Acórdão TJSP - Carência

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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1008581-91.2023.8.26.0224 e código Ny43DtUo.
Registro: 2024.0000268078

ACÓRDÃO

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por BENEDITO ANTONIO OKUNO, liberado nos autos em 01/04/2024 às 22:21 .
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação
Cível nº 1008581-91.2023.8.26.0224, da Comarca de Guarulhos, em que é apelante
Cuidar.me Saúde S.A., sendo apelado Nilton Roberto Gomes.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 8ª


Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do
relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores


SALLES ROSSI (Presidente) e PEDRO DE ALCÂNTARA DA SILVA LEME FILHO.

São Paulo, 1º de abril de 2024.

BENEDITO ANTONIO OKUNO


Relator

Assinatura Eletrônica

Apelação Cível nº 1008581-91.2023.8.26.0224 - Voto nº 11987 e 1


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Apelação Cível nº 1008581-91.2023.8.26.0224
Apelante: Cuidar.me Saúde S.a.
Apelado: Nilton Roberto Gomes
Comarca: Guarulhos
Voto nº 11987

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por BENEDITO ANTONIO OKUNO, liberado nos autos em 01/04/2024 às 22:21 .
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C. INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS – Plano de saúde – Sentença de
procedência para condenar a ré a custear procedimento de
urgência e a pagar indenização por danos morais – Autor
portador de cardiopatia classificada como bradiarritmia e faz
uso de marcapasso – Apelação da ré – Alegação de que a
negativa de cobertura foi devido ao prazo de carência de 24
meses para doença preexistente – Desacolhimento – Autor foi
atendido em pronto socorro apresentando “escape de controle
de arritmia”, tendo sido prescrita a investigação com urgência
da funcionalidade do marcapasso – Verificada a situação de
urgência do quadro de saúde do paciente, a negativa foi
abusiva – Aplicação da Súmula 103 do TJSP – Danos morais –
Ocorrência – Paciente temeu agravamento do quadro de sua
saúde – Fatos narrados ultrapassam o mero dissabor –
Indenização devida – Fixação em R$ 10.000,00 –
Admissibilidade – Juros de mora – Termo inicial é a citação e
não o evento danoso – Responsabilidade contratual –
Honorários de advogado – Fixação em 10% sobre o valor da
causa quando não for possível mensurar o proveito econômico
– Cabimento – Art. 85, § 2º, do CPC – Sentença reformada em
parte, para determinar a incidência dos juros moratórios desde
a citação – RECURSO PROVIDO EM PARTE.

Vistos.

Apelação contra sentença que condenou a ré a arcar com


os custos do procedimento cirúrgico, conforme prescrição médica, incluindo despesas
com exames, medicamentos, internação e procedimentos de urgência e emergência
necessários para o tratamento, bem como condenou a pagar indenização por danos

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morais no valor de R$ 10.000,00, com correção monetária desde a data da sentença e
juros de mora de 1% ao mês contados da negativa de cobertura.

Sustenta a ré-apelante que a negativa de cobertura da


internação se deu em razão da cobertura parcial temporária (CPT) para implante de
marcapasso, tendo em vista que a solicitação foi feita durante o prazo de carência para
doença preexistente, de 24 meses. O autor preencheu declaração de saúde, informou que

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possuía implante de marcapasso e tomou ciência da CPT. Ele sabia que a vida útil do
marcapasso estava próxima do fim, já que implantado há 10 anos, o que afasta o evento
imprevisível. Não se tratava de situação de urgência, pois o relatório não mencionou
risco de vida ou de lesões irreparáveis ao paciente. Pretende afastar a indenização por
danos morais, argumentando que não praticou ato ilícito, que o descumprimento
contratual configurou mero dissabor. Alternativamente, requer a redução do valor da
indenização. Entende ainda que os juros de mora incidem desde o arbitramento ou ao
menos a partir da citação e visa a fixação do honorários de advogados sobre o valor da
condenação e não sobre o valor da causa.

Recurso tempestivo, com preparo e contrarrazões (fls.


228/249).

É o relatório.

Narra o autor que contratou o plano de saúde em


27/09/2022. É portador de cardiopatia classificada como bradiarritmia e faz uso de
marcapasso desde 2013. Em 09/02/2023, o médico recomendou a troca urgente da
bateria que estava no fim, mas a ré não autorizou o procedimento. Em 24/02/2023,
acordou se sentindo mal, com tonturas e mal estar. Foi ao hospital e depois de mais de
doze horas de espera a operadora respondeu dizendo que não poderia autorizar o
procedimento devido ao prazo de carência de 24 meses para doença preexistente.

Há relação de consumo entre as partes, nos termos da


Súmula 100 deste Tribunal de Justiça:

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“O contrato de plano/seguro de saúde submete-se aos
ditames do Código de Defesa do Consumidor da Lei 9.656/98, ainda que a avença
tenha sido celebrada antes da vigência desses diplomas legais.”

E, ainda, Súmula 469 do Superior Tribunal de Justiça:

“Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos

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contratos de plano de saúde".

No caso, a petição inicial veio acompanhada de


documentos como laudos médicos atestando a necessidade do procedimento em caráter
de urgência (fls. 28/30).

De acordo com o relatório médico de fls. 28, o autor foi


atendido em pronto socorro apresentando “escape de controle de arritmia”, razão pela
qual foi prescrita a investigação com urgência da funcionalidade do marcapasso.

Como bem observou a sentença recorrida, não se tratava


de consulta de rotina para manutenção programada de marcapasso.

Verificada a situação de urgência, como a descrita na


petição inicial, a recusa da ré se mostrou abusiva, de acordo com o entendimento da
Súmula 103 deste Tribunal de Justiça:

“É abusiva a negativa de cobertura em atendimento de


urgência e/ou emergência a pretexto de que está em curso período de carência que não
seja o prazo de 24 horas estabelecido na Lei 9.656/98”.

Logo, a ré tinha a obrigação contratual de atender e


internar o paciente, em razão do risco de agravamento de seu quadro de saúde e da
situação de emergência.

Insta consignar que não cabe à operadora de plano de


saúde interferir no procedimento prescrito por médico, quem tem a competência para
qualificar o tratamento como sendo de urgência ou emergência.

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Ainda, ao alegar que o autor contratou o plano de saúde
sabendo do término da vida útil do marcapasso, a ré suscita a má-fé do paciente.
Contudo, como se sabe, a boa-fé é presumida, mas a má-fé deve ser comprovada. E, no
caso, não há nos autos qualquer prova de que o autor agiu de má-fé. O fato de ter
declarado a doença preexistente reforça a sua boa-fé contratual.

Logo, a negativa de autorização revelou-se injustificável,

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sendo evidente a responsabilidade da ré pelos prejuízos morais aos quais deu causa.

Dano moral é o prejuízo que afeta extraordinariamente o


ofendido em seu ânimo psíquico e moral, é o que causa um distúrbio anormal na vida
do indivíduo, a ponto de afetar os direitos da personalidade, como a honra, privacidade,
valores éticos, a saúde emocional. Dessa maneira, não é qualquer dissabor da vida que
faz nascer a obrigação de indenizar. Deve o juiz, utilizando-se de critérios objetivos do
homem médio, decidir se a conduta causou desconforto extraordinário ao ofendido.

No caso, o autor teve o tratamento negado


injustificadamente e ainda temeu pelo agravamento do seu quadro de saúde. Tal
situação experimentada ultrapassou o mero dissabor, dando azo à indenização.

O valor da condenação por dano moral deve ser arbitrado


considerando-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de forma a
compensar a dor experimentada e coibir a reincidência das condutas danosas.

Sobre a questão, o entendimento do STJ:

“Embora a avaliação dos danos morais para fins


indenizatórios seja das tarefas mais difíceis impostas ao magistrado, cumpre-lhe
atentar, em cada caso, para as condições da vítima e do ofensor, o grau de dolo ou
culpa presente na espécie, bem como os prejuízos morais sofridos pela vítima, tendo em
conta a dupla finalidade da condenação, qual seja, a de punir o causador do dano, de
forma a desestimulá-lo à prática futura de atos semelhantes, e a de compensar o
sofrimento indevidamente imposto, evitando, sempre, que o ressarcimento se

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transforme numa fonte de enriquecimento injustificado ou que seja inexpressivo ao
ponto de não retribuir o mal causado pela ofensa.” (AI nº 163.571-MG, Rel. Min.
EDUARDO RIBEIRO, j. 9.2.99, DJU de 23.12.99, p. 71)

Esta Câmara de Direito Privado assim já decidiu em casos


análogos:

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APELAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. PRAZO DE
CARÊNCIA. Negativa de custeio de procedimento cirúrgico em caráter de emergência
antes de decorrido o prazo de carência. Sentença de procedência, isto para determinar
que requerida autorize e custeie os procedimentos prescritos ao autor, bem como para
condená-la ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais. Insurgência de
ambas as partes. Inexigível o cumprimento de período de carência superior a 24 horas
em casos de urgência/emergência. Inteligência do artigo 12, V, "c" e artigo 35-C, I da
Lei nº 9.656/98. Aplicação da Súmula 103 deste Tribunal de Justiça. Irrelevância da
Resolução nº 13 do CONSU. Danos morais caracterizados. Sofrimento que extrapola o
mero aborrecimento. Quantum indenizatório que atende às funções ressarcitória e
punitiva da reparação. Sentença mantida. RECURSOS DESPROVIDOS. (TJSP;
Apelação Cível 1044343-60.2020.8.26.0100; Relator (a): Clara Maria Araújo Xavier;
Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 4ª Vara Cível; Data
do Julgamento: 22/09/2021; Data de Registro: 24/09/2021)

Ante as peculiaridades do caso concreto, observando-se os


parâmetros da jurisprudência desta Câmara de Direito Privado, mostra-se razoável a
indenização fixada em primeiro grau, em R$ 10.000,00, não sendo caso de acolher o
pedido de redução.

Sobre o valor da indenização, incidem juros de mora de


1% ao mês desde a citação (e não do evento danoso, como determinou a sentença), por
se tratar de responsabilidade contratual.

Vencida, a ré foi condenada a pagar as custas e despesas

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processuais, além de honorários de advogado fixados em 10% sobre o valor da causa.

Em relação à modificação da base de cálculo dos


honorários advocatícios, sem razão a apelante.

Nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, “os honorários serão


fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da

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condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o
valor atualizado da causa”.

No caso, a ré foi condenada ao custeio do procedimento e


despesas a ele inerentes, além de indenização por danos morais.

Assim, não sendo possível mensurar o proveito econômico


obtido pelo autor, a base de cálculo da verba honorária corresponde ao valor da causa,
como constou da sentença.

Nessas condições, a sentença é reformada em parte tão


somente para determinar a incidência dos juros moratórios desde a citação.

Provido em parte o recurso, é inviável a majoração dos


honorários, de acordo com o art. 85, § 11, do CPC.

Ante o exposto, pelo, meu voto, DOU PROVIMENTO


EM PARTE ao recurso.

BENEDITO ANTONIO OKUNO


Relator

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