Dissertação de Aline Miranda

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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro de ciências Sociais


Faculdade de Serviço Social

Aline Miranda Cardoso

Organizações sociais na saúde: Rio Intransparente

Rio de Janeiro
2012
Aline Miranda Cardoso

Organizações sociais na saúde: Rio Intransparente

Dissertação apresentada, como requisito


parcial para obtenção do título de Mestre,
ao Programa de Pós-Graduação em
Serviço Social, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Área de
Concentração: Trabalho e Política Social.

Orientadora: Profª. Dra. Elaine Rossetti Behring


Coorientador: Prof. Dr. Maurílio Castro de Matos

Rio de Janeiro
2012
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/ BIBLIOTECA CCS/A

C268o Cardoso, Aline Miranda .


Organizações sociais na saúde: Rio Intransparente / Aline
Miranda Cardoso. – 2012.
123 f.

Orientadora: Elaine Rossetti Behring.


Coorientador: Maurílio Castro de Matos.
Dissertação (mestrado) - Universidade do Estado do Rio de
Janeiro. Faculdade de Serviço Social.
. Bibliografia.

1. Política social – Rio de Janeiro (Estado) - Teses. 2.


Serviço social – Rio de Janeiro (Estado) - Teses. I. Behring,
Elaine Rossetti. II. Matos, Maurílio Castro de. III. Universidade
do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade de Serviço Social. III.
Título.

CDU 36

Autorizo apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação, desde que
citada a fonte.

_____________________________________ ___________________________
Assinatura Data
Aline Miranda Cardoso

Organizações sociais na saúde: Rio Intransparente

Dissertação apresentada, como requisito


parcial para obtenção do título de Mestre,
ao Programa de Pós-Graduação em
Serviço Social, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Área de
concentração: Trabalho e Política Social.

Aprovada em 11 de outubro de 2012.

Banca Examinadora:
_____________________________________________
Profª. Dra. Elaine Rossetti Behring (Orientadora)
Faculdade de Serviço Social - UERJ

_____________________________________________
Prof. Dr. Maurílio Castro de Matos (Coorientador)
Faculdade de Serviço Social - UERJ

_____________________________________________
Profª. Dra. Maria Inês de Souza Bravo
Faculdade de Serviço Social - UERJ

_____________________________________________
Profª. Dra. Sara Granemann
Escola de Serviço Social - UFRJ

Rio de Janeiro
2012
DEDICATÓRIA

À minha querida Bazinha (in memoriam) que soube desfrutar a


beleza da vida e deixou tanta saudade em nossos corações.
Quero sua risada mais gostosa
Esse seu jeito de achar
Que a vida pode ser maravilhosa...
Ivan Lins
AGRADECIMENTOS

[...]E aprendi que se depende sempre


de tanta, muita, diferente gente
Toda pessoa sempre é as marcas
das lições diárias de outras tantas pessoas
E é tão bonito quando a gente entende
que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá
E é tão bonito quando a gente sente
que nunca está sozinho por mais que pense estar [...].
Gonzaguinha

É no embalo de Gonzaguinha que gostaria de iniciar meus agradecimentos,


pois seria uma tremenda injustiça dizer que trilhei este caminho sozinha, foram
muitas e tantas pessoas que com “as marcas das lições diárias” me proporcionaram
concluir esta dissertação. Foi uma dura e longa jornada, mas jamais poderia tê-la
trilhado sem o esforço, a torcida, o apoio e o carinho de pessoas que fizeram e
fazem parte da minha vida. Sob pena de esquecer ou subestimar, ouso nomear
algumas delas...
Aos meus pais, Elenita e Damázio, pela luta diária que me permitiu chegar
até aqui. Pelos valores, pelo apoio, pelo carinho e pelos abraços e sorrisos que
renovavam minhas energias a cada vez que voltava para casa.
Aos meus irmãos, Dolores, Fernanda, Damázio e Diego, cada um a seu
modo por me completar e fazer ser quem eu sou. Pelo incentivo, pelo
companheirismo, pelos abraços e sorrisos.
Às minhas avós, Sebastiana e Maria José, que com seus 90 e tantos anos
esbanjam sabedoria e torcem para que cada neto trilhe o caminho da felicidade.
Aos meus tios e tias que acompanharam mais de perto essa dura jornada,
pelos conselhos, pelo incentivo e pela torcida, Zilda, Ari, Zenir, Maria Auxiliadora,
Deniz, Eloizo, Maria José, Fernanda e, em especial, à minha querida Bazinha que
partiu antes que pudesse concluir este trabalho, deixando tanta saudade. Mas, não
importa onde esteja eu sei que sempre estará comigo!
Aos meus primos que me fizeram dar mais um passo, quando eu achava que
não tinha mais forças, em especial: Rodrigo, Ari, Tiago e Verônica.
Às amigas de longa data, Lelê, Paty e Winnie, que souberam entender
minhas ausências e sempre se fizeram presentes, seja por um telefonema ou pelos
inúmeros SMS que chegavam para me arrancar um sorriso e aliviar a tensão. Pelos
bons momentos que compartilhamos, pela força e apoio nos momentos ruins, pelas
confidências e cumplicidade.
Às minhas amigas que me acompanham desde a graduação na UFRJ. Josi
e Rosa que, na condição de viver sob o mesmo teto, tiveram que aturar mais de
perto meu mau humor e desespero. Agradeço pelo carinho, companheirismo,
incentivo, pela paciência, pelos sorrisos e lágrimas que me fortaleceram,
principalmente, na fase final dessa caminhada. Ainda teremos muitas histórias pra
contar!
À Kinha pela amizade cultivada desde o primeiro período da faculdade, pelo
carinho especial e incentivo constante.
À Vivi, pela amizade que começou no campo de estágio e desde então só foi
crescendo. Pelo companheirismo que se expressou desde quando decidimos
ingressar no mestrado, estudando intensamente, pela infalível simpatia “bjotchau
UERJ, até o ano que vem!” e por mergulhar no mundo das OS tão incisivamente,
trocando comigo as descobertas desse terreno tão obscuro. Pelos lamentos, choros,
carinho, alegrias e, principalmente, por me levantar quando já não tinha mais forças.
À Vê por ser uma pessoa formidável que tive a honra de conhecer na pós-
graduação. Pelos conselhos, confidências, apoio, trocas e reflexões.
Ao ME/2010, a turma mais bonita do PPGSS/UERJ, que através do
companheirismo, cumplicidade, reflexões, viradões, amigo oculto “perfeito”, pizzas,
cervejas e viagens amenizou os efeitos dessa longa e dura jornada. Aos seus
integrantes que fizeram história: Ana Paula, Carolina, Charles, Cristiane, Daniele,
Eliane, Everton, Guilherme, Lívia, Jonatas, Maria Clara, Marianne, Matheus,
Morena, Natália, Roberto, Sirley, Verônica e Vivian.
Aos amigos que conquistei nos três anos de trabalho no Hospital Federal de
Bonsucesso, em especial, Magda e Keila que vivenciam diariamente os reflexos do
sucateamento dos serviços de saúde, mas sem perder o compromisso pela defesa
de uma política de saúde pública, gratuita e de qualidade. Pelo aprendizado, pela
amizade, pela força e apoio que me deram para concluir esta fase de minha vida.
Aos companheiros do Grupo de Estudos e Pesquisas do Orçamento Público e
da Seguridade Social (GOPSS) que me acolheram e compartilharam seus
conhecimentos e reflexões em torno do orçamento público, em especial, Tainá,
Giselle, Aline Abreu, Jeanne, Tatiana e Rodrigo.
Ao Luiz Mario pela disponibilidade em sanar muitas das minhas dúvidas
referentes ao Rio Transparente.
Aos funcionários e professores PPGSS que forneceram as condições
necessárias para minha formação profissional, em especial, Rose e Luciano.
Às professoras que compõem minha banca, Sara e Maria Inês. À Sara, uma
das responsáveis por eu ter ingressado na pós-graduação, pelo incentivo e,
principalmente, por sempre despertar em mim o desejo de conhecer mais e mais. À
Maria Inês por suas contribuições enriquecedoras que me impulsionaram a
mergulhar mais fundo no “mundo das OS”.
Aos meus queridos orientadores, Maurílio e Elaine, que tiveram paciência,
confiança e aceitaram ser meus guias neste percurso. Pela acolhida generosa, pelo
aprendizado incomensurável, pelo apoio e pelas sugestões pertinentes que foram
fundamentais para minha formação.

O nosso caminho é feito pelos passos que damos,


mas a beleza dessa caminhada,
depende de quem vai conosco.
Autor desconhecido
A solução pro nosso povo
Eu vou dá
Negócio bom assim
Ninguém nunca viu
Tá tudo pronto aqui
É só vim pegar
A solução é alugar o Brasil!...

Nós não vamo paga nada


Nós não vamo paga nada
É tudo free!
Tá na hora agora é free
Vamo embora
Dá lugar pros gringo entrar
Esse imóvel tá prá alugar
Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah!...
Raul Seixas

Não adianta olhar pro céu


Com muita fé e pouca luta
Levanta aí que você tem muito protesto pra fazer
E muita greve, você pode, você deve, pode crer
Não adianta olhar pro chão
Virar a cara pra não ver
Se liga aí que te botaram numa cruz e só porque Jesus
Sofreu não quer dizer que você tenha que sofrer!
Até quando você vai ficar usando rédea?!
Rindo da própria tragédia
Até quando você vai ficar usando rédea?!
Pobre, rico ou classe média
Até quando você vai levar cascudo mudo?
Muda, muda essa postura
Até quando você vai ficando mudo?
muda que o medo é um modo de fazer censura
Gabriel O Pensador
RESUMO

CARDOSO, Aline Miranda. Organizações sociais na saúde: Rio Intransparente.


2012. 121 f. Dissertação (Mestrado em Serviço Social) - Faculdade de Serviço
Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

O presente trabalho tem por objetivo analisar uma das diversas alterações
decorrentes da contrarreforma do Estado brasileiro que tem incidido diretamente
sobre o campo das políticas sociais: a adoção dos modelos privatizantes de gestão.
A despeito do acirramento da “questão social” e consequente aumento da demanda
por serviços sociais, o Estado tem caminhado numa via oposta. Focaliza as políticas
sociais, precariza os serviços já existentes e drena recursos da seguridade social
para sustentação das altas taxas de juros e pagamento da dívida pública. Somado a
isso, para possibilitar a criação de novos espaços lucrativos, o Estado tem reeditado
repetidamente diferentes instrumentos de privatização das políticas sociais – as
Organizações Sociais, as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, as
Fundações Estatais de Direito Privado e a Empresa Brasileira de Serviços
Hospitalares – processando-se, desta forma, um duplo favorecimento do capital na
apropriação do fundo público. Desse modo, conferimos especial destaque às
Organizações Sociais, instrumento privilegiado da operacionalização da
modernização da gestão da rede de serviços da atual gestão municipal da política
de saúde carioca. Buscamos analisar as tendências da alocação dos recursos
orçamentários da saúde no Rio de Janeiro (Função Saúde e Fundo Municipal), os
contratos de gestão a fim de captar os processos de privatização, focalização e
mercantilização da saúde, no período de 2009-2010. Nesse contexto, revelou-se
uma profunda falta de transparência nos gastos públicos com a política de saúde
carioca que perpassa os recursos destinados ao Fundo Municipal de Saúde, mas
também se expressa nos inúmeros repasses financeiros – muitas vezes elevados e
sem justificativas palpáveis – destinados às Organizações Sociais. Desse modo, a
efetivação das ações e serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) fica relegada ao
segundo plano e põe-se na ordem do dia o favorecimento do capital através de uma
apropriação cada vez maior do fundo público.

Palavras-chave: Organizações sociais. Privatização da saúde. Rio transparente.


ABSTRACT

The present work aims to analyze one of the several changes made by the
counter reformation of the Brazilian State which have directly affected the social
policies: the adoption of the management privatization models.In spite of the
worsening of the “social question” and the consequent increasing of the demand for
the social services, the State has taken the opposite direction: it focalizes the social
policies, compromises the quality of the existent services and drains resources from
the social security in order to keep the high interest rates and the payment of the
public debt. Besides, so as to enable the creation of new profitable spaces, the State
has repeatedly reissued different privatization instruments of the social policies –
Social Organizations, Public Interest Civil Society Organizations, State Foundations
of the Private law and the Brazilian company of hospital services -, processing, in
that way, a double benefit of the capital in its public fund appropriation.For that
reason, we give particular attention to the Social Organizations, privileged instrument
of the management modernization of the current health care system in the Rio de
Janeiro city. We intent to analyze the health resources allocation tendency in Rio de
Janeiro city (health function and Municipal Fund), the management contracts in order
to understand the process of privatization and focalization of the health care from
2009 to 2010.Given the context, the research showed a deep lack of transparency on
the public spending with the Rio de Janeiro city health care, which comes from the
Health Municipal Fund and also from several financial transfers to the Social
Organizations – many times with high values and no valid explanation. This way, the
carrying out of the actions and services of the Brazilian Health System is pushed into
the background and the capital is benefited into the appropriation of the Fund Public.

Keywords: Social organizations. Privatizing public health system. Rio Transparente.


LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Iniciativas Estratégicas da Saúde.............................................................. 67

Quadro 2 Município do Rio de Janeiro/RJ - OS qualificadas até 2010 por áreas de


68
atuação.......................................................................................................
Quadro 3 Estimativa de Receita................................................................................. 75
Quadro 4 Fixação da Despesa................................................................................... 75
Quadro 5 Resumo das despesas por órgãos, segundo origem dos recursos........... 76
Quadro 6 Resumo das despesas por função, segundo origem dos recursos........... 76
Quadro 7 Unidades Orçamentárias da SMSDC......................................................... 79
Quadro 8 Evolução da despesa por função de governo............................................ 80
Quadro 9 Fundo Municipal de Saúde – despesas..................................................... 81

Quadro 10 Comparação entre as diferentes fontes de dados do Fundo Municipal de


82
Saúde.........................................................................................................
Quadro 11 Organizações Sociais vencedoras dos editais lançados em 2009............ 83
Quadro 12 Organizações Sociais vencedoras dos editais lançados em 2010............ 84

Quadro 13 Contratos de Gestão, celebrados nos anos de 2009 e 2010, que não
86
possuem termos aditivos............................................................................
Quadro 14 Contratos de gestão, celebrados nos anos de 2009 e 2010, que
87
possuem termos aditivos............................................................................
Quadro 15 Termos Aditivos ao CG 01/2009 – SMSDC/RJ e SPDM........................... 87
Quadro 16 Termos Aditivos ao CG 02/2009 – SMSDC/RJ e FIOTEC......................... 89
Quadro 17 Termos Aditivos ao CG 03/2009 – SMSDC/RJ e IABAS........................... 91
Quadro 18 Termos Aditivos ao CG 04/2009 – SMSDC/RJ e Viva Comunidade......... 93
Quadro 19 Termos Aditivos ao CG 05/2009 – SMSDC/RJ e Viva Comunidade......... 94
Quadro 20 Termos Aditivos ao CG 06/2009 – SMSDC/RJ e Viva Comunidade......... 95
Quadro 21 Termos Aditivos ao CG 05/2010 – SMSDC/RJ e IABAS........................... 96
Quadro 22 Termos Aditivos ao CG 08/2010 – SMSDC/RJ e SPDM........................... 98
Quadro 23 Termos Aditivos ao CG 22/2010 – SMSDC/RJ e IABAS........................... 99
Quadro 24 Recursos da SMSDC destinados às OS – 2009 e 2010............................ 100
Quadro 25 Organizações sociais com convênios anteriores com a prefeitura.......... 101
Quadro 26 Legislação municipal pertinente às Organizações Sociais........................ 104
Quadro 27 Rescisão de contratos – CIAP................................................................... 110
LISTA DE SIGLAS

A. MARCA Associação Marca para Promoção de Serviços


ABRASCO Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva
ADCT Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
ADIN Ação Direta de Inconstitucionalidade
ANFIP Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil
AP Área de Planejamento
CAMPO Centro de Apoio ao Movimento Popular
CAP Caixa de Aposentadoria e Pensões
CAPSad Centro Atenção Psicossocial Álcool e Drogas
CAPSI Centro de Atenção Psicossocial
CEBES Centro Brasileiro de Estudo de Saúde
CEP 28 Centro de Estudos e Pesquisas 28
CEPESC Centro de Pesquisa em Saúde Coletiva
CF/88 Constituição Federal de 1988
CG Contrato de Gestão
CGM/RJ Controladoria Geral do Município do Rio de Janeiro
CGU Controladoria Geral da União
CIAP Centro Integrado de Apoio Profissional
CIEZO Conselho das Instituições de Ensino Superior da Zona Oeste
CNPJ Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica
COFINS Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social
CONSOCIAL Conferência Nacional sobre Transparência e Controle Social
COQUALI Comissão de Qualificação de Organizações Sociais
CORE Coordenação Operacional Regional de Emergência
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito
CPMF Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira
CRESS Conselho Regional de Serviço Social
CSF Clínica Saúde da Família
CSLL Contribuição Social sobre o Lucro Líquido
CUT Central Única dos Trabalhadores
DOM/RJ Diário Oficial do Município do Rio de Janeiro
DRU Desvinculação de Receitas da União
EBSERH Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares
EC Emenda Constitucional
ESF Equipes Saúde da Família
FEDP Fundação Estatal de Direito Privado
FIBRA Instituto Social Fibra
FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz
FIOTEC Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Saúde
FMI Fundo Monetário Internacional
FMS Fundo Municipal de Saúde
GLOBAL Associação Global Soluções em Saúde
IABAS Instituto de Atenção Básica a Saúde
IAP Institutos de Aposentadoria e Pensões
INAMPS Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
INCA Instituto Nacional de Câncer
INTO Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia
ITCI Instituto de Tecnologia, Capacitação e Integração Social
LBA Legião Brasileira de Assistência
LDO Lei de Diretrizes Orçamentárias
LOA Lei Orçamentária Anual
LOS Lei Orgânica da Saúde
LRF Lei de Responsabilidade Fiscal
MARE Ministério da Administração e da Reforma do Estado
MP Medida Provisória
MPF Ministério Público Federal
MS Ministério da Saúde
NASF Núcleo de Apoio à Saúde da Família
NOB Norma Operacional Básica
ONG Organização Não governamental
OPAS Olivas Planejamento, Assessoria e Serviços
OS Organização Social
OSS Orçamento da Seguridade Social
OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
PADI Programa de Atendimento Domiciliar a Idosos
PAM Posto de Atendimento Médico
PCB Partido Comunista Brasileiro
PC do B Partido Comunista do Brasil
PDRE Plano Diretor da Reforma do Estado
PDT Partido Democrático Trabalhista
PEC Proposta de Emenda à Constituição
PF Polícia Federal
PG/PADM Procuradoria Administrativa
PIB Produto Interno Bruto
PMS Plano Municipal de Saúde 2009-2013
PPA Plano Plurianual
PSB Partido Socialista Brasileiro
PSF Programa Saúde da Família
PT Partido dos Trabalhadores
RT Rio Transparente
SME Secretaria Municipal de Educação
SMSDC Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil
SPDM Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina
STF Supremo Tribunal Federal
SUS Sistema Único de Saúde
T. A. Termos Aditivos
TEIAS Territórios Integrados de Atenção à Saúde
TCM/RJ Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro
TCU Tribunal de Contas da União
UERJ Universidade Estadual do Rio de Janeiro
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UPA Unidade de Pronto Atendimento
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................. 15
1 POLÍTICA SOCIAL, FUNDO PÚBLICO E SAÚDE.......................................... 22
1.1 Trabalho e Política Social............................................................................... 22
1.2 Política Social: produção e reprodução das relações sociais.................... 31

1.3 Política Social no Brasil e Fundo Público..................................................... 36


2 CONTRARREFORMA DO ESTADO BRASILEIRO E SAÚDE........................ 44
2.1 Política de Saúde: conquistas e entraves a partir da Constituição
Federal de 1988.............................................................................................. 44
2.2 (Des)Financiamento do SUS: precarização, focalização e privatização... 50
2.3 PDRE e Organizações Sociais: breves considerações.............................. 54
2.4 Saúde no município do Rio de Janeiro........................................................ 59
3 SAÚDE NO RIO DE JANEIRO: A INTRANSPARÊNCIA DAS
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS............................................................................. 72
3.1 Orçamento público: tendências de alocação dos recursos municipais... 74
3.2 Fundo Municipal de Saúde: onde está?....................................................... 78
3.3 Contratos de gestão: gerência [d]eficiente de recursos............................ 82
3.4 Organizações sociais: cada uma por si e o fundo público por todas....... 103
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 114
REFERÊNCIAS................................................................................................ 117
15

INTRODUÇÃO

A presente dissertação deriva de algumas inquietações acumuladas no


decorrer de nosso Trabalho de Conclusão de Curso1 na graduação em Serviço
Social. O referido estudo esteve orientado para a compreensão de algumas
alterações no campo das políticas sociais por meio do que consideramos
instrumentos de viabilidade da contrarreforma neste campo, a saber: as
Organizações Sociais (OS), Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
(OSCIP), e as Fundações Estatais de Direito Privado (FEDP).
Nesse sentido, realizamos naquele momento uma análise comparativa da
legislação2 que dá vida a estes instrumentos, o que nos permitiu afirmar que,
embora nos deparávamos com formatos aparentemente diferenciados, o conteúdo
presente em cada proposta caminhava numa única direção: privatização das
políticas sociais.
Tendo em vista a impossibilidade de realizar à época um estudo de
investigação referente a uma experiência concreta que refletisse os efeitos da
contrarreforma do Estado (BEHRING, 2008a) no âmbito das políticas sociais3, nos
propomos a efetuar tal análise durante a elaboração da dissertação de mestrado.
Desse modo, ainda imbuídos do desejo de captar as particularidades expressas
numa experiência concreta, nos dedicaremos neste trabalho à análise da
privatização da saúde no município do Rio de Janeiro, no período de 2009-20104, na
qual a adoção do modelo de gestão das OS assume papel central.
Embora estejamos buscando nos aproximar da privatização que atinge a
política de saúde, em especial no município do Rio de Janeiro, não podemos

1
O referido trabalho, intitulado “A materialização da contrarreforma do Estado brasileiro no âmbito das políticas
sociais: uma análise de alguns de seus instrumentos”, foi apresentado à Escola de Serviço Social da
Universidade Federal do Rio de Janeiro.
2
Referimo-nos à Lei nº 9.637 de 15 de maio de 1998; à Lei nº 9.790 de 23 de março de 1999; e ao Projeto de Lei
Complementar nº. 92 de 4 de junho de 2007.
3
São inúmeros efeitos para este campo que, no geral, vêm se ancorando no trinômio articulado do ideário
neoliberal: privatização, focalização e descentralização (BEHRING; BOSCHETTI, 2009).
4
Optamos por analisar este período, primeiramente, pelo fato da Lei municipal que regulamenta as OS ter sido
aprovada no ano de 2009, no governo Eduardo Paes (2009-2013), mas ainda sob vigência do Plano Plurianual
do governo anterior. Nesse sentido, consideramos que não necessariamente os objetivos e as diretrizes contidos
no referido Plano favoreciam o novo modelo de gestão adotado. Assim, ao estendermos nossa análise para o
ano de 2010, partimos do pressuposto de que, de certo modo, as diretrizes, objetivos, metas e investimentos
prioritários estejam em sintonia com aprovação da lei das OS.
16

desarticular esse debate do processo que o conjunto das políticas sociais vem
enfrentando atualmente.
De modo geral, o cenário que se desenha para a seguridade social5 brasileira
é progressivamente agravado, pois a despeito das novas condições de trabalho –
que se refletem diretamente no crescimento da demanda por serviços sociais –, nos
deparamos com uma forte tendência de redução de direitos e transformação das
políticas sociais em ações pontuais e compensatórias. Isso sem contarmos o
financiamento das políticas que sofre com a realocação do fundo público em
decorrência de seu direcionamento ao pagamento da dívida pública. Somam-se a
ainda, as ações que visam a transferência dos serviços sociais para a iniciativa
privada (MOTA et al, 2006; BEHRING, 2008b).
Assim, se por um lado, não podemos analisar a política de saúde
isoladamente, por outro, não podemos entender a configuração assumida pelas
políticas sociais contemporaneamente desarticulada do papel atribuído ao Estado
para que seguisse garantindo as taxas de lucro capitalistas – no período posterior à
crise da década de 1970.
No Brasil, as medidas e os ajustes ditados pelos países avançados, na
tentativa infrutífera de retomar as taxas de crescimento típicas do período áureo do
capitalismo, só atingiram o solo nacional na década de 19906. Esta década foi
marcada pela necessidade de refuncionalização do Estado Brasileiro que,
supostamente, teria se desviado de suas funções, de modo que se colocou a
necessidade de restringir seu papel ao de promotor e regulador do desenvolvimento
econômico e social do país.
Dessa forma, elaborou-se o Plano Diretor da Reforma do Estado (PDRE), no
qual foi o proposto um redesenho do Estado que, por sua vez, implicou num
conjunto de “reformas” de teor regressivo para a classe trabalhadora.

5
Segundo Mota et al, a “Seguridade Social é por definição um campo de disputas, seja por parte do trabalho,
seja por parte do capital que continuamente tenta adequá-la aos seus interesses” (2006, p. 165). É nesse sentido
que verificamos na atualidade, diante da ofensiva neoliberal, um redirecionamento das políticas de proteção
social. Assim, neste contexto, a seguridade social é fortemente marcada pela focalização das ações; expansão
da assistência em detrimento das outras políticas de seguridade; privatização dos serviços sociais; surgimento
da figura do cidadão consumidor; emergência de novos protagonistas – tais como, empresas socialmente
responsáveis e voluntariado; e despolitização das desigualdades sociais, dentre outros.
6
A ditadura e sua derrocada, somadas ao processo de redemocratização da sociedade, nos anos 1980, marcado
pelo amplo movimento na sociedade civil, acabaram por adiar a implementação do receituário neoliberal para a
década seguinte.
17

Segundo Alencar e Granemann (2009), diante da necessidade do Estado


promover as condições para um novo período de crescimento, foi demandada uma
série de contrarreformas no sentido de privatizar o fundo público de variadas formas
e, dentre elas, destacam-se:
a) entrega do parque estatal lucrativo (produtivo e de serviços) aos negócios
privados;
b) redução da proteção à força de trabalho ocupada e excedente pela diminuição de
direitos trabalhistas e sociais de que são exemplos característicos as
contrarreformas previdenciárias, trabalhistas e sindical;
c) redefinição do campo de atuação das políticas sociais como atividades não
exclusivas do Estado de modo a torná-las serviços privados, esferas possíveis
de comercialização, de criação de novos negócios e de intensificação dos já
existentes (por exemplo, a saúde, a previdência e o ensino privado) com
subsídios do fundo público;
d) canalização de parte mínima dos recursos do fundo público que financia as
políticas sociais de responsabilidade do Estado para a fração da classe trabalhadora
mais pauperizada (programas de transferência de renda/ assistenciais curiosamente
cognominados “bolsas”), a enorme fração excedentária da força de trabalho, pela via
de operação monetarizada,com dinheiro plástico, operado por bancos, de modo a
torno o recurso também recursos monetários manipulados por instituições bancário-
financeiras, no interesse do grande capital portador de juros;
e) imputação à força de trabalho empregada pelo Estado de responsabilidade pela
ineficiência dos serviços públicos para impor similares condições de trabalho e vida,
de contrato rebaixado, de instabilidade no trabalho e redução de direitos trabalhistas
e sociais às praticadas nas empresas capitalistas contra a força de trabalho. Para
consecução dessas medidas é indispensável alterar em profundidade o
aparelho estatal e criar novos entes jurídicos “estatais”. Tais entes em geral
carregam do público apenas a denominação porque sua natureza é essencial e
profundamente privada. Tais “instituições” viabilizam as parcerias público-
privadas e se metamorfoseiam em distintas formas, conforme os embates em
cada espaço e local, das quais as mais comuns são as “fundações estatais de
direito privado”, as “organizações sociais (OS)”, as “organizações da
sociedade civil de interesse público (OSCIP)” e as “fundações de apoio” (2009,
p. 165, grifos nossos).

Ressalta-se que, ainda nessa conjuntura, o aparelho estatal não se desfez de


sua face repressora contra os movimentos sociais da classe trabalhadora, de modo
que no Brasil – e também a nível mundial – passa-se a criminalizar a pobreza e suas
reivindicações por melhores condições de vida (ALENCAR ; GRANEMANN, 2009).
Nesse sentido, sob o argumento de dispor de poucos recursos7 para
operacionalizar as políticas sociais – o que no mínimo é contraditório, já que o
Estado permanece financiando as ações executadas pelo capital – vem ganhando
força no contexto atual a proposição de um mix entre público e privado, tal como
sinalizado por Alencar e Granemann (2009). Isso se deve, em grande medida

7
A partir da crise da década de 1970 acirra-se a disputa pelos fundos públicos. É nesse contexto em que,
“preconiza-se o corte dos gastos sociais estatais, para o ‘equilíbrio das contas públicas’, como indicador de
saúde econômica. Então, a política social entra no cenário como paternalismo, como geradora de desequilíbrio,
como algo que deve ser acessado via mercado, e não como direito social. Daí as tendências de
desresponsabilização e desfinanciamento da proteção social pelo Estado, o que aos poucos (já que há
resistências e sujeitos políticos nesse processo), vai configurando um Estado mínimo para os trabalhadores e um
Estado máximo para o capital” (BEHRING, 2002, p. 186, grifos da autora).
18

porque, supostamente, este último executa os serviços com maior eficiência e


menos custos.
Especificamente no âmbito da saúde, a despeito dos avanços firmados na
Constituição Federal de 1988 (CF/88), o setor privado – que desde a ditadura já
vinha sendo favorecido –, progressivamente, vai assumindo um caráter não de
complementar, mas de substituto dos serviços públicos de saúde8. Ademais, para
além da abertura de espaço para atuação dos planos (seguros) de saúde, o Sistema
Único de Saúde (SUS) também tem sido alvo da privatização – o que não ocorre de
forma inédita na saúde, mas que se opera de forma diferenciada, como é o caso das
OS.
Desse modo, o que observamos é um deslocamento da responsabilidade
pelos diversos problemas que o SUS vem enfrentando para sua efetivação, da falta
de recursos suficientes para as formas de gestão do sistema. Nesse sentido, o que
se tem por suposto é a ineficiência da administração pública direta ou indireta
(BEHRING, 2008b).
Isso pode ser observado no município do Rio de Janeiro quando no Plano
Municipal de Saúde (PMS) 2009-2013 menciona-se uma série dificuldades na
materialização do SUS. Reconhece-se a fragmentação dos diferentes níveis de
atenção, a falta de continuidades das ações que estão aliadas à utilização das
urgências e emergências como porta de entrada do sistema, além da distribuição
desigual dos serviços nas diferentes Áreas de Planejamento9 (AP).
No entanto, a solução proposta parece estar aquém de uma efetiva
concretização do SUS, já que, embora se pretenda uma ampliação da rede
assistencial, a inauguração de novas unidades esteve condicionada à aprovação da
Lei nº 5 02610 de 19 de maio de 2009 que regulamenta as OS no município.
Rezende (2008) ao discorrer sobre a introdução da administração gerenciada
no âmbito do SUS assinala que na realidade constitui-se um mecanismo para a

8
O que reafirma uma cidadania dual: aqueles que podem atender suas necessidades via mercado e aqueles que
só resta o enfrentamento das longas filas nos hospitais e unidades de saúde da rede SUS.
9
Desde 1993, a cidade do Rio de Janeiro foi dividida em 10 AP,no âmbito da saúde, a saber: AP1) Centro,
Portuária, Rio Comprido, São Cristóvão, Paquetá e Santa Tereza; AP2.1) Botafogo, Copacabana, Lagoa e
Rocinha; AP2.2) Tijuca e Vila Isabel; AP3.1) Ramos, Penha, Ilha do Governador, Complexo do Alemão e Maré;
AP3.2) Inhaúma, Méier e Jacarezinho; AP3.3) Irajá, Madureira, Anchieta e Pavuna; AP4) Jacarepaguá, Barra da
Tijuca e Cidade de Deus; AP5.1) Bangu e Realengo; AP5.2) Campo Grande e Guaratiba; AP5.3) Santa Cruz
(SMSDC, 2009).
10
A referida Lei foi aprovada em caráter de urgência e sem considerar a rejeição da proposta na X Conferência
Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, tal como consta no próprio Plano Municipal de Saúde (SMSDC, 2009).
19

terceirização e privatização de serviços da saúde, acarretando uma série de


problemas. Dentre eles, destacamos:
desprofissionalização dos Serviços, dos Servidores Públicos e desorganização do
processo de trabalho em saúde; flexibilização dos contratos de trabalho; desmonte
da Gestão Única do SUS; recentralização da gestão de várias políticas públicas e da
gestão do SUS nos Ministérios e nas Secretaria de Estado; a hierarquização dos
serviços de saúde estará comprometida, na medida em que cada serviço
terceirizado/privatizado tem em si a característica de autonomia em relação à
Administração Pública e ao SUS. Fica comprometido o Sistema de Referência e
Contra-Referência (REZENDE, 2008, p.32).

Ademais, não evidenciamos no modelo de gestão das OS formas claras e


efetivas do exercício do controle social, o que compromete a possibilidade de
participação dos usuários – importante conquista expressa no texto constitucional.
Vale dizer que a elaboração do Plano Municipal de Saúde foi simultânea à do
Plano Plurianual (PPA)11, pois nos termos da Secretaria Municipal de Saúde e
Defesa Civil (SMSDC), “uma das formas de garantir a execução do PMS é garantir a
inserção destas ações em programas de trabalho do Plano Plurianual” (2009, p.106).
Além disso, o mesmo plano anuncia a ampliação de recursos para a saúde,
indicando que esta será a área que mais receberá recursos no período de 2010-
201312. Resta-nos saber de que forma esses recursos serão utilizados.
Nossa hipótese inicial era a de que parte considerável desses recursos seria
destinada aos contratos de gestão firmados com as OS para gerência das unidades
– principalmente as Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e Clínicas Saúde da
Família13 – e programas municipais de saúde, o que consideramos um grande
entrave para efetivação do SUS preconizado na CF/88.
O Serviço Social na cena contemporânea está fortemente comprometido com
a luta pela garantia de direitos – posicionamento que é fruto de um longo processo
de amadurecimento da categoria profissional. No entanto, o cenário no qual se
realiza o exercício profissional é completamente adverso. Trata-se de um momento
em que assistimos a recorrência a medidas e estratégias do capital para reavivar as
taxas de crescimento alcançadas no período de grande crescimento que se refletem
no âmbito da produção e da reprodução da força de trabalho.

11
No âmbito do Orçamento público é o “plano plurianual (PPA) [que] estabelece os projetos e os programas de
longa duração do governo, definindo objetivos e metas da ação pública para um período de quatro anos”.
Disponível em: http://www9.senado.gov.br/portal/page/portal/orcamento_senado Acesso em 16 abr 2011.
12
Cerca de 10 bilhões de reais, o que corresponde a 19% de todo o recurso do PPA e 27% dos valores
aplicados nas áreas de resultado (SMSDC, 2009).
13
Até 2013, a prefeitura tem como meta a implantação de 20 UPA e 70 Clínicas da Família.
20

No Brasil, a marca da reestruturação produtiva – uma das estratégias do


capital frente à crise –, nos termos de Mota e Amaral, tem sido
a redução dos postos de trabalho, o desemprego dos trabalhadores do núcleo
organizado da economia e a sua transformação em trabalhadores por conta própria,
trabalhadores sem carteira assinada, desempregados abertos, desempregados
ocultos por trabalho precário, desalento, etc. (MOTA ; AMARAL, 2010, p. 34)

Desse modo, paralelamente, temos um acirramento da “questão social”,


repercutindo diretamente no aumento da demanda por serviços sociais. Por outro
lado, assistimos a (des)responsabilização do Estado frente às políticas sociais,
abrindo espaço para forte privatização e mercantilização deste campo. Nesse
contexto, a luta pela garantia de direitos se coloca necessariamente na contra
corrente, pois significa empenhar uma luta contra o capital que incessantemente
busca a maximização de seus lucros. O Serviço Social – profissão inserida na
divisão sócio-técnica do trabalho – que possui como uma das frentes de atuação a
implementação das políticas sociais, vem sofrendo com seus novos contornos na
atualidade.
Neste modesto trabalho, partimos do pressuposto de que “as políticas sociais
[são] processo e resultado de relações complexas e contraditórias que se
estabelecem entre Estado e sociedade civil, no âmbito dos conflitos e luta de classes
que envolvem o processo de produção e reprodução do capitalismo” (BEHRING,
2009, p. 270). Desse modo, nosso esforço empreendido aqui se orienta por analisar
as relações sociais necessárias a realização do processo produtivo, mas sem
desconsiderar o processo de produção na sua continuidade, ou seja, a reprodução.
É nesse sentido que as inúmeras indagações nos levaram a investigar esse
processo de privatização em curso no município do Rio de Janeiro, pela via do
orçamento público14. Desse modo, o presente estudo estará baseado na análise das
peças orçamentárias, de documentos institucionais e em pesquisa bibliográfica
acerca da temática.
Para nos debruçarmos sobre o processo de privatização em curso na política
social de saúde no município do Rio de Janeiro temos por suposto a necessidade de
se considerar as múltiplas dimensões envolvidas e suas conexões internas. Desse
modo, não podemos perder de vista o processo de contrarreforma do Estado
Brasileiro e seus impactos no campo das políticas sociais, a particularidade do
desenvolvimento da política de saúde no município do Rio de Janeiro, a forma como
14
Vale ressaltar que o orçamento não é mera peça técnica, mas reflete as prioridades governamentais e as
disputas políticas.
21

as questões estruturais econômicas interferem na condução desta política, assim


como expressam determinada forma de alocação dos recursos do fundo público.
Tudo isso sem deixar de relevar o papel dos sujeitos envolvidos nesse processo, o
confronto entre os grupos que também tecem o processo em curso. Assim, nossa
bússola metodológica envolve a perspectiva da totalidade e a categoria da
contradição, centrais na análise.
Este trabalho expõe o resultado da pesquisa realizada a partir da seguinte
estrutura. No Capítulo I situamos nossa perspectiva de análise iniciando nossa
exposição como uma categoria central na tradição marxista: o trabalho. Buscamos
demonstrar sua configuração assumida na sociedade capitalista a fim de evitar a sua
dissociação da “questão social” que em determinado momento histórico passa a ser
enfrentada com as políticas sociais. Em seguida, evidenciamos que estas últimas
emergem com uma funcionalidade profundamente atrelada à promoção e
reprodução das relações sociais capitalistas. Por fim, tratamos das políticas sociais
no Brasil e sinalizamos a importância que o fundo público vem assumindo para o
capital.
No Capítulo II buscamos demonstrar o cenário no qual se desenvolve a
política de saúde após as conquistas celebradas no texto constitucional.
Consideramos que as marcas imprimidas pelo (des)financiamento, precarização e
focalização dos serviços de saúde, tal como a proposta de [contra]reforma do
Estado brasileiro são fundamentais para entender o processo que se materializa
atualmente na política de saúde carioca.
No Capítulo III apresentamos inicialmente as tendências de alocação dos
recursos no âmbito do orçamento municipal nos anos de 2009 e 2010 e o Fundo
Municipal de Saúde para, posteriormente, mergulharmos na análise da experiência
concreta de contratação de OS, sob a justificativa de promover a modernização da
gestão da rede serviços de saúde.
Nas Considerações Finais apresentamos um relatório parcial deste processo,
ainda em curso, mas que já nos indica elementos importantes para desmontar todos
os argumentos amplamente divulgados pelos defensores dos “novos” modelos de
gestão.
22

1 POLÍTICA SOCIAL, FUNDO PÚBLICO E SAÚDE

1.1 Trabalho e Política Social

Abordar a temática de política social não nos parece uma tarefa tão simples.
Objeto de reflexão de inúmeras pesquisas e estudos, orientados por diferentes
perspectivas teóricas, presente em muitos debates, esta temática tem se
apresentado como um rico campo de possibilidade analíticas. Dentro de uma
perspectiva crítica, à luz da tradição marxista, é que buscamos desenvolver nossas
análises neste presente trabalho.
Para tanto, consideramos absolutamente necessário iniciar nosso percurso
pela concepção de trabalho em Marx – uma das categorias centrais no interior da
tradição marxista – e a configuração que este assume na sociedade capitalista, de
modo que possamos contribuir com a superação do equívoco em dissociar trabalho
de “questão social” – que em determinado momento histórico passa a ser enfrentada
nas suas múltiplas manifestações, de maneira fragmentada, por meio das políticas
sociais. É este o espírito que nos guiará nas próximas linhas.
O trabalho é o meio pelo qual o homem interfere na natureza a fim de atender
suas necessidades. Em termos marxianos, “[...] o trabalho é um processo de que
participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua própria
ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza”
(MARX, 1988, p. 202). O homem atua na natureza, modificando-a e, no mesmo
processo, modifica a si próprio. Desse modo, diferenciando-se das atividades
naturais, o trabalho humano se caracteriza por conter uma relação mediada entre o
sujeito e o objeto. No decurso histórico permanece sempre um meio de trabalho, um
instrumento que permite essa relação mediada (NETTO ; BRAZ, 2009).
Ademais o que propicia a diferenciação entre o trabalho humano e o trabalho
das outras espécies é a capacidade teleológica que consiste na antecipação ideal
dos resultados deste. “Ele não transforma apenas o material sobre o qual opera: ele
imprime ao material o projeto que tinha conscientemente em mira, o qual constitui lei
determinante do seu modo de operar e ao qual tem de subordinar sua vontade”
(MARX, 1988, p.202).
23

Ao analisar o processo de trabalho, Marx (1988) define como componentes: a


atividade orientada a um fim – o próprio trabalho – que expressa uma
intencionalidade; a matéria sobre qual age o trabalho – objeto de trabalho – podendo
conter trabalho humano anterior (matéria-prima) ou não; e os meios de trabalho -
mediação posta entre a força de trabalho e a matéria. Ressaltamos ainda que para
Marx,
o que distingue as diferentes épocas econômicas não é o que se faz, mas como,
com que meios de trabalho se faz. Os meios de trabalho servem para medir o
desenvolvimento da força humana de trabalho e além disso, indicam as condições
sociais em que se realiza o trabalho (MARX, 1988, p. 204).

Até aqui descrevemos, ainda que brevemente, o processo de trabalho em


termos simples e abstratos. No entanto, na especificidade do modo de produção
capitalista, a finalidade central do processo de trabalho é a criação de mais valor
(mais valia).
São partícipes do processo de trabalho elementos diversos que atuam de
forma diferenciada na formação do valor dos produtos. O trabalhador através de sua
força de trabalho (capital variável) é o único elemento capaz de engendrar novo
valor que se origina do acréscimo de determinada quantidade de trabalho15. Neste
mesmo processo de trabalho, ocorre uma transferência dos valores e meios de
produção (capital constante) consumidos para o novo produto. Estes últimos,
diferentes da força de trabalho humana, são incapazes de gerar novo valor quando
atuam como elementos constitutivos do processo de trabalho e não mais como
resultado deste. No entanto, é pelo uso, ou seja, pela ação do trabalho vivo
(humano) que se torna possível conservar no novo produto o trabalho pretérito
incorporado neste16.
Os produtos originários deste processo – as mercadorias – não têm somente
a função de satisfazer necessidades humanas, materiais ou espirituais. Ao final
temos produtos que contêm em si trabalho humano incorporado, ou seja, a
quantidade de trabalho socialmente necessário neles investido, elemento comum
que permite que ocorra a troca entre produtos de qualidades diversas. “Assim,

15
“A produção mercantil capitalista, à diferença da produção mercantil simples, assenta na exploração da força
de trabalho, que o capitalista compra mediante o salário. Os ganhos (lucros) do capitalista [...]: sua origem está
na exploração do trabalho – reside no interior do processo de produção de mercadorias, que é controlado pelo
capitalista” (NETTO ; BRAZ, 2009, p. 83, grifos dos autores).
16
Isso revela claramente que o capital não pode prescindir do trabalho, pois este último além de produzir mais
valia, empresta vida aos meios de produção.
24

portanto, a mercadoria é uma unidade que sintetiza valor de uso e valor de


troca” (NETTO ; BRAZ, 2009, p. 80, grifos dos autores).
O trabalho corporificado nas mercadorias possui também uma natureza dupla.
Há o trabalho na sua forma abstrata, ou seja, uma atividade despida de qualquer
traço definidor, mas que por ser dispêndio de energia física e/ou mental permite uma
mensuração. Por outro lado, temos a realização do trabalho concreto/útil que é
caracterizado pela forma como essa energia é despendida.
No decorrer do desenvolvimento das relações de produção a própria força de
trabalho se transforma em mercadoria. Essa lógica de produção de mercadorias se
universaliza17 a tal ponto no modo de produção capitalista que passa a permear
todas as esferas da vida social.
O processo capitalista de produção expressa, portanto, uma maneira historicamente
determinada de os homens produzirem e reproduzirem as condições materiais da
existência humana e as relações sociais através das quais levam a efeito a
produção. Neste processo se reproduzem, concomitantemente, as ideias e
representações que expressam estas relações e as condições materiais em que se
reproduzem, encobrindo o antagonismo que as permeia (IAMAMOTO apud
IAMAMOTO ;CARVALHO, 2006, p. 30).

Na sociedade capitalista a produção social não se refere apenas à produção


de objetos materiais, mas também à “[...] relação social entre pessoas, entre classes
sociais que personificam determinadas categorias econômicas” (IAMAMOTO apud
IAMAMOTO ; CARVALHO, 2006, p. 30). Tanto o capital quanto o trabalho
assalariado se supõem e para que este modo de produzir se realize é necessário
que o capitalista – detentor dos meios de produção – e o trabalhador – possuidor
apenas de sua força de trabalho – se confrontem no mercado enquanto
proprietários, “[...] dotados de igual condição, diferenciando-se apenas por um ser o
vendedor e o outro o comprador, sendo ambos juridicamente pessoas iguais”
(MARX, 1988, p. 188).
Assim, para dar vida ao processo produtivo o capitalista emprega a força de
trabalho, sendo ela mesma uma mercadoria18, cuja particularidade se expressa na
característica de ser a única mercadoria que é fonte de valor. Mas, para que a força
17
“A riqueza das sociedades onde impera o regime capitalista de produção se nos parece como ‘um imenso
arsenal de mercadorias e a mercadoria como sua forma elementar’. Por isso nossa investigação parte da
mercadoria” (MARX, 1975 apud IAMAMOTO apud: IAMAMOTO ; CARVALHO, 2006). Assim, é partindo da
mercadoria que Marx consegue reproduzir a totalidade das relações sociais capitalistas.
18
A força de trabalho, no entanto, não é uma mercadoria na sua essencialidade. Ela se torna mercadoria dentro
do processo produtivo capitalista, no qual a força de trabalho incorpora em si valor de uso e valor de troca
necessário a manutenção do capital. A capacidade teleológica – possibilidade de projetar e escolher – não
permite torná-la integralmente uma mercadoria, pois ao mesmo tempo em que ela dá vida ao processo produtivo,
produzindo e reproduzindo as relações sociais capitalistas, também carrega em si a potencialidade de alterar
essas mesmas relações.
25

de trabalho apareça como uma mercadoria é necessário que o trabalhador seja livre
para vender sua força de trabalho por um determinado período de tempo e, ainda,
desprovido dos meios de produção.
A continuidade dessa relação exige que o possuidor da força de trabalho venda-a
sempre por tempo determinado [...]. Tem sempre de manter sua força de trabalho
como sua propriedade, sua própria mercadoria, o que só consegue, se a ceder ao
comprador apenas provisoriamente, por determinado prazo, alienando-a sem
renunciar sua propriedade sobre ela. [...] para o possuidor encontrar no mercado
força de trabalho como mercadoria: o dono dessa força não pode vender
mercadorias em que encarne seu trabalho, e é forçado a vender sua força de
trabalho que só existe nele mesmo (MARX, 1988, p. 188).

Marx (1988) reconhece no trabalho o elemento fundante do ser social. Por


meio do trabalho se exprime a essência humana que é um produto histórico. Mas, a
forma como se realiza esse trabalho na sociedade capitalista – na qual os homens
não controlam mais os instrumentos de trabalho, as matérias de produção, os
produtos nem as relações travadas no processo de trabalho – se constitui enquanto
trabalho alienado que atinge basicamente em três níveis os trabalhadores.
O primeiro nível constitui-se na relação entre trabalhador e o produto de seu
trabalho (que não lhe pertence, mas sim ao capitalista); o segundo nível encontra-se
na relação com o outro, o que não permite os trabalhadores reconhecerem-se como
iguais; e, por fim, o trabalho alienado afasta o homem da natureza e de si mesmo.
A forma específica de alienação do modo de produção capitalista é o fetiche
da mercadoria. Esta última torna-se para o homem algo estranho, pois não lhe
permite reconhecer nela sua capacidade produtiva. Assim, passa-se a atribuir-lhe o
valor por meio de suas características, como se fossem as qualidades inerentes que
a valorizam. Nesse sentido, se oculta o processo que a originou e todas as relações
sociais contidas nela.
[...] As relações socais dos produtores aparecem como se fossem relações entre as
mercadorias, como se fossem relações entre coisas. A mercadoria passa a ser,
então, a portadora e a expressão das relações entre os homens. [...] na medida em
que o movimento das mercadorias se apresenta independentemente da vontade de
cada produtor, opera-se uma inversão: a mercadoria, criada pelos homens, aparece
como algo que lhes é alheio e os domina; a criatura (a mercadoria) revela um poder
que passa a subordinar o criador (homens) (NETTO ; BRAZ, 2009, p. 92, grifos dos
autores).

Por fim, mas não menos importante, destacamos que o modo de produção do
capital é ao mesmo tempo processo de trabalho – processo em que por meio do
trabalho concreto a força de trabalho em contato com os meios de produção cria
novos valores de uso – e de valorização – processo em que ocorre valorização dos
26

valores contidos nos meios de produção através do trabalho vivo19. De forma alguma
tratamos de processos independentes, mas sim de uma unidade (IAMAMOTO;
IAMAMOTO ; CARVALHO, 2006).
O processo de produção, quando unidade do processo de trabalho e do processo de
produzir valor, é processo de produção de mercadorias; quando unidade do
processo de trabalho e do processo de produzir mais valia, é processo capitalista de
produção, forma capitalista da produção de mercadorias (MARX, 1988, p. 222).

Assim como para Iamamoto (apud IAMAMOTO ; CARVALHO, 2006), o que


nos interessa neste momento é destacar as relações sociais envolvidas na
realização do processo de produção [capitalista]. Para isso, tanto os capitalistas
quanto os trabalhadores não devem ser pensados individualmente, mas “enquanto
classes sociais que personificam categorias econômicas: o capital, o trabalho e o
seu antagonismo. E, ainda, considerar o processo de produção na sua continuidade,
isto é, na sua reprodução” (IAMAMOTO apud IAMAMOTO ; CARVALHO, 2006, p.
46, grifos da autora).
Enquanto processo que demanda continuidade, a produção é também
reprodução, ou seja, ao final de cada processo produtivo estão postos os elementos
e condições para que este possa se reiniciar. “Por isso mesmo, a produção
capitalista não é tão-somente produção e reprodução de mercadorias e de mais
valia: é produção e reprodução de relações sociais” (NETTO ; BRAZ, 2009, p.
136, grifos dos autores).
Ao final de cada processo produtivo temos, de um lado, os capitalistas,
detentores dos meios de produção e dispondo de condições para comprar a força de
trabalho e, de outro, os trabalhadores, despojados dos meios de produção e
encontrando na venda de sua força de trabalho o único meio para sobreviver. Nesse
sentido, ao produzir mercadorias os trabalhadores estão produzindo e reproduzindo
também sua própria condição de exploração20 (NETTO ; BRAZ, 2009).

19
Nesse processo a força de trabalho retira os meios de produção de sua inércia, transferindo os valores
contidos neles (trabalho morto) para a nova mercadoria. “O que se consome dos meios de produção é o valor de
uso e o trabalho cria produtos através desse consumo. [...] O valor dos meios de produção reaparece no valor do
produto, mas falando exatamente, não é reproduzido. O que é produzido é o novo valor de uso em que
reaparece o anterior valor de troca” (MARX, 1988, p. 233). Ademais, em ação, a força de trabalho é capaz não
só de reproduzir seu próprio valor, mas de criar valor excedente. Isso decorre da apropriação do capitalista do
trabalho excedente que não é pago ao trabalhador sob a forma salário, sendo este inferior aos valores
produzidos no processo produtivo. Vale salientar, que é o trabalho socialmente necessário a mediação do
trabalho excedente, ou seja, é por necessitar do salário que o trabalhador compõe o processo que engendra
mais valor.
20
“A classe trabalhadora cria, pois, em antítese consigo mesma, os próprios meios de sua dominação, como
condição de sua sobrevivência” (IAMAMOTO apud IAMAMOTO ; CARVALHO, 2006, p. 47).
27

No decurso histórico é perceptível que na relação estabelecida entre capital e


trabalho, aqueles que se encontram na condição de portadores apenas de sua força
de trabalho tendem a ficar cada vez mais expropriados. O que nos remete à lei geral
da acumulação capitalista21, pois ao passo que se eleva progressivamente o
montante da riqueza social produzida, vemos crescendo igualmente a pobreza.
Independentemente das características particulares das economias nacionais, em
todos os espaços em que se desenvolveu e desenvolve a acumulação capitalista, o
resultado é essa polarização riqueza/pobreza; evidentemente, a consideração de
ambas (riqueza e pobreza sociais) deve ser contextualizada historicamente –
entretanto, mesmo com essa contextualização, o que resulta da acumulação
capitalista é a polarização mencionada (NETTO ; BRAZ, 2009, p. 138-9).

Com efeito, a prova da vigência da lei geral da acumulação capitalista se


expressa na atualidade da “questão social”, ineliminável do modo de produção
capitalista e determinada pela referida lei. Ainda que haja diferentes concepções
sobre a “questão social”, podemos considerar que nos diferentes períodos históricos,
desde sua emersão22 até os dias atuais, suas expressões foram objetos de variadas
intervenções/ respostas, construídas no tensionamento da luta de classes. No
entanto, essas respostas dadas nunca atingiram o cerne da contradição
capital/trabalho, até porque não há como superar a “questão social” sem superar os
marcos da sociedade capitalista.
Sabendo-se que as respostas dadas variam historicamente, especificamente
na Idade dos Monopólios – que recebe atenção especial neste trabalho – a “questão
social” passa a ser enfrentada via políticas sociais23. Mas, primeiramente,
necessitamos demarcar o surgimento das políticas sociais, pois se por um lado, só

21
“Quanto maiores a riqueza social, o capital em funcionamento, o volume e a energia de seu crescimento,
portanto, também a grandeza absoluta do proletariado e a força produtiva do seu trabalho, tanto maior o exército
industrial de reserva. A força de trabalho disponível é desenvolvida pelas mesmas causas que a força expansiva
do capital. A grandeza proporcional do exército industrial de reserva cresce, portanto, com as potências da
riqueza. [...E] quanto maior, finalmente a camada lazarenta da classe trabalhadora e o exército industrial de
reserva, tanto maior o pauperismo oficial” (MARX, 1984 apud NETTO ; BRAZ, 2009, p. 138).
22
Segundo Netto (2007), o termo questão social surgiu no século XIX para dar conta do fenômeno do
pauperismo na Europa Ocidental, decorrente da primeira onda industrializante iniciada na Inglaterra. Como
nunca havia se registrado na história a pobreza se elevava na razão direta em que aumentava a capacidade
social de produção de riquezas.
23
Nesse período, a atuação do Estado passa a ser mais organizada e sistemática e para implementar suas
ações um elenco de profissões é demandado, dentre elas, o Serviço Social (NETTO, 2007). A intervenção
estatal realiza-se, precisamente, fragmentando e parcializando a “questão social”, o que, segundo Netto, não
poderia ocorrer de outra forma. Tomar a “questão social” na sua “totalidade processual específica é remetê-la
concretamente à relação capital/trabalho [...]. [Deste modo], enquanto intervenção do Estado burguês no
capitalismo monopolista, a política social deve constituir-se necessariamente em políticas sociais: as sequelas da
‘questão social’ são recortadas como problemáticas particulares (o desemprego, a fome, a carência habitacional,
o acidente de trabalho, a falta de escolas, a incapacidade física etc.) e assim enfrentadas” (ibid, p.32, grifos do
autor).
28

podemos situar sua gênese no modo capitalista de produção, por outro, não
podemos localizá-las desde sua fase inicial. Elas surgem num período específico: na
transição entre o capitalismo livre concorrencial e o capitalismo monopolista – fins do
século XIX e início do século XX –, momento em que o capitalismo atinge sua
maturidade e o Estado24 alarga suas funções, atuando de forma mais organizada e
sistemática.
Vale precisar que tal gênese não pode ser compreendida descolada do
debate sobre o papel do Estado. Nesse sentido, basicamente dois elementos são
essenciais para entender esse processo: o crescimento do movimento operário,
assim como o fenômeno da monopolização do capital.
No estágio concorrencial do modo de produção temos uma forte presença do
ideário da tradição liberal, o qual preconizava uma não intervenção estatal na
economia. Mas, ainda que houvesse essa defesa ferrenha da não interferência do
Estado, sabemos que sua atuação sempre foi imprescindível para a manutenção da
ordem capitalista25. Nesse sentido, o Estado se restringia basicamente a três
funções: proteção da propriedade privada; controle dos efetivos policiais e atuação
em situações emergenciais.
Na passagem do estágio concorrencial para o monopolista, vários processos
são deflagrados e o alargamento das funções estatais26 – para além das três
funções básicas já desempenhadas – passa a ser uma exigência do modo de
produção capitalista. O Estado deveria intervir organizada e sistematicamente na
dinâmica da economia capitalista. Mas, para que se pudesse viabilizar a busca
constante de lucros do capital, o Estado necessitava de legitimidade frente às outras
frações de classes.27 Assim, não podemos deixar de referendar que o Estado é

24
Behring e Boschetti (2009) ressaltam que não se trata de estabelecer uma linha evolutiva entre o Estado liberal
e o Estado social, as primeiras iniciativas relativas às políticas sociais devem ser compreendidas na relação de
continuidade entre esses dois momentos da intervenção estatal. Tanto o Estado liberal quanto o Estado social
têm em comum o reconhecimento de direitos, mas sem tocar nos fundamentos da ordem capitalista.
25
Nos termos de Netto, “[...] o Estado, desde quando a pressão da burguesia ascendente deu origem ao
chamado absolutismo, sempre interveio no processo econômico capitalista; o traço intervencionista do Estado
[...] a serviço de franjas burguesas revela-se muito precocemente [...]. Nada é mais estranho ao desenvolvimento
capitalista do que um Estado “árbitro” (2007a, p. 24, grifo do autor).
26
Para uma análise muito consistente das funções estatais que foram alargadas no estágio monopolista, ver
Netto, 2007.
27
É nesse estágio especificamente que “as funções políticas do Estado imbricam-se organicamente com suas
funções econômicas” (NETTO, 2007, p. 25). Mas, deve-se considerar que articulação entre essas funções é
mediatizada pela correlação das forças sociais. Netto nos alerta que as respostas sociopolíticas do capitalismo
monopolista comportam alternativas que variam desde o Welfare State até o fascismo.
29

constituído por uma intensa correlação de forças que tem como arena a luta de
classes.
Vale ressaltar que quando nos referirmos ao Estado, não se pode
desconsiderar que este é mais antigo que o capital e, nesse sentido, deve-se evitar
cair no erro de derivar suas funções diretamente das necessidades de produção e
da circulação de mercadorias (MANDEL, 1985). Nos termos mandelianos, o Estado
tornou-se “parteiro do modo de produção capitalista” apenas quando houve certo
grau de maturidade nas relações de produção que, por sua vez, alteraram as
relações entre as antigas e novas classes proprietárias, derruindo as formas
tradicionais de dominação política por meio da expansão do capital-dinheiro. É neste
momento em que o Estado torna-se fundamental para a acumulação capitalista.
Assim, nessa transição do capitalismo concorrencial para o monopolista
alterou-se
necessariamente tanto a atitude subjetiva da burguesia em relação ao Estado,
quanto a função objetiva desempenhada pelo Estado ao realizar suas tarefas
centrais. O surgimento dos monopólios gerou uma tendência à superacumulação
permanente nas metrópoles e à correspondente propensão a exportar capital e a
dividir o mundo em domínios coloniais e esferas de influência sob o controle das
potências imperialistas. Isso produziu um aumento substancial nas despesas com
armamentos e o desenvolvimento do militarismo, o que, por sua vez, levou a um
crescimento ainda maior do aparato estatal, envolvendo um desvio maior de
rendimentos sociais para o Estado (MANDEL, 1985, p. 337-8).

Nesse processo também tiveram grande relevância para essa mudança no


papel estatal a mobilização e organização do movimento operário28 (BEHRING ;
BOSCHETTI, 2009). O acúmulo de lutas dos trabalhadores culminou em conquistas
no trânsito à Idade dos Monopólios – vide a luta em torno da redução da jornada de
trabalho.
Ademais a mobilização e organização da classe trabalhadora contaram com o
alento da vitória do movimento socialista na Rússia de 1917, fortalecendo o
movimento operário internacional. Mas, note-se que as conquistas das classes

28
Conjugados aos processos sociopolíticos manifestos na segunda metade do século XX podem ser localizados
articuladamente três outros processos: um de natureza científico-técnica – alto desenvolvimento das forças
produtivas – e, outros dois de natureza estritamente econômica – surgimento dos monopólios e a modificação do
papel dos bancos. O surgimento dos monopólios industriais é acompanhado também pela monopolização do
capital bancário. Posteriormente, a fusão dos referidos capitais constitui o que conhecemos por capital financeiro
que assume absoluta centralidade no estágio imperialista do capitalismo, gestado nas últimas décadas do século
XIX e que se prolonga – contendo transformações significativas – até os tempos atuais, entrada do século XXI
(NETTO ; BRAZ, 2009).
30

trabalhadoras ao longo da historia são precedidas de movimentos de pressão sobre


a classe dominante29.
Dessa forma, diante da “[...] concretização das possibilidades econômico-
sociais e políticas segregadas na ordem monopólica [...]” (NETTO, 2007, p. 29) se
instaura um novo modo de intervir sobre a “questão social”: as políticas sociais30.
Não devemos esquecer que, embora incorpore demandas legitimas das classes
trabalhadoras, este ainda é um Estado de classe, ou seja, o atendimento das
reivindicações dos trabalhadores tem como limite último a manutenção da ordem
capitalista.
Por isso é relevante o entendimento de que as políticas sociais condensam
interesses contraditórios, pois ao passo que podem significar melhorias reais nas
condições de vida dos trabalhadores, também favorecem a acumulação capitalista.
No desencadeamento do processo de acumulação a busca incessante por
lucros implica na necessidade de aumento da produtividade do trabalho. Disto
resulta que o capitalista investe proporcionalmente mais em capital constante em
detrimento do capital variável, possibilitando um crescimento da taxa de mais valia
ou exploração31. Nesse sentido, ainda que não possa prescindir do emprego da
força de trabalho no processo produtivo, a tendência é a de expulsar contingentes
cada vez maiores de trabalhadores, engrossando as camadas do denominado
exército industrial de reserva – produto e condição da efetivação do processo de
acumulação.
Contraditoriamente, portanto, a classe trabalhadora, ao fazer crescer a lucratividade
da classe capitalista, reduz as possibilidades de obter os meios de vida do conjunto
da população trabalhadora, já que neste mesmo processo em que cria riquezas para
outros, cria também as condições para que se reproduza uma parcela de população
excessiva para as necessidades médias do capital, isto é, em proporção à
intensidade e extensão do processo de acumulação (IAMAMOTO apud IAMAMOTO
; CARVALHO, 2006, p. 59).

29
“O surgimento das políticas sociais foi gradual e diferenciado entre os países, dependendo dos movimentos de
organização e pressão da classe trabalhadora, do grau de desenvolvimento das forças produtivas e das
correlações e composições de força no âmbito do Estado. Os autores são unânimes em situar o final do século
XIX como o período em que o Estado capitalista passa a assumir e a realizar ações sociais de forma mais ampla,
planejada, sistematizada e com caráter de obrigatoriedade” (BEHRING e BOSCHETTI, 2009, p. 64).
30
Note-se que as sequelas/refrações da “questão social” passam a ser enfrentadas via políticas sociais, mas de
forma fragmentada, pois de maneira alguma essa intervenção atinge ou objetiva atingir concretamente o cerne
da relação capital e trabalho.
31
Vale destacar que essa redução do capital investido na compra da força de trabalho é uma redução relativa,
não absoluta, já que como sinalizamos anteriormente o capital não pode prescindir da força de trabalho, pois é o
único elemento capaz de gerar mais valor no processo de produção. Neste processo o capitalista, mantendo o
mesmo gasto com capital variável, coloca em movimento maior quantidade de trabalho, através de maior
exploração intensiva e extensiva de forças de trabalho individuais (IAMAMOTO ; IAMAMOTO ; CARVALHO,
2006).
31

Deste modo, as políticas sociais não possuem uma inserção casual neste
processo. São datadas historicamente e emergem com uma funcionalidade bem
definida: promover a produção e reprodução das relações sociais capitalistas, como
será tratado no item seguinte.

1.2 Política Social: produção e reprodução das relações sociais

As políticas sociais são dirigidas tanto aos trabalhadores empregados no


processo produtivo, funcionando como complementos ou salários indiretos, quanto
para os trabalhadores improdutivos e aqueles pertencentes ao exército industrial de
reserva. Neste último caso, as políticas sociais são essenciais para sua
sobrevivência. Contraditoriamente as políticas sociais também atendem a interesses
do capital, possibilitando as suas condições de produção e reprodução. Desse
modo, no elenco de funções assumidas pelo Estado nos marcos do monopólio
localizamos sua função extraeconômica ou política, na qual
[...] como instância da política econômica do monopólio – é obrigado não só a
assegurar continuamente a reprodução e a manutenção da força de trabalho,
ocupada e excedente, mas é compelido (e o faz mediante os sistemas de
previdência e segurança social, principalmente) a regular a sua pertinência a níveis
determinados de consumo e a sua disponibilidade para a ocupação sazonal, bem
como a instrumentalizar mecanismos gerais que garantam sua mobilização e
alocação em função das necessidades e projetos do monopólio (NETTO, 2007, p.
27).

É nesse sentido que situamos a funcionalidade das políticas sociais.


Constituem-se enquanto respostas positivas a demandas legítimas da classe
trabalhadora [ocupada32 ou não], mas na medida em que deixam intocáveis os
fundamentos da ordem capitalista e que possam possibilitar a maximização dos
lucros.
[...] A funcionalidade essencial da política social do Estado burguês no capitalismo
monopolista se expressa nos processos referentes à preservação e ao controle da
força de trabalho – ocupada, mediante a regulamentação das relações
capitalistas/trabalhadores; lançada no exército de trabalho, através dos sistemas de
seguro social. Os sistemas de previdência social (aposentadorias e pensões), por
seu turno, não atendem apenas a estas exigências: são instrumentos para
contrarrestar a tendência ao subconsumo, para oferecer ao Estado massas de
recursos que doutra forma estariam pulverizados (os fundos que o Estado administra
e investe) e para redistribuir pelo conjunto da sociedade os custos da exploração

32
Neste caso, na atualidade consideramos como força de trabalho ocupada não somente os trabalhadores
inseridos da lógica formal do contrato de trabalho, mas também os grandes contingentes de trabalhadores
inseridos do mercado informal de trabalho.
32

capitalista-monopolista da vida “útil” dos trabalhadores, desonerando os seus únicos


beneficiários, os monopolistas. [...] As políticas setoriais que implicam investimentos
em grande escala [...] abrem espaços para reduzir as dificuldades de valorização
33
sobrevindas da supercapitalização (NETTO, 2007, p. 31).

Feitas essas considerações podemos retomar a nossa análise inicial acerca


da produção e reprodução na lógica capitalista melhor nutridos desse debate, o que
permite clarificar o fato de que as políticas sociais possibilitam a garantia das
condições para que a força de trabalho ocupada se preserve e reproduza para
novamente compor o processo produtivo. Do mesmo modo que propiciam a
concretização da mais valia – gerada no processo de produção, mas que somente
se realiza na esfera da circulação – quando nos referimos à possibilidade de
efetivação do consumo.
Não podemos deixar de acrescentar que a forma como as políticas sociais se
desenvolvem relaciona-se tanto aos fatores políticos, sociais, econômicos e culturais
de cada formação social quanto aos protagonistas em cena. É um espaço, no qual
se desenvolve também a luta de classes e por isso, segundo Netto (2007), as lutas e
confluências dos protagonistas não se esgotam na sua formulação, atingem a
implementação que é igualmente permeada por tensões e alianças, inclusive no que
se refere ao papel desempenhado pelas categorias técnico-profissionais
especializadas.
No interior da tradição marxista, há um consenso estabelecido de que o
capitalismo experimentou profundas transformações em fins do século XIX. No
entanto, vale a pena demarcar que essas transformações apenas elevaram o
patamar
[d]o sistema totalizante de contradições que confere à ordem burguesa os seus
traços basilares de exploração, alienação e transitoriedade histórica, todos eles
desvelados pela crítica marxiana (NETTO, 2007, p. 19).

Em fins do século XIX na Alemanha, Bismark implementou algumas ações


pautadas na lógica do seguro social que podem ser consideradas protoformas das
políticas sociais. Essas medidas tinham em vista frear o crescente movimento social
democrata no período. Nesse sentido, se por um lado constituiu algumas medidas
de proteção aos trabalhadores (leis de acidente de trabalho, de seguro-doença, de
proteção à invalidez e certa proteção à aposentadoria), por outro, foi duro no trato às
organizações revolucionárias do proletariado (GRANEMANN, 2008).
33
Vide um exemplo bem atual da área da saúde [e não só] que vem sofrendo sucessivos ataques diante da
busca constate de lucros do capital. Este campo tem sido a “menina dos olhos” para a implementação dos mais
diversos instrumentos de privatização.
33

Somente no pós 1929, podemos ver com clareza uma intervenção estatal na
economia de modo mais abrangente na vida social em escala mundial. Segundo
Salvador (2010), a ideia contemporânea de seguridade social desenvolveu-se
gradualmente a partir da sanção do Social Security Act pelo presidente norte
americano Franklin Roosevelt. No entanto, somente com o Informe Beveridge houve
uma ampliação e adoção em diversos países a favor da universalização da
seguridade social.
Essas medidas implementadas pelo presidente Roosevelt não podem ser
descoladas do contexto de profunda crise que assolou o mundo capitalista em fins
da década de 1920, reduzindo um terço do comércio mundial e aproximando o
número de desempregados na Europa a 30 milhões (GRANEMANN, 2008). Disto
resultou o New Deal (Nova Política), caracterizado por uma interferência incisiva do
Estado a fim de retomar o crescimento da economia.
John Maynard Keynes, economista britânico, diante da crise de 1929 também
estava preocupado com respostas. Suas preocupações se relacionavam a saídas
democráticas34. Sua proposta apontava uma mudança na relação do Estado com o
sistema produtivo, rompendo com os princípios liberais clássicos. Desse modo,
o Estado, com o keynesianismo, tornou-se produtor e regulador, o que não
significava o abandono do capitalismo ou a defesa da socialização dos meios de
produção. Keynes defendeu a liberdade individual e a economia de mercado, mas
dentro de uma lógica que rompia com a dogmática liberal conservadora da época
(BEHRING ; BOSCHETTI, 2009, p. 84, grifos nossos).

É nesse período, nos anos imediatamente posteriores à crise, que o mundo


pôde assistir à consolidação e generalização das políticas sociais, sobretudo, no
pós-1945, o que posteriormente permitiu ao capitalismo por aproximadamente três
décadas vivenciar os “anos dourados”, característicos dos países centrais.
Trataremos a seguir dos fundamentos desse processo.
Nos marcos do keynesianismo, o Estado deveria estar embasado por alguns
pilares: geração de emprego dos fatores de produção via produção de serviços
públicos, além da produção privada; aumento da renda e promoção de uma maior
igualdade via instituição de serviços públicos, incluindo neste rol as políticas sociais
(BEHRING ; BOSCHETTI, 2009).
Ao keynesianismo aliou-se o fordismo, caracterizado pela produção e
consumo em massa e dos acordos coletivos com os trabalhadores do setor

34
Ressalta-se aqui que as formulações de Keynes, de forma alguma, iam para além dos marcos da sociedade
capitalista.
34

monopolista em torno dos ganhos de produtividade do trabalho. Embora o fordismo,


tenha se constituído no início do século XX, somente no pós-1945 conseguiu se
estabelecer. Isso se deve porque o fordismo, além de ser um modo de produzir, é
também um modo de vida. Nesse sentido, necessitava de um modo de
regulamentação que o sustentasse, o que foi possível com o keynesianismo
(HARVEY, 1993).
Esse período foi caracterizado por ganhos tanto para o capital quanto para o
trabalho. O pacto firmado neste momento permitiu uma melhora efetiva nas
condições de vida dos trabalhadores, ao mesmo tempo em que proporcionou um
crescimento real da economia, possibilitando ao capital atingir as maiores taxas de
lucro. Ademais, propiciou a contenção da radicalidade das lutas operárias frente à
possibilidade de obter conquistas importantes nos marcos capitalistas.
Vale salientar que não devemos promover uma identidade entre Welfare State
e as políticas sociais. Segundo Mishra (1995 apud BEHRING ; BOSCHETTI, 2009),
não são todas nem quaisquer formas de políticas sociais que podem ser designadas
como Welfare State35. Este último possui uma conotação histórica, sendo mais
característico dos países centrais durante os anos dourados. A forma como se
processou dependeu tanto das forças em presença quanto dos elementos da
formação social de cada país.
Mas em fins da década de 1960 e início de 1970 esse padrão de acumulação
já esboçava seus primeiros sinais de esgotamento. Às altas taxas de inflação
combinavam-se as baixas taxas de lucro. Posteriormente, já em meados da década
de 1970, o quadro é de uma recessão generalizada. Essa onda de crise causou
impactos na economia mundial e exigiu medidas que possibilitassem a superação
das crises econômicas (ANDERSON, 1995).
Ainda que muitos neguem, o que assistimos na década de 1970 foi uma crise
clássica de superprodução. Behring e Boschetti, pautadas nas análises
mandelianas, assinalam alguns dos processos que implicaram na queda da taxa
média de lucros:

35
Para Mishra os princípios estruturantes do Welfare State se relacionam com aqueles apontados no Plano
Beveridge, a saber: “1) responsabilidade estatal na manutenção das condições de vida dos cidadãos, por meio
de um conjunto de ações em três direções: regulação da economia de mercado a fim de manter elevado nível de
emprego; prestação pública de serviços sociais universais, como educação, segurança social, assistência
médica e habitação; e um conjunto de serviços sociais pessoais; 2) universalidade dos serviços sociais; e 3)
implantação de uma ‘rede de segurança’ de serviços de assistência social” (BEHRING ; BOSCHETTI, 2009, p.
94).
35

A crise [...] tem a função objetiva de se constituir como meio pelo qual a lei do valor
se expressa e se impõe. Ela é a consolidação de dificuldades crescentes de
realização da mais valia socialmente produzida, o que gera superprodução,
associada à superacumulação. A própria lógica interna do crescimento cria
empecilhos no momento subsequente: a situação keynesiana de “pleno emprego”
dos fatores de produção – diminuindo, em consequência, o exército industrial de
reserva –, dificultou o aumento da extração da mais valia, com a ampliação do poder
político dos trabalhadores e maior resistência à exploração; e a generalização da
revolução tecnológica diminuiu o diferencial de produtividade (BEHRING ;
BOSCHETTI, 2009, 117-8).

Nesse ínterim, como resposta a mais uma crise do capital, a burguesia se


utilizou da combinação de três medidas principais: a reestruturação produtiva, a
mundialização do capital e ideologia neoliberal (BEHRING, 2008a). Embora as
referidas medidas determinem alterações no papel desempenhado pelo Estado no
interior da dinâmica capitalista, é o ideário neoliberal o que mais incide no mesmo,
imprimindo novos contornos as políticas sociais – uma de suas inúmeras
consequências.
A primeira experiência mundial36 ocorreu em 1973, no Chile, por meio de um
golpe militar – financiado pelo grande capital –, levando ao poder o general
Pinochet. Os teóricos37 que buscaram embasar essa nova fase do Estado eram
dissonantes das ideias desenvolvidas por Keynes. Exaltavam a força do livre
mercado, além de identificar a crise como uma suposta crise fiscal do Estado –
insuflado de gastos sociais – e, portanto, a necessidade apontada de constituição de
um Estado mínimo. Dessa forma, buscava-se construir argumentos para sustentar a
falsa ideia de que a crise era provocada pelo modo de intervenção do Estado na
economia.
Diante desse receituário, pode-se verificar que as consequências para a
classe trabalhadora são as piores: desmonte das políticas sociais; esvaziamento da
esfera pública, abrindo espaço para o lucro do capital; e, em decorrência disso, o
surgimento de políticas focalizadas para atender a população mais pauperizada, ou
seja, aqueles não podiam satisfazer suas necessidades via mercado
(GRANEMANN, 2008).
36
A programática neoliberal levou certo período para se tornar hegemônica, cerca de uma década. Em 1979, ao
ser eleito o governo Thatcher na Inglaterra, emergiu sua oportunidade. Este foi o primeiro país de capitalismo
avançado a explicitar seu empenho em pôr em prática a programática neoliberal. Posteriormente, temos a
adesão de outros países: 1980, com Reagan nos EUA; 1982, com Khol na Alemanha; 1983, com Schluter na
Dinamarca. Com exceção da Suécia e da Áustria, todos os países do norte da Europa ocidental aderiram a onda
de direitização, o que para Anderson, “tinha um fundo político para além da crise econômica do período”
(ANDERSON, 1995, p. 11).
37
Hayek e seus seguidores defendiam que as raízes da crise “estavam localizadas no poder excessivo e nefasto
dos sindicatos e, de maneira mais geral, do movimento operário, que havia corroído as bases da acumulação
capitalista com suas pressões reivindicativas sobre os salários e com sua pressão parasitária para que o Estado
aumentasse cada vez mais os gastos sociais” (ANDERSON, 1995, p. 10).
36

Segundo Sader (1995), cada país – a partir de suas estruturas deixadas pelos
modelos vigentes anteriormente – adotou sua versão do neoliberalismo.
Assim, este, em suas várias versões, se constituiu como uma resposta neste
quadro de crise. No Brasil, por exemplo, apenas tardiamente o ideário neoliberal
encontrou solo fértil para seu estabelecimento. Mas, antes de tratarmos da adoção
das medidas referenciadas pelo neoliberalismo e suas consequências para as
políticas sociais brasileiras – principalmente para a saúde –, iremos transitar no rumo
que estas últimas seguiram a partir da aprovação da Constituição Federal de 1988
(CF/88).

1.3 Política Social no Brasil e Fundo Público

Há uma vasta bibliografia que trata a trajetória das políticas sociais no período
anterior à promulgação da CF/8838. Embora não seja algo central para nosso estudo,
vale retomar as características principais que marcaram esse percurso.
Conforme Boschetti (2008), a trajetória do crescimento dos direitos no Brasil
foi marcada por uma “nebulosidade conceitual”, não houve opção por um único
modelo de proteção social.
Desde os anos 1920, tivemos a constituição de benefícios da previdência
social restritos apenas a algumas categorias. Particularmente, a garantia de direitos
no Brasil nasceu vinculada ao exercício de um trabalho assalariado, ou seja,
pautada na lógica do seguro. Esta lógica permeou predominantemente a proteção
social brasileira até fins dos anos 1960, praticamente sem alterações. E, já em
meados dos anos 1970, iniciou-se um processo, no qual certos direitos à saúde e
alguns benefícios da previdência passam a ser garantidos, sendo mais próximos à
lógica de “direito de cidadania” (BOSCHETTI, 2008).
Sem limitarmo-nos a esta explicação, vale considerar que um dos caminhos
importantes para se entender a emergência das políticas de proteção social
brasileiras consiste na necessidade de integração da classe trabalhadora ao sistema
capitalista.

38
Ver seguintes autores: VIANNA, 1998; OLIVEIRA ; TEIXEIRA, 1985; BEHRING ; BOSCHETTI, 2009; PAIVA,
2006; MALLOY, 1976; SANTOS, 1987; BEHRING, 2008a; MATOS, 2009; dentre outros.
37

Nesse sentido, os direitos vinculados ao trabalho imputaram ao Estado a


possibilidade de intervir na reprodução da força de trabalho, mas sem tocar na
questão da eliminação da propriedade privada.
Contudo, principalmente, a partir dos anos 1970
De alguma forma, tomou-se consciência de que o crescimento econômico e a
industrialização não haviam provocado nem a redistribuição da riqueza, nem a
redução das desigualdades, nem a integração da maioria da população em um
sistema de proteção social via salário (BOSCHETTI, 2008, p. 91, grifo da autora).

Assim, era inviável transpor para a realidade brasileira – basicamente


marcada pela acentuada concentração de renda e pelas relações informais de
trabalho, o que significa a ausência de proteções vinculadas ao trabalho – o modelo
de proteção social característico dos países europeus. Desse modo, inicia-se um
processo de luta pela extensão dos direitos da parcela da população não vinculada à
previdência.
Aos poucos o trabalho assalariado que era um elemento chave para pensar a
constituição da cidadania foi sendo destituído para ceder lugar a uma reivindicação
pautada no pertencimento à comunidade nacional. Nos termos da autora, “não por
acaso, o slogan dos movimentos de reivindicação de universalização da saúde nos
anos 1970, afirmava: ‘Saúde – direito dos cidadãos, dever do Estado’, em clara
oposição à vinculação entre saúde e previdência social predominante na época”
(BOSCHETTI, 2008, p. 92).
Nesse sentido, o avanço das lutas democráticas dos anos 1980 propiciou a
construção de um modelo de seguridade social pública, celebrado na CF/88. Este
conceito de seguridade social significou um avanço em termos de políticas sociais –
ainda que para alguns pesquisadores do tema, este conceito seja “retardatário,
híbrido, distorcido ou inconcluso” (BEHRING, 2008a, p. 250) –, pois englobou num
mesmo sistema apenas as políticas de saúde, previdência e assistência social.
Objetivou-se criar “um sistema de proteção social amplo, com perspectivas
universalizantes e fundado na ampliação da cidadania social” (BOSCHETTI ;
BEHRING, 2003). As políticas de saúde, previdência e assistência social deveriam
ser executadas formando um todo integrado e articulado, sustentadas nos princípios
constitucionais39. No entanto, não foi o que assistimos nos anos posteriores, nos

39
São eles: universalidade da cobertura e do atendimento, uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços
às populações urbanas e rurais, seletividade e distributividade na prestação de benefícios e serviços,
irredutibilidade do valor dos benefícios, equidade na forma de participação do custeio, diversidade na base de
financiamento e o caráter democrático e descentralizado da administração (CF/88).
38

quais verificamos um profundo ataque ao campo dos direitos, restando às políticas


sociais o trinômio articulado do neoliberalismo: a privatização, a focalização e a
descentralização (BEHRING, 2008b).
Para Salvador (2010), a vinculação de recursos às políticas sociais40 foi uma
grande conquista da CF/88 – forma encontrada para garantir sua efetivação, já que
historicamente no Brasil há uma subordinação das políticas sociais às políticas
macroeconômicas. Vide à industrialização do país que contou basicamente com
recursos do fundo previdenciário, tanto para investimentos nas empresas estatais
quanto na construção de infraestrutura no país.
Posteriormente, na abertura da década de 1990, a hiperinflação foi utilizada
como mecanismo de indução ao neoliberalismo e criou terreno fértil para sua
posterior germinação. A dívida contraída pelo setor privado no decorrer da década
de 1980, diante de pressões do Fundo Monetário Internacional (FMI), foi sendo
gradativamente socializada. Cerca de 70% da dívida externa do país se tornou
estatal (BEHRING ; BOSCHETTI, 2009).
Criou-se uma contradição entre a intensa geração de receitas de exportação pelo
setor privado e o intenso endividamento do setor público. [...] Ao governo só
restaram três caminhos: cortar gastos públicos, imprimir dinheiro ou vender títulos do
Tesouro a juros atraentes” (KUCINSKI ; BRANDFORD, 1987 apud BEHRING ;
BOSCHETTI, 2009, p. 139).

Nesse sentido, a Nova República, sob a justificativa de conter a crise que


atravessou o país na década de 1980, estabeleceu um terreno fértil para o
surgimento do neoliberalismo à brasileira (OLIVEIRA, 1995).
No governo do presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992), tivemos a
implantação de políticas de “desestatização, política monetária que privilegia os
juros nas alturas [...] privatizações e redução do Estado para o trabalho por
intermédio de várias reformas regressivas nos marcos dos direitos já conquistados”
(GRANEMANN, 2008, p. 20). Disto, podemos inferir que o caminho evidenciado pelo
Estado brasileiro foi o de emissão de títulos da dívida, o que elevou os juros e
aumentou o processo inflacionário.
Os efeitos da crise de endividamento foram muitos: empobrecimento generalizado
da América Latina, especialmente no seu país mais rico, o Brasil; crise dos serviços
sociais públicos num contexto de aumento da demanda em contraposição à não
expansão dos direitos; desemprego; agudização da informalidade na economia;
favorecimento da produção para exportação em detrimento das necessidades
internas (BEHRING & BOSCHETTI, 2009, p. 139).

40
Vincular os recursos acaba por imprimir uma obrigação da destinação de parte da receita à área social, de
modo a permitir a universalização dos direitos.
39

Dessa forma, ao longo da década de 1990, aos poucos se sedimentou o que


conhecemos por “reforma” do Estado. Tivemos uma importante expressão disso no
Plano de reestruturação do Estado proposto pelo governo do presidente Fernando
Henrique Cardoso (1995-1998), o Plano Diretor de Reforma do Estado (PDRE,
1995). O projeto inscrito neste plano tinha por suposto que a intervenção estatal no
mercado provocou crescentes distorções que se refletiram nesta década (MARE,
1995).
Há um conjunto de argumentos que balizam esse processo, em curso ainda
nos dias atuais. O Estado é acusado pelo excesso de burocratismo e,
fundamentalmente, pelo impedimento do desenvolvimento social e econômico do
país, ao se desviar de suas funções41. Supostamente a assunção de determinadas
funções, com ênfase no setor produtivo, teria engendrado uma crise fiscal do
Estado. Esses são alguns dos argumentos norteadores do projeto de [contra]reforma
inscrito no PDRE.
Esse arranjo é composto para indicar a necessidade de refuncionalização do
papel estatal, já que este, sob esta ótica, não estaria dando conta de responder as
demandas que lhe eram direcionadas, incluindo as de caráter social.
De modo geral, há uma crítica às duas respostas anteriores à crise: o
“populismo econômico” do governo Sarney [1985-1990] e o neoliberalismo do
governo Collor (PDRE, 1995; BEHRING, 2008a). O que se observa é um
distanciamento que se estabelece entre o neoliberalismo e projeto inscrito no PDRE.
No entanto, é absolutamente possível afirmar a existência de um “fio condutor” entre
os governos de Collor e Cardoso, pois mesmo havendo diferenças em torno de
método e conteúdo, ambos abortam a “possibilidade de um pacto social resultante
das lutas pós-ditadura, consolidado em parte na Constituição de 1988” (BEHRING,
2008a).
A despeito de todo o significado que envolveu a eleição do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva – por se tratar de “um representante da classe operária
brasileira com forte experiência de organização política” (BRAZ, 2004 apud BRAVO ;
MENEZES, 2011), o que envolvia uma forte expectativa de enfrentamento das
políticas de ajuste e a constituição de um cenário mais favorável às políticas sociais
e à participação social – tivemos não apenas uma continuidade, mas um
41
Nessa ótica, caberia ao Estado apenas o desempenho do papel de promoção e regulação do desenvolvimento
econômico e social.
40

aprofundamento das políticas empreendidas pelo governo de Fernando Henrique


Cardoso42.
Optou-se pela lógica da focalização em detrimento daquela vinculada ao
direito e à concepção de uma seguridade social universalizada, ao manter a
subordinação das políticas sociais à política econômica. Conforme Bravo e Menezes
(2011), as expectativas criadas sobre a eleição de Lula também contagiaram o
campo da saúde. Esperava-se que este governo fortalecesse o projeto da Reforma
Sanitária, conforme será tratado no próximo capítulo.
Mas antes de prosseguirmos é importante ressaltar que um dos elementos
fundamentais a se considerar na análise de viabilização/efetivação das políticas
sociais diz respeito ao financiamento. Como prescindir do financiamento se
queremos de fato concretizar determinada política social? Mas, não há como falar de
financiamento sem mencionarmos o fundo público que assume um lugar estrutural
na manutenção do capitalismo contemporâneo, sendo relevante tanto na reprodução
do capital quanto da força de trabalho (BEHRING, 2010; SALVADOR, 2010).
O fundo público corresponde ao montante de recursos recolhidos pelo Estado
para o exercício de suas inúmeras funções. Mas qual seria a proveniência desses
recursos que ao final vão servir – desproporcionalmente – tanto ao capital quanto ao
trabalho? O que nos importa ressaltar é que fundamentalmente o fundo público,
conforme tratamos aqui é sustentado “nos” e “pelos” salários dos trabalhadores.
Assim, para além do trabalho excedente (mais valia) que em parte é apropriado pelo
Estado, o fundo público também é constituído pelo trabalho necessário quando os
trabalhadores pagam direta e indiretamente – via consumo – os inúmeros impostos
(BEHRING, 2010).
É desse modo que se torna possível sustentar que
a exploração do trabalho na produção é complementada pela exploração tributária
crescente nesses tempos de intensa crise e metabolismo do capital, formando o
fundo público, especialmente em espaços geopolíticos nos quais as lutas de classe
não conseguiram historicamente impor barreiras a sistemas tributários regressivos
(BEHRING, 2010, p. 21, grifos da autora).

Conforme sinalizamos, o fundo público serve tanto ao capital quanto ao


trabalho, numa disputa que é expressão da luta de classes. Deste modo, verificamos
que são os trabalhadores que se encontram atualmente numa posição claramente

42
Conforme análise de Behring (2004) foram mantidos todos os parâmetros econômicos do período anterior: o
superávit primário, a Desvinculação de Receitas da União (DRU), taxas de juros parametradas pela Selic, o
inesgotável pagamento dos juros, encargos e amortizações da dívida pública, além do aumento da arrecadação
da União que não se traduziu em investimentos produtivos nem em políticas sociais.
41

desfavorável43. A forma como se estrutura o fundo público no Brasil demonstra que o


Estado de modo algum realiza uma redistribuição, já que a tributação pouco incide
sobre o patrimônio e recai fundamentalmente sobre os trabalhadores, na forma de
impostos diretos e indiretos, o que configura uma carga tributária extremamente
regressiva44.
Fato é que, embora a seguridade social seja uma importante conquista social
preconizada pela CF/88,
a concretização dessa conquista social passa pela efetivação do orçamento da
seguridade social; para tanto, um dos princípios constitucionais estabelecidos é a
diversidade das bases de financiamento, que deveriam ser constituídas por
contribuições sociais exclusivas. Essas contribuições adicionadas às receitas
arrecadas sobre a folha de pagamentos mais impostos a serem transferidos pelo
orçamento fiscal seriam conduzidas para um fundo público redistributivo da
seguridade social (SALVADOR, 2010, p. 27-28).

No entanto, o que a pesquisa de Salvador (2010) nos revela é que,


fundamentalmente, são os trabalhadores que sustentam o financiamento da
seguridade social via tributos diretos e indiretos. No período de 2000 a 2007,
analisado pelo referido autor, as contribuições sociais alcançaram a média de 90,1%
das fontes de financiamento da seguridade social.
A vinculação de recursos às políticas sociais é uma importante conquista
inscrita na CF/88, pois imprime uma obrigação da destinação de parte da receita à
área social, de modo a permitir a universalização dos direitos. Uma questão
relevante para o controle social da seguridade social é a vinculação dos recursos
aos fundos das políticas do sistema, no entanto, o que Salvador (2010) demonstra é
que muitas vezes uma parcela destes não passa pelos fundos, estando imune ao
controle por parte dos Conselhos.
No âmbito dessa disputa desleal pelo fundo público entre capital e trabalho
foram constituídos instrumentos importantes para drenagem de recursos da
seguridade social para a esfera financeira. Referimo-nos aqui à Desvinculação de
Receitas da União (DRU) e à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Em 1993, os economistas formuladores do Plano Real, com a pretensa defesa dos
equilíbrios das contas públicas brasileiras, defendem a criação de um Fundo Social
de Revisão n. 1, de 1994, permitindo a desvinculação de 20% dos recursos
destinados às políticas da seguridade social. Nos exercícios financeiros de 1994 e
1995, por meio do Fundo de Estabilização Fiscal (EC n. 10 e EC. 17 e,
posteriormente, EC n. 27), que criou a Desvinculação de Receitas da União (DRU),

43
No conjunto de autores que vem se dedicando ao debate do fundo público sob uma perspectiva crítica há
fortes indicações de que, no Brasil, uma parcela considerável do orçamento público tem se destinado ao
favorecimento do setor financeiro da economia através do pagamento da dívida pública. Ver: Alencar e
Granemann, 2009; Salvador, 2010; Behring, 2010, dentre outros.
44
Para uma melhor caracterização deste debate, ver Salvador (2010).
42

permitiu a desvinculação de 20% da arrecadação de impostos e contribuições até o


fim de 2003 (SALVADOR, 2010, p. 230-31).

Posteriormente, nos dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva


que manteve a mesma política fiscal do governo anterior, o período de vigência da
DRU contou com duas prorrogações: em 2003 – através da Emenda Constitucional
(EC) n. 42 (reforma tributária) – e em 2007 – através da EC n. 56 que estendeu o
prazo até o final de 2011 (SALVADOR, 2010). E, ao final de 2011, no governo da
presidente Dilma, novamente contamos com a prorrogação da vigência da DRU até
2015, por meio da EC n. 68. Assim, ao longo dos quase 17 anos de vida, a DRU
constituiu-se como um importante mecanismo de escoamento de recursos da
seguridade social45, sendo uma
peça-chave na estratégia da política fiscal para a composição do superávit primário,
o que significa que, “por meio deste expediente, processa-se, então, uma
transferência não desprezível de recursos do lado real da economia, e mais
explicitamente, da área social, para a gestão financeirizada da dívida pública [...]”
(SALVADOR, 2010, p. 380).

No que diz respeito à LRF, trata-se de da Lei Complementar n. 101 que foi
aprovada no ano de 2000, a fim de limitar despesas não financeiras e pôr no
primeiro plano o pagamento de juros. É nesse sentido que se realiza o superávit
primário à custa do corte de gastos sociais que resulta no sucateamento,
focalização, seletividade e privatização das políticas sociais46. Em linhas gerais,
a LRF é um instrumento de contingenciamento do gasto fiscal, diminuindo a
capacidade de intervenção do Estado e de ampliação dos gastos sociais. ela está
inserida no conjunto das políticas neoliberais em voga no país, a partir dos anos
1990, que comprometeram o crescimento e o desenvolvimento econômico social em
prol do favorecimento do capital financeiro, com recursos assegurados pelo fundo
público. Isso enfraquece a capacidade do Estado de realizar políticas públicas
universais e abala a efetivação dos direitos sociais estabelecidos na CF de 1988,
pois o orçamento público fica comprometido com o superávit primário e, por
corolário, o pagamento do serviço da dívida (SALVADOR, 2010, p. 386).

Na prática, uma das principais implicações da LRF tem sido a limitação


imposta na contratação de pessoal47, o que significa a redução de concursos

45
Recursos estes que não são contabilizados quando se anuncia o suposto déficit da previdência social, ao não
se considerar a totalidade das fontes de financiamento da Seguridade Social no custeamento dos direitos sociais
previstos no texto constitucional. “Segundo a própria ANFIP e também outros analistas, como Fraga, uma das
principais causas do suposto déficit é a realocação das fontes oriundas das contribuições sociais (COFINS,
CSLL e CPMF) pelo Tesouro Nacional, por meio da Desvinculação das Receitas da União (DRU) [...]”
(BOSCHETTI ; BEHRING, 2003, p. 14).
46
No período analisado por Salvador (1999-2004) observa-se um crescimento progressivo das metas de
superávit primário em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), mas ainda assim tivemos um aprofundamento do
endividamento estatal já que os recursos economizados não serviram para cobrir toda a despesa com os juros
(SALVADOR, 2010).
47
O limite total de despesa com pessoal, conforme o art. 18 da Lei Complementar n. 101, não poderá exceder os
percentuais da receita corrente liquida do seguinte modo: I) União – 50%; II) Estados – 60% e III) Municípios –
60%.
43

públicos para os diferentes serviços públicos, incluindo os de saúde (CISLAGHI et


al, 2011).
Assim, frequentemente a adoção do modelo privatizante de gestão da saúde
é apresentada como uma alternativa positiva para enfrentar essa restrição imposta
pela LRF. No caso das OS, para além da dispensa de licitação para compra de
material, temos a possibilidade de livre contratação, sem a necessidade de
realização de concurso público.
Desse modo, podemos inferir que não é aleatório o fato da vinculação dos
recursos da seguridade social ser sistematicamente descumprida (MENDES ;
MARQUES, 2005). Drenar recursos da seguridade social é absolutamente
necessário para garantir uma parcela considerável do fundo público para a
reprodução do capital. Nesse sentido, vale considerar que atualmente a proposição
da gestão privada dos serviços públicos tem sido um dos caminhos buscados para
uma apropriação ainda maior do fundo público.
Na verdade, priorizar o pagamento de juros e cortar gastos sociais exprime uma
hierarquização das decisões de gasto, pela qual o pagamento de juros é tido como
inadiável. Se pudéssemos alterar tais hierarquias e declarar inadiáveis os direitos
sociais, não haveria dinheiro para pagar os juros. E a leitura da problemática do
financiamento público seria construída de outra maneira, não mais em torno do
caráter “perdulário” do gasto fiscal, mas sim em torno do equívoco e da prepotência
de uma política de juros que vem sacrificando o bom desempenho das contas
públicas, endividando os brasileiros e comprometendo a capacidade de
financiamento das políticas sociais, tudo isso em nome de uma estabilização fiscal
nunca concretizada (DAIN, 2001, p.114).

A composição deste cenário atinge profundamente o campo das políticas


sociais e, em especial, da saúde. Esta política específica comparativamente às
outras políticas comportou importantes conquistas na legislação a partir da
aprovação da CF/88, mas que infelizmente não se traduziram integralmente na
realidade.
No próximo capitulo iniciaremos uma análise desse período, abordando
aspectos importantes que se materializaram no campo desta política e que ajudam a
explicar seus rumos, tais como: o (des)financiamento, a precarização e a focalização
dos serviços, assim como, a proposta de [contra]reforma do Estado e suas
implicações, para finalmente nos aproximarmos da particularidade assumida pela
política no município do Rio de Janeiro.
44

2 CONTRARREFORMA DO ESTADO BRASILEIRO E SAÚDE

Eu tô sem segurança, sem transporte, sem trabalho, sem lazer


Eu num tenho educação, mas saúde eu quero ter
Já paguei minha promessa, não sei o que fazer!
Já paguei os meus impostos, não sei pra quê?
Eles sempre dão a mesma desculpa esfarrapada:
‘A saúde pública está sem verba’.
Gabriel O Pensador

2.1 Política de Saúde48: conquistas e entraves a partir da Constituição Federal


de 1988

A Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na história do país inseriu


as políticas sociais na matriz do direito, colocando-as sob responsabilidade do
Estado. Aprovada em tempos de redemocratização da sociedade, momento em que
o país estava tomado por um forte e amplo movimento no âmbito da sociedade civil,
o texto constitucional refletiu a disputa de hegemonia, presente naquele momento.
Por isso encontramos avanços em alguns aspectos, mas a presença de traços
conservadores em outros (BEHRING ; BOSCHETTI, 2009).
Naquele período constituiu-se
uma Articulação Nacional de Entidades pela Mobilização Popular na Constituinte,
reunindo movimentos sociais, personalidades e partidos políticos com compromissos
democráticos que participaram dos grupos de trabalho. Daí decorre, por exemplo, a
introdução do conceito de seguridade social articulando as políticas de
previdência, saúde e assistência social, e dos direitos a ela vinculados, a exemplo
da ampliação da cobertura previdenciária aos trabalhadores rurais, agora no valor de
um salário mínimo e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) para idosos e
pessoas com deficiência (BEHRING ; BOSCHETTI, p. 144, grifos nossos).

Particularmente, a política de saúde foi pensada na CF/88 permeada por uma


relevante influência do Movimento da Reforma Sanitária, iniciado em fins da década
de 1970. Segundo Matos (2009), o referido movimento se constituiu inicialmente por
profissionais da saúde, mas durante a crise da ditadura, nos anos 80, passa a
congregar vários movimentos e diferentes sujeitos, para além dos profissionais da

48
Embora tenhamos por pretensão analisar a política de saúde, para fins desse trabalho não estaremos
elaborando uma análise sistemática acerca de sua trajetória histórica, nos ateremos fundamentalmente no
período em que consideramos de maior avanço – ainda que seja no plano legal – para esta política setorial, o
que foi possível com a promulgação da CF/88.
45

área da saúde ou usuários de tal política. O Centro Brasileiro de Estudo de Saúde


(CEBES), primeiro protagonista institucionalizado do movimento (NETO, 1997),
cumpriu um papel relevante de difusão e ampliação do debate em torno da saúde e
democracia. Juntamente com a Associação Brasileira de Pós- Graduação em Saúde
Coletiva (ABRASCO), com a promoção de inúmeras atividades – publicações,
encontros, seminários e simpósios –, contribuiu para iniciar uma sistematização de
uma proposta alternativa ao modelo médico-assistencial privatista que era
hegemônico nos anos 1970 (MENDES, 1999).
Conforme Bravo, as principais propostas debatidas pelo movimento versavam
sobre a
universalização do acesso, a concepção de saúde como direito social e dever do
Estado; a reestruturação do setor através da estratégia do Sistema Unificado de
Saúde, visando um profundo reordenamento setorial com um novo olhar sobre a
saúde individual e coletiva; a descentralização do processo decisório para as esferas
estadual e municipal; o financiamento efetivo e a democratização do poder local
através de novos mecanismos de gestão – os Conselhos de Saúde (BRAVO, 2001,
p.25).

Ainda na mesma linha, para Mendes, a reforma sanitária foi responsável por
trazer três aspectos fundamentais: primeiramente, um conceito abrangente de
saúde, sendo esta uma
resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio
ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e
acesso a serviços de saúde. É assim, antes de tudo, o resultado das formas de
organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos
níveis de vida (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1987 apud MENDES, 1999, p. 42-3).

O segundo diz respeito à emersão da saúde como um direito de cidadania e


como dever do Estado. E, por fim, estrategicamente foi proposta
uma profunda reformulação do Sistema Nacional de Saúde com a instituição de um
Sistema Único de Saúde que tenha como princípios essenciais a universalidade, a
integralidade das ações, a descentralização com mando único em cada instância
federativa e a participação popular (MENDES, 1999, p. 43).

A luta pela saúde, todavia, não esteve isenta de embates. Os defensores de


um conceito de saúde integral, vinculado às condições de vida e trabalho da
população se depararam com os “fortes interesses econômicos do setor privado, a
exemplo da Federação Brasileira dos Hospitais e da indústria farmacêutica, que
conseguiram lamentavelmente assegurar sua participação no Sistema Único de
Saúde (SUS), com acesso, portanto, aos recursos públicos” (MENDES, 1999, p.
145).
A CF/88 afirma que a saúde deve ser vista de forma ampliada, uma vez que é
um direito humano fundamental, com caráter social e universalista. Nesse sentido,
46

concebe-se a saúde como um processo, que, portanto, vai para além do binômio
saúde/doença. E ao inscrever na Carta Magna que “a saúde é direito de todos e
dever do Estado” confere-se às ações e aos serviços de saúde uma relevância
pública, devendo ao Estado regulamentar, fiscalizar e controlar.
Desse modo, o SUS, fruto de uma conquista política da classe trabalhadora,
se construiu pautado sobre princípios como a universalidade, acesso gratuito,
integralidade, descentralização organizativa e divisão de responsabilidades entre as
esferas de governo. Esses princípios conferem uma organização do modelo
assistencial de maneira diferenciada, na qual a saúde é pensada por região/
população, considerando as questões epidemiológicas e sua relação com as
condições socioeconômicas. Portanto, esse modelo acaba por compreender que o
processo de adoecimento dos cidadãos ocorre de maneira diferenciada.
Do ponto de vista da legislação, essa organização do SUS demanda
competências e atribuições específicas dos diferentes níveis de governo, já que a
cada um corresponde um nível de abrangência territorial. Assim, esse modelo de
assistência à saúde requer a descentralização dos serviços e, consequentemente,
confere uma responsabilidade e atuação mais ampla dos municípios.
Apesar de todas as conquistas, o SUS vem sofrendo uma série de ataques
que atingem suas bases e princípios tal como se propõe. Assim, já no início da
década de 1990 é possível verificar uma tensão entre o governo do presidente
Fernando Collor e os movimentos em prol da afirmação da saúde como um direito.
Isso permite vislumbrar o que BRAVO (2006) identifica como uma permanente
tensão entre dois projetos: projeto da reforma sanitária – construído na década de
1980 e expresso na CF/88 – e o projeto de saúde articulado ao mercado ou
privatista. Essa tensão provocou retrocessos e impediu efetivação do texto
constitucional.
Essa tensão pode ser identificada, principalmente, na aprovação da Lei
Orgânica da Saúde (LOS), na qual vários artigos relativos ao controle social e ao
financiamento do SUS foram vetados. Como consequência deste processo foram
aprovadas duas leis (8080 e 814249, ambas de 1990) para regulamentar a saúde
(CRESS, 2006).

49
A aprovação da Lei nº. 8.142 surgiu da luta travada por meio de uma articulação da Plenária Nacional de
Entidades da Saúde que pressionou o Congresso para formular e apresentar um projeto de lei que culminou,
posteriormente, na a fim de garantir o controle social e a transparência do financiamento do SUS (CRESS,
2006).
47

A Lei 8.080/1990, que regulamenta o artigo 196 da Constituição, dispõe sobre


as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde bem como rege a
organização e funcionamento dos serviços correspondentes ao SUS. No entanto,
ela sofreu com os rebatimentos da política neoliberal na década de 1990.
Os princípios e diretrizes afirmados são: universalidade de acesso aos
serviços de saúde em todos os níveis de assistência; a integralidade da assistência
que pauta a articulação entre os serviços; a preservação da autonomia dos
indivíduos; igualdade; garantia de acesso à informação de forma a potencializar os
serviços oferecidos; dados epidemiológicos que afirmam a priorização de serviços e
alocação dos recursos; a integração das ações de saúde; meio ambiente e
saneamento básico; financiamento por parte das três esferas de governo;
capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis da assistência;
organização dos serviços de forma a evitar duplicidades; a participação da
comunidade e a descentralização político-administrativa para os setores de
assistência. Nesse sentido, há o privilégio pela ação pública na saúde onde as
ações da iniciativa privada são afirmadas como caráter complementar (CRESS,
2006).
Mas, embora esteja explícita no texto constitucional a possibilidade de
atuação complementar da iniciativa privada na assistência à saúde, salta aos nossos
olhos o processo crescente de privatização dos serviços de saúde. O que podemos
observar é que no decurso histórico, a depender das forças em presença, diferentes
instrumentos são utilizados para viabilizá-la e é desse modo que no presente estudo
conferimos destaque à proposta das OS50 como um caminho possível para tal
desígnio.
Vale considerar que nos anos imediatamente posteriores à aprovação da
CF/88, assistimos a um largo processo de sucateamento da rede de serviços, fruto
do subfinanciamento da política, embora a situação não seja apresentada nesses
termos quando se justifica a adoção dos diferentes instrumentos de privatização.
Pautados nas considerações de Bravo e Matos (2001) podemos afirmar que
houve um forte boicote à implantação do SUS no governo do presidente Fernando
Collor, embora neste período também tenha se conquistado a aprovação da Lei
Orgânica da Saúde (Leis 8 080/90 e 8 142/90).
50
Para além das OS, podemos exemplificar como instrumentos que buscam concretizar a privatização dos
serviços de saúde, as cooperativas, as OSCIP, a proposta das Fundações Estatais de Direito e, a mais atual,
Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares.
48

No governo seguinte, do presidente Itamar Franco, tivemos dois momentos


diferenciados. O primeiro, com a presença de Jamil Haddad como ministro da
saúde, que significou uma estagnação no processo de sucateamento da saúde. Já o
segundo, sob a gestão de Henrique Santillo, se caracterizou como um período sem
alterações significativas neste campo.
No governo do presidente Fernando Henrique houve uma adoção mais
explícita do projeto neoliberal. Especificamente para a saúde coube uma proposta
direcionada à assistência ambulatorial e hospitalar. Propunha-se uma
descentralização mais ágil e decisiva, firmando mais claramente as atribuições de
cada esfera administrativa; a montagem de um sistema integrado, hierarquizado e
regionalizado, composto por um subsistema de entrada e controle (postos de saúde
e Programa Saúde da Família) e outro de referência ambulatorial e especializada
(unidades de maior complexidade e especialização na rede ambulatorial e por
hospitais credenciados – incluindo estatais, públicos não-estatais e privados); e, por
fim, a constituição de um sistema de informação em saúde, gerenciado pelo SUS,
através do DATASUS (BRAVO ; MATOS, 2001).
Ademais, é neste governo que emerge pela primeira vez a proposta das OS,
inscrita no Plano Diretor da Reforma do Estado e que será melhor tratada no item
2.3. Além disso, também é fruto deste processo a proposta das OSCIP, outro
instrumento utilizado na privatização dos serviços sociais.
Num primeiro momento do governo do presidente Lula, observou-se o resgate
da concepção do movimento sanitário, inclusive com a escolha de profissionais
comprometidos com a Reforma Sanitária para o segundo escalão do Ministério da
Saúde, além da convocação extraordinária da 12ª Conferência Nacional de Saúde e
da escolha de representante da Central Única de Trabalhadores (CUT) para a
secretaria executiva do Conselho Nacional de Saúde. No entanto, Bravo e Menezes
destacam que houve a continuidade da ênfase na focalização51 – haja vista a
centralidade do Programa Saúde da Família (PSF) como um programa de cobertura
para populações carentes –, precarização, terceirização dos recursos humanos e
desfinanciamento (BRAVO ; MENEZES, 2011).
Dessa forma, observa-se que a política de saúde continuou refém da política
macroeconômica. Ademais, foi durante o segundo mandato do governo Lula, em

51
Esse cenário nos permite afirmar que a tensão entre os projetos da Reforma Sanitária e o Privatista se
manteve no governo Lula.
49

2007, que surgiu a proposta da Fundação Estatal de Direito Privado (FEDP) –


Projeto de Lei Complementar nº 92/07 – que embora vise atingir todas as áreas não
exclusivas do Estado, teve o debate mais avançado no âmbito da saúde.
Por fim, no apagar das luzes de seu governo, o presidente Lula lançou a
Medida Provisória 520 (MP 520), autorizando o Poder Executivo a criar a empresa
pública, denominada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A. – EBSERH.
Com isso, constituiu-se mais um instrumento de privatização da saúde que, ao fim e
ao cabo, trata-se de uma reedição da
formulação que tem como princípios os mesmos já identificados nas Fundações
Estatais de Direito Privado e nas Organizações Sociais, ou seja, transferência de
patrimônio público, flexibilização dos direitos dos trabalhadores do serviço público,
estabelecimento de financiamento das políticas sociais mediante a celebração de
contratos de gestão, possibilidade de captar recursos com a venda de serviços e
consequente mercantilização das políticas e direitos sociais, dentre outros (MARCH,
2012, p. 67).

Como o período máximo para tramitação e aprovação da medida no


Congresso foi excedido, a mesma foi derrubada mediante obstrução de votação no
Senado em junho de 2011. Mas, no mês subsequente o governo da então
presidente Dilma Rousseff, encaminhou ao Congresso Nacional, sob regime de
urgência e contendo poucas alterações da proposta anterior, o projeto de lei que
criava a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) (MARCH, 2012).
Em fins do ano de 2011, mesmo com o posicionamento contrário da 14ª
Conferência Nacional de Saúde, tivemos a aprovação da Lei nº 12 550/2011,
autorizando a criação da EBSERH, ou seja, permanece claro o interesse do governo
em concretizar a privatização da saúde.
Assim, no próximo item iremos nos aproximar da lógica de financiamento do
SUS e buscaremos trazer à tona as disputas em torno do fundo público que se
refletem na alocação de recursos no âmbito da saúde. Nossa intenção é demonstrar
que o (des)financiamento da saúde serve a certos propósitos: precarizar a rede de
serviços e focalizar em determinados programas é absolutamente necessário para
que a adoção de diferentes instrumentos de privatização surjam como opções
viáveis de eficiência e resolutividade.
50

2.2 (Des)Financiamento do SUS: precarização, focalização e privatização

Passados um pouco mais de 20 anos ainda é possível observar sérias


dificuldades do SUS na garantia de recursos estáveis e suficientes para seu
financiamento (DAIN, 2007). Isso muito se deve à subordinação da política social à
política econômica, o que agrava ainda mais a desigualdade existente na divisão de
recursos no interior da própria seguridade social. Conforme já sinalizamos, grande
parte dos recursos que deveriam servir à viabilização do rol de políticas sociais são
escoados para o pagamento da dívida pública (MARQUES ; MENDES, 2009).
O fato de comportar programas universais exigiu uma diversificação das
bases de financiamento da seguridade social. Além disso, era necessário reduzir a
dependência do financiamento em relação às variações cíclicas da economia,
principalmente no que se refere ao emprego junto ao mercado formal de trabalho, já
que anteriormente o financiamento estava pautado basicamente na folha de salários
(MARQUES ; MENDES, 2005).
Para tanto, foi estabelecido no art. 195 CF/88 que esta deveria ser financiada
mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos estados, do Distrito
Federal e dos municípios, além das contribuições sociais dos empregadores –
incidentes sobre a folha de salários, o faturamento (Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social - COFINS52) e o lucro (Contribuição sobre o
Lucro Líquido - CSLL53) –, dos trabalhadores e da receita dos concursos de
prognósticos.
Embora no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT - art. 55)
tenha se estabelecido a reserva de no mínimo 30% dos recursos da seguridade
social para a saúde, excetuando-se os recursos do seguro-desemprego, até a
aprovação da lei de diretrizes orçamentárias em 1990, essa determinação nunca foi
seguida.
A partir de 1990, verificou-se, de forma cada vez mais acentuada, a não observância
do artigo 55 do ADCT, já mencionado, que regia os repasses do MPAS ao MS. Em

52
Contribuição regulamentada pela Lei Complementar n. 70/91, na qual se estabelece que “a contribuição tem
como fato gerador a venda de mercadorias ou serviços de qualquer natureza, a percepção de rendas ou receitas
operacionais e não operacionais e de receitas patrimoniais das pessoas jurídicas” (SALVADOR, 2010, p. 249).
53
Conforme Salvador (2010), este é o único tributo que financia a seguridade social que tem como base de
cálculo o lucro líquido das empresas, ajustado antes da provisão para o Imposto de Renda.
51

1993, sob a alegação de restrições fiscais e de aumento das despesas da


Previdência Social, os recursos originários da folha de salários deixaram de ser
repassados ao Ministério da Saúde, passando a financiar exclusivamente a
Previdência Social (DAIN, 2007, p. 1853).

Posteriormente, buscou-se garantir uma maior estabilidade dos recursos da


saúde com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 169/93, tornando definitiva
a vinculação de 30% dos recursos do Orçamento da Seguridade Social (OSS), além
de 10 % da receita de impostos da União, Distrito Federal, estados e municípios. No
entanto, a referida proposta acabou sendo arquivada.
Na mesma década, devido à irregularidade de aportes de receitas ao OSS, o
Ministério da Saúde (MS) assumiu e liderou a luta pela criação da Contribuição
Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF), visando garantir uma fonte
específica de recursos para a saúde (DAIN, 2007). Mas, embora se esperasse uma
ampliação dos recursos para esta área, o que ocorreu foi um desvio da função inicial
da CPMF54. Ademais, este desvio foi acompanhado da substituição das fontes no
orçamento do MS, podendo-se identificar uma redução da importância tanto da
CSLL quanto da COFINS.
Em meio a uma série de polêmicas foi aprovada no ano de 2000 a EC n. 29,
definindo a forma de inserção da União, dos estados e dos municípios do
financiamento do SUS (Marques e Mendes, 2009).
A EC 29 estabeleceu que estados e municípios devem alocar, no primeiro ano, pelo
menos, 7% dessas receitas, sendo que esse percentual deve crescer anualmente
até atingir, para os estados, 12%, no mínimo, em 2004 e, para os municípios, 15%
no mínimo. Em relação à União, a EC 29 determina que, para o primeiro ano,
deveria ser aplicado o aporte de pelo menos 5% em relação ao orçamento
empenhado do período anterior; para os seguintes, o valor apurado no ano anterior
é corrigido pela variação do PIB nominal. Para a União, a EC 29 não explicita a
origem dos recursos e em relação à Seguridade Social foi omissa, como se não
houvesse disputa por seus recursos, como mencionado anteriormente. (MARQUES ;
MENDES, 2009, p. 847).

Vale ressaltar que a descentralização55 ainda é algo não concretizado no


âmbito do SUS e, ao longo dos anos, este campo tem se configurado como um
palco de disputa política (MARQUES ; MENDES, 2009). Dentro desse processo a
Norma Operacional Básica do ano de 1993 (NOB 93) assumiu um papel relevante.
Com ela buscou-se regulamentar a gestão dos serviços e ações no interior do SUS,

54
A CPMF deixou de ser fonte exclusiva da saúde, pois passou a financiar a Previdência e, posteriormente, o
Fundo de Combate à Pobreza (DAIN, 2007). Outra forma de fuga dos recursos que deveriam ser direcionadas à
saúde deu-se por meio do Fundo Especial de Emergência, em1994/1995, passando para Fundo de Estabilização
Fiscal (FEF) entre 1996 e 1999 e finalmente tornando-se a atual DRU, o que permitiu o uso indiscriminado de
recursos em áreas alheias à saúde.
55
Princípio de organização do SUS que já se colocava antes mesmo da aprovação da CF/88, vide a experiência
das Ações Integradas de Saúde (AIS) nos anos 1980 – Cf. Neto, 1997.
52

instituindo mecanismos de financiamento das ações de saúde e diretrizes para os


investimentos (SOUZA ; ARAÚJO, 2001).
Conforme Mendes e Marques (2005), a NOB 93 ampliou a participação dos
municípios no financiamento do SUS, mas, embora a União tenha permanecido com
a parcela majoritária do financiamento, foi a esfera que menos ampliou a aplicação
dos recursos. Adotou-se como sistemática as transferências regulares e automáticas
do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos Municipais de Saúde, mas garantindo
a autonomia dos municípios na aplicação dos recursos.
No entanto, essa autonomia não foi traduzida na realidade já que, a partir da
NOB 96, se instituiu a prática de destinação de recursos “carimbados”, ou seja, a
destinação por parte do governo federal de recursos vinculados à realização de
programas específicos.
Desse modo, ao que se refere à autonomia municipal na definição da política
de saúde, tivemos uma restrição dos municípios ao papel de mero executor.
Ademais, ao longo dos anos, o que se pode observar é um frequente
descumprimento da EC n. 29 por parte dos estados (Mendes e Marques, 2005).
Mas, vale ressaltar que, dentre aqueles cumpridores da EC n. 29, alguns estados
incluíram gastos alheios à saúde:
As despesas com inativos, empresas de saneamento, habitação urbana, recursos
hídricos, merenda escolar, programas de alimentação, hospitais de "clientela
fechada" (como hospitais de servidores estaduais). E tudo isso em que pese já
existirem parâmetros claros e acordados entre o Ministério da Saúde, os estados e
seus tribunais de contas para o que seria incluído como despesas de ações e
serviços de saúde (Ver Resolução 322/2003 do Conselho Nacional de Saúde).
Mediante “artifícios”, os estados desconheceram esses parâmetros e incluíram
gastos alheios à saúde para atingirem sua meta de aplicação (MENDES ;
MARQUES, 2005, p. 168).

Esse quadro não se apresenta da mesma forma no caso dos municípios, pois
tem se observado uma atenção aos percentuais definidos pela EC n. 29, embora
possamos observar o mesmo erro de inclusão dos inativos nos gastos da saúde.
Segundo Salvador (2010), pode-se considerar que a EC n. 29 foi parcialmente bem-
sucedida, isso no que se refere à ampliação da participação dos estados e
municípios, já que estes saíram de 40,1%, em 2000, para alcançar 51,57%, em
2007, do total dos gastos públicos em saúde no país. Desse modo, nota-se uma
alteração da responsabilidade do gasto em saúde pública já que houve um
decréscimo da participação federal.
53

Assim, podemos inferir que ao longo dos anos, embora houvesse uma série
de dispositivos presentes desde a CF/88 nunca se chegou a um quadro de um
financiamento razoável das ações em saúde, ou seja, embora o sistema tenha se
tornado universal, nunca se investiu o suficiente na rede de serviços para absorção
de toda a população56. Isso muito se deve, nos termos de Mendes e Marques
(2005), aos caminhos tortuosos do financiamento da seguridade social e,
particularmente, da saúde, pois ao passo que se busca implantar o SUS, com base
no princípio de universalidade, agrava-se a “crise fiscal e financeira do Estado,
limitando o aporte de recursos para a saúde e seguridade” (MENDES ; MARQUES,
2005, p. 174).
De modo geral, as políticas sociais ficam a mercê da tensão permanente por
recursos financeiros e, nesta disputa, é sempre a área social quem sai perdendo.
Quando se tivéssemos um financiamento da seguridade social baseado na
concepção expressa na CF/88, ou seja, sem haver um forte desvio dos recursos
para o pagamento dos juros da dívida, teríamos um orçamento da seguridade social
superavitário, conforme demonstram diferentes autores (SALVADOR, 2010;
MENDES e MARQUES, 2005; BEHRING, 2008a; dentre outros).
Além disso, não podemos desconsiderar as despesas assumidas pelo OSS,
mas que deveriam constar no orçamento fiscal. Este é o caso do custeio do regime
de previdência dos servidores públicos federais, do apoio administrativo, do
programa de valorização do servidor público, da assistência médica, dentre outros
(SALVADOR, 2010).
Para Vianna, o subsídio à assistência médica específica aos servidores [as
despesas não ficam restritas ao MS, abrangem outras unidades orçamentárias, mas
são custeadas com recursos do orçamento da seguridade social] é contrassenso em
relação ao SUS de acesso universal criado pela Constituição, pois se trata de
custear um acesso diferenciado a determinado segmento da sociedade, ou seja, é
iníquo (SALVADOR, 2010, p. 304).

Por outro lado, ainda temos os casos de dedução das despesas médicas da
declaração do imposto de renda, o que na realidade configura um gasto indireto do
Estado, ou seja, significa a transferência de recursos do fundo público para os
planos de seguros e atendimento privado de saúde (SALVADOR, 2010).

56
Baseado nos dados trazidos por Piola e Vianna (2008 apud SALVADOR, 2010), podemos verificar uma
incoerência no caso brasileiro, pois possivelmente é o único país com um sistema universal de saúde que possui
um gasto privado maior que o público. Os EUA, ainda que se tenha uma cobertura ancorada no mercado de
trabalho (paga pelo empregador), uma restrita (assumida pelo Estado e direcionada aos idosos e deficientes) e
tendo o restante da população pagando pelo seu atendimento, acaba superando o gasto público sobre o total em
relação ao Brasil (SALVADOR, 2010).
54

Todo esse processo demonstra um duplo favorecimento do capital, pois se de


um lado o Estado focaliza sua intervenção, sucateando a rede de serviços e
drenando recursos para o pagamento da dívida pública, por outro, abre novos
espaços para realização de inversões, ou seja, as políticas sociais – e,
especialmente, a saúde – tornam-se espaços altamente interessantes e lucrativos
para a implementação dos modelos privatizantes de gestão.
Por isso, torna-se importante nos aproximarmos do teor contido na proposta
de “reforma” do Estado apresentada no governo do presidente Fernando Henrique e
que ainda fundamenta os diversos ataques sofridos pelas políticas sociais, em
especial pela saúde, nos governos posteriores.

2.3 PDRE e Organizações Sociais: breves considerações

O projeto de “reforma” inscrito no Plano Diretor da Reforma do Estado,


embora mantenha uma relação de continuidade com os períodos históricos que o
precederam,
a exemplo do conservadorismo político na condução dos processos decisórios e do
patrimonialismo, é muito diferente daqueles “saltos para adiante”, modernizações
conservadoras ou processos de revolução passiva e “pelo alto” que engendraram a
industrialização e a urbanização brasileiras, acompanhadas da formação de um
mercado interno significativo, embora sempre estreito diante das potencialidades
(BEHRING, 2008a, p. 282, grifos da autora).

Em síntese, embora os defensores dessa proposta a apontem como uma


“reforma”57, ou seja, um processo que contém elementos de avanços em relação ao
que já está instituído, embora com limites, esse projeto materializado no PDRE e
que se encontra em curso nos dias atuais representa efetivamente uma
contrarreforma. Isso se deve ao conjunto de mudanças estruturais regressivas que
incidem fundamentalmente sobre os trabalhadores e a massa da população
brasileira (BEHRING, 2008a).
A partir da identificação dessa crise do Estado é posta a necessidade de
refuncionalização do papel estatal e sua reconstrução sobre novas bases. Parte-se
do pressuposto de que o Estado teria se desviado de suas funções, tendo uma
57
Para Behring (2008a), reforma na concepção que tem como referência o debate clássico sobre reforma e
revolução sempre está relacionada a possibilidades de mudanças progressistas, ainda que limitadas.
55

ênfase no setor produtivo e, portanto, apresenta-se a proposta de sua restrição ao


papel de promoção e regulação do desenvolvimento econômico e social.
Avalia-se que ao se responsabilizar diretamente pelo desenvolvimento, o
Estado é ineficaz e ineficiente, mas o que figura por trás desse argumento é a
necessidade de instituir vias para as privatizações, embora não se fale claramente.
Dentre outros elementos, no PDRE temos a proposição da divisão do Estado
em setores diferenciados: Núcleo Estratégico; Atividades Exclusivas; Atividades não
Exclusivas; Produção de Bens e Serviços para o Mercado58. E para cada um desses
setores haveria um tipo de propriedade correspondente: estatal para o Núcleo
Estratégico e Atividades Exclusivas; pública não estatal para Atividades Não
Exclusivas; e privada para Produção de Bens e Serviços para o Mercado.
O que precisamos nos atentar é que a criação desse espaço público não
estatal tem implicações na restrição do nível de atuação estatal direta e,
principalmente, no que se refere à execução das políticas sociais. É este o ponto
que permitiu a criação de instrumentos de privatização, os quais só foram
posteriormente conhecidos no âmbito das políticas sociais.
No teor do PDRE temos a explicitação do seguinte objetivo:
transferir para o setor público não-estatal estes serviços [sociais], através de um
programa de “publicização”, transformando as atuais fundações públicas em
organizações sociais, ou seja, em entidades de direito privado, sem fins lucrativos,
que tenham autorização específica do poder legislativo para celebrar contrato de
gestão com o poder executivo e assim ter direito a dotação orçamentária (MARE,
1995, p. 46-47).

Vale observar que, em termos práticos, esse processo de “publicização”


acaba por viabilizar a transferência de fundo público para o capital, sob o argumento
de garantir melhores serviços com um custo menor para os denominados “cidadãos
clientes”. A implementação das OS constituía a estratégia central do PDRE,
justamente para permitir e estimular a “publicização” (MARE, 1997).
É, nesse sentido, que a Lei nº 9.637/98 surgiu para dispor sobre a
qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como OS
para atuar em áreas59 como: ensino, pesquisa científica, desenvolvimento
tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde.

58
Neste setor como a eficiência em suas ações assume maior relevância, o modelo gerencial é proposto como o
mais adequado, assim como para os setores de Atividades Exclusivas e de Produção de Bens e Serviços para o
Mercado. Já para o Núcleo Estratégico que se objetiva uma maior efetividade propõe-se um mix entre os
modelos burocrático e gerencial.
59
Estas áreas de atuação são entendidas como áreas de responsabilidade não exclusiva do Estado.
56

A referida lei estabelece que deverá ser celebrado um contrato de gestão60


entre a entidade e o Poder Público, com vistas à formação de parceria entre as
partes para fomento e execução das atividades. E, para fins do cumprimento do
contrato de gestão, a entidade poderá contar com recebimento de recursos
orçamentários e bens públicos. Isso acaba por reafirmar o papel do Estado apenas
como financiador e não executor das políticas sociais.
Alguns elementos61 merecem nosso destaque nessa proposta:
• Existem brechas claras para burlar os processos licitatórios a que as
organizações estatais estão sujeitas e, inclusive, essa condição é vista
como algo “vantajoso” em face da administração pública;
• Não há nenhuma obrigatoriedade em respeitar as normas que
regulamentam a gestão dos recursos humanos, pelo contrário, os
funcionários são contratados via regime celetista, podem ser desligados a
qualquer momento e, além disso, o plano de cargo e salários é por OS;
• Não há condições e meios claros para o exercício do controle social62 –
importante conquista do SUS;
• As OS são qualificadas como “entidades de interesse social e utilidade
pública”, ou seja, estão imunes à carga tributária63;
• Deverá ser celebrado um contrato de gestão64 entre a OS e o poder
público, de modo a formar uma parceria entre as partes no que tange ao
fomento e à execução das atividades;

60
A adoção desse modelo de gestão traz sérios impactos para as políticas sociais, no sentido de comprometer a
continuidade das mesmas já que estas ficarão a mercê de cada governo (BEHRING, 2008b). Outro elemento a
ser considerado é a ausência da explicitação de mecanismos reais de participação tanto dos usuários quanto
dos trabalhadores nos espaços deliberativos dessas entidades.
61
Aqui destacamos que todos esses elementos se fazem presentes na lei municipal que regulamenta as OS na
cidade do Rio de Janeiro que será tratada no item 2.4.
62
Segundo Bravo e Menezes (2010), embasadas nos argumentos de Franco (1998), “há duas razões para se
duvidar de que haverá controle social nos estabelecimentos geridos pelas OS. A primeira diz respeito ao fato de
que, na Medida Provisória (MP) aprovada, que cria as OS, não há nenhuma menção ao controle externo destas.
Por serem estabelecimento regulados através de um contrato de gestão com o poder público, o seu
funcionamento será fiscalizado pelo governo que fará o controle da entidade. [O que chega ao absurdo de] pela
MP, o Ministério Público só agirá contra os dirigentes das OS a chamado do governo, limitando assim a ação
controladora da sociedade” (BRAVO ; MENEZES, 2010, p. 232).
63
Por um lado recebem recursos públicos provenientes da coleta de impostos e contribuições para a seguridade
social, partes relevantes da formação do fundo público, mas de outro, estão imunes a carga tributária.
64
A adoção desse modelo de gestão traz sérios impactos para as políticas sociais, no sentido de comprometer a
continuidade das mesmas já que estas ficarão a mercê de cada governo (BEHRING, 2008a).
57

• Por fim, mas não menos importante, parte das atividades previstas de
atuação são de responsabilidade maior do Estado, não devendo este
transferir esse papel.
Vale ressaltar que a aprovação da Lei nº 9.637/98 não foi isenta de reações.
Foi proposta uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) 1923/9865
questionando a ausência de processo licitatório, a transferência de atividades
desenvolvidas por autarquias e fundações públicas para entidades direito privado.
Além disso, a referida ação sinaliza que esta transferência fere a CF/88 no que se
refere à fiscalização orçamentária, ao limite de despesas com pessoal, à realização
de concurso público para admissão de pessoal e à aquisição de bens mediante
licitação (ADUSP, 2010).
Bravo e Matos (2001) analisam o Caderno nº 13/98 do Ministério da
Administração e da Reforma do Estado (MARE), no qual consta a intencionalidade
em dirigir a “reforma” no âmbito da saúde para a assistência ambulatorial e
hospitalar66. Os autores ressaltam que no conjunto de normatizações formuladas na
segunda metade dos anos 1990 – Norma Operacional Básica (NOB/96),
regulamentação dos planos e seguros de saúde e dos preços de medicamentos,
incluindo os genéricos – temos elementos relevantes para entender a “reforma”
proposta para essa área.
Mas, no geral, essas normatizações contribuem para conformar uma
dualidade no SUS: SUS para pobres e outro para consumidores. Nesse mesmo
período da década de 1990, houve um fortalecimento do Ministério da Saúde, mas
que apenas acabou por favorecer o setor privado.
[...] Ministério da Saúde não tem contribuído para melhorar as condições de saúde
da população brasileira, para delimitar a base social do financiamento dos planos e
seguros de saúde, nem para disciplinar as relações com o setor privado (tanto
contratado como autônomo). As regulamentações trazem explicitamente uma
contradição, que é a regulamentação da ação do capital estrangeiro na saúde, mas
ao mesmo tempo naturaliza a concepção de cidadão consumidor, rompendo com o
conceito do Movimento da Reforma Sanitária, em que a saúde é um direito de todos
e sua prestação um dever do Estado. Assim, as propostas de normatizações estão
coerentes com a contra-reforma em curso no Brasil (BRAVO ; MATOS, p. 211).

65
A ADIN 1923/98 foi proposta pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Democrático Trabalhista (PDT)
que se opunham ao modelo proposto pelo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Isso se torna um
episódio no mínimo curioso, pois o que vem se processando nos dias atuais no que se refere aos instrumentos
de privatização das políticas sociais tem partido justamente de governos vinculados ao PT. De certa forma, estes
igualmente têm viabilizado e aprofundado a contrarreforma do Estado.
66
Conforme o documento são áreas fundamentais e ainda as mais caras do SUS (MATOS; BRAVO ; MATOS,
2001).
58

Embora esta ação esteja sendo julgada no Supremo Tribunal Federal (STF)67,
tendo os votos dos ministros Ayres Britto68 e Luiz Fux69 pela sua procedência parcial,
já são inúmeros os estados que adotaram este modelo de gestão em determinadas
áreas, vide os exemplos dos municípios de São Paulo – na cultura e na saúde – e o
Rio de Janeiro – com um processo acelerado marcadamente na área da saúde com
as Clínicas Saúde da Família e as Unidades de Pronto Atendimento, alguns
programas no âmbito da Secretaria Municipal de Saúde e, mais recentemente,
alguns hospitais.
Vale considerar que concomitantemente a esse processo acelerado a nível
municipal tivemos a aprovação no âmbito da esfera estadual do Rio de Janeiro dos
projetos de lei das FEDP70 – em 2007 – e das OS – em 2011 –, a despeito do
posicionamento contrário dos movimentos em defesa da saúde pública, gratuita e de
qualidade. Ressaltamos aqui que o processo de aprovação desta última legislação,

67
A Frente Nacional contra a Privatização do SUS realizou audiências com os ministros do STF responsáveis
pelo julgamento da ADIN 1923/98. A primeira audiência foi com o ministro Ayres Britto, relator da ADIN; a
segunda com o ministro Ricardo Lewandowski; e, por fim, com o Dr. Jairo Schefer, magistrado instrutor do
gabinete do ministro Gilmar Mendes. Disponível em: <http://www.cfess.org.br/noticias_res.php?id=579>. Acesso
7 ago 2012.
68
Este ministro declarou inconstitucionalidade nos seguintes dispositivos previsto na lei federal de
regulamentação das OS: “a) o fraseado ‘quanto à conveniência e oportunidade de sua qualificação como
organização social’, contido no inciso II do art. 2º; b) a expressão ‘com recursos provenientes do contrato de
gestão, ressalvada a hipótese de adicional relativo ao exercício de função temporária de direção e assessoria’,
contida no § 2º do art. 14; c) os arts 18, 19, 20, 21 e 22, com a modulação proposta no parágrafo anterior.
Interpreto ainda, ‘conforme à Constituição’ os arts. 5º, 6º e 7º da Lei 9.637/98 e o inciso XXIV do art. 24
da Lei 8.666/93, para deles afastar qualquer interpretação excludente da realização de um peculiar proceder
competitivo público e objetivo para: a) a qualificação de entidade privada como ‘organização social’; b) a
celebração do impropriamente chamado ‘contrato de gestão’.” Disponível em: <http://www.stf.jus.br>. Acesso em:
23 ago 2012.

69
Em síntese, Luiz Fux indicou a necessidade de conferir interpretação conforme à Constituição à Lei nº
9.637/98 e ao art. 24, XXIV da Lei nº 8666/93, incluído pela Lei nº 9.648/98, para que: (i) o procedimento de
qualificação seja conduzido de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do
art. 37 da CF, e de acordo com parâmetros fixados em abstrato segundo o que prega o art. 20 da Lei nº
9.637/98; (ii) a celebração do contrato de gestão seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com
observância dos princípios do caput do art. 37 da CF; (iii) as hipóteses de dispensa de licitação para
contratações (Lei nº 8.666/93, art. 24, XXIV) e outorga de permissão de uso de bem público (Lei nº 9.637/98, art.
12, §3º) sejam conduzidas de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do
art. 37 da CF; (iv) os contratos a serem celebrados pela Organização Social com terceiros, com recursos
públicos, sejam conduzidos de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do
art. 37 da CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade; (v) a seleção de pessoal
pelas Organizações Sociais seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos
princípios do caput do art. 37 da CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade; e
(vi) para afastar qualquer interpretação que restrinja o controle, pelo Ministério Público e pelo TCU, da aplicação
de verbas públicas. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/Voto__ADI1923LF.pdf>. Acesso em: 23 ago 2012.
70
O Rio de Janeiro foi o primeiro estado a aprovar o projeto das FEDP, mas até presente data não conseguiu
viabilizá-lo. Nossa hipótese é a de que para além das lutas empreendidas pelos movimentos sociais, fóruns
populares, sindicatos, conselhos de políticas, etc. contra a privatização das políticas sociais, trata-se de um
projeto ainda não aprovado no âmbito nacional e que, portanto, carece de verbas para sua viabilidade.
59

em 2011, se realizou à custa do impedimento da entrada dos manifestantes na


Assembleia Legislativa e da repressão policial71.

2.4 Política de Saúde no município do Rio de Janeiro

Primeiramente, iniciamos nosso percurso assinalando a considerável sintonia


entre o projeto inscrito no PDRE e a gestão do atual do prefeito do Rio de Janeiro,
Eduardo Paes (2009-2013), principalmente no que se refere ao campo das políticas
sociais. Não é por acaso que dentre as primeiras leis aprovadas em seu governo,
esteja a Lei nº 5.026/2009 que regulamenta as OS no município.
O que buscamos mostrar neste trabalho relaciona-se ao que vem sendo
apresentado como possibilidade de ampliação da cobertura assistencial e
modernização da gestão da rede municipal de serviços (SMSDC, 2009), mas que na
verdade, tem sido viabilizado pela adoção dos “novos” modelos de gestão,
principalmente, as OS. Diante disso, nos perguntamos: quais os reais impactos para
a política de saúde frente a adoção deste modelo? As necessidades da população
efetivamente estão sendo atendidas?
De modo geral, consideramos que as dificuldades advindas do referido
modelo de gestão para efetivação de uma política pública de acesso integral,
universal e gratuito à população – tal como preconiza o texto constitucional – não
são poucas nem insignificantes.
Ao nos debruçarmos sobre esse processo nos remetemos a um episódio
singular da mitologia grega. Aqui fazemos alusão à da Guerra de Tróia, narrada em
a Ilíada e a Odisséia – dois poemas épicos de Homero, lendário poeta da Grécia
Antiga.
Sumariamente, a Guerra de Tróia72 foi um conflito bélico, com duração de
aproximadamente 10 anos, entre aqueus e troianos que habitavam uma região que
corresponde a atual Turquia. O fato promotor do início do conflito foi o rapto da

71
Processos similares de criminalização dos movimentos sociais contrários à legislação das OS ocorreram nas
cidades de João Pessoa (Paraíba) e Niterói (Rio de Janeiro).
72
Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/historia/guerra_de_troia.htm>. Acesso em: 11 jun 2011.
60

princesa Helena de Tróia (esposa do rei lendário Menelau) por Páris (filho do rei
Príamo de Tróia).
Durante o conflito inúmeros soldados foram mortos e o desfecho da guerra
se deu após execução do grande truque que consistia em presentear os troianos
com um grande cavalo de madeira e declarar a desistência da guerra. Os troianos
aceitaram e permitiram a entrada do enorme presente para dentro de seus muros
protetores. Em momento oportuno, após uma longa comemoração que deixou os
troianos exaustos, as portas do cavalo de madeira que continha centenas de
soldados gregos se abriram. A cidade de Troia foi tomada pelos gregos e atacada
até sua destruição.
Assim, identificamos no conjunto das iniciativas estratégicas propostas
atualmente para a saúde no âmbito do município do Rio de Janeiro – dentre as quais
figura o programa Saúde Presente73–, tal como na epopéia de Homero, um cavalo
de tróia repleto de surpresas. A expansão das UPA e Clínicas da Família, além dos
diversos programas implementados sob gerenciamento de OS que aparentemente
assegurariam o atendimento mais eficaz e resolutivo às necessidades da população,
vêm carregados de processos de privatização, focalização e mercantilização dos
serviços de saúde, ou seja, constitui-se como um verdadeiro “presente de grego”.
Para entender os processos de privatização, focalização e mercantilização
da saúde no município do Rio de Janeiro atualmente, consideramos imediatamente
necessário nos reportarmos a alguns aspectos que consideramos centrais na
trajetória da política de saúde no âmbito municipal.
Para tanto, iniciamos nosso caminho destacando o fato do Rio de Janeiro ter
sido capital colonial, imperial e republicana, o que lhe conferiu uma série de
características sócio-culturais e administrativas peculiares. Este percurso teve início
no ano de 1763 e se estendeu até 1960, quando houve a transferência da capital do
Rio de Janeiro para Brasília – processo que não foi isento de embates em relação
ao retorno do Distrito Federal para os limites territoriais do estado do Rio de Janeiro.
No entanto, a transformação do antigo Distrito Federal em estado da Guanabara foi
o que vigorou até o ano de 1975, quando as forças favoráveis à fusão baseadas em

73
Segundo o PMS, o Saúde Presente abarca as Policlínicas, UPA, Agentes da Vigilância em Saúde, Agentes da
Defesa Civil, Saúde Bucal, Clínicas da Família, Farmácia Presente, Hospital de Referência, Centro de Atenção
Psicossocial (CAPSI) e Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPSad) (SMSDC, 2009).
61

estudos técnicos e beneficiadas pelo ambiente político74 daquele momento,


conseguiram firmar seus anseios junto ao Governo Federal e ao Congresso
Nacional (PARADA, 2001).
Vale observar que a fusão administrativa não significou que tenha ocorrido
uma fusão também no âmbito da saúde75. Desse modo, o estado do Rio de Janeiro,
conforme conhecemos atualmente, passou a ter duas Secretarias Estaduais de
Saúde, comportando seus perfis diferenciados (OLIVAR, 2006).
De um lado, tínhamos o estado da Guanabara – que corresponde ao
município do Rio de Janeiro – que havia sido capital do país e, portanto, possuía
uma economia forte, um importante parque industrial, além de um setor de serviços
considerável para aquela época. Sua população havia passado por inúmeros
movimentos históricos que lhe conferiram um grau de consciência diferenciado em
relação aos demais estados brasileiros. Além disso, por possuir um contingente
populacional elevado, era o segundo colégio eleitoral do país, o que, para Parada
(2001, p. 22) seria uma “razão pela qual o término desse estado constituiu-se numa
das armas utilizadas pelo Governo Federal para tentar obstruir o avanço das forças
contrárias ao regime militar”.
Por outro lado, nos deparávamos com o estado do Rio de Janeiro que
possuía reduzida expressão na política nacional, embora contasse com um grande
colégio eleitoral. Sua economia ancorava-se mais na agropecuária, já que possuía
reduzida expressão no âmbito do parque industrial (PARADA, 2001).
No que concerne à saúde, especificamente, enquanto o estado da Guanabara
havia herdado toda rede de serviços do antigo Distrito Federal76, ao estado do Rio
de Janeiro restava apenas uma pequena rede de hospitais especializados e uma
vasta rede de unidades básicas (OLIVAR, 2006). Durante a fusão houve uma
redistribuição das unidades entre o novo município e o estado do Rio de Janeiro,
mas sem levar em consideração a necessidade de um aprofundamento que

74
Segundo Parada, “fusão criaria ambiente favorável para conter as forças de oposição ao regime, hegemônicas
no estado da Guanabara (Município do Rio de Janeiro), abrindo caminho para as forças políticas ligadas à
situação e, naquele período, dominantes no velho estado do Rio de Janeiro” (2001, p. 21).
75
Segundo Parada, no decorrer da construção do SUS “o município do Rio de Janeiro atua autonomamente,
auto-referido, sem dependência do estado e estabelece relações diretamente com o governo federal. Observou-
se, ainda, que todos os momentos de transformação da saúde tiveram íntima relação com as transformações
federativas no país” (2001, p. 19).
76
A rede era constituída por “unidades próprias do ex-Distrito Federal, unidades do Ministério da Saúde, do
INAMPS [Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social], das universidades, hospitais militares
e aqueles destinados aos servidores públicos federais e estaduais” (PARADA, 2001, p. 27).
62

apontasse o perfil mais adequado das redes estadual e municipal. O pouco de


racionalidade que houve nesse processo foi o fato de unidades consideradas de
referência estadual serem delegadas ao novo estado do Rio de Janeiro, enquanto
aquelas cujo perfil dos usuários era dominado por municípios permanecerem na
nova Secretaria Municipal de Saúde (PARADA, 2001).
A forma de constituição da rede de serviços teve muitas implicações na
construção do SUS nesse território, criando, inclusive, muitos impasses no que se
refere ao processo de municipalização. Essa distribuição desigual dos serviços foi
uma característica tão marcante que ainda hoje repercute na rede de serviços
existentes no âmbito do estado e, especificamente, no município do Rio de Janeiro.
Numa pesquisa nos anos 1990 que resultou na sua tese de doutoramento,
Vasconcelos (2007) indicou que embora a cidade do Rio de Janeiro concentre a
maior rede pública de saúde do país, não conseguia atender – quantitativa e
qualitativamente – a demanda da população carioca, ademais sobrecarregada com
os moradores de outros municípios do estado do Rio de Janeiro que não possuem
rede própria ou que possuem deficiências no atendimento.
O fato de possuir uma vasta rede de hospitais públicos concentrados no
município do Rio de Janeiro dificultou ainda mais o processo de municipalização
dessas unidades. Vasconcelos (2007) ainda considera a complexidade do sistema
de saúde como sendo decorrência da presença dos três níveis de governo, o que se
constituiu como um grande atraso para a efetivação do processo de
municipalização. Endossando essa assertiva, Olivar (2006) destaca que o referido
processo também não foi acompanhado de uma adequação da rede às exigências
do SUS. Assim assinala que duas principais culturas sanitárias permaneceram
convivendo:
• A cultura municipal herdada do período do Distrito Federal – cujo foco é
atendimento de urgência/emergência e materno-infantil;
• A cultura federal herdada do antigo INAMPS – cujo foco é o atendimento eletivo
secundário (PAM’s) e terciário (hospitais gerais).
[E] além dessas “culturas sanitárias”, funcionavam outras lógicas: a dos hospitais
especializados (INCA, INTO, etc.); a dos hospitais gerais universitários; e a da rede
de serviços estadual. Tais lógicas ou culturas tinham uma expressão menor tanto
em termos quantitativos, quanto da atenção ao conjunto da população (OLIVAR,
2006, p.103).

Ao longo dos anos 1990 observamos algumas investidas de determinados


governos no âmbito do estado no sentido da privatização, mas nada que fosse
adiante. Um exemplo disso é o programa HELP – Programa de Hospitais em Locais
Populares – componente do Plano de Desestatização do Estado do Rio de Janeiro,
63

forma utilizada pelo governo de Marcello Alencar (1995-1998) para conceder à


iniciativa privada a gerência dos hospitais gerais (PARADA, 2001). Note-se que o
referido governo possui uma direção claramente de privilegiamento do setor privado,
Bravo (2007) ressalta suas características centrais: política autoritária, terceirização
dos recursos humanos; ênfase na privatização; denuncias de desvio de verbas da
saúde; proposta de transformar os hospitais públicos em OS.
Não por acaso, nos anos imediatamente posteriores ao governo de Marcello
Alencar, este processo de privatização não foi adiante. Destaca-se aqui a reação,
articulação e pressão dos movimentos sociais em torno da saúde que durante a
campanha eleitoral de 1998 conseguiu obter da chapa vitoriosa – composta pelo
PDT/PT e demais forças progressistas (PSB, PCB e PC do B) – a assunção de um
compromisso em prol do fortalecimento do SUS.
É deste modo que se torna possível localizar no governo de Anthony
Garotinho (1999-2001) alguns elementos centrais na política de saúde:
Combate à terceirização e à transformação dos hospitais públicos em organizações
sociais; realização de concurso público para os trabalhadores da saúde e
contratação imediata; elaboração do Plano Estadual de Saúde, por meio do
planejamento estratégico; fortalecimento do Conselho Estadual de Saúde (BRAVO,
2007, p. 16).

Se nos restringirmos ao município do Rio de Janeiro e tomarmos como marco


a elaboração do PDRE, apresentado em meados da referida década e seguirmos
até meados da década seguinte, não há nada de concreto que aponte um
significativo investimento na proposta do modelo de gestão das OS77. Mas
ressaltamos que isso não significa que não se tenha recorrido ao uso de outras
modalidades de privatização da saúde. Vide o recurso às Organizações Não
Governamentais (ONGs) na execução do PSF no governo Cesar Maia.
No governo de Eduardo Paes (2009-2013) a proposta das OS assume
absoluta centralidade, principalmente no âmbito da saúde. Aprovada nos primeiros
meses deste governo, em caráter de urgência e sem considerar as manifestações

77
Consideramos que os elementos que nos ajudariam a explicar o por que dessa proposta surgir com mais força,
no âmbito municipal atualmente, cerca de 15 anos depois da apresentação do PDRE, ainda necessitam ser
melhor aprofundados. Embora não possa ser julgado como determinante, consideramos que um dos elementos
que concorreram nesse processo foram as sucessivas crises na saúde no âmbito do município que vinham
ocorrendo desde os anos 1990 e que nos anos 2000 atingem seu auge em 2005, quando o Conselho Municipal
de Saúde decidiu desabilitar o município da gestão plena de saúde (recuperada apenas em 2007, no mandato do
governador Sergio Cabral).
64

contrárias78, a Lei nº 5 026/2009 revela claramente o comprometimento em relação


às políticas sociais e, especialmente, à saúde.
A referida lei é similar à lei federal em muitos aspectos, principalmente
naqueles enumerados no item 2.3. Há apenas algumas particularidades. Em relação
às áreas de atuação, a lei municipal contempla as mesmas áreas da lei federal –
ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do
meio ambiente, cultura e saúde –, incorporando apenas o esporte. Há duas
ressalvas importantes neste artigo, pois no caso das OS atuantes no ensino, suas
atividades são restritas a creches e reforço escolar. Já no caso das OS qualificadas
para atuar na saúde, estas deverão se restringir a unidades de saúde criadas a partir
da entrada em vigor da lei, ao Hospital Municipal Ronaldo Gazolla e aos
equipamentos destinados ao Programa de Saúde da Família79.
Os contratos de gestão firmados estão submetidos ao controle externo da
Câmara dos Vereadores, auxiliada pelo Tribunal de Contas, já o controle interno fica
a cargo do Poder Executivo. Conforme está previsto no Decreto n° 30780 de 02 de
Junho de 2009, que regulamenta a referida lei e dispõe sobre a qualificação de
entidades como OS, institui-se uma Comissão de Qualificação de Organizações
Sociais (COQUALI), responsável pela decisão em relação aos requerimentos de
qualificação das OS no âmbito municipal. Compõem-na o Secretário Municipal da
Casa Civil; o Procurador Geral do Município; o Controlador Geral do Município; o
Secretário Município de Fazenda; e o Secretário Municipal de Administração. Além
disso, a Secretaria Municipal vinculada à área da atividade descrita na lei também
interfere nesse processo, devendo autuar o requerimento e emitir parecer relativo ao
preenchimento dos requisitos formais para qualificação.

78
É digno de nota o fato de que, embora esteja expresso no PMS que o município do Rio de Janeiro é um
exemplo da presença do controle social exercido de forma democrática e atuante na construção de um sistema
público de saúde – por possuir um Conselho Municipal de Saúde e 10 Conselhos Distritais que tem a finalidade
de auxiliar o poder público na análise, planejamento, formulação, aplicação e deliberação de políticas e
fiscalização das ações do governo – seu posicionamento contrário à tramitação do projeto de lei que tratava da
qualificação de entidades como OS não foi respeitado e a solicitação de retirada da pauta e votação em caráter
de urgência a fim de promover a abertura de debates públicos com ampla participação dos servidores municipais
e da sociedade civil organizada foi ignorada.
79
Posteriormente, podemos verificar que a prefeitura encontrou meios para burlar a própria Lei 5 026/2009. No
ano de 2010, foram lançados editais para programas como Cegonha Carioca – voltado para atuar nas
maternidades municipais – e Saúde nas Escolas. E, mais recentemente, foram lançados editais para
Coordenação Operacional Regional de Emergência, teoricamente um novo órgão criado, para atuar nas
emergências dos hospitais municipais Miguel Couto, Souza Aguiar, Lourenço Jorge e Salgado Filho (unidades
existentes antes da lei).
65

Os requisitos para qualificação como OS da lei federal são mantidos no


âmbito municipal e outros são acrescidos, dentre eles destacamos: a necessidade
da entidade ter sede ou filial localizada no município do Rio de Janeiro; a exigência
de estar constituída há pelo menos dois anos no pleno exercício das atividades
descritas no art. 1º da lei (áreas de atuação), a comprovação da presença, em seu
quadro de pessoal, de profissionais com formação específica para a gestão das
atividades a serem desenvolvidas, notória competência e experiência comprovada
na área de atuação e obrigatoriedade de publicação anual, no Diário Oficial do
Município (DOM/RJ), dos relatórios financeiros e do relatório de execução do
contrato de gestão com o Município.
O Conselho de Administração, órgão de deliberação máxima de cada OS, no
âmbito municipal mantém a composição não paritária, não prevê a participação da
população e restringe a possibilidade de participação dos trabalhadores a 10% do
total. O que chama atenção é que tendo essa formatação, são previstas como
atribuições privativas a fixação da remuneração dos membros da Diretoria; a
alteração do Estatuto da entidade; a aprovação do Regimento Interno, além da
aprovação por maioria, no mínimo, de dois terços de seus membros, do regulamento
próprio contendo os procedimentos que deve adotar para a contratação de obras e
serviços, bem como para compras e alienações e o plano de cargos, salários e
benefícios dos empregados da entidade.
Em seu art. 6º está previsto que deverá ser publicado na íntegra no DOM/RJ
o contrato de gestão celebrado, por intermédio da Secretaria Municipal conforme
sua natureza e objeto, contendo as atribuições, responsabilidades e obrigações do
Poder Público e da entidade contratada. Ademais, o contrato deverá ser submetido
ao Secretário Municipal da área correspondente, após a aprovação do Conselho de
Administração.
Em relação à execução e fiscalização do contrato de gestão, a lei determina
que a fiscalização seja responsabilidade do Secretário Municipal da área
correspondente. O contrato deve prever a possibilidade de, ao final de cada
exercício ou a qualquer tempo, o Poder Público requerer a apresentação pela
entidade qualificada de relatório pertinente a sua execução, contendo comparativo
específico das metas propostas com os resultados alcançados, acompanhado da
prestação de contas correspondente ao exercício financeiro, assim como suas
publicações no DOM/RJ.
66

Os referidos resultados devem ser analisados periodicamente por uma


comissão de avaliação indicada pelo Secretário Municipal composta por
profissionais de notória especialização. E o balanço e demais prestações de contas
devem, necessariamente, ser também publicadas no DOM/RJ e submetidas à
análise do Tribunal de Contas do Município (TCM/RJ).
Por fim, em relação à desqualificação de entidades, caso ocorra
descumprimento das disposições expressas no contrato de gestão, temos prevista a
realização de processo administrativo, garantindo à entidade ampla defesa. Caso
seja definida a desqualificação, os bens permitidos e saldos remanescentes dos
recursos financeiros destinados à OS serão revertidos, sem prejuízo das sanções
contratuais penais e civis aplicáveis à espécie.
Destacamos aqui o fato de que, embora tenhamos a possibilidade de atuação
das OS em sete áreas diferenciadas, observaremos posteriormente que a
expressividade de qualificação destas entidades permanecerá sempre predominante
na saúde. Não consideramos isso uma mera coincidência já que está expresso no
PMS que a saúde seria a área que mais receberia recursos no período de 2010-
201380.
No conjunto de propostas da gestão Eduardo Paes, verificamos algumas
iniciativas estratégicas, tal como o programa Saúde Presente, a Reestruturação de
Atendimento de Emergência, o Programa de Atendimento Domiciliar a Idosos (PADI)
e a criação das UPA (SMSDC, 2009). Estas podem ser observadas no Quadro 1,
elaborado a partir de informações contidas no Plano Estratégico da Prefeitura do Rio
de Janeiro 2009 – 2012.
Destacamos que o fio condutor dessas ações é o primado pelo mix entre
público e privado, já que a SMSDC conta com as OS para operacionalização das
ações.

80
Recordemos dos 10 bilhões de reais anunciados no PMS (SMSDC, 2009).
67

Quadro 1 – Iniciativas Estratégicas da Saúde


Iniciativa Estratégica Descrição Resultados esperados
O programa Saúde Presente consiste na implantação Ampliação da cobertura do
dos Territórios Integrados de Atenção à Saúde, tendo Saúde da Família para 35%
como eixo fundamental para sua organização a em 2012, com atendimento
expansão da Saúde da Família no município do Rio de de melhor qualidade, mais
Janeiro, através da implantação das Clínicas da Família, próximo ao cidadão, com
SAÚDE
nas quais cada equipe de saúde da família será aumento da resolutividade do
PRESENTE (TEIAS)
responsável pelo cuidado em saúde de 4 mil pessoas. atendimento local e
Além das Clínicas da Família, os territórios oferecerão consequente redução do
serviços de Policlínica, Centro de Especialidade fluxo de pacientes nas
Odontológica e Centro de Atenção Psicossocial. grandes emergências do
município.
Este programa consiste na criação de um Plano de Otimização do uso dos
Excelência para a urgência e emergência nos hospitais recursos, melhoria do padrão
Miguel Couto, Souza Aguiar, Lourenço Jorge e Salgado de atendimento, redução do
Filho, por meio de acolhimento e classificação de risco. tempo de espera e melhoria
REESTRUTURAÇÃO
As principais iniciativas são: (i) redesenho de processos da satisfação dos pacientes
DO ATENDIMENTO
para melhoria de atendimento e operacionalização; (ii) com o serviço prestado pelos
DE EMERGÊNCIA
implantação de novas políticas de gestão de RH; (iii) principais hospitais
implantação de política de humanização; (iv) melhoria municipais.
dos sistemas de informação; e (v) contratação de
médicos pesquisadores (convênio Fiocruz).
Este programa se subdivide em dois projetos: o de Redução da internação de
desospitalização que transfere pacientes dos hospitais longa permanência e
de emergência para outros locais; e o de atendimento melhoria na qualidade do
domiciliar que trata dos pacientes com doenças crônicas atendimento aos pacientes
passíveis de recuperação funcional e autonomia. O da terceira idade.
atendimento residencial traz três benefícios, entre
PROGRAMA
outros: (i) facilita a recuperação devido a participação
DE ATENDIMENTO
efetiva da família; (ii) reduz o tempo médio de internação
DOMICILIAR AO
hospitalar e; (iii) libera leitos para outros pacientes. A
IDOSO
primeira fase do projeto contará com 6 equipes, que
(PADI)
contam com as seguintes categorias profissionais:
médico, enfermeiro, fisioterapeuta, terapeuta
ocupacional nutricionista, psicólogo, assistente social e
técnico de enfermagem. As equipes deverão contar com
veículos de suporte. Cada equipe irá realizar 12
atendimentos por dia.
O programa consiste na criação de 20 Unidades de Desafogar a emergência dos
Pronto Atendimento UPA, distribuídas em toda a cidade, hospitais da rede municipal,
para atendimento ambulatorial 24 horas por dia. aproximando a população da
CRIAÇÃO oferta de serviço de saúde
DE UPA por tempo integral. A
previsão é que cada UPA
atenda entre 300 e 500
pessoas por dia.
Fonte: Plano Estratégico da Prefeitura do Rio de Janeiro 2009 – 2012.

Desde a aprovação da Lei nº 5 026/2009 até o final do ano de 2010, 27


entidades foram qualificadas como OS no município do Rio de Janeiro (Quadro 2),
sendo mais da metade para atuar no âmbito da saúde81. E, embora a referida lei
informe que nas atividades dirigidas à saúde, as OS poderão atuar somente em
unidades criadas a partir da vigência da lei, no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla e
nos equipamentos destinados ao Programa Saúde da Família, verificamos uma
81
Consideramos que o fato de esporte ser a segunda área com maior número de OS qualificadas está
fortemente vinculado com a escolha do Rio de Janeiro para sediar dois eventos esportivos significativos: a Copa
do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016.
68

diversificação dos objetos de contrato. Para além das unidades novas, durante o ano
de 2010, lançaram-se editais para gerir programas como Cegonha Carioca – voltado
para atuar nas maternidades municipais – e Saúde nas Escolas, o que demonstra a
real intenção em progressivamente privatizar os equipamentos públicos de saúde.

Quadro 2 – Município do Rio de Janeiro/RJ - OS qualificadas até 2010 por áreas de atuação82

ORGANIZAÇÃO SOCIAL ÁREA DE


CNPJ
ATUAÇÃO

MOVIMENTO CULTURAL SOCIAL – MCS 03.852.999/0001-95 ESPORTE

FUNDAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO E TECNOLÓGICO EM SAÚDE –


02.385.669/0001-74 SAÚDE
FIOTEC

INSTITUTO DE ATENÇÃO BÁSICA E AVANÇADA À SAÚDE – IABAS 09.652.823/0001-76 SAÚDE

CENTRO COMUNITÁRIO LÍDIA DOS SANTOS – CEACA-VILA 29.014.008/0001-99 ESPORTE

ASSOCIAÇÃO PAULISTA PARA O DESENVOLVIMENTO DA MEDICINA – SPDM 61.699.567/0001-92 SAÚDE

CENTRO INTEGRADO DE APOIO PROFISSIONAL – CIAP 04.351.940/0001-86 SAÚDE

ASSOCIAÇÃO GLOBAL SOLUÇÕES EM SAÚDE 03.552.757/0001-86 SAÚDE

PRÓ-SAUDE – ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL 24.232.886/0001-67 SAÚDE

VIVA COMUNIDADE 04.856.049/0001-00 SAÚDE

CENTRO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL ALZIRA DE ALELUIA 06.065.394/0001-42 ESPORTE

82
Quadro elaborado a partir das publicações no DOM/RJ. O levantamento dos dados ocorreu conjuntamente
com Vivian de Almeida Mattos, à época mestranda do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social/UERJ
que defendeu em Setembro/2012 a dissertação intitulada “Serviço Social – cotidiano profissional nas Unidades
de Pronto Atendimento geridas por Organizações Sociais no Município do Rio de Janeiro”.
69

INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS ESPECIALIZADOS E AVANÇADOS – IBEEA 04.641.617/0001-47 ESPORTE

ASSOCIAÇÃO MARCA PARA PROMOÇÃO DE SERVIÇOS – A. MARCA 05.791.879/0001-50 SAÚDE

INSTITUTO SAS 05.576.125/0001-88 SAÚDE

CENTRO DE APOIO AO MOVIMENTO POPULAR – CAMPO 40.426.546/0001-23 SAÚDE

ASSOCIAÇÃO CRESCER COM META 05.515.363/0001-83 ESPORTE

INSTITUTO BRASILEIRO DE ASSISTÊNCIA E PESQUISA – IBAP 27.774.561/0001-02 SAÚDE

SOLAZER CLUBE DOS EXCEPCIONAIS 28.008.530/0001-03 ESPORTE

CENTRO DE PESQUISA EM SAÚDE COLETIVA – CEPESC 31.104.896/0001-82 SAÚDE

SOCIEDADE ESPANHOLA DE BENEFICÊNCIA – HOSPITAL ESPANHOL 33.005.638/0001-74 SAÚDE

CONSELHO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR DA ZONA OESTE – CIEZO 05.146.996/0001-61 SAÚDE

INSTITUTO SOCIAL FIBRA - FIBRA 02.744.384/0001-82 SAÚDE

CENTRO DE INTEGRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – CIEDS BRASIL 05.039.392/0001-16 EDUCAÇÃO

UNIÃO ESPORTIVA VILA OLÍMPICA DA MARÉ – UEVOM 03.139.962/0001-14 ESPORTE

INSTITUTO NACIONAL DE BENEFÍCIOS E ASSISTÊNCIA ÀS COOPERATIVAS E


06.942.340/0001-18 SAÚDE
ASSOCIAÇÕES – INSTITUTO ADVANCE

CASA DA ÁRVORE 05.153.789/0001-34 SAÚDE


70

CENTRO DE ESTUDOS E PESQUISAS 28 – CEP 28 33.927.377/0001-40 SAÚDE

INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL E AÇÃO SOCIAL – IDEIAS 05.696.218/0001-46 EDUCAÇÃO

Fonte: DOM/RJ – Deliberação COQUALI n 37, publicada em 27 de dezembro de 2010.


.
Para efeito de demonstração das referidas intenções do governo temos uma
incursão ainda maior no ano de 2011, pois foram lançados seis editais83, tendo como
objetos de contrato as Clínicas Saúde da Família, as emergências dos hospitais
Miguel Couto, Souza Aguiar, Lourenço Jorge e Salgado Filho84, Hospital Geral da
Estrada do Galeão, Hospital Pedro II, Maternidades Moncorvo Filho e Praça 1º de
maio e CORE Centro, Ilha e Santa Cruz. E, até abril/2012, foram lançados quatro
editais: para CORE Leblon e Barra, para UPA e para o PADI.
Embora a Lei nº 5 026/2009 explicite a necessidade de se observar os
princípios do SUS, expressos tanto no art. 198 da CF/88 quanto no art. 7º da Lei
8080/90, não identificamos de que forma se realizará, a começar pela pouca
possibilidade de exercício do controle democrático da política, passando pela
inexistência de referência e contrarreferência, falta de articulação entre os diferentes
níveis de complexidade, por exemplo. Tudo isso somado à possível existência de
uma rotatividade dos profissionais e a não garantia da continuidade das ações, já
que tratamos de contratos de gestão.
No entanto, ressaltamos que esse processo não se realiza sem
tensionamentos, presentes antes mesmo da aprovação da lei que regulamenta as
OS no município. Isso nos permite afirmar que os ataques ao SUS não vêm
prescindindo de resistências85 que, em alguns momentos, alcançaram importantes
conquistas86.

83
Nem todos os editais foram encontrados no sítio eletrônico da prefeitura ou DOM/RJ.
84
O GLOBO. Organizações sociais: liminar impede novo modelo em emergências em hospitais. Quinta-feira. 17
de fev. de 2011. Disponível em: < http://oglobo.globo.com/rio/organizacoes-sociais-liminar-impede-novo-modelo-
em-emergencias-em-hospitais-2821463#ixzz25j2QSZuH>. Acesso em: 10 ago 2012.
85
Resistências que se constituem no âmbito do município do Rio de Janeiro, mas que também transbordam os
limites municipais e estaduais.
86
Como exemplo, indicamos a liminar, fruto da ação proposta pelo Sindicato dos Enfermeiros e pelo dos
Médicos que impediu a adoção das OS em emergências dos hospitais municipais Miguel Couto, Souza Aguiar,
Lourenço Jorge e Salgado Filho, em Fevereiro/2011. Disponível em:
http://oglobo.globo.com/rio/mat/2011/02/17/organizacoes-sociais-liminar-impede-novo-modelo-em-emergencias-
em-hospitais-923829570.asp Acesso em: 17 jun 2011.
71

Assim, indicamos a relevância do Fórum de Saúde do Rio de Janeiro, que


tem se constituído enquanto espaço importante de debates e articulação de
movimentos sociais em defesa da saúde pública. A experiência do fórum teve início
no ano de 2005 devido à crise da saúde no Rio de Janeiro e em 2007 foi
transformado no Fórum em Defesa do Serviço Público e contra as Fundações a fim
de conferir uma unidade ao movimento – composto por centrais sindicais, sindicatos,
partidos políticos e mandatos parlamentares, representantes dos conselhos
municipais e estadual de saúde, projetos de pesquisa e extensão universitária das
universidades públicas, além de outras entidades e movimentos sociais – que
buscava interferir no processo de tramitação do Projeto de Lei que autorizava a
criação de FEDP para gerir 24 hospitais no âmbito do estado do Rio de Janeiro
(BRAVO ; MENEZES, 2010).
Mesmo após a aprovação e sanção da referida lei, buscou-se agregar outros
movimentos sociais de outras áreas que, posteriormente, também poderiam ser
afetadas. Desse modo, foi sendo construído um espaço importante para pensar
estratégias para o enfrentamento desse processo, envolvendo representações de
trabalhadores e usuários. A partir da assessoria do Projeto Políticas Públicas de
Saúde da Faculdade de Serviço Social da UERJ87 inúmeras atividades foram
desenvolvidas, tais como: realização de debates com as entidades representativas e
também com estudiosos da temática, seminários, elaboração e divulgação de
manifestos, elaboração e encaminhamento de Ações de Inconstitucionalidade –
Violação do Estado de Direito; Inconstitucionalidades Formais, Parciais e Total –,
além da participação em atividades nacionais, realização de curso de extensão,
dentre outros (BRAVO ; MENEZES, 2010).
Em 2008, visando unificar a luta dos servidores públicos estaduais com a
pretensão de ampliar para os também servidores federais e municipais, o fórum
resultou no Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais que,
posteriormente, passou a contar, em 2009, com o Fórum de Saúde como meio de
articulação de suas ações e espaço de interlocução entre movimentos sociais e
academia no que tange à saúde (BRAVO ; MENEZES, 2010).

87
Este espaço contou com a assessoria direta do Projeto Políticas Públicas de Saúde da Faculdade de Serviço
Social da UERJ. Para melhor conferir essa experiência, ver Bravo e Menezes (2010).
72

No ano de 2010, juntamente com os Fóruns de Alagoas, Paraná, São Paulo


e Londrina, compôs uma Frente Nacional pela procedência da ADIN1923/98. Desde
então, dentre as iniciativas promovidas pela Frente, destacam-se a criação de um
abaixo-assinado on-line pela procedência da ADIN, a elaboração de uma carta aos
Ministros do STF e de um documento intitulado “Contra Fatos não há argumentos
que sustentem as Organizações Sociais no Brasil”88 – nele estão contidos fatos
ocorridos nos estados e municípios brasileiros que adotaram o modelo gestão das
OS em seus serviços públicos e que demonstram os prejuízos à sociedade, aos
trabalhadores e ao erário público – e realização de audiências com alguns Ministros
do STF.
Além disso, essa articulação entre os Fóruns89 permitiu a realização de um
seminário, em 2010, reunindo diversas entidades e culminando na criação da Frente
Nacional contra a Privatização da Saúde a fim de articular ainda mais as ações,
ampliar o debate e proporcionar a criação de Fóruns em outros estados (BRAVO,
2011).
Este seminário já contou com mais duas edições, o segundo foi realizado no
ano de 2011 em São Paulo e o mais recente ocorreu neste ano em Maceió. Estes
eventos têm se configurado como um espaço importante de interlocução entre os
fóruns e as demais entidades, no qual se busca aprofundar o debate em defesa da
saúde pública estatal e construir uma agenda comum de lutas.
Cientes das particularidades expressas na política de saúde carioca é que
iremos, no próximo capítulo, mergulhar na análise da experiência concreta da
implementação das OS em solo carioca pela via do orçamento público.

88
O referido documento foi construído por movimentos sociais, sindicatos, Conselhos e várias entidades de
âmbito nacional e contemplou questões como: as fraudes vinculadas as OS, os abusos na dispensa de licitação
e a inexistência de controle social.
89
“As ações desenvolvidas por esses Fóruns de Saúde tem sido: pautar junto STF a importância da votação
favorável à ADIN n. 1923/98, por intermédio de audiências com os ministros; divulgar carta nacional pedindo a
aprovação da ADIN assinada por entidades e movimentos sociais do país [...]; constituir campanha por meio de
abaixo-assinado digital, a fim de mobilizar a população e explicitar os problemas de mercantilização do serviço
público” (BRAVO, 2011, p. 185).
73

3 SAÚDE NO RIO DE JANEIRO: A INTRANSPARÊNCIA DAS ORGANIZAÇÕES


SOCIAIS

Nossa pesquisa baseia-se na análise de fontes primárias de dados, ou seja,


optamos por percorrer os caminhos que dão publicidade aos recursos orçamentários
destinados à política de saúde no âmbito do município do Rio de Janeiro. Assim,
iniciamos uma longa e dura jornada, na qual a imprecisão dos dados revelou a
profunda falta de transparência dos gastos públicos efetuados.
Muito tem se discutido sobre a necessidade da divulgação de informações e
transparência no gasto público90, como forma de garantir o controle democrático. No
entanto, há muito que se percorrer neste caminho. Embora tenha se ampliado a
divulgação das informações, bem como dos dados públicos e tenha havido certo
esforço em facilitar a compreensão da linguagem orçamentária, os dados nem
sempre se apresentam de uma forma clara para maioria da população. E, por outro
lado, se verificamos um grande rol de informações e dados públicos no âmbito
federal, principalmente, se nos basearmos numa análise a partir do governo do
presidente Lula, isso não ocorre da mesma forma em relação aos estados e
municípios. Sendo estes últimos, os piores em relação à disponibilização das
informações.
É importante ressaltar essa dificuldade, pois ela permeou toda a realização de
nossa pesquisa. Embora se intitule Rio Transparente91, o sistema de consulta que
permite o acompanhamento da execução orçamentária dos órgãos e programas do
governo municipal é turvo em muitos aspectos, principalmente quando tratamos dos
recursos destinados às entidades de maior interesse neste estudo, as OS.

90
São exemplos: a aprovação da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 que regula o acesso a informação
e a iniciativa da realização de Conferências sobre Transparência e Controle Social em todo o país neste ano,
iniciando pela etapa municipal até culminar na etapa federal. Mas, embora, esta seja uma iniciativa interessante
já que tem por objetivo principal “promover a transparência pública e estimular a participação da sociedade no
acompanhamento e controle da gestão pública, contribuindo para um controle social mais efetivo e democrático”
(Regimento Interno da Consocial – disponível em: <http://www.consocial.cgu.gov.br/regimento-interno/>), ela
também apresenta limites. Não se toca na questão da participação da população na definição de prioridades
para utilização dos recursos; há um foco maior na utilização “eficiente” dos recursos; e, em sua versão municipal
do Rio de Janeiro, foram basicamente pessoas do governo que organizaram e deram norte à conferência,
havendo pouco espaço para debates e discussões.
91
O Rio Transparente é um aplicativo de consulta on-line da CGM/RJ que permite o acompanhamento da
execução orçamentária dos órgãos e programas do governo municipal.
74

Além disso, recorremos a informações relativas às OS em aproximadamente


330 publicações do DOM/RJ92, do período de maio/2009 a maio/2012, referente aos
editais de convocação que anteriormente eram publicados integralmente neste meio,
conforme determinação da Lei 5 026/2009 (cf. item 2.4). Mas, a partir de
fevereiro/2010 passaram a ser publicados somente avisos de seleção, remetendo a
disponibilidade de consulta presencial na sede da prefeitura e virtual através do
endereço eletrônico da SMSDC. No entanto, mesmo no âmbito virtual nem todos os
editais e contratos foram disponibilizados.
O mesmo se pode dizer dos diversos contratos de gestão, além dos termos
aditivos e apostilamentos. Ou seja, se há algo PRESENTE93 na gestão do atual
prefeito, Eduardo Paes, é a profunda falta de transparência na condução de uma
política que vem movimentando consideráveis parcelas do fundo público.
Ademais, outro impedimento encontrado foi a localização das OS no
orçamento municipal. É possível encontrarmos pelo nome ou Cadastro Nacional de
Pessoa Jurídica (CNPJ) das entidades o montante de recursos destinados às
mesmas, mas não fica claro o objeto de contrato no Rio Transparente. Temos uma
visão geral dos recursos destinados, quando realizamos uma busca por ano, mas
não sabemos exatamente a qual contrato está vinculado.
No interior das diferentes unidades orçamentárias temos a descrição de
elemento de despesa “39 - OUTROS SERVIÇOS DE TERCEIROS - PESSOA
JURÍDICA” que tanto pode contemplar despesas com empresas terceirizadas
quanto pode se referir aos recursos destinados às OS.
Diante disso, nos parece que não há nenhum interesse em que estes dados
estejam dispostos de forma a facilitar a compreensão dos mesmos, o que poderá ser
observado ao longo de nossa exposição no presente capítulo. A cada item
verificaremos o quanto é gritante a contradição existente entre as diferentes fontes
de dados.
Mas, antes de nos debruçarmos sobre os contratos de gestão firmados com
as OS, propriamente ditos, realizaremos uma breve análise da tendência de

92
Em alguns momentos, houve necessidade de refazer as buscas utilizando diferentes palavras-chave, já que
não havia padronização nem periodicidade nas publicações com informações relevantes sobre as OS. Este
processo trabalhoso foi realizado conjuntamente com Vivian de Almeida Mattos.
93
Recordemos que os programas da prefeitura geralmente levam o nome PRESENTE, vide o Saúde Presente,
Prefeitura Presente, dentre outros.
75

alocação dos recursos orçamentários no âmbito da Prefeitura Municipal do Rio de


Janeiro.

3.1 Orçamento público: tendências de alocação dos recursos municipais

A CF/88 foi responsável por inovar na estruturação do orçamento público.


Desde então, o ciclo orçamentário configura-se a partir do Plano Plurianual94
(PPA), que define as prioridades governamentais (federal, estadual e municipal) por
um período de quatro anos; a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que
anualmente estabelece e especifica os programas e ações prioritários do governo,
definindo uma meta concreta que deve ser alcançada até o final do ano subsequente
e respeitando os limites impostos pela LRF; e, por fim, a Lei Orçamentária Anual
(LOA) que estima a receita e fixa a despesa para o exercício financeiro do ano
seguinte. A LOA deve estar em sintonia tanto com o PPA quanto com a LDO.
Nossa pesquisa refere-se ao período temporal de dois anos específicos, 2009
2010, tendo como marco a aprovação da lei que regulamenta as OS no âmbito
municipal, na gestão de Eduardo Paes, mas ainda sob a regência do PPA do
governo anterior e o segundo ano da referida lei com o PPA elaborado na nova
gestão.
O orçamento municipal é composto pelo Orçamento Fiscal, referente aos
Poderes do Município, seus fundos, órgãos e entidades da Administração Pública
Municipal Direta e Indireta, inclusive Fundações instituídas e mantidas pelo Poder
Público; pelo Orçamento da Seguridade Social, abrangendo todas as entidades e
órgãos da Administração Direta e Indireta a ele vinculados, bem como Fundações
instituídas e mantidas pelo Poder Público; e pelo Orçamento de Investimento das
Empresas em que o Município, direta ou indiretamente, detém a maioria do capital
social com direito a voto.
De acordo com LOA há uma previsão de receita para o orçamento fiscal de
R$ 10.985.665.605,00 para o ano de 2009 e de R$ 9.690.976.211,00 para 2010. Já
o orçamento da seguridade social prevê R$ 2.405.757.954,00 e R$

94
O PPA é elaborado no primeiro ano de governo e vigora do segundo ano do mandato vigente até o primeiro
ano do mandato da gestão seguinte.
76

2.614.512.928,00, respectivamente, nos anos de 2009 e 2010. Embora tenha havido


um aumento de 9% nesta estimativa de um ano para outro, em termos percentuais a
seguridade social reduziu sua participação no volume total de recursos, em valores
correntes.

Quadro 3 – Estimativa de Receita


2009 % 2010 %

ORÇAMENTO FISCAL R$ 9.690.976.211,00 80,11% R$ 10.985.665.605,00 80,78%

ORÇAMENTO DA SEGUIRDADE SOCIAL R$2.405.757.954,00 19,89% R$ 2.614.512.928,00 19,22%

TOTAL
R$12.096.734.165,00 100% R$ 13.600.178.533,00 100%
Elaboração própria – Fonte: LOA 2009 e LOA 2010

Em relação à fixação de despesas temos uma previsão de R$


5.653.465.465,00 e R$4.957.279.408,00 para orçamento da seguridade social que
representam 40,98% e 41,57% do total de despesas do orçamento municipal nos
dois anos analisados.

Quadro 4 – Fixação da Despesa


2009 % 2010 %

ORÇAMENTO FISCAL R$7.139.454.757,00 59,02% R$ 7.946.713.068,00 58,43%

ORÇAMENTO DA SEGUIRDADE SOCIAL R$4.957.279.408,00 40,98% R$ 5.653.465.465,00 41,57%

TOTAL 100% 100%


R$12.096.734.165,00 R$ 13.600.178.533,00
Elaboração própria – Fonte: LOA 2009 e LOA 2010.

A seguir temos o resumo das despesas por função da seguridade social,


segundo a origem dos recursos, no qual podemos observar que assistência social
detém uma parte ínfima dos recursos previstos, menos de 3% nos dois anos, a
saúde teve uma ampliação dos recursos tanto em termos absolutos quanto
percentuais e a previdência obteve um decréscimo em termos percentuais.
77

Quadro 5 – Resumo das despesas por função, segundo origem dos recursos
2009
Função Recursos do Recursos de
tesouro - R$ % outras fontes - R$ % Total %
Previdência Social 928.204.000 8,85% 1.278.223.000 79,26% 2.206.427.000 18,24%
Assistência Social 172.769.415 1,65% 185.489.885 11,50% 358.259.300 2,96%
Saúde 2.060.591.352 19,65% 2.060.591.352 17,03%
Outras funções 7.322.435.859 69,85% 149.020.654 9,24% 7.471.456.513 61,77%
Total 10.484.000.626 100,0% 1.612.733.539 100,00% 12.096.734.165 100,00%
2010
Função Recursos do Recursos de
tesouro - R$ % outras fontes - R$ % Total %
Previdência Social 945.808.746 8,00% 1.425.922.000 80,52% 2.371.730.746 17,44%
Assistência Social 225.830.223 1,90% 172.799.750 9,75% 398.629.973 2,93%
Saúde 2.449.725.133 20,70% 2.449.725.133 18,01%
Outras funções 8.207.856.833 69,40% 172.235.848 9,73% 8.380.092.681 61,62%
Total 11.829.220.935 100,0% 1.770.957.598 100,00% 13.600.178.533 100,00%
Elaboração própria – Fonte: LOA 2009 e 2010.

Em relação aos órgãos executores das políticas que compõem a seguridade


social temos a seguinte previsão de alocação dos recursos:

Quadro 6 – Resumo das despesas por órgãos, segundo origem dos recursos
2009
Órgão Recursos do Recursos de
tesouro - R$ % outras fontes - R$ % Total %
Secretaria Municipal de Administração 929.856.105 8,87% 1.463.712.885 90,76% 2.393.568.990 19,79%
Secretaria Municipal de Assistência Social 161.114.638 1,54% 0,00% 161.114.638 1,33%
Secretaria Municipal de Saúde 2.060.642.559 19,66% 2.060.642.559 17,03%
Outros 7.332.387.324 69,93% 149.020.654 9,24% 7.481.407.978 61,85%
Total 10.484.000.626 100,0% 1.612.733.539 100,00% 12.096.734.165 100,00%
2010
Órgão Recursos do Recursos de
tesouro - R$ % outras fontes - R$ % Total %
Secretaria Municipal de Administração 987.699.302 8,35% 1.598.721.750 90,27% 2.586.421.052 21,38%
Secretaria Municipal de Assistência Social 208.313.369 1,76% 0,00% 208.313.369 1,72%
Secretaria Municipal de Saúde 2.457.980.814 20,78% 2.457.980.814 20,32%
Outros 8.175.227.450 69,11% 172.235.848 9,73% 8.347.463.298 56,58%
Total 11.829.220.935 100,0% 1.770.957.598 100,00% 13.600.178.533 100,00%
Elaboração própria – Fonte: LOA 2009 e 2010.

Podemos observar que a Secretaria Municipal de Administração, a qual aloca


recursos relativos à previdência social, não acompanhou as oscilações da função
78

previdência, pois de um ano para outro teve sua participação ampliada no


orçamento total. A Secretaria Municipal de Assistência Social teve um acréscimo de
R$ 47.198.731, o que elevou sua participação a 1,72% do total. Já a Secretaria
Municipal de Saúde, nos dois anos analisados, obteve recursos previstos acima dos
valores da função saúde. A soma da diferença dos dois anos é de R$ 8.306.888, e
no ano de 2010 a referida secretaria atinge 20,32% do valor total.
Se compararmos os valores previstos para o orçamento da seguridade social
com os previstos para cada órgão executor das políticas de seguridade obteremos
uma diferença para menos de R$ 341.953.221,00, em 2009, e R$ 400.750.230,00,
em 2010. Isso demonstra uma diferença que supera os recursos previstos para a
Secretaria Municipal de Assistência no mesmo período, além de sinalizar uma
provável fuga de recursos da seguridade social.
No âmbito do PPA 2010-2013, temos expressas as seguintes metas relativas
à saúde;
• Reduzir a taxa de mortalidade infantil em pelo menos 11% até 2013, tendo
como referência o ano de 2008;
• Reduzir a taxa de mortalidade materna em pelo menos 19% até 2013, tendo
como referência o ano de 2008;
• Reduzir em, pelo menos, 20% o tempo de espera nas emergências dos
hospitais públicos até 2013, tendo como referência o ano de 2009;
• Garantir uma cobertura mínima de 55% do Programa Saúde da Família no
município até 2013;
• Aumentar o número de atendimentos a idosos realizados pelo PADI para,
pelo menos, 60 mil por ano até 2013;
• Construir 17 novas UPA até 2013, além das três previstas para o ano de
2009.
Vale observar que a viabilização de praticamente todas as metas está
alinhada aos objetivos de modernização da gestão da rede de serviços de saúde a
ser operada pela contratação das OS. Ou seja, o aumento de recursos a ser
movimentado pela Secretaria Municipal de Saúde parece estar vinculado à
promoção do processo de privatização da política de saúde carioca.
79

3.2 Fundo Municipal de Saúde: onde está?

Num primeiro momento, objetivávamos verificar se todos os recursos da


Função Saúde passavam pelo Fundo Municipal de Saúde95 (FMS), ou seja, não
estariam imunes ao controle social por parte do conselho96.
Baseados nos dados trazidos por Salvador (2010) em relação ao orçamento
federal, quando nos revela que grande parte dos recursos das políticas de
seguridade social não passa pelos fundos, nossa hipótese inicial era a de que essa
situação se repetia também a nível municipal e que poderia ser ainda mais
recorrente em função da transferência de recursos para as ditas entidades sem fins
lucrativos, as OS.
Desse modo, buscávamos realizar uma análise das tendências de alocação
dos recursos do FMS e, no interior deste, identificar a parcela destinada às OS.
Porém, esta análise foi obstaculizada pela forma de disposição dos dados no Rio
Transparente.
Nosso primeiro impedimento ocorreu quando não identificamos o FMS como
uma das unidades orçamentárias97 no âmbito da SMSDC. Mas, em contato com a
Controladoria Geral do Município do Rio de Janeiro (CGM/RJ) fomos informados de
que todos os recursos apresentados na SMSDC compunham o FMS.
Assim, constam como unidades orçamentárias da SMSDC as Coordenadorias
de Saúde de todas as AP, o Gabinete da SMSDC, os hospitais municipais, dois
institutos municipais, além da Subsecretaria de Defesa Civil e a Vigilância Sanitária.

95
“As receitas do FMS são constituídas por: recursos do orçamento da União, do Estado e do Município,
observado o disposto na Emenda Constitucional nº 29 de 13 de setembro de 2000, na Lei Federal 8.080 de 19
de setembro de 1990, na Portaria nº 399/GM, de 22 de fevereiro de 2006 – Pacto pela Saúde e demais
legislações pertinentes; auxílios, subvenções, contribuições, transferências e participações em convênios e
ajustes; resultados financeiros de suas aplicações; recursos de pessoas físicas e jurídicas, públicas e privadas,
nacionais e estrangeiras, sob a forma de doação; todo e qualquer recursos proveniente de multas ou
penalidades que tenham origem na fiscalização e ações da Secretaria Municipal de Saúde; receitas provenientes
do ressarcimento de despesas de usuários com cobertura securitária de entidade privada e outras receitas”
(CGM/RJ 2009 e 2010).
96
Ao não passar todos os recursos destinados à saúde pelo devido fundo, abre-se a possibilidade de desvios de
recursos – viabilização de programas e ações – para áreas alheias à política de saúde.
97
Unidade da Administração Direta a que o orçamento do Estado consigna dotações específicas para a
realização de seus programas de trabalho e sobre os quais exerce o poder de disposição.
80

Quadro 7 – Unidades Orçamentárias da SMSDC


2009 2010
CÓDIGO UNIDADE ORÇAMENTÁRIA
VALOR PAGO % VALOR PAGO %

1805 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-1 26.126.945,85 1,53% 47.501.011,75 2,31%

1806 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-2.1 20.483.976,31 1,20% 58.017.475,92 2,82%

1807 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-2.2 23.595.118,11 1,39% 37.655.387,45 1,83%

1808 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-3.1 22.941.459,35 1,35% 91.772.503,53 4,46%

1809 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-3.2 16.889.949,79 0,99% 37.709.338,54 1,83%

1810 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-3.3 20.717.252,92 1,22% 60.868.411,43 2,96%

1811 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-4 6.280.782,90 0,37% 27.933.817,40 1,36%

1812 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-5.1 12.950.662,77 0,76% 44.264.157,41 2,15%

1813 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-5.2 10.046.082,51 0,59% 58.986.418,23 2,87%

1814 COORDENADORIA DE SAÚDE DA AP-5.3 9.375.502,41 0,55% 71.417.348,47 3,47%

1801 GABINETE DA SMSDC 1.112.384.249,57 65,31% 909.286.903,21 44,16%

1877 HOSPITAL MATERNIDADE ALEXANDER FLEMING 9.926.025,08 0,58% 15.007.755,14 0,73%

1871 HOSPITAL MATERNIDADE CARMELA DUTRA 14.317.149,91 0,84% 22.620.268,67 1,10%

1862 HOSPITAL MATERNIDADE FERNANDO MAGALHÃES 20.497.750,21 1,20% 26.772.008,86 1,30%

1874 HOSPITAL MATERNIDADE HERCULANO PINHEIRO 13.778.702,79 0,81% 17.295.789,98 0,84%

1863 HOSPITAL MATERNIDADE OSWALDO NAZARETH 10.962.596,08 0,64% 15.053.728,58 0,73%

1883 HOSPITAL MUNICIPAL BARATA RIBEIRO 11.102.513,73 0,54%

1872 HOSPITAL MUNICIPAL DE PIEDADE 11.313.740,83 0,66% 14.641.841,11 0,71%

1876 HOSPITAL MUNICIPAL FRANCISCO DA SILVA TELES 12.044.662,93 0,71% 16.661.814,65 0,81%

1867 HOSPITAL MUNICIPAL JESUS 21.748.641,77 1,28% 27.026.550,84 1,31%

1878 HOSPITAL MUNICIPAL LOURENÇO JORGE 41.231.269,33 2,42% 60.600.263,90 2,94%

1864 HOSPITAL MUNICIPAL MIGUEL COUTO 57.332.998,94 3,37% 77.875.467,46 3,78%

1882 HOSPITAL MUNICIPAL N S DO LORETO 9.227.255,40 0,45%

1869 HOSPITAL MUNICIPAL PAULINO WERNECK 12.850.256,28 0,75% 16.129.610,00 0,78%

1880 HOSPITAL MUNICIPAL RAPHAEL DE PAULA SOUZA 7.211.005,85 0,42% 10.515.459,02 0,51%

1875 HOSPITAL MUNICIPAL RONALDO GAZZOLA 34.602.759,63 2,03% 40.215.463,27 1,95%

1870 HOSPITAL MUNICIPAL SALGADO FILHO 61.029.540,78 3,58% 83.393.393,80 4,05%

1861 HOSPITAL MUNICIPAL SOUZA AGUIAR 57.886.337,73 3,40% 84.070.826,55 4,08%

1881 INSTITUTO MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA A SAÚDE JULIANO MOREIRA 7.558.328,73 0,44% 17.393.796,06 0,84%

1873 INSTITUTO MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA A SAÚDE NISE DA SILVEIRA 3.466.471,90 0,20% 12.390.604,43 0,60%

1816 SUBSECRETARIA DE DEFESA CIVIL 6.402.820,40 0,31%

1815 VIGILÂNCIA SANITÁRIA 23.666.584,99 1,39% 29.037.579,88 1,41%

TOTAL 1.703.216.806,25 100,00% 2.058.847.585,07 100,00%


Elaboração própria – Fonte: CGM/ RJ.

Conforme podemos observar (Quadro 7) é o Gabinete da SMSDC a unidade


orçamentária que concentra a maior parte dos recursos nos dois anos, cerca de
65,31%, em 2009, e 44,16%, em 2010. Em seguida, temos o conjunto dos hospitais
municipais com 22,71% dos recursos no primeiro ano e 26,63% no segundo. As
Coordenadorias de Saúde saem de 9,95%, em 2009, para 26,04%, em 2010.
Embora não seja possível rastrear com precisão o volume de recursos destinados às
81

OS, supomos que o referido aumento seja em função dos inúmeros contratos
firmados com as OS para gerência das Clínicas Saúde da Família e UPA dispersas
nas diferentes AP.
Os institutos percebem uma parcela ínfima dos recursos, pois nos dois anos
ficam abaixo dos 2%, mesmo tendo o total de recursos ampliado, em termos
absolutos, de um ano para outro. Do mesmo modo, há um acréscimo, em termos
absolutos, nos recursos da Vigilância Sanitária. No entanto, em termos percentuais,
esta unidade orçamentária permaneceu praticamente inalterada, o que mostra o
peso ínfimo das atividades preventivas. E, por fim, a Subsecretaria de Defesa Civil
figura como unidade orçamentária apenas no ano de 2010, com cerca de 0,3% dos
recursos.
Nesse sentido, se considerarmos que o FMS é composto por todos os
recursos dispostos no orçamento da SMSDC, teremos os valores de R$
1.703.216.806,25 e R$ 2.058.847.585,07 para os anos de 2009 e 2010,
respectivamente.
No entanto, se nos basearmos nos valores expostos nos Relatórios de
Prestação de Contas de 2009 e 2010 (Quadro 9), elaborados pela CGM, não há
correspondência com os valores indicados no Rio Transparente, o que no mínimo é
contraditório já que, conforme consta em seu sítio eletrônico, é a própria CGM que
alimenta este sistema de consulta.
Assim, embora, os relatórios nos permitam afirmar que boa parte dos
recursos da Função Saúde passam pelo FMS, é de se estranhar a diferença
existente entre os valores dispostos no Rio Transparente e aqueles expostos nos
referidos relatórios.
Abaixo podemos observar, segundo os relatórios da CGM, que a Função
Saúde deteve 19% dos recursos no ano de 2009. Já, em 2010, esse percentual caiu
para 18%, embora tenha havido um acréscimo em termos absolutos.
Quadro 8 – Evolução da despesa por função de governo
Função 2009 2010
Saúde 2.023.531.000 19% 2.512.589.000 18%
Assistência Social 323.582.000 3% 339.050.000 2%
Previdência Social 2.018.813.000 19% 2.133.864.000 15%
Outras Funções 6.404.220.000 59% 9.293.397.000 65%
TOTAL 10.770.146.000 100% 14.278.900.000 100%
Fonte: Relatórios de Prestação de Contas 2009 e 2010 – CGM/RJ.
81

Quadro 9 – Fundo Municipal de Saúde - despesas


2009 2010

Autorizadas Autorizadas
Despesas Corrigidas Realizadas Saldos Despesas Corrigidas Realizadas Saldos
Despesas Correntes 2.113.501.871,72 2.008.218.127,41 105.283.744,31 Despesas Correntes 2.464.381.188,59 2.363.978.783,06 100.402.405,53
Pessoal e Encargos Sociais 1.139.600.251,30 1.070.236.438,70 69.363.812,60 Pessoal e Encargos Sociais 1.114.324.299,01 1.060.305.095,47 54.019.203,54
Juros e Encargos da Dívida 0 0 0 Juros e Encargos da Dívida 0 0 0
Outras Despesas Correntes 973.901.620,42 937.981.688,71 35.919.931,71 Outras Despesas Correntes 1.350.056.889,58 1.303.673.687,59 46.383.201,99

Despesas de Capital 37.225.844,77 15.512.551,87 21.713.292,90 Despesas de Capital 194.035.027,35 148.610.266,24 45.424.761,11
Investimentos 37.225.844,77 15.512.551,87 21.713.292,90 Investimentos 194.035.027,35 148.610.266,24 45.424.761,11
Inversões Financeiras 0 0 0 Inversões Financeiras 0 0 0
Amortizações da Dívida 0 0 0 Amortizações da Dívida 0 0 0

SOMA 2.150.727.716,49 2.023.730.679,28 126.997.037,21 SOMA 2.658.416.215,94 2.512.589.049,30 145.827.166,64


SUPERÁVIT 0 0 0 SUPERÁVIT 0 0 0
TOTAL 2.150.727.716,49 2.023.730.679,28 126.997.037,21 TOTAL 2.658.416.215,94 2.512.589.049,30 145.827.166,64
Fonte: Relatórios de Prestação de Contas 2009 e 2010 – CGM/RJ.
82

Para uma melhor visualização abaixo comparamos os valores fornecidos


pelas diferentes fontes de dados.

Quadro 10 – Comparação entre as diferentes fontes de dados do Fundo


Municipal de Saúde
2009 2010
Rio Transparente (SMSDC) 1.703.216.806,25 2.058.847.585,07
Função Saúde 2.023.531.000,00 2.512.589.000,00
Fundo Municipal de Saúde (Despesas Realizadas) 2.023.730.679,28 2.512.589.049,30
Elaboração própria – Fontes: Rio Transparente e Relatórios de Prestação de Conta 2009 e 2010 – CGM/RJ.

Desse modo, podemos constatar que os dados referentes aos recursos que
compõem o FMS, dispostos no Rio Transparente – que consideramos o canal de
consulta mais acessível à população –, estão geralmente abaixo dos dados obtidos
institucionalmente.
Por isso, cabem as seguintes perguntas: Por que o FMS não figura como uma
das unidades orçamentárias da SMSDC? Se todos os recursos da SMSDC são o
próprio FMS, por que os valores são divergentes daqueles expressos nos relatórios
da CGM? Assim, estas questões acabam por favorecer a permanência de nossa
suspeita inicial de que parte dos recursos destinados à saúde possa, de fato,
transitar por fora do FMS. Uma confirmação cabal exigiria mais tempo de
investigação, o que não foi possível no contexto de uma dissertação de mestrado,
mas consideramos que os dados elencados são chaves importantes.
O cenário que se desenha a partir da análise dos contratos de gestão
firmados entre prefeitura, na figura da SMSDC, e as OS nestes dois primeiros anos
de aprovação da lei que as regulamenta reflete as mesmas divergências nos dados
consultados em diferentes fontes, o que nos leva a crer que este tem sido um ato
absolutamente proposital.

3.3 Contratos de gestão: gerência [d]eficiente de recursos

Nos primeiros meses de aprovação da Lei nº 5 026/2009, mais precisamente


entre os meses de agosto e outubro/2009, foram lançados pela prefeitura 13 editais,
sendo 12 para Clínicas Saúde da Família e um para UPA. Destes editais, apenas
83

nove tornaram-se contratos de gestão (CG) celebrados entre a SMSDC e as OS


vencedoras, até dezembro do mesmo ano, e um edital fracassou.

Quadro 11 – Organizações Sociais vencedoras dos editais lançados em 2009


CONTRATO VENCEDOR DO
EDITAL DE GESTAÕ AP UNIDADE DE SAÚDE
EDITAL

01/2009 01/2009 5.3 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA SPDM

08/2010 5.3 LOTE I - UPA SANTTA CRUZ SPDM


02/2009
LOTE II - UPA CIDADE DE DEUS
03/2009 4.0/5.1 IABAS
E BANGU

03/2009 FRACASSADO 3.2 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA FRACASSADO

3.1[EXCETO
04/2009 05/2009 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA VIVA COMUNIDADE
MANGUINHOS]

05/2009 11/2010 1.0 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA GLOBAL

06/2009 * 4.0 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA CIAP

3.1 – TEIAS
07/2009 02/2009 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA FIOTEC
MANGUINHOS

08/2009 06/2009 2.1 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA VIVA COMUNIDADE

09/2009 * 2.2 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA CIAP


3.3 –
10/2009 * COMPLEXO CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA CIAP
MADUREIRA
11/2009 04/2009 3.3 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA VIVA COMUNIDADE

12/2009 ** 5.1 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA CAMPO

13/2009 ** 5.2 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA CAMPO


Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.
*Contratos rescindidos em função de irregularidades.
**Contratos não localizados.

No segundo ano, em 2010, houve uma diversificação nos objetos de contrato.


Foram lançados 16 editais que contemplaram desde as Clínicas Saúde da Família e
as UPA, até programas como o PADI, o programa Cegonha Carioca e o programa
Saúde nas Escolas. Além disso, tivemos um último edital referente à prestação de
serviços de saúde em eventos.
Conforme podemos observar, do universo de editais lançados no período de
2009-2010 que se concretizaram em contratos foi o IABAS quem mais venceu os
84

editais, sendo nove no total. Ele é seguido da SPDM e o CIAP98 com quatro, a Viva
Comunidade com três, o CAMPO99 com dois e a FIOTEC, a GLOBAL, o CEP 28, a
A. MARCA e o FIBRA, com um cada.
Quadro 12 – Organizações Sociais vencedoras dos editais lançados em 2010
CONTRATO
EDITAL AP UNIDADES E SERVIÇOS VENCEDOR DO EDITAL
DE GESTÃO

01/2010 20/2010 3.2 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA / ESF SPDM

PROGRAMA DE ATENDIMENTO
02/2010 16/2010 TODAS IABAS
DOMICILIAR A IDOSOS (PADI)

03/2010 * 3.2 UPA - ENGENHO DE DENTRO CIAP


ADIADO SINE DIE EM
ADIADO SINE
04/2010 3.2, 4, 5.1 e 5.3 PROGRAMA CEGONHA CARIOCA 15/03/2010 - PROCESSO:
DIE
09/007081/09
05/2010 CANCELADO 2.1 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA / ESF CANCELADO
ATÉ O FINAL DE 2010 NÃO
06/2010 FRACASSADO 3.1 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA / ESF
HAVIA VENCEDOR.

3.1 – COMPLEXO
07/2010 05/2010 UPA COMPLEXO DO ALEMÃO IABAS
DO ALEMÃO

08/2010 21/2010 3.2 UPA - ENGENHO DE DENTRO SPDM

09/2010 22/2010 3.3 UPA - MADUREIRA IABAS

10/2010 05/2011 5.1 UPA - SENADOR CAMARÁ A. MARCA


01/2010
SME/ PROGRAMA SAÚDE NAS ESCOLAS IABAS
SMSDC
MATERNIDADES PROGRAMA CEGONHA CARIOCA –
11/2010 06/2011 CEP 28
DA PREFEITURA MÓDULO ACOLHIMENTO

12/2010 02/2011 5.1 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA IABAS

13/2010 03/2011 5.2 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA IABAS

14/2010 01/2011 2.2 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA FIBRA

15/2010 04/2011 4.0 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA IABAS

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE
ASSISTÊNCIA À SAÚDE EM
POSTOS PRÉ-HOSPITALAR FIXO
(PHF) NOS EVENTOS DA CIDADE
DO RIO DE JANEIRO, A SABER:
16/2010 35/2010 IABAS
ENSAIOS TÉCNICOS DAS ESCOLAS
DE SAMBA DO CARNAVAL,
REVEILLON, ATIVIDADES PRÉ-
CARNAVAL NO “TERREIRÃO DO
SAMBA” E CARNAVAL 2011
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.
*Contratos rescindidos em função de irregularidades.

98
Três contratos foram rescindidos posteriormente e um deles não chegou a ser firmado, em função do processo
de intervenção judicial a que o CIAP estava submetido no período (Cf. item 3.4).
99
Ao que nos parece os contratos não chegaram a ser celebrados entre esta entidade e a SMSDC/RJ (Cf. item
3.4).
85

O acompanhamento do emprego dos recursos destinados aos mais variados


programas e unidades de saúde torna-se ainda mais árduo quando verificamos que
para além do orçamento previsto para os 12 primeiros meses de contrato, a
prefeitura prosseguiu ampliando o montante de recursos através dos termos
aditivos100 (T. A.) e apostilamentos101.
Vale sublinhar que, da mesma forma, tivemos dificuldades em localizar todos
os T. A. de contratos existentes no âmbito da SMSDC. Apenas recentemente, mais
precisamente em agosto deste ano – por ocasião da campanha para a reeleição do
prefeito Eduardo Paes –, grande parte dos T. A. foram disponibilizados no sítio
eletrônico da SMSDC.
No quadro abaixo relacionamos apenas os contratos de gestão firmados que,
até agosto/2012, não apresentaram nenhum T. A. aos seus objetos. Estes
representam 29% do universo de contratos firmados com as OS, nos anos de 2009
e 2010, no âmbito da SMSDC.

100
Os Termos Aditivos referem-se a alterações na essência do contrato e necessariamente devem ser
publicados no DOM/RJ. De modo geral, os objetos dos T. A. analisados em nossa pesquisa tiveram a finalidade
de incluir novos serviços, contratar temporariamente equipes de saúde e promover a prorrogação dos contratos,
acrescendo os respectivos valores aos contratos. No decorrer de nossa exposição trataremos dos T. A.
localizados por meio da busca no DOM/RJ e disponibilizados no sítio eletrônico da SMSDC/RJ até agosto/2012.
101
Apostilamento corresponde a um ato administrativo previsto no art. 65, § 8º da Lei 8 666/93 . Em síntese,
trata-se de um registro de variação contratual decorrente de reajuste de preços previsto no próprio contrato,
atualizações, compensações ou penalizações financeiras em função das condições de pagamento nele
previstas, bem como o empenho de dotações orçamentárias suplementares até o limite do seu valor corrigido.
Diferente, do T. A., não há necessidade de haver publicação do DOM/RJ já que não corresponde a uma
alteração do contrato.
86

Quadro 13 – Contratos de Gestão, celebrados nos anos de 2009 e 2010,


que não possuem termos aditivos
CONTRATO
VENCEDOR
EDITAL DE AP UNIDADE DE SAÚDE ORÇAMENTO
DO EDITAL
GESTAÕ
R$ 12.184.143,34
05/2009 11/2010 1.0 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA GLOBAL
(12 MESES)
R$
CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA /
01/2010 20/2010 3.2 SPDM 113.494.759,68102
ESF
(24 MESES)
PROGRAMA DE ATENDIMENTO R$ 5.387.840,00
02/2010 16/2010 TODAS IABAS
DOMICILIAR A IDOSOS (PADI) (24 MESES)
R$ 30.829.360,00
08/2010 21/2010 3.2 UPA - ENGENHO DE DENTRO SPDM
(24 MESES)
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE
ASSISTÊNCIA À SAÚDE EM
R$ 5.252.188,41*
16/2010 35/2010 POSTOS PRÉ-HOSPITALAR IABAS
FIXO (PHF) NOS EVENTOS DA
CIDADE DO RIO DE JANEIRO**
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.
*Não há contrato disponibilizado no sítio eletrônico da SMSDC/RJ, referente a este edital. Trata-se de uma
quantia obtida pela soma simples dos valores que constam no Rio Transparente.
**Ensaios Técnicos das Escolas de Samba do Carnaval, Réveillon, atividades pré-Carnaval no “Terreirão do
Samba” e Carnaval 2011.

A partir da composição do cenário que descrevemos anteriormente, optamos


por nos deter apenas nos contratos celebrados pela SMSDC que possuem T. A.,
apontando alguns dos problemas identificados.
Assim, até o final do ano de 2010 temos um total de 17103 contratos de gestão
celebrados entre a SMSDC e as diferentes OS (ver Quadro 11 e Quadro 12), sendo
que nove destes possuem T. A. Vale destacar que, excetuados os contratos
rescindidos, todos os contratos firmados no ano de 2009 possuem T. A. Já em
2010, este número cai para apenas três, metade dos contratos firmados neste ano.

102
Conforme está expresso no referido contrato a partir do 13º até o mês 24º, os recursos orçamentários
mensais serão calculados a partir da média dos recursos do 11º e 12º, desde que todos os itens listados no
ANEXO III - recursos orçamentários estejam totalmente implementados. Caso contrário será feito ajuste
proporcional à quantidade de serviços prestados.
103
Deste total, três contratos firmados com a OS CIAP foram rescindidos (Cf. item 3.4).
87

Quadro 14 – Contratos de gestão, celebrados nos anos de 2009 e 2010, que


possuem termos aditivos
CONTRATO VENCEDOR DO
AP UNIDADE DE SAÚDE
DE GESTÃO EDITAL

01/2009 5.3 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA SPDM


3.1 - TEIAS
02/2009 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA FIOTEC
MANGUINHOS
03/2009 4.0/5.1 LOTE II - UPA CIDADE DE DEUS E BANGU IABAS
VIVA
04/2009 3.3 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA
COMUNIDADE
3.1 [EXCETO VIVA
05/2009 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA
MANGUINHOS] COMUNIDADE
VIVA
06/2009 2.1 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA
COMUNIDADE
3.1 -
05/2010 COMPLEXO UPA COMPLEXO DO ALEMÃO IABAS
DO ALEMÃO
08/2010 5.3 LOTE I - UPA STA CRUZ SPDM

022/2010 3.3 UPA - MADUREIRA IABAS


Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

No quadro abaixo (Quadro 15) está relacionado o primeiro contrato celebrado,


em outubro/2009, entre a SMSDC e a OS SPDM para operacionalização, apoio e
execução de atividades e serviços de saúde da família no âmbito da AP 5.3 pelo
período de dois anos104.

Quadro 15 - Termos Aditivos ao CG 01/2009 – SMSDC/RJ e SPDM


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
5.3 R$ 35.355.745,60 CLINICAS SAÚDE DA FAMÍLIA
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA
T. A. 02/2010 em 01 de
R$ 2.224.881,89 POR 3 MESES DE 12 EQUIPES
março de 2010
NASF
2º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 19/2010 em 01 de CONTRATAÇÃO POR 16 MESES
R$ 84.866.241,14
junho de 2010 DE 12 EQUIPES NASF
3º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 12/2011 em 07 de PRORROGAÇÃO DO CG POR
R$ 231.217.237,58
outubro de 2011 MAIS 2 ANOS (24 + 4 NOVAS)
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

104
As OS podem ter seu contrato renovado por duas vezes, uma por igual período (2 anos) e outra pela metade
(1 ano), ou seja, podem ficar até 5 anos gerindo determinada unidade se obtiverem 80% das metas definidas
para o período anterior.
88

O CG 01/2009 prevê o apoio105 a 13 Postos de Saúde, unidades já existentes,


e gerência de 15 Clínicas Saúde da Família, após a finalização das obras da
Riourbe, o que totaliza 28 unidades. Como pode ser observado, o valor previsto para
os 12 primeiros meses do contrato é de R$ 35.355.745,60 e ao longo do ano de
2010 tivemos dois T. A. relacionados à contratação de equipes para os Núcleos de
Apoio à Saúde da Família (NASF).
Esclarece-se no primeiro T. A. que o NASF diz respeito às equipes de
profissionais de diferentes áreas de conhecimento106, que irão atuar em parceria
com os profissionais das Equipes Saúde da Família (ESF), compartilhando as
práticas em saúde nos territórios sob responsabilidade dessas equipes. O primeiro
T. A. era referente à contratação temporária por três meses (março a maio/2010) de
12 equipes, enquanto o segundo era pelo período de 16 meses (junho/2010 a
setembro/2011), sendo que juntos totalizaram R$ 87.091.123,03.
O que, no mínimo, é curioso é o fato de no ano de 2011, quando houve a
prorrogação do contrato por mais dois anos para a OS SPDM continuar a atuar nas
mesmas unidades e gerir quatro unidades novas que já estavam previstas
inicialmente no contrato, o valor atingir R$ 231.217.237,58. Cabe nos questionar que
se estamos tratando da manutenção de um serviço que teoricamente já estaria
consolidado e, mais, da gerência de mais quatro novas unidades – o que não foi
cumprido nos dois primeiros anos do contrato – por que aumentar tão
significativamente, aproximadamente 227% do valor inicial do contrato, o volume
de recursos destinados à entidade contratada? Isso sem contarmos que
provavelmente haverá outros T. A.
O segundo contrato (Quadro 16) diz respeito à operacionalização, apoio e
execução de atividades e serviços de saúde da família no âmbito do Território
Integrado de Atenção à Saúde (TEIAS) – Manguinhos e prevê para os primeiros 12
meses de atuação a quantia de R$ 24.494.299,13. O primeiro T. A. deste contrato
objetivou ampliar o horário de funcionamento do pronto atendimento da Clínica
Saúde da Família da Comunidade de Manguinhos e, para tanto, R$ 10.088.321,29
foram repassados à FIOTEC de modo que o valor total do contrato passou a ser R$
34.582.620,42.
105
Leia-se gerência das unidades já existentes.
106
Para o funcionamento do NASF espera-se que a contratação contemple os seguintes profissionais: médicos,
enfermeiros, assistentes sociais, sanitaristas, nutricionistas, fonoaudiólogos, farmacêuticos, fisioterapeutas e
psicólogos.
89

O T. A. subsequente, diferente dos outros T. A., não está disponibilizado no


sítio eletrônico da SMSDC nem foi localizado no DOM/RJ. Desse modo, não há
informações sobre o objeto, se houve repasse de recursos para execução de
determinada atividade nem quando o mesmo foi assinado.
O terceiro T. A. do CG 02/2009 teve por objeto sua prorrogação por mais dois
anos, prevendo o repasse de R$ 54.929.935,62 para o terceiro ano e de R$
55.094.053,04 para o quarto ano, o que totaliza R$ R$ 110.023.988,66. Ademais,
tratou da inclusão de regras para as condições do repasse, o controle de ponto e
acesso biométrico dos funcionários contratados107 e da remuneração dos dirigentes
e profissionais da atividade meio108, não podendo ultrapassar 10% do valor total do
contrato.

Quadro 16 - Termos Aditivos ao CG 02/2009 – SMSDC/RJ e FIOTEC


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
3.1 - TEIAS MANGUINHOS R$ 24.494.299,13 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
EXTENSÃO DO HORÁRIO DE
T. A. 01/2010 em 04 de
R$ 10.088.321,29 FUNCIONAMENTO DO PRONTO
fevereiro de 2010
ATENDIMENTO DA CF
2º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T.A 032/2010 * *
3º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
PRORROGAÇÃO DO CG POR
T. A. 019/2011 em 30 de
R$ 110.023.988,67 MAIS 2 ANOS
dezembro de 2011
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.
* Todos os Termos Aditivos deste contrato encontram-se listados no sítio eletrônico da SMSDC/RJ, mas somente
o 2º não está disponível para consulta.

O terceiro contrato celebrado ainda no ano de 2009 tem por objeto a


operacionalização, apoio e execução de atividades e serviços de saúde no âmbito
das Urgências e Emergências em UPA, Unidades de Atendimento não hospitalar
das AP 4.0 e 5.1 – Lote II. É importante destacar que o referido contrato, assinado
em 1º de dezembro/2009, é o que mais possui T. A., sendo seis no total.

107
Em decorrência desse controle sobre as horas efetivamente trabalhadas dos funcionários contratados para
execução do contrato, o T. A. prevê ainda que a entidade, no caso a FIOTEC, a apresentação no prazo de 45
dias de um projeto básico com três orçamentos a fim adequar ao cronograma financeiro previsto. Além disso,
indica a necessidade de apresentar a cada três meses, juntamente com o relatório trimestral de cumprimento de
metas, um relatório de frequência com base no controle biométrico implementado.
108
Esclarece-se no T. A. que é considerada atividade meio aquela que não está relacionada com a finalidade da
entidade, ou seja, trata-se de uma atividade acessória quanto ao objeto do contrato.
90

O primeiro T. A. data de fevereiro/2010 e se refere à contratação temporária


por três meses de 55 equipes de Saúde da Família, 35 equipes de Saúde Bucal,
nove NASF, 20 equipes da Clínica Saúde da Família – agentes comunitários de
defesa civil e 20 equipes de Atenção Farmacêutica no âmbito da AP 5.2. Mas, caso
o contrato com OS CAMPO com idêntico objeto fosse firmado, o período de vigência
poderia ser antecipado e os repasses de créditos orçamentários reduzidos
proporcionalmente.
O segundo T. A., também de fevereiro/2010, trata da contratação de 50
equipes de Saúde da Família, 22 equipes Clinicas da Família Atenção Farmacêutica,
25 equipes de Saúde Bucal, nove NASF e 22 equipes de agentes comunitários de
defesa civil na AP 5.1 e seguiu a mesma lógica do T. A. anterior em relação à
assunção das atividades pela OS CAMPO.
Ao que nos parece estes dois T. A. tiveram por objetivo fazer com que o
IABAS assumisse emergencialmente as atividades que seriam executadas pelo
CAMPO, enquanto o contrato deste último não fosse celebrado, em razão dos
impedimentos que serão abordados posteriormente (Cf. item 3.4). Juntos os T. A.
acrescem a quantia de R$ 22.925.995,65 ao CG 03/2009.
Após manifestar expressamente o “interesse público” na execução das
atividades de atenção primária das AP 5.1 e 5.2, por força dos terceiro e quarto T. A.
tivemos a inclusão pelo período de oito meses das atividades e gerenciamento de
atenção à saúde, assim como das adaptações e programação visual das unidades e
dos gastos operacionais de equipes de Saúde da Família e NASF nas AP
supracitadas. Para tanto, houve uma alteração do cronograma de desembolso e
acréscimo contratual no valor de R$ 50.057.830,41.
O quinto T. A. teve por objetivo alterar o CG 03/2009 em alguns aspectos:
revisão do cronograma financeiro, readequando os valores mensais pactuados;
supressão da quantia de R$ 1. 387.260,00 do valor total do referido contrato e;
inclusão de regras para as condições do repasse, o controle de ponto e acesso
biométrico dos funcionários contratados e da remuneração dos dirigentes e
profissionais da atividade meio, não podendo ultrapassar 10% do valor total do
contrato – nas mesmas condições do CG 02/2009.
91

Quadro 17 - Termos Aditivos ao CG 03/2009 – SMSDC/RJ e IABAS


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
LOTE II - UPA CIDADE DE DEUS E BANGU
4.0/ 5.1 R$ 23.985.600,00
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA POR 3
MESES DE 55 EQUIPES DA SAÚDE DA
T. A. 03/2010 em 1º
R$ 11.900.360,67 FAMÍLIA, 35 DE SAÚDE BUCAL, 9 NASF, 20
fevereiro de 2010
AGENTES COMUNITÁRIOS E 20 DE
ATENÇÃO FARMACÊUTICA NA AP 5.2.
2º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA POR 3
MESES DE 50 EQUIPES DA SAÚDE DA
T. A. 04/2010 em 1º
R$ 11.025.634,98 FAMÍLIA, 22 ATENÇÃO FARMACÊUTICA, 25
de fevereiro de 2010
DE SAÚDE BUCAL, 9 NASF, 22 DE
AGENTES COMUNITÁRIOS NA AP 5.1
3º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
INCLUSÃO POR 8 MESES DA ATIVIDADE E
GERENCIAMENTO DE ATENÇÃO À SAÚDE,
ASSIM COMO DAS ADAPTAÇÕES E
T. A. 17/2010 em 7 PROGRAMAÇÃO VISUAL DAS UNIDADES E
R$ 32.316.937,74
de junho de 2010 DOS GASTOS OPERACIONAIS DE
EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA E NASF
NA AP 5.2 E ALTERAÇÃO NO
CRONOGRAMA DO DESEMBOLSO
4º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
INCLUSÃO POR 8 MESES DA ATIVIDADE E
GERENCIAMENTO DE ATENÇÃO À SAÚDE,
ASSIM COMO DAS ADAPTAÇÕES E
T. A.18/2010 em 7
R$ 17.740.892,67 PROGRAMAÇÃO VISUAL DAS UNIDADES E
de junho de 2010
DOS GASTOS OPERACIONAIS DE
EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA E NASF
NA AP 5.1
5º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 11/2011 18 de SUPRESSÃO DE
ALTERAÇÃO DO CG
outubro de 2011 R$1.387.260,00
6º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 15/2011 em 30
PRORROGAÇÃO DO CG POR MAIS 2 ANOS
de novembro de R$ 59.058.720,00
DA UPA
2011
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.
* Todos os Termos Aditivos deste contrato encontram-se listados no sítio eletrônico da SMSDC/RJ, mas somente
o 6º está disponível para consulta.

Conforme expresso neste último T. A., pela alteração motivada por ele, o CG
03/2009 passaria a vigorar com o valor total de R$ 45.585.740,00. No entanto,
identificamos uma divergência neste valor já que se considerarmos os valores
expressos no contrato109 para os dois primeiros anos, R$ 23.985.600,00 e R$
23.385.600,00, respectivamente, e suprimirmos a quantia de R$1.387.260,00

109
Quando tratamos dos valores totais dos contratos não consideramos os T. A. que têm por objeto atender uma
necessidade pontual e/ou temporária.
92

teremos R$ 45.983.940,00, ou seja, quase R$ 400 mil a mais do que o previsto no T.


A.
Por fim, depois de todo esse processo, tivemos mais um T. A. que prorrogou
o CG 03/2009 a partir de dezembro/2011 por mais 24 meses, o que acresceu R$
59.058.720,00 ao valor total. A partir de então, o contrato passaria a vigorar com o
valor total de R$ 104.644.460,00110, ou seja, com menos quase R$ 400 mil que
estavam previstos nos valores iniciais do contrato.
O contrato que trataremos a seguir, CG 04/2009, foi assinado em
dezembro/2009 e tem por objeto a operacionalização, apoio e execução de
atividades e serviços de Saúde da Família no âmbito da AP 3.3, tendo como valor
inicial para os 12 primeiros meses a quantia de R$ 26.148.810,65.
Conforme consta no referido contrato passariam a receber apoio à gestão
pela Viva Comunidade até nove unidades de saúde atualmente existentes ou que
seriam adaptadas nas comunidades/bairros existentes na AP 3.3 e até 13 novas
unidades de saúde na AP 3.3 que seriam geridas após finalização das obras da
Riourbe.
Cerca de dois meses após a assinatura do contrato, tivemos o primeiro T. A. a
fim de incluir por três meses nove equipes de profissionais para os NASF da AP 3.3.
Para tanto, o valor repassado à Viva Comunidade aumentou em R$ 1.486.869,52.
O segundo T. A. deste contrato teve a finalidade de acrescer o valor de R$
66.382.792,13, correspondente ao segundo ano de execução da atividade na AP
3.3. Assim como no 5º T. A. ao CG 03/2009, tivemos neste a previsão de inclusão de
regras para as condições do repasse, o controle de ponto e acesso biométrico dos
funcionários contratados e da remuneração dos dirigentes e profissionais da
atividade meio, não podendo ultrapassar 10% do valor total do contrato.
O último T. A. deste contrato se refere à prorrogação de sua vigência pelo
prazo de um ano, acrescendo a quantia de R$ 89.224.532,62 ao valor anterior.
Diferente do previsto inicialmente passariam a receber apoio da Viva Comunidade
20 unidades já existentes e apenas três unidades novas, ou seja, no total cerca de
23 unidades. E, considerando que o contrato foi renovado apenas por mais um ano
tivemos um acréscimo de 241% em relação ao valor orçado para os 12 primeiros
meses. Segundo o T. A., o contrato atingiria dessa forma o valor total de R$

110
Se realizarmos uma soma simples entre os valores previstos para os dois primeiros anos do contrato, R$
45.983.940,00, e o valor previsto na prorrogação, R$ 59.058.720,00, chegaremos ao total de R$ 105.042.660,00.
93

183.193.031,89, mas se somarmos todos os valores constantes no quadro abaixo –


excetuando o T. A. que tem objeto uma necessidade temporária – obteremos a
quantia de R$ 181.756.135,40.

Quadro 18 - Termos Aditivos ao CG 04/2009 – SMSDC/RJ e Viva Comunidade


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
3.3 CLÍNICAS SAÚDE DA
R$ 26.148.810,65
FAMÍLIA
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 14/2010 em 01 de INCLUSÃO POR 3 MESES
R$ 1.486.869,52
fevereiro de 2010 DE 9 EQUIPES NASF
2º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
ACRÉSCIMO DE VALOR
T. A. 38/2010 em 30 de
R$ 66.382.792,13 CORRESPONDENTE AO
dezembro de 2010
SEGUNDO ANO
3º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 14/2011 em 20 de PRORROGAÇÃO DO CG
R$ 89.224.532,62
dezembro de 2011 POR MAIS 1 ANO
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

O CG 05/2009, também assinado em dezembro/2009, tem por objeto a


operacionalização, apoio e execução de atividades e serviços de Saúde da Família
no âmbito da AP 3.1, com exceção de Manguinhos. Assim como nos outros
contratos a vigência é de dois anos e orçamento previsto para os 12 primeiros
meses é apresentado no valor de R$ 55.152.419,76.
Passariam a receber o apoio à gestão pela Viva Comunidade as unidades de
saúde existentes ou que seriam adaptadas nas comunidades existentes na AP 3.1,
além de cinco novas unidades de saúde da AP 3.1, após finalização das obras da
Riourbe, totalizando no mínimo 90 equipes de Saúde da Família e no mínimo 30
equipes de Saúde Bucal.
O primeiro T. A. foi assinado em fevereiro/2010 e tinha por objeto a inclusão
por três meses de quatro equipes de profissionais para os NASF AP 3.1 e, por isso,
o acréscimo orçamentário no valor de R$ 660.842,90.
O T. A. subsequente teve por objeto a alteração da redação da cláusula
segunda, item 2.5, do contrato, no qual acrescentou às responsabilidades da Viva
Comunidade, as obrigações previdenciárias decorrentes da contratação e
pagamento do pessoal necessário à execução dos serviços inerentes às atividades
executadas pela referida instituição executora. Ademais, sinalizou que a quantia
referente à prestação dos serviços previstos no CG 05/2009 que seria repassada à
94

Viva Comunidade nos dois anos de vigência do contrato seria de R$


110.304.839,52.
O terceiro T. A. tratou da prorrogação do contrato pelo prazo de um ano e
acréscimo do valor, correspondente ao mesmo período, em R$ 98.361.561,38.
Segundo o mesmo T. A., o valor total do contrato elevou-se para R$ 237.820.305,66.
Porém, mais uma vez identificamos uma divergência no valor total do contrato, pois
a soma simples dos valores referentes a cada um dos três anos totaliza a quantia de
R$ 208.666.400,90. Ademais, também é recorrente uma elevação considerável do
valor do contrato.

Quadro 19 - Termos Aditivos ao CG 05/2009 – SMSDC/RJ e Viva Comunidade


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
3.1 [exceto Manguinhos] R$ 55.152.419,76 CLINICAS SAÚDE DA FAMÍLIA
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 15/2010 em 01 de INCLUSÃO POR 3 MESES DE 4
R$ 660.842,90
fevereiro de 2010 EQUIPES NASF
2º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 37/2010 em 22 de ALTERAÇÃO DA CLÁUSULA
dezembro de 2011 - SEGUNDA DO CG.
3º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 16/2011 em 20 de PRORROGAÇÃO DO CG POR
R$ 98.361.561,38
dezembro de 2011 MAIS 1 ANO
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

Na sequência segue o CG 06/2009, segundo contrato com mais T. A., que


tem por objeto a operacionalização, apoio e execução de atividades e serviços de
Saúde da Família na AP 2.1. Nele está previsto o apoio a até 10 unidades de saúde
atualmente existentes ou que seriam adaptadas nas comunidades da referida AP e
até uma nova unidade de saúde, após finalização das obras pela Riourbe.
Cerca de três meses após assinatura do contrato tivemos o primeiro T. A.,
referente à inclusão por nove meses (março a novembro/2010) de uma equipe de
profissionais para os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) tipo III, no valor de
R$ 2.009.347,69.
Surpreendentemente, o segundo T. A. é cronologicamente anterior ao
primeiro e, no universo de contratos celebrados pela prefeitura nos anos de 2009 e
2010 que possuem T. A., este é o segundo a também ter a finalidade de incluir um
serviço de pronto atendimento, neste caso, a UPA Rocinha. Assim, pelo acréscimo
desta prestação de serviço foi repassado à Viva Comunidade o valor de R$
6.370.000,00.
95

Por meio do terceiro T. A. foi acrescentada, pelo período de um ano, a


atividade e gerenciamento do PSF e do Programa de Atenção Psicossocial na AP
2.1, aumentando o valor repassado à Viva Comunidade em R$ 37.000.049,09. Nas
mesmas condições dos outros contratos, está prevista a inclusão de regras para as
condições do repasse, o controle de ponto e acesso biométrico dos funcionários
contratados e da remuneração dos dirigentes e profissionais da atividade meio, não
podendo ultrapassar 10% do valor total do contrato.
O T. A. subsequente teve por objeto a prorrogação da vigência do CG
06/2009 pelo prazo de um ano, acrescendo o valor de R$ 51.991.635,37, relativo ao
mesmo período, o que elevou o valor total do contrato – sem considerar os repasses
referentes à inclusão da UPA – para R$ 113.645.447,23. Novamente, identificamos
uma divergência entre o valor total do contrato expresso neste último T. A. e a soma
dos repasses financeiros referentes aos três anos do contrato. Comparando-se
estes dois valores totais verificamos uma diferença de R$ 95.676,64.

Quadro 20 - Termos Aditivos ao CG 06/2009 – SMSDC/RJ e Viva Comunidade


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
2.1 R$ 24.558.086,13 CLÍNICAS SAÚDE DA FAMÍLIA
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 12/2010 em 06 de INCLUSÃO POR 9 MESES DE
R$ 2.009.347,69
março de 2010 UMA EQUIPE PARA O CAPS III
2º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
INCLUSÃO DE UM SERVIÇO DE
T. A. 13/2010 em 18 de
R$ 6.370.000,00 PRONTO ATENDIMENTO [UPA
fevereiro de 2010
ROCINHA]
3º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
ATIVIDADE E
T. A. 33/2010 em 21 de GERENCIAMENTO DO PSF E
R$ 37.000.049,09
dezembro de 2010 PROGRAMA DE ATENÇÃO
PSICOSSOCIAL
4º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 17/2011 em 20 de PRORROGAÇÃO DO CG POR
R$ 51.991.635,37
dezembro de 2011 MAIS 1 ANO
5º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 18/2011 em 20 de PRORROGAÇÃO DO CG POR
R$ 11.392.290,00
dezembro de 2011 MAIS 1 ANO DA UPA
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

Por fim, tivemos o quinto T. A. com a finalidade de prorrogar por mais um ano
a vigência das atividades e serviços de saúde no âmbito do Pronto Atendimento da
Clínica da Família 24 horas, ou seja, da UPA Rocinha. Ademais, também consta
96

neste T. A. que a execução do presente contrato estará sob responsabilidade de


uma filial, especificamente criada para este fim!
No universo de seis contratos celebrados no ano de 2010, metade deles
possuem T. A. assinados até agosto/2012, sendo todos referentes à gestão de UPA.
Iniciaremos nosso percurso em 2010 pelo CG 05/2010, celebrado entre a
SMSDC e o IABAS, que trata de serviços de saúde no âmbito das urgências e
emergências em UPA, Unidades de Atendimento não hospitalar, das áreas de
Planejamento 3.1 – Complexo do Alemão, tendo como valor previsto para o primeiro
ano a quantia de R$ 8.260.000,00.
O referido contrato até o presente momento teve apenas dois T. A., o primeiro
para alterar o porte da UPA de I para II111, acrescendo o valor de R$ 12.259.947,50
e o segundo para prorrogar a vigência do mesmo por mais dois anos. Deste modo,
foi previsto o repasse de R$ 22.784.580,00.

Quadro 21 - Termos Aditivos ao CG 05/2010 – SMSDC/RJ e IABAS


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
3.1 – COMPLEXO DO
R$ 8.260.000,00 UPA COMPLEXO DO ALEMÃO
ALEMÃO
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 034/2010 em 30 de MUDANÇA DE PORTE DA UPA [I
R$ 12.259.947,50
dezembro de 2010 para II]
2º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. em 21 de março de PRORROGAÇÃO DO CG POR MAIS
R$ 22.784.580,00
2012 2 ANOS
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

Na sequência temos o CG 08/2010 referente à operacionalização, apoio e


execução de atividades e serviços de saúde no âmbito das Urgências e
Emergências em UPA, Unidades de Atendimento não hospitalar da AP 5.3 – LOTE I.
Integram o referido lote 19 unidades já existentes e uma unidade que foi criada, a
UPA Santa Cruz.
O primeiro T. A. deste contrato, ao que nos parece, foi fruto de uma
solicitação à Procuradoria Administrativa (PG/PADM) do município pelo próprio
secretário municipal de Saúde e Defesa Civil, Hans Fernando Rocha Dohmann, em
decorrência de uma situação similar ao CG 03/2009.

111
As UPA podem ser classificadas em três diferentes portes, segundo os seguintes critérios: população a ser
coberta, capacidade física instalada, número de leitos disponíveis, recursos humanos e capacidade diária de
realizar atendimentos médicos. A diferença dos portes também se expressa no incentivo financeiro de
investimento para implantação da unidade (edificação/ mobiliário/ materiais e equipamentos) e no repasse
financeiro (manutenção) (BRASIL, 2009).
97

Espantosamente, a justificativa recai sobre a necessidade de realizar a


compra de equipamentos, materiais permanentes e mobiliário a fim de atender as
diretrizes de implantação das UPA, conforme Portaria GM nº 1 020, de 13 de maio
de 2009, que, inicialmente, estaria sob a responsabilidade do município.
No entanto, após o primeiro contrato celebrado pela prefeitura
especificamente para gerir uma UPA, o CG 03/2009, foi verificado que o tempo
necessário para a realização de cotação de preços e compra dos itens supracitados
– procedimento necessário ao serviço público – atrasaria a inauguração e traria
prejuízos à assistência da população, conforme argumentos da SMSDC.
Para amenizar o alegado problema recorreu-se aos materiais, equipamentos
e mobiliários oriundos de outras unidades hospitalares municipais – Hospital
Municipal Souza Aguiar, Lourenço Jorge e Ronaldo Gazolla – e os que atendem aos
eventos oficiais112 e de epidemias no município, quando a SMSDC atende em
estrutura temporária de pré-hospitalar fixo.
Diante disso, a SMSDC concluiu que o repasse de recursos à OS seria a
solução mais adequada, para que o próprio IABAS efetuasse a compra direta. Para
tanto, houve a necessidade de antecipar a primeira parcela mensal do pagamento
destinado ao custeio das atividades previstas no contrato.
Desse modo, deixou-se de observar o procedimento previsto no art. 38,
parágrafo único da Lei nº 8 666/93, que determina que “as minutas de editais de
licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes devem ser
previamente examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração”.
Sob o argumento de que o repasse efetuado não ocasionou qualquer prejuízo
ao interesse público nem a terceiros, a SMSDC na figura de seu secretário, solicitou
a avaliação da possibilidade de convalidação, pela Administração, do ato praticado a
fim de promover a devida regularização da instrução processual.
Nesse sentido, tivemos o primeiro T. A. ao CG 08/2010 com o objetivo de
antecipar a primeira parcela mensal do pagamento, no valor de R$ 1.300.000,00,
destinado ao custeio das atividades do referido contrato, a fim de possibilitar a
implantação das atividades da UPA Santa Cruz, isentando de qualquer
apresentação de relatório referente à liberação desta parcela!
O segundo T. A. teve a finalidade de acrescer ao contrato a quantia de R$
14.599.100,00, referente ao segundo ano de execução do contrato, alterando o valor
112
Também gerenciados por OS.
98

total para R$ 27.545.500,00. Porém, assim como em outros contratos, constatamos


uma diferença de R$ 346.400,00 entre o valor total informado pelo T. A. e a soma
dos repasses referentes aos dois primeiros anos. Além disso, trata das regras para
as condições do repasse, o controle de ponto e acesso biométrico dos funcionários
contratados e da remuneração dos dirigentes e profissionais da atividade meio, não
podendo ultrapassar 10% do valor total do contrato.
O terceiro T. A. teve por objeto a inclusão de duas novas UPA – Sepetiba e
Paciência – ao CG 08/2010. Para execução do referido objeto foi previsto o repasse
financeiro no valor de R$ 18.907.605,00, elevando o valor total do contrato à quantia
de R$ 46.453.105,00, ou seja, permanece a diferença de R$ 346.400,00, sinalizada
anteriormente.

Quadro 22 - Termos Aditivos ao CG 08/2010 – SMSDC/RJ e SPDM


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
5.3 R$ 11.992.800,00 LOTE I – UPA SANTA CRUZ
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
ACRÉSCIMO DO VALOR
T. A.25/2010 em 28 de
R$ 1.300.000,00 CONTRATUAL E ALTERAÇÃO
julho de 2010
DO DESEMBOLSO
2º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
ACRÉSCIMO RELATIVO AO
T. A.10/2011 em 18 de
R$ 14.599.100,00 SEGUNDO ANO DE
outubro de 2011
EXECUÇÃO
3º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 13/2011 em 30 de UPA SEPETIBA E UPA
R$ 18.907.605,00
dezembro de 2011 PACIÊNCIA
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

Para encerrar este percurso por entre os contratos com T. A. celebrados nos
anos de 2009 e 2010, temos o CG 22/2010, assinado em dezembro/2010, que tem
por objeto a operacionalização, apoio e execução de atividades e serviços de saúde
no âmbito das Urgências e Emergências em UPA, Unidades de Atendimento não
hospitalar da AP 3.3. Para o primeiro ano de atividades foi previsto o repasse total
de R$ 15.771.730,00.
O referido contrato possui um único T. A. que teve por objetivo incluir a UPA
Costa Barros (tipo III) no mesmo, por 20 meses, período restante de sua vigência.
Neste T. A. estão previstos os repasses financeiros correspondentes, sendo R$
12.256.330,00 para o primeiro ano e R$ 14.881.860,00 para o segundo. Com esta
99

alteração, conforme está expresso no T. A., o contrato passou vigorar com o valor
total de R$ 57.967.550,00.

Quadro 23 - Termos Aditivos ao CG 22/2010 – SMSDC/RJ e IABAS


ORÇAMENTO
AP UNIDADE DE SAÚDE
[12 MESES]
R$ 15.771.730,00
3.3 UPA MADUREIRA
1º TERMO ADITIVO VALOR OBJETO
T. A. 07/2011 em 12 de ACRÉSCIMO DA UPA COSTA
R$ 27.138.190,00
abril de 2011 BARROS [III] AO CG
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

Ao final deste percurso temos um conjunto de elementos que revelam


claramente a falta de transparência nos recurso destinados para as OS,
principalmente, quando nos debruçamos sobre os diferentes contratos e seus
respectivos T. A. que denotam diferenças importantes nos valores. Diferenças estas
que não estão resguardadas por justificativas palpáveis, ou seja, mesmo se tratando
de recursos originários do fundo público há uma profunda obscuridade em seu
emprego.
Temos um volume significativo de recursos circulando na operacionalização
dos contratos firmados com as OS, mas que não têm se refletido numa melhora real
da saúde da grande maioria da população, dependente da rede pública de saúde.
Conforme elucidou a recente pesquisa de Mattos (2012), a adoção do modelo de
gestão privatizante, ao contrário do que propagam seus defensores, não trouxe
benefícios para a população113. Pelo contrário, acaba por endossar o processo de
precarização e focalização da política de saúde, inclusive, reforçado na campanha
para reeleição do prefeito Eduardo Paes quando anuncia que haverá uma Clínica
Saúde da Família para cada cidadão sem plano de saúde!
Ainda que possamos considerar que parte das divergências identificadas se
deve à parte variável do contrato, relacionada às metas cumpridas e à prestação de
contas, consideramos que este justificativa deveria ser explicitada durante o
processo.
De modo geral, quando verificamos o conjunto de contratos firmados com a
prefeitura e as OS, dispostos no Rio Transparente, as disparidades se ampliam. Os
valores relativos aos contratos geralmente divergem daqueles expressos nas

113
A despeito do grande volume de recursos destinados para as OS, a referida pesquisa (MATTOS, 2012)
demonstra que faltam médicos e recursos nas unidades geridas por elas.
100

publicações do DOM/RJ e no sítio eletrônico da SMSDC. Nem todos os T. A.


constam neste sistema e, curiosamente, aparecem registros de apostilamentos a
diversos contratos. Ou seja, embora tenhamos recorrido a diversas fontes primárias
de dados há uma forte dificuldade em precisar o quanto de fato estas entidades
estão se apropriando do fundo público.
Mesmo assim, tomando por referência os valores dispostos no Rio
Transparente114 elaboramos o quadro a seguir.

Quadro 24 – Recursos da SMSDC destinados às OS – 2009 e 2010


2009 2010
ORGANIZAÇÃO
SOCIAL VALOR ÓRGÃO VALOR ÓRGÃO SUBTOTAL
SPDM 2.647.206,96 SMSDC 64.610.645,99 SMSDC 67.257.852,95
Nenhum
VIVA Nenhum
registro no 99.226.618,09 SMSDC 99.226.618,09
COMUNIDADE registro no RT
RT
Nenhum
Nenhum
GLOBAL registro no 10.437.111,24 SMSDC 10.437.111,24
registro no RT
RT
Nenhum
Nenhum Nenhum Nenhum registro no Nenhum
CIAP registro no
registro no RT registro no RT RT registro no RT
RT
FIOTEC 16.803.396,12 SMSDC 95.121.495,67 SMSDC 111.924.891,79
CAMPO 7.486.100,99 SMSDC 8.305.789,78 SMSDC 15.791.890,77
Nenhum
Nenhum
IABAS registro no 90.651.831,10 SMSDC 90.651.831,10
registro no RT
RT

Secretaria Especial
Nenhum
Nenhum de Envelhecimento
A. MARCA registro no 2.040.172,73 2.040.172,73
registro no RT Saudável e
RT
Qualidade de Vida

Nenhum
Nenhum Nenhum Nenhum registro no Nenhum
CEP28 registro no
registro no RT registro no RT RT registro no RT
RT
Nenhum
Nenhum Nenhum Nenhum registro no Nenhum
FIBRA registro no
registro no RT registro no RT RT registro no RT
RT
TOTAL 72.615.309,02 390.769.617,94 463.384.926,96
Elaboração própria – Fonte: Rio Transparente (RT).

Nele constam os recursos destinados às OS nos anos de 2009 e 2010, mas


como os recursos não estão detalhados não há como identificar a qual contrato
estão vinculados.

114
Neste caso, a partir do nome ou CNPJ das entidades, realizamos a consulta por Favorecido nos dois anos.
101

Vale observar que existem contratos firmados com estas entidades que são
anteriores à aprovação da lei que regulamenta as OS (ver Quadro 25) e, além disso,
contrariamente à referida lei, há casos em que algumas entidades recebem recursos
para contratação de recursos humanos para hospitais municipais. Basta observamos
os recursos destinados à FIOTEC no ano de 2009 – a quantia de R$ 16.803.396,12
–, quando a referida entidade só teve seu primeiro contrato assinado em meados de
dezembro/2009.

Quadro 25 – Organizações sociais com convênios anteriores com a prefeitura


VIVA COMUNIDADE*

ASSOCIAÇÃO GLOBAL SOLUÇÕES EM SAÚDE - GLOBAL

FUNDAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO E


TECNOLÓGICO EM SAÚDE – FIOTEC**

CENTRO DE APOIO AO MOVIMENTO POPULAR – CAMPO

CENTRO DE PESQUISA EM SAÚDE COLETIVA – CEPESC

CONSELHO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR DA


ZONA OESTE – CIEZO

Elaboração própria – Fonte: Rio Transparente.


*A Viva Comunidade é um dos braços da ONG Viva Rio.
** A FIOTEC é uma entidade vinculada à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Além da FIOTEC, temos o CAMPO, pois embora tenha vencido dois editais
em 2009, não localizamos nenhum contrato assinado com a SMSDC, mesmo assim
temos o registro da destinação de R$ 7.486.100,99, em 2009, e R$ 8.305.789,78,
em 2010, provavelmente referente a contratos anteriores115.
Os recursos visualizados no Quadro 24, também incluem os contratos
decorrentes dos inúmeros editais lançados pela prefeitura nos anos de 2009 e 2010.
Nesse sentido, é o curioso o fato de uma das primeiras OS a ser desqualificada,
CIAP, não ter nenhum registro116 de recebimento de recursos no Rio Transparente,
já que no ano de 2009 a mesma firmou três contratos com SMSDC para a gerência

115
Conforme expresso no DOM/RJ, em 25/05/2009, a referida entidade, na condição de ONG, estava habilitada
a promover a cobertura populacional, no que tange às ações de prevenção, promoção e assistência à saúde, no
sentido de dar continuidade ao impacto positivo na qualidade de vida das comunidades de Fazenda Modelo e
Moriçaba, Jardim América e Rio das Pedras.
116
Nos casos em que nenhum registro foi encontrado, geralmente, havia a seguinte mensagem: “Em
atualização... Aguarde!”. Porém, até o presente momento a referida atualização não foi concluída.
102

de Clínicas Saúde da Família nas AP 2.2, 3.3 3 4.0 e sua desqualificação ocorreu
apenas em agosto/2011.
Nesse sentido, se considerarmos que os contratos foram assinados em
dezembro/2009 e janeiro/2010, ou seja, decorridos quase dois anos
operacionalização das atividades e serviços de saúde previstos nos contratos não é
possível identificar o montante de recursos que lhe foram destinados117.
Esses elementos só corroboram com a profunda falta de transparência que
existe na condução da política de saúde carioca que inclui a falta de clareza dos
recursos que passam pelo FMS, mas que também se revela desde a concorrência
dos editais lançados pela prefeitura e alcança o âmbito dos numerosos e elevados
repasses financeiros – via contratos de gestão, T. A. e apostilamentos – realizados
para as OS.
Assim, em termos percentuais, podemos considerar que os valores
destinados às OS, R$ 72.615.309,02 e R$ 390.769.617,94 – nos anos 2009 e 2010
– em relação ao volume total de recursos da SMSDC (ver Quadro 7) representam
4%118 e 19%119 dos recursos orçamentários, respectivamente. Desse modo, embora
não possamos afirmar que parte considerável dos recursos da saúde foi destinada
aos contratos de gestão firmados com as OS para gerência das unidades,
principalmente, as UPA e Clínicas da Família e programas municipais de saúde –
conforme expressamos na nossa hipótese inicial – podemos sim constatar que há
uma forte tendência que caminha nesse sentido. E, pior, em detrimento das
unidades, serviços e ações geridas e operacionalizadas diretamente pelo poder
público.

117
Vale lembrar que os valores orçados para os 12 primeiros meses dos três contratos somam cerca de
R$ 37.846.178,95.
118
Consideramos que este baixo percentual pode estar relacionado ao fato de que grande parte dos contratos
dos editais lançados em 2009 foi assinada no período de novembro/2009 a janeiro/2010, ou seja, parte
considerável dos recursos foi incluída somente no orçamento de 2010.
119
Há um levantamento sobre as OS do vereador Paulo Pinheiro, provavelmente realizado por vias institucionais
– diferente dos dados encontrados por meio de nossa pesquisa – que demonstrou que as OS representam
5,13% dentro do custeio total da SMSDC a partir LOA do ano de 2010. O referido levantamento foi
disponibilizado por Luiz Mario Behnken, coordenador do Fórum Popular de Orçamento do Rio de Janeiro, em
visita realizada à sede.
103

3.4 Organizações sociais: cada uma por si e o fundo público por todas

Há uma legislação pertinente à implantação das OS em solo carioca (Quadro


26). No entanto, gostaríamos de conferir especial destaque ao Decreto nº. 33010 de
novembro de 2010 que trata dos critérios para aplicação financeira dos saldos de
recursos transferidos às OS via contratos de gestão. Chamamos atenção para o fato
do referido decreto determinar que enquanto não utilizados os saldos deverão ser
aplicados obrigatoriamente em cadernetas de poupança de instituição financeira
oficial se a previsão de seu uso for igual ou superior a um mês; em fundos de curto
prazo; e em operações com títulos públicos federais!
Desse modo, cabe-nos ressaltar o ciclo vicioso que se estabelece:
O Estado prioriza metas fiscais, reduz o montante de recursos destinados às
políticas sociais, focalizando-as, drena recursos da seguridade social para garantir o
pagamento da dívida pública e repassa120 – via adoção dos modelos privatizantes de
gestão – a execução dos serviços sociais para as entidades, ditas do “terceiro setor”,
mas mantendo o financiamento das ações.
Por sua vez, estas entidades que recebem recursos públicos, por serem
denominadas entidades sem fins lucrativos, possuem imunidade tributária, ou seja,
não contribuem para a formação do fundo público que viabiliza os próprios serviços
executados por elas. E, como não bastasse esse arranjo, estas mesmas entidades
no âmbito do município do Rio de Janeiro, por força do Decreto n°. 33010 de 03 de
novembro de 2010, podem aplicar financeiramente os saldos de recursos que lhe
forem transferidos para execução de contratos em operações com títulos públicos
federais! E, para sustentar os juros altos e garantir o pagamento da dívida pública o
ciclo é reiniciado pelo Estado.
O Decreto n°. 35129 de 16 de Fevereiro de 2012 também é digno de nota já
que tem por objetivo limitar o percentual de gastos dos contratos de gestão com uma
mesma entidade. O referido decreto define que no universo de contratos de gestão
celebrados pela prefeitura, uma mesma entidade, não pode perceber recursos num
120
Embasadas nos argumentos de que “as OS tornam mais fácil e direto o controle social, por meio da
participação nos conselhos de administração dos diversos segmentos representativos da sociedade civil, ao
mesmo tempo que favorece seu financiamento via compra de serviços e doações por parte da sociedade. Não
obstante, gozam de uma autonomia administrativa muito maior do que aquela possível dentro do aparelho do
Estado. Em compensação, seus dirigentes são chamados a assumir uma responsabilidade maior, em conjunto
com a sociedade, na gestão da instituição e na melhoria da eficiência e da qualidade dos serviços, atendendo
melhor o cidadão-cliente a um custo menor” (MARE, 1997, p. 14).
104

percentual superior a 20% da totalidade das despesas anuais orçadas para o


mesmo fim, por área de atuação.
Caso haja alguma OS que já tenha ultrapassado o percentual supracitado,
fica proibida a celebração de novos contratos, até que seja atingido o referido limite.

Quadro 26 – Legislação municipal pertinente às Organizações Sociais


Dispõe sobre a qualificação de entidades
Lei Municipal n°. 5026 de 19 de maio de 2009 como Organizações Sociais e dá outras
providências.

Regulamenta a Lei Municipal n° 5026, de 19


de Maio de 2009, que dispõe sobre a
Decreto n°. 30780 de 02 de junho de 2009
qualificação de entidades como organizações
sociais e dá outras providências.

Torna obrigatória a apresentação da Certidão


de Regular Funcionamento das Fundações,
Decreto n°. 32318 de 07 de junho de 2009 expedida pelo Ministério Público do Estado
do Rio de Janeiro para contratar ou conveniar
com a Prefeitura do Rio de Janeiro.

Define instrução processual para qualificação


de Organizações Sociais, procedimentos da
Deliberação COQUALI n°. 02 de 27 de julho de 2009
Comissão de Qualificação de Organizações
Sociais-COQUALI e dá outras providências.

Altera o Decreto n° 30780, de 02 de junho de


Decreto n°. 30916, de 29 de julho de 2009
2009 e dá outras providências.
Altera o Decreto n° 30780, de 02 de junho de
Decreto n°. 31618 de 18 de dezembro de 2009 2009 e dá outras providências.

Dispõe sobre critérios para aplicação


financeira dos saldos de recursos
Decreto n°. 33010 de 03 de novembro de 2010 transferidos a Organizações Sociais, por
conta de contratos de gestão firmados com a
municipalidade.
Limita o percentual de gastos dos contratos
Decreto n°. 35129 de 16 de fevereiro de 2012
de gestão com uma mesma entidade.
Fonte: Sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

Conforme vimos demonstrando até aqui há uma imensa contradição entre o


que os defensores dos modelos privatizantes de gestão apresentam como
vantagens e o que se materializa na realidade. Teoricamente as entidades são
capazes de executar as mesmas funções do Estado no âmbito das políticas sociais,
mas de forma mais ágil, mais eficiente, efetiva e com menos custos.
105

Em relatório emitido pelo TCM/RJ, referente a UPA municipais que estão sob
a gerência de OS121, foram revelados gastos excessivos (O DIA, 25/10/2011). Por
determinação da lei que as regulamenta, estas entidades possuem autonomia para
decidir sobre os procedimentos que devem adotar para a contratação de obras e
serviços, bem como para compras e alienações.
No entanto, contraditoriamente, o relatório supracitado revela exatamente
que, munida desta autonomia, a entidade contratada pela prefeitura pagou um preço
por serviços, medicamentos e produtos com valores acima do que a própria
prefeitura desembolsa com unidades de saúde diretamente sob sua gerência (O
DIA, 25/10/2011).
Conforme apresentado na reportagem, a inspeção solicitada pelo vereador
Paulo Pinheiro, identificou que os recursos públicos destinados ao contrato firmado
com a OS IABAS pela prefeitura pagam 56% a mais por serviços de limpeza, 168%
por remédios (antibióticos, antitérmicos, analgésicos e anti-inflamatórios) e 51% a
mais por gases medicinais em relação às mesmas despesas nos centros de saúde.
Isso sem contarmos que aquisição dos medicamentos e contratação dos serviços
prescinde da realização de licitações.
No conjunto das empresas que se constatou a prática dos sobrepreços pelo
IABAS está a Ruffolo, empresa também investigada pela realização de fraudes em
licitações públicas em hospitais do município do Rio de Janeiro. Dentre outros
exemplos encontramos o pagamento de cerca de R$ 2.500 por cada um dos 38
porteiros que trabalham no horário diurno, ou seja, 71% a mais do que a prefeitura
paga nas suas unidades122.
O IABAS, atualmente é a entidade que possui mais contratos celebrados com
a prefeitura123, em sua maioria, assinados pelo diretor médico Ricardo José de
Oliveira e Silva. Mas em fins do ano de 2010, o mesmo deixou o cargo e em

121
Foram analisados contratos de maio/2010 a março/2011 das UPA da Cidade de Deus e da Vila Kennedy,
ambas sob a gerência da OS IABAS comparando-se seus gastos com despesas de unidades diretamente
gerenciadas pela SMSDC, os Centros Municipais de Saúde Jorge Saldanha Bandeira de Melo (Jacarepaguá) e
Waldir Franco (Bangu), no mesmo período.
122
Disponível em < http://gestordasaude.blogspot.com.br/2012/04/organizacao-social-da-saude-pratica.html >
Acesso em: 7 ago 2012.
123
Do total de 30 editais lançados nos anos de 2009 a 2010, período analisado por nossa pesquisa, a referida
entidade venceu nove editais com objetos diferenciados, a saber: UPA, Clínicas da Família, PADI, Programa
Saúde nas Escolas, além da prestação de serviços de assistência à saúde em Postos Pré-Hospitalar fixo (PHF)
nos eventos da cidade do Rio de Janeiro.
106

fevereiro do ano seguinte, sob assessoramento de outros três ex-funcionários124 da


saúde pública carioca, foi gerir na cidade de Natal (Rio Grande do Norte) uma
campanha contra a Dengue. Ricardo José assumiu o cargo de diretor executivo do
Instituto de Tecnologia, Capacitação e Integração Social (ITCI), mas foi afastado
dois meses mais tarde (VEJA, 06 abr. 2012).
O afastamento foi decorrente da identificação de irregularidades na
contabilidade e contratação de serviços. Conforme ressaltado na matéria, há
“indícios de que os descalabros na saúde do Rio de Janeiro e de Natal podem estar
conectados por uma teia da qual ainda não se conhece a amplitude”.
A investigação do TCM/RJ ainda revela que entidade foi qualificada para
atuar no âmbito da saúde carioca como OS sem nem ter um departamento montado
para tal, o que está em desacordo com a Lei 5 026/2009 que impõe como um dos
requisitos para qualificação ter sede ou filial situada no município.
No entanto, numa espécie de “quarteirização”, o IABAS contratou a Anstafi
Serviços Econômicos e Financeiros Ltda., empresa que tem como sócio André
Staffa Filho que à época era um dos diretores da OS, por R$ 853.000, para atender
a essa necessidade. Vale ressaltar que a consultoria externa para prestar serviços
administrativos não é uma despesa prevista nos contratos firmados pelo IABAS.
Conforme reportagem do Jornal O DIA, publicada em 19 de abril deste ano, a
prefeitura aplicou pena de advertência em sete OS com contratos vigentes, são elas:
FIBRA, A. MARCA, FIOTEC, IABAS, SPDM, Viva Comunidade e CEP 28125. As
advertências foram motivadas pelo não envio ou entrega com erros de informações
necessárias ao monitoramento dos contratos de gestão.
O que buscamos demonstrar é que os gastos acima daqueles destinados a
uma mesma despesa numa unidade de saúde diretamente gerida pelo poder
público, além da destinação dos recursos públicos a fins alheios aos previstos nos
contratos de gestão firmados entre a prefeitura e as diferentes OS não é algo
isolado, ou seja, não é uma exceção e sim uma regra para estas entidades que, em
suma, não possuem nada de sem fins lucrativos. O que corrobora a hipótese de que

124
Marcos Henrique Crispim, funcionário da Toesa Service — prestadora de serviços que também apresenta
irregularidades; o tenente-coronel bombeiro Rafael Amoreira Paixão que era fiscal de um contrato de aluguel de
ambulâncias da Toesa no município; por fim, Saulo Pereira Fernandes, ex-assessor especial da Subsecretaria
Executiva de Saúde do Rio e também ex-IABAS.
125
Vale destacar que todas estas OS foram vencedoras de editais no período analisado por nossa pesquisa
(2009-2010).
107

é provavelmente este o caminho utilizado para se beneficiarem com o desvio de


recursos públicos.
Prosseguindo, nos desvios praticados pelas OS – que não são ínfimos –
temos o caso da Viva Comunidade, um dos braços da reconhecida ONG Viva Rio. A
referida entidade, já no primeiro ano de aprovação da lei que regulamenta as OS,
conforme sinalizado no item 3.3, saiu vencedora de três editais para gerir Clínicas da
Saúde da Família nas AP 2.1, 3.1 (exceto Manguinhos) e 3.3.
Há indícios de que a entidade utilizou recursos públicos para reformar dois
andares da sede da ONG Viva Rio. A inspeção do TCM/RJ encontrou notas fiscais
que comprovam despesas de R$ 140.721 com as obras, que poderiam ainda atingir
a quantia de R$ 208 mil (O DIA, 11 out. 2011).
Conforme vimos no item 2.4, um dos requisitos específicos necessários à
qualificação como OS, nos termos da lei, é a comprovação da presença em seu
quadro de pessoal, de profissionais com formação específica para a gestão das
atividades a serem desenvolvidas, além de notória competência e experiência
comprovada na área de atuação. No entanto, o TCM/RJ condena exatamente a
contratação de serviços de consultoria que totalizam o valor de R$ 192.979 por parte
da Viva Comunidade (O DIA, 11 out. 2011), ou seja, além do fato de ser um serviço
não previsto nos contratos celebrados, teoricamente, a entidade deveria ter
experiência na área, já que conseguiu se qualificar enquanto tal.
Somados a essas irregularidades, tiveram descontos dos funcionários
relativos ao pagamento do INSS pela referida OS, no entanto os valores
correspondentes não foram repassados aos cofres públicos.
Não é por acaso que, da mesma forma, identificamos no caso da A. MARCA
a recorrência do mesmo dispositivo para efetivação do desvio de recursos públicos:
a consultoria. A investigação do MP na Operação Assepsia, por meio de um laudo
contábil, revelou que a referida entidade entre os meses de novembro/2010 e
maio/2011 gastou R$ 1.715.632,12 sob a forma de consultoria, sem que houvesse
qualquer esclarecimento que justificasse esta despesa.
A OS A. MARCA, na verdade uma empresa que assume a forma de uma
entidade “sem fins lucrativos”, foi fundada por um ex-secretário municipal de saúde
do Rio de Janeiro, o Antonio Carlos de Oliveira Junior, e a reativada por sua esposa,
Rosimar Gomes Bravo e Oliveira. Embora os dois sejam proprietários, formalmente
estão na condição de prestadores de serviço à OS por meio de outra empresa, a
108

Olivas Planejamento, Assessoria e Serviços (OPAS), que recebia os valores


correspondentes à consultoria126.
Assim, como foi tratado no item 1.3, frequentemente a LRF é utilizada como
argumento para justificar a adoção dos modelos privatizantes de gestão em razão da
restrição imposta na contratação de pessoal. Mas, segundo Darze (2011a), a lógica
empenhada pela prefeitura tem sido baseada na retirada de servidores concursados
da administração pública, degradando trabalhos e salários.
Comparando-se os orçamentos de 2010 e 2011 da SMSDC temos uma
redução de 43% para 35% em relação aos gastos com pessoal, o que demonstra
que estes estão aquém do limite de 60%, imposto pela LRF (DARZE, 2011a).
Em outra inspeção realizada pelo TCM/RJ no período de agosto a novembro
de 2010 nos contratos de gestão firmados entre a SMSDC e duas OS – não
informadas na reportagem – fica claro o forte escoamento de recursos públicos sem
a devida fiscalização.
O relatório do Tribunal avalia documentos da secretaria, que revela-se incompetente
para fiscalizar e apontar falhas no uso dos recursos públicos e das próprias OSs,
para as quais os contratos destinam mais de R$ 90 milhões anuais. Para um mesmo
cheque houve 50 lançamentos com a mesma data, para pagamento de despesas
diversas, tendo sido ele “descontado” em datas distintas. Outro absurdo refere-se ao
diário financeiro de janeiro de 2010, onde há registro de um cheque cuja despesa foi
de R$ 2.196,60. O mesmo, porém, teria sido compensado no valor de R$ 42.256,36.
Ainda neste diário foi detectada diferença de R$ 491.863,14 entre o saldo final de
março e o inicial de abril, sem qualquer justificativa. Essas OSs não recolheram os
encargos tributários, sociais e trabalhistas, não cumpriram as metas estipuladas e
realizaram obras em edificações que não são unidades de saúde, entre outros.
Foram identificados também no diário de despesas valores genéricos totalizando R$
422.247,52 com a descrição “despesas compromissadas”, sem qualquer justificativa
ou vinculação ao objeto do contrato, e muito menos registro dos cheques utilizados
no diário (DARZE, 2011b).

Nesse sentido, podemos inferir que os relatórios do TCM/RJ só vêm


demonstrando que a terceirização dos serviços tem custado muito mais caro aos
cofres públicos. Embora estas entidades tenham salários mais atrativos em
comparação ao serviço público, há uma considerável rotatividade dos profissionais,
provavelmente devido à fragilidade dos vínculos e ausência de plano de carreira, o
que implica em consequências no vínculo com a população e continuidade do
serviço e/ ou ações a serem desenvolvidas. Ou seja, a despeito do que se anuncia a
atuação das OS – instrumento de privatização das políticas sociais adotado no

126
Operação Assepsia: Associação Marca, empresa disfarçada de OS e os pagamentos de consultoria.
Disponível em: <http://www.blogdodanieldantas.com.br/2012/06/operacao-assepsia-associacao-marca.html>.
Acesso em: 10 ago 2012.
109

âmbito municipal – não tem se refletido num atendimento eficiente e efetivo da


população.
E, mesmo diante de todo esse quadro de irregularidades e fraudes – muitas
vezes já presentes antes da qualificação das entidades como OS no âmbito do
município do Rio de Janeiro – até o momento, das OS qualificadas no período
compreendido pela nossa pesquisa duas entidades foram desqualificadas –
Deliberação COQUALI nº 49 de 15 de agosto de 2011 – em função de
irregularidades apuradas, são elas: o CIAP e o CIEZO.
A primeira foi vencedora de quatro editais lançados pela prefeitura no período
de 2009-2010. Os três primeiros contratos de gestão eram relativos à gerência de
novas Clínicas da Saúde da Família e apoio a gestão do Saúde da Família em
unidades já existentes, nas AP 4.0, 2.2 e 3.3 –“Complexo Madureira”, sendo orçado
para os 12 primeiros meses de contrato os valores de R$ 15.866.958,50; R$
16.147.382,97 e R$ 5.831.837,48, respectivamente. O último tinha como objeto a
gerência da UPA Engenho de Dentro (AP 3.2) e o valor orçado foi de 13.299.988,00
para os doze primeiros meses.
A OS CIAP que era suspeita de desviar cerca de R$ 300 milhões de recursos
públicos em Londrina, onde era qualificada como OSCIP, foi alvo da Operação
Parceria. A referida operação foi fruto de uma atuação conjunta da Controladoria
Geral da União (CGU), da Receita Federal do Brasil, do Ministério Público Federal
(MPF) e da Polícia Federal (PF) que encontrou inúmeras irregularidades. Conforme
investigação, o esquema criminoso baseava-se na seguinte estrutura:
Identificação de recursos públicos disponíveis para celebração de termos de
parceria e convênios; atuação prévia de lobistas integrantes do grupo para
direcionar os recursos para o Ciap; celebração dos termos de parceria e convênios
com valores superdimensionados; superfaturamento dos serviços prestados; não
comprovação aos parceiros públicos da totalidade das despesas – os valores não-
comprovados constituem a parte desviada127.

Assim, diante da acusação, a OS CIAP ficou sob intervenção federal, pelo


período de seis meses, para administração da entidade, visando o encerramento
das atividades já que sofria a ação do pedido de extinção e cancelamento do
registro como OSCIP e não poderia assinar novos convênios com entes públicos.
Foi conferido ao interventor federal, dentre outros, o poder de tratar para que os
contratos pendentes não fossem mais gerenciados pela entidade e assim

127
Assessoria de Comunicação Social/CGU. Disponível em:
<http://www.cgu.gov.br/imprensa/Noticias/2010/noticia05610.asp>.
110

providenciar a negociação com os entes públicos para que fossem repassados para
outras entidades128. Além disso, havia a possibilidade de rescindir contratos,
inclusive trabalhistas quando os convênios/contratos fossem repassados.
Desse modo, foram celebrados os Termos de Rescisão Contratual
Consensual entre a SMSDC e a OS CIAP, na figura do interventor federal Zilmar
Rodrigues, dos contratos referentes às Clínicas Saúde da Família129. Em relação à
UPA Engenho de Dentro não houve a necessidade de rescindir o contrato, pois
embora a OS tenha vencido o edital, por já estar sob intervenção federal, não
chegou a ser firmado.
Quadro 27 – Rescisão de contratos – CIAP

TERMO DE
CONTRATO DE GESTÃO AP UNIDADES RESCISÃO
CONSENSUAL

24/2010
assinado em 18
10/2010 3.3 CLINICAS SAÚDE DA FAMÍILIA
de novembro
2010
28/2010
assinado em 18
09/2010 4.0 CLINICAS SAÚDE DA FAMÍILIA
de novembro
2010
assinado em 18
07/2009 2.2 CLINICAS SAÚDE DA FAMÍILIA de novembro
2010

CONTRATO NÃO CONTRATO


3.2 UPA ENGENHO DE DENTRO
FIRMADO NÃO FIRMADO
Elaboração própria – Fonte: DOM/RJ e sítio eletrônico da SMSDC/RJ.

Em relação ao caso do CIEZO não encontramos informações oficiais da


prefeitura que explicam a sua desqualificação como OS, nem mesmo um termo de
rescisão de contrato. Primeiramente, podemos dizer que de todos os editais
lançados pela prefeitura que tinham os mais variados objetos, em nenhum deles a
referida OS saiu vencedora. No entanto, sabemos que a relação desta entidade com
a prefeitura não é recente, pois já havia sido constituída desde a gestão César Maia,

128
Cf. Ação Civil Pública nº 5010224-60.2010.404.7000/PR.
129
Posteriormente, foram lançados editais, tendo como objeto de contrato essas unidades. As entidades
vencedoras dos editais para gerir as Clínicas Saúde da Família das AP 2.2 e 4.0 foram a OS IABAS e a OS
Instituto Social Fibra, respectivamente. Em relação às Clínicas da AP 3.3 – “Complexo Madureira” não
identificamos um edital lançado posteriormente com o mesmo objeto. Houve outro edital para a UPA Engenho de
Dentro, no qual a OS SPDM foi a vencedora.
111

quando foi contratada como ONG – sem licitação – para atuar no Programa Saúde
da Família. Em auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) foram
identificadas irregularidades e ainda assim, posteriormente, o CIEZO conseguiu se
qualificar como OS130.
Essa relação antiga do CIEZO com a prefeitura pode ser observada na
matéria publicada em abril/2010 no blog do Jornal O GLOBO131, a qual informa que
desde janeiro do mesmo ano as equipes médicas contratadas pelo CIEZO para
atuar no PSF da Zona Oeste estavam com o pagamento atrasado, fazendo com que
muitos dos trabalhadores abandonassem seu posto. O prejuízo para a população
atendida pelo programa deu-se em função da existência de um hiato entre o término
do contrato do CIEZO132 que tinha como objeto a administração do PSF de Santa
Cruz e Bangu e assunção das atividades pela OS CAMPO que naquele período
estava impedida de iniciar as atividades devido a uma pendência judicial relativa a
dívidas trabalhistas.
Ao que parece o CAMPO nunca assumiu como OS a gerência das CSF
naquela região, pois embora tenha vencido os editais – 12/2009 e 13/2009 –, não
encontramos disponível para consulta no DOM/RJ ou no sítio eletrônico da SMSDC
os contratos correspondentes. Ademais, no referido período duas outras entidades
qualificadas como OS, o IABAS e a SPDM, assumiram emergencialmente o
programa na região (O GLOBO, 05 abr. 2010) e, coincidentemente ou não, foram
lançados editais para CSF em outubro/2010 – 12/2010 e 13/2010 – dos quais o
IABAS saiu vencedor.
A OS GLOBAL133 atualmente está sofrendo processo de desqualificação.
Conforme vimos demonstrando até aqui, todo o processo que envolve a contratação
das OS é claramente não transparente. Nesse sentido, o processo de

130
Disponível em:< http://www.vermelho.org.br/ap/noticia.php?id_noticia=36012&id_secao=10>. Acesso em: 29
jul 2012.
131
O GLOBO. Mudança de gestão no Saúde da Família prejudica atendimento na região. Bairros Zona Oeste.
Segunda-feira, 05 de abr. de 2010. Disponível em:
<http://oglobo.globo.com/rio/bairros/posts/2010/04/05/mudanca-de-gestao-no-saude-da-familia-prejudica-
atendimento-na-regiao-279789.asp>. Acesso em: 10 mar 2011.
132
Nesse período, a CIEZO demitiu cerca de 400 funcionários sem pagar a rescisão contratual, valor que
superava R$ 15 milhões.
133
Esta entidade se inscreveu para concorrer ao processo licitatório para gerir o Hospital de Emergência e
Trauma Senador Humberto Lucena, mas teve sua qualificação para atuar no âmbito da saúde indeferida pelo
Estado da Paraíba. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/diarios/38003427/doepb-16-06-2012-pg-8> e <
http://www.interjornal.com.br/noticia.kmf?cod=13656256>. Acesso: 31 ago 2012.
112

desqualificação não nos causa espanto já que a entidade em tela havia sido criada
cerca de um mês antes da aprovação da lei que regulamenta as OS no município.
Seu surgimento deu-se a partir de uma ONG, o Instituto Assistencial Mundo
Melhor, também comandada pelo médico colombiano Carlos Mauricio Medina
Gallego, que foi contratada na gestão Cesar Maia para atuar na estratégia do PSF
(O GLOBO). Desse modo, considerando o período de 2003 a 2010, ou seja, da
gestão Cesar Maia até o inicio da atual gestão do Eduardo Paes cerca de R$ 147
milhões foram destinados a contratos entre empresas e instituições representadas
por Carlos Mauricio com fortes suspeitas de irregularidades134.
Em função disso, a referida entidade já havia motivado o vereador Paulo
Pinheiro, integrante da Comissão de Saúde da Câmara dos Vereadores do
município, a instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para
investigação dos contratos firmados (CORREIO da Paraíba,).
Em fevereiro/2010 foi celebrado o CG 11/2010, tendo por objeto a
operacionalização, apoio e execução de atividades e serviços de saúde da família
no âmbito da AP 1.0 e prevendo cerca de R$ 25 milhões para o período de dois
anos do contrato.
Mas, em 16 de abril deste ano, a referida OS foi notificada por meio de
publicação no DOM/RJ para reaver aos cofres públicos, no prazo de dois dias, a
quantia de R$ 2.057.214.36 pela não comprovação do gasto realizado para
execução do CG 11/2010, implicando a abertura de Prestação de Contas Especial,
caso o mesmo não fosse cumprido.
Por fim, temos a OS A. MARCA para Promoção de Serviços que ainda não foi
desqualificada no âmbito do município do Rio de Janeiro, mas foi alvo da Operação
Assepsia referente a um forte esquema de desvio de verba pública que foi
deflagrada em junho deste ano pelo Ministério Público Estadual do Rio Grande do
Norte e pela Polícia Militar. A referida OS no momento está sofrendo intervenção
judicial135.

134
O GLOBO. Instituições de médico colombiano receberam R$ 147 milhões da prefeitura do Rio em contratos
sob suspeita. Sexta-feira, 21 de maio de 2010. Disponível em:
<http://oglobo.globo.com/rio/mat/2010/05/21/instituicoes-de-medico-colombiano-receberam-147-milhoes-da-
prefeitura-do-rio-em-contratos-sob-suspeita-916655277>. Acesso em: 10 mar 2011.

135
JusBrasil. Assepsia: entidade contratada por município sofre intervenção. 28 de jun. de 2012. Disponível em:
<http://tj-rn.jusbrasil.com.br/noticias/3165538/assepsia-entidade-contratada-por-municipio-sofre-intervencao>.
Acesso em: 6 ago 2012.
113

Para além de outras implicações fica clara a falta de comprometimento com a


continuidade de uma política tão cara à população. Por outro lado, vale destacar que
muitas das entidades qualificadas como OS para atuar no âmbito do município do
Rio de Janeiro já possuíam convênios anteriores com a prefeitura – conforme foi
sinalizado no item anterior – e, em alguns casos, com irregularidades. É importante
sinalizar isso, pois a despeito disso conseguiram se qualificar como OS.
Nesse sentido, o que podemos verificar é que a priorização da expansão das
unidades de atenção básica não tem se viabilizado no sentido de fortalecimento do
SUS, ou seja, visando uma atuação maior no nível de prevenção e promoção da
saúde. Ao que nos parece a referida priorização se alinha aos interesses
particulares do capital em ocupar novos espaços lucrativos, no qual a realização de
um atendimento efetivo das necessidades de saúde da população fica relegada ao
segundo plano.
114

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Me cansei de lero lero


Dá licença, mas eu vou sair do sério
Quero mais saúde
Me cansei de escutar...
Rita Lee

As tendências de alocação do fundo público têm revelado um forte


favorecimento do capital, no qual as políticas sociais ficam sempre a mercê das
políticas macroeconômicas. Ainda no interior das políticas sociais verificamos uma
tendência geral de focalização e precarização dos serviços, o que acaba por
estabelecer outra via de favorecimento dos interesses do capital já que cria espaços
possíveis para obtenção de lucros por meio da adoção dos diferentes instrumentos
de privatização.
Desse modo, há uma notável consonância entre os argumentos norteadores
da contrarreforma do Estado brasileiro e aqueles que justificam a intenção da atual
gestão municipal em modernizar a gestão da rede de serviços via adoção do modelo
[privatizante] das OS. Conforme saltam aos nossos olhos, no próprio PMS (2010-
2013) se reconhece as dificuldades de materialização do SUS, no entanto, sem
tocar na questão da falta de recursos – estrutura e realização de concursos públicos
– para viabilizar as ações e serviços de saúde.
Assim, é como se o problema pairasse sobre as formas de gestão e, portanto,
a contratação de entidades, aparentemente sem fins lucrativos, mais eficientes e
resolutivas que a administração pública, supriria esta necessidade. Anunciada no
PMS como sendo a área que receberia mais recursos durante a gestão, não é de se
estranhar que das diferentes áreas de atuação a saúde seja a área com maior
número de entidades qualificadas.
No entanto, os dados da realidade são gritantes e demonstram que além de
não propiciarem uma melhora no atendimento efetivo da população, a gerência das
unidades conta com a prática de sobrepreços e desvios de recursos para despesas
alheias aos objetos de contrato – como é o caso, das consultorias – dispositivos
recorrentes de apropriação do fundo público que, inclusive, estas mesmas
entidades, munidas do escudo da imunidade tributária, não contribuem com sua
formação. Causa-nos um espanto ainda maior quando por meio de um decreto as
115

referidas entidades obtenham permissão para investir recursos em títulos da dívida


pública federal!
O cenário que envolve todo esse processo ainda é composto pelos aumentos
nos valores dos contratos de gestão por meio dos inúmeros termos aditivos e
apostilamentos e outros ainda mais abusivos e sem justificativas palpáveis quando
da prorrogação dos contratos para gerir, na maioria das vezes, as mesmas
unidades!
Constatamos em alguns momentos um desrespeito à própria lei que as
regulamenta, o que inclui os inúmeros movimentos empreendidos para gerência de
unidades já existentes – no qual destacamos o edital que teve como objeto a
gerência da emergência de quatro hospitais municipais –, as qualificações de
entidades com histórico de irregularidades e fraudes, além da quase inexistência de
publicização de prestação de contas das entidades.
Por outro lado, observamos que a despeito das inúmeras irregularidades
sinalizadas em nossa pesquisa, apenas duas entidades foram desqualificadas até o
momento. E, do mesmo modo, o processo que envolve estas desqualificações não é
publicizado, os contratos rescindidos simplesmente desaparecem da rede pública de
dados sem deixar rastros.
Nosso esforço em analisar as OS no âmbito da saúde carioca apenas
expressa um relatório parcial deste processo em curso. Mostramos apenas a ponta
do iceberg, pois há muito ainda o que desvelar. Constatamos a profunda falta de
transparência no gasto público, o que impede qualquer cidadão que trafegue pelos
canais regulares da rede pública de dados de realizar uma análise precisa dos
recursos orçamentários destinados à política de saúde.
A imprecisão dos dados se expressa desde quando buscamos identificar os
recursos que compõem o FMS até a análise dos inúmeros repasses financeiros
relativos aos contratos de gestão firmados com as entidades. Temos um forte
escoamento de recursos, mas sem promover um retorno efetivo a uma política tão
cara à população.
Ainda permanecemos reféns do modelo hospitalocêntrico, pois mesmo que
possamos constatar um relativo aumento no investimento na atenção básica, este
tem se dado por meio da contratação das entidades que carregam o fardo pesado
de todos os problemas elucidados em nossa pesquisa.
116

Nesse sentido, a defesa por um maior volume de recursos para a saúde deve
necessariamente ser acompanhada da defesa na qualidade de sua alocação, ou
seja, não basta conquistarmos mais recursos para serem escoados pelas vias
privatizantes de gestão e em detrimento do SUS.
Por fim, nosso estudo demonstra que há muito que se evoluir na
transparência e controle democrático dos gastos públicos, inclusive, se
considerarmos que nos debruçamos sobre a análise de um município que possui,
em termos de disponibilização de dados para consulta on-line, uma realidade
completamente diferente da grande maioria dos municípios brasileiros.
O cenário que se apresenta não é dos melhores, mas somente a partir do
aprofundamento de nossos estudos e pesquisas que se posicionam na defesa de
uma política de saúde pública, gratuita e de qualidade é que promoveremos cada
vez mais o desmascaramento dessa farsa que se construiu em torno da satanização
de tudo que é público. E, desse modo, promovendo um confronto entre o que os
defensores dos modelos privatizantes de gestão propagam aos quatro ventos e a
realidade.
117

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