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Produção, v. xx, n. x, p.

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doi: XX.XXXX/XXXXX-XXXXXXXXXXXXXXXXX

Fatores de satisfação com o uso de autônomos


no transporte rodoviário de cargas

Peter Fernandes Wankea*


a
*peter@coppead.ufrj.br, UFRJ, Brasil

Resumo
No Brasil, o transporte de cargas é predominantemente rodoviário e depende fortemente da subcontratação de
motoristas autônomos. Este artigo apresenta resultados de survey conduzido com 105 embarcadores – listados no
Ranking Exame Melhores e Maiores – para avaliar os principais fatores relacionados à satisfação com os serviços
prestados pelos autônomos, agrupando-se as empresas contratantes (embarcadores) em termos de necessidades
comuns de serviço. Os resultados apontam para três grandes grupos de embarcadores, nos quais a qualidade de
serviço percebida depende do uso intensivo de autônomos, do volume de carga transportado anualmente e do nível
de exigência quanto à segurança dos carregamentos.
Palavras-chave
Fatores. Satisfação. Transporte de cargas. Autônomos. Segmentação.

1. Introdução
Atualmente, o transporte de cargas é destaque no 2011). A predominância do modal rodoviário gera
Brasil devido à necessidade de uma estrutura logística enormes problemas de produtividade devido às
adequada para sustentar o crescimento econômico dimensões continentais do Brasil. Países de dimensões
do país. Estradas em bom estado de conservação, similares como EUA, Austrália e China transportam,
portos e ferrovias eficientes e aeroportos seguros respectivamente, 26%, 24% e 8% de sua carga pelo
são temas recorrentes na mídia nacional. Após longo modal rodoviário (FLEURY, 2003a).
período sem investimentos, o governo federal destinou Soma-se a isto o fato de o transporte rodoviário
R$ 503,9 bilhões à infraestrutura no período de 2007 ser tratado pelos órgãos públicos como um mercado
a 2010, sendo R$ 58,3 bilhões específicos para a livre. Dessa forma, não há legislação específica nem
área de logística (BRASIL, 2008). Por meio desses exigências para entrada e saída deste. As figuras
investimentos, a meta governamental é assegurar um de autorização, permissão e concessão não estão
crescimento econômico de 5% ao ano entre 2008 presentes nessa atividade (AGÊNCIA..., 2008a). O
e 2010 (YOSHIDA, 2007). Apesar dos significativos modal de transporte rodoviário destaca-se dos demais
valores, ainda assim é questionável se os mesmos serão por possuir grande flexibilidade, uma vez que os
suficientes para eliminar todos os gargalos logísticos. veículos automotores podem operar em qualquer via
Por exemplo, a Confederação Nacional do Transportes disponível. A necessidade de poucos investimentos em
(CNT) elaborou um Plano de Logística para o Brasil ativos faz com que o transporte rodoviário seja muito
que prevê a necessidade de investimentos mínimos atrativo para autônomos. Dados da Agência Nacional
de R$ 405 bilhões (CONFEDERAÇÃO..., 2011). de Transportes Terrestres (ANTT) mostram que 46,2%
A matriz de transporte brasileira mostra a seguinte dos veículos cadastrados no Registro Nacional de
distribuição entre os modais: 61,1% no rodoviário, Transporte Rodoviário de Cargas (RNTRC) pertencem
21% no ferroviário, 14% no aquaviário, 3,5% no aos autônomos, contra 53,1% pertencentes às empresas
dutoviário e 0,4% no aéreo (CONFEDERAÇÃO..., e 0,71% às cooperativas (AGÊNCIA..., 2011).
*UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Recebido 14/10/2010; Aceito 18/10/2011
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O elevado percentual de autônomos atuando a revisão de literatura. A terceira seção mostra as


no transporte rodoviário de cargas faz com que perguntas a serem respondidas, define o universo e a
suas práticas impactem profundamente o setor. amostra, a forma como foram coletados os dados, a
As expectativas das empresas quanto aos serviços metodologia utilizada para análise e sua justificativa.
prestados, assim como sua satisfação, variam muito. A quarta seção analisa os resultados obtidos à luz
Isso ocorre basicamente porque empresas com da revisão de literatura. Já a quinta seção discute
diferentes níveis de sofisticação logística empregam esses resultados. Por fim, a sexta seção encerra o
prestadores de serviço de características distintas artigo, com as conclusões alcançadas e sugestões
(WANKE; ARKADER; HIJJAR, 2007). Os prestadores para futuros estudos.
de serviço de transporte rodoviário podem até tentar
adequar sua oferta às demandas de seus clientes, mas
para tanto é necessário, primeiro, que os fatores de 2. Transporte de cargas e o uso de
satisfação dos clientes quanto aos serviços prestados autônomos
apresentem um padrão em comum. Descobrir se isso
Chopra e Meindl (2006) afirmam que o transporte
de fato ocorre no Brasil levou a definir o primeiro
objetivo desta pesquisa: determinar se os embarcadores de cargas movimenta produtos por entre diversos
apresentam fatores de satisfação em comum com pontos da cadeia de suprimentos, sendo um fator‑chave
relação ao serviço prestado pelos transportadores para atingir maiores níveis de eficiência, velocidade e
rodoviários. confiabilidade. Para os autores, a decisão fundamental
é escolher entre o custo do transporte e a rapidez na
O agrupamento dos embarcadores, com base
entrega. Por exemplo, pode-se optar por um custo
nesses fatores (ou padrões) de satisfação, permitiria
maior de transportes e maior agilidade ou por um
aos transportadores melhorar seu nível de serviço nos
custo menor e um prazo de entrega mais longo.
aspectos relevantes para cada segmento. Existem,
no entanto, limitações técnicas e financeiras para Os autores também analisam as características
se atender a todos os agrupamentos. A possibilidade de desempenho de diferentes modais quanto aos
de diferenciar os agrupamentos de embarcadores tamanhos dos lotes transportados, aos estoques
com base em características demográficas seria de de segurança, aos estoques em trânsito, aos custos
grande utilidade, permitindo melhor posicionamento incorridos e aos tempos em trânsito. As relações
dos transportadores no mercado. Devido à ampla entre essas características e os diferentes modais são
utilização de autônomos no transporte rodoviário de apresentadas na Tabela 1, por meio de uma escala de
cargas, o percentual de carga transportada por esses 1 a 6, na qual um menor valor indica menor custo,
profissionais foi a primeira característica escolhida para tempo ou estoque.
diferenciar os agrupamentos. A segunda característica Especificamente com relação ao Brasil,
foi escolhida por tratar-se de um dado relevante Nazário (2000) afirma que, como cada vez mais
ao planejamento das operações de distribuição: a se busca redução nos custos logísticos e maior
tonelagem transportada anualmente. Chega-se, assim, confiabilidade no serviço prestado, o uso de mais
ao segundo objetivo desta pesquisa: determinar se é de um modal (multimodalidade/intermodalidade)
possível distinguir os agrupamentos de embarcadores, surge como oportunidade competitiva. Isso decorre
originalmente gerados a partir de fatores de satisfação da predominância do modal rodoviário na matriz
em comum, com base nessas duas características de transportes brasileira, mesmo para produtos de
demográficas. baixo valor agregado em longas distâncias. Ainda em
O artigo está organizado em seis seções. relação à competitividade do modal rodoviário, Fleury
A primeira seção apresenta uma visão geral do (2003b) enumera outros quatro grandes desafios,
transporte rodoviário no Brasil, a relevância do tema todos associados, em maior ou menor grau, ao uso
e os objetivos do trabalho. A segunda seção traz de autônomos. Eles são detalhados a seguir.

Tabela 1. Impacto dos modais de transporte no desempenho da cadeia de suprimentos.


Rodoviário
Rodoviário Entrega
Ferroviário (carga Aéreo Hidroviário
(carga fechada) expressa
fracionada)
Tamanho do lote 5 4 3 1 2 6
Estoques de segurança 5 4 3 1 2 6
Estoques em trânsito 5 4 3 1 2 6
Custo do transporte 2 3 4 6 5 1
Tempo de transporte 5 3 4 1 2 6
Fonte: Chopra e Meindl (2006).
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2.1. Fragmentação do setor e expectativas habilitaria a logística a ser vista como uma vantagem
de serviço competitiva, capaz de melhorar a eficiência por meio
da redução de custos, mas também aprimoraria a
Cerca de 50% da frota nacional pertence a eficiência do marketing na personalização de processos
autônomos, 20% a embarcadores e 30% a que gerem maior lucro para as empresas.
transportadoras. Com relação às empresas de
transporte, há em torno de 40.000 delas no Brasil,
sendo que 85% têm menos de 50 empregados. Apesar 2.2. Envelhecimento da frota por
de poucos artigos tratarem do tema, percebe-se que incapacidade de renovação
essa fragmentação afeta sobremaneira não apenas as
relações entre embarcadores e transportadores, mas A frota de caminhões no Brasil apresenta idade
também as expectativas e percepções com relação à média de 18 anos. Além disto, 87% das empresas
qualidade dos serviços prestados. transportadoras não adotam programas para renovar
Pesquisa realizada por Gibson, Rutner e Keller seus veículos. Candido (2004) afirma que a oferta
(2002), na qual os embarcadores estavam representados excedente de frete, em decorrência de uma frota
em sua maioria por fabricantes, evidenciou que o custo sucateada, contribui para deprimir os preços. Para
é o item de maior importância quando são consideradas garantir um volume mínimo de carga, o transportador
parcerias com transportadores. Os embarcadores autônomo acaba se sujeitando a trabalhar em
atribuíram ao custo maior importância com relação condições inadequadas, muitas vezes em jornadas
à sua satisfação na parceria. Tanto os embarcadores superiores às permitidas pela legislação, com excesso
quanto os transportadores apresentaram um nível de carga e em velocidades exageradas ou inadequadas
de satisfação extremamente baixo com relação ao às condições de conservação das vias.
desempenho da outra parte em controlar, reduzir e De fato, o setor encontra-se preso a um círculo
eliminar os custos da operação. Isso mostra que a vicioso. Pequenas barreiras de entrada e elevadas
relação entre embarcadores e transportadores carece barreiras de saída geram mais oferta do que demanda
de maior atenção, visto que não é possível que apenas (CENTRO..., 2002). O excesso de oferta faz com
uma das partes incorra em todos os esforços para que os preços de frete caiam sistematicamente. Os
redução de custos. transportadores passam, então, a ter maior dificuldade
Hopkins et al. (1993), por sua vez, aplicaram para captar carga. Pressionados por baixos preços
questionário em embarcadores de diferentes indústrias e pela ociosidade, os autônomos passam a adotar
e em empresas de transporte que utilizam os principais práticas de concorrência predatória, como excesso
modais (aéreo, rodoviário, ferroviário e aquaviário). de peso, de horas trabalhadas e de velocidade,
Os autores concluíram que um fator de grande além da crônica falta de manutenção adequada dos
importância para a satisfação com relação à qualidade veículos. A capacidade disponível ofertada ao mercado
do serviço prestado é o não cumprimento de promessas aumenta em decorrência dessas práticas. Com maior
por parte dos transportadores. oferta de transporte, o frete reduz-se ainda mais,
Em linhas gerais, diferentes segmentos de retroalimentando esse círculo vicioso. Em síntese,
clientes enfatizariam diferentes componentes do a crônica dificuldade de renovação da frota reforça
serviço logístico prestado por transportadores a relação de dependência dos embarcadores junto
(MENTZER; FLINT; HULT, 2001). Entretanto, pode aos autônomos.
haver similaridades (fatores em comum) entre esses
segmentos. Dessa forma, os gerentes de logística
deveriam ser capazes de desenvolver processos 2.3. Insegurança
aplicáveis a todos os segmentos. Por exemplo, a
qualidade do contato pessoal teve impacto positivo O roubo de cargas vem aumentando
na percepção do serviço em todos os segmentos sistematicamente no Brasil, sendo que em 2009 foram
estudados pelos autores. Os gerentes também deveriam 13.500 ocorrências, contra 2.500 em 1994 e 7.500 em
ser capazes de avaliar quais são os aspectos mais 2001. Esse problema, como era de se esperar, é mais
relevantes para os segmentos que eles atendem. Caso grave em transportadores de menor porte, visto que
existam fatores em comum, seria possível desenvolver eles afirmam ter muita dificuldade na administração
recursos específicos para elevar a satisfação de todos dos seguros de carga. Mais precisamente, essas
os segmentos simultaneamente. E se as necessidades empresas com frequência se deparam com problemas
dos segmentos forem distintas, o gestor deveria buscar na contratação de seguro contra roubo, basicamente
personalizar seu serviço para atender a um segmento por não possuírem políticas adequadas para gestão
específico. Esse tipo de procedimento não apenas de risco (GAMEIRO; CAIXETA FILHO, 2002).
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Além disso, a maioria dos transportadores Na Argentina, a situação de um motorista


desconhece se as cargas contratadas estão efetivamente autônomo tem sido considerada como a de
cobertas pelo seguro dos embarcadores. Do mesmo um “trabalhador independente com posição de
modo, com relação ao seguro obrigatório, verifica-se dependência”. Ademais, existe a prática de incentivar
também essa falha de comunicação entre as duas os motoristas a trabalharem como autônomos nas
partes (GAMEIRO; CAIXETA FILHO, 2002). Segundo próprias empresas que os demitiram e das quais
os autores, como a grande maioria dos embarcadores eles recebem incentivos para adquirir seu próprio
não utiliza o seguro que lhes é obrigatório, maior veículo. Essa prática é conhecida na Finlândia como
responsabilidade recai necessariamente sobre os “empregadores involuntários”. Muitos motoristas
transportadores no caso de sinistros de carga. trabalham para o mesmo empregador, de quem
alugam um caminhão segundo um plano de trabalho
O roubo de cargas, quando comprovado ter
preestabelecido.
sido caso de força maior, não mais é considerado
Nos “acordos de transporte” no Japão, o
responsabilidade do transportador. Nesses casos, o
caminhoneiro autônomo é proprietário do veículo,
seguro do embarcador é que deve ressarci-lo das
sendo responsável pelas despesas de manutenção e
perdas ocasionadas. Por se tratar de seguro pouco
pelo combustível, assim como outras taxas, incluindo
utilizado, há grande pressão sobre os transportadores
a seguridade social. Muitos desses trabalhadores
para que sejam responsabilizados pelo ocorrido. Por
estão submetidos à forte relação de dependência,
outro lado, em se confirmando a responsabilidade pois trabalham para uma única empresa. Por diversas
do transportador sobre a ocorrência do evento, vezes, o caminhão de propriedade do autônomo tem
seu seguro é que deve ser acionado (GAMEIRO; que ostentar claramente a marca ou o logotipo da
CAIXETA FILHO, 2002). empresa contratante.
Na Austrália, existem poucas barreiras ao ingresso
2.4. Desregulamentação das relações de de caminhoneiros autônomos no setor de transportes.
trabalho Entretanto, o alto nível de endividamento contraído
pelo caminhoneiro e o excesso de oferta favorecem
No Brasil, os transportadores autônomos o enfraquecimento de seu poder de barganha,
frequentemente trabalham em parceria com as aumentando sua situação de dependência. Como
transportadoras, sendo contratados normalmente pode ser percebido, em praticamente todo mundo tem
para suprir picos de demanda e para viajar longas ocorrido uma substancial modificação das condições
distâncias (VALENTE; PASSAGLIA; NOVAES, 1997). de trabalho desta categoria. Seu impacto nas relações
Verifica-se ainda a utilização simultânea de motorista de emprego desse setor depende fundamentalmente
contratado pela empresa e de caminhoneiro autônomo do ordenamento jurídico e da estrutura de custos de
para conferir maior flexibilidade na alocação de transporte de cada país.
veículos e de rotas. Além disso, observa-se uma Não obstante, também tem ocorrido a proliferação
crescente complexidade nas relações de emprego, de empresas de subcontratação (quarteirização), o
reforçada pela terceirização, a qual dissimula as que garante a oferta de mão de obra e a prestação
de serviços ao embarcador, mas acaba claramente
relações de subordinação entre as partes. Contudo,
encobrindo a relação de dependência que prevalecia
ainda que as atividades desenvolvidas por motoristas
até então. Esse fenômeno também contribui para
e autônomos sejam praticamente as mesmas, não
desarticular ainda mais esse mercado de trabalho,
há um contrato formal de trabalho no último caso
na medida em que dificulta a organização sindical
(CHAHAD; CACCIAMALI, 2005).
por parte dos autônomos (INTERNATIONAL..., 2003).
Também em outros países muitos motoristas têm Nickerson e Silverman (2003) afirmam que a relação
passado da posição de empregados regulares para de emprego nas empresas transportadoras engloba uma
a situação de terceirizados, ou de autônomos, que “zona de tolerância” diferente daquelas observadas em
devem dispor de seu próprio caminhão, ou mesmo relações contratuais tradicionais, referentes a outras
alugá-lo, executando praticamente os mesmos serviços formas de organização do trabalho. Percebe-se que
que realizavam quando regularmente empregados os motoristas com vínculos de emprego regulares
(INTERNATIONAL..., 2003). Na Alemanha, por exemplo, são mais fáceis de administrar do que os motoristas
o número dos chamados motoristas independentes autônomos. Hart e Moore (1990) destacam que isso
tem aumentado consideravelmente nos últimos ocorre devido à propriedade do caminhão. A posse
anos. Na observância de um suposto “contrato de desse ativo resulta em diferentes posições de barganha
transporte”, eles conduzem os caminhões em favor de quando o contrato se rompe. Essa diferença no poder
um embarcador, ainda que sem direitos trabalhistas. de barganha afeta a cooperação e o relacionamento
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entre a empresa e o autônomo, significando que amostra, partiu-se, inicialmente, dos 379 embarcadores
a “zona de tolerância” não é resultado do estado de carga rodoviária listados entre as 1.000 maiores
mental de ambas as partes, mas decorrente da posse empresas do Brasil, conforme ranking divulgado pela
do ativo físico, no caso, o caminhão. revista Exame.
Segundo Chahad e Cacciamali (2005), embora a Antes do envio dos questionários, foi efetuado
propriedade do caminhão não seja mais da empresa, contato telefônico com as empresas-alvo explicando
transformando-se num instrumento de trabalho do os objetivos da pesquisa e consultando-as sobre
caminhoneiro, ela representa a utilização de uma seu desejo em participar. Esse procedimento se
forma de capitalização mais flexível, cujo investimento justifica tendo em vista que o número de contatos,
e manutenção foram repassados para o autônomo. contatos personalizados e contatos prévios é
Segundo os autores, a ocorrência de diferentes frequentemente associado às altas taxas de resposta
arranjos trabalhistas, decorrente da busca por maior em pesquisas conduzidas pela internet (COOK; HEATH;
eficiência no transporte de cargas, não deixa de implicar THOMPSON, 2000). Ao final dessa fase inicial de
relações de emprego dissimuladas, caracterizadas por contatos, 379 empresas se dispuseram a responder
dependência direta ao embarcador. o questionário.
O questionário foi elaborado em planilha Excel.
3. Objetivos e metodologia O mesmo foi enviado anexado a um e-mail com as
orientações sobre os objetivos da pesquisa e sobre
Observando-se o objetivo principal desta pesquisa, o preenchimento da planilha. Durante o período
que é determinar se os embarcadores apresentam de coleta dos dados foram feitos diversos contatos
fatores de satisfação em comum no transporte telefônicos com as empresas, visando aumentar a
rodoviário de cargas, apresentamos a primeira taxa de respostas. Ao término do período de coleta,
pergunta: 113 questionários haviam sido recebidos. Destes,
1. Os embarcadores apresentam fatores de dois foram descartados por não terem seus dados
satisfação em comum com relação ao serviço de validados. Dos questionários restantes, outros seis
transporte que lhes é prestado? foram eliminados por não possuírem todas as respostas
Para responder essa pergunta, foi elaborada a que tratam da satisfação com os transportadores de
seguinte hipótese nula: cargas pelo modal rodoviário, o que inviabilizava
H0 1: Os embarcadores não apresentam fatores seu uso nas análises que se seguiram. Dessa forma,
de satisfação em comum com relação ao transporte restaram 105 questionários, perfazendo um total de
rodoviário de cargas. 27,7% de respostas válidas.
Observando-se o segundo objetivo principal, que As pesquisas conduzidas por meio do envio
é agrupar os embarcadores com base nesses fatores de correspondências são alvo de críticas quanto à
de satisfação em comum, apresentamos a segunda possibilidade de substanciais diferenças entre os perfis
pergunta: dos respondentes e dos não respondentes. A melhor
2. Os embarcadores podem ser segmentados em forma de minimizar esse erro é manter a porcentagem
função da tonelagem transportada anualmente e de não respondentes abaixo de 30% (ARMSTRONG;
do percentual de movimentação de cargas efetuado OVERTON, 1977).
via autônomos? Como a pesquisa obteve uma taxa de não
Para responder essa pergunta, relevante por respondentes acima deste valor, optou-se por comparar
eventualmente possibilitar um posicionamento de as características demográficas conhecidas do universo
mercado mais adequado por parte dos transportadores, com as características da amostra. Isso foi feito
foi elaborada a seguinte hipótese nula: por meio da tabulação cruzada da distribuição de
H0 2: A tonelagem transportada anualmente e o frequências, pelas diferentes indústrias, dos dados da
percentual de transporte efetuado com autônomos amostra e do universo considerado (Ranking Exame).
não diferenciam os segmentos de embarcadores Os testes utilizados foram o gamma de Goodman
constituídos a partir dos fatores de satisfação em e Kruskal, tau-b de Kendall e o tau-c de Kendall
comum. (RODRIGUES; STANK; LYNCH, 2004).
O universo desta pesquisa compõe-se de todos As distribuições das empresas entre os diversos
os embarcadores de cargas no modal rodoviário. segmentos industriais, tanto no universo como na
Devido ao grande número de empresas que compõe amostra, são apresentadas na Tabela 2.
essa população, abrangendo os mais diversos portes, Os testes de correlação não paramétricos tau-b e
ramos de atividades e práticas administrativas, houve a tau-c de Kendall e gamma de Kruskal mostraram-se
necessidade de limitar a amostra. Para a definição da significativos, assegurando que a amostra é aderente
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à população e que, dessa forma, não há diferenças do que o teste de Spearman (FIELD, 2005). Como
significativas entre ambas as distribuições (cf. Tabela 3). buscamos comprovar se o aumento da satisfação
Finalmente, a nomenclatura das variáveis coletadas, afeta positivamente a percepção do desempenho dos
as dimensões avaliadas e o tipo de escala, com sua transportadores, foi utilizado um teste unicaudal,
descrição, são apresentados na Quadro 1. também, chamado direcional (WITTE; WITTE, 2005).
O resultado do teste de correlação não paramétrica
tau-b de Kendall apresentou correlações significativas
4. Análise dos resultados para todas as variáveis analisadas em relação à
percepção do desempenho médio dos transportadores.
A variável área geográfica de atuação mostrou-se
4.1. Padrões comuns de satisfação significativa a 0,05. As demais variáveis mostraram-se
significativas a 0,01.
O primeiro passo foi verificar se a variável que As correlações significativas foram tratadas
trata a percepção da satisfação dos embarcadores com estatisticamente por meio da técnica de análise
a média dos transportadores (variável 1) se relaciona fatorial, buscando-se determinar se havia relações
com a percepção de satisfação acerca de diferentes entre as mesmas e permitindo a formação de fatores
aspectos do serviço prestado (variáveis 2 a 15). Foi de satisfação comuns aos embarcadores. Foi realizada
utilizado o teste de correlação não paramétrica uma análise fatorial do tipo R, que procurou encontrar
tau-b de Kendall por tratar-se de um teste mais correlações entre as variáveis. O método utilizado foi o
apropriado, permitindo uma correlação mais acurada de componentes principais, por tratar-se de pesquisa
exploratória de dados para a geração de hipóteses
Tabela 2. Distribuições das empresas entre as indústrias. (FIELD, 2005). Além disto, esse método apresenta
População (M&M mais facilidade de processamento quando comparado
Indústria Amostra
1.000) com outros disponíveis, encontrando-se resultados
Alimentos, Bebidas e Fumo 116 13 semelhantes na maioria dos casos em que há mais
Atacado e Comércio Exterior 84 8 de 30 variáveis ou as comunalidades excederem
Automotivo 51 10 0,60 para a maioria das variáveis (HAIR; ANDERSON,
Comércio Varejista 66 5 TATHAM, 2005). Para determinar o número de fatores
Comunicações 12 2 a ser extraído, optou-se pelo critério do teste scree.
Confecções e Têxteis 25 7 Utiliza-se o teste scree para determinar o ponto em
Construção 22 0
que a variância única dos fatores passa a dominar
Diversos 13 0
a estrutura de variância comum. Esse critério foi
Eletroeletrônicos 45 7
preferido ao critério eigenvalue devido ao número
Farmacêutico, Higiene e
Cosméticos
32 7 de variáveis, pois, para menos de 20 variáveis, como
Limpeza 2 1 é o caso desta pesquisa, o critério eigenvalue resulta
Material de Construção 26 5 em um número conservador de fatores.
Mecânica 16 1 Finalmente, como forma de tornar essa opção mais
Mineração 16 1 robusta, foi observada a percentagem de variância. A
Outros 1 0 determinação do número de fatores pela quantidade
Papel e Celulose 19 8
de variância explicada calcula o acúmulo da variância
Plásticos e Borracha 16 0
para cada fator extraído até que se atinja um nível
Química e Petroquímica 87 12
satisfatório. Dessa forma, foi verificado se os fatores
Serviços de Transporte 38 0
Serviços Diversos 61 0
extraídos pelo critério do teste scree possuíam a
Serviços Públicos 118 0 variância mínima de 60%, recomendada pela literatura
Siderurgia e Metalurgia 69 13 (MALHOTRA, 2001).
Tecnologia e Computação 29 2 Após a determinação do número de fatores, os
Telecomunicações 36 3 dados foram rotacionados. Esse procedimento se
Total => 1.000 105 justifica uma vez que, na maioria dos casos, ajuda a
diminuir ambiguidades na interpretação dos fatores.
Havendo a opção por rotações oblíquas e ortogonais,
Tabela 3. Tabulação cruzada entre amostra e população. optou-se por esta última devido à existência de
Teste Valor Significância controvérsias sobre os procedimentos analíticos das
Kendall’s tau-b 0,398 0,011 rotações oblíquas, além destes ainda não estarem bem
Kendall’s tau-c 0,397 0,011 desenvolvidos (HAIR; ANDERSON; TATHAM, 2005).
Gamma 0,424 0,011 Dentre os métodos disponíveis de rotação ortogonal,
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adotou-se o varimax por sua característica de procurar Finalmente, todas as variáveis apresentaram cargas
relacionar variáveis possuidoras de cargas altas em um fatoriais superiores a 0,55 em pelo menos um fator.
único fator (SHARMA, 1996). Isso resulta em fatores Nenhum fator foi composto por apenas uma variável.
cuja interpretação é mais simples (FIELD, 2005). Dessa forma, todas as variáveis foram incluídas na
Os quatro fatores extraídos explicam 64,31% análise. Os resultados são apresentados na Tabela 4.
da variância. O teste KMO teve como resultado Os quatro fatores encontrados foram interpretados
0,839, o que é considerado um resultado notável e e nomeados de forma a indicar o seu significado,
comprova a possibilidade de gerar fatores distintos conforme apresentado a seguir.
e confiáveis. Por sua vez, o teste de esfericidade de • Fator 1 – Sinergia: Compreende as atividades de
Bartlett teve significância inferior a 0,000, rejeitando inteligência por parte do transportador, que oferece
a existência de uma matriz identidade e permitindo a ao embarcador não só o transporte em si, mas
análise. Também cabe ressaltar que, das 14 variáveis melhorias no seu serviço;
analisadas, 10 mostraram comunalidades superiores • Fator 2 – Confiabilidade: Caracterizado pelo
a 0,6, comprovando a adequação da análise de desempenho do transportador na execução direta
componentes principais. do serviço contratado;

Quadro 1. Variáveis coletadas e escalas utilizadas.


Tipo de
Dimensão Variáveis Escala adotada
escala
Hipótese 1
1 (menor satisfação) a
1. Desempenho médio de todos os transportadores Ordinal
10 (maior satisfação)
2. Disponibilidade de veículos e equipamentos
3. Preço cobrado
4. Condições de veículos e equipamentos
5. Consistência nos prazos
6. Rapidez
Satisfação em relação 1 - Satisfação muito alta
7. Integridade da carga
aos transportadores 2 - Satisfação alta
8. Qualificação de pessoal
3 - Satisfação média Ordinal
9. Variedade de serviços oferecidos
4 - Satisfação baixa
10. Soluções propostas para melhoria das atividades
5 - Satisfação muito baixa
11. Sofisticação tecnológica
12. Área geográfica de atuação
13. Disponibilidade de informações gerenciais
14. Histórico de não envolvimento em acidentes
15. Histórico de não envolvimento em roubos
Hipótese 2
Volume da operação 16.Tonelagem transportada anualmente pelo modal rodoviário 0 a 100 Razão
Propriedade da frota 17. Percentual da carga rodoviária transportada por autônomos 0 a 100 Razão

Tabela 4. Matriz rotacionada de componentes.


Componentes
Variável
Fator 1 Fator 2 Fator 3 Fator 4
Percentual explicado da variância pelo fator 19,86% 19,20% 12,99% 12,26%
Disponibilidade de veículos e equipamentos 0,023 0,604 –0,045 0,556
Preço cobrado 0,098 0,228 0,126 0,739
Condições de veículos e equipamentos 0,379 0,637 –0,148 0,047
Consistência de prazos 0,104 0,699 0,298 0,066
Rapidez 0,211 0,727 0,174 0,130
Integridade da carga 0,114 0,565 0,131 0,277
Qualificação de pessoal 0,410 0,327 0,145 0,556
Variedade dos serviços oferecidos 0,710 0,079 0,174 0,116
Soluções propostas 0,642 0,444 0,213 0,117
Sofisticação tecnológica 0,757 0,380 0,100 0,090
Área geográfica de atuação 0,497 –0,075 0,055 0,590
Disponibilidade de informações gerenciais 0,771 0,122 0,092 0,219
Histórico de não envolvimento em acidentes 0,135 0,221 0,858 0,112
Histórico de não envolvimento em roubos 0,205 0,067 0,887 0,083
Wanke, P. F.
X
Fatores de satisfação ... transporte rodoviário de cargas. Produção, v. xx, n. x, p. xx-xx, xxx/xxx, xxxx

• Fator 3 – Gerenciamento de riscos: Consistência quanto ao serviço, apresenta a maior satisfação média,
do transportador em evitar incidentes que causam podendo ser chamado de Tolerante (cf. Tabela 6).
prejuízo ao embarcador; e Já o cluster A tem maior expectativa em relação
• Fator 4 – Qualificadores: Requisitos mínimos que aos fatores sinergia, confiabilidade e gerenciamento
devem ser oferecidos pelo transportador, sem os de riscos. Com isso, a satisfação nesses três fatores é
quais o embarcador não aceita contratá-lo. menor em relação ao cluster Tolerante. Para atender
Os fatores 1, 2, 3 e 4 apresentaram valores para as necessidades das empresas que compõem esse
o alfa de Cronbach de 0,821; 0,764; 0,828 e 0,635, cluster, os transportadores exigem um preço-prêmio,
respectivamente. Como todos os fatores apresentaram o que faz com que a satisfação com relação ao
um alfa de Cronbach superior a 0,6, os mesmos foram fator qualificador também decresça. Esse cluster foi
considerados validados. As correlações inter-item nos denominado como Exigente.
fatores 1, 2 e 3 formam superiores a 0,3. No fator O cluster C tem comportamento semelhante ao
4, a relação entre as variáveis preço cobrado e área cluster Tolerante em relação aos fatores sinergia,
geográfica de atuação foi de 0,243, inferior a 0,3. confiabilidade e qualificadores. A expectativa
Porém, como o valor do alfa de Cronbach para o das empresas desse cluster em relação ao fator
fator foi aceitável, o fator foi considerado validado. O gerenciamento de risco é maior do que nos clusters
último passo da análise fatorial consiste no cálculo dos Tolerante e Exigente. Essas características fazem com
escores fatoriais. Esse procedimento foi importante, que a satisfação em relação ao fator gerenciamento
pois omB e 24 (22,86% dos casos) no cluster C. Os de risco decresça de forma análoga, porém mais
respectivos centroides são apresentados na Tabela 5. acentuada, ao que ocorre com o cluster Exigente.
Pelo resultado do teste Mann-Withney, os Esse cluster apresenta a pior satisfação média. Tendo
centroides do cluster B diferenciam-se dos demais em vista a peculiaridade do cluster em relação ao
clusters em todos os fatores. Sabemos também, fator gerenciamento de risco e a provável maior
pelo mesmo teste, que os clusters A e C diferem exigência com relação ao mesmo, esse agrupamento
apenas no fator 3. Os diferentes níveis de satisfação foi denominado Protetor.
apresentados pelos clusters têm ligação direta com
as expectativas dos embarcadores que os compõem. 4.2. Diferenciação dos agrupamentos
Um valor elevado na satisfação de cada fator pode
ser resultado de um nível de serviço alto prestado Segundo Hair, Anderson e Tatham (2005), para
pelo transportador ou de expectativas baixas por verificar se as variáveis indicadas na hipótese 2
parte do embarcador. diferenciam os agrupamentos, podem ser utilizadas a
A análise de cada agrupamento nos permite análise discriminante múltipla ou a regressão logística
concluir que o cluster B recebe os piores serviços e multinomial. Ambas são adequadas quando a variável
tem o menor custo repassado pelos transportadores. dependente é categórica (com três ou mais grupos)
Entretanto, por possuir as menores expectativas e as variáveis independentes são métricas.
Os mesmos autores ressaltam que a utilização
As variáveis destacadas correspondem aos fatores. da análise discriminante depende da existência
Tabela 5. Centroides dos clusters. de normalidade multivariada e de matrizes de
Fatores A B C variância‑covariância iguais. Quando esses pressupostos
Fator 1 – Sinergia 2,47 1,65 2,38 não são satisfeitos, a regressão logística mostra-se
Fator 2 – Confiabilidade 1,60 1,31 1,68 muito mais robusta. Além disso, pode aceitar
Fator 3 – Gerenciamento de riscos 1,73 1,43 2,84 variáveis não métricas desde que codificadas na
Fator 4 – Qualificadores 1,71 1,38 1,79 forma de variáveis dicotômicas (dummy). Esses
motivos justificaram a opção pela regressão logística

Tabela 6. Interpretação dos clusters de satisfação.


Centroides dos clusters
(A) (B) (C)
Exigentes Tolerantes Protetores
Fator 1 – Sinergia 2,47 R 1,65 S 2,38 R
Fator 2 – Confiabilidade 1,60 S 1,31 MS 1,68 S
Fator 3 – Gerenciamento de riscos 1,73 S 1,43 MS 2,84 R
Fator 4 – Qualificadores 1,71 S 1,38 MS 1,79 S
Média dos fatores 1,88 S 1,44 MS 2,17 R
Interpretação da satisfação: R = regular, S = satisfeito, MS = muito satisfeito.
Wanke, P. F.
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Fatores de satisfação ... transporte rodoviário de cargas. Produção, v. xx, n. x, p. xx-xx, xxx/xxx, xxxx

multinomial. A significância máxima adotada para os Como consequência, os clusters Exigente e Protetor
testes foi de 0,10 por se tratar de estudo exploratório apresentam-se satisfeitos e o cluster Tolerante, muito
(MENTZER; FLINT, 1997). satisfeito. Podemos inferir que o cluster Tolerante
Os resultados da análise de regressão apresentados tem expectativas menores do que as dos clusters
na Tabela 7 indicam que as variáveis total de carga Exigente e Protetor.
transportada (em toneladas, pelo modal rodoviário) O terceiro fator, gerenciamento de riscos, padece
e percentual de carga transportada por autônomos dos mesmos problemas que os fatores anteriores
apresentaram significância satisfatória (abaixo de 0,10), em função da competição, não sendo comum no
mostrando que as mesmas discriminam os clusters. Brasil a adoção de seguros que protejam as cargas.
De fato, o teste de razão de verossimilhança para o Quanto a esse fator, o cluster Tolerante mostra-se
modelo final apresentou significância de 0,014. Esse muito satisfeito, o cluster Exigente, satisfeito, e o
resultado evidencia a adequação da combinação entre cluster Protetor, com satisfação regular. Podemos
as variáveis explicativas e os clusters. inferir que o cluster Protetor é o que possui maiores
expectativas quanto ao gerenciamento de riscos por
5. Discussão dos resultados parte do transportador.
O quarto fator, qualificadores, contém os
Os fatores analisados englobam tanto o custo indicadores que, se não alcançarem patamar mínimo,
quanto as características dos serviços prestados, impedem a contratação do serviço. Nesse caso, os
elementos fundamentais nas decisões gerenciais de clusters Exigente e Protetor estão satisfeitos e o
transporte. Também englobam as principais dimensões cluster Tolerante está muito satisfeito. Tratando-se
desse tipo de serviço: velocidade, consistência, especificamente desse fator, inferimos que o cluster
capacitação, disponibilidade e frequência. Tolerante paga valores reduzidos, o que gera maior
O primeiro fator, sinergia, refere-se aos serviços satisfação. Os clusters Exigente e Protetor devem
prestados pelo transportador em sintonia com o pagar valores mais elevados pelo serviço prestado. É
embarcador, agregando valor às suas atividades. A importante ressaltar que esse fator faz referência ao
competição que caracteriza o mercado brasileiro, e custo do frete, mas não aborda diretamente outros
faz com que os preços caiam, não deixa margem custos relevantes na escolha da rede de transportes
para que o transportador pague seus custos, execute como os custos de estoques, instalações, processamento
essas atividades de valor agregado e ainda obtenha de pedido e nível de serviço.
lucro. Dessa forma, podemos inferir que a expectativa Observando os resultados da análise de regressão
dos embarcadores deveria ser modesta. Isso parece logística, apresentados na Tabela 7, pode-se montar
ocorrer no cluster Tolerante. No entanto, os clusters o seguinte sistema de equações, o qual fornece
Exigente e Protetor apresentam um grau de satisfação as respectivas probabilidades de se pertencer a
regular. Podemos concluir que ambos possuem maior determinado cluster com base nas variáveis total de
expectativa e, consequentemente, uma zona menor de carga transportada (TotalCarga) e percentual de carga
tolerância quanto à sinergia no transporte de cargas. transportada por autônomos (PercAut):
O segundo fator, confiabilidade, refere-se a
indicadores básicos do serviço de transporte. Como Exigente: = e(0,087 – 0,015 PercAut + 0,0001 Total Carga) (1)
no fator anterior, a competição agressiva reduzindo
preços faz com que as expectativas pelo nível de Protetor: = e(0,087 – 0,015 PercAut + 0,0001 Total Carga) (2)
serviço sejam baixas. Por outro lado, esses indicadores
são mais facilmente atingíveis, exigindo-se menor Tolerante: = - e(0,087 - 0,015 PercAut + 0,0001 Total Carga)
(3)
dispêndio de recursos por parte do transportador. - e(-0,397 - 0,032 PercAut + 0,0001 Total Carga)

Tabela 7. Regressão logística multinomial.


Graus de
Cluster Variável B Erro padrão Wald Significância
liberdade
Constante 0,087 0,361 0,058 1 0,809
Exigente % Transp. por autônomos –0,015 0,009 2,840 1 0,092
Total carga transp. (ton.) 0,0001 0,000 4,056 1 0,044
Constante –0,397 0,416 0,911 1 0,340
Protetor % Transp. por autônomos –0,032 0,015 4,648 1 0,031
Total carga transp. (ton.) 0,0001 0,000 3,749 1 0,053
R-Quadrado de Nagelkerke: 0,19. Cluster de referência: Tolerante.
Wanke, P. F.
X
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Para a análise que se segue, deve ser observado diminuir. Isso representa uma limitação no volume
que conclusões válidas são obtidas somente para transportado, possivelmente por ter maior valor
a região do espaço em que as três probabilidades agregado. Além disso, esse agrupamento é o que
somadas são necessariamente iguais a 1, e cada uma, apresenta a menor probabilidade de utilizar-se de
individualmente, é maior ou igual que 0 e menor autônomos, provavelmente pela busca de maior
ou igual a 1. segurança em função do perfil de carga transportada.
Analisando-se em termos do total de carga
transportada, para diferentes percentuais de uso
6. Conclusões e sugestões para pesquisas
de autônomos, vemos que os Tolerantes têm,
em comparação com os outros clusters, maior futuras
probabilidade de movimentar pequenos volumes O mercado de transporte rodoviário de cargas
até, aproximadamente, 400 t. Essa probabilidade no Brasil segue uma prática encontrada em vários
continua a decrescer até aproximar-se de 0 em países do mundo, a saber: a utilização de profissionais
torno de 12.000 t. Esse cluster também tem a menor
autônomos como forma de reduzir custos e evitar a
probabilidade de utilizar uma pequena proporção de
existência de relações trabalhistas mais dispendiosas.
autônomos para transportar suas cargas. No entanto, o
Embora os motivos que levam as empresas a utilizar
segmento apresenta as maiores probabilidades quando
autônomos ao redor do mundo variem pouco, no
temos a proporção de cerca de 90% a 100% da carga
Brasil, peculiaridades como a ausência de barreiras à
transportada por autônomos. Os motivos que levam
entrada e grandes dificuldades ao tentar abandonar a
empresas com menor volume de carga transportada
indústria criaram uma situação inusitada, na qual um
a ter menor expectativa podem ser atribuídos ao
círculo vicioso afeta todo o setor, comprometendo
baixo impacto que a movimentação de pequenos
margens e nível de serviço.
volumes tem nos custos totais da empresa. Quanto
maior a escala, maior o custo e, consequentemente, Apesar das características desse mercado – no
a preocupação com questões operacionais. Essa qual a disputa por custos é acirrada e os outros
ausência de preocupação com a atividade de transporte modais não representam ameaça significativa –, esta
também é refletida na utilização de autônomos em pesquisa demonstrou que nem todos os embarcadores
maior proporção. Uma vez que as empresas não se possuem as mesmas expectativas quanto ao serviço
preocupam com o nível de serviço prestado, seu que recebem e, dessa forma, comportam-se de forma
objetivo passa a ser o menor custo possível, o que distinta. Esses resultados podem contribuir no sentido
é encontrado com os transportadores autônomos. de auxiliar não apenas os transportadores, em decisões
Os Exigentes são o agrupamento que tem maior relativas à segmentação dos mercados e ao desenho
probabilidade de transportar cargas a partir de cerca de serviços personalizados de transporte de cargas,
de 400 t anuais. Quanto ao emprego de autônomos, mas também os embarcadores, com relação a um
os Exigentes têm a maior probabilidade de utilizá-los entendimento melhor de suas expectativas e principais
desde que eles sejam responsáveis de 0% até cerca critérios para avaliação desse serviço.
de 90% da carga transportada. Por ter a maior Mais especificamente, os resultados da pesquisa
probabilidade de movimentar grandes volumes, este indicam que os embarcadores se agrupam em
agrupamento apresenta as maiores expectativas quanto três diferentes segmentos (Protetor, Tolerante e
ao serviço prestado. O impacto dessa atividade nos Exigente) a partir de fatores de satisfação em comum
custos totais deve ser bem maior nesse segmento do (sinergia, confiabilidade, gerenciamento de riscos e
que nos outros. qualificadores). Além de diferenças com relação à
Os Protetores têm a menor probabilidade de tolerância a níveis de serviço menores e à aversão
movimentar pequenos volumes (até cerca de 1.600 t ao risco de roubo de cargas, os resultados também
anuais). As chances de movimentar um maior volume indicam que esses segmentos se diferenciam pela
aumentam até cerca de 6.000 t, quando começam a tonelagem transportada anualmente e pelo percentual
decrescer. Quanto aos transportadores autônomos, de transporte efetuado com autônomos.
esse segmento apresenta as menores probabilidades Em linhas gerais, parece que a maior utilização de
para níveis de utilização entre 20% e 100%. Apesar autônomos está relacionada a segmentos nos quais o
das várias semelhanças que os Protetores guardam em volume movimentado é pequeno e por isso o percentual
relação aos Exigentes quanto às suas expectativas, as de autônomos pode ser maior, sem implicar maiores
diferenças entre eles nos permitem inferir conclusões riscos para a operação de transporte. Por outro lado,
interessantes. A probabilidade de pertencer ao grupo percebe-se que maior volume transportado acarreta
dos Protetores, em função da movimentação, cresce maiores expectativas com relação aos níveis de serviço
até aproximadamente 6.500 t, quando começa a e aos riscos da operação, levando, necessariamente, a
Wanke, P. F.
X
Fatores de satisfação ... transporte rodoviário de cargas. Produção, v. xx, n. x, p. xx-xx, xxx/xxx, xxxx

uma progressiva redução no percentual de autônomos. CENTRO DE ESTUDOS EM LOGÍSTICA - CEL. Transporte
É de se esperar que, com o continuo crescimento de carga no Brasil - Ameaças e oportunidades para o
desenvolvimento do país. 2002. Disponível em:<http://
da economia a se verificar nos próximos anos, o www.centrodelogistica.org/new/fs-pesquisa.htm>.
segmento Tolerante tenda a desaparecer, não apenas Acesso em: 02 mai. 2008
em função de uma maior escala da operação (ou seja, CHAHAD, J.P.Z.; CACCIAMALI, M.C. As transformações
maiores volumes transportados), mas também em estruturais no setor de transporte rodoviário e a
virtude do acirramento da concorrência de outros reorganização no mercado de trabalho do motorista de
caminhão no Brasil. Revista da ABET, v. 2, n. 10, 2005.
embarcadores e do investimento em infraestrutura
CHOPRA, S.; MEINDL, P. Gerenciamento da cadeia de
em outros modais de transporte. suprimentos: Estratégia, planejamento e operação. São
Esse cenário, no qual o Exigente tende a Paulo: Prentice-Hall, 2006.
predominar, traz consequências, como a necessidade CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO TRANSPORTE - CNT.Plano
de maior profissionalização do setor de transporte CNT de Logística. 2011. Disponível em:<www.cnt.org.br/
rodoviário de cargas para se manter competitivo. É Paginas/Plano-CNT-de-Logistica.aspx>. Acesso em: 25
mai. 2011.
provável que a figura solitária do autônomo acabe
COOK, C.; HEATH, F.; THOMPSON, R.L. A meta-analysis
desaparecendo ao longo do tempo ou, pelo menos, of response rates in web- or internet-based surveys.
fique cada vez mais dependente da subcontratação Educational and Psychological Measurement,
por empresas de transporte de cargas. Essas, por sua v. 60, n. 6, p. 821-836, 2000. http://dx.doi.
org/10.1177/00131640021970934
vez, deverão experimentar, por conta do crescimento
econômico e pressões competitivas, uma onda de FIELD, A. Discovering statistics using SPSS. Londres: Sage
Publications, 2005.
fusões e aquisições – assim como é verificada nos
demais setores da economia –, de modo a conseguir FLEURY, P. F. Gestãoestratégica do transporte. In:
FIGUEIREDO, K.F.; FLEURY, P.F.; WANKE, P. Logística e
aumentar simultaneamente a escala da operação e o gerenciamento da cadeia de suprimentos: planejamento
escopo dos serviços prestados, mantendo a eficiência do fluxo de produtos e dos recursos. São Paulo: Editora
em custos. Atlas, 2003a.
Como principal limitação desta pesquisa, além FLEURY, P. F. Panorama do transporte de cargas no Brasil. In:
FIGUEIREDO, K.F.; FLEURY, P.F.; WANKE, P. Logística e
de sugestão para estudos futuros, observa-se que gerenciamento da cadeia de suprimentos: planejamento
não foram considerados outros dados demográficos do fluxo de produtos e dos recursos. São Paulo: Editora
relevantes como tipo de indústria, processo de Atlas, 2003b.
manufatura utilizado ou região onde a empresa opera. GAMEIRO, A. H.; CAIXETA FILHO, J.V. Administração de
O estudo das relações entre os fatores de satisfação Seguros no Transporte de Cargas. RAE-eletrônica,
v. 1, n. 1, 2002. http://dx.doi.org/10.1590/
e os segmentos embarcadores por entre diferentes S1676‑56482002000100009
indústrias poderia trazer resultados valiosos para a
GIBSON, B. J.; RUTNER, S.M.; KELLER, S. B. Shipper‑carrier
identificação, por exemplo, de nichos de atuação e partnership issues, rankings and satisfaction.
para o desenho de serviços de transporte específicos. International Journal of Physical Distribution & Logistics
Management, v. 32, n. 8, p. 669-681, 2002. http://
dx.doi.org/10.1108/09600030210444917
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SHARMA, S. Applied multivariate techniques. New York: John projeto número E-26/103.286/2011 - Bolsa Jovem
Wiley & Sons Inc., 1996. Cientista do Nosso Estado.

Satisfaction factors with the use of for-hire


trucking in road transportation
Abstract
In Brazil, cargo transportation services are predominantly based on truckloads and are dependent mostly on for‑hire
trucking. This paper reports on a survey conducted with 105 carriers – listed at “Exame – Melhores e Maiores”
magazine ranking – to evaluate the major factors related to the satisfaction with the services provided, and also
to cluster carriers in terms of common requirements of transportation services. Results indicate three major groups
of carriers, in which the service quality perceptions depend on the intensive use of for-hire trucking, the aggregate
volume transported per year, and the shipments required safety levels.
Keywords
Factors. Satisfaction. Cargo transportation. For-hire trucking. Segmentation.

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