absolutamente
essencial para um indivíduo que queira ler em latim é:
4. Uma familiaridade perfeita e funcional com as formas romanas de construir frases.
Ora, ensinamos as primeiras três coisas de modo mais ou menos eficiente – vocabulário, inflexão
e sintaxe. Mas e a última?
Passo agora para os livros do tipo “Iniciação ao Latim” a fim de ver o que dizem aos estudantes
naquele período mais crítico do estudo do idioma: o começo. Lembro-me bem de como me
ensinaram na Academia Pihillips Exeter – de veneranda memória – a atacar uma frase latina.
Dizia o meu professor: “Primeiro encontre o verbo e traduza-o. Em seguida, encontre o sujeito e
traduza-o. Em seguida, encontre os complementos do sujeito, em seguida os complementos dos
verbos, etc., etc.” Ora, depois da Exeter, levei mais de quatro anos para aprender a ler em latim
com alguma sensação de que aquilo não era um jeito singularmente tortuoso e distorcido de
expressar ideias, as quais eu não tinha nenhuma esperança de compreender a não ser que
reformulasse as frases do meu autor e as reduzisse ao inglês. Desde minha época, entretanto,
métodos melhores podem ter aparecido. Assim, passo para os livros de dois cavalheiros da
academia, conhecidos meus e também professores na ativa: senhor Comstock, da Academia
Phillips Andover, e dr. Leighton, da Escola de Latim Brooklyn. Na página 233 da obra “Primeiro
livro de latim” do senhor Comstock e nas páginas 211 e 212 do livro “Primeiros passos no
latim”, deparei-me com regras distintas, porém essencialmente as mesmas, para a operação em
questão. O primeiro começa assim:
a. Em toda oração simples, encontre e traduza
(1) O sujeito
(2) O predicado.
Eis um novo ponto de partida, uma revolução total em relação a minha época. Fui ensinado a
encontrar primeiro o predicado. Uma mudança tão radical, um método tão diametralmente
oposto ao antigo, deveria conduzir a resultados opostos, isto é, o poder de ler em latim com
facilidade e não com dificuldade. Assim, com um coração cheio de alegria, peguei uma oração
simples do quarto discurso contra Catilina (3, 5) e experimentei meu novo método.
Haec omnia indices detulerunt. Procurei o sujeito. Felizmente estava bem à mão. É haec,
nominativo plural. Depois o traduzi: estas; ou, dado que é neutro, estas coisas. Em seguida, fui
em busca do verbo, que também estava evidente, ou seja, detulerunt, na terceira pessoa do plural,
concordando com o sujeito haec. Talvez eu tenha tirado de algum lugar a feliz ideia de não
buscar as palavras no dicionário antes de tentar traduzi-las. Desse modo, muito adequadamente,
eu procedo com o significado mais simples que me vem à mente, ou seja, trouxeram. Agora
comecei bem: Estas coisas trouxeram. Depois eu procuro os complementos do sujeito e encontro
omnia. Uno-o com haec e tenho agora “todas estas coisas” como sujeito: “todas estas coisas
trouxeram”. Em seguida eu procuro os complementos do predicado e encontro indices,
testemunhas, acusativo plural, objeto direto do verbo. Tudo está em seu devido lugar. Todas
estas coisas trouxeras as testemunhas. Deixo como está. Quando venho para a sala de aula, o
professor chama meu nome, leio em voz alta: “Todas estas coisas trouxeram as testemunhas”,
preparado para fazer a análise sintática do trecho até a última palavra – e então ouço que estou
totalmente equivocado[1].
Ora, um garoto romano de minha idade, ainda que muito menos inteligente do que eu, se tivesse
entrado escondido no senado naquele dia, teria entendido o que aquelas palavras significavam no
instante em que Cícero tivesse pronunciado a última delas, detulerunt. Que diferença há entre
nós? Ambos, ele e eu, sabíamos substancialmente o significado de cada palavra; ambos sabíamos
declinar; ambos sabíamos toda a sintaxe necessária. Entretanto, eu não compreendi a ideia, ele
sim. Como ele me superou? Bem, simplesmente neste ponto: eu, seguindo a orientação de meus
professores, primeiramente procurei meu sujeito e decidi tomar haec. O garoto romano não sabia
se haec era sujeito ou objeto. Somente conhecia a palavra como haec. Eu tinha certeza de que
detulerunt era o verbo, bem como ele quando a palavra apareceu. Eu tinha certeza de que omnia
concordava com o sujeito haec, ao passo que ele somente deduziu que estava asssociada a haec,
independente do que pudesse ser. Eu tinha certeza de que indices era o objeto, ao passo que ele
sentiu que indices era o sujeito ou o objeto, e que isso era o oposto de haec omnia (o aposto está
fora de questão), sendo o objeto se a outra parte se tornasse sujeito e sujeito se a outra parte se
tornasse objeto. Depois ouviu detulerunt, e com essa palavra tudo se encaixou de modo tão
simples como na seguinte frase de Milton:

“(...) a lua, cujo globo


através do vidro óptico o artista toscano vê,”

A última palavra resolve nosso suspense momentâneo quanto à relação entre globo e artista;
relação esta que seria exatamente a inversa caso encontrássemos uma palavra, por exemplo,
como alegra.

b. Em um período composto por coordenação traduza cada oração como se fosse um período
simples. Se houver orações subordinadas, traduza-as em ordem de importância. Uma oração
subordinada ou dependente é aquela que, como em inglês, limita alguma parte da oração
principal (como descrito em 42, página 12). Uma oração introduzida por uma palavra latina que
signifique se, quem, qual, porque, desde, embora, quando, depois, enquanto, etc., é dependente e
deve ser deixada de lado até que se consiga o significado da oração principal.
c. Em um período composto por subordinação, traduza primeiro a oração principal como uma
oração simples; em seguida traduza as orações subordinadas de acordo com as instruções acima
(b).

Mas qual é a ordem de importância e como devo começar? Com o conectivo, suponho.
Suponhamos que seja ut. Mas como traduzi-lo? Há meia-dúzia ou mais de “significados”: para,
de modo que, quando, como, considerando que, embora. Qual é o significado neste caso? Não
consigo dizê-lo. Tampouco o conseguiria um romano. Mas a diferença é que um romano não iria
querer dizer qual desses significados o conectivo ut tem aqui, mas esperaria até que algo no
restante da frase – talvez vinte ou cinquenta palavras mais à frente – lho informasse; ao passo
que a mim se pede para, por assim dizer: jogar cara ou coroa e começar com um significado,
estando as probabilidades em peso contra mim; talvez encontrar meu erro e voltar para corrigi-lo;
acrescentar um erro a outro – o que é mais provável de acontecer – para “fazer sentido”; e, assim,
abarcar a coisa toda numa confusão desesperadora.
Ora, isso tudo está errado. É uma fonte terrível de confusão ficar vagando sem eira nem beira na
frase de um modo cego que pareceria patético a um romano que olhasse as coisas sem as
informações adicionais dadas a ele pela ordem; e, ademais, é uma terrível perda de tempo. Pegue
uma oração como de costume; por exemplo, a abertura da terceira oração contra Catilina,
realizada diante do público. Agora, imagine duas cenas: de um lado, o Fórum Romano em 3 de
dezembro de 63 a.C., com uma massa de homens e garotos escutando Cícero narrar a história de
como foram encurralados os conspiradores remanescentes em Roma; por outro lado, uma sala de
aula moderna, digamos no colégio Syracuse (embora eu espere que vá difamar o dr. Bacon), em
3 de dezembro de 1886. No primeiro caso, digamos, Cícero tem o chão; no segundo, o assistente
do dr. Bacon, livro na mão, e os alunos ali na frente. Ambos os públicos querem saber a mesma
coisa: que Cícero tem a dizer. Na primeira cena, Cícero continua:

Rem publicam, Quirites, vitamque omnium vestrum bona, fortunas, coniuges liberosque
vestros atque hoc domicilium clarissimi imperii, fortunatissimam pulcherrimamque
urbem, hodierno die deorum immortalium summo erga vos amore, laboribus, consiliis,
periculis meis, e flamma atque ferro ac paene ex faucibus fati ereptam et vobis
conservatam ac restitutam videtis.

Ao dizer isso, cada alma que o escutou sabe exatamente o que ele quer dizer. Agora, passemos
para o colégio Syracuse. O professor diz: “Em primeiro lugar, encontre o sujeito.” Assim, nós
prosseguimos, farejando um sujeito:

Rem publicam, Quirites, vitamque omnium vestrum bona, fortunas, coniuges liberosque
vestros atque hoc domicilium clarissimi imperii, fortunatissimam pulcherrimamque
urbem, hodierno die deorum immortalium summo erga vos amore, laboribus, consiliis,
periculis meis, e flamma atque ferro ac paene ex faucibus fati ereptam et vobis
conservatam ac restitutam videtis.

Bem, terminamos a frase toda e não há sujeito! Portanto, é certo que esteja implícito no verbo;
ademais, há o pronome da segunda pessoa do plural. Em seguida, encontramos nosso verbo. Ou
seja, como costuma acontecer, a última palavra, videtis. Desse modo, não devemos voltar e
procurar os complementos do sujeito e depois os do verbo? Não, respondo a tudo isso. Se
tivermos sido ensinados da forma correta, nós já entendemos tudo naquela frase quando
chegamos à última sílaba, sem que, entrementes, tenhamos pensado em cada palavra em inglês;
e em 1886 estamos tão preparados para seguir imediatamente para a próxima frase quanto o
estaríamos se tivéssemos sido romanos no Fórum Romano naquele dia em 63 a.C. Ou, em outras
palavras, o garoto que, tendo diante de si aquele discurso ao longo de sua preparação para a
faculdade, não é capaz de compreender aquela frase em particular – e um número muitíssimo
maior de frases muito mais difíceis naquele discurso – em uma leitura à primeira vista em latim,
ou melhor, na simples escuta do professor que a lê ininterruptamente uma só vez em latim, foi
ensinado de modo errado, está perdendo seu tempo de uma maneira triste – e a vida é
extremamente curta – e, longe de estar no caminho que o leva direto a ler em latim com fluência
e deleite, e então seguir adiante nos estudos para atingir esse fim, encontra-se no caminho que o
leva direto a deixar isso de lado assim que o sistema eletivo de sua faculdade o permitir e, se
tiver alguma preocupação literária, se matriculará em algum idioma em que não seja necessário
primeiro encontrar o sujeito, depois o predicado, depois os complementos do sujeito, depois os
complementos do predicado, e depois fazer a mesma coisa com a oração subordinada, ou, se
houver várias subordinas, fazer a mesma coisa com cada uma delas na ordem de importância que
têm, e depois juntar esses pedaços de trapos em uma colcha de retalhos.
Ora, não é preciso dizer que os alunos, ao começarem desse modo, empreendem mais esforço
que o necessário. Seja como for, posso atestar, com base em minha própria experiência, que
apesar dos esforços admiráveis das escolas em “leitura à primeira vista”, os alunos não a fazem
quando vão para Harvard ou Cornell. Em minha sala de aula, eu me permito – cuidando para que
nada saia dali, como é de costume entre professores universitários – um gracejo por ano. Quando
encontro uma sala de calouros pela primeira vez (pois eu não suportaria deixar uma matéria-
prima tão preciosa inteiramente com o mais perfeito dos assistentes), eu lhes pergunto:
“Suponham, agora, que vocês tenham que dizer-me, como o fizeram na prova de admissão outro
dia, o significado de uma frase em um livro que vocês nunca viram – digamos, um discurso de
Cícero; como fazem para captar o que o autor quer dizer?” Imediatamente as vozes ressoam em
coro (pois se prepararam intensamente para aquela pergunta através do aprendizado dos
comandos impressos, como vimos, nos primeiros livros que estudaram): “Primeiro encontre o –
SUJEITO”, dizem três quartos deles; “PREDICADO”, diz o outro quarto. E eu lhes digo: “Ora,
eis aqui uma inconveniente diferença de opinião acerca dos primeiros princípios em um assunto
referente à prática do dia a dia e que é de suma importância. Que lado está com a razão?” Eles
não sabem. “Que vocês acham que os romanos que ouvissem o discurso proferido no Fórum
procurariam primeiro, o sujeito ou o predicado?” Esse pequeno gracejo, embora simples, sempre
tem grande sucesso, pois não somente provoca risos (sem valor em si mesmos), como também
mostra de imediato, até para o calouro, como é absurdo ler em latim caçando em primeiro lugar o
sujeito ou o predicado; e, assim, o gracejo ganha a simpatia do estudante para que experimente
algum outro meio, se se puder mostrar-lho. Mas, ao mesmo tempo, isso me prova que o método
ensinado na etapa mais crítica de todas, o início, ainda está errado. Somente mais de dez anos
depois, e mesmo assim muito raramente, algum estudante responde a minha questão com:
“Primeiro, leia a primeira palavra latina sem a traduzir, depois a segunda, em seguida a terceira,
e assim por diante até o final, assimilando todas as funções possíveis de cada palavra – enquanto
se excluem imediatamente as impossíveis – e, acima de tudo, pecando, se for o caso, pelo
excesso e manter a mente em suspense por mais tempo do que o necessário, e, por fim,
esperando até que uma solução segura seja dada pela própria frase.”
No entanto, esse é o único método que deveria ser rigorosamente usado em todos os lugares,
desde o dia da primeira aula até a última peça de latim que o estudante formado ler para
confortar sua velhice. Mas, o processo que no início é consciente e lento em cada ponto, como
não o era com os romanos, se torna, no latim de dificuldade normal, um processo complemente
inconsciente e muito rápido, justamente como o era com os romanos. Se tal prática ocorresse já
desde o início, eu não saberia dizer o momento exato em que o processo se tornaria fácil para o
latim normalmente simples. Em minha própria experiência com universitários, e todos
precisaram mudar os hábitos, noto que ocorre uma diferença considerável em um único período
letivo. Ao cabo de dois anos, quando se inicia a etapa eletiva, percebo então que é inteiramente
viável para a turma dedicar-se ao estudo da literatura latina somente em latim, sem qualquer
necessidade de versão para o inglês, exceto nas provas; e nunca tive uma tradução tão boa e
vivaz, seja à primeira vista seja em leitura usada no período letivo, como na semana passada
quando, pela primeira vez, apliquei uma prova desse tipo no fim de um período letivo em que
não se recorreu à tradução.
A fim de que a questão adquira uma forma definida e prática, a melhor maneira com que posso
indicar aquilo que me parece que vocês devam orientar os seus professores de latim a fazer,
mutatis mutandis, é dizendo-lhes o que eu mesmo faço desde o momento em que encontro os
meus calouros pela primeira vez até o final do segundo ano de faculdade.
Depois de minha piadinha sobre os romanos a caçarem primeiro o sujeito e depois o predicado
enquanto Cícero lhes dirigia a palavra, ou primeiro o predicado e depois o sujeito, qualquer que
seja o método que se julgue ter sido adotado pelos romanos, eu asseguro a eles que: “O que
temos que fazer é aprender a compreender uma frase romana exatamente como um romano a
compreendia quando a ouvia ou lia, digamos, por exemplo, em um discurso. Ora, o romano
ouvia, ou lia, primeiro a primeira palavra, depois a segunda, depois a terceira, e assim
sucessivamente, frase por frase, até o final da oração, sem regressões, sem buscar coisas de um
lado e de outro. E, ao fazer isso, era o tempo todo guiado de tal modo por indícios de um tipo ou
de outro – de certa forma, dispersos em cada frase – que, quando a última palavra da frase era
falada ou lida, o significado inteiro do enunciado chegava ao seu intelecto. O processo de
detecção desses indícios de significado lhe era absolutamente inconsciente. Nós modernos,
entretanto, certamente não podemos começar nesse nível. Essa inconsciência do processo é a
nossa meta. Mas devemos ser obrigados, ao longo de alguns dos primeiros anos, a estudar
explicitamente esses indícios até que venhamos a ter familiaridade com eles, um de cada vez. Por
certo tempo, devemos pensar em voz alta, a todo o momento, conforme a frase avança (e isso
sem nunca nos permitir antecipar nada), em todos aqueles elementos que expressam significado,
seja escolha de vocabulário, seja escolha de sintaxe, seja escolha de caso, seja escolha de modo
verbal, seja escolha de tempo verbal, seja escolha de qualquer coisa que ali fosse suficiente para
a mente romana. E quando esses indícios – que, no final das contas, não são tão numerosos – se
nos tornarem tão familiares que a maior parte deles esteja apta a resplandecer diante de nosso
intelecto sem que tenhamos que deliberadamente reuni-los, estaremos muito próximos do ponto
de interpretá-los, num latim adequado as nossas capacidades em desenvolvimento, de forma
inconsciente. No momento em que o fizermos, leremos em latim segundo o método dos próprios
romanos.
Tomo agora – todos os livros fechados – uma frase de estrutura muito simples, da qual cada
palavra, cada função seja conhecida; digamos, um trecho de Tito Lívio.[2]
Digo-lhes o contexto. Dois assassinos são admitidos, sob o pretexto de que se decidisse uma
disputa, à presença de Tarquínio. Enquanto um distrai a atenção do rei com sua narrativa, o outro
enterra um machado na cabeça do monarca; em seguida, ambos correm em direção à porta.
Para que a interpretação seja feita rigorosamente na ordem em que um romano a faria, sem
antecipar nada, escreverei uma palavra de cada vez no quadro (como o farei novamente no
quadro diante de vocês) e farei perguntas, conforme eu avançar, do seguinte modo[3]:
Tarquinium. “Que Tito Lívio quer dizer quando coloca aquela palavra no início da frase?” Que
a pessoa mencionada nela é neste momento de notável importância. “Qual o caso de
Tarquinium?” Acusativo singular. “Que esse fato significa para vocês?”
Aqui a maior parte deles fica de certo modo atordoada por não estar acostumada com a palavra
significado, a mesma palavra que deve ser constantemente usada quando se lida com sintaxe ou
com a chamada “análise sintática”. Assim, muito provavelmente eu tenha que dizer: “Será que
significa a duração do tempo da ação a que se refere?” Não, dizem. Pergunto: “Por que não?”
Alguém diz: “Porque o nome de uma pessoa não pode indicar tempo.” Digo: “Dê-me algumas
palavras que podem indicar tempo.” Eles me dão dies, noctes, aetatem, etc. Então eu pergunto:
“Será que significa extensão do espaço?” Não, dizem, e justificam sua resposta de modo
semelhante. Quando lhes peço palavras que possam indicar extensão do espaço, dão-me, talvez,
mille passuum, tres pedes, etc. Em seguida, pergunto: “Será que indica a extensão da ação do
verbo, a medida até a qual a ação se estende?” Não, respondem por uma razão semelhante. Mas
quando peço palavras que possam significar a extensão da ação, geralmente não conseguem
dizer-mas, pois curiosamente as gramáticas não reconhecem esse tipo de uso; embora frases
como ele caminha muito todos os dias (multum cotidie ambulat) sejam ainda mais comuns que
frases como ele caminha três milhas todos os dias (cotidie tria milia passuum ambulat) e os
acusativos signifiquem essencialmente a mesma coisa em ambas as frases. Então pergunto: “Será
que significa com respeito ao que é dito – quanto a Tarquínio – o acusativo de especificação?” A
uma questão desse tipo, sinto dizer que muitos sempre respondem sim, pois os alunos têm noções
muito vagas dos usos reais do acusativo latino de especificação. Alguém, entretanto, pode ser
capaz de dizer-me que o nome de uma pessoa nunca é usado no acusativo de especificação e que,
em geral, o uso desse acusativo na época de Cícero e Virgílio estava quase sempre restrito à
poesia. “Que palavras eram usadas no acusativo de especificação na prosa?” Aqui nunca recebo
uma resposta, embora a lista seja limitada, breve e importante. Assim, eu mesmo tenho que
dizer: “Devo acrescentar ao conhecimento básico de vocês um item útil. Escrevam o seguinte em
seus cadernos: partem, vicem, genus com omne ou um pronome (quod, hoc, id), secus com virile
ou muliebre, hoc e id com aetatis, o relativo quod e o interrogativo quid, são usados na prosa
latina em todas as épocas como acusativos de especificação. Eis, portanto, um pouco de
informação sucinta que pode capacitá-los, tão logo encontrem essas palavras novamente (e vocês
as encontrarão muito em breve no primeiro livro de Tito Lívio), a caminhar sem tropeçar em uma
frase na qual vocês deveriam, na verdade, passear.” Em seguida, retorno para o Tarquinium.
Pergunto: “Será um acusativo de exclamação?” Possivelmente, dizem. Digo: “Possivelmente,
embora você quase nunca espere, na narrativa histórica, que o historiador use esse tipo de
exclamação.” Depois pergunto: “Será um acusativo cognato?” A isso respondem não, dizendo-
me, talvez com algum auxílio, que o nome de uma pessoa não pode ser de modo algum a
reafirmação de um ato – não pode significar uma atividade. “Bem, então que significa esse
acusativo afinal?” Nesse momento, bastantes alunos conseguem dizer: é o objeto de um verbo ou
o aposto do objeto. Pergunto, porém, se há algo mais que seja possível, e alguém responde:
Sujeito de um infinitivo. Respondo: “Sim. Mais alguma coisa ainda?” Predicado de um infinitivo,
alguém responde.
Pergunto: “Ora, que aprendemos com tudo isso? Quando se tem o nome de uma pessoa – ou
nomes de pessoas – no acusativo sem preposição, quantas e quais funções são possíveis?” Agora
todos são capazes de responder: Objeto de um verbo, sujeito ou predicado de um infinitivo.”
Digo-lhes: “Muito bem. Conservem essas possibilidades frescas em suas mentes, deixando-as
resplandecer nela no momento em que vocês virem uma palavra assim; e, feito isso, ESPEREM,
e NUNCA DECIDAM qual desses significados possíveis estava na mente do orador ou escritor
romano antes que o restante da frase dê uma resposta clara a essa pergunta. Agora, digam-me
que funções são possíveis para um acusativo como hiemem.” Respondem: Duração de tempo,
aposto, objeto de verbo, sujeito ou predicado de um infinitivo. “Para um acusativo como pedes?”
Respondem: Extensão do espaço, aposto, objeto de verbo, sujeito ou predicado de um
infinitivo.” “Para um acusativo como vitam?” Acusativo cognato, aposto, objeto do verbo, sujeito
ou predicado de um infinitivo. Nesse momento, pergunto: “Algum de vocês pode me dizer que
funções podemos esperar se o verbo for uma palavra como doceo ou celo?” Todos respondem e,
com isso, fiz em pouco tempo uma revisão rápida de praticamente todo o conteúdo das funções
com acusativo. Mais ainda – e isso é vital: fi-lo com base em uma perspectiva eminentemente
prática. Não pedi que o aluno “fizesse análise sintática” de uma palavra após ver seu nexo
completo na frase (um exercício que perde oitenta por cento de sua força por estar fora de lugar),
mas exigi uma análise sintática prévia. Fiz as perguntas de tal forma que meus alunos
aprenderam, para todos os acusativos, que ideias instantâneas das funções possíveis uma palavra
exibe na frase que lhes ocorrer, e isso à primeira vista e partindo da própria natureza da palavra.
Depois, prossigo: “Temos o rei Tarquínio diante de nossos olhos como a pessoa que a frase
coloca no centro de nossa atenção, e sabemos que ele é objeto de uma ação, sujeito ou predicado
de uma ação infinitiva; ou, provavelmente, é aposto de um objeto, sujeito ou predicado.
Prossigamos: que é a próxima palavra, moribundum, e qual o seu caso?” Adjetivo; neutro no
nominativo singular, neutro no acusativo singular ou masculino no acusativo singular. Não riam
disso. O hábito de fazer com que um jovem diga em voz alta todas essas coisas, ainda que não
errasse caso não lhe fossem perguntadas, evita que muitos se percam em trechos complicados.
“Que é provável acerca da palavra moribundum, de acordo com o que temos nesta frase em
particular?” Que esteja associada a Tarquinium. “Correto. Agora, mantenham esta imagem na
mente: Tarquinium moribundum, o rei, em seus últimos suspiros, sofrendo ou realizando
uma ação. Agora, para a próxima palavra: Tarquinium moribundum cum. Que é cum?”
Alguns respondem preposição com perfeita prontidão; outros, conjunção. [4] Replico: “Mas, se
estiverem acostumados com a grafia correta, vocês sabem, com um segundo de pensamento, que
nenhum romano na história poderia dizer, neste momento, se se trata de preposição ou
conjunção. A fim de que possam dizê-lo, vocês devem esperar o quê?” Ablativo ou verbo,
respondem. E continuamos: “Tarquinium moribundum cum qui. Que o qui nos revela
imediatamente sobre o cum?” Conjunção. “Correto. Que sabemos agora, com certeza quase
absoluta, sobre Tarquinium? A que parte da frase pertence?” Aqui, sofro ao dizê-lo, respondem
sempre em coro: Verbo principal. Ora, de uma forma um tanto quanto misteriosa, os alunos
chegam às universidades sem ter aprendido que os romanos adoravam tirar a palavra, ou
combinação de palavras, mais importante de uma oração subordinada introdutória e colocá-la
bem no comecinho, antes do conectivo – uma singela informação bastante valiosa para a leitura
prática. Nesse momento, exponho-lhes esse hábito de expressar-se e pergunto: “Dada uma frase
iniciada com mors si, que vocês sabem sobre ela?” Que mors é o sujeito ou predicado de um
verbo introduzido por si. “Dada uma frase introduzida por Hannibali victori cum ceteri?” Que
Haníbal depende de algo na oração com cum. Voltemos agora para a nossa frase e para a palavra
qui. Qual é sua classe gramatical? Pronome relativo, dizem. Pergunto: “Que mais?” Pronome
interrogativo. “Em que gênero e caso?” Masculino no nominativo singular ou plural. “Se é um
relativo, onde na frase como um todo está seu antecedente?” Deveriam responder: “Dentro da
oração com cum”. O cum serve como o primeiro dos dois parênteses para incluir a oração com
qui. “Se, por outro lado, se trata de um interrogativo, qual é o único tipo de interrogativa possível
aqui?” Indireta e no subjuntivo, respondem. “Nesse caso, que espécie de significado, de modo
geral, deve ter o verbo introduzido por cum?” Deve ser capaz de insinuar algum tipo de
pergunta. “Correto. Talvez possamos ter uma frase desse tipo em: Quando todos indagaram
quem eram esses homens – Cum qui essent omnes quaererent; ou talvez devamos pensar que o
qui é um relativo. A próxima palavra é circa: Tarquinium moribundum cum qui circa. De
que classe gramatical?” Advérbio. “Assim, que funções pode ter?” Pode modificar um verbo, um
adjetivo ou outro advérbio. Continuamos: Tarquinium moribundum cum qui circa erant.
“Agora, que faz o circa?” Modifica erant. “Qual era o número de qui?” Plural. “Era um relativo
ou um interrogativo?” Relativo. “Como vocês sabem disso?” Porque erant não está no
subjuntivo. “Correto. Agora, qui circa erant pode ser tando um substantivo quanto um pronome
– um substantivo indeclinável ou um pronome no plural. Pense nisso dessa forma conforme
continuamos. Tarquinium moribundum cum qui circa erant excepissent. Não pergunto hoje
o significado do modo de excepissent, pois o mundo todo tem dúvidas enormes quanto à questão
da história e da força de construções com cum. Mas que queria Tito Lívio dizer ao escrever o
acusativo Tarquinium?” Objeto de excepissent. “Sim, e qual era o sujeito de excepissent?” O
antecedente de qui. “Sim, ou, olhando a questão de maneira mais ampla, o sujeito era qui circa
erant.”
“Antes de continuar, que imagem temos diante de nós? Que nos disse a frase até agora? Isto:
Olhem para Tarquínio, ele está morrendo! Vejam os presentes! Vejam-nos enquanto o
pegam! A própria ordem das palavras estimula nossa curiosidade. A próxima palavra é illos –
Tarquinium moribundum cum qui circa erant excepissent, illos...Que a posição de illos,
primeira palavra na oração principal propriamente dita, nos diz?” Que as pessoas às quais se
refere têm especial importância neste momento. “Quem vocês acham que são esses illos, essas
pessoas mais distantes, colocadas assim em um contraste enfático com Tarquinium, de modo
que cada palavra encabece a oração em que se encontra?” Os assassinos, a classe toda responde.
“Olhando para o caso da palavra, que sabemos do significado pensado por Tito Lívio?” Agora
todos respondem em um coro afinado e de forma completa: Aposto, objeto do verbo principal,
sujeito ou predicado do infinitivo. Continuamos: Tarquinium moribundum cum qui circa
erant excepissent, illos fugientes... “Qual a classe gramatical de fugientes?” Particípio.
“Qual?” Presente e ativo. “Portanto, vocês estão vendo uma fuga acontecer bem diante de seus
olhos. Qual é o gênero?” Masculino ou feminino. “Qual é o número?” Plural. “Logo, vocês veem
dois homens ou duas mulheres em fuga. Qual é o caso?” Nominativo ou acusativo. “Levando
tudo isso em conta, vocês conseguem ter certeza do caso?” Sim; acusativo. “O vocábulo
fugientes está ligado à qual palavra?” Illos. “Por quê?” Porque com certeza os assassinos, os
illos, fugiriam. Respondo: “Sim, mas não se erra se se espera até que não haja nenhuma sombra
de dúvida. Continuemos: Tarquinium moribundum cum qui circa erant excepissent, illos
fugientes lictores... Eis outro grupo de pessoas, os guarda-costas do rei. Em que caso?”
Nominativo ou acusativo plural. “Qual?” Eles não sabem. “Bem, então illos pode concordar com
lictores se vocês levarem em consideração somente as formas?” Sim. “Nesse caso, a palavra
fugientes teria que estar relacionada com illos lictores, não é mesmo?” Sim. “Mas os litores
fugiriam?” Não. “E os assassinos?” Sim. “Com certeza. Assim, fugientes não se relaciona com
licotres e sim com illos; e illos parecem ser, como já tínhamos suspeitado à primeira vista, os
assassinos. Entretanto, devemos fazer-nos mais uma pergunta: É possível um aposto entre illos e
litores?” Não, pois se trata de pessoas muito diferentes. “É possível que haja alguma relação
predicativa entre eles? Pode um ser o predicado de um infinitivo que tem o outro por sujeito?”
Não, pois, como foi dito, são pessoas muito diferentes. “Contudo, é possível que lictores seja
acusativo. Se o for, pode ser objeto e, nesse caso, illos é necessariamente o sujeito, pois, como o
vimos, um não pode ser aposto do outro; ou, pode ser o sujeito, e nesse caso, pelas mesmas
razões, illos deve ser o objeto. Qualquer que seja o caso, deve haver uma oposição direta entre
eles, um deles (ainda não sabemos qual) será o sujeito e o outro, o objeto; outrossim, se lictores
for nominativo, vocês ainda têm a mesma relação, bastando-lhes saber qual é o sujeito e qual é o
objeto. De qualquer forma, vocês veem que os termos estão colocados em contraste entre si, e
juntos formam um sujeito e um objeto. Agora deixe os resultados desse raciocínio à mão para os
inumeráveis casos em que tais combinações ocorrem. Tomemos dois substantivos como bellum
Saguntum. Quais são as funções?” Um é o sujeito de um verbo, o outro o objeto, e por enquanto
não podemos afirmar nada com certeza. “Exato. Agora lhes apresentarei uma combinação ainda
mais complicada, mas bastante frequente e comum: quae nos materiem. Que vocês conseguem
perceber nisso?” Algum rapaz inteligente dirá: Nos deve ser o sujeito de algum verbo, conjugado
ou no infinitivo; quae e materiem são objeto e predicativo do objeto. “Excelente. Portanto, que
tipo de significado o verbo provavelmente tem?” Algum que indique o ato de nomear ou chamar.
“Correto. As palavras são de Lucrécio e o verbo que ele usou foi vocamus. Guarde essa
combinação bem como seu significado.”
“Agora, voltemos para os assassinos em fuga e os guarda-costas do rei. Informo-lhes que há
somente mais uma palavra na frase. À qual classe gramatical pertence?” Verbo. “Voz ativa ou
passiva?” Ativa. “Exato. Que diz o verbo?” Diz o que os litores fazem com os assassinos.
“Portanto, qual é o modo?” Indicativo. “Quais são os dois tempos verbais possíveis?” O perfeito
e o presente histórico. “Isso mesmo. Agora a situação está bastante dramática. Se vocês
estivessem escrevendo a história, qual desses dois tempos verbais logicamente escolheriam?” O
presente. “E Tito Lívio também. Agora me digam: Que verbo vocês acham que é?” Interficiunt,
diz alguém. Capiunt, diz outro, captando a ideia mas sem acertar a palavra, que é
comprehendunt, agarram-nos; botam as mãos neles; ou, como um inglês mais insosso poderia
expressá-lo, seguram-nos.”
“Agora, vertamos para o inglês a frase toda, traduzindo não somente as palavras de Tito Lívio,
mas o desenvolvimento real de seu pensamento. Tarquinium, eis Tarquínio; moribundum, é
um homem que agoniza; cum qui circa erant, vocês veem os presentes fazer alguma coisa;
excepissent, pegam e amparam o rei; illos, você se volta e encara os assassinos; fugientes, eles
fogem em disparada; lictores, há os guarda-costas do rei; seguramos o fôlego em suspense; -
comprehendunt, AGARRAM-NOS! Portanto, aquela ordem latina, que parece tão distorcida
para quem está acostumado a despedaçar a frase e depois tornar a montá-la, nos dá a sucessão
mesma na qual se veriam os eventos reais, entrelaça todos os acontecimentos em um todo
compacto, mantendo, contudo, a ordem natural o tempo todo, ao passo que qualquer ordem que
possamos inventar para uma única frase correspondente em inglês torcerá e entortará a ordem
natural de tal forma que deixaria um romano bastante estupefato.”
“Por fim, com a compreensão e o senso do dramático na situação, que adquirimos ao trabalhar na
frase conforme Tito Lívio a escrevera, observem a distorção que temos se trabalharmos
corretamente segundo o método de encontrar primeiro o sujeito da oração principal, depois o
predicado, etc.: os litores seguram os assassinos enquanto eles fogem, ao passo que os que
estavam presentes tinham segurado e amparado o moribundo Tarquínio. Os fatos estão
todos aí, mas o estilo, a alma, foi embora.”
Em seguida, coloco imediatamente em prática o que aprendemos dando uma folha de papel em
branco para cada aluno e iniciando uma nova frase, que deve conter o que acabamos de ver bem
como algum assunto novo. As perguntas são cuidadosamente estudadas e escritas com
antecipação, e o momento de cada uma delas está indicado pra mim, no manuscrito que preparei,
por um número associado à palavra latina em questão, como se fosse uma nota de rodapé.
Conforme as perguntas são feitas, os alunos escrevem abaixo, de imediato, o número e dão a
resposta por completo. Depois, meu assistente passa cuidadosamente por todos os trabalhos e
com um lápis colorido anota cada erro para minha própria orientação e para o estudo, penitência
e proveito do autor. Eis um exemplo realmente usado, extraído de Tito Lívio 21, 53. A resposta
esperada é dada com cada pergunta.

Hannibal1 cum2 quid3 4 5 6 7 8 9 optimum10 11 12 foret13 hosti14 cerneret,15


16
vix17 ullam spem18 19 habebat20 temere21 22 atque23 24 _________ 25
_________26 consules27 28 29 30 31 _________32.

1. Função?
Sujeito de um verbo subordinado ou principal.
2. Classe gramatical?
Preposição ou conjunção.
3. Cum era que classe gramatical?
Conjunção.
4. Função de Hannibal?
Sujeito ou predicativo no nominativo do verbo introduzido por cum.
5. Qual a classe gramatical de quid?
Pronome interrogativo.
6. Modo do verbo com o qual quid está associado?
Subjuntivo de uma interrogativa indireta.
7. Natureza geral do significado do verbo introduzido por cum?
Algum significado que pode insinuar uma pergunta.
8. Gênero e caso de quid?
Neutro no nominativo ou no acusativo singular.
9. Função de quid?
Sujeito, predicativo, predicado ou objeto de um verbo conjugado ou no infinitivo; ou
acusativo de especificação, o chamado advérbio.
10. Gênero e caso?
Neutro no nominativo ou no acusativo singular, ou masculino no acusativo singular.
11. Função?
Se for neutro, concorda com o sujeito ou objeto do verbo, ou é predicado. Se for masculino,
concorda com o objeto do verbo, com o sujeito ou com o predicado de um infinitivo.
12. Que funções podem seguir para completar o significado de optimum?
Dativo da pessoa a quem algo é optimum, ou ablativo da coisa acerca da qual algo é
optimum. (Vale a pena memorizar essas duas possibilidades devido à grande classe de palavras
da qual optimum é um exemplo.)
13. Tempo e modo?
Imperfeito do subjuntivo (Razão já apresentada no número 6).
14. Função?
Dativo para optimum (Razão apresentada no número 12).
15. Tempo e modo? Introduzido por qual palavra?
Imperfeito do subjuntivo, introduzido por cum.
16. Função de Hannibal?
Sujeito de cerneret.
17. Vix, dificilmente, tem um sentido negativo. Em uma construção assim, qual seria o pronome
para significar algo, alguém e qual o adjetivo? (Provavelmente ninguém sabe.)
Quisquam, ullus.
18. Função?
Acusativo singular, objeto do verbo, sujeito ou predicado do infinitivo.
19. Spes, como spero, indica uma atividade mental. Devemos seguramente procurar algo mais
para completar seu significado, o complemento de spes. Qual será o caso:
(a) Se a palavra que completa spes for um substantivo?
Genitivo objetivo.
(b) Se for um verbo?
Genitivo objetivo do gerúndio ou do gerundivo com substantivo, ou infinitivo futuro.
20. Qual o sujeito?
Um pronome retomando Hannibal.
21. Classe gramatical e significado mais simples?
Advérbio, e significa temerariamente.
22. Tendo em mente que, segundo o costume romano, as palavras eram colocadas antes
daquelas que modificavam, e não depois, que você acha de temere?
Que modifica o complemento esperado de spem, que, por conseguinte, é um verbo.
23. Introduz provavelmente o quê?
Outro advérbio relativo a temere.
24. Escreva um advérbio que signifique de modo descuidado.
Improvide.
25. Escreva o neutro singular, nominativo ou acusativo, que signifique qualquer coisa (em uma
palavra).
Quicquam.
26. Em que caso está esta palavra e com qual verbo está associada?
Acusativo, associada com um verbo que deve depender de spem.
27. Caso e número sem referência ao contexto?
Nominativo ou acusativo plural.
28. Caso com referência ao contexto? E como o sabe?
Acusativo, pois habebat está no singular.
29 . Significado deste acusativo?
Consules é sujeito, objeto ou predicado de um infinitivo.
30. Relação entre quicquam e consules?
Um é objeto e o outro é sujeito do infinitivo.
31. Complete a frase usando um verbo que signifique fazer?
Acturos com ou sem esse.
32. Escreva, no melhor inglês que puder, uma tradução para a frase.

Continuo falando com meus alunos: “Agora, vocês devem memorizar essa frase e estar
preparados para dizê-la fluentemente em latim em nossa próxima aula. Será desse modo que
vocês memorizarão todos os trechos que usarmos neste ano, e nas provas de cada período letivo
se lhes pedirá que escrevam uma dessas passagens, sempre de memória. Além disso, o mais
importante de tudo: nunca mais fiquem a pescar sujeito, predicado, etc.; mas, ao preparar suas
lições diárias, façam exatamente o que fizemos nesta manhã, mas sem traduzir nenhuma frase ou
parte de uma frase até que você tenha percorrido toda a leitura em latim e tenha dominado todo o
seu significado. Dou-lhes um pequeno texto e chamarei um ou dois alunos para selecionar uma
frase, passar por ela rapidamente em latim, palavra por palavra, como acabamos de fazer, e dizer-
nos como ela deve ser trabalhada. Ao preparar sua lição, a fim de garantir que seus olhos não vão
se desviar do caminho e tentar avançar, cortem um pedaço de cartolina flexível ou, enquanto
vocês ainda não têm cartolina, um pedaço de um papel mais firme que tenha em comprimento
aproximadamente o dobro da largura do seu texto impresso e entre cinco e oito centímetros de
largura. Corte longitudinalmente uma tira da parte superior até a metade do comprimento que
seja larga o suficiente para corresponder exatamente a uma linha do seu texto, incluindo o
espaço.[5] Use esse pedaço de papel de forma a expor somente uma palavra de cada vez bem
como, claro, todas as palavras precedentes; ou seja, ao pensar em palavra por palavra, enquanto
empurram o papel, vocês verão constantemente toda a frase percorrida até aquele momento sem
que possam olhar adiante.”
No encontro seguinte, a turma, assim preparada, lê em voz alta de acordo com o descrito, e
diversos alunos tentam mostrar exatamente qual é o processo mental que se deve seguir para
abordar as orações da leitura. Dois encontros depois, e assim ao longo de todo o primeiro ano,
com os livros fechados, o instrutor lê a leitura de revisão em voz alta com a máxima eficiência
que lhe é possível, uma frase de cada vez, e chama os alunos um a um para a tradução. [6] Como
forma de preparação para esse exercício, os alunos são encorajados a ler a revisão em voz alta
por diversas vezes em seus próprios aposentos, fazendo o máximo possível de justiça a seu autor.
Em cada exercício durante o ano, exceto no exercício especial da semana, diversas orações,
preparadas pelo instrutor e baseadas no texto da leitura daquele momento, são distribuídas aos
alunos para que sejam escritas no quadro, tanto em inglês como em latim, ao passo que o restante
da turma trabalha na tradução da revisão enquanto o professor a lê. Quando o trabalho da revisão
estiver terminado, essas orações latinas no quadro passarão por uma análise crítica da sala. Eu
toco em um defeito muito sério da maior parte de nossas escolas preparatórias quando digo que,
do começo ao fim, não deveria haver em hipótese nenhuma recitação em uma língua estrangeira
desvinculada da atividade de tradução escrita ou oral naquela língua.
Para o exercício especial da semana, mencionado acima, pode ser que não haja uma preparação
considerável, que ultrapasse a confiança incessante depositada no trabalho diário. Assim, o
tempo que sobra é usado para a preparação de uma tradução formal escrita de um trecho em
inglês baseado no latim lido recentemente. (Veremos que não se usa nenhum manual de
redação). O exercício entregue pelos alunos é posteriormente analisado e devolvido no encontro
seguinte com as anotações de todos os erros.
A escrita da oração latina no quadro, palavra por palavra, durante o exercício especial da semana,
descrito acima, dá lugar em poucas semanas a um ditado equivalente, lido uma palavra de cada
vez, que deve ser escrito no papel pelo aluno, e as perguntas são feitas, evidentemente, como
antes. O exercício passa por mudanças constantes devido à retirada de perguntas com as quais o
aluno já se familiarizou e ao acréscimo de perguntas que englobam novos princípios.
Entrementes, o exame dos trabalhos escritos mostra, semana após semana, o ponto exato da
dificuldade do aluno. Em pouco tempo, todas as estruturas que constantemente aparecem se
tornam familiares, como temas práticos e ativos. Depois (e este momento surge em alguma época
perto do fim do primeiro trimestre), deixo completamente de escrever o latim e apresento meu
trecho (que agora pode ter um tamanho respeitável) oralmente, ainda fazendo ocasionalmente
algumas perguntas, que são respondidas por escrito, em pontos perigosos ou instrutivos. Depois
que todo o trecho foi apresentado dessa forma, pega-se novamente uma oração de cada vez e os
alunos produzem uma tradução por escrito. Os trechos são geralmente escolhidos do livro que a
turma está a ler e não se encontram muito à frente do ponto alcançado nas outras aulas da
semana. Procura-se sempre selecionar um trecho que contenha um encerramento dramático ou
impressionante. Toda semana, como já foi dito, o exercício inteiro da semana anterior é
memorizado e repetido por vários alunos, tendo-se grande atenção na transmissão eficiente do
significado, que é feito: pela reunião, assim como em todas as línguas faladas, de um conjunto de
palavras que formam um grupo na frase inteira; pela reflexão cuidadosa, na apresentação oral,
das palavras que a exigem, etc., etc. Por todo esse tempo, os alunos: adquirem um conhecimento
ativo de sintaxe, vista da verdadeira perspectiva para os primeiros propósitos do trabalho
acadêmico, ou seja, como um mecanismo para transmitir significado de um intelecto a outro;
aprendem a colocar em prática o conhecimento de sintaxe da forma mais econômica; ganham
familiaridade com os truques romanos relacionados à ordem das palavras; e armazenam um
vocabulário em constante expansão.[7] Durante todo o tempo, a fim de ter sempre em vista a ideia
de que o objetivo da coisa toda é aprender a ler em latim, aplicam-se testes esporádicos de
tradução de novos trechos de um texto, ou de outro documento impresso, ao longo do período
letivo (como deve sê-lo, certamente, em qualquer sistema). No final de cada período letivo, o
primeiro exercício da prova final é uma tradução pela escuta; o segundo, uma tradução à
primeira vista; o terceiro, uma tradução à primeira vista do inglês para o latim; o quarto, a escrita
de um dos trechos memorizados durante aquele período letivo; e somente quando isso for feito, o
aluno segue para um exercício de tradução e comentário das passagens lidas ao longo do período
letivo. Ademais, a maior parte das questões gramaticais do trabalho são organizadas não de
acordo com os trechos lidos durante o período letivo, e sim de acordo com os trechos
apresentados pela primeira vez nas provas, isto é, os trechos que devem ser traduzidos pela
escuta e à primeira vista.
No segundo ano, mantém-se constantemente diante dos alunos o objetivo de aperfeiçoar a
capacidade de ler em latim e, de quando em quando, aplicam-se durante o período letivo provas
escritas de leitura à primeira vista, e o primeiro exercício da prova final do período letivo é
sempre uma tradução à primeira vista. Um complemento adequado a isso é alguma disciplina
eletiva de fala e escrita em latim. No segundo e no terceiro período do segundo ano, que são
dedicados a Horácio, pode-se ler grande quantidade de material com uma boa dose de
memorização; e a abordagem pode ser quase toda literária. Assim seremos conduzidos pelo
segundo ano até o início dos trabalhos com as disciplinas eletivas empreendidos em conjunto
pelas turmas do penúltimo e do último ano. Aqui se encerra a tradução da leitura diária, exceto
nos raros casos em que o significado de um trecho difícil não pode ser dado pela explicação da
estrutura gramatical ou pela adaptação do trecho a outra forma de latim.[8] As traduções são
escritas em exercícios esporádicos aplicados ad hoc durante o período letivo e sempre fazem
parte da prova final, de modo que todos os alunos se sintam obrigados a compreender seu autor.
E os alunos são estimulados a não fazer nada em inglês na preparação para suas leituras diárias
ou para a prova final, mas a preparar-se para ler em latim como literatura, representando o autor
com a máxima competência possível.
Em toda minha prática docente, dois exercícios se destacam dos demais por me darem grande
satisfação devido ao interesse e ao desempenho intelectual de meus alunos: primeiramente, os
exercícios com os calouros que descrevi e que são aplicados por mim semanalmente; em
segundo lugar, um exercício como o que eu apliquei a uma turma de eletiva recentemente,
quando, ao fim de um período letivo dedicado a Plauto, li uma nova peça ininterruptamente em
latim (os alunos me seguiam com seus textos), sem tradução e com pouquíssimos comentários,
na velocidade aproximada com que se leria uma nova peça de Shakespeare de uma forma
semelhante, e senti que meu público interagia – mesmo numa risada inesperada que nos deteve
por algum momento – com praticamente tudo em nosso autor que teria sido inteligível, sem
explicações especiais, em uma tradução inglesa.
Por fim, se vocês me perguntarem se o método que estou a descrever não toma muito tempo,
responderei que a quantidade de latim lido no primeiro período letivo é muito menor do que no
modo corrente, mas que a habilidade de leitura aumenta rapidamente e que a quantidade total
lida no primeiro ano é de certa forma maior do que no sistema comum, consideravelmente maior
no segundo ano e, nos anos das disciplinas eletivas, absolutamente maiores; isso sem falar da
compreensão mais justa do original, do sentimento de maior intimidade com ele e da satisfação
muito mais viva na leitura; e o aluno que segue esse método adquire tudo isso. Mas há mais uma
coisa por dizer sobre esse tipo de trabalho, esse treinamento para fazer o aluno ler em latim com
rapidez. Isso não é, de forma alguma, responsabilidade da universidade. Nas universidades, os
rapazes não deveriam aprender a ler o latim, mas deveriam lê-lo. Deveria ser a minha
responsabilidade fazê-los ter familiaridade com o corpus da literatura, fazê-los conhecê-lo, em
todo o caso, e amá-lo, se possível. Mas o dever de prepará-los a isso, ensinando-os a ler o latim
intermediário com facilidade e fluidez, não é do professor universitário, mas das escolas sob a
responsabilidade dos senhores. Creio firmemente que a aplicação, desde o primeiro dia de leitura
de uma frase romana de uma só palavra, do método descrito aqui faria, sem que se acrescentasse
um único dia ao tempo dedicado à preparação para a universidade, com que o jovem fosse capaz,
no início de seu primeiro ano na universidade, de ler em latim com mais facilidade e fluidez do
que meus alunos no final desse mesmo primeiro ano – sem mencionar o enorme prazer que
teriam em realizar suas atividades. Ademais, não faço esse juízo com base somente em minha
experiência de professor universitário, pois esse mesmo método de ensino é aplicado pelos meus
alunos a alunos do Ensino Médio, de habilidade variada, na preparação para a universidade e
com resultados que confirmam integralmente a minha tese. E os estudantes do Ensino Médio não
são os únicos que ganham com isso. O próprio professor se surpreenderá ao ver como o seu
prazer com o trabalho será maior; e, se mantiver o hábito de ler literatura latina, como certamente
se esforçam todos os professores em mantê-lo, surpreender-se-á quando perceber que sua fluidez
aumentou. O método em si não lhe será difícil de aprender; pois no próprio ato de preparar os
trabalhos para as provas desse tipo, ou, na pior das hipóteses, no próprio ato de conduzir
exercícios orais sem preparação, o professor terá em um curto espaço de tempo ensinado a si
mesmo toda a arte.
SUPLEMENTO

Ao discurso precedente – longo, e ainda assim bastante breve – gostaria de acrescentar duas
coisas: modelos adicionais de trabalhos realmente usados por mim com uma turma de calouros e
sugestões para a aplicação do método nas escolas preparatórias.
Neste momento, gostaria de aconselhar ao leitor fatigado, se sentir confiança no método, a pôr
este opúsculo de lado e fazer ele próprio a experiência com uma turma, retornando à leitura
quando se sentir interessado em sugestões adicionais quanto aos detalhes. Em relação ao leitor
fatigado que não sentir confiança no método, certamente deixará este opúsculo de lado sem que
seja preciso admoestá-lo a isso.

MODELOS DE ATIVIDADES

Ao dar, desta forma, detalhes do sistema com que conduzo meu trabalho, não me sinto obrigado
a elaborar uma apologia. Quem propõe um método deve ter uma base muito sólida para sua
proposta. Essa base deve ser uma experiência da eficiência daquilo que recomenda; e essa
experiência deve ser dada com a máxima clareza e precisão. Com efeito, deseja-se que os
professores de determinada disciplina por todo o país, quer atuem em faculdades, quer atuem em
escolas, possam ver a si mesmos como um só corpo com um propósito comum, e que trocas
constantes de experiência e opinião possam transitar entre eles, tanto em relação à pesquisa
quanto em relação à pedagogia.
È preciso lembrar que os documentos impressos abaixo foram usados no início do primeiro ano
da faculdade com alunos que haviam sido preparados para o curso superior com base em um
sistema familiar e absolutamente não romano. Se tivessem sido preparados pelo método correto,
não se proporiam nem dez por cento das questões feitas aqui e o exercício de tradução pela
escuta seria um assunto rápido e atrativo.
Esses trabalhos foram dados aos calouros em sequência, semana após semana, no outono de
1885: nesse tempo as atividades de outras leituras da semana eram feitas com base em Tito
Lívio. O objetivo constante – e a turma deve ser informada dele – era encontrar para esses
trabalhos, entregues semanalmente, trechos que exigissem deles uma habilidade prática de lidar
com construções debatidas em outros exercícios da semana, de modo que o progresso deles fosse
de aquisição constante sem qualquer tipo de perda: foi-lhes prometido que dessa forma
possuiriam em pouco tempo familiaridade imediata e desimpedida com todas as estruturas mais
recorrentes da língua. Disse-lhes também que, como nesses exercícios não daria a eles a tradução
do significado de nenhuma palavra anteriormente vista, eles tinham um motivo muito forte para
construir por si mesmos um vocabulário pela memorização de cada palavra latina que aparecesse
nas atividades diárias, e que tinham um motivo muito forte para prestar o máximo de atenção,
tanto antes como depois das outras leituras da semana, em todas as explicações de uma ou outra
palavra, seja isolada seja comparada com outras que com ela tivessem relação no significado (por
exemplo, alius em comparação com alter e ceteri) que poderiam ser-lhes apresentadas da mesma
forma nas leituras do dia a dia. E não fiquei satisfeito com isso; pois, a fim de que não houvesse
desvio de percurso, preparei um programa parcial de pontos definíveis nas atividades ao longo
do período letivo, e uma cópia foi adquirida por todos os alunos da turma diretamente da gráfica
que a imprimiu.
No início do ano letivo, as atividades da lição antecipada eram feitas em grande parte em sala de
aula, docente e discentes trabalhando juntos. Inferir-se-á com acerto disso que a classe progredia
lentamente no início. Eu acredito piamente no valor da leitura de grandes quantidades de material
dos clássicos; na verdade, ela é, no presente momento, meu objetivo pessoal e imprescindível;
mas também creio no que chamam “longo prazo”, e “em longo prazo” somente um sujeito
educado de modo sólido chega muito longe. Na instrução preliminar é necessário em primeiro
lugar investir bastante tempo examinando cuidadosamente, por vezes com considerável dose de
sofrimento para o futuro atleta, uma turma de novos alunos: que foram cuidadosamente
ensinados a distorcer e estraçalhar a oração latina; que certamente não conseguiram adquirir os
hábitos de alerta e vigilância do pensamento e da suspensão do juízo ao qual o método recebido,
com a sua impaciência resultante do “fazer sentido”, é prática e fortemente oposto; cujo
conhecimento de sintaxe é do tipo retorcido, inútil para quase tudo, exceto “fazer análise
sintática” de forma mais ou menos mecânica e ineficaz, depois de uma frase inteira ter sido
remexida, mas de nenhuma utilidade para a interpretação atual da sintaxe feita palavra a palavra
in situ conforme a frase avança; e, por fim, alguns dos quais foram ensinados a pronunciar o
latim com base no método inglês, outros no continental, e outros em um ou outro daquela
enorme variedade de métodos que atualmente são passados sob o nome genérico de “romano”, e
muitos dos alunos, logicamente, acham muito difícil entender uma palavra monossílaba na
pronúncia do meu assistente ou mesmo na minha – isso para não falar das palavras dissílabas.
Até a quarta semana inclusive, o latim era escrito no quadro nos exercícios semanais, uma
palavra por vez, e as perguntas eram feitas, como o indicado pelas notas nos trabalhos dados
abaixo, em pontos variados conforme a frase avançava. Por diversas semanas depois daquele
período, cada aluno escrevia a frase latina, uma palavra de cada vez, conforme ditava o instrutor,
e as perguntas eram organizadas e respondidas como antes. Depois disso, a escrita do latim foi
proibida e os trechos usados eram interpretados somente pela escuta da leitura do instrutor.
Na primeira entrevista, a turma trabalhou, conforme foi posto no quadro, uma palavra de cada
vez, com a frase de Tito Lívio em I.1, 5.
Ibi egressi Troiani, ut quibus ab immenso prope errore nihil praeter arma et naves
superesset, cum praedam ex agris agerent, Latinus rex Aboriginesque, qui tum ea tenebant
loca, ad arcendam vim advenarum armati ex urbe atque agris concurrunt.
Quando chegamos a ...ut quibus, eles perceberam, depois de questionados, que ut poderia ser (1)
uma conjunção, e nesse caso quibus poderia ser (a) um pronome interrogativo para introduzir
uma interrogativa indireta dependente do verbo regido por ut, ou (b) um pronome relativo
referente a algo associado com o verbo regido por ut; ou que, por outro lado, o ut pudesse ser (2)
um advérbio, e nesse caso a oração de quibus deveria ser substancialmente um adjetivo
modificando Troiani; em outras palavras, uma oração subordinada ajetiva explicativa. Nesse
encadeamento foi-lhes dito, com o objetivo de que tivessem todo o assunto memorizado para o
repertório de combinações desse tipo, que o essencial nesse caso era a oração subordinada
adjetiva em si, e que, estritamente falando, não era necessária nenhuma palavra introdutória;
entretanto, se se usasse uma, poderia ser ut, utpote ou quippe; destacou-se também que, ao passo
que havia três possibilidades para uma combinação como ut quibus, existia somente uma
possibilidade para uma combinação como utpote quibus ou quippe quibus.
Quando chegamos a superesset, destacou-se, contra o costume prático de raciocínio de quase
toda a sala, que, como em latim a prática comum era colocar uma frase ou oração modificadora
antes da coisa modificada, era possível que a oração com quibus, se viesse a ser uma oração
subordinada adjetiva, estivesse relacionada não com egressi, mas com algo que ainda
esperávamos. (Esse algo veio a ser cum...agerent – a coisa natural que fazem homens
empobrecidos).
Quando chegamos a ...cum praedam, nesta altura era certo que cum era uma conjunção,
destacou-se, embora novamente contra as impressões da turma, que Troiani era o sujeito do
verbo introduzido por cum, pois os romanos gostavam de tirar uma palavra ou frase chamativa
pertencente a uma oração subordinada adverbial temporal e colocá-la antes do conectivo.[9]
O trecho escolhido para o primeiro exercício escrito se mostrou um bocado difícil para o
raciocínio na parte et cui, embora tivesse indubitável e considerável utilidade na exposição para a
turma de uma frase cujo significado alguns deles – apesar de conhecerem o significado de cada
palavra e de serem capazes de “analisá-la sintaticamente” do começo ao fim se lhes fosse
traduzida – não conseguiriam compreender devido à ausência de um conhecimento funcional das
construções envolvidas.

Primeiro Exercício (Tito Lívio I.34, 7)

[Tanaquil está pressionando Lucumo, que mora em Tarquinii, dizendo que ele teria mais
esperança de crescimento em uma nova cidade e ressalta que Roma tem vantagens especiais.]

Facile1 persuadet2 3 ut4 5 cupido6 7 honorum et8 9 cui10 11 Tarquinii12


materna13 14 tantum15 16 patria _______17 18 19; sublatis20 itaque
rebus21 22 commigrant23 ________24.

1. De que classe gramatical pode ser? De qual caso e gênero?


Adjetivo, neutro, nominativo ou acusativo singular; ou advérbio.
2. De que modo a pessoa persuadida, se houver alguma, será expressa?
Pelo dativo.
3. De que modo será expresso aquilo a que a pessoa é persuadida, se for (a) um pronome?

(b) uma ideia verbal?


(a) Pelo acusativo.
(b) Pelo infinitivo, se houver uma afirmação de crença, etc.; por uma oração subordinada
adverbial final, se for um ato que se deseja trazer à tona.
4. O suspense em torno de facile está provavelmente resolvido agora?
O autor quis que fosse um advérbio modificando persuadet.
5. Que construções provavelmente seguirão ut, se for:
(a) uma conjunção?
(b) um advérbio?
(a) Uma oração subordinada adverbial final
(b) Um substantivo (aposto), adjetivo ou oração subordinada adjetiva pertencente ao sujeito
ou objeto de persuadet, portanto, no nominativo ou no dativo.
6. Pode ser de qual classe gramatical e de qual caso? Em que construção?
Substantivo, nominativo, sujeito da oração subordinada adverbial final introduzida pela
conjunção ut; ou adjetivo, dativo, concordando com o objeto de persuadet e introduzido pelo
advérbio ut.
7. Precisa de algo para completar o significado? Se sim, de quê?
De um genitivo objetivo.
8. Quais são os três usos da palavra et?
(1) Ligação entre duas palavras = e; (2) como o primeiro dos dois et = tanto...quanto; ou (3)
ênfase de uma única palavra = até, mesmo, também.
9. Que usos o et pode ter, em cada caso, neste trecho?
Ele pode ligar cupido ou honorum a algo que ainda está por vir; ou pode ser o primeiro
dos et; ou pode enfatizar uma palavra ou frase que está por vir.
10. Qual é agora o provável significado de et? Qual é sua função? Que luz ele lança sobre
cupido? Marque a quantidade do i na em cupido.
E; liga a sentença com cui a cupĭdo, que é um adjetivo.
11. Se a suposição estiver correta, a que classe gramatical a oração de cui será equivalente? Por
que modo esse significado será expresso?
Um adjetivo; expresso por uma subordinada adjetiva; o modo será o subjuntivo.
12. O nome da cidade está no nominativo plural? Quais são as três possibilidades de construção?
Sujeito, predicadtivo ou aposto com um ou outro.
13. Classe gramatical e casos possíveis?
Adjetivo; feminino no nominativo singular, no ablativo singular; ou neutro no nominativo
ou no acusativo plural.
14. Por que está colocado na frente do substantivo?
Por questão de ênfase.
15. Possíveis classes gramaticais e significados?
Ajetivo, significando tão grande; ou advérbio, significando até esse ponto, ou até esse
ponto e não mais, ou seja, somente.
16. No último sentido, quais são os seus sinônimos?
Solum e modo.
17. De que classe gramatical era tantum e o que modificava?
Advérbio, modificando materna.
18. Provável relação entre patria e Tarquinii?
Tarquinii é provavelmente o sujeito do verbo da oração com cui e patria é o predicativo.
19. Escreva o verbo.
Esset.
20. Forma e casos?
Particípio, dativo ou ablativo plural.
21. Casos possíveis?
Dativo ou ablativo.
22. Construção provável?
Ablativo absoluto com sublatis.
23. O lugar para onde vão é Roma. Complete a frase de duas formas: em uma, sue urbs; na
outra, Roma.
Ad urbem; Romam.
24. Traduza o trecho.

Segundo Exercício (Tito Lívio I. 9, 1)

[Rômulo fechou um grande espaço com suas fortificações e reuniu uma multidão de refugiados
em sua nova cidade]

Iam res1 Romana2 adeo3 erat4 5 valida, ut cuilibet6 7 finitimarum8


civitatum bello9 10 11 par12 13 ________; sed penuria14 15 mulierum
hominis aetatem16 duratura17 18 magnitudo19 20 _______, quippe21
quibus22 23 24 25 26 nec27 domi28 spes29 prolis nec cum finitimis
conubia30 __________31.
1. Casos possíveis?
Nominativo singular; nominativo ou acusativo plural.
2. Provável construção e caso de res?
Nominativo, sujeito do verbo principal.
3. Significado mais comum de adeo? Como deve ser completado seu significado se for
completado?
A tal ponto; por uma oração consecutiva introduzida por ut.
4. Significado do tempo verbal?
Estado da questão até o ponto alcançado pela história.
5. Quais são as duas classes gramaticais aptas a completar a frase?
Adjetivo e particípio.
6. Classe gramatical? Que outra palavra é substancialmente equivalente?
Pronome indefinido; cuivis.
7. Que devemos pensar do significado do caso?
Como algum aspecto do objeto indireto.
8. Sugere o início de qual construção?
Genitivo partitivo.
9. Casos e construções possíveis?
Dativo de algum aspecto do objeto indireto ou ablativo de instrumento.
10. É possível que cuilibet esteja concordando com bello? Por quê?
Não, pois o genitivo partitivo mostra que cuilibet se refere a civitati.
11. Portanto, é mais provável que bello seja dativo ou ablativo?
Ablativo.
12. Que suspense sobre o que quis dizer Tito Lívio está resolvido agora?
Cuilibet é o dativo do objeto indireto relacionado com a qualidade de par, e bello é o
ablativo de respeito para par.
13. Escreva o predicado com sum.
Esset.
14. Casos possíveis?
Nominativo ou ablativo.
15. Se a ideia estiver completa, por qual caso estará completa?
Genitivo objetivo.
16. Possíveis significados do caso?
Duração do tempo; aposto; objeto de um verbo; sujeito ou predicado de um infinitivo.
17. Provável significado do caso de aetatem?
Duração do tempo.
18. Quais as duas possibilidades para a regência de duratura?
Concorda (1) com penuria ou (2) com algo a que ainda não chegamos.
19. Qual é agora nossa impressão sobre o caso de penuria e o significado de seu caso?
É um ablativo que expressa a causa de duratura.
20. Escreva o predicado com sum, tomando cuidado na escolha do tempo verbal.
Erat.
21. Pense em quippe como um advérbio significando na verdade, com efeito.
22. Qual é a provável natureza da oração com quibus e qual sua construção?
Adjetiva, ou seja, uma oração subordinada adjetiva no subjuntivo.
23. Qual deve ser a relação subjacente entre a condição das coisas que descobriremos expressas
na oração com quibus e a condição das coisas expressa na oração principal?
Causal.
24. Qual é o antecedente de quibus?
As pessoas às quais a palavra magnitudo está associada, os habitantes da cidade.
25. Casos possíveis?
Dativo ou ablativo.
26. Quibus indica pessoas. Como isso estreita as possibilidades de uma construção com
ablativo?
Só pode ser ablativo absoluto; ou ablativo dependente de um comparativo ou de uma
palavra como fretus ou contentus; ou ablativo de origem com alguma palavra como genitus,
ortus, natus.
27. Qual é a certeza que temos quanto a nec?
Que esta palavra está articulada com um futuro nec ou et.
28. Construção?
Locativo.
29. Que deve seguir?
Genitivo objetivo ou futuro do indicativo.
30. Complete a frase escrevendo a forma correta do verbo sum.
Essent.
31. Traduza.

Terceiro Exercício (Tito Lívio I.24, 2)

[Os reis de Alba e de Roma propuseram que a guerra entre os dois povos deveria ser decida por
uma luta entre os Horácios e os Curiácios]
Nihil recusatur. Tempus et locus convenit. Priusquam1 2

dimicarent, foedus ictum3 inter Romanos et Albanus est his4 5


legibus6, ut cuius7 8 populi cives9 eo certamine vicissent10 is alteri11
12
populo cum bona pace13 _________14.
1. Que ideias uma pessoa pode ter em mente quando escreve antequam ou priusquam? Por
qual modo verbal essas ideias serão respectivamente representadas?
Ela pode querer dar a ideia de uma ação antecipada – ou seja, observada previamente do
tempo da ação da oração principal – por alguma pessoa mencionada naquela oração, e expressará
isso pelo modo da ideia, o subjuntivo. Ou pode querer afirmar a ocorrência real de um evento
como um horizonte além do qual o evento principal ocorreu, e expressará isso pelo modo do fato,
o indicativo.
2. À luz da situação, qual das duas ideias é mais provável que Tito Lívio expressará?
A primeira.
3. Há alguma certeza quando ao caso de foedus ou à classe gramatical de ictum?
Não.
4. Que se deve manter em mente como possibilidades para todos os pronomes demonstrativos,
como is, hic, ita, etc.?
Que se referem a algo já mencionado ou a algo por mencionar.
5. Qual é o caso aqui?
O segundo.
6. Que construção você acha que está por vir?
Uma oração final que dirá o que eram his legibus.
7. Em geral, quais são as duas possibilidades que descobrimos quando se encontra a combinação
de ut e o relativo?
(1) Que ut é a conjunção e a oração com qui aguarda um antecedente que será dado
posteriormente na oração com ut; ou (2) que ut é um advérbio, o qui se refere a algo já dito e a
oração relativa forma uma oração adjetiva que mantém uma relação causal com a oração
principal.
8. Mantendo em mente his legibus, qual dos dois significados possíveis da combinação ut cuius
você supõe que estava na mente de Tito Lívio neste caso em particular?
O primeiro.
9. Provável significado do caso de populi?
Possessivo que depende de cives.
10. Significado do tempo verbal?
Futuro perfeito de uma perspectiva no passado.
11. Provável natureza da combinação.
Sujeito e objeto indireto.
12.Como se diferencia de alius quanto ao significado?
Refere-se a outro entre dois, enquanto alius significa outro entre qualquer número.
13. Deduza, se possível, qual é o verbo final e, em todo o caso, diga o modo e o tempo.
Imperfeito do subjuntivo; imperaret (é mais provável que se escreva imperaret do que o
frequentativo de Tito Lívio imperitaret; mas a palavra pode ser admitida).
14. Traduza.

Quarto Exercício (Tito Lívio XXII. 38, 1)


[O ano seguinte da derrota no lago Trasimeno. Insatisfação com a política de Fábio. O povo
elegeu um cônsul, Varrão; a nobreza, outro, Emílio Paulo. Os dois estão prestes a marchar para a
campanha militar do verão.]

Contiones1 priusquam2 ab urbe signa moverentur3 consulis4


Varronis multae ac feroces fuere, denuntiantis5 6 bellum7 8 9
arcessitum10 in11 Italiam ab nobilibus mansurumque12 in13
visceribus reipublicae si14 plures Fabios imperatores haberet, se15
quo die16 hostem vidisset17 perfecturum.18 19
1. Significados possíveis?
Reunião e discurso feito antes de uma reunião.
2. Que significados podem vir depois? Indicados por quais construções?
Ação antecipada no tempo em relação a uma ação principal e expressa pelo subjuntivo; ou
evento real, atrás do qual se encontra a ação principal, expresso pelo indicativo.
3. Qual era a nuance especial de significado em priusquam...moverentur?
Que a contiones foi tida, ou feita, em antecipação à marcha esperada.
4. Que está claro agora quanto ao significado de contiones?
Que significa discurso, arenga.
5. À qual palavra se liga?
A consulis.
6. Denuntiare significa fazer um anúncio. Como o objeto será expresso se for
(a) um substantivo ou pronome?
(b) um verbo que traz a declaração de um fato?
(c) um verbo que traz uma ação desejada?
(a) Acusativo.
(b) Infinitivo.
(c) Oração subordinada adverbial final.
7. Que construção lhe ocorre de imediato para bellum?
Objeto de denuntiantis.
8. Há alguma certeza de que era isso que Tito Lívio queria dizer?
Não.
9. Que mais Tito Lívio podia ter em mente?
Um sujeito ou um objeto para um infinitivo que depende de denuntiantis.
10. Quais as possibilidades para arcessitum?
Particípio concordando com bellum ou de parte de um infinitivo perfeito (com esse por vir)
ou futuro (com iri por vir), tendo bellum por sujeito.
11. Que caso você espera encontrar na sequência e por quê?
Acusativo, pois arcessitum envolve a ideia de movimento.
12. Qual é a única coisa que você sabe, com certeza, acerca de mansurum?
Que sua construção é a mesma de arcessitum.
13. Que caso você espera encontrar na sequência e por quê?
Ablativo, pois mansurum envolve a ideia de repouso.
14. Que indicação você tem da provável natureza da condição e como será expressa?
Parece que é a condição para mansurum. Nesse caso, será um futuro ou futuro a partir de
uma perspectiva do passado, expresso pelo chamado imperfeito ou mais-que-perfeito do
subjuntivo.
15. Provável construção de bellum e arcessitum? Em que se baseia sua opinião?
Se é acusativo ou ablativo. Não pode ser ablativo absoluto, visto que se refere ao sujeito da
frase; e provavelmente não é o ablativo de origem, pois é improvável que encontremos uma
palavra que signifique nascido aqui. Nesse caso, bellum é sujeito ou objeto de um infinitivo
ativo que ainda veremos e do qual se é sujeito ou objeto. Arcessitum, que é passivo, é, portanto,
não um infinitivo, mas um particípio; e, além disso, mansurum, que está na mesma estrutura
com arcessitum, não é transitivo.
16. Onde está o antecedente de quo die e que você sabe sobre ele?
Ainda está por vir e está, de alguma forma, ligado com o infinitivo mais à frente, o qual
notamos ser dependente de denuntiantis.
17. Significado do tempo verbal e do modo?
Futuro perfeito da perspectiva do passado no discurso indireto.
18. Que construções suspensas estão resolvidas agora?
Perfecturum é infinitivo; se é seu sujeito, bellum é seu objeto, ao qual particípios
arcessitum e mansurum estão ligados, tendo o último uma condição futura dependente dele.
19. Traduza.

Quinto Exercício (Tito Lívio XXI. 53, 1)

[O trecho usado aqui foi empregado na alocução no início do opúsculo. É apresentado aqui
novamente no seu lugar entre o presente grupo de atividades, em parte, com a intenção de
mostrar que o minuto de perguntas com que um professor de calouros destreinados deve começar
pode dar lugar, em pouco tempo, a um movimento mais rápido depois que for estabelecido o
hábito da observação e da predisposição em manter a mente em suspense.]

Hannibal cum quid1 optimum foret hoste cerneret, vix2 ullam


spem3 habebat temere4 5 atque improvide6 _______ consules7 8
________; cum alterius ingenium, fama9 prius deinde re10
cognitum, percitum ac ferox sciret11 __________, ferocius factum
prospero cum praedatoribus12 suis certamine crederet, adesse
gerendae rei fortunam haud diffidebat.13
1. Qual deve ser a construção do verbo da oração de quid? Por quê?
Subjuntivo da interrogativa direta do fato ou pergunta deliberativa indireta.
2. Em uma construção como essa, qual deveria ser o pronome para significar algum? Qual o
adjetivo?
Quisquam, ullus.
3. Qual seria a construção para completar (a) se nominal?[10]
(b) se verbal?
(a) Genitivo.
(b) Genitivo do gerúndio ou do gerundivo, ou infinitivo futuro.
4. Temere, a julgar pela ordem, modifica provavelmente habebat ou algo que ainda está por
vir?
A segunda opção.
5. Que você supões sobre o construção que completa spem?
Que é uma construção verbal.
6. Escreva o pronome neutro que significa algo na forma nominativa ou acusativa.
Quicquam.
7. Construção geral indicada com esta palavra? Construção de consules? Construção da
palavra que você acabou de escrever?
A construção verbal para spem é um infinitivo, sendo quicquam o sujeito e consules, o
objeto, ou vice-versa.
8. Escreva o infinitivo para fazer.
Acturos.
9. Caso?
Nominativo ou ablativo.
10. Caso de fama. Prove-o.
Ablativo, pois a frase prius deinde torna essa palavra paralela à palavra re.

11. Escreva o verbo necessário para completar a oração.


Esse.
12. Que é indicado por uma combinação como prospero cum praedatoribus?
Que a palavra cum está ligada com praedatoribus e que há um substantivo ainda por vir ao
qual a palavra prospero está associada.
13. Traduza.

Sexto Exercício (Tito Lício XXII. 40, 1)

Adversus1 ea2 oratio3 consulis haud sane laeta fuit, magis fatentis4
ea5 quae diceret vera quam facilia6 ________7 _________:
dictatori magistrum8 9 equitum intolerabilem fuisse; quid10 11
consuli adversus collegam seditiosum ac temerarium virium
atque auctoritatis12_______?13

1. Qual é a classe gramatical de adversus?


Particípio ou preposição.
2. Qual é a possibilidade para ea?
Objeto da preposição adversus ou concordando com um ablativo singular ou acusativo
plural.
3. Que você sabe agora sobre adversus e ea? Como?
Oratio é nominativo feminino, de modo que adversus não é particípio, mas preposição,
sendo ea seu objeto.
4. Construção na sequência se (a) nominal?
(b) verbal?
(a) Acusativo.
(b) Declaração infinitiva no discurso indireto.
5. Construções possíveis?
Objeto de fatentis; sujeito ou predicado de um infinitivo.
6. Escreva em latim fazer para completar a ideia de facilia?
Factu.
7. Escreva em latim qualquer coisa que ainda seja necessária para completar a frase.
Esse.
8. Significado da posição de dictatori e magistrum?
Forte contraste.
9. Provável estrutura geral da oração?
Discurso indireto no infinitivo, sendo magistrum seu sujeito e dictatori o objeto indireto do
infinitivo ou de um adjetivo no predicado.
10. Na presente construção, quais são os modos possíveis depois de quid? Com quais
significados respectivamente?
Subjuntivo da interrogativa indireta, seja deliberativa seja pedindo informação com
seriedade, ou infinitivo na pergunta retórica correspondendo praticamente a uma afirmação.[11]
11. Se seguir um genitivo partitivo, em que parte da frase notamos que provavelmente o
encontraremos?
Tão distante da palavra de que depende quanto outros aspectos do estilo o permitirem.
12. Decida, à luz do trecho todo, que tipo de oração é esta necessariamente e escreva em latim
haveria.
Fore ou futurum esse.
13. Traduza.
Aplicação do Método no Trabalho Preparatório

Nestas sugestões, será interessante fazer referência a um dos livros normalmente usados pelos
que se iniciam no latim. Tomemos, por exemplo, o livro “Primeiros passos no latim” do dr.
Leighton. A aplicação das sugestões pode, seguramente, ser feita sem dificuldades com qualquer
livro do mesmo tipo.
Em primeiro lugar, é de suma importância que o iniciante se acostume desde o princípio com os
sons da língua romana. Na lição XIII, por exemplo, o estudante, tendo-se exercitado nas orações
regina laudat, scribae portant, puellae laudant, laudas, laudamus, reginae donant, etc., não
deve abrir o livro para traduzi-las. O livro deve estar fechado e ele deve dar o significado de
regina laudat, etc. conforme o professor ditar-lhe. Traduzir regina laudat de ouvido, depois de
tê-la estudado, não está além da capacidade mental do jovem moderno. Tampouco está além de
sua capacidade, desde que haja um pouquinho de paciência da parte do professor, traduzir de
ouvido uma nova frase do mesmo tipo, por exemplo, laudo; scriba laudat; scriba donat;
scribae donant. Mas se isso é verdade, segue-se imediatamente outra verdade muito importante.
Não há, admitamo-lo, maior salto, em qualquer que seja o livro de latim para principiantes, do
que sair do absolutamente nada e ir para a primeira lição com frases em latim de uma ou duas
palavras. Se, dando esse passo, o jovem pode preparar-se com êxito para traduzir pela escuta a
lição preparada e, da mesma forma, as novas frases criadas com o mesmo vocabulário e mesma
estrutura das anteriores, logo ele pode preparar-se, à medida que progride por etapas
cuidadosamente niveladas, em quaisquer livros de uso comum, a traduzir de ouvido qualquer
latim estudado previamente e quaisquer novas frases que sejam do mesmo tipo das já vistas,
formuladas para ele pelo engenho de seu professor. Antes que o livro seja aberto por alguém
além do professor, os exercícios em sala de aula devem ser (1) a tradução pela escuta da revisão,
(2) a tradução pela escuta da lição antecipada e (3) a tradução pela escuta de novas frases do
mesmo tipo das já vistas. E ninguém ousará dizer que um jovem conduzido dessa forma por um
livro introdutório não começaria a ler César como um latinista melhor do que um que não
houvesse iniciado seus estudos assim.
Na lição XIII, como vimos, o jovem aprendeu que o sujeito de um verbo é expresso pelo
nominativo. Na lição seguinte, é-lhe dito que o objeto direto de um verbo transitivo é expresso
pelo acusativo. Por enquanto essa é a soma total de seus conhecimentos sobre o acusativo.
Obviamente, o professor estreitará seus próprios conhecimentos ao horizonte do aluno. Portanto,
o professor começará com uma frase iniciada por um acusativo, por exemplo, scribas, e
perguntará ao aluno, sem que este ouça o restante da frase, o que ele compreende do caso, tendo
em mente a relação entre escribas e o restante da frase; em suma, qual é o significado do caso.
Em seguida, o professor dará o começo de outra frase que contenha um nominativo e um
acusativo, digamos, regina scribam, e perguntará ao aluno o que os dois casos significam para
ele. O jovem responderá sujeito e objeto. Depois o professor dará algumas combinações de
sujeito e objeto, por exemplo, scriba puellam, nauta agricolam, empregando todo o
vocabulário usado na lição. Após isso, refazendo os passos, o professor dará frases completas
cujas combinações recém-usadas poderão ser tomadas como início, repetindo cada uma dessas
combinações em ligação com o maior número possível dos verbos apresentados; por exemplo,
regina scribam laudat, regina scribam vocat, regina scribam exspectat. Depois outra
combinação, por exemplo, scriba puellam, deverá ser repetida de modo similar com diversos
verbos. Em tudo isso, o latim deve ser dado de maneira deliberada[12], a fim de que o aluno
possa ser capaz de formar com facilidade suas imagens mentais conforme escuta palavra por
palavra. Ademais, ele deve ser encorajado a formar essas imagens sem pensar nas palavras em
inglês. A palavra regina deve trazer uma regina a sua visão mental em vez de trazer
primeiramente a palavra e só depois a visão mental de uma rainha.[13]
Nesses exercícios, não deve haver nenhuma tradução para o inglês (vale lembrar que o latim da
revisão e o latim da lição já foram traduzidos na escuta). Em seguida, vem um exercício como o
seguinte: “Como, em latim, você pode apresentar para minha mente uma rainha agindo sobre
alguém?” Dizendo rēgīnă. “Como pode apresentar uma garota que sofre uma ação?” Dizendo
puellam. “E um escriba?” Dizendo scribam. “Uma carta?” Dizendo epistulam. “Agora ponha
diante de mim uma rainha que pratica uma ação e uma garota que a sofre.” Rēgīna puellam.
“Um agricultor que pratica uma ação e um marinheiro que a sofre.” Agricolă nautam. Depois de
dar algumas dessas combinações: “Agora, diga-me em latim que a rainha está esperando o
escriba”; depois: “que a rainha está esperando a carta”; etc., etc. Variações de tempo verbal
também devem ser usadas. Entretanto, devo limitar-me a mostrar o método de como lidar com os
casos.
Na lição seguinte, a XVI, o aluno aprenderá um dos usos simples do genitivo. Depois ele deve
ser questionado sobre o que os casos lhe dizem em liber pueri (certamente, é necessário fazê-lo
ver que, embora pueri possa ser nominativo plural quanto à forma, não pode sê-lo aqui, pois
liber deve ser o sujeito), em magister reginae filiam, etc.; em seguida, deve ser conduzido por
vários exercícios similares aos sugeridos em conexão com a lição anterior. Ainda na lição XVI,
também aprenderá o aposto, que será retomado dentro de pouco tempo. Na lição XVII, aprenderá
o modo de expressar o objeto indireto de um verbo e deve, neste momento, ser perguntado sobre
o significado dos casos em combinações como agricolae nautis viam, nauta agricolis viam,
scriba puero librum, scriba reginae libros, agricola puero scribae viam, etc.; em seguida,
devem ser-lhe dadas sentenças inteiras bem como combinações e frases em inglês para tradução
em latim, conforme descrito acima.
Desse modo, as estruturas são ensinadas uma após outra, dando-se somente o significado mais
simples de cada caso quando este for visto pela primeira vez. Posteriormente, são ensinados
outros usos desses mesmos casos e a certeza que o aluno antes sentia em relação à intenção do
orador quando ouvia determinado caso (digamos, o acusativo) agora se esvai. Logo no capítulo
XVI, ele aprendeu, conforme o vimos, que “um substantivo usado para descrever outro
substantivo ou um pronome, e significando a mesma coisa, é colocado no mesmo caso.” Neste
momento, por conseguinte, ele reconhece que há uma dupla possibilidade para determinado
acusativo. Supondo que peguemos uma frase iniciada com, digamos, legatum; a palavra no
acusativo pode vir a ser duas coisas, a saber, o objeto do verbo ou o aposto do objeto do verbo.
Essas duas possibilidades, e somente elas, devem, em algumas semanas, irradiar-se pela mente
do iniciante quando vir ou ouvir um acusativo. Contudo, futuramente (lições LI e LIII), ele
descobrirá que a natureza de certos verbos os faz reger dois objetos e lhes serão apresentados
exemplos. Neste momento, um acusativo tem para ele três possibilidades: pode ser, segundo a
intenção de quem fala, objeto, pode ser segundo objeto ou poder ser aposto; enquanto o sentido
das palavras é tal que exclui qualquer possibilidade de ser a última dessas opções, por exemplo,
em uma frase começada por me fraudem, nota-se imediatamente que o significado da
combinação, por sua vez, tem me como primeiro objeto e fraudem como o segundo de um dos
verbos que regem dois objetos para completar seu sentido, por exemplo, celo. Em pouco tempo,
ele aprenderá (Lição LXI) o acusativo de duração do tempo e o de extensão do espaço, e agora
deve reconhecer ainda outra possibilidade para quaisquer acusativos como annos ou pedes, mas
não para uma palavra como Caesarem ou me. Mais tarde ainda, ele aprenderá a acrescentar ao
seu repertório o entendimento do acusativo cognato, do acusativo como sujeito de um infinitivo,
etc. O professor deixará claro para a mente do aluno que, ao passo que qualquer acusativo pode
ser objeto direto, sujeito ou predicado de um infinitivo, somente palavras de um significado
especial podem ser usadas na expressão de duração do tempo, etc., e somente palavras de outro
significado, igualmente especial, podem desempenhar o papel de acusativo cognato, etc. Seria
bom que o professor fizesse para si, conforme o livro avança, uma coleção de frases curtas que
ilustrassem todos os possíveis tipos de acusativo (já conhecidos pelo aluno) nos quais uma
palavra como Caesarem, annos, vitam pode ocorrer (e, certamente, coleções similares para
outros casos) e que passasse por uma dessas coleções com frequência, talvez diariamente, com a
sala e sem usar o inglês. Ao longo de todo esse progresso, vale notar, não se deixou nada cair no
esquecimento. A maneira descrita de olhar para todos os significados possíveis de um, digamos,
acusativo, visto ou ouvido, constitui uma revisão contínua de natureza muito perspicaz e,
ademais, de tipo muito persuasivo e insistente, que visa ao uso prático, imediato e constante.
Se esses métodos forem seguidos, o aluno, quando chegar ao final do livro, mantidos os
exercícios de tradução pela escuta e de compreensão pela escuta sem tradução, terá obtido a
competência de captar a força das estruturas com acusativo em frases curtas e simples, e isso
com correção e sem operações conscientes de raciocício. Pois a própria familiaridade com todas
as possibilidades de estruturas com acusativo para palavras de um ou outro significado o
colocará em condições de, por um lado, ESPERAR COM MENTE ABERTA a palavra ou
palavras que determinarão a intenção que o orador tinha em seu próprio pensamento (se, como
ocorre amiúde, as palavras ainda estiverem por vir); e, por outro lado, graças a uma sensibilidade
agora tornada inconsciente, APREENDER INSTINTIVAMENTE, quando aparecer a palavra ou
palavras determinantes, qual era aquela intenção; em suma, terá feito uma boa introdução na
compreensão da língua romana da forma como era entendida por ouvintes e leitores romanos.
O esquema dado aqui para o tratamento das estruturas com acusativo sugere o modo com que se
deve lidar com qualquer conjunto de construções. Acrescento alguns exemplos dos resultados
para esta ou aquela classe de palavras em alguns casos. Admito que enumeração para o ablativo,
e mesmo para o genitivo, é excessivamente ampla; mas isso é somente o equivalente a dizer que
o número de significados dos casos ablativo e genitivo que um aluno deve aprender, qualquer
que seja o método, é muito grande.
O genitivo de qualquer pronome pode vir a significar o possuidor de alguma coisa ou de alguma
ação (sendo a ação expressa por um verbo nominal), o objeto de uma ação (expressa por um
substantivo, um adjetivo ou alguns verbos de determinada lista), o todo do qual outra palavra
expressa uma parte – pode ser, por tanto, subjetivo, objetivo ou partitivo; ou ainda pode
simplesmente pertencer a algum substantivo, exatamente como um adjetivo. O genitivo de
qualquer substantivo (digamos, civitatis) pode vir a ser subjetivo, objetivo, partitivo ou aposto de
outro genitivo. O genitivo de um substantivo como periculi pode vir a ser aposto, subjetivo,
objetivo, partitivo ou (se for modificado por um substantivo ou particípio) qualitativo. O genitivo
de um substantivo que indica uma ação ou estado mental de natureza má pode ser aposto,
subjetivo, objetivo, incluindo a acusação de um crime ou a sentença de uma penalidade, ou pode
ser partitivo. Um genitivo da natureza de magni pode concordar com um substantivo ou
significar o valor de algo.
O dativo de qualquer palavra pode significar a pessoa ou coisa indiretamente referida em uma
ação ou estado expresso por um substantivo ou adjetivo de certo grupo de palavras. O dativo do
nome de uma pessoa (digamos, Caesari) pode ter esse significado geral ou, em um ou outro
momento especial, pode significar a pessoa referida em uma obrigação indicada por um
gerundivo (o agente) ou o possuidor de algo. O dativo de uma palavra como dolori, laudi, etc.
pode significar, de modo geral, a coisa indiretamente referida ou, num fase especial daquela
ideia, a finalidade desejada.
Já tratamos do acusativo. O vocativo pode se virar sozinho quando a forma é inequívoca.
O ablativo é um caso que pode causar pavor. De modo geral, deveria ser cortado em pedaços os
menores possíveis como os outros casos. Pode-se fazer algo procedendo das seguintes três ideias:
ponto de partida, meio e lugar (verdadeiro ablativo, instrumental e locativo), como na tabla do
dr. Leighton na página 290 e na tabela da página 254 da gramática de Allen & Greenough; mas
as melhores intenções dos gramáticos e professores ainda não tornaram o assunto fácil para os
estudantes. As sugestões dadas aqui devem ir além dessas três divisões.
Quase todos os ablativos podem ser absolutos, podem depender de um comparativo ou de uma
palavra como dignus ou contentus. Além disso, um nome próprio (digamos, Caesare) pode estar
no ablativo de origem ou pode depender de alguma palavra como genitus, embora tal forma de
expressão seja naturalmente rara na prosa lida antes da faculdade. Evidentemente tal palavra não
pode ser ablativo de meio (no sentido mais estrito), de especificação, de tempo ou de grau de
diferença. Uma palavra como die, entretanto, além das possibilidades gerais, pode indicar tempo
ou grau de diferença; uma palavra como auro, meio ou preço; uma palavra como capite,
descrição, etc. Não tentarei aqui dar uma lista exaustiva de sugestões. Em geral, apesar da
complexidade dos usos do ablativo, é menos provável que o estudante fique terrivelmente
desorientado ao lidar com esse caso na prática real do que ao lidar com o genitivo ou o acusativo.
Há um ponto de que ainda não tratamos e que é de suma importância. Quando aparece uma
forma que pode estar em dois casos, e mesmo em três ou quatro casos, o estudante não deve
permitir-se supor que sabe o caso, ainda que uma possibilidade se apresente de imediato. Por
exemplo, um aluno que leia De Bello Gallico 1, 3 e passe por ea (his rebus adducti et auctoritate
Orgetotigis permoti constituerunt ea, quae, etc.) pode facilmente supor que ea seja o objeto de
constituerunt em vez de esperar até que lhe seja dada alguma certeza pelo restante da frase,
certeza esta que mostrará que ea era o objeto não de constituerunt, mas de um infinitivo que só
aparecerá quando a oração de quae estiver terminada. Esta deve ser a orientação para o
estudante: Mantenha os olhos abertos, mas fique em estado de dúvida pelo máximo de tempo que
puder; em suma, PENSE e ESPERE.
Deve-se lidar com construções verbais de modo similar. As possibilidades depois das conjunções
em especial devem ser completamente conhecidas. Dada uma conjunção como quamquam ou
quamvis, o estudante deve ser capaz de dizer instantaneamente o que virá. Dada uma conjunção
como antequam, deve saber com exatidão quais são as duas ideias que transmite, qual delas é
possível que esteja na mente do autor e por qual modo os romanos expressavam cada uma delas.
Dada uma conjunção como ut, deve conhecer todo o leque de ideias possíveis que o autor tem
quando começa uma oração assim e por qual construção se expressa cada uma dessas ideias.
Mostrar-se-á especialmente útil colocar diante da sala todo o leque de construções verbais
capazes de ter a função de objeto ou sujeito de um verbo (orações substantivas) e perguntar aos
alunos quais e quantas delas determinado verbo ou frase pode admitir. Essas orações substantivas
são as seguintes:
Declaração indireta de um fato (infinitivo)
Pergunta indireta de um fato.
Pergunta deliberativa indireta.
Oração final.
Oração consecutiva.
Agora, apresente à turma um verbo, dicit, e pergunte quais são as possíveis ideias que o
completam e que matiz de significado uma ou outra dessas ideias indicaria para o próprio verbo
dicit. A resposta deve ser: infinitivo, se dicit significar que se faz uma declaração; subjuntivo
introduzido por uma palavra interrogativa (certamente incluindo ut), se dicit significar dar uma
resposta a uma pergunta de fato ou uma pergunta deliberativa; subjuntivo com ut ou ne, se dicit
significar dar uma direção. Sem dúvida, é impossível que dicit admita uma oração subordinada
consecutiva. Por outro lado, o significado de uma palavra como effecit é de tal natureza que pode
admitir a oração subordinada consecutiva e pode não admitir nenhuma outra; assim, a menos que
encontremos um objetivo acusativo claro, estamos certos de que, ao encontrar um effecit, um
objeto verbal introduzido por ut ou ut non deve aparecer cedo ou tarde. Um verbo como peto
pode admitir somente uma oração subordinada final, um verbo como quaero, somente uma
oração interrogativa (seja uma pergunta de fato, seja uma pergunta deliberativa), etc. É
extremamente útil olhar para essas questões deste modo particular. Se, por exemplo, a turma está
traduzindo pela escuta, em Cat. Mai. 63, a anedota que começa com quin etiam memoriae
proditum est, todos devem neste momento reconhecer de imediato que um infinitivo de
declaração é cedo ou tarde inevitável e, conhecendo o costume latino de organização da frase,
deve imediatamente associar com aquele iminente infinitivo todo a questão intermediária, cum
Athenis ludis quidam in theatrum, etc. Vê-se a mesma coisa, com um suspense muito mais
breve, na frase de César id si fieret, intellegebat magno com periculo, etc, B. G. 1, 10, 2.
A maior parte do que foi mencionado até aqui se tornará familiar para o estudante antes que
abandone o livro introdutório e inicie César. Neste momento, ele começa a ver frases mais
complexas, mas que normalmente não contêm nenhum princípio novo. O professor lhe prestará
um grande serviço ao ler em voz alta tanto as frases conhecidas como as novas de uma maneira
que lance as partes no todo e ao ensinar o aluno a fazer a mesma coisa no que já leu. Por
exemplo, em B.G. 1, 8, as palavras ea legione quam secum habebat formam uma ideia e não
devem ser dadas separadamente; as palavras militibusque qui ex provincia convenerant
formam outra, conectada, depois de uma breve pausa, com o grupo anterior; a frase qui fines
Sequanorum ab Helvetiis dividit deve ser dada em um todo único e de um modo que mostre
que se trata de um trecho de uma explicação parentética. Assim, o professor pode fazer com que
seus ouvintes sintam que essa oração de cinco linhas relativamente longa, com o verbo mantido
na última posição, é, na verdade, extremamente simples. O professor deve também chamar a
atenção para os elementos catafóricos bastante comuns em uma oração explicativa e que são
obtidos por pronomes e advérbios pronominais como, por exemplo, em id em 1, 31, 2 (non
minus se id contendere) que, como nos diz o significado de contendere, deve ser-nos explicado
posteriormente em uma oração adverbial final; como em hoc em 1, 32, 4 (respondit hoc esse
miseriorem et graviorem fortunam), que deve ser explicado posteriormente por um quo em
uma frase que contenha outro comparativo ou por uma oração com quod que contenha a
declaração de um fato; como em haec em 1, 40, 11 (haec sibi esse curae), que deve ser
explicado por uma oração final ou por um infinitivo; como em ita, que antecipa uma oração com
ut ou si, ou um infinitivo; etc., etc.
Entrementes, o professor saberá muito bem com que coisas sua turma está familiarizada e com
que coisas não está; por conseguinte, fará perguntas sobre aquelas e as continuará sobre estas.
Mas até o último dia, devem-se estabelecer exercícios de tradução pela escuta, digamos, uma vez
por semana, com perguntas metódicas acerca dos pontos críticos para a apreensão do sentido; os
próprios trechos deverão ser posteriormente memorizados. Esse é o mecanismo mais eficiente do
método, a maneira mais segura de manter os hábitos de observação e de predisposição para
esperar.
Agora, ofereço um breve sumário de sugestões no qual me dirigirei diretamente ao professor.
Faça o aluno entender desde o princípio que a língua latina fora um dia a língua diária de
homens, mulheres e crianças. Uma língua na qual as pessoas não somente escreviam livros, mas
faziam as refeições e jogavam tênis; uma língua falada e compreendida em sua modalidade oral.
Portanto, oriente-o para o objeto de associar o significado com o som da palavra, não somente
com grupos de letras numa página. Peça-lhe, conforme ele memoriza o vocabulário, que tire os
olhos da palavra impressa e repita diversas vezes em sua mente a palavra falada, de modo que,
quando a ouvir de seu professor, sentirá seu significado de imediato.
Ao longo de todo o material didático introdutório, não deixe de fazer a tradução de ouvido da
revisão e da lição antecipada; da mesma forma, faça com que o aluno, com o livro fechado, passe
as frases inglesas impressas para o latim conforme você lhas apresenta. Se você fizer isso desde
o início, quando terminar o material didático, ele será capaz de expressar uma oração de
considerável tamanho em latim, tomando-a como um todo em vez de passar uma palavra para o
latim, depois outra e assim por diante aos pedaços.
Se você tiver tempo disponível para o preparo da aula, foque na repetição. Elabore para seu uso
pessoal um grupo de frases relacionadas com a lição do livro que, através do emprego do
vocabulário já adquirido, avancem em sucessivas variações, mas com uma diferença sutil por
vez. Um exemplo simples do que quero dizer pode ser retirado das páginas 56 e 58. Nesse
aspecto – a insistência na importância da repetição – o método de Sauveur está absolutamente
correto.
Conforme o aluno aprende um uso novo depois do outro, digamos, do acusativo, ajude-o a
formar uma ideia clara e com uso prático das possibilidades de significado de um ou outro tipo
de palavra, como Caesarem, mille passuum, annum, multum.[14]
De forma semelhante, ajude-o a classificar as ideias expressas por construções verbais,
especialmente em orações subordinadas. Faça-o, por exemplo, conhecer com perfeita
familiaridade quais os dois tipos de ideias adversativas que existem na natureza das coisas e por
que modo são respectivamente expressas no latim (do período com que o aluno está trabalhando)
e com quais partículas introdutórias. Faça-o conhecer de modo seguro quais as duas ideias que se
podem ter em mente quando se usa uma construção com antequam, uma com dum e assim por
diante e como essas ideias são expressas.
Quando tiver terminado o livro introdutório, o aluno terá, assim, tomado conhecimento de modo
inteligente de praticamente todas as construções do idioma e deverá tê-las todas à disposição
numa ordem funcional, como ferramentas com as quais se está habituado.
Quando chegar a César, não deixe que sua classe dê o primeiro mergulho sozinha, mas por
alguns dias conduza-a você mesmo pelo processo de aperfeiçoamento, evitando, de sua parte, a
tradução o quanto possível, lendo-lhes o latim com a máxima excelência e eficiência de que for
capaz, e chamando a atenção para a sintaxe e a construção. Ao longo de César e Cícero (eu diria
exatamente a mesma coisa em relação à obra Anábase), prepare a revisão de cada dia para que
seja traduzida de ouvido. Encoraje seus alunos a aprender a recitar bem o latim escolhendo, de
tempos em tempos, um bom candidato a leitor que se prepare com antecipação para ler a revisão
para a classe no seu lugar. Deixe que fique do seu lado com os olhos voltados para seus colegas;
e quando ele terminar uma frase, ou um daqueles trechos que devem ser ditos de uma vez só,
escolha por si mesmo o aluno que deverá fazer a tradução.
Certifique-se de que você trata constantemente as construções como meios de expressar certas
ideias, não como meras exemplificações de regras. Para fazer valer esse ponto de vista, e
também por muitas outras razões, observe constantemente o desenvolvimento das ideias ao
trabalhar com frases que os alunos não viram antes e, quando pedir respostas escritas, ou
respostas em viva voce, chame a atenção para cada aspecto no desdobramento gradual do
sentido, exigindo o tempo todo aquilo que chamei alhures de análise sintática antecipatória.
Tenha por objetivo ir um pouco além da lição todos os dias, fazendo com que sua turma continue
a leitura não pelo que vê, mas pelo que ouve, sendo este tópico adicional compreendido como
parte da revisão do próximo encontro.
A desvantagem da leitura visual continuada é dupla. O aluno tem grande tendência a avançar o
olhar enquanto alguém está lendo, preparando-se para fazer uma boa apresentação caso seja
chamado. E mesmo que não o faça, é muito propenso a ir e voltar com os olhos, não aceitando de
fato a ordem latina, mas fazendo uma obra rápida de artesanato mais ou menos hábil. Acontece-
me com frequência, ao lidar com alunos que foram bem treinados em leitura visual antes vir para
a universidade, de ler em voz alta uma frase que contenha somente palavras conhecidas. Os
alunos apreendem todas elas conforme a frase é recitada, no entanto não conseguem perceber
nenhum sentido na frase como um todo. Normalmente percebo que, se de imediato eu disser a
frase com as mesmas palavras, mas na ordem do inglês, eles a compreenderão no mesmo instante
e sem dificuldade. Essa experiência prova que se pode trabalhar com grande quantidade de
leitura visual e, mesmo assim, nunca conhecer a ordem latina de um modo prático.[15]
Por fim, não se deve passar nenhum dia sem a prática da redação. A escrita do latim é uma das
mais deprimentes ocupações intelectuais ou uma das mais prazerosas. Quase sempre a primeira
opção se aplica a um garoto que não escreveu uma única frase em latim desde quando terminou o
livro de noções elementares e começou com seu César até o momento em que, poucos meses
antes de ingressar na faculdade, tomou seu livro especial de composição latina com o único
propósito de preparar-se para a prova nessa disciplina. O objetivo de escrever em latim nas
escolas preparatórias não é capacitar o aluno para passar em uma prova, mas capacitá-lo para ler
em latim; e se esse objetivo for buscado de maneira inteligente, a prova de composição em latim
cuidará de si mesma. Entretanto, a persecução desse objetivo ser incessante. Todos os dias
algumas frases baseadas no autor com que se está trabalhando em dado momento devem ser
escritas por vários integrantes da turma, mandados para o quadro para esse propósito. Pode-se
facilmente conseguir tempo para isso fazendo com que a atividade de escrita prossiga enquanto a
turma está recitando a revisão; depois disso, devem-se pedir correções da turma como um todo.
Ao longo de todo o trabalho da escola preparatória, o professor deve insistir no fato de que o
objetivo principal do aluno é aprender a ler em uma grande literatura com a menor barreira
possível entre ele e o autor, e o próprio professor deve considerar casos, modos e tempos verbais
– e fazer com que seus alunos os considerem – como chaves para a literatura, como
transmissores diretos de pensamento de um intelecto a outro. Como o último pode ser realizado
de modo eficiente e rápido, foi o que tentei demonstrar. Estritamente falando, todo o escopo do
presente opúsculo reside nisso. Mas não posso abster-me de acrescentar que o professor que está
conduzindo uma aula por César, Cícero ou Virgílio não deve nunca perder de vista o fato de que
seu trabalho não é inteiramente preparatório e de que ele já está lidando com uma grande
literatura. Quanto mais puder fazer com que seus alunos percebam – através da força do próprio
prazer que tem com ela e, sobretudo, da capacidade de poder ensiná-los a lê-la por si mesmos –
que se trata de uma grande literatura, mais fácil será sua tarefa, mais ricas suas recompensas
tangíveis e maior será sua contribuição para a soma total da educação clássica.
E isso nos leva à universidade com os seus múltiplos objetivos: estudo da literatura e da história
de seu desenvolvimento, estudo comparativo de formas e sintaxe, estudo de história antiga a
partir das fontes, estudo da vida na antiguidade, da arte antiga, etc. Todos esses vários objetivos,
entretanto, se fundamentam em última instância principalmente na capacidade de ler em latim
com facilidade e fluidez.

[1]
Se o exemplo escolhido não foi feliz, qualquer professor do ensino básico – receio que mesmo qualquer professor
universitário – poderia, em poucos dias de observação de uma turma, fornecer exemplos que irão comprovar-lhe que o
método habitual, não importa o quão elevados sejam os objetivos do professor, tende a trazer negligência na análise atenta,
e isso constantemente leva a erros grosseiros como o do exemplo dado aqui.
[2]
I.41
[3]
A frase se desenvolve no quadro pelo acréscimo de uma palavra de cada vez. Para obter o mesmo resultado na impressão,
com cada nova palavra se repetirá a extensão da frase até aquele momento. E, para que haja maior clareza, as respostas
serão diferenciadas das perguntas pelo uso do itálico.
[4]
O fato de ser possível que alunos, sem um momento de reflexão, mergulhem nas coisas desse modo infelizmente bem
conhecido mostra como é completamente ineficaz o método vigente para o ensino de principiantes no que se refere ao
desenvolvimento de uma obervação perspicaz e autocrítica. Essa acusação, como se o verá, não pode ser lançada contra o
método defendido neste escrito.
[5]
No encontro da Associação de Filologia de Ithaca no verão passado, o professor Gildersleeve, ao longo de alguns
apontamentos sobre a leitura em grego e em latim, expressou-se com grande severidade em relação ao modo habitual com
que é realizada e sugeriu que seria desejável, a fim de forçar os alunos a aceitar a ordem do original, exigir que lessem
através de um buraco em uma folha de papel ou com um cartão com furos. O método encorajado no presente opúsculo é
praticamente tão idêntico nos resultados que resultariam da sugestão do professor Gildersleeve, que nada, a não ser o fato
de que esse método já estava impresso no registro da Universidade Cornell para o período 1885-6 e no anúncio especial de
cursos de estudos clássicos, poderia salvar este opúsculo da suspeita de ser meramente um desenvolvimento da dica do
professor Gildersleeve. O mesmo vale em relação à admirável injunção no prefácio à nova edição de Cícero de Allen e
Greenough, publicada em maio de 1886. Entretanto, como se vê, fica claro que o objetivo essencial do método deste
opusculo (não necessariamente, decerto, seus detalhes) tem confirmação forte e expressa.
[6]
Por esse aspecto utilíssimo do trabalho descrito, devo os meus agradecimentos a meu assistente, dr. A. C. White.
Desconheço alguma atividade que seja mais encantadora e alegre de escutar, com exceção da tradução de um novo texto em
latim seguindo os mesmos princípios.
[7]
Para variar o exercício, lê-se ocasionalmente, sem pausas e sem repetição, uma história contínua de várias páginas de
tamanho e cada aluno, depois, escreve um resumo tão completo quanto possível.
[8]
A preparação indicada tem conduzido há alguns anos ao abandono da tradução nas leituras diárias e, na verdade, tenho-me
esforçado para reservar um tempo no final da aula para recitar, sem tradução, antecipadamente a leitura a meus alunos. Mas
não teria tido a coragem no presente ano de acabar com a tradução na sala de aula durante a leitura antecipada, se não
fossem as garantias dadas a mim pelo professor Greenough, sustentado por suas próprias experiências em fazer exatamente
isso. Minha experiência no período letivo passado foi tão gratificante que me levou a desejar ardentemente que o professor
Greenough pudesse expor, de uma maneira acessível, as grandes vantagens do sistema para alunos corretamente ensinados
a isso. Entrementes, deixem-me partir da premissa que o deleite desse modo de tratar a literatura – o encanto da
comunicação direta com o autor, de sentir, de fato, a própria impossibilidade de tradução da linguagem e do estilo – não
pode ser imaginada por quem não fez a experiência; supondo sempre, naturalmente, que a turma foi ensinada de antemão e
levada ao ponto em que tal leitura é possível.
[9]
Agora deve estar claro que eu não considero o “método Sauveur” suficiente para lidar com um idioma tão difícil quanto o
latim, especialmente em uma comunidade na qual, por maior que seja o esforço empreendido, nada tornará o latim o meio
habitual da conversação diária. Mas sinto, no entanto, que devamos ser muito gratos ao dr. Sauveur e a seus seguidores por
insistirem no fato de que uma língua deve ser tratada como viva e inteligível aos ouvidos.
[10] Seria uma conveniência prática se houvesse, em inglês, um adjetivo que tivesse a mesma relação com as palavras
substantivo e pronome assim como verbal em relação a verbo. Emprego o adjetivo nominal nesse sentido para meu próprio
uso.
[11] Certamente não é aconselhável, no trabalho em sala de aula desse tipo, cobrir no início todas as possibilidades da oração
interrogativa indireta. Apresento algumas delas que são fáceis de compreender e de grande importância.
[12] O professor que usa o método romano deve ser meticuloso em sua pronúncia, pois seu próprio exemplo dirá muito mais
que sua instrução. Atualmente, visto que todos os livros têm todas as sílabas marcadas, não há justificativa possível para a
incorreção. No entanto, muitos professores, ao chegarem a rēgīna e amīcĭtiam no capítulo XIV, pronunciarão rĕgīna e
ămĭcĭtiam; não poucos lerão vŏcant como vōcant; e, infelizmente o receio, quase todos, ao ensinarem que o a final é longo
no ablativo e breve no nominativo, etc., pronunciarão fāmă e fāmā exatamente da mesma forma, ou seja, como um
ablativo, embora o som do a breve seja muito bem representado para nós em inglês palavras familiares como Californiă,
Nevadă, Cubă.
[13] Creio que os professores sejam céticos quanto à possibilidade de fazer isso. Mas, se o jovem aluno começar da maneira
correta e for ajudado da maneira correta ao longo do percurso, isso não é nem mesmo difícil. A aparente dificuldade
remonta aos falsos hábitos mentais produzidos por fazer da tradução o método constante de chegar à compreensão do autor
e, por assim dizer, o objetivo último dos estudos, ao passo que o verdadeiro fim dos estudos, exatamente como ocorre com
as línguas modernas, é adquirir a capacidade de ler o original. Também é de recear que, na pressão criada pelas longas
horas de trabalho diário, muitos professores das escolas preparatórias não leiam eles próprios os autores que ensinam, mas
somente fazem preparação para corrigir as traduções dos alunos nas leituras. Se dedicassem cinco minutos por dia a ler
César, Virgílio e Cícero em voz alta, diante de um público imaginário, e mais cinco minutos diante de um público real na
sala de aula, notariam que sua confiança aumentaria rapidamente.
[14] Pergunto se não seria melhor usar um vocabulário mais reduzido nas primeiras lições do que o empregado por alguns
livros e fazer com que o principal objetivo seja – pela repetição variada de relativamente poucas palavras nas construções
simples de sujeito, objeto direto, objeto indireto e predicado – fornecer ao aluno uma destreza real em apreender os
significados e a expressão dos significados através das inflexões. É difícil para a mente do jovem obter essa destreza
quando lida com coisas demasiadamente novas se se encontra, ao mesmo tempo, sobrecarregada por ter de trabalhar com
um vocabulário muito amplo.
[15] Aqui está a resposta à pergunta: Qual é a vantagem de passar por uma dificuldade a mais na compreensão do latim
abrindo mão do recurso ao elemento visual, quando nosso único objetivo é adquirir a capacidade de ler páginas impressas?
Sem dizer nada sobre o enorme senso de realidade e o enorme interesse que esse modo de lidar com o idioma traz consigo,
pode-se elucidar a questão supondo que a situação estivesse invertida. Se o inglês fosse uma língua morta e garotos
romanos estivessem aprendendo a lê-lo com professores romanos que o tivessem dominado, seria obviamente um
procedimento muito lento reduzi-lo a pedaços e reorganizá-lo segundo a ordem romana como meio de compreendê-lo. O
fantasma mais cortês entre nós riria na cara do professor se visitasse uma escola romana e visse esse tipo de coisa
acontecendo; sem dúvida, assim também o mais cortês dos fantasmas romanos deve rir – a menos que talvez seu senso de
pesar pela perda de tempo leve embora o melhor de seu senso de humor – se alguma vez visitar uma escola moderna
quando uma turma está lendo uma oração de seus grandes compatriotas. Da mesma forma que ele certamente nos diria que
essa é precisamente a forma de nunca aprender a ler em latim, assim também nosso fantasma anglófono imploraria ao
professor que abandonasse todo aquele negócio e adotasse algum meio que fizesse com que fosse absolutamente inevitável
que o aluno aceitasse nossa ordem inglesa de expressão, a fim de que pudesse realmente aprender a ler a língua; esse meio
seria necessariamente tentar compreender pela escuta primeiramente frases de dificuldade correspondente ao grau de
conhecimento do aluno; depois, passagens ininterruptas da literatura.

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