Da Responsabilidade Civil
Da Responsabilidade Civil
Da Responsabilidade Civil
Introdução
O presente Trabalho de pesquisa, tem em vista, a obtenção de conhecimento para servir-nos de
guia na nossa apresentação. O mesmo subordina-se ao tema "responsabilidade civil”. A
responsabilidade civil é a obrigação de reparar os danos sofridos por alguém, a responsabilidade
civil é um capítulo das obrigações, que atua no conjunto de situações limitadas em que não é
justo que sejamos nós a suportar as consequências negativas que sobre nós recaíram. Nestes
casos, o ordenamento jurídico confere-nos um direito contra outrem que faz com que esse
outrem se deva responsabilizar pelo mal que me aconteça, se uma pessoa “a título
exemplificativo” destrói o meu código civil, eu não tenho que conservar na minha esfera jurídica
este prejuízo. Posso dirigir-me ao autor desse ato e dizer-lhe que tem de me ressarcir tendo
também em conta que vivemos em uma sociedade, onde de forma dolosa ou não dolosa ferimos
o direito alheio, faz-se ainda mais importante debruçar-nos a respeito da responsabilidade civil.
Assim para o alcance dos objectivos da nossa pesquisa “ que abaixo se fazem mencionar” e para
também poder acrescer o saber do leitor, o grupo fara o uso método analítico e consultas
bibliográficas.
1.1 Justificativa
A elaboração deste trabalho, foi motivada pela necessidade de demonstrar em diferentes
vertentes aspectos relacionados ao instituto da responsabilidade civil, pois todos vivemos em
sociedade e enquanto ser social, se não gerarmos dano, haverá sempre quem o gere em nós, dai
que faz-se necessário que todos nós tenhamos conhecimentos solidos em torno deste instituto,
para que havendo dano, nos possa ser ressarcido.
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1.2. Problematização
Diz a Lei: “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou
qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o
lesado pelos danos resultantes da violação”. Neste contexto, surge a seguinte inquietação: até
que ponto se pode chamar o regime da responsabilidade civil?
1.3. Objectivos
1.3.1 Objectivo geral
Analisar o regime da responsabilidade civil.
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A RESPONSABILIDADE CIVIL
A responsabilidade civil, segundo TELLES Galvão, ( P- 208) , consiste na obrigação de
reparar os danos sofridos por alguém, ele diz ainda que esta trata-se de indemnizar os prejuízos
de que esse alguém foi vitima, fala de indemnizar porque se procura tornar o lesado indemne dos
prejuízos ou danos, reconstruindo a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento
causador destes, assim, faz-se verdadeiro este entendimento no arrimo do disposto no artigo 562
do código civil.
Tradicionalmente, a responsabilidade civil é um capítulo das obrigações, já que é uma das suas
fontes. Não importa o tipo de responsabilidade civil que esteja em causa o resultado final é
sempre a afirmação e uma obrigação. As obrigações têm uma caracterização própria e um regime
próprio que consiste na obrigação de indemnizar, prevista nos artigos 562º e ss. do CC.
A responsabilidade civil aponta para um desvio excepcional em relação àquela que é a solução
normal do ordenamento jurídico: è Regra geral, cada um de nós suporta na sua esfera jurídica as
consequências negativas daquilo que eventualmente nos aconteça.
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• O responsável; Exemplo: uma pessoa destrói o meu código civil, a título excepcional eu não
tenho que conservar na minha esfera jurídica este prejuízo. A título excepcional posso dirigir-me
ao autor desse ato e dizer-lhe que tem de me ressarcir
.
Existem três tipos de responsabilidade civil:
• Responsabilidade civil extra obrigacional (artigos 483 e ssº)
• Responsabilidade civil obrigacional
• Responsabilidade civil pré-contratual (227º)
O que estes três tipos de imputação têm em comum é que todos eles assentam na ideia que a
causa que justifica a imputação dos efeitos negativos na esfera de outrem é a circunstância de ter
sido praticado um facto que é contrário ao Ordenamento Jurídico, ilícito:
• No primeiro caso, essa ilicitude traduz-se na circunstância de o responsável ter actuado contra
uma situação jurídica activa alheia, desde que esta não seja um direito de crédito e o responsável
não seja o devedor.
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• Não obstante os vários títulos de imputação e a grande diversidade das situações, a lei adotou
depois uma situação única como se fosse possível termos uma consequência única para factos tão
distintos.
• Os artigos 562º e ss. exigem um esforço interpretativo para que possam ser aplicáveis a outros
tipos de responsabilidade que não a extra-obrigacional
• Nos artigos 483º e ss. temos, à partida, o regime geral da responsabilidade extraobrigacional e
vemos que de facto, o que lá se prevê, foi pensado para a responsabilidade extra-obrigacional
Exemplo: A utilização de um automóvel não tem nada de censurável, mas um automóvel é algo
que comporta risco. Na medida em que eu ao utilizar um automóvel para proveito próprio estou a
criar risco potencial para terceiro, eu devo assumir responsabilidade pelos danos que
eventualmente venham a resultar da concretização dos riscos que eu criei.
Conceito de dano
Existindo responsabilidade civil, existe um determinado facto que é fonte da obrigação de
indemnizar. Existem duas situações paralelas delineáveis:
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• Situação real: um acontecimento histórico que se verificou e a história continuaram após a
verificação desse facto;
• Situação hipotética: situação que existiria se aquele facto não tivesse ocorrido;
Na responsabilidade civil lidamos sempre com as duas situações: identificamos um facto que
historicamente é a fonte da obrigação de indemnizar e a partir da verificação desse facto
conseguimos distinguir duas situações - a real e a hipotética. As diferenças entre a situação real e
a situação hipotética é aquilo a que se chama dano.
Exemplo: uma pessoa atira uma pedra contra um vidro de um táxi e parte-o.
O proprietário do táxi vai à oficina para pôr o vidro de novo. A despesa que tem na oficina
corresponde a um dano emergente: aquilo que ele vai despender no sentido de reparar aquilo que
perdeu. Enquanto o táxi está na oficina, o taxista não conseguiu trabalhar: para além do que
perdeu na oficina, perdeu o que deixou de ganhar no dia de trabalho (lucro cessante). Todos estes
danos são, à partida, indemnizáveis. A obrigação de indemnizar serve para os reparar. Quando a
reparação é integral e é perfeita, anula-se a diferença que existe entre a situação real e a situação
hipotética.
O que acontece é que a situação real é puxada até àquela em que seria a situação hipotética. O
melhor que o lesado pode ficar é nesta situação hipotética, aquela em que estaria se não fosse o
facto gerador de responsabilidade. O lesado não pode nunca e em caso algum, ficar melhor após
a indemnização do que estaria na situação hipotética.
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Apuramento do dano
Identificamos consequências práticas que uma pessoa sofreu devido ao facto gerador de
responsabilidade, seja em termos de danos emergentes, ou de lucros cessantes.O dano não se
confunde com a violação de situações jurídicas activas.
Não posso dizer que violar o direito de propriedade é um dano: dano são as consequências
práticas que resultam dessa violação. Os danos são autónomos na medida em que são as
consequências da violação da situação jurídica. Os danos são acontecimentos destacáveis do
facto gerador de responsabilidade.
O que tem que se fazer no âmbito da responsabilidade civil é identificar quais são esses
acontecimentos, já que são esses os danos que vão ser reparados. A distinção entre danos
presentes e danos futuros surge artigo 564º/2. Todos estes danos são indemnizáveis.
No âmbito deste artigo “na fixação da indemnização, pode o tribunal atender aos danos futuros,
desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização
correspondente será remetida para decisão ulterior”. Ao contrário do que acontece com os danos
emergentes e os lucros cessantes, os danos presentes e futuros só se distinguem em função do
momento em que me coloco para a sua identificação. Por definição, todos os danos futuros hão-
de tornar-se, no futuro, em danos presentes. Os danos presentes são aqueles que já se
concretizaram num momento em que eu identifico as consequências danosas de um determinado
facto.
Exemplo: estou a fazer este exercício pressupondo que o arranjo do táxi vai demorar uma
semana. Pensando nisto a partir de quarta-feira, o lucro cessante de segunda, terça e quarta é
presente, o de quinta e sexta é futuro.
O que se visa com esta regra é que a decisão inicial de indemnizar seja exaustiva, isto é, que
olhe para os danos presentes, mas também para os futuros evitando que, no futuro, se crie nova
discussão.
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Responsabilidade civil extra-obrigacional
É aqui resulta do dever de indemnizar prejuízos sofridos por outrem, mas porque se tenha
deixado de cumprir uma obrigação anterior.
Estamos a falar de responsabilidade civil por factos ilícitos. Isto é, trata-se de situações em que o
fundamento da responsabilidade por parte é um comportamento por parte do responsável
contrário ao que o ordenamento jurídico exigia de si. Assim, há uma reprovação e censura desse
dado comportamento. Para que esta censura seja eficiente, é necessário que estejam verificados
cumulativamente os cinco requisitos do artigo 483º/1, CC:
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O facto voluntário
Só há responsabilidade se a pessoa que queremos responsabilizar tiver adoptado um determinado
comportamento que há-de corresponder a um facto voluntário.
A ilicitude
O facto voluntário tem que ser ilícito. Encontram-se três referências sobre e ilicitude no artigo
483º/1:
• “violação de direito alheio ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios”
– tipo objectivo da ilicitude;
• “com dolo ou mera culpa” – corresponde, na opinião do professor a elementos da ilicitude –
tipo subjectivo da ilicitude;
• “ilicitamente”;
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O juízo de ilicitude pressupõe que percorramos estas três fases num raciocínio lógico que há de
conduzir a um juízo de ilicitude. Os dois primeiros elementos são elementos de verificação
positiva, no sentido em que sem eles não há ilicitude. O último elemento é de verificação
negativa. É a sua verificação que exclui a ilicitude.
• Contemplar directamente a pessoa e atribuir-lhe uma posição activa – “direito alheio”. O direito
alheio é toda a situação jurídica activa atribuída a um sujeito reservando-lhe o aproveitamento
individual do bem que lhe foi conferido. Reserva-se para A o bem x, de modo que se gera um
dever de respeito pelos demais em relação a esse bem.
• Atribuição de situações jurídicas passivas a terceiros de cujo respeito resulta a protecção do
sujeito visado – A tem o bem x e o ordenamento jurídico diz a B, C e D como devem agir de
modo a que x fique salvaguardado na esfera jurídica de A.
Na protecção indirecta, a norma que configura o bem protegido tem como fim a protecção de
cada um dos titulares.
O artigo 483º apenas abrange a protecção indirecta. Assim, a violação de normas de protecção
reflexa* não se traduzem nos casos protegidos pelo artigo. Deste modo, temos que saber se a
norma visa proteger um interesse público (protecção reflexa) ou uma questão de protecção
indirecta.
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Exemplo: Existe uma norma que diz que ninguém pode perturbar a normal deslocação de
transportes públicos com o objectivo de permitir que os transportes públicos andem a horas.
Imagine-se uma pessoa que impede o autocarro de se deslocar e outra que perde a entrevista de
emprego. Isto é uma norma reflexa ou indirecta? Se for uma norma reflexa não há indemnização.
Se, ao contrário, estiver em causa não a protecção e um bem público, mas do conjunto de pessoas
que andam de autocarro, estaríamos perante uma norma de protecção indirecta. Havendo
protecção indirecta, já haveria indemnização interesse público (protecção reflexa) ou uma
questão de protecção indirecta.
Daqui decorre que o lesado é sempre, ou titular da situação jurídica activa, ou o titular da
protecção indirecta. Um terceiro que tenha sofrido danos de um determinado facto que não seja
ilícito em relação a si, não pode, obviamente, fundar no regime da responsabilidade civil extra-
obrigacional uma qualquer pretensão indemnizatória. Aquele que quer indemnização tem de ser
o titular da protecção que esteja em causa. *Tratam-se de normas que, embora dirigidas á tutela
de interesses particulares – quer exclusivamente, quer conjuntamente com o interesse público –
não atribuem aos titulares desses interesses um verdadeiro direito subjectivo por não lhes
atribuírem exclusivamente o aproveitamento de um bem.
Nota: se nenhum dos dois pontos acima se verificar, não há responsabilidade civil extra-
obrigacional. Se se passar por um destes dois pontos, avança-se para o tipo subjectivo.
No entanto, na opinião do professor estes são elementos subjectivos da ilicitude. Não faz sentido
que digamos que um facto é ilícito se não tivermos o mínimo de interpretação subjectiva do
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desvalor ao agente. Para que um facto seja contrário não basta que o seu resultado seja
indesejado, é necessário que eu possa imputar subjectivamente esse resultado ao agente: é
necessário que o agente tenha contribuído com dolo ou falta de cuidado para esse resultado. O
dolo supõe sempre um elemento cognitivo.
O agente tem de representar a realidade até ao exacto momento em que ele se torna ilícito
do ponto de vista objectivo, ou seja, a partir do momento em que começa a interferir com o
direito ou a esfera jurídica alheia. Se o agente não tiver representado a totalidade dos elementos
que compõe o tipo objectivo, então não actuou com dolo.
Exemplo:
• Uma pessoa está na varanda e não consegue ver nada para baixo por isso entretém-se a atirar
pedras e não contempla sequer a possibilidade de alguém poder ser atingido. Não representou os
elementos de que fazemos depender um juízo de valor em sentido objetivo, pelo que não há dolo.
Para que houvesse teria que ter representado a projeção do seu ato até à interferência com a
esfera jurídica alheia
. • Imagine-se que ele está a atirar pedras e pensa que as pedras são tao pequeninas que não vão
fazer mal a ninguém. As pedras fazem mal a alguém. Se ele contemplou a possibilidade e
representou que podia atingir alguém mesmo pensando que não faria mal, isso é suficiente para
se poder dizer que há dolo.
• Dolo necessário: quando o agente representa que o seu comportamento vai ser ilícito e ainda
assim decide actuar. O resultado não é pretendido, mas é uma consequência necessária da
actuação.
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• Dolo eventual: quando o agente representa o resultado como consequência possível da sua
actuação e mesmo assim atua.
A negligência imputa subjectivamente o facto ao agente, não porque ele o queira, mas porque o
praticou violando deveres de cuidado, desviando-se do que lhe era exigido.
Quando falamos de negligência, o que censuramos é o descuido. o agente não quis fazer nada de
mal, mas não observou as circunstâncias de cuidado que eram exigidas para que o mal não
acontecesse. O desvalor está neste desvio face à diligência que deveria ter tido na situação
concreta.
O padrão pelo qual se afere a diligência é o do bom pai de família (487º/2). Regra geral, para o
direito civil, é indiferente que uma pessoa actue com dolo ou negligência, já que o resultado será
o mesmo: havendo dano, o mal será através deste medido. Ainda assim, há casos em que a
distinção é relevante, já que é possível reduzir a responsabilidade nos casos de mera culpa.
Artigo 494º: Quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser
fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde
que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais
circunstâncias do caso o justifiquem.
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Na aplicação deste artigo não há diferença necessária de grau quanto à gravidade da negligência
consciente ou inconsciente. A graduação da negligência encontra-se sim na distinção entre a
negligência grave e a negligência leve. O que fazemos é apontar deveres de cuidado que uma
pessoa devia ter observado e não observou. Esses deveres de cuidado são encontrados pela
comparação do nosso comportamento ao do comportamento do bom pai de família (artigo
487º/2).
Assim sendo, para que o facto seja ilícito, temos que ver se estão preenchidos os elementos
essenciais em relação à formação do tipo objectivo e se estão preenchidos os elementos
essenciais à formação do tipo subjectivo. Se faltarem os elementos objectivos ou os elementos
subjectivos não estamos perante um facto ilícito já que a presença de ambos os elementos é
cumulativa.
Isto não basta, ainda, para que o facto seja considerado ilícito. É isso que justifica a expressão
“ilicitamente” a complementar as anteriores. Tendo os elementos objectivos e subjectivos
concretizados, temos que verificar se não concorre nenhum outro elemento que exclua essa
ilicitude.
Por exemplo, se alguém matar e eu respondo no sentido de evitar a concretização da ameaça,
estou a praticar um facto voluntário, que corresponde a uma perturbação da esfera jurídica alheia,
com dolo, mas, porém, o meu comportamento não é descontrário ao ordenamento jurídico
porque existe uma causa de justificação do comportamento. O comportamento que era ilícito
deixou de o ser pela cláusula de exclusão de ilicitude.
Este elemento é de exclusão negativa porque eu mantenho a ilicitude se não acontecer mais nada
para além dos elementos objectivos e subjectivos. Se acontecer alguma coisa é que se exclui a
ilicitude.
A culpabilidade
Para que se possa fazer um juízo de culpa, é necessário passar por diversos patamares, o que
torna o juízo de culpa complexo. Muitos autores dizem que culpa corresponde ao dolo ou à
negligência e aí a culpa é fácil de encontrar. Para aqueles que, como o professor, não consideram
estes elementos qualificativos de culpa, esta passa a ser mais difícil de qualificar.
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Artigo 483º/2: “Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos
especificados pela lei”.
Artigo 487º/1: “É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo
presunção legal de culpa”. Na responsabilidade extra obrigacional, a culpa tem de ser
demonstrada pelo lesado, não se presume.
O inimputável é aquele que não tem a capacidade para dirigir o seu comportamento em função
das exigências que o ordenamento jurídico ponha a seu cargo (artigo 488º/1).
A inimputabilidade existe quando alguém, no momento em que praticou o facto, está
incapacitado de entender ou querer o facto tal como o praticou, isto é, está incapacitado de
entender ou querer o facto danoso.
O facto danoso é o facto ilícito tal como identificado. Para quem considere que o dolo e a
negligência são elementos da culpa, obviamente se uma pessoa é inimputável é incapaz de ter
dolo. Para quem considere que o dolo e a mera culpa são elementos da ilicitude, tem de aceitar
que uma pessoa possa ser inimputável e actuar com dolo.
Um inimputável pode querer atirar uma pedra contra um carro e nesse sentido actuar com dolo
directo. O problema é que ele não tem capacidades de entender o desvalor que o ordenamento
jurídico confere ao seu comportamento. Não é que a pessoa não seja capaz de querer praticar um
determinado acto, simplesmente está é numa situação em que não consegue entender o que esse
ato significa.
A segunda parte do artigo 488º/1 fala-nos das “acções livres na causa”. Isto é, nas
situações em que no momento em que uma pessoa pratica o ato não está em condições de
entender o acto, mas assim o é porque se colocou nessa situação voluntariamente. Assim,
quem se coloca nessa posição é, à mesma, imputável. Deste modo, é possível concluir que
nem todos os incapazes são inimputáveis.
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Nota: O artigo 489º pondera excepcionalmente circunstâncias excepcionais a uma situação
em que se justifica que o inimputável responda pelos danos causados. Regra geral o
inimputável não responde, mas o artigo 489º permite que, excepcionalmente, responda se as
pessoas a quem cabe a sua vigilância (artigo 491º) não poder ser responsabilizadas. Ora, o
inimputável responderá sempre sob critérios assentes na equidade e sempre salvaguardando
as suas necessidades.
Por exemplo, um pai que recebe a notícia que o filho está gravemente doente no hospital e
deixa tudo para ir ter com ele. Nesses casos afastamos a circunstância de indemnização
porque o sujeito actuou sem culpa.
Mas o que é que o terceiro que sofreu os danos tem a ver com a doença do filho? Isso é
justo? É, porque é as consequências de vivermos em sociedade; por vezes temos de passar
por estas circunstâncias.
Quanto muito pode haver responsabilidade nos termos do artigo 489º, mas não
responsabilidade extra obrigacional.
A existência de dano
Um facto voluntário, ilícito e culposo não gera responsabilidade civil. É necessário, portanto,
que existam danos. A existência de dano significa a supressão ou limitação de uma posição
de vantagem protegida pelo direito.
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Exemplo: o direito de propriedade resulta de conceder ao proprietário uma posição de
vantagem que permite que essa pessoa com detrimento ou exclusão e todos os outros se
aproprie de todas as utilidades que aquela coisa lhe proporciona, afectando essa coisa á
satisfação das suas necessidades. O dano será a supressão desta posição de vantagem.
Traduz-se nas consequências práticas da limitação esta posição de vantagem.
• Serem insusceptíveis de avaliação pecuniária. São exemplos a dor, o sofrimento… Isto não
quer dizer que dos danos a bens de personalidade não possa haver consequências a nível
patrimonial.
Temos de ver em que bem concreto se traduziu a lesão que está em causa. Se agrediu um bem
pessoal, estamos perante um dano não patrimonial. Se agrediu um bem que corresponde a um
decréscimo patrimonial, então estamos perante um dano patrimonial. Os danos patrimoniais não
suscitam especiais dificuldades de ressarcimento. Ou são suscetíveis de ser restituídos em natura,
ou não sendo suscetíveis de ser desta forma ressarcidos, podem ser ressarcidos pelo seu valor
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patrimonial. Já os danos não patrimoniais, não podem ser restituídos em espécie, nem
pecuniariamente (artigo 496º).
Os danos não patrimoniais são susceptíveis de ser indemnizados e a lei condiciona o seu
ressarcimento a uma especial gravidade.
O pressuposto é o de que nem todas as situações de desconforto correspondem a situações que
merecem a tutela do direito. Temos então de aferir a gravidade para perceber se o direito deve
intervir ou não. A gravidade afere-se pela natureza do bem lesado. Temos que estar perante a
lesão de um bem de personalidade que seja protegido pelo ordenamento jurídico. Em segundo
lugar, na perspetiva do lesado, essa lesão tem de assumir uma dimensão relevante: tem de se
traduzir num desconforto sério. Para aplicar o 496º/1:
O artigo 496º trata ainda da ressarcibilidade do dano morte. Este problema é para os juristas, por
razões lógicas, dos mais difíceis de resolver. Primeiro porque todos nós achamos que a vida é um
bem essencial que está acima de todos os outros. Assim, é difícil não reconhecer que alguém
deva ser responsabilizado por violar esse bem essencial. Mas quando nós morremos, cessa a
nossa personalidade jurídica, o que significa que existe uma incompatibilidade.
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No momento em que nasce o direito a ser indemnizado, é o momento em que deixa de haver
personalidade jurídica, para que esse direito possa nascer na esfera jurídica da pessoa que
morreu.
O artigo 496º/2 diz-nos que quando a morte de alguém é causada por outrem, o direito á
indemnização por danos não patrimoniais cabe ao cônjuge não separado em bens, aos
descendentes e, à falta destes, aos ascendentes. Estas pessoas têm direito a indemnização se
provarem a existência de dano. O objectivo deste artigo é limitar as pessoas que podem ser
ressarcidas por danos não patrimoniais por morte de outrem.
O artigo 496º/3, acrescenta ainda que no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não
patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização
pela morte de outrem (cônjuge, descendentes e ascendentes).
.O nexo de causalidade
Artigo 483º/1: “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou
qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o
lesado pelos danos resultantes da violação” São indemnizados os danos resultantes da lesão, ou
seja, aqueles danos que já seleccionados nos termos anteriores se encontram com o facto ilícito
numa relação de causalidade. Para entender o nexo de causalidade devemos ir, em especial, aos
artigos 562º e 563º. Primeiro, encontramos uma entrada para o conceito geral de dano.
Artigo 562º: ”Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que
existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”.
O artigo 563º vem limitar o artigo 562º, dizendo que afinal a obrigação de indemnizar só existe
em determinados casos. Artigo 563º: “A obrigação de indemnização só existem em relação aos
danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”. Este artigo não se
basta com um conceito puramente natural de causalidade. Para que os danos sejam efectivamente
indemnizáveis é necessário mais do que a causalidade naturalística, é necessária uma causalidade
normativa ou jurídica que qualifique a mera sucessão natural dos fenómenos.
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Não basta que o dano seja consequência do facto, é necessário que o dano seja consequência
provável do facto. O artigo 563º exclui dos danos ressarcíveis aqueles que o lesado, segundo
juízo de probabilidade, não teria sofrido se não fosse o facto – teoria causalidade adequada.
Ocorre um facto ilícito do qual surgem consequências. Algumas são normais no sentido que seria
normal que viessem a acontecer no decurso normal das coisas.
Por exemplo, dando um tiro a alguém tenho de admitir que a pessoa morra. Agora imagine-se
que uma pessoa inflige a outra um fermento ligeiro. No estado de saúde dessa pessoa, essa ferida
ligeira torna-se grave e leva a pessoa a morrer. A morte da pessoa não é antecipável segundo
regras de experiencia comum quanto ao facto (a agressão ligeira). Deve ser feito um juízo de
prognose: colocamos uma pessoa normal dotada dos conhecimentos que a generalidade das
pessoas tem, enriquecida com os conhecimentos que o agente tenha na posição em que estava
quando praticou o facto ilícito.
O que vamos fazer é perguntar a essa pessoa normal se, naquelas circunstâncias, devia ou não
ter antevisto a concretização do resultado. Fazemos isso em relação a todos os danos. Os danos
em relação aos quais demos uma resposta positiva, são indemnizáveis, os danos em relação aos
quais demos uma resposta negativa não serão ressarcíveis. A teoria da causalidade adequada
pode ter uma formulação positiva ou negativa:
• A formulação positiva para que os danos indemnizáveis sejam menos. Isto porque o juízo de
causalidade adequada na formulação positiva é mais exigente já que só existe causalidade
adequada na medida em que o homem médio com os especiais conhecimentos do agente devesse
prever aquele resultado como consequência provável do seu comportamento.
• A formulação negativa é adoptada pelo artigo 563º. De acordo com esta formulação, não é
preciso demonstrar que o dano é consequência provável do facto, só tenho de provar que não era
legítimo ao autor do facto excluir a sua verificação.
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Regime específico da responsabilidade extra-obrigacional
São relevantes os artigos 484º, 485º e 486º.
Artigo 484º: ofensa do crédito ou do bom nome – Este artigo não faz prescindir dos requisitos
gerais do artigo 483º; não traz um título novo de imputação. Os requisitos de um e de outro
artigo devem ser lidos em conjunto e não em separado.
Deste artigo resulta uma modalidade da ilicitude que resulta da ofensa e do bom nome de
outrem. O que está em causa é a agressão a determinados direitos de personalidade: todos temos
direito ao nosso bom nome e todos temos direito ao crédito. Quem agredir o bom nome de
outrem pratica um facto que viola direito alheio. Se alguém disser que sou desonesta está a
ofender o meu bom nome. Se difundirem informações sobre mim dizendo que tenho muitas
dividas, se disserem que estou em insolvência… o que ofendem é o meu crédito.
Este artigo esclarece que a agressão desses bens corresponde a um comportamento ilícito que
pode levar a obrigação de indemnizar. Refere ainda que pode estar a ficar sujeito a obrigação de
indemnizar aquele que afirmar (criar a informação) ou difundir (o que divulga). Mas o que é
ofender o bom nome e o crédito? A simples circunstância de a situação ser verdadeira exclui a
ilicitude? Para o professor não é admissível que este simples facto exclua a ilicitude. A
divulgação de informação verdadeira pode constituir um facto ilícito. Há um interesse legítimo
na divulgação da informação a ponto de se justificar que a prossecução do seu interesse
prevalece ao mal que esta a causar aos outros?
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Artigo 485º: conselho, recomendações ou informações – Este artigo refere-se à descrição de
uma actividade que é apta à violação de direitos alheios, gerando por isso a obrigação de
indemnizar. Aquilo que o nº1 nos diz é que em abstracto, em muitas circunstâncias,
pronunciamo-nos acerca do que os outros nos perguntam, prestamos informações, damos
conselhos… e que como isto faz parte da vida normal não temos que responder por essas
informações ou conselhos ainda que tenhamos sido negligentes ou descuidados.
O ordenamento jurídico não impõe sobre nós um dever de diligência daquilo com que prestamos
informações aos outros. O princípio geral é o da irresponsabilidade. Esta irresponsabilidade tem
limites previstos no nº2. A obrigação de indemnizar existe, então, nos seguintes casos:
• Quanto tenhamos assumido a responsabilidade perante outro, cai sobre nós a responsabilidade
sobre a informação;
• Quando havia o dever jurídico de dar conselhos, recomendação ou informação - casos em que
o conselho não é espontâneo, mas é dado em satisfação de um dever jurídico que recai sobre
quem os dá. Se temos o dever jurídico de prestar a informação ou a recomendação, então temos
de actuar de forma diligente; se não o fizermos, suportamos as consequências negativas pelos
danos que tivermos causado;
• Quando exista intenção de prejudicar – uma coisa é dar uma má informação por ser descuidado,
outra é dala com o objectivo de prejudicar. A intenção de prejudicar significa a existência de
dolo e por isso implica responsabilização,
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Por exemplo, eu dirijo-me a uma repartição pública para obter informações. As pessoas que aí
estão têm o dever jurídico de me informar correctamente, mas não têm com cada um de nós uma
relação contratual ou obrigacional. A fonte do seu dever resulta do seu estatuto, das funções que
exercem… Este artigo aplica-se, então, num contexto extra obrigacional. O que dele retiramos é
a explicitação de uma forma de comportamento de uma acção que pode gerar responsabilidade
na medida em que pode levar a um juízo de ilicitude.
• Da lei: lei deve ser lido no sentido de corresponder à fonte de qualquer norma jurídica. Podem
então estar em causa regulamentos, portarias… Só é necessário que estejamos perante uma
norma jurídica que imponha, naquele caso, o dever de actuar independentemente da origem da
fonte dessa norma. Não é necessário que tenhamos uma norma concreta, o que é necessário é que
o dever de actuar seja exigível juridicamente, isto é, segundo os critérios do ordenamento
jurídico. Posso estar numa situação em que o dever de actuar é mera concretização da boa-fé, não
encontrado eu uma norma especifica que diga que naquele caso concreto tal pessoa tem de fazer
isto. Devemos dar a esta fonte um sentido mais lato que o normal.
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• De negócio jurídico: este negócio jurídico não pode ser um negócio jurídico entre o
responsável e o lesado, porque neste caso estaremos sobre responsabilidade obrigacional ou
contratual.
Assim, em caso algum, o ressarcimento vai superar a medida dos danos. Não existem no
ordenamento português os danos punitivos: os casos em que a obrigação de indemnizar inclui
para além de uma função ressarcitória uma função penalizadora.
Exemplo: uma marca fabricante de automóveis produziu um dado automóvel, vindo a constatar
que ele tinha um defeito grave. Era então possível que um dado numero de pessoas pudesse vir a
ter um acidente devido ao defeito do carro. A marca foi confrontada com as seguintes situações:
assumir publicamente o defeito do carro e as consequências que daí adviriam ou deixar os
automobilistas continuar com os carros e esperar que houvesse algum acidente e depois pagar as
devidas indemnizações em função dos danos causados. Num caso como este a indemnização não
deve ser exclusivamente indemnizatória, porque no caso de a empresa escolher a segunda opção
isso denota um desprezo por bem maiores.
Artigo 494º - este artigo sobre limitação da indemnização no caso da mera culpa só se aplica nos
casos de negligência, e nunca nos casos de dolo. Assim, a referência a mera culpa deve ser
entendida como mera culpa. Do ponto de vista subjectivo, o facto é imputado ao agente não por
haver um juízo doloso, mas por o acontecimento ser consequência de um comportamento
descuidado. Em geral, é irrelevante que o agente actue com dolo ou negligência, mas este artigo
atribuir relevância a esse aspecto. Na mera culpa, a indemnização vai até ao limite dos danos
causados, mas pode ser causada em montante inferior. Esta fixação é determinada por juízos de
equidade, ou seja, ponderando todas as situações do caso concreto.
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Existe, porém, uma lista de circunstâncias enunciativas:
• Situação económica do agente e do lesado Este artigo não permite que a indemnização seja
maior à medida do ano. O que permite a titulo excepcional sobre juízos de equidade é que em
casos de negligencia a indemnização fique aquém do dano.
Artigo 497º: Se tivermos várias pessoas responsáveis pelo mesmo dano existe uma
responsabilidade solidária perante o lesado. De acordo com o número 1, a justificação da
solidariedade é encontrada no resultado. Não nos interessa a que titulo os agentes são
responsáveis, nem de que forma colaboraram ou não para os danos, se actuaram em processos
paralelos ou entre si… o que interessa é o resultado final. Uma pessoa pode ser responsável a
titulo obrigacional e outra a título extra-obrigacional, uma por dolo e outra por mera culpa.
Porém, nada disto é relevante para determinarmos o âmbito de aplicação do artigo 497º. Este
artigo apenas se centra no resultado. A solidariedade quer dizer que o lesado pode dirigir-se a
cada um dos responsáveis e pedir todo o valor da indemnização sem qualquer limitação. Apenas
lidamos com a relação que se estabelece entre os vários responsáveis e o lesado. É disso que trata
o nº2 do artigo. O facto de responderem por inteiro perante o lesado não prejudica a existência
do direito de regresso, feito de acordo com a medida da culpa de cada um. Culpa para efeitos do
artigo 497º. Significa “na medida da responsabilidade”, “na medida do contributo de cada um
para os danos”.
Artigo 498º: Este artigo contém uma regra especial acerca da indemnização. Regra geral, as
obrigações prescrevem passados 20 anos. O direito de indemnização prescreve passados apenas
3 anos.
A lei admite que a obrigação de indemnizar possa prescrever antes, decorrido um prazo de 3
anos contados a partir do momento em que o lesado teve conhecimento do direito a ser
indemnizado. O que acontece é que dentro dos 20 anos vamos ver quando é que o lesado teve
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conhecimento do direito a ser indemnizado. Se tem conhecimento ao 9º ano dos 20, a partir daí
contam-se 3 anos, não deixando os 20 anos terminar. Se ao fim dos 20 anos o lesado nunca
tomou conhecimento do direito a ser indemnizado, então a prescrição é de 20 anos. Se tomar
conhecimento no 19º ano, a prescrição dá-se ao 20º ano.
A prescrição dá-se sempre no prazo que terminar primeiro. Para além dito, devem ser
consideradas outras três situações:
• O direito de regresso também prescreve em 3 anos;
• Se o facto ilícito constituir crime e o prazo de prescrição do crime acabar depois do prazo de
prescrição do ilícito civil então acolhemos o prazo mais longo do direito criminal;
• A prescrição do direito de indemnização não importa prescrição da acção de reivindicação, nem
da acção de restituição por enriquecimento sem causa;
• Responsabilidade extra-obrigacional
• Responsabilidade obrigacional: associada ao incumprimento de uma obrigação
Portanto, traduz-se na circunstância de aquela pessoa, naquela circunstância em concreto, não ter
feito aquilo que lhe era juridicamente exigível numa obrigação em que ele era o devedor. Assim,
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aquilo que as distingue é o formato, a configuração que a ilicitude tem. Também na
responsabilidade obrigacional, subjacente à responsabilidade começa por estar sempre um ato
voluntário, um comportamento, uma decisão que a aquela pessoa tomou no sentido de se
comportar daquela forma. O primeiro pressuposto é o mesmo: a existência de um facto
voluntário.
O credor, a única coisa que tem de demonstrar é que aquela pessoa, num determinado contexto
concreto, atuou em termos desconformes ao dever da obrigação que a vinculava. Se conseguir
fazer esta demonstração, a única coisa que tem que demonstrar, para efeitos de responsabilização
em sede de responsabilidade obrigacional, é que daquele comportamento resultaram danos e que
esses danos são objectivamente imputáveis ao comportamento, ou seja, tem que demonstrar que
existiram danos e nexo de causalidade.
Portanto, os requisitos cuja demonstração fica a cargo do lesado são mais reduzidos do que
aqueles que encontramos na responsabilidade extra-obrigacional, porque nesta incube ao lesado
demonstrar que o responsável actuou com dolo ou negligência e que, naquelas circunstâncias
concretas, o ato do responsável deve ser imputado a título culposo. Portanto, o juízo de culpa
também se presume na responsabilidade obrigacional. Na responsabilidade extra-obrigacional, a
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situação hipotética que construímos é sempre a que aqui existiria se o facto não se tivesse
verificado (ilícito, voluntário, culposo). A situação hipotética é sempre essa e só uma. Assim,
vamos tentar apagar as consequências que aquele facto teve, reconstruindo a situação que
existiria se aquele facto não tivesse ocorrido.
Quando lidamos com a responsabilidade obrigacional, as situações hipotéticas podem ser duas e
temos que fazer a opção por uma delas:
• Interesse contratual negativo, dano de confiança. Neste caso, reconstruímos a situação que
existiria se o contrato que está na base da obrigação incumprida nunca tivesse sido negociado ou
celebrado. Ou seja, reconstruímos a situação que existiria se o contrato nunca tivesse existido.
Em alguns casos, compete ao credor fazer a escolha entre uma situação hipotética e a outra.
Noutras situações, essa escolha não existe porque o ordenamento jurídico impõe uma
determinada situação a reconstruir. Esta escolha que tenhamos, ou não, é fundamental para
identificar os danos que são ressarcíveis.
Os danos que relevam do interesse contratual negativo são, por definição, diferentes dos danos
que relevam do interesse contratual positivo. A situação real é sempre a mesma, mas vamos
compará-la com situações hipotéticas diferentes. Naturalmente, se as situações hipotéticas que
utilizamos para efeito de comparação são diferentes, os danos também o serão dado que são a
diferença entre a situação real e a situação hipotética. A identificação adequada da situação
hipotética que vamos reconstituir é fundamental para que identifiquemos os danos que vão ser
ressarcidos.
Daí que seja fundamental saber em que casos tem o credor a opção de aceder a indemnização por
interesse positivo ou negativo. Quando falamos de interesse contratual positivo e negativo em
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responsabilidade obrigacional, devemos ter adicionalmente em conta que estamos a tomar a parte
pelo todo, no seguinte sentido: é verdade que a generalidade das obrigações de indemnizar com
que somos confrontados tem fonte contratual, e por isso faz sentido que, a propósito do
incumprimento, falemos de interesse contratual negativo ou positivo, mas sabemos que nem
todas as obrigações têm fonte contratual, sendo que existem outras fontes de obrigações:
• Fonte legal: não têm origem num ato de autonomia das pessoas, mas na verificação de
pressupostos que a lei impõe para o surgimento de determinadas obrigações (gestão de negócios
e enriquecimento sem causa). Para estas, não faz sentido falar de interesse contratual positivo ou
negativo porque, se não tem fonte contratual, não faz sentido falar em interesse contratual. Não
está na disponibilidade do respeito credor apaga-las do ordenamento jurídico, porque, dado a sua
fonte ser legal, elas não estão na responsabilidade do credor. Então, em sede indemnizatória, o
credor só pode exigir o interesse por incumprimento, isto é, ser colocado na situação em que
estaria se aquela obrigação tivesse sido pontual e integralmente cumprida. O dano de confiança
não é relevante nas obrigações de fonte legal uma vez que não é possível de ser ressarcido.
O que é que leva que o ordenamento jurídico permita que o credor opte?
O que está na base do interesse contratual negativo é a circunstância de haver uma determinada
pessoa que aderiu, em confiança, a um programa contratual que saiu frustrado. Nessa sequência,
quer que retirem da sua vida aquilo que saiu frustrado, que o coloquem na situação em que
estaria se nunca tivesse aderido ao programa obrigacional. Isto que a lei permite ao credor dizer
relativamente ao contrato, faz sentido quando a pessoa aderiu a um contrato, mas não faz sentido
nas obrigações de fonte legal porque a pessoa não aderiu a qualquer programa. Verificados
determinados pressupostos, o ordenamento jurídico impõe a constituição daquela obrigação e
não está na disponibilidade do credor dispor da mesma, uma vez que não foi ele que aderiu à
situação. Assim sendo, a única coisa que pode fazer é querer ficar na situação em que estaria se a
obrigação fosse cumprida.
O que leva o legislador a dizer que, nas obrigações com fonte contratual, o credor pode
optar por aquilo que o contrato lhe daria ou, em alternativa, destruir o contrato?
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Aquilo que fundamenta isto é o facto de o agente ter aderido a um programa que saiu frustrado.
Quando falamos em obrigações de fonte legal, não houve ilusão nenhuma, não foi o credor que
aderiu à solução, foi o ordenamento jurídico que impôs, portanto, o credor não pode dispor
daquela situação. Então, não pode dizer que o tratem como se a obrigação não existisse, pode
apenas dizer que o tratem como se a obrigação tivesse sido cumprida.
• Se falamos de obrigação com fonte num ato de autonomia do credor, em abstrato, podemos
admitir que o credor diga que, em vez do cumprimento, quer ser colocado na situação em que
estaria se nunca tivesse exercido a sua autonomia no sentido de se vincular àquele programa, ou
seja, diz que “se soubesse o que sei hoje, não me colocaria nesta situação”.
• Por outro lado, quando a fonte da obrigação é outra, que não um ato voluntário do credor, ou
seja, quando a fonte é legal, o credor não pode fazer esta opção, o máximo que pode fazer é
exigir a indemnização relativa à colocação da situação em que estaria se a obrigação tivesse sido
plenamente cumprida. E isto que vale para as obrigações de fonte legal, vale para as situações de
negócio jurídico unilateral, dado que o que surgiu nunca dependeu da vontade do credor. Assim,
as obrigações com origem num negócio jurídico unilateral do devedor não podem ser alvo de
ressarcimento pelo interesse contratual negativo, porque as mesmas nunca estiveram na
disponibilidade da vontade do credor.
Os únicos casos em que o credor pode optar por interesse negativo é quando, para constituição
da obrigação incumprida, ocorreu um atamos da sua parte. Em relação aos negócios jurídicos
unilaterais, eles também se formam sem necessidade de concurso da vontade do credor.
Formam-se apenas por vontade do devedor e são fontes de obrigação para o próprio, não para
terceiro.
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• O primeiro é aquele que se refere à eventual cumulação dos pressupostos da responsabilidade
obrigacional e extra-obrigacional, num determinado caso concreto. Pode acontecer que, num
determinado caso, existam vias alternativas de responsabilização e, então, devemos escolher uma
delas.
Se procurarmos doutrina sobre este tema, vemos que existem várias concepções. Aquilo que
prevalece, na opinião do professor, é o seguinte: se temos duas vias alternativas de
responsabilização, se o lesado pode obter ressarcimento quer seguindo a via da responsabilidade
extra-obrigacional, quer seguindo a via da responsabilidade obrigacional, não parece existir
alguma razão para que ele possa sair beneficiado em relação a qualquer uma das vias de
responsabilização, pela circunstância de no caso cumularmos duas vias de responsabilização
alternativa. Se existem duas vias alternativas de responsabilização, o lesado sabe que não pode
cumular as duas, mas pode optar por aquela que, no caso, lhe pareça a mais adequada. Não existe
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nenhuma razão para que, podendo seguir uma ou outra, lhe digamos que tem que ir por uma ou
por outra, desde que cumpra os pressupostos relativos à via alternativa escolhida.
• Responsabilidade obrigacional: “nos termos do contrato de empreitada, tinhas que fazer a obra
com segurança, isto é, executar a obra com determinados deveres, não o fizeste e por isso tens
que indemnizar”, nos termos do artigo 798º e ss. Por qualquer uma das duas vias, em princípio,
iria obter indemnização.
Existe alguma razão para que digamos que, por existir opção de ir pelo contrato de empreitada,
só pode recorrer a essa via, em vez de ir pelos artigos 483º e ss? Não. O lesado que opte por uma
delas e responsabilize o responsável.
Normalmente, se nada se opuser em sentido contrário, tendo alternativa, é natural que opte pela
responsabilidade obrigacional, dado que o ónus de prova é mais reduzido. Os requisitos são os
mesmos, a forma de repartir o ónus é que é diferente. Na responsabilidade obrigacional, há uma
presunção de culpa e o responsável tem o ónus de ilidir a presunção. Pretendendo o lesado seguir
a via mais fácil, contando com a presunção de culpa do artigo 749º, é expectável que siga essa
via. No entanto, podem existir casos em que seja mais benéfico para o lesado seguir o caminho
da responsabilidade extra-obrigacional. Isto acontece quando a responsabilidade obrigacional
seja, por alguma forma, limitada.
Por exemplo, temos um contrato de empreitada que tem uma cláusula em que o empreiteiro diz
que, em caso algum, responde por danos superiores a 50% da obra. Se os danos excederem este
montante e o lesado quiser uma indemnização pelos danos, tem que seguir o caminho da
responsabilidade extra-obrigacional, onde esta situação não existe.
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É evidente que existe a situação adicional da interpretação da cláusula que limita a
responsabilidade, ou seja, temos que ver se as partes pretenderam limitar apenas a
responsabilidade obrigacional ou ambas, sendo que, à partida, nada impede que limitem ambas.
As partes só não podem limitar essa responsabilidade em relação aos direitos que assumamos
como indisponíveis.
As cláusulas de limitação de responsabilidade são cláusulas típicas, assim, podem dizer “limita a
responsabilidade, independentemente da sua fonte”. Mas, depois acrescenta-se “exclui-se, em
qualquer caso, os danos causados à vida, …”. Exclui-se porque os bens em questão são bens
indisponíveis e, portanto, não podemos renunciar à protecção dos mesmos.
Assim, as partes podem criar e fazer-se valer destas cláusulas, ainda que as mesmas tenham
origem na aplicação do regime da responsabilidade extracontratual, desde que não venham
limitar ou renunciar antecipadamente a protecção de bens jurídicos indisponíveis. Depois de
constituído o direito à indemnização, podemos exercê-lo ou não.
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Regra geral, para que a apliquemos o artigo 494º é necessário que o facto seja imputado ao
agente a titulo de negligência e não de dolo, e na verdade, quando analisamos os requisitos da
responsabilidade civil extra-obrigacional, temos uma regra de acordo com a qual incumbe ao
lesado fazer a alegação e a prova dos factos constitutivos do seu direito, nomeadamente o titulo
subjectivo de imputação do facto ao agente.
Isto não quer dizer que do ponto de vista teórico a questão não tenha relevância. Discutimos se,
em abstracto, pode o devedor, invocar que actuou com mera culpa e com base nessa imputação
tentar aplicar o artigo 494º procurando por essa via que a indemnização seja fixada em montante
inferior ao dos danos.
Em abstracto, não existe razão que nos possa levar a excluir a aplicação do artigo 494º à
responsabilidade obrigacional, desde que esteja demonstrado que o facto de incumprimento é
imputado ao agente a titulo de mera culpa.
A aplicação deste artigo num contexto de responsabilidade obrigacional deve ser mais exigente
do que no contexto da responsabilidade extra-obrigacional porque a exigência que devemos
colocar no comportamento do devedor deve ser superior à que colocamos na generalidade das
pessoas. Na responsabilidade extra-obrigacional temos uma pessoa que não tem relação com a
outra e que, na sua actividade, e provoca danos a outros num contexto em que o seu
comportamento é ilícito e culposo, mas a pessoa está a actuar espontaneamente, não está
vinculada a nenhum programa. No caso do devedor, este já está vinculado a um programa a que
tem de responder.
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Assim sendo, Não existe uma incompatibilidade total na aplicação do artigo à responsabilidade
obrigacional, no entanto esta deve levar-nos a ser mais exigentes na limitação da
responsabilidade do que quando se tarte de responsabilidade extra-obrigacional.
O incumprimento de uma obrigação pode trazer danos morais não patrimoniais que satisfaçam
os requisitos deste artigo e que, como tal, devam ser indemnizados. Não existe qualquer
diferença no desvalor objectivo que se traduz na violação do direito alheio e no desvalor de
incumprimento de uma obrigação. Em ambos os casos estamos numa situação de violação de
imperativos do ordenamento jurídico.
Se uma determinada pessoa incumpre obrigações perante outra e faz com que esta fique incapaz
de cumprir os seus próprios compromissos, pode para além do dano patrimonial ter danos
morais. O critério é que sejam danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito. Se
merecerem a tutela do direito em função da sua gravidade, devem considerar-se ressarcíveis quer
na responsabilidade extra-obrigacional, quer na obrigacional.
A obrigação primária que foi não observada pelo respectivo devedor está sujeita ao regime que
lhe seja aplicada, normalmente a conjunção. Se uma obrigação primária tiver dois devedores e
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apenas um incumprir só sobre ele recairá a obrigação de indemnizar. Mas se tivermos dois
devedores segundo o regime geral da conjunção, se ambos incumprem gerando um determinado
dano, surge a obrigação de indemnizar associada ao ressarcimento do dano. Esta obrigação é e
não se confunde com a anterior. Se temos duas pessoas que respondem pelo dano. A
circunstância de a primeira obrigação não ser solidária, em nada implica que a obrigação de
indemnizar também não o seja.
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seja em espécie. Assim, este é um desvio suplementar na responsabilidade obrigacional
relativamente à regra-geral da indemnização.
Se temos o incumprimento de uma obrigação, o credor vai olhar primeiro para o que está feito e
o que tinha que ser feito. Se ele decide que já não quer a prestação, passa para a próxima questão,
a da indemnização. o artigo 566º diz que a indemnização tem de ser em espécie, de modo a que o
lesado fique na situação em que estaria se não tivesse existido o facto ilícito. Se o facto não
tivesse existido, o credor teria recebido a prestação. Mas se ele diz que não quer a prestação, não
a pode receber por força do 566º. Para evitar este resultado, a partir do momento em que ele
recusa a prestação, não faz sentido impor o que ele recusou.
Então, todos aqueles que contribuam para o incumprimento da obrigação podem responder com
o devedor, mas enquanto o devedor responde a título de responsabilidade obrigacional, eles
respondem título de responsabilidade extra-obrigacional, desde que verificados os requisitos do
artigo 483º.
O direito de crédito não é um direito que esteja subtraído ao artigo 483º, é como todos os outros
direito subjectivos, um direito que pode ser violado por terceiros, a diferença é que é violado
pelo seu devedor. Sempre que existe um terceiro que viola direito alheio ou norma que protege
interesses alheios, esse terceiro é responsabilizado, nos termos do artigo 483º, segundo o regime
da responsabilidade extra-obrigacional.
Exemplo: há uma pessoa que deve ir a casa de uma outra pagar uma dívida e eu não quero que
o faça. Então, tranco essa pessoa em casa e não a deixo sair por uma semana. Entretanto, essa
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pessoa vai ter o seu cumprimento atrasado em uma semana. Eu não sou responsável pelo
incumprimento porque não sou devedor, mas sim terceiro. No entanto, fui eu que originei a
situação que levou ao incumprimento. No que concerne ao devedor, existe uma presunção de
culpa, dado que vai ser responsabilizado por via da responsabilidade obrigacional. Em relação ao
terceiro, vou ter que demonstrar tudo. Neste exemplo, estamos perante uma violação de direito
de crédito alheio.
A responsabilidade objectiva
A ideia fundamental na responsabilidade objectiva ou responsabilidade pelo risco é que existem
actividades que são perigosas pela sua natureza e pelos meios que operam. Funciona com a
lógica de fazer recair na esfera jurídica da pessoa que utiliza a vantagem perigosa os danos do
eventual perigo. Deste modo, o ordenamento jurídico responsabiliza determinadas pessoas pelo
dano que causam no outro, não porque dirigem a essa pessoa um qualquer juízo de censura, mas
porque consideram que esses danos são concretização de um risco criado pela pessoa que vai ser
responsabilizada e do qual ela retira benefícios.
A circunstância de se tratar de actividades perigosas, não quer dizer que não querem ser
exercidas não há qualquer censura ao seu exercício, até porque normalmente são actividades
úteis que trazem vantagens a quem as usa.
A responsabilidade pelo risco só existe nos casos previstos pela lei, ou seja, para haver
responsabilidade objectiva temos que encontrar títulos que nos permitam imputar essa
responsabilidade.
Se eu verificar que existe uma determinada pessoa que cria uma situação de risco para terceiro,
mas a lei não prevê a propósito dessa situação um título especifico de imputação de
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responsabilidade, essa imputação não existe. O máximo que se pode dizer é que se uma pessoa
criou uma situação de risco, impõe a boa-fé que toma as medidas adequada no sentido de evitar o
risco.
Nos casos é que não se pode recorrer à imputação objectiva pode recorrer-se à responsabilidade
extra-obrigacional. Nessa situação não se responsabiliza a pessoa por ter criado a situação de
risco, mas a responsabilizá-la por faltar ao cumprimento de um dever que o ordenamento jurídico
impõe. Se o incumprimento desse dever for culposo, determinar dano e estiver num nexo de
causalidade com o dano, então há responsabilidade nos termos dos artigos 483º e 484º. A
responsabilidade objectiva ou responsabilidade pelo risco é prevista nos artigos 499º e ss.
Artigo 499º:
Em principio, mais na teoria do que na prática, o regime da responsabilidade por factos ilícitos é
aplicável à responsabilidade objectiva. No entanto existem duas excepções:
• Existência de preceitos legais em contrário: aquelas normas específicas que prevêem soluções
que se afastam das soluções gerais da responsabilidade por factos ilícitos.
Por exemplo, na responsabilidade pelo risco associado à utilização de automóveis, temos regras
quanto ao limite do valor da indemnização. Esta é uma regra específica que vale em vez das
regras gerais da responsabilidade extra-obrigacional;
• Diferença à parte aplicável: aquelas normas que pela sua natureza não podem ser aplicadas na
responsabilidade com o risco, por ser insusceptíveis de ser aplicáveis neste. As regras que
regulam os requisitos da culpa,
por exemplo, por definição, não são aplicáveis na responsabilidade pelo risco por, pela sua
natureza, serem incompatíveis.
A lei prevê várias figuras de responsabilidade pelo risco, das quais se destacam a
responsabilidade do comitente (artigo 500º) e os acidentes causados por veículos (artigos 503º e
ss.)
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A responsabilidade do comitente
A responsabilidade do comitente encontra-se no artigo 500º. Aquele que encarrega outrem de
qualquer comissão, responde independentemente de culpa pelos danos que o comissário causar,
desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar. Estamos perante situações em
que estão pelo menos envolvidas três pessoas:
• O comitente: É aquele que encarrega o comissário de fazer qualquer coisa, de uma
determinada comissão. É aquele que dá instruções ao comissário para que pratique determinado
ato.
• O comissário: É aquele que recebe as instruções e pratica o ato ao abrigo das instruções que
recebeu.
• O terceiro lesado: É aquele que sofre danos na sequencia dos actos que o comissário pratique
no âmbito da comissão.
O que a lei nos diz é que se recai sobre o comissário a obrigação de indemnizar o terceiro, o
comitente responde pelos danos que o comissário tenha causado, independentemente de culpa. A
lógica é que havendo uma pessoa que pode actuar por si, decide actuar por outro: o comitente
decide não actuar por si, encarregando um comissário de fazer o que ele faria. Quem retira o
beneficio do ato que está a ser praticado é o comitente. É sobre suas instruções que está a actuar
o comissário. O comissário, ao actuar nestes ermos, provoca danos a terceiro.
Se o comissário for responsável, ou seja, se em relação ao comissário verificarmos os requisitos
da responsabilidade civil, é evidente que o comissário responde.
O que nos diz ao artigo 500º é que o comissário não responde sozinho, mas juntamente com o
comitente. Quando afirmamos a responsabilidade do comitente não criamos uma nova
responsabilidade que permite ao lesado receber mais do que receberia. O lesado vai receber
exactamente o mesmo que tinha direito a receber da sua relação com o comissário. O que o
artigo nos traz é outro responsável: onde havia apenas um responsável a este é junto outro – o
comitente junta-se ao comissário.
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O lesado pode então dirigir-se, para além de ao comitente, também ao comissário. O terceiro
lesado pode, então, dirigir-se indiferentemente ao comissário ou ao comitente que ficam numa
relação de solidariedade.
Internamente, diz o artigo 500º/3 que apesar de na generalidade destas situações para que o
comissário seja responsável, é preciso que tenha praticado um facto ilícito e culposo. A lei diz-
nos que desde que verificados os pressupostos pelos quais o comissário devesse responder, o
comitente também vai responder, não por ter feito algo de mal, mas porque era ele o beneficiário
da actividade que o outro estava a exercer. O comitente tem o direito de exigir do comissário o
reembolso de tudo o que haja pago, excepto se houver também culpa da sua parte, caso em que
se aplica o artigo 500º/2. Como quem faz alguma coisa de mal efectivamente foi o comissário, é
ele que tem de suportar o valor do que seja pago.
A culpa do comitente é um conceito específico diferente de outros conceitos de culpa. A lei fala
aqui daqueles casos em que exigiu menor diligência do comitente da sua relação com o
comissário. Existem em geral três tipos de culpa relevantes para este efeito:
• A culpa inteligente: o comitente escolhe mal a pessoa que encarrega de fazer qualquer coisa –
perante o terceiro lesado ambos continuam responsáveis, mas internamente as coisas modificam-
se. A última repartição vai fazer-se nos termos do artigo 497º segundo a medida da
responsabilidade de cada um.
Por exemplo, um empreiteiro encarrega uma pessoa com anomalia especifica para manobrar
uma grua. Se ao manobrar a grua o funcionário provocar danos a terceiro, externamente, temos
solidariedade, mas internamente temos uma repartição diferente porque não há razão para que
digamos que toda a responsabilidade foi do funcionário.
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• A culpa invigilante: neste caso, a responsabilidade do comitente resulta de ele não ter vigiado
adequadamente segundo os deveres de diligência que são exigíveis ao bom pai de família, a
atividade do comissário.
• É responsável aquele que tem a direcção efectiva do veículo: não tem nada a ver com
condução, tem a ver com ter disponibilidade material sobre o veículo, a ponto de ter a
possibilidade material de tomar o essencial das decisões que respeitem à utilização ou afetação
daquele veículo. Na ausência de prova em contrário, a direcção efectiva está com o seu
proprietário. Ainda assim, admite-se prova em contrário: que se demonstre que afinal a direcção
efectiva não coincide com o direito de propriedade sobre o veículo. Podemos fazer esta
demonstração com base em argumentos de natureza jurídica, ou com base em argumentos de
natureza factual. Sobre uma coisa podem incidir vários direitos: o direito de propriedade é um
direito elástico que pode ser comprimido pelo direito de outra pessoa sobra o veículo. É o que
acontece se o veículo for furto de um usufruto, de uma locação financeira…
O furto quebra a ligação entre o proprietário e o veiculo fazendo com que do ponto de vista
prático o proprietário fique impedido de exercer os poderes materiais que tem sobre as coisas.
• É responsável o que utiliza o veículo no seu próprio interesse (ainda que por intermédio de
comissário): esta referência permite-nos concluir que a utilização no interesse de uma
determinada pessoa não pressupõe que seja essa pessoa que esteja a utilizar directamente o
veículo. Devemos chegar, para que responsabilizemos uma determinada pessoa, à conclusão de
que aquele veículo está a ser afecto à satisfação de uma necessidade daquela pessoa a ponto de
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dizermos que aquela pessoa está a colher um proveito da utilização do veículo naquela
circunstância. Naturalmente, há situações que não suscitam dúvida.
Regra geral, cada um de nós utiliza o seu próprio veículo para seu próprio interesse. Mas
existem situações de fronteira, nomeadamente a da relação comitente/comissário: se tivermos
alguém que encarregue outrem de realizar uma determinada tarefa que pressupõe a utilização de
um veiculo, a responsabilidade objectiva recai sobre o comitente e nãos obre o comissário.
Quem está a utilizar o carro no seu interesse é o comitente e não o comissário. Outra situação de
fronteira é quando emprestamos o nosso carro a alguém: nessa viagem a pessoa tem um acidente.
Aquele que emprestou não deixou de ter um interesse próprio no empréstimo de o veículo
porque ao 28 emprestar também colhemos o benefício do proveito que estamos a fazer. Isso é
suficiente para que se entenda que continuamos a utilizar o veículo no nosso próprio interesse.
• É necessário que os danos verificados sejam resultado dos riscos próprios do veículo,
ainda que este não esteja em circulação: este requisito relaciona-se com o fundamento da
responsabilidade. O veiculo é um objeto perigoso que suscita riscos. Aquilo com que lidamos é a
imputação àquele que tem a direção efetiva e que utiliza o veiculo para seu proveito os riscos
próprios do veículo. Os riscos próprios do veículo são aqueles que são colaterais na utilização do
veículo, ou seja, são aqueles que quando concretizados nós não possamos dizer que nos são
surpreendentes em função das características que um veículo tem. Se assim é, temos a
possibilidade de recortar este conceito pela negativa. Não nos centrando naquilo que são aos
riscos próprios do veículo, recorremos às excepções:
aquelas que não são riscos próprios do veículo. É com isso que concorre o artigo 505º, três
circunstâncias em que os danos não ocorrem em virtude da concretização de riscos próprios do
veículo:
O acidente foi causado pelo próprio lesado;
O acidente foi causado pelo terceiro;
O acidente resultou de causa de força maior estranha ao funcionamento: uma causa de força
maior é um facto que é externo e irresistível (é algo que foge ao nosso controlo e que nos é
imposto num circunstancialismo, ficando nós a isso sujeitos). Sempre que o acidente é
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consequência destes factos, não existe responsabilidade porque os danos não correspondem a um
risco próprio do veículo.
Nos termos do 503º/2 diz-se que os inimputáveis respondem nos termos do artigo 489º
(responsabilidade dos inimputáveis no contexto da responsabilidade subjectiva). Isto significa
que a culpa não é um pressuposto da responsabilidade objectiva, já que esta existe
independentemente de culpa. Ainda assim, o Ordenamento Jurídico deu relevância à
circunstância de os requisitos a que faz referência o artigo 503º/1 se verificarem na esfera
jurídica de uma pessoa que seja inimputável. A ausência de susceptibilidade de culpa por se ser
inimputável pode levar a um aligeiramento ou anulação da responsabilidade em função da
aplicação dos critérios de equidade do artigo 489º.
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O artigo 505º diz-nos quando excluímos a responsabilidade. Este artigo tem uma parte inicial
que diz “sem prejuízo do disposto no artigo 570º”. Este artigo trata da culpa do lesado. O sentido
da remissão é que se existir culpa do lesado a indemnização pode ser mantida, limitada ou
excluída com base na gravidade da culpa de ambas as partes e das consequências que delas
resultarem. Isto significa que, o artigo 505º já excluí a responsabilidade se o acidente for
imputável ao lesado ou a terceiro.
Temos que distinguir, portanto, o que é a culpa do artigo 570º e o que é a imputação do artigo
505º, já que se fossem a mesma coisa não fazia sentido ressalvar a situação do 570º. Se o 505º
pudesse ser lido no sentido de quando o acidente fosse culpa do terceiro pudéssemos afastar a
responsabilidade não era preciso ir buscar nada ao 570º. A sua ressalva é então importante
porque:
• No artigo 505º é possível que o acidente seja imputável ao lesado sem que no seu
comportamento identifiquemos algo que seja merecedor de censura;
• Continuamos a relevar a aplicação do artigo 570º sabendo que por sua força a responsabilidade
é excluída sempre que a responsabilidade assente numa presunção de culpa; se isto acontece na
presunção de culpa, deve valer nos casos em que a responsabilidade é objetiva. Existindo
responsabilidade objetiva de uma determinada pessoa independentemente de culpa de uma
determinada pessoa, a circunstancia em que o lesado teve culpa exclui sempre a
responsabilidade.
• A referencia ao artigo 570º só tem um conteúdo prático efectivo nos casos em que a
responsabilidade e que esteja em causa seja uma responsabilidade subjectiva. É o que acontece
por exemplo no artigo 503º/3 a propósito do comissário.
Artigo 505º: o seu objecto é fixar os casos em que se excluí a responsabilidade de acordo com o
503º/1. Resulta directo do artigo 505º que quando o acidente tenha sido causado pelo lesado,
excluímos a responsabilidade porque não vai haver um risco próprio do veículo.
Se, não obstante, não ter causado o acidente, e existir da parte do lesado culpa na verificação dos
danos, temos a possibilidade de aplicar o artigo 570º. Aplicando este artigo, resulta que a
responsabilidade que estivemos a considerar como objectiva, a existência de culpa do lesado,
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deve, nos termos do 570º excluir a responsabilidade objectiva (artigo 570º/2). Se a
responsabilidade de que estivermos a falar for subjectiva, devemos aplicar o 570º/1 e 2 consoante
a situação. se a situação, apesar de subjectiva, assentar numa presunção de culpa, aplicamos o
nº2. Se a culpa for subjectiva e não existir presunção de culpa, aplicamos o nº1.
Artigo 506º: Temos aqui uma regra específica sobre colisão de veículos. Este artigo fala das
situações em que os veículos colidem e o responsável é mais do que um sujeito. Trata da
responsabilidade que existe nas relações entre proprietários dos veículos que colidam e não da
responsabilidade destes perante terceiro.
Se existir culpa, só o que tenha actuado com culpa é que responde e é obrigado a indemnizar.
Não existindo culpa, o critério da repartição é o do risco próprio do veiculo.
Artigo 507º: Este artigo 507º tem uma regra específica de solidariedade que diz que havendo
vários responsáveis perante um mesmo lesado, a responsabilidade deles é solidária nas suas
relações externas ainda que exista culpa de algum ou alguns deles. O lesado pode pedir
indemnização por inteiro a qualquer um dos responsáveis e depois, internamente, através do
direito de regresso, compõe-se a repartição da responsabilidade.
Artigos 504º e 508º: Estes artigos tratam de situações de limitação de responsabilidade objectiva
que levam a que uma pessoa responda pelos danos causados a outra independentemente do seu
comportamento.
O legislador decidiu adequar que a responsabilidade objectiva tivesse limitações. Temos
limitações quantitativas no artigo 508º. O lesado tem que demonstrar danos já que só é ressarcido
na medida dos seus danos. Porém, se eles excederem os limites máximos não são indemnizáveis.
Estes limites só são aplicáveis quando não haja culpa do responsável. Temos também limites
qualitativos que atendem à natureza dos beneficiários, tendo a ver com quem é indemnizado e
com que danos são indemnizados.
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A responsabilidade civil pré-contratual
A responsabilidade civil pré-contratual é considerada um terceiro tipo de responsabilidade civil.
Esta tem como especifico o contexto em que ocorre o facto produtor da responsabilidade. O facto
gerador da responsabilidade individualiza-se por se verificar nesse contexto: o contexto negocial.
O que a responsabilidade pré-contratual tem de especifico é o facto gerador de responsabilidade
ocorrer no contexto negocial e por haver violação de deveres que naquele contexto especifico são
concretização da boa-fé em sentido objectivo.O que caracteriza a responsabilidade pré-contratual
e a distingue é:
• Contexto negocial em que o facto gerador de responsabilidade ocorre
• Violação de deveres que naquele contexto especifico corresponde à violação da boa-fé em
sentido objectivo.
No direito Moçambicano, esta figura está prevista no artigo 227º - culpa na formação dos
contratos.
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Conclusão
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Bibliografia
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