Noções de Direito para Segurança Privada

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Noções de Direito

para Segurança
Privada
Prof. Pedro Henrique Nascimento Zanon

Indaial – 2021
1a Edição
Elaboração:
Prof. Pedro Henrique Nascimento Zanon

Copyright © UNIASSELVI 2021

Revisão, Diagramação e Produção:


Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI

Z33n

Zanon, Pedro Henrique Nascimento

Noções de direito para segurança privada. / Pedro Henrique Nascimento


Zanon– Indaial: UNIASSELVI, 2021.

164 p.; il.

ISBN 978-65-5663-957-4
ISBN Digital 978-65-5663-958-1

1. Direito Administrativo. - Brasil. 2. Direito do Trabalho. - Brasil. II. Centro


Universitário Leonardo da Vinci.

CDD 342

Impresso por:
APRESENTAÇÃO
Olá, acadêmico! Seja bem-vindo ao Livro Didático Noções de Direito para
Segurança Privada. Abordaremos o Direito Constitucional e as normas internas e
estruturais fundamentais da República; o Direito Penal, com ênfase nos princípios que
devem ser respeitados para o convívio social harmônico (vida, liberdade, intimidade,
propriedade etc.). Estudaremos também as leis e as normas fundamentais que regem
o Direito Administrativo, com o objetivo de explicar os serviços públicos prestados pelo
Estado à sociedade a fim de garantir o bem social comum. E, por fim, compreenderemos
as principais obrigações e direitos do trabalhador de acordo com a Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT).

Na Unidade 1, apresentaremos os princípios fundamentais, os seus fundamentos,


objetivos e princípios que regem as relações internacionais. Falaremos sobre os direitos
e garantias fundamentais, sobre os direitos e deveres individuais, direitos sociais e
nacionalidade. E, por fim, trataremos da organização do Estado, da organização político-
administrativa, da União, dos Estados e dos municípios e do Distrito Federal e Territórios.

Em seguida, na Unidade 2, estudaremos o Direito Penal e o Direito Administrativo.


Veremos os princípios constitucionais do Direito Penal (intervenção mínima,
fragmentariedade, subsidiariedade, insignificância e ofensividade ou lesividade).
Veremos a aplicação da lei penal, os crimes contra a pessoa, contra o patrimônio e
contra a dignidade sexual. E, para concluir a unidade, abordaremos os princípios que
regem a Administração Pública.

Por fim, na Unidade 3, aprenderemos sobre o Direito do Trabalho, seus princípios,


a relação emprego versus relação de trabalho, jornada (espécies, duração e período de
descanso), remuneração e salário, férias e extinção contratual.

Portanto, esperamos que faça bom proveito das leituras, dicas e aprendizados
que irá ver a seguir.

Boa leitura e bons estudos!

Prof. Pedro Henrique Nascimento Zanon


GIO
Olá, eu sou a Gio!

No livro didático, você encontrará blocos com informações


adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento
acadêmico como um todo. Eu ajudarei você a entender
melhor o que são essas informações adicionais e por que você
poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações
durante o estudo do livro. Ela trará informações adicionais
e outras fontes de conhecimento que complementam o
assunto estudado em questão.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos


os acadêmicos desde 2005, é o material-base da disciplina.
A partir de 2021, além de nossos livros estarem com um
novo visual – com um formato mais prático, que cabe na
bolsa e facilita a leitura –, prepare-se para uma jornada
também digital, em que você pode acompanhar os recursos
adicionais disponibilizados através dos QR Codes ao longo
deste livro. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura
interna foi aperfeiçoada com uma nova diagramação no
texto, aproveitando ao máximo o espaço da página – o que
também contribui para diminuir a extração de árvores para
produção de folhas de papel, por exemplo.

Preocupados com o impacto de ações sobre o meio ambiente,


apresentamos também este livro no formato digital. Portanto,
acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com
versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.

Preparamos também um novo layout. Diante disso, você


verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses
ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos
nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos,
para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os
seus estudos com um material atualizado e de qualidade.

QR CODE
Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você –
e dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, nós disponibilizamos uma diversidade de QR
Codes completamente gratuitos e que nunca expiram. O QR Code é um código que permite
que você acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois,
é só aproveitar essa facilidade para aprimorar os seus estudos.
ENADE
Acadêmico, você sabe o que é o ENADE? O Enade é um
dos meios avaliativos dos cursos superiores no sistema federal de
educação superior. Todos os estudantes estão habilitados a participar
do ENADE (ingressantes e concluintes das áreas e cursos a serem
avaliados). Diante disso, preparamos um conteúdo simples e objetivo
para complementar a sua compreensão acerca do ENADE. Confira,
acessando o QR Code a seguir. Boa leitura!

LEMBRETE
Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma
disciplina e com ela um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conheci-


mento, construímos, além do livro que está em
suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem,
por meio dela você terá contato com o vídeo
da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementa-
res, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de
auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que


preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


SUMÁRIO
UNIDADE 1 — DIREITO CONSTITUCIONAL...............................................................1

TÓPICO 1 — PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS.............................................................. 3


1 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 3
2 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS .............................................................................. 3
3 FUNDAMENTOS....................................................................................................4
4 OBJETIVOS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL...................................... 8
5 PRINCÍPIOS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL QUE REGEM AS
RELAÇÕES INTERNACIONAIS.............................................................................. 9
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................... 10
AUTOATIVIDADE.....................................................................................................11

TÓPICO 2 — DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS....................................... 13


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 13
2 DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS COLETIVOS............................................. 14
3 DIREITOS SOCIAIS..............................................................................................22
4 NACIONALIDADE................................................................................................29
RESUMO DO TÓPICO 2...........................................................................................33
AUTOATIVIDADE....................................................................................................34

TÓPICO 3 — ORGANIZAÇÃO DO ESTADO..............................................................35


1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................35
2 ORGANIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA...................................................35
3 UNIÃO.................................................................................................................. 37
4 ESTADOS FEDERADOS...................................................................................... 40
5 MUNICÍPIOS........................................................................................................ 41
6 DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS.................................................................43
LEITURA COMPLEMENTAR.................................................................................. 44
RESUMO DO TÓPICO 3...........................................................................................49
AUTOATIVIDADE....................................................................................................50

REFERÊNCIAS........................................................................................................52

UNIDADE 2 — DIREITO PENAL E DIREITO ADMINISTRATIVO..............................53

TÓPICO 1 — PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL.......................................................55


1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................55
2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PENAL......................................55
3 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA..............................................................59
4 PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIEDADE...............................................................59
5 PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE....................................................................60
6 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.......................................................................60
7 PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE OU LESIVIDADE............................................... 61
RESUMO DO TÓPICO 1...........................................................................................62
AUTOATIVIDADE....................................................................................................63
TÓPICO 2 — DIREITO PENAL – PARTE GERAL....................................................65
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................65
2 APLICAÇÃO DA LEI PENAL.................................................................................65
3 CRIME..................................................................................................................68
4 IMPUTABILIDADE PENAL................................................................................... 72
5 CONCURSO DE PESSOAS................................................................................... 73
6 PENAS................................................................................................................. 76
7 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE............................................................................ 77
RESUMO DO TÓPICO 2...........................................................................................78
AUTOATIVIDADE.................................................................................................... 79

TÓPICO 3 — DIREITO PENAL – PARTE ESPECIAL................................................ 81


1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 81
2 CRIMES CONTRA A PESSOA............................................................................... 81
3 CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO...................................................................... 84
4 CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL..........................................................86
RESUMO DO TÓPICO 3...........................................................................................88
AUTOATIVIDADE....................................................................................................89

TÓPICO 4 — PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA...................................... 91


1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 91
2 PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO SOBRE O PRIVADO...... 91
3 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE PÚBLICO PELA
ADMINISTRAÇÃO................................................................................................92
4 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE DIREITO ADMINISTRATIVO....................92
RESUMO DO TÓPICO 4...........................................................................................96
AUTOATIVIDADE.................................................................................................... 97

TÓPICO 5 — REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO E ORGANIZAÇÃO


ADMINISTRATIVA..............................................................................99
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................99
2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA................................................................................99
3 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA............................................................100
4 FUNDAÇÃO PÚBLICA DE DIREITO PRIVADO...................................................103
5 FUNDAÇÃO PÚBLICA DE DIREITO PÚBLICO...................................................104
LEITURA COMPLEMENTAR.................................................................................105
RESUMO DO TÓPICO 5.........................................................................................108
AUTOATIVIDADE..................................................................................................109

REFERÊNCIAS...................................................................................................... 110

UNIDADE 3 — DIREITO DO TRABALHO................................................................ 111

TÓPICO 1 — PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO........................................ 113


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 113
2 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO................................................................................ 113
3 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE................................................................ 114
4 PRINCÍPIO DA NORMA MAIS FAVORÁVEL........................................................115
5 PRINCÍPIO DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA.................................................... 116
6 PRINCÍPIO DA INTANGIBILIDADE SALARIAL.................................................. 116
7 PRINCÍPIO DA REALIDADE SOBRE A FORMA...................................................117
RESUMO DO TÓPICO 1..........................................................................................119
AUTOATIVIDADE..................................................................................................120
TÓPICO 2 — RELAÇÃO DE EMPREGO X RELAÇÃO DE TRABALHO.................... 123
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 123
2 CONCEITOS.......................................................................................................124
3 ELEMENTOS CARACTERIZADORES................................................................124
4 SUJEITOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO........................................................... 126
RESUMO DO TÓPICO 2.........................................................................................128
AUTOATIVIDADE.................................................................................................. 129

TÓPICO 3 — JORNADA..........................................................................................131
1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................131
2 ESPÉCIES DE JORNADA................................................................................... 132
3 DURAÇÃO DO TRABALHO................................................................................ 133
4 PERÍODO DE DESCANSO..................................................................................134
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................... 136
AUTOATIVIDADE.................................................................................................. 137

TÓPICO 4 — REMUNERAÇÃO X SALÁRIO........................................................... 139


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 139
2 CONCEITOS.......................................................................................................140
3 ADICIONAIS.......................................................................................................142
4 VERBAS QUE POSSUEM NATUREZA SALARIAL.............................................143
RESUMO DO TÓPICO 4.........................................................................................144
AUTOATIVIDADE..................................................................................................145

TÓPICO 5 — FÉRIAS............................................................................................. 147


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 147
2 DIREITO ÀS FÉRIAS E SUA REMUNERAÇÃO...................................................148
3 ADICIONAIS.......................................................................................................149
4 REMUNERAÇÃO E ABONO DE FÉRIAS.............................................................149
RESUMO DO TÓPICO 5.........................................................................................150
AUTOATIVIDADE...................................................................................................151

TÓPICO 6 — EXTINÇÃO CONTRATUAL................................................................ 153


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 153
2 RESCISÃO INDIRETA........................................................................................154
3 PEDIDO DE DEMISSÃO.....................................................................................154
4 DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA....................................................................... 155
5 CULPA RECÍPROCA.......................................................................................... 156
6 FALÊNCIA DE EMPRESAS................................................................................ 157
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................. 159
RESUMO DO TÓPICO 6..........................................................................................161
AUTOATIVIDADE.................................................................................................. 162

REFERÊNCIAS......................................................................................................164
UNIDADE 1 —

DIREITO CONSTITUCIONAL

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• entender quais são os fundamentos e objetivos da República;

• compreender os direitos e garantias individuais e coletivos;

• identificar os cargos privativos de brasileiro nato;

• conceituar: União; Estado federado; Município; Distrito Federal e Território.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

TÓPICO 2 – DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

TÓPICO 3 – ORGANIZAÇÃO DO ESTADO

CHAMADA
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1
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!

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2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 —
PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 1, abordaremos o Direito Constitucional e seus princípios,
objetivos e políticas que regem o nosso dia a dia no país, assim como as relações
internacionais.

O Direito Constitucional é uma disciplina que possui como objeto de estudo as


normas constitucionais expressas em uma Constituição. A Carta Magna é o documento
que materializa regras e princípios políticos e jurídicos de um determinado Estado.
Portanto, a Constituição é a norma suprema de regência e de organização do Estado.
O Direito Constitucional se enquadra dentro da seara do Direito Público e possui
importância na organização/funcionamento do Estado e na articulação dos elementos
bases da estrutura política. O jurista Jorge Miranda define o Direito Constitucional como:

a parcela da ordem jurídica que rege o próprio Estado, enquanto


comunidade e enquanto poder. É o conjunto de normas (disposições
e princípios) que recordam o contexto jurídico correspondente à
comunidade política como um todo e aí situam os indivíduos e os
grupos uns em face dos outros e frente ao Estado-poder e que,
ao mesmo tempo, definem a titularidade do poder, os modos de
formação e manifestação da vontade política, os órgãos de que esta
carece e os atos em que se concretiza (MIRANDA, 1990, p. 13-14).

2 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil são valores que
ditam a aplicabilidade de todas as normas constitucionais e infraconstitucionais. Dessa
forma, os princípios fundamentais servem como elementos de interpretação e de
integração do texto Magno, contribuindo, assim, para uma unidade da Constituição.

Os princípios fundamentais são apresentados nos primeiros artigos do texto


constitucional, logo após o preâmbulo. Especificamente, estão enumerados no Título I
da Constituição, do art. 1º ao 4º. Assim, cada um dos artigos irá destacar uma espécie
de princípio fundamental. Nesse sentido, o art. 1º trata dos fundamentos da República
Federativa do Brasil. Já o art. 2º versa sobre o princípio da separação de poderes. O
art. 3º destaca os objetivos fundamentais. O art. 4º, por último, traz os princípios da
República Federativa do Brasil nas relações internacionais.

3
3 FUNDAMENTOS
Os fundamentos da República Federativa do Brasil são a base do ordenamento
jurídico e estão previstos no art. 1º da Constituição (BRASIL, 2016, on-line):

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união


indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-
se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I- a soberania;
II- a cidadania;
III- a dignidade da pessoa humana;
IV- os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V- o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por


meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição.

Com base nas disposições da normativa acima, temos que a República Federativa
do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados, municípios e do Distrito Federal.
Isso significa dizer que, no Brasil, não é possível ocorrer a secessão entre os entes
federados, isto é, nenhum dos entes pode se separar ou declarar independência. Com
isso, existirá intervenção federal ou estadual caso algum dos entes federados tente se
separar da federação.

A soberania está elencada como o primeiro fundamento da República. Entende-


se por soberania o atributo que o Estado brasileiro possui, ou seja, o Brasil não está
subordinado a nenhum outro Estado, seja em âmbito nacional ou internacional. Trata-se,
aqui, da soberania na ordem interna, ou seja, a capacidade de editar uma ordem jurídica
sem a ingerência de qualquer outro Estado Nacional. O professor Marcelo Caetano assim
comenta sobre a soberania nacional:

um poder político supremo e independente, entendendo-se


por poder supremo aquele que não está limitado por nenhum
outro na ordem interna e por poder independente aquele que, na
sociedade internacional, não tem de acatar regras que não sejam
voluntariamente aceites e está em pé de igualdade com os poderes
supremos dos outros povos (CAETANO, 1987, p. 169).

Nessa toada, o princípio da soberania possui duas dimensões: uma na ordem


interna e outra na ordem externa. Quanto à primeira, trata-se da autonomia nacional
para editar normas jurídicas com validade e eficácia no território nacional, sempre
com supremacia da Constituição Federal da República. Na ordem externa, trata-se de
igualdade de tratamento e reconhecimento com outros Estados Nacionais igualmente
soberanos.

Em seguida, tem-se a cidadania, que pode ser compreendida como um


compromisso com o povo brasileiro. A cidadania “representa um status e apresenta-se
simultaneamente como objeto e um direito fundamental das pessoas” (MORAES, 2020,

4
p. 79). Por meio desse fundamento, será concedida a possibilidade de participação
popular nas decisões políticas do Estado. Essa participação do povo será efetivada
mediante voto, iniciativa popular de leis e demais instrumentos de participação.

A dignidade da pessoa humana figura como terceiro fundamento da República


brasileira. Nos moldes desse fundamento, a Constituição confere ao ser humano
características de centralidade. O princípio fundamental da dignidade da pessoa
humana “concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às
personalidades humanas” (MORAES, 2020, p. 79). Com isso, a proteção a dignidade da
pessoa humana é a base de todos os direitos fundamentais.

O Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante nº 11, que versa sobre
o uso de algemas, a partir de uma interpretação do princípio da dignidade humana.
Vejamos:

Súmula Vinculante 11: Só é lícito o uso de algemas em casos de


resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade
física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada
a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade
disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade
da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da
responsabilidade civil do Estado (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2021).

De igual modo, em relação ao tratamento da tortura, o Supremo Tribunal Federal


(STF) se fundamentou no princípio da dignidade da pessoa humana para arguir que
“o argumento descolado da dignidade da pessoa humana para afirmar a invalidade da
conexão criminal que aproveitaria aos agentes políticos que praticaram crimes comuns
contra opositores políticos, presos ou não, durante o regime militar, não prospera”
(SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2010). Também, com fundamento neste mesmo
princípio, em 2014, foi editada a Emenda Constitucional 81, que previu a expropriação
de imóvel como punição à exploração de trabalho escravo.

Dessa forma, as propriedades rurais e urbanas de qualquer região do


País onde for localizada a exploração de trabalho escravo na forma da
lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas
de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário
e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Observe-se,
ainda, que todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em
decorrência da exploração de trabalho escravo será confiscado e
reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei
(MORAES, 2020, p. 81).

Por fim, o princípio da dignidade da pessoa humana também foi fundamento


para o STF editar a tese de reconhecimento de paternidade e de filiação por origem
biológica, ainda que exista paternidade socioafetiva em registro público, declarada ou
não.

5
Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa são o quarto fundamento da
República. O Brasil é um país que adotou o sistema capitalista, e o trabalho é um valor da
sociedade consagrado como direito social no caput do art. 6º da Constituição. Quanto
a este princípio fundamental, vejamos o comentário do jurista Alexandre de Moraes
(2020, p. 81):

[...] é através do trabalho que o homem garante sua subsistência


e o crescimento do país, prevendo a Constituição, em diversas
passagens, a liberdade, o respeito e a dignidade ao trabalhador (por
exemplo: CF, arts. 5º, XIII; 6º; 7º; 8º; 194-204). Como salienta Paolo
Barile, a garantia de proteção ao trabalho não engloba somente
o trabalhador subordinado, mas também aquele autônomo e o
empregador, enquanto empreendedor do crescimento do país.

Por último, tem-se o fundamento do pluralismo político, o qual expressa a


garantia de inclusão dos diferentes grupos sociais no processo político nacional,
conferindo aos cidadãos liberdade de convicção filosófica e política. Nesse aspecto,

demonstra a preocupação do legislador constituinte em afirmar-se


a ampla e livre participação popular nos destinos políticos do país,
garantindo a liberdade de convicção filosófica e política e, também,
a possibilidade de organização e participação em partidos políticos
(MORAES, 2020, p. 81).

A partir desse fundamento, existe uma proteção contra ações autoritárias de


qualquer grupo que tente se valer da posição dominante para reprimir minorias.

O parágrafo único exprime a soberania popular, por meio da qual o titular do


poder sempre será o povo. No tocante ao exercício do poder, este pode ser realizado
na forma direta ou indireta. Em razão disso, fala-se que a democracia no Brasil é mista
ou semidireta.

FIGURA 1 – SOBERANIA POPULAR

FONTE: <http://twixar.me/T5Nm>. Acesso em: 13 jul.2021.

6
A democracia indireta é a regra em nosso ordenamento. Por meio da democracia
indireta, os cidadãos escolhem e votam em seus representantes e estes os governam e
aprovam as leis. Por outro lado, a democracia direta é a exceção, podendo ser exercida
por meio do plebiscito (art. 14, I), referendo (art. 14, II) e iniciativa popular de lei (art. 61, §
2º), dispositivos da Constituição Federal da República (BRASIL, 2016). Vejamos:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e


pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos
da lei, mediante:
I- plebiscito;
II- referendo;
III- iniciativa popular.
[...]
Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a
qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado
Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao
Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-
Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos
nesta Constituição.
[...]
§ 2º A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à
Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um
por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco
Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de
cada um deles (BRASIL, 2016, on-line).

Assim, o princípio democrático possui fundamental importância para a


participação efetiva de todos enquanto coletividade e também de cada indivíduo na
vida política do país. Vejamos o comentário do cientista político e jurista espanhol
Manuel Garcia Pelayo (1989, p. 177):

A formação da teoria da representação democrática e, por conseguinte,


da democracia indireta – aquela na qual o povo exerce seu poder
por intermédio de representantes – corresponde principalmente ao
núcleo de ideias jurídico-políticas da Revolução Francesa. A origem
e a estrutura de tal formação estão condicionadas por dois motivos:
um, a impossibilidade técnica da democracia direta, é dizer, da
tese de Rousseau, questão na qual os teóricos da Constituinte se
vinculam com o pensamento de Montesquieu e de De Lolme; o outro,
pela substituição da ideia do povo como algo tangível e visível pela
ideia da nação. Em resumo, é o resultado da aplicação do princípio
democrático em um grande espaço e para uma grande população.

7
4 OBJETIVOS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
A nossa Carta Magna estabelece diversos objetivos fundamentais com o escopo
de desenvolvimento e de progresso da nação brasileira. A Constituição Federal de 1988
elencou em seu art. 3º os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Os
objetivos fundamentais expressam os ideais, os fins a serem alcançados pelo país. Eis o
dispositivo em comento:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa


do Brasil:
I- construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II- garantir o desenvolvimento nacional;
III- erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades
sociais e regionais;
IV- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação
(BRASIL, 2016, on-line).

Deve-se destacar que todos os objetivos fundamentais se iniciam com um verbo


no infinitivo, quais sejam: construir, garantir, erradicar e promover. É muito importante
frisar que o art. 3º da Constituição estabelece os objetivos internos do Brasil.

Ao legislador ordinário e ao intérprete, em especial às autoridades


públicas dos poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e da
Instituição do Ministério Público, esses objetivos fundamentais
deverão servir como vetores de interpretação, seja na edição de leis
ou atos normativos, seja em suas aplicações. Logicamente, o rol de
objetivos do art. 3º não é taxativo, tratando-se somente da previsão
de algumas finalidades primordiais a serem perseguidas pela
República Federativa do Brasil. Os poderes públicos devem buscar
os meios e instrumentos para promover condições de igualdade real
e efetiva e não somente contentar-se com a igualdade formal, em
respeito a um dos objetivos fundamentais da República: construção
de uma sociedade justa (MORAES, 2020, p. 84).

Além disso, esses objetivos representam quais as metas que o país deseja
alcançar, reconhecendo, ao mesmo tempo, que nenhum dos objetivos foi objetivamente
concretizado.

ATENÇÃO
Os fundamentos da República Federativa do Brasil são considerados
como a base do ordenamento jurídico brasileiro. Por sua vez, os
objetivos fundamentais da República são tidos como os ideais que o
Brasil pretende alcançar, ou seja, são as metas a serem promovidas por
todo o sistema estatal brasileiro.

8
5 PRINCÍPIOS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
QUE REGEM AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Os princípios que regem a República Federativa do Brasil em suas relações
internacionais estão elencados no art. 4º da Constituição Federal de 1988. Confira:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações


internacionais pelos seguintes princípios:
I- independência nacional;
II- prevalência dos direitos humanos;
III- autodeterminação dos povos;
IV- não-intervenção;
V- igualdade entre os Estados;
VI- defesa da paz;
VII- solução pacífica dos conflitos;
VIII- repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX- cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
X- concessão de asilo político.
Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração
econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina,
visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações
(BRASIL, 2016, on-line).

O art. 4º da Constituição Federal de 1988 surgiu de inspirações da Carta da


Organização das Nações Unidas, de 1945. Naquele período, o mundo amargava
os sofrimentos advindos da Segunda Guerra Mundial, e um dos maiores anseios da
humanidade seria garantir a paz. A partir desse desejo, o art. 4º detalha os princípios
que regem o Brasil nas relações estrangeiras à luz da harmonia, erradicando a ideia de
conflitos bélicos.

FIGURA 2 – A DEFESA DA PAZ É UM DOS PRINCÍPIOS QUE REGEM AS


RELAÇÕES INTERNACIONAIS DO BRASIL

FONTE: <http://twixar.me/L5Nm>. Acesso em: 16 jul. 2021.

Destaca-se que as orientações e princípios a serem seguidos pelo Brasil nas


relações com os outros países também são chamados de princípios externos e estão
pautados, principalmente, em ideais de paz, de cooperação e de igualdade entre os
Estados soberanos.

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RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil são valores que ditam a


aplicabilidade de todas as normas constitucionais e infraconstitucionais. Eles servem
como elementos de interpretação e de integração, contribuindo para uma unidade da
Constituição.

• A Constituição estabelece objetivos fundamentais em prol do desenvolvimento e do


progresso da nação brasileira. Dentre estes objetivos, estão a construção de uma
sociedade livre, justa e solidária e a erradicação da pobreza e da marginalização e a
redução das desigualdades sociais e regionais.

• Os princípios que regem a República Federativa do Brasil em suas relações


internacionais estão elencados no art. 4º da Constituição Federal de 1988 e pregam,
dentre outras questões, a independência nacional; a prevalência dos direitos
humanos; a não intervenção e a defesa da paz.

10
AUTOATIVIDADE
1 A Constituição Federal de 1988 foi influenciada pela evolução dos direitos sociais
positivada na Constituição Mexicana de 1917 e pela Lei Fundamental da República
Federal da Alemanha (Lei Fundamental de Bonn) de 1949. A respeito dos direitos
sociais previstos na Constituição de 1988, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O direito à moradia encontra-se consagrado no caput do art. 6º da Constituição


Federal de 1988 desde o seu texto original.
b) ( ) A localização “topográfica” dos direitos sociais no texto da Constituição Federal
reforça a tese de que os mesmos não se tratam de direitos fundamentais.
c) ( ) Muito embora a doutrina sustente a tese do “direito ao mínimo existencial”, a
jurisprudência do STF rejeita o seu acolhimento, amparada, sobretudo, no
princípio da separação dos poderes.
d) ( ) A Constituição Federal consagra expressamente o direito à educação como
direito público subjetivo.

2 A Constituição Federal de 1988 elencou, em seu art. 3º, os objetivos fundamentais


da República Federativa do Brasil. Os objetivos fundamentais expressam os ideais,
os fins a serem alcançados pelo país (BRASIL, 2016). Com base num dos objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Promover o bem de todos, desde que estes sofram alguma discriminação.


b) ( ) Garantir o desenvolvimento social.
c) ( ) Prestar asilo político.
d) ( ) Construir uma sociedade livre e justa, apenas.

3 A República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e


municípios e do Distrito Federal. Com base nisso, marque a opção CORRETA:

a) ( ) Poderá haver secessão entre os entes federados.


b) ( ) Nenhum dos entes federados poderá se separar, ou seja, declarar independência.
c) ( ) A República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Social de Direito.
d) ( ) Caso algum dos entes federados tente se separar da federação, não haverá
intervenção.

11
4 O Título I da Constituição Federal trata “Dos princípios fundamentais”. O art. 1º dispõe
que a “República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem
como fundamentos [...]”. Por sua vez, o art. 3º determina que “constituem objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil: [...]” (BRASIL, 2016, on-line). Qual
é a diferença no tocante à hermenêutica constitucional entre os fundamentos da
República Federativa do Brasil (art. 1º) e os objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil (art. 3º)?

5 Leia os trechos a seguir:

“[...] assim como jamais se interpreta um texto normativo, mas sim o direito, não se
interpretam textos normativos constitucionais, isoladamente, mas sim a Constituição,
no seu todo. Não se interpreta a Constituição em tiras, aos pedaços. A interpretação de
qualquer norma da Constituição impõe ao intérprete, sempre, em qualquer circunstância,
o caminhar pelo percurso que se projeta a partir dela – da norma – até a Constituição”
(GRAU, 2009, p. 113).

“[...] o método sistemático de interpretação jurídica é o único a possibilitar um visual de


conjunto, uma vista panorâmica do material investigado, que é a consequência lógica
do interpretar articulado (cada dispositivo em combinação com os demais, para que a
união de cada parte ao todo traga para o Direito a qualidade do todo, e não somente a
qualidade de cada parte mesma) (BRITTO, 2003, p. 64)”.

A partir dos trechos anterior, é possível identificar a ideia de que a interpretação das
normas constitucionais não deve acontecer de maneira isolada. Considerando a unidade
da Constituição, indique exemplos da busca pelos objetivos da República Federativa
do Brasil (art. 3º CF/88) que estejam pautados nos fundamentos previstos no art. 1º da
Carta Magna.

NOTA
O tema dos direitos e garantias fundamentais é um dos mais importantes
assuntos previstos na Constituição. Com sua indiscutível relevância, os
direitos e garantias fundamentais estão topograficamente elencados a
partir do Título II da Constituição, especificamente entre o art. 5º ao 17
da Carta.

12
UNIDADE 1 TÓPICO 2 —
DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
1 INTRODUÇÃO
Agora, no Tópico 2, abordaremos alguns conceitos que serão essenciais para
a compreensão dos próximos tópicos, assim como assuntos relativos aos direitos e
garantias individuais e coletivos.

Para facilitar e compreender o estudo do tema, faz-se necessário introduzir


e conceituar as características dos direitos e garantias fundamentais. No dizer de
Canotilho (1993, p. 541), os direitos fundamentais são destinados:

à função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva:


(1) constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência
negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as
ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num
plano jurídico-subjetivo, o poder de exercer positivamente direitos
fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes
públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos
(liberdade negativa).

A característica da relatividade possui relação com o fato de que os direitos


não são absolutos, ou seja, podem sofrer algum tipo de mitigação. Um exemplo da
relatividade pode ser visualizado na aplicação da pena de morte em caso de guerra
declarada (art. 5º, XLVII, “a”). Portanto, nem mesmo o direito à vida é encarado como um
direito absoluto no ordenamento jurídico brasileiro.

A característica da imprescritibilidade apresenta que não se fala em perda do


direito por não usá-lo ou exercê-lo em um determinado tempo. Nesse sentido, não há
incidência de prescrição ou decadência dos direitos fundamentais, podendo assim,
serem exercidos a qualquer tempo.

A característica da historicidade remete ao fato de que os direitos fundamentais


surgiram ao longo da história e sempre estão se atualizando e se adaptando. Dessa
maneira, novos direitos fundamentais surgem ao longo do tempo, e a sua interpretação
deve ser feita em harmonia com o contexto histórico e com base nas necessidades
sociais.

A característica da universalidade diz respeito ao fato de que os direitos


fundamentais se destinam a todos os seres humanos, sem qualquer discriminação. No
entanto, considerando algumas especificidades de determinados grupos sociais, haverá
alguns desses direitos que se destinarão para grupos específicos, como é o caso dos
direitos dos trabalhadores.

13
A característica da irrenunciabilidade significa que o titular do direito não poderá
renunciar, ou seja, abrir mão de seus direitos de maneira definitiva.

A característica da inalienabilidade também é chamada de indisponibilidade e


implica que não é possível um indivíduo transferir ou alienar o seu direito fundamental,
transferindo-o para outro titular. Em outras palavras, não é possível doar, vender ou
ceder os direitos fundamentais.

ATENÇÃO
Os direitos fundamentais possuem como uma de suas
características a relatividade, ou seja, não há que se falar em
direitos fundamentais absolutos, tendo em vista que até a vida
pode ser mitigada, como ocorre, por exemplo, nos casos de
pena de morte nos casos de guerra declarada.

2 DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS COLETIVOS


Os direitos e deveres individuais coletivos estão arrolados no art. 5º da
Constituição Federal de 1988. O art. 5º é o mais extenso da Carta, apresentando 78
incisos, que exprimem temas extremamente relevantes e, ao mesmo tempo, complexos,
gerando várias divergências interpretativas no âmbito jurídico. Assim, para iniciar
o estudo recomenda-se entender os princípios presentes no art. 5º da Constituição
Federal. Eis o dispositivo em tela:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, [...] (BRASIL, 2016, on-line).

O primeiro princípio apresentado é o princípio da igualdade. A Constituição


estabelece que todos são iguais perante a lei. Com isso, não há que se falar em qualquer
tipo de distinção entre as pessoas.

Observe-se, porém, que a expressão residentes no Brasil deve


ser interpretada no sentido de que a Carta Federal assegura ao
estrangeiro todos os direitos e garantias mesmo que não possua
domicílio no País, só podendo, porém, assegurar a validade e
gozo dos direitos fundamentais dentro do território brasileiro, não
excluindo, pois, o estrangeiro em trânsito pelo território nacional, que
possui igualmente acesso às ações, como o mandado de segurança
e demais remédios constitucionais. Igualmente, as pessoas jurídicas
são beneficiárias dos direitos e garantias individuais, pois reconhece-
se às associações o direito à existência, o que de nada adiantaria
se fosse possível excluí-las de todos os seus demais direitos. Dessa
forma, os direitos enunciados e garantidos pela constituição são de
brasileiros, pessoas físicas e jurídicas (MORAES, 2020, p. 111).

14
FIGURA 3 – PRINCÍPIO DA IGUALDADE É ASSEGURADO PELA CONSTITUIÇÃO

FONTE: <http://twixar.me/55Nm>. Acesso em: 14 jul. 2021.

Faz-se necessário destacar que a igualdade se desdobra em material e formal.


A igualdade material possibilita o estabelecimento das ações afirmativas, também
chamadas de discriminações positivas ou reversas. É o caso, por exemplo, das cotas em
concursos públicos e universidades para deficientes e para pessoas negras e pardas. Já
a igualdade formal está relacionada na ideia de tratar todos de maneira indistinta.

O inciso II do art. 5º da Constituição consagra o princípio da legalidade: “ninguém


será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (BRASIL,
2016, on-line). Esta legalidade é chamada de legalidade ampla, sendo dirigida aos
administrados, ou seja, todos os indivíduos particulares. Assim, os indivíduos particulares
podem fazer tudo aquilo que não seja proibido em lei. Aqui surge um ponto importante
e está relacionado ao princípio da legalidade administrativa, isto é, a Administração
Pública, diferentemente dos particulares, só pode agir quando houver alguma lei que
autorize a sua atuação.

Ao prosseguir no estudo dos direitos e garantias fundamentais tem-se o


princípio da liberdade de expressão arrolado no inciso IV do art. 5º da Carta: “é livre a
manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (BRASIL, 2016, on-line).

Aqui, a Constituição conferiu à liberdade de pensamento como direito fundamental.


Contudo, ao exercer esse direito, o titular não pode se ocultar. Além disso, deve-se
deixar claro que a liberdade de expressão não admite qualquer tipo de discurso de ódio.
Nesse sentido, a título de exemplo, imagine que um líder religioso, além de defender o
ponto de vista ideológico de sua crença, passe a ofender as religiões diversas. Isso seria
considerado crime, e ele não poderia invocar o princípio da liberdade de expressão.

O inciso V da CF/88 traz o direito à indenização quando algum indivíduo sofrer


algum tipo de dano, podendo este ser material, moral ou à imagem: “é assegurado o
direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material,
moral ou à imagem” (BRASIL, 2016, on-line).

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Ressalta-se que um mesmo ato ou evento pode gerar mais de um dano a
alguma pessoa. Assim, é possível haver a cumulação de danos e, consequentemente, a
cumulação de indenizações.

A Constituição trata da chamada escusa de consciência no inciso VIII do art.


5º. Confira: “VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou
de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal
a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei” (BRASIL,
2016, on-line).

Com base nesse dispositivo, é possível que um jovem, ao completar 18 anos, se


recuse a cumprir o serviço militar obrigatório justificando que sua religião não permite
o manuseio de armas de fogo. Nesse caso, o jovem não será privado de algum direito
em decorrência da escusa de consciência. No entanto, o jovem deverá cumprir outras
obrigações que não estejam relacionadas com as armas; caso se negue a cumprir a
função alternativa, poderá sofrer a privação de direitos.

Nos termos da Carta Magna, a casa é o asilo inviolável do indivíduo. Eis o


respectivo dispositivo: “XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo
penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre,
ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial” (BRASIL, 2016,
on-line).

FIGURA 4 – CASA É ASILO INVIOLÁVEL, CONFORME A CONSTITUIÇÃO FEDERAL

FONTE: <http://twixar.me/S5Nm>. Acesso em: 14 jul. 2021.

Nesse ponto, deve-se compreender o conceito de casa para fins de asilo


inviolável. “O Supremo Tribunal Federal já decidiu que mesmo sendo a casa o asilo
inviolável do indivíduo, não pode ser transformado em garantia de impunidade de crimes,
que em seu interior se praticam” (MORAES, 2020, p. 155). Com base nisso, o conceito
de casa deve ser interpretado amplamente, ultrapassando assim, o mero entendimento

16
de residência. Dessa forma, qualquer compartimento, não aberto ao público, em que o
indivíduo esteja alojado pode ser considerado como casa, por exemplo: quarto de hotel;
barraca de acampamento, garagem, dentre outros.

Acontece que, com base na relativização dos direitos fundamentais, existirão


hipóteses em que será possível o ingresso na casa sem autorização do morador. São
elas: prestar socorro; casos de flagrante delito; desastre; ou por determinação judicial,
desde que durante o dia.

O Inciso XII do art. 5º da CF/88 dispõe que o sigilo da correspondência, das


comunicações telegráficas, dos dados e das comunicações telefônicas são invioláveis.
Veja:

XII - É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações


telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no
último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei
estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual
penal (BRASIL, 2016, on-line).

Note que, em alguns casos, será possível haver a mitigação dessa inviolabilidade.
Destaca-se que o Poder Judiciário é o único a poder fazer a quebra de qualquer dos
sigilos descritos na Carta. Essa prerrogativa, entretanto, deve ser feita mediante decisão
devidamente fundamentada, justificando, no caso concreto, qual é a real necessidade
da medida, tendo em vista que a regra é o sigilo. Assim, a possibilidade da quebra de
sigilo é extraída da inexistência de direito absoluto e da impossibilidade de se valer de
uma garantia constitucional para praticar atos ilícitos.

O inciso XIII do art. 5º da CF/88 versa sobre a liberdade para exercer trabalho,
ofício ou profissão: “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas
as qualificações profissionais que a lei estabelecer” (BRASIL, 2016, on-line).

Perceba que a parte final desse dispositivo, destacada pela expressão “que a lei
estabelecer”. Isso significa dizer que alguns trabalhos, ofícios ou profissões deverão ser
regidos e exercidos em conformidade com a lei. A título de exemplo, tem-se a figura do
advogado, que deve possuir registro nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB) para realizar a sua função sem qualquer embaraço.

O inciso XVI do art. 5º da CF/88 prevê a liberdade de reunião:

XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais


abertos ao público, independentemente de autorização, desde que
não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo
local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente
(BRASIL, 2016, on-line).

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FIGURA 5 – REUNIÃO PÚBLICA NÃO PRECISA DE AUTORIZAÇÃO

FONTE: <http://twixar.me/p5Nm>. Acesso em: 16 jul. 2021.

O direito de reunião é assegurado expressamente na CF/88. Entretanto, para


organizar a prática desse direito, o grupo de pessoas deve comunicar às autoridades
competentes para evitar conflito com outra reunião também designada para o mesmo
local.

O direito de reunião é um direito público subjetivo de grande


abrangência, pois não se compreenderia a liberdade de reuniões
sem que os participantes pudessem discutir, tendo que se limitar
apenas ao direito de ouvir, quando se sabe que o direito de reunião
compreende não só o direito de organizá-la e convocá-la, como o de
total participação ativa. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal
declarou a inconstitucionalidade de ato normativo que limitava a
participação popular nas reuniões, vedando a utilização de carros,
aparelhos e objetos sonoros (MORAES, 2020, p. 188).

Destaca-se que não se deve pedir autorização para realizar as reuniões, tendo
em vista que a Constituição cita apenas a necessidade de comunicar, isto é avisar as
autoridades competentes sobre a realização do encontro.

Os incisos XXII e XXIII do art. 5º da CF/88 tratam do direito de propriedade: “XXII


- é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social
(BRASIL, 2016, on-line).

FIGURA 6 – CONSTITUIÇÃO GARANTE O DIREITO DE PROPRIEDADE

FONTE: <http://twixar.me/85Nm>. Acesso em: 16 jul. 2021.

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Veja que o tema possui dois núcleos: de um lado, argumenta-se sobre o direito
de propriedade como componente de um direito absoluto e que, em alguns casos,
permite a ocorrência de desapropriações ou expropriações. Assim, quando for caso
de necessidade, de utilidade pública ou de interesse social, é possível formalizar um
processo de desapropriação de propriedade privada. Nessa hipótese, o proprietário
possui direito a ser previamente indenizado e com pagamento em dinheiro. Todavia,
caso a propriedade não cumpra a sua função social, como advertido pela Constituição
Federal no art. 5º, inciso XXIII; art. 170, inciso III; e art. 184 (BRASIL, 2016), poderão
acontecer algumas implicações jurídicas. Confira a seguir:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXIII- a propriedade atenderá a sua função social;
[...]
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios:
[...]
III- função social da propriedade;
[...]
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para
fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua
função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da
dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis
no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão,
e cuja utilização será definida em lei (BRASIL, 2016, on-line).

O próprio nome do instituto já demonstra uma ideia de punição. Nesse caso,


a indenização será paga em títulos da dívida pública ou títulos da dívida agrária,
resgatáveis em até 10 ou 20 anos, respectivamente.

A Constituição trata do Tribunal do Júri no inciso XXXVIII do art. 5º

XXXVIII- é reconhecida a instituição do júri, com a organização que


lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida
(BRASIL, 2016, on-line).

O Tribunal do Júri surgiu como garantia dos cidadãos. A ideia central é submeter
à sociedade o julgamento de alguém que matou um integrante daquela comunidade. O
Tribunal do Júri possui competência para julgar os crimes dolosos contra a vida, quais
sejam: homicídio, infanticídio, aborto e instigação, auxílio ou induzimento ao suicídio.

19
O inciso XL do art. 5º da CF dispõe sobre a retroatividade da lei penal: “a lei penal
não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” (BRASIL, 2016, on-line). Dentro desse cenário,
caso sobrevenha uma lei mais favorável, por exemplo, diminuindo a pena, ela deverá ser
aplicada ao réu, ainda que a sentença já tenha sido proferida. Além disso, mesmo que
a condenação já tenha transitado em julgado, caberá ao juízo das execuções penais
reduzir a pena imposta ao réu.

Em nosso ordenamento jurídico, apenas o crime de racismo e o crime de grupos


armados, civis ou militares contra a ordem constitucional e o Estado democrático são
caracterizados como imprescritíveis. Isso significa que o Estado, por meio do Poder
Judiciário, poderá, sempre e a qualquer momento, instaurar processo penal para
investigar a prática desses crimes e aplicar a respectiva penalidade ou sanção.

Os incisos XLII e XLIV do art. 5º da Constituição Federal destacam o racismo e a


ação de grupos armados como crimes inafiançáveis e imprescritíveis. Confira.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XLII- a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível,
sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
[...]
XLIV- constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos
armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o
Estado Democrático; (BRASIL, 2016, on-line).

Os incisos LIV e LV do art. 5º da CF/88 tratam do princípio do devido processo


legal e dos princípios que nortearão o processo judicial e administrativo. Veja:

LIV- ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o


devido processo legal;
LV- aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos
acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (BRASIL, 2016,
on-line).

O devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa são princípios que dão
segurança às relações entre o Estado e os particulares, bem como entre estes com seus
pares. A Constituição dispõe que ninguém será privado de sua liberdade ou de seus
bens sem que esses princípios sejam observados.

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É provável que a garantia do devido processo legal configure uma
das mais amplas e relevantes garantias do direito constitucional, se
considerarmos a sua aplicação nas relações de caráter processual
e nas relações de caráter material (princípio da proporcionalidade/
direito substantivo). Todavia, no âmbito das garantias do processo é
que o devido processo legal assume uma amplitude inigualável e um
significado ímpar como postulado que traduz uma série de garantias
hoje devidamente especificadas e especializadas nas várias ordens
jurídicas. Assim, cogita-se de devido processo legal quando se fala
de (1) direito ao contraditório e à ampla defesa, de (2) direito ao juiz
natural, de (3) direito a não ser processado e condenado com base
em prova ilícita, de (4) direito a não ser preso senão por determinação
da autoridade competente e na forma estabelecida pela ordem
jurídica (MENDES, 2020, p. 787-788).

Assim, também nas hipóteses de desapropriação, por exemplo, caberá ao Estado


respeitar as diretrizes constitucionais. O devido processo legal é um metaprincípio, a
partir do qual nascem os demais dentro da lógica processual. Ele vale não só para o
direito processual no âmbito judicial, pois também deve ser aplicado aos procedimentos
administrativos.

O inciso LXVII do art. 5º da CF/88 traz a impossibilidade de prisão civil em


decorrência de dívidas, exceto nos casos de inadimplemento de pensão alimentícia e
do depositário infiel. “Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo
inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário
infiel” (BRASIL, 2016, on-line).

Conforme inteligência do dispositivo acima, o que possibilita a prisão não é o


fato de o indivíduo deixar de pagar a pensão alimentícia, mas sim recusar-se a pagar
porque quer, sem apresentar nenhuma justificativa plausível. No tocante ao depositário
infiel e ao alienante fiduciário, a prisão atualmente não é mais cabível.

O inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal apresenta a assistência jurídica


aos necessitados. “O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que
comprovarem insuficiência de recursos” (BRASIL, 2016, on-line).

A assistência jurídica possui aplicação dentro e fora do processo, isto é, judicial


e extrajudicial. Para viabilizar o direito fundamental de assistência jurídica, foram
criadas as Defensorias Públicas. Assim, a partir da Constituição de 1988, incumbe à
Defensoria Pública defender aqueles que comprovarem insuficiência de recursos, e não
ao Ministério Público.

O inciso LXXV do art. 5º da Constituição Federal destaca a indenização em


decorrência de algum erro judiciário ou pelo fato de o condenado ter ficado preso por
tempo superior àquele estipulado na sentença. “O Estado indenizará o condenado por
erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença” (BRASIL,
2016, on-line).

21
FIGURA 7 – ERRO JUDICIÁRIO É INDENIZÁVEL PELO ESTADO

FONTE: <http://twixar.me/V5Nm>. Acesso em: 16 jul. 2021.

Aqui, o erro judiciário acarretará responsabilidade civil do Estado na forma


objetiva, ou seja, não será necessário comprovar o dolo ou culpa da Administração
Pública, pois o simples fato da ocorrência do erro gera hipótese de indenização.

O inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal preconiza o princípio da


razoável duração do processo. Isso significa dizer que será assegurado a todos uma
duração célere, seja nos processos judiciais ou administrativos. “A todos, no âmbito
judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios
que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 2016, on-line).

Acontece que, embora a Constituição fale em prazo razoável, não existe uma
quantificação objetiva em dias ou meses de duração do processo. Assim, a questão
deve ser analisada caso a caso, observando-se a complexidade de cada processo para
a apuração de sua duração.

O inciso 2º do art. 5º da Constituição Federal não exclui outros decorrentes


do regime e dos princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais em que a
República Federativa do Brasil seja parte. Isso significa dizer que, o extenso rol de direitos
e garantias expresso do art. 5º, apesar de extremamente abrangente, não exemplifica
de maneira taxativa todos os direitos fundamentais existentes. Com isso, a listagem dos
direitos previstos no art. 5º é exemplificativa, podendo ser ampliada para atingir os fins
que a Constituição almeja.

3 DIREITOS SOCIAIS
Os direitos sociais possuem um capítulo próprio, estando elencados entre os
art. 6º ao 11 da CF/88. O art. 6º apresenta um rol de direitos sociais. Confira.

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o


trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição (BRASIL, 2016, on-line).

22
FIGURA 8 – SAÚDE, LAZER, EDUCAÇÃO SÃO DIREITOS SOCIAIS

FONTE: <http://twixar.me/75Nm>. Acesso em: 14 jul. 2021.

Os direitos sociais demandarão uma prestação positiva do Estado, ou seja, cabe


ao Poder Público garantir a efetividade dos direitos sociais.

Embora os direitos sociais, assim como os direitos negativos,


impliquem tanto direitos a prestações em sentido estrito (positivos)
quanto direitos de defesa (negativos), e ambas as dimensões
demandem o emprego de recursos públicos para a sua garantia, é
a dimensão prestacional (positiva) dos direitos sociais o principal
argumento contrário à sua judicialização (MENDES, 2020, p. 937).

Entretanto, os recursos financeiros públicos não conseguem abarcar a totalidade


dos direitos sociais e assegurá-los à sociedade. A partir dessa ideia de que o dinheiro
público é finito, surge a teoria da reserva do possível. O pensamento fundante dessa
teoria argumenta que o atendimento às necessidades dos indivíduos deve ser praticado
dentro de uma medida razoável do possível. Essa teoria sofre duras críticas por abrir
uma possibilidade de justificativa, lastreada na própria Constituição Federal, de negar a
efetivação de direitos e garantias fundamentais, como saúde e educação.

Contudo, a reserva do possível é limitada por outra teoria, qual seja: a do mínimo
existencial. Por mínimo existencial deve-se entender como uma parcela mínima capaz
de fazer com que o cidadão alcance uma vida digna. Nesse sentido, o mínimo existencial
deve ser resguardado e não pode ser negado.

A teoria do mínimo existencial possui núcleo de fundamentação teórica na


própria eficácia do princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, reflete ainda
como um dos principais pilares dos direitos e garantias fundamentais expressos na
Constituição Federal.

O art. 7º da CF/88 trata dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais.

23
FIGURA 9 – DIREITOS DOS TRABALHADORES

FONTE: <http://twixar.me/N5Nm>. Acesso em: 16 jul. 2021.

Dentre os direitos arrolados nos 34 incisos do art. 7º, merece destaque a proteção
contra a despedida arbitrária ou sem justa causa: “relação de emprego protegida contra
despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá
indenização compensatória, dentre outros direitos” (BRASIL, 2016, on-line).

Como mecanismo de proteção do empregado, a Constituição Federal dispõe


que a relação de emprego será protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa
e que, caso assim ocorra, haverá indenização compensatória, dentre outros direitos.

Os direitos de ordem social, elencados na Constituição Federal,


não excluem outros, que se agreguem ao ordenamento pátrio, seja
pela via legislativa ordinária, seja por força da adoção de tratados
internacionais. Assim, como primeira nota dos direitos sociais, há
que acentuar sua abertura (não são numerus clausus). É o que se
depreende do próprio caput do art. 7º, que declara não estarem
excluídos outros direitos sociais que visem à melhoria da condição
social dos trabalhadores (TAVARES, 2020, p. 908).

Os incisos II e III do art. 7º da CF/88 fazem menção ao seguro desemprego e


ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) com o intuito de proporcionar uma
estabilidade ao trabalhador. O FGTS propõe resguardar o trabalhador e permite o saque
dos valores recolhidos em caso de desemprego involuntário, aposentadoria ou ainda em
outras situações definidas pelo conselho curador do fundo.

O inciso IV dispõe sobre o salário mínimo do trabalhador, o qual deve atender ao


mínimo existencial:

IV- salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de


atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com
moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene,
transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe
preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para
qualquer fim (BRASIL, 2016, on-line).

24
FIGURA 10 – SALÁRIO MÍNIMO É IRREDUTÍVEL

FONTE: <http://twixar.me/Q5Nm>. Acesso em: 16 jul. 2021.

Com base no inciso apresentado anteriormente, o salário mínimo deve suportar


todas as necessidades básicas do trabalhador e de sua família. E o inciso VI do art. 7º
da CF/88 dispõe sobre a irredutibilidade do salário: “irredutibilidade do salário, salvo
o disposto em convenção ou acordo coletivo” (BRASIL, 2016, on-line). Segundo este
inciso, como regra, o salário do trabalhador não pode ser reduzido. Para que eventual
redução seja legítima, esta deve decorrer de negociação coletiva com a participação
obrigatória do sindicato.

Já o inciso VIII do art. 7º da CF/88 destaca o 13º salário: “décimo terceiro salário
com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria” (BRASIL, 2016, on-
line). Será devido o 13º salário ao trabalhador, com base na remuneração integral ou
no valor da aposentadoria. Assim, se o trabalhador recebe um salário mínimo mensal a
título de remuneração por trabalho ou a título de aposentadoria, terá o direito de receber
o mesmo valor a título de 13º salário.

O inciso IX da CF/99 indica que a remuneração do trabalho noturno deverá ser


superior à remuneração do diurno (BRASIL, 2016). Aqui tem-se o chamado adicional
noturno.

FIGURA 11 – REMUNERAÇÃO DO TRABALHO NOTURNO É SUPERIOR À DO TRABALHO NOTURNO

FONTE: <http://twixar.me/DXNm>. Acesso em: 14 jul. 2021.

25
Acontece que a Carta não determinou o quantum remuneratório do trabalho
noturno. A matéria é tratada na CLT, que irá indicar o horário considerado noturno,
levando em conta trabalhadores urbanos e rurais.

O inciso XIII trata da jornada de trabalho. Veja:

XIII- duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias


e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de
horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção
coletiva de trabalho;
XIV- jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos
ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva
(BRASIL, 2016, on-line).

O inciso em tela cita que a jornada semanal de trabalho deve corresponder a 44


horas, o que vale para trabalhadores CLT. No entanto, é permitida a compensação de
horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.
Também há de se destacar a possibilidade de jornadas distintas, como por exemplo, a
jornada 12x36.

O inciso XVI do art. 7º da CF trata das horas extras: “remuneração do serviço


extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal” (BRASIL, 2016,
on-line). O serviço extraordinário possui remuneração superior, no mínimo, em 50% à do
normal e, para os servidores públicos, o art. 53 da Lei n. 8.112/1990 garante adicional por
serviço extraordinário com acréscimo fixo de 50%.

As férias remuneradas estão elencadas no inciso XVII do art. 7º da CF/88: “gozo


de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal”
(BRASIL, 2016, on-line)

FIGURA 12 – FÉRIAS É DIREITO GARANTIDO AO TRABALHADOR

FONTE: <http://twixar.me/FXNm>. Acesso em: 16 jul. 2021.

Assim, é assegurado aos trabalhadores o gozo de férias anuais remuneradas


com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal, ou seja, o trabalhador terá
direito ao descanso de 30 dias e deverá receber uma quantia correspondente ao salário
acrescido de no mínimo um 1/3.

26
O inciso XXI do art. 7º da CF/88 versa sobre o aviso prévio em caso de
desligamento do trabalhador das atividades laborais: “aviso prévio proporcional ao
tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei” (BRASIL, 2016,
on-line). O dispositivo confere uma segurança tanto para o trabalhador quanto para
o empregado, evitando que ambos sejam pegos de surpresa caso o trabalhador peça
demissão ou venha a ser demitido.

O inciso XXIII do art. 7º da CF/88 dispõe sobre o adicional de remuneração


devido para aqueles trabalhadores que desempenham funções penosas, insalubres
ou perigosas. São consideradas atividades penosas aquelas exercidas em zonas de
fronteira ou que exigem expressivo dispêndio físico. Já a atividade insalubre trata-se
do comprometimento da saúde do trabalhador em seu ambiente de trabalho. Por sua
vez, a atividade perigosa é considerada como aquela que incorre em ameaça à vida
(BRASIL, 2016). Exemplo desta, podemos dizer das situações que envolvem contato
direto com inflamáveis, instalações elétricas de grandes voltagens, vigilância de risco,
dentre outras.

Outro ponto muito importante elencado no inciso XXX, do art. 7º da CF/88, é a


proibição de salários diferentes, de exercício de funções e de critério de admissão por
motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

FIGURA 13 – BRASIL PROÍBE SALÁRIOS DIFERENTES POR CRITÉRIO DE SEXO

FONTE: <http://twixar.me/LXNm>. Acesso em: 16 jul. 2021.

Além disso, a CF/88 também veda a discriminação fundada em critérios de


admissão do trabalhador portador de deficiência ou que distingam o trabalho manual,
técnico e intelectual. Veja:

XXXI- proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e


critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;
XXXII- proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual
ou entre os profissionais respectivos (BRASIL, 2016, on-line).

27
O inciso XXXIII do art. 7º da CF/88 estabelece limites etários para determinadas
espécies de trabalho:

XXXIII- proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a


menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de
dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de
quatorze anos (BRASIL, 2016, on-line).

FIGURA 14 – CONSTITUIÇÃO VEDA TRABALHO A MENORES DE 16 ANOS

FONTE: <http://twixar.me/hXNm>. Acesso em: 15 jul. 2021.

O inciso em questão consagra a proibição de trabalho noturno, perigoso ou


insalubre aos menores de 18 anos e de qualquer trabalho aos menores de 16 anos,
salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos. Deve ser ressaltado que, mesmo
havendo pagamento dos respectivos adicionais, fica vedado o trabalho do menor nessas
situações. Destaca-se ainda que aprendiz não é sinônimo de estagiário. O aprendiz é
tido como o jovem, que possui entre 14 e 24 anos, contratado por entes de cooperação
governamental (Sesc, Senai, Senar) para aprender alguma formação profissional
metódica do ofício ou da ocupação.

O inciso XXXIV do art. 7º da CF/88 determina a igualdade de direitos entre o


trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso, ou seja,
aquele trabalhador que presta serviços de natureza urbana ou rural a diversas empresas,
sem vínculo empregatício: “igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo
empregatício permanente e o trabalhador avulso” (BRASIL, 2016, on-line).

A igualdade prevista no inciso reafirma o caráter de igualdade e isonomia


pregados pega Carta Magna. O art. 7º da CF/88 apresenta vários direitos dos
trabalhadores. Mesmo assim, esse rol de direitos compreendidos entre os 34 incisos
do dispositivo constitucional possui natureza meramente exemplificativa, não
impedindo o reconhecimento de outros direitos aos trabalhadores.

Prosseguindo no estudo dos direitos sociais, tem-se o tratamento constitucional


acerca do direito sindical. Nos moldes do inciso I do art. 8º da CF/88, a associação
profissional ou sindical é livre, desde que sejam observados alguns pontos. Veja:

28
Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o
seguinte:
I- a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de
sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas
ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização
sindical (BRASIL, 2016, on-line).

Assim, a lei não possui o condão de exigir autorização do Estado para a fundação
de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ainda ao poder público
a interferência e a intervenção na organização sindical. O inciso VIII do art. 8º da CF/88
trata da estabilidade do dirigente sindical:

VIII- é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do


registro da candidatura a cargo de direção ou representação
sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final
do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei
(BRASIL, 2016, on-line).

Essa estabilidade não é absoluta. Em caso de falta grave, o empregado


sindicalizado pode sofre demissão. A estabilidade é apenas um mecanismo que protege
a própria categoria, permitindo que o seu dirigente atue sem medo de repressões ou de
ameaças de perder o seu sustento. O art. 9º da CF/88 irá prever o direito de greve dos
trabalhadores. Confira:

Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores


decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que
devam por meio dele defender.
§ 1º A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre
o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
§ 2º Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei
(BRASIL, 2016, on-line).

Dessa maneira, cabe aos trabalhadores, regidos pela Consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT), decidir sobre a oportunidade de exercer esse direito. Com relação
aos servidores públicos, por exemplo, os concursados, regidos por estatutos próprios,
a Constituição Federal dispõe no art. 37, VII (BRASIL, 2016), que haverá uma lei
específica para regulamentar o direito de greve. No tocante aos serviços essenciais,
como transporte público, serviços de fornecimento de água, serviços funerários, dentre
outros, o exercício do direito de greve é também assegurado, mas sofrerá restrições.

4 NACIONALIDADE
A nacionalidade diz respeito a um vínculo jurídico-político que faz com que
a pessoa se torne um dos elementos componentes da dimensão pessoal do Estado,
como, por exemplo, irá compor o conjunto de nacionais, sejam eles brasileiros natos
ou naturalizados. Portanto, a nacionalidade é um vínculo que une uma pessoa a um
determinado Estado. Por isso, que os brasileiros possuem um vínculo de nacionalidade
com a República Federativa do Brasil.

29
O direito internacional prevê duas formas de aquisição da nacionalidade:
a originária e a derivada. A nacionalidade originária também é chamada de primária,
de primeiro grau, ou nato. Por outro lado, a nacionalidade derivada também é chamada
secundária, de segundo grau, ou naturalizado.

A nacionalidade originária é conferida àqueles que preencham determinados


requisitos: 1) ligados ao sangue (jus sanguinis); ou 2) ao nascimento dentro do território
do país (jus solis). O primeiro critério, ius sanguinis, está relacionado na hereditariedade.
Trata-se, aqui, de filhos de pais brasileiros. O segundo critério, ius solis, trata-se de um
aspecto territorial e não se considera a nacionalidade dos pais. Para o critério do ius solis,
será considerado brasileiro nato todo aquele que nascer dentro dos limites territoriais da
República Federativa do Brasil.

O Brasil adotou como regra para definição da nacionalidade o critério ius solis,
permitindo a utilização do ius sanguinis em algumas hipóteses. O art. 12, I da CF/88
apresenta quem são os brasileiros natos. Veja:

Art. 12. São brasileiros:

I- natos:
a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais
estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país;
b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira,
desde que qualquer deles esteja a serviço da República
Federativa do Brasil;
c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira,
desde que sejam registrados em repartição brasileira competente
ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem,
em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela
nacionalidade brasileira (BRASIL, 2016, on-line).

Com base na alínea “a”, adota-se o critério do ius solis: nasceu no Brasil, será,
em princípio, brasileiro nato. No entanto, aquele que nascer em território brasileiro, for
filho de pais estrangeiros e ao menos um deles estiver a serviço de seu país de origem,
exemplo dos diplomatas, o critério de naturalidade nata não será aplicado.

Na alínea “b”, a Constituição adotou o critério ius sanguinis. Assim, nos casos
em que alguém nascer no exterior e algum dos pais estiver a serviço da República
Federativa do Brasil, será considerado brasileiro nato. Deve-se ter atenção que a
República Federativa do Brasil abrange todos os órgãos e todas as entidades da
Administração Pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal ou
dos municípios. Nesta senda, se nasceu no exterior e é filho de pai brasileiro que está
a serviço do município de Vitória/ES, por exemplo, esta criança será brasileira nata.
Portanto, o critério ius sanguinis se refere às relações sanguíneas ou familiares.

30
FIGURA 15 – BRASIL ADOTA CRITÉRIO IUS SOLIS PARA DEFINIR NACIONALIDADE

FONTE: <http://twixar.me/XjNm>. Acesso em: 15 jul. 2021.

No caso da alínea “c”, a Constituição adotou o critério ius sanguinis e aponta duas
hipóteses distintas de nacionalidade originária, ou seja, serão brasileiros natos, os nascidos
no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em
repartição brasileira competente, por exemplo, em repartição diplomática ou consular.
Também serão brasileiros natos, os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe
brasileira, desde que venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em
qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira.Após
o estudo dos casos de nacionalidade primária, deve-se analisar as situações em que
haverá nacionalidade secundária. A nacionalidade secundária é aquela adquirida pelo
estrangeiro que passa por um processo de naturalização.

A naturalização consiste no processo que permite ao estrangeiro adotar a


nacionalidade do país em que se encontra, desde que preenchidos os requisitos
constitucionais e legais. O art. 12, inciso II da CF/88, traz as hipóteses constitucionais
para adotar a nacionalidade brasileira. Veja:

II- naturalizados:
a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira,
exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas
residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral;
b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na
República Federativa do Brasil há mais de quinze anos
ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram
a nacionalidade brasileira (BRASIL, 2016, on-line).

A alínea “a” traz uma hipótese e os requisitos para adquirir a nacionalidade


brasileira. No entanto, o simples preenchimento ou satisfação dos requisitos trazidos
(um ano ininterrupto e idoneidade moral) não assegura ao estrangeiro originário de
países de língua portuguesa a nacionalidade brasileira. Isso porque, a concessão da
naturalização, como regra, é ato discricionário do presidente da República decorrente
da soberania estatal.

31
Na alínea “b”, a Constituição prevê uma hipótese de naturalização extraordinária,
que também é chamada de quinzenária. Destaca-se que nessa hipótese de naturalização,
não há discricionariedade do presidente da República. Com isso, o interessado possui
direito público subjetivo à nacionalidade brasileira, desde que requeira e preencha os
pressupostos constitucionais de residir por 15 anos ininterruptos no Brasil e não existir
condenação penal contra ele. A Constituição prevê expressamente que não poderá
haver distinção entre brasileiros natos e naturalizados. Destaca-se que apenas nos
casos apontados no art. 12, § 2º e § 3º, da CF/88 poderá haver a diferenciação. Confira:

§ 2º A lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e


naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituição.
§ 3º São privativos de brasileiro nato os cargos:
I- de Presidente e Vice-Presidente da República;
II- de Presidente da Câmara dos Deputados;
III- de Presidente do Senado Federal;
IV- de Ministro do Supremo Tribunal Federal;
V- da carreira diplomática;
VI- de oficial das Forças Armadas.
VII- de Ministro de Estado da Defesa (BRASIL, 2016, on-line).

Registra-se que os cargos privativos de brasileiros natos alcançam tanto os


titulares do cargo quanto os seus substitutos. E o motivo de ser assim diz respeito ao
fato de que o próprio presidente da República precisa ser brasileiro nato. Portanto, todos
aqueles que estiverem na linha sucessória do presidente da República também deverão
ser brasileiros natos. Nos casos da carreira diplomática, dos oficiais das Forças Armadas
e do ministro de Estado da Defesa, a ideia é proteger a segurança nacional. O art. 13 da
CF/88 destaca o idioma oficial e os símbolos do Brasil:

Art. 13. A língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa


do Brasil.
§ 1º São símbolos da República Federativa do Brasil a bandeira, o
hino, as armas e o selo nacionais.
§ 2º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão ter
símbolos próprios (BRASIL, 2016, on-line).

FIGURA 16 – BANDEIRA, HINO, ARMAS E SELO SÃO SÍMBOLOS DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

FONTE: <http://twixar.me/NjNm>. Acesso em 16 jul. 2021.

32
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os direitos e deveres individuais constam no art. 5º da Constituição Federal, o mais


extenso, com 78 incisos, que apontam temas de extrema relevância e, ao mesmo
tempo, complexos.

• Os direitos sociais têm um capítulo próprio na Constituição, que vai do art. 6º ao 11.
O art. 6º apresenta um rol desses direitos (educação, saúde, alimentação, trabalho,
moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e
à infância e assistência aos desamparados).

• A nacionalidade diz respeito a um vínculo jurídico-político, que faz com que a pessoa
se torne um dos elementos componentes da dimensão pessoal do Estado, como,
por exemplo, irá compor o conjunto de nacionais, sejam eles brasileiros natos ou
naturalizados. O direito internacional prevê duas formas de aquisição da nacionalidade:
a originária e a derivada.

33
AUTOATIVIDADE
1 O art. 5º da CF/88 determina que todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza. Acerca do princípio da Igualdade, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As cotas para negros em universidades públicas são consideradas exemplo de


igualdade material.
b) ( ) O princípio da igualdade comporta somente a igualdade material.
c) ( ) O princípio da igualdade não está expressamente previsto no texto constitucional.
d) ( ) O princípio da igualdade se desdobra em: imaterial e material.

2 O inciso II do art. 5º da Constituição Federal consagra expressamente o princípio da


legalidade. Com base nesse princípio, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A legalidade expressa na Constituição é dirigida a todos os administrados.


b) ( ) A legalidade disposta no dispositivo não é chamada de legalidade ampla.
c) ( ) O princípio da legalidade está implícito no texto constitucional.
d) ( ) A mesma legalidade aplicada aos particulares é aplicada à administração pública.

3 É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a


oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
Assinale a alternativa CORRETA no que diz respeito ao direito de greve:

a) ( ) Qualquer trabalhador ou servidor público pode exercer o direito de greve dado à


universalidade dos direitos sociais.
b) ( ) Não existirá abusos quanto ao exercício do direito de greve.
c) ( ) Os trabalhadores que prestam serviços essenciais não poderão exercer o direito
à greve.
d) ( ) Os trabalhadores que prestam serviços essenciais poderão exercer o direito de
greve, contudo, com algumas restrições.

4 A lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo
nos casos previstos na Constituição. Indique três casos.

5 O que significa que dizer que os direitos e garantias fundamentais, em regra, são
relativos e não absolutos?

34
UNIDADE 1 TÓPICO 3 —
ORGANIZAÇÃO DO ESTADO

1 INTRODUÇÃO
No Tópico 3, abordaremos o estudo da organização do Estado. Inicialmente,
serão trabalhados alguns conceitos importantes para a compreensão do tema. Depois,
enfrentaremos assuntos como a organização político-administrativa, a União, os
Estados, os municípios, o Distrito Federal e os Territórios.

Em sede inicial do estudo da organização do Estado, é imprescindível o


entendimento de três elementos acerca do tema, quais sejam: forma de Estado;
forma de governo; e sistema de governo.

A forma de Estado consiste na maneira pela qual o Estado organiza o povo e


o território e estrutura o seu poder relativamente a outros poderes de igual natureza.

Já a forma de governo diz respeito ao conjunto de instituições políticas por


meio das quais um Estado se organiza a fim de exercer o seu poder sobre a sociedade.

Por sua vez, o sistema de governo significa o modo pelo qual os poderes se
relacionam, especialmente o Poder Executivo e o Poder Legislativo.

O Brasil adota a federação como forma de Estado; a República como forma de


Governo; e o presidencialismo como Sistema de Governo.

2 ORGANIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA
A organização política-administrativa do Brasil possui tratativa constitucional
nos arts. 18 e 19. O art. 18 da CF/88 versa sobre a composição da República Federativa
do Brasil. “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil
compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos,
nos termos desta Constituição” (BRASIL, 2016, on-line).

Com base no art. 18, tem-se que a República Federativa do Brasil possui
soberania; enquanto os entes que a compõem (União, Estados, Distrito Federal e
municípios) gozam apenas de autonomia. A União, os Estados, o Distrito Federal e os
municípios contam com a tríplice autonomia: financeira, administrativa e política.
Por outro lado, os territórios federais, acaso sejam criados, pois, atualmente, não existe
nenhum, não serão dotados de autonomia. Ao contrário, eles pertencerão à União,
integrando a sua Administração indireta, na condição de autarquias.

35
Pelo fato de ter optado a forma federativa de Estado, a Constituição determina
que os entes da federação não poderão professar uma religião oficial, recusar fé aos
documentos públicos nem criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.
Confira:

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos


Municípios:
I- estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-
lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes
relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a
colaboração de interesse público;
II- recusar fé aos documentos públicos;
III- criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si (BRASIL,
2016, on-line).

FIGURA 17 – BRASIL ADOTA ESTADO LAICO

FONTE: <http://twixar.me/rjNm>. Acesso em 16 jul. 2021.

Com base no inciso I do art. 19 da CF/88 há, atualmente, uma separação entre
o Estado e a Igreja. Assim, a Constituição adotou o Estado laico não pregando uma
religião oficial brasileira. Um ponto importante no que diz respeito à laicidade do Estado,
diz respeito ao fato de que o ensino religioso é de oferecimento obrigatório na grade
escolar, mas matrícula é facultativa.

O ensino religioso poderá, desde que sempre de matrícula facultativa,


constituir disciplina dos horários normais das escolas públicas de
ensino fundamental (CF, art. 210, § 1º). Ressalte-se que essa previsão
constitucional deverá adequar-se às demais liberdades públicas,
dentre elas a liberdade de culto religioso e a previsão do Brasil
como um Estado laico. Dessa forma, destaca-se uma dupla garantia
constitucional. Primeiramente, não se poderá instituir nas escolas
públicas o ensino religioso de uma única religião, nem tampouco
pretender-se doutrinar os alunos a essa ou àquela fé. A norma
constitucional pretende, implicitamente, que o ensino religioso
deverá constituir-se de regras gerais sobre religião e princípios
básicos da fé. Em segundo lugar, a Constituição garante a liberdade
das pessoas em matricularem-se ou não, uma vez que, conforme já
salientado, a plena liberdade religiosa consiste também na liberdade
ao ateísmo (MORAES, 2020, p. 139).

36
Dessa maneira, em observância ao direito fundamental da escusa de consciência
e da liberdade de crença, o aluno não é obrigado a cursar a disciplina ensino religioso.

3 UNIÃO
O presidente da República assume, ao mesmo tempo, as funções de chefe do
Governo Federal e chefe de Estado. Com base nisso, a União possuirá dupla personalidade
jurídica, tendo em vista que assume um papel interno e outro internacional.

Quanto ao plano interno, podemos arguir que a União se caracteriza como


pessoa jurídica de direito público interno. Assim, compõe a República Federativa do
Brasil igualmente com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, com autonomia
financeira, administrativa e política. No âmbito internacional, a União representa a
República Federativa do Brasil perante as relações internacionais.

O art. 20 da CF/88 apresenta um rol exemplificativo dos bens pertencentes à


União. Nesse sentido, podem ser considerados bens da União, outros bens que não
estejam presentes nos incisos do art. 20. Eis o dispositivo em comento:

Art. 20. São bens da União:


I- os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser
atribuídos;
II- as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras,
das fortificações e construções militares, das vias federais de
comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei;
III- os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu
domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites
com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele
provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais;
IV- as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros
países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras,
excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios,
exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade
ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;
V- os recursos naturais da plataforma continental e da zona
econômica exclusiva;
VI- o mar territorial;
VII- os terrenos de marinha e seus acrescidos;
VIII- os potenciais de energia hidráulica;
IX- os recursos minerais, inclusive os do subsolo;
X- as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e
pré-históricos;
XI- as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios (BRASIL, 2016,
on-line).

O inciso II do art. 20 da CF/88 faz menção às chamadas terras devolutas.


Destaca-se que, em regra, as terras devolutas são de propriedade dos estados. Assim,
são consideradas com bens da União as terras devolutas que se encontrem em regiões
de fronteiras, ou seja, as terras indispensáveis para promover a defesa do território
nacional ou de outros interesses nacionais.

37
O inciso III do art. 20 da CF/88 especifica quais águas serão tidas como bens
da União. Sabe-se que os rios e lagos possuem grande capacidade de produção de
riquezas, dada sua capacidade de irrigação, pesca e outras maneiras de exploração.
Considerando essa fonte de rendimentos é normal que exista disputa entre os Estados
sobre a titularidade de lagos e rios. Com base nisso, serão bens da União a propriedade
dos cursos de água quando venham de outro país, sigam para outro país, ou que banhem
mais de um Estado da Federação, como ocorre por exemplo com o Rio São Francisco.

FIGURA 18 – RIO SÃO FRANCISCO ESTADOS ATINGE SEIS ESTADOS E DISTRITO FEDERAL

FONTE: <encurtador.com.br/eACQ3>. Acesso em: 20 jul. 2021.

O inciso VI do art. 20 da CF/88 aponta que as ilhas oceânicas e costeiras


pertencerão à União. Contudo, existem exceções. Com base na primeira exceção, esses
bens pertencerão ao município se funcionarem como sede de município.

FIGURA 19 – FERNANDO DE NORONHA PERTENCE AO ESTADO DE PERNAMBUCO

FONTE: <encurtador.com.br/jzRS7>. Acesso em 21 jul. 2021.

38
A outra ressalva diz respeito ao arquipélago de Fernando de Noronha, que
pertence ao Estado de Pernambuco por expressa previsão do art. 15 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, segundo o qual o ex-território federal foi
reincorporado ao Estado de Pernambuco (BRASIL, 2016).

Com relação ao inciso VII do art. 20 da Constituição, os terrenos de Marinha e


seus acrescidos ainda que situados em ilhas costeiras com sede em municípios serão
tidos como bens da União.

O inciso XI do art. 20 da CF/88 aponta que as terras tradicionalmente ocupadas


pelos índios são bens da União.

FIGURA 20 – TERRAS INDÍGENAS SÃO INALIENÁVEIS

FONTE: <encurtador.com.br/fhjG5>. Acesso em 21 jul. 2021.

O art. 231 da CF/88 aponta que as terras tradicionalmente ocupadas pelos


índios se destinam a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das
riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. Essas terras são inalienáveis e
indisponíveis, além do que os direitos sobre elas são imprescritíveis. Destaca-se que
os índios atuam como possuidores, podendo usufruir da terra, mas não possuem a
propriedade dessas áreas, as quais pertencem à União.

ATENÇÃO
Os bens da União arrolados no art. 20 da Constituição são
exemplificativos, o que significa dizer que é possível existir
outros bens da União que não estejam dispostos nos incisos
do art. 20 da Constituição.

39
4 ESTADOS FEDERADOS
Os Estados Federados possuem tratativa constitucional, especificamente, nos
arts. 25 a 28 da CF/88. Nos moldes do caput do art. 25, os Estados também terão suas
próprias Constituições. Cabe destacar que as Constituições dos Estados não poderão violar
ou contrariar quaisquer das disposições elencadas na Constituição Federal de 1988. Eis o
dispositivo analisado: “Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições
e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição” (BRASIL, 2016, on-line).

O art. 26 da CF/88 apresenta o rol de bens pertencentes aos Estados. Veja:

Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados:


I- as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em
depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes
de obras da União;
II- as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu
domínio, excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou
terceiros;
III- as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União;
IV- as terras devolutas não compreendidas entre as da União (BRASIL,
2016, on-line).

O inciso I do art. 26 da CF/88 apresenta que serão considerados como bens do


Estado o rio que banha apenas seu território e o rio que esteja em seus limites territoriais.
Essa situação é comum em estados como Tocantins e outros do Norte do País, que
contam com outras ilhas fluviais.

Conforme apresentado anteriormente, em regra, as terras devolutas


são consideradas bens pertencentes aos Estados. As terras devolutas, “aquelas
propriedades públicas não afetadas ao uso comum ou especial” (TAVARES, 2020, p.
724), são consideradas como bens da União serão aquelas que estiverem na região
de fronteira. Assim, a União ficaria apenas com as terras devolutas necessárias para
a defesa do território ou de quaisquer outros interesses nacionais.

O art. 27 da CF/88 versa sobre o número de deputados estaduais que irão


compor a Assembleia Legislativa dos Estados. Veja:

Art. 27. O número de Deputados à Assembleia Legislativa


corresponderá ao triplo da representação do Estado na Câmara dos
Deputados e, atingido o número de trinta e seis, será acrescido de
tantos quantos forem os Deputados Federais acima de doze (BRASIL,
2016, on-line).

Conforme disposição do artigo transcrito acima o número de deputados na


Assembleia Legislativa corresponde ao triplo da representação do Estado na Câmara
dos Deputados. Em outras palavras, se o Estado possuir oito parlamentares na Câmara
dos Deputados, terá 24 deputados estaduais. No entanto, essa regra só valerá até ser
atingido o quociente de 36 representantes. Assim, a partir daí serão acrescidos tantos
quantos forem os deputados federais acima de 12.

40
Com relação à competência dos Estados para legislar, além de participar da
competência comum, os estados também atuam na competência concorrente, ocasião
em que fica responsável pela elaboração de normas suplementares.

Nesse cenário, cabe à União elaborar a norma geral. No entanto, caso ela
permaneça omissa, os Estados e do Distrito Federal poderão editar tanto a norma
geral quanto a suplementar, situação em que terão a chamada competência legislativa
plena. Contudo, se posteriormente for editada a norma federal, aquela que fora feita
pelos estados e pelo Distrito Federal ficará com sua eficácia suspensa, na parte em que
contrariar a norma federal.

5 MUNICÍPIOS
As disposições constitucionais sobre os municípios estarão localizadas nos arts.
29 ao 31 da CF/88. O art. 29 da CF/88 fala que o Município será regido por lei orgânica
devendo ser votada e aprovada pela por membros da Câmara Municipal. Veja:

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos,
com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços
dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos
os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do
respectivo Estado e os seguintes preceitos [...] (BRASIL, 2016, on-line).

Deve-se entender por lei orgânica como um conjunto de normas que regulam
a vida pública do município. Frisa-se que a lei orgânica deve respeitar e seguir
estritamente os preceitos da Constituição do Estado e os preceitos da Constituição
Federal. Nesse sentido, as leis orgânicas serão o meio pelo qual o município irá reger e
assumir obrigações de interesse local em prol dos munícipes.

O inciso I do art. 29 refere-se às eleições para Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores:


“eleição do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Vereadores, para mandato de quatro anos,
mediante pleito direto e simultâneo realizado em todo o País” (BRASIL, 2016, on-line).

As eleições para vereadores estão ligadas ao sistema proporcional, assim como


acontece nas eleições para deputados. O sistema proporcional também é chamado
de voto proporcional e consiste em um sistema eleitoral de vencedor múltiplo, no
qual a proporção de cadeiras parlamentares ocupada por cada partido é diretamente
determinada pela proporção de votos obtida por ele.

Por outro lado, a eleição para prefeito e vice-prefeito segue o sistema majoritário,
como também acontece na escolha do presidente da República, dos governadores e
dos senadores. O sistema majoritário se divide em simples e complexo. Com relação ao
sistema simples, vencerá o candidato que obtiver mais votos, independentemente da
quantidade superior. Já o sistema complexo, vencerá o candidato que atingir maioria
absoluta dos votos válidos. Assim, caso isso não aconteça no primeiro turno, os dois
mais votados seguem para o segundo turno.

41
ATENÇÃO
A eleição para vereadores segue o sistema de votação proporcional,
o qual observará a proporção de cadeiras parlamentares ocupada
por cada partido é diretamente determinada pela proporção de
votos obtida por ele. Por outro lado, a eleição para prefeito e vice-
prefeito observará o sistema majoritário, sendo este subdividido em
simples e complexo.

O art. 30 da Constituição apresenta as Competências Legislativas dos Municípios.


Confira:

Art. 30. Compete aos Municípios:


I- legislar sobre assuntos de interesse local;
II- suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
III- instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como
aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar
contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;
IV- criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;
V- organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou
permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de
transporte coletivo, que tem caráter essencial;
VI- manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do
Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental;
VII- prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do
Estado, serviços de atendimento à saúde da população;
VIII- promover, no que couber, adequado ordenamento territorial,
mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da
ocupação do solo urbano;
IX- promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local,
observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual
(BRASIL, 2016, on-line).

O inciso I do art. 30 emprega uma liberdade para o município legislar sobre


assuntos de interesse local. Acontece que esse conceito de interesse local é muito
genérico, gerando dificuldades em especificar detalhadamente o seu conceito. No
entanto, a título de exemplo, é possível apresentar como interesse local questões
relacionadas à coleta de lixo e serviços funerários. Certo é que o município pode editar
legislação própria, com fundamento na autonomia constitucional que lhe é inerente.

42
6 DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS
As tratativas constitucionais acerca do Distrito Federal e dos Territórios estão
localizadas nos arts. 32 e 33 da CF/88. Com base no art. 32 da CF/88, assim como
acontece com os municípios, o Distrito Federal também é regido por lei orgânica. Além
do mais, a Constituição veda a divisão do Distrito Federal em municípios. Veja:

Art. 32. O Distrito Federal, vedada sua divisão em Municípios, reger-


se-á por lei orgânica, votada em dois turnos com interstício mínimo
de dez dias, e aprovada por dois terços da Câmara Legislativa, que a
promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição
(BRASIL, 2016, on-line).

Com o advento da Constituição de 1988, o Distrito Federal deixou de ser a capital


federal. Assim, o art. 18, § 2º, da CF/88, conferiu à Brasília a incumbência de capital do
Brasil. Destaca-se que, embora tenha sido criada na década de 60, Brasília somente se
tornou a capital do Brasil a partir da Constituição de 1988.

O art. 33 da CF/88 faz referências aos territórios. Atualmente, não existe


nenhum território no Brasil. Contudo, deve-se destacar a possibilidade de serem criados
por lei complementar federal. Uma vez criados, os territórios integrariam a União, ou
seja, pertenceriam à União.

Para ilustrar o entendimento sobre os territórios é possível destacar o exemplo


quando da promulgação da Constituição de 1988, momento em que havia três territórios
federais, quais sejam: Roraima, Amapá e Fernando de Noronha. Roraima e Amapá se
transformaram em Estados, por outro lado, Fernando de Noronha foi reincorporado a
Pernambuco.

Ao contrário do que ocorre com a União, Estados, Distrito Federal e municípios,


os territórios não possuem autonomia política, considerando que o seu governador será
nomeado pelo presidente da República, após aprovação do Senado Federal. Com base
nisso, não serão realizadas eleições diretas para a escolha do governador.

ATENÇÃO
Atualmente, não existem territórios no Brasil. Contudo, eles podem
ser criados por meio de Lei Complementar federal. Além disso,
os territórios não possuem autonomia política pelo fato de seu
governador ser indicado pelo Presidente da República.

43
LEITURA
COMPLEMENTAR
30 ANOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL: ENTRE PASSADO E FUTURO

Marcelo Casseb Continentino

A travessia que caracteriza a história constitucional brasileira pós-88, para alguns,


já seria coisa do passado, eis que após 2016, com o impeachment da presidente Dilma
Rousseff, a Constituição de 1988 teria perdido sua vigência. Para outros, a Constituição
sustenta-se ainda no presente, pois, embora tenha sido frontalmente vilipendiada e
permaneça vigorando, já teria chegado a hora de editar-se uma nova Constituição,
mediante a convocação de Assembleia Constituinte. Por fim, há aqueles que acreditam
ser necessário insistir em seu futuro, pois a Constituição de 1988 reflete uma conquista
democrática dos direitos fundamentais dos cidadãos à igual consideração e respeito.

A Constituição tem história. Não é uma simples palavra; nem a Constituição de


1988 uma simples lei.

No tempo, o conceito semântico de Constituição envolve a ideia mais elementar


de limitação do poder político. E o poder político seduz. Tende ao arbítrio, Montesquieu
já o disse ao referir-se à tentação antropológica do homem (“quem exerce o poder
tende a abusar do poder”). A Constituição foi a grande invenção dos modernos, dos
revolucionários apoiados na razão iluminista, para tentar conter os excessos do poder e,
ao mesmo tempo, legitimar seu exercício.

Não à toa a Declaração dos Direitos de 1789, em França, tem validade e integra
o “bloco de constitucionalidade” do direito francês.

Tão forte é a presença da Constituição na cultura jurídica ocidental, que hoje não
se reconhece governo legítimo que não conte com uma Lei Fundamental para regê-lo e
limitá-lo. Poderíamos assim dizer, na esteira do grande filósofo contemporâneo, Jürgen
Habermas, que não existe democracia sem Constituição.

A necessidade histórica de legitimar regimes políticos, bem ou mal, chegou


ao Brasil, sendo inclusive o então príncipe regente, Pedro de Alcântara, antes mesmo
de declarar a independência do Brasil, aconselhado a convocar uma Constituinte para
preservar a integridade política e territorial do Reino do Brasil.

44
A história seguiu, e sabemos o sucesso dos eventos. Independência, convocação
da Constituinte de 1823, dissolução da Constituinte e outorga da Constituição de
1824, que, após um período de intensa contestação (Frei Caneca e Pernambuco são
testemunhas) e instabilidade política, vigorou por décadas, pelo tempo da Monarquia.
Sobreveio para o povo a República, e, com ela em 1891, a nova Constituição, elaborada
por uma comissão de notáveis e declaradamente embebida em valores e conceitos
tão altamente anunciados à época, como progresso, desenvolvimento, civilização,
liberdade, cidadania etc.

A história também mostrou as fragilidades de que essa Constituição padeceu e,


de certa forma, como foi instrumentalizada pelas elites econômicas/políticas. A primeira
Constituição, destarte, republicana mostrou-se pouco republicana aos brasileiros, bem
servindo aos propósitos das elites econômicas e políticas do país.

Nova revolução se seguiu, a de 1930. O remédio tardio, vindo por pressão social
e política, foi a breve, mas promissora Constituição de 1934, que, antes de completar o
seu terceiro aniversário de vida, saiu de cena para dar lugar à Carta de 1937, escrita por
Francisco Campos, forjada à luz dos “novos tempos”, que demandavam um Estado forte
e eficiente. O Estado Novo, respaldado na “Constituição” de 1937, iniciou obscuro ciclo de
autoritarismo e centralização do poder político, cujo fim seria simbolicamente marcado
pela redemocratização com a Constituição de 1946.

Marcada por intensas convulsões sociais e econômicas, além de permanente


instabilidade política, com o suicídio de um presidente, deposições presidenciais
e mudanças de regime de governo (parlamentarismo e presidencialismo), a
redemocratização buscada pela Constituição de 1946, na prática, não teve vida longa.
A Constituição esteve a reboque dos ventos da política. Daí, Paulo Bonavides haver
acentuado que “as comoções políticas de raiz social fizeram-na desembocar, por obra
da corrupção do regime presidencial”.

Curvou-se a Constituição de 1946 à força do Ato Institucional 1, de 9 de abril de


1964, que cristalizou o golpe civil-militar, iniciando novo ciclo de autoritarismo político
no país.

Sob a justificativa de eliminar os dispositivos obsoletos, de amoldar as instituições


constitucionais aos fatores reais do poder e de consolidar a democracia, impôs-se
nova Constituição, cujo projeto foi submetido ao Congresso, que mal teve a chance de
apreciar e aprová-lo, dada a exiguidade do prazo (de 12 de dezembro a 24 de janeiro
de 1967) previsto no Ato Institucional 4, de 1966. A Constituição de 1967 revestiu-se
das características próprias do regime político autoritário subjacente, sendo suficiente
recordar a supressão do voto direto para eleição do presidente da república, que atingiu
um pilar fundamental da democracia. Pouco tempo depois, foi substancialmente
modificada pela Emenda Constitucional 1, de 1969, que manteve com mais rigor ainda o
estreitamento do exercício do poder político e dos direitos dos cidadãos.

45
1985 representa o marco histórico do início do regresso à democracia, cujos
primeiros passos para a “abertura lenta, gradual e segura” foram dados com o Presidente
Ernesto Geisel, embora retrocessos tenham dificultado a caminhada, a exemplo da
edição do “Pacote de Abril”. Assumindo a Presidência da República em 1979, o general
João Batista Figueiredo deu continuidade ao processo de distensionamento rumo à
democracia.

Mesmo com a derrota da emenda Dante Oliveira, em 1984, que buscava restaurar
integralmente o direito ao voto da população, realizaram-se eleições presidenciais.
Elegeu-se indiretamente o presidenciável Tancredo Neves, mas foi empossado José
Sarney.

A retomada da democracia constitucional, por sua vez, passava pela ruptura


político-jurídica com o regime autoritário iniciado em 1964 e com a vigente Constituição
de 1967/69, o que significava a adoção de uma nova Constituição, a ser elaborada por
uma Assembleia Nacional Constituinte, não obstante opiniões dissidentes. O percurso da
Constituinte estava trilhado: a questão não seria mais se deveria haver ou não haver a
convocação de Constituinte Nacional para nova Constituição, mas sim “como” convocá-
la, compô-la e organizá-la.

José Sarney honrou o compromisso firmado pelo presidente eleito, Tancredo


Neves. Pelo Decreto 91.450, de 18 de julho de 1985, instituiu a “Comissão Provisória
de Estudos Constitucionais” (conhecida como “Comissão Arinos”), presidida por Afonso
Arinos de Melo Franco e composta por intelectuais dos mais diversos campos (por
exemplo: o sociólogo Gilberto Freyre, o escritor Jorge Amado, o economista Celso
Furtado, o jurista Miguel Reale e os constitucionalistas Pinto Ferreira e Raul Machado
Horta), responsável pela elaboração de um Anteprojeto de Constituição, que serviria de
base para a Constituinte. Pelo encaminhamento da Proposta de Emenda à Constituição
(PEC) 43, de 1985, convertida na Emenda Constitucional 26, de 1985, convocou a
Assembleia Nacional Constituinte para reunir-se a partir de 1º de fevereiro de 1987. Em
15 de novembro de 1986, vieram as eleições para a Constituinte.

Finalizado o anteprojeto e formalmente encaminhado ao Presidente da


República em setembro de 1986, notória a insatisfação do governo com o teor da
proposta, em particular pela previsão do regime parlamentar e do (curto) prazo para
mandato presidencial de quatro anos. A Constituinte, por seu turno, iniciou seus
trabalhos “do zero”, adotando após intensa disputa interna uma metodologia de
trabalho descentralizada, com comissões e subcomissões temáticas responsáveis
pela elaboração dos títulos e capítulos da futura Constituição, além das propostas e
sugestões enviadas pela população em geral.

É de ressaltar-se, na Constituinte de 1987-88, a intensa participação do povo. A


sociedade civil teve presença efetiva. Mulheres, índios, trabalhadores, quilombolas, dentre
tantos outros grupos de interesses das mais diversas classes sociais acompanharam,

46
participaram, influenciaram e pressionaram os constituintes. O professor Gilmar Ferreira
Mendes costuma lembrar conversa do então constituinte, ex-senador Marco Maciel,
com taxista durante a fase final da Constituinte:

“Dizia o Senador Marco Maciel que, já no momento final do processo constituinte,


teve que sair do Congresso Nacional para ir até o Ministério da Justiça; e, diante do
retardo do seu motorista, tomou um táxi. E o taxista, então, procurou entabular com
ele uma conversa que envolvia uma análise do processo constituinte. E disse, então,
o taxista ao Senador:

— Senador, esta Constituição - cujo processo de deliberação já estava na sua


fase final -, está toda errada.

E o senador quis saber por quê. E o taxista disse algo mais ou menos assim:

— Esta Constituição está tratando de todo mundo, do índio, do garimpeiro e do


seringueiro, mas ainda não tratou do taxista”.

O sentimento de injustiça do taxista, em verdade, revela-nos um dos muitos


indícios existentes de como a participação da população na elaboração do texto
constitucional foi intensa e determinante para o resultado final do Texto da Constituição
de 1988, sendo lugar comum hoje dizer que a de 1988 foi a mais democrática das
Constituições promulgadas no Brasil. Afora o sofisticado sistema de garantias
constitucionais e o amplo leque de direitos fundamentais, que, como ela própria
reconhece em seu artigo 5º, § 2º, não esgota outros direitos implícitos no sistema
constitucional ou recepcionados por força de tratados internacionais.

Esse é um aprendizado histórico que tivemos e, talvez, somente 1988 tenha


podido nos ter legado: a democracia constitucional. Nossa jornada até a Constituição
de 1988 foi longa e tortuosa.

Não obstante, presidentes brasileiros, desde Fernando Henrique Cardoso


até o atual, defenderam seja a convocação de uma “mini Constituinte” para reforma
substancial da Constituição de 1988, seja a convocação de uma Assembleia Constituinte
originária para uma nova Constituição. Mesmo hoje, os atuais candidatos à Presidência
da República, embora tenham relativizado as propostas e/ou declarações, sustentaram a
convocação de Constituinte para nova Constituição.

Esse breve exercício histórico conduz-nos a um diagnóstico e uma conclusão.

Por sobre a superfície da aparente positividade dos textos legais ao longo da


nossa história, o Brasil foi marcado pela existência de diversas Constituições. Mas, nas
camadas subterrâneas, nas estruturas do pensamento e da ação política e jurídica,
parece haver uma história constitucional distinta. É que, em cada novo governo, a
cada ruptura política que se seguiu, conflagrou-se a luta em torno da apropriação e

47
da ressignificação semântica da Constituição em prol de projetos dos novos grupos
políticos hegemônicos nem sempre republicanos e democráticos, de modo que, até
hoje, a Constituição ainda não logrou verdadeiramente plena força normativa, o que
seria próprio de sua história semântica.

É como se houvesse algo de constitucional faltando em nossa experiência


jurídica. Mas, o que seria essa ausência? Qual a razão possível a explicar tantas
Constituições em curto espaço de tempo?

A nosso ver, tem a ver com a “ética constitucional”, isto é, com a nossa atitude
em torno da aplicabilidade da Constituição voltada à realização do interesse geral da
sociedade. Nos últimos 200 anos, as Constituições no Brasil foram surpreendidas com
tentativas de serem conformadas à força da política e das necessidades governamentais
do momento. Contudo, a Constituição deve precisamente ser o esteio normativo de
racionalidade a restringir a vontade política nas horas mais sensíveis e de maior
dificuldade, quando a “crise” quer forçar decisões extremadas.

A história da Constituição de 1988 mostrou-nos a travessia e superação de desafios


delicados, nem sempre devidamente neutralizados. O Supremo Tribunal Federal tem sua
parcela de responsabilidade nessa fragmentação da ética constitucional, já que, não raro,
tem ampliado a insegurança jurídica com decisões contraditórias e dissensos internos.

Celebrar os 30 anos da Constituição de 1988 importa, pois, defender um


percurso constitucional mais que secular, o qual nos trouxe até aqui. Mas, também, é
uma atitude voltada para o futuro.

Se a Constituição como norma jurídica nos possibilita um diálogo em cuja


dimensão temporal passado, presente e futuro perdem seus contornos, uma conclusão
é certa: o futuro da Constituição de 1988 depende visceralmente da consolidação de
uma ética constitucional, isto é, do firme compromisso de todos os atores políticos e dos
cidadãos com o cumprimento de suas regras e princípios em prol do interesse de toda a
sociedade. Do contrário, estaremos arriscados a sofrer o fracasso constitucional, tão bem
destacado por Nelson Saldanha quando denunciou a tentativa de abuso constitucional
pelo então imperador do Brasil, dom Pedro I: “aquele Guilherme de Orange às avessas
pretendia adequar a ele o nosso Bill”.

E, se assim for, isto é, se nossos governantes e agentes públicos insistirem


na ideia de moldar a Constituição a seus interesses governamentais, vinculando-se
apenas formalmente a seu texto, o futuro do Brasil certamente estará em xeque, como já
cantou o poeta ao perguntar-se “Que país é este?”: “Ninguém respeita a Constituição, mas
todos acreditam no futuro da nação”.

A democracia constitucional no Brasil, portanto, depende da longa vida da


Constituição de 1988.

FONTE: <https://bit.ly/3Loap3k>. Acesso em: 20 jul. 2021.

48
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• A organização político-administrativa do Brasil está prevista nos art. 18 e 19 da


Constituição Federal, e compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os
municípios.

• O presidente da República assume, ao mesmo tempo, as funções de chefe do


Governo Federal e chefe de Estado. Dessa forma, a União terá dupla personalidade
jurídica, tendo em vista que assume um papel interno e outro internacional.

• Os Estados estão contemplados dos arts. 25 a 28 da CF/88 e terão as suas próprias


constituições. Cabe destacar que estas não poderão violar ou contrariar quaisquer
das disposições elencadas na Constituição Federal de 1988. O art. 29 da CF/88 fala
que o município será regido por lei orgânica, devendo ser votada e aprovada por
membros da câmara municipal.

• O Distrito Federal e os Territórios estão localizadas nos arts. 32 e 33 da CF/88. O


Distrito Federal é regido por lei orgânica. Atualmente, não existe nenhum território no
Brasil. Mas se forem criados, pertencerão à União.

49
AUTOATIVIDADE
1 A organização política-administrativa do Brasil está prevista nos arts. 18 e 19 da
CF/88 e versa sobre a composição da República Federativa do Brasil. Com base no
exposto, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil é


formada pela União e pelos Estados.
b) ( ) A União possui supremacia sobre todos os demais entes da federação.
c) ( ) Todos os entes da federação (União, Estados, Distrito Federal e municípios) são
autônomos, nos termos da Constituição.
d) ( ) A União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios podem criar distinções
entre brasileiros ou preferências entre si.

2 Os territórios poderão ser divididos em municípios, conforme o artigo 33, § 1º, da


Constituição Federal. Sobre os territórios, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Atualmente, não existe territórios no Brasil.


b) ( ) Os territórios gozam de autonomia.
c) ( ) Os territórios pertencerão aos municípios quando localizados nos respectivos
limites.
d) ( ) Os territórios pertencem aos Estados.

3 Ao Distrito Federal são atribuídas as competências legislativas reservadas aos


Estados e municípios. Com base nas disposições constitucionais acerca do Distrito
Federal, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A capital do Brasil é o Distrito Federal.


b) ( ) O Distrito Federal não pode se dividir em municípios.
c) ( ) Nos moldes da Constituição, o Distrito Federal não é regido por lei orgânica.
d) ( ) O Distrito Federal é considerado um território.

4 O preâmbulo constitucional dispõe: Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos


em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado
a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança,
o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos
de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das
controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da
República Federativa do Brasil. Qual foi a intenção do poder constituinte brasileiro na
mensagem “sob a proteção de Deus” apresentada no preâmbulo constitucional (qual
o significado desta disposição)?

50
5 É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a
oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
De igual modo, a Constituição assegura que seja livre a manifestação do pensamento,
sendo vedado o anonimato. Qual a diferença entre o direito de greve e o direito de
manifestação?

51
REFERÊNCIAS
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de
1988. Brasília, DF: Presidência da República, 2016. Disponível em: http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm. Acesso em: 15 jul. 2021.

BRITTO, C. A. Teoria da constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

CAETANO, M. Direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987.

CANOTILHO, J. J. G. Direito constitucional. Coimbra: Almedina, 1993.

GARCIA PELAYO, M. Direito constitucional comparado. 3. ed. Madri: Revista do


Ocidente, 1989.

MENDES, G. F. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Saraiva Educação,
2020.

MIRANDA, J. Manual de direito constitucional. 4. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1990.

MORAES, A. Direito constitucional. 36. ed. São Paulo: Atlas, 2020.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADPF 153, voto do rel. min. Eros Grau, j. 29-4-2010, P,
DJE de 6-8-2010. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 15 jul. 2021.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Súmula Vinculante nº 11. Súmula da Jurisprudência


Predominante do Supremo Tribunal Federal – Anexo ao Regimento Interno. Edição:
Imprensa Nacional, 2021. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 15 jul. 2021.

TAVARES, A. R. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Saraiva


Educação, 2020.

52
UNIDADE 2 —

DIREITO PENAL E DIREITO


ADMINISTRATIVO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• identificar a aplicabilidade dos princípios do Direito Penal;

• conceituar crime;

• identificar quais são as penas previstas no Código Penal;

• identificar o bem jurídico protegido nos crimes contra a pessoa; contra o patrimônio
e; contra a dignidade sexual;

• identificar a aplicabilidade dos princípios da Administração Pública;

• caracterizar Administração Pública direta e indireta;

• conceituar Autarquia; Fundação; Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em cinco tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL

TÓPICO 2 – DIREITO PENAL PARTE GERAL

TÓPICO 3 – DIREITO PENAL PARTE ESPECIAL

TÓPICO 4 – PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

TÓPICO 5 – REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO E ORGANIZAÇÃO ADMINISTATIVA

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UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 1, abordaremos os princípios do Direito Penal. Aqui você
vai aprender a identificá-los e descobrir como aplicá-los em casos práticos. Os princípios
penais podem estar previstos na Constituição Federal de 1988, no Código Penal e no
ordenamento jurídico brasileiro de uma maneira geral.

Os princípios penais podem estar previstos de maneira expressa nos textos


legais, bem como podem aparecer de maneira implícita. Os princípios serão a base
para aplicação do Direito Penal e devem ser observados e seguidos, fielmente, pelos
legisladores, juízes, advogados ou por qualquer pessoa que atuar de alguma maneira
com o Direito Penal.

Portanto, os princípios constituem importantes mecanismos de defesa dos


indivíduos contra arbitrariedades ou abuso de poder, e estão intimamente ligados com
a dignidade da pessoa humana. A partir disso, devemos iniciar nossos estudos de Direito
Penal a partir dos princípios penais.

2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO PENAL


Os princípios de qualquer ramo do direito são tidos como uma base normativa
que ditam o caminhar de uma ciência. Assim, para ser considerada uma ciência
autônoma, toda disciplina deve possuir princípios aplicáveis a ela, bem como, deve
seguir um objeto próprio.

Com relação ao conceito de princípio, Nucci destaca o seguinte:

Etimologicamente, princípio tem vários significados, entre os quais


o de momento em que algo tem origem; causa primária, elemento
predominante na constituição de um corpo orgânico; preceito, regra
ou lei; fonte ou causa de uma ação. No sentido jurídico, não se poderia
fugir de tais noções, de modo que o conceito de princípio indica uma
ordenação, que se irradia e imanta os sistemas de normas, servindo
de base para a interpretação, integração, conhecimento e aplicação
do direito positivo (NUCCI, 2019, s.p.).

55
Ressalta-se que existem princípios previstos em lei de maneira explícita, assim
como existem princípios implícitos no sistema jurídico. Certo é que, conforme ensina
Nucci (2019), os princípios servirão como orientações para a criação de leis, atuando
como garantias diretas e imediatas aos indivíduos, bem como funcionando como
critérios de interpretação, integração e aplicação do sistema jurídico.

Os princípios constitucionais do Direito Penal são aqueles que estão dispostos


no texto da Constituição Federal de 1988. Com base nisso, serão apresentados a seguir,
sete princípios constitucionais do Direito Penal, os quais são considerados como
aqueles mais relevantes para o estudo da disciplina. Ressalta-se desde já que existem
outros princípios constitucionais penais que não serão abarcados neste estudo. Assim,
os princípios apresentados serão os seguintes: princípio da legalidade; princípio da
irretroatividade; princípio da intranscendência; princípio da individualização da pena;
princípio do devido processo constitucional; princípio do contraditório e ampla defesa;
e princípio do estado de inocência.

O princípio da legalidade e o princípio da anterioridade estão previstos no art. 5º,


XXXIX da CF/88 e no art. 1ª do Código Penal. Eis o teor dos dispositivos citados:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XXXIX- não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem
prévia cominação legal (BRASIL, 1988, on-line).

Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem
prévia cominação legal (BRASIL, 1988, on-line).

Segundo o princípio da legalidade, somente lei em sentido estrito pode


criar crime e cominar pena. Já o princípio da anterioridade aduz que a lei criadora do
crime tem que estar em vigor antes do cometimento da conduta prevista como crime.
Com base nisso, medidas provisórias, decretos, tratados internacionais ou qualquer
outra espécie normativa que seja diferente de lei, não possui o condão de criar crime e
cominar penas.

Destaca-se que o princípio da Irretroatividade também está previsto no inc.


LX do art. 5º da Constituição: “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.
Nos termos do inc. XL do art. 5º da CF/88, a lei penal não retroagirá, ou seja, não será
aplicada a fatos passados. Contudo, essa regra pode ser descartada quando a lei penal
beneficiar o réu.

56
O inc. XLV do art. 5º da CF/88 destaca o princípio da intranscendência ou
responsabilidade pessoal do condenado.

XLV- nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a


obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de
bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra
eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido
(BRASIL, 1988, on-line).

Com base na intranscendência, qualquer que seja a pena aplicada, ela estará
restrita à liberdade, ao patrimônio e à pessoa do agente condenado. Acontece que
temos uma exceção a essa regra. Com isso, há a possibilidade de usar o patrimônio
transferido em herança para quitar obrigação de decretação de perdimento de bens e
de reparação de dano provocado pelo de cujos. A razão da norma consiste em descontar
os valores do patrimônio do falecido, de modo que os herdeiros não sejam obrigados por
indenizações e penas além do que for efetivamente transferido.

O inc. XLVI do art. 5º da CF/88 regula o princípio da individualização da pena.


Confira:

XLVI- a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras,


as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos (BRASIL, 1988, on-line).

Nos moldes do princípio da individualização, as penas devem ser proporcionais


à conduta e à pessoa de cada agente, ou seja, cada indivíduo terá a sua própria pena,
ainda que tenham cometido o mesmo crime juntos. Dessa maneira, Nucci (2019) ensina
que não há que se falar em aplicação de penas genéricas, cabendo ao juiz o dever de
observar todos os critérios para fixar de maneira individualizada as penas.

O inc. LIV do art. 5º da CF/88 preconiza o princípio do devido processo


constitucional. O processo possui a função de estabelecer as balizas e direções do
exercício do poder estatal. Ao exercer sua função, o poder exercido pelo Estado será
legítimo. Veja o que diz o dispositivo: “ninguém será privado da liberdade ou de seus
bens sem o devido processo legal” (BRASIL, 1988, on-line).

O princípio do devido processo constitucional é um princípio macro de qualquer


processo, seja ele civil, penal ou administrativo. Todos os demais princípios integram
o devido processo constitucional. Nesse sentido, se o processo seguir fielmente todas
as garantias constitucionais, o poder estatal de privar a liberdade do condenado será
legítimo.

57
FIGURA 1 – APLICAÇÃO DA LEI CONFORME O DEVIDO PROCESSO LEGAL

FONTE: <encurtador.com.br/rDTV4>. Acesso em: 22 jul. 2021.

O inc. LV do art. 5º da CF/88 aponta dois princípios, sendo eles: contraditório


e ampla defesa. Apesar de estarem intimamente ligados, um não se confunde com o
outro. Observe o dispositivo: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e
aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios
e recursos a ela inerentes” (BRASIL, 1988, on-line).

O contraditório consiste, basicamente, na oportunidade que o acusado


possui de se manifestar diante das acusações levantadas em seu desfavor, ou seja,
corresponde na possibilidade de respostas às acusações. Por outro lado, a ampla
defesa consiste em uma ferramenta usada pelo acusado, se valendo do uso de todos
os meios juridicamente lícitos e aceitos para demonstrar a sua inocência ou diminuir a
sua culpabilidade.

O inc. LVII do art. 5º da CF/88 traz o princípio do estado de inocência, também


chamado de presunção de não culpabilidade ou presunção de inocência, “ninguém
será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”
(BRASIL, 1988, on-line).

Nucci (2019) aponta que, com base nesse princípio, existe a discussão acerca
da execução provisória da pena, isto é, execução da pena antes do trânsito em julgado.
Com base nas interpretações dessa norma constitucional, uma corrente defende a tese
de que o agente condenado em 1ª Instância poderia iniciar o cumprimento provisório da
pena. Acontece que, a corrente contrária a esse entendimento aponta que a execução
provisória da pena viola frontalmente o princípio do estado de inocência.
Assim, com base nessas discussões, o STF entende que não é cabível a execução
provisória da pena.

58
3 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA
O princípio da intervenção mínima também é chamado de última ratio. Com
base na intervenção mínima, o direito penal somente deve intervir quando os demais
instrumentos de controle social (não jurídicos ou jurídicos) não são capazes de proteger,
de maneira eficiente, os bens jurídicos mais importantes. Portanto, o direito penal deve
atuar como um soldado de reserva.

Com base nisso, a atuação do direito penal deve ser mínima, pois se trata de um
ramo do direito extremamente seletivo, violento e estigmatizante. Assim, intervenção
mínima é um principio constitucional implícito, no qual o Estado jura consagrar deter-
minados direitos fundamentais e intervir coercitivamente na vida dos seus cidadãos,
apenas na medida em que esses direitos consagrados e resguardados são violados.

Nos moldes da intervenção mínima, tem-se dois subprincípios: da fragmenta-


riendade e da subsidiariedade. Com isso, esses subprincípios são desdobramentos
lógicos do princípio da intervenção mínima e serão estudados a seguir.

4 PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIEDADE
O princípio da fragmentariedade aponta que o direito penal não tutela todos
os bens jurídicos existentes na seara jurídica, ou seja, o direito penal deve proteger
apenas os bens jurídicos mais importantes contra as ofensas intoleráveis.
Portanto, a atuação do direito penal é fragmentária. Esse princípio é destinado ao
legislador que deve analisar e escolher as condutas consideradas intoleráveis e tipificá-
las como o crime. Com o passar do tempo, caso essas se tornem socialmente aceitáveis,
poderão ser descriminalizadas. Um exemplo de conduta que se tornou socialmente
aceita e deixou de ser alvo do direito penal é a bigamia.

FIGURA 2 – BIGAMIA COMO ATO DESCRIMINALIZADO

FONTE: <encurtador.com.br/acjkA>. Acesso em: 21 jul. 2021.

59
5 PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE
Segundo Nucci, “o princípio da subsidiariedade consiste no fato de que o direito
penal somente deve atuar caso os demais ramos do direito fracassarem na proteção
do bem jurídico” (NUCCI, 2019, s.p.). Com isso, o direito penal figura como a última ratio
atuando de maneira fragmentária, em último caso.

6 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
O princípio da insignificância também é chamado de princípio da bagatela. Esse
princípio é corolário do princípio da fragmentariedade e significa que as lesões ínfimas ao
bem jurídico protegido não preenchem a dimensão material da tipicidade penal.

FIGURA 3 – MÍNIMA OFENSIVIDADE

FONTE: <encurtador.com.br/otGLQ>. Acesso em: 20 jul. 2021.

Pelo fato de não preencher a dimensão material da tipicidade penal não haverá
crime. Portanto, o princípio da insignificância ou bagatela incide na dimensão
material da tipicidade penal.

O STF no julgamento dos Habeas Corpus nº 123108, 123533 e 123734, estabeleceu


alguns parâmetros para a incidência do princípio da insignificância:

a) mínima ofensividade da conduta;


b) nenhuma periculosidade social da conduta;
c) reduzido grau de reprovabilidade da conduta;
d) mínima ou ínfima lesão ao bem jurídico protegido.

Com base nisso, havendo a falta de qualquer dos parâmetros listados acima,
não poderá se falar em aplicação do princípio da insignificância. Além do mais, nos
termos das súmulas nº 599 e 589 do STJ, o princípio da insignificância é inaplicável
nos crimes praticados contra a Administração Pública e nos crimes praticados
contra a mulher no contexto de violência doméstica e familiar. Veja a seguir.

60
Súmula 599 do STJ - O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes
contra a Administração Pública.

Súmula 589 do STJ - É inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou


contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas.

7 PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE OU LESIVIDADE


Com base no princípio da ofensividade ou lesividade, somente poderá ser
considerado crime as condutas que ostentarem, no mínimo, alguma potencialidade de
lesionar o bem jurídico objeto de proteção do tipo penal incriminador.

Existe uma discursão doutrinária em torno do princípio da ofensividade ou


lesividade no que diz respeito à constitucionalidade dos crimes de perigo abstrato.
Isso porque, apesar de ser contrário a esse entendimento, Nucci ensina que o “crime de
perigo abstrato não exige dano ao bem jurídico protegido para que a sua consumação
ocorra” (NUCCI, 2019, s.p.). Assim, para a consumação do crime de perigo abstrato, basta
que tenha havido uma exposição de perigo ao bem jurídico tutelado pelo Direito Penal.

Nucci (2019) aponta que o crime de perigo abstrato seria inconstitucional por
violar o princípio da lesividade ou ofensividade, tendo em vista que ainda não houve
uma efetiva lesão ao bem jurídico. Contudo, o poder judiciário em geral, entende que os
crimes de perigo abstrato são constitucionais. A título ilustrativo, é possível apontar o
tráfico de drogas como exemplo de crime de perigo abstrato.

FIGURA 4 – TRÁFICO DE DROGAS

FONTE: <encurtador.com.br/ax128>. Acesso em: 22 jul. 2021.

Após apresentar o conceito de crime de perigo abstrato, faz-se necessário


apresentar o conceito de crime de perigo concreto. Nesse sentido, Nucci aponta que “os
crimes de perigo concreto são aqueles que exigem que o bem jurídico protegido seja,
efetivamente ou concretamente, ameaçado o colocado em perigo, ou seja, exposto a
risco de lesão” (NUCCI, 2019, s.p.).

61
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os princípios penais são a base do sistema normativo penal, sendo imprescindíveis


para assegurarem a manutenção dos direitos fundamentais previstos na Constituição.

• Existem princípios penais previstos expressamente na Constituição Federal de 1988,


bem como princípios que são extraídos da interpretação da Carta Magna.

• Antes de aplicar os princípios penais nos casos abarcados pela tutela penal, é
necessário conceituá-los e compreendê-los.

62
AUTOATIVIDADE
1 Os princípios constitucionais do Direito Penal são aqueles que estão dispostos de
maneira expressa no texto da Constituição Federal de 1988. Segundo o princípio da
legalidade, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Decreto presidencial pode criar crime, mas não pode cominar pena.
b) ( ) Lei em sentido amplo pode cominar pena.
c) ( ) A lei que criar o crime não precisa estar em vigor antes do cometimento do fato
para penalizar o agente.
d) ( ) Somente lei em sentido estrito pode criar crime e cominar pena.

2 Com base no princípio da ofensividade ou lesividade, somente poderá ser considerado


crime as condutas que ostentarem, no mínimo, alguma potencialidade de lesionar
o bem jurídico objeto de proteção do tipo penal incriminador. Com base nessas
informações, analise as afirmativas a seguir:

I- Os crimes de perigo abstrato são constitucionais.


II- O tráfico de drogas é um exemplo de crime de perigo abstrato, mesmo não havendo
ainda uma lesão concreta a um bem jurídico de alguma pessoa.
III- Não existe crime de perigo abstrato no Brasil por não preencher os requisitos do
princípio da ofensividade.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As afirmativas I e III estão corretas.
b) ( ) As afirmativas I e II estão corretas.
c) ( ) Somente a afirmativa II está correta.
d) ( ) Somente a afirmativa I está correta.

3 A Constituição Federal de 1988 prevê, de maneira expressa em seu texto, alguns


princípios penais, como ocorre no caso do princípio da irretroatividade da lei penal,
disposto no art. 5º, XL, CF/88. Com base na irretroatividade da lei penal, analise as
afirmativas a seguir:

I- O Código Penal prevê hipóteses em que uma lei seja aplicada a fatos ocorridos fora
do âmbito de sua vigência.
II- A lei penal maléfica pode retroagir para prejudicar o acusado.
III- Caso uma lei posterior deixe de considerar determinada conduta criminosa, haverá
a cessação da execução e dos efeitos penais da sentença penal condenatória.

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Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Somente a afirmativa I está correta.
b) ( ) As afirmativas II e III estão corretas.
c) ( ) As afirmativas I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a afirmativa II está correta.

4 Os princípios de qualquer ramo do direito são tidos como uma base normativa que
ditam o caminhar de uma ciência, servindo como meio de interpretação e integração
do sistema jurídico. Com base no estudo dos princípios do direito penal, aponte quais
são as semelhanças e quais são as diferenças dos princípios da fragmentariedade e
da subsidiariedade.

5 O Direito Penal é um ramo autônomo do direito e, a partir do estudo dos princípios


penais, podemos perceber que ele possui características próprias que o tornam ainda
mais peculiar. Considerando isso, disserte sobre os motivos pelos quais o Direito
Penal é considerado como sendo a última ratio.

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UNIDADE 2 TÓPICO 2 —
DIREITO PENAL – PARTE GERAL

1 INTRODUÇÃO
O Código Penal brasileiro é dividido em duas partes, quais sejam: Parte Geral e
Parte Especial.

A parte geral do CP está disciplinada entre os arts. 1º ao 120 e possui a tarefa de


definir os critérios a partir dos quais o Direito Penal será aplicado, ou seja, diz quando o
crime existe, como e quando aplicar a pena, dentre outros aspectos gerais.

Por outro lado, a parte especial está disciplinada entre os arts. 121 ao 361, tendo
como parâmetro a previsão dos crimes em espécie e as penas correspondentes.

2 APLICAÇÃO DA LEI PENAL


Segundo Nucci (2019), a regra geral no âmbito das relações jurídicas é a
aplicação da lei vigente à época dos fatos. No campo penal, não ocorre de maneira
diversa. Assim será aplicado ao crime cometido em determinada data, a lei penal vigente
exatamente no mesmo dia, ainda que, posteriormente, venha a ser proferida a sentença
penal condenatória.

Entretanto, existem exceções a essa regra geral. Com isso, há possibilidades


de que uma lei seja aplicada a fatos ocorridos fora do âmbito de sua vigência. Para
isso, tem-se o fenômeno da extratividade, que será promovido de duas maneiras:
retroatividade e ultratividade.

A retroatividade está disposta no art. 2º, parágrafo único do CP, e consiste na


aplicação da lei penal mais benéfica a fato acontecido antes do período da sua vigência.
Veja o dispositivo mencionado:

Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de
considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos
penais da sentença condenatória.
Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer
o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por
sentença condenatória transitada em julgado (BRASIL, 1940, s.p.).

65
A ultratividade está elencada no art. 3º do CP e é um fenômeno pelo qual
a lei vigente à época da prática do fato, ainda que revogada, será aplicada. Portanto,
no momento de prolatar a sentença, o juiz aplicará a lei que estava vigente à época
da prática dos fatos e que no momento do julgamento já havia sido revogada. “A lei
excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as
circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência”
(BRASIL, 1940, s.p.).

O art. 4º do CP (BRASIL, 1940) disciplina o tempo do crime, ou seja, define


o momento da ocorrência do crime, quando efetivamente o crime é considerado
praticado. Sobre o tema, o Código Penal adotou a teoria da atividade ou ação. Assim,
o crime será considerado praticado no momento em que houve a ação ou a omissão,
independentemente do momento em que ocorreu o resultado.

O art. 6º do CP disciplina o lugar do crime, define o lugar em que o crime será


considerado praticado. “Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação
ou omissão, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado” (BRASIL,
1940, s.p.). Assim, CP adotou tanto a teoria da atividade ou ação quanto a teoria
do resultado. Portanto, no tocante ao lugar do crime, o art. 6º do CP adotou a teoria
mista, também chamada de ubiquidade.

No que diz respeito à aplicação da lei penal no espaço, o art. 5º do CP apresenta


o princípio da territorialidade. Nos moldes desse dispositivo, a lei penal brasileira
será aplicada nos crimes cometidos no Brasil, observando ainda as convenções,
tratados e regras de direito internacional. O §1º do art. 5º do CP aponta a chamada
extensão ficta do território brasileiro. Assim, nos moldes do dispositivo em tela,
é possível que um navio que esteja fora do Brasil seja considerado como território
nacional. Especificamente, as embarcações e aeronaves brasileiras, sejam elas públicas
ou privadas, serão consideradas como extensão do território brasileiro, onde quer que
se encontrem, desde que estejam a serviço do governo nacional.

Além disso, o §2º do art. 5º determina que será aplicada a lei penal brasileira
contra os crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de
propriedade privada, desde que estejam em território brasileiro e não estejam a serviço
do governo de seu país.

Com base no princípio da territorialidade, a lei penal brasileira será aplicada


às infrações penais cometidas no território brasileiro. Os parágrafos do art. 5º do CP
conceituam, de modo ficto, o território brasileiro para fins penais.

A lei penal brasileira poderá gozar de extraterritorialidade. A extraterritorialidade


significa a aplicação da lei penal brasileira cometida fora do território brasileiro.
A extraterritorialidade da lei penal está disposta no art. 7º do CP. Nos moldes desse
dispositivo, a extraterritorialidade poderá ser incondicionada ou condicionada.

66
Nesse sentido, a extraterritorialidade incondicionada aponta que ficarão
sujeitos à lei penal brasileira, mesmo que sejam cometidos no estrangeiro, os crimes
que atentem contra a vida ou a liberdade do presidente da República. Frisa-se que aqui,
o Código Penal visou proteger a autoridade máxima da República Federativa do Brasil.

Também será caso de extraterritorialidade incondicionada os crimes praticados


contra o patrimônio ou a fé pública da Administração Direta ou da Administração Indireta.
Além disso, os crimes cometidos contra a Administração Pública, por quem está a seu
serviço, também se amoldam na hipótese incondicionada.

A última hipótese de extraterritorialidade incondicionada prevista no Código


Penal é o crime de genocídio. Nesse caso, teremos o requisito de que o autor do crime
deverá ser brasileiro ou domiciliado no Brasil. Assim, com base na extraterritorialidade
incondicionada, o autor do delito será punido nos moldes da lei brasileira, ainda que seja
absolvido ou condenado no estrangeiro.

O inc. II do art. 7º do CP traz as hipóteses de extraterritorialidade condicionada,


ou seja, os casos em que a lei penal brasileira será aplicada, desde que preenchidas as
condições previstas no §2º do art. 7º do CP. Com base nisso, os crimes que o Brasil se
obrigou a reprimir por tratado ou convenção; os cometidos por brasileiros; os praticados
em embarcações ou aeronaves de propriedade privada, em solo estrangeiro, e não
forem julgadas no estrangeiro, serão casos de extraterritorialidade condicionada. Como
dito anteriormente, o § 2º do art. 7º do CP apresenta quais são as hipóteses que devem
ser preenchidas, cabendo destacar que essas hipóteses são cumulativas. Veja:

§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do


concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira
autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí
cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo,
não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável
(BRASIL, 1940, s.p.).

O inciso I, do art. 7º, do CP (BRASIL, 1940, s.p.) prevê as hipóteses de


extraterritorialidade incondicionada. Já o inc. II do mesmo art. 7º prevê as hipóteses de
extraterritorialidade condicionada. Por sua vez, os §§ 2º e 3º destacam as condições
para que ocorra a extraterritorialidade condicionada.

O § 3º, do art. 7º, prevê uma hipótese específica de extraterritorialidade


condicionada. Haverá extraterritorialidade condicionada quando o crime for praticado
fora do Brasil contra brasileiro.

67
ATENÇÃO
Na hipótese de extraterritorialidade condicionada, prevista no §3º do
art. 7º do CP, além das condições previstas no §2º do mesmo art. 7º,
o crime deve ter sido cometido por estrangeiro contra brasileiro, não
poderá ter sido pedida a extradição ou esta deve ter sido negada. Além
disso, deve haver requisição do ministro da Justiça.

3 CRIME
Para iniciar o estudo deste tópico, faz-se necessário apresentar os conceitos
de crime, os quais serão desdobrados em conceito material, formal e analítico. Segundo
Nucci, o conceito material de crime:

É a concepção da sociedade sobre o que pode e deve ser proibido, mediante


a aplicação de sanção penal. É, pois, a conduta que ofende um bem juridicamente
tutelado, merecedora de pena. Esse conceito é aberto e informa o legislador sobre as
condutas que merecem ser transformadas em tipos penais incriminadores (NUCCI,
2019, s.p.).

Segundo o autor, o conceito formal de crime:

É a concepção do direito acerca do delito, constituindo a conduta


proibida por lei, sob ameaça de aplicação de pena, numa visão
legislativa do fenômeno. Cuida-se, na realidade, de fruto do conceito
material, devidamente formalizado. Quando a sociedade entende
necessário criminalizar determinada conduta, através dos meios
naturais de pressão, leva sua demanda ao Legislativo, que, aprovando
uma lei, materializa o tipo penal (NUCCI, 2019, s.p.).

Já o conceito analítico, conforme Nucci (2019, s.p.),

É a concepção da ciência do direito, que não difere, na essência,


do conceito formal. Na realidade, é o conceito formal fragmentado
em elementos que propiciam o melhor entendimento da sua
abrangência. Trata-se de uma conduta típica, antijurídica e culpável,
vale dizer, uma ação ou omissão ajustada a um modelo legal de
conduta proibida (tipicidade), contrária ao direito (antijuridicidade)
e sujeita a um juízo de reprovação social incidente sobre o fato e
seu autor, desde que existam imputabilidade, consciência potencial
de ilicitude e exigibilidade e possibilidade de agir conforme o direito.
Justamente quanto ao conceito analítico é que se podem encontrar
as maiores divergências doutrinárias.

Prosseguindo no estudo do crime, Nucci aponta que “faz-se necessário levantar


a distinção entre crime e contravenção penal. O direito penal estabeleceu diferença
entre crime e contravenção penal. Ressalta-se que ambos são espécies de infração

68
penal” (NUCCI, 2019, s.p.). De maneira bem superficial, é possível entender que os
crimes são considerados infrações penais mais graves, enquanto que as contravenções
são consideradas infrações penais mais leves. Nucci afirma que tanto é assim que “os
crimes sujeitam seus autores às penas de reclusão ou detenção. Por outro lado, as
contravenções, no máximo, implicam em prisão simples” (NUCCI, 2019, s.p.).

Sobre os sujeitos do crime, cabe apontar aquele que figura no polo ativo e aquele
que figura no polo passivo. Com base nisso, para Nucci (2019), o sujeito ativo do crime
é a pessoa que pratica a conduta descrita pelo tipo penal. Com base nisso, animais,
objetos ou coisas não podem ser sujeitos ativos de crimes, nem autores de ações, pois
lhes falta o elemento vontade. Já o sujeito passivo é o titular do bem jurídico protegido
pelo tipo penal incriminador, que foi violado.

O art. 13 do CP prevê o chamado nexo de causalidade, ou seja, o vínculo entre


a conduta do agente e o resultado gerado por meio da sua ação ou omissão. É o liame
entre a conduta e o resultado, que faz nascer o fato típico. Assim, a causa será toda ação
ou omissão que é indispensável para a configuração do resultado concreto, por menor
que seja o seu grau de contribuição. Veja o teor do dispositivo citado: “O resultado, de que
depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se
causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido” (BRASIL, 1940, s.p.).

O art. 14 do CP apresenta os crimes consumados e os crimes tentados. Veja:

Art. 14 - Diz-se o crime:


I- consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua
definição legal;
II- tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente.
Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa
com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um
a dois terços. (BRASIL, 1940, s.p.).

O crime será considerado consumado quando todas as elementares típicas


que integrem a definição legal de crime estiverem presentes. Para que o crime se
consume, o agente deverá percorrer todos os caminhos do chamado iter criminis
que é composto pela: a) cogitação; b) preparação; c) execução; e d) consumação. Já
o crime tentado é aquele em que a execução é iniciada, mas, de alguma maneira, o
crime não chega ao resultado final, ou seja, à consumação por circunstâncias alheias
à vontade do agente. Na tentativa, pune-se o agente com a pena correspondente ao
crime consumado, porém, haverá uma diminuição de 1/3 a 2/3. O vetor hermenêutico
que irá orientar o juiz na diminuição da pena será a proximidade que o crime esteve de
se consumar. Com base nisso, quanto mais distante estiver a consumação do crime,
maior será a diminuição.

69
O art. 18 do CP apresenta quais crimes serão dolosos e quais crimes serão
culposos. Veja:

Art. 18 - Diz-se o crime:


I- doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de
produzi-lo;
II- culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência,
negligência ou imperícia (BRASIL, 1940, s.p.).

Existem inúmeras divisões, classificações e conceituações de dolo. O crime


doloso, basicamente, consiste naquele em que o agente detém a vontade específica
de praticar a ação ou omissão, ou seja, ele possui a intenção de cometer o crime e
atingir os resultados. No tocante à culpa, o agente não pretende alcançar o resultado
lesivo. Assim, conforme conceito apresentado por Nucci (2019, s.p.), a culpa representa
“o comportamento voluntário e desatencioso do agente, voltado a um determinado
objetivo, lícito ou ilícito, embora produza resultado ilícito, não era desejado”. Ressalta-se
que, para se punir alguém por delito culposo, é indispensável que a culpa venha
expressamente prevista no tipo penal.

O art. 23 do CP apresenta o rol de excludentes de ilicitude. Confira.

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:


I- em estado de necessidade;
II- em legítima defesa;
III- em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de
direito.
Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo,
responderá pelo excesso doloso ou culposo (BRASIL, 1940, s.p.).

Nesse sentido, caso esteja presente uma das causas relacionadas no art. 23 do
Código Penal, está-se afastando um dos elementos do crime, que é a contrariedade da
conduta ao direito, ou seja, a ilicitude. Assim, não haverá crime algum, pois a excludente
de ilicitude torna lícito o que era ilícito.

Entende-se por estado de necessidade o sacrifício de um interesse


juridicamente protegido, para salvar de perigo atual e inevitável o direito do próprio
agente ou de terceiro, desde que outra conduta, nas circunstâncias concretas, não
fosse razoavelmente exigível.

No tocante à legítima defesa, Nucci ensina como sendo “a defesa necessária


empreendida contra agressão injusta, atual ou iminente, contra direito próprio ou de
terceiro, usando, para tanto, moderadamente, os meios necessários de repulsa” (NUCCI,
2019, s.p.). Nucci (2019) ensina ainda que assim como ocorre no estado de necessidade,
somente pode invocar a legítima defesa quem estiver defendendo bem ou interesse
juridicamente protegido pela lei penal. Com base nisso, não existe a possibilidade de
defesa contra agressão a bem sem proteção jurídica.

70
Sobre o estrito cumprimento do dever legal, Nucci afirma se tratar de uma
“ação praticada em cumprimento de um dever imposto por lei, penal ou extrapenal,
mesmo que cause lesão a bem jurídico de terceiro” (NUCCI, 2019, s.p.). Um exemplo de
excludente de ilicitude pelo estrito cumprimento do dever legal pode ser visualizado
quando policiais realizam a prisão de algum indivíduo procurado pela justiça. Em tese,
os policiais estariam cometendo um ilícito penal ao restringir a liberdade do indivíduo.
Contudo, estão agindo aparados na legalidade.

FIGURA 5 – POLÍCIA REALIZANDO PRISÃO DE INDIVÍDUO

FONTE: <encurtador.com.br/awSZ5>. Acesso em: 18 jul. 2021.

Por fim, o exercício regular de direito é uma excludente de ilicitude em que “o


desempenho de uma atividade ou a prática de uma conduta está autorizada por lei,
que torna lícito um fato típico. Se alguém exercita um direito, previsto e autorizado de
algum modo pelo ordenamento jurídico, não pode ser punido, como se praticasse um
delito” (NUCCI, 2019, s.p.). Um exemplo do exercício regular de direito é visualizado nas
lutas de box, em que os lutadores causam lesões corporais uns aos outros, mas não são
penalizados por tal conduta, pois estão agindo com base em uma excludente de ilicitude.

De acordo com o parágrafo único do art. 23, em cada excludente de ilicitude é


possível haver excesso. Se tal situação ocorrer, deve-se verificar qual o tipo de excesso
ocorrido e analisar se será punível ou não. Os excessos podem ser dolosos ou culposos.

71
4 IMPUTABILIDADE PENAL
A Imputabilidade Penal está disposta entre os arts. 26 ao 28 do Código Penal.
Segundo Nucci, a Imputabilidade Penal:

É o conjunto das condições pessoais, envolvendo inteligência e


vontade, que permite ao agente ter entendimento do caráter ilícito do
fato, comportando-se de acordo com esse conhecimento. O binômio
necessário para a formação das condições pessoais do imputável
consiste em sanidade mental e maturidade (NUCCI, 2019, s.p.).

Com base nisso, o agente não possuir condições para entender a diferença entre
o certo e o errado poderá, em algum momento, praticar um fato típico e antijurídico sem
que possa por isso ser censurado, ou seja, sem que possa sofrer juízo de culpabilidade,
sendo considerado, portanto, inimputável.

A primeira hipótese de inimputabilidade penal está prevista no art. 26 do CP.


Ei-lo:

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou


desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo
da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter
ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento
(BRASIL, 1940, s.p.).

O art. 26 do CP destaca que o agente não sofrerá pena se quando praticado


o fato tido como crime não era capaz de entender o que estava fazendo. Contudo, o
agente poderá ser sancionado penalmente com a aplicação de medida de segurança,
que se baseia no juízo de periculosidade do indivíduo. Assim, o autor de um fato típico
e antijurídico, sem compreensão do que fazia, não merece ser considerado criminoso,
embora possa ser submetido a medida especial cuja finalidade é terapêutica, ou seja,
finalidade de tratamento.

O parágrafo único do art. 26 traz que a pena poderá ser reduzida caso o agente
possuísse determinadas condições, ainda que diminuídas, de compreender e entender
o caráter ilícito de sua ação. Observe:

Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços,


se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por
desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente
capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento (BRASIL, 1940, s.p.).

Nesse caso, não haverá a eliminação completa da imputabilidade do agente.


Dessa forma, ele poderá sofrer o juízo de reprovação social inerente a sua culpabilidade.
Destaca-se outra vez que, em razão da capacidade diminuída, o juiz reduzirá a pena de
1/3 a 2/3.

72
A menoridade também é tida como uma das causas de inimputabilidade penal
prevista no CP. O art. 27 versa sobre a menoridade. “Os menores de 18 (dezoito) anos
são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação
especial” (BRASIL, 1940, s.p.).

FIGURA 6 – CRIANÇA SUBMETIDA À RESTRIÇÃO DE LIBERDADE

FONTE: <encurtador.com.br/cjoDL>. Acesso em: 19 jul. 2021.

Aqui, o CP adotou o critério puramente biológico, ou seja, a lei penal criou uma
presunção absoluta de que os menores de 18 anos, em face do desenvolvimento mental
incompleto, não possuem condições de compreender o caráter ilícito do que fazem ou
capacidade de determinarem de acordo com esse entendimento.

ATENÇÃO
Segundo o art. 27 do CP, menores de 18 anos não comentem crime.
Assim, crianças e adolescentes podem cometer atos análogos ao
crime, os quais são denominados de atos infracionais. Dessa forma,
os menores de 18 anos serão submetidos às disposições da Lei nº
8.069/90, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente.

5 CONCURSO DE PESSOAS
Os arts. 29 e 30 do CP versam sobre o concurso de pessoas. Trata-se da
“cooperação desenvolvida por mais de uma pessoa para o cometimento de uma
infração penal. Chama-se, ainda, em sentido lato, coautoria, participação, concurso de
delinquentes, concurso de agentes, cumplicidade” (NUCCI, 2019, s.p.).

73
FIGURA 7 – GRUPO DE AGENTES CRIMINOSOS

FONTE: <encurtador.com.br/oqK17>. Acesso em: 19 jul. 2021

Com base no art. 29, o CP adotou, em regra, a teoria unitária, também


chamada de monista ou monística. Assim, Nucci destaca que “havendo pluralidade
de agentes, com diversidade de condutas, mas provocando-se apenas um resultado, há
somente um delito. Nesse caso, portanto, todos os que tomam parte na infração penal
cometem idêntico crime” (NUCCI, 2019, s.p.). Veja o teor do dispositivo:

Art. 29- Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas
penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.
§ 1º- Se a participação for de menor importância, a pena pode ser
diminuída de um sexto a um terço.
§ 2º- Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos
grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada
até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave
(BRASIL, 1940, s.p.).

O §1º do art. 29 aponta que, aquele que colaborou minimamente para a


empreitada penal deve receber a pena diminuída de um sexto a um terço, o que significa
a possibilidade de romper o mínimo legal da pena prevista em abstrato. O §2º destaca
que, se o agente desejava praticar um determinado delito, sem condição de prever a
concretização de crime mais grave, deve responder pelo que pretendia cometer, não se
podendo a ele imputar outra conduta não desejada.

Segundo Nucci, os requisitos para a ocorrência do concurso de pessoas são os


seguintes: “a) existência de dois ou mais agentes; b) relação de causalidade material
entre as condutas desenvolvidas e o resultado; c) vínculo de natureza psicológica
ligando as condutas entre si; d) reconhecimento da prática da mesma infração para
todos; e) existência de fato punível” (NUCCI, 2019, s.p.).

O art. 30 do CP preceitua a incomunicabilidade de determinadas circunstâncias.


“Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando
elementares do crime” (BRASIL, 1940, s.p.). As circunstâncias e as condições de caráter
pessoal são aquelas que não se comunicam, ou seja, não se transmitem aos coautores
ou partícipes, pois devem ser consideradas individualmente no contexto do concurso
de agentes.

74
Para Nucci (2019, s.p.), a “circunstância de caráter pessoal é a situação ou
particularidade que envolve o agente, sem constituir elemento inerente à sua pessoa”.
Como exemplo, pode-se apresentar a circunstância em que um pai comete homicídio,
em concurso de pessoas, contra um indivíduo que agrediu o seu filho naquele instante.
Note que esse pai agiu impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob
o domínio de violenta emoção, logo em seguida, a injusta provocação da vítima. Com
isso, a sua pena poderá ser reduzida de 1/6 a 1/3. Por outro lado, essa circunstância
não será comunicada ao coautor do homicídio, tendo em vista que a circunstância não
é elementar do crime.

Com relação às condições de caráter pessoal, é possível entendê-las como


“o modo de ser ou a qualidade inerente à pessoa humana” (NUCCI, 2019, s.p.). Como
exemplo, de condição pessoal, Nucci (2019) destaca a menoridade ou a reincidência.
Dessa forma, o agente que pratica o crime sendo menor de 21 anos não transmite essa
condição, que funciona como atenuante aos demais, do mesmo modo que o agente,
reincidente, não transfere essa condição, que é agravante, aos outros agentes.

As elementares são componentes integrantes do tipo penal incriminador. Por


exemplo, “subtrair”, “coisa alheia móvel” e “sem emprego de violência” são elementares
do crime de furto. Estabelece o art. 30 que as referidas elementares se comunicam aos
coautores e partícipes. Assim, Nucci aponta que existem determinadas “circunstâncias
ou condições de caráter pessoal que são integrantes do tipo penal incriminador, de
modo que, pela expressa disposição legal, nessa hipótese, transmitem-se aos demais
coautores e partícipes” (NUCCI, 2019, s.p.). Como exemplo, é possível apresentar o
crime de peculato, em que a condição de funcionário público é elementar do crime.
Assim, caso exista um crime de peculato cometido em concurso de pessoas entre um
funcionário público e um particular, a condição pessoal do funcionário será comunicada
ao particular, pois, conforme já destacado, a condição de funcionário público é elementar
do crime.

O art. 31 do CP prevê uma hipótese em que não haverá punição. “O ajuste, a


determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são
puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado” (BRASIL, 1940, s.p.). Com
base no conceito formulado por Nucci (2019), o ajuste é o acordo ou o pacto celebrado
entre pessoas. Já a determinação é a decisão tomada para alguma finalidade. Por sua
vez, a instigação é a sugestão ou estímulo à realização de algo e auxílio é a ajuda ou a
assistência dada a alguém.

Em regra, em direito penal, os atos preparatórios não são punidos e o art. 31 do


CP segue essa regra. Assim, se há o ingresso na fase executória, não haverá punição,
pois as condutas serão irrelevantes. Ressalta-se que a lei pode punir determinadas
condutas preparatórias, como ocorre no crime de associação criminosa, previsto no art.
288 do CP.

75
6 PENAS
Pode-se entender como pena, segundo Nucci,

a sanção imposta pelo Estado, através da ação penal, ao criminoso,


cuja finalidade é a retribuição ao delito perpetrado e a prevenção a
novos crimes. O caráter preventivo da pena desdobrasse em dois
aspectos, geral e especial, que se subdividem em outros dois. Temos
quatro enfoques: a) geral negativo, significando o poder intimidativo
que ela representa a toda a sociedade, destinatária da norma
penal; b) geral positivo, demonstrando e reafirmando a existência
e eficiência do Direito Penal; c) especial negativo, significando a
intimidação ao autor do delito para que não torne a agir do mesmo
modo, recolhendo-o ao cárcere, quando necessário e evitando a
prática de outras infrações penais; d) especial positivo, que consiste
na proposta de ressocialização do condenado, para que volte ao
convívio social, quando finalizada a pena ou quando, por benefícios,
a liberdade seja antecipada (NUCCI, 2019, s.p.).

O art. 32 do CP destaca as espécies de pena existentes no direito penal brasileiro:


privativas de liberdade; restritivas de direitos; de multa (BRASIL, 1940, s.p.).

FIGURA 8 – AGENTE SUBMETIDO À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

FONTE: <encurtador.com.br/bemwA>. Acesso em: 22 jul. 2021.

As penas privativas de liberdade são: “reclusão, detenção e prisão simples”


(BRASIL, 1940, s.p.). Nesse sentido, as penas de reclusão e detenção serão aplicadas
quando houver a prática de crimes. Por outro lado, as penas de prisão simples serão
aplicadas quando houver o cometimento das chamadas contravenções penais.

76
As penas restritivas de direitos são penas alternativas expressamente
previstas em lei, tendo por fim evitar o encarceramento de determinados criminosos,
autores de infrações penais consideradas mais leves, promovendo-lhes a recuperação
através de restrições a certos direitos. As penas restritivas de direitos são as seguintes:
prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de
direitos, limitação de fim de semana, prestação pecuniária e perda de bens e valores.

Por fim, a pena de multa consiste em uma pena pecuniária, ou seja, é uma
sanção penal que importa no pagamento de uma determinada quantia em dinheiro,
previamente fixada em lei, sendo destinada ao Fundo Penitenciário.

7 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE
A extinção da punibilidade consiste no desaparecimento da pretensão punitiva
ou executória do Estado, em razão de específicos obstáculos previstos em lei. O art. 107
do CP aponta as causas extintivas de punibilidade.

Art. 107 - Extingue-se a punibilidade:


I- pela morte do agente;
II- pela anistia, graça ou indulto;
III- pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como
criminoso;
IV- pela prescrição, decadência ou perempção;
V- pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos
crimes de ação privada;
VI- pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite;
VII- Revogado;
VIII- Revogado;
IX- pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei (BRASIL, 1940, s.p.).

Dentre as causas que estão arroladas no art. 107, pode-se dividi-las em gerais
ou comuns, pois se aplicam a todos os delitos, por exemplo: morte, prescrição, dentre
outras; e as específicas ou particulares, pois somente se aplicam a alguns tipos de delitos,
por exemplo: retratação do agente nos crimes contra a honra, perdão judicial, dentre
outras. Portanto, em regra, ocorrendo uma dessas causas, extingue-se a possibilidade
de o Estado impor uma pena ao agente, embora remanesça o crime praticado.

IMPORTANTE
As causas extintivas de punibilidade previstas no art. 107, do CP,
são meramente exemplificativas, tendo em vista que existem
outras causas previstas de maneira esparsa no próprio Código
ou em legislação extravagante.

77
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• As principais disposições acerca da parte geral do Código Penal serão aplicadas a


todos os crimes da parte especial.

• O Código Penal disciplina os casos de aplicação da lei penal no tempo e no espaço;


os conceitos de dolo e culpa, bem como distingue os crimes consumados dos crimes
tentados.

• Há elementos caracterizadores e requisitos do concurso de pessoas, e isso irá refletir


nas penas previstas no Código Penal.

• A extinção da punibilidade consiste no desaparecimento da pretensão punitiva ou


executória do Estado, em razão de específicos obstáculos previstos em lei.

78
AUTOATIVIDADE
1 Para proceder com a aplicação da lei penal, os aplicadores da norma devem seguir
fielmente as disposições do Código Penal, como, por exemplo: a anterioridade da lei
penal, a territorialidade, o lugar do crime, o tempo do crime, dentro outros aspectos.
No tocante ao tempo do crime, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Considera-se praticado o crime no momento do resultado.


b) ( ) O tempo do crime pode ser expresso tanto no momento da ação quanto no
momento do resultado.
c) ( ) O tempo do crime é o mesmo que o lugar do crime.
d) ( ) Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que o
resultado ocorra em tempo posterior.

2 O Direito Penal prevê algumas espécies de penas quando ocorre a prática de algum
crime previsto na parte especial do Código. Com base nas penas previstas no Código
Penal, analise as sentenças a seguir:

I- A pena de banimento e as penas privativas de liberdade são espécies de penas


previstas no Código Penal.
II- O Código Penal prevê apenas as penas privativas de liberdade e de multa.
III- As penas previstas no Código Penal são as privativas de liberdade, as restritivas de
direitos e de multa.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Somente a sentença II está correta.
b) ( ) Somente a sentença III está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) As sentenças i e II estão corretas.

3 A extinção da punibilidade consiste no desaparecimento da pretensão punitiva ou


executória do Estado, em razão de específicos obstáculos previstos em lei. Com base
nas causas excludentes de punibilidade, analise as sentenças a seguir:

I- A prescrição e a morte do agente são exemplos de causas de extinção da punibilidade.


II- A renúncia do direito de queixa ou o perdão aceito, nos crimes de ação privada
constitui causa de exclusão de punibilidade.
III- É possível a extinção da punibilidade pela retroatividade da lei penal.

79
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença III está correta.
c) ( ) Somente a sentença II está correta.
d) ( ) Somente a sentença I está correta.

4 O Código Penal brasileiro prevê hipóteses de territorialidade e extraterritorialidade


para a aplicação penal. Considerando essas hipóteses, disserte sobre o significado de
territorialidade e extraterritorialidade. Em seguida, aponte uma situação de aplicação
da lei penal com base na territorialidade e uma situação de aplicação da lei penal com
base na extraterritorialidade incondicionada.

5 Com base no conceito dogmático ou estratificado, o crime é um fato típico, ilícito e


culpável. Assim, para existir o crime, todos esses elementos devem ser preenchidos.
Com base na teoria finalista da ação, a culpa ou o dolo, dentre outros elementos,
integram o fato típico. Considerando isso, disserte sobre as diferenças entre dolo e
culpa, em seguida aponte quais são os elementos que correspondem ao caminho do
crime, também chamado de iter criminis.

80
UNIDADE 2 TÓPICO 3 —
DIREITO PENAL – PARTE ESPECIAL

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 3, abordaremos a Parte Especial do Código Penal. Serão
abordados os crimes contra as pessoas, contra o patrimônio e contra a dignidade sexual.
No que diz respeito aos crimes contra a pessoa, você aprenderá quais são os principais
crimes previstos no Código Penal e o bem jurídico tutelado.

Você também aprenderá sobre os crimes contra o patrimônio, qual é o bem


jurídico protegido pela legislação penal, os sujeitos ativos e passivos das condutas e as
especificidades de cada delito.

E, por fim, estudará alguns dos crimes contra a dignidade sexual, com
enfoque para as inovações legislativas sobre o tema, principalmente, sobre o crime de
“divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo
ou de pornografia”.

2 CRIMES CONTRA A PESSOA


Os crimes contra a pessoa são aqueles que afetam diretamente a pessoa,
ou seja, o ser humano. Assim, os bens jurídicos tutelados pelo direito penal estão
essencialmente ligados com a personalidade humana, tais como a integridade física e
psicológica, a honra e a liberdade do indivíduo.

O art. 121 do CP inaugura o Título dos Crime contra a vida. O verbo nuclear do
tipo penal em estudo consiste em eliminar a vida extrauterina de alguém, ou seja, a
vítima do crime de homicídio não pode se encontrar em estado de gestação, pois, se
assim estiver, haverá a prática de outro crime e não homicídio.

No tocante aos sujeitos do crime, cabe destacar que o sujeito ativo, aquele
que realiza a ação de matar, pode ser qualquer pessoa, por isso, trata-se de crime
comum. Já o sujeito passivo identificado pela elementar “alguém”, também pode ser
qualquer pessoa física, isto é, ser vivo nascido de mulher.

O §2º do art. 121 do CP traz as figuras qualificadas do homicídio. Pode-se


entender como qualificado o crime praticado de maneira mais gravosa ou que possui
maior repulsa social, apresentando assim, circunstâncias e elementos mais gravosos
que o tipo original.

81
O § 3º apresenta a figura do homicídio culposo, ou seja, aquele em que o autor
não pretendia tirar a vida da vítima. O homicídio culposo, terá a aplicação de uma pena
de detenção de 1 a 3 anos.

O art. 122 do CP trata do Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a


automutilação. “Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou
prestar-lhe auxílio material para que o faça” (BRASIL, 1940, s.p.). Nesse crime, o verbo
“induzir” significa fazer nascer a ideia, criar o propósito suicida. Já o verbo “instigar”
significa estimular, encorajar, ampliar o propósito já concebido. Por sua ver, o verbo
“auxiliar” significa viabilizar os meios e os modos de fornecer material para o suicídio.

O art. 123 do CP trata do infanticídio: “Matar, sob a influência do estado puerperal,


o próprio filho, durante o parto ou logo após. Pena - detenção, de dois a seis anos”
(BRASIL, 1940, s.p.).

FIGURA 9 – MULHER COM O FILHO NOS BRAÇOS LOGO APÓS O PARTO

FONTE: <encurtador.com.br/cdRZ2>. Acesso em: 19 jul. 2021.

O crime de infanticídio é um crime próprio, pois somente pode ser praticado pela
mãe em estado puerperal, o qual consiste em um fenômeno biopsicológico, promovendo
uma reação hormonal que desencadeia uma reação psicológica. Esse evento domina
o pensamento da mãe, e esta perde parcialmente a capacidade de pensar. Registra-se
que, se um homem ajudar a mãe a cometer o infanticídio, este terá cometido o mesmo
crime, pois a condições e características de caráter pessoal da mãe irão se comunicar
ao homem.

Os arts. 124 ao 128 do CP versam sobre o crime de aborto. O aborto consiste na


interrupção da gravidez com o resultado da morte do feto. Segundo Nucci (2019, s.p.),

Aborto é a cessação da gravidez, antes do termo normal, causando


a morte do feto ou embrião (de ab ortus, ou seja, parto sem
nascimento, cuida-se de palavra latina, que expressa a ação e o

82
efeito da interrupção do processo reprodutivo da espécie, vale
dizer, da gestação, antes do término normal, com consequências
eliminatórias.

O aborto criminoso é aquele realizado pela própria gestante, ou por terceiro,


com ou sem o seu consentimento. Assim, o aborto criminoso é o aborto doloso. Existem
espécies de aborto que não serão punidos, conforme disposição do art. 128 do CP.

Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:


I- se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
II- se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de con-
sentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante
legal (BRASIL, 1940, s.p.).

O art. 129 irá tratar dos crimes de lesões corporais: “Ofender a integridade
corporal ou a saúde de outrem” (BRASIL, 1940, s.p.). Nucci ensina que (2019, s.p.)

O objeto da conduta é a integridade corporal (inteireza do corpo humano)


ou a saúde (normalidade das funções orgânicas, físicas e mentais do ser humano).
Lembremos que se trata de uma ofensa física voltada à integridade ou à saúde do corpo
humano, não se admitindo, neste tipo penal, qualquer ofensa moral.

FIGURA 10 – ESPÉCIES DE LESÕES CORPORAIS

FONTE: <encurtador.com.br/giyBC>. Acesso em: 20 jul. 2021.

Para a configuração do crime de lesão corporal, “é preciso que a vítima sofra


algum dano em seu corpo, sofrendo alterações internas ou externas, podendo, ainda,
abranger qualquer modificação prejudicial à sua saúde, à função orgânica ou causando-
lhe abalos psíquicos comprometedores” (NUCCI, 2019, s.p.).

83
Os crimes contra a honra estão dispostos entre os arts. 138 a 145 do CP. O art.
138 trata do crime de calúnia:

Art. 138- Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido


como crime:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
§ 1º- Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a
propala ou divulga.
§ 2º- É punível a calúnia contra os mortos (BRASIL, 1940, s.p.).

Caluniar, segundo Nucci, “é fazer uma acusação falsa, tirando a credibilidade


de uma pessoa no seio social. Além disso, o Código Penal exige que a acusação falsa
realizada diga respeito a um fato concreto definido como crime” (NUCCI, 2019, s.p.).

O art. 139 dispõe sobre a difamação: “difamar alguém, imputando-lhe fato


ofensivo à sua reputação. Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa” (BRASIL,
1940, s.p.). Difamar uma pessoa implica divulgar fatos infamantes à sua honra objetiva,
sejam eles verdadeiros ou falsos.

O art. 140 traz o crime de injúria: “injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou


o decoro” (BRASIL, 1940, s.p.). Injuriar significa realizar um insulto que macula a honra
subjetiva, arranhando o conceito que a vítima faz de si mesma.

3 CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO


Com relação aos crimes contra o patrimônio, Nucci (2019) destaca como sendo
aqueles em que o bem jurídico tutelado pelo direito penal é o patrimônio dos indivíduos.
Assim, o patrimônio pode ser constituído de coisas de sua propriedade ou posse. Já o
objeto material dos crimes contra o patrimônio é a “coisa sujeita à subtração, aquela que
sofre a conduta criminosa, integridade física e a liberdade do indivíduo” (NUCCI, 2019, s. n.).

O art. 155 do CP inaugura o Título dos Crimes contra o patrimônio e trata do


crime de furto como “Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel“ (BRASIL, 1940,
s.p.). Segundo Nucci (2019, s.p.),

Subtrair significa tirar, fazer desaparecer ou retirar. É verdade que o


verbo furtar tem um alcance mais amplo do que subtrair e justamente
por isso o tipo penal preferiu identificar o crime como sendo furto e a
conduta que o concretiza como subtrair, seguida, é lógico, de outros
importantes elementos descritivos e normativos.

84
FIGURA 11 – AGENTE REALIZANDO O CRIME DE FURTO

FONTE: <encurtador.com.br/jwAWZ>. Acesso em: 18 jul. 2021.

Assim, o crime de furto é descrito como subtração, ou seja, diminuição do


patrimônio de outra pessoa, sem que haja violência.

O art. 157 (BRASIL, 1940, s.p.) trata do crime de roubo: “subtrair coisa móvel
alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois
de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência”.

FIGURA 12 – AGENTE REALIZANDO O CRIME DE ROUBO

FONTE: <encurtador.com.br/cxFN6>. Acesso em: 20 jul. 2021.

O roubo é um crime mais grave que o furto. Está descrito na lei como “subtração
de coisa alheia móvel mediante grave ameaça ou violência” (BRASIL, 1940, s.p.). Nucci
aponta que “os bens jurídicos tutelados pelo direito penal contra o crime de roubo
são o patrimônio, a integridade física e a liberdade do indivíduo” (NUCCI, 2019, s.p.).
Os mesmos elementos descritos no delito de furto estão previstos no crime de roubo.
Acontece que neste está acrescentada a violência ou a grave ameaça ou a redução da
possibilidade de resistência.

85
Os arts. 158 a 160 tratam dos crimes de extorsão. A extorsão, segundo Nucci,

é uma variante de crime patrimonial muito semelhante ao crime de


roubo, pois também implica uma subtração violenta ou com grave
ameaça a bens alheios. A grande diferença concentra-se no fato
de que a extorsão exige a participação ativa da vítima, ou seja, o
autor do crime exige que a vítima faça ou não faça alguma coisa,
em decorrência da ameaça ou da violência sofrida. Por outro lado,
no roubo, por outro lado, o agente atua sem a participação da vítima
(NUCCI, 2019, s.p.).

Assim, na extorsão, o autor do delito apenas consegue subtrair a coisa alheia


se a vítima cooperar. Por exemplo, no caso de saques em caixas eletrônicos. Como o
criminoso não sabe a senha da vítima, ele não conseguirá pegar o dinheiro se a vítima
não realizar alguma ação.

4 CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL


Os crimes contra a dignidade sexual possuem tratativa legal dos arts. 213 ao
234 do CP. A dignidade sexual é uma das espécies do gênero dignidade da pessoa
humana e deve ser tutelada pelo Direito Penal.

O art. 213 do CP inaugura o Título dos crimes contra a dignidade sexual e trata,
especificamente, do crime de estupro. “Constranger alguém, mediante violência ou grave
ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro
ato libidinoso” (BRASIL, 1940, s.p.). Com base no art. 213 do CP, a prática da conjunção
carnal e/ou de qualquer outro ato libidinoso configura a prática do crime de estupro. O §
1º do dispositivo traz uma forma qualificada do estupro. Assim, se o crime for cometido
contra vítima menor de 18 ou maior de 14 anos ou se da ação resultar lesão corporal de
natureza grave, a pena será aumentada. O §2º do mesmo dispositivo prevê uma pena
ainda mais grave se, da conduta do estupro, sobrevenha o resultado morte.

O art. 217-A do CP (BRASIL, 1940, s.p.) aponta o crime de estrupo de vulnerável:


“ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos”.
Conforme as disposições deste artigo, a relação sexual, ainda que consentida pelo
menor de 14 anos, será considerada como criminosa e estará sujeita às sanções penais.
Nesse sentido, é vedada a prática sexual com tais pessoas, visto que a maioria não
possui o necessário discernimento, nem condições de autorizar o ato sexual. Desse
modo, a vulnerabilidade de suas situações indica à presunção de que a prática do ato
sexual ocorreu de maneira violenta.

O art. 218-C foi inserido recentemente no Código Penal e surgiu a partir de


diversas divulgações em redes e mídias digitais contendo cenas de estupro e sexo.

86
Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor
à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive
por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou
telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que
contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça
apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima,
cena de sexo, nudez ou pornografia (BRASIL, 2019, s.p.).

FIGURA 13 – COMUNICAÇÃO DIGITAL POR MEIO DA INTERNET

FONTE: <encurtador.com.br/aefzC>. Acesso em: 20 jul. 2021.

Com a crescente divulgação de cenas de estupro na mídia e nas redes sociais,


gravadas pelos agressores ou por terceiros, assim como a divulgação de vídeos íntimos,
fotos e material pornográfico em geral, sem autorização da vítima, o legislador introduziu
no Código Penal o art. 218-C, que dispõe sobre os crimes de “divulgação de cena de
estupro ou de cena de estupro de vulnerável”, “divulgação de cena com apologia ao
estupro” e “divulgação de cena de sexo ou de pornografia”.

87
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os crimes contra a pessoa são aqueles que afetam diretamente o ser humano. Os
crimes contra o patrimônio são aqueles em que o bem jurídico tutelado pelo direito
penal é o patrimônio dos indivíduos. E que os crimes contra a dignidade sexual são
os que acometem uma das espécies do gênero dignidade da pessoa humana.

• O crime de furto é a subtração (diminuição do patrimônio de outra pessoa), sem que


haja violência. O crime de roubo é um crime mais grave do que o furto. É a subtração
de coisa alheia móvel, mediante grave ameaça ou violência.

• A extorsão é uma variante de crime patrimonial muito semelhante ao crime de roubo,


pois também implica uma subtração violenta ou com grave ameaça a bens alheios. A
diferença é que, na extorsão, exige-se a participação ativa da vítima.

• Com a crescente divulgação de cenas de estupro na mídia e nas redes sociais,


gravadas pelos agressores ou por terceiros, o legislador introduziu no Código Penal
um artigo que dispõe sobre os crimes de divulgação de cena de estupro ou de cena
de estupro de vulnerável.

88
AUTOATIVIDADE
1 O crime de roubo e de furto são exemplos de crimes contra o patrimônio previstos
no Código Penal brasileiro. No tocante à diferença entre furto e roubo, assinale a
alternativa CORRETA:

a) ( ) Subtrair coisa alheia móvel, com emprego de violência, configura crime de furto.
b) ( ) Crime de furto e roubo são sinônimos.
c) ( ) Considera-se crime de roubo somente se houver violência, dispensando-se a
grave ameaça.
d) ( ) Subtrair coisa alheia móvel, com emprego de violência ou grave ameaça,
configura o crime de roubo.

2 O infanticídio é tido como um crime contra a vida, previsto no art. 123 do Código Penal.
Com base nas causas excludentes de punibilidade, analise as sentenças a seguir:

I- A mulher deve estar em estado puerperal para que o crime seja considerado
infanticídio, pois é elementar do crime.
II- O crime de infanticídio não pode ser praticado em concurso de pessoas, porque o
estado puerperal é íntimo da mulher.
III- Mesmo após o estado puerperal a mulher pode praticar infanticídio contra o próprio
filho.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Somente a sentença I está correta.
b) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) As sentenças I e III estão corretas.

3 A dignidade sexual é uma das espécies do gênero dignidade da pessoa humana e


deve ser tutelada pelo Direito Penal. Com base nos crimes contra a dignidade sexual,
analise as sentenças a seguir:

I- Praticar qualquer ato libidinoso com menor de 14 anos não configura estupro de
vulnerável se o menor demonstrou, sem sombra de dúvidas, que queria ter a relação.
II- O crime de estupro somente se consuma se houver conjunção carnal.
III- Divulgar cenas de estupro ou sexo sem autorização configura crime de divulgação
de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de
pornografia.

89
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
b) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

4 Joaquim é secretário de Agricultura de um determinado município. No fim do ano de


2020, Joaquim realizou uma viagem de férias para o Canadá, juntamente ao seu filho,
José. No momento do embarque, o filho de Joaquim possuía 17 anos e estava prestes
a completar 18 anos. Ambos ficaram 12 dias no Canadá. Nesse período, José atingiu
a maioridade. Ainda em solo estrangeiro, no momento em que embarcaram no avião
para retornarem ao Brasil, José esfaqueou uma aeromoça que, posteriormente, veio
a óbito em decorrência dos ferimentos. Com base nessa situação, José cometeu
algum crime? Em caso de resposta positiva, qual crime foi cometido? Ele estará
sujeito à lei penal brasileira ou à lei penal estrangeira? Por quê?

5 Um grupo armado, composto por cinco indivíduos, subtraiu, mediante violência e


grave ameaça, o carro de Mateus. Após isso, planejou assaltar um banco. Ao chegar
na agência, se deparou com Ivone, professora de uma rede de ensino particular. Os
indivíduos coagiram Ivone a digitar a senha numérica e realizar saques em sua conta
salário. Depois de três meses, os cinco indivíduos foram capturados pela polícia. Com
base nesse enunciado, quais crimes foram praticados pelos cinco criminosos? Houve
concurso de pessoas? Existe alguma causa de extinção da punibilidade?

90
UNIDADE 2 TÓPICO 4 —
PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1 INTRODUÇÃO
Os princípios da Administração Pública encontram-se explícitos, em especial, no
texto constitucional pelo art. 37. De saída, podemos observar que a Constituição Federal
elenca que a Administração Pública, seja direta ou indireta, deverá seguir aos princípios
da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência.

Os princípios da Administração Pública conferem características próprias a


esse ramo do Direito, formando assim, o chamado regime jurídico administrativo, ou
seja, um conjunto de princípios expressos em lei ou implícitos no ordenamento jurídico.
Esses princípios irão conduzir a Administração Pública para atingir as necessidades e
interesses públicos.

2 PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO


SOBRE O PRIVADO
O princípio da supremacia do interesse público sobre o privado é considerado
como o fundamento para o exercício das prerrogativas conferidas à Administração
Pública em busca do interesse público. Assim, quando houver divergências entre o
interesse público e o privado, aquele sempre deverá prevalecer.

Segundo Mazza,

A supremacia do interesse público sobre o privado, também chamada


simplesmente de princípio do interesse público ou da finalidade
pública, princípio implícito na atual ordem jurídica, significa que os
interesses da coletividade são mais importantes que os interesses
individuais, razão pela qual a Administração, como defensora
dos interesses públicos, recebe da lei poderes especiais não
extensivos aos particulares. A outorga dos citados poderes projeta
a Administração Pública a uma posição de superioridade diante do
particular. Trata-se de uma regra inerente a qualquer grupo social: os
interesses do grupo devem prevalecer sobre os dos indivíduos que o
compõem. Essa é uma condição para a própria subsistência do grupo
social. Em termos práticos, cria uma desigualdade jurídica entre a
Administração e os administrados (MAZZA, 2020, s.p.).

Ressalta-se que a supremacia do interesse público sobre o privado não confere


poderes irrestritos à administração. Nesse sentido, a administração está sujeita a uma
série de restrições, as quais devem ser devidamente respeitadas, sob pena de ilegalidade
ou ilegitimidade em sua atuação.

91
3 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DO INTERESSE
PÚBLICO PELA ADMINISTRAÇÃO
Segundo ensinamentos do princípio da indisponibilidade do interesse público
pela administração, o administrador não é titular da máquina pública nem do interesse
público. O gestor público administra os bens de todos, isto é, da coletividade. Dessa
forma, não pode, por exemplo, alienar um bem público sem que haja previsão expressa
em lei que o autorize.

Segundo Mazza (2020, s.p.),

O supraprincípio da indisponibilidade do interesse público enuncia


que os agentes públicos não são donos do interesse por eles
defendido. Assim, no exercício da função administrativa os agentes
públicos estão obrigados a atuar, não segundo sua própria vontade,
mas do modo determinado pela legislação. Como decorrência dessa
indisponibilidade, não se admite tampouco que os agentes renunciem
aos poderes legalmente conferidos ou que transacionem em juízo.

Note-se que a indisponibilidade do interesse público possui destaque


nas relações da Administração Pública. Além disso, todos os princípios do Direito
Administrativo devem observar e obedecer às disposições trazidas pelos princípios da
supremacia do interesse público e da indisponibilidade do interesse público. Conforme
o entendimento de Mazza (2020, s.p.).

[...] todos os princípios do Direito Administrativo são desdobramentos


da supremacia do interesse público e da indisponibilidade do
interesse público. Tecnicamente seria mais correto dizer que os
princípios administrativos, por representarem limitações ao poder
estatal, decorrem diretamente da indisponibilidade do interesse
público, e não da supremacia.

4 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DE DIREITO


ADMINISTRATIVO
Os princípios constitucionais do Direito Administrativo também são chamados
de princípios explícitos ou expressos, pois estão diretamente previstos na Constituição
Federal. O caput, do art. 37, da CF/88, apresenta alguns dos princípios constitucionais.
“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” (BRASIL, 1988, on-line).

Registra-se desde já que o rol de princípios constitucionais do Direito


Administrativo não se esgota no caput do art. 37, da CF/88, pois existem outros
princípios expressamente previstos no texto constitucional. Feita essa consideração
sobre o rol exemplificativo dos princípios constitucionais do Direito Administrativo,
faz-se necessário estudar, de maneira detalhada cada um deles. Acompanhe.

92
O princípio da legalidade representa a subordinação da Administração
Pública à vontade popular. Com base nisso, o exercício da função administrativa não
pode ser pautado pela vontade da administração ou dos agentes públicos, mas deve,
obrigatoriamente, respeitar a vontade da lei. A partir disso, a Administração Pública
somente pode fazer o que a lei autorizar. Por outro lado, o particular pode fazer tudo
aquilo que a lei não proibir.

O princípio da impessoalidade estabelece um dever de imparcialidade na


defesa do interesse público, impedindo assim, discriminações, perseguições, privilégios
ou favoritismos, indevidamente dispensados a particulares no exercício da função
administrativa. A partir disso, o princípio da impessoalidade busca proibir o tratamento
desigual entre pessoas que se encontrem na mesma condição. A impessoalidade ainda
possui o enfoque de que a Administração Pública deve ser impessoal a ela mesma, ou
seja, quando um prefeito, por exemplo, determina a realização de uma obra pública,
quem o faz juridicamente é a pessoa jurídica de direito público do município e não a
pessoa física do prefeito. Dessa maneira, o prefeito não pode fazer propagandas em seu
nome se valendo de obras públicas.

FIGURA 14 – AGENTES TRABALHADO EM OBRA PÚBLICA

FONTE: <encurtador.com.br/ctyY4>. Acesso em: 22 jul. 2021.

Sobre esse aspecto, Mazza (2020, s.p.) aponta que:

A impessoalidade possui outro aspecto importante. A atuação


dos agentes públicos é imputada ao Estado, significando um agir
impessoal da Administração. Assim, as realizações não devem ser
atribuídas à pessoa física do agente público, mas à pessoa jurídica
estatal a que estiver ligado. Por isso que, em regra, a responsabilidade
pela reparação de danos causados no exercício regular da função
administrativa é do Estado, e não do agente que realizou a conduta.

93
O princípio da moralidade constitui pressuposto de validade dos atos
administrativos, podendo haver invalidação do ato administrativo por ser contrário à
moralidade. A Constituição, em pelo menos três oportunidades, impõe aos agentes
públicos o dever de observância da moralidade administrativa.

Art. 5º [...]
LXXIII- qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que
vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade
de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao
meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o
autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e
do ônus da sucumbência.

Art. 37- A administração pública direta e indireta de qualquer dos


Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios [...], moralidade, [...].

Art. 85- São crimes de responsabilidade os atos do Presidente


da República que atentem contra a Constituição Federal e,
especialmente, contra:
[...]
V- a probidade na administração (BRASIL, 1988, on-line).

A moralidade administrativa é diferente da moral comum. O princípio jurídico da


moralidade administrativa não impõe o dever de atendimento à moral comum vigente na
sociedade, mas exige respeito a padrões éticos, de boa-fé, decoro, lealdade, honestidade
e probidade incorporados pela prática diária ao conceito de boa administração.

Destaca-se que o ato administrativo pode estar em sintonia fina com a


legalidade e, mesmo assim, ser considerado imoral. Para exemplificar essa situação é
possível imaginar a necessidade de um determinado município em comprar automóveis
para prestar serviços públicos. Mesmo com o orçamento em baixa, o prefeito resolve
adquirir carros de luxo para satisfazer o interesse público. Em tese, a conduta do
prefeito estaria dentro da legalidade, pois é admitido comprar veículos para satisfazer a
necessidade pública. Por outro lado, a ação do prefeito não está abarcada pelos dizeres
da moralidade, pois, ao comprar carros de luxo, deixou de observar os parâmetros éticos
minimamente aceitáveis na sociedade.

O princípio da publicidade pode ser definido como o dever de divulgação


oficial dos atos administrativos. Esse princípio apresenta um contexto geral de livre
acesso dos indivíduos a informações de seu interesse e de transparência na atuação
administrativa. A própria Constituição traz possibilidades do princípio da publicidade.

Art. 5º [...]
XXXIII- todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de
seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que
serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade,
ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança
da sociedade e do Estado.

94
XXXIV- são a todos assegurados, independentemente do pagamento
de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de
direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para
defesa de direitos e esclarecimento de situações de
interesse pessoal.

LXXII- conceder-se-á "habeas-data":


a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à
pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos
de dados de entidades governamentais ou de caráter
público;
b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo
por processo sigiloso, judicial ou administrativo (BRASIL,
1988, on-line).

Pelo fato de os agentes públicos atuarem na defesa dos interesses da


coletividade, a proibição de condutas sigilosas e atos secretos é uma condição da
natureza funcional de suas atividades. Para respeitar o princípio da publicidade, a
atuação do administrador público não pode ser secreta, tendo em vista que os bens
administrados são de titularidade do povo. Nesse sentido, o titular dos bens públicos
deve ter acesso às informações para poder verificar a legitimidade e a legalidade dos
atos praticados na gestão da Administração Pública.

FIGURA 15 – PROMOÇÃO DA PUBLICIDADE DOS ATOS PÚBLICOS

FONTE: <encurtador.com.br/xMXZ1>. Acesso em: 22 jul. 2021.

O princípio da eficiência não era previsto no texto original da Constituição.


Esse princípio foi incluído no caput do art. 37 por meio da Emenda Constitucional nº
19/1998 e foi um dos pilares da reforma administrativa, que buscou atingir um modelo
de administração gerencial, voltada para o alcance e controle de resultados na atuação
estatal. Um dos motivos do surgimento do princípio da eficiência possui relação com
a existência de obras e serviços públicos inacabados, com o desperdício de dinheiro
público e do aumento da corrupção. Com base nisso, o princípio da eficiência faz com
que a conduta dos administradores atinja os melhores resultados possíveis com menos
custos, sempre visando evitar desperdícios de recursos públicos. O núcleo do princípio
da eficiência está pautado em desempenhar a atividade administrativa com o menor
gasto possível.

95
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os princípios da Administração Pública são chamados de princípios explícitos ou


expressos, pois estão previstos na Constituição Federal, no art. 37, da CF/88.

• O princípio da supremacia do interesse público sobre o privado é o fundamento das


prerrogativas da Administração Pública em busca do interesse público.

• O princípio da indisponibilidade do interesse público determina que o administrador


público não possui discricionariedade em sua atuação e deve agir de modo determinado
pela legislação.

• O princípio da legalidade representa a subordinação da Administração Pública à lei


de modo que apenas pode agir nos limites que a legislação permitir.

• O princípio da impessoalidade impede discriminações, perseguições, privilégios


ou favoritismos, indevidamente dispensados a particulares no exercício da função
administrativa.

• O princípio da moralidade administrativa impõe o dever de respeito a padrões éticos,


de boa-fé, decoro, lealdade, honestidade e probidade, incorporados pela prática
diária ao conceito de boa administração.

• O princípio da publicidade pode ser definido como o dever de divulgação oficial dos
atos administrativos.

• O princípio da eficiência buscou atingir um modelo de administração gerencial,


voltada para o alcance e controle de resultados na atuação estatal.

96
AUTOATIVIDADE
1 O princípio da supremacia do interesse público sobre o privado é considerado como
o fundamento para o exercício das prerrogativas conferidas à Administração Pública
em busca do interesse público. Sobre esse princípio, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Havendo conflito entre o interesse público e o privado, o público deve prevalecer.


b) ( ) O interesse privado é supremo.
c) ( ) Não existe prevalência entre interesses públicos ou privados.
d) ( ) O interesse privado prevalece sobre o interesse público.

2 Segundo disposições do caput do art. 37 da Constituição Federal, as administrações


públicas direta e indireta estão sujeitas a determinados princípios. Com base nos
princípios que a Administração Pública deve observar, analise as opções a seguir:

I- Legalidade.
II- Maleabilidade.
III- Pessoalidade.
IV- Publicidade.
V- Eficiência.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As opções I, II e III estão corretas.
b) ( ) As opções I, IV e V estão corretas.
c) ( ) As opções I, III, IV e V estão corretas.
d) ( ) As opções I, III e IV estão corretas.

3 O exercício da função administrativa não pode ser pautado pela vontade da


Administração ou dos agentes públicos, mas deve, obrigatoriamente, respeitar a
vontade da lei. Sobre os princípios da Administração Pública, assinale a alternativa
CORRETA:

a) ( ) A Administração Pública somente pode fazer o que a lei autorizar. Por outro lado,
o particular pode fazer tudo aquilo que a lei não proibir.
b) ( ) Não existe vedação legal para atuação da Administração Pública.
c) ( ) O governador pode realizar qualquer ação no seu governo, independentemente
de previsão legal que autorize seu trabalho.
d) ( ) Os particulares só podem fazer aquilo que a lei permite.

97
4 No princípio da indisponibilidade do interesse público pela administração, o
administrador não é titular da máquina pública nem do interesse público. O gestor
público administra os bens de todos, isto é, da coletividade. Disserte sobre a diferença
entre o princípio da supremacia do interesse público e o princípio da indisponibilidade
do interesse público.

5 Os princípios constitucionais do Direito Administrativo também são chamados de


princípios explícitos ou expressos, pois estão diretamente previstos na Constituição
Federal, no caput, do art. 37. Disserte sobre os princípios contitucionais expressos do
Direito Administrativo:

98
UNIDADE 2 TÓPICO 5 —
REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO E
ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA

1 INTRODUÇÃO
O regime jurídico administrativo é composto pelas normas que tipificam o Direto
Administrativo e destacam a Administração Pública em circunstância verticalmente
privilegiadas na relação jurídico-administrativa. Trata-se das prerrogativas da Adminis-
tração Pública e das sujeições dos administrados e dos agentes públicos no regime
jurídico em tela.

A relação jurídica possui o interesse público como objeto, e a Administração


Pública sempre estará como sujeito dos atos. De acordo com Reinaldo Couto (2019,
p. 158), a “Administração Pública é o organismo público dotado, sob regime jurídico
diferenciado, da função administrativa”.

A Organização Administrativa, por sua vez, é composta pelos organismos


administrativos formados pelo conjunto de pessoas e órgãos com competência
para exercer as prerrogativas conferidas pelo regime jurídico administrativo. Essa
competência deve sempre ter como base os princípios da Administração Pública. Em
especial, aqueles elencados no art. 37 da Constituição Federal.

2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados
e municípios e do Distrito Federal, assim preconizado no art. 1º da Constituição
Federal. Isso significa dizer que, ao contrário do modelo político de Estado Unitário, o
Estado Federativo distingue o “poder político central dos poderes atribuídos aos entes
integrantes” (CARVALHO FILHO, 2009, p. 487).

Podemos, então, apontar três características da Administração Pública em


nosso Estado Federado. São elas: descentralização política; autoconstituição das
entidades federativas integrantes; e participação dos entes federativos na
política nacional. Essas características decorrem do princípio da autonomia dos entes
federados, com independência em sua gestão interna. Nas palavras de Carvalho Filho
(2009, p. 488), “são indissociáveis as noções de federação e autonomia das pessoas
federativas nos termos pautados na Constituição Federal, e é a autonomia que atribui
aos entes da federação os poderes de autoconstituição, autogoverno, autolegislação e
autoadministração”.

99
A Administração Pública se subdivide em: administração direta e administração
indireta. A Administração direta compreende as pessoas federativas para o exercício das
atividades de Estado. Trata-se das pessoas políticas da federação. Em âmbito federal,
a União assume o papel de Administração Pública direta, com atuação autônoma
em termos de Poder Judiciário, Executivo e Legislativo. No âmbito estadual, temos
a mesma simetria para os Estados federativos, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande
do Sul, Amazonas etc. Por fim, a Administração Pública também possui alocação em
âmbito municipal ocupado aqui pelos municípios. Ao contrário da União e dos Estados,
o “município não tem Judiciários próprio, mas tem Legislativo (Câmara Municipal),
que também poderá dispor sobre sua organização, a símile do que ocorre nas demais
esferas” (CAVALHO FILHO, 2009, p. 494).

FIGURA 16 – PALÁCIO DO PLANALTO

FONTE: <encurtador.com.br/nEILX>. Acesso em: 21 jul. 2021.

3 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA


A Administração Pública indireta é composta por entidades administrativas e,
por isso, presta serviço de forma descentralizada. Compõem a administração indireta:
as autarquias, as fundações, as empresas públicas e as sociedades de economia mista.
Nas palavras do jurista Carvalho Filho (2009, p. 496):

Administração Indireta do Estado é o conjunto de pessoas


administrativas que, vinculadas à respectiva Administração Direta, têm
o objetivo de desempenhar as atividades de forma descentralizada. O
conceito, que procuramos caracterizar com simplicidade para melhor
entendimento, dá destaque a alguns aspectos que entendemos
relevantes. Primeiramente, a indicação de que a administração
indireta é formada por pessoas jurídica, também denominadas por
alguns e até pelo Decreto-lei nº 200/67, de entidades (art. 4º, II).
Depois, é preciso não perder de vista que tais pessoas não estão
soltas no universo administrativo. Ao contrário, ligam-se elas, por elo

100
de vinculação, às pessoas políticas da federação, nas quais está a
respectiva administração direta. Por Fim, o objetivo se sua instituição –
a atuação estatal descentralizada.

Ao seguirmos o texto normativo do artigo 4º, inc. II, do Decreto-lei nº 200/67,


observaremos que a Administração Indireta compreende categorias jurídicas de
entidades com personalidade jurídica própria:

Art. 4° A Administração Federal compreende:


I- A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados
na estrutura administrativa da Presidência da República e dos
Ministérios.
II- A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias
de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria:
a) Autarquias;
b) Empresas Públicas;
c) Sociedades de Economia Mista.
d) Fundações públicas (BRASIL, 1967, s.p.).

Assim, passaremos a analisar cada uma dessas entidades de forma apartada.

Autarquia

As autarquias são pessoas jurídicas administrativa, com poder de gestão e


autonomia de seus cargos, mas com controle do Estado que a originou. De acordo com
o Decreto-Lei nº 200/67, em seu art. 5°, podemos compreender as autarquias como:

Art. 5º Para os fins desta lei, considera-se:


I- Autarquia - o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade
jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades
típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor
funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada
(BRASIL, 1967, s.p.).

FIGURA 17 – ANATEL COMO EXEMPLO DE AUTARQUIA ADMINISTRATIVA

FONTE: <encurtador.com.br/kqETZ>. Acesso em: 19 jul. 2021.

101
São exemplos de autarquias:

• Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL).


• Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
• Banco Central do Brasil (BACEN).
• Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
• Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES).

Empresas Públicas

Também compõem a Administração Pública Indireta, as Empresas Públicas,


compreendidas, como:

[...] entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com


patrimônio próprio e capital exclusivo da União, criada por lei para
a exploração de atividade econômica que o governo seja levado a
exercer por força de contingência ou de conveniência administrativa,
podendo revestir-se de qualquer das formas admitidas em direito
(BRASIL, 1967, s.p.).

FIGURA 18 – CAIXA ECONÔMICA FEDERAL COMO EXEMPLO DE EMPRESA PÚBLICA

FONTE: <encurtador.com.br/uT349>. Acesso em: 19 jul. 2021.

São exemplos de empresas públicas no Brasil:

• Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.


• Caixa Econômica Federal.
• Companhia Brasileira de Trens Urbanos.
• Empresa Brasil de Comunicação (EBC).
• Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.
• Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias.

102
Sociedade de Economia Mista

Por fim, temos como Administração Pública indireta as Sociedade de Economia


Mista. Estas compreendem toda a entidade dotada de personalidade jurídica de direito
privado, criada por lei para a exploração de atividade econômica, sob a forma de
sociedade anônima, cujas ações, com direito a voto, pertençam, em sua maioria, à União
ou à entidade da Administração Indireta. Esse conceito de Sociedade de Economia Mista
pode ser observado pelo teor do art. 5º, inc. III, do Decreto-Lei nº 200/1967.

FIGURA 19 – PETROBRAS COMO EXEMPLO DE EMPRESA PÚBLICA

FONTE: <encurtador.com.br/oGIK8>. Acesso em: 20 jul. 2021.

No Brasil, são exemplos de sociedades de economia mista: a Petrobras, o Banco


do Brasil, o Banco do Nordeste e a Eletrobras.

4 FUNDAÇÃO PÚBLICA DE DIREITO PRIVADO


As fundações criadas por particulares são regidas inteiramente pelo direito
privado. São exemplos de fundações de direito privado: a Fundação Xuxa, a Fundação
Ayrton Senna, entre outros exemplos. As Fundações de Direito Privado surgem quando
um particular resolve destinar parte de seu patrimônio para uma atividade de natureza
social, seguindo os direcionamentos do Código Civil para tanto. A partir daí, há uma
separação entre o patrimônio pessoal do particular e o patrimônio da fundação, que
deverá cumprir a sua função institucional e será, inclusive, fiscalizada pelo Ministério
Público.

103
5 FUNDAÇÃO PÚBLICA DE DIREITO PÚBLICO
Quanto às Fundações Públicas, por sua vez, trata-se de pessoa jurídica de
direito privado com finalidades não lucrativas e criadas mediante autorização legislativa.
Conforme o art. 5º, inc. IV, podemos dizer que as Fundações Públicas possuem o
objetivo de “desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos ou
entidades de direito público, com autonomia administrativa, patrimônio próprio gerido
pelos respectivos órgãos de direção, e funcionamento custeado por recursos da União
e de outras fontes”.

FIGURA 20 – ALDEIA INDÍGENA PARA REPRESENTAR A FUNAI

FONTE: <encurtador.com.br/bcerQ>. Acesso em: 21 jul. 2021.

São exemplos de Fundações Pública:

• Fundação Nacional do Índio (Funai).


• Fundação Nacional de Saúde (Funasa).
• Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
• Fundação Nacional de Artes (Funarte).
• Fundação Biblioteca Nacional.

104
LEITURA
COMPLEMENTAR
O INTERESSE PÚBLICO AINDA RESPIRA BEM,
MAS NECESSITA SEMPRE DE CUIDADOS INTENSIVOS

Fabrício Motta

A imprensa noticiou que dois ministros do Tribunal de Contas da União (TCU),


acompanhados de suas respectivas mulheres, passaram um final de semana memorável
em uma ilha paradisíaca, às custas do empresário Joesley Batista (o empresário, as
empresas do grupo JBS e as atividades não necessariamente republicanas apontados
pela operação "lava jato" dispensam maiores comentários).

Segundo a revista Veja, “em meados do ano passado, a Lava Jato já havia
deflagrado três dezenas de operações. As empresas do grupo J&F, dos irmãos Joesley
e Wesley Batista, ainda não haviam caído na teia, mas já eram alvo de investigações que
apuravam suspeitas de pagamento de propina para obter financiamentos no BNDES e
na Caixa Econômica Federal. Na época, longe de Brasília, no píer de uma mansão em
Mangaratiba, no Rio de Janeiro, uma pequena lancha aportou para apanhar um grupo
que havia chegado para um fim de semana de lazer. Todos a bordo, a embarcação rumou
mar adentro, até encontrar o iate Why Not. Para os ministros do TCU, era o começo de um
animado dia de mordomias, com boa comida, champanhe e vinho da melhor qualidade,
tudo diante de uma paisagem deslumbrante”. Segundo a reportagem, um dos ministros
negou que tenha beneficiado o Grupo J&F nos processos em trâmite no TCU, alegando
que votou a favor do prosseguimento de investigações sobre as empresas do grupo.
Ora, se não houve favorecimento, why not?

A situação narrada volta nossa atenção para a importância da prevenção dos


conflitos de interesses. O interesse público é o coração do direito público, desfrutando
de proteção diferenciada conferida pelo ordenamento jurídico. Como aduz Marçal
Justen Filho, um interesse deixa de ser privado e se transmuta em público quando seu
atendimento não puder ser objeto de transigência, pois as regras não podem ser as
mesmas dos interesses individuais. Segundo o autor, “modernamente, o conceito de
interesse público não se constrói a partir da impossibilidade técnica de os particulares
satisfazerem determinados interesses individuais, mas pela afirmação da impossibilidade
ética de deixar de atendê-los”.

105
As sutilezas jurídicas que envolvem a proteção do interesse público não
comportam análise nesta coluna, razão pela qual remeto o leitor a estudos de autores
que já trataram do tema com profundidade e propriedade. Entretanto, algumas
características gerais atuais do conceito de interesse público – ou da investigação em
sua busca – podem ser colacionadas, sem pretensão de exaurimento: a) não existe
realização válida do interesse público pela Administração Pública fora dos quadros da
juridicidade (não há um interesse público por natureza que seja revelado ou aplicado
em sentido contrário à lei ou face a condutas desconformes com a lei, como ressalta
Paulo Otero); b) interesse público não se confunde com interesse do Estado, e este não
detém exclusividade na realização do interesse público; c) a complexidade da sociedade
e do ordenamento jurídico permitem identificar a existência de diversos interesses
igualmente públicos; e d) interesse público e interesses privados não se encontram
necessariamente em campos opostos, pois a defesa do direito ou do interesse
juridicamente protegido do particular (se considero a categoria de interesses legítimos,
por exemplo) é decorrência do interesse público.

Essas características conferem maior importância à regulação dos conflitos


de interesses. De acordo com a Lei nº 12.813/13, conflito de interesses é a situação
gerada pelo confronto entre interesses públicos e privados que possa comprometer
o interesse coletivo ou influenciar, de maneira imprópria, o desempenho da função
pública (artigo 3º, I). Na máxima popular, não se pode servir a dois senhores – no caso,
a interesses antagônicos. Conflito de interesses não é sinônimo de corrupção, mas deve
ser adequadamente regulado para evitar que se transforme em patologia corruptiva. O
objetivo principal é evitar que interesses privados possam contaminar indevidamente
processos decisórios públicos, comprometendo a integridade e impessoalidade que
devem marcar o exercício de toda e qualquer função pública.

De acordo com a OCDE, o estabelecimento de uma política pública voltada à


prevenção dos conflitos de interesses deve necessariamente abarcar: a) a identificação
de riscos para a integridade de organizações públicas e agentes públicos; b) a proibição
de formas específicas inaceitáveis de interesse privado; c) a conscientização das
organizações e agentes públicos a respeito das circunstâncias em que podem surgir
conflitos; d) garantias para que os procedimentos efetivos sejam implantados para a
identificação, divulgação, gestão e promoção da resolução apropriada de situações
de conflito de interesses. Ainda segundo a OCDE, atenção especial deve recair sobre
formadores de políticas e titulares de cargos públicos que trabalham em funções
estruturais do Estado e também sobre agentes responsáveis por decisões em áreas
sensíveis na interface entre os setores público e privado. O objetivo principal é promover
uma cultura de serviço público na qual conflitos de interesse sejam devidamente
identificados e resolvidos ou gerenciados, de maneira apropriadamente transparente
e atempada, sem inibir indevidamente a eficácia e eficiência das organizações públicas
envolvidas.

106
A Lei Federal nº 12.813/13 regula as situações que configuram conflito de
interesses envolvendo ocupantes de cargo ou emprego no âmbito do Poder Executivo
Federal, os requisitos e restrições a ocupantes de cargo ou emprego que tenham
acesso a informações privilegiadas, os impedimentos posteriores ao exercício do
cargo ou emprego e as competências para fiscalização, avaliação e prevenção de
conflitos de interesse. A lei não se afasta das diretrizes gerais da OCDE ao identificar
como conflito de interesse, por exemplo, “receber presente de quem tenha interesse
em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe fora dos limites
e condições estabelecidos em regulamento” (artigo 5º, VI). A lei estabelece ainda um
sistema interessante para a gestão dos conflitos, incluindo a identificação e avaliação
das situações, além da possibilidade de orientação e esclarecimento de dúvidas e
controvérsias interpretativas.

Em se tratando de conflito de interesses, como se percebe, a punição não


é o elemento essencial. Punições já existem, em todas as esferas, para diversos
atos identificados pelo ordenamento (sanções administrativas, disciplinares, crime,
improbidade). O essencial é o estabelecimento de uma política preventiva transparente
e eficaz para evitar a prática dos atos condenáveis por meio da correta identificação,
gestão e, se for o caso, sanção.

Percebe-se que essa política possui não somente uma vertente normativa
(composta de leis, como a Lei nº 12.813/13, códigos de ética e conduta), como outra
institucional/organizacional (a colocar em relevo a importância de instituições
permanentes, com autonomia, competência e poderes para fazer cumprir suas
decisões). Ainda assim, de nada adiantará um marco normativo adequado, a ser
aplicado por instituições igualmente adequadas, se não for discutida com seriedade a
profissionalização da função pública. Nesse particular, a influência político-partidária no
provimento de cargos estruturais do Estado, sobretudo por intermédio dos cargos em
comissão, vai na contramão de qualquer tentativa de profissionalização.

Retomando o caso inicial, vale relembrar a importância do bom exemplo por


parte dos líderes públicos, ocupantes dos escalões superiores do funcionalismo, para
que qualquer política pública de integridade possa ter repercussão e efetividade. Ao
mesmo tempo, a ausência de qualquer proveito ou benefício efetivo não invalida a
importância do tema: o que se busca é evitar a promiscuidade entre interesses por parte
daqueles que devem tutelar somente o interesse público, comprometendo a integridade
e mesmo a confiabilidade das decisões públicas. Neste Dia de Finados, a despeito de
alguns autores já terem reconhecido a morte do tradicional conceito de serviço público,
convém reconhecer que o interesse público ainda respira bem, em que pese necessitar
sempre de cuidados intensivos.

FONTE: MOTTA, F. O interesse público ainda respira bem, mas necessita sempre de cuidados intensivos.
Conjur. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2017-nov-02/interesse-publico-interesse-publico-
ainda-respira-bem-necessita-cuidados. Acesso em: 7 ago. 2021.

107
RESUMO DO TÓPICO 5
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• O regime jurídico administrativo é composto pelas normas que tipificam o Direto


Administrativo e destacam a Administração Pública em circunstância verticalmente
privilegiada.

• A Organização Administrativa é composta pelos organismos administrativos formados


pelo conjunto de pessoas e órgãos com competência para exercer as prerrogativas
conferidas pelo regime jurídico administrativo.

• São características da Administração Pública: a descentralização política; a


autoconstituição das entidades federativas integrantes; e a participação dos entes
federativos na política nacional.

• A Administração Direta compreende as pessoas federativas para o exercício das


atividades de Estado, enquanto a Administração Pública Indireta é composta por
entidades administrativas que prestam serviço de forma descentralizada. Compõem
a Administração Indireta: as autarquias, as fundações, as empresas públicas e a
sociedades de economia mista.

• As autarquias são pessoas jurídicas administrativas com poder de gestão e autonomia


de seus cargos, mas com controle do Estado que a originou.

• As Fundações Públicas de Direito Público são pessoas jurídicas de direito privado


com finalidades não lucrativas e criadas mediante autorização legislativa; enquanto
que as Fundações de Direito Privado são aquelas criadas por particulares para uma
atividade de natureza social.

108
AUTOATIVIDADE
1 A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência. No que diz respeito
aos princípios da Administração Pública, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A Administração Pública somente pode fazer o que a lei autorizar. Por outro lado,
o particular pode fazer tudo aquilo que a lei não proibir.
b) ( ) Não existe vedação legal para atuação da Administração Pública.
c) ( ) O governador pode realizar qualquer ação no seu governo, independentemente
de previsão legal que autorize o seu trabalho.
d) ( ) Os particulares só podem fazer aquilo que a lei permite.

2 O gestor público administra os bens de todos, isto é, da coletividade. Segundo o


princípio da indisponibilidade, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O prefeito de uma cidade pode vender livremente os bens do município,


independentemente de autorização legal, desde que compre outros.
b) ( ) Assim, no exercício da função administrativa, os agentes públicos estão
obrigados a atuar, segundo a sua própria vontade.
c) ( ) Segundo tal princípio, o administrador não pode dispor livremente dos bens
públicos, dependendo de lei que autorize a venda de veículos, por exemplo.
d) ( ) O administrador é titular da máquina pública e do interesse público.

3 A Administração Pública indireta é composta por entidades administrativas e, por


isso, presta serviço de forma descentralizada. No que diz respeito à administração
indireta, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A Petrobrás é considerada uma autarquia.


b) ( ) As autarquias podem ser criadas independentemente de lei específica.
c) ( ) A Caixa Econômica integra a Administração Pública direta.
d) ( ) As autarquias dependem de lei específica para serem criadas.

4 O princípio da supremacia do interesse público sobre o privado é considerado como o


fundamento para o exercício das prerrogativas conferidas à Administração Pública em
busca do interesse público. Considerando esta informação, indique e exemplifique ao
menos três situações de concretização do princípio do interesse público sobre o privado.

5 A Constituição Federal estabelece que a Administração Pública direta e a indireta


estão sujeitas aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da
publicidade e da eficiência. A partir disso, conceitue cada um desses princípios, e, em
seguida, indique exemplos práticos da efetivação desses princípios nas atividades da
Administração Pública.

109
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Rio de
Janeiro, 7 dez. 1940. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/
del2848compilado.htm. Acesso em: 22 jul. 2021.

BRASIL. Decreto-Lei nº 200/1967, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre


a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma
Administrativa e dá outras providências. Brasília, 25 fev. 1967. Disponível em: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm. Acesso em: 22 jul. 2021.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Promulgada em


5 de outubro de 1988. Brasília, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 22 jul. 2021.

CARVALHO FILHO, J. S. Manual de direito administrativo. São Paulo: Atlas, 2009.

COUTO, R. Curso de direito administrativo. 3 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

MAZZA, A. Manual de direito administrativo. São Paulo: Saraiva Educação SA, 2020.

MOTTA, F. O interesse público ainda respira bem, mas necessita sempre de cuidados
intensivos. Revista Consultor Jurídico, [s. l.], 2 nov. 2017. Disponível em: https://
www.conjur.com.br/2017-nov-02/interesse-publico-interesse-publico-ainda-respira-
bem-necessita-cuidados. Acesso em: 6 ago. 2021.

NUCCI, G. S. Manual de direito penal. Rio de Janeiro: Forense, 2019.

110
UNIDADE 3 —

DIREITO DO TRABALHO
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• identificar a aplicabilidade dos princípios de Direito do Trabalho;

• diferenciar a relação de emprego da relação de trabalho;

• enunciar os elementos caracterizadores da relação de emprego;

• identificar os sujeitos da relação de emprego;

• caracterizar a jornada de trabalho;

• identificar as verbas de natureza salarial;

• conceituar o direito às férias e as suas características;

• identificar as formas de extinção contratual.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em seis tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO

TÓPICO 2 – RELAÇÃO DE EMPREGO X RELAÇÃO DE TRABALHO

TÓPICO 3 – JORNADA

TÓPICO 4 – REMUNERAÇÃO X SALÁRIO

TÓPICO 5 – FÉRIAS

TÓPICO 6 – EXTINÇÃO CONTRATUAL

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

111
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!

Acesse o
QR Code abaixo:

112
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 1, abordaremos os princípios do Direito do Trabalho,
aprenderemos seus conceitos e as suas aplicações no dia a dia da prática jurídica.
A correta compreensão dos princípios em Direito do Trabalho é a peça-chave para
alavancar o estudo de outros conceitos. Dessa forma, trata-se de um ponto de partida
fundamental para o estudo avançado.

Princípios são normas que podem ser aplicadas, diretamente, em um caso


concreto, como podem ser instrumentos de interpretação de outras normas. Além disso,
nos casos em que a lei é omissa, os princípios funcionam como peças de integração do
sistema jurídico, suprindo lacunas que as regras não são capazes de abarcar.

Em Direito do Trabalho, vamos encontrar aplicação tanto de princípios gerais


(boa-fé, proporcionalidade, ampla-defesa etc.), quanto de princípios específicos aos
casos trabalhistas, que é o que estudaremos a seguir.

2 PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO
O princípio da proteção disciplina que a parte mais frágil da relação processual
trabalhista será protegida. Isso significa que as normas serão interpretadas e aplicadas
da maneira mais favorável ao trabalhador, visando ao estreitamento dos poderes das
partes, na busca do equilíbrio na relação processual. O princípio objetiva ainda oferecer
uma maneira de compensar a superioridade financeira e a técnica do empregador
em relação ao trabalhador. Ressalta-se que esse princípio não protege todos os
trabalhadores, mas o empregado.

O princípio da proteção possui três aplicações práticas principais, e desdobra-


se em três outros princípios. Confira a seguir.

1. A aplicação da interpretação normativa mais benéfica ao trabalhador (princípio do in


dubio pro operario). Segundo este princípio, na dúvida entre duas normas trabalhistas
que versem sobre o mesmo assunto, prevalecerá aquela que se mostra mais favorável
ao trabalhador no caso concreto.
2. A aplicação da norma mais favorável ao trabalhador, nos casos em que mais de uma
norma é aplicável ao caso em concreto (princípio da aplicação da norma mais favorável).
3. A aplicação da condição mais benéfica ao trabalhador (princípio da condição - ou
cláusula - mais benéfica).

113
FIGURA 1 – SUPERIORIDADE DO EMPREGADOR DIANTE DOS EMPREGADOS

FONTE: <encurtador.com.br/djlu6>. Acesso em: 4 ago. 2021.

A partir do princípio da proteção é muito perceptível a disparidade entre as


partes, ou seja, a diferença entre empregado e empregador. Nesse sentido, devido às
desigualdades técnicas e econômicas entre os polos, o princípio da proteção surge a
partir da intervenção estatal para proteger o trabalhador, seja pela elaboração das leis
trabalhistas, seja pela aplicação da legislação.

Destaca-se que a disparidade entre empregador e empregado encontra as suas


bases no fato de que aquele possui poderes de mandar e chefiar este. Considerando isso,
o legislador e o judiciário devem assegurar a paridade e proteger os mais vulneráveis
das relações presentes no Direito do Trabalho, efetivando, assim, as disposições
constitucionais acerca dos trabalhadores e da dignidade da pessoa humana.

3 PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE
Também chamado de princípio da irrenunciabilidade de direitos, esse princípio
impede que o trabalhador renuncie a direitos trabalhistas. Tal comando está subentendido
nos arts. 9º, 468 e 500 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), havendo ainda outros
textos normativos em que tal princípio encontra-se embutido. Importa ressaltar, ainda,
que a Súmula 276 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) evidencia o seu conteúdo:
“o direito ao aviso prévio é irrenunciável pelo empregado. O pedido de dispensa de
cumprimento não exime o empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação
de haver o prestador dos serviços obtido novo emprego” (BRASIL, 2003, s.p.).

114
O princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas também está relacionado
com a busca de paridade entre os integrantes dos polos empregatícios. Mesmo sendo
considerado como um dos princípios mais importantes do direito do trabalho, em 2017,
com a reforma trabalhista, o princípio da indisponibilidade sofreu algumas modificações.
Assim, alguns acordos realizados entre empregado e empregador que antes eram tidos
como impossíveis de se concretizar, a partir de 2017 se tornaram possíveis.

Anote-se que, mesmo com as relativizações trazidas pela reforma de 2017, a CLT
ainda mantém o cerne do caráter indisponível e irrenunciável dos direitos trabalhistas.

ATENÇÃO
Em Direito do Trabalho, não se admite que o trabalhador renuncie
aos seus direitos. Se, por exemplo, o empregado decidir renunciar
ao seu direito de gozar férias, tal ato não terá qualquer validade,
pois, sendo um direito trabalhista é, portanto, irrenunciável. Nesse
sentido, o art. 9º da CLT assim prevê: “serão nulos de pleno direito
os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar
a aplicação dos preceitos trabalhistas” (BRASIL, 1943, s.p.).

4 PRINCÍPIO DA NORMA MAIS FAVORÁVEL


Como mencionado anteriormente, este princípio é um desdobramento do
princípio da proteção, que é o verdadeiro carro chefe da proteção do trabalhador em
Direito do Trabalho. Nesta seara, o princípio da norma mais favorável estabelece que,
existindo mais de uma norma aplicável ao caso concreto, prevalecerá aquela que mais
beneficie o empregado.

Entende-se que esse princípio foi qualitativamente recepcionado pela


Constituição Federal, no caput do art. 7º, quando dispôs: “São direitos dos trabalhadores
urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social […]”
(BRASIL, 1988, s.p., grifo nosso).

Além do mais, para que se possa falar em aplicação do princípio da norma


mais favorável, é imprescindível que exista uma pluralidade de normas capazes de
produzirem efeitos na seara trabalhista. Preenchido esse elementar, proceder-se-á
com a avaliação de qual norma é mais favorável ao trabalhador, ou seja, haverá uma
comparação entre as normas jurídicas que estão em conflito e assim, aquela que melhor
atender o trabalhador, deverá ser aplicada.

115
5 PRINCÍPIO DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA
Assim como o princípio da norma mais favorável, esse princípio também é um
desdobramento do princípio da proteção. O princípio da condição mais benéfica ordena
que, sobrevindo norma jurídica menos vantajosa ao trabalhador, prevalecerá aquela
anteriormente criada, por ser mais benéfica. Perceba-se que esse princípio guarda
estreita relação com o princípio da segurança jurídica, e visa à proteção do trabalhador
prevista no caput do art. 7º da Constituição Federal. Esse princípio também pode ser
visualizado no art. 468 da CLT, segundo o qual assim dispõe:

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração


das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda
assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos
ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta
garantia (BRASIL, 1943, s. p.).

Pode-se dizer, ainda, sobre o princípio da condição mais benéfica, que este
prediz que as vantagens já conquistadas pelo trabalhador não podem ser modificadas
para pior. Trata-se da regra do direito adquirido, prevista no art. 5º, XXXVI da Constituição
Federal. Um exemplo claro de aplicação deste princípio está previsto na Súmula 51 do
TST, segundo a qual “as cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens
diferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou
alteração do regulamento” (BRASIL, 2005, s.p.).

6 PRINCÍPIO DA INTANGIBILIDADE SALARIAL


O princípio da intangibilidade salarial está evidenciado no inciso VI, do art.
7º, da Constituição Federal, e proíbe a diminuição do salário de forma arbitrária pelo
empregador. Veja-se:

Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de


outros que visem à melhoria de sua condição social: […]
VI- irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou
acordo coletivo (BRASIL, 1988, s.p.).

Com base nisso, o princípio da intangibilidade salarial surge para garantir um


certo grau de estabilidade econômica ao trabalhador. Assim como demais princípios,
a intangibilidade salarial está intimamente ligada com a ideia de proteção da parte
mais vulnerável, qual seja: o trabalhador. Isso ocorre pelo fato de que na ausência
desse princípio, o empregador poderia alterar os salários dos empregados sempre que
achasse conveniente. No entanto, conforme apresentado alhures, o trabalhador possui
a garantia constitucional de que seu salário não será diminuído de maneira arbitrária.

116
FIGURA 2 – CORTE SALARIAL DE TRABALHADOR

FONTE: <encurtador.com.br/fguWY>. Acesso em: 4 ago. 2021.

7 PRINCÍPIO DA REALIDADE SOBRE A FORMA


Esse princípio, também chamado de princípio da primazia da realidade,
prescreve que os fatos prevalecem sobre os documentos e sobre as aparências. Esse
princípio (em combinação com o princípio da proteção, que reconhece a vulnerabilidade
do trabalhador, como parte mais frágil na relação processual), reconhecendo a
hipossuficiência (técnica e financeira) do empregado, pressupõe que, muitas vezes,
na relação “empregador X empregado”, aquilo que está pactuado no “papel” pode não
refletir a realidade da situação do trabalhador.

Na CLT, os arts. 9º, 442 e 456 apresentam a incidência do princípio da realidade


sobre a forma. Ei-los:

Art. 9º - Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo


de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos
na presente Consolidação. (BRASIL, 1943, s. p.).

Art. 442 - Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou


expresso, correspondente à relação de emprego. (BRASIL, 1943, s. p.).

Art. 456. A prova do contrato individual do trabalho será feita pelas


anotações constantes da carteira profissional ou por instrumento
escrito e suprida por todos os meios permitidos em direito.

Parágrafo único. A falta de prova ou inexistindo cláusula expressa


e tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e
qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal (BRASIL,
1943, s.p.).

Assim, a partir desse princípio, mesmo havendo a formalização de quaisquer


situações ou garantias trabalhistas no contrato de trabalho ou na carteira de trabalho,
o que realmente possuirá validade jurídica será a realidade vivenciada pelo trabalhador.

117
A título de exemplo podemos ilustrar um caso hipotético em que o empregador efetue
pagamentos ao trabalhador superiores àqueles previstos no contrato de trabalho. Nesse
caso, a realidade irá se sobressair sobre a forma e os valores que servirão para uma
futura base de cálculo em uma ação trabalhista serão os efetivamente pagos e não os
previstos no contrato de trabalho.

IMPORTANTE
Em direito do trabalho, a busca pela realidade na relação de
trabalho prevalece sobre aquilo que está documentado, a fim de
que o trabalhador seja protegido, mesmo que tenha assinado
ou, supostamente, pactuado em documento que diverge da sua
condição real de trabalho.

118
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os princípios são normas que podem ser aplicadas diretamente, em um caso concreto,
como podem funcionar como peças de integração do sistema jurídico, auxiliando os
operadores a preencherem as lacunas existentes na legislação.

• O princípio da proteção visa oferecer uma maneira de compensar a superioridade


financeira e técnica do empregador em relação ao trabalhador. A finalidade desse
princípio é realmente proteger o trabalhador.

• Em direito do trabalho, não se admite que o trabalhador renuncie a seus direitos.


Mesmo com a mitigação desse princípio com a reforma trabalhista de 2017, a CLT
mantém suas bases de irrenunciabilidade.

• O princípio da norma mais favorável estabelece que, existindo mais de uma norma
aplicável ao caso concreto, prevalecerá aquela que mais beneficie o empregado.
Nesses termos, existe uma vedação ao retrocesso trabalhista.

• O princípio da condição mais benéfica ordena que, sobrevindo norma jurídica menos
vantajosa ao trabalhador, prevalecerá aquela anteriormente criada, por ser mais
benéfica.

• O princípio da intangibilidade salarial proíbe a diminuição do salário de forma arbitrária


pelo empregador.

• Em direito do trabalho, a busca pela realidade na relação de trabalho prevalece sobre


aquilo que está documentado, a fim de que o trabalhador seja protegido.

119
AUTOATIVIDADE
1 Os princípios são normas que possuem função de integrar a ordem jurídica. Assim, a
aplicabilidade dos princípios na prática trabalhista é muito grande. No que diz respeito
ao princípio da proteção, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O direito do trabalho possui como matriz a proteção do empregador diante dos


abusos do empregado, como as faltas injustificadas ao serviço.
b) ( ) Empregado e empregador estão no mesmo nível de proteção.
c) ( ) O direito do trabalho não é protecionista.
d) ( ) O direito do trabalho, com base no princípio da proteção, visa proteger o
trabalhador, parte vulnerável da relação empregatícia.

2 O art. 8º da CLT (BRASIL, 1943, s.p.) aponta as fontes do Direito do Trabalho destacando
que tanto os princípios gerais quanto os princípios específicos serão aplicados
no direito do trabalho. Com base nisso, quando o juiz for interpretar determinada
norma, ele deve considerar aquela que seja mais favorável ao trabalhador. Assinale
a alternativa CORRETA que corresponda à passagem expressa anteriormente:

a) ( ) Princípio da qualidade da norma.


b) ( ) Princípio da garantia da norma.
c) ( ) Princípio da norma mais favorável.
d) ( ) Princípio da segurança da norma.

3 Nos moldes da CF/88, o salário deve atender todas as necessidades básicas do


trabalhador e de sua família. Assinale a alternativa CORRETA no que diz respeito ao
princípio da irredutibilidade salarial:

a) ( ) Por possuir natureza alimentar, o salário não pode ser unilateralmente reduzido.
b) ( ) Somente os trabalhadores que recebem salário-mínimo serão protegidos pela
irredutibilidade salarial, dado a sua condição de hipossuficiente.
c) ( ) O salário pode ser reduzido, desde que o trabalhador aceite de maneira individual.
d) ( ) O salário pode ser reduzido por meio de decreto.

4 No direito do trabalho, devemos sempre analisar a prática concreta das prestações


de serviços como forma de efetivar o princípio da realidade sobre a forma. Nesse
sentido, disserte sobre a importância desse princípio, bem como exemplifique a sua
aplicação prática.

120
5 O princípio da norma mais favorável pode ser visualizado em três esferas relacionadas
ao direito do trabalho, quais sejam: a) na elaboração das normas; b) no conflito de
normas; e na interpretação de normas. A partir disso, imagine que João trabalhe em
uma empresa XYZ e, em seu contrato de trabalho, consta que não haverá expediente
noturno. No entanto, surge a necessidade de aumento da produção e a empresa
XYZ altera o contrato de trabalho de João para que ele trabalhe no período noturno.
Considerando essa situação hipotética, a ação da empresa XYZ está abarcada pela
legislação trabalhista? Disserte sobre o assunto.

121
122
UNIDADE 3 TÓPICO 2 —
RELAÇÃO DE EMPREGO X RELAÇÃO
DE TRABALHO

1 INTRODUÇÃO
Agora, no Tópico 2, abordaremos a necessária distinção entre as relações de
emprego e de trabalho, conceitos que, muitas vezes, são confundidos (até mesmo pela
própria legislação trabalhista) e cuja diferenciação se faz necessária.

Em Direito do Trabalho, nota-se que o assunto tratado pela legislação trabalhista é,


na realidade, a relação de emprego. Ou seja, a própria CLT confunde ambos os conceitos.
No entanto, deve ficar claro que, na maioria das vezes, a modalidade disciplinada por
essa legislação refere-se à relação de emprego, na qual está caracterizado o trabalho
subordinado. Portanto, há uma diferença técnica entre a relação de emprego e a
relação de trabalho, que a CLT não deixou muito clara.

FIGURA 3 – CONJUNTO DE TRABALHADORES

FONTE: <encurtador.com.br/afHS3>. Acesso em: 4 ago. 2021.

A relação de emprego é uma espécie do gênero relação de trabalho. Na relação


de emprego, algumas características são evidentes, como, por exemplo, a subordinação
e a habitualidade. Observe-se que o direito brasileiro não faz distinção entre empregado
e operário, isto é, para a legislação trabalhista brasileira, não importa se o trabalho é
intelectual ou manual, a proteção será a mesma.

Diferenciar “contrato de trabalho” e “contrato de emprego” é simples. “Contrato de


trabalho” é gênero, enquanto que “contrato de emprego”, é espécie. O contrato de trabalho
pode compreender qualquer tipo de trabalho, por exemplo, trabalho autônomo, eventual,
avulso etc. Já o contrato de emprego pressupõe a relação de subordinação entre empregador
e empregado. A CLT e a Justiça do Trabalho, de modo geral, disciplinam e julgam questões e
situações envolvendo relações de emprego. Observe que a CLT assim preceitua:

123
Art. 442. Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso,
correspondente à relação de emprego.
[…]
Art. 443. O contrato individual de trabalho poderá ser acordado
tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo
determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho
intermitente (BRASIL, 1943, s. p.).

Observa-se, portanto, que a CLT não é precisa na definição de seus conceitos,


uma vez que, ora utiliza-se da expressão “relação de emprego”, como podemos ver
nos arts. 2º e 6º, por exemplo, ora utiliza-se da expressão “contrato de trabalho” (arts.
443, 445, 448, 451, etc.). Trata-se de uma falha técnica da própria CLT, que embaralhou
ambos os conceitos, situação que procuraremos esclarecer a seguir.

2 CONCEITOS
Martins (2019, p. 161), ao conceituar contrato de trabalho (aqui, melhor
compreendido como contrato de emprego, disciplinado pela legislação trabalhista),
o define como:

[...] o negócio jurídico entre uma pessoa física (empregado) e uma


pessoa física ou jurídica (empregador) sobre condições de trabalho
[…]. A relação se forma entre empregado e empregador […]. Representa
o contrato de trabalho um pacto de atividade, pois não se contrata
um resultado. Deve haver continuidade na prestação de serviços, que
deverão ser remunerados e dirigidos por aquele que obtém a referida
prestação. Tais características evidenciam a existência de um acordo
de vontades, caracterizando a autonomia privada das partes.

3 ELEMENTOS CARACTERIZADORES
O contrato tratado pela CLT (que, apesar de dizer “trabalho”, melhor se qualifica
como de “emprego”) refere-se ao trabalho não gratuito e contínuo, prestado de forma
hierarquicamente subordinada pelo empregado ao empregador. A relação de emprego
importa em elementos caracterizadores. São eles: continuidade, subordinação,
onerosidade, pessoalidade e alteridades. Detalharemos cada um desses elementos
a seguir.

No concernente à continuidade, trata-se de requisito que traduz o trato


sucessivo, duradouro da relação de emprego. Podemos dizer que, se o serviço é
esporádico, descontínuo, não se trata de relação de emprego. Chamamos a atenção
para o fato de que a relação de emprego não se resume a um serviço estritamente de
resultado, pois trata-se de uma prestação contínua, um esforço contínuo em prol da
atividade econômica sob direção do empregador.

124
Quanto à subordinação, podemos defini-la como a dependência do empregado à
direção do empregador. Na relação de emprego, a atividade econômica em que trabalha o
empregado é dirigida e comandada pelo empregador, que também assume todos os riscos
dessa atividade. Nesse caso, o empregado se coloca à disposição do empregador para
produzir conforme as orientações deste, conforme entender conveniente ao negócio.

FIGURA 4 – EMPREGADOR ORIENTANDO EMPREGADOS

FONTE: <encurtador.com.br/eEO12>. Acesso em: 4 ago. 2021.

Com relação à onerosidade, esta refere-se à contraprestação salarial do


empregado, por seus serviços prestados. O contrato de emprego é, necessariamente,
oneroso. Se não há remuneração, a relação contratual não é de emprego.

FIGURA 5 – EMPREGADOS RECEBENDO SALÁRIO

FONTE: <encurtador.com.br/eyBLR>. Acesso em: 4 ago. 2021.

125
A pessoalidade importa em dizer que emprego é intuito personae. Ou seja,
personalíssimo, pactuado com pessoa determinada e insubstituível. Nessa situação,
o empregado apenas pode ser pessoa física, pois não há relação de emprego entre
contratante e pessoa jurídica. Por isso, dispõe-se que o contrato de trabalho é pessoal
e intransferível. Em caso de necessidade de substituição ou troca de empregado, o
contrato deve ser encerrado e outro deve ser formulado.

FIGURA 6 – CONTRATO DE TRABALHO PESSOAL

FONTE: <encurtador.com.br/cFSZ5>. Acesso em: 4 ago. 2021.

A alteridade ocorre quando o empregado presta serviços em benefício de


outrem. Há, nessa ocasião, uma contraprestação pecuniária sem assumir nenhum risco
por eventuais prejuízos do negócio. Isso significa que o negócio está sob responsabilidade
do empregador, detentor dos lucros (ou da parte majoritária deles) e dos riscos, que não
se comunicam ao empregado.

Ainda é possível citar como exemplo de características do contrato de trabalho


a não obrigatoriedade da exclusividade da prestação de serviços a apenas um único
empregador; a não necessidade da especialização do empregado para a sua contratação;
a intenção do empregado (se o trabalhador possuía a intenção de ser sócio da empresa,
isso pode descaracterizar a relação de emprego, por exemplo). No entanto, tratam-se de
requisitos não essenciais ao contrato de trabalho.

4 SUJEITOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO


Em uma relação de emprego, é possível definir empregado como a pessoa física
que presta serviço de forma habitual e subordinada a outra pessoa (física ou jurídica),
mediante contraprestação financeira que compense suas horas de trabalho.

126
FIGURA 7 – EMPREGADOS EM LINHA DE PRODUÇÃO

FONTE: <encurtador.com.br/psOST>. Acesso em: 4 ago. 2021.

Por sua vez, o empregador será a pessoa física ou jurídica que está à frente da
atividade econômica e assume todos os riscos. Ele será o responsável por comandar a
atividade, contratar, orientar e dirigir o trabalho dos empregados, mediante o pagamento
de salário.

FIGURA 8 – EMPREGADORA COORDENANDO OS SERVIÇOS

FONTE: <encurtador.com.br/rGJOV>. Acesso em: 4 ago. 2021.

127
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Há uma diferença técnica entre a relação de emprego e a relação de trabalho. A


relação de emprego é uma espécie do gênero relação de trabalho. Na relação de
emprego, algumas características são evidentes, como, por exemplo, a subordinação
e a habitualidade.

• O direito brasileiro não faz distinção entre empregado e operário, isto é, para a
legislação trabalhista brasileira, não importa se o trabalho é intelectual ou manual, a
proteção será a mesma.

• O contrato de trabalho (emprego) de que trata a CLT, então, refere-se à prestação de


serviço subordinado e não eventual do empregado para com o empregador.

• A relação de emprego pressupõe alguns elementos caracterizadores, sendo eles:


continuidade, subordinação, onerosidade, pessoalidade e alteridades.

128
AUTOATIVIDADE
1 O direito do trabalho é um ramo do direito responsável por abarcar as relações de
trabalhos. No que concerne às peculiaridades entre relação de emprego e relação de
trabalho, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Todo indivíduo que prestar serviços esporadicamente ao empregador será


considerado empregado.
b) ( ) A natureza não eventual é um dos requisitos para configurar a relação de
emprego.
c) ( ) Será considerado empregado o trabalhador que prestar serviços ao empregador,
independentemente do recebimento de salário.
d) ( ) A prestação de serviço autônomo é considerada uma relação de emprego.

2 Existem diferenças entre relação de emprego e relação de trabalho do ponto de


vista jurídico. Sabemos que, para caracterizar a relação de emprego, é necessária a
existência de alguns requisitos. Com base no exposto, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as falsas:

I- Para caracterizar a relação de emprego, a prestação do serviço pode ser feita por
pessoa física ou jurídica.
II- A pessoalidade e a não eventualidade são alguns dos requisitos para caracterizar a
relação de emprego, embora não sejam cumulativos.
III- A subordinação do empregado ao empregador é um dos requisitos para caracterizar
a relação de emprego.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença III está correta.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença I está correta.

3 A CLT destaca os sujeitos da relação de emprego no direito do trabalho. Sobre o tema,


analise as sentenças a seguir:

I- Nos moldes do art. 3º, da CLT, o empregado somente será pessoa física.
II- Para ser considerado empregador, o sujeito da relação de trabalho deve assumir os
riscos da atividade econômica.
III- O empregador, dentre outras atividades, assalaria e dirige a prestação pessoal de
serviço.

129
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) Somente a sentença III está correta.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) Somente a sentença I está correta.
d) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.

4 Em uma análise fora do campo jurídico, trabalho e emprego podem ser entendidos
como sinônimos. Acontece que, assim como em todo ramo do direito, a seara
trabalhista possui termos técnicos que devem ser observados e seguidos, sob pena
de incorrer em atecnia jurídica. Dito isso, elenque as principais características sobre
relação de trabalho e relação de emprego.

5 A CLT (BRASIL, 1943, s.p.) versa sobre o trabalho do menor e apresenta algumas
peculiaridades. A título de exemplo, uma função que pode ser exercida pelos menores
é o estágio. Outro exemplo que merece destaque é o caso do menor aprendiz. A partir
disso, aponte qual é a idade legal para o trabalho dos menores, a jornada de trabalho
e as restrições impostas aos trabalhos dos menores.

130
UNIDADE 3 TÓPICO 3 —
JORNADA

1 INTRODUÇÃO
Agora, no Tópico 3, abordaremos o tema “jornada de trabalho”. A legislação
brasileira oferece olhar especial à jornada do trabalhador, pois, ao regulamentá-la, estão
sendo observados os limites de saúde do trabalhador, as horas que devem lhe restar
para outras tarefas durante o dia, como, subsistência, alimentação, lazer etc.

Dessa maneira, a regulamentação da jornada de trabalho é um assunto sério,


que envolve questões de saúde e de segurança do trabalhador, tendo em vista que as
suas integridades física, psicológica e moral devem ser preservadas durante o seu dia
de trabalho.

A jornada de trabalho é compreendida como o tempo de oito horas em que


o empregado se designa ao trabalho. Por vezes, nem sempre haverá, dentro das oito
horas, trabalho efetivamente depreendido. Por outro lado, a duração do trabalho é o
período de tempo em que o empregado presta serviços ao empregador, descontado
o período de intervalo. A jornada de trabalho, portanto, seria a quantidade de serviço
prestado pelo empregado durante um dia.

FIGURA 9 – FINAL DE JORNADA DIÁRIA DE EMPREGADO

FONTE: <encurtador.com.br/gqBRV>. Acesso em: 4 ago. 2021.

131
2 ESPÉCIES DE JORNADA
Conforme apresentando no tópico anterior, a jornada pode ser entendida como
uma contagem de tempo em que o empregado realiza suas atividades. Em outras
palavras, a jornada é a quantidade de trabalho fornecida, diariamente, pelo empregado
ao empregador em decorrência de uma pactuação entre as partes.

A partir disso, três perspectivas precisam ser consideradas quando falamos


em jornada de trabalho: 1) tempo efetivamente trabalhado; 2) tempo à disposição do
empregador; 3) tempo in itinere. Deve-se destacar que a legislação brasileira sobre
direito do trabalho permite o denominado sistema híbrido sobre a teoria do tempo
efetivamente trabalhado, ou seja, é possível haver mais de uma espécie de jornada para
um mesmo empregado.

Com relação ao tempo efetivamente trabalhado, os adeptos a essa teoria


consideram computados na jornada de trabalho apenas as horas em que o empregado
esteja realmente exercendo suas atividades laborais. Nessa perspectiva, os períodos de
descanso não estariam abarcados pela teoria do tempo efetivamente trabalhado.

Ao se falar que os períodos de descanso não integram a jornada de trabalho,


chega-se à consequência de que não haveria remuneração desses respectivos períodos,
o que gera uma certa pressão no empregado para um maior volume de produção e trabalho.

No que se refere à teria do tempo à disposição do empregador, considera-


se como jornada de trabalho todo aquele lapso temporal em que o empregado fica à
disposição do empregador. Esse tempo de espera pode ocorrer enquanto o empregado
aguarda ordens, por exemplo. Nessa toada, será computado na jornada de trabalho os
períodos em que o empregado ficou de prontidão, mesmo que durante esse período não
tenha desempenhado alguma atividade laborativa.

Por sua vez, o tempo in intinere representa o lapso temporal em que o trabalhador
dispende para chegar e voltar do trabalho. Com a reforma trabalhista de 2017, o art. 58,
§2º da CLT passou a prever expressamente que o tempo in intinere não integrará a
jornada de trabalho do empregado. Eis o dispositivo mencionado:

§ 2º O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência


até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno,
caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido
pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por
não ser tempo à disposição do empregador. (BRASIL, 1943, s.p.).

A teoria do tempo efetivamente trabalhado não é aplicada no Brasil. Segundo a


legislação brasileira, a teoria adotada é a do tempo em que o empregado fica à disposição
do empregador. No entanto, depois de 2017, o lapso temporal gasto para chegar até o
trabalho, não será computado na jornada, dada a previsão expressa do art. 58, §2º da CLT.

132
3 DURAÇÃO DO TRABALHO
Observa-se que a teoria do tempo à disposição do empregador considera como
duração do trabalho o momento em que o empregado, não apenas está trabalhando,
mas também os momentos em que ele está de prontidão, aguardando ser acionado; os
momentos em que ele está de sobreaviso; e os momentos em que ele está na empresa,
à disposição do empregador. A CLT (BRASIL, 1943, s.p.) prevê exemplos dessa teoria nos
arts. 294 (que trata sobre o trabalho dos mineiros); 238 e 244, § 2º (que versam sobre
o trabalho dos ferroviários); e a Súmula 229 do TST (BRASIL, 2003, s.p.), que regula o
sobreaviso dos eletricitários.

Cabe, ainda, dizer que o art. 4º da CLT assim prevê: “considera-se como serviço
efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando
ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada” (BRASIL,
1943, s.p.).

A teoria do tempo in itinere considera como tempo de jornada de trabalho,


também, o momento do trajeto do empregado desde a sua residência até o local de
trabalho e seu retorno. No direito brasileiro, há hipóteses em que essa teoria é admitida,
mas cuidado! A legislação brasileira admite o cômputo das horas in itinere na jornada de
trabalho, mas desde que o empregador forneça a condução e o local de trabalho seja de
difícil acesso ou não servido por transporte regular público. É o que prevê o § 2º do art.
58 da CLT (BRASIL, 1943, s.p.).

FIGURA 10 – TEMPO DE TRABALHO DISPONÍVEL

FONTE: <encurtador.com.br/dhzLY>. Acesso em: 4 ago. 2021.

133
4 PERÍODO DE DESCANSO
Os trabalhadores possuem direito a descansar entre os turnos de trabalhos. Tanto
entre turnos de dias diferentes, quanto dentro do mesmo turno quando estiverem em
uma jornada de trabalho extensiva. Ou seja, durante a jornada de trabalho, propriamente
dita, ou entre uma jornada e outra. Estudaremos agora apenas os intervalos relacionados
à jornada de trabalho.

Quanto aos intervalos relacionados à jornada de trabalho, esses podem ser


de dois tipos: interjornada ou intrajornada. Trataremos primeiro dos intervalos
intrajornada, que são aqueles realizados durante a própria jornada de trabalho. Esse
intervalo está regulamentado pelo art. 71 da CLT (BRASIL, 1943, s.p.):

Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda 6 (seis) horas, é


obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação,
o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou
contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas.
§ 1º- Não excedendo de 6 (seis) horas o trabalho, será, entretanto,
obrigatório um intervalo de 15 (quinze) minutos quando a duração
ultrapassar 4 (quatro) horas.
§ 2º- Os intervalos de descanso não serão computados na duração
do trabalho.

O intervalo intrajornada é garantido para preservar a saúde, a segurança e a


higiene do empregado, sendo mais do que um direito garantido, mas uma necessidade
do trabalhador que a legislação protege.

Após a reforma trabalhista de 2017, foi introduzido o art. 611-A. Nos moldes
do inc. III desse dispositivo, o empregado que possuir uma jornada acima de 6 horas,
poderá ser reduzido o intervalo intrajornada, desde que respeitado o limite mínimo de 30
minutos. Eis o dispositivo em análise:

Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm


prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:
[...]
III- intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos
para jornadas superiores a seis horas (BRASIL, 1943, s. p.).

Deve-se deixar claro que essa redução não significa uma discricionariedade do
empregador. Assim para haver a redução é imprescindível a presença de uma convenção
ou um acordo coletivo de trabalho, nos quais deverão constar todas as disposições
acerca do descanso e da alimentação dos empregados.

Outro ponto importante que deve ser avocado e que diz respeito ao intervalo
intrajornada é que esse lapso temporal de descanso não integrará as horas trabalhadas.
Isso significa dizer que se um empregado possui a jornada diária de 8 horas, ele deverá
permanecer no trabalho pelo período de 9 horas, pois a diferença de 1 hora será destinada
ao intervalo de descanso intrajornada.

134
O intervalo interjornada é aquele em que o trabalhador possui um tempo
para descansar entre um dia e outro de trabalho. Ou seja, entre uma jornada de trabalho
e outra. O art. 66, da CLT (BRASIL, 1943, s.p.), regulamenta o intervalo interjornada ao
dispor que, entre duas jornadas de trabalho, deve haver um intervalo mínimo de 11 horas
consecutivas para descanso.

Nesse sentido, o intervalo interjornada é considerado o período de descanso


entre uma jornada e outa de trabalho, tendo por objetivo a recuperação mental e física,
proporcionando uma maior produtividade, zelo pela saúde e convívio com familiares.
Assim a inobservância dos preceitos contidos no art. 66 da CLT gera multa de natureza
administrativa ao empregador, conforme se extrai do art. 75 da CLT.

A súmula 110 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) apresenta que o empregador,


deverá pagar horas extras ao profissional pela não concessão regular do intervalo
interjornada pelo aos professores, in verbis:

Súmula nº 110 do TST: No regime de revezamento, as horas


trabalhadas em seguida ao repouso semanal de 24 horas, com
prejuízo do intervalo mínimo de 11 horas consecutivas para descanso
entre jornadas, devem ser remuneradas como extraordinárias,
inclusive com o respectivo adicional. (BRASIL, 2003, s.p.).

A partir disso, pode-se inferir que os intervalos, seja ele intrajornada ou


interjornada, decorrem de razões físicas, biológicas e econômicas. Por meio dos
intervalos, busca-se prevenir a fadiga, e assegurar que o empregado tenha condições
de melhor produzir.

FIGURA 11 – TRABALHADOR EM PERÍODO DE DESCANSO

FONTE: <encurtador.com.br/pFW38>. Acesso em: 4 ago. 2021.

135
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• A duração do trabalho é o período de tempo em que o empregado presta serviços ao


empregador, descontado o período de intervalo.

• No Brasil, a legislação trabalhista admite um sistema híbrido das teorias do tempo à


disposição do empregador e do tempo in itinere, havendo rejeitado a teoria do tempo
efetivamente trabalhado.

• A teoria do tempo à disposição do empregador considera como duração do trabalho


o momento em que o empregado, não apenas está trabalhando, mas também os
momentos em que ele está de prontidão, aguardando ser acionado.

• A teoria do tempo in itinere considera como tempo de jornada de trabalho, também,


o momento do trajeto do empregado desde a sua residência até o local de trabalho e
seu retorno.

• Quanto aos intervalos relacionados à jornada de trabalho, esses podem ser de dois
tipos: interjornada ou intrajornada.

• O intervalo interjornada é aquele período de descanso entre uma jornada e outra,


ou seja, entre o final de uma jornada e o início de outra. Lembrando que o intervalo
interjornada deve ser de 11 horas, nos moldes do art. 66 da CLT.

• O intervalo intrajornada é aquele que ocorre dentro da própria jornada de trabalho.


A título de exemplo pode-se apresentar o horário de almoço. A reforma trabalhista
de 2017, por meio do inc. III do art. 611-A da CLT autoriza a diminuição do intervalo
intrajornada, respeitando o limite de 30 minutos.

136
AUTOATIVIDADE
1 A jornada pode ser compreendida como o lapso temporal diário em que o trabalhador
disponibiliza seus serviços ao empregador. No que se refere à jornada, assinale a
alternativa CORRETA:

a) ( ) O limite de jornada está ligado à preocupação com as horas extras; não se


dedicando à saúde do empregado.
b) ( ) A legislação não autoriza a jornada de trabalho 12h x 36h.
c) ( ) A Constituição de 1988 prevê a jornada de 8 horas diárias e 40 horas semanais.
d) ( ) A Constituição de 1988 prevê o limite da jornada em 8h diárias e 44 horas
semanais.

2 As normas que versam sobre a jornada de trabalho estão intimamente ligadas com
a saúde dos trabalhadores e com a harmonia do meio ambiente do trabalho. Sobre o
intervalo de jornada, analise as sentenças a seguir:

I- O intervalo intrajornada sempre será de 1 hora.


II- O intervalo interjornada compreende o período de 11 horas entre os dias.
III- O intervalo de repouso diário considerado como tempo de descanso do trabalhador
entre um dia e o outro será denominado de intervalo interjornada.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença III está correta.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença II está correta.

3 A CLT prevê os períodos de descanso dos trabalhadores. Esses períodos podem ser,
por exemplo, intrajornada ou extrajornada. No tocante ao descanso dos trabalhadores,
analise as sentenças a seguir:

I- O repouso semanal remunerado ocorrerá, preferencialmente, aos domingos.


II- O horário de almoço é um exemplo de intervalo intrajornada.
III- As horas extras são períodos de descanso extrajornada.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) Somente a sentença I está correta.
b) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença II está correta.

137
4 João trabalha em uma empresa de serviço de assistência técnica para computadores.
Nessa empresa, a sua jornada de trabalho tem duração de 6 horas. A empresa está
obrigada a permitir que João faça uma pausa? Qual é a regra geral sobre os intervalos
intrajornada?

5 A duração do trabalho possui parâmetros regulamentados tanto pela Constituição


Federal quanto pela Consolidação das Leis do Trabalho. O objetivo é preservar a
saúde do trabalhador e garantir um descanso tanto entre um dia e outro de trabalho
quanto dentro do mesmo dia em jornadas extensivas. Sobre a jornada de trabalho na
legislação brasileira, conceitue a teoria do tempo in itinere.

138
UNIDADE 3 TÓPICO 4 —
REMUNERAÇÃO X SALÁRIO

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, neste tópico, abordaremos o tema da remuneração e do salário do
trabalhador. A remuneração é a contraprestação que o trabalhador recebe pelas horas
de serviço prestadas ao empregador. Além disso, é possível entender a remuneração
como um gênero composto pelo salário e pelas gorjetas. O salário é pago diretamente
pelo empregador ao empregado, enquanto que as gorjetas são pagas por terceiros.

A regulamentação desse tema pelo ordenamento jurídico é de suma importância,


pois, no regramento da remuneração, devem protegidas a dignidade do trabalhador,
a sua saúde, a sua alimentação, a sua subsistência, a sua moral, e outros princípios
relacionados a sua vida.

É por essa razão que este tema deve ser objeto de muita atenção e estudo.
Como exemplo, tomemos o salário mínimo, o qual deve (ou, pelo menos, deveria) ser
suficiente para garantir ao trabalhador a sua alimentação digna, vestimentas, acesso à
saúde e à educação de qualidades. Entretanto, na prática, vemos que isso não acontece.
Por essa razão, à medida em que avançamos com os estudos em direito do trabalho,
fica mais claro o quanto ainda precisamos progredir, e apenas será possível com a
conscientização e a mobilização da sociedade e de seus líderes.

FIGURA 12 – IGUALDADE SALARIAL

FONTE: <encurtador.com.br/desz9>. Acesso em: 4 ago. 2021.

139
2 CONCEITOS
A remuneração do empregado é a retribuição, a contraprestação salarial pelo
serviço prestado. A remuneração é disciplinada pelo Capítulo II da CLT, que, em seu art.
457, assim rege:

Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos


os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo
empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que
receber.
§ 1º Integram o salário a importância fixa estipulada, as gratificações
legais e as comissões pagas pelo empregador.
§ 2º As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda
de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro,
diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração
do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não
constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e
previdenciário (BRASIL, 1943, s. p.).

Observe-se que o art. 458 da CLT admite o pagamento de salário em utilidades,


o que chamou de prestações in natura. Veja-se o texto legal:

Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para


todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras
prestações "in natura" que a empresa, por força do contrato ou do
costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será
permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.
§ 1º Os valores atribuídos às prestações "in natura" deverão ser justos
e razoáveis, não podendo exceder, em cada caso, os dos percentuais
das parcelas componentes do salário-mínimo (arts. 81 e 82).
§ 2o Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas
como salário as seguintes utilidades concedidas pelo empregador:
I- vestuários, equipamentos e outros acessórios fornecidos aos
empregados e utilizados no local de trabalho, para a prestação
do serviço;
II- educação, em estabelecimento de ensino próprio ou de terceiros,
compreendendo os valores relativos a matrícula, mensalidade,
anuidade, livros e material didático;
III- transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno,
em percurso servido ou não por transporte público;
IV- assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada direta-
mente ou mediante seguro-saúde;
V- seguros de vida e de acidentes pessoais;
VI- previdência privada;
VII- (VETADO);
VIII- o valor correspondente ao vale-cultura.
§ 3º - A habitação e a alimentação fornecidas como salário-utilidade
deverão atender aos fins a que se destinam e não poderão exceder,
respectivamente, a 25% (vinte e cinco por cento) e 20% (vinte por
cento) do salário-contratual (BRASIL, 1943, s.p.).

140
O objetivo da remuneração é que o trabalhador, com ela, possa garantir a sua
subsistência e de sua família. O valor do mínimo necessário à subsistência deveria
ser aquele fixado no salário mínimo, mas sabemos que, na realidade, isso dificilmente
acontece.

Martins (2019, p. 381) esclarece que são elementos da remuneração: a


habitualidade, a periodicidade, a quantificação, a essencialidade e a reciprocidade.
A habitualidade e a periodicidade são requisitos necessários na caracterização da
remuneração pois, como o contrato de trabalho é um pacto de trato sucessivo, contínuo,
a remuneração também o deve ser. É direito do empregado saber quanto receberá no
fim do mês. Portanto, seu salário deve ser quantificável, e o cálculo do salário-base deve
ser pago independente de outras condições.

Quanto ao requisito da essencialidade, é sabido que toda relação de emprego


é onerosa. Assim, faz parte da caracterização da relação de emprego o pagamento de
salário, razão pela qual prestará o trabalhador serviços ao empregador.

Quanto à reciprocidade, está subentendida no caráter pactual da relação de


emprego. Isto é, paga-se uma remuneração em contrapartida a uma prestação de
serviços. Esta é a ilustração do requisito da reciprocidade, elemento essencial na
caracterização da remuneração.

FIGURA 13 – RECEBIMENTO DE GORJETA

FONTE: <encurtador.com.br/dwFGO>. Acesso em: 4 ago. 2021.

141
3 ADICIONAIS
Os adicionais são contraprestações suplementares, pagas ao empregado em
razão da prática de atividades em situações ou circunstâncias especiais. São exemplos
de adicionais: a insalubridade e a periculosidade.

FIGURA 14 – TRABALHO DE PERICULOSIDADE

FONTE: <encurtador.com.br/xMNP4>. Acesso em: 4 ago. 2021.

Importa esclarecer que os adicionais são parcelas salariais, pagas ao trabalhador


em razão de atividade mais danosa, perigosa ou insalubre. Observe-se que o valor dos
adicionais pode variar em razão da intensidade do risco ao trabalhador. Por exemplo, a
insalubridade pode variar (tendo como referencial o salário mínimo) nos percentuais de
10, 20 e 30%, a depender do grau de insalubridade (mínimo, médio e máximo).

FIGURA 15 – AMBIENTE DE TRABALHO INSALUBRE

FONTE: <encurtador.com.br/rVXZ4>. Acesso em: 4 ago. 2021.

142
4 VERBAS QUE POSSUEM NATUREZA SALARIAL
O § 1º, do art. 457, da CLT prevê que “integram o salário a importância fixa
estipulada, as gratificações legais e as comissões pagas pelo empregador” (BRASIL,
1943, s.p.). Assim, são verbas de natureza salarial, o salário in natura, as comissões,
as gratificações e a gorjeta. Por sua vez, possuem caráter indenizatório as diárias, os
prêmios, as ajudas de custo, a participação nos lucros, o salário-família e o abono. Como
mencionado anteriormente, o salário in natura é aquele pago por meio de utilidades
(moradia, alimentação, vestuário etc.), conforme previsto no art. 458 da CLT.

As comissões são uma forma de remuneração por unidade de obra ou serviços,


medidas através da produção do empregado. É muito comum a prática da comissão para
os empregados que trabalham com comércio, de forma que a retribuição de comissões
é um incentivo à produtividade do empregado e ao lucro do empregador.

Quando o empregador, por liberalidade, deseja remunerar o empregado com um


valor extra, isso é chamado de gratificação. E conforme determinação do § 1º, do art. 457,
da CLT (BRASIL, 1943, s.p.), para todos os efeitos legais, a gratificação integra a verba
salarial. Por fim, a gorjeta é todo o pagamento realizado por terceiros ao empregado,
como retribuição pelo serviço este prestou.

143
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• São elementos da remuneração: a habitualidade, a periodicidade, a quantificação, a


essencialidade e a reciprocidade.

• Os adicionais são contraprestações suplementares, pagas ao empregado em razão


da prática de atividades em situações ou circunstâncias especiais. São exemplos
de adicionais, a insalubridade e a periculosidade.

• São verbas de natureza salarial, o salário in natura, as comissões, as gratificações e a


gorjeta.

• Possuem caráter indenizatório as diárias, os prêmios, as ajudas de custo, a participação


nos lucros, o salário-família e o abono.

144
AUTOATIVIDADE
1 O art. 3º da CLT aponta que um dos elementos caracterizadores da relação de emprego
é a onerosidade. No tocante à remuneração e salário, analise as sentenças a seguir:

I- Com base na isonomia salarial, os trabalhos de igual valor devem possuir o mesmo
salário.
II- O salário e a gorjeta formam a remuneração.
III- As gorjetas somente podem ser pagas pelo empregador e não podem ser pagas por
terceiros.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença I está correta.
c) ( ) Somente a sentença III está correta.
d) ( ) As sentenças I e II estão corretas.

2 O salário pode conter acréscimos adicionais a depender do trabalho exercido. Os


adicionais poderão ser de natureza constitucional, legal ou convencional. Sobre os
adicionais do salário, analise as sentenças a seguir:

I- Os adicionais são parcelas salariais decorrentes de atividades mais insalubres, mais


perigosas ou mais danosas ao trabalhador.
II- Os adicionais não podem surgir de acordo coletivo de trabalho.
III- A legislação trabalhista prevê apenas os adicionais de insalubridade e periculosidade.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
b) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença I está correta.

3 O salário comporta diferentes parcelas em sua composição. Com isso, existem


parcelas que refletem diretamente em demais verbas trabalhistas. No tocante às
parcelas remuneratórias, analise as sentenças a seguir:

I- As horas extras e o adicional noturno não são exemplos de parcelas remuneratórias.


II- As parcelas remuneratórias integram o salário do trabalhador.
III- O dano moral e as multas previstas na CLT são consideradas parcelas remuneratórias.

145
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença I está correta.
c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
d) ( ) As sentenças I e III estão corretas.

4 O salário será composto por diferentes parcelas, que em sua composição, são formadas
por cinco elementos: habitualidade, periodicidade, quantificação, essencialidade e
reciprocidade. Disserte sobre, ao menos, três elementos das verbas remuneratórias.

5 Ao prestar serviços para o empregador, o trabalhador precisa receber pelos serviços


executados. Com isso, a contraprestação recebida pelo empregado pode ser
considerada como salário e remuneração. A partir dessa ideia, aponte os conceitos e
as diferenças entre salário e remuneração.

146
UNIDADE 3 TÓPICO 5 —
FÉRIAS

1 INTRODUÇÃO
No Tópico 5, estudaremos sobre as férias. Elas são um direito do trabalhador.
Gozar férias não é apenas uma medida de lazer, mas de saúde e de segurança. Isso
porque há uma relação direta entre a realização de descanso do trabalho com a
diminuição de acidentes no trabalho, de forma que as férias são uma pausa necessária.

Trata-se de um período de descanso remunerado, previsto tanto pela


Constituição Federal, quanto pela CLT e pela Convenção 132 da OIT (OIT, 1970, s.p.). As
férias são um direito tão importante do trabalhador, que não podem ser renunciadas em
sua integralidade (ou “vendidas”, na linguagem popular).

No tocante a natureza jurídica das férias pode-se apresentar uma série de


ramificações e isso irá depender do polo da relação de emprego. Nesses termos, para
quem figura no polo do empregador, as férias possuem natureza jurídica de obrigação
de fazer (o empregador deve liberar o empregado para gozar das férias) e obrigação
de dar (o empregador deve pagar o quantum referente às férias). Por outro lado, para
aquele que figura no polo do empregado, as férias possuem a natureza de exigibilidade
bem como o direito de se eximir do trabalho durante esse período.

FIGURA 16 – INGRESSO EM PERÍODO DE FÉRIAS

FONTE: <encurtador.com.br/otwA1>. Acesso em: 4 ago. 2021.

147
2 DIREITO ÀS FÉRIAS E SUA REMUNERAÇÃO
A Constituição Federal garantiu ao trabalhador um adicional de 1/3 em sua
remuneração durante o período de férias. Além de ser uma retribuição extra para o
empregado. Esse adicional é concedido no período de férias para incentivar o turismo e
impulsionar a economia.

Vejamos as previsões legais brasileiras sobre o tema. Na Constituição Federal:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros


que visem à melhoria de sua condição social:
[…]
XVII- gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço
a mais do que o salário normal (BRASIL, 1988, s.p.).

Na Consolidação das Leis do Trabalho:

Art. 129- Todo empregado terá direito anualmente ao gozo de um


período de férias, sem prejuízo da remuneração.

Art. 130- Após cada período de 12 (doze) meses de vigência do


contrato de trabalho, o empregado terá direito a férias, na seguinte
proporção:
I- 30 (trinta) dias corridos, quando não houver faltado ao serviço
mais de 5 (cinco) vezes;
II- 24 (vinte e quatro) dias corridos, quando houver tido de 6 (seis) a
14 (quatorze) faltas;
III- 18 (dezoito) dias corridos, quando houver tido de 15 (quinze)
a 23 (vinte e três) faltas;
IV- 12 (doze) dias corridos, quando houver tido de 24 (vinte e quatro)
a 32 (trinta e duas) faltas.
§ 1º- É vedado descontar, do período de férias, as faltas do empregado
ao serviço.
§ 2º - O período das férias será computado, para todos os efeitos,
como tempo de serviço (BRASIL, 1943, s.p.).

No cenário brasileiro, portanto, são características das férias:

• são anuais e devem ser de, no mínimo, 30 (trinta) dias;


• são remuneradas, tendo a Constituição Federal previsto um adicional mínimo de 1/3;
• é um direito de todos os empregados;
• é irrenunciável;
• podem ser individuais ou coletivas.

148
FIGURA 17 – TRABALHADORA AGUARDANDO PERÍODO DE FÉRIAS

FONTE: <encurtador.com.br/ovxDN>. Acesso em: 4 ago. 2021.

3 ADICIONAIS
E como deve ser realizado o cálculo do adicional de 1/3 nos casos em que o
salário recebido pelo trabalhador é variável? Nesse caso, o cálculo das férias é realizado
sobre o valor das parcelas habitualmente recebidas pelo trabalhador.

Por exemplo, se o adicional de insalubridade é habitualmente recebido pelo


trabalhador, assim como frequentemente realiza horas extras, esses adicionais
(habituais) serão contabilizados para o cálculo do adicional de férias. No entanto, as
verbas de natureza indenizatória não integram o cálculo de férias, como, por exemplo, o
vale transporte. Assim, caso o empregado constate algum erro de cálculo nos adicionais
que deveriam constar nas férias, ele poderá exigir do empregador essa diferença.

4 REMUNERAÇÃO E ABONO DE FÉRIAS


É possível a venda de férias, sendo uma faculdade do empregado converter 1/3
do período de suas férias em abono pecuniário. Esse abono corresponderá ao valor da
remuneração que seria devida ao empregado nos dias de férias abonados. Cabe dizer,
ainda, que, para que seja válida a solicitação do abono de férias, o mesmo deverá ser
requerido em até 15 dias antes do término do período aquisitivo.

Assim prevê o art. 58-A, § 6º, da CLT: “é facultado ao empregado contratado sob
regime de tempo parcial converter um terço do período de férias a que tiver direito em
abono pecuniário” (BRASIL, 1943, s.p.).

149
RESUMO DO TÓPICO 5
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• As férias são o período de descanso remunerado, previsto tanto pela Constituição


Federal, quanto pela CLT e pela Convenção 132 da OIT.

• As férias são um direito tão importante do trabalhador, que não podem ser renunciadas
em sua integralidade (ou “vendidas”, na linguagem popular).

• No cenário brasileiro, portanto, são características das férias: anuais e devem ser
de, no mínimo, 30 dias; remuneradas, tendo a Constituição Federal previsto um
adicional mínimo de 1/3; direito de todos os empregados; e irrenunciáveis; podendo
ser individuais ou coletivas.

• As férias são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social.

150
AUTOATIVIDADE
1 Quando um contrato de trabalho é extinto e são visualizadas férias adquiridas e não
gozadas, elas deverão ser indenizadas. Com base nisso, analise as sentenças a seguir:

I- Os trabalhadores demitidos antes de completados 12 meses não receberão férias


proporcionais.
II- Somente fará jus a férias proporcionais se o empregado for demitido sem justa causa.
III- Nos contratos de trabalho por tempo determinado, ao serem extintos, o empregador
deverá pagar as férias proporcionais se não corresponder a 12 meses completos de
trabalho.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença III está correta.
c) ( ) Somente a sentenças II está correta.
d) ( ) As sentenças II e III estão corretas.

2 As férias representam uma cessação da prestação de serviços, ocorrendo assim, a


interrupção do trabalho. Considerando o instituto das férias, classifique V para as
sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) As férias poderão ser dividias em três períodos de concessão, independentemente


de concordância do trabalhador.
( ) As férias deverão ser anotadas na carteira de trabalho do empregado.
( ) As férias possuem como uma de suas características a indisponibilidade.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) F – V – V.
b) ( ) F – V – F.
c) ( ) V – V – F.
d) ( ) V – F – V.

3 As férias são direitos indisponíveis do trabalhador, ou seja, não podem ser cedidas
a outrem. Ainda sobre as características das férias, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as falsas:

151
( ) As férias são consideradas como um direito de todo empregado, por isso não podem
ser coletivas.
( ) O prazo mínimo do período de férias é de 30 dias, e o trabalhador não terá prejuízo
na remuneração.
( ) As férias serão remuneradas com um acréscimo de, no mínimo, 1/3 do valor do
salário recebido.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) F – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – V.
d) ( ) F – F – V.

4 As férias podem ser entendidas como um descanso por um lapso temporal longo com
o fito de que o trabalhador recupere as suas energias para a continuidade da relação de
emprego. Disserte sobre o direito de férias, respondendo a partir de quanto tempo de
trabalho prestado que o trabalhador possuirá o direito de férias, e por quanto tempo
ele poderá ficar afastado?

5 A CLT prevê os períodos aquisitivos e os concessivos de férias. Assim, no que se


refere ao direito de férias, disserte sobre a possibilidade de o trabalhador vender ou
dispor das férias.

152
UNIDADE 3 TÓPICO 6 —
EXTINÇÃO CONTRATUAL

1 INTRODUÇÃO
No Tópico 6, estudaremos sobre a extinção contratual, que é o término do pacto
laboral, que se dá mediante a rescisão do contrato de trabalho, isto é, o fim do vínculo
entre empregador e empregado. A extinção do contrato de trabalho pode ocorrer por
vontade do empregador ou do empregado. No entanto, a CLT prevê hipóteses em que
pode ser aplicada a decisão por justa causa.

O art. 482 da CLT autoriza o empregador a dispensar o empregado quando este


cometer falta grave. Trata-se de dispensa por justa causa, isto é, quando algum ato
ou comportamento incorreto do trabalhador dá ensejo à sua demissão. Assim prevê a
legislação brasileira:

Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de


trabalho pelo empregador:
a) ato de improbidade;
b) incontinência de conduta ou mau procedimento;
c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do
empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa
para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso
não tenha havido suspensão da execução da pena;
e) desídia no desempenho das respectivas funções;
f) embriaguez habitual ou em serviço;
g) violação de segredo da empresa;
h) ato de indisciplina ou de insubordinação;
i) abandono de emprego;
j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra
qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições,
salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas
contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de
legítima defesa, própria ou de outrem;
l) prática constante de jogos de azar.
m) perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para
o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do
empregado.
Parágrafo único - Constitui igualmente justa causa para dispensa
de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito
administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional (BRASIL,
1943, s. p.).

Nota-se que a CLT é taxativa em relação às hipóteses que ensejam a demissão


por justa causa, que se limitam estritamente àquelas previstas.

153
2 RESCISÃO INDIRETA
A rescisão indireta ocorre quando o empregado decide romper o seu vínculo
contratual empregatício em razão de justa causa praticada pelo empregador. Tal
situação está prevista e autorizada pelo art. 483 da CLT (BRASIL, 1943, s.p.):

O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a


devida indenização quando:
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei,
contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos
com rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas
de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo
em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou
tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
§ 1º - O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou
rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais,
incompatíveis com a continuação do serviço.
§ 2º - No caso de morte do empregador constituído em empresa
individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho.
§ 3º - Nas hipóteses das letras "d" e "g", poderá o empregado pleitear a
rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas
indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do
processo.

3 PEDIDO DE DEMISSÃO
O contrato de trabalho pode ser rescindido por vontade do empregado, através
do pedido de demissão. Trata-se de um ato unilateral, no qual o empregado comunica ao
empregador que deseja se desligar do serviço. Nessa modalidade de rescisão contratual,
o empregado deverá realizar aviso prévio para que o empregador tenha tempo hábil para
substituí-lo sem prejuízo ao seu negócio. Caso o empregado não cumpra o aviso prévio,
é permitido ao empregador descontar o valor correspondente aos dias não trabalhados
do montante devido (verba rescisória), caso queira.

154
FIGURA 18 – EMPREGADO INFORMANDO A DEMISSÃO AO EMPREGADOR

FONTE: <encurtador.com.br/gwI05>. Acesso em: 4 ago. 2021.

4 DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA


A demissão é uma faculdade do empregador (na maioria dos casos). No entanto,
são assegurados direitos ao trabalhador, para que o mesmo não seja pego de surpresa,
e nem se encontre desprovido de recursos, em caso de uma rescisão contratual
inesperada. Quanto à demissão sem justa causa, assim legislou a CLT:

Art. 477. Na extinção do contrato de trabalho, o empregador


deverá proceder à anotação na Carteira de Trabalho e Previdência
Social, comunicar a dispensa aos órgãos competentes e realizar o
pagamento das verbas rescisórias no prazo e na forma estabelecidos
neste artigo.
§ 1º (Revogado)
§ 2º - O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que
seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada
a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu
valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas
parcelas.
§ 3º (Revogado)
§ 4º O pagamento a que fizer jus o empregado será efetuado:
I - em dinheiro, depósito bancário ou cheque visado, conforme
acordem as partes; ou
II - em dinheiro ou depósito bancário quando o empregado for
analfabeto.
§ 5º - Qualquer compensação no pagamento de que trata o parágrafo
anterior não poderá exceder o equivalente a um mês de remuneração
do empregado.
§ 6º - A entrega ao empregado de documentos que comprovem a
comunicação da extinção contratual aos órgãos competentes bem
como o pagamento dos valores constantes do instrumento de
rescisão ou recibo de quitação deverão ser efetuados até dez dias
contados a partir do término do contrato.
a) (revogado);
b) (revogado)
§ 7º (Revogado).

155
§ 8º - A inobservância do disposto no § 6º deste artigo sujeitará o
infrator à multa de 160 BTN, por trabalhador, bem assim ao pagamento
da multa a favor do empregado, em valor equivalente ao seu salário,
devidamente corrigido pelo índice de variação do BTN, salvo quando,
comprovadamente, o trabalhador der causa à mora.
§ 9º (vetado).
§ 10. A anotação da extinção do contrato na Carteira de Trabalho
e Previdência Social é documento hábil para requerer o benefício
do seguro-desemprego e a movimentação da conta vinculada
no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, nas hipóteses legais,
desde que a comunicação prevista no caput deste artigo tenha sido
realizada (BRASIL, 1943, s. p., grifos nossos).

FIGURA 19 – EMPREGADO DEMITIDO

FONTE: <encurtador.com.br/qrzZ8>. Acesso em: 4 ago. 2021.

5 CULPA RECÍPROCA
A culpa recíproca é a modalidade de extinção do contrato de trabalho em que,
simultaneamente, empregador e empregado cometem a prática de falta grave. Essa
forma de rescisão contratual está prevista no art. 484 da CLT, que preceitua: “havendo
culpa recíproca no ato que determinou a rescisão do contrato de trabalho, o tribunal
de trabalho reduzirá a indenização à que seria devida em caso de culpa exclusiva do
empregador, por metade” (BRASIL, 1943, s.p.).

As faltas graves que devem cometer ambas as partes para que ocorra esse tipo
de rescisão contratual são as mesmas previstas pelo art. 482 (faltas do empregado) e
pelo art. 483 (faltas do empregador) da CLT (BRASIL, 1943, s.p.). Além disso, deve estar
presente o elemento do nexo causal entre as faltas do empregador e do empregado, isto
é, ambas devem estar relacionadas para que configure a rescisão por culpa recíproca.

156
6 FALÊNCIA DE EMPRESAS
Em nossa contemporaneidade, o risco é inerente à atividade econômica de todo
o empresário, e os riscos do negócio são inerentes a todo o empreendedor em nosso
contexto econômico. Destaca-se que nem sempre o insucesso da atividade empresarial
é vinculado à inaptidão de desenvolvimento da empresa. Cenários de infortúnios ou
de condições inesperadas podem provocar graves crises econômico-financeira em
empresas.

FIGURA 20 – FALÊNCIA DE EMPRESA

FONTE: <encurtador.com.br/cvGY4>. Acesso em: 4 ago. 2021.

Em cenário de crise, credores, consumidores e trabalhadores podem ser


afetados pelos o empresário que estiver passando por alguma situação de dificuldade
econômico-financeira. Assim assevera Sacramone (2021, p. 52):

Diante dessa crise, não apenas os interesses dos credores, com o


inadimplemento dos seus créditos, poderão ser comprometidos. Os
interesses dos consumidores poderão ser afetados com a interrupção
da oferta dos produtos ou serviços ao mercado. Os interesses dos
trabalhadores serão comprometidos com o fechamento dos postos
de trabalho em razão do fim da produção.

O Estado disponibilizou, então, o instituto da Recuperação Judicial e da Falência


por meio da Lei n° 11.101/2005 para auxiliar às empresas e seus credores, inclusive
os credores trabalhistas. O objetivo é assegurar tanto a preservação da empresa
para o prosseguimento de sua atividade quanto o interesse daqueles que podem
ser prejudicados caso a empresa não consiga arcar com suas obrigações. Por isso, a
falência de empresa é um instituto jurídico, regulamentado pela Lei n° 11.101/2005 que
busca assegurar a satisfação dos interesses dos credores, através da liquidação dos
bens da empresa devedora.

157
Nas palavras de Sacramone (2021, p. 54):

Sua decretação permite que todos os bens do devedor sejam


arrecadados e alienados para a satisfação dos créditos. Se por
um lado os credores poderão ter seus créditos satisfeitos com o
produto dessa liquidação, por outro os bens poderão ser adquiridos
por empresários que aloquem esses recursos para desempenho
de uma atividade mais eficiente, com benefício aos trabalhadores,
que poderão conservar seus postos de trabalho, aos consumidores,
que poderão ter produtos ou serviços melhores à disposição, e ao
mercado como um todo, beneficiado pela circulação de riqueza e
menor consumo de seus recursos escassos.

Além do mais, também é assegurado ao empresário que for decretado a falência


o direito de tentar uma nova atividade econômica. A ideia principal é de tornar a crise
empresarial uma questão transitória e permitir que o empresário retirado do mercado
retorne reestruturado em sua atividade econômica.

158
LEITURA
COMPLEMENTAR
DIREITOS FUNDAMENTAIS LABORAIS E SUA EFETIVIDADE NO BRASIL

Rafael Simão de Melo

Os direitos fundamentais são divididos por categorias de gerações. Os de


primeira geração são os direitos civis e políticos, também chamados de liberdades
públicas negativas, porque consubstanciam a defesa do indivíduo perante o Estado.
Os de segunda geração, depois de liberto o homem das garras do Estado, servem para
dotar o ser humano das condições materiais minimamente necessárias ao exercício de
uma vida digna. São direitos positivos, como os sociais, econômicos e culturais. Os de
terceira geração são os direitos de solidariedade e fraternidade, como o direito à paz no
mundo, ao desenvolvimento econômico dos países, à preservação do meio ambiente,
do patrimônio comum da humanidade e à comunicação.

No decorrer dos tempos, especialmente depois das primeira e segunda guerras


mundiais, tem havido multiplicação de direitos, enquanto que outros vão sendo cria-
dos. Seguindo o mandamento imposto no Tratado de Versalhes, em 15 de novembro
de 1920 foi criada a Liga das Nações, a qual, de fato, conseguiu algumas "vitórias", com
ênfase no incremento dos direitos dos trabalhadores.

Os direitos fundamentais laborais destacam-se como imprescindíveis à


condição humana e merecem proteção do Estado e da própria sociedade.

No âmbito trabalhista, embora se tenha avançado com relação à liberdade


sindical, vedando-se ao Estado intervir e interferir na organização sindical (CF, artigo 8º,
inciso I) e no tocante ao direito de greve, reconhecendo-o de forma ampla (CF, artigo
9°), restaram importantes restrições que contribuem para a inviabilidade de um modelo
de relações de trabalho adequado à solução direta dos conflitos entre empregados e
empregadores e, consequentemente, para a efetividade dos direitos laborais.

No tocante aos direitos de segunda geração, a Constituição Federal não só


manteve aqueles já existentes como garantiu outros direitos sociais, como se vê do seu
artigo 7º e de outras disposições esparsas, avançando sobremaneira quanto à última
categoria, por exemplo, sobre a proteção do meio ambiente (artigos 7º, inciso XXII, 200,
inciso VIII, e 225 e parágrafos).

159
Mas a grande pergunta que se faz é se tais disposições são realidade no dia a dia
do povo brasileiro e, especialmente, dos trabalhadores. A resposta, em grande parte das
situações é negativa, principalmente nos momentos de crise que vive o país, quando o
trabalhador, premido pela necessidade do emprego, submete-se às mais degradantes
condições de trabalho e não se anima a reclamar seus direitos individualmente. Exemplo
inconteste é o que se vive no momento, agravado pela reforma trabalhista de 2017, que,
ao invés de cumprir o prometido (modernização das relações de trabalho e criação de
novos empregos), vem provocando mais precarização do trabalho, especialmente pela
sua intensa informalidade. Ademias, e para piorar ainda mais a situação de desemprego
e as condições de trabalho, veio a crise da Covid-19, que, lamentavelmente, promete
mais desestruturação do mercado de trabalho.

Disse Norberto Bobbio, em uma das suas obras ("A era dos direitos"), que o
grande problema, no entanto, é transformar em realidade esses direitos, uma vez que
teoria e prática andam em caminhos opostos, em velocidades bastante desiguais.
Adverte Norberto Bobbio que "nos últimos anos falou-se e continua a se falar de direitos
do homem, entre eruditos, filósofos, juristas, sociólogos e políticos, muito mais do que se
conseguiu fazer até agora para que eles sejam reconhecidos e protegidos efetivamente, ou
seja, para transformar aspirações (nobres, mas vagas), exigências (justas, mas débeis),
em direitos propriamente ditos (isto é, no sentido em que os juristas falam de 'direito')".

Assim, cabe ao Estado não só criar direitos, mas também atuar sobre sua
efetividade, apresentando-se como uma das formas de efetivar esses direitos a utilização
da jurisdição coletiva no processo do trabalho, especialmente pelos sindicatos, que, na
grande maioria, ainda não vislumbraram essa forma coletiva de defesa e concretização
dos direitos das respectivas categorias. É certo que, para uma boa aplicação dos novos
instrumentos processuais coletivos, necessita-se ultrapassar barreiras tradicionais
do velho sistema individualista ortodoxo que marcou todo o século passado, com boa
compreensão do Poder Judiciário, que também será beneficiado com a diminuição do
grande número de ações individuais que abarrotam os fóruns trabalhistas.

FONTE: MELO, R. S. Direitos fundamentais laborais e sua efetividade no Brasil. Revista Consultor
Jurídico, 19 de março de 2021. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-mar-19/reflexoes-
trabalhistas-direitos-fundamentais-laborais-efetividade-brasil. Acesso em: 12 ago. 2021.

160
RESUMO DO TÓPICO 6
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• A extinção do contrato de trabalho pode ocorrer por vontade do empregador ou do


empregado.

• O art. 482 da CLT autoriza o empregador a dispensar o empregado quando este


cometer falta grave.

• A CLT é taxativa em relação às hipóteses que ensejam a demissão por justa causa,
que se limitam estritamente àquelas previstas pelo art. 482, da CLT.

• A rescisão indireta ocorre quando o empregado decide romper o seu vínculo contratual
empregatício em razão de justa causa praticada pelo empregador.

• A culpa recíproca é a modalidade de extinção do contrato de trabalho em que,


simultaneamente, empregador e empregado cometem a prática de falta grave.

161
AUTOATIVIDADE
1 A extinção do contrato de trabalho pode ocorrer de diversas formas. A título de
exemplo, é possível citar a demissão sem justa causa, o pedido de demissão ou
a rescisão indireta. Considerando as disposições sobre a extinção do contrato de
trabalho, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) O trabalhador demitido por justa causa não terá direito a receber os valores
proporcionais referentes às férias e ao 13º salário.
( ) O trabalhador pode rescindir seu contrato de trabalho. Para tanto, deverá avisar com
antecedência ao seu empregador e cumprir o aviso prévio.
( ) A extinção do contrato de trabalho sem justa causa é considerada quando o
empregador demite o empregado sem que o trabalhador tenha cometido alguma
falta grave incompatível com a continuidade da relação.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – V.
b) ( ) F – V – F.
c) ( ) V – F – V.
d) ( ) F – V – V.

2 A extinção do contrato de trabalho é a cessação do vínculo obrigacional entre o


empregador e empregado. No tocante à extinção do trabalho, classifique V para as
sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) O pedido de demissão é uma forma de extinção do contrato de trabalho.


( ) A legislação trabalhista não prevê a possibilidade de extinção do contrato de trabalho
por meio da falência da empresa.
( ) Com base no princípio da proteção, o empregador não pode demitir o empregado
sem que haja justa causa.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) F – V – V.
b) ( ) V – V – F.
c) ( ) V – F – F.
d) ( ) V – F – V.

3 O art. 482, da CLT, autoriza o empregador a dispensar o empregado quando este


cometer falta grave. Trata-se de dispensa por justa causa, isto é, quando algum ato
ou comportamento incorreto do trabalhador dá ensejo à sua demissão. Sobre atos
que caracterizam justa causa e que ensejam demissão do trabalhados, assinale a
alternativa CORRETA:

162
a) ( ) Deixar de declarar imposto de renda.
b) ( ) Prática ocasional de jogos de azar.
c) ( ) Negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador.
d) ( ) Descumprir ordem do empregador, ainda que a ordem seja para cometar ato
contra a lei.

4 As relações de emprego perduram no tempo. Em regra, o empregado tem uma


relação contínua no emprego possibilitando, com isso, cumprir seus compromissos e
necessidades. No entanto, existem os casos de extinção dos contratos de trabalhos.
A partir dessa ideia, disserte sobre a demissão sem justa causa e apresente as suas
principais características.

5 O empregado pode rescindir o contrato de trabalho por meio de um pedido formal


de demissão. Aqui temos um ato unilateral, em que o próprio trabalhador possui o
interesse de se desligar do serviço. Disserte sobre os direitos e deveres do empregado
que solicitar demissão ao trabalhador.

163
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado
Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/
constituicao.htm. Acesso em: 12 ago. 2021.

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-Lei nº 5.442, de 1º maio 1943,


Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso
em: 12 ago. 2021.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 51. As cláusulas regulamentares, que


revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores
admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. Brasília, DF: Superior Tribunal
de Justiça, [2003]. Disponível em: https://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_com_
indice/Sumulas_Ind_51_100.html#SUM-51. Acesso em: 12 ago. 2021.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 229. Por aplicação analógica do art.
244, § 2º, da CLT, as horas de sobreaviso dos eletricitários são remuneradas à base de
1/3 sobre a totalidade das parcelas de natureza salarial. Brasília, DF: Superior Tribunal
de Justiça, [2003]. Disponível em: https://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_
com_indice/Sumulas_Ind_201_250.html#SUM-229. Acesso em: 11 ago. 2021.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 276. O direito ao aviso prévio é


irrenunciável pelo empregado. O pedido de dispensa de cumprimento não exime o
empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador
dos serviços obtido novo emprego. Brasília, DF: Superior Tribunal de Justiça, [2003].
Disponível em: https://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_com_indice/
Sumulas_Ind_251_300.html#SUM-276. Acesso em: 12 ago. 2021.

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 110. No regime de revezamento, as


horas trabalhadas em seguida ao repouso semanal de 24 horas, com prejuízo do intervalo
mínimo de 11 horas consecutivas para descanso entre jornadas, devem ser remuneradas
como extraordinárias, inclusive com o respectivo adicional. Brasília, DF: Tribunal Superior
do Trabalho, [2003]. Disponível em: https://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_
com_indice/Sumulas_Ind_101_150.html#SUM-110. Acesso em: 12 de ago. 2021.

MARTINS, S. P. Direito do trabalho. 35 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT). Convenção 132 da OIT.


Convenção sobre Férias Remuneradas (Revista), 1970. Disponível em: https://www.ilo.
org/brasilia/convencoes/WCMS_235863/lang--pt/index.htm. Acesso em: 12 ago. 2021.

SACRAMONE, M. B. Comentários à Lei de recuperação de empresas e falência. 2.


ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021.

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