Capítulo de Libro
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Celso Belmiro
Daniel Queiroz Pereira
Flávia Pereira Hill
Leonardo Oliveira Silveira Santos Martins
(coordenadores)
COLETÂNEA
ESTUDOS SOBRE
MEDIAÇÃO
NO BRASIL E NO EXTERIOR
VOLUME 4
1
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Celso Belmiro
Daniel Queiroz Pereira
Flávia Pereira Hill
Leonardo Oliveira Silveira Santos Martins
(coordenadores)
COLETÂNEA
ESTUDOS SOBRE
MEDIAÇÃO
NO BRASIL E NO EXTERIOR
VOLUME 4
1ª edição
2020
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
CONSELHO EDITORIAL
COMITÊ EDITORIAL
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Todos os direitos são reservados. Nenhuma parte deste livro poderá ser
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Bibliotecária responsável: Fabiana Lorenzon Prates - CRB 10/1406
ISBN: 978-65-5790-032-1
Catalogação: Fabiana Lorenzon Prates - CRB 10/1406
Correção ortográfica: pelos autores
Diagramação: Daiana Stockey Carpes
Bibliotecária responsável: Fabiana Lorenzon Prates - CRB 10/1406
Catalogação: Fabiana Lorenzon Prates
Revisões: revisão metodológica e gramatical pelos autores
Diagramação: Daiana Stockey Carpes
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
APRESENTAÇÃO
Os Coordenadores.
Primavera de 2020.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Sumário
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
J. J. Calmon de Passos foi preciso ao declarar: “Se quisermos identificar o que, na segunda
metade do século XX, representou novidade no campo do direito processual, concluiremos
por identificá-la na denominada constitucionalização do processo1.” O Constitucionalismo
surge como movimento jurídico baseado na teoria dos direitos fundamentais, em que as
normas constitucionais conferem força normativa aos princípios que contêm.
Com a derrota dos regimes nazista e fascista na Segunda Guerra Mundial, reconheceu-
se estar o Direito, nas palavras de Flávia Hill, “necessariamente imbuído de valores éticos e
que a adoção de um sistema normativo acrítico, como sustentado pelo positivismo jurídico,
se mostra falsa e equivocada.”2 Há um reencontro com o pensamento kantiano3, com os
1 in “Instrumentalidade e Devido Processo”, Revista Diálogo Jurídico, Ano I, Vol. I., n°1, abril de 2001, Salvador, pág. 05
2 In O Direito Processual transnacional como forma de acesso à justiça no século XXI, pág. 13. Rio de Janeiro: GZ
Editora. 2013.
3 O imperativo ético de Kant apresenta-se como um novo paradigma baseado na racionalidade do homem, que diante de
sua liberdade e autonomia é um ser dotado de moralidade e dignidade, e não num objeto.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4 Conforme lição de Flávia Piovesan in Direitos Humanos e Justiça Internacional. 6. Ed. São Paulo: Saraiva. 2015. Pág. 46.
5 Para Leonardo Greco, “Foram a constitucionalização e a internacionalização dos direitos fundamentais, particularmente
desenvolvidas na jurisprudência dos tribunais constitucionais e das instâncias supra-nacionais de Direitos Humanos, como
a Corte Européia de Direitos Humanos, que revelaram o conteúdo da tutela jurisdicional efetiva como direito fundamental,
minudenciado em uma série de regras mínimas a que se convencionou chamar de garantias fundamentais do processo,
universalmente acolhidas em todos os países que instituem a dignidade da pessoa humana como um dos pilares do Estado
Democrático de Direito”.
6 Flávia Hill in O Direito Processual Transnacional como forma de acesso à justiça, pág. 20, Ed. GZ, Rio de Janeiro,
2013, assim leciona: “Os constitucionalistas modernos e, com destaque, os brasileiros, debruçam-se atualmente com lou-
vável empenho em torno do tema, tendo reconhecido que o mínimo existencial do princípio fundamental da dignidade da
pessoa humana implica garantir renda mínima, saúde básica, educação fundamental e acesso à justiça.”.
7 A iniciativa coube ao processualista francês Serge Guinchaud, seguida por outros fenômenos como a criação de Códigos
Tipo, ou o Código Modelo Para a Ibero América, e a produção do Principles and Rules of Transnational Civil Procedure,
em conjunto por juristas da American Law Institute – ALI e da UNIDROIT, disponível em < https://www.unidroit.org/instru-
ments/transnational-civil-procedure> . Acesso, acessado em 15/12/2019.
8 Esta expressão é cunhada por Serge Guinchaud in Droit Processuel. Droits fondamentaux du process. 6. Ed. Paris:
Dalloz. 2011. Pág. 47.
9 Flávia Hill identifica “o atual estágio evolutivo do Direito, que vimos de apresentar, consubstancia-se em um dos dois
sólidos pilares que fundamentam a noção do Direito Processual Civil Transnacional como resposta adequada à garantia do
acesso à justiça em prol da sociedade contemporânea.” Op cit, pág. 22/23.
10 Nas palavras do processualista Leonardo Greco in Garantias fundamentais do processo: o processo justo: ”Como relação
jurídica plurissubjetiva, complexa e dinâmica, o processo em si mesmo deve formar-se e desenvolver-se com absoluto respeito
aos direitos fundamentais de todos os cidadãos, especialmente das partes, de tal modo que a justiça do seu resultado possa
ser alcançada pela adoção das regras mais propícias à ampla e equilibrada participação dos interessados, à isenta e adequada
cognição do juiz e à apuração da verdade objetiva: um meio justo para um fim justo”.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
11 Mauro Cappelletti assim lecionou: “Como movimento de pensamento, o acesso à justiça expressou uma potente reação
contra uma impostação dogmático-formalística que pretendia identificar o fenômeno jurídico exclusivamente no complexo
da norma” (in Acesso à Justiça e a função do Jurista em nossa época, RP 61 pág. 144 01/1991).
12 Aluísio Gonçalves de Castro Mendes e Larissa Clare Pochmann da Silva relatam com precisão:”a obra de Mauro Cappel-
letti, em colaboração com Bryant Garth e Nicolò Trocker, publicada em 4 (quatro) volumes, em anos distintos, a partir de
1974/1975, foi de extrema importância para a estruturação do tema, revelando-se um verdadeiro marco para o estudo do
direito processual. Apesar da extensão e da relevância em sua íntegra da pesquisa, apenas o último volume, assinado por
Mauro Cappelletti e Bryant Garth, que representou a conclusão dos estudos do denominado Projeto Florença - na verdade,
essa denominação representou a reunião de um conjunto de projetos de pesquisa centralizado em Florença (CAPPELLETTI,
1982, p. 2) -, foi traduzido para o português, sendo divulgado no Brasil através de tradução realizada pela hoje Ministra
aposentada do Supremo Tribunal Federal Ellen Gracie Northfleet” (in “Acesso à Justiça: uma releitura da obra de Mauro Cap-
pelletti e Bryant Garth, a partir do Brasil, após 40 anos”.. Revista Quaestio iuris, vol. 08, nº. 03, Rio de Janeiro, 2015. pp.
1827-1858 DOI: 10.12957/rqi.2015.18818. Disponível em <https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/quaestioiuris/
article/view/19385>.
13 In Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002, pág. 10.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
para significar a obrigação de o litigante ter à sua disposição um processo justo14, ou seja,
aquele que observa princípios fundamentais. Segundo esta nova visão, não será suficiente
o mero ingresso no Judiciário se subsistem óbices a que o processo realize o que se propõe:
conferir ao titular da ação a real possibilidade que obtenha aquilo que o direito material
prevê. A observância às garantias processuais – ao lado da valoração das provas pelo juiz,
e da aplicação da lei – elevará o grau de justiça da decisão proferida pelo juiz15e, portanto,
corresponde ao atendimento ao princípio do acesso à justiça.
Os entraves existentes para se acessar o judiciário propiciaram, em grande medida,
a adoção de métodos consensuais de solução de conflitos; estes se iniciaram em muitas
situações onde a “alternativa”16 passou a ser a ser única viável às partes, considerando os
custos do ajuizamento ou prosseguimento de uma demanda; ou mesmo a incapacidade do
sistema decisório em produzir uma decisão adjudicada (dificuldades práticas na realização
de perícias, em processar demandas repetitivas em grande escala, e dificuldades na fase de
execução, por exemplo).
O sistema multiportas norte-americano (Multi-door Courthouse17) foi igualmente
embrionado na década de 70, e compreendeu o Poder Judiciário como um centro de
resolução de disputas capaz de disponibilizar procedimentos diversos conforme alguns
critérios, como a natureza da disputa, o relacionamento entre as partes, o valor da disputa
e o custo de um acordo. O Brasil vem tentando implementar os métodos consensuais no
âmbito do Poder Judiciário para aumentar a eficiência processual18, o que motivou as
reformas anteriores ao anterior código de 1973, e o empreendimento agregou escopos
políticos e sociais, atinentes à democratização da Justiça e à pacificação social19. Mas
remotamente, tais objetivos são compatíveis com a tradicional doutrina processualista de
14 Leonardo Greco assim lecionou sobre a garantia do acesso à justiça (in Garantias fundamentais do processo: o processo
justo): “Segundo JAVIER BARNES VAZQUEZ, a garantia da tutela jurisdicional efetiva não é mais do que a conseqüência neces-
sária da própria noção de Estado de Direito e da proscrição da auto-tutela. A consagração desse direito em face do poder
público é freqüentemente apontada como a forma mais genuína e importante desse direito. A garantia do acesso à Justiça
não se esgota no direito de provocar o exercício da função jurisdicional, mas abrange também o direito de defesa, ou seja,
o direito de ser ouvido e de influir na atividade jurisdicional por parte daquele em face do qual foi ela desencadeada”.
15 Michele Taruffo (in Idee per uma teoria dela decisione giusta) rejeita tanto a idealização de uma decisão judicial perfeita,
quanto o pessimismo de não obtê-la, e assim leciona sobre os modos de obter uma decisão o mais justa possível: “Infine,
anche il valido impiego di un procedimento giusto e necessario, poiche e attraverso il procedimento che si forma la decisione
finale, ed un « buon » procedimento e quanto occorre per preparare nel modo migliore tale decisione”.
16 A doutrina norte-americana cunhou a expressão ADR, sigla correspondente a alternative dispute resolution, significando
qualquer processo que implique o término de uma disputa, com exceção do julgamento pelo juiz. Devido à inserção dos
mecanismos consensuais no diploma processual civil torna-se mais frequente falar-se em métodos adequados de solução de
conflitos – MASC’s. Aqui trataremos indistintamente por ambos os termos tanto a conciliação quanto a mediação.
17 Aduz Earl Johnson, Jr. (Dispute Resolution Magazine, Fall 2012, vol. 19, n. 01, Ed. American Bar Association Section of Dis-
pute Resolution, ISSN: 1077-3592, Features, p. 07) que Frank Ernest Arnold Sander não cunhou a expressão, mas concebeu que
cada demanda merecia um processo personalizado em seu discurso Varieties of Dispute Processing, proferido na Conferência
Nacional de Causas da Insatisfação Popular com a Administração da Justiça, chamada “Pound Revisited Conference.”, ocorrida
entre 7 e 9 de abril de 1976 em Minnesota – EUA. Posteriormente o jurista publicou a obra deste nome, em 1978.
18 Depreende-se da Exposição de Motivos do CPC, elaborado pela Comissão de Juristas, alta preocupação com a eficiência
antes de tudo, o que exemplificamos com o seguinte trecho: “Nessa dimensão, a preocupação em se preservar a forma
sistemática das normas processuais, longe de ser meramente acadêmica, atende, sobretudo, a uma necessidade de caráter
pragmático: obter-se um grau mais intenso de funcionalidade. Sem prejuízo da manutenção e do aperfeiçoamento dos in-
stitutos introduzidos no sistema pelas reformas ocorridas nos anos de 1992 até hoje, criou-se um Código novo, que não
significa, todavia, uma ruptura com o passado, mas um passo à frente. Assim, além de conservados os institutos cujos re-
sultados foram positivos, incluíram-se no sistema outros tantos que visam a atribuir-lhe alto grau de eficiência.”
19 Conforme lição de Ada Pellegrini Grinover: “Releva, assim, o fundamento social das vias conciliativas, consistente na
sua função de pacificação social. Esta, via de regra, não é alcançada pela sentença, que se limita a ditar autoritativamente
a regra para o caso concreto, e que, na grande maioria dos casos, não é aceita de bom grado pelo vencido, o qual contra
ela costuma insurgir-se com todos os meios na execução; e que, de qualquer modo, se limita a solucionar a parcela de lide
levada a juízo, sem possibilidade de pacificar a lide sociológica, em geral mais ampla, da qual aquela emergiu, como simples
ponta do iceberg.” (Fundamentos da Justiça Conciliativa, pág. 03).
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
28 Nas palavras de Humberto Dalla Bernardina de Pinho:” Ao dizer que o Código será disciplinado de acordo com os valores
e princípios, o legislador está adotando, expressamente, a teoria do direito processual constitucional” (in “Os princípios e
as garantias fundamentais no projeto de código de processo civil: breves considerações acerca dos artigos 1º a 12 do PLS
166/10”.. Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume VI. ISSN 1982-7636, pág. 51)
29 A norma fundamental, nesta hipótese, deve ser observada pelos três poderes tanto em suas funções privativas quanto
nas administrativas. Neste ponto, não há que se recorrer a qualquer argumento “geográfico” quanto à norma localizar-se
numa lei processual; trata-se de um código que consiste em lei aprovada em um regime qualificado e eleita à categoria de
norma fundamental processual; assim tanto o legislador ordinário quanto o julgador ou o administrador devem respeitar a
forma consensual de solução no Poder Judiciário em suas funções. Não poderá o Conselho Nacional de Justiça, por exem-
plo, editar resolução que vede algum método consensual; o Procurador-Chefe de advocacia pública não poderá proibir os
procuradores de propor acordos; o legislador não poderá excluir algum método consensual do Poder Judiciário sem antes
derrogar este dispositivo mediante quórum o qualificado da codificação.
30 Caberá a responsabilização de advogados públicos, defensores ou promotores nos moldes do §6 do artigo 77 do CPC,
dada a abertura do caput quanto às hipóteses de responsabilização das partes.
31 Além da norma do procedimento comum contida no artigo 334 e parágrafos do CPC, temos nos procedimentos especiais,
como nas ações de família a audiência preliminar de conciliação do artigo 695 e seguintes do CPC.
32 Conforme previstas na Resolução CNJ 125/2010, art. 8º §1º: “As sessões de conciliação e mediação pré-processuais deverão
ser realizadas nos Centros, podendo, as sessões de conciliação e mediação judiciais, excepcionalmente, serem realizadas nos
próprios Juízos, Juizados ou Varas designadas, desde que o sejam por conciliadores e mediadores cadastrados pelo tribunal (in-
ciso VII do art. 7º) e supervisionados pelo Juiz Coordenador do Centro (art. 9°)” (Redação dada pela Emenda nº 2, de 08.03.16).
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Esta postura alinha-se com o princípio cooperativo constante do artigo 6º, pois a decisão
de mérito, justa e efetiva corresponde à sentença homologatória de transação judicial que
culmina com o processo cercado de garantias. Para tanto, é desejável que os representantes
de partes opostas obtenham treinamento em técnicas de negociação e comunicação
desenvolvidas para se tornarem capazes de mutuamente gerar uma espiral construtiva de
atitudes e percepções33. Caso contrário, conciliadores e mediadores nestas treinados terão
um trabalho muito mais dificultoso em audiência (art. 334) quando instaurado o processo.
Numa outra hipótese, Juízes, promotores e defensores públicos devem se ajustar para tornar
possível o estabelecimento de uma rotina viável de audiências para os jurisdicionados, e
nisso devem cooperar entre si.
A boa-fé no processo (art. 5º) é objetiva e comporta três funções34: “a) cânon
interpretativo/integrativo; b) norma de criação de deveres jurídicos; c) norma de limitação
ao exercício de direitos subjetivos”. Aplica-se a boa-fé a esta atividade de cooperação tanto
para estimulá-la como para limitá-la; as normas fundamentais do processo não se coadunam
com a utilização do processo em prejuízo a outra parte ou terceiros, da legalidade ou da
ordem pública como nas hipóteses descritas no artigo 80 do Código. Alterar a verdade para
obter acordo ou mediante o acordo (art.80, II), utilizar o acordo para conseguir objetivo
ilegal (III) são fatos que poderão ser invocados para desconstituir o acordo e são passíveis
de serem conhecidas pelo conciliador ou mediador para suspender a sessão, ou pelo juiz na
oportunidade da homologação. Ser a única parte a requerer audiência de conciliação e nela se
recusar ao procedimento sem apontar causa configura incidente manifestamente infundado
(VI) ou ato temerário pelo não exercício tempestivo da manifestação de desinteresse (V). O
simples não comparecimento injustificado é conduta que conta com penalização específica
no artigo 334, §8º do CPC.
As normas fundamentais do processo contêm efetividade e a infringência a estas
frustram os direitos fundamentais relacionados ao processo, gerando nulidades35.
O princípio dispositivo (art. 2º) remonta ao início do processo e constitui uma exceção
ao impulso oficial, temperando o gerenciamento do processo pelo magistrado quando a lei
permita as partes modular o procedimento; caso do estabelecimento do calendário processual
(art. 191) ou da dupla recusa em participar de audiência de conciliação ou mediação (art. 334
§4º). A leitura do princípio sob a garantia fundamental do acesso à justiça leva a permitir uma
interpretação alargada para todo o procedimento, significando que o autor da ação, após o
ajuizamento, não delega ao Poder Judiciário a titularidade do seu direito de agir; da mesma
forma que inicia terá o direito de desistir da ação – abrindo mão de qualquer espécie de
solução; ou terá a possibilidade de requerer, a qualquer tempo, que seja designada audiência
de conciliação ou mediação36, dispondo da decisão adjudicada em prol de uma solução
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
37 Neste ponto o legislador observa a tendência internacional, retratada na obra de Flávia Hill, Camila Bem e Flávio Campista
(in A duração razoável do processo e os parâmetros jurisprudenciais dos tribunais internacionais de direitos
humanos, pág. 132): “A Corte Interamericana de Direitos Humanos não destoa da orientação da Convenção Americana de
Direitos Humanos, e observa que ‘prazo razoável’ de acordo com o artigo 8.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos
deve ser apreciado em relação à duração total do procedimento até a condenação definitiva, conforme decidido no caso
Suárez Rosero Vs. Equador, mais o tempo que se prolongar a etapa de execução da sentença, conforme ficou estabelecido
no caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) Vs. Brasil”.
38 Robert Alexy em sua Teoria dos direitos fundamentais, expõe que a colisão entre os princípios não os invalida, e exem-
plificou a respeito de um condenado que deveria comparecer a audiência sob o risco de sofrer um derrame cerebral, e assim
sentenciou sobre os princípios envolvidos (págs. 94/96): “A solução para essa colisão consiste no estabelecimento de uma
relação de precedência condicionada entre os princípios, com base nas circunstâncias do caso concreto.”
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
39 José Carlos Barbosa Moreira levantou questões relevantes sobre a audiência preliminar do art. 331 do antigo CPC/1973
ao criticar a valorização extrema da norma como solução ao problema da duração razoável do processo no artigo “O futuro
da Justiça: alguns mitos” in Temas de direito processual. 8ª série. São Paulo, Saraiva, 2004, p. 08: “A tentativa ob-
rigatória de conciliação, tal como regulada no art. 331, é uma faca de dois gumes: quando se obtém o acordo das partes,
encurta-se notavelmente o itinerário do feito; quando não, ele ao contrário se estica mais do que se se omitisse a audiência
a isso destinada, sem que os ganhos laterais superem o inconveniente da procrastinação. Pois bem: qual o percentual de
tentativas frutíferas? Superará ele notavelmente o das infrutíferas? E mais: em que matérias tem sido mais fácil promover o
acordo? Quais os principais óbices à respectiva consumação?”
40 Op cit., pág. 05: “Mas o princípio manifesta-se, na verdade, numa imensa variedade de formas, desde a simples informa-
ção e tomada de consciência, passando pela reivindicação, as consultas, a co-gestão, a realização dos serviços, até chegar à
intervenção nas decisões e ao controle, como a caracterizar graus mais ou menos intensos de participação.”
41 A confidencialidade tem as linhas gerais descritas nos §§1º e 2º do art. 166 do CPC e maiores detalhes na descrição
contida no artigo 30 e parágrafos da Lei nº 13.140/2015, que previu as exceções nos §§3 e 4º.
42 Obviamente tal reinvindicação haverá de ser confrontada com as demais normas do código, incluídas as demais garan-
tias fundamentais, como a duração razoável do processo, como acima explicitamos.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
A audiência bilateral exige a eficaz intimação para a participação das partes, e todas
terão o direito de ter a palavra e relatar sua versão dos fatos, observando a do outro; de
apresentar documentos – advertidos, claro, das características da confidencialidade; de
fazer propostas e contrapropostas; de exigir a presença de terceiros não constantes da
relação processual, mas que de alguma forma sejam afetados pelo possível acordo ou
que sejam responsáveis pelo seu cumprimento43. Afinal, se o contraditório participativo44
é uma expressão do princípio constitucional democrático no processo civil, devem ser
afastados quaisquer impedimentos a que as partes possam utilizar do processo judicial para
produzir a solução de seus próprios conflitos. Ainda que no campo civilístico a questão
seja solucionada à luz da admissibilidade de transação e da autonomia da vontade, ainda
que estes sejam indisponíveis, esta possibilidade não será concretizada se não houver na
seara processual a oportunidade para a conciliação.
Há ofensa inicial à paridade de tratamento e, em última análise, ao contraditório
participativo45, se o órgão jurisdicional substituir a audiência do artigo 334 por alguma
iniciativa de negociação direta exterior ao processo, suspendendo o seu andamento; nesta
hipótese as tratativas se desenvolverão em ambiente proporcionado por uma das partes, que
obviamente desfrutará de melhor conforto da situação em flagrante prejuízo à igualdade46.
Aqui é ainda aplicável a norma fundamental da inafastabilidade da tutela jurisdicional, esta
entendida de uma forma ampla, sob o viés multiportas47.
Por último, o contraditório participativo exige que o acordo que apresente conformidade
com a lei e a ordem pública deva ser homologado pelo juiz imparcial e competente para
o julgamento do feito ou designado coordenador de Centro Judiciário48. Certamente o
contraditório será amplo acaso identificadas as exceções à confidencialidade constantes do
artigo 30§§ 3º e 4º da Lei nº 13.140/2015, que vermos a seguir.
43 Conforme Humberto Dalla Bernardina de Pinho e Pedro Gomes de Queiroz in As garantias fundamentais do processo
e o instituto da mediação judicial: pontos de tensão e de acomodação: “o contraditório participativo pressupõe que todos
os contrainteressados tenham o direito de intervir no processo e exercer amplamente as prerrogativas inerentes ao direito de
defesa e que preservem o direito de discutir os efeitos da sentença que tenha sido produzida sem a sua plena participação.
44 Leonardo Greco, “Garantias Fundamentais do Processo: o Processo Justo”, in Os princípios da Constituição de 1988,
coletânea organizada por Manoel Messias Peixinho, Isabella Franco Guerra e Firly Nascimento Filho, 2ª ed., Lumen Juris,
Rio de Janeiro, 2006, págs.369/40: “2.Contraditório participativo. Talvez a mais importante dessas garantias, porque ela
própria engloba diversas outras, é a garantia do contraditório, consagrada no inciso LV do art. 5ᵒ da Constituição Federal.
Contraditório como implementação no processo judicial do princípio político da participação democrática ou da chamada
democracia participativa. Contraditório como a garantia que assegura aos sujeitos parciais do processo a mais ampla
possibilidade de influir eficazmente em qualquer provimento jurisdicional, especialmente o provimento jurisdicional final,
submetendo à cognição do juiz todas as alegações e provas que possam contribuir para essa influência. Contraditório como
influência com paridade de armas.”
45 Para Carlos Alberto Alvaro de Oliveira “a participação no processo para a formação da decisão constitui, de forma imedia-
ta, uma posição subjetiva inerente aos direitos fundamentais, portanto é ela mesma o exercício de um direito fundamental.
Tal participação, além de constituir exercício de um direito fundamental, não se reveste apenas de caráter formal, mas deve
ser qualificada substancialmente.” Op. cit.
46 SCHENK, Leonardo Faria. Cognição Sumária: limites impostos pelo contraditório no processo civil. São Paulo:
Saraiva, 2013, p. 58: “É possível afirmar que o contraditório é indissociável do princípio da igualdade, eis que a garantia da
possibilidade de manifestação em todas as fases deverá ser assegurada de igual modo aos litigantes na dinâmica processual,
refletindo a busca pela almejada efetividade da prestação jurisdicional, que contempla a paridade de armas como um dos
pilares da ampla defesa.”
47 Nas palavras de Ada Pellegrini Grinover, op. cit.: “a mediação e a conciliação, como visto, se inserem no plano da política
judiciária e podem ser enquadradas numa acepção mais ampla de jurisdição, vista numa perspectiva funcional e teleológi-
ca,” pág. 03.
48 Nos termos do artigo 9º da Resolução CNJ 125/2010: “Art. 9° Os Centros contarão com 1 (um) juiz coordenador e, se ne-
cessário, com 1 (um) adjunto, aos quais caberão a sua administração e a homologação de acordos, bem como a supervisão
do serviço de conciliadores e mediadores. Salvo disposição diversa em regramento local, os magistrados da Justiça Estadual
e da Justiça Federal serão designados pelo Presidente de cada tribunal dentre aqueles que realizaram treinamento segundo
o modelo estabelecido pelo CNJ, conforme Anexo I desta Resolução” (Redação dada pela Emenda nº 2, de 08.03.16).
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
O Código de Processo Civil de 2015 (art. 166) institui a adoção dos métodos
consensuais como norma fundamental e, da mesma forma, inaugura princípios informativos
da conciliação e da mediação, os quais também devem ser interpretados à luz das demais
normas fundamentais. Os princípios informativos pertinentes à conciliação e à mediação
consagrados pela lei geral processual são: “independência, da imparcialidade, da
autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão
informada”49.
A Lei de Mediação, em seu artigo 2º, acrescenta ainda os princípios da isonomia entre
as partes, da busca do consenso e da boa-fé, deixando de fazer menção aos princípios da
independência e da decisão informada, e diante de seu caráter de lei especial não derroga os
princípios do diploma processual, mas lhe acrescem. Não há que se defender, por absurdo,
o menosprezo à isonomia ou boa-fé na conciliação; o artigo 166 trata de princípios setoriais,
que encontram justificação nos princípios fundamentais processuais e, por esta razão,
permanecem resguardados nas normas atinentes à igualdade (art. 7º CPC), ao contraditório
(art.; 7º e 9º CPC) e à boa-fé (art. 5º CPC).
A busca do consenso constitui um objetivo curioso ao se tornar exclusivo da mediação,
eis que contraria a literalidade da regra do Código de Ética dos Conciliadores e Mediadores
consistente na ausência de obrigação de resultado50. A maneira de compatibilizar as disposições
é utilizar a interpretação teleológica eis que estes terceiros imparciais não terão suas atividades
profissionais avaliadas conforme os índices de acordo que alcancem, conquanto tenham a
missão de buscar o consenso das partes respeitados os princípios informativos e princípios
fundamentais do processo51.
Estas diferenças pontuais não geram uma separação ontológica entre a mediação e a
conciliação as quais, definidas por decorrência das atividades dos mediadores e conciliadores nos
49 Outros princípios instituídos pela Resolução CNJ n° 125/2010 em seu Anexo III (Código de Ética de Conciliadores e
Mediadores Judiciais) não foram acolhidos pela legislação processual, como: autonomia (do mediador ou conciliador), em-
poderamento, validação, respeito à ordem pública e leis vigentes, competência, e outros que são classificados como regras:
desvinculação da profissão de origem, ausência de obrigação de resultado e teste de realidade.
50 Esta é a redação do artigo 2º, III do Anexo III da Resolução CNJ nº 125/2010: “III – Ausência de obrigação de resultado -
dever de não forçar um acordo e de não tomar decisões pelos envolvidos, podendo, quando muito, no caso da conciliação,
criar opções, que podem ou não ser acolhidas por eles;”.
51 Dada a autonomia da vontade das partes inexiste obrigação de resultado tanto na atividade conciliatória quanto na me-
diação, o que está expressamente previsto no Código de Ética de Conciliadores e Mediadores Judiciais como uma regra do
procedimento.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
parágrafos 2º e 3º do artigo 165 do código, são regidas pelos mesmos princípios informativos52.
A oralidade e a informalidade já são nossas conhecidas desde os juizados de pequenas
causas53, e estão atualmente mantidas nos juizados especiais54 sucessores, passando então a
integrar o procedimento comum, ou seja, a serem aplicados em quaisquer órgãos jurisdicionais,
em qualquer instância, desde que incidentalmente se institua algum procedimento de
conciliação ou mediação.
A oralidade se refere ao contato pessoal com as partes através da realização de
audiências e classicamente se desdobra em irrecorribilidade, imediatidade, concentração dos
atos processuais e identidade física do juiz; contudo não é um princípio cuja aplicação tenha
sido prestigiada, por diversos motivos. Inicialmente, diante das dificuldades práticas em se
assegurar que o julgamento seja feito pelo juiz que presidiu a audiência, eis que a duração
do processo ultrapassa a permanência do mesmo em sua lotação original, a preferência pela
prova documental, registrada, fornece vantagens.
Em segundo lugar, o grande número de processos em curso no Poder Judiciário brasileiro
tem sido um fator relevante, invocado pelos órgãos judiciais como obstáculo em termos de
tempo para se realizar audiências em todos. Por último, ligada a oralidade à noção, pelos
magistrados, de produção de prova, é ainda um meio desvalorizado, pelo tempo que toma e
pela possibilidade da mentira, chance esta sobrevalorizada55.
A informalidade dispensa a rigidez de ritos pré-estabelecidos, o que não significa, por
outro lado, a ausência total de regras procedimentais; antes mesmo do tratamento pelo
próprio código processual dos métodos consensuais de solução de conflitos – ou MASCS, se
adotarmos a concepção de “métodos adequados” – diplomas regulamentares56 e manuais dos
conselhos fiscalizadores57 disciplinam a sessão de conciliação ou mediação e estabelecem
alguma ordem de atos, embora permitida a dispensa de algumas fases. O Código de Processo
Civil, acertadamente, não desceu às minúcias da audiência do artigo 334 e outras de seu
texto; o princípio tem seu conteúdo aberto e a forma das sessões evoluirá com o tempo,
mantém o texto sua contemporaneidade dispensando reformas posteriores.
A imparcialidade também já frequentava os códigos processuais anteriores quanto
aos magistrados e auxiliares da justiça – nos quais se inserem conciliadores e mediadores,
52 Traçar as diferenças entre os MASCS - para Leonard Riskin (Compreendendo as orientações, estratégias e técnicas do
mediador: um padrão para iniciantes. In: Azevedo, André Goma de (org.). Estudos de Arbitragem, Mediação e Negociação.
Brasília: Brasília Jurídica, 2002) uma diferença de gênero (mediação) para espécie (conciliação) - transborda os objetivos do
presente trabalho, mas é necessário ressaltar que constam do código definições baseadas nos conflitos a serem tratados,
que são fatores externos aos novos institutos processuais. Contudo, a procura por uma definição mediante o procedimento
da conciliação ou da mediação não revelará uma individualização de conceitos, a não ser nas menções a sugestões, cujas
identificações podem ser bem traiçoeiras na casuística das audiências. Sem diferenças precisas quanto a técnicas utiliza-
das, restam princípios genericamente colocados, deixando à prática dos Tribunais nomear suas atividades num ou noutro
método sem consequências.
53 A primeira referência veio na instituição dos Juizados de Pequenas Causas, conforme se depreende da Lei n°7.422/84:”
Art. 2º - O processo, perante o Juizado Especial de Pequenas Causas, orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade,
informalidade, economia processual e celeridade, buscando sempre que possível a conciliação das partes.”
54 Conforme artigo 2° da Lei n° 9.099/95: “Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, infor-
malidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.” A nova lei re-
presentou um amadurecimento dos antigos juizados de pequenas causas, e em realidade a edição da nova lei foi necessária
diante da declaração de inconstitucionalidade da Lei n°7.422/84, e posteriormente à Emenda Constitucional 22/99.
55 Dados de pesquisa empírica realizada por Bárbara Gomes Lupetti Batista e constante do artigo “A oralidade processual e
a construção da verdade jurídica”. Disponível em: <https://www.jfrj.jus.br/sites/default/files/revista-sjrj/arquivo/76-252-
1-pb.pdf>. Acesso em: 28/01/2020.
56 Vide as Resoluções CNJ nº 125/2010 e CJF nº 298/2016.
57 Conselho Nacional de Justiça e Conselho da Justiça Federal têm se destacado nesta função e produziram excelentes ma-
teriais como o Manual de Mediação CNJ e o Manual de Mediação e Conciliação da Justiça Federal.
19
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
contudo o instituto confere relevos particulares às suas funções. O mediador não adjudicará
qualquer decisão, e sequer se aplica algum paralelo ao princípio do juiz natural pois pode
ser escolhido pelas partes, contudo deverá imediatamente comunicar impedimento (art. 170)
para que as negociações sejam conduzidas em respeito à paridade de tratamento entre as
partes, norma fundamental do processo civil (art. 7º).
A autonomia da vontade diz respeito, inicialmente, ao aspecto processual, ou seja, à
disposição das partes em se submeter ao MASC conforme se trate de relação continuada ou
não – indicando que poderá ocorrer conciliação ou mediação. O comparecimento à audiência
prévia de conciliação é obrigatório e será contrário à vontade de uma das partes ao menos,
bastando que a outra não manifeste expressamente desinteresse no método consensual, na
forma do artigo 334, §4º, I do CPC. Incide o princípio de forma ampla na hipótese da dupla
recusa das partes em não realizar a audiência, bem como na sua realização, de forma mais
restrita, tomando em conta a vontade de uma parte apenas contra a vontade da outra, em
realizá-la. Ressalte-se aqui que nenhuma outra audiência do código contém regra semelhante
em termos da apreciação da vontade das partes para sua realização, cuja determinação
compete ao juiz imbuído do impulso oficial, ainda que a requerimentos de produção de prova
oral. Considerando que o dispositivo atribui de forma completa às partes a decisão – ou a
uma, e retiradas as exceções legais como a inadmissibilidade de transação –, a conclusão é
por haver uma grande carga da autonomia da vontade na regra do artigo 334, §4º, I do CPC.
Assim, à luz das características dos métodos consensuais, que operam através de
técnicas negociais e da perspectiva de mudanças nas intenções iniciais das partes, a questão
da obrigatoriedade da audiência para a parte não concordante deve ser resolvida à luz da
norma fundamental contida no artigo 3º, §3º do CPC, pois o estímulo à conciliação e à
mediação deve não apenas para as partes em juízo, mas sobre elas próprias.
A técnica das sessões autocompositivas determina a realização pré-mediação58, que
consiste na fase preliminar da audiência, oportunidade em que o conciliador ou mediador fará
a explicação das regras e princípios do procedimento, o que é indispensável ainda diante do
princípio da decisão informada. Segue-lhe a declaração de abertura59, que tem entre as suas
funções obter a concordância de ambas as partes em se submeter às regras do procedimento.
Assim, antes mesmo de qualquer tentativa de transação, basta a uma das partes manifestar-
se contrariamente à autocomposição após o que não será concluída a abertura da sessão.
O §4º do artigo 166 prevê quanto a este aspecto a viabilidade de as partes alterarem
regras procedimentais, o que se deve à vista ainda do princípio da informalidade do caput do
dispositivo ou ainda diante da norma fundamental que resguarda o princípio cooperativo no
artigo 6º do código. O dispositivo aplica-se à própria sessão autocompositiva – a qual poderá
58 A pré-mediação é uma etapa informativa anterior à sessão autocompositiva, a ser realizada tanto na conciliação quanto
na mediação e, nas lições de Tânia Almeida: “no que tange aos mediandos, estes recebem informações sobre o processo de
autocomposição visando: (i) elencar claramente os temas que os trazem à Mediação; (ii) possibilitar a escolha consciente
da Mediação como meio de resolução do conflito e; ou das questões existentes; (iii) identificar se encontram em si mesmos
disponibilidade para rever posições rígidas ou competitivas; (iv) trabalhar focados na busca de soluções de benefício mú-
tuo; (v) reconhecer a possibilidade de empenho na observância dos propósitos e princípios éticos do instituto” (in Caixa de
ferramentas em mediação. Apostes práticos e teóricos. São Paulo: Dash editora, 2014, Pág. 37).
59 O Manual de Mediação e Conciliação da Justiça Federal define o que se realizará nestas etapas da sessão de forma di-
versa, contudo os doutrinadores costumam divergir ou misturar as fases de pré-mediação e abertura (Pág. 63/64). O Manual
de Mediação do Conselho Nacional de Justiça tem a pré-mediação (pág. 310) em um dos pontos do programa de formação
de mediadores, mas não trata da fase do procedimento.
20
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
do CPC; neste caso o magistrado deverá decidir à luz do comando das normas fundamentais
do processo civil e eventuais colisões entre seus princípios.
A confidencialidade é o princípio inaugurado no diploma processual e na Lei de
Mediação sem qualquer tradição no direito brasileiro, cujo passado aliás remonta à mais
absoluta publicidade do processo, à exceção de segredos de justiça baseados no interesse
da instrução penal, ou na intimidade das partes em questões de família. Questiona-se
se, por também localizar-se neste dispositivo do Livro III, Título IV, Capítulo III, Seção V,
se o princípio da confidencialidade estaria se dirigindo tão-somente a estes auxiliares
da justiça, não se aplicando aos juízes competentes para o julgamento após frustrado o
consenso. Outra questão, decorrente, diz respeito à possibilidade de os juízes julgarem
os processos depois de fracassada a tentativa conciliação por estes realizada ao início das
audiências de instrução.
É claro que os demais princípios informativos da conciliação e mediação orientam ou
limitam as atuações de conciliadores e mediadores – enunciados no artigo 166 – e dos demais
atores do processo; tomemos por exemplo a autonomia da vontade das partes, que não
podem ser impingidas pelo magistrado, como não podem ser por estes auxiliares da justiça,
a aceitar o acordo.
Contudo, nenhuma destas hipóteses contempla a oposição de segredo em face do juiz
da causa, mesmo de fato conhecido pelo conciliador ou mediador judiciais, o que parece
ser a principal razão do princípio, o qual podemos definir como a obrigação de que todos
os participantes da sessão não-adversarial guardem segredo sobre fatos, documentos e
propostas apresentados na mesma em face daqueles que dela não participem. Inevitável
que, para atender ao princípio, da ata da audiência não poderá constar qualquer reprodução
ou menção destes dados.
Afinal, um dos receios das partes em negociar consiste em que os dados que sejam
revelados nesse esforço sejam posteriormente utilizados para a formação do convencimento
do juiz, e essa é a razão do princípio. A confidencialidade também fundamenta a realização
da sessão consensual nos centros judiciários (art. 165) e por conciliadores ou mediadores
certificados (art. 167 §1º do CPC): apenas assim será resguardado o princípio e, de forma
mediata, a norma fundamental do estímulo das soluções consensuais.
Disto decorrem algumas consequências: acaso inexistente centro judiciário na comarca
ou seção judiciária – posto que a criação só é exigida pelos conselhos superiores6162 diante
de um certo número de órgãos judiciais reduzidos – e, ainda, ausentes estes auxiliares da
61 Conforme o artigo 8º da Resolução CNJ 125/2010: “§ 2º Nos tribunais de Justiça, os Centros deverão ser instalados nos
locais onde existam 2 (dois) Juízos, Juizados ou Varas com competência para realizar audiência, nos termos do art. 334
do Novo Código de Processo Civil. § 3º Os tribunais poderão, enquanto não instalados os Centros nas Comarcas, Regiões,
Subseções Judiciárias e nos Juízos do interior dos estados, implantar o procedimento de Conciliação e Mediação itinerante,
utilizando-se de Conciliadores e Mediadores cadastrados. § 4º Nos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça, é fac-
ultativa a implantação de Centros onde exista um Juízo, Juizado, Vara ou Subseção desde que atendidos por centro regional
ou itinerante, nos termos do parágrafo anterior. § 5º Nas Comarcas das Capitais dos Estados bem como nas Comarcas do
interior, Subseções e Regiões Judiciárias, o prazo para a instalação dos Centros será concomitante à entrada em vigor do
Novo Código de Processo Civil. § 6º Os tribunais poderão, excepcionalmente, estender os serviços do Centro a unidades
ou órgãos situados em outros prédios, desde que próximos daqueles referidos no § 2º, podendo, ainda, instalar Centros
Regionais, enquanto não instalados Centros nos termos referidos no § 2º, observada a organização judiciária local. (Redação
dada pela Emenda nº 2, de 08.03.16)”
62 No âmbito federal, disciplinou o Conselho da Justiça Federal na Resolução CJF 298/2016, em seu artigo 7º §2º: “Nas
subseções judiciárias onde houver um único juízo, juizado ou vara, é facultativa a implantação de CEJUSCONS, desde que
atendidos centros regionais ou itinerantes.”
22
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
63 Adotando uma concepção ampla de jurisdição abarcando a resolução consensual de conflitos, e dado que entre as de-
cisões de mérito se inserem a sentença homologatória de acordo, temos que as ideias de Michele Taruffo quanto a uma
potencialidade maior da decisão justa ser aquele que observa as normas processuais temos por este exemplo de uma in-
fringência a princípio – da confidencialidade – que resultará em um acordo menos proveitoso por uma ou ambas as partes,
por prejudicada a negociação.
64 Consoante o Manual de Mediação e Conciliação da Justiça Federal “O cheque ou teste de realidade consiste na apresen-
tação de uma perspectiva diversa àquela de uma ou ambas as partes, de maneira a se notar a discrepância entre o que
se imagina e o que se costuma ocorrer”, pág. 82. Disponível, disponível em < https://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-
justica-federal/centro-de-estudos-judiciarios-1/publicacoes-1/outras-publicacoes/manual-de-mediacao-e-conciliacao-na-jf-
versao-online.pdf>. Acesso em 10/11/2019.
65 Lei 13.140/2015: “Art. 31. Será confidencial a informação prestada por uma parte em sessão privada, não podendo o
mediador revelá-la às demais, exceto se expressamente autorizado”.
66 Sobre o tema já trataram Humberto Dalla Bernardina de Pinho e Pedro Gomes de Queiroz: “Não enxergamos violação ao
contraditório, desde que o mediador exponha a possibilidade da realização de sessões privadas no curso do procedimento,
e as partes concordem expressamente”, pág. 8.
23
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4. Conclusão
Referências
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DESJUDICIALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO
DAS FORMAS DE SOLUÇÃO
CONSENSUADA DOS CONFLITOS NOS
SERVIÇOS EXTRAJUDICIAIS: UMA NOVA
FRONTEIRA PARA A DISSEMINAÇÃO
DA CULTURA DOS MASC
Celso Belmiro
28
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Porém, diferentemente do que ocorre de forma rotineira, não serão aqui trazidos os
dados constantes do relatório anual do CNJ – Conselho Nacional de Justiça – denominado
“Justiça em Números”, onde se apontam, ano após ano, as mazelas de um sistema que parece
vocacionado à ineficiência, com números cada vez mais impressionantes de demandas
ajuizadas e de outras tantas pendentes de julgamento ou, ainda, os percentuais alarmantes
da “taxa de congestionamento” dos tribunais nacionais. Os dados, ainda que de extrema
relevância, compõem a “consequência” do problema. E, neste capítulo introdutório, o foco
será, porém, a indicação, ainda que sem a pretensão de esgotamento da extensa matéria,
das possíveis alternativas e soluções para o grave problema, através do processo de
“desjudicialização” (ou “extrajudicialização” )1, com vista a tornar mais razoável e racional a
complexa situação em que se encontra o sistema de prestação jurisdicional no Brasil.
Assim, em abordagem introdutória, pode-se afirmar que, se houve o efetivo
reconhecimento de uma crise relacionada ao excesso de demandas apresentadas ao Poder
Judiciário, duas frentes de batalha se abrem: a primeira, ainda com vistas à solução das
controvérsias no âmbito estatal (vale dizer, mantendo-se o processo estatal de solução de
conflitos), refere-se à necessidade de que os procedimentos judiciais sejam mais simples e
mais céleres. Nesse sentido, Cândido Dinamarco, ao tecer comentários sobre a elaboração do
NCPC, já reconhecia que o afã de aceleração do processo “se manifesta de modo explícito em
um daqueles propósitos enunciados pela Comissão (o da “simplificação dos procedimentos,
eliminando formalidades ou atos desnecessários ou inúteis”) e está presente ao longo de todo
o Código, na disciplina de muitos de seus institutos.”2 É necessário, portanto, sob os auspícios
do novo CPC, que uma vez mantidos os processos sob a jurisdição estatal, cobertos pelo
manto do Estado-Juiz, que eles se desenvolvam no menor tempo possível e que sejam também
simplificados, o mais informalizados possível, para que se respeite o princípio constitucional
da razoável duração do processo e para que a prestação jurisdicional seja efetiva.
A outra das frentes de batalha, especificamente tratada no presente ensaio, é a da
diminuição ou retirada completa da solução das controvérsias do âmbito do Poder Judiciário, o
que se dá por meio da chamada Desjudicialização. Por meio dela, elimina-se a necessidade de
instauração de um processo judicial e outorga-se a um terceiro a possibilidade de solucionar o
conflito, como se dá, a título de exemplo, no procedimento instaurado perante a arbitragem,
conforme já previsto na lei respectiva (Lei 9.307/96) desde o longínquo ano de 1996.3
Se é possível afirmar que o NCPC trouxe importantes inovações quanto ao intrincado
tema da desjudicialização, como a previsão da usucapição extrajudicial (art. 1701, inserindo
o art. 216-A na Lei 6.015/73 – Lei dos Registros Público), da homologação do penhor
legal (previsto sem seu art. 703) e do protesto de sentença judicial (art. 517), é também
importante ressaltar, por outro lado, que a busca pela desjudicialização não nasce apenas
com a promulgação do Código de Processo Civil de 2015, dado que antes de sua edição
já havia iniciativas concretas e específicas com esta finalidade, como a já mencionada Lei
1 O posicionamento mais acertado no que se refere à relação entre as expressões parece ser o que sustenta ser a “desju-
dicialização” um gênero mais amplo do qual faz parte a espécie “extrajudicialização”, quando o exercício de determinada
atividade específica for atribuído aos Serviços Extrajudiciais delegados.
2 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. v.1. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2016. p. 43
3 Com vistas a incentivar a busca da solução pela via da arbitragem, o legislador buscou dar à “sentença arbitral” o mesmo
status da decisão proferida pelo órgão jurisdicional (título executivo extrajudicial), exigindo-se, quanto ao procedimento, as
mesmas garantias do processo judicial, como a o contraditório, a ampla defesa e a imparcialidade do órgão julgador.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Os notários e registradores são agentes públicos, mas não são considerados funcionários
públicos em sentido estrito. São particulares em colaboração com a administração,
pessoas alheias ao aparelho estatal, mas que compõem uma terceira categoria de agentes
públicos, ao lado dos agentes políticos e dos funcionários públicos. (...) não integram
a estrutura do funcionalismo público e não são remunerados pelos cofres públicos: a
remuneração da atividade provém dos particulares, por meio dos emolumentos, que
possuem natureza de taxa. O exercício desta atividade é delegação pelo Estado ao
particular. Trata-se do instituto da delegação e não da concessão ou permissão, que tem
natureza contratual7
6 “Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
§ 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus
prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços
notariais e de registro.
§ 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que
qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.”
7 DEBS, Martha El; DEBS, Renata El; SILVEIRA, Thiago. Sistema mutiportas – a mediação e a conciliação nos cartórios
como instrumento de pacificação social e dignidade humana. Salvador: Editora Juspodivm, 2020, p.158-159
8 A título ilustrativo, no Rio de Janeiro esses repasses (acrescidos ao preço final cobrado do usuário) são de 34%. Em MG,
39,66%, em SP 38, 49%, no RS, 35,09% e na BA, 52,20%.
31
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
O notário desenvolve função facilitadora das transações, sejam elas relativas a uma
escritura de venda e compra ou a uma escritura de mediação e conciliação. Por isso,
mediar e conciliar são atribuições ínsitas, inerentes, inatas aos notários e registradores.
O notário é verdadeiro “engenheiro” das soluções consensuais, exatamente como o faz
o melhor dos mediadores.
Com base nesses elementos, por força das características próprias da atividade e
dos requisitos exigidos para o seu desempenho, as habilidades profissionais requeridas
de tabeliães e oficiais de registro, inerentes ao exercício do seu mister, é que se afirma
que a perspectiva e os objetivos buscados com a implementação dos MASC se adequam
perfeitamente a esses profissionais do Direito.
A lei de regência da atividade extrajudicial (Lei 8.935/94) estabelece, em seu art. 44, §
9 Parecer elaborado acerca do Provimento da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo n. 17/2013, que au-
torizou e implementou os serviços de mediação e conciliação nos Serviços Extrajudiciais daquele Estado.
32
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
2º. que “em cada sede municipal haverá no mínimo um registrador civil das pessoas naturais”.
Isso faz com que os serviços extrajudiciais estejam espalhados por todo o território nacional,
em uma ramificação maior até do que os próprios órgãos do Poder Judiciário. Nesse sentido,
relembre-se os critérios, previstos nas normas dos estados, para a criação de uma “comarca”
e, a partir daí, a viabilidade de instalação de um órgão jurisdicional, ainda que de atribuição
única. Não raro, diversos municípios se encontram desprovidos de qualquer representação
do Poder Judiciário, fazendo eles parte de uma região e, na sede desta (e apenas na sede) o
cidadão tem acesso ao órgão estatal. Tal não acontece com os Serviços Extrajudiciais.
Em números precisos, são 13.627 unidades, das mais diversas atribuições, distribuídos
pelos 5.570 municípios brasileiros10, sendo necessário, conforme afirmado, pelo menos um em
cada município, com finalidade, a princípio, de realização de atos de nascimentos, casamentos
e registro de óbitos, nada impedindo, porém, que venham a realizar outros atos, como os aqui
abordados, tendentes à solução extrajudicial do conflito. No estudo mencionado, verificou-se
que existem mais Serviços Extrajudiciais do que, por exemplo, loterias (13.241), agências dos
Correios (12.362), igrejas católicas (em torno de 11.000) e agências do Banco do Brasil (5.450)11.
Trata-se, portanto, de entidades que desempenham atividade pública (ainda que em
caráter privado) e estão presentes em todo o território nacional, apresentando-se como
instrumento com enorme potencial e excepcionais possibilidades de difusão da cultura do
não-litígio e da busca dos meios adequados de solução de conflitos.
Em 26 de março de 2018, o CNJ fez publicar o Provimento 67, que teve por finalidade
dispor sobre os procedimentos de conciliação e de mediação nos serviços notariais e de
registro no Brasil.
Já nos “considerandos”, o Provimento 67/2018 reconhece a efetividade da conciliação
e da mediação como instrumentos de pacificação social, solução e prevenção de litígios e
identifica a necessidade de organização e uniformização de normas e procedimentos afetos
aos serviços de conciliação, mediação e a outros métodos consensuais de solução de conflitos,
a serem prestados pelos serviços notariais e de registro.13
10 Fonte: “Cartório em Números: Capilaridade, Serviços Eletrônicos, Cidadania e Confiança. Serviços Públicos que nada
custam ao Estado e que beneficiam o cidadão em todos os municípios do país”, publicação da ANOREG/BR – Associação de
Notários e Registradores do Brasil.
11 Para fins de contextualização e com base em números absolutamente precisos, 88 países possuem “cartórios” que atuam
no mesmo sistema jurídico vigente no Brasil (notariado “latino” ou notariado de “Direito latino”), ao que se somam alguns
dados relevantes sobre o sistema utilizado no Brasil, que está presente: a) em 7 das 10 maiores economias do mundo (Ale-
manha, França, Japão, China, Rússia, Indonésia e Brasil); b) em 22 dos 28 países que compõem a União Europeia; c) em 15
dos 20 países que compõem o G20, além de representar o modelo que atende a 2/3 da população mundial. Não é pouco...
12 Merece menção o Provimento da Corregedoria do Estado de São Paulo 17/2013 que, com base na Resolução 125/2010
do Conselho Nacional de Justiça e com vistas a regulamenta-la, autorizou os notários e registradores paulistas a realizarem
mediação e conciliação e disciplinou, de forma pormenorizada, essa atuação. Porém, em virtude de iniciativas da OAB junto
ao CNJ, foi proferida liminar suspendendo provisoriamente os seus efeitos, o que culminou com a edição do Provimento
CGJ 31/2016, em 08 de junho de 2016, através do qual foi revogado o mencionado Provimento CGJ 17/2013 (também pelo
motivo de que, nesta data, já estava em vigor a Lei de Mediação (Lei 13.140/2015)).
13 Importa, uma vez mais, trazer as lições de Celso Campilongo, para quem “Mediar e conciliar não são meros clichês de
salvação desesperada de uma Justiça falida. São muito mais. Visam o escopo social de pacificação e o objetivo político de
participação na construção do direito. Pressupõem o espaço de liberdade que apenas o direito garante ao cidadão; liberdade
para a discussão e aceitação do acordo; liberdade para a formação e manifestação da vontade; liberdade para o atingimento
33
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
14 A listagem de estabelecimentos autorizados pelo CNJ a funcionar como cursos de formação de conciliadores e mediado-
res é encontrável no site do próprio Conselho Nacional de Justiça.
15 ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados.
34
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Portanto, não parece fazer muito sentido a restrição imposta, sendo o entendimento
mais consentâneo com o que pretendeu o legislador da Lei 13.140/2015 que a possibilidade
de realização de conciliação ou mediação pelos serviços extrajudiciais seja a mais ampla
possível, sem qualquer tipo de restrição.
Nos arts. 13 a 20, o provimento procurou estabelecer os requisitos para a apresentação
do requerimento de conciliação ou mediação e o procedimento a ser observado pelo cartório,
como a designação imediata de data para a realização da sessão de conciliação ou de mediação,
16 SANTOS, Luis Ricardo Bykowski; SILVEIRA, Sebastião Sérgio da. “Mediação e conciliação nos cartórios de Registro Civil das
Pessoas Naturais, Instrumento para a solução alternativa de litígios e fortalecimento da cidadania.”. In Revista Cidadania
e Acesso à Justiça. Disponível em: <https://www.academia.edu/35604568/MEDIACAO_E_CONCILIACAO_NOS_CARTO-
RIOS_DE_REGISTRO_CIVIL_DAS_PESSOAS_NATURAIS> Acesso em 05/11/2019.
35
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
o modo por meio do qual a parte requerida será notificada e os custos iniciais referentes a
este procedimento.
Obtido o acordo, na conformidade do art. 22, será lavrado termo de conciliação e ou
de mediação, fazendo-se o arquivamento no livro cartorário próprio (livro de conciliação e
de mediação, cuja abertura atenderá às normas estabelecidas pelas Corregedorias-Gerais de
Justiça dos Estados e do Distrito Federal). Não obtido o acordo na primeira sessão, é possível a
designação de novas sessões de conciliação ou de mediação, até que finalizadas as tratativas.
Quanto aos valores a serem pagos pelos interessados, o tema é tratado na Seção VII – Dos
Emolumentos. E talvez nesse ponto específico resida o mais grave equívoco do provimento.
Isso porque os emolumentos pagos aos serviços notariais e registrais têm natureza jurídica de
taxa estadual, como já mencionado no presente ensaio, espécie, portanto, do gênero tributo,
que é submetido à estrita competência tributária do ente federativo para o estabelecimento
de seu valor de cobrança.
Ainda assim, o art. 36 do Provimento 67/2018 procurou estabelecer que:
Art. 36. Enquanto não editadas, no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, normas
específicas relativas aos emolumentos, observadas as diretrizes previstas pela Lei 10.169, de
29 de dezembro de 2000, aplicar-se-á às conciliações e às mediações extrajudiciais a tabela
referente ao menor valor cobrado na lavratura de escritura pública sem valor econômico.
Art. 39. Com base no art. 169, § 2º. do CPC, os serviços notariais e de registro realizarão
sessões não remuneradas de conciliação e de mediação para atender demandas de
gratuidade, como contrapartida da autorização para prestar o serviço.
36
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Vale dizer, o Provimento, além de fixar a remuneração em patamares bem abaixo das
câmaras privadas (prática de mercado), parece não se preocupar com a quantidade máxima
de audiências não remuneradas (o que, eventualmente, acabaria por inviabilizar por completo
a prestação do serviço, mas sim com o percentual mínimo, não importando o quanto esse
valor percentual possa alcançar (20, 30, 50%?). Quando o Provimento busca comparação
com as câmaras privadas, é somente para a fixação desse percentual de audiências não
remuneradas, ignorando por completo o valor a ser cobrado como remuneração justa pelo
relevante serviço prestado.17 Não há análise econômica que faça a conta fechar...
Ainda assim, as medidas previstas no Provimento 67/2018, como um todo, são
alvissareiras e representam um novo marco na pluralização do acesso aos meios adequados
de solução de conflitos, mesmo que hoje ainda se encontre pendente de regulamentação
em várias unidades da Federação, abrindo importante flanco para a ampliação da cultura
da solução acordada de conflitos, especialmente pela capilaridade de que são dotados os
serviços extrajudiciais por todo o país.
Em outras palavras, com a possibilidade aberta para que os cartórios possam realizar
conciliação e mediação e a exigência de que estejam em todos os municípios do país (o que
não é exigido nem para varas judiciais), a disseminação da cultura do acordo pode encontrar,
nos serviços extrajudiciais, um grande aliado.
Art. 1º. Recomendar aos tribunais de justiça dos Estados e do Distrito Federal, por
intermédio de seus Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de
Conflitos, a celebração de convênios com notários e registradores do Brasil para a
instalação de centros judiciários de solução de conflitos e cidadania nos locais em que
ainda não tenham sido implantados.
Trata-se de mais uma iniciativa para a utilização dos serviços extrajudiciais de notas e
de registros como polos difusores da cultura da solução consensualizada dos conflitos, desta
vez com a instalação de CEJUSCs nas dependências desses serviços, em virtude de convênio
celebrado entre o Poder Judiciário e Notários e Registradores.
17 Para efeito de ilustração, o CBMA – Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem estabelece como custas de mediação e
honorários dos mediadores os seguintes valores: a) taxa de registro (que deve ser recolhida pelo solicitante, no momento
da instauração do proceso: R$ 4.000,00 (quatro mil reais), não compensáveis; b) taxa de administração: valor a ser reco-
lhido mensalmente pelas partes, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) para cada parte, a partir do Termo de Mediação e
enquanto durar o procedimento. c) honorário do(s) mediador(es): deverão ser recolhidos, em partes iguais, pelo solicitante
e pelo solicitado, antes da assinatura do Termo de Mediação, o valor de R$ 800,00 (oitocentos reais) a hora efetivamente
prestada pelo(s) mediador(es), garantidas 10 (dez) horas mínimas ao(s) profissional(is).Além disso, não estão incluidas nos
itens acima eventuais despesas incorrida pelos mediadores e pelo CBMA, que solicitará, sempre que necessário, o reembolso
dos valores despendidos.(o regimento de custas pode ser consultado no site: www.cbma.com.br)
37
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Por óbvio, o funcionamento de CEJUSCs nesta condição está sujeito às rígidas normas
de controle do Poder Judiciário, desde o estudo preliminar, que envolve a viabilidade jurídica,
técnica e financeira do serviço para que possa ser celebrado o convênio, passando pela
manutenção em seu site de listagem pública dos CEJUSCs instalados por meio desse convênio
e chegando na fiscalização, pela Corregedoria-Geral da Justiça e pelo juiz coordenador do
CEJUSC de todos os procedimentos de conciliação e de mediação realizados nos parâmetros
fixados na Recomendação.
Mais uma vez vislumbra-se, com a Recomendação 28/2018, uma clara intenção do
Conselho Nacional de Justiça de apostar na difusão dos meios adequados de solução dos
conflitos através dos serviços notariais e de registro espalhados por todo o território nacional.
Por derradeiro, em 27 de junho de 2018, o CNJ, por meio de sua Corregedoria Nacional
de Justiça, para além da consensualidade buscada por meio de conciliações e de mediações
stricto sensu, criou a possibilidade de que, especificamente os tabelionatos de protesto do
país procedam às chamadas medidas de incentivo à quitação ou renegociação de dívidas
protestadas, dispondo que são medidas prévias e facultativas aos procedimentos de
conciliação e mediação.
E na esteira do que já fora disposto no Provimento 67/2018, há aqui forte atuação do
órgão de fiscalização que, dentre outras iniciativas, manterá em seu site listagem pública
dos tabelionatos de protesto autorizados a realizar, tanto as medidas de incentivo à quitação
ou renegociação de dívidas como também, se for o caso, a conciliação ou a mediação
subsequente.
Dispõe o parágrafo único do art. 4º que referidas medidas serão adotadas pelos
delegatários ou por seus escreventes autorizados, devendo as sessões de conciliação e
mediação observar as regras do Provimento 67/2018.
Sensível facilitação do acesso às medidas consensuais pode ser observada quando se
faculta, tanto ao credor, quanto ao devedor, o requerimento para o início do procedimento,
que pode ser feito pessoalmente ou por meio eletrônico, tanto no tabelionato onde foi
lavrado o protesto, como também pelas centrais eletrônicas (CRAs – Centrais de Remessa de
Arquivos ou CENPROTs – Centrais Eletrônicas de Protesto) mantidas pelos IEPTBs – Institutos
de Estudos de Protestos de Títulos e outros documentos de dívida, entidade representativa
da categoria dos tabeliães de protesto e presente em todos os Estados do país.
O art. 6º cuida dos requisitos mínimos para o requerimento das medidas de incentivo à
quitação e a renegociação, ganhando destaque a necessidade de indicação de meio idôneo de
notificação da outra parte (para além do endereço físico já apontado quando da apresentação
do título a protesto) e a proposta de renegociação da dívida. Se feito pelo credor o requerimento,
deve ele apresentar o valor atualizado do débito e eventuais condições especiais de pagamento,
como abatimento parcial do valor ou parcelamento, tudo sempre observando-se as instruções
contidas na autorização do credor, que poderá também dar autorização ao tabelionato de
protesto para dar quitação ao devedor e promover o cancelamento do protesto.
38
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Dispõe a seu turno o art. 10 que o credor ou devedor poderão requerer a designação
de sessão de conciliação ou de mediação, aplicando-se, uma vez mais, as disposições do
Provimento 67/2018.
Regramento interessante surge no art. 11, referente às CDAs (Certidões de Dívida Ativa)
da União, Estados, Distrito Federal e Municípios e respectivas autarquias quando referidos
títulos executivos extrajudiciais estiverem protestados nos respectivos tabelionatos, abrindo-
se a possibilidade de, através de convênio firmado entre os tabelionatos de protesto do Brasil
e as pessoas jurídicas de direito público acima indicadas, seja possível a adoção das medidas
de incentivo à quitação e renegociação do crédito público, tudo a depender, se se tratar de
convênio de âmbito nacional, de homologação da Corregedoria Nacional de Justiça, ao passo
que, em se tratando de convênio local, a homologação será dada pelas Corregedorias dos
Estados e do Distrito Federal mediante, uma vez mais, estudo prévio acerca da viabilidade
jurídica, técnica e financeira do serviço.
Quanto aos valores cobrados das partes, as mesmas considerações tecidas em relação
ao Provimento 67/2018 aqui são renovadas. Eis o expresso teor do art. 14 do Provimento
78/2018:
Art. 14. Enquanto não editadas, no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, normas
específicas relativas aos emolumentos (...) aplicar-se-á às medidas de incentivo à quitação
ou à renegociação de dívidas protestadas a tabela referente ao menor valor de uma
certidão individual de protesto; às conciliações e às mediações extrajudiciais, a tabela
referente ao menor valor cobrado na lavratura da escritura pública sem valor econômico,
incidindo as disposições previstas na Seção VII do Provimento CN-CNJ 67/2018.
7. Considerações finais
Referências
DEBS, Martha El; DEBS, Renata El; SILVEIRA, Thiago. Sistema mutiportas – a mediação e
a conciliação nos cartórios como instrumento de pacificação social e dignidade
humana. Salvador: Editora Juspodivm, 2020
GRINOVER, Ada Pellegrini...[et al.]. Lei de Mediação comentada artigo por artigo:
dedicado à memória da Profa. Ada Pellegrini Grinover. Indaiatuba: Editora Foco, 2018.
HALE, Durval; PINHO, Humberto Dalla Bernardina de; CABRAL, Tricia Navarro Xavier. O marco
legal da mediação no Brasil: comentários à Lei no. 13.140, de 26 de junho de 2015.
São Paulo: Atlas, 2016.
40
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
PAUMGARTTEN, Michele; PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Os Desafios para a Integração
entre o Sistema Jurisidicional e a Mediação a partir do Novo Código de Processo Civil. Quais
as Perspectivas para a Justiça Brasileira? In: A Mediação no Novo Código de Processo
Civil. 2a. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
SANTOS, Luis Ricardo Bykowski; SILVEIRA, Sebastião Sérgio da. Mediação e conciliação
nos cartórios de Registro Civil das Pessoas Naturais, Instrumento para a solução
alternativa de litígios e fortalecimento da cidadania. In Revista Cidadania e Acesso à
Justiça. Disponível em: https://www.academia.edu/35604568/MEDIACAO_E_CONCILIACAO_
NOS_CARTORIOS_DE_REGISTRO_CIVIL_DAS_PESSOAS_NATURAIS> Acesso em 05/11/2019
41
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1. Introdução
42
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
prestação jurisdicional1 e dos meios alternativos para solução de conflitos, uma vez que a
solução de conflitos pode ter um caminho judicial ou mesmo extrajudicial.
Desta forma, os novos movimentos sociais ligados à busca da apreensão do significado
da Justiça - caracterizada em elementos que permitam melhor qualidade de vida, diminuição
da distância na redistribuição de rendas, na espera de uma ética alicerçada na dignidade
humana – não podem ignorar o discurso jurídico na sua estrutura delineadora das práticas
sociais, isto é, deve-se possibilitar o acesso democrático à efetivação do Direito2.
Neste ponto, adquire relevo a mediação, a conciliação e a arbitragem3. Estas formas
de solução de conflitos têm a finalidade precípua de evitar que uma relação conflituosa seja
prolongada em juízo, com todos os problemas dela resultantes na resistência judicializada e
que conduz a desgastes e incomodações na vida das partes.
O status de direito fundamental conferido ao acesso à justiça remete à discussão acerca
da máxima efetividade dos denominados métodos alternativos ou adequados de solução
de conflitos, no que tange à sua eficácia processual no ordenamento jurídico pátrio. A ideia
reside em fortalecer estes meios alternativos, com intuito de dirimir os litígios de forma mais
humana e eficaz.
Neste particular, deve-se ressaltar prática já tradicional na Justiça do Trabalho,
consistente na adoção das chamadas Comissões de Conciliação Prévia, bem como a atuação
do Ministério Público do Trabalho na resolução dos conflitos trabalhistas. É alvissareiro
salientar que o Ministério Público - conforme prelecionam os arts. 127, caput da CRFB/88,
1ª da LC nº 75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público da União) e 1º da Lei nº 8.625/93
(Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) – consiste em “instituição permanente,
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica,
do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. Na defesa da
ordem jurídica, o Parquet – sobretudo seu ramo juslaboralista, cuja atuação será objeto de
análise mais detida adiante – tem se valido de diversos instrumentos institucionais, como
o inquérito civil, a audiência pública, a ação civil pública, a mediação e a arbitragem. Estes
dois últimos mecanismos, mais do que possibilitar a tutela da ordem jurídica, permitem
que conflitos sejam solucionados sem a necessária intervenção do Judiciário e revelam a
importância do Órgão Ministerial na atual ordem democrática.
1 Neste particular, sugere Jasson Ayres Torres a realização de “reformas processuais com a simplificação dos procedimentos,
a reestruturação do Poder Judiciário, visando à aproximação dos cidadãos aos serviços prestados, com o intuito de melhorar
o acesso à Justiça. Nessa linha de pensamento, está o de propiciar meios para audiências preliminares à composição mais
rápida do litígio, assim como a extensão e descentralização dos serviços da Justiça, com efetiva presença em locais deter-
minados por uma pauta de atendimento, seja no âmbito urbano, seja no âmbito rural”. TORRES, Jasson Ayres. O Acesso à
Justiça e Soluções Alternativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 155.
2 Selma Regina Conceição afirma que suprimir “os impactos das desigualdades sociais sob a égide da Justiça, permeada
por uma prática que conceba o Direito como fruto da hermenêutica técnica, sem afastar o dinamismo da realidade que
este mesmo Direito representa, é diminuir as barreiras para um novo paradigma conceitual jurídico-social, concedendo ao
cidadão uma nova interpretação deste valor social, legal, distributivo e comutativo, que é a Justiça”. CONCEIÇÃO, Selma
Regina. Manual de Conciliação. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 63.
3 Humberto Dalla Bernardina Pinho classifica as vias alternativas de resolução de conflitos em puras e híbridas. As pri-
meiras se caracterizam pela solução do conflito sem qualquer interferência do Estado, destacando-se a negociação, me-
diação e arbitragem. As segundas são marcadas pela atuação do Estado-juiz, mesmo que seja para mera homologação
do acordo. Sendo assim, as vias alternativas hibridas com maior relevância em nosso ordenamento são a conciliação no
curso do processo já instaurado, a transação penal (art.76 Lei 9.099), remissão prevista no Estatuto da Criança e do Ado-
lescente (art.148,II; 180,II; 201,I da Lei 8069) e o Termo de Ajustamento de Conduta celebrado em uma Ação Civil Pública
(art 5º §6º da Lei 7347/85; art.211 da Lei 8069). PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Teoria Geral do Processo Civil
Contemporâneo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p.358. Para os objetivos deste trabalho, serão enfocadas a mediação, a
conciliação e a arbitragem, sobretudo aplicadas aos dissídios trabalhistas.
43
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática. 4 ed. São Paulo: LTr,
2010, p. 157.
5 Ada Pellegrini Grinover cita lição clássica de Denti, que segundo a autora, “reconduz a participação na administração
da justiça a três modelos: a) a participação como instrumento de garantia, correspondendo à evolução do Estado liberal e
tendo sua manifestação mais saliente na instituição do júri; b) a participação como instrumento de transformação, com a
função criadora do direito por parte dos órgãos jurisdicionais, exercida sobretudo nos momentos de profundas transfor-
mações econômico-sociais, e que Calamandrei reconduzia, em seu luminoso estudo de 1920, às categorias gerais da juris-
dição segundo eqüidade; e c) a participação como instrumento de controle, moderna visão da justiça de tipo corporativo do
antigo regime, que atua mediante a participação das categorias sociais representadas na solução das controvérsias, numa
espécie de co-gestão das lides, atingindo finalidades de fiscalização e absorção de tensões e conflitos sociais”. GRINOVER,
Ada Pellegrini. “A conciliação Extrajudicial” in GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo.
Participação e Processo. São Paulo: RT, 1988, p. 286.
6 “A mediação e a conciliação podem ser desenvolvidas e colocadas em efetiva atuação, sob a coordenação do Poder Ju-
diciário. Não se desconhecem os movimentos existentes e nem se coloca em dúvida a validade dos acordos que possam
ser obtidos fora do Poder Judiciário, pois buscam a pacificação social. Defendemos, porém, que essa amplitude e alterna-
tividade na solução de conflitos deva ser realizada sob a coordenação e orientação do Poder Judiciário, que tem estrutura e
confiabilidade. Basta uma tomada de consciência, uma nova mentalidade, uma forma diferenciada e corajosa de enfrentar
os problemas, com mecanismos e métodos simplificados, visando à objetividade da ação. Essa forma pragmática de aplicar
o direito para as partes envolvidas no conflito já tem sido assumida por inúmeros magistrados, que dão destaque à concil-
iação e, através dela, procuram, nos casos concretos, a realização da justiça”. TORRES, Jasson Ayres, op.cit., p. 159. Outra
visão acerca do tema é esposada por Lília Maia de Morais Sales que afirma que “o Poder Judiciário continua com o pleno
poder constitucional de solucionar os conflitos (monopólio jurisdicional) e a mediação, pela sua efetivação, auxiliará nessa
tarefa de resolução de conflitos (principalmente daqueles conflitos que, pelas condições sociais e financeiras das partes,
talvez nunca alcançassem os tribunais) evitando o número exagerado de processos nas Cortes. [...] Com as técnicas alter-
nativas de solução de conflitos, especialmente a mediação, entende-se que haverá um fortalecimento do Poder Judiciário,
pois este finalmente poderá oferecer à sociedade prestação jurisdicional efetiva, já que não mais se encontrará abarrotado
de ações judiciais”. SALES, Lília Maia de Moraes. Justiça e Mediação de Conflitos. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 67.
7 SALES, Lília Maria de Moraes, op.cit., p. 52.
44
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
soluções criativas, de modo a facilitar a resolução satisfatória para ambas. Nas palavras
de Mauricio Godinho Delgado, a mediação “é a conduta, pela qual, um terceiro aproxima
as partes conflituosas, auxiliando e, até mesmo, instigando sua composição, que há de ser
decidida, porém, pelas próprias partes8”.
Desta forma, diante da definição de mediação e dos objetivos desse processo, percebe-
se que a mesma pode ser aplicada a vários tipos de conflito. Na ausência de legislação
específica que regulamente o alcance da mediação de conflitos, pode-se afirmar com maior
segurança que a mesma é aplicável às hipóteses que versem sobre direitos disponíveis,
ou sobre direitos indisponíveis em que a própria legislação abra margem para negociação
(indisponibilidade relativa).
Dentre as diversas áreas em que se pode utilizar a mediação, destacam-se:
a) Família: negociações relativas a separação ou divórcio, revisão de pensão e guarda
dos filhos, adoção, conflitos entre pais e adolescentes;
b) Sociedades empresárias e instituições: prevenção e/ou resolução de conflitos intra e
interempresariais ou institucionais, assim como entre sociedades empresárias/instituições e
seus clientes;
c) Cível: situações patrimoniais (art. 841 do CC de 2002) tais quais acidente de
automóvel (indenização), locação ou retomada de imóveis e revisão de aluguéis, dissolução
da sociedade, sucessão, inventários e partilhas, perdas e danos;
d) Comercial: títulos de crédito, frete, seguro e entrega de mercadorias, comércio
interno e internacional, Mercosul;
e) Trabalhista: conflitos individuais e coletivos;
f) Penal: nas hipóteses em que há a possibilidade de disposição da ação, já que a
vontade do indivíduo é imprescindível para a existência da ação (crimes de ação penal pública
condicionada à representação do ofendido e crimes de ação penal privada; art. 100 do CP) 9.
Especificamente no âmbito do Direito Coletivo do Trabalho, insta salientar que a ordem
jurídica trabalhista anterior a 1988 previa a mediação compulsória, a ser realizada por
autoridades do Ministério do Trabalho.
8 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 8 ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 1.328.
9 Destaca Lilia Maia de Moraes Sales que “o escritório da Mediadoras Associadas em Campinas/SP, em convênio com o
Instituto de Mediação e Arbitragem no Brasil (IMAB), aponta que no âmbito comercial a mediação tem demonstrado rapidez
e eficácia nos conflitos contratuais nacionais e internacionais. Indica que nas empresas pode ser utilizada na solução e pre-
venção de conflitos organizacionais e trabalhistas. Ressalta ainda que é também importante aliada ‘nas questões que abran-
gem famílias, comunidades, escolas, em meio ambiente, onde a relação entre as partes seja importante e os participantes
desejem assumir a solução dos mesmos’”. SALES, Lília Maria de Moraes, op. cit., p. 53.
10 DELGADO, Mauricio Godinho, op. cit., pp. 1.334-1.335.
45
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
[...] significa a discussão franca e aberta, podendo acontecer antes de ser instaurado um
processo litigioso, como política judiciária, como alternativa viabilizadora de aproximação
das partes. A força e o poder da conciliação são muito grandes, porque estabelecem um
relacionamento harmonioso entre as partes em conflito, influindo decisivamente para
criar a paz social. Evita-se, através desse procedimento, que surjam novas desavenças,
aumentem os problemas e situações incontornáveis, gravíssivimas para a sociedade14.
11 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática, op. cit., pp. 157-
158.
12 SALES, Lília Maria de Moraes, op. cit., p. 72.
13 SALES, Lília Maria de Moraes, op. cit., p. 72.
14 TORRES, Jasson Ayres, op.cit., p. 159.
46
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Contudo, a força condutora da dinâmica conciliatória por esse terceiro é real, muitas
vezes conseguindo implementar resultado não imaginado ou querido, primitivamente,
pelas partes. Um tipo de conciliação endoprocessual muito importante no Direito
Individual do Trabalho é a que se passa nas Varas Trabalhistas, sob direção do Juiz do
Trabalho, nos processos judiciais postos a seu exame15.
15 DELGADO, Mauricio Godinho, op. cit., p. 1.328. Salienta ainda o autor que a “conciliação judicial trabalhista é, portanto,
ato judicial, através do qual as partes litigantes, sob interveniência da autoridade jurisdicional, ajustam solução transacio-
nada sobre matéria objeto de processo judicial. Embora próxima às figuras da transação e da mediação, delas distingue-se
em três níveis: no plano subjetivo, em virtude da interveniência de um terceiro e diferenciado sujeito, a autoridade judicial;
no plano formal, em virtude de realizar-se no corpo de um processo judicial, podendo extingui-lo parcial ou integralmente;
no plano de seu conteúdo, em virtude de poder a conciliação abarcar parcelas trabalhistas não transacionáveis na esfera
estritamente privada”. DELGADO, Mauricio Godinho, op. cit., p. 1.328.
16 CAETANO, Luiz Antunes. Arbitragem e Mediação: rudimentos. São Paulo: Atlas, 2002, p. 99.
17 GRINOVER, Ada Pellegrini, op.cit., p. 288.
18 GRINOVER, Ada Pellegrini, op.cit., p. 292.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
19 MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 85.
20 “A arbitragem denota a solução do conflito mediante a decisão de um árbitro, que poderá ser um órgão ou pessoa. É
uma decisão proferida por um terceiro que é aceito pelas partes como árbitro e que tem como escopo a composição de uma
controvérsia”. NETO, Francisco Ferreira Neto; CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Direito Processual do Traba-
lho. 8 ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 112.
21 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de, op. cit., p. 366.
22 DELGADO, Mauricio Godinho, op. cit., p. 1.329.
23 “Este tipo de arbitragem ocorre, regra geral, quanto a conflitos entre Estados, em que um terceiro Estado ou um or-
ganismo internacional passam a atuar como árbitros. Ocorre também no tocante a conflitos entre grupos econômicos ou
outros sujeitos de direito que tenham presença significativa no mercado supranacional, solucionando disputas de interesse
comerciais, tecnológicos, etc”. DELGADO, Mauricio Godinho, op. cit., p. 1.330.
48
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
A arbitragem obrigatória, ao seu turno, se caracteriza por ser imposta às partes, podendo
resultar de imposição legal ou de prévia imposição convencional, estipulada pelas mesmas
partes (trata-se da chamada cláusula compromissória, prevista no art. 4º da Lei nº 9.307/96
– Lei de Arbitragem)24. A arbitragem facultativa (ou voluntária) é decidida pelas partes no
contexto do surgimento do conflito (neste caso, a convenção que elege a arbitragem como
fórmula de resolução do conflito denomina-se compromisso arbitral e está prevista no art. 9º
da Lei nº. 9.307/96).
Outro parâmetro de comparação separa a arbitragem legal da convencional. A primeira
decorre de previsão de norma heterônoma estatal, podendo ser obrigatória (art. 23 da Lei
nº. 8.630/93, por exemplo) ou facultativa (como se verifica no âmbito do Direito Coletivo
do Trabalho, conforme previsão do art. 114, § 1º da CRFB/88). Já a arbitragem convencional
resulta de ajuste de vontade das partes, mediante convenção de arbitragem (art. 3º e seguintes
da Lei nº. 9.307/96), que pode verificar-se antes da própria existência da celeuma, tornando
obrigatório o seguimento da via arbitral caso o conflito emerja (cláusula compromissória), ou
ainda no momento em que a dissensão se manifesta, optando-se pela arbitragem para sua
solução (compromisso arbitral).
Cumpre ainda mencionar o critério diferenciador da arbitragem que a classifica em
de direito ou de equidade. A arbitragem de direito tem por objeto conflito interpretativo de
regra ou princípio jurídicos ou de cláusula contratual. A arbitragem por equidade tem por
objeto conflito de interesses materiais, dotados de evidente matiz econômico, envolvendo
reivindicações materiais ou circunstanciais disputadas pelas partes.
No que concerne à utilização da arbitragem na seara do Direito Individual do Trabalho,
cumpre mencionar que, embora existam dispositivos na ordem jurídica pátria que se refiram
a sua presença, a efetiva validade deste mecanismo de solução de conflitos era controvertida.
Duas regras importantes podem ser mencionadas. De um lado, o já referido art. 23, § 1º,
da Lei de Trabalho Portuário (n. 8.630, de 1993), que, inclusive, prevê a obrigatoriedade
da arbitragem de ofertas finais nos casos que regula.
De outro lado, há o Estatuto do Ministério Público (Lei Complementar n. 75, de 1993),
que conferiu legitimidade aos membros do Ministério Público do Trabalho para que
atuem como árbitros [...] (art. 83, XI, LC 75). Trata-se, aqui, de arbitragem meramente
facultativa, à escolha das partes contratuais trabalhistas25.
A par da existência dos dois preceitos, muito se questionava tal possibilidade, uma vez
que a Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/96) preleciona, em seu art. 1º, que o instituto poderá
ser utilizado para “dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis” (Grifei).
O referido preceito adquiria especial relevo em virtude de vigorar no Direito do Trabalho,
sobretudo em seu segmento individual, o princípio da indisponibilidade de direitos, que
acarreta a invalidade de qualquer renúncia ou transação lesiva operada pelo empregado
ao longo do contrato de trabalho. Assim sendo, não se poderia admitir que o recurso à
arbitragem, que pode conduzir a uma considerável redução ou supressão de direitos, tenha
24 Como exemplo de dispositivo legal que menciona o caminho arbitral obrigatório pode-se citar o art. 23 da Lei nº.
8.630/93, que regula o trabalho portuário:
“Art. 23. Deve ser constituída, no âmbito do órgão de gestão de mão-de-obra, Comissão Paritária para solucionar litígios
decorrentes da aplicação das normas a que se referem os arts. 18, 19 e 21 desta Lei.
§ 1º Em caso de impasse, as partes devem recorrer à arbitragem de ofertas finais” (Grifei)
25 DELGADO, Mauricio Godinho, op. cit., pp. 1.331-1.332.
49
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
força para esterilizar ou atenuar o referido princípio. “Nessa linha, é desnecessário relembrar
a absoluta prevalência que a Carta Magna confere à pessoa humana, à sua dignidade no
plano social, em que se insere o trabalho, e a absoluta preponderância deste no quadro de
valores, princípios e regras imantados pela mesma Constituição26”. Além disso, salientava
Mauricio Godinho, haver nítida dificuldade de compatibilização da regra inserta nos arts. 18 e
31 da Lei de Arbitragem com o amplo acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV da CRFB/88), pois, ao
conferir status de coisa julgada material à decisão arbitral, mesmo em conflitos meramente
interindividuais, exclui da apreciação judicial lesão ou ameaça a direitos trabalhistas que
poderiam estar nela embutidas27.
Contudo, com o advento da Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017), tornou-se
possível a utilização da arbitragem para a solução dos conflitos nos contratos individuais
de trabalho, conforme prevê o art. 507-A, da CLT, quando a remuneração do empregado
seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral
de Previdência Social. Acrescente-se, contudo, que somente direitos disponíveis podem ser
objeto de arbitragem, conforme atestam os artigos 611-A e 611-B da CLT.
Já no âmbito do Direito Coletivo do Trabalho a própria Constituição faz referência à
arbitragem facultativa como meio para a resolução de disputas coletivas no mercado de
trabalho. Neste sentido, preleciona o art. 114, § 1º da CRFB/88 que: “Frustrada a negociação
coletiva, as partes poderão eleger árbitros” (Grifei)28.
Resulta, portanto, a arbitragem de deliberação das partes coletivas trabalhistas, no
contexto da negociação coletiva. Em tais circunstâncias, o laudo arbitral dá origem a regras
jurídicas, isto é, dispositivos gerais, abstratos, impessoais e obrigatórios no âmbito das
respectivas bases coletivas representadas.
Na esteira da CRFB/88, outros diplomas legais posteriores aludiram ao processo
arbitral no plano juscoletivo. É o caso da Lei de Greve (Lei nº 7.783/89), que, em seu
art. 3º, caput, subordina a validade do movimento paredista à frustração da negociação
coletiva e à subsequente impossibilidade de recurso à via arbitral. Dispõe ainda o aludido
diploma legal, em seu art. 7º, que as relações obrigacionais, durante o período da
greve, serão regidas por “acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do
Trabalho” (Grifei). Também a Lei de Participação nos Lucros (Lei nº 10.101/00) se referiu
à arbitragem ao prever, em seu art. 4º, que, havendo impasse na negociação coletiva
disciplinadora da participação nos lucros, as partes poderão recorrer à mediação ou à
arbitragem de ofertas finais para a solução do litígio, tendo o respectivo laudo arbitral
força normativa. Por fim, insta mencionar a já revogada Lei nº. 8.542/92 que, em seu
art. 1º, § 2º, aludia ao laudo arbitral no conjunto de diplomas coletivos e normativos
que arrolava.
50
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
29 “A par das garantias constitucionais conferidas à Instituição como um todo, outras há, além da independência funcional
[...], que são destinadas especificamente aos seus membros.
Assim, nos termos do art. 128, § 5º, inciso I, da CF/88, o membro do Ministério Público terá as seguintes garantias: vitalicie-
dade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios”. LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho:
doutrina, jurisprudência e prática, op. cit., pp. 67-68.
30 “Insta frisar, de logo, que prerrogativa não se confunde com privilégio, vez que aquela deriva de norma de ordem pública,
cujo fim é assegurar que o seu destinatário possa exercer determinada atividade ou função com segurança, independência e
autonomia em prol da própria coletividade. Este, ao revés, constitui vantagem individual sem qualquer razão jurídica plausível,
ferindo, assim, o princípio da igualdade preconizado pela ordem constitucional (CF, art. 5º)”. LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Mi-
nistério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática, op. cit., p. 71. São prerrogativas asseguradas aos membros
do Ministério Público da União aquelas previstas no art. 18 da LC nº. 75/93 e elas se dividem em institucionais e processuais.
51
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
homogêneos (art. 83, III e IV da LC nº 75/93). Para alguns, teria o referido diploma legal
extrapolado os limites previstos pelo art. 129 da CRFB/88. Contudo, a atuação do MP
está guiada pela repercussão social da questão e, mais do que isso, o Código de Defesa
do Consumidor (Lei nº 8.078/90) e a Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85), ao
estabelecerem a reciprocidade de suas disposições compatíveis, acabaram por definir e
prever a proteção dos direitos individuais indisponíveis via ação coletiva para a qual está
legitimado o MP. Insta salientar que o próprio Código de Defesa do Consumidor, em seu
art. 1º, considera suas disposições como sendo de ordem pública e interesse social. Daí
a legitimidade do Parquet para a tutela de tais direitos e a constitucionalidade da norma
encartada na LC nº 75/93. Não estará legitimado, entretanto, à defesa de interesses
meramente individuais, disponíveis31.
Neste passo, cumpre ressaltar que a atuação do MPT como órgão agente – isto é,
perquirindo se, de fato, ocorreu a lesão a direito metaindividual, transindividual (coletivo
lato sensu) invocada, com respaldo nos arts. 129, II da CRFB/88 e 83, III da LC nº. 75/93
– pode dar-se extrajudicialmente, judicialmente e extrajudicialmente desembocando na
esfera judicial, posteriormente. Nas palavras de Carlos Henrique Bezerra Leite, “a atuação
extrajudicial ocorre, via de regra, no âmbito administrativo, mas pode converter-se em
atuação judicial32”.
A LC nº. 75/93 prevê ainda, em seu art. 83, XI, a possibilidade de atuar o membro do
MPT como árbitro. “[...] vale destacar que a atuação do Ministério Público do Trabalho na
qualidade de árbitro, quando solicitada pelas partes, nos dissídios de competência da Justiça
do Trabalho, revela também atuação administrativa do ‘Parquet’33”.
Deste modo, com o intuito de regulamentar as atividades de mediação e arbitragem,
foi instituído Grupo de Estudo (Resolução nº 32/98 do CSMPT), no âmbito do Ministério
Público do Trabalho, para estudar teoricamente os institutos e propor ao Conselho Superior
do Ministério Público do Trabalho a normatização da atividade.
Não obstante isso, o Ministério Público do Trabalho, pelos seus Membros, vem atuando
como árbitro e mediador na solução de conflitos trabalhistas de natureza coletiva,
envolvendo trabalhadores e empresa ou sindicatos de trabalhadores e empresas (e/ou
sindicato patronal), com vantagens adicionais para as partes interessadas quais sejam:
1. credibilidade dos Membros oficiantes quanto à sua atuação e formação jurídica;
2. isenção e imparcialidade absolutas em seu pronunciamento;
3. ausência de custo para as partes, salvo se houver necessidade de perícias ou produção
de outras provas34.
Ao abordar o tema, Carlos Henrique Bezerra Leite qualifica a atuação do Parquet Laboral
31 “A Lei Complementar nº. 75/1993 dispôs sobre a organização do Ministério Público do Trabalho em seus arts. 83
usque 115. A instituição atuará nas causas de competência da Justiça do Trabalho (art. 83, caput). Suas funções espe-
cíficas estão previstas nos incisos do art. 83 e os respectivos órgãos no art. 85. Em relação às atribuições, o Supremo
Tribunal Federal, por não vislumbrar qualquer cerceamento à liberdade sindical, reconheceu a constitucionalidade do
art. 83, IV, que dispõe sobre a atribuição do Ministério Público do Trabalho para propor as ações cabíveis visando à
declaração de cláusula de contrato, acordo coletivo ou convenção coletiva, que viole as liberdades individuais
ou coletivas ou os direitos indisponíveis dos trabalhadores. A Corte também reconheceu a legitimidade ativa
do Ministério Público do Trabalho para a propositura de ação civil pública em defesa dos trabalhadores” (Grifei).
GARCIA, Emerson. Ministério Público: organização, atribuições e regime jurídico. 3 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2008, pp. 81-82.
32 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 8 ed. São Paulo: LTr, 2010, p. 159.
33 SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. 6 ed. São Paulo: Método, 2009, p. 183.
34 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática, op. cit., p. 158.
52
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
em judicial, prevista nos arts. 127 e 129 da CRFB/88 e no art. 8335 da LC nº. 75/93, e
extrajudicial, que se dá na seara administrativa, com arrimo no art. 8436 da LC nº. 75/9337.
Ressalva, contudo, que
Afirma ainda o autor que, quando atua judicialmente, o Ministério Público do Trabalho
pode fazê-lo na condição de custos legis, conforme já mencionado, ou de parte, que se
dá nas hipóteses previstas no art. 83, I, III, IV, V, VIII e X da LC nº. 75/93. Além destas
hipóteses, atuará o MPT como parte quando interpuser recurso das decisões da Justiça do
Trabalho (art. 83, VI da LC nº 75/93) e na forma do art. 793 da CLT (quando figurará como
substituto processual, pois atuará em nome próprio na defesa do interesse do menor).
Entretanto, menciona que tais distinções, referentes à atuação judicial do MPT, permanecem
tão somente para fins didáticos, no sentido de facilitação para o acesso coletivo à Justiça,
já que o princípio da inércia da jurisdição exige sempre que haja um autor, pois é ele quem
provoca o funcionamento do aparelho Judiciário. Defende, pois, a formação de uma nova
mentalidade a respeito da atuação judicial do Parquet Laboral, que seja consentânea com
a ideologia da nova ordem constitucional, que prestigia a unidade e indivisibilidade como
princípios institucionais do Ministério Público, e com a sistemática adotada pelo Código de
Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) e pela Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85),
35 Prevê o referido dispositivo que: “Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribui-
ções junto aos órgãos da Justiça do Trabalho: I - promover as ações que lhe sejam atribuídas pela Constituição Federal e
pelas leis trabalhistas; II - manifestar-se em qualquer fase do processo trabalhista, acolhendo solicitação do juiz ou por sua
iniciativa, quando entender existente interesse público que justifique a intervenção; III - promover a ação civil pública no
âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucional-
mente garantidos; IV - propor as ações cabíveis para declaração de nulidade de cláusula de contrato, acordo coletivo ou con-
venção coletiva que viole as liberdades individuais ou coletivas ou os direitos individuais indisponíveis dos trabalhadores;
V - propor as ações necessárias à defesa dos direitos e interesses dos menores, incapazes e índios, decorrentes das relações
de trabalho; VI - recorrer das decisões da Justiça do Trabalho, quando entender necessário, tanto nos processos em que for
parte, como naqueles em que oficiar como fiscal da lei, bem como pedir revisão dos Enunciados da Súmula de Jurisprudência
do Tribunal Superior do Trabalho; VII - funcionar nas sessões dos Tribunais Trabalhistas, manifestando-se verbalmente sobre
a matéria em debate, sempre que entender necessário, sendo-lhe assegurado o direito de vista dos processos em julgamen-
to, podendo solicitar as requisições e diligências que julgar convenientes; VIII - instaurar instância em caso de greve, quando
a defesa da ordem jurídica ou o interesse público assim o exigir; IX - promover ou participar da instrução e conciliação em
dissídios decorrentes da paralisação de serviços de qualquer natureza, oficiando obrigatoriamente nos processos, manifes-
tando sua concordância ou discordância, em eventuais acordos firmados antes da homologação, resguardado o direito de
recorrer em caso de violação à lei e à Constituição Federal; X - promover mandado de injunção, quando a competência for da
Justiça do Trabalho; XI - atuar como árbitro, se assim for solicitado pelas partes, nos dissídios de competência da Justiça do
Trabalho; XII - requerer as diligências que julgar convenientes para o correto andamento dos processos e para a melhor so-
lução das lides trabalhistas; XIII - intervir obrigatoriamente em todos os feitos nos segundo e terceiro graus de jurisdição da
Justiça do Trabalho, quando a parte for pessoa jurídica de Direito Público, Estado estrangeiro ou organismo internacional”.
36 “Art. 84. Incumbe ao Ministério Público do Trabalho, no âmbito das suas atribuições, exercer as funções institucionais
previstas nos Capítulos I, II, III e IV do Título I, especialmente: I - integrar os órgãos colegiados previstos no § 1º do art. 6º,
que lhes sejam pertinentes; II - instaurar inquérito civil e outros procedimentos administrativos, sempre que cabíveis, para
assegurar a observância dos direitos sociais dos trabalhadores; III - requisitar à autoridade administrativa federal competen-
te, dos órgãos de proteção ao trabalho, a instauração de procedimentos administrativos, podendo acompanhá-los e produzir
provas; IV - ser cientificado pessoalmente das decisões proferidas pela Justiça do Trabalho, nas causas em que o órgão tenha
intervindo ou emitido parecer escrito; V - exercer outras atribuições que lhe forem conferidas por lei, desde que compatíveis
com sua finalidade”.
37 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho, op. cit, pp. 159-165.
38 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho, op. cit, p. 165.
53
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Para operacionalizar tais metas, o MPT se vale dos diversos instrumentos institucionais
colocados à sua disposição e, quando demandado pelas partes, poderá atuar na mediação e
arbitragem de dissídios trabalhistas.
4. Conclusão
39 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática, op. cit., pp. 120-
125.
40 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho, op. cit, pp. 165-166.
41 DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 12 ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 185.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
5. Referências
CAETANO, Luiz Antunes. Arbitragem e Mediação: rudimentos. São Paulo: Atlas, 2002.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 8 ed. São Paulo: LTr, 2009.
GARCIA, Emerson. Ministério Público: organização, atribuições e regime jurídico. 3 ed. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 8 ed. São
Paulo: LTr, 2010.
MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2004.
NETO, Francisco Ferreira Neto; CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Direito Processual
do Trabalho. 8 ed. São Paulo: Atlas, 2019.
PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Teoria Geral do Processo Civil Contemporâneo. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
SALES, Lília Maia de Moraes. Justiça e Mediação de Conflitos. Belo Horizonte: Del Rey,
2004.
SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. 6 ed. São Paulo: Método,
2009.
TORRES, Jasson Ayres. O Acesso à Justiça e Soluções Alternativas. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2005.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1 Artigo redigido a partir de Live realizada no dia 03/06/2020 no perfil do Instagram do Professor Vinícius Lemos @vini-
ciuslemos.ro e de Webinar organizado pelo CEPED/UERJ, no dia 17/06/2020, na plataforma Zoom. WEBINAR CEPED UERJ.
Judicialização e desjudicialização dos litígios. Webinar apresentado por Flávia Hill, Trícia Navarro e Maria Angélica Feijó. [Rio
de Janeiro: CEPED, 17/06/2020]. 1 vídeo (47min 40 seg). Publicado no YouTube. Disponível em https://www.youtube.com/
watch?v=UawTYYvuigs
2 Em outro trabalho, abordamos que a existência de conflitos não é, em si mesma, deletéria, sendo, em verdade, um ca-
talizador de aprimoramentos e avanços, a depender de como são solucionados. HILL, Flávia Pereira. “Passado e futuro da
mediação: perspectiva histórica e comparada”. Revista de Processo. vol. 303/2020. Maio/2020. p. 479-502.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
3 WATANABE, Kazuo. “Acesso à justiça e sociedade moderna”. In GRINOVER, Ada Pellegrini. DINAMARCO, Cândido Rangel.
WATANABE, Kazuo (Orgs). Participação e processo. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1988.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em números 2019. Disponível no endereço eletrônico: https://www.cnj.jus.br/
pesquisas-judiciarias/justica-em-numeros/. Acesso em 20/05/2020.
5 COUNCIL OF EUROPE EUROPEAN COMMISSION FOR THE EFFICIENCY OF JUSTICE (CEPEJ). https://www.coe.int/en/web/
cepej. Acesso em 02/05/2020.
6 ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECCIONAL RJ. Em nota oficial, OABRJ sugere uso de meios extrajudiciais para pre-
venir colapso no Poder Judiciário. Disponível no endereço eletrônico: https://www.oabrj.org.br/noticias/nota-oficial-oabrj-
sugere-uso-meios-extrajudiciais-prevenir-colapso-poder-judiciario. Acesso em 30/05/2020.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
7 G1. Coronavírus: confinamento teria causado número recorde de divórcios em cidade da China. Muitos casais parecem não
ter resistido à proximidade em tempo integral: após redução de transmissões do Coronavírus, município de Xi’am registrou
aumento drástico no número de pedido de divórcios. Disponível no endereço eletrônico: https://g1.globo.com/ciencia-e-
saude/noticia/2020/03/24/coronavirus-confinamento-teria-causado-numero-recorde-de-divorcios-em-cidade-da-china.ght-
ml. Acesso em 02/06/2020.
8 CONSULTOR JURÍDICO. Divórcios operam de forma excepcional por conta da quarentena. Disponível no endereço eletrônico:
https://www.conjur.com.br/2020-mai-24/divorcios-operam-forma-excepcional-conta-quarentena. Acesso em 03/06/2020.
9 ANGELO, Tiago. “Sem marco legal para guarda dos filhos na epidemia, pais devem priorizar acordos”. Consultor Jurídico.
Disponível no endereço eletrônico: https://www.conjur.com.br/2020-abr-20/fica-guarda-compartilhada-tempos-coronavi-
rus. Acesso em 02/06/2020.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
3ª Vara de Família e Sucessões de Curitiba/PR, deferiu o pedido de uma mãe para suspensão
temporária do convívio presencial da filha com o pai, limitado aos finais de semana. Visando
evitar a ruptura do vínculo paterno-filial, a magistrada julgou adequado que o contato se
mantenha por chamada de vídeo nos mesmos dias de visitação acordados entre as partes.
Os encontros presenciais estão suspensos até que perdurem as restrições do poder público
com o objetivo de amenizar a disseminação da Covid-1910.
Outro núcleo potencial de emergência de conflitos em tempos de isolamento social
são os condomínios de casas ou, mais ainda, de apartamentos, visto que os condôminos
estão passando mais tempo em suas residências, devido ao isolamento social determinado
pelas autoridades.
O Desembargador do TJPE, Jônes Figueiredo Alves, diretor da comissão de magistrados
do IBDFAM, informou que “decisões recentes de magistrados de Guarujá (SP) os juízes Gustavo
Gonçalves Alvarez (3ª Vara Cível) e Gladis Naira Cuvero (2ª Vara Cível), em face de dois
inquilinos moradores de um mesmo condomínio em local nobre, os submeteram ao decreto
judicial de despejo liminar, face comportamentos antissociais e lesivos e por promoverem
festas noturnas em seus apartamentos, com a presença de muitos convidados”11. Tal
conduta, que até pouco tempo atrás, se circunscreveria a perturbar o sossego dos vizinhos,
atualmente, representa, ainda, incremento dos riscos de contágio entre os moradores, em
razão do aumento da circulação de pessoas nas dependências do condomínio.
Reportagem publicada no Jornal O Globo do dia 02/08/2020 confirma que o número
de reclamações entre vizinhos triplicou desde março de 2020, sendo que os litígios se
referem a: (i) barulho das unidades, especialmente obras; (ii) descumprimento das regras
de isolamento e (iii) atividades nas varandas ou janelas das unidades, que repercutem na
vizinhança, tais como competições de pipa, churrascos e projeção de filmes nas paredes de
condomínios. Por tal razão, ABADI (Associação Brasileira de Administradoras de Imóveis)
lançou um protocolo de mediação de conflitos condominiais, a fim de incentivar que tais
conflitos sejam solucionados através de acordo extrajudicial. Trata-se de excelente iniciativa,
que apenas corrobora a nossa defesa da mediação como método adequado para a solução
de litígios entre vizinhos, especialmente no contexto da pandemia12.
Outro núcleo que, a nosso ver, merece um olhar mais atento dos profissionais do Direito
quanto à aplicação dos métodos de solução consensual dos litígios consiste nas relações
trabalhistas, embora não seja esse o objeto do presente trabalho. Temos testemunhado
muitos empregadores demitindo seus empregados, muitas vezes, por faltar diálogo aberto
e franco entre ambos. No meio do “tsunami”, o empregador se desespera e, não vendo
saída, demite. A mediação fortaleceria o diálogo e permitiria, não raro, que soluções
fossem ventiladas em conjunto, para a próprio bem da empresa, pois podemos afirmar,
por experiência própria, que a troca de equipe é nefasta para a continuidade na prestação
dos serviços. Sendo assim, as demissões impensadas demandarão que, no momento
10 INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMÍLIA. Pandemia do coronavírus: guarda compartilhada está entre desafios
enfrentados no Direito das Famílias. Disponível no endereço eletrônico: http://www.ibdfam.org.br/noticias/7189/+Pan-
demia+do+coronav%C3%ADrus%3A+guarda+compartilhada+est%C3%A1+entre+desafios+enfrentados+no+Direito+das+-
Fam%C3%ADlias. Acesso em 02/06/2020.
11 ALVES, Jones Figueiredo. Em proteção da família, a dispensa das regras ordinárias. Disponível no endereço eletrônico:
https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/855146981/em-protecao-da-familia-a-dispensa-das-regras-ordinarias. Acesso
em 03/06/2020.
12 DINIZ, Ana Carolina. O Globo. “Pandemia triplica o número de conflitos entre vizinhos”. Edição de 02/08/2020.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Um dos mais graves – quiçá o mais grave – entraves à ampla adoção da mediação
no Brasil, especialmente no âmbito judicial, consiste no déficit do número de mediadores
capacitados.
A mediação demanda que o profissional desenvolva aptidões e capacidades adicionais,
com vistas a não apenas buscar solucionar o litígio pontualmente considerado, mas, mais
amplamente, restaurar o diálogo, de modo a preservar a relação pretérita existente entre
os mediandos. Por isso, com razão, a Lei Federal nº 13.140/2015 exige que o mediador
extrajudicial seja pessoa “capacitada” (artigo 9º da lei federal) e que o mediador judicial seja
pessoa capaz, que tenha concluído o ensino superior há, pelo menos, dois anos e tenha
frequentado curso de capacitação específico em consonância com as diretrizes fixadas pelo
CNJ (artigo 11 da lei federal e artigo 167, § 1º do CPC/2015).
13 CASEMIRO, Luciana. O Globo. “Informação clara e negociação na volta às aulas”. Edição de 02/08/2020.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
14 O juiz Dr. Fabio Costa Soares, Titular do Juizado Especial Cível de Cabo Frio/RJ, a quem registramos o nosso agradeci-
mento pelas relevantes informações prestadas a respeito das dificuldades enfrentadas pela magistratura fluminense para
manter as suas atividades em tempos de pandemia, nos relatou que, somente no Juizado de que é titular, cerca de 500
audiências são realizadas mensalmente e, por conseguinte, precisam de soluções urgentes para que sejam realizadas e os
processos possam, pois, prosseguir.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
de vídeo, por e-mail ou outro meio célere e idôneo de comunicação que comprove a ciência
inequívoca, contanto que seja certificado circunstanciadamente o ato nos autos.
Consideramos acertado o teor do §7º do mesmo artigo 2º, ao prever que, em caso de
acordo, o conciliador dará fé do encontro de vontades expressado na via não presencial,
submetendo o acordo a imediata homologação judicial. O provimento do tribunal goiano, em
boa hora, dispensa a coleta de assinaturas no acordo, incumbindo o conciliador de dar fé do
encontro de vontades, o que, a nosso sentir, compatibiliza a segurança jurídica, de um lado
– até mesmo porque a sessão de conciliação e mediação online decerto terão sido gravadas,
embora sejam mantidas em sigilo -, e a informalidade, de outro.
Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES): Editou a Portaria 01/2020,
publicada em 23/04/2020, regulamentando a realização online de sessões de mediação
e conciliação. Foi disponibilizado o e-mail nucleosolucaoconflito@tjes.jus.br para que os
interessados requeiram o agendamento de sessão de mediação ou conciliação online, ainda
que seja pré-processual, ou seja, antes de ajuizada a ação. Deverá ser anexado ao e-mail um
formulário preenchido (anexo à Portaria), documentação indicada e ser informado endereço
para correspondência, e-mail e telefone da parte reclamada. A sessão online somente é
realizada com o consentimento de todos os interessados.
Portanto, os tribunais que ainda não haviam implantado o sistema eletrônico, ou o
tinham implantado apenas parcialmente, estão envidando esforços para fazê-lo o quanto
antes, a fim de evitar a formação de uma nefasta “litigiosidade contida”.
Deve-se, portanto, empregar tais ferramentas, de forma perene, para viabilizar
a mediação e a conciliação online a curtíssimo prazo, a fim de evitar o agravamento da
sobrecarga do Poder Judiciário em futuro próximo. Esse movimento não pode ser postergado
para depois da retomada das atividades, mas, ao contrário, tais ferramentas precisam ser
disponibilizadas aos jurisdicionados com a maior brevidade possível. Afinal, a legitimidade
do sistema de justiça reside precisamente em sua aptidão para identificar e responder, a
tempo e a hora, aos anseios da sociedade a que serve.
De se destacar, ainda, que, paralelamente ao aparelhamento do Judiciário para atender
a essa demanda, é de todo recomendável a criação de núcleos de mediação extrajudicial
que congreguem mediadores capacitados e disponibilizem plataformas eficientes de
mediação online. Embora vivenciemos uma fase em que a mediação usualmente é oferecida
pelos tribunais, através dos Cejuscs, entendemos que o ideal é que os métodos de solução
consensual dos litígios sejam prestados prevalentemente na esfera extrajudicial.
15 CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Acesso à justiça: Juizados Especiais Cíveis e Ação Civil Pública. Uma nova sistematização da Teo-
ria Geral do Processo. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense. 2000.
65
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Portanto, para que a mediação online seja efetivamente empregada pelos jurisdicionados
nessa fase de emergência sanitária, é necessário, antes de mais nada, informar-lhes, de maneira
clara, didática e objetiva, como acessar as plataformas eletrônicas, o que, lamentavelmente,
nem sempre é tido como prioritário entre os tribunais do país.
Deve-se, portanto, privilegiar a formulação de uma campanha ampla de difusão das
plataformas de mediação online disponibilizadas à população para a solução de conflitos
durante a fase de isolamento social decorrente da pandemia.
4. Conclusão
66
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
ANEXO16
Referências
ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezende de. PANTOJA, Fernanda Medina. PELAJO, Samantha
(Orgs). A mediação no novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: GEN Forense.
2015.
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70
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1. Introdução
A situação atual do país chama atenção para a questão da probidade do agente público.
O administrador público não é o senhor dos bens públicos, é apenas seu gestor. No entanto, a
história do Brasil é marcada por situações que exibem atos incompatíveis com a administração
proba, que remontam, por exemplo, ao tesoureiro de D. João VI. Bento Maria Jargini, que foi
nomeado barão e, posteriormente, visconde, ficou conhecido pelo seguinte ditado: “Quem
furta pouco é ladrão. Quem furta muito, barão. Quem mais furta e esconde passa de barão a
visconde.”1
Com o decorrer dos séculos, a corrupção no Brasil passou a ser tolerada e institucionalizou-
se. Nos últimos anos, porém, o combate a tais práticas acirrou-se com a Operação Lava Jato,
que culminou na prisão de vários agentes públicos.
A repressão à corrupção pode ser feita de forma preventiva ou repressiva. Preventiva,
através da valorização da ética na Administração Pública e repressiva, pela aplicação efetiva
de um conjunto de leis denominado “Bloco de Combate à Corrupção”, no qual se inserem a Lei
71
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa, ou LIA); o Código Penal; as leis que definem
os chamados crimes de responsabilidade (Lei nº 1.79/50 e Decreto-Lei nº 207/67); a LC nº
135/10 (Lei da Ficha Limpa), que alterou a LC nº 64/90, para estabelecer novas hipóteses de
inelegibilidade; a Lei nº 12.850/13 (Lei de Organização Criminosa); e a Lei nº 12.846/13 (Lei
Anticorrupção), que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas
pela prática e por atos contra a Administração Pública nacional e estrangeira e mais recentemente
com a Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime). Além disso, a Constituição da República Federativa
do Brasil dita, no seu art. 37, os princípios que devem nortear uma administração proba.
A corrupção é um tema constante no País e de grande importância para a sociedade,
ao lado da improbidade administrativa. Nesse cenário surgiu a Lei nº 8.429/92, que veio
regulamentar o § 4º do art. 37 da CRFB, a fim de reprimir a improbidade administrativa. Com
apenas 25 (vinte e cinco) artigos, contém vários temas controversos.
Nessa esteira, a Lei de Improbidade Administrativa consiste em um eficaz instrumento
para o combate à corrupção. No entanto, a vedação da possibilidade de acordo ou transação
na seara dessa lei acabou por dificultar a finalidade precípua de recuperação da res publica e,
por isso, inicia-se a defesa da aplicabilidade dos métodos de solução de conflito, ainda mais
com a recente alteração do artigo 17, §1º da LIA.
Ainda que com previsões esparsas em outras legislações, com o advento do Novo
Código de Processo Civil (NCPC) ocorre uma valorização dos métodos consensuais de solução
de conflitos, com uma maior promoção da razoável duração do processo por meio de seus
arts. 165 a 175. Aliás, o próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 2 por meio da Resolução
nº 125/10, em seu art. 165, menciona que os Tribunais:
Dessa forma, verifica-se acerto do legislador quanto à previsão expressa dos métodos de
solução de conflitos, pouco abordados no antigo Código de Processo Civil (1973), reforçando
a ideia de celeridade, a exemplo da conciliação e da mediação.
Em que pese a similitude conceitual da conciliação e da mediação estabelecida pelo
legislador no NCPC, consigna-se que os institutos não se confundem, ainda que ambos sejam
realizados por um terceiro sem poder decisório e com imparcialidade. Isso porque a conciliação
é procedimento simplório, em que o conciliador pode interferir na questão, caracterizada por
incidir em uma controvérsia pontual. Diferentemente, a mediação caracteriza-se como um
procedimento de negociação realizada por terceiro também imparcial, nos casos de existência
de vínculo anterior entre as partes.3
2 DALLA, Humberto; MAZZOLA, Marcelo. Manual de mediação e arbitragem. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. p. 38.
3 ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezende de; PANTOJA, Fernanda Medina; PELAJO, Samantha (coord.). A mediação no novo
código de processo civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 140-141.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Ainda que o Novo Código de Processo Civil enalteça os métodos de solução de conflitos
como instrumentos de celeridade processual, o art. 17, § 1º, da Lei nº 8.429/927 até pouco
tempo proibia expressamente “transação, acordo ou conciliação” no processo de improbidade
administrativa, conforme se verifica, in verbis:
Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público
ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida
cautelar.
§ 1º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput.
Salienta-se que o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) ajuizou uma ADI, que recebeu o nº 5.980,8
em que questionava o § 1º do art. 17 da LIA. A fundamentação do partido é de que tal regra vedava
o Ministério Público ou a pessoa jurídica da administração direta ou indireta de buscar qualquer so-
lução de composição nas ações sobre o tema de improbidade, ainda que seja de interesse público.
4 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Jurisdição e pacificação: limites e possibilidades do uso dos meios con-
sensuais de resolução de conflitos na tutela dos direitos transindividuais e pluri-individuais. Curitiba: CV, 2017.
P. 235.
5 NEIVA, Geisa Rosignoli. Conciliação e mediação pela administração pública: parâmetros para sua efetivação. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2019. p. 117.
6 BRASIL. Supremo Tribunal Federal (1. Turma). Recurso Extraordinário nº 253.885/MG. Recorrente: Município de Santa
Rita do Sapucaí. Recorrida: Lázara Rodrigues Leite. Relatora: Ministra Ellen Gracie. Brasília. Disponível em: www.stf.gov.jus.
br. Acesso em: 20 set. 2019.
7 BRASIL. Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos
de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou
fundacional e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8429.htm. Acesso em 20
set. 2019.
8 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 5.980. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?inciden
te=5512784. Acesso em 20 set. 2019
73
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Nesse sentido, antes mesmo da alteração promovida pelo Pacote Anticrime era adequado
defender a aplicabilidade do instituto da leniência na fase pré-processual e extrajudicial, mas não
no bojo da própria ação de improbidade, conforme entendimento de Kleber Bispo dos Santos:12
9 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 404-406.
10 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 240-242.
11 BRASIL. Lei n° 12.846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas
jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12846.htm. Acesso em 20 set. 2019.
12 SANTOS, Kleber Bispo dos. Acordo de leniência na Lei de Improbidade e na Lei Anticorrupção. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2018. p. 156.
13 DIDIER JR., Fredie; BOMFIM, Daniela Santos. A colaboração premiada como negócio jurídico processual atípico nas deman-
das de improbidade administrativa. A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano
17, n. 67, p. 105-120, jan./mar. 2017. DOI: 10.21056/aec.v17i67.475. Disponível em: http://www.revistaaec.com/index.
php/revistaaec/article/view/ 475/637. Acesso em: 3 mar. 2018.
74
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
14 DIDIER JR., Fredie; BOMFIM, Daniela Santos. A colaboração premiada como negócio jurídico processual atípico nas deman-
das de improbidade administrativa. A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano
17, n. 67, p. 105-120, jan./mar. 2017. DOI: 10.21056/aec.v17i67.475. Disponível em: http://www.revistaaec.com/index.
php/revistaaec/article/view/ 475/637. Acesso em: 3 mar. 2018.
15 Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arqui-
vamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada
na proposta.
§ 1º Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade.
§ 2º Não se admitirá a proposta se ficar comprovado:
I - ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva;
II - ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos
termos deste artigo;
III - não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias,
ser necessária e suficiente a adoção da medida.
§ 3º Aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será submetida à apreciação do Juiz.
§ 4º Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa,
que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos.
§ 5º Da sentença prevista no parágrafo anterior caberá a apelação referida no art. 82 desta Lei.
§ 6º A imposição da sanção de que trata o § 4º deste artigo não constará de certidão de antecedentes criminais, salvo para
os fins previstos no mesmo dispositivo, e não terá efeitos civis, cabendo aos interessados propor ação cabível no juízo cível.
16 Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o
Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o
acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que
autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).
§ 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do Juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o
processo, submetendo o acusado a período de prova, sob as seguintes condições:
I - reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo;
II - proibição de frequentar determinados lugares;
III - proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz;
IV - comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.
§ 2º O Juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à
situação pessoal do acusado.
§ 3º A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar,
sem motivo justificado, a reparação do dano.
§ 4º A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou
descumprir qualquer outra condição imposta.
§ 5º Expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade.
§ 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.
§ 7º Se o acusado não aceitar a proposta prevista neste artigo, o processo prosseguirá em seus ulteriores termos.
75
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
O artigo 17, § 1º, da Lei 8.429/92 veda a “transação, acordo ou conciliação” nas ações
de improbidade administrativa. Se em 1992, época da publicação da Lei, essa vedação
até se justificava tendo em vista que estávamos engatinhando na matéria de combate
aos atos ímprobos, hoje, em 2015, tal dispositivo deve ser interpretado de maneira
temperada. Isso porque, se o sistema jurídico permite acordos com colaboradores no
campo penal, possibilitando a diminuição da pena ou até mesmo o perdão judicial
em alguns casos, não haveria motivos pelos quais proibir que o titular da ação de
improbidade administrativo, no caso, o MPF pleiteie a aplicação de recurso semelhante
na esfera cível. Cabe lembrar que o artigo 12, parágrafo único, da Lei 8.429/92 admite
uma espécie de dosimetria da pena para fins de improbidade administrativa, sobretudo
levando em conta as questões patrimoniais. Portanto, os acordos firmados entre os réus
e o MPF devem ser levados em consideração nesta ação de improbidade administrativa.
17 DINO, Nicolao. A colaboração premiada na Improbidade Administrativa: possibilidade e repercussão probatória. In: SAL-
GADO, Daniel de Resende; QUEIROZ, Ronaldo Pinheiro de. A prova no enfrentamento à macrocriminalidade. Salvador:
Juspodivm, 2015. p. 455-459.
18 MASSON, Cleber; MARÇAL, Vinicius. Crime organizado. São Paulo: Método, 2015. p. 152-155.
19 BRASIL. Tribunal Regional Federal da Quarta Região (4. Turma). Agravo de Instrumento nº 50016898320164040000
5001689-83.2016.404.0000. Relator: Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle. Julgamento: 21 jan. 2016. Publicação: D.E.
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50016898320164040000-5001689-8320164040000?ref=juris-tabs. Acesso em: 20 set. 2019.
20 GARCIA, Emerson. ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. 9 ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Saraiva,
2017. p. 915.
76
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Art. 36. No caso de conflitos que envolvam controvérsia jurídica entre órgãos ou
entidades de direito público que integram a administração pública federal, a Advocacia-
Geral da União deverá realizar composição extrajudicial do conflito, observados os
procedimentos previstos em ato do Advogado-Geral da União.
[...]
§ 4º Nas hipóteses em que a matéria objeto do litígio esteja sendo discutida em ação de
improbidade administrativa ou sobre ela haja decisão do Tribunal de Contas da União,
a conciliação de que trata o caput dependerá da anuência expressa do juiz da causa ou
do Ministro Relator.
Diante de tantos argumentos de reforço para concretizar acordos no bojo de uma ação
de improbidade administrativa, surgem as mais recentes introduções sobre segurança jurídica
21 Art. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade,
em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
[...]
Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:
I - estar provada a inexistência do fato;
IV - estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
VI - existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos
do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
22 BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de
controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública; altera a Lei nº 9.469, de 10 de julho
de 1997, e o Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972; e revoga o § 2º do art. 6º da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997.
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23 BRASIL. Conselho Nacional do Ministério Público. Resolução nº 179, de 26 de julho de 2017. Regulamenta o § 6º do art.
5º da Lei nº 7.347/1985, disciplinando, no âmbito do Ministério Público, a tomada do compromisso de ajustamento de conduta.
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77
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Art. 6º A Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, passa a vigorar com as seguintes alterações:
Art. 17.
§ 1º As ações de que trata este artigo admitem a celebração de acordo de não persecução
cível, nos termos desta Lei.
24 BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Dispo-
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78
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4. Conclusão
Com base nos fundamentos acima expostos, conclui-se que os métodos consensuais
de solução de conflitos são fortes instrumentos de auxílio à celeridade em causas sobre o
combate à corrupção, incluindo-se as ações de improbidade administrativa.
No atual Estado Democrático de Direito, medidas de composição concorrem para um
resultado mais ágil em assuntos que atingem diretamente toda a sociedade, diante dos
desvios financeiros resultantes de cometimento de atos ímprobos, o que lesa os cidadãos em
esferas como saúde e educação.
Em que pese a antiga vedação legal de acordo e transação prevista no art. 17, § 1º,
da Lei nº 8.429/92, verifica-se uma onda inovadora de legislações no combate à corrupção,
como leniência, colaboração premiada, acordos e mediação, que mesmo dispostas em outras
leis permitiram amplificar a discussão sobre não ser absoluta a vedação legal da LIA.
Nesse sentido, a ultrapassada previsão legal de impossibilidade de acordos na esfera
de uma ação de improbidade administrativa foi mitigada com o tempo, com o fundamento
de que o interesse público em certas situações necessita de uma solução consensual. Desse
modo, os métodos alternativos de solução de conflitos tornaram-se parceiros do Poder
Judiciário, conscientizando o ímprobo de seus atos e permitindo a colaboração dos infratores
com a solução do caso.
Com isso, não restou outra alternativa a não ser a alteração legislativa do art. 17,
§ 1º, da LIA. Ademais, legislações como as Leis de Mediação e de Organização Criminosa
sugestionam a ocorrência de uma revogação tácita da vedação prevista na Lei de Improbidade.
Como argumento de reforço, a disposição do art. 26 da LINDB não deixou dúvida quanto a
essa revogação, uma vez que a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro se irradia
para todas as demais normas do ordenamento jurídico, assim como a Lei nº 8.429/92.
Por última disposição, e para não deixar mais dúvidas, o Pacote Anticrime tornou possível
expressamente a possibilidade de acordos nas ações de improbidade, com a modificação
expressa do artigo 17, §1º da LIA.
Desse modo, a utilização da solução consensual dos conflitos na seara da improbidade
administrativa não sugestiona a interpretação de violação aos interesses difusos. Pelo
contrário, a composição na esfera da improbidade administrativa é o próprio incentivo para
a probidade administrativa, pois se reflete no aspecto positivo do interesse público.
Por fim, conclui-se que, após anos de vigência da Lei de Improbidade Administrativa,
o surgimento de várias leis integrantes do bloco de combate à corrupção, bem como demais
normas e a alteração recente promovida pelo Pacote Anticrime revelam que a composição
na improbidade administrativa, a depender do caso em concreto, pode ser o meio mais
adequado para a efetiva tutela do patrimônio público.
79
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Referências
ALMEIDA, Diogo Assumpção Rezende de; PANTOJA, Fernanda Medina; PELAJO, Samantha
(coord.). A mediação no novo código de processo civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016.
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agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego
ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/ L8429.htm. Acesso em: 20 set.
2019.
BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares
como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da
administração pública; altera a Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997, e o Decreto nº 70.235,
de 6 de março de 1972; e revoga o § 2º do art. 6º da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.htm.
Acesso em: 20 set. 2019.
80
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
BRASIL. Tribunal Regional Federal da Quarta Região (4. Turma). Agravo de Instrumento
nº 50016898320164040000 5001689-83.2016.404.0000. Relator: Luís Alberto
d’Azevedo Aurvalle. Julgamento: 21 jan. 2016. Publicação: D.E. 28 jan. 2016. Disponível em:
https://trf-4.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/381072265/agravo-de-instrumento-ag-5001
6898320164040000-5001689-8320164040000?ref=juris-tabs. Acesso em: 20 set. 2019.
DIDIER JR., Fredie; BOMFIM, Daniela Santos. A colaboração premiada como negócio
jurídico processual atípico nas demandas de improbidade administrativa. A&C –
Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, ano 17,
n. 67, p. 105-120, jan./mar. 2017. DOI: 10.21056/aec.v17i67.475. Disponível em:
http://www.revistaaec.com/index.php/revistaaec/article/view/475/637. Acesso em:
3 mar. 2018.
GARCIA, Emerson. ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. 9. ed. rev., ampl.
e atual. São Paulo: Saraiva, 2017.
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NEIVA, Geisa Rosignoli. Conciliação e mediação pela administração pública: parâmetros
para sua efetivação. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019.
81
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
82
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM
INTERNACIONAIS E O PROCESSO DE
VALIDAÇÃO E SEUS EFEITOS NO BRASIL
1. Introdução
83
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
2.1 DA MEDIAÇÃO
84
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
2.2 DA ARBITRAGEM
1 REZEK, Francisco. Direito Internacional Privado. 10 ed. São Paulo. Saraiva, 2007, p 349-355.
2 CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e Processo. Um comentário à lei 9.307/96. São Paulo. Atlas. 2009, p. 1.
85
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
86
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Fato é que ainda vivermos a “cultura da sentença”, onde preferimos uma decisáo
proferida pelo Juiz, o famoso “bateu o martelo”, que poderá ser muito ruim para uma das
partes ou para ambas. Muito melhor seria buscarem uma solução alternativa, em que poderão
chegar a uma composição mais adequada e mais rápida, comparando-se o tempo de solução
demandado para a sentença arbitral e para a sentença judicial.
3 ONU – Art. 2 (3) - “settle their international disputes by peaceful means in such a manner that international peace and
security, and justice, are not endangered”.
4 ARAÚJO, Nadia de. Direito Internacional Privado. Teoria e Prática Brasileira. 7ª Ed. São Paulo: 2018. p. 455.
87
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
5 DELINGER, Jacob e TIBÚRCIO, Carmem. Direito Internacional privado. Arbitragem Comercial internacional. Rio de
Janeiro. Renovar. 2003.
88
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
O primeiro laudo arbitral homologado pelo STJ foi o da sentença estrangeira no caso
em que foram partes L´Aiglon S/A, empresa suíça, e Têxtil União S/A empresa brasileira com
sede no Ceará.
A empresa brasileira foi condenada ao pagamento da quantia de R$ 900.000,00
(novecentos mil reais), sob o fundamento de um descumprimento parcial de contrato firmado
entre as partes, relativo a compra e venda de algodão cru. O laudo foi proferido pela Liverpool
Cotton Association, com sede na Inglaterra6.
Há uma exceção dentro dessa sistemática de homologação, que se refere ao divórcio
consensual, caso em que as partes não necessitam de homologação para produzir efeitos no
6 SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. CONTRATO. ASSINATURA A Corte Especial deferiu o
pedido de homologação de sentença arbitral ao entendimento de que é possível a cláusula compromissória tácita quando a
parte compareceu ao processo de arbitragem e não impugnou sua existência. No caso, considera-se preenchido o requisito
ao ter sido aceita a convenção de arbitragem, de acordo com a prova dos autos, ao manifestar defesa no juízo arbitral, sem
impugnar oportunamente a existência da cláusula compromissória. SEC 856-EX, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito,
julgado em 18/5/2005. (Informativo STJ Nº 0247/2005)
89
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Brasil, conforme artigo 960 §5º do CPC, o que, vale uma crítica, abre um espaço indevido
para a ocorrência de divórcios eivados dos mais diversos vícios.
Já que há essa abertura para os divórcios consensuais, porque não também atribuir
eficácia imediata a diversos outros acordos firmados e que, a princípio, não irão de encontro
à nossa ordem pública, dispensando-se-lhes a homologação?
Cabe a reflexão, bem como a afirmação de que essa exceção mostra-se completamente
sem critério objetivo, pois existem diversos outros casos que facilmente poderiam ser
dispensados desse processo de homologação, juízo de delibação, etc.
6. Considerações Finais
Com base nos itens e subintens do presente trabalho, podemos concluir que tanto a
arbitragem quanto a mediação estão cada vez mais presentes no cenário internacional, pelas
inúmeras vantagens apresentadas.
Aqui no Brasil, ainda encontramos uma resistência, desnecessária, por conta de nossa
cultura ainda ser a da sentença e do fato de que temos ainda certa desconfiança quanto a
esses meios adequados de resolução de conflitos, diferentes da solução judicial.
7 Art. 965. O cumprimento de decisão estrangeira far-se-á perante o juízo federal competente, a requerimento da parte,
conforme as normas estabelecidas para o cumprimento de decisão nacional.
90
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Importante as novas normas introduzidas pelo CPC/15 que buscam não só a inserção
da mediação no nosso ordenamento, bem como introduzir um sistema de cooperação judicial
e um sistema de múltiplas portas, contando cada vez mais com a participação de todos os
envolvidos na resolução dos conflitos.
A mediação e arbitragem como meio alternativos se apresentam, quando cabíveis,
quase que 100% das vezes como o meio mais benéfico para as partes resolverem um litígio,
tendo em vista que a decisão ali proferida tem influência direta das partes na sua formulação,
inobstante as figuras do mediador e do árbitro.
A mediação busca resgatar o diálogo para a composição do litígio, missão de paz que,
no plano das relações privadas, pode representar o restabelecimento de uma conversa que
se tornou impossível com o tempo.
Da mesma forma, a arbitragem, mesmo com a figura do árbitro, não possui as mesmas
formalidades e o distanciamento presentes em uma ação proposta perante o Poder Judiciário.
Em tais meios adequados de solução, mesmo que seja proferida uma sentença (caso
não haja composição), seus efeitos poderão ser muito menos dolorosos do que se proferida
fosse pelo juiz togado.
Em se tratando de arbitragem estrangeira, mostra-se necessária a ação de homologação
de sentença judicial, e o juízo de delibação, pois de fato há de se verificar como foi o processo
no país origem, bem como se o mérito irá ferir nossa ordem pública. Não se pode executar
uma sentença que se mostra contrária aos princípios constitucionais brasileiros.
A crítica fica por conta de somente os divórcios consensuais terem sido excluídos da
ação de homologação porque, conforme demonstrado, outros tipos de acordos, que são de
jurisdição voluntária poderiam ser dispensados da ação.
Quanto à execução, outro ponto a ser observado é a opção do juiz federal, sem
menção da especialidade do mesmo, onde, por exemplo, uma sentença de guarda que aqui
é de competência da justiça comum, caso estrangeira será federal. Causaria insegurança
jurídica? Talvez.
No mais, cabe aos operadores do direito a missão de tornar a mediação e arbitragem
cada vez mais presentes no nosso ordenamento jurídico, no plano nacional e internacional.
Todos ganhariam: as partes, os advogados e o Poder Judiciário.
Referências
ARAÚJO, Nadia de. Direito Internacional Privado. Teoria e Prática Brasileira. 7ª Ed. São
Paulo: RT. 2018.
BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2012. – (Coleção
saberes do direito; 53)
91
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DIDIER, Jr. Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao direito processual civil
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MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros,
1999.
THEODORO JR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre de Melo Franco; PEDRON, Flávio.
Novo CPC: Fundamentos e Sistematização. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,
_________; Mazzola, Marcelo. Manual de Mediação e Arbitragem. São Paulo. Saraiva. 2019.
REZEK, Francisco. Direito Internacional Privado. 10 ed. São Paulo. Saraiva, 2007.
92
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1. Introdução
Cada ser humano possui suas particularidades, com valores e ideais diferentes, esses
aspectos pessoais transformam cada indivíduo em um ser único, dentro desse contexto tem-
se uma pluralidade de pessoas que em conjunto formam e transformam a sociedade. Ao
estar interligado com a sociedade, o indivíduo assume um papel social para cada âmbito da
93
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1 CARMO, S. Paulo. Sociologia e sociedade pós industrial: Uma introdução. São Paulo: Paulus, 2007. p. 13.
2 GIMENEZ, Charlise Paula Colet; SPENGLER, Fabiana Marion; BRUNET, Karina Schuch. O papel do terceiro e as interro-
gações do conflito social. 1. Ed. Santa Cruz do Sul: Editora Essere nel Mondo, 2015.
94
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
3 GIMENEZ, Charlise Paula Colet; SPENGLER, Fabiana Marion; BRUNET, Karina Schuch. O papel do terceiro e as interroga-
ções do conflito social. 1. ed. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo, 2015.
4 GHISLENI, Ana Carolina. O descrédito na jurisdição e a mediação enquanto política pública eficaz nos trata-
mentos de conflitos conforme a resolução nº 125 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. 1. ed. Santa Cruz do Sul:
Essere nel mondo, 2018.
5 GIMENEZ, Charlise Paula Colet; SPENGLER, Fabiana Marion; BRUNET, Karina Schuch. O papel do terceiro e as interro-
gações do conflito social. Op. cit.
6 SPENGLER, Fabiana Marion. (Des) caminhos do Estado e da Jurisdição. 1. ed. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo,
2017. p. 108.
95
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
7 GHISLENI, Ana Carolina. O descrédito na jurisdição e a mediação enquanto política pública eficaz nos trata-
mentos de conflitos conforme a resolução nº 125 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Op. Cit.
8 SPENGLER, Fabiana Marion. Da Jurisdição à Mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. Ijuí:
Editora Unijuí, 2010. p. 214.
9 SPENGLER, Fabiana Marion. (Des) caminhos do Estado e da Jurisdição. Op. Cit. p. 102.
10 SPENGLER, Fabiana Marion. Da Jurisdição à Mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. Op.
Cit. p. 103.
11 GHISLENI, Ana Carolina. O descrédito na jurisdição e a mediação enquanto política pública eficaz nos tratamen-
tos de conflitos conforme a resolução nº 125 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Op. Cit. p. 30.
12 GIMENEZ, Charlise Paula Colet. SPENGLER, Fabiana Marion. O Mediador na Resolução 125/2010: um estudo a par-
tir do Tribunal Múltiplas Portas. Águas de São Pedro: Livro Novo, 2016. p. 198.
13 SPENGLER, Fabiana Marion. (Des) caminhos do Estado e da Jurisdição. Op. Cit.
96
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
ser negativo ou positivo. Ou seja, o conflito, desde que controlado, acarreta a produção de
conhecimento e crescimento social14.
O diferencial capaz de tornar o conflito bom ou mau para a sociedade será a forma como
ele será tratado. Se for bem manejado ele assume o seu caráter afirmativo, evolucionista;
todavia, não sendo bem tratado, o conflito se torna uma ameaça à paz dos indivíduos
envolvidos e, de maneira reflexa, da sociedade como um todo15.
O conflito sendo algo impossível de eliminar deve buscar então a sua convivência
renegociando as ações a fim de colaborar com a paz social. É nesse sentido que se deve
pensar o papel social do indivíduo na busca por um melhor tratamento dos seus conflitos,
atuando com autonomia nas questões em que a complexidade do conflito se dá justamente
na sua relação entre os conflitantes, situação a qual o Estado não tem como gerenciar.
A principal característica dessas relações conflituosas se dá pelo fato dos protagonistas
se enfrentarem como inimigos, na busca pelo direito de extinguir o oponente transformando
os polos em perdedores e vencedores16.
14 GIMENEZ, Charlise Paula Colet; SPENGLER, Fabiana Marion; BRUNET, Karina Schuch. O papel do terceiro e as interro-
gações do conflito social. Op. Cit. p. 60.
15 SENGER, Ilise. “A mediação e a Busca da Resolução dos conflitos com base na ética da amizade: o respeito e a considera-
ção como fator determinante na solução de conflitos”. In: Schorr, Janaína; Zasso, Izabele; Spengler, M. Fabiana. A Justiça
Brasileira em debate: Desafios da mediação. 1. ed. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo, 2015.
16 GIMENEZ, Charlise Paula Colet; SPENGLER, Fabiana Marion; BRUNET, Karina Schuch. O papel do terceiro e as interro-
gações do conflito social. Op. Cit. p. 61.
17 GIMENEZ, Charlise Paula Colet; SPENGLER, Fabiana Marion; BRUNET, Karina Schuch. O papel do terceiro e as interro-
gações do conflito social. Op. Cit. p. 65.
18 WÜST, Caroline. Mediação Comunitária e Acesso à Justiça: As duas faces da metamorfose social. Santa Cruz do
Sul: Esse Nel Mondo, 2014.
97
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias
entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração
pública. Parágrafo único. Considera-se mediação a atividade técnica exercida por
terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes,
as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a
controvérsia21. (grifei)
19 WARAT, Luis Alberto. Surfando na Pororoca: o Ofício do Mediador. v. III. Florianópolis: Fundação BOITEUX, 2004. p. 33.
20 GIMENEZ, Charlise Paula Colet. SPENGLER, Fabiana Marion. O Mediador na Resolução 125/2010: um estudo a par-
tir do Tribunal Múltiplas Portas. Águas de São Pedro: Livro Novo, 2016. p. 129-175.
21 BRASIL. Lei nº 13.140 de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução
de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm. Acesso em: 02 jul. 2020.
98
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Art.3º
[...]
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de
conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e
membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial24. (grifei)
Art.165
[...]
§ 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo
anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões
e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da
comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem
benefícios mútuos25. (grifei)
22 SPENGLER, Fabiana Marion. Da Jurisdição à Mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. Op. cit.
23 BRASIL. Lei nº 13.140 de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução
de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. Op. cit.
24 BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 02 jul. 2020.
25 Ibidem.
99
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
impulsionar a visão do conflito para ambos. A presença do terceiro é crucial nesse momento,
por isso deve ser feita com muita responsabilidade, porém destaca-se que a sua importância
não o caracteriza como poder central, mas sim em razão de ser seu papel ajudar os conflitantes
a se despirem de todo os sentimentos que os trouxeram até ali e, sozinhos, poderem traçar o
caminho para restabelecer sua comunicação. O mediador se posiciona de forma secundária,
seu papel é mediar os interesses conflitivos, conduzindo as partes para um tratamento
adequado aos desejos e necessidades delas26.
As características essenciais do mediador são: a capacidade de aplicar diferentes
técnicas autocompositivas em conformidade com a necessidade de cada litígio; ter capacidade
de escutar a exposição de cada pessoa/parte, fazendo uso da técnica da escuta ativa; a
capacidade de inspirar respeito e confiança; a capacidade de administrar situações em que os
ânimos estejam acirrados; estimular as partes a desenvolverem soluções criativas, as quais
permitam a compatibilização dos interesses aparentemente contrapostos; examinar os fatos
sob uma nova ótica, afastando as perspectivas litigiosas para aproximar as perspectivas
conciliatórias; motivar os envolvidos para atingir um resultado sem atribuição de culpas;
estimular o desenvolvimento de condições que permitam reformular questões diante de
eventuais impasses; abordar com imparcialidade todas e quaisquer questões que estejam
influenciando a relação entre as partes. Ou seja, a parte do mediador é voltada para a condução
da situação de maneira adequada, interferindo quando precisar, todavia sem qualquer poder
decisório, é tão somente um estímulo para o restabelecimento do contato27.
Já o procedimento em si da mediação se caracteriza pela: privacidade – é desenvolvido
em um ambiente secreto e somente será divulgado se for de vontade das partes; economia
financeira e de tempo – os conflitos tratados pela mediação tendem a alcançar um resultado
em menor tempo do que se tivessem um trâmite judicial regular, o que, indiretamente,
acarreta na diminuição dos custos e ainda promove a autonomia dos conflitantes, que caso
estejam novamente em confronto terão a possibilidade de lidar com ele de outra maneira,
não recorrendo ao Poder Judiciário novamente; outro ponto de destaque é a oralidade – a
mediação constitui-se em um procedimento informal, no qual as partes têm espaço para
dialogar e debater a fim de que juntas encontrem a melhor resposta ao seu conflito, inclusive,
tal aspecto permite que os conflitantes mais carentes possam externalizar seus sentimentos
e aflições a sua maneira; provoca, também, a reaproximação das partes – a partir de práticas
dialogadas e consensuais, trabalha-se o conflito, restaurando as relações entre as partes
e, por conseguinte, as reaproximando; e, por fim, a autonomia das decisões: as decisões
tomadas pelas partes, a quem compete a decisão, equilíbrio das relações entre as partes –
confere-se a todos os envolvidos igual oportunidade de fala e garante-se a compreensão das
ações que estão sendo desenvolvidas28.
Embora a mediação seja abordada ainda em âmbito judicial, é importante que
os legisladores tenham se preocupado com o rumo dos conflitos sociais, mas há certos
apontamentos realizados pelos juristas sobre a aproximação do direito e da mediação, e se
26 GIMENEZ, Charlise Paula Colet; SPENGLER, Fabiana Marion; BRUNET, Karina Schuch. O papel do terceiro e as interro-
gações do conflito social. Op. Cit.
27 SPENGLER, Fabiana Marion. Retalhos de Mediação. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo, 2014.
28 MORAIS, Jose Luis Bolzan de; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação e Arbitragem. Alternativas à Jurisdição! Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2012.
100
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
o instituto sendo estabelecido pela via judicial iria conseguir superar as suas expectativas e
alcançar os objetivos, tal discussão não é o objetivo do trabalho, mas destaca-se apenas para
fins de apontamento.
Desse modo, ainda que seja uma atuação dos Poderes Judiciário e Legislativo, é importante
que tenha sido tomado a iniciativa de abordá-la, e nesse âmbito aponta-se a necessidade da
mediação enquanto política pública, pois toda política pública tem por objetivo resolver um
problema social reconhecido politicamente como público, cujos reflexos causam insatisfação
social. Ou seja, a ineficácia do Poder Judiciário é reconhecida e deve ser revista para que
possa possibilitar respostas adequadas aos conflitos29.
E, para exercer a implantação da política pública, a Resolução nº 125/2010 prevê: 1) que
devem os órgãos judiciários oferecer mecanismos de soluções de controvérsias, em especial
os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação, assim como prestar
atendimento e orientação ao cidadão; 2) que se objetiva a boa qualidade dos serviços e a
disseminação da cultura de pacificação social; 3) a possibilidade de parcerias com entidades
públicas e privadas, bem como a atribuição de funções ao Conselho Nacional de Justiça e
aos Tribunais de cada estado; 4) nos artigos 13 e 14, que os Tribunais deverão criar e manter
banco de dados sobre as atividades de cada Centro Judiciário de Cidadania e Solução de
Conflitos, com as informações constantes do Portal da Conciliação30.
A Resolução nº 125/2010 do CNJ busca a construção de uma cultura jurídica que leve os
cidadãos a sentirem-se mais próximos da justiça, por meio do reconhecimento da ineficiência
da prestação jurisdicional atual e da instituição de meios complementares mais adequados às
necessidades das partes31.
E, com isso, buscam-se mudanças e transformações no relacionamento do Poder
Judiciário com a sociedade, em razão da grande insensibilidade que sentem em face
de seus problemas, dos seus direitos, da interpretação que deles o sistema faz. Ou
seja, é necessário o Poder Judiciário reconhecer a sua ineficácia na atuação em certos
conflitos sociais e, ainda, que os Tribunais se vejam como parte de uma coalização
política que leve a Democracia a sério, acima dos mercados e da concepção possessiva
e individualista de direitos32.
Portanto, ao falar em tratamento de conflitos, é importante considerar todos os pontos,
o caminho que o Poder Judiciário percorre e como a sua atividade se tornou ineficaz, em certos
conflitos sociais, exigindo então que seja repensado o modelo tradicional de tratamento de
conflitos, a fim de possibilitar que os indivíduos também repensem seu papel social33, para
que a sociedade evolua como um todo, tanto no poder que o Estado possui, quanto nos
indivíduos que compõe a sociedade.
29 GIMENEZ, Charlise Paula Colet. SPENGLER, Fabiana Marion. O Mediador na Resolução 125/2010: um estudo a par-
tir do Tribunal Múltiplas Portas. Op. Cit. p. 198.
30 GIMENEZ, Charlise Paula Colet. SPENGLER, Fabiana Marion. O Mediador na Resolução 125/2010: um estudo a partir
do Tribunal Múltiplas Portas. Op. Cit. p. 200-202.
31 GIMENEZ, Charlise Paula Colet., SPENGLER, Fabiana Marion, BRUNET, Karina Schuch. O papel do terceiro e as interro-
gações do conflito social. Op. Cit.
32 Ibidem.
33 Os caminhos da mediação podem ajudar a recuperar os sentimentos que fazem o que somos; a desfazer-nos das cama-
das superficiais para sermos muito mais íntegros nos confrontos com o outro. [...] A mediação, em uma primeira aproxi-
mação, não seria outra coisa do que a realização com o outro dos próprios sentimentos. Fazer mediação nada mais é que
viver, viver em harmonia com a própria interioridade e com os outros, viver em harmonia com a própria reserva selvagem.
((WARAT, Luis Alberto. Surfando na Pororoca: o Ofício do Mediador. Op. Cit. p. 28).
101
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4. Considerações Finais
102
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Referências
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
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BRASIL. Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015. Dispõe sobre a mediação entre particulares
como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no
âmbito da administração pública. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
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103
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alternativas à Jurisdição! Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.
SENGER, Ilise. “A mediação e a Busca da Resolução dos conflitos com base na ética da amizade:
o respeito e a consideração como fator determinante na solução de conflitos”. In: SCHORR,
Janaína; ZASSO, Izabele; SPENGLER, M. Fabiana. A Justiça Brasileira em debate: desafios
da mediação. 1. ed. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo, 2015.
SPENGLER, Fabiana Marion. (Des) caminhos do Estado e da Jurisdição. 1. ed. Santa Cruz
do Sul: Essere nel Mondo, 2017.
SPENGLER, Fabiana Marion. Retalhos de Mediação. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo,
2014.
104
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Nathalia Ribeiro
1. Introdução
1 Tecnologia disruptiva compreendida como aquela que rompe com pressupostos antigos e revoluciona a atividade.
SANTOS, Paulo; DE MARCO, Cristhian; MÖLLER, Gabriela. Tecnologia Disruptiva e Direito Disruptivo: Com-
preensão do Direito em um Cenário de Novas Tecnologias. Revista Direito e Práxis, v. 10, 2019. Disponível em:
https://www.researchgate.net/publication/337666588_Tecnologia_Disruptiva_e_Direito_Disruptivo_Compreens-
ao_do_Direito_em_um_Cenario_de_Novas_Tecnologias/link/5df0a48ea6fdcc2837178b2a/download. Acesso em 11
20jun. 2020.
105
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
para o processo, com impactos relevantes na vida dos operadores do direito e do próprio
jurisdicionado.
Por exemplo, o processo, que era físico, se tornou eletrônico (Lei nº 11.419/2006);
alguns atos processuais, que eram realizados exclusivamente de forma presencial, passaram
a ser admitidos mediante o uso de ferramentas tecnológicas2; a internet se tornou uma
ferramenta oficial de divulgação de informações processuais3.
Porém, nada obstante a implementação de tantas inovações, o Poder Judiciário continua
completamente assoberbado, tendo encerrado o ano de 2018 com 78,7 milhões de processos
em tramitação4, figurando como exemplo mundial de ineficiência e congestionamento5, em
posição pior do que outros países subdesenvolvidos, como é o caso da Índia (que possui
cerca de trinta milhões de processos em curso).
Ao que parece, o uso de ferramentas tecnológicas dentro do perímetro do Poder
Judiciário, por si só, não está sendo suficiente para resolver a crise da litigância, o
que justifica a aplicação da tecnologia em outras esferas, especialmente nos métodos
alternativos de solução de conflitos, que podem prevenir o ingresso de novas ações no
Judiciário.
Embora as formas tradicionais de conciliação/mediação estejam ganhando espaço,
ainda encontram algumas dificuldades operacionais, como, por exemplo, o deslocamento e
o tempo dispendido no procedimento, que, eventualmente, podem ser minimizados com o
uso de aplicações tecnológicas (plataformas online de resolução de conflitos), maximizando
seus índices de sucesso.
E mais, a Online Dispute Resolution6 (ODR) – considerada como ferramenta online
que utiliza a inteligência artificial (“quarta parte”7) para conduzir as negociações8 – tem
o potencial de transformar a visão do jurisdicionado sobre a resolução de conflitos,
viabilizando soluções céleres e desburocratizadas, especialmente para litígios de baixa
complexidade.
2 Como, por exemplo, o depoimento pessoal, a oitiva de testemunha, a acareação e a sustentação oral, que passaram a ser
admitidas por videoconferência (arts. 236, §3º, 385, §3º, 453, §1º, 461, §2º, 937, §4º, do CPC/15). Além disso, vale desta-
car a implementação de plenário virtual no Supremo Tribunal Federal desde 2007.
3 Por exemplo, artigos 12, § 1º; 197, caput; 755, § 3º, do CPC/15.
4 “O Poder Judiciário finalizou o ano de 2018 com 78,7 milhões de processos em tramitação, aguardando alguma solução
definitiva.” Relatório “Justiça em Números 2019””, do CNJ. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/up-
loads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf. Acesso em: 11 jun. 2020. p. 79.
5 Informações veiculadas pelo Professor Richard Susskind na palestra “Online Courts and the Future of Justice”. Disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=QOS4LRf-zes&feature=youtu.be. Acesso em: 24 abr.20 2020.
6 Em português: resolução online de litígios.
7 Esse termo “fourth part” foi empregado originalmente por Ethan Katsh e Janet Rifin (KATSH, Ethan; RIFKIN, Janet. Online
Dispute Resolution: resolving conflicts in cyberspace. San Francisco: Jossey-Bass, 2001, p 5.)
8 A tecnologia é considerada a “quarta parte”, sendo, portanto, um elemento a mais, além das partes e da possibilidade do
terceiro neutro. ARBIX, Daniel. Resolução Online de Controvérsias. São Paulo: Intelecto, 2017. p. 215.
106
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
9 ADR corresponde à expressão “Alternative Dispute Resolution”, que, no Brasil, alguns autores traduzem para a língua
portuguesa como MASCs (Meios Alternativos de Solução de Conflitos). Para Menkel-Meadow (1997), a expressão mais apro-
priada para denominar esse tipo de solução seria a expressão Adequate Dispute Resolution (Meios adequados de resolução
de disputas), pois “one role of legal system is to provide a variety of choices about how best to handle particular issues,
problems, disputes, conflits, and transactions – now called a menu, a multi-door corthouse” (MENKEL-MEADOW, Carrie J. Do
the haves come out ahead in alternative judicial systems? Repeat players in ADR. Ohio State Journal on Dispute
Resolution, v. 15, 1999. p. 19-61).
10 “A noção de justiça adequada ganha efetivo realce nas soluções consensuais, alcançadas por meio de conciliação, transa-
ção ou mediação, pois ninguém melhor do que as partes envolvidas no conflito para decidi- rem o melhor deslinde da lide.
Os desgastes de um longo e penoso litigio judicial acirra, ainda mais, a animosidade certamente já existente entre os envol-
vidos e, na grande maioria das vezes, a decisão nele proferida, embora encerre formalmente a lide, nem sempre é capaz de
apaziguar a desavença dos litigantes no plano dos fatos”. SILVA, Jaqueline Mielke; XAVER, José Tadeu Neves. “Primeiras refle-
xões sobre o sistema de justiça multiportas e a tutela dos direitos coletivos.”. In: MACEDO, Harzheim Elaine. DAMASCENO,
Marina. (Orgs.) Sistema multiportas e métodos integrados de resolução de conflitos. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2018.
p. 69. Disponível em: http://pos.unipar.br/files/publicao_academica/c31605fefad050d121a51d63a564c9a8.pdf. Acesso
em: 28.09.19 set. 2019.
11 O conceito do sistema multiportas foi apresentado por Frank Sander em sua palestra de abertura da Pound Conference,
no ano de 1976, em Saint Paul, Minessotta, conforme explica o próprio Frank Sander em: “Diálogos entre os professores
Frank Sander e Mariana Hernandez Crespo: explorando a evolução do Tribunal Multiportas, in”. In: CRESPO, Maria Hernan-
dez. (Org.) Investindo no capital social para maximizar o sistema de solução de conflitos no Brasil. Rio de Janeiro:
FGV Editora, 2012. p. 31.
12 “A Justiça Multiportas pressupõe, nesse e em outros casos, que além do caminho judicial e da autotutela (quando permi-
tida) outros mecanismos também se mostram viáveis e disponíveis para a resolução de litígios inclusive sendo mais adequa-
dos em muitos casos. Assim, as formas autocompositivas também são hábeis a resguardar acesso à justiça e distribuição
do direito, podendo ser realizadas tanto com o auxílio de um terceiro imparcial – conciliador ou mediador – para a condução
das atividades, dando lugar às assim consideradas vias assistidas autocompositivas (conciliação e mediação), ou conduzidas
autonomamente pelas partes e seus auxiliares para o alcance de uma deliberação comum (negociação).” (SCARPARO, Eduar-
do. “Negociando estrategicamente em litígios cíveis.”. In: MACEDO, Harzheim Elaine. DAMASCENO, Marina. (Orgs.) Sistema
multiportas e métodos integrados de resolução de conflitos. Op. Cit.
13 Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/atos-normativos?documento=156. Acesso em: 11 jun.20 2020.
14 “Assim, percebe-se que um dos pontos de destaque do artigo 1º da Resolução 125/CNJ consiste, justamente, na obri-
gatoriedade de o Poder Judiciário, além da solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de solução
de controvérsia, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a conciliação”. MARCATO, Ana Cândida
Menezes. “A audiência do art. 344 do Código de Processo Civil. in”. In: ZANETI JR., Hermes; CABRAL, Trícia Navarro Xavier
(Coords.); DIDIER JR., Fredie. (Coord. Geral). Justiça multiportas: mediação, conciliação, arbitragem e outros meios
de solução adequada de conflitos. Salvador: Juspodivm, 2017. p. 131.
107
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
15 CABRAL, Trícia Navarro Xavier. “O poder de autorregramento da vontade no contexto da mediação e da conciliação.”. In:
PORTO, José Roberto Sotero de Mello. RODRIGUES, Roberto de Aragão Ribeiro (Coord.). Direito Processual Contemporâ-
neo: estudos em homenagem a Humberto Dalla Bernardina de Pinho. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2018. p. 549.
16 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. MAZZOLA, Marcelo. Manual de Mediação e Arbitragem. São Paulo: Saraiva
Educação, 2019, p. 45-47.
17 Ibidem. p. 47-48.
18 CABRAL, Trícia Navarro Xavier. “O poder de autorregramento da vontade no contexto da mediação e da conciliação.”. Op.
Cit. p. 550.
19 “A verdadeira justiça só se alcança quando os casos ‘se solucionam’ mediante consenso. Não se alcança a paz resolvendo
só parcela do problema (controvérsia); o que se busca é a pacificação social do conflito com a solução de todas as questões
que envolvam o relacionamento entre os interessados. Com a implementação de um modelo mediacional, complementar e
consensual de solução dos conflitos, o Estado estará mais próximo da pacificação social e da harmonia entra as pessoas.”.
BACELLAR, Roberto Portugal. “O Poder Judiciário e o Paradigma da Guerra na Solução dos Conflitos.”. In: RICHA, Morgana de
Almeida. PELUSO, Antonio Cezar (Coords.). Conciliação e Mediação: estruturação da política judiciária nacional. Rio
de Janeiro: Forense, 2011, pp. 32-33.
20 “Os meios de resolução de conflitos, além de estarem em consonância com os princípios da eficiência e da proporciona-
lidade, representam um importante meio de abreviação de disputas e economia de recursos, existem que que a atuação do
Estado se realize da forma menos onerosa para os cofres públicos e que acarrete menos transtornos ou sacrifício de inte-
resses legítimos dos particulares.””. MENDES, Viviane Alfradique Martins de Figueiredo. “Mecanismos de consenso no direito
administrativo e sua contribuição para a desjudicialização da política pública.”. In: PINHO, Humberto Dalla Bernardina de.
RODRIGUES, Roberto de Aragão Ribeiro. Mediação e Arbitragem na Administração Pública. Curitiba: CRV, 2018. p. 221.
108
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
21 Na década de 1970 foram introduzidas a mediação e em menor escala a arbitragem como formas de resolver os conflitos
fugindo dos tribunais. KATSH, Ethan; RABINOVICH-EINY, Orna. Access to Digital Justice: Technology and the Internet
of Disputes, 2017. p. 39-54.
22 Esse termo “fourth part” foi empregado originalmente por Ethan Katsh e Janet Rifin (KATSH, Ethan; RIFKIN, Janet. Online
Dispute Resolution: resolving conflicts in cyberspace. San Francisco: Jossey-Bass, 2001. p 5.).).
23 A tecnologia é considerada a “quarta parte”, sendo, portanto, um elemento a mais, além das partes e da possibilidade do
terceiro neutro (ARBIX, Daniel. Resolução Online de Controvérsias. São Paulo: Editora Intelecto, 2017. p. 215)).
24 “Some commentators have defined ODR exclusively as the use of ADR assisted principally with ICT tools, although part
of the doctrine incorporates a broader approach including online litigation and other sui generis forms of dispute resolution
when they are assisted largely by ICT tools designed ad hoc. 11 The latter definition seems more appropriate as it incorpo-
rates all methods used to resolve disputes that are conducted on the internet through a tailored online platform. Moreover,
this approach is more consistent with the fact that ODR term was created out of the conceptual distinction with offline
dispute resolution processes.” (CORTÉS, Pablo. Online Dispute Resolution for consumers in the European union.
Routledge: Abingdon, 2011. p. 54)).
25 “Katsh e Rifkin (2001) denominam a tecnologia no ODR de “quarta parte”, afirmando que esta passa a interagir com as
partes envolvidas no conflito e o terceiro imparcial (quando presente). As ferramentas tecnológicas melhorariam o processo
de solução do conflito e agiriam de forma mais decisiva do que simplesmente transferindo a informação por meio da Inter-
net. Comportar-se-iam como uma verdadeira aliada da terceira parte (árbitro, mediador ou conciliador). A tecnologia escolhi-
da garantiria grande leque de utilidades aptas a facilitar e aprimorar o processo da ODR, como, por exemplo, 5 apresentando
e organizando informações, de maneira graficamente amigável ao usuário.” (LIMA, Gabriela Vasconcelos; FEITOSA, Gustavo
Raposo Pereira. Online dispute resolution (ODR): a solução de conflitos e as novas tecnologias. Revista do Direito,
Santa Cruz do Sul, v. 3, n. 50, p. 53-70, set. 2016. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/direito/article/
view/8360 .Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/direito/article/view/8360. Acesso em: 27 set. 182018.)
109
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
programação dos algoritmos, como também do big data26, que fornece as informações
necessárias para que a inteligência artificial possa compreender as disputas, verificar a
pertinência e os limites das propostas, a fim de permitir a solução consensual do conflito.
Nesse contexto, a ODR garante a presença da inteligência artificial, que tem o condão de
negociar com as partes, tratando as propostas, à luz dos dados armazenados na plataforma
para aquela modalidade de disputa, viabilizando a solução consensual da controvérsia online,
de forma mais rápida, com menor custo, sem a necessidade de um representante e sem
os desgastes inerentes ao litígio judicial, dando concretude ao acesso à justiça, de forma
eficiente e adequada.
26 “Big Data é o termo empregado para designar um conjunto de dados tão grande e complexo, capaz de reunir e processar
uma quantidade de informações que leva a acreditar que estamos diante da totalidade do que se tem disponível acerca de
determinado tema. Tal conceito funda-se sobre aquilo que se convencionou chamar `5 Vs`: os aspectos velocidade, volume
e variedade, articulados com os fatores veracidade e valor.”(.” (TRINDADE, André Karam; ROSA, Alexandre Morais da. O Big
Data e a lógica da performance quantitativa no Poder Judiciário. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2015-
set-05/diario-classe-big-data-logica-performance-quantitativa-poder-judiciario. Acesso em: 28 set.19) 2019.)
27 E-Bay. Disponível em: www.ebay.com. Acesso em: 25 set.18 2018.
110
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Resolution Center), que possui fases não cumulativas, visando que o conflito seja encerrado
em um dos “degraus” propostos. Esse sistema conta com pouquíssima intervenção humana
e gerencia mais de 60 milhões de conflitos por ano, com 90% de sucesso28.
Sob outro prisma, vale destacar a plataforma europeia de resolução de litígios online,
que se dedica a resolver conflitos decorrentes de compras e vendas online nos países da
União Europeia.
Como já destacado, o avanço da tecnologia modificou o perfil das relações comerciais
e, atualmente, a maior parte dos consumidores da União Europeia (57%) faz compras online,
sendo certo que 33% adquire produtos de outros países do bloco, resultando em uma média
de 21% de relações que desaguam em conflitos.
Essa plataforma atualmente atende 31 países e está disponível em 25 idiomas. Apenas
nos 2 primeiros anos de funcionamento da ferramenta foram mais de 4 milhões visitas, que
resultaram no registro de mais de 50 mil queixas, totalizando uma média de 2 mil queixas
por mês, número que aumenta sobremaneira na época de natal.
A sistemática é a seguinte: a partir do momento em que o consumidor registra a
reclamação, a plataforma notifica o fornecedor e as partes podem iniciar o diálogo, com a
possibilidade de troca de arquivos e realização de reunião online. As partes têm o prazo
de 90 (noventa) dias para firmar o acordo, mas podem abandonar o procedimento a
qualquer tempo.
Caso as partes não consigam chegar a um acordo no prazo acima ou prefiram a
participação de um terceiro na negociação, a plataforma oferece às partes a opção de recorrer
a uma entidade de resolução de litígios, inaugurando prazo de 30 (trinta) dias para formular
o acordo, sob pena de extinção do procedimento na plataforma29.
Além das plataformas online de resolução de conflitos mencionadas, vale destacar
o Tribunal de Resolução Civil de British Columbia30, que é uma corte online (tribunal
administrativo) com procedimento mais complexo, que vale ser examinado.
Esse Tribunal online possui jurisdição31 para julgar conflitos referentes a acidentes
com veículos automotores envolvendo valores até $50.000,00 (cinquenta mil dólares);
disputas relativas a imóveis (questões entre proprietários, inquilinos, etc.); pequenas causas
envolvendo compra e venda de produtos ou serviços; empréstimos e débitos; construções
28 WERNECK, Isadora. “Online Dispute Resolution (ODR) e a (Des)Necessidade de formulação de reclamação prévia.”. In:
NUNES, Dierle; LUCON, Paulo Henrique dos Santos; WOLKART, Erik Navarro (Coords.). Inteligência artificial e direito pro-
cessual. Salvador: Juspodivm, 2020. p. 111-112.
29 Disponível em: https://ec.europa.eu/consumers/odr/main/?event=main.home.howitworks. Acesso em: 11 jun.20 2020.
30 SALTER, Shannon; THOMPSON, Darin. Public-Centred Civil Justice Redesign: A Case Study of the British Columbia Civil
Resolution Tribunal, 2017. Disponível em: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2955796. Acesso em: 01
mai. 192019.
31 “On July 13, 2016, the CRT began accepting condominium disputes. About a year later, on June 1, 2017, the CRT assumed
jurisdiction of small claims disputes $5,000 and under. The monetary threshold for claims within the CRT’s jurisdiction will
slowly increase, by regulation, until the CRT becomes the mandatory forum in British Columbia for claims under $25,000.
Consistent with the CRT’s public-focused approach, the next phases of the technology development, namely expanding the
case management system and the CRT’s communication tools, will be informed by feedback from the CRT’s early partici-
pants. In fact, in the first forty-eight hours after beginning to accept claims, the CRT made agile and transparent changes to
the CRT’s website, processes, rules, and intake form in response to feedback from participants. Continuous improvement
is a core value for the CRT, and this improvement involves consulting with the public, testing processes with stakeholders,
listening closely, incorporating feedback, and then doing all of this again and again.” (SalterSALTER, Shannon. ONLINE DIS-
PUTE RESOLUTION AND JUSTICE SYSTEM INTEGRATION: BRITISH COLUMBIA’S CIVIL RESOLUTION TRIBUNAL.Online Dispute
Resolution and Justice System Integration: British Columbia’s Civil Resolution Tribunal. Windsor Yearbook of Ac-
cess to Justice/Recueil annuel de Windsor d’accès à la justice, 34 (1), p. 112–129. Disponível em: https://www.erudit.org/
en/journals/wyaj/2017-v34-n1-wyaj03386/1043018ar.pdf. Acesso em: 27 set.19 2019.)
111
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
112
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
analisa a competência e, caso não seja competente, o conflito será remetido ao tribunal
membro com competência para dirimir a disputa.
Se a corte online for competente é iniciada a segunda fase, denominada de negociação,
em que as partes têm a oportunidade de resolver o caso diretamente, com pouca interferência
do tribunal e baixo custo.
Assim, os interessados podem se comunicar pelo meio que considerarem mais
adequado (telefone, correspondências ou meio eletrônico), sendo certo que os contatos são
monitorados pelo tribunal, a fim de identificar eventuais abusos ou assédio, únicas hipóteses
em que se verifica a sua intervenção direta.
Importante ter em mente que essa fase não resolve a maior parte dos conflitos, mas
serve para empoderar as partes com opções de resolver a disputa.
Na sequência, inicia-se a terceira fase do procedimento: a facilitação. Essa etapa busca
a resolução consensual e flexível de disputa, mediante a participação dos facilitadores
(funcionários do tribunal com experiência em resolução de conflitos). A função do facilitador
é afastar as barreiras de acesso à justiça, prestando todos os esclarecimentos às partes e
ajudando a chegar a uma solução customizada do conflito.
A rigor, a primeira medida adotada pelo facilitador é se certificar que as partes
compreenderam o conflito, esclarecer eventuais questões duvidosas, além de solicitar mais
informações ou provas às partes. Em seguida, o facilitador revisa a disputa e busca formas
de facilitar a resolução via acordo, podendo sugerir soluções neutras ou apontar a forma que
o tribunal tem a tendência de decidir esse tipo de caso.
Se as partes chegarem a um acordo, o facilitador auxilia na sua redação e pode submeter
à chancela de um membro do tribunal, para que se torne um título judicial exequível. Em caso
de não ser possível o acordo, o facilitador assume a função de gestor do caso e prepara as
partes para a fase de adjudicação, explicando o procedimento dali em diante, além de revisar
os pedidos pendentes, identificar fatos e provas relevantes e preparar os argumentos para a
última fase: a adjudicação.
A última etapa tem o propósito de alcançar uma solução final para o conflito que será
imposta às partes. Trata-se de processo adversarial, em que as partes apresentam seus
pedidos e argumentos. Com relação às provas, o especialista poderá determinar a produção
de outras provas, a fim de garantir a justiça da decisão para partes autorrepresentadas. Ao
final, a decisão é enviada por e-mail e essa ordem tem força de título executivo.
Trata-se, portanto, de modelo com ênfase nas necessidades, interesses e limitações do
jurisdicionado, para quem a justiça deve servir. O uso da abordagem adequada, com o dispêndio
dos esforços necessários para a solução do caso concreto, enseja um processo colaborativo,
com gestão processual e, quando necessário, um processo adversarial adjudicatório. Tudo
isso com o uso da tecnologia para aproximar as partes e facilitar a comunicação.
Apenas para que se possa ter uma ideia de sua eficiência, até o mês de maio/202035
foram submetidas 16.820 disputas, sendo 15.162 resolvidas, 1.658 pendentes, além de 418
novos casos recebidos naquele mês.
Em suma, a resolução online de conflitos por intermédio de plataformas ou tribunais é
113
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
uma realidade mundial, que viabiliza a solução adequada para conflitos menos complexos,
melhorando não apenas a eficiência e a efetividade, como o próprio acesso à justiça.
36 Acordo Fechado, Acordo Legal, Adam, ConciliaBr, Concilie já, Concilie online, D`Acordo, EConciliador, ITKOS, JUSPRO,
Justto, Leegol, Mediar 360, Mediar Tech, Melhor Acordo, MOL, Quero Reclamar, Sem processo, Vamos Conciliar. (JUNQUILHO,
Tainá Aguiar. “Resolução On-line de Conflitos.”. In: Inteligência artificial e direito processual. NUNES, Dierle; LUCON,
Paulo Henrique dos Santos; WOLKART, Erik Navarro (Coord.). Salvador: Juspodivm, 2020. p. 192-193.).
37 Todas as informações foram colhidas no site oficial da plataforma. Disponível em: https://www.consumidor.gov.br/pa-
ges/principal/?1569680425180. Acesso em: 27 set. 2019.
114
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4. Conclusão
115
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
plataformas de Online Dispute Resolution (ODR) – em que se identifica a quarta parte – têm
tudo para revolucionar os métodos consensuais de resolução de conflitos, pois o big data
poderá auxiliar no balizamento de acordos e tratamento das informações nos contatos
mantidos entre as partes, aumentando as chances de êxito.
Portanto, forçoso reconhecer que a revolução digital alcançou o universo jurídico e veio
para ficar, assumindo a missão de trazer eficiência e efetividade para a resolução de conflitos,
inclusive em âmbito extrajudicial.
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118
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
A ANULAÇÃO DE MEDIAÇÃO
HOMOLOGADA EM JUÍZO EM RAZÃO
DE ATOS PRATICADOS POR
FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS
1. Introdução
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1 Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 31.
2 Foi utilizada a palavra pressuposto por considerada mais técnica. Antônio Junqueira de Azevedo (Op. Cit. p. 29), utiliza a
palavra elemento relacionado com existência. À validade relaciona requisitos, e à eficácia fatores.
3 Antônio Junqueira de Azevedo fala em elementos gerais do negócio jurídico - intrínsecos (forma, objeto, circunstâncias
negociais) e extrínsecos (agente, lugar e tempo). Op. cit. pp. 31-33.
4 Op. cit. p. 40. No mesmo sentido, Pontes de Miranda defende que a validade “só diz respeito aos negócios jurídicos e aos
atos jurídicos stricto sensu” (Tratado de Direito Privado. Tomo IV. 4 ed. p. 4).
5 Id. p. 41.
6 Op. cit. pp. 6-7.
120
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
7 Especificamente sobre a participação de servidores, vide nosso artigo “Responsabilidade dos servidores e empregados
públicos que participam de mediações”, publicado no recente livro Mediação e Arbitragem (PINHO, Humberto Dalla Ber-
nardina de. RODRIGUES, Roberto de Aragão Ribeiro (Coords.). v. II. Santa Cruz do Sul: Essere nel Mondo, 2020.).
121
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,
imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto,
na regra de competência;
II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva
permanecer em segredo;
IV - negar publicidade aos atos oficiais;
V - frustrar a licitude de concurso público;
VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;
VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva
divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de
mercadoria, bem ou serviço.
VIII - descumprir as normas relativas à celebração, fiscalização e aprovação de contas de
parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas.
IX - deixar de cumprir a exigência de requisitos de acessibilidade previstos na legislação.
X - transferir recurso a entidade privada, em razão da prestação de serviços na área de
saúde sem a prévia celebração de contrato, convênio ou instrumento congênere, nos
termos do parágrafo único do art. 24 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990.
A Lei 13.140/15 preocupou-se em tratar da responsabilidade do servidor que participa
da mediação. O artigo 40 expressamente protege os funcionários públicos que participarem
do processo de composição extrajudicial do conflito:
Humberto Dalla e Marcelo Mazzola anotam que para “blindar esses servidores, no
exercício de suas atribuições, eles somente poderão ser responsabilizados civil, administrativa
8 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim e outros (Coords.). Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 3 ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. p. 631.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
9 DALLA, Humberto. MAZZOLA, Marcelo. Manual de Mediação e Arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 180.
10 Op. cit. p. 181.
123
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
EMENTA.
“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. SOCIETÁRIO. AÇÃO DE EXECUÇÃO ESPECÍFICA
DE CLÁUSULA ARBITRAL (LEI 9.307/96). ACORDO DE ACIONISTAS. PREVISÃO DE
SOLUÇÃO ALTERNATIVA DE CONFLITOS: RESOLUÇÃO POR MEDIAÇÃO OU ARBITRAGEM.
COMPATIBILIDADE. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA (VAZIA). EXISTÊNCIA. FORÇA
VINCULANTE. VALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.
1. O convívio harmônico dos juízos arbitrais com os órgãos do Judiciário constitui ponto
fundamental ao prestígio da arbitragem.
Na escala de apoio do Judiciário à arbitragem, ressai como aspecto essencial o da
execução específica da cláusula compromissória, sem a qual a convenção de arbitragem
quedaria inócua.
2. Não se pode ter como condição de existência da cláusula compromissória que a
arbitragem seja a única via de resolução admitida pelas partes, para todos os litígios e
em relação a todas as matérias.
3. É válida, assim, a cláusula compromissória constante de acordo que excepcione ou
reserve certas situações especiais a serem submetidas ao Judiciário, mormente quando
124
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Cabe, então, a análise de se uma mediação homologada judicialmente pode ser objeto
de uma ação anulatória se o servidor ou empregado público que dela tenha participado agir
por dolo ou fraude.
O dolo é tratado nos diversos ramos do direito.
A legislação civil trata inicialmente do dolo no artigo 145 do Código Civil quando prevê
que “são os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa”. E os artigos
seguintes são dedicados a eventuais consequências de uma anulação de negócio jurídico
viciado pelo dolo. O Código revogado também trazia disposições no mesmo sentido (a partir
do artigo 92).
Mas é importante referir em que plano do direito civil encontra-se o dolo, para melhor
compreendê-lo. Encontra-se no segundo plano, da validade, já referido.
Pontes de Miranda situa o dolo como uma causa de anulabilidade dos atos jurídicos.
Ou seja, o ato doloso existe e a falha está em um momento posterior. Nas suas palavras,
dolo, “causa de não-validade dos atos jurídicos, é o ato, positivo, ou negativo, com que,
conscientemente, se induz, se mantém, ou se confirma outrem em representação erronêa”11.
Em sentido amplo, a doutrina o conceitua como a conduta astuciosa que induz alguém
à prática de um negócio jurídico, viciando a manifestação de vontade que só se consuma se
a enganação existir. O dolo objetiva prejudicar a outra parte do negócio jurídico.
Segundo José Delgado e Luiz Manoel Gomes Júnior, o “dolo pode resultar tanto de ações
comissivas quanto de omissivas. O que importa, em qualquer dessas modalidades de agir, é
que a conduta seja astuciosa, viciada pelo artifício, pelo estratagema ou ardil.”12.
A consciência do prejuízo não é exigida, apesar de quase sempre quem procede com
dolo saber que a outra pessoa foi ou pode vir a ser prejudicada.
E o dolo, embora não seja a regra, pode ocorrer também por omissão, quando houver
o aproveitamento do erro de outrem, desde que haja o dever de falar ou de esclarecer. Aliás,
no ponto, vale anotar as espécies de dolo, segundo classificação do Código Civil:
a) dolo acidental – artigo 146;
b) dolo provocado por omissão – artigo 147;
c) dolo de terceiro – artigo 148;
d) dolo do representante legal – artigo 149;
125
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Ementa.
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
“PREFEITO DE CAMPINÁPOLIS/MT. ALEGAÇÃO DE PROMOÇÃO PESSOAL INDEVIDA EM
JORNAL LOCAL (FOLHA DO ARAGUAIA). ART. 11 DA LEI 8.429/92. ELEMENTO SUBJETIVO
(DOLO) NÃO CONFIGURADO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A Lei da Improbidade
Administrativa (Lei 8.429/92) objetiva punir os praticantes de atos dolosos ou de
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
má-fé no trato da coisa pública, assim tipificando o enriquecimento ilícito (art. 9o.),
o prejuízo ao erário (art. 10) e a violação a princípios da Administração Pública (art.
11); a modalidade culposa é prevista apenas para a hipótese de prejuízo ao erário (art.
10). 2. Não se tolera, porém, que a conduta culposa dê ensejo à responsabilização do
Servidor por improbidade administrativa; a negligência, a imprudência ou a imperícia,
embora possam ser consideradas condutas irregulares e, portanto, passíveis de sanção,
não são suficientes para ensejar a punição por improbidade; ademais, causa lesão à
razoabilidade jurídica o sancionar-se com a mesma e idêntica reprimenda demissória a
conduta ímproba dolosa e a culposa (art. 10 da Lei 8.429/92), como se fossem igualmente
reprováveis, eis que objetivamente não o são. 3. O ato ilegal só adquire os contornos
de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da
Administração Pública coadjuvada pela má-intenção do administrador, caracterizando a
conduta dolosa; a aplicação das severas sanções previstas na Lei 8.429/92 é aceitável,
e mesmo recomendável, para a punição do administrador desonesto (conduta dolosa)
e não daquele que apenas foi inábil (conduta culposa). 4. No presente caso, a conduta
imputada ao recorrente (e destacado na Sentença e no Acórdão condenatórios) consiste
na suposta realização de promoção pessoal indevida nos meses de agosto e setembro
de 2003, quando, em Jornal Local (Folha do Araguaia), houve publicação de matéria
jornalística que apresentava a imagem do recorrente e trechos do periódico que
afirmavam o seguinte: A Administração do prefeito Joaquim Matias Valadão saiu na frente
e já deu inicio às obras; (...); O Bananeira está de parabéns por ter conseguido incluir
Campinápolis dentro do programa de construção de casas populares do Governo Blairo, já
no primeiro ano. Não podemos esquecer e sempre devemos lembrar: ele (prefeito) corre
atrás das coisas; Joaquim Bananeira, o político do Vale do Araguaia. 5. Insta salientar,
ainda, que a primeira passagem do periódico que foi apontado na Sentença possui
caráter informativo acerca das ações governamentais, enquanto a segunda alude a um
comentário feito por um morador do próprio Município de Campinópolis/MT, sendo o
terceiro insuficiente para a configuração de ato de improbidade. 6. Ademais, não houve
associação à conduta do recorrente do elemento subjetivo doloso, qual seja, o propósito
desonesto, não havendo que se falar, portanto, em cometimento de ato de improbidade
administrativa tipificado no art. 11 da Lei 8.429/92. Precedentes: REsp. 939.142/RJ, Rel.
Min. FRANCISCO FALCÃO, Rel. p/ Acórdão Min. LUIZ FUX, DJe 10.04.2008; AgRg no REsp.
1.260.963/PR, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 14.05.2012. 7. Recurso Especial
provido, para absolver o recorrente da conduta ímproba que lhe é imputada, a despeito
do parecer Ministerial oficiar pelo seu desprovimento. (STJ – RESP 1186192/MT. Relator
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Primeira Turma. DJ de 02/12/2013).
EMENTA.
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. IRREGULARIDADE
EM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. ATO QUE ATENTA CONTRA OS PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO GENÉRICO COMPROVADO. 1.
Na hipótese dos autos, não há falar em reexame do contexto fático-probatório, pois
a quaestio iuris requer apenas a revaloração de fatos incontroversos já delineados
nos autos e das provas devidamente colhidas ao longo de toda a instrução probatória,
bem como a discussão, meramente jurídica, acerca da interpretação a ser dada
sobre os fundamentos apontados pelas instâncias de origem. 2. In casu, nota-se que
efetivamente houve dolo, ao menos genérico, no sentido de frustrar procedimento
licitatório, valendo destacar fundamento e constatação do Juízo singular a respeito da
controvérsia: “(...) Conclui-se, deste modo, que, na verdade quem realizou memorial
descritivo, orçamento quantitativo, memorial de cálculo e cronograma físico financeiro
da ampliação do centro de idoso foi Solismar Costa, o qual possuía impedimento legal
para tanto, por ser servidor público. Impende destacar ainda, que restou demonstrado
nos autos o conluio entre as empresas requeridas para direcionar a licitação, eis que
referido procedimento licitatório foi deflagrado apenas com um projeto arquitetônico
incompleto e desacompanhado dos demais projetos fundamentais, não só para a
execução da obra, como também para oferta de preços pelas empresas requeridas.
Nesse sentido é a prova pericial produzida: ‘O projeto apresentado pelo poder público
a fim de basear a composição dos valores da licitação estava incompleto e omisso quanto
aos materiais e serviços a serem executados’ (fls. 1665). ‘Pode-se observar no item
127
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4.4 e seus subitens deste laudo que tais projetos são necessários para um levantamento
quantitativo e de valores, pois são os projetos que detalharão e pré-dimensionarão todas
as instalações a serem executadas”. (fls. 1667, quesito 04)’. Corrobora, ainda, com o
acima, a prova oral, na medida que o depoimento pessoal do réu Elber Fabiano Turra,
confirma a necessidade dos projetos para a proposta objetiva de preços na licitação:
‘ELBER FABIANO TURRA, engenheiro que assinou os projetos, em seu depoimento
pessoal, afirmou que na opinião do depoente, na qualidade de engenheiro civil,
entende ser possível a elaboração de proposta de valores da obra, mesmo sem o projeto
arquitetônico estar completo, entretanto será realizado por estimativa, sendo que a
fiscalização desta fica complicada em razão da ausência de especificidades’. Portanto,
se as propostas, ainda que possível de serem realizadas por estimativa, é certo que as
empresas requeridas não poderiam, sem prévio conluio, estimar valores tão próximos
quanto os das propostas apresentadas, com variações mínimas de centenas de reais,
entre umas e outras, considerando que o valor do objeto da licitação era considerável
(+78.000,00). Ademais, as empresas requeridas apresentaram as propostas de preços
confeccionadas de comum acordo, eis que todas foram redigidas com a mesma
estrutura de texto, ou seja, mesmas palavras, frases, parágrafos, definições de letras
em maiúsculas e minúsculas, além da mesma representação dos números arábicos e por
extenso, indicando que foram escritas por uma única pessoa, conforme documentos de
fls. 57, 68 e 74. (...)” 3. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, nos autos do
REsp 951.389/SC, firmou jurisprudência no sentido de que, para a configuração do
ato de improbidade que atenta contra os princípio da Administração Pública (Art. 11 da
LIA), faz-se necessária a análise do elemento volitivo, consubstanciado pelo dolo, ao
menos genérico, de agir no intuito de infringir os princípios regentes da Administração
Pública. 4. Dessarte, verificada a presença de dolo genérico no caso dos autos, mister
sejam restabelecidas as sanções impostas em sentença aos recorridos Solismar Costa e
Tânia Mara Gnoatto & Cia. LTDA. 5. Recurso Especial parcialmente provido. (STJ – RESP
1708170/PR. Rel. Min. Herman Benjamin. Segunda Turma. DJ de 12/03/2019)
Todavia, de se lembrar que o artigo 28 da LINDB (incluído pela Lei 13.655/2018) prevê
a punição do agente público em caso de dolo e, também, de erro grosseiro.
Sobre a fraude, a legislação civil trata mais especificamente da fraude contra credores,
que é também uma causa de anulabilidade do negócio jurídico, consoante o disposto no
artigo 158 do Código Civil.
Conforme a doutrina civilista, ela não é um vício de vontade propriamente dito, mas o
vício que a caracteriza é social, pois o negócio é celebrado de encontro aos interesses dos
credores (que não participam do ato negocial).
Já no direito penal, a fraude em geral é tratada dentro do tipo do estelionato, que tem
justamente na fraude a sua característica primordial. Damásio de Jesus a define como o
“engodo empregado pelo sujeito para induzir ou manter a vítima em erro, com o fim de obter
um indevido proveito patrimonial”16.
Importante destacar que a vítima é levada a erro por quem se utiliza de meio fraudulento.
Na verdade ela pode, além de ser levada a erro, ser mantida em erro.
E a doutrina alinha-se no sentido de que o resultado deve ser duplo: obtenção de
vantagem ilícita e prejuízo alheio.
Ou seja, o sujeito que obtém a vantagem ilícita deve causar um prejuízo a terceiro, seja
induzindo a erro ou mantendo em erro a vítima. O prejuízo deve ser efetivo e não apenas
potencial.
Então, pode-se sintetizar que são essenciais que se façam presentes para a caracterização
da fraude: prejuízo efetivo e vantagem ilícita.
16 JESUS, Damásio E. de. Direito penal. v. I. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 374.
128
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Configurados dolo ou fraude, na linha do que acima anotado, o funcionário público que
participou da mediação será responsabilizado. Trata-se de uma garantia para quem participa –
só será punido nessas hipóteses previstas na legislação – e, ao mesmo tempo, para o Estado.
Mas, ocorrendo dolo ou fraude, o empregado ou o servidor será responsabilizado civil,
administrativa e até criminalmente.
E, havendo essa responsabilização, constatada a ocorrência de um dos elementos –
dolo ou fraude – o ato em si tornar-se-á viciado (plano da validade). A mediação, assim,
deverá ser anulada por consequência, nos termos da lei civil – vício de vontade ou social que
torna o ato nulo.
Homologada judicialmente, a nulidade não será reconhecida de plano, mas dependerá
de manifestação judicial.
Mesmo que facilitado pelo já constatado dolo/fraude que ensejou a responsabilização
do servidor ou empregado público, deverá ser ajuizada ação de anulação (e não rescisória)
nos termos do parágrafo 4º, do artigo 966, do Código de Processo Civil, já que as nulidades
em processo dependem sempre de decretação judicial.
5. Conclusão
A mediação, enquanto método consensual de resolução de conflitos, tem sido cada vez
mais estimulada. A atual legislação processual a adota, inclusive, como diretriz. E a legislação
específica a regulamenta de forma detalhada.
A Administração Pública pode participar e promover mediações, nos termos da lei.
Os princípios da isonomia, moralidade, etc., devem ser preservados. Todos os participantes
devem agir conforme a legislação civil, administrativa e penal.
Por outro lado, os servidores ou empregados públicos que participam de mediações
devem ter garantias, até para que a participação não seja desestimulada. A Lei 13.140/2015,
então, prevê que a responsabilização deve ocorrer em hipóteses restritas, como quando
verificado dolo ou fraude.
Havendo esse reconhecimento, está viciado o ato da mediação, por vício social ou de
vontade.
Nos termos do Código de Processo Civil vigente, tendo havido a homologação judicial
da mediação, a via própria para atacar o ato viciado e anulá-lo deve ser a de uma ação
anulatória (não havendo mais dúvida de que não serve para o fim a via rescisória).
Mas deve haver o ajuizamento da ação, não se podendo de plano considerar nulo o ato.
Referências
ALVIM, Teresa Arruda et al. Primeiros Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed.
São Paulo: Thomson Reuters, 2020.
AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Negócio Jurídico: Existência, Validade e Eficácia. 3. ed.
São Paulo: Saraiva, 2000.
129
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
DELGADO, José Augusto. Comentários ao Código Civil Brasileiro. v. II. Rio de Janeiro:
Forense, 2008.
DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. v. I. 19. ed. Salvador: Editora
JusPodivm, 2017.
JESUS, Damásio E. de. Direito penal. v. I. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1995.
MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz, MITIDIERO, Daniel. Novo Código de
Processo Civil comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.
MARQUES, José Frederico. Curso de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1956.
PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. RODRIGUES, Roberto de Aragão Ribeiro. Mediação e
arbitragem na Administração Pública (Orgs.). Curitiba: Editora CRV, 2018.
PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. RODRIGUES, Roberto de Aragão Ribeiro. Mediação
e arbitragem na Administração Pública (Coords.). v. II. Santa Cruz do Sul: Essere Nel
Mondo, 2020.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; DANTAS, Bruno
(Coords.). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. 3. ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2016.
130
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1. Introdução
1 O Inciso V do artigo 4 do CDC assim dispõe: incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de controle de
qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo.
2 CABRAL, Antonio do Passo; CUNHA, Leonardo Carneiro da. “Negociação direta ou resolução colaborativa de disputas
(collaborative law): ‘mediação sem mediador.’” In: ZANETI JR., Hermes; CABRAL, Trícia Navarro Xavier. Justiça Multiportas.
Salvador: Juspodivm, 2016.
131
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
3 Há várias decisões judiciais de extinção de ação, por alegada ausência de interesse de agir da parte autora, em função da
mesma ter deixado de buscar a via administrativa para tentar solucionar seu conflito de consumo, com menção explícita
à ferramenta governamental denominada consumidor.gov.br. Ilustra-se como exemplo a decisão da 1ª vara Cível de Santa
Luzia/MA, que indeferiu petição inicial do consumidor que não comprovou ter buscado solução consensual de conflito com
uma instituição financeira, através da plataforma digital www.consumidor.gov.br. Processo n. 0802095-76.2019.8.10.0057.
TJMA. Sentença publicada em 29/03/2020.
4 SANTOS, Boaventura de. O Estado e o Direito na transição pós-moderna: Para um novo senso comum sobre o poder
e o direito; Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 30, jun. de 1990, p. 15-16.
5 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Jurisdição e pacificação: limites e possibilidades do uso dos meios consensuais
de resolução de conflitos na tutela dos direitos transindividuais e pluri-individuais. Curitiba: CRV, 2017.
132
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
modernização dos tribunais e as Defensorias Públicas etc. – primeira onda6. Depois, se tornou
necessária especialização dos tribunais e a representação de interesses difusos – segunda
onda7. Na terceira onda, há uma ampliação do conceito de acesso à justiça, abrangendo os
meios judiciais e extrajudiciais8.
Gradualmente, o Estado passou por um processo de diminuição, adotando a postura
de fiscalizador e de regulador e, nesse sentido, veio também o incentivo aos métodos
extrajudiciais de resolução de controvérsias9. Sob o aspecto jurisdicional, o Estado também
adota uma função minimalista, como gerenciador de conflitos, incentivando as partes a
optarem pelo método mais adequado10.
Com isso, abandona-se a perspectiva positivista e legalista de aplicação e interpretação
do direito como ideia de justiça e jurisdição, em prol da efetiva tutela do direito material
conflituoso e da concretização de direitos fundamentais11. Isso resulta em modificações
dos sistemas de pacificação social, mediante deslegalização e desregulação, em direção à
possibilidade de uso de mecanismos informais e extrajudiciais pela sociedade civil12.
Diante deste cenário, a percepção de acesso à justiça é modificada, sofrendo uma
releitura para abranger os métodos extrajudiciais. Cumpre recordar que a própria conceituação
de justiça e o direito de acesso a esta remetem ao iluminismo e às revoluções liberais. A
justiça equivale a uma base da sociedade moderna, envolvendo a distribuição de direitos e
deveres de forma razoável, mediante a maximização de benefícios e minimização de danos,
para haver um equilíbrio1314.
O acesso à justiça, por sua vez, é um direito de primeira geração, que se referia
inicialmente à possibilidade de acesso ao Poder Judiciário. Tal direito está imbricado no Estado
de direito, garantindo a isonomia dos cidadãos de acesso a um processo justo15. Frente a sua
morosidade da prestação jurisdicional, o direito passou por renovações, principalmente, a
partir das reformas de retorno ao protagonismo das partes. Com isso, o acesso à justiça deve
ser entendido como o direito dos jurisdicionados buscarem a satisfação do direito material
pelo método de resolução de conflitos que optarem uma satisfação do direito material,
seguindo a noção sociológica de jurisdição16.
Nesse passo, o Brasil passou por reformas judiciais para a inserção e o estímulo para
a adoção de meios alternativos de resolução de conflitos. Em 1996, veio a Lei de Arbitragem
(Lei n. 9.307/96), regulamentando a arbitragem no país. Contudo, o arcabouço jurídico dos
métodos alternativos de resolução de conflitos (MARC) surgiu com o Código de Processo
6 CAPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988.
7 Ibidem.
8 Ibidem. p. 67.
9 SANTOS, Boaventura de. O Estado e o Direito na transição pós-moderna: Para um novo senso comum sobre o poder
e o direito; Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 30, jun. de 1990, p. 26.
10 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. MAZZOLA, Marcelo. Manual de mediação e arbitragem. São Paulo: Saraiva
Educação, 2019. p. 53.
11 Paiva, Marcella da Costa Moreira de. Tribunal arbitral e ética discursiva. Dissertação (mestrado)-Universidade Fed-
eral Fluminense, Niterói, 2019.
12 SANTOS, Boaventura de. O Estado e o Direito na transição pós-moderna: Para um novo senso comum sobre o poder
e o direito; Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 30, jun. de 1990, p. 17.
13 RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Trad. Almiro Pisettae, Lenira M. R. Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 1997. p. 7-8.
14 HANSEN, Gilvan Luiz. “A resolução de conflitos no estado democrático de direito: Uma perspectiva habermasiana”. In:
BANNWART JUNIOR, Clodomiro José. FACHIN, Zulmar Antonio. (Orgs.). Direito e filosofia: diálogos. 1. ed. Campinas: Mil-
lenium, 2012. p. 103-104.
15 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. MAZZOLA, Marcelo. Manual de mediação e arbitragem. Op. Cit. p. 55-56.
16 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 189-190.
133
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Somente podem ser dirimidos por meio da mediação os conflitos que versem sobre
direitos disponíveis ou direitos indisponíveis que admitam a transação (art. 3°, Lei n. 13.140
de 2015). Por conseguinte, a transacionalidade é elemento que deve ser verificado nos direitos
para que seja possível sua resolução por tal método.
17 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. MAZZOLA, Marcelo. Manual de mediação e arbitragem. Op. Cit. p. 52.
18 GAGLIETTI, Mauro. GAGLIETTI, Natália. “Os conflitos no âmbito do consumo como experiência de educação cidadã na
cultura da mediação”. In: SOBRINHO, Liton Lanes Pilau. ZIBETTI, Fabíola Wüst. SILVA, Rogerio da. (Orgs.) Balcão do Consu-
midor: coletânea cidadania, mediação e conciliação. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2018. p. 174.
134
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Deste modo, existe um campo de disputas bastante particular, cujo tratamento dos
conflitos deve ser manuseado a partir da lógica do microssistema jurídico consumerista. É
cediço que é norteado pela ideia de hipossuficiência do consumidor perante o fornecedor,
pressuposição esta que deve reger todo o sistema de defesa de direitos consumeristas e a
própria forma de resolução de conflitos.
No Brasil, há a judicialização de conflitos oriundos de relações de consumo e grandes
fornecedores comumente – principalmente dos setores financeiro e de telefonia – constam entre
19 GAGLIETTI, Mauro. GAGLIETTI, Natália. “Os conflitos no âmbito do consumo como experiência de educação cidadã na
cultura da mediação”. Op. Cit. p. 165-166.
20 A cultura do cancelamento é um movimento de ativismo digital que se iniciou voltada para o linchamento virtual de insti-
tuições e pessoas com posturas racistas ou sexistas. Entretanto, o ativismo nas redes sociais se expandiu para reclamações
em outras áreas, como o tratamento de forma não cordial a consumidores e publicidades abusivas ou enganosas.
21 GAGLIETTI, Mauro. GAGLIETTI, Natália. “Os conflitos no âmbito do consumo como experiência de educação cidadã na
cultura da mediação”. Op. Cit. p. 162.
135
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
22 CNJ. Sumário Executivo: Justiça Pesquisa. Políticas Públicas do Poder Judiciário. Os maiores litigantes em ações con-
sumeristas: mapeamento e proposições, 2018. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2018/01/
bd8f715ca9ae1f539cd2d15421e843e7.pdf. Acesso em: 19 jul. 2020.
23 “Somente em 2014, foram mais de dois milhões de casos novos envolvendo responsabilidade do fornecedor ou
indenização por dano moral, situando o assunto como o terceiro mais demandado de todos os tribunais, com pelo menos
4% de todas as novas demandas do ano de 2014 (Justiça em Números 2015)” (CNJ, 2018, p. 7).
24 MARTINS, Guilherme M. A Mediação e os Conflitos de Consumo. Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro, Rio
de Janeiro, nº 63, p. 71-83, jan./mar. 2017. p. 77.
25 Andressa Michel aponta três blocos fundamentais para a criação de qualquer programa de mediação: (a) definição de
critérios para determinar quem pode participar do programa; (b) forma de ingresso no programa; (c) desenvolvimento de
mecanismos práticos para a condução do programa. Ilustra comentários a respeito do art. 4º, V, da Lei 8.078/90, enten-
dendo com base na necessidade de proporcionar alternativas menos custosas e mais céleres para resolver os litígios, dando
margem ao surgimento da técnica do design de sistemas de disputas, envolvendo métodos sistemáticos para solucionar
conflitos complexos ou recorrentes. Trata-se de um sistema que envolve procedimentos elaborados sob medida para a
resolução de controvérsias, com o objetivo de promover eficiência e reduzir os custos, além de incentivar a participação
das partes na satisfação do fim pretendido. (MICHEL, Andressa. Programas de mediação e acidentes de consumo: um
estudo prático de métodos alternativos de resolução de conflitos. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v.
80, p. 237-273, out./dez. 2011. p. 242).
26 MARTINS, Guilherme M. A Mediação e os Conflitos de Consumo. Op. Cit. p. 78.
27 DAMITZ, Caroline; SANTOS, Cássio Henrique. “A mediação e a conciliação como instrumentos de efetivação dos direitos
do consumidor”. In: SOBRINHO, Liton Lanes Pilau. ZIBETTI, Fabíola Wüst. SILVA, Rogerio da. (Orgs.) Balcão do Consumidor:
coletânea cidadania, mediação e conciliação. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2018.
28 VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas. São Paulo: Método, 2018. p. 50.
136
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
relações futuras, como ocorre nos casos consumeristas. É inegável ainda seus potenciais
reconstrutivos em casos relativos a contratos continuados, como a prestação de serviço.
A mediação, em alguns ordenamentos jurídicos, como o espanhol, é regulamentada
conforme o assunto que versa, sendo a mediação de consumo diferenciada da cível ou
comercial. Tal opção legislativa atenta às peculiaridades de cada um dos sistemas em que
se insere. No caso da mediação de consumo, envolve as disputas relativas à apropriação de
bens e serviços.
29 MICHEL, Andressa. Programas de mediação e acidentes de consumo: um estudo prático de métodos alternati-
vos de resolução de conflitos. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, vol. 80, p. 237-273, out./dez. 2011. p. 243.
137
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
30 CARRASCO, Manuel Izquierdo. “La mediación em conflictos de consumo em la legislación de la Unión Europea y en Es-
paña”. In: CHAI, Cássius Guimarães (Org.). Mediação e Relações de Consumo. São Luís: Procuradoria Geral de Justiça do
Estado do Maranhão/Jornal da Justiça/Cultura, Direito e Sociedade (DGP/CNPq/UFMA). Mediación en conflictos de consumo:
presente y futuro. Anuario Jurídico y Económico Escurialense, XLII, pp. 129-152, 2014, p. 17.
31 “Su objetivo es imponer a los Estados Miembros que garanticen que los consumidores puedan, si así lo desean, presentar
reclamaciones contra los comerciantes, tanto en litigios nacionales como transfronterizos, ante entidades que ofrezcan
procedimientos de resolución alternativa de litigios a las que se les imponen unas determinadas condiciones de independencia,
imparcialidad, transparencia, efectividad, rapidez y justicia” (CARRASCO, Manuel Izquierdo. “La mediación em conflictos de
consumo em la legislación de la Unión Europea y en España”. In: CHAI, Cássius Guimarães (Org.). Mediação e Relações
de Consumo. São Luís: Procuradoria Geral de Justiça do Estado do Maranhão/Jornal da Justiça/Cultura, Direito e Sociedade
(DGP/CNPq/UFMA). Mediación en conflictos de consumo: presente y futuro. Anuario Jurídico y Económico Escurialense, XLII,
pp. 129-152, 2014, p. 17).
32 ABREU, Elizabeth de Almeida. Arbitragem nas Relações de Consumo. Rio de Janeiro: Cop Editora, 2015.
138
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
139
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
41 Ibidem, p. 21.
42 Ibidem, p. 23.
43 Ibidem.
44 Ibidem, p. 24; TJ, Processo C-75/16, sentença de 14 de junho de 2017.
45 ANDALUZIA. Memoria de actividades de la junta arbitral de consumo de andalucía. Espanha: Junta Arbitral de
Consumo e Junta de Andalucía, 2018. Disponível em: https://www.consumoresponde.es/sites/default/files/articulos/Me-
moria%20de%20Actividades%20JACA%202018_0.pdf. Acesso em: 19 jul. 2020. p. 14.
46 ANDALUZIA. Memoria de actividades de la junta arbitral de consumo de andalucía. Op. Cit. p. 38.
47 ANDALUZIA. Memoria de actividades de la junta arbitral de consumo de andalucía. Op. Cit. p. 15.
140
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
48 CATALUNHA. Ley 22/2010, de 20 de julio, del Código de consumo de Cataluña, BOE num. 196, de 13 de ago. de 2010.
49 ROSA, Fernando Esteban de la. La vertebración del régimen español de la mediación de consumo en el marco
del Derecho europeo, Op. Cit., p. 24.
50 Ao contrário da Argentina, que a Lei 24.573/95 cuida da mediação como um procedimento extrajudicial obrigatório,
portanto fora do Poder Judiciário e que se desenvolve previamente, conforme o respectivo art. 1º: Institúyese con carác-
ter obligatorio Inmediación previa a todo juicio, la que se regirá por las disposiciones de la presente ley. Este procedi-
miento promoverá la comunicación directa entre las partes para la solución extrajudicial de la controvérsia. Las partes
quedarán exentas del cumplimiento de este trámite si acreditaren que antes del inicio de la causa, existió mediación ante
mediadores registrados por el Ministerio de Justicia. Disponível em: <http://servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/ane-
xos/25000-29999/29037/norma.htm>. Acesso em: 22 jul. 2020.
141
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
52% do valor total das reclamações submetidas às entidades de resolução de litígios), 5.406
foram resolvidas por mediação – cerca de 40% do valor total51.
Diante do exposto, constata-se que a Espanha não possui propriamente uma
regulamentação nacional da mediação de consumo, de modo que há a mediação prévia no
Sistema Arbitral de Consumo e a privada nas entidades de resolução alternativa de litígios.
Todavia, as Comunidade Autônomas apresentam competência exclusiva para legislar
sobre mediação consumerista e algumas, como a Andaluzia e a Catalunha, desenvolveram
o procedimento no âmbito de órgãos públicos de defesa do consumidor. Ou seja, são
extrajudiciais. Nestas, a mediação tem caráter voluntário e ocorrem no curso de processos
administrativos, mais especificamente de reclamações de consumidores.
Em 1990, foi sancionada o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078 de 1990), que
criou um microssistema de proteção e defesa dos consumidores, com normas jurídicas e a
criação de uma Política Nacional as Relações de Consumo. Neste passo, foi instituído o Sistema
Nacional e Defesa do Consumidor (SNDC), do qual os órgãos federais, estaduais, do Distrito
Federal e municipais e as entidades privadas de defesa do consumidor fazem parte (art. 105,
CDC). Em âmbito nacional, cabe ao Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, da
Secretaria Nacional do Consumidor vinculada ao Ministério da Justiça a elaboração da política
supramencionada e outras atribuições previstas no art. 106 do CDC.
Em 28 de maio de 2012, por meio do Decreto n. 7.738, foi criada a Secretaria Nacional
do Consumidor (Senacon), à qual possui a atribuição atual de elaboração da política nacional
de consumo e das disposições do art. 106. É composta pelos Programas de Proteção e Defesa
do Consumidor (Procons) estaduais, do Distrito Federal e municipais, pelas Defensorias
Públicas, pelos Ministérios Públicos, pelas entidades civis de defesa do consumidor e pelas
delegacias do consumidor.
O Procon possui uma estrutura para instauração de processo administrativo de
reclamação, o Balcão do Consumidor, para a apuração de violação de normas consumeristas
e de existência danos aos consumidores. Contudo, a decisão do Procon não possui força
vinculante e tampouco é definitiva, podendo ser revisada judicialmente. Esclarece-se que o
Brasil adota o modelo inglês de jurisdição, no qual a jurisdição é una e exercida pelo Poder
Judiciário. Em face da ausência de poder jurisdicional, os consumidores tendem a buscar
outras formas de resolução de disputas, como o processo judicial, a mediação e a conciliação
em câmaras privadas e o Consumidor.gov.
As relações consumeristas, como é cediço, são caracterizadas pelo desequilíbrio entre
as partes, mais especificamente, pela hipossuficiência – ou vulnerabilidade – do consumidor
perante o fornecedor. A atuação do PROCON como câmara pode ser um mecanismo de reajuste
na balança dentro da controvérsia, mas deverá ocorrer em conformidade com os princípios da
mediação. Deste modo, é factível a constituição de câmara de mediação no Procon para atuar
na resolução de conflitos entre consumidores e fornecedores, adotando uma perspectiva da
51 CATALUNHA. Actuacions de l’Agència Catalana del Consum 2018. Balance 2018. Barcelona, 15 mar. 2019.
142
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
52 TALAMINI, Eduardo. Apud. ABREU, Elizabeth de Almeida. Arbitragem nas Relações de Consumo. Op. Cit.
53 ABREU, Elizabeth de Almeida. Arbitragem nas Relações de Consumo. Op. Cit.
54 Alguns Ministérios Públicos estaduais, como o MPMG, apresentam fundos específicos para a defesa de consumidores,
Fundo Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor.
143
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
partes, podendo ser externo à câmara ou parte do rol de mediadores, como mencionado
anteriormente. Caso não houvesse concordância, a câmara apontaria o mediador, como
ocorre nas mediações em câmaras privadas, sem que seja vinculado a algum órgão de defesa
ao consumidor. Faz-se necessário a adoção de regras de condutas para os mediadores, como
o Código de ética para Mediadores Extrajudiciais e o Código de Ética para Instituições de
Mediação e Arbitragem, ambos do CONIMA (Conselho Nacional das Instituições de Mediação
e Arbitragem).
Um regulamento do procedimento se faz imprescindível para demonstrar a seriedade
da instituição e, bem como, para vincular os contraentes às suas regras. Adicionalmente, a
previsão das regras procedimentais gera maior credibilidade para a instituição, sendo um
incentivo a seu uso por consumidores e fornecedores.
5. Considerações Finais
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Referências
ABREU, Elizabeth de Almeida. Arbitragem nas Relações de Consumo. Rio de Janeiro: Cop
Editora, 2015.
CABRAL, Antonio do Passo.; CUNHA, Leonardo Carneiro da. “Negociação direta ou resolução
cola- borativa de disputas (collaborative law): ‘“mediação sem mediador.’”. In: ZANETI JR.,
Hermes.; CABRAL, Trícia Navarro Xavier. Justiça Multiportas. Salvador: Juspodivm, 2016.
CAPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988.
CATALUNHA. Ley 22/2010, de 20 de julio, del Código de consumo de Cataluña, BOE num.
196, de 13 de ago. de 2010.
CNJ. Sumário Executivo: Justiça Pesquisa. Políticas Públicas do Poder Judiciário. Os maiores
litigantes em ações consumeristas: mapeamento e proposições, 2017. Disponível em: https://
145
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2018/01/bd8f715ca9ae1f539cd2d15421e843e7.pdf.
Acesso em: 19 jul. 2020.
GAGLIETTI, Mauro. GAGLIETTI, Natália. “Os conflitos no âmbito do consumo como experiência
de educação cidadã na cultura da mediação”. In: SOBRINHO, Liton Lanes Pilau. ZIBETTI, Fabíola
Wüst. SILVA, Rogerio da. (Orgs.) Balcão do Consumidor: coletânea cidadania, mediação
e conciliação. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2018.
MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2010.
PAIVA, Marcella da Costa Moreira de. Tribunal arbitral e ética discursiva. Dissertação
(mestrado)-Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2019.
146
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Trad. Almiro Pisettae, Lenira M. R. Esteves. São Paulo:
Martins Fontes, 1997.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1. Introdução
148
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
o produto final do Poder Judiciário e o acesso à uma resposta jurisdicional efetiva. Por
conseguinte, incrementou-se a justiça seletiva, que não alcança quem mais necessite de sua
tutela: os vulneráveis e os hipossuficientes. Enquanto os litigantes habituas – figuras assíduas
no Poder Judiciário – beneficiam-se da mora processual, os hipossuficientes e vulneráveis,
por não disporem de tempo, recursos ou mesmo por desconhecimento suportam os ônus
impostos por uma prestação jurisdicional lenta e onerosa e, consequentemente, acabam por
aceitar menos que deveria ser concedido.
Considerada o marco regulatório do tema, a Resolução n. 125/2010 trouxe em seu
bojo mudanças e inovações substanciais, implementando um robusto sistema pré-processual
de solução de conflitos, também conhecido como sistema multiportas. Nesse modelo, a parte
tem a sua disposição vários meios para resolução do conflito, podendo utilizar a solução
adjudicada ou não, cabe a parte escolher o método de resolução de conflitos que melhor se
ajuste a sua demanda.
No mesmo sentido, ergueu-se o arcabouço normativo e principiológico do Código
de Processo Civil de 2015. O sistema processual inaugurado pelo Código de Processo Civil
atual visa ao empoderamento das partes, por meio da ampla participação e efetiva influência
dos indivíduos envolvidos no conflito na atividade criativa do juiz que deságua na norma
produzida para aquele caso concreto.
Não somente isso, o Código de Processo Civil de 2015 instituiu uma nova forma de
pensar o processo, sob uma lente cooperativa e conciliativa.
Já nas primeiras normas, o Código de Processo Civil atual estabelece os pilares de
sustentação desse novo sistema. Com efeito, nos artigos inaugurais, percebe-se o cuidado do
legislador em deixar clara essa nova forma de pensar, inclusiva, conciliativa, que empodera
as partes. Afinal, a real busca do microssistema da resolução consensual de conflitos é a
pacificação social.
Tendo em vista o advento desse cenário colaborativo e propício a consensualidade,
o próprio conceito de acesso à justiça precisa ser ressignificado, com propósito de abarcar
não somente a solução adjudicada dos conflitos, mas também a solução adequada para cada
conflito, seja judicial ou não.
Apesar desse minucioso amparo legislativo dos meios de resolução de conflitos, de nada
adiante uma matriz principiológica processual que dignifica, empodera e concede autonomia
às partes, se na prática o processo não tutela substancialmente direitos, principalmente em
relação aos vulneráveis e hipossuficientes, na medida em que é moroso, custoso e ineficaz.
Tanto a dignidade quanto o empoderamento perpassam por um Poder Judiciário forte e
pelo acesso amplo à justiça substancial, com a entrega de uma resposta jurisdicional efetiva,
eficiente e em prazo razoável.
Diante da crise quantitativa e qualitativa – na medida em que o Poder Judiciário não
consegue entregar uma prestação efetiva dentro de lapso temporal razoável –, que assola o
Poder Judiciário, há quem argumente que meios alternativos de resolução de conflitos seriam
solução para o problema, pois escoariam o volume de processos a cargo do Poder Judiciário.
Essa forma de pensar os meios alternativos de resolução de conflitos é advinda de uma
cultura demandista que reclama alteração, vez que os relega a uma justiça de segunda classe.
É acertado observar o problema não através de um prisma utilitarista e pragmático, a
fim de acabar com a crise numérica do Poder Judiciário, mas pela lente da adequação, para
149
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1 SARMENTO, Daniel. Dignidade da pessoa humana: conteúdo, trajetórias e metodologia. Belo Horizonte: Fórum,
2016. Pgp. 105
150
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Os direitos não devem estar sujeitos a cálculos de utilidade social. Direitos fundamentais
configuram trunfos que, a não ser em hipóteses muito excepcionais, devem prevalecer
sobre tais cálculos, ainda quando o resultado deles seja apresentado sob rótulos como
o de “bem comum” ou de “interesse público2
De todo modo, é preciso ter em conta que a dignidade deve significar o empoderamento
do indivíduo. Nessa toada, o Estado criado para proteger o indivíduo de atrocidades, deve
2 SARMENTO, Daniel. Dignidade da pessoa humana: conteúdo, trajetórias e metodologia. Op. Cit.
3 SARMENTO, Daniel. Dignidade da pessoa humana: conteúdo, trajetórias e metodologia. Op. Cit. p. 155
151
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
2. Desenvolvimento
Ainda que o Código Processual Civil de 2015 incentive métodos alternativos de solução de
conflitos, bem como a autonomia da parte para compor seu conflito da melhor forma possível,
judicial ou extrajudicialmente, apenas a previsão legislativa não é suficiente para assegurar da
utilização da mediação. Assim, é necessário dar concretude aos comandos da lei.
Empoderamento pressupõe não apenas que seja disponibilizada para a pessoa
a oportunidade de escolha, mas que a escolha seja feita de forma autônoma e refletida.
Considerando vantagens e desvantagens dos modelos propostos para então fazer uma
escolha racional e relevante.
O desgaste e o conflito são naturais no seio familiar, principalmente, em relações
conjugais. Importante é utilizar instrumentos adequados para resolver o conflito, a fim de
evitar que novas ramificações daí advindas proliferem e criem-se outros problemas.
A justiça conciliativa exerce, nesse ponto, uma função preventiva, tendo em vista evitar
as possíveis lides futuras decorrentes daquela.
Assim, o direito de família, área em que, via de regra, as relações se perpetuam, é terreno
fértil para o plantio e desenvolvimento da cultura da pacificação proposta pelo microssistema
dos meios alternativos de solução de conflitos. Nessa seara não há vencedor e vencido, há
vulneráveis que precisam ser protegidos dos possíveis efeitos que essa polarização pode causar.
Fato é que sempre haverá uma parte insatisfeita na configuração dual estabelecida
pela solução adjudicada, quando não as duas. Exemplo emblemático que melhor explica
a situação é trazido por pesquisadores de Harvard. No caso concreto, havia duas crianças
disputando durante horas uma única laranja. A mãe cansada da briga, sem questionar as
crianças, cortou a laranja ao meio, entregando parte igual da fruta para cada uma. Todavia,
a solução aparentemente mais justa no sentir da mãe, foi insatisfatória e ineficaz para as
crianças, pois, em verdade, a intenção de uma era fazer um suco, enquanto a outra queria
brincar com a casca.
De igual modo, os litigantes devem ser tratados como dois lados de uma mesma moeda
e não combatentes em um ringue. Devido aos limites da sentença, essa não comporta todos
os meandros do litígio. Por conseguinte, melhor será que as partes em conjunto construam
a solução.
Do contexto apresentado, questão que urge é a seguinte: como implementar e difundir
a utilização dos equivalentes jurisdicionais? Ao menos três medidas são de grande proveito.
4 BARROSO, Luís Roberto. Justiça, empoderamento jurídico e direitos fundamentais. Disponível em: http://luisrober-
tobarroso.com.br/wp-content/uploads/2014/06/ONU_Justica-Empoderamento-legal-e-direitos-fundamentais_versao-em-
portugues.pdf. Acesso em: 21 jul. 2020.
153
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154
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Certo é que se para a parte for ofertado procedimento – ainda que extrajudicial –
eficiente, no qual tenha livre participação, além da oportunidade de resolução em lapso
temporal exíguo e que efetivamente influencie, é bem provável que esta seja sua opção.
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5 ASENSI, Felipe. PINHEIRO, Roseni. Defensoria pública e diálogo institucional em saúde: a experiência de Brasília‐
DF. Revista Direito & Práxis, Rio de Janeiro, v. 6, n. 12, 2015, p. 11-36.
6 A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advo-
gados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
156
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
6. Conclusão
157
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Poder Judiciário. De igual modo, nem sempre a mediação será o modelo adequado para a
resolução do conflito. Não obstante, é salutar incentivar o uso da mediação inclusive nos
conflitos judicializados.
A mudança mais importante a ser feita é a mudança de mentalidade dos litigantes
e dos profissionais, do mesmo modo, a mudança da cultura demandista para a cultura da
pacificação, isso se dá por meio de fomento ao uso dos meios alternativos de solução de
conflitos, por intermédio de visibilidade e informação.
Referências
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: introdução ao direito processual
civil, parte geral e processo de conhecimento. 15.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2013.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. v. único. 12 ed.
Salvador: JusPodivm, 2020.
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1. Considerações iniciais
1 WARAT, Luis Alberto. O oficioofício do mediador. Florianópolis: Habitus Editora, 2001, p. 81.
159
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
O foco, portanto, deve ser outro. Não se trata de eliminar o conflito, mas sim considerá-
lo como parte integrante das relações humanas e buscar meios para compor as diferenças de
forma construtiva.
Há uma tendência em se criar formas para proteger as pessoas dos conflitos. Isso
resulta numa falta de aptidão para lidar com as diferenças desde os processos iniciais da
educação infantil. As crianças não são estimuladas a lidar com as diferenças e a aprender a
compor os conflitos de forma construtiva.
O escamoteamento do conflito vai minando toda e qualquer capacidade para
autocomposição e terceiros são constantemente demandados para dar uma “solução” para
o conflito. Os sujeitos do conflito passam a ser considerados como peças, ou “objetos do
conflito.4
Eligio Resta afirma que as técnicas de mediação tornam “comunicáveis mundos e
linguagens diversas; representa contextos, interpreta textos e traduz, tornando acessíveis,
significados que, de outro modo, seriam incompreensíveis”5.
A mediação parte da perspectiva da teoria contemporânea do conflito, tratando-o como
elemento inerente à essência humana e inserindo a dinâmica dialógica e comunicacional no
processo. Isso gera nos envolvidos uma retomada de seus papéis de sujeitos e os desprende
da figura de “objetos” do conflito.
O protagonismo dos sujeitos pode ser estimulado por diversas técnicas. A questão
passa a ser como lidar de forma pacífica e o que esperar da oportunidade do conflito.
Não há uma essência negativa do conflito necessariamente, pois a questão é outra, a da
forma de se lidar com o conflito, se de forma violenta ou não-violenta. A resposta ao conflito
é que pode assumir um caráter construtivo ou destrutivo.
Sendo assim, deve-se analisar a fundo os motivos pelos quais a cooperação pode ser minada
no processo de solução de um conflito, instaurando um processo adversarial e competitivo.
2 GALTUNG, Johan. Peace and social structure: essays in peace research III. Copenhagen: Christian Elgers, 1978, p. 484.
3 MULLER, Jean Marie. Não-Violência na Educação. São Paulo: Palas Athena, 2006, p. 23.
4 GALTUNG, Johan. Peace and world structure: essays in peace research IV. Copenhagen: Christian Elgers, 1980, p. 506.
5 RESTA, Eligio. O Direito Fraterno. Tradução de Sandra Regina Martini Vial. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2004, p. 131.
160
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
No artigo 3º do mesmo diploma legal, no qual estão definidos os oito campos de ação em
que o Estado e a sociedade civil devem atuar para garantir a promoção da cultura de paz, há
menção à “possibilidade de que todas as pessoas, em todos os níveis, desenvolvam aptidões
para o diálogo, negociação, formação de consenso e solução pacífica de controvérsias” como
aspecto integralmente vinculado ao desenvolvimento pleno desta.
Fazendo um recorte nacional, a implementação de tal legislação programática no
âmbito brasileiro já teve início antes mesmo de sua publicação, mediante a promulgação da
Constituição Federal de 1988. Em seu corpo normativo, esta foi responsável por instaurar o
Estado Democrático de Direito, um tipo especial de Estado, cujo objetivo primeiro é satisfazer
os requisitos essenciais à democracia, bem como garantir a segurança jurídica por meio da
prevalência do governo das leis7.
Em acréscimo, trouxe, em seu art. 5º, um extenso rol de direitos e garantias fundamentais,
6 ONU. Declaração e Programa de Ação sobre uma Cultura de Paz. Resolução aprovada por Assembleia Geral em 06
de outubro de 1999, nº 53/243.
7 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002 (1933), p. 218.
161
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
[...] são princípios que fundamentam o próprio Estado brasileiro como um todo (art. 1º),
entre outros, a cidadania (II) e a dignidade humana (III), aparecendo também entre os
objetivos fundamentais da República brasileira a construção de uma sociedade “justa”
(art. 3º, I), e a prevalência dos direitos humanos, a defesa da paz e a solução pacífica
dos conflitos entre os princípios reitores do Brasil em suas relações internacionais (art.
4º, II, VI e VII).8
Com a estruturação desse panorama jurídico, houve também mudança nas instituições
que compõem o sistema de Justiça, arquitetadas para a proteção e salvaguarda desses
direitos, em um movimento de formalização da institucionalidade democrática, com base
nos princípios de igualdade e de liberdade9. Em meio à preeminente constitucionalização, a
perspectiva de avanços na pacificação social tornou-se cada vez mais evidente, tornando-se
efetivamente uma política pública.
Nesse sentido, a busca pela construção desse panorama abarca o aprendizado individual
relativo à gestão das emoções, uma vez que o substrato emocional é ínsito à natureza
humana, ou seja, o ser humano está constantemente sendo afetado psicofisiologicamente
pelo surgimento de emoções em seu interior, cuja influência pode potencializar a tomada
de atitudes sem o devido uso da razão, culminando em maior tendência à propagação da
violência em suas inúmeras formas.
A gestão emocional pode ser caracterizada como um conjunto de habilidades
socioemocionais de autoconhecimento e autocontrole que visa a desenvolver a capacidade
do indivíduo de observar, avaliar, controlar e expressar suas emoções e sentimentos. Sua
importância é evidente no contexto atual, considerando-se, como exemplo, as inúmeras
atividades exercidas pelos profissionais da área jurídica, demarcadas, em sua maioria, por
intensos contatos e relações interpessoais, normalmente envoltos em alguma situação de
conflito de interesses, na qual estão em evidência direitos e deveres a serem contemplados
e estabelecidos. Assim, considerando a notória influência destes na vida em sociedade,
aprender a lidar com o complexo emaranhado de emoções que surgem nos conflitos torna-
se fundamental.
Sob esse viés, a própria natureza conflitiva que perpassa o domínio do Direito no mundo
dos fatos é um dos objetos principais dentro do movimento de edificação de uma cultura
de paz, em cujo cerne encontra-se o amadurecimento na forma de compreender os padrões
emocionais e como estes condicionam, em certa medida, as interpretações pessoais e as
ações ou omissões tomadas em consequência dessas, sendo crucial modificar o entendimento
socialmente prevalecente de que há necessariamente uma contraposição entre conflito e paz,
como contemplado na obra “Cultura de Paz: processo em construção”:
8 BESTER, Gisela Maria. Cultura da paz como compromisso constitucional brasileiro - Parte II: Nos caminhos do
humanismo e da justiça restaurativa. Empório do Direito, [S. l.], 17 fev. 2016. Disponível em: https://emporiododireito.
com.br/leitura/cultura-da-paz-como-compromisso-constitucional-brasileiro-parte-ii-nos-caminhos-do-humanismo-e-da-jus-
tica-restaurativa. Acesso em: 20 jun. 2020.
9 SADEK, Maria Tereza Aina. Acesso à Justiça: Visão da Sociedade. Justitia, São Paulo, v. 65, n. 198, p. 271-279, jan./
jun. 2008, p. 272.
162
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Esmiuçando cada um, pode-se dizer que percepção emocional significa reconhecer
diferentes emoções em si e nos outros, de maneira acurada, e expressá-las socialmente.
Já a emoção enquanto facilitadora do pensamento é a capacidade do pensamento gerar
emoções e a possibilidade destas influenciarem o processo cognitivo. Ainda, a compreensão
emocional diz respeito a três habilidades: (a) capacidade de identificar emoções e codificá-
las; (b) entender os seus significados, o seu curso e a maneira como se constituem e se
correlacionam; e (c) conhecer as suas respetivas causas e consequências. Por fim, a gestão
emocional é a regulação de emoções em si e nos outros, isto é, a capacidade de gerar emoções
positivas e reduzir as negativas, conforme o caso13.
Sob esse espectro de análise, uma das práticas que surge em evidência devido à grande
relevância para o auxílio no aprendizado dessas habilidades é o mindfulness, palavra de
origem inglesa que significa “atenção plena”, podendo ser conceitualizada como:
10 DAMIANI, Suzana; HANSEL, Cláudia M.; QUADROS, Maria S. P. de. Cultura de Paz: processo em construção. Caxias
do Sul, RS: Educs, 2017, p. 19.
11 MAYER, J. D., & SALOVEY, P. “¿Qué es la inteligencia emocional??” In: J. M. M., Navas, & P. F., Berrocal. (Coord.). Manual de
inteligencia emocional. pp. 25-45. Madrid: Anaya, 2007. p. 32.
12 BRANCO, Maria A. V. “Inteligência Emocional.”. In: JARDIM, Jacinto; FRANCO, José Eduardo. Dicionário de educação
para o empreendedorismo. Lisboa: Gradiva, 2019. p. 424.
13 Ibidem, p. 426.
163
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Essa condição pacificadora se impõe como a decisão mais acertada, considerando-se que
derrotar litigante oposto, na maioria dos casos, pode não representar, necessariamente,
que o problema tenha sido resolvido, ou que a decisão judicial, tomada com base no que
os Autos apresentam, seja, realmente, a solução desejada.17
14 ARAÚJO, Geissy Lainny de Lima. Efeitos psicofisiológicos de uma breve intervenção baseada em mindfulness
em adultos jovens saudáveis. Tese (Doutorado em Neurociências)). Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Insti-
tuto do Cérebro, Programa de Pós-Graduação em Neurociência, Natal, 2018.
15 Estudos sobre mindfullness com adultos jovens saudáveis vêm corroborando a compreensão de que o treinamento
baseado em mindfulness produz diversos benefícios ao bem-estar individual, mesmo no curto prazo, observando-se efeitos
significativos sobre aspectos importantes envolvidos no processo de regulação emocional, gerando resultados tais como
maior engajamento de processos atencionais e redução de estresse percebido, de afeto negativo e do estado de ansiedade,
além de melhora da regulação comportamental e redução da reatividade emocional. KENG, Shian-Ling; SMOSKI, Moria J. &
ROBINS, Clive J. Effects of mindfulness on psychological health: a review of empirical studies. Clinical Psychology
Review, v. 31, n. 6, p. 1041-56, 2011. Disponível em: http://doi.org/10.1016/j.cpr.2011.04.006. p. 75.
16 WATANABE, Kazuo. “Cultura da sentença e cultura da pacificação”. In: YARSHELL, Flávio Luiz. MORAES, Maurício Zanoide
de. Estudos em homenagem à Professora Ada Pelegrini Grinover. São Paulo: DPJ Editora, 2005.
17 CARNEIRO, Fernanda M. A. A mediação e sua relação com a cultura de paz e a pacificação social. Revista de For-
mas Consensuais de Solução de Conflitos, Belém, v. 5, n. 2, p. 01-19, jul./dez. 2019.
164
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
18 CARNEIRO, Fernanda M. A. A mediação e sua relação com a cultura de paz e a pacificação social. Revista de For-
mas Consensuais de Solução de Conflitos, Belém, v. 5, n. 2, p. 01-19, jul./dez. 2019, p. 98.
19 LEDERACH, John Paul. Building Peace: Sustainable Reconciliation in Divided Societies. Washington, D.C.: United
States Institute of Peace Press, 1997, p. 97.
20 MULLER, Jean Marie. O Princípio da Não-Violência: Percurso Filosófico. São Paulo: Editora Palas Athena, 2007, p.13.
165
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
decide o que ele reinstitucionaliza como conflito, ou seja, o ‘conflito jurídico’. Não julga o
fato; julga o ‘fato jurídico’”21.
Jean-Marie Muller afirma que, apesar da violência estar presente na história da
humanidade, não pode ser considerada oriunda de uma natureza inata cruel, pois o ser
humano é racional e, portanto, influenciado por sua cultura. Há uma construção cultural em
torno da violência, que objetiva legitimar e justificar o seu uso:
Visa ocultar aquilo que a violência tem de irracional e de inaceitável [...] O objetivo
almejado é na maioria das vezes alcançado – é a banalização da violência. Em vez
de banida – declarada à margem da lei -, a violência é banalizada – declarada em
conformidade com a lei.22
A violência é também uma construção histórica. Nesse sentido, o referido autor afirma:
“A sociedade cultiva a violência [...], inculcando-a nos indivíduos como virtude do homem
forte, do homem corajoso, do homem honrado [...]”23.
Jean-Marie Muller afirma que: “As tradições que herdamos, por terem reservado um
amplo e belo espaço à violência, não reservaram praticamente nenhum espaço à não-violência,
ignorando-lhe inclusive o nome.” E, portanto, “em vez de ser banida – declarada fora da lei -,
a violência é banalizada – declarada em conformidade com a lei”24.
Deve-se questionar o porquê da institucionalização do sistema adversarial. Por que se
elegeu o método adversarial para solução dos conflitos? Os métodos consensuais são uma
criação da contemporaneidade?
Para responder a essas perguntas, recorre-se à Filosofia da Libertação, de Enrique Dussel,
a partir da perspectiva crítica desenvolvida ao Eurocentrismo, para afirmar que os métodos
consensuais de solução de conflitos sempre estiveram presentes na história da humanidade
e foram simplesmente encobertos, dando ênfase ao sistema adversarial. Não se pretende
fazer uma análise profunda da obra de Dussel, mas tão somente analisar como o Projeto
de Modernidade e o Eurocentrismo contribuíram para o encobrimento de outras formas de
solução de conflitos para além do sistema adversarial. Como afirma Enrique Dussel:
Enrique Dussel afirma que, até 1492 d.C., havia um protagonismo das nações
muçulmanas e asiáticas, relegando à Europa a um papel de pouca importância. Os europeus
recorriam às guerras, “encobrindo” os povos conquistados, desconsiderando a sua cultura e
21 BISOL, Jairo. “Mediação e modernidade: sítios para uma reflexão hermenêutica.”. In: WARAT, Luis Alberto. (Org.). Em
nome do acordo: a mediação no direito. 2. ed. Argentina: Almed, 1998, p. 112.
22 MULLER, Jean Marie. O Princípio da Não-Violência: Percurso Filosófico. São Paulo: Editora Palas Athena, 2007, p.13.
23 MULLER, Jean Marie. Op. cit., p. 12.
24 MULLER, Jean Marie. Op. cit., p. 11.
25 DUSSEL, Enrique. 1492 - O encobrimento do outro: a origem do mito da modernidade. Tradução de Jaime A.
Clasen. Petrópolis: Vozes, 1993, p.7.
166
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
impondo o modo eurocentrista que utilizava o sistema adversarial ou romano para resolução
de seus conflitos:
A ‘conquista’ é um processo militar, prático, violento que inclui dialeticamente o Outro como
o ‘si-mesmo’. O Outro, em sua distinção, é negado como Outro e é sujeitado, subsumido,
alienado a se incorporar à totalidade dominadora como coisa, como instrumento, como
oprimido [...]”.26 “Uma vez reconhecidos os territórios, geograficamente, passava-se ao
controle dos corpos, das pessoas: era necessário “pacificá-las”- dizia-se na época27.
Jay Folberg afirma que os métodos consensuais de solução de conflitos eram utilizados
em territórios orientais como China, Japão e África28. Como tais povos foram colonizados,
as suas práticas consensuais foram encobertas pela ação dos colonizadores que impunham
o seu modo de ver o mundo.
Verifica-se assim que a violência não é uma característica humana inata, mas sim uma
construção cultural fruto da racionalidade humana, pois “a violência apenas existe e age
através dos homens; é sempre o homem que é responsável pela violência”29. Sendo assim, se
a violência é construída a partir da racionalidade humana, pode, portanto, ser desfeita por
essa mesma racionalidade.
167
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Com o uso da tecnologia e dos meios de comunicação, seria possível que houvesse uma
diminuição do ritmo de trabalho em razão da facilitação de todos os processos. Contudo,
o efeito foi reverso. Passamos a viver de uma forma frenética, já que os processos foram
simplificados. Os feedbacks são esperados de forma instantânea, já que os indivíduos são
multitarefas, executando atividades paralelas: dirigem seus carros, se alimentam, falam ao
celular e respondem mensagens via e-mail31.
Vivemos num estágio de hiperatenção e de reação, num mundo que não permite a
perfeita contemplação. Byung-Chul Han afirma que devemos “habituar o olho ao descanso,
à paciência, ao deixar-aproximar-se-de-si”, isto é, capacitar o olho a uma atenção profunda e
contemplativa.
Precisamos reaprender a não sermos tão reativos, mas a velocidade que imprimimos
nas relações contemporâneas parece nos exigir uma resposta imediata a todo e qualquer
estímulo, desde um alarme de mensagem no celular a um conflito com o vizinho. O preço é
alto, pois
A hiperatenção, como já visto anteriormente, nos leva a executar várias tarefas ao mesmo
tempo e gera um esgotamento neuronal. Assim, para dar conta de todas as atividades, mesmo
que às custas desse esgotamento, permanecemos na superfície, ou seja, não submergimos
nas relações.
A consequência é uma variedade de atividades e relações superficiais que nos esgotam
e geram um cansaço para tratar de assuntos que nos exigiriam uma maior doação para além
do superficial. Assim, diante de um conflito, e considerando que temos um aparato disponível
no sistema judicial, terceirizamos a solução dos nossos conflitos e não estamos abertos nem
à escuta, nem ao diálogo.
Trabalhar o conflito exige doação, entrega, troca, imersão, fala, escuta e empatia.
Estamos tão esgotados neuronalmente que não temos disponibilidade para isso.
Devemos analisar, também, de que forma somos educados para naturalizar a violência
e para reproduzi-la sem constestá-la. Trata-se de considerar o discurso de opressão que nos
foi apresentado justamente para “domesticar” os nossos corpos, objetificando as pessoas.
Para tanto, fomos educados a pensar em termos binários (certo/errado, bom/mau,
bem/mal), como se tudo pudesse ser analisado e julgado a partir desses termos. Diante do
errado e do mal, fomos educados, a partir de um processo de julgamento, a reagir com o uso
31 BRUM, Elaine. Revista Época, 29 abr. 2013. “Estamos vivendo como se tudo fosse urgente. Urgente o suficiente para
acessar alguém. E para exigir desse alguém uma resposta imediata. Como se o tempo do “outro” fosse, por direito, também
o “meu” tempo. E até como se o corpo do outro fosse o meu corpo, já que posso invadi-lo, simbolicamente, a qualquer
momento. Como se os limites entre os corpos tivessem ficado tão fluidos e indefinidos quanto a comunicação ampliada
e potencializada pela tecnologia. Esse se apossar do tempo/corpo do outro pode ser compreendido como uma violência.
Mas até certo ponto consensual, na medida em que este que é alcançado se abre/oferece para ser invadido. Torna-se, ao
se colocar no modo “online”, um corpo/tempo à disposição. Mas exige o mesmo do outro – e retribui a possessão. Olho
por olho, dente por dente. Tempo por tempo”. Disponível em: http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/eliane-brum/noti-
cia/2013/04/e-urgente-recuperar-o-sentido-de-urgencia.html. Acesso em: 23 fev. 2019.
32 HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Op. Cit.
168
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
da violência. Basta analisar os filmes e animações que são apresentados às crianças33. Trata-
se de uma sucessão de personagens malévolos que serão derrotados pelas “forças do bem”,
como se a violência fosse a única saída para tratar outra violência. Não se está a dizer que o
processo de naturalização da violência decorra tão somente deste aspecto, mas, certamente,
contribui já que povoa o imaginário infanto-juvenil.
A violência, que já vem sendo naturalizada no período infanto-juvenil, continua com o
mesmo processo ao longo de nossas vidas pelos meios de comunicação. Jean-Marie Muller
analisa o impacto dos meios de comunicação na construção da violência: “Os meios de
comunicação de massa não nos informam sobre as razões e riscos da violência, mas sobre a
própria violência; não suscitam uma opinião pública, mas uma emoção pública”34.
No artigo intitulado “Se a paz fosse Coca-Cola...”, José Paulo Santos recorre a uma
metáfora para analisar o processo de assimilação do princípio da não-violência. Afirma o
referido autor que o primeiro slogan criado para a campanha publicitária da Coca-Cola em
Portugal foi criado em 1929 por Fernando Pessoa: “Primeiro estranha-se, depois entranha-se.”
José Paulo Santos esclarece que:
De um momento para o outro, quer por via dos meios de comunicação social, quer
pelas redes sociais, somos invadidos por grotescas imagens de violência, por frases
de vingança de políticos, de comentadores e dos mais diversos indivíduos. Esta espiral
que inicia em focos muito precisos, acaba por expandir-se e alastrar-se, tornando-se,
cada vez mais, um problema para 7 mil milhões de habitantes. Um problema para o
mundo inteiro. E este vocabulário violento, estas imagens de terror, vão-se infiltrando
nas nossas mentes e nos nossos corações, fazendo emergir o pior de cada um de nós: o
desejo de vingança. Amaldiçoa-se, insulta-se, injuria-se!35
Ao final do artigo, o autor propõe uma “Coca-Cola da Paz”, ou seja, uma campanha de
marketing pela paz.
Jean-Marie Muller afirma que a não violência pode ser considerada como uma nova ideia
que causa estranheza, pois a nossa civilização consolidou e institucionalizou a violência.
Nesse sentido, o autor afirma:
33 Isso sem contar com os jogos eletrônicos que permitem que você agrida, mate e roube pessoas.
34 MULLER, Jean Marie. Op. cit. p. 9.
35 SANTOS, José Paulo. Se a paz fosse Coca-Cola. Jornal Voz de Cambra, Aveiro, jul. 2016, p. 21.
36 MULLER, Jean Marie. Não-Violência na Educação. São Paulo: Palas Athena, 2006, p. 11-12.
169
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Tensin Gyatsu, o atual Dalai Lama afirmou: “As palavras não usam armas, mas ferem o
coração”37. O aspecto comunicacional é de extrema importância para a mediação de conflitos.
O manejo das palavras permite que o conflito vá perdendo densidade e assuma o seu real
tamanho.
A escuta ativa e a comunicação não-violenta são instrumentos utilizados para permitir
um verdadeiro diálogo, realizando uma troca de ideias para a solução de conflito. Quando
bem manejados, esses instrumentos tendem a criar um fio condutor que interliga as partes
que antes se encontravam desconectadas, permitindo uma comunicação empática.
Além desses instrumentos, o mediador conta com outras ferramentas para facilitar
a comunicação e a despolarização, dentre elas o recontextualização (parafraseamento), o
resumo, a formulação de perguntas, troca de papéis, sessões privadas e teste de realidade.
A mediação é um processo comunicacional catalisado pelo mediador, que deve possuir
habilidades comunicativas, pois é por meio da linguagem que se promoverá uma comunicação
efetiva, ou seja, dialógica.
O diálogo permite a co-construção e respeita a diversidade de opiniões e as vê como
complementares. No diálogo, há a escuta ativa com o objetivo de entender o ponto de vista
do outro.
Já numa conversação adversarial, as partes buscam o embate e não a complementaridade
de pensamentos, buscam deslegitimar a fala do seu “oponente” atacando-o de forma pessoal.
Para tanto, ouvem com a intenção de contra-argumentar, não propiciando a escuta ativa.
Outro aspecto a ser considerado é que acreditamos que uma comunicação eficaz está
baseada naquilo que dizemos e não naquilo que foi compreendido pelo outro. Porém, a
dinâmica é outra, pois a comunicação está baseada naquilo que foi entendido pela outra
parte. O mediador poderá identificar ruídos na comunicação e permitir que as partes tenham
o entendimento daquilo que está sendo dito.
Deve-se considerar que o aspecto dialógico é um momento ritualístico que separa o
desentendimento do entendimento. O mediador, além de ter boa capacidade de escuta, deve
promover um ambiente propício para que os mediados saibam ouvir e para que a escuta seja
circular, ou seja, permitindo também o protagonismo do outro, bem como o aprendizado e a
ressignificação do conflito.
O mediador deve promover, também, uma comunicação compassiva, favorecendo (re)
conexões empáticas que irão facilitar o diálogo e a escuta empática.
A Comunicação Não-Violenta (CNV) é uma técnica desenvolvida pelo psicólogo
americano Marshall Rosenberg38, na década de 60, que promove a conexão entre as
pessoas. Marshall sustenta que, por meio da fala, expressamos necessidades e aponta
quatro componentes da CNV: observação, expressão de sentimentos, reconhecimento
37 Apud ARAÚJO, José Roberto. “Ensinar a paz: uma proposta para um currículo de educação.”. In: MOLL, Jaqueline. (Org.)
Caminhos da Educação Integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos no Brasil. São Paulo:
Penso, 2012. p. 211.
38 ROSENBERG, Marshall. Comunicação Não-Violenta - Técnicas Para Aprimorar Relacionamentos Pessoais e Pro-
fissionais. Trad. Mário Vilela. São Paulo: Ágora, 2006.
170
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
171
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
razão da amplitude espacial e temporal das ações humanas, torna-se difícil para o homem
sentir-se emocionalmente atingido pelas consequências de suas ações.
Nesse ponto, recorre-se à ilustração realizada por Lorenz43, sobre a comparação do
homem paleolítico com um machado em punho e o piloto que transportou a bomba de
Hiroshima. O manipulador do machado de mão ainda apresentava fortes instintos repressivos,
pois ele tinha que se defrontar com seu adversário olho no olho, ou seja, ele via a sua condição
de ser humano espelhada no seu adversário. Já a situação do piloto que transportou a bomba
de Hiroshima é diferente, pois ele é preservado do encontro humano com o “inimigo”, afinal
apenas apertou um botão, não vivenciando as consequências da liberação da bomba de
forma sensitivo-emocional.
Transportando para a questão presente, a dificuldade que possuímos em enxergar a
humanidade do outro se deve ao fato de que não estarmos a ele conectados e não identificarmos
o compartilhamento das mesmas necessidades. Ao enxergarmos tão somente como inimigo,
temos dificuldade em considerá-lo um semelhante.
A CNV humaniza as relações e permite a ressignificação da construção cultural e
histórica da violência e da opressão. Somos criados para sermos reativos e a reação é sempre
mais forte do que a ação. Esse círculo vicioso de ação e reação nos impossibilita não só a
escuta ativa, mas também de elaborarmos o nosso raciocínio considerando a humanidade do
outro. Com a tendência que nos é incutida pela cultura e pela nossa historicidade, a nossa
fala será sempre adversarial e não colaborativa.
Assim, as palavras, ao invés de serem uma reação automática, passam a ser uma
escolha consciente das nossas necessidades e das necessidades dos outros. A expressão se
torna mais clara e permitimos ver o outro de forma empática. Além disso, a dinâmica da CNV
permite que os sujeitos envolvidos façam uma autoanálise e, por meio da fala, consigam
expressar as suas necessidades e os seus sentimentos que antes se achavam encobertos
por acusações e por uma fala violenta dirigida ao outro. Ao ser indagado do porquê tem
determinadas necessidades, acessamos aquilo que não conseguíamos enxergar e que, muitas
das vezes, está ao alcance do outro.
A comunicação passa a ter uma nova dinâmica, substituindo antigos padrões de defesa
e ataque.
6. Considerações finais
Durante muito tempo, o acesso à justiça foi considerado numa perspectiva reducionista,
se concentrando apenas em torno da jurisdição judicial, como se somente a via judicial fosse
a única solução.
Não se está a dizer que o processo judicial não seja uma forma legítima de solução
dos conflitos, já que a perspectiva estatal apresenta elementos democráticos, permitindo
o contraditório e o equilíbrio entre as partes por meio de um procedimento regulado
juridicamente.
A jurisdição judicial, apesar de ser um mecanismo tradicional de resolução de conflitos,
172
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Referências
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175
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Robert Segal
1 Introdução
No ano de 2019, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou seu relatório Justiça
em Números, com ano-base 2018, apresentando dados que apontam para a existência de
aproximadamente 78,7 milhões de processos judiciais em trâmite ou aguardando julgamento
junto ao Poder Judiciário, no Brasil.
Considerando que o país tinha, até então, cerca de 210 milhões de habitantes1, chega-
se à quantidade de um caso de conflito judicializado para cada 2,67 habitantes, o que ilustra
1 NITAHARA, Akemi. Estimativa da população do Brasil passa de 210 milhões, diz IBGE. Agência Brasil, Econo-
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lacao-do-brasil-passa-de-210-milhoes-diz-ibge#:~:text=O%20Instituto%20Brasileiro%20de%20Geografia,total%20de%20
210.147.125%20pessoas>. Acesso em: 18/02/2002.
176
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
2 RODAS, Sérgio. Em 5 anos, Lei da Mediação ajudou a mudar cultura do litígio no país. Consultor Jurídico,
Conjur, Solução Consensual, 27/06/2020. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2020-jun-27/anos- lei-media-
cao-ajudou-mudar-cultura-litigio?fbclid=IwAR3x-EFxZGYlDWjj0Pzu3lG84x9C8RXnPu_fRjBqM0eCRw_XBpHXE_wbYq4>. Aces-
so em: 28/06/2020.
3 CHRISPINO, Alvaro; CHRISPINO, Raquel S. P. A judicialização das relações escolares e a responsabilidade civil dos
educadores. Ensaio: Avaliação de Políticas Públicas, Rio de Janeiro, v. 16, n. 58, p. 9-30, jan./mar. 2008. Disponível em:
<https://www.scielo.br/pdf/ensaio/v16n58/a02v1658.pdf>. Acesso em: 02/03/2020.
4 ORSINI, Adriana Goulart de Sena; SILVA, Lucas Jeronimo Ribeiro da. Da escola ao poder judiciário: reflexões sobre o
bullying escolar e a judicialização de conflitos infanto-juvenis. In: SILVA, Juvêncio Borges; THIBAU, Tereza Cristina Sorice
Baracho; MACHADO, Edmilson Donisete (Coord.). Acesso à justiça I: XXIV Congresso Nacional do CONPEDI, UFMG, FUMEC,
Dom Helder Câmara. Florianópolis: CONPEDI, 2015, 281-299.
5 MINAYO, Maria Cecília de Souza. Ciência, técnica e arte: o desafio da pesquisa social. In: IDEM. Pesquisa social: teoria,
método e criatividade. 21. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. 9-29.
6 YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e método. Tradução de Daniel Grassi. 2. Ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.
177
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Bacellar7, Moore8 e Spengler9, assim como aquelas que pudessem auxiliar numa análise sobre
a judicialização de conflitos em questões escolares, tais como as obras de autoria de Chrispino
e Chrispino10, e Orsini e Silva11, para, em seguida, proceder uma pesquisa documental com
foco na jurisprudência12 do TJRJ.
Feito isso, o passo seguinte se deu pela escolha de contribuições no campo das Ciências
Sociais, com aporte em Geertz13-14 e Rouland15, entre outros, com vistas a compreender os
sentidos das decisões judiciais analisadas.
Grife-se, nessa oportunidade, que não se pretende crítica à atuação do Poder Judiciário,
mas, a partir das decisões dos magistrados que lá atuam, mitigar desafios referentes a um
determinado ponto da mediação de conflitos, no caso, seus limites e possibilidades no campo
escolar, em questões judicializadas.
Para tanto, houve uma pesquisa, na página (site) do TJRJ16, sobre as decisões
pertinentes aos conflitos judicializados entre famílias e escolas, respectivamente, nos
links “consultas”, “jurisprudência” e “consulta jurisprudência”17. Neste último link, em
“pesquisa livre”, deu-se uma busca de palavras-chave tais como “escolas”, “escolas
privadas”, “escolas e indenização”, “escola e bullying”, “escolas e acidentes”, “escola e
matrícula”, “escola e inclusão”, “escola e dano” e “escola e indenização”, com recorte em
casos de conflitos judicializados entre famílias e escolas da rede privada, inicialmente,
entre os anos de 1990 e 2020, considerando, a partir da natureza jurídica da própria
relação entre as famílias e as escolas privadas, baseada em relações de consumo, à luz da
Lei nº 8.078/1990.
No entanto, como um dos objetivos específicos se refere justamente à discussão sobre
os limites e as possibilidades da mediação de conflitos escolares judicializados, no âmbito do
TJRJ, houve outro recorte, dessa vez, quanto às ações judiciais envolvendo famílias e escolas
privadas, privilegiando-se o período entre o ano de 2016 – quando entrou em vigor o Código
de Processo Civil (vide art. 1.045) – e o ano de 2020.
Deste recorte, foram obtidos 18 casos de conflitos escolares judicializados, sobre os
7 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito,
53.
8 MOORE, Christopher W. O processo da mediação: estratégias práticas para a resolução de conflitos. Tradução de Magda
França Lopes. 2. Ed. Porto Alegre: Artmed, 1998.
9 SPENGLER, Fabiana Mario. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. 2. Ed. Ijuí: Edi-
tora Unijuí, 2016.
10 CHRISPINO, Alvaro; CHRISPINO, Raquel S. P. A judicialização das relações escolares e a responsabilidade civil dos
educadores. Ensaio: Avaliação de Políticas Públicas, Rio de Janeiro, v. 16, n. 58, p. 9-30, jan./mar. 2008. Disponível em:
<https://www.scielo.br/pdf/ensaio/v16n58/a02v1658.pdf>. Acesso em: 02/03/2020.
11 ORSINI, Adriana Goulart de Sena; SILVA, Lucas Jeronimo Ribeiro da. Da escola ao poder judiciário: reflexões sobre
o bullying escolar e a judicialização de conflitos infanto-juvenis. In: SILVA, Juvêncio Borges; THIBAU, Tereza Cristina Sorice
Baracho; MACHADO, Edmilson Donisete (Coord.). Acesso à justiça I: XXIV Congresso Nacional do CONPEDI, UFMG, FUMEC,
Dom Helder Câmara. Florianópolis: CONPEDI, 2015, 281-299.
12 De um modo geral, jurisprudência pode ser definida como um conjunto de decisões uniformes e constantes, por parte
dos Tribunais de Justiça, resultante da aplicação das normas a casos semelhantes, constituindo-se assim regra geral aplicável
a todas as hipóteses similares ou idênticas. Cf. DINIZ, 2019.
13 GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008.
14 GEERTS, Clifford. O saber local: fatos e leis em uma perspectiva comparativa. In: IDEM. O saber local: novos ensaios em
antropologia interpretativa. Capítulo 8. Tradução de Vera de Mello Joscelyne. 7. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004, p. 249-357.
15 ROULAND, Norbert. Nos confins do direito: antropologia jurídica da modernidade. Tradução de Maria Ermantina de
Almeida Prado Galvão. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 223-317. Coleção justiça e direito.
16 Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, PJERJ. Disponível em: <http://www.tjrj.jus.br/>. Acesso em: 13/02/2020.
17 Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro, PJERJ, Consultas, Jurisprudência, Consultas Jurisprudência. Disponível em:
<http://www4.tjrj.jus.br/ejuris/ConsultarJurisprudencia.aspx>. Acesso em: 13/02/2020.
178
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
18 Com relação aos referidos casos, os mesmos foram obtidos mediante a leitura das decisões contidas nos se-
guintes processos cíveis, desde os despachos de recebimento das petições iniciais das correspondentes ações indeni-
zatórias até as decisões finais das Câmaras Cíveis do TJRJ: 0014927-83.2016.8.19.0008; 0021486-47.2016.8.19.0205;
0028603-98.2016.8.19.0202; 0040347-81.2016.8.19.0205; 0010476-35.2016.8.19.0066; 0004482-97.2016.8.19.0204;
0009871-90.2016.8.19.0001; 0025056-45.2016.8.19.0042; 0361623-28.2016.8.19.0001; 0000136-83.2017.8.19.0070;
0044702-36.2017.8.19.0000; 0005867-46.2017.8.19.0204; 0061180-16.2017.8.19.0002; 0039838-15.2018.8.19.0001;
0039838-15.2018.8.19.0001; 0029002-49.2019.8.19.0000; 0062694-39.2019.8.19.0000; 0027722-43.2019.8.19.0000.
19 KANT DE LIMA, Roberto; BAPTISTA, Bárbara Gomes Lupetti. Como a antropologia pode contribuir para a pesquisa
jurídica?: um desafio metodológico. Anuário antropológico, UnB, Brasília, v. 39, n. 1. p. 9-37, 2014. Disponível em: <http://
www.dan.unb.br/images/pdf/anuario_antropologico/Separatas%202013_I/Como%20a%20 Antropologia%20pode%20contri-
buir%20para%20a%20pesquisa%20juridica.pdf>. Acesso em: 14/02/2020.
20 VELHO, Gilberto. Um antropólogo na cidade: ensaios de antropologia urbana. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
21 SPENGLER, Fabiana Mario. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. 2. Ed. Ijuí:
Editora Unijuí, 2016.
22 LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 14. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.
179
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
23 GEERTS, Clifford. O saber local: fatos e leis em uma perspectiva comparativa. In: IDEM. O saber local: novos ensaios em
antropologia interpretativa. Capítulo 8. Tradução de Vera de Mello Joscelyne. 7. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004, p. 249-357.
24 ROULAND, Norbert. Nos confins do direito: antropologia jurídica da modernidade. Tradução de Maria Ermantina de
Almeida Prado Galvão. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 223-317. Coleção justiça e direito.
25 GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008.
26 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
27 SPENGLER, Fabiana Mario. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. 2. Ed. Ijuí:
Editora Unijuí, 2016.
28 O que encontrou eco no Código de Processo Civil instituído pela Lei nº 13.105/2015: “Art. 3º. Não se excluirá da apre-
ciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito”.
29 SPENGLER, Fabiana Mario. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. 2. Ed. Ijuí:
Editora Unijuí, 2016.
30 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
180
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
conferidos pelo sistema legal em vigor como pelo senso de injustiça, em consequência da
capacidade humana de aumentar suas expectativas. Num dado momento, a preocupação com
a justiça não diz respeito tão somente com os novos tipos de problemas, mas também de
incluir problemas de grupos que, anteriormente, não eram considerados, tais como pessoas
deficientes e minorias sexuais, por exemplo. Com isso tem-se um movimento que reivindica
o acesso à justiça em constante expansão31.
Tal realidade contribui para aquilo que se convencionou chamar de ondas de acesso à
justiça32-33.
A primeira onda diz respeito à disposição de advogados em favor das camadas
pobres da população e à efetividade de serviços de assistência judiciária gratuita – seja,
pela remuneração de profissionais e organizações privadas, por parte do Estado, seja por
intermédio de defensores públicos – ou com custas acessíveis aos menos favorecidos. Isto
porque, a principal distorção processual teria sua origem na assimetria econômica entre as
partes, razão pela qual tem cabido ao Estado intervir na busca de garantir uma isonomia
judicial entre as partes conflitantes34.
Enquanto isso, uma segunda onda de acesso à justiça nasce dos limites da proteção de
interesses individuais diante da complexidade dos conflitos em sociedade, quando passou a
se verificar, a partir da década de 1970, por exemplo, nas questões ambientais e também nos
casos envolvendo consumidores, ensejando assim uma proteção dos direitos difusos35-36.
Em relação à terceira onda, o acesso a Justiça passa a ser compreendido a partir de suas
múltiplas alternativas, merecendo atacar suas diversas barreiras, a exemplo dos entraves
processuais, fruto das imperfeições do próprio ordenamento37, bem aproveitadas por usuários
usuais (repeat players) do sistema judiciário que, conhecedores dos meandros jurídicos, com
capacidade de contratar serviços legais especializados e com habilidade para desenvolver
expertise, ou cultivar relações informais facilitadoras com titulares institucionais, colocam-se
em vantagem com relação àqueles que se utilizam do supracitado sistema apenas uma única
vez (one shotters)38.
Quanto à quarta onda, esta se refere às dimensões éticas dos profissionais que
desempenham papéis no próprio acesso à Justiça (como, por exemplo, os advogados),
implicando novas responsabilidades ao ensino jurídico39.
Por fim, mas sem esgotar as ondas de acesso à justiça (tendo em vista a ilimitada
31 GALANTER, Marc. Acesso à justiça em um mundo com capacidade social em expansão. In: FERRAZ, Leslie S.
Repensando o acesso à justiça: estudos internacionais. Volume 2 – estudos inovadores. Aracajú: Evocati, 2016,
p. 21-31. Disponível em: <https://mestrados.unit.br/ppgd/wp-content/uploads/sites/5/2016/12/Repensando-o-acesso-%-
C3%A0-Justi%C3%A7a-no-Brasil_Estudos-Internacionais_Volume-2_final.pdf>. Acesso em: 20/11/2019.
32 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
33 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris Editor, 1988.
34 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris Editor, 1988.
35 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
36 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Anto-
nio Fabris Editor, 1988.
37 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris Editor, 1988.
38 GALANTER, Marc. Acesso à justiça em um mundo com capacidade social em expansão. In: FERRAZ, Leslie S.
Repensando o acesso à justiça: estudos internacionais. Volume 2 – estudos inovadores. Aracajú: Evocati, 2016,
p. 21-31. Disponível em: <https://mestrados.unit.br/ppgd/wp-content/uploads/sites/5/2016/12/Repensando-o-acesso-%-
C3%A0-Justi%C3%A7a-no-Brasil_Estudos-Internacionais_Volume-2_final.pdf>. Acesso em: 20/11/2019.
39 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
181
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
capacidade inventiva humana), chega-se a uma quinta onda, com as configurações de métodos
adversariais e métodos consensuais.
Sobre os métodos adversariais, interessa registrar a participação de um terceiro
imparcial que, na atribuição de juiz ou árbitro, conhecendo a demanda – mediante coleta
de informações sobre a lide, concentrando a produção de provas e analisando argumentos
– produz um veredicto, adjudicando o ganho de causa a uma das partes em detrimento
da outra. Fundam-se em posições polarizadas, numa ótica dialética de tese (aquilo que
o autor pede) e antítese (a refutação, por parte do réu, daquilo que o autor pede), de
ausência de cooperação, sem expressão de sentimentos, e tendo seu ápice numa sentença
judicial ou arbitral40.
Historicamente, a arbitragem teve caráter obrigatório nas demandas societárias até
a entrada em vigor da Lei nº 1.350/1866, se consolidando como uma faculdade entre as
partes conflitantes, com vínculo de compromisso, com advento do Código Civil de 1916 e do
Código de Processo Civil de 1936 e, após, com o Código de Processo Civil de 197341.
Atualmente, a arbitragem encontra-se regulada pela Lei nº 9.307/1996, com as
alterações dadas pela Lei nº 13.129/2015, e pela Lei nº 13.105/2015, que instituiu o Código
de Processo Civil, em seus arts. 3º, § 1º; 485, VII; e 1.012, § 1º, IV.
Enquanto isso, nos métodos consensuais, um terceiro imparcial, com função típica
de conciliador ou mediador, colhe informações sobre o conflito, identifica e relaciona as
questões apresentadas pelos interessados e, dentro de sua competência, facilita a busca pela
realização de um acordo.
Com relação ao mediador, aliás, cabe a este focar nos interesses dos sujeitos
envolvidos no conflito, extraindo o máximo de informações possíveis – quanto ao conflito
em si, às suas necessidades e aos seus sentimentos –, a fim de facilitar o diálogo entre
aqueles para que, por eles mesmos, tenham a oportunidade de chegar a um acordo que
satisfaça a ambos42-43-44.
Ainda sobre a mediação, vale o registro de que se trata de um típico método
autocompositivo de resolução de conflito, baseado em princípios como a confidencialidade
(aquilo que é dito, gerado e elaborado entre as partes, fica adstrito às mesmas), imparcialidade
(segundo a qual o mediador, assim como conciliador, não toma partido de nenhuma das
partes), voluntariedade (uma vez que as partes só permanecem na sessão de mediação se
assim desejarem) e autonomia de vontade, tendo em vista que qualquer decisão há de ser
tomada pelas partes, sem interferência de terceiro quanto a isto45.
Tais princípios, dentre outros, encontram-se reconhecidos pela Resolução nº 125/2010,
do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e incorporados tanto pela Lei nº 13.105/2015, que,
40 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
41 SPENGLER, Fabiana Marion; SPENGLER NETO; Theobaldo (Org.). Mediação, conciliação e arbitragem. Rio de Janeiro:
FGV Editora, 2016.
42 AZEVEDO, André Gomma de (Org.). Manual de mediação judicial. 6. Ed. Brasília, DF: Conselho Nacional de Justiça,
2016. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2015/06/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf>.
Acesso em: 10/01/2020.
43 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
44 MOORE, Christopher W. O processo da mediação: estratégias práticas para a resolução de conflitos. Tradução de Mag-
da França Lopes. 2. Ed. Porto Alegre: Artmed, 1998.
45 AZEVEDO, André Gomma de (Org.). Manual de mediação judicial. 6. Ed. Brasília, DF: Conselho Nacional de Justiça,
2016. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2015/06/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf>.
Acesso em: 10/01/2020.
182
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
como dito, instituiu o novo Código de Processo Civil, como pela Lei nº 13.140/2015, conhecida
por Lei da Mediação.
No que tange, de maneira específica, à audiência de conciliação, esta já estava prevista
no art. 277, do Código de Processo Civil de 1973, instituído pela Lei nº 5.869, com as
alterações que se seguiram em leis posteriores.
Com relação à mediação, apesar de não ser um instituto novo no mundo46, no caso
brasileiro, ganhou corpo com a Resolução nº 125/2010, do CNJ, que, instituindo uma política
pública de tratamento de conflitos mediante o consenso entre as partes, como parte de um
movimento de pacificação social, estimula a criação dos Centros Judiciários de Solução de
Conflitos e Cidadania (CEJUSC), cabendo nestes espaços a atuação nas fases pré-processual e
processual, por meio de conciliadores e mediadores.
No diapasão da citada Resolução do CNJ, a conciliação e mediação restam normatizadas
pela Lei nº 13.140/2015 e pela Lei nº 13.105/2015, valendo o grifo que, segundo esta
última, “o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos” (art.
3º, § 2º) e que:
46 MOORE, Christopher W. O processo da mediação: estratégias práticas para a resolução de conflitos. Tradução de Mag-
da França Lopes. 2. Ed. Porto Alegre: Artmed, 1998.
47 FANTE, Cleo. Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. Campinas: Verus Editora,
2005.
48 MALDONADO, Maria Tereza. Bullying e cyberbullying. São Paulo: Moderna, 2011.
183
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Verifica-se, portanto, que o tempo médio (Me = ẋ) de trâmite das ações analisadas, entre
o ingresso de uma petição inicial de ação indenizatória, com seu protocolo e recebimento
em uma das Varas Cíveis do TJRJ, e a decisão do recurso de apelação, pelas Câmaras
Cíveis do mesmo Tribunal, no que diz respeito aos conflitos escolares judicializados, é de
aproximadamente 3 anos e 6 meses.
Ainda com relação aos casos analisados, das 133 decisões lidas, vale registrar que
em, 50 casos, houve procedência às famílias demandantes, isto é, em 37,59% vê-se o ganho
de causa em seus pedidos de indenização por danos materiais e/ou morais, considerando
inclusive a sede de recurso de apelação, uma vez ausentes qualquer prova de verossimilhanças
nas respectivas alegações.
De um modo geral, a procedência dos pedidos das famílias diz respeito à ausência de
céleres cuidados em casos de acidentes com crianças nas escolas, por parte destas mesmas
instituições; aos casos de bullying em que, apesar de solicitações e alertas por parte das
famílias, as escolas nada teriam feito para cessar tal prática abusiva; e hipóteses de práticas
vexatórias ou violentas por funcionários das escolas.
Entre o menor valor de indenização por danos morais, de R$ 1.000, e o maior, no
patamar de R$ 60.000, a média obtida nas decisões cotejadas é de R$ 10.800, sendo que
o valor mais frequentemente arbitrado a título de reparação dos danos morais, por parte
do Poder Judiciário do estado do Rio de Janeiro – que, estatisticamente, é definido como
“moda”50 – é de R$ 5.000, cuja ocorrência refere-se a 11 casos.
49 MORETTIN, Pedro A.; BUSSAB, Wilton de O. Estatística básica. 9. Ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
50 MORETTIN, Pedro A.; BUSSAB, Wilton de O. Estatística básica. 9. Ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
184
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Assim, uma vez que se dê atenção à relação entre o valor “moda” das indenizações por
danos morais alcançados (R$ 5.000), em face das escolas acionadas judicialmente, e o tempo
médio de trâmite das ações cíveis em tela (3 anos e 6 meses), tem-se o valor médio de R$
1.388 por cada ano de demanda judicial em trâmite, o que, dividido em 12 meses, atinge o
valor de R$ 115,66 por cada mês que um processo judicial permanece em curso.
Interessa observar que, mesmo após a Resolução nº 125/2010, quase que, de modo
absoluto, não houve qualquer intenção no sentido de se realizar uma mediação de conflitos,
durante o desenrolar dos processos então em tramitação no TJRJ. A exceção ficou por conta
de uma única manifestação por parte do Ministério Público, favorável à mediação de conflito,
entre uma família de um aluno, de um lado, e uma escola da rede privada e sua docente, de
outro, que restou infrutífera, em decorrência à negativa de uma das partes rés51.
Estes dados são relevantes, inclusive do ponto de vista processual, eis que, diante das
variadas opões de acordo, as partes (nos casos, as famílias demandantes) podem cogitar se
os valores obtidos com as indenizações por danos morais – inclusive, levando-se em conta
um valor médio para cada ano em que a ação judicial se encontra em trâmite, portanto, sem
decisão definitiva –, efetivamente satisfazem aos seus interesses, o que, também poderia
levar-lhes à reflexão se, diante de um desgaste emocional e de recursos materiais, persistir
numa demanda judicial seria a melhor opção52, ou ao menos represente uma melhor alternativa
a um acordo negociado53-54.
Outra observação se faz importante, no sentido de que os deferimentos dos pedidos
de indenização, por danos causados aos estudantes, representados nos processos por um
de seus pais, têm sido fundamentados de acordo com os termos dos arts. 2º, 3º e 14 da Lei
nº 8.078/1990, ao qualificar as escolas privadas como prestadoras de serviço, ao mesmo
tempo em que lhes atribui a responsabilidade objetiva, portanto, sem a necessidade de
comprovação de culpa (negligência, imprudência ou imperícia), bastando a comprovação do
nexo de causalidade.
Por isso, em todas as sentenças e os acórdãos no TJRJ, há o reconhecimento claro de
que a relação entre as famílias e as escolas privadas é de consumo, o que ainda assim enseja
uma interpretação acerca de tal fato.
Do ponto de vista jurídico, uma explicação possível está na teoria do risco do
empreendimento e da responsabilidade civil, fundada na culpa objetiva, independentemente
da necessidade de se provar a negligência, a imprudência ou a imperícia55, o que tem
influenciado, inclusive, a gestão das próprias escolas56.
Essa hipótese jurídica ganhou eco no Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406/2002,
185
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
ao estabelecer, em seu art. 932, IV, que “são também responsáveis pela reparação civil [...]
os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro,
mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos”57.
Pelo que se vê, no atual cenário brasileiro, apesar de não caber ao Judiciário o dever
originário de conduzir a identificação e solução dos problemas característicos da educação, do
ensino e das relações escolares – sendo, pois, professores, gestores de todos os níveis, famílias
e seus filhos os protagonistas do processo de restauração desses mesmos problemas58-59 –,
o Poder Judiciário tem sido constantemente acionado para resolver conflitos entre as famílias
e as escolas, como se observa na experiência do TJRJ, cuja atuação encontra alguns limites.
Uma pergunta que ainda cabe ao presente trabalho diz respeito ao que levaria as famílias
a acionarem judicialmente as escolas em que seus filhos encontram-se matriculados. Pergunta
esta que traz consigo a busca dos sentidos da educação e, no caso, da educação escolar.
Com base nesta questão, uma perspectiva explicativa se apresenta plausível com a
teoria de Durkheim60, uma vez que a educação estaria vinculada ao grau de solidariedade
pela qual uma determinada sociedade atravessa, permitindo a construção de um ser social, a
partir de valores, religiosidade e padrões de comportamentos tidos como importantes numa
dada sociedade, inclusive do ponto de vista político.
De alguma forma, a teoria durkheimiana sobre a constituição de um ser social pela
educação foi incorporada a documentos como as Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB), estabelecidas pela Lei nº 9.394/1996, ao prever, em seu art. 1º, § 2º, que “a educação
escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social”; os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs), que em seus princípios e fundamentos, contempla a cidadania mediante o
acesso de todos à totalidade de recursos culturais considerados relevantes para a participação
na vida social61; e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), no tocante aos campos de
experiência da educação infantil62, ao ensino fundamental63 e ao ensino médio64.
57 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <ttp://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm#:~:text=LEI%20N%20o%2010.406%2C%20DE%2010%20DE%20JANEIRO%20DE%20
2002&text=Institui%20o%20C%C3%B3digo%20Civil>. Acesso em: 20/02/2020.
58 CHRISPINO, Alvaro; CHRISPINO, Raquel S. P. A judicialização das relações escolares e a responsabilidade civil
dos educadores. Ensaio: Avaliação de Políticas Públicas, Rio de Janeiro, v. 16, n. 58, p. 9-30, jan./mar. 2008. Disponível
em: <https://www.scielo.br/pdf/ensaio/v16n58/a02v1658.pdf>. Acesso em: 02/03/2020.
59 ORSINI, Adriana Goulart de Sena; SILVA, Lucas Jeronimo Ribeiro da. Da escola ao poder judiciário: reflexões sobre
o bullying escolar e a judicialização de conflitos infanto-juvenis. In: SILVA, Juvêncio Borges; THIBAU, Tereza Cristina Sorice
Baracho; MACHADO, Edmilson Donisete (Coord.). Acesso à justiça I: XXIV Congresso Nacional do CONPEDI, UFMG, FUMEC,
Dom Helder Câmara. Florianópolis: CONPEDI, 2015, 281-299.
60 DURKHEIM. Educação e sociologia. Tradução de Stephania Matousek. 5. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
61 BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais. Brasília, DF: MEC; SEF,
1997, p. 27. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro01.pdf>. Acesso em: 18/03/2020.
62 BRASIL. Base nacional comum curricular (BNCC). Brasílias, DF: MEC, 2018, p. 40. Disponível em: <http://basenacio-
nalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf>. Acesso em: 18/03/2020.
63 BRASIL. Base nacional comum curricular (BNCC). Brasílias, DF: MEC, 2018, p. 58; 62. Disponível em: <http://basena-
cionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf>. Acesso em: 18/03/2020.
64 BRASIL. Base nacional comum curricular (BNCC). Brasílias, DF: MEC, 2018, p. 472. Disponível em: <http://basenacio-
nalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf>. Acesso em: 18/03/2020.
186
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Se, numa via, a litigiosidade por parte das famílias em face das escolas onde seus
filhos encontram-se matriculados sugere a formação de uma cultura baseada na exacerbação
do individualismo e do materialismo, típico das sociedades de mercado69 ou complexas70 –
inclusive, como produto de uma massificação da educação, que trouxe uma gama variada
de alunos para o interior das instituições de ensino, chegando a demandar do Poder
Judiciário a intervenção em áreas que ainda não atuava71, e da crença de que cumpre à
atividade jurisdicional em solucionar os mais variados tipos de conflitos72 –, noutra, ao dar
um tratamento meramente consumerista aos conflitos escolares, o Poder Judiciário parece
reforçar esta mesma cultura, distanciando a educação do conceito de uma espécie de fato
65 BOAS, Franz. A mente do homem primitivo. Tradução de José Carlos Pereira. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.
66 DURKHEIM, Émile. A divisão do trabalho social. Tradução de Eduardo Brandão. 5. Ed. São Paulo: WMF, 2019.
67 VELHO, Gilberto. Um antropólogo na cidade: ensaios de antropologia urbana. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
68 Cabendo o alerta, no entanto, que: “Nenhuma sociedade, por mais simples tecnologicamente, apresenta consenso abso-
luto. Já não faz mais sentido, em termos de antropologia, estimular fantasias a respeito de paradisíacas sociedades tribais
onde as pessoas jamais estariam em conflito” (VELHO, 2013, p. 18).
69 SPENGLER, Fabiana Mario. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. 2. Ed. Ijuí:
Editora Unijuí, 2016.
70 VELHO, Gilberto. Um antropólogo na cidade: ensaios de antropologia urbana. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
71 CHRISPINO, Alvaro; CHRISPINO, Raquel S. P. A judicialização das relações escolares e a responsabilidade civil dos
educadores. Ensaio: Avaliação de Políticas Públicas, Rio de Janeiro, v. 16, n. 58, p. 9-30, jan./mar. 2008. Disponível em:
<https://www.scielo.br/pdf/ensaio/v16n58/a02v1658.pdf>. Acesso em: 02/03/2020.
72 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
187
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
social total, isto é, algo que agrega as mais variadas dimensões da vida humana, de maneira
simultânea, tais como familiar, comunitária, religiosa, política, econômica etc.73.
Tanto que, observando todos os conflitos judicializados entre famílias e escolas, entre
os anos de 2016 e 2020, o embasamento jurídico de relação de consumo tem prevalecido,
tanto das petições iniciais e razões de apelações, como nas decisões das Varas Cíveis e
Câmaras Cíveis do TJRJ, sob a égide da Lei nº 8.078/1990, sobre todas as outras justificativas
possíveis, cabendo, a título ilustrativo, o seguinte exemplo:
A escola mudou o olhar. A escola é uma empresa. Não é só a nossa escola. As famílias
são agora clientes. Então, qualquer problema nessa empresa, ou boto essa empresa na
justiça. Acho que a questão foi de olhar, que a escola deixou de ser a escola e passou a
ser empresa (Hannah, orientadora educacional).
73 MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva: forma e razão da troca nas sociedades arcaicas. In: IDEM. Sociologia e antropo-
logia. Tradução de Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003.
74 SEGAL, Robert. A mediação entre famílias e escolas: limites e possibilidades, 2020, 79 p. (monografia de curso de
especialização em mediação de conflitos). AVM, Rio de Janeiro, 2020. Disponível em: <http://www.avm.edu.br/docpdf/
monografias_publicadas/K239644.pdf>. Acesso em: 18/04/2020.
75 MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva: forma e razão da troca nas sociedades arcaicas. In: IDEM. Sociologia e antropo-
logia. Tradução de Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003.
76 VELHO, Gilberto. Um antropólogo na cidade: ensaios de antropologia urbana. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
188
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Estas observações de cunho cultural interessam à medida que abrem caminho para
uma possível compreensão acerca dos significados e sentidos das decisões judiciais que,
recebendo as petições iniciais, determinam a citação das partes rés (nos casos, as escolas),
designando datas para audiência de conciliação, e não de mediação, cuja experiência jurídica
sugere negociação meramente baseadas nos valores das indenizações.
Sobre esta compreensão, vale o registro de que, conforme dito, realizando um novo
recorte – dessa vez pertinente às ações judiciais no TJRJ, envolvendo famílias e escolas
privadas, entre o ano de 2016, considerando a entrada em vigor do Código de Processo
Civil, e julho de 2020 (data da finalização desse trabalho) –, foi possível observar que, em 16
casos, as determinações judiciais foram no intuito da realização de audiência de conciliação,
enquanto que, em somente 2 casos, houve manifestação das partes quanto à realização, ou
não, de conciliação ou mediação77.
Importa assinalar que, de acordo com o Código de Processo Civil vigente, o possível
vínculo entre as partes é uma questão pertinente à realização de conciliação ou mediação,
conforme os seguintes termos:
Em que pese não definir, de modo categórico, casos específicos para a atuação exclusiva
de conciliadores e mediadores, o mesmo art. 165 do Código de Processo Civil, prevê que,
preferencialmente, proceder-se-á conciliação quando não houver vínculo anterior entre as
partes (art. 165,§ 2º), ao passo que dispõe sobre a mediação nos casos que haja vínculo
anterior entre as partes (art. 165, § 3º).
Conforme se observa nos conflitos escolares no âmbito do TJRJ, há vínculos anteriores
às demandas judicializadas, o que, ensejaria a mediação, ao invés de conciliação, consoante
previsão do art. 165 do Código de Processo Civil.
Se, no contexto brasileiro, a mediação tem representado um avanço, por exemplo,
no tocante à resolução de conflitos em áreas como familiar, empresarial e trabalhista, em
especial com o advento da Lei nº 13.104/2015, cujas relações entre os sujeitos envolvidos
são continuadas – ou seja, as partes possuem vínculo anterior às demandas judiciais –, então,
por que não lançar mão da mediação em conflitos envolvendo as famílias e as escolas onde
os filhos daquelas encontram-se matriculados, em alguns casos, com vínculos por um tempo
até considerável?
Quiçá, o critério definitivo das relações de consumo, inclusive, para a designação de
189
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
79 GEERTZ. O saber local: fatos e leis em uma perspectiva comparativa. In: IDEM. O saber local: novos ensaios em antro-
pologia interpretativa. Capítulo 8. Tradução de Vera de Mello Joscelyne. 7. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004, p. 249-357.
80 ROULAND, Norbert. Nos confins do direito: antropologia jurídica da modernidade. Tradução de Maria Ermantina de
Almeida Prado Galvão. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 223-317. Coleção justiça e direito.
81 BACELLAR, Roberto Portugal. Mediação e arbitragem. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Coleção Saberes do Direito, 53.
82 SPENGLER, Fabiana Mario. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de conflitos. 2. Ed. Ijuí:
Editora Unijuí, 2016.
190
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
própria ênfase do referido Código83, não há indícios ao longo dos processos judiciais
pesquisados, qualquer menção à mediação, inclusive em fase de recurso, o que, pela
inteligência do referido artigo, seria cabível, suspendendo os feitos, de acordo com o
art. 16 da Lei nº 13.140/2015.
Pelos dados coletados e analisados, parece que a cultura do litígio – seja por parte dos
cidadãos que acionam o Poder Judiciário, seja pelo próprio tratamento dado aos conflitos
por parte deste último – ainda representa um limite à consolidação da mediação de conflitos
em casos de conflitos escolares, não gozando essa área social dos avanços da mediação
experimentados em outras áreas, tais como família e empresas.
Entretanto, sendo o direito dotado de valores, e considerando que os próprios valores
são construções sociais de acordo com saberes e localidades específicas, em determinados
tempos, e não gerais84-85, tem-se uma abertura à relativização da aplicação do Direito e,
consequentemente, a relativização de valores tidos como consagrados, inclusive, aqueles
experimentados nas diversas sociedades contemporâneas.
Logo, o ideal de que as relações entre famílias e as instituições da rede privada de
ensino sejam alicerçadas mormente nas relações de consumo merece ser revisto, uma vez
que se relativizem conceitos e valores pertinentes à educação, educação escolar e as próprias
relações de consumo, mesmo porque, conforme as próprias sociedades, inclusive a brasileira,
aperfeiçoam suas linguagens, mais colocam o Direito material e processual civil diante de
possibilidades de constante criação e ressignificado.
No campo dos conflitos escolares judicializados, a possibilidade da mediação de
conflitos depende de se considerar as partes envolvidas, a natureza dos próprios conflitos,
para cada caso específico – considerando, inclusive, o vínculo entre as partes – e a atuação do
Poder Judiciário no tratamento dos mesmos, para além de critérios formais e objetivos que
focam apenas nas relações de consumo.
Por vezes, as posições entre as partes estão baseadas em uma ruptura de confiança,
tal como se verificou, no curso da pesquisa, em ações judiciais com o argumento de que
as escolas foram negligentes no cuidado com crianças e adolescentes, haja vista, por
exemplo, casos de acidentes, nos mais variados graus, ocorridos no interior daquelas
instituições. Nesta situação, tomando-se o fato de que aquelas mesmas crianças e
adolescentes mantém vínculo com outras crianças e adolescentes, caberia levar em
consideração se uma decisão judicial seria efetivamente satisfatória dos interesses
daquelas pessoas que, em juízo, têm seus direitos representados exclusivamente por
seus pais ou outros representantes legais.
Estes são alguns pontos que abrem possibilidades para a mediação de conflitos escolares,
ainda mais quando há um arcabouço jurídico que permite tal abertura, como ocorre tanto
com a Lei de Mediação como o Código de Processo Civil.
83 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Direito processual civil contemporâneo. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
84 GEERTZ. O saber local: fatos e leis em uma perspectiva comparativa. In: IDEM. O saber local: novos ensaios em antro-
pologia interpretativa. Capítulo 8. Tradução de Vera de Mello Joscelyne. 7. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004, p. 249-357.
85 ROULAND, Norbert. Nos confins do direito: antropologia jurídica da modernidade. Tradução de Maria Ermantina de
Almeida Prado Galvão. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 223-317. Coleção justiça e direito.
191
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
5. Conclusão
192
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
prestadoras de serviço, ao passo que tutela os direitos subjetivos das famílias demandantes,
mantendo, pois, posições fixas sob o viés judicial. E tal peso, por sua vez, não têm satisfeito
aos interesses ou às necessidades das famílias, considerando o tempo médio das ações e a
moda dos valores atribuídos a título de indenização por danos morais.
Da mesma forma, também se verifica um tratamento jurídico uniforme a todos
os conflitos referentes às famílias em face das escolas, independentemente de suas
respectivas naturezas, quais sejam: acidentes no interior dos estabelecimentos de ensino,
com consequências leves ou graves; práticas supostamente vexatórias por parte de algum
funcionário das escolas; danos e furtos de pertences de alunos dentro das escolas; conflitos
sobre supostas inadequações pedagógicas; problemas com documentação escolar; casos de
violência, nos mais variados níveis etc.
Outro fato observado, durante o supracitado período, diz respeito à pouca ou quase
nenhuma cogitação, tanto por parte dos advogados das partes como entre os magistrados,
da mediação para resolver os conflitos judicializados, conforme análise das sentenças e
dos acórdãos no âmbito do TJRJ. De um modo geral, as primeiras decisões, logo após as
petições iniciais, por parte dos magistrados lotados nas Varas Cíveis, têm sido no sentido de
se determinar datas para audiências de conciliação, o que, do ponto de vista processual se
coaduna com o que dispõe o Código de Processo Civil.
Contudo, se por um lado, estas mesmas decisões assim procedem, por outro, fica uma
indagação do motivo acerca da não indicação de sessão de mediação, ao invés de audiência
de conciliação, em especial, quando as partes conflitantes – no caso, famílias e escolas – já
possuem um vínculo anterior à judicialização das demandas, conforme prevê os arts. 165, §
3º, e 334, da referida norma processual.
A partir das referidas observações, é possível perceber limites à consolidação da
mediação de conflitos em questões escolares, a exemplo de outras experiências cada vez
mais bem sucedidas das relações sociais levadas a juízo.
Um destes limites concerne, repita-se, ao enfoque exclusivo ou predominantemente
jurídico formal aos conflitos escolares, descartando-se possibilidades de leitura de um mundo
para além do Direito, a fim de levar em consideração aspectos psicológicos, éticos, sociais
e, sobretudo, culturais relevantes, inclusive, quando está em jogo decidir litígios envolvendo
famílias – que, nas demandas judicializadas, representam menores sob suas guardas – e
escolas.
Importa ter isso em mente quando se uniformiza o tratamento dado, por parte do
Poder Judiciário, a todo e qualquer tipo de conflito envolvendo as famílias e as escolas,
inclusive, as da rede privada, objeto de análise nesse trabalho. Eis que, caberia perguntar se
seria impossível manter um vínculo entre as partes, considerando, por exemplo, um conflito
gerado por um acidente no interior de uma escola, com repercussões leves, distintamente do
que ocorre em um caso grave de violência, com repercussões físicas, morais ou psíquicas de
difícil reversão.
Em outras palavras, seria razoável dar tratamento jurídico a tipos diferentes de conflitos,
inclusive na seara escolar, com consequências distintas, inviabilizando a autocomposição
entre as partes, através da mediação, em que elas, por si mesmas, possam alcançar uma
satisfação mútua?
Possíveis respostas a esta questão podem contribuir para se pensar as possibilidades de
193
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
mediação dos próprios conflitos escolares judicializados, desde que: o mundo do Direito se
abra a outros mundos – tais como os mundos histórico, sociológico, antropológico, filosófico
etc. –; profissionais como advogados e defensores públicos orientem as partes por eles
assistidos, a buscar a solução dos conflitos, por si mesmas, portanto, de modo autônomo;
e magistrados incentivem estas mesmas partes neste mesmo sentido, sensíveis ao mundo
social para além dos Tribunais.
A Constituição Federal, o Código Civil, o Código de Defesa do Consumidor, o Código
de Processo Civil e a Lei de Mediação são textos e, como textos, para além de escritos,
carregam consigo variados significados e sentidos, cujas interpretações, em uma perspectiva
relativizadora para cada contexto e situação, a exemplo do que propõe o pensamento
antropológico, possibilite novas formas de se resolver conflitos, inclusive escolares, por
intermédio da mediação, o que, em última instância, contribua na transformação de uma
cultura do litígio em uma cultura da autocomposição.
Esta é a conclusão, ainda que transitória, a partir de um diálogo entre o Direito e a
Antropologia, que se pode extrair de uma pesquisa exploratória e cujas contribuições espera-
se deixar às leitoras e aos leitores.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1. Introdução
1 “Cito o exemplo dos Ingarikó, povo que habita a região mais setentrional do Brasil, no norte da Terra Indígena Raposa/Serra do
Sol, ao pé do majestoso Monte Roraima. Eles não têm um código escrito, mas possuem normas que são transmitidas oralmente,
de geração em geração. São regras legisladas conforme suas próprias instituições, muito embora, como já dito, não sejam escri-
tas. Quando uma regra é quebrada, um elaborado sistema de resolução de conflitos é acionado. Há, pelo menos, quatro instân-
cias para tentar resolver a questão. A primeira é a família. Sendo algo que não pode ficar apenas na esfera privada da unidade
familiar, o problema é levado ao Tuxaua (líder político, uma espécie de cacique). Não podendo dar solução, chama-se o Esak, um
líder religioso, mas também guardião da cultura Ingarikó, que acumula alguns poderes políticos. Tanto o Tuxaua quanto o Esak
tentam resolver a questão ouvindo os envolvidos na quebra das normas, as respectivas famílias e a comunidade. Se ainda assim
não for pacificada a demanda, leva-se à instância máxima, o Pukkenak, líder máximo dos Ingarikó, guardião de toda cultura de
seu povo, com poderes políticos e religiosos, acima do Tuxaua e do Esak. Ele, após ouvir todos os envolvidos, famílias e comuni-
dade, decidirá a questão” (SILVA, Márcio Rosa da. Diálogo com sistemas de Justiça indígenas como forma de resolução
de conflitos. In: MP no Debate, de 06 de março de 2017. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2017-mar-06/mp-debate-
dialogo-sistemas-justica-indigenas-resolucao-conflitos>. Acesso em: 25 mai. 2020).
199
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
um membro da tribo, “um elaborado sistema de resolução de conflitos é acionado” para tentar
resolver a questão ouvindo os envolvidos na quebra das normas, as respectivas famílias e a
comunidade. Apenas se não for pacificada a demanda nessas tentativas é que o caso é levado
à instância máxima, ao guardião da cultura do povo, com poderes políticos e religiosos, que
depois de ouvir os envolvidos, famílias e comunidade, decide a questão.
Hoje essas práticas estão sendo ressuscitadas como ferramentas paralelas à
administração da justiça do Estado para resolver conflitos que surgem na sociedade. Não
possuem a intenção de suplantar a justiça ordinária, mas complementá-la. Esses métodos ou
mecanismos alternativos constituem uma resposta à justiça sem consenso, que é buscada
através do poder coercitivo exercido pelo Estado e que protege o direito de encontrar soluções
para disputas, por meio da imposição de força legal na resolução do caso e não pela soma de
vontades de ambas as partes.
Na busca por atacar o problema de uma administração de justiça ineficaz e tardia,
o Brasil vem vivendo o auge dos métodos alternativos de resolução de conflitos, com o
objetivo maior de obter acesso rápido, imparcial, eficaz, independente, equitativo, adequado,
responsável e confiável à justiça.
O conceito de justiça por consenso se fundamenta na capacidade das pessoas de
resolver seus próprios conflitos de forma livre e pacífica, com ou sem a intervenção de um
terceiro. Quando ocorre pelo consenso das partes em acatar a decisão de um terceiro, por
elas escolhido, é denominada de arbitragem. Se as partes resolvem procurar alguém para
ajudá-los a resolver a disputa, está-se diante da mediação. No caso de acordo envolvendo
apenas as partes no conflito, ocorre a negociação.
Para Lília Maia de Morais Sales2 os meios alternativos de solução de conflitos são: a
negociação, a conciliação, a mediação e a arbitragem e “todos são de extrema relevância para
o estudo e prática da solução de conflitos na atualidade, visto que a cada dia as empresas, as
associações, os indivíduos procuram formas próprias para compor divergências”.
Hoje o Brasil convive com três tipos de justiça: retributiva, alternativa e restaurativa.
A justiça retributiva se orienta essencialmente em retribuir com o mal da pena o mal
causado pelo delito. O principal objetivo do modelo de justiça retributiva que atualmente
domina o sistema de direito penal é definir a sentença e aplicar a sanção em cada caso
específico. A justiça alternativa é qualquer procedimento alternativo ao processo jurisdicional
para solucionar conflitos de natureza civil, familiar, comercial, criminal ou judicial, aos quais
as partes envolvidas possam recorrer voluntariamente, para buscar uma solução acordada
para encerrar sua controvérsia, através das várias técnicas previstas na lei. A justiça
restaurativa é um modelo alternativo para enfrentar o crime e resolver disputas que, em
vez de se basear na idéia tradicional de vingança ou punição, parte da importância para a
sociedade da reconciliação entre a vítima e o ofensor, para que o mal sofrido seja reparado
e a pessoa responsável pelo crime possa voltar ao convívio social. Um terceiro imparcial
assume a responsabilidade de auxiliar na decisão dos envolvidos sobre quanto dano pode
ser reparado, quanto pode ser prevenido para se conseguir a restauração do status social
previamente existente.
Dentro desse contexto macro, o artigo em tela trata das formas de composição de
2 SALES, Lília Maia de Moraes. Justiça e mediação de conflitos. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 36.
200
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
2. Processo da desjudicialização
3 Procedimentos especiais de jurisdição voluntária (Capítulo XV - dos procedimentos de jurisdição voluntária - artigos 719
e seguintes do Código de Processo Civil de 2015).
201
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
não for possível é que a questão será remetida à Justiça Federal, que é o juízo competente
para o caso4.
Ainda a Lei nº 11.977, de 07 de julho de 2009 que desjudicializa a usucapião urbana
prevista no artigo 183, da Constituição Federal de 1988.
Com a perspectiva da colaboração e celeridade no processo, trazida pelo atual Código
de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015), a desjudicialização contempla
diversas medidas para desafogar o Poder Judiciário, buscando a pacificação de conflitos sociais
de modo extrajudicial. Para tanto, oferece diversas alternativas de resolução de conflitos
por vias extrajudiciais, inclusive a possibilidade de mediação e conciliação no âmbito dos
cartórios, o que antes só era possível com a intervenção do Poder Judiciário.
Antes, porém, ainda em 2010, o Conselho Nacional de Justiça, por meio da Resolução
nº 125, de 29 de novembro, deu importante passo no sentido de fomentar o uso da mediação
e da conciliação, ao incumbir aos órgãos do Poder Judiciário a tarefa de “oferecer mecanismos
de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação
e a conciliação bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão” (parágrafo único,
do artigo 1º, da Resolução CNJ nº 125, de 29 de novembro de 2010). O artigo 8º, da mesma
Resolução, previu a criação de Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Centros
ou CEJUSCs), para a realização de sessões de conciliação e mediação pré-processuais.
Os mais recentes instrumentos normativos no sentido da desjudicialização do Poder
Judiciário é a Lei da Mediação, Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015, que, dentre outras
disposições, prevê a possibilidade de mediação extrajudicial como figura jurídica consensual
de resolução de conflitos; e a Emenda CNJ nº 02, de 08 de março de 2016, que altera a
Resolução CNJ nº 125, de 29 de novembro de 2010, que dispõe sobre a Política Judiciária
Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário.
De acordo com o parágrafo único, do artigo 1º, da Resolução CNJ nº 125, de 29 de
novembro de 2010, alterada pela Emenda CNJ nº 02, de 08 de março de 2016:
Parágrafo único: aos órgãos judiciários incumbe, nos termos do artigo 334 do Novo
Código de Processo Civil combinado com o artigo 27 da Lei de Mediação, antes da
solução adjudicada mediante sentença, oferecer outros mecanismos de soluções de
controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a mediação e a
conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão.
Estas inovações, dentre outras nesse sentido trazidas à ordem jurídica brasileira, visam
aliviar o Poder Judiciário por meio da delegação de algumas de suas funções meramente
administrativas, desjudicializando procedimentos tipicamente administrativos5.
A tendência da desjudicialização impõe a releitura da “atuação do Poder Judiciário nos
processos de jurisdição voluntária e naqueles em que não há litígios”6, para que tal competência
possa ser compartida com outros órgãos fora da esfera judicial. A solução que já vem sendo
4 Vide Seção III-A “Da Demarcação de Terrenos para Regularização Fundiária de Interesse Social”, composta pelos artigos
18-A, 18-B, 18-C, 18-D e 18-F, do Decreto-Lei nº 9.760, de 05 de setembro de 1946, incluída pela Lei nº 11.481, de 31 de
maio de 2007.
5 SANTOS, César Augusto dos. Breve abordagem sobre o tema da desjudicialização em busca de alternativas ao
descongestionamento do Poder Judiciário. In: Revista Jurídica De Jure, vol. 10, nº 17, p. 259-281. Ministério Público do
Estado de Minas Gerais, jul./dez. 2011. p. 274.
6 CHALHUB, Melhim Namem. Usucapião administrativa. In: SOUZA, Eduardo Pacheco Ribeiro de (org.). IDEAL (Instituto de
Estudos Albergaria) - direito notarial e registral. São Paulo: Quinta Editorial, 2010. p. 231.
202
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Artigo 35: a execução das medidas socioeducativas reger-se-á pelos seguintes princípios:
I - legalidade, não podendo o adolescente receber tratamento mais gravoso do que o
conferido ao adulto; II - excepcionalidade da intervenção judicial e da imposição de
medidas, favorecendo-se meios de autocomposição de conflitos; III - prioridade a práticas
ou medidas que sejam restaurativas e, sempre que possível, atendam às necessidades
das vítimas; IV - proporcionalidade em relação à ofensa cometida; V - brevidade da
medida em resposta ao ato cometido, em especial o respeito ao que dispõe o artigo
7 CAMPOS, Mario. Métodos alternativos de resolução de conflitos e o Novo CPC. In: Jus Brasil, de 13 de novembro
2017. Disponível em: <https://mcaampos.jusbrasil.com.br/artigos/519785874/metodos-alternativos-de-resolucao-de-con-
flitos-e-o-novo-cpc>. Acesso em: 27 mai. 2020. p. 01.
203
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
8 “Artigo 122: a medida de internação só poderá ser aplicada quando: I - tratar-se de ato infracional cometido mediante
grave ameaça ou violência a pessoa; II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves; III - por descumprimento
reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta. Parágrafo 1º: o prazo de internação na hipótese do inciso III
deste artigo não poderá ser superior a três meses, devendo ser decretada judicialmente após o devido processo legal.
Parágrafo 2º: em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada (Estatuto da Criança e do
Adolescente).
9 DIGIÁCOMO, Murillo José. A mediação e o direito da criança e do adolescente no Brasil: construindo alternativas
para a desjudicialização do atendimento. In: Doutrina do Boletim Informativo nº 77, ano IX, p. 01-07. Rio de Janeiro: Centro
de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça da Infância e Juventude, jan./fev./mar. de 2017. p. 04.
10 SALES, Lília Maia de Moraes. Op. cit., p. 36.
204
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
partes não são tidas como adversárias, figurando o acordo como consequência da comunicação
entre as partes. Enquanto “na conciliação o mediador sugere, interfere, aconselha”; “na
mediação, o mediador facilita a comunicação, sem induzir as partes ao acordo”11.
A conciliação se traduz no encerramento do conflito por intermédio de uma composição
amigável, por iniciativa de um conciliador que interfere nas tratativas, podendo ser um
magistrado, o árbitro ou um terceiro, dispensando sua decisão de mérito, cuja sentença
passa a ser meramente homologatória, não devendo ser confundida com o acordo, cujo teor
é levado pelas partes e homologado pelo juiz. O conciliador não é escolhido pelas partes, o
que resulta em uma maior intervenção na tentativa de solução do conflito12.
Existe muita discussão doutrinária em torno das diferenças e semelhanças entre
conciliação e mediação. Porém, o grande dissenso se dá em virtude de serem afins, chegando
até mesmo a confundirem-se algumas vezes, haja vista que tanto num quanto noutro instituto
a intervenção do terceiro visa apenas propor soluções que, entretanto, não substituem a
vontade das partes. Desse modo, “é de pouca importância tentar distingui-los”13.
Para Ada Pellegrini Grinover, Kazuo Watanabe e Caetano Lagrasta Neto14, sobre a
diferenciação entre conciliação e mediação, “a conciliação vem prevista no Código de
Processo Civil”: “artigo 125: o juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código,
competindo-lhe: [...]; IV - tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes [...]” e no artigo 331,
in verbis:
Artigo 331: se não ocorrer qualquer das hipóteses previstas nas seções precedentes, e
versar a causa sobre direitos que admitam transação, o juiz designará audiência preliminar,
a realizar-se no prazo de trinta dias, para a qual serão as partes intimadas a comparecer,
podendo fazer-se representar por procurador ou preposto, com poderes para transigir.
Parágrafo 1º: obtida a conciliação, será reduzida a termo e homologada por sentença.
Parágrafo 2º: se, por qualquer motivo, não for obtida a conciliação, o juiz fixará os pontos
controvertidos, decidirá as questões processuais pendentes e determinará as provas a
serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento, se necessário.
Parágrafo 3º: se o direito em litígio não admitir transação, ou se as circunstâncias da causa
evidenciarem ser improvável sua obtenção, o juiz poderá, desde logo, sanear o processo
e ordenar a produção da prova, nos termos do parágrafo 2º.
205
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
A mediação é um processo voluntário que oferece àqueles que estão vivenciando uma
situação de conflito a oportunidade e o espaço adequados para conseguir buscar uma
solução que atenda a todos os envolvidos. Na mediação as partes expor seu pensamento
e terão uma oportunidade de solucionar questões importantes de um modo cooperativo
e construtivo. O objetivo da mediação é prestar assistência na obtenção de acordos,
que poderá construir um modelo de conduta para futuras relações, num ambiente
colaborativo em que as partes possam dialogar produtivamente sobre seus interesses e
necessidades.
15 GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo; LAGRASTA NETO, Caetano. Op. cit., p. 12.
16 SALES, Lília Maia de Moraes. Op. cit., p. 40.
17 Plá Rodriguez apud MARTINS FILHO, Ives Gandra. Processo coletivo do trabalho. 3. ed. ver. e ampl. São Paulo: LTr,
2003. p. 23.
18 RODRIGUES JUNIOR, Walsir Edson. A prática da mediação e o acesso à justiça. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 50.
19 PJERJ, Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro. O que é mediação? Palácio da Justiça do Estado do Rio de Janeiro
- Fórum Central. Disponível em: <http://www.tjrj.jus.br/web/guest/institucional/mediacao/estrutura-administrativa/o-que-
e-mediacao>. Acesso em: 28 mai. 2020. p. 01.
20 Plá Rodriguez apud MARTINS FILHO, Ives Gandra. Op. cit., p. 23.
206
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
[...] um grande e fértil campo de trabalho para o advogado, que, com a celeridade,
objetividade e efetividade do processo arbitral, obtêm resposta aos reclamos de seus
Cientes de forma ágil e satisfatória (o mesmo ocorre, obviamente, com a remuneração
decorrente de seu trabalho na demanda).
207
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
especial que qualquer pendência surgida em decorrência do contrato será dirimida por meio
da arbitragem. No momento posterior, ou seja, depois do surgimento da controvérsia, a
parte interessada manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via
postal ou por outro meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento,
convocando-a para, em dia, hora e local certos, firmar o compromisso arbitral (artigo 6º, da
Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996).
Em qualquer dos casos (cláusula ou compromisso), surgida à controvérsia, as partes,
depois da escolha do árbitro ou árbitros (pode ser mais de um, mas em número ímpar, para
que a decisão não resulte empatada27) firmarão um contrato de compromisso arbitral, onde
serão fixadas as regras procedimentais nas quais a arbitragem será desenvolvida.
Operacionalmente existem dois tipos de arbitragem: a institucional e a ad hoc. A primeira
é aquela em que as partes submetem o seu litígio a uma instituição arbitral que administrará
todo o procedimento de arbitragem, oferecendo um rol de árbitros para serem escolhidos
pelas partes, além de todos os procedimentos a serem observados. Já na arbitragem ad hoc,
as partes escolhem um árbitro, e ambos disciplinarão, previamente, os procedimentos da
arbitragem, específicos para o caso em questão28.
O árbitro (ou árbitros), terceira pessoa que compõe a relação formada na arbitragem,
é responsável pela solução de um conflito entre as partes. Para decidir as questões
suscitadas, o árbitro se fundamentará de acordo com seu livre arbítrio e convicção,
baseando-se na lei ou na equidade (fora das regras de direito objetivo) e exarando sua
decisão na sentença arbitral29.
Na arbitragem tudo é previamente estipulado pelas partes desde os prazos e os gastos,
sem burocracia e os diversos problemas da Justiça Estatal, sem se falar das nem sempre
desejadas surpresas de uma decisão judicial. Como a arbitragem se desenvolve da forma
predefinida pelas partes e, por isso, diferente do que ocorre nos fóruns, não existe tensão e
o excesso de rigor processual presentes no contencioso judicial.
No procedimento arbitral destacam-se três princípios jurídico-processuais: a igualdade
de tratamento das partes, o do contraditório e o da livre convicção do julgador, no caso,
o árbitro. Ademais é um procedimento sigiloso, pois somente as partes e o árbitro tem
conhecimento da sua ocorrência e conteúdo, e bem mais célere do que a Justiça Estatal, já
que não cabe recurso à decisão do árbitro.
Com efeito, a arbitragem difere completamente do instituto da conciliação, pois o
conciliador faz uma proposta, após ouvir as questões suscitadas pelas partes tampouco significa
mediação, pois nessa modalidade as próprias partes fazem a negociação, assessoradas por
um mediador. Não se pode olvidar que, antes de instituir a arbitragem, o árbitro pode atuar
como mediador, aproximando as partes, encontrando a melhor solução para a controvérsia. O
instituto da arbitragem também se difere da decisão judicial principalmente porque a solução
jurisdicional é pública enquanto que a arbitragem é privada, o que não significa que tenha
27 “Artigo 13: pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes. Parágrafo 1º: as partes nomearão
um ou mais árbitros, sempre em número ímpar, podendo nomear, também, os respectivos suplentes. [...]” (Lei nº 9.307, de
23 de setembro de 1996).
28 LIMA, Alex Oliveira Rodrigues de. Arbitragem: um novo campo de trabalho. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Iglu, 1998.
p. 12.
29 “Artigo 2º: a arbitragem poderá ser de direito ou de equidade, a critério das partes” (Lei nº 9.307, de 23 de setembro de
1996).
208
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
30 MORAES, José Luis Bolzan de; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação e arbitragem: alternativas à Jurisdição. 2. ed. rev.
e amp. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 126.
31 MAIA NETO, Francisco. Op. cit., p. 18.
32 SOUZA, Fábio Araújo de Holanda. Mediação familiar e a segurança pública. Artigo publicado em 17 de junho de
2009. Disponível em: Acesso em: 22 ago. 2012. p. 01.
33 Luís Alberto Warat apud SALES, Lília Maia de Moraes. Op. cit., p. 04.
209
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
34 INTERNACIONAL, Legislação. Convenção sobre os Direitos da Criança: adotada em Assembleia Geral das Nações
Unidas em 20 de novembro de 1989. Disponível em: <http://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10120.htm>. Acesso em:
29 mai. 2020. p. 01.
35 Artigo 40, da Convenção sobre os Direitos da Criança, de 1989.
36 ROSA, Miriam Debieux. O discurso e o laço social dos meninos de rua. Psicol. USP, vol.10, no 2, São Paulo, 1999. Dis-
ponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-65641999000200013&script=sci_arttext>. Acesso em: 26 mai.
2020. p. 01.
37 ROSA, Miriam Debieux. Op. cit., p. 01.
210
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1889, a proteção e assistência aos menores de idade foi se tornando cada vez mais necessária.
A sociedade exigia uma manifestação positiva do Estado nesse sentido, até que em 1920 já
estava consolidada a ideia de que a assistência à criança carente e abandonada, definida na
época como “menor”, deveria ser prestada pelo Estado e não pela iniciativa privada. Por isso é
que se começou a trabalhar na elaboração de uma lei de proteção aos menores brasileiros, que
acabou consolidada na forma do Decreto nº 17.043-A, de 12 de outubro de 1927, e que foi
batizado de “Consolidação das Leis de Assistência e Proteção a Menores” ou, simplesmente,
“Código de Menores de 1927”.
O Código de Menores de 1927, primeiro texto normativo especial a tratar da matéria em
toda a América Latina, adotou a tese de que a assistência aos menores (carentes, abandonados,
delinquentes) deveria acontecer por meio da educação e que, quanto mais cedo houvesse
tal intervenção, no sentido de tratamento, maiores seriam as chances de sua recuperação e
reintegração social.
É importante destacar, todavia, que a definição do menor obrigatoriamente delinquente
apenas por ser pobre não é uma construção brasileira. Um dos fatores que fortemente
concorreram para a disseminação da ideia de que criança pobre é criança delinquente,
também chamada de “menor”, segundo Jadir Cirqueira de Souza38, consistiu na criação do
Primeiro Tribunal para Menores de Illinóis, nos Estados Unidos da América, em 1899 que,
depois, teve como consequência, a criação da doutrina do menor em situação irregular. Outro
importante acontecimento que reforçou a tese da pobreza como condição de marginalidade
penal decorreu, paradoxalmente, do término da Primeira Grande Guerra Mundial, vale dizer,
dos efeitos bélicos que deixaram grande número de crianças miseráveis e sem famílias que,
para sobreviver, tiveram que praticar delitos patrimoniais e, ao mesmo tempo, era alvo fácil
para serem usadas no cometimento de infrações penais diversas39
Esses fatores internacionais também refletiram e influenciaram a sociedade brasileira,
na medida em que acrescidos aos diversos acontecimentos internos, provocaram também
no Brasil a confusão conceitual entre as crianças pobres e as crianças praticantes de ilícitos
penais. Esta visão distorcida sobreviveu ao tempo e ainda perdura na atualidade.
Apesar de alguns movimentos isolados no sentido da melhoria da defesa infanto-
juvenil no plano jurídico-legislativo devido à difusão dos princípios iluministas da Revolução
Francesa de 1789 (liberté, legalité, fraternité), até o fim da Segunda Grande Guerra Mundial
(1945), as ações protetivas tinham nítido conteúdo repressivo e autoritário. Ademais, até
então as legislações internas da maioria dos países ainda não contemplavam a proteção
infantojuvenil, nos termos da atual doutrina da proteção integral.
Isso se verifica no Brasil, pois em todas as Constituições brasileiras anteriores à de
1988, os direitos e interesses relativos às crianças e aos adolescentes foram fixados de forma
esparsa, quase inexistente, sem nenhuma sistematização, voltados, principalmente, para os
aspectos e medidas repressivas estatais da delinquência juvenil40.
A palavra “menor” fora utilizada até a década de vinte do século passado como “categoria
jurídica” caracterizadora da criança ou adolescente carente e envolvido com a prática de
infrações penais. Com o Código de Menores de 1927, o termo foi utilizado para designar
38 SOUZA, Jadir Cirqueira de. A efetividade dos direitos da criança e do adolescente. São Paulo: Pillares, 2008. p. 58.
39 SOUZA, Jadir Cirqueira de. Op. cit., p. 58.
40 Idem, ibidem, p. 24.
211
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
aqueles que se encontravam em situação de carência material ou moral, além das infratoras.
Depois surge o Código de Menores de 1979 que traz uma nova categoria, a do “menor em
situação irregular”, vale dizer, o menor de dezoito anos materialmente abandonado, vítima
de maus-tratos, em perigo moral, juridicamente desassistido, com desvio de conduta ou
autor de infração penal41.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, as crianças e os adolescentes foram
significativamente beneficiados, a começar pela expressão “menor”, substituída por “criança
e adolescente”. Adotou-se, de forma definitiva no cenário brasileiro, a doutrina jurídica da
proteção integral, que passou a representar um novo marco na proteção da infância e da
adolescência. Na visão dessa teoria, a criança e o adolescente devem ser protegidos e seus
direitos garantidos em qualquer situação, além de terem reconhecidas prerrogativas idênticas
às dos adultos. Com o termo “doutrina da proteção integral dos direitos da infância” se faz
referência a um conjunto de instrumentos jurídicos de caráter internacional, que expressam
um salto qualitativo fundamental na consideração social da infância. Nas palavras de Felício
Pontes Júnior42:
O resultado da mobilização popular em favor dos direitos da criança, que tinha como
argumento os fatores objetivos (realidade brasileira) e subjetivos (normativa internacional),
foi a inclusão na Constituição Federal de 1988 de uma verdadeira Declaração dos Direitos
e Garantias lnfanto-Juvenis Fundamentais (artigo 277) cujo conteúdo inaugurou a nova
concepção sociojurídica sobre infantes e jovens, denominada de “doutrina da proteção
integral” e, ainda, consagrando o princípio da prioridade absoluta no atendimento de seus
direitos. Entretanto, essa inovação não se resume ao aspecto de uma Constituição possuir
uma declaração específica para crianças e adolescentes. Nela estão incluídos, também, os
modos pelos quais os direitos são assegurados, ou seja, as garantias dos direitos - daí a
denominação de “Declaração de Direitos e Garantias Infanto-Juvenis Fundamentais”.
Recorde-se que a Constituição Federal de 1988 foi elaborada logo depois do encerramento
do período ditatorial, como “instrumento legítimo de consagração, com força jurídica, das
aspirações por justiça social e proteção da dignidade humana”. Não se pode perder de vista
que foi em resposta a esses anseios que o Legislador Constituinte de 1988 fez consignar,
no texto constitucional, “os direitos fundamentais da pessoa humana” inovando ao prever,
também, “os meios de garantia desses direitos e fixando responsabilidades por seu respeito
e sua promoção”43.
Na sequência cronológica, a partir das exigências da Constituição Federal de 1988 e em
substituição ao Código de Menores de 1979, em julho de 1990 o legislador infraconstitucional
criou o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990), que
insere a questão dessas pessoas nos parâmetros Constitucionais e internacionais, de forma
a considerar sua peculiaridade de “pessoa em desenvolvimento”.
Com a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente, que
adotaram a doutrina da proteção integral, desaparece a figura do “menor”, expressão
estigmatizada, e passa-se a falar em crianças e adolescentes, agora como sujeitos de direitos,
41 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente: construindo o conceito de sujeito-cidadão.
p. 31-50. In: WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato (orgs.). Os “novos” direitos no Brasil: natureza e
perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 35.
42 PONTES JÚNIOR, Felício. Conselhos de direitos da criança e do adolescente. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 10.
43 DALLARI, Dalmo de Abreu. Constituição e Constituinte. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 115.
212
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
protegidos juridicamente, devendo estes possuir os mesmos direitos que os adultos e, ainda,
contando com direitos especiais advindos da sua condição específica de pessoa em fase de
desenvolvimento.
Sinteticamente, o direito da criança e do adolescente contemporâneo se estrutura a
partir do direito internacional público e privado, dos tratados e convenções internacionais,
do direito constitucional contemporâneo, do direito civil, do direito trabalhista, do direito
processual e, também, de certas leis extravagantes como a Lei de Ação Civil Pública (Lei nº
7.347, de 24 de julho de 1985), imprescindível quando o assunto é tutela dos interesses
difusos e coletivos e a recente Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012 que, basicamente,
regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique
ato infracional e institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). Ao
adolescente acusado da prática de ato infracional são assegurados direitos individuais,
relacionados nos artigos 106 a 109 do Estatuto da Criança e do Adolescente, em reprodução
a disposições similares contidas no artigo 5º, da Constituição Federal de 1988.
Mais recentemente surge Código de Processo Civil de 2015. Como a tônica do
procedimento para apuração de ato infracional é a celeridade, sendo que embora possua
regras próprias e não tenha por escopo a aplicação de sanção de natureza penal, por força
do disposto no artigo 152, do Estatuto da Criança e do Adolescente são a ele aplicadas, em
caráter subsidiário (na falta de disposição expressa do Estatuto e desde que compatíveis
com a sistemática e os princípios que estabelece), as normas gerais previstas no Código
de Processo Penal, com exceção do sistema recursal do artigo 198 do Estatuto que prevê
a adoção do sistema recursal do Código de Processo Civil, o que é válido, inclusive, para o
procedimento para apuração de ato infracional44.
Além de todo este arcabouço normativo, o direito da criança e do adolescente se
entrelaça com outras áreas não jurídicas do conhecimento, a exemplo da sociologia, da
psicologia, da pedagogia e da criminologia, dentre outras.
Esta nova ordem representa uma verdadeira revolução, na esteira dos desenvolvimentos
das doutrinas internacionais, em termos de proteção integral e do reconhecimento da
criança e do adolescente como cidadãos e sujeitos de direitos. Significa que as crianças e
os adolescentes não podem mais ser tratados como meros receptores de garantias. Como
sujeitos, são elevados a autores da própria história, enquanto atores sociais.
Para tanto, o direito da criança e do adolescente faz uso de uma importante ferramenta:
a educação, considerada um dos mais eficazes instrumentos para o surgimento do sujeito-
cidadão. Nas palavras de Josiane Rose Petry Veronese45:
44 MPPR, Ministério Público do Paraná. Criança e adolescente: procedimento para apuração de Ato Infracio-
nal. Disponível em: <http://www.crianca.mppr.mp.br/pagina-1661.html>. Acesso em: 29 mai. 2020. p. 01.
45 VERONESE, Josiane Rose Petry. 2003. Op. cit., p. 32.
213
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
214
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
escolhido como vítima, dentre outras perguntas que jamais seriam proferidas diante de um
juiz ou de um Tribunal de Júri. Essa comunicação poderá trazer alento à vítima que além de
saber as razões do autor do fato criminoso poderá desabafar sobre seu sofrimento e expor
sua revolta de forma pacífica50.
Ademais, a mediação penal também autoriza a resolução objetiva do conflito, ou
seja, a proposição de pena e a ficação de obrigações. A reparação poderá ser de natureza
econômica, na forma da realização de um serviço em benefício da vítima ou à coletividade.
Ainda pode simplesmente resultar numa manifestação de arrependimento ou num pedido de
desculpas51.
Os tipos penais passíveis de mediação penal restaurativa são todos os conflitos em
que as partes e a comunidade possam se beneficiar com o resultado. Assim, sempre que
os benefícios do processo restaurativo sejam identificados como possíveis, os métodos da
mediação penal restaurativa podem ser usados, em qualquer tipo penal e qualquer estágio
do processo de justiça criminal. Essencialmente a mediação penal restaurativa tem por meta
substituir o castigo pela compensação, a exclusão pela reintegração e a imposição pela
negociação. Devido aos seus benefícios relacionados à responsabilização, à conscientização
e à possibilidade de reflexão, vem sendo cada vez mais pensada e praticada para a resolução
de conflitos penais envolvendo adolescentes.
A justiça restaurativa está harmonizada com a justiça penal tradicional, inclusive
indica princípios disciplinadores e prevê a supervisão e controle, pelo Estado, dos acordos.
Conforme Ana Carla Coelho Bessa52, a mediação penal restaurativa não pode ser taxada
como conivente ou permissiva do autor do ato infracional, ou, de outro nado, como punitiva.
A pretensão dessa prática é o diálogo, a comunicação e o envolvimento ativo da vítima, do
agressor e de outros envolvidos, na busca da melhor solução possível para o conflito.
Um exemplo, do ponto de vista jurídico e ideológico, de um ambiente propício para
o desenvolvimento de mecanismos de mediação é nas escolas, onde podem ser utilizados,
inclusive no caso de prática de atos infracionais pelos alunos. Partindo do princípio de que a
intervenção socioeducativa deve ter uma conotação eminentemente “pedagógica”, as escolas
podem contribuir para a efetivação de uma política socioeducativa idônea e resolutiva, por
meio da “criação de mecanismos de prevenção à violência e à evasão escolar, bem como de
mediação dos conflitos que surgirem entre os membros da comunidade escolar”.
De acordo com o artigo 205, da Constituição Federal de 1988, a educação é um direito
de todos e um dever do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. O dever do Estado com a educação
será efetivado mediante a garantia de “educação básica obrigatória e gratuita dos quatro aos
dezessete anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não
tiveram acesso na idade própria” (inciso I, do artigo 208, da Constituição Federal de 1988).
Portanto, praticando ato infracional dentro ou fora do ambiente escolar, o fato é que todo
adolescente deve estar frequentando uma escola, e nenhum ambiente é mais propício para o
215
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Em razão disto, algumas das técnicas usadas na mediação devem ser ensinadas a todos
os profissionais da educação, de modo que estes saibam como abordar e encaminhar
o caso de forma adequada, efetuando aos alunos envolvidos e seus pais as orientações
preliminares devidas. Na verdade, cabe ao regimento escolar não apenas prever a
existência dos referidos mecanismos de mediação, mas também definir um “protocolo”
para atuação dos professores - e da própria direção da escola - quando da ocorrência
de situações de conflito envolvendo seus alunos, sem prejuízo da articulação de ações
com a “rede de proteção à criança e ao adolescente” local, de modo que esta possa ser
imediatamente acionada sempre que necessário.
216
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
[...] contemple mecanismos de mediação dentro de fora das escolas, com a definição de
“fluxos” e “protocolos” de atendimento entre os diversos órgãos e agentes corresponsáveis
pelo atendimento de adolescentes (e mesmo crianças) envolvidas com a prática de atos
infracionais e suas respectivas famílias56.
5. Conclusão
Para finalizar e arrematar o raciocínio traz-se à luz o mito grego da Esfinge58, que
retrata bem o jovem adolescente, o qual deseja e busca, sem saber ao certo como, alcançar o
respeito como sujeito singular e autônomo. Quando isso não ocorre, este atua em desacerto,
como no caso vivenciado por Édipo59.
217
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
218
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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221
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
OS MÉTODOS ADEQUADOS DE
RESOLUÇÃO DE CONFLITOS E
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:
DO LITÍGIO AO CONSENSO
1. Introdução
A noção de supremacia absoluta do interesse público tem sido revisitada, já que data
de uma época que não mais condiz com a evolução da humanidade. Além disso, a própria
definição de interesse público também foi objeto de aprimoramento, objetivando-se adequar
o novo perfil da Administração Pública aos anseios da sociedade.
O atual papel do Estado Democrático de Direito, com a observância dos princípios
constitucionais e o respeito ao direito à boa administração pública, deve se pautar na busca
pela resolução consensual dos conflitos, sendo que a participação do cidadão também se
mostra fundamental para a legitimidade democrática da atuação estatal.
Desta forma, a busca pela consenso, ao invés da batalha judicial, implica, acima de
tudo, uma mudança cultural, uma mudança de pensamento, onde a cooperação entre as
partes acarreta ganhos para os dois lados, pois nem sempre aquele que se logra vencedor
numa demanda, acaba vencendo de fato, tendo em vista a existência de inúmeros fatores,
dente eles, a possibilidade de se interpor recursos, bem como de ajuizar a ação rescisória nas
hipóteses legalmente previstas, além dos inúmeros entraves burocráticos para se conseguir,
222
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Modernamente, tem se constatado que o acesso à justiça precisa ser concebido não
apenas como o ingresso no Poder Judiciário, mas sim como o acesso a uma ordem jurídica
efetivamente justa, no qual os métodos adequados de resolução de conflitos se apresentam
como instrumentos hábeis à solução de questões pela via da consensualidade.
De acordo com o ilustre mestre Humberto Dalla Bernardina de Pinho1, o princípio da
1 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. In “A releitura do princípio do acesso à justiça e o redimensionamento da in-
tervenção judicial na resolução dos conflitos na contemporaneidade”. Disponível em: https://www.cidp.pt/revistas/
rjlb/2019/3/2019_03_0791_0830.pdf. Acesso em: 04 jul. 2020.
223
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
inafastabilidade da jurisdição deve passar por uma releitura, não ficando restrito ao acesso ao
Judiciário, mas também abrangendo demais possibilidades de solucionar conflitos no âmbito
privado. Ainda segundo o renomado mestre, a via judicial deve permanecer aberta, mas não
precisa ser a primeira ou a única solução, devendo ser utilizado de forma subsidiária, evitando-
se a sua sobrecarga, a fim de gerar efetividade e a celeridade da prestação jurisdicional.
Desta forma, a busca pela consensualidade tem contribuído de forma significativa, para
a diminuição do tempo de duração das demandas que já foram ajuizadas perante os Tribunais
e também tem evitado o ajuizamento de novas ações, auxiliando no descongestionamento
do Poder Judiciário e fornecendo um resultado útil para as partes envolvidas2.
Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero3 nos informam que:
Cumpre, ainda, mencionar que o acesso deve ser assegurado não apenas no âmbito
do Poder Judiciário, mas também na esfera administrativa, na medida em que o cidadão deve
estar integrado nas tomadas de decisões por parte da Administração.
Aquele perfil autoritário, austero, da Administração Pública não mais se adequa às
Constituições democráticas, nas quais o ser humano passou para o centro do ordenamento
jurídico, devendo os demais ramos do direito obediência aos direitos e garantias
constitucionalmente assegurados.
Além disso, a noção de acesso à justiça precisa ser ampliada além das fronteiras do
território do país em que foi proferida determinada decisão, seja judicial ou administrativa,
bem como abranger não apenas a via judicial, mas também os métodos adequados de
resolução de conflitos.4
2 De acordo com Alexandre Freitas Câmara, “as soluções consensuais são, muitas vezes, mais adequadas do que a impo-
sição jurisdicional de uma decisão, ainda que esta seja construída democraticamente através de um procedimento em
contraditório, com efetiva participação dos interessados.” (In O Novo Processo Civil Brasileiro. 2.ed. São Paulo: Atlas,
2016. p. 7).
3 MARINONI. Luiz Guilherme. ARENHART. Sérgio Cruz e MITIDIERO, Daniel. Curso de Processo Civil – Volume 1 – Teoria
do Processo Civil. 2.ed. Revista dos Tribunais. 2016. p.180-181.
4 Segundo a ilustre mestre Flávia Pereira Hill, “Com efeito, o acesso à justiça deve garantir ao jurisdicionado não apenas
a possibilidade de se utilizar de instrumentos processuais eficazes perante o seu país de origem, mas onde quer que seja
necessário para que logre alcançar o bem da vida que faz jus. (...) Reconhecer que o acesso à justiça é universal e que emana
do próprio mínimo existencial da dignidade da pessoa humana, sem o qual não há existência humana condigna, importa em
assentir que se trata de um princípio basilar, que deve sobrepairar aos demais. Desse modo, faz-se necessário estender aos
jurisdicionados envolvidos em controvérsias com viés transnacional a garantia fundamental do acesso à justiça, resgatando-
se, assim, a sua genuína universalidade. (...) O princípio fundamental do acesso à justiça deve ser revisitado à luz das novas
características apresentadas pela sociedade moderna, marcadamente globalizada. O acompanhamento das modificações
sociais ao longo dos tempos é essencial para a manutenção do acesso à justiça a todos os jurisdicionados. A aplicação,
acrítica e automática, de propostas antigas a anseios sociais novos coloca em xeque o acesso à justiça e, com isso, acaba
por vulnerar a efetividade do processo.” (In O Direito Processual Transnacional como forma de acesso à justiça no
século XXI: os reflexos e desafios da sociedade contemporânea para o direito processual civil e a concepção de um título
executivo transnacional. Rio de Janeiro: GZ editora, 2013. p. 99-100).
224
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Um dos fatores que têm contribuído para o aumento da busca pelo acesso à justiça é o
direito à informação. De acordo com a lição do ilustre mestre Paulo Cezar Pinheiro Carneiro5:
Desta forma, verifica-se que, para ser assegurada a qualidade do acesso à justiça e o
atendimento equânime das partes, a realidade social acaba por ensejar a busca pela utilização
de outros métodos, igualmente eficazes, para a resolução dos conflitos.
José dos Santos Carvalho Filho6 nos informa, ainda, que os meios de solução consensual,
como por exemplo, a conciliação e a mediação, têm sido denominados pela doutrina de
equivalentes jurisdicionais, na medida em que as partes têm buscado a autocomposição, sem
a necessidade de ingressar no Poder Judiciário, evitando, desta forma, o demandismo judicial
que sempre marcou a nossa formação cultural.
Insta salientar, ainda, que o tempo de duração de um processo é analisado, inclusive,
sob o aspecto econômico7, do que se infere que um Poder Judiciário com um menor
número de demandas consegue apresentar, de forma mais célere e com qualidade, melhores
resultados, sendo o referido fator também levado em consideração quando se pensa em
fazer investimentos em um determinado País.
Em âmbito nacional, o Conselho Nacional de Justiça, a partir de 2015, trouxe dados a respei-
to da lentidão no processo, no “Justiça em números.” A análise realizada até 31/12/2018 levou em
consideração os seguintes indicadores: (i) o tempo médio da inicial até a prolação da sentença; (ii) o
tempo médio da inicial até a baixa e (iii) a duração média dos processos que ainda estavam penden-
tes até 31/12/2018. De acordo com as informações constantes do “Justiça em números 2019”8:
5 CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Acesso à Justiça: Juizados Especiais Cíveis e Ação Civil Pública: Uma nova siste-
matização da Teoria Geral do Processo. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2000. p. 57.
6 CARVALHO FILHO, JOSE DOS SANTOS. O Estado em Juízo no Novo CPC. Atlas. 2016, p.96.
7 Segundo a lição de José Rogério Cruz e Tucci “à medida em que se torna mais delongada e complexa a duração do pro-
cesso, produzindo novas contingências e incertezas, os empresários são obrigados e desenvolver, com presteza, intrinca-
dos mecanismos para proteger seus negócios, capitais e investimentos. A rapidez, destarte, constitui um dos pressupostos
essenciais para a neutralização dos riscos inerentes às tensões e desequilíbrios dos mercados (...) Daí a decisão em tempo
real hoje presente na economia (...) Salta aos olhos ‘a incompatibilidade entre essas duas concepções de tempo. Para gover-
nos, empresas e instituições financeiras, o tempo diferido dos tribunais é sinônimo de elevação dos custos das transações
econômicas. Para o Judiciário, a instituição em hipótese alguma deve ser o reflexo instantâneo dos mundos econômico e
político. O tempo real é visto pelos integrantes desse poder como a negação da maior virtude do império da lei, a certeza,
na medida em que propiciaria julgamentos precipitados, sem o devido distanciamento. Como no choque entre a panela de
barro e a de ferro sempre quebra a mais fraca, o tempo diferido dos tribunais não está conseguindo fazer frente ao tempo
real da economia...(In Tempo e Processo, São Paulo: RT.1997, pp. 117/118).”
8 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em números. Brasília: CNJ, 2019, p. 148. Disponível em:<https://www.cnj.jus.
br/wpcontent/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>, p. 148.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
9 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em números. Brasília: CNJ, 2019, p. 148. Disponível em:<https://www.cnj.jus.
br/wpcontent/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf>, p.142-143.
10 MOREIRA, JOSÉ CARLOS BARBOSA. “O futuro da justiça: alguns mitos”. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/por-
tal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_boletim/bibli_bol_2006/
RDC_06_36.pdf. Acesso em: 04 jul.2020.
11 Com propriedade, Luis Roberto Barroso, ao analisar a força normativa e a efetividade da CRFB/88, nos informa que: “é bem
de ver que o próprio reconhecimento de força normativa às normas constitucionais é conquista relativamente recente no cons-
titucionalismo do mundo romano-germânico2. No Brasil, ela se desenvolveu no âmbito de um movimento jurídico acadêmico
conhecido como doutrina brasileira da efetividade3. Tal movimento procurou não apenas elaborar as categorias dogmáticas
da normatividade constitucional, como também superar algumas das crônicas disfunções da formação nacional, que se mate-
rializavam na insinceridade normativa, no uso da Constituição como uma mistificação ideológica e na falta de determinação
política em dar-lhe cumprimento. A essência da doutrina da efetividade é tornar as normas constitucionais aplicáveis direta e
imediatamente, na extensão máxima de sua densidade normativa. Como consequência, sempre que violado um mandamento
constitucional, a ordem jurídica deve prover mecanismos adequados de tutela – por meio da ação e da jurisdição –, discipli-
nando os remédios jurídicos próprios e a atuação efetiva de juízes e tribunais. Para realizar seus propósitos, o movimento pela
efetividade promoveu, com sucesso, três mudanças de paradigma na teoria e na prática do direito constitucional no país. No
plano jurídico, atribuiu normatividade plena à Constituição, que se tornou fonte de direitos e de obrigações, independente-
mente da intermediação do legislador. Do ponto de vista científico ou dogmático, reconheceu ao direito constitucional um ob-
jeto próprio e autônomo, estremando-o do discurso puramente político ou sociológico. E, por fim, sob o aspecto institucional,
contribuiu para a ascensão do Poder Judiciário no Brasil, dando-lhe um papel mais destacado na concretização dos valores e
dos direitos constitucionais. O discurso normativo, científico e judicialista foi fruto de uma necessidade histórica. O positivis-
mo constitucional, que deu impulso ao movimento, não importava em reduzir o direito à norma, mas sim em elevá-lo a esta
condição, pois até então ele havia sido menos do que norma. A efetividade foi o rito de passagem do velho para o novo direito
constitucional, fazendo com que a Constituição deixasse de ser uma miragem, com as honras de uma falsa supremacia, que
não se traduzia em proveito para a cidadania. (Barroso, Luis Roberto. In: “O Constitucionalismo Democrático no Brasil: Crônica
de um sucesso imprevisto”,, pp.4/5.Disponível em: http://www.direitodoestado.com.br/tvdireito/luis-roberto-barroso/o-cons-
titucionalismo-democratico-no-brasil-cronica-de-um-sucesso-imprevisto. Acesso em 04 jul. 2020.
226
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
interpretados à luz de uma nova ordem constitucional, no qual o “ser” passou a ocupar lugar
de destaque, e não apenas o “ter”.
Conforme nos ensina o mestre Humberto Dalla Bernardina de Pinho12:
No que tange exclusivamente ao direito, uma das principais mudanças pós-moderna foi,
sem dúvida, a ampliação do acesso à justiça como programa de reforma e método de
pensamento (...).
Tal mudança, inclusive, encabeçou e continua servindo de norte para todas as alterações
trazidas no bojo do direito ao longo da contemporaneidade: o acesso à justiça passa a
ser um norte, um ideal perseguido por toda e qualquer reforma do direito processual.
12 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Jurisdição e Pacificação: limites e possibilidades do uso dos meios consen-
suais de resolução de conflitos na tutela dos direitos transindividuais e pluri-individuais. Paraná: CRV.2017, p.25.
13 Segundo, ainda, nos informa o saudoso mestre Diogo de Figueiredo Moreira Neto: “À falta de autêntica legitimidade,
que resulta da consonância com um projeto de poder dimanado da sociedade, os interesses públicos terciários se voltam
prioritariamente à disputa do poder, que nem sempre é respeitosa das regras do jogo democrático e, até mesmo com in-
devido sacrifício de interesses públicos secundários, quando não, e de modo ainda mais aberrante, dos próprios interesses
públicos primários. É, pois, esta renovação trazida pela juridicidade que progressivamente se vem impondo, tangida pelos
novos sopros da consensualidade e da flexibilidade, para atender às crescentes demandas sociais próprias da complexidade
e do pluralismo desta vida contemporânea, densamente organizada em sociedades cada vez mais conscientes e atuantes,
e às suas céleres e profundas mutações em todos os setores da interação humana (In “Para a compreensão do Direito Pós-
Moderno”.. Revista de Direito Público da Economia – RDPE. Belo Horizonte, v.II, n.44, p. 67-86, out/dez. 2013).
14 RODRIGUES. Marco Antônio dos Santos. A Fazenda Pública no Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Grupo Editorial
Nacional – Atlas, 2016, p.9
15 SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo Regulatório. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p.178
16 BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo: direitos fundamentais, democracia e constitucio-
nalização. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2014. p.31
227
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
17 “ Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado De-
mocrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o
desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias,
promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”
18 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p.41
19 Sobre a previsão expressa do conceito de boa administração, o artigo 41, da Carta dos direitos fundamentais da União
Europeia dispõe no sentido de que: “O Direito a uma boa administração 1. Todas as pessoas têm direito a que os seus assun-
tos sejam tratados pelas instituições, órgãos e organismos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável. 2.
Este direito compreende, nomeadamente: a) O direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada
qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente; b) O direito de qualquer pessoa a ter acesso aos processos que
se lhe refiram, no respeito pelos legítimos interesses da confidencialidade e do segredo profissional e comercial; c) A obri-
gação, por parte da administração, de fundamentar as suas decisões. 3. Todas as pessoas têm direito à reparação, por parte
da União, dos danos causados pelas suas instituições ou pelos seus agentes no exercício das respetivas funções, de acordo
com os princípios gerais comuns às legislações dos Estados-Membros. 4. Todas as pessoas têm a possibilidade de se dirigir
às instituições da União numa das línguas dos Tratados, devendo obter uma resposta na mesma língua”. Disponível em:
https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:12016P/TXT&from=FR. Acesso em: 04 jul.2020.
228
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Diante do novo quadro institucional que tem sido inaugurado, com a edição da Resolução
n.125/2010, pelo Conselho Nacional de Justiça, que instituiu a Política Judiciária Nacional de
tratamento adequado dos conflitos de interesses, bem como a previsão da possibilidade de a
Administração Pública se utilizar de métodos adequados de resolução de conflitos, como por
exemplo, a conciliação, a mediação, previstas no artigo 174, do Código de Processo Civil e
na Lei 13.140/1522, constata-se que a busca pelo consenso tem sido estimulada como forma
de efetivação da paz social.
O Novo Código de Processo Civil veio positivar uma verdadeira mudança de cultura, ao
estabelecer, em seu artigo 3º23, parágrafo terceiro, que não apenas os juízes, mas também os
20 João Bernardo Antunes de Azevedo Guedes, ao discorrer sobre o tema, afirma que: “o direito a uma boa administração
pública aos poucos passou a integrar parte das mais diversas agendas políticas de Estados modernos, fazendo com que os
agentes públicos viessem a ser cada vez mais cobrados quando da emanação dos seus atos. Resultados efetivos devem ser
alcançados em consonância com a pauta da probidade e moralidade administrativa. Foi nessa esteira que a boa administ-
ração de modo gradativo surgiu no mundo jurídico até alcançar o elevado patamar de direito fundamental expressamente
previsto na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia”. (In Direito Fundamental à boa administração pública:
análise da gestão e condução dos certames licitatórios. Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro. 2019, p. 20).
21 Art. 18. A Câmara de Conciliação e Arbitragem da Federal compete: I - avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução
de conflitos, por meio de conciliação, no âmbito da Advocacia-Geral da União; II - requisitar aos órgãos e entidades da Admi-
nistração Pública Federal informações para subsidiar sua atuação; III - dirimir, por meio de conciliação, as controvérsias entre
órgãos e entidades da Administração Pública Federal, bem como entre esses e a Administração Pública dos Estados, do Distrito
Federal, e dos Municípios; IV - buscar a solução de conflitos judicializados, nos casos remetidos pelos Ministros dos Tribunais
Superiores e demais membros do Judiciário, ou por proposta dos órgãos de direção superior que atuam no contencioso judi-
cial; V - promover, quando couber, a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta nos casos submetidos a procedimento
conciliatório; VI - propor, quando couber, ao Consultor-Geral da União o arbitramento das controvérsias não solucionadas por
conciliação; e VII - orientar e supervisionar as atividades conciliatórias no âmbito das Consultorias Jurídicas nos Estados.
22 Lei 13.140/2015 – Art.2º. A mediação será orientada pelos seguintes princípios: I - imparcialidade do mediador; II - iso-
nomia entre as partes; III - oralidade; IV - informalidade; V - autonomia da vontade das partes; VI - busca do consenso; VII
- confidencialidade; VIII - boa-fé.
23 Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. § 1º É permitida a arbitragem, na forma
da lei. § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3º A conciliação, a mediação e
outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e
membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
229
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Verifica-se que o mencionado princípio traz uma importante missão, qual seja, a de
estimular a mudança da cultura do litígio para a do diálogo, do consenso entre as partes,
abrindo espaço para a autocomposição e valorizando a capacidade das partes envolvidas
para chegarem à solução dos conflitos.
No âmbito do estado do Rio de Janeiro, a Câmara de Resolução de Litígios de Saúde,
criada através do convênio nº 003/0504/2012, também tem resolvido centenas de demandas
na esfera administrativa, através de uma análise prévia dos requerimentos, evitando, com
isso, o ingresso em juízo.
Registre-se, ainda, o convênio celebrado, entre a Procuradoria Geral do Estado do Rio
e a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, a fim de serem resolvidas demandas,
na esfera administrativa, de pleitos referentes à obtenção de vagas em escolas e de
histórico escolar.
Relevante ressaltar, ainda, a instituição da Câmara Administrativa de Soluções de
Litígios, vinculada à Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, através do Decreto
nº 46.522/2018, e regulamentada pela Resolução nº4430/2019, e que tem por objetivo a
autocomposição de controvérsias administrativas ou judiciais que
Contudo, os métodos adequados de resolução de conflitos não podem ser
24 Art. 166. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia
da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada. § 1º A confidencialidade estende-
se a todas as informações produzidas no curso do procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele
previsto por expressa deliberação das partes. § 2º Em razão do dever de sigilo, inerente às suas funções, o conciliador e o
mediador, assim como os membros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundos
da conciliação ou da mediação. § 3º Admite-se a aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente
favorável à autocomposição. § 4º A mediação e a conciliação serão regidas conforme a livre autonomia dos interessados,
inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais.
25 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de con-
hecimento. 17. ed. v.1. Salvador: Editora Jus Podivm, 2015, p.273.
230
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
concebidos como uma fórmula mágica que irá resolver todos os problemas que vêm
se arrastando há décadas, na medida em que afigura-se necessária uma mudança de
cultura não apenas dos agentes privados, mas também da Administração Pública e dos
órgãos de controle.
26 Registre-se que consta referência, nas considerações iniciais do Decreto nº 46.522/2018, à bem sucedida cooperação
realizada entre a Defensoria Pública Geral do Estado e a Procuradoria Geral do Estado, que culminou com a criação da Câ-
mara de Resolução de Litígios de Saúde (CRLS). Cumpre mencionar que, apesar de ainda não serem realizadas conciliação
e mediação no âmbito da CRLS, a mencionada Câmara se utiliza de outro método adequado de resolução de conflitos, ao
realizar a análise prévia dos requerimentos em sede administrativa.
27 Segundo o disposto nos artigos 1º e15, do Decreto nº 46.522/2018: Art. 1º - A Câmara Administrativa de Soluções de
Litígios - CASC tem por objetivo a autocomposição de controvérsias administrativas ou judiciais que envolvam a Adminis-
tração Pública Estadual, Direta e Indireta, do Estado do Rio de Janeiro. Parágrafo Único - A CASC ficará vinculada à Procu-
radoria Geral do Estado do Rio de Janeiro, a teor do disposto no art. 32 da Lei federal nº 13.140, de 26 de maio de 2015.
Art. 15 - Caberá à Procuradoria Geral do Estado, por meio de Resolução própria, disciplinar os aspectos procedimentais de
funcionamento da CASC.
28 Art. 34. A instauração de procedimento administrativo para a resolução consensual de conflito no âmbito da administra-
ção pública suspende a prescrição.
29 Art. 2º - São diretrizes de atuação da CASC: I - a instituição de valores e de meios jurídicos que aprofundem o relacio-
namento de pessoas físicas e jurídicas com a Administração Estadual; II - a prevenção e a solução de controvérsias admin-
istrativas e judiciais entre pessoas físicas e jurídicas e a Administração Estadual; III - a garantia da juridicidade, da eficácia,
da estabilidade, da segurança e da boa-fé das relações jurídicas e administrativas; IV - a agilização e a efetividade dos
procedimentos de prevenção e de solução de controvérsias; e V - a racionalização da judicialização de litígios envolvendo a
Administração Pública Direta e Indireta. Parágrafo Único - A CASC poderá atuar de ofício ou mediante provocação.
231
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
30 No que diz respeito aos conflitos envolvendo a União e entidades estaduais, a Câmara de Conciliação e Arbitragem da
Administração Federal (CCAF) possui atribuição para dirimi-los. A CCAF é um órgão da Consultoria Geral da União, da AGU,
e tem por finalidade resolver, na via administrativa, os conflitos entre os órgãos e entidades federais, e também as contro-
vérsias entre os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e a União (Portaria AGU nº 1099/2008).
31 Art.5º, p. único, do Decreto nº 46.522/2018. Segundo a mestre Odete Medauar, o equilíbrio econômico-financeiro,
também conhecido como equação financeira do contrato “significa a proporção entre os encargos do contratado e a
sua remuneração, proporção esta fixada no momento da celebração do contrato; diz respeito às chamadas cláusulas
contratuais, terminologia redundante, classicamente usada para designar as cláusulas referentes sobretudo à
remuneração do contratado”contratado’ (Direito administrativo moderno. São Paulo: Revista dos Tribunais, 8ª ed.,
2004, p. 254).
32 Art. 7º É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais,
aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo
contraditório.
33 Como ocorre, por exemplo, com a inversão do ônus da prova, que veio expressamente previsto no artigo 373, parágrafo
primeiro, do CPC/2015, in verbis: art. 373.§ 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas
à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção
da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão funda-
mentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. Note-se que a
apontada inversão já era prevista no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90).
34 Exemplificando, nas hipóteses de extinção do processo previstas no artigo 485, do CPC/2015: O juiz não resolverá o
mérito quando: I - indeferir a petição inicial; II - o processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das
partes; III - por não promover os atos e as diligências que lhe incumbir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta)
dias; IV - verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; V - re-
conhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada; VI - verificar ausência de legitimidade ou de
interesse processual.
232
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Em geral, há uma presunção de que, quanto mais detalhada essas regras, mais elevado
o nível de igualdade entre as partes e mais democrático o processo. Mas isso nem
sempre é verdadeiro. A profusão de regras pode sobrecarregar o procedimento e tornar
demasiado longo e complexo o método dialético-investigativo de solução de conflitos.
(...) A complexidade de regras processuais abrem caminho para que o diálogo entre
as partes para a solução do conflito se transforme em uma batalha de regras formais,
desatenta a seu objeto primordial, a solução dos conflitos.
35 SILVA. Paulo E. A. Gerenciamento de processos judiciais. São Paulo: Saraiva, 2010, p.30-31.
36 Luciana Moessa de Souza nos informa que “o melhor argumento para se buscar uma decisão a respeito da adequação
da mediação de conflitos na seara pública consiste em realizar a sua comparação com o processo adversarial tradicional,
seja na esfera administrativa ou em juízo. Será que o processo contencioso, com seu formalismo e rigoroso sistema de
preclusões, oferece maiores condições de igualdade? Será que o processo judicial, em que tantas e tantas vezes a questão
de direito material é esquecida em prol de discussões processuais, e em que é comum que o “vencedor” seja quem melhor
manipula o procedimento, por ter o melhor advogado, é um processo baseado em maior equilíbrio de poder? É evidente
que não. As possibilidades de enfrentar o desequilíbrio de poder, em realidade, são muito mais profícuas na mediação.” (In
Resolução Consensual de Conflitos envolvendo Políticas Públicas. 1.ed. Fundação Universidade de Brasília – FUB.
2014, p.67)
37 DINAMARCO, Cândido Rangel e LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho. Teoria Geral do Novo Processo Civil. 2.ed. Mal-
heiros Editores, p.33
38 Arts. 7º, do Decreto nº 46.522/2018 e 6º, da Resolução PGE nº .430/2019.
233
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
como o TAC só pode ser celebrado pelos órgãos públicos, já caberá a eles, dentro de
suas atribuições, proceder ao exame da conveniência e oportunidade da realização do
acordo. Ademais, não houve alteração expressa do artigo quinto, parágrafo sexto, da lei
n. 7347/85. Por fim, diga-se que o art.32, parágrafo terceiro da Lei de Mediação dispõe
expressamente que havendo consenso entre as partes, o acordo será reduzido a termo
e constituirá título executivo extrajudicial.
Além disso, com relação aos órgãos e entidades da Administração Pública estadual, o
termo de transação ou de ajustamento de conduta terá a eficácia equivalente à orientação para
o cumprimento de julgado, devendo ser encaminhada para o órgão ou entidade responsável
para o seu cumprimento.41
Registre-se, ainda, que não poderão ser objeto de apreciação pela referida Câmara
os conflitos que somente possam ser resolvidos através de ato ou concessão de direitos
que dependam de autorização legislativa, as pretensões contrárias à orientação jurídica
da PGE/RJ 42, bem como contrárias à jurisprudência consolidada pelos Tribunais
Superiores 43. São limitações legais e jurisprudenciais à atuação da CASC. O fato de
os direitos serem indisponíveis não significa que não sejam transacionáveis, mas os
apontados parâmetros devem ser levados em consideração quando da submissão à
CASC.
Uma questão que tem sido colocada refere-se à necessária imparcialidade do
conciliador/mediador, considerando-se que há previsão expressa no sentido de que deve
integrar as respectivas carreiras públicas44, o que, a princípio poderia influenciar na
elaboração dos acordos. Contudo, a prática tem demonstrado que a condução das reuniões
por integrantes de carreiras públicas tem obtido resultados consideráveis, na medida em
234
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
45 Cumpre, ainda, ressaltar que, em âmbito federal, poderão ser conciliadores os integrantes da Consultoria-Geral da
União e da Advocacia-Geral da União, nos termos do art.13, da Portaria nº 1.281/2007, in verbis: Poderão ser designados
conciliadores: I - os integrantes da Consultoria-Geral da União, por ato do Consultor-Geral da União; II - os integrantes da
Advocacia-Geral da União, por ato do Advogado-Geral da União.
Ainda sobre a atuação da CCAF, a autora Sílvia Helena Picarelli Gonçalves Johonsom di Salvo nos informar que “nos casos
mediados pela CCAF e selecionados para o presente estudo, não se constatou questionamentos quanto à imparcialidade do
mediador. De modo diverso, o fato de o mediador ser advogado público imprimiu caráter de autoridade, o que contribuiu
para uma postura mais colaborativa das partes, por exemplo no caso da Biblioteca do Colégio Militar de Santa Maria, a apre-
sentação da mediadora como procuradora federal facilitou a comunicação com uma estrutura hierárquica estratificada, o
Exército Brasileiro – a comunicação feita entre autoridades. No entanto, não se vê óbice a que se repense a exigência de que
se ocupe cargo de advogado público federal para se atuar como mediador na CCAF, tendo em vista a tendência de ampliação
do sistema gerenciado pela câmara às outras esferas da Administração Pública. (In Mediação na Administração Pública
Brasileira – O desenho institucional e procedimental, Editora Almedina, 2018, pp.159/160).
De acordo, ainda, com as informações fornecidas por Lúcio Picanço Facci, “a exigência de que o Conciliador seja integrante
da AGU, obviamente, não inibe a presença de representantes dos Estados e dos Municípios nas reuniões de conciliação.
Atuarão estes últimos como partes interessadas no conflito objeto do processo na Câmara. Embora tenham funções dife-
rentes do Conciliador, uma vez dentro do contexto de busca pelo entendimento mútuo que caracteriza as reuniões havidas
na CCAF, e para que o propósito de construir consensualmente uma decisão para que o caso seja alcançado, deverão os
representantes dos Estados e Municípios estarem pautados pelas mesmas premissas que informam a atuação do Concili-
ador, acima referidas.” (In Meios adequados de resolução de conflitos administrativos. Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris, 2019, p.167).
235
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
46 Art. 35. As controvérsias jurídicas que envolvam a administração pública federal direta, suas autarquias e fundações
poderão ser objeto de transação por adesão, com fundamento em: I - autorização do Advogado-Geral da União, com base
na jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal ou de tribunais superiores; ou II - parecer do Advogado-Geral da
União, aprovado pelo Presidente da República.§ 1º Os requisitos e as condições da transação por adesão serão definidos
em resolução administrativa própria.§ 2º Ao fazer o pedido de adesão, o interessado deverá juntar prova de atendimento
aos requisitos e às condições estabelecidos na resolução administrativa.§ 3º A resolução administrativa terá efeitos gerais
e será aplicada aos casos idênticos, tempestivamente habilitados mediante pedido de adesão, ainda que solucione apenas
parte da controvérsia.§ 4º A adesão implicará renúncia do interessado ao direito sobre o qual se fundamenta a ação ou o
recurso, eventualmente pendentes, de natureza administrativa ou judicial, no que tange aos pontos compreendidos pelo
objeto da resolução administrativa.§ 5º Se o interessado for parte em processo judicial inaugurado por ação coletiva, a
renúncia ao direito sobre o qual se fundamenta a ação deverá ser expressa, mediante petição dirigida ao juiz da causa.§ 6º
A formalização de resolução administrativa destinada à transação por adesão não implica a renúncia tácita à prescrição nem
sua interrupção ou suspensão.
47 Na esfera federal, da leitura do inciso IV, do artigo 18, do Decreto nº 7.392/2010, verifica-se a possibilidade de os Minis-
tros dos Tribunais Superiores e demais membros do Judiciário suspenderem os processos, a fim de se tentar resolver o con-
flito na via consensual. Em sede do Mandado de Segurança nº 33069, referente a um conflito de terras na Bahia, localizado
no Município de Rodelas, o Ministro Gilmar Mendes, com base na concordância das partes na busca pelo consenso, encami-
nhou os autos do referido mandado de segurança à CCAF. Verificou-se que inúmeras ações judiciais envolvendo agricultores
e indígenas são fruto da ausência de uma tentativa prévia de uma solução consensual. Registre-se que a concordância das
partes é um fator essencial para o encaminhamento dos processos para a CCAF.
236
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
6. Conclusão
Referências
CÂMARA. Alexandre Freitas. LOPES. O Novo Processo Civil Brasileiro. 2.ed. São Paulo:
Atlas, 2016
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parte geral e processo de conhecimento. 17. ed. v.1. Salvador: Editora Jus Podivm, 2015
DINAMARCO, Cândido Rangel e LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho. Teoria Geral do Novo
Processo Civil. São Paulo: 2.ed. Malheiros Editores
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Civil - v.1 – Teoria do Processo Civil. 2.ed. Revista dos Tribunais, 2016
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2004.
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SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo Regulatório. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2002
239
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
1. Consideraciones iniciales
1 La Justicia Tradicional, es la que, siendo de cualquiera de las materias del Derecho que admite el juicio, se acude a los
Tribunales para que las partes versen, donde uno sale ganador y el otro vencedor, y en este caso de la Justicia Penal, es
mediante una sanción punible en la mayoría de los casos privativa de libertad hacia una de las partes, y sobre la otra la
simulación de obtención de justicia.
240
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Un aspecto que ha generado gran debate tiene que ver con los fundamentos jurídicos
de la JR, postulándose dos vertientes que perfilan un enfoque comparativo sobre la forma de
implementar estas metodologías: como mecanismo o proceso; y como programa.
En apoyo a la primera tesis, la denominación del mecanismo, a los procesos restaurativos,
responde a que se encuentran vinculada a un modelo jurídico concreto, y buscan su aplicación
2 Gómez, G. d., & Villeda, B. J. (2018). “Justicia restaurativa, una herramienta de paz en la resolución de conflictos comuni-
tarios. Caso Nuevo León”. Política criminal, 13(25), 548-571, p. 555.
241
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
a través de marcos legales estrechos que le confieren operatividad. Desde esa óptica, el proceso
se entiende como la participación conjunta de víctima, victimario, facilitador y comunidad para
resolver las cuestiones derivadas del delito, buscando como resultado el acuerdo reparatorio
que responda a las necesidades individuales y colectivas. En este sentido, la intervención de
la JR no puede supeditarse a un esquema procesal, considerando que sus postulados no solo
contemplan la participación y acercamiento de las partes a conocer las causas del conflicto,
sino que, también se constata el impacto emocional reflejado en la víctima, como factor
sensibilizador en el infractor que le impulsa a responsabilizarse con el hecho y reparar el daño.
De manera que, los posibles pasos, o fases, que pueden desarrollarse desde el enfoque
restaurativo, no pueden considerarse actos procesales, puesto que estos no encuentran
sustrato en la actividad jurisdiccional, sino en la colaboración de las partes3-4. Tampoco puede
considerarse la JR como un mecanismo, considerando que va mucho más allá de la intervención
de dos personas auxiliadas por un mediador o conciliador en función de lograr un acuerdo
provechoso para los involucrados. En la JR se busca involucrar a la comunidad en la solución
del conflicto, proyectando un efecto expansivo hacia el reforzamiento del tejido social.
Por otro lado, una segunda postura, avalada por la ONU, define la JR como un programa,
que integra cualquier esquema procesal que utilice e intente lograr resultados restaurativos
(Brito, 2010). Sobre este tópico, cabe señalar que resulta frágil la tesis que designa la JR como
un modelo o un programa, puesto que esta metodología contempla un grupo de principios
y valores como el respeto, encuentro, reparación, responsabilidad, seguridad, curación,
reintegración y empatía5-6, que tienen una connotación diferente en cada país o región donde
se implementa. De ahí que, no pueda representarse como un modelo único o ideal. Tampoco
es saludable, incorporarle como un atributo general, el término de comunitaria, considerando
que el área de aplicación de los procesos restaurativos habilita otros ámbitos en los que, de
igual modo tienen un impacto trascendental.
Dentro de este marco, coincidimos con la Dra. Virginia Domingo de la Fuente7 en
considerar a la JR como ¨un marco filosófico o teoría jurídica — que impulsa el cambio de
paradigma — para responder al delito que se centra en el daño causado y en las acciones
requeridas para enmendar este daño. Concordamos también, en que ciertamente, …¨ se
parte de la premisa que el crimen causa daños a las personas y a la comunidad, y que la
justicia puede reparar esos daños, dándole participación a las partes en el proceso¨.
Además, también se les da participación a otros sujetos afectados indirectamente por el
delito resultante del hecho punible, haciéndole ver al acusado las consecuencias de sus actos,
y motivándole a reconocer su participación, así como, reparar el daño causado, acciones
estas que gravitan dentro de un grupo de metodologías que propician su materialización, y
que pueden denominarse procesos, programas o prácticas según su contenido.
3 Fernández Pereira, J. A. (2002). Temas para el estudio del Derecho Procesal Penal.Parte I. La Habana: Editorial Félix
Varela.
4 Maier, J. B. (2003). Derecho Procesal Penal.Tomo II.Parte general.Sujetos procesales (1ra ed.). Buenos Aires: Edi-
tores del Puerto s.r.l.
5 Domingo de la Fuente, V. (16 de 10 de 2017). Justicia restaurativa como ciencia penal o social, encaminada a
mejorar la justicia. Educació Social. Revista d’Intervenció Socioeducativa (67), 73-90.
6 Albertí i Cortés, M., & Pedrol Llirinós, M. (2017). El enfoque restaurativo en el ámbito educativo. Cuando innovar la
escuela es. Educació Social. Revista d’Intervenció Socioeducativa, 47-72.
7 Domingo de la Fuente, V. (16 de 10 de 2017). Justicia restaurativa como ciencia penal o social, encaminada a me-
jorar la justicia. Educació Social. Revista d’Intervenció Socioeducativa (67), 73-90.
242
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
8 Llobet Rodríguez, J. (2005). Justicia Restaurativa y la Protección de la Víctima. Libro en Homenaje a Julio Maier,
pp. 873-886.
9 Achutti, D. (2015). Abolicionismo penal y justicia restaurativa: del idealismo al realismo político-criminal. Re-
vista de Derechos Humanos y Estudios Sociales, Año VII(13), 55-74
10 Díaz Madrigal, I. N. (2016). La mediación en el sistema de justicia penal: justicia restaurativa en México y Es-
paña. Serie Juicios Orales. núm. 9. México, D.F, p. 45.
11 Ferrajoli, L. (1986). El derecho penal mínimo. Poder y control, vol. 10, 1-25.
12 Ferrajoli, L. (1986). El derecho penal mínimo. Poder y control, vol. 10, 1-25, p. 17.
243
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Otro aspecto relevante del cuerpo legal de la entidad federal ― artículo 24 ― es, que
se apertura la posibilidad a las partes para que puedan elegir el tipo de proceso restaurativo
y los MSC contemplados, para solucionar su disputa13; aunque, la reparación del daño en el
ámbito penal queda fuera de la aplicación de esta ley, considerando que solo aplica para las
controversias que se suscitan en materia familiar, civil, escolar y comunitaria.
Por su parte, la LNMASCMP, contempla dentro de las denominaciones recogidas en
su texto, como dispositivos no adversariales, a la mediación, la conciliación, y la Junta
Restaurativa; este último sería el único de los procedimientos restaurativos reconocidos.
La designación de Junta Restaurativa resultó ser un nombre novedoso, interesante y
13 LEY DE DE MECANISMOS ALTERNATIVOS PARA LA SOLUCIÓN DE CONTROVERSIAS PARA EL ESTADO DE NUEVO LÉON. (28
de JUNIO de 2017). PERIÓDICO OFICIAL DEL ESTADO. Recuperado el 23 de Mayo de 2020, de www.hcnl.gob.mx: http://
www.hcnl.gob.mx/trabajo_legislativo/Ledees/Leydees/Leyde_de_mecanismos_alternativos_para_la_solucion_de_contro-
versias_para_el_Estado_de_nuevo_leon/
244
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
de amplio contenido social14 ya que, no solo involucra a los protagonistas del conflicto, sino
posibilita de la intervención de representantes de la comunidad a la que pertenecen, a efecto
de fomentar la recomposición social. La denominación de Junta Restaurativa proviene del
poder legislativo15, y representa una innovación nominal, considerando que virtualiza los
objetivos tradicionales de la JR16.
Cabe señalar, que la Junta Restaurativa es el único mecanismo― así nombrado por la
ley que distingue desde la propia conceptualización cuáles son los actores que podrán
interactuar dentro del enfoque restaurativo, en este caso la víctima, el ofensor y además la
comunidad17:
Por lo que, la calificación de las personas plenamente identificadas sería uno de los
criterios para remitir al proceso restaurativo, que continuaría con la valoración del resarcimiento
del daño, desde una perspectiva integral.
Ahora bien, a pesar de concebirse la Junta, como un modelo de aplicación de la JR, no
cumple totalmente esta finalidad, considerando que, se contempla dentro de la LNMASCMP
como uno de los mecanismos alternos, y tal denominación distorsiona la naturaleza y alcance
de este tipo de metodologías de intervención. La forma de materializarse es a través del
acuerdo reparatorio que concentra las necesidades individuales y colectivas.
En este orden de ideas, la Junta Restaurativa― también nombrada en otros ordenamientos
jurídicos como conferencias familiares, o grupales de comunidad y familia―, tiene por objetivo
desarrollar entre todas las personas que participan, un plan para responder al delito, y, sobre
todo, realiza una reparación, buscando mayor participación de la comunidad local, desde un
entorno próximo a las partes y a la comunidad18-19.
Es decir, los procesos restaurativos buscan enfatizar en la dimensión social de los
delitos y conflictos, restaurar el lazo social dañado, a través de un proceso de reparación
y reconciliación entre víctima y ofensor, con la participación de la comunidad20. Luego,
la utilización de los esquemas restaurativos, buscan más allá de la responsabilización y
reinserción del infractor, además, su diseño no está enfocado a reducir la reincidencia;
14 CARLÍN BALBOA, A. MANUAL BÁSICO DE JUSTICIA PARA ADOLESCENTES, México D.F, México: Poder Judicial del Estado de
Nuevo León, 2018, p.65.
15 Graillet González, E. (2015). DE LA JUNTA RESTAURATIVA. En C. A. Vásquez Gándara, LEY DE NACIONAL DE
MECANISMOS ALTERNATIVOS DE SOLUCIÓN DE CONTROVERSIAS EN MATERIA PENAL COMENTADA (pág. 143).
Veracruz: Universidad de Xalapa, p. 144.
16 Sánchez García, A. (2019). ESQUEMAS DE MEDIACIÓN Y ARBITRAJE. Ciudad de México: tirant lo blanch, p. 30.
17 LEY DE NACIONAL DE MECANISMOS ALTERNATIVOS DE SOLUCIÓN DE CONTROVERSIAS EN MATERIA PENAL. (29 de Diciem-
bre de 2014). Diario Oficial de la Federación. Recuperado el 22 de Mayo de 2020, de /www.diputados.gob.mx: http://www.
diputados.gob.mx/LeydeesBiblio/pdf/LNMASCMP_291214.pdf
18 Forés, N. C. (2015). Prácticas restaurativas: círculos y conferencias. Recuperado el 23 de Mayo de 2020, de Sociedadvas-
cavictimologia. org,: Http: //Sociedadvascavictimologia. org, p. 9.
19 Rodríguez, R. C. (2017). La justicia restaurativa como mecanismo de solución de conflictos. Su examen desde el derecho
penal. Justicia juris, 13(1), 122-132, p. 124.
20 Britto Ruiz, D. (2010). JUSTICIA RESTAURATIVA: Reflexiones sobre la Experiencia de Colombia. Loja: Universidad Técnica
Particular de la Loja, p. 25.
245
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
tampoco sus fundamentos teóricos están orientados únicamente a delitos leves u ofensores
no reincidentes. Por ende, sus postulados también pueden aplicarse a conductas más graves,
con la diferencia de que en los delitos de mayor entidad no actuarían como dispositivos que
buscan la extinción de la acción penal, sino que representan un complemento ― tampoco
es un reemplazo al modelo tradicional vigente ― al proceso penal, pudiendo emplearse
en cualquier etapa del proceso, y ayudando a sanar a la víctima, y que el victimario logre
responsabilizarse con sus acciones21.
Al analizar los aspectos mencionados, se advierten algunos desaciertos del modelo
restaurativo que obra en la LNMASCMP. En primer orden, la propia configuración legal del
artículo 27 de la normativa22, dispone que el objetivo fundamental de la Junta Restaurativa
es la de lograr un acuerdo que podrá contener la satisfacción de las necesidades colectivas
e individuales. Lo que nos lleva a colegir, que la materialización de estas necesidades, están
reflejadas en el contenido del convenio. Este particular, se ve ratificado en la consecución
de los apartados del cuerpo legal, reflejándose en la figura del facilitador quien deberá,
concretar los aspectos del acuerdo especialmente en materia de reparación ― en este caso el
alcance de la reparación comprende el reconocimiento de responsabilidad y formulación de
una disculpa, así como el compromiso de no repetición de la conducta a través de programas
o actividades que contribuyan evitar a la reincidencia en la conducta; y además, un plan
de restitución que pueda ser económico o en especie―, lo que posibilitará a través de la
ratificación del convenio, la extinción de la acción penal.
Lo anterior significa, que lo dispuesto en la Junta Restaurativa, deberá patentizarse
en la suscripción del acuerdo, lo que impone una restricción a este proceso, en cuanto que,
en el período de formulación de denuncia y antes de dictar el auto de apertura a juicio,
solo podrá llevarse a cabo en la conductas delictivas previstas en autorizadas en la norma
(Código Nacional de Procedimientos Penales, 2014) -CNPP―art. 187, fracción I, II, III―,
desnaturalizando los fundamentos teóricos de esta institución. Es decir, en los casos en que
se pretenda lograr un acuerdo reparatorio, por medio de este modelo restaurativo, solo podrá
realizarse, por lo menos en la etapa investigativa, en delitos culposos, o delitos de carácter
patrimonial sin violencia contra las personas, lo que sin dudas representa una limitante para
modalidad restaurativa, al tener que regirse por la legislación procesal.
Otros aspectos que dificultan la instrumentación de la Junta Restaurativa, en la
fase investigativa, es, que de acuerdo a su metodología este dispositivo requiere mayor
preparación en la detección y armonización de los intereses y necesidades de las partes―el
art.28 de la LNMASCMP aborda que el facilitador realizará sesiones preparatorias con cada
uno de los intervinientes―, escenario que involucra otros actores como la comunidad, por
la connotación social que puede conllevar una actuación asertiva de los intervinientes23.
Por tanto, es poco probable que los aspectos señalados puedan materializarse a través del
21 Domingo de la Fuente, V. (16 de 10 de 2017). Justicia restaurativa como ciencia penal o social, encaminada a
mejorar la justicia. Educació Social. Revista d’Intervenció Socioeducativa (67), 73-90, p. 79.
22 LEY DE NACIONAL DE MECANISMOS ALTERNATIVOS DE SOLUCIÓN DE CONTROVERSIAS EN MATERIA PENAL. (29 de Diciem-
bre de 2014). Diario Oficial de la Federación. Recuperado el 22 de Mayo de 2020, de /www.diputados.gob.mx: http://www.
diputados.gob.mx/LeydeesBiblio/pdf/LNMASCMP_291214.pdf
23 LEY DE NACIONAL DE MECANISMOS ALTERNATIVOS DE SOLUCIÓN DE CONTROVERSIAS EN MATERIA PENAL. (29 de Diciem-
bre de 2014). Diario Oficial de la Federación. Recuperado el 22 de Mayo de 2020, de /www.diputados.gob.mx: http://www.
diputados.gob.mx/LeydeesBiblio/pdf/LNMASCMP_291214.pdf
246
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
acuerdo reparatorio, en el período de UN MES que prevé la legislación procesal federal para
la fase indagatoria. De ahí que, en la práctica las autoridades prioricen su aplicación en la
fase de ejecución penal, quedando latente la modificación del término previsto en el período
investigativo, buscando optimizar la función judicial.
4.2 LA LEY NACIONAL DE EJECUCIÓN PENAL Y LAS BONDADES DE LOS PROCESOS RESTAURATIVOS
Sin embargo, de la lectura del artículo, y los siguientes de este título, se advierte
que no hay una descripción de los procesos restaurativos que podrán utilizarse en favor
del arreglo de la víctima y el ofensor, con la participación de la comunidad. Solo puede
colegirse, de la propia configuración legal del art.200, que el modelo empleado es la
Junta Restaurativa porque la conceptualización es casi una réplica de la incorporada a
la LNMASCMP26.
Por otro lado, la disposición regulatoria de ejecución de penas, no solo se limita a señalar
el modelo restaurativo heredado de la LNMASCMP; sino que en su configuración presenta dos
24 Maltos Rodríguez, M. (2017). La justicia restaurativa en las Ley dees “nacionales” mexicanas. Recuperado el 12 de Mayo
de 2020, de http://biblioteca.cejamericas.org: http://biblioteca.cejamericas.org/bitstream/handle/2015/5530/MariaMal-
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25 Ley de Nacional de Ejecución Penal. (16 de Junio de 2016). Diario Oficial de la Federación. Recuperado el 24 de Mayo de
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26 Maltos Rodríguez, M. (2017). La justicia restaurativa en las Ley dees “nacionales” mexicanas. Recuperado el 12 de Mayo
de 2020, de http://biblioteca.cejamericas.org: http://biblioteca.cejamericas.org/bitstream/handle/2015/5530/MariaMal-
tos_Lajusticiarestaurativa_REV20.pdf?sequence=1&isAllowed=y, p. 40.
247
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
27 Ley de Nacional de Ejecución Penal. (16 de Junio de 2016). Diario Oficial de la Federación. Recuperado el 24 de Mayo de
2020, de www.diputados.gob.mx: http://www.diputados.gob.mx/LeydeesBiblio/pdf/LNEP_090518.pdf
28 Ley de Nacional de Ejecución Penal. (16 de Junio de 2016). Diario Oficial de la Federación. Recuperado el 24 de Mayo de
2020, de www.diputados.gob.mx: http://www.diputados.gob.mx/LeydeesBiblio/pdf/LNEP_090518.pdf
248
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
4.3 EL ENFOQUE RESTAURATIVO DE LEY NACIONAL DEL SISTEMA INTEGRAL DE JUSTICIA PENAL
PARA ADOLESCENTES (LNSIJA), Y SU EFECTO DINAMIZADOR EN EL ORDENAMIENTO PENAL
MEXICANO
29 LNSIJA. (16 de Junio de 2016). Diario Oficial de la Federación. Recuperado el 24 de Mayo de 2020, de www.diputados.
gob.mx: http://www.diputados.gob.mx/LeydeesBiblio/pdf/LNSIJPA.pdf
30 Maltos Rodríguez, M. (2017). La justicia restaurativa en las Ley dees “nacionales” mexicanas. Recuperado el 12
de Mayo de 2020, de http://biblioteca.cejamericas.org: http://biblioteca.cejamericas.org/bitstream/handle/2015/5530/
MariaMaltos_Lajusticiarestaurativa_REV20.pdf?sequence=1&isAllowed=y, p. 42.
249
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
Artículo 93. Del acuerdo: Los acuerdos alcanzados a través de los mecanismos establecidos
en este Título, se tramitarán conforme a lo establecido en el Título siguiente, ya sea
como acuerdos reparatorios o como propuesta del plan de reparación y sugerencias de
condiciones por cumplir para la suspensión condicional del proceso.
Lo anterior demuestra, que la LNSIJA ha venido a suplir todas las vicisitudes de los MSC,
en la ley procesal de adultos, logrando no solo diversificar las formas de solución pacífica
de conflictos, sino que ofrece algunas alternativas para que estos puedan materializarse, en
función privilegiar el derecho de los ciudadanos― en este caso de los menores― de acceder a
una justicia más participativa, en todas las etapas del proceso penal, y con especial atención
a la fase de ejecución penal.
31 LNSIJA. (16 de Junio de 2016). Diario Oficial de la Federación. Recuperado el 24 de Mayo de 2020, de www.diputados.
gob.mx: http://www.diputados.gob.mx/LeydeesBiblio/pdf/LNSIJPA.pdf
250
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
La fase de ejecución del código procesal juvenil establece parámetros similares a la ley federal
de adultos―LNEP―, con relación a los efectos derivados de los acuerdos en la etapa de cumplimiento
de pena, en donde el fin perseguido, será la reparación del daño, y no la extinción de la acción
penal, puesto que ya hay una sentencia firme. Por tanto, será viable este modelo a todos los
delitos, y no contradice en modo alguno, los aspectos reflejados en fases predecesoras, ni tampoco
colisiona esto, con otras formas de gestión pacífica de conflictos. Lo que sí, es válido señalar, es
que la consecución del acuerdo no conllevará ningún beneficio de excarcelación anticipada.
32 Rangel Buitrago, S. C. (2018). Ejecución Penal y Medidas de Seguridad. En M. PÚBLICO, CÓDIGO PROCESAL PENAL DE
LA REPÚBLICA DE PANAMÁ (COMENTADO) (págs. 320-324). Ciudad de Panamá: Procuraduría General de la Nació.
33 España Lozano, J. (2017). Análisis de la justicia restaurativa y la conciliación penal a la luz de la suspensión
condicional del proceso. En G. d. Gorjón Gómez, Tratado de Justicia Restaurativa, Un enfoque integrador (págs. 237-252).
Ciudad de México: tirant lo blanch.
251
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
En el caso de las medidas alternas del cumplimiento de la pena, estas tienen un enfoque
resocializador puesto que le conceden al sancionado la oportunidad de incorporarse a un
programa de trabajo o estudio, que, de acuerdo con su comportamiento, podrá desplegarse
dentro o fuera del centro penitenciario. Entre las medidas que se contemplan en el art. 57 se
encuentran: La educación con provecho académico, en los distintos niveles de enseñanza; El
trabajo en labor comunitaria no remunerado; y , la participación como instructor en cursos
de alfabetización, de educación, de adiestramiento o de capacitación, la que se computará
por cada ocho horas laboradas como un día de trabajo34. Lo anterior, se concatena con
la potestad concedida al Juez de cumplimiento, de sustituir hasta el 30% de las penas de
prisión impuesta, por otras penas menos estigmatizantes como el trabajo comunitario,
arresto domiciliario, días multas o una compensación económica a la víctima, ya sea de forma
individual o mixta35.
Por otro lado la suspensión condicional de la ejecución de las penas, permite por medio
de la figura del Juez de cumplimiento, que las sanciones impuestas al infractor, ―ya sea la
pena de prisión, el arresto de fines de semana, la reclusión domiciliaria o inclusive la de
días-multa―, puedan suspenderse por un término de dos a cinco años, siempre y cuando
el sancionado se sometiere a un grupo de condiciones dispuestas en ley : que sea infractor
primario de la norma, y además haber cumplido con los términos de la reparación de la
víctima, o al menos, haberse comprometido a cumplir satisfactoriamente el resarcimiento al
afectado (De Castro, 2015). No obstante, la institución mencionada cuenta con una limitante
de aplicación―un aspecto que se diferencia notablemente con la legislación mexicana―, y es
que solo pueden ser elegibles para este beneficio, los sancionados a penas de hasta 3 años
de privación de libertad; eliminándose esta condición, para las sanciones de arresto de fines
de semana, de prisión domiciliaria, o de días-multa.
Es decir, la ausencia de metodologías restaurativas en la fase de ejecución penal
de la legislación procesal panameña es visible, pero esto no obsta para que dentro del
ordenamiento procesal puedan visualizarse algunos preceptos con proyección a la justicia
reparadora. En el caso de las medidas alternas a la pena, estas tienen por propósito
reconducir la conducta del infractor y convidarle a reinsertarse en la sociedad con un
comportamiento responsable. Lo referido, propicia la responsabilización del sancionado
por los actos reprochables, y actuar en consecuencia, para generar un compromiso de
no repetición; aspectos que convergen con los postulados de la JR. Por otra parte, la
suspensión condicional de la ejecución de las penas propicia la reparación del daño en su
afectación real, considerando el criterio de la víctima, generando un clima de acercamiento
y comunicación, que favorece el saneamiento de las heridas emocionales. Estos factores
constituyen esbozos del enfoque restaurativo, y develan un área de oportunidad propensa
al asentamiento definitivo de la JR en la legislación procesal nacional.
34 MINISTERIO PÚBLICO. (2015). TEXTO ÚNICO DEL CÓDIGO PENAL DE LA REPÚBLICA DE PANAMÁ. (Comentado): PROCURA-
DURÍA GENERAL DE LA NACIÓN.
35 MINISTERIO PÚBLICO. (2015). TEXTO ÚNICO DEL CÓDIGO PENAL DE LA REPÚBLICA DE PANAMÁ. (Comentado): PROCURA-
DURÍA GENERAL DE LA NACIÓN.
252
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
36 Ministerio de Gobierno de la República de Panamá, M., & Fondo de las Naciones Unidas para la Infancia, U. (2017). Marco
legal de justicia penal adolescente. Panamá: UNCEF/ MGRP, p. 7.
37 O´Donnell, D. (2004). Anuario del XIX Congreso Panamericano del Niño. La Doctrina de la Protección integral y las nor-
mas jurídicas vigentes en relación a la familia, (págs. 119-161). Monterrey.
253
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
de la sanción y sobre la finalización de estas, aludiendo que las sanciones que se les impongan
sean conducentes y tengan como fin la resocialización del adolescente, siendo obligación
del Juez de cumplimiento velar por esa observancia, del mismo modo se concede a los
adolescentes la posibilidad, pero a la vez, la obligatoriedad de participar en programas de
asistencia y orientación de carácter socioeducativas como la amonestación, la participación
obligatoria en programas de asistencia, la prestación de servicios a la comunidad y la reparación
de daños a la víctima, artículos 16.14, 125 y 130-134 de la RERPA (1999), pretendiendo
proporcionar un enfoque restaurativo en beneficio del adolescente, y lo encuentre como un
área de oportunidad para la reconstrucción del tejido social.
La relación con los elementos personales que integran la noción de proceso restaurativo
que expone el38 y el informe del39 sobre los sujetos indirectos que participan en los procesos
restaurativos, se contempla de forma similar en esta Ley en los artículos 48, 127, 128 de la
(Ley 40 de 1999 del Régimen Especial de Responsabilidad Penal para la Adolescencia, 1999),
el involucramiento y participación de manera activa de familiares, tutores o responsables del
adolescente en diversas parte del proceso penal; esto es, durante el proceso: en el estudio
psicosocial del adolescente o como testigos del hecho investigado y en la culminación del
proceso: en la ejecución de medidas cautelares o en el cumplimiento las sanciones impuestas.
Al mismo tiempo, manifiesta que la forma de aplicación de las sanciones deberá tener
objetivos primordialmente educativos, preferentemente con la intervención de la familia, la
comunidad, y con la asistencia de especialistas. Esto permite la visibilización de la Justicia
Restaurativa a través de la inclusión de familiares o allegados, profesionales de la judicatura,
trabajadoras sociales, abogados o representantes de la comunidad, fomentando el diálogo
y la cooperación para poder tener sociedades más pacíficas, libres de violencia y conflicto.
La propia ley compete a los Jueces penales para conocer en primera instancia sobre la
suspensión condicional del proceso, para los casos en que el adolescente reúna dos requisitos:
que el delito cometido admita la conciliación; y que el adolescente haya realizado esfuerzos
por reparar el daño causado, o que el acto cometido no puso en grave peligro ni la integridad
física de las personas ni sus bienes. También concede el beneficio a las formas de terminación
anticipada del proceso a los adolescentes, como la remisión, el criterio de oportunidad, la
conciliación, cuando los delitos cometidos por estos causan daños leves o insignificante o
cuando el adolescente tenga escasa participación en el delito -artículos 21.8, 98, 17.7, 66-78
y 131 de la RERPA (Ley 40 de 1999 del Régimen Especial de Responsabilidad Penal para la
Adolescencia, 1999), incidiendo en ambigüedad respecto de lo que comprenden los MSC y
las salidas alternas del proceso penal, ya que no explica la diferencia de lo que representan
ambos esquemas de justicia.
Siendo esta la forma en que la Justicia Restaurativa manifiesta sus postulados, y
bondades aplicadas en materia penal para adolescentes, entrando paulatinamente en un
área del derecho muy sensible por tratarse con menores y adolescentes. Además, impulsa
38 Oficina de las Naciones Unidad contra la Droga y el Delito, O. (2006). Manual sobre Programas de Justicia Restaurativa.
Serie de Manuales sobre Justicia Penal. Obtenido de https://www.unodc.org/documents/justice-and-prison-reform/Manual_
sobre_programas_de_justicia_restaurativa.pdf, p. 6.
39 Organización de las Naciones Unidas, O., & Comisión de Prevención del Delito, O. (16-25 de abril de 2002). Debate
temático sobre la reforma del sistema de justicia penal: logro de la eficacia y la equidad. Reglas y normas de las Naciones
Unidas en materia de prevención del delito y justicia penal. Obtenido de https://www.unodc.org/documents/commissions/
CCPCJ/CCPCJ_Sessions/CCPCJ_11/E-CN15-2002-05-Add1/E-CN15-2002-5-Add1_S.pdf
254
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
6. Conclusiones
Como ideas finales, puede concluirse que, en las legislaciones penales juveniles de
México y Panamá, existe una mayor flexibilización mediante la introducción de preceptos
y figuras que permiten alejarse del modelo de justicia tradicional e implementar nuevos
esquemas de corte colaborativo, buscando estrategias más inclusivas, y a la vez menos
lesivas para los adolescentes, en consonancia con la protección al Interés Superior de la
niñez y la adolescencia. En ese sentido, la Ley Nacional del Sistema Integral de Justicia
Penal para Adolescentes ha incorporado los principios esenciales de la JR, desarrollando
un catálogo de procesos restaurativos, que posibilita diversificar las fórmulas pacificas de
solución de conflictos, considerando además que la propia ley dispone las salidas alternas
que materializarán la aplicación del enfoque reparador, aspecto que sin dudas conecta con
la sinergia que debe existir entre los preceptos de una normativa. En Panamá, por su parte,
en enfoque se ha dirigido a establecer algunos preceptos que pueden conducir a prácticas
restaurativas como la resocialización de los infractores y la reparación del daño causado,
por medio del aprendizaje de una actitud constructiva hacia su entorno, que determina la
reintegración social del individuo, postulados que se refrendan en la Justicia Restaurativa. Este
perfil de las leyes penales juveniles, tienen la misma configuración legal, en las normativas
que remiten a la fase de ejecución penal de ambos países.
Por otro lado, aunque México cuenta con una La Ley Nacional de Mecanismos Alternativos
de Solución de Controversias en Materia penal, a diferencia de Panamá, que introdujo la
modalidades no adversariales en la legislación procesal; la normativa de la nación Azteca
no cuenta con una denominación específica de procesos restaurativos, y la metodología
restaurativa que se reconoce, Junta Restaurativa, es contemplada como un mecanismo alterno,
de similar construcción a la mediación y la conciliación, lo que impide una cabal compresión
sobre la distinción entre las metodologías restaurativas, y dispositivos alternos de solución
de conflicto.
En consecuencia, los fundamentos teóricos, principios y definiciones sobre los modelos
restaurativos, deberán estar contemplados en las leyes procesales nacionales, y de esa
manera replicarse en las leyes adjetivas para adolescentes, considerando que el enfoque
restaurativo, constituye un rubro dinamizador de los modelos de enjuiciamiento, por ello
adquiere un carácter relevante en todo el Sistema de Justicia Penal.
255
ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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Real justice y Manual de reuniones restaurativas. International Institute for Restorative
Practices.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
SOBRE OS COORDENADORES
CELSO BELMIRO
Mestre e Doutorando em Direito Processual Civil pela Universidade Estácio de Sá (UNESA).
Especialista em Direito Público e Privado pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro
(EMERJ). Especialista em Direito Notarial e Registral pela Faculdade Arthur Thomas (FAAT).
Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Notário no Rio de
Janeiro (aprovação em 1o. lugar em concurso público) e ex-Procurador da Fazenda Nacional
(aprovação em 1o. lugar em concurso público). Palestrante e conferencista em congressos,
seminários e simpósios sobre Direito Processual Civil e Direito Notarial e Registral. Professor
convidado da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro e conferencista do Fórum
de Direito Notarial, Registral e Urbanístico do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Ex-professor dos cursos de pós-graduação da Universidade Cândido Mendes, da Fundação
Getúlio Vargas, da Escola de Administração Fazendária e dos cursos preparatórios CEJ 11
de Agosto e Master Juris. Membro Titular da Academia Notarial Brasileira, do IBDP - Instituto
Brasileiro de Direito Processual e do Conselho Editorial da Editora Impetus. Pesquisador do
Observatório da Mediação e Arbitragem da Universidade Estácio de Sá.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
FLÁVIA PEREIRA HILL - Professora Adjunta de Direito Processual Civil da UERJ. Doutora
e mestre em Direito Processual pela UERJ. Pesquisadora visitante da Università degli Studi di
Torino, Itália. Membro da Comissão de Mediação de Conflitos da OAB/RJ. Tabeliã. E-mail:
flaviapereirahill@gmail.com
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
OSMAR MENDES PAIXÃO CÔRTES - Pós-Doutor em Processo Civil pela UERJ. Doutor
em Direito pela PUC/SP. Mestre em Direito e Estado pela Unb. Diretor do IBDP. Professor do
doutorado/mestrado do IDP/DF. Advogado.
PLINIO LACERDA MARTINS - Doutor em Direito pela UFF, Mestre em Direito pela UGF,
Professor adjunto do Departamento de Processo da Faculdade de Direito da UFF., Professor
do quadro permanente do programa de Pós-graduação do Doutorado em Direito Instituições
e Negócios da Universidade Federal Fluminense.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
ROBERT SEGAL - Doutor em Educação pelo PPGE da UFRJ, mestre em Educação pelo PPGE
da UNIRIO, mestrando em Sociologia e Direito pelo PPGSD da UFF, especialista em Mediação de
Conflitos pela UCAM e AVM, especialista em Direito Ambiental pela ESA da OAB/RJ e UNIFOA,
licenciado em Filosofia pela UNIRIO, bacharel em Direito pela UCAM, advogado e integrante do
grupo de pesquisas do Observatório da Mediação. E-mail: robertsegal70@gmail.com
SERGIO GUSTAVO PAUSEIRO - Doutor em Direito pela UFF, Mestre em Direito pela
UFF, Professor adjunto do Departamento de Direito Privado da Faculdade de Direito da UFF,
Professor do quadro permanente do programa de Pós-Graduação do Doutorado em Direito
Instituições e Negócios da Universidade Federal Fluminense.
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ESTUDOS SOBRE MEDIAÇÃO NO BRASIL E NO EXTERIOR
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