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DIAGNÓSTICO DE COLANGITE ASSOCIADO À MUCOCELE

DA VESÍCULA BILIAR POR Cyniclomyces guttulatus EM CÃES


- RELATO DE CASOS*
Tássia Torres Furtado1, Gilberto Flausino2, Paulo Daniel de Sant’Anna Leal3, Juliana
Pinto Ferreira4, Douglas McIntosh5, Walter Flausino6, Walter Leira Teixeira Filho6,
Elan Cardoso Paes-de-Almeida8 e Carlos Wilson Gomes Lopes7+
ABSTRACT. Furtado T.T., Flausino G., Leal P.D. de S., Ferreira J.P., McIntosh D.,
Flausino W., Teixeira Filho W.L., Paes-de-Almeida E.C. & Lopes C.W.G. [Diagnosis
of cholangitis associate to mucocele in gallbladder due to Cyniclomyces guttulatus
in dogs - Case reports.] Diagnóstico de colangite associado à mucocele da vesícula
biliar por Cyniclomyces guttulatus em cães - Relato de casos. Revista Brasileira de
Medicina Veterinária, 35(1):1-6, 2013. Programa de Pós-Graduação em Ciências Vete-
rinárias, Instituto de Veterinária, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, BR 465
Km 7, Seropédica, RJ 23890-000, Brasil. E-mail: lopescwg@ufrrj.br
Vegetative cells of an ascomycete, morphologically similar to previously descrip-
tions of Cyniclomyces guttulatus were observed on the surface of the mucosa of the
gallbladder, in samples of gastric lavage and feces of two dogs with a history characte-
rized by diarrhea, vomiting, thickening of the stomach mucosa, and hypertrophy of the
gallbladder. The diagnosis of biliary cholangitis was confirming by ultrasound exami-
nation and changes in liver enzymes. For treatment of this ascomycete fluconazol was
used at a dose of 5mg/kg body weight which is efficient, because this was not observed
ascomycete cells in gastric lavage and feces samples of these animals after treatment.
KEY WORDS. Cyniclomyces guttulatus, gallbladder, dogs, natural infection, cholecystitis.

RESUMO. As células vegetativas de um ascomi- vesícula biliar. O diagnóstico de colangite biliar


ceto, morfologicamente semelhantes às descrições foi confirmando pelo exame de ultrassom e de al-
anteriores de Cyniclomyces guttulatus foram ob- terações nas enzimas hepáticas. Para o tratamento
servadas sobre a superfície da mucosa da vesícu- deste ascomiceto foi utilizado fluconazol na dose de
la biliar, em amostras de lavagem gástrica e fezes 5mg/kg de peso corporal, que foi eficiente, por não
de três cães com história caracterizada por gastrite ser observado células deste ascomiceto na lavagem
e colangiohepatite, com diarreia, vômitos, espes- gástrica e nas amostras de fezes destes animais após
samento da mucosa do estômago e hipertrofia da o tratamento.
*Recebido em 19 de novembro de 2011.
Aceito para publicação em 7 de janeiro de 2013.
1
Bióloga, Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias (PPGCV), Instituto de Veterinária (IV), Universidade Federal Rural do Rio
de Janeiro (UFRRJ), BR 465 Km 7, Seropédica, RJ 23897-970, Brasil. E-mail: tassia@ufrrj.br
2
Médico-veterinário, Zootecnista, DSc. Departamento de Microbiologia, IV, UFRRJ, BR 465 km 7, Seropédica, RJ 238897-970. E-mail:
gilflausino@ufrrj.br
3
Médico-veterinário, M.Med.Vet., PPGCV, IV, UFRRJ, BR 465 Km 7, Seropédica, RJ 23.897-970. E-mail: paulodaniel@ctiveterinario.com.br
4
Médica-veterinária, Centro de Terapia Intensiva e Emergência Veterinária, Av. das Américas, 3939, Bl. 2, Lj I, Shopping Esplanada da
Barra, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, RJ 22631-003. E-mail: ctiveterinario@ctiveterinario.com.br
5
Microbiologista, PhD. Departamento de Parasitologia Animal (DPA), IV, UFRRJ, BR 465 Km 7, Seropédica, RJ 238897-970. E-mail:
mcintosh@ufrrj.br
6
Biólogo, PhD. DPA, IV, UFRRJ, BR 465 Km 7, Seropédica, RJ 238897-970. E-mails: flausino@ufrrj.br, leira@ufrrj.br - bolsista CNPq.
7
Médico-veterinário, PhD, LD. Departamento de Parasitologia Animal, IV, UFRRJ, BR 465 Km 7, Seropédica, RJ 238897-970. +Autor para
correspondência. E-mail: lopescwg@ufrrj.br - bolsista CNPq.
8
Médica-veterinária, DSc., Departamento de Ciências Básicas, FCB, Universidade Federal Fluminense, Pólo Universitário de Nova Fribur-
go, Rua Dr. Sílvio Henrique Braune 22, Centro, Nova Friburgo, RJ 24020-420, Brasil. E-mail: elancardozo@gmail.com

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Tássia Torres Furtado et al.

PALAVRAS-CHAVE. Cyniclomyces guttulatus, vesicular bi- e fungos, os isolados mais comuns são a Escheri-
liar, infecção natural. chia coli e Enterobacter, Enterococcus, e Clos-
tridium (Wagner et al. 2007). Dentre as infecções
INTRODUÇÃO fúngicas, a presença de um ascomiceto do gênero
As doenças que acometem o sistema hepatobiliar Cyniclomyces vem sendo assinalada com alguma
em cães, em particular a obstrução biliar extra-he- frequência em fezes de cães (Houwers & Blankens-
pática ocorre quando há alteração no fluxo normal tein 2001, Gjerde et al. 2009, Dijkstra et al. 2010,
da bile, devido a diversas causas. Historicamente, Flausino et al. 2012), estômago (Flausino et al.
a incidência de doenças restritas à vesícula biliar 2012) e associado a colecistite supurativa e colan-
é baixa, no entanto, com o uso de diagnóstico de giohepatite em cães (Neel et al. 2006), em cães com
rotina de ultrassonografia abdominal, a incidência gastrite crônica foram encontradas quantidades de
de mucocele da vesícula biliar e colelitíase têm au- C. guttulatus no lavado gástrico e nas fezes, sendo
mentado (Center 2009). Em geral, são achados de que o seu diagnóstico foi baseado na identificação
exame e dificilmente implicam em sinais clínicos microscópica, no isolamento através de cultivo e no
identificáveis, porque frequentemente estes são dis- sequenciamento do DNA desta espécie encontrada
cretos, temporários e recidivantes. A icterícia é mais no Brasil (Flausino et al. 2012).
notada quando material lodoso ou cálculos causam O presente trabalho teve como objetivo assinalar
a obstrução do ducto biliar (Slatter 1998). Tam- o diagnóstico e tratamento da infecção natural por
bém podem ser notados vômito, depressão, perda C. guttulatus associado à colangite e colângiohepa-
de peso, febre, desidratação, fezes acólicas e dores tite em três cães.
abdominais associadas à colecistite ou obstrução
do ducto biliar (Slatter 1998, Willard & Fossum HISTÓRICO
2005). A ultrassonografia pode auxiliar na detecção Três cães foram atendidos no Centro de Terapia
de obstrução de vias biliares e suas causas (Willard Intensiva e Emergência Veterinária (CTIVet), lo-
& Fossum 2005). A mucocele da vesícula biliar é calizado na Barra da Tijuca, município do Rio de
diagnosticada com maior frequência em cães, mas Janeiro, RJ; uma cadela com 13 anos da raça Sch-
a sua verdadeira incidência permanece incerta. A nauzer e os outros com 17 anos de idade e sem raça
causa subjacente a esta condição ainda é contro- definida.
versa, mas há uma forte associação com a hiperpla-
sia das glândulas mucosas no epitélio da vesícula Caso 1
biliar. Embora o tratamento cirúrgico tenha sido o Portador de insuficiência cardíaca congestiva,
tratamento de eleição (Willard & Fossum 2005), a emagrecimento progressivo nos últimos oito me-
evidência baseada em casos recentes sugere que al- ses, anorético há dois dias, episódios de vômitos,
guns pacientes podem responder ao tratamento mé- de diarreia há 15 dias, prostrado, dispneico, fraque-
dico (Quinn & Cook, 2009). Mucocele geralmente za muscular presente e com 11,6 kg de peso vivo.
são relatados em cães de pequeno e médio porte, Ao exame clínico apresentava aumento abdominal
cães pastores de Shetland e Cocker spaniels são sugestivo de ascite, temperatura retal de 37,80C;
mais acometidos (Worley et al. 2004), assim como frequência cardíaca de 120 batimentos por minuto,
raças pequenas como Schnauzer (Mehler & Bennett frequência respiratória de 32 movimentos por mi-
2006). A maioria dos pacientes com mucocele são nuto, pulso arterial de apresentação intensa; tempo
mais velhos (média de idade de 9 anos), predileção de preenchimento capilar de 3 segundos; palidez da
por sexo não tem sido estabelecida (Neer 1992). mucosa oral, taxa de desidratação em torno de 6%.
Pode ser difícil compreender as diferenças entre
lama biliar e mucocele no exame ultra-sonográfico, Caso 2
lama biliar é móvel e dependente da gravidade, en- Portador de insuficiência cardíaca congestiva,
quanto que mucocele é imóvel e exibe um padrão hiperadrenocorticismo, doença periodontal, gengi-
distinto estriado ou estrelado (Besso et al. 2000). vite, halitose intensa, eventuais episódios de vômi-
Para o diagnóstico além dos testes laboratoriais tos e com 14 kg de peso vivo. Ao exame clínico
de rotina, a colecitocentese pode ser realizada, com apresentava temperatura retal de 38,80C; frequência
o objetivo do isolamento do microorganismo res- cardíaca de 112 batimentos por minuto, frequência
ponsável através de cultura de aeróbios, anaeróbios respiratória de 40 movimentos por minuto, pulso

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Diagnóstico de colangite associado à mucocele da vesícula biliar por Cyniclomyces guttulatus em cães - Relato de casos

arterial de apresentação intensa; tempo de preenchi- pequenas cadeias com morfologia semelhante ao do
mento capilar de 2 segundos, ausculta torácica com gênero Cyniclomyces (Figura 1a), indicando a ne-
sibilo expiratório. cessidade de coleta de material estomacal, devido
ao fato de C. guttulatus estar associado à gastroen-
Caso 3 terite em cães. Através de lavado gástrico, utilizan-
Anorético há dois dias, prostrado, dispneico, com do sonda nasogástrica número 8, seringa de 60 mL
7,5 kg de peso vivo. Ao exame clínico apresentava e solução fisiológica a 0,8%, sem necessidade de
aumento abdominal localizado na região hepática, medicação pré-anestésica foi coletado material que
temperatura retal de 38,8°C; frequência cardíaca no exame direto foi observado células levedurifor-
de 128 batimentos por minuto, frequência respira- mes cilíndricas em pequenas cadeias com morfolo-
tória de 40 movimentos por minuto, pulso arterial
de apresentação intensa; tempo de preenchimento
capilar de 2 segundos.
Com o intuito de diagnóstico, foi solicitado exa-
me de imagem ultrassonográfico do abdômen, cole-
ta de fezes da ampola retal e sangue da veia jugular
direita, com uma seringa de 8 mL, com agulha 25
x 7 mm, onde 3 mL foi acondicionado em tubo de
ensaio pediátrico com ácido etilenodiaminotetracé-
tico (anticoagulante-EDTA), e 5 mL em tubo de en-
saio pediátrico sem anticoagulante, com o material
da própria seringa foi feito dois estiraços sanguí-
neos corados com Panótico Rápido LB para conta-
gem específica dos leucócitos e observações perti-
nentes. As amostras foram processadas no próprio
CTIVet, com a utilização de aparelho automático
(Ms4-Vet-Melet Schloesing Laboratoires coulter),
Refratômetro Portátil e Microcentrifuga (E3500108
MICROSPIN CDR), para hemograma completo
(leucograma, eritrograma, plaquetometria e prote-
ína total) e concentrado de leucócitos e plaquetas
(capa leucocitária) em dois estiraços em lâminas de
vidro, obedecendo a mesma técnica de fixação, de-
sidratação e coloração para o estiraço sanguíneo. As
amostras sem anticoagulante foram centrifugadas
em centrífuga (Mod. 208N, Excelsa Baby, marca
Fanem Ltda.) a 350 x g por 10 minutos, para separa-
ção do soro, e utilizando pipeta automática de 32μl,
para alaninaminotranferase (ALT), bilirrubina total
(BT), fosfatase alcalina (FAL), uréia (UR), Gama-
glutamil transferase (GGT) em aparelho de fotome-
tria de reflectância in vitro Reflotron® Plus (Roche
Diagnostics GmbH, Mannheim-Baden-Württem-
berg) e utilizando o conjunto Katal Biotecnológica
Ind. & Com Ltda, se obteve à determinação da al-
bumina (g/dL).
Amostras de fezes foram coletadas e examinadas
com a utilização da técnica de centrifugo-flutuação
com solução saturada de açúcar (Birgel et al. 1977).
Figura 1. Cyniclomyces guttulatus (¨) observado nas fezes
Nas fezes de dois animais (1 e 2), foram observadas (a), lavado gástrico a fresco (b) e em meio de cultura YPGA
células leveduriformes cilíndricas, isoladas ou em (c) 400X.

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Figura 2. Vesícula biliar de cão: mucosa com pseudovilosidades (a) 40X; formas vegetativas no entorno da pseudo-
vilosidade (b) 200X; células vegetativas de Cyniclomyces guttulatus na superfície da mucosa e sedimento (¨) (c)
1000X; e, em maior número, no sedimento (¨) (d ) 1000X. H.E.

gia semelhante ao do gênero Cyniclomyces (Figu- Para o isolamento, o material procedente do lavado
ra 1b). As amostras coletadas foram devidamente gástrico e fecal foi processado de acordo Flausino et
acondicionadas em caixas isotérmicas e, imediata- al. (2012). Além disso, foram obtidas colonias iso-
mente, levadas para o Laboratório de Coccídios e ladas do material fecal de coloração ambar ao mar-
Coccidioses, Departamento de Parasitologia Ani- ron em meio YPGA (Figura 1c), com características
mal, Instituto de Veterinária, UFRRJ. Amostras do próprias (cheiro e forma) de C. guttulatus (Flausino
conteúdo estomacal foram coradas a fresco, entre et al. 2012). Preparados, entre lâmina e lamínula,
lâmina e lamínula, pelo azul de algodão lactofenol de colonias isoladas, suspensas em solucão salina
de Amann (Rippon 1974) e, desidratadas em meta- a 0,85% e coradas pelo azul de algodão lactofenol
nol e coradas pelo Giemsa (Flausino et al. 2012). mostraram células com morfologia semelhante a do
Tabela 1. Análise laboratorial dos animais com diagnóstico para Cyniclomyces guttulatus
associado à colangite.
Parâmetros Valores em mg/dL
Caso 1 Caso 2 Caso 3 Referênciab
Avaliaçõesa Avaliações Avaliações
Antes Após Antes Após Antes Após
Albumina 2,10 2,8 -c - 3,7 2,2 2,8
ALT (TGP) 246 77,9 43,9 <0,5 71,7 473 C<89
Bilirrubina Total 4,48 <0,5 - 272 0,3 0,3 C<0,5
Fosfatase Alcalina 1420 114 132 72,1 1310 3900 C<164
Uréia 84,9 72,1 33,6 <0,5 88,6 - C<54
Gama GT 17,3 16,0 - 65,8 < 5,0 251 C<20
a
Antes e após tratamento com fluconazol 5mg/kg de peso vivo
b
Roche Diagnostics GmbH, Mannheim-Baden-Württemberg, RFA
c
Não avaliado (-)

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Diagnóstico de colangite associado à mucocele da vesícula biliar por Cyniclomyces guttulatus em cães - Relato de casos

gênero Cyniclomyces. No caso 3, após a remoção manisfestaram por episódios de vômito, diarréia
cirúrgica da vesícula biliar, fragmentos da mesma (Houwers & Blankenstein 2001, Gjerde et al. 2009,
foram fixados em formol histológico, emblocados Dijkstra et al. 2010, Flausino et al. 2012,) e colangi-
em parafina e, mais tarde, corados em Hematoxi- te (Neel & Tarigo 2006), foi com antifúngico sistê-
lina e Eosina. Na Figura 2 podem-se observar as mico, fluconazol, que possui largo espectro de ação
pseudovilosidades na mucosa da vesícula biliar e, e efeitos tóxicos bastante reduzidos e com a melhor
a presença de células vegetativas de C. guttulatus absorção dentre os antifúngicos de sua categoria
agrupadas em meio ao sedimento localizado sobre a (Nobre et al. 2002), foi utilizado na dose de 5mg/kg
superficie da mucosa e no muco biliar. de peso vivo (Sharp et al. 1991, Nobre et al. 2002),
o qual se mostrou eficiente, pois não ocorreu a ob-
DISCUSSÃO servação dessas estruturas no lavado gástrico e nas
Nos três animais desse estudo foram isolados do fezes, este foi preferido ao itraconazol, pois este já
lavado gástrico, fezes (exceção do animal 3), bile e se mostrou incompetente no tratamento deste asco-
visualizado no corte histológico da mucosa da ve- miceto (Gjerde et al. 2009) e a nistatina que em ex-
sícula biliar o ascomiceto C. guttulatus, que esteve periência recente para tratamento de C. guttulatus
associado aos sinais clínicos caracterizados por vô- indicou que a dosagem mais eficaz para cães e gatos
mito e diarréia a semelhança do que foi assinalado é de 50.000 UI /kg, via oral a cada 24 horas por 4
por Houwers & Blankenstein (2001), Gjerde et al. dias (Peters & Houwers 2009) ou de 500.000 UI/30
(2009), Dijkstra et al. (2010) e Flausino et al. (2012). kg de peso corporal (Gjerde et al. 2009), porém é
Além disso, o animal do caso 2 apresentava imagem extremamente tóxica para uso parenteral e nas do-
ultrassonográfica sugestiva de gastrite e com a ob- ses terapêuticas por via oral a absorção pelo trato
servação de grande quantidade de cadeias longas gastrointestinal é praticamente inexistente (Sande
deste ascomiceto, formando pseudo-hifas no lavado & Mandell 1987). Apesar de Escherichia coli, En-
gástrico semelhante à descrição prévia de Flausino et terobacter, Enterococcus, e Clostridium serem co-
al. (2012). O animal do caso 3 apresentava imagem muns (Wagner et al. 2007), não havia envolvimento
ultrassonográfica sugestiva de colangite, com gran- bacteriano nos três casos observados, a não ser a
de distensão da vesícula biliar e mucocele severa. presença de C. guttulatus, caracterizando como co-
Os resultados laboratoriais foram sugestivos langite exclusivamente em decorrência de um único
para doença hepatobiliar com aumento da atividade agente etiológico. Segundo Neel et al. (2006), há
de transaminases parenquimatosas (alanina amino- necessidade que haja a presença de um agente etio-
transferase, aspartato aminotransferase) animais 1 e lógico para que ocorra colangite clínica.
2 e enzimas colestáticas (fosfatase alcalina e gama-
-glutamil transferase) (Center 2009) e no exame REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
de imagem ultassonográfico, principal para o diag- Aguirre A.L., Center S.A., Randolph J.F., Yeager A.E.,
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Fossum 2005, Romero et al. 2008). Além disso, foi
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observada a presença de sedimento biliar com mu- Besso J.G., Wrigley R.H., Gliatto J.M. & Webster C.R. Ul-
cocele, visto que os três animais do presente estudo trasonographic appearance and clinical findings in 14
tinham idade entre 13 e 17 anos, de porte médio a dogs with gallbladder mucocele. Vet Radiol Ultrasound,
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