Quebra Pedras
Quebra Pedras
Quebra Pedras
Divulgação
Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil
Adriana Morais Aita,1 Hélio Nitta Matsuura,1 Clarice Azevedo Machado,2
Mara Rejane Ritter*,1
1
Departamento de Botânica, Instituto de Biociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Av. Bento
Gonçalves, 9500, 91509-900 Porto Alegre-RS, Brasil,
2
Faculdade de Farmácia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Av. Ipiranga, 6681, 90619-900
Porto Alegre-RS, Brasil
estabelecendo-se padrões morfológicos que servirão e afecções dos pulmões, rinite e tosse (Vendruscolo,
de modelo para a identificação de diferentes espécies, 2004). Caracteres morfológicos: folhas simples,
contribuindo para a caracterização farmacognóstica das opostas, pecioladas, glabras, com bordo serrado ou
espécies de interesse como matéria-prima na indústria esparsamente dentado e tricomas glandulares (Fig. 1).
farmacêutica. Além disso, buscaram-se indícios de Dados químicos e biológicos: o óleo essencial tem como
toxicidade, dados químicos e biológicos destas plantas. principal componente o mentofurano e tujeno, além de
limoneno, β-cariofileno e pulegona (Bordignon et al.,
MATERIAL E MÉTODOS 1997). O primeiro corresponde a uma hepatotoxina.
Outros constituintes foram identificados no óleo
Foi realizada uma revisão bibliográfica de essencial de folhas e flores, como limoneno, 1,8-cineol,
trabalhos efetuados em várias regiões do Estado do linalol, mentofurano, L-copaeno, espatulenol, óxido
Rio Grande do Sul, referentes à utilização medicinal de de cariofileno, 2-pentadecanona, além de mentona
espécies conhecidas popularmente como quebra-pedras. e mentol. Foi relatada ação antidematogênica do
Os trabalhos revisados foram Garlet (2000), Marodin extrato hidroalcoólico das partes aéreas da planta, em
(2000), Possamai (2000), Ritter et al. (2002), Sebold experimento com animais de laboratório. O óleo essencial
(2003) e Vendruscolo (2004). foi ineficaz em camundongos no teste de proteção a
Foram adquiridas, mediante pagamento, no convulsões induzidas por “eletrochoque transcorneal
período de julho de 2005 a julho de 2006, 16 amostras máximo” (ETM). A ação “hepatotóxica” devido à
em diferentes locais da cidade, de 14 comerciantes de presença do mentofurano (componente principal) no
plantas medicinais em bancas fixas ou em feiras-livre, óleo essencial sugere precaução no uso desta espécie.
nos bairros Centro e Bom Fim, locais de maior circulação A não comprovação da ação protetora a convulsões, não
de pessoas e, conseqüentemente, de comerciantes. As indica o uso da planta como calmante. Não há relatos que
amostras encontravam-se como material fresco ou seco, comprovem seu uso para cólicas, diarréias, gripe e tosse.
em ramos inteiros ou rasurados. É relatada atividade antidematogênica para a referida
O material adquirido foi analisado e identificado espécie (Marodin, 2000). A atividade antimicrobiana do
no laboratório de Taxonomia de Angiospermas, do óleo essencial foi efetiva contra espécies de Bacillus sp.
Departamento de Botânica da Universidade Federal do Staphylococcus aureus, e outras bactérias específicas
Rio Grande do Sul, com auxílio da literatura específica (Sandri et al., 2007).
e por comparação com material botânico depositado no
Herbário ICN/UFRGS. Para a identificação das espécies Desmodium incanum DC. - Fabaceae
de Phyllanthus, foi utilizado o trabalho de Machado
(2003) e para as espécies de Euphorbia o trabalho de Nomes populares: pega-pega (Garlet, 2000;
Allem (1975). Sebold, 2003; Vendruscolo, 2004). Uso: em problemas
O sistema de classificação adotado para as de sangue, rins, bexiga e próstata; segura urina frouxa de
famílias é o da APG II (2003). criança (Garlet, 2000), para problemas nos rins (Sebold,
Para cada espécie foi realizada uma busca de 2003) e nos ovários (Vendruscolo, 2004). Caracteres
dados químicos e biológicos na literatura específica morfológicos: folhas compostas pinado-trifolioladas,
e em bases de dados, como Medline 2007 e Science alternas, pecioladas, pilosas, com bordo inteiro e base
Direct 2007. aguda (Fig. 2). Dados químicos e biológicos: presença
de flavonóides, taninos e saponinas (Bianchi et al.,
RESULTADOS E DISCUSSÃO 1989). Não foi encontrada atividade tóxica no ensaio de
toxicidade aguda em camundongos nas doses 250 e 500
Foram identificadas sete espécies pertencentes mg/Kg para extratos aquosos liofilizados (Bianchi et al.,
a cinco famílias: 1989) e mutagênica para o extrato aquoso no teste de
Ames (Vargas et al., 1991).
Cunila microcephala Benth. - Lamiaceae
Euphorbia prostrata Aiton - Euphorbiaceae
Nomes populares: poejinho (Sebold, 2003),
poejo-cheiroso (Possamai, 2000), poejo (Possamai, Nomes populares: quebra-pedras-roxo (Garlet,
2000; Garlet, 2000; Marodin, 2000), poejo-miúdo 2000), quebra-pedras-rasteiro (Sebold, 2003), quebra-
(Marodin, 2000), poejo-graúdo (Vendruscolo, 2004). pedra (Vendruscolo, 2004). Uso: em infecção de
Usos: como tempero, para sinusite e bronquite garganta, inflamação e pedras nos rins (Garlet, 2000).
(Possamai, 2000), tosse (Possamai, 2000; Sebold, Como diurético e para problemas nos rins (Sebold,
2003), gripe (Possamai, 2000; Garlet, 2000), calmante 2003; Vendruscolo, 2004). Caracteres morfológicos:
da tosse, problemas de peito, estômago e cólica de nenê folhas simples, opostas, pecioladas, glabras, com bordo
(Garlet, 2000), para bronquite, dores de barriga, quando serrado ou esparsamente dentado e base assimétrica
se está gripado e enjoado, para expectorar, em infecções (Fig. 3). Dados químicos e biológicos: presença de
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Espécies medicinais comercializadas como “quebra-pedras” em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil
Figuras 1-7. Amostras de espécies comercializadas como quebra-pedras. 1. Cunila microcephala Benth. 2. Desmodium incanum
DC. 3. Euphorbia prostrata Aiton 4. Euphorbia serpens Kunth 5. Heimia salicifolia Link 6. Phyllanthus niruri L. 7. Phyllanthus
tenellus Roxb.
em roedores infectados (Venkateswaran et al., 1987) antibacterianas contra Aeromonas hydrophila, Bacillus
além de ação antihepatotóxica (Syamasundar, 1985) ou subtilis, Pseudomonas aeruginosa e Staphylococcus
hepatoprotetora e antioxidante (Harish & Shivanandappa, aureus (Oliveira et al., 2007) e ação antiviral contra o
2006). Foi verificado através de análises clínico- vírus da hepatite B testado em patos (Shead et al., 1992).
laboratoriais que doses do infuso acima das comumente
usadas não mostraram ação tóxica para o homem. Foram Das espécies comercializadas como quebra-
observados que extratos de P. niruri normalizaram os pedras em Porto Alegre, as espécies de Phyllanthus
níveis altos de cálcio urinário diminuindo a formação niruri e Euphorbia serpens são as que apresentam maior
dos cálculos em pacientes (Nishiura et al., 2004) semelhança morfológica quando comercializadas secas
sugerindo que deva interferir nos primeiros estágios de e destacadas dos ramos ou fragmentadas.
formação da pedra e pode representar uma alternativa Nos trabalhos efetuados em outras regiões
no tratamento e/ou prevenção da urolitíase (Barros et do Rio Grande do Sul, Desmodium incanum, Cunila
al., 2003). Foi evidenciado uma elevação da filtração microcephala e Heimia salicifolia são conhecidas por
glomerular e da excreção urinária do ácido úrico. Os outros nomes populares. Provavelmente D. incanum
resultados obtidos podem justificar, pelo menos em parte, e H. salicifolia estão sendo utilizadas atualmente
o uso medicinal da planta em certas afecções renais ou para afecções renais e acabaram sendo denominadas
mesmo nos casos de insuficiência renal (Sousa et al., também por quebra-pedras. Quanto à C. microcephala,
1991). Estudos esclarecem que a utilização da planta provavelmente houve um engano por parte do
promove um relaxamento dos ureteres que, aliado a uma comerciante, ao vender esta espécie como quebra-
ação analgésica (Santos et al., 1995), facilita a descida pedras, já que é tradicionalmente utilizada para afecções
dos cálculos, geralmente sem dor nem sangramento, do trato respiratório.
aumentando a filtração glomerular e a excreção de ácido A grande maioria dos usos relatados pela
úrico (justificando seu uso para pedra nos rins) (Lorenzi população não encontra ainda respaldo nos estudos
& Matos, 2002). O extrato aquoso inibe o virus humano realizados até o momento.
da imunodeficiência tipo-1 trancriptase reversa (HIV-1- As espécies do gênero Euphorbia contêm um
RT) (Ogata et al., 1992). Ainda apresenta ação abortiva látex extremamente cáustico, o qual pode causar lesões
e purgativa em dosagens acima das normais (Martins et na pele (Santucci et al., 1985; Schmidt & Evans, 1980),
al., 1994). nos olhos (Scott & Karp, 1996) e, quando ingerido,
na mucosa gastrointestinal, pode levar a lesões renais
Phyllanthus tenellus Roxb. - Phyllanthaceae (Schenkel et al., 2000).
Em várias amostras constatou-se a presença
Nomes populares: quebra-pedras-de- de material estranho, como pedaços de plástico,
arvorezinha, erva-pombinha (Garlet, 2000); quebra- invertebrados, pedras e outras plantas. Além disso,
pedra (Possamai, 2000; Marodin, 2000; Sebold, 2003; várias se encontravam contaminadas por fungos,
Vendruscolo, 2004), quebra-pedra-claro (Possamai, demonstrando a qualidade duvidosa destes materiais.
2000), quebra-pedra falso, quebra-pedra graúdo Estes dados demonstram que diferentes
(Vendruscolo, 2004). Uso: para bexiga, rins e como espécies conhecidas pelo mesmo nome popular de
diurético (Garlet, 2000; Sebold, 2003), em casos de quebra-pedras são usadas indistintamente como
cálculo renal, cistite, corrimento, como diurética, medicinais, evidenciando a necessidade de estudos
em problemas dos rins e dos ovários, frio da bexiga, complementares e um controle de qualidade eficiente,
inflamações na bexiga e pedra nos rins (Vendruscolo, para uma utilização eficaz e segura.
2004). Caracteres morfológicos: folhas simples,
opostas, pecioladas, glabras, com bordo inteiro e AGRADECIMENTOS
base atenuada (Fig. 7). Dados químicos e biológicos:
presença de alcalóides, ácido gálico (Simões et al., À FAPERGS pela bolsa de iniciação científica
1986), flavonóides, terpenos, lignanas e fenóis (Calixto (processo número 05502482) concedida à primeira
et al., 1997). Plantas do gênero Phyllanthus têm ações autora e ao botânico Ângelo Alberto Schneider pelo
terapêuticas no tratamento de hepatite B e litíase e auxílio na editoração das figuras.
como antinociceptivo (Calixto et al., 1997). Os extratos
fluídos e o decocto das partes aéreas deste vegetal não REFERÊNCIAS
apresentaram atividade diurética, nem antiinflamatória
nos ensaios em ratos (Simões et al., 1986). Atividade Alarcon-Aguilara FJ, Roman-Ramos R, Perez-Gutierrez S,
antinociceptiva foi relatada, em experimentos com Aguilar-Contreras A, Contreras-Weber CC, Flores-
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ratos, a partir do extrato das folhas, caule e raízes. Testes of plants used as antidiabetics. J Ethnopharmacol 61:
em ratos com o extrato fluido não relataram o aumento 101-109.
da diurese, e nem sua atividade antiinflamatória, Allem AC 1975. Estudo taxonômico do gênero Euphorbia L.
apresentando baixa toxicidade. Apresenta propriedades (Euphorbiaceae) no Rio Grande do Sul. Porto Alegre,
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