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EMENTA
1. A Lei nº 14.879, de 4 de junho de 2024 deu nova redação aos parágrafos 1º e 5º do art. 63 do CPC
estabelecendo a possibilidade de declinação de ofício deparando-se com hipótese de escolha aleatória
de foro.
2. O novo diploma, rompendo com a tradição do direito, estabeleceu requisitos para validade das
declarações de vontade feitas em contrato, permitindo a análise pessoal do juiz sobre qual foro será
mais adequado para solução do litígio.
3. Agravo desprovido.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
A parte agravante sustenta, em síntese, que se trata de regra de competência territorial, prevista no
artigo 53, inciso III, alínea “a”, do Código de Processo Civil, razão por que o feito deve ser processado
no domicílio da sede do agravado, ou seja, em Brasília/DF.
Requer, ao final, a suspensão da decisão agravada e, no mérito, o provimento do recurso para declarar a
competência do Juízo de origem para processar e julgar o feito.
Preparo recolhido.
O pedido liminar foi deferido para suspender os efeitos da decisão agravada até o julgamento de mérito
do recurso.
É o relatório.
VOTOS
A parte agravante sustenta, em síntese, que se trata de regra de competência territorial, prevista no
artigo 53, inciso III, alínea “a”, do Código de Processo Civil, razão por que o feito deve ser
processado no domicílio da sede do agravado, ou seja, em Brasília/DF.
Com efeito, trata-se de ação de reparação por danos, o que atrai a regra geral de competência
territorial, de natureza relativa, em atenção aos interesses dos litigantes, na forma do artigo 53, inciso
III, alínea “a”, do CPC, ou seja, “onde está a sede, para a ação em que for ré pessoa jurídica”.
Nesse contexto, como se trata de competência territorial relativa, distribuída a ação e fixada a sua
competência, sua modificação somente é permitida por vontade do réu, caso alegue a incompetência
em preliminar de contestação, a teor dos artigos 64 e 65 do CPC, sob pena de prorrogação da
competência.
Além disso, em conformidade com o enunciado de Súmula 33 do STJ, “a incompetência relativa não
pode ser declarada de ofício”, de modo que não poderia o magistrado a quo ter declinado de sua
competência.
Desse modo, deve ser reformada a decisão que declarou, de ofício, a incompetência territorial e
determinou a remessa dos autos para uma das Varas Cíveis da Comarca de São Paulo/SP.
Registra-se, por fim, que a decisão que deferiu o pedido liminar no recurso examinou devidamente a
questão posta sub judice, bem como não houve mudança fática ou jurídica dos fundamentos que a
integram, mostrando-se suficientes para orientar o julgamento de mérito do agravo. Assim, adotam-se
os mesmos argumentos como razões de decidir.
Diante do exposto, DOU PROVIMENTOao agravo de instrumento para reformar a decisão agravada
e declarar a competência do Juízo de origem para processar e julgar a presente ação de reparação de
danos.
É como voto.
A Lei Nº 14.879, de 4 de junho de 2024, deu nova redação aos parágrafos 1º e 5º do art. 63 do CPC
estabelecendo:
“§ 1º A eleição de foro somente produz efeito quando constar de instrumento escrito, aludir
expressamente a determinado negócio jurídico e guardar pertinência com o domicílio ou a residência
de uma das partes ou com o local da obrigação, ressalvada a pactuação consumerista, quando
favorável ao consumidor.
§ 5º O ajuizamento de ação em juízo aleatório, entendido como aquele sem vinculação com o
domicílio ou a residência das partes ou com o negócio jurídico discutido na demanda, constitui
prática abusiva que justifica a declinação de competência de ofício.”
A nova redação, conquanto represente uma ruptura com a tradição do Direito (disposição que
constava nas Ordenações, no CPC de 1939, no CPC de 1973 e no CPC de 2015 até a nova lei) e
aparentemente se possa cogitar de interferência na autonomia da vontade dos contratantes, apresenta
uma literalidade que não se pode desconsiderar.
Quis o legislador, ao que parece, estabelecer que até mesmo quando o foro for favorável ao
consumidor - como no caso, em que a demanda foi proposta pelo próprio consumidor segundo seus
interesses- o juiz, mediante análise pessoal, pode entender que outro será o foro mais favorável para
ele.
Na espécie, o Agravante tem domicílio fora do Distrito Federal, e a empresa Ré, conquanto tenha sua
sede nesta Capital, apresentou exceção de incompetência na origem, ou seja, prefere ser demandada
no domicílio do consumidor.
Em tal caso, até que novas luzes sejam lançadas sobre a questão pela doutrina e pela jurisprudência,
prevalece a decisão agravada, não por seus fundamentos, mas pelo advento da nova lei.
Pelo exposto, peço vênia para divergir e NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo a
decisão recorrida.
É como voto.
Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que declinou de ofício de sua competência para São
Paulo/SP, no qual foi aberta a conta individual, referente à inscrição no Programa de Formação do
Patrimônio do Servidor Público (PASEP), e que coincide com o domicílio do autor.
A ação de conhecimento ajuizada pelo autor, visa, em suma, a condenação do réu ao pagamento de
danos por prejuízos decorrentes de suposta má gestão do fundo Pasep, que tem o Banco do Brasil S.A.
como administrador legal. A controvérsia recursal gira em torno da eventual incompetência do Juízo
de origem para processar e julgar a presente demanda.
Verifica-se a natureza civil, e não consumerista, da relação jurídica entre as partes, tendo em vista que
o fundo Pasep, programa de formação do patrimônio dos servidores públicos, é regido por regras
específicas previstas em um conjunto de diplomas normativos, quais sejam, a Lei Complementar n.
8/1970, a Lei Complementar n. 26/1975, a Lei n. 9.715/1998 e o Decreto n. 9.978/2019, sendo certo
que o Banco do Brasil S.A. é o administrador das contas vinculadas ao fundo Pasep apenas por
decorrência de imposição legal.
O autor reside em São Paulo/SP, a conta vinculada ao fundo Pasep está cadastrada em agência do
Banco do Brasil localizada no mesmo local, os advogados possuem escritório m Recife. Inexiste,
assim, justificativa jurídica hábil ao ajuizamento da demanda no Distrito Federal.
Um dos critérios definidos pelo legislador para determinar o local onde deve ser proposta uma ação é
a chamada competência territorial, definida com fulcro na circunscrição geográfica.
O art. 53, III, a e b, do CPC, pertinente ao caso em análise, dispõe que, quando a ré for pessoa
jurídica, é competente o foro do lugar onde está a sua sede, bem como onde se acha agência ou
sucursal, quanto às obrigações contraídas. Trata-se de regra de competência relativa, que, a princípio,
possibilitaria a livre escolha do autor.
Ocorre que, não se pode desconsiderar, por completo, na seleção do lugar a se ajuizar a ação pela
parte, os chamados fatores de ligação entre os elementos da causa e o foro eleito, sob pena de
desvirtuamento do instituto. Sobre o assunto, Cândido Rangel Dinamarco[1]leciona:
No trato da competência territorial aparece com mais clareza o significado dos fatores de ligação (
momenti di collegamento: Liebman) de uma causa com determinado órgão, que são os responsáveis
pela atribuição daquela a este. As disposições da lei sobre a competência territorial fazem com que
as ligações de fato entre a causa e o foro se convertam em motivos de ligação entre ela e os órgãos
judiciários ali instalados. As partes, os fatos integrantes da causa de pedir ou o objeto do pedido têm
sempre uma dimensão territorial que os põe em visível contato com determinada porção do território
nacional. Ora é o domicílio do réu em tal comarca, ou o imóvel pretendido que se situa numa outra,
ou os fatos danosos que aconteceram aqui ou ali etc. O desenho da distribuição da competência
territorial na ordem judiciária de um país é o resultado do modo como o legislador manipulou esses
fatores de ligação e os combinou, dando prevalência a um em certos casos e valorizando outros em
relação a determinadas outras situações, etc.
A despeito de não haver uma ordem de preferência expressa entre as alíneas do inciso III do art. 53 do
CPC, a hipótese do item b(foro do lugar onde se acha agência ou sucursal, quanto às obrigações que a
pessoa jurídica contraiu) é específica em relação ao do item a (foro do lugar onde está a sede), de
aplicação subsidiária, em prol da segurança jurídica e da coerência do sistema normativo, coincidente,
na hipótese, com o foro do domicílio do autor.
É certo que o princípio do juiz natural exige que a escolha do Juízo competente para julgar uma
determinada demanda seja feita com base em critérios objetivos e pré-estabelecidos (art. 5º, XXXVII
e LIII, da CF[2]). A norma se relaciona, ainda, à organização judiciária de um determinado Tribunal,
com a atribuição de julgamentos de forma orgânica e equilibrada no âmbito de sua extensão.
Nessa mesma linha de compreensão foi editada a Lei nº 14.879, de 4 de junho de 2024, que alterou
o art. 63 do CPC, afastando a possibilidade de escolha aleatória de foro de eleição.
Ressalte-se, nesse ponto, que a situação demonstrada de escolha aleatória, abusiva, sem amparo
normativo adequado, em preterição ao juiz natural, permitiria, não apenas o distinguishingrestritivo e,
assim, o afastamento daSúmula n. 33 do c. STJ, diante dos fundamentos e ratio decidendidiversos do
aludido precedente,considerando-se, ainda, a preservação do princípio da segurança jurídica com a
tramitação regular do feito no Estado da Federação no qual que reside o autor e possui agência a
instituição financeira ré, mas especialmente a vedação que decorre do § 5º do art. 63 do CPC que veda
o ajuizamento de ação em juízo aleatório, entendido como aquele sem vinculação com o domicílio ou
a residência das partes ou com o negócio jurídico discutido na demanda, porque constitui prática
abusiva que justifica a declinação de competência de ofício.
Assim, com renovadas venias ao eminente Relator, conheço e nego provimento ao agravo, mantendo
indene a r. decisão da origem.
É como voto.
[1] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 8ª ed. Vol. I. São Paulo:
Malheiros, 2016, p. 680/681.
[2] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
(...)
LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;
DECISÃO